TfouniLedaVerdiani - Adultos Alfabetizados o Avesso Do Avesso

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Tti~e ap,;e~,ntada ao Q~~~rtallll!

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de +é'~e defr~d.dà F' LEOA \IERDI/\Iõ1
TFO\J~1 e cpm,;ood;, peic ComtSS~o
1ul~ccloTê e.m ~i'ícói'9C:i

T319a (1/~A ~.f~ fê~~<~-


!

7404/BC UNICAMp
BiBLIOTECA CENfRAl
AGRADECIMENTOS

-Por motivos vãrios, afetivo·s e intelectuais,agr2_

deço ãs seguintes pessoas:

Angela Bustos Kleiman


Clãudia T.G. de Lemos
Eni P. Drl andi
Eduardo J. Guimarães
Dair A. F. de Camargo
Regina Maura da Silva Troca
-A9radeço ao CNPq e ã CAPES pelos auxilias forne-
cidos.

-Agradeço aos adultos que me abriram as portas de


suas casas e de suas mentes, e, como se não b.a·stasse, mais
11
de uma vez convi d.aram-me para Vo 1 ta r outro ·dia e tome r
uma macarronada com frango caipira••.
"Quem prediri o voo de uma pal~vra?"

(Virg1nia Woolf, -----


As Ondas)
RESUMO

Este trabalho ·tem como objetivo tentar explici -

tar alguns aspectos do funcionamento cognitivo de um grupo

de adultos brasileiros não-alfabetizados, através da obser

vação de como·usam a linguagem, e"m situação dialógica,dia_!!


te de uma tarefa específica: a compreensão. de raciocínios

lÓgico-verbais. Apesar de haverern.sido testados em uma si-

tuação controlada experimentalmente, a análise das produ-

çoes verbais dos sujeitos, no entanto, foi efetuada seguin

do a metodologia de Análise do Discurso, o que permitiu que

fossem considerados como relevantes dados emergentes duran

te o processo de enunciação, tais como a produção de sin-

cretismos e o .uso de modalidades. Apesar de na o haver sido

encontrada qualquer evidência da existência de racioc!nio

lógico em populações ágrafas, em estudos trans-culturais an

teriores, esta pesquisa revel~u alguns sujeitos que demon~

traram ter adquirido os atributos cognitivos necessários

para a compreensão dos silogismos. A discussão dos dados

procura mostrar que existem mudanças desenvolvimentais que

classicamente são atribu!das à alfabetizaç,ão e/ou escolari

zação, mas podem ocorrer em sua ausência. Explicações teó-

ricas alternativas, fundamentadas na pragmática do discur-

so, são apresentadas para esses dados. Como resultadq ge-

ral, emerge deste trabalho um perfil de como se comporta um

grupo ágrafo cuja cultura está perpassada pelos valores de

urna sociedade letrada.

Autora: Leda Verdiani Tfouni

Orientadora: Dra. Angela Bustos Kleirnan


ÍNDICE

Pág.

CAP. I. ASPECTOS TEÓRICOS .....•.•..••..•........•.•• 1

Parte I. In tradução .......................... . 1

Parte II. Linguagem escrita e raciocinio


- .
1 og1c0 ...••••........••••••••..... 15

Parte III.Caracterização das culturas


iletradas. • • • . • . . . . . • • . • • . • • . . . . . . 35

Parte IV. Escrita, escolarização e de-


senvolvimento cognitivo ..••••••... 45

Notas .....••......••••••••••.•••••.••••...•. 51

CAP. II. r-1ETODOLOGIA ••••••••••••••••••••••••••••••••• 53

Parte I. . Introdução. . • . . . . . • . • • . • • . • . . . . . . . 53

Parte II. Procedimentos •••.••..•••••.••.••••• 59

CAP. III. A PRODUÇÃO DE SINCRETISMOS •..••.••.......... 66

Parte I. Introçlução •.•••.•••••..•..• .~ .•.••. 66

Parte II. Um exemplo introdutório ••.••.•.... 63

Parte III.Estudo dos sincretismos produzidos


pelos sujeito~ do Grupo I ...•..•.. 76

Parte IV. Tentativa de definição do pro-


cesso .............................. ~ ..•. 98

Parte v. Estudo dos sincretismos produzidos


pelos sujeitos do Grupo II .•....•• 101

Parte VI. Apresentação dos dados e discussão

geral ...•...• ~ ..................... 107

Notas .•....•...••..•...•..•.•••.•..••.••.•.. l20

CAP. IV. 0 USO DE MODALIDADES ..........•.....•..•.... 121

Parte I. Introdução •••....•..••....••••.•.. l21

Parte II. Modalidades: referencial teó-


rico ..••.•.•••••..•.•••.•.•••.•.•• 122

Parte III.Apresentação dos dados e dis-


são .••......•..•......•.••..•. ~ ..• 135
Pág.

Parte IV. Conclusões •••••.••••••••• ~ •••••••• l51

CAP, V. COMPORTAMENTO METAPROCEDIMENTAL EM NÃO-


-ALFABETIZADOS .•.••••.•••••••••.••••••..•••• 154

Parte I. Introduçao •••••••••••••••••••••••• 154

Parte II. Metaconhecimento e escrita ..•.•••. l62

Parte III.Apresentação preliminar dos


dados •••••••• ············••o•• •• o.l65

Parte rv~ Proposta exp1icativa:as estraté-


gias ••••••• o. ·••••o••••-•o••••·····173

Parte v. Discussão e conclusões •••••••••••• 185

Notas .••••..••••••••••.•••• ····••o•• •••o•o •• 193

CAP. IV. CONCLUSOES •••••••••• o ••••••••••••••••• o •••.• 194

Parte I. 1.0s sincretismos e as moda1iza-


-
çoes.o···············•••o······••ol94
2.0s comportam~ntos metaprocedi-
mentais .••• o •.• o ••••••••• o ••••••• 202

Parte II.1.DomÍ~io da escrita e metacorthe-


cimento:relação.necessãria? ...••• 204

2.Escrita e oralidade: valor e


preconceito .••••.••••.••••• oo•···209

3o0 ponto de vista teórico ••••••••• 214

BIBLIOGRAFIA •••••••••••• o •••••••••• o •••• o. o •• o •.•• o. o. 218

ANEXOS. o .••• o •••• o .••••••••• o o •••• o ••• o •.••• o o .•• o o o o. 226

Anexo I. Entrevista e características adi-


Cionais dos sujeitos.o••••••o•••ooo227

Anexo IIoDescrição das gravuras,apresenta-


ções e silogismos utilizados para
o Grupo I,Grupo.experimental e p~

ra o Grupo II,Grupo experimental ..• 229

Anexo III.Silogismos utilizados para o Gru-


po !,Grupo controle e para o Gru-
po II, Grupo controle •• o•••••o•••··236
- 2 -

fia pertinente, limitei-me a estudar mais detalhadamente a

queles Autores que tratam especificamente dos problemas da

linguagem nos povos "pJtim.LtivoJ.o"

Deixo, assim, de considerar em detalhes dis-

cussoes clássicas e às vezes polêmicas, sobre os povos


"ptt.Lmiliv o.6", tais como as de DURKHEIM, L~VI-STRAUSS,

GLUCKMAN, entre outros.

GOODY(l977) coloça também este problema de

delimitação do escopo, e observa, com muita propriedade,ao

comentar os Autores acima:

"In .took.ing at the.. c.hange..& that have. tak.e.n


p.tac.e. .in human thought, the.m, we. mu.6-t
abandon the. _e.t.hnoc.e.ntJt.ic. dic.ho.tom-Le.l:! (l)that

have. c.haJtacte.n.Lze.d J.ooc.ia.t thought in the.


pe.Jtiod oá EuJtope.an e.xpanJ.oian. InJ.ote.ad we.
6hou!d took 6oJt molte 6pec-é6-éc cJtdelt-éa 601t
the. d,Lfifie.Jt.e.nc.e.6 11 (op.cit., p.9).

Mais adiante, explicitando seu ponto de vis-

ta alternativo, diz ele:


11
o o oU J...6 not a que.6-tion o6 e.6-ta.bU.6hJ..ng a.
boundaJtq, but oó de;te.JtmJ..nJ..ng the. e.X-te.n.6J..on
oó c.ognJ..t.ive. ac.t.iv-Lty tha-t ianguage. pe.Jtrn.i.t.6

and e.nc.ouJtáge..6 11 (id. ib.).

Pelas citações acima, dois pontos ficam ela-

ros:

19- que a "d-ióe.Jtenç.a."(se é que existe ... )e.!!_

tre "pJtJ..m.it.J..vo.6 11 e "c.-iv-if..izado.6" não deve ser buscada em


11
classificações dualísticas do tipo pe.n.6ame.nto ml.6-t.ic.o" X

"pe.n.6a.me.nto c..ie.nt.Z6-Lc.o", ·uma vez que tais critérios, além


- 3 -

de serem descritivos e superimpostos, ainda desviam a dis-

cussão de seu aspecto central;

29 - que o' fundamental a ser estudado e a

Linguagem, talvez o único atributo comum a todas as cultu-


ras, a todas as instituições sociais( 2 ). Portanto, o obje-
tivo de análise em estudos desse tipo deve ser as diferen-

ças no ufJ o da linguagem por povos "i..e;tJtad.ol.:!" e "não .tet][_a.-

doi.:!".

Meu objetivo, neste trabaho, seguindo a li-

nha teórica exposta, será o de explicitar alguns aspectos

do funcionamento cognitivo de adultos brasileiros não-alfa

betizados, através da observação de como eles usam a lin -

guagem, em situação dialógica, numa tarefa específica: a

compreensao de raciocínios lÓgico-verbais.

O emprego dessa tarefa não foi casual, como

se poderia supor. Com efeito, além de já existir uma çerta

tradição quanto à sua aplicação a povos "p1LimLtivo.6" (cf.

LURIA (1977), SCRIBNER(1979) ,SCRIBHER e COLE (1981)), há

uma outra ordem de .colocações, relacionadas mais com a r e,...

levância deste tipo de tarefa, do que·propriamente com

seus antecedentes bibliográficos, as quais passo a discu -

tir a seguir.

O raciocínio silogístico clássico constitui-

-se num segmento de discurso, do tipo lÓgico~dedutivà, que

é, em grande parte, artificial e dependente da linguagem

escrita. Não existe evidência da existência de discursos

desse tipo em povos com tradição oral de transmissão de

cultura. Gostaria de acrescentar, no entanto, que não é o

caso de se considerar os indivÍduos não-alfabetizados como

incapazes de raciocinarem lÓgicamente. A .diferença entre

o tipo de raciocínio lÓgico desse indivíduo e o raciocínio


- 4 -

lógico-verbal clássico está na natureza dos argumentos:en-

quanto que os argumentos usados pelos não-alfabetizados só

podem ser julgados quanto à "ve.Jto.6.6.ün-i...thanç_a ou p!LobabJ....tJ..-

dade. que.. a.6 p!Le..mi.6.6a.6 c.on6-i.Jtam à.6 Jte.6pect.J..va4 c.onc.lu.6Õe..6 u

(cf. COPI, 1974,p.35), no segundo.. caso, dizemos que ora·-

ciocínio "ê vãLtdo quando .6 ua.6 p!te.ml.t..6 a.6, .6 e v e.ndade.iJta.6

6oJtne.c.e.m pJtova.6 c.o»v-i.nc.e.nte..t. paJta .&ua c.onc.lu.õão, .U,to e.,


quando a.6 p!te.mi.6.6a.6 e a c.onc.lu.6ao e..6tão de. tal modo Jte..ta-
c.ionada.6 que. ê ab.6olutame.nte. irnpo.6.61ve..t a.6 plte.mi.6.6a.6 .6e.Jte.m
ve.Jtdade.iJta.6 4e a c.onc.lu.6ão tampouco 6oJt ve.Jtdade.iJta'' (id. ,
ib., p.35}. Na realidade,o que se tem ai são dois tinos

de raciocinio lÓgico.: o indu.t1vo e o de.du.tivo 1 e é o segu!!


do deles que foi utilizado como base para a testagem deste

trabalho.

Neste ponto, duas questões merecem ser colo-

cadas: a primeira trata da natureza do raciocínio dedutivo;

a segunda relaciona-se à eventual relevância do uso de si-

logismos como material de testagem. A seguir, vou examinar

cada uma delas.

Raciocínio dedutivo

É definido pelos lÓgicos e filÓsofos como a-

quele tipo de raciocínio contido em um argumento "c.uja<!> p!r.e.

ml{)<!>al> 6oJr.ne.c.e.m p!Lova<!> de.e~l>~val> paJr.a a ve.Jr.dade. de. uma eon


cttMão" (COPI, op. cit., p.l39) •.

A definição parcial acima citada é decisiva

para estabelecer o estatuto formal do silogismo na LÓgica

tradicional: na estrutura do silogismo, e somente nela,de-

vem ser buscados os elementos que inv~lidern ou nao seus

argumentos. Assim, a avaliação dos raciocínios dedutivos é


- 5 -

feita em termos de estabelecimento de critérios para a ve-

rificação das "Jte.taçõe.& e.nL·'te. a.& plte.rn..i..&.&a.& e. a c.onelu.&ão de.

um Jtac.ioc.Znio ou attgume.JU:o váiido 11 bem como das "técnica;.,

paJta avafiação do.& aJtgume.nto.& dedutivo.&, i.&to e, pa!ta di.&-


:t:,..i.nguifl.. evttJte a.6 de.duçÕe..6 vã.tJ..da.& e. invál-Lda.õ" (id. ib.).

Uma análise do conteúdo dos silogismos apon-

ta para os seguintes aspectos:

De acordo com STRAWSON(l969), os lógicos em

sua maioria, atêm-se ao estudo dos silogismos em si mesmos,

e entre eles "ha .6ido c.ornún de.J.Jc.u.tdalt. he.c.ho.& taf.e.& como

que. una y la mi.&ma e.xp!te..&.&iÕn pue.de. u.&alt.&e. e.m oc.a.&ione..& di

que. .ta opo4tunidad e.n que. .&e. a4tic.u.ta una oJtac.lÕn pu e de

ta". (op·.cit., p.35).


A cri ti c a aí cont'ida pode ser interpretada

corno uma negação da. visão clássica a respeito do silogismo,

a qual considerava o mesmo como a forma perfeita de dedu -

ção, ao mesmo tempo em que atribuía ao conteúdo das propo-


sições nele contidas "6ollç.a de. J!..e.i..",isto é: a verdade das

mesmas tornava-se necessária em termos das relações de

inclusão entre os membros das classes declaradas e da Úni-

ca conclusão lÓgicamente possível. Seguindo uma linha mais

pragmática, STRAWSON propõe qu~ o conteúdo do silogismo

·pode ser checado de encontro a um outro pano de fundo: as

~ituaç.Õe.~ em que as asseverações são usadas podem servir

de ponto de referência para estabelecer sua verdade ou fal

sidade.
- que
O mesmo Autor (STRAWSON,l950) propoe se

p!t.e.~~ up .9.
11
introduza no estudo dos silogismos o conc.ei to de
- 6 -

lliç_ão e.xlJ.d e.nc.-Lal", conceito este que é ilustrado por COPI


da seguinte maneira:

"Suponhamoll, pott e..xe..mplo, que alguém a6-tJtme..


"Toda.ó a.6 ma./;ã.ó da c.a.ixote. .6ão de.. Fulano", e
olhamo.ó patta. de..nttto do caixote.. e e..nc.ontttamo-
-.to vazio. CoJt.Jte..nte..me.n-te.., não c..onc.lu-i.Jtlamo.ó
di.óllo que.. a p!topo.ó~ção óa.6.6e ve..ttdade..-<.tta ou
óall.la, E.ótaJtZamo.ô mai.6 inc..t-i..nadoll a c.hama.Jt a
atenção pa!ta o 6ato de.. não have..tt maçãll no
c.a.ixot e.., -Lndic.ando que., ne...ót e c.a..ó o pa.Jttic.u -
latt, o ptte..ll.óupo.óto e..xL.óte..nc.ial e..llt.ive...ólle.. e..Jt-
4ado" (id. ib., pp. 157-158).

A lÓgica tradicional (aristotélica) fica em

parte abandonada quando se considera o conteúdo existen -

cial, o qual passou a ser incluído na chamada lógica· boole


ana, ou lógica simbÓlica moderna.

De acordo com a proposta booleana, as contra


dições entre as proposições de um silogismo podem ser cau-

sadas (além das contradições de' qualidade e quantidade vis

tas atrás) pelo fato de se afirmar que urna classe que nao

possui membros os possui (isto é, quantificar uma classe

que constitui um conjunto vazio porque nãO tem conteúdo e-

xistencial) .

Temos -
a~, tanto em STRAWSON quanto em COPI,

uma correçao da lÓgica aristotélica tradicional.

Em outras palavras, a oposição acima traçada

trata na realidade da oposição entre intensão e extensão e

o papel que desempenham no cálculo do valor das operaçoes

interproposicionais.PIAGE.T(l976) resume bem o problema,di-


- 7 -

zendo que a lógica moderna opoe-se à lÓgica tradicional p~

lo fato de que aquela não aceita o critério de quanti.6-i.c..a-

ção no cálculo, se bem que, ainda segundo o Autor, RUSSELL


tenha introduzido 11
Á noção de.· &unç_ão p!topo.t.-i.c.iona.t c.omo
e.io e.ntJte. a~.> dua.t.: a.t. ôunç_Õe..t. p!topo.t.i.c.ionai..ó pode.m,c.om e.-

6e.Lto, .6e.Jt 11
.óe.mph.e." ve.Jtdade.-i.Jta-6 ou "â.ó ve.ze..6" ou "jama.L6",

o que. une. a quantidade. p!tÕp!tia_ã.t. c.ta&.óe..ó ã ve.Jtdade. ou -


a
6af..óidade. p!t.ÔpJtia..ó à.t. p!topol.liç.Õe.!J" (op.cit. ,p. 350).
TOULMIN (1958) também faz algumas observações

a respeito do silogismo. O Autor diz-se interessado,não em

silogismos aristotélicos, nos quais ambas as premissas são

uni ver sais, mas "in aiLgume.nt.ó b y wh-ic.h g e.ne.Jta.t piLo po.6J..t.J..o n6

ane. a.pp..tie.d :to ju.6.ti6y pa!L.tlc..u.ta.Jt c.onc...tu.6lon.6 about indiv:!:_


dual.6" (op.cit., p.l08), e acrescenta·que pretende mostrar
que ''the appa!te.ntly innoce.nt Joftm.6 u.6ed in .6yllogi.6tic a.Jt-

gume.n-1:.6 tuJt.n out to have ft h.-tdden c.omplexity" (id.ib).


TOULMIN ainda classifica de "e.ngana.doJta" a

estrutura tradicional dv silogismo {duas premissas e uma

conclusão) e analisa particularmente a premissa maior em

termos de uma ambigüidade intrínseca. Esta ambigüidade, em

linhas gerais, é a seguinte, segundo o Autor:

No silogismo:

Jac.k tem 0.6 pé.6 toJt.to.6;


Todo.6 o.6 homen.6 de pé.6 toJt.to.6 têm dióic.u.tda-
de. pa.JLa anda.Jt.;
Logo, Jac.k tem dlfilc.uldade pa.Jta. anda.Jt..

A premissa maior pode ser interpretada de

duas maneiras:
19 - Espera-se que um homem de pés tortos te

rá dificuldade para andar:


- 8 -

-
29 - Todo homem de pes tortos que conhecemos

teve dificuldade para andar.

No primeiro caso, temos o que TOULMIN denom!_

na um "i..n6e.ne.nc.e.-Waftnant" argúmento, e no seçjundo caso te-

mos um argumento "bac..king", baseado em informação factual.


Existe, assim, uma ambigüidade constante, presente nas

premissas maiores de um silogismo, relativa ao estatuto an

terior do conteúdo (ou ordem de .fatos) que a eles deu cri -

gern.

Utilizando esta mesma argumentação, TOULMIN

recusa a hipótese existencial, já vista acima. A esse res-

peito, afirma ele que, sendo a premissa maior ambígua(pri!!

cipalmente as que contêm o quantificador universal) , nao

se pode dar garantias existenciais para a mesma, principal

mente devido à leitura 11


i_n 6e.fl.e.nc.e-. Wafl.~ta.nt 11 intrínseca -
a

mesma. Diz o Autor:

"No e.nti.Jte.·.tlj ge.ne.lta.t an6We.Jt be. gi.ve.n :to


the I exütent.<a.t) quel>t-i.on, 6oiL wh«t deteiL-
mine.-6 whe;the.IL :the.Jte a.Jte oJt a.Jte. no:t e.xL~:tent

not the 6o1Lm o6 <>tatement .ét<~t.t6,but ILatheiL


:the pJI.a.ct.i.c.a..t u.6e. to whic.h thi-6 óoJtm i.-6 put
on .tha:t oc.c.a-6-i.on" (id.ib., p. 115).

Concluindo, TOULMIN afirma que mesmo a leitu

ra "ba.c.k.ing" pode ser ambÍgua, e completa:

''Onc.e one. ha.6 be.c.ome. a.c.c.o6tume.d to e.xpanding


<>tatementó o6 the 6Mm "AU A'<> a!Le B I .ó 11
'
and ll.e.plac.i.ng the.m, a6 oc.c.a6i.on ne.qui.fl.e..6,by
- 9 -

badüg, o'" w!_U &l_nd Lt a puzzte :tha:t ta-


g!_cl_an• have been wedded to :thi• 6ohm o6
.&.ta.teme.nt-6 .6o .to11g". (id.ib., p.ll6).

A seguir, tentarei justificar o porquê do

uso de silogismos como material de testagem para pesquisar


a cognição de individuas não alfabetizados.

Por que testar compreensao de silogismos?

A questão acima colocada remete-nos a outra,

intimamente relacionada: o que torna o silogismo, do pon-

to de vista cognitivo, em algo digno de atenção?

Essa é urna discussão que pode ser abordada


sob dois ângulos: o ponto de vista epistemológico e o his-
tórico-social. corno representante do primeiro, pode-se ci-
tar PIAGET, enquanto que no segundo caso encontra-se a cha

mada psicologia cognitiv~ dialética, principalmente,na dis

cussao dos silogismos, com LURIA.

PIAGET(l976) faz uma oposição inicial entre

lóg~ca e ep~6temolog~a, dizendo que:

~convenc~ona~emo6, poi4 chama~ de epi6temolo-


gia o e4tudo do conhecimento enquanto ~ela­

çao entne o 6ujeito e o objeto, e nehenvan


o tenmo de lÕgica pana a anâli4e nonmal do
c.onhe.c...úne.nto'! (op.cit., p.4).
Mais adiante, o Autor continua tentando deli

mitar os dois conceitos:

" ••• a lÕg~ca penman.ec..e. e.xc.luhivame.nte. ne.lat:!:,


va. àh ativida.de..ó do 4uje.i:to e não tnata da.õ

inte~aç;e.-6 e.nt~e. o 4uje.ito e o objeto, a4


quai4 c..oncennem apena.õ à epi4temologia. Ih-
- 10 -

~o nao hign16ic.a qu~ a f.Õg~c.a negue de. qua~


que.Jt 6o1Lma {como ta.mbêm não Gl.ÓL'tma) a e.xi-6-
tênc.ia e.pihte.molâgic.a do objeto, mah, ah o-
pe.Jtaç.Õe.h c.uja c.oe.Jtênc.la 6oJtma.t e..ta e.h.tuda.
podendo •e~ eóetuadaõ oob~e objetoõ exte~1o

Jte.h quaihque.Jt, e..ta não ne.c.e.hhita c.onhide.Jta.Jt


a inte.Jtve.nção d~hte.h'' (op.cit., p.S).

A lÓgica formal é· uma disciplina que, para o

Autor, nao se constituiu autonomamente. Ela- pressupoe uma

reflexão anterior sobre o real. Diz ele:


11
A .tÕgic.a. ê., poi.6, o ptwdu.:to de. uma Jte.lóe.xão
e de. uma óonma.tização Jte.tJto.6pe.c.tiva.6 e. nao
c.on.6titui um código jâ óoJtmulado a.nte..6 de.
.6ua..6 ap.tic.aç.Õe..6" (op.cit., p.6).

O estatuto cognitivO da lógica, para PI~GET,


está relacionado ao curso·do desenvolvimento intelectual

Neste sentido, diz o autor: "a.6 e.6tttutu.Jta.6 .tôg.ic.a.6 exptt.i -

mem a..6 le..i.6 do pen.6a.men.to 11 (p.B), isto é, exprimem aquelas


leis "que. 1te.gula.r,1 a..6 ativ.ida.de..6 do .6u.jeito .6u.6c.e.t.Z:ve.i.6 de.
daiL OILige.m a 1Le.laç.Õe..6 ve.ndade.iJta.6 ou 6a.t.6a..6".(p.8).
Existe, então, para PIAGET, um isomorfimo ~

tre as operações da lÓgica e as estruturas do pensamento ,

sendo que aquelas exprimem estas:

''E, pO.i.6, o c.onjuntb da.6 ope.1Laç.Õe..6 do pe.n.6a.-


me.n.to que. a .tóg.ic.a .te.m obJtigaç.ão de. 6ottma.t~

zatt, .6e. ptte.te.nde. c.he.gatt a uma te.ottia exa.u.6-


tiva da c.oe.Jr.ênc..ia 6ottma.t'', {p.lü).
Ontogeneticamente, o pensamento lÓgico, de

acordo com PIAGET (l947),é atingido na Última etapa do

desenvolvimento cognitivo, no chamado estágio das operações


- 11 -

formais. ~ característico desse estágio o raciocínio hipo-

tético-dedutivo, ou das operaçÕes·lÓgico-matemáticas,quan-

do o indivíduo, raciocinando em termos proposicionais,con-

segue considerar todas as hip6teses possíveis para a solu-

ção de um dado problema, e, através da manipulação isolada

de cada variável pertinente, consegue atingir a solução

desse problema. Antes disso, o que caracteriza o pensamen-

to é o raciocínio transdutivo, em que o pensamento vai do

particular ao particular sem nunca a tingir -a generalização

necessária para a compreensão do silogismo.

Deste ponto de vista, o silogismo pode ser


encarado como sillbolizando o lugar onde se pode detectar se

o sujeito é capaz de raciocinar logicamente ou não , visto


que, apesar de sua estrutura aparentemente verdadeira, po-

dem ocorrer contradições, incompatibilidades, etc., quer

entre os termos sujeitos,.quer entre os termos predicados,

dentro de um mesmo silogismo, ou ainda entre um silogismo

e outras formas de conhecimento, como, por exemplo, o co-

nhecimento heurístico.

PIAGET chama a essas operaçoes de "opeA.aç.Õe..6

de. .6e.gunda po:tênc.ia" (p.l4), e o individuo só é capaz de

realizá-las quando atinge o estágio operatório formal.

Portanto, do ponto de vista da psicologia g~

nética, o silogismo (e o pensamento lÓgico, por inclusão )

significa,ao mesmo tempo, o estágio mais adiantado do de-

senvolvimento intelectual do individuo, e o auge da forma-

lização lógica. conforme afirma PIAGET:


11 o- ·
••• a -<..-Og.{.c.a ê. a ax-i.omâ.t-i.c.a
ope.~a.tõ~ia.6, da qual a p.6-i.c.otogia e a .6oc.-i.~

.togia do pe.n.6amen:to e..6:tudam o 6unc.ionamen.to


- 12 -

Jteat" (p.l4).

Na linha de estudos sócio-interacionistas ,

LURIA(l977), analisando o silogismo do ponto de vista de

uma visão marxista, afirma que ele é um dos produtos do de

senvolvimento sócio-histórico, e deriva-se, por um proces-

so dialético, do aparecimento de novos códigos de pensame~

to, tal como os códigos lógicos. Para o Autor,

"Th-i~ l.õ wha..t p!Lovlde.d the. tnan-t.Ltion 61tom


.õe.Ytll ony to Jta.tiona.l c.on-6 c.lou-6 ne.-6.&, a phe.nom~

non :tha.t c.la-6.6-i.c.-6 o6 Ma!r.x-l.óm !Legattde.d a.ó


one. o6 the. mo.&t .impoJttant in hLó:toJty" (op.

cit., p,lOl).

Continuando, o Autor fa~ considerações acer-

ca da natureza do silogismo, que ele define como sendo" ...

a he.t o6 .i.nd.i.viduat judgementh o6 vo.Jtlf.i.ng degJteeh o6 gene-

JLaU:t.y i..n c.e.!Ltal..n obje.c_:ti_ve.llj ne.c.e..6.6afi..!J tt.e.lation.õ.hipp to

one anothe.JL" (p.lOl).

A estrutura formal do silogismo, diz LURIA,

ao contrário do que pa~savam alguns psicólogos fenomenológl

cos, nao espelha "ba.&.-i.c. p!Lope!Lt.-le.& oE, human c.on.&c..-i.ou.&ne.!d"

(p.lül); e, antes, atingida pela evolução intelectual de-

corrente da evolução histórica.

O silogismo, assim, faz parte de um sistema

lógico de códigos, cuja função é servir de canal para que

os conceitos sejam expressos. Diz LURIA a respeito:

"A.& theon~tic.af.. though.t de.ve.lop.&, the. .&y.&tem

be.c.ome..& malte. and m'one. c.ompf..e.x. Tn addi..tion

to wond.& (mo!Le.,p!Le.c..t.&e..tlj, me.an..-i.ng.&,wh.-i.c.h have.

a. c.omp.te.x c.o11.c.e.ptuai. .&t!Luc.tu!Le.) a11.d .&en-

tenc.e.& (who.õ e fogJ.c.a-t and g!Lammatic.a-t .&t!Lu.e


- 13 -

tune.. pe.!LmLt -the.m to 6unc.t-i..on at~ -the. bat..ic.


appa!Lantt. to ju.dge.me.nt.6) ,thL~ 6if6-te.m a.l.óo

inc..tude..6 moJt.e. c.omple.x and .togic.af. "de.vi.c.c..6"


thltt make ü poHibLe to peJt6ofLm the ope!La-

t.ion.6 o6 de.du.c.ti.on. a.nd -i.nfie.Jr.e.nc.e. w-Lthou;t .Jte.

Uanc..e. on di..lte.ct e.xpe.Jr.ie.nc.e." (p.lOl).

O silogismo constitui-se, para o Autor, num


11
desses "atdJ..61c.i..o.6", ou e..t.que.rna.ó- f.Õgic.o6".
Em outro local, LURIA (1979) usa o tenno"ma--
_tJt.iz e..6" para designar os produtos do desenvolvimento cogn!
tivo quando examinados do ponto de vista sócio-histórico:

"0 .&i.õ.te.ma. obje.t.-i.vo de. ma-t:Jtize..6 que. .~e. t}o!tm~

nam no pnoc.e.6.6o de. de.6e.nvolvime.nto hi6tÕni-


c.o e. 6 e. Jte.file..t e. ta.nt o na a.t.iv.i.dade. ma.-t e.n-i..ai
do home.m quanto no 6l.6te.ma da Úngu.a., deve
.&etr.v.i..n de. ba..6e. a t}o!tma.6 ma.L6 c.omple.xa..6 · do
pe.n6amento, a..õ-óegul!.a.ndo uma opena.ç..ão de.. Jta-
c1oc.Znlo e canc.lu4ão"{op.cit.",p.l02).

com exemplos de matrize~, o Autor cita as e~

truturas sintáticas e lexicais das lfn9-uas, e as "ma.tJt1ze.4

lÕg-i.c.a..ó oóje.-tiva-6 de.te.Jt.m.-i.nan:te.-6 dol.l ne.x:o-6 que. l.lultge.m na


con.óc.lência e.voluZda do homem" (p.l04). O silogismo inclui-
-se entre estas Últimas. Sobre ele, afirma LURIA:

"O .&1log11.Jmo ( ••. ) é_ o Jte...&ultado de.. uma longa


expeJt1ênc1a pnãtica, Jte..6le.t1da num e..l.lque.ma
LÕg.i.oo fLe6tfLÜo{ .•. )" {pp.l04-l05).

E prossegue:

"Na h1ld.ÕJtia da .t1nguage..m e 11a h11.ltÕJtia da


.tôg1ca 6o!tma!tam- .6 e. me.1oi.J obj e.t-Lvol.l, que. a!Lt o
- 14 -

ma.tlc.ame.nte. tJt.an.&mi.te.m ao ind1v1duo a e.xpe.-

Jt..iênc.ia da.!J ge.Jt.aç.õe.,s, .t.-i.vJtaJtd(}- o da ne.c.e..6.6l


dade. de. obte.Jt in6oJtmação da p!tâLi.ca indlv-<--

dua.t imediata e. pe.Jtmiti.ndo- ih e. obt e.Jt o j uZ-


zo c.otULe..óponde.nte. poJt v-ta te.Õtr.-Lc.a,.C.Õg1c.a "
(p.l05).

Pelo exposto acima, pode-se concluir que o

silogismo constitui-se num lugar privilegiado para se estu

dar o desenvolvimento cognitivo, ~uer do ponto de vista on

togenético, quer do filogenético. Verificar em que ponto

do desenvolvimento estão as chamadas culturas iletradas,ou

primitivas modernas é também, em parte, determinar se, e

como, seus processos mentais foram afetados pelas mudanças

sociais, e se as alterações porventura existentes podem ser

explicadas apesar da ausência da variável considerada até

agora como a mais importante para o desenvolvimento cogni-

tivo: a aquisição da escrita. Em outras palavras, uma pes-

quisa que use os silogismos como instrumentos de testcgem

pode vir a esclarecer pontos obscuros relacionados à clas-

sificação das "c.uUuJta.6 p~tim1-tiva..6" ou "inteiigê.nc.ia p~téiti

c.a", que, comumente, por serem iletradas, são consideradas


como ".sabendo me.n.o.õ", ou incapazes de raciocinar para além

do factual e subjetivo.

Existem mudanças·desenvolvimentais que clas-

sicamente sao atribuídas à alfabetização, mas podem ocor-

rer em sua ausência, e, portanto, requerem explicações al-

ternativas? Esta é a questão básica que pode ser em parte

respondida pelo estudo dos processos lÓgicos de raciocínio

em adultos não-alfabetiz~dos

A seguir, examinarei os pontos seguintes:


- 15 -

l - Relações entre aquisição da escrita e ra


ciocínio lÓgico;

2 - Caracterização das culturas ágrafas, ou

iletradas;

3 - Relações entre aquisição da escrita, es-

colarização, e desenvolvimento cognitivo.

PARTE II

Linguagem eScrita e raciOcínio lÓgico.

Existe um consenso, entre alguns Autores que


3
estudam a escrita( )quanto ao fato de que, uma vez adquiri

da, seja na cadeia onto ou filogenética da evolução, ela

passa a ser a causa de mudanças cognitivas nos indivíduos

e em suas culturas. Há alguma divergência quanto ao estatu

to dessas mudanças.

Para alguns, como é o caso de BRUNER (1978),

"The bame. babic. mental 6unction.6 all..e. pJte.be.nt in aduU.6 -tn

any cuUuJte. Wha.t d.é66e"-• ü .the deptoyment o6 .the•e 6unc-


:tion~: Wha.t i.6 c.onbi..de.Jte.d aJt.e. app1DPIL-i.a.te. .6t.'tateg-i.e.6 .6u-i.t-

e.d :to :t.he. .6i...tua-t-i.on and .ta.6k" (op. cit., p.88). Assim tam -
bém pensam outros pesquisadores, principalmente psicÓlogos,

como COLE e SCRIBNER, para os quais existem "modalidade!> de.

penl:.ame.nto" diferentes, o que implica em considerar uma es


trutura intelectual Única por trás.

Para outros Autores, as mudanças que se ope-

ram numa sociedade que adquire um sistema escrito são Jta.di

ca.i.6,na medida em que somente o domínio da escrita possibi

lita o aparecimento de capacidades cognitivas mais sofisti

cadas, como e o caso do raciocínio lÓgico.

As pesquisas mostram que, aparentemente, o


- 16 -

saber escrever e ler parece ser fator central determinante

da habilidade para raciocinar dedutivamente a partir de um

silogismo qualquer. O domínio da escrita garantiria ao in-

divíduo a possibilidade de se afastar do conhecimento fac-

tual, da expe~iência pessoal, ao ~esmo tempo em que possi-

bilitar-lhe-ia considerar o silogismo como algo teórico,d~

pendente apenas do conteúdo proposicional. Do mesmo modo,a

capacidade para enxergar as duas premissas em termos de in

clusão de conjunto só é atingida por indivíduos alfabetiza

dos.

SCRIBNER e COLE(op.cit.) alistam cinco domí-

nios da atividade intelectual que são freqüentemente cita-

dos corno cohstituindo efeitos da aquisição da escrita. são

eles:

- pensamento abstrato,

- categorização taxionômica,

- memória,

- raciocínio lÓgico,

- conhecimento ref~exivo sobre a ~inguagem.

O estudo das relações entre linguagem escri-

ta e raciqcinio lógico aponta para uma direção: a aquisi -

ção e dominio da escrita afetam de maneira saliente o ra-

ciocínio lÓgico dos indivíduos.

Em termos históricos, alguns.Autores ( GOODY

e WATT, 1968; HAVELOCK, 1976, 1978) subordinam o apareci -

mente do silogismo à expansão da escrita. GOODY e WATT(op.

cit.) historiam a evolução da linguagem escrita desde as

primeiras manifestaçÕes gráficas das pinturas de cavernas

da pré-história até a introdução do alfabeto (já um siste-

ma fonético} na Grécia, por volta do século VIII A.C. A


- 17 -

respeito da escrita fonética, dizem os Autores ser ela su-

perior a outros sistemas de escritas, ideográficas ou picto

gráficas, especialmente porque:

" ... phone.tic. WJtLting, by imita.Li..ng human dl.õ

c.ault.õe., i-6 in 6ac_t .6!fmboUz1ng, not the. ob-


j etc. o6 the. .6 oc.ial and natuna.t oJtde.n , but

the. vetu.j pJtoc.e.-6.6 o6 huma.n in.-te.Jtac.t1on -<..n


.6pe.ac.h ( ••• ) Phane.tc. l:!!f.6:te.m~.> ane. tile.ne.·6one.
ada.p.t e.d to e.x.ptte..6.6ing e.ve.Jty nuanc.e. o 6 lnd-i-
v.idu.a.t :though~t, to Jte.c.onding pe.Jt.t. o na. i Jc.e.ac.-

:tionr., a.6 we.Lt a.-6 Ue.m.6 o6 majofl .6oc)_ai 1m-

poJL.ta.nc.e.. Non- PhoneLi.c. wn1t1ng, on the. a:the.n


hand, :te.nd.6 Jt~the.n to ne.c.ond and ne.16U on.ty
:tho.6e. ite.m.6 in :the. c.u.ttu4a.l Jte.pe.l!..-toltr.e. roh.ic.h
LU e.}[.a.t e. .6 pe.c.i.a.U.bt-6 h ave. .6 e..te.c.t e.d 6olt
Wltlite.n e.x.ptte..6.6Lon; and Lt :te.nd.6 to e.xpJte.-6.6
:the. ç_o.t.te.ctive. a..ttLtude. toWaiLdl:J -the.m" (op.

cit., p. 324).

A introdução e expansão do uso do alfabeto na

expressao escrita não causaram inicialmente mudanças na

cultura de tradição oral de alguns povos, como por exemplo

os hebreus e os gregos. O processo de difusão de um siste-

ma escrito é demorado, levando, ~uitas vezes, séculos.

~ por isso que semente nos séculos V e VI

A.C. é possível detectar uma sociedade que pode ser rotula

da de 11
.f.e.tJtada 11 , na Grécia e Jônia.
O processo de difusão da escrita na Grécia é

também discutido por GOODY e WATT (op.cit.), e estes Auto-

res colocam lado a lado esse pTocesso e o do desenvolvimen

to da civilização grega. Por este motivo, afirmam eles que


- 13 -

é possível " ... to outü11e. the. po.tdible. ne..tationt.h/..p-6 be.-


twe.e.n -the. wn-L-ting .61JI.d.e.m a11d tho&e. c.u.ttuJta.t innovation-6 o6
e.a.Jt.ty Gtt.e.e.c.e. whic.h ane. c.ommon to a..tl a..tphabe.t:ic.a.tl!f- lU e.n-
a.te. .6oMe.ti..v.," (id. ib., p.330).
Dentre as mudanças mais marcantes determina-

das pela expansão da escrita na sociedade grega (e que po-

dem, por expansão, ser atribuÍdas às demais sociedades le-

tradas), os Autores assinalam a passagem do pensamento" não

6Lta-6Õ6ic.o" ao "6ilo-6ÔQic.o", a aquisição do pensamento "lÕ

gic.o- e.mp11Lic.o 11 , etc.


No entanto, gostaria de chamar a atenção pa-

ra uma mudança mais saliente, do ponto de vista dos objet~

vos desta tese, que é a seguinte: devido à expansão e soli

dificação da escrita fonética na Grécia é que foi possível

o aparecimento de duas novas disciplinas intelectuais: A

História e a LÓgica; a primeira, porque foi devido à escri

ta que "the. .6en.6e oi human pa.6t a..6 a.n obj ec.t.-i.ve Jtea.lity WM

6oJtmcif..t!::{ de.ve.tope:d" (GOODY & WATT, op.cit., pp. 331-332); a


segunda, devido ao fato de constituir-se em"an i.mmu.-tabte.
and -i.mpe.Jt.6onai mode. o6 d-i..6c.ouJt.6e" (id._,p.331), só tornado

possível graças à objetividade garantida pela escrita.

SCRIBNER e COLE (op.cit.) apontam o apareci-

mento e consolidação da escrita como conseqüência do desen

volvimento do comércio, da diversificação dos meios de

produção e da complexidade crescente da agricultura.Ao mes

mo tempo, dentro de uma visão dialética, a linguagem escr~

ta torna-se numa causa de mudanças sÓcio-histÓricas profu~

das, tais como "-the devef.opment o6 -i.nc.JLe.a.t.-i.ng.ty c.omple.x.


c.omme.Jtc.-i.a..t and a.dm-i.n-L.6-tJta..t-i.ve. ne.twoJLk.6"(op.cit., p.4)assim
como do aparecimento da máquina a vapor, do telescópio, e
- 19 -

da sociedade industrial.

Quanto à relação entre a linguagem escrita e

o aparecimento das chamadas funções mentais suiJeriores,


SCRIBH.ER e COLE (op.cit.) afirmam que, ao contrário da lin

guagem oral, que não se presta para exprimir conceitos abs

tratos ou proposições lÓgicas,

"WJtilte.n languag~?- {·, •• ) ha.-6 an applt.optd.a:t e

.6yntax 6ott the. e.xp1Lt.6.6,ion o6 ana.lytic. Jte..ta.-


.t.i..on.&h.iph. And ln the. ve.Jty c.·ouJtl.le o6 p!todu.-

c.lng it, :the. wJt-i...te.n lh 6oJtc.e.d to e.ngage. -tn


a.b.6tfLac.t ope.Jta.t1an.6 :that p!Lov1de. :the. ba.óll:!

6aJt the. lte.ptac.e.me.nt oó J..ma.gi_.6t.ic. Jte.plte..6e.nt~

t.ion.b by ttw.e. c.onc.e.pt.ó" (id. ib., p.6).

Ainda segundo os Autores, devido ao fato de

ser concretamente permanente (atraVés de símbolos visuais)

a linguagem escrita possibilita o aparecimento de opera-

ções intelectuais que eram impossíveis de ocorrer com o

sistema oral, devido à sua transitoriedade. A linguagem es

crita permite a checagem e avaliação de inconsistências de

raciocínio que passam desapercebidos na tradição oral.Por-

tanto, torna-se explicável porque a Lógica formal, os si -

logismos, a inferência lÓgica só puderam ser sistematiza -

dos por Aristóteles, no período de expansão da escrita na

Grécia antiga, quando grande parte da população já domina-

va o sistema fonético.

Em resumo, SCRIBNER e COLE escrevem:

" { .•. } W!r.Ltte.n language. pJtomote-6 ab-átJtac.t c.on


c.ept-6, a.nat~:rt.ic. !tea-6-óonútg, ne.w way-6 o6 c.a-
t e.g o!t.iz ing, a log-i..c.at app!toac.h to languag e.".

(op. cit., p. 7).


- 20 -

PIAGET, nos "tc.Jt{te.-6 Soc.ioiog-i.qu.e..6" (1928a),


discutindo o pensamento lÓgico dos povos "pJt.imJ..tJ..voh",acha

que a sua 6u.nç_ão é, tal como o pensamento "c.ivLtüado", de


4
buscar a coerência, o equilÍbrio ( ). No entanto,diz ele ,

existe uma diferença na e.-6tJt.utu.Jt.~ dos dois tipos de pensa-

mente: enquanto que o primeiro busca uma coerência de or-

dem afetiva ou motora, o segundo busca uma coerência lÓgi-

ca, ou intelectual. Deste modo, o raciocínio lÓgico-verbal

é atingido com o desenvolvimento progressivo das estrutu -


ras intelectuais.

Voltando ao dualismo estrutura X função e


sua aplicação ao raciocinio lógico, PIAGET(op.cit.) afirma

ainda que 11
0.6 ph.J..nc.1pi..M da .tõg..<.c.a ap.U.c.am- .be. .&ome.nte. a
uma JLe.aUdade. ax.J.omatizada" (id.ib., p.64), diferente da-

quela existente nas culturas primitivas.

PIAGET acrepita também que o desenvolvimento

do raciocínio lÓgico deve-se especialmente ao que ele den~

mina "me.c..ani.6me.-!l .6oc..J..aux" {p· 65). Dois desses mecanismos

são especialmente destacados pelo Autor: a "c..ontJtaint e. .6 o-

c..J..ale." e a cooperação. O primeiro existe, quando, em um

dado grupo social, intervém "u.n e.lême.l't-t d'atttoJtitê ou. de.


pll..e..õtJ..ge." {p. 66). O segundo é o oposto, ou seja, um tipo

de relacionamento social onde "n'J..nte.Jtvie.n:t au.c.u.n ê..tê.me.nt


d'autoJti..tê. ou de. p!Le.htige." (p.67) .. A seguir, PIAGET afirma
que a cooperaçao gera a razão, enquanto a "c.on-tJtainte. .60-
c.J..af.e." gera a pJtê.- .tõgJ..c.a, acrescentando que "la me.ntaf.i-
:tê. pJ<.im.ilJ..ve. e..&t a.&.&u.Jtê.me.l1t le. p!t.oduit le. plu.& .&ig11i6J..c.a-

tJ..6 de. la c.ontJtaL11te. .&oc..iale.'' ~.68).

Em resumo, parece que, para PIAGET,os povos

"p!tLmLtivo.&" nao possuem os pré-requisitos cognitivos es -


- 21-

truturais necessários ao raciocínio lÓgico-formal, e que

uma das causas disso é o fato de viverem em sociedades fe-

chadas, tra4icionais, cujas representações coletivas ~

um sistema de crenças obrigatório e cristalizado sobre as

consciências individuais.

Quanto à existência ou ausência de raciocí -

nio lÓgico nos "pJLJ..m-<.tivo-6", temos, ainda observando pes-

quisas com abordagem cognitivista piagetiana, duas postu-

ras diversas:

19- Em primeiro lugar, seguindo o que eu


chamaria de abordagem piagetiana 11
c.lá.õl.lic.a.", estão traba-

lhos trans-culturais, como o de HALLPIKE (1973). Atra:vés


do estudo da~ representações coletivas ( 5 ) das populações -
a-

grafas, o Autor pretende mostrar que essas representações

sao operatórias ou pré-operatórias. O mesmo, diz ele, em

uma certa medida, pode ser afirmado com relação aos prece~

sos individuais de raciocínio. Diz HALLPIKE: 11 We !.Jha.t.t 6J..nd

tha:t in ge.neJtai the. pa.Jz.a.d-Lgm oó the. .tate.Jz. -6ta.ge. o6 ptr.e.- o-


pe.tr.atotr.y .thought (cilt.tic..u.tate.d intuilion) L~ the. moi.Jt ap-
plt.optr.ia:te. to ptr.bnit..<..ve. .thought, though. in 6a.voufl..able. cJJL-
c.um.6tanc.e.4 c.onc.fl..e..te. ope.tr.a.Li..oni.J do de.ve..t.op" (op.cit. ,p.24),
e acrescenta ainda que afirmar isso não sig~ifica negar

aos primitivos que eles sejam capazes de um raciocínio e

de urna sistematização elaborada do conh~cirnento,corno e

a sociedade industrial. A diferença está em que, no caso

dos primitivos, os processos cognitivos empregados são mais

complexos, devido a causas tais como; educação, alfabetiza

çao e raciocínio tecnológico.

Quanto aos indivíduos, membros das socieda-

des primitivas, diz HALLPIKE que ".the. moJte. inte.llige.nt pe.!!:_


- 22 -

.6Dn.6,oft tho-se. who have be.e.rt e.xpot.e.d ta moJte. c.ogn..LtJ..ve.-ty d!!:_


mand.in.g .6..U.ua.tion.6 11 (como navegação, medida de terra) (id.

ib., p.58), poderão eventualmente ultrapassar as represen-

tações coletivas de sua cultura, atingindo, deste modo, um

estágio cognitivo mais avançado. Mas, em geral, afirma ele,

o raciocínio pré-operatório basta para o indivÍduo primitl

vo lidar com as exigências do seu meio-ambiente.

Uma revisão das idéias recentes de PIAGET a

respeito da posição expressa nos "tc.nit.6" (op.cit.) quanto


à mentalidade primitiva mostra que elas não mudaram muito.
Assim, o mesmo Autor declara (PIAGE'f,l974) que " .• . i_t Á_.6

qu.Ue. po.ó.õlble. { ••• ) :that -tn nu.me.Jtou..6 c.u.ttu.Jte..6 adu..tt .th-LY!-b.

-<.ng doe..6 not ptt.oc.e.e.d be.yon.d the. le.ve.l o6 c.ovrc:lle.t ODe.lla-

t.ion-6, and doe-6 rwt !leac.h tha.t o6 pllopo!.:J.{..t/.ona.t ope.Jt.at.<.on.6,


e.ta.bofLa.te.d be.twe..e..n 12 a.nd 15 yeaJt-6 o6 age in oufL c.ultuJLe "
(op.cit., p.309).

29 - Estudos recentes em psicologia genética

trans-cultural, no entanto, (e esta é a segunda postura)têm

demonstrado que o problema não? bem esse. DASEN(l977),por

exemplo, reconhece que muitas vezes o etnocentrismo do

pesquisador pode funcionar como viés ao estudar os "p!r..im.{..-

t..ivo-6" e que uma linha de pesquisa fidedigna, seguindo o

paradiqma piagetiano, seria aquela que estudasse uma deteE

minada cultura a partir dela m~sma, sem superimpor catego-

rias, usando situações experimentais mais adequadas.

O mesmo Autor cita BUCK-!10RSS{l975), que diz:

''The ex/..6tenee o6 a ''time lag'' di.õc.ove..Jt.e..d .in


the. c.Jt.o-6.6- c.uUuJLal appUc.ation oó P!AGET
te.6t.6 may fLe...õult 5Jtom a .6 oc_io- e.c.onomic_ bia-6
-in P-ia9e.t '-& tite.Oft1J .Ab.ótfLac_t, 6oJr.mal c.ogn-t.-
- 23 -

e.x.c.hange..
value., Jt.ei6-tc.at,{on, and a.tie.na.tion whic.h go-
ve.Jtn ptwdu.ction· a.nd e.xc.hange. in the. indu!J -
tn.iaüze.d We.!:.:t" (op.cit., p.35)

Com relação ao estatuto atual do paradigma

piagetiano aplicado a estudos *nter-culturais, DASEN (op.

cit.) afirma que, do seu ponto de vista, as pesquisas nes-

se campo tenderão a mostrar que, primeiro, ·as invariantes

funcionais, tais como equilibração e adaptação, deverão de

fato aparecer como processos universais,e, segundo, que a

hipótese segundo a qual os povos primitivos não terian atin

gido as operações concretas cairia por terra, desde. que

se criassem tarefas adequadas, ou desde que se treinassem

os sujeitos em uma tarefa específica. Ainda na opinião do

Autor, as diferenças que se têm observado entre, "pll..imUi_ -

vo.õ" e "civi.t1zado.ó" sao antes de desempenho


ance.")que de competência, e desempenhos diferentes devem

ser creditados a diferenças c..ultuha1.ó, nãO c..ogn~iva.ó,

Para VYGOTSKY (1984)J a linguagem escrita

constitui-se num segundo nível de mediação entre o cognitl

vo e o social, um simbolismo de segunda ordem, criado no

momento em que os homens perceberam que podiam desenhar,

"a..tê:m de. c..oi.6a..ó tambê:m a 6aia" (opocit., p.l31). A aquisi-

ção da escrita, para o Autor,representa o coroamento de um

processo histórico de transformação a diferenciação no ~so

de instrumentos mediadores, bem como a causa da elaboracão


>

de formas diferentes de comportamento,culminando com o ap~

recimento das funções mentais superiores. Para o Autor,"o-

pe.!talt com o .ói.gni-6-ic.ado de ca-i..6a..6 leva ao pe.n.óamen:ta a.b.ó-


- 24 -

t11.ato" (op.cit. ,p.ll5) ao mesmo tempo em que leva a um pro-


cesso de internalização e de tran~formação das atividades

intelectuais. A linguagem escrita, então, porque possibili

ta que se simbolizem símbolos (que sao as palavras), repr~

senta, no limite máximo, a transformação de processos in-

trapsicológicos em processos interpsicolÓgicos, e a con-

seqüente aquisição de comportamentos formalizados de manei

ramais elaborada,.como é o caso do raciocÍnio lÓgico.Essa

visão dialética explica o desenvolvimento como produtos g~

rados pelo processo de mediação entre o histórico-social e

o cognitivo, produtos esses que por sua vez passam a con-

tribuir para aquele processo modificando-o, e assim por

diante.

Para VYGOTSKY {1979), a linguagem escrita,

por ser um diálogo com o interlocutor ausente, coloca no e

missor demandas intelectuais bastante mais complexas do

que o discurso oral. Diz. ele:

"No di~.:,c.uh!>o e.-6c.Ji.ito, ao qua.t óaltam a-6 a~

poia-6 ~.:,i.tuac.iana.i-6 1 tem que !>e. c.on!>egu.i!L a


c.omun~c.ação po!L he.c.uh-60 e.xc..tuh~vo à~.:, pala
viLa!> e !>ua4 c.ombinaç3e6. T-6to exige que a
atividade di~.:,c.uhl>iva a-6!>uma 6ahmah c.omplic.~

da-6 11 (op.cit., p. 189).

A seguir, falando sobre os rascunhos, diz o

Autcr que a produção do discurso escrito requer que se ela

borem rascunhos mentais, os quais constituem-se de fato nu

ma manifestação do discurso interior, isto é: o indivíduo

é capaz de representar-se a situação ausente de diálogo e

de "pe.n-6aJt a-6 pa.la.vJta-6, e.m vez de. a-6 pttonu.nc.iatt"(id.ib. p.

177). Obviamente, em termos psicolÓgicos, VYGOTSKY relacio


- 25 -

na o completo domínio da escrita com o aparecimento das


funções intelectuais superiores, entre as quais se inclui

o raciocínio lÓgico.

Um dos trabalhos mais importantes de investi

gaçao sobre as relações entre a escrita e o desenvolvimen-

to cognitivo é o de LURIA (1977). Seu trab~lho é fundamen-


tal por dois motivos: em primeiro lugar, porque é um pio-

neiro, na Psicologia, em estudos deste tipo; em segundo,poE

que LURIA realizou suas pesquisas num momento e num lugar

que apresentavam características ótimas para as mesmas. O


próprio autor assim prefacia seu livro:

"The hL6.tolL.Ij o6 .thi.ó book i..-6 .t.ome.whM untLóua.t ..

Ali o& -i.ts ob.t. e.llva.tional mat t![.J.al wa.t. col-


.te.ct:.e.d ln 1931- 32, dufLing .the. Sovie.t Ul'ú..on'.~

mo.6t nadi..eaf. ne.bt~uetun~ng: the. e.l~m~nat~on

o6 Ltlitetwc.y, the tnan.bd~on to a c.o.Lf..e.c.t~

vi.-6-f. e.c.onomy, and -the. ne.adju.t>tme.nt o6 U6e.


to ne.w .6 oc.~aLü:t pni.nc.i.pf.e..ó • .T hi..ó pe.ni.od of
6e.n~d a uni.que. oppontuni.ty -to ob.õe.nve. how
ded.. ói..ve.ty aU theõe Jte6Mmó e66ected nat
anil} a b!Loa.de.ni.ng o 6 ou;t f.ook. but al.ó o na. di-
c.a.l c.hange..t> in :the .6-tJt.uctuJt.e. ofi eogni.ti.ve.
pJt.oee.6.6e.6" (op. cit., p.V).

A principal tese de LURIA é ~ue mudanças so-

ciais acarretam mudanças profundas e fundamentais nos pro-

cessos mentais. Conforme afirma COLE (1977), o objetivo de

LURIA ''wa.õ to .bhow :the. boc.iohi..õtohic.al Jt.oot.ó o6 ali babi.c.


eog~tdive pnoc.e..6.6e.6; the. bthuc.tu!Le. o6 thought de.pe.nd-6 upon

the. .6-th..uc.:tufte. o6 the. dom-i.nant .type..t. o6 ac.ti.vi.ty .<.n di.66e.Jt.-


e.nt c.u.UuJt.e.b. Fnom -thi.b .t,e;t o fi a.6.6ump-ti.on.t., i..t 6ollow.6
thctt pnac.ti.c.af. thi.nk.ing wiLt pJte.domi.na.te. i.n .6oc.ie.ti.e..6 tha:t
- 26 -

a.Jte ohaJtadOLiz ed by pJtac;tioal manipulaUon,; o6 obj ecü ,and


malte. "abJ.:..tJtac.t" ott 11
the..o1Let.t.ea.l" a.c.t..ivUlj .<..n tec.hno.tog.t.c.a.l
J.:. oc.iU.ie.J.:. wLt.t J.nduc.e. mo !te ab.6.tJr.ac:t 1 the oll.e.. ti.c.a..t t h.t.n/2./.. ng ".
(op.cit., pp. XIV, XV).

Na tentativa de demonstrar que alguns preces

sos mentais somente apareCem como decorrên<?ia de apropria-

das atividades sociais, LURIA levou a efeito, então,um es-

tudo nas regiões do Uzbequistão e Kirghizia, as quais,logo

após a revolução comunista de 1917 na (então) Rússia,sofre


ram mudanças radicais, passando de uma economia e meios de

produção característicos da pré-industrialização, para um

acelerado avanço tecnológico, em todas as áreas, inclusive

no concernente ao aspecto escolar.oesse modo, havia re-


giÕes onde velhos aldeÕes não-alfabetizados, que não ha-

viam ainda tido qualquer contato com as inovações tecnoló-

gicas e sociais que estavam sendo introduzidas pelo novo


11
.ótatu.ó quo", conviviam com jovens já engajados no proces-
so de mudanças sociais que estavam sendo introduzidas.

LURI~ descreve a economia e as atividades de

produção dessas regiÕes como sendo, na época, feudais,pri-

mitivas, e a cultura como sendo iletrada, com marcada in-

fluência do islamismo. Com o regime comunista, foi implan-

tado na região um sistema coletivo de produção agrícola,e,

ainda segundo o Autor, a indústria começou a desenvolver -

-se.

A abertura de escolas desencadeou o processo

de alfabetização do povo.
-
Foi durante essa epoca de mudanças sociais

profundas e rápidas que LURIA aplicou, seguindo o método

clínico, uma bateria de testes aos habitantes dessa região.


- 27 -

Esses testes procuravam medir as capacidades de: Percepção;

Generalização e Abstração; Dedução e Inferência, Raciocí-

nio e Solução de Problemas; Imaginação; Auto-Análise e Au-

to-Consciência. Os indivíduos estudados pertenciam a vá-

rios grupos, que diferiam profundamente quanto aos seguin-

tes fatores: atividades práticas, modalidades de comunica-

çao e perspectivas culturais. Traduzo abaixo a caracteriza

çao desses grupos feita pelo Autor:

1 - "Mu.lhe..Jte..6 "ic..hk.ani" que Jte..6idJ..am em v-<..-


la-6 dL6tante.6,q-u.e. e.Jtam Ltet!Lada.6, e n.ao

e..&tavam e.nvolvl.da.6 em q-u.al_.óqu.e.Jt at-tvida-

de...6 mode.Jtnall. Ne..6te. gJtu.po,a.6 e.n.ttte.v.Ltda.6


6onam fie.ita.6 poJt mulhe.Jte..6, p.oi.6 .60 e..6 -.

ta.6 podiam e.ntltaJt no.6 apo.6e.nto.6 6e.m/..ni-

110.6.

2 -. Campone..6e..6 de. vi.ta.6 di.6tante..6, o.6 quai.6

aJ..nda mantinham uma e.~onomia individua -

i1.6ti~a,-2..Jr.am ile.tJr.ado.6, e. não e..6tavam e.n

vólvido.6 no tJr.aba.tho .60~iaiizado.

3 - Mu.the..tte..6 que. haviam 6e.it o ~u.Jt.6 o.6 de. c. un-

ta du.ttaç.ão paha e.n.6inaJt na p!r.ê.- eJ..c.o.ta. E~

.6a.6 mu.the.Jr.e.6 em ge.Jtal não po.6.6u.Zam qua.t-

que.Jr. e.duc.aç.ão 6oJtma!, e. qua.6e. nenhum tnei

no e.m a.t6abe.tizaç.ão.

4 - TJtaba.thadone.6 ativo.6 de. 6az enda.6 c.a.te.ti-

va.6 ("k.o.tk.hoz"l, e. jove.n.6 que. haviam Se..i:_


to c.u.Jt.6 o.6 c.u.Jtt o.6. E.te..6 e..6tavam e.nvo.tv-L

do.6 ativamente. na admin-i..6tJr.aç.ão da.6 6a-

ze.nda.6. Tinham e.xpe.Jr.i~nc.la ~On.6idenave..t

e.m p.tane.j ame.nt o de. p!r.oduç.ão, na di.6ttt.i -

buiç.ão do tltaba.tho,e.tc..Lldavam c.om ou


- 26 -

:tJto-6 me..mb.lt.o-& de.. 6az e.nda.& c.ole.ti..va-&, e. po~

.&uZam pe.Jt.6pe.c.tiva.6 mai-& amp.ta.6 do que. o-6


c.ampone..&e..& i.&olado.&. Ma-& haviam 6Jte.qae.*
.ta.do a e..õc.ola. dunante. pouc..ç te.mpo,e. a-<.n-
da pe.Jtma.ne.c.iam qua.6e. ile.tJta.do.&,
5 - Mulhe.Jte..6 e..6tudante..6 que. tinham .6-f..do admi

tida.& pa.Jta uma e.-&c.ola de. 6oJtma.ção de. pJt~

ót.6.6 otULó a pô.& dol.ó ou tJtê.ll ano-& de. e..t.tu-

do, Sua.& qua.li6ic.aç~e.4 e.duc.ac.ionai-&, no


ÚU:anto, e.Jtam aivtda bar.,:ta.Jtte. ba1xa.6"(op.

cit., p.lS).

De acordo com o Autor, somente os três Últi-

mos grupos 11
had e.xpeJtie.nc..e.d :t h e. c. o nd..<.-tl on.6 ne.c.e..t..6 a.Jty 6o!L
anq Jta.d1c.al p11yc.hologic.al c.ha.nge. 11 (id.ib., p.lS).

Como, neste capítulo, meu objetivo é relacio

nar o domínio de um sistema escrito com o aparecimento do

raciocínio lógico, aprofundarei, a seguir, o exame da o-

bra de LURIA enfocando o capítulo que trata do raciocínio

dedutivo e inferencial.

LURIA descreve nesse capitulo como testou

seus sujeitos quanto à compreensão de silogismos de dois

tipos: contendo premissas cujos conteúdos eram familiares

aos sujeitos, e premissas cujos conteúdos nao eram familia

res (no primeiro caso, o autor esperava que a experiência

prática influiria nas inferências, e, no segundo caso, que

as inferências seriam puramente teóricas).

Os silogismos apresentados tinham a seguinte

estrutura: duas premissas apresentadas da forma usual, e a

conclusão apresentada sob a forma de pergunta, que induzia

a inferência, ou conclusão lógica.


- 29 -

Exemplo de silogismo do tipo relacionado -


a

experiência prática:

"Co.tton gJtow-& we.Lt whe..Jte. -d if.J hot an.d d~ty.

Engtand i-6 ~old and damp.


Voe.f.J cotton gJtow the.Jte., oJt not?''
(op.cit., p.l07).

Exemplo de silogismo de conteúdo nte.Õ!Lic..o".

"In the. Fa.Jt No!Lth, whe..Jte. ib -ónow, af..t be.a!t.6


a}(._ e. whi.t e.
Novanga. Ze.m.tya Á..!J ..u1 the. Falt Nottth.What co-
11
.tolt.6 a!Le be.aJt.6 the!t.e?

(id. ib., p.l07).

Os sujeitos testados, em número de vi·nte,fo-

ram distribuídos em um grupo experimental, composto de

quinze camponeses do segundo grupo acima descrito {campon~

ses iletrados) e um grupo contro.le, composto por cinco in

divíduos do quarto grupo acima (trabalhadores das fazendas

coletivas, que tinham tido escolarização durante um ou


dois anos) .

Os resultados que LURIA Obteve, em resumo,f~

ram os seguintes:

- Os sujeitos do grupo experimental nao de-

rronstraram perceber que o silogismo formava um todo.Perce -

biam cada parte como isolada das demais. Logo, conforme ex

plica o próprio Autor, ".õ!{llogi.6m.6 aJte.. n.ot pe._ttc.e.ive.d b!f


the..õe. .6ubje.c.t.6 a.õ un.i&ie.d .togic.al .6Y.6te.m.6"(op.cit. ,p.l06).
Em oposição,os sujeitos do grupo controle ,

"with .õome. .6c.hoo.tin.g, Jte.pe.a.te.d the. .õy.t.togi.6!M w-Lth no .6pe.-


c.ia.t di66-te.uttie..6. Aóte.Jt 011e. oJt two Jtepe.tition.~.:o ,the.y u.~.:ouai_

ly Jte.pJtoduc.e.d .the. .6i.tlogi~.:ot-Lc. 6-i.gu!te.l.l c.o!tJte.ctly 11 (p.l07).


- 30 -

Quanto às inferências, os sujeitos do grupo

experimental recusaram-se a fazê-las com os dois tipos de

silogismos, sendo a recusa mais enfática com os silogismos

":te.ÕJLic.a~.:,",isto é , "-the. l:.ubje.c..-t-6 Jte.fiu.6e. tç ll..e..6oltt to


(p.l08) .No en-

tanto, apesar de não fazerem inferências, esses sujeitos

demonstraram ser capazes de tirar conclusões a partir de

suas próprias experiências. Eis um exemplo:

"CoLton c.an gJtow ovtl!..tj Whe.tc.e. i:t i-6 hot and


dlty. h Eng!ad .U ü co.ed and damp.Can cotton

g!tOW the.Jr.e.?"
1 don ':t k.now.

"Thinfl about U"

I've onllj be.e.n in .the. Ka..t.hgatt c.ounttr.y; I

do:tt' k.now be.!Jond that ...

(Re6u<~a!; 1te6e1tence to !ach oj reMoJta! <Upe!Ú-


e.nc.e. l .
"BLd on the. ba.6 .U, o6 what I 6a:i_d to you, c..an
c.ot:t·on gJtow the.Jte.?"
Ió the. land il.:! good, c.O.tton wi.t.t gfLow the.Jte.,

but ifi ~t i.6 damp a»d poon,~t wo»'t gnow.


I fi --Lt 1
.6 .t.ike .the Ka.õhgan cou.»tfLlj 1 Á...t w.i.t.t
gnow the.Jte toa. Ifi .the. .õoi.t -Ü f..oo.õe.,it c.a»
gJtoW .thene. toa, o6 coutL.óe".
(Both pnemi.õe-6 ig»o!Led, Jteaho»i»g c.o~duc.ted

within the 6Jtamewonk ofi cond.ition-6 advance.d


lndepe»dent.ty)"

Em alguns casos, LURIA relata que a recusa

para ir além da experiência pessoal era drástica.

- Em resumo, os sujeitos iletrados de LURIA


- 31 -

apresentaram capacidade bastante limitada para fazer infe-


rências lÓgicas a partir de um silogismo. o Autor, cita,co. -
mo causas, três fatores:
19 - desconfiança de qualquer premissa que
nao tenha como conteúdo fatos relativos à experiência pes-

soal;

29 - nao compreensao da universalidade das

premissas, que era~ tratadas como representando fatos par-

ticulares;

39 - desintegração das três partes do silo -

gisrno, reduzindo-as a proposições isoladas, impendindo,de~

ta forma ":thought :to be.. c..hanl'l.e..te.d w.i.thin .thi.l.l llq.õ:te.m" (p.

115) •

Apesar de se recusarem a fazer inferências a

partir dos silogismos, no entanto, os sujeitos iletrados

eram capazes de fazer inferências válidas, e, portanto, de

raciocinar logicamente, desde que tivessem como referência

fatos de seu conhecimento e relacionados à sua experiência.

LURIA conclui seu estudo afirmando que "a.ó


ba.t.Ic. 6oJt.m.ó o6 aetivily c.hange.., a.& lite..tr...ac.y if> ma.õ:tetr...e..d,
and a ne..w f>tage.. o6 .t.oc.ial and hifJ:toc.Ic.al pltac.tic..e. i.t. Jte.ac.h.
e:d, maj otr... .õhi6t.õ oc.c.u!t in hltman me.ntal ac.tJ..vJ..ty. The.f>e..
aJt.e. not limite.d .óimply to an e.xpanding o6 man'f> hotr...izon.t.,
b~t involve. the. c.Jte.a:tion o& ne.w m~tive..fJ fiotr... action and
Jtadic.allif a66'e.c.t the. .t.:ttr...uctatr...e. oó c.ognJ..tive. pnoc..e.f>f>e..t." (p.
161) .

O Autor relaciona essas mudanças cognitivas,

entre outras causas,à aquisição da escrita, sendo que uma

de suas conseqüências mais profundas é tornar os indivídum

capazes de fazer inferências "not on.ty on the. ba.õi.ó o6


one.'.6 own pnac.t,ic.a.t e.xpe.tt-<..e.nc.e., bu.t on the. ba.õ,i.6 o6
- 32 -

Concluindo esta secção, creio que posso a-

firmar que existem, na literatura, estudos e pesquisas re-

lacionando a aquisição e domÍnio de um sistema escrito

com a capacid~de para o raciocínio lógico-abstrato.

Quanto aos Autores aqu~ resenhados,creio que

podemos distinguir algumas tendências nos mesmos. Em •nri-


meiro lugar, colocam-se aqueles qUe julgam ser caracterís-

ticas dos povos "pl!.-i.m.U-Lvo-6" a falta de raciocínio lógico

(especialmente no sentido piagetiano, das operações lÓgico-

-matemáticas, características do Último estágio do desen-

volvimento cognitivo, o chamado estágio das operações for-

mais). Este é o caso de HALLPIKE e do próprio PIAGET, para

os quais o raciocínio lógico é atingido em decorrência do

desenvolvimento dos indivíduos em interação com o meio-am-

biente. Se este exige o suficiente, então a estrutura cog-

nitiva do indivíduo, em busca da equilibração, atingirá ní

veis mais altos. Entretanto, deve ficar bem.claro que exi~

tem, para PIAGET, &.unç.Õe.-6 invariáveis, presentes em todos

os indivÍduos. ~as palavras do próprió PIAGET.

nBne.6 1 Ai la óon~t~on e.ht ~onAtante., il y a


de.õ type..A dive..Jr..A d' onganization, e..t mê.me. Ai
c.e-6 .type..-6 obê.iA.õe..n:te. ã une.. lo-i unique.. d'evE._
lut.ion- je.. veu.x ditte.. me.me.. Ai l'otr..ganlhatJ..on
logJ..que.. e..l.it appe..lê.C'. ã l.ie.. d'ê.gage..tr.. n'ê.~e..AAain~
me.nt de..A ongani.6a.tionl.i pnê.logiqu.e...6 - Lt t)au.t
di._htingue..Jr.. le..h di á 6êne~tc.e.6 qu.alitati..ve...6 e..n.-
ttr..e. le..!.i htnu.c.tu.Jr..e..b ~otr..tr..e..Apo~tda~tt aux htade..A
Auc.e..h.6i66" . (1928a, p. 53).
HALLPIKE, por sua vez, tem uma posição bas -

tante semelhante. Os indivíduos desenvolvem sua capacidade


- 33 -

intelectual através de interações COQ o meio-ambiente fisi


co e social. Declara ele que:

"Th-ih inte.lt.ac.tion i~ the. ba.6i.6 o6 c.ognÃ..tive.

gnowth, whic.h --.


ih gove.nne.d --
by tawh
-.--- ge.ne.nai
~ human be.ing.6 in ali .6oc.ie.tie..6,.6uc.h that
a.t.t nonmat individuai.6 w.Lt.t p!toglte..6.6 thttough
a. .6e.que.nc.e. o6 de.ve.iopme.nta.t .6tage..6 whic.h

end.o Ovt the .otage à6 6oJtma.e opell.Ovtün.o. Ho-

we.ve.~t., the.y may not attain thi.6 levei o6


thought i6 e.nviJtome.nta..t c.on"dition.6 aJte. ,{_/'1-

.&u661c.ie.nt.ty de.manding. In othe.Jt woJt.d.6, .6ome.


way.6 o6 lt.e.pne..6e.nting the. won.td a!t.e. mone. e..t~

me.ntaJLy than othe.JL..6 and C.OI'L6 e.gue.ntly wlLt

oc.c.uJt be.6o~t.e. mo!t.e. advanc.e.d ~t.e.plte..6e.ntation.6

.in the. de.ve..topme.vt-t o6 e.ve.tty i_ndivj_dua.t" (op.


cit., p. 59, grifo meu).

Os pesquisa~ores piagetianos que fazem estu-

dos trans-culturais por sua vez, tal como já discuti acima,


discordam de PIAGET, e HALLPIKE quanto a considerar a inte-

ligência primitiva como "p!tê.- R.Õg-i.c.a.", ·enquanto que a civi-

lizada seria "R.Õgic.a.". Acham eles que tudo se iguala,desde

que o paradigma piagetiano seja aplicado "de. de.ntJto" da

cultura e não a partir de pré-juizos dos pesquisadores. ~

este o pensamento, por exemplo, de DASEN (op.cit.).

Uma outra tendência, representada por LURIA

(1977,1979) e VYGOTSKY (1979), sem ser contrária à teoria

piagetiana é no meu entender mais completa, e mais expli-

cativa, pois insere, antes da variável cognitiva, a variá-

vel histórico-social. Diz LURIA: "Se.Jti.a .<..nc.oii.Jte.to pe.n..6aJt


que. o homem n.a.6c.e. c.om ''.6e.ntido l~gic.o'' ac.abado e. que. a.6
''.6en.6aç~e..6 lÕgic.a.6'' e.xpe.!time.ntada.6 pe.lo homem adulto de..6e.n
- 34 -

volvido ~ao 'pnopnie.dade.h do e..õpZnito'' que. e.xl6te.m eomo ~


1

nata6 e.m .toda pe..6.6oa" (1979,p.l05).


Para LURIA, existem estruturas, que ele deno

mina "ma.tn-i.ze.-6", as quais são produto da história da lin-

guagem e da lÓgica. Essas matrizes, (uma das quais consti-

tui-se no silogismo) passam a substituir uma etapa do de-

senvolvimento do indivíduo. ~ assim que o silogismo consti

tui-se no produto histórico do desenvolvimento do conheci-

menta prático do indivíduo, de tal modo que, assimilando

essas matrizes lÓgicas, ele, indivíduo, estará automatica-

mente assimilando "a e.x.pe.niênc).a da.ó ge.Jtaç.Õe.r.. ", o que o li

vrará da "ne.c.e..6-6-i.dade. de. ob.te.Jz.. in6o1tmaç.ão da p!têitic.a i..VLdi-

vi..dua.t ,[me.dJ..a.:ta pe.1tm.Lti11do- .the. obte.Jt o juZzo c.o!t!te.6ponden-


te po!t v-La teÔI!.J.c.a.,lÕgJ.c.a." (id.ib., p.lOS).
Diz LURIA que é por isso que os povos "pJtim-Z.

tJ.vo.6 na.o tê.m Jta.c.-Z.oc.Znio dedutJ.-vo: poJt.que em .6Ua..6 "6oJt.ma-

ç.Õe.6 h-Z..6tÕJtJ.c.a.6" a.J.nda p!Leva.lec.e o c.onhec..-Lmerrto de oJtdem

pJtâi.J..c.a., e po!Ltarrto "o pen.õamento teÕJtic.o ainda nao a.tin-

giu o hu6ic..iente de.õenvolv-Z.merrto" (id.ib., p.l06).

VYGOTSKY, contemporâneo de LURIA, foi quem

postulou a necessidade de se considerar o desenvolvimento

cognitivo do indivíduo como resultado de um processo dialé

tico, no qual as funções mentais do indivÍduo e as experi-

ências sociais e culturais estão em constante interação,

sendo que as funções sociais são determinantes das funções

psicolÓgicas. Como ele próprio afirma:

"Eve.Jty 6unc.-tion in the c..hLtd'.6 c.uUuJta.t de-

velopment appeaJL.6 twic..e, on two .teve.t.6.


F-LJt.6t, on the .6oc...ial, and late.Jt on the p.61j-
c.hoR.og-Z.c.a.i. .teve.t; 6LHt betwee.n people a..6
- 35 -

an .i.nte~p<~yehoiogieai eategMy, and :then -en


!lide. the. c.hild, a.ó an. i-ntJtap.ó yc.holog-Lc.a.t c.a-
tegMy" (1978, p.57).

A seguir, examinarei g~ maior detalhe a taxi

onomia utilizada correnterrente par.;:t caracterizar os "plt-i.m-i-

tivo.6" e diferenciá-los dos "avanç.ado.ó". Devido à ênfase

dada pelos Autores à relação entre tipo de cultura e tipo

de pensamento, a discussão anterior sobre raciocínio lÓgi-

co terá um prolongamento necessário, o que não deixa de

ser positivo, na medida em que detalhes mais esclarecedo -

res serão acrescentados.

PARTE II

Caracterização das culturas iletradas

um dos primeiros Autores a usar o termo 11 pll.i-


mU-<..vo" foi L~VY-BRUHL {aoud HALLPIKE, op.cit.}o qual ain-
da classifica as culturas primitivas corno "P.ttê-.tõgic..a-6 ".Sua

motivação é a seguinte: seguindo a abordagem positivista

de DURKHEIM, o Autor acredita que a mentalidade dos indiví

duas pertencentes a um dado grupo social é determinada in-

teiramente pelos processos e instituições através dos quais

aquelas sociedades se organizam. Sendo assim,os "pJtimiti -

vo.t. 11 são prisioneiros de uma estrutura social fechada,não-


-cientÍfica,que determina sua falta de raciocínio lÓgico .

PIAGET (1928a) faz u~ bom resumo do pensamento de LEVY-

-BRUHL:

'' •.. A ehaque tqpe d'oJtganization .óoc..iale c..o~

Jte-6ponde. une. 11
mentaLi.té", la me.ntal.i.té d.i.te.
pJtimitive. pouJt le.-6 óoc.ietê.6 c..on6oJtmiót.6 ou
.6e.gme.ntaiJte.ó 1 la me.ntal.i.tê Jtat.i.one.lle. pouJt
- 36 -

.6oc.,{e.tê., c.onç.ue. c.omme. .ta c.ivi..L[-6ati..on .6ou..ó-


j a.c.e.nt e à t ou:t e..ó .te..6 c.lv-Lli.õat.<..o n.ó e.6 t

a.in.õi Jtompue.. Mai.ó, du mê:me. c.oup, .te. JtaL<..o-

na.L{.6me. dê6ini c.omme. ia doc.tJtine. de. .ta 6i..x~

tê. de. ta Jt.ai.ó on, e.6.t Jte.j rdê.. La Jtai.ó on e..ót


p.ta.&.tique. e.t dlve.Jt.ó .type.~.> de. .6.L6te.ma.tizat1an

.togi..qu.e.~.:, .óon c.onc.e.va.b.te..ó. B-Le.n p.tu.ó,c.e..é ty-


pe..6 .6 on.t lJtJtê.du.Ui...bie..é e.n.tne. e.ux et, pan c.on.

.6é:que.nt, .t'e.vo.tu.:tioft de. .ta Jtai.óon e..6t à c.on


c.e.vo..[Jc. c.omme. c.ont:tl'lge.nfe." (op.cit., p.Sl).

Mais adiante, PIAGET interpreta a categoriz~

çao de "pJtê.- .tÕgic.a" dada por L~VY-BRUHL à mentalidade pri-

mitiva:

" ••• nau.& c.fLOIJOI't.ó que., du. po1n.t de. vu.e. de. .ta
pan6a.lie.me.nt
6ondê. ã pa.n.te.Jt d'une. pJtê..toglque., e.n c.e. .6e.n.6

que. c.e. qui paJt.aZt c.ohê.Jte.~t au.x pJt1miti6.6


nou.é. pa!LaU -i.n.c.ohê.Jte.nt e;t vic.e. ve.JL.t.a" (op.

cit., p. 53).

Seguindo as idéias de Lévy-Bryhl, mas deslo-

cando o enfoque para o estudo da linguagem, MALINOWSKI

(1976), ao pesquisar as sociedades primitivas das ilhas

Trobriand através da abordagem etnográfica, também pOstula

a classificação de 11
pJt.é.- .tõg-i.c.a'' para a mente primitiva.Pa-
ra ele, a linguagem primitiva tem natureza emocional e -
e,

antes de tudo, um modo de ação sobre o mundo. O funciona -

lismo de Malinowski, aliado à sua posição naturalista e em

pirista de etnógrafo, levaram-no a propor que os dados ex-

ternos( a organização social, por exemplo) antecedem os da


- 37 -

dos lingüísticos e determinam sua natureza. Para o Autor, a

mentalidade, ou o pensamento dos indivíduos é moldada pela

linguagem, a qual por sua vez, contém as idéias e catego -

rias daquela sociedade específica (determinismo lingüísti-

co).
Voltando"ã Unguage.m e.m aç.ão" termo criado

por MALINOWSKI para denominar o uso da :inguagem pelas so-

ciedades primitivas 1 temos que ·essa linguagem caracteriza-

-se pelo seu caráter não reflexivo, emocional. Em oposição,

"t .õome.vrte. em c.vz.:to.õ u..6o.6 muUo.ó e..õpe.c.,.la-<...6, numa comun-ida-


de. c..ivi.tizada, e .6ome1t-te. em .6eu..6 u.6o.6 ma1.6 e..te.vado.6,que. a
linguagem .6e. e.mp!te.ga pal!..a e..õ.tJtutu.tt.att e. e.xpfl..e..6.6atr. pe.n.6ame.n-
to.61' (op.cit., p.312).
Pode-se, portanto, seguindo r~INOWSKI,falar

em uma função intelectual da linguagem, que só existiria

nas sociedades evoluídas, função esta que apareceria " na.6

ob11..a-s de c.iênc.ia e 6Lto.õ o 61a" onde "tipo-6 aliam en.t e de-s e.n-

vo.tvido-s de Sa.ta !lâo emp!tegadoll patLa c.onttLo.tatL .Ldê.iafl e


toll..nâ.- .ta-s p!topJtiedade. c.omum da 1]-uman.Ldade. c..ivLtizada" (id.

ib., p. 312).

Dessa linha de raciocínio originou-se outro


11
termo usado para nomear os pJtim1tivofl u: trata-se de upJtê-

- c.ien.t16ic.o".

PIAGET {1928a), preocupado com a filogênese

do funcionamento do raciocÍnio e do aparecimento da lógica

e suas possíveis relações com a estrutura social, ocupa-se

também do estudo dos povos "pJt-i.mitivo-6". Classifica essas

sociedades de 1
'c.on6oJtmillta6 11
ou '1 in6eJtioll..efl''(op.cit.,p.47).

PIAGET discorda de LfVY-BRUHL, o qual afirma que o que ca-

racteriza essas sociedades é a ausência de contradições.P~


- 38 -

ra PIAGET, a busca pela coerência, que ele coloca como fun


ção do princípio de contradição, existe em todas as civili
zações, bem como no sonho e no delírio ou ainda na ontogê-

nese. Esta discussão será retomada mais adiante. Por ora,

cabe discutir o termo "intlettlo!t.", que o Autor usa para


qualificar os "pné- .tõgic.o.ó ". BUCK-MORSS (op. c i t.) , cri ti c a~

do a teoria do desenvolvimento cognitivo de PIAGET como

sendo etnocêntrica, mas voltad~ para os padrÕes cUlturais

da sociedade ocidental, afirma que tudo não passa de um en

godo (r'tn-<..c.k"). Diz a Autora:

" ••• The. ope.Jtationa.t p!tln.c.ip.te. o6 the. tJtic.k ,

"ne.ve.Jt..õlbLtLtq", 1.6 :tha;t p!t.inc.lp.te. o6 ab.6-

ttr..ae.t e.qu.i.va.te.nc.y whic.h c.anc.e.t6 .out a.l'l

appe.altan.c.e..ó o6 dl66e.Jte.nc.e., whlc.h 16 al-õ o

.the. l>e.c.JLe.t oó e.xc.ha.nge.. In c.ovt.t!Lall.t,c.onc.tte.te.


f.ogic. i..-6 c.ognit.i.:vely int)e.JtioJL, be.c.au.6e. i.t.6

ope.1Lation.6 go in oniy one. dine.c.tion. The.


c..ttlie.Jr..ion oó "ne.ve.Jr.õibLU.ty" thu.6 -·c.onde.mn.6
to inóe.JtioJtLty any .togJ..c. (e..g. dia.te.c.t1c.ai
.togic.)wic.h bai.Je..6 i. .Lóe.lfl on hLtdoJt1c.al tuz.ality,

óoJL h1.6tolly L6 i...nde.e.d iJtJte.ve.Jthible." {id. ib.,


p.42) o

A citação tem dupla função:serve como escla-


recimento e como crítica ao uso do termo "-i.nfie.Jr..<.oJt" por

PIAGET. De fato, tal termo, na psicologia genética,é usado

para denotar aqueles estágios do desenvolvimento cognitivo

nos quais o pensamento ainda está ligado à ação, aos obje-

tos externos, ou seja, todos os estágios anteriores ao es-

tágio das operações formais: o sensório-motor, o pré-oper~

tório e o das operaçÕes concretas. Estágios "-in. 6eJt..ioJt.e.ó H


- 39 -

significam, para PIAGET, aqueles nos quais o raciocínio ló

gico-matemático, abstrato, descentrado e equilibrado,ainda

não foi atingido. Por este motivo, PIAGET denomina os "piL~

mitivo.ó" de "int)e.tt.i..oJte..ó", visto que o desenvolvimento cog-


nitivo desses povos não atinge nunca o estágio das opera-

ções formais. Quanto à crítica a PIAGET contida na citação

acima, ela está por demais evidente para precisar ser co-

mentada.

HALLPIKE (op.cit.) discutindo o conceito de

"pllúa..ttJ..vo", comenta que, de seu ponto de vista, não exis-

te nada de depreciativo no mesmo, uma vez que, etimologic~

mente, "pfLimilJ..vo" significa "ot) o!t be.loft-ing to the. J-l!t.ot


age., pe.n-iod, ofr.. .ótage." (id.ib. p.V). O Autor diz também

-
que o termo, como tal, e o mais adequado para referir-se a

esses primeiros estágios da civilização,acrescentando que

outros termos alternativo:;, como ".6-i.mple...ó" e "11ão-le.tnado"

não servem como alternativas, uma vez que ".6-i.mpUe.J..ty"( .•. )

Whie.h
onden and e.lanJ..ty o6 de.ói...gn ane J..mpo.óed only with gJteat

the...óe tc.epe.ct.ó i.t Á....ó ptc.i..mi..ti..ve. .óoe.i..e.ty ihat Á....ó c.omplex., ai1d

.induótJt.ia..t óoc.iety tha.t ü ó.Lmpfe lo o oi" (idoibo ,poVI) o


Para HALLPIKE, o termos "pJtJ..mLtivo 11 serve p~

ra designar aquelas sociedades nãq-letradas, relativamente

não especializadas, pré-industriais, de pequena escala,ca-

racterizadas por 11 "6ac.e..- to- 6ac.e.." ne.úttiof1.6 J..n eve.ttyday L<-6e."

(id.ib.·, p.VI). Quanto ao raciocínio primitivo, HALLPIKE

concorda com PIAGET em que o desenvolvimento cognitivo de~

ses povos geralmente pára no estágio pré-operatório,chega~

do raramente até o das operações concretas.


- 40 -

Nos Autores estudados até aqui, nao se - nota

urna preocupação central com a não~alfabetização como carac

terística dominante da mentalidade "pJL..<.mU.iva".Eles não n~

garn, entretanto, que o agrafiSmo seja um dos fatores dessa

mentalidade.

MALINOWSKI (op.cit.), por exemplo diz que"o.ó


m~mbJLo.ó anal6abeto.6 de uma comunidade. civilizada tJLatam e
c.on;.,ide.Jtam a.ó paiavJta.ó de. um modo -&e.me.ihante ao& .óelvageJM
( ... )" (p.3l8).

HALLPIKE (op.cit.) também considera a alfab~

tização corno uma das mais importantes "e.xpe.Jtie.nc.e...ó le.adlng

.to c.ognUive. gttowth" (p.30), e ac'rescenta que uma das cau-


sas das diferenças cognitivas entre "p!L-i.miti.vo.6 11
e "c.ivil:!:

zado-6" está no fato de os segundos serem alfabetizados,en-


quanto que os primeiros não o sao.

Examinarei, a seguir, ainda discu~indo o tra

tamento interpretativo dado pelos teóricos ao termo "p!tl-

mUJ...vo", um outro grupo de Autores, para os quais a exis -


tência ou não de um sistema escrito num grupo social é fa-

tor determinante das modalidades de pensamento dos indivi-

duos pertencentes a esse grupo.

GOODY{op.cit,) faz alguns comentários basta~

te pertinentes a respeito da categorização dualística us~

da por sociólogos e antropólogos.para diferenciar as cul-

turas "pJt.-imLt.-iva-6" das "ava11ç.ada.6" (além disso, o autor c~

ta outras oposições, tais como: racional/irracional;lÓgico-

empiric"o/mitopêico; lógico/pré-lógico; selvagem/domestica-

do; fechado/aberto).

Acha o Autor que essas classificações "6u.11c.-

t.i.o11a.tLtd and .6-tJtu.c.tu.Jta.U.,.H" {id. ib., p. 2) são falhas, na


- 41 -

medida em que levam os pesquisadores a abandonar uma pers-


pectiva desenvolvimental, a qual, no seu entender, é a

mais adequada para estudos desse tipo. Acrescenta ainda que,

na tentativa de justificar o uso da dicotomia, o cien·tista

limita "the 6-i.e..td both o6 tlie. top.<..c. an.d o6 it-6 e.xp.tanation"


(id.ib .,p.3), além de perder-se às vezes em estudos de fe-

nômenos genéricos demais. GOODY coloca-se frontalmente con

tra essas análises porque elas 11


t e.nd to ttr..e.a:t man a.6 imp!t.:i:_
.6one.d by the. c.once.pt.6 he. ha.6 p!t.oduce.d and he.nee. fiail to
ac.c.ount fioJt :the. ge.ne.Jtative. a.6pe.c.:t.6 oó hi.6 c.uUu.Jt.e." (id.ib.,
p. 9) •

Baseando-se em suas próprias observações,


GOODY (op.cit.) opõe-se às dicotomias classificatórias pri~

cipalmente devido à descontinuidade que pressupoem, afir -

mando a respeito: "In the. c.ouJt.óe. o6 l>e.ve.Jt.al qe.alt.6 Li..v.i.ng

among pe.ople. o6 "othe.Jt c.u.ttuJr.e..6" I have. ne.ve.n e.xpe.nie.nc.e.d

the. kind-6 o6 hia.tu.6 in c.omunic.ation -that would be. the. c.a.6e.

16 I and -the.y we.Jr.e. appnoac.hing the. phy.6ic.al .woJt.ld 61tom op-

po.6ile. e.ndl>" (id.ib.• , p.8). A seguir, o Autor propoe que

se adotem outros critérios, diversos daqueles taxionômicos.

Segundo seu ponto de vista pessoal, a melhor abordagem pa-

ra estudar os povos primitivos é através da observação de

seu sistema de comunicação, especificamente a linguagem,e,

principalmente, "t h e. ne.duc..tio n o 6 .6 pe.e.c.h :to gnaph.i.c. ;) oJtm-6,

in :the. de.ve.lopme.nt o6 Wltliing" (id.ib., p.lO).

Estudando-se as mudanças nos sistemas de co-

municação dos povos, estaremos, segundo o Autor,evitando a

fixidez classificatória, uma vez que esta se torna bloque~

da pelo caráter múltiplo daquelas mudanças. Quanto a nomen

clatura, GOODY utiliza os termos ":t!tadic.ionail>","inte.Jtme.-


- 42 -

dÃ..ã.JLÁ..a.6 11 e "avanç.ada,su (são dele as aspas), mas deixa cla-

ro que a passagem de uma a outra deve-se a um processo, e

nao a um ".õaliou em direção ao raciocínio lÓgico. Como ba-

se de tal processo estaria a história da apropriação de um

sistema escrito por uma dada sociedade. Quanto às mudanças

cognitivas, elas seriam também decorrentes desse processo

de mudança nos "l.lyf.lte.m-6 oü c.ommun-lc.a.tlve. ac.t.6 11


(id.ib., p.

15) •

Com esta abordagem alternativa, segundo GCODY,

tem-se a vantagem de poder estudar a·s sociedades quanto a

serem letradas ou não-letradas, e, através do estudo do

"c.ont-Lnuum", garantir a não-ruptura das dicotomias anterio


res. Conforine o próprio Autor afirma apropriadamente: "The.
tJLaditÃ..onat c.haJLacteJL~zatlon ~4 e.44e.nt~ally a 4tat~c one.

in -that lt glve..õ n.o fte.a4on. 6oft eha.n.ge., n.o l.de.a oó how oft

why dome.4t1cat1on occuJtfte.di l.t a44ume.4 -the. p!tlmi.tl.ve. mlnd

ha4 .th1.6 paJL-tlculaft cha.Jtac.te.JL, the. a.dvance.d ha.6 tha-t, an.d

U 14 due. the. ge.n{u4 o6 -the. G/f..eek.J.> ofi the. Wê.õ.te.Jtn Eu!Lope.aVl.ó

:that mode.!Ln ma.n eme'lr.ged. Bu.t mode.Jtn ma.n 1..4 e.me.!Lging e.ve.Jty

da.y in c.onte.PJpoJta!Ly AJ!Lica,wUhout, I .6ugge..6t,the. total

-tJLan4óoJtmat-i.on o6 p!Loc.e.44e.4 oó "thought" oft a:tJti.bu:te..õ o6


"mind" -tha:t e.x.i..J.>ting theoJt{e..6 imp..ty" (id.ib._, p.l6).

SCRIBNER e COLE (op.cit.) que, como já foi

dito, estudaram uma sociedade primitiva, os_ "Vai", da Libé

ria, Africa, do ponto de vista das alterações ocasionadas

na cognição pela alfabetização, refutam, tal como GOODY,as

classificações estáticas feitas por outros pesquisadores .

Por outro lado, os autores não negam aos "pJti.mU{vot," a ca

pacidade para o raciocínio lÓgico. Com efeito, não é esta

a medida de classificação adotada por eles, visto que em


- 43 -

sua pesquisa, usam as seguintes categorias para classifi-

car seus informantes: ""tf(.a.di..t-i.ona.l" (ac.ti..vi..ti..e.-6 e.11gage.d in

by Vai pe..ople. in ulde.JL day.ó a.õ we.Lt a.6 today,huc.lt a.6 we.av-

ing ) ; "tltanl.lili..onal" (;tJc.aditional oc.c.upation cafi..Jti..e.d out


with mode.Jut me.an-6 1 t.uc.h a6 c._a!r.pe.ntll.y); OlL "mode.Jtn" job.6

i..ntfl..oduc.e.d by i..mpo!U:e.d te.c.hnologif with no ante.c.e.de.nt.6 -<..n

the. c.uliulLe., .6uc.h a.6 automobi.te. dJt-tving)" (id.ib. ,pp. 9Cl -

91). Como se vê, o sentido do termo "tnad.ic.i..ona-t" sofreu

uma grande mudança se comparado, por exemplo, com o senti-

do dado por PIAGET. Para SCRIBNER e COLE, não é uma socie-

dade em sua globalidade que pode ser taxada de "tJtadic.-i.o -

na.t" ,mas sim grupos dentro dessa sociedade. Por outro lado,
"tnadi..c.ionai", tem para eles uma certa conotaç~o relacion~

da ao domínio ou não de urna tecnologia mais moderna { con-

forme o· conceito de "mode.Jwo" dos próprios autores).

Outro Autor a rejeitar a classificação em o-

postos é LURIA (1977) o qual, já no prefácio, declara: "Tfú6

booh l:.tandJ.:, in cont!ta..õt to a .R.a..Jtge. numbe.Jt o6 "cu.R..tuJta.f.ogic

a.t" ~,:,tudie.l> made. oU-tJ.:,.{de. the. URSS -<.lt the. 1940-6 and 1950~,:,.

Some. o6 -the.m, by JLe.ac:t-ionatLy au:thotLJ.:,, ttLij to app.ty "tLac.-ial"

the.otLle.-6 to the. data ln oJtde.tr.. to ptr..ove. {he. ~,:,ubje.ct-6 "1nóe.-

Jt1oJtLty""(id.ib., p.VI). Para referir-se aos povos que

estudou, LURIA usa os termos "bac./'-watLdrr (id.ib. ,p.l2) e"ptr..i:_

mLt1ve."(p.23) 1 mas na maioria das vezes evita tais rotula-

ções, preferindo utilizar perífrases do tipo u~,:,u.bj e.c.tJ.:, óJtom

tr..e.mote. v1Ltage.J.J who üve. a.tmol:.t e.xc..f.u.õlve..ty o66 the. land

( • •• ) but afLe. une.duca..te.d and l.f.LLte.tr..~te." (id.ib., p. 77), ou

"peaJ.:,ant .{n ttemo.te. v1.t.tage..6 1 who c.ontinue.d to manta;_n an

1ndividuaü-6tic. e.c.onomy, to tr..e.ma;_YL /...f..lj_te.tLate., and to -<.n-

vo.tve the.ra!Je.lve..õ ln 110 way wj_th J.Joc.;aüze.d labotr.." (id., p.


- 44 -

15), ou, ainda com mais freqüência, simplesmente denomina-

-os "iR..tUe.Jta-te. pe.a..óa.nt-6" (id. v.q. pp. 81 e 86).

De um modo geral, pelo exposto, parece que

as preocupaçoes com a caracterização das sociedades tradi-

cionais podem ser reduzidas a duas posturas:

19 - um tipo de caracterização que coloca a


cultura "pltimiliva" como homogênea, estática, cognitivamen
. . -
te "in6e.Jt...i..Oll 11
à "mode.ltna." e anterior a esta temporalmente.

29 - outros Autores preferem ver as socieda-

des "plt-Lml:t-lva.-6" dentro de um "c.ontinuum",com característi


cas culturais e cognitivas próprias, o que determinaria mo

dalidades de pensamento típicas. Em geral, este segundo

grupo coloca a ausência de um sistema escrito como fator


básico, ao lado de outros, como: escolaridade, domínio de

técnicas mais sofisticadas de agricultura, etc.

Não só o nã9-domínio da escrita tem sido co-

locado pelos estudiosos pertencentes a esse grupo, portan-

to.
uma outra variável é freqüentemente conside-

rada como interferência extra, devido ~ Íntima re~ação que

mantém com o processo de aprendizagem da escrita: trata-se

do processo de escolarização, que a aquisição da escrita

implica na maioria dos grupos sociais. Com efeito,nas so-

ciedades modernas a escrita é transmitida e ensinada essen

cialmente dentro do sistema escolar, o que torna quase im-

possível separar até onde vai a influência da escola e até

onde vai a do aprendizado da escrita enquanto fatores in-

tervenientes nos processos mentais das pessoas letradas.

A opinião dos Autores consultados a respeito

é mais ou menos coesa e concorde com o que foi colocado a-


- 45 -

cima. Vejamos o que dizem.

PARTE IV

Escrita, escolarização_e desenvolvimento cognitivo.

HALLPIKE (op.cit.), por exemplo, afirma que


".tlte.Jtac.y a.nd .õc.hooUn.g a.tLe. two ot) :the. mol.lt lmpohta.nt e.xp~

Jt.ie.nc.e.I.J ie.ading to c.ognitive. gltowth, and lt ih inde.e.d l.lome.


wha.t c:u,toni..Mting tha.t an.thJt.opof.ogi.td!.>, and fio!L -tha..t ma.-tte.Jt,

phi.to.&ophe.Jt.6, t.Jt.ying to e.xp.ta.iYL .the. di66e.fLe.nc.e..& b e.twe.e.n

li.te.na.te. indu..!Jtltla.t a.nd p!Limitlve. thought, have. no.t c.onJ.J-L-


de.ne.d the. obvioul.l po.in-t that pe.op.te. who go :to &c.hoo.t óofL a.

numbe.IL ofi ye.a.Jt.ó a.nd a.c.qu..iiLe. .tite.fLac.y and nume.Jtac.y a.Jte. fiRe
.ey to th-i.nk -i.n Jta.the!t d-i.66eJtent wa.yó 6-<orn thMe who h a. v e.

ne.ve.Jt had .th/..6 e.xpe.Jtle.nc.e." {id.ib., p.30).


Para VYGOTSKY (1979), o ato de escrever re-

quer das pessoas um grau maior de abstração, o qual nao

precede, mas vem em decorrência do domínio da escrita, as-

saciado ao ensino escolar.

Em outro local,VYGOTSKY {1978) afirma que a

escrita é "a paJLtieuJ'.afL .61j.6te.m o6 .t.ymbol.ó and .&ign.ó Who.t.e.

ma.t..te.Jty he.Jtald.ó a eJtiti..c.al tuJtning-point in .the. e.n:ti.Jte. c.ul

tufLal de.ve.J'.opme.nt o6 the. c.h.ild" (id. ib. p.l06), acrescen-

tando que o sistema escolar desempenha um papel importante

na aquisição da escrita, uma vez que essa modalidade de

linguagem deve ser, em parte, ensinada, para ser aprendida.

Uma opinião semelhante é a de LURIA (1977)

para quem a instrução escolar é fator determinante para o

aparecimento do raciocinio lÓgico nas crianças em idade es

colar.

Ainda considerando a variável escolarização,


- 46 -

SCRIBNER (op.cit.) e SCRIBNER e COLE (op.cit.) levaram a

efeito um projeto invejável quanto· à separaçao que possibi

litou entre esta variável e a aquisição da escrita.Os Au-

teres estudaram um povo denominado Vai, na Libéria,onde e-

xistem três modalidades diferentes de aquisição da escrita.

19 - a aquisição do inglês escrito, que -


e

feita através da instrução formal, em escolas;

29 - a aquisição do árabe escrito, realizado

com uma única finalidade: a leitura do Alcorão (os Va~ são

muçulmanos);

39 - a aquisição do Vai escrito, que é feita

de maneira não-formal, assistemática, sem ser através da

escola (os pais ensinam aos filhos, os patrões aos .empreg!:

dos, etc).

SCRIBNER e COLE (op.cit.) dedicam um capítu-

lo de seu livro à discussão sobre as relações elltre escri-

ta e escolarização. Nesse sentido, aplicaram a seus sujei-

tos uma bateria de testes, sob a forma de tarefas, com a

finalidade de verificar se, naquelas tarefas que produziam

diferenças significativas entre letrados e iletrados, hav~

ria também alguma correlação entre os letrados escolariza-

dos formalmente (19 grupo - acima) e os letrados sem esco-

larização institucional (29 e 39 grupos). Na própria des-

crição dos autores:

"In .Lt-6 -ó1mpie..-ó:t 6oJtm, ou!t -ót.Jta..te..gy wa-6 to


det. e..Jtmine.. 16 :t h e. k.1nd-ó o 6 c.hang e.-6 a-6-6 oc.1a:t-
e..d w.-i..th -óc.hoo-t e..du.c.a.tion W.oud be. ob.&e.Jtve..d

-óc.hoo.t-6"(op.cit., p. 113).
- 47 -

A bateria de testes utilizada incluía as


cinco áreas da atividade cognitiva mencionadas anteriormen

te, que rep~tirei aqui:

- pensamento abstrato;

categorização taxionômica;

- memória;

raciocínio lÓgico;

conhecimento reflexivo sobre a linguagem.

Os autores incluÍram variáveis correlaciona-


das com algum dos três tipos de escrita: idade; modernida-

de de ocupação; tipo de atividade rural, além de variáveis

":t eÔI!.lc.a.&": medidas de experiência urbana, ocupação, rendi


mentes e multilingüalismo. Em adição, para cada tarefa,era

pedido ao sujeito que explicasse a mesma, bem corno as cau-

sas de seu desempenho.

Os resultados obtidos demonstraram que os e-

feitos da escolarização são bastante consistentes, sendo o

mais marcante deles obtido na tarefa que requeria que os

sujeitos falassem sobre o que estavam efetuando ao serem

testados. A instrução formal (na aprendizagem da língua i~

glesa) aumentou a habilidade dos sujeitos para efetuarem

explicações verbais. Segundo os Autores:

"Ju..&t..i.J..i.c.at..i.an g..i.ven by .6c.haa.te.d i.ndi.vi.dua.t.6


we.!Le. malte. ta.6fê. otL.-i.e.nte.d and -.-i.nfioiLmat.-i.ve. than
tho.&e. g.-i.ve.n by othe.IL.&; the.y malte. ofite.n made.
u.&e. o fi c..ta..6.6 a.nd a. .tiL.-i.bute. name..6" (op.cit. ,p.
131).

Quanto àqueles fatores que os autores chamam

de exceçoes à contribuição positiva da escola (acima apon-

tada) , SCRIBNER e COLE apontam que a escolarização formal


- 48 -

nao trouxe diferenças significativas para algumas tarefas:

a de classificação taxionômica em tarefas de classificação

livre e de memória; e atitude abstrata na tarefa de classi

ficação geométrica. De acordo com os Autores! estes resul-

tados, discre~antes de outros obtidos em pesquisas na mes-

ma área, podem ser creditados à pouca escolarização dos su

jeitos.

Urna outra variável examinada por SCRIBNER e

COLE foi estarem os sujeitos ainda engajados no processo

de escolarização, ou não. Afirmam eles a respeito que:

"Ou!t Jte..õu.U.t. Jta.t~.>e a -ópec.te.Jt: e..ve..n ió we.. we..,te..


to ac.c.e..pt a-6 a woJL.Il.útg p!Lopo.õil.ion .tha.t

.õc.hoal pltoduc.e..f.t ge..ne..Jtaf c.hange..f.t in c.e..Jtta.tn


..i..nte..tte..ct:u.al ope..Jt.a;t.-i.on.t., we.. m.ight have.. .ta
quctli6y the.. c.onc..tu..6.-i..on :to 4e.6e4 onlq to !>tu
de.nt!>, 4e.c.e.nt ex- .õ.tu.de.nt-6, oh.. tho!>e. c..ont-i-

nuln.g in ~.:,ç_hool Uk.e.-oc.c.u.pat-ion" (op.cit. 1 p.

131) •

Quanto as escritas aprendidas sem escolariz~

çao (o vai e o árabe) 1 nenhuma "Wa-6 a.~.õoc.ia.te.d wilh wha.-t

aJte.- c.on~.:,ide.Jte.d the. highe.Jt- oJtde.Jt J..Y!Xe.lle.c..tua.t .õk.-i..ll-6" (id.

ib. 1 p.l32) 1 o que leva a concluir que aparentemente nao

é o fato de ser alfabetizado ou não que leva a mudanças ~

nitivas; a escolarização é fator importantíssimo e defini-

dor nesse caso. Segundo os autores:

"Thuh, ne.Lthe.Jt Va-i -6C.!t.-i..pt noft QuJt'an-i.c.-le.ar...!:!_

-ing - a.nd- k'ta.b-ic.- .&c.nipt ac.t a.& llufLJLoga.te..& 6oJt

llc.hool-ing. The.q do no.t p!Loduce. t.h.e. f!.a.nge. o6

c.ogn.Ltive. e.66ect.ó tha.t .õc.hooling doe.~.:,, no!{.

do the.y a.lwa.yll ac.t on the. .&a.me. ta.hk4''( id.


- 49 -

ib.' p. 132).

Concluindo, creio que, para os Autores aqui

revisados, a escolarização, mais do que a aquisição de um

sistema escrito, é considerada como fator responsável pelo

desenvolvimento dos processos cognitivos. Creio que existe

um problema a ser considerado nestas colocações, e que pa~

sou despercebido dos Autores. Trata-se da seguinte questão:

Qual é o uso social que vai ser dado à escrita, uma vez ad

qui ri da?
No caso dos Vai, fica bem claro que tanto a

escrita vai quanto a árabe vão servir para restritos con-

textos de utilizaçãoi especificamente: a tarefa de ler o

Alcorão, no caso do árabe, e tarefas familiares, não espe-

cializadas do ponto de vista tecnolÓgico, no caso do vai

(escrever cartas a familiares, preparar rol de lavanderia,

etc.). Ora, o tipo de tarefa para a qual a aquisição de

um código ou outro Vai preparar o individuo é, do meu pon-

to de vista, fator importante, que não foi considerado pe-

los Autores. Portanto, creio que se deve encarar como pro-

visória a conclusão a que chegaram a respeito de ser a es-

colarização, e não a alfabetização, a responsável pelo de-

senvolvimento intelectual.

Resumindo, este capitulo ocupou-se de uma re

visão da bibliografia existente em etnolingüistica, psico-

logia trans-cultural e psicolingüistica, abordando três pog

tos básicos para este trabalho, quais sejam:

o problema da classificação das culturas i

letradas,

- a relação. provável entre agrafismos e ra -

ciocinio lógico,
- 50 -

as relaçÕes existentes entre a escolariza-

çao e a aquisição da escrita.

As várias posições aqui discutidas serao re-

tomadas no decorrer deste trabalho, quer para uma revisão,

quer para uma reformulação crítica. Acrescento que minha

posição pessoal emergirá através da apresentação e discus-


são dos dados coletados para a elaboração desta pesquisa.
- 51 -

NOTAS:

1 - O A. está se referindo às classificações do ti-


po: ".õelva.ge.m"X "dome.bL[c.a.do", "c.-i.en..t16-i.c.o" X

"p!r...im.Lti..vo" ' "nÕ.õ" X


.
"eie-6" ' comuns entre os an-

tropólogos empiristas.

2- Ao afirmar que a "linguagem pe.ILm.Ue. e e.ttcoJt.aja."

a atividade cognitiva, GOODY situa-se dentro de


urna antiga polêmica, presente sempre que se fa-

'zern estudos sobre linguagem e cognição. Trata -


-se da· discussão sobre três posturas fundamen
.tais, a saber:

- a linguagem determina o pensamento, e, con

seqüenteménte, desempenha um papel essen-


cial tanto na atividade cognitiva quanto

no desenvolvimento do intelecto; (í·JHORF-

-SAPIR, LEVY-BRUHL).

- a linguagem é apenas uma entre outras ati-


vidades cognitivas; não serve, por si só,

para explicar o pensamento, apesar de ser

um fator necessário para o desenvolvimento

intelectual (PIAGET)

- linguagem e pensamento seguem caminhos pa-

ralelos, não existindo, no início(onto ·ou

filogenético)qualquer interdependência en-

tre os dois. ~ durante o desenvolvimento

histórico da consciência humana que ambos

vêm a relacionar-se (VYGOTSKY) .


- 52 -

3 - O termo "e.6r:Jtita" está sendo usado aqui corno

tradução do vocábulo inglês "iitenac.y", para o

qual não existe forma vernácula equivalente. o


11
termo ilie.Jtac.y" convenciona a criação e apro-

priação histórica de um sistema gráfico que,

ideográgica ou foneticamente, representa a lin-

guagem oral de uma comunidade lingüística.

4 - Nesse artigo, PIAGET- traça um paralelo entre a

ontogênese e a filogênese das estruturas men-

tais, considerando que existem relações necessá

rias entre o pensamento infantil e o dos povos

"plt.i..mUivo.õ". Assim, pór exemplo, o pensamento

egocêntríco das crianças teria sua contraparti-

da no que ele denomina de "pe.n-t.ame.nto c.on6onmi!

:ta." dos "pJL..i.mLtJ.vo.6". Creio que esta postura,

além de ser reQucionista, carrega corisigo um

certo idealisffio positivista, com o qual não con

corda. Por este motivo, não considerarei a com-

paração piagetiana, atendo-me apenas às suas

referências sobre os povos ~'p!L-i.mLtivo-6".

5 - Representações coletivas são "who.f..e. .61jf..te.m.6 oó


thought and 6e.e.ling" (GLUCKHAN, 1949-SO,cit. em

HALLPIKE, op.cit., p.41), tais como: emoções,a-

valiações do bem e do mal, percepçoes, idéias

das causas dos eventos.


- 53 -

CAP Í'rULO II

METODOLOGIA

I - Introduçã9:

A pré-história deste trabalho tem como marco

inicial a leitura que fiz dos artigos de SCRIBNER(op.cit.)

e LURIA (1977).

Esses Autores, como já foi visto no capítulo

introdutório, realizaram estudos trans-culturais procuran-

do investigar os efeitos cognitivos da aquisição de um sis

tema de escrita. Sua inquietação epistemológica, da qual

compartilho, foi bem descrita por SCRIBNER e COLE {op .


cit.). Dizem eles {de um certo modo criticando os traba-

lhos e teorias acerca das prováveis conseqüências cogniti-

vas da aquisição da escrita):

"It ih .6.tnik ..i..ng tha-t .6c.ho.tan.6 ·who o66eiL theóe.


c.i.aJ.:m-6 QolL .6pe.c.i6ic. c.hange.6 in p.óyc.hof.ogi~

a .e p!toee.6.6 e.6 pJr.e.6 e.nt no diJted evide11ce

that individual& in llie.Jt.a.-te. &oc.ie..tie.& do,

in 6act, plt.oc.e.-&6 in6oJt.rnation about the.

woJt.ld di66e.Jt.e.nt.ty 6Jtom tho&e. A..n &oc.ie.-tJ...e.&

w.Uhou.-t Lli.e.Jt.ac.y". (op.cit., p. 7).

Continuam SCRIBNER e COLE dizendo que, se

bem que o procedimento acima delineado seja apropriado oa-

ra antropólogos, sociólogos e classicistas, no entanto, a

fim de comprovar a hipótese de que "üte.Jt.ac.y malze.& a Móóe~

e.nce. -in me.fttal pJtoc.e.&lle.-~, p&yc.hologic.al analy&i& ha& to

be. jo-i.ne.d with c.u.UuJta.t a.na.R.y-6i&" (op.cit., p.8). Por este


- 54 -

motivo, os Autores adotam um enfoque trans-cultural, que

tem o objetivo de "-tuttn o-the.Jt .6c.ie.nLi..6t.6 ' hypo-the..t.i.c.ai'. me.

c.han1.6m.6 in-to de.mon.6.ttta:te.d me.c.hani.6m.6". (id., p. 8).


Os testes utilizados, tanto po~ LURIA quanto

por SCRIBNER e COLE, procuram tipicamente medir o desempe-

nho dos sujeitos em tarefas classicamente relacionadas com

as atividades cognitivas superiores; solução de problemas,

raciocínio dedutivo, memória, etc.

A metodologia usada tanto por LURIA quanto

por SCRIBNER é a mesma, e também já foi comentada no capí-

tulo introdutório. Consiste basicamente na apresentação de

raciocínios silogísticos verbais simples do tipo:duas pre-

missas seguidas de uma conclusão, sendo a conclusã~ apre -

sentada aos sujeitos sob a forma de pergunta.

Entretanto, apesar de haverem contribuído p~

ra a reflexão sobre o tema em questão, percebi, ao ler os

trabalhos citados, que os autores não iam além da mera cons

tatação da existência ou não de uma• relação ·entre o domí-


nio da escrita e a "capacidade referencial, e que deixavam,

assim, de atingir um nível explicativo .. Este, a meu ver ,

seria atingido se se conseguisse especificar quais sao os

fatores que, no caso dos indivíduos alfabetizados, permi -

tem compreender que o conteúdo das premissas está expresso

em termos de meta-conhecimento. Do mesmo mqdo, dever-se-ia

explicar porque os indivíduos não-alfabetizados não conse-

guem atingir a compreensão de que a fala pode (como é o ca

so com os silogismos) atingir um grau de objetificação,que

serve para deslocá-la da realidade factual.

As pesquisas citadas, portanto, nao partem

de hipóteses explicativas, que exigiriam, aliás, modifica-


- 55 -

ções na situação experimental.


Com base nessas reflexões, elaborei um pri-

meiro projeto de pesquisa, que tinha por finalidade verifi


car a compreensão de raciocínios lÓgico-verbais por adul-

tos brasileiros não-alfabetizados. Nesse projeto, introdu-

zi uma modificação na situação experimental, que, segundo

meu ponto de vista na época, iria suprir a lacuna explica-


tiva que havia detectado em LURIA e SCRIBNER: o uso de gr~

vuras.

A finalidade das gravuras era facilitar a


compreensao dos silogismos, visto que os mesmos, por se

constituírem em raciocínio fechados formalmente, nao podem,

em termos lÓgicos, ser discutidos contra um pano de fundo

que contenha informações factuais. Minha hipótese era que

as gravUras ajudaLiam os sujeitos a colocar a informação

dos silogismos em um contexto mais restrito,na medida em

que criariam um universo de referência mais ou menos fixo.

Deste modo, eu acreditava que a utilização das gravuras p~

ra os grupos experimentais iria facilitar a compreensao dos

silogismos, pelo fato de que ajudariam os sujeitos a "col~

ca4 ent4e a~pa~", a suspender, as situações descritas pe-

los silogismos acima de suas crenças pessoais, levando-os,

deste modo, ao grau de distanciamento exigido para a com-

preensão dos silogismos. O conteúdo dos silogismos era, de

algum modo, relacionado com os aspectos visuais da gravura,

o que significa que as gravuras forneciam informações de

contextualização para os silogismos.

Deste modo, preparei o material relativo ao

Grupo I e testei um grupo de oito sujeitos, sendo quatro 1

do grupo controle, testados da maneira descrita em LURIA


- 56 -

e SCRIBNER; e quatro, do grupo experimental, testados com

a apresentação concomitante de gravura e silogismo.

Ao transcrever as gravações, no entanto, no-

tei que o material colhido permitia um tipo de análise que

ia além da mera constatação da capacidade dos sujeitos pa-

ra raciocinarem logicamente, visto que os sujeitos introdu

ziarn transformações no material lingüístico que lhes era

apresentado sob a forma de silogismos. Percebi, sobretudo,

que esses dados, que talvez até fossem considerados como

"Jt.eé.idua.-i..õ ", por outros pesquisadores mais formalistas ,eram


exatamente o que de novo e relevante estava ocorrendo. E

somente um enfoque da situação experimental como sendo, an


tes de tudo, uma situação de d~~cun~o regulada· num certo

limite, é que me permitiria levar em consideração esses da

dos. Por este motivo, como a natureza discursiva do teste

é o aspecto saliente deste trabalho, mas como, ao mesmo

tem~o houve toda uma situação experimental (não etnográfi-

ca) montada, existem oscilações explicáveis na terminolo-

gia usada neste trabalho: 11


.6-i..tua.ç.ão de .te~tagem 11
e ".6ujeJ..-

:to", por exemplo, alternam com "dJ..â.togo", ".6-<-.tuaç.ão dJ..~c.uJt

Deste modo, abandonei parcialmente a hipóte-

se inicial (sobre o uso das gravuras), e elaborei um segu~

do plano de pesquisa, no qual me propunha a estudar esses

dados epilingüísticos produzidos pelos sujeitos do ponto

de vista de uma análise qualitativa. Esta, a meu ver, 50-


poderia ser realizada através de alguma espécie de micro-

-análise que conseguisse detectar o que, no comportamento

~ou y_ do sujeito, o dife_renciaria do comportamento consi-


derado adequado para aquela situação experimental,já agora
- 57 -

tomada como um di&~u~&Oo

No caso do estudo da compreensao de silogis-

mos, que é o objetivo deste trabalho, um dos enfoques se-

ria investigar quais diferenças ocorrem (e de que natureza

sao elas) entre o desempenho dos sujeitos não-alfabetiza -

dos e o dos alfabetizados, do ponto de vista, não da cate-

goria que estivesse sendo investigada (e.g.:raciocínio de-

dutivo, ou capacid~de inferencial), mas sim das transforma

ções discursivas introduzidas pelos sujeitos na estrutura

do silogismo, bem como na análise das marcas lingüísticas

que pudessem ser detectadas durante as etapas da testagem.

Essa metodologia de análise representa urna

união entre o traba~ho restrito do lingüista e o trabalho

heurístico-pragmático do analista do discurso. ORLETTI

(1984) ,postulante da mesma metodologia, afirma que subja-

cente a ela está um princípio de origem etnometodológica,e

acrescenta:

"AccoJtdlng :ta :thl.ó me:thodolaglca.t p!Llnclple.,

the. anly phe..nomena woJt.Ch!f a6 i.nteA.e&t aJLe tho.óe.

wh.{.ch :the. conve.Jt.óa.:Ci.onalL~d.ó :the.m.óe.lve..ó c.ovt

.óide..IL to be. ne.te..van.t". (op.cit.,p.S61).

Pelos motivos acima, fica evidente que seria

incoerente a utilização, ou mesmo definição, de catego-

rias prévias neste trabalho. Com efeito, as "c.a.:te.goJt.ia..ó"

que eventualmente utilizo quando da análise dos dados sao

determinadas "a po.ó.te.Jtiotti",pela prÓpria estrutura dos

discursos produzidos pelos sujeitos testados.ORLETTI (op.

cit.) apropriadamente afirma que:

"The. poin:t Ló to de.ve.lop he.uJti..ldic. p!toc.e.dutte.ó


1 1
a po.óte..ttl,otti.. to ide.n.ti..6iy the. phe.vwme.-
58 -

na. :to be a.na-ty.&ed, ta.l,.útg into a.c.c.ount wha.t


i.& go.ing on .in :the. inte!La.c.tion" (op.cit., p.

561)

As categorias prévias, portanto, foram subs-

tituídas pela investigação das produções verbais dos parti

cipantes da pesquisa. Essa investigação teve seu caminho de

terminado pelo exame e descoberta dos procedimentos discur

sivos utilizados pelos próprios sujeitos testados.

Assim, a situação de teste foi um mero pre-

texto que também não permitiria levantamento de hipóteses

prévias. Tratava-se, na realidade, de investigar as possí-

veis marcas cognitivas do agrafismo, bem como as relações

entre comportamentos metaprocedimentais e domínio da escri

ta. Não se trata de verificar se os indivíduos testados ocm

preendiam ou não os silogismos, coisa praticamente impossi

vel de ser comprovada, e ~vidente para quem observa os ga-

baritos com as transcrições. Com efeito, respostas negati-

vas à interrogativa co-ocorriam com respostas afirmativas

aleatoriamente; por outro lado, o ·mesmo sujeito ·respondia

afirmativamente da primeira vez. e negativamente (ou vice-

-versa)quando da repetição feita pelo experimentador, num

sinal evidente de que interpretara a repetição como convi-

te à correção de uma respost~ errada.

Taffibém pelos motivo~ expostos, nao privile -

giei uma análise quantitativa dos dados, a qual é conside-

rada, por aqueles que se ocupam de estudos da linguagem,c~

mo obscurecedora dos fatos (ver, a respeito, IAVAL'IDERA,l984) .

De fato, das três etapas de testagem (Respo~

ta, Repetição e Justificativa) que serão detalhadas mais

adiante, as Respostas foram os lugares onde menos riqueza


- 59 -

de detalhes ocorreu, além do fato de nao se poder quantifi


car respostas "c.en.ta..ó" e "eJLJtada..b" pelos motivos já expos-

tos. Os dados mais atraentes e dignos de atenção ocorreram

durante as etapas de repetição e justificativa, lugares o~

de os coMportamentos metaprocedimentais e as estratégias de

adaptação revelaram-se mais claramente através dos dados

epilingüísticos.

Pedir aos sujeitos para justificarem sua re~

posta, fosse ela certa ou errada, permitiu-lhes que medi-

tassem sobre seus raciocínios, que tentassem uma volta so-

bre seus próprios pensamentos; em resumo, que procurassem

estabelecer contatos metaprocedimentais com o experimenta-

dor.
Pedir que repetissem o silogismo possibili -

tou aos·sujeitos que mostrassem se realmente haviam enten-

dido o conteúdo das premissas e- a relação necessária de

continuidade de significado bem como a inclusão da menor

na maior, e a única solução lógica possível (conclusão).

Nesses dois momentos, principalmente, é que

o funcionamento intelectual desses indivíduos transparecia

Seu discurso, então, adotava marcas formais, pelas quais

pude perceber, mais do que qualquer teste pré-programado

poderia mostrar, que espécie de relação cognitiva se esta-

belecera entre esses sujeitos e o silogismo,e, por exten -

são entre eles e o mundo formalizado criado pela linguagem

escrita.

II - Procedimentos

A - Sujeitos:

No total, foram testados 16(dezesseis) suje!


- 60 -

tos, cujo perfil foi levantado através de entrevista (Ver,


no Anexo I, o roteiro da entrevista).
Os dezesseis sujeitos testados moravam,à ép~

ca da testagem, na cidade de Ribeirão Preto, especialmente

em dois bairros de periferia: Quintino Facci II e Ipiranga.

O critério adotado para a escolha dos sujeitos foi a nao-

-alfabetização.
Dos dezesseis, treze eram mulheres, três eram

homens. As idades variaram de 17 a 68 anos, com urna idade

média de 43,4 anos.


Dez sujeitos declararam que já haviam ido à
escola, e seis nunca haviam freqüentado a mesma. Os dez

que freqüentaram declararam os seguintes perÍodos de esco-

larização:

dois anos 02 sujeitos

um ano 04 sujeitos

dois meses 01 sujeito

vinte dias 01 sujeito


- uma· semana 01 sujeito

na o se lembra 01 sujeito

Das escolas freqüentadas, seis ficavam na zo

na rural (escolas de fazendas) , e quatro fiGavarn na zona

urbana.

Os seis sujeitos que declararam nunca ter

ido à escola apresentaram as mais diversas explicações pa-

ra o fato. Por exenplo:

- A mãe enviuvou, e ela era a filha mais ve-

lha. Precisou ficar em casa para ajudar a mae.

- Morava na fazenda e lá é difÍcil para estu

dar.
- 61 -

- Na fazenda nao tinha escola, e era preciso

ajudar a família na lavoura.

Quinze sujeitos declararam que nao sabem ler.

Um declarou que "c.onhe.c.e. a!J .te.Ltta!J e O.ó nume.lto!J, ma..ó na o

~Jabe. ju.IU:a.Jt".
Nove sujeitos declararam que nao sabem escre

ver. Cinco sabem assinar o nom~. Um consegue copiar letras

de forma e um "óa.z ·c. anta. de c..a.biLç.a.".

Quatorze sujeitos declararam que nunca apren

deram a ler nem escrever. Um declarou que aprendeu " algu-

ma c.oi.6a". Um declarou que aprendera, mas "pa.!Lou, não li-

gou ma.l!J, e.!Jque.c.e.u".


Quanto as origens do pai e da rnae e as respec

tivas escolaridades, temos que a maior parte dos pais e


mães são, ou eram, da zona rural. Quanto à alfabetização ,

temos os seguintes dados:.

- Pais alfabetizados - 07

Mães alfabetizadas- 03(uma delas nunca fai

à escola;foi alfabetizada pela patroa)


Pais analfabetos - 06

Mães analfabetas - 12

Os demais pais e mães nao foram computados

porque os sujeitos não se lembravam dos dados solicitados.

Um dos sujeitos declarou que o pai sabia ler e escrever,

mas nunca tinha ido à escola.

Os sujeitos foram divididos em dois Grupo~ ,

cada um com 8(oito) sujeitos:


Grupo I - sujeitos testados com 13(treze) si

logismos cujas premissas maiores eram de caráter no~m~t~vo 1

isto é, exprimiam normas sociais, costumes, regulamentos,

etc.
- 62 -
Grupo I I - sujeitos testados com 9(nove) si-

logismos que continham premissas maiores deóe~itiva~, isto

é, que exprimiam leis físicas, biológicas, etc.


O Anexo II contém todos os silogismos.

Os Grupos I e II foram, por sua vez,cada um

subdividido em: grupo controle e grupo experimental.Os su-

jeitos do grupo controle eram testados somente com a leitu


ra do silogismo pela entrevistàdora. Os do grupo experirne~

tal eram testados com a leitura dos silogismos mais a apre

sentação de gravuras.
Esquematicamente, a divisão dos sujeitos foi

a seguinte:

Grupo I - 13 silogismos Contnole(4 sujeitos)-te~

(8 sujeitos) - Premissas maiores tado -óem gravuras.

no ltm at i v a.-6 Expen,[mentai. ( 4 sujei tos)


.testado c.om
gravuras.

Grupo II - 9 silogismos Conthole(4 sujeitos)-tes


(8 sujeitos) - Premissas maiores tados -6 em gravuras.
Expe~ental(4 sujeitos)-te~

tados c.om gravu-


ras.

B - I..faterial:

1. Fichas contendo os silogismos, que o en -

trevistador lia para os sujeitos. Os silogismos tinham a


seguinte estrutura: duas premissas, na forma usual,sendà a
conclusão apresentada em forma de pergunta.
Exemplo:
"SÕ quem malta na c..-i.da.de pe-õc..a. no -Jt-i.o Ta.guá..
O Pedho pe-õc..a. no h;o Ta.guá.
- 63 -

Ele. moita. na c.-Ldade., ou não?"

2. Gravuras coloridas, recortadas de revis.-

tas, retrat~ndo pessoas, animais, paisagens, etc., monta-

das em retângulos de cartolina medindo 25cm X 21 em. Essas

gravuras foram utilizadas para os sujeitos do grupo experi

mental, os quais ouviam a leitura dos silogismos ao mesmo

tempo em que olhavam para uma gravura. Cada gravura podia

ser utilizada para somente um, ou até dois silogismos.O A-

nexo I I contém a descrição de cada gravura utilizada.

C - Procedimentos

Inicialmente, os sujeitos foram submetidos a

uma entrevista, que permitiu sua posterior caracterização,

(Ver Anexo I) •

Em seguida, foi iniciada a testagem propri~

mente dita.

Cada sujeito foi testado separadamente, e as


c
instruções dadas an.tes do início pela investigadora eram

as seguintes:

Para o grupo controle: "Eu vou .ten a.tguma.ó

c.oi...6a.6 paJt.a o {a) SJL.(a). Vepoi...ó, o(a) Str..(a) vaJ.. tr.e.6pon-

detr. ã petr.gunta".

Para o grupo experimental: "Eu vou

a.tgumah gtr.avuJLa.6 e .ten a.tgumah c.oi.óa.ó paJt.a o(aj SfL. (a). AZ

o (a.) SJL. (a) vaJ.. tr.e.6pondetr. ã pengunta.".

Todos os sujeitos testados passaram pelas se

guintes etapas:

19 - Respondiam à pergunta correspondente a-


conclusão de silogismo(Re.6po.6ta);
64 -

29 - Explicavam o porquê de sua resposta(Ju~

39 - Eram solicitados a repetir o silogismo

I RepeL<ção I .
A ordem dessas etapas nao foi seguida rigida

mente. Assim, cada sujeito poderia iniciar sua participa -

ção conforme desejasse. Alguns repetiram primeiro, outros

responderam primeiro. A justificativa era sempre solicita-

da depois da resposta.

Os silogismos eram apresentados um de cada

vez, e sempre que um novo silogismo era iniciado, a entre-

vistadora indicava isso, dizendo: "AgoJta, vamo.!, vefL

u.m" •
Os sujeitos do grupo controle foram testados

da seguinte maneira: a investigadora lia cada silogismo na

ficha e aguardava a resposta ou a repetição do sujeito,pa-

ra, em seguida, continuar solicitando as outras etapas. Os

sujeitos do grupo experimental também foram.testados sepa-

radamente, sendo a .leitura dos silogismos precedida pela ~

presentação das gravuras. Estas geralmente eram dadas para

o próprio sujeito segurar.

Para cada gravura, era feita pela investiga-

dera, ao sujeito, uma espécie de apresentação, e, quando

era o caso, as ' pessoas ou objetos era nomeados. Gestos de

apontar eram utilizados pela investigadora para localizar

nas gravuras os elementos nomeados no silogismo. Exemplo:

Gravura n9 1 (Grupo I) - V~hc~ição:

Um rio, algumas pedras, um rapaz ajoelhado ã

margem, bebendo a água do rio, tendo ao lado as botas e o

capacete de motociclista.
- 65 -

Ap4e4entação: (Entrevistadora).
"Ebte {apontando) é o Pe.d,.~o. O Pe.dfl.o e..&tâ be.
be.ndo a água do ~~o, o(a} Sn. (a) e.btâ ven-
do?"
Silogismo: "SÕ qu.e.m moJta na c.idade. pe..&c.a no

JLio Taguâ {apo~ando)

O Pe.dJto (apontando) pe..&c.a no !t-io Taguã.

Ele mofl.a na cidade., ou nio?"

O conteúdo dos silogismos no Grupo I era o

mesmo para grupo controle e o experimental. O mesmo ocor-

ria para o Grupo II. As modificações introduzidas devem-se

aos gestos de apontar e outros fatores decorrentes da uti-

lização das gravuras.

Cada silogismo podia ser repetido pelo expe-

rimentador até três vezes, a pedido do sujeito, ou quando

o experimentador julgasse que não houvera atenção suficien

te da parte do sujeito.

Todas as informações obtidas durante a testa

gem foram gravadas e as fitas p9steriorrnente transcritas.


- 66 -
CAPÍTULO III

A PRODUÇÃO DE SINCRETISMOS

PARTE I

Introdução

Conforme explico em detalhes no Capítulo I e

Capítulo II,a análise do material transcrito foi feita sem

a determinação de categorias prévias.Nessa investigação pre

liminar,procurava detectar,nas produções verbais dos sujei

tos, procedimentos discursivos que indicassem que esses s~

jeitos estavam agindo sobre os silogismos,transformando-os.

Tais transformações,após detectadas. constituíram-se no ob

jeto próprio de minha análise.

Os primeiros dados epilingüísticos a me a-

traírem a atenção foram as ocorrências de ~~nc~etihmo~,pr~

duzidos pelos sujeitos dos dois grupos. Esses sincretismos,

então, foram tomados como indícios reveladores, marcas foE

mais, lugares no discurso onde a própria na~ureza do com-

portamento cognitiv.o desses adultos não-alfabetizados se

entremos trava.

KARMILOFF-SMITH(ms.,s/d) assim define o que

sejam dados epilingüísticos:" (, .. ) -Útve.6t.-iga.t OfL.6 may c.ol-


.te.c.:t ' e.p.-iLé..ngu.-i.6Li..c.' dM:.a 1 i. e. eapi.ta.ti.ze. on the 6ac.t
that a c.hLtd !ta.6 ju.t:.t u.t:.e.d a ,t,i..ngui..t:.ti.c. pJtoc.eduJr..e(c.oMec.tly
OfL i.nc.oJr..Jr..e.c.t.tq i.n a gi.ve.n c.onte.xt), OfL made. .t:.eló- Jr..e.pa.-iJr..,avtd
.the.n que..t:.Li..on .the. c.hild -<..mme.ci.La,te_.ty about he.Jr.. .6e.tó- ge.ne.Jr..at-
e.d be.hav.-iouJr.."(op.cit.,p.3). Deste modo, o dado epilin-

güístico equivale ao produto de uma introspecção do sujei-

to realizada sobre o seu processo de produção da linguagem.

O dado epilingüístico difere em natureza do


- 67 -
chamado "me-ta.ti.ngUZé:.tlc.a",pelo fato de que estes Últimos

são obtidos através de perguntas diretas feitas pelo inves

tigador, relativas ao conhecimento formalizado sobre as re

gras da língua.

Conforme foi explicado no Capítulo I, este

aspecto de introspecção do sujeito sobre suas produções

lingüísticas (que vai propiciar o aparecimento dos dados

epilingüisticos) está presente na metodologia de testagem

utilizada neste trabalho, e os ·sincretismos, por serem :oro

duzidos nesses momentos de introspecção, podem ser classi-

ficàos como um tipo de dado epilingüistico. Neste capítulo,

pretendo investigar a natureza desses sincretismos do pon-

to de vista de sua função cognitiva, bem como de sua rela-

ção com a característica comum a todos esses sUjeitos: o

agrafismo.

O termo ".6inc..Jte.:U. .6mo 11 , que etimologicamente

significa "c..omb..i.naJt, fiund...i.Jt", tem sido usado com alguma

freqüência nas Ciências Humanas.

E~ Lingüística, DUBOIS et alii (1978), por e

xemplo, definem o sincretismo c9mo:


11 1 ... /) o
••• o ue.nome.no pe.~o qua~ o.6 e.ie.me.nto.6 d..i.6 -
t..in.to.6 na oJtige.m ou que. a anâ.t..i..6e. .te.va a
d..i..6.6oc..i.a!l.. .6e. e.ncontJtam m..i..6tunado.6 numa fioJt-
ma Ün..i.ca, de. mane...i.Jta apaJte.nte.me.nte. ..i.nd1.6.6o-
c....i.âve....t"[op.c..i.:t., p.552),

Em Psicologia, entre outros, CLAPAREDE,

VYGOTSKY e PIAGET utilizaram o termo.

Para CLAPA~DE(l907;apud PIAGET,l973a) as

"pe.Jtc..e.pç.Õe.-6 .61ncnê.t..i.c..a.6" referem-se à percepção do conjun-


to, característica das cr·ianças, a qual, segundo PIAGET

(op.cit.), antecede a percepção analítica dos detalhes,que


- 68-

é característica dos adultos.


VYGOTSKY ( 1979), segue a definição de CLAP.AffiDE ,

e, aplicando-a ao estudo da compreensão do significado das

palavras, afirma que o primeiro significado atribuído pe-

las crianças às palavras "não denota ma.i.& do que. uma c.on -

g.tome..!Laç.ão .6-<'.nc.Jt.ê.tic.a e vaga da,s objetai.:! J..nd.iv.idu.a.J..l:! que.


duma óohma ou dou.tha c.oate..&c.e.Jt.am numa .imagem no .&e.u. e..&p11L{
:to. Vada. a !lua oJt.ige.m .&.ineJtê.t.ic.a, e..6.6a. imagem ê. a.t.tame.n.te.
..in.õtãve..t" (op. cit., p.84). Coritinua VYGOTSKY:
"Na pe.nc.e.pç.ão, no pe.nhame.nto e. na ação, a c.JtJ..an
ça. tende. a 6und.iJL oh e..te.me.nto-6 ma.i-6 d.ive..ILI.:!0-6 nu

ma .6Ô .imagem não a.Jt.t~c.u.tada .&ob a


ma..L.6 inte.n.6a. de. uma. -<..mplte.-6.6ão oc_a..t,J.onaf" (op.c.Lt.

p.84i.

Como se percebe, é uma definição bastante seme -

lhante à de CLAPARtDE.

PIAGET(l928a,l928b,l973a), também seguindo a de-

finição inicial de CLAPARtDE, estudou mais profundamente,e


ampliou a noçao de sincretismo.

Neste capítulo, nortearei a discussão sobre os

sincretismos produzidos pelos adultos não-alfabetizados

aqui estudados principalmente pelo embasamento teórico foE

necido por PIAGET. Por esse motivo, apresentarei em deta -

lhes a teor-ia piagetiana sobre o sincretismo.Quero esclar~

cer, entretanto, que, apesar de apoiar-me em princípio no

referencial teórico piagetiano, isto não significa necessa

riamente que haverá um acordo total de minha parte com a

teoria em questão. Pelo contrário, e~ muitos aspectos mos-

trarei que a explicação que PIAGET oferece para o sincre -

tismo infantil(e que ele estende aos povos "pi!..Á..mLtivo-6 11


) é
- 69 -

muitas vezes inadequada para explicar o sincretismo dos

adultos.

PIAGET (1928a), definiu o sincretismo como sendo

"la tende.n~e. a pe.Aee.uoi~ et 5 eonee.voin le..ó c.ho6e.6 globa -


le.me.nt, e.t ã Li..e.Jt. ai~t-6-i. .tou;t ã tou.t, au. gne. de.ó !tapp1toc.he.-

rne.nt.6 l.lu.bje.c.ti6.6" (p. 72). Ele encontrou muitos casos de

sincretismos ao estudar crianças de 9-11 anos, as quais,

após ouvirem e explicarem um provérbio, escolhiam, em uma

lista de frases, aquela que melhor explicaria o provérvio.

As construções formadas por estas crianças foram denomina-

das de ".óinc.Jte.A:1.6mo.ó ve.nba1.6", os quais PIAGET define cerne

'' •• • .te.nde.nc.e. ••. ã c.ompJte.ndlt.e. le..6 mo-t.ó, non paJt Jtê6le.xlon


analy:ti..que., maJ...ó e11 6onc.tlon du.. 6 c.hé.ma g.tobal de. la pfvtMe.,

c.e .t.c.hêma lul-même.. éta.nd díi à une vi.6Ã.-on Ã.-mmédÃ.-ate. e;t :tou.:te.
pe.Jt.hone..t.te." (id.ibid).
PIAGET(l973a) divide os sincretismos verbais em

dois tipos: da compreensão e do raciocínio.

O sincretismo da compreensão engloba aqueles ca-

sos em que, por não entender uma ou várias Palavras de uma

frase, a criança ignora-as, e interpreta a frase somente

em função das palavras entendidas. Forma com estas um es -

quema de conjunto, o qual vai utilizar para interpretar a-


11
quelas palavras dÃ.-áZc_e..i.6". Trata-se, aqui, .de u:m processo

de deformação dos elementos constituintes de uma proposi -

ção, durante o qual o conjunto global é compreendido antes

das partes que o compõem, e estas partes, por sua vez, sao

compreendidas em função daqueles conjunto, o qual nem sem-

pre fornecerá a interpretação correta das palavras, visto

que o esquema de conjunto pode estar deformado.

PIAGET expÕe sua teoria sobre os sincretismos ao


- 70 -

realizar uma série de estudos sobre "a..fguma.-6 pattt.ic.utanidE!:_

de.!> de c.ompJte.e.n.ãão ve.ltbal da c.nianç.a de. 9 a l l ano.6 11 ( op.

cit. p. 211). Nesses estudos, PIAGET e seus colaboradores

apresentavam à criança uma lista de provérbios. À apresen-

tação de cada provérbio, seguia-se uma lista.de frases. A


. .
criança deveria dizer qual das frases correspondia ao pro-

vérbio em questão. Apresento abaixo uma ilustração de sin-

cretismo apontado por PIAGET num desses casos:

O provérbio "A.6 mo.6 c.a.6 que. voam e.m :tottno do.6

c.ava.to.6 nao 6aze.m ava.nç.aJt a diL.i.gênc.ia" é indicado por uma


criança como correspondendo à frase ''A.6 pe..6.6oa.6 de. pe.que.na

e..6ta.tu.Jta podem .6e.IL de g~tande. mê.ttLto". Segundo PIAGET, isto


ocorreu porque a criança nao entendeu a palavra "mê:Jtito",e

interpretou-a, em função do esquema global formado para o

provérbio, como significando "qu.alqu.e.Jt c.oi-6a ê gna.nde.", ou

"u.m g!Lande. númvw de. mo.6c.a-6" (op. cit. p. 238).


O sincretismo do raciocínio segue o mesmo

processo de formação que o da compreensão, com a diferença

de que, neste caso, a criança amalgama proposiçÕes isola -

das, por meio de uma relação de impli~ação artificial,fun-

dindo-as num esquema que, nao raras vezes, deforma o senti

do dessas ·proposições, mesmo que elas tenhan sido compree~

didas isoladamente. Transcrevo abaixo um dos exemplos cita

dos por PIAGET ..

"NOV {12;11) a-6-6imila "Limita.ndo--6e. 6az--6e.·de.


uma. tna.ve u.ma agulha'' c.om ''Aqu.e.le..6 que di-6-
.6-ipam .6 eu. tempo c.ui.dam mal de. .6 e.u.6 ne.gôc.i.o.6"
"ponqu.e. limando quen dJ..ze.Jt que. ã. 6oJtç.a de.
.ti.matt ela (uma. tJtave.) 6-i.c.a menoft.
que. nao -6abem o que 6aZe.Jt do .6eu. te.mpo,e.le-6
.limam e aquele-6 que c.ui.dam mal do-6 .6eu.6 ne-
-71-

gõc~o~ bazem duma ~nave uma agulha: ela óic.a


~empne. me.nan, nao ~e. ~abe. o que. óa.zen da tn~

uen (euida-~e mal dela,pontantol" (id.ibid.,

pp. 225-6).

Como se pode verificar, o seguinte processo

ocorreu acima: ao entrar em contato com uma proposição(pr~

vérbio), o raciocínio sincrético formou um esquema global,

o qual condensa as "ne.pJte.-óe.nta~Õe.t. c.anc.ne..ta.6 e -imag-i.na.da.-6


que. a J:.e..Ltutr.a pJtovoc.a" (id. ibid., p. 227). O amálgama re-

sultante passou então a ser utilizado pela criança para

compreender a frase que corresponderia ao provérbio. Neste

momento, diz PIAGET, dá-se uma "dige.ll.:tão" da frase, que a

criança assimila aos elementos do esquema formado para com

preender o provérbio.

Esses esquemas globais sao formados por sín-

tese subjetiva. Essa inexistência de implicações objetivas,

diz PIAGET, é explicada pelo caráter egocêntrico do racio-

cínio infantil, e pela necessidade de justificação a qual-

quer preço. Esta Última, segundo o autor, e determinante

do egocentrismo, e pode ser resumida pela frase: "Tudo .be.


liga a tudo, e. nada~ 6o~tuito"(id.ibid. p. 230). Essa ne-
cessidade faz com que a criança procure aproximar fatos a-

parentemente sem qualquer ligação entre si, "como .óe { ... )

excluZ.ó.õe inte.i~amente o ac.a.bo da ma~c.ha do,t, ac.ontec.imen -

:to.ó" (id. ibid. p.230).


Deste modo, no raciocínio sincrético,a crian

ça realiza uma "t}u-6ão global de dua.ó p~opo.õiç.Õe.-6" (p. 222),

descarta a existência do acaso( tudo tem sua explicação) ,e

assimila toda idéia nova a alguma outra que já tenha ocor-

rido.
- 72 -
O exposto acima resu~e como PIAGET conceitua

o sincretismo.

Retornando agora aos adultos não-alfabetiza-

dos,gostaria, antes de iniciar a análise dos sincretismos

produzidos pelos sujeitos desta pesquisa, de justificar a

pertinência de um estudo deste gênero com adultos. A possi

bilidade de se atribuir raciocínio sincrético aos povos

primitivos, na verdade, é sugerida pelo ~róprio PIAGET.Com

efeito, nos "tc.Jt.{A:-6 Soc.J..oiog-Lque.-6" (1928~) ao traçar um P!:

ralelismo entre a mentalidade da criança e a mentàlidade

primitiva, o autor afirma existirem "é'.ton.navl.-t:e.l.l tt.e..6.6e.mb.ta.!:

c.e...6 6on.c.tion.e..t.te..6 e.n.tJr.e. .te.;., no!tme.ll togJ..que..6 e.;t mê.me. mona-


le..ó adop.tê.e..6 de. pan.t e.t d'au:ttte." (id. ib., p. 69), e cita,

entre essas semelhanças, o caráter global, nao analítico

do pensamento, ou seja, o ~i~L~eXi~ma.

Antes de iniCiar a discussão propriamente d~

ta, acrescento .a explicação sobre a estruturação deste ca-

pítulo:

Inicialmente, na Parte II,a título de ilus-

tração, apresentarei uma anális~ descritiva de um exemplo

de sincretismo produzido por um sujeito. Procurarei mos-

trar quais element~s estruturais servem para caracterizar

o exemplo em questão como um sincretismo, e adiantarei al-

guns problemas teóricos a respeito de uma argumentação ex-

plicativa para a produção de sincretisnos no caso destes a

dultos.
A seguir, na Parte III,apresentarei um estu-

do mais formalizado dos sincretismos que ocorreram com os

sujeitos do Grupo I (premissas maiores normativas). Esta

parte estará dividida em três partes, que são:

1. - Sincretismos que ocorreram guando o su-


- 73-

jeito conco.rdava com o conteúdo do silogismo.

2. - Sincretismos que ocorreram quando o su-

jeito nao concordava com o conteúdo do silogismo.

3. - Aprofundamento da análise explicativa,

tentando especificar quais são os fatores que atuam,na si-

tuação em questão, e contribuem para a construção dos sin-

cretismos.

Na parte IV, denominada "Te.nta.L.i..va. de.

n..i..ç.ã.o do pJtoc.e..6t.o", procuro integrar·a abordagem teórico-


explicativa e as descrições dos sincretismos da Parte II

tentando aprofundar as explicações em termos de urna teoria

de funcionamento cognitivo.

Na parte V, estendo a análise e as explica-

çoes aos sincretisrnos produzidos pelos sujeitos do Grupo

II (premissas maiores descritivas).

Finalmente, na Parte VI,apresento alguns da-

dos quantitativos relativos aos sincretismos nos Grupos I

e II, e levo a efeito uma discussão a respeito.

PARTE II

Um exemplo introdutório

SINCRETISMO N9 l

O, respondeu corretamente ao qilogismo n9 11

(Grupo I - Experimental).

Ao justificar sua resposta,di.sse:

"Pollqu.e. e.te. vai longe.;l.le. ac.onte.c.ê qualqu.e.Jt aJ:_

go c.om ele, o c.achoJtllo voLta p!ta avil.lall que.

a.contec.eu. a..tg_u.m ac..ide.nte.".


Os enunciados acima constituem-se num sincre

tismo,cuja estrutura passo a analisar. Em primeiro lugar,

existe indicação, pela resposta correta dada ao silogismo


- 74 -

("E.te. vai ln.do .tange.") que O. compreendeu as relações de

significado estabelecidas entre as prernissas,bem como que

conseguiu deduzir,dessas relações; a resposta lÓgica soli-

cita da pela pergunta: "E f. e. vai .tong e. ou pe.Jtt a da 6 az e.nda? ".

Em segundo lugar, ao dar sua justificativa,o.

inicia-a incorporando uma parte do silogismo: "Polf..que. e.le.


va-i longe."; porém, logo em seguida, ao invés de continuar

atendo-se apenas ao conteúdo proposiciona) das premissas ,

acrescenta: " ... &e. ac.on.te.c.e.Jt . •• a.tga c.om e.le., o c..ac.haJUto


vo.Ua p.!Lã avL6alt •.. ".o., ao dizer isto, separou-se do con-
teúdo lÓgico do silogismo, mas não rompeu totalmente com

seu esquema de conteÚdo referencial. Tanto assim é,que con

tinua falando do cão, somente que de um outro plano refe-

rencial, qual seja, ·daquele da sua própria experiência pe..§_

soal, segundo a qual o cachorro é um animal que serve para

guardar e proteger o dono do perigo.

O que ocorreu nesse exemplo, a meu ver,foi o

seguinte processo:durante um certo tempo,o raciocínio de

O. c9nseguiu centralizar-se somente no quadro referencial

fornecido pelas premissas. Logo, entretanto esse referen-

cial foi assimilado por um esquema de conjunto relativo ao

conhecimento factual e prático do sujeito, especificamente

relacionado à função do cão como animal de guarda.

Deste modo, da formulação inicial do silogi~

mo, somente urna palavra ficou e foi esta que funcionou co-

mo elemento de ligação entre o silogismo e a justificativa

de ordem prática; refiro-me à palavra "c.ão" 1 0 significado. de

"c.ão", que para O., está ligado ao conhecimento prático, as-


similou as relações lógicas, e até mesmo as referências in

dividuais do silogismo,transformando a irnplicação,ou a de-

dução lÓgica,num arrazoado sobre a utilidade do animal do-

méstico.
- 75 -
Insere-se aqui, talvez, urna discussão sobre

os conceitos de 11
C.onhec..tmento p!tá.t1c.o", e "c.onhec.-<-mento -te
x-tc.a.l",discutidos por r1ILLER(l977). O Autor usa os dois
termos para tentar explicitar a forma de conhecimento que

pode estar associada, na mente dos falantes, ao uso de no-

mes que designam categorias. Ele define o conhecimento prá


tico corno aquele que se refere 11
:to the pe.IL.óon'-& ge.ne.Jtat
knowtedge ~bout the wo~td ~nd the th~ngõ th~t h~ppen ~n

-Lt" (op. cit. 1 p. 400); enquanto que o conhecimento lexi-

cal seria aquele relacionado com "e.nta.-i..tme.nú that óo.t.tow


óiLOm a c.laim that .óome.th1ng i.ó a membe.Jt OIL in.óta.nc.e DÓ a.

c.ategony" (id. ibid.).


No caso que está sendo discutido aqui,a com-

preensao da palavra 11
c.ão", enquanto ocorrência- dentro do

quadro referencial do silogismo, requer do sujeito um co-

nhecimento do tipo lexical. Este, no entanto, interpreta o

significado da _palavra de acordo com seu conhecimento prá-

tico.

Ternos aí aquilo que PIAGET denominaria sin -

cretismo da compreensão, visto 9ue prevalece o significado

individualizado da palavra "cão", o qual o sujeito usa pa-

ra interpretar e justificar as proposições do silogismo.

Pessoalment.e, entretanto, vejo ainda mais

além dos fatos acima expostos, na medida em que os casos

de sincretismo que recolhi não.parecem confirmar que sejam

resultantes do raciocínio egocêntrico, ou da incapacidade

de descentração cognitiva. Muito menos se pode dizer que

haja 11
de6oJtma.ç.ão" de proposições. f': essa linha argumentat.:!:.
va que tentarei desenvolver neste capítulo.

Acredito que, no caso já verificado, assim

como naqueles que irei apresentar no decorrer deste capítu-


- 76 -

lo, os sincretismos construídos pelos adultos aqui estuda-

dos representam exatamente o oposto: existe neles um esfor

ço para descentrar e, deste modo, separar o aspecto formal

das premissas do conhecimento pessoal, bem como uma tenta-

tiva de acomodação, de recuperação desse conhecimento fac-


tual e do mundo. A argumentação a respeito será aprofunda-
da mais adiante, quando discutirei a interrelação entre as

similação e acomodação no paradigma piagetiano, bem como

o papel que ambas desempenham rieste trabalho.


Passo, a seguir, à apresentação e descrição

de outros casos de sincretismos detectados na lingu?gem

desses adultos.

PARTE III

Estudo dos sincretismos produzidos pelos sujeitos

do Grupo I.

O primeiro fato a chamar minha atenção foi

que _os sujeitos ora-concordam, ora discordam do conteúdo

dos silogismos. Este é um ponto importante a ser considera

do, na medida em que parece que·os adultos utilizam estra-

tégias diferentes num caso e no outro, e estas diferentes

maneiras de lidar com os silogismos e seus conteúdos refle

tem-se nos sincretismos encontrados.

Por este motivo, dividirei em duas partes o

estudo dos sincretismos nos sujeitos: aqueles que ocorrem

quando o sujeito ~on~anda com o conteúdo do silogismo e

aqueles que ocorrem quando o sujeito di~conda do conteúdo

do silogismo.

Esclareço melhor esses dois aspectos,Concon-

dan com o conteúdo do silogismo significa que o sujeito em


questão adotou um, ou os dois comportamentos seguintes: em
- 77 -

primeiro lugar, deu uma resposta certa para a questão que,

no silogismo, estava no lugar da conclusão. Em muitos ca -

sos, essa resposta equivalia a uma concordância com o con-

teúdo das premissas, especialmente quando a questão era do

tipo Interrogativa sim/não, como, por exemplo, o silogismo

n9 1 do Grupo I, ou o silogismo nQ 2 do Grupo II. Outra e-

vidência de que o sujeito concordava com o conteúdo do si-

logismo está no fato de o conteúdo do sincretismo produz~

do ser solidário àquéle do silogismo. Os exeMplos apresen-

tados abaixo ilustrarão melhor este aspecto.

Do mesmo modo, a dL6eo~dâneia com o conteúdo

do silogismo era explicitada pela resposta ehhada dada a

questão equivalente ã concl~são, e/ou então pelo fato de o

sincretismo construído não ser solidário ao conteúdo do

silogismo.

Na parte V deste Capítulo retornarei a estes

aspectos, analisando-os do ponto de vista expliCativo.

Ao verificar os sincretismos dos dois tipos,

pret~ndo evidenciar que, ao contrário do que PIAGET afirma,

eles constituem-se em evidências da capacidade de descen -

tração dos adultos estudados. No decorrer da análise,proc~

rarei ainda caracterizar essas descentrações, que transpa-

recem lingüisticamente nos sincretismos,como sendo parte do

esforço feito pelo sujeito para adaptar o conteúdo dos si-

logismos ao seu conhecimento factual e experiência pessoal.

1 - SINCRETISMOS QUE OCORRERAM QUNIDO O SUJEITO CONCORDAVA

COM O CONTEÚDO DO SILOGISI10.

camoexemplo deste tipo de sincretismo,cito a

UNtCAMP
BJBLJQJCCt~ CE~HRAL
- 78-

justificativa dada por o. a resposta (positiva)_do silogis-

mo {Grupo Controle).

SINCRETISMO Ng Z

"PoJtque.. ã.t. ve.-iz, ne., a.6 ve.L6 ê o p!tinc...-i..pal do


c..o!tpo da pe..t..t.oa, ã.t. ve.~z ê o le.~e.,nê? Que.Jt
dize.Jt que. 6aiz bem pno conpo da pe..t..t.oa a
.te.Ue., nê?"

Dois aspectos devem ser ressaltados na cita-

çao acima: o primeiro deles refere-se ao afastamento das

relações lógico-formais do silogismo, e ao modo como isso

é feito. Note-se que, tal como foi verificado para o


exemplo apresentado na Introdução, aqúi também somente uma

palavra restou; a- palavra ".te.Ue.". Em função dessa palavra

é que D. constrói sua justificativa, a qual já não contém

nada das relações lÓgico-formais do silogismo original, e

muito menos do quadro referencial contido no mesmo.

o segundo aspecto relaciona-se ao significa-

do do sincretismo construído por D. :Partindo da palavra

"leite.", este sujeito construíu uma justificativa, confor-


me já vimos, que não é sugerida pelas relações de signifi-

cado estabelecidas nas premissas do silogismo. O conteúdo

desta justificativa é,conforme assinalarei no capítulo so-

bre as modalidades, retirado de um conhecimento de cunho

alético, adquirido pelo sujeito através da experiência,, o

qual corresponderia a fórmulas "ene.ap-&u.tada-&"(apud DeLe-

mos, 1983) do conhecimento do mundo. Neste caso específico,

conforme já verifiquei ao estudar o uso de modalidades alé

ticas pelos adultos não-alfabetizados (TFOUNI,l984) ,exis -

tem "J.J.togart-&'r subjacentes do tipo:


- 79 -

"Beba ma.L6 ie.Lte.!"

"LeU e ê bom pa.Jt.a a. .õa.Úde..!"

Essas receitas de conhecimento,fórmulas pro~

tas que sincretizam as crenças e a ideologia de uma deter-

minada sociedade estão presentes quase literalmente no sin

cretismo visto acima: "Fa.iz be..rn pJto c.oJtpo da. pe.-ó.&oa o le..i-

:te., n[?"
Conforme verei de forma mais detalhada à me-

dida que for desenvolvendo este capítulo, acredito que es-

te uso de formas genéricas ("0 .tede ê o pJt.lnc...<.pa..t pito c.oJL.


po da. pe...õ.õoa."l retiradas do cotidiano, em substituição ao

genérico presente no silogismo ("Toda.6 0.6 6Ltho.6 e 6i...lha.fl

do Jõao tomam .te.ile..") representa uma forma de descentra-

ção feita por D., na tentativa de libertar-se da forma fe-

chada do silogismo e recuperar a ~asse e o uso de seu co-

nhecimento experimental. Este processo, em Última análise,


representa uma tentativa de modificação de uma situação que

coloca em choque sua posição enquanto interlocutor,bem co-

mo suas crenças, tabus, etc. Assim é que o locutor(sujei-

to) recusa a perspectiva impessoal da lógica e vai na dire

çao do conhecimento de senso comum.

Outros exemplos de sincretismos que ocorre-

ram nos casos em que o sujeito concorda com o conteúdo do

silogismo ocorreram com o silogismo n9 lO(Grupo I-Contro-

le), Um dos adultos, após responder corretamente à pergunta

{"vai .tonge."),justificou sua resposta assim:

SINCRETISMO N9 3

"PoJtque. e..te. va-t. lovrge.; ~e. ac..onte.c..ê qua.tqueJL

a.tgo com e.te.,o cachoJLJLo vo.tta pJtâ avi~aJt

que aconteceu a..tgum acidente".


- 80 -

Outro adulto também respondeu corretamente,e

justificou-se da seguinte maneira:

SINCRETISMO N9 4

"Poltque. qua.tque.Jt c.ai-6-i.vtha o c.ac.ho!tno dã o f..i


na.t" .

O conteúdo dos enunciados dos dois é seme-

lhante, :na medida em que centralizam-se também, tal como

foi visto para os outros casos de sincretismo, numa das pa

lavras do silogismo; neste caso, "c.ac.hoJUL0 11 • Entretanto,os

dois sujeitos distanciam-se também do conteúdo das premis-

sas. Seria o caso de afirmar-se que o esquema de conjunto

formado para a palavra "c.ac.hotuw" assimilou o conteúdo glo

bal do silogismo, tal' como PIAGET diria?

Não creio ser esse o caso.uma das evidências

que apresento é a primeira parte dos enunciados do sincre-

tismo n9 3, quando o adulto afirma: "Pall..que ef.e vai longe".

Estas são provas evidentes de que O. não aceitou plenamen-

te o silogismo. Por outro lado, acredito também que, ao

contrário do que PIAGET enfatiza, não há "dige..&.tão" de um

conjunto por outro. Há, isto sim, a meu ver, um estabeleci

menta de planos por parte do sujeito: o plano do teste pr2

priamente dito, e o plano em que ele reafirma, ou coloca~

penas,sua maneira de pensar sobre'o assunto. Aprofundarei

esta colocação na Parte IV deste capítulo.

Note-se que nestas duas ocorrências de sin

cretismo temos também uma asseveraçao genérica, que está

inplÍcita, mas pode ser facilmente recuperada: "0 c_a.c_haJtJto

é. amigo do homem". Aparentemente, os dois adultos, ao con~

truírem esses sincretismos, estão tentando estabelecer pa-


- 81-

ra si e para o interlocutor esta outra verdade do cotidia-

no.

Para o silogismo 12 {Grupo I -Experimental) ,

recolhi mais um caso de sincretismo. Este ocorreu durante

a resposta:

SINCRETISMO Nq 5

"Bom, ele-6 já. almoç.a.Jtam. E-:S.õa v-i~,:,J..:ta. deve. .óeJL

a..6.61m ••• coma ê v~-:SJ..:ta, efe.-6 o&e.ne.celtam um


ca.óezlnho pitá vl.õi:ta poltque. ge.Jtalmen:te todo
mundo ot)e.Jtec.e u.m ea.fiê pJtâ vi.61ta ••• "

Observe-se que a resposta ao silogismo está

correta. Logo a seguir, no entanto, este sujeito acrescen-

ta algo que nao lhe fora solicitado ainda, ou seja,uma ju~

tificativa. Esta é totalmente baseada na palavra "v1hLta "

e no esquema que este adulto tem para esta palavra, esque-

ma este que está, mais uma vez, formulado em termos genér!

cos, de comportamentos típicos de um grande ·número de pes-

soas em nossa cultu·ra quando recebem uma visita: oferecer

um café.

I~este caso, o conhecimento genérico é de na-

tureza diferente do conhecimento genérico subjacente à si~

nificação atribuÍda a "c_ão" anteriormente. Se,naquele caso,

a base para o estabelecioento do genérico era o conhecirnen

to funcional, no caso de "vi..-ói..ta" o genérico foi aparente-

mente determinado a partir de rotinas sociais. ~ quase co-

mo se, fazendo parte do sentido nuclear da palavra "v.-üi.. -

ta", houvesse, para este adulto a seguinte asseveração im-


plícita:
- 82 -

Será este sincretismo o produto de uma ne-

cessidade de justificativa a qualquer preço, conforme di-

ria PIAGET? Parece-me que não, pelo seguinte:a segunda paE

te ("E.ó.&a. v.Lõ.Lta ••• "}é tão cmplementar à resnosta(" ... efe.J.J


·- a.tmoç_aJtam")
ja. como o seria a justificativa correta para o
-
silogismo. O que ocorre neste caso e que o adulto abre o

leque de alternativas (que é Íechado, no silogismo, pois

restringe-se à situação "de.po-i.-5 do a.tmoç_o") para englobar

uma situação mais ampla, que é ·a de "Jte.c..e.be.JL viJ.J-Lta". Tra-

ta-se aí, não de uma necessidade de responder qua.tquetl.. c..oi


.óa para sair-se bem do teste, como talvez alguns poderiam

pensar, mas de um restabelecimento do conhecimento genéri-

co sobre as coisas do mundo. Este tipo de conhecinento,pr~

duto da internalização de práticas culturais generalizadas,

que sao ensinadas, em certos grupos sociais, creio eu que

mais através da ação do que da linguagem, e que pode ser

condensado em regras reguladoras do comportamento (do tipo

dos provérbios, por· exemplo), é este conhecimento,repito,

mais abrangente do que a generalização expressa pela pre-


missa maior do silogismo, a qua~, conforme já foi verific~

do, restringe o "-toma.fl. c.a6~" à situação "de.po.i-1:. do a.l.moç.o".

Conforme explicarei em detalhes mais adiante, cre.io que t;::,

mos aqui, antes, um outro exemplo de assimilação do conteú

do do silogismo pelo conhecimento do mundo, assimilação e~

ta que é um produto da capacidade que este sujeito tem pa-

ra descentrar sua atenção do silogismo, e, sem perdê-lo de

vista, ir buscar evidências mais amplas, de uma outra nat~

reza, de um outro nivel epistemolÓgico, para aquilo que o

silogismo afirma. ~' portanto, mais uma prova da capacida-

de de descentração, deste~ sujeitos, semelhante àquelas que

examinei anteriormente neste mesmo capitulo.


- 83 -

Discutirei mais adiante as constatacões fei-



tas nesta parte em termos de suas implicações para a caraE

terização dos adultos não-alfabetizados desta pesquisa.

2 - SINCRETISMOS QUE OCORRERAM QUANDO O SUJEITO NÃO COIJCOR-

DAVA COM O CONTEÚDO DO SILOGISHO.

Nesta parte discutirei sincretismos que, de

um modo geral, ocorreram porque o adulto discordava de al-

gum modo das relações de significado expressas pelos silo-

gismos.

Como exemplo inicial, citO a seguinte

justificativa dada à resposta (errada) do silogismo 12(Gr~

po I - Experimentalf.

SINCRETISMO N9 6

"Ah,nio! Vece4to levantou,n~, naquela hona.


Tão .tomando a.:tJta-õado".

Dois aspectos devem ser ressaltados nesse e-

xemplo: o primeiro deles e que o sujeito demonstra possuir

como dado de sua experiência pessoal que as pessoas só to-

mam café após se levantarem da cama. Este comporta~ento,in

teriorizado pelo sujeito como genérico, aplicável a todas

as situações possíveis, e decorrente , como já dissemos,do

conhecimento de situações específicas de comportamento( no

caso, talvez o próprio ambiente familiar do sujeito) entra

em conflito co~ o conteúdo do silogismo, segundo o qual t~

das as pessoas só tomam café depois do almoço.Temos aí uma

situação de contradição, na qual o conteúdo da comunicação

i.e., o teste, nega o conteúdo interiorizado da experiên-

cia do sujeito.
- 84 -

O que acontece com o sujeito neste contexto?

Entra aqui o segundo aspecto digno de nota ,

qual seja, este adulto ne~onheee estar numa situação con-

traditória. Prova disto é que ele desfaz a contradição a-

malgamando uma parte de cada enunciado genérico, ou seja :

ele junta a parte do silogismo que afirma que as pessoas

estão tomando café naquela hora (premissa menor)com a par-

te de sua experiência, estratificada em forma genérica, a

qual afirma que as pessoas tomâm café só de manhã, quando

levantam. A fim de compatibilizar um com o outro, este su-

jeito acrescenta um terceiro fator, este contido na premis

sa maior: é hora de almoço. SÓ que, a fim de escapar nova-

mente da contradição, deixa implícito que as pessoas cita-

das no silogismo ainda não almoçaram; antes, levanta~am-~e

na. hok.a do almoç.o e e.6:tã.o .tomando c.afié' a.:th.a..6ado.6.

A meu ver, o processo de construção de sin -


-
cretismo descrito acima, cujo objetivo e resolver uma con-

.traqição, parece indicar que esta pessoa agiu, no caso,co-

mo alguém capaz de solucionar problemas, pois, ao invés de


deixar-se enredar pelo conflito• resolve-o de maneira coe-
rente, lÓgica e ".õau.dâvel"(l), fazendo' prevalecer o seu

ponto de vista genérico sobre o genérico contido na premi~

sa maior do silogismo.

Este procedimento pode ser interpretado,mais

uma vez, como produto da capacidade que o sujeito teve pa-

ra descentrar seu raciocínio diante da contradição, e,jun-

tando as partes compatíveis nessa contradição,conseguiu fo.!::

mar um todo coerente e satisfatório. O exemplo seguinte

serve para confirmar e elucidar melhor essas afirmativas :

um outro sujeito deu a seguinte resposta{errada) ao silo -

gismo n9 11 {Grupo I - Experimental) :


- 85 -

"Hoje ... pode 4e~ um 6~bado ~noite''.

(Obs.; O dia dito no silogismo foi "domingd').

Como justificativa para essa resposta,O., o

adulto em questão, disse:

SINCRETISMO NQ 7

"Baa,a gente ... pelo meno6 eu,go6to de 14 no


6âbado ã noite 6azê vi6ita,po~que na domin-
go eu po66o do4mi4 at~ mai6 ta4de,n~?''

À primeira vista, percebe-se a breve hesita-

çao no início do enunciado. O adulto ia iniciar sua justi-

ficativa por um genérico indefinido, "a gente"., mas substi

tUÍu""'"o detx:>iS pelo pronome de 1ê- pessoa "eu". Interpreto es-

te fato-como se segue:

Ao dizer "a gente", este adulto irnediatamen-

te percebeu que a f9rma indefinida poderia abranger mais

pessoas do que aquelas que ele queria indicar (inclusive o

interlocutor do discurso) . Isto significa que as seguintes

coordenadas foram tomadas em considerayão:

19 - A situação do discurso, a qual incluía

ele,adulto, e eu, investigadora;

29 - A experiência individual do adulto e

suas preferências pessoais com relação

a visitas.

Percebendo que o uso do indefinido "a ge_n.te_"

poderia incluir alguém estranho(no caso, eu) e que esta

inclusão poderia não corresponder à verdade com relação aos

meus gostos e preferências, o adulto então auto-corrige-se,

introduzindo-se como indivíduo agente do discurso,e, por-


- 86 -
tanto, como responsável único pelo que afirma, através do

uso da forma "e.u.".

Novamente temos aí a resolução de uma situa-

çao conflitante, somente que este conflito é de uma ordem

diferente daquela que acabamos de ver no sincretismo n9 5,

pois originou-se da consciência do adulto quanto ã situa-

ção de enunciação e não propriamente da incompatibilidade

entre o que é expresso nas premissas e o conhecimento de

fato do sujeito. Tanto isto é verdadeiro que,após uma se-

~da leitura do silogismo feita pelo investigador,este a-

dulto não tem dificuldade nenhuma para perceber que errara,

e diz:

"SÕ ao.ó dom1ngo.6 e..te-6 l}azem, 11ê?

Bom, en:tão .•• hoje é dom-ingo"

Mais adiante, justificando esta segunda res-

posta, ele diz:

naom, pela· pe~gun~a que a ~enhona me 6ez, eu

~enho que ne~ponden que ele ~õ 6az vi~i~a

a.o~ domingoj ~em que .6ê ao.6 dom-i..ngo".

Aqui novamente se percebe o estabelecimento

de planos de conhecimento por parte deste adulto: o uso al

ternado, e nunca coincidente dos três pronomes: "a. gente"


"eu" e "e-fe-6 11 (este nas citações acima) denota claramente

que o genérico para ele não é o mesmo genérico do silogis-

no, pois, enquanto este Último é absoluto, alético e fech~

do em si mes~o, o do adulto é relativo, aberto e epistêmi-

co. O próprio adulto demonstra que tem consciência da ne-

cessidade de estar de acordo com o silogismo, mesmo se es-

te contradisser suas crenças pessoais e não puder ser ex-

plicado por elas; nota-se este fato pela tautologia: "Já


- 87-

que ·e,t~.e-6 -6 o 6a.z ao.6 dom.i.ngo, .tem que .6 elt a.o.6 dom-<-ngo".
Portanto, este adulto raciocinou, neste caso,

novamente, como alguém que toma cOnsciência de uma contra-

dição, e, através de descentrações, organiza seus dados em

termos. de planos, ou níveis, quais sejam: o nível de sua

experiência pessoal, o nível do silogismo e seu conteúdo,e

o nível do discurso, da interação de testagen. Resolve,en-

tão a situação-problema através do uso alternado de "a ge~

te", "eu."e "e.te.6", cada um desses pronomes claranente refe

rindo-se a um dos três planos acima citados.

Esta capacidade para ir e vir entre os três

planos, atribuindo a cada um sua parcela de verdade e de

verossimilhança sem perder de vista seu quadro pessoal de

referência, delineia, novamente, uma. série de descentra.ções

ao final das quais se resolve um conflito de ordem episte-

molÓgica, e se estabelece uma acomodação entre informações

contraditórias.

Colocarei agora mais um caso de sincretismo

cuja. finalidade é resolver uma situação conflituosa.Quando

lhe foi lid? o silogismo 7 (Grupo I - Controle), I. inici-

almente repete-o com fidelidade. A seguir, ocorre o segui~

te diálogo entre I. e a entrevistadora (El:

SINCRETISMO N9 8

E: "Onde ele thabalha?''

I: ''Ah, num 6e~,n~o ..• Onde ele tkabalha?''


E: ''N~o 6el ... Onde a 6enho~a acha que ele
t~abalha?"

I: "Na coz.inha?"
E: ''Na coz.inha? Poh qu2?''
- 88-

I:"Ou •.. na. cozinha do Banc.o,pJLã 6azê. um c.a.

6e- .. •
E:"A Ae..nhoJLa ac.ha. que. ele tJLaba.lha. no Banc.o,
ma6 ~ na cozinha?''
I: "Eu a.c.ho".

E: "Poli.. quê.?"
I: "Ua.-i., todo.ó tJL..a.ba.lha no Banc..o,6Ô e.te que

uõa J.Jaia tambê.m,nê.?"


E:"Então, pott .i66o ele. vai na cozinha?"
I: "Eu pe.n.óo que. vai., nê.?"

E: "PoJt.que. ele u.óa. &a1a?"

I: "Ele. u.óa .óaia. igual o.& ou.tJto!:. tambê.m,ri.ê.?"


E: "Ahn •. ; .6e...i..".

I: ''Ou ê. 6axine.iJLo, ou tJLabalha na cozinha''.


E: "Ah, 6e.,i.,que.Jt dize.Jt que. o.& que. u.6a.m
va.o .6e.IL ••• vão 6a.zvt e.6.6a..6 c.oi.óa.&?"
I:"Eu acho, ua.i!"
E:"Tâ.".
I: "App.!:.a.Jt. que. o homem nao u.óa .6aia,nê?"

E: "Homem não u.&a? Não .óe.i .. • "

I: "Então! Não u.6a .óaia".

Pelo diálogo, nota-se que I. percorreu as se

guintes etapas de raciocínio:

19 - I. detectou a situação ~onflituosa que


se estabeleceu entre o atributo de "home.n.6 11 e "João", con-

tido nas premissas (a saber: "u.ãa.Jt. .óai.a") e seu próprio~

dro de referência. Neste primeiro momento, sua reaçao é de

confusão, conforme se percebe pela resposta: "Num 'e'9 -,

-
na o •.. "
29 - Logo a seguir, construindo o sincretis-
- 89 -

mo, I. contrapõe ao silogismo uma informação estranha a


ele: "(João ;tJtaba.tha) na cozinha'!" Porém, a modalidade in-

terrogativa indica que este é ao mesmo tempo um procedimen

to de checagem do experimentador e a expressao de uma dúvi

da quanto à própria resposta.

·Logo após,I. incorpora uma parte da referên-

cia do silogismo ao sincretismo: "Ou. .•• na· cozinha do Ban-

co plLa 6azê: ca.óé'?" Inicia-se,neste momento, o processo de

acomodação entre os dois planos conflitantes, o do silogis

mo e o da experiência concreta do sujeito. Esta acomodação1

cujo significado teórico será explicitado na Parte IV, tem

a finalidade de conferir a João um papel que justifique o

fato de ele plteci~aJt usar saia (conforme está expresso pe-

la forma alética subjacente do silogismo) . Este só pode

ser um papel tradicionalmente considerado como feminino

serviço de cozinha, tal como fazer café, ou fazer faxina.

39 - Quase no final, entretanto, I. diz:"Ap~

.õa.Jt que. homem não u.6a .6aia., né.?" Esta asseveração demons -

tra que durante todo o processo I. conseguiu de.6ee.n~4a~,ou

seja, conseguiu manter separados os planos de conteúdo so-

bre os quais precisou atuar.

Em outras palavras, I. conseguiu

o 6io da.6 me.a.da.6", lidando com informações que para ele

eram contraditórias, pois negavam suas crenças e seu conhe

cimento do mundo, estabelecendo uma acomodação sobre essas

informações, amalgamando-as num primeiro momento e separa~

do-as mais tarde, restabelecendo, deste modo, o equilÍbrio

dentro de um sistema anteriormente conflituoso.

Coloquei, até aqui, de maneira não sistemati

zada, o referencial teórico que vai ser utilizado neste ca

pÍtulo para explicar a formação de sincretismos pelos adul


- 90-

tos não-alfabetizados aqui estudados. Na secçao 3, que vem

a seguir, retomarei os conceitos de descentração,acomoda -

ção, assimilação, solução de problemas, e, formalizando-os,

verificarei em que proporçao eles atuam e interagem com os

três planos de referência mencionados atrás, a saber:os si

logismos e suas premissas; o indivíduo não-alfabetizado e

seu conhecimento pessoal; o quadro de referência do diálo-

go.

3 - OS PLANOS DE REFE~NCIA E SEU P"~EL"

Os três níveis ou planos de referência que

participam na situação de testagem da compreensão de racio

cínios lÓgico-verbais levada a efeito neste trabalho sao:

lQ - o quadro de referência fornecido pelas

premissas constantes dos silogismos, bem como das relações

do conteúdo entre elas;

29 - o quadro de referências do próprio su-

jeito, formado a partir de sua experiência pessoal, de seu

conhecimento factual e do mundo!

39 - o quadro de referênCia que está sendo

construido durante o diálogo entre sujeito e entrevistador.

Este é um quadro mutável, sujeito a checagens e correções.

Examino, a seguir, cada um deles em maior de

talhe.

19 - OS SILOGISMOS E SUAS PREMISSAS:

Retorno aqui à discussão sobre os silogismos

feita no capitulo introdutório desta tese.

Os silogismos são constituidos por duas pre-


- 91-

missas e uma oraçao interrogativa, cuja resposta correta

corresponde à dedução lógica das relações de significado

estabelecidas entre as premissas.

A premissa maior contém um quantificador uni

versal ("todo.õu} e o verbo está no tempo denominado "pJt.e.-


.&e.nte. omnile.mpoJtal" (cf. STRAWSON,op. cit.). Esta estrutu-

ra caracteriza a premissa maior como um "e.nuncJ.ado- .te.-i.", o

qual poderíamos definir, parafraseando STRAWSON (9P· cit.)

como aquele enunciado no qual a referência das palavras não

depende de nenhuma maneira da situação em que foram enun-

ciadas. Deste modo, o enunciado-lei caracteriza-se por es-

tabelecer um quadro referencial fechado em si mesmo, váli-

do em todos os tempos possíveis.

A premissa menor, por sua vez, restringe a

referência da maior, deslocando o genérico para o indivi -

dual. Assim, o atributo de todo um conjunto na premissa

maior passa a ser atributo de indivíduo(s) na premissa me-

nor .. Isto estabelece uma relação de .i~tc.iu.õão, ou seja: a

premissa menor refere um conjunto de indivÍduos caracteri-

zados como uma classe do conjunto universal instituído pe-

la premissa maior.

Segue-se que as duas premissas passam a cons

tituir um todo, uma verdade necessária, cuja garantia de

confirmação só pode ser encontrada dentro dela mesma, nao

necessariamente nos eventos do.mundo exterior a ele.

Gostaria de salientar ainda o caráter genér~

co da premissa maior. Como se sabe, as experiências físi-

cas são diferentes das abstrações levadas a efeito pela ló

gica.uma dessas diferenças reside no caráter genérico da

premissa maior do silogismo, cuja natureza é diferente da-

quele genérico que faz parte do oonhecinlento dos indivíduos não-al


- 92 -

fabetizados.

A diferença fundamental entre elas foi apon-

tada por OSTEN DAHL (1972), que iritroduz o conceito de 11


a..ó

.6e.veJtaçÕe..õ nômic..a.ó" para nomear as expressões de caro?. ter


genéri.co que possuem força de lei, isto é, aquelas que, pa-

ra serem verdadeiras, requerem uma consideração não só dos

estados de coisas reais, como também dos estados de coisas

alternativos. Deste modo, as generalizações nômicas, segun

do o A., incluem tanto os casos ILe.al-6 quanto aqueles nao-

-~eal.ó mas po.ó.ólvei.ó. Uma proposição desta espécie(E)pode-


ria ser parafraseada, diz o A., do seguinte modo:

"P é vettdade-LJr...a em .todo-6 o.ó mundo<. que .têm

uma c.e..Jt:ta Jte.taç.ão c.om o mundo !Lea.t"(op.cit.,


p o 3) o

Como já disse acimat e esta espécie de gené-

rico nômico que caracteriza a premissa maior do_silogismo.

OSTEN DAHL ainda di-stingue entre dois tipos

de asseverações nômicas: as de..6c.Jt.i:tJva.6 e as n.oJt.mativa.6 .As

asseverações nômicas descritivas são aquelas que exprimem

leis físicas, biológicas, etc., e que não podem ser viola-

das ou desobedecidas. As asseveraçoes nômicas normativas

exprimem normas sociais, costumes, regulamento,etc., e po-

dem ser violadas ou desobedecidas. Um exemplo do primeiro

caso seria: "0 c.lo!to ê .6otúve.t na âgua". Para o segundo ca

so, cito: "Todo.6 lavam a1.1 maol.l an.te.1.1 do atmoç.a".

Examinando os silogismos utilizados para a

testagem do Grupo I desta pesquisa, nota-se que todos os

silogismos exprimem asseverações nômicas normativas.

Esta característica essencial que as premis-

sas maiores normativas têm de poderem ser constestadas de-


- 93 -

sernpenha, conforme veremos adiante, um papel central na e-


laboração dos sincretismos pelos adultos não-alfabetizados
aqui estudados, especialmente nos casos em que eles(adul-

tos) discordam do conteúdo dos silogismos.

Por ora, continuarei a examinar os três pla-

nos de referência mencionados atrás. Passo a seguir ao· se-

gundo deles.

29 - O INDIVÍDUO NÃO-ALFABETIZADO E SEU CONHECIMENTO PES -

SOAL:

Segundo ROBIN HORTON (1970), o pensador tra-

dicional encara as palavras como estando ligadas de uma m~

neira absoluta à realidade. Isto significa que· existe uma

correspondência unívoca entre referência e referente na


mente d~sses indivíduos, e que qualquer alteração em um al

terará também a outra, e vice-versa. Ainda segundo esta vi

são, as palavras e seus conceitos formariam amálgamas, fe-

chados em si mesmos, sem possibilidade de aberturas para

escolhas diversas.

Esta caracterização pode, ser vista no primei

ro tipo de sincretismos analisados aqui: aqueles em que o

sujeito concorda com o conteúdo dos silogismos. Com efeito,

parece que naqueles casos os sujeitos retêm das premissas

um dos referentes, e atribuem ~ este referente uma referên

cia pessoal, também genérica, mas de natureza diversa da-

quele genérico do silogismo, pois este genérico interposto

pelo indivíduo está ligado ao conhecimento estratificado ,

que codifica os valores e crenças de sua própria cultura.

A natureza dessa diferença entre os dois ge-

néricos a meu ver, deve-se basicamente ao caráter formal ,


- 94 -

particular e teórico do genérico do silogismo, em oposição

ao caráter pragmático, profundamente enraizado no uso da

linguagem cotidiana, do genérico do referencial dos sujei-

tos.

Conforme já foi visto, o genérico dos silo -

gismos do Grupo I é constituído por proposições nômicas,com


"6ol!.ma de. .tei", de caráter normativo, uma vez que podem
ser negadas, contraditas ou desobedecidas. Já o genérico

dos sujeitos não-alfabetizados, constitui aquilo que OSTEN

DAHL (op.cit.) denomina de "ge.ne.Jr.aLLza.ç.Õe.-6 ac..-<..de.n-ta.L~", ou

seja, aquelas formas genéricas que se referem apenas a ca-

sos reais, a um conjunto limitado, conhecido, de indiví -

duas. Exclui, deste modo, os objetos possíveis, e nao admi

te que se façam p~~v~óÕ~ó a partir delas.

~ interessante notar que, se do ponto de vis

ta da estrutura, esses dois genéricos são tão diversos,não

é assim que os sujeitos aqui estudados os encaram. Como ve


remos adiante em detalhe, parece que às vezes o conteúdo

genérico do silogismo é considerado como c.omp.te.me.nta~ ao

do conhecimento do sujeito (esp~cificamente nos casos em

que os sujeitos c.oneo~dam com o conteúdo do silogismo).

39 - 0 QUADRO DE REFERENCIA DO DIÁLOGO:

Estou tomando a palavra d~â.togo aqui como

tendo um sentido dinâmico e dialético, tal como concebido

por RIEGEL (1979) e FREEDLE (1978). Entendo que e durante

o diálogo, que considero como um phoce.~óo, que as inten-

ções de comunicação, bem como os significados, sao estabe-

lecidos, compartilhados e transformados.

Com muita propriedade, FREEDLE (op. cit.)co~

sidera o diálogo como sendo o determinante do "ó~gn~t)~cado


- 95 -

e.me. . fge.nte.", isto é, o diálogo propiciaria a descoberta e

o estabelecimento dos significados das formas verbais uti-

lizadas nos enunciados.

A dimensão dialética do diálogo é estabeleci

da por· RIEGEL (op.cit.) quando afirma que "In a dialogue.


bo.th 4pe.ake.!t.!J a!Le. .õubje.et and obje.c...t a.t the. .õame. :t-Lme., a.nd
.the. Jte.la.tion-6 e..õ.tabli.õhe.d be..twe.e.n the.m wi.th e.ac..h u.t.te.Jtanee.
a.Jte. alway.6 Jteá.tec.tive" (p. 89) •. :t; durante a relação dialóg_!

ca que o significado dos enunciados é negociado e estabel~

cido, através de um processo dinâmico de inter-troca de in

formações, conceitos e referências, tendo como pano de fun

do o ambiente social e cultural bem como o grau de desen-

volvimento cognitivo e lingüistico de cada participante.se,

conforme diz RIEGEL, o enunciado inicial representa uma

".te.õe", e o subseqüente (feito pelo outro participante)re-

presenta uma "an.tZ.te.t>e.",na medida em que sempre modificará

a 11
.tet> e" de algum modo, então teremos uma ".6Zn.tú, e" quando

da resposta do primeiro participante a esta antítese.

Porém, esta síntese, por sua vez também esta

rá modificando a tese e a antítese anteriores, o que faz

dela própria, ao mesmo tempo que síntese, uma antítese do

segundo enunciado, e uma tese, do ponto de vista do enun

ciado subseqüente.
~ importante acrescentar que RIEGEL fala em

diálogo "e.x..tetr.1afl.." e "1n.te.fl..iofl..", b que significa que ele

incorpora ao seu conceito de diálogo também a parte cober-

ta, não expressa, que sempre o acompanha.

~ dentro do quadro de referência estabeleci-

do durante o diálogo que os adultos aqui estudados levam a

efeito as descentrações e adaptações cognitivas, bem como

resolvem os problemas colocados pelas contradições entre


- 96 -

os Outros dois quadros: o dos silogismos e o de seu conhe-

cimento pessoal.
Por haver mencionadO o termo "adaptaç.ã.o c.og-
n-Lt-l.va" acima, gostaria de acrescentar aqui uma discussão

sobre esse conceito, bem corno de suas partes constituintes


e complementares: a assimilação e a acomodação, já mencio-
nadas neste trabalho.

PIAGET (1952,1947) introduz estes dois con -

ceitos quando fala do processo de adaptação que todo orga-


nismo leva a efeito, em busca do equilíbrio. Em outro lo-

cal, PIAGET (1967) afirma que a base do verdadeiro diálogo


é a informação adaptada, o que leva a estabelecer um víncu
lo entre os papéis da assimilação e da acomodação e sua
contribuição para o significado emergente do diálogo.
A assimilação é definida pelo A. como "e-6.t.Jtu

.tuJta~ão poJt ~ncoJtpoJta~ão da Jteat~dade txteJt~oJt a 6oJtma-6 d!


vida.& à a.t~v~dade. do ;.,uje..i.ta" (197S,p.l7), ou seja, a ass!_
milação é o mecanismo responsável pela interpretação de d~

dos da realidade externa ao sujeito (ou reinterpretação dos

mesmos), dentro dos limites cognitivos deste sujeito.

A acomodação ocorre quando "ao inc.oJtpoJtaJt 0.6

novo.& e.ltmento.& ao.6 e..6quema.6 an.ttJt.i..oJte..6, a intet.i..gênc.ia mo


dió.i..c.a inc.e.-&-6ante.me.n.te. o.6 Ú.l.timo.6 paJta aju.&.tã.-lo.& ao,s no-
vo• dado•" {id. ibid. p.l8).
Em outras palavras,·a assimilação denota a

mudança do objeto em benefício do sujeito, enquanto que a

acomodação denota as mudanças do sujeito tendo em vista. o

objeto. A adaptação, portanto, é um processo modificador

das estruturas externas e internas, isto é, do sujeito e

do objeto. Parece-me que, nos casos de sincretismos que a-

nalisei atrás, o produto desse processo de adaptação seria


- 97-

o significado emergente, ou seja: as buscas e tentativas

feitas pelos adultos com o objetivo de harmonizar o quadro

de referência do silogismo e o seu próprio, em busca do e-

quilíbrio. Os próprios sincretismos fazem parte desse pro-

cesso de construção.
,se os indivíduos não-alfabetizados aqui est~

dados passam por esses processos durante a·testagem, então

teremos as seguintes coordenadas a considerar no processo

de construção dos sincretismos que estou analisando nesta

secçao:

19 - os quadros de referências fornecidos p~

lo investigador, i. e., o conteúdo dos silogismos, consti-

tuir-se-iam na realidade externa;

29 - o quadro de referência formado pelo co-

nhecimento do mundo dos sujeitos caracterizaria a realida-

de interna;

39 - os processos de assimilação e acomoda -

çao entre os dois quadros acima, que ocorreriam durante o

diálogo, seriam os responsáveis pelo significado emergente

(neste caso específico, pelos sincretismos).

Procurarei, a seguir, explicitar como se dá

esse processo de adaptação, o qual, a meu ver, pressupoe

descentrações e soluções de problemas da parte dos sujei-

tos. Tentarei também verificar o porquê da construção de

sincretismos como alternativa às respostas esperadas como

certas para os testes de compreensão dos silogismos. Final

mente, farei uma tentativa de relacionar esse processo gl~

bal com o estatuto de não-alfabetizados dos indivíduos ~

estudados.
- 98 -

PARTE IV

Tentativa de definição do processo

Como então, dadas as três coordenadas acima,

(os silogismos, o conhecimento dos sujeitos e o processo

dialógico), ocorreriam os sincretismos aqui mostrados?

A meu ver, o processo seria o seguinte:


O sujeito inicialmente confronta-se com a es

trutura do silogismo, de onde sobressai o genérico da pre-

missa maior, o qual, como vimos, tem caráter normativo, o


11
que significa que as "le.l-6 ali expressas podem ser discu-

tidas.

~ exatamente isto que os indivíduos não-alf~

betizados aqui estudados fazem, ou seja, não encaram o ge-

nérico da premissa maior como sendo definitivo, e contra-

poern a ele outro genérico, este de caráter acidental , o

qual provém de seu quadro de referência pessoal, formado

a partir da experiência e da transmissão oral.

Começa então o processo de adaptação entre

esses dois genéricos: ao mesmo tempo em que o genérico do

sujeito aComoda-se ao do silogismo, este é assimilado pelo

primeiro. Os dados epilingüísticos que recolhi e tenho a-

presentado no decorrer deste trabalho indicam exatamenteis

to.

Durante este processo de adaptação, conforme

mostrei na primeira parte deste capítulo, o indivíduo efe-

tua de~Qent~açõe~, isto é, consegue considerar como separ~

dos o seu próprio quadro de referências e o do silogismo .

Muitas vezes esta capacidade para descentrar aparece ex-

pressa de forma bastante clara, como é o caso do sincretis


- 99 -

mo n9 7; outras vezes, ela se processa de maneira coberta,


como no sincretismo n9 S.
Durante essas descentrações, que leva a efei

to a fim de acomodar-se ao genérico do silogismo, e conse-


qüentemente a fim de assimilá-lo ao seu próprio genérico,o
sujeito percebe que tem duas perspectivas: os dois genéri-
cos sao eomplemen~a~e~, ou então são eont~aditõn~o~ entre

si.
No primeiro caso; os sincretismos construí -
dos, serao confirmatórios do silogismo, ou então acrescen-

tarão uma nova perspectiva, que o silogismo não havia colo

cada, {são os casos em que o sujeito eaneonda com o conteú

do do silogismo, já examinados neste capítulo).

No segundo caso, o sujeito constrói sincre-

tismos que têm por finalidade contra-dizer o genérico do

silogismo, e estabelecer seu ponto de vista genérico pes-

soal sobre o as-sunto (são os sincretismos construídos qua!!:.

do o sujeito di~co~da do conteúdo do silogismo,também exa-

minados atrás) .

O que garante ess& diferença entre os sincre

tismos, ou seja: como eles podem ser solidários ora com o

genérico da premissa maior, ora com o genérico do sujeito?

A meu ver, é a própria natureza dos proces-

sos de acomodação e assimilação. Sabe-se que ambos são sub

processos de um todo maior, que é a adaptação. Deste modo,

não existe assimilação pura, nem acomodação pura.Ambas in-

teragem continuamente, de maneira holística.

Há, ainda, uma outra característica importag


te relativa ao funcionamento do conjunto assimilatório-ac~

modatõrio a qual foi assim descrita por FLAVELL (1963):"So

me cognitive act~ ~how a ~elative p~epondenance aó the


- 100 -

a..!..&imi..ta.Li.ve. c.ompone.nt; o:the.!t.& .&eem he.a.ve..ty we.-Lgh:te.d :towa.Jul.ó

a.c.ommoda.:tion". (op. cit., p.49).


Assim, apesar de constituirem urna só unidade,

a assimilação e a acomodação variam quanto ao grau de par-

ticipação no processo adaptativo: ora urna, ora outra pode

predominar.

Creio que é nesta característica de desequi-

líbrio entre o funcionamento dos dois processos de adapta-

Ção, que se deve buscar a explicação para a diferença en-

tre os sincretismos apontados atrás. Explico-me:

Em primeiro lugar, considerando os sincretis

mos elaborados nos casos em que o sujeito concordava com o

conteúdo genérico do silogismo, penso que haveria aí um

predomínio da acomodação sobre a assimilação, visto que o

ajustamento entre o genérico do silogismo e o do sujeito e

feito quase que sem esforço de identificação (assimilação)

por parte do sujeito. Portanto, o esforço acomodatório e,

nestes casos, maior do que o assirnilatório.

Em segundo lugar, e de maneira similar,pode-

-se dizer que, nos casos em que o sujeito discorda do con-

teúdo do silogismo, o esforço identifiCador dirigido ao

conteúdo da premissa maior do silogismo toma o maior espa-

ço da atividade intelectual do sujeito. Ele·tenta reconhe-

cer, dar um significado àquele genérico que contradiz sua

experiência pessoa. Isto significa que a assimilação pred~

mina sobre a acomodação. Neste caso, o sujeito tenta alte-

rar os dados da premissa, de modo a resolver a contradição,

numa forma de incorporar esses dados ao seu conhecimento

genérico específico, decorrente de tradições e experiência


pessoal, e uma das etapas deste processo assirnilatório re-

sulta na emergência dos sincretismos do segundo tipo, isto


- 101-

-
e , aqueles produzidos nos casos em que o sujeito discorda

do conteúdo do silogismo, e tenta resolver uma contradição.

Estes são, a meu ver, os processos que se


passam com os sujeitos estudados, em termos cognitivos, no

caso dos sincretismos aqui apresentados.

·oiscuti, at.é este momento, os dados a respei

to dos sincretismos produzidos pelos sujeitos do Grupo I,

cujos silogismos continham premissas maiores normativas.

O que ocorre com os sujeitos do Grupo II,cu-

jos silogismos apresentam premissas maiores descritivas? ~

o que verificarei a seguir.

PARTE V

Estudo dos sincretismos produzidos pelos ~mjei tos

do Grupo II.

Com relação aos sincretismos produzidos por

este grupo, cabe notar os seguintes aspectos:

Em primeiro lugar, .to do-& os sincretismos ,com

exceçao de um, ocorreram em casos onde os sujeitos aee~a-

nam a resposta. Deste modo, são ocorrências do primeiro ti


po qescrito anteriormente para o Grupo I, ou seja: os su-

jeitos eoneo~dam com o conteúdo do silogismo,mais especifi

camente com o genérico descriti,Jo, de caráter científico ,

das premissas maiores. Se assim é, então é o caso de se po

der afirmar que existe um genérico subjacente ao conteúdo

dos sincretismos, o qual exp_rime o conhecimento dos sujei-

tos a respeito do conteúdo dos silogismos. Também é o caso

de se afirmar que esse genérico, elaborado pelos sujeitos

a P.artir de sua experiência e conhecimento do mundo,não -


e

contraditório, mas é complementar ao genérico da premissa

maior dos silogismos.Vejamos se isto acontece, através da


- 102 -

análise de ocorrências.

SINCRETISMO NV 9

(Silogismo n9 6 - experimental - Justificati

va - Resposta certa)

"Ah, ponqu.e. e..le ê um bi..c.ho a.ó.õim ne.h..vo.ó0 7 9D~

ta de. 6ic.â mai...õ .õozi..nho; não go.õ~a de 6ic.ã


a..6.6i..m em baJtu.ihe.i..JL.a, go.õ;ta de. .tê c.aJtma; eu •••

eu. ••• a onça ê um bic.ho ne.nvo.õo, e c.omo o


gato ••• o gato quando tã ne.nva.õo,c.ê ve. que.
não pode. nem pô a mão ne.ie., aJtlte.pi..a o Jta-
b o?"

Para este sujeito (M.P.), a palavra retida

do silogismo apresentado foi "onça." (para o sujeito,sinôni

mo de ";tigtt.e.") ·- H.P. inicia sua justificativa afirmando que

a onça gosta de lugares calmos. Isto significa que,do pon-

to de vista de M.P., a floresta, lugar onde a onça mora, é

um lugar calmo. A seguir, M.P. faz uma comparação entre a

onça e o gato, e apresenta seu conhecimento pessoal sobre

o gato para estendê-lo à onça. Aparentemente, o raciocínio

subjacente para a construção deste sincretismo foi:

19 A onça mora na floresta

29 - A floresta é um lugar silencioso,calmo;

39 - A onça é nervosa, nao gosta de lugares

barulhentos;

49 - Porisso, a onça mora na floresta.

A seguir, procurando alguma evidência para o

que diz ,M. P. recorre ao s·eu conhecimento empírico:


- 103-

-
19 - A onça e igual ao gato.

-
29 - O gato e um animal nervoso.

39 Logo,a onça e um animal nervoso.

Como se percebe, este sujeito parece ter o


seguinte objetivo em mente: é preciso. justificar o silogi.ê_

mo, cujo conteúdo ele aceita como verdadeiro.

Como fazê-lo? Ao invés de recorrer ao conteú

do da premissa maior, e dizer "PotLque. é um animal .6e..tvagem

li..vtLe.",M.P. recorre a uma outra ordem de fatos, fora dos~

legismo, diferentes daqueles expostos acima. Deste modo,M.

P. apresenta argumentos pessoais para dois fatos afirmados

por ele (a):

19 - para o fato de que a onça mora na flo -

resta;
-
29 - para o fato de que a onça e um animal

nervoso.

Ambos estão intimamente relacionados para M.

P •.· Se o primeiro estabelece o elo de ligação entre o ra -

ciocínio de N.P. e o conteúdo do silogismo, o segundo faz

conexão entre o conteúdo do silogismo ~ o conhecimento do

mundo deste sujeito. Existe aí, então, uma ponte construí-


da: o conteúdo descritivo da premissa maior do silogismo

nao é discutido. Ele é aceito como verdadeiro. A tentativa

de justificativa da resposta baseia-se na premissa menor,a

qual, por sua vez é tomada como referência genérica do si-

legismo. Do outro lado desta ponte está o conhecimento ge-

nérico do sujeito sobre os gatos. A ponte,então, se estab~

lece entre esses dois conhecimentos, suprindo, assim,a ne-

cessidade de justificativa.

A necessidade de comparaçao com fatos apareg


- 104 -

temente mais experienciados pelo sujeito, a fim de justif!

car melhor a resposta ocorre novamente no sincretismo se-

guinte, elaborado pelo mesmo sujeito:

SINCRETISMO NV 10

(Resposta:certa. Silogismo n9 9)

"E ponque. ê a na:tu.IL.e.za dela, da maç.a,Ja ve.m


com a vLtam-Lna, não ê.? •.. Qu.e. ne.m a la.Jt..anfa
•• • a la.!t.anja. pa.![_e.c.e. que. não .te.m nada.,ma.-6 a
la.Jtanja. te.m mu.<...ta. v-Ltamina.. [ ••• 1"

Empiricamente, dadas as condições sócio-eco-

nômicas dos sujeitos, é indiscutível que a laranja é uma


fruta mais conhecida do que a maçã.Logo, a comparaçao da
-
maça com a laranja (do mesmo modo que a da onça com o gato
no sincretismo anterior) reveia um apelo do sujeito ao seu

conhecimento pessoal e experiência do mundor a fim de apr~

sentar evidências mais "Jte.a.i-6" para sua resposta. Nota-se,

nos dois casos acima, que o sujeito tem conhecimento de

que· existe uma categoria superordenada onde gatos e onças

se inserem, e outra categoria, da qual laranjas e maÇãs são

membros. No primeiro caso, talvez seja "an.ima,[-6 ne.Jwo.6o.6";

no segundo, simplesmente "61Luta.6".Este sujeito,então,trab~

lha com um genérico subjacente nos dois casos. As compara-

ções feitas nos dois casos são complementares ao genérico

expresso pela premissa maior do silogismo, uma espécie de

reforço ao conteúdo do silogismo, extraído do conhecimento

empírico do sujeito. Os sincretismos n9s 9 e 10 são,portan

to, confirmatórios do conteúdo dos silogismos corresponde~

tes.
- 105 -

Em outras ocorrências de sincretisrnos no Gru


po II, a cornplementariedade também transparece, como no ca

so abaixo, em que o sujeito ~l.J. (experimental) justifica

sua resposta (correta) ao silogismo n9 6 dizendo:

SINCRETISMO NÇ ll

»Ah, po~que ~gato, ~do mato ... Ehheh bicho


aqui .õâ:o tudo do mato. Lã. ·na PaJtan.â, rnat:aJLam
uma bicha dehha bem pentinho de onde nÔih
moJLava, como daqui ali •.• "

Novamente, o sujeito recorre a uma compara -

çao do silogismo e um dado de sua experiência, a fim de me

lhor confirmar sua resposta (e, por extensão, o próprio si


legismo). A parte não expressa do sincretismo n9 11 refe-

re-se ao fato de que no Paraná, onde o sujeito rnorava,é m~

to, e esse fato possibilitou o aparecimento da onça que

foi morta.

Mais uma vez, o sincretismo construído foi

complementar ao silogismo, e a natureza da argumentação es

tranha ao silogismo, inserida pelo sujeito na sua justifi-

cativa, é relativa a uma busca de meios de reforço ao con-

teúdo do silogismo, meios esses extraídos da experiência

factual do sujeito. Do mesmo modo que o sujeito que cons -

truíu o sincretismo n9 9, M.J. ·também insere onças e gatos

na mesma categoria: 11
a.n,i,ma,i,.6 que. moJta.m no ma-to". Evidência
para esta afirmativa está no fato de M.J. ter identificado

o animal da gravura como sendo onça, mas depois ter-se re-

ferido a ele, no sincretismo, como sendo gato.

Então, tal _como ocorreu com os sincretisrnos

construídos pelos sujeitos do Grupo I, creio que no caso


- 106 -

do Grupo II, com os silogismos contendo premissas maiores

descritivas, ocorre a mesma operação de descentração por

parte dos sujeitos, os quais vão procurar evidências empí-

ricas para justificar o conteúdo das premissas, com o qual

conc·ordam. Esse comportamento, novamente como no Grupo I ,

denota um esforço assimilatório por parte dos sujeitos, ao

mesmo tempo em que serve para restabelecer, diante da si-

tuação de testagem, o plano do conhecimento factual dos su

jeitos, que eles percebem como ·sendo complementar ao conhe

cimento científico dos silogismos.

Conforme já afirmei no início, ocorreu neste

Grupo II um Único caso de sincretismo em que o sujeito dis

corda do conteúdo do silogismo.

Para justificar sua resposta ("Nâo")dada a

pergunta do silogismo n9 4, o sujeito S.M. diz:

STNCRETTSMO NQ 12

''Po~que nao e um eoLah me~mo, ne, e- a 61gu~a

de um c.ol.ah".

Ora, o que temos nesse sincretismo é, estri-

tamente falando, um caso de discordância com o conteúdo do

silogismo do mesmo tipo daqueles que ocorreram no Grupo I.

Com efeito, este sujeito está tentando resolver uma situa-

ção conflituosa ou contraditória criada entre o conteúdodo

silogismo e a realidade presente a situação de testagem.De

fato, o colar em questão, mostrado na gravura, não tem bri

lhantes, apenas Jte.tlta.ta brilhantes. Obviamente s .M. está

plenamente consciente da existência dos três planos menci~

nados atrás: o plano onde se situa o conteúdo dos silogis-

mos; o plano da experiência pessoal do sujeito, e o plano


- 107 -

do Significado emergente do diálogo.

Neste caso particular, talvez se possa acre~

centar ainda um outro plano, do qual o sujeito tem cons -

ciência: refiro-me a um lugar no discurso em que se faz

uma distinção entre o ''de.. dieta n e o "de. ne.". Em outras p~

lavras, a capacidade de descentração de S.M. parece ir até

ao ponto de perceber que aquilo sobre o que se fala nao -


e

idêntico à própria fala, ou, ainda, que o ato de falar so-

bre não garante por si só a verossimilhança daquilo que e

dito. Deste modo, este sujeito separa bem a afirmação: "E~

h e. c.ola.Jt te.m mu.Lto.6 biL.i..thante..6 ", contida na premissa menor,

do plano da realidade que está servindo como referência p~

r a o discurso: " ... não ê c.of.a.Jt, ••• , ê a fi..Lgull.a de. um c..o.ta.IL".

Por isso, S.M. demonstra que conseguiu detectar urna contra

dição entre o significado do silogismo e sua percepçao pe~

soal da situação de testagem, qual seja: as pedras precio-

sas declaradas pelas premissas não existem de 6ato,isto é,


nao estão presentes na situação de testagem. Deste modo,S.

M., tal qual os sujeitos do Grupo I, discorda do conteúdo

do silogismo, e coloca em evidência, como justificativa, a

experiência empírica que está vivenciarido: trata-se de uma

figura, um desenho, logo, não são pedras verdadeiras.A re-

presentação não é o objeto real. Deste modo, temos neste

caso outro exemplo de descentração cognitiva levada a efei

to pelo sujeito como parte de um esforço assimilatório que

ele, sujeito, realiza a fim de restabelecer seu quadro de

referência pessoal numa situação em que outros quadros de

referência contraditÓrios estão interagindo.

PARTE VI

Apresentação dosdados e discussão geral


- 108 -

Existe assim, uma correspondência entre os

tipos de sincretismos(formulados tanto pelos sujeitos do

Grupo I quanto pelos do Grupo II) ·com relação às "dêmaJtc.hv., 11

cognitivas realizadas pelos sujeitos durante a construção

dos si.ncretismos: nos dois grupos ocorrem sincretismos que

sao complementares ao conteúdo dos silogismos (nos casos

em que o sujeito concorda com esse conteúdo), ou então que

são contraditórios com relação.ao silogismo {casos em que

o sujeito discorda do conteúdo do silogismo). Em ambos po-

de-se perceber claramente que os sujei tos e'stão levando a

efeito descentrações cognitivas entre os três planos de re

ferência que estão interagindo durante a testagem, e que

existe ainda um esforço dos sujeitos para se adaptarem co~

nitivamente diante dessas perspectivas às vezes conflituo-

sas. Esse esforço adaptativo, onde ora predomina a acomod~

çao, ora a assimilação, é resolvido através da produção dos

sincretismos, nos quais o. sujeito restabelece séu conheci-

mento genérico do mundo e o relaciona com o conteúdo gené-

rico "6e.c.hado" dos silogismos.


Neste ponto, porém, é preciso colocar em pa~

ta a seguinte questão:

Como já foi dito, as premissas maiores dife-

rem em conteúdo nos dois Grupos: no Grupo I, elas contêm

um genérico normativo, e no Grupo II elas contêm um genér~

co do tipo descritivo. A análise,· até aqui, não mostrou di

ferenças na produção de sincretisrnos pelos dois Grupos. A

questão a ser colocada, então, é a seguinte: haveria algu-

ma diferença quantitativa entre os dois Grupos, com rela -

ção à produção dos sincretismos?

De fato, existe um parâmetro quantitativo que

serve para mostrar que o conteúdo normativo ou descritivo


- 109 -

das premissas maiores faz uma diferença na construção dos

sincretismos: Observando-se a freqüência relativa de cear-

rência dos sincretismos nos dois grupos, temos urna média

de ocorrência de 3,07 sincretismos por silogismo para o

Grupo I, e uma média de 1,22 sincretismos por silogismo pa

ra o Grupo II~ o que dá quase o dobro de sincretismos por

silogismo para o Grupo I, que contém as premissas maiores

normativas.Este resultado reforça a discussão feita ante-

riorrnente, neste mesmo capitulo: o conteúdo normativo des-

ses silogismos, porque exprime normas, costumes, etc.,apre

senta-se potencialmente corno urna verdade que pode ser col~

cada em xeque, examinada de outros ângulos e pontos de vi~

ta que n-ao necessariamente aqueles expressos pela premis-

sa maior.naí, a probabilidade de formulação de sincretis -

mos aumenta, e o número real dos mesmos também.

Tabela 1 - Freqüência relativa de ocorr~encia de sincretis


mos complementares e contraditórios e freqüên -
cia relativa dos grupos controle e experimental,
para os Grupos I e II.

GRUPOS! m:~I.EME:_i CONTRADI-


T CONTROLE
EXPERI -
T
TARES T6RIOS MENTAL
( 18) (22) ( 4 o) ( 2 6) (14) ( 4 o)
I 45 55 65 35

II (10~0,9 (01)9 (ll)


( 03127,2 (0 "72,7 <IlT

Obs: Os números entre parênteses indicam as freqÜências ab-


solutas.

Com relação aos sincretismos serem compleme~

tares ou contraditórios ao conteúdo do silogismo,seria de

se esperar que, no Grupo II, cujos genéricos exprimem leis

fÍsica:;;,biolÓgicas etc., e, portanto, verdades mais "c.le.n-


- 110 -

tZ6-ic.a..6",ocorresse um número relativamente maior de sincre


tismos complementares do que no Grupo I.Realmente, a Tabe-

la 1 mostra que dos ll(onze) sincretismos formados pelo

Grupo II, lO(dez) s-ao complementares (90,99%) ,enquanto a-

penas l{um) é contraditório (9,09%) .Estes dados talvez se

jam mais um indicador de que os sujeitos aqui estudados nao


perdem de vista o conteúdo dos silogismos,·e que entendem

perfeitamente que as asseverações descritivas de uma certa

fOrma não podem ser contestadas, uma vez que formulam leis

"c.ie.ntZ6ic.a.6". oeste ponto de vista, o sujeito se represen


ta como alguém que aceita os conhecimentos passados a ele

por uma sociedade letrada.

g preciso ressaltar,porém, que aceitar ao

nível da inserção no discurso não significa ter consciên -

cia de que esse conhecimento veio através de práticas do

cotidiano que estão impregnadas pelos valores e leis deter

minados pela escrita.

Com o Grupo· I, praticamente nao existe dife-

rença entre o número de sincretisrnos complementares (18;

45%) e os contradit'órios (22;55%), o que reforça o argume~

to acima.

Quanto a variação na situação experimental

(grupo controle: sem gravura; grupo experimental;com grav~

ra) , os dados da Tabela 1 mostram o seguinte:

-Para o Grupo I, existe uma.vantagem no peE

centual relativo ao grupo controle sobre o experimental

(respectivamente 65% e 35%), isto é: quando as premissas

maiores são normativas, parece que o uso de gravuras faz

diminuir a quantidade de sincretismos.

- Para o Grupo II, a situação se inverte, ou

seja: a porcentagem de sincretismos aumenta sensivelmente


- 111-

no grupo experimental. Portanto, quando as premissas maio-


res são descritivas, o uso de gravuras faz aumentar a pro-

dução de sincretismos.

Parece, então, que o uso de um sistema de


contextualização para o conteúdo dos silogismos(isto é, as
gravuras) aumenta o distanciamento entre o sujeito e o
quadro referencial especifico do silogismo, no caso do Gru

po II, ao mesmo tempo em que permite uma interaç-ao maior

entre esse quadro referencial ê os outros a que me referi

atrás, quais sejaM: o conhecimento pessoal desses adultos,

e o contexto fornecido pela situação dialÓgica da testagem.

Tabela 2 - Freqllência relativa de ocorrência de sincretis


mos complementares e contraditórios· para os Gr~

pos I e II, em funç-ao da variação na situação


experimental.

GRUPO I GRUPO II

c E c E

CCMPIE. OJNTR. OJMPL. CONTR. CXM'L. OJNTR. COMPL. OJNTR.


(13) (13) (05) (09) ( 03) (jl) (07) (01)

50 50 35,7 64,2
.100 jl 87,5 12.5

IT (26) (14) (03) (08)

A Tabela 2, por outro lado, complementa da

seguinte maneira os dados acima:

Para o Grupo I, o nao uso de gravuras nao

interfere no tipo de sincretismo produzido ( contraditório

ou complementar). O uso de gravuras interfere,na medida em

que possibilita um percentual maior de sincretismos contra

ditórios. Este resultado parece indicar que o uso de grav~

ras pode estar reforçando, para o sujeito, o conteúdo do


- 112-

silogismo, que ele, sujeito, percebe como algo que desmen-

te sua experiência pessoal.

Para o Grupo II, os sincretismos complement~

res são privilegiados, quer se visem ou não as gravuras.

De um modo geral, então, parece que esses da

dos confirmam o que foi dito atrás: os silogismos cujas

premissas maiores são descritivas são vistos por estes su-

jeitos como verdades, e seu conteúdo "c.J.en-t.Z6..i.eo" é aceito

como tal. O fato de se contextualizar ou não esse conteúdo

não interfere na crença dos sujeitos nessas verdades.Ape -

nas, no caso do uso das gravuras (grupo experimental), au-

menta a produção de sincretismos (conforme Tabela 1). As

gravuras, então, parecem funcionar, no caso das premissas

maiores descritivas, corno um referencial confi.rmatório do

sistema de crenças dos sujeitos, o qual, por sUa vez,coin-

cide com o quadro referencial teórico dos silogismos. Com

efeito, nesta situação específica, as gravuras sao quase

que.um reforço para· o raciocínio sincrético do tipo comple

mentar,cuja finalidade é, corno já vimos, reafirmar que o

quadro de referências pessoais do sujeito não entra em con

flito com os quadros de referência fornecidos pelos silo -

gismos. Daí o aumento da produção de sincretismos em situ~

çao experimental: as gravuras sao, para o sujeito,mais um

lugar onde suas crenças e seu conhecimento pessoal e fac-

tual se confirmam.

Voltando ao conteúdo dos silogismos, gosta -

ria, neste ponto, de introduzir urna discussão relativa à


natu4eza dos sincretismos e sua relação com a resposta da-
da pelo sujeito à pergunta que corresponde à conclusão do

silogismo ser "c.e.Jt:ta" ou "e.Jt!ta.da".

SCRIBNER(op.cit.), fez um estudo sobre a com


- 113 -

preénsão de silogismos em uma tribo de plantadores de ar-

roz da Libéria, denominada Kpelfe.Seus resultados neste es

tudo são consistentes com aqueles.obtidos por LURIA(l977),

e foram relatados mais aprofundadamente, desta vez com re-

lação -aos Vai, numa publicação posterior (SCRIBNER e COLE

(op. cit.)).

Comentando as justificativas que os Kpelle

dão para suas respostas à pergunta do silogismo, SCRIBNER

classifica-as em dÚas categorias: empZni~ah e teãnieah. No


primeiro caso, os sujeitos recorriam a evidências externas

ao conteúdo do silogismo para se justificarem,enquanto que

no segundo as evidências utilizadas na argumentação eram

extraídas do próprio conteúdo das premissas. Como exemplo,

cito abaixo uma justificativa teórica e uma empírica para

o seguinte silogismo:

"All pe..ople.. who own hou..6e...6 pay a hou.&e.. ;tax.

Bo~ma doe..&·no;t pay a hou.&e. ;tax.

Voe...& Bo-ima own a. hou.&e.?"

(SCRIBNER, op.cit., p.230)

Justificativa te..Õnica fornecida por um Kpelle

"I6 qou 6aif Bo-ima doe.& not pay a hou.6e. tax, he. cannot own

a. hou&e." (id. ibid., p.230).


Justificativa e.mpZJt.-ica: "Bo-ima doe..6 no:t have.

mone.q to pay a hou6e. tax" (id. ibid.).

As justificativas ernpiricas consistiam princi:_

palrnente de fatos, crenças e opiniões dos sujeitos ares -

peito do silogismos, ou seja, um apelo ao conhecimento fac

tual e do mundo, bem como às experiências pessoais desses

sujeitos. A autora denomina esta busca por evidências empf

ricas de "viê.6 e.mpZn-ic.o", e acrescenta que esses viés fun -


- 114 -

ciona como um distrator, o qual desvia o sujeito da ordem·

relevante de dados que deveriam ser considerados para uma

justificativa logicamente correta. SCRIBNER levanta,então,

a seguinte discussão: será que existe alguma correlação en

tre a resposta (certa/errada) dada pelo sujeito, e a natu-

reza da justificativa (empiricajteórica)? Um exame realiza

do sobre as respostas e justificativas de 100 indivÍduos

Vai mostrou que, num total de 600 silogismos houve 171 res

postas erradas, "bu;t vto.t a. .6.-i.ngle.. c..a.ó e. -in wh.{.c.h a :the.oJte.-


:tJ..c. Jte.a..õon. c.oe.x.i..J.>.té. w1th a. Wll.ong an.6WOt 11 (op. cit. ,p. 234},
enquanto que 11
tttadi..tio na.l'. me.n a.nd w.ome.n wh o g,J..ve. the.oJte..tJ..c.al
Jte.a.6on.6 on pa.Jt;t,[c.ula.IL p!Loble.m.6 p!t.oduc.e. .the. .togJ.c.a..t.ty c.oJt.-
tt..ect. an-6tVett..-6 on t.he.óe ptt..oblem.ó, even though all the/...tt.. otheA

an.óWelt...õ may be l!JJI.Ong" {id. ibid,).

Deste modo, no estudo de SCRIBNER, e nos de-

mais citados pela autora em seu artigo, ficou claro que as

justificativas .empíricas em sua maioria ocorriam com res-

postas erradas, enquanto que as justificativas teóricas e~

tavam na maioria dos casos relacionadas a respostas corre-

tas.

Retorno aqui à minha discussão sobre os sin-

cretismos a fim de relacioná-la com a discussão sobre o

viés empÍrico de SCRIBNER. Observando os gabaritos e as

instanciações da autora, pude perceber que as justificati-

vas empíricas de seus sujeitos.constituem-se em sincretis-

mos, apesar de a autora não ter abordado o problema desta

maneira, uma vez que sua análise tinha outros objetivos. O

interessante, no entanto, é notar que, no caso dos adultos

brasileiros que serviram como sujeitos para o presente tra

balho, tal como em SCRIBNER, ocorreram muitos casos em que

uma razão empírica é dada para uma resposta certa.Na verda


- 115-

de, sao todos aqueles casos de sincretisrnos complementa~eó

ao conteúdo do silogismo. Os casos em que a justificativa

empírica vem depois de uma resposta errada são os casos em

que o sincretismo e cont~aditãnio com relação ao conteúdo

dos silogismos. ~ claro que aparecem, neste estudo, também

casos de sujeitos que apresentam razões teóricas para res-

postas certas, mas estes serão estudados num capitulo a


parte. Cabem, aqui, algumas considerações a respeito dos

casos de resposta certa com juStificativa empÍrica(ou:sin-

cretismos complementares). Com efeito, todos os 28 sincre-

tisrnos complementares encontrados nos dois Grupos aqui es-

tudados pertencem a essa categoria, o que, de um certo mo-

do, contradiz as descobertas de SCRIBNER, uma vez que nao

se encontram referências específicas a esse tiPo de ocor-

rência em seu artigo.

Pode o viés empírico agir em casos onde o ra

ciocínio já atingiu a formalização suficiente para enten -

der .o conteúdo do silogismo?

A fim de discutir este problema,creio que

.duas perspectivas deveriam ser ~alocadas: ~a de ordem me-

todológica, outra de ordem teórica.

O aspecto metodológico relevante, do meu po~

to de vista, e já mencionado na secção de Metodologia, é o

seguinte: não me parece sempre possível avaliar, pelos ga-

baritos, quando uma resposta déve ser considerada "c.en.ta".

Vamos observar o caso abaixo, que reproduz

um trecho retirado do gabarito de D. (Grupo I - Controle):

E: "SÔ quem mona na c.ldade pe.6c.a no


Taguã.
O Pedna pe.6c.a no nlo Taguã.
E.te mona na c.lda.de, ou não?"
- 116-

D: "Ah 1 e.ie. malta".

E: "Molla? Faia ma-i-6 aqu.i,õ, pe.Jr..to".


O: "Malta".

E: "Po!L qu.ê:?

Polt que que. ele malta?''


D: "Cu.mé qu.-ié,me.mo? Pe.dJto pe..óc..a .•• ,cume qi.Ué.?"

E: (Repete o úlogümo)

D: "Ah , no Jt-<..o,
. -
ne., e.n-t-"
ao •
E: (Re.pe.te. o .6.ilogJ....6mo, e pede. pa!ta V. 11..e.pe.-
:t-iA., ac.e.ilando e..<S..sa ü..ttJ..ma a..6.6e.ve.Jtaç.ão de.
V. como Jte.Apo..6ta).
D: "Ah, não (malta)".

Pergunto: Qual das três respostas dadas por

D. deve ser considerada como válida? Deve o pesquisador i~

terpretar que a primeira resposta, apesar de "c.e.Jtta.", esta

va '~e.JtJtada" ,porque depois o sujeito trocou-a por outra? Do

meu ponto de vista, esse enfoque não leva a lugar algum.Não

se pode concluir com objetividaãe sobre a resposta estar

"c.e.Jt:ta" ou "e.JtJtada" em casos como esses. Logo,não é possí-


vel fazer um estudo sobre a correlação entre respostas 11 c.e..!:;_

t.a.ó"/ 11 0Utada.ó 11 e justificativas "te..ÔJt-i.ca.t."/"e.mpZJL-i.ea.ó". A

evidência final e conclusiva para esse argumento é encon-

trada na justificativa que o ptóprio o. deu à resposta aci

ma transcrita. Na continuação do_ gabarito acima temos:

E: "Não moJLa? Polt. quê?"

D: "Ah, poJt.qu.e.. pe..t.c.a no Jtio Tagu.â, aeho que.


nao pode.. moJt.â na c...i.dade., né?"

Ora, a primeira parte da justificativa de o.

nao seria classificada, de acordo com os critérios de


- 117-

SCRIBNER, de "e..vldênc.ia .te.ÔJr..ica?" Obviamente, esta discus-

s-ao não leva a lugar algum, a não ser à constatação de


que não é possível saber, com certeza e em todos os casos,

se a resposta do sujeito é "c.rur..ta.'' ou "e.Jt.tr.a.da".

Quanto à argumentação teórica que julgo rel~

vant~ para a discussão do problema aqui exposto, retomo t~

do o que foi discutido neste capitulo, a respeito da capa-

cidade de descentração e dos planos de referência com os


quais os sujeitos interagem durante a situação de testagem.

Conforme foi discutido atrás, os sujeitos que constroem os

sincretismos complementares concordam com o conteúdo dos


silogismos, mas, na justificativa, apresentam evidências

tiradas do seu conhecimento empírico e de sua experiência

pessoal. Aquilo que SCRIBNER denominou de "viê.J:.",eu gosta-

ria de denominar de ''Jteóo!I.ç.o a!I.gume.ntat-Lvo". Isto é, a vi-

sao do viés já é uma visão enviesada e intelectualizada,que

procura comparar parâmetros de raciocínio entre, cul_turas

desiguais. Com efeito, qualquer pessoa que preste atenção

às conversas da gente não intelectualizada, há de perceber

que a discussão de experiências e o relato de ocorrências

cotidianas ocupam quase que o espaço todo. A vida dessas

pessoas está ancorada em circunstâncias e eventos cotidia-

nos, práticos. t esta prática, então, que eles levam como

quadro de referência para a situação de testagem, e as pr~

vas maiores que podem encontrar para reforçar uma opinião

relativa a um raciocÍnio formalizado (o outro quadro de

referência) são exatamente citações da experiência ou do

conhecimento prático que possuem.

Nesse sentido, não estaria talvez adequado

considerar as razões empíricas como sendo um viés, no sen-

tido de que se afastariam do quadro lógico de raciocínio a


- 118 -

que o silogismo obriga seus cornpreendedores. o uso do ter-

mo "JLe.óoJLço a4gu.mentat-<.vo 11 está então, do meu ponto de


vista, mais coerente com a posição aqui adotada, a qual

considera os "e.JtJta.ó" como tenta ti v a de solucionar um qua-

dro referencial contraditório, e os "a.c.eJtto.6" como reconhe

cimento da harmonia dentro desse quadro. As razões empíri-

cas, deste ponto de vista,serão até encaradas como recur -

sos "natu.Jtai-6" (em oposição ao conteúdo "atLti6ic.ia.l"da si-

logismo),e não tem sentido qualquer discussão que procure

interpretá-las em termos de estarem mais próximas ou mais


distantes dos processos de raciocínio envolvidos na com-

preensão dos silogismos.

Uma hipótese que poderia ser levantada aqui,

para posterior comprovação experimental, e que não foi ob-

jeto do presente trabalho, visto ser esta uma pesquisa bá-

sica, é a seguinte: a produção de sincretismos (tanto os

contraditórios quanto os complementares) constitui-se numa

prova de que os sujeitos que os produzem não atingiram aig

da o nível de desenvolvimento cognitivo que lhes permita ~

dotar um comportamento rretaproced.i.rrental. Por este motivo, ap~


sar de serem capazes de atingir um graU de descentração

quanto aos três planos de referência já mencionados, estes

indivíduos não conseguem integrar as informações entre as

duas premissas, e concentram-se principalmente no conteúdo

genérico do silogismo. Logo, não conseguem chegar à conclu

são lógica sem maiores problemas, visto que os silogismos

constituem um sistema fechado, que não pode ser desmentido

pela experiência nem pelo conhecimento empírico,e,portanto,

requer descentrações específicas 1 net~ptocedimentais, relati-

vas à sua própria natureza. Este assunto será aprofundado

no Capítulo v.
- 119 -

A produção de sincretismos deve ser vista,e~

tão como uma forma de adaptação cognitiva entre planos de

referências de natureza diversa, cujo conteúdo às vezes e -


complementar, às vezes é contraditório um em relação ao

outro. Um produto dialético da negociação diálÓgica, esta-

belecido de déntro de uma visão que coloca a linguagem co-

mo atividade cognitiva, e o discurso como um lugar onde o

conhecimento é constituído e cons-{des)-truido, devido ao

seu próprio processo de funcionamento.


- 120-

CAPÍTULO III

NOTAS

(l)o Termo ".6audâve.t" é aqui empregado por antitese,basea-


do em ~VATZLAWICK et al·. (1973), os quais propõem como

provável explicação para a esquizofrenia a impossibili-

dade que o doente apresentâ para desfazer paradoxos e

contradições presentes nas comunicações de outras pes -

soas.
- 121-

CAPÍTULO IV

O USO DE MODALIDADES

PARTE I

Introdução

Outros dados epilingüísticos produzidos pe-

los sujeitos deste estudo foram as modalidades lingüísti-

cas.

Essas modalidades, que nao existiam nos silo

gismos originais, fOrneciam alguns indícios sobre corno o

sujeito que as utilizava estava interpretando o significa-

do das premissas.

Como exe@plo, preliminarmente cito aqui um

sujeito do Grupo I, Exoerimental, que justificou o silogi~

mo n9 1 da seguinte maneira:
11
•• • .6Õ quem malta. na. c.ldade. que. pode. pe.<Sc.á no

!tio Tagu.ã".

A ocorrência de pode, que nao existia no si-

logismo original, demonstra que o sujeito está modalizando

o conteúdo inicial do silogismo.

O que são essas modalidades, e qual a sua

relação, nesta situação específica, com o raciocínio dos a

dultos não-alfabetizados que as produziram?

~ o que pretendo investigar neste capítulo .

Para tanto, inicialmente farei uma breve introdução do con

ceito de modalidade, e, a seguir, passarei a expor os fa-

tos pertinentes relativos à produção de modalidades pelos


- 122 -

sujeitos aqui estudados.

PARTE II

Modalidades: referencial teórico

Tradicionalmente, o estudo das modalidades

tem-se preocupado com as idéias de po~~1biiidade. e necehhi

dade., as quais, por sua vez, relacionam-se com os concei-

tos de p~opo~içõe~ hintêtieah (aquelas que sao contigente-

mente verdadeiras) e anal1tica~ (aquelas que são verdadei-

ras em todos os mundos possíveis). As sintéticas estão re-

lacionadas à po44ibiiidade., enquanto que as analíticas re-

ferem-se à ne.ce.hhidade. do evento ou estado de coisas des-

crito pelas proposições.

A formalização da necessidade e da possibili

dade envolve três tipos de modalidades: a a.ié:tic.a, a e.p-L6-


têm.<..ea e a de.ôntiC.a, as quais passo a estudar a seguir.
Os predicados aléticos formam o chamado"quaE_

teto ontológico", que contém as•quatro modalidades tradi-

cionais, ou aristotélicas: "ne.c.e.-:S<Sâtr..io", "po.6.6Zve.-t", " im7


po.6.6Zve.-t" e "c.ontinge.nte.". Esses quatro modos constituem

os predicados típicos com os quais a lÓgica modal opera. o

"ne.c.e..6.6âtio'' é convencionado pelo símbolo" O " e o "po.6.6!:_

ve...t" pelo simbolo "(/ "


O termo a.têtic.o vem do étimo grego que signi

fica "ve.tr..dade.". As proposiçÕes aleticamente necessárias sao

também verdades necessárias, isto é, são verdadeiras em

todos os mundos possíveis. As proposições aleticamente po~

síveis não são necessariamente falsas.

Segundo PIAGET (1976), o conceito clássico ,


- 123-

aristotélico de po~~zvel apresenta uma ambigüidade, visto

que 11
••• dan& une. dé.ó.<.n.Lt-<.on du poJ...&i..b.te., ia. po&&i.b)J.Ltê.
e.&t dLtd:ingué. de. la ne.c.e.&&.ité., e.t de. i' 1rnpo.6&ib.ili...tê., .ta.ndi.6
que. da.n& .t'a.ut4e. dé.óin1tlon .te ne.ce&&a.ine e&t dlt .tu.<. mM&l
po&&ib.te; .te nec.e&&a.lne et .te po&&ib.te n'y &on.t mu.tue.t.te-
men.t exc..tu&16&". (op. cit., p.SS).
Corno conseqüência, pode-se afirmar que as
proposições aleticamente possíveis não são necessariamente

falsas, e que, sendo assim, existe a seguinte relação de

implicação entre o necessário e o possível:

Os exemplos abaixo mostram essa relação de

implicação:

venha"
(?J"t pol.l.6Zve.t; e poJttan.to nece&&ãn-i.a,· que ele
venha".

Em usos da linguagem natural, o segundo exem

plo pode ser considerado aceitável, dependendo do contexto.

No entanto, em termos lógicos, a inaceitabi-

lidade nao e determinada pelo contexto de uso, mas pela ~e

g4a da implicação entre o necessário e o possível.Temos as

sim que, na lÓgica, a regra antecede e constitui os fatos

do sistema, e esses fatos não correspondem a fatos reais ;

são, antes, determinados dentro de um sistema formalizador

(ou lÓgico) .

~ exatamente nesse ponto que está a impossi-

bilidade de aplicação do sistema lÓgico ao estudo da lín-

gua natural: por sua própria natureza formalizadora,não e-


- 124 -

o sistema mais adequado para explicar os fatos da língua


natural, uma vez que, na lógica, o sistema pré-existe aos

fatos, e é ele que os constrói.

A modalidade eoistêmica, "de.al-6 wUh the. f.egiE:_

a.l l:.:tJLuctu.Jte. o& l:.ta..te.me.ntl:. whic.h a.6.6e.Jtt olt imp.ty that a


k.nawn

OIL be.Ue.ve.d" (LYONS, 1977, p. 793). Incluem-se aí as atitu

des proposicionais lexicali zadás como "l:. ab e.tt, "ac.1U!.dLtaJL "

"du.vlda.Jt". Todas essas palavras denotam, em maior ou menor


escala, o grau de comprometimento do falante com a verdade

da proposição expressa.

Com relação ao possível e ao necessário, e


importante marcar aqui que nao existe, dentro da modalida-

de epistêmica, a mesma relação de implicação que há nas a-

léticas.

PARRET (1976) afirma a respeito que "Le


.6 en.6 u.6 ue..t de. POSSI BLE dai1.6 .te .tang ue..6 ncU: utte.t.te.6 n' e.6t
paó a.l.êthlque maü epüté:mique (POSSIBLE oppoõê ã: CERTAIN

p.tutô:t qe.'ã NECESSAIRE}. PouJt:tan:t, J. . .t 1J a de...t. Jta .Cson.t. pouJt


ne paJ 1dent16-f-eit PROBABLE et POSSIBLE õu!t .l.'axe ep.ú.têmlque
qu.<. ga.ttde.. a..-i.n-61 .t.a. t.l!...{_va.te.n.c.e..:
(16) CERTAIN (p) ~(au molnó) PROBABLE

(p) ~(au ma-Lnõ) POSSTBLE(p)".

( op. c i t. , p. 55) .

Os exemplos abaixo ilustram essa relação de

implicação:

"E c.e.Jt.to, e poJtta.nto pttovãve...t (po.t..6Zve..t) que.


e..te. ve.n.ha".
"t pttovâve...t, e poJtta.nto po.t..6Zve..t,que. e..te. ve.-
nha.".
?"'t p!Lovâve.t, e pottta.nto c.e.Jtto, que. e..te. ve.~tha."
- 125-

?''E poAAZvel, e pon~an~o Qe.nto,que. ele venha''


?''E po6&Zve.l, e pontanto pnovivel,que ele ve.-
nha."

Ao contrário das modalidades alética e epis-

têmica, que se relacionam com o valor verdade das proposi

çoes, a deôntica está relacionada com a necessidade ou po~

sibilidade de atos realizados por agentes moralmente res-

pensáveis. Sendo assim, a modalidade deôntica abrange urna

escala que inclui a obn~ga~ão, a penmJ&&ão, a pnoJbição e


a ill e.nção. Algumas lexicalizações desta modalidade são: "c.e.Jt

to"·, 11
e.Jl.lt.a.do", "-Lfe.ga.l", "impnÕpn..Lo", "-Lmona.l" "-i.nJ.u&.to"
' '
etc.
KALINOWSKI (1976) coloca que existe urna rela

çao de analogia entre as modalidades aléticas e as deôni -

cas, a qual, segundo o autor, já fora mencionada porLE~Z.

Ainda segundo KALINOWSKI, as modalidades

deônticas também podem ser submetidas ao cálculo proposi-

cional, e, deste modo, deixar-se-ia de atribuir às modali-

dades deônticas o sentido da lógica das normas, em virtude

do fato de que, também com as deônticas é possível que "on.

pa.ó:6e. de..ó n.olt.me.h e.n.once.e.h e.n langa.ge. - obje.:t au.x


óoJr.mu.lêe.h e.n mé'::ta..ta.nga.ge." (op. cit., p. 18).
Segundo a proposta do autor, as funções tÍpi

cas da lÓgica deôntica, como "OA"(que significa"~ ê obJt.i-


ga.:tÔILio"), ou. J/Pp" ("é pVLmi.:ti..do que p") continuariam a

ser usadas, somente que deixariam de pertencer à linguagem

objeto, e passariam a ser usadas como operadores lógicos ,

que pertencem a uma rnetalinguagem. Diz o Autor:

"Va.n.ó ce.:t:te. pellpe.c:tlve. une óo}[.mu..te. comrne:


(4) S~ OA a!o~• PA
.6 1
-in:te.!Lpllé:ta.nt: "Si le. !é':g1.óta.ull a ê.dle:tê. une. nollme. valide.
- 126 -

he.lon laqu.e.lle. A e~X obl~gatoi4e., alo!L~ !e têgil>late.u4 a


édi..c.tê. u11e. noltme. valide. .õe.lon laqu.e.lte. A e.õte pvr.m,{.õ" peu..t
ê.tJte .te.nue. pou.Jt une loi {.thê.õe) .tog.ique e..t.

151 OA
Vottc PA
pou.Jt." u.n .&c.htme. logique. d'-l.n&êne.nc.e." (op.cit., p.l7).

Deste modo, a chamada ''lÓgica das normas "po-

de ser substituÍda por uma lógica deôntica, cujos argumen-

tos seriam as próprias normas.

GREIMAS (1976) também compara as modalidades

deônticas (que ele denomina "moda.ti...t'é..õ du fialJte.") com as


11
idéias (ou modaLLté.6 de. l'ê.tJte."). Diz o autor a respeito:
"La c.ompall.L6on de;., modal-L.tê.6 dê.on.tJ..qu.e.t> e..t
a..t'é-th.ique..6 e..&.t .õugge..6Li.ve.: a.tOJt.6 que. .te.u.Jt.6

dênominat.ion.6 te.nde.nt ã le..õ .õêpa!te.Jt e.t a


le.6 fia-i.Jt.e. c.ont..ide.ne.Jt c.omme. de..6 mod.a.LL6ation1
d.i.6t.inc.te..6, le.aJt.6 dé6inition4 .õyntax~que..õ

le4 nappnoche.nt: le.õ p~êdica~.õ modaux êtant


dan.6, -te4 deu.x c.a.õ -Lde.nt.i..que..õ, .6 eu.te .ta. na.t.!:!;
ne. de..6 êno11c.ê4 moda..ti-6 ê4 ( ênoncê.õ de. Da-i.ne.

on ênonc.ê-6 d'êtat.l ie.-6 d-i..õt.ingue." (op. cit.,

p.98).

O estudo da modalidade tem sido objeto prin-

cipalmente de três disciplinas: a LÓgica, q Lingüística, e

a Semiótica. Existe ainda uma tendência a nao separar as

três, mas antes a integrar os resultados de suas indaga-

çoes. Como bem se expressa DARRAULT a respeito 11


••• Van.õ .te.

doma-i.ne. de. .te..õ modai.i..tê.õ, ii n'e..õt p.tu.õ gu.êne po-6.6-i.ó.te d'


imagine.n de. .õoiution .õ.t/t..{cte.me.nt monod.üc.i.pLi.na.i.JLe." (1976,

p.3). O autor chama ainda a atenção para o fato de que, ao


127 -

lado das três abordagens acima,"u.l1 nornbJt.e. de. p.tu-6 em p.tu1.1

b!e~" {p.3)

A abordagem LÓgica da modalidade tem por ob-

jetivo a 6otLma.ilzaç.ão "libe.ILée. de .ta. C.Of'ltinge.nc.e. de..6 dê.no-

mina.tion.ó e.mpnuntê.e..6 a te.l.te ou te.tie. .tangue. na.tune.Lte."


(DARRAULT, op.cit., p.4) dos chamados conceitos modais :

"ne.c.e..ó.6â.Jtio", "po.&.61ve.i", etc..


Segundo KALINOWSKI (op. cit.) o interesse
principal dos lÓgicos está voltado para a modalidade aléti

ca, e sua preocupaçao fundamental é estabelecer uma meta-

linguagem para o estudo da mesma através do cálculo dos


predicados. Assim, é do domínio da LÓgica a utilização de

fórmulas do tipo

Exist?m algumas críticas relativas à aborda-


gem estritamente lÓgica das modalidades. A principal delas
refere-se ao seu caráter reducionista. GUIMARÃES(l979)afir
ma, por exemplo, que, do seu ponto de vista, "a lÕgJ.c.a e
vJ.~~a como uma ne.dução óe.J.~a a pan~J.n da~ e.~tnutuna~ da
linguagem natuna.t. Ve.~~a 6onma (p~o~~e.gue. o Autonl c.an~J.de

~t.a-~e. que a~ ne.faç_Õe.~ puname.11te. fóg.ic.a~ não ~ão ~u6.ic..ie11 -

te.~ paJLa e.xplJ.c.aJt o~ 6e.nômeno~ da tinguage.m natunal". (op.


11 • 1 •
cit. ,p.39), e, .1-
e~pe.c.-<.n-<.Came.n-t..e, ( ..• } pana expfic.an
lt.e..iaçõ e.~ en..tJLe a~ mo dali da de~ na Unguagem na..tuJt.af 11 (id.

ibid., p.40). Para comprovar essas afirmativas, o Autor


mostra que as relações expressas pelo quadrado lÓgico con-
seguem explicar porque a oraçao abaixo é inaceitável:
" (?) ~ c.e.JL..to, ma~ impltovâve..t que e..fe v-i.Jtâ.".
mas não conseguem explicar porque a oração seguinte é tam-
- 128 -

bém inaceitável:
"(?) E c.e4to e {po~tanto) p~ouive.l que. ele
viJtâ".

Como alternativa, o Autor propoe ":tJta:taJt a.&


modalJ.za.ç.Õe.-6 como -tendo uma oJtJ..en:ta.ç.ão a.Jtgume..n.tativa"(op.
cit., p.43).
Quanto à abordagem L[ngüZ.õ:U.c.a ao estudo das

modalidades, DARRAULT (op.cit.) contrasta-a como a lógica

nos seguintes termos:

"Si .ta log-Lque. -6'e.66ottc.e.. avant: :tout:(e.Jt po.6ant


une. oJtganiza:tion 6oJtme.lle.. de...6 c.onc.e.p:t.6 mo-
da.u.x, :te..l-6 que. .te. "ne..c.e.:.&.6aine..", le. "po.6.6-i -
b.te.", .te "c.ont.inge..n:t", et:c)de .6e. L[bé.tte.tc. du

.tingu.i.6:tique., .6au.6 pe..lne.. de. .&e vo11L a.c.c.u-5eJt

drê..tiLe "be..a.uc.oup ;t1wp a.J.J.6uje.:ttie.. a.ux a.c.c.i -


de.n:t.6 du langa.ge..", c.'e.6t: .te c.on.tJte..::.p,(.e.d de.
·c.e.:t.te.. atitude. qu1 p11..e.nd .te lJ..ngu1.6L[que. qui,
pouJt·Jte.pJte..ndJte. le..& te.Jtme...6 de. B.POTTIER ici-
même., "e..tJ.t oblJ.gé de. .te.nJ.tr. comp.te. de.6 .tJJ.gne.-6
e.mp.toyé.ó, e..t de. JOh.oc.e.de.Jt d'abotr.d li .te.utr. ana

.ty.tJe." ••• " (p.4).

O Autor acrescenta ainda, especificamente a

respeito da modalidade lingüística, que esta " ... ptr.e.nd e.n


comp.te. l'aJtbi.tnaiJte. du .tJigne. e..t, dan-6 l'analq.tJe. de..6 moda!~

.té.ó !exicaf.i.6ée.6 de .te.lle. ou .te.lle. langue. na.tutr.e.lle.{ patr.


exempl.e., e.n 6-tanç.ai-6, f.e-6 ve.Jtbe-6 pouvoiJt, vouloLt, de.voitt,
.tJavoLt), .6e he.uJt.te. dane. ã: inê.vLtabf.e..ó p-tob.e.ê.me.-6 de. poly.tJê.-
m-Le." (p.4).
O estudo lingüístico das modalidades,portan-

to, tem por objetivo a ocorrência de lexicalizações modali

zadoras, isto é, de palavras que expressem, ao nível da


- 129-

_linguagem objeto, as idéias de "ne.c.e.ótJ.ida.de." ,etc, existen-

tes na rnetalinguagern da lógica. Estamos aqui, obviamente ,


no campo da polissemia, visto que .a ambigüidade e fator

freqüentemente presente em enunciados modalizados,como em:

"E.te pode. vLt",


que apresenta uma leitura deõntica ( "peJr.m-i.-6.6 ão") e uma lei tu

ra epistêmica{"pJtouãve..t"); ou ainda em:


"Ele. deve v.iJt".
O enunciado acima,segundo GUIMARÃES(op.cit.,p.33) ,pode ser

parafraseado por

"E ne.c..e.;.,J.JãJL.io que. e.R..e. venha"

"E..te. -tem obJt.igaç.ão de. v.in"


"E pa.64lve.l que ele venha''
"E plt.ouãve.l que. e.le. venha"
"t ceJt-to qu.e. ele v.ittâ"
Como se depreende, as múltiplas leituras de

deve no enunciado acima i~cluem sentidos aléticos, epistê-

rnicos e deônticos.Esta é a característica básica da expre~

são da modalidade lingüística.

Quando se trata,então, das lingUagens natu -

rias, a abordagem estritamente lÓgica das modalidades tor-

na-se insuficiente, e fica claro que é necessária uma abor

dagem pluridisciplinar. Com relação ao caráter polissêmico

das modalidades linqüísticas, outro ponto parece estar cl~

ro: a plena interpretação dos enunciados ambíguos modaliz~

dos só será atingida de um ponto de vista"p!Lagmátic..o", que

leve em conta, além do nível lingüístico ".õt.lLictu


(i.e.,o' estudo do enunciado do ponto de vista da sintaxe e

da semântica) ,também o nível da enunciação, e dos fatores

significativos do contexto que devem e podem ser levados em

conta para a interpretação de ocorrências de modalidades.

A própria natureza dos dados colhidos neste

trabalho impõe um tipo de análise que escapa à análise pu-


- 130-

rarnente formal dos enunciados modalizados. Com efeito,con-

forme ficou exposto no capitulo anterior, devem ser toma-

dos corno fatores constitutivos do ·sentido dos enunciados

produzidos pelos adultos aqui estudados, além de seu conhe


cimento lingüístico, também a interação entre elementos do

contexto mediata e imediatamente relevantes para a produ -

çao discursiva. são estes elementos os quadros de referên-

cia citados no capítulo anteri?r: o silogismo e seu conteú

do; o conhecimento·lingüístico, factual e do.mundo dos a-

dultos não-alfabetizados; e a situação de testagem, que

permite que determinados significados emerjam, tendo em

vista a atividade dialógica, de negociação e construção de

sentido que ali se processa.

PARRET (op. cit.), levando em consideração os

fatos acima, propõe uma abordagem das·modalidades do ponto

de vista pnagmâXlc.o, e esclarece:

"Comme pJt.agrpa:tlque, c.e:t:te. app:r..oc.he. ·.õe dl.õ:tln

que de. :tou:te .õêmantlqu.e de..6 modailtê.õ.L'obJet

eon.6tJt.ult en pJt.agmatlque e.6t ie 6Jt.agment


llngul.6tlque dan.6 J.ion c.on.te.x:te.;,.

Continuando a discussão, PARRET ten~a delimi

tara noçao de c.ontextb, e acrescenta que a abordagem pra~

mâtica proposta por ele não deve ser identificada com a pra_s:
mática lÓgica,de MO~TAGUE,por exernplo,urna vez que o conceito

de CJJ n:te.xto nessa Última teoria é formalizado ao extremo, o


11
que transforma a pragmática em um Jt.amo da .6e.mân:tlc.a".
A abordagem pragmática proposta por PARRET

leva em conta fatores tais como: a estrutura profunda dos

enunciados, as máximas conversacionais griceanas, a inten-

cionalidade do locutor, seu grau de certeza com relação ao

enunciado e aos fatos expressos por ele, etc. PARRET prqXe


- 131-

inclusive q~e o que ele chama de 11


-ta. c. o ntexA:u.a..ti..tê 1 a.c.-t-i. o -
ne.t.te'" (p.S2) seja alargada, no caso das modalidades. As-
sim afirma o autor:
"I.t ne. .6e.Jt.a. pa.b di66i..c.i.te d'êla.JLg.iJt c.e c.ha.mp
de 6ac.te.uJLb p!La.gmatiqu.e.-6 domiuant .ta dibtJL.i
bu.i..t..Lon de.& 6oJtme.& gJta.ma-t-Lc.a.te..& de.-6 moda.ux,
e.n ..Lnc.o!Lpona.nt, pan example.; le.-6 htJtatêgie.-6
de pat~teõõe lcfi.R. LAKOFF,l972)et te •~t

.6oc.-i.o-pe.n:)'anma.-t.i6 de.ll .toc.ute.uJt.6" {p. 52).

~ dentro desta visão pragmática ampla que se

rã situada a discussão das modalidades produzidas pelos su

jeitos da presente pesquisa.

As categorias utilizadas para classificar as

modalidades produzidas pelos sujeitos desta pesquisa foram

as categorias tradicionais: alética, epistêmica e deôntica.

Os critérios utilizados para a classificação foram os se-

guintes:

19 - Foram classificados como aiêXiQa~ as

ocorrências de modalidades que podiam ser interpretadas co

mo contendo uma avaliação sobre as condições de verdade do

fato expresso pelas proposições contidas nos silogismos.As

sim, as pioduções modalizadas dos sujeitos eram considera-

das aléticas quando exprimiam a n~~~~~idad~; e podiam ser

interpretadas como uma avaliação, por parte do sujeito, de

que o fato expresso era considerado verdadêiro em todos os

mundos possiveis; quando exprimiam a po~~~b~i~dad~, ou se-

ja, quando podiam ser interpretadas como sendo uma avalia-

ção de que o fato expresso era verdadeiro em pelo menos um

mundo possivel; quando exprimiam a {mpo~~ibilidade(fato in

terpretado como sendo falso em todos os mundos possíveis),

e quando exprimiam a eonting~neia(fatos considerados pelo


- 132-

sujeito não· necessariamente verdadeiros em todos os mundos

possíveis).

29 - As epi~têm1ea~ foram assim classifica-

das quando a construção modalizada continha urna avaliação

do conhecimento do falante sobre o fato. Assim, distingue~

-se das aléticas na medida em que não é mais o fato em si

que é colocado em questão, mas a enença pe~~aal do falante

acerca dos estados de coisas expressos pelos silogismos.As

epistêmicas, portanto, exprimem aquilo que o sujeito pensa

que o fato é.
39 - As deântiea~ também se referem ao conhe

cimento do locutor, do ponto de vista do conteúdo proposi-

cional estar de acordo (ou não) com as normas, jurídicas ,

etc., de que ele, locutor, tem conhecimento.Deste rnodo,es-

te foi o critério de classificação das deônticas.

Por se tratar de uma classificação de rnodali

dades lexicalizadas, as ocorrências de polissemia foràm i-

nevitáveis. Neste caso, a fim de interpretar o sentido pr~

dominante, foram usados os critérios de inte.rpretação aci-

ma.

O poden, por exemplo, era classificado como

de.Õ~ieo quando o contexto colocava um quadro social de

obrigações, deveres,etc. Por exemplo, na justificativa da-

da ao silogismo n9 1 (Grupo I - experimental) , um dos su-

jeitos disse:

"Ponque., pe.ia. pe.ngu~a que. a .6e.nhoJta me. óe.z,


.&o que.m moJta na c.idade. que. pode. pe..6c.a. no
llio Taguá".

A ocorrência de pode. foi classificada como

de.ônt;c.a. e não atét;ca, devido ao fatO de ter sido inter -


pretada como sendo a expressão de pe.Jtm.L.6.6âo para pescar,d~
- 133 -

da pelo grupo social formado pelos que moram na cidade.

Outras ocorrências de poden (ou suas paráfr~

ses) foram classificadas como alê~lea~, quando exprimiam

uma avaliação do fato expresso, em termos de sua possibili

dade, impossibilidade, contingência ou necessidade, e a re

lação com o conceito de mundos possíveis. Por exemplo, na

justificativa dada ao silogismo n9 2, o mesmo sujeito do e

xemplo anterior disse:

n ... ~odo4 que eu vejo, que anda de. mo~oeicle

ta, tem o capaeete.Multo4 talvez não tenha


opofLtunldade. de. u.6â.-lo".

No exemplo acima, a perífrase "te.4 opo!ttunJ..-

dade." é equivalente ao modal pode.:tr.., que, nesse. caso, foi

classificado como alético, urna vez que exprime a impossibi

lidade. ·

Nos casos em que o uso de pode4 exibia uma

ambigüidade entre o.po~~Zve! {alético) e o p~ovãve!( epis-

têmico) , então a decisão era tomada em favor do provável ,

visto que o possível não pode ser graduado (ou seja,não e-

xiste um fato que seja mais ou menos possível, no sentido

lÓgico; esse possível é, na realidade, o provável epistêmi

co). A própria ambigüidade é indicadora da graduação, por

isso nos casos ambíguos optei pela classificação epistêmi-

ca. Por exemplo, na resposta dada ao silogismo n? 8 (Grupo

I, experimental), um sujeito disse:

"Bom, eu néio :tô vendo c-<.dade aqu...t. E.ta pode


te~ vi~to alguma i.tha ... a.tgu.ma~ ... como 6afa?
Montanha! SÕ -Ü~o".

A ocorrêncLa de pode no exemplo acima foi

classificada como epistêmica, visto que, por ser graduá -


- 134-

vel, exprime a probabilidade, e nao a possibilidade. Um

uso de pode que foi classificado corno exprimindo a possibi

lidade, logo, como alético, é o seguinte {Grupo II -contra

le- silogismo n9 4, justificativa):

Após dar uma resposta negativa,(e portanto

errada) à pergunta relativa à conclusão do silogismo,um su

jeito justificou-se assim:


''Po~que., po~que o cola~ num ...
num pode. tê: {pe..dJta-6 pnec.ia.6a.6 J ".

Essa ocorrência, por nao apresentar ambigüi-

dade entre a possibilidade e a probabilidade, foi classifi

cada corno sendo alética.


Além desse critério para resolver dúvidas em
casos ambÍguos entre epistêmicas e aléticas, foi ainda a-

plicado·a teste do "muito bem". Essa locução pode ser usa-


da com o poden das epistêmicas, mas fica inaceitável com

as aléticas, confor~e, respectivamente:

" ••• e.ta pode muLto bem :teJt VÁ..!J:to a.tguma ilha"

e
( 'I
. " • • •o co.taJt ~um pode muJ..:to bem :tê{pedJta!J plte-

cJ..o.6 a!J) ".

Outro teste realizado foi com os advérbios

"nunc.a" e ".6empJte", que podem ser usados com as modalida-

des aléticas, mas não podem com as epistêmicas.

Em linhas gerais, ~stes foram os critérios u

tilizados. Houve casos, no entanto, em que o contexto nao


- outra.Es
era suficiente para privilegiar uma leitura e nao

tes foram classificados à parte, como sendo casos de poli~

semia não resolvida, e também foram quantificados separada

mente.Abaixo, um exemplo de emprego polissêmico não resol-


- 135-

vido de modalidade:
"Ah, po!Lque. pe..6c.a no tr..io Taguá,ac.ho que. nao

pode. mo!Lá na cidade, nê? ... Pode. mona na be.i


Jta do Jtio, nê?"

As duas ocorrências supra de pode. nao pude -

ram ser interpretadas, principalmente devido à falta de

oon~o • O número de ocorrências polissêmicas não resolvi-

das, no entanto, foi bastante baixo, conforme mostra a Ta-


bela I (7,0% para o Grupo I; nenhuma para o Grupo II), nao
chegando a interferir nos dados.

PARTE III

Apresentação dos dados e discussão

Apresentarei aqui alguns dados numéricos


(percentuais) que servirão para aprofundar melhor a análi-

se sobre o significado do uso das modalidades por estes a-

dultOs não-alfabetizados. Optei, ~al como no capítulo ant~

rior, pelo uso do cálculo de porcentagem, pelos seguintes

motivos: Em primeiro lugar, porque, corno a porcentagem nao

implica em nenhuma inferência, não corro o risco de ver

meus resultados generalizados para amostras maiores,ou mes

mo para todo o universo da população não-alfabetizada bra-

sileira, fato que não entrn em minhas especulações ou ambi

ções de trabalhadora intelectual. Em segundo lugar,devo di

zer que o cálculo percentual fica ainda bastante preso aos

valores numéricos originais, o que me permite focalizar n~

ma mesma tabela aqueles dados que, mesmo não sendo prova -

velmente relevantes em uma análise estatística rigorosa,

são, no entanto, cruciais para uma discussão qualitativa ,


- 136 -

como a que estou realizando nesta tese.


Devo esclarecer ainda que nos dados quantifi

cados a seguir não estão todas as modalidades produzidas

pelos sujeitos. Foram consideradas apenas as modalizações

que ocorreram durante as três etapas da testâgern de compr~

ensão dos silOgismos (isto é, durante a Resposta, a Justi-

ficativa e a Conclusão). Isto se deve ao fato de ser nes-

ses momentos especÍficos que o conteúdo dos silogismos es-

tá em ~ogo, o que caracteriza os dados como epilingüisti -

cos. Houve outros momentos em que os sujeitos rnodalizaram:


durante a apresentação das gravuras, para os grupos experi

mentais, por exemplo. Outros sujeitos intercalavam relatos

de experiências pessoais, recordações de fatos, etc.,e pr~

duziam modalidades também nesses momentos, mas, por fugi-

rem ao objetivo estrito desta tese, esses dados nao - foram

considerados aqui.

A - Freqüência de uso das modalidades


Tabela 1 - Freqüência relativa de uso das modalidades nos Grupos I e II

G R U P O I G R U P O II

DADOS PERCENTUAIS RE- DADOS PERCENTUAIS RELATI DADOS PERCENTUAIS RELATI DADOS PERCENTUAIS RELATIVOS
LATIVOS AO TOTAL GERAL VOS AOS TOTAIS PARCIAIS VOS AO TOTAL GERAL AOS TOTAIS PARCIAIS(C= 26 ;
(57) (C=33; E= 24) (54) E= 28)

AL EP D FOL T AL EP D POL AL EP D POL T AL EP D POL

(9) (22) (IJ) (2) (33) (9I (22) (IJ) (2 I ( 6) ( 18) (2 I (!9 I (26) ( 6) ( 18) (2) ()Õ)
c 15,7 38,6 )9 3,5 57,8 27,2 66,6 )9 6,0 11,1 33,3 3,7 )9 48,1 23,0 69,2 7,6 )9
(9)(11) (2) (2) (24) (9I (ll) (2) (2J ( 71, ( 21) 1'~1 (~ J l2ti J l7J l21) ()9) (iJ)
E 15,7 19,3 3,5 3,5 42,1 37,5 45,8 8,3 8~3 12,9 38,8 0 )9 51,8 2 51 Q 75,0 iJ fã
(18) (33) (2) (4) (57) (13) ( 3 9) ( 2) (fã) (54)
T 31,5 57,8 3,5 7,0 99,9 24,0 72,2 3,7 fã 99,9
L__ -- - -- --

OBS: Os números entre parênteses indicam as freqüências absolutas.

Legenda: C= CONTROLE
E= EXPERIMENTAL
AL= ALllTICO
EP= EPISTJ':MICO
D= DEilNTICO
POL= POLISS~MICO
....w
fã= ZERO -.!
I
- 138-

Os percentuais da Tabela 1 indicam que o Gr~

po I produziu um total de 57 modalidades, sendo 33 epistê-

rnicas (57 ,8%), 18 aléticas (31,5%) e 2 deônticas (3,5%) .Ho~

ve ainda 4 Ocorrências polissêmicas não resolvidas {7,0%).

Para o Grupo II, de um total de 54 modalidades, temos 39 e

pistêrnicas (72,2%), 13 aléticas (24,0%) e duas deônticas

(3,7%). Nos dois grupos, portanto, foi privilegiado o uso

de modalidades epistêmicas, em seguida as aléticas e por

Último as deônticas. Como se recorda, os Grupos I e II di-

feriam quanto ao fato de o primeiro conter premissas maio-

res normativas, e o segundo conter premissas maiores des -

critivas. Os resultados da Tabela 1 indicam que a diferen-

ça do conte~do entre as premissas dos dois grupos nao in-

terfere nos percentuais acima: as epistêmicas são privile-

giadas, seguidas pelas aléticas, e a ocorrência de deônti-

cas é quase nula.

B - Freqüência de uso das modalidades e variação na

situação experimental

Ainda consultando a Tabela 1, pode-se verifi

car que oS percentuais, para os Grupos I e II, de acordo

com a variação na situação experimental {isto é: grupo cog


trole - testado sem gravuras; grupo experimental - testado

com gravura) são: no Grupo I, 57,8% para o ·grupo controle

e 42.1% para o experimental; e no Grupo II, 48,1% para o

controle e 51,8% para o experimental. Esses resultados de

quase equilíbrio percentual entre os grupos controle e ex-

perimental indicam que o uso ou não da gravura não teve in

terferência marcante na freqüência de-produção de modalida

des.Parece,portanto,que o uso de modalidades pelos sujeitos


- 139 -

independe da variação na situação experimental.

Tabela 2- Freqüência de silogismos modalizados(I(n=l3);II

(n~9) )

GRUPO GRUPO
I II

(11) (7)
c 84,6 77,7
(11) (9)
E 84,6 100,0

Os dados acima sao confirmados em parte pela


Tabela 2, que mostra que o número de silogismos modaliza -
dos não se altera muito, quer quando se considera o conteú
do normativo ou descritivo das premissas maiores,quer qu~

do se observa a: interferência do uso das gravuras.Esses d~

dos,. então, parecem. confirmar que existe, nestes sujeitos,

uma tendência para modalizar que é generalizada.

C - Tipo de modalidade produzida e variação na si-

tuação experimental

Com relação ao tipo de modalidade produzida,

temos os seguintes percentuais; ainda de acordo com a Tabe

la 1:

Controle: epistêmicas: 66,6%

aléticas: 27,2%
deônticas:
- 140 -

Experimental: epistêmicas: 45,8%

aléticas: 37,5%

deônticas: 8,3%

Grupo I I

controle: epistêmicas: 69,2%

aléticas: 23,0%

deônticas: 7,6%

Experimental: epistêmicas: 75,0%

aléticas: 25,0%

deônticas: ~

Em síntese, esses dados apontam para o se-

guinte fato. :existe uma tendência generalizada, por parte

dos sujeitos desta pesquisa, para modificar o conteúdo ori

ginal dos silogismos através do uso de modalizações.A fre-

qüência de uso destas por sua vez, indica uma preferência,

por parte do sujeito, para a modalidade epistêmica, que -


e

a privilegiada em todas as situações experimentais,seguida

pela alética, e, em quantidade bastante baixa, pela deônt~

cas. Com relação à variação na situação experimental os d~

dos· da Tabela 1 indicam ainda que o grupo experimental pr~

vilegia o uso das modalidades epistênicas q~ando as premi~

sas maiores são descritivas (75% de ocorrências para o Gru

po II e 45,8% para o Grupo I).

Examinarei, a seguir, qual a relação existen

te entre esses dados numéricos, e a natureza de cada urna

das três modalidades.

Ocorrências de modalidades epistêmicas

Alguns exemplos de ocorrências de modalida -

des epistêmicas são os seguintes:


- 141-

1 - "Eu acho que ela toma.;4e. :tadol.l toma .te-<. ~

.te.,e.la tambê.m toma" (Resposta dada ao si


legismo n9 3 - Grupo I - Experimental) .

2 - "E.te. {o Plx.o.te.) deve .óeJt. c..ac.hoJt!Lo de. Jta-


ç.a."(Justificativa- sil. n9 5 - Grupo I-

Controle).

3 - "Tem, poJtque. eu a.c..ho que. ela tambê.m, ne, -


c..io.óct.ó, nê., no c..o.ta.Jt de..ta;_e.ntão e.u acha
que. .te.m" (Justificativa sil. n9 4 Gru-

po I I - Controle) .

4- "Ah; e.u não .6e.1, já pal.ll.lou; 6ol e.mboJta".


(Repetição - sil. n9 9 - Grupo II - Exp~

riniental) .

Como se percebe pelos exemplos acima, o uso

da modalidade epistêmica Por estes sujeitos estabelece um

vínculo entre eles (sujeitos)e seu enunciado, o qual col~

ca em pauta o comprometimento que o falante assume com a

verdade dos fatos expressos pelas proposições contidas nos

silogismos (no caso dos exemplos 1,2 e 3)ou então·com o

conhecimento (ou ausência dele) desses fatos (caso do e-

xemplo 4 acima) .

LYONS(op.cit.) fala em modalidades epistêmi

cas objetivas e subjetivas. Nas objetivas, o falante ex -

pressa seu comprometimento com a factualidade da assevera

ção. :t: .o caso, aqui, do exemplo n9 2 em que o sujei to eX-

prime sua dúvida sobre o cachorro ser de raça. Nas subje-

tivas,o falante coloca um estado de dúvida relacionado a

sua crença pessoal na informação. Os exemplos 1 e 3 ilus-

tram essa postura epistêmica subjetiva. Deixo o exemplo 4


- 142 -

para discutir mais abaixo.

Retomo,aqui, o esquema teórico utiliZado no

capítulo anterior para explicar os sincretismos produzidos

pelos sujeitos deste estudo. Conforme ficou claro, do pon-

to de vista de uma abordagem interacionista · estão em jo-

go, e coexistem (havendo predomínio ora de um, ora de ou -

tro}, três planos de referência na situação específica em

que esses sujeitos foram testados, a saber:

1 - O plano de referência formado pelo con -

teúdo dos silogismos;

2 - O plano de referência formado pelo conh~

cimento pessoal (factual e experiencia -

do) dos sujeitos;

3 - O plano.de referência da situação dialÓ-

gica formada pela interação entre o su-

jeito e a entrevistadora, durante o qual

o significado é negociado e construido.

Esses três planos aparecem novamente aqui:


nos exemplos 1 e 3 acima, as ocorrências de acho devem ser

inseridas como indicando uma predominância do plano de re-

ferência relativo ao conhecimento pessoal do falante: suas

crenças, dúvidas e opiniões pessoais a respeito dos fatos

expressos pelas prern~ssas. No exemplo n9 2, é o plano de

referência do conteúdo proposicional do silogismo que está

sendo modalizado epistemicamente. E, finalmente, no caso


do exemplo n9 4, temos em primeiro plano, o significado e-

mergente, isto é, uma relação entre falante e enunciação ,

mais do que entre falante e enunciado. Com efeito, ao enun

ciar "e.u não .&e.i", o sujeito está pretendendo expressar que

não é capaz de preencher um lugar que é pedido a ele den -


- 143 -

tro da situação dialógica, qual seja: cumprir a tarefa de

repetir o silogismo.

O uso da modalidade epistêmica, em resurno,p~

rece mostrar uma tendência, nestes_sujeitos, para comparar

constantemerite os enunciados a que estão expostos durante

o diálogo com sua percepção pessoal da realidade,seu conh~

cimento próprio das coisas que estão sendo predicadas. A

partir daí, fazem recortes epistêmicos, conforme predomina

um ou outro plano de referência, incidindo nesses recortes,

bastante pessoais, a ocorrência da modalidade epistênica.

Nesse sentido, o uso das gravuras parece ter um papel im -

p~rtante: corno foi visto atrás, o percentual de epistêmi -

cas aumenta bastante para o Grupo II,experimental. Parece,

então, que a representação visual adquire para os sujeitos

um caráter sui generis, que inclusive funciona corno alter-

nativa ao conteúdo"c.1e.ntZó1c.o" das premissas maiores. Por

isso, talvez, os sujeitos·do grupo experimental neste caso,

conseguem realmente contextualizar aquele conteúdo com re-


lação à sua visão pessoal das coisas; daí o aumento das e-

pistêmicas. A superioridade percentual da epistêmica sobre

as aléticas e deônticas confirma a afirmativa de que a ven

dade(epistêmica) é mais forte do que a ne.c.e.~~idade.( aléti-

ca) em situações naturais de uso da língua.

Além do mais, através da modalização epistê-

mica, os sujeitos demonstram que estão procurando resolver

urna contradição que detectaram existir entre o conteúdo das

premissas dos silogismos e seu quadro de referência par-ti-

cular. O conteúdo das premissas, devido à objetificação da

realidade que tenta levar a efeito, afasta-se da realidade

factual dos sujeitos. No entanto, em alguns casos, o conh~

cimento pessoal do sujeito nega aquele conteúdo formaliza-


- 144 -

do. -Em outros casos, confirma-o .

Ocorrência de modalidades ãléticas

Como exemplos de ocorrências de modalidades

aléticas, temos:

1- "Ah, pa!Lque. o .te.ite. ê um a.lirne.n.to,nê?Tu-


do dia. a. ge.n~e. .tem que. tê ... Que.m pode.
tê, compnã, compna nê? Quem não pode.,6i-
ca ~e.m. O leite. ê um alimento bão, né?"
(Justificativa - sil. n9 3 - Grupo I-Con

trole}.

2 - "Se. e.le. 'é vaque.itr.o, .tem de. u-óa

co-U,a.6,né?" (Justificativa- sil. n9 9 -


Grupo I - Controle).

3- "Po!Lque._ê muito quente.; e.le. deve. pnocu-


JLaiL o "áJt-i.o" (Justificativa - sil. n9 2 -

Grupo II - Experimental) .

Para entender melhor a natureza da modalida-

de alética, e sua função no discurso destes sujeitos,foca-

lizemos o exemplo 1 acima, onde se observa claramente a o-

posição entre a nece~~idade alética {pelo uso de Xem que),

e a po~~~b~~idade alética (pelas duas ocorrências de pode).

Nota-se aí que a explicação para o uso da

possibilidade alética nao pode ser procurada no âmbito das

experi~ncias pessoais dos sujeitos, visto que, devido ·às

condições sócio-econômicas dos mesmos, não seria o caso de

se poder afirmar que eles podem adquirir leite na quantida

de necessária à saúde. A experiência pessoal não é, porta~

to, o fator determinante.


- 145 -

Existe, entretanto, um tipo de conhecimento

cotidiano, de cunho alético, com o qual provavelmente es-

ses sujeitos estão em contato através dos meios de comuni-

cação, corno a televisão, campanhas.de educação em saúde ,


etc. Refiro-me ao conhecimento condensado em· 11 slogans 11 do

tipo:

"Beba maL& .te.ite!"

"Le.Lte. ê bom paJLa a .!>aÚ.de.".

Apesar de nao terem a experiência vivida a

respeito do conteúdo alético subjacente a essas fÓr~ulas

pré-fabricadas de comunicação (que carregam consigo ao me~

mo tempo, implicitamente, afirmativas acerca da necessida-

de de tomar--lei te) o que se percebe é que, no mundo axioló

gico dos sujeitos,esse conteúdo alético existe, e é recupe-

rado pelos mesmos através da inserção das modalidades alé-

ticas nos silogismos.

Outro fato digno de comentário é a alternân-

cia entre a necessidade e a possibilidade a~ética, no mes-

mo exemplo. Essa al.ternância entre o r:ossivel e o necessá -

rio, aliada ao conteúdo das proposições onde eles ocorrem,

aponta para a seguinte relação: os sujeitos aceitam que é

necessário tornar leite em todos os mundos possiveis ("Tudo

{lei~e))
11
dia a gente tem que tê ;no entanto, ao lado dessa

crença, oS sujeitos têm o seu conhecimento pessoal a-res-

peito das possibilidades de comprar esse leite necessário

(" ... a que4tao i que nao pode QOmpna").


O que se verifica aí, então, é o estabeleci-

mento de um conflito entre a necessidade que os sujeitos ~

ceitam, e a possibilidade real que eles conhecem. Para re-

solver esse conflito é que os sujeitos efetuam transforrna-

çoes no silogismo original, acrescentando as modalidades a


- 146 -

léticas, qu~ nada mais sao do que as marcas de um quadro

referencial especifico, organizado pelo próprio sujeito,te~

do como base seu conhecimento sobre o que é necessário e o


que é possível. Em termos cognitivos, essas transformações

podem ser interpretadas como decorrentes da çapacidade de

descentração Çlos sujeitos, e de s.uas manobras para adaptar-

-se cognitivamente à situação de testagem,.ao mesmo tempo

em que conseguem detectar e resolver situações contraditª

rias ou conflitantes, tais corno as expostas acima para a

necessidade e a possibilidade.

Note-se, ainda pelos exemplos,que, com rela-

çao aos três planos de referência que entram em jogo no ca

so dos sincretismos e para as modalidades epistêmicas, o

mesmo nao oCorre com as aléticas, uma vez que, com exceção

de apenas uma ocorrência, todas as demais, nos dois Grupos,

estão relacionadas somente ao conteúdo dos silogismos. Os

outros dois planos de referência (isto é, o conhecimento

factual e do mundo dos sujeitos, e a situação de enuncia -

ção) não entram na modalização alé.tica. Este fato está co~

rente com a própria· natureza da modalidade alética,a qual,

por seu caráter essencialmente lógico,' tem íntima relação

com o conteúdo proposicional dos silogismos. Como tal, es-

te é o lugar apropriado por natureza para as aléticas ocor

rerem.

Este fato exprime convenientemente que a re-

lação entre os sujeitos aqui examinados e seus enunciados

nao e casual, mas sim determinada por fatores constituti -

vos da situação discursiva (entre eles, os planos de refe-

rência já citados) ,bem como fatores cognitivos, entre eles,

a capacidade de descentração entre esses planos, e o uso

pragmaticamente adequado das modalidades.


- 147-
Ocorrências de modalidades deônticas

Devido ao baixo número de ocorrências de mo-

dalidades deônticas, alisto-as todas a seguir:

1 - ''Ponque., pela pengunta que. a 4e.nhona me


óez, 4Õ quem mona na cidade. que. pode. pe.~

c.a. no Jtia Ta.guã" (Justificativa - sil.

n9 1 - Grupo I - Experimental)

2 - 11 • • • ponque. rio domingo eu poh40 dottmúr.

até mai.h -ta.Jt.de." (idem - sil. n9 11 - id.


ibid.) .

3 - "A mãe. :tem que. a.mame.n..tâ e.le.-6". (id.; sil.


n9 3, Grupo II - Controle).

4- " ... a. ge.nte. ... qua.ndo qui óazi uma c.aiha


qua.ique.Jt pn'uma c.nia.n~a(doe.n:te.),né, ..tem

que. :ta.- c.oJtfLe.n-d o ••• • (1d.;


. sil. nQ 9; id.,

ibid.) .

Os casos 1 e 2 acima exprimem a pe.nmi~4ão,oo~

traparte deôntica da possibilid~de; os casos 3 e 4 expres-

sam a obniga~ão, contraparte da necessidade.

Note-se que aquilo que é permitido (proibi-

do), ou obrigatório (facultativo) está, nas ocorrências,

bastante próximo das experiências do sujeito: no exer:tplo

n9 1, essa experiência relaciona-se à própria situação de

testagem, e à interação entre sujeito, entrevistadora e

conteúdo do silogismo(" ... pela pe~gunta que a ~enho~a me

óe.z" ... ). Nos outros três casos, o deôntico tem muito a

ver com o conhecimento e experiência pessoal dos sujeitos.

Assim está expresso, por .exemplo, no uso da primeira pes -

soa, na ocorrência n9 2.
- 148 -

Segundo LYONS (op.cit.), a modalidade deônti

ca tem origem, ontogeneticamente, nas funções desiderativa

e instrumental da linguagem, que, para HALLIDAY(l973), por

exemplo são·as primeiras a serem adquiridas pelas crianças.

A primeira presta-se à manifestação de desejOs e vontades

9 a Segunda serve para ÍffipQrffiQS llÓSSa VOntade aOS OUtros 1

ou vice-versa.

Existem vínculos essenciais entre o social,o

cultural e o deôntico, uma vez que os deveres, obrigações,

sançoes, permissões, etc., variam de sociedade para socie-

dade (em termos das leis ou códigos morais impostos pelos

grupos sociais}, e, numa mesma sociedade, diversas {sub-

culturas podem possuir códigos variados sobre o "c.eJtto", o

"ju.óto" e o "i..nju.ó;to", e, assim por diante. Deste modo, o

obrigatório e o permitido sao noções muito relativas,e es-

tão relacionados com o código moral (ético) dos individuas

ou grupos sociais.

O fato de quase nao modalizarem deonticamen-

te durante as etapas de testagem da compreensão dos silo -

gismos, então, talvez indique que est~s sujeitos compreen-

deram que o conteúdo dos silogismos equivale a uma lei que

está fora·de questionamento em termos de valores morais ou

éticos socialmente vigentes num determinado·grupo social.

~ interessante notar qp.e houve muitas ocorrências

da modalidade deôntica, durante a testagem; em situações

que estão à parte das três etapas relativas a compreensão

do silogismo (a saber: Resposta, Justificativa e Repetição).

Alguns sujeitos modalizaram deonticamente, por exemplo, du-

rante a apresentação das gravuras, como é o caso de M.P.

do Grupo II - Experimental, que, durante a apresentação da

gravura relativa ao silogismo n9 3, onde apareciam macacos,


- 149-

iniciou um processo de cornparaçao entre os macacos e os ne-

gros, e, num determinado momento, disse:


"Nã.o plle.-6-ta. óa-tã:, que é pec.a.do,ma.& pa.Jte.c.e.
me.-ómo, ne.. Aqu..-i. te.m um ne.gJto que. e a- c.aJta
de um mac.a.c.o".

Outros sujeitos usaram modalidades deônticas


ao referirem-se diretamente à situação de interação da tes

tagem. Por exemplo:


"Vã pna. tte.pe.tiJt?"
(Pedindo para a entrevistadora repetir o si

legismo).
"Po&-6 o vo.t-ta.Jt?"
{Pedindo para tentar novamente).
Prossigo,a seguir, na análise dos dados.

D - Distribuição das modalidades pelas etapas de

testagem

Tabela 3 - Distribuição das modalidades pelas etapas de


testagem
.
GRUPO I GRUPO I I
R J Rç R J Rç
(ll) ( 18) ( 4) (2) ( 2 3) (1)
c 33,3 54,5 12,1 7,6 88,4 3,8
( 7) ( 15) (2) (5) (17) ( 6)
E 29,1 62,5 8,3 17,8 60,7 21,4
( 18) (33) ( 6) (7) ( 40) ( 7)
T 31,5 57,8 10,5 12,9 74,7 12,9

Legenda: R= Resposta

J= Justificativa

Rç= Repetição
- 150 -

Os totais da Tabela 3 demonstram que a dis -

tribuição das modalidades pelas três etapas de testagem(i~

to é:Re..&po.&t"a à pergunta do silogismo; Ju.&:ti..S.ic.a:ti..va. para


a resposta, e Repe:ti..ção do silogismo) não é homogênea,pre-

valescendo a Justificativa, com porcentagem superior às d~

mais etapas tanto no Grupo I quanto no II. Estes resulta -

dos serão discutidos conjuntamente com os dados que expo-

rei a seguir.

E - Distribuição das modalidades pelas três etapas

de testagem e variação na situação experimental

Ainda pela Tabela 3, pode-se perceber que,

quando se considera a variação na situação experimental ,

os resultados acima não se modificam. C om efeito,quer no

grupo controle, quer no experimental, predomina o uso das

modalidades durante a Justificativa, tanto no Grupo I qua~

to no II.

Estes dados parecem indicar que a etapa mais

próxima da experiência pessoal ?os sujeitos durante a tes-

tagem seria aquela em que eles deveriam justificar suas

respostas. Durante a elaboração da metodologia e execução

dos testes, ocorreu-me que a atitude de justificar provoc~

ria um maior distanciamento, por parte dos sujeitos,do con

teúdo proposicional colocado pelas premissas. Parece que

estes resultados confirmam minha hipótese. Com efeito, se

o uso das modalidades indica que os sujeitos estão,num cer

to sentido, comparando seu conhecimento pessoal com o co-

nhecimento expresso pelos silogismos, e se o uso das moda-

lidades indica ainda que o quadro referencial tomado pelos

sujeitos não é teórico, mas sim trata-se de algo moldado


- 151 -

em seu dia-a-dia, em seu cotidiano contato com as coisas

do mundo concreto, só se poderia esperar que uma postura


.
de tentativa de recuperação da neCessidade e da possibili-

dade dos eventos descritos pelas proposições emergisse du-

rante .o processo de justificativa, o qual requer uma atitu


de mais subjetiva e mais comprometida com os valores pes -

soais.

A esse respeito,.observa ROBIN HORTON(op.cit.

pp. 146-147), que "s~~ee the ovenniding aim o6 exptanation


appanent
ehao~, the &eaneh fion explanatony analogie~ mu~t tend ta-
a~~oeiated

with ~uch quatitie~". Isto significa que a experiência pe~

soal é o fator determinante da justificativa. No caso dos

nossos sujeitos, parece que a experiência pessoal entra em

conflito com o conteúdo proposicional dos silogismos e,

tentando recuperar seu quadro referencial de valores e

crenças, esses sujeitos utilizam-se das modalidades, que,

pelo.motivo exposto, aparecem compreensivelmente em maior

número na Justificativa.

PARTE IV

conclusões

O conteúdo proposicional dos silogismos ori-

ginais do teste nao se compromete explicitamente nem com a

necessidade, nem com a possibilidade dos fatos expressos.A

forma pela qual as premissas são apresentadas dá-lhes uma

aparência de neutralidade que não existe na realidade. Os

sujeitos, então, tentando reconquistar sua experiência, a


-=-
quai é rejeitada por essa forma de lei das premissas,expli

citam a necessidade ou a possibilidade dos fatos expressos,

recuperando, para si próprios, o que está por baixo da ne~

tralidade. Por isso, ora modalizam em termos do valor ver-

dade das proposições (modalidade alética); ora quanto ao

fato de essas proposições serem, ou não, de seu conhecime~

to e aceitação (modalidade epistêmica); ora, ainda em ter-

mos de essas proposições serem-equivalentes a leis ou nor-

mas sociais (modalidade deôntica) •

Analogamente ao que foi escrito no capítulo

anterior, para a produção de sincretisrnos, pode-se agora

afirmar que, no caso das modalidades também existe um com-

portamento generalizado, subjacente ao uso das modalidades,

que está relacionado com a capacidade dos sujeitos para

detectarem contradições existentes entre os três planos que

interagem durante a testagem: o plano da experiência fac -

tual e conhecimento do munao dos sujeitos; o plano que e-


determinado pelo quadro referencial específico dos silogi~

mos,· e finalmente o plano de interação, do diálogo que es-

tã sendo realizado entre sujeito e entrevistadora.

Em síntese, o uso das modalidades, de um mo-

do geral, indica que estes sujeitos estão tentando recupe-

rar seu quadro de referências pessoal, o qual é negado em

parte pelo conteúdo dos silogismos. Modalizando, os sujei-

tos da pesquisa restabelecem-se cOmo sujeitos do discurso.

Essas tentativas de recuperação da identidade estão no cer-

ne de um conflito mais amplo, que se resume na valorização

do conhecimento científico e na desvalorização do conheci-

mente prático, de senso comum. O silogismo, como produto

do pensamento formal e da escrita, situa-se como algo que

raia a objetividade completa, algo que não existe no coti-


- 153-

diano. Então, um sujeito cognoscente com o raciocínio to -


talrnente formal, independente dos dados experienciais, -
e

uma criação artificial, que, no fundo, funciona como uma

camisa-de-força prototípica, irreal, mas que é tomada corno


paradigma para determinar o que é "meihoJt"e 6 que é "pi.oJL 11

cognitivamenté. ~desta visão que·os sujeitos estudados

neste capítulo e no anterior tentam se libertar.

Ainda deve ser acrescentado que aqui também

se pode perceber a construção, pelos sujeitos, de um qua-

dro referencial próprio, o qual emerge durante a situação

de testagem, o que indica que eles, sujeitos, percebem os

planos que estão interagindo, e, através de descentrações,

optam por transformar, modalizando, num ou noutro lugar,a-

través do uso de aléticas, epistêmicas ou deônticas, mas

sempre marcando, através das modalidades, sua participação

ativa na enunciação.
- 154 -

CAPtTULO V

COMPORTAMENTO METAPROCEDIMENTAL EM NÃO-ALFABETIZADOS

PARTE I

Introdução

Refletir ~ab~e a linguagem. Ser capaz de co~

siderar um enunciado, ou conjunto de enunciados,corno obje-

tq; como algo que existe óo~a do organismo. Colocar um ra-

ciocínio expresso verbalmente em exposição, corno se fosse

um quadro pendurado na parede. Analisá-lo objetivamente; ia

zer dele o ponto de partida de nossa atenção e reflexão.Con

seguir dissecá-lo nos seus pontos relevantes. Descobrir

quais marcas estruturais e formais destoam do todo: corri-

gi-las, e novamente examinar o produto. Observar as rela-

ções de significado que se estabelecem entre as várias


proposições; detectar incoerências, deduções distorcidas ,
trechos "non .õequ,i,;tu.Jt", eleição de argumentos nao relevan-

tes. Checar o não-dito, ou seja, a informação que fica no


...
n~vel
.
pressupos~cional, e as '
~mplicaçoes
- ..
desse conteudo nao -
explicitado para o conteúdo global do(s) enunciado(s).

Estas são algumas das tarefas que só s~ ter-

nam possiveis através do uso do me~aeo~hee~mento, esta ca-

pacidade especifica da espécie humana, que permite a obseE

vação dos processos de pensamento, e que parece ter Intima

relação com o desenvolvimento filo e ontogenético.

O que é o metaconhecimento? Qual a sua rela-

çao com a estrutura do silogismo? Existe algum tipo de re-

lação necessária entre o metaconhecimento e o dominio da


- 155 -

escrita? Finalmente, quais sao os fatores cognitivos que

permitem ao sujeito atingir o metanível? Estes são os pon-

tos que discutirei a seguir.

Discutir o metaconhecimento requer que se co

loquem em evidência os estatutos epistemológicos do ato de

conhecer. O que é conhecer? Conhecer é apropriar-se do ob-

jeto e submetê-lo à nossa vontade? Com certeza que não.Es-

se caminho de mão Única não existe no verdadeiro ato de co

nhecimento, que pressupõe uma interação e uma integração

constantes entre sujeito e objeto, a tal ponto que o conh~

cimento do segundo pelo primeiro equivale a uma experiên -

cia de reconstrução ambivalente, a um processo em que um

e outro são modificados, ao final do qual não mais serao

os mesmos.

PIAGET(l973b) introduz as noçoes de expe~iê~

c.ia 61;..1c.a e expe~1êne.1a .tâgic.a-matemât.i.c.a. para descrever

como, durante o ato de conhecimento, sujeito e objeto int~

ragem continuamente• A experiência f!sica equivale àquelas

propriedades que sao extraídas pelo sujeito a partir das

propriedades do próprio objeto .. Segundo ELKIND(l972) "


a apAend1zagem F(Ql;..ic.a) enva.tve. a de~c.abe~ta. da~ qual1da-

de-6 e pAapl!...ie.dade.-6 da;.. c.a.i;..a-6 (.o o). Ta.i;.. e.xpe.~.iê.nc..ia-6 6aa


aAbLtAâ.A.ia-6, (.o.) na 6e.nt1do de que -õãa de-õtitulda-6 de. ne.-

c.e.64.idade. .t6g1c.a''. (p. 87).

Deste modo, as experiências f!sicas do suje~

to derivam-se da percepção deste sujeito a partir das pro-

priedades intrínsecas do objeto. Por exemplo, perceber que

o limão é azedo e que a laranja é doce; que dois objetos

diferentes têm pesos diferentes; as relações entre o peso,

o volume e a densidade dos objetos, todas essas são abstra

çoes que o sujeito leva a efeito a partir das propriedades


- 156 -

fisicas da natureza do próprio objeto. Como tal, a expe -

riência fÍsica é predominantemente sensorial, perceptual.

Não se deve, no entanto, tomar a experiência

física de PIAGET no sentido ernpirista, de pura leitura dos

dados sensoriais. Diz o autor a respeito que:.

."0 eonhe.c.lme.nto 6Z&J...c.o e.xpe.Jti.me.n.ta.e. em ge.Jta.t


(c.ompJte.e.nde.ndo-~e. al a ge.ome..tnia do mundo
Jte.at) pJtoc.e.de., em compe.n~a.~ao, poJt abb.tJta-
ç.ão, a. pa.JttiJt da.-6 ptt.opJtie.dade.-6 do obje..to C. E_

mo .tal. [ ... )Ma.-6, e. i-660 é e..6.6e.nc.J..a.t, a.c.on-

te.c.e. que., também ne.bte. te.JtJte.no, a pe.Jtc.ep~ão

ja.ma.J....& age. .6Dzi-nha: .6Õ de..6c.obtr..imo.6 a pno-


pnie.da.de. de. um objeto ac.Jte.bc.e.ntando algo a
pe!Leepção". (id. ib., p. 78).

Esse "algo" é o segundo tipo de experiência:

a experiência lÓgico-matemática, ou aprendizagem lÓgico-m~

temática (L M), que é, para PIAGET uma segunda forma de c~

nhecimento, indissociável de fato da experiência física,mas

de outra natureza.

As características básicas da experiência L

M são: o sujeito aqui está agindo sobre o objeto, através

da ação e·da operação, e deriva, dessas ações e operações,

um conhecimento que não é mais intrínseco aó objeto. A des

coberta da transitividade por exemplo (A=B, B=C,logo A=C )

não está presente nas propriedades fÍsicas·e perceptuaisdo

objeto; é, antes, uma construção do sujeito, a partir de

suas açoes sobre os objetos. Quando a criança percebe que

obtém a mesma quantidade de pedrinhas, qualquer que seja o

lugar da fileira pelo qual inicie a contagem, está, na ver

dade, levando a efeito uma aprendizagem lógico-matemática,

na medida em que "o que. o .6uje..i.:to de..6c..obli.e. e.n:tão não ê. u.ma


- 157 -

p~opnie.dade. 6Zl>iea daó pe.d~inhah, maó uma ~t.etação de. inde-


pendência enttt.e. a.& du.a.-6 a.ç.Õe.l> de tte.união e o!Lde.naç.ão". (id.
ibid.' p. 77).

Como já assinalei, PIAGET acha que, durante

nossas açoes sobre o mundo, o conhecimento F e o L M exis-

tem sempre lado a lado, na medida em que, ao explorarmos os


objetos do mundo fÍsico, estamos enriquecendo esses obje -

tos "de p!Loplt.ie.dade.J.J ou Jt.e.laç.Õe..6 nova.&, que. c.on-óe.!Lvam a.-6

p!top!L-Le.dade.t:. ou JLe..taç.Õe.h a.nte.n..i:oJte.-6, ma-6 c.omple..tando-ah pofl

.óihte.mal> de. c..ta.hhi6ic.aç.Õe.h, de. ott.de.na.ç.Õe.h e.m c.oJttt.e.hpondên-


c.ia.h, de. e.nume.Jt.a.ç.Õe..ó ou me.dida.h, e.tc..; e.hha-6 a.h a.ç.oe.h que.
c.hama.Jte.mo-6 de. .tõgic.o-ma.te.mã.t.<..c.a.-6 11 • (id.ibid., p. 73) .Existe,
no entanto, uma relação assimétrica de dependência entre

F e L M. Segundo PIAGET:

"Realmente, é 6undamental paJta nóll-bo p!topÓll{


to lembnaJt que, 1:.e exi-bte. um eo nhe.c.imento

-lÕgic.o-ma:temâ.tic.o puJto, enquan-to de-btac.ado

de toda expeJtiênc.ia, não exillte, Jte.c.ipJtoc.a-


mente, conhec.ime.nta expe.Jtimen:tal que po-blla
-belt. qual.iQic.ado de "puJt.o", enquanto de!ltac.E:_
do de toda oJtganização lÕg1c.o-ma:te.mât1c.a. A
expe!t.lênc.ia bÕ ê ac.ellllZve.l polt. intenmêdio de.
q uadJt.o 1:. .tõ g-Lc.o -mate.mât1c.o-b ... '' (id.ibid., pp.

78-79).

A medida em que o desenvolvimento intelectual

se processa, as ações vão-se interiorizando em operaçoes,e

o sujeito começa a prescindir do objeto, do dado concreto,

em alguns contextos: Sobre isso, diz PIAGET que 11 ••• ctll

açÕell .tõgic.o-matemãtic.all do -bujeLto podem, em dado momevt:to,


dill pen.6 a.Jt -.6 e de .6 eJt. ap.tiCadall a objeto~.> {1.-bú2.0-b e in.te.nJ..o-

Jtizan-lle. em openaçÕe..6 .61mbol1c.amente man1putãve.J...6. E1.6 polt-


- 156-

que, em out~a~ palav~a6, ex~6te, a pa~tih de um cento nZ-


vel, uma iÕg{ca e uma matemãt~ca puna6, a6 quai6 a expeni-
ênc..ia 6e totc.na .inú..:U.l" (id., ibid., p. 78).

Essas estruturas cognitivas que conseguem

dispensar o objeto físico, ultrapassando suas propriedades,

e, portanto, a experiência, são as operações da lÓgica foE

mal para PIAGET, que se caracterizam pela Sua flexibilida-

de, reversibilidade, e pelo fato de possibilitar ao sujei-

to que descentre sua atenção do tc.e.ai e que possa conside -

rar também o po66Zvei,o hipotêtieo.


Neste nível do funcionamento cognitivo,o das

operaçoes formais, o sujeito adquire "o pode.Jt de 6oJtmatc. o-

petc.açÕe6 6obtc.e opetc.açÕe6, que petc.mite ao conhecimento ui-


ttc.apa66atc. o ~eal e que lhe ab~e a v~a ~ndeó~n~da do~ po~­

~zve~!J •.• " (PIAGET, 1972 , p. 49).

~ este o nível do metaconhecirnento, de que

estou ocupando-me neste capitulo. PIAGET não utiliza o ter

mo "me.:taeonhe.e~men:to", maS fala em "ab~:t~aç.ão ~e.üle:t~do~a"

(id. ibid., p. 70 "pa.!J~~m") 1 a qual o autor ·opõe à "~n:tel!:_

g~nc.~a. ln:tu.l:tiva"ou' "pen~amen:to na.:tu~al" (id., ibid.,). Es-

sa abstração refletidora leva à formalização da lÓgica, a

qual pôde ."c.onqu.ih:ta~ o d~ttei:to d-e e~c.olhe~ ~eu~ a.x~oma.!J

c.om ~oda libe~dade, de ac.o~do c.om !Ju.a.!J nec.e.J.>!Jida.de!J~!Jem ~e

a:te.IL ao!J e.temen:to~ óo~nec.ldo~ pelo pen!Ja.men:to na:tu.Jta..t ape. -


nato". (id., ibid., p.70).

Um dos produtos desse raciocínio puramente

lÓgico-matemático, formalizador e abstrato é o !Jilogi!Jmo

Com efeito, conforme já discuti nos capítulos anteriores

o silogismo caracteriza-se pela sua estrutura fechada, on-

de existe uma relação de necessidade lógica entre as pre-

missas, relação esta que deve ser analisada independent.§:_


~ 159 -

mente do conteúdo referencial que os membros dessa premis-

sa possam ter para o pensamento natural, ou em termos da


experiência física das pessoas. Deste ponto de.vista,o su-

jeito só pode entender a conclusão de um silogismo quando

se ativer ao conteúdo relacional que existe entr.e as pre-

missas, e quando conseguir descentrar seu pensamento do co

nhecimento físico, atendendo-se apenas à experiência lógi-

co- matemática. Em outras palavras, para Compreender um si

legismo o indivíduo deve ser capaz de estabelecê-lo como

pertencendo a um metanível, não necessariamente inserido em

sua realidade física e factual.

LURIA (1977) denomina este tipo de atividade

de "ttecJ..oc.Zn.io conc.ei-tu.al", e afirma que:

"Conceptual thln~lng inuolue~ an e.nonmou~

e.xpan~ion o6 the. ne.~ultant 6onm~ oó cogn~t~

ve actiulty. A pe.n~on eapable oó ab~tnact

thought ne.óle.ct~ the. e.xte.nnal wonld ·mone.


pnofioundl!f" and comp.te.te..ty and mah.e~ eonc.tu-
~ion~ and lnfie.ne.nce.~ 6nom peheei..ved phenom~

na on the. ba~i~ not only oó hi~ pe.n~onal

loglcal
thi..nki..ng tha:t obj_e.ct1ue.ty_,tak·e. h/rape. in a J.aJ.~tR.y

advanc.e.d ~tage. o6 de.ve.lopme.ntn. (id.,p.lOO).

O comportamento metaprocedimental (o termo

foi emprestado de KARMILOFF -SMITH, ms. s/d) requer,portag

to, que o indivíduo seja capaz de realizar uma série de

descentrações. No caso da compreensão do silogismo,teria -

mos: em primeiro lugar, o sujeito precisa isolar os "poltm!

noite.~", produtos "do~ dado~ da expe.niênc.ia" (PIAGET,l972 ,


p. 84), que constituem, entre outras coisas, o seu sistema

pessoal de crenças, tabus, cÓdigos morais. A seguir, esse


- 160 -

indivíduo precisa suspender esse sistema moral, axiológico,

momentaneamente, e, através de outra descentração, ele de-

ve ser capaz de isolar o conhecimento, expresso pelo silo-

gismo, desse código pessoal.Dentro da própria estrutura do

silogismo, ele deve ainda ser capaz de ir e vir entre as


premissas, perceber a relação de inclusão entre a premissa

maior e a menor, e compreender que, do ponto de vista do

metaconhecimento, as proposições subjacentes ao silogismo

constituem-se em verdades necessárias, na medida em que

elas, e somente elas, podem levar à conclusão lÓgica. Quer

neguem o conhecimento factual, ou nao, quer sejam •


pOSSl-

veis ou não em termos da experiência física do sujeito,so-

mente as premissas e seu conteúdo podem levar à dedução ex

pressa pela conclusão.

Qualquer estratégia que fuja a esse comport~

mente metaprocedimental vai evidentemente produzir compor-

tamentos epilingüísticos, corno é o caso dos sincretismos e

das ·modalizações que estudei nos capitules anteriores.

Do ponto de vista do processamento e compre-


.
ensao da informação verDal contida nos silogismos,do meta-

conhecimento e de seus pressupostos cognitivos, tenho alg~

mas observações que considero relevantes.

A objetividade e a dedução são noçoes indis-

sociáveis do comportamento metaprocedimental. No caso dos

silogismos, em que consistiria tal comportamento, em ter-

mos de processos cognitivos? Ou, melhor dizendo, quais as

características cognitivas de um sujeito que, conseguindo

realizar as descentrações acima descritas, eleva conseqüe~

temente o silogismo a uma manifestação de segundo grau do


conhecimento e consegue e"stabelecer a conclusão lÓgica pa-
- 161-

ra as duas premissas?

Já assinalei que, de acordo com PIAGET,o com


portarnento metaprocedimental parece atingir uma forma com-
pletamente objetiva e descentrada, com relação à dedução
lÓgico-verbal, no estágio das operações formais, ou lógico

-matemáticas.

Para PIAGET, a característica básica do pen-

samento do estágio operatório formal é ser esse pensamento

pnopohieio~ai. O desligamento do mundo físico, real, e a


interiorização dos esquemas de ação em operações, possibi-

litando a inclusão do hipotético, é que permitem à inteli-


gência deixar de trabalhar com objetos para operar sobre

proposições.
O autor acrescenta (id. ibid.), quanto ao
estatuto epistemolÓgico das hipóteses, que elas consistem

em operações intraproposicionais, na medida em que envol -

vem o conteÚdo .de proposições simples. ·Quanto a dedução,

diz o autor:

" ••• a ope..Jtaç.ão de..du.:tiva, que. le.va da.ó hipÕ-


:te..6e..6 à.õ .6u.a.6 c.onc..lu..6Õe.6, nã.a ê mai.ó do me...õ
mo ~po, ma.õ ê inte.Jtp.!topo.õic.ional e c.on.õi.õ-
te., poi.õ, em uma opeJtaç.ão e..óe..tu.ada .õobJte o-
pe.naç.Õe.õ, i.õto ê, uma ope..~z.aç.ão elevada a
.õe.gunda pot~nc.ia .• . ''(id. ibid., p.48).

g exatamente o pensamento proposicional que

permite ao sujeito desligar-se da experiência física,e po~

sibilita-lhe que passe a lidar com o vintu.al.Nesse sentido,

as proposiçÕes talvez desempenhem, no plano psicológico,p~

ra o estágio formal, o mesmo papel que o objeto concreto

desei_rtpenha para a intelig'ência intuitiva e pré-operatória.


- 162 -

Do mesmo modo, as açoes do sujeito sobre os objetos exter-

nos passam a ser operaçoes sobre proposições. INHELDER e


PIAGET afirmam que "Na. Jte.a.JU.. da.de., "quando oll objeto.& .óão
llub.6:tJ..tuZdoll pon e.ftunc.ia.do-6 ve.Jtba.L&, -6upe.!tpomoJ.J uma nova

lÕgic.a.. - a da..6 opeJt.a.ç..Õe..õ - à da!> c.la.lde.J.J e. Jte..ta.ç.Õe.ll que.

.6e. Jte.óe.4e.m a e.-&.& e. objeto" (1976, p.l90). Ainda de acordo

com os mesmos autores, "o motoll. e.be.:t1vo da .tõgic.a. da.ó plt.o-

polliç.Õe.-6 ••. ê o pode.Jt de. c.ornbina.Jt, gJta.ç.a.ll ao qual ela infle.


Jte. o Jt.e.a.l no c.onjuYI.to da..õ hipÕte..õ e.-6 poi.>.&Zve.l.ó, c.ornpa..tZve.i.ó
c.orn o.6 da.do.6" (id., ibid.).

Quanto aos silogismos, raciocinios l'Ógico -


verbais, dependentes da dedução lÓgica decorrente dos con-

teúdos expressos pelas premissas, já observei anteriormen-

te, neste mesmo trabalho, que é essencial, para a compreen

sao dos mesmos, que se compreenda a relação entre a premi~

sa maior e a menor, bem como a necessidade lógica da con -

clusão. Ora, tais operações somente são possíveis quando

alé~ de compreender o conteúdo de cada premissa (intrapro-

posicional), o sujeito, recorrendo ao reciocínio interpro-

posicional, realiza sobre esse silogismo operações de se -

gunda ordem, e percebe, deste modo, que pode compreender

as relações de implicação entre as duas premissas, " de

e.ta.b olta.Jt Jte..taç.õ e.6 ent:lte ne..taç.Õ e.-6 [pito po!tç.Õ e.6, d.i...6 .ttr..ibuti v~
dade., e.tc.l, de c.ootr.de.na.Jt do.ü .6-L~.te.ma..6 de Jte.6e.Jr.ê:nc.1a, et:c.."

(PIAGET,l972, p.48).

PARTE II

Metaconhecimento e escrita

Muitas especulações têm sido feitas, por fi-


- 163 -
lósofos, antropólogos e psicólogos, a respeito da influên-

cia da escrita sobre os processos cognitivos humanos.De m~

neira geral, a tese defendida é que a aquisição de um sis-

tema escrito ocasiona grandes mudanças psicológicas e cul-

turais,_ a ponto de revolucionar totalmente a história da hu

manidade ( 1 ) •

GOODY e WATT (1968) 1 por exemplo,admitem que

consideram "ha.ndiy po-6.6lb.te., (~ •. ) to de.:te.Jtm-i.ne. what .impon


:tanc.e. mu.6t be. at:tn-Lbute.d to :the. aiphabe.:t a.6 :the. cau.6e. on
a.6 :the. ne.ce..6.6any condltlon o6 the. .6e.minal ~nte.ile.c:tuai ~n­

nova.t-i.on.6 tha:t oc.c.utur.e.d {n the GJr.eek wottf.d duJt-i.ng :t-he. c.el1-

;tuJLÜó that &o.t.towed the d-é66u•.ion o6 WJLiUng I ... )" ( id.


ibido 1 P• 337) o

O conCeito de escrita é também muito invoca-

do como critério para uma classificação trans-cultural. Os


11
povos iletrados são, por exemplo, classificados como pltê-

-.tõg.icoh 11 , "plt.im.i.:tivo.6", etc. FINNEGAN (1973) cóloca o pr9_


blema da seguinte maneira:

"Whe.n pe.op.te. w.it.h :to make. a bat.i-c. di-.6-ti.nc:ti-on


be.twee.n dL66e.tte.nt &0ci-e..tie..6 O/f... h.Lt..to!Li-ca.t P!!:
4iod&, one afi :the. commonly ~nvaked c.lt~:te.!L~a

i-.6 li-.te.Jtacy. I 11. pan:tic.u.i.alt :tho.6 e wha


:ta avoi-d .the. c.anno:ta.ti-onh afi "ptti-mLti-ve."
"u.nc.i..v.ili-ze.d", "abott.igina.l", :te.nd :to .tu.Jtn
:to a. de.6c.Jtip:t.ion o 6 "pJte.-log.ic.a.t O !L "p!i...e-.t:!:_
:teJt.a..te.". Ce.Jt:ta.inly, o.the.Jt.
aJLe a!õo emp.toyed (paJLt-écu!aJL!y that . o6
technotogy) but that o6 the abõence oJL p~e-

(id., p. 112).

A passagem da discussão sobre iletrados para


- 164 -

juízos de valor acerca de sua especificidade cognitiva pa-

rece seguir o seguinte raciocínio: Como a característica

central dos povos "p!timi-tivo.t." é o agrafisrno, e como some!!


te a aquisição da escrita leva às formas superiores de fun

cionamento cognitivo, então os iletrados permaneceriam no

nível pré-lógico, ou intuitivo de -pensamento.

FINNEGAN(op.cit.}, discutindo a questão de

se saber se a escrita tem alguma influência sobre as moda-

lidades de pensamento, coloca que "One. c.ommon att6We.Jt .tha..t


i...6 a6.te.n imp..tie.d 1!:. .that. .the. p!Le..t.e.nc..e. oJt ab.6_e.nc.e. o6 li.te.Jt~

c.y i.t. oó ab.õolu.te...ty c.Jtuc.ia..t .t.ignióic.anc.e. óon .the. qua..ti.tq


oó though.t .in a give.n c.uLtuJt.e.". (id., ibid.).
Parece, portanto, que, de modo geral,não se

consideram os povos primitivos, ou os iletrados em geral ,

corno capazes de exibir comportamentos metacognitivos. ONG

(1982), por exemplo, afirma que "Wtr..J..tJ.ng .áe.pa.tr..a..te.-6 .the.


knowe.tr.. btr..om .the. known a.nd :t.hu-6 .6e.A:.6 u.p c..ondJ..t1on.ã botr..· "ob-

je.c..:t.1vJ..ty" J.n :t.he. .õe.n.óe. oO pe.Jt.õona.i d1.õe.ngage.me.n:t otr.. dJ..6 -


:tanc..J.ng 11 • (id., p. 46).
Para PIAGET, parece que esta tese também pr~

valece, visto que o metaconhecimento é decorrência da int~

riorização das estruturas lógico-mate.mâticas, da descentr~

ção cognitiva e do raciocÍnio interproposicional,sendo que

todas essas características só são atribuídas por ele aos

indivÍduos "c..1vLt.-[zado.õ", letrados, escolal:'izados,os quais

conseguem atingir o estágio operatório formal. Os povos

iletrados ,primitivos, por sua vez, exibem um raciocínio

ainda bastante ligado ao concreto, às açoes, a irreversi-

bilidade , sendo, portanto, de acordo com o autor, incapa-

zes de exibir um comportamento metapr~ntal . (e.g.PIAGET

e HALLPIKE, op. cit. ) .


- 165 -

Ora, diante dessas idéias, levanto a seguin-

te questão: se, de fato, esse estado de coisas fosse uma

verdade constante, então não seria esperado que nenhum dos

indivíduos não-alfabetizados estudados neste trabalho se


saísse bem nas etapas de testagem para compreensão dos si-

logismos? Especificando melhor, diria que a previsão,no c~

so, deveria ser de que nenhum dos sujeitos testados apre-

sentasse um desempenho que sugerisse que ele estivesse u-

sando comportamento metaprocedimentais. Este desempenho se

ria, considerando-se ·qs três etapas da testagem (Resposta,

Justificativa e Repetição), que algum sujeito sistematica-

mente desse a resposta certa, apresentasse uma justificati

va adequada (presa exclusivamente ao conteúdo das premis -

sas) e produzisse uma repetição literal do silogismo.

Surpreendentemente, tal fato ocorreu, e nao

somente com um sujeito. são essas contra-evidências que

passo a discutir a seguir.

Dos dezesseis sujeitos testados, pertencen -

tes aos Grupos I e II, alguns (cinco ao todÓ), comportaram-

-se de maneira dive.rsa dos demais com relação às três eta-

pas da testagem.

Examinando a transcrição de seus desempenhos,

percebi que havia diferenças marcantes entre as respostas,

justificativas e repetições (principalmente estas duas Úl-

timas) dadas por estes sujeitos, e os dema~s. Vou examinar

em detalhe cada um deles, após o que discutirei esses da-

dos.

PARTE III

Apresentação preliminar dos dados


- 166 -

Nesta parte, irei apenas registrar e comen -

tar alguns aspectos básicos do desempenho destes sujeitos

que, contrariamente às expectativas, demonstraram ter com-

preendido as relações lÓgicas dos silogismos. Em resumo,p~

rece que c.A.P., J.D.s.s., B.O., J.L. e M.N.M. apesar de

serem não-alfàbetizados, são capazes de comportamentos me-

tacognitivos, como revela a compreensão dos silogismos por

eles exibida.

Inicialmente, esclareço que o critério adota

do para considerar a resposta "c.onJte..ta" era estar a justi-

ficativa adequada.

Passo agora aos dados.

J.D.S.S., sujeito do Grupo II, controle.

J.D.S.S. apresentou desempenho 100% correto

para os silogismos 3, 4 e 5, isto é: as respostas estão

corretas, as justificativas são dadas mantendo-se o sujei-

to estritamente dentro da relação de necessidade imposta

pelo conteúdo das premissas e sua inclusão, e, finalmente,

a repetição é 11 veltba.Lt.mn.

Com relação aos silogismos n9s 1,2,6,7,8 e 9,

J.D.S.S. manteve uniformes suas respostas e justificativas

certas. suas "üal.ha-6", durante a repetição, devem-se prin-

cipalmente ao fato de haver operado sobre o·silogismo uma

transformação de inclusão lÓgica, a qual teve como efeito

omitir a premissa menor, talvez porque o Stljeito a tenha

considerado óbvia demais. Por exemplo, na repetição do si-

logismo n9 6, esse sujeito disse:

"Todo-6 avt.i.ma.t 1.-i.vlte moita na ói.olte.&:ta

O tl.gJte moJta. também?"

O mesmo para o silogismo n9 9:

"Toda-6 61tuta tem vitamina


- 167 -

A maça tem uitami~a?"

Já na repetição dos silogismos 7 e 8, este

sujeito incorporou a conclusão ao silogismo, já em forma

declarativa. Este procedimento talvez revele que, para es-

te sujeito, não existe questionamento possível quanto à lÓ

gica da conclusão, o que o leva a omitir a forma interrog~

tiva que a mesma tinha no silogismo de testagern. Assirn,te-

mos, para o silogismo n9 7:


" O p.tâ..6X.ic.o não en6eJtJtuja

A Lutz.de.CJ tem uma .t~andâlia. de piâl.d:J.._c.o; nao

en6e.Jtnuja.".
Para o silogismo n9 8:
11
Todo -1a..t de..õmanc.ha. o l!..Zqu-i..do
O Pa.u.to de..6ma.nc.hou ... de..6pe.jou .óal num c.opo
de água e de..õmanc.hou".

e de se notar que essas modificações efetua-

das _pelo sujeito durante a repetição não a..tte.Jta.m nem de

6oJtmam a estrutura dos silogismos, do ponto de vista do

conteúdo.

B.O., sujeito do Grupo I, experimental.

Bantante nervoso, notam-se em seu gabarito f!:.

lhas devidas mais a esse problema do que propriamente rela

tivas à cognição.

Conforme observei anteriormente, as respos -

tas só foram consideradas corretas quando a justificativa

era adequada. Por exemplo, para o silogismo n9 l,B.O. deu

a resposta certa e a justificativa adequada:

R: "Moita"
J: "Po!Lqu.e. ·e.le. pe..&c.a no tt..i..o Tagu.ã.".

A mesma coerência entre resposta correta e


- 168-

justificativa adequada ainda é encontrada, neste sujeito ,

para os silogismos n9 5, 6,7,8,10,11,12 e 13.

Quanto às repetições, B.O. repetiu de manei-

ra idêntica os silogismos 1,2,5,6,7 e 9. Para os silogis-

mos n9 3,4,8,10 e 12, o sujeito omitiu, durante a repeti -

ção, informação que estava presente ostensivamente na gra-

vura, e/ou que já havia ocorrido durante a apresentação da

mesma pela entrevistadora. Por. exemplo, B.O. repetiu o si-


legismo n9 4 assim:

"Todo.ó o.ó 6i...tho.6 do Joã.a ••• e· 6Lfha..& ••. toma


lei-te.
Ela toma. le.1te. ou não?"

O termo omitido, no caso, a premissa menor ,

("EJta. é uma. 61f..ha"l torna-se presente na situação de tes-


tagem pela gravura, o que, de certo modo, torna redundante

sua repetição. Alég do mais, elementos dêiticos -


nao-ver-

bais, como o gesto de apontar e o movimento dos olhos tam

bém servem para suprir essa informação. A mesma explicação

pode aplicar-se aos demais casos çitados para este sujeito.

Este sujeito apresenta uma característica

digna de nota: seu desempenho não é constante, ou seja,ele

não acerta as respostas, justificativas e repetições sist~

maticamente para os mesmos silogismos. Existe uma não-uni-

formidade. No caso do silogismo n? 4, por exemplo,B.O.erra

a resposta e a justificativa, mas repete de maneira adequ~

da, considerando-se a ressalva discutida acima. Este fato

será di-scutido em detalhe mais adiante.

C.A.P., sujeito do Grupo II, controle.

Este sujeito apresentou resultados perfeita-


- 169 -

mente corretos para os silogismos n9 1,2 (na segunda tenta

tiva), 4,5,6,7,8 e 9.

Sua Única falha, relativa ao silogismo nQ 3,

deve-se, creio eu, ao fato de desconhecer o significado da


2
palavra "ma.ti116e.Jto" ( }.

Temos aqui, portanto, um caso de sujeito ile

trado com praticamente 100% de acertos em teste de compre-

ensao de raciocinios lógico-verbais.

J.L., Grupo I, experimental

Conservando o critério de só considerar cor-

reta a resposta que viesse acompanhada por uma justificati

va adequada ao conteúdo do silogismo, então J.L. teve um

desempenho correto, em resposta e justificativa, no cada

dos silogismos n9 4,6,7,8,9 e 10 ..

O mesmo sujeito acertou resposta,,justifica-


tiva e repetição no caso- dos silogismos n9 2,3,11,12 e 13.

Algumas das repetiçÕes aqui são do mesmo tipo daquelas da-

das por B.O., visto ser este sujeito também do grupo expe-

rimental, e haver sido, portanto, testado com gravura. As-

. sim, no caso do silogismo n9 11, J.L. repete assim:

"E.&-óe..& amigo.& .t.ão ••. óaJ.z vLt.Lta -óÕ oh domJ.n-

9 o.
Q.ue. dia ê. hoje.?"

A premissa menor ("Hoje. e.f.e.h e.-ó:tão .t.e. vi-ói -

:tanta") foi omitida, uma vez que a gravura representa a

própria cena da visita.

O mesmo se aplica para a repetição do silo -

gismo n9 4:

''Todo6 óilho de João toma leite.


- 170 -

EAAa 6ilha dele toma leite., ou nao?''

em que a informação visual fornecida pela gravura, aliada

ao gesto dêitico de apontar o referente, foi considerada

suficiente pelo sujeito, que deixou de explicitá-la verbal

mente.
O mesmo sujeito ace.rtou somente a repetição

do silogismo nQ 6, tendo errado a resposta e a justificati

va.

M.N.M., Grupo I, Controle.

Este sujeito e "I.:Jui ge.ne.!Lii.:J", especial, por

três mo ti vos:

-Em primeiro lugar, devido à posição que a~

sumiu enquanto interlocutor. Enquanto os outros sujeitos

da pesquisa pareciam intimidados, alguns nervosos, outros

inseguros, pedindo descul[Jas pela "c.abe.ç.a que não ê. boa" .


M.N.M. pelo contrário, assumiu uma posição simétrica dura~

te a entrevista. Segura de si, às vezes até.se impunha,coE

tando o turno da en,trevistadora, como por exemplo, durante

a testagem do silogismo n9 3, quando a E. dispõe-se a repe

tir. o mesmo e M.N.M. retruca: "Pe.Jta a.Z, de...ixa e.u fia.tâ-",

- Em segundo lugar, é surpreendente verifi -

car como M.N.M. consegue transformar os silogismos em nar-

rativas, sem, no entanto, retirar dos mesmos os seus ele -

mentes básicos, nem seu caráter lÓgico,dedutivo.

Apenas como exemplo, cito a segunda repeti -

çao para o silogismo n9 5:

"Todoll c.ac.hotuz.o pe.que.no ê. da MaJt-i.a,ma.6 hoje.


a Ma4..ia. tá cum cacho4Jto g4ande..t o P..ixote..
O Pixote. não ê. da MaJtia po4que. o Plxote. -<
gJtan.de. 11 •
- 171-

Comparado com o silogismo original, ressal-

tam à análise as seguintes características de narrativa no

texto acima:
- apresentação destacada das personagens;

uma alteração na ordem original dos even -

tos; tal qual, foram apresentados ·no silogismo;

- evidenciação (ênfase) de certos elementos

circusntanciais, especialmente o -tempo ("hoje");

- sobretudo, este sujeito tansforrna a estru-

tna do silogismo em h~~tõ~~a.


A essa narrativa, M.N.M. introduz inclusive

a conclusão lÓgica do silogismo sob forma declarativa, es-

tratégia usada por outros dos sujeitos .aqui estudados. Só

que, neste caso, a conclusão transforma-se no dehen{aee,no


fecho da história.

Às vezes, M.N .r1. introduz em suas respostas

os elementos implÍcitos logicamente no conteúdo do silogi~

mo, como, por exemplo, na· repetição do silogismo n9 7, em

que diz:

"Q.ue.m' num ;tJLabaJ..a no Bane. o, num Ué. a é. aia,.

- O terceiro fator que me atraiu especialme~

te a atenÇão para este sujeito foi o seguinte: M.N.M. ha-

via sido testada quase uma semana antes comô sujeito do

grupo experimental, tendo, portanto, visto as gravuras e

ouvido as apresentações das mesmas. Por uma falha do apar~

lho, entretanto, sua participação nao foi gravada. Lembro.-

me de que, já desta primeira vez, ela apresentou um desem-

penha excelente e adequado, acertando se não todos, pelo

menos a maioria dos silogismos.

Como experimentadora, esperei alguns dias e

voltei para gravá-la; desta vez, como sujeito do grupo con


- 172 -

trole (ainda com os silogismos do Grupo I, visto que os do

Grupo II, foram elaborados mais tarde) .

O aspecto atraente e de surpresa deste fato,

no entanto, está em que, contra todas as minhas expectati-

vas, M.N.M. recordava-se da testagem anterior, e não some~

te como um episódio de experiência pessoal; ela lembrava -

-se do"ve.Jt.b.a.t-<.m 11 quase que perfeitamente. Prova disto está

no fato de que ela insere em suas respostas trechos da a-

presentação das gravuras que só havia ouvido na sessão an-

terior. Por exemplo, na resposta (que é também uma repeti-

ção) dada para o silogismo n9 3, M.N.M. an~ec~pa uma das

premissas do silogismo n9 4, ao dizer:

"Ana .tâ t1a me.-óa".

Ora, tal premissa nao faz parte do n9 3, e

sim do ~, sob a forma:

"João e..tJ.tá na rne..6.a. 11 •

Pela justificativa dada ao n? 3, por outro

ladO, percebe-se que não se pode afirmar que M.N.M. nao

compreendeu, ou não se lembra da premissa menor:

11
PoJtqu.e. e..ta ê 6-i.tha. do João e da LÚ.c.1a.".

Outro fato a se notar é que a parte grifada

acima também não consta da premissa menor do silogismo 3,

mas aparece na apresentação do mesmo para a gravura, que

nao está sendo mostrada ao sujeito nessa ocasião.outra evi

dência da memória prodigiosa deste sujeito, não somente

relativa à l:i_nguageM,como também à parte visual, ou icôni-

ca da testagem.

No silogismo n9 5 temos outro exemplo. Na

justificativa, ela diz:

''Todo4 c.ac.ho~~o de. naça c.ome. c.a~ne. •.. e. 04 ou


- 173-

t4oA, que. nao ~ de. 4aca, come ve4du~a''.

Ora, esse trecho nada mais e do que as - pre-


missas maior e menor do silogismo ;.. egu-<.nte., n? 6' que M.N.
M. ainda ncw ltavla e.-6 c.utado naquele diJL.
Novamente, o fato acima indica que este su-

jeito possui memória privilegiada, incomum até.

A seguir, pretendo sistematizar a discussão,

aprofundando as análises iniciadas neste parte, ao mesmo

tempo em que apresentarei, do ponto de vista teórico, pro-

váveis explicações para estes fatos.

PARTE IV

Proposta explicativa: as estratégias

Voltando aos cinco sujeitos apresentados no

inÍcio deste capítulo, fica evidente que eles também utili

zam.estratégias, as quais acompanham o comportamento meta-

procedimental de compreensão dos silogismos.

Tais estratégias podem ser assim especifica-

das:

1 - Omissão da premissa menor( 3 )durante are


petição.

2 - Colocação da interrogativa (relativa á


Conclusão) sób a forma de declarativa.

3 - Utilização de _técnicas de narrativa.

A seguir, focalizarei as estratégias acima ,

discutindo cada uma delas.

Estratégia n9 1:

Omissão da premissa· menor.


- 174 -

Conforme foi mostrado acima, em algumas Rep~

tições, a premissa menor, ou parte dela, foi omitida. Al-

guns exemplos:

"0.& u.Jth o na o moll,a em iuga.IL quen-te..

No de..&e.IL-to do Sa.a.r..a., não moJta. uJt&o .tâ".

(J.D.S.S., sil. n9 2, Grupo II)

"Todoh a.n-i.ma..t l.iv!Le. mo!La. na. óloJte..t.-ta..


O .t.igJt.e. mona. .tambt'm?"

(id., sil. nQ 6}

"Toda.õ 6'Jtu:ta :tem vi.A:a.mina..

A maç.ã te.rn v-Ltam-Lna.?"


(id., sil. n9 9}

"SÕ que.m já c..ame.u e.-6.tâ. na me..õa.


O João já c..ome.u?''
(B.O., sil. n9 4, Grupo I)

"Todoll que. .&obe ne..&-óa pe.dJta. e.nxe.Jtga uma c...ida


de.
O que. e.la e.nxe.ngou?"
(id., sil, n9 8)

''Todo.& 6ilho de. Joã:o toma le.i.te..


E.&.&a ó.i.lha de.le. toma. f...e.J...te.,ou não?"
(J.L., sil. nq 3, Grupo I)

"E.ó.&e..ó amigo .&ão .•. óa.iz vi.&i:ta .óÔ o.ó domingo.

Q_ue. d1a .ó e.Jtá hoje.?"


(id., sil. n9 11)

"Toda..& a..ó pe..ó.óoa.-6 tomam c.a6ê de..poi.6 do alma-

co.
Ele..4 j~ a.lmaça.~am, ou nia?''
(id., sil. n9 12)
- 175-

Em todas as instanciações acima, os sujeitos

utilizaram a estratégia de omissão da premissa menor, ou

parte dela. Poder-se-ia afirmar, sem generalizar, que um

dos fatores responsáveis pelo uso desta estratégia é a uti

lização das gravuras para o grupo experimental. Neste caso,

a omissão da informação verbal poderia ser interpretada c~

mo sendo devida à redundância, isto é, ao fato de a mesma

estar presente sob forma icônica na gravura.

Dois fatores, no entanto, refutam esta expl!

cação:
- Em primeiro lugar, nao sao apenas sujeitos

do grupo experimental que a utilizam;

-Em segundo lugar, pergunto: por que também

as premissas maiores não foram omitidas na repetição des -

tes sujeitos?

Os pontos acima levantados talvez sirvam co-

mo indicadores -de que a operação de apagamento da informa-

çao.verbal especÍfiCa da premissa menor, realizada pores-

tes sujeitos, deve-se a fatores mais complexos do que so-

mente o trabalho da percepção, que fica apenas a nível sen

serial, de "i_nput" do estímulo visual.

Conforme já comentei na primeira parte deste

capítulo o que se pode depreender deste comportamento -


e,
antes, um trabalho, por parte do sujeito, de cornpreensao

da relação de inclusão existente entre a premissa maior

e a menor. Como conseqüência disto, segue-se uma outra op~

ração mental, esta de valor econômico ou simplificador,que

tem como efeito a retirada, na enunciação, da parte redun-

dante do silogismo, qual seja, aquela que já ocorrera na

premissa maior.

Esta argumentação também evidencia que estes


- 176 -

sujeitos compreenderam de fato o significado global do si-

logismo, e operaram sobre ele como o todo que é de fato. ~

importante também que se observe que as relações lógicas ,

dedutivas, expressas pelos silogismos, não se perderam em

virtude dessas alterações, fatO que teria ocOrrido, em al-

guns casos se· a premissa maior tiv·esse sido omitida ou sim

plificada. A título de ilustração, vejam como ficaria o si

legismo n9 12, do Grupo I, sem a premissa maior:

"AgoJta e.&.&ell amigo.!! e..&.tão .tomando c.aJé:.

Ele.& já. almoça.Jt.am, ou. não?"

Os enunciados acima reduziram-se a meros fa-

tos submetidos à adivinhação, e perderam toda a coerência

e implicação lÓgica tÍpicas dos silogismos.

Em particular, quero crer que esse comporta-

mento indica que o sujeito que o utiliza tem algum domínio

sobre um tipo de pressuposição pragmática, a qual esp~cifi

ca que os responsáveis pela enunciação podem deixar .4r!Plícita

aquela informação que eles acreditam já ser do conhecimento de

seu interlocutor. A omissão da premissa menor deve ser vis

ta, então como uma opção consciente, feita entre outras

possíveis mas não adequadas (por exemplo, a omissão, nos

mesmos silogismos, da premissa maior). Essa estratégia in-

dica ainda que o emissor é capaz de estabelecer para si um

certo consenso sobre a quantidade de conhecimento partilh~

do. Significa, ainda, que este emissor sabe que seu inter-

loctor é capaz de efetuar "dê.rna.Jt.c.heJ.:."(cf.GRICE, 1975, cita

do em DUCROT, 1977) discursivas sobre a mensagem que ele

estiver recebendo, e que é capaz de "pJt.e.e.nc.he.Jz." a informa-

ção ausente.

Esta estratégia de omissão da premissa menor,

do ponto de vista estritamente cognitivo, indica também


- 177 -

que os individues que a utilizam sao capazes de perceber a

i..mp.tieaç.ão lógica existente entre a premissa maior e a me-


nor. Levar a efeito a omissão da premissa menor é, portan-

to, o resultado de uma operação rnetaprocedimental relacio-

nada à capacidade cognitiva exigida para a compreensão do

silogismo.

Estratégia n9 2:

Colocação da interrogação em forma declarativa.

Apresento, inicialmente alguns exemplos da


utilização desta estratégia:

"(A &avtdã.tia de p.tâ.õt.ic.o)nã.o e.nfieJLJLu.ja"

(J.D.s.s., sil. n9 7, Grupo II)

" ... e (o 6al) de.&manc.hou.''


(id., sil. n9 8)

"En.tã.o Pe.dJto malta. rta. c..i.da.de."


'
(M.N.M., sil. n9 1, Grupo I)

"O Pixo.te. c.ome. c.attne., po!Lqu.e. o P.ixote. e.te. -


e
de. Jta.ça".

(id., sil. n9 5)

A explicação desta estratégia parece estar

ligada à seguinte questão:

Por que se fazem-perguntas?

Do ponto de vista pragmático, pode-se dizer

que as perguntas representam busca de informação, dissipa-

çao da dÚvida, confirmação de suspeita, etc. ( 4 )

Para DUCROT(op.cit.), "o p.lte...&.&upo.t.:to da pe..Jt-

gunta ê o e..le.me.nto comum. { óo"!tmu.iado e.ve..ntua.ime..nte.. .&ob a.


6oJtma de.. uma di.&junção lÓgica) a toda.& a.& Jte...&po.&ta-6 que..
- 178-

ela a.dm.Lte" .• (p. 100). Acrescenta o autor que "E.ó.óa pJtopJt.,.{,s-_


dade pode, eon.õeqUe.nteme.nte, val~Jt c.omo uma de..6iniçao ge-
Jta.t do.ó pJte..!Jllupo.õ:to-6 da.ó pe..Jtgunta..ó - o que pe..Jtmi.te.. 6aJtmu -
fa.Jt. a lte..gJta: ab Ú.niea.ó I!.. e..!! po.t..ta.& admitida.& polt uma pe./tgun-

ta .1ão .aque..la.ó qu..e.. lhe.. c.on.õe..ltvam o.ó p1Le...ó.óu..po4to.õ". (id.pp.

100-101).

De acordo com o autor, uma interrogativa do

tipo sim/não, por exemplo, só admite respostas, que sejam

também os seus pressupostos;.6im, ou não, e acrescenta que

"Qu..alqu..e..lt ou.:tlta a:ti.tu.de.. .óign.ióic.aJt.ia não Jte...bponde..Jt" { id.


p. 100). A mesma argumentação é valida para as chamadas in

terrogativas "qu- 11 •

Continuando a discussão sobre as funções


-
pragmáticas da interrogativa, acrescento ainda que essa

modalidade é usada interacionalmente quando aquele que in-

terroga deseja contrastar a informação nova e a velha rele

vantes dentro de um recorte internacional.

OCHS et alii {1979), discutindo a função das

interrogativas no processo de aquisição da linguagem, argu

mentam que, dentro 'de uma visão vertical do discurso,o par

pergunta-resposta corresponde a uma construção argumento -

predicado.realizada conjuntamente, pelo participante que

pergunta e pelo que responde, e que o produto deste proce-

dimento é a construção conjunta de uma proposição.Deste mo

do, o controle dos interlocutores sobre a ~unção lógica

das interrogativas {a construção argumento-predicado) deve

ser buscado dentro da situação discursiva em que elas ocor

rem. O mesmo argumento aplica-se à sua função pragmática.

Retornemos agora ao problema especifico que

estou discutindo, qual seja, a estratégia n9 2: por que a

substituição da interrogativa por uma declarativa? Creio

eu que esta estratégia é utilizada simplesmente porque os


- 179 -

-
sujeitos nao ve.e.m mo.tivo-6 pa.!ta in.te.JtJtogaJt. Isto implica em

afirmar que:
19 - Esses sujeitos ·compreenderam as variá-

veis pragmáticas presentes ao recorte interacional especi-

fico da sitUação de testagem. Sabem, portanto, que o entre

vistador está fazendo uma pergunta meramente retórica. Ou

seja: os sujeitos sabem perfeitamente que o entrevistador

não tem dúvidas a dissipar; logo, não há, realmente,pergu~

ta nenhuma a ser feita.

29 - A inclusão lÓgica entre premissa maior

e menor também desempenha um papel aqui: a pergunta da con

clusão, na verdade, nao tem a finalidade de introduzir in-

formação nova,visto que toda informação necessária já foi


explicitada pelas duas premissas. Logo, novamente, por que

perguntar?

39 - Em virtude desses fatores, estes sujei-

tos escolhem nao responder à exigência implícità da testa-

gem, o que equivaleria a repetir o silogismo "venba:tlm" ,com

a conclusão na forma interrogativa. Cognitivamente, esta

escolha pode ser interpretada corno uma medida de economia,

de evitação de redundâncias, o que me leva a reconhecer

nesses sujeitos um mecanismo de controle objetivo sobre as

variáveis presentes à situação discursiva.

Tal como ocorre com a estratégia anterior,a-

parentemente esta também parece encaminhar para um caminho

explicativo determinado: estes adultos compreenderam e op~

raram sobre os silogismos a nível metaprocedimental, e e

por este motivo que substituem a interrogativa, que expri-

me dúvida, pela afirmativa que exprime certeza.

Esta estratégia aponta também para outra ca-

racterística cognitiva destes sujeitos; eles têm consciên-


- 180-

cia Ua construção conjunta de conhecimento que está ocor

rendo durante a testagem, e que inclui a eles, sujeitos, e

à entrevistadora. ~ assim, de fato, que dispensam a pergu~

ta e vão direto à resposta, no caso das conclusões dos si-

logismos, uma vez que a resposta, em alguns casos, já ha -

via sido dada antes da repetição, e, portanto, a constru-

çao conjunta argumento-predicado de que falam OCHS et alii

(op. cit.) já fora explicitada anteriormente, pelo próprio

caráter de verticalidade do diálogo. Portanto, parece que

esses adultos não perdem de vista o processo dialÓgico que

está em fluxo no momento, nem o aspecto de produção conju~

ta de significados que ocorre na situação de enunciação.Os

enunciados produzidos, portanto, devem ser inseridos neste

processo de produçãà, cuja dinâmica ao mesmo tempo determi

na e é determinada pelo que já foi dito e pelo potencial -

mente enunciável.

Por outro lado, voltando à análise de DUCROT

(op.cit.) sobre a função. pragmático-semântica das interro-

gativas, talvez se possa explicar a presente estratégia pe

lo fato de que os adultos que a utilizam deram-se conta de

que a pergunta feita pela entrevistadora nao é uma pergun-

ta com função normal de interrogar. Logo, os pressupostos

de DUCROT nao são válidos neste caso, e os adultos compre-

endem que o ato de interrogar é inútil, visto que eles já

sabem a resposta, sabem que a entrevistadora também sabe

a resposta e que ela sabe que eles sabem a resposta. Logo,

engaja~-se na Única saída, também proposta por DUCROT, que

é não n~~pond~n. Notem que, se este raciocÍnio for válido,

então temos aí, na própria estratégia, uma operação inte-

, lectual de segunda ordem, qual seja: os adultos não atuan di-

retamente sobre o conteúdo explícito dos enunciados,mas s~

bre os seus pressupostos. O que evidencia, mais uma vez, a


- 181-

consciência da verticalidade do diálogo que esses adultos

têm.

Estratégia n? 3:

Utilização de técnicas de narrativa.

O uso desta estratégia tem por efeito a trens

formação da estrutura do silogismo em estrutura de narrati

va. Dentre as técnicas utilizadas, ressalto as seguintes:

destaque atribuÍdo à atuação das persona -

gens;

uma reordenação dos eventos, que deixam de

obedecer à seqüência lógica que tinham no

silogismo,e passam a seguir uma ordem mais

livre;

a inclusão de elementos indicativos de cir

cunstâncias; conectivos, etc;

- a conclusão do silogismo torna a forma de

desenlace da narrativa.

Vejamos alguns exemplos, todos retirados do

gabarito de M.N.M., que, como vimos no inÍcio deste capit~

lo, é o sujeito que se destacou pela utilização desta es -


tratégia:

- Justificando a resposta ao silogismo n9 3,

este sujeito diz:

" Patt.que. e.ie. -tã na me..6a, e. que.m jâ c.ome.u, ·já


.6aiu da me..6a. Na c.a.6a de. João, .6Õ vai na me.-
.6a que.m inda nao c.ome.u ainda. E o João c.'

a 6amZ.tia -tã na me..6a.. t pOJtque. e.le..6 ainda


num comeu ainda~.
- 182-

No exemplo acima, chamo a atenção para a fo-

calização central dada às personagens, para o desfecho, do

tipo narrativo, e para a reordenaÇão dos eventos.

-Ao repetir o silogismo n9 lO,M.N.!1. diz:


11
0 va.que..i..Jto João hoje. vai.. longe.,poltque. e..te.
vai. .te.va.ndo o c.a.c.hotutinho. O dÂ..a. que. e..e.e.
va.~ pe.Jtto, e..te. num le.va o c.ac.hoJtJto,ma~ h~

je. e.! e. va..i. .tange., vai .te.vando o c..ac.hotuw ".

Estão presentes aí os seguintes elementos de

narrativa: elementos circunstanciais indicadores de tempo

("hoje.", "o dia"); conectivos ("ma-i.&", "poJtque."); rem;-gan.!.

z~ção da ordem· de ocorrência dos eventos.

~ importante ressaltar que, apesar da utili-

zaçao dessas técnicas :reveladoras da Estratégia n9 3, M.N.

M., não obstante 1 preserva o conteúdo lÓgico do silogismo,

e em nenhum momento altera ou distorce as relações de con-

teúdo estabelecidas pelas premissas.

Por que M.N.M. usa esta estratégia? Este su-

jeito foi meu intermediário para contatar outros adultos

não-alfabetizados de sua comunidade. Por este motivo, tive

uma curta convivência com ela. Durante esse período, desc~

bri ser M.N.M. uma exímia contadora de histórias,muitas d~

las longuíssimas. M.W.M. lembra-se de diversas histÓrias

"de. me.mÕJt-{.a", e nãó se faz de rogada para contá-las.


SCRIBNER(op.cit.) relata o caso de pelo me-

nos um sujeito que assimila o conteúdo do silogismo à es-

trutura. da narrativa. O silogismo apresentado pela autora,

neste caso foi o seguinte:

"A.t.t :the. ;.,:toJte.6 -<..n Kpe..t.te..tand a.Jte. -Ln a town.

Mn. Ulla.tu. '.6 .õ:toJt.e. ;_;., in Kpe..t.te..tand. l.t, MJt.


U0a:tu'.6 .õ:toJte. -Ln a :town?" (p. 237).
- 183 -

Um dos Kpelle testados por SCRIBNER produziu

a seguinte repetição desse silogismo:


"You :to.td me. MJr.. Ukatu c.ame. t)Jtam hJ...6 h ame.

and bullt hi.6 .6toJte. ~n the. Kpe.lle..tand. The.n


you a1.1k.e.d me., 1.6 i:t -<..n a .town?" (p. 237).

A Autora faz a seguinte observação sobre a

repetição acima:

" ...
.to a na.JUt.ative. óoJtM.He. i..mpoJt.:te.d ne.w 1nt)o.tma
:tlon pe.n.ta.in.i..ng :to a pe.lt.6onaLf..y k.nown MJt.

Uka..tu ( ..• } bu.t am-é:t:ted the ma.jo1<


enü'<e!q". lp. 238).

No mesmo artigo, SCRIBNER apresenta uma ex -

plicação teórica para essas assimilações, sob a forma de


esquemas de conhecimento pré-existentes, os quais,ainda se
gundo a autora,. atuariam sobre o conteúdo dos silogismos ,

modificando-o:
"I 6 .the. Jte.iat:ion..6 :the. p1tobl.e.m.6 e.x.p.:r.e.-6.6 ane.
aJt.bJ..:tJt.aJr.y, :though, no.t c.on.6onan.t wi.th, on

in oppolition to, accumulated knawledge,
thein allimllatlon lnto pneexlltlng Qnow-
ledg .6c.hemM ma.y miiLtate. aga/..n.6t, na.then
tha.n 6ac1iita.te., comp~ehen.6ion,neca.ii, and
p4obiem-.6olv/..ng~(op.cit.,p. 239).

Chamo a atenção, entretanto, para o fato de


que o sujeito citado por SCRIBNER deteriorou a estrutura
lÓgica do silogismo, enquanto que o meu sujeito,M.N.M.,co~

.6e4va a..6 neta.~Õe.6 lÕgica.6, a.cne.6cendo-lhe.6 uma e.6t4utuna


na.n~ativa..Com efeito, parece que M.N.M. é um caso inverso
do discutido por SCRIBNER, visto que usa o conhecimento da
- 184 -

estrutura narrativa corno ponto de partida para comp~eende~

e ~ep~oduzi~ os silogismos.

Deste modo, temos, no caso de M.N.M. alguém

que consegue .atingir o nível metaprocedimental utilizando

um conhecimento anterior como estratégia: o · conhecimento

da estrutura da narrativa. Isto significa, talvez, que, do

ponto de vista cognitivo, este sujeito usa·o esquema para

a estrutura narrativa, que ele já havia internalizado,como

urna via de acesso para a compreensão de outros esquemas(no

caso, o esquema para compreender o raciocÍnio lÓgico-ver -


bal). Esse esquema da narrativa, no entanto, é utilizado

de maneira aXiva por M.N.M., como urna estratégia que lhe

permite inclusive atingir o nível metaprocedimental.

O domínio do esquema de narrativa, então,peE

rnite que este sujeito contextualize o conteúdo formalizado

do silogismo, e o transforme em um tipo de discurso nao

mais formalizado do ponto de vista lÓgico, poré~ lÓgiCo em

outro sentido: no sentido que se atribui à lógica no uso

cotidiano da língua.

SCRIBNER (op.cit.) afirma, a respeito, que

"I.t .i-6, o6 c.au.ue, tJt.ue. tha.t pe.opie. do not "~:,pe.ak. -in JJI}R..-

.tag.üm-6" -in any c.ommuni.ty we. flnow o fi { ••• )" (p.240). Poré!'l

não se pode negar que nos usos ordinários, comunicativos ,

da língua, muitas vezes se inserem silogismos, ou raciocí-

nios dedutivos sob a forma de silogismo, e .que estes usos

estão incorporados a linguagem cotidiana de tal maneira que

ninguém acha "e.-6qu.i.-6Lta" a ocorrência de um silogismo in -

terpenetrando uma conversa informal. Somente para ilustrar

e utilizando um recorte do momento sócio-político-econômi-

co atual, creio que seria bastante plausível que,numa con-

versa entre dois cidadãos, de repente ocorresse a seguinte

construção:
- 185-

"Quando 0-6 ptteç.o.õ .õa.o c.onge.tado.6, a. 1n6laç.ão


c.ai. Como o Funa~o congelou o.6 ptte.ç.o.6,en~ão

você pode. e.6pettatt que. vai ha.ve.tt uma queda


no Zndlc.e. de. -i.n6.ta.ç.ão".

Ora, no exemplo acima está presente um recio

cínio lÓgico-verbal, se bem que não tenha a formalização e~

trutural da lÓgica.

~ a esses usos cotidianos do discurso lÓgico

que estou me referindo quando relato o caso de 1'·1.N .M.

PARTE V

Discussão e conclusões

Em resu~o, até este momento, examinei neste


capítulo casos de sujeitos que demonstram terem compreend!

do o conteúdo dos silogismos a eles apresentado?,fato que

se evidencia pelas respostas, repetiçÕes e .justificativas


adequadas. No entan,to, apesar de afirmar que estes sujei-

tos atingiram em termos cognitivos um·nível que pode ser

chamado de metaprocedimental, gostaria de chamar a aten-

çao para o fato de que o comportamento utilizado por eles

durante as três etapas da testagem vtao e o comportamento

que teria uma pessoa alfabetizada e com escolaridade:

Existem diferenças básicas, que se evidenciam

pelas transformações que esses sujeitos não- alfabetizados

introduzem na estrutura do silogismo, transformações essas

que foram tratadas como estratégias.

Adiantando um pouco mais a discussão, direi

que a formalização introdutória sobre o metaconhecimento

pode perfeitamente aplicar-se às pe~~oa~ tet~ada~ e e~cofa


- 186 -

4iza.Wu,mas nao é de modo algum adequada para explicar a

produção e compreensão de silogismos no caso dos iletrados.

Fatos teóricos de outra natureza devem ser invocados neste

Último caso. Creio eu que de natureza di~cu~~iva e p~agmâ-

ti c.a..

Minha proposta é a seguinte: existem :cami-

nhos alternativos, não necessariamente iguais, nem compen-

satórios, os quais levam a um domínio do discurso, no •


m-

vel "me.ta", pessoas que não percorreram os caminhos tradi-

cionais que levam a esse domínio (por exemplo: alfabetiza-

ção e educação formal). Como conseqllência, a natureza dos

metraprocedimentos utilizados por essas pessoas é diferen-

te, estando mais ligados ao conhecimento pragmático e -


as

regras que fundamentam os usos cotidianos do discurso, em


situaçõ~s comuns de comunicação.

Toda discussão e _exemplificação levadas a

efeito nas partes anteriores deste capítulo apontam para

esta direção: a utilização de estratégias é guiada muito

mais por princípios pragmáticos do que pela necessidade ló


gica de coerência imposta pelos'silogisrnos.

Especificando melhor esses princípios,ou co-

nhecimento pragmático, acrescento que eles parecem relaci~

nados com uma habilidade para detectar e resolver confli -

tos que se estabelecem na dialogia, e que são mais produz~

dos pela situação de enunciação do que pelos enunciados e~

volvidos. Esses princípios, portanto, estariam determina-

dos pelo conhecimento das leis conve~~acionai~, conforme

formuladas por GRICE(op.cit.) e DUCROT(l972), levando em

conta as restrições feitas à teoria griceana pela teoria

da enunciação, isto é: deixando de considerar a in6ollmação

como eixo determinante das máximas conversacionais, e des-


- 187-

locando esse eixo para a interação, o diálogo, a própria a


tividade conversacional enquanto processo.

GRICE(op.cit.)utiliza o termo

relacionado a uma análise lÓgica da conversação,para desi~

nar " ... a c.e..JLtaút .&ubbc..la.t..ó o6 nonc.onve.JU:..i..ona.t Vnplic:atwr.e.<>,

wh-éoh I ;haU caU CONVERSAT!OfJAL J.mpR_úatuJteõ ..• "(p.

4 5) , as quais, segundo o Autor, estão" •.. e.õ .6 e. nt..i..a.t.tq c.onne.c.t

e.d wLth c.e.ttta.in ge.ne.nal 6e.a.tutte.6 oS d-i..õc.ou.Jtt.e. •.• {idibid.).


Na visão griceana, portanto,o Princípio cooperativo fu~cio

na como um quadro pré-existente,ao qual os interlocutores

devem aderir durante a interlocução. Criticas recentes a

teoria griceana, GUIMARÃES{op.cit.);ORLANDI(l983};FLAHAULT

(1979);WILSON e SPERBER (1979); RECANATI(1979) ,no entanto,

têm questionado a validade das máximas de GRICE.Com efeito,

na medida em que são colocados aprioristicamente,sua acei-

tação significaria negar o modelo construtivista do diálo-

go, cujo produto não pode ser antecipado por máxima nem

princípio algum,dadO o conceito de ".6-i.gni&-ú:.ado e.me.Jtge.nte."

que está subjacente ao mesmo.

Deste rnodo,ao falar em uma lÓgica da conver-

saç~o,incorporo à mesma as criticas acima feitas ao modelo


griceano.Talvez fosse mais oportuno aqui adotar os reparos

feitos a esse modelo por WILSON e SPERBER(op.cit.) ,os quais

reduzem o princípio cooperativo e as máximas· a um único a-

xioma,que os Autores denominam ·ax.i.oma da pe.Jttinê.nc..[a, o qual

fundamenta-se em" ... un Jtappoti e.nt:Jte. d 'une. pallt une. p!topo-

.6-i:t.i.on e.nonc.ê:e. ú d'alLth..e. pahvt un e.n.6e.mbie. de. p!topo-6-i...t.[on-6


que. .t'audite.u!L a e.n mé:moiJr.e." (p.88) .Tal formulação não entra
em conflito com o modelo de construção que estou seguindo

neste trabalho,segundoo qual o relevante é ronstruído no momen-

to da interação.

Retomando as estratégias apresentadas no in!


- 188-

cio, e analisando-as a partir do ponto de vista acima, ob-

teremos os seguintes resultados:

Estratégia nQ 1:

Omissão da premissa menor.

De maneira genérica, esta estratégia poderia

ser desdobrada da seguinte maneira: dado que estes sujei-

tos têm consciência do "c.on;t-i.nuum" do discurso no recorte

interacional especifico da sitação de testagem,então,no mo

menta em que lhes é pedido para repetir o silogismo, eles

omitem a premissa menor, uma vez que, como já vimos, exis-

te urna parte de informação desta premissa que é não perti-

nente, pois está presente na premissa maior. Estão, agindo

assim, evitando prolixidade e exagero na interação. Fica


claro, do ponto de vista cognitivo, que a aplicação desta

estratégia só é possível porque o sujeito é capaz de des-

centrações, e porque ele tem consciência de que estão ocor

rendo conflitos na situação dialÓgica, os quais ele resol-

ve pela utilização da estratégia.

Estratégia n'? 2:

Colocação da interrogativa na forma declarativa:

Do ponto de vista de uma abordagem interaci~

nal, é preciso integrar esta estratégia, para complementá-

-la, a .um conceito pertencente à análise do discurso: as

formações imaginárias, especificamente as relativas ao re-

ferente (silogismo).

Sob este aspecto, observa-se que, com o de-

correr do diálogo {testagem), a imagem que os sujeitos que


- 189 -

usam a estratégia n9 2 fazem do referente vai se modifican

do: no momento de dar a Resposta, a situação de interlocu-

ção se configurava da seguinte malleira: a pergunta relati-

va à conclusão do silogismo devia ser respondida, isto -


e,
o suje.ito interpretava a situação como um lugar do diálogo

em que ele precisava provar que sabia qual era o referente,

e que esta prova seria fornecida pela resposta. Porém, no

momento em que a entrevistadora pede-lhe que repita o sil~

gisrno, então a resPosta jâ foi dada, e a situação de inte-

ração é mais ou menos especificada pelos seguintes fatores:

quando o sujeito é solicitado a repetir o silogismo,ele já

sabe qual é a resposta à pergunta da conclusão e já sabe

que eu (entrevistadora) sei que ele sabe a resposta.

Deste modo, obedecendo ao conhecimento de

uma lógica da conversação,- especificamente do axioma da

pertinência, ao repetir o silogismo ele não repete a per-

gunta, mas repete a resposta, colocando, portanto, a con-

clusão na forma declarativa.

Mais uma vez, percebe-se que estão em jogo

aí fatores cognitivos, relacionados à capacidade de descen

·tração desses sujei tos, que lhes permite manter "e.m 6lu.xo"

uma visão global da construção de significados que está

sendo feita durante o diálogo, daquilo que é dito e que

não é dito. Novamente, ainda, a explicação desta estraté -

gia prende-se a uma necessidade d€ resolver um conflito

detectado pelo sujeito na interlocução, qual seja: atender

o pedido para repetição "ve.1r.ba:tlm" representaria, do pon-


to de vista da interação, uma negação das etapas já ultra-

passadas (Resposta e Justificativa) e um retorno ao início,

o que equivaleria a negar o significado construído até

aquele momento, bem como as formações imaginárias relati-


- 190 -

vas ao referente. Seria negar, em resumo, o conhecimento

compartilhaU.o,que o sujeito, através da aplicação desta es


tratégia, demonstra saber que existe e que está em jogo

na construção do discurso.
Além do mais, do ponto de vistá pragmático ,

o fato de o sUjeito não repetir a· pergunta como tal leva a


outra suposição: nao perguntar pode significar, ao nível
da metamensagem, que o sujeito compreendeu e aceitou os

papéis que estão em jogo nessa interação específica,ou se-


ja: um sujeito pengunta(no caso, a entrevistadora), o ou-

tro !Le..6ponde.. (ele, sujeito). Por isso, "a.que..te. que. tte..6ponde."

evita a pergunta e transforma-a em resposta.

Estratégia n9 3:

Uso de técnicas de narrativa.

A meu ver, o seguinte processo ocorreria~:

Em primeiro lugar, M.N.M. interpreta a situa


çao de testagem como um lugar de dialogia, de inter-troca

de informação e de construção conjunta de um referente.

Os silogismos, nesse pano de fundo, aparece~

-lhe como "c.oJtpo.& e..õt:Jta.vtho-6", visto que sua·estrutura for-

malizada está antecipadamente pronta, e portanto não pode

ser negociada. A informação presente nos silogismos (con -

teúdo das premissas e da conclusão) independe de evidên-

cias e contém uma verdade intrínseca decorrente da própria

estrutura dos mesmos.

No entanto, para o sujeito, esta situação


configura-se como contraditÓria, visto que existe um con-

teúdo percebido como pronto {o silogismo) num recorte que


- 191 -

M.i.~ .M. interpreta como sendo um lugar de negociação de con

teúdos (a dialogia).

Esse conflito é resolvido por M.N.M. através


do acréscimq de uma estrutura verossímil à estrutura do

silogismo: a estrutura da narrativa, a qual, ·por sinal,de-


vido à experiência pessoal desse sujeito, sintetiza o modo

de interação ideal entre os interlocutores, num diálogo(al

guérn que conta uma história para alguém que ouve essa his-
tória) .

Desse modo, através das técnicas de narrati-

va, M.N.M. está usando o axioma da pertinência, ao mesmo

tempo em que atribui evidências adequadas ao conteúdo dos

silogismos.

Do ponto de vista cognitivo, o uso desta es-


tratégia denota, mais uma vez, que o sujeito que a usa é
capaz de levar a efeito descentrações cognitivas que lhe

permitem analisar, numa situação conflituosa, quais os ele

mentes destoantes, e reparar essa situação utilizando- se

para tanto, de seu conhecimento pragmático.·

Por Outro lado, vemos que ,mesmo dentro da

estrutura narrativa, este sujeito preserva o conteúdo dos

silogismos, o que indica que um nível de metaprocedimento

foi atingido, mas foi modificado pelo quadro de referências

pessoal do sujeito e pelo seu conhecimento sobre o funcio-

namento do discurso.

g neste tipo de conhecimento, portanto, que

se deve buscar a explicação para os comportamentos metapr~

cedimentais exibidos pelos cinco sujeitos estudados neste

capítulo. Reafirmo novamente que o metaconhecimento destes

não-alfabetizados não é da mesma natureza que o metaconhe-

cimento atingido pelas pessoas letradas e escolarizadas~i~


- 192 -
to que as rotas que levam a um e outro sao diversas: conhe

cimentos e práticas não-formalizados nem sistematizados por

um lado, e do outro formalização do conhecimento e treino

em certos esquemas de pensamento (como o raciocínio deduti

vo), formalização e treino esses que sao feitos primordial

mente através da escola e que só se tornaram possíveis de-

vido ao uso da escrita.


- 193-

CAP!TULO V

NOTAS

(1)
Pessoalmente, nao concordo com essa visão da escrita

corno sendo cau4a. Acredito, antes que ela seja um p~o­

da~o social, que surge em decorrência de mudanças nas

relações de produção, e do aparecimento de novas neces


sidades de mediação entre o homem e seu meio ambiente.

(Z)ApÓs perceber esse fato, comecei a perguntar aos sujei-

tos que testava se sabiam "o q_u.e.. di..ze.Jt. "mamZ&ow"". A

maioria deles não sabia. Este fato parece confirmar mi-

nha suposição a respeito de C.A.P.

( 3 )Em Lógica, o silogismo em qu'e se subentende uma premis-


sa é denominado ~· e.nt-i.me.ma.".

4
( )Não incluo nesta discussão as perguntas que equivalem a

atos de fala indiretos, isto é, perguntas que exprimem

ordens, pedidos, etc.


- 194-

CAPITULO VI

CONCLUSÕES

PARTE I

1. Os sincretismos e as rnodalizações

O sincretismo é um fato natural nos usos co-

tidianos da linguagem. Existem, no entanto, discursos espe

cializados onde o sincretismo não tem lugar. ~ o caso da

ciência em geral, e da lÓgica, em particular.

Nas ciências, especialmente as chamadas "e.xa

:tal>", as explicações para os fenômeno~ observados devera o-

bedecer a duas exigências, às quais HEr-1PEL (1981) chaiua de


11 11
h..e.QIÚ... t>d 04 : o requisito da relevância explanatória e o-

requisito da verificabilidade. A relevância explanatória ,

segundo o Autor,

"E a c..ondJ..ç.ão a .6Vt-.6ati.õfie.Lta pa.Jta. que. e..ó:te.


jamo.f.l a.t.doltiza.do~.> a. dize.Jt: "O &e.nõme.no e..ótã
e.xplic.ado- ê.. ju-td.a.me.nte. o que. .&e. e..6pe.Jta.va
na.& c.iJtc.un.6tânc.J..a..ó da.da.-6"". (op.cit.,pp. 66-
67) o

O requisito da ver i ficabilidade exige que" ...

o~ enuneiada6 que eon,6tituem uma explicação eient16ica de


vem plte,6taJt--6e ii veJtióieação emp1Jtic.a". (op.cit., p. 67~

A relevância explanatória tem Intima relação

com o discurso cientifico: com efeito, a explicação do fe-

nômeno deve ser tal que permita a verificabilidade. Qual-

quer tentativa de inverter o processo, e tentar forçar a


- 195-

estrutura verbal a fim de dar uma aparência de cientifici-


dade à mesma, resulta em explicações não relevantes,porta~

to, não científicas. Minha hipótese é que essas "e.x.p.tic.a. -

çÕ.e..&" seriam todas sincretismos. Observemos, com ilustra

çao, o seguinte exemplo de explicação não relevante (e,por


tanto, nao científica) dado pelo próprio HEMPEL .
"0 M-tll.Ônomo FRANCESCO S!Zl apll.eõeY~-tau o <~e-

gu..tnte a.Jtgu.me..nto pa.Jt.a. demon.6.tlta.Jt polL qu.e..,a.o


c.on:tJtâtr.io do que. .& eu c.onte.mpoJtâne..o Ga.U.te.u.
aft.inma.va :te.IL v-i.tdo c.om uma. luneta, na.o pode..
ha.ve..Jt .&atê.tite..& c.iJtc.u.lando em :tonno de. Júp~

.t e.II. ..

"Ex.i.&:te.m .&e.te.. ja.ne..la.6 na. c.a.be..ç.a:· du.a..& venta&,


du.a.lJ oJL.e..fha..6, doi& a.tho.6 e uma boc.a.. Vo me..!.>
mo modo, e..x.i.tde..m no c.êu du.a..& e..õ~tlte...e.a..o pJtop:!:_
_c.la.dona.6 , du.a..6 d-e.& tÍ a. v otr.ã.v e.i&, dua.& lumino& a&
e uma &Õ inde.c.L&a e Indiüetr.ente, que ê. Me.Jt-
c.Ú.tr.Io. VaZ i de muLto& ou.ttr.oll 6enôme.noll lle--

'
que. lletr.ia 6atiga.nte. e.nume.ll.atr., c.onc.luZmo!l que.
o nüme.Jto do& pla.ne..ta.& ê. ne.c.e.&.&a.Jtia.me.nte. .&e-
te ••• Além d.ü-t>o, o-6 &atêUte.& .6a.o invi&.Z-

ve..i.& a olho nu, lago nã.o podem .te.tr. út6luên-

'•tn"'m 1111 • ( op.c1' t • , p.66).


n ao -.:..X,.t..,.
o

O sincretismo, ou sincretisrnos, presentes à


argumentação acima são evidentes: a analogia entre a anat~

mia do corpo humano e a constituição do universo; a coloca

çao do "mág.ic.o núm e.Jt o 7" como dogma científico; a postula-

çao da não-existência para o nao visível a olho nu,etc.


- 196 -

Do ponto de vista da estrutura discursiva, o

que se nota na argumentação acima é o uso de conjunções co

mo: logo, daZ, e de advérbios como neQ~66a~iamente, que


dão uma aparência científica à formulação explanatória.

Uma das exigências .~o discurso científico é,

portanto, evitar os sincretismos. O raciocínio silogístico,

deste ponto de vista, é o lugar ideal para que isso se rea

lize, principalmente devido à sua estrutura fechada, e a -


relação de inclusão de um p·articular num genérico.

Chegamos agora à questão específica levanta-

da pelo genérico da premissa maior.A função desse genérico

é de restringir o conhecimento, já que no silogismo ele


serve como moldura para enquadrar o particular (contido pe

la pre~issa menor) .

Ora, vamos opor a esse genérico dos silogis-

mos cuja força está em restringir e formalizar,~~ outro ti

po de genérico, que ocorre em situações cotidianas, nao-

científicas, de uso do discurso,algumas das·quais já foram

mencionadas anteriormente, especialmente no Capítulo I I I :

trata-se dos genéricos que ocorrem em.provérbios,sinpatias,

con.selhos, rezas.

Nessas situações naturais, não-formalizadas

do uso do discurso, a estrutura formalizada do genérico ar

-existe com o uso de sincretismos e de modalidades.

Nesses contextos, o genérico perde a força

restritiva que possui no silogismo, e adquire função total

mente oposta: ao invés de fechar, ab~e um leque infinito

de possibilidades.

A diferença fundamental entre os dois genér!

cos está no fato que, enquanto que o genérico dos silogis-

mos está direcionado para a formalização de uma estrutura


- 197-

científica, ao contrário, o genérico dos provérbios,rezas,


etc., está orientado para finalidades pragmáticas.

Neste ponto, um "fila.bh" do passado vem-me à


memória: mae atarefada com sete filhos barulhentos,que nao

cessavam de correr, pular, brigar, e, conseqüentemente nao

lhe davam sossego, esporadicamente proferia a seguinte rna-

xirna:

"Macaco que. muito pu.ta que.JL chumbo".

O genérico contido no provérbio acima soa co

mo urna advertência, quando proferido no contexto em ques -

tão. Esta é a finalidade pragmática, neste caso: o provér-

bio é usado pela mãe como tentativa para regular o compor-

tamento dos filhos.

Imagino, no entanto, outros recortes em que

o mesmo provérbio poderia ser usado: por exemplo, para en-

cerrar uma narrativa (ou relato) sobre alguém que cometeu

um crime e por isso foi castigado.

Outra experiência que muitos de nos, que já

freqüentamos escolas, ternos, refere-se àquele momento da

aula de Português em que o(a) professor(a) coloca na lousa

um provérbio como, por exemplo:

"Ve.u.& ajuda que.m c.e.da madJt.uga"


e depois diz aos alunos:

"Cantem uma. hi.&:tÔJt.i..a. c.om e..&.&e. p!t.ovê.JtbJ..o".

E cada aluno cria uma história diferente.

~ a esse caráter de abertura para o mundo~e

o genérico do senso comum possibilita, que me referi atrás.

Com relação às rezas, feitiços, simpatias, a

estrutura genérica aparentemente serve para que o agente

(curandeiro,etc) proteja-se contra eventuais fracassos:corn


- 198 -

efeito, o genérico das rezas é tão aberto que se pode per-

feitamente dizer que "aque.l.e. não .&e.JLviu" e apelar para ou-


tro, e assim consecutivamente, até que algum efeito se pr~

duza, ou então que o interessado desista. Deste modo, a

pessoa daquele(a) que benze fica resguardada, visto que

"óo-L a. Jt.e.za que. não 6u.n.c.ionou". Nestes cas?s, existe ainda

o fator misticismo em ação, pois o benzedor é visto somen-

te como um intermediário que detém o conhecimento das fór-

mulas mágicas que curam. Então, o fracasso pode sempre ser

creditado à não-benevolência das entidades invocadas.

Então, é esta abertura infinita para práti-

cas, interpretações e usos diversos que caracteriza o gen~

rico do senso comum.

Como se deduz, a compreensao desses genéri-

cos pelos indivíduos de um determinado grupo social que d~

les faz uso, vem impregnada por um caráter sincrético,isto

é, eles são compreendidos contra o pano de fundo das varia

das situações em que foram usados. Não têm sentido fora de

um quadro de referê,ncias pragmático •.•

Portanto, esses genéricos e o sincretismo an

dam lado a lado. Com efeito, foi isso que mostrei no capí-

tulo III, onde ficou claro que os sincretismos produzidos

pelos sujeitos ali estudados estão relacionados a um conhe

cimento genérico de características de senso-cornum,conhec!

menta esse que aflora numa situação em que o sujeito sen-

te-se confrontado com o outro genérico, este de caráter ci

entÍfico e fechado, formalizado, presente nas premissas

maiores dos silogismos que lhe estão sendo apresentados.I~

capazes de enfrentar esse genérico "e..t.t.Jt.anho",deslocado de

contextos, os sujeitos então substituem-no pelos seus gen~

ricos familiares,e, através da produção dos sincretismos ,


- 199 -

resgatam-se enquanto sujeitos de seu próprio discurso, e


introduzem na situação de testagem seus parâmetros pro-

prios de argumentação.
Conforme já foi visto no capit~lo III, esse

movimento no sentido da auto-afirmação como sujeito do pr~

prio discurso tem, como bases cognitivas, a adaptação e

suas duas faces: acomodação e assimilação., bem corno um es-


forço de descentração, que é bem sucedido ao nível pragmá-

tico.

E quanto às modalizações introduzidas pelos

sujeitos no conteúdo não modalizado dos silogismos?

Os silogismos, conforme já disse atrás, ape-

sar de sua àparência de neutralidade, têm, no entanto, um

conteúdo rnodal subjacente, relacionado com o caráter da

nece44~dade alêtica.Com efeito, a estrutura do silogismo

conduz a uma, e somente uma, conclusão lÓgica, e qualquer

. -
outra alternativa será considerada errada. O silogismo,oor

tanto, estabelece com sua estrutura um parâmetro pré-deteE

minado de verdade necessária por si mesma, independenteme~

te do conteúdo proposicional ou mesmo das referências gen~

ricas ou específicas que contenha. A conclusão lógica colo

ca no sujeito, portanto,uma exigência que não admite esco-

lha nem discussão:dados A e B,nece~~a~lamente deve-se con-

cluir C.

Ora,a necessidade alética é, talvez, de to-

das as modalidades, aquela mais formalizada e mais difícil

de ser encontrada nas línguas naturais em seus usos coti -

dianos. Por outro lado, sabe-se taffibém que a modalidade a-

lética é considerada pelos lÓgicos como a mais importante,

e é a mais estudada por eles em termos do estabelecimento

de uma metalinguagem.
- 200 -

Parece haver., então, uma relação Intima en -

tre a necessidade alética supjacente ao silogismo, e o ca-


ráter fechado do genérico da premissa maior.

o movimento de restabelecimento de um quadro

de referências pessoal, realizado pelos sujeitos que prod~

zem sincretismos e modalidades, pode, então, ser visto co-

mo uma tentativa de trazer, para a situação de interlocu -

çao, urna outra ordem de conhecimento, de outra natureza,s~

melhante estruturalmente, mas alternativo e contrário: ou-

tro genérico, mais aberto e mais abrangente; outras modali

dades, mais próximas ao conhecimento do mundo.

Do ponto de vista cognitivo, corno já foi vis

to, os sujeitos que produzem sincretismos e modalidades es

tão realizando descentrações, num esforço de adaptação co~

nitiva à situação discursiva, que apresenta enunciados que

soam talvez estranhos para eles. Esses enunciados prontos

e "odd", semelhantes a bandejas congeladas de "TV dinneJt 11 ,

então, são negados pelos sujeitos durante a construção de

significado que ocorre no momento da interação e são subs-

tituídos por outros, que sao para eles (ou para seu quadro

de referências) mais adequados para a situação em questão.

Deve ser lembrado que os sincretismos co-o

correm com as modalidades em muitos casos. Os sujeitos que

produzem ambos são os mesmos. Existem, no entanto, algumas

diferenças entre os dois.

Os sincretismos, do ponto de vista da Histó-

ria da Ciência, constituem um lugar de passagem, um momen-

to de primeira tentativa de formalização de dados brutos

que ainda necessitam de explicação científica formalizada,

ou então, como vimos no inicio deste capítulo, o sincretis


- 201 -

mo representa momentos em que um paradigma já nao e mais


"e-i.ent16ic.o", visto que nao serve para explicar novos fenô
menos ou dados novos observados •••
Desse ponto de vista, o nível de descentra -

çao exigido para a elaboração de sincretisrnos pode ser


considerado como mais sofisticado, mais elaborado do que

aquele exigido para a produção de modalidades.

Com efeito, as modalidades podem ser compre-

endidas como produtos de descentrações feitas em termos p~

ramente ax-i.oiôg-i.c.o~, equivalendo a juízos de valor sobre o

caráter de necessidade alética subjacente aos silogismos

Este tipo de descentração parece-me mais simples do que a-

quele que leva ã produção dos sinçretismos. Estes são pr~

dutos de descentrações feitas pelos sujeitos as quais es-

tão sitUadas ao n!vel dos a~gumento~ usados durante a si-

tuação discursiya. Vê-se claramente, no capítulo sobre os

sincretismos, que os sujeitos conco~dam ou di~condam dos

silogismos e que é o genérico dos mesmos que está sendo


comparado com o outro genérico, de cunho pragmático.

Portanto, a produção de sincretismos e a de

modalidades podem ser encaradas corno maneiras diversas de

inserção do sujeito na enunciação através da recorrência

ao seu conhecimento factual e do senso-comum. Nas modalida

des, o sujeito compara o neces~ário expresso pelo silogis-

mo com o seu sistema pessoal de valores. Nos sincretismos,

o sujeito compara o conhecimento genérico expresso pela


premissa maior com o seu conhecimento genérico, não-letra-

do do mundo. Muitas vezes, esse conhecimento não-letradoes

tá impregnado pelo conhecimento letrado, devido ao próprio


fato de que estes sujeitos vivem em uma cultura perpassada
- 202-

por valores, normas e verdades "eient16ic.a.6",produtos da


escrita.

Portanto, os dois movimentos de descentração

exprimem estruturas cognitivas diferentes e graus diferen-


tes de aproximação ao domínio do raciocínio formalizado, o

qual, por sua vez, será atingido pelos adultos que aprese~

taram comportamentos rnetaprocedirnentais.

2. Os comportamentos metaprocedimentais

O rnetaconhecimento, conforme já foi visto no


decorrer deste trabalho (especialmente nos capítulos I e

V), tem sido considerado como urna aquisição tardia no cur-


so do desenvolvimento cognitivo, a qual se dá· em função de

fatores. como: escolarização e domínio da escrita.


O domínio do nívet "me.ta.", em geral, é consi
derado pelos autores aqui apresentados como intimamente re

!acionado com o desenvolvimento do raciocínio lÓgico, e a

aquisição de modalidades abstratas de pensamentos.

Em termos trans-culturais, tem-se afirmado

que os grupos sociais "pnJ.milJ.vo.6" não se desenvolvem inte

lectualrnente a ponto de atingirem o nível do metaconheci -

mente, fato que é creditado principalmente à sua cond~ção

ágrafa ou iletrada.

A aquisição de um sistema escrito tem sido ,


11
então, apontada como condição .6-i.ne qua. non" para a aquis.!_

ção do metaconhecimento, visto que somente a escrita permi

te a decontextualização total que é exigida, por exemplo ,

na compreensão de raciocínios lÓgico-verbais, ou silogis -

mos. GOODY (1977), por exemplo, afirma:


- 203 -

" •• • .tog-i.c., "ouJt. .tog-i.c.", -t.n the Jte.-6-th..-i.c;te.d


~e.nl>e. o6 an ln~tJtume.nt ofi analy~ic. pnoc.~

du.IL<• I •.. I •eemed t:o be o. 6u.nct-<on o6 Wlt.i.t

ing, l>inc.e. it Wal> ~he. le.tting down


.6 pe.e.c.h tha-t e.nabf..e.d man c..te.a!tly .:to .6 e.patt.a.t e.
woJtd.é 1 to manipuia..te. the.J..IL oJr.de.tt and to de.-
ve.lop .õy.t.togi.tJ.tlc. ~o!Lm.õ o6 Jt.e.a.&on-i.ng; .:the.-t>e.
.tate.Jt. we.ne. .6e.e.n a& .6pe.c.i6-i.c.a.t.ty Lite.Jt.ate.
Jt<ltheJtt:ho.n OJto..t { ••• ) {op.cit., p.ll).

No entanto, mostrei neste trabalho, contra-~

xernplos a esta ordem de coisas, visto que alguns dos adul-


tos não-alfabetizados que estudei conseguiram compreender

os silogismos apresentados.
As implificações deste fato sao de várias or

dens, e pressupõem uma discussão em três níveis, a saber :

19) Uma discussão acerca da existência ou


não de uma relação necessária entre o do
mínio da escrita e o metaconhecimento;

29) Uma discussão acerca da escrita.e suava

lorização nas sociedades industrializa -

das, valorização essa que freqüentemente

vem acompanhada de uma desvalorização da

oralidade;

39} Uma discussão ao nível teórico,principa!

mente do paradigma piagetiano, visto que

o mesmo mostrou-se inadequado em muitos

momentos para explicar os dados aqui le-

vantados.

~ o que veremos a seguir.


- 204 -

PARTE II

1. Domínio da escrita e metaconhecimento: relação

necessária?

Na verdade, a ordem dos termos no questiona-

mento acima deve ser invertida. Com efeito, os vários est.!:!_

dos que foram revistos neste trabalho parecem não deixar


dÚvidas acerca do fato de que a aquisição de um sistema es

crito leva ao metaconhecimento, quer se observe a história


social das civilizações, quer se observe a história dos
indivíduos em uma dada sociedade.

No entanto, se a escrita necessariamente con

duz ao raciocínio lÓgico e ao nível meta, cabe aqui a se-

guinte questão: 6cmente a aquisição de um sistema escrito

possibilita esse progresso? Ou, ainda melhor: seria o.met~

conhecimento de natureza tal que ele só se torna acessível

àqueles que sabem ler e escrever bem?

Os dados colhidos e mostrados neste trabalho,

bem como as interpretações que foram dadas aos mesmos apo~

tam· para uma resposta negativa: não, os níveis meta de fun

cionamento não são possíveis somente para quem domina o

sistema escrito de sua língua.

Notem que usei o plural acima: "nZveit."meta.

Isto porque urna das conclusões que se tira observando os

dados aqui apresentados é que não se pode considerar um

Único nível de metaconhecimento. Do mesmo modo, não se po-

de considerar que somente um tipo de conhecimento leva ao

metaconhecimento (por exemplo, somente o conhecimento e do

mínio da escrita).
- 205 -

Já mostrei no início deste capítulo que a


pro?ução de sincretismos pode ser encarada como um primei-

ro nível meta, quer em termos de raciocÍnio individual,~

em termos de história da ciência. A natureza das descentra

ções que são levadas a efeito no .caso da produção dos si_n-

cretismos pelos sujeitos aqui estudados mostra bem que e-

xiste um objeto que esses sujei tos estão conseguindo "a.iç.aJt"

corno objeto de cc~templação objetiva: é assim que comparam

o conteúdo dos silogismos àquele de seu quadro de referên-

cias baseado na experiência pessoal, esteja esta impregna-

da ou não pelas modalidades de pensamento e "veJtdade.6 '' dis

seminadas pela escrita.

RUSSELL (1951, p. 23, citado em WATZLAWICK '

et alii, op.cit., p. 174) ·afirma que:

11
{ ••• ) toda a .ti.nguage.m te.m, c.omo a6.i.nma
WITTGENSTEIN, uma e..õtJtu:tuna a c.uj o Jte.õpe.Lto,

na linguagem, nada pode. .õe.n di..to,e.xc.e:to que.

pode.Jtã have.Jt uma outJta .U.nguâge.m que. tJtate.

da e.'.õtJtutuJt.a da pJt.i.me.Lta linguagem e c.on.te.-

nha e.m .õi. uma nova e..6tJt.u:tuJta., e que ta.i.ve.z

na.o e.xi.htam .t.i.mi..te..6 pa.Jta e..õ.õa hie.JtaJtqui.a. de.

linguagem".

Desse ponto de vista, as modalidades e os

sincretismos poderiam ser encarados corno niveis meta ante-

riores aos comportamentos metaprocedimentais. De dentro de

urna perspectiva pragmática, esses níveis serviriam para

desfazer a visão congelada do mundo que o silogismo trans-

mite, a qual não faz sentido numa situação de interação,o~

de o significado emergente é dado corno pressuposto.


- 206 -

O meta-nível seguinte, aquele dos comporta -


mentes metaprocedimentais, mostrados no capítulo v, é de
natureza diferente de outros níveis meta, alcançados por

pessoas letradas.

A questão seguinte é: qual é a natureza des

sa diferença de natureza entre os dois procedimentos meta,


o dos não-alfabetizados e o dos letrados? Quanto ao dos

letrados, ficou já especificad~ no decorrer deste trabalho

(principalmente no início do capítulo V) corno ele funcio-


na, corno se desenvolve e quais suas características.Em re-
sumo, o metaconhecimento dos letrados pode ser tomado como
sinônimo de: descentração completa, equilíbrio estável,re-
versibilidade operatória. Decorre do desenvolv.imento das

estruturas lÓgico-matemáticas, instala-se durante o está -


gio operatório-formal, e está relacionado casualmente com
a escolarização e o domínio da ·escrita.
Como já foi visto no capítulo V, no entanto,

os comportamentos metaprocedimentais apresentados pelos a-


dultos não-alfabetizados estudados nesta pesquisa baseiam-
-se em estratégias, que não são usadas na mesma situação ,
por adultos alfabetizados.
A meu ver, essas estratégias fornecem as pis
. -
tas para se responder às questões colocadas no inÍcio des-
ta secção.
Minha proposta é a seguinte: existem caminhos
que levam a um nível meta de raciocínio, os quais são al -
ternativos àqueles apontados tradicionalmente. Um desses
caminhos parece ter ficado evidente neste trabalho:refiro-
-me ao conhecimento e domínio demonstrado pelos adultos(em
questão no capítulo V) acerca de como funciona o discurso
- 207 -

e de quais os mecanismos subjacentes à situação dialógica.


Pesquisas recentes sobre aquisição de lingu~

gem de abordagem sócio-interacionista, têm procurado mos-

trar que o egocentrismo detectado por PIAGET e outros na

linguagem das crianças pequenas , na realidade nao existe,

e pode ser estudado de um outro ponto de vista.

CARUGATI et alii (1982), por exemplo, argu-

mentam que crianças muito pequenas {desde o sensório-motor)

já demonstram um comportamento engajado em trocas comunica

tivas com um interlocutor. Essa capacidade precoce para a

tomada de turnos !epresenta, para os Autores, que o egoce~

trismo e a incapacidade de descentração não existem, quan-

do se considera o desempenho conversacional dos indivÍduos

desde tenra idade. Deste modo, os Autores propÕem urna in-

versão da posição piagetiana: ao invés de se colocar desen

volvirnento cognitivo e desenvolvimento social numa re~ação

paralelística, CARUGATI e.t ali i propõem que o cognitivo ~

tas vezes avança corno decorrência de fatores sociais, tal

como a capacidade para comunicar-se adequadamente. Dizem

eles:

"In a.UJt.J, te.Jtmini, .f' úU:e.Jtazione. ~ocia.le. !ti


.&u..Ua. p!toó/..cua. pe.!t lo .6v/..lu.ppo cognitivo ne.l
la mÜU!La .i_n cu.i_ •Ma conh<nt• .Ca p!t•ha dA_

eo.&cie.nza dei dióóe.ILe.nti pu~ti di vi6ta(de.l


le. d/..66e.Jte.nt1 1Li.6po.6te.) o alme.no che. po6.6~

no e.x1.6te.ne. altne. Jt1.6po.6-te. { •.• )" (op. cit.,


p.92).

O ponto de vista que estou defendendo aqui ,

qual seja: a proposta de que existem caminhos alternativos

que levam a níveis meta de funcionamento, segue uma argu-


- 208 -

mentação semelhante: a meu ver, o conhecimento acerca da


pragmática do discurso ( "p;z.agméitica" entendida aqui no seu

sentido mais amplo, que inclui o conhecimento do funciona-

menta do discurso enquanto atívidade de interação social ,

com todos os seus fatores,ou a competência comunicativa)


'
pode sofisticar-se a tal ponto, nos indivíduos, que leva

ao metaconhecimento, independentemente do fato de esses in

divíduos serem alfabetizados e escolarizados.

Em termos mais específicos, a proposta acima

significa que outros sistemas de conhecimento competem com

a instrução formalizada que é passada "via" escolarização,

e com o conhecimento abstrato advindo do uso da escrita em

situações substitutivas da língua oral (por exemplo: escre

ver uma carta, ao invés de ter uma conversa pessoal com

alguém). Especificamente, neste trabalho, sugiro que o

conhecimento pragmático S?bre o funcionamento dG discurso,

pode vir a ser um caminho alternativo para os rnetaníveis.

No entanto, conforme afirmei atrás, apesar

de ser alternativo, não é compensatório.

Isto significa que a natureza do produto -


e

de outra ordem. Deste modo, parece apropriado propor, além

de rnetaníveis hierárquicos, também escalas diferentes de

rnetaníveis, as quais se organizariam de acordo com a natu-

reza do conhecimento que lhes deu. origem.

Em termos de formalização teórica, seria pr~

ciso propor pelo menos duas formas alternativas (não comp~

titivaS) como explicação possível aos fatos acima expos-

tos: uma delas, baseada nos pressupostos piagetianos, ex-

plicaria a aquisição do nível meta pela evolução das estr~

turas lÓgico-matemáticas até o estágio operatório-formal,o


- 209 -

que significa atingir uma estrutura cognitiva, cujo espe-

lho externo é a lÓgica. Estariam aqui incluídos grupos so-

ciais alfabetizados escolarizados, de nível sócio-econômi-

co médio ou.alto, e que não estivessem margirializados dos

modos de produção.
A segunda teoria explicativa, a qual, que eu

saiba, nao foi formalizada ainda, deveria propor um modelo

de desenvolvimento baseado no conhecimento da pragmática ,

do funcionamento do discurso, na construção. conjunta do

significado emergente, etc. Esta segunda teoria deveria in

clusive e necessariamente explicar o aparecimento de •


m-

veis meta de funcionamento, e sua.característica "bu..i ge.nS;_

4.ib", diferente dos·nÍveis meta atingidos. via desenvolvi-

mento do raciocínio lÓgico. Obviamente, deveriam estar in-

clusos nessa teoria mecanismos sócio-culturais ulternati-

vos à escola e à alfabeti~ação, ou melhor: mecanismos que

considerassem mais a competência social e comunicativa das

pessoas do que sua competência cognitiva. Uma inclusão dos

quadros de referência que proponho neste trabalho, bem co-

mo de uma interação dialética entre eles também me parece

adequada para a formalização dessa proposta.

2. Escrita e oralidade: valor e preconceito

"Já. moJtJte.Jta.m, a mae. e o-6 doi-6 1Jtmão-6.t t a.IL-

de. de.mai.~ tam6êm pa.Jta .temblr..a.nç.a-6. {{oj e .-


JG.
não 0.6 amo. Não .6e.1. me..6mo .6e o.6 ame.i.Eu
abandonei. Não tenho mai.6 na mente. o ehe.i~t.o

de. .6ua pele. nem no.6 oiho-6 a eolr.. do.6


oiho.6.Não me. ie.mbn.o da. voz,a não .6Vt a..6 ve-
- 210 -

ze-6 da voz doce. com a. 6a.diga. da noUe..O Jti..-


.6-o,na.o o ouço ma...i-6-; nem o Jti.&o, nem 0.6- g1li-

:to.6-. Tudo acabado, na o me. .te.mblt.o ma.L6. Polt


i-6.6-0 e..óc.lz.evo .6-0btte. e..ta. hoje. c.qm tanta fiac.i-
Udade.; e..6~1te.vo .to.nga.me.nte., de.ta..thadame.nte.,
ela &e tJta.nJ.J6oJt.mou. em e.óc.Jt.,{.ta."
(DURAS, 1985, p.33)

MARGUERITE DURAS sintetiza em dois momentos,

dentro da citação acima, o dilema escrita x oralidade. Diz

ela: "Tudo acabado, não me. .te.mbJto ma.L6". E acrescenta:

"PoJt. i.l:do e.óc.Jt.evo •.. e.ta. .&e tJta.n.ófioJl..mou em e.6c..Jtila.".


Ao contrário da visão tradicional, que apre-

goa a superioridade da língua escrita sobre a oral exata -


mente porque a primeira permite a permanência do objeto no

tempo, a visão de DURAS a respeito da escrita mostra o pr~

cesso de apagamento do sujeit9 que sente pelo sujeito que

escreve. As emoções, as experiências pessoais, os episó-

dias autobiográficos se transrnudam, solidificam-se, conge-

lam-se, quando são colocados em forma_escrita. o sujeito-

-escritor não é nunca idêntico ao sujeito-oral. E o objeto

da escrita nunca coincide_corn o objeto da oralidade.

Há uma alteração essencial que se processa

nesse objeto quando da passagem de um primeiro para ~m se-

gundo sistema de mediação, e essa alteração nem sempre traz

conseqüências positivas.

~ sobre isso que pretendo falar aqui: o que

se perde quando urna simbolização de segunda orde~(a escri-

ta) predomina sobre a de primeira ordem (oralidade); que é

o que ocorre nas sociedades industrializadas. Por extensão,

falarei também das perdas sofridas por grupos sociais que,

embora ágrafos, estão inseridos nessas sociedades letradas,


- 211-

"evo.tu1.da..;., 11 , industrializadas, e precisam compartilhar com


elas práticas sofisticadas, alienantes e massificadoras~,

em sua grande parte, têm como veículo a escrita.

Urna das "vantage.n.ó" apontadas para valorizar

as sociedades .letradas é o seu de.senvolvimento cientifico

e tecnolÓgico, que seria impossível sem a escrita. No en-

tanto, esse desenvolvimento, ao nível de uma análise hist2

rico-social, não ocorre às custas de nada. Esse desenvolvi

menta, na verdade, aliena os indivíduos de seu próprio de-


sejo, de sua individualidade, e, muitas vezes, de sua cul-

tura e historicidade. A alienação é também um produto da

escrita. Muitas vezes essa alienação vem de contra-peso aos

avanços tecnolÓgicos e a uma atitude cientificista assumi-

da com relação a esses avanços.

~ assim que grupos sociais ágrafos que vi-

vem inseridos numa sociedade letrada são pouco a pouco des

truídos de suas práticas. Em outro local (TFOUNI,ms. njp )

teço considerações a respeito de como os não-alfabetizados

são desconsiderados 11
QtLa.ndo .óe. c.ol.oc.a. e.m pauta. a. pnodução
e &-i.6:te.ma.t-izayão do c.onhe.c.ime.nto" (id). No artigo em ques-

tão, afirmo que:

"Na. Jt.e.a.Uda.de., o.t. "a.vanço.õ" .t e.c.noiõg.-Lc.o-6, p!LE_


mov-ido-6 pela ne.c.e-6&--i.dade de --i.ndu.õtJt--i.a.Uza -
.ç.ã.o e p!Loduç.ão e.m la.Jtga. e.-6 c. ala de. be.n-6 de.
c.on-6umo, têm .6oia.pado ã lnte.l.-l.gênc.la pnãt.<_-
c.a. têc.nic.a.-6 a..Ue.Jtna.tiva..õ, c.la..t..t.i6ic.a.da..õ c.o-
mo "-Lna.de.qua.da.-6 11
,
11
-Ln.6t-i..n.tiva.õ ", 6Jtu.t o de.
c.Jt.e.ndic.e.-6 11 e ou.tno.-6 JLÕtuio-6 impo.t.to-6 in-te.l1-
c.1onalme.nt"e., c.om a. 6.i.na.!1da.de. de. .t.ub,tJt.a.iJL
ao povo .õe.u c.onhe.c..ime.n-to e .õua. i..de.nt.icfade."
(ibid.) o
- 212 -

A ciência, produto da escrita, e a tecnolo -

gia, produto da ciência, são, portanto, do ponto de vista

aqui adotado, elementos reificadores, principalmente para

aquelas pessoas que, por não serem alfabetizadas, nao têm

acesso ao conhecimento sistematiz.~do nos livros, comoên-


..
dias e manuais, o que configura "uma Jtuptu!La e.ntlte. eiênc.-ia

e conhe.c.ime.nt o comum" (id.) •

Abrir mão do próprio conhecimento, em larga

escala fundamentado no senso comum e em práticas cultural-

mente herdadas, é o preço que os não-alfabetizados dentro

das sociedades modernas pagam para poderem sobreviver, e,

muitas vezes, subsistir, dentro dessas sociedades.

Deste modo, a escrita, no mesmo movimento

com que cria, também destrói. Não pretendo absolutamente~

gar, ou sequer diminuir a importância da escrita para o

desenvolvimento do conhecimento e o aumento do bem-estar

das sociedades. Apenas quero mostrar "o ave.-6.60 do ave..&.õo


do ave..6.6o", como diria Caetano Veloso. Numa·visão dialéti-
ca, sempre que se ganha, também se perde algo, ~ do ponto

de vista da perda que estou me situando. E o trabalho de-

senvolvid~ aqui serve muito bem para mostrar corno tem sido

etnocêntrica e preconceituosa a maneira de ~xplicar e estu

dar a mentalidade "plt-i.mli-Lva". Por extensão, creio que mo~

trei que os sujeitos não-alfabetizados aqu~ estudados esp~

lham, em seu discurso, sua história, bem corno a existência

de caminhos e modos de funcionamento cognitivo que não são

"me.no-6", nem "p-i.oJte.-6"; sao, antes, diferentes e alternati-


vos, por serem, tal como os dos letrados, produtos históri

co-culturais.

Se é verdade que os discursos têm embutidos

em si papéis sociais, que são alocados (e aceitos ou nao


- 213-

pelos interlocutores), então o que este trabalho nos mos-

tra é exatamente a relutância das ·pessoas ágrafas em acei-

tar a forma pronta do silogismo, exatamente devido ao"cie.n

t1 6-ie.o!' inseri to no mesmo, com o qual não querem cornpactuar


por ser de natureza diferente do "c.-i.entZ6-i.c.o" especÍfico

de sua cultura. No fundo, esses ·indivíduos parecem recusar

-se a ecoar, e a se constituírem como sujeitos responsá-

veis por um discurSo estranho e. deslocado do seu cotidiano,

de suas crenças, de suas práticas ••. A LÓgica termina sub-

vertida pelo senso comum, pela modalidade,pelos sincretis-

mos, pelos comportamentos rnetaprocedimentais.


Do ponto de vista dá explicação teórica, so-

mos remetidos novarnénte ao Caoítulo III, onde mostro que o

plano da experiência pessoal está constantemente em estado

de tensão com relação ao discurso.mais forrnalizado.A obje-

tividade total é urna farsa.

E para os sujeitos aqui estudados, essa far-


sa f~cou muito aparente, na medida em que, em um contexto

entendido corno conversacional, começam a ser introduzidos

silogismos. Além do mais, do ponto de vista dos sujeitos,

a forma dos silogismos, pronta e fechada, deve ter sido

sentida como urna maluquice da entrevistadora, mais ou me-

nos algo parecido com aquilo que nós,"c.J.vil.iza.do.t.", "c..i.e.n-

t.i.tda-6" e. letrados, sentimos em presença de um esquizofrê-


nico.

WATZLAWICK et alii(op.cit.) tocam no ce:;r-ne

desse problema quando discutem o paradoxo fundamental da

existência humana, o qual é assim formalizado:

"0 homem é, e.rn úLtima -<'.n.t.tânc.ia, .&uje.ilo e.

obje.to de. .t.ua bu.&c.a.. Conquanto .t.e.ja impnovª-


- 214-

ve..t e.nc.ontJt.a.Jt. alguma vez uma. h.e.õpo.&ta. à in-


te.JtJtogação f..obli.e. .&e a mente. pode. .&e.1l c.on.&i-

dena.da. algo f..erne.lha.nte a um .&if..te.ma. üoJt.ma.i~

za.do, (. -.,) a ba.õc.a. humana. de. Uma c.omplte.e.n-


Aao do .&igni6ic.ado de. f..ua. e.xi6t~nc.ia. c.on.&tb
tu.( uma. tentativa de. óoJtma.liza.ç.ão". (id.ibid.,
p. 246, grifos dos A.).

Em outras palavras, o que esse paradoxo nos

transmite e o seguinte: não se pode atingir a objetividade

total sem a experiência pessoal,mas a experiência pessoal

não tem espaço para a objetividade total. A inserção da

subjetividade é algo inevitável, e, deste ponto de vista ,

nao existem meios e fins: antes, talvez se pudesse dizer

que existem sempre me.iof.. que, dentro de uma visão pontual,

podem pa.Jt.ec.elt. 6in.&,ou ser tomados corno tal, para efeitos

acadêmicos.

3. O ponto de vista teórico

"PaJt.a. uma Jt.e&po&-ta que na.o pode &eJt. expJt.e&-6a.,

tampouco a peJt.gunta. pode &eJt. expne-6&a.. O

enigma nao exi&te ( ••• )

Sentimo.6 que, me.-6mo -6e Jt.e.6pondê.&&emo& a to-

da.6 a.6 po-6.6.Zvei-6 pê.ngun:ta.& cient.Z6ica.-6,me-6-

mo a&.6im 0.6 pnoblema.6 da vida Qontinuaniam

J..ntoca.do4. ~ c.tano, não ne-6-ta.nâ então pe!t -

gunta alguma e e.t>ta. e_ pne.c.i&amente a. Jt.e&po~

ta.'' {WITTGENSTEIN,l95l,p.l87, citado em

WATZLAWICK et alii, op. cit., p. 248).

O modelo da lógica formal espelha o funciona


- 215 -

menta intelectual do homem? Esta é uma pergunta que, do

ponto de vista dos dados e argumentos aqui mostrados, nao

pode ser respondida afirmativamente em definitivo,visto que,

do ponto de vista de uma abordagem pragmática, do funcion~

menta do discurso, alguns pontos básicos das propostas pi~

getianas sobre o desenvolvimento cognitivo ficam subverti-

dos e tornam-se questionáveis.

Vejamos quais sao eles.

PIAGET coloca a lÓgica formal corno o corres-

pondente, no mundo exterior, às extruturas totalmente adaE

tadas da inteligência do indivÍduo.

Tal como a lógica formal, então, essas estru

turas caracterizam-se principalmente por dois fatores: a

~evenóibilidade e a de~eentna~ão. Quando atinge o estágio

operatório formal, o indivíduo, cognitivamente equilibrado,

consegue atingir a descentração geral e reversível.Por es-

te motivo, consegue considerar todas as coordenadas rele -

vantes para a solução de um problema, conseguindo testar

várias hipóteses, sem perder de vista seu ponto de partida

inicial.

Essas operaçoes formais, para PIAGET,só têm

sentido dentro de um modelo de funcionamento cognitivo que,

como já disse, tem sua contrapartida externa nas operaçoes

da lógica formal. Por que o modelo da lógtça formal?

A formalização extrema do conhecimento, a


"ve.Jtdade." científica, a objetividade a qualquer preço: é
isto que se obtém como resultado da adoção do modelo da

lógica formal. Dentro desse modelo, cujo paradigma prevê


um final pronto e acabado a ser atingido, não tem valor o

subjetivo, o experimental, e muito menos a criatividade


- 216 -

científica, a liberdade para questionar e (tentar) mudar o

objeto formalizado, produto do conhecimento "f.Õgic.o".BUCK-

MORSS (op.cit.) critica o fato de a lÓgica formal servir


como 11
pa.Jta.d.igrna c.o.&mo.tÕgic.o" e_ como determinante das no-

çoes de realiQ.ade e verdade (p. 3.8, tradução da A.) , visto

que essa lÓgica (e o conhecimento abstrato, o raciocínio

formalizado que ela refletiria) tem servido, ideologicarne~

te, às sociedades capitalistas e aos meios de produção ca-

racterísticos delas.
Cabem, então, neste momento, as seguintes par

guntas: Por que a lÓgica formal? Por que nao a pragmática

do discurso? Uma das contribuições deste trabalho, segundo

meu ponto de vista, foi ter mostrado que a ótica com a


qual se tem examinado os processos cognitivos dos iletra-

dos pode ser mudada: em lugar de observar os enunciados,ou

os produtos do pensamento em geral (como fazem LURIA (op.

cit.); SCRIBNER (op.cit.) e SCRIBNER e COLE (op.cit.), por

exemplo) pode-se alternativamente tomar o sujeito do dis-

curso e a enunciação como lugares privilegiados onde o fun

cionamento intelectual (também) pode ~er detectado e inves

t i gado.

Para essa substituição do produto pelo pro -

cesso, enquanto objeto de análise, a metodologia e os pos-

tulados teóricos de análise do discurso mostraram-se extre

rnamente produtivos, visto que possibilitaram, entre outros

aspectos, que a situação fechada de testagem pudesse ser

considerada como um discurso. Isto permitiu que fatos como

as modalizações e os sincretismos pudessem ser alçados co-

rno objeto de análise

Do ponto de vista psicolingüístico, este tra


- 217 -

balho mostrou ainda que a abordagem centrada na pragmática

do discurso e rica o suficiente para que sejam trazidos à

tona alguns processos cognitivos de adultos não-alfabetiz~

dos que não haviam ainda sido detectados pelos pesquisad~

res que se têm ocupado do problema. Isto possibilitou que

o estudo das relações pensamento-linguagem aparecesse como

um lugar onde o não-alfabetizado deixa de ser um "n.ãa", e

passa a ser um "-6im" ,ou um "ta.mbê:m".


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- 226 -

ANEXOS
- 227 -
ANEXO I

Entrevista

1. - Nome.

2. Idade (ou ano do nascimento).

3. - Profissão atual.
4. - Profissões que já exerceu.
5. Onde nasceu? Cidade, Estado.
6. - Nasceu no campo(fazenda) ou na cidade?

7. - (Se nasceu em outro local) Quando veio para Ribeiião

Preto?
8. (Idem) Em quais outros lugares morou?

9. - Já foi à escola?
10.- {Se sim)Quanto tempo? Onde era?

11.- (Se não)Por quê?


12.- Sabe ler?

13.~ Sabe escrever?


14.- Já aprendeu a ler alguma vez?

15.- (Se ~) Por que não sabe mais?

16.- Já aprendeu a escrever alguma vez?

17.- (Se sim) Por que não sabe mais?

18.- Onde aprendeu a ler (a escrever)?

19.- Origem do pai.


20.- Origem da mae.
21.- Escolaridade do pai.
22.- Escolaridade da mae.

Características adicionais dos sujeitos, levantadas

pela entrevista.
- 228 -

As profissões (ou ocupações) que os sujeitos


declararam estar exercendo à época da testagem foram:

prendas domésticas - 09 sujeitos

empregada doméstica- 02 sujeitos

- faxineira,lavadeira- 02 sujeitos

vigilante noturno - 01 sujeito

biscateiro - 01 sujeito

Um s~jeito estava desempregado no dia da

testagem.

As profissões (ocupações) anteriores declaru

das pelos sujeitos foram:

lavador

bóia-fria

- empregada doméstica

ajudante de cozinha

costureira

- prendas ~omésticas

faxineira

Doze dos sujeitos sao originários do Estado

de são Paulo, três de Minas Gerais e um· de Alagoas.

Dez nasceram na zona rural, quatro na zona

urbana, um em olaria, e um nao se lembra onde. Somente cin

co sempre moraram no município de Ribeirão Preto. Os ou-

tros onze vieram de outros municípios para a cidade.


- 229 -

Anexo II

A- Ve~e~{ção da& g~avuna~. ap~e~e.ntaçÕe~ e ~ifogi~rno& uti-


lizado& pana o Gnupo l. Gnupo e.xpe.nime.ntal ( Sujeitos

testados com gravuras, sendo as premissas maiores nor-

mativas).

Gravura n9 1: Um rio, algumas pedras, Um rapaz tomando

água no rio, tendo ao lado·suas botas e um c~pacete de

motociclista. (Esta gravura foi utilizada para os silo

gismos n9s 1 e 2 do grupo experimental).

Apresentação: "Ell.te {apontando) é o !tio Taguá, e e&-te

(apontando) ê. o Pe.dJLo. O PediLo e..õ-tá. bebendo água no

!t.lo, o(a) Sn. (a) e..&tá. vendo?"


Sil?gismo n9 1: "SÕ quem mona na c...idade. pe.&ca. no ttio
Ta.g!f.á.. O Ped!to (apontando} _pe.6c.a no ILio Ta.guã. (a-ponta!!

do I .
. E.te mona na. cidl:tde., ou não?"

Silogismo n9 2: "Toda..õ a..ó pe..ó&oa.ó que. u.óa.rn c.a.pa.c.~te.

andam de mot:oc...ic..l.e.:ta. E.õt:e.. ê.apac.e..t:e.. (apon-tando) ê do


Ped4o (apo~ando).

Ele. a.nda de mot:oc..ic.l.e.:ta?"

Gravura nQ 2: Sete pessoas (2 adultos e quatro crian-

ças). Os dois adultos e duas das crianças estão senta-

dos à mesa, fazendo uma refeição. Três das crianças

estão afastadas da mesa, fazendo outras coisas. O lo-

cal é urna varanda aberta, com um gramado e árvores ao

fundo, o que dá a impressão de estarem ao ar livre. (U-


tilizada para os silogismos 3 e 4).

Apresentação:"E.õ--t:a fiamZl.ia(apontando) e.6-tá c.omendo em-


- 230

ba.i..xo da.& á.Jtvolte..&. E.te.& e..&-tã.o fta.ze.ndo pique.-n1que.. O

João(a.pontando) é o pai... A LÚ.c..ia(a.ponta.ndo) -e -


a ma.e., e
e..õ:t e.& ( apont a.n.do) .6 ã.o 06 6-i..tho-.6".

Silogismo n9 3: "Todo.6 Oll 6.i...tho6 e ó1.tha..6 do João .to-

mam le.Ue..
E!da.(aponta.ndo uma da..6 c.n1a.n_ç.a.6} e uma t)Ltha.. -
Ela .torna .te...U.e., ou não?"

Silogismo n9 4: "SÕ que.rn J a comeu na. a e.l:l:tâ. na me..& a..

O João (apontando) e.-6-tâ. na me..6a.

Ele. j ã. comeu?"

Gravura n9 3: Uma moça sentada no chão, segurando uma

escova, com um cao "c.oll.i.e."no colo. (Utilizada para os

silogismos n9s 5 e 6).

Aprysentação:"O nome. de..&.ta. mo.ç_a.(a.ponta.ndo) e. Ma.tr.ia.. A


Ma.ll-ia. :te.m muUo.6 ca.c.holtJt0-6 11 _.
Silogismo n9 5: "Todo.6 o.& c.a.c.hoJtJta-6 da. Ma.ll.ia. .6a.o Pe.quS:_

-no.6.
E.&:te. c.a.c.hontr.o {apontando) ê. gJta.nde..

Ele. ê da. Ma.Jt.la. ou não?"

Silogismo n9 6: "Todo-6 o-6 c..ac..hoJtJto-6 de. Jtaç.a .6Õ c..ome.m


c..aJtne.; nunc..a c..ome.m ve.JtduJta.
E.6~e. c..ac..hoJtJto (apontando} e. de Jtaç.a.
O que. ele. c..ome.?"

Gravura n9 4: Um homem em pe, de barba cerrada; biga - -


des, paletó, gravata borboleta, camisa branca e meias

brancas. Em lugar das calças, está usando anágua bran-

ca. (Utilizada para o silogismo n9 7).

Apresentação:"E.6te (apontando) e. o Pe.dJto. E.te. u.6a .6a-i.a,


o{a) SJt. {a} e.6t5 ve.ndo?''
- 231 -
~gismo n9 1:"Todot:J o-6 home..rt.& que.. u..6am .õa-i.a .tJta. ba.-

lha.m no bane. o.
O Pe..d~o (apontando) u.&a .&ala.
Onde.. e.R..e.. ttt.a.balha.?"

Gravura n9 5: Uma pedreira em primeiro plano; um peda-

ço de praia e de mar. Uma moça no topo da pedreira, o-


lhando em direção à terra firme. (Utilizada para o si-

logismo n9 8) .

Apresentação: "E-t.ta..6 pe..dJt.a..6 (apontando} -6-ic.a.m na be..-i..Jta.


da p!ta.i.a.. E.&:ta. maç.a (apontando) ê. a. Ana. Ma.Jt1a.".

Silogismo n9 8: "Todo.6 que. .6obe..m ne...6ta..6 pe..d!Lab {a.ponta.n

do) e..nxe..tt.ga.m uma c.ida.de...


A Ana Ma~Ja (apontando) ;ub/u aZ.

O que.. e...ta. e..nxe..Jtgou?"

Gravura n9 6: Uma paisagem de caatinga. Em primeiropl~

no, um homem a cavalo~ vestido com roupas de ·couro,te~

do ao lado um cachorro. (Utilizada para os silçgismos

9 e 10) •

Apresentação: "Eó.te. {apontando) ê: o João. Ele ê: va.qu.e~

JLo. E.6te (apanta.ndo}ê a bu.JLJLo Pinhão. E e.6te (apontan-


do) é o ca.chaJr.Jr.o do João. O nome de.te e Xote".
Silogismo n9 9: "Todo.6 o.6 vaqu.eill.a.6 .6Ô u..õa.m Jr.ou.pa. de

couJLo paJLa. rnontaJL.


O João (apontando) e vaqu.eiJLo:
O que e.te. u.6a paJLa. montaJL?"
Si~ogismo n9 10: "0 João .6Õ leva o cachoJLJLa Xote. junta
quando vai longe. da áaze.nda.
Hoje e-te( apontando) eUéi levando o Xote(apontando).
Ele. vai inda longe. ou pe.Jtt"o do. áa.ze.nda?"
- 232 -

Gravura n9 7: Dois casais sorridentes, sentados e~ uma

sala de visitas, tomando café. (Utilizada para os silo

gismos n9s 11 e 12).

Apresentação:"Et..õe.-6 quatlto(apontando) .6a.o amigo.&. Ete..6

.e..6.tã.o .6 e v-i...6ila.ndo".
Silogismo n9 11: "E.&.óe.-6 a.m-i.go.ó (apontando) .&Ô 6a.ze.m v.i
.ói.ta de.--------- (aqui o e~;perimentador dizia um dia

da seoana díverso do d{a de testageiD) •

Hoje., e.le..& e..ótão .óe. vL6i:ta.ndo.


Q.ue. d-La. é. hoje?"
Silogismo n9 12: "Toda..6 a.ó pe..6.6oa..6 .60 tomam c.aáé. de.-
po-i..-6 do a..tmo ç.a.
AgoJta,e..te.f:> (apontando) e..&-tã.o -tomando c.a.áé.
E.te.6 j ii a.tmoç.a.Jr.a.m, ou não?"

GraVura n9 8:Um casal em roupas de banho, deitado numa

praia.

Vê-se urna nesga de mar e umas pedras próximas da


praia. (Utilizada para o silogismo n9 13).

Apresentação: "E6.te. (apontando} ê. o Joaqu.irn.Eh!:a (apo!1

tando) ê. a Ihaull.a. E.te-6 eh:tão na pll.a.ia tornando .õo.t".


Silogismo n9 13:"0 Joaqu.im{apontando) .õabe nada.Jt, ma.6

a I.6a.uJta (apontando)não .6abe.

Pna c.hegan ne.õ.6a..6 pednah (apontando) pll.e.c.i.6a ill nadando.

Q.ua.t d0.6 do.i-6 c.on.6egue c.hega.Jt .tâ?"

B - Ve.õc.Jtiç.ão da.h gJta.vuJta.-6, apJte.õentaç.Õe.õ e .õLtogi.6mo.õ uti..-

lizado.6 pa.Jta o GJtupo II. Gnupo e.xpen.ime.nta.t (Sujeitos

testados com gravuras, sendo as premissas maiores de.6-

c.ll..it.iva-6). OBS: Para cada silogismo foi utilizada u~a

gravUra.
- 233 -

Gravura n9 1: Uma paisagem de inverno: árvores e capim

semi-cobertos pela neve. Três reses pastando.

Apresentação:"O(a.) SJt. (a) .6a.be. o que ê e.6.6a. coJ...6a bJta.n

ca.? (E.ópe..Jta.va. a Jte..6po.6ta.). ~neve.. E.6.6e iuga.Jt a1 61c.a


em Santa: Cata.Jt.üta".

Silogismo n9 1: "Quando c.a.[ a neve.; .6emplle 6az 6Jr...io.


Hoje e..td.ã. c.aindo neve a1 (apontando) e.m Santa Catanina.
E.õtã 6aze.ndo 6Jti..o a1?"

Gravura n9 2: Dois ursos dentro de um rio semi-encacho

eirado.

Apresentação: "O(a) SJL.(a.) c.onhe.c.e. e.6.6el.l b-<..c.ho.6?(e.6pe-

Jta.va. Jte..&po.6ta).

São uJt.6 o&".


Siloaismo n9 2: "0.6 u!l..6D.6 nao mollam em iuga-'r.e..& que.nte..6.

O de..6e.lt..to do -Saa.Jt.a ê um .tu.ga.Jt .mu-Lto qu.e.nt:e..


MoJtam u!t.60.6 lá., ou não?"

Gravura n9 3: Dois macacos em cima de uma árvore.

Apresentação: "O(a) SJL. (a)· c.onhe.c.e e.&.te.& b..Lc.ho.&?(Agualt

dava a Jt.e..&po.&-ta). São mac.ac.o.&, não é:?"


Silogismo n9 3: "Todo.& o.& mac.ac.o.& .&ão mamZ6e.Jr..o-6.

E.&.&e.& b..Lc.ho.& aJ: (apof'ltandol .&ã.o mac.ac.o.&.

E.te..& .t.ão mamZ6ell.o.t. ou não?"

Gravura nQ 4: Um colar de ouro e enormes brilhantes.

Apresentação:"O(a.) Slt. (à) e.&.tã. vendo e.&-te c.o.ta.Jt?"


11
Silogismo n9 4: 0.& bJt..L.thante..6 4ão pe.dJr..a..& p!t.e.c...Lo.&a..6,

E.&-t'e. c.o.ta.Jt (apof'ltando) tem mu..L:to-6 bJt..L.tha.nte.&.

Tem pe.dJta..6 p!te.c...Lo.&ah aZ no c.of..a.Jt?"

Gravura n9 5: Uma cegonha em uma das pernas.


- 234 -

Apresentação: "O(a.) SJt.. (a) c.onhe.c.e. e.-6-ãe b-i.c.ho? {Agua.Jtda.

va. a Jte..&po.&-ta)

~uma c.e.gonha".
Silogismo n9 5: "Toda..t. a.-6 c.e.gonha.-6 t-êm pe.l!.na.6 c.omptt.-i.-

da.ó.
E.6.6e b-i.c.ho (apontando) é uma cegonha.
E.ta. tem pe.ltna.6 c.ompJtida..&?"

Gravura n9 6: Um tigre com as patas dianteiras engan -

chadas num galho de árvore.


Apresentação: "O(a.) SJL. (a) c.onhe.c.e. e..6.6e b/..c.ho? {Agu.a.n-

da.va. a Jte..6po.6-ta.)

E um .tigne".
Silogismo n9 6: _" 0.6 a.nima.i.6 .6 e.lva.g e.n.& f..ivJte.6 mo!Lam na

ólMe<~ta..

E.&te. .tigne.(a.pon:ta.ndo) ê um a.n.ima.t .&e..tva.ge.m Uvtr.e..

Onde. e.le. mo!La?"

Gravura n9 7: Dois pés de sandálias de plástico;umave~

<àe, urna amarela.


Apresentação: "O{a) SJt. (a.) e..&tâ vendo? São dua..6 .&a.ndâ.-

Ua.&".
Silogismo n9 7: "0 p.tâ.6.ti..c.o na.o e.n6cUr.Jtuj a..

E.6.6a..6 .6a.ndâ.tia..6 (apontando) .6ão de p.tâ.-6:tic.o.


E.ta.-6 en6eJtJwjam, ou. não?"

Gravura n9 8: Três taças contendo bebidas.

Apresentação:"O(a) SJt. (a) .6abe. o que é. 1.&-&o?(a.gua.Jtdava

a JLe.6po.6ta.J.
são c.opo6 c.om lZquido dentJLo".
Silogismo n9 8: "Todo .6a..t de.ômanc.ha no .tZquido.

O Pauto de.ôpejou .&ai aZ ne.ô.&e.& copo-6 (apontando).


O .&ai de.&-maV!.c.hou 1 o'u. V!.ão?"
- 235 -

Gravura n9 9: Uma maça vermelha.


Apresentação: "O La.} S4. (a.) conhece e.õ.õa. 6Jt.u.ta.? (Agua.IL-

dava a Jte..t.po-6-ta.)

t uma. maçã".
si-lgisrno n9 9: "Toda 6JLuta. tem v.i.tamlna..&.
EM:a maçii{apon-tandol e- uma ó~<.uta.

Ela. te.m v-Lta.m.i.na.?"


- 236 -

ANEXO III

A - Silojilmo~ ~t1tizado~ pa~a o G~upo I - Gnu.po c.o~tnole

(Sujeitos testados sem gr~vuras. Premissas maiores nor-

rnativas).

Silogismo n9 1:

"SÕ quem moJr.a. na.·c.ida.de. pe..&c.a. no tr..1o Ta.gu.ã


O Pe.dno pe..&c.a. no n1o Ta.gu.ã
Ele. mo)[.a na. c.1da.de., ou não?"
Silogismo n9 2:

"Todo.6 que. u.6a.m c.apac.e.te. andam de. .motaci.c.le.ta.


O Pe.dno u..&a. c.a.pac.e.te.
E.te. anda de. motoc.1c..te..ta.?"
Silogismo n9 3:

"Todo.ó olJ ói.tha.& e ~iiha..6 do João tomam leitE..


A Ana ê 6~tha do João
Ela toma .te.de., ou não?"
Silogismo n9 4:

"Na c.a..t.a. do João, .60 quem já c.ome.u na.o Sic.a.


na me..&a.

O João e..&.tã na. me..&a.


Ele. j ã comeu.?"

Silogismo n9 5:
.
"Todo.& o.6 c.a.c.hoJtJto.& da Ma.Jtla. .&ão pe.que.J'to.&

O P1xote. ê um c.a.c.honno gnande.


Ele. ê da Ma.Jtia, ou não?"
Silogismo n9 6:

"Todo.& o.& c.ac.hoJtJto.& de. Jt.aç.a .6 o comem c.anne. ;


nunca eom~m v~~du~a
- 237 -

o Rex -
e um c. a c. h Olt!LO de Jtaça
o que ele c.ome.?"
Silo9:ismo n9 7:
"Todo.ó o• home.nh que uham .6a-i.a t~<.abatham no
Bane. o
O Pe.dJto u&a .6aia
Onde e .te -tJtabaf.ha.?"
Silogismo n9 8:

"TodÓ.6 que .6obe.m na pe.d.te.Lta e.nxe.nga.m uma c.i


da de
A LÜc.ia &ubiu na pe.dJte.-i.Jta

O que. ela e.nxe.Jtgou?"


Silogismo n9 9:

"Todo.~; ob vaque.iJtoh .60 u&am Jt-ou.pa de. C.OU.l!..D

pana. monta.IL

O João ~ va.que.lJto
O que. ele. ctha pa!La. monta.Jt.?"
Silogismo n9 10:

"0.6 vaque.iJto.t. .6Ô levam he.u. c.ac.haJUto J u..nt o


quando vão longe. da 6aze.nda
O vaqu..e.iJto João he.mpJte. leva &eu. ,c.ac.hoJt.ão
junto

Ele va-i. longe. ou pe.Jtto da 6aze.nda?"


Silogismo n9 11:

"Hoje. a Joaqu..lm óa-L'v.i.6Ua!t a An~&-i.o


O Joaquim .6Õ 6az vi..-&ita!:. de.{c.oloc.ava-.t.e. aqui
um dia da .6e.mana di6e.Jte.nte. do d-i.a do te.&~e.)

Q.u..e. dia ê. hoje.?"


Silogismo n9 12:

"Toda.t. a..6 pe..6.6oa.6 .&o tomam e.a.6ê. de.paL6 do

a.lmaç.o
238 -

O Paulo e a Ma~ia e.J..tão tomando ca.óê


E.te& j ã. a..trnoç.a.Jtam ou não?"
Silogismo n9 13:

"0 Joaquim J..abe. nada.IL, ma..& a 1&au.Jta. nao .t.a.be.


PJta che.ga.lt no ltancho,pJte.c~&a lJt nadando
Q.ua..t do& doi-& c.on.& egue c.hega.Jt .tá?"

B - Sllogi.&mo.& utilizado& pa.Jta o GJtu.po 11 - Gnu.po c.ontJtaie.


(Sujeitos testados sem graVuras.Premissas maiores des-

critivas).

Silogismo n9 1:

"Q.u.a.ndo c.ai ne.ve., óa.z 6~tio

Hoje. e..&.tâ. nevando em Santa Ca.taJLina

E.6tâ 6az e.ndo 6Jtio .tá?"


Silogismo n9 2:

"0.& UIL.6D.6 na.o moJt·a.m em .tuga.Jte..õ qu.e.nte.6

O de..&e.kto do Sa.a.Jta. ê um .tu.ga.Jt muito quente


MoJtam Ulr..6o.6 J!..á., ou. não?~'

Silogismo n9 3:

"T od.a.6 o.6 mac.a.c.o& .6 ão ma.m..Z 6e.Jto&.


No zao.tõgic.o tem doi& mac.ac.o.6
Ele..& 6ão mamZóe.Jt.o.6, ou. não?"
Silogismo n9 4:

"0.6 bJL.i...lhante..6 .6ao pe.dna.6 p!te.c.io.6a.6


A Solange. te.m u.m c.o.talt c.om c.J..nc.o bnJ...thante..6

Te.m pe.dJt.a..& ph..e.c.J..o.6a.6 no co.ta.Jt de..ta., ou não?"


Silog'ismo n9 5:

"Toda..6 a.6 c.egonha..6 -têm pe.h..na.-6 c.omph..-i..da-6


Em Mato-Git0.6.6o te.m multa..6 c.e.gonha.6
E.ta.6 têm p'e.Jtna.6 c.ompJt..J..da.6, ou não?"
- 239 -

Silogismo n9 6:
11
0.6 a.n.i.ma..i.~.> ~.>e.lva.ge.n.6 Uv!t.e.-6 molta.m na 6loJt.e._!
ta.
O t.i.gJz.e. ê um animal &e.lva.ge.m LivJt.e.
Onde. ele. molla.?"

Silogismo n9 7:
"0 plâ.&ti..c.o na.o e.n6e.towga

A LuJt.de..6 te.m uma. .6andâLia de. plâ&t.i.c.a


A ba.ndã.tia da Lu.Jt.de..& e.nóe.Jowj a, ou não?"

Silogismo n9 8:

"Todo &a.l de.~.>manc.ha no i2.qu...i..do


O Paulo de.-ópe.j ou .6al num c.opo c.om l1qu.i..do
O .6a.l de..&ma.nc.hou., ou. iíã.o?"

Silogismo n9 9:

"Toda 61tut"a .tem v..Ua.m.i.na&


A maçã é uma óJt.uXa.
Ela tem vlia.mina?"

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