3.2 - Moura - Plantão Psicológico Na Escola o Aluno Como Centro

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PLANTÃO PSICOLÓGICO NA ESCOLA: O ALUNO COMO CENTRO

 
 
Ivânia F. C. Moura*;
Érica L. Oliveira*;
Tatiana M.
Brilhante*;
Dener L. Silva**
Disponível em: http://www.ichs.ufop.br/conifes/anais/EDU/edu0515.htm.
Acessado em 05-03-2014
 
 
INTRODUÇÃO
O procedimento psicoterapêutico denominado Plantão Psicológico visa trabalhar
as demandas urgentes e imediatas levantadas pelo cliente no momento de tomada de
consciência de seu sofrimento psíquico. Trata-se de um atendimento em nível
emergencial, distinguindo-se, portanto, de uma psicoterapia tradicional cujas bases e
procedimentos caracterizam-se pelo estabelecimento de um “setting” específico:
atendimento sistemático e de longo prazo com vistas à uma integração profunda e
permanente na pessoa atendida.
Carl Rogers, psicoterapeuta americano que juntamente com outros profissionais
e teóricos da Psicologia Contemporânea (Maslow, Frankel, Erickson) acabaram por
revolucionar a postura e o entendimento do fazer Psicoterápico, foi um dos fundadores
da Psicologia Humanista que dá base ao trabalho no Plantão Psicológico.
A Psicologia Humanista surgiu como resposta à uma “crise” estabelecida entre os paradigmas do
Comportamentalismo de um lado e os da Psicanálise do outro. Dividida entre o entendimento do Homem
como comportamento resultante das contingências as quais ele é exposto (Comportamentalismo) ou um
entendimento pautado nas emoções, desejos e um aparelho psíquico autônomo – inconsciente
(Psicanálise), a Psicologia procurava um entendimento do Homem que incorporassem as noções de
liberdade, busca de sentido e positividade. O Humanismo surge como resposta a estes anseios, como
afirmação de uma positividade na Natureza Humana, não no sentido Russeauliano ( de uma origem boa e
pacífica) mas no sentido de uma busca e de uma necessidade de estar se aperfeiçoando, buscando graus
cada vez mais elevados de auto-integração e realização. A teoria Humanista, e mais precisamente o
trabalho de Rogers, acabaram por influenciar inúmeros campos do fazer humano como a educação, o
relacionamento familiar, o trabalho etc.
No que concerne ao encontro terapêutico, Rogers afirmou que este deve ser
pautado no tripé Empatia, Congruência e Aceitação Incondicional. Empatia entendida
como o movimento afetivo-cognitivo do terapeuta em direção a perspectiva
fenomenológica do cliente, ou seja, ao modo como este último percebe e sente o mundo.
Por sua vez, Congruência exige do terapeuta que este esteja consciente de seu universo
fenomenológico (percepções, sentimentos, juízos etc.) e expresse tal universo na medida
em que isto possa auxiliar o cliente a tomar contato com seu próprio campo, focando o
processo no relacionamento presente entre terapeuta e cliente. Finalmente, Aceitação
Incondicional diz respeito à postura do terapeuta em criar um “clima” de acolhimento,
em que o sujeito possa sentir-se à vontade para expressar-se livremente, sem que tenha
que recorrer à papeis ou posturas estereotipadas.
Uma vez que assim se estabeleça o relacionamento entre Psicoterapeuta e
Cliente, tal “encontro” resultará na promoção da saúde. Saúde aqui entendida não
apenas como ausência de doenças mas como bem-estar advindo do equilíbrio entre os
fatores físicos, psicológicos/afetivos e sociais.
Durante o ano de 2000 uma equipe de psicologia, composta por professor e
estagiários, desenvolveu uma experiência de Plantão Psicológico em uma escola de 1º e
2º Grau de São João del Rei. A referida escola contava, naquele momento, com um
contingente de aproximadamente 1300 alunos e 90 funcionários distribuídos entre os
três turnos de funcionamento. A equipe de Psicologia já havia, durante o ano anterior,
efetivado trabalhos de Psicologia Educacional na escola.
Na experiência do estágio, aqui parcialmente relatada, a Equipe de Psicologia
optou por uma intervenção que compreendesse a escola como um todo. Em decorrência
disto foram escolhidos métodos de trabalho que correspondessem a este modelo de
atuação, como análise institucional, do cotidiano escolar e das pessoas que dele
participavam. Deste modo, a equipe realizou diferentes atividades – que eram
modificadas de acordo com as necessidades da escola e também com a capacidade da
equipe - ao longo da intervenção. O dispositivo do Plantão Psicológico veio de encontro
com a postura tomada pela equipe, que era de fortalecer os pontos positivos de seus
clientes, desenvolver novos meios de solucionar seus problemas acreditando que o
cliente já possuía recursos próprios para solucioná-los. Nota-se aqui, a coerência da
postura tomada pela equipe com a proposta Humanista de Rogers.
A proposta de se implantar o Plantão Psicológico surgiu da própria equipe, como
forma alternativa de atendimento para se oferecer aos alunos. Durante as primeiras
reuniões da Equipe de Psicologia com os professores e dirigentes da escola naquele ano
falou-se da possibilidade de oferecer este novo serviço, fato que de imediato foi aceito e
aclamado como de fundamental importância. Este rápido e “explosivo” acolhimento da
nova proposta deve-se a alguns fatores: a) tradicionalmente a escola se exime de
participar das discussões sobre as causas do fracasso e indisciplina escolares. A “culpa”
recai, geralmente, sobre a figura do aluno e seus familiares; b) o serviço de Plantão
Psicológico seria oferecido para todos os turnos da escola criando um “clima” de
segurança psicológica; c) a escola precisaria disponibilizar apenas uma sala para que o
serviço pudesse ser estabelecido; d) o serviço seria gratuito tanto para a escola quanto
para a clientela atendida, uma vez que seria realizado por alunos voluntários. Tais
fatores, no nosso entender, acabam por concretizar um quadro de baixo
comprometimento por parte da escola em relação ao Serviço de Psicologia oferecido na
escola.
O dispositivo Plantão Psicológico vem sendo utilizado com sucesso no contexto
escolar (Mahfoud, 1999), tradicionalmente no atendimento dos alunos e com resultados
que justificam sua continuidade (Mahfoud, 1999; Bellas, 1999). Apesar de só agora
estar sendo discutido e de ganhar uma maior visibilidade, o Plantão Psicológico teve sua
implantação, no Brasil, na década de 70 em diferentes contextos, dentre eles o
educacional (Rosenberg, 1987).
 
 
METODOLOGIA
 
As atividades iniciaram-se pela seleção dos plantonistas. Os critérios adotados
foram interesse, disponibilidade e/ou que estivessem exercendo outras atividades
naquela escola.
A equipe era composta por 7 plantonistas e um supervisor que também atendia
no Plantão. Reunia-se duas vezes por semana para supervisão e grupo de estudo. Este
foi organizado com o objetivo de aprofundar-se teoricamente, dando um suporte técnico
para o estagiários; esse grupo orientava as etapas a serem seguidas e o material a ser
estudado. Tais atividades ocorreram durante todo o estágio.
Promoveu-se um mini-curso de capacitação para atendimento em Plantão
Psicológico para a Equipe de Psicologia, ministrado pelo professor Dr. Miguel Mahfoud
(UFMG), que juntamente com seus estagiários desenvolviam uma experiência de
Plantão em escolas públicas e particulares da grande BH.
Iniciou-se o trabalho através de uma intensa propaganda na escola. Efetuou-se
visita a todas as salas de aula, em todos os turnos, explicando-se o que seria o Plantão
Psicológico e respondendo às perguntas dos alunos. Perguntas do tipo “o que faz o
psicólogo?”, “qual a diferença entre o psicólogo e o padre?”, “eu não sou louco, porque
eu preciso ir ao Plantão?”, foram as mais freqüentes. Ainda nesta etapa de divulgação,
pedimos para a direção da escola que as músicas do CD que acompanha o livro “Plantão
Psicológico: novos horizontes”, organizado pelo professor Miguel Mahfoud, fossem
tocadas nos intervalos de recreio durante três semanas nos três turnos. Nosso intuito era
o de tornar o tema e as questões do Plantão familiares e próximas das realidades dos
alunos, uma vez que as músicas eram voltadas para o público jovem, com ritmos
variados entre o Rap e o Rock. Foram afixados cartazes pelo pátio da escola e
distribuídos bilhetes informativos convidando e explicando sobre o Plantão Psicológico.
Neste período pôde-se conhecer mais a instituição, compartilhar expectativas e
aprofundar na teoria existente do Plantão Psicológico. A divulgação precisou ser
retomada em função dos adventos da greve e da diminuição da procura pelo
atendimento.
O Plantão funcionava nos três turnos da escola, com 2 horas por turno. A
princípio 2 dias por semana (3ª e 5ª feiras), após as duas greves (dos Funcionários
Públicos Estaduais e Federais) passou-se para 3 dias ( 2ª, 4ª e 6ª feiras). Cada
plantonista atendia uma vez por semana, em um turno somente.
Uma das características do serviço foi a exigência do não encaminhamento dos
alunos pela direção ou pelos professores. Tal solicitação que, no início criou impasse
entre a Equipe e a Escola, foi melhor explicitada e aceita a partir das reuniões entre as
mesmas. Também pediu-se para a escola que permitisse ao aluno uma maior liberdade
em decidir quando ir ao Plantão. Assim, este poderia se ausentar da sala de aula quando
achasse necessário. No decorrer dos trabalhos, tal permissão foi questionada por muitos
professores, uma vez que começaram a ocorrer, por parte de alguns alunos, a saída para
o Plantão com o intuito de “cabular” aula.
A duração de uma sessão variou de acordo com a disponibilidade interna do
cliente para entrar em contato com suas questões e chegar a uma tomada de decisão. A
instituição disponibilizou duas salas para atendimento, uma para tarde e noite, e outra
para manhã.
Os atendimentos aconteceram de março a novembro de 2000, interrompidos por
dois meses devido às greves do funcionalismo estadual e federal. Cada estagiário
registrava seus atendimentos em relatórios individuais para posterior análise.
Nos atendimentos o aluno pôde tratar de quaisquer questões que achasse
relevantes e estivessem interferindo de alguma forma em sua vida pessoal/escolar sendo
ouvido e ajudado pelo plantonista a sentir-se sujeito de sua existência.
 
RESULTADOS
 
No período compreendido entre março e novembro de 2000 foram realizados um
total de 90 sessões de atendimentos individuais e grupais, nos 3 turnos.
Os relatórios elaborados pelos plantonistas de cada atendimento foram
analisados e, a posteriori, categorizados.
Em 90 sessões, foram atendidas 108 pessoas, a diferença, entre o número de
sessões e de pessoas atendidas se deve ao fato de 22% dos atendimentos serem em
Nº DE ATENDIMENTO EM RELAÇÃO À IDADE

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QUANTIDADE ( % )
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IDADE ( ANOS )

grupo, e 78 % individuais. De acordo com os dados a forma de atendimento individual


predominou.
As pessoas do sexo feminino procuraram mais o plantão psicológico, perfazendo
70% dos atendidos, do que as pessoas do sexo masculino, com 30% . Um dado
importante a ser considerado é que 5 dos 8 plantonistas eram do sexo feminino.
No que se refere a idade das pessoas atendidas, as que mais procuraram o
Plantão Psicológico foram as que possuíam 12 anos, perfazendo 16,4% dos
atendimentos, enquanto as de 16 e 17 anos, com 13% cada, as de 14 anos com 11,7% e
as de 13 anos com 10,5%. As pessoas com 21, 22, 24 e 32 anos, apareceram com
porcentagens iguais, 2,3% dos atendimentos, e as de 20 e 23 anos aparecem com 1,2%
cada. Não houve procura na faixa etária entre 25 anos e 31 anos. Os dados
demonstraram que os pré-adolescentes e adolescentes procuraram com maior freqüência
o Plantão Psicológico do que os adultos.
 
Nº DE ATENDIMENTO POR SÉRIE

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QUANTIDADE ( % )

50
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SÉRIE

Os atendimentos categorizados por série apontam o Ensino Médio (2º grau) com
55% dos atendimentos, sendo que os 1º anos perfizeram 30,6% do total. O Ensino
Fundamental foi apontado com 45% dos atendimentos, sendo que a 5ª série perfez 21%.
Nº DE ATENDIMENTO E DURAÇÃO DA SESSÃO

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Nº DE ATENDIMENTOS ( % )
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TEMPO DE ATENDIMENTO

Os dados demonstram uma pequena diferença (5%) entre o Ensino Médio e


Fundamental, mas com predomínio do primeiro na procura do Plantão Psicológico.
 
 
No que se refere a duração da sessão, o atendimento de 40 min. perfez 24,5% do
total dos mesmos. A duração de 30 min. foi a segunda mais freqüente correspondendo a
17% e a de 60 min. a 11%. Apesar da duração das sessões serem variadas e obedecerem
a escolha/disposição do atendido, os dados apontam que mais da metade dos
atendimentos tiveram duração de sessão semelhante à convencional da área clínica.
DEMANDAS IDENTIFICADAS NO ATENDIMENTO

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PORCENTAGEM (%)

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DEMANDAS IDENTIFICADAS

 
A demanda que mais solicitou atendimento durante o trabalho foi a relacionada
aos problema familiares, estando presente em 21,5% deles. Os problemas relacionados a
namoro apareceram em 19% dos casos, a ansiedade, pensamentos negativos e angústia
em 13%.
 
 
Através da análise dos dados e interpretação dos resultados, chegou-se a
conclusão que, aproximadamente, 80% destes atendimentos mostraram-se eficientes e
deliberativos, resultando na tomada de decisão e ou atitude positiva por parte do cliente,
meta final do Plantão Psicológico.
 
CONCLUSÃO
 
Ao término da intervenção, verificou-se que o Plantão Psicológico é uma
possibilidade de atuação eficaz no contexto escolar, cujo sucesso depende não só da
habilidade dos plantonistas (os pilares do encontro terapêutico), mas também do
esclarecimento do que este tipo de serviço oferece e de suas regras características.
Portanto, é necessário a criação de um espaço que seja reconhecido como um lugar para
elaborações de experiências, percebidas pelo cliente como um sofrimento ou como algo
de grande significado, culminando na compreensão ampla dessas e em uma conseqüente
tomada de decisão ou posicionamento frente à situação. Esse esclarecimento deverá ser
feito primeiramente através da clareza do projeto de intervenção apresentado à direção
da escola. Uma vez aceito, a escola estará comprometida a manter as condições básicas
do Plantão Psicológico, citadas anteriormente. Outra forma de esclarecimento deverá ser
direcionado aos alunos. Essa etapa será executada anterior a implantação do Plantão
Psicológico.
Percebeu-se que esse trabalho inicial de esclarecimento e divulgação foi de
fundamental importância para um melhor aproveitamento do Plantão Psicológico,
como para sua diferenciação da Psicologia Clínica, e para o entendimento da Psicologia
Educacional/ Escolar de uma forma geral. Embora, não seja a proposta deste texto a
diferenciação da Psicologia Escolar de uma Psicologia Clínica aplicada à escola, torna-
se necessário citá-la, uma vez que esta, influenciou diretamente na participação da
escola e consequentemente nos resultados do trabalho.
O Plantão Psicológico avaliado isoladamente, não considerando as outras intervenções presentes
na escola, demonstrou o quanto pode ser eficaz para a promoção da saúde das pessoas que o procuram,
independente do contexto em que elas estão inseridas, uma vez que este dispositivo foca exclusivamente
o bem estar destas. Porém, uma vez atendendo a clientela pertencente ao contexto específico estará
beneficiando este local como um todo.
Além disso, os dados obtidos após a análise dos atendimentos permitiu a elaboração de um perfil
do cliente atendido, de suas principais demandas e o alcance do Plantão, como também forneceu uma
noção sobre os seus próprios limites. Foi possível perceber, como demonstrado acima, que há uma
predominância de certas queixas. Enfim, o cruzamento dos dados abre um novo leque de possibilidades
para se trabalhar na escola, o Plantão Psicológico além de ser um dispositivo eficiente de intervenção no
contexto escolar, pode ser utilizado como um instrumento de diagnóstico.
 
 
* Acadêmicos de Psicologia, FUNREI
** Professor Assistente III, FUNREI
E-mail: [email protected]
 
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA:
 
AMATUZZI, M.M. O que é Ouvir. Estudos de Psicologia, Campinas, v.7, n° 2, p. 86-
97, ago/dez., 1990.
BELAS, J.I. Plantão Psicológico. Abril/1998.
DAYRELL, J.T.A. A Escola como Espaço Sócio-cultural. In: Educação e Cultura:
Múltiplos Olhares. Belo Horizonte: UFMG, 1996, p. 1-30.
 
 LUKAS, E. Como a Família pode lidar com Pessoas Psiquicamente Doentes. In:
Mentalização e Saúde. Petrópolis: Vozes, 1990, p. 105-18.
MAHFOUD, M. (org.). Plantão Psicológico: Novos Horizontes. São Paulo:
Companhia Ilimitada, 1999.
ROSENBERG, R.L. Aconselhamento Psicológico Centrado na Pessoa. São Paulo:
EPU, 1987 (Temas Básicos de Psicologia, v.21), 2a ed.
ROGERS, C.R. Um Jeito de Ser. São Paulo: EPU, 1983, 5a ed.
 

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