Cópia de Caso 7 - Prática J. III

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

FACULDADE NACIONAL DE DIREITO


PRÁTICA JURÍDICA III (PENAL)

Prof. Rafael Fonseca de Melo

CASO CONCRETO HIPOTÉTICO 7

O Ministério Público ofereceu denúncia contra Alexandre Silva, brasileiro, casado, taxista,
nascido em 21/01/1986, pela prática de infração prevista no art. 121, caput, do CP. Consta, na
denúncia, que, no dia 10/10/2006, aproximadamente às 21 horas, em via pública da cidade de
Brasília/DF, o acusado teria efetuado um disparo contra a pessoa de Filipe Santos, que, em
razão dos ferimentos, veio a óbito. No laudo de exame cadavérico acostado aos autos, os
peritos do Instituto Médico Legal registraram a seguinte conclusão: “morte decorrente de
anemia aguda, devido a hemorragia interna determinada por transfixação do pulmão por ação
de instrumento perfuro-contundente (projétil de arma de fogo)”. Consta da folha de
antecedentes penais de Alexandre, um inquérito policial por crime de porte de arma, anterior à
data dos fatos e ainda em apuração. No interrogatório judicial, o acusado afirmou que, no
horário dos fatos, encontrava-se em casa com sua esposa e dois filhos; que só saiu por volta
das 22h para comprar refrigerante, oportunidade em que foi preso quando adentrava no bar;
que conhecia a vítima apenas de vista; que não responde a nenhum processo. Na instrução
criminal, Paulo Costa, testemunha arrolada pelo Ministério Público, em certo trecho do seu
depoimento, disse que era amigo de Filipe, que aparentemente a vítima não tinha inimigos;
que deve ter sido um assalto; que estava a aproximadamente cinquenta metros de distância e
não viu o rosto da pessoa que atirou em Filipe, mas que certamente era alto e forte, da
mesma compleição física do acusado; que não tem condições de reconhecer com certeza o
ora acusado. André Gomes, também arrolado pela acusação, disse que a noite estava muito
escura e o local não tinha iluminação pública; que estava próximo da vítima, mas havia
bebido; que hoje não tem condições de reconhecer o autor dos disparos, mas tem a
impressão de que o acusado tinha o mesmo porte físico do assassino. Breno Oliveira, policial
militar, testemunha comum, afirmou que prendeu o acusado porque ele estava próximo ao
local dos fatos e suas características físicas correspondiam à descrição dada pelas pessoas
que teriam presenciado os fatos; que, pela descrição, o autor do disparo era alto, forte,
moreno claro, vestia calça jeans e camiseta branca; que o céu estava encoberto, o que
deixava a rua muito escura, principalmente porque não havia iluminação pública; que, na
delegacia, o acusado permaneceu em silêncio; que a arma do crime não foi encontrada.
Maíra Silva, esposa de Alexandre, arrolada pela defesa, confirmou, em seu depoimento, que
o marido permanecera em casa a noite toda, só tendo saído para comprar refrigerante,
oportunidade em que foi preso e não mais voltou para casa; que só tomou conhecimento da
acusação na delegacia e, de imediato, disse ao delegado que aquilo não era possível, mas
este não acreditou; que o acusado vestia calça e camiseta clara no dia dos fatos; que
Alexandre é um bom marido, trabalhador e excelente pai. Após a audiência, o juiz abriu vista
dos autos ao Ministério Público, que requereu a pronúncia do réu nos termos da denúncia.

Considerando a situação narrada, apresente, na qualidade de advogado de Alexandre, a peça


jurídica privativa de advogado cabível, invocando todas as questões (preliminares e de mérito),
fundamentos jurídicos e dispositivos legais e jurisprudenciais aplicáveis à espécie e
apresentando todas as teses jurídicas de direito material e processual pertinentes.

A peça integral deverá ser datada do último dia do prazo para protocolo, considerando que a
intimação ocorreu no dia 03/03/2008, segunda-feira. Obs¹.: a peça deve abranger todos os
fundamentos de Direito que possam ser utilizados para dar respaldo à pretensão. A simples
menção ou transcrição do dispositivo legal não confere pontuação.
AO EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA VARA DO TRIBUNAL DO JÚRI DA
COMARCA DE BRASÍLIA/DF

Processo nº: 000000000000000000

ALEXANDRE SILVA, já devidamente qualificado nos autos do processo em


epígrafe, por intermédio dos seus advogados que a esta subscreve conforme
instrumento procuratório acostado aos autos, vem à presença de Vossa Excelência,
com fundamento nos arts. 403, § 3º, do Código de Processo Penal, apresentar suas

ALEGAÇÕES FINAIS em forma de MEMORIAIS

pelos motivos de fato e direito a seguir delineados:

I - DOS FATOS

Consta na denúncia que, no dia 10/10/2006, aproximadamente às 21


horas, em via pública da cidade de Brasília/DF, o acusado teria efetuado um disparo
contra a pessoa de Filipe Santos, que, em razão dos ferimentos, veio a óbito.
Na perícia tanatoscópica (laudo de exame cadavérico) acostada aos
autos, os peritos do Instituto Médico Legal registraram a seguinte conclusão: “morte
decorrente de anemia aguda, devido a hemorragia interna determinada por
transfixação do pulmão por ação de instrumento pérfuro-contundente (projétil de
arma de fogo).

II – DO DIREITO
II.II - DA AUSÊNCIA DE PROVAS.

Emérito Julgador, a bem da verdade, a prova judicializada, é


completamente estéril e infecunda, no sentido de corroborar com a exordial
acusatória, haja vista, que o Titular da Ação, não conseguiu arregimentar uma única
voz, isenta e confiável, que depusesse contra o réu, no intuito de incriminá-lo do
delito que lhe é graciosamente capitulado.
Assim, ante a manifesta anemia probatória hospedada na presente
demanda, impossível é sazonar-se reprimenda penal contra o réu, embora a mesma
seja perseguida, de forma equivocada, pelo denodado integrante do parquet.
Assinale, que para referendar-se uma condenação na esfera penal,
mister que a autoria e a culpabilidade resultem incontroversas. Contrário senso, a
absolvição se impõe por critério de justiça, visto que, o ônus da acusação recai
sobre o artífice da peça acusatória. Ademais, o Direito Penal não opera com
conjecturas ou probabilidades. Sem certeza total e plena da autoria e da
culpabilidade, não podendo o Juízo criminal proferir condenação".
Ademais, todos os termos de declarações encartado aos autos
demonstram com clareza a inexistência de indícios suficientes de autoria que possa
ensejar um decreto condenatório, além do que, no caso dos autos, todo o conjunto
probatório reúne apenas depoimentos de quem mal viu algo, sendo forçoso
reconhecer sua eficiência para comprovar a autoria do delito, sendo este o
entendimento maciço da jurisprudência.
Nesse norte, é de se afirmar que o ônus de acusar recai ao Ministério
Público, o qual foi infeliz ao apresentar denúncia com base em argumentos falhos,
baseados única e exclusivamente em “parecia com o Alexandre”. Em verdade, a
única testemunha presencial afirmou categoricamente que deve ter sido um assalto,
uma vez que a vítima não possuía inimigos, assim repita-se em tese atribuída ao
denunciado, deve-se prevalecer o princípio do in dubio pro reo.
Excelência, neste caso há todos os vícios da prática policial: a pré-
concepção unilateral da autoria do crime; o ajustamento forçado de provas a este
preconceito; e principalmente a aceitação de indicações e auxílios da parte de
pessoas que têm interesses antagônicos ao descobrimento da verdade .
Ademais, a prova judiciária, sabe-se, tem um claro, claríssimo objetivo,
qual seja “a reconstrução dos fatos investigados no processo, buscando a maior
coincidência possível com a realidade histórica, isto é, com a verdade dos fatos”.
Essa tarefa de reconstruir a verdade dos fatos, não é fácil de ser cumprida,
resultando, não raro, que, pese as várias provas produzidas, não se consegue a
reconstrução histórica dos fatos, assomando dos autos, muitas vezes, apenas a
verdade processual. O processo, não raro, produz apenas uma certeza do tipo
jurídica, mas que pode, sim, não corresponder à verdade da realidade histórica.
É truísmo afirmar, mas devo fazê-lo, que “para que o juiz declare a
existência da responsabilidade criminal e imponha sanção penal a uma determinada
pessoa, é necessário que adquira a certeza de que foi cometido um ilícito penal e
que seja ela a autoria”.
O magistrado só estará convicto de que o fato ocorreu e de que seja
determinada pessoa a autora do ilícito, quando a ideia que forma em sua mente se
ajusta perfeitamente com a realidade dos fatos. Se o Ministério Público denunciou
uma determinada pessoa, acusando-a de ter infringido um comando normativo, mas
não consegue demonstrar, quantum sufficti, ser verdadeira a imputação, não pode o
julgador, validamente, editar um decreto de preceito sancionatório. Sem que consiga
o representante ministerial demonstrar tenha determinado acusado enfrentado um
comando normativo penal, restará, debalde, com efeito, eventual pretensão de que
seja o réu punido, pois que, é ressabido de nada adiante o direito em tese ser
favorável a alguém se não consegue demonstrar que se encontra numa situação que
permite a incidência da norma.
Assim, não se pode perder de vista que a pronúncia deve sempre
resultar de provas tranquilas, convincentes e certas. Na dúvida é preferível a
IMPRONÚNCIA do acusado, visto que tal posicionamento é manifestação de um
imperativo da justiça.

II.III - DÚVIDA QUANTO A AUTORIA. IN DUBIO PRO REO.

Ao princípio do in dubio pro reo, cumpre analisar quem é o detentor do


ônus probatório, nos termos do CPP. Paulo Rangel (2013, p.27) afirma que, em
virtude do artigo 5º, LVII, da CRFB/88 (que preconiza que ninguém será considerado
culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória), do princípio da
ampla defesa e do sistema acusatório, o ônus da prova é do Ministério Público.
Deste modo, não é o réu que tem que provar sua defesa, mas sim o Ministério
Público a sua acusação.
Aury Lopes Jr. (2014, p.190), por sua vez, estatui: Gravíssimo erro é
cometido por numerosa doutrina (e rançosa jurisprudência), ao afirmar que à defesa
incumbe a prova de uma alegada excludente. Nada mais equivocado. A carga do
acusador é de provar o alegado; logo, demonstrar que alguém (autoria) praticou um
crime (fato típico, ilícito e culpável). Isso significa que incumbe ao acusador provar a
presença de todos os elementos que integram a tipicidade, a ilicitude e culpabilidade
e, logicamente, a inexistência das causas da jurisdição.
Pois bem, quanto ao princípio do in dubio pro reo, Américo Bedê Júnior
e Gustavo Senna (2012. p.96) afirmam que: [...] a lógica do in dubio pro reo é que
se o magistrado, ao analisar o conjunto probatório, permanecer em dúvida sobre a
condenação ou absolvição do réu, deve optar pela absolvição, até porque entre duas
hipóteses não ideais é menos traumático para o direito absolver um réu culpado do
que admitir a condenação de um inocente.
Ora, se o Magistrado ficou em dúvida quanto à autoria e materialidade
do fato é porque o Ministério Público não logrou êxito em sua tese acusatória, de
modo que o réu não pode ser prejudicado por não conseguir provar sua inocência.
Ademais, provar algo que não se praticou é muito mais complexo do que provar algo
que se praticou.
Destarte, o princípio do in dubio pro réu preconiza que, no caso de
dúvida acerca da autoria de crime, o juiz deve decidir a favor do acusado, agindo
assim em consonância com o ordenamento jurídico pátrio,

III – DO PEDIDO

Ante o exposto, requer:

(i) a IMPRONÚNCIA do acusado ALEXANDRE SILVA, dando-se por


IMPROCEDENTE os termo narrados na Denúncia, em razão da inexistência de
suporte probatório mínimo a indicar a autoria do crime, com base no art. 414, do
Código Processual Penal, ;
Nesses termos,
Pede e espera deferimento.

Rio de Janeiro, 10 de março de 2008

Gabriel Carneiro de Oliveira


OAB/RJ

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