SUAS Garantia Direitos Crianças Adolescentes Vitimas Testemunhas Violencia
SUAS Garantia Direitos Crianças Adolescentes Vitimas Testemunhas Violencia
SUAS Garantia Direitos Crianças Adolescentes Vitimas Testemunhas Violencia
Brasília - DF
2020
EXPEDIENTE ELABORAÇÃO PÓS CONSULTA PÚBLICA
Introdução 12
Princípios 14
Revelação espontânea 22
Ambiente da Escuta 31
Compartilhamento de informações 33
Educação Permanente 35
Glossário 38
Referências 40
9
Apresentação
As orientações a seguir têm como objetivo orientar e apoiar Estados,
Municípios e Distrito Federal no que diz respeito à implementação da Lei nº 13.431,
de 4 de abril de 2017 - regulamentada pelo Decreto nº 9.603, de 10 de dezembro de
2018 - que detalhou as finalidades do Sistema de Garantia de Direitos da Criança e
do Adolescente Vítima ou Testemunha de Violência (SGD) e as ações para garantir o
trabalho intersetorial de forma integrada e coordenada.
10
A expectativa é que este documento respalde e facilite a atuação de
profissionais do SUAS – gestores e trabalhadores – e também elucide aos demais
atores da rede as possibilidades e limites de atuação da política de Assistência Social
no atendimento e acompanhamento de crianças e adolescentes em situação de
violência e suas famílias. É de fundamental importância a clareza das competências
de cada órgão integrante do SGD, considerando as diferentes atribuições das políticas
que integram a rede de proteção e os órgãos responsáveis pela investigação e
responsabilização.
Lelo Coimbra
Secretário especial do Desenvolvimento Social
11
Introdução
A violência contra crianças e adolescentes é uma preocupante realidade em
nosso país. Segundo dados da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos, no ano de
2018 as principais denúncias de violações de direitos humanos recebidas foram de
situações envolvendo crianças e adolescentes, representando média de 209 denúncias
por dia e 55,28% do total das denúncias realizadas aos canais1.
1 A Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos, vinculada ao Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos
Humanos (MMFDH) recebe denúncias sobre violações de direitos humanos por meio de diferentes
canais. O canal mais conhecido e também o principal receptor de denúncias é o Disque 100. As denúncias
também são recebidas pelo Clique 100 – Denúncia WEB, pela Ouvidoria Online, pelo Aplicativo Proteja
Brasil, e por canais presenciais.
2 De acordo com o Decreto nº 9.603/2018, a revitimização é o discurso ou a prática institucional que
submeta crianças e adolescentes a procedimentos desnecessários, repetitivos, invasivos, que levem
as vítimas ou testemunhas a reviver a situação de violência ou outras situações que gerem sofrimento,
estigmatização ou exposição de sua imagem.
3 O Sistema de Garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente (SGD) é um sistema de articulação
e integração de instituições e instâncias do poder público na aplicação de mecanismos de promoção,
defesa e controle para a efetivação dos direitos da criança e do adolescente, nos níveis federal,
estadual, distrital e municipal. Foi instituído pela Resolução nº 113, de 19 de abril de 2006, do Conselho
Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA), que dispõe sobre os parâmetros para a
institucionalização e fortalecimento do SGD.
12
desta lei é, justamente, evitar a revitimização da criança e do adolescente decorrentes
de procedimentos desnecessários, repetitivos e invasivos, que levem as vítimas
ou testemunhas a reviver a situação de violência ou outras situações que gerem
sofrimento, estigmatização ou exposição de sua imagem.
4 As discussões foram realizadas em diferentes momentos e espaços, como reuniões técnicas no âmbito da
SNAS, reuniões da Comissão Intergestores Tripartite – CIT, oficinas nos encontros regionais do CONGEMAS
(Norte, Nordeste e Sul), videoconferência com representantes do Fórum Nacional de Secretários (as) de Estado
da Assistência Social – FONSEAS e do Colegiado Nacional de Gestores Municipais de Assistência Social –
CONGEMAS, roda de conversa com trabalhadoras e trabalhadores da Proteção Social Básica e Especial do
Distrito Federal e de municípios circunvizinhos (Cidade Ocidental/GO, Valparaíso/GO, Planaltina/GO e Cabeceira
Grande/MG), workshop no Seminário do Pacto Nacional pela Primeira Infância – Região Sudeste.
13
diferentes atores do SUAS que subsidiaram a elaboração do presente documento, o qual
apresenta parâmetros a serem adotados pela rede socioassistencial no atendimento
à criança e ao adolescente vítima ou testemunha de violência e suas famílias, em
cumprimento à Lei nº 13.431/2017 e ao Decreto nº 9.603/2018. A versão preliminar
deste material foi colocada em consulta pública em agosto de 2019 e, a partir das
contribuições realizadas por profissionais do SUAS e de outras áreas, apresentamos o
documento Parâmetros de Atuação do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) no
Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente Vítima ou Testemunha de
Violência, pactuado na 174ª Reunião Ordinária da Comissão Intergestores Tripartite –
CIT, ocorrida no dia 13 de novembro de 2019.
Princípios
Os parâmetros constantes no presente documento orientam-se por princípios
previstos na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, no Estatuto da
Criança e do Adolescente – ECA (Lei nº 8.069/1990 e alterações posteriores), na Lei
Orgânica de Assistência Social - LOAS (Lei nº 8.742/1993 e atualizações), na Política
Nacional de Assistência Social - PNAS (Resolução CNAS nº 145/2004), na Lei nº
13.431/2017 e no Decreto nº 9.603/2018, sem prejuízo das disposições constantes
em outras normativas nacionais e internacionais de proteção, garantia e defesa de
direitos de crianças e adolescentes.
14
IV. A promoção dos direitos e proteção da criança e do adolescente deve ser
realizada observando, sempre, o respeito à intimidade, o direito à imagem e
à vida privada;8
V. Toda criança e adolescente têm direito a ser criado e educado no seio de sua
família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência
familiar e comunitária, em ambiente que garanta seu desenvolvimento
integral;9
15
Sistema Único de Assistência Social e o atendimento
a crianças e adolescentes vítimas ou testemunhas de
violência
A Assistência Social é organizada em um sistema descentralizado e
participativo denominado Sistema Único de Assistência Social (SUAS), conforme
estabelece a Lei nº 8.742/1993 (LOAS) e a Resolução CNAS nº 145/2004, que aprova
a Política Nacional de Assistência Social (PNAS). O SUAS, implantado em 2005, é
um sistema constituído nacionalmente com comando único, caracterizado pela
corresponsabilidade dos entes na gestão e no cofinanciamento e controle social
exercido pelos Conselhos de Assistência Social das diferentes esferas.
16
A família, independentemente dos formatos ou modelos que assume, é
mediadora das relações entre os sujeitos e a coletividade, delimitando
continuamente os deslocamentos entre o público e o privado, bem como
geradora de modalidades comunitárias de vida. Todavia, não se pode
desconsiderar que ela se caracteriza como um espaço contraditório,
cuja dinâmica cotidiana de convivência é marcada por conflitos e
geralmente, também, por desigualdades (BRASIL, MDS, 2004, p. 41)
17
Considerando o objetivo da Assistência Social, previsto na LOAS, de prover
Proteção Social, as ofertas do SUAS17 são organizadas em 2 (dois) níveis de proteção:
Básica e Especial, orientados para promover a proteção social a famílias e indivíduos
em situação de vulnerabilidade ou risco social e pessoal.
17 As ofertas do SUAS reúnem serviços, programas, projetos e benefícios. A oferta de serviços no SUAS
é padronizada pela Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais, aprovada pela Resolução
nº 109/2009 do Conselho Nacional de Assistência Social. No documento foram estabelecidos a
denominação dos serviços, usuários, objetivos, período de funcionamento e a unidade de oferta de cada
serviço, dentre outras especificações a serem observadas.
18
realizado pelo PAIF e pelo Serviço de Proteção e Atendimento Especializado a
Famílias e Indivíduos – PAEFI18. O SCFV é organizado em grupos, segundo os ciclos
de vida dos participantes19. Possui caráter preventivo e proativo, sendo ofertado de
modo a garantir as seguranças de acolhida e de convívio familiar e comunitário,
além de estimular o desenvolvimento de competências pessoais e relacionais dos
usuários, com vistas ao fortalecimento de sua autonomia. Caracteriza-se por ser
uma oferta continuada, sistemática e planejada, em acordo com o território e o ciclo
de vida, sendo um serviço com grande potencial para o fortalecimento de vínculos:
participantes entre si e destes com orientador, bem como dos participantes com a
família e a comunidade.
19
técnica com os (as) usuários (as), orientação sobre direitos e a rede de serviços,
encaminhamentos, entre outras. O Serviço Especializado em Abordagem Social deve
ser ofertado de forma continuada e programada, a partir de diagnóstico socioterritorial.
20
O conjunto dos serviços socioassistenciais deve primar, ainda, pela
garantia de acesso e qualificação do atendimento às especificidades da população.
Nesse sentido, destaca-se a necessidade de romper barreiras de acessibilidade
comunicacional e espacial a fim de garantir o acesso às pessoas com deficiência
e proteção social desse público. Para isso, devem-se utilizar recursos de tecnologia
assistiva23, como metodologias específicas de atendimento, intérprete de LIBRAS,
comunicação alternativa, entre outras, para proporcionar a plena acessibilidade no
atendimento realizado.
21
provisão da oferta de serviços e benefícios nos territórios. Compete às trabalhadoras
e aos trabalhadores do SUAS as responsabilidades éticas e técnicas no trabalho
interdisciplinar, tanto no âmbito da gestão quanto no do atendimento pelas equipes
de referência dos serviços normatizadas na NOB-RH/SUAS (Resolução CNAS nº
269/2006) e nas Resoluções CNAS nº 17/2011 e nº 09/2014, que ratificam as equipes
de referência definidas pela NOB-RH/SUAS e reconhecem os profissionais de nível
superior, ensino médio e ensino fundamental que atuam no SUAS.
Com base na Lei nº 13.431/2017, o SUAS tem por objetivo realizar o atendimento
e/ou acompanhamento da vítima ou da testemunha de violência e suas famílias,
com vistas a evitar a continuidade e repetição da violência, fornecer suporte para
superação das consequências da violação sofrida e prevenir agravos, limitando-se ao
cumprimento da sua finalidade de proteção socioassistencial.
Revelação espontânea
Quando a criança ou adolescente, em um contexto de atendimento já em
andamento no SUAS, revelar espontaneamente que vivenciou ou testemunhou
situação de violência para a (o) profissional do SUAS, os seguintes procedimentos
devem ser adotados:
27 Inclusive para aqueles que não são os (as) responsáveis diretos pelo atendimento e acompanhamento
socioassistencial, o que inclui até mesmo os (as) profissionais que exercem funções de nível fundamental
de escolaridade.
22
Nos casos em que a criança ou o adolescente fizer a revelação
espontânea, é importante:
28 Considerar a necessidade de identificar pessoas adultas/responsáveis que já podem ter ciência da violência
sofrida pela criança ou adolescente (amigo (a), irmão ou irmã, professor (a), tia ou tio, vizinha (o) etc.).
23
o seu silêncio, com o mínimo de interferência possível no relato espontâneo.
É importante que o profissional se mostre acessível e disponível para a
escuta; não realize perguntas que possam constranger ou reprimir a criança
ou o adolescente ou induzir respostas. Recomenda-se que sejam evitadas
perguntas cujas respostas não agreguem informações necessárias para a
proteção da criança e do adolescente e para a realização de encaminhamentos
subsequentes para os órgãos do SGD – como o encaminhamento para
provisão de cuidados urgentes no âmbito da saúde, por exemplo. Também
não se deve colocar em dúvida o relato e nem submeter a criança ou
adolescente a julgamentos morais e/ou discriminatórios29.
29 Assim, não devem ser feitas perguntas do tipo: “Foi [nome da pessoa/grau de parentesco] que fez isso
com você?” (não direcionar um nome, para não induzir respostas); “Como ou o que exatamente o(a)
[nome/parentesco] fez?”; “O que você sentiu quando isso aconteceu?”; “O que você acha que vai acontecer
quando sua família/outras pessoas descobrir (em)?”; “Você sabe que isso é muito sério e pode prejudicar
muitas pessoas?”; “Você nunca tentou fazer nada para que isso não acontecesse?”.
As situações de violência contra adolescentes, especialmente situações de violência sexual contra
adolescentes do sexo feminino, tendem a ser ainda mais estigmatizadas, pois parte-se do pressuposto
que nessa fase da vida a adolescente já tem plenas condições de compreender e de se proteger de
determinadas situações de violência, ou mesmo que esta seria “culpada” por ter sofrido violência ou
julgada “por comportamento tido como inadequado” ou por “usar vestimenta inapropriada”. Nessas
situações é imprescindível à/ao profissional assumir postura ética e orientada para a proteção integral,
para não revitimizar a/o adolescente e não culpabilizar a vítima.
24
de assistência social, saúde, etc. Também deve-se buscar abordar com a
criança e o adolescente a possibilidade de comunicar a situação a familiar/
responsável ou pessoa com vínculo significativo com o qual possa contar
para assegurar sua proteção. Estas informações à criança e ao adolescente
têm como objetivo assegurar-lhes o direito à participação e informação sobre
procedimentos que lhe dizem respeito, para que tenham a consciência de que
houve uma violação de seus direitos, que precisam ser protegidos e que o (a)
profissional do SUAS deve realizar encaminhamentos e procedimentos para
assegurar sua proteção. Objetivam, ainda, preservar a relação de confiança,
evitando-se que as crianças e os adolescentes sejam surpreendidas com as
ações dos órgãos competentes e se sintam traídos ou em conflito ético para
com os (as) profissionais do SUAS.
25
dentre outros procedimentos - e considerar a celeridade do
atendimento que estas situações exigem.
Nos casos em que a situação de violência seja revelada por outra pessoa
que não a criança ou adolescente vítima ou testemunha (por exemplo: familiares
26
ou pessoas da comunidade), o (a) profissional do SUAS deve realizar a acolhida e
a escuta do relato e comunicar o fato ao Conselho Tutelar, que acionará os demais
órgãos do Sistema de Garantia de Direitos da Crianças e do Adolescente Vítima ou
Testemunha de Violência, respeitando o fluxo local estabelecido. O (a) profissional
deve ainda informar à pessoa que revelou a situação sobre os encaminhamentos que
serão realizados e a possibilidade de ter sua identidade preservada, garantindo-se o
sigilo profissional.
27
sonolência, cansaço constante ou indisposição frequente; tristeza e isolamento social;
baixa autoestima; agitação ou irritação extrema; perda da confiança nas pessoas; entre
outros. A presença destes sinais por si só não deve ser tomada como evidência de
que houve uma violência, sendo importante, todavia, que os (as) profissionais estejam
atentos a estes sinais e busquem mais elementos para compreendê-los.
A referida Lei nomeia os atores que fazem esta escuta, de acordo com o escopo
de cada um, e diferencia esse procedimento do Depoimento Especial, cuja finalidade é
a produção de provas para o processo de investigação e responsabilização. No SUAS, a
escuta especializada a que se refere a Lei nº 13.431/2017 e o Decreto nº 9.603/2018
poderá ser realizada no âmbito dos serviços, em razão de uma revelação espontânea
ou livre relato em um contexto de atendimento já em andamento. Nas localidades
onde houver centros específicos ou integrados para escuta especializada, nos termos
do art. 16 da Lei nº 13.431/2017, recomenda-se a elaboração de fluxos e orientações
locais para o referenciamento deste procedimento a estes centros.
28
desenvolvida por profissionais que atuam nas unidades e serviços socioassistenciais,
possuindo um caráter protetivo para a criança e o (a) adolescente. A legislação,
ao normatizar mecanismos e princípios para o atendimento da criança e do (da)
adolescente vítima ou testemunha de violência, busca qualificar e aprimorar o SGD.
Não é necessário, portanto, que sejam compostas novas equipes para a realização da
escuta qualificada.
30 Objetivos da Assistência Social, nos termos do Art. 2º da Lei n° 8.742/1993: I – a proteção social,
que visa à garantia da vida, à redução de danos e à prevenção da incidência de riscos; II – a vigilância
socioassistencial, que visa analisar territorialmente a capacidade protetiva das famílias e a ocorrência
de vulnerabilidades, ameaças, vitimizações e danos; e III – a defesa de direitos, que visa garantir o pleno
acesso aos direitos no conjunto das provisões socioassistenciais.
29
estar em situação de extrema fragilidade emocional e relacional, o que afeta sua
forma de se expressar. Assim, a escuta qualificada se fundamenta na capacidade dos
(das) profissionais de apreender para além do que foi dito; de analisar e compreender
as entrelinhas das falas e discursos; e de se atentar para comportamentos e sinais
que possam evidenciar a vivência de situações de violência e demais violações de
direitos. Nesse processo é preciso levar em consideração:
30
A proteção em face da revitimização não significa que a criança ou o adolescente
não receberá o devido atendimento socioassistencial, mas que ela não será requisitada
a se manifestar novamente sobre a situação de violência vivida ou testemunhada. No
entanto, caso a criança ou adolescente expresse desejo em se manifestar sobre a
situação, a escuta deve ser realizada, considerados os princípios estabelecidos. É
importante compreender que o relato e a escuta podem ter um caráter terapêutico
para algumas pessoas e essa vontade deve ser respeitada e acolhida. A reparação do
sofrimento gerado pela situação de violência vivida implica, muitas vezes, que a criança
e o adolescente possam falar sobre isso. Contudo, nesses casos, é importante avaliar
a necessidade de encaminhamento para o devido acompanhamento psicoterapêutico
na rede de saúde.
Ambiente da Escuta
Sempre que possível, deve-se oportunizar o processo de escuta qualificada no
atendimento socioassistencial em ambiente acolhedor, que proporcione privacidade
e sigilo. Todavia é importante ressaltar que a revelação espontânea ou o livre relato
sobre a violência vivida ou testemunhada pode emergir ao longo de um atendimento
ou acompanhamento realizado em serviço socioassistencial em diferentes contextos
– como o domicílio do usuário, espaços de atendimento coletivo ou individual
em unidades socioassistenciais, e até mesmo no espaço público. Portanto, não
é necessário criar novos espaços no SUAS para acolher revelações espontâneas
ou livre relato sobre situações de violência vividas ou presenciadas pela criança ou
adolescente, mas preparar os (as) profissionais para que as revelações ou relatos
possam ser acolhidos em diferentes contextos de atendimento.
31
por protocolo de oitiva, e ser realizado em sala adequada e equipada especificamente
para este procedimento.
A rede socioassistencial não deve ter seu papel institucional confundido com o
de outras políticas ou órgãos do Sistema de Garantia de Direitos e, por conseguinte, as
funções de sua equipe com as de equipes interprofissionais de outros atores. Também
não deve assumir a atribuição de investigação para verificação e/ou confirmação da
ocorrência de violência ou para a responsabilização de autores e autoras de violência,
tendo em vista que seu papel institucional é definido pelo escopo de competências
do SUAS31. Nessa perspectiva, ressalta-se que as trabalhadoras e os trabalhadores
do SUAS não realizam e não participam do procedimento de depoimento especial,
assim como a escuta realizada na rede socioassistencial não tem a função de
interrogar vítimas ou testemunhas e de produzir provas. Nesse sentido destaca-se
que não compete aos profissionais do SUAS produzir provas, realizar laudos, perícias
e pareceres em relação às violências. Nesse sentido, não compete à Assistência
Social executar ações que se caracterizem como de investigação, com finalidade de
produzir provas e responsabilização. Entretanto, situações demandadas pelo Sistema
de Justiça que não estejam sob acompanhamento social deverão ser inseridas no
atendimento e acompanhamento dos serviços socioassistenciais.
32
Compartilhamento de informações
A fim de evitar a revitimização de crianças e adolescentes, os órgãos do
SGD devem compartilhar entre si, de forma integrada, por meio de relatórios e em
conformidade com o fluxo estabelecido em âmbito local, as informações sobre a
situação de violência relatadas espontaneamente no atendimento e que podem
contribuir para a continuidade do acompanhamento das vítimas ou testemunhas de
violência e suas famílias. Tais informações devem ser registradas de maneira objetiva,
sem interpretações por parte do (da) profissional, aproximando-se o máximo possível
do relato realizado pela criança ou adolescente em situação de violência, pela sua
família ou por outras pessoas da sua rede comunitária.
32 Nos termos do Art 9º, § 2º, do Decreto nº 9.603/2018 “Os serviços deverão compartilhar entre si, de
forma integrada, as informações coletadas junto às vítimas, aos membros da família e a outros sujeitos
de sua rede afetiva, por meio de relatórios, em conformidade com o fluxo estabelecido, preservado o
sigilo das informações”.
33
Em casos de extrapolação ao compartilhamento das informações no âmbito
dos órgãos que efetivamente precisam das mesmas para a proteção à
criança e ao adolescente, os (as) profissionais podem incorrer no previsto no
Art. 154 do Código Penal Brasileiro.
34
Educação Permanente
Para ofertar um atendimento socioassistencial qualificado às crianças e
adolescentes vítimas ou testemunhas de violência e suas famílias, é importante que
o órgão gestor da política de Assistência Social promova ou possibilite a participação
de todos (as) os (as) profissionais do SUAS em ações de educação permanente, de
acordo com a Política Nacional de Educação Permanente do SUAS – PNEP/SUAS33.
É necessária a capacitação sobre temas e metodologias específicas para: a escuta
qualificada da revelação espontânea e do livre relato; a identificação de sinais de
violência; o atendimento de crianças e adolescentes em situação de violência e suas
famílias; a diversidade dos públicos atendidos; as especificidades e complexidade
das situações de violência e violações de direitos; articulação intersetorial e trabalho
em rede, entre outros. Destaca-se a importância do órgão gestor de Assistência
Social proporcionar ações de qualificação de metodologias de atendimento e
acompanhamento socioassistencial específicas para a garantia da proteção social à
crianças e adolescentes com deficiência e crianças e jovens indígenas ou pertencentes
a outros povos e comunidades tradicionais.
35
Gestão e Governança do SUAS no Sistema de Garantia
de Direitos de Crianças e Adolescentes Vítimas ou
Testemunhas de Violência
Na relação com os demais órgãos que compõem o Sistema de Garantia de
Direitos de crianças e adolescentes vítimas ou testemunhas de violência, é necessário
que os processos de articulação das ações sejam coordenados pelo órgão gestor da
Assistência Social, e não por meio de ações particularizadas e individuais dos (das)
profissionais atuantes nos serviços socioassistenciais. Isso é fundamental para a
institucionalização dessa relação e do funcionamento efetivo do Sistema através da
integração das redes setoriais. Assim, é papel do órgão gestor assegurar a participação
da política de Assistência Social nas comissões intersetoriais locais instituídas para a
articulação das ações, na elaboração e pactuação de fluxos de atendimento do Sistema
de Garantia de Direitos, no planejamento e na oferta de capacitações intersetoriais
para a rede, dentre outras atividades.
36
compartilhados com o SGD devem ser acompanhados de documento de ciência
expressa da corresponsabilidade institucional pelo atendimento em andamento ou já
realizado, assinado pelo (a) coordenador (a) da unidade, do serviço ou da gestão.
37
Glossário
38
Livre relato Relato verbal ou por outros meios de se comunicar
(ex: LIBRAS) sobre a situação de violência vivida ou
testemunhada pela criança ou adolescente. É denominado
livre relato porque não deve ser provocado ou induzido
a ser realizado – respeitando o desejo da criança e do
adolescente de se manifestar ou não sobre a situação
de violência – e, quando ocorrer, deve haver o mínimo de
interferência por parte do (da) profissional – não sendo
objeto de questionamentos desnecessários, interrupções,
interpretações ou constrangimentos.
Plano de O Plano de Acompanhamento Individual ou Familiar é um
Acompanhamento instrumento construído de forma gradativa e participativa
Individual ou para guiar o trabalho social, bem como para delinear, junto
Familiar aos usuários, a construção de novas perspectivas de vida. O
plano deve traçar estratégias que serão adotadas no decorrer
do acompanhamento socioassistencial e os compromissos
de cada parte, em conformidade com as especificidades das
famílias e das situações atendidas.
Revelação Revelação verbal ou por outros meios de se comunicar
espontânea (ex: LIBRAS), que ocorre de forma espontânea por parte
da criança ou do adolescente para profissional do SUAS,
sobre a vivência ou o testemunho de situação de violência.
Nem sempre a revelação é explícita e literal, indicando a
necessidade de que os (as) profissionais estejam atentos à
manifestações que podem indicar a ocorrência de situação
de violência.
Situação de Refere-se a vivência de violência, tanto como vítima quanto
violência como testemunha.
39
Referências
BRASIL. Balanço Geral 2011 a 2018. Dados sistematizados de denúncias de violações
de direitos humanos coletadas nos canais da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos.
Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Ouvidoria Nacional de Direitos
Humanos. Brasília: 2019. Disponível em <https://www.mdh.gov.br/informacao-ao-
cidadao/ouvidoria/balanco-disque-100> Acesso em 02 out. 2019.
40
______. Política Nacional de Assistência Social – PNAS/2004. Norma Operacional
Básica – NOB/SUAS. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome,
Secretaria Nacional de Assistência Social. Brasília, 2005. Disponível em <http://www.
mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/Normativas/PNAS2004.pdf>
Acesso em 04 nov. 2019.
Ferreira, Stela da Silva. NOB-RH Anotada e Comentada. Brasília, DF: MDS; Secretaria
Nacional de Assistência Social, 2011. Disponível em <https://www.mds.gov.br/
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