06 Inalatorios
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INALATÓRIOS
Colaboraram nesta edição:
Conteúdo produzido por:
Portal Anestesia
Diretor Científico:
Dr. Eduardo Piccinini
CRM: 91189 - SP
Responsável pelo tema:
Dra. Betina Borges
CRM: 26521 - RS
Não se esqueça que todas as suas dúvidas poderão ser sanadas no e-mail
[email protected]. Todas as mensagens são encaminha-
das ao professor responsável pela sua aula.
Com carinho,
Equipe Portal Anestesia
Bons estudos!
PRINCIPAIS CONCEITOS
• A descoberta do gás do riso, o óxido nitroso (N2O), foi a largada
para o início da anestesia. Depois surgiu o éter, clorofórmio e ou-
tros agentes.
• O halotano foi o primeiro anestésico inalatório utilizado na era
moderna, mas devido a sua alta solubilidade sanguínea perdeu
espaço para outros de baixa solubilidade, como o sevoflurano e
desflurano.
• O N2O é capaz de expandir cavidades que contém ar devido a sua
alta difusibilidade; deve ser evitado nos casos de pneumotórax,
pneumoencéfalo e timpanoplastias.
• São fatores importantes na velocidade de indução dos anestési-
cos inalatórios: ventilação minuto, débito cardíaco, solubilidade
sanguínea do agente, diferença alvéolo-venosa e concentração
anestésica oferecida.
• Dentre esses fatores, a solubilidade sangue-gás é uma das mais
importantes, pois influencia significativamente na velocidade de
indução e de recuperação.
• A concentração alveolar mínima ou CAM é a concentração alve-
olar à 1 atm que produz ausência de resposta a estímulo cirúrgi-
co em 50% dos pacientes; é uma medida de potência, sendo que
quanto maior a CAM, menor será a potência.
• Exceto para crianças menores que 1 ano, a CAM varia inversa-
mente com a idade, atingindo seus menores valores após os 80
anos.
• Os inalatórios diminuem a taxa metabólica cerebral e aumentam
a pressão intracraniana de forma dose dependente; hipocapnia
pode amenizar ou abolir a vasodilatação cerebral em alguns ca-
sos.
• Os inalatórios produzem cardiodepressão e vasodilatação de uma
PRINCIPAIS CONCEITOS
maneira dose dependente. O halotano apresenta uma depressão
miocárdica direta e também é muito arritmogênico.
• Produzem queda do volume corrente, aumento da frequência res-
piratória, inibição da resposta à hipercarbia e hipóxia de maneira
dose dependente; são broncodilatadores.
• N2O apresenta a capacidade de inibir a metionina sintase, enzima
envolvida na produção da vitamina B12; em alguns casos houve
alterações hematológicas e neurológicas.
• Toxicidade dos anestésicos inalatórios está relacionada a sua
metabolização, atingindo principalmente o fígado e os rins; os
inalatórios atuais são muito pouco metabolizados, resultando em
menor toxicidade.
• Os inalatórios são drogas capazes produzir proteção de órgãos,
principalmente no sistema cardiovascular
INALATÓRIOS
Introdução
A descoberta da possibilidade de anestesia através do óxido nitroso abriu um novo horizonte
na história da medicina e possibilitou o avanço da cirurgia.
O éter foi usado pela primeira vez em uma operação cirúrgica no Hospital Geral de Mas-
sachusetts, em 16 de outubro de 1846. O Dr. John Warren usou éter para anestesiar um pa-
ciente e, em seguida, removeu uma malformação congênita do pescoço do paciente. Éter, no
entanto, estava longe de ser uma droga perfeita. Era altamente inflamável e também induzia
vômitos em pacientes. Na Inglaterra foi rapidamente substituído por clorofórmio.
O clorofórmio foi desenvolvido pela primeira vez como anestésico por James Young Simp-
son, um médico escocês, professor de obstetrícia e médico da rainha Victoria. Devido aos
efeitos colaterais e de depressão cardiorrespiratória grave, esses agentes foram abandonados.
Com a descoberta dos anestésicos inalatórios mais antigos, como o halotano, a anestesiologia
foi se desenvolvendo cada vez mais até a descoberta de agentes menos solúveis e menos tóxi-
cos, como o sevoflurano e o desflurano, que promovem anestesia rápida, eficaz e com poucas
alterações hemodinâmicas.
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Agentes
Oxido nitroso
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É um gás não inflamável com cheiro agradável que é praticamente insolúvel no sangue (co-
eficiente sangue-gás 0,46). Tem baixa potência, apresentando CAM de 104%, apesar de pos-
suir propriedades analgésicas. Não produz relaxamento muscular e relaciona-se com maior
incidência de náuseas e vômitos. Por ser extremamente difusível, seu uso em situações onde
existe aprisionamento de ar em cavidades fechadas pode causar expansão e piora da situação
clínica (pneumotórax, pneumoencéfalo).
A maior parte do N2O é exalada de forma inalterada, embora uma pequena parte possa ser
eliminada através da pele ou excretada na urina. Por apresentar solubilidade 34 vezes supe-
rior à do nitrogênio, difunde mais rapidamente para compartimentos que contenham ar, tais
como ouvido médio e bolhas pulmonares, podendo expandi-los com risco de causar dor e
pneumotórax.
O N2O é um analgésico potente e sua administração em fração inspirada de 20% equivale a
15 mg de morfina por via subcutânea. Mistura contendo 50% de N2O em O2 é comumente
empregada para prover analgesia durante o trabalho de parto, vítimas de traumas e outras
dos pacientes não é afetada pela inativação temporária da vitamina B12 após a administração
de N2O. No entanto, esta reação pode ser clinicamente significativa em pacientes com má
nutrição, deficiência de vitamina B12 preexistente ou outras doenças metabólicas que con-
vergem para as mesmas vias metabólicas. A exposição a N2O pode levar a parestesias, ataxias
e destreza manual fraca.
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Embora não pareça que o N2O seja teratogénico para seres humanos, devido aos efeitos sobre
a síntese de DNA, é prudente evitar exposição durante o primeiro trimestre de gestação. O
N2O apresenta potência 230 vezes superior ao monóxido de carbono para o efeito estufa e
seu uso em anestesia contribui em aproximadamente 0,1% do aquecimento global, com meia
vida na atmosfera de aproximadamente 120 anos.
Halotano
É potente agente inalatório e possui estrutura de alcano - derivado etano com substituição
por halogênios. É o mais solúvel em uso atualmente e tem coeficiente sangue-gás 2,5.
Devido ao grupamento CF3, o halotano (2-bromo-2-cloro-1,1,1-trifluoroetano), sofre oxi-
dação espontânea e, exposto a luz ultravioleta, é decomposto em HCl, HBr, íons cloro, bromo
e fosgênio (COCl2). Para prevenção da decomposição ele é armazenado em frasco âmbar
com adição do conservante timol. Aproximadamente 20 a 40% do halotano captado pelo or-
ganismo sofre metabolismo, mais alto que qualquer outro anestésico volátil de uso corrente.
Enflurano
É um isômero do isoflurano e possui odor pungente. Tem metabolização hepática de 2,4% e
coeficiente de partição sangue-gás de 1,9.
Devido a baixas taxas de metabolismo hepático, em torno de 2,5%, o enflurano (2-cloro-
-1,1,2-trifluoretil difluorometil éter) foi introduzido na clínica como alternativa ao halotano,
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principalmente em múltiplas exposições. Não obstante, tem a capacidade de induzir ativi-
dades paroxísticas no eletroencefalograma, acentuadas na presença de anestesia profunda e
hipocarbia, efeito este não acentuado em portadores de epilepsia, durante ou após anestesia
com enflurano. Ele é metabolizado por isoenzimas do citocromo P450, especialmente a P450
2E1, produzindo metabólitos que incluem o ácido trifluoracético (TFA) e o íon fluoreto inor-
gânico. Hepatite por enflurano tem sido relatada, embora a incidência seja baixa (1:800.000)
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e o dano hepático seja pequeno. Nas doses clínicas habituais, o pico de concentração de íons
fluoreto raramente excede 25 mM.l-1, mantendo-se por pouco tempo, reduzindo o risco de
toxicidade renal.
Isoflurano
O isoflurano (1-cloro-2,2,2 trifluorometil éter) é um isômero estrutural do enflurano que
não requer preservativo e é estável na presença de luz ultravioleta. Apresenta coeficiente san-
gue-gás 1,46. Sofre metabolismo em taxas inferiores a 0,2%, sem descrição de efeitos tóxicos
sobre o fígado. Seu metabolismo gera aumento de fluoreto sanguíneo, mas, raramente, com
lesão renal. Possui alto grau de pungência.
Sevoflurano
O sevoflurano (fluorometil2,2,3-trifluoro-1-[trifluorometil]etil éter) é um metil isopropil
éter fluorado, que apresenta taxa de metabolismo de 2 - 5%, superior ao isoflurano e enflura-
no. Seu Coeficiente sangue-gás é de 0,65.
Desflurano
O desflurano (1,2,2,2-tetrafluoretil-difluor-metil éter) difere do isoflurano em apenas um
átomo de flúor substituído por cloro no grupamento alfa etil. Esta substituição é responsável
pela redução na solubilidade sanguínea (coeficiente sangue-gás 0,42), tecidual e também na
potência. Adicionalmente, a fluoração da molécula etil-éter resulta em alta pressão de vapor
que, juntamente com o baixo ponto de ebulição exige vaporizador especial aquecido. É o
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hidrocarboneto halogenado que sofre menos metabolismo hepático (0,02%) e, assim, não
está associado lesão hepática. Entretanto, existem relatos de pacientes que desenvolveram
hepatotoxicidade aguda após anestesia com desflurano.
Como o desflurano é resistente à degradação pela cal sodada, em certas condições pode-se
acumular no sistema respiratório, levando à formação de CO quando em contato com cal
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Xenônio
O xenônio apresenta muitas das propriedades do anestésico ideal, com coeficiente de par-
tição sangue-gás de 0,14, o mais baixa de todos os anestésicos em uso corrente, permitindo
rápida indução. Não é metabolizado no corpo humano, não causa alteração significativa na
contratilidade miocárdica ou resistência vascular periférica, mesmo na presença de doença
cardíaca. Sua ação se dá por inibição de receptores N-metil-D-aspartato (NMDA) e também
sobre bombas de cálcio da membrana neuronal inibindo respostas nociceptivas no corno
posterior da medula espinhal. Por ser um constituinte natural da atmosfera, não adiciona
poluição quando expelido para fora do circuito anestésico e em contraste com outros agen-
tes, não causa destruição da camada de ozônio. Possui CAM 71% e fornece alguma analgesia.
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ao fluxo de gás fresco no aparelho de anestesia.
A pressão de vapor de um anestésico volátil é a pressão parcial gasosa na interface líquido-
-gás, como aquela em um vaporizador.
A pressão parcial de um gás anestésico é a força motriz que move o anestésico para o espaço
alveolar e, portanto, para o sangue (Pa) que entrega a droga ao cérebro e outros comparti-
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mentos do corpo. Como os gases se movem de um compartimento do corpo para outro de
acordo com os gradientes de pressão parcial (do maior para o menor), o estado de equilíbrio
é alcançado quando a pressão parcial em cada um destes compartimentos é equivalente ao
da mistura inspirada. No equilíbrio:
Quando a pressão parcial alveolar se equilibra com a pressão parcial arterial e pressão parcial
cerebral, a concentração alveolar é igual ao do local de ação (SNC). A fração expirada na
monitorização dos gases exalados só traduz o anestésico inalatório presente no SNC durante
o estado de equilíbrio das pressões parciais. A pressão alveolar é utilizada como índice de
profundidade anestésica e recuperação da anestesia.
por (1) captação pela vasculatura pulmonar; (2) ventilação; e (3) efeito con-
centração e efeito segundo gás. Fa (concentração arterial de gás) é afetado
pelas alterações ventilação/ perfusão.
Existem muitos fatores que influenciam a pressão parcial alveolar de um anestésico volátil,
mas, em última análise, é determinada pela entrega do inalatório aos alvéolos e pela captação
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1.Captação
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Se não houvesse captação de agente anestésico pelo corpo, a concentração de gás alveolar
(FA) se aproximaria rapidamente da concentração inspirada (FI). Como os agentes anesté-
sicos são captados pela circulação pulmonar durante a indução, as concentrações alveolares
ficam aquém das concentrações inspiradas (FA / FI <1,0). Quanto maior a captação, menor
a taxa de aumento da concentração alveolar e menor a relação FA/FI.
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Uma vez que a concentração de um gás é diretamente proporcional à sua pressão parcial,
então a pressão parcial alveolar também subirá lentamente. A pressão parcial alveolar é im-
portante pois determina a pressão parcial de anestésico no sangue e, em última análise, no
cérebro. Da mesma forma, a pressão parcial do anestésico no cérebro é diretamente propor-
cional à sua concentração no tecido cerebral o que determina sua clínica e efeito.
Quanto maior a captação do agente anestésico, maior a diferença entre as concentrações ins-
pirada e alveolar e mais lenta a indução.
Os 3 fatores que determinam a captação pela vasculatura pulmonar são:
Mas porque um anestésico menos solúvel manifesta seu efeito mais rapidamente no SNC?
Não se pode pensar em anestesia inalatória como se fosse uma anestesia venosa. Sempre de-
vemos lembrar que o efeito na inalatória é oriundo da pressão parcial do gás e não do agente
anestésico diluído no sangue. Logo, se o agente for menos solúvel, será menos captado e sua
pressão parcial alveolar será maior.
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Na tabela abaixo, você deve saber o coeficiente de partição sangue-gás que determina a solu-
bilidade. Geralmente esses valores são pedidos na prova.
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quando comparado ao Isoflurano e Sevoflurano, pois, dessa forma,
um grande número de moléculas de desflurano passam da fase
líquida para a fase de vapor. Porém, essa mudança de estado físico
gasta energia e resfria o líquido anestésico. A queda de tempera-
tura aumenta a solubilidade dos gases, reduzindo sua volatilidade.
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Por esse motivo, o desflurano precisa de um vaporizador elétrico
que compense o resfriamento do líquido via aquecimento.
Além disso, o vaporizador de desflurano é pressurizado a 1500
mmHg para impedir que o líquido vaporize em sala na temperatu-
ra ambiente, uma vez que pode entrar em ebulição a uma pressão
atmosférica de 760mmHg e temperatura de 24°C.
O segundo fator que afeta a captação do anestésico inalatório é o débito cardíaco. À medida
que o débito cardíaco aumenta, a captação do anestésico pela vasculatura pulmonar também
aumenta, diminuindo a pressão parcial alveolar e retardando a velocidade da indução. O
efeito da alteração do débito cardíaco é menos pronunciado para os anestésicos insolúveis,
pois são pouco captados, independentemente do fluxo sanguíneo alveolar.
O anestésico “extra” captado nos estados de alto débito será depositado nos músculos e gor-
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duras, pois são compartimentos de depósito que demoram mais tempo para entrar em equi-
líbrio com a pressão parcial alveolar.
Os estados de baixo débito, ao contrário, elevam a concentração alveolar dos agentes solú-
veis, uma vez que a taxa de captação está reduzida. Lembrar que a maioria dos agentes volá-
teis causa depressão do miocárdio em maior ou menor grau. Após algum tempo de anestesia,
começa a ocorrer uma diminuição da captação do agente, provocando aumento súbito da
pressão alveolar e acelerando a indução anestésica semelhante aos estados de baixo débito.
Com os agentes pouco solúveis este efeito quase não é percebido, pois o equilíbrio ocorre
antes que a diminuição do débito cardíaco tenha um efeito significativo sobre a captação do
agente.
Agora é importante entender que o débito cardíaco altera o tempo de indução conforme
o momento da anestesia: início da indução ou mais próximo do equilíbrio entre FA e FI.
No início da indução, nas primeiras incursões respiratórias, o aumento do débito cardíaco
aprofunda a anestesia, pois significa uma maior oferta de agente para os tecidos ricamente
vascularizados (recebem 75% do débito cardíaco). Prepondera, então, a pressão parcial do
sangue que libera inalatório para o SNC. Próximo ao equilíbrio (FA=FI), o aumento do dé-
bito cardíaco, aumenta a captação do anestésico com redução da pressão parcial alveolar,
lentificando o tempo de indução.
Veja o exemplo da questão a seguir, o examinador especifica o momento. Nesse caso foi 35
minutos após a indução.
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centração alveolar do anestésico. Assim, à medida que a concentração
do anestésico aumenta, maior será a depressão cardiovascular, com au-
mento ainda maior da concentração alveolar. A menor captação alveolar
secundária ao feedback positivo pode levar a uma profunda depressão
cardiovascular, notadamente com anestésicos com coeficiente de partição
sangue:gás elevado, como o halotano.
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Referências: Miller RD Eriksson LI, Fleisher LA, Wiener-Kronish JP, Young
WL – Miller’s Anesthesia 8th Ed, Philadelphia, 2015.
O terceiro fator que afeta a captação do inalatório é o gradiente alvéolo-venoso. Este gradien-
te de concentração depende da captação anestésica pelos órgãos e tecidos. Se os anestésicos
não passassem pelos órgãos, como o cérebro por exemplo, as pressões parciais venosas e
alveolares seriam idênticas (pois não haveria captação tecidual) e o sangue retornaria ao pul-
mão cheio de inalatório. Logo, não haveria captação pulmonar.
A pressão parcial do sangue venoso na artéria pulmonar rapidamente se equilibra com a
pressão parcial alveolar. Dessa forma, o sangue arterial que parte do pulmão distribui o ina-
latório para todos os tecidos. A captação de anestésico pelos tecidos reduz a pressão parcial
venosa, gerando um maior gradiente alvéolo – venoso estimulando a vasculatura pulmonar a
captar mais anestésico. Ao longo do tempo, a pressão parcial no sangue venoso aproxima-se
muito da mistura inspirada, e não ocorre mais captação anestésica pela vasculatura pulmo-
Quanto maior o volume efetivo, maior o tempo necessário para alcançar o equilíbrio (analo-
gia com o volume de distribuição da anestesia venosa).
Então, os coeficientes de partição sangue-gás e tecido-sangue determinam a distribuição
dos inalatórios no corpo. O desflurano, por exemplo, tem baixos coeficientes de partição
sangue-gás e tecido-sangue, ou seja, seus compartimentos são menores resultando em pre-
enchimento e equilíbrio mais rápido com redução do gradiente entre o sangue arterial e os
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tecidos. Isso leva a um menor gradiente alvéolo-venoso com menor captação de anestésico
pela vasculatura pulmonar, acelerando a elevação da razão FA/FI. No final do procedimen-
to, o paciente desperta mais rápido, pois menores volumes geram menos acúmulo e rápida
eliminação.
Veja na tabela abaixo a dife-
rença entre os coeficientes do
desflurano quando comparado
com o Isoflurano. A capacidade
do desflurano em reter anesté-
sico é menor que a do Isoflu-
rano, acelerando seu equilíbrio
na indução e despertar.
Os tecidos são divididos em grandes grupos de acordo com o fluxo sanguíneo que recebem
e seu volume:
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· O grupo de tecidos ricamente vascularizado (cérebro, coração,
fígado, rim e órgãos endócrinos) apresenta solubilidade moderada
e pequeno volume. É o primeiro a receber quantidades apreciáveis
de anestésico, alcançando rápido equilíbrio (ou seja, as pressões
parciais arterial e tecidual são iguais) e estabilização. Cerca de 6 a
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12 minutos, o gradiente de pressão parcial alvéolo-venosa torna-se
muito estreito, reflexo da saturação desse compartimento.
2. Ventilação
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o equilíbrio.
A ventilação altera de forma mais importante o aumento da pressão alveolar dos anestésicos
mais solúveis, como o halotano. Para os menos solúveis como o protoxido, o aumento da
ventilação não é tão significativo. Um aumento em quatro vezes da ventilação dobra a pres-
são de halotano enquanto para o protoxido ocorre aumento de apenas 15%.
No entanto, hiperventilar o paciente não acelera a indução, porém aumenta os efeitos inde-
sejáveis. Cérebro e coração estão dentro do mesmo compartimento dos tecidos ricamente
vascularizados. Se, por exemplo, realizarmos uma indução inalatória com halotano em uma
criança hiperventilando (chorando), a vasoconstrição cerebral resultante da hipocarbia vai
“fechar” as portas do SNC para o inalatório. Dessa forma, a criança pode apresentar bradi-
cardia, mesmo antes de perder a consciência.
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ção do débito cardíaco. O resultado final é uma maior oferta com menor captação, aceleran-
do o equilíbrio entre FA e FI.
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uma vez que uma fração inspirada alta compensa a captação do anestésico pelo sangue. Isto
é chamado efeito da concentração do anestésico. No início da indução, a fração inspirada
deve ser alta para acelerar a indução anestésica e depois reduzida a níveis desejáveis para a
manutenção do estado anestésico.
FIXANDO CONHECIMENTO
(TSA 2016) Mulher, 23 anos, 82 kg e 1,65 m, será submetida à mamo-
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plastia redutora. Recebeu anestesia geral balanceada com desflurano
6%, oxigênio a 0,3 L.min-1 e óxido nitroso 0,5 L.min-1. O anestesiologista
observou um aumento inicial da concentração expirada de oxigênio se-
guido por uma queda gradual no analisador de gases. Qual é a possível
explicação para este fato?
A) Efeito segundo gás do óxido nitroso
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B) Saturação do circuito pelo desflurano
C) Menor absorção sistêmica do óxido nitroso inicial
D) Inibição da vasoconstrição pulmonar hipóxica pelo desflurano
Resposta: A
lúveis que não sofrem extensa captação (como o sevoflurano) a ocorrência de shunt diminui
a elevação da pressão alveolar, causando atraso na indução, pois reduz a oferta do agente para
o alvéolo e dilui a pressão parcial arterial. É o que ocorre na intubação seletiva, na ventilação
monopulmonar, no shunt intracardíaco D-E (síndrome de Eisenmenger).
Durante uma ventilação monopulmonar com sevoflurano, por exemplo, a fração expirada do
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anestésico não reflete a pressão parcial arterial que está menor na verdade, devido à diluição
gerada pela área de shunt. Então, a CAM expirada pode estar elevada e o paciente apresentar
plano inadequado de anestesia.
Alterações na elevação da
Fa/Fi devido a ocorrência
de shunt são mais notá-
veis com os anestésicos
de baixa solubilidade.
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Representação gráfica do
enchimento dos comparti-
mentos segundo as cons-
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tantes de tempo.
Os tecidos ricamente vascularizados apresentam a menor constante de tempo, pois seu vo-
lume anatômico é pequeno e perfundido por 75% do débito cardíaco. Como resultado, esse
compartimento se estabiliza mais rápido.
Compreendendo as constantes de tempo, fica mais fácil de entender o comportamento dos
inalatórios nas diferentes faixas etárias. No neonato, por exemplo, existem diferenças na cap-
tação e distribuição do anestésico, nas necessidades anestésicas, nas ações vasculares dos
anestésicos e na sensibilidade do miocárdio neonatal a esses agentes. A pressão parcial do
anestésico no cérebro e miocárdio do recém-nascido é maior e é atingida mais rapidamente
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que em adultos com a mesma fração inspirada. A captação alveolar do anestésico inalatório é
mais rápida em recém-nascidos do que em crianças mais velhas. Neonatos apresentam venti-
lação minuto 3 a 4 vezes maior que crianças mais velhas e adultos, mas a mesma capacidade
residual funcional (em mL.Kg-1). A menor relação entre a capacidade residual funcional e
a ventilação minuto (maior nessa faixa etária) proporciona elevação mais rápida da fração
alveolar do anestésico. A distribuição e saturação dos tecidos ricamente vascularizados (co-
ração, cérebro, rins) ocorre muito rapidamente devido ao débito cardíaco proporcionalmen-
te elevado para esses tecidos. O cérebro infantil, por exemplo, recebe quase 30% do debito
cardíaco em comparação a cerca de 15% no adulto. Embora o maior débito cardíaco possa
lentificar a taxa de aumento na relação FA/FI, na verdade, ele acelera o equilíbrio em bebês e
crianças. Esse efeito paradoxal pode ser atribuído ao maior débito cardíaco dos tecidos rica-
mente vascularizados em bebês.
Além disso, a pequena massa de tecido muscular e de gorduras nas crianças implica em sa-
turação com pequena quantidade de anestésico e consequente pequeno impacto na redução
da concentração sanguínea do anestésico. Assim, o sangue venoso que retorna aos pulmões
apresenta pressão parcial relativamente alta de anestésico o que reduz ainda mais a diferença
entre FA e FI, aumentando a quantidade de anestésico nos alvéolos. Ainda, os inalatórios
são menos solúveis no sangue neonatal do que em adultos. Como resultado, concentrações
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alveolares mais elevadas do anestésico administrado são atingidas mais rapidamente que o
esperado.
Recuperação
A recuperação da anestesia depende da redução da concentração do anestésico no tecido
cerebral. As concentrações do agente inalatório nos tecidos servem como um reservatório
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para manter a pressão parcial alveolar quando a pressão parcial inspirada passa para zero na
conclusão da anestesia. O impacto desse armazenamento depende da duração da anestesia e
da solubilidade dos anestésicos em vários compartimentos teciduais.
A recuperação da anestesia é dependente da solubilidade, débito cardíaco e ventilação, sendo
a solubilidade o mais importante fator. Na recuperação anestésica dos inalatórios ocorrem
diferenças farmacocinéticas:
Quando cessa o fluxo de inalatório e a pressão parcial alveolar cai, a pressão parcial cerebral
também começa a cair. A velocidade de recuperação geralmente é mais rápida do que de in-
dução porque os tecidos que não atingiram o equilíbrio continuarão a absorver o agente até
a pressão parcial alveolar cair abaixo da pressão parcial do tecido.
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O tecido adiposo, para a maioria dos inalatórios, não está saturado ao final da anestesia. A
gordura continuará a absorver o agente e acelerar a recuperação até que a pressão parcial
nesse tecido exceda a pressão parcial alveolar. Dessa forma, durante a recuperação, a contí-
nua absorção do agente inalatório pela gordura acelera a queda da pressão parcial cerebral e
o consequente despertar. Por esse motivo, o despertar dos inalatórios solúveis é mais rápido
comparado à sua própria velocidade de indução.
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Único agente
que se equili-
bra em pou-
cas horas com
a gordura é o
óxido nitro-
so. Seu coe-
ficiente gor-
dura-sangue
é muito baixo
(2,3).
Figura da esquerda mostra a velocidade de elevação da FA/FI, evidenciando Recuperação
que anestésicos de baixa solubilidade apresentam elevação da FA/FI mais do efeito anes-
rápida, ou seja, indução mais rápida. Na figura a direita, evidencia-se que
tésico é dife-
essa propriedade vale também para a recuperação da anestesia.
rente de sua
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Farmacodinâmica
A farmacodinâmica estuda os efeitos dos diversos agentes sobre o organismo. Para melhor
entender as relações entre dose e efeito anestésico, foi criado o conceito de concentração
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alveolar mínima (CAM), definida como a concentração, em uma atmosfera, que inibe a res-
posta de MOVIMENTO a um estímulo doloroso supramáximo (em seres humanos seria
a incisão cirúrgica da pele) em 50% dos pacientes. A CAM reflete o efeito do inalatório na
medula, pois avalia imobilidade, ou seja, não é uma avaliação cortical como o BIS.
A CAM é uma dose efetiva em 50% dos pacientes (DE50). Este conceito trouxe uniformidade
quanto às doses a serem administradas. Com isto se estabelece quantidades relativas para se
atingir pontos específicos durante a administração dos agentes inalatórios.
O coeficiente óleo-gás determina a potência dos anestésicos inalatórios. Está inversamente
relacionado com a concentração alveolar mínima (CAM). Se o agente tem elevada potência,
terá baixa CAM e elevado coeficiente de partição óleo – gás. A CAM compara a potência
anestésica dos inalatórios sob as mesmas condições de temperatura e pressão.
Daí foram derivados outros conceitos como a CAM acordada (0,15 – 0,5 CAM), que é a con-
centração alveolar mínima na qual o paciente perde a capacidade de responder verbalmente.
A CAM acordado é menor na presença de bloqueio neuroaxial, pois esse reduz os sinais as-
cendentes da medula para o córtex.
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A CAM BAR (1,5CAM) seria a CAM na qual ocorre bloqueio das respostas autonômicas à
incisão cirúrgica. A DE95, ou seja, a CAM que inibe a resposta motora em 95% dos pacientes
corresponde a 1,3 CAM (CAM expandida). A CAM para os diferentes agentes voláteis, entre
as idades de 30 a 55 anos, temperatura de 37°C, sob pressão barométrica de uma atmosfera
deve ser decorada para a prova.
Os valores de CAM para dife-
rentes agentes anestésicos ad-
ministrados em conjunto são
aditivos. Logo, a associação de
0,5 CAM de N2O e 0,5 CAM de
halotano fornecem 1 CAM.
De uma forma geral, condições
que aumentam a atividade me-
tabólica e a concentração de
neurotransmissores provocam
aumento da CAM. O inverso é verdadeiro.
O ritmo circadiano, a tempe-
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Alterações no SNC
De maneira geral, os agentes inalatórios reduzem o metabolismo cerebral, refletido pela di-
minuição do consumo de oxigênio. Isto resulta em proteção do SNC nas situações em que
podem ocorrer dano cerebral devido a um menor aporte de sangue e, consequentemente, de
oxigênio ao cérebro.
Para a maioria dos agentes, o metabolismo cerebral é reduzido na medida em que a atividade
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da do metabolismo cerebral CAM-dependente do que o halotano, e, por causa disso, pode
suprimir a atividade no EEG em doses clínicas que são geralmente bem tolerados do ponto
de vista hemodinâmico. O halotano é uma exceção, uma vez que mesmo após o EEG ficar
isoelétrico, ele continua a provocar queda do metabolismo cerebral. Além disso, o halotano,
em altas concentrações, causa alterações na fosforilação oxidativa, com aumento do lactato.
31
O desflurano e sevoflurano causam diminuição semelhante ao isoflurano.
O sevoflurano e o enflurano podem estar associados à atividade epileptiforme no EEG, espe-
cialmente em concentrações mais altas ou quando a hiperventilação controlada é instituída.
Todos os anestésicos voláteis e o óxido nitroso diminuem a amplitude e aumentam a latência
dos potenciais evocados somatossensoriais de maneira dose-dependente. Os potenciais evo-
cados podem ser abolidos com 1 CAM de anestésico volátil sozinho ou acima de 0,5 CAM
administrado com 50% de óxido nitroso. Os potenciais evocados visuais são os mais sensí-
veis aos efeitos dos anestésicos voláteis e os potenciais evocados auditivos do tronco cerebral
são os mais resistentes.
Os potenciais evocados motores (PEM) avaliam a integridade funcional das vias descenden-
tes motoras. A resposta evocada mais comumente registrada é uma contração muscular. Bai-
xas concentrações de anestésico volátil (0,2 a 0,3 MAC) podem diminuir a confiabilidade do
monitoramento do potencial evocado motor e geralmente devem ser evitados nesses casos.
Esse impacto sobre o PEM pode ser parcialmente superado pelo uso de estímulos multipulso.
Todos inalatórios aumentam o fluxo sanguíneo cerebral (FSC) de forma dose dependente de-
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vido à vasodilatação. Os anestésicos voláteis aumentam a velocidade do fluxo sanguíneo na
artéria cerebral média, com o sevoflurano causando menor vasodilatação do que o isoflurano
ou o desflurano. O aumento do FSC ocorre independente da redução do metabolismo ce-
rebral. Esse é o chamado mecanismo de desacoplamento. O halotano pode aumentar o FSC
em quase 200% enquanto reduz o metabolismo cerebral em apenas 10%. O Isoflurano, ao
contrário, aumenta o FSC em cerca de 20% enquanto reduz o metabolismo cerebral em 45%.
De modo geral, todos alteram a autorregulação do fluxo sanguíneo cerebral. O sevoflura-
no não afeta a autorregulação, se administrado até 1 CAM. A 1,5 CAM, a autorregulação é
melhor preservada com sevoflurano do que com o isoflurano. Tanto o desflurano quanto o
isoflurano reduzem a autorregulação de uma maneira dose-dependente.
CAM e a auto-regulação (ou seja, o mecanismo adaptativo que normaliza o fluxo sanguíneo
cerebral em uma ampla gama de pressões arteriais sistêmicas em pacientes acordados) é pre-
judicada em concentrações menores que 1 CAM. Em geral a pressão intracraniana (PIC) irá
aumentar ou diminuir em proporção às mudanças no fluxo sanguíneo cerebral.
O isoflurano aumenta PIC minimamente em animais com e sem doença cerebral, incluin-
32
Alterações cardiovasculares
A pressão arterial média (PAM) diminui com as crescentes concentrações de desflurano,
sevoflurano, isoflurano, halotano e enflurano. Com exceção do halotano, todos diminuem a
PAM por redução da resistência vascular sistêmica (RVS). A diminuição da RVS relacionada
à dose é minimizada pela substituição do óxido nitroso por uma porção do anestésico volátil.
O óxido nitroso causa vasoconstrição sistêmica e pulmonar através de seu efeito simpatico-
mimético. O halotano pouco altera a RVS, mas reduz a PAM por depressão do miocárdio de
modo dose dependente.
Portal Anestesia
O aumento gradual das concentrações de isoflurano, desflurano e sevoflurano aumentam
a frequência cardíaca. Em concentrações tão baixas quanto 0,25 CAM, o isoflurano causa
um aumento linear e dose-dependente. A frequência cardíaca aumenta minimamente com
concentrações de desflurano inferiores a 1 CAM. Entretanto, o desflurano pode causar taqui-
cardia, resultante da estimulação do sistema nervoso simpático (possivelmente mediada por
receptores das vias aéreas superiores, dos pulmões e sistêmicos), quando a fração inspirada
33
é aumentada rapidamente para 6%. Isso pode ser preocupante, especialmente em pacientes
com doença arterial coronariana concomitante. A tendência do desflurano de estimular a
circulação (isto é, aumentar a PAM e a frequência cardíaca) é atenuada com administração
de bloqueador β-adrenérgico (esmolol), opióide (fentanil) e com o passar do tempo (10 a 15
minutos) durante a manutenção da anestesia. Em menor grau, o isoflurano tem uma capaci-
dade semelhante para provocar aumentos na frequência cardíaca e na pressão arterial.
Em contraste com o desflurano e o isoflurano, a frequência cardíaca na presença do sevo-
flurano não aumenta até a concentração exceder 1,5 CAM. O sevoflurano apresenta, sobre o
isoflurano, essa vantagem de causar mínimos efeitos sobre a frequência cardíaca. Contudo, a
indução com sevoflurano a 8% provoca taquicardia em crianças e pacientes adultos subme-
tidos à hiperventilação controlada. Esta taquicardia pode resultar da estimulação do sistema
nervoso simpático associada à atividade cerebral epileptiforme.
Isoflurano, sevoflurano, desflurano e halotano, diminuem as respostas do baroreceptor de
maneira concentração-dependente. Halotano, principalmente, inibe o reflexo baroreceptor
que consiste em aumentos na frequência cardíaca em resposta à hipotensão detectada pelo
Alterações respiratórias
Todos os agentes inalatórios deprimem a ventilação, elevam a PaCO2 e alteram a curva de
resposta ventilatória ao CO2.
Todos os anestésicos voláteis reduzem o volume corrente e aumentam a frequência respira-
tória de tal forma que ocorrem pequenas alterações na ventilação minuto (VM = Fr x VC).
Embora a ventilação minuto seja relativamente preservada, a diminuição do volume corrente
leva a uma proporção relativamente maior de ventilação do espaço morto (EM) em relação
à ventilação alveolar. Veja na seguinte fórmula: VA = Fr ( VC – EM). O resultado é uma tro-
ca de gás progressivamente menos eficiente levando ao aumento da PaCO2 em níveis mais
Portal Anestesia
profundos de anestesia. A substituição do óxido nitroso (60%) por uma porção equivalente
de anestésico volátil pode atenuar esse aumento da PaCO2, pois ele aumenta a frequência
respiratória.
Os efeitos ventilatórios são dose-dependentes, com concentrações mais elevadas resultando
em maiores decréscimos no volume corrente e maior aumento da frequência respiratória, à
35
exceção do isoflurano, que não aumenta a frequência respiratória acima de 1 CAM. A de-
pressão respiratória pode ser parcialmente antagonizada durante a estimulação cirúrgica.
A capacidade residual funcional também diminui porque os pacientes experimentam um
aumento na atividade muscular expiratória causando deslocamento cefálico do diafragma e
o deslocamento para dentro da caixa torácica.
Todos diminuem o tônus da musculatura brônquica. Os anestésicos voláteis relaxam o mús-
culo liso das vias aéreas principalmente por redução direta do tônus do músculo liso e in-
diretamente através da inibição das vias neurais reflexas. Foram utilizados de forma eficaz
para o tratamento de mal asmático quando outros tratamentos convencionais falharam. O
óxido nitroso não tem ação sobre a resistência respiratória. Nas concentrações equipotentes,
a resistência respiratória é reduzida pelo sevoflurano> halotano> isoflurano. Em contraste
com os outros anestésicos voláteis, o desflurano está associado a nenhum efeito broncodila-
tador ou a efeitos broncoconstritores em concentrações mais elevadas. A indução inalatória
com desflurano está associada a tosse e aumento do risco de laringoespasmo, o que é prova-
velmente causado por sua pungência. Todos anestésicos voláteis reduzem a movimentação
consequente hiperpolarização.
tem o menor efeito geral sobre a perfusão hepática devido ao aumento compensatório no
fluxo da artéria hepática. Em contraste, o halotano causa vasoconstricção da artéria hepática
e diminui o fluxo sanguíneo na veia porta, gerando queda na saturação venosa de oxigênio
na veia hepática, devido a necessidade de maior captação tecidual de oxigênio. Esse contexto
aumenta o risco de toxicidade hepática pelo halotano. O N2O causa efeitos circulatórios mí-
nimos no fígado.
Diferentemente da maioria dos anestésicos intravenosos, anestésicos voláteis modernos so-
frem mínimo metabolismo hepático, e como eles são excretados principalmente através dos
pulmões, afetam minimamente a função hepática. Outra consideração é uma evidência con-
vincente de que os anestésicos voláteis podem produzir proteção contra lesão hepática isquê-
mica. Quando o sevoflurano foi comparado à anestesia com propofol em pacientes submeti-
dos à cirurgia de revascularização do miocárdio, os marcadores bioquímicos pós-operatório
de disfunção hepática foram menores após a anestesia com sevoflurano.
Os agentes anestésicos voláteis causam diminuições dose-dependentes no fluxo sanguíneo
renal, taxa de filtração glomerular e produção de urina, que podem ser minimizadas com hi-
Outras alterações
Quanto à junção neuromuscular, todos são capazes de produzir relaxamento muscular su-
ficiente para permitir a intubação e potencializam todos os bloqueadores neuromusculares.
Desflurano é o inalatório que mais potencializa os bloqueadores neuromusculares, já o óxido
nitroso não tem ação relaxante. A administração de agentes inalatórios diminui em cerca de
15% as doses requeridas de não-despolarizantes. Os efeitos diretos dos anestésicos voláteis
para relaxar o músculo esquelético são mais proeminentes acima de 1 CAM e um efeito 40%
maior tem sido observado em pacientes com miastenia gravis.
Hipertermia Maligna (HM) é uma síndrome clínica aguda com aumento no metabolismo
do músculo esquelético, resultando no consumo elevado de oxigênio, formação de lactato,
produção de calor e rabdomiólise. Suscetibilidade a HM é hereditária e é transmitida como
uma doença genética autossômica dominante com penetrância reduzida e expressão variá-
vel. Enquanto N2O e xenônio são considerados seguros em pacientes sensíveis a HM, todos
Portal Anestesia
os anestésicos voláteis potentes podem ser gatilhos nestes pacientes.
Quando a anestesia geral com inalatórios é utilizada para uma cesariana, deve-se reduzir a
CAM para 0,5. A concentração do agente inalatório é minimizada na tentativa de reduzir o
sangramento resultante do relaxamento uterino induzido pelo agente e para minimizar a ex-
posição fetal ao anestésico (a transferência placentária de anestésicos voláteis é rápida porque
37
esses agentes têm um baixo peso molecular, são não ionizados e são altamente lipossolúveis).
Existe uma diminuição dose dependente na contratilidade miometrial. O desflurano e sevo-
flurano também inibem a frequência e a amplitude das contrações do miométrio induzidas
pela ocitocina numa forma dose dependente.
Mecanismos de ação
Os mecanismos de ação dos agentes voláteis são assuntos de longas discussões, e muitas vezes
infrutíferas. Segundo a teoria de Meyer-Overton existiria correlação entre a lipossolubilida-
de dos agentes e sua potência anestésica. Assim, presume-se que os agentes voláteis agem por
alterar a conformação da membrana plasmática das células nervosas, alterando propriedades
físico químicas, com distorção dos canais de íons, determinando sua incapacidade de agirem
funcionalmente. Atualmente, as evidências sugerem que os agentes voláteis agem por ligação
a receptores específicos como os receptores de glicina, GABAA, glutamato (NMDA, AMPA e
cainato) e até mesmo alterando a função dos canais de sódio (a lidocaína diminui a CAM).
Aparentemente os anestésicos inalatórios não estimulam a liberação de opioides endógenos.
seria resultado da ação em diversos locais do SNC e atingindo alvos moleculares variados.
Provavelmente, ocorrem alterações funcionais dos canais iônicos e da transmissão sináptica
que, em última análise, resulta no fenômeno da anestesia.
Toxicidade
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Genotoxicidade e mutações
Os anestésicos inalatórios apresentam potencial para atividade mutagênica ou carcinogêni-
ca, com interesse elevado na exposição ocupacional. Eles podem aumentar a frequência de
aborto espontâneo em mulheres que trabalham nas salas de operação e afetar a reprodução.
Também pode ocorrer dano genético com alterações na estrutura do DNA ou aumento na
permuta de cromátides. Não obstante, estudo envolvendo a permuta de cromátides em mito-
ses estimuladas de linfócitos T de quarenta crianças submetidas a anestesia com sevoflurano
para procedimentos cirúrgicos menores não observou nenhum efeito genotóxico. O xenônio
pode parar a reprodução celular bloqueando a mitose durante o estágio metáfase-anáfase,
embora seja reversível com sua retirada.
Hepatotoxicidade
O dano não é causado apenas pelo agente anestésico propriamente, mas pelos metabólitos
Portal Anestesia
nominado radical livre intermediário. Macromoléculas podem reagir com este radical livre
ou outros metabólitos intermediários e causar uma reação auto catalítica peroxidativa em
cadeia no fígado, com desarranjo e necrose da membrana celular.
A hepatite tipo II é de ocorrência imprevisível e rara, com estimativa geral de 1 em 35.000
anestesias com halotano em adultos. Em crianças a ocorrência estimada é de 1 em 82.000
39
exposições a halotano. Resulta em hepatite grave fulminante com alta incidência de morta-
lidade. A exposição prévia é usual e pode haver relato de hiperpirexia e icterícia, tardias no
pós-operatório. Os primeiros sinais são febre, erupção cutânea e/ou dores articulares que
podem preceder a icterícia e podem ter início em até um mês após anestesia com halotano.
Na impossibilidade de transplante hepático, a hepatite evolui com alto índice de mortalidade.
Atualmente, é aceito que a hepatite tipo II é imunomediada, com resposta direcionada aos
hepatócitos. O metabolismo oxidativo do halotano pelo citocromo P450 2E1 (CYP2E1) gera
um intermediário reativo (trifluoracetilcloreto - TFA), que se liga de forma covalente às pro-
teínas hepáticas formando neoantígenos trifluoracetilados que estimulam o sistema imuno-
lógico a atacar os hepatócitos, resultando em necrose hepática fulminante nas exposições
subsequentes de pacientes susceptíveis. Fatores genéticos provavelmente estão envolvidos, e
as mulheres são afetadas cerca de duas vezes mais do que os homens. A necrose hepática foi
relatada em muitos casos após múltiplas exposições ao halotano, consistente com uma res-
posta imune secundária amplificada.
No soro de pacientes com hepatite tipo II são encontrados anticorpos que reagem de forma
Toxicidade renal
Portal Anestesia
O metabolismo de alguns anestésicos inalatórios libera íons de flúor inorgânicos (F-), que
podem causar insuficiência renal poliúrica e aumento da mortalidade. Os achados clínicos
incluem hipernatremia, hiperosmolaridade e aumento da creatinina. A nefrotoxicidade do
fluoreto inorgânico foi aventada primeiramente em 1960, com a introdução do metoxiflura-
40
no. O metoxiflurano foi retirado de uso clínico por causa da elevada incidência de nefroto-
xicidade associada a concentrações plasmáticas de fluoreto excedendo 50 mM.L-1, com alto
índice de falência renal não responsiva a vasopressina.
Entre os agentes utilizados atualmente, altas concentrações de fluoreto têm sido relatadas
com sevoflurano. Após duas CAM/hora de anestesia com sevoflurano, concentrações de flu-
oreto excedendo 50 mM.L-1 foram documentadas. Entretanto, não há relatos de disfunção
renal associada a exposição prolongada a sevoflurano e uma importante diferença entre os
dois agentes é que o fluoreto produzido durante anestesia com metoxiflurano é produzido
nos rins, causando dano direto. Isto é em parte relacionado a presença nos rins de múltiplas
isoenzimas do citocromo P450 (CYP2A6, CYP3A, CYP2E1), responsáveis pelo metabolismo
do metoxiflurano enquanto que o metabolismo renal do sevoflurano é quatro vezes menor,
de forma que baixos níveis de fluoreto são encontrados nos rins.
O sevoflurano merece consideração especial por sofrer degradação espontânea quando ex-
posto a temperaturas que excedem 50°C na presença de absorvedores de dióxido de carbono,
produzindo fluormetil-2,2-difluor-1-trifluormetil vinil éter (FDVE), conhecido como com-
posto A e pequenas quantidades de 2-fluormetoxi-3-metoxi-1,1,1,3,3-pentafluorpropano,
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conhecido como composto B. Os produtos de degradação resultam da extração de próton
(ácido) do sevoflurano na presença de bases (KOH ou NaOH). O composto A é metabolizado
pela conjugação com glutationa S-conjugado e hidrolisado pela cisteína S-conjugado. A cap-
tação destes S-conjugados pelos rins e seu subsequente metabolismo pela beta-liase parece
ser responsável pela necrose tubular causada em ratos. Em contraste, em pacientes expostos
a anestesia com sevoflurano e baixo fluxo de gases, a concentração média de composto A foi
de 8 a 32 ppm, sem apresentar efeitos clínicos significativos sobre a função renal, enquanto
nos ratos foi de 400 ppm. Esta diferença pode explicar a nefrotoxicidade do Composto A em
ratos pela maior atividade da beta-liase nestes animais 20 (atividade da b-liase em ratos é dez
vezes maior do que em seres humanos).
Portal Anestesia
Absorvedores de Dióxido de Carbono
Os anestésicos voláteis halogenados se degradam na presença de adsorvedores de CO2 al-
calinos secos em circuitos fechados. A decomposição na presença de adsorvedores de CO2
dessecados libera monóxido de carbono (CO), formaldeído, metanol e calor. Essas reações
exotérmicas podem incendiar os componentes do circuito respiratório e causar intoxicação
41
por CO ao elevar os níveis de carboxi-hemoglobina nos pacientes. A afinidade entre a hemo-
globina e o monóxido de carbono é aproximadamente 230 vezes maior que a da hemoglobina
e do oxigênio. Isso diminui a capacidade de transporte de oxigênio do sangue e inibe a utili-
zação de oxigênio pelo organismo.
O sevoflurano libera mais calor do que o desflurano ou isoflurano, e a produção de monóxi-
do de carbono é mais alta com desflurano> enflurano> isoflurano> sevoflurano> halotano.
(longnecker)
A produção de monóxido de carbono e carboxi-hemoglobina aumenta com (1) o anestésico
inalado utilizado (desflurano = enflurano> isoflurano >> halotano = sevoflurano), (2) fluxo
de gás fresco baixo durante a anestesia, (3) concentrações mais altas de anestésicos inalados,
(4) maiores temperaturas dos absorvedores, e mais importante, (5) o grau de secagem do
absorvedor (Miller).
No livro de casos clínicos da SBA existe uma informação diferente:
“Tradicionalmente, o agente mais relacionado à produção de CO é o desflurano, seguido pelo
sevoflurano produz mais calor. A forte reação exotérmica gera produção significativa de ca-
lor, incêndios e pode causar lesões nos pacientes. Em contexto experimental, a exposição
prolongada de 1CAM de sevoflurano ao hidróxido de bário dessecado resultou temperaturas
no canister superiores a 300°C. O hidróxido de bário foi removido do mercado americano
por tais intercorrências.
42
Portal Anestesia
absorventes de dióxido de carbono comercialmente disponíveis com bases monovalentes
diminuídas ou ausentes (isto é, hidróxido de sódio e hidróxido de potássio) não sofrem uma
degradação extensa na exposição aos anestésicos voláteis, independentemente do estado de
hidratação.
Proteção de órgãos
43
Lesão de órgãos
A isquemia celular provoca alterações estruturais e funcionais consequentes à depleção dos
estoques de energia. Dois mecanismos são responsáveis pela irreversibilidade da lesão celu-
lar: inabilidade em reestabelecer a função mitocondrial e a destruição da membrana celular.
Durante a isquemia parte das células sofre lesão irreversível e parte sofre alterações bioquí-
micas, mas se o fluxo sanguíneo e a oferta de oxigênio forem reestabelecidos a função celular
pode ser recuperada.
Sabemos que a restauração do fluxo sanguíneo é primordial para a célula evitar a irreversibi-
lidade da lesão, mas a reperfusão por si só pode agravar as lesões produzidas na fase isquê-
mica isolada.
Em um estudo feito com animais submetidos a períodos de isquemia intestinal, no grupo
onde a isquemia foi contínua por 4 horas, houve menos alterações histológicas que no grupo
Mediadores envolvidos
na reperfusão e suas
respectivas ações.
44
Portal Anestesia
semelhanças fundamentais, incluindo a ativação da proteína G, proteína C cinase e dos ca-
nais K.
Mimetizando o pré-condicionamento
Interessados na possibilidade de métodos de modulação de injúria e estresse miocárdico,
45
Kersten et al. descreveram o efeito de pré-condicionamento do isoflurano num modelo ani-
mal. Os estudos iniciais envolveram o miocárdio, mas posteriormente se observou que a
proteção também ocorria em outros órgãos, como os rins, pulmões e fígado. Dessa forma, a
utilização dos anestésicos inalatórios teria uma aplicação clínica significante, principalmente
em cirurgias ou procedimentos que estão em alto risco de lesão isquemia-reperfusão. Outro
benefício na utilização desses agentes anestésicos seria a proteção tardia ou de segunda janela
no período pós-operatório tardio.
Proteção renal
Todos sabem da importância da preservação da função renal durante o período perioperató-
rio e o significado de lesão renal no pós-operatório imediato e tardio. Apesar das alterações
significativas nas condutas intra e pós-operatórias e do incremento da tecnologia na circula-
ção extracorpórea, a insuficiência renal aguda continua apresentando alta incidência após ci-
rurgias cardíacas. Obviamente a lesão renal acaba prolongando o tempo de internação, causa
maior ocupação de unidades de terapia intensiva e aumenta significativamente as taxas de
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morbimortalidade. Sabe-se que isso também leva a um maior custo de internação hospitalar.
O primeiro estudo sobre proteção renal por anestésicos inalatórios envolveu o sevoflurano e
demonstrou a preservação das funções cardíaca e renal em pacientes submetidos à cirurgia
de revascularização do miocárdio com circulação extracorpórea e cardioplegia. Marcadores
de disfunção e injúrias miocárdica (peptídeo natriurético cerebral, CKMB e troponina) e
renal (cistatina C) foram medidos e comparados. No grupo em que foi utilizado sevoflurano,
houve uma notável diminuição dos níveis séricos de cistatina C, concluindo-se que há maior
preservação da função renal pós-operatória. Outro estudo analisou anestésicos inalatórios
diversos (isoflurano, halotano, sevoflurano e desflurano) e anestésicos venosos (cetamina e
pentobarbital) em modelos animais submetidos à lesão de isquemia-reperfusão. No grupo
dos inalatórios houve uma redução acentuada dos índices inflamatórios de lesão com todos
os agentes, exceção do desflurano que demonstrou menor bloqueio dos fatores de inflamação
e, consequentemente, menor proteção renal. Um estudo experimental utilizando sevoflurano
e células tubulares renais demonstrou diminuição direta de necrose e inflamação in vitro via
mecanismos envolvendo a redução de fatores pró-inflamatórios. Um estudo publicado neste
ano demonstra a capacidade do isoflurano em provocar a liberação do fator transformador
de crescimento beta-1 (TGF-β1), que determina produção de adenosina (citoprotetor) e ec-
to-5-nucleotidase renal. Essas duas substâncias protegem contra a lesão isquemia-reperfusão
Portal Anestesia
renal.
Apesar de haver alguns questionamentos sobre se a melhor preservação da função renal era
secundária à proteção cardíaca, os trabalhos vêm mostrando que realmente existe um bene-
fício na proteção renal.
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Proteção cardíaca
Os eventos isquêmicos cardiológicos perioperatório são os mais temidos e causam maior
risco de morbimortalidade após qualquer tipo de cirurgia. Sabe-se da importância da pre-
venção da isquemia e da utilização de fármacos que diminuam o consumo de oxigênio e
contribuam para a prevenção do evento isquêmico. Podem-se citar como exemplos os beta-
bloqueadores que se mostraram eficientes na redução de morbimortalidade em pacientes de
risco submetidos a cirurgias de grande porte não cardíacas.
Os anestésicos inalatórios apresentam efeitos benéficos no balanço entre oferta e consumo
de oxigênio no miocárdio. Além disso, observa-se uma cardioproteção direta celular princi-
palmente durante períodos de isquemia e de reperfusão. Isoflurano, desflurano e sevoflurano
demostraram efeito protetor durante cirurgia de revascularização de miocárdio com ou sem
circulação extracorpórea. Essa ação protetora era observada tanto no pré- quanto no pós-
-condicionamento. Em uma metanálise de 22 estudos, foi demonstrado que o desflurano e o
sevoflurano diminuíram significativamente a taxa de infarto e a morte em pacientes subme-
tidos à cirurgia cardíaca.
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O uso de anestésicos halogenados durante toda a cirurgia cardíaca, inclusive durante a circu-
lação extracorpórea, parece ser o método mais adequado de cardioproteção. Nas cirurgias de
revascularização de miocárdio sem circulação extracorpórea, a administração de sevoflura-
no entre concentrações de 1,0 a 1,5 MAC mostrou-se efetiva na proteção miocárdica.
Alguns fatores limitam os benefícios dos anestésicos inalatórios no coração. Em um estudo,
observou-se que os efeitos do desflurano no pós-condicionamento não eram efetivos quando
se usava terapia com betabloqueadores. A presença de níveis glicêmicos elevados parece li-
mitar os efeitos do pré-condicionamento. A ocorrência de hiperglicemia em ratos anestesia-
dos com desflurano não diminuiu a extensão da área de infarto e parece bloquear os efeitos
protetores.
Há controvérsia sobre a diminuição de complicações cardiológicas em pacientes de risco
submetidos a cirurgias não cardíacas e uso de agentes inalatórios. Num artigo de 2013 sobre
cardioproteção no perioperatório, nenhum regime anestésico, seja venoso, seja inalatório,
se mostrou significativamente efetivo ou superior a outro. Em cirurgias de aorta abdominal,
uma análise entre anestesia baseada com sevoflurano e fentanil, comparada a propofol e
remifentanil, não houve diferença dos níveis de troponina entre os grupos. Disso, supõe-se
que não haveria benefícios em cirurgias vasculares de grande porte como os achados em
cirurgia cardíaca. Mesmo havendo controvérsia nesses achados, a American Heart Associa-
Portal Anestesia
tion/American College of Cardiology tem a convicção de que existe um benefício no uso de
anestésicos inalatórios durante cirurgia não cardíaca em pacientes de alto risco de infarto
perioperatório. Dessa forma, os anestésicos inalatórios foram incluídos nos protocolos pe-
rioperatórios de coronariopatas submetidos a cirurgias não cardíacas.
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Proteção hepática
Seria de grande utilidade um anestésico que conferisse proteção durante cirurgias hepáticas,
principalmente nos transplantes e naquelas em que há clampeamento da veia porta. Em
estudos animais, os anestésicos inalatórios vêm demostrando um perfil adequado. Em um
estudo em ratos anestesiados com isoflurano e submetidos a determinado período de isque-
mia hepática, houve menor dano histológico e níveis mais baixos de marcadores de lesão em
comparação ao grupo controle. Em um estudo controlado e randomizado, humanos anes-
tesiados com sevoflurano ou propofol e submetidos à hepatectomia com clampeamento de
hilo hepático foram avaliados quanto a alterações de enzimas de lesão hepática (AST/ATL) e
taxas de complicações pós-operatórias. Além de taxas mais baixas de AST/ATL séricas, hou-
ve menor ocorrência de complicações pós-operatórias no grupo sevoflurano.
Concluiu-se que o precondicionamento farmacológico em cirurgias hepáticas demonstrou
um efeito protetor com anestésico inalatório e que essa estratégia era facilmente aplicável e
efetiva para proteger o fígado e diminuir as complicações pós-operatórias. Novos estudos e
pesquisas nesse sentido estão em anda- mento para melhor conhecimento e aplicabilidade
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dessa estratégia.
Outros órgãos
O uso de anestésicos inalatórios tem efeito anti-inflamatório nos alvéolos de pacientes sub-
metidos à ventilação monopulmonar. Em um estudo utilizando sevoflurano e desflurano
houve supressão da resposta inflamatória alveolar, mas não sistêmica. Já outro estudo mostra
efeito negativo na resposta inflamatória pulmonar e no efeito protetor com o uso de anestési-
cos inalatórios em comparação ao propofol em pacientes submetidos à ventilação pulmonar.
Estudos atuais envolvendo anestesia inalatória com isoflurano ou sevoflurano e endotoxemia
experimental em ratos demonstram importantes redução na resposta inflamatória e no papel
na proteção de órgãos.
Portal Anestesia
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Portal Anestesia
• Casos Clínicos Comentados/Márcio de Pinho Martins, Deise Martins Rosa e Paulo Alipio
Germano Filho. Rio de Janeiro: Sociedade de Anestesiologia do Estado do Rio de Janeiro,
2016.
• Clinical Anesthesiology – Morgan and MiKhail’s - 2013, 2006, 2002 by McGraw-Hill Edu-
cation.
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