Enterite Linfoplasmocítica Canina

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UNIVERSIDADE TÉCNICA DE LISBOA

Faculdade de Medicina Veterinária

ENTERITE LINFOPLASMOCÍTICA CANINA

Tiago Mendes de Lacerda Peixoto de Magalhães

CONSTITUIÇÃO DO JÚRI ORIENTADOR

Presidente
Professora Doutora Professora Doutora
Maria Manuela Grave Rodeia Espada Niza Maria Constança Matias Ferreira Pomba

Vogais
Professor Doutor
Mário António Pereira da Silva Soares de Pinho

Professora Doutora
Maria Constança Matias Ferreira Pomba

2008

LISBOA

1
UNIVERSIDADE TÉCNICA DE LISBOA
Faculdade de Medicina Veterinária

ENTERITE LINFOPLASMOCÍTICA CANINA

Tiago Mendes de Lacerda Peixoto de Magalhães

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO INTEGRADO EM MEDICINA


VETERINÁRIA

CONSTITUIÇÃO DO JÚRI ORIENTADOR

Presidente
Professora Doutora Professora Doutora
Maria Manuela Grave Rodeia Espada Niza Maria Constança Matias Ferreira Pomba

Vogais
Professor Doutor
Mário António Pereira da Silva Soares de Pinho

Professora Doutora
Maria Constança Matias Ferreira Pomba

2008

LISBOA

2
Enterite Linfoplasmocítica Canina

AGRADECIMENTOS

Ao meu pai, por todo o amor, carinho e apoio que me deu, e que me permitiram crescer e
chegar onde cheguei.

Ao meu irmão Pedro, que embora seja uma melga, nunca deixou de me apoiar.

À Ana, que me permitiu sentir o que é ter uma mãe.

Ao resto da minha família, pois não conseguiria desejar uma família melhor.

À Rita, a minha melhor amiga, e que sem ela não seria ninguém.

À Andreia, Carlota, Flávio, Jo, Joaninha, Kika, Lina, Tiago e Vera, por serem os amigos que
são, e me proporcionarem os melhores anos da minha vida.

À Maria, amiga e companheira de Erasmus, pela amizade e força de viver que demonstra
todos os dias.

À Drª. Maria Vasconcelos, Drª. Elsa Figueiredo e Drª. Inês Alves, pelos bons momentos que
passei na Clínica Veterinária de Corroios, e por toda a ajuda que me deram ao longo da
minha formação.

À Professora Doutora Maria Constança Pomba, pelo auxílio na execução desta dissertação.

Aos restantes professores da Faculdade de Medicina Veterinária, pela dedicação na


formação dos médicos veterinários de amanhã.

i
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

RESUMO: ENTERITE LINFOPLASMOCÍTICA CANINA

O termo doença inflamatória intestinal crónica (Inflammatory Bowel Disease – IBD) reflecte
um conjunto de doenças que se caracterizam por sinais gastrointestinais persistentes ou
recorrentes e evidência histológica de inflamação gastrointestinal focal, multifocal ou difusa,
sem causa conhecida. A inflamação pode atingir o estômago, intestino delgado ou cólon,
sendo caracterizada histologicamente por número aumentado de células inflamatórias na
lâmina própria da região afectada. A enterite linfoplasmocítica representa o tipo mais comum
de IBD e, tal como o nome indica, é caracterizada por infiltração da lâmina própria por
linfócitos e plasmócitos, embora também possam estar presentes outras populações de
células inflamatórias. A etiologia desta patologia continua ainda por esclarecer, suspeitando-
se que resulte de uma desregulação do sistema imune intestinal, despoletada por uma
interacção de factores genéticos, ambientais e imunoreguladores, que resultam na perda de
tolerância oral a antigénios alimentares e microbianos no lúmen intestinal. O sinal clínico
mais frequente é diarreia crónica de intestino delgado, embora vómito e perda de peso
sejam também comuns. Pela sua definição, a enterite linfoplasmocítica é uma afecção
idiopática, e é diagnosticada por exclusão, o que dificulta o seu diagnóstico. Não existem
alterações características na maioria dos exames complementares de rotina, e o seu papel
principal é a eliminação de diagnósticos possíveis. O diagnóstico definitivo apenas pode ser
realizado por biópsia e observação de infiltração da lâmina própria por linfócitos e
plasmócitos. O tratamento consiste geralmente de terapia imunossupressora, antibioterapia
e maneio dietético, embora casos ligeiros consigam por vezes ser geridos apenas com
terapia antibiótica ou dietética. Como complemento ao estudo bibliográfico, foram analisados
4 casos clínicos de enterite linfoplasmocítica. Não ocorreram diferenças relevantes entre os
achados clínicos reportados na bibliografia e os casos reportados. O grande problema ligado
a estes casos clínicos deveu-se à dificuldade em eliminar todas as causas conhecidas de
inflamação intestinal e assim diagnosticar uma afecção idiopática. Em um dos casos foi
realizado um diagnóstico posterior de linfoma intestinal, o que levanta dúvidas se ocorreu
um erro no diagnóstico inicial ou se se estava perante uma evolução de uma patologia
inflamatória para uma patologia neoplásica.

Palavras-chave: cão, diagnóstico de exclusão, diarreia crónica, Inflammatory Bowel Disease,


enterite linfoplasmocítica.

ii
Enterite Linfoplasmocítica Canina

ABSTRACT: CANINE LYMPHOCYTIC-PLASMACYTIC ENTERITIS

Inflammatory Bowel Disease (IBD) is a term which reflects a number of diseases


characterized by persistent or recurrent gastrointestinal signs with histological evidence of
focal, multifocal or diffuse gastrointestinal inflammation, without known cause. The
inflammation can target the stomach, small intestine or large intestine, and it is histologically
characterized by increased numbers of inflammatory cells in the lamina propria of the
affected region. Lymphocytic-plasmacytic enteritis represents the most common type of IBD,
and as its name says, it is characterized by infiltration of the lamina propria with lymphocytes
and plasma cells, though other inflammatory cell populations can also be present. The
etiology of this conditions its still not completely understood, but it is suspected that results
from a disregulation of the intestinal immune system, triggered by an interaction of genetic,
environmental and immunoregulator factors, which result in the loss of oral tolerance to
luminal dietary and microbial antigens. The main clinical sign is chronic small bowel diarrhea,
although vomiting and weight loss are also common. By its definition, lymphocytic-
plasmacytic enteritis is an idiopathic disorder, and it’s diagnosed by exclusion, which difficults
its diagnosis. There are no characteristic changes in the most part of the tests commonly
performed, and their purpose is mainly to eliminate other possible diagnosis. The definitive
diagnosis can only be made by intestinal biopsy and evidence of lamina propria infiltration by
lymphocytes and plasma cells. The treatment usually consists of immunosuppressive drugs,
antibiotics and dietary management, although mild cases can sometimes be managed by
antibiotic or dietary therapy alone. As a complement to the bibliographic study, 4
lymphocytic-plasmacytic enteritis cases were analyzed. There weren’t relevant differences
between the clinical findings mentioned in the literature and the clinical cases. The biggest
problem in these cases was due to the difficulty in eliminating all the known causes of
intestinal inflammation, and so diagnosing an idiopathic disorder. In one of the clinical cases,
a late diagnosis of intestinal lymphoma was performed. This arises some questions
regarding the correctness of the first diagnosis, whether it was an evolution of an
inflammatory pathology to a neoplasic pathology or not.

Keywords: dog, chronic diarrhea, exclusion diagnosis, inflammatory bowel disease,


lymphocytic-plasmacytic enteritis.

iii
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

ÍNDICE
Pág.
AGRADECIMENTOS ............................................................................................................. i
RESUMO: ENTERITE LINFOPLASMOCÍTICA CANINA ...................................................... ii
ABSTRACT: CANINE LYMPHOCYTIC-PLASMACYTIC ENTERITIS.................................. iii
ÍNDICE ................................................................................................................................. iv
ÍNDICE DE FIGURAS.......................................................................................................... vii
ÍNDICE DE GRÁFICOS...................................................................................................... viii
ÍNDICE DE TABELAS.......................................................................................................... ix
LISTA DE ABREVIAÇÕES ................................................................................................... x
1. INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 1
1.1 ACTIVIDADES DE ESTÁGIO....................................................................................... 1
1.2 CASUÍSTICA ............................................................................................................... 1
2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA: ENTERITE LINFOPLASMOCÍTICA CANINA..................... 9
2.1 ETIOLOGIA E IMUNOPATOGÉNESE ......................................................................... 9
2.1.1 Tolerância Oral.................................................................................................... 10
2.1.2 Antigénios Microbianos e Alimentares................................................................. 11
2.1.3 Permeabilidade Intestinal .................................................................................... 13
2.1.4 Factores Genéticos ............................................................................................. 14
2.1.5 A Resposta Inflamatória na IBD .......................................................................... 16
2.2 SEQUELAS................................................................................................................ 21
2.2.1 Má absorção ....................................................................................................... 21
2.2.2 Linfangiectasia .................................................................................................... 22
2.2.3 Gastrite Crónica Antral ........................................................................................ 22
2.2.4 Colite................................................................................................................... 22
2.2.5 Dilatação Gástrica/Volvo ..................................................................................... 23
2.2.6 Linfoma Gastrointestinal...................................................................................... 23
2.3 APRESENTAÇÃO CLÍNICA E EXAME FÍSICO ......................................................... 24
2.4 DIAGNÓSTICO.......................................................................................................... 26
2.4.1 Hemograma ........................................................................................................ 28
2.4.2 Bioquímicas Séricas............................................................................................ 29
2.4.3 Urianálise ............................................................................................................ 30
2.4.4 Exames Fecais.................................................................................................... 31
2.4.4.1 Citologia Fecal e Citologia Rectal ................................................................. 31
2.4.4.2 Métodos de Flutuação .................................................................................. 31
2.4.4.3 Culturas Fecais ............................................................................................ 32
2.4.4.4 Testes imunodiagnósticos ............................................................................ 32
2.4.4.5 Sangue Oculto nas Fezes ............................................................................ 33

iv
Enterite Linfoplasmocítica Canina

2.4.5 Radiologia ........................................................................................................... 33


2.4.6 Ultrasonografia.................................................................................................... 34
2.4.7 Teste de Estimulação dos Ácidos Biliares ........................................................... 37
2.4.8 Testes Endócrinos .............................................................................................. 37
2.4.9 Folato e Cobalamina Séricos .............................................................................. 38
2.4.10 Testes para Insuficiência Pancreática Exócrina ................................................ 39
2.4.10.1 Trypsin-Like Immunoreactivity .................................................................... 40
2.4.10.2 Pancreatic Lipase Immunoreactivity ........................................................... 40
2.4.10.3 Elastase Pancreática Fecal ........................................................................ 40
2.4.11 Testes para Sobrecrescimento Bacteriano........................................................ 41
2.4.11.1 Folato e Cobalamina Séricos...................................................................... 41
2.4.11.2 Hidrogénio do Ar Expirado.......................................................................... 41
2.4.11.3 Ácidos Biliares Não Conjugados Séricos.................................................... 42
2.4.11.4 Culturas Duodenais Quantitativas .............................................................. 43
2.4.11.5 Diagnóstico Terapêutico ............................................................................. 43
2.4.12 Testes de permeabilidade, absorção e perda intestinal de proteínas ................ 44
2.4.12.1 Permeabilidade aos Açúcares .................................................................... 44
2.4.12.2 Absorção de Açúcares................................................................................ 45
2.4.12.3 Teste dos 5 Açúcares................................................................................. 45
2.4.12.4 Inibidor das α1-Proteases Fecais ............................................................... 46
2.4.13 Outros Marcadores Diagnósticos ...................................................................... 47
2.4.13.1 Gastrina Sérica........................................................................................... 47
2.4.13.2 Anticorpos Citoplasmáticos Perinucleares Antineutrofílicos ........................ 47
2.4.14 Biopsia Gastrointestinal..................................................................................... 48
2.4.14.1 Laparotomia ............................................................................................... 48
2.4.14.2 Endoscopia................................................................................................. 49
2.4.14.3 Histopatologia............................................................................................. 55
2.5 TRATAMENTO .......................................................................................................... 60
2.5.1 Maneio Dietético ................................................................................................. 60
2.5.1.1 Constituintes da Dieta .................................................................................. 60
2.5.1.2 Protocolos Dietéticos.................................................................................... 65
2.5.2 Maneio Médico.................................................................................................... 66
2.5.2.1 Antiparasitários............................................................................................. 66
2.5.2.2 Antibióticos ................................................................................................... 66
2.5.2.3 Imunossupressores ...................................................................................... 67
2.5.2.4 Outros tratamentos....................................................................................... 70
2.5.2.5 Novos tratamentos para a IBD...................................................................... 72

v
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

2.6 RESPOSTA AO TRATAMENTO E PROGNÓSTICO ................................................. 72


2.6.1 Canine Inflammatory Bowel Disease Activity Index ............................................. 73
2.6.2 Outros Marcadores de Resposta ao Tratamento e Prognóstico .......................... 75
3. CASOS CLÍNICOS .......................................................................................................... 77
3.1 CASO CLÍNICO 1 – Benny ........................................................................................ 77
3.2 CASO CLÍNICO 2 – Riack.......................................................................................... 80
3.3 CASO CLÍNICO 3 – Theodora ................................................................................... 85
3.4 CASO CLÍNICO 4 – Rouck ........................................................................................ 90
3.5 DISCUSSÃO.............................................................................................................. 93
4. CONCLUSÃO................................................................................................................ 101
5. BIBLIOGRAFIA............................................................................................................. 102

Anexo 1 - Diferenciação entre Diarreia de Intestino Delgado e Diarreia de Intestino


Grosso.............................................................................................................................. 115
Anexo 2 - Diferenciação entre Vómito e Regurgitação ................................................. 116
Anexo 3 – Parâmetros para Classificação de Inflamação Duodenal............................ 117
Anexo 4 - Exemplo de Dieta Caseira para Cães Adultos com Diarreia Crónica.......... 120
Anexo 5 – Classificação dos Diferentes Sinais Clínicos que Compõem o CIBDAI..... 121

vi
Enterite Linfoplasmocítica Canina

ÍNDICE DE FIGURAS
Pág.
Figura 1 – A. Quantidade excessiva de gás no intestino delgado sem dilatação sugere
enterite; B. Numerosas indentações murais radiolucentes, resultando em defeitos de
preenchimento são observadas no duodeno e com menor expressão no jejuno de um cão
com enterite linfoplasmocítica............................................................................................... 34
Figura 2 – Critérios para obtenção do CIBDAI ..................................................................... 73
Figura 3 – A. Radiografia torácica (vista lateral); B. Radiografia torácica (vista ventro-dorsal) .
............................................................................................................................................. 83
Figura 4 – A. Espessamento da parede do intestino delgado; B. Nódulo hipoecogénico no
baço...................................................................................................................................... 83
Figura 5 – Hiperecogenicidade hepática .............................................................................. 88
Figura 6 – Dilatação do ducto colédoco ............................................................................... 88
Figura 7 – Espessamento da parede duodenal .................................................................... 88
Figura 8 – A. Espessamento, perda de contraste e possível local de ruptura de uma ansa
jejunal; B. Linfadenopatia mesentérica ................................................................................. 92

vii
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

ÍNDICE DE GRÁFICOS
Pág.
Gráfico 1 – Número de casos observados por espécie animal............................................... 2
Gráfico 2 – Número de casos observados em cada serviço................................................... 2
Gráfico 3 – Número de casos por especialidade médica e espécie animal ............................ 3
Gráfico 4 – Número de casos de patologia reprodutora e de outras intervenções em
canídeos ................................................................................................................................. 4
Gráfico 5 – Número de casos observados em dermatologia por espécie e tipo de patologia . 5
Gráfico 6 – Número de casos por tipo de cirurgia e espécie animal....................................... 6
Gráfico 7 – Número de casos no internamento de medicina por especialidade médica e
espécie animal........................................................................................................................ 6
Gráfico 8 – Número de casos no internamento de cirurgia por tipo de intervenção cirúrgica e
espécie animal........................................................................................................................ 7
Gráfico 9 – Número de casos por tipo de exame imagiológico e espécie animal ................... 7
Gráfico 10 – Número de casos por tipo de profilaxia vacinal e espécie animal ...................... 8

viii
Enterite Linfoplasmocítica Canina

ÍNDICE DE TABELAS
Pág.
Tabela 1 – Diagnósticos Diferenciais de diarreia crónica de intestino delgado ..................... 27
Tabela 2 – Resultados do hemograma (Benny).................................................................... 77
Tabela 3 – Resultados das bioquímicas séricas (Benny)...................................................... 78
Tabela 4 – Resultados do cTLI, folato e cobalamina séricos (Benny)................................... 78
Tabela 5 – Resultados do hemograma (Riack)..................................................................... 80
Tabela 6 – Resultados das bioquímicas séricas (Riack)....................................................... 81
Tabela 7 – Resultados do ionograma (Riack) ....................................................................... 81
Tabela 8 – Resultados do segundo hemograma (Riack) ...................................................... 82
Tabela 9 – Resultados do segundo ionograma (Riack) ........................................................ 82
Tabela 10 – Resultados das segundas bioquímicas séricas (Riack)..................................... 82
Tabela 11 – Resultados do cTLI, folato e cobalamina séricos (Riack) .................................. 82
Tabela 12 – Resultados do hemograma (Theodora) ............................................................ 86
Tabela 13 – Resultados do ionograma (Theodora)............................................................... 87
Tabela 14 – Resultados das bioquímicas séricas (Theodora)............................................... 87
Tabela 15 – Resultados do cTLI, folato e cobalamina séricos (Theodora)............................ 87
Tabela 16 – Resultados do teste de estimulação dos ácidos biliares (Theodora) ................. 89
Tabela 17 – Resultados do hemograma (Rouck).................................................................. 91
Tabela 18 – Resultados das bioquímicas séricas (Rouck).................................................... 91
Tabela 19 – Resultados dos parâmetros sanguíneos monitorizados durante a noite (Rouck)
............................................................................................................................................. 92
Tabela 20 – Resultados do folato e cobalamina séricos (casos clínicos 1,2 e 3) .................. 96
Tabela 21 – Resultados do CIBDAI, endoscopia e histopatologia (casos clínicos 1,2 e 3) .......
........................................................................................................................................... 100

ix
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

LISTA DE ABREVIAÇÕES

Ac anticorpo
ACTH adrenocorticotropic hormone - hormona adrenocorticotrófica
Ag antigénio
ALT alanina transaminase
APC antigen presenting cell – célula apresentadora de antigénios
ARD antibiotic-responsive diarrhea – diarreia que responde a antibióticos
BT-PABA N-benzoil-tirosil-paraminobenzoato
Ca2+ cálcio
cE1 canine pancreatic elastase – elastase pancreática canina
CHCM concentração de hemoglobina corpuscular média
CHU colite histiocítica ulcerativa
CIBDAI canine inflammatory bowel disease activity index
Cl- cloro
cNOS constitutive nitric oxide synthase – óxido nítrico sintase constitutivas
CO2 dióxido de carbono
cPLI canine pancreatic lipase immunoreactivity
CRP c-reactive protein – proteína C-reactiva
cTLI canine trypsin-like immunoreactivity
DNA deoxiribonucleic acid – ácido desoxirribonucleico
DRD diet-responsive diarrhea – diarreia que responde ao tratamento dietético
ELISA enzyme-linked immunosorbent assay
eNOS endotelial nitric oxide synthase – óxido nítrico sintase endotelial
FA fosfatase alcalina
FOS fructooligossacáridos
HCM hemoglobina corpuscular média
HCO3- bicarbonato
HPLC high pressure liquid chromatography – cromatografia líquida de alta pressão
IBD inflammatory bowel disease – doença inflamatória intestinal crónica
IFN-γ interferon-γ – interferão-γ
Ig imunoglobulina
IL interleucina
IM intra-muscular
iNOS inducible nitric oxide synthase – óxido nítrico sintase induzível
IPE insuficiência pancreática exócrina
K+ potássio
L:R rácio lactulose:ramnose
Mg2+ magnésio
mRNA messenger ribonucleic acid – ácido ribonucleico mensageiro
Na+ sódio
NaCl cloreto de sódio
NF-κB nuclear transcription factor-κB – factor de transcrição nuclear-κB
NH3 amoníaco
nNOS neuronal nitric oxide synthase – óxido nítrico sintase neuronal
NO nitric oxide – óxido nítrico
pANCAs perinuclear antineutrophilic cytoplasmic antibodies – anticorpos
citoplasmáticos perinucleares antineutrofílicos
PCR polymerase chain reaction
PO per os
PU/PD poliúria/polidipsia
q(...)h cada (...) horas
RIA radioimunoensaio
RT-PCR polymerase chain reaction de transcrição reversa
SC subcutânea

x
Enterite Linfoplasmocítica Canina

SIBO small intestinal bacterial overgrowth – sobrecrescimento bacteriano no


intestino delgado
S:M rácio sucrose:3-O-metil-D-glucose
SUBA serum unconjugated bile acids – ácidos biliares não conjugados séricos
TGF-β transforming growth factor-β – factor de crescimento transformador-β
TGI tracto gastrointestinal
TCL triglicéridos de cadeia longa
TCM triglicéridos de cadeia média
Th T helper
TLR toll-like receptor – receptor toll-like
TNF-α tumor necrosis factor-α - factor de necrose tumoral-α
UI unidade internacional
VCM volume corpuscular médio
WSAVA world small animal veterinary association
X:M rácio D-xilose:3-O-metil-D-glucose
α1-PI α1-protease inhibitor - inibidor das proteases-α1
ºC grau celsius

xi
Enterite Linfoplasmocítica Canina

1. INTRODUÇÃO

O estágio de final de curso que deu origem a esta dissertação de mestrado foi realizado no
hospital escolar da École Nationale Vétérinaire d’Alfort, França, local escolhido não só pela
excelente crítica a nível internacional, mas também de modo a proporcionar uma visão da
clínica de pequenos animais diferente da observada em Portugal. O referido estágio teve a
duração de 4 meses, desde o início de Setembro de 2007 ao fim de Janeiro de 2008.

1.1 ACTIVIDADES DE ESTÁGIO

O estágio teve como principal objectivo fornecer uma utilização prática e progressiva dos
conhecimentos teóricos adquiridos durante o curso de medicina veterinária, aplicando-os a
situações reais na clínica de pequenos animais. O período de estágio foi dividido em
semanas, cada semana correspondendo a uma área diferente da clínica de pequenos
animais, dando maior destaque a algumas das áreas. Assim, foram realizadas no total 3
semanas em consultas nas especialidades de nefrologia e urologia, endocrinologia,
gastroenterologia, cardiologia, pneumologia, oncologia, oftalmologia, neurologia e ortopedia,
2 semanas no internamento de medicina, 2 semanas no bloco de cirurgia, 1 semana no
internamento de cirurgia, 2 semanas em reprodução, 2 semanas em
parasitologia/dermatologia, 1 semana em vacinação e 2 semanas em imagiologia. Era
função dos estagiários não só a realização das consultas (e todos os aspectos a elas
ligados), mas também a recolha de amostras para exames complementares, realização dos
próprios exames em alguns casos e a administração de eventuais terapêuticas necessárias.
Embora fosse esperada do estagiário autonomia na realização destas tarefas, encontrava-
se sempre disponível um médico veterinário (interno, residente, assistente ou professor),
que supervisionava os vários passos de todo o processo, especialmente a escolha dos
exames complementares a realizar e a instituição das terapêuticas apropriadas. No bloco de
cirurgia, era da competência do estagiário a realização de castrações e esterilizações, bem
como o auxílio na realização de outras cirurgias, a preparação dos animais para a cirurgia e
a supervisão dos mesmos durante a recuperação da anestesia.

1.2 CASUÍSTICA

Durante o estágio no hospital escolar da École Nationale Vétérinaire d’Alfort foram


observados no total 319 animais. É necessário ter em atenção que nem todos estes animais
foram acompanhados desde a consulta inicial. No caso das semanas no internamento (de
medicina e de cirurgia), os animais eram apenas acompanhados durante a sua
hospitalização, não se observando, na maioria dos casos, a maior parte do processo

1
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

diagnóstico. O mesmo ocorreu no caso das semanas em imagiologia, uma vez que os
animais se apresentavam apenas para a realização dos exames necessários e depois eram
novamente reencaminhados para o serviço original. O Gráfico 1 demonstra o número de
casos por espécie animal, observando-se uma grande predominância de canídeos, seguida
dos felídeos e, por fim, roedores e lagomorfos.

Gráfico 1 - Número de casos observados por espécie animal.

250

214

200

150 Canídeos
Felídeos

102 Roedores
100 Lagomorfos

50

2 1
0
Canídeos Felídeos Roedores Lagomorfos

O Gráfico 2 demonstra a divisão dos casos seguidos nos diversos serviços que se
encontram ao dispor no hospital escolar. É necessário ter em atenção que o número de
casos observados em cada área da clínica de pequenos animais depende em grande parte
ao número de semanas passadas em cada uma destas áreas.

Gráfico 2 - Número de casos observados em cada serviço.

Internamento de Cirurgia 12

Internamento de
19
Medicina

Cirurgia 23

Imagiologia 63

Dermatologia 38

Reprodução 23

Consultas de Medicina e
109
Cirurgia

Profilaxia Vacinal 32

0 20 40 60 80 100 120

2
Enterite Linfoplasmocítica Canina

As consultas de medicina e cirurgia representam a área com maior número de casos


observados, o que se deve não só ao facto de englobarem um elevado número de
especialidades médicas, mas também ao facto de terem sido a área na qual foi passado
maior número de dias. No Gráfico 3 pode-se verificar a divisão dos casos observados nesta
área pelas suas diversas especialidades médicas e espécie animal.

Gráfico 3 - Número de casos por especialidade médica e espécie animal.

18
16
16 1515
14
12 11
10 9 Canídeos
8
8 Felídeos
6 6
6 5
4
4 3 3 3
2 1 1 1 1 1
0
ia

ia

ia
ia

ria

ia

a
ia

s
gi
og

di
ia

og
og
og

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lo

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s
lo

sa
Ne

to

io
Pa

cc
fe
In
s
ça
en
Do

Como se pode observar, a nefrologia/urologia representa a especialidade médica com maior


número de casos. Dentro desta especialidade, merecem destaque as insuficiências renais
crónicas e as infecções urinárias, uma vez que compõem grande parte da casuística,
embora também tenham sido observados casos de cistite idiopática, de urolitíase e de
ureteres ectópicos. Já no caso da endocrinologia, registou-se um elevado número de casos
de hiperadrenocorticismo e de hipertiroidismo, embora outras patologias endócrinas também
tivessem sido observadas. O elevado número de casos nesta especialidade prende-se com
o facto de o hospital escolar da École Vétérinaire ser um centro de referência, com acesso a
variados meios terapêuticos não disponíveis em outros centros. No caso da
Gastroenterologia, salientam-se os casos de doença inflamatória crónica do intestino, bem
como casos de linfangiectasia ou de megacólon. A cardiologia foi uma especialidade com
menor número de casos observados, não por ausência de animais com patologia cardíaca,
mas pelo facto de a maior parte dos casos observados nesta especialidade serem seguidos
pelos próprios médicos veterinários do hospital escolar. Já no caso da patologia respiratória

3
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

destaca-se o colapso da traqueia como a patologia mais frequente. A oncologia foi


provavelmente a especialidade que revelou maior heterogeneidade, observando-se casos
de neoplasia em diversos sistemas orgânicos, embora com destaque para a neoplasia
hepática e esplénica. Os casos de oftalmologia foram também pouco frequentes,
destacando-se as cataratas como a patologia mais frequente. No caso das doenças
infecciosas e parasitárias, foram observados casos de leptospirose, leishmaniose e mesmo
coccidiose. A neurologia foi uma das especialidades com menor número de casos
observados, e os casos clínicos observados foram maioritariamente casos referenciados de
hérnias discais. A ortopedia foi uma especialidade que registou elevada casuística,
representada por casos de displasia da anca, artrites ou mesmo casos referenciados de
ruptura do ligamento cruzado cranial.

O serviço de reprodução e obstetrícia funcionava isoladamente, não se encontrando


englobado nas especialidades médicas referidas anteriormente. Neste serviço, para além
das consultas de reprodução e obstetrícia, eram também realizadas outras intervenções
nesta área, tal como ultrasonografias para controlo de gravidez, inseminações artificiais ou
mesmo cirurgias. Um importante facto a salientar é que não foram observados felídeos no
serviço de reprodução, o que provavelmente se encontra relacionado não só com uma
possível menor incidência de patologias do sistema reprodutor nesta espécie, mas também
pelo motivo de que enquanto as castrações e esterilizações de canídeos eram realizadas no
serviço de reprodução e obstetrícia, estas cirurgias em felídeos eram realizadas pelo serviço
de cirurgia. O Gráfico 4 revela o número de casos de patologia reprodutora na espécie
canina, bem como de outras intervenções realizadas. A patologia mamária (neoplasias) foi a
patologia mais frequentemente observada neste serviço, embora fossem também
observados casos de pseudogestação, patologia vaginal e testicular.

Gráfico 4 - Número de casos de patologia reprodutora e de outras intervenções em canídeos.

1
6

3
Patologia mamária
Patologia Aparelho Reprodutor
Imagiologia
Inseminações
Cirurgias

11

4
Enterite Linfoplasmocítica Canina

A dermatologia foi outras das áreas com elevada predominância de casos em canídeos, o
que está provavelmente ligado ao facto de numa cidade, os canídeos terem geralmente
maior acesso ao exterior, enquanto que os felídeos representam geralmente animais de
interior (apartamento).

Gráfico 5 - Número de casos observados em dermatologia por espécie e tipo de patologia.

14

12
12
11

10
9

8
Canídeos
Felídeos
6

4
3
2
2
1

0
Dermatites Pododermatites Otites Doenças
Imunomediadas

Como se pode observar pelo Gráfico 5, foram registados diversos casos de dermatite,
pododermatite e otite. No caso das doenças imunomediadas, apenas foi visto um caso, o
que reflecte a baixa incidência deste tipo de patologia. Um facto interessante no caso da
patologia da pele é que grande parte dos proprietários dos canídeos observados reportou
que o seu animal esteve em contacto com uma fonte de água pouco limpa (rio, lago, poça)
antes de apresentar os primeiros sinais dermatológicos, o que reflecte a importância desta
factor em muitas patologias dermatológicas.

A cirurgia é uma área que apresenta uma maior frequência de casos em felídeos, o que se
encontra ligado ao facto de as castrações e esterilizações nesta espécie serem realizadas
por este serviço e não pelo serviço de reprodução. Este tipo de intervenções representa
assim grande parte das cirurgias de tecidos moles em felídeos. Já em canídeos as cirurgias
de tecidos moles observadas foram na sua maioria cirurgias para remoção de massas
neoplásicas, especialmente a nível abdominal. Já no caso da ortopedia, adquirem maior
destaque as resoluções cirúrgicas de fracturas de membros, tanto em canídeos como em
felídeos. O Gráfico 6 revela o número de cirurgias a tecidos moles e ortopédicas realizadas
em canídeos e felídeos.

5
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

Gráfico 6 - Número de casos por tipo de cirurgia e espécie animal.

12
Tecidos M oles
5

Felí deos
Canídeos

2
Ortopedia
4

0 2 4 6 8 10 12 14

No que respeita ao internamento do serviço de medicina observa-se um grande destaque a


nível do número de casos de patologia do aparelho urinário em felídeos, como se pode
observar pelo Gráfico 7.

Gráfico 7 - Número de casos no internamento de medicina por especialidade e espécie animal.

Hematologia
1

Cardiologia
1

2 Felídeos
Oncologia
2 Canídeos

Gastroenterologia
3

Nefrologia e 8
Urologia 2

0 2 4 6 8 10

Em relação ao internamento de cirurgia, registou-se um igual número de casos de ortopedia,


na sua maioria casos de fracturas de membros, tanto em canídeos como em felídeos, e de
cirurgia dos tecidos moles, neste último salientando-se os pacientes em recobro de
ovariohisterectomias por piómetra e uretrostomias. O Gráfico 8 demonstra o número de
casos por tipo de intervenção cirúrgica e espécie animal.

6
Enterite Linfoplasmocítica Canina

Gráfico 8 - Número de casos no internamento de cirurgia por tipo de intervenção cirúrgica e espécie animal.

5 2

4 4
Felídeos
Canídeos
3

2 4

1 2

0
Ortopedia Tecidos Moles

O serviço de imagiologia foi outro dos serviços que apresentou elevada variação nos casos
observados. É importante salientar que estes casos não foram seguidos na sua totalidade,
representam apenas os exames imagiológicos realizados e/ou presenciados pelo estagiário
no decurso das semanas no serviço de imagiologia.

Gráfico 9 - Número de casos por tipo de exame imagiológico e espécie animal.

40
37

35

30

25
Radiologia
20 Ultrasonografia
Endoscopia
15

10 9
7

5 4
3
2
1
0
Canídeos Felídeos Roedores Lagomorfos

Como se pode observar pelo Gráfico 9, a radiologia foi o principal tipo de exame
imagiológico realizado, o que está ligado não só ao menor custo das radiografias em
comparação com as ultrasonografias, mas também ao facto de alguns tipos de patologias
serem melhor analisadas por este tipo de exame. Assim, verificou-se que grande parte dos
exames radiográficos realizados estava ligada à patologia ortopédica, especialmente
avaliação de artrites, diagnóstico de displasia da anca ou avaliação pré ou pós cirúrgica de

7
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

fracturas. Verificou-se também que a pesquisa pulmonar de metástases foi outro dos
motivos mais frequentes para a realização de exames radiológicos. Já a nível das
ultrasonografias, o motivo mais frequente para a realização deste tipo de exame foi a
pesquisa de patologia a nível abdominal, especialmente a nível hepático e esplénico, e a
realização de cistocentese ecoguiada. As endoscopias referidas tinham como intuito a
pesquisa de alterações na mucosa gastrointestinal, bem como a recolha de amostras de
mucosa para biopsia.

Nas consultas referentes à profilaxia vacinal foi também observada uma maior frequência de
canídeos, tanto ao nível de primovacinações como ao nível de revacinações. No Gráfico 10
podem-se observar o número de casos para cada um destes tipos de intervenção, para
canídeos e felídeos.

Gráfico 10 - Número de casos por tipo de profilaxia vacinal e espécie animal.

15
16

14
12

10 8
Canídeos
8 6 Felídeos
6
3
4
2

0
Primovacinações Revacinações

8
Enterite Linfoplasmocítica Canina

2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA: ENTERITE LINFOPLASMOCÍTICA CANINA

O termo "doença inflamatória intestinal crónica" (Inflammatory Bowel Disease - IBD) reflecte
um grupo de doenças idiopáticas crónicas que afectam o Homem e os animais,
caracterizadas por sinais gastrointestinais persistentes ou recorrentes e evidência
histológica de inflamação gastrointestinal difusa, focal ou multifocal, sem causa conhecida.
Podem estar afectados o estômago, o intestino delgado (o mais frequentemente atingido), o
cólon ou uma combinação destas regiões. A nomenclatura baseia-se na caracterização das
populações inflamatórias predominantes que infiltram a lâmina própria mucosa (e por vezes
a submucosa) do tracto gastrointestinal (TGI). As infiltrações celulares são constituídas por
números variáveis de linfócitos, plasmócitos, eosinófilos, macrófagos ou neutrófilos, sendo
mais comuns as infiltrações linfoplasmocíticas, seguidas das eosinofílicas, histiocíticas e,
por fim, neutrofílicas (estas últimas pouco frequentes em cães, aparecendo sobretudo na
IBD humana). Existem assim, gastrites e/ou enterites e/ou colites linfoplasmocíticas,
eosinofílicas ou colites histiocíticas. Apesar de existirem tipos celulares predominantes, é
normal a infiltração conter populações mistas das restantes células inflamatórias. É
importante salientar que a IBD é uma descrição das células inflamatórias encontradas no
tracto gastrointestinal, e não uma verdadeira entidade. Como existem diversas afecções que
podem provocar inflamação gastrointestinal histologicamente semelhante à IBD, alguns
autores preferem designar esta doença como “IBD idiopática”. O termo
gastrite/enterite/colite linfoplasmocítica será utilizado nesta dissertação apenas para os
animais afectados com IBD, enquanto que os animais afectados com outras patologias que
também podem provocar inflamação intestinal serão referidos pela sua patologia primária.

2.1 ETIOLOGIA E IMUNOPATOGÉNESE

Embora a IBD seja uma entidade clínica conhecida há vários anos, a sua etiologia continua
desconhecida, mesmo em medicina humana. É, no entanto, universalmente aceite que a
IBD humana resulta de uma desregulação do sistema imune intestinal, provavelmente
precipitada por uma complexa interacção de susceptibilidade genética, factores ambientais
(por exemplo, antigénios dietéticos e microbianos) e factores imunorreguladores, que
resultam na perda de tolerância oral a antigénios dietéticos e bacterianos presentes no
lúmen intestinal (Friedman & Blumberg, 2005). Embora tenha sido sugerido que a IBD
canina apresenta semelhanças com a sua correspondente humana, na realidade pouco foi
estudado acerca da imunopatogénese desta doença na espécie canina, pelo que a maior
parte dos estudos realizados nesta espécie são investigações de factores conhecidos,
envolvidos na imunopatogénese da IBD em humanos.

9
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

2.1.1 Tolerância Oral


Para compreender os mecanismos imunes provavelmente envolvidos na patogénese da
IBD, é necessário compreender o mecanismo de tolerância oral. A tolerância imunológica é
um mecanismo do sistema imunológico que permite ao organismo distinguir entre self e não
self, tentando assim proteger contra patógenos externos sem reagir contra constituintes self
(Weiner, 1995). Neste fenómeno, células M especializadas à superfície do epitélio intestinal
(placas de Peyer, folículos linfóides isolados ou mesmo na lâmina própria) recolhem por
pinocitose macromoléculas, complexos antigénio-anticorpo (Ag-Ac) e células microbianas,
que são depois transportados até linfócitos B, macrófagos e células dendríticas (Prescott,
Harley & Klein, 2002; Xavier & Podolski, 2007). Estas células apresentadoras de antigénios
(Antigen Presenting Cells - APC) não possuem os co-estimuladores CD80 e CD86, pelo que
quando são apresentadas a linfócitos B e T imaturos, estes últimos pouco proliferam. Estes
linfócitos activados vão então entrar na corrente sanguínea e são distribuídos pelas
mucosas do organismo, permanecendo na lâmina própria, esperando um novo contacto com
o antigénio que as originou (Cave, 2003).

No entanto, para que ocorra uma nova estimulação destes linfócitos, os antigénios
necessitam de atingir a lâmina própria, geralmente mediante as APC. Porém, tal como as
suas congéneres primárias, estas APC apresentam também ausência de co-estimuladores,
pelo que a resposta imune é suprimida, o que contribui ainda mais para a tolerância
ambiental (Cave, 2003; Prescott et al., 2002). Os linfócitos T activados por estas APC
secundárias vão então dirigir a resposta para a diferenciação em linfócitos Thelper (Th) 2 e
Th3, produtores de interleucina (IL) -10 e factor de crescimento transformador - β
(Transforming Growth Factor-β - TGF-β), as quais inibem a proliferação de linfócitos Th1
(através da indução de apoptose) e a produção de imunoglobulina (Ig) G, ao mesmo tempo
que estimulam a diferenciação dos linfócitos B para plasmócitos produtores de IgA (Cave,
2003; Prescott et al., 2002; Weiner, 1994). A IgA tem um papel importante na defesa da
barreira intestinal (e de outras mucosas), ligando-se a vários agentes microbianos e
impedindo a aderência e invasão dos tecidos por agentes patogénicos. Adicionalmente, a
IgA liga-se a antigénios no interior da camada mucosa intestinal, formando complexos Ag-Ac
que são excretados para o lúmen intestinal (Prescott et al., 2002).

Porém, mesmo assim o sistema imune consegue responder a antigénios microbianos


através de receptores específicos, como os receptores membranários Toll-like (Toll-like
Receptors - TLR), dos quais já foram identificadas várias variantes caninas, como os TLR2,
TLR3, TLR4, TLR5 e TLR9, e os seus correspondentes citossólicos Nod, Nod1 e Nod2,
identificados em células de mamíferos (Burgener & Jungi, 2006a; Burgener & Jungi, 2006b;
Swerdlow et al., 2006). Recentemente, foi descoberto que estes receptores, classicamente

10
Enterite Linfoplasmocítica Canina

pensados como estando presentes apenas em células da linha mielóide (monócitos,


granulócitos e linfócitos), são também expressos em células epiteliais colónicas caninas
(Swerdlow et al., 2006). A activação dos TLR inicia uma cascata de sinalização que culmina
na libertação do factor nuclear de transcrição-κB (Nuclear Transcription Factor-κB - NF-κB),
permitindo a translocação para o núcleo e induzindo a transcrição de genes específicos, tais
como para citoquinas pró-inflamatórias (por exemplo, IL-1, IL-6, IL-8, IL-12), síntese de
factores co-estimuladores (por exemplo, CD80/CD86) e de radicais livres do oxigénio e
azoto (Burgener & Jungi, 2006a; Cave, 2003). Para evitar respostas exageradas aos
antigénios luminais, a expressão destes receptores é praticamente inexistente no intestino
normal, sendo apenas aumentada em resposta a estímulos infecciosos e inflamatórios
(Swerdlow et al., 2006).

2.1.2 Antigénios Microbianos e Alimentares


É com base neste mecanismo de tolerância oral e na presença de receptores específicos,
como os receptores TLR e Nod, que se baseiam as suposições de que a flora microbiana
intestinal e que componentes antigénicos da dieta possam desempenhar um papel na
patogénese da IBD, tanto canina como humana.

Como vários agentes microbianos provocam respostas inflamatórias intestinais


caracterizadas por infiltrações inflamatórias semelhantes às encontrados na IBD, durante
muito tempo foi pensado que seria um agente específico o responsável por esta doença,
mas até ao momento apenas foi identificado um agente patogénico específico na Colite
Histiocítica Ulcerativa (CHU) (German, 2005). Um estudo recente demonstrou a presença de
colonização intestinal intramural por Escherichia coli em Boxers com CHU, mas tal
colonização não foi observada em pacientes com outros tipos de colite ou em indivíduos
normais (Simpson et al., 2006). Estudos em modelos murinos para colite demonstraram que
animais com flora luminal normal desenvolviam colite espontaneamente, enquanto que nas
mesmas condições mas mantidos num estado gnotobiótico não eram observados sinais de
colite (Xavier & Podolski, 2007). Porém, vários agentes bacterianos diferentes, tanto agentes
patogénicos como os presentes na flora entérica normal ou alterada (qualitativa e
quantitativamente), provocam respostas inflamatórias intestinais semelhantes,
nomeadamente infiltração linfoplasmocítica, pelo que pode ser que a IBD se deva, pelo
menos em parte, a uma resposta imunológica excessiva à presença de tais agentes (Cave,
2003; German, 2005). As melhoras clínicas observadas quando se medicam animais
afectados com antibióticos, como o metronidazol ou a tilosina, suportam a hipótese de que
uma bactéria patogénica específica ou a flora intestinal estão envolvidos na patogénese da
IBD (German, 2005; Hall & German, 2005; Tams, 2003; Washabau & Holt, 2005;
Westermarck et al., 2005). No entanto, é importante não esquecer que estes antibióticos são

11
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

conhecidos pelas suas acções imunomoduladoras, pelo que as melhorias observadas


podem não ser devidas apenas à sua acção antibiótica (Allen, Pringle, Smith, Pasloske &
Day, 1998; Hall & German, 2005; Tams, 2003; Tennant, 2005; Washabau & Holt, 2005;
Webster, 2005; Westermarck et al., 2005). É também de salientar que o sobrecrescimento
bacteriano é uma complicação comum em pacientes com IBD, pelo que é esperado que
ocorra uma melhoria do quadro clínico em pacientes medicados com antibióticos, e esse
mesmo sobrecrescimento pode provocar, por si só, uma resposta linfoplasmocítica
intestinal, não se sabendo assim se a IBD é uma causa ou uma consequência deste
sobrecrescimento (Cave, 2003; German, Hall & Day, 2003b; Hall & German, 2005; Rutgers,
Batt, Elwood & Lamport, 1995; Tams, 2003).

Os microrganismos fúngicos são outra possível fonte antigénica para os intestinos, e em


humanos está já comprovado que o fungo Saccharomyces cerevisiae está envolvido na
patogénese da IBD (Friedman & Blumberg, 2005). Um estudo recente em cães demonstrou
uma baixa sensibilidade e especificidade de um teste para detecção de Ac contra S.
cerevisiae em cães com IBD, pelo que o papel deste fungo na patogénese da IBD canina
está ainda por verificar (Allenspach et al., 2004.). Foi recentemente reportado um outro
estudo avaliando a prevalência de ácido desoxirribonucleico (Deoxiribonucleic acid – DNA)
fúngico no intestino de cães normais e cães com IBD, relatando que embora não tenham
sido encontradas diferenças significativas na prevalência de DNA fúngico entre os dois
grupos de cães, cães com IBD apresentam maior prevalência de fungos oportunistas, como
Candida sp. (Allenspach et al., 2007b).

A dieta constitui uma enorme fonte de antigénios potencialmente envolvidos na patogénese


da IBD. O papel da dieta na patogénese da IBD é suportado pela observação de que os
sinais clínicos de pacientes com IBD muitas vezes melhoram quando são alimentados com
uma dieta contendo uma nova fonte proteica ou uma fonte de proteínas hidrolisadas
(Chandler, 2002a; German, 2005; Guilford & Matz, 2003; Hall & German, 2005; Tams, 2003;
Willard, 2003). É possível que com a alteração da dieta e a consequente remoção do
estímulo antigénico, mesmo que não seja o único responsável pela resposta imune anormal,
ocorra redução da inflamação intestinal e melhorias clínicas. Porém, não se sabe se esta
hipersensibilidade aos antigénios alimentares é responsável pela doença ou se é o resultado
de alterações na permeabilidade intestinal ou na disrupção da barreira mucosa intestinal
induzidas pela presença de uma infiltração inflamatória na mucosa intestinal. Por outro lado,
sabe-se que as sensibilidades alimentares adquiridas podem ter um papel na perpetuação
da IBD, pois não só partilham muitas das características histológicas da IBD, mas também
existem relatos de cães com IBD que se tornaram positivos a testes de sensibilidade
alimentar algumas semanas após a alteração da dieta para uma nova fonte proteica

12
Enterite Linfoplasmocítica Canina

(German, 2005; Guilford & Matz, 2003). Isto deve-se provavelmente ao facto de que muitas
vezes a alteração da dieta se realiza enquanto o intestino continua inflamado, permitindo a
sensibilização do organismo à nova fonte alimentar (Davenport, Remillard, Simpson &
Pidgeon, 2000; Sturgess, 2005). É também de referir que os constituintes da dieta podem
exercer efeitos sobre a flora intestinal, nomeadamente alteração do equilíbrio entre as
espécies bacterianas, podendo promover o crescimento de microrganismos patogénicos,
potencialmente responsáveis pela resposta imune anormal.

É no entanto interessante que a utilização de probióticos e de prebióticos tem sido relatada


como tendo efeito benéfico na melhoria dos sintomas clínicos de pacientes com IBD, não só
ao diminuir a inflamação intestinal como também ao diminuir o números de microrganismos
patogénicos no lúmen intestinal (Guilford & Matz, 2003; Zentek, 2007). Estes agentes são
capazes de promover uma melhoria da função do intestino como barreira, modular a função
imune intestinal e competir com agentes patogénicos por substractos, o que se traduz por
uma melhoria dos sinais clínicos (Jergens, 2007; Zentek, 2007).

2.1.3 Permeabilidade Intestinal


Durante muito tempo a permeabilidade intestinal foi suspeita de estar alterada em pacientes
com IBD, pensando-se estar directamente envolvida na resposta imune anormal que se
observava no intestino de pacientes com IBD. Em pacientes humanos, tem sido relatado
aumento da permeabilidade intestinal em pacientes com Doença de Crohn, bem como em
familiares em primeiro grau de pacientes com Doença de Crohn (Xavier & Podolski, 2007).
Já em pacientes caninos, têm sido reportados casos de permeabilidade intestinal
aumentada em pacientes com sensibilidade ao glúten, sobrecrescimento bacteriano, bem
como em outras patologias intestinais (Cave, 2003). Alguns estudos relatam a inexistência
de aumentos na permeabilidade intestinal em pacientes caninos com IBD (Vaden et al.,
2000; Allenspach et al., 2006a), mas estudos recentes demonstram aumentos na
permeabilidade intestinal em pacientes caninos com enterite linfoplasmocítica (Kobayashi et
al, 2007b). É possível que a discrepância de resultados possa dever-se a diferenças na
severidade dos casos seleccionados para os estudos.

Em humanos e murinos, foi demonstrado que as junções apertadas entre as células


intestinais são dinamicamente reguladas em resposta à secreção de factor de necrose
tumoral-α (Tumor Necrosis Factor-α – TNF-α), IL-17, interferão-γ (Interferon-γ – INF-γ),
quimoquinas e à rede de células imunes subjacente (Xavier & Podolski, 2007). Foi também
demonstrado que a secreção das citoquinas inflamatórias TNF-α e IFN-γ, frequentemente
aumentadas em casos de IBD, aumenta a permeabilidade intestinal, e que o TNF-α induz a
apoptose das células epiteliais intestinais (Cave, 2003). Por outro lado, foram também

13
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

reportadas em pacientes humanos com IBD, diminuições na expressão de proteínas


envolvidas nos complexos juncionais, como a E-caderina e β-catetina, embora os
mecanismos envolvidos não sejam conhecidos (Xavier & Podolski, 2007). Foi recentemente
reportada uma diminuição da expressão epitelial de E-caderina e α-catetina em cães com
enterite linfoplasmocítica, o que reforça a importância da permeabilidade intestinal na
patogénese da IBD (Kobayashi et al, 2007a). Em humanos e modelos murinos foram
também já identificados vários loci associados com a Doença de Crohn e aumentos na
permeabilidade intestinal (Xavier & Podolski, 2007). Atendendo aos resultados dos estudos
realizados em pacientes humanos, canídeos e murinos com IBD, é provável que os
pacientes caninos com IBD sofram de aumentos na permeabilidade intestinal pelos mesmos
mecanismos (nomeadamente a secreção de citoquinas), mas até agora ainda não foram
identificados loci associados a esta alteração nesta espécie.

Embora não se saiba se o aumento da permeabilidade intestinal está envolvido na etiologia


da IBD ou se consiste numa sequela resultante dos processos inflamatórios intestinais,
sabe-se que permite maiores movimentos de antigénios (microbianos e alimentares) através
do epitélio intestinal, no que resulta aumento da exposição imune a estes antigénios, bem
como na perda de líquido e proteínas para o lúmen intestinal, como é observado nos casos
mais severos de enterite linfoplasmocítica (Cave, 2003; Kobayashi et al., 2007b).

2.1.4 Factores Genéticos


A existência de predisposição racial classicamente reportada em algumas formas de IBD
canina, como a colite histiocítica ulcerativa dos Boxers, a enteropatia imunoproliferativa dos
Basenjis, a enteropatia e/ou nefropatia com perda de proteínas dos Soft Coated Wheaten
Terriers, a enteropatia crónica dos Shar-Peis ou a enteropatia dos Pastores Alemães, torna
provável a existência de uma componente genética na etiologia da IBD. Porém, poucos
estudos foram realizados no sentido de avaliar esta predisposição racial e identificar loci
envolvidos.

A CHU é classicamente considerada uma entidade específica de Boxers ou raças próximas,


pelo que foi sugerida a possibilidade de uma predisposição genética nesta raça (Hall, 2004;
Hall, 2007). Surpreendentemente, no caso da CHU, foi recentemente descrita a ocorrência
desta forma de IBD em três cães não Boxers (um Mastiff, um Dobermann Pincher e um
Malamute do Alasca), o que sugere que, embora os Boxers possam realmente possuir uma
predisposição a esta doença, ela não é exclusiva desta raça, ou que existem outros factores
envolvidos na patogénese desta forma severa de colite (Stokes, Kruger, Mullaney, Holan &
Schall, 2001). Foram também recentemente descritos dois outros casos de CHU em cães
não Boxers, um num Bulldog Francês (Tanaka, Nakayama & Takase, 2003) e outro num

14
Enterite Linfoplasmocítica Canina

Bulldog Inglês (Hostutler et al., 2004), mas cães destas raças e Boxers são considerados
parentes distantes, podendo partilhar o mesmo potencial de base genética da doença. Outro
estudo recente reportou a existência de grande número de cocobacilos, mais tarde
identificados como E. coli aderente e invasiva, no interior da mucosa intestinal em Boxers
afectados com CHU (Simpson et al., 2006), o que pode sugerir a existência de uma
predisposição à invasão colónica por esta espécie bacteriana. No entanto, todos os animais
incluídos neste estudo pertenciam à raça Boxer, não se sabendo se existe colonização
intramural por E. coli em cães não Boxers afectados pela CHU.

Foi também reconhecida a ocorrência de transmissão familiar de uma enteropatia com


perda de proteínas, nefropatia com perda de proteínas ou ambas em Soft Coated Wheaten
Terriers (Littman, Dambach, Vaden & Giger, 2000). A análise de um número elevado de
casos demonstrou a existência de um antepassado macho comum, embora ainda não se
conheça o modo de transmissão. Como esta forma de IBD ocorre geralmente em animais
adultos, pensa-se que esta doença será o resultado da actuação de factores externos em
animais predispostos (Littman et al., 2000).

Está reportada a existência de uma deficiência relativa na produção duodenal de IgA em


Pastores Alemães com enteropatias crónicas em relação à produção intestinal de IgA em
cães de outras raças com doença entérica (German, Hall & Day, 2000). Porém, como a
concentração sérica, salivar ou lacrimal de IgA não se encontrava alterada nestes Pastores
Alemães e não se encontraram diferenças entre o números de plasmócitos produtores de
IgA entre Pastores Alemães e cães de outras raças, permanece a dúvida se este facto se
deve a um defeito primário existente nesta raça ou se algum acontecimento, durante a
patogénese das enteropatias crónicas, provoca diminuição da secreção desta
imunoglobulina (German et al, 2000). Está também documentada uma deficiência em IgA
em Shar-Peis (Rivas et al., 1996). Uma vez que a IgA associada à mucosa intestinal tem um
papel importante na defesa do hospedeiro, será esperado que nestas raças, onde ocorre
uma deficiência nesta imunoglobulina, as defesas intestinais estejam comprometidas,
predispondo à doença intestinal.

Apesar de alvo de vários estudos, ainda não é conhecida a forma de transmissão da


enteropatia imunoproliferativa dos Basenjis. A possibilidade da existência de uma
predisposição genética baseia-se no facto de que esta forma de IBD apenas surgir em cães
desta raça, e não na identificação de alterações genéticas (Hall, 2004; Hall, 2007).

Ao contrário do que sucede em canídeos, a investigação de genes de susceptibilidade da


IBD humana, bem como a investigação de modelos murinos de colite, tem lançado novas

15
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

perspectivas acerca da imunopatogénese desta doença. Foram já identificados variados


cromossomas com loci potencialmente envolvidos na patogénese da IBD humana, como os
cromossomas 1, 3, 5, 7, 12 e 16, embora na maioria dos casos os genes envolvidos ainda
não tenham sido confirmados (Friedman & Blumberg, 2005). Inicialmente, foi identificado o
gene NOD2 no cromossoma 16, o qual activa um potente factor de transcrição pro-
inflamatório, o NF-kB (Hugot et al., 2001; Ogura et al., 2001). Desde então vários outros loci
envolvidos na susceptibilidade à IBD têm sido identificados e confirmados, incluindo IBD5,
IL23R, ATG216L1 e os cromossomas 5p13.1, 5q33.1 e 10q21.1 (Xavier & Podolski, 2007).
Outros loci foram identificados, mas aguardam ainda confirmação do seu papel na
susceptibilidade à IBD, como o NCF4, PHOX2B, PTPN2, TNFSF15 ou o cromossoma
16q24.1. Todos estes loci parecem afectar ou a função da barreira mucosa ou a imunidade
inata e adquirida, predispondo à Doença de Crohn (Xavier & Podolski, 2007). É possível que
muitas destas anomalias genéticas ocorram também em pacientes caninos, pelo que são
necessários estudos para identificar e caracterizar possíveis genes de susceptibilidade em
cães.

2.1.5 A Resposta Inflamatória na IBD


Como foi referido, no intestino normal o fenómeno de tolerância oral permite ao organismo
suprimir as respostas imunes contra antigénios luminais. Porém, nos pacientes com IBD,
ocorre uma alteração deste mecanismo, o que resulta numa resposta inflamatória
exagerada aos antigénios luminais. Assim, nos pacientes com IBD, na presença de um
antigénio, não só ocorre activação de receptores TLR presentes em células epiteliais, como
de APC, nomeadamente macrófagos, e linfócitos T localizados na lâmina própria intestinal.
A activação destas células resulta na produção e expressão de mais receptores TLR, bem
como na produção de diversas citoquinas pro-inflamatórias, as quais não só activam outras
células inflamatórias presentes na mucosa intestinal, como também exercem efeitos
quimiotácticos sobre outros linfócitos, monócitos e outros leucócitos inflamatórios presentes
na circulação sistémica.

Embora classicamente a IBD seja classificada consoante o(s) tipo(s) de células


predominantes na infiltração da lâmina própria, existe agora uma preocupação crescente em
avaliar as populações celulares e realizar a sua caracterização em subtipos, de maneira a
melhor compreender o desenrolar dos fenómenos inflamatórios nesta doença. Num desses
estudos, foi relatado um aumento no número de plasmócitos produtores de IgG e IgA, bem
como de linfócitos T CD3+ em cães com colite linfoplasmocítica, quando comparados com
cães saudáveis (Jergens et al., 1999). Outro estudo relata também a presença de número
aumentado de linfócitos T na lâmina própria e epitélio glandular colónicos e de linfócitos B
na lâmina própria colónica de cães com IBD (Stonehewer, Simpson, Else & Macintyre,

16
Enterite Linfoplasmocítica Canina

1998). Um outro estudo revelou, surpreendente, números diminuídos de plasmócitos


produtores de IgA e IgG e de linfócitos T CD3+ na lâmina própria do intestino delgado de
cães com IBD, quando comparados com cães saudáveis e cães com gastroenterites não
específicas (Jergens, Moore, Kaiser, Haynes & Kinyon, 1996). Jergens, Sonea, Kaufman,
Moore e Benson (2001) demonstraram aumento de linfócitos CD3+, acompanhados de
aumentos menores de linfócitos CD4+, ambos exprimindo maioritariamente receptores dos
linfócitos T (TCR) αβ+. Similarmente, foi reportada a existência de número aumentado de
plasmócitos produtores de IgG, bem como de linfócitos T CD3+ e CD4+ e de receptores αβ-
TRC (expressos nas células do epitélio e lâmina própria intestinais) na lâmina própria
duodenal de cães com IBD (German, Hall & Day, 2001). O mesmo estudo reporta ainda
aumentos no número de linfócitos intraepiteliais, nomeadamente CD3+, macrófagos,
granulócitos, e diminuições no número de mastócitos. Este último achado, juntamente com
os resultados de um estudo recente realizado por Kleinschmidt, Meneses, Nolte & Hewicker-
Trautwein (2007), contrastam com as descobertas de outro estudo (Locher et al., 2001), que
relata aumento de mastócitos e IgE na mucosa gastrointestinal de cães com IBD, sugerindo
que reacções de hipersensibilidade (provavelmente a antigénios bacterianos e/ou dietéticos)
estão envolvidas na patogénese da IBD. German et al. (2001) e Kleinschmidt et al. (2007)
referem que as diferenças encontradas no número de mastócitos podem dever-se à
utilização de diferentes técnicas de identificação de mastócitos e não a uma verdadeira
diminuição do seu número, uma vez que o método utilizado não reconhece mastócitos
desgranulados, o que está de acordo com os resultados de dois estudos efectuados em
pacientes humanos com IBD, que relatam aumento do número de mastócitos desgranulados
e eosinófilos na lâmina própria intestinal (Bischoff et al., 1996; Knutson, Ahrenstedt, Odlind &
Hällgren, 1990). German et al. (2001), relatam também que não foram encontradas
diferenças significativas nos números de eosinófilos na lâmina própria entre pacientes com
enterite linfoplasmocítica e animais saudáveis, o que não impede, no entanto, que estas
células desempenhem um papel importante na patogénese da IBD. Recentemente, um
estudo por Dandrieux, Bornand, Doherr, Zurbriggen & Burgener (2007) investigando os
relatos de aumento do número de linfócitos na lâmina própria intestinal de cães afectados
com IBD, documentou a diminuição da apoptose de linfócitos em cães com IBD, quando
comparados com cães saudáveis, o que poderá estar relacionado com um desvio da
expressão de citoquinas imunossupressoras (IL-10 e TGF-β), indutoras da apoptose de
linfócitos, para a expressão de citoquinas pró-inflamatórias.

A análise dos níveis de ácido ribonucleico mensageiro (messenger Ribonucleic Acid –


mRNA) de citoquinas presentes no intestino de cães afectados com enterocolite
linfoplasmocítica tem sido alvo de vários estudos, pois as células imunes das infiltrações
intestinais exercem muitos dos seus efeitos através das citoquinas que produzem. German

17
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

et al. (2000) reportou aumento significativo de mRNA de IL-2, IL-5, IL-12p40, TNF-α e TGF-
β1 em amostras de biopsias duodenais de cães Pastores Alemães com enterite
linfoplasmocítica e SIBO, quando comparados com cães num grupo controlo, mas não
encontraram diferenças significativas entre o grupo de cães com enterite linfoplasmocítica e
SIBO, o que sugere aumento das respostas imunes nestas duas patologias. Já os níveis de
IL-4, IL-10 e IFN-γ não se encontravam significativamente alterados entre cães sãos e cães
afectados por estas patologias. Outro estudo em cães com colite linfoplasmocítica revelou
aumentos significativos no mRNA de IL-2 e TNF-α, bem como aumentos ligeiros no mRNA
de IL-12p40 e IFN-γ, e níveis normais de mRNA de IL-4, IL-6 e IL-12p35, achados que
sugerem uma resposta inflamatória de tipo Th1 (IL-2, IL-12, IFN-γ) (Ridyard, Nuttall, Else,
Simpson & Miller, 2002). Curiosamente, os resultados de German et al. (2000) sugerem uma
resposta TH1 (IL2, IL-12) e TH2 (IL-5) simultânea. É, no entanto, necessário referir que o
estudo de German et al. (2000) foi realizado apenas em cães Pastores Alemães, raça
predisposta a IBD, o que poderá ter influenciado os resultados. Recentemente, Peters,
Helps, Calvert, Hall & Day (2005) quantificaram através de polymerase chain reaction (PCR)
de transcriptase reversa (“Reverse Transcriptase-PCR” - RT-PCR) em tempo real mRNA de
citoquinas (IL-2, IL-4, IL-5, IL-6, IL-10, IL-12, IL-18, INF-γ, TNF-α, TGF-β) na mucosa
duodenal de cães com enteropatias crónicas (enterite linfoplasmocítica, eosinofílica ou
mista), reportando a inexistência de diferenças significativas entre os cães com enteropatias
e cães sem doença gastrointestinal. Igualmente, também não foram encontradas diferenças
entre animais de diferentes raças, diferentes infiltrações inflamatórias ou diferente gravidade
histológica da doença. Os autores do mesmo estudo esclarecem que as discrepâncias entre
os resultados de diferentes estudos podem dever-se aos diferentes métodos de
quantificação utilizados, uma vez que German et al. (2000) e Ridyard et al. (2002)
empregaram RT-PCR semi-quantitativo, método actualmente considerado impreciso
relativamente ao RT-PCR em tempo real. No entanto, outro estudo recente utilizando RT-
PCR em tempo real demonstrou a inexistência de diferenças significativas entre as
quantidades de mRNA de IL-5, IL-10, IL-12p40, IL-13, IFN-γ, TNF-α e TGF-β1 na mucosa
duodenal e colónica entre cães com IBD e cães com diarreia sensível ao tratamento
dietético (Diet-Responsive Diarrhea – DRD) antes da realização de tratamento, embora
relate grande aumento dos níveis de mRNA de TNF-α, especialmente nos pacientes com
IBD (Sauter, Allenspach & Blum, 2007). Surpreendentemente, o mesmo estudo reporta
níveis superiores de mRNA de IL-5 e INF-γ nas amostras colónicas de cães controlo e
aumento de mRNA de TNF-α em cães com DRD após o tratamento.

Recentemente, foi também comprovado o aumento da expressão de mRNA dos receptores


TLR e Nod em amostras de intestino delgado e cólon de cães com IBD, o que sugere que
estes receptores desempenham um papel importante na patogénese da IBD (Burgener &

18
Enterite Linfoplasmocítica Canina

Jungi, 2007). Os mesmos autores referem ainda que ausência de diminuição da expressão
do mRNA destes receptores após o tratamento pode sugerir a presença de uma
predisposição genética, tal como em humanos. Outro estudo em modelos murinos reportou
que as células epiteliais colónicas (e seus TLR) são capazes de distinguir entre diferentes
estirpes de bactérias comensais, e que probióticos (Lactobacillus rhamnosus) são capazes
de suprimir a indução, por bactérias comensais, da produção de citoquinas pró-inflamatórias
(Lan et al., 2005). Outra das moléculas que é frequentemente alvo de estudos é o NF-κB,
uma vez que muitos genes de citoquinas pro-inflamatórias apresentam locais de ligação a
este factor, que regula a transcrição génica. Luckschander et al. (2006a) demonstraram
aumento da expressão do NF-κB em cães com IBD e DRD, o que sugere a importância do
papel deste factor na patogénese destas doenças. Controversamente, um estudo recente
em modelos murinos de colite demonstrou que a ausência de NF-κB, conseguida através de
deleção génica, induzia colite espontânea em ratos, uma vez que esta deficiência aumenta a
sensibilidade das células epiteliais colónicas a apoptose induzida pelo TNF, aumenta a
translocação de bactérias para o interior da mucosa (secundária a disrupção epitelial) e
provoca diminuição da produção de péptidos antimicrobianos pelo epitélio colónico, o que
induz a expressão de citoquinas pro-inflamatórias como TNF e IL-1, que provocam maior
destruição epitelial e acentuam a infiltração inflamatória (Nenci et al., 2007). Como se pode
observar pelos resultados destes estudos, as vias de sinalização do NF-κB parecem ter um
papel importante na imunopatogénese da IBD, tanto humana como canina, uma vez que
tanto têm efeitos benéficos como deletérios.

O óxido nítrico (Nitric Oxide - NO) tem sido também alvo de variados estudos, investigando
o seu papel na patogénese e manutenção da IBD em humanos. O NO é um radical livre
derivado do aminoácido L-arginina, possuindo vários efeitos biológicos, e que é produzido
pela acção de duas isoformas constitutivas da óxido nítrico sintase (constitutive Nitric Oxide
Synthase - cNOS), a neuronal (neuronal Nitric Oxide Synthase - nNOS) e a endotelial
(endothelial Nitric Oxide Synthase - eNOS), e uma isoforma induzível (inducible Nitric Oxide
Synthase - iNOS) que é expressa em leucócitos e outras células após estimulação por
citoquinas, bactérias ou seus produtos (Krieglstein et al., 2007). O NO produzido pelas
cNOS possui várias funções homeostáticas na mucosa gastrointestinal, como a manutenção
de uma perfusão sanguínea adequada, controlo da permeabilidade da microvasculatura e
do epitélio intestinal e possui ainda efeitos anti-inflamatórios. Por outro lado, o aumento da
produção de óxido nítrico pela iNOS pode ter efeitos deletérios na mucosa intestinal, através
de citotoxicidade directa, activação de neutrófilos, formação de nitrosaminas, redução do
tónus muscular ou através da formação de outros radicais tóxicos (Kolios, Valatas & Ward,
2004). Estudos em modelos murinos de colite revelaram que a utilização de inibidores não
específicos da produção de óxido nítrico exacerbam os efeitos da inflamação intestinal,

19
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

enquanto que a utilização de inibidores específicos das iNOS, como a aminoguanidina ou a


mercaptoetilguanidina, reduziu a inflamação intestinal e lesão tecidular (Kreiglstein et al.,
2007). Gunawardana, Jergens, Ahrens & Niyo (1997) demonstraram aumento das
concentrações de óxido nítrico e IgG em lavados colónicos de cães com colite
linfoplasmocítica, encontrando valores praticamente ou mesmo indetectáveis destas
moléculas em cães normais. Por outro lado, Jergens et al. (1998b) demonstraram aumento
do mRNA da isoforma induzível da óxido nítrico sintase (iNOS) em amostras endoscópicas
de mucosa colónica de cães com IBD.

Apesar do interesse da quantificação de mRNA de citoquinas e de outras moléculas em


extractos homogéneos de mucosa na investigação da imunopatogénese da IBD, esta
quantificação apresenta várias limitações. Uma destas limitações é que não é possível
determinar qual a correlação da quantidade de mRNA de citoquinas com a produção
proteica das mesmas, uma vez que podem ocorrer regulações pós-transcripcionais que vão
influenciar a concentração de proteína final, ou seja, grandes quantidades de mRNA não
significam necessariamente elevada quantidade de citoquinas (Peters et al., 2005). Outras
limitações são o desconhecimento de variados factores, como a expressão de receptores
para as citoquinas nas células-alvo, o efeito total de citoquinas com efeitos opostos e o
efeito que uma distribuição heterogénea de citoquinas tem na mucosa. Uma das formas de
contornar parte destes efeitos seria avaliar directamente a quantidade de citoquinas
biologicamente activas através da utilização de anticorpos contra estas, mas são poucos os
anticorpos para citoquinas caninas disponíveis (Cave, 2003).

Como se pode observar pelos variados e, por vezes, contraditórios achados dos estudos da
imunopatogénese da IBD canina, esta é uma doença de grande complexidade, sendo que
ainda não é possível afirmar com certeza qual o mecanismo imunopatogénico que lhe dá
origem. É necessário também ter em atenção que a grande parte dos modelos
experimentais são realizados com o intuito de estudar a IBD humana, nomeadamente a
Doença de Crohn e a Colite Ulcerativa, doenças que afectam principalmente o cólon e íleo
humanos, ao contrário das IBD caninas, que afectam mais frequentemente a porção
proximal do intestino delgado. Adicionalmente, com base nos achados dos estudos de
caracterização das populações leucocitárias das infiltrações inflamatórias e dos perfis de
mRNA de citoquinas em pacientes caninos, não é possível classificar a IBD canina como
uma resposta Th1 ou TH2, uma vez que os resultados tanto no intestino delgado como no
cólon revelam características dos dois tipos de resposta. Pode ser que a IBD em cães
apresente diferenças imunopatogénicas com a IBD humana, em que cada tipo de resposta
está associado com uma forma diferentes da doença (Doença de Crohn – resposta Th1 e
Colite Ulcerativa – resposta Th2) (Friedman & Blumberg, 2005). Será então de esperar que

20
Enterite Linfoplasmocítica Canina

embora existam semelhanças, também existam diferenças entre a imunopatogénese da IBD


entre diferentes porções do intestino e entre espécies diferentes.

2.2 SEQUELAS

Para além das alterações que ocorrem na própria mucosa do intestino delgado, a ocorrência
de infiltrações inflamatórias leva a patologias secundárias, tanto no intestino delgado como
em outros sectores do TGI, que são responsáveis por um agravamento do quadro clínico do
animal afectado com IBD. A resolução destas complicações depende na maior parte das
vezes de um tratamento efectivo da causa primária, mas por vezes é necessário recorrer a
terapias específicas para estas complicações.

2.2.1 Má absorção
A mais frequentemente observada destas sequelas é a síndrome de má absorção. A
presença de uma infiltração inflamatória na lâmina própria da mucosa intestinal pode
provocar má absorção através da redução do número de células intestinais capazes de
absorver os nutrientes (redução da área absortiva intestinal), redução da actividade das
enzimas da bordadura em escova, perda dos mecanismos de transporte celulares bem
como alteração do transporte de nutrientes para a corrente sanguínea (alteração da lâmina
própria) (Hall & German, 2005). Esta diminuição da absorção de nutrientes, para além de
diminuir o aporte energético do animal, aumenta também a quantidade de solutos no lúmen
intestinal, induzindo a formação de uma diarreia osmótica e aumentando também a
disponibilidade de nutrientes para a flora intestinal, promovendo o desenvolvimento de
números de bactérias anormais (sobrecrescimento bacteriano), bem como alterações no
equilíbrio entre as espécies bacterianas existentes no lúmen intestinal, nomeadamente o
desenvolvimento de microrganismos patogénicos (Hall & German, 2005). A ocorrência de
sobrecrescimento bacteriano leva a disfunção das enzimas da bordadura em escova,
desconjugação de ácidos biliares e hidroxilação de ácidos gordos, que para além de
provocarem maiores danos aos enterócitos e agravarem a má absorção, estimulam ainda a
secreção colónica, o que contribui ainda mais para a diarreia (German, 2005; Hall &
German, 2005; Willard, 2003). Outra possível consequência do sobrecrescimento bacteriano
é a produção aumentada de gás intestinal devido a fermentação bacteriana dos nutrientes
disponíveis secundária a má absorção (Hall & German, 2005).

Embora esteja implícito que a ocorrência de má absorção origina deficiências nutricionais,


foram já reportadas diversas deficiências nutricionais específicas em cães com IBD. A
ocorrência de hipocalcémia e diminuição das concentrações séricas de vitamina D e seus
metabolitos secundária a enterite linfoplasmacítica foi já reportada por Fornel-Thibaud et al.

21
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

(2007), Kimmel, Waddell & Michel (2000) e Mellanby et al. (2005), provavelmente por
diminuição da absorção intestinal cálcio e/ou de vitamina D. Os mesmos autores reportam
ainda a ocorrência de hiperparatiroidismo secundário à deficiência em cálcio e vitamina D.
Uma das consequências possíveis do hiperparatiroidismo é a ocorrência do síndrome da
mandíbula de borracha, em que o cálcio ósseo é mobilizado para repor a calcémia (Fornel-
Thibaud et al., 2007). Outra das deficiências reportadas é hipomagnesiémia, secundária não
só a diminuição da absorção intestinal como também a perda de fluidos para o TGI em
casos de enteropatia com perda de proteínas (Kimmel et al., 2000; Mellanby et al., 2005).

2.2.2 Linfangiectasia
Por outro lado, a presença de infiltrações inflamatórias, especialmente em casos severos,
pode também dar origem à perda intestinal de fluidos e proteínas (linfangiectasia
secundária) (Cave, 2003; Peterson & Willard, 2003; Williams, 2005). De facto, muitas das
vezes a enteropatia com perda de proteínas é provocada secundariamente a enterite
linfoplasmocítica devido a obstrução linfática pelas infiltrações em seu redor, sendo esta
inclusivamente uma causa mais frequente de enteropatia com perda de proteínas que a
linfangiectasia intestinal primária (Tams, 1999). A ocorrência de linfangiectasia agrava
consideravelmente o quadro clínico, uma vez que os animais, geralmente já mal nutridos,
começam também a perder proteínas e lípidos para o lúmen intestinal, dando origem a
hipoproteinémia e hipocolesterolémia e agravando a diarreia já presente (German, 2005;
Peterson & Willard, 2003).

2.2.3 Gastrite Crónica Antral


É relativamente frequente o envolvimento do estômago em casos de enterite
linfoplasmocítica, uma vez que surge secundariamente à inflamação intestinal
incompetência pilórica, que por sua vez origina refluxo do conteúdo duodenal, contendo
bílis, suco pancreático e secreções duodenais, que ao entrar no antro pilórico provoca lesão
da camada mucosa que normalmente cobre a mucosa gástrica e a protege da acção do
ácido clorídrico gástrico, originando inflamação da mucosa (García-Sancho et al., 2005).
Esta inflamação, por sua vez, origina hipomotilidade pilórica e hipersecreção de gastrina, o
que leva a dificuldades no esvaziamento gástrico e ao aumento da produção e secreção de
ácido clorídrico, respectivamente, o que tem como consequência o vómito (García-Sancho
et al., 2005).

2.2.4 Colite
Embora possa ocorrer colite linfoplasmocítica como uma entidade única, primária, em casos
de enterite linfoplasmocítica a ocorrência de diarreia crónica de intestino delgado pode
resultar em inflamação colónica e no aparecimento de diarreia de intestino grosso (German,

22
Enterite Linfoplasmocítica Canina

2006). O principal mecanismo deve-se à hidroxilação de ácidos gordos e à desconjugação


de ácidos biliares que ocorre no intestino delgado secundária a má absorção, uma vez que
as bactérias intestinais passam a ter maior disponibilidade de nutrientes para a realização
destas reacções. Ambas estas substâncias, ao atingirem o cólon, provocam aumentos da
secreção colónica, ou seja, diarreia de intestino grosso (Hall & German, 2005).

2.2.5 Dilatação Gástrica/Volvo


É referida na literatura uma possível associação entre IBD e dilatação gástrica/volvo,
possivelmente secundária a uma alteração da motilidade gástrica induzida pela inflamação
intestinal, embora tal teoria ainda não tenha sido comprovada (Willard, 2003). Foi já
publicado um estudo por Braun, Lester, Kuzma & Hosie (1996), no qual foram estudados 23
casos de dilatação gástrica/volvo, em que cerca de 60% dos casos apresentavam indícios
de uma possível patologia inflamatória subjacente, o que suporta a possibilidade da
existência de tal associação.

2.2.6 Linfoma Gastrointestinal


Está comprovado em medicina humana que a ocorrência de IBD de longa duração
predispõe ao aparecimento de neoplasias gastrointestinais (Friedman & Blumberg, 2005).
Em medicina veterinária, é referida na literatura uma provável associação entre a enterite
linfoplasmocítica e o desenvolvimento de linfoma, reportando que a enterite linfoplasmocítica
pode representar uma fase inicial no desenvolvimento tumoral (Cave, 2003; German, 2005;
Kleinschmidt et al., 2006; Tams, 2003; Willard, 2003). Este facto ainda não foi comprovado,
e a ocorrência de diversas dificuldades no diagnóstico destas patologias pode levar a
diagnósticos erróneos. A maior destas dificuldades prende-se com o facto de que a maior
parte dos exemplares de mucosa intestinal são colhidos por endoscopia, pelo que apenas é
observada mucosa intestinal ao exame histopatológico, e na falta de um esquema de
graduação padronizado, pode ser difícil a diferenciação entre as duas patologias,
especialmente quando se considera que os linfomas gastrointestinais podem fazer-se
acompanhar de inflamação linfoplasmocítica (Cave, 2003; German, 2005; Kleinschmidt,
Meneses, Holte & Hewicker-Trautwein, 2006; Willard et al., 2002). Outra hipótese possível é
a ocorrência das duas afecções concomitantemente, diagnosticando-se inicialmente apenas
a enterite linfoplasmocítica e mais tarde, devido ao agravamento do quadro clínico,
diagnostica-se o linfoma (German, 2005). No entanto, por enquanto estas teorias são
apenas teorias, sendo necessários mais estudos para averiguar se realmente existe uma
predisposição ao desenvolvimento de linfoma em pacientes com enterite linfoplasmocítica.

23
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

2.3 APRESENTAÇÃO CLÍNICA E EXAME FÍSICO

Os cães com IBD apresentam-se geralmente à consulta devido a diarreia crónica (com pelo
menos 3 semanas de duração), cíclica ou intermitente, acompanhada ou não de vómito e
perda de peso (Allenspach et al., 2006c; Craven, Simpson, Ridyard & Chandler, 2004;
German, 2005; German, 2006; Hall & German, 2005; Jergens, Moore, Haynes & Miles,
1992; Tams, 2003). Um estudo de 24 cães com enterite linfoplasmocítica (idiopática em 18
cães) reportou a ocorrência de diarreia de intestino delgado em 100% dos cães, contudo,
outros autores referem que embora a diarreia seja o sinal clínico mais comum, não está
presente em todos os casos e existem ainda autores que apontam o vómito como o sinal
clínico mais frequente (Craven et al., 2004; García-Sancho et al., 2005; García-Sancho et
al., 2007; Jacobs, Collins-Kelly, Lappin & Tyler, 1990; Jergens et al., 1992). Não parece
existir predisposição em qualquer um dos géneros, e embora seja considerado que não
existe predisposição racial, existem algumas formas da doença, geralmente de gravidade
acentuada, que estão associadas a algumas raças, como a Enteropatia Imunoproliferativa
dos Basenjis, a Enteropatia e/ou Nefropatia com perda de proteínas dos Soft Coated
Wheaten Terriers, a Enteropatia Crónica dos Shar-Peis ou a Enteropatia dos Pastores
Alemães (Craven et al., 2004; German, 2006; Hall & German, 2005; Jergens et al., 1992).
Os cães são geralmente de meia-idade (idades médias entre 4,3 e 6,3 anos), embora a
doença possa ser observada em animais mais novos, especialmente no caso das raças
anteriormente referidas (Craven et al., 2004; German, 2006; Hall & German, 2005; Jergens
et al., 1992; Jergens et al., 2003; Tams 2003).

No paciente que se apresenta com diarreia crónica, uma das primeiras acções a realizar
será a distinção entre diarreia de intestino delgado e diarreia de intestino grosso, uma vez
que o tipo de diarreia irá remeter-nos para o local do TGI mais provavelmente afectado
(Anexo 1 – Diferenciação entre Diarreia de Intestino Delgado e Diarreia de Intestino Grosso).
Em caso de diarreia de intestino delgado, as fezes serão volumosas, moles a aquosas, por
vezes exibindo sinais de melena. Pode também estar presente esteatorreia. Já no caso de
diarreia de intestino grosso, serão comuns fezes com presença de muco, presença de
frequência aumentada e tenesmo, podendo também ocorrer hematoquézia (Hall & German,
2005). Embora esta distinção possa ser realizada, podem ocorrer casos que apresentem
sinais de diarreia de intestino delgado concomitantemente com diarreia de intestino grosso,
sugerindo envolvimento das duas porções do intestino (Chandler, 2002c; Jacobs et al.,
1990; Tams 2003). A presença de diarreia de intestino grosso pode significar presença de
inflamação colónica primária ou pode ser o resultado de diarreia de intestino delgado
prolongada (German, 2006; Hall & German, 2005). Vómito crónico, por vezes cíclico, é outro
dos sinais mais frequentemente associados a IBD, podendo mesmo ocorrer sem a presença

24
Enterite Linfoplasmocítica Canina

de outro sinal clínico aparente, embora esta seja uma apresentação muito pouco comum em
cães (Craven et al., 2004; Jacobs et al., 1990; Jergens et al., 1992; Tams, 2003). Contém
geralmente bílis, embora ocasionalmente também possam ser observados restos de
alimentos (Hall & German, 2005; Tams, 2003). Em pacientes com hipomotilidade gástrica
concorrente, idiopática ou secundária à IBD, por vezes podem ser observados vómitos
acompanhados de alimentos não digeridos várias horas após as refeições. Principalmente
quando o vómito é um dos principais sinais clínicos do paciente, será necessário distingui-lo
de regurgitação secundária a outra patologia (Anexo 2 – Diferenciação entre Vómito e
Regurgitação). A hematemese não é um achado frequente, embora possa ocorrer em caso
de erosão ou ulceração gástrica ou duodenal (Craven et al., 2004; Hall & German, 2005;
Jergens et al., 1992; Tams, 2003).

A perda de peso é também um achado frequente em casos de IBD, sendo geralmente


moderada, embora casos severos (por vezes associados a enteropatia com perda de
proteínas) possam apresentar perda de peso marcada, com perda de massa muscular
acentuada (Craven et al., 2004; Jacobs et al., 1990; Jergens et al., 1992; Lane, Miller &
Twedt, 1999; Tams, 2003). Outra das alterações frequentemente registadas com esta
patologia são as alterações do apetite, que se pode apresentar normal, aumentado ou
diminuído (mais frequentemente diminuído) (Craven et al., 2004; German, 2005; Hall &
German, 2005; Jacobs et al., 1990; Jergens et al., 1992; Tams, 2003). Polifagia está
geralmente associada a perda de peso, enquanto que a anorexia está associada a
inflamação gastrointestinal; inflamação ligeira geralmente não provoca alterações do apetite
(Hall & German, 2005). Estão também documentados a presença de borborigmos
excessivos, bem como de desconforto ou dor abdominais (German, 2005; Jergens et al.,
1992). Em caso de doença severa, por vezes ocorre enteropatia com perda de proteínas,
caracterizada clinicamente pela presença de ascite (podendo observar-se distensão
abdominal) e/ou edemas subcutâneos devido à consequente hipoproteinémia (Allenspach et
al., 2006b; German, 2005; Hall & German, 2005; Lane et al., 1999). Se a hipoproteinémia for
acentuada, podem também ocorrer derrames pleurais ou edema pulmonar, surgindo tosse,
taquipneia ou mesmo cianose. Este envolvimento respiratório é mais frequentemente
observado em Soft Coated Wheaten Terriers, devido à severa enteropatia e/ou nefropatia
com perda de proteínas, que os torna particularmente susceptíveis aos efeitos sistémicos da
hipoproteinémia (Littman et al., 2000). Embora o exame clínico não apresente geralmente
alterações dignas de registo para além da perda de peso, por vezes podem ser identificados
espessamento das ansas intestinais e linfadenopatia mesentérica à palpação abdominal
(German, 2005; Hall & German, 2005). É necessário ter em atenção que na presença de um
animal excepcionalmente magro, a ausência de gordura abdominal poderá fazer com que as
ansas intestinais pareçam espessadas, o que deverá ser distinguido de um verdadeiro

25
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

espessamento, onde as ansas surgem mais firmes (Sturgess, 2005). No entanto, é


necessário ter em conta que os sinais clínicos apresentados dependem em grande parte da
gravidade da doença. Assim, casos ligeiros estão geralmente associados a diarreia e vómito
crónicos, por vezes intermitentes, enquanto que doença severa está associada a diarreia
intratável, inapetência, perda de peso acentuada ou mesmo ascite e edemas subcutâneos
(Hall & German, 2005).

Porém, nem todos os animais com IBD exibem todos ou mesmo apenas alguns dos sinais
referidos anteriormente. Recentemente foram descritos dois casos de cães, mais tarde
diagnosticados com IBD, que se apresentaram à consulta devido a letargia, sendo
posteriormente observadas mucosas pálidas ao exame físico (Ristic & Stidworthy, 2002).
Nenhum dos dois cães apresentava diarreia ou vómito, os sinais mais frequentemente
observados em casos de IBD, bem como a presença de sangue visível nas fezes (Ristic &
Stidworthy, 2002). Embora estes casos sejam exemplos atípicos, pouco frequentes, servem
para relembrar que tal como para muitas outras patologias, existem também apresentações
clínicas pouco usuais com a IBD canina.

Um dos maiores problemas associados a esta doença é a natureza cíclica ou intermitente


dos sinais clínicos, que por vezes faz com que os proprietários não lhes atribuam
significado, apenas levando os seus animais ao veterinário quando estes aumentam de
frequência ou gravidade, sinal que a inflamação intestinal aumentou e a doença progrediu
para um estado mais severo.

2.4 DIAGNÓSTICO

Como a própria definição de IBD indica, a enterite linfoplasmocítica não possui causa
conhecida, pelo que o seu diagnóstico é realizado com base na exclusão de todas as outras
causas possíveis de infiltração inflamatória da lâmina mucosa intestinal. Com base nos
sinais clínicos pouco específicos geralmente apresentados pelos pacientes à consulta, mais
frequentemente diarreia e vómito crónicos, por vezes acompanhados de perda de peso,
torna-se claro que tal não é um processo fácil. É então necessário um protocolo diagnóstico
exaustivo, de maneira a comprovar que é um processo verdadeiramente idiopático e não
uma resposta inflamatória a uma causa não diagnosticada. Um dos mais importantes
passos de qualquer protocolo para o diagnóstico de doença gastrointestinal crónica é a
recolha de um historial completo do animal, incluindo quaisquer patologias gastrointestinais
anteriores, a dieta do animal (bem como anteriores dietas), outros tipos de alimentos
oferecidos ao animal (biscoitos, comida dos proprietários, etc), possível acesso a outras
fontes de alimento (caixote do lixo, rua, etc) ou a fontes de tóxicos, desaparecimento de um

26
Enterite Linfoplasmocítica Canina

objecto de casa (por exemplo, meias, bolas, etc, que podem ser ingeridos e funcionar como
corpos estranhos), se existe relação entre um qualquer factor e o aparecimento dos sinais
clínicos, etc. A importância da história nunca deve ser menosprezada, uma vez que a
omissão de um factor importante pode dirigir o diagnóstico para a pesquisa de causas que à
partida podiam ter sido eliminadas, levando à realização de testes diagnósticos
desnecessários. Outro dos passos importantes a realizar será a construção de uma lista de
diagnósticos diferenciais, geralmente baseada na presença de diarreia crónica de intestino
delgado (Tabela 1), sinal mais frequentemente observado em cães com enterite
linfoplasmocítica.

Tabela 1 – Diagnósticos Diferenciais de diarreia crónica de intestino delgado (adaptado de Hall & German, 2005,
p-1367; Tams, 2003, p.220; Willard, 2003, p. 355).
Dietéticas: • Ileus: hipocaliémia, hipoalbuminémia,
• Intolerância alimentar enterite, disautonomia
• Alergia alimentar • Linfangiectasia
• Enteropatia por sensibilidade ao Doença pancreática:
glúten • Pancreatite crónica
Doença de intestino delgado: • Insuficiência pancreática exócrina
• Enterite bacteriana: E. coli, • Obstrução do ducto pancreático
Campylobacter jejuni, Salmonella Doença hepática:
sp., Clostridium perfringens, • Insuficiência hepática
Clostridium difficile, Yersinia • Colestase intrahepática
enterocolitica • Obstrução do ducto biliar
• Sobrecrescimento Doença renal:
bacteriano/Diarreia que responde a • Urémia
antibióticos • Síndrome nefrótico
• Parasitas: variados helmintes Outras causas:
gastrointestinais, Giardia sp., • Toxinas: chumbo, organofosforados
Cryptosporidium sp. • Insuficiência cardíaca congestiva
• Fúngica: Histoplasma sp. • Imunodeficiências: deficiência em
• IBD: linfoplasmocítica, eosinofílica, IgA
granulomatosa • Hipoadrenocorticismo
• Doença infiltrativa: linfossarcoma, • Doença autoimune: lúpus
mastocitose eritematoso sistémico, etc
• Obstrução parcial: neoplasia,
estenose, corpo estranho,
invaginação

Será a partir deste momento que começará a realização de testes diagnósticos, não só para
avaliar o estado de saúde do paciente, mas também para eliminar algumas das causas
sistémicas possíveis dos sinais gastrointestinais. O protocolo inicial deverá incluir
hemograma, bioquímicas séricas, urianálise tipo II (caracteres físico-químicos e exame de
sedimento urinário), bem como a realização de análises fecais (citologias fecais e rectais,
testes de flutuação ou testes imunodiagnósticos). Outros exames possivelmente úteis na
investigação de patologia gastrointestinal são a radiografia (simples ou de contraste) e a
ultrasonografia abdominais. Após esta avaliação inicial, poderá avançar-se para testes mais
específicos, para pesquisa de doença pancreática, hepática ou mesmo sobrecrescimento

27
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

bacteriano. Apenas após a realização destes exames se procederá à realização de outros


testes diagnósticos, geralmente mais dispendiosos e por vezes invasivos, como endoscopia,
laparotomia exploratória, etc. É necessário ter em atenção que os testes diagnósticos
descritos nesta secção representam uma lista de testes possíveis de serem realizados,
embora seja do conhecimento do autor que a maioria das clínicas e hospitais veterinários
não possui ao seu dispor muitas destas técnicas, muitas vezes apenas encontradas em
centros especializados.

2.4.1 Hemograma
O hemograma encontra-se muitas das vezes normal, e quando existem alterações estas são
geralmente não específicas de doença gastrointestinal. Assim, por vezes observa-se anemia
não regenerativa ligeira, geralmente normocítica e normocrómica, embora microcitose possa
também ocorrer (Craven et al., 2004; Jergens et al., 1992; Ristic & Stidworthy, 2002; Tams,
2003). Ou seja, anemia associada a doença inflamatória crónica, má nutrição ou perda
gastrointestinal crónica, esta última geralmente associada a deficiência em ferro (Hall &
German, 2005; Jergens et al., 1992; Ristic & Stidworthy, 2002). Inversamente, pode também
ocorrer eritrocitose, provavelmente devido a desidratação secundária à diarreia, vómito ou
anorexia (Jergens et al., 1992).

A presença de leucocitose devido a neutrofilia sem desvio à esquerda é um achado comum,


sugerindo stress ou doença inflamatória crónica activa (German, 2005; Hall & German,
2005; Jergens et al., 1992). A ocorrência de neutrofilia com desvio à esquerda está
associada à ocorrência de infecção, podendo significar infecção intestinal (endotoxémia
crónica) (Jergens et al., 1992). Pode também ser observada linfopénia, que pode estar
associada a linfangiectasia intestinal (Craven et al., 2004; German, 2005; Hall & German,
2005; Tams, 2003). A ocorrência de eosinofilia é um achado ocasional e está geralmente
associada a gastroenterocolite eosinofílica, embora possa também ocorrer em outros tipos
de IBD (Craven et al., 2004; Hall & German, 2005; Jergens et al., 1992; Tams, 2003). Pode
também surgir monocitose, provavelmente devido à presença de inflamação crónica (Jacobs
et al., 1990).

Foi também recentemente sugerida uma associação entre trombocitopénia e IBD em cães,
possivelmente imunomediada, embora o mecanismo causal da trombocitopénia não seja
conhecido (Ridgway, Jergens & Nyio, 2001). Esta trombocitopénia não parece estar
associada a hemorragia clínica mas, no entanto, deverá ser monitorizada. Está também
descrita a ocorrência de trombocitose e megatrombocitose (aumento do números de
plaquetas maiores que o normal) em pacientes caninos com IBD, possivelmente devido à
estimulação pelas citoquinas inflamatórias de megacariócitos e da produção hepática de

28
Enterite Linfoplasmocítica Canina

trombopoetina (Craven et al., 2004; Lubas, Corazza, Guidi & Cardini, 2007). Em humanos a
presença de trombocitose é um achado comum em pacientes com IBD e está associada à
ocorrência de eventos tromboembólicos e alterações na microcirculação local (Lubas et al.,
2007).

2.4.2 Bioquímicas Séricas


Embora as alterações de variados parâmetros bioquímicos séricos não sejam
patognomónicas, permitem uma avaliação do estado de diversos sistemas orgânicos do
paciente. Um dos achados mais frequentes consiste em hipoproteinémia ou
hipoalbuminémia, possivelmente devido a diminuição do aporte dietético, má absorção ou
perda gastrointestinal de proteínas (Craven et al., 2004; German, 2005; Hall & German,
2005; Jergens et al., 1992; Tams, 2003). Se ocorrem hipoalbuminémia e hipoglobulinémia
concomitantemente, podem normalmente ser excluídas causas hepáticas ou renais de
perda de proteína, normalmente associadas apenas a hipoalbuminémia, sugerindo então
enteropatia com perda de proteínas (Craven et al., 2004; Jacobs et al., 1990; Lane et al.,
1999; Matz & Guilford, 2003). Porém, hipoalbuminémia com globulinémia normal a
aumentada pode também ocorrer em casos de enterite linfoplasmocítica (sendo que neste
caso alterações hepáticas e renais não podem ser excluídas), achado frequente em
Basengis com enteropatia imunoproliferativa (German, 2005; Hall & German, 2005; Tams,
2003; Willard, 2003).

A presença de concentrações séricas aumentadas de enzimas hepáticas, nomeadamente


alanina transaminase (ALT) e fosfatase alcalina (FA) poderá significar a existência de
doença hepática, mas pode também ser devida a uma enteropatia grave ou crónica
(hepatopatia reactiva), possivelmente devido à absorção de bactérias, endotoxinas ou
antigénios para a circulação portal (Craven et al., 2004; Jacobs et al., 1990; Jergens et al.,
1992; German, 2005; Hall & German, 2005; Tams, 2003; Willard, 2003). A presença de
concentrações séricas aumentadas das enzimas hepáticas acima referidas indica a
necessidade de avaliar a função e morfologia hepáticas, através de ultrasonografia e um
teste de estimulação de ácidos biliares. Outro dos parâmetros séricos por vezes
aumentados são as enzimas amilase e lipase, provavelmente como consequência de
inflamação intestinal, embora possa também representar um sinal de envolvimento
pancreático (Craven et al., 2004; Jergens et al., 1992; Steiner, Rutz & Williams, 2006;
Steiner et al., 2007). Hipocolesterolémia pode ocorrer como consequência de má absorção
ou de perda gastrointestinal (Hall & German, 2005; Jergens et al., 1992). A ocorrência de
panhipoproteinémia, linfopénia e hipocolesterolémia são altamente sugestivas de
enteropatia com perda de proteínas.

29
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

Os valores da creatininémia e urémia são também um indicador útil de doença renal.


Embora estejam normalmente dentro de valores normais em caso de doença
gastrointestinal, aumento dos seus valores pode ocorrer em caso de desidratação
secundária a vómito, diarreia ou anorexia ou devido a insuficiência renal primária (Craven et
al., 2004; German, 2005; Jacobs et al., 1990; Jergens, 2005).

São também vulgares as alterações electrolíticas em caso de doença gastrointestinal.


Hipocaliémia, hiponatrémia e hipoclorémia podem ocorrer conjunta ou isoladamente como
consequência de perdas por vómito e diarreia ou devido a deficiente aporte nutricional
secundário a anorexia (Jacobs et al., 1990; Jergens, 2005; Jergens et al., 1992). A presença
de hipercaliémia e hiponatrémia concorrentes são sugestivas de hipoadrenocorticismo (Matz
& Guilford, 2003). A hipocalcémia é também um achado ocasional, normalmente secundária
a hipoalbuminémia, embora possa também dever-se a deficiente aporte dietético, má
absorção de cálcio ou de vitamina D (Craven et al., 2004; Fornel-Thibaud et al., 2007;
Jacobs et al., 1990; Jergens et al., 1992; Mellanby et al., 2005). É no entanto pouco comum
que deficiências nestes electrólitos se devam a deficiência dietética, já que a grande maioria
dos animais é alimentada com dietas comerciais de boa qualidade. Hipomagnesiémia tem
sido outra das alterações electrolíticas registadas, podendo ser provocada por variados
factores, como perda renal, perda gastrointestinal, terapia com fluidos pobres em magnésio
ou mesmo deficiente aporte dietético na alimentação ou devido a anorexia (Bush, Kimmel,
Wosar & Jackson, 2001; Cave, 2003; Kimmel et al., 2000; Mellanby et al., 2005).

2.4.3 Urianálise
A urianálise é outra das ferramentas úteis na exclusão de várias patologias. A presença ou
ausência de proteínas na urina permite inferir sobre a presença ou ausência de nefropatia
com perda de proteínas. Uma forma rápida e pouco dispendiosa de avaliar a ocorrência de
proteinúria é através das tiras para análise dos parâmetros bioquímicos da urina, que
detectam quantidades de proteína entre 30-1000mg/dL (Grauer, 2003). Uma outra forma
rápida e económica de avaliar a ocorrência de proteinúria é a realização do teste do ácido
sulfosalicílico. Este teste baseia-se na mistura, em partes iguais, de ácido sulfosalicílico a
5% e de urina centrifugada, que em caso de proteinúria gera um precipitado, permitindo
detectar quantidades de proteína entre 5-5000mg/dL (Grauer, 2003). A análise da densidade
urinária, aliada aos dados da creatinina e ureia séricas permite avaliar a função renal e
excluir uma possível doença renal.

30
Enterite Linfoplasmocítica Canina

2.4.4 Exames Fecais


A análise de fezes é um dos pontos mais importantes do diagnóstico de qualquer afecção
gastrointestinal, uma vez que permite avaliar a presença de parasitas (nos seus vários
estados evolutivos), células inflamatórias, sangue, proteínas, entre outros.

2.4.4.1 Citologia Fecal e Citologia Rectal


A citologia fecal é um teste de realização rápida e económica, consistindo na observação
microscópica de uma amostra de fezes, a partir da qual se faz um esfregaço com o auxílio
de um pouco de soro fisiológico. Este teste permite identificar ovos, larvas, oocistos e
trofozoítos da maioria dos parasitas gastrointestinais. Um dos grandes problemas deste
método é que a pequena quantidade de fezes utilizada torna provável a não observação de
parasitas, a não ser que se trate de uma infestação maciça, pelo que a obtenção de um
resultado negativo não exclui a possibilidade de infestação parasitária (Urquhart, Armour,
Duncan, Dunn & Jennings, 1998).

A citologia rectal pode ser um meio de diagnóstico útil de doenças colónicas ou rectais. É
realizado inserindo um dedo com luva no recto e friccionando gentilmente a parede rectal,
colocando seguidamente a amostra numa lâmina. Ambos os métodos, quando utilizados
conjuntamente com uma técnica de coloração (por exemplo, azul de metileno, Diff-Quick ou
Wright’s), permitem a observação microscópica de células de descamação epitelial e de
células inflamatórias e evidenciar agentes etiológicos, podendo auxiliar no diagnóstico de
patologias infecciosas, inflamatórias ou neoplásicas do intestino (Matz & Guilford, 2003;
Tams, 2003). A presença de números elevados de neutrófilos em ambas as técnicas é
sugestiva de inflamação intestinal ou de enterite bacteriana.

A coloração de esfregaços fecais com uma solução de Lugol pode ser útil na identificação
de cistos de Giardia sp., enquanto que a coloração de um esfregaço com a técnica de Ziehl-
Nielsen (protocolo álcool-ácido resistente) permite identificar oocistos de Crystosporidium
sp., que coram de vermelho vivo (Payne et al., 2002; Urquhart et al., 1998). É porém
importante ter em atenção que a citologia fecal raramente tem utilidade no diagnóstico de
afecções fúngicas, sendo geralmente necessárias citologias rectais ou observação de
biopsias para evidenciar microrganismos como Histoplasma sp. (em macrófagos) ou
Candida sp. (Matz & Guilford, 2003; Willard, 2003).

2.4.4.2 Métodos de Flutuação


Os métodos de flutuação são dos métodos mais fiáveis de avaliação parasitológica de fezes.
Consistem na colocação de uma amostra de fezes num recipiente, juntamente com uma
solução concentrada de elevada densidade, normalmente de cloreto de sódio ou açúcar,

31
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

durante vários minutos. Os ovos e oocistos de maioria dos parasitas possuem densidade
menor que estes líquidos, pelo que sobem e flutuam no topo do recipiente (Urquhard et al.,
1998). É necessário ter em atenção que se as soluções empregues não forem
suficientemente concentradas, os ovos mais pesados podem não flutuar.

Para o diagnóstico de Giardia sp. está recomendada a utilização de uma solução


concentrada de sulfato de zinco (Urquhard et al., 1998). Como este parasita liberta oocistos
para o exterior intermitentemente, é aconselhada a recolha de 3 amostras em períodos
diferentes, de modo a aumentar a probabilidade de encontrar o parasita (Matz & Guilford,
2003; Steiner, 2005b; Tams, 2003). A utilização de um protocolo de flutuação aliado com
técnicas de centrifugação aumenta a probabilidade de obtenção de resultados positivos
(Zajac, Johnson & King, 2002).

2.4.4.3 Culturas Fecais


As culturas fecais são outra das técnicas classicamente disponíveis para identificar bactérias
potencialmente responsáveis pelos sinais clínicos apresentados. Existem alguns
microrganismos classicamente implicados em infecções bacterianas intestinais em cães, tal
como E. coli, C. jejuni, Salmonella sp., C. perfringens, C. difficile ou Y. enterocolitica
(Chandler, 2002b; Chandler, 2002c). Uma das maiores dificuldades com a interpretação de
resultados destes testes é que estes microrganismos são agentes que se podem encontrar
presentes na flora intestinal de cães sem doença clínica, o que torna discutível até que
ponto estes testes serão úteis para o diagnóstico de enterite bacteriana (Hall & German,
2005). O diagnóstico destas infecções depende muito da correlação do resultado destes
testes com a história e apresentação clínica dos animais e testes diagnósticos de detecção
de enterotoxinas, bem como de demonstração histológica de invasão intestinal por estes
microrganismos (Cave, Marks, Kass, Melli & Brophy, 2002; Matz & Guilford, 2003; Willard
2005). Por vezes também se consegue cultivar Candida sp. a partir de amostras de fezes,
mas como este é um microrganismo oportunista, não se sabe até que ponto a obtenção de
resultados positivos para este microrganismo tem interesse diagnóstico (Allenspach et al.,
2007b; Willard, 2003).

2.4.4.4 Testes imunodiagnósticos


Actualmente existem já disponíveis no mercado testes ELISA para detecção de trofozoítos
de Giardia sp. e Cryptosporidium sp. em amostras fecais. O teste ELISA para Giardia sp.
parece ser altamente específico, embora apresente uma sensibilidade reduzida quando
comparado com as técnicas de flutuação com sulfato de zinco (Payne et al., 2002).
Actualmente, é considerado que o gold standard para o diagnóstico de giardíase consiste na
utilização combinada de testes de flutuação com sulfato de zinco e de testes ELISA (Steiner

32
Enterite Linfoplasmocítica Canina

2005b, Tams 2003). Já o teste ELISA para detecção de Crystosporidium sp. tem-se
revelado pouco útil para o diagnóstico deste protozoário (Payne & Carter, 2005), embora
existam autores que o consideram um método mais útil que as examinações microscópicas
fecais (Willard, 2003). Existem também outras técnicas disponíveis para detecção destes
parasitas, tal como testes de imunofluorescência para detecção de cistos e oocistos ou
mesmo técnicas de PCR.

A utilização de técnicas de imunodiagnóstico pode também ser útil para a identificação de


infecção por Clostridium sp., através da identificação da citotoxina de C. difficile ou da
enterotoxina α de C. perfringens. Os métodos baseiam-se na identificação em amostras de
fezes de enterotoxinas destas bactérias, embora sejam comuns testes negativos em animais
com enterotoxémia e testes positivos em animais sem doença clínica (Cave et al., 2002;
Steiner, 2005b; Willard, 2003).

O maior problema destas técnicas é o facto de serem bastante dispendiosas, limitando a


sua utilidade. A crescente disponibilidade comercial de testes de detecção rápida poderá vir
a representar um meio útil no diagnóstico de algumas destas patologias.

2.4.4.5 Sangue Oculto nas Fezes


Existem diversas doenças gastrointestinais que estão associadas com a perda intestinal de
sangue, surgindo clinicamente como melena ou hematoquézia, facilmente identificáveis.
Porém, por vezes, em pacientes com IBD pode mesmo ocorrer perda de sangue não
identificável clinicamente, como sangue oculto nas fezes. Para o diagnóstico de sangue
oculto nas fezes, existem kits disponíveis para o clínico, que se baseiam no reconhecimento
de hemoglobina nas fezes e na mudança de cor de um dos reagentes do teste. Existem
testes baseados na toluidina ou no guaiaco, ambos mudando de cor para azul quando
oxidados pela hemoglobina (Steiner, 2005b). Podem ocorrer resultados falso-positivos com
este teste quando os animais avaliados são alimentados com dietas contendo carnes
vermelhas ou ricos em peroxidases. Nestes casos, é recomendável parar a administração
destas dietas durante 2 ou 3 dias para realizar o teste, evitando também especialmente os
alimentos semi-húmidos enlatados (Steiner, 2005b).

2.4.5 Radiologia
Os exames radiográficos permitem avaliar as cavidades torácica e abdominal, auxiliando na
pesquisa e exclusão de várias patologias, incluindo cardiopatias, megaesófago, massas,
corpos estranhos radiopacos, invaginações, etc. Por vezes são encontradas ansas
intestinais distendidas com gás (Figura 1A) ou fluído (Kealy & McAllister, 2005; Jacobs et al.,
1990; Jergens et al., 1992; Lane et al., 1999). A realização de estudos de contraste pode,

33
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

em alguns casos, fornecer informação adicional, permitindo avaliar defeitos na integridade


da mucosa gastrointestinal, observando-se por vezes irregularidades/indentações (Figura
1B) ou espessamento da mucosa, indicativas de doença infiltrativa, não permitindo, no
entanto, distinguir entre infiltrações inflamatórias ou neoplásicas (Kealy & McAllister, 2005;
Jacobs et al., 1990; Jergens et al., 1992; Riedesel 2002). Porém, os exames radiográficos
(simples ou de contraste) são na maior parte das vezes normais nos pacientes com IBD,
pelo que a realização deste exame serve principalmente para excluir outros diagnósticos
possíveis (German, 2005; Hall & German, 2005; Jacobs et al., 1990; Jergens et al., 1992;
Riedesel, 2002; Sturgess, 2005; Chandler, 2002c; Tams, 2003). Embora os exames
radiográficos pareçam não ter muita utilidade diagnóstica, são uma mais valia,
especialmente nos centros veterinários que não possuem ultrasonografia ao seu dispor.

Figura 11 - A. “Quantidade excessiva de gás no intestino delgado sem dilatação sugere enterite” (tradução
livre) (imagem e texto de Kealy & McAllister, 2005); B. “Numerosas indentações murais radiolucentes,
resultando em defeitos de preenchimento são observadas no duodeno e com menor expressão no jejuno (...)
de um cão com enterite linfoplasmocítica” (tradução livre) (adaptado de Riedesel, 2002).

A B

2.4.6 Ultrasonografia
A ultrasonografia é um meio de diagnóstico imagiológico recente, que auxilia bastante a
avaliação do tracto gastrointestinal. Esta técnica permite avaliar a ecogenicidade dos vários
tecidos do organismo, permitindo assim avaliar a estrutura dos vários órgãos abdominais,
detectar alterações no parênquima de vários órgãos, incluindo a existência de massas,
abcessos e quistos. No caso dos pacientes suspeitos de IBD, a ultrasonografia é
considerada superior à radiografia, permitindo avaliar as camadas da parede
gastrointestinal, espessura da parede gastrointestinal (e consequentemente a existência de
edema ou infiltrações), a motilidade gastrointestinal e o envolvimento de linfonodos
mesentéricos (Gaschen, 2005).

34
Enterite Linfoplasmocítica Canina

A avaliação dos linfonodos mesentéricos é um parâmetro frequente de avaliação nos


diversos estudos ultrasonográficos de cães com enteropatias crónicas, podendo ocorrer
aumento reactivo dos linfonodos regionais (Kealy & McAllister, 2005; Penninck, 2002).
Porém, num estudo recente realizado por Gaschen et al. (2008), aumentos dos linfonodos
mesentéricos não se revelaram relacionados com o tipo ou gravidade da inflamação
intestinal.

A espessura da parede intestinal é um dos parâmetros mais utilizados na identificação


ultrasonográfica de pacientes com IBD, estando classicamente reportada como aumentada
em caso de infiltrações inflamatórias (Kealy & McAllister, 2005; Penninck, 2002). Porém,
outras patologias podem provocar espessamento da parede intestinal, como neoplasia, e a
ultrasonografia não permite distinguir qual o tipo de infiltração presente, bem como a
severidade do processo (Gaschen, 2005; Rudorf et al., 2005). Para auxiliar no diagnóstico
ultrasonográfico de enteropatias em cães, Delaney, O’Brien & Waller (2003) realizaram um
estudo com o objectivo de criar valores de referência da espessura da parede intestinal em
cães dependendo do seu peso. Assim, para o duodeno, são normais espessuras ≤ 5,1mm
para cães até 20kg de peso vivo, ≤ 5,3mm para cães entre 20 e 29,9kg de peso vivo e
espessuras ≤ 6,0mm para cães com 30kg ou mais de peso vivo. Já para o caso do jejuno,
são normais espessuras ≤ 4,1mm para cães até 20kg de peso vivo, ≤ 4,4mm para cães
entre 20 e 39,9kg de peso vivo e espessuras ≤ 4,7mm para cães com 40kg ou mais de peso
vivo.

Um estudo retrospectivo tentou diferenciar ultrasonograficamente enterite de neoplasia


intestinal, concluindo que a espessura da parede se encontra aumentada nos dois tipos de
patologia, mas que a neoplasia intestinal é geralmente responsável por maiores
espessamentos da parede (Penninck, Smyers, Webster, Rand & Moore, 2003). Já
Sutherland-Smith, Penninck, Keating & Webster (2007) reportaram também que todos os
cães com doença inflamatória primária do seu estudo apresentavam aumento da espessura
da parede intestinal (utilizando a escala proposta por Delaney et al., 2003). No entanto,
existem outros estudos que reportam que o espessamento da parede intestinal não é um
achado consistente em pacientes com IBD, e que pacientes afectados podem ter
espessuras intestinais normais e cães ultrasonograficamente normais podem ter doença
infiltrativa intestinal (Gaschen & Kircher, 2007; Gaschen et al., 2008; Rudorf et al., 2005).
Rudorf et al. (2005) reportaram espessuras intestinais normais em cães com IBD (utilizando
a escala proposta por Delaney et al., 2003), explicando que tal achado pode dever-se ao
facto de a inflamação não ser grave o suficiente para provocar espessamento intestinal ou
de a atrofia das vilosidades provocar diminuição da espessura da parede intestinal.
Explicam ainda que a presença ou ausência de gordura na face serosa intestinal e as

35
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

diferentes pressões exercidas sobre o abdómen quando se efectuam os exames


ultrasonográficos podem também ser em parte responsáveis pelos resultados obtidos.
Recentemente, num estudo realizado por Gaschen et al. (2008), foi reportado que a
espessura da parede intestinal não se mostrou um marcador sensível ou específico de
enteropatias crónicas. No mesmo estudo é ainda referido que a presença de manchas
hiperecogénicas na parede intestinal é um parâmetro sensível de doença inflamatória
intestinal, embora não seja útil para diferenciar entre diferentes causas de inflamação
intestinal. Já a presença de estriações hiperecogénicas na mucosa intestinal tem-se
revelado um bom indicador de enteropatia com perda de proteínas, nomeadamente
linfangiectasia intestinal (Gaschen et al., 2008; Sutherland-Smith et al., 2007).

Outro dos parâmetros de valor diagnóstico em casos de IBD é a organização estrutural das
várias camadas da parede intestinal. São geralmente identificadas cinco camadas de
ecogenicidade diferente no intestino normal, e Penninck et al. (2003) referem que este
parâmetro é especialmente útil na distinção entre doença inflamatória e neoplasia, uma vez
que as lesões inflamatórias estão associadas a uma integridade das diferentes camadas
normal a reduzida, enquanto que as lesões neoplásicas estão frequentemente relacionadas
com perda total da estrutura normal das várias camadas da parede intestinal, o que está
relacionado com o facto de a infiltração neoplásica no intestino não se conter apenas à
mucosa e por vezes submucosa intestinais, podendo infiltrar a parede intestinal em toda a
sua espessura. Estes achados estão em concordância com os resultados obtidos por
Gaschen et al. (2008), que refere que a estrutura normal das diferentes camadas da parede
intestinal é normalmente preservada em caso de enteropatias crónicas, apenas se alterando
nos poucos casos em que se regista espessamento da parede intestinal. A ultrasonografia
permite também observar alterações da motilidade intestinal em consequência da infiltração
inflamatória, especialmente hipomotilidade, em que o intestino se revela rígido, com poucos
ou mesmo sem os movimentos normais.

Recentemente, foram realizados dois estudos sobre a circulação sanguínea gastrointestinal


em cães com enteropatias crónicas utilizando ultrasonografia com Doppler, reportando que
cães afectados com IBD não possuem respostas hemodinâmicas adequadas durante a
digestão dos alimentos (Gaschen et al., 2005; Gaschen et al., 2007). Estas alterações são
provavelmente devidas aos efeitos que a infiltração inflamatória tem sobre a rede capilar
intestinal, que juntamente com a disrupção e infiltração das vilosidades e linfangiectasia
origina uma resposta hemodinâmica insuficiente durante a digestão e resulta em má
absorção de alimentos. Gaschen et al. (2005) afirmam ainda que a velocidade do fluxo
sanguíneo diastólico médio está correlacionada com a presença e gravidade da doença,
pelo que constitui um meio complementar ao diagnóstico de pacientes com IBD.

36
Enterite Linfoplasmocítica Canina

2.4.7 Teste de Estimulação dos Ácidos Biliares


Os ácidos biliares são produzidos exclusivamente pelo fígado, sendo libertados para o
lúmen intestinal aquando de uma refeição e posteriormente absorvidos pela mucosa ileal
para a corrente sanguínea portal, de onde são removidos pelo fígado. Apenas uma pequena
quantidade de ácidos biliares atinge a circulação sistémica, e a medição da sua
concentração sérica total pode ser utilizada como um marcador da função hepática (Steiner,
2005b). Os animais são colocados em jejum por cerca de 12 horas, sendo que ao fim deste
período são recolhidas amostras para a quantificação das concentrações séricas totais de
ácidos biliares. Seguidamente é oferecida uma refeição ao animal, e cerca de 2 horas após
a ingestão da refeição, novas amostras são recolhidas (Bunch, 2003; Steiner, 2005b;
Suchodolski & Steiner, 2003). Com base nos valores obtidos pelo teste, pode então ser
analisada a capacidade do fígado de recolher os ácidos biliares da circulação portal, dando
uma medida de disfunção hepática se estes estiverem aumentados (Bunch, 2003; Steiner,
2005b; Suchodolski & Steiner, 2003).

2.4.8 Testes Endócrinos


Os testes endócrinos podem ser úteis para excluir algumas patologias endócrinas,
nomeadamente hipoadrenocorticismo atípico, em que ocorre deficiência em cortisol com
electrólitos normais. Esta patologia apresenta um quadro clínico semelhante ao da IBD,
inclusive infiltração linfoplasmocítica intestinal, pelo que se não for excluída com base em
testes endócrinos, um animal pode ser erroneamente diagnosticado como possuindo IBD
(Steiner, 2005a; Sturgess, 2005). Outro dos factores que poderá levar a um falso
diagnóstico é que quando os animais erradamente diagnosticados como tendo IBD são
medicados com corticosteróides para provocar diminuição da infiltração inflamatória
intestinal, os sinais clínicos resolvem-se pois este tratamento é também o tratamento para o
hipoadrenocorticismo (ausência de cortisol). É então essencial excluir este diagnóstico
diferencial mediante um teste de estimulação com hormona adrenocorticotrófica
(Adrenocorticotropic Hormone – ACTH) antes de avançar para outras técnicas diagnósticas,
uma vez que após iniciar o tratamento com corticóides poderá ser praticamente impossível
diferenciar as duas patologias.

O teste de estimulação com ACTH é um teste de realização simples, podendo ser efectuado
em grande parte dos centros veterinários. O teste consiste na recolha inicial de uma amostra
de sangue para quantificação das concentrações séricas basais de cortisol, seguido de uma
injecção endovenosa de ACTH sintética. Cerca de 30 a 60 minutos após a injecção de
ACTH (alguns autores preferem esperar 60 a 90 minutos), uma nova amostra de sangue é
recolhida, sendo novamente quantificadas as concentrações séricas de cortisol. Em
Portugal, apenas se encontra disponível no mercado uma suspensão injectável de uma

37
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

forma sintética da ACTH (acetato de tetracosactido, Synacthen®, Laboratórios Novartis), de


aplicação intramuscular, embora o protocolo se mantenha. Em cães normais, as
concentrações séricas de cortisol antes da injecção de ACTH encontram-se entre 20 e 250
nmol/L, enquanto que após a injecção de ACTH aumentam para valores entre 200 e 450
nmol/L (Herrtage, 1998a). Em caso de hipoadrenocorticismo, as concentrações séricas de
cortisol antes da injecção de ACTH serão baixas, com uma resposta mínima ou ausente à
estimulação com ACTH (Herrtage, 1998b). Este teste permite assim diagnosticar
hipoadrenocorticismo, embora não permita a diferenciação entre hipoadrenocorticismo
primário e secundário.

2.4.9 Folato e Cobalamina Séricos


O folato e a cobalamina (vitamina B12) são micronutrientes absorvidos no intestino delgado,
e as concentrações séricas destas vitaminas dependem não só do aporte dietético, como da
absorção e produção bacterianas e das perdas fecais, pelo que variações nas suas
concentrações séricas podem ser potencialmente indicadoras de patologia gastrointestinal.
O folato é uma vitamina hidrossolúvel que se encontra na alimentação sob a forma de
poliglutamato, uma forma muito pouco absorvível. Apenas no jejuno é que esta vitamina é
desconjugada pela folato desconjugase, uma enzima da bordadura em escova, sendo
posteriormente absorvida por meio de transportadores específicos (Matz & Guilford, 2003;
Sucholdolski & Steiner, 2003). A absorção de folato é muito aumentada pela diminuição do
pH luminal (Suchodolski & Steiner, 2003). Já a cobalamina, outra vitamina hidrossolúvel,
tem um mecanismo de absorção complexo, que culmina com a absorção de complexos
cobalamina/factor intrínseco na porção distal no intestino delgado (íleo) por transportadores
específicos (Matz & Guilford, 2003; Suchodolski & Steiner, 2003). Este factor intrínseco, no
caso do cão, é secretado no estômago e pâncreas.

A suplementação das dietas comerciais com estas vitaminas torna improvável a sua
diminuição sérica por deficiente aporte nutricional. Por outro lado, podem ocorrer aumentos
nas concentrações séricas de folato devido a aumento do aporte nutricional, por meio da
dieta ou suplementos vitamínicos, ou por meio de coprofagia (Batt, 2002; Chandler, 2002c).
Devido ao facto de existirem locais específicos para a absorção destas vitaminas, a
ocorrência de doença no jejuno e íleo pode levar ao aparecimento de deficiências em folato
e cobalamina, respectivamente (Matz & Guilford, 2003; Suchodolski & Steiner, 2003). É de
referir que em caso de doença duodenal, as concentrações destas vitaminas podem
apresentar-se normais, uma vez que a capacidade da sua absorção não está afectada.
Também a não secreção do factor intrínseco pelo pâncreas, em casos de IPE, pode levar a
diminuições nas concentrações séricas de cobalamina devido a diminuição da sua absorção
ileal (Suchodolski & Steiner, 2003). Por outro lado, a diminuição da secreção de bicarbonato

38
Enterite Linfoplasmocítica Canina

pelo pâncreas pode levar a diminuição do pH luminal e consequentemente, ao aumento do


folato sérico (Matz & Guilford, 2003). Existem também alguns medicamentos que provocam
aumento das concentrações séricas de folato, nomeadamente sulfasalazina ou
fenobarbitona (Chandler, 2002c). Já em caso de sobrecrescimento bacteriano no intestino
delgado (Small Intestinal Bacterial Overgrowth – SIBO), o aumento do número de
microrganismos no intestino delgado pode levar a uma maior competição pela cobalamina,
bem como na ocupação dos seus receptores, pelo que as suas concentrações séricas
podem encontrar-se diminuídas nesta patologia. Pelo contrário, o folato sérico pode
encontrar-se aumentado, uma vez que as bactérias colónicas produzem grandes
quantidades de folato, e se migrarem proximalmente, podem produzir folato numa região
onde a sua absorção é possível (Suchodolski & Steiner, 2003; Matz & Guilford, 2003). Outro
factor que pode influenciar as concentrações séricas de folato é a ocorrência de hemólise na
amostra de sangue recolhida, uma vez que os eritrócitos contêm elevados teores de folato,
e na presença de hemólise este é libertado para o plasma, falseando os resultados
(Suchodolski & Steiner, 2003).

É também importante referir que existe um pool destas vitaminas no organismo, pelo que
apenas em caso de doença prolongada é que as concentrações séricas destas vitaminas
surgirão alteradas (Suchodolski & Steiner, 2003).

2.4.10 Testes para Insuficiência Pancreática Exócrina


A insuficiência pancreática exócrina (IPE) é uma doença que em cães está relacionada com
a ocorrência de pancreatite linfocítica atrófica imunomediada, podendo assemelhar-se
clinicamente à IBD, provocando mesmo uma reacção inflamatória intestinal (Jacobs et al.,
1990). A IPE tem sido classicamente diagnosticada através de vários métodos,
nomeadamente a observação microscópica de gordura, amido e fibras musculares nas
fezes de animais, testes de digestão de gelatina, em que se testa a existência de tripsina
nas fezes, ou com base em testes de N-benzoil-tirosil-paraminobenzoato (BT-PABA), em
que se testa a actividade da quimiotripsina (Willard, 2003). Estes testes são relativamente
poucos dispendiosos, embora sejam morosos e pouco fiáveis, ocorrendo vários resultados
falso-positivos e falso-negativos (Willard, 2003). Um exemplo de um factor que pode dar
origem a falsos diagnósticos é a ocorrência de enteropatia com perda de proteínas, que
origina perda intestinal de inibidor das α1-proteases, molécula que pode inibir a actividade
das proteases pancreáticas e assim dar origem a resultados falso-negativos (Ruaux, Steiner
& Williams, 2004).

39
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

2.4.10.1 Trypsin-Like Immunoreactivity


O trypsin-like immunoreactivity canino (cTLI) é um teste diagnóstico recente que veio
substituir os morosos e pouco fiáveis testes de digestão e absorção, e é actualmente
considerado o gold standard para o diagnóstico de IPE (Suchodolski & Steiner, 2003). Este
teste doseia o tripsinogénio e tripsina (principalmente tripsinogénio) encontrados na
circulação sanguínea, produtos exclusivamente secretados pelo pâncreas exócrino e
encontrados em quantidades residuais no sangue (Matz & Guilford, 2003). Este teste doseia
o tripsinogénio existente na circulação sanguínea por radioimunoensaio (RIA), e enquanto
que em cães sem doença pancreática os valores de referência situam-se entre 5,0 e 35
µg/L, no caso de IPE os valores são inferiores a 2,5 µg/L (Steiner, 2005b; Williams & Batt,
1988). Os mesmos autores constatam ainda que a presença de doença intestinal não afecta
significativamente os resultados obtidos com este teste, sendo assim considerado de
elevada sensibilidade e especificidade. A observação de concentrações < 5,0 µg/L em
animais clinicamente sãos deve ser tomada em consideração, uma vez que podem ser
indicativas de IPE subclínica, situação que se pode prolongar por meses a anos, uma vez
que o pâncreas, embora esteja a perder células exócrinas funcionais, consegue ainda
produzir enzimas suficientes para controlar o aparecimento dos sinais clínicos de IPE
(Wiberg, Nurmi & Westermarck, 1999; Wiberg & Westermarck, 2002). Devido ao facto que
apenas alguns centros de referência possuem os meios para a realização deste
radioimunoensaio, foi recentemente criado um teste ELISA para a detecção de tripsinogénio
e tripsina séricos, revelando boa correlação com os valores obtidos por radioimunoensaio
(Waritani et al., 2002).

2.4.10.2 Pancreatic Lipase Immunoreactivity


Recentemente foi também desenvolvido um radioimunoensaio específico para a isoforma
pancreática da lipase, mensurando apenas a imunorreactividade da lipase pancreática
canina (canine Pancreatic Lipase Immunoreactivity - cPLI), o que o torna altamente
específico para diagnosticar afecções pancreáticas exócrinas (Steiner & Williams, 2003). Em
caso de IPE, será esperada uma diminuição da produção desta enzima, pelo que menor
quantidade será observada no sangue dos animais afectados. Os valores de referência
situam-se entre 4,4 e 276,1 µg/L (Steiner & Williams, 2003). Porém, os resultados dos testes
efectuados por este método revelaram que existe alguma sobreposição entre os valores
mínimos registados em cães sãos e os valores máximos registados em cães com IPE, o que
o torna menos fiável que o cTLI (Steiner et al., 2006).

2.4.10.3 Elastase Pancreática Fecal


Outro teste possível de ser utilizado é um ELISA desenvolvido para detectar a elastase
pancreática canina (canine pancreatic elastase - cE1) presente nas fezes, sendo que

40
Enterite Linfoplasmocítica Canina

valores <20 µg/g são indicativos de IPE clínica (Spillman et al., 2000). Spillman et al. (2000)
e Battersby, Peters, Day, German & Hall (2005) referem que este teste apresenta boa
correlação com os resultados do TLI, mesmo em pacientes com enteropatias crónicas. No
entanto, um estudo recente por Steiner & Pantchev (2006) reporta até cerca de 23% de
resultados falso-positivos utilizando este teste, quando comparado com os resultados do
cTLI, pelo que a utilidade deste marcador para o diagnóstico de IPE continua por verificar.

2.4.11 Testes para Sobrecrescimento Bacteriano


O diagnóstico de SIBO é um dos pontos mais problemáticos da gastroenterologia, uma vez
que a demonstração de número aumentado de bactérias no intestino delgado é
relativamente complicada. Numerosos testes têm sido sugeridos para o diagnóstico desta
patologia, tais como medição das concentrações séricas de folato e cobalamina, testes ao
hidrogénio no ar expirado, medição de ácidos biliares não conjugados séricos, etc, mas
permanece em dúvida a verdadeira utilidade destas técnicas (Matz & Guilford 2003,
Suchodolski & Steiner 2003). Por muitas vezes não ser possível a demonstração de número
aumentado de microrganismos no intestino delgado, muitos autores denominam agora esta
afecção de diarreia sensível a antibióticos (Antibiotic Responsive Diarrhea - ARD). A ARD é
uma patologia que pode surgir associada a várias outras patologias gastrointestinais,
nomeadamente IPE e IBD, não se sabendo se surge como doença primária ou
consequência, o que torna ainda mais difícil a análise dos resultados de vários testes
laboratoriais (German et al., 2003b; Rutgers, Batt, Elwood & Lamport, 1995).

2.4.11.1 Folato e Cobalamina Séricos


Um dos testes mais utilizados para auxiliar ao diagnóstico de ARD é a medição do folato e
cobalamina séricos. Após exclusão de IPE, são indicativas de sobrecrescimento diminuições
na cobalamina sérica ou aumentos no folato sérico ou uma combinação destas duas
alterações (Batt, 2002). Porém, nem todos os animais com sobrecrescimento bacteriano
apresentam alterações nas concentrações séricas de folato e cobalamina, e a existência de
outras doenças pode alterar as concentrações séricas destas vitaminas mesmo na presença
de ARD (German et al., 2003b; Marks, 2003b). Por esta razão, está actualmente posta em
causa a utilidade das concentrações séricas destas vitaminas como marcadores fiáveis para
o diagnóstico de ARD.

2.4.11.2 Hidrogénio do Ar Expirado


O teste do hidrogénio do ar expirado é outro dos testes actualmente disponíveis e que pode
auxiliar ao diagnóstico de sobrecrescimento bacteriano, servindo também para diagnosticar
má-assimilação de carbohidratos e aumento da velocidade do trânsito gastrointestinal (Batt,
2002; Steiner, 2005b; Washabau, Strombeck, Buffington & Harrold, 1986a; Washabau,

41
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

Strombeck, Buffington & Harrold, 1986b). Este teste baseia-se no facto de que as células
dos mamíferos não são capazes de metabolizar carbohidratos (por exemplo, glucose,
lactulose ou xilose) a hidrogénio, ao contrário do que sucede com as bactérias intestinais
(Hall & German, 2005; Matz & Guilford, 2003). Assim, num animal normal, os carbohidratos
são digeridos e absorvidos maioritariamente no intestino delgado, formando-se hidrogénio
em quantidades residuais, o qual é absorvido para a corrente sanguínea e expelido através
do ar expirado, podendo então ser mensurado. A mensuração realiza-se através da
colocação de uma máscara ligada a um saco colector por meio de uma válvula
unidireccional, e realiza-se ao longo de várias horas de modo a criar uma curva de
libertação de hidrogénio (Matz & Guilford, 2003). Em caso de má assimilação, os
carbohidratos atingem o cólon, onde as bactérias aí residentes rapidamente os fermentam,
libertando hidrogénio, do qual parte vai ser absorvida pelo tracto intestinal, criando um pico
de expiração de hidrogénio cerca de 4 a 6 horas após a ingestão do alimento (Chandler,
2002c; Matz & Guilford, 2003; Steiner, 2005b). Em caso de sobrecrescimento bacteriano, a
fermentação ocorre no intestino delgado, sendo que o hidrogénio absorvido origina um pico
cerca de 1 a 2 horas após a refeição (Chandler, 2002c; Matz & Guilford, 2003; Steiner,
2005b). Os equipamentos necessários para a quantificação do hidrogénio estão disponíveis
apenas em alguns laboratórios veterinários de referência, o que dificulta a utilização deste
teste. Existem disponíveis no mercado monitores portáteis para utilização em
gastroenterologia pediátrica humana, mas os resultados obtidos não foram satisfatórias para
a sua utilização em medicina veterinária (German, Martin, Papasouliotis & Hall, 1998). Deve-
se ter em atenção que a ocorrência de desidratação poderá levar a aumento do hidrogénio
respiratório, falseando os resultados (Bisset, Guilford, Haslett & Sunvold, 1998a). Os testes
podem ser padronizados através da utilização consistente de uma mesma ração rica em
carbohidratos, sem que haja necessidade de um período de habituação (Bisset, Spohr,
Guilford & Haslett, 1998b). Este teste apresenta uma elevada sensibilidade para
sobrecrescimento bacteriano, chegando mesmo a detectar animais positivos mesmo quando
o teste considerado gold standard para o diagnóstico de ARD não foi capaz de os
diagnosticar (Batt, 2002). Porém, resultados negativos não são indicativos de ausência de
ARD (Batt, 2002).

2.4.11.3 Ácidos Biliares Não Conjugados Séricos


Os ácidos biliares não conjugados séricos (Serum Unconjugated Bile Acids - SUBA) são
outro dos marcadores actualmente utilizados para o diagnóstico de sobrecrescimento
bacteriano. Este teste baseia-se no facto de os ácidos biliares conjugados que atingem o
lúmen intestinal poderem ser desconjugados por algumas das espécies de bactérias da flora
intestinal, reacção que o organismo dos mamíferos não consegue efectuar, sendo
posteriormente absorvidos pela mucosa intestinal para a corrente sanguínea portal (Cave,

42
Enterite Linfoplasmocítica Canina

2003; Matz & Guilford, 2003; Steiner, 2005b). Como o fígado possui uma baixa capacidade
de remover os SUBA da circulação sanguínea, estes ligam-se fortemente à albumina
circulante, entrando na circulação sistémica. Deste modo, os seus níveis séricos podem ser
então quantificados. Em caso de ARD, o aumento do número de bactérias promove uma
maior desconjugação de ácidos biliares, o que leva a um aumento das concentrações
séricas de SUBA (Cave, 2003; Matz & Guilford, 2003; Steiner, 2005b). Como as células de
mamíferos não são capazes de desconjugar ácidos biliares, este facto torna este teste um
excelente marcador de sobrecrescimento bacteriano (Melgarejo, Williams, O’Connell &
Setchell, 2000). Este teste requer um jejum de cerca de 12 horas, uma vez que os SUBA
podem aumentar após uma refeição. Porém, foi recentemente posta em causa a utilidade
deste teste para o diagnóstico de ARD, uma vez que num estudo realizado por German et
al. (2003b) apenas alguns de vários cães diagnosticados com ARD possuíam concentrações
aumentadas de SUBA, enquanto que alguns dos cães sãos do grupo controlo também
possuíam concentrações aumentadas de SUBA.

2.4.11.4 Culturas Duodenais Quantitativas


O gold standard para o diagnóstico de sobrecrescimento bacteriano é a realização de
culturas (para microrganismos aeróbios e anaeróbios) de líquido duodenal, recolhido
durante endoscopia ou por punção durante laparotomia (Steiner, 2005b). Os animais são
considerados como tendo ARD quando são observadas contagens totais superiores a 105
UFC/ml de líquido duodenal e contagens de anaeróbios superiores a 104 UFC/ml (Matz &
Guilford, 2003). Porém, nem todos os animais com sobrecrescimento bacteriano são
diagnosticados por esta técnica, uma vez que a amostra colhida pode não ser representativa
da área intestinal com ARD, e por vezes o doseamento do hidrogénio do ar expirado
consegue identificar pacientes com ARD cujas culturas deram resultados negativos (Batt,
2002). Outro dos problemas desta técnica é que outras patologias intestinais podem
apresentar ARD como uma complicação, e a obtenção de culturas com valores superiores a
105 UFC/ml de líquido duodenal não permite inferir sobre qual a doença primária intestinal
(German et al., 2003b). O facto de esta técnica ser um processo dispendioso e moroso,
sendo necessárias várias precauções especiais com a recolha e manuseamento das
amostras a enviar para o laboratório, bem como o facto de serem difíceis de interpretar os
resultados obtidos por esta técnica, tornam este método pouco utilizável na clínica
veterinária, optando-se muitas vezes pela utilização dos restantes métodos descritos acima
para a realização de um diagnóstico de ARD.

2.4.11.5 Diagnóstico Terapêutico


Outra das opções seguidas por muitos veterinários é a instituição de uma terapêutica
diagnóstica com antibióticos, mas a não obtenção de melhoria clínica pode não ser

43
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

indicativa de ausência de ARD, uma vez que em alguns pacientes é necessário terapia
antibiótica prolongada para se obterem resultados (Batt, 2002). Classicamente, os
antibióticos mais utilizados são o metronidazol, tilosina, tetraciclinas ou ampicilina
(Westermarck et al., 2005).

2.4.12 Testes de permeabilidade, absorção e perda intestinal de proteínas


Os testes descritos nesta secção são testes desenvolvidos para avaliar a função da mucosa
intestinal enquanto barreira entre o meio interno e o meio externo (lúmen intestinal),
fornecendo dados sobre a integridade física e funcional da mucosa intestinal, podendo
também servir como marcadores de recuperação da mucosa gastrointestinal. Um dos
problemas atribuídos a estes métodos é que apenas podem ser realizados em centros de
referência devido aos materiais necessários para a sua realização, pelo que a sua utilização
na prática clínica é limitada.

2.4.12.1 Permeabilidade aos Açúcares


O teste de permeabilidade aos açúcares fornece uma medida da permeabilidade intestinal,
sendo útil na avaliação do dano sofrido pela mucosa intestinal. São usualmente empregues
dois açúcares, a lactulose e ramnose, os quais são absorvidos por diferentes vias na
mucosa intestinal, e variações no rácio das suas concentrações séricas ou urinárias, rácio
lactulose/ramnose (rácio L:R), medidas por cromatografia líquida de alta pressão (high
pressure liquid chromatography – HPLC), fornece informação acerca do estado da mucosa
(Sørenson, Proud, Adam, Rutgers & Batt, 1993; Sørenson et al., 1997). A ramnose, um
monossacarídeo, é absorvida no intestino através de numerosos pequenos poros
transcelulares localizados na superfície luminal dos enterócitos, enquanto que a lactulose,
um dissacarídeo, é absorvida por poros paracelulares maiores situados nas junções firmes
entre os enterócitos. Devido à localização e quantidade de cada um dos tipos de poros
(trans- e paracelulares), num animal saudável são geralmente absorvidas maiores
quantidades de ramnose, originando, consequentemente, um baixo rácio L:R (Matz &
Guilford, 2003; Suchodolski & Steiner, 2003). Em caso de doença intestinal, ocorre muitas
das vezes lesão dos enterócitos com perda de superfície de absorção, com perda de poros
transcelulares e maior acesso aos poros paracelulares, o que origina maior absorção de
lactulose e, consequentemente, um rácio L:R mais elevado (Matz & Guilford, 2003;
Suchodolski & Steiner, 2003). A apresentação dos resultados sob a forma de um rácio entre
dois açúcares permite assim eliminar outros factores que não a mucosa intestinal, uma vez
que é esperado que qualquer outro factor afecte igualmente os dois açúcares (Allenspach et
al, 2006a). Os valores de referência séricos encontram-se entre 0,05 e 0,17 (Sørenson et al.
1997). É importante salientar que foi recentemente demonstrada uma correlação entre
tamanho, idade e permeabilidade intestinal, sendo que cães de raças grandes e cachorros

44
Enterite Linfoplasmocítica Canina

saudáveis apresentam maiores rácios L:R, pelo que a interpretação de resultados deve ser
realizada com precaução (Weber, Martin, Dumon, Biourge & Nguyen, 2002).

Um estudo realizado por Rutgers et al. (1996), demonstrou aumentos da permeabilidade


intestinal em cães com ARD e ausência de evidência histológica de doença intestinal, pelo
que este teste pode ser um marcador útil de resposta ao tratamento nesta patologia. Já
Kobayashi et al. (2007b) reportaram uma correlação entre a permeabilidade intestinal
avaliada por este método e a gravidade histológica de cães com enterite linfoplasmocítica.

2.4.12.2 Absorção de Açúcares


Este teste baseia-se na medição de açúcares no plasma ou urina de um animal após a
ingestão de uma solução contendo açúcares, geralmente D-xilose e 3-O-metil-D-glucose.
Estes açúcares são absorvidos pela mucosa intestinal através de transportadores
(transportadores de fructose para a D-xilose e transportadores de glucose para a 3-O-metil-
D-glucose, fornecendo assim uma medida da função absortiva intestinal (Matz & Guilford,
2003; Suchodolski & Steiner, 2003). A medição destes açúcares pode ser realizada na urina
ou plasma, por HPLC, sendo seguidamente transformada num rácio D-xilose/3-O-metil-D-
glucose (rácio X:M), cujos valores de referência séricos encontram-se entre 0,45 e 0,65
(Sørenson et al., 1993; Sørenson et al., 1997).

2.4.12.3 Teste dos 5 Açúcares


Este teste junta os princípios dos testes anteriormente descritos nesta secção. O teste dos
cinco açúcares baseia-se na administração simultânea de uma solução contendo D-xilose,
3-O-metil-D-glucose, ramnose e lactulose, contando ainda com a adição de sucrose, um
marcador da integridade da barreira mucosa gástrica (Steiner, Williams & Moeller, 2000;
Steiner, Williams & Moeller, 2002). A sucrose é um dissacarídeo que, em condições
normais, não é absorvido pela mucosa gástrica intacta, atingindo o intestino, onde é
rapidamente metabolizado a monossacarídeos, que são absorvidos. Em caso de aumento
da permeabilidade gástrica, esta molécula consegue passar intacta para a corrente
sanguínea, podendo ser quantificada no sangue ou urina (Suchodolski & Steiner, 2003).
Com a administração simultânea destas várias moléculas, é possível a realização dos rácios
L:R, X:M e sucrose/3-O-metil-D-glucose (rácio S:M). O grande problema deste tipo de testes
consiste na necessidade de colher amostras de urina durante longos períodos de tempo (de
6 a 24 horas), mas foi recentemente demonstrado que a colheita de 10ml de urina após 6
horas da administração da solução de açúcares permite a obtenção de resultados
satisfatórios (Allenspach et al., 2006a). Este teste permite assim avaliar simultaneamente a
permeabilidade gástrica e intestinal e a capacidade de absorção da mucosa intestinal.

45
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

No entanto, foi recentemente demonstrada a inexistência de correlação entre os resultados


dos testes de permeabilidade e absorção gastrointestinais e a gravidade clínica e
histopatológica em cães com enteropatias crónicas, pelo que estes testes poderão não ter
grande valor na avaliação da progressão e prognóstico de doença intestinal crónica
(Allenspach et al., 2005; Allenspach et al., 2006a). A discrepância entre estes resultados e
os resultados do estudo por Kobayashi et al (2007b) podem relacionar-se com a gravidade
dos casos seleccionados, uma vez que no estudo de Allenpach et al. (2006a) apenas um
dos cães apresentava enteropatia com perda de proteínas, enquanto que no estudo de
Kobayashi et al. (2007b) a maioria dos cães apresentava hipoalbuminémia. Como a
enteropatia com perda de proteínas é um achado comum em cães com casos severos de
enterite linfoplasmocítica, este achado poderá explicar as diferenças encontradas.

2.4.12.4 Inibidor das α1-Proteases Fecais


A medição do inibidor das α1-proteases (α1-Protease Inhibitor - α1-PI) é um método recente
de avaliação da perda entérica de proteínas, validado para cães (Melgarejo, Williams &
Asem, 1998). Esta molécula, que existe no sangue, linfa e tecidos do organismo, tem um
peso molecular semelhante ao da albumina, pelo que é perdida para o lúmen intestinal ao
mesmo tempo que a albumina. Devido ao facto de ser minimamente degradada aquando da
sua passagem pelo TGI devido à sua acção inibidora de proteases (inclusive as proteases
digestivas e bacterianas), recolhendo-se intacta nas fezes, a α1-PI torna-se um excelente
marcador da perda intestinal de proteína. Por outro lado, a presença de um inibidor de
proteases nas fezes pode diminuir a actividade proteolítica das mesmas, podendo falsear os
resultados de testes de digestão para diagnóstico de IPE (Ruaux et al., 2004). É também
necessário ter em atenção que como este inibidor das proteases se encontra em vários
tecidos do organismo, em caso de úlcera gastrointestinal ou trauma (por exemplo, trauma à
mucosa colónica durante palpação rectal), as suas concentrações fecais podem aumentar
sem que exista verdadeira perda intestinal de proteínas (Koenig, Slater, Ruaux, Steiner &
Williams, 2002). O teste consiste num ELISA a três amostras de fezes frescas (colhidas no
mesmo dia ou em dias seguidos), de modo a evitar variações entre colheitas. O grande
problema desta técnica é que actualmente apenas está disponível no laboratório da
Universidade do Texas, pelo que se torna inviável a sua utilização por veterinários do resto
do mundo. Existem ainda alguns relatos que a medição fecal da α1-PI é um bom método de
diagnóstico de enteropatias com perda de proteínas ainda antes da observação de
hipoalbuminémia. Devido às propriedades desta molécula, ela começa a ser perdida para o
lúmen intestinal juntamente com a albumina, pelo que a sua medição consegue identificar
pacientes a perder albumina para o TGI antes de esta perda ser severa o suficiente para o
animal entrar em hipoalbuminémia (Murphy et al., 2003).

46
Enterite Linfoplasmocítica Canina

Outro dos testes para avaliação da perda intestinal de proteínas, considerado o gold
standard, é a medição de albumina radiomarcada (51Cr-albumina) (Hall & German, 2005;
Suchodolski & Steiner, 2003). O grande problema desta técnica é a utilização de
marcadores radioactivos, uma vez que torna imperativa a utilização de instalações
adequadas, ficando assim restrito a alguns centros de referência, para além dos perigos
normalmente associados à utilização de tais produtos (Suchodolski & Steiner, 2003).

2.4.13 Outros Marcadores Diagnósticos


Devido à dificuldade técnica do diagnóstico da IBD, especialmente em veterinária, estão
constantemente a serem investigados novos marcadores que possam ser utilizados para o
diagnóstico desta afecção em cães, muitas das vezes a partir de métodos diagnósticos
validados para a sua utilização em medicina humana.

2.4.13.1 Gastrina Sérica


Como referido anteriormente, o vómito é um dos sinais clínicos mais frequentes em
pacientes com IBD, provavelmente como consequência de uma gastrite antral crónica
secundária a inflamação do intestino delgado. Esta inflamação do antro gástrico tem como
consequência uma maior produção de gastrina por células secretoras do epitélio gástrico,
pelo que esta molécula será encontrada em maiores concentrações no sangue de indivíduos
com lesões gástricas. (García-Sancho et al., 2005). García-Sancho et al. (2005)
demonstraram recentemente a ocorrência de níveis séricos de gastrina aumentados em
cães com enterite linfoplasmocítica quando comparados com animais saudáveis, pelo que
esta molécula possui provavelmente um papel na patogénese das lesões gástricas
frequentemente encontradas nos pacientes com IBD.

2.4.13.2 Anticorpos Citoplasmáticos Perinucleares Antineutrofílicos


Os anticorpos citoplasmáticos perinucleares antineutrofílicos (perinuclear Antineuthophilic
Cytoplasmic Antibodies - pANCAs) são autoanticorpos utilizados frequentemente como
complemento ao diagnóstico de IBD em humanos (Friedman & Blumberg, 2005). Um estudo
recente demonstrou a ocorrência de associação entre a presença de pANCAs e IBD canina,
mas reportou que o teste utilizado (imunofluorescência indirecta), embora apresente uma
elevada especificidade, apresenta uma baixa sensibilidade (Allenspach et al., 2004). Outro
estudo reporta que os níveis de pANCAs são mais elevados em cães com DRD do que em
cães com IBD, pelo que este teste poderá ser útil para distinguir entre estas duas afecções
(Luckschander et al, 2006b). No entanto, são necessários mais testes antes que se possa
utilizar este marcador no diagnóstico de afecções crónicas gastrointestinais.

47
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

2.4.14 Biopsia Gastrointestinal


A biopsia gastrointestinal é uma técnica que possui actualmente um papel importante no
diagnóstico de variadas afecções gastrointestinais. Após a realização de muitos dos testes
diagnósticos descritos anteriormente, cabe muitas das vezes à análise de amostras de
parede gastrointestinal o diagnóstico de variadas afecções gastrointestinais. Existindo dois
métodos diferentes comummente utilizados, endoscopia ou laparotomia, cada um com as
suas vantagens e desvantagens, estas técnicas de diagnóstico permitem a obtenção de
amostras da parede do TGI, permitindo assim a observação macro e microscópica de
lesões, bem como a sua caracterização. O exame histopatológico é assim um exame
indispensável e que surge intimamente ligado a estas técnicas.

2.4.14.1 Laparotomia
A laparotomia exploratória é um procedimento comum para o diagnóstico de afecções
gastrointestinais, e uma das suas maiores vantagens consiste no facto de que praticamente
todos os centros veterinários estão equipados para a sua realização. Esta técnica permite a
avaliação de toda a cavidade abdominal, tornando possível a observação de lesões em
qualquer órgão e não apenas no estômago, intestino e cólon (Mansell & Willard, 2003). Com
esta técnica torna-se também possível avaliar áreas do TGI às quais não é possível aceder
por meio de endoscopia, como grande parte do jejuno e íleo. É possível então recolher
amostras não só do estômago e intestinos, mas também de fígado, pâncreas, etc, se a
situação o indicar (Hall & German, 2005; Mansell & Willard, 2003). Por outro lado, o acesso
à cavidade abdominal pode ter vantagens terapêuticas, nomeadamente no que diz respeito
à ocorrência de invaginações intestinais, perfurações gastrointestinais ou mesmo tumores
(Hall & German, 2005; Mansell & Willard, 2003). Outra das vantagens desta técnica sobre a
endoscopia gastrointestinal, e talvez a mais importante, é que permite a obtenção de
amostras a toda a espessura da parede gastrointestinal, e não só da mucosa e submucosa,
o que pode ser um factor de elevada importância no diagnóstico de certas patologias (por
exemplo, linfangiectasia intestinal, neoplasias) (Hall & German, 2005; Kleinschmidt et al.,
2006; Mansell & Willard, 2003).

A recolha de amostras de parede intestinal pode realizar-se utilizando técnicas


convencionais de cirurgia ou utilizando um punch de biopsia de pele (utilizado em
dermatologia), permitindo ambas a obtenção de amostras de óptima qualidade (Keats,
Weeren, Greenlee, Evans & Minihan, 2004).

No entanto, esta técnica possui várias desvantagens, as quais devem ser tomadas em
consideração. Uma das suas desvantagens consiste no facto de não permitir a avaliação da
superfície mucosa do TGI, tornando-se por vezes difícil localizar certas lesões apenas por

48
Enterite Linfoplasmocítica Canina

observação e palpação dos órgãos (Mansell & Willard, 2003). Por esta razão, mesmo que
durante a realização de laparotomia exploratória não sejam identificadas quaisquer lesões,
será sempre recomendado que se obtenham várias amostras de biopsia para posterior
análise histopatológica. Outra das desvantagens relaciona-se com a existência de risco
anestésico, uma vez que o procedimento é realizado sob anestesia geral (Hall & German,
2005). Torna-se então imprescindível avaliar todos os possíveis factores que podem
contribuir para o risco anestésico, nomeadamente a idade dos pacientes, uma vez que
muitos dos casos ocorrem em pacientes que estão prestes a entrar ou já se encontram na
geriatria. Outro dos factores, e um dos mais discutidos, consiste na possibilidade de
deiscência de suturas, secundárias a hipoalbuminémia (Hall & German, 2005; Mansell &
Willard, 2003). De facto, a hipoalbuminémia/hipoproteinémia é um achado comum em
pacientes com doença gastrointestinal, especialmente nos casos mais severos. É possível
minimizar este factor através da administração de soluções coloidais anteriormente à
cirurgia, bem como pela utilização de suturas não absorvíveis e de aposição de omento
sobre a superfície serosa das linhas de sutura. Está também contra-indicada a realização de
biopsias cirúrgicas ao cólon, uma vez que esta secção do intestino tem uma reduzida
capacidade de regeneração, aumentando o risco de deiscência das suturas (Mansell &
Willard, 2003). Existe também risco de ocorrência de estenose intestinal após a realização
de biopsias cirúrgicas se mais de 20% do diâmetro do intestino for removido (Mansell &
Willard, 2003). Devido ao método em si mesmo, são também de esperar maiores
morbilidades após a resolução do procedimento, o que se torna uma enorme desvantagem,
especialmente em pacientes já por si em mau estado geral (Hall & German, 2005; Mansell &
Willard, 2003). Outro dos factores a ter em conta com a realização deste procedimento
prende-se com a suspeita clínica, uma vez que se suspeitar de uma patologia que requeira
a administração de corticóides para o seu tratamento, este apenas poderá ser instituído
após a completa cicatrização da linha de sutura, uma vez que estes fármacos atrasam a
cicatrização de feridas (Hall & German, 2005). Por último, e talvez a mais importante
desvantagem deste procedimento, consiste no elevado custo inerente à realização de uma
cirurgia e aos cuidados pré- e pós-operatórios. Este factor tem uma importância decisiva,
uma vez que muitos dos proprietários, após a realização de uma miríade de testes
diagnósticos que muitas das vezes não forneceram resultados de utilidade diagnóstica,
encontram-se relutantes a permitir a realização de um procedimento tão dispendioso e ao
qual se encontram associados vários riscos para a saúde do seu animal.

2.4.14.2 Endoscopia
A endoscopia é um procedimento relativamente recente que tomou um lugar de destaque no
diagnóstico das doenças gastrointestinais. Esta técnica é minimamente invasiva e permite a
observação da mucosa gastrointestinal e, com o auxílio de variados instrumentos que

49
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

podem ser colocados em canais próprios do endoscópio, permite também a remoção de


corpos estranhos, a realização de citologias e a obtenção de amostras de conteúdo
gastrointestinal e de biopsias da mucosa. Podem ser distinguidos dois procedimentos
diferentes, a esofagogastroduodenoscopia, que permite a visualização do TGI proximal, e a
colonoscopia, que permite a visualização do TGI distal. Nesta secção são discutidas as
vantagens e desvantagens da endoscopia, bem como os princípios gerais da sua utilização
e as principais lesões geralmente encontradas em casos de IBD.

Inicialmente apenas se encontravam disponíveis os endoscópios rígidos, que embora


permitam a colheita de amostras de elevada qualidade (mucosa a toda a sua profundidade),
devido à sua reduzida flexibilidade, não são indicados para a avaliação do tracto intestinal
proximal, sendo actualmente apenas utilizados para esofagoscopia e colonoscopia
(Simpson, 2005b). Actualmente, já se encontram disponíveis endoscópios flexíveis, os quais
devido à sua elevada flexibilidade, permitem uma maior margem de manobra, tornando
possível a observação do intestino delgado proximal, íleo e cólon (Roth, Leib, Davenport &
Monroe, 1990). Juntamente com os endoscópios, estão também disponíveis equipamentos
que permitem a realização de fotografias e vídeos do procedimento, o que torna possível a
posterior análise da endoscopia. No entanto, todos estes equipamentos são relativamente
dispendiosos, pelo que a maior parte dos centros veterinários não os dispõe. É também
necessário um operador experiente, uma vez que o manuseamento do endoscópio e a
colheita de amostras de boa qualidade são procedimentos com alguma dificuldade técnica.

Outro dos factores que se deve ter em especial atenção antes da realização de uma
endoscopia é a preparação do paciente. Para obter uma máxima visualização da mucosa
gastrointestinal, o TGI deverá estar limpo de alimentos e fezes. Para isto, é geralmente
aconselhado que os animais realizem um jejum de 12 a 24 horas (a água pode ser retirada
apenas 3 a 4 horas antes do procedimento) para gastroduodenoscopia ou um jejum de 24 a
48 horas (alguns autores preferem mesmo 72 horas) para colonoscopia (Moore, 2003;
Simpson, 2005b; Willard, 2001; Zoran, 2001). No caso de colonoscopia, devem ainda ser
administradas soluções de lavagem por via oral na noite anterior ao procedimento e devem
ser realizados enemas com água morna na manhã do procedimento para remover eventuais
restos de fezes. Deve-se ter em atenção que a água dos enemas não deverá conter
quaisquer outras substâncias, uma vez que estas podem irritar o cólon e falsear os
resultados (Moore, 2003; Simpson, 2005b; Willard, 2001).

Devido à natureza dos pacientes em medicina veterinária e à natureza delicada e


dispendiosa do equipamento, a gastroduodenoscopia e a colonoscopia pressupõem a
utilização de anestesia geral, pelo que deverão ser tomados em atenção quaisquer factores

50
Enterite Linfoplasmocítica Canina

que possam contribuir para o risco anestésico. Deve-se também ter em atenção quais os
medicamentos administrados durante a indução anestésica, uma vez que podem interferir
com a motilidade gastrointestinal (devem ser evitados a atropina e os opiáceos). Devem
também ser descontinuados a metoclopramida e os protectores da mucosa, uma vez que
alteram a motilidade e dificultam a visualização da mucosa, respectivamente (Willard, 2001;
Zoran, 2001).

Existem endoscópios de variadas dimensões, e em medicina veterinária, devido às menores


dimensões dos pacientes, são geralmente utilizados endoscópios de pediatria humana ou
endoscópios próprios para medicina veterinária, mais finos mas também mais curtos que os
endoscópios para adultos (Mansell & Willard, 2003; Tams, 1999). Isto reflecte-se geralmente
numa das maiores limitações da endoscopia, o alcance do endoscópio, sendo que
normalmente apenas são visualizáveis esófago, estômago, duodeno e cólon (Mansell &
Willard, 2003; Moore, 2003; Tams, 1999; Willard, 2001; Zoran, 2001). No caso de a
endoscopia ser realizada num animal de pequenas dimensões, poderá ser possível a
visualização da porção proximal do jejuno e da porção terminal do íleo (esta última através
de colonoscopia) (Simpson, 2005b; Tams, 1999). Já no caso de um cão de grandes
dimensões, devido ao comprimento do endoscópio, poderá não ser possível atingir todo o
duodeno (Mansell & Willard, 2003; Simpson, 2005b; Tams, 1999; Willard, 2001; Zoran
2001). A utilização de endoscópios mais finos reflecte-se também no tamanho das amostras
que se podem recolher, e estas têm necessariamente que ser mais pequenas para
passarem pelo canal do endoscópio (Jergens & Moore, 1999). Nestes casos, pode não ser
possível realizar um diagnóstico ou avaliar a gravidade do processo, uma vez que as lesões
podem ser mais graves ou apenas localizarem-se numa região não acessível ao
endoscópio, pelo que nestes casos se recomenda a realização de laparotomia.
Interessantemente, foi recentemente realizado um estudo que reporta que o duodeno não é
representativo de todo o intestino delgado em cães com IBD, o que reflecte esta grande
desvantagem da endoscopia (Dossin, Tesseydre, Concodet & Raymond, 2007). Nos locais
que o endoscópio consegue alcançar, dado que a mucosa intestinal é relativamente macia,
é geralmente possível obter amostras de mucosa para posterior análise histopatológica. No
caso de lesões mais firmes, pode por vezes ser difícil obter biopsias por meio de um
endoscópio flexível (Mansell & Willard, 2003).

O grande problema da colheita de amostras de mucosa através da utilização de um


endoscópio consiste em colher amostras de boa qualidade, que permitam ao patologista
realizar um diagnóstico. Dado que os fórceps de biopsia apenas conseguem colher
amostras de mucosa (e por vezes submucosa) intestinal com 2 a 3 mm de espessura, é
imperativo que estas sejam de boa qualidade, e mesmo assim por vezes não é possível

51
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

diagnosticar certas afecções apenas por amostras de mucosa (Moore, 2003). Esta é uma
das razões pelas quais está recomendada a recolha de várias amostras de mucosa (7 a 10)
d-e cada área analisada, mesmo na ausência de lesões óbvias (Mansell & Willard, 2003;
Simpson, 2005b). É também frequente que ocorra alguma distorção anatómica das
amostras colhidas, pelo que a colheita de vários exemplares minimiza este risco.
Surpreendentemente, um estudo em 383 cães com diarreia crónica reportou que
aproximadamente 23% de amostras obtidas por endoscopia não se encontravam em
condições para serem examinadas, o que reflecte a importância de uma colheita adequada
na utilização desta técnica (Van der Gaag & Happé, 1990). Para uma melhor qualidade da
amostra, esta deve ser colhida transversalmente à parede intestinal, ou seja, o fórceps deve
ser colocado perpendicularmente à mucosa. Se tal não for realizado, os fórceps vão como
que raspar sobre a superfície mucosa antes de obterem a amostra, destruindo vilosidades e
criptas ou só obtendo vilosidades (Jergens & Moore, 1999; Simpson, 2005b; Zoran, 2001).
Poderão também ser colhidas várias amostras do mesmo local, de modo a obter exemplares
mais profundos, mas deve-se ter cuidado pois existe risco de perfuração, tal como em caso
de biopsia de úlceras ou outras lesões profundas. Pode também ocorrer perfuração
gastrointestinal se for aplicada demasiada força no endoscópio enquanto se tenta passar
por curvaturas do intestino ou em esfíncteres, mas são situações raras (Moore, 2003;
Simpson, 2005b). A hemorragia que se origina com a colheita de amostras de biopsia é
negligenciável, pelo que geralmente não é necessária intervenção médica. O diâmetro do
endoscópio é também um factor importante, uma vez que quanto mais elevado, maiores
serão os instrumentos que se podem utilizar, permitindo a obtenção de amostras de melhor
qualidade (Mansell & Willard, 2003; Moore, 2003). Outro dos factores que dificulta a
obtenção de amostras de boa qualidade é o facto de que a maior parte do intestino é como
que móvel dentro da cavidade abdominal, e quando se pressiona o fórceps de biopsia
contra a parede intestinal, esta move-se, não permitindo obter amostras de toda a
profundidade da mucosa com tanta facilidade (Zoran, 2001). No caso de animais em que
não é possível atingir o íleo por colonoscopia, é possível muitas vezes apenas avançar o
fórceps de biopsia para o interior do íleo através da válvula íleocólica, embora neste caso
não se consiga observar como se colhem as amostras (Mansell & Willard, 2003; Simpson,
2005b; Tams, 1999; Willard, 2001).

Durante o procedimento endoscópico, para além de recolha de amostras de biopsia, podem-


se também apreciar diversas lesões macroscópicas em cães com IBD. Jergens et al. (1992)
reportaram lesões na mucosa gastrointestinal em cerca de 50% dos cães incluídos no seu
estudo, entre elas, eritema, friabilidade e granularidade da mucosa e ocorrência de erosões
e úlceras. Rodríguez-Franco, Sainz, García-Sancho & Rodríguez-Castaño (2002a) relataram
os achados endoscópicos de cem cães com enterite linfoplasmocítica, reportando que 87%

52
Enterite Linfoplasmocítica Canina

dos casos apresentavam lesões no duodeno, incluindo redução do diâmetro do lúmen


duodenal, congestão da mucosa, soluções de continuidade da mucosa (erosões e úlceras),
irregularidade e friabilidade da mucosa. Os mesmos autores referem ainda que foram
observadas lesões na porção distal do esófago e no estômago, possivelmente devido a
inflamação secundária a refluxo duodenogastroesofágico. Já Yamasaki, Suematsu &
Takahashi (1996) apenas reportam irregularidade e friabilidade da mucosa duodenal de
alguns dos cães com enterite linfoplasmocítica do seu estudo, juntamente com
irregularidade da mucosa gástrica em alguns cães com enterite linfoplasmocítica e cães
normais. Outro estudo, realizado por Roth et al. (1990), reporta granularidade e friabilidade
da mucosa como as principais lesões encontradas em caso de infiltração inflamatória do
duodeno. Este mesmo estudo compara os achados da endoscopia com os achados
histopatológicos, reportando que se um animal tiver lesões macroscópicas, terá grande
probabilidade de ter também lesões microscópicas. Em caso de linfangiectasia secundária à
infiltração inflamatória, podem também ser observadas pequenas formações granulares
esbranquiçadas na mucosa intestinal, representando as vilosidades da mucosa distendidas
devido à acumulação de linfa nos quilíferos (German, 2005; Hall & German, 2005; Peterson
& Willard, 2003; Tams, 2003). Por vezes podem também ser observadas acumulações de
material branco no lúmen intestinal, que representam linfa que extravasou dos quilíferos da
mucosa (Peterson & Willard, 2003; Tams, 2003). Quando existe uma suspeita de
linfangiectasia intestinal, está recomendada a administração de uma refeição rica em óleo
de milho na noite anterior, uma vez que em caso de doença intestinal torna os vasos
linfáticos mais proeminentes (Peterson & Willard, 2003). Nos casos de suspeita de
linfangiectasia, é necessário precaução adicional durante a colheita das amostras de
mucosa para biopsia, uma vez que a pressão exercida pelo fórceps de biopsia sobre a
mucosa pode provocar ruptura dos quilíferos dilatados e perda da linfa acumulada (Peterson
& Willard, 2003).

A grande variação entre os achados endoscópicos dos diferentes estudos aqui


apresentados pode dever-se apenas a diferentes graus de severidade da doença que os
causou, e uma vez que até ao corrente ano não existia qualquer esquema de graduação das
lesões histopatológicos, torna-se difícil comparar resultados entre diferentes estudos. É
importante salientar que em todos estes estudos alguns dos cães não apresentavam
qualquer tipo de lesões na mucosa gastrointestinal, sendo apenas encontradas alterações a
nível microscópico, existindo também relatos de animais histologicamente normais mas com
lesões na mucosa (Roth et al., 1990). Esta discordância pode ser devido a amostra não
representativa, ocorrência de artefactos ou incapacidade do patologista em reconhecer
alterações histológicas. É devido a casos como estes que é aconselhado recolher sempre
amostras de mucosa gastrointestinal quando se realiza uma endoscopia, uma vez que

53
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

mesmo que os pacientes não apresentem lesões apreciáveis macroscopicamente, estas


podem existir e ser encontradas por meio de biopsia e análise histopatológica.

A citologia gastrointestinal é um dos procedimentos que pode ser realizado durante a


endoscopia. Esta técnica permite obter informações sobre as células presentes na mucosa
intestinal antes de os resultados do exame histopatológico chegarem, que demoram alguns
dias. Existem duas técnicas possíveis, a técnica de escova ou a técnica do toque (Jergens,
Andreasen, Hagemoser, Ridgway & Campbell, 1998a; Jergens & Moore, 1999). Para a
técnica em escova, são utilizadas escovas próprias que são inseridas num dos canais do
endoscópio, que são depois utilizadas para escovar a superfície mucosa a analisar; a
escova é posteriormente rolada sobre uma lâmina, fixada, corada e observada ao
microscópio (Jergens & Moore, 1999). No caso da citologia por toque, uma amostra de
mucosa intestinal é removida do fórceps de biopsia e pressionada delicadamente sobre uma
lâmina, deixando algumas das suas células, sendo a lâmina posteriormente fixada, corada e
observada ao microscópio (Jergens & Moore, 1999) Num estudo recente por Jergens et al.
(1998a), foi demonstrado que a citologia gastrointestinal tem um valor diagnóstico preditivo
em mais de 90% dos casos (comparando com o diagnóstico definitivo por histopatologia),
apresentando uma baixa taxa de resultados falso-positivos e falso-negativos. Jergens et al.
(1998a) refere ainda que a técnica em escova é especialmente útil para detectar infiltrações
celulares na lâmina própria gastrointestinal, enquanto que a técnica do toque detecta
principalmente casos de inflamação aguda da mucosa. Pode também ser possível identificar
agentes etiológicos específicos nas amostras colhidas, como por exemplo Prototheca sp.,
Histoplasma sp., bactérias e outros protozoários. É importante salientar que resultados
negativos com esta técnica não significam ausência de patologia, apenas que será
necessário esperar pelos resultados da histopatologia para obter o diagnóstico. Esta é uma
técnica útil e que pode ser utilizada como complemento para o diagnóstico de diversas
afecções gastrointestinais. Durante o procedimento endoscópico podem também ser
recolhidas amostras de fluído duodenal para posterior cultura bacteriológica, sendo este o
método considerado o gold standard para o diagnóstico de sobrecrescimento bacteriano
(Steiner, 2005b). As amostras são colhidas através de um fino tubo estéril que é passado
através de um canal do endoscópio (Jergens & Moore, 1999; Steiner, 2005b).

Recentemente, foi introduzida em medicina humana uma nova técnica de endoscopia, a


endoscopia de duplo balão, que permite a observação de todo o intestino delgado. Esta
técnica baseia-se na utilização de um endoscópio com um balão insuflável na sua ponta e
num tubo exterior também provido de um balão insuflável (Latorre, Ayala, Carballo, Ayala &
Pérez-Cuadrado, 2007). Cada um destes instrumentos é avançado de sua vez e fixo por
meio de insuflação do seu balão, procedendo-se então ao avançar do outro instrumento e

54
Enterite Linfoplasmocítica Canina

sua fixação, e por aí em diante. Torna-se assim possível visualizar todo o intestino delgado,
ultrapassando-se uma das maiores limitações da endoscopia clássica. Porém, nem mesmo
esta técnica permite a observação de todo o intestino delgado de uma só vez, sendo
necessário realizar esofagogastroduodenoscopia e colonoscopia para tal (Latorre et al.,
2007). Conforme a localização suspeita das lesões, pode-se assim optar por um ou outro
procedimento ou, se necessário, realizar ambos. Latorre et al. (2007) estudaram
recentemente a aplicação desta inovadora técnica em cães, reportando que este é um
procedimento seguro e de extrema utilidade no diagnóstico de lesões no jejuno e íleo,
regiões do intestino delgado de difícil acesso, e que pode também ter as mesmas vantagens
terapêuticas que a endoscopia clássica. Foi também recentemente reportado por Peña et al.
(2007) um caso de um cão com enterite linfoplasmocítica jejunal, o qual realizou
esofagogastroduodenoscopia e colonoscopia clássicas, sem obtenção de resultados
diagnósticos. Foi seguidamente realizada endoscopia de duplo balão, técnica que permitiu a
observação e recolha de amostras, bem como a realização do diagnóstico final, o que revela
o enorme potencial desta nova técnica no diagnóstico de afecções intestinais crónicas.

É importante salientar que devido às limitações da endoscopia clássica, nomeadamente o


facto de não atingir todo o intestino delgado, aliado ao facto de que as amostras colhidas
restringem-se à mucosa intestinal (e raramente, submucosa), são comuns resultados
inconclusivos com esta técnica. Nestes casos, está recomendada a laparotomia para
recolha de amostras de toda a espessura do intestino.

2.4.14.3 Histopatologia
O exame histopatológico é um exame indispensável para realizar um diagnóstico de enterite
linfoplasmocítica (bem como de outros tipos de IBD). De facto, apenas com a observação
microscópica de exemplares de biopsia se podem observar as infiltrações de células
inflamatórias que caracterizam esta afecção. Por outro lado, e tal como referido
anteriormente, é importante não esquecer que diversas patologias diferentes provocam uma
imagem inflamatória intestinal com infiltração da lâmina própria por populações de células
inflamatórias, pelo que se não forem excluídas todas as causas conhecidas de inflamação
crónica do intestino, não é possível afirmar com certeza que se trata de um caso de IBD
idiopática com base no exame histopatológico. Tendo isto em mente, segue-se uma breve
descrição das dificuldades inerentes ao exame histopatológico de exemplares de biopsia
(endoscópica ou cirúrgica), bem como uma caracterização das principais lesões intestinais
microscópicas encontradas em cães com enterite linfoplasmocítica.

Uma das grandes dificuldades encontradas na avaliação de biopsias intestinais prende-se


com o facto de que as amostras são muitas vezes de má qualidade, com distorção dos

55
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

exemplares ou com a presença de numerosos artefactos, especialmente com as biopsias


obtidas por meio de endoscopia (Mansell & Willard, 2003; Willard, 2003). De facto, neste tipo
de biopsias, como geralmente apenas se colhe uma porção da mucosa, e geralmente esta é
uma mucosa lesada, é normal a ocorrência de várias dificuldades técnicas. Uma destas
dificuldades relaciona-se com o processamento e orientação dos exemplares obtidos. Como
referido anteriormente, o médico que realiza a endoscopia deve ter especial atenção com a
orientação do fórceps de biopsia em relação à mucosa, de modo a colher o máximo de
mucosa possível sem a danificar. Se os fórceps forem como que arrastados sobre a
mucosa, podem destruir a estruturas anatómicas a observar (Jergens & Moore, 1999;
Simpson, 2005b; Zoran, 2001). Após a recolha do exemplar, surge outra das dificuldades
desta técnica, que se prende com o posicionamento da amostra e a salvaguarda da
estrutura anatómica original. De facto, deve-se ter especial atenção a este passo, uma vez
que a mucosa intestinal é uma estrutura incrivelmente frágil, podendo-se facilmente destruir
ou criar artefactos (Jergens & Moore, 1999; Mansell & Willard, 2003). As amostras devem
idealmente ser removidas do fórceps de biopsia com o auxílio de uma agulha hipodérmica e
devem ser rapidamente colocadas sobre um suporte (por exemplo, esponja ou cartão) antes
de serem submergidas na solução fixadora (por exemplo, solução de formol a 10%), uma
vez que se secarem ao ar ocorre distorção anatómica do exemplar (Jergens & Moore, 1999;
Mansell & Willard, 2003; Simpson, 2005b). Será a superfície da amostra oposta à superfície
epitelial da mucosa que será aposta no suporte. A colocação das amostras num suporte
evita que também ocorra distorção anatómica durante a fixação. Posteriormente ao
processo laboratorial de obtenção de uma amostra parafinada, surge o corte da amostra de
mucosa. Deve-se ter especial atenção a este passo, uma vez que idealmente os cortes
devem ser realizados paralelos às criptas e vilosidades, de modo a que seja possível
observar na mesma lâmina vilosidades, criptas, lâmina própria, etc (Mansell & Willard,
2003). No caso de amostras obtidas por cirurgia, conseguem ser contornadas muitas das
dificuldades encontradas com o processamento de amostras obtidas por endoscopia. Os
exemplares cirúrgicos são geralmente bastante maiores, o que aliado ao facto de conterem
toda a espessura da parede intestinal, torna mais fácil o seu manuseamento e a obtenção
de exemplares de óptima qualidade, sem artefactos e bem orientados (Mansell & Willard,
2003; Willard, 2003).

Através da análise de um bom exemplar, o patologista será capaz de apreciar as lesões


microscópicas, bem como avaliar quantitativa e qualitativamente as populações
inflamatórias que podem existir na mucosa intestinal. Em alguns casos, torna-se também
possível identificar certos agentes etiológicos, tais como bactérias, fungos ou parasitas que
invadiram a mucosa (Willard, 2003). Especialmente no caso de bactérias, é necessário
recorrer a outras técnicas laboratoriais para identificar a espécie bacteriana responsável.

56
Enterite Linfoplasmocítica Canina

Porém, na grande maioria das vezes, e como é o caso da IBD, o patologista não consegue
identificar tais agentes infecciosos ou parasitários, podendo apenas realizar uma análise das
lesões microscópicas e das populações celulares que se encontram na mucosa.

Existe, no entanto, uma grande componente subjectiva na graduação histológica de


amostras gastrointestinais, pelo que os resultados obtidos variam de patologista para
patologista (Jergens & Moore, 1999). De facto, embora as lesões observadas em casos de
IBD sejam classicamente caracterizadas como ligeiras, moderadas ou severas, não existe
um consenso para esta graduação entre patologistas, e cada laboratório de patologia possui
o seu próprio esquema de graduação. Devido a este facto, e como os resultados obtidos
pelos patologistas dependem grandemente da sua própria experiência pessoal, é possível
que certo patologista classifique uma amostra num certo grau, enquanto que outro
patologista classifica a mesma amostra num grau diferente. Isto é especialmente fácil de
ocorrer em caso de infiltrações linfoplasmocíticas, uma vez que estas populações celulares
encontram-se também no intestino saudável, e por vezes pode ser difícil conseguir distinguir
uma mucosa saudável de uma mucosa com uma infiltração inflamatória (Roth et al., 1990;
Yamasaki et al., 1996). O facto de muitas das vezes os patologistas trabalharem com
amostras obtidas por endoscopia só vem complicar este processo, uma vez que nestes
casos só é possível analisar a mucosa (e, por vezes, a submucosa), não se sabendo se o
resto da parede intestinal se encontra normal ou se as alterações observadas são
consequência de um processo localizado na muscular ou serosa do intestino. Isto é
especialmente verdade na distinção entre inflamação linfoplasmocítica e linfoma intestinal. O
linfoma gastrointestinal é muitas vezes acompanhado por uma reacção linfoplasmocítica,
pelo que a amostra observada por um patologista pode apenas indicar um processo
inflamatório, quanto na realidade de trata de um processo neoplásico (Cave, 2003;
Kleischmidt et al., 2006). Nestas situações, a realização de biopsias por meio de laparotomia
permite realizar o diagnóstico, uma vez que nestes casos o patologista consegue avaliar
toda a parede intestinal. Mesmo com a obtenção de um diagnóstico por meio de
histopatologia, é necessário relembrar que um mesmo animal pode ter infiltrações
inflamatórias de diferentes gravidades em regiões diferentes do intestino. Por exemplo,
podem ocorrer situações em que a amostra duodenal indica infiltração linfoplasmocítica
ligeira, enquanto que se tivessem sido recolhidas amostras jejunais, o processo seria
classificado como severo. De facto, um estudo recente por Dossin et al. (2007), reporta que
a mucosa duodenal não é representativa de todo o intestino em cães com IBD, o que aliado
ao facto de que o duodeno é a região anatómica do intestino a que se fazem mais biopsias,
revela o grande potencial para falsos diagnósticos. Willard et al. (2002) reportaram um
estudo sobre a variação da graduação de lesões inflamatória em tecidos intestinais, obtendo
resultados surpreendentes. De facto, neste estudo surgiram casos em que diferentes

57
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

patologistas classificavam a mesma amostra como infiltração ligeira ou infiltração severa, ou


mesmo um caso em que a mesma amostra foi classificada como normal por um patologista
e como neoplásica por outro.

Os estudos acima referidos servem para demonstrar o quanto a falta de um esquema de


graduação standard pode fazer variar o diagnóstico de uma lesão, e por esta razão, foi
criado já há alguns anos o World Small Animal Veterinary Association (WSAVA)
Gastrointestinal Standardization Group, que tinha como um dos seus principais objectivos
criar standards endoscópicos e microscópicos em gastroenterologia de pequenos animais.
Este grupo publicou, recentemente, uma proposta de graduação histológica das principais
regiões do TGI às quais se realiza biopsia endoscópica em cães e gatos, entre elas corpo
gástrico, fundo gástrico, duodeno e cólon (Day et al., 2008). Para cada uma destas regiões,
foram definidos padrões histológicos relativamente a alterações morfológicas e aos
principais tipos de células inflamatórias que infiltram o epitélio e lâmina próprias dessa
região. Neste modelo proposto por Day et al. (2008), apenas foram contabilizadas as lesões
consideradas de maior relevância para os processos inflamatórios, e lesões como
hemorragia capilar ou edema tecidular não foram incluídos. Para o caso do duodeno, órgão
representativo de enterite linfoplasmocítica, foram incluídos como parâmetros atrofia das
vilosidades, lesão epitelial, distensão das criptas, dilatação de quilíferos, fibrose da mucosa,
linfócitos intraepiteliais, linfócitos e plasmócitos da lâmina própria, eosinófilos e neutrófilos
da lâmina própria. Para cada um destes parâmetros foi descrito um resumo e apresentada
uma imagem histológica para as categorias de mucosa normal, inflamação ligeira, moderada
e severa. Como alguns dos parâmetros incluem contagens de células, estão também
descritos os números considerados normais para as diferentes populações de células
inflamatórias. No Anexo 3 desta dissertação – Parâmetros para Classificação de Inflamação
Duodenal, encontra-se um resumo dos vários parâmetros para cada uma das categorias
relativas ao duodeno. Como este esquema de graduação histológica apenas foi apresentado
este ano, ainda não existe feedback da sua utilização, embora o WSAVA Gastrointestinal
Standardization Group esteja já a realizar um estudo de validação deste esquema, a
apresentar ainda este ano.

Tendo em conta que até ao presente ano não existia um esquema de graduação de lesões
histológicas intestinais padronizado, segue-se uma descrição das principais lesões
microscópicas encontradas em diversos estudos de cães com IBD, especialmente com
infiltração linfoplasmocítica. Em caso de infiltração linfoplasmocítica, como o nome indica,
são encontrados números aumentados de linfócitos e plasmócitos na lâmina própria e de
linfócitos intraepiteliais, que embora sejam as populações dominantes, estão também
associadas a alguma infiltração por outras células inflamatórias, como eosinófilos,

58
Enterite Linfoplasmocítica Canina

macrófagos e neutrófilos, variando a gravidade da infiltração com a severidade da doença


(Cave, 2003; Craven et al., 2004; German, 2005; Hall & German, 2005; Jacobs et al., 1990;
Jergens et al., 1992; Jergens et al., 2003; Rodríguez-Franco, Sainz, García-Sancho &
Rodríguez-Castaño, 2002b; Sturgess, 2005; Tams, 2003; Twedt, 2007; Yamasaki et al.,
1996). São também frequentemente reportadas lesões da mucosa de gravidade variável,
como atrofia ou fusão de vilosidades, fibrose da lâmina própria, lesão epitelial (hiperplasia,
degeneração, necrose, erosão, ulceração, perda de células caliciformes, dilatação glandular)
e edema da lâmina própria (Cave, 2003; German, 2005; Hall & German, 2005; Kleinschmidt,
et al., 2006; Jacobs et al., 1990; Tams, 2003; van der Gaag & Happé, 1990; Yamasaki et al.,
1996). Já em casos de linfangiectasia intestinal secundária a enterite linfoplasmocítica,
podem observar-se ao microscópio óptico vilosidades dilatadas por acumulação de linfa nos
quilíferos, que dependendo da gravidade da dilatação, podem ocupar até praticamente toda
a espessura da vilosidade (Brooks, 2005; Cave, 2003; German, 2005; Hall & German, 2005;
Jacobs et al., 1990; Kleinschmidt et al., 2006; Peterson & Willard, 2003; Tams, 2003). É
necessário ter atenção que em alguns cães observa-se dilatação de vasos linfáticos na
submucosa, pelo que se as amostras de biopsia forem colhidas por endoscopia, pode não
ser possível identificar estas lesões no exame histopatológico (Hall & German, 2005;
Peterson & Willard, 2003). Tal como referido anteriormente, é necessário um grande
cuidado durante a obtenção de amostras de biopsia em pacientes suspeitos de
linfangiectasia, uma vez que se se provocar a ruptura dos quilíferos durante a colheita, não
serão observados quilíferos dilatados ao exame histopatológico (Peterson & Willard, 2003).

Através do recurso a novas técnicas laboratoriais, é actualmente possível obter diversas


informações a partir de uma biopsia intestinal. De facto, é actualmente possível caracterizar
diferentes subpopulações celulares através do recurso a técnicas de imunohistoquímica e
fluorescência, observar os constituintes celulares através de microscopia electrónica,
quantificar proteínas endógenas e exógenas e seu mRNA através de PCR, etc (Zoran,
2001). Dentro em breve será também possível analisar o DNA dos nossos pacientes em
medicina veterinária e identificar genes responsáveis por algumas doenças, tal como já é
realizado em humanos. Por enquanto, a maioria destas técnicas está limitada a alguns
centros laboratoriais e de ensino, mas será possível que no futuro estas técnicas possam
ser utilizadas na clínica de dia a dia. É possível que exista um agente etiológico responsável
pelo quadro clínico e lesões observadas em pacientes com IBD, mas por enquanto tal
agente ainda não foi identificado. Poderá ser que a utilização de novas e mais modernas
técnicas de diagnóstico permitam no futuro chegar a uma etiologia precisa para esta
afecção.

59
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

2.5 TRATAMENTO
O tratamento da enterite linfoplasmocítica é, primeiro que tudo, um processo faseado. Esta
divisão do tratamento em fases deve-se principalmente às dificuldades de diagnóstico das
afecções gastrointestinais, uma vez que muitas das vezes não se conseguem eliminar todas
as causas possíveis de inflamação intestinal, nomeadamente as causas parasitárias,
dietéticas ou bacterianas. Será então prudente tentar primeiro eliminar estas patologias
através de testes terapêuticos com antiparasitários, novas dietas e antimicrobianos, antes
de avançar para terapias mais agressivas para o animal, que inevitavelmente apresentam
mais efeitos secundários (German, 2005; Hall & German, 2005). A excepção a esta regra
será nos casos de pacientes muito debilitados, em que é urgente a instituição de uma
terapia que alivie os sinais clínicos e auxilie o paciente a regressar a uma condição física
favorável. É necessário referir que existe alguma sobreposição entre os tratamentos para a
IBD e os tratamentos para as afecções dietéticas e bacterianas, uma vez que existe uma
forte componente dietética e microbiana envolvida na patogénese da IBD canina. Assim,
embora alguns animais apresentem melhorias clínicas apenas com tratamento dietético ou
antibiótico, será possível que estes animais tenham realmente IBD, especialmente em casos
ligeiros (German, 2005). Classicamente, a terapia da IBD canina assenta na gestão de
maneio dietético e médico, este último incluindo fármacos antimicrobianos e anti-
inflamatórios/imunossupressores (German, 2005; Hall & German, 2005).

2.5.1 Maneio Dietético


O maneio dietético é um dos passos mais importantes para a gestão de casos de IBD
canina, possuindo também um papel extremamente importante na eliminação de causas
dietéticas de inflamação intestinal, nomeadamente alergia ou intolerância alimentar.

2.5.1.1 Constituintes da Dieta


Um dos aspectos mais importantes da terapia dietética de doenças gastrointestinais prende-
se com a fonte de proteínas, uma vez que estas são consideradas os elementos mais
alergénicos de uma dieta (Marks, 2003a; Zoran, 2003). Em caso de IBD, é introduzida ao
animal uma nova dieta, ou com uma nova fonte de proteínas, que o animal nunca tenha
ingerido (minimizando a possibilidade de alimentar uma proteína a que o animal é alérgico),
ou com uma fonte de proteínas hidrolisadas, de modo a que os péptidos resultantes
possuam menos de 10.000 daltons, tornando-se pequenos demais para serem reconhecidos
pelo sistema imune da mucosa intestinal como antigénios (Chandler 2002a). Existem várias
fontes de proteína no mercado a que geralmente os animais não tiveram acesso
(dependendo da história de cada animal), nomeadamente queijo fresco, tofu, ovos, peru,
animais de caça, coelho (Chandler, 2002a; Zoran, 2003). Outro dos aspectos a ter em
atenção é a digestibilidade da proteína alimentar, que deve ser superior a 87%, uma vez que

60
Enterite Linfoplasmocítica Canina

assim se diminui não só a disponibilidade de proteínas para a flora intestinal como também
se diminui a exposição da mucosa a proteínas potencialmente alergénicas (Chandler,
2002a; Guilford & Matz, 2003; Zoran, 2003). Também se deverá ter em conta que as
necessidades proteicas de alguns pacientes podem estar aumentadas, especialmente nos
casos de enterite linfoplasmocítica severa acompanhada de enteropatia com perda de
proteínas, pelo que se devem fornecer fontes proteicas de elevado valor biológico e, se
necessário, aumentar o teor de proteínas na dieta (Davenport et al., 2000).

A glutamina é um aminoácido não essencial, mas uma vez que é utilizado como fonte de
energia pelos enterócitos, promove a recuperação estrutural e funcional da mucosa do
intestino delgado, pelo que a sua suplementação em caso de doença intestinal é
recomendada (Chandler, 2002a; Davenport et al., 2000; Zoran, 2003).

A fonte de carbohidratos é outro dos pontos-chave da dieta ao qual se deve prestar atenção,
uma vez que são constituintes importantes das dietas caninas. Um dos factores que afecta a
escolha da fonte de carbohidratos é a digestibilidade dos mesmos, uma vez que se pretende
utilizar um carbohidrato altamente digerível (digestibilidade maior que 90%), de modo a
evitar complicações secundárias a má absorção destes elementos, tais como diarreia
osmótica ou sobrecrescimento bacteriano (Chandler, 2002a; Marks, 2003a). As fontes de
carbohidratos também devem ser livres de glúten, uma vez que este constituinte é
actualmente reconhecido como sendo responsável por sensibilidades alimentares em
algumas espécies, tais como Setters Irlandeses ou Soft Coated Wheaten Terriers (Chandler,
2002a; Daminet, 1996; Vaden et al., 2000; Zoran, 2003). A lactose é outro dos constituintes
que se deve evitar, uma vez que a actividade da enzima que a digere, a lactase, diminui
com a idade dos animais, podendo então provocar diarreia (Chandler, 2002a; Guilford &
Matz, 2003; Marks, 2003a). O queijo fresco contém baixos teores de lactose, pelo que a sua
utilização geralmente não constitui problema (Chandler, 2002a). A fonte de carbohidratos
mais utilizada para as dietas de pacientes com doença gastrointestinal é o arroz cozido, uma
vez que é altamente digerível e não contém glúten.

O tipo e quantidade de fibras na dieta de pacientes com doença intestinal é um dos pontos
controversos na formulação de dietas para estes animais, especialmente nos casos de
envolvimento do cólon (colite). As fibras são constituintes normais das plantas que as
células dos mamíferos pouca capacidade têm de digerir, deixando esse papel a cabo da
flora microbiana intestinal, pelo que a escolha do tipo de fibra tem um papel importante na
regulação da flora intestinal (Chandler, 2002a; Zoran, 2003). As fibras podem ser
classificadas em solúveis (fermentescíveis) ou insolúveis (pouco ou nada fermentescíveis).
As fibras fermentescíveis formam géis, prendendo água e outras substâncias (entre elas

61
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

substâncias tóxicas), atrasam o trânsito gastrointestinal, inibem a absorção de diversos


nutrientes (por exemplo, colesterol) e são transformadas em ácidos gordos de cadeia curta
pelas bactérias colónicas (diminuindo assim o pH luminal e impedindo o crescimento de
bactérias patogénicas), especialmente o butirato, uma importante fonte de energia para os
colonócitos (Chandler, 2002a; Guilford & Matz, 2003; Marks, 2003a; Zoran, 2003). São
exemplos deste tipo de fibras os fructooligossacáridos (FOS), pectinas, psillium, entre
outros. Por seu lado, as fibras não fermentescíveis não formam géis, pouco efeito têm no
trânsito gastrointestinal (podendo, no entanto, auxiliar a normalizá-lo), aumentam bastante o
volume fecal, diminuindo assim o contacto da mucosa com substâncias tóxicas presentes no
intestino e, como o nome indica, são pouco fermentáveis por bactérias intestinais (Chandler,
2002a; Zoran, 2003). Os exemplos mais comuns deste tipo de fibras são a celulose e as
fibras de cereais. De todas as maneiras, é necessário salientar que de uma maneira geral a
introdução de fibras numa dieta diminui a digestibilidade da mesma, pelo que nestes
pacientes, como se pretende uma dieta de alta digestibilidade, a sua quantidade não deve
ser elevada (Guilford & Matz, 2003; Marks 2003a). De uma maneira geral, está
recomendada em pacientes com doença colónica a suplementação da dieta escolhida com
uma quantidade moderada de fibra solúvel, ou com uma mistura de fibra solúvel e insolúvel
(Chandler, 2002a; Davenport et al., 2000; Guilford & Matz, 2003; Jergens, 2002; Marks,
2003a; Zoran, 2003).

Os fructooligossacáridos (FOS) são um tipo de fibra solúvel que apresenta propriedades


potencialmente úteis no tratamento de doença intestinal. Estas substâncias, ao atingirem o
cólon, são fermentadas especialmente por bactérias benéficas (por exemplo, Lactobacillus
sp. e Bifidobacterium sp.), promovendo a proliferação destas espécies bacterianas e inibindo
o desenvolvimento de bactérias patogénicas, o que poderá ter interesse no maneio de
numerosas patologias com envolvimento bacteriano (Chandler, 2002a; Guilford & Matz,
2003; Marks, 2003a; Zoran, 2003). Por enquanto, são poucos os estudos sobre os efeitos
destes prebióticos em pacientes caninos com doença gastrointestinal, pelo que se deve ter
precaução na sua utilização.

O teor de gordura é classicamente recomendado como reduzido (<10% do teor em matéria


seca), uma vez que o excesso de gorduras atrasa o esvaziamento gástrico e em caso de má
absorção de gorduras, estas atingem o cólon, onde são hidroxiladas, formando os ácidos
gordos hidroxilados, tóxicos para a mucosa colónica (Chandler, 2002a; Guilford & Matz,
2003; Marks, 2003a; Zoran, 2003). Esta redução do teor de gordura da dieta é
especialmente importante quando existe envolvimento do estômago, uma vez que a
ocorrência de gastrite crónica antral encontra-se já associada a dificuldades no
esvaziamento gástrico (García-Sancho et al., 2005). Deve-se ter atenção que a gordura da

62
Enterite Linfoplasmocítica Canina

dieta é uma importante fonte calórica, para além de aumentar a palatibilidade da dieta, pelo
que os teores de gordura utilizados devem ser bem ponderados, uma vez que os pacientes
com enterite linfoplasmocítica são geralmente pacientes mal nutridos, necessitando de uma
dieta que forneça um alto aporte energético. Uma opção possível para aumentar o aporte
energético em pacientes mal nutridos será aumentar a quantidade de alimento fornecido
mas, como referido anteriormente, estes pacientes podem apresentar anorexia parcial ou
total, o que dificultará esta acção. Em caso de enteropatia com perda de proteínas (por
exemplo, linfangiectasia intestinal secundária a enterite linfoplasmocítica), está
recomendada uma alteração da fonte de gordura, uma vez que os triglicéridos de cadeia
longa (TCL) geralmente utilizados nas dietas são digeridos antes de serem absorvidos para
a rede linfática intestinal sob a forma de quilomícrons, o que exacerba a perda de gorduras
secundária a obstrução linfática (Chandler, 2002a, Peterson & Willard, 2003). Assim, os
pacientes com estas afecções podem ver substituídos os TCL por triglicéridos de cadeia
média (TCM), os quais são maioritariamente absorvidos para a circulação portal sem
sofrerem um processo digestivo, o que alivia a pressão colocada sobre os vasos linfáticos
intestinais (Chandler, 2002a; Davenport et al., 2000; Peterson & Willard, 2003). Os grandes
problemas das fontes de TCM, tais como o óleo de coco, é que possuem geralmente uma
baixa palatibilidade, o que dificulta a sua introdução em dietas, e não contêm as vitaminas
lipossolúveis essenciais, pelo que os animais necessitam de ser suplementados (Chandler,
2002a; Davenport et al., 2000; Peterson & Willard, 2003).

A alteração do teor dietético de ácidos gordos ómega-6 para ácidos gordos ómega-3 é outro
dos pontos frequentemente discutidos no maneio dietético da IBD humana e canina. Os
ácidos gordos ómega-3 existentes nos óleos de peixe têm sido extensamente estudados em
medicina humana devido às suas propriedades anti-inflamatórias, e parecem ter efeitos
benéficos na mucosa intestinal, ao serem incluídos em membranas biológicas e diminuindo
a produção de medidores pro-inflamatórios (Davenport et al., 2000; Jergens, 2002; Marks,
2003a; Wild, Drozdowski, Tartaglia, Clandinin & Thomson, 2007). Por outro lado, os ácidos
gordos ómega-6 são precursores de mediadores pró-inflamatórios (como leucotrienos,
prostaglandinas ou mesmo IL-1), que se encontram aumentados na mucosa intestinal de
pacientes com IBD (Jergens, 2002; Marks, 2003a; Wild et al., 2007). Por enquanto ainda
não existem estudos comprovados em medicina veterinária, mas muitos autores continuam
a recomendar a sua utilização, geralmente baseados em extrapolações de medicina
humana ou na sua própria experiência clínica, e muitos fabricantes já os incluem
regularmente nas suas dietas (Chandler, 2002a; Davenport et al., 2000; Guilford & Matz,
2003; Jergens, 2002; Marks, 2003a; Zoran, 2003).

63
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

A constituição vitamínica das dietas utilizadas é outro dos factores a ter em conta, uma vez
que a ocorrência de diarreia e de má absorção de gorduras predispõe à perda entérica de
vitaminas hidro- (especialmente vitaminas do complexo B e vitamina C) e lipossolúveis
(vitaminas A, D, E e K), pelos que nestes casos as dietas devem ser suplementadas
(Chandler, 2002a; Zoran, 2003). Pelos mesmos motivos, podem também ocorrer
deficiências em alguns minerais, como potássio e magnésio, pelo que os animais poderão
ter que ser suplementados, inicialmente com suporte parenteral e posteriormente
aumentando o teor de minerais na dieta (Chandler, 2002a; Davenport et al., 2000; Zoran,
2003).

Os probióticos são agentes bacterianos benéficos (por exemplo, Lactobacillus sp. e


Enterococcus sp.) que se podem administrar a pacientes com doença gastrointestinal, uma
vez que alteram a flora microbiana, produzem substâncias antibacterianas, competem por
substrato com bactérias patogénicas, modulam as respostas imunes intestinais e melhoram
a função do intestino como barreira (Jergens, 2007; Zentek, 2007). Porém, tal como para os
prebióticos, ainda não existem estudos controlados em pacientes caninos com IBD, pelo que
a sua utilidade está ainda por determinar.

Resumindo, para o caso de IBD de intestino delgado, estão recomendadas dietas altamente
digeríveis, hipoalergénicas, sem glúten, com baixo teor de lactose, baixo teor em gordura e
equilibrada em termos de electrólitos e vitaminas hidro- e lipossolúveis. (Chandler, 2002a;
Guilford & Matz, 2003; Marks, 2003a; Zoran, 2003). Em caso de envolvimento colónico está
recomendada a suplementação da dieta com fibras moderadamente fermentescíveis
(Chandler, 2002a; Guilford & Matz, 2003; Marks, 2003a; Zoran, 2003).

No Anexo 4 – Exemplo de Dieta Caseira para Cães Adultos com Diarreia Crónica -
encontra-se uma receita que pode ser utilizada para cães com enterite linfoplasmocítica.
Também se encontram disponíveis no mercado variadas rações comummente utilizadas na
terapia de pacientes com doença gastrointestinal, com novas fontes de proteína, como por
exemplo a Royal Canin Veterinary Diet: Sensitivity Control®, a Hill’s Prescription Diet
Canine: d/d® ou a Purina Veterinary Diet Canine Formula: DRM®, fontes de proteínas
hidrolisadas, como a Royal Canin Veterinary Diet: Hypoallergenic®, Hill’s Prescription Diet:
z/d low allergen® e z/d ultra® ou a Purina Veterinary Diet Canine Formula: HA®. Muitas
destas dietas conjugam vários dos princípios referidos anteriormente, como elevada
digestibilidade, baixo teor em gordura, inclusão de FOS e ácidos gordos ómega-3 ou mesmo
suplementação com fontes de TCM.

64
Enterite Linfoplasmocítica Canina

2.5.1.2 Protocolos Dietéticos


Uma vez escolhida a dieta para o animal, esta deve idealmente ser mantida por várias
semanas (pelo menos 3 semanas) como única terapia do animal, de modo a observar se a
introdução de uma dieta hipoalergénica ou com uma nova fonte de proteínas consegue
resolver os sinais clínicos. Se tal for o caso, após cerca de 3 semanas deve-se voltar a
introduzir a dieta anterior, de modo a comprovar a ocorrência de sensibilidade alimentar
(Chandler; 2002a; Sturgess, 2005). O grande problema com este tipo de provas é que os
proprietários dos pacientes geralmente não concordam com este tipo de provas, uma vez
que os seus animais estão clinicamente saudáveis e não desejam que voltem a apresentar
sinais clínicos de doença intestinal, preferindo continuar a alimentar a nova dieta. É
necessário salientar que alguns casos de enterite linfoplasmocítica idiopática ligeira
apresentam melhorias clínicas significativas apenas com a introdução da nova dieta, não
pela ocorrência de uma sensibilidade primária, mas sim possivelmente pelo papel que os
antigénios alimentares desempenham num quadro de inflamação intestinal e permeabilidade
intestinal aumentada como é o caso da IBD (Davenport et al., 2000; Hall & German, 2005;
Münster, Hörauf & Bilzer, 2006; Washabau & Holt, 2005). Devido a estes inconvenientes, é
por vezes difícil realizar a distinção entre uma sensibilidade alimentar e uma IBD idiopática.

Alguns autores advogam que o facto de alimentar uma nova dieta quando ainda se mantém
a inflamação intestinal pode levar a nova sensibilização, uma vez que a mucosa intestinal
continua alterada, com a permeabilidade aumentada e assim permitindo maior
sensibilização do sistema imune intestinal aos constituintes da nova dieta (Davenport et al.,
2000; Sturgess, 2005). Devido a este facto, alguns autores recomendam a alteração para
uma segunda dieta ao fim de algumas semanas, embora não existam estudos clínicos
validados que suportem este facto.

Outro dos pontos a focar é que embora a terapia dietética seja uma parte fundamental da
terapia de pacientes caninos com enterite (ou mesmo colite) linfoplasmocítica, apenas em
alguns casos ligeiros se consegue manter os animais clinicamente sãos apenas com a
introdução de uma nova dieta (Davenport et al., 2000; Hall & German, 2005; Washabau &
Holt, 2005). Na maioria dos casos, especialmente em caso de inflamação moderada a
severa, a terapia nutricional não é mais que um complemento (se bem que importante) à
terapia imunossupressora, considerada a base da terapia da enterite linfoplasmocítica
idiopática.

65
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

2.5.2 Maneio Médico

2.5.2.1 Antiparasitários
Os antiparasitários representam uma primeira linha de tratamento das afecções intestinais
crónicas, especialmente devido ao carácter intermitente da eliminação de formas
parasitárias fecais de alguns parasitas, especialmente Giardia sp. (Hall & German, 2005;
Tennant, 2005). Este parasita não é eliminado pelos antiparasitários convencionais, pelo
que está recomendada a realização de um tratamento com fenbendazol, a 50mg/kg PO
q24h, durante três dias, o que também se mostra eficaz contra alguns nemátodos e
céstodes (Allen et al., 1998; Tennant, 2005). Será a seguir a este tratamento, e se os sinais
clínicos não melhorarem, que se avançará para uma terapêutica dietética.

2.5.2.2 Antibióticos
Devido à problemática do diagnóstico de sobrecrescimento bacteriano e de enterites
bacterianas, devem-se também instituir terapêuticas antibióticas antes de avançar para
terapia imunossupressora. Porém, tal como referido anteriormente, existe alguma
sobreposição entre estas patologias e a IBD, uma vez que as alterações na mucosa
intestinal que se registam durante a patogénese da IBD favorecem o sobrecrescimento
bacteriano e absorção de antigénios pela mucosa, pelo que o registo de melhorias clínicas
não permite inferir sobre a presença ou ausência de IBD. Isto é especialmente verdadeiro
para os casos de infiltrações inflamatórias ligeiras, em que a remoção de um dos factores
contribuintes para a inflamação intestinal poderá resolver os sinais clínicos.

O metronidazol é classicamente um dos antibióticos mais utilizados para o controlo de


microrganismos intestinais, tanto em medicina veterinária como em medicina humana
(Friedman & Blumberg, 2005; Hall & German, 2005; Sturgess, 2005; Washabau & Holt,
2005). Este antimicrobiano é eficaz contra bactérias anaeróbias e alguns protozoários,
nomeadamente Giardia sp., o que torna esta molécula um excelente agente para o tracto
gastrointestinal (Allen et al., 1998; Hall & German, 2005; Tennant, 2005; Washabau & Holt,
2005; Webster, 2005). Em condições anaeróbias, o metronidazol é convertido em
metabolitos activos que provocam lesão do DNA e morte das células bacterianas (Tennant,
2005; Webster, 2005). Para além dos seus efeitos antibacterianos e antiprotozoários, o
metronidazol parece também exercer uma acção imunomoduladora, inibindo a imunidade
mediada por células e a adesão leucocitária endotelial, que tornam esta molécula o
antibiótico de eleição em casos de IBD (Allen et al., 1998; Hall & German, 2005; Tennant,
2005; Webster, 2005). O metronidazol é utilizado na dose de 15-25mg/kg PO q12h
(Tennant, 2005). Devido às suas propriedades imunomoduladoras, este fármaco é também
frequentemente utilizado em combinação com a terapia imunossupressora em casos
severos de IBD canina.

66
Enterite Linfoplasmocítica Canina

A tilosina é outro dos antibióticos que é frequentemente utilizado no tratamento de


alterações bacterianas intestinais. Este antibiótico inibe a síntese proteica bacteriana e
afecta a adesão bacteriana à parede intestinal, possuindo também alguns efeitos
imunomoduladores, que tornam esta molécula um eficaz agente na IBD canina (Allen et al.,
1998; Hall & German, 2005; Tennant, 2005; Westermarck et al., 2005). A dose recomendada
desta molécula é de 7-11mg/kg PO q6-8h, embora alguns autores advoguem doses mais
elevadas (Allen et al., 1998; Tennant, 2005; Westermark et al., 2005).

2.5.2.3 Imunossupressores
O tratamento com fármacos imunossupressores é uma das bases do tratamento da IBD,
mas devido ao facto de que muitos dos fármacos imunossupressores possuem vários
efeitos secundários indesejáveis, muitos autores preferem realizar uma terapêutica faseada,
tentando primeiro controlar a sintomatologia apenas com maneio dietético ou antibiótico.
Apenas nos casos mais severos se inicia uma terapêutica mais agressiva, com protocolos
combinados de maneio dietético, antibiótico e imunossupressor (German, 2005; Hall &
German, 2005; Münster et al., 2006). Mesmo dentro do tratamento imunossupressor, podem
ser realizados protocolos combinados com mais de uma droga, de maneira a diminuir a
ocorrência de efeitos secundários.

Os corticóides são o grupo de imunossupressores classicamente utilizados para o maneio


médico da IBD canina, sendo geralmente utilizadas a prednisona e prednisolona. Estes
fármacos são conhecidos pelos seus potentes efeitos anti-inflamatórios e
imunossupressores, dependendo da dose utilizada, sendo utilizadas para uma enorme
variedade de afecções em medicina veterinária. Utilizados em doses imunossupressoras,
estes agentes inibem a libertação de diversos mediadores inflamatórios, nomeadamente IL-
1, IL-2 e TNF-α, impedindo assim o desenvolvimento de uma resposta imune (Webster,
2005). Para este efeito, a prednisona e a prednisolona são utilizadas a uma dose de 1,0-
2,0mg/kg PO q12h até à remissão dos sintomas, sendo então de seguida realizada uma
diminuição lenta e gradual das doses ao longo de várias semanas (Hall & German, 2005;
Webster, 2005). Em casos severos de enterite linfoplasmocítica, os corticosteróides podem
ser administrados por via parenteral, uma vez que pode ocorrer diminuição da sua absorção
intestinal (Hall & German, 2005). Devido aos frequentes e por vezes graves efeitos
secundários, e à dificuldade em manter a remissão da doença apenas com baixas doses de
corticóides, são muitas vezes utilizadas associações entre corticóides e outros fármacos,
dos quais os mais comuns exemplos são a azatioprina e o metronidazol. Outro factor a ter
em conta é que estão reportados vários casos de cães com IBD cuja doença se revelou
refractária ao tratamento com corticóides, pelo que nestes casos é necessário investir em
outras opções terapêuticas (Allenspach et al., 2006c; Craven et al., 2004). Allenspach et al.

67
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

(2006b), explicam que esta refractariedade ao tratamento com corticóides se deve


provavelmente a um aumento da expressão de glicoproteína-P nos linfócitos presentes na
lâmina própria intestinal, uma vez que esta molécula é uma proteína transmembranária que
remove as moléculas de corticóide do interior da célula, negando assim o seu efeito
terapêutico. Os mesmos autores explicam ainda que tratamentos com prednisolona resultam
em aumentos na expressão de glicoproteína-P, o que poderá explicar o aparecimento de
refractariedades após um primeiro tratamento bem sucedido com corticóides.

A azatioprina é um fármaco imunossupressor que é muitas vezes utilizado em combinação


com corticóides, uma vez que a sua administração conjunta permite diminuir a dose de
corticóides e assim diminuir os seus efeitos secundários. Este agente é metabolizado no
organismo a ácido tioinosínico, um inibidor da síntese de ribonucleótidos de purina, e que é
responsável pela inibição das respostas imunes celulares e humorais e pela inibição do
crescimento celular (Allen et al., 1998; Friedman & Blumberg, 2005; Tennant, 2005;
Webster, 2005). Este fármaco é utilizado a 2mg/kg PO q24h até à remissão dos sintomas,
podendo então ser reduzida a dose para 0,5-2,0mg/kg PO q24h (Hall & German, 2005;
Tennant, 2005). É necessário ter em atenção que a azatioprina demora algumas semanas
até mostrar efeitos benéficos, pelo que a terapia com este fármaco não deve ser
descontinuada imediatamente após o início do tratamento, mesmo que não sejam visíveis
melhorias clínicas (Allen et al., 1998; Hall & German, 2005; Webster, 2005). A azatioprina
não está recomendada em felinos, e em cães o seu principal efeito secundário é a
ocorrência de mielossupressão, pelo que em caso de utilização deste fármaco, está
recomendada a monitorização periódica do hemograma (Allen et al., 1998; Tennant, 2005).

A ciclosporina é um fármaco imunossupressor utilizado frequentemente para a gestão de


casos de queratoconjuntivite seca e dermatite atópica em cães (Allen et al., 1998; Tennant,
2005). Actualmente, este fármaco tem também sido utilizado para o maneio de casos
refractários de IBD em humanos (Friedman & Blumberg, 2005). A ciclosporina actua através
da supressão de linfócitos T activados que infiltram a mucosa intestinal, inibindo a produção
de diversas citoquinas pro-inflamatórias, especialmente IL-2, que são responsáveis pelas
respostas imunes celulares (Allen et al., 1998; Friedman & Blumberg, 2005; Tennant, 2005;
Webster, 2005). Recentemente, Allenspach et al. (2006c), realizaram um estudo sobre a
farmacocinética e eficácia clínica da ciclosporina no tratamento de cães com IBD refractária
ao tratamento com esteróides, reportando uma eficácia em cerca de 80% dos casos. Neste
estudo, a ciclosporina foi utilizada a 5mg/kg PO q24h, durante pelo menos dez semanas, as
mesmas doses recomendadas na literatura (Allen et al., 1998; Tennant, 2005).

68
Enterite Linfoplasmocítica Canina

Recentemente, alguns fármacos prescritos para o maneio da IBD humana estão a ser
investigados para a sua utilização em cães. Um destes exemplos é o metotrexato, uma
molécula até recentemente apenas recomendada em medicina canina para o tratamento de
neoplasias, nomeadamente linfoma (Allen et al., 1998; Tennant, 2005; Yuki et al., 2006).
Este fármaco é um inibidor do ácido fólico, impedindo a utilização deste composto na
síntese de DNA e replicação celular, pensando-se também que possui um efeito anti-
inflamatório relacionado com a diminuição da produção de IL-1 (Friedman & Blumberg,
2005; Tennant, 2005; Yuki et al., 2006). Embora seja utilizado já há vários anos para o
maneio médico de casos de IBD em humanos, apenas recentemente foi publicado o
primeiro estudo sobre o efeito deste fármaco num cão com enterite linfoplasmocítica
refractária ao tratamento com prednisolona e ciclosporina, onde foi reportada a eficácia
desta molécula na remissão dos sintomas (Yuki et al., 2006). Neste estudo, o metotrexato foi
utilizado na dose de 0,6mg/kg IM cada 7 dias, num total de cinco administrações, mantendo-
se depois a remissão com baixas doses de prednisolona e azatioprina. Infelizmente, este
estudo apenas foi realizado num único cão, pelo que mais estudos são necessários para
garantir a eficácia e segurança deste composto no tratamento da IBD canina.

Outro dos fármacos que tem sido investigado em medicina veterinária é a budesonida, um
novo corticóide utilizado em medicina humana que quando administrado oralmente, permite
uma acção anti-inflamatória ou imunossupressora sobre o tracto gastrointestinal com poucos
efeitos secundários sistémicos, uma vez que é eliminada em cerca de 90% na primeira
passagem pelo fígado (Friedman & Blumberg, 2005; Stroup, Behrend, Kemppainen & Smith-
Carr, 2006; Tennant, 2005; Tumulty, Broussard, Steiner, Peterson & Williams, 2004). Porém,
os primeiros estudos em cães saudáveis e cães com IBD revelam que esta molécula
provoca supressão do eixo hipotálamo-hipófise-suprarrenais, pelo que a sua utilidade como
alternativa à terapia com corticóides convencionais em cães com IBD está ainda por
certificar (Stroup et al., 2006; Tumulty et al., 2004).

De qualquer das maneiras, e independentemente do protocolo terapêutico seleccionado, a


terapia médica da IBD pressupõe sempre uma redução progressiva das doses dos fármacos
utilizados a partir do momento em que é atingida a remissão dos sintomas. Em casos mais
ligeiros, é possível que se consiga eventualmente parar a administração destes fármacos,
mas os casos mais severos requerem provavelmente uma terapia a longo prazo, podendo,
no entanto, ser possível manter a remissão dos sintomas com doses mais baixas que as
utilizadas inicialmente (Hall & German, 2005; Willard, 2003).

69
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

2.5.2.4 Outros tratamentos


A desidratação é uma ocorrência comum em pacientes com enterite linfoplasmocítica,
essencialmente devido às perdas secundárias à diarreia e vómito, mas também devido a
diminuição da ingestão secundária a anorexia. É, portanto, essencial restabelecer o
equilíbrio hídrico dos pacientes realizando fluidoterapia. A escolha do fluído a utilizar
depende dos desequilíbrios electrolíticos que acompanhem a desidratação, sendo
geralmente utilizadas soluções de cloreto de sódio a 0,9% ou de lactato de ringer,
suplementadas com os devidos electrólitos, se necessário.

Um dos problemas frequentes com a alimentação de dietas em pacientes com enterite


linfoplasmocítica prende-se com o facto de que em casos mais severos, estes animais
muitas vezes apresentam anorexia parcial ou total, o que compromete a utilidade da
administração oral de dietas. Nestes casos, pode recorrer-se à colocação de um tubo de
alimentação entérico, e passar a administrar uma dieta líquida que satisfaça as
necessidades do paciente (Davenport et al., 2000; Guilford & Matz, 2003). O problema deste
método de alimentação prende-se com os pacientes que apresentam vómito e má absorção
severos, e nestes casos pode-se recorrer a uma outra opção, a administração de nutrientes
por via parenteral, podendo substituir parcial ou totalmente a alimentação oral ou entérica. A
nutrição por via parenteral consegue-se através da administração de soluções existentes no
mercado, realizando uma mistura de aminoácidos, gordura, dextrose, electrólitos e vitaminas
(Lane et al., 1999). Este tipo de alimentação é de grande utilidade, especialmente em casos
de debilitação grave ou de hipoproteinémia acentuada, uma vez que permite o rápido
restabelecimento dos índices nutricionais normais (especialmente de uma proteinémia
normal) e evita assim as consequências graves que por vezes se observam nos pacientes
com enteropatias com perda de proteínas, como é o caso dos edemas e ascite (Lane et al.,
1999). Outra das vantagens deste tipo de nutrição é que permite o descanso da mucosa
intestinal, diminuindo o contacto com partículas alimentares e, consequentemente,
diminuindo o número de bactérias no intestino, o que permite ao intestino regenerar-se
(Lane et al., 1999). Porém, se não forem administrados alimentos por via oral (nutrição
parenteral total) pode ocorrer atrofia da mucosa intestinal, pelo que nestes casos pode-se
continuar a fornecer algum alimento por meio de um tubo entérico ou suplementar a solução
parenteral com glutamina e ácidos gordos de cadeia curta (fonte de energia para os
enterócitos e colonócitos) para evitar esta atrofia (Davenport et al., 2000; Guilford & Matz,
2003; Lane et al., 1999). Outro dos problemas da nutrição parenteral prende-se com os seus
custos elevados, o que a torna proibitiva em muitos casos.

Como referido anteriormente, por vezes observam-se deficiências vitamínicas em pacientes


com doença intestinal, nomeadamente deficiência em cobalamina, pelo que nestes casos

70
Enterite Linfoplasmocítica Canina

devem-se corrigir os défices desta vitamina através da sua administração parenteral, a 250-
800µg IM ou SC semanalmente durante 6 semanas, depois a cada duas semanas durante 6
semanas e por fim uma última dose um mês depois (Steiner, 2005a). Uma outra forma de
regular a administração será até os sinais clínicos resolverem-se e as concentrações séricas
de cobalamina estabilizarem-se num valor normal.

O vómito é um dos sinais clínicos mais frequentes em cães com enterite linfoplasmocítica,
podendo representar a ocorrência de gastrite crónica antral secundária a enterite
linfoplasmocítica. De uma forma geral, nestes casos está aconselhada a administração de
fármacos anti-ácidos, antagonistas dos receptores H2, cimetidina (5-10mg/kg IV, IM ou PO
q6-8h) ou ranitidina (2mg/kg IV, SC ou PO q8-12h), ou inibidores das bombas de protões,
como o omeprazol (0,5-1,5mg/kg IV ou PO q12h), especialmente se houver evidência de
erosão/ulceração gástrica (Simpson, 2005b; Sturgess, 2005; Tennant, 2005). Estes
fármacos actuam por mecanismos diferentes, mas ambas as classes resultam na diminuição
da secreção de ácido clorídrico pelas células da mucosa gástrica (Tennant, 2005). Dado que
pode ser necessário um tratamento prolongado com estes agentes, será provavelmente
mais prático optar pelas formulações para administração oral. Se for utilizado o omeprazol
como fármaco de escolha, a terapia deverá ter uma duração máxima de oito semanas, uma
vez que a administração crónica deste fármaco está associada a hiperplasia e hipertrofia da
mucosa gástrica e formação de carcinomas (Tennant, 2005). Também se deverá tomar
atenção com a administração destes fármacos no sentido que ao diminuirem a produção de
ácido gástrico provocam aumento do pH, o que poderá predispor ao desenvolvimento de
sobrecrescimento bacteriano (Webster, 2005). Outros fármacos possíveis de serem
utilizados são os protectores da mucosa gástrica, tais como o sucralfato, a 0,5-1g/cão PO
q6-8h (Sturgess 2005, Tennant 2005). Este fármaco deverá ser administrado pelo menos
uma hora antes das refeições.

Em caso de envolvimento colónico, existem alguns fármacos que possuem grande utilidade
no maneio médico de colite linfoplasmocítica canina. Alguns destes fármacos são utilizados
igualmente no tratamento de enterite linfoplasmocítica, como é o caso dos corticóides,
azatioprina, ciclosporina ou mesmo antibióticos. Um dos fármacos mais utilizados no maneio
médico de colite é a sulfasalazina, um inibidor de sintetases de prostaglandinas que é
constituído por duas moléculas, uma de 5-aminosalicilato (mesalamina) e outra de
sulfapiridina, unidas por uma ligação azo (Tennant; 2005; Washabau & Holt, 2005; Webster,
2005). Embora parte deste complexo seja absorvida no intestino delgado, a grande parte
atinge o cólon, onde é clivada por acção bacteriana, libertando as duas moléculas referidas.
O 5-aminosalicilato é a porção que possui efeitos terapêuticos, inibindo a cicloxigenase
presente na mucosa colónica e impedindo assim a cascata inflamatória. A dose

71
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

recomendada é de 15-30mg/kg PO q8h até à resolução dos sintomas, após o qual se pode
reduzir gradualmente a dose e tentar manter a remissão apenas com terapia dietética
(Tennant, 2005; Washabau & Holt, 2005). Em alternativa existe ainda uma outra molécula, a
olsalazina, composta por duas moléculas de 5-aminosalicilato, que é também clivada por
bactérias colónicas mas é minimamente absorvida no intestino delgado (Tennant, 2005;
Washabau & Holt, 2005). As doses recomendadas são de 10-20mg/kg PO q12h (Tennant,
2005).

Em casos severos ou refractários de colite linfoplasmocítica, tal como os casos de enterite


linfoplasmocítica, podem realizar-se protocolos combinados, por exemplo adicionando
antibióticos como o metronidazol ou a tilosina à terapêutica anti-
inflamatória/imunossupressora (Hall & German, 2005; Willard, 2003). Outro dos fármacos
que pode ser utilizado é a loperamida, um derivado opiáceo sem efeitos analgésicos, que
diminui as contracções propulsivas intestinais e aumenta as contracções segmentares,
aumentando também a absorção de água e electrólitos (Tennant, 2005; Washabau & Holt,
2005). É utilizada na dose de 0,05-0,1mg/kg PO q6-8h (Tennant, 2005).

2.5.2.5 Novos tratamentos para a IBD


Devido à problemática da IBD em humanos, estão constantemente a surgir novas moléculas
possíveis de serem utilizadas para atingir a remissão da doença e com o aparecimento de
menos efeitos secundários indesejáveis. A maior parte destes fármacos são novos
imunossupressores e anti-inflamatórios (por exemplo, micofenolato, talidomida,
oxpentifilina), embora existam também novos tratamentos baseados na utilização de
anticorpos monoclonais contra citoquinas-chave do processo inflamatório intestinal, como é
o caso dos Ac anti-TNF-α, Ac anti-IL-2 ou IL-12, ou mesmo na administração de citoquinas
(por exemplo, IL-10), de modo a modular a resposta inflamatória e evitar o
desencadeamento e perpetuação de uma resposta imune celular (German, 2006; Hall &
German, 2005). Com a recente descoberta do papel do NF-κB na imunopatogénese da IBD
em humanos, o aparecimento de fármacos que inibam a expressão deste factor poderão ter
um papel importante no futuro do tratamento da IBD. Porém, por enquanto, a grande maioria
destes fármacos ainda se encontra numa fase experimental em medicina humana, pelo que
a sua utilização em medicina veterinária ainda terá que esperar.

2.6 RESPOSTA AO TRATAMENTO E PROGNÓSTICO

A resposta ao tratamento e o prognóstico são dos elementos da IBD canina a que os


proprietários dão maior importância, visto que esta afecção é uma doença crónica e que, na
maior parte dos casos, requer tratamento por vários anos, se não mesmo para o resto da

72
Enterite Linfoplasmocítica Canina

vida do animal. O prognóstico dos pacientes caninos com IBD varia com a severidade da
doença, podendo ser observada em casos ligeiros remissão completa e a remoção do
tratamento, embora seja muito frequente a observação de recaídas mesmo quando
instituída uma terapia correcta ou mesmo a ocorrência de refractariedade ao tratamento,
especialmente em casos severos (Hall & German, 2005; Tams, 2003). Por este motivo,
diversos estudos focando diferentes marcadores de resposta ao tratamento e prognóstico
têm sido realizados, de modo a permitirem a monitorização e ajuste do tratamento.
Recentemente, foi construído um índice de actividade clínica (ou seja, um índice de
severidade da doença), na tentativa de proporcionar uma forma rápida e pouco dispendiosa
de avaliar o estado clínico dos pacientes com IBD, tanto na primeira consulta como nas
consultas de acompanhamento do paciente.

2.6.1 Canine Inflammatory Bowel Disease Activity Index


O Canine Inflammatory Bowel Disease Activity Index (CIBDAI) é um índice de severidade da
doença proposto por Jergens et al. (2003), composto por seis variáveis/sinais clínicos
(atitude/actividade, apetite, vómito, consistência das fezes, frequência de defecação e perda
de peso), as quais se classificam de 0 a 3 consoante a sua gravidade clínica. Uma descrição
mais pormenorizada da classificação dos diferentes sinais clínicos encontra-se no Anexo 5.
Após a classificação de cada variável, procede-se à soma das pontuações obtidas, obtendo-
se assim uma estimativa da gravidade clínica da doença (doença insignificante, doença
ligeira, doença moderada e doença severa). A Figura 2 resume este processo.

Figura 2 – Critérios para obtenção do CIBDAI (adaptado de Jergens et al., 2003, p.292, tradução livre)
A. Atitude/Actividade Classificadas de 0-3:
B. Apetite
C. Vómito 0 = Normal
D. Consistência das fezes 1 = Alteração ligeira
E. Frequência de defecação 2 = Alteração moderada
F. Perda de peso 3 = Alteração severa

Soma das 6 variáveis

Pontuação cumulativa total do CIBDAI


0-3 4-5 6-8 ≥9
Doença clinicamente IBD ligeira IBD moderada IBD severa
insignificante

Este índice permite assim obter uma estimativa fácil, rápida e pouco dispendiosa da
gravidade clínica da doença de cada vez que o animal é observado na consulta (antes,

73
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

durante e após o tratamento), sem recorrer a outros exames mais complicados e


dispendiosos (por exemplo, histopatologia), permitindo assim uma avaliação do prognóstico
e da resposta ao tratamento (Jergens et al., 2003). Contudo, é preciso referir que esta
avaliação baseia-se em caracteres subjectivos avaliados pelos proprietários, pelo que será
normal a ocorrência de alguma dificuldade na avaliação correcta da gravidade de cada sinal
clínico, e nem todos os cães apresentam a mesma graduação em todos os sinais clínicos
avaliados, o que poderá influenciar os resultados. Outro factor negativo é que a ocorrência
de complicações secundárias à IBD que afectam o TGI irão influenciar a gravidade dos
sinais clínicos avaliados, induzindo em erro. Devido a esta subjectividade, os autores deste
estudo referem que para complementar a informação fornecida pelo cálculo deste índice,
pode ainda ser quantificado um marcador de inflamação, a proteína C-reactiva (C-Reactive
Protein - CRP). Este marcador demonstrou uma boa correlação com a pontuação do CIBDAI
em cães com doença clínica, estando aumentado em pacientes com doença clínica,
especialmente com doença considerada grave pelo cálculo do CIBDAI e diminuindo
juntamente com a pontuação do CIBDAI após o tratamento dos casos estudados (Jergens et
al., 2003). É, no entanto, necessário salientar que a CRP é uma proteína de fase aguda,
produzida no curso de variadas afecções inflamatórias e infecciosas, pelo que não é um
marcador específico para a IBD, sendo necessário excluir todas as outras causas
conhecidas de inflamação para este marcador ter utilidade clínica (Jergens et al., 2003;
Jergens, 2004). Os autores deste estudo referem ainda que as pontuações do CIBDAI nos
cães avaliados apresentaram uma elevada correlação com a graduação histológica
(esquema de graduação anterior à publicação de Day et al., 2008) das amostras intestinais
colhidas para biopsia anteriormente ao tratamento, o que indica o elevado valor deste
índice. No entanto, outro estudo recente comparou os resultados do CIBDAI com a
graduação histológica obtida, reportando ausência de qualquer correlação entre os dois
(McCann, Ridyard, Else & Simpson, 2007). Poderá ser que a ausência de um esquema
padronizado de avaliação histológica de amostras de mucosa entre estes estudos poderá
levar a diferenças significantes, pelo que novos estudos utilizando o esquema proposto por
Day et al. (2008) são necessários para tirar mais conclusões.

Recentemente, foi realizado por García-Sancho et al. (2007) um estudo em cães com
enterite linfoplasmocítica, onde os autores introduziram algumas alterações ao CIBDAI
criado por Jergens et al. (2003), nomeadamente a introdução de 3 novas variáveis, como
dor abdominal, flatulência e diminuição ou aumento do apetite. Esta última variável foi
apenas alterada, uma vez que o índice proposto por Jergens et al. (2003) apenas
considerava diminuição do apetite e não o seu aumento, que pode também ocorrer em
casos de IBD. Este estudo reportou assim resultados semelhantes aos de Jergens et al.
(2003), observando uma diminuição da pontuação do índice ao longo do tratamento (e,

74
Enterite Linfoplasmocítica Canina

subsequentemente, uma diminuição na gravidade dos sinais clínicos). Outro estudo


envolvendo o CIBDAI reportou que embora este índice seja útil, podem ocorrer
interpretações erradas, pelo que a associação dos resultados deste índice com a graduação
histológica e a quantificação da albumina sérica será uma melhor alternativa e permitirá
obter melhores estimativas da gravidade da doença ou da resposta ao tratamento (Münster
et al., 2006).

2.6.2 Outros Marcadores de Resposta ao Tratamento e Prognóstico


Diversos marcadores de resposta ao tratamento e prognóstico têm sido avaliados em cães
com IBD, de modo a fornecerem uma estimativa da inflamação intestinal, uma vez que
raramente se consegue o consentimento dos proprietários para a realização de uma nova
laparotomia ou endoscopia após o início do tratamento. Esta investigação de diferentes
marcadores têm-se revelado de grande utilidade, uma vez que alguns estudos recentes
reportam a resolução das lesões endoscópicas juntamente com a permanência de lesões
microscópicas de inflamação intestinal, mesmo quando a terapêutica é bem sucedida e os
animais apresentam melhoria dos sinais clínicos iniciais (Allenspach et al., 2006c; García-
Sancho et al., 2007). Esta diferença pode dever-se ao facto de que as lesões microscópicas
necessitam de mais tempo para se resolverem do que as lesões macroscópicas, tornando-
se assim difícil utilizar estas lesões como marcadores fiáveis de inflamação intestinal após o
início do tratamento.

A CRP sérica, uma proteína sintetizada no organismo em caso de inflamação, é um dos


marcadores mais frequentemente referidos em estudos de cães com IBD. Jergens et al.
(2003) referem uma correlação entre as medições da CRP e o CIBDAI, estando aumentadas
antes do tratamento e diminuindo ao longo do curso deste. Contudo, estudos recentes sobre
o valor de diferentes marcadores de prognóstico reportaram que esta proteína não se
encontrava correlacionada nem com a pontuação do CIBDAI nem com os resultados de
avaliação histológica de amostras de mucosa intestinal (esquema de graduação proposto
pelos autores) (Allenspach, Wieland, Gröne & Gaschen, 2007a; McCann et al., 2007).
McCann et al. (2007) referem ainda no seu estudo que a medição do TNF-α sérico e de
microalbuminúria revelaram não serem bons indicadores de doença intestinal, uma vez que
o TNF-α não se encontrava aumentado em nenhum dos cães avaliados e apenas cerca de
13% dos animais afectados revelou microalbuminúria.

Um estudo recente por Ohno et al. (2006) investigou diferentes marcadores de prognóstico
em cães com enterite linfoplasmocítica, comparando diversos achados clínicos e
laboratoriais entre um grupo de cães sobreviventes e outro grupo de cães que não
sobreviveram mesmo com a realização do tratamento. Os autores concluíram que a

75
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

ocorrência de anorexia, hipoproteinémia e uma baixa resposta inicial ao tratamento são


indicadores de mau prognóstico em cães com enterite linfoplasmocítica. Allenspach et al.
(2007a) publicaram recentemente um estudo prospectivo sobre factores de risco para mau
prognóstico em 70 cães com enteropatias crónicas. Os autores reportaram que cães mais
velhos com doença de intestino delgado precisam provavelmente de terapia
imunossupressora, enquanto que cães novos com sinais de intestino grosso respondem
muitas vezes apenas com terapia nutricional. Também a gravidade das lesões duodenais à
endoscopia se encontrava associada a mau prognóstico neste estudo, enquanto que as
lesões histológicas não se encontraram correlacionadas com o prognóstico, o que poderá
em parte advir da ocorrência de subjectividade na classificação histológica dos exemplares
de biopsia ou poderá querer dizer que serão outros factores que influenciam a resposta ao
tratamento e prognóstico que não a gravidade histológica das lesões intestinais. Tal como
no estudo por Ohno et al. (2006), também Allenspach et al. (2007a) reportam uma
associação entre a ocorrência de hipoalbuminémia e mau prognóstico, chegando mesmo a
propor a inclusão deste parâmetro como um dos critérios para cálculo do CIBDAI.
Allenspach et al. (2007a) reportam ainda a existência de uma associação entre níveis
séricos de cobalamina diminuídos e mau prognóstico, pelo que este parâmetro poderá
indicar refractariedade ao tratamento. Outro estudo recente, realizado por Kathrani et al.
(2007), reporta que a ocorrência de pancreatite crónica em cães com IBD está associada a
mau prognóstico, especialmente porque a pancreatite crónica, devido ao seu carácter
subclínico em muitos casos, é uma patologia difícil de diagnosticar.

Como referido anteriormente, a presença de nitrito em lavados colónicos poderá também ser
um indicador útil de inflamação da mucosa colónica e de resposta ao tratamento, mas por
enquanto são necessários mais estudos para avaliar a utilidade deste marcador na IBD
canina (Gunawardana et al., 1997). Como referido anteriormente, alguns autores reportam
que os testes de absorção e permeabilidade podem ser utilizados como marcadores da
função e estrutura intestinais, enquanto outros autores referem que estes testes não se
encontram correlacionados nem com a gravidade clínica nem com a gravidade histológica
em casos de cães com enterite linfoplasmocítica, pelo que mais testes são necessário para
avaliar a utilidade destes testes (Allenspach et al., 2005; Allenspach et al., 2006a; Kobayashi
et al., 2007b; Rutgers et al., 1996). Luckschander et al. (2006b) publicaram recentemente os
resultados de um estudo sobre a utilização de pANCAs na monitorização do tratamento em
cães com IBD, reportando que este marcador não se encontra associado com as
pontuações do CIBDAI antes e após o tratamento nem com a severidade das lesões
endoscópicas e histológicas encontradas, pelo que a sua utilização na monitorização destes
pacientes é relativamente baixa.

76
Enterite Linfoplasmocítica Canina

3. CASOS CLÍNICOS

Nesta secção da dissertação são apresentados 4 casos clínicos de enterite linfoplasmocítica


presenciados pelo autor no decurso do estágio, seguido de uma discussão dos mesmos.

3.1 CASO CLÍNICO 1 – Benny


Benny, um cão macho de 1 ano de idade, de raça Pastor Alemão, com 20kg de peso vivo,
apresentou-se ao serviço de consultas de gastroenterologia do hospital escolar da École
Nationale Vétérinaire d’Alfort devido a uma história de diarreia crónica desde os 6 meses de
idade. O proprietário referiu também que para além da história de diarreia líquida, o animal
apresentava também diminuição do apetite, aumento da ingestão de água e vómito
ocasional (1 vez ao mês). O paciente apresentava as suas vacinações em dia e era
desparasitado regularmente com um antihelmíntico de largo espectro (exfendazole). A sua
alimentação consistia numa ração comercial disponível em supermercados. O exame clínico
não revelou qualquer alteração para além da perda de peso acentuada. Devido à diarreia
líquida crónica e perda de peso acentuada, as suspeitas clínicas recaíram sobre uma
enteropatia grave ou neoplasia intestinal. O proprietário demonstrou algumas reservas
relativamente à realização de uma investigação diagnóstica exaustiva, optando por começar
pelas análises básicas, hemograma (Tabela 2), bioquímicas séricas (Tabela 3) e urianálise,
consentindo também a medição do cTLI, folato e cobalamina séricos (Tabela 4).

Tabela 2 – Resultados do hemograma (Benny)

Parâmetros Resultados Unidades Valores de Referência


Hematócrito 0,50 L/L 0,37-0,54
Eritrócitos 7,2 1012/L 6-9
Hemoglobina 16,1 g/L 12-18
VCM 70,1 fL 60-77
CHCM 31,9 g/dL 31-35
HCM 22,2 pg/L 19-25
Reticulócitos 28,3 103/µL < 150
Leucócitos 25,2 109/L 6-17
Neutrófilos 87 % 60-79
Eosinófilos 1 % 2-10
Basófilos 0 % 0-1
Linfócitos 10 % 12-30
Monócitos 2 % 3-9
Plaquetas 358 109/L 200-600
Esfregaço sanguíneo: sem alterações

77
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

Tabela 3 – Resultados das bioquímicas séricas (Benny)

Parâmetros Resultados Unidades Valores de Referência


Albumina 19 g/L 32-47
Proteínas Totais 46 g/L 53-77
Globulinas 27 g/L 21-30
Glucose 0,9 g/L 0,6-1
Ureia 0,27 g/L 0,15-0,4
Creatinina 7.4 mg/L 3-13
ALT 77 UI/L 15-90
FA 44 UI/L 0-50

O hemograma não revelou grandes alterações exceptuando uma leucocitose por neutrofilia
sem desvio à esquerda, possivelmente associada a stress ou doença inflamatória crónica.
Já as bioquímicas séricas revelaram uma hipoproteinémia secundária a hipoalbuminémia.
Esta pode geralmente ser atribuída a causas hepáticas (diminuição da produção de
proteínas), renais ou gastrointestinais (perda de proteínas). Dada a ausência de sinais de
envolvimento hepático, excluiu-se à partida este órgão como o responsável pela
hipoalbuminémia. A urianálise não revelou quaisquer alterações, e não foi detectada
proteinúria através do teste do ácido sulfosalicílico, podendo-se assim eliminar causas
renais de hipoalbuminémia. A realização de exames imagiológicos (radiografia e
ultrasonografia) foi recusada pelo proprietário quando informado de que estes exames
poderiam não auxiliar ao diagnóstico. Com base nos resultados destes exames,
especialmente a hipoproteinémia (hipoalbuminémia), e na ausência de indícios de doença
hepática ou renal, a suspeita clínica recaiu sobre uma possível enteropatia.

Tabela 4 – Resultados do cTLI, folato e cobalamina séricos (Benny)

Parâmetros Resultados Unidades Valores de Referência


cTLI 10,9 µg/L 5-35
Folato 5,9 ng/mL 7-17
Cobalamina 125 pg/mL 225-860

Dado o resultado do cTLI, pode-se excluir IPE como a causa do quadro clínico, e a
diminuição da concentração sérica do folato e cobalamina indica a ocorrência de uma
doença intestinal difusa, que afecte o jejuno e íleo. Dada a perda de peso marcada e a
hipoalbuminémia, optou-se por iniciar o tratamento imediatamente e realizar uma
endoscopia com biopsia após uma melhoria clínica do paciente, ficando marcada para 1
mês depois. Iniciou-se então um protocolo combinado de prednisolona, 1mg/kg PO q12h
durante 2 semanas, depois 0,5mg/kg PO q12h durante 1 semana, seguido de 0,5mg/kg PO
q24h durante 1 semana e por fim, 0,5mg/kg PO q48h durante uma semana (com a
possibilidade de alterar o protocolo dependendo da resposta do paciente); metronidazol
(Flagyl®), 17,5mg/kg PO q12h durante 1 mês; diosmectita (Smecta®) (silicato de alumínio e
magnésio), uma saqueta de 3g q12h durante 3 semanas, 30 minutos antes das refeições;
omeprazol, 1 cápsula de 10mg PO q12h durante 1 mês, parando no dia anterior à biopsia;

78
Enterite Linfoplasmocítica Canina

cobalamina, 500µg SC, 1 vez por semana e dieta caseira à base de arroz cozido e borrego,
adicionada de 1 colher de sopa de azeite.

Uma semana depois, o Benny regressou à consulta de gastroenterologia, apresentando


notáveis melhorias, nomeadamente ausência de diarreia e apetite normal. Decidiu-se
continuar o protocolo terapêutico como estipulado até ao dia da biopsia. Três semanas
depois, o Benny regressou ao serviço de gastroenterologia para uma consulta de
acompanhamento e realização da endoscopia. Continuava sem diarreia e tinha já ganho
algum peso. A anestesia foi induzida através de uma combinação de propofol e diazepam,
sendo seguidamente mantida com isoflurano. À gastroduodenoscopia não foram observadas
lesões ao nível do esófago, e a mucosa gástrica também não apresentava lesões visíveis,
com excepção de um esbranquiçamento da região pilórica. O duodeno apresentava-se
moderadamente eritematoso e friável. Por seu lado, a colonoscopia revelou inflamação
ligeira da mucosa colónica proximal. Foram recolhidas amostras de mucosa gástrica,
duodenal e cólica para biopsia. Com base nos sinais de inflamação observados à
endoscopia, optou-se por continuar o tratamento (metronidazol, diosmectita, omeprazol,
cobalamina e dieta caseira), continuando a prednisolona a 0,5mg/kg PO q48h.

Cerca de uma semana mais tarde, o Benny regressou novamente à consulta devido a um
agravamento do quadro clínico, apresentando-se abatido e novamente com diarreia líquida.
Os resultados do exame histopatológico revelaram a presença de uma infiltração
inflamatória de gravidade moderada na mucosa duodenal, constituído por linfócitos,
plasmócitos e raros eosinófilos. Ao nível da mucosa colónica foi também observada
infiltração por linfócitos e plasmócitos, embora em menor número que no duodeno. Não
foram detectadas alterações ao nível do estômago. A conclusão do exame histopatológico
foi assim uma enterite linfoplasmocítica moderada, acompanhada de colite linfoplasmocítica
ligeira. Com base nestes resultados, decidiu-se então voltar a aumentar a dose de
prednisolona para 1mg/kg PO q12h durante 2 semanas, realizando o mesmo protocolo para
desmame dos corticóides que referido anteriormente. Decidiu-se também alterar a
alimentação para Royal Canin Veterinary Diet: Hypoallergenic®.

Cerca de um mês depois o Benny regressou à consulta para avaliar a progressão do


tratamento. Embora as fezes continuassem moles, tinha deixado de apresentar diarreia.
Decidiu-se então continuar o tratamento, mantendo a prednisolona a 0,5mg/kg PO q24h
durante mais algumas semanas, antes de tentar remover completamente os corticóides.

79
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

3.2 CASO CLÍNICO 2 – Riack


Riack, um cão macho de raça Rottweiller com 7 anos de idade e 57kg de peso vivo,
apresentou-se ao serviço de urgências do hospital escolar da École Nationale Vétérinaire
d’Alfort com uma história de diarreia crónica (líquida, clara, sem sangue, por vezes mucosa,
2-3 vezes ao dia) desde há 1,5 anos. O Riack tem sido seguido desde então no seu
veterinário assistente, que realizou tratamentos com diosmectita (Smecta®) e uma
associação de neomicina, sulfaguanidina e atropina (Enterotab®), que resultaram em
melhorias clínicas durante cerca de uma semana mas que acabam por resultar em novas
recaídas. A proprietária referiu ainda que durante os episódios de diarreia aumentava a
ingestão de água e a quantidade de urina produzida, mas sem ocorrência de vómitos ou
alterações do apetite. O paciente não apresentava historial clínico de relevância,
exceptuando uma castração dois anos antes devido a problemas prostáticos e uma história
de eritrocitose, polipneia e glutamato-oxaloacetato transaminase sérica aumentada desde
há 2-3 anos.

Ao exame físico o Riack mostrava-se em boa condição geral, apenas se destacando um


ligeiro abatimento, polipneia e uma palpação abdominal tensa e dolorosa, não se
identificando, no entanto, qualquer massa ou corpo estranho. Foi também realizada
palpação rectal, sem nada a destacar. A poliúria/polidipsia (PU/PD) reportada pela
proprietária foi considerada uma consequência da perda de fluidos pela diarreia, pelo que foi
apenas inicialmente considerado como problema a diarreia crónica, considerada como uma
mistura entre diarreia de intestino delgado e de intestino grosso. A investigação diagnóstica
foi iniciada com a realização de um hemograma (Tabela 5), bioquímicas séricas (Tabela 6),
ionograma (Tabela 7) e urianálise.

Tabela 5 – Resultados do hemograma (Riack)

Parâmetros Resultados Unidades Valores de Referência


Hematócrito 0,67 L/L 0,37-0,54
Eritrócitos 9,8 1012/L 6-9
Hemoglobina 20,1 g/L 12-18
VCM 66 fL 60-77
CHCM 30,9 g/dL 31-35
HCM 20,5 pg/L 19-25
Reticulócitos 63 103/µL < 150
Leucócitos 17 109/L 6-17
Neutrófilos 75,3 % 60-79
Eosinófilos 5 % 2-10
Basófilos 0 % 0-1
Linfócitos 12,8 % 12-30
Monócitos 6,9 % 3-9
Plaquetas 600 109/L 200-600
Esfregaço sanguíneo: sem alterações

80
Enterite Linfoplasmocítica Canina

Tabela 6 – Resultados das bioquímicas séricas (Riack)

Parâmetros Resultados Unidades Valores de Referência


Albumina 20 g/L 32-47
Proteínas Totais 43 g/L 53-77
Globulinas 23 g/L 21-30
Glucose 1,11 g/L 0,6-1
Ureia 0,3 g/L 0,15-0,4
Creatinina 7 mg/L 3-13
ALT 44 UI/L 15-90
FA 75 UI/L 0-50

Tabela 7 – Resultados do ionograma (Riack)

Parâmetros Resultados Unidades Valores de Referência


Na+ 151 mEq/L 140-155
K+ 3,9 mEq/L 3,6-5,8
Mg2+ 1,87 mEq/L 1,8-2,4
Ca2+ 1,19 mEq/L 2,35-2,93

O hemograma apresentou apenas eritrocitose, o que coincidiu com o historial prévio do


animal. Já a nível das bioquímicas séricas observou-se apenas uma hipoalbuminémia
marcada, não se encontrando indícios de doença hepática ou renal. A hipocalcémia
registada foi considerada secundária à hipoalbuminémia. A urianálise revelou uma
densidade urinária normal, o que contrastou com a PU/PD reportada pela proprietária.
Foram também observados indícios de proteinúria e sangue na urina, porém, o teste do
ácido sulfosalicílico não revelou a presença de proteínas. Com base nos resultados dos
testes efectuados, decidiu-se internar o paciente e aguardar por uma consulta de
gastroenterologia, marcada para três dias depois. Simultaneamente, decidiu-se realizar uma
terapêutica até à consulta de gastroenterologia com loperamida, 1 cápsula de 2mg PO q8h,
e diosmectita (Smecta®), 1 saqueta de 3g PO q8h, 30 minutos antes das refeições, que
passaram a 3 por dia.

Três dias depois, o Riack apresentou-se à consulta de gastroenterologia, tendo-se decidido


realizar novamente hemograma (Tabela 8), ionograma (Tabela 9) e algumas bioquímicas
séricas (Tabela 10), uma vez que os aparelhos do laboratório do hospital escolar eram mais
recentes e fiáveis que os aparelhos encontrados no serviço de urgências. Simultaneamente,
decidiu-se também realizar a medição do cTLI, folato e cobalamina séricos (Tabela 11), bem
como realizar um exame coprológico.

81
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

Tabela 8 – Resultados do segundo hemograma (Riack)

Parâmetros Resultados Unidades Valores de Referência


Hematócrito 0,58 L/L 0,37-0,54
Eritrócitos 7,8 1012/L 6-9
Hemoglobina 19 g/L 12-18
VCM 74 fL 60-77
CHCM 33 g/dL 31-35
HCM 24 pg/L 19-25
Reticulócitos 70,2 103/µL < 150
Leucócitos 18,1 109/L 6-17
Neutrófilos 67 % 60-79
Eosinófilos 7 % 2-10
Basófilos 0 % 0-1
Linfócitos 21 % 12-30
Monócitos 5 % 3-9
Plaquetas 493 109/L 200-600
Esfregaço sanguíneo: sem alterações

Tabela 9 – Resultados do segundo ionograma (Riack)

Parâmetros Resultados Unidades Valores de Referência


Na+ 144 mEq/L 140-155
K+ 5,3 mEq/L 3,6-5,8
Cl- 114 mEq/L 93-113
Ca2+ 2,44 mEq/L 2,35-2,93
Fósforo 45 mg/L 21-63
CO2 20 mEq/L 17-24

Tabela 10 – Resultados das segundas bioquímicas séricas (Riack)

Parâmetros Resultados Unidades Valores de Referência


Albumina 20 g/L 32-47
Proteínas Totais 43 g/L 53-77
Globulinas 23 g/L 21-30
Colesterol 1,03 g/L 1-2,65

Tabela 11 – Resultados do cTLI, folato e cobalamina séricos (Riack)

Parâmetros Resultados Unidades Valores de Referência


cTLI 29,4 µg/L 5-35
Folato 11,6 ng/mL 7-17
Cobalamina 205 pg/mL 225-860

Como se pode observar pelos resultados do hemograma, embora ainda se registasse uma
eritrocitose, esta era bastante mais moderada que a encontrada na primeira colheita de
sangue. Já as bioquímicas séricas revelaram apenas adicionalmente uma colesterolémia
baixa. Já o resultado do cTLI permitiu excluir uma IPE como causa do quadro clínico, e a
diminuição da concentração sérica de cobalamina observada era compatível com uma
patologia ileal. Ao exame coprológico não foram detectadas formas parasitárias. Foi então
proposta a realização de exames radiográficos ao tórax para avaliar uma possível causa
para a polipneia crónica que o paciente apresentava (Figura 3), aos quais a proprietária
concordou.

82
Enterite Linfoplasmocítica Canina

Figura 3 – A. Radiografia torácica (vista lateral); B. Radiografia torácica (vista ventro-dorsal).

A B

Analisando as imagens radiográficas, observa-se uma opacificação broncointersticial


marcada, compatível com um processo infeccioso, parasitário ou alérgico, problema que se
decidiu explorar em uma outra ocasião. Seguidamente, foi realizado um exame
ultrasonográfico abdominal, especialmente para avaliar as estruturas hepáticas e
abdominais, órgãos suspeitos de serem a causa da hipoalbuminémia. Foi assim observado
um espessamento difuso da parede do intestino delgado (espessuras até 5,4mm) sem perda
da diferenciação entre as diferentes camadas, compatível com uma infiltração inflamatória
ou mesmo neoplásica da parede intestinal (Figura 4A). Surpreendentemente, foram também
observados 2 nódulos hipoecogénicos no baço, não específicos, compatíveis com
metaplasia, hiperplasia, necrose ou mesmo neoplasia (Figura 4B). Não foram, no entanto,
observadas quaisquer alterações a nível dos restantes órgãos abdominais, incluindo fígado
e cólon.

Figura 4 – A. Espessamento da parede do intestino delgado; B. Nódulo hipoecogénico no baço.

A B

Com base nos achados das análises séricas e do espessamento observado à endoscopia,
decidiu-se prosseguir a investigação diagnóstica com a realização de uma endoscopia,
marcada para uma semana depois. Entretanto, instituiu-se uma terapêutica com
cobalamina, 500µg SC, 1 vez por semana, juntamente com metronidazol (Flagyl®), 10mg/kg

83
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

PO q8h, e diosmectita (Smecta®), 1 saqueta de 3g q8h, esta última parando no dia anterior
à endoscopia.

Uma semana depois, o Riack regressou ao hospital escolar para a realização da


endoscopia, e embora se apresentasse em bom estado geral, continuava com a diarreia. A
anestesia foi induzida com propofol e diazepam, e mantida por meio de isoflurano. Ao
exame esogafogastroduodenoscópico não foi observada qualquer alteração da mucosa
esofágica. O estômago apresentava-se ainda com bastante líquido, o que aliado ao jejum,
permite suspeitar de um possível atraso do esvaziamento gástrico. Ao nível da mucosa
pilórica observava-se ainda eritema, o que poderia indicar refluxo gastroduodenal, tendo-se
recolhido algumas peças desta região. Não foi possível introduzir o endoscópio através do
piloro, tendo sido, no entanto, colhidas amostras da mucosa duodenal introduzindo o fórceps
de biopsia através do piloro. Prosseguiu-se seguidamente o exame endoscópico com a
colonoscopia, tendo-se encontrado grandes quantidades de ervas ao nível do cólon distal.
Após limpeza da região com um enema de água morna, prosseguiu-se o exame, não se
observando lesões a este nível. Já ao nível do cólon proximal, observou-se eritema e
friabilidade da mucosa, tendo sido recolhidas várias amostras. A válvula íleo-cólica
apresentava-se congestionada, mas conseguiu-se introduzir o endoscópio através desta
válvula e assim observar o íleo. A mucosa ileal apresentava-se muito congestionada,
observando-se ainda numerosos pontos brancos na mucosa, possível indicação de
linfangiectasia. Foram também recolhidas várias amostras desta zona. Concluiu-se assim
que as lesões observadas eram indicativas de inflamação gastrointestinal difusa, moderada
nas regiões gástrica e colónica e severa na região ileal, quadro compatível com uma doença
infiltrativa difusa, inflamatória ou neoplásica. Decidiu-se então prosseguir com a mesma
terapêutica, adicionando apenas fosfato de alumínio (Phosphalugel®) à terapêutica, 1
saqueta PO q8h, 30 minutos antes de cada refeição, devido às lesões gástricas
encontradas.

Uma semana depois da endoscopia chegaram os resultados do exame histopatológico


realizado às amostras de mucosa recolhidas. O exame da mucosa gástrica revelou uma
gastrite de intensidade ligeira a moderada, não específica, caracterizada por fibrose e
infiltração linfoplasmocítica, mais severas ao nível pilórico. As amostras duodenais
recolhidas não se encontravam em condições para serem analisadas, pelo que apenas
foram avaliadas as amostras ileais. Observou-se assim uma inflamação severa, de carácter
polimorfo, encontrada em todas as amostras ileais, caracterizada por capilares
congestionados, bem como uma infiltração inflamatória misto, predominantemente composta
por linfócitos e plasmócitos, embora também estivessem presentes eosinófilos. Ao nível das
criptas não se observaram lesões óbvias para além da infiltração inflamatória. Os quilíferos

84
Enterite Linfoplasmocítica Canina

encontravam-se moderadamente dilatados, indicando uma linfangiectasia provavelmente


secundária ao processo inflamatório severo da mucosa ileal. Já as amostras colónicas
apresentavam um carácter mais variado, com inflamação variando de intensidade. Algumas
amostras da mucosa do cólon revelaram-se pouco lesadas, enquanto outras demonstraram
inflamação moderada, encontrando-se congestivas, fibróticas e edematosas, com
infiltrações linfoplasmocíticas e eosinofílicas. Não foram observadas bactérias a nível
gástrico nem parasitas a nível intestinal. A conclusão do exame histopatológico foi então
gastrite e colite crónica, de intensidade ligeira a moderada, bem como enterite severa mista,
linfoplasmocítica e eosinofílica, acompanhada de linfangiectasia.

Dado os resultados do exame histopatológico, decidiu-se então alterar o protocolo


terapêutico do Riack. O paciente começou assim um tratamento imunossupressor com
prednisolona, 1mg/kg PO q12h durante 15 dias, depois 0,75mg/kg PO q12h durante 15 dias,
seguido de 0,25mg/kg PO q24h durante 15 dias. Ao tratamento imunossupressor aliou-se
metronidazol 15mg/kg PO q12h durante 15 dias, seguido de 10mg/kg PO q12h durante 15
dias e, por fim, 7,5mg/kg PO q24h durante 15 dias. Decidiu-se também continuar a
terapêutica com diosmectita, fosfato de alumínio e cobalamina, nas doses referidas
anteriormente.

Cerca de mês e meio mais tarde, o Riack regressou à consulta, deixando de apresentar
diarreia, embora a proprietária referisse que as fezes continuassem um pouco moles.
Decidiu-se então alterar a terapêutica e tentar manter o Riack apenas com metronidazol,
10mg/kg PO q8h durante 15 dias, seguido de 10mg/kg PO q12h durante 15 dias e, por fim,
10mg/kg PO q24h durante 15 dias.

3.3 CASO CLÍNICO 3 – Theodora

Theodora, uma cadela de raça Bulldog Inglês de 5 anos de idade, com 17kg de peso vivo,
apresentou-se ao serviço de urgências da École Nationale Vétérinaire d’Alfort por diarreia e
vómito crónicos. O proprietário informou que a cadela possuia uma história de dermatite
atópica severa, diagnosticada alguns anos antes, e que cerca de 2 meses antes, tinha
recebido um tratamento experimental (molécula desconhecida pelo proprietário) para esta
afecção, e que passados alguns dias, a Theodora tinha começado com vómito e diarreia
profusa. A paciente foi observada pelo seu veterinário assistente, mas apesar dos
tratamentos sintomáticos (o proprietário apenas se lembrava de utilizar Canidiarix®), os
sinais gastrointestinais permaneceram. Cerca de um mês após o tratamento com a molécula
experimental, a paciente sofreu um volvo intestinal, o qual foi resolvido cirurgicamente.
Durante a cirurgia, foi constatado que os intestinos apresentavam um aspecto inflamatório

85
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

difuso. Após a recuperação da cirurgia, a paciente começou uma terapêutica anti-


inflamatória com prednisolona 1,5 mg/kg IV e foi alterada a sua alimentação para Hill’s
Prescription Diet i/d®, tratamento com o qual apresentou melhoras dos sintomas. Porém,
quando se tentou passar de uma terapia anti-inflamatória endovenosa para uma terapia por
via oral, voltou a piorar da diarreia e dos vómitos, perdendo também aos poucos o apetite.
Uns dias antes da consulta, a paciente tinha sofrido também um episódio de edema dos
membros posteriores e ascite, o qual foi tratado com furosemida. O seu veterinário
assistente acabou por sugerir a eutanásia, pelo que o proprietário decidiu pedir uma
segunda opinião ao serviço de gastroenterologia do hospital escolar. A Theodora
apresentava as vacinações e desparasitações em dia.

O exame físico inicial foi difícil de ser realizado, uma vez que o animal se mostrou bastante
agressivo. No entanto, foi constatado que a paciente encontrava-se bastante magra e com
mucosas pálidas. Decidiu-se então realizar hemograma (Tabela 12), ionograma (Tabela 13),
bioquímicas séricas (Tabela 14) e urianálise, de modo a poder avaliar o estado geral do
animal.

Tabela 12 – Resultados do hemograma (Theodora)

Parâmetros Resultados Unidades Valores de Referência


Hematócrito 0,36 L/L 0,37-0,54
Eritrócitos 4,9 1012/L 6-9
Hemoglobina 12,5 g/L 12-18
VCM 73 fL 60-77
CHCM 35 g/dL 31-35
HCM 26 pg/L 19-25
Reticulócitos 211 103/µL < 150
Leucócitos 12,6 109/L 6-17
Neutrófilos 65 % 60-79
Eosinófilos 7 % 2-10
Basófilos 0 % 0-1
Linfócitos 24 % 12-30
Monócitos 4 % 3-9
Plaquetas 924 109/L 200-600
Esfregaço sanguíneo: sem alterações

Tabela 13 – Resultados do ionograma (Theodora)

Parâmetros Resultados Unidades Valores de Referência


Na+ 144 mEq/L 140-155
K+ 5,3 mEq/L 3,6-5,8
Ca2+ 1,25 mEq/L 2.35-2,93
pH 7,46 - 7,35-7,45

86
Enterite Linfoplasmocítica Canina

Tabela 14 – Resultados das bioquímicas séricas (Theodora)

Parâmetros Resultados Unidades Valores de Referência


Albumina 16 g/L 32-47
Proteínas Totais 31 g/L 53-77
Globulinas 15 g/L 21-30
Glucose 1,49 g/L 0,6-1
Ureia 0,54 g/L 0,15-0,4
Creatinina 9 mg/L 3-13
ALT 1444 UI/L 15-90
FA 543 UI/L 0-50
NH3 59 µmol/L < 70

Ao hemograma foi observada uma anemia regenerativa ligeira, atribuída a perda


gastrointestinal de sangue. As bioquímicas séricas revelaram uma hipoproteinémia
(hipoalbuminémia e hipoglobulinémia), bem como um aumento da concentração sérica de
ureia. A urianálise revelou-se normal e o teste do ácido sulfosalicílico revelou-se negativo,
pelo que foram excluídos os rins como causa da hipoproteinémia. A hipocalcémia registada
foi atribuída à hipoalbuminémia. Decidiu-se então hospitalizar a paciente durante a noite,
aguardando a consulta com o gastroenterologista no dia seguinte. Entretanto, foi
administrada apenas uma solução de NaCl glucosada por via endovenosa durante a noite.

No dia seguinte, a Theodora não apresentou vómitos nem diarreia, chegando mesmo a
comer Hill’s Prescription Diet a/d®. O exame físico não revelou alterações desde o dia
anterior. Decidiu-se então avançar no plano diagnóstico com a realização da quantificação
do cTLI, folato e cobalamina séricos (Tabela 15), seguido de ultrasonografia abdominal.

Tabela 15 – Resultados do cTLI, folato e cobalamina séricos (Theodora)

Parâmetros Resultados Unidades Valores de Referência


cTLI 8,31 µg/L 5-35
Folatos 11,86 ng/mL 7-17
Cobalamina 293 pg/mL 225-860

O resultado do cTLI permite excluir IPE como causa do quadro clínico. Os resultados do
folato e cobalamina séricos, mesmo estando normais, não excluem a presença de doença
intestinal, uma vez que existe um pool destas vitaminas que tem de ser esgotado antes de
as suas concentrações séricas diminuírem para valores anormais.

A ultrasonografia abdominal permitiu a observação de líquido no abdómen em quantidade


significante, o qual foi recolhido e analisado, revelando um líquido transparente e com uma
constituição proteica de 10 g/L, o que o classificou como um transudado. O fígado
apresentava-se de tamanho normal, homogéneo, embora de ecogenicidade ligeiramente
aumentada (Figura 5). Foi também observada uma ligeira dilatação do ducto colédoco
(diâmetro de 5,5 mm) (Figura 6). Ao nível do duodeno observou-se um espessamento da

87
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

parede (espessura de 5,1 mm), bem como um aumento da ecogenicidade da mucosa


intestinal (Figura 7). Não foram detectadas alterações nos restantes órgãos abdominais,
incluindo estômago e cólon. O espessamento da parede intestinal, aliado ao derrame
peritoneal, sugeria fortemente enteropatia exsudativa, como IBD ou linfangiectasia.

Figura 5 – Hiperecogenicidade hepática Figura 6 – Dilatação do ducto colédoco

Figura 7 – Espessamento da parede duodenal

Com base nos aumentos das concentrações séricas de ALT e FA, bem como na
hipoalbuminémia e no aumento da ecogenicidade hepática, decidiu-se avaliar a função
hepática através da realização de um teste de estimulação dos ácidos biliares (Tabela 16).

Tabela 16 – Resultados do teste de estimulação dos ácidos biliares (Theodora)

Parâmetros Resultados Unidades Valores de Referência


Ácidos biliares em jejum 4 µmol/L 0-15
Ácidos biliares pós-prandiais 6 µmol/L 0-30

Com base nos valores normais obtidos com a realização deste teste pode-se inferir sobre a
função hepática, pelo que se pode excluir o fígado como o órgão responsável pela
hipoproteinémia e quadro clínico. Excluídas causas hepáticas, a suspeita recaiu sobre

88
Enterite Linfoplasmocítica Canina

doenças intestinais, pelo que foi marcada endoscopia alta e baixa (com biopsia) para alguns
dias depois. Entretanto, decidiu-se começar uma antibioterapia com metronidazol (Flagyl®),
20mg/kg PO q12h até ao dia da endoscopia. Em caso de diarreia, foi também proposta a
administração de diosmectita (Smecta®), 1,5 saquetas de 3g q12h.

A Theodora regressou ao hospital escolar no dia da endoscopia. Desde a última consulta


que não apresentava diarreia, embora as fezes continuassem moles. Ao exame físico não
existiam diferenças significativas desde a última visita, continuando bastante magra e com
as mucosas pálidas. A anestesia foi induzida com propofol e dialzepam, e depois mantida
com isoflurorano. Não foram encontradas quaisquer alterações a nível da mucosa esofágica
e gástrica, embora se tenham recolhido amostras da última. A mucosa duodenal
apresentava-se muito inflamada, eritematosa e friável, pelo que foram recolhidas várias
amostras. Foram também observadas pequenas manchas esbranquiçadas na mucosa
duodenal, compatíveis com uma dilatação dos vasos linfáticos das vilosidades intestinais.
Ao nível do lúmen duodenal observavam-se secreções esbranquiçadas, possivelmente
extravasações linfáticas. Por seu lado, a colonoscopia não revelou quaisquer alterações a
nível da mucosa colónica ou mesmo junção íleo-cólica. Não foi possível atingir o íleo, tendo
sido, no entanto, colhidas amostras da mucosa colónica. O aspecto inflamatório difuso do
duodeno foi considerado como compatível com uma doença inflamatória crónica associada
a linfangiectasia severa. Até à obtenção dos resultados do exame histopatológico, decidiu-
se manter a mesma terapêutica, uma vez que foram obtidos resultados positivos.

Uma semana depois, a Theodora voltou à consulta de gastroenterologia, não revelando


alterações do quadro clínico desde o dia da endoscopia. Os resultados do exame
histopatológico revelaram a presença de uma infiltração inflamatória constituída por
linfócitos e plasmócitos ao nível do duodeno, embora também estivessem presentes
eosinófilos e neutrófilos. Foram também encontradas lesões de congestão e edema da
mucosa, bem como dilatação moderada dos vasos linfáticos das vilosidades.
Surpreendentemente, embora não tenham sido observadas quaisquer lesões endoscópicas
ao nível do estômago e cólon, o exame histopatológico revelou a presença de uma gastrite e
colite ligeiras, associadas a uma ligeira infiltração linfoplasmocítica e, no caso do estômago,
a uma discreta atrofia das estruturas glandulares. Foi assim concluído que a Theodora
apresentava lesões associadas a enterite linfoplasmocítica moderada, associada a
linfangiectasia, acompanhadas de uma gastrite e colite ligeiras.

Com base no diagnóstico fornecido pela histopatologia, decidiu-se então alterar o protocolo
terapêutico. A Theodora passou então a fazer prednisolona, 1mg/kg PO q12h durante 15
dias, depois 0,5mg/kg PO q12h durante 15 dias, seguido de 0,5mg/kg PO q24h durante 15

89
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

dias e, por fim, 0,5mg/kg Po q48h durante 15 dias; metronidazol 15mg/kg PO q12h durante
1 mês, seguido de 15mg/kg PO q24h durante 15 dias e depois 15mg/kg PO q48h. Em caso
de vómito, fosfato de alumínio (Phosphalugel®), 1 saqueta PO q12h, 30 minutos antes de
cada refeição. Devido ao apetite caprichoso da Theodora, decidiu-se alterar a dieta para
Hill’s Prescription Diet d/d, uma dieta que a Theodora comia bem.

Cerca de dois meses mais tarde, a Theodora regressou à consulta, não revelando sinais de
doença gastrointestinal. Apresentava-se em bom estado geral, tendo aumentado
ligeiramente de peso. Decidiu-se então manter a dieta e recomendou-se ao proprietário que
monitorizasse as fezes da Theodora e regressasse à consulta em caso de diarreia.

3.4 CASO CLÍNICO 4 – Rouck

Rouck, um cão macho de raça Pastor Alemão, com 7 anos de idade, apresentou-se no
serviço de consultas de medicina do hospital escolar da École Nationale Vétérinaire d’Alfort
por abatimento, perda de peso severa e diarreia crónica do intestino delgado. O Rouck foi
pela primeira vez observado no hospital escolar há cerca de 2 anos, devido a diarreia
crónica. Foram realizados vários exames complementares, entre eles exames coprológicos,
ultrasonografia abdominal, doseamento de cobalamina e, por fim, endoscopia e biopsia
gastrointestinais, a partir dos quais foi diagnosticado com enterite linfoplasmocítica severa.
Desde então, foram realizados vários tratamentos, incluindo prednisolona, metronidazol,
diosmectita, cobalamina parenteral, entre outros, aos quais reagiu positivamente durante
alguns meses, período após o qual recomeçou a agravar o quadro clínico. Desde então e
até à actualidade têm realizado tratamentos periódicos com antibióticos, anti-diarreicos,
corticóides, sem resultados visíveis.

Ao exame clínico registou-se que o que era considerado pelos proprietários como
abatimento era na realidade um estado de choque. O Rouck, embora revelasse estar
consciente, não era capaz de se mover e estava profundamente deprimido. Apresentava
também uma perda de peso bastante severa (peso vivo de 23kg) e uma desidratação > 10%
(olhos encovados na órbita por vários milímetros, o que provavelmente era ainda mais
acentuado pela perda de peso (e gordura periorbital). As mucosas encontravam-se pálidas e
o tempo de repleção capilar entre 2-3 segundos. A palpação abdominal revelou-se dolorosa,
e foram observadas míases na região anal e perianal. Curiosamente, não se detectou
qualquer alteração a nível respiratório ou cardíaco. A temperatura corporal era de 41,3ºC.
Imediatamente de seguida foi colocado um catéter endovenoso e recolhido sangue para
realização de hemograma (Tabela 17) e bioquímicas séricas (Tabela 18), começando de
seguida a realizar fluidoterapia com uma solução de NaCl a 0,9%.

90
Enterite Linfoplasmocítica Canina

Tabela 17 – Resultados do hemograma (Rouck).

Parâmetros Resultados Unidades Valores de Referência


Hematócrito 0,34 L/L 0,37-0,54
Eritrócitos 4,4 1012/L 6-9
Hemoglobina 11,5 g/L 12-18
VCM 77 fL 60-77
CHCM 34 g/dL 31-35
HCM 26 pg/L 19-25
Reticulócitos 42,24 103/µL < 150
Leucócitos 5,1 109/L 6-17
Neutrófilos 89 % 60-79
Eosinófilos 1 % 2-10
Basófilos 1 % 0-1
Linfócitos 4 % 12-30
Monócitos 5 % 3-9
Plaquetas 346 109/L 200-600
Esfregaço sanguíneo: polimorfonucleares neutrófilos jovens: ++

Tabela 18 – Resultados das bioquímicas séricas (Rouck).

Parâmetros Resultados Unidades Valores de Referência


Albumina 11 g/L 32-47
Proteínas Totais 40 g/L 53-77
Globulinas 29 g/L 21-30
Glucose 0,5 g/L 0,6-1
Ureia 0,41 g/L 0,15-0,4
Creatinina 19 mg/L 3-13
ALT 61 UI/L 15-90
FA 189 UI/L 0-50
Colesterol 1,8 g/L 1-2.65
Bilirrubina 6 mg/L 0-4

O hemograma revelou leucopénia (linfopénia), que aliada à presença de numerosos


polimorfonucleares neutrófilos jovens no esfregaço sanguíneo, sugeria infecção. A presença
de uma anemia ligeira, não regenerativa, na presença de um quadro clínico de choque,
sugeria uma hemorragia interna, não detectada ao exame clínico. Já nas bioquímicas
séricas, foi registada uma hipoproteinémia (hipoalbuminémia), bem como aumentos de
ureia, creatinina, bilirrubina e FA. A desidratação severa do paciente poderia explicar alguns
destes aumentos. No entanto, dado o estado do paciente e a dor registada durante a
palpação abdominal, a suspeita clínica recaiu sobre uma ruptura gastrointestinal,
provavelmente devido à doença intestinal severa que o paciente exibia. Dada a suspeita de
ruptura gastrointestinal/peritonite, o Rouck foi imediatamente transferido para o serviço de
imagiologia, onde realizou um ultrasonograma abdominal. A ultrasonografia revelou um
grande derrame abdominal fortemente ecogénico e pneumoabdómen na parte cranial da
cavidade abdominal, bem como esteatite associada a um conjunto de ansas jejunais. Foi
também possível observar um espessamento parietal de algumas ansas jejunais (espessura
de 5 a 6mm) com diminuição do contraste entre camadas (Figura 8A), bem como
adenomegália mesentérica (Figura 8B). Foi também recolhido líquido do derrame abdominal

91
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

por punção ecoguiada, de cor acastanhada, que foi enviado para cultura bacterológica e
teste de sensibilidade a antibióticos. As imagens de derrame, juntamente com o
pneumoabdómen e a esteatite indicavam a ocorrência de pancreatite associada a uma
ruptura digestiva. Já o espessamento da parede jejunal, aliado à perda de contraste entre
camadas e à adenomegália, indicavam um possível processo neoplásico, embora não
pudessem ser excluídos processos inflamatórios.

Figura 8 – A. Espessamento, perda de contraste e possível local de ruptura de uma ansa jejunal; B.
Linfadenopatia mesentérica.

A B

Com base nestes achados, o Rouck foi levado para o serviço de cirurgia, onde foi realizada
laparotomia de urgência. Durante a cirurgia, foi registada a presença de um líquido com
conteúdo alimentar abundante no abdómen. Analisando o tubo digestivo, foi possível
identificar uma ruptura da parede intestinal ao nível do jejuno. Devido à necrose e
inflamação em redor, foi realizada enterectomia com remoção de intestino até 15cm para
cada lado da ruptura, e a peça recolhida foi enviada para análise histopatológica. O intestino
foi devidamente suturado e a cavidade abdominal lavada com uma solução morna de NaCl
a 0,9% até à obtenção de um líquido transparente, sendo depois suturada a linha incisional
abdominal. No pós-operatório foi ainda administrada cefalexina, 15mg/kg IV, e metronidazol,
20mg/kg IV. O Rouck recuperou sem problemas da cirurgia, embora se apresentasse um
pouco hipotérmico, pelo que foi aquecido por meio de aquecedores e aquecimento da
solução de fluidoterapia. Foi também monitorizado durante a noite, revelando importantes
flutuações na temperatura corporal. Durante a noite, foram também medidos alguns
parâmetros sanguíneos (Tabela 19).

Tabela 19 – Resultados dos parâmetros sanguíneos monitorizados durante a noite (Rouck).

Parâmetros Resultados Unidades Valores de Referência


20h 22h 24h 04h
Glucose 0,6 - - 0,85 g/L 0,6-1
pH 7,01 7,24 7,29 7,18 - 7,35-7,45
HCO3- 9 13 14 12,2 mEq/L 21-27
K+ 3,4 - - 3,6 mEq/L 3,6-5,8

92
Enterite Linfoplasmocítica Canina

Embora o Rouck não se encontrasse em hipoglicémia, devido à má nutrição, foi decidido


alterar a fluidoterapia para uma solução com glucose a 5%. A hipocaliémia e acidose
metabólica registadas durante a noite foram tratadas com a adição de cloreto de potássio
(20mEq/L de fluidoterapia) e bicarbonato (30mEq/L de fluidoterapia), respectivamente. No
dia seguinte, o Rouck apresentava-se ainda bastante abatido, com as mucosas muito
pálidas, embora a sua temperatura estivesse já normalizada. Tendo em conta a anemia e a
acidose metabólica observadas, foi referido aos proprietários a necessidade de uma
transfusão sanguínea e de continuação da correcção da acidose, e devido aos custos
inerentes a estes tratamentos, aliado aos custos da restante terapêutica, estes optaram pela
eutanásia do paciente.

Cerca de uma semana mais tarde, o relatório histopatológico da peça cirúrgica revelou
linfoma intestinal de grandes linfócitos granulosos com infiltração difusa, severa e
transparietal da parede intestinal, e necrose hemorrágica da mucosa. O relatório referia
ainda que nos segmentos mais proximais e distais ao local da ruptura, se podia observar
uma infiltração marcada da mucosa por uma população predominantemente plasmocítica,
embora também estivessem presentes grandes linfócitos granulares, fusão das vilosidades,
dilatação das estruturas glandulares e edema.

3.5 DISCUSSÃO

Como se pode observar pela idade dos pacientes, estes são na sua maioria animais de
meia-idade, com excepção do Benny, um cão Pastor Alemão de 1 ano de idade. É possível
que exista uma causa genética subjacente que tenha despoletado a doença mais cedo que
o normal, mas tal factor não é conhecido. Curiosamente, todos os casos clínicos aqui
apresentados correspondem a animais de raça, com uma predominância para os Pastores
Alemães, mas o reduzido número de casos não permite inferir sobre uma possível
predisposição racial.

A apresentação clínica dos animais não revelou grandes alterações relativamente à descrita
anteriormente, com todos os animais apresentando diarreia crónica como principal sinal,
embora alguns dos pacientes apresentassem também mais alguns sintomas, tais como
perda de peso, vómito, dor abdominal ou mesmo palidez das mucosas (Allenspach et al.,
2006c; Craven, Simpson, Ridyard & Chandler, 2004; German, 2005; German, 2006; Hall &
German, 2005; Jacobs et al., 1990; Jergens, Moore, Haynes & Miles, 1992; Lane et al.,
1999; Ristic & Stidworthy, 2002; Tams, 2003). No caso clínico 4 foi observada uma
apresentação clínica pouco usual, em que o animal se apresentava em estado de choque,
com perda de peso e desidratação severas, mucosas pálidas e febre. No entanto,

93
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

continuava presente um historial de diarreia crónica do intestino delgado. Exceptuando o


caso clínico 4, os restantes animais revelaram uma apresentação clínica pouco específica,
que embora indique envolvimento gastrointestinal, não permite saber se a causa primária
origina-se do tracto gastrointestinal ou não.

Os achados hematológicos foram bastante variáveis. Um dos casos revelou uma leucocitose
por neutrofilia sem desvio à esquerda, o que poderá estar associado a stress ou doença
inflamatória crónica (German, 2005; Hall & German, 2005; Jergens et al., 1992). Outro dos
casos revelou uma eritrocitose e leucocitose, possivelmente associadas a uma desidratação
ligeira, não constatável clinicamente. Outro dos casos revelou uma anemia regenerativa
ligeira, que na ausência de parasitas endoglobulares e alterações ao nível do esfregaço
sanguíneo, bem como ausência de sangue na urianálise, foi atribuída a perda
gastrointestinal não detectável clinicamente (Hall & German, 2005; Jergens et al., 1992;
Ristic & Stidworthy, 2002). Este mesmo caso revelou ainda trombocitose, e embora o seu
estudo não tenha sido aprofundado, poderá estar relacionada com fenómenos inflamatórios,
nomeadamente estimulação da produção por mediadores inflamatórios (Craven et al., 2004;
Lubas et al., 2007). O último caso revelou uma anemia não regenerativa ligeira, mais tarde
atribuída a perda de sangue por ruptura intestinal. Neste último caso, no entanto, não é
possível afirmar com certeza que a anemia não estaria já presente antes da ruptura
intestinal ocorrer. Os achados bioquímicos foram também bastante variáveis, embora um
dos parâmetros sobressaísse em frequência, a hipoproteinémia. Esta encontrava-se
especialmente associada a hipoalbuminémia, embora um dos casos apresentasse também
hipoglobulinémia. Em nenhum dos casos a hipoproteinémia foi atribuída a doença hepática
ou renal. Esta hipoproteinémia deveu-se provavelmente a uma enteropatia com perda de
proteínas, nomeadamente linfangiectasia secundária, embora também possam ter
contribuído fenómenos de má absorção (Craven et al., 2004; German, 2005; Hall & German,
2005; Jergens et al., 1992; Tams, 2003). Outro dos parâmetros frequentemente alterados
foram as enzimas hepáticas, ALT e FA, cujos aumentos (de ligeiros a severos), na ausência
de sinais de doença hepática, foram atribuídos a uma hepatopatia reactiva, secundária a
aumento da absorção de bactérias, endotoxinas e antigénios para a circulação portal devido
à doença intestinal (Craven et al., 2004; Jacobs et al., 1990; Jergens et al., 1992; German,
2005; Hall & German, 2005; Tams, 2003; Willard, 2003). Num dos casos foi também
observada uma elevação ligeira da ureia sérica, que na ausência de outros indicadores de
doença renal (nomeadamente aumento sérico da creatinina e alterações na urianálise), foi
considerada secundária a desidratação. Outro dos casos revelou uma hipocolesterolémia
ligeira/colesterolémia muito baixa, que com base nos resultados do exame histopatológico
ao intestino, foi atribuída a linfangiectasia intestinal secundária. O ionograma não revelou
grandes alterações, exceptuando em dois dos casos clínicos, que revelaram hipocalcémia,

94
Enterite Linfoplasmocítica Canina

mas esta foi considerada secundária à hipoalbuminémia registada em ambos os casos, e no


último caso clínico, que revelou hipocaliémia e acidose metabólica, provavelmente
secundários às perdas de fluidos na diarreia e à ruptura intestinal observada. A urianálise
também não revelou alterações significantes, e aliada ao teste do ácido sulfosalicílico, teve
como especial propósito a exclusão de patologia renal como causa da hipoproteinémia
observada nos vários casos clínicos.

Como politíca dos gastroenterologistas do hospital escolar, os exames imagiológicos em


casos de diarreia crónica restringem-se geralmente à ultrasonografia, técnica que
geralmente permite obter mais e melhores informações (Gaschen, 2005). A utilização da
radiografia restringe-se geralmente aos casos em que existem sinais de envolvimento de
outro sistema orgânico, como se verificou no caso clínico 2. O exame ultrasonográfico,
realizado em 3 dos casos apresentados, permitiu observar espessamentos da parede
intestinal nos 3 casos onde foi realizada ultrasonografia. É importante referir que segundo a
escala de Delaney et al (2003), o que foi considerado espessamento da parede intestinal
pelos imagiologistas do hospital escolar pode não corresponder a verdadeiro espessamento.
Aplicando a referida escala ao caso clínico 3, observa-se que não existe espessamento,
enquanto que os valores obtidos para o caso clínico 4 classificam-no como espessamento,
tanto pela escala de Delaney et al (2003) como pela experiência dos imagiologistas do
hospital escolar. No caso clínico 2, não se encontra especificada a região intestinal na qual
foi observado espessamento, pelo que se for duodeno, a espessura poderá ser considerada
normal, mas se corresponder a uma imagem de jejuno, reflectirá um verdadeiro
espessamento. Como se pode observar, existe alguma discrepância entre resultados, pelo
que para utilizar esta técnica imagiológica ao nível intestinal, será prudente identificar
sempre qual a região anatómica que está a ser analisada, de modo a ser possível identificar
verdadeiros espessamentos da parede intestinal. Outro achado comum foram as variações
nas camadas da parede intestinal, em que um dos casos revelou estrutura parietal normal,
outro revelou aumento da ecogenecidade parietal e, por fim, um outro revelou perda da
diferenciação entre camadas. É de referir que o único caso em que foi observada uma nítida
diminuição do contraste entre camadas corresponde a uma caso mais tarde diagnosticado
como neoplasia e não a uma infiltração inflamatória. Outros achados ultrasonográficos foram
a presença de dois nódulos hipoecogénicos no baço de um dos pacientes e
hiperecogenecidade hepática e dilatação do ducto colédoco em um outro caso. No caso
clínico 4, foram também observadas imagens de derrame abdominal, pneumoabdómen,
esteatite em região jejunal e adenomegália mesentérica, provavelmente secundárias à
ruptura intestinal e neoplasia e consequente peritonite.

95
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

Outros dos exames frequentemente realizados em caso de diarreias crónicas são a


mensuração do cTLI e do folato e cobalamina séricos. O cTLI permite excluir com certeza a
possibilidade de uma IPE (Suchodolski & Steiner, 2003). Já o folato e cobalamina séricos,
embora não permitam realizar um diagnóstico, podem permitir a identificação da região
intestinal afectada (Matz & Guilford, 2003; Suchodolski & Steiner, 2003). A Tabela 20
resume os resultados destes testes para os casos clínicos nos quais foram realizados.

Tabela 20 – Resultados do folato e cobalamina séricos (casos clínicos 1,2 e 3)

Casos Clínicos Folato Cobalamina


Caso Clínico 1 5,9 ng/ml 125 pg/ml
Caso Clínico 2 11,6 ng/ml 205 pg/ml
Caso Clínico 3 11,86 ng/ml 293 pg/ml
Valores de Referência 7-17 ng/ml 225-860 pg/ml

No caso clínico 1, observa-se uma diminuição das concentrações séricas tanto de folato
como de cobalamina, pelo que presume que a doença intestinal afecte tanto o jejuno como o
íleo, respectivamente, locais de absorção destas vitaminas (Matz & Guilford, 2003;
Suchodolski & Steiner, 2003). Este caso foi mais tarde diagnosticado como enterite
moderada. Já no caso clínico 2, observa-se apenas uma diminuição da concentração sérica
de cobalamina, pelo que se pode esperar que a região ileal se encontre afectada, o que de
facto veio a ser comprovado (enterite severa). No entanto, é importante não esquecer que
nem sempre se verificam estas alterações, como observado no caso clínico 3, um caso de
enterite moderada. Pela discrepância entre achados (deficiências vitamínicas e gravidade
histológica das lesões), pode-se deduzir que a quantificação das concentrações séricas
destas vitaminas serve principalmente para localizar a afecção e para se poderem corrigir
deficiências vitamínicas, e não tanto para diagnosticar uma afecção, como era realizado
anteriormente. É provável que outros factores, tais como a duração da doença ou a
existência de um pool destas vitaminas no organismo, tenham grande influência nestes
resultados, o que limita a utilização destes parâmetros para efeitos diagnósticos. Outro
exames que se realiza frequentemente é o teste de estimulação dos ácidos biliares, que tem
como objectivo avaliar a função hepática. De facto, na existência de sinais de doença
hepática, tais como aumentos séricos das enzimas hepáticas e alterações imagiológicas do
fígado, a realização deste teste permite assim verificar se o quadro clínico é provocado por
uma afecção hepática ou não, como se realizou para o caso clínico 3. Isto é especialmente
importante uma vez que doença hepática pode provocar alterações histológicas a nível do
intestino semelhantes à IBD (Bunch, 2003).

A endoscopia revelou lesões inflamatórias nos três casos clínicos que a realizaram, embora
nem todos os órgãos do tracto gastrointestinal apresentassem lesões. De facto, não foi
observado qualquer tipo de lesões a nível do esófago, nem mesmo no caso clínico 3, em

96
Enterite Linfoplasmocítica Canina

que o animal apresentava vómito crónico. Já ao nível do estômago, os achados


endoscópicos foram bastante variados, revelando esbranquiçamento da região pilórica em
um dos casos, eritema da região pilórica em outro caso ou ausência de lesões no restante
caso. Um dos casos revelou ainda um atraso no esvaziamento gástrico, o que poderá estar
ligado às lesões eritematosas encontradas a nível do piloro, estas por sua vez
provavelmente ligadas a um refluxo gastroduodenal (García-Sancho et al., 2005).
Curiosamente, a endoscopia com ausência de lesões gástricas corresponde ao caso clínico
3, o único caso em que o vómito era um dos sinais clínicos predominantes. Já no caso do
duodeno, este apenas foi observado em dois dos casos clínicos, uma vez que não foi
possível atravessar o piloro no caso clínico 2. Foram assim encontradas lesões inflamatórias
caracterizadas por eritema e friabilidade da mucosa duodenal, sendo que um dos casos
clínicos apresentava também pequenas lesões esbranquiçadas, geralmente indicativas de
dilatação dos vasos linfáticos das vilosidades intestinais. Neste mesmo caso clínico foram
também observadas a nível do lúmen duodenal secreções esbranquiçadas,
correspondentes a linfa que extravasou dos linfáticos dilatados (Peterson & Willard, 2003;
Tams, 2003). A mucosa ileal apenas foi observada num dos casos clínicos, felizmente no
caso a que não foi possível observar a mucosa duodenal. Neste caso foram encontradas
lesões congestivas da mucosa, acompanhadas de numerosas pequenas manchas
esbranquiçadas, sinal de uma possível dilatação linfática. Ao nível do cólon, foram
encontradas lesões de inflamação ligeira do cólon proximal num dos casos clínicos,
enquanto que outro caso apenas apresentava lesões de eritema e friabilidade da mucosa a
nível do cólon proximal e congestão da junção íleocólica. No caso clínico 3, não foram
observadas quaisquer lesões a nível do cólon ou junção ileocólica. Como se pode observar,
as lesões encontradas à endoscopia são geralmente inespecíficas, indicando apenas a
ocorrência de um processo inflamatório a nível da mucosa gastrointestinal, não conseguindo
oferecer indicações de uma possível etiologia. A excepção são as pequenas lesões
esbranquiçadas a nível da mucosa intestinal, indicativas de uma dilatação dos vasos
linfáticos da mucosa intestinal, não conseguindo, no entanto, fornecer dados sobre a causa
desta dilatação (German, 2005; Hall & German, 2005; Peterson & Willard, 2003; Tams,
2003). Os achados de inflamação gástrica e cólica de intensidade inferior ao processo no
intestino delgado poderão significar que estes processos são secundários à enterite
verificada.

Os achados histopatológicos das amostras de mucosa recolhidas durante a endoscopia


permitiram a realização de um diagnóstico definitivo em todos os casos (aos quais foi
realizada endoscopia). Foram assim encontradas infiltrações de células inflamatórias a nível
das amostras de intestino delgado em todos os pacientes, de severidade variável,
caracterizadas predominantemente por infiltrações linfoplasmocíticas, acompanhadas

97
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

também por outros tipos de células inflamatórias, tais como eosinófilos e neutrófilos,
permitindo um diagnóstico de enterite linfoplasmocítica, tal como referido por vários autores
(Cave, 2003; Craven et al., 2004; German, 2005; Hall & German, 2005; Jacobs et al., 1990;
Jergens et al., 1992; Jergens et al., 2003; Rodríguez-Franco, Sainz, García-Sancho &
Rodríguez-Castaño, 2002b; Sturgess, 2005; Tams, 2003; Twedt, 2007; Yamasaki et al.,
1996). Em dois dos casos observou-se também dilatação dos quilíferos, linfangiectasia,
considerada como secundária às infiltrações inflamatórias (Brooks, 2005; Cave, 2003;
German, 2005; Hall & German, 2005; Jacobs et al., 1990; Kleinschmidt et al., 2006;
Peterson & Willard, 2003; Tams, 2003). Foram também observadas outras lesões a este
nível, como congestão de capilares e edema da mucosa, também frequentemente descritas
por alguns autores (Cave, 2003; German, 2005; Kleinschmidt, et al., 2006; van der Gaag &
Happé, 1990). Num dos casos clínicos, as amostras duodenais não se encontravam em
condições de serem analisadas, não permitindo saber se a afecção também afectava o
duodeno. Isto reflecte a importância da colheita de amostras por endoscopia, uma vez que
facilmente se obtêm amostras impróprias para análise. As amostras gástricas revelaram
sinais de gastrite ligeira a moderada, caracterizada por infiltrações linfoplasmocíticas,
acompanhados de outras lesões, como atrofia das estruturas glandulares e fibrose. Já as
amostras colónicas revelaram lesões de colite ligeira a moderada, caracterizadas por
infiltrações linfoplasmocíticas e eosinofílicas, num dos casos juntamente com congestão,
edema e fibrose da mucosa. É interessante observar que as lesões histológicas encontradas
apresentaram grande correlação com a presença e gravidade das lesões endoscópicas,
excepto no caso clínico 3, em que não foram observadas lesões endoscópicas a nível do
estômago e cólon, mas em que o exame histopatológico revelou gastrite e colite ligeiras. No
caso clínico 4, a amostra foi colhida por laparotomia, e o exame histopatológico revelou um
linfoma intestinal, caracterizado por uma infiltração jejunal difusa e transparietal por grandes
linfócitos granulares. Este achado é particularmente interessante dado o prévio diagnóstico
de enterite linfoplasmocítica efectuado cerca de 2 anos antes. De facto, o relatório
histopatológico da peça cirúrgica revelou que as regiões do intestino localizadas mais
distalmente ao local da ruptura (e do tumor) apresentavam uma infiltração plasmocítica,
acompanhada de alguns grandes linfócitos granulares. É possível que o primeiro diagnóstico
estivesse errado, e que de facto o paciente já apresentasse um linfoma na altura do primeiro
diagnóstico. O facto de o diagnóstico ter sido realizado por endoscopia e biopsia torna este
facto bastante provável, uma vez que devido às limitações da endoscopia, não é possível
observar o jejuno (local onde se encontrava o tumor) e recolher amostras de mucosa desta
localização. O facto de se poderem encontrar infiltrações inflamatórias (e não neoplásicas)
ao nível do intestino de animais com neoplasias intestinais também pode ter contribuído
para um diagnóstico errado (Cave, 2003; German, 2005; Kleinschmidt et al., 2006; Willard et
al., 2002). Também é possível que mesmo que tenham sido colhidas amostras neoplásicas,

98
Enterite Linfoplasmocítica Canina

o facto de apenas se colher mucosa à endoscopia tenha impedido a realização de um


diagnóstico correcto, tal como referido por Moore (2003). No entanto, não é possível afirmar
com certeza que este se trata de um caso em que foi realizado um diagnóstico errado, uma
vez que não se pode excluir a possibilidade que o primeiro diagnóstico encontrava-se certo,
e que a patologia evoluiu para uma neoplasia com o passar do tempo, tal como ocorre em
humanos (Friedman & Blumberg, 2005). A refractariedade ao tratamento que este animal
demonstrou poderá ser indicativa de que a neoplasia já se encontrava presente quando o
diagnóstico inicial foi efectuado, ou poderá representar uma evolução da patologia de
enterite linfoplasmocítica para linfoma.

Observando o processo diagnóstico nos vários casos clínicos, pode-se observar que nem
todos os diagnósticos diferenciais foram eliminados. Esta é uma das maiores dificuldades no
diagnóstico desta doença, considerada idiopática e, como tal, com um diagnóstico de
exclusão. De facto, a enorme lista de diagnósticos diferenciais, aliada às dificuldades
económicas de muitos proprietários, torna difícil a realização de todos os testes necessários
para uma correcta eliminação dos vários diagnósticos diferenciais. Assim, embora a maior
parte dos possíveis diagnósticos tenha sido eliminada, não é possível afirmar com certeza
que estes casos se tratam verdadeiramente de uma enterite linfoplasmocítica idiopática.

As opções terapêuticas não variaram muito entre os diferentes casos clínicos, consistindo
inicialmente de antibioterapia com metronidazol, protectores gastrointestinais como
dismectita e fosfato de alumínio, suplementação vitamínica com cobalamina em caso de
deficiência nesta vitamina e alteração para uma dieta hipoalergénica. Dos dois casos que
começaram a terapêutica com metronidazol e maneio dietético, apenas um revelou melhora
da diarreia, embora continuasse com fezes moles. Nestes dois casos, os pacientes apenas
apresentaram cura sintomatológica quando se juntou prednisolona ao protocolo terapêutico.
No caso clínico 1, visto a perda de peso marcada e a hipoalbuminémia, decidiu-se começar
imediatamente a terapêutica com prednisolona, juntamente com os fármacos referidos
anteriormente e uma dieta caseira, terapia à qual o paciente respondeu bem. No caso
clínico 4, a terapêutica foi cirúrgica, e devido à decisão de eutanásia não se procedeu a
mais nenhum tratamento. Devido à instituição inicial de terapia dietética e terapia antibiótica
em dois casos, e terapia dietética, antibiótica e imunossupressora em outro, deixa de se
tornar possível a diferenciação entre casos de ARD, alergias ou intolerâncias alimentares e
IBD, uma vez que não é possível afirmar com certeza se foi um dos constituintes específicos
do protocolo terapêutico que provocou as melhoras clínicas observadas ou se foi realmente
a terapia imunossupressora a única responsável pelas melhoras observadas. A
diferenciação entre estas patologias torna-se ainda mais difícil de realizar quando os

99
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

animais apresentaram melhoras, embora não completas, com um dos constituintes do


protocolo terapêutico, necessitando de outro para se atingir a remissão dos sintomas.

Aplicando os achados clínicos às tabelas apresentadas no Anexo 5 – Classificação dos


Diferentes Sinais Clínicos que compõem o CIBDAI – e consultando as conclusões retiradas
dos exames endoscópicos e histopatológicos, foi possível construir a Tabela 21, que
relaciona assim estes vários resultados.

Tabela 21 – Resultados do CIBDAI, endoscopia e histopatologia (casos clínicos 1,2 e 3).


Casos Clínicos CIBDAI
Pré- Pós-Tratamento Endoscopia Histopatologia
Tratamento
Caso Clínico 1 8 (IBD 3 (doença clinicamente Moderada Moderada
moderada) insignificante)
Caso Clínico 2 4 (IBD ligeira) 2 (doença clinicamente Severa Severa
insignificante)
Caso Clínico 3 12 (IBD 3 (doença clinicamente Severa Moderada
severa) insignificante)

Como se pode observar pelos dados da Tabela 21, os três casos clínicos referidos
apresentavam pontuações no CIBDAI pré-tratamento de intensidade variável, incluindo IBD
ligeira, moderada e severa, sendo que após o tratamento (entenda-se final do tratamento
como a última data referida na descrição dos vários casos clínicos) todos os três casos
passaram para uma pontuação de doença clinicamente insignificante. Dado as pontuações
finais atribuídas, não é visível qualquer correlação entre as pontuações iniciais e finais do
CIBDAI, uma vez que mesmo na presença de pontuações iniciais bastante diferentes, todos
os casos regrediram para um estado de doença clinicamente insignificante. Por outro lado,
observando as conclusões dos exames endoscópicos e histopatológicos, é possível
observar uma correlação na gravidade atribuída a cada caso, sem grandes discrepâncias.
No entanto, quando se tenta comparar a gravidade clínica da doença com a gravidade
endoscópica ou histopatológica, observa-se que não existe grande correlação entre
resultados, uma vez que no caso clínico 2, de gravidade clínica ligeira, observa-se uma
gravidade endoscópica e histológica severa, enquanto que no caso clínico 3, de gravidade
clínica severa, observa-se uma gravidade endoscópica severa e histológica moderada, o
que suporta o descrito por McCann et al. (2007). Já no caso clínico 1, todos os resultados
apontam para uma gravidade moderada da doença. Em face destes resultados, e tendo em
conta a dificuldade em repetir os exames endoscópicos e histopatológicos, o CIBDAI poderá
ser utilizado de modo a realizar uma avaliação da gravidade clínica da doença, a qual se
pode traduzir na qualidade de vida do paciente, embora não possa ser utilizado para prever
ou monitorizar as lesões histopatológicas.

100
Enterite Linfoplasmocítica Canina

4. CONCLUSÃO

A escolha e estudo do tema apresentado nesta dissertação provém de um interesse do


autor no campo das gastroenteropatias crónicas em canídeos, o que aliado à prática
exercida no decorrer do estágio de final de curso, permitiu aprofundar conhecimentos
teóricos adquiridos anteriormente, bem como observar em primeira mão a aplicação prática
desses mesmos conhecimentos, não só na área da gastroenterologia, mas também nas
restantes áreas da medicina e cirurgia de pequenos animais.

Embora seja provavelmente a patologia intestinal crónica de maior frequência em canídeos,


o facto de a enterite linfoplasmocítica se expressar por sinais clínicos inespecíficos leva a
uma enorme lista de diagnósticos diferenciais, o que aliado ao diagnóstico de exclusão
inerente às patologias idiopáticas, como esta, torna extremamente difícil a realização de um
diagnóstico definitivo. A elevada quantidade de testes necessária para excluir todas as
causas conhecidas de inflamação intestinal, muitas vezes de custos elevados ou nem
mesmo disponíveis na maior parte dos centros veterinários, juntamente com as dificuldades
económicas que cada vez mais se fazem sentir, tornam improvável, se não mesmo
impossível, a eliminação de todos os diagnósticos diferenciais possíveis na maior parte dos
casos. É então importante reconhecer que sem a realização de todos estes testes, não se
poderá afirmar com certeza que tal caso de trata realmente de uma enterite linfoplasmocítica
idiopática. Com o crescente estudo da imunopatogénese desta afecção, bem como com o
desenvolvimento contínuo de novas e melhores técnicas de diagnóstico, espera-se que para
breve seja possível diagnosticar esta doença sem recurso a protocolos diagnósticos de
exclusão.

101
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

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114
Enterite Linfoplasmocítica Canina

Anexo 1 - Diferenciação entre Diarreia de Intestino Delgado e Diarreia de


Intestino Grosso

Sinais Intestino Delgado Intestino Grosso


Volume Fecal Grande Pequeno
Frequência de Defecação Normal Aumentada
Muco Raro Comum
Melena Por vezes Ausente
Hematoquézia Rara Por vezes
Gordura Por vezes Ausente
Urgência Incomum Comum
Tenesmo Raro Comum
Perda de Peso Comum Rara
Vómito Por vezes Incomum
Eruptação Ocasional Rara
Flatulência Comum Ocasional
Distensão Abdominal Comum Rara
Exame Rectal Normal Doloroso
Prurido Anal Ausente Ocasional
(adaptado de Hall & German, 2005, p. 1346; Jergens, 2005, p.82; Willard, 2003, p.353)

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Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

Anexo 2 - Diferenciação entre Vómito e Regurgitação

Vómito Regurgitação
Consciente Inconsciente
Fase preparatória Varia com a postura
Contracção abdominal Passiva
Pode conter bílis Nunca contém bílis
Alimento digerido ou não digerido Alimento não digerido
pH<6 pH>6
Não moldado Moldado
Se conter sangue, este é digerido ou não Sangue vivo
Cheiro acre/ácido Cheiro dos alimentos ingeridos
(adaptado de Willard, 2003, p.345)

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Enterite Linfoplasmocítica Canina

Anexo 3 – Parâmetros para Classificação de Inflamação Duodenal

Atrofia dos Vilosidades


• Mucosa Normal: Vilosidades longas, finas e uniformes quando seccionadas
longitudinalmente.
• Inflamação Ligeira: Vilosidades reduzidas a aproximadamente 75% do comprimento normal;
algumas podem estar aumentadas em largura e não uniformes.
• Inflamação Moderada: Vilosidades reduzidas a aproximadamente 50% do comprimento
normal (atrofiadas). A maioria está aumentada em largura e algumas podem estar fundidas.
• Inflamação Severa: Vilosidades reduzidas a < 25% do comprimento normal e muitas vezes
fundidas; a superfície intestinal pode estar lisa em casos severos.

Lesão Epitelial
• Mucosa Normal: Camada simples de epitélio colunar. Em cães o número normal de células
caliciformes é aproximadamente 3 por 100 enterócitos.
• Inflamação Ligeira: Atenuação, degeneração, vacuolação ou separação de áreas focais de
epitélio superficial.
• Inflamação Moderada: Alterações degenerativas mais marcadas do epitélio das vilosidades,
com perda focal de algum epitélio.
• Inflamação Severa: Ulceração extensa da superfície epitelial.

Distensão das Criptas


• Mucosa Normal: Criptas uniformes alinhadas perpendicularmente à superfície, com estreitas
áreas luminais. Epitélio colunar das criptas com células caliciformes ocasionais (normal no cão
é aproximadamente 9 por 100 enterócitos).
• Inflamação Ligeira: Até 10% das criptas seccionadas estão dilatadas, distorcidas ou contêm
material luminal eosinofílico/ neutrófilos degenerados (abcesso das criptas).
• Inflamação Moderada: Até 25% das criptas seccionadas estão dilatadas, distorcidas ou
presentes como abcessos das criptas.
• Inflamação Severa: Até 50% das criptas seccionadas estão dilatadas, distorcidas ou
apresentam-se como abcessos das criptas.

117
Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

Dilatação dos Quilíferos


• Mucosa Normal: Quilíferos centrais representam até aproximadamente 25% da largura da
lâmina própria da vilosidade quando seccionadas longitudinalmente.
• Inflamação Ligeira: Quilífero central representa até aproximadamente 50% da largura da
lâmina própria da vilosidade quando seccionada longitudinalmente. Vilosidades geralmente
maiores que o normal.
• Inflamação Moderada: Quilífero central globoso, representando até 75% da largura da lâmina
própria das vilosidades quando seccionadas longitudinalmente. As vilosidades afectadas são
mais largas que o normal.
• Inflamação Severa: Quilífero central marcadamente dilatado, podendo ocupar até 100% da
lâmina própria da vilosidade. A lâmina própria envolvente (onde é aparente) está edematosa.
As vilosidades estão marcadamente distendidas, particularmente nas pontas, dando uma
aparência de taco.

Fibrose da Mucosa
• Mucosa Normal: Banda estreita de estroma separa as criptas, com até 1 a 2 fibroblastos de
largura.
• Inflamação Ligeira: Criptas separadas por uma banda de estroma, com até 5 fibroblastos em
largura.
• Inflamação Moderada: Criptas separadas por uma banda de estroma, com até 10 fibroblastos
de largura. As critas podem variar em largura, algumas sendo atróficas.
• Inflamação Severa: Criptas separadas por uma área extensa de matriz colagenosa, com mais
de 10 fibroblastos em largura. As criptas podem estar fibróticas ou perdidas e substituídas por
matriz fibrótica.

Linfócitos Intraepiteliais
• Mucosa Normal: Número normal em vilosidades, aproximadamente 5-10 por campo de
epitélio a 40x.
• Inflamação Ligeira: Aumento ligeiro no número de linfócitos intraepiteliais significa até 20-30
por campo de epitélio de vilosidades a 40x.
• Inflamação Moderada: Aproximadamente 30-50 linfócitos intraepiteliais por campo de epitélio
de vilosidades a 40x.
• Inflamação Severa: Aproximadamente 30-50 linfócitos intraepiteliais por campo de epitélio de
vilosidades a 40x. Estes podem estar agrupados e ocorrer a todos os níveis do epitélio.

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Enterite Linfoplasmocítica Canina

Linfócitos e Plasmócitos da Lâmina Própria


• Mucosa Normal: No interior da lâmina própria, aproximadamente 25% da área de um campo
a 40x pode estar ocupada por linfócitos e plasmócitos. Entre as criptas, podem existir 1-2
linfócitos ou plasmócitos.
• Inflamação Ligeira: Linfócitos e plasmócitos podem ocupar 25-50% da área da lâmina própria
num campo a 40x. As criptas podem estar separadas por até 5 linfócitos ou plasmócitos.
• Inflamação Moderada: Linfócitos e plasmócitos podem ocupar até 50-75% da lâmina própria
das vilosidades num campo a 40x. As criptas podem estar separadas por até 10 linfócitos ou
plasmócitos.
• Inflamação Severa: Linfócitos e plasmócitos podem ocupar até 75-100% da lâmina própria da
vilosidade num campo a 40x. As criptas podem estar separadas por até 20 linfócitos e
plasmócitos.

Eosinófilos da Lâmina Própria


• Mucosa Normal: Números normais de eosinófilos podem chegar a 2-3 células por campo a
40x. Os eosinófilos podem ser mais numerosos em animais jovens.
• Inflamação Ligeira: Elevação ligeira do número de eosinófilos para aproximadamente 5-10
por campo a 40x. As células mononucleares ainda dominam a população tecidular de
leucócitos.
• Inflamação Moderada: Elevação moderada do número de eosinófilos para 10-20 por campo a
40x. As células mononucleares ainda dominam a população tecidular de leucócitos ou ocorrem
num número similar ao dos eosinófilos.
• Inflamação Severa: Os eosinófilos dominam a população tecidular de leucócitos e não são
facilmente enumerados num campo a 40x.

Neutrófilos da Lâmina Própria:


• Mucosa Normal: Neutrófilos não devem estar presentes.
• Inflamação Ligeira: Infiltração ligeira na lâmina própria pode espalhar-se para o epitélio (5-10
neutrófilos por campo a 40x). As células mononucleares ainda dominam.
• Inflamação Moderada: : Infiltração moderada (20-30 neutrófilos por campo a 40x); pode ser
acompanhada de macrófagos. Neutrófilos e células mononucleares podem estar presentes em
números iguais.
• Inflamação Severa: Os neutrófilos são a população dominante num campo a 40x e não são
facilmente enumerados. Podem ser acompanhados por macrófagos (Day et al., 2008, pp.23-32,
tradução livre).

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Dissertação de Mestrado – Tiago Magalhães

Anexo 4 - Exemplo de Dieta Caseira para Cães Adultos com Diarreia Crónica

Nesta secção apresenta-se um exemplo de uma dieta para cães adultos com doença
gastrointestinal, fornecendo aproximadamente 400Kcal :

• “ 225g de arroz branco cozido


• 125g de queijo fresco, tofu, carne de galinha cozida (sem pele) ou carneiro cozido
(este último com mais gordura)
• 1 colher de chá de óleo vegetal
• 1 a 2 colheres de sopa de fibra comercial ou farelo para pacientes com doença
colónica (omitir se a dieta for utilizada como dieta de eliminação)
• ¾ de colher de chá de KCl (como utilizado para pacientes cardíacos)
• Suplemento vitamínico; podem ser necessárias injecções adicionais de vitamina B12”
(Chandler, 2002a, p.529, tradução livre).

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Enterite Linfoplasmocítica Canina

Anexo 5 – Classificação dos Diferentes Sinais Clínicos que Compõem o


CIBDAI:

Apetite
Atitude/Actividade
0 Normal
0 Normal
1 Ligeiramente diminuído
1 Ligeiramente diminuída
2 Moderadamente diminuído
2 Moderadamente diminuída
3 Severamente diminuído
3 Severamente diminuída

Vómito Perda de peso


0 Ausente 0 Nenhuma
1 Ligeiro (1x/semana) 1 Ligeira (<5%)
2 Moderado (2-3x/semana) 2 Moderada (5-10%)
3 Severo (>3x/semana) 3 Severa (>10%)

Frequência de defecação Consistência das fezes


0 Normal 0 Normal
1 Ligeiramente aumentada (2- 1 Fezes moles, ou com sangue,
3x/dia) muco ou ambos
2 Moderadamente aumentada 2 Fezes muito moles
(4-5x/dia) 3 Fezes aquosas
3 Severamente aumentada
(>5x/dia)

(adaptado de Jergens et al., 2003, p.292)

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