Manuscritos Econômico-Filosóficos, de Karl Marx
Manuscritos Econômico-Filosóficos, de Karl Marx
Manuscritos Econômico-Filosóficos, de Karl Marx
Manuscritos Econômico-
Filosóficos
Karl Marx
Agosto de 1844
Índice
Prefácio
Primeiro Manuscrito
Trabalho alienado
Segundo Manuscrito
Terceiro Manuscrito
Prefácio
Não é necessário assegurar ao leitor familiarizado com a Economia Política que minhas
conclusões são o fruto de uma análise inteiramente empírica, baseadas em um meticuloso
estudo crítico da Economia Política.
É claro que além de aos socialistas franceses e ingleses também recorri a trabalhos de
socialistas alemães. Mas as obras alemães originais e importantes a este respeito - fora as de
Weitling - limitam-se aos ensaios publicados por Hess no Einundzwanzib Bogen , e ao de
Engels, "Umrisse zur Kritik der Nationaloekonomie" no Deutsch-Franzoesischer Jahrbücher.
Nesta última publicação, eu mesmo indiquei, de forma bastante genérica, os elementos básicos
do presente trabalho.
A crítica positiva, humanista e naturalista tem início com Feuerbach. Os trabalhos menos
espetaculares de Feuerbach são os mais certos, profundos, extensos e duradouros em sua
influência; eles são os únicos, desde a Fenomenologia e a Lógica de Hegel que contêm uma
verdadeira revolução teórica.
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Ao contrário dos teólogos críticos de nossa época, considerei o capítulo final do presente
trabalho, uma exposição crítica da dialética hegeliana e de sua filosofia geral, como
absolutamente essencial, pois isso ainda não foi feito. Esta falta de meticulosidade não é
acidental, pois o teólogo crítico continua a ser um teólogo. Ele tem de partir, seja de certos
pressupostos da filosofia aceita como oficial, ou então, se no decurso da crítica e como resultado
de descobertas de outras pessoas surgirem-lhe na mente dúvidas acerca dos pressupostos
filosóficos, abandona-os de forma covarde e sem justificativa, abstrai a partir deles, e demonstra
ao mesmo tempo dependência servil face a elas e seu ressentimento a essa dependência de
maneira negativa, inconsciente e sofística.
Olhada mais de perto, a crítica teológica, que foi no começo do movimento um fator
genuinamente progressista, é vista como sendo, em última análise, nada mais que a culminação
e conseqüência do antigo transcendentalismo filosófico, e especialmente hegeliano, deformado
numa caricatura teológica. Descreverei alhures, com maior minúcia, esse ato interessante de
justiça histórica, essa nêmese que agora destina a teologia, sempre o setor infectado da filosofia,
a espelhar em si a mesma dissolução negativa da filosofia, isto é, o processo de sua decadência.
Manuscritos Econômico-Filosóficos
Karl Marx
Primeiro Manuscrito
Trabalho Alienado
(XXII) Partimos dos pressupostos da Economia Política. Aceitamos sua terminologia e suas
leis. Aceitamos como premissas a propriedade privada, a separação do trabalho, capital e terra,
assim como também de salários, lucro e arrendamento, a divisão do trabalho, a competição, o
conceito de valor de troca, etc. Com a própria economia política, usando suas próprias palavras,
demonstramos que o trabalhador afunda até um nível de mercadoria, e uma mercadoria das
mais deploráveis; que a miséria do trabalhador aumenta com o poder e o volume de sua
produção; que o resultado forçoso da competição é o acumulo de capital em poucas mãos, e
assim uma restauração do monopólio da forma mais terrível; e, por fim, que a distinção entre
capitalista e proprietário de terras, e entre trabalhador agrícola e operário, tem de desaparecer,
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dividindo-se o conjunto da sociedade em duas classes de possuidores de propriedades e
trabalhadores sem propriedades.
A economia Política parte do fato da propriedade privada; não o explica. Ela concebe o
processo material da propriedade privada, como ocorre na realidade, por meio de fórmulas
abstratas e gerais que, então, servem como leis. Ela não compreende essas leis; isto é, ela não
mostra como surgem da natureza da propriedade privada. A Economia Política não dá nenhuma
explicação da base para a distinção entre trabalho e capital, entre capital e terra. Quando, por
exemplo, a relação entre salários e lucros é definida, isso é explicado em função dos interesses
dos capitalistas; por outras palavras, o que devia ser explicado é admitido. Analogamente, a
competição é referida a todos os pontos e explicada em função das condições externas. A
Economia Política nada nos diz a respeito da medida em que essas condições externas, e
aparentemente acidentais, são simplesmente a expressão de uma evolução necessária. Vimos
como a própria troca se afigura um fato acidental. As únicas forças propulsoras reconhecidas
pela Economia Política são a avareza e a guerra entre os gananciosos, a competição.
Por isso, temos agora de apreender a ligação real entre todo esse sistema de alienação -
propriedade privada, ganância, separação entre trabalho, capital e terra, troca e competição,
valor e desvalorização do homem, monopólio e competição - e o sistema do dinheiro.
Não iniciaremos nossa exposição, como o faz o economista, por uma legendária situação
primitiva. Uma tal situação arcaica nada explica; simplesmente afasta a pergunta para uma
distância turva e enevoada. Ela afirma como fato ou acontecimento o que deveria deduzir, ou
seja, a relação necessária entre duas coisas; por exemplo, entre a divisão do trabalho e a troca.
Da mesma maneira, a teologia explica a origem do mal pela queda do homem; isto é, ela
assegura como fato histórico aquilo que deveria elucidar.
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cria apenas objetos; ele também se produz a si mesmo e ao trabalhador como uma mercadoria,
e, deveras, na mesma proporção em que produz bens.
Esse fato simplesmente subentende que o objeto produzido pelo trabalho, o seu produto,
agora se lhe opõe como um ser estranho, como uma força independente do produtor. O produto
do trabalho humano é trabalho incorporado em um objeto e convertido em coisa física; esse
produto é uma objetificação do trabalho. A execução do trabalho é simultaneamente sua
objetificação. A execução do trabalho aparece na esfera da Economia Política como uma
perversão do trabalhador, a objetificação como uma perda e uma servidão ante o objeto, e a
apropriação como alienação.
A execução do trabalho aparece tanto como uma perversão que o trabalhador se perverte
até o ponto de passar fome. A objetificação aparece tanto como uma perda do objeto que o
trabalhador é despojado das coisas mais essenciais não só da vida, mas também do trabalho. O
próprio trabalho transforma-se em um objeto que ele só pode adquirir com tremendo esforço e
com interrupções imprevisíveis. A apropriação do objeto aparece como alienação a tal ponto que
quanto mais objetos o trabalhador produz tanto menos pode possuir e tanto mais fica dominado
pelo seu produto, o capital.
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de existência em sentido mais restrito, ou sejam os meios de subsistência física para o próprio
trabalhador. Assim, quanto mais o trabalhador apropria o mundo externo da natureza
sensorial por seu trabalho, tanto mais se despoja de meios de existência, sob dois aspectos:
primeiro, o mundo exterior sensorial se torna cada vez menos um objeto pertencente ao
trabalho dele ou um meio de existência de seu trabalho; segundo, ele se torna cada vez menos
um meio de existência na acepção direta, um meio para a subsistência física do trabalhador.
O apogeu dessa escravização é ele só poder se manter como sujeito físico na medida em que
é um trabalhador, e de ele só como sujeito físico poder ser um trabalhador.
A relação direta do trabalho com seus produtos é a entre o trabalhador e os objetos de sua
produção. A relação dos possuidores de propriedade com os objetos da produção e com a
própria produção é meramente uma conseqüência da primeira relação e a confirma.
Apreciaremos adiante este segundo aspecto. Portanto, quando perguntamos qual é a relação
importante do trabalho, estamos interessados na relação do trabalhador com a produção.
Até aqui consideramos a alienação do trabalhador somente sob um aspecto, qual seja o de
sua relação com os produtos de seu trabalho. Não obstante, a alienação aparece não só como
resultado, mas também como processo de produção, dentro da própria atividade produtiva.
Como poderia o trabalhador ficar numa relação alienada com o produto de sua atividade se não
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se alienasse a si mesmo no próprio ato da produção? O produto é, de fato, apenas a síntese da
atividade, da produção. Conseqüentemente, se o produto do trabalho é alienação, a própria
produção deve ser alienação ativa - a alienação da atividade e a atividade da alienação A
alienação do objeto do trabalho simplesmente resume a alienação da própria atividade do
trabalho.
Consideremos, agora, o ato de alienação da atividade humana prática, o trabalho, sob dois
aspectos: 1) a relação do trabalhador com o produto do trabalho como um objeto estranho que o
domina. Essa relação é, ao mesmo tempo, a relação com o mundo exterior sensorial, com os
objetos naturais, como um mundo estranho e hostil; 2) a relação do trabalho como o ato de
produção dentro do trabalho. Essa é a relação do trabalhador com sua própria atividade
humana como algo estranho e não pertencente a ele mesmo, atividade como sofrimento
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(passividade), vigor como impotência, criação como emasculação, a energia física e mental
pessoal do trabalhador, sua vida pessoal (pois o que é a vida senão atividade?) como uma
atividade voltada contra ele mesmo, independente dele e não pertencente a ele. Isso é auto-
alienação, ao contrário da acima mencionada alienação do objeto.
(XXIV) Temos, agora, de inferir uma terceira característica do trabalho alienado, partindo
das duas já vistas.
O homem é um ente-espécie não apenas no sentido de que ele faz da comunidade (sua
própria, assim como as de outras coisas) seu objeto, tanto prática quanto teoricamente, mas
também (e isto é simplesmente outra expressão da mesma coisa) no sentido de tratar-se a si
mesmo como a espécie vivente, atual, como um ser universal e conseqüentemente livre.
A vida da espécie, para o homem assim como para os animais, encontra sua base física no
fato de o homem (como os animais) viver da natureza inorgânica, e como o homem é mais
universal que um animal, assim também o âmbito da natureza inorgânica de que ele vive é mais
universal. Vegetais, animais, minerais, ar, luz, etc., constituem, sob o ponto de vista teórico, uma
parte da consciência humana como objetos da ciência natural e da arte; eles são a natureza
inorgânica espiritual do homem, se meio intelectual de vida, que ele deve primeiramente
preparar para seu prazer e perpetuação. Assim também, sob o ponto de vista prático, eles
formam parte da vida e atividade humanas. Na prática, o homem vive apenas desses produtos
naturais, sob a forma de alimento, aquecimento, roupa, abrigo, etc. A universalidade do homem
aparece, na prática, na universalidade que faz da natureza inteira o seu corpo: 1) como meio
direto de vida, e igualmente, 2) como o objeto material e o instrumento de sua atividade vital. A
natureza é o corpo inorgânico do homem; quer isso dizer a natureza excluindo o próprio corpo
humano. Dizer que o homem vive da natureza significa que a natureza é o corpo dele, com o
qual deve se manter em contínuo intercâmbio a fim de não morrer. A afirmação de que a vida
física e mental do homem e a natureza são interdependentes, simplesmente significa ser a
natureza interdependente consigo mesma, pois o homem é parte dela.
2) aliena o homem de si mesmo, de sua própria função ativa, de sua atividade vital, assim
também o aliena da espécie. Ele transforma a vida da espécie em uma forma de vida individual.
Em primeiro lugar, ele aliena a vida da espécie e a vida individual, e posteriormente transforma
a segunda, como uma abstração, em finalidade da primeira, também em sua forma abstrata e
alienada.
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Pois, trabalho, atividade vital, vida produtiva, agora aparecem ao homem apenas como
meios para a satisfação de uma necessidade, a de manter sua existência física. A vida produtiva,
contudo, é vida da espécie. É vida criando vida. No tipo de atividade vital, reside todo o caráter
de uma espécie, seu caráter como espécie; e a atividade livre, consciente, é o caráter como
espécie dos seres humanos. A própria vida assemelha-se somente a um meio de vida.
O animal identifica-se com sua atividade vital. Ele não distingue a atividade de si mesmo.
Ele é sua atividade.
O homem, porém, faz de sua atividade vital um objeto de sua vontade e consciência. Ele tem
uma atividade vital consciente. Ela não é uma prescrição com a qual ele esteja plenamente
identificado. A atividade vital consciente distingue o homem da atividade vital dos animais: só
por esta razão ele é um ente-espécie. Ou antes, é apenas um ser auto-consciente, isto é, sua
própria vida é um objeto para ele, porque ele é um ente-espécie. Só por isso, a sua atividade é
atividade livre. O trabalho alienado inverte a relação, pois o homem, sendo um ser
autoconsciente, faz de sua atividade vital, de seu ser, unicamente um meio para sua existência.
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como ente-espécie, e muda a superioridade sobre os animais em uma inferioridade, na medida
em que seu corpo inorgânico, a natureza, é afastado dele.
Assim como o trabalho alienado transforma a atividade livre e dirigida pelo próprio
indivíduo em um meio, também transforma a vida do homem como membro da espécie em um
meio de existência física.
A consciência que o homem tem de sua espécie é transformada por meio da alienação, de
sorte que a vida como espécie torna-se apenas um meio para ele.
(3) Então, o trabalho alienado converte a vida do homem como membro da espécie, e
também como propriedade mental da espécie dele, em uma entidade estranha e em um meio
para sua existência individual. Ele aliena o homem de seu próprio corpo, a natureza extrínseca,
de sua vida mental e de sua vida humana.
(4) Uma conseqüência direta da alienação do homem com relação ao produto de seu
trabalho, à sua atividade vital e a sua vida como membro da espécie, é o homem ficar alienado
dos outros homens. Quando o homem se defronta consigo mesmo, também está se defrontando
com outros homens.
O que é verdadeiro quanto à relação do homem com seu trabalho, com o produto desse
trabalho e consigo mesmo, também o é quanto à sua relação com outros homens, com o
trabalho deles e com os objetos desse trabalho.
De maneira geral, a declaração de que o homem fica alienado da sua vida como membro da
espécie implica em cada homem ser alienado dos outros, e cada um dos outros ser igualmente
alienado da vida humana.
A alienação humana, e acima de tudo a relação do homem consigo próprio, é pela primeira
vez concretizada e manifestada na relação entre cada homem e os demais homens. Assim, na
relação do trabalho alienado cada homem encara os demais de acordo com os padrões e relações
em que ele se encontra situado como trabalhador.
Examinemos, agora, mais além, como esse conceito de trabalho alienado deve expressar-se
e revelar-se na realidade. Se o produto do trabalho me é estranho e enfrenta-me como uma força
estranha, a quem pertence ele? Se minha própria atividade não me pertence, mas é uma
atividade alienada, forçada, a quem ela pertence? A um ser, outro que não eu. E que é esse ser?
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Os deuses? É evidente, nas mais primitivas etapas de produção adiantada, por exemplo,
construção de templos, etc., no Egito, Índia, México, é nos serviços prestados aos deuses, que o
produto pertencia a estes. Mas os deuses nunca eram por si sós os donos do trabalho humano;
tampouco o era a natureza. Que contradição haveria se quanto mais o homem subjugasse a
natureza com seu trabalho, e quanto mais as maravilhas dos deuses fossem tornadas supérfluas
pelas da industria, ele se abstivesse da sua alegria em produzir e de sua fruição dos produtos por
amor a esses poderes!
O meio através do qual a alienação ocorre é, por si mesmo, um meio prático. Graças ao
trabalho alienado, por conseguinte, o homem não só produz sua relação com o objeto e o
processo da produção como com homens estranhos e hostis, mas também produz a relação de
outros homens com a produção e o produto dele, e a relação entre ele próprio e os demais
homens. Tal como ele cria sua própria produção como uma perversão, uma punição, e seu
próprio produto como uma perda, como um produto que não lhe pertence, assim também cria a
dominação do não-produtor sobre a produção e os produtos desta. Ao alienar sua própria
atividade, ele outorga ao estranho uma atividade que não é deste.
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Apreciamos até aqui essa relação somente do lado do trabalhador, e posteriormente a
apreciaremos também do lado do não-trabalhador.
Assim, graças ao trabalho alienado o trabalhador cria a relação de outro homem que não
trabalha e está de fora do processo do trabalho, com o seu próprio trabalho. A relação do
trabalhador com o trabalho também provoca a relação do capitalista (ou como quer que se
denomine ao dono da mão-de-obra) com o trabalho. A propriedade privada é, portanto, o
produto, o resultado inevitável, do trabalho alienado, da relação externa do trabalhador com a
natureza e consigo mesmo.
Está claro que extraímos o conceito de trabalho alienado (vida alienada) da Economia
Política, partindo de uma análise do movimento da propriedade privada. A análise deste
conceito, porém, mostra que embora a propriedade privada pareça ser a base e causa do
trabalho alienado, é antes uma conseqüência dele, tal e qual os deuses não são
fundamentalmente a causa, mas o produto de confusões da razão humana. Numa etapa
posterior, entretanto, há uma influência recíproca.
Só na etapa final da evolução da propriedade privada é revelado o seu segredo, ou seja, que
é, de um lado, o produto do trabalho alienado, e do outro, o meio pelo qual o trabalho é
alienado, a realização dessa alienação.
(1) A Economia Política inicia tomando o trabalho como a verdadeira alma da produção e, a
seguir, nada lhe atribui, concedendo tudo à propriedade privada. Proudhon, defrontando-se
com essa contradição, decidiu em favor do trabalho contra a propriedade privada. Percebemos,
contudo, que essa aparente contradição é a contradição do trabalho alienado consigo mesmo e
que a Economia Política meramente formulou as leis do trabalho alienado.
Observamos, também, por conseguinte, que salários e propriedade privada são idênticos,
porquanto os salários como o produto ou objetivo do trabalho, o próprio trabalho remunerado,
são apenas conseqüência necessária da alienação do trabalho. No sistema de salários, o trabalho
aparece não como um fim por si mas como o servo dos salários. Mais tarde nos entenderemos
sobre isto, limitando-nos, aqui, a desvendar algumas das conseqüências (XXVI).
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melhor de escravos, e não restauraria, seja para o trabalhador seja para o trabalho, seu
significado e valor humanos.
Mesmo a igualdade das rendas que Proudhon exige só modificaria a relação do trabalhador
de hoje em dia com seu trabalho em uma relação de todos os homens com o trabalho. A
sociedade seria concebida, então, como um capitalista abstrato.
(2) Da relação do trabalho alienado com a propriedade privada também decorre que a
emancipação da sociedade da propriedade privada, da servidão, assume a forma política de
emancipação dos trabalhadores; não no sentido de só estar em jogo a emancipação destes, mas
por essa emancipação abranger a de toda a humanidade. Pois toda servidão humana está
enredada na relação do trabalhador com a produção, e todos os tipos de servidão são somente
modificações ou corolários desta relação.
Sem embargo, antes de considerar essa estrutura, tentemos solucionar dois problemas.
(2) Tomamos como fato e analisamos a alienação do trabalho. Como sucede, podemos
indagar, que o homem aliene seu trabalho? Como essa alienação se alicerça na natureza da
evolução humana? Já fizemos muito para resolver o problema, visto termos transformado a
questão referente ã origem da propriedade privada em uma questão acerca da relação entre
trabalho alienado e o processo de evolução da humanidade. Pois, ao falar de propriedade
privada, acredita-se estar lidando com algo extrínseco à espécie humana. Mas, ao falar de
trabalho, lida-se diretamente com a própria espécie humana. Esta nova formulação do problema
já encerra sua solução.
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Consideramos um aspecto, o trabalho alienado, em seus reflexos no próprio trabalhador,
isto é, a relação alienada do trabalho humano consigo mesmo. E constatamos ser corolário
obrigatório dessa relação, a relação de propriedade do não-trabalhador com o trabalhador e
com o trabalho. A propriedade privada, como expressão material sinóptica do trabalho
alienado, inclui ambas as relações: a relação do trabalhador com o trabalho, com o produto de
seu trabalho e com o não-trabalhador, e a relação do não-trabalhador com o trabalhador e
com o produto do trabalho deste.
Já vimos que em relação ao trabalhador, que apropria a natureza por intermédio de seu
trabalho, a apropriação se afigura uma alienação, a atividade própria como atividade para
outrem e de outrem, a vida como sacrifício da vida, e a produção do objeto como perda deste
para uma força estranha, um homem estranho. Consideremos, agora, a relação deste homem
estranho com o trabalhador, com o trabalho e com o objeto do trabalho.
Deve ser observado, de início, que tudo que aparece ao trabalhador como uma atividade de
alienação, aparece ao não-trabalhador como uma condição de alienação. Em segundo lugar, a
atitude prática real do trabalhador na produção e face ao produto (como estado de espírito)
afigura-se ao não-trabalhador, que com ele se defronta, como uma atitude teórica.
(XXVII) Em terceiro lugar, o não-trabalhador faz contra o trabalhador tudo que este faz
contra si mesmo, mas não faz contra si próprio o que faz contra o trabalhador.
Manuscritos Econômico-Filosóficos
Karl Marx
Segundo Manuscrito
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objetiva do fato de o trabalho ser o homem perdido para si mesmo. Contudo, o trabalhador tem
o infortúnio de ser um capital vivo, um capital com necessidades, que se deixa privar de seus
interesses e, conseqüentemente, seu ganha-pão, todo momento em que não se acha
trabalhando. Como capital, o valor do trabalhador varia conforme a oferta e a procura, e sua
existência física, sua vida, foi e é considerada um estoque de mercadoria, similar a qualquer
outra. O trabalhador produz capital e o capital produz o trabalhador. Assim, ele se produz a si
mesmo, e o homem como trabalhador, como utilidade, é o produto de todo esse processo. O
homem é simplesmente um trabalhador, e como tal suas qualidades humanas só existem em
proveito do capital que lhe é estranho. Como trabalho e capital são estranhos um ao Outro, e por
isso relacionados unicamente de maneira acidental e exterior, esse caráter de alienação tem de
aparecer na realidade. Logo que ocorre ao capital — seja forçada seja voluntariamente — não
existir mais para o trabalhador, ele não mais existe para si mesmo: ele não tem trabalho, nem
salários, e como existe exclusivamente como trabalhador e não como ser humano, pode
perfeitamente deixar-se enterrar, morrer a míngua, etc, O trabalhador só é trabalhador quando
existe como capital para si próprio, e só existe como capital quando há capital para ele. A
existência do capital é a existência dele, sua vida, visto determinar o conteúdo de sua vida
independentemente dele. A Economia Política, pois, não reconhece o trabalhador desocupado, o
homem capaz de trabalhar, uma vez colocado fora dessa relação de trabalho. Vigaristas, ladrões,
mendigos, os desempregados, o trabalhador faminto, indigente e criminoso, são figuras não
existentes para a Economia Política, mas apenas para os olhos de outros: médicos, juízes,
coveiros, burocratas, etc. Eles são figuras fantasmagóricas fora do domínio da Economia. As
necessidades do trabalhador, portanto, reduzem-se à necessidade de mantê-lo durante o
trabalho, de molde a não se extinguir a raça de trabalhadores. Conseqüentemente, os salários
têm exatamente o mesmo significado da manutenção de qualquer outro instrumento de
produção e do consumo de capital em geral, de modo a que este possa reproduzir-se a si mesmo
com juros. Ë como o óleo aplicado a uma roda para conservá-la rodando. Os salários, portanto,
formam parte dos custos necessários do capital e do capitalista, e não devem exceder ao
montante assim necessário. Por isso, era assaz lógico para os donos de fábricas ingleses, antes
da Emenda de 1834, deduzir dos salários as esmolas públicas recebidas pelos trabalhadores
através das taxas estabelecidas pela lei de assistência aos pobres, tratando-as como parte
integrante dos respectivos salários.
A produção não apenas produz o homem como uma utilidade, a utilidade humana, o
homem sob a forma de mercadoria; de acordo com essa situação, produz o homem como um
ser mental e fisicamente desumanizado. — Imoralidade, aborto, escravidão de trabalhadores e
capitalistas. — Seu produto é a mercadoria com consciência própria e capacidade grande passo
dado à frente por Ricardo, Mill, etc., em contraposição a Smith e Say, declarar a existência de
seres humanos — a maior ou menor produtividade humana da mercadoria —como indiferente,
ou deveras nociva. O verdadeiro objetivo da produção não é o número de trabalhadores
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sustentados por determinado capital, porém o volume de juros que ele adquire, a poupança total
anual. Foi, analogamente, um grande avanço lógico da recente economia política inglesa (XLI)
que, embora estabelecendo o trabalho como seu princípio exclusivo, distinguisse claramente a
relação inversa entre salários e juros do capital e observasse que, via de regra, o capitalista só
poderia aumentar os ganhos pelo rebaixamento dos salários e vice-versa. A relação normal é
considerada como sendo não a burla do consumidor, mas a trapaça mútua de capitalista e
trabalhador. A relação da propriedade privada inclui em seu íntimo, em estado latente, a relação
da propriedade privada como trabalho, a relação da propriedade privada como capital, e a
influência recíproca de ambos. Por um lado, é a produção da atividade humana como trabalho,
isto é, uma atividade alheia a si mesma, ao homem e à natureza, e portanto alheia à consciência
e à realização da vida humana; a existência abstrata do homem como um mero trabalhador
que, por conseguinte, diariamente salta de sua nulidade realizada para a nulidade absoluta, para
a não-existência social, e por isso real. Por outro lado, há a produção de objetos do trabalho
humano sob a forma de capital, onde toda característica natural e social do objeto é dissolvida,
onde a propriedade privada perdeu sua qualidade natural e social (e, portanto, perdeu
totalmente seu disfarce político e social e não mais se afigura vinculada às relações humanas), e
onde o mesmo capital permanece o mesmo nas mais diversas circunstâncias naturais e sociais,
sem relevância para o conteúdo real dele. Esta contradição, em seu auge, é forçosamente o
apogeu e o declínio da relação inteira.
É, por conseguinte, outra grande conquista da recente Economia Política inglesa ter
definido o arrendamento da terra como a diferença entre os rendimentos da terra pior cultivada
e da melhor, ter posto abaixo as ilusões românticas do proprietário de terras — sua suposta
importância social e a identidade de seus interesses com os do conjunto da sociedade (uma
opinião sustentada por Adam Smith ainda após os Fisiocratas) — e ter antecipado e preparado a
evolução da realidade que transformará o proprietário de terras em um capitalista comum e
prosaico e, portanto, simplificará a contradição, superando-a e preparando sua solução. A terra
como terra, o arrendamento de terra como arrendamento de terra, perderam sua
diferenciação de status, convertendo-se em meros capital e juros, ou, melhor, capital e juros que
só entendem a linguagem do dinheiro.
A distinção entre capital e terra, lucro e arrendamento de terra, e a distinção entre salários,
indústria, agricultura, propriedade privada imóvel e móvel, é uma distinção histórica, nunca
uma distinção inscrita na natureza das coisas. Ë uma etapa fixa na formação e desenvolvimento
da antítese entre capital e trabalho. Na indústria, etc., ao contrário da propriedade agrária
imóvel, só o modo de origem e a antítese face à agricultura graças à qual a indústria se
desenvolveu, é manifestada. Como um género particular de trabalho, como uma distinção mais
significativa, importante e global, ela existe apenas na medida em que a indústria (vida urbana)
se estabelece em oposição à propriedade agrária (vida feudal aristocrática). Em uma situação
assim, o trabalho ainda parece ter um significado social, ainda tem o significado de genuína vida
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comunal, e ainda não progrediu para a neutralidade face a seu conteúdo, para uma auto-
suficiência completa, isto é, para um estado de abstração de todas as outras existências e, pois,
para o capital liberado.
Esta transformação tem lugar a princípio por intermédio do lavrador rendeiro. Este,
porém, é o representante, o segredo revelado, do dono da terra. Só por meio dele o dono da
terra tem existência econômica, como possuidor de propriedades; pois o arrendamento da terra
só existe como resultado da competição entre rendeiros. Assim, o dono da terra já se converteu,
na pessoa do rendeiro, em um capitalista comum. E isso tem de Ser realizado na realidade; o
capitalista que dirige a agricultura (o rendeiro) tem de transformar-se em dono da terra, ou vice-
versa. O negócio industrial do rendeiro é o do proprietário, pois a existência daquele estabelece
a deste.
Ela (a propriedade móvel) alega ter conquistado a liberdade política para o povo, retirado
os grilhões que tolhiam a sociedade civil, unido entre si mundos diferentes, estabelecido o
comércio que promove a amizade entre os povos, criado uma moral pura e cultura agradável.
Deu ao povo, em lugar de suas necessidades cruéis, outras mais civilizadas, assim como os
modos de satisfazê-las. Mas, o proprietário de terras — esse ocioso especulador de cereais —
aumenta o preço das necessidades básicas da vida do povo e, por isso, obriga o capitalista a
elevar os salários sem ser capaz de aumentar a produtividade, tolhendo assim e finalmente
impedindo o crescimento da renda nacional e a acumulação de capital da qual depende a criação
de trabalho para o povo e de riquezas para o país. Ele dá lugar a um declínio generalizado, e
parasitariamente explora todas as vantagens da civilização moderna sem fazer a mínima
contribuição para esta, e sem abandonar qualquer de seus preconceitos feudais. Finalmente, faz
com que ele — para quem o amanho do solo e a própria terra só existem como uma fonte de
dinheiro mandada pelo céu —encare o rendeiro e diga se ele próprio não é um canalha íntegro,
fantástico e ladino que, no fundo do coração e realmente, de há muito foi conquistado pela livre
indústria e pelas delíciais do comércio, por mais que possa resistir-lhes e murmurar acerca de
recordações históricas ou de objetivos morais e políticos. Tudo que ele de fato pode apresentar
em justificativa sé é verdade no tocante ao cultivador da terra (o capitalista e seus empregados)
de quem o dono da terra é antes o inimigo; assim, ele depõe contra si mesmo. Sem capital, a
propriedade imobiliária é coisa sem vida e sem valor. E, com efeito, a vitória civilizada da
propriedade móvel ter descoberto e criado o trabalho humano como fonte da riqueza, em vez de
coisas sem vida. (Ver Paul Louis, Courier, Saint-Simon, Ganilh, Ricardo, Mill, MacCulloch,
Destutt de Tracy e Michel Chevalier.)
(1) Ver o palavroso teólogo hegeliano à moda antiga, Funke, que, segundo Herr Leo, contou
com lágrimas nos olhos como um escravo recusara, quando foi abolida a servidão, cessar de ser
uma propriedade nobre. Ver, também, o livro Patriotische Phantasien, de Justus Moser, que se
destaca pelo fato de nunca abandonar, por nenhum momento, o horizonte ingênuo, pequeno-
burguês, "feito em casa", comum e limitado do filisteu, e no entanto permanece sendo pura
fantasia. Essa contradição tornou essas fantasias tão aceitáveis ao espírito alemão.
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Notas:
(1) Ver o palavroso teólogo hegeliano à moda antiga, Funke, que, segundo Herr Leo, contou
com lágrimas nos olhos como um escravo recusara, quando foi abolida a servidão, cessar de ser
uma propriedade nobre. Ver, também, o livro Patriotische Phantasien, de Justus Moser, que se
destaca pelo fato de nunca abandonar, por nenhum momento, o horizonte ingênuo, pequeno-
burguês, "feito em casa", comum e limitado do filisteu, e no entanto permanece sendo pura
fantasia. Essa contradição tornou essas fantasias tão aceitáveis ao espírito alemão. (retornar ao
texto)
Manuscritos Econômico-Filosóficos
Karl Marx
Terceiro Manuscrito
Assim, em vista dessa economia política esclarecida que descobriu a essência subjetiva da
riqueza dentro da estrutura da propriedade privada, os partidários do sistema monetário e do
mercantilismo, para quem a propriedade privada é uma entidade puramente objetiva para o
homem, não fetichistas e católicos. Engels está certo, por isso, de chamar Adam Smith o Lutero
da Economia Política. Assim como Lutero reconheceu a religião e a fé como a essência do
mundo real, e por essa razão assumiu uma posição adversa ao paganismo cristão; assim como
ele anulou a religiosidade externa ao mesmo passo que fazia da religiosidade a essência interior
do homem; assim como ele negou a distinção entre sacerdote e leigo porque transferiu o
sacerdócio para o coração do leigo; também a riqueza extrínseca ao homem e dele independente
(só podendo, pois, ser adquirida e conservada de fora) é anulada. Isso quer dizer, sua
objetividade externa e indiferente é anulada pelo fato de a propriedade privada ser incorporada
20
ao próprio homem, e de ser o próprio homem reconhecido como sua essência. Mas, como
resultado, o próprio homem é levado para a esfera da propriedade privada, exatamente como,
com Lutero, é levado para a da religião. Sob o disfarce de reconhecer o homem, a economia
política, cujo princípio é o trabalho, leva à sua lógica conclusão a negação do homem. O próprio
homem não mais é uma condição da tensão externa com a substância externa da propriedade
privada; ele próprio se converteu na entidade oprimida por tensões, que é a da propriedade
privada. O que era anteriormente um fenômeno de ser extrínseco a si mesmo, uma
manifestação extrínseca real do homem, transformou-se, agora no ato de objetivação, de
alienação. Esta economia política parece, por conseguinte, a princípio, reconhecer o homem
com sua independência, sua atividade pessoal, etc. Ela incorpora a propriedade privada à
essência mesma do homem, e não é mais, portanto, condicionada pelas características locais ou
nacionais da propriedade privada considerada como existente fora dela mesma. Ela manifesta
uma atividade cosmopolita, universal, que destrói todos os limites e todos os vínculos,
reputando-se a si mesma como a única orientação, a única universalidade, o único limite e o
único vínculo. Em seu desenvolvimento ulterior, contudo, vê-se obrigada a rejeitar essa
hipocrisia e a mostrar-se em todo o seu cinismo. Faz isso, sem qualquer consideração pelas
contradições aparentes a que sua doutrina conduz, revelando por uma outra maneira unilateral,
e por isso com maior lógica e clareza, que o trabalho é a única essência da riqueza, e
demonstrando que essa doutrina, ao contrário da concepção original, tem conseqüências
daninhas ao homem. Finalmente, ela aplica o golpe de morte à renda da terra, aquela última
forma individual e natural da propriedade privada e fonte de riqueza existente
independentemente do movimento do trabalho que foi a expressão da propriedade feudal, mas
tornou-se inteiramente sua expressão econômica e não mais consegue oferecer qualquer
resistência à economia política. (A Escola de Ricardo.)
Não só o cinismo da Economia Política aumenta a partir de Smith, passando por Say,
Ricardo, Mill, etc., uma vez que para este último as conseqüências da industria se afiguraram
cada vez mais ampliadas e contraditórias; sob um ponto de vista positivo elas tornaram-se mais
alienadas, e mais conscientemente alienadas, do homem, em comparação com suas
predecessoras. Isso é somente porque sua ciência se expande com maior lógica e verdade. Posto
que eles fazem a propriedade privada em sua forma ativa formar o tema, e posto que ao mesmo
tempo fazem o homem como não-entidade tornar-se uma entidade, a contradição na realidade
corresponde inteiramente à essência contraditória por eles aceita como princípio. A realidade
dividida (II) da indústria está longe de refutar, antes confirma, seu princípio de autodivisão.
Seu princípio, com efeito, é o princípio dessa divisão.
Notas:
Manuscritos Econômico-Filosóficos
Karl Marx
Terceiro Manuscrito
23
ad ibidem. A substituição do auto-alheamento segue a mesma marcha do auto-alheamento.
A propriedade privada é primeiro considerada somente em seu aspecto objetivo, mas
considerado o trabalho como sua essência. Sua maneira de existir, portanto, é o capital, que é
necessário abolir, "como tal". (Proudhon.) Ou, então, a forma específica de trabalho (trabalho
que é levado a um nível comum, subdividido e, por isso, não-livre) é visto como a fonte da
nocividade da propriedade privada e de sua alienação em relação ao homem. Fourier, de acordo
com os Fisiocratas, encara o trabalho agrícola como sendo, no mínimo, o tipo exemplar de
trabalho. Saint-Simon assevera, pelo contrário, ser o trabalho industrial, como tal, a essência do
trabalho, e em conseqüência pleiteia o papel exclusivo dos industriais e um melhoramento da
situação dos operários. Finalmente, o comunismo e a expressão positiva da abolição da
propriedade privada e, em primeiro lugar, da propriedade privada universal. Entendendo essa
relação em seu aspecto universal, o comunismo é (1) em sua primeira forma, apenas a
generalização e concretização dessa relação. Como tal, ele aparece numa forma dupla; a
ascendência da propriedade material avulta de tal maneira que visa a destruir tudo que for
incapaz de ser possuído por todos como propriedade privada. Ele quer abolir o talento, etc., pela
força. A posse física imediata parece-lhe a única meta da vida e da existência. O papel do
trabalhador não é abolido, mas ampliado a todos os homens. A relação da propriedade privada
continua a ser a da comunidade com o mundo das coisas. Por fim, essa tendência a opor a
propriedade privada em geral à propriedade privada é expressa de maneira animal; o
casamento (que é incontestavelmente a forma de propriedade privada exclusiva) é posto em
contraste com a comunidade das mulheres, em que estas se tornam comunais e propriedade
comum. Pode-se dizer que essa idéia de comunidade das mulheres é o segredo de Polichinelo
desse comunismo inteiramente vulgar e irrefletido. Assim como as mulheres terão de passar do
matrimônio para a prostituição universal, igualmente todo o mundo das riquezas (i. é, o mundo
objetivo do homem) terá de passar da relação de casamento exclusivo com o proprietário
particular para a de prostituição universal com a comunidade. Esse comunismo, que nega a
personalidade do homem em todos os setores, é somente a expressão lógica da propriedade
privada, que é essa negação. A inveja universal estabelecendo-se como uma potência é apenas
uma forma camuflada de cupidez que se reinstaura e satisfaz de maneira diferente. Os
pensamentos de toda propriedade privada individual são, pelo menos, dirigidos contra qualquer
propriedade privada mais abastada, sob a forma de inveja e do desejo de reduzir tudo a um
nível comum; destarte, essa inveja e nivelamento por baixo constituem, de fato, a essência da
competição. O comunismo vulgar é apenas o paroxismo de tal inveja e nivelamento por baixo,
baseado em um mínimo preconcebido. Quão pouco essa eliminação da propriedade privada
representa uma apropriação genuína é demonstrado pela negação abstrata de todo o mundo da
cultura e da civilização, e pelo retorno â simplicidade inatural (IV) do pobre e indigente que não
só ainda não ultrapassou a propriedade privada, mas nem ainda a atingiu.
24
A comunidade é só uma comunidade de trabalho e de igualdade de salários pagos pelo
capital comunal, pela comunidade como capitalista universal. Os dois aspectos da relação são
elevados a uma suposta universalidade; o trabalho como uma situação em que todos são
colocados, e o capital como a universalidade e poder admitidos na comunidade.
Na relação com a mulher, como presa e serva da luxúria comunal, manifesta-se a infinita
degradação em que o homem existe para si mesmo; pois o segredo dessa relação encontra sua
expressão inequívoca, inconteste, franca e patente na relação do homem com a mulher e na
maneira pela qual se concebe a relação direta e natural da espécie. A relação imediata, natural e
necessária de ser humano como ser humano é também a relação do homem com a mulher.
Nesta relação natural da espécie, a relação do homem com a natureza é diretamente sua relação
com o homem, e sua relação com o homem é diretamente sua relação com a natureza, com sua
própria função natural. Portanto, nessa relação se revela sensorialmente, reduzida a um fato
observável, até que ponto a natureza humana se tornou natureza para o homem e a natureza se
tornou natureza humana para ele. Dessa relação, pode-se estimar todo o nível de evolução do
homem. Conclui-se, do caráter dessa relação, até que ponto o homem se tornou, e se entende
assim, um ser-espécie, um ser humano. A relação do homem com a mulher é a mais natural de
ser humano com ser humano. Ela indica, por conseguinte, até que ponto o comportamento
natural do homem se tornou humano, e até que ponto sua essência humana se tornou uma
essência natural para ele, até que ponto sua natureza humana se tornou natureza para ele.
Também mostra até que ponto as necessidades do homem se tornaram necessidades humanas
e, conseqüentemente, até que ponto a outra pessoa, como pessoa, se tornou uma de suas
necessidades, e até que ponto ele é, em sua existência individual, ao mesmo tempo um ser
social. A primeira anulação positiva da propriedade privada, o comunismo vulgar, é, portanto,
apenas uma forma fenomenal da infâmia da propriedade privada representando-se como
comunidade positiva.
(2) O comunismo (a) ainda político em sua natureza, democrático ou despótico; (b) com a
abolição do Estado, mas ainda incompleto e influenciado pela propriedade privada, isto é, pela
alienação do homem. Em ambas as formas, o comunismo já se dá conta de ser a reintegração do
homem, seu retorno a si mesmo, o repúdio da auto-alienação do homem. Porém, como ainda
não aprendeu a natureza positiva da propriedade privada, ou a natureza humana das
necessidades, ainda se acha cativo e contaminado pela propriedade privada. Compreendeu bem
o conceito, mas não a essência.
É fácil entender a necessidade que leva todo movimento revolucionário a encontrar sua
base empírica, assim como a teórica, na evolução da propriedade privada e, mais precisamente,
do sistema econômico.
26
partida, bem como o resultado, desse movimento (e porque deve haver esse ponto de partida, a
propriedade privada é uma necessidade histórica). Por conseguinte, o caráter social e o caráter
universal de todo o movimento; da mesma forma que a sociedade produz o homem como
homem, também ela é produzida por ele. A atividade e o espírito são sociais em seu conteúdo,
assim como em sua origem; eles são atividade social e espírito social. O significado humano da
natureza só existe para o homem social, porque só neste caso a natureza é um laço com outros
homens, a base de sua existência para outros e da existência destes para ele. Só, então, a
natureza e a base da própria experiência humana dele e um elemento vital da realidade
humana. A existência natural do homem tornou-se, com isso, sua existência humana, e a
própria natureza tornou-se humana para ele. Logo, a sociedade é a união efetiva do homem com
a natureza, a verdadeira ressurreição da natureza, o naturalismo realizado do homem e o
humanismo realizado da natureza.
(VI) A atividade social e o espírito social não existem apenas, de forma alguma, sob a forma
de atividade ou espirito que sela diretamente comunal. Sem embargo, a atividade e o espírito
comunais, i. é, atividade e espírito que se exprimem e confirmam diretamente em associação
real com outros homens, ocorrem sempre onde essa expressão direta de sociabilidade brote do
conteúdo da atividade ou corresponda à natureza do espírito.
Ainda quando realizo trabalho cientifico, etc., uma atividade que raramente posso conduzir
em associação direta com outros homens, efetuo um ato social, por ser humano. Não é só o
material de minha atividade - como a própria língua que o pensador utiliza - que me é dado
como um produto social. Minha própria existência é uma atividade social. Por essa razão, o que
eu próprio produzo, o faço para a sociedade, e com a consciência de agir como um ser social.
Minha consciência universal é apenas a forma teórica daquela cuja forma viva é a
comunidade real, a entidade social, embora no presente essa consciência universal seja uma
abstração da vida real e oposta a esta como uma inimiga. Por isso é que a atividade de minha
consciência universal como tal é minha existência teórica como um ser social.
Acima de tudo, é mister evitar conceber a "sociedade" uma vez mais como uma abstração
com que se defronta o indivíduo. O indivíduo é o ser social. A manifestação da vida dele - ainda
quando não apareça diretamente sob a forma de manifestação comunal, realizada em associação
com outros homens - é, por conseguinte, uma manifestação e afirmação de vida social. A vida
humana individual e a vida-espécie não são coisas diferentes, conquanto o modo de existência
da vida individual seja um modo mais especifico ou mais geral da vida-espécie, ou da vida-
espécie seja um modo mais específico ou mais geral da vida individual.
Em sua consciência como espécie, o homem confirma sua verdadeira vida social, e reproduz
sua existência real em pensamento; reciprocamente, a vida-espécie confirma-se na consciência
27
como espécie e existe por si mesma em sua universalidade como ser pensante. Embora o
homem seja um indivíduo original, e é justamente esta particularidade que o torna um
indivíduo, um ser comunal realmente individual - ele é igualmente o conjunto, o conjunto ideal,
a existência subjetiva da sociedade como é imaginada e vivenciada. Ele existe na realidade como
a representação e o verdadeiro espirito da existência social, e como a soma da manifestação
humana da vida.
Pensar e ser são deveras distintos, mas também formam uma unidade. A morte parece ser
uma impiedosa vitória da espécie sobre o indivíduo e contradizer sua unidade; porém, o
indivíduo em particular é apenas um determinado ente-espécie, e, como tal, mortal.
(4) Tal e qual a propriedade privada é a mera expressão sensorial do fato de o homem ser
ao mesmo tempo um fato objetivo para si mesmo e tornar-se um objeto estranho e não-humano
para si mesmo; tal e qual sua manifestação de vida é também sua alienação da vida e sua
realização própria uma perda da realidade, o aparecimento de uma realidade estranha, assim
também a revogação positiva da propriedade privada, i. é, a apropriação sensorial da essência
humana e da vida humana do homem objetivo e das criações humanas, pelo e para o homem,
não devem ser consideradas exclusivamente na acepção de fruição imediata e exclusiva, ou na
de possuir ou ter. O homem apropria seu ser multiforme de maneira global, e portanto como
homem integral. Todas as suas relações humanas com o mundo - ver, ouvir, cheirar, saborear,
pensar, observar, sentir, desejar, agir, amar - em suma, todos os órgãos de sua individualidade,
como órgãos que são de forma diretamente comunal (VII), são, em sua ação objetiva (sua ação
com relação ao objeto) a apropriação desse objeto, a apropriação da realidade humana. A
maneira pela qual eles reagem ao objeto é a confirmação da realidade humana. (1) É efetividade
humana e sofrimento humano, pois o sofrimento, considerado humanamente, é uma fruição do
eu pelo homem.
A propriedade privada tornou-nos tão néscios e parciais que um objeto só e nosso quando o
temos, quando existe para nós como capital ou quando é diretamente comido, bebido, vestido,
habitado, etc., em síntese, utilizado de alguma forma; apesar de a propriedade privada
propriamente dita só conceber essas várias formas de posse como meios de vida e a vida para a
qual eles servem como meios ser a vida da propriedade privada - trabalho e criação de capital.
Assim, todos os sentidos físicos e intelectuais foram substituídos pela simples alienação de
todos eles, pelo sentido de ter. O ser humano tinha de ser reduzido a essa pobreza absoluta a fim
de poder dar à luz toda sua riqueza interior. (Sobre a categoria de ter ver Hess em
Einundzwanzig Bogen. )
28
humanos, tanto sob o ponto de vista subjetivo quanto sob o objetivo. O olho tornou-se olho
humano quando seu objeto passou a ser um objeto humano, social, criado pelo homem e a este
destinado. Os sentidos, portanto, tornaram-se direta mente teóricos na prática. Eles se
relacionam com a coisa em atenção a esta, mas a própria coisa é uma relação humana objetiva
consigo mesma e com o homem, e vice-versa. (2) A necessidade e a fruição, portanto, perderam
seu caráter egoísta, e a natureza perdeu sua mera utilidade pelo fato de sua utilização ter-se
tornado utilização humana.
(1) Por conseguinte, ela valia tanto quanto as tendências da natureza e das atividades
humanas.
(2) Na prática, só posso relacionar-me de maneira humana com uma coisa quando esta se
relaciona de maneira humana com o homem.
É evidente que o olho humano aprecia as coisas de maneira diferente do olho bruto, não-
humano, assim como o ouvido humano diferentemente do ouvido bruto. Conforme vimos, é só
quando o objeto se torna um objeto humano, ou humanidade objetiva, que o homem não fica
perdido nele. Isso somente é possível quando o objeto se torna um objeto social, e quando ele
próprio se torna um ser social e a sociedade se torna para ele, nesse objeto, um ser.
Por um lado, é só quando a realidade objetiva em toda parte se torna para o homem-em-
sociedade a realidade das faculdades humanas, a realidade humana, e portanto a realidade de
suas próprias faculdades, que todos os objetos se tornam para ele a objetificação dele próprio.
Os objetos, então, confirmam e realizam a individualidade dele, eles são os objetos dele próprio,
i. e, o próprio homem torna-se o objeto. A maneira pela qual esses objetos passam a ser dele,
depende da natureza do objeto e da natureza da faculdade correspondente, pois é exatamente o
caráter determinado dessa relação que constitui o modo real específico de afirmação. O objeto
não e o mesmo para o olho que para o ouvido, para o ouvido que para o olho. O caráter
distintivo de cada faculdade é precisamente sua essência característica e, pois, também, o modo
característico de sua objetificação, de seu ser objetivamente real, vivo. Portanto, não é apenas
em pensamento (VIII), mas por intermédio de todos os sentidos que o homem se afirma no
mundo objetivo.
Pode ser notado que a história da indústria, e a indústria como existe objetivamente, é um
livro aberto das faculdades humanas, e uma psicologia humana que pode ser apreendida
sensorialmente. Essa história não foi até aqui concebida com relação à natureza humana, mas
só sob um ponto de vista utilitário superficial, desde que na situação de alienação só era viável
conceber faculdades humanas reais e ação da espécie humana sob a forma de existência humana
em geral, como religião, ou como história em seu aspecto geral, abstrato, como política, arte e
literatura, etc. A indústria material quotidiana (que pode ser concebida como parte daquela
30
evolução geral; ou igualmente, a evolução geral pode ser concebida como parte específica da
industria, visto que toda a atividade humana até agora tem sido trabalho, i. é, indústria,
atividade auto-alienação) revela-nos, sob a forma de objetos úteis sensoriais, de maneira
alienada, as faculdades humanas essenciais transformadas em objetos. Nenhuma psicologia
para a qual esse livro, i. é, parte mais sensivelmente presente e acessível da História, permaneça
fechado, pode tornar-se uma ciência de verdade com um conteúdo genuíno. Que se deve pensar
de uma ciência que se mantém apartada de todo esse enorme campo do trabalho humano e que
não se sente sua própria inadequação, mesmo que essa grande riqueza de atividade humana
nada mais signifique para ela senão, quiçá, o que pode ser expresso na simples expressão -
"necessidade", "necessidade comum"?
A experiência dos sentidos (ver Feuerbach) tem de ser a base de toda ciência. A ciência só é
ciência genuína quando procede da experiência dos sentidos, nas duas formas de percepção
sensorial e necessidade sensória, i. é, só quando procede da natureza. O conjunto da História é
uma preparação para o 'homem" tornar-se um objeto da percepção sensorial, e para o
desenvolvimento das necessidades humanas (as necessidades do homem como tal). A própria
História é uma parte real da História Natural, do aperfeiçoamento da natureza até chegar ao
homem. A ciência natural algum dia incorporará a ciência do homem, exatamente como a
ciência do homem incorporará a ciência natural; haverá uma única ciência.
31
O homem é o objeto direto da ciência natural, porque a natureza diretamente perceptível é
para o homem experiência sensorial. Sua própria experiência sensorial só existe como a outra
pessoa que lhe é diretamente apresentada de maneira sensorial. Sua própria experiência
sensorial só existe como experiência sensorial humana através da outra pessoa. Mas, a natureza
é o objeto direto da ciência do homem. O primeiro objeto para o homem - o próprio homem - é a
natureza, a experiência sensorial; e as faculdades humanas sensórias em particular, que só
podem encontrar realização objetiva em objetos naturais, só podem alcançar o conhecimento
próprio na ciência do ser natural. O próprio elemento do pensamento, o elemento da
manifestação viva do pensamento, a linguagem, é de natureza sensorial. A realidade social da
natureza e ciência natural humana ou ciência natural do homem, são expressões idênticas.
A partir daqui, ver-se-á como, em lugar da riqueza e pobreza da Economia Política, teremos
o homem rico e a plenitude da necessidade humana. O homem rico é, ao mesmo tempo, aquele
que precisa de um complexo de manifestações humanas da vida, e cuja própria auto-realização
existe como uma necessidade interior, como uma carência. Não só a riqueza como também a
pobreza do homem, adquire, em uma perspectiva socialista, o significado humano, e portanto
social. A pobreza é o vinculo passivo que leva o homem a experimentar uma carência da máxima
riqueza, a outra pessoa. O ímpeto da entidade objetiva dentro de mim, a rotura sensorial de
minha atividade vital, é a paixão que aqui se torna a atividade de meu ser.
(5) Um ser não se encara a si mesmo como independente a menos que seja seu próprio
senhor, e ele só é seu próprio senhor quando deve sua existência a si mesmo. Um homem que
vive pelo favor de outro, considera-se um ser dependente. Mas, eu vivo completamente por favor
de outra pessoa quando lhe devo não apenas a continuação de minha vida, como igualmente sua
criação; quando ele é a origem dela. Minha vida tem forçosamente uma causa assim extrínseca
quando não é de minha própria criação. A idéia de criação, pois, é difícil de eliminar da
consciência popular. Essa consciência e incapaz de conceber a natureza e o homem existindo
por sua própria conta, pois tal existência contraria todos os fatos tangíveis da vida prática.
A idéia da criação da Terra recebeu sério golpe da ciência da geogenia, i. é, da ciência que
descreve a formação e o desenvolvimento da Terra como um processo de geração espontânea.
Generatio aequivoca (geração espontânea) é a única refutação prática da teoria da criação.
É fácil, todavia, deveras, dizer a um indivíduo em particular do que Aristóteles disse: você
foi gerado por seu pai e sua mãe, e conseqüentemente foi o coito de dois seres humanos, um ato
da espécie humana, que produziu o ser humano. Vê-se, pois, que mesmo em um sentido físico o
homem deve sua existência ao homem. Por conseguinte, não basta ter em mente apenas um dos
dois aspectos, a progressão infinita e perguntar a seguir: quem gerou meu pai e meu avô?
Também se tem de ter em vista o movimento circular, perceptível nessa progressão, segundo o
qual o homem, no ato da geração, reproduz-se a si mesmo: destarte, o homem sempre
32
permanece como sujeito. Mas, responder-se-á: admito esse movimento circular, mas em troca
você deve aceitar a progressão, que leva ainda mais adiante ao ponto onde eu pergunto: quem
criou o primeiro homem e a natureza como um todo? Só posso responder: sua pergunta é, em si
mesma, um produto da abstração. Pergunte a si mesmo como chegou a essa pergunta. Pergunte-
se se sua pergunta não nasce de um ponto de vista a que eu não posso responder por que ele é
deturpado. Pergunte-se se essa progressão existe como tal para o pensamento racional. Se você
indaga acerca da criação da natureza e do homem, você está abstraindo estes. Você os supõe
não-existentes e quer que eu demonstre que eles existem. Replico: desista de sua abstração e ao
mesmo tempo você abandonará sua pergunta. Ou então, se você quer manter sua abstração, seja
coerente, e se pensa no homem e na natureza como não-existentes (XI) pense também em você
como não-existente, pois você também é homem e natureza. Não pense nem formule quaisquer
perguntas, pois logo que você o faz sua abstração da existência da natureza e do homem se
torna sem sentido. Ou será você tão egoísta que concebe tudo como não-existente, mas quer que
você exista?
Você pode retrucar: não quero conceber a inexistência da natureza, etc.; só lhe pergunto
acerca do ato de criação dela, tal como indago do anatomista sobre a formação dos ossos, etc.
Como, no entanto, para o socialista, o conjunto do que se chama história mundial nada
mais é que a criação do homem pelo trabalho humano, e a emergência da natureza para o
homem, ele, portanto, tem a prova evidente e irrefutável de sua autocriação, de suas próprias
origens. Uma vez que a essência do homem e da natureza, o homem como um ser natural e a
natureza como uma realidade humana, se tenha tornado evidente na vida prática, na
experiência sensorial, a busca de um ser estranho, um ser acima do homem e da natureza (busca
essa que é uma confissão da irrealidade do homem e da natureza) torna-se praticamente
impossível. O ateísmo, como negação desse irrealismo, não mais faz sentido, pois ele é uma
negação de Deus e procura afirmar, por essa negação, a existência do homem. O socialismo
dispensa esse método assim tão circundante; ele parte da percepção teórica e prática sensorial
do homem e da natureza como seres essenciais. É autoconsciência positiva humana, não mais
uma autoconsciência alcançada graças à negação da religião; exatamente como a vida real do
homem é positiva e não mais alcançada graças à negação da propriedade privada, por meio do
comunismo. O comunismo é a fase de negação da negação e é, por conseguinte, para a próxima
etapa da evolução histórica, um fator real e necessário na emancipação e reabilitação do homem.
O comunismo é a forma necessária e o princípio dinâmico do futuro imediato, mas o
comunismo não é em si mesmo a meta da evolução humana - a forma da sociedade humana.
Manuscritos Econômico-Filosóficos
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Karl Marx
Terceiro Manuscrito
(XIV) (7) Vimos que a importância deve ser atribuída, em uma perspectiva socialista, à
riqueza das necessidades humanas, e conseqüentemente também a um novo sistema de
produção e a um novo objeto de produção. Uma nova manifestação das forças humanas e um
novo enriquecimento do ser humano. Dentro do sistema da propriedade privada, ela tem o
significado diametralmente oposto. Cada homem especula sobre a criação de uma nova
necessidade no outro a fim de obrigá-lo a um novo sacrifício, colocá-lo sob nova dependência, e
induzi-lo a um novo tipo de prazer e, em conseqüência, à ruína econômica. Todos procuram
estabelecer um poder estranho sobre os outros, para com isso encontrar a satisfação de suas
próprias necessidades egoístas. Com a massa de objetos, por conseguinte, cresce também o
reino de entidades estranhas a que o homem se vê submetido. Cada novo produto é uma nova
potencialidade de mútua fraude e roubo. O homem torna-se cada vez mais pobre como homem;
ele tem necessidade crescente de dinheiro para poder apossar-se do ser hostil. O poder de seu
dinheiro diminui na razão direta do aumento do volume da produção, i. é, sua necessidade
cresce com o poder crescente do dinheiro. A necessidade de dinheiro é, pois, a necessidade real
criada pela economia moderna, e a única necessidade por esta criada. A quantidade de dinheiro
torna-se cada vez mais sua única qualidade importante. Assim como ele reduz toda entidade a
sua abstração, também se reduz a si mesmo, em seu próprio desenvolvimento, a uma entidade
quantitativa. Excesso e imoderação passam a ser seu verdadeiro padrão. Isso é demonstrado
subjetivamente, em parte pelo fato de a expansão da produção e das necessidades tornar-se uma
subserviência engenhosa e sempre calculista a apetites desumanos, depravados, antinaturais e
imaginários. A propriedade privada não sabe como transformar a necessidade bruta em
necessidade humana; seu idealismo é fantasia, capricho e ilusão. Nenhum eunuco lisonjeia a
seu tirano de forma mais desavergonhada nem procura por meios mais infames estimular seu
apetite embotado, a fim de granjear algum favor, do que o eunuco da indústria, o homem de
empresa, a fim de adquirir algumas moedas de prata ou de atrair o ouro da bolsa de seu amado
próximo. (Todo produto é uma isca por meio da qual o indivíduo tenta engodar a essência da
outra pessoa, o dinheiro desta. Toda necessidade real ou potencial é uma fraqueza que atrairá o
passarinho para o visgo. A exploração universal da vida humana em comunidade. Como toda
imperfeição do homem é um vínculo com o céu, um ponto em que seu coração é acessível ao
sacerdote, assim também toda necessidade material é uma oportunidade para a gente
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aproximar-se do próximo, com uma atitude amistosa, e dizer: "Caro amigo, dar-lhe-ei aquilo de
que você precisa, mas você conhece a conditio sine qua non . Você sabe qual tinta tem de usar
para entregar-se a mim. Eu o trapacearei ao proporcionar-lhe satisfação.") O homem de
empresa concorda com os mais depravados caprichos de seu próximo, desempenha o papel de
alcoviteiro entre eles e suas necessidades, desperta apetites mórbidos, nele, e presta atenção a
cada fraqueza a fim de, posteriormente, reivindicar a remuneração por esse serviço de amor.
Essa alienação é em parte mostrada pelo fato de o requinte das necessidades e dos meios de
satisfazê-las produzir, como correspondente, uma selvajaria bestial, uma simplicidade completa,
primitiva e abstrata das necessidades; ou melhor, simplesmente reproduzir-se no sentido
oposto. Para o trabalha dor, até a necessidade de ar fresco deixa de ser uma necessidade. O
homem volta novamente a morar em cavernas, mas agora é envenenado pelo ar pestilento da
civilização. O trabalhador só tem um direito precário a habitá-las, pois elas se transformaram
em residências estranhas que de repente podem não estar mais disponíveis, ou de que ele pode
ser despejado se não pagar o aluguel. Ele tem de pagar por esse sepulcro. A residência cheia de
luz que Prometeu, em Ésquilo, indica como uma das grandes dádivas por meio das quais
converteu selvagens em homens, deixa de existir para o trabalhador. Luz, ar, e a mais singela
limpeza animal deixam de ser necessidades humanas. A imundície, essa corrupção e putrefação
que corre pelos esgotos da civilização (isto deve ser tomado literalmente), torna-se o elemento
em que o homem vive. Negligência total e antinatural, a natureza putrefata, passa a ser o
elemento em que ele vive. Nenhum de seus sentidos sobrevive, seja sob forma humana, seja
mesmo em forma não-humana, animal. Os processos (e instrumentos) mais grosseiros de
trabalho humano reaparecem; assim, o moinho acionado pelos pés dos escravos romanos
tornou-se o modo de produção e o modo de existência de muitos operários ingleses. Não basta
que o homem perca suas necessidades humanas; até as necessidades animais desaparecem. Os
irlandeses não mais têm nenhuma necessidade senão a de comer - comer batatas, e ainda assim
só da pior espécie, batatas bolorentas. Mas a França e a Inglaterra já possuem em toda cidade
industrial uma pequena Irlanda. Selvagens e animais podem, ao menos, satisfazer suas
necessidades de caçar, fazer exercício e ter companheiros. A simplificação da maquinaria e do
trabalho, porém, é utilizada para fazer operários dos que ainda estão crescendo, que ainda estão
imaturos, crianças, enquanto o próprio operário converteu-se em uma criança desatendida de
qualquer cuidado. A maquinaria é adaptada à fraqueza do ser humano, de modo a transformar o
fraco ser humano em máquina.
O fato de o aumento das necessidades e dos meios de satisfazê-las resultar em uma falta de
atendimento das necessidades e meios de satisfazê-las, é demonstrado de várias maneiras pelo
economista (e pelo capitalista; com efeito, é sempre a homens de negócios empíricos que nos
referimos quando falamos de economistas, que são sua auto-revelação e existência científica).
Primeiramente, reduzindo as necessidades do trabalhador às míseras exigências ditadas pela
manutenção de sua existência física, e reduzindo a atividade dele aos movimentos mecânicos
35
mais abstratos, o economista assevera que o homem não tem necessidade de atividade ou prazer
além daquelas; e no entanto declara ser esse gênero de vida um gênero humano de vida. Em
segundo lugar, aceitando como padrão geral de vida (geral por ser aplicado à massa dos
homens) a vida mais pobre que se possa conceber; ele transformar o trabalhador em um ser
destituído de sentidos e necessidades, assim como transforma a atividade dele em uma
abstração pura de toda atividade. Assim, todo o luxo da classe trabalhadora parece-lhe
condenável, e tudo que ultrapasse a mais abstrata exigência (quer se trate de uma satisfação
passiva ou uma manifestação de atividade pessoal) é encarada como luxo. A Economia Política,
a ciência da riqueza, portanto, ao mesmo tempo, a ciência da renúncia, da privação e da
poupança, que de fato consegue privar o homem de ar fresco e de atividade física. A ciência de
uma indústria maravilhosa é, concomitantemente, a ciência do ascetismo. Seu verdadeiro ideal é
o sovina, ascético porém usurário, e o escravo ascético porém produtivo. Seu ideal moral é
trabalhador que leva uma parte do salário para a caixa econômica. Chegou mesmo a achar uma
arte servil para corporificar essa idéia favorita, que foi apresentada de forma sentimental no
palco. Assim, a despeito de sua aparência mundana e sequiosa de prazeres, ela é uma ciência
verdadeiramente moralista, a mais moralista de todas as ciências. Sua tese principal é a
renúncia à vida e às necessidades humanas. Quanto menos se comer, beber, comprar livros, for
ao teatro ou a bailes, ou ao botequim, e quanto menos se pensar, amar, doutrinar, cantar, pintar,
esgrimir, etc., tanto mais se poderá economizar e maior se tornará o tesouro imune à ferrugem e
às traças - o capital. Quanto menos se for, quanto menos se exprimir nossa vida, tanto mais se
terá, tanto maior será nossa vida alienada e maior será a economia de nosso ser alienado. Tudo
o que o economista tira da gente sob a forma de vida e humanidade, devolve sob a de dinheiro e
riqueza. E tudo que não se pode fazer, o dinheiro pode fazer para a gente; pode-se comer, beber,
ir ao baile e ao teatro. Ele pode adquirir arte, saber, tesouros históricos, poder político; e pode-
se viajar. Ele pode apropriar todas essas coisas para a gente, pode comprar tudo; ele é a
verdadeira opulência. Mas, apesar de poder fazer tudo isso, ele só quer criar a si mesmo, e
comprar a. si mesmo, pois tudo mais se lhe submete. Quando se possui o dono, também se
possui o servo, e ninguém precisa do servo do dono. Dessa maneira, todas as paixões e
atividades têm de ser submersas na avareza. O trabalhador deve ter apenas o que lhe é
necessário para desejar viver, e deve desejar viver para ter isso.
36
diminui ao invés de aumentar minhas posses. O segundo grupo é hipócrita, ao não admitir que
são o capricho e a fantasia que determinam a produção. Esquecem-se das "necessidades
requintadas", e que sem consumo não haveria produção. Esquecem-se de que, através da
competição, a produção tem de tornar-se sempre mais universal e luxuosa, que é o uso que
determina o valor das coisas e que o uso é função da moda. Eles querem que a produção seja
limitada a "coisas úteis", mas esquecem que a produção de um número excessivo de coisas úteis
resulta em muitas pessoas inúteis. Ambos os lados esquecem que prodigalidade e parcimônia,
luxo e abstinência, riqueza e pobreza, são equivalentes.
Não se tem de ser abstinente apenas na satisfação de nossos sentidos diretos, como comer,
etc., mas também em nossa participação em interesses gerais, nossa compaixão, confiança, etc.,
se se deseja ser econômico e evitar arruinar-se devido a ilusões.
Tudo o que se possui deve ser tornado venal, i. é, útil. Suponhamos que eu pergunte ao
economista: estou agindo de acordo com as leis econômicas se ganhar dinheiro com a venda de
meu corpo, prostituindo-o à concupiscência de outra pessoa (na França, os operários chamam à
prostituição de suas esposas e filhas a enésima hora de trabalho, o que é literalmente
verdadeiro); ou se eu vender meu amigo aos marroquinos (e a venda direta de homens ocorre
em todos os países civilizados sob a forma de alistamento nas forças armadas)? Ele responderá:
você não está agindo contra as minhas leis, mas tem de levar em conta o que a Prima Moral e a
Prima Religião têm a dizer. Minha moralidade e religião econômicas nada têm a objetar, porém
Mas, a quem se deve dar crédito, ao economista ou ao moralista? A moral da economia política é
ganho, trabalho, parcimônia e sobriedade - no entanto, a economia política promete satisfazer
minhas necessidades. A economia política da moral é a riqueza de uma boa consciência, virtude,
etc., mas como posso ser virtuoso se não estiver vivo e como posso ter uma boa consciência se
não me der conta de nada? A natureza da alienação subentende que cada esfera aplica uma
norma diferente e contraditória, que a Moral não aplica a mesma norma que a Economia
Política, etc., porque cada uma delas é uma alienação particular do homem; (XVII) cada uma
está concentrada em uma área específica de atividade alienada e, por sua vez, acha-se alienada
da outra.
É assim que M. Michel Chevalier censura Ricardo por não levar em conta a Moral. Mas
Ricardo deixa a Economia Política falar sua língua própria; não se deve condená-lo se essa
língua não é a da Moral. M. Chevalier ignora a Economia Política, ao preocupar-se unicamente
com a Moral, mas ignora de fato e necessariamente a Moral quando se preocupa com a
Economia Política; pois o reflexo desta naquela é arbitrário e acidental, carecendo, assim, de
qualquer base ou caráter científico, uma mera impostura, ou então é essencial e só pode ser
então uma relação entre as leis econômicas e a Moral. Se não existe uma relação assim, pode
Ricardo ser chamado à responsabilidade? Outrossim, a antítese entre Moral e Economia Política
37
é em si mesma apenas aparente; há uma antítese e igualmente não há antítese. A Economia
Política exprime à sua própria maneira, as leis morais.
O significado da produção com relação aos ricos é revelado no que tem para os pobres. No
alto, sua manifestação é sempre requintada, disfarçada, ambígua, uma aparência; nas camadas
inferiores, ela é crua, franca, sem rodeios, uma realidade. A necessidade áspera do trabalhador é
fonte de muito maior lucro do que a necessidade requintada do abastado. As moradias em
porões de Londres dão mais aos senhorios do que os palácios, i. é, elas constituem maior
riqueza no que toca ao senhorio e, assim, em termos econômicos, maior riqueza social.
Assim como a indústria se reflete no refinamento das necessidades, também o faz em sua
rudeza, e na rudeza delas produzida artificialmente, cuja verdadeira alma é a auto-estupefação,
a satisfação ilusória das necessidades, uma civilização dentro da barbárie grosseira da
necessidade. As tavernas inglesas, são, portanto, representações simbólicas da propriedade
privada. Seu luxo desmascara a relação real do luxo industrial e da riqueza com o homem. Elas
são, pois, adequadamente, o único divertimento dominical do povo, pelo menos tratado com
brandura pela polícia inglesa.
Por fim, (7) o economista pressupõe a união original de capital e trabalho como união de
capitalista e trabalhador. Essa é a situação paradisíaca original. Como esses dois fatores (XIX),
tal como se fossem duas pessoas, avançam para a garganta do outro, é, para o economista, um
acontecimento fortuito que por isso pode ser explicado apenas pelas circunstâncias exteriores
(ver Mill).
As nações ainda estonteadas pelo fulgor físico de metais preciosos e, por isso, ainda
fetichistas do dinheiro metálico, não são ainda nações financeiras plenamente desenvolvidas.
38
Com pare-se a França com a Inglaterra. A medida em que a solução de um problema teórico
incumbe à prática, e é conseguida pela prática, e a medida em que a prática correta é a condição
para uma teoria verídica e positiva, é demonstrada, por exemplo, no caso do fetichismo. A
percepção sensorial de um fetichista difere da de um grego porque sua existência sensorial é
diferente. A hostilidade abstrata entre sentidos e espírito é inevitável enquanto o sentido
humano para a natureza, ou o significado humano da natureza, e conseqüentemente o sentido
natural do homem, não tiver sido produzido por meio do trabalho do próprio homem.
A igualdade nada mais é que o alemão "Ich-Ich", traduzido para a forma francesa, i. é,
política. A igualdade como base do comunismo é uma fundação política e é a mesma de quando
os alemães apóiam sobre ela o fato de conceberem o homem como autoconsciência universal.
Está claro, a transcendência da alienação sempre provém da forma de alienação que é a força
dominante; na Alemanha, autoconsciência; na França, igualdade, por causa da política; na
Inglaterra, a necessidade real, material, auto-suficiente, prática. Proudhon deve ser apreciado e
criticado sob este ponto de vista.
(XX) Quando a Economia Política afirma que a oferta e a procura sempre se equilibram,
esquece imediatamente sua própria tese (a teoria da população) de que a oferta de homens
39
sempre excede a procura, e conseqüentemente, que a desproporção entre oferta e procura é
mais chocantemente expressa no fim essencial da produção - a existência do homem.
O grau até o qual o dinheiro, que tem a aparência de um meio, é o poder real e o único fim,
e em geral o grau até que o meio que me assegura a existência e posse do ser objetivo estranho é
um fim em si mesmo, podem ser vistos no fato da propriedade agrária onde a terra é a fonte da
vida, e cavalo e espada onde estes são os verdadeiros meios de vida, são também reconhecidos
como os verdadeiros poderes políticos. Na Idade Média, um estado torna-se emancipado
quando tem o direito de levar espada. Entre povos nômades, é o cavalo que torna livre o
homem, fazendo-o membro da comunidade.
Dissemos, acima, que o homem está regressando à habitação da caverna, mas numa forma
alienada e maligna. O selvagem em sua caverna (um elemento natural que lhe é livremente
oferecido para uso e proteção) não se sente um estranho; pelo contrário, sente-se tão em casa
quanto um peixe na água. Mas, a habitação do pobre num porão é uma habitação hostil, "um
poder estranho, constrangedor, que só se entrega em troca de suor e sangue". Ele não pode
considerá-la como seu lar, como um lugar onde afinal possa dizer "aqui estou em casa". Pelo
contrário, ele se encontra na casa de outra pessoa, a casa de um estranho que está à sua espera
diariamente e o despeja se não pagar o aluguel. Ele também se dá conta do contraste entre sua
própria morada e uma residência humana, como as que existem naquele outro mundo, o
paraíso dos ricos.
A alienação é evidente não só no fato de meu meio de vida pertencer a outrem, de meus
desejos serem a posse inatingível de outrem, mas de tudo ser algo diferente de si mesmo, de
minha atividade ser outra coisa qualquer, e, por fim (e isso também ocorre com o capitalista),
de um poder desumano mandar em tudo. Há uma espécie de riqueza que é inativa, pródiga e
devotada ao prazer, cujo beneficiário se comporta como um indivíduo efêmero de atividade sem
propósito, que encara o trabalho escravo dos outros, sangue e suor humanos, como a presa de
sua cupidez e vê a humanidade, e a si mesmo, como um ser supérfluo e votado ao sacrifício.
Assim, ele adquire um desprezo pela humanidade, expresso na forma de arrogância e de
malbaratamento de recursos que poderiam sustentar cem vidas humanas, e também na forma
da ilusão infame de que sua extravagância irrefreada e interminável consumo improdutivo é
condição indispensável ao trabalho e à subsistência de outros. Ele vê a realização dos poderes
essenciais do homem apenas como a realização de sua própria vida desordenada, de seus
caprichos e de suas idéias inconstantes e bizarras. Tal riqueza, contudo, que vê a riqueza
somente como um meio, como algo a ser consumido, e que é, portanto, tanto senhora como
escrava, generosa como mesquinha, caprichosa, presunçosa, vaidosa, refinada, culta e
espirituosa, ainda não descobriu a riqueza como uma força inteiramente estranha, mas vê nela
seu próprio poder e fruição antes que riqueza. . . meta final. [N3]
40
(XXI) . . .. e a fulgente ilusão acerca da natureza da riqueza, produzida por sua estonteante
aparência física, é defrontada pelo industrial trabalhador, sóbrio, econômico e prosaico, que
está esclarecido a respeito da natureza da riqueza e que, embora incrementando a amplitude da
vida regalada do outro e lisonjeando-o com seus produtos (pois seus produtos são outros tantos
ignóbeis mimos para os apetites do perdulário), sabe como apropriar para si mesmo, da única
maneira útil, os poderes decadentes do outro. Malgrado, portanto, a riqueza industrial pareça à
primeira vista ser o produto de riqueza pródiga e fantástica, não obstante despoja o último de
maneira ativa por seu próprio desenvolvimento. A queda da taxa de juros é uma conseqüência
necessária da evolução industrial. Assim, os recursos do arrendatário esbanjador minguam
proporcionalmente ao aumento dos meios e oportunidades de divertimento. Ele se vê obrigado,
seja a consumir seu capital e arruinar-se, seja a tornar-se ele próprio um industrial. . . Por outro
lado, há um aumento constante da renda da terra no decorrer do progresso industrial, mas
consoante já vimos deve chegar uma hora em que a propriedade imobiliária, como qualquer
outra forma de propriedade, recai na categoria de capital que se reproduz por meio do lucro - e
isso é resultado do mesmo progresso industrial. Assim, o perdulário proprietário de terras tem
de entregar seu capital e arruinar-se, ou então tornar-se um rendeiro de sua própria
propriedade - um industrial agrícola.
O declínio da taxa de juros (que Proudhon considera como abolição do capital e uma
tendência para a socialização do capital) é, pois, antes um sintoma direto da vitória completa do
capital ativo sobre a riqueza pródiga, i. é, a transformação de toda propriedade privada em
capital industrial. É a vitória completa da propriedade privada sobre suas qualidades
aparentemente humanas, e a submissão total do dono da propriedade à essência da propriedade
privada - o trabalho. É evidente que o capitalista industrial também tem seus prazeres. Ele não
retorna absolutamente a uma simplicidade antinatural em suas necessidades, mas sua fruição é
somente questão secundária; é recreação subordinada à produção, e, assim, um divertimento
calculado, econômico, pois ele anota seus prazeres como um desembolso de capital e o que
esbanja não deve ser mais do que pode ser substituído com lucros pela reprodução do capital.
Destarte, o divertimento fica subordinado ao capital e o indivíduo amante de prazeres e sujeito
ao acumulador de capital, enquanto outrora ocorria o contrário. A queda da taxa de juros é, por
conseguinte, um mero sintoma de abolição do capital, na medida em que é um sintoma de seu
crescente domínio e alienação que acelera sua própria abolição. De maneira geral, essa e a única
maneira pela qual o que existe afirma seu contrário.
A disputa entre economistas a respeito de luxo e poupança, portanto, é apenas uma disputa
entre a economia política que se deu bem conta da natureza da riqueza e a que ainda está
sobrecarregada com recordações românticas, anti-industriais. Nenhum dos lados, entretanto,
sabe como expressar o assunto da disputa em termos simples, ou é capaz, por conseguinte, de
resolver a pendenga.
41
Além disso, a renda da terra, qua renda da terra, foi posta abaixo, pois contra a
argumentação dos Fisiocratas de ser o dono da terra o 'único produtor legítimo, a economia
moderna demonstra, antes, que o dono da terra como tal é o único arrendatário completamente
improdutivo. A agricultura é um negócio do capitalista, que emprega seu capital nela quando
pode contar com uma taxa de lucro normal. A afirmação dos Fisiocratas de que a propriedade
agrária, como única propriedade produtiva, devia ser a única a pagar impostos e, em
conseqüência, ser a única a aprová-los e a participar dos negócios públicos, é transformada na
convicção oposta de que os impostos sobre o arrendamento da terra são os únicos impostos
sobre um rendimento improdutivo e, assim, os únicos não nocivos ao produto nacional. Está
claro que sob este ponto de vista, nenhum privilégio político para os proprietários de terras
decorre de sua situação como principais contribuintes de impostos.
Tudo o que Proudhon concebe como um movimento do trabalho contra o capital é somente
o movimento do trabalho sob a forma de capital, de capital industrial contra o que não é
consumido como capital, i. é, industrialmente. E a esse movimento segue seu caminho
triunfante, o caminho da vitória do capital industrial. Ver-se-á que só quando o trabalho é
concebido como a essência da propriedade privada é que podem ser analisadas as características
reais do movimento econômico propriamente dito.
A sociedade, como é vista pelo economista, é a sociedade civil, em que cada indivíduo é
uma totalidade de necessidades e apenas existe para outra pessoa, como esta existe para ele, na
medida em que cada um é um meio para o outro. O economista (como a política em seus
direitos do homem) reduz tudo ao homem, i. é, ao indivíduo, a quem ele despoja de todas as
características com o fito de classificá-lo como capitalista ou como trabalhador.
Adam Smith[N4]:
"Como é por meio de tratado, de troca e de compra que obtemos de outros a maior
parte dos bons ofícios de que mutuamente carecemos, assim também é essa
mesma disposição para negociar que originariamente enseja a divisão do trabalho.
Em uma tribo de caçadores ou pastores, uma de terminada pessoa faz arcos e
flechas, por exemplo, com maior rapidez e perícia que qualquer outra.
Freqüentemente as troca por gado ou carne de veado com seus companheiros, e
acaba verificando que dessa maneira pode conseguir mais gado ou carne de veado
do que se fosse pessoalmente ao campo para pegá-los. Tendo em vista seu
interesse próprio, então, a confecção de arcos e flechas passa a ser seu principal
negócio. . . (págs. 13-14) .
"Assim como é essa distribuição que forma aquela diferença de talentos. . . entre
os homens, também é ela que torna útil tal diferença. Muitas tribos de animais. . .
da mesma espécie recebem da natureza uma diferenciação de índole muito mais
notável do que, precedendo o costume e a educação, parece ter lugar entre os
homens. Por natureza, um filósofo não é no temperamento e na inclinação nem a
metade diferente de um carregador do que o é um mastim de um galgo, ou um
galgo de um spaniel, ou este último de um cão-pastor. Essas diferentes tribos de
animais, contudo, apesar de todas da mesma espécie, são de pouca utilidade uma
para a outra. O vigor do mastim (XXVI) não é, pelo me nos, assistido seja pela
43
agilidade do galope, seja. . . Os efeitos desses diferentes temperamentos e talentos,
à falta de capacidade ou inclinação para trocar e cambiar, não podem ser
congregados em um cabedal comum, e em nada contribuem para melhor
acomodação e utilidade da espécie. Cada animal continua obrigado a sustentar-se
e a defender-se, separada e independentemente, e não obtém qualquer gênero de
superioridade dessa variedade de talentos com que a natureza distinguiu seus
semelhantes. Entre os homens, pelo contrário, os mais diversos pendores são de
utilidade mútua; os diferentes produtos de seus respectivos talentos, graças à
inclinação geral para trocar, negociar e cambiar, são reunidos, por assim dizer, em
um cabedal comum, onde cada homem pode adquirir qualquer parte da produção
dos talentos de outros homens para que tenha aplicação (págs. 14-15).
Num estágio adiantado da sociedade: "Todo homem, pois, vive por meio da troca,
ou torna-se, em certa medida. um mercador, e a própria sociedade alcança o que é
propriamente uma sociedade comercial" (pág. 20). (Ver Deustutt de Tracy[N5]: "A
sociedade é uma série de trocas recíprocas; o comercio é toda a essência da
sociedade.") A acumulação de capital aumenta com a divisão do trabalho e vice-
versa.
"Se toda família produzisse tudo o que consome, a sociedade poderia prosseguir
sem que tivesse lugar qualquer espécie de intercâmbio. Em nosso estado
adiantado de sociedade, a troca, apesar de não ser fundamental, é
indispensável."[N6] "A divisão do trabalho é um hábil desdobramento das
capacidades do homem; ela aumenta a produção da sociedade - seu poder e seus
prazeres - mas diminui a capacidade de cada pessoa considerada individualmente.
A produção não pode ter lugar sem a troca."[N7]
44
"As faculdades intrínsecas do homem são sua inteligência e sua capacidade física
para trabalhar. As oriundas da situação da sociedade consistem na capacidade
para repartir o trabalho e distribuir tarefas entre diferentes pessoas e no poder
trocar os serviços e produtos que constituem os meios de subsistência. O motivo
que impele o homem a dar seus serviços a outro é o interesse próprio; ele exige
uma retribuição pelos serviços prestados. O direito à propriedade privada
exclusiva é indispensável ao estabelecimento das trocas entre os homens. . . Troca
e divisão do trabalho são mutuamente dependentes."[N8]
"A atuação do homem pode ser reconstituída por elementos muito simples. Ele
não pode, com efeito, fazer mais nada se não produzir movimento. Pode
aproximar as coisas uma da outra, (XXXVII) e pode separá-las uma da outra: as
propriedades da matéria desincumbem-se do resto. . . No emprego do trabalho e
da maquinaria, constata-se, amiúde, que os efeitos podem ser aumentados pela
distribuição hábil, pela separação das operações que têm qualquer tendência a se
obstarem mutuamente, e pela conjugação de todas as operações que podem ser
feitas de modo a auxiliarem-se umas às outras. Como os homens em geral não
podem executar muitas operações diferentes com a mesma rapidez e destreza com
que pela prática aprendem a executar algumas, é sempre vantajoso limitar tanto
quanto possível o número de operações impostas a cada um. Para dividir o
trabalho, e repartir os esforços dos homens e máquinas, com a máxima vantagem,
em muitos casos e necessário operar em grande escala; por outras palavras,
produzir as utilidades em grandes quantidades. E essa vantagem que dá existência
às grandes manufaturas, de que umas poucas, instaladas nos locais mais
convenientes, freqüentemente abastecem não um país, porém muitos, com a
quantidade desejada da utilidade produzida."[N9]
Toda a moderna Economia Política, entretanto, está acorde em que a divisão do trabalho e
riqueza da produção, a divisão do trabalho e acumulação de capital, determinam-se
mutuamente; e também que só a propriedade privada livre e autônoma pode produzir a mais
eficaz e extensiva divisão do trabalho.
O raciocínio de Adam Smith pode ser sintetizado da seguinte forma: a divisão do trabalho
confere a este uma capacidade de produção ilimitada. Ela se origina da propensão a trocar e
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barganhar, uma propensão especificamente humana que provavelmente não é acidental porém
determinada pelo uso da razão e da fala. O motivo dos que se empenham nas trocas não é a
bondade, mas o egoísmo. A diversidade dos talentos humanos é mais o efeito que a causa da
divisão do trabalho, i. é, do intercâmbio. Ademais, é só a última que torna útil essa diversidade.
As qualidades particulares das diferentes tribos dentro de uma espécie animal são naturalmente
mais pronunciadas que as diferenças de aptidões e atividades dos seres humanos. Mas como os
animais não são capazes de estabelecer troca, a diversidade de atributos dos animais da mesma
espécie, porém de tribos diferentes, não beneficia qualquer animal individualmente. Os animais
são incapazes de combinar as varias qualidades de sua espécie, ou de contribuir para a
superioridade e conforto comum da espécie. Dá-se o contrario com os homens, cujos mais
diversos talentos e formas de atividade são úteis uns aos outros, porque eles podem reunir seus
diferentes produtos em um cabedal comum, de que cada homem pode comprar. Como a divisão
do trabalho surge da propensão a trocar, ela se desenvolve e é limitada pela extensão da troca,
pela extensão do mercado. Em condições adiantadas, todo homem é um mercador e a sociedade
é uma associação comercial. Say encara a troca como acidental e não fundamental. A sociedade
poderia existir sem ela. Torna-se indispensável em um estágio adiantado da sociedade. Todavia,
a produção não pode ocorrer sem ela. A divisão do trabalho é um meio cômodo e útil, um hábil
desdobramento das faculdades humanas para a riqueza social, mas diminui a capacidade de
cada pessoa considerada individualmente. O último comentário é um progresso da parte de
Say.
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Declarar que a propriedade privada é a base da divisão do trabalho e da troca é
simplesmente afirmar que o trabalho é a essência da propriedade privada; uma afirmação que o
economista não pode provar e que desejamos provar para ele. É precisamente no fato de a
divisão do trabalho e da troca serem manifestações da propriedade privada que encontramos a
prova, primeiro de que a vida humana necessitava da propriedade privada para sua realização,
e, segundo, que ela agora exige a revogação da mesma.
A divisão do trabalho e a troca são os dois fenômenos que levam o economista a gabar o
caráter social de sua ciência, enquanto, ao mesmo tempo, inconscientemente exprime a
natureza contraditória dessa ciência - o estabelecimento da sociedade graças a interesses não-
sociais, particulares.
Os fatores que temos de considerar agora são os seguintes: a propensão a trocar - cuja base
é o egoísmo - é encarada como a causa do efeito recíproco da divisão do trabalho. Say considera
a troca como não sendo fundamental para a natureza da sociedade. A riqueza e a produção são
explicadas pela divisão do trabalho e pela troca. O empobrecimento e o desnaturamento da
atividade individual devido a divisão do trabalho, são admitidos. A troca e a divisão do trabalho
são reconhecidas como as fontes da grande diversidade dos talentos humanos, que por sua vez
se torna útil em decorrência da troca. Skarbek distingue duas partes nas faculdades produtivas
dos homens: 1) as aptidões específicas ou habilidades, as individuais e inatas, e a sua
inteligência; 2) as provindas não do indivíduo real, mas da sociedade - a divisão do trabalho e a
troca. Além disso, a divisão do trabalho é limitada pelo mercado. O trabalho humano é simples
movimento mecânico; a maior parte é feita pelas propriedades materiais dos objetos. O menor
número possível de operações deve ser atribuído a cada indivíduo. Fissão do trabalho e
concentração do capital; a nulidade da produção do indivíduo e a produção em massa de
riqueza. Significado da propriedade privada livre na divisão do trabalho.
Notas:
[2] Uma parte da página está rasgada neste ponto, e seguem-se fragmentos de seis linhas que são
insuficientes para reconstruir a passagem. - Nota do T. (retornar ao texto)
[3] O fim da página está rasgado e faltam várias linhas do texto. - Nota do T. (retornar ao texto)
[4] As passagens seguintes são de A Riqueza das Nações, Livro I, Cap. II, III e IV. Marx refere-se à
tradução francesa: Recherches sur la nature et les causes de la richesse des nations, por Adam Smith.
Marx cita com omissões e em alguns casos, parafraseia o texto original, usando a edição Everyman,
colocando dentro de colchetes as partes que foram parafraseadas. - Nota do T. (retornar ao texto)
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[5] Destutt de Tracy, Éléments d'idéologie. Traité de Ia volonté et ses effets:, Paris, 1826, págs. 68, 78.
(retornar ao texto)
[6] Jean-Baptiste, Say, Traité d'économie politique. 3éme édition, Paris, 1817. T. I, pág. 300. (retornar ao
texto)
[8] F. Skarbek, Théorie des richesses sociales, suivie d'une bibliographie de l'économie politique, Paris,
1829, T. I, págs. 25-27. (retornar ao texto)
[9 ] James Mill, Elemeats of Political Economy, Londres, 1821. Marx cita da traduçao francesa por J. T.
Parisot (Paris, 1823). - Nota do T. (retornar ao texto)
Manuscritos Econômico-Filosóficos
Karl Marx
Terceiro Manuscrito
Dinheiro
(1) que seu modo de afirmação não e um só e imutável, mas, antes, que os diversos modos
de afirmação constituem o caráter distintivo de sua existência, de sua vida. A maneira pela qual
o objeto existe para eles é a forma distintiva de sua gratificação;
(2) onde a afirmação sensorial é uma anulação direta do objeto em sua forma independente
(como ao beber, comer, trabalhar um objeto, etc), esta é a afirmação do objeto;
(3) na medida em que o homem, e daí também seus sentimentos, etc., são humanos, a
afirmação do objeto por outra pessoa também é sua gratificação própria;
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(4) só por meio da indústria evoluída, i. é, por meio da propriedade privada, concretiza-se a
essência ontológica das paixões humanas, em sua totalidade e humanidade; a própria ciência do
homem é um produto da autoformação do homem graças à atividade prática;
"Que é isto? Ouro? Ouro amarelo, brilhante, precioso? Não, deuses: eu não faço
protestos vãos. Raízes quero, ó céus azuis! Um pouco disto tornaria o preto
branco; o feio, belo; o injusto, justo; o vil, nobre; o velho, novo; o covarde, valente.
Mas, oh, ó deuses! por que é isso? isto que é, deuses? Isto fará com que os vossos
sacerdotes e os vossos servos se afastem de vós; isto fará arrancar o travesseiro de
debaixo das cabeças dos homens fortes. Este escravo amarelo fará e desfará
religiões; abençoará os réprobos; fará prestar culto à alvacenta lepra; assentará
ladrões, dando-lhes título, genuflexões e aplauso, no mesmo banco em que se
assentam os senadores; isto é que faz com que a inconsolável viuva contraia novas
núpcias; e com que aquela, que as úlceras purulentas e os hospitais tornavam
repugnante, fique outra vez perfumada e apetecível como um dia de abril. Anda
cá, terra maldita, meretriz, comum a toda a espécie humana, que semeia a
desigualdade na turba-malta das nações, vou devolver-te à tua verdadeira
natureza."
49
E mais adiante:
"Ó tu, amado regicida; caro divorciador da mútua afeição do filho e do pai;
brilhante corruptor dos mais puros leitos do Himeneu! valente Marte! tu, sempre
novo, viçoso, amado galanteador, cujo brilho faz derreter a virginal neve do colo
de Diana! tu, deus visível, que tornas os impossíveis fáceis, e fazes como que se
beijem! que em todas as línguas te explicas para todos os fins! Ó tu, pedra de
toque dos corações! trata os homens, teus escravos, como rebeldes, e, pela tua
virtude, arremessais a todos em discórdias devoradoras, a fim de que as feras
possam ter o mundo por império!"[N11]
O que existe para mim por intermédio do dinheiro, aquilo por que eu posso pagar (i. é, que
o dinheiro pode comprar), tudo isso sou eu, o possuidor de meu dinheiro. Meu próprio poder é
tão grande quanto o dele. As propriedades do dinheiro são as minhas próprias (do possuidor)
propriedades e faculdades. O que eu sou e posso fazer, portanto, não depende absolutamente de
minha individualidade. Sou feio, mas posso comprar a mais bela mulher para mim.
Consequentemente, não sou feio, pois o efeito da feiúra, seu poder de repulsa, é anulado pelo
dinheiro. Como indivíduo sou coxo, mas o dinheiro proporciona-me vinte e quatro pernas; logo,
não sou coxo. Sou um homem detestável, sem princípios, sem escrúpulos e estúpido, mas o
dinheiro é acatado e assim também o seu possuidor. O dinheiro é o bem supremo, e por isso seu
possuidor é bom. Além do mais, o dinheiro poupa-me do trabalho de ser desonesto; por
conseguinte, sou presumivelmente honesto. Sou estúpido, mas como o dinheiro é o verdadeiro
cérebro de tudo, como poderá seu possuidor ser estúpido? Outrossim, ele pode comprar pessoas
talentosas para seu serviço e não é mais talentoso que os talentosos aquele que pode mandar
neles? Eu, que posso ter, mediante o poder do dinheiro, tudo que o coração humano deseja, não
possuo então todas as habilidades humanas? Não transforma meu dinheiro, então, todas as
minhas incapacidades em seus contrários?
O que sou incapaz de fazer como homem, e, pois, o que todas as minhas faculdades
individuais são incapazes de fazer, me é possibilitado pelo dinheiro. O dinheiro, por
conseguinte, transforma cada uma dessas faculdades em algo que ela não é, em seu antônimo.
Se estou com vontade de comer, ou desejo de viajar na diligência da posta por não ser
bastante forte para ir a pé, o dinheiro proporciona-me a refeição e a diligência, i. é, ele
transforma meus desejos de representações em realidades, de seres imaginários em seres reais.
Atuando assim como mediador, o dinheiro é uma força genuinamente criadora.
A procura também existe para o indivíduo sem dinheiro, mas sua procura é mera criatura
da imaginação, que não tem efeito nem existência para mim, para um terceiro, para. . . (XLIII) e
que, assim, permanece irreal e sem objeto. A diferença entre a procura efetiva, apoiada pelo
dinheiro, e a inefetiva, baseada em minhas necessidades, minha paixão, meu desejo, etc., é a
diferença entre ser e pensar, entre a representação meramente interior e a representação
existente fora de mim mesmo como objeto real.
Se não disponho de dinheiro para viajar, não tenho necessidade - nenhuma necessidade
real e auto-realizável - de viajar. Se tenho vocação para estudar, mas não disponho do dinheiro
para isso, então não tenho vocação, i. é, não tenho vocação efetiva, legítima. O dinheiro é o
meio e poder, externo e universal (não oriundo do homem como homem ou da sociedade
humana como sociedade) para mudar a representação em realidade e a realidade em mera
representação. Ele transforma faculdades humanas e naturais reais em meras representações
abstratas, i. é, imperfeições e torturantes quimeras; e, por outro lado, transforma imperfeições e
fantasias reais, faculdades deveras importantes e só existentes na imaginação do indivíduo, em
faculdades e poderes reais. A esse respeito, portanto, o dinheiro é a inversão geral das
individualidades, convertendo-as em seus opostos e associando qualidades contraditórias às
qualidades delas.
O dinheiro, então, aparece como uma força demolidora para o indivíduo e para os laços
sociais, que alegam ser entidades auto-subsistentes. Ele converte a fidelidade em infidelidade,
amor em ódio, ódio em amor, virtude em vício, vício em virtude, servo em senhor, boçalidade
em inteligência e inteligência em boçalidade.
51
Posto que o dinheiro, como conceito existente e ativo do valor, confunde e troca tudo, ele é
a confusão e transposição universais de todas as coisas, o mundo invertido, a confusão e
transposição de todos os atributos naturais e humanos.
Aquele que pode comprar a bravura é bravo, malgrado seja covarde. O dinheiro não é
trocado por uma qualidade particular, uma coisa particular ou uma faculdade humana
especifica, porém por todo o mundo objetivo do homem e da natureza. Assim, sob o ponto de
vista de seu possuidor, ele troca toda qualidade e objeto por qualquer outro, ainda que sejam
contraditórios. Ele é a confraternização dos incomparáveis; força os contrários a abraçarem-se.
Suponhamos que o homem seja homem e que sua relação com o mundo seja humana.
Então, o amor só poderá ser trocado por amor, confiança, por confiança, etc. Se se desejar
apreciar a arte, será preciso ser uma pessoa artisticamente educada; se se quiser influenciar
outras pessoas, será mister se ser uma pessoa que realmente exerça efeito estimulante e
encorajador sobre as outras. Todas as nossas relações com o homem e com a natureza terão de
ser uma expressão específica, correspondente ao objeto de nossa escolha, de nossa vida
individual real. Se você amar sem atrair amor em troca, i. é, se você não for capaz, pela
manifestação de você mesmo como uma pessoa amável, fazer-se amado, então seu amor será
impotente e um infortúnio.
Notas:
[10] Goethe, Fausto, Parte 1, Cena 4. Esta passagem foi tirada da trad. por Bayard Taylor, The Modem
Library, Nova York, 1950 - N. do T (N. do T. - Em português, recorremos à trad. de Jenny Klabin Segail,
S. Paulo, Instituto Progresso Editorial, 1949, pàg. 106.) (retornar ao texto)
[11] Shakespeare, Timon of Athens, Act Iv, Scene 3. Marx citou a traduçao (alemã) de Schlegel-Tieck. -
Nota do T. (N. do T. - Recorremos à tradução portuguesa de Henrique Braga, Pôrto, Livraria Chardron,
de Leilo & Irmao, 1913, págs. 119 e 145.) (retornar ao texto)
Manuscritos Econômico-Filosóficos
Karl Marx
Terceiro Manuscrito
52
Crítica da Filosofia Dialética e Geral de Hegel
(6) Este talvez seja um ponto apropriado a explicar e substanciar o que foi dito, e a tecer
certos comentários gerais a respeito da dialética de Hegel, especialmente como se acha exposta
na Fenomenologia e na Lógica, e a respeito de sua relação com o moderno movimento crítico.
A crítica alemã moderna tem estado tão preocupada com o passado, e tão tolhida por seu
enredamento com o tema, que tinha uma atitude totalmente pouco crítica face aos métodos de
crítica e ignorava completamente a pergunta, em parte formal, mas de fato essencial qual nossa
posição relativamente à dialética hegeliana? Essa ignorância da relação da crítica moderna com
a filosofia geral de Hegel, e em particular com a dialética, era tão grande que críticos como
Strauss e Bruno Bauer (o primeiro em todos os seus trabalhos; o último em seu Synoptiker,
onde em oposição a Strauss, ele substitui a "autoconsciência" do homem abstrato pela
substância da - "natureza abstrata", e mesmo em Das entdeckte Christentum) viram-se, pelo
menos implicitamente, presos na armadilha da lógica hegeliana. Assim, por exemplo, em Das
entdeckte Christentum, argumenta-se: "Como se a autoconsciência ao postular o mundo, o que é
diferente, não se produzisse a si mesma ao produzir seu objeto; pois então ela anula a diferença
entre si mesma e o que produziu, já que só tem existência nessa criação e movimento, só tem
sua finalidade nesse movimento, etc." Ou então: "Eles (os materialistas franceses) não podiam
ver que o movimento do universo só se tornou real e unificado em si mesmo na medida em que é
o movimento da autoconsciência." Essas expressões não só não diferem do conceito hegeliano,
como o reproduzem textualmente.
(XII) Quão pouco esses autores, ao empreenderem sua crítica (Bauer em seu Synoptiker) se
davam conta de sua relação com a dialética de Hegel, e quão pouco essa percepção brotou de sua
crítica, é demonstrado por Bauer em seu Gute Sache der Freiheit quando, em vez de responder à
pergunta indiscreta feita por Gruppe, "E agora, o que fazer com a lógica?", ele a transfere a
futuros críticos.
Agora que Feuerbach, em sua "Thesen" em Anecdotis, e com maior minúcia em sua
Philosophie der Zukunft, demoliu o princípio interior da dialética e da filosofia antigas, a
"Escola Crítica", que foi incapaz de fazer isso por si mesma mas viu-o realizado, proclamou-se a
crítica pura, decisiva, absoluta e finalmente esclarecida, e em sua soberba espiritual reduziu
todo o movimento histórico à relação existente entre ela mesma e o resto do mundo,
enquadrado na categoria de a massa". Ela reduziu todas as antíteses dogmáticas a única antítese
dogmática entre sua própria sagacidade e a estupidez do mundo, entre o Cristo crítico e a
humanidade - a ralé. Em todos os instantes do dia, demonstrou sua própria excelência vis-à-vis
a estultícia da massa, e anunciou, finalmente, o juízo final crítico, proclamando estar iminente o
dia em que toda a humanidade decaída se reunirá diante dela e será dividida em grupos, a cada
um dos quais será entregue o respectivo testimoniu paupertatis (certificado de pobreza). A
53
Escola Critica tornou pública sua superioridade sobre todos os sentimentos humanos e o
mundo, acima do qual ela está sentada num trono em sublime solidão, contente de ocasional
mente deixar escapar dos lábios o riso dos deuses do Olimpo. Após todas essas momices
divertidas do idealismo (do Jovem Hegelianismo) que está expirando sob a forma de crítica, a
Escola Crítica ainda nem insinuou até agora ser necessário examinar criticamente sua própria
fonte, a dialética de Hegel, nem deu qualquer indicação de sua relação com a dialética de
Feuerbach. Esse é um procedimento completamente desprovido de senso crítico.
Feuerbaché a única pessoa que tem uma relação séria e critica com a dialética de Hegel,
efetuou descobrimentos verdadeiros nesse campo e, acima de tudo, levou de vencida a velha
filosofia. A grandeza do feito de Feuerbach e a modesta simplicidade com que apresenta sua
obra ao mundo, contrastam incrivelmente com a conduta de outros:
(1) ter mostrado a filosofia nada mais ser do que a religião trazida para o pensamento e
desenvolvida por este, de vendo ser igualmente condenada como outra forma e modo de
existência da alienação humana;
(3) ter-se oposto à negação da negação que alega ser o positivo absoluto um princípio auto-
suficiente, positivamente baseado em si mesmo.
Destarte, Feuerbach concebe a negação da negação como sendo apenas uma contradição
dentro da própria filosofia, que afirma a teologia (transcendência, etc.) após tê-la anulado, e
assim a afirma em oposição à filosofia.
54
Ao conceber a negação da negação, sob o aspecto da relação positiva a ela inerente, como a
única verdadeiramente positiva, e sob o aspecto da relação negativa a ela inerente, como o único
ato verdadeiro, e que se confirma a si próprio, de todo o ser, Hegel descobriu simplesmente uma
expressão abstrata, lógica e especulativa do processo histórico, que ainda não é a verdadeira
história do homem como um dado sujeito, mas apenas a história do ato de criação, da gênese
do homem.
Explicaremos tanto a forma abstrata desse processo quanto a diferença entre o processo
como foi ideado por Hegel e pela crítica moderna, e por Feuerbach em Das Wesen des
Christentums; ou melhor, a forma crítica desse processo, ainda tão pouco crítico em Hegel.
Fenomenologia
A. Autoconsciência
1. Consciência.
(a) Certeza da experiência sensorial, ou o "isto" e o significado.
(b) Percepção, ou a coisa com suas propriedades, e ilusão.
(c) Poder e compreensão, fenômenos e o mundo supra-sensível.
II. Autoconsciência. A verdade da certeza de si mesmo.
(a) Independência e dependência da autoconsciência, dominação e servidão.
(b) Liberdade da autoconsciência. Estoicismo, ceticismo, a consciência infeliz.
III. Razão. Certeza e verdade da razão.
(a) Razão perceptível: observação da natureza e da autoconsciência.
(b) Auto-realização da autoconsciência racional. Prazer e necessidade. A lei do
coração e o frenesi da vaidade. A virtude e a trajetória do mundo.
(c) A individualidade que é real em si e para si mesma. O reino animal espiritual e a
burla, ou a própria coisa. Razão legislativa. Razão que põe à prova as leis.
B. Espirito
I- Espírito verdadeiro; moral consuetudinária.
II- Espírito auto-alienado; cultura.
III- O espírito certo de si mesmo; moral.
C. Religião
Religião natural, a religião da arte, religião revelada.
D. Conhecimento absoluto.
55
pensando dentro dos limites de sua auto-alienação, i. é., concebendo-se a si mesma de forma
abstrata. A lógica é o dinheiro da mente, o valor-pensamento especulativo do homem e da
natureza cuja essência é indiferente a qualquer caráter real determinado e, portanto, irreal; o
pensamento que é alienado e abstrato e ignora o homem e a natureza reais. O caráter externo
desse pensamento abstrato. . . a natureza como existe para esse pensamento abstrato. A
natureza é externa a ele, uma privação dele mesmo, e só concebida como algo externo, como
pensamento abstrato, mas pensamento abstrato alienado. Finalmente, o espírito, esse
pensamento retornando à própria origem e que, como espírito antropológico, fenomenológico,
psicológico, consuetudinário, artístico-religioso, não é válido para si mesmo até se descobrir e
relacionar-se com conhecimento absoluto no espírito absoluto (i. é, abstrato), quando recebe
sua existência consciente e adequada. Pois seu verdadeiro modo de existência é a abstração.
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No momento, façamos estas observações preliminares: o ponto de vista de Hegel é o da
moderna Economia Política. Ele concebe o trabalho como a essência, a essência
autoconfirmadora do homem; observa somente o aspecto positivo do trabalho, não o seu
aspecto negativo. O trabalho é a marcha do homem para se tornar ele próprio dentro da
alienação, ou como homem alienado. Assim, o que acima de tudo constitui a essência da
filosofia, a alienação do homem conhecendo-se a si mesmo, ou a ciência alienada concebendo-
se a si mesma, Hegel percebe como essência dela. Consequentemente, ele fica em condições de
reunir os elementos separados da filosofia anterior e apresentar a sua própria como sendo a
Filosofia. O que outros filósofos fizeram, isto é, conceber elementos isolados da natureza e da
vida humana, como fases da autoconsciência e, deveras, da autoconsciência abstrata, Hegel sabe
por fazer filosofia; por conseguinte, sua ciência é absoluta.
Conhecimento absoluto
O ponto capital é o objeto da consciência nada mais ser do que autoconsciência, o objeto
ser apenas autoconsciência objetificada, autoconsciência como um objeto. (Homem que postula
= autoconsciência.)
Expressa de maneira mais lata, a revogação do objeto da consciência significa: (1) que o
objeto como tal se apresenta à consciência como algo que desaparece; (2) que é a alienação da
autoconsciência que estabelece o característico de "coisa"; (3) que essa alienação tem significado
positivo assim como negativo; (4) que ela tem esse significado não apenas para nós ou em si,
mas também para a própria autoconsciência; (5) que para a autoconsciência a negação do
objeto, sua revogação, tem significado positivo, ou a autoconsciência conhece a nulidade do
objeto porquanto ela se aliena a si mesma, pois nessa alienação ela se estabelece como objeto ou,
em prol da união indivisível de existir por si mesma, estabelece o objeto como ela própria; (6)
que, por outro lado, esse outro "momento" está igualmente presente, a auto consciência revogou
e reabsorveu essa alienação objetivamente, e está, assim, em casa em seu outro ser como tal; (7)
que esse e o movimento da consciência, e esta é, então, a totalidade de seus "momentos"; (8)
que, analogamente, a consciência deve ter-se relacionado com o objeto em todas as suas
determinações, e tê-lo concebido em função de cada uma delas. Essa totalidade de
determinações faz o objeto intrinsecamente, um ser espiritual, e ele se torna assim, deveras,
para a consciência, pela apreensão de cada uma dessas determinações como o Eu, ou pelo que
foi anteriormente chamado de atitude espiritual para com elas.
ad (1) Que o objeto como tal se apresenta à consciência como algo que desaparece, é a
acima mencionada volta do objeto para o Eu.
Quando o homem real, corpóreo, com os pés firmemente plantados no chão, aspirando e
expirando todas as forças da natureza, postula suas faculdades objetivas reais, como resultado
de sua alienação, como objetos alienados, o postulador não é o sujeito desse ato mas a
subjetividade da faculdade objetiva cuja ação, pois, também deve ser objetiva. Um ser objetivo
age objetivamente, e não agiria objetivamente se a objetividade não fizesse parte de seu ser
essencial. Ele cria e estabelece apenas objetos porque é estabelecido por objetos e porque é
fundamentalmente natural. No ato de estabelecer, não desce de sua "atividade pura" para a
criação de objetos; seu produto objetivo simplesmente confirma sua atividade objetiva, sua
atividade como ser natural, objetivo.
O homem é diretamente um ser natural. Como tal, e como ser natural vivo, ele é, de um
lado, dotado de poderes e forças naturais, nele existentes como tendências e habilidades, como
impulsos. Por outro lado, como ser natural, dota dotado de corpo, sensível e objetivo, ele é um
ser sofredor, condicionado e limitado, como os animais e vegetais. Os objetos de seus impulsos
existem fora dele como objetos dele independentes; sem embargo, são objetos das necessidades
dele, objetos essenciais indispensáveis ao exercício e a confirmação de suas faculdades. O fato de
o homem ser dotado de corpo, vivo, real, sensível e objetivo, com poderes naturais, significa ter
objetos reais e sensíveis como objetos de seu ser, ou só poder expressar seu ser em objetos reais
e sensíveis. Ser objetivo, natural, sensível e, ao mesmo tempo, ter objeto, natureza e sentidos
fora de si mesmo, ou ser ele mesmo objeto, natureza e sentidos para um terceiro, é a mesma
coisa. A fome é uma necessidade natural; ela exige, portanto, uma natureza a ela extrínseca, um
objeto a ela extrínseco, a fim de ser satisfeita e aplacada. A fome e a necessidade objetiva que um
corpo tem de um objeto existente fora dele e essencial para sua integração e a expressão de sua
natureza. O sol é um objeto, um objeto necessário e assegurador de vida para a planta, tal como
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a planta é um objeto para o sol, uma expressão do poder vivificador e dos poderes essenciais
objetivos do sol.
Um ser que não tenha sua natureza fora de si mesmo não é um ser natural e não
compartilha da existência da natureza. Um ser sem objeto fora de si mesmo não é um ser
objetivo. Um ser que não seja, ele próprio, o objeto para um terceiro ser, não possui ser para seu
objeto, i. é, não é relacionado objetivamente e seu ser não é objetivo.
(XXVII) Um ser não-objetivo é um não-ser. Suponhamos um ser que não seja objeto por si
mesmo nem tenha objeto. Em primeiro lugar, um ser assim seria o único ser; nenhum outro
existiria fora dêle, e êle estaria sôzinho e solitário. Pois, desde que existam objetos fora de mim,
logo que eu não esteja só, sou um outro, uma outra realidade com relação ao objeto exterior a
mim. Para êsse terceiro objeto, portanto, sou uma outra realidade, que não é, i. é, o objeto dele.
Supor um ser que não é objeto de outro, seria supor não existir ser objetivo nenhum. Logo que
tenho um objeto, êsse objeto tem a mim para objeto dêle. Um ser não-objetivo, porém, é um ser
irreal, insensível, meramente concebido; i. e, um ser simplesmente imaginado, uma abstração.
Ser sensorial, i. é, real, é ser um objeto dos sentidos ou objeto sensorial e, pois, ter objetos
sensoriais fora de si mesmo, obje tos de suas próprias sensações. Ser sensível é sofrer (expe
rienciar).
O homem, como ser sensível objetivo, é um ser sofredor, e como sente seu sofrimento, um
ser apaixonado. A paixão é o esfôrço das faculdades do homem para atingirem seu objetivo.
Contudo, o homem não é apenas um ser natural; êle é um ser natural humano. Ele é um ser
por si mesmo e, portanto, um ente-espécie; como tal, tem de expressar-se e autenticar-se ao ser
assim como ao pensar. Consequentemente, os objetos humanos não são objetos naturais como
se apresentam diretamente, nem é o sentido humano, como é dado imediata e objetivamente,
sensibilidade e objetividade humanas. Nem a natureza objetiva nem a subjetiva são
apresentadas diretamente de forma adequada ao ser humano. E como tudo o que é natural tem
de ter uma origem, o homem tem então seu processo de gênese, a História, que é para êle,
entretanto, um processo consciente e, portanto, conscientemente autotranscendente.
(Voltaremos a isso mais tarde.)
O modo em que a consciência é, e em que algo é para ela, o conhecimento. Conhecer é sua
única ação. Assim, algo chega a existir para a consciência na medida em que ela conhece esse
algo. Conhecer e sua única relação objetiva. Ela conhece (ou sabe), então, a nulidade do objeto
(i. é, sabe a não-existência da distinção entre si mesma e o objeto, a não-existência do objeto
para ela) por ela conhecer o objeto como sua auto-alienação. Isso quer dizer, ela conhece a si
mesma (conhece, conhecendo como um objeto) porque o objeto é apenas uma imagem de um
objeto, uma ilusão, que intrinsecamente nada é senão o conhecer-se que se defrontou consigo
mesmo, estabeleceu em face de si mesmo uma nulidade, um "algo" que não tem existência
objetiva fora do próprio conhecimento. O saber sabe que ao se relacionar com um objeto está
apenas fora de si mesmo, aliena-se, e que ele só lhe parece como um objeto; ou, por outras
palavras, que aquilo que lhe aparece como objeto é apenas ele próprio.
Por outro lado, Hegel diz, esse momento" está presente ao mesmo tempo; ou seja, que a
consciência igualmente revogou e reabsorveu essa alienação e objetividade e,
consequentemente, está em casa em seu outro ser como tal. Neste exame, todas as ilusões da
especulação acham-se congregadas.
Primeiro, a consciência - autoconsciência - está em casa em seu outro ser como tal. Ela
está, portanto - se nos abstrairmos da abstração de Hegel e substituirmos a autoconsciência por
autoconsciência do homem - em casa em seu outro ser como tal. Isso subentende,
primeiramente, que a consciência (saber como saber, pensamento como pensamento) alega ser
diretamente o outro de si mesma, o mundo sensorial, a realidade, a vida; é o pensamento
ultrapassando-se a si mesmo em pensamento (Feuerbach). Este aspecto é nela contido, na
62
medida em que a consciência como mera consciência não é afrontada pela objetividade alienada
mas pela objetividade como tal.
Não pode haver mais dúvida acerca da transigência de Hegel com a religião, o Estado, etc.,
pois esta mentira é a mentira de toda sua argumentação.
(XXIX) Se conheço a religião como autoconsciência humana alienada, o que conheço nela
como religião não é minha autoconsciência, porém minha autoconsciência alienada nela
confirmada. Assim, meu próprio eu, e a autoconsciência que e a essência dele, não são
confirmados na religião, mas na abolição e revogação da religião.
Em sua existência efetiva, essa natureza móvel é escondida. E pela primeira vez revelada no
pensamento, na filosofia em conseqüência, minha verdadeira existência religiosa e minha
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existência na filosofia da religião, minha verdadeira existência política é minha existência na
filosofia do Direito, minha verdadeira existência natural é minha existência na filosofia da
natureza, minha verdadeira existência artística é minha existência na filosofia da arte, e minha
verdadeira existência humana é minha existência na filosofia. Da mesma maneira, a verdadeira
existência da religião, do Estado, da natureza e da arte, é a filosofia da religião do Estado, da
natureza e da arte. Mas, se a filosofia da religião é a única existência verdadeira da religião, só
sou verdadeiramente religioso como filósofo da religião, e contesto o sentimento religioso
efetivo e o homem religioso concreto. Ao mesmo tempo, entretanto, eu os confirmo, em parte
por minha própria existência ou na existência alienada com que os enfrento (pois essa é apenas,
a expressão filosófica deles), e em parte em sua própria forma original, desde que são para mim
o meramente aparente outro ser, alegorias, os contornos de sua verdadeira existência própria (i.
é, de minha existência filosófica) disfarçada por cortinas sensoriais.
Por outro lado, essa revogação é a de um ente de razão; assim, a propriedade privada como
pensamento é revogada pelo pensamento de moral. E mesmo que o pensamento imagina ser ele
mesmo, sem intermediário, o outro aspecto de si mesmo, ou seja, a realidade sensorial, e
considera sua própria ação como sendo ação real, sensorial, essa revogação em pensamento,
que deixa seu objeto existindo no mundo real, acredita ter ela mesmo realmente superado ele.
Por outro lado, como o objeto agora se tornou para ela um "momento" do pensamento, ele e
encarado em sua existência real como confirmação do pensamento, da autoconsciência, da
abstração.
(XXX) Sob um aspecto, portanto, o existente que Hegel revoga em filosofia não é a religião,
Estado ou natureza real, mas a própria religião como objeto do conhecimento, i. é, a dogmática;
e analogamente com a jurisprudência, a ciência política e a ciência natural. Sob este aspecto,
pois, ele se coloca em oposição tanto ao ser real quanto à ciência direta, não-filosófica (ou os
conceitos não-filosóficos) desse ser. Logo, ele contradiz os conceitos convencionais.
Sob o outro aspecto, o homem religioso, etc., pode encontrar em Hegel sua confirmação
definitiva. (a) A revogação como movimento objetivo que reabsorve a alienação em si mesma.
Este é o discernimento, expresso dentro da alienação, na apropriação do ser objetivo graças à
revogação de sua alienação. E o discernimento alienado da objetificação real do homem, da
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apropriação real de seu ser objetivo pela destruição do caráter alienado do mundo objetivo, pela
anulação de seu modo alienado de existência. Da mesma maneira, o ateísmo como anulação de
Deus é o surgimento do humanismo teórico, e o comunismo como anulação da propriedade
privada é a defesa da vida humana real como propriedade do homem. O último é, também, o
surto do humanismo prático, pois o ateísmo é o humanismo atingido por intermédio da
anulação da religião, ao passo que o comunismo é o humanismo atingido mediante a anulação
da propriedade privada. Só pela revogação desse intermediário (que, no entanto, é condição
prévia indispensável) pode aparecer o humanismo positivo autogerado.
O ateísmo e o comunismo, entretanto, não são uma fuga ou abstração, ou ainda perda, do
mundo objetivo, que os homens criaram pela objetificação de suas faculdades. Eles não são um
retrocesso empobrecido à primitiva simplicidade antinatural. São, antes, o primeiro surto real, a
legítima concretização, da natureza do homem como algo real.
Hegel, pois, pelo fato de ver o significado positivo da negação auto-referível (apesar de sob
forma alienada), concebe o auto-alheamento do homem, sua alienação do ser, perda de
objetividade e realidade, como autodescoberta, mudança de natureza, objetificação e realização.
Em resumo, Hegel concebe o trabalho como o ato de autocriação do homem (embora em
termos abstratos); ele percebe a relação do homem consigo mesmo como um ser alienado e o
aparecimento da consciência de espécie e da vida-espécie como a demonstração de seu ser
alienado.
(b) Em Hegel, porém, à parte da, ou antes, como conseqüência da inversão já descrita por
nós, esse ato de gênese surge, antes de mais nada, como ato meramente formal, por ser abstrato
e por ser a própria natureza humana tratada como natureza abstrata, pensante, como
autoconsciência.
Em segundo lugar, por ser formal e abstrata a concepção, a anulação da alienação torna-se
confirmação da alienação. Para Hegel, esse movimento de autocriação e auto-objetificação, sob
a forma de auto-alheamento, é a expressão absoluta, e por isso final, da vida humana, que tem
seu fim em si mesma, está em paz consigo mesma e unida à sua própria natureza.
Esse movimento, em sua forma abstrata (XXXI) como dialética, é então visto como vida
humana verdadeira, mas como, sem embargo, é uma abstração, uma alienação da vida
humana, é visto como processo divino e, portanto, o processo divino da humanidade; é um
processo por que passa o ser abstrato, puro e absoluto do homem, e não ele próprio.
Em terceiro lugar, esse processo tem de ter um portador, um sujeito, mas este emerge
inicialmente como um resultado. Este resultado, o sujeito conhecer-se a si mesmo como
autoconsciência absoluta, é portanto Deus, o espírito absoluto, a idéia que se conhece e se
manifesta por si mesma. O homem real e a natureza real convertem-se em meros predicados,
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símbolos desse homem e natureza irreais e ocultos. Sujeito e predicado, por conseguinte, têm
uma relação inversa entre si; um sujeito-objeto místico, ou uma subjetividade que ultra passa o
objeto, o sujeito absoluto como processo de auto-alienação e o retorno da alienação para si
mesmo, e, ao mesmo tempo, de reabsorção dessa alienação, o sujeito como esse processo; puro,
incessante movimento de repetição dentro de si mesmo.
Visto Hegel igualar homem e autoconsciência, o objeto alienado, o ser real alienado do
homem, é simplesmente consciência, a mera idéia de alienação, sua expressão abstrata, e por
isso vazia e irreal, a negação. A anulação da alienação é também, portanto, apenas uma
anulação abstrata e inane dessa abstração vazia, a negação da negação. A atividade repleta, viva,
sensória e concreta da auto-objetificação reduz-se, destarte, a mera abstração, negatividade
absoluta, uma abstração que é a seguir cristalizada como tal e concebida como uma atividade
independente, como a própria atividade. Já que essa assim chamada negatividade é meramente
a forma abstrata e vazia daquele ato real vivo, seu conteúdo só pode ser um conteúdo formal
produzido pela abstração de todo conteúdo. Essas são, pois, formas de abstração gerais,
abstratas, que se referem a qualquer conteúdo e são, portanto, neutras face a, e válidas para,
qualquer conteúdo; formas de pensamento, formas lógicas destacadas do espírito e da natureza
reais. (Exporemos, adiante, o conteúdo lógico da negatividade absoluta.)
(XXXII) A idéia absoluta, a idéia abstrata que, "encarada sob o aspecto de sua unidade
consigo mesma, é intuição" (Hegel, Encyclopaedia, 3ª ed., pág. 222) e "em sua própria verdade
absoluta resolve permitir o momento de sua particularidade ou de determinação inicial a ser-
outro, a idéia imediata, como seu reflexo, emergir livremente de si mesma como natureza".
(ibid.) Toda esta idéia, que se comporta de maneira assim tão bizarra e caprichosa e tem dado
66
aos hegelianos tão terríveis dores de cabeça, nada mais é do que abstração, i. é, o ser pensante
abstrato. E a abstração que, tornada prudente pela experiência e esclarecida a respeito de sua
própria verdade, resolve, em condições várias (falsas e ainda abstratas) abandonar-se e
estabelecer seu outro ser, o particular, o determinado, em lugar de sua auto-absorção, não-ser,
universalidade e indeterminação; e resolve deixar a natureza, escondida dentro dele somente
como uma abstração, como um ente de razão, emergir livremente de si mesma. Isto é, ela
decida renunciar à abstração e a observar a natureza livre da abstração. A idéia abstrata, sem a
qual mediação se converte em intuição, não passa de pensamento abstrato que se abandona e
opta pela intuição. Toda essa transição da lógica à filosofia da natureza é simplesmente a
transição do abstrair para o intuir, extremamente difícil para o pensador abstrato efetuar e, por
isso, descrita por ele em termos tão estranhos. O sentimento místico que impele o filósofo do
pensamento abstrato para a intuição é o ennui [N.T.- tédio, aborrecimento, fastio], a aspiração
de um conteúdo.
(O homem alienado de si mesmo é também o pensador alienado de seu ser, i. é, de sua vida
natural e humana. Seus pensamentos são, em conseqüência, espíritos extrínsecos a natureza e
ao homem. Em sua Lógica, Hegel aprisionou juntos todos esses espíritos, concebendo-os, um
por um, primeiro como negação, i. é, alienação do pensamento humano, e depois como negação
da negação, i. é, como revogação dessa alienação e expressão real do pensamento humano. Visto
como, todavia, essa negação da negação é em si mesma restrita à alienação, ela é em parte uma
restauração daquelas formas espirituais fixas em sua alienação e em parte uma imobilização no
ato final, o ato de auto-referência como o verdadeiro ser dessas formas espirituais. [N12] Além
disso, na medida em que essa abstração concebe a si mesma e experiência uma crescente fartura
de si mesma, aparece em Hegel um abandono do pensamento abstrato que se movimenta
unicamente na esfera do pensamento e é destituído de olhos ouvidos, dentes, tudo enfim, e uma
resolução de reconhecer a natureza como um ser e apelar para a intuição.)
A exterioridade não deve ser aqui entendida como o mundo auto-exteriorizador dos
sentidos, aberto à luz e aos sentidos do homem. Deve ser considerada na acepção de alienação,
um erro, um defeito, que não devia existir. Pois o verdadeiro é ainda a idéia.
"Para nós, o espírito tem a natureza como sua premissa, sendo a verdade da
natureza e, por conseguinte, seu primus absoluto. Nessa verdade, a natureza
desapareceu e o espírito capitulou como a idéia que alcançou ser-por-si, cujo
objeto, assim como o sujeito, é o conceito. Essa identidade e negativamente
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absoluta, pois enquanto na natureza o conceito encontra sua perfeita objetividade
exterior, aqui sua alienação foi revogada e o conceito identificou-se a si mesmo.
Ele é essa identidade somente na medida em que é um retorno da natureza." (loc.
cit., pág. 392.)
"A revelação, como a idéia abstrata, é uma transição sem mediação para o vir-a-
ser da natureza; como a revelação do espírito livre é o estabelecimento da
natureza como seu próprio mundo, estabelecimento esse que, como reflexo, é
simultaneamente a pressuposição do mundo como natureza existente
independentemente. A revelação em conceito é a criação da natureza como o
próprio ser do espírito, no qual ele adquire a afirmação e verdade de sua
liberdade." "O absoluto é espírito; esta é a mais alta definição do absoluto."
Notas:
[12] Isto é, Hegel substitui essas abstrações fixadas pelo ato de abstração rodopiando dentro de si
mesmo. Ao fazê-lo, antes de mais nada ele tem o mérito de haver indicado a fonte de todos aqueles
conceitos Inadequados que originariamente pertenciam a diferentes filosofias, e havê-los reunido e
estabelecido a amplitude global das abstrações, em vez de uma determinada abstração, como o objeto da
crítica. Veremos mais tarde por que Hegel separa o pensamento do sujeito. Já esta claro, todavia, que se
o homem não for humano a expressão de sua natureza não poderá ser humana e, consequentemente, o
próprio pensamento não poderá ser concebido como uma expressão da natureza humana, como uma
expressão de um sujeito humano e natural, com olhos, ouvidos, etc., vivendo na sociedade, no mundo e
na natureza. (retornar ao texto)
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