A. A. Hodge - Esboços de Teologia

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ESBO(;OS
de
TEOLOGIA

Archibald Alexander Hodge, D. D.

Professor de Teologia Sistern::itica


no Sernimirio Teol6gico de Princeton
New Jersey, EUA

PUBLICA<;OES EVANGELICAS SELECIONADAS


Caixa Postall287
01059-970- Sao Paulo- SP
;,
~-

Titulo original:
Outlines of Theology

Primeira edi~ao em ingles:


1860

Primeira edi~ao em portugues -Portugal:


1895
J ~ .~
Tradu~ao do ingles: ..
F.J.C.S.- Lisboa

Primeira edi~ao lan~ada no Brasil: '' · <1 \ · · ': 1


2001 ·-fc! -

Linguagem atualizada:
Odayr Olivetti e Azena Valim Olivetti

Revisao:
Antonio Poccinelli

Cooperador:
Jose Serpa

Capa:
Sergio Menga

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Indice
Capitulos ~ ; . ' !
Paginas ·

Prefacio ........................................................................... 7
1. A teologia crista: suas diversas divis6es; sua rela~ao
com outros ramos do conhecimento humano ............ 11
2. A origem da ideia de Deus; prova da Sua existencia 30
3. Os mananciais da teologia ........................................... 64
4. A inspira~ao da Biblia ................................................. 80
5. A regra de fee pratica; as Escrituras do Velho e do
Novo Testamentos; a unica regrade fee o unico juiz
nas con troversias ......................................................... 104
6. Compara~ao de sistemas ............................................ 122
7. Credos e confiss6es ..................................................... 146
8. Os atributos de Deus .................................................. 170
9. A Santissima Trindade ............................................... 220
10. Os decretos de Deus em geral.. .................................. 268
11. A predestina~ao .......................................................... 287
12. A cria~ao do mundo ................................................... 320
13. Os anjos ....................................................................... 337
14. A providencia ............................................................. 349
15. A constitui~ao da alma, a vontade, a liberdade, etc. 380
16. A cria~ao eo estado original do homem ................... 402
17. A alian~a das obras ..................................................... 421
18. A natureza do pecado eo pecado de Adao ............... 430
19. 0 pecado original - (Peccatum Habituale) ............... 445
20. A incapacidade ........................................................... 465
21. A imputa~ao do pecado original de Adao a sua
posteridade .................................................................. 480
22. A alian<:;:a da gra<:;:a ....................................................... 507

23. A Pessoa de Cristo ...................................................... 523
24. 0 oficio medianeiro de Cristo ................................... 542
25. A propicia<:;:ao; sua natureza, necessidade, perfei<:;:ao
e extensao .................................................................... 556
26. A intercessao de Cristo ............................................... 593
27. 0 reinado medianeiro de Cristo ................................ 596
28. A voca<:;:ao eficaz .......................................................... 619
29. A regenera<:;:ao ............................................................. 635
30. A fe .............................................................................. 648
31. A uniao dos crentes com Cristo ................................. 672
32. 0 arrependimento e a doutrina romanista das
penitencias .................................................................. 678
33. A justifica<:;:ao .............................................................. 691
34. A ado<:;:ao e a ordem observada pela gra<:;:a na aplica-
<:;:ao da reden<:;:ao, nas diversas partes da justifica-
<:;:ao, a regenera<:;:ao e da santifica<:;:ao ........................... 718
35. A santifica<:;:ao ....................... ;...................................... 725
36. A perseveran<:;:a dos santos .......................................... 756
37. A morte e o estado da alma depois da morte ............ 765
38. A ressurrei<:;:ao ............................................................. 782
39. 0 segundo advento eo juizo geral ............................ 791
40. 0 ceu e 0 inferno ······························· ......................... 806
41. Os sacramentos ........................................................... 822
42. 0 Batismo: sua natureza e prop6sito, seus objetos,
modo, efic:kia e necessidade ..................................... 843
43. A Ceia do Senhor ....................................................... 885
Indice de Autores e de Assuntos* ............................. 914
) ,..

* Acrescentado pela PES ao volume original em


portugues I r f

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1.\.
Prefacio •~. · ·.. • • l.

Apresentando este livro ao leitor, tenho a dizer que a


concep~ao e a execu~ao da obra sao devidas a experiencia que
tive de ser necessaria tal manual de defini~6es e argumenta~6es
teol6gicas, no meu trabalho de instruir os membros da Igreja
da qual fui pastor. Os diversos capitulos foram, em primeiro
lugar, preparados e usados por mim como as bases de uma
serie de discursos dirigidos, sem notas, a minha congrega~ao
nos domingos a noite, e no uso que assim fiz delas, achei
que estas prepara~6es eram uteis alem das minhas esperan~as;
pois a maior parte da congrega~ao foi induzida a entrar, com
muito interesse, no estudo ate dos assuntos mais abstrusos.
Tendo, pois, esta obra passado por essa prova pratica, ofere~o­
-a, agora, a meus colegas no ministerio do evangelho para que
dela se sirvam, se quiserem, como urn repert6rio de material
digesto para o ensino doutrinario do seu povo, seja em classes
biblicas, seja por meio de discursos no culto publico. Ofere~o­
-a tambem como uma tentativa de prover assim a uma
reconhecida necessidade publica, como urn resumo de
estudo teol6gico para uso dos estudantes de teologia em geral,
e para uso dos muitos laboriosos pregadores do evangelho a
quem falta o tempo necessaria ou a oportunidade, ou outro
meio essencial, para estudarem as obras custosas e elaboradas
das quais se colheram os materiais deste compendia.
As perguntas tern sido conservadas formalmente, nao com
o fim de adaptar assim o livro de qualquer modo ao ensino
catequetico, e sim, por ser este o modo mais conveniente e
perspicuo de apresentar urn "esbo~o de teologia". Esta mesma
necessidade de condensar, espero que sirva para desculpar,
ate certo ponto, alguns casos de obscuridade nas defini~6es e

7
alguns em que talvez haja falta de ilustrac;6es, casos que o lei tor,
sem duvida, notar:i.

No Prefacio da segunda edir;iio desta obra (em ingles), revista e


aumentada, o editor ainda diz:

0 Prefacio da edic;ao original narra, acurada e urn tanto


circunstanciadamente, a maneira pela qual se originou esta
obra. Desde a sua primeira publicac;ao ate agora tern se
multiplicado as provas de que ela proveu a uma necessidade
publica, e grande numero de exemplares tern sido vendidos
na America doN orte e na Gra-Bretanha. Alem disso, tern sido
traduzida para a lingua do Pais de Gales e para o grego
moderno, e e usada em diversos seminarios teol6gicos.
Desde que saiu a sua primeira edic;ao, o autor tern estado
ocupado catorze anos no trabalho pratico de instrutor teol6gico.
Tern adquirido mais conhecimentos e tambem mais experiencia
como professor, e estes tern sido utilizados nesta nova e
aumentada edic;ao, que chegou ao seu tamanho atual mediante
os acrescimos feitos durante alguns anos de ensino ministrado
as diversas classes do Seminario Teol6gico.
Esta edic;ao contem quase cinqiienta por cento mais
materias que a primeira. As discuss6es das doutrinas que
dividem os diversos ramos da lgreja, tern sido acrescentados
extratos dos principais credos, confiss6es e classicos escritores
teol6gicos das grandes lgrejas hist6ricas. Eo apendice con tern
uma traduc;ao do Consensus Tigurinus de Calvino, e daF6rmula
Consensus Helvetica de Heidegger e Turretino, duas confiss6es
de muito grande interesse doutrinario para o estudante da
teologia reformada, mas pouco acessiveis.
A obra e outra vez oferecida a lgreja Crista, nao como urn
tratado completo sobre teologia sistematica para uso dos
proficientes, e sim como urn simples manual, adaptado as
necessidades dos estudantes que tomam suas primeiras lic;6es
nesta grande ciencia, e a conveniencia dos muitos trabalhadores
serios que talvez desejem refrescar a sua memoria por meio
de uma revisao sumaria do terreno sobre o qual passaram nos
primeiros anos de seus estudos teol6gicos.

-A.A. Hodge
Princeton, New Jersey
06 de agosto de 1878

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9
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··· ·· ;,_: Teologia Crista;


Suas Diversas Divisoes;
Sua Rela~ao com Outros Ramos
do Conhecimento Humano

1. Que eReligiiio? Que eTeologia, no seu sentido cristiio?


Religiao, no seu sentido rnais geral, e a soma das rela~6es
que o hornern sustern para corn Deus, e cornpreende as ver-
dades, experiencias, a~6es e institui~6es que correspondern a
essas rela~6es ou que delas provern.
Teologia, no seu sen tido rnais geral, e a ciencia da religiao.
A religiao crista e aquele conjunto de verdades, experi-
encias, a~6es e institui~6es que se acharn deterrninadas pela
revela~ao que nos e apresentada sobrenaturalrnente nas
Escrituras Sagradas. Teologia cristae a deterrnina~ao, inter-
preta~ao e defesa cientifica dessas Escrituras, junto corn a
hist6ria da rnaneira pela qual as verdades nelas reveladas tern
sido entendidas, e os deveres nelas impastos tern sido curn-
pridos, por todos os cristaos, ern todos os seculos.

2. Que eEnciclopidia Teol6gica? Que eMetodologia Teol6gica?


Enciclopedia teol6gica (de urn terrno grego que significa
o drculo inteiro da educa~ao geral), apresenta ao estudante o
circulo inteiro das ciencias especiais que tern por firn descobrir,
elucidar e defender o conteudo da revela~ao contida nas
Escrituras Sagradas, e procura apresentar essas ciencias nas

11
Capitulo 1
relas;6es organicas determinadas por sua genese e sua natureza
intima.
Metodologia teol6gica e a ciencia do metodo teol6gico.
Assim como cada divisao das investigas;6es humanas exige
urn modo de tratamento peculiar, e cada subdivisao de cada
divisao geral exige certas modificas;6es especiais de tratamento,
e que lhe sao pr6prias, assim tambem a metodologia teol6gica
tern por fim determinar cientificamente qual o verdadeiro
metodo geral e especial, pelo qual con vern estudar as ciencias
teol6gicas. Isso inclui duas categorias distintas: (a) OS metodos
pr6prios para a investigas;ao original e construs;ao das diversas
ciencias, e (b) OS metodos pr6prios para a instrus;ao elementar
nessas ciencias.
Tudo isso deve ser acompanhado de informas;6es criticas
e hist6ricas, e de instrus;6es sobre o modo de tirar proveito do
imenso material literario com que essas ciencias estao
ilustradas. -~·:r·t!LY; :· .·•:uU ~r:O~J !;·:s·: nT:k':f.' ;•: .:.·:

3. Ate onde seria passive! a classificafao cientifica de todas as


ciencias teol6gicas? E par que edesejavel que se procure fazer tal
classificafao?
Tal classifica<;ao pode aproximar-se da perfeis;ao s6 na
propors;ao em que essas ciencias se aproximem, elas mesmas,
da sua forma finale absoluta. Atualmente toda tentativa nesse
sentido s6 pode aproximar-se mais ou menos de urn ideal que
nao se pode alcans;ar no estado atual dos conhecimentos, nesta
vida. 0 born exito comparativo de cada tentativa separada
depende tam bern, necessariamente, da justeza comparativa dos
principios teol6gicos gerais em que se baseia. E evidente que
os que tomarem a Razao, os que tomarem uma lgreja inspirada,
e os que tomarem as Escrituras inspiradas como fonte e norma
de todo o conhecimento divino hao de, necessariamente,
configurar as ciencias teol6gicas nos diversos fundamentos em
que as fizerem assentar.
0 ponto de vista adotado neste livro e o evangelico, e

12
Teologia Crista

especificamente o calvinista ou agostiniano, e toma como


verdadeiros os seguintes principios fundamentais: 1°. As
Escrituras inspiradas sao a regra e padrao (mico e infalivel de
todo o conhecimento religioso. 2°. Cristo e Sua obra sao o centro
ao redor do qual se disp6e, em ordem, toda a teologia crista.
3°. A salva<;;ao trazida a luz no evangelho e sobrenatural e
provem da LIVRE GRAC::A DE DEus. 4°. Todo conhecimento
religioso tern uma finalidade pratica. As ciencias teol6gicas,
lange de terem a si mesmas como seu fim absoluto, tern o fim
nobre de fazer os homens progredirem na santidade pessoal,
de habilit::'i-los a servir melhor a seus semelhantes, e de
PRO MOVER AGLORIA DE DEUS.
As vantagens de agruparmos assim as ciencias teol6gicas
sao 6bvias e grandes. As rela<;;6es de todas as verdades sao
determinadas pela sua natureza, donde se segue que sua natu-
reza e revelada pela exibi<;;ao de suas rela<;;6es. Essa exibi<;;ao
tendera tambem a alargar o horizonte mental do estudante, a
incita-lo a adquirir largueza de cultura, e a impedir que exalte
indevidamente ou cultive exclusivamente qualquer ramo
especial, pervertendo assim esse ramo por olha-lo fora de
suas limita<;;6es e dependencias naturais.

4. Quais as perguntas fundamentais a que toda a czencia


teol6gica se propoe a dar respostas e que, par isso, determinam a
ordem em que se seguem as diversas divisoes dessa ciencia geral?
1a. Existiria urn Deus? 2a. Teria Deus falado? 3a. Que disse
Deus? 4a. Como e que OS homens, no tempo passado, enten-
deram a Palavra de Deus e realizaram praticamente, nas suas
pessoas e institui<;;6es, as inten<;;6es de Deus?

5. Qual a posifiiO que, numa enciclopedia de ciencias teol6gicas,


epreciso dar a outros ramos do conhecimento humano?
E evidente que, vista que a revela<;;ao sobrenatural que
aprouve a Deus dar-nos veio a n6s em uma forma hist6rica,
essa hist6ria, bern como ada Igreja Crista, eligada inseparavel
;S~'8UDl'fC.£\ AUBREY CLARK
13
Capitulo 1
e, mais ou menos diretamente, com toda a hist6ria humana.
E e evidente tambem que, vista que toda a verdade e urn s6
todo, todas as verdades e deveres revelados se acham ligados
indissoluvelmente a todos os ramos do conhecimento humano
e a todas as instituic;:6es da sociedade humana. Segue-se
pois, que a ciencia teol6gica em nenhum ponto pode ser
separada da ciencia em geral, e que algum conhecimento, de
todos os ramos do conhecimento humano, acha-se compre-
endido necessariamente em qualquer sistema de enciclopedia
teol6gica como auxiliar das pr6prias ciencias teol6gicas.
Algumas dessas ciencias auxiliares sustem relac;:6es especiais
para com certas ciencias teol6gicas e estao relacio,nadas muito
rernotarnente corn outras. Convern, porern, atribuir-lhes urn
lugar proprio e separado por constituirern, ern geral, urna
disciplina preparat6ria e auxiliar da ciencia de teologia
considerada como urn todo.
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6. Quais as principais divisoes da classificafilO proposta das


ciencias teol6gicas?
I 0 • Ciencias auxiliares no estudo de teologia.
2°. Apologetica- abrangendo as respostas as duas perguntas:
existiria urn Deus? Teria Deus falado?
3°. Teologia exegetica- abrangendo a deterrninac;:ao crftica
das ipsissima verba da revelac;:ao divina e a interpretac;:ao do seu
sentido.
4°. Teologia sistematica- abrangendo o desenvolvirnento ern
urn sistema cornpleto e consequente do conteudo inteiro dessa
revelac;:ao, e sua subsequente elucidac;:ao e defesa.
5°. Teologia pratica- abrangendo os prindpios e leis revela-
dos nas Escrituras para direc;:ao dos cristaos: (a) na prornul-
gac;:ao dessa revelac;:ao divina, assirn averiguada e interpretada,
e (b) ern levarern todos os hornens ao curnprirnento pratico
dos deveres nela impastos e (c) na fruic;:ao das benc;:aos que ela
confere.
6°. Teologia hist6rica- abrangendo a hist6ria do desenvol-

14
Teologia Crista

vimento durante todos os seculos passados e entre todos os


povos, dos elementos te6ricos e praticos dessa revela~ao: (1)
na fe e (2) na vida da Igreja.

7. Quais os ramos principais do conhecimento humano, auxiliares


no estudo de teologia? ,:
1°. Hist6ria universal, que e ramo essencial a todos os de-
mais ramos da ciencia humana e, em particular, as hist6rias
do Egito, da Babilonia, da Assiria, da Grecia, de Roma e da
Europa medieval e moderna, que sao auxiliares especialmente
dacienciateol6gica. . .:.1 .'~·;:;.'.'·
2°. A arqueologia no seu sentido mais compreensivo,
abrangendo a interpreta~ao de inscri~6es, monumentos,
moedas e remanescentes das artes e as ilustra~6es recolhidas
dai e de todas as outras fontes acessiveis, da distribui~ao
geografica e condi~6es fisicas, e das institui~6es e costumes
politicos, religiosos e sociais, de todos os povos e de todos os
seculos.
3°. A etnologia - a ciencia das di vis6es da familia h umana
em ra~as e na~6es, e da sua dispersao sobre a face da terra- que
indaga de sua origem e afilia~6es, das variedades do seu carater
fisico, intelectual, moral e religioso, e tambem das causas e
condi~6es que modificam essas varia~6es.
4°. A filologia comparativa- a ciencia que, tomando como
ponto de partida os grupos naturais das linguas humanas,
investiga as rela~oes e origens das linguas e dialetos; e,
remontando alem das eras em que se principia a hist6ria
humana, acha ai provas da unidade de ra~as agora separadas,
e os elementos de civiliza~6es ja ha muito extimas, e os fatos
de mudan~as hist6ricas que nao deixaram outros vestigios.
5°.A ciencia da religiiio comparativa (religioes comparadas)
- o estudo critico e a compara~ao da hist6ria, das cren~as, do
espirito, dos principios, das institui~6es e do can1ter pratico
de todas as religi6es etnicas, investigando a luz que elas lan~am
sobre (a) a natureza e a hist6ria humanas, (b) o governo moral

15
Capitulo 1
de Deus, e (c) a revela~ao sobrenatural contida nas Escrituras
Sagradas. · _, · J!.!O':= t ~jl}~ n:-i:, ···, _
6°. A filosofia - a base e mestra de todas as ciencias
meramente humanas. Abrange a hist6ria da origem e do
desenvolvimento de todas as diversas escolas de filosofia- as
antigas, as da idade mediae as modernas- o estudo critico e a
compara~ao dos prindpios, metodos e doutrinas, e da extensao
e carater da sua influencia respectiva sobre todas as outras
ciencias e institui~6es, especialmente sobre as que sao politicas
e religiosas, e mais especialmente ainda sobre as que sao
definitivamente cristas.
7°. A psicologia- ou essa divisao da ciencia experimental
que descobre as leis da a~ao da mente humana, como ela se
manifesta sob condi~6es normais (a) nos fenomenos da
consciencia e a~ao individuais, e (b) nos fenomenos da vida
social e poli rica. ' _., ,:. ,,, ,
8°.A estetica, ou a ciencia das leis do bela em todas as suas
formas de musica, ret6rica, arquitetura, pintura, etc., os
prindpios e a hist6ria de todas as diversas divis6es da arte.
9°. As ciencias fisicas, seus metodos gerais e especiais; sua
genese, desenvolvimento e tendencias atuais; sua rela~ao com
a filosofia, especialmente como Deismo e com a religiao natu-
ral, com a civiliza~ao e com a hist6ria e doutrinas consignadas
nas Escrituras.
10°. A estatistica, cujo fim e dar-nos elementos completos
sobre o estado atual da ra~a humana no mundo, a respeito de
tudo o que se pode sujeitar a compara~6es - quanta ao seu
numero e estado fisico, intelectual, religioso, social e politico
de civiliza~ao, comercio, literatura, ciencias, artes, etc.;
elementos dos quais estao sendo desenvolvidos gradualmente
as formas imaturas da ciencia social e da economia politica.

8. Que e que se abrange sob o titulo de Apologetica?


Este ramo divide-se em dois titulos: (1) Existiria urn
Deus? (2) Teria Deus falado? Ele inclui:

16
Teologia Crista
1°.A prova da existencia de Deus, isto e, de uma Pessoa extra-
-terrena, transcendente e ao mesmo tempo imanente; crian-
do, conservando e governando todas as coisas segundo o seu
plano eterno. Isto envolve a discussao e refutac;;ao de todos os
sistemas antiteistas, como sejam o ateismo, o panteismo, o
deismo naturalista, o materialismo, etc.
2°. 0 desenvolvimento da teologia natural, compreende a
relac;;ao em que Deus esta como Governador moral para com
os agentes inteligentes e responsaveis, e as indicac;;6es da Sua
vontade e prop6sito e, por conseguinte, dos deveres e destinos
dos homens ate onde e possivel descobri-los aluz da natureza.
3°.As provas do cristianismo, compreendendo ...
(1) A discussao do uso proprio da razao nas quest6es
religiosas.
(2) A demonstrac;;ao da possibilidade a priori de uma
revelac;;ao sobrenatural.
(3) A necessidade e probabilidade de tal revelac;;ao,
tomando-se em considerac;;ao o carater de Deus e o estado do
genero humano segundo no-lo revela a luz da natureza.
(4) A prova positiva do Jato real de que tal revelac;;ao foi
dada: (a) mediante os profetas do Velho Testamento (b)
mediante os profetas do Novo Testamento, e sobretudo, (c) na
Pessoa e obra de Cristo. Isto envolve naturalmente a discussao
critica de todas as provas que dizem respeito a este ponto, tanto
externas como internas, hist6ricas, racionais, morais e espiri-
tuais, naturais e sobrenaturais, te6ricas e praticas; e a refutac;;ao
de toda a critica hist6rica e racionalista que tern impugnado o
fato da revelac;;ao, ou a integridade dos escritos que a contem.
Muito daquilo que se acha mencionado aqui estara neces-
sariamente compreendido tambem sob os titulos de teologia
sistematica e teologia exegetica.

9. 0 que a Teologia Exegetica compreende?


Quando os fatos: (1) que existe urn Deus, e que (2) Deus
nos tern falado - forem estabelecidos, sera necessaria ainda

17
Capitulo 1
responder a pergunta: o que nos tem dito Deus? Teologia exe-
getica e 0 titulo geral daquela divisao da ciencia teol6gica que
tern por fim a interpreta<;:ao das Escrituras como a Palavra de
Deus, deixada por escrito em linguagem humana, e que nos
foi transmitida por canais humanos; e para conseguir esse fim,
o assunto de Interpreta<;:ao procura recolher e organizar todo o
conhecimento que para isso e necessariamente introdut6rio.
Isso inclui as respostas a duas perguntas: (l) Quais os livros
que formam o canon, e quais as palavras exatas contidas nos
registros originais dos escritores desses diversos livros? (2)
Qual o sentido dessas palavras divinas, assim averiguadas ?
As respostas a todas as perguntas preliminares a inter-
preta<;:ao, propriamente ditas, pertencem ao titulo introdw;ao,
e esta se divide em: (1) introdufiio geral, que inclui toda
informa<;:ao preliminar ainterpreta<;:ao que tern rela<;:ao com a
Biblia, como urn todo, ou com cada urn dos Testamentos, como
urn todo; e (2) introdufiio especial, que inclui toda a prepara<;:ao
necessaria para a interpreta<;:ao de cada urn dos livros da Biblia,
em separado.
A. lntrodufiio Geral compreende:
1°. A critica superior /alta critical, ou o exame das provas
que existem e de toda especie, em apoio da autenticidade de
cada urn dos livros do canon sagrado.
2°. A critica do texto/critica textual, a qual, por uma
compara<;;ao dos melhores manuscritos e das vers6es antigas,
pelas provas internas, e pela hist6ria critica do texto desde o
seu primeiro surgimento ate ao tempo presente, procura
determinar as ipsissima verba dos aut6grafos originais dos
escritores sagrados.
3°. A Filologia biblica, que da respostas as perguntas: por
que foram usadas diversas linguas nos escritos sagrados? Por
que as linguas hebraica e grega? Quais sao as caracteris-
ticas especiais dos dialetos dessas linguas realmente usados,
e qual a sua rela<;:ao para com as familias de linguas a que
elas pertencem? Quais eram as caracteristicas especiais dos

18
Teologia Crista
escritores sagrados individualmente, quanta ao dialeto, ao
estilo, etc.?
4°.Arqueologia biblica, compreendendo a geografia fisica e
politica dos paises biblicos, durante o transcurso da hist6ria
biblica e determinando a condic;;ao fisica, etnol6gica, social,
politica e religiosa do povo entre o qual se originaram as
Escrituras, junto com a descric;;ao de seus costumes e
instituic;;6es, e da relac;;ao em que estes estavam para com os de
seus antepassados e contemporaneos.
5°. Hermeneutica, ou a determinac;;ao cientifica dos
principios e regras de interpretac;;ao biblica, compreendendo
(1) os principios 16gicos, gramaticais e ret6ricos que deter-
minam a interpretac;;ao da linguagem humana, em geral; (2)
as modificac;;6es desses principios apropriadas ainterpretac;;ao
das formas especificas da linguagem humana, e.g., hist6ria,
poesia, profecia, parabola, simbolo, etc., e (3) as outras
modificac;;6es desses principios apropriados a interpretac;;ao
dos escritos inspirados sobrenaturalmente.
6°. Inspirafiio biblica. Depois de ter a apologetica esta-
belecido o fato de serem as Escrituras Sagradas o veiculo de
uma revelac;;ao sobrenatural, e necessaria que discutamos e
determinemos a natureza e a extensao da inspirafiiO biblica ate
onde esta e determinada pelo que as Escrituras mesmas dizem
sobre este ponto, e pelos fenomenos que elas representam.
7°. A Hist6ria da Interpretafiio, incluindo a hist6ria das
antigas e modernas vers6es e escolas de interpretac;;ao, ilustrada
por uma comparac;;ao critica dos mais importantes comentarios.
B. Introdufiio especial, trata de cada livro da Biblia por si e
fornece sobre o seu dialeto, autor, ocasiao, designio e recepc;;ao,
toda a informac;;ao necessaria para a sua interpretac;;ao acurada.
C. Exegese propria e a aplicac;;ao de todo o conhecimento
recolhido, e de todas as regras desenvolvidas nas precedentes
divis6es da introduc;;ao ainterpretac;;ao do texto sagrado, assim
como este se acha nas suas conex6es originais dos Testamentos,
livros, paragrafos, etc.

19
Capitulo 1
Seguin do as leis da gramatica, o usus loquendi das palavras,
a analogia das Escrituras e a dire<;ao do Espirito Santo, a exegese
procura discernir a mentalidade do Espirito como se acha
expressa nos periodos inspirados, arranjados na ordem em que
os achamos.
Ha diversas divis6es especiais classificadas sob o titulo
geral de teologia exegetica que envolvem, ate cerro ponto,
a classifica<;ao e a combina<;ao dos testemunhos biblicos
em t6picos e assuntos, que sao a caracteristica distintiva de
teologia sistematica. Essas divis6es sao:
1a. Tipologia, que compreende a determina<;ao cientifica
das leis dos simbolos e tipos biblicos e sua iriterpreta<;ao,
especialmente os do ritual mosaico relacionado com a Pessoa
e a obra de Cristo.
2a. Cristologia do Velho Testamento, a exposi<;ao critica da
ideia messianica, como vern desenvolvida no Velho Testa-
mento. ' ,.... :.;~c:•J'~'H~-· .·•, .: ·· ·
3a. Teologia biblica, que investiga a evolu<;ao gradual dos
diversos elementos das verdades reveladas, desde a sua primeira
sugestao, atraves de cada fase sucessiva, ate asua mais completa
manifesta<;ao no texto sagrado; e exibe as formas e conex6es
peculiares em que essas diversas verdades sao apresentadas
pelos diversos escritores inspirados.
4a. 0 desenvolvimento dos principios de interpretafiiO
projetica, e sua aplica<;ao a constru<;ao de urn esbo<;o das
profecias dos do is Testamentos. Notes on New Testament Litera-
ture, por Dr. J. A. Alexander.

10. Que e que se acha compreendido sob o titulo de Teologia


Sistematica?
Como o da a entender o seu nome, teologia sistematica
tern por fim reunir tudo quanto as Escrituras ensinam sobre o
que devemos crer e fazer, e apresentar todos os elementos desse
ensino na forma de urn sistema simetrico. A mente humana
procura sempre unidade, em todos os seus conhecimentos. A

20
Teologia Crista

verdade de Deus e una, e o conteudo inteiro de todas as


revelaqoes naturais e sobrenaturais nao pode deixar de consti-
tuir urn s6 sistema completo em si, cada parte do qual se acha
relacionada organicamente com todas as outras partes.
0 metoda de construqao e indutivo. Tern por base OS resul-
tados da exegese. Seus dados sao passagens das Santas
Escrituras, averiguadas e interpretadas. Esses dados, quando
interpretados corretamente, revelam suas pr6prias relaqoes e
seu lugar no sistema do qual a Pessoa e a obra de Cristo sao o
centro. E, assim como o conteudo da revelaqao esta em relaqao
intima com todos os outros ramos dos conhecimentos
humanos, a tarefa da teologia sistematica envolve, neces-
sariamente, a demonstraqao e a ilustraqao da harmonia que
existe entre todas as verdades reveladas e toda a ciencia
legitima, quer material, quer psicol6gica, toda a verdadeira
filosofia especulativa e toda a verdadeira filosofia moral e
filantropia pnitica.
A teologia sistematica compreende: A. A construqao de
urn completo sistema de fe e deveres, composto do conteudo
inteiro da revelaqao. B. A hist6ria desse processo de
constrw;ao, como ele prevaleceu na Igreja, no passado. C.
polemica.
A. A constrw;ao de urn completo sistema composto do
conteudo da revela<;ao. Isso compreende o tratamento cien-
tifico de: (a) todas as materias de fe reveladas; e (b) todos os
deveres impastos.
No modo de arran jar os t6picos, a maior parte dos te6logos
tern seguido o que o Dr. Chalmers denomina - metoda
sintetico. Tomando como ponto de partida a ideia e a natureza
de Deus, reveladas nas Escrituras, consideram seus prop6sitos
eternos e seus atos temporais nas obras da cria<;ao, providencia
e reden<;ao, ate a consuma<;ao final. 0 Dr. Chalmers prefere,
porem, 0 que ele chama- metoda analitico, e toma por ponto
de partida os fatos da experiencia e da luz da natureza, e a
condi<;ao atual e moralmente enferma do homem, e dai vai

21
Capitulo 1

subindo ate chegar a reden<;ao e ao caniter de Deus, como


nela e revelado.
Quando se segue 0 primeiro destes metodos, agrupam-se
comumente todos os elementos do sistema, sob os seguintes
titulos:
1°. Teologia propriamente dita: compreendendo a exis-
tencia, os atributos e a personalidade tri(ma de Deus,
juntamente com os Seus prop6sitos eternos e os atos temporais
de cria<;ao e providencia.
2°. Antropologia (a doutrina do homem): compreendendo
a cria<;ao e a natureza do homem, seu estado original, queda e
conseqiiente ruina moral. Isto abrange a psicologia biblica e a
doutrina biblica sobre o pecado, sua natureza, origem e modo
de propaga<;ao.
3°. Soteriologia (a doutrina da salva<;ao): que inclui o plano,
a execu<;ao e a aplica<;ao, e os efeitos gloriosos da salva<;ao dos
homens. Is so abrange a Cristologia (a doutrina sobre Cristo): a
encarna<;ao, a constitui<;ao da Pessoa de Cristo, Sua vida, morte
e ressurrei<;ao, juntamente com a obra propria do Espirito
Santo, os meios de gra<;a, a Palavra de Deus e os sacramentos.
4°. Erica crista: abrangendo os principios, regras, motivos
e auxilios dos deveres humanos revelados na Biblia, como sao
determinados (a) pelas rela<;6es naturais que o homem tern
como homem com os seus semelhantes, e (b) suas rela<;6es
sobrenaturais como homem remido.
5°. Escatologia (a ciencia das ultimas coisas): compre-
endendo a morte, o estado intermediario da alma, o segundo
advento, a ressurrei<;ao, o juizo geral, o ceu e o inferno.
6°. Eclesiologia (a ciencia da lgreja): incluindo a
determina<;ao cientifica de tudo quanto as Escrituras ensinam
a respeito da Igreja visivel e invisivel, em seu estado temporal
e no eterno; a ideia da Igreja - sua verdadeira defini<;ao, sua
constitui<;ao e organiza<;ao, seus oficiais e suas fun<;6es. A
compara<;ao e critica de todas as modifica<;6es da organiza<;ao
eclesiastica que tenham existido, juntamente com sua genese,

22
Teologia Crista

sua hist6ria e seus efeitos pnhicos.


B. Hist6ria das doutrinas: que compreende a hist6ria
de cada uma destas grandes doutrinas, a investiga<;,::io de seu
primeiro aparecimento e subsequente desenvolvimento atraves
das controversias a que cada doutrina deu lugar, e as Confiss6es
em que se acha definida. <.,, .~;
C. Polemica ou teologia controversial: incluindo a defesa
do verdadeiro sistema de doutrina, tanto no seu todo como
tambem em cada urn de seus elementos constitutivos contra
as pervers6es dos partidos hereticos, dentro do ambito da lgreja
geral. Isso abrange: (a) Os principios gerais e o verdadeiro
metodo de controversias religiosas. (b) A defini<;,::io do
verdadeiro status quoestionis em cada controversia e uma
exposi<;,::io das fontes de testemunho e dos metodos defensivos
e ofensivos de vindicar-se a verdade. (c) A hist6ria das
con troversias.

11. Que e que se acha compreendido sob o titulo de Teologia


Pratica?
Teologia pnitica e tanto uma arte como uma ciencia. Como
arte, tern por fim a publica<;,:ao eficaz do conteudo da revela<;,:ao
entre todos os homens e a perpetua<;ao, extensao e edifica<;,:ao
do reino terrestre de Deus. Como ciencia, tern como sua
provincia as leis e os prindpios revelados da arte acima
definida. Por isso, assim como a teologia sistematica baseia-se
numa cabal exegese, ao mesmo tempo cientifica e espiritual,
assim tambem a teologia pratica baseia-se nos grandes
principios desenvolvidos pela teologia sistematica, enquanto
que a divisao de eclesiologia e terreno comum a essas duas
divis6es: e 0 produto de uma delas e 0 fundamento da outra.
Inclui as seguintes divis6es principais:
1a. A ideia e designio da Igreja e de seus atributos revelados
divinamente.
za. A determinas:ao da Constitui<;ao divinamente prescrita
da lgreja, e dos metodos de sua administra<;,:ao, com a discussao

23
Capitulo I

e refuta<;:ao de todas as outras formas de organiza<;:ao eclesiastica


que existiram ou existem, sua hist6ria, e as controversias que
tern ocasionado.
3a. A discussao da natureza e extensao da descri<;:ao que
Cristo deixou a Sua Igreja para ajustar OS metodos de orga-
niza<;:ao e administra<;:ao eclesiastica as mutaveis condi<;:6es
sociais e hist6ricas dos homens.
4a. A determina<;:ao das condi<;:6es sob as quais uma pessoa
pode fazer-se membro da Igreja, e a rela<;:ao para com Cristo
envolvida no fato de ser membro dela, juntamente com os
privilegios e deveres, absolutos e relativos, das diversas classes
de membros. A rela<;:ao das crian<;:as batizadas com a Igreja e
os deveres relativos dos paise da Igreja em rela<;:ao a elas.
sa. Os Oficiais da Igreja - extraordinarios e ordinarios;
temporais e perpetuos:
(1) Sua voca<;:ao e ordena<;:ao; sua rela<;:ao para com Cristo
e a Igreja. ! -'; .~ ·.·:. •·: ·

(2) Suas fun~6es: .:• -,,


(a) Como mestres, incluindo:
(i) Catequese: sua necessidade, principios e hist6ria.
(ii) Escolas Dominicais. Os deveres dos pais e da
Igreja quanto aeduca~ao religiosa das crian<;:as.
' 1 (iii) Ret6rica sagrada, homiletica e elocu~ao do
pulpito.
(iv) Literatura crista. Folhas, peri6dicos e livros
permanentes.
(b) Como diretores do culto, incluindo:
--. • (i) Liturgias- seu uso, abuso e hist6ria.
1. u ~; (ii) Form as livres de ora~ao.
_,~·h.: (iii) Salmodia- inspirada e nao inspirada, seu uso e
hist6ria.
· .J>', 1 (iv) Musica sagrada- vocal e instrumental, seu uso
e hist6ria. . ..
(c) Como regentes:
(i) 0 oficio, qualifica~ao, deveres e autoridade biblica

24
Teologia Crista
dos presbiteros regentes.
(ii) 0 oficio, qualifica<;ao, deveres, modo de elei<;ao
e ordena<;ao, e autoridade biblica do oficio de bispo
ou pastor, doN ovo Testamento.
(iii) A Junta de presbiteros /Conselho ou Consist6rio:
sua constitui<;ao e fun<;6es. A teoria, regras e metodos
praticos de disciplina na Igreja.
(iv) 0 presbiterio e sua constitui<;ao e fun<;6es. A
teoria, regras e precedentes praticos que regulam a
a<;ao dos tribunais eclesiasticos, no exercicio do
direito constitucional de revista e inquiri<;ao em tudo
o que diz respeito a processos, queixas e apela<;6es
eclesiasticos.
(v) 0 Sinodo e a Assembleia Geral- sua consti tui<;ao
e fun<;6es. Os principios e modos de proceder de
Comiss6es, Comissionarios, Mesas Administrativas,
etc.
Isso leva as fun<;6es da Igreja como urn todo, e a autori-
dade para distin<;6es denominacionais, aos usos e abusos dessas
distin<;6es, e as rela<;6es em que estao as diversas denomina<;6es,
umas para com outras.
1°. Estatistica eclesiastica, incluindo nossa propria Igreja,
as outras Igrejas eo mundo.
2°. Economia crista, social e eclesiastica, incluindo os
deveres de administra<;ao crista, consagra<;ao pessoal, e
beneficencia sistematica. A rela<;ao da Igreja com sociedades
voluntarias: associa<;6es de mo<;os cristaos, etc.
3°. A educa<;ao do ministerio, a dire<;ao, constitui<;ao e
administra<;ao de Seminarios teol6gicos.
4°. Miss6es internas, incluindo a evangeliza<;ao agressiva,
a sustenta<;ao de ministros entre os pobres, a extensao da
Igreja e a constru<;ao de edificios para Igrejas.
5°. A rela<;ao da lgreja como Estado, e a verdadeira rela<;ao
do Estado com a Igreja, e a condi<;ao real da lei comum e
estatuidade em rela<;ao a propriedade eclesiastica e a a<;ao

25
Capitulo 1
dos tribunais eclesiasticos no exerdcio da disciplina, etc. As
obriga<;6es dos cidadaos cristaos. A rela<;ao da Igreja com a
civiliza<;ao, as reformas morais, as artes, ciencias, cultura social,
etc.
6°. Miss6es no estrangeiro, em todos os seus ramos.
VejaLectures on Theological Encyclopedia and Methodology)
pelo Rev. John Me Clintock, D. D., L. L. D., editado por J. T
Short, R. D. Biblioteca Sacra, vol. 1, 1844; Theological Encyclo-
pedia and Methodology) pelo Prof. Tholuck, editado pelo Prof.
E. A. Park.

12. Que e que se acha compreendido sob o titulo de Teologia


Hist6rica?
Segundo a evolu<;ao 16gica de to do o conteudo das ciencias
teol6gicas, a interpreta<;ao da letra das Escrituras Sagradas e a
constrw;ao do sistema inteiro das verdades e deveres relaci-
onados que nelas sao revelados, precisam preceder a hist6ria
do desenvolvimento dessa revela<;ao na vida e fe da Igreja,
assim como a fonte precede ao rio que dela emana. No estudo,
porem, das ciencias teol6gicas, a hist6ria as deve preceder e
lan<;ar fundamento para todas as demais. E s6 a hist6ria que
nos da as Escrituras em que se acha contida essa revela<;ao, e
tam bern os meios pelos quais podemos averiguar, criticamente,
os diversos livros canonicos e suas ipsissima verba. A mesma
fonte devemos tambem os nossos metodos de interpreta<;ao e
seus resultados, como estes se acham ilustrados na imensa
quantidade de literatura teol6gica acumulada ate agora e
associada aos nossos credos e confiss6es, os do cum en tos
relatives as controversias e, por conseguinte, os documentos
que mostram como o nosso sistema de doutrina se desenvolveu
gradualmente. Na ordem de produ<;ao e aquisi<;ao, a hist6ria
vern primeiro, enquanto que na ordem de uma exposi<;ao 16gica
das ciencias teol6gicas constitutivas, ela tern a honra de abrir
caminho para a serie inteira. J

A teologia hist6rica divide-se em teologia hist6rica biblica

26
Teologia Crista
e eclesiastica. A primeira tern por fonte, principalmente, os
livros inspirados e continua ate o encerramento do canon
do Novo Testamento. A Segunda principia onde a primeira
acaba, e continua ate o tempo presente.
A hist6ria biblica subdivide-seem: 1°. Hist6ria do Velho
Testamento, e inclui as eras: (1) Patriarca!, (2) Mosaica e (3)
Profetica, juntamente com a (4) Hist6ria do povo escolhido
durante o intervalo entre o Velho eo Novo Testamentos. 2°. 0
Novo Testamento, incluindo (1) a vida de Cristo, (2) a fundac;ao
da Igreja Crista pelos ap6stolos, ate ao fim do primeiro seculo.
Para o estudo da hist6ria eclesiastica, como ciencia, sao
necessarios diversos ramos preliminares de estudo.
1°. Algumas das ciencias auxiliares ja enumeradas e preciso
citarmos como exigidas especificamente nesta conexao. Sao:
(1) geografia antiga, medieval e moderna. (2) cronologia. (3)
antigi.iidades de todos os povos incluidos na area pela qual se
estendeu, em qualquer tempo, a Igreja. (4) estatistica -
mostrando qual a condic;ao do mundo, em qualquer periodo
dado. (5) o curso inteiro de hist6ria geral.
2°. As fontes de on de se deriva a hist6ria eclesiastica devem
ser investigadas criticamente. (1) Fontes monumentais, como
sejam: (a) edificios (b) inscric;oes (c) moedas, etc. (2) Fontes
documentais, que sao: (a) publicas, como as atas de concilios,
as breves decretais e hulas de papas; os arquivos de governo,
os credos, confissoes, catecismos e liturgias de Igrejas, etc.; (b)
Documentos particulares, como literatura contemporanea de
toda qualidade, brochuras, biografias, anais, e relat6rios e
compilac;oes mais modernas.
3°. A hist6ria da literatura sobre a hist6ria eclesiastica,
desde Eusebio ate Neander, Schaff e Kurtz. Os metodos que
tern sido e devem ser seguidos na colocac;ao em ordem do
material da hist6ria eclesiastica.
0 metodo que sempre foi e provavelmente sempre sera
seguido e uma combinac;ao dos dois metodos naturais: (a) o
cronol6gico e (b) o t6pico.

27
Capitulo I
0 Dr. Me Clintock diz que o principia fundamental,
segundo o qual se devem arranjar os materiais de historia
eclesiastica, e a distinc;:ao entre a vida da lgreja e sua fe. As
duas divis6es sao, pois: (1) historia da vida da lgreja, ou historia
eclesiastica propriamente dita, e (2) historia do pensamento
da Igreja, ou historia das doutrinas.
1a. A historia da vida da lgreja trata de pessoas, comu-
nidades e eventos, e deve ser tratada segundo os metodos
ordinarios de composic;:ao his tori ca. ·,.
2a. A historia do pensamento da Igreja compreende:
( 1) patristica, ou a literatura dos chamados "Pais" da lgreja;
e patrologia, ou a exibic;:ao cientifica de sua doutrina.
Esses "Pais" da Igreja dividem-se em tres grupos: (a)
apostolicos, (b) antenicenos, e (c) pos-nicenos, terminando com
Gregorio, o grande, entre os latinos, 604 d.C., e com Joao
Damasceno, entre os gregos, 754 d. C. Este estudo envolve: (a)
a discussao do proprio uso dos escritos desses Pais da Igreja, e
sua autoridade legitima nas controversias modernas; (b) uma
historia completa de sua literatura e das edic;:6es principais de
suas obras, e (c) significado, valor e doutrina de cada urn desses
Pais, individualmente.
(2) Arqueologia crista, que trata dos costumes, culto e
disciplina da Igreja Primitiva, e da historia do culto, artes,
arquitetura, poesia, pintura, musica, etc., cristaos.
(3) Historia das doutrinas, ou a historia critica da genesee
do desenvolvimento de cada elemento do sistema doutrinario
da Igreja, ou de qualquer de seus ramos historicos, com a
historia tam bern de todas as formas hereticas de doutrina, das
quais a verdade tern sido separada, e a historia das controversias
por meio das quais foi efetuada a eliminac;:ao. A isto acompanha
naturalmente a historia critica de toda a literatura da historia
das doutrinas, dos principios aceitos, dos metodos seguidos e
do trabalho feito.
(4) Simbolica, que envolve: (a) a determinac;:ao cientifica
da necessidade e usos de Credos e Confiss6es publicos. (b) a
Teologia Crista

hist6ria das ocasi6es, da genese e recep<;;iio, autoridade e


influencia de cada urn dos Credos e Confissoes da cristandade.
(c) o estudo do conteudo doutrinario de cada Credo e de cada
grupo de Credos separadamente, e (d) simb6lica comparativa,
ou estudo comparativo de todas as Confissoes da lgreja, e a
exibi<;;ao sistematica de todos os pontos em que respectivamente
concordam e discrepam entre si. " ,

(Theological Encyclopedia, por Me Clintock.Notes on Eccle-


siastical History, por Dr. ]. A. Alexander, editado pelo Dr. S.
D. Alexander.)

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Origem da Ideia de Deus


e Prova da Sua Existencia

1. Qual a distinfiio entre uma definifiio nominal e uma definifiio


real? Equal a 'U'erdadeira defimfdO do termo ''Deus''?
Uma definic;ao nominal explica simplesmente a signifi-
cac;ao do termo usado; e uma definic;ao real explica a natureza
daquilo a que se aplica o termo usado.
A derivac;ao da palavraDeus (em portuguese latim) e Theos
(em grego) tern sido comumenteatribuida ao sanscrito Div-
dar "luz". Mas Curtis, Cremer e outros derivam-na de Thes
em thessesthai - "implorar". Theos e ''Aquele a quem se faz
orac;ao".
A palavraDeus e muitas vezes usada em sentido panteista,
para significar a base impessoal, inconsciente de toda existen-
cia, e por muitos, para designar a causa primaria desconhecida
e que se nao pode conhecer, do mundo existente. E por isso
que tantos especuladores, que negam real ou virtualmente a
existencia do Deus da cristandade, assim mesmo repudiam
indignados o nome ateistas, por admitirem a existencia de
uma substancia que existe por si, ou de uma causa primaria
a que dao o nome Deus, denegando-lhe, porem, a posse das
propriedades pessoais que, em geral, lhe sao atribuidas pelos
que fazem uso desse termo.
Mas, como questao de fa to, em conseqiiencia da predomi-
nancia de ideias cristas na literatura das nac;6es civilizadas
durante os ultimos dezoito seculos, o termo "Deus" e

30
Origem da I deia de Deus
empregado geralmente no sentido definido e permanente de
urn Espirito eterno, absolutamente perfeito, livre, pessoa1, que
existe por si mesmo, e e distinto do mundo que Ele criou e
sobre 0 qual e soberano.
0 homem que nega a existencia de tal Ser, nega a Deus.
I ..

2. Como se pode construir uma "real" definic;iio de Deus?


E evidente que Deus pode ser definido s6 ate onde nos e
conhecido, e a condi<;ao da possibilidade de 0 conhecermos e
0 fato de que fomos criados aSua imagem. E preciso que toda
defini<;ao de Deus pressuponha o fato de que, em algum
sentido essencial, Ele e Suas criaturas inteligentes sao seres
do mesmo genero. Deus e definido, pois, dizendo-se o Seu
genero e Suas diferen<;as espedficas. Quanto ao Seu genero, e
urn Espirito inteligente e pessoal. Quanto a Suas diferen<;as
espedficas, aquilo que 0 constitui Deus, Ele e infinito, eterno
e imutavel, em Sua existencia, sabedoria, poder, santidade,
e todas as perfei<;6es em harmonia com o Seu Ser.

3. Ate onde se deve a tradic;ao, a ideia de Deus?


E evidente que se tern chegado a ideia completa de Deus
apresentada na defini<;ao precedente, somente por meio da
revela<;ao sobrenatural que temos nas Escrituras Sagradas. E
tambem urn fato que as tres (micas religi6es teistas que em
qualquer tempo tern prevalecido entre os homens (a judaica, a
maometana e a crista) se acham ligadas historicamente com
essa mesma revela<;ao. Eem vao especular-se quanto ao resul-
tado a que chegariam os homens, independentemente de todos
os habitos herdados e de todas as opini6es tradicionais, par-
que estamos inteiramente sem experiencia ou testemunho a
respeito de qualquer especie de conhecimentos adquiridos ou
jufzos formados sob tais condi<;6es. E, alem disso, e certo tam-
bern que a forma que tomam as concep<;6es teistas, e as asso-
cia<;6es que a acompanham, sao determinadas no caso de cada
comunidade, pelas tradi<;6es teol6gicas herdadas de seus pais.

31
Capitulo 2

Por outro lado, e certo que todos OS homens, debaixo de


todas as condi~oes conhecidas, e por isso, debaixo de todas as
condi~oes verdadeiramente naturais, reconhecem espontanea-
mente uma existencia divina que lhes e revelada, mais ou
menos claramente, na constitui~ao e na experiencia conhecidas
de seus pr6prios espiritos e na natureza externa. Por conse-
guinte, a concep~ao teista nao e mais devido aau tori dade, como
muitas vezes se diz absurdamente, do que e devido a cren~a,
formada debaixo das mesmas condi~oes de educa~ao, na
realidade sub;etiva do espirito humano, ou na realidade
ob;etiva da materia. A existencia do Deus automanifesto e
reconhecida espontanea e universalmente, o que e uma prova
evidente de serem claras e presentes, em toda parte, as provas
da Sua existencia, e serem convincentes para todos os homens
desenvolvidos normalmente.

4. Seria INATA a ideia de Deus? Seria ela uma verdade


INTUITIVA? .•. ,._< ;.
As respostas dependem do sentido em que tomamos os
termos respectivos. E evidente que nao ha ideias "inatas" no
sentido deja ter nascido crian~a com a concep~ao do ser di-
vino, ou qualquer outra ja formada na sua mente. E certo
tambem que a mente humana, quando desenvolvida em
condi~oes puramente naturais e na ausencia de toda revela~ao
sobrenatural, nunca pode chegar a uma concep~ao adequada
da natureza divina. Por outro lado, porem, toda a hist6ria
prova que a ideia de Deus e inata, no sentido de que as
faculdades constitucionais do espirito humano sao tais que,
em todas as condi~oes naturais, chegam ao reconhecimento,
mais ou menos claro, de Deus como a causa primaria de toda
existencia e como o Senhor da consciencia, automanifestado
na alma e no mundo. Einata por serem as provas da existencia
divina presentes tao universalmente como o e a luz do dia,
e por ser constitucional o processo pelo qual se apreendem
essas provas.

32
Origem da I deia de Deus
Se tomarmos o termo "intui<;;:ao" no sentido estrito de visao
direta de uma verdade, vista a sua propria luz como verdade
necessaria, por urn ato intelectual que e impassive! resolver
em processos de pensar mais elementares, nesse caso, a
existencia de Deus nao e uma verdade apreendida intuitiva-
mente pelos homens. 0 processo pelo qual chegamos ao
conhecimento desta verdade, quer espontaneamente, quer
por meio de urn raciocinio elaborado, abrange como elementos
muitas intui<;;:6es indubitaveis, mas ninguem apreende a
Deus mesmo por uma intui<;;:ao direta, porque:
I 0 • Ainda que o reconhecimento da existencia divina seja
necessaria, no sentido de ser uma verdade aceita pela grande
maioria dos homens que nao podem deixar de crer nela,
mesmo quando querem; e embora ninguem possa deixar de
crer nela sem que fa<;;:a violencia a sua natureza, contudo nao e
uma verdade necessaria, no sentido de nao se poder conceber
a nao existencia de Deus.
2°. Porque Deus nao Se nos manifesta imediata, e sim,
mediatamente por meio de Suas obras. E, no ato pelo qual a
alma reconhece a Sua presen<;;:a e a<;;:ao, ha sempre, pelo menos
implicitamente, uma inferencia, uma dedu<;;:ao.
3°. Porque a verdadeira ideia de Deus e muito complexa,
e chega-se a ela por meio de urn processo complexo, o qual,
quer seja espontaneo quer nao, envolve diversos elementos
que se pode analisar e descrever.
Por outro lado, e certo que Deus Se manifesta nas opera-
<;;:6es de nossas almas e na natureza exterior de urn modo
analogo aquele pelo qual se nos manifestam as almas invisiveis
de nossos semelhantes, e reconhecemos a existencia dEle com
a mesma certeza com que reconhecemos a dessas almas. A
existencia dessas reconhecemos: (a) porque somas generica-
mente semelhantes aos outros, e (b) porque seus atributos se
manifestam em suas palavras e atos. E a existencia de Deus
reconhecemos: (a) porque fomos criados a Sua imagem, e este
fa to reconhecemos espontaneamente, (b) pela revela<;;:ao que

33
Capitulo2

Deus faz de Si na nossa consciencia, e pelas caracteristicas


do mundo exterior. ., , ..... ·
"Ainda que se possa analisar o processo mental que
acabamos de descrever - a inferencia teista - esta e em si
sintetica. Os principios dos quais depende acham-se ligados
entre si, de modo que o espirito os pode compreender todos
em urn s6 ato, e inclui e aplica todos eles, necessariamente, na
sua apreensao de Deus. A vontade, a inteligencia, a consciencia,
a razao e as ideias que elas fornecem; causa, designio, bondade,
infinidade, e os argumentos que tern estas ideias por base-
tudo isso junta-se nesse grande processo"- Theism, Prof. Flint,
pags. 71, 72.

5. Sea existencia de Deus ereconhecida espontaneamente par


todos as homens, em estado normal de consciencia, qual a utilidade
de argumentos formais para provar essa existencia? E quais sao as
argumentos geralmente us ados?
1°. Esses argumentos sao de valor como analises e
verificac;6es cientificas dos processos mentais envolvidos
implicitamente no reconhecimento espontaneo das
automanifestac;6es de Deus.
2°. Sao de utilidade tambem para indicar a legitimidade
do processo contra as crfticas do ceticismo.
3°. Confirmam e vivificam o reconhecimento espontaneo,
chamando a atenc;ao para a extensao e variedade das provas
que atestam a mesma verdade.
4°. Os diversos argumentos sao convergentes antes que
consecutivos. Nem todos estabelecem os mesmos elementos
da concepc;ao teista, mas cada urn deles estabelece indepen-
dentemente seu elemento separado e assim e util, contribuindo:
(a) como prova confirmativa de que Deus existe, e (b) como
prova complementar quanto ao que Ele e.
Constituem urn todo organico, e sao a analise e a ilustra~ao
do ato espontaneo em virtude do qual a grande massa dos
homens tern sempre reconhecido a existencia de Deus. "Se

34
Origem da Ideia de Deus
bern que causalidade nao pressup6e designio, nem designio
bondade; designio pressup6e causalidade, e bondade, tanto
causalidade como designio. As provas de inteligencia sao
tam bern provas de poder; e as provas de bondade o sao tam bern
de inteligencia e poder. Os principios da razao que nos obrigam
a pensar em Deus, na Suprema lnteligencia Moral como urn
ser auto-existente, eterno, infinito e imutavel, suplementam
as provas derivadas de outras fontes, e tornam consequente e
completa a doutrina do teismo" - Theism, Prof. Flint, pags.
73, 74.
Os argumentos comuns serao examinados sob os seguintes
titulos:
1°. Argumento Cosmol6gico, ou a prova da existencia de
Deus como causa primaria.
2°. Argumento Teleol6gico, ou as provas da existencia de
Deus fornecidas pela ordem e adapta<;:ao que reinam no
umverso.
3°. Argumento Moral, ou as provas fornecidas pela
consciencia morale pela hist6ria da ra<;:a humana.
4°. As provas fornecidas pelos fenomenos das Sagradas
Escritu'ras e pela hist6ria sobrenatural nela registrada.
5°. 0 Argurnentoa priori eo testernunho que a razao dade
Deus como o lnfinito e Absoluto.
··_.··1,:'

6. Quale o Argumento Cosmol6gico?


Pode ser apresentado na forma de urn silogisrno, assim:
Premiss a Maior- Tudo quanto principia a existir de novo,
e qualquer mudan<;:a em qualquer coisa que ja existe, teve
necessariamente uma causa preexistente e adequada.
Premissa menor- 0 universo, ern seu todo e em todas as
suas partes, e urn sistema de mudan<;:as.
Conclusiio- Logo, o universo teve necessariamente uma
causa exterior a si, e a causa ultima e absoluta nao pode deixar
de ser eterna, nao causada e imutavel.
1°. Quanto aprernissa maior: 0 juizo causal eintuitivo e

3S
Capitulo 2 .I ~

absolutamente universal e necessaria. Alguns especuladores,


como Hume e Mill, o tern negado teoricamente, mas tern sido
empregado por eles e por todos os demais em todos os seus
raciodnios sobre a origem do mundo, como tambem de tudo
quanto ele contem. E urn juizo inevitavel, o contrario do qual
nem se pode imaginar. Alguma coisa existe agora, por conse-
guinte alguma coisa necessariamente tern existido desde toda
a eternidade, e aquilo que tern existido desde toda a eternidade
e a causa daquilo que existe agora.
Tem-se alegado que o juizo causal conduz apenas a uma
serie eterna e regressiva de causas e efeitos. Isso, porem, e urn
absurdo.
( 1) 0 juizo nao e que tudo teve urn a causa, e sim, que tudo
o que principia a existir e toda a mudanc;:a naquilo que ja existe,
foi causado. Para aquilo, porem, que e eterno e imutavel, esse
juizo nao pede causa.
(2) Uma serie eterna de causas e efeitos e absurda, porque
seria simplesmente uma serie de mudafl(;;as, que e precisa-
mente aquilo que pede uma causa, e tanto mais impera-
tivamente quanto mais longa e a serie. Uma causa real, porem,
uma causa que satisfac;:a absolutamente ao juizo causal, nao
pode ser nem uma mudanc;:a nem uma serie de mudanc;:as, e
sim alguma coisa nao causada, eterna e imutavel.
Como questao de fato, e inegavel que todos OS fil6sofos e
homens de ciencia, sem nenhuma excec;:ao, postulam estes
prindpios. Eles todos postulam uma causa eterna, auto-
existente e imutavel do universo, quer seja urn espirito pessoal,
quer atomos materiais, quer uma alma mundi inconsciente,
inteligente, em uniao com a materia.
2°. Quanto apremissa menor: o fato de ser o universo, ern
seu todo e em todas as suas partes, urn sistema de mudanc;:as, e
ensinado por todos os prindpios e li<;:6es da ciencia moderna.
Todas as descobertas nos campos da geologia e da astronornia,
e todas as especulac;:6es, como sejam- a hip6tese nebulosa e a
da evoluc;:ao- tern esse principia na sua propria essencia.

36
Origem da I deia de Deus

Mas John Stuart Mill, no seuEssay on Theism, pags. 142 e


143, diz: "Ha na natureza urn elemento permanente, como
tambem urn elemento variavel; as mudanc;as sao sempre os
efeitos de mudan<;as anteriores; as existenciais permanentes
porem, ate onde as conhecemos, de modo algum sao efeitos ...
Ha em todos OS objetos outro elemento que e tambem
permanente, a saber, a substancia ou substancias espedficas e
elementares de que eles consistem, e suas propriedades sao
inerentes. Nao se sabe quando essas come<;am a existir. Dentro
do tempo a que remontam, os conhecimentos humanos nao
tiveram principia, e por conseguinte, tampouco causa; em bora
eles sejam as causas ou concausas de tudo quanta sucede".
Sempre que na explica<;ao de urn fenomeno fisico se remonta
asua causa, acha-se que esta consta de uma certa quantidade
de for<;a combinada com certas coloca<;6es ... A for<;a em si e
essencialmente uma e sempre a mesma, e dela existe na natureza
uma quantidade fixa que, sea teoria da conserva<;ao das for<;as
e verdadeira, nunca aumenta nem diminui. Eis, pais, nas
mudan<;as da natureza material urn elemento permanente, que
parece ter todas as caracteristicas daquele mesmo que estamos
procurando. Ea isso pais que, segundo parece, devemos atribuir
o carater de Causa Primaria, se ha coisa que mere<;a essa
distin<;ao -Essay on Theism, pags. 144, 145.
RESPONDEMOS: (1) A existencia de "Energia" ou "For<;a",
em qualquer de suas formas conversiveis, e separada da
materia, e absolutamente impossivel imaginar-se. Este faro e
reconhecido como uma indubitavel verdade cientifica por
Stewart e Tait (Unseen Universe, pag. 79). (2) E urn faro 6bvio
que toda a luz e calor do sol e das estrelas, salvo uma fra<;ao
muito diminuta, sai para o espa<;o e nunca volta para esses
corpos. E urn fato tambem que o movimento visivel de todos
os grandes corpos do universo esta sendo retardado gradual-
mente por alguma coisa que se pode chamar "fric<;ao eterea", e
que afinal tombarao todos juntos e constituirao, por agrega<;6es
sucessivas, uma s6 massa. "Enfim, a degrada<;ao da energia do

37
Capitulo 2
universo visivel procede,pari passu, com a agrega<;ao de mass a.
0 proprio faro, pois, de serem de tamanho finito as grandes
massas do universo visivel, torna certo que esse processo nao
pode ter continuado desde toda a eternidade ou, em outras
palavras, o universo visivel necessariamente teve principio no
tempo". Porque: (a) ainda ha energia em quantidades finitas e
nao difusa; e porque (b) a materia do universo existe ainda em
massas separadas. Assim pois, a propria lei da correla<;ao de
energia ou for<;a para a qual o sr. Mill apela, prova, quando
realmente aplicada, que o universo teve principio e tera fim
(Stewart e Tait, Unseen Universe, pag.166). (3) Tambem o seu
postulado de que a materia do universo, em seus ultimos
atomos, e eterna e imutavel, nao esta provado e esta em
contradi<;ao com a analogia cientifica. Clark Maxwell (em seu
discurso como presidente daBritishAssociationfor Advancement
of Science, 1870) diz: "A igualdade exata de cada molecula com
todas as demais moleculas da mesma substi1ncia, da-lhe, como
bern o disse Sir John Herschell, o carater essencial de urn objeto
fabricado; e isso e incompatfvel com a ideia de ser ela eterna e
auto-existente". (4) Como questao de fato, todas as teorias
evolutivas sobre a genese do universo postulam necessaria-
mente urn principio e uma neblina primordial e luminosa.
Mas essa neblina luminosa nao pode sera Primeira Causa que
o nosso juizo causal pede, porque nao e eterna e imutavel. Se
fosse eterna, estaria inteiramente desenvolvida; e se estivesse
inteiramente desenvolvida, nao poderia desenvolver-se ainda
para formar o universo. Se fosse imutavel, nao estaria sujeita a
mudanc;;as; e se nao e imutavel, e, assim como o universo que
se desenvolve dela, urn estado transit6rio da materia, pedindo
como todas as outras mudanc;;as, uma causa.

7. Qual o Argumento Teleol6gico?


Teleologia (telos - fim, e logos - discurso) e a ciencia das
causas finais, ou dos prop6sitos ou designios, como estes se
acham exibidos na natureza, na adaptac;;ao das partes aos
Origem da I diia de Deus

inteiros, dos meios aos fins e dos 6rgaos aos seus usos. E
chamado tambem argumento baseado no Designio; afinal e
baseado no reconhecimento das opera~6es de uma causa
inteligente na natureza. Pode ser apresentado sob duas formas,
baseadas respectivamente nas manifesta~6es mais gerais e mais
especiais dessa inteligencia.
PRIMEIRA FORMA. Premissa maior - Ordem e harmonia
universais na opera~ao concorrente de uma imensa multidao
de elementos separados, acham explica~ao s6 no postulado de
uma causa inteligente.
Premissa menor- 0 universo, no seu todo e em todas as
suas partes, e uma estrutura da ordem mais complexa e
simetrica.
Conclusiio- Logo, a causa eterna e absoluta do universo e
uma mente inteligente.
SEGUNDA FORMA. Premissa maior - 0 ajustamento das
partes e a adapta~ao dos meios para efetuar urn fim ou prop6sito,
podem ser explicados s6 referindo-os a uma inteligencia e
vontade que tinham em vista esse fim ou prop6sito.
Premissa menor - 0 universo esta cheio de semelhantes
ajustamentos de partes e de organismos compostos de partes
que concorrem para efetuar certos fins.
Conclusiio- Logo, a Primeira Causa do universo nao pode
deixar de ser uma mente e uma vontade inteligentes que
tinham em vista esses fins.
Se estes argumentos sao validos, provam que Deus e uma
Pessoa eterna e auto-existente. Trata-se de urn absurdo o
postulado de uma inteligencia inconsciente ou de uma
inteligencia que produza efeitos sem que opere vontade
alguma. Estas frases nao representam nenhuma ideia possivel;
e inteligencia e vontade, quando se acham juntas, constituem
personalidade.
Quanto aprimeira forma do argumento, e evidente que 0
proprio fato de ser a ciencia uma coisa possivel, e prova
indubitavel de ser intelectual a ordem da natureza. A ciencia e

39
Capitulo2
urn produto do espirito humano que e absolutamente incapaz
de passar alem das leis da sua constitui~ao. As intui~6es da
razao, OS proceSSOS 16gicos da analise, inferencias indutivas OU
dedutivas, a imagina~ao, a invenc;ao e todas as atividades da
alma e que organizam OS proceSSOS cientificos; e Se ve que
tudo isso corresponde perfeitamente anatureza exterior. Depois
de resolvidos ate os mais sutis problemas abstratos da materna-
rica e da mecanica, tem-se achado subsequentemente que as
solu~6es foram antecipadas na natureza. As leis da natureza
sao as express6es de harmonias numericas e geometricas, e
exemplos maravilhosos de uma razao superior e do belo perfeito.
Contudo, essas leis, embora sejam invariaveis nas mesmas
condi~6es, nem sao eternas nem inerentes a constitui~ao
elementar do universo. As propriedades da materia elementar
sao constantes, mas as leis que as organizam sao, elas mesmas,
efeitos complicados, o resultado de ajustamentos anteriores sob
as categorias de tempo, espa~o, quantidade e qualidade. A
medida que se mudam esses ajustamentos, mudam-se tam bern
as leis. E esses ajustamentos sao, pois, a causa dessas leis; e os
ajustamentos nao podem, por isso, deixar de ser o produto ou
do acaso, 0 que e absurdo, ou da inteligencia, 0 que e certo.
Esta ordem intelectual da natureza eo primeiro postulado
necessario de toda a ciencia, e e a essencia de todos os processos
do universo, desde 0 agrupamento de atomos ate a revolu~ao
dos mundos; desde a digestao de urn p6lipo ate aac;ao funcional
do cerebro humano.
Quanto asegunda forma deste argumento- 0 prindpio
de designio pressup6e a ordem intelectual geral do universo
e suas leis, e apresenta ja, antecipadamente, a afirmac;ao de
que o carater da Primeira Causa e manifestado mais ainda
pelas provas encontradas em toda parte, de serem essas leis
gerais obrigadas a concorrer para, por meio de ajustamentos
especiais, efetuar certos fins que evidentemente se deviam
efetuar. Este principio e ilustrado pelos ajustamentos mutuos
descobertos nas diversas providencias da natureza, e

40
Origem da I deia de Deus

especia1mente pe1os organismos vegetais e animais, e as rela<;6es


que envo1vem de urn organismo para com outro organismo,
de organismo para como instinto, e de organismos e classes
de organismos para com outros, e as circunstancias fisicas em
que se acham co1ocados. Em muitos casos, a inten<;ao destes
ajustamentos e adapta<;6es especiais e evidente de per si e
inegave1, como, e.g., o caso das diversas partes do o1ho para
produzir a visao. N outros casos, a inten<;ao e mais obscura e
conjetural. Mesmo no estado atua1 das ciencias, podemos
compreender s6 em parte; porem ja desde o principia, as
provas de designio inteligente tern sido transparentes e
abundantes. Urn s6 periodo num manuscrito e prova de
inteligencia, mesmo se o contexto for indecifravel. No en tanto,
todo passo que se da adiante nas ciencias, descobrem-se mais
provas espalhadas em area maior e com uma luz mais clara.

8. Quais sao algumas das objefi5es feitas contra a inferencia


deista tirada do argumento de designio especial, e quais sao as
respostas?
1a. Hume (Dialogues on Natural Religion, Pt. 7, etc.) afirma
que a nossa convic<;ao de que adaptac;ao e prova de designio,
e devida aexperiencia e nao pode passar a1em dela: e a de que
o nosso juizo dos organismos naturais implicam designio na
sua causa e uma inferencia tirada da analogia das invenc;6es
engenhosas do homem e dos seus efeitos. Diz mais, que essa
ana1ogia e fa1sa- (1) Porque ja temos conhecimento previo do
inventor humano como agente inteligente, enquanto que do
autor da natureza nao temos nenhum conhecimento previo, e
e esse mesmo autor que a inferencia deista procura verificar.
(2) Todos OS processos da natureza sao diversos daque1es por
meio dos quais os homens executam as suas obras; e a formac;ao
do mundo e a instituic;ao dos processos da natureza sao efeitos
peculiares, inteiramente disseme1hantes daque1es que temos
experiencia.
RESPONDEMOS: (1) 0 argumento peca porter como base

41
Capitulo2
urn falso postulado de fato. Do inventor humano, da sua alma
nao temos conhecimento previo nem conhecimento algum, a
nao ser o que nos da o carater das obras pelas quais se manifesta
a n6s. E e exatamente do mesmo modo e na mesma extensao
que chegamos ao conhecimento do Autor da natureza. (2) 0
argumento baseia-se num falso postulado de principia. A
analogia das inven<;;6es do engenho humano nao e a base da
nossa convic~ao de que a ordem e a adapta~ao sao provas de
in teligencia. Ejuizo universal e necessaria da razao que a ordem
e a adaptac;ao s6 podem proceder de uma causa inteligente, ou
do acaso; e esta ultima suposic;ao e absurda.
za. Alguns cientistas, tendo adquirido o costume de
considerar o universo como uma unidade absoluta, cujos
processos sao todos executados por leis gerais, invariaveis (urn
modo de pensar em que a teologia agostiniana se antecipou
por seculos aciencia), fazem objec;ao que, tomando como prova
de intenc;ao o ajustamento das partes, em certos grupos ou
sistemas especiais o te6logo natural toma, por engano, uma
parte pelo todo e urn efeito incidental de uma lei geral,
resultado de condic;6es especiais e temporais, pelo fim real da
propria lei. Dizem que mesmo se fosse inteligente a Primeira
Causa do universo, os homens cometeriam urn absurdo infinito
nutrindo a presunc;ao de interpretar o Seu prop6sito, por meio
dos resultados especiais que eles veem proceder da opera~ao
de leis que ja tern estado operando desde toda a eternidade,
por todo o espa~o infinito e sobre urn sistema infinito de partes
concorrentes.
RESPONDEMOS: (1) Eevidente que as relac;6es das partes
de urn todo especial, concorrendo todas para produzir urn fim
especial, podem ser entendidas muito bern enquanto
permanec;am inteiramente desconhecidas as rela~6es desse todo
especial para com a totalidade do todo geral; ainda que a razao
e a revela~ao derramem muita luz mesmo sobre esta ultima
parte. Urn s6 osso de urn animal de especie desconhecida da
testemunho inegavel de adapta~ao especial, e pode ate, como

42
Origem da Ideia de Deus
dizem com toda a razao os cientistas, lan<;:ar muita luz para
alem de si, sobre a constitui<;:ao daquele todo a que pertenceu,
mas do qual nao temos outro conhecimento. (2) Confessamos
que essa critica, se bern que falhe quanto ao argumento tirado
do designio, tern for<;:a quanto ao modo pelo qual este argu-
mento tern, as vezes, sido aplicado. Os antigos te6logos naturais,
muitas vezes em grau urn tanto exaltado, abstrairam orga-
nismos individuais do grande todo dinamico do qual sao tanto
produtos como partes. 0 Dr. Flint (Theism, pag. 159) distingue
bern os fins intrinsecos, extrinsecos e supremos de qualquer
ajustamento especial. Assim, o fim intrinseco desse ajusta-
mento especial chamado olho, e a visao. Seus fins extrinsecos
sao os fins uteis para os quais esse 6rgao serve para o animal
que o possui, e os fins uteis para os quais o animal serve para
tudo o que esta com ele, em rela<;:ao imediata ou remota. Seu
fim supremo e 0 fim do proprio universo. "Quando afirmamos,
pois, que ha causas finais no sentido de fins intrinsecos em
quaisquer coisas, afirmamos s6 que as coisas sao unidades
sistematicas, cujas partes se acham relacionadas definitiva-
mente umas com outras, e coordenadas para produzirem
urn resultado comum; e quando afirmamos que ha em
quaisquer coisas, causas finais, no sentido de fins extrfnsecos,
afirmamos somente que as coisas nao sao sistemas isolados e
independentes, e sim, sistemas definitivamente relacionados
com outros sistemas, e ajustados de modo que sao partes
componentes de sistemas superiores e meios para produzir
resultados mais compreensiveis do que elas mesmas" -
Theism, pag. 163
E verdade que urn homem nao pode discernir o supremo
fim de uma parte, enquanto nao discerne o supremo fim do
todo, e que nao pode discernir todos OS fins extrfnsecos de
qualquer sistema especial, enquanto nao conhece todas as suas
rela<;:6es para com todos os demais sistemas especiais. Apesar
disso, porem, assim como urn homem, que nao sabe nada das
rela<;:6es que tern uma certa planta ou urn animal para com a

43
Capitulo 2
flora ou a fauna de urn continente, pode ter certeza absoluta
quanta as funs;6es da raiz ou de uma garra ou unha, na economia
da planta ou do animal, assim tambem podera entender
perfeitamente a maneira por que todas as partes que concorrem
para produzir urn todo especial sao adaptadas para esse fim,
sem que, por ora, nada saiba da rela<;:ao extrinseca em que esta
esse todo especial para com aquila que esta fora dele.
32 • Certa classe de cientistas tern afirmado, nestes ultimos
tempos, que o testemunho dado da existencia de Deus, pela
ordem e adaptas;ao manifestadas nos processos da natureza,
fica muito enfraquecido, senao invalidado absolutamente pela
probabilidade de ser verdadeira a hip6tese alternativa da
evolu<;:ao. Ha muitas teorias da evolll(;;ao, mas o termo, no
sentido geral, significa o juizo de que o estado do universo
como urn todo e em todas as suas partes, em qualquer
momenta tern sua causa no estado em que se achava o universo,
no momenta anterior; que as mudan<;:as notadas foram
produzidas pela agencia de for<;:as inerentes na natureza, e que
se pode notar a operas;ao dessas fon;as, de momenta para
momenta, sem solu<;:ao de continuidade causal, durante todo
o tempo passado.
Todas as possiveis teorias da evolu<;:ao, consideradas em
sua rela<;:ao com a teologia, podem ser assim classificadas: (1)
As que nao negam nem obscurecem o testemunho que a ordem
e a adapta<;:ao observadas na natureza dao da existencia de
Deus, da Sua imanencia nas Suas obras, e do Seu governo
providencial sabre elas. (2) As que, embora reconhe~am a
Deus como a causa original a Quem se deve referir no passado
remota a origem e os ajustamentos primarios do universo,
contudo negam a Sua imanencia e constante atividade
providencial nas Suas obras. (3) As que manifestam, ou vir-
tualmente obscurecem ou negam, o testemunho que a ordem
e adaptas;ao do universo dao da existencia e atividade de Deus,
tanto como Criador como tambem como Governador
providencial.

44
Origem da I deia de Deus
Para com aprimeira destas classes de teorias da evolu~ao, o
te6logo natural sente, naturalmente, s6 o mais amigavel inte-
resse.
Quanto asegunda classe, que admite que uma inteligencia
divina ideou e inaugurou o universo no principia absoluto,
mas nega que qualquer agente semelhante esteja imanente no
universo dirigindo seus processos, cabe-nos dizer: (1) Que o
ponto que estamos procurando estabelecer agorae a auto-exis-
tencia de uma Primeira Causa inteligente, e nao o modo da
Sua rela~ao para com o universo. Este ultimo ponto sera
elucidado em diversos cap:ftulos subseqiientes. (2) E muito
filos6fico e mais de acordo com a verdadeira interpreta~ao do
principia cient:ffico de continuidade, o conceber-se a Primeira
Causa como imanente no universo, e como concorrendo
organicamente com todas as causas secundarias e nao inteli-
gentes em todos OS procesSOS que sao ind:fcios de poder OU
inteligencia. Isso e reconhecido por todos os cientistas, e
caracteriza a grande maioria deles, que sao de:fstas ortodoxos
OU que referem todos OS fenomenos do universo f:fsico aa~ao
dinarnica da vontade divina. (3) Sao incontestaveis as provas
que a consciencia moral do hornern, a hist6ria e a revela~ao
fornecem, ern favor da imanencia e opera~ao eficaz de Deus,
ern todas as Suas obras.
Quanto a terceira classe de teorias da evolu~ao que
obscurecern ou negam, quer manifesta quer virtualrnente, o
testernunho que a ordern e a adapta~ao do universo sao de urna
inteligente Causa Prirnaria do universo, como, e.g., a teoria de
Darwin quanto a diferencia~ao de todos OS organismos, ern
virtude de varia~6es acidentais surgindo durante urn tempo
ilirni tado, cabe-nos dizer:
1°. Toda teoria sernelhante, quando proposta para explicar
o universo atual, deve fornecer urna explica~ao provavel de
todas as classes de fatos. Mas e not6rio que todas as teorias da
evolu~ao purarnente natural, deixarn inteiramente de explicar
os fatos seguintes: (1) A origem da vida. Nao poderia existir

45
Capitulo 2
na suposta neblina luminosa, e nao poderia ser gerada por
aquila que nao tern vida. A decisao madura da ciencia de hoje
(1878) e a que ja se acha expressa no axioma antigo omne vi-
vum ex vivo. (2) A origem da sensa<;:ao. (3) Tambem a da
inteligencia e da vontade. (4) Tambem ada consciencia. (5) 0
estabelecimento de tipos distintos, logicamente correlatados e
persistentes, em generos e especies, mantidos pela lei da
hibridade. (6) A origem do homem. 0 Prof. Virchow, de Bedim,
no seu recente discurso perante aSociedadeAlema de Naturalistas
e Medicos, em Munich, diz: "Saibam que me ocupo atualmente
com especialidade no estudo de Antropologia; mas sinto-
me obrigado a declarar que cada passo que temos dado para
diante na provincia de antropologia pre-hist6rica tern-nos
realmente afastado mais de qualquer prova de semelhante
conexao (isto e, de ser 0 homem descendente de qualquer tipo
inferior)".
2°. Mas mesmo se fosse possivel provar como fato a
evolw;;ao continua, isso de modo algum afetaria as provas que
nos fornecem a ordem inteligente e as adapta<;:6es notadas no
universo. Estabeleceria somente urn metoda ou sistema de
meios, porem em grau algum alteraria a natureza dos efeitos
ou os atributos da causa real, descoberta por meio desses efeitos.
(1) Seria preciso ainda explicar a origem das leis da abiogenese,
de reprodu<;:ao, de diferencia<;:ao e reprodu<;:ao sexuais, de
hereditariedade, de varia<;:ao das leis que, de atomos e energia
med'mica, possam desenvolver sensa<;:ao, razao, consciencia e
vontade. (2) Leis nunca sao causas, mas sempre modos
complicados de a<;:ao; o resultado da coa<;:ao de imimeros
agentes inconscientes. Em vez de serem explica<;:6es, sao elas
mesmas efeitos muito complexos dos quais a razao exige uma
causa intelectual. (3) Todas as leis fisicas sao o resultado das
propriedades originais da materia, operando sob a condi<;:ao
mutua de certos ajustamentos complicados. Alterados os
ajustamentos, alteram-se as leis. As que executam a evolw;;ao
ou antes aquelas em que eanalisado 0 processo da evolu<;:ao, e

46
Origem da I deia de Deus

preciso que se refiram retrospectivamente aos ajustamentos


originais dos elementos materiais da neblina luminosa. Esses
ajustamentos nos quais, segundo a hip6tese da evolu~ao, devia
achar-se latente toda futura ordem e vida, tiveram necessaria-
mente como causa, ou o acaso ou a inteligencia. Huxley, em
seu Criticisms on Origin of Species, pag. 330, baseia no acaso
toda a 16gica da evolu~ao, assim: "Tern sido demonstrado que
urn aparelho, muito bern adaptado para urn fim particular,
pode ser o resultado de urn metodo de tentativas e erros,
executado por agentes inconscientes; como tambem da
aplica~ao direta de meios adaptados para produzirem esse
fim, por urn agente inteligente". Segundo a teologia, cada
organismo e como uma bala de carabina atirada diretamente
num alvo. Segundo Darwin, "os organismos sao como que
metralhadora da qual uma bala ou poucas acertam em algum
objeto, e as outras caem longe". A moderna explica~ao
cientifica dos processos do universo, por meio s6 de causas
fisicas aexclusao da inteligencia, difere da antiga teoria ja ha
muito abandonada do acaso, somente nos acidentes: (a) do
uso enganador das palavras "leis da natureza", e (b) do postu-
lado de que o acaso, operando durante urn tempo in-definido,
pode fazer uma obra de inteligencia. Todavia, assim como
ninguem pode crer que qualquer soma de tempo possa
explicar a forma das facas de pedra e as pontas de seta de pedra,
sem o trabalho humano; nem que uma cole~ao de tipos
lan~ados ao acaso mesmo em numero ilimitado de vezes
possa cair em uma ordem tal que formem os dramas de
Shakespeare ou Os Luziadas por Cam6es, assim tambem
ninguem pode crer racionalmente que a ordem complicada
e tao evidentemente intelectual do universo proceda do
acaso. (4) Na cria~ao artificial e o homem que escolhe; na
sele~ao natural (natural selection) e a natureza que escolhe.
Por conseguinte, se os resultados sao os ajustamentos mais
cuidadosos para efetuar urn fim determinado, segue-se que
essa caracteristica foi estampada sobre os organismos pela

47
Capitulo 2
natureza e que, por isso, esta foi dirigida inteligentemente: (a)
ou por uma inteligencia imanente nos seus elementos, ou em
seu to do organizado; (b) ou pelo ajustamento original do seu
maquinismo, ou por urn Criador inteligente.
. ._; .

9. Exposifiio do argumento moral, is to e, as provas fornecidas


pela consciencia moral e pela hist6ria da rafa humana.
0 argumento cosmologico nos conduziu a uma Causa
Primaria eterna e auto-existente. 0 argumento deduzido da
ordem e adapta~ao descobertas nos processos do universo
revela-nos que essa grande Causa Primaria possui inteligencia
e vontade, isto e, que e urn espirito pessoal. 0 argumento
moral ou antropologico fornece dados novos para inferencias,
confirmando as conclus6es anteriores quanto ao fato da
existencia de uma Causa Primaria pessoal e inteligente; e, ao
mesmo tempo, acrescentando a essa concep~ao os atributos
de santidade, justi~a, bondade e verdade. 0 argumento
deduzido do designio inclui o argumento deduzido da
causa; e o argumento deduzido da justi~a e benevolencia
inclui esses dons e acrescenta ainda urn elemento novo que
lhe e proprio.
Este grupo de argumentos pode ser assim exposto:
1°. Consciencia de si ea base fundamental de todo conheci-
mento. Da-nos imediatamente o conhecimento de nos mesmos
como existentes e como sujeitos a certos atributos e agentes
em certas formas de atividade. Nossas almas, com todos os
seus atributos, precisam de explica~ao. Nao existem desde a
eternidade; tampouco podiam ser desenvolvidas de elementos
materiais, porque: (1) A consciencia da testemunho da sua
unidade, simplicidade e espiritualidade. (2) As leis da razao e
o sentimento moral nao podem ser explicados como o resultado
de transformadas impress6es do sentido, modificadas pelas
associa~6es divididas pela hereditariedade, segundo Mill e
Spencer, porque: (a) sao universalmente as mesmas, (b) nao
podem ser analisadas, (c) sao necessarias e (d) soberanas sabre
Origem da Ideia de Deus
todos os impulsos. Segue-se que a alma humana foi criada, e
seu Criador nao pode deixar deter atributos superiores aos da
sua obra. d -~· · _,. '\,; ,, . ,-
2o. 0 homem e essencial e universalmente urn ser religioso.
Tern os sentimentos de dependencia absoluta e de respon-
sabilidade moral inerentes em sua natureza; esses sentimentos
sao universais e necessarios. A consciencia implica sempre em
responsabilidade para com urn ser superior em autoridade
moral e, por isso, em carater moral. Essa responsabilidade
esta implicita especialmente no sentimento de culpa que
acompanha toda viola~ao de consciencia. Deus manifesta-Se
e e reconhecido na consciencia como uma vontade santa, reta,
justa e inteligente, isto e, urn espirito santo e pessoal.
3°. As adapta~6es encontradas na natureza, ate onde nose
possivel examinar as suas rela~6es para com criaturas sensiveis,
sao caracteristicamente beneficas e dao testemunho de urn
prop6sito geral de promover a felicidade e satisfazer o
sentimento do belo. Isso implica em designio, e designio de
urn especial carater estetico e moral, e prova que a Causa
Primaria e benevola e amante do belo.
4°. A hist6ria inteira da ra~a humana, ate onde e conhecida,
descobre uma ordem e urn prop6sito morais que nao acham
sua explica~ao na inteligencia ou no prop6sito moral dos
agentes humanos que nela figuram; e essa hist6ria descobre
tambem uma unidade de plano que abrange tudo, todos os
povos e todos os seculos. Os fenomenos da vida social e nacional,
da distribui~ao etnol6gica, e do desenvolvimento e difusao
das civiliza~6es e religi6es, podem ser explicados unicamente
pela existencia de urn governador e educador sabio, reto e
benevolo dos homens.

10. Como expor as objer;oes ao argumento moral, e tambem as


suas respostas?
Essas obje~6es baseiam-se nestes pontos: 1°. A inva-
riabilidade mecanica das leis naturais, e sua inexoravel falta

49
Capitulo 2
de aten<;;ao ao bem-estar das criaturas dotadas de consciencia.
2°. Os sofrimentos dos animais irracionais. 3°. A existencia
geral de males morais e fisicos entre os homens. 4°. A partilha
desigual dos favores providenciais, e a ausencia de toda
propor<;;ao entre a soma de felicidade concedida eo caniter
moral dos que a recebem.
Estas dificuldades que de todos provam mais ou menos a
fe, sao, na maior parte dos casos, os motivos reais do ateismo
cetico. John Stewart Mill, em seu Essay on Nature (Three
Essays on Religion) assevera que e caracteristico da "Natureza"
infligir, sern piedade, sofrirnentos e a rnorte; e que, sea causa
da natureza e urna vontade pessoal, deve ser urn rnonstro de
crueldade e injusti<;;a. Ern seuEssay on Theism, Pt.2, argurnenta
como se fosse urna irnoralidade aborninavel afirrnar que o
au tor da natureza, assirn como nos a conhecernos, e onisciente
e onipotente, e ao rnesrno tempo, absolutarnente justo e
benevolo; que o iinico rneio de absolve-10 da acusa<;;ao de ser
cruel e injusto e negar que seja ilirnitado o Seu conhecimento
ou o Seu poder, ou rnesrno ambos. A conclusao que tira das
provas que cita, ele apresenta assirn: "Urn ser cujo poder e
grande mas lirnitado, e lirnitado de urn modo que nern
podernos conjecturar; cuja inteligencia e grande e talvez
ilirnitada, mas talvez rnais lirnitada ainda do que e o seu
poder; que deseja a felitidade de Suas criaturas e a isso presta
algurna aten~ao, porern, ao rnesrno tempo, parece ter outros
rnotivos para Suas as;oes, e rnotivos que tern para ele rnais
peso; e a cujo respeito e dificil crer que tenha criado o uni-
verso s6 para esse firn." Na sua Autobiography, ch.2, falando
de seu pai James Mill, ele diz: "Ouvi-o dizer que foi a leitura
da Analogy por Butler que produziu nele urna reviravolta
sobre esse ponto. E essa obra, sobre a qual continuava sernpre
a falar corn rnuito respeito, o conservou, por urn tempo
consideravel, crente na autoridade divina do cristianisrno,
provando-lhe que fossern quais fossern as dificuldades que se
opunharn a aceita<;;ao do Velho e do Novo Testamentos como

50
Origem da I deia de Deus
livros que procederam de urn ser perfeitamente sabio e born,
ou que estes livros registram os atos de tal ser, as mesmas
dificuldades ou maiores ainda se op6em a cren~a de que urn
ser de semelhante carater seja o Criador do universo. Ele
considerava os argumentos de Butler como concludentes
contra OS unicos oponentes aos quais sao dirigidos. Os que
admitem a existencia do Criador e Governador onipotente, e
tambem perfeitamente justo e benevolo de urn mundo como
este, pouco podem alegar contra o cristianismo que nao se
possa alegar, com pelo menos igual for~a, contra eles. Por
conseguinte, nao encontrando lugar de descanso no deismo,
ficou em estado de perplexidade ate que afinal, e sem duvida
depois de muitas lutas, cedeu aconvic~ao de que sobre a origem
das coisas, absolutamente nada se pode saber".
RESPONDEMOS: 1°. Ecerto que Deus nao criou o universo
como unico fim, nem mesmo como fim principal de promover
a felicidade de Suas criaturas. A nossa razao, a observa~ao e as
Escrituras Sagradas concorrem em revelar como fins muito
mais exaltados e mais dignos da a~ao divina, a manifesta~ao
da Sua propria gloria e a promo~ao da mais exaltada excel en cia
de Suas criaturas inteligentes, por meio da educa~ao e da
disciplina. E e evidente que a opera~ao de inexoraveis leis
gerais, a miseria e os sofrimentos incidentais desta vida podem
ser os meios mais eficazes para promover esses fins.
2°. A inten~ao direta de todos os orgaos de que se acham
providas as criaturas dotadas de consciencia e, evidentemente,
a promo~ao do seu bem-estar; adore a miseria sao incidentais.
Mesmo a morte subita e violenta dos animais irracionais
promove, provavelmente, a maior soma possivel de alivio no
campo dos sentido
3°. A consciencia tern ensinado aos homens, em todos os
seculos, que os sofrimentos a que estamos sujeitos nesta vida
sao as conseqiiencias diretas e merecidas dos pecados dos
homens, quer como penas, quer como castigos cuja inten~ao
benevola eo nosso melhoramento moral.

51
Capitulo 2
4°. A origem do pecado e confessadamente urn misterio,
atenuado em parte, porem, pela consideras;ao de que e o
resultado do abuso da dadiva melhor e mais valiosa que nos
foi concedida, a agencia livre e responsavel; e tambem pelo
fato, revelado nas Sagradas Escrituras, de que na providencia
divina ate o pecado tera de servir para manifestar mais
plenamente as perfeis;6es de Deus, e contribuir para prom over
a excelencia morale a felicidade da cria~ao inteligente.
5°. As desigualdades das cotas concedidas pela providencia
e a despropor~ao entre o bem-estar eo carater moral dos homens
nesta vida resultam do fato de nao ser este mundo lugar de
recompensas e castigos, e que os caracteres e destinos diversos
exigem disciplina diversa de educas;ao; e essas desigualdades
e despropors;6es apontam para reajustamentos futuros,
revelados na Biblia (Sal. 73, Almeida).
6°. Nem o argumento teleol6gico nem o moral envolvem
a asser~ao de podermos, no estado atual dos nossos conheci-
mentos, discernir no universo provas de uma sabedoria ou
bondade que fosse infinita ou mesmo perfeita. Estes atributos
sao indicados como fatos e caracteristicas gerais da natureza.
Mas o nosso discernimento deles e necessariamente limitado
pela imperfei~ao dos nossos conhecimentos. Mesmo no juizo
s6 da razao e infinitamente provavel que, quando tivermos
adquirido conhecimentos mais adequados, veremos que aquilo
que agora nos parece anomalo e incompativel tanto com a
sabedoria perfeita como com a bondade perfeita, ilustra essas
mesmas perfei~6es que fomos tentados a julgar obscurecidas
por certas anomalias.

11. ExposifiiO das provas biblicas.


Sendo o homem criatura finita, culpada e moralmente
corrompida, e inevitavel que as automanifestas;6es de Deus na
natureza sejam imperfeitamente apreendidas por n6s. A
revelas;ao sobrenatural que Deus manifestou, mediante urn
processo hist6rico de intervens;6es especiais em sucessao

52
Origem da Ideia de Deus
cronol6gica, interpretadas por uma ordem de profetas dota-
dos sobrenaturalmente e registradas nas Escrituras Sagradas,
suplementa a luz da natureza, explica os misterios da
Providencia e da-nos os principios de uma verdadeira teodiceia.
0 Deus que a natureza encobre, mesmo quando 0 revela, as
Sagradas Escrituras no-10 apresentam descoberto, em toda a
perfei~ao da sabedoria, santidade e am or, na Pes so a de Jesus
Cristo. Quem vern a Cristo vern a Deus. A verdade do teismo
e demonstrada na Pessoa de Jesus, e dai por diante nao mais
sera aceita senao por aqueles que lealmente reconhe~em Sua
soberania sobre a inteligencia, a consciencia e a vida.

12. ExposifiiO do principia em que se baseiam os argumentos,


a priori, a favor da existencia de Deus, o valor desse principia,
e as formas principais sob as quais esses argumentos tern sido
apresentados.
Argumentos a posteriori sao os que, dos fatos da ex-
periencia, se deduzem das causas ou dos principios. Assim,
e.g., nos, por meio dos argumentos precedentes mediante os
fatos da consciencia e da natureza exterior, temos sido
conduzidos ao conhecimento de Deus como urn espirito
pessoal, inteligente e reto, a Causa Primaria, poderosa, sabia
e benevola, e Governador moral. Argumentos a priori sao
OS que procedem das ideias necessarias da razao e vao as
conseqiH~ncias necessariamente deduzidas delas, ou as verdades
necessarias nelas incluidas.
E certo que as intui~6es das verdades necessarias sao as
mesmas, em todos os homens. Nao sao generaliza<;;6es tiradas
da experiencia, e sim estao pressupostas em toda a nossa
experiencia. Levam o cunho da universalidade e da neces-
sidade. Tern validade objetiva, nao dependendo do estado
subjetivo da consciencia pessoal, nem da natureza das coisas,
mas anterior e superior a todas as coisas. Que seria, pois, que
pode ser a base, o fundamento de verdades eternas, necessarias,
universais e imutaveis, a nao ser uma natureza infinita, eterna,

53
Capitulo 2 , . .. · .
autoexistente, imutavel, da qual seja a essencia?
Temos visto que a nossa razao s6 se pode contentar com
uma causa que nao teve causa. Essa causa nao pode deixar de
ser eterna, autoexistente e imutavel. Temos, em nossas mentes,
as ideias e intui~oes da infinidade e perfei~ao, como tambem
as da eternidade, autoexistencia e imutabilidade. "Estas, a nao
ser que sejam inteiramente ilus6rias- suposi~ao que nao se
pode conceber - devem ser atribuiveis a algum ser. A (mica
questao e entao: de que Ser? Deve ser dAquele que ja pro-
vamos ser a Primeira Causa de tudo, a fonte de todo o poder,
sabedoria e bondade manifestados no universo. Nao podem
ser atribuidos ao universo, porque ja se mostrou que este nao
e senao urn efeito, e efeito de uma inteligencia, uma Pessoa.
Isso nao pode ser de n6s mesmos, nem de coisa alguma ao
alcance de nossos sentidos porque n6s, e tudo o que os nossos
sentidos podem alcan~ar, somos finitos, contingentes e
imperfeitos. S6 o Autor do universo, o Pai do nosso espirito,
Aquele de quem vern toda a boa dadiva e todo o dom perfeito,
pode ser nao criado, nao condicionado, infinito e perfeito. Isso
completa a ideia de Deus, ate onde pode alcan~ar a razao
natural, ou esta a pode formar; e da tambem consistencia a
ideia. As conclusoes dos argumentos a posteriori nao satisfazem
nem a inteligencia nem Q cora<;ao, enquanto nao sao ligadas a
intui~ao da razao sobre a infinitude e por esta suplementadas.
A concep<;ao de urn Deus que nao seja infinito, urn Deus que
nao seja ilimitado em todas as Suas perfei<;oes - e uma
concep<;ao autocontradit6ria que a inteligencia recusa-se a
aceitar" -Dr. Flint, Theism, pag. 291.
1°. Anselmo, Arcebispo de Canterbury (1093-1109), em
seus tratadosMonologion eProslogion, expoe o argumento assim:
temos a ideia de urn Ser infinitamente perfeito. Mas existencia
e urn elemento necessaria para a perfei<;ao infinita. Por isso
existe urn Ser infinitamente perfeito porque, de outro modo,
faltaria a perfei<;ao infinita, como n6s a concebemos, urn
elemento essencial aperfei<;ao.

54
Origem da ldeia de Deus
2°. Descartes (1596-1650), em suas Meditationes de prima
philosophia, prop. 2, pag. 89, o exp5e assim: "Nao podia ter
origem numa fonte finita, a ideia que temos de urn Ser
infinitamente perfeito, e por conseguinte, essa ideia nos foi
comunicada necessariamente por urn Ser infinitamente per-
feito". 0 mesmo fil6sofo, em conexao com outros assuntos,
diz tam bern que essa ideia representa uma realidade objetiva,
porque: (1) e ideia muito clara, e as ideias levam a conviq:ao
de corresponderem a verdade, na propon;:ao da sua clareza e
(2) porque e necessaria.
3°. 0 Dr. Samuel Clarke publicou em 1705 sua Demon-
stration of the Being and Attributes of God. Seu argumento e que
o tempo e o espa~o sao infinitos e existem necessariamente.
Contudo nao sao substancias. Logo, existe necessariamente
uma substancia eterna e infinita da qual sao propriedades.

AS PRINCIPAlS TEORIAS ANTITEISTAS

13. Que e ateismo?


Ateismo, segundo sua etimologia, significa negac;ao da
existencia de Deus. 0 nome foi aplicado pelos antigos gregos
a Socrates e a outros fil6sofos, para indicar que eles nao se
conformaram com a religiao popular. Foi aplicado tambem,
no mesmo sentido, aos cristaos primitivos. Segundo o uso
estabelecido em todas as linguas modernas, o termo significa
agora a nega~ao da existencia de urn Criador pessoal e
Governador moral. Se bern que a cren~a na existencia de urn
Deus pessoal seja o resultado de urn reconhecimento
espontaneo de Deus, manifestando-Se na nossa consciencia e
nas obras da natureza, ainda assim o ateismo e possivel como
estado anormal da consciencia, produzido por especula~5es
sofisticas ou pela indulgencia de paix5es pecaminosas, do
mesmo modo que o idealismo subjetivo e possivel. Existe sob
as seguintes formas: 1. Pratico. 2. Especulativo. 0 ateismo
especulativo pode ainda ser (I) Dogmatico, como no caso de

55
Capitulo 2 - . ,\"":Jl'.\)

chegar-se aconclusao de que: (a) Deus nao existe, ou (b) que


as faculdades do hom em sao incapazes de averiguar ou verificar
a Sua existencia (e. g., Herbert Spencer, First Principles, pt. 1).
(2) Cetico, como no caso de s6 duvidar-se da Sua existencia
e de negar-se o carater conclusivo das provas geralmente
apresentadas a favor dessa existencia. (3) Virtual, como no caso
(a) de se manterem princfpios essencialmente incompativeis
com a existencia de Deus, ou com a possibilidade de adqui-
rirmos algum conhecimento a esse respeito, e. g., materialistas,
positivistas, idealistas absolutos; (b) de se negarem alguns dos
atributos essenciais da natureza divina, como fazem os
panteistas, e J. S. Mill em seus Essays on Religion; (c) de se
adotarem explica~6es do universo que excluem (i) a agencia
de urn Criador e Governador inteligente, (ii) ou o governo
moral de Deus e a liberdade moral do homem, como e. g., as
teorias de Darwin e Spencer, e os necessitarianos, em geral.
Veja Ulrici, God and nature e Review of Strauss; Strauss, em
Old and New; Buchanan, Modern Atheism; Tulloch, Theism;
Flint, Theism.

14. Que edualismo?


0 dualismo (em Filosofia, a teo ria oposta ao Monismo) e
a doutrina de existirem no universo duas essencias generica-
mente distintas: materia e espirito. Neste sentido, a doutrina
comum do cristianismo e dualista. Todos os antigos fil6sofos
pagaos criam na existencia eterna e independente da materia
e, por conseguinte, todos os que entre eles eram tambem teistas,
eram realmente dualistas cosmol6gicos. A religiao de Zoroastro
era urn dualismo mitol6gico, que tinha por fim explicar a
existencia do mal. Segundo ela, Ormuz e Ahriman - os
principios pessoais do bern e do mal - emanaram de uma
suprema divindade abstrata, Akerenes. Algumas das seitas
dessa religiao sustentavam o dualismo na sua forma absoluta,
e referiam todo o mal a hute, a materia auto-existente. Este
principia dominava entre as diversas seitas cristas espurias e

5.6
Origem da I deia de Deus
gn6sticas, no segundo seculo da era crista, e no sistema de
Manes, no terceiro seculo; e sua influencia no mundo oriental
manifestou-se na tendencia ascetica da Igreja Crista Primitiva.
Veja J. F. Clarke, Ten Religions; Hardwicke, Christ and other
Masters; Neander's, Church History; Pressense, Early Years of
Christianity; Tennemann,Manual Hist. Phil.

15. Que epoliteismo?


0 politeismo (polys e theos) distribui as perfei~oes e fun~oes
do Deus infinito, entre muitos deuses limitados. Teve origem
no culto da natureza, representado nos mais antigos Vedas
dos hindus e que, em tao pouco tempo e radicalmente,
substituiu o monotefsmo primitivo. No principia, enquanto
se conservava na Caldeia e na Arabia, consistia em culto dos
elementos, especialmente das estrelas e do fogo. Depois tomou
formas especiais, segundo as tradic;oes, o genio e a civilizac;ao
relativa dos diversos povos. Entre os selvagens mais grosseiros
degenerou-se ate ao fetichismo, como na Africa Central e
Ocidental. Entre os gregos, tornou-se o veiculo para a expres-
sao do seu humanitarismo mais apurado na apoteose de
homens her6icos, antes que na revelac;ao dos deuses encarnados.
Na India, sendo af filho de uma filosofia panteista, tem-se
desenvolvido ao extrema o mais extravagante, tanto a respeito
do numero quanto ao do carater de seus deuses. Sempre que
o politeismo esteve ligado a especulac;oes, apareceu como a
contra-parte exoterica do panteismo. Carlyle, Hero Worship;
Max Muller, Compar. Myth., nos Oxford Essays; Prof. Tyler,
Theology of Greek Poets.

16. Que edeismo?


0 deismo (de deus), se bern que etirnologicamente seja
o mesmo que teismo (de theos ), tern sido distinguido des de
meados do seculo 16 e eo nome dado ao sistema que admite
a existencia de urn Criador pessoal, mas nega Sua presenc;a
diretora no mundo, Seu imediato governo moral e toda a

57
Capitulo 2

interven~ao e revela~ao sobrenaturais. 0 movimento come~ou


com os deistas ingleses, Lorde Herbert de Cherbury (1581-
1648), Hobbes (1680), Shaftesbury, Bolingbroke (1678- 1751),
Thomas Paine (1809), etc. Passou para a Fran~a, onde veio a
ser representado por Voltaire e pelos enciclopedistas. Dai passou
para a Alemanha, onde teve como representantes Lessing e
Reimarus (Wolfenbiittel Fragmentist), e, invadindo a Igreja e a
teologia, foi representado essencialmente pela antiga escola
dos racionalistas naturalistas que o admitiam com uma forma
branda e inconsequente do socinianismo, e. g., Eichhorn (1752-
1827), Paulus (1771-1851), Wegscheider (1771-1848). Foi repre-
sentado na America pelo falecido Theodore Parker, e ainda o
e pela extrema esquerda do partido chamado Cristaos Liberais.
N a Alemanha, o mero dualismo naturalista cedeu ao pan-
teismo, assim como este cedeu, ultimamente, ao ateismo
materialista, e. g., Strauss. Veja Leland, View of Deistical
Writers; Boyle Lectures por Van Mildert; Farrar, Critical Hist. of
Free-thought; Dorner, Hist. Protest. Theology; Hurst,Hist. ofRa-
tionalism;Analogy, por Butler.

17. Que eidealismo?


"Idealismo e a doutrina de que, nas percep~6es externas,
os objetos conhecidos iinediatamente sao ideias. Ela tern
sido mantido sob diversas formas." Veja Reid, por Hamilton,
nota C. .·' ··; : : , ,, ~' · . ·,~-, '"'
N a seguin te passagem de Lewes, pode- se ver quais sao
algumas das formas do idealismo moderno, entre os alemaes:
"Vejo uma arvore. Os psicologistas comuns me dizem que
neste fato da vista acham-se implicadas tres coisas, a saber:
uma arvore, uma imagem dessa arvore, e uma mente que
apreende essa imagem. Fichte me diz que sou eu s6 que existo.
A arvore e sua imagem sao uma co is a, e esta e uma modifica~ao
da minha mente. Isto e idealismo subjetivo. Schelling me diz
que tanto a arvore como o meu ego ( o eu) sao existenciais, igual-
mente reais ou ideais; mas nao sao nada menos do que

58
Origem da I deia de Deus
manifestac;6es do absoluto, infinito ou nao condicionado. Isso
e idealismo objetivo. No en tan to, Hegel me diz que todas estas
explicac;6es sao falsas. A unica coisa que existe (nesse fato da
vista) e a ideia, a relac;ao. 0 eu e a arvore s6 sao do is termos da
relac;ao, e lhe devem sua realidade. Isso e idealismo absoluto.
Segundo esse, nao ha nem espirito nem materia, nem ceu nem
terra, nem Deus nem homem. A doutrina oposta ao idealismo
e o realismo" - Vocabulary of the Philosophical Sciences) por
C. P. Krauth, D. D., 1878.

18. Que e materialismo? . ,. . ..


Logo que comec;amos a refletir, ficamos c6nscios da
presenc;a de duas classes de fen6menos, entrelac;adas em todas
as suas partes e, ao mesmo tempo, sempre distintas- formando
uma dessas classes, os fen6menos chamados pensamentos,
sentimentos e vontade, e a outra os chamados extensao, inercia,
etc. Por mais que os analisemos, nao podemos nunca fundir os
fen6menos de uma classe com os da outra. Os de uma classe
conhecemos pela consciencia, os da outra pela sensac;ao; e
conhecemos os de uma classe tao direta e certamente como os
da outra. E nao sendo possfvel fundir os fen6menos de uma
dessas classes com os da outra, referimos uma classe a uma
substancia chamada espfrito, e a outra a uma substancia
chamada materia.
Os materialistas sao uma classe de fil6sofos superficiais
nos quais a consciencia moral nao esta muito viva, e que
adquiriram o costume de dirigir sua atenc;ao exclusivamente
aos objetos sujeitos aos nossos sentidos, e de explicar os
fen6menos fisicos por meio de concepc;6es mecanicas. Por isso
caem no erro fundamental de afirmar: (1) Que ha s6uma subs-
tancia, ou antes, que todos os fen6menos do universo podem
achar explicac;ao nos atomos e na energia. (2) Que inteligencia,
sentimento, consciencia, voli<;ao, etc., sao propriedades da
materia, ou func;6es de uma organizac;ao material, ou
modifica<;6es de energia conversivel. Nao foi a inteligencia que

59
Capitulo 2

precedeu e produziu ordem e organiza<;:ao, mas sao estas que,


desenvolvidas por leis inerentes na materia, produzem
inteligencia. Os darwinianos alemaes chamam esse sistema o
desenvolvimento mecanico causal do universo. Diz Huxley que
a vida, e por conseguinte a organiza<;:ao, e o resultado da
"mecanica molecular do protoplasma".
RESPONDEMOS: 1°. Esta nao e nenhuma teoria rec6ndita,
como alguns pretendem a respeito de substancia. Se os
fen6menos da consciencia podem ser resolvidos em
modifica<;:6es de materia e energia, isto e, em algum modo de
movimento, en tao todas as verdades conclusivas e necessarias
sao impossiveis, 0 dever nao obriga ninguem; a consciencia e
uma mentira e a liberdade da vontade e urn absurdo. Nesse
caso, seriam dissolvidos o dever e a verdade, a honra e a
esperan<;:a, toda moralidade e toda religiao.
2°. A teoria e parcial e sem provas. Como questao de fato,
temos conhecimento mais direto e clara da alma e de suas
intui<;:6es, faculdades e poderes, do que o homem cientifico
tern da materia. Que e que ele sabe da natureza real do atomo,
da energia, for<;:a, gravidade, etc.?
3°. A expl1cafao d.a m.ater1.a por me1o do espir1to, d.a forp
e da ordem por meio da inteligencia e da vontade, e racional.
Mas a explica<;;ao dos fen6menos da inteligencia, da vontade e
da consciencia como modifica<;;6es da materia ou for<;;a, e
absurda. A razao pode contentar-se com a primeira, mas nao
pode contentar-se com a outra. Da alma humana sabe-se que e
uma causa absoluta, da materia sabe-se que nao 0 e- que e s6
veiculo da energia, e que esta num processo de dispersao. Da
inteligencia, sabe-se que e a causa da ordem e da organiza<;;ao;
a respeito destas, porem, nao podemos imaginar como
poderiam ser as causas da inteligencia.
Tyndal (Athenaeum, de 29 de agosto de 1868) diz: "E
impassive! imaginar a passagem da fisica do cerebra para OS
fatos correspondentes da consciencia. Mesmo concedendo que
urn pensamento definido e uma definida a<;:ao molecular no

60
Origem da I deia de Deus

cerebro tern lugar simultaneamente, nao possuimos 0 6rgao


intelectual, nem segundo parece, o rudimento de tal6rgao que
nos habilitaria a passar por urn processo de raciocinar de urn
desses fenomenos para outro ... Quando se afirma que o
crescimento do corpo e processo medlnico, e que quando
pensamos, tern lugar no cerebro uma a9ao correlativa, parece-
-me que se tern expos to a posi9ao do materialista, ate on de essa
posi9ao e sustent::ivel. Creio que o materialista conseguini,
afinal, sustentar essa posiqao contra todos os ataques; porem
nao creio que, na constituiqao atual da mente humana, possa
passar alem disso. Nao creio que tern o direito de dizer que
seu agrupamento molecular e seus movimentos moleculares
explicam tudo. Na realidade nao explicam nada". ! ·:;· -'

19. Que i panteismo?


Panteismo (pantheos) e monismo absoluto, e mantem que
o inteiro universo fenomenal e a forma em constante mudan9a
da existencia da unica e exclusiva substancia universal, que e
Deus. Assim, pois, Deus e tudo, e tudo e Deus. Deus e (to on)
existencia absoluta, da qual cada coisa finita e uma forma
diferenciada e transit6ria. Esta doutrina pode naturalmente
tomar formas muito diversas. (1) 0 panteismo de uma s6
substancia, de Spinoza. Este sustentava que Deus e a unica
substancia absoluta de tudo; que possui dois atributos -
pensamentos e extensao- dos quais, por meio de uma evolu9ao
eterna, inconsciente e necessaria, procedem respectivamente
os mundos fisico e intelectual. (2) 0 panteismo materialista
de Strauss, Der Alte und der Neue Glaube. (3) 0 panteismo
idealista de Schelling, que mantem a identidade absoluta do
sujeito e objeto; e de Hegel, que mantem a identidade absoluta
do pensamento e da existencia como determina96es do unico
Espirito absoluto.
E6bvio que o panteismo, em todas as suas formas, neces-
sariamen te nega, ou a personalidade moral de Deus ou a do
homem, ou enfim a de ambos. Logicamente torna as duas

61
Capitulo 2

impossiveis. Segundo ele, Deus s6 chega a consciencia de si


no homem: a consciencia da livre determinac;;:ao pessoal de si
no homem, e uma ilusao; a responsabilidade moral e urn
preconceito; 0 sobrenatural e impossfvel e a religiao e uma
superstic;;:ao. Mesmo assim, porem, e tal a flexibilidade do sis-
tema que ele, sob uma forma, toma uma guisa mistica e
representa a Deus como a pessoa universal que absorve o
mundo em Si; e sob a forma contniria, toma uma aparencia
puramente naturalista e representa o mundo como absorvendo
a Deus, e prop6e-nos a rac;;:a humana em seu desenvolvimento
sempre culminando como o (mico objeto de reverencia e culto.
0 mesmo Spinoza, que Pascal e Bossuet declararam ateista, e
chamado por Jacobi e Schleiermacher de o mais fervoroso e
reverente dos misticos. A individualidade intensa das ciencias
fisicas do presente seculo tern reagido de urn modo poderoso
sobre o panteismo, substituindo o idealismo pelo materialismo,
afastando Deus e elevando o homem, como se ve na recente
degradac;;:ao do panteismo para oateismo, nos casos de Strauss,
Feuerbach, etc.
0 panteismo mais antigo, mais persistente e mais espa-
lhado de que temos noticia na hist6ria do mundo, e o da
india. Como religiao, tern modelado o carater, os costumes e
a mitologia do povo, durante 4.000 anos. Como filosofia, tern
aparecido sob tres formas principais: a Sanckhya, a Nyaya e
a Vedanta. Modos panteistas de pensar formavam, em escala
maior ou menor, a base de todas as formas da filosofia grega, e
especialmente a da escola neoplatonica de Plotino (205-270),
Porfirio (233-305), e Jamblico Ct 333). Tornou a aparecer, no
en sino de J oao Scotus Erigena (nasceu em 800) e no dos neo-
-platonicos daRenaissance, e. g., Giordano Bruno Ct 1600). 0
pantefsmo moderno comec;;:ou com Benedito Spinoza (1632-
1677), e terminou com os disdpulos de Schelling e Hegel.
Alem do panteismo puro, tern havido uma variedade
infinita de formas impuras de panteismo virtual. Isso e
verdadeiro quanto a todos os sistemas que afirmam a imper-

62
Origem da Ideia de Deus

sonalidade do infinito e absoluto, e que resolvem todos os


atributos divinos em modos de causalidade. 0 mesmo e
verdadeiro tambem quanto a todos os sistemas que
representam a preserva~ao providencial como uma cria~ao
continua, negam a eficacia real das causas secundarias e
afirmam que Deus eo unico agente no universo, e. g., Edwards
on Original Sin, ponto 4, capitulo 3, e Emmons. A mesma
categoria pertence, tambem, a doutrina fantasiosa das
emana~6es que era a fei~ao principal das teosofias orientais, e
o Hylozoismo de Averroes Ct 1198) que sup6e a co-eternidade
da materia e de umaanima mundi plastica e inconsciente. Veja
Hun t,Essay on Pantheism, Londres, 1866; Saisset,Modern Pan-
theism, Edimburgo, 1863; Cousin, Histoire de la Philosophie
Moderne; Ritter, Hist. Ancient Philos.; Buchanan,Faith in God,
etc.; Dollinger, Gentile and Jew, Londres, 1863; Max Muller,
Hist. Anc. Sanscrit Lit.

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Os Mananciais da Teologia

Definic;ao geral de teologia, Capitulo 1, Pergunta 1.


1. Quais as duas grandes sefoes em que se divide a teologia?
1a. Teologia natural, que e a ciencia que se prop6e estas
duas perguntas: (1) Seria possivel estabelecer, por provas
satisfat6rias, a existencia objetiva de Deus como urn Espirito
pessoal e extra-terreno? (2) Que e que se pode averiguar legiti-
rnarnente a respeito da verdadeira natureza de Deus ern si, e a
respeito de Suas relac;6es corn ouniverso, e especialrnente corn
o hornern, sornente mediante a luz da natureza? Aqui e neces-
saria fazer-se, corn cuidado, urna distinc;ao entre o conheci-
mento a que pode chegar, por rneio das provas fornecidas nas
Suas obras, a razao hurnana, independenternente de todas as
sugest6es fornecidas pela revelac;ao sobrenatural, e.g., a teologia
de Platao e a de Cicero; e por outro lado, o conhecimento de
Deus que as faculdades hurnanas podern agora deduzir dos
fenornenos da natureza, sendo ajudadas, rnesrno sern
reconhecerern, pela luz de urna revelac;ao sobrenatural, e.g., a
teologia dos racionalistas rnodernos.
2a. Teologia revelada ea ciencia que, pressuposta a teologia
natural, cornpreende como seu campo tudo quanto nos tern
sido revelado de diversos rnodos sobrenaturais a respeito de
Deus e Sua relac;ao corn o universo, e especialrnente corn os
hornens.

2. Que opinioes extremas tem sido admitidas quanto a


Mananciais da Teologia
possibilidade e validade da teologia natural, e em distinfiio da
teologia revelada?
1a. A dos defstas ou teistas naturalistas, que negarn ou a
possibilidade ou o fa to hist6rico de urna revela~ao sobrenatural,
e rnantern que a teo1ogia natural descobre-nos tudo quanto e
possivel ou necessaria que os hornens saibarn agora a respeito
de Deus e Suas rela~6es conosco. Muitos racionalistas sobre-
naturalistas alernaes, enquanto adrnitern o fato hist6rico de
urna revela~ao sobrenatural, sustentarn que esta tern por firn
unicarnente refor~ar e ilustrar as verdades que nos sao dadas
na teologia natural, e que estas sao, de per si, suficientes, preci-
sando ser refor~adas sornente porque os hornens nao lhes
prestarn bastante aten~ao.
Esta doutrina erefutada abaixo. Perguntas 7 a 10.
za. Ha cristaos que sustentarn o extrerno contrario, de
nao existir realrnente urna ciencia de teologia natural, e que
devernos as nossas prirneiras inforrna~6es validas quanto a
existencia de Deus a urna revela~ao sobrenatural. Isso erefu-
tado- (1) Pelo testernunho das Escrituras, Rorn.l:20-24, e
2:14,15, etc. (2) Pelo testernunho da experiencia, e.g., o
conhecimento de Deus adquirido por alguns dos fil6sofos
pagaos, ernbora fosse irnperfeito. (3) A validade da inferencia
deista deduzida dos fenornenos da consciencia e do rnundo
exterior foi vindicada no Cap. 2. (4) E evidente, de per si,
que algurn conhecimento do ser de Deus ja se pressup6e
logicarnente pelo reconhecirnento de urna certa revela~ao
sobrenatural advinda dEle.

3. Quais as principais respostas dadas a pergunta : qual e a


fonte au norma autoritativa do conhecimento em teologia?
1a. A teoria de Schleierrnacher e da Escola Transcenden-
tal. Ele foi pregador e professor ern Halle e ern Bedim de
1796 a 1831, autor de Teologia Medianeira, e inaugurou o
rnovirnento corn seus Discursos sabre Religiao, Dirigidos aos
Instruidos Entre as que a Desprezam, 1799, e A Fe Crista sob

65
Capitulo 3
os Principios da Igreja Evangelica, 1821.
Ele tomava a religiao como uma especie de sentimento, e
1l
'
sustentava que ela se baseia em nossa consciencia constitucional
de Deus, a qual consiste, segundo ele, do lado intelectual numa
intui<;ao de Deus, e do lado emocional, num sentimento de
dependencia absoluta. 0 cristianismo consiste naquela forma
espedfica dessa consciencia religiosa constitucional que foi
gerada no peito de seus discipulos pelo Deus homem, Jesus
Cristo. E assim como a consciencia humana, em geral, e gerada
em cada individuo pelas suas rela<;:6es sociais, assirn, a cons-
ciencia crista, ern geral, e gerada ern cornunhao corn aquela
sociedade (a Igreja) que Cristo fundou e da qual Ele eo centro
da vida. E assirn como as institui<;:6es comuns dos hornens
sao aquilo para o que se apela ern ultimo recurso, ern todas as
quest6es dos conhecimentos naturais, assim tambem a com urn
consciencia crista da Igreja e aquilo para o que devemos apelar
em todas as quest6es da fe crista, a qual, na sua totalidade, e
nao as Escrituras, e a regrade fe.
OBJE(:OES: (1) Esta .doutrina nao condiz com a natureza
do cristianismo que, como sistema remediador, baseia-se em
certosfatos hist6ricos, os quais, e necessaria que saibamos para
que se tornem eficazes, e dos quais podemos ter conhecimento
certo s6 por meio de uma revela<;:ao sobrenatural. Nenhuma
forma de intui<;:ao no-los pode ensinar. (2) Nao condiz com a
convic<;ao uniforme dos cristaos: de que o cristianismo e urn
sistema de fatos e prindpios revelados divinamente. (3) Nao
nos da nenhum criteria da verdade. Se essa doutrina fosse
verdadeira, todas as diversas doutrinas dos diversos partidos
da Igreja seriam, necessaria e tao-somente, outras tantas
varia<;:6es concili:'iveis da mesma verdade fundamental. (4) Nao
condiz com o que ensinam as Escrituras Sagradas, que ela e a
Palavra de Deus; nem como que ensina explicitamente, quanto
a sua natureza - que ela e uma revela<;:ao, comunicando
verdades objetivas; e quanto anecessidade para a salva<;:ao das
verdades assim comunicadas.

66
Mananciais da Teologia
2a. A mistica doutrina da "luz interior", ou da inspira~ao
geral de todos os homens, ou, ao menos, de todos os cristaos,
mantida pelos Quacres. Esta doutrina difere do racionalismo
porque faz dos sentimentos, e nao da razao, o 6rgao das verdades
religiosas, e porque toma a "luz interior" como o testemunho
que o Espirito Santo da ao homem e como espirito do homem.
Difere da nossa doutrina da inspira~ao, por ensinar a dire~ao
pratica e a ilumina~ao do Espirito Santo no cora~ao de todos
os homens crentes, e nao s6 no dos fundadores oficiais e
primeiros mestres da lgreja. Difere da ilumina~ao espiritual
que, segundo cremos, experimentam todos os crentes
verdadeiramente regenerados, e s6 eles, porque (1) pretende
chegar ao conhecimento da verdade, independentemente da
sua revela~ao nas Escrituras, e (2) afirma que pertence a todos
os que queiram prestar-lhe aten~ao e obedecer-lhe.
OBJE<;6ES: (1) Esta doutrina contradiz as Escrituras. (a)
Elas nunca prometem uma ilumina~ao que leve os homens
alem do proprio ensino delas, e os torne independentes desse
ensino. (b) Ensinam que a revela~ao objetiva dada nelas e
absolutamente necessaria a salva~ao (Rom: 11:11-18). (2) E
refutada pela experiencia que (a) testifica que a "a luz inte-
rior" nao da nenhum criterio por meio do qual se possa
determinar a verdade de qualquer doutrina; (b) testifica que
essa "luz interior" nunca levou nenhum individuo ou
comunidade ao conhecimento da verdade salvadora, indepen-
dentemente da revela~ao objetiva; e (c) testifica que essa "luz"
produziu sempre uma deprecia~ao irreverente das Escrituras,
e no transcurso do tempo, desordem e confusao.
3a. A teoria de uma lgreja inspirada, isto e, inspirada nas
pessoas, ou ao menos no ensino oficial de seus pastores e mestres
principais. Esta teoria e refutada no Cap. 5.
4a. 0 postulado com urn de todos os racionalistas, de sera
razao a fonte e medida de todo o nosso conhecimento de Deus.
Esta teoria e considerada e refutada abaixo. Perguntas 7 a 10.
sa. A doutrina verdadeira e protestante, de que as
67
Capitulo]
Escrituras Sagradas do Velho e Novo Testamentos, sendo
inspiradas por Deus, sao para nos a Sua Palavra, e uma regra
de fe e prcitica infalivel e de autoridade, e a unica fonte
e norma autorizada da teologia crista, a exclusao de todas
as outras fontes e normas .
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4. Qual o sentido exato em que o termo "raziio" e empregado


par aqueles que a contrastam com a fe como a fonte do conhecimento
religioso?
0 termo "razao" e empregado em sentidos diversos pelas
diversas classes de racionalistas. Alguns entendem por ela o
orgao por cujo meio apreendemos intui~6es superiores, as
verdades necessarias e conclusivas. Tais sao a consciencia intima
da existencia e atributos de Deus, de Schleiermacher, e a
intui~ao do infinito, de Schelling e Cousin, e tambem os
sentimentos morais de intui~ao, de Newman e Parker. Outros
entendem pelo termo "razao" o entendimento, ou a faculdade
logica de observarmos, julgarmds e tirarmos inferencias dentro
da esfera da experiencia. Compreende, por conseguinte, como
seu fundamento e norma a massa inteira dos conhecimentos e
opini6es hodiernas. Praticamente todos os homens dao o nome
respeitavel de "razao" ao seu proprio habito e atitude de
espirito, com a inteira massa organizada de conhecimentos,
opini6es e preconceitos de que seus animos estao cheios.
Chamam razoavel aquilo que esta de conformidade com esse
habito ou essa massa de opini6es por eles aceitas.
Nesta controversia, porem, designamos com o termo
"razao" a inteira faculdade natural que o homem possui para,
por meio dela, chegar ao conhecimento da verdade, e incluimos
nela as intui~6es, o entendimento, a imaginac;:ao, os afetos e as
emoc;:6es, operando em condi~6es naturais e independente-
mente de auxilio sobrenatural.
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5. Que eRacionalismo?
"Naturalista" e quem sustenta que a natureza e uma esfera

68
Mananciais da Teologia

completa em si e inteiramente independente; e nega por isso,


ou a realidade do que se chama sobrenatural, ou a possibilidade
de poderem os homens chegar a ter qualquer conhecimento
do sobrenatural, see que esse existe; nega, por conseguinte, a
necessidade ou a possibilidade, ou o fato de uma revela~ao
sobrenatural. 0 termo "racionalista" e rnais geral. Inclui OS
naturalistas de todos os graus e tarnbem todos os que, em bora
admitam o fato de uma revela~ao divina, rnantem, contudo,
que essa revela~ao, suas doutrinas, e os documentos em que se
acham contidas, devem todos ser sujeitos arazao humana como
supremo arbitro, para serem por ela avaliados e acreditados,
ou rejeitados e interpretados. Com OS racionalistas, a razao e 0
ultimo fundamento e juiz da fe.
No seu senti do hist6rico o racionalismo, como uma
forma da incredulidade que brotou no meio da propria
Igreja Crista, e que faz uso ilegitimo da razao na interpre-
ta~ao das Escrituras e suas doutrinas, tern sido ativo sempre
numa ou noutra forma, e em diversos graus, e manifestou-se,
de urn modo notavel, numa classe dos escolasticos medievais
e nos discipulos de Socino. Sua forma rnoderna e mais ex-
trema teve origem na Alemanha em meados do seculo passado.
As causas a que se deve atribuir foram: (a) 0 estado abatido
em que se achava a religiao em todos os paises protestan tes.
(b) A influencia da filosofia formal e do dogmatismo de Wolf,
discipulo de Leibnitz. (c) A influencia dos deistas ingleses.
(d) A influencia dos incredulos franceses reunidos na corte de
Frederico o grande- rei da Prussia. Semler, professor em Halle,
(nascido em 1725, falecido em 1751) foi o pai do racionalismo
critico. Embora pessoalmente devoto, ele examinava arbitra-
riamente a canonicidade dos livros das Sagradas Escrituras, e
sem fazer caso das provas hist6ricas, substituiu-as por suas
pr6prias ideias subjetivas do que convinha. Introduziu, na
interpreta~ao da Biblia, o principia da "acomoda~ao",
sustentando que, alem de muitas verdades positivas, Cristo e
Seus ap6stolos ensinaram tambem muitas coisas em

69
Capitulo 3
"acomodas;:ao" as ideias geralmente aceitas entre os seus
contemporaneos - Hurst, History of Rationalism.
Esta tendencia, muito refors;:ada depois mediante a
influencia de Lessing e Reimarus o Fragmentista de Wolfen-
biittel, penetrou na massa da literatura teol6gica alema e
culminou nos ultimos anos do seculo 18 e nos primeiros do
seculo 19. Entre os seus principais representantes sobressaem j
os nomes de Bretschneider, Eichhorn e Paulus na teologia ~
biblica, e o de Wegscheider na teologia dogmatica. Foram
especialmente OS dois ultimOS que, admitindo 0 fatO de Ser 0 1
cristianismo uma revelas;:ao sobrenatural, ao mesmo tempo
mantiveram que e meramente uma republicas;:ao dos ele- '
mentos da religiao natural, e que a "razao" e o juiz supremo
quanto aos livros que se devem ter por canonicos e tambem
quanto ao que ensinam. Os milagres, eles rejeitaram como
indignos de credito. As narras;:oes de milagres, registradas nas
Escrituras, eles relacionavam a ignorancia, superstis;:ao ou
parcialidade dos escritores, e os milagres relacionavam a causas
naturais. A Jesus, tinham em conta de homem born, e o
cristianismo original eles consideravam como uma especie de
socianismo filos6fico. E isso o que, na Alemanha, tern sido
designado hist6ricamente pelo titulo deRacionalismo, e mais
especificamente por Rationalismus vulgaris, o racionalismo
antigo, ou do sensa comum.
Depois de levantarem-se as filosofias de Fitche, Schelling
e Hegel, receberam novo impulso a especulas;:ao teol6gica e a
interpretas;:ao biblica. Isso deu lugar, por urn lado, a uma reas;:ao
para a ortodoxia, por meio da "Teologia da Medias;:ao" de
Schleiermacher, e por outro, a uma escola nova do racionalismo
transcendental, a base do qual e urn modo panteista de pensar.
N ega necessariamente o sobrenatural e postula como principia
fundamental, a impossibilidade de urn milagre. Essa escola,
cujo quartel-general foi a cidade de Tubingen, tern sido
representada proeminentemente por Christiano Baur, com sua
teoria de Tendencias; Strauss, com sua teoriaMistica; e Renan,

70
Mananciais da Teologia
com sua teoriaLegendaria, para explicar a origem das Escrituras
do Novo Testamento, negando, ao mesmo tempo, sua base
hist6rica de fatos.
Essa tendencia, com diversos graus de for<,;a, tem-se
manifestado no caniter da opinifw teol6gica na Inglaterra e
America, principalmente na escola de Coleridge, Maurice,
Stanley, Jowett e Williams, e entre os latitudinarios em geral;
na Esc6cia, em Tulloch; e na America, no falecido Theodoro
Parker, na escola dos cristaos liberais e na relaxa<.;ao geral da
fe, que se nota em toda parte.
German Rationalism, por Hagenbach, Clarke Edinburgh
Library; History of German Protestantism, por Kahnis, Clarke
Ed. Lib.; Critical History ofFree Thought, por A. S. Farrar, New
York, D. Appleton & Co.; Germany: its Universities, Theology
and Religion, por Philip Schaff, D. D. History of Rationalism,
President Hurst, C. Scribner, New York.

6. Quais as duas classes em que se pode agrupar todas as bases


argumentativas de oposifiio ao cristianismo hist6rico?
1a. Bases a priori. Estas descansam em ideias falsas sobre a
existencia e natureza de Deus e de Sua rela<.;ao com o mundo.
Por isso o positivista, que limita os conhecimentos do homem
a fen6menos e suas leis de coexistencia e sequencia; o deista,
que nega a imanencia de Deus nas Suas obras, e nega tambem
ou torna remota ou obscura a Sua rela<.;ao conosco como
Governador moral e Pai espiritual: o panteista, que nega a
personalidade de Deus; e o naturalista cientifico, que ve na
natureza so mente a opera<.;ao de leis fisicas que sao invariaveis
e automaticas: todos negam igualmente a possibilidade e
credibilidade de urn milagre, resolvem a inspira<.;ao em genio,
e de urn ou de outro modo, explicam as Sagradas Escrituras
de forma que nao lhes fica base hist6rica de fatos. Esta classe
de quest6es ja foi discutida acima, no Cap. 2.
2a. Bases hist6ricas e criticas. Estas descansam todas nos
defeitos que se alega acharem-se nas provas hist6ricas da

71
Capitulo 3 . ~ ·.

genuinidade e autenticidade dos diversos livros do "canon


sagrado", e nas discrepancias e erros hist6ricos e cientificos
que se diz encontrarem-se nas Escrituras. Desta classe de
quest6es trata-se nas se~6es de Introdu~ao Biblica e Herme-
neutica.
,-, ·.! if.:l.A c··.w:·.. ' !

7. Quais os argumentos em prova de que a raziio niio e, em


ultima instancia, a medida das ideias religiosas, de que estas niio
tem nela sua origem?
Sao, em geral, tres:
1°. A priori. A razao, por causa do estado atual do hom em,
que eestado de ignorancia, degrada~ao morale tulpa, nao tern
as qualidades necessarias para torna-la competente para
adquirir, de per si, nem (1) certeza, nem (2) conhecimento
suficiente para 0 governo pratico do homem, quanto a
existencia de Deus, Seu carater, Sua rela~ao conosco, ou Seus
prop6sitos a nosso respeito.
2°. A experiencia universal: a razao, de per si, nunca
conseguiu resolver esses problemas, e sempre, quando os
homens confiavam nela de urn modo indevido, levou-os,
apesar de uma revela~ao desprezada, para o ceticismo e a
confusao.
3°. Como questao de tato, tern-nos sido dado urn
documento infalivel de uma revela~ao sobrenatural, o qual,
quando interpretado com o auxilio iluminador do Espirito
Santo, nos ensina conhecimentos que sao necessarios asalva~ao,
e que a "razao" de modo algum podia ter antecipado.
Para estabelecer-se este argumento e necessario que se
estabele~am, em sua ordem e separadamente, os pontos
seguintes:
1°. Uma revela~ao sobrenatural enecessaria para o homem,
no seu estado atual.
2°. Uma revela~ao sobrenatural epossivel tantoa parte Dei
quanto a parte hominis.
3°. Por aquilo que a teologia natural nos revela, dos

n
Mananciais da Teologia
atributos de Deus, de Suas rela<;6es para com os homens
e de nosso estado moral, uma revela<;ao sobrenatural e
antecedentemente provavel. ~Jlt·. · --
40. Eurn fato hist6rico que o cristianismo e uma revela<;ao
sobrenatural.
5°. Etam bern urn fa to hist6rico que o canon atual do Velho
e Novo Testamentos s6 consta dos documentos autenticos
e genuinos que atualmente existem dessa revela<;ao e contem
todos esses documentos.
6°. Os livros de que se comp6e esse canon foram inspirados
de urn modo sobrenatural, de maneira que constituem a
Palavra de Deus, e uma regra infalivel e autorizada de fe e
pratica para OS hom ens.
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8. Provas de que uma revelafiio sobrenatural enecessaria para


os homens no seu estado atual.
1a. A propria razao ensina: (1) que, como questao de fato,
a natureza moral do homem esta em desordem, e (2) que suas
rela<;6es para com Deus acham-se perturbadas pela culpa e
aberra<;ao.
A razao pode descobrir o fato de existir o pecado, mas
nenhuma sugestao faz, quanto ao modo de remedia-lo.
Podemos determinar a priori que Deus esta resolvido a punir
o pecado, porque isso, sendo materia de justi<;a, descansa na
Sua natureza inalter:ivel e necessaria; mas nada podemos
determinar assim quanto a Sua disposi<;iio de prover, ou
permitir que se ofere<;a, urn remedio, porque isso, sendo
materia da Sua gra<;a, depende da Sua vontade.
za Urn anelo religioso espontaneo, naturale universal, por
uma divina automanifesta<;iio e interven<;ao da parte de Deus,
e que e manifesto em toda a hist6ria humana, prova a neces-
sidade de uma revela<;iio sobrenatural.
3a. A razao nunca, no caso de nenhuma comunidade
hist6rica, conseguiu dar aos homens certeza; satisfazer as suas
necessidades e regular a sua vida.

73
Capitulo 3
4a. 0 racionalismo e forte s6 para atacar e destruir. Nunca
mostrou-se muito apto para construir. Nao ha dois racionalistas
proeminentes que concordem quanta ao que sejam os
resultados positivos e certos do ensino da razao.

9. Provas de que uma revelafiiO sobrenatural eposs£vel da parte


de Deus e tambim quanta ao que diz respeito ao homem.
Quanta asua possibilidade da parte de Deus- se o teismo
e verdadeiro- se Deus e uma Pessoa infinita e extra-terrena,
que ainda dirige a operas;ao das leis que Ele instituiu como
Seu metoda, e subordinou o sistema fisico aos interesses
superiores do Seu govern a moral- en tao e evidente que limita-
-10 quanta a maneira, ao carater e a extensao de Suas auto-
manifestas;6es a Suas criaturas, e urn absurdo. Todas as
pressuposi~6es filos6ficas alegadas contra a possibilidade de
uma revelac;:ao sobrenatural da parte de Deus, tern por base
principios deistas, materialistas ou panteistas. 0 argumento
que estabelece o teismo ja expusemos no Cap.2.
Para provar que, da parte do homem, ha uma impos-
sibilidade de comunicar-se-lhe verdades novas por meio de
uma revelac;:ao em forma de livro, os modernos racionalistas
transcendentais tern empregado este argumento: as palavras
sao sinais convencionais que tern o poder de despertar, na
mente, s6 as ideias que, tendo sido apreendidas anteriormente,
tern sido associadas convencionalmente a essas palavras.
RESPONDEMOS: 1°. Admitimos que e necessaria que as
simples ideias definitivas que nao se pode analisar, sejam
primeiro apreendidas por urn 6rgao apropriado num ato de
intuic;:ao espontanea. Ninguem pode chegar a ter a ideia de
cores senao pela funs;ao de seus olhos; nem a ideia do que e
direito senao por urn ato intuitivo de seu sentido moral.
2°. A revelas;ao crista nao contem novas ideias simples,
defi-nitivas, e impossiveis de serem analisadas. Ela pressup6e
e envolve a materia de todas as intuis;6es semelhantes e naturais,
e desperta as intui~6es racwna1s e marais a urn exercicio

74
J Mananciais da Teologia
mais ativo e normal pela associa<;:ao com novos aspectos de
nossas rela<;:6es espirituais; pela maior parte, porem, ela narra
fatos objetivos e concretos, explica a aplica<;:ao de principios
intuitivos as nossas verdadeiras rela<;:6es e condi<;:6es hist6ricas;
e faz-nos saber os prop6sitos, exigencias e promessas de Deus.
3°. Ate novas ideias simples podem ser despertadas na
mente humana, por meio de uma ilumina<;ao interior,
sobrenatural e espiritual, operando nas mentes daqueles que
sao os objetos da experiencia religiosa. A obra do Espirito
Santo, acompanhando a palavra escrita, completa a revela<;:ao.
Urn cristao experimentado, sob o ensino do Espirito Santo
aplicando a Palavra de Deus, tern urn conhecimento tao claro
e certo da materia compreendida na sua experiencia como eo
que tern da materia que percebe por meio de seus sentidos
corporms.

10. Demonstrar, pelos dados da teologia natural, que no estado


atual da natureza humana, uma revelafiiO sobrenatural eantecedente
provavel.
Como mostramos no Cap. 2, a teologia natural nos ensina
que existe urn Deus pessoal que e infinito, eterno, sabio, e
absolutamente justo, reto e benevolo. Ensina-nos, tambem, que
0 homem criado a imagem divina e corrupto moralmente e
condenado judicialmente. Revela-nos que o homem precisa
da ajuda de Deus, que ele a anela e espera, e que por isso nao
csta incapacitado para ela, como o estao os anjos maus. Por
conseguinte, todas as perfei~6es de Deus e todas as miserias
dos homens autorizam a esperan<;a racional de que, em algum
tempo e de algum modo, Deus, na Sua gra<;:a, esteja disposto a
intervir de urn modo sobrenatural a favor do homem e a revelar
Seu carater e Seus prop6sitos mais plenamente para dire<;:ao
do homem.

11. Como se pode provar que, como jato hist6rico, o cristianismo


crea/mente uma estupenda revelar;iio sobrenatural?
75
Capitulo 3

A este respeito, e necessaria referir ao leitor os muitos e


excelentes tratados sobre as evidencias do cristianismo. As
obras por Paley, Chalmers, Erskine e Alexander sobre as
Evidencias; Critical History of Free Thought, por A. S. Farrar;
I
Evidences of Christianity, por Hopkins; Evidences of Christianity
in the Nineteenth Century, por Albert Barnes; Leading Evidences
of Christianity, por G. Wardlaw; Apologetics ofthe Christian Faith,
por Hetherington; Grounds of Christian Hope, por Leathes;
Supernatural in the New Testament, por Row; Superhuman

l
Origin of the Bible, por Rogers; Modern Doubt and Christian
Belief, por Christlieb; Historical Evidence of the Truth of the
Scripture Records, por Rawlinson; Christianianity and Morality,
por Wace; Cautions for Doubters, por Titcomb; Prize Essay
on Infidelity, por Pearson; Witness of History to Christ, por F.
W. Farrar.

12. Como se pode provar que o canon aceito do Velho e do


Novo Testamentos consta s6 dos livros autenticos e genuinos da
revelafiiO crista e contem todos esses livros?
A este respeito tambem e preciso recomendar ao lei tor os
melhores tratados sobre o canon das Sagradas Escrituras. B.
F. Westcott, sobre The Canon e sabre Introduction to the Study of
the Gospels; When were our Gospels composed?, por Tischendorf;
Historic Origen ofthe Bible, porE. Cone Bissell; The Supernatu-
ral Origin of Christianity e The Beginnings of Christianity, por
Prof. George P. Fisher.

13. Qual e a natureza e qual a extensiio da inspirafiiO das


Escrituras Sagradas?
Veja a seguir, no Cap. 4.

14. Quale o oficio legitimo da raziio na esfera da religiiio?


1°. A razao ea revela~ao primaria que Deus fez ao homem,
e enecessariamente presuposta em toda revela~ao subseqiiente,
seja qual for sua especie.

76
Mananciais da Teologia
2°. Por isso a razao, inclusive a natureza moral, emocional
e a experiencia, e necessariamente o instrumento por meio do
qual apreendemos e recebemos todas as revela<;6es
subseqiientes. Uma revela<;ao dirigida aos irracionais seria tao
inconseqiiente como a luz para os cegos. Este eo usus organicus
da razao.
3°. Segue-se que nenhuma revela<;ao subseqiiente pode
contradizer a razao, operando legitimamente dentro da sua
propria esfera. Porque, de outro modo, (1) Deus Se contradiria
a Si mesmo, e (2) a fe se tornar-ia impossivel. Quando cremos,
assentimos que uma coisa e verdadeira; mas quando essa coisa
contradiz a razao, vemos quenao everdadeira. Por conseguinte,
a razao, julgando pelas evidencias, ou interpretando os escritos
de uma revela<;ao sobrenatural, tern o oficio de exercer ojudi-
cium contradictionis. A razao tern, pois, que determinar duas
quest6es: (1) Seria Deus quem fala? (2) Que diz Ele? Isso,
porem, exige (a) a coopera<;ao de todas as faculdades do saber,
tanto as morais como as puramente intelectuais; (b) urn espirito
humilde e d6cil; (c) sinceridade perfeita e lealdade averdade;
(d) prontidao para a pnitica de toda verdade conhecida, e (e) a
ilumina<;ao e a assistencia do Espirito da verdade que nos e
prometido.
Esta e a antiga distin<;ao entre aquilo que e contrario a
razao e aquilo que esta acima dela. E evidente que o maior
absurdo que podemos cometer e alegarmos, como obje~ao a
uma revela<;ao acreditada por toda especie de provas, que a
nossa razao nao pode compreender o que essa revela<;ao ensina,
ou que ela contem elementos que parecem inconciliaveis com
outras verdades. Porque: (1) Essa obje<;:ao pressup6e que a razao
humana e a mais exaltada forma de inteligencia, 0 que e urn
absurdo. (2) Nao ha outro ramo em que os homens limitem a
sua fe por sua capacidade de compreender. Pergunto: o que
compreendem ou entendem os cientistas quanto a natureza
original dos atomos, da inercia, da gravidade, da energia ou
for<;a, e da vida ? No entanto, creem em tudo isso, e nao ha

77
Capitulo 3
momento em que nao se vejam obrigados a aceitar o incom-
preensivel como uma verdade e a reconhecer que o inexplicavel
e certo. ' ...
Toda a incredulidade especulativa tern sua origem no louco
orgulho do espirito humano, no desejo insaciavel de ver tudo
explicado, e, sobretudo, de ver todo o conhecimento reduzido
em aparencia aunidade 16gica. 0 senso com urn eo habito de
reduzir as opini6es apnitica conduzem a saude do corpo e do
espirito, e tambem, afe religiosa. ,. '!

15. Que eFilosofia) equal a sua relafiio com a .Teologia?


Filosofia, no seu sentido lato, abrange todos os conheci-
mentos humanos adquiridos por meio das faculdades naturais
do homem, e consiste nesses conhecimentos interpretados e
sistematizados pela razao. Ciencia e palavra mais especifica,
que diz respeito a algum ramo especial, reduzido perfeitamente
a urn sistema. Em nossos dias, o termo ciencia esta sendo
limitado mais e mais definidamente ao conhecimento dos
fenomenos fisicos do universo. Neste sentido, a ciencia tern
por alvo a determina~ao dos fenomenos nas suas classifica~6es
de semelhan~a e dissemelhan~a, e suas leis ou ordem de
coexistencia ou sucessao, e nao indaga sobre substancia, causa,
prop6sito, etc. A filosofia e pressuposta, pois, na ciencia como
o conhecimento primario e mais geral. Indaga a respeito do
amago das leis do pensar, da intui~ao e da verdade absoluta,
da substancia e existencia real, da causa absoluta, da natureza
absoluta, da for~a e da vontade, da consciencia e do dever.
Quanto as suas rela~6es com a teologia, nota-se:
1°. Que os primeiros principios da verdadeira filosofia sao
pressupostos em toda a teologia, tanto natural como revelada.
2°. Que as Sagradas Escrituras, se bern que nao tenham
primariamente a finalidade de ensinar filosofia, contudo
pressup6em necessariamente e envolvem os principios
fundamentais de uma filosofia verdadeira- nao as inferencias
deduzidas desses principios agrupados num sistema, e sim os

78
Mananciais da Teologia
pr6prios principios, os que dizem respeito a substancia e causa,
a consciencia e o dever.
3°. A filosofia em voga em qualquer tempo reagiu e
necessariamente reagini ante a interpretac;ao das Escrituras e a
formac;ao de sistemas teol6gicos. Isso foi verdade quanto ao
Platonismo, ao Neo-Platonismo do segundo periodo; quanto
a filosofia aristotelica da ldade Media; aos sistemas de
Descartes e Leibnitz; de Kant, Fichte, Schelling e Hegel na
Europa continental, e de Locke, Ried, Coleridge, etc., na
lngla terra.
4°. 0 creme devoto, porem, que tern a certeza de ser a
Biblia a propria Palavra de Deus, nunca pode permitir que a
sua filosofia, derivada de fontes humanas, domine a sua
interpretac;ao da Bfblia, mas procurani com espfrito d6cil e
como auxilio do Espirito Santo, fazer sua filosofia harmoni-
zar-se perfeitamente com aquilo que e contido implicitamente
na Palavra de Deus. Ha de procurar, sem falta, ter uma filosofia
que seja serva genufna e natural daquilo que esta revelado
nessa Palavra.
Todo o pensar humano e toda a vida humana sao urn. Se,
pois, Deus fala com qualquer finalidade, Sua palavra deve ser
suprema; e ate on de diz respeito a qualquer ramo das opini6es
e ac;6es dos homens, deve ser aceita nesse ramo como autoridade
indiscutivel e como a Lei suprema.
As diversas sec;6es em que se divide a teologia crista ja
foram enumeradas no capitulo 1.

79
·i· ·•

A Inspira~ao das Escrituras


PRESSUPOSI(:OES NECESSARIAS

1. Quais sao as pressuposifi5es necessarias quanta a principios


e questoes de jato, que e precis a admitir-se antes de poder afirmar
a possibilidade da inspirafiio ou a inspirafiiO de qualquer livro
em particular?
1a. A existencia de urn Deus pessoal possuindo, em
absoluta perfeic,;:ao, os atributos de poder, inteligencia e
excel en cia moral. , .· -, ..
za. Que, em Sua relac,;:ao como universo, Ele e ao mesmo
tempo imanente e transcendente. Que esta acima de tudo, e
sobre rudo age livremenre, de fora. Que esta dentro de rudo e
age atraves de toda parte do interior, no exercicio de todas as
Suas perfeic,;:oes, e segundo as leis e modos de ac,;:ao que tern
estabelecido para as Suas criaturas, sustentando-as e gover-
nando-as em todas as Suas ac,;:oes.
3a. Que o governo moral de Deus sobre os homens e sobre
todas as criaturas inteligentes, governo que Ele exerce por meio
da verdade e de outros motivos dirigidos a razao delas e a
vontade delas, recompensa-as e castiga-as segundo os seus
caracteres e as suas ac,;:oes morais, e educa-as benevolamente
para o seu destino exaltado, em Sua comunhao e em Seu
serv1c,;:o.
4a. 0 fa to de que a rac,;:a humana, em vez de progredir por
via de urn desenvolvimento natural de uma condic,;:ao moral
inferior para uma condic,;:ao moral superior, caiu de seu estado
InspirafiiO das Escrituras
e rela~ao originais e esta agora perdida numa condi~ao que
envolve corrup~ao e culpa, e e incapaz de salvar-se dela sem
interven~ao sobrenatural. ' 1oq t/IJ;'.'i'':·;;, ·.'
sa. A integridade hist6rica das Escrituras Sagradas, sua
veracidade como hist6ria, e a genuinidade e autenticidade dos
diversos livros que a comp6em.
6a. A verdade do cristianismo, no sentido em que este se
acha exposto nos documentos sagrados.
Todas essas pressuposi~6es necessarias, a verdade das quais
esta envolvida na doutrina de serem inspiradas as Sagradas
Escrituras, dividem-se em duas classes-
(1 a) As que se fundam na intui~ao, e as provas morais e
espirituais da verdade divina como sejam, a existencia e os
atributos de Deus e Suas rela~6es com o mundo e com os
homens; o testemunho da consciencia moral dos homens de
que sao pecadores condenados justamente, e incapazes de
salvar-se por si mesmos.
(2a) As que se fundam em quest6es de fato, e que depen-
dem do testemunho hist6rico e critico quanto a verdadeira
origem e ao conteudo dos livros sagrados.
Sese duvidar de qualquer desses principios ou fatos, deve-
-se procurar as suas provas nas divis6es da teologia que tratam
deles especialmente, como por exemplo, no ramo da
apologetica- o argumento teista e a teologia natural, as provas
do cristianismo, a origem hist6rica das Escrituras, o canon,
critica e exegese do texto sagrado.

EXPOSI<;AO DA DOUTRINA DA IGREJA


SOBRE A INSPIRA<;Ao

2. Qual o sentido em que a Biblia e inspirada, segundo o ensino


universal da lgreja, e ate onde e que se estende essa inspirafiio,
segundo esse mesmo ensino?
A Igreja ensina universalmente que os escritores sagrados
eram de tal modo influenciados pelo Espirito Santo que seus

81
Capitulo 4
escritos, em seu todo e em todas as suas partes, sao a Palavra
de Deus para n6s - uma revela<;ao de autoridade, que Deus
nos fez, aprovada por Ele e enviada a n6s como uma regra de
fee pratica. Os escritos originais da qual eram absolutamente
infaliveis, quando interpretados no sentido em que os autores
empregavam as palavras que escreveram com autoridade
divina absoluta.
,;•r·;·.;, :~· . · ·, .. · · .. ; .• :•-.1: 1 .

3. Que quer dizer inspirafiio '1Jlena"?


Uma influencia divina, plena e suficiente para conseguir
o seu fim. 0 fim conseguido, neste caso, e a perfeita infali-
bilidade das Escrituras em todas as suas partes, como
documento autentico quanto aos fatos narrados e doutrinas
ensinadas; e infalivel tanto a respeito dos pensamentos
expostos como das express6es empregadas na sua exposi<;ao.
De modo que, nao obstante virem a n6s por meio do espfrito,
cora<;ao, imagina<;;ao, consciencia e vontade de homens, sao
ainda assim, no sentido mais restrito do termo, a Palavra de
Deus. ; ·, , ···

4. Que quer dizer a expressiio "inspirafiio verbal", e como se


pode provar que as palavras da Biblia for am inspiradas?
Quer dizer que, fosse qual fosse a influencia divina que
assistia aos sagrados escritores naquilo que escreveram,
estendeu-se a expressao de seus pensamentos em palavras,
como tambem aos pensamentos. Sendo o efeito disso que, nos
escritos originais, a linguagem exprime com certeza infalfvel
os pensamentos que Deus queria manifestar, de modo que as
palavras, bern como os pensamentos, sao a revela<;;ao que Deus
nos fez. Que essa influencia estendia-se as palavras, torna-se
evidente-
1°. Pelo proprio designio que a inspira<;ao tinha em vista,
que nao era tornar infalivelmente acertadas as opini6es dos
homens inspirados (havia diferen<;as de opiniao entre Paulo e
Pedro, Gal. 2:11, e as vezes os profetas nao sabiam o sentido

82
InspiraftiO das Escrituras
daquilo que escreviam), e sim, fazer com que nos documentos
fosse consignada infalivelmente a verdade. Todavia urn
documento consta de palavras, •L · H •~
· " ., ' " ' ' ' ''

2°. Os homens pensam em palavras, e quanto mais


definidamente pensam, tanto mais imediatamente se acham
seus pensamentos associados com uma expressao verbal
exatamente apropriada ao pensamento. Por conseguinte, e
impossivel conseguir-se ou conservar-se infalibilidade nos
pensamentos independentes da infalibilidade na sua expressao
verbal.
3°. As Escrituras afirmam a sua inspira~ao verbal. 1 Cor.
2:13; 1 Tess. 2:13. ~·
4°. Os escritores do Novo Testamento, quando citam o
Velho Testamento em apoio de urn argumento, muitas vezes
baseiam o argumento nas pr6prias palavras empregadas,
atribuindo assim autoridade as palavras, e nao s6 aos pensa-
mentos que as palavras exprimem- Mat. 22:32 e Ex. 3:6,16;
Mat. 22:45 e Sal. 100: 1; Gal. 3:10 e Gen. 17:7, no original e na
Vulgata.

5. Por quais meios produziu Deus, segundo o ensino da lgreja,


o resultado acima definido?
A doutrina da Igreja reconhece o fa to de que as Escrituras
sao, ao mesmo tempo, urn produto da as;ao de Deus e dos
homens. Os escritores humanos produziram, cada urn a sua
parte, no exerdcio livre e natural de suas faculdades pessoais,
nas condis;6es hist6ricas em que se achavam. Deus, tambem,
de tal modo operou concorrentemente nesses e por esses
escritores que o inteiro organismo das Escrituras e cada parte
delas e, para n6s, a Sua palavra infalivelmente verdadeira, no
sentido em que foi escrita e e de autoridade absoluta.
A as;ao de Deus inclui os tres elementos seguintes:
1°. Sua a<;ao providencial em produzir as Escrituras. 0
curso inteiro da redens;ao da qual a revela<;ao e a inspiras;ao
eram funs;6es especiais, foi uma providencia especial,

83
Capitulo 4

dirigindo a evoluc;;ao de uma hist6ria especialmente


providencial. Nesta, o naturale o sobrenatural continuamente
interpenetravam-se. Mas, como era necessariamente o caso, o
natural era a regra e o sobrenatural a excec;;ao; sendo este,
porem, tao pouco sujeito a acidentes e tanto sujeito ao designio
racional de Deus, como o e o natural. Assim, Deus produziu
providencialmente, a Seu tempo, os homens expressamente
destinados para ocasi6es determinadas, revestidos das
faculdades, qualidades, educac;;ao e experiencia da grac;;a
necessarias para a produc;;ao dos escritos que Deus tencionava
fazer aparecer. Moises, Davi, Isaias, Paulo ou Joao; genio e
carater, natureza e dotes da grac;;a, lavrador, fil6sofo ou rei; o
homem e, com ele, todos os sutis acidentes pessoais foram
preparados providencialmente no momento proprio como as
necessarias precondic;;6es instrumentais para a obra que se devia
fazer.
2°. A revela~ao de verdades inatingiveis de outro modo.
Sempre que o escritor nao possuia ou nao podia por meios
naturais tornar-se possuidor do conhecimento que Deus queria
comunicar, foi-lhe revelado, de uma maneira sobrenatural,
mediante palavras ou uma visao. Esta revelac;;ao era sabre-
natural, objetiva quanto a quem a recebia, e era-lhe certificada
como verdade, de origem divina por testemunho apropriado.
Foi revelada dessa maneira, diretamente, grande parte das
Escrituras- as profecias sobre eventos futuros, as doutrinas
peculiares do cristianismo, as promessas e ameac;;as da Palavra
de Deus, etc., mas nao foi revelado, de modo algum, todo o
conteudo das Escrituras.
3°. Inspirac;;ao. Os escritores estavam sujeitos a uma divina
influencia plena chamada inspirac;;ao, que atuava sobre e
mediante suas faculdades naturais, em tudo o que escreveram,
dirigindo-os na escolha do assunto e em todo o curso de seus
pensamentos e no modo de os exprimir em palavras, de
maneira que, sem interferencia no livre exercicio natural de
suas faculdades, eles, livre e espontaneamente, produziram

84
Inspirafiio das Escrituras

os pr6prios escritos que Deus queria que produzissem, e que


possuem assim os atributos de infalibilidade e autoridade,
comosupradefinidos. .,__ ... " ·.·•::,·,;:·:-' :_,
A inspiras;ao difere, portan to, da revelas;ao- ( 1) Em que a
inspiras;ao e a constante experiencia dos escritores sagrados
em tudo o que escreveram, e em que afeta a infalibilidade
igual de todos os escritos que produziram; enquanto que a
revelas;ao, como ja dissemos acima, era concedida sobre-
naturalmente, s6 quando era necessaria. (2) Em que a revelas;ao
comunica, objetivamente, ao escritor, verdades desconhecidas;
enquanto que a inspiras;ao era uma influencia divina,
operando subjetivamente sobre os sagrados escritores, sem
comunicar-lhes nada, mas dirigindo suas faculdades no seu
exerdcio natural, de modo que produzissem documentos
autenticos e infaliveis quanto as materias de hist6ria, doutrina,
profecia, etc. que Deus tinha o designio de enviar por meio
deles aSua Igreja.
Ela difere da iluminas;ao espiritual em que esta e urn
elemento essencial na obra santificadora do Espirito Santo
comum a todos os cristaos. Nunca resulta no conhecimento
d~. verdades novas, e sim, somente no discernimento da beleza
e do poder espirituais das verdades ja reveladas nas Sagradas
Escrituras. c· ._,i; ;... ·- · ·
J :· ~"',:
: ' • .- ... ·:

A inspiras;ao e uma influencia especial do Espirito Santo,


que foi peculiar aos profetas e ap6stolos e lhes assistia s6 no
exerdcio de suas funs;6es como mestres divinamente acre-
ditados. A maioria deles foi inspirada e tambem iluminada
espiritualmente. Alguns, como Balaao, nao sen do regenerados
foram inspirados, porem estavam sem iluminas;ao espiritual.

AS PROVAS DA DOUTRINA DA IGREJA


SOBRE A INSPIRA<;Ao

6. Quais as fontes de onde se deve tirar as provas quanta a


natureza e aextensao da inspirafiiO das Escrituras? It-.

85
Capitulo 4
1a. As assen;:6es das pr6prias Escrituras Sagradas.
2a. Os fenornenos das Escrituras quando exarninados
criticarnente.

AS AFIRMAC.::OES DAS ESCRITURAS SAGRADAS


QUANTO A NATUREZA DA SUA
, .,~1~ <J.,, PROPRIA INSPIRAc_::Ao

7. Como se pode justificar a apresentafiio das asserfoes das


Sagradas Escrituras como prova da sua inspirafiio?
Nao raciocinarnos nurn circulo vicioso quando basearnos
a verdade da inspira<;:ao das Escrituras ern suas pr6prias
asser<;:6es. Chegarnos a esta questao ja crendo na credibilidade
das Escrituras como hist6ria, e na de seus escritores como
testernunhas de fatos, e na verdade do cristianisrno e na
deidade de Cristo. Por conseguinte, deve ser verdade tudo
quanta Cristo afirrna a respeito do Velho Testamento, tudo
quanta prorneteu aos ap6stolos, tudo quanta estes asseverarn
a respeito de urna influencia divina, operando neles e por rneio
deles; ou a respeito da infalibilidade e autoridade dos seus
escritos. E isso rnais especialrnente porque todas as suas
reivindica<;:6es forarn endossadas por Deus, operando corn eles
por rneio de sinais rnaravilhosos e dons do Espfrito Santo. E
evidente que, se negarrnos a sua inspira<;:ao e a infalibilidade
e autoridade dos seus escritos, os acusarernos de presun<;:ao
fanatica e de fazerern falsas representa<;:6es do carater, o rnais
grosseiro, e negarernos a validade do seu testernunho sabre
qualquer ponto. Se negarrnos a inspira<;:ao plena das Escrituras,
ficara solapada toda a fe crista.

8. Como se pode, com justifa, inferir a inspirafiio dos ap6stolos


do fa to de fazerem milagres?
0 rnilagre e urn sinal divino, credenciando a pessoa a
quem foi concedido esse poder, como agente cornissionado
divinarnente- Mat. 16:1-4; Atos 14:3; Heb. 2:4. Este

86
Inspirafiio das Escrituras
testemunho divino nao s6 anima a crer, mas torna absoluta-
mente obrigat6rio o dever de crer. Deus nos manda crer
quando vemos urn sinal; mas nao podia mandar-nos crer em
coisa que nao fosse verdade pura comunicada de urn modo
infalivel.

9. Como se pode mostrar que o dom da inspirafiio foi prome-


tido aos ap6stolos?
Mat. 10:19; Luc. 12:12; Joao 14:26; 15:26; 16:13; Mat.
28:19, 20; Joao 13:20.

10. De que modos diversos os ap6stolos reivindicaram para si,


a posse do Espirito?
Disseram:
1°. Que tinham o Espirito de conformidade com a
promessa de Cristo- Atos 2:33; 4:8; 13:2-4; 15:28; 21: 11; 1
Tess.1:5.
2°. Falaram como os profetas de Deus -1 Cor. 4: 1; 9: 17;
2 Cor. 5:19; 1 Tess. 4:8.
3°. Falaram com autoridade plena- 1 Cor. 2: 13; 1 Tess.
2: 13; 1 Joao 4:6; Gal. 1:8,9; 2 Cor. 13:2,3,4. Colocam seus
escritos na mesma categoria das Escrituras do Velho Testa-
mentp: 2 Ped. 3: 16; 1 Tess. 5:27; Col. 4: 16; Apoc. 2:7- Dr.
Hodge. -

11. Como foram confirmadas suas asserfi5es a esse respeito?


1°. Por sua vida santa, simples, temperada e ao mesmo
tempo her6ica.
2°. Pela santidade da doutrina que ensinaram e pela virtude
espiritual dessa doutrina, atestada por seus efeitos sobre
comunidades e individuos.
3°. Pelos milagres que realizaram- Heb. 2:4; Atos 14:3;
Mar. 16:20.
4°. Todos estes testemunhos nos vern, nao s6 comprovados
pelos escritos dos pr6prios ap6stolos, mas tambem pelo

87
Capitulo 4
testemunho uniforme dos primeiros cristaos, seus contem-
poraneos e seus sucessores imediatos.

12. Como demonstrar que os escritores do Velho Testamento -)


declaravam-se inspirados?
1°. Moises diz-nos que escreveu, pelo menos, parte do
Pentateuco por ordem divina: Deut. 31:19-22; 34:10; Num.
16:28,29- Davi afirma que falou por inspira~ao- 2 Sam. 21:1.
2°. Como fato caracteristico, os escritores do Velho Testa-
mento nao falam em seu proprio nome, mas introduzem suas
mensagens como prefacio: "Disse o Senhor", "0 Senhor me
disse", "0 Senhor falou", etc.: Jer. 9: 13; 13: 13; 30:4; Is. 8: 1;
23:11; Miq. 4:4. Amos 3:1; Deut. 18:21,22; 2 Sam. 21:1; 1
Cron. 17:3 - Dr. Hodge.

13. Como foram confirmadas as suas asserfi5es a esse respeito?


1°. Foram confirmadas a seus contemporaneos pelos
milagres que esses profetas realizaram, pelo cumprimento de
muitas de suas predi~6es (Num. 16:28-33), pela santidade de
sua vida, pela perfei~ao moral e espiritual de sua doutrina, e
pela adapta~ao pd.tica do sistema religioso que revelaram as
necessidades urgentes dos homens.
2°. Sao confirmadas a nos principalmente - (1) Pelo
cumprimento notavel de muitas de suas predi~6es, seculos
depois de proferidas. (2) Pela evidente rela~ao que existia en-
tre a religiao simbolica que promulgaram e os fatos e doutrinas
do cristianismo, provando assim, urn divino pre-ajustamento
do tipo para o antitipo. (3) Pelo abono de Cristo e Seus
apostolos.
.:, '

14. Quais as formulas que introduzem no Novo Testamento


muitas das citafi5es tiradas do Velho Testamento; e como provam
essas formas de expressao a inspirafiio das antigas Escrituras?
"0 Espirito Santo diz", Heb. 3:7; "Significando com isto
o Espirito Santo" Heb. 9:8; "Diz o Senhor", Atos 2:17 e Is.
InspirafiiO das Escrituras
44:2; "Diz a lei" 1 Cor. 9:9,10 e Deut. 25 :4; "Diz a Escritura",
Rom. 4:3; Gal. 4:30; "Esta escrito" Luc. 18:31; 21:22; Joao
2: 17; 20:31; Rom. 4: 17; "Disseste pelo Espirito Santo por
boca de Davi", Atos 4:25 e Sal2: 1,2; "Deus determina ... urn
certo dia ... dizendo por David", Heb. 4:7 e Sal. 9:7, 8; "Davi
lhe chama em espirito, dizendo": Mat. 22:43 e Sal. 110: l.
Assim, pois, as Escrituras do Velho Testamento sao o que
Deus disse, o que falou por boca de Davi, etc. e sao citadas
como bases autorizadas para argumenta<;;ao conclusiva; por
isso nao podem deixar de ser inspiradas.

15. Como se pode provar a inspirafiio dos escritores do Velho


Testamento pelas declarafoes expressas do Novo Testamento?
Luc. 1:70; Heb. 1: 1; 2 Tim. 3: 16; 1 Ped. 1: 10,12; 2 Ped.
1:21.

16. Qual e o argumento sabre este ponto, tirado da maneira


pela qual Cristo e Seus ap6stolos, nos seus argumentos, muitas vezes
citam o Velho Testamento como autoridade suprema?
Cristo cita, constantemente, o Velho Testamento. Mat.
21: 13; 22:43. Declara que nao pode falhar, Joao 7:23; 10:35;
que a lei toda eobrigat6ria, Mat. 5:18; e que era necessario que
se cumprisse tudo o que a Seu respeito se acha escrito em
"Moises", os profetas e os Salmos", Luc. 24:44. Os ap6stolos
costumam citar o Velho Testamento do mesmo modo. "Para
que se cumprisse o que se achava escrito" e, para eles, uma
formula caracteristica: Mat. 1:22; 2: 15; 17:23; 26:54; Joao
12:38; 15:25, etc. Todos apelam para as palavras das Escrituras
como autoridade suprema. Isso, de certo modo, prova a
infalibilidade das Escrituras.

89
Capitulo 4

OS FENOMENOS DAS ESCRITURAS


CONSIDERADOS COMO PROVAS DA NATUREZA
E EXTENSAO DA SUA INSPIRA(:AO

17. Que provas temos nos fenomenos das Escrituras sabre a


natureza e extensao das causas humanas que cooperaram para
produzi-las?
Toda parte das Escrituras igualmente contem provas de
uma origem humana. Os escritores de todos os livros eram
homens, eo processo de composi~ao que lhes deu origem era,
caracteristicamente, processo humano. As caracteristicas
pessoais do modo de pensar e sentir dos escritores operaram
espontaneamente na sua atividade literaria e imprimiram
carater distinto em seus escritos, de urn modo em tudo seme-
lhante ao efeito que o carater de quaisquer outros escritores
produz nas suas obras. Escreveram impelidos par impulsos
humanos, em ocasi6es especiais e com fins determinados. Cada
urn deles enxerga o seu assunto do seu ponto individual de
vista. Recolhe o seu material de todas as fontes que lhe sao
acessiveis- da experiencia e observa<;;ao pessoais, de antigos
documentos e de testemunho contemporaneo. Arranja seu
material com referencia ao fim especial que tern em vista; e
de prindpios e fatos tira inferencias segundo o seu proprio
modo, mais ou menos 16gico, de pensar. Suas emo<;;6es e
imagina<;;6es exercitam-se espontaneamente e manifestam-se
como co-fator nas suas composi<;;6es. As limita<;;6es de seu
conhecimento pessoal e de seu estado mental em geral, e os
defeitos de seus habitos de pensar e de seu estilo sao tao 6bvios
em seus escritos como o sao outras quaisquer de suas carac-
teristicas pessoais. U sam a linguagem e os modis mas pr6prios
da sua na<;;ao e classe social. Adotam osusos loquendi correntes
entre o seu povo, sem tamar a responsabilidade das ideias
filos6ficas que lhes deram origem.
Os habitos e metodos mentais dos escritores eram os da
sua na<;;ao e gera<;;ao. Eram orientais, em sua maioria, e par

90
Inspirafi:io das Escrituras
isso seus escritos estao repletos de metaforas e simbolos. E, se
bern que podemos confiar sempre na veracidade de suas
afirma<;;:6es, contanto que as limitemos, segundo a inten<;;:ao
dos autores, aquilo que tinham em vista como seu fim, eles
nunca visavam essa exatidao na enumerac;ao, ou em narrac;6es
cronol6gicas ou circunstanciais, que caracteriza as estatisticas
das modernas na<;;:6es ocidentais. Assim como todos os homens
puramente literatos, em todos OS secu}os, eles descrevem a
ordem e os fatos da natureza segundo parecem, e nao de
conformidade cientifica com suas leis ou causas abstratas.
Muitos pensadores superficiais tern dito que alguns dos
fatos que acabamos de mencionar nao condizem com o fato
alegado de serem os escritores sagrados dirigidos divinamente.
Mas, se refletirmos, parecer-nos-a evidente que, se Deus quiser
revelar-Se a n6s, nao ira faze-lo senao sob todas as limita<;;:6es
dos modos humanos de pensar e falar. E se Ele inspira homens
para comunicar Sua revelac;ao mediante escritos, e necessario
servir-Se dos hom ens de urn modo que condiga com a natureza
destes, como agentes racionais e espontaneos. E e evidente
que todas as distin<;;:6es entre os diversos graus de perfeic;ao do
conhecimento dos homens, e na elegancia do dialeto e estilo
humanos, nada sao quando olhados a luz das rela<;;:6es comuns
do hom em para com Deus. Eevidente que Deus podia revelar-
-Se tao bern por meio de urn campones como de urn fil6sofo;
e muito melhor, se por Sua gra<;:a e meios providenciais
ajustou, previamente, as caracteristicas pessoais do campones
para os fins especiais que tinha em vista.

18. Que provas temos, nos fenomenos das Escrituras, quanta a


natureza e extensi:io da influencia divina exercida na sua produfi:io?
1a. Em toda parte das Escrituras acham-se provas morais
e espirituais da sua origem divina, sendo, porem, naturalmente
mais conspicuas em algumas partes que em outras. Encontram-
-se reveladas nelas verdades transcendentais, uma moralidade
perfeita, uma revela<;;:ao das perfei<;;:6es absolutas da Deidade,

91
Capitulo 4
uma previsao de eventos futuros, urn conhecimento perfeito
e intima dos segredos do cora~ao humano, uma luz que
esclarece a razao e uma autoridade que obriga a consciencia,
uma compreensao de todos os motivos da experiencia e vida
humanas, que nao podiam vir de fonte que nao fosse divina.
Tudo isso e caracteristica de grande parte das Escrituras, e em
toda a literatura tudo isso e caracteristico tao-somente das
Escrituras. E isso, juntamente como testemunho do Espirito
Santo, e, praticamente, o testemunho em que confia a maioria
dos verdadeiros crentes.
2a. No entanto, ha outra caracteristica das Escrituras, a
qual, tomada em conexao com o precedente, prova, incon-
testavelmente, a sua origem divina, em seu todo e em cada
uma de suas partes. As Sagradas Escrituras sao urn organismo,
isto e, urn todo composto de muitas partes diversificadas
entre si em materia, forma, e estrutura como os diversos
membros do corpo; e, ao mesmo tempo, cada parte se acha
ajustada as outras e ao todo, mediante as correla~6es, as mais
intricadas e delicadas, mas tendo em vista todas urn fim
co mum.
As Escrituras sao a hist6ria e a interpreta~ao da obra da
reden~ao. Essa e uma obra que Deus preparou e levou a efeito
por meio de muitos atos sucessivos durante urn processo
hist6rico que durou muitos seculos. Uma providencia
sobrenatural ia desenvolvendo, durante esse tempo, urn
sistema de interven~6es divinas, acompanhadas e interpretadas
por uma ordem de profetas instruidos e dirigidos de urn modo
sobrenatural. Cada urn dos escritores tinha sua propria ocasiao
especial e temporaria de escrever; e tambem seus pr6prios
temas e audit6rio especiais e temporarios. E, contudo, cada
urn contribuiu com parte daquilo que era necessaria para
construir o organismo comum, ao passo que progredia a
hist6ria providencial tomando cada documento, alem de servir
para o seu fim temporario, o seu lugar permanente como
membra do todo. De modo que o evangelho cumpriu a lei, o

92
Inspiraftio das Escrituras
antitipo correspondeu ao tipo eo cumprimento apredi<;,:ao, a
hist6ria foi interpretada pelas doutrinas e as doutrinas deram
leis ao dever e a vida. Quanto mais minuciosamente for
estudado o conteudo de cada livro a luz de seu fim especial,
tanto mais diversas e exatas se achara que sao suas articula<;,:6es
no sistema geral do todo, e tanto mais bern ordenada ver-se-a
que e a estrutura do todo. Isso constitui a melhor prova de
designio que nose possivel imaginar, e no caso das Escrituras,
e prova de uma influencia divina e sobrenatural compreen-
dendo o seu todo, e estendendo-se a todas as partes, durante
dezesseis seculos; compreendendo sessenta e seis escritos, e
cerca de quarenta cooperadores humanos. Assim, pois, a a<;,:ao
divina na genese de toda parte das Escrituras e determinada
tao claramente e com a mesma certeza como o e na genese
mais antiga dos ceus e da terra.

19. Qual a ob}eftiO feita a esta doutrina, baseada na mane ira


livre par que as Escrituras do Velho Testamento sao citadas no
Novo, equal a resposta a essa objeftio?
Na maioria dos casos, os escritores do Novo Testamento
citam os do Velho com exatidao verbal. As vezes, citam a versao
Septuaginta quando ewi conforme com o hebraico; outras
vezes, introduzem uma outra tradu<;,:ao; e outras vezes ainda,
citam a versao Septuaginta mesmo quando difere do hebraico.
Em alguns casos, comparativamente poucos, suas cita<;:6es do
Velho Testamento sao feitas de urn modo muito livre, e em
acomoda<;,:ao aparente do sentido literal.
Baseando seu raciodnio sobre esta ultima classe de
cita<;,:6es, OS interpretes racionalistas tern dito que e impOSSI-
vel que fossem inspirados plenamente, tanto os escritores do
Velho Testamento citados, como tambem os do Novo Testa-
mento fazendo as cita~6es, porque dizem eles, se os ipsissima
verba eram infaliveis em primeiro Iugar, urn escritor infali-
vel os teria transferido sem altera<;,:ao. Mas, see verdade que
urn autor humano pode citar-se a si mesmo de urn modo

93
Capitulo 4
livre, mudando de expressao, e dando urn novo jeito ao
seu pensamento para adapta-lo, o mais perspicuamente, ao
fim que tern em vista, o Espirito Santo pode, por certo, fazer
o mesmo. 0 mesmo Espirito, que tornara infalfveis os
escritores do Velho Testamento para escreverem s6 a verdade
pura, naquela forma que estava melhor adaptada ao fim que
entao tinham em vista, tornou infalfveis os escritores do Novo
Testamento para usarem desse material ja disponivel de tal
modo que, enquanto tirassem dele urn sentido novo, ensinas-
sem s6 a verdade; e, alem disso, a propria verdade que Deus
tivera em vista desde o principia. E ensinaram essa verdade
com autoridade divina- Veja Hermeneutical Manual, Part 3,
por Fairbairn. Cada uma dessas cita~6es deve ser examinada
separadamente e em seus detalhes, como fez o Dr. Fairbairn.

20. Que objefiiO a doutrina da inspirafiiO pfenaria tira-se do


jato alegado de existirem "discrepancias" no texto das Escrituras?
E como se deve responder a esta objefiio?
Objeta-se que o texto sagrado con tern numerosas asser~6es
e narra~6es que nao estao de acordo com outras contidas em
outras partes das Escrituras, ou com fatos bern averiguados
da hist6ria ou da ciencia.
E evidente que semelhante estado de coisas, mesmo se
fosse provada a sua existencia, nao serviria, avista das muitas
provas apresentadas acima, para refutar a doutrina de serem
as Escrituras, ate certo ponto e em certo grau, o produto da
inspira~ao divina. A for~a da obje~ao dependeria, essencial-
mente, do numero e carater dos casos de discrepancia cuja
existencia fosse provada; e esses casos nada provariam contra
o fato da inspira~ao, e diriam respeito s6 asua natureza, grau
e extensao.
E 6bvio que o fato de realmente existirem semelhantes
"discrepancias" pode ser determinado s6 pelo exame cuidadoso
e independente de cada caso alegado. Este exame pertence
aos ramos da critica e da exegese biblicas. As seguintes

94
Inspirafiio das Escrituras
considera~6es, porem, sao evidentemente bern fundadas, e sao
suficientes para acalmar todas as apreens6es a este respeito.
1a. A lgreja nunca ensinou a infalibilidade verbal de
nenhuma tradu~ao das Sagradas Escrituras,* nem a exatidao
perfeita de nenhum dos manuscritos das Escrituras, no origi-
nal hebraico e grego, que possuimos agora. Ereconhecido que,
nesses exemplares, ha muitas "discrepancias" como resultado
de muitas transcri<;;6es sucessivas. E, porem, testemunho
unanime dos cristaos letrados que, ainda que essas varia~6es
dificultem a interpreta~ao de muitos pormenores, nao
envolvem a perda, nem diminuem as provas de urn s6 fato ou
doutrina essencial do cristianismo. E e urn fato consolador
que os criticos cristaos, descobrindo e conferindo exemplares
das Escrituras, em manuscritos cada vez mais antigos e exatos,
estao constantemente progredindo no seu desempenho de dar
a lgreja urn texto mais perfeito das Escrituras, nas Hnguas
originais, que nenhum outro dos que possuiam desde os tem-
pos dos ap6stolos.
2a. A Igreja afirmou sempre a infalibilidade absoluta s6
dos registros originais das Escrituras, como eles sairam das
maos dos escritores inspirados. E mesmo a respeito destes
nunca afirmou que tivessem conhecimentos infinitos, mas s6
que eram infaliveis quanto aquilo que tinham 0 designio de
anunciar. U rna "discrepancia" pois, no sentido em que os novos
criticos afirmam e a Igreja nega sua existencia, e uma palavra,
frase ou passagem existindo no registro original de qualquer
parte das Escrituras, cujo fim evidente era de afirmar como
verdade alguma coisa que estava em manifesta e irreconciliavel
contradi<;;ao como que se dizia em outra qualquer parte desses

* E necessar1o excetuar a igreja cat6lica romana., que declarou a


tradw;ao chamada Vulgata de autoridade indiscutivel, apesar de canter
inumeros erros de tradw;ao, sendo alguns deles bern graves, como por e.g.
"malitia", em Isaias 40:2; "sacramentum", em Efesios 5:32, e Hebreus
11:21. Nota do tradutor.

95
Capitulo 4

mesmos registros ongmais, em hebraico e grego, das


Escrituras, ou em contradi~ao com qualquer fa to conhecido e
indubitavel. Sera necessaria que se prove a existencia de uma
"discrepancia" que, em todos os sentidos, tenha estas carac-
teristicas, antes que a alega~ao de existirem "discrepancias"
possa afetar a doutrina da Igreja com referencia a inspira~ao
verbal e plenaria das Escrituras.
3a. Ecerto que, a vista de tudo 0 que as pr6prias Escrituras
afirmam ou descerram quanto a natureza e extensao da influ-
encia divina que regulava e dirigia a sua genese, e quanto a
sua autoridade sobre a consciencia e vida como a voz de Deus,
a existencia de "discrepancias" no sentido supra definido, e
extremamente improvavel. Os que afirmam sua existencia
devem aponta-las e provar, perante juizes competentes, que
todos os elementos da defini~ao supra encontram-se, em cada
caso alegado, nao s6 provavelmente mas sem a possibilidade
de duvida. 0 onus probandi esta sobre eles exclusivamente.
4a. Esta, porem, e uma tarefa que e muito dificil e ate
quase impossivel de se desempenhar. Porque, para sustentarem
sua posi<;ao contra as muitas probalidades que ha contra ela,
sera necessaria que os que afirmam a existencia de
discrepancias nas Escrituras, provem, em cada caso alegado,
cada urn dos seguintes pontos: (1) Que a discrepancia alegada
existia no registro original das Escrituras inspiradas. (2) Que
a interpreta~ao dada ao texto pelo objetor e a unica admissivel,
e que e aquilo mesmo que o escritor queria dizer. A
dificuldade disso se tornara evidente quando se considerar
que sao de uma obscuridade inerente antigas narra<;6es, nao
cronol6gicas e fragmentarias, com urn fundo quase impene-
travel as nossas pesquisas e escritas, em circunstancias que
nao conhecemos. Este estado de coisas, que tantas vezes
embarac;:a o interprete e impede o apologista de provar a perfeita
harmonia das narra~6es, impede, com igual forc;:a, todos os
esfor~os engenhosos dos criticos racionalistas de provar a
existencia de "discrepancias". Mas tudo isso eles devem fazer,
Inspirafiio das Escrituras
ou fica em pe a probabilidade da sua nao existencia. (3) E
preciso que provem tambem que os fatos cientificos ou
hist6ricos, ou as afirma~6es das Escrituras, que se alegam estar
em contradi~ao com esses fatos, sejam deveras fatos, e que
essas afirma~6es sejam realmente parte do texto inspirado das
Escrituras canonicas, e que o sentido em que elas se acham
contradit6rias com esses fatos, seja realmente o (mico sentido
que racionalmente podem ter. (4) Depois de provadas- a
realidade dos fatos, a genuinidade do texto que parece estar
em contradi~ao com eles, e a legitimidade da interpreta<;ao
que parece tambem estar em contradi<;ao com esses fatos-
sera ainda necessaria provar que nao s6 parece haver contra-
di~ao e que esta parece irreconciliavel no estado atual dos
nossos conhecimentos, como tambem provar que eles, em si,
sao real e essencialmente irreconciliaveis.
sa. Finalmente, e suficiente que chamemos a aten<;ao
para o fato de que nenhum caso de "discrepancia", no sen-
tido acima definido desta palavra, tern sido provado de tal
modo que fosse reconhecido pela comunidade de letrados
crentes. Existem, nas Escrituras, muitas passagens dificeis de
serem interpretadas, e outras que parecem irreconciliaveis
umas com as outras, mas nao se tern provado nenhuma
"discrepancia". A medida que os homens progridem no
conhecimento, desaparecem algumas dificuldades e surgem
outras. E e provavel, no mais alto grau, que se tivessemos
conhecimento perfeito de tudo, nao encontrariamos
dificuldade alguma nas Sagradas Escrituras.

21. Explicar o sentido de passagens como 1 Corintios 7:6,


12,14; Romanos 3:6,19; Galatas 3:15, e mostrar sua perfeita
consoniincia com a inspirafiio plenaria da Biblia inteira.
"Como homem" ou "humanamente falando" sao expres-
s6es que se encontram freqtientemente, e seu sentido fica
determinado pelo contexto. Em Romanos 3:6 significa que
Paulo, por amor aclareza, servia-se da linguagem comumente

97
Capitulo 4
usada entre os homens; o que dizia era opiniao dos judeus,
nao a sua propria. Em Romanos 6:19 significa: "de urn modo
adaptado a compreensao humana"; e em Galatas 3:15,
significa: "sirvo-me de uma ilustra<;ao tirada das coisas
humanas", etc.
Em 1 Corintios 7:6: "Eu digo isto por permissao"
(segundo o original e avulgata, ((secundum indulgentia") "e nao
por mandamento", refere-se ao versfculo 2. 0 matrimonio
sempre era permitido, porem em certas circunstancias era
inoportuno.
"Aqueles que estao unidos em matrimonio mando, nao
eu, senao o Senhor"; ''Aos mais digo eu, nao o. Senhor" - 1
Cor. 7: 10,12. Aqui o ap6stolo refere- se aquilo que "o Senhor",
isto e, "Cristo" ensinou quando estava na terra, e distingue
entre aquilo que Cristo ensinou e o que o ap6stolo ensina. E
como Paulo, nesta passagem, poe suas palavras em igualdade
de autoridade com as de Cristo, este fato mostra que Paulo
reivindicava para si uma inspira<;;ao que tornava sua palavra
igual a de Cristo, em infalibilidade e autoridade.
"Julgo que tambem eu tenho o espirito de Deus" - 1 Cor.
7:40. "Julgo que tenho" e, segundo 0 uso da lingua grega, s6
urn modo regional de dizer: eu tenho. Sobre o uso deste verbo
no grego, confira-se Galatas 2:6 e 1 Corintios 12:22. Paulo
nao tinha nenhuma duvida de ser instrumento do Espirito
Santo - Hodge, Com. on First Corinthians.

DECLARA<:;AO DEFECTIVA DA DOUTRINA

22.Diga qual o sentido em que os escritores teol6gicos em-


pregam os termos de ((inspirafiio" de ((superintendencia", de
((elevafiio", de ((direfiio" e de ((sugestiio ".
Certos escritores sobre este assunto, confundindo a
distin<;;ao entreinspirafiiO e revelafiio e empregando o primeiro
destes termos, no sentido de toda a influencia divina que atuava
sobre os sagrados escritores, tanto para que conhecessem a

98
Inspirafao das Escrituras
verdade como para que a escrevessem, distinguem entre
diversos graus de inspira~ao para acomodar a sua teoria aos
fatos do caso. Porque, em primeiro lugar, e evidente que parte
do conteudo das Escrituras podia bern ser conhecida dos
escritores, sem nenhum auxilio sobrenatural, enquanto que
outra parte nao podia ser conhecida deles; em segundo lugar,
os diversos escritores fizeram uso de suas faculdades naturais
e introduziram, nos seus escritos, suas peculiaridades indivi-
duais de pensamento, de sentimento e de estilo.
Por "inspira~ao de superintendencia", esses escritores
queriam dizer exatamente aquilo que demos acima como a
defini~ao de inspira~ao. Por "inspira~ao de eleva~ao" entendem
essa divina influencia que exaltava as qualidades naturais dos
escritores sagrados a urn grau de energia a que, de outro modo,
nao poderiam chegar.
Por "inspira~ao de dire~ao" entendiam essa influencia
divina que dirigiu os escritores sagrados na escolha e
disposi\ao do seu material.
Por "inspira\ao de sugestao" entendiam essa influencia
divina que sugeriu a suas mentes verdades novas e que, de
outro modo, estariam fora do seu alcance.

23. Que objefoes se pode fazer a essas distinf6es?


1a. Essas distin\6es nascem da falta anterior de nao se
distinguir entre revela~ao (que e fenomeno apresentado
freqiientemente) e a inspira\ao (fenomeno apresentado
constantemente nas Escrituras); uma fornece o material no
caso dos escritores nao poderem obte-lo de outro modo; outra
dirige os escritores a todo instante, (1) em garantir a verdade
infalivel de tudo quanto escreveram (2) na escolha e distri-
bui\ao do seu material.
2a . .E perigoso distinguir entre graus diferentes da
inspira\ao, como se certas partes das Escrituras fossem a Pala-
vra de Deus em graus diferentes, enquanto que, na verdade,
toda ela e igual e absolutamente a infalivel Palavra de Deus.

99
Capitulo 4
FALSAS DOUTRINAS SOBRE A INSPIRA(:AO

24. Quais os principios que conduzem, necessariamente, a


negafiio de qualquer inspirafiio sobrenatural?
Todos os prindpios filos6ficos ou rnodos de pensar que
excluern a distin<;ao entre o natural e o sobrenatural neces-
sariarnente conduzern a nega<;ao da inspira<;ao, no sentido
ern que e afirrnada pela Igreja. Sao, por exernplo, todos os
principios panteistas, rnaterialistas e naturalistas, e,
naturalrnente, os prindpios racionalistas, ern todas as suas
forrnas. ~ l , ' I., ::, ; • ; • ', · : 1 ;

25. Quais as divers as formas em que se tem sustentado a doutrina


de uma inspirafiio parcial ?
1a. Afirrna-se que certos livros forarn inspirados
plenariarnente, enquanto que outros forarn escritos s6 corn o
natural auxilio providencial e gracioso de Deus. S.T. Coleridge
adrnitia a inspira<;ao plemiria da lei e dos profetas, dos quais
nao podia passar urn s6 i ou urn til sem que fosse curnprido;
mas negava isso a respeito dos dernais livros do canon.
2a. Muitos adrnitern que os elementos rnorais e espirituais
das Escrituras e as doutrinas, ate onde estas dizern respeito a
natureza e aos prop6sitos de Deus cujo conhecimento e
inatingivel de outro modo, sao produtos da inspira<;ao; mas
negarn isso quanto aos elementos hist6ricos e biograficos, e a
todas as alus6es a fatos ou leis cientificas.
3a. Outros adrnitern que a inspira<;ao dos escritores dirigia
os seus pensarnentos, mas negarn que se estendia a sua
expressao ern palavras.
Nurn desses sentidos, ou ern todos, diversos hornens tern
rnantido e afirrnarn que as Escrituras sao s6 "parcialrnente"
inspiradas. Por conseguinte, todos negarn que "siio a palavra
de Deus", como e afirrnado pelas pr6prias Escrituras e por
todas as Igrejas hist6ricas. Adrnitern s6 que elas "contern a
palavra de Deus". ,. ,,

100
InspirafiiO das Escrituras
26. Quale a doutrina da "InspirafiiO da Grafa"?
Coleridge, em suas Confessions ofan Inquiring Spirit, Carta
7, mantem que as Escrituras, exceto a lei e os profetas, foram
produzidas por seus escritores auxiliados pelo "grau superior
daquela gra<;;a e comunhao com o Espirito que se ensina a
lgreja, em todas as circunstancias, e a todo o membro
regenerado da lgreja de Cristo, a esperar e pedir em orac;ao".
Esta e a doutrina de Maurice (Theological Essays, pag. 339) e,
virtualmente, a de Morell (Philosophy ofReligion, pag. 186), e
dos quacres. Estes admitem que ha uma revelac;ao objetiva
sobrenatural e que esta e contida nas Escrituras, as quais sao
muito uteis e a regra, de au tori dade, de fee pratica, no senti do
de nao poder ser verdadeira uma revelac;ao pretendida que
esteja em desacordo com as Escrituras; e que estas sao juiz,
em todas as controversias entre cristaos. Mas eles mantem,
tambem, que as Escrituras sao s6 "uma regra secundaria,
subordinada ao Espirito de quem receberam toda sua
excelencia", o qual Espirito ilumina a todo o homem e lhe
revela, ou pelas Escrituras, ou sem elas, se lhe forem desco-
nhecidas, todo esse conhecimento de Deus e da Sua vontade
que lhe e necessaria para sua salvac;ao e direc;ao, sob a condic;ao
de prestar obediencia constante a essa luz que lhe e assim
comunicada graciosamente a ele e a todos os homens.Barclay's
Apology, Theses Theological, proposic;6es 1, 2 e 3.

EXPOSic_;6ES AUTORIZADAS

CATOLICO-ROMANA- Decretos do Concilio de Trento,


sess. 4 "0 evangelho ... primeiramente promulgado pela
boca de N osso Senhor Jesus Cristo Filho de Deus, e depois
pelos seus apostolos ... o mandou pre gar a toda a criatura; e
vendo que esta verdade e disciplina se contem em livros
escritos, e em tradi<.;6es (sem escritos) que, recebidas pelos
apostolos da boca de Cristo, ou ditadas pelo Espirito Santo,
dos mesmos apostolos, como de mao em mao chegaram
ate nos; (o Concilio) seguindo o exemplo dos padres

101
Capitulo 4

ortodoxos, com igual afeto de piedade, venera e recebe


todos os Livros, tanto do Velho como do Novo Testa-
mento, sendo Deus 0 unico autor de ambos OS Testa-
mentos; e tambem as mesmas tradis;6es, que pertencem
tanto a fe como aos costumes; como ditadas pela boca de
Cristo, ou pelo Espirito Santo, e por uma continua suces-
sao, conservadas na igreja cat6lica, recebe-as e venera com
igual afeto, piedade e reverencia."
Decretos dogmaticos do Concilio vaticano, 1870, Sess. 3,
Cap. 2. "Ademais, esta revelas;ao sobrenatural, segundo a
crens;a universal da lgreja, declarada pelo santo Sinodo
de Trento, e contida nos livros escritos e tradis;6es nao
escritas, que tern chegado ate nos, tendo sido recebidas
pelos ap6stolos da propria boca de Cristo, ou aos pr6prios
ap6stolos ditadas pelo Espirito Santo, foram transmitidas
como de mao em mao. E esses livros do Velho e do Novo
Testamentos devem ser recebidos como sagrados e can6-
nicos, na sua inteireza, com todas as suas partes, assim
como se acham enumerados no decreto do dito Concilio,
e estao contidos na antiga edis;ao da Vulgata. Esses a igreja
(cat6lica romana) tern por sagrados e can6nicos, nao
porque houvessem sido compostos cuidadosamente por
industria meramente humana, nem porque foram depois
aprovados por sua autoridade, nem somente por conterem
uma revelas;ao sem mistura alguma de erro; e sim porque,
tendo sido escritos por inspiras;ao do Espirito Santo, tern
Deus por seu autor e foram entregues como tais a mesma
lgreja."
LUTERANAS -Formula Concordiae Epitome. 1: "Cremos,
confessamos e ensinamos que a unica regra e norma
segundo a qual todos os dogmas e doutrinas devem ser
estimados e julgados nao e nenhuma OUtra senao OS
escritos profeticos e apost6licos do Velho e do Novo
Testamentos, assim como esta escrito em Sal. 119: 105 e
GaL 1 :8."
REFORMADAS - Segunda Confissiio Helvetica. Cap. 1. A
respeito das Escrituras Sagradas: "Cremos e confessamos
que as Escrituras canonicas dos santos profetas e

102
Inspiraftio das Escrituras
J ap6stolos de cada urn dos Testamentos sao a verdadeira
Palavra de Deus, e que possuem autoridade suficiente
por si s6 e nao dos homens. Pois Deus mesmo falou aos
patriarcas, aos profetas e aos ap6stolos, e continua a falar
a nos, pelas Escrituras Sagradas."
A Confissao Belga. Art. 3. "Confessamos que esta Palavra
de Deus nao foi enviada nem entregue pela vontade do
hom em, e sim, que OS homens santos de Deus e que falaram,
inspirados pelo Espirito Santo, como diz o apostolos Pedro
(2 Ped. 1:21). E que depois Deus, levado a isso pelo cuidado
especial que tern por nos e nossa salva<;:ao, mandou Seus
servos, os profetas e apostolos, escreverem a Sua palavra
revelada, e Ele mesmo escreveu, com Seu proprio declo,
as duas tabuas da lei. Por isso chamamos santos, e
Escrituras divinas, a todos esses escritos."
A Confissiio de Fe, de Westminster. Cap. 1. "Por isso
aprouve ao Senhor revelar-Se e declarar essa Sua vontade
a Sua Igreja, em diversos tempos e de varios modos; e
depois, para melhor conserva<;:ao e propaga<;:ao da verdade
e para mais seguro estabelecimento e conforto da Igreja
contra a corrup<;:ao da carne e a malicia de satanas e do
mundo, faze-la escrever toda inteira". A autoridade das
Escrituras Sagradas, as quais devem ser cridas e obedecidas,
nao depende do testemunho de nenhum homem ou igreja,
mas somente de Deus (que e a propria verdade), seu
Autor; e, por isso, deve ser recebida - por ser a Palavra de
Deus."

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• \·I,

103
5

A Regrade Fee Pratica

AS ESCRITURAS DO VELHO E NOVO


TESTAMENTOS, TENDO SIDO DADAS POR
INSPIRAc;Ao DE DEUS, SAO A UNICA REGRA, E
REGRA INTEIRAMENTE SUFICIENTE, DE FE E
PRATICA, E JUIZ NAS CONTROVERSIAS.

1. 0 que se quer dizer quando se afirma que as Escrituras sao a


{mica regra infalivel de fie pratica?
Tudo quanto Deus ensina ou ordena e de autoridade sobe-
rana. Tudo quanto nos comunica o conhecimento infalivel
daquilo que Ele ensina e ordena, e uma regra infalivel. As
Escrituras do Velho e Novo Testamentos sao os (micos meios
pelos quais Deus, durante a dispensa<;ao atual, comunica-nos
o conhecimento da Sua vontade quanto aquilo que devemos
crer a Seu respeito, e diz-nos quais os deveres que Ele de n6s
ex1ge.

2. 0 que a igreja romana declara ser a regra infalivel de je e


pratica?
A teoria romana e que a regra completa de fe e pnitica
consta das Escrituras e da tradi<;ao, ou seja, o ensino oral de
Cristo e Seus ap6stolos transmitido ate nos pela igreja (cat6lica).
Afirmam que a tradi<;ao e necessaria, 1°. para o ensino de
verdades adicionais, nao contidas nas Escrituras; 2°. para
interpretar as Escrituras, e que a igreja (cat6lica romana) foi

104
A Regra de Fee Pratica
designada divinarnente para ser a depositaria e o juiz, tanto
das Escrituras como da tradi~ao -Decretos do Concilio de Trento,
Sess. 4, e Teologia de Deus, Tom. 2, N°. 80 e 81.' · · 1'0'' '

3. Por quais argumentos os defensores dessa teoria procuram


estabelecer a autoridade da tradifiio? Qual o criteria de que se servem
para distinguir as tradifi5es verdadeiras das falsas, e quais os
fundamentos em que baseam a autoridade das tradifi5es que admitem
como verdadeiras?
1°. Seus argumentos a favor das tradi~6es sao: (1) As
Escrituras autorizarn-nas: 2 Tess. 2:14 (15); 3:6. (2) Os antigos
"ss. padres" afirmavam a autoridade da tradi~ao e em grande
parte baseavam nela a sua fe. (3) 0 ensino oral de Cristo e Seus
ap6stolos, quando determinado claramente e conhecido, e
intrinsecamente de igual autoridade a dos seus escritos. As
pr6prias Escrituras nos tern sido transmitidas pelo testemunho
da tradi~ao, e o rio nao pode subir mais alto do que a sua
origem. (4) A necessidade: (a) As Escrituras sao de sentido
obscuro, e precisam da tradi~ao como seu interprete. (b) As
Escrituras sao incompletas como regra de fee pratica devido
haver muitas doutrinas e institui~6es, reconhecidas universal-
mente, baseadas na tradi~ao como suplemento as Escrituras.
(5) A analogia. Todos os Estados reconhecem tanto as leis nao
escritas como leis escritas, a lei comum e a lei baseada ern
estatutos.
2°. 0 criteria de que se servem para distinguir entre as
tradi~6es verdadeiras e as falsas, e consenso cat6lico. Os
ritualistas anglicanos lirnitam a aplica~ao desta regra aos
primeiros tres ou quatro seculos. Os romanistas reconhecern
como consenso de autoridade aquilo que foi determinado
constitucionalmente pelos bispos reunidos em condlio geral,
ou pelo papa ex cathedra, em qualquer epoca.
3°. Defendem as tradi~6es que tern por verdadeiras- (1)
Com base no testemunho hist6rico, e as deduzern dos ap6stolos
como sua origem. (2) Baseando-se na autoridade da igreja,

105
Capitulo 5
expressa pelo consenso cat6lico.
I
4. Par quais argumentos pode-se demonstrar a invalidade de
todas as tradifoes eclesiasticas, como parte de nossa regra de fi e
pratica?
1°. As Escriturasnao atribuem, como se afirma, autoridade
as tradi<;6es orais. As tradi<;6es de que Paulo fala nas passagens
citadas de 2 Tess. 2:14 (15); 3:6, foram todas as suas instrw;:6es,
orais e escritas, e comunicadas par ele a esses mesmos
tessalonicenses; nao foram transmitidas. Por outro lado, Cristo
repreendeu severamente esta mesma doutrina dos cat6licos
romanos, na pessoa dos predecessores destes- os fariseus. Mat.
15:3; Mar. 7:7 (8).
2°. E improvavel, a priori, que Deus suplementasse as
Escri turas com a tradi<;ao, como parte de nos sa regra de fe. ( 1)
Porque as Escrituras, como mostraremos abaixo (perguntas
7-14 ), sao certas, definidas, completas e perspfcuas. (2) Porque
a tradi<;ao, por sua propria natureza, e indeterminada e esta
sujeita a ser adulterada por todas as formas de erro. Alem disso,
como haveremos de demonstrar abaixo (pergunta 20), a
autoridade das Escrituras nao se acha baseada, em ultima
ins tan cia, na tradi<;ao.
3°. A base inteira em que os romanistas apoiam a autori-
dade de suas tradi<;6es, is toe, a hist6ria e a autoridade da igreja,
e invalida. (1) Eles nao tern apoio nenhum na hist6ria. Por
mais de trezentos anos, depois do tempo dos ap6stolos, eles
tern pouquissimas evidencias a favor de qualquer de suas
tradi<;6es, e as que tern contradizem-se mutuamente. Sao, por
isso, obrigados a recorrer ao postulado absurdo de que aquilo
que se ensinou no quarto seculo, foi ensinado no terceiro, e
por conseguinte, tam bern no segundo e no primeiro. (2) A igreja
(cat6lica) nao e infalivel, como demonstraremos abaixo
(pergunta 18).
4°. Sua pratica nao esta em conformidade com seus
principios. Os romanistas nao aceitam muitas das tradi<;6es

106
A Regra de Fee Pratica
mais antigas e mais bern atestadas; e muitas das suas preten-
sas tradi~6es sao inven~6es recentes e desconhecidas pelos
seus predecessores.
5°. Muitas de suas tradi~6es, como aquelas que dizem
respeito ao sacerd6cio, ao sacrificio da missa, etc., estao fla-
grantemente em oposi~ao direta ao ensino das Escrituras.
Nao obstante, essa igreja pretensamente infalivel afirma a in-
falibilidade das Escrituras! Uma casa dividida contra si mesma
nao subsistini.

5. Que e necessaria para constituir uma regra


unica e infa-
livelde je? ·"
Inspira~ao plemiria, e que a regra seja completa, perspicua
e acessivel. .... - - _

6. Que argumentos oferecem as pr6prias Escrituras a favor da


doutrina de serem elas a unica regra infalivel de je?
1°. As Escrituras falam sempre em nome de Deus e se
imp6em, como obrigat6rias, a fe e a obediencia.
2°. Cristo e Seus ap6stolos referiam-se sempre as Escrituras
escritas que, existiam entao; e anenhuma outra regra deje, fosse
qual fosse- Luc. 16:29; 10:26; Joao 5:39; Rom. 4:3; 2 Tim.
3:15. ~.~:l, : .

3°. Os bereanos foram elogiados por sujeitarem todas as


quest6es, e mesmo o ensino dos ap6stolos, a prova das
Escrituras- Atos 17:11; veja tam bern Is. 8:16.
4°. Cristo repreendeu os fariseus por fazerem acrescimos
as Escrituras e perverte-las- Mat. 15: 7-9; Mar. 7: 5-8; veja
tam bern Apoe. 22:18, 19; e Deut. 4:2; 12:32; e Jos. 1:7.

7. Em que sentido eque se afirma que as Escrituras sao completas


como regra de je? ,!

Nao quer dizer que, nas Escrituras, se acham todas as


revela~6es feitas por Deus em qualquer tempo ao homem, e
sim que o seu conteudo e a unica revela~ao que Ele nos faz

107
Capitulo 5
agora, e que esta revela<;:ao e abundantemente suficiente para a
nossa dire<;:ao, em todas as quest6es de fe, pr:hica e modos de
prestar-Lhe culto, e exclui a necessidade eo direito de inven-
<;:6es humanas.

8. Como se pode provar, pelo designio das Escrituras, que estas


sao completas? . .
As Escrituras professam conduzir-nos a Deus; por
conseguinte, devem ensinar-nos tudo 0 que e necessaria para
esse fim. Se, para esse fim, houvesse necessidade de qualquer
regra suplementar, como a tradi<;:ao, isto seria referido nelas ..
"Se nao fossem completas a este respeito, seriam mentirosas".
Mas, conquanto os sagrados escritores remetam constante-
mente aos escritos dos outros, nenhum deles, nem uma s6 vez,
fala da necessidade nem na existencia de outra regra- Joao 20:
31; 2 Tim. 3:15-17.

9. Por quais outros argumentos pode-se provar este principia?


As pr6prias Escrituras se apresentam como uma regra
completa para o fim a que se prop6em, e assim tambem o
verdadeiro povo espiritual de Deus, em todos os seculos, veem
nelas essa regra completa. Ensinam urn sistema completo e
consequente de doutrina. Fornecem todos os tipos necessarios
para o governo da vida particular dos cristaos, em todas as suas
rela<;:6es; para o culto publico a Deus; e para a administra<;:ao
do reino de Deus. E repelem todas as pretensas tradi~6es e
inova<;:6es sacerdotais.

10. Qual o sentido em que os protestantes afirmam e os


romanistas negam a clareza das Escrituras?
Os protestantes nao afirmam que as doutrinas reveladas
nas Escrituras estejam ao nivel das faculdades humanas para
compreende-las. Confessam que muitas delas estao alem de
to do o entendimento. N em afirmam eles que se possa explicar
todas as partes das Escrituras com certeza e perspicuidade,

108
A Regrade Fee Pratica
porque muitas das profecias sao inteiramente enigmaticas,
enquanto nao explicadas pelos eventos a que se referem.
Afirmam, porem, que todo artigo essencial de fe e regra de
pratica e revelado claramente nelas, ou pode ser deduzido delas
com certeza. Tudo isso o cristao menos instruido pode aprender
nas Escrituras, sem dificuldade; por outro lado, e verdade
tambem que, com o progresso dos conhecimentos hist6ricos e
criticos, e por meio das controversias, a Igreja Crista esta
fazendo progresso constante na interpreta~ao exata das Escri-
turas e na compreensao, na sua integridade, do sistema nelas
ensinado.
Os protestantes afirmam e os romanistas negam que se
pode, sem perigo, conceder aos cristaos particulares e nao
instruidos, a licen~a de interpretar as Escrituras por si.

11. Como se pode provar a perspicuidade das Escrituras pelo


jato de serem uma lei e uma mensagem?
Ja virnos (pergunta 8) que as Escrituras ou sao completas
ou falsas, pelo designio nelas rnesmas professado. Provarnos
agora sua perspicuidade, pelo mesmo prindpio. Elas professam
ser: (1) uma lei que devernos obedecer; (2) uma revela~ao de
verdades que devernos crer, e afirma que em ambos estes aspec-
tos devemos recebe-la, sob pena de morte eterna. Supor-se,
pois, que nao e perspicua, tanto nos seus mandarnentos como
no seu ensino, eo mesrno que acusar a Deus de tratar-nos de
urn modo que e ao rnesmo tempo dissimulado e cruel.

12. Quais as passagens onde e afirmada a sua perspicuidade?


Sal. 18 (19):8, 9; Sal. 118 (119): 105, 130; 2 Cor. 3:14; 2
Ped. 1:18-21; Heb. 2: 2; 2 Tim. 3:15, 17.

13. Que outros argumentos ha para estabelecer este ponto?


1°. As Escrituras sao dirigidas irnediatarnente ou a todos
os homens indistintarnente, ou a todos os crentes tornados
como tais- Deut. 6:4-9; Luc, 1:3; Rom. 1:7; 1 Cor. 1:2; 2 Cor.

109
Capitulo 5
1: 1; e 4: 2; Gal. 1:2; Ef. 1 : 1; F il. 1: 1; Col. 1:2; Tia. 1: 1; 2 Ped.
1:1; 1 Joao 2:12, 14; Judas, vers.1; Apoc.1:3,4; 2:7. As (micas
excec;6es sao as Epistolas dirigidas a Tim6teo e Tito.
2°. Manda-se todos os cristaos, indistintamente, exami-
narem as Escrituras: 2 Tim. 3: 15,17; Atos 17:11; Joao 5:39.
3°. A experiencia universal. Temos provas tao claras do
poder das Escrituras de darem luz, como temos a respeito do
sol. Os argumentos contra isso sao urn insulto acompreensao
de todos os leitores da Biblia no mundo.
4°. A unidade essencial na fee pratica, apesar de algumas
diferenc;as circunstanciais em todas as comunidades cristas,
em todas as idades e nac;6es que aprendem sua religiao
diretamente nas Escrituras.

14. Qual foi a terceira qualidade mencionada como necessaria


para constituir as Escrituras em regra suficiente de je e pratica?
Que fossem acessiveis. Eevidente que esta e a caracteristica
proeminente das Escrituras, em contraste corn a tradic;ao, que
esta entregue a custodia de uma corporac;ao de sacerdotes, e
corn qualquer outra regra pretendida. 0 que cabe aIgreja fazer
a esse respeito e simplesmente dar a maior circulac;ao possivel
a Palavra de Deus.
15. Que e que se entende quando se diz que as Escrituras
sao o juiz e tambem a regra, em questoes de je?
"U rna regra e uma norma segundo a qual se deve julgar;
urn juiz e quem exp6e e aplica essa regra a decisao dos casas
particulares". A doutrina protestante e:
1°. Que as Escrituras sao a unica regra infalivel de fe e
pratica.
2°. (1) Negativamente: que nao ha corporac;ao alguma de
homens que sejam qualificados ou estejam autorizados a
interpretar as Escrituras, ou a aplicar os seus principios a
decisao das quest6es particulares,no sentido de serem suas decisoes
obrigat6rias para outros cristaos. (2) Positivamente: que as

110
A Regra de Fee Pratica
Escrituras sao a (mica voz infalivel na Igreja, e devem ser
interpretadas a sua propria luz e com o auxilio gracioso do
Espirito Santo, prometido a todos os cristaos (1 Joao 2:20,27)
pelos individuos, cada urn de per si, com a ajuda, mas nao sob
a autoridade dos outros cristaos, seus irmaos. Os credos e
confiss6es, quanto asua forma, sao obrigat6rios somente para
os que os professam voluntariamente; quanto a sua materia,
sao obrigat6rios somente ate onde afirmam aquilo que a
Bib1ia ensina, e porque a Biblia ensina assim.

16. Quale a doutrina cat6lico-romana quanta aautoridade da


igreja como interprete infalivel da regra de fe e juiz autorizado de
tadas as controversias?
A doutrina da igreja cat6lica romana e que a igreja e
absolutamente infa1ive1, em todas as materias de fe e pnitica
cristas; e a depositaria e interprete, divinamente autorizada,
da regra de fe. Seu oficio nao e a comunica~ao de novas
revela~6es da parte de Deus, mas a sua inspira~ao a torna
infalivel na dissemina~ao e interpreta~ao da revela~ao origi-
nal comunicada pelos ap6stolos.
Por isso a igreja determina, com autoridade divina: 1°. 0
que sejam Escrituras Sagradas. 2°. 0 que seja tradi~ao
verdadeira. 3°. Qual o sentido das Escrituras e da tradi~ao, e
qual a aplica~ao dessa regra perfeita a cada questao em par-
ticular de fe ou pratica.
Dessa autoridade se acham revestidos o papa, quando faz
ou diz qualquer coisa no seu carater oficial; e os bispos, como
corpora~ao, quando se acham reunidos em condlio ecumenico,
ou quando dao assentirnento geral a urn decreto do papa ou de
urn condlio- Decretos do Concilio de Trento, sefiiO 4,· Teologia de
Deus, N°. 80, 81, 84, 93, 94, 95, 96. Bellarmine, Lib.3, De Eccl.,
cap.14, e Lib. 2, De Concil., cap. 2.

17. Quais as argumentos que a igreja romana emprega no


intuito de estabelecer essa doutrina?

111
Capitulo 5
1°. As promessas de Cristo feitas, segundo dizem, aos
ap6stolos e seus sucessores oficiais, tornando-os infaliveis, e
suas decis6es e interpreta<;6es autorizadas- Mat. 16: 18;18: 18-
20; Luc. 24:48,49; Joao 16: 13;20:23.
2°. A comissao dada a igreja (romana) como mestra do
mundo- Mat. 28:19, 20; Luc. 10:16, etc.
3°. A igreja e declarada ser "coluna e firmamento da
verdade", e que "as portas do inferno nao prevalecerao contra
ela" - 1 Tim. 3: 15; Mat. 16:18.
4°. A igreia (romana) e dada o poder de ligar e desligar, e
a ordem de que aquele que nao a ouvir seja tido por "urn gentio
ou urn publicano"- Mat. 16: 19; 18:15-18.
5°. A igreja (romana) recebeu a ordem de discriminar
entre a verdade eo erro, e por isso deve ser qualificada e estar
autorizada a fazer isso -2 Tess.3:6; Rom.16: 17; 2 Joao, vers. 10.
6°. A necessidade. Os homens precisam e desejam urn
interprete e juiz infalivel, sempre vivo, visivel e contem-
poraneo.
7°. A analogia universal. Todas as comunidades entre os
homens tern juizes vivos, bern como a lei escrita, e esta seria
de pouco valor sem aqueles.
8°. Este poder e necessario para se conseguir unidade e
universalidade que todos reconhecem como atributos essenciais
da verdadeira igreja (a igreja cat6lica romana).

18. Quais as argumentos que demonstram nao terem funda-


mento algum essas pretensoes da igreja romana?
1°. Uma pretensao, revestindo homens mortais de urn
poder de tanto peso, pode ser estabelecida s6 pelas provas mais
claras e decisivas; e a falta de se apresentarem tais provas
converte a pretensao em trai<;ao contra Deus e contra a ra<;a
human a.
2°. As provas apresentadas nao estabelecem essas pretens6es
porque, das promessas que Cristo fez a lgreja de preserva-la
da extin<;ao e do erro, nenhuma se estende ate ao ponto de

112
A Regrade Fee Pratica

torna-la infalivel. 0 mais que prometeu foi que o verdadeiro


povo de Deus nunca desapareceria inteiramente da terra; nem
seria jamais abandonado, mesmo se apostatasse das coisas
essenciais da fe.
3°. As provas apresentadas nao estabelecem as suas pre-
tens6es, porque essas promessas nao foram feitas por Cristo
aos oficiais da Igreja como tais e, sim, ao corpo inteiro dos
verdadeiros crentes. Confira-se Joao 20:23 com Luc. 24:33,
47-49, e 1 Joao 2:20, 27.
4°. As provas apresentadas nao servem para estabelecer as
suas pretens6es porque a Igreja a qual foram e sao feitas as
promessas preciosas das Escrituras nao e uma sociedade externa
e visivel, a autoridade sobre a qual se ache entregue nas maos
de uma linha perpetua de ap6stolos. Isto porque- (1) a palavra
Igreja (ecclesia) e urn termo coletivo, e abrange todos OS
chamados eficazmente ou regenerados- Rom. 1:7; 8.28; 1Cor.
1:2; Jud. vers.1; 2 Tim. 1:9; Heb. 9:15; 1 Ped. 2:9; 5:10; Ef.
1: 18; 2 Ped. 1: 10. (2) Os atributos imputados aIgreja provam
que ela consta tao-somente do verdadeiro povo espiritual de
Deus- Ef. 5:27; 1 Ped. 2:5; Joao 10:27; Col. 1:18,24. (3) As
Epistolas foram dirigidas aIgreja, e nas suas saudas;6es temos
a explicas;ao de que a expressao "a igreja" e equiva1ente a "os
chamados", "os santos", "os que servem a Deus em espirito"-
como se ve nas saudas;6es em 1 e 2 Corintios; Efesios;
Colossenses; 1 e 2 Pedro; Judas. Tambem no corpo das
Epistolas os mesmos predicados sao atribuidos aos membros
da verdadeira lgreja- 1 Cor. 1:30; 3:16; 6:11,19; Ef. 2:3-8 e
19-22; 1Tess. 2: 13; Col. 1:21; 2: 10; 1 Ped. 2:9.
5°. Os ap6stolos inspirados nao tiveram sucessores. (1) No
Novo Testamento nao ha prova alguma de que OS tivessem. (2)
Proveu-se para a perpetuas;ao regular dos oficios de presbitero
e diacono (1 Tim. 3: 1-13), mas nada absolutamente se fez para
a perpetuas;ao do apostolado. (3) Nos escritos dos primeiros
seculos nada se encontra que diga respeito a existencia de
ap6stolos na Igreja. Tinham deixado de existir tanto o nome

113
CapituloS
como o oficio. (4) N enhum daqueles que se dizem sucessores
dos apostolos tern feito ver "os sinais do apostolado"- 2 Cor.
12: 12; 1 Cor. 9: 1; Gal. 1: 1,12; Atos 1:21,22.
6°. Esta reivindicac;:ao, quando baseada na autoridade do
papa, e totalmente antibiblica, pois as Escrituras nada sabem
sobre o papa. Devido ser baseada na autoridade do conjunto
total dos bispos, expressa no seu assentimento geral, e oposta
as Escrituras pelos motivos supra expostos, e e, alem disso,
impraticavel, porque seu juizo universal nunca foi e nunca
podera ser reunido e enunciado imparcialmente.
7°. Nao pode haver infalibilidade onde nao ha consistencia
propria. Mas, como questao de fato, a igreja papal nao tern
sido consistente consigo no seu ensino. (1) Tern ensinado
doutrinas diversas, em diversas partes e seculos. (2) Afirma a
infalibilidade das Escrituras e, ao mesmo tempo, ensina
doutrinas evidente e radicalmente irreconciliaveis com o
sentido claro das mesmas Escrituras, como por exemplo, as
doutrinas sobre o sacerdocio, a inissa, as penitencias, as boas
obras, o culto prestado a Maria e as imagens. Por isso e que a
igreja romana esconde as Escrituras do povo.
8°. Se o sistema religioso dos romanistas e verdadeiro, entao
e evidente que a religiao verdadeira e espiritual deve florescer
nos paises da sua comunhao e todo o resto do mundo ser urn
deserto moral. E notorio, porem, que os fatos sao exatamente
o inverso disso. Se, pois, admitimos que o sistema romano e
verdadeiro, subverteremos uma das principais provas do
proprio cristianismo, a saber, a luz auto-evidencial e a virtude
pratica da verdadeira religiao, e o testemunho do Espirito
Santo.

19. Quais os argumentos diretos pelos quais se pode estabelecer


a doutrina de que as Escrituras sao o supremo juiz nas controversias?
Que todos os cristaos devern estudar por si as Escrituras, e
que ern todas as quest6es quanto a vontade revelada de Deus
se deve apelar so a elas, fica provado pelos seguintes fatos:

114
A Regrade Fee Pratica
1°. As Escrituras sao perspicuas: veja acima as perguntas
11-13. 1
_•i

2°. As Escrituras sao dirigidas a todos os cristaos: veja


pergunta 13.
3°. As Escrituras ordenam a todos os cristaos examina-las,
julgar e provar por elas todas as doutrinas e todos os que
professam ser mestres dos outros- Joao 5:39; Atos 17: 11; Gal.
1:8; 2 Cor. 4:2; 1 Tess. 5:21; 1 Joao 4:1, 2.
4°. 0 Espirito Santo, autor e interprete das Escrituras, e
prometido a todos os cristaos. Confira-seJoao 20:23 com Luc.
24:47- 49; 1 Joao 2:20,27; Rom. 8:9; 1 Cor. 3:16,17.
5°. A religiao e essencialmente uma coisa pessoal. E
necessaria que todo cristao conhe9a e creia na verdade,
explicitamente para si, sobre o fundamento direto de suas
pr6prias provas morais e espirituais, e nao simplesmente sobre
o fundamento da autoridade de outros. A nao ser assim, a fe
nao poderia ser o que e, urn ato moral; nem poderia "purificar
o cora~ao". A fe deriva seu poder santificador da verdade que
ela apreende imediatamente em fun9ao das provas experi-
mentais que essa verdade, quando aceita, da de si mesma -
Joao 17:17,19; Tia. 1:18; 1 Ped. 1:22.

20. Qual a objefiiO apresentada contra esta doutrina, pelos


romanistas, sabre o fundamento de sera igreja (cat6lica) a nossa
unica autoridade para crermos que as Escrituras sao a Palavra de
Deus?
Sua obje~ao e que, desde que recebemos as Escrituras como
a Palavra de Deus s6 por confiarmos no testemunho autorizado
da igreja romana, nossa fe nas Escrituras nao e senao outra
forma de fe nessa igreja. E sendo a autoridade da igreja o
fundamento da autoridade das Escrituras, a igreja deve,
naturalmente, ser superior as Escrituras.
Isso e absurdo, e por dois motivos:
1°. 0 fato postulado e falso. 0 testemunho sobre 0 qual
aceitamos as Escrituras como a Palavra de Deus nao e a

115
Capitulo 5

autoridade da igreja (cat6lica romana), mas: (1) Deus falou


pelos ap6stolos e profetas, como e evidente (a) pela natureza
de sua doutrina, (b) pelos milagres que realizaram, (c) por suas
profecias, (d) por nossa experiencia pessoal e pela observa~ao
do poder da verdade. (2) Estas mesmas Escrituras que pos-
suimos foram escritas pelos ap6stolos, etc., como fica evidente
(a) por suas provas internas, (b) pelo testemunho hist6rico dado
por todas as testemunhas competentes e contemporaneas, na
igreja e fora dela.
2°. Mesmo se o fato postulado fosse verdadeiro, isto e, se
soubessemos s6 pelo testemunho autorizado da igreja, que as
Escrituras sao de Deus, seria absurda a conclusao que pre-
tendem tirar: porque a testemunha que prova a identidade ou
I
primogenitura de urn principe nao adquire, por esse motivo,
o direito de governar o reino, e nem mesmo ode interpretar a
vontade do principe.

21. Como se deve responder ao argumento a favor da


necessidade de um juiz visivel, e que os romanistas tiram da
diversidade de seitas e doutrinas entre os protestantes?
1°. Nao temos a pretensao de dizer que seja infalivel o
juizo particular dos protestantes, mas s6 que, quando com
espirito humilde e crente julgam as coisas divinas a luz das
Escrituras, chegam a ter urn conhecimento competente das
verdades essenciais.
2°. 0 termo protestante e simplesmente negativo, e sao
chamados assim muitos incredulos que protestam, tanto con-
tra as Escrituras como contra Roma. No entanto, entre os
protestantes biblicos existe, apesar de muitas diferen~as
circunstanciais, urn maravilhoso grau de acordo sobre as coisas
essenciais de fe e pratica, como atestam seus hinos e livros de
devo~ao.
3°. A diversidade que realmente existe entre eles tern sua
origem na falta de aplicarem, com fidelidade, os principios
protestantes pelos quais contendemos. Os homens nao tomam

116
A Regrade Fee Pratica
seu credo sirnplesrnente, e sern preconceitos da Biblia.
4°. A igreja cat6lica rornana, na sua exposi<;ao autorizada
feita pelo Condlio de Trento, provou ser juiz rnuito indefinido.
Suas decis6es doutrimirias precisarn de urn interprete infalivel,
infinitarnente rnais do que precisarn dele as Escrituras.

22. Como se pode mostrar que a teoria cat6lico-romana, bem


como a protestante, impi5e necessariamente ao povo a obrigafiiO de
decidir segundo o seujuizo particular?
Acaso existe urn Deus? Teria Ele Se revelado? Teria Ele
estabelecido uma Igreja? Seria essa lgreja mestra infalivel?
Seria verdade que o juizo particular e guia cego? Qual de todas
as pretendidas igrejas seria a verdadeira? Eevidente que codas
estas quest6es tern de ser decididas pelo juizo particular do
inquiridor antes de lhe ser possivel entregar, racional ou
irracionalmente, 0 seu juizo particular a dire~ao da igreja que
se blazona de ser infalivel e nao admite o direito de juizo par-
ticular. Assim os romanistas se veem obrigados a apelar para
as Escrituras para provar que elas nao podem ser entendidas,
e dirigem seus argumentos ao juizo particular dos homens
para provar que 0 juizo particular e incompetente para nos
dirigir com acerto. Seus argumentos baseiam-se, pois, naquilo
a respeito do qual querem provar, por meio de seus argumentos,
que nao tern base!

23. Como se pode provar que o povo e muito mais competente


para descobrir o que seja aquila que a Biblia ensina do que o epara
decidir, segundo os sinais em que insistem os romanistas, qual seja a
igreja verdadeira?
Os romanistas, obrigados pela necessidade, tern decidido
que ha certos sinais pelos quais se pode distinguir a verdadeira
igreja de todas as falsas. Sao (1) Unidade (sujeitando-se todos
a uma cabec;a visivel, o papa); (2) Santidade (3) Catolicidade
(4) Apostolicidade (envolvendo uma sucessao, ininterrupta,
de bispos canonicamente ordenados desde os ap6stolos) -

117
Capitulo 5

Catecismo do Concilio de Trento, Parte 1, Cap. 10. Ora, a


compreensao e aplicac;:ao inteligentes destes sinais envolve uma
soma imensa de instruc;:ao e capacidade inteligente da parte do
inquiridor. Ser-lhe-ia tao facil provar-se descendente de Noe
por uma serie, ininterrupta, de casamentos legftimos, como
lhe sera estabelecer que a igreja romana tern direito ao ultimo
dos sinais acima numerados. Ao mesmo tempo, ninguem pode
racionalmente ceder o seu direito de julgar por si o ensino da
Bfblia enquanto nao for claramente provado esse ponto.
As Escrituras, por certo, com seu poder espiritual dando
testemunho delas, nao exigem tanto do jufzo particular.

DOUTRINA CATOLICO-ROMANA QUANTO


A INTERPRETA<;Ao DAS ESCRITURAS,
A TRADI<;AO E A INFALIBILIDADE DO PAPA
1°. QUANTO A INTERPRETA(:AO DAS ESCRITURAS -
Decretos do Concilio de Trento, Sessao 4. Alern disso, o
mesmo sacrossanto Sfnodo ... determina e declara que:
esta mesma antiga e vulgata edi~ao, que pelo uso de tantos
seculos foi aprovada na igreja (cat6lica romana), nas li~6es
publicas, disputas, prega~6es e exposi~6es, seja dada por
autentica- e em forma que ninguem, com pretexto algum,
se atreva ou intente rejeita-la.
"Ademais, para refrear engenhos petulantes, determina
que: ninguem, confiado na sua prudencia em materia de
fe e costumes, e edifica~ao da doutrina crista, tor~a as
Sagradas Escrituras para os seus conceitos particulares,
contra aquele sentido que abra~ou, e abra~a a santa madre
igreja a quem pertence julgar o verdadeiro sentido e
interpreta~ao das Escrituras, nem se atreva a interpretar
as mesmas Escrituras contra o unanime consenso dos
padres; ainda que essas interpreta~6es nunca venham a
tona".
Decretos dogmaticos do Concilio Vaticano, cap. 2 - "E
havendo sido mal interpretadas, por alguns, as coisas que

118
A Regrade Fee Pratica

o santo Sinodo de Trento decretou, a bern das almas a


respeito da interpreta~ao das Escrituras Sagradas, com o
fim de refrear espiritos rebeldes, nos, renovando o dito
decreta, declaramos que este e o seu sentido: que, em
materias de fe e costumes, pertencendo a edifica~ao da
doutrina crista, deve-se ter aquila como verdadeiro sentido
das Santas Escrituras que nossa santa madre igreja abra~ou
e abra~a, a qual pertence julgar o verdadeiro sentido das
Santas Escrituras e, par isso, a ninguem e permitido
interpretar as Sagradas Escrituras de modo contnirio a
esse sentido, ou ao consenso unanime dos padres".
2°. QUANTO ATRADI<;Ao -Prof Fidei Tridentince (1564
d.C.) 2 e 3 - "Aceito e abra~o firmemente a tradi~ao
apostolica e eclesiastica, e todas as demais ordena~6es e
institui~6es da mesma igreja. Aceito, tambem, as Santas
Escrituras, segundo o sentido que abra~ou e abra~a a santa
madre igreja, a quem pertence julgar o verdadeiro sentido
e interpreta~ao das Escrituras; e nunca hei de toma-las
ou interpreta-las de urn modo que nao seja de acordo com
o consenso unanime dos padres."
Concilio de Trento. Sessao 4 - "E vendo que esta verdade
e disciplina se contem em livros escritos, e sem escritos
nas tradi~6es que recebidas pelos apostolos, da boca de
Cristo, ou ditadas pelo Espirito Santo aos mesmos
apostolos, como de mao em mao, chegaram ate nos".
3°. QUANTO A AUTORIDADE ABSOLUTA DO PAPA-
Decisoes dogmaticas do Concilio Vaticano, cap. 3 - "Par isso
ensinamos e declaramos que par ordena~ao do Senhor...
o poder de jurisdi~ao do pontifice romano e imediato, e
que a ele todos, de qualquer rita e dignidade que sejam,
tanto os pastores como os fieis, e tanto individual como
coletivamente, sao, par seu dever de subordina~ao
hierarquica e obediencia verdadeira, obrigados a sujeitar-
se, nao so nas materias que pertencem a fe e costumes,
mas tambem nas que pertencem a disciplina e governo da
igreja, em todo o mundo ... Alem disso, ensinamos e
declaramos mais que ele e o supremo juiz dos fieis, e que
em todas as causas cuja decisao pertence a igreja, pode-se

119
Capitulo 5

recorrer ao seu tribunal, e que ninguem pode reabrir a


decisao da se apost6lica, por nao haver autoridade supe-
rior a dela, nem pode alguem legalmen te passar em
revista a sua decisao. Por isso desviam-se do curso reto
OS que afirmam que e legal apelar das decis6es do pontffice
romano para urn condlio ecumenico, como para uma
autoridade superior a do pontffice romano".
4°.QUANTO AINFALIBILIDADE ABSOLUTA DO PAPA
COMO MESTRE DA IGREJA EM TODO 0 UNIVERSO -
Decretos dogmaticos do Concflio Vaticano, cap. 4 - "Aderindo,
pois, fielmente a tradi<;;ao recebida do principia da fe crista
para a gloria de Deus nosso Salvador, a exalta<;;ao da
religiao cat6lico-romana e a salva<;;ao do povo cristao,
aprovando o sacrossanto condlio, ensinamos e definimos
que e uma doutrina revelada divinamente: que 0 pontffice
romano quando fala ex-cathedra, isto e, quando em
cumprimento do offcio de pastor e doutor de todos os
cristaos, em virtude de sua autoridade apost6lica, define
a
uma doutrina que diz respeito fe ou costumes, e que a
igreja universalmente deve crer, pelo auxflio divino que
lhe e prometido em Pedro bem-aventurado, ele e revestido
da infalibilidade com a qual o divino Salvador queria que
fosse revestida Sua lgreja, com o fim de definir doutrinas
que digam respeito a fe e costumes; e que por isso tais
defini<;;6es do pontffice romano sao irreformaveis em si
mesmas, e nao pelo consenso da igreja. Mas se alguem
presumir - o que Deus nao permita - a contradizer esta
nossa defini<;;ao, seja anatema".
0 Cardeal Manning, no seu livro T!atican Council, diz
que nesta defini<;;ao ha seis pontos a serem notados:
"1 °. Define o significado da frase bern conhecida loquens
ex-cathedra, isto e, falando do assento ou lugar, ou com a
autori-dade do mestre supremo de todos os cristaos e
obrigando o assentimento da igreja em todo o universo.
"2°. A materia de que trata o ensino infalfvel, a saber,
a doutrina de fe e costumes.
"3°. A causa eficiente da infalibilidade, isto e, o auxflio
divino prometido a Pedro, e nele, a seus sucessores.

120
A Regra de Fee Pratica

"4°. 0 ato a que e ligado esse auxilio divino, que e o de


definir doutrinas que digam respeito a fe e costumes.
"5°. A limita~ao desta autoridade infalivel ao oficio
doutrinal da igreja.
"6°. 0 valor dogmatico das decisoes ex-cathedra, a sa-
ber, que sao em si mesmas irreformaveis por serem, em si
mesmas, infalivel e nao porque a igreja, ou uma parte ou
urn membro dela, lhes de o seu assentimento".
Decretos dogmaticos do Concflio Vaticano, cap. 4- "Porque
o Espfrito Santo nao foi prometido aos sucessores de
Pedro a fim de que, por Sua revela~ao, anunciassem
doutrinas novas; e sim, para que por Seu auxilio, pudessem
guardar inviolavelmente e explicar fielmente, a revela~ao
ou deposito de fe transmitida por meio dos ap6stolos" .

..
.'

·'',_ ;_.' :. -. ; ;

121
6

Compara~ao de Sistemas

Neste capitulo sera apresentado urn breve esbo<;:o das


principais posi<;:6es contrastadas dos tres sistemas rivais do
pelagianismo, semipelagianismo e agostinianismo, ou, como
sao chamados em suas formas mais completamente desenvol-
vidas - socinianismo, arminianismo e calvinismo; e tambem
urn esbo<;:o da hist6ria da sua origem e dissemina<;:ao.

1. Qual foi, em geral, o estado das opinioes teol6gicas nos


primeiros tres seculos?
Durante OS tres primeiros seculos que decorreram depois
da morte do ap6stolo Joao, OS animos especulativos da Igreja
ocupavam-se principalmente em defender a verdade do
cristianismo contra os incredulos - combater as heresias
gn6sticas geradas pelo fermento da filosofia oriental - e em
determinar definitivamente as quest6es que se desenvolveram
nas controversias a respeito das Pessoas da Trindade.
Nao parece que se fizessem, nesses seculos, exposi<;:6es
definidas e consequentes a respeito da natureza, da origem e
das consequencias do pecado no homem; nem quanto a
natureza e aos efeitos da gra<;:a divina; nem quanto anatureza
da obra redentora de Cristo, ou o metod6 da sua aplica<;:ao pelo
Espirito Santo ou da sua apropria<;:ao pela fe. Como fato geral,
pode-se dizer que, em consequencia da grande influencia de
Origenes, os chamados Pais da Igreja Grega, quase todos,
adotaram uma especie de semipelagianismo, negando a culpa

122
Comparafiio de Sistemas
do pecado original e sustentando que o pecador tern o poder
de predispor-se e cooperar com a gra~a divina. E este, ainda
hoje, eo carater da antropologia grega. Os mesmos atributos
caracterizaram, tambem, as especula~6es dos mais antigos
escritores da Igreja Ocidental; mas, durante os seculos 3 e 4,
manifestou-se, entre os Pais latinos, uma tendencia notavel
para adotarem as opini6es mais corretas, que foram depois
vindicadas, tao assinaladamente, pelo grande Agostinho. Essa
tendencia pode ser notada, mais claramente, nas obras de
Tertuliano de Cartago, que morreu cerca do ano de 220, e de
Hilario de Poitiers Ct 368) e Ambrosio de Milao Ct 397).

2. Por que meios tem a lgreja feito progresso na clara


discriminafiiO da verdade divina? E quais os seculos, e quais os ramos
da lgreja em que as grandes doutrinas da Trindade, da Pessoa de
Cristo, do pecado e da grafa, da redenfiiO e sua aplicafiio, foram
definidas?
A lgreja tern sempre feito progresso, no sentido de adquirir
mais claras concep~6es e mais exatas defini~6es da verdade
divina, por meio de controversias ativas. E aprouve a
Providencia que as diversas grandes se~6es do sistema revelado
nas Escrituras inspiradas fossem discutidas, mais completa e
mais claramente definidas, ern seculos diversos e no seio de
na~6es diversas tambem.
Assim, as quest6es profundas envolvidas nas se~6es da
teologia propria, e da cristologia, foram investigadas, princi-
palmente, por homens de origem grega, e foram definidas
autorizadamente em sfnodos, reunidos na metade oriental da
lgreja geral, durante o seculo 4 e os que se seguiram imediata-
mente. Quanto ateologia, a divindade consubstancial de Cristo
foi definida no Condlio de Niceia, em 325, e a personalidade
e deidade do Espfrito Santo, no Condlio de Constantinopla,
em 381, acrescentando os latinos a clausulaFilioque, no Concilio
de Toledo, em 589. Quanto acristologia- 0 Concilio de Efeso
afirmou, em 431, a unidade pessoal do Teantropos. 0 Concilio

123
Capitulo 6
de Calcedonia afirrnou, ern 451, que as duas naturezas ern
Cristo sao distintas. 0 sexto Concilio de Constantinopla, ern
680, afirrnou que o Senhor possuiu urna vontade hurnana,
como tarnbern urna vontade divina. Estas decis6es tern sido
aceitas pela Igreja inteira, grega e rornana, luterana e reformada.
As quest6es a respeito do pecado e da gra~a, incluidos no
titulo geral de antropologia, forarn rnais cornpletarnente
investigadas, ern prirneiro Iugar, por hornens de origem latina
que chegararn prirneiro a conclus6es definidas na controversia
de Agostinho corn Pelagio, ern rneados do seculo 5.
As quest6es sobre a reden~ao, eo rnetodo da sua aplica~ao,
abrangidas sob a grande divisao da soteriologia~ nao forarn
investigadas cornpletarnente ate o tempo da Reforma, e depois
pelos grandes te6logos da Alernanha e da Sui~a.
Muitas quest6es pertencentes agrande divisao de eclesio-
logia, ainda hoje esperarn sua solu~ao cornpleta no futuro.

3. Quais sao os tres grandes sistemas de teologia que tem sempre


subsistido na Igreja?
Abrangendo a revela~ao dada nas Escrituras- urn sistema
cornpleto de verdades - cada se~ao separada nao pode deixar
de sustentar muitas rela~6es 6bvias, algumas 16gicas outras nao,
com todas as outras se~6es, como as diversas partes de urn
grande todo. 0 desenvolvimento irnperfeito e a concep~ao
defeituosa ou exagerada de urna doutrina qualquer intro-
duzirao, inevitavelmente, a confusao eo erro no sistema inteiro.
Por exemplo: opini6es pelagianas sobre o estado natural do
homern tendem sernpre a dar em resultado opini6es socinianas
sobre a Pessoa e a obra de Cristo. E opini6es sernipelagianas
sobre o pecado e a gra~a sao atraidas irresistivelmente e, por
sua vez, atraern opini6es arminianas sobre os atributos divinos,
a natureza da expia~ao e a obra do Espirito.
Ha, com efeito, como poderiamos ja prever, sodois sistemas
cornpletos e autoconseqtientes de teologia crista possiveis ..
1°. Ha, de urn lado, o agostinianismo, cornpletado no

124
Comparafiio de Sistemas
calvinismo. 2°. De outro lado ha o pelagianismo, completado
no socinianismo. E 3°, o arminianismo, que esta entre os dois,
e e urn sistema de compromissos, o semipelagianismo
desenvolvido.
No uso comum, o termo socinianismo e empregado para
designar esses elementos do falso sistema que dizem respeito
a Trindade e a Pessoa de Cristo. Os termos pelagianismo e
semipelagianismo sao aplicados aos desvios mais extremistas
ou mais moderados feitos das verdades de que trata a Antro-
pologia, e 0 termo arminianismo e empregado para designar OS
erros menos extremistas que neste sistema sao ensinados na
se~ao desoteriologia.

4. Quando, onde e por quem foram primeiro discriminados


claramente os principios fundamentais das duas grandes escolas
antagonistas de teologia?
As posi~6es contrastadas dos sistemas agostiniano e
pelagiano foram primeiro desenvolvidas e definidas por meio
de controversias mantidas pelos homens eminentes cujos
nomes trazem- Agostinho e Pelagio- durante a primeira ter~a
parte do seculo 50
Agostinho foi bispo de Hipona, Africa setentrional, de 395
a 430. Pelagio, cujo sobrenome foi Morgan, era urn monge
britanico. Foi ajudado nas suas controversias por seus disci-
pulos Celestio e Juliano, de Eclano, ltalia.
As posi~6es mantidas por Pelagio foram condenadas
geralmente pelos representantes da Igreja inteira desde aquele
tempo ate agora, e todas as denomina~6es (com exce~ao dos
socinianos professos) as tern reputado como heresias fatais.
Foram condenadas pelos dois condlios reunidos em Cartago,
em 407 e 416; pelo Concflio de Milevo, na Numidia, em 416;
pelos papas Inocencio e Z6simo, e pelo concilio ecumenico de
Efeso, em 431. Este repudio apressado e universal do
pelagianismo prova que, embora fossem muito imperfeitas as
ideias dos primeiros pais sobre essa classe de quest6es, o sistema

125
Capitulo 6
ensinado por Agostinho devia ser, quanto as coisas essen-
ciais, o mesmo que a fe da Igreja, em sua substancia, desde o
prindpio da era crista.

5. Como se pode expor, em contraste, as principais doutrinas


distintivas dos sistemas agostiniano e pelagiano?
"1 a. Quanto ao pecado original:*
Agostinianismo - Pelo pecado de Adao, em quem pecaram
todos os homens juntos, vieram para o mundo o pecado e todos
os demais castigos merecidos do pecado de Adao. Por ele ficou
corrompida a natureza humana, tanto fisica como moralmente.
Todo homem traz consigo para o mundo uma natureza ja tao
corrupta que nada pode fazer senao pecar. A propaga<;:ao desta
qualidade da sua natureza e pela concupiscencia. 1
"Pelagianismo - Por sua transgressao, Adao s6 fez mal a si
e nao a sua posteridade. Quanto ao que diz respeito a sua
natureza moral, todo o homem nasce na mesma condi<;:ao em
que foi criado Adao. Nao ha, pois, pecado original.
"2a. Quanto ao livre-arbitrio:
''Agostinianismo- Pelo pecado de Adao, a vontade humana
perdeu inteiramente a sua liberdade. Em seu atual estado
corrompido, o homem s6 pode querer e fazer o mal.
"Pelagianismo- A vontade do homem e livre. Todo homem
tern o poder de querer e fazer o bern, como tam bern o mal. Por
isso depende s6 de si, se for born ou mau.
"3a. Quanto agra<;:a:
''Agostinianismo- Se, porem, o homem, no seu estado atual,
quer e faz o bern, e s6 devido a obra da gra<;:a divina. Esta e
uma obra interna, secreta e maravilhosa, operada por Deus no
homem. E uma obra que precede e tambem acompanha. Pela
gra<;:a precedente o homem alcan<;:a a fe, e mediante esta chega
aver o que e born e recebe o poder de querer o bern. Para fazer

* Historical Presentation of Augustinianism and Pelagianism (Exposi<;ao


Hist6rica de Agostinianismo e Pelagianismo) por Dr. G. F. Wiggers.

126
ComparafaO de Sistemas
qualquer boa obra, precisa da gra<;a cooperante. Como o
homem nao pode fazer nada sem a gra<;a, assim tambem nada
pode fazer contra ela. Eirresistivel. E como o homem nao tern,
por natureza, merecimento algum, Deus, dando a Sua gra<;a a
qualquer homem, nao 0 faz em aten<;ao a disposi<;ao moral
desse hom em, mas opera segundo a Sua propria livre vontade.
"Pelagianismo - Ainda que seja verdade que o homern,
por sua livre vontade que e urn dorn de Deus, tern capacidade
para querer e fazer o bern, sern o auxilio especial de Deus,
contudo para que o possa fazermaisfacilmente, Deus revelou a
lei, deu-lhe o ensino e exernplo de Cristo para o ajudar, e
concedeu-lhe ate rnesrno as opera<;6es sobrenaturais da gra<;a.
Esta, no seu sentido rnais lirnitado (influencia graciosa) e
concedida s6 aqueles que, ernpregando fielrnente suas pr6prias
for<;as, rnerecern que o seja. Mas o hornern pode resistir-lhe.
"4a. Quanto apredestina~ao e areden~ao:
'Ylgostinianismo - Desde toda a eternidade, Deus fez urn
decreto livre e incondicional de salvar alguns de toda a
hurnanidade que estava corrupta e sujeita a condena~ao.
Aqueles que predestinou para essa salva<;ao da os rneios
necessarios para conseguirern esse firn. Sobre os outros, porern,
que nao pertencern ao pequeno nurnero* dos eleitos, cai a
rnerecida ruina. Cristo veio ao mundo e morreu somente a
favor dos eleitos.
"Pelagianismo- 0 decreto divino de elei~ao e reprova~ao e
fundado na presciencia de Deus. Aqueles, a quem Deus previu
que guardariarn os mandamentos, predestinou para a salva~ao;
os outros, para a condena<;ao. A reden<;ao de Cristo e geral,
mas s6 aqueles que realmente pecaram precisarn da Sua
morte expiat6ria. Todos, porem, podern ser levados a urna
perfei<;ao e virtude superior, por meio do ensino e exemplo de
Cristo."

*A doutrina de Agostinho nao nos permi te concluir, de forma alguma,


que OS eleitos sao "poucos" OU em "pequeno numero".

127
Capitulo 6
6. Qual foi a origem do sistema mediano ou semipelagiano?
Enquan to a controversia pelagiana estava no seu auge, Joao
Casiano, de descendencia siria, e educado na lgreja Oriental,
tendo ido para Marselha, Fran~a, com o fim de promover os
interesses do monasticismo nessa regiao, come~ou a dar
publicidade a urn sistema de doutrinas que ocupava posi~ao
media entre OS sistemas de Agostinho e Pelagio. Esse sistema,
a cujos advogados se deu o nome de massilianos, devido a
origem do seu chefe, chamados depois semipelagianos pelos
escolasticos, e, nos seus prindpios essenciais, o mesmo que
agora se chama arminianismo, uma exposi~ao do qual
falaremos numa parte subseqiiente deste capitulo. Fausto, bispo
de Riez, Fran~a, de 427 a 480, foi urn dos defensores mais
distintos e dos propagadores mais bern sucedidos dessa l
doutrina, a qual foi aceita permanentemente pela Igreja Ori- ~
ental, e por algum tempo, disseminada largamente tambem 1
na lgreja Ocidental, ate ser condenada pelos sinodos de
Orange e Valence, em 529.

7. Qual a relafiio do agostinianismo com o calvinismo, e do


semipelagianismo como arminianismo?
Depois desse tempo, o agostinianismo tornou-se a
ortodoxia reconhecida da lgreja Ocidental, e o nome de
nenhum outro homem, nao inspirado, exerce influencia tao
universal, tanto entre os papistas como entre os protestantes,
como Agostinho. Sese deve usar de algum nome humano como
designa~ao de urn sistema de verdades, divinamente reveladas,
o termo agostinianismo como oposto ao pelagianismo designa,
com propriedade, todos aqueles elementos de fe que o mundo
inteiro de cristaos evangelicos man tern em com urn. Por outro
lado, agostinianismo como oposto a semipelagianismo designa,
com propriedade, o sistema comumente chamado calvinismo
- enquanto cassianismo seria, propriamente, a designa~ao
hist6rica do sistema mediano ou semipelagiano, comumente
chamado agora arminianismo.

128
Comparafiio de Sistemas
8. Como se achavam divididos os partidos, entre os escolasticos,
com respeito a esses grandes sistemas, e como se acham divididos
na moderna igreja papal?
Depois de decorrida a idade das trevas, durante a qual
permanecera entorpecida toda a especula9ao ativa, o grande
Tomas de Aquino, italiano por nascimento, 1124 d.C., monge
da ordem dominicana, "Doctor Angelicus", advogou com
habilidade consumada o sistema agostiniano, do modo
inc6modo e artificial que caracterizava os escolasticos. Joao
Duns Scotus, ingles por nascimento, 1265 d.C., monge da
ordem franciscana, "Doctor Subtilis", foi, naquele seculo, o
defensor mais habil do sistema que se chamava entao semi-
pelagiano. As controversias ressuscitadas assim continuaram
por muitos seculos, sustentando os dominicanos e tomistas,
em geral, a elei9ao incondicional e a graqa eficaz; e os francis-
canos e scotistas, em geral, a eleiqao condicional e o poder
inalienavel da vontade humana de cooperar com a graqa divina
ou resistir-lhe. As mesmas disputas, sob diversos nomes
partidarios, continuam ainda a agitar a igreja romana desde a
Reforma, se bern que o genio de seu sistema ritual e a
predominancia dos jesuitas nos seus condlios tenham feito
prevalecer, em quase toda essa igreja, o semipelagianismo.
0 Condlio Ecumenico de Trento, cujas sess6es comeqa-
ram em 1546 d.C., procurou formular urn credo indefinido
que satisfizesse aos adeptos de ambos os sistemas. A conse-
qi.iencia foi que tanto os dominicanos como os franciscanos
disseram que suas opini6es haviam sido sancionadas por aquele
concilio. A verdade e que, enquanto as exposiq6es gerais e
indefinidas de doutrina que se encontram nos seus canones
sao, muitas vezes, agostinianas na forma, as explicaq6es mais
detalhadas e exatas que se lhes seguem sao uniformemente
semipelagianas.
A ordem dos jesuitas, fundada em 1541 d.C. por Inacio
de Loyola, tem-se identificado sempre com a teologia semi-
pelagiana. Luiz Molina, jesuita espanhol, 1588 d.C., in-

129
Capitulo 6

ventor da distin<;:ao denominada scientia media, alcan<;:ou tanta


fama na defesa do semipelagianismo que os adeptos deste,
na igreja papal, tern sido chamados molinistas. Em 1638 d.C.
faleceu Jansenio, bispo de I pres, nos Paises Baixos, deixando
sua grande obraAugustinus, na qual desenvolveu claramente e
estabeleceu, por extratos numerosos, o verdadeiro sistema de
Agostinho. Esta obra ocasionou controversias muito dila-
tadas, foi atacada ferozmente pelos jesuftas, e condenada pelas
bulas de Inocencio X e Alexandre VII, em 1653 e 1656 d.C.-
seguidas, em 1713 d.C., pela bula celebre unigenitus, de
Clemente XI, condenando o Comennirio do Novo Testamento,
por Quesnel.
Os agostinianos, na igreja romana, foram subsequente-
mente chamados jansenistas, e tinham sua sede principal na
Rolanda e na Belgica, como tambem em Porto Royal, perto
de Paris. Tern havido, entre eles, homens muito ilustres como
Tillemont, Arnaulos, Nicole, Pascal e Quesnel. As contro-
versias entre os dominicanos e os molinistas, os jansenitas e os
jesuitas tern continuado ate o nosso tempo, se bern que agora o
semipelagianismo junto com o jesuitismo, que triunfou
definitivamente no Concilio Vaticano, em 1870 d.C., reina
quase universalmente na igreja cat6lica romana.

9. Qual a posic;iio da lgreja Luterana com relac;iio a esses


grandes sistemas?
Lutero, monge da ordem agostiniana e discipulo fervoroso
de Agostinho, ensinou urn sistema de fe que concorda, no
espiri to e em todos os pon tos essenciais, com o espiri to
desenvolvido depois mais sistematicamente por Calvino. 0
unico ponto importante em que diferiu do consenso comum
das igrejas calvinistas, era o que diz respeito apresen<;:a literal
e fisica da Pes so a de Cristo em, come sob os elementos da euca-
ristia. Com essas opini6es de Lutero parece que Melanchthon
concordava, quando publicou a primeira edi<;:ao dos seus
Loci communes. Posteriormente, porem, modificaram-se

130
ComparafiiO de Sistemas
gradualmente suas opini6es sobre a liberdade do homem e a
soberania da gra~a divina. Depois da morte de Lutero, na
conferencia de Leipzig, em 1548, declarou, explicitamente,
que concordava com os sinergistas que afirmam que, no ato
regenerador, a vontade humana coopera com a gra~a divina.
Por outro lado, as opini6es de Melanchthon quanto a rela~ao
do sinal significado nos sacramentos (ou seja, as ordenanc;as)
com a gra~a, estavam muito mais em conformidade com as
que mantinham os discipulos de Zwinglio e Calvino do que
com as que ensinava sua propria igreja. Sua posi~ao, em rela~ao
a esses dois pontos, ofendeu muito os "velhos luteranos", e
ocasionou controversias prolongadas e amargas. Afinal pre-
valeceu sobre seus antagonistas o partido "velho" ou dos
luteranos estritos, e fez-se de suas opini6es uma completa
exposic;ao cientifica na Formula Concordiae, publicada em
1580 d.C. Ainda que este documento notavel nao chegasse a
ocupar posic;ao igual a que ocupa a Confissao de Augsburgo
c sua Apologia, que sao a confissao reconhecida universal-
men te das igrejas luteranas, pode, com justi~a, ser considerada
como a melhor testemunha ao nosso alcance a respeito daquilo
que realmente e a teologia estritamente luterana, quando
desenvolvida num sistema completo.
As caracteristicas da teologia luterana quando contrastadas
com as das igrejas reformadas podem ser expostas sob os
seguintes pontos:
1°. Quanto a teo}ogia propria e a cristologia, OS (micos
pontos em que diferem do calvinismo sao os dois seguintes:
(1) Quanto aos atributos divinos ligados a preordena~ao
soberana, eles mantem que ate onde esta diz respeito as ac;6es
dos agentes morais, e limitada as ac;6es que sao boas moral-
mente, e que nao tem relac;ao determinante com as que sao
mas. Deus preve todos os eventos, sejam quais forem; Ele
prcordena todas as ac;6es dos agentes necessarios, e as boas
tu.;6cs dos agentes livres- mas nada mais.
(2 ) Quanto a cristologia, mantem que, em virtude da
~1')8qL,~(,_:nu;.:\ AUBREY CLARK
131
Capitulo 6
uniao hipostatica, o elemento humano da Pessoa de Cristo tern
parte com o divino em pelo menos alguns dos seus atributos.
Assim, Sua alma humana tern parte na onisciencia e onipo-
tencia da Sua deidade, e Seu corpo, na sua onipresen~a, e jun-
tos tern o poder de dar vida ao verdadeiro crente que recebe a
ordenan~a.
2°. Quanto a antropologia, suas opini6es sao identicas as
dos mais estrenuos proponentes da teologia reformada, como,
por exemplo, a imputa~ao antecedente e imediata do primeiro
pecado de Adao; a total deprava~ao moral de todos os seus
descendentes, por natureza e desde o nascimento; e sua inca-
pacidade absoluta de, por suas pr6prias for~as, fazerem, como
devem fazer, coisa alguma das que pertencem a sua rela~ao
com Deus.
3°. Quanto aos grandes elementos centrais da soteriologia,
concordam com muita exatidao com os reformados quanto a
natureza e a necessidade da obra expiat6ria de Cristo; quanto
a justifica~ao forense, mediante·a imputa~ao ao crente tanto
da obediencia ativa como da passiva de Cristo; quanto a
natureza e ao oficio da fe justificadora; quanto a a~ao somente
da gra~a divina na regenera~ao do pecador, com a qual gra~a a
alma, morta por seus delitos, nao pode,em principia, cooperar;
quanto a elei~ao eterna e soberana que Deus faz dos crentes
em Cristo, nao por causa de qualquer coisa neles, e sim em
virtude de Sua vontade graciosa e, por conseguinte, quanto ao
fato de dever-se atribuir a salva~ao de toda alma realmente
salva s6 e unicamente a gra~a de Deus, e de modo algum a
vontade cooperante do homem, ou ao seu merecimento.
Ao mesmo tempo ensinam, com 6bvia inconsequencia
16gica, que, na divina inten~ao, a gra~a do evangelho e
absolutamente universal- que Cristo morreu igualmente, e
no mesmo sentido, por todos os homens; da gra~a a todos
igualmente. Os que se perdem, perdem-se porque resistem a
gra~a. Os que sao salvos, devem sua salva~ao unicamente a
gra~a, a mesma que tern em comum com os perdidos - a

132
ComparafiiO de Sistemas

mesmissima gra~a - nao em grau maior de gra~a ou em grau


menor de pecado - nem ao born uso que fazem da gra~a
I
recebida, e sim, simplesmente apropria gra~a. Segundo eles,
Deus elege soberanamente todos os que sao salvos, mas nao
I passa soberanamente por alto nos que se perdem. Da a mesma
gra~a a todos, e os destinos sao diversos porque os que se perdem
persistem em resistir a essa gra~a.
A distin~ao mais importante do luteranismo diz respeito
a doutrina sobre a eucaristia. Eles mantem a presen~a real e
fisica do Senhor na Ceia do Senhor - em, com, e sob os
elementos - e que a gra~a significada e comunicada pelas
ordenan~as e necessaria a salva~ao, e nao e comunicada
ordinariamente por nenhum outro meio. Por isso a teologia e
vida eclesiastica dos luteranos estritos concentram-se nos
sacramentos. Diferem do partido altamente sacramental da
lgreja Episcopal, em rejeitarem o dogma da sucessao apost6lica
cas tradi~6es da lgreja Primitiva.

10. Em quantos grandes partidos tem estado dividido sempre o


mundo protestante, e quais sao?
Todo o mundo protestante, desde os tempos da Reforma
ate agora, tern estado dividido em duas grandes familias de
lgreja, classificadas respectivamente como LUTERANAS, ou as
que tomaram o seu carater de Lutero e Melanchthon; e
REFORMADAS, ou as que receberam a impressao caracteristica
de Calvino. A familia LUTERANA de igrejas compreende todos
aqueles protestantes da Alemanha, Hungria, e das provincias
lnilticas da Russia, que aderem a Confissiio de Augsburgo,
juntamente com as igrejas nacionais da Dinamarca, Noruega
e Suecia, e a grande denomina~ao desse nome na America do
Norte. 0 numero de seus adeptos e estimado em vinte cinco
milh6es* de luteranos autenticos, enquanto que a lgreja
Evangelica da Prussia, formada por uma uniao politica dos

• Mcados do seculo XIX.

133
Capitulo 6
adeptos das duas confiss6es, abrange, provavelmente, mais
onze milh6es e meio. Seus livros simb6licos sao a Confissao de
Augsburgo e sua Apologia, os artigos de Esmalcalda, os Cate-
cismos, grandee pequeno, de Lutero e, recebida pelo partido
estrito deles, a Formula Concordiae. As igrejas CALVINISTAS
ou REFORMADAS abrangem, segundo o uso restrito do termo,
todas as igrejas protestantes que derivam sua teologia, de
Genebra; e entre elas, por causa de 6bvias condi~6es
modificadoras, as igrejas episcopais da lnglaterra, Irlanda e
America do Norte formam uma subdivisao separada; e os
metodistas wesleyanos, que sao comumente classificados com
os reformados por terem--se desenvolvido historicamente
daquele ramo, acham-se afastados mais ainda do que a lgreja
da lnglaterra, do tipo normal da classe geral. Num sentido
geral, porem, esta classe compreende todas aquelas igrejas da
Alemanha que aceitam o Catecismo de Heidelberg; as igrejas
protestantes da Sui~a, Fran<;:a, Rolanda; as igrejas nacionais
da lnglaterra e Esc6cia; as independentes e batistas da
lnglaterra e America do Norte; e os diversos ramos da lgreja
Presbiteriana da lnglaterra, Irlanda e America. Compreendem
cerca de oito milh6es de reformados alemaes; dois milh6es da
lgreja Reformada da Hungria; doze milh6es e meio de
episcopais; seis milh6es de presbiterianos; tres e meio milh6es
de metodistas; quatro e meio milh6es de batistas, e urn milhao
e meio de independentes - ao todo, cerca de trinta e oito
milh6es.
As confiss6es principais da lgreja Reformada sao as
Confiss6es Galicana, Belga; Segunda Helvetica e a Escocesa;
o Catecismo de Heidelberg; os trinta e nove Artigos da lgreja
da lnglaterra; os Canones do Sfnodo de Dort, e a Confissao e
Catecismos da Assembleia de Westminster.

11. Qual foi a origem da heresia unitaria?


Na lgreja Primitiva, os ebionitas, seita judia-gn6stica-crista,
foram OS unicos representantes daqueles que, nos tempos

134
Comparafiio de Sistemas
modernos, tern o nome de socinianos. Urn partido entre eles
chamava-seelkasitas. Suas ideias, com modifica~oes especiais,
acham-se expressas nasHomilias Clementinas, escritas cerca do
anode 150 d.C., na Siriaoriental. Os humanistas mais distintos
da lgreja Primitiva foram os dois Teodotos de Roma, ambos
leigos- Art em on (t 180), e Paulo de Samosata, bispo de An tio-
quia (260-270), deposto por urn concilio reunido em 269 d.C.
A maioria desses admitia o nascimento sobrenatural de Cristo,
mas afirmava que era meramente homem, honrado com uma
especial influencia divina. Eles admitiam uma apoteose ou
deifica~ao relativa de Cristo, subseqiiente a Sua vida e obra
neste mundo. .;, ,.,, u .· '"')
Cerinto, que viveu durante a ultima parte do primeiro
seculo e a primeira parte do segundo, sustentava que Jesus foi
mero homem, nascido de Maria e Jose, e que o Cristo ou Logos
desceu sobre Ele, na forma de uma pomba, no Seu batismo, e
que foi, entao, elevado adignidade de Filho de Deus, operou
milagres, etc. 0 Logos deixou o homem Jesus na crucificaqao
dEle. Negou, tambem, a ressurreiqao de Jesus.
A esses sucederam osarianos, no quarto seculo. Durante a
!dade Media, nao ficou nenhum partido, na Igreja, que negasse
abertamente a divindade suprema de Jesus. Nos tempos
modernos reviveu o unitarismo, no periodo da Reforma, por
meio dos trabalhos de Lelio Socino, da Inilia. Foi, por este,
levado para a Suiqa, e ali existiu como doutrina professada
por alguns hereges conspicuos, de 1525 a 1560 d.C. Os seus
professores mais proeminentes foram os Socino (Lelio e
Fausto), Serveto e Ochino. Existia como igreja organizada em
Rocow, Polonia, on de os hereges exilados acharam refugio, de
1539 a 1658, quando os socinianos foram expulsos da Polonia
pclos jesuitas e, passando para a Rolanda, ficaram absorvidos
pclas igrejas "remonstrantes" ou arminianas. Em 1609
Schmetz, com os materiais tirados do ensino de Fausto Socino,
sobrinho de Lelio e do de J. Crellio, compos o Catecismo
Racoviano, que ea obra normal do socianismo (veja a tradu~ao

135
Capitulo 6
de Rees, 1818). Depois da sua dispersao, Andre Wissowatis e
outros reuniram as obras mais importantes dos seus te6logos
mais ilustres sob o titulo deBibliotheca Fratrum Polonorum. Esses
escritores desenvolveram o socianismo com habilidade
consumada, deram-lhe uma forma perfeita e reduziram-no a
urn sistema 16gico. E puramente unitario na sua teologia,
humanista na sua cristologia,pelagiano na sua antropologia; e
sua soteriologia foi desenvolvida em perfeita coerencia 16gica
e etica com esses elementos. Uma exposi<;ao de suas posi<;6es
caracteristicas encontra-se abaixo.
Tornou a aparecer, com doutrina sustentada por alguns
homens isolados, na Inglaterra, no seculo 17. Durante o seculo
18, certo numero de igrejas presbiterianas da Inglaterra
decairam para o socianismo; enos fins do mesmo seculo, urn
numero maior de igrejas congregacionais, no leste do estado
de Massachussetts, seguiram o seu exemplo. E essas juntas
constituem a base da denomina<;ao unitaria moderna.
"Sua ultima forma e uma ·modifica<;ao do socianismo
antigo, devido apres sao da religiao evangelica de uma parte, e
da critica racionalista de outra. Priestly, Channing e J.
Martineau sao os exemplos das fases sucessivas do unitarismo
moderno. Priestly e exemplo do socianismo antigo, que se
edificava sobre uma filosofia sensacional; Channing e exemplo
de urn esfor<;o de se conseguir urn grande desenv()lvimento do
elemento espiritual; e Martineau e o da eleva<;ao de vista
induzida pela filosofia de Cousin, e pela introdu<;ao da ideia
de progresso hist6rico nas ideias religiosas"- Farrar Grit. Hist.
of Free Thought, Bampton Lecture, 1862.

12. Quando e em que circunstfmcias teve origem o arminianismo


moderno?
James Arminius, professor de teologia na Universidade
de Leyden, de 1602 ate a sua morte em 1609, embora sendo
ministro da Igreja Calvinista da Rolanda manteve, a principia,
secreta e depois mais abertamente, esse sistema de opiniao

136
Comparafiio de Sistemas
teol6gica que desde aquele tempo tern sido chamado por seu
nome. Suas opini6es difundiram-se rapidamente e foram, ao
mesmo tempo, combatidas pelos principais homens da Igreja.
Cerca de urn ano ap6s a morte de Arminio, seus discipulos
constituiram-se em partido organizado e, nessa forma, apresen-
taram aos Estados da Rolanda e Friesland ocidental uma
representa<;;ao (remonstrance), pedindo que se lhes permitisse
conservar seus lugares na Igreja sem que fossem sujeitos, pelos
tribunais eclesiasticos, a exames incomodos sobre sua ortodoxia.
Pelo fa to de sera apresenta<;;ao dessaremonstrance o seu primeiro
ato combinado como urn partido, ficaram, depois, sendo
conhecidos na hist6ria como remonstrantes. ··; ·:·'· ·
Pouco depois disso, os remonstrantes, com o fim de definir
bern a sua posi<;;ao, apresentaram as autoridades cinco artigos
em que exprimiam sua fe quanto a predestina~ao e a gra<;;a.
Essa foi a origem dos celebres "Cinco Pontos" na controversia
entre o calvinismo e o arminianismo. Em breve, porem, a
controversia estendeu-se a mais pontos; e os arminianos, por
se conservarem 16gicos, viram-se obrigados a ensinar doutrinas
radicalmente erroneas quanto a natureza do pecado, ao pecado
original, a imputa<;:ao, a natureza da propicia<;:ao, e a justifica-
<;:ao pela fe. Alguns de seus autores levaram o espfrito
racionalista inerente no seu sistema ate aos seus resultados
lcgitimos, num pelagianismo quase irrestrito, e alguns foram
ate suspeitos de socianismo.
Nao se tendo conseguido, por outros meios, impor silencio
aos inovadores, os Estados Gerais reuniram em Dort, Rolanda,
urn Sinodo geral, cujas sess6es ocorreram em 1618 e 1619.
Constava de pastores, presbiteros regentes e professores
rcol6gicos das igrejas da Rolanda, e de deputados das igrejas
da Inglaterra, Esc6cia, Hesse, Bremen, Palatinado e Sui<;;a-
nao se achando presente ninguem da Fran<;:a, por te-lo proibido
o seu rei. Os delegados estrangeiros presentes eram dezenove
prcsbiterianos das igrejas reformadas do continente, um da
Esc6cia e quatro episcopais da lgreja da Inglaterra, entre eles,

137
Capitulo 6
como chefe, o bispo de Llandaff. Este Sinodo condenou
unanimemente as doutrinas dos arminianos, enos seus Artigos
confirmou a comum fe calvinista das igrejas reformadas. Os
te6logos remonstrantes mais distintos que se sucederam a
Arminio foram Episc6pio, Curcelloea, Limborch, Le Clerc,
Wetstein eo ilustre jurisconsulto Grotio.
A denomina~ao dos metodistas na Gra-Bretanha e na
America e a unica grande entre OS protestantes do mundo
inteiro cujo credo e abertamente arminiano. Mas o seu armi-
nianismo, como este se acha exposto nas obras de Ricardo
Watson, seu escritor mais autorizado e te6logo incomparavel-
mente mais competente do que Wesley, esta muito menos
afastado do calvinismo da Assembleia de Westminster do que
o esta o sistema dos remonstrantes ulteriores, e deve sempre
ser designado pelo nome qualificado de "arminianismo
evangelico". Nas obras de Watson a antropologia e a sote-
riologia do arminianismo sao, em sentido geral, muito
semelhantes as divis6es correspondentes do luteranismo e do
calvinismo de Baxter, e da Escola Francesa do seculo 17.

13. Eis um esbor;o das principais posir;oes do sistema sociniano.


TEOLOGIA E CRISTOLOGIA
1°. A unidade divina.
(1) Esta unidade e incompativel com quaisquer distin~6es
pessoais na deidade.
(2) Cristo e mero homem.
(3) 0 Espirito Santo e uma influencia divina impessoal.
2°. Os atributos divinos. 4
(1) Nao existe em Deus nenhum prindpio de justi~a
vindicativa: nada que o impe~a de aceitar os pecadores s6 sob
a base do seu arrependimento.
(2) E essencialmente impossivel que sejam conhecidos
futuros eventos contingentes. A presciencia de Deus nao se
estende a tais eventos. ., .. · ·. ~
ComparafiiD de Sistemas
ANTROPOLOGIA • '· • rt. ~•

1°. 0 homem foi criado sem carater moral positivo. ''A


imagem de Deus" a qual, diz a Biblia, o homem foi criado,
nao inclui a santidade.
2°. Adao, comendo o fruto proibido, cometeu pecado e
incorreu, assim, naira de Deus, mas, nao obstante isso, retinha
ainda a mesma natureza morale as tendencias com as quais
fora criado, e transmitiu-as integralmente asua posteridade.
3°. A culpa do pecado de Adao nao e imputada a sua
descendencia.
4°. 0 homem pode, agora, cumprir todas as suas obriga~6es
por natureza, e faze-lo tao bern quanto Adao antes de pecar. As
circunstfmcias nas quais se forma o carater do homem, agora
sao menos favoniveis do que no caso de Adao, e por isso o
hom em efraco. Mas Deus e infinitamente misericordioso, e a
obriga~ao e graduada pela capacidade. 0 homem foi criado
mortal, por natureza, e teria morrido mesmo que nao tivesse
pecado.
SOTERIOLOGIA
A grande finalidade da missao de Cristo foi ensinar e dar
certeza quanto as verdades a cujo respeito as conclus6es da
razao meramente humana sao problem:hicas. Isso Ele fez
tanto por sua doutrina como por seu exemplo.
1°. Cristo nao desempenhou, sobre a terra, o ofkio de
sacerdote; fe-lo no ceu, mas em sentido muito indefinido.
2°. 0 oficio principal de Cristo foi profetico. Ele ensinou
uma lei nova. Deu o exemplo de uma vida santa. Ensinou
sobre a personalidade de Deus. E ilustrou a doutrina de uma
vida futura por Sua propria ressurrei~ao.
3°. Sua morte foi necessaria como a condi~ao impres-
cindivel da Sua ressurrei~ao. Seu designio foi tambem o de
produzir assim uma impressao moral nos pecadores, dispondo-
-os a arrepender-se dos seus pecados, e assegurando-lhes a
clcmencia de Deus. Nao havia necessidade de nenhuma
propicia~ao da justi~a divina, nem seria possivel propicia-la

139
Capitulo 6
por meio de sofrimentos vicarios.
ESCATOLOGIA
1°. No periodo intermediario entre a morte e a ressurrei<;;ao,
a alma permanece inconsciente.
2°. "Porque fica evidente, pelas autoridades citadas, que
eles ( os primeiros socinianos) igualmen te com ou tros
mantinham, constantemente, que haveria uma ressurrei<;;ao
tanto dos justos como dos injustos, e que os injustos seriam
condenados a urn castigo eterno, mas que os justos seriarn
adrnitidos avida eterna." B. Wissowatio.
''A doutrina sobre os tormentas eternos no inferno, a rnaior
parte dos unitarios de hoje (1818) rejeita, por ser, na sua
opiniao, inteirarnente inconciliavel corn a bondade divina, e
por nao ter base nas Escrituras. Com referencia ao destino
futuro dos impios, alguns sustentarn que, depois da ressur-
rei<;;ao, serao aniquilados ou que sofrerao a destrui<;;ao eterna,
no sentido literal das palavras. A maioria, porern, tern aceitado
a doutrina da restaura<;;ao universal, segundo a qual todos os
hornens, por rnais depravados que tenham sido seus caracteres
nesta vida, serao afinal, por rneio de urna disciplina corretiva
adaptada na sua severidade anatureza de cada caso particular,
levados a tornar-se bons e, por consequencia, felizes" -
Catecismo Beacoviano, de Rees- pags. 367, 368.
ECLESIOLOGIA
1°. A Igreja e sirnplesrnente urna sociedade voluntaria.
Seu firn e o aperfei<;;oarnento rnutuo. Seu la<;;o cornurn,
semelhan<;;a de sentirnentos e aspira<;;6es. Sua regra e a razao
hurnana.
2°. Os sacrarnentos sao sirnplesmente ordenan<;;as
comernorativas e instrutivas.

14. Eis um esbofo das posif6es principais do sistema arminiano.


OS ATRIBUTOS DIVINOS
1°. Adrnitem que a justi<;;a vindicativa e urn atributo
divino; rnantem, porern, que e cedivel, que e opcional rnais

140
I Comparafiio de Sistemas
do que essencial, que pertence antes apolitica adrninistrativa,
e que nao e tanto urn principia necessaria.
2°. Adrnitern que Deus tern presciencia de todos os eventos
sern nenhurna exce~ao. Inventaram a distin~ao expressa pelo
termo Scientia Media para explicar a presciencia certa de
eventos futuros cuja ocorrencia, porem, nao fica determinada
nem por Deus, nem por qualquer outra causa antecedente.
3°. Negam que a preordena<;:ao de Deus se estenda as
voli<;:6es dos agentes livres, e mantem que a eleis;:ao dos homens
nao e absoluta, e sim condicionada a fee obediencia previstas.
ANTROPOLOGIA
1°. Urn carater moral nao pode ser criado, mas e deter-
minado so por decisao previa de quem o possui.
2°. Tanto a liberdade como a responsabilidade envolvem,
necessariamente, a possibilidade de poder fazer o contrario.
3°. Costumam negar a imputa~ao do primeiro pecado de
Adao a sua posteridade.
4°. Os arminianos estritos negam a deprava~ao total do
homem, e so admitem que e moralmente fraco por natureza.
Arminio e Wesley eram ortodoxos, mas menos conseqti.entes.
5°. Negam que o homem tenha capacidade moral para
principiar uma vida santa ou continuar nela, por sua propria
for<;:a e sem auxilio divino- mas afirmam que todos tern o
poder de cooperar com a grafa comum, ou de resistir-lhe.
Somente o que distingue o santo do pecador eo seu proprio
uso ou abuso da gra<;:a.
6°. Consideram a influencia graciosa de Deus como sen do
influencia moral e suasoria em vez de urn exercicio direto e
cficaz da energia recriadora de Deus.
JO. Mantem que qualquer santo pode cair da gra<;:a- em
qualquer periodo da sua vida terrestre.
SOTERIOLOGIA
1°. Admitem que Cristo fez urn sacrificio vicario de Si
como substituto dos pecadores mas, ao mesmo tempo, negam
que tenha sofrido a pena literal da lei ou uma pena plenamente

141
Capitulo 6
equivalente a ela, e mantem que os Seus sofrimentos foram
por gra~a aceitos como substitutos dessa pena.
2°. Mantem que nao s6 com respeito a suficiencia e
adapta~ao da morte de Cristo, mas tam bern na inten~ao do Pai
em dar Seu Filho, e na inten~ao do Filho em Se entregar,
Cristo morreu, no mesmo sentido, por todos os homens
igualmente.
3°. Que a aceita~ao, da parte do Pai, da satisfa~ao de Cristo
em vez da execu~ao da pena na propria pessoa do pecador,
envolve urn afrouxamento da lei divina.
4°. Que, em resultado da satisfa~ao feita por .Cristo, Deus
pode agora, de perfeita conformidade com Seu car:her e com
os interesses de Seu governo geral, oferecer a salva~ao sob
condi~6es mais f:keis. Por conseguinte, o evangelho e uma
nova lei, exigindo fe e obediencia evangelica em vez da
obediencia perfeita exigida originalmente.
5°. Por conseguinte, a obra de Cristo nao salva realmente
a ninguem - s6 torna possivel a ·salva~ao de todos- tirou os
obstaculos legais que exigiam - nao adquire fe para ninguem
mas torna possivel a salva~ao, sob a condi~ao da fe.
6°. A todos os homens sao concedidas influencias
suficientes do Espirito Santo, oportunidades e meios de gra~a
suficientes para serem salvos.
7°. Todos os homens podem e tern a obriga~ao de alcan~ar,
nesta vida, a perfei~ao evangelica. Esta, segundo as explica~6es
que eles dao a respeito dela, consiste em ser o cristao
perfeitamente sincero, em achar-se animado por urn amor
perfeito, e em fazer tudo o que de n6s e exigido nesta dispen-
sa~ao do evangelho.
8°. A respeito dos pagaos, alguns tern mantido que o
evangelho e, de urn ou de outro modo, pregado virtual, senao
formalmente, a todos os homens. Outros, que no mundo
futuro ha tres condi~6es correspondentes as grandes classes em
que se pode dividir a ra~a inteira, com rela~ao ao evangelho -
o Status Credentium; o Status Incredulorum, e oStatus Ignorantium.

142
Comparafiio de Sistemas
15. Eis um breve esbor;o das posir;oes principais do sistema
calvinista.
TEOLOGIA -· · .~.· · .. ,,
1°. Deus e urn soberano absoluto, infinitamente sabio, reto,
justo, benevolo e poderoso, determinando, desde toda
eternidade, a ocorrencia certa de todos os eventos, de qualquer
classe, que sejam segundo o conselho da Sua propria vontade.
2°. A justi<;a vindicativa e uma perfei<;ao essencial e
imutavel da natureza divina, que exige o castigo pleno de todo
e qualquer pecador, e Deus nao pode afrouxar o seu exercicio
nem deixar de exerce-lo.
CRISTOLOGIA , ·!J .... ·.. • ,: · · •
0 Mediador e uma s6 pessoa eterna e divina, ao mesmo
tempo verdadeiro Deus e verdadeiro homem. Na unidade da
Pessoa teantr6pica as duas naturezas permanecem puras e nao
misturadas, e cada uma retem distintos seus atributos separados
e incomunicaveis. A personalidade e a do Logos eterno e
imutavel. A Sua natureza humana e impessoal. Todos OS Seus
atos medianeiros envolvem o exercicio concorrente das
energias das duas naturezas, segundo suas diversas proprie-
dades, na unidade da Sua Pessoa, que e uma s6.
ANTROPOLOGIA
1°. Deus criou o homem por urn ato imediato da Sua
onipotencia, e num estado em que nao havia defeito fisico,
intelectual ou moral, e com carater moral formado
posi ti vamen te.
2°. A culpa do pecado publico de Adao, Deus, por urn ato
judicial, poe aconta imediata de cada urn de seus descendentes,
desde o momento em que come~am a existir, e antes de
qualquer de seus atos.
3°. Os homens, por conseguinte, come<;am a existir num
estado de condena<;ao, privados daquelas influencias do
Espirito Santo das quais depende a sua vida morale espiritual.
4°. Segue-se disso que principiam a ser agentes morais
privados daquela retidao original que pertencia a natureza

143
Capitulo 6
humana como a mesma foi criada em Adao, e ja com uma ~
tendencia previa para o pecado; e essa tendencia que neles esta
e da natureza do pecado, e merece castigo.
5°. A natureza do homem, ainda depois da Queda,
conserva suas faculdades constitucionais de razao, consciencia
e livre vontade, e por isso o hom em continua a ser agente moral
e responsavel; mas, nao obstante, esta morro espiritualmente,
e totalmente avesso ao que e born espiritualmente, e e
absolutamente incapaz para mudar seu cora~ao ou cumprir,
de urn modo adequado, qualquer dos deveres que nascem da
sua rela~ao com Deus.
SOTERIOLOGIA
1°. A salva~ao do homem e absolutamente da gra~a de
Deus. Deus estava livre para, em conformidade com as
perfei~6es infinitas da Sua natureza, salvar todos ou muitos,
ou poucos ou ninguem, segundo a Sua soberana vontade.
2°. Cristo fez-Se Mediador em virtude de urn pacto eterno
feito entre o Pai eo Filho, segundo o qual tornou-Se o substituto
legal de Seu povo eleito, e como tal cumpriu, por meio da Sua
obediencia e sofrimentos, todas as obriga~6es que para esses
eleitos nasceram das Suas rela~6es federais para com a lei-
pagando vicariamente mediante Seus sofrimentos a sua divida
penal - cumprindo vicariamente, por Sua obediencia, todas
as condi~6es pactuadas das quais dependia sua felicidade
eterna- cumprindo, assim, tudo o que a lei exigia, satisfazendo
a justi~a de Deus e adquirindo a salva~ao eterna daqueles
por quem morreu.
3°. Por isso adquiriu, por Sua morte, as influencias
salvadoras do Espirito Santo para todos aqueles por quem
morreu. Eo Espirito Santo aplica, infalivelmente, a reden~ao
adquirida por Cristo a todos os que intencionava salvar, no
tempo exato e sob aquelas mesmas condi~6es que foram
predeterminadas no pacto eterno da gra~a - e isso faz pelo
exercicio imediato e intrinsecamente eficaz de Seu poder,
operando diretamente neles, e nas opera~6es da sua natureza

144
Comparm;iio de Sistemas
renovada levando-os afe, ao arrependimento e a obediencia.
4°. A justificas;ao e urn ato judicial de Deus, pelo qual,
imputando-nos a justis;a perfeita de Cristo na qual se acham
inclufdas sua obediencia ativa e passiva, comes;a a nos ver e
nos tratar de conformidade com essa justis;a, declarando que
estao satisfeitas todas as exigencias penais, e que nos, graciosa-
mente, temos direito a todas as imunidades e recompensas
condicionadas no pacto original com Adao, sob sua obediencia
perfeita.
5°. Embora nao seja possfve1 alcans;ar absoluta perfeis;ao
moral nesta vida, e a certeza nao seja da essencia da fe, e, nao
obstante, possivel e obrigatorio para todo crente esfors;ar-se
por chegar a ter certeza da sua propria salvas;ao pessoal, e
esquecendo-se do que para tnis fica, que se esforce por tornar-
-se perfeito em tudo.
6°. Apesar do fato que entregue a si proprio todo crente
cairia imediatamente, e embora a maioria dos crentes sofra
desvios temporais, todavia, por meio da operas;ao da Sua
gras;a no coras;ao, de conformidade com as provisoes do pacto
eterno da gras;a e como proposito de Cristo em morrer, Deus
impede infalivelmente que ate o crente mais fraco apostate
inteiramente ou peres;a eternamente.
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145
7

Credos e Confissoes

Embora os credos e confiss6es, seus usos e sua hist6ria,


formem urn ramo distinto e separado de esiudos, iremos
considera-los juntos neste capitulo, e nos diversos capftulos
desta obra que se seguirem seriio encontradas referencias ao
credo particular em que se acha definida mais claramente ou
com mais autoridade a doutrina particular que esta sendo
tratado.
Sobre este assunto inteiro consulte-se a notavel obra
hist6rica e crftica por Dr. Philip Schaff- The Creeds of
Christendom. No primeiro volume, o autor nos da a hist6ria da
origem e da ocasiao em que foi composto cada credo ou
confissao, e uma apreciac;ao crftica do seu conteudo e valor.
No segundo e no terceiro volumes, nos e dado o texto de
todos os credos principais, em dois idiomas.

1. Por que sao necessarios credos e confissoes, e como foram


produzidos?
Tendo sido dadas, por inspirac;ao de Deus, as Escrituras
do Velho e do Novo Testamentos, elas sao para o homem,
no seu estado atual, a unica e toda-suficiente regra de fe e
pratica. Essa palavra divina e, pois, a unica norma de doutrina
que tern au tori dade intrfnseca para obrigar a consciencia. Todas
as demais normas sao de valor e autoridade s6 ate onde
ensinem o mesmo que ensinam as Escrituras.
Mas, eo clever inalienavel dos homens e uma necessidade

146
Credos e Confiss6es
que, no uso de suas faculdades naturais e pelos meios comuns
de interpreta<;ao, chegue cada urn a certas conclus6es a respeito
daquilo que as Escrituras ensinam. Desde que todas as verdades
concordam entre si, em todas as suas partes, e desde que a razao
humana procura sempre e instintivamente reduzir a uma
unidade e coerencia logica todos os elementos dos conheci-
mentos que procura adquirir, segue-se que os homens sao como
que obrigados a construir, mais ou menos formalmente, urn
sistema de fe com os materiais apresentados nas Escrituras.
Todos os que estudam a Biblia fazem isso, necessariamente,
no proprio processo de compreender e coordenar o seu ensino;
e pela linguagem de que OS serios estudantes da Biblia se
servem, em suas oraq6es e outros atos de culto e na sua
costumeira conversa<;ao religiosa, todos tornam manifesto que,
de urn ou de outro modo, acharam nas Escrituras urn sistema
de fe tao completo como no caso de cada urn deles lhe foi
possivel. Se os homens recusarem o auxilio oferecido pelas
exposi<;,:6es de doutrina elaboradas e definidas vagarosamente
pela Igreja, cada um teni de fazer seu proprio credo, sem auxilio
e confiando so na propria sabedoria. A questao real entre a
Igreja e OS impugnadores de credos humanos nao e, como eles
muitas vezes dizem, uma questao entre a Palavra de Deus e os
credos dos hom ens, mas e questao entre a fe provada do corpo
coletivo do povo de Deus e o juizo provado e a sabedoria
desassistida do objetor individual. Assim, como era de supor-
-se, foi de fato assim que a Igreja procedeu, muito vagarosa-
mente e pouco a pouco, nesta obra de interpretar exatamente
as Escrituras e de definir as grandes doutrinas que comp6em
o sistema de verdades reveladas nessas mesmas Escrituras.
Muitas vezes a aten<;_:ao da Igreja era chamada para o estudo de
uma doutrina numa epoca, e numa epoca subseqiiente para o
de outra; e a medida que assim se fazia progresso gradual na
discrimina<;ao clara das verdades evangelicas, fez a Igreja, em
di versos periodos, exposi<;_:6es exatas do resultado das novas
aquisi<;_:6es e deu assim ao mundo novos credos ou confiss6es

147
Capitulo 7
de fe com o fim de conservar a verdade, de instruir nela o povo,
e de discrimina-la e defende-la contra as pervers6es dos hereges
e dos ataques dos incredulos e, tambem, com o fim de ter
nesses credos urn las;o comum de fee regra comum para o
ensino e a disciplina.
Os credos antigos da Igreja (universal) foram compostos
pelos primeiros quatro condlios ecumenicos ou gerais, exces-
sao feita daquele que e chamado Credo dos Ap6stolos, formado
gradualmente das confiss6es feitas nas ocasi6es de batismo
nas igrejas ocidentais, e do Credo Atanasiano, feito particular-
mente, nao se sabe por quem, nem onde. A grande confissao
autorizada pela igreja papal foi produzida pelo condlio
ecumenico reunido em Trento, 1545. A maioria das principais
confiss6es protestantes sao devidas a pessoas individuais,
ou a pequenos grupos de pessoas, e.g., a Confissao de Augsburgo
e a Apologia, a Segunda Confissao Helvetica, o Catecismo de
Heidelberg, a antiga Confissao Escocesa, os Trinta e Nove Artigos
da Igreja da Inglaterra, etc. Duas, porem, das mais valiosas e
mais geralmente aceitas confiss6es protestantes foram produ-
zidas por gran des e veneniveis assembleias de te6logos eruditos,
a saber: os Canones do Sinodo Internacional de Dart, e a
Confissao e as Catecismos da Assembleia Nacional de JfiJstminster.

2. Quais sao seus usos legitimos?


Tern sido achados iiteis, em todas as epocas da Igreja, para
os seguin tes fins: 1. Para assinalar, conservar, e disseminar as
aquisis;6es feitas no conhecimento das verdades cristas por
qualquer ramo da lgreja, em qualquer grande crise de seu
desenvolvimento. 2. Para discriminar a verdade das glosas de
mestres falsos; e para defini-la acuradamente na sua inteireza
e em suas propors;6es definidas. 3. Para servir como meios na
grande obra de instrus;ao popular. . . '

3. Qual e a base e a extensao da sua autoridade ou poder


de obrigar a consciencia?

148
Credos e Confissoes
A materia de todos esses credos e confiss6es obriga as
consciencias dos homens s6 ate onde esta em conformidade
com as Escrituras, e de acordo com essa conformidade. A forma,
porem, em que se acha exposta essa materia obriga s6 aqueles
que subscreveram voluntariamente a confissao, e porque a
subscreveram.
Em todas as igrejas faz-se uma distin<;ao entre as condi<;6es
nas quais se admitem membros a sua congrega<;ao e as
condi<;6es nas quais os oficiais sao admitidos a seu oficio
sagrado de ensinar e governar. Nenhuma igreja tern o direito
de impor a seus membros particulares uma condi<;ao que
Cristo nao fez condi<;ao da salva<;ao. A Igreja e o rebanho de
Cristo. As ordenan<;as sao os selos do Seu pacto. Todos aqueles,
pois, que professam a verdadeira religiao de urn modo que
mere<;a credito, is toe, todos OS que sao presumivelmente pOVO
de Deus tern o direito de admissao aIgreja. Essa profissao que
mere<;a credito envolve naturalmente urn conhecimento
competente das doutrinas fundamentais do cristianismo, uma
declara<;ao de fe pessoal em Cristo e de dedica<;ao ao Seu
servi<;o, e uma disposi<;ao de espirito e costumes de vida que
condigam com essa profissao. Por outro lado, a ninguem se
pode confiar nenhum oficio numa igreja se nao professa crer
na verdade e sabedoria da constitui<;ao e leis que ele tera o
dever de conservar e administrar. A nao ser assim, seriam
impossiveis toda harmonia de sentimentos e toda coopera<;ao
eficaz em a<;ao.
E urn prindpio de moral admitido universalmente que o
animus imponentis, o sentido em que as pessoas que imp6em
urn juramenta, uma prornessa ou obriga<;:ao o entendern, obriga
a consciencia das pessoas que se obrigarn pelo juramenta ou
pcla prornessa. Todos os candidatos, pois, a qualquer oficio na
Igreja Presbiteriana, ou creem pessoalmente no "sistema de
doutrinas" ensinado nos sirnbolos norrnais dessa Igreja, no
scntido ern que tern sido entendido historicamente ser a
vcrdade de Deus, ou eles rnentern solenernente diante de

149
Capitulo 7
Deus e dos homens.

4. Quais os credos da Igreja Primitiva em que fica ainda a


heranfa comum da Igreja moderna?
1°. 0 CREDO DOS AP6STOLos, assim chamado. Este credo
desenvolveu-se gradualmente da compara<;ao e assimila<;ao dos
credos batismais das principais igrejas da parte ocidental ou
latina da Igreja Primitiva. As formas mais completas e
populares desses credos batismais eram os de Roma, Aquileja,
Milao, Ravena, Cartago e Hipo, "das quais a forma romana,
aumentando-se com acrescimos derivados de outras, pouco a
pouco tornou-se a mais geralmente aceita. Enqminto os seus
diversos artigos, considerados separadamente, sao todos de
origem nicena ou anti-nicena, nao se pode achar vestigios do
Credo dos Ap6stolos como urn todo, anteriores ao seculo 6".-
Creeds of Christendom, por Schaff, vol. 1, pag. 20.
Foi, junto com a Ora<;ao Dominical·e os Dez Manda-
mentos, acrescentado ao seu catecismo pelos te6logos de
Westminster, "nao como se fosse composto pelos ap6stolos
ou devesse ser considerado Escritura can6nica, e sim por
ser urn sumario breve de fe crista, de conformidade com a
Palavra de Deus e recebido antigamente nas igrejas de Cristo".
Os que formularam a Constitui<;ao da lgreja Presbiteriana
dos Estados Unidos retiveram-no como parte do nosso
catecismo. E tambem parte do catecismo da Igreja Metodista
Episcopal. "E usado na confissao batismal das igrejas inglesa,
reformada, luterana, romana, metodista episcopal e protestante
episcopal."
E como segue:
"Creio em Deus Pai, todo-poderoso, criador do ceu e
da terra; e em Jesus Cristo, Seu unico Filho, nosso Senhor;
o qual foi concebido por obra do Espirito Santo; nasceu
da virgem, Maria; padeceu sob o poder de Poncio Pilatos;
foi crucificado, morto e sepultado; desceu ao inferno
(hades); ao terceiro dia ressurgiu dos mortos; subiu ao

150
Credos e ConfissiJes
ceu; e esta sentado a mao direita de Deus Pai todo-pode-
roso; donde ha de vir para julgar os vivos e os mortos.
Creio no Espirito Santo; na santa Igreja cat6lica, na
comunhao dos santos, na remissao dos pecados, na
ressurrei<;:ao do corpo e na vida eterna. Amem".

2°. 0 CREDO NrcENO, no qual esta definida a verdadeira fe


trinit:iria da Igreja, em oposi~ao aos erros arianos e semi-arianos.
Existe em tres formas, e foi evidentemente moldado sobre
formas preexistentes, de urn modo semelhante pelo qual se
desenvolveu o CredoApost6lico.
(1) A forma original em que foi composto e decretado
pelo concilio ecumenico de Niceia, 325 d.C., e a seguinte:
"Creio em urn s6 Deus, Pai todo-poderoso, criador
de todas as coisas visiveis e invisiveis.
"E em urn s6 Senhor Jesus Cristo, Filho de Deus,
gerado do Pai, Unigenito, isto e, da essencia do Pai, Deus
de Deus, Luz de Luz, verdadeiro Deus de verdadeiro Deus;
gerado (nao feito) de uma substancia com o Pai; por quem
foram feitas todas as coisas, tanto no ceu como na terra;
que, por amor de n6s os homens, e pela nossa salva~ao,
desceu do ceu e encarnou, e foi feito homem; padeceu, e
ao terceiro dia ressuscitou; subiu ao ceu, donde ha de vir
para julgar os vivos e os mortos.
"E no Espirito Santo.
"Mas, OS que dizem: "Houve tempo em que nao era";
"Nfw era antes de ser feito e: "Foi feito do nada"; ou: "E
de substancia, ou essencia diversa"; ou: "0 Filho de Deus
foi criado"; ou "e mutavel" ou "alteravel"- sao condenados
pela santa igreja cat61ica e apost6lica".
(2) 0 Credo Niceno-Constantinopolitano. Este consiste do
Credo Niceno, supratranscrito, mas com uma ligeira mudan~a
no primeiro artigo, e com acrescimo das clausulas que definem
a Pessoa e a obra do Espirito Santo, e sem o an:itema no fim.
Esta nova forma do Credo Niceno e geralmente atribuida ao
Concilio de Constantinopla, convocado pelo Imperador
Teod6sio, em 381, para condenar a doutrina dos macedonios,

151
Capitulo 7
que negaram a deidade do Espirito Santo. E certo que essas
mudan<;:as foram feitas mais ou menos naquela epoca; e as
diversas "clausulas" acrescentadas ja existiam anteriormente
em formularies propostos por te6logos individuais. No entanto,
niio existem provas de que essas mudan~as foram feitas pelo
Concilio de Constantinopla. Foram, porem, reconhecidas pelo
Concilio de Calcedonia, em 431.
E nesta segunda forma que 0 Credo Niceno e utilizado
agora na lgreja Grega.
(3) A terceira, ou forma latina deste credo, na qual e
utilizado nas igrejas romana, episcopal e luterna, difere da
segunda forma supramencionada s6 nos seguintes pontos:
(a) Restitui aprimeira clausula as palavras "Deus de Deus";
haviam pertencido ao Credo Niceno original, mas tinham
sido omitidas na sua forma grega niceno-constantinopolitana.
(b) Acrescentou-se o celebre termo Filioque a clausula que
afirmava que o Espirito procede do Pai. Este termo foi
acrescentado pelo concilio provincial de Toledo, Espanha,
em 589, e foi gradativamente aceito por toda a lgreja Ocidental,
e dai por todos os protestantes, sem nenhuma ratifica<;:iio
ecumenica. E rejeitado pela Igreja Grega. 0 texto deste credo,
recebido com reverencia por todos os cat6licos e protestantes,
ecomo segue:
"Creio em urn s6 Deus, Pai onipotente, Criador dos
ceus e da terra, e de todas as coisas visiveis e invisiveis; e
em urn s6 Senhor Jesus Cristo, Filho unigenito de Deus,
gerado de Seu Pai antes de todos os seculos; Deus de Deus,
Luz de Luz, verdadeiro Deus de verdadeiro Deus, gerado
e nao feito, de uma s6 substancia com o Pai; por quem
foram feitas todas as coisas; o qual, por amor de n6s, os
homens, e pela nossa salva~ao, desceu do ceu, encarnou
por obra do Espfrito Santo, e nasceu da virgem, Maria, e
foi feito homem; foi tambem crucificado por amor de
n6s sob o poder de P6ncio Pilatos; padeceu e foi sepultado,
e ao terceiro dia ressuscitou, segundo as Escrituras; e subiu
ao ceu, e esta sentado a direita de Deus Pai. E tornara a

152
Credos e Confissoes

vir com gloria para julgar os vivos e os mortos; cujo reino


nao tera fim. E creio no Espirito Santo, o Senhor e Doador
da vida, que procede do Pai e do Filho (esta frase
"Filioque" foi acrescentada ao credo de Constantinopla
pelo concilio da Igreja Ocidental reunido em Toledo, em
589), o qual, junto com o Pai e o Filho, e adorado e
glorificado, o qual falou pelos profetas. E creio numa s6
Igreja Cat6lica e Apost6lica; confesso urn s6 batismo para
a remissao dos pecados; e espero a ressurrei~ao dos mortos
e a vida do mundo futuro. Am em".

3°. 0 CREDO ATANASIANO, tambem chamado Quicunque


vult (Quem quer que), por serem estas as suas primeiras
palavras, e vulgarmente atribuido ao grande Atanasio, bispo
de Alexandria, de cerca de 328 a 373, e chefe do partido
ortodoxo da lgreja, oposto ao arquiherege Ario. Os ilustrados
te6logos modernos, porem, dao-lhe unanimemente origem
menos antiga, e dizem que veio provavelmente do Norte da
Africa, e da escola de Agostinho. Bigham refere-o a Virgilius
Tapsensis, do firn do seculo quinto. Schaff diz que, na sua
forma completa, nao aparece antes do seculo oitavo.
Este credo e aceito nas igrejas romana, grega e inglesa.
Apresenta uma exposis:ao muito bern expressa da fe tipica de
todos OS cristaos, fazendo-se obje<;ao SO as "clausu}as
condenat6rias", que realmente nunca deveriam fazer parte de
uma cornposi<;ao hurnana, especialrnente de uma que faz
distin<;6es tao sutis num assunto tao profunda.
E como segue:
"1. Quem quer que queira ser salvo, e-lhe necessaria,
primeiro que tudo, que receba a fe cat6lica.* 2. A qual e
preciso que cada urn guarde perfeita e inviolada, ou tera
com certeza que perecer para sempre 3. A fe cat6lica,
porem, e esta: que adoremos urn s6 Deus em trindade, e
trindade em unidade. 4. Nao confundindo as Pessoas, nem

• Nao se refere afe da igreja cat6lica romana.

153
Capitulo 7
separando a substancia. 5. Porque a Pessoa do Pai e uma, a
do Filho outra, e a do Espfrito Santo outra. 6. Mas no Pai,
no Filho e no Espfrito Santo h:i uma s6 deidade, gloria
igual e majestade coeterna. 7. 0 que o Pai e, o Filho e, e o
Espfrito Santo e. 8. 0 Pai e incriado, o Filho e incriado, o
Espfrito Santo e incriado. 9. 0 Pai e imenso, o Filho e
imenso, o Espfrito Santo e imenso. 10. 0 Pai e eterno, o
Filho e eterno, o Espirito Santo e eterno. 11. E, contudo,
nao ha tres eternos, porem urn s6 eterno. 12. Assim
tambem nao ha tres incriados, nem tres imensos, mas urn
s6 incriado e urn s6 imenso. 13. Do mesmo modo, o Pai e
onipotente, o Filho e onipotente e o Espfrito Santo e
onipotente. 14. E, contudo, nao ha tres onipo'tentes, mas
urn s6 onipotente. 15. Assim o Pai e Deus, o Filho e Deus,
o Espirito Santo e Deus. 16. E, contudo, nao ha tres Deuses,
porem urn s6 Deus. 17. Assim o Pai e Senhor, o Filho e
Senhor, o Espfrito Santo e Senhor. 18. E, contudo, nao ha
tres Senhores, mas urn s6 Senhor. 19. Porque, assim como
somas obrigados pela verdade crista a confessar que cada
pessoa de per si e Deus e Senhor, assim tambem somos
proibidos pela religiao cat6lica de dizer que h:i tres Deuses
ou Senhores. 20. 0 Pai nao foi feito de ninguem, nem
criado, nem gerado. 21. 0 Filho e s6 do Pai, nao feito,
nem criado, mas gerado. 22. 0 Espirito Santo e do Pai e
do Filho, nao feito, nem criado, nem gerado, mas
procedente. 23. Por isso h:i urn s6 Pai, nao tres Pais, urn
s6 Filho, nao tres Filhos, urn s6 Espfrito Santo, nao
tres Espiritos Santos. 24. E nesta trindade nenhum e o
primeiro ou o ultimo, maior ou menor. 25. Todavia todas
as tres pessoas coeternas sao coiguais entre si; de modo
que, como se disse acima, deve-se adorar tanto a unidade
em trindade como a trindade em unidade. 26. Portanto,
quem quiser ser salvo, deve pensar assim a respeito da
Trindade. 27. Mas e necessaria para a salvac;:ao eterna que
tambem creia fielmente na encarnac;:ao de nosso Senhor
Jesus Cristo. 28. E, portanto, verdadeira fe que creiamos
e confessemos que o nosso Senhor Jesus Cristo e tanto
homem como Deus. 29. E Deus, gerado desde a eternidade

154
Credos e Confissi5es
da substancia do Pai; homem nascido no tempo, da
substancia de sua mae. 30. Perfeito Deus, perfeito homem,
subsistindo numa alma racional e em carne humana. 31.
lgual ao Pai com respeito a Sua deidade, menos do que o
Pai com respeito a Sua humanidade. 32. 0 qual, embora
sendo Deus e homem, nao e dois Cristos, e sim urn so. 33.
Urn s6, nao por conversao da Sua deidade em carne, mas
sim por ser assumida em Deus a sua humanidade. 34. Urn
s6, de modo algum por confusao de substancia, e sim pela
unidade da Pessoa. 35. Porque, assim como a alma racional
e a carne sao urn so homem, assim tambem Deus e o
homem sao urn so Cristo. 36. 0 qual padeceu pela nossa
salva~ao, desceu ao inferno, ao terceiro dia ressurgiu dos
mortos. 37. Subiu ao ceu, esta assentado a mao direita de
Deus Pai onipotente, donde vira para julgar os vivos e os
mortos. 38. Em cuja vinda todos os homens ressurgirao
com seus corpos, e darao conta de suas pr6prias obras. 39.
E os que tiverem praticado o bern entrarao na vida eterna;
os que tiverem praticado o mal irao para o fogo eterno.
40. Esta e a fe cat6lica, e se o homem nao a crer fiel e
firmemente, nao podera ser salvo.

4°. 0 CREDO DE CALCEDONIA. 0 Imperador Marciano


convocou o quarto Concilio ecumenico para reunir-se em
Calcedonia, na Bitinia, sabre o mar B6sforo, frente a
Constantinopla, para suprimir as heresias eutiquiana e
nestoriana. 0 condlio foi composto de 630 bispos e esteve
em sessao de 8 ate 31 de outubro de 451 d.C.
A principal parte da "Defini<;ao de Fe" em que concordou
esse concilio foi como segue:
"Nos, pais, seguindo aos santos Pais, todos unanime-
men te, ensinamos aos homens a confessar, urn s6 e o
mesmo Filho, nos so Senhor Jesus Cristo; o mesmo
perfeito em deidade, e perfeito, tambem, em humanidade;
verdadeiramente Deus, e tambem, verdadeiramente
homem, de uma alma racional e corpo; consubstancial
com o Pai segundo a deidade, e consubstancial conosco

155
Capitulo 7
.
segundo a humanidade; em tudo semelhante a n6s, mas
sem pecado; gerado do Pai antes de todos os seculos,
segundo a deidade, e nestes ultimos dias, por n6s e pela
nos sa sal va~ao, nasceu de Maria, a virgem mae de Deus
segundo a humanidade. E urn s6 eo mesmo Cristo, Filho,
Senhor, unigenito, existindo em duas naturezas sem
mistura, sem mudan~a, sem divisao, sem separa~ao; nao
sendo, de modo algum, destruida a diversidade das duas
naturezas por sua uniao, porem sendo conservadas as
propriedades peculiares de cada natureza, e concorrendo
para (formar) uma s6 pessoa e uma s6 subsistencia, nao
separadas ou divididas em duas pessoas, e sim urn s6 e o
mesmo Filho, e Unigenito, Deus o Verbo, o Senhor Jesus
Cristo; assim como os profetas, desde o principio,
declararam acerca dEle, e como o proprio Senhor Jesus
Cristo nos ensinou, e como o credo dos santos Pais nos
transmitiu".
Corn esse credo cornpletou-se o desenvolvirnento da
doutrina ortodoxa sobre a Trind<J,de de Pessoas no Deus (mico,
e sobre a dualidade de naturezas no Cristo unico. Perrnanece
como exposis,:ao universalrnente respeitada da fe cornurn da
Igreja.

5. Quais os Simbolos Doutrinarios da igreja de Roma?


Alern dos credos suprarnencionados, todos os quais sao
de autoridade reconhecida na igreja cat6lica rornana, seus
sfrnbolos de fe mais autorizados sao:
1. 0 Os Canones e Decretos do Concilio de Trento, o qual os
romanistas consideram como o vigesimo condlio ecumenico,
e foi convocado pelo papa Pio IV, para sustar o progresso
da Reforma (1545-1563 d.C.). Os decretos contem as exposi-
s,:6es positivas da doutrina papal. Os canones explicarn os
decretos, distribuem a materia sob breves tftulos e condenam
as doutrinas opostas em cada ponto. Se bern que o sistema de
doutrina ensinado seja propositalmente ambfguo, e evidente
mas nao consequentemente semipelagiano.

156
Credos e Confissoes
2. 0 0 Catecismo Romano, ou Catecismo do Concilio de Trento,
que explica e confirma os canones do Concilio de Trento, foi
composto por ordem de Pio V, e promulgado por autoridade
de Pio V, em 1566.
3. 0 0 Credo do Papa Pio IV, tam bern chamado Professio
Fidei Tridentinae ouForma Professionis Fidei Catholicae, contem
urn sumario das doutrinas ensinadas nos Canones e Decretos
do Concilio de Trento, e foi promulgado numa bula pelo
papa Pio IV, em 1561. Subscrevem-no todos os mestres e
eclesiasticos cat61ico-romanos, seja qual for seu grau, e todos
os convertidos do protestantismo.
E como segue:
"Eu, F, creio e professo com fe firme todas e cada uma
das coisas contidas no simbolo de fe usado na santa igreja
cat6lica romana; a saber, creio num s6 Deus Pai, todo-
-poderoso, Criador do ceu e da terra, e de todas as coisas
visiveis e invisiveis; e em urn s6 Senhor Jesus Cristo,
Filho unigenito de Deus, gerado do Pai antes de todos os
seculos; Deus de Deus, Luz de Luz, verdadeiro Deus de
verdadeiro Deus, gerado, nao feito, consubstancial com o
Pai, por quem foram feitas todas as coisas; o qual, por
amor de n6s os homens e pela nossa salva~ao desceu do
ceu, encarnou por obra do Espirito Santo, e nasceu da
Virgem Maria, e se fez homem; foi crucificado por amor
de nos sob o poder de Poncio Pilatos, padeceu e foi
sepultado, e ao terceiro dia ressuscitou segundo as
Escrituras, e subiu ao ceu, esta sentado a mao direita do
Pai, e tornara a vir com gloria para julgar os vivos e os
mortos; cujo reino nao tera fim; e no Espirito Santo, o
Senhor e Doador da vida, que procede do Pai e do Filho,
o qual, junto com o Pai e o Filho, e adorado e glorificado,
o qual falou pelos santos profetas; e numa s6 igreja santa,
cat6lica e apost6lica. Confesso urn s6 batismo para a
remissao dos pecados, e espero a ressurrei~ao dos mortos
e a vida eterna no mundo futuro. Amem.
"Admito e abra~o firmissimamente as tradi~6es apos-
t6licas e eclesiasticas, e todas as outras constitui~6es e

157
Capitulo 7
institui~oes da mesma igreja. Admito tambem as Santas
Escrituras no sentido em que as abra~ou e abrac:;a a santa
madre igreja, a quem pertence julgar do verdadeiro sentido
e interpreta<;ao das Escrituras; e nunca hei de toma-las
ou interpreta-las de urn modo que nao seja de
conformidade com o unanime consenso dos padres.
Professo tambem que ha verdadeira e propriamente sete
sacramentos na lei nova, instituidos por Jesus Cristo nosso
Senhor, e necessarios para a salvac:;ao dos homens, se bern
que nem todos o sejam para todos - a saber, batismo,
confirmac:;ao, eucaristia, penitencia, extrema-unc:;ao,
ordem e matrimonio, e que conferem gra~a; e desses,
batismo, confirma~ao e ordem nao se pode reiterar sem
sacrilegio. Recebo tambem e admito as cerimonias da
igreja cat6lica romana, recebidas e aprovadas na adminis-
trac:;ao solene de todos os sacramentos supramencionados.
Recebo e abra<;o todas e cada uma das coisas definidas e
declaradas no santo Condlio de Trento a respeito do
pecado e da justifica~ao. Professo igualmente que na missa
se oferece a Deus urn sacrificio verdadeiro, proprio e
propiciat6rio pelos vivos e pelos mortos; e que no san-
tissimo sacramento da eucaristia estao verdadeira, real e
substancialmente o corpo e o sangue, junto com a alma e
a divindade de nosso Senhor Jesus Cristo, e que se faz
uma conversao da substfmcia inteira do pao em seu corpo,
e da substancia inteira do vinho em seu sangue, a qual
conversao a igreja cat6lica romana chama transubs-
tanciac:;ao. Confesso tambem que debaixo de cada uma das
especies separadamente se recebe o Cristo todo e inteiro,
e urn verdadeiro sacramento. Sustento com constancia
que ha urn purgat6rio, e que as almas detidas nele sao
ajudadas com o sufragio dos fieis. Tambem que os santos,
que reinam juntamente com Cristo, devem ser honrados
e invocados, que _oferecem ora~oes a Deus por n6s, e que
se deve venerar suas reliquias. Afirmo firmissimamente
que as imagens de Cristo, e da mae de Deus sempre
virgem, e tambem as dos demais santos, deve-se ter e
conservar, e se lhes deve tributar a devida honra e

158
Credos e L'onjzssoes
venera~ao. Afirmo tambem que o poder das indulgencias
foi deixado por Cristo na igreja, e que o uso delas e
sumamente saudavel ao povo cristao. Reconhe~o a santa
igreja cat6lica e apost6lica, mae e mestra de todas as
igrejas; e prometo e juro verdadeira obediencia ao bispo
romano, o sucessor de S. Pedro, principe dos ap6stolos e
vigario de Jesus Cristo. Professo tambem, e recebo
indubitavelmente todas as demais coisas estatuidas,
definidas e declaradas pelos santos canones e concilios
ecumenicos, e especialmente pelo santo Concilio de
Trento (e estatuidas, definidas e declaradas pelo Concilio
Ecumenico Vaticano, especialmente as que dizem respeito
a primazia e a infalibilidade do pontifice romano.*
"E condeno, rejeito e anatematizo igualmente todas as
coisas contnirias a isso, e todas as heresias, quaisquer que
sejam, condenadas, rejeitadas e anatematizadas pela igreja.
Esta verdadeira fe cat6lico-romana, fora da qual ninguem
pode ser salvo, que professo agora livremente e abra~o
verdadeiramente, eu, F., prometo, protesto e juro abra~ar
com toda a constancia e professar a mesma toda e inteira,
com a ajuda de Deus, ate ao fim da minha vida; e procurar,
ate onde chegarem as minhas for~as, que a mesma seja
abra~ada, ensinada e pregada por todos os que estao sob
minha autoridade, ou foram confiados ao meu cuidado,
em virtude do meu oficio, com a ajuda de Deus e destes
santos evangelhos de Deus - Amem".
4. 0 0 Santo Concilio Ecumenico Vaticano foi convocado por
Pio IX; reuniu-se na Basilica do Vaticano em 8 de dezembro
de 1869, e continuou suas sess6es ate ao dia 20 de outubro de
1870, depois do qual foi suspenso indefinidamente.
Os decretos desse concilio dividem-se em duas se~6es:
(1) "A Constitui~ao Dogmatica sobre a Fe Cat6lica". Esta
abrange quatro capitulos. 0 capitulo 1 trata de Deus como
Criador; o capitulo 2, da revela~ao; o capitulo 3, da fe; o capitulo

* Acrescentado pela "Sagrada Congrega~ao do Concilio", 2 de janeiro de


1887.

159
Capitulo 7
4, da fe e a razao. A estes seguem-se dezoito canones que con- '~
denam os erros do racionalismo e da incredulidade modernos.
(2) "Primeira Constitui~ao Dogmatica sobre a lgreja de
Cristo". Esta abrange tambem quatro capitulos. 0 capitulo 1
tern por titulo: "Da institui~ao da primazia apost6lica em Pedro
bem-aventurado"; o capitulo 2: "Da perpetuidade da primazia
de Pedro bem-aventurado nos pontifices romanos"; o capitulo
3: "Do poder e da natureza da primazia do pontifice romano". ~
A materia nova vern nos dois ultimos capitulos, que ensinam
o absolutismo papal, e a infalibilidade papal. Estas defini~6es
ja foram apresentadas em extensao suficiente no capitulo 5
deste livro.
Em conseqiiencia desse principio de infalibilidade Papal,
segue-se necessariamente que a serie inteira de bulas papais, e
especialmente as que foram dirigidas contra os jansenistas; o
Decreto de Pio IX "Sobre a imaculada concei~ao da bem-
-aventurada Virgem Maria", promulgado a 8 de dezembro de
1854, e seu Syllabus de erros, de 8 de dezembro de 1864, sao
todos infaliveis e irreformaveis, e sao partes dos espantosos
Simbolos de Fe que sao de autoridade indiscutivel na igreja
cat6lica romana!

6 Quais sao os simbolos normais de doutrina da Igreja Grega?


A lgreja Primitiva, por causas primariamente politicas e
eclesiasticas e secundariamente doutrinarias e rituais, dividiu-
-se em duas grandes se~6es- a lgreja Oriental, ou grega, e a
lgreja Ocidental, ou latina. Essa divisao tomou corpo no setimo
seculo e foi consumada no oitavo. A lgreja Grega abrange cerca
de oitenta milh6es de pessoas- a maioria dos suditos cristaos
do imperio turco, e as igrejas nacionais da Grecia e da Russia.
Todas as igrejas protestantes procederam da divisao ocidental
ou latina da lgreja.
A lgreja Grega arroga-se, preeminentemente, o titulo de
"Ortodoxa" porque os originais credos ecumenicos, definindo
as doutrinas da Trindade e da Pessoa de Cristo, foram

160
Credos e Confissoes
produzidos na divisao oriental da lgreja Primitiva e na lingua
grega, e sao por isso, em sentido especial, a sua heran<;a; e
porque, sendo a sua teologia absolutamente estacionaria,
contenta-se ela com a repeti<;ao literal das formulas antigas.
Adere aos credos antigos e as decis6es doutrinais dos sete
primeiros condlios ecumenicos, e possui alguns catecismos e
confiss6es modernos. Os mais importantes deles sao:
1°. A "Confissao Ortodoxa da lgreja Grega Cat6lica e
Apost6lica", composta por Pedro Mogilas, metropolitano de
Kiev, na Russia, em 1643, e aprovada por todos os patriarcas
do Oriente.
2°. Os "Decretos do Condlio de Jerusalem", ou Confissao
de Dositeo, 1672.
3°. Os Catecismos Russos, que tenham a san<;ao do santo
Sinodo, especialmente o Catecismo Maior, de Philaret,
metropolitano de Moscou, 1820- 1867, aprovado unanime-
mente por todos os patriarcas orientais, e desde 1839 usado
geralmente nas igrejas e escolas da Russia.
Os decretos do Sinodo de Jerusalem ensinam substan-
cialmente, posto que menos definidamente, a mesma doutrina
que o Condlio de Trento quanta as Escrituras e a tradi<;ao, as
boas obras e a fe, a justifica<;ao, aos sacramentos, ao sacrificio
da missa, ao culto dos santos e ao purgat6rio.
0 Catecismo de Filareto aproxima-se mais do principia
evangelico da supremacia da Biblia em materias de fee vida
cristas, do que qualquer outra exposi<;ao feita pela lgreja
Oriental.

7. Quais sao os simbolos normais de doutrina da Igreja


Luterana?
Alem dos grandes credos gerais que aceitam em comum
todos os cristaos, seus simbolos de fe sao:
1°. A Confissiio de Augsburgo, cujos autores comuns foram
Lutero e Melanchthon. Depois de assinada pelos principes e
lideres protestantes, foi apresentada ao lmperador e a Dicta

161
Capitulo 7
imperial, em Augsburgo, em 1530. E a mais antiga confissao
protestante, a base fundamental da teologia luterana, * e a (mica
norma doutrinaria universalmente aceita nas igrejas luteranas.
Consta de duas grandes divis6es. A primeira, que contem vinte
urn artigos, apresenta uma exposic;:ao positiva das doutrinas
cristas como os luteranos as entendem; a segunda, com sete
artigos, condena os principais erros caracteristicos do roma-
nismo. E evangelica, no sentido agostiniano, posto que nao
seja tao exata na exposic;:ao como o sao as confiss6es calvinistas
mais perfeitas, e contem naturalmente os germens das opini6es
peculiares dos luteranos quanta anecessidade dos sacramentos
para a salvac;:ao, e quanta arela~ao dos sinais sacrainentais com
a grac;:a que significam. Contudo, estas peculiaridades estao
tao lange de serem expostas explicitamente, que Calvina achou
esta confissao tao consoante com suas ideias sabre as verdades
divinas que a subscreveu durante a sua residencia em
Estrasburgo.
Em 1540, dez anos depois ·de adotada como simbolo
publico da Alemanha protestante, Melanchthon preparou e
publicou uma edi~ao em latim, na qual fizera diversas
alteras;6es e que, par isso, ficou conhecida como a Variata
enquanto se chamava Invariata a confissao original e (mica
autentica. As mudan~as principais introduzidas nessa edi~ao
tendem a opini6es sinergistas ou arminianas a respeito da grac;:a
divina de urn lado, e do outro, a ideias quanta aos sacramentos
que sao mais simples e mais de conformidade com a das igrejas
reformadas. Veja: History of Christian Doctrine, de Shedd, Liv.
7, cap. 2; e, tambem, a exata e erudita edi~ao ilustrada da Conf.
de Augsburgo, do Dr. Charles Krauth, D.D.
2°. AApologia (Defesa)da Confissiio deAugsburgo, preparada
por Melanchthon, em 1530, e subscrita pelos te6logos

* Isto parece um tanto equivoco. Os te61ogos luteranos, assim como os das


demais denominac;6es protestantes, dizem que a base fundamental (the
ultimate basic) de sua teologia e a Bfblia, e nao a Confissao de Augsburgo.

162
, Credos e Confissoes
protestantes em 1537, em Esmalcalda.
3°. Os Catecismos Maior e Menor de Lutero, 1529 d.C., "o
prirneiro para uso dos pregadores e professores, eo outro para
guia dos jovens."
4°. Os Artigos de Esmalcalda, preparados por Lutero, ern
1536, e subscritos pelos te61ogos evange1icos, ern fevereiro de
15 37, na cidade cujo nome trazern.
5°. A Formula Concordia; (Forma de Acordo), preparada
ern 1577 por Jacob Andrese e Martinho Chernnitz e outros,
corn o firn de por terrno a certas controversias que se haviarn
suscitado na Igreja Luterana, especialrnente (1) a respeito da
a~ao relativa da gra~a divina e da vontade humana, na obra da
regenerac;ao; (2) a respeito da natureza da presenc;a do Senhor
na eucaristia. Esta Formula contern urna exposi<;ao rnais
cientifica e rnais bern desenvolvida da doutrina 1uterana do
que qua1quer outra que se possa achar nos seus sirnbolos
publicos. Sua autoridade, porern, ereconhecida s6 pe1o partido
extrema dos luteranos, isto e, por aque1e partido, na Igreja,
que leva conseqiienternente as peculiaridades da teologia
luterana ao seu rnais cornpleto desenvolvirnento 16gico.
Todos estes sirnbolos luteranos acharn-se editados,
acuradarnente, ern latirn emLibri Symbolici, pelo Dr. C. A. Hase,
l.cipzig, 1836, e ern Creeds of Christendom, pelo Dr. Schaff.

8. Quais as principais Confissoes das Igrejas Reformadas ou


( :alvinistas ?
As Confiss6es das Igrejas Reforrnadas sao rnuito consi-
dcraveis ern nurnero, e variarn urn tanto ern caniter, posto que
concordern substancialrnente quanta ao sistema de doutrina
que ensinarn. Veja:
l. 0 A rnais antiga confissao daquele ramo do protestan-
r ismo, que nao estava satisfeito corn a tendencia e corn o
simholo luterano, eaConfessio Tetratpolitna -porque os te6logos
de quatro cidades do sul da Alernanha, Estrasburgo, Cons-
tance, Merningen e Lindau, preparararn-na e a apresentararn

163
Capitulo 7
ao imperador na mesma Dieta de Augsburgo, em 1530, em
que foi apresentado o primeiro simbolo luterano. Dos te6logos
que se ocuparam em sua preparac;,:ao, o principal foi Martinho
Bucer, de Estrasburgo. Consta de vinte e dois artigos, e
concorda geralmente com a Confissao de Augsburgo. Os pontos
de diferenc;,:a pertencem a doutrina sobre os sacramentos.
Quanto a esse assunto e zuingliana. Em 1532, porem, essas
quatro cidades adotaram a Confissao de Augsburgo, de modo
que a Confessio Tetrapolitana deixou de ser o simbolo adotado
formalmente por qualquer ramo da lgreja Luterana.
2. 0 As confiss6es reformadas de maior autoridade entre
as igrejas sao as seguintes:
( 1) A Segunda Confissao Helvetica, preparada por Bullinger,
em 1564, e publicada em 1566, substituiu a Primeira Confissao
Helvetica de 15 36. Foi adotada por todas as igrejas reformadas
da Suic;a, com excec;,:ao da de Basileia (que conservou a
primeira), e pelas igrejas reformadas da Polonia, da Franc;a, da
Hungria e da Esc6cia, e tern sido considerada sempre por
todas as igrejas reformadas como da maior autoridade.
(2) 0 Catecismo de Heidelberg, preparado por Ursino e
Oleviano, em 1562. Foi estabelecido pela autoridade civil como
o simbolo normal de doutrina, como tambem como meio de
ensino religioso, para as igrejas do Palatinado - naquele tempo
urn Estado alemao que incluia as duas margens do Reno. Foi
aprovado pelo Sinodo de Dort, e e simbolo normal de doutrina
das igrejas reformadas (alemas e holandesas) da America do
Norte. Era usado na Esc6cia para ensino das crianc;as, antes da
adoc;ao dos Catecismos da Assembleia de Westminster, e seu
uso foi sancionado unanimamente pela primeira Assembleia
Geral da lgreja Presbiteriana Unida dos Estados Unidos, em
1870. Veja as Atas.
(3) Os Trinta e noveArtigos da Jgreja da Jnglaterra. Em 1552,
Cranmer, auxiliado por outros bispos, preparou os Quarenta e
dois Artigos de Religiiio que foram publicados por autoridade
do Rei, em 1553. Foram revistos e reduzidos ao numero de

164
Credos e ConfissiJes

t rinta e nove pelo arcebispo Parker e outros bispos, e ratificados


pclas duas Casas de Convoca~ao e publicados por autoridade
do Rei, em 1563. Constituem o Simbolo normal de doutrina
da Igrejas Protestantes Episcopais da Inglaterra, da Irlanda,
da Esc6cia, das Colonias e dos Estados U nidos da America do
Norte. Tern sido discutida, e sem motivo algum, a questao sobre
sc estes artigos sao ou nao calvinistas; pois 0 decimo setimo
Artigo,Da PredestinafaO e EleifaO, e decisivo e e como segue:
"A predestinas;ao a vida e o eterno prop6sito da
Deidade, pelo qual (antes de lans;ados os fundamentos do
mundo) Deus tern decretado, por Seu conselho oculto a
n 6s, livrar da maldis;ao e condenas;ao os que elegeu em
Cri sto, dentre OS homens, e conduzi-los por Cristo a
salvac,rao eterna. Por isso, os que se acham dotados de urn
tao excelente beneficia de Deus sao chamados, segundo o
proposito divino, por Seu Espfrito, atuando no devido
te mpo: pela gras;a obedecem ao chamamento; sao
justificados livremente; sao feitos filhos de Deus por
adoc,rao; sao formados a imagem de Seu unigenito Filho,
Jesus Cristo; vivem religiosamente em boas obras e, afinal,
chegam, pela misericordia de Deus, a felicidade eterna.
"Assim como a piedosa considerac,rao da predestinac,rao
c da nossa eleic,rao em Cristo esta cheia de urn suavfssimo,
doce, e inexplicavel conforto para as pessoas devotas, e as
que sentem, em si mesmas, a operas;ao do Espirito de
Cristo, que vai mortificando as obras da carne e seus
membros terrenos, e levantando OS SeUS pensamentOS as
coisas altas e celestiais, nao so porque estabelece e con-
firm a muito a sua fe na salvas;ao eterna que hao de gozar,
por meio de Cristo, mas tambem porque torna mais
fcrvo roso o seu amor para com Deus; assim tambem, para
as pessoas curiosas e carnais, destituidas do Espfrito de
Cr isto, o ter, de continuo, ante os olhos a sentenc,ra da
prcdestinas;ao divina e urn precipicio muitissimo peri-
goso, por onde o diabo as arrasta ao desespero, ou a que
viva m numa seguran~a de vida impurfssima, nao menos
pt:rigosa do que o desespero.

165
Capitulo 7
"Ademais, devemos receber as promessas de Deus do
modo pelo qual nos sao, geralmente, propostas nas
Escrituras Sagradas; devemos seguir, em nossas obras, a
vontade divina que nos e declarada expressamente na
Palavra de Deus".
Estes artigos, purgados do seu calvinismo e reduzidos em
numero a vinte e cinco, inclusive urn novo artigo politico
(o vigesimo terceiro ), ado tan do como artigo de fe o sistema
politico do governo dos Estados Unidos, constituem o simbolo
normal de doutrina da Igreja Metodista Episcopal da America.
(4) Os Canones do Sinodo de Dart. Este celebre sinodo foi
convocado para reunir-se em Dort, Holanda, por autoridade
dos Estados Gerais, como fim de por termo as controversias
suscitadas pelos discipulos de Arminio. Suas sess6es tiveram
continuidade de 13 de novembro de 1618 a 9 de maio de 1619.
Constava de pastores, presbiteros regentes e professores
teol6gicos das igrejas da Holanda, e deputados das igrejas da
Inglaterra, da Esc6cia, de Hesse, de Bremen, da Sui~a e do
Palatinado. Os canones desse sinodo foram aceitos por todas
as igrejas reformadas como uma exibi~ao exata, verdadeira e
eminentemente revestida de autoridade do sistema calvinista
de teologia. Constituem, juntos com o Catecismo de Heidel-
berg, a confissao doutrinaria da Igreja Reformada da Holanda,
e de sua filha, a Igreja Reformada (holandesa) da America.
(S)A Confissiio e os Catecismos daAssembliia de m;stminster.
Esta assembleia de te6logos foi convocada por ato do
Parlamento Amplo, votado em 12 de junho de 1643. A convo-
ca~ao original abrangia dez membros da Camara Alta, ou dos
lordes, e vinte da Camara Baixa, ou doscomuns, como membros
leigos, e cento e vinte e urn te6logos, aos quais se acrescentaram
depois vinte ministros, ficando assim representadas as diversas
opini6es quanto ao governo da Igreja. Essa corpora~ao
continuou em sessao de 1ode julho de 1643 ate 22 de fevereiro
de 1649. A Confissao e os Catecismos que produziram foram

166
Credos e Confissoes
imediatamente adotados pela Assembh~ia Geral da Igreja da
Escocia. Tambem a Convenc;ao Congregacional, convocada por
Cromwell, que se reuniu em Savoy. Londres, em 1658, aprovou
a parte doutrinal da Confissao e dos Catecismos da Assembleia
de Westminster, e incorporou, quase inteiramente, em sua
propria confissao, aDeclarafiio de Savoy. ''A diferenc;a entre as
duas confiss6es e tao pequena que OS independentes rnodernos
tern, por assirn dizer, abandonado o uso dela (a Declarac;ao de
Savoy) ern suas farnflias, e concordado corn os presbiterianos
em usar os Catecisrnos da Assernbleia"- Neal, Puritans,
vol. 2, pag. 178. Essa Confissao, juntarnente corn os Catecisrnos
Maior e Menor, sao os sirnbolos norrnais de doutrina de
todas as igrejas presbiterianas no rnundo, de derivac;ao inglesa
ou escocesa. E tarnbern, de todos os credos, o que e rnais
' stimado por todas as igrejas dos congregacionalistas, na
I nglaterra e America.
Todas as assembleias que se reunirarn na Nova Inglaterra
corn o firn de estabelecer a base doutrinal de suas igrejas, ou
aprovararn ou adotararn, explicitarnente, essa Confissao e esses
<:arecisrnos como exposic;6es exatas da sua propria fe. Fez assirn
o Sinodo que se reuniu em Cambridge, Massachusetts, em
junho de 1647, e outra vez em agosto de 1648, e preparou a
Plataforma de Cambridge. Fe-lo tambem o Sinodo reunido em
Boston, ern setembro de 1679, e ern maio de 1680, e que
produziu a Confissiio de Boston. Tam bern o fez o Sino do reunido
·m Saybrook, Connecticut em 1708, o qual produziu a
fJfataforma de Saybrook.
3a. Ha ainda rnais algumas confiss6es reformadas que,
•mbora nao sejarn sirnbolos normais de doutrina de grandes
lenominac;6es de cristaos, sao, contudo, de muito interesse
1<1ssico e de autoridade por causa de seus autores ou das
i r unstancias ern que se originararn.
( 1) 0 Consensus Tigurinus ou Consensus de Zurich, ou "0
·onscnso mutuo dos pastores da Igreja de Zurich e de Joao

167
Capitulo 7
Calvino, pastor da igreja de Genebra, a respeito da doutrina
do sacramento." Constava de vinte e seis artigos, tratando
exclusivamente de quest6es que diziam respeito a Ceia do
Senhor, e foi preparado por Calvino, em 1549, como fim de
efetuar acordo mlituo entre todos os partidos da Igreja
Reformada a respeito das quest6es de que trata. Foi subscrito
pelas igrejas de Zurich, Genebra, St. Gall, Schaffhausen,
N eucha tel, Basileia e dos Grisons, e recebido favoravelmente
em todas as diversas partes da Igreja Reformada, e fica
monumento excelso da doutrina verdadeira da Igreja Refor-
mada sobre essa questao tao discutida. Ede valor especialmente
porque exp6e com muita clareza e com autoridade indubitavel,
as verdadeiras opini6es de Calvino sobre esta materia, expostas
deliberadamente depois de haver deixado de fazer esfon;:os
vaos, no intuito de conseguir a unidade do protestantismo por
meio de uma concessao as opini6es luteranas quanto a presen~a
do Senhor na eucaristia.
No apendice achar-se-a uma tradu~ao exata desse
documento importante.
(2) 0 Consensus Genevensis foi preparado por Calvino, em
1552, em nome dos pastores de Genebra, e e uma exposi~ao
completa das ideias de Calvino sobre a Predestinafiio. Tinha
por fim unir todas as igrejas sui~as em suas ideias a respeito
desse ponto. Fica como monumento proeminente dos
principios fundamentais do verdadeiro ca1vinismo.
(3) A Formula Consensus Helvetica, elaborada em Zurich,
em 1675, por Joao Henrique Heidegger, de Zurich, ajudado
por Francisco Turretino, de Genebra; e Lucas Gern1er, de
Basileia. Seu titulo e: "Forma de acordo das grejas reformadas
sui~as, a respeito da doutrina da gra~a universal, das doutrinas
ligadas a essa, e de alguns outros pontos". Tinha por fim unir
as igrejas sui~as em condenar e excluir a forma modificada do
calvinismo que naquele seculo emanava da Escola Teol6gica
de Saumur, e representada por Amyraldo, P1aceo, etc. Esta e a

168
Credos e Confissi5es

mais cientifica e completa de todas as confiss6es reformadas.


A proeminencia de seus autores* eo fa to de representar distin-
1ivamente a escola mais perfeitamente consequente dos
calvinistas antigos a tornam de muito interesse classico. Foi
subscrita por quase todas as igrejas sui~as, mas em 1722 deixou
deter autoridade publica como confissao. ** Todas as confiss6es
das igrejas reformadas acham-se publicadas num s6 volume
na Collectio Confessionum in Ecclesiis Reformatis publicatarum,
por Dr. H. A. Niemeyer, Leipzig, 1840, e em Creeds of
Christendom, por Dr. Schaff.

+<Ve jaHerzog's Real-Encyclopedia, Bombe1ger's Translation. Artigo,Helvetic


:onfessions.

1 -lC Aparecera traduzida no apendice.

169
8

Os Atributos de Deus

1. Quais os tres metodos de determinar os atributo~ que pertencem


ao S er divino?
1°. 0 metoda de analisar a ideia da perfei<;iio infinita e
absoluta. Este metoda procede com base no postulado de que
nos, como agenres marais e inteligentes, fomos criados a
imagem de Deus. Neste processo atribuimos a Deus toda a
excel en cia da qual temos experiencia ou ideia, em grau infinito,
e em perfei<;iio absoluta, e negainos que ele seja de qualquer
modo imperfeito ou limitado.
2°.0 metoda de inferir suas caracteristicas pelas obras dele
que vemos ao redor de nos, e da nossa experiencia pelo modo
como nos trata.
3°. 0 ensino didatico das Escrituras, a elucida<;iio que nela
nos e dada do Seu cararer, na Sua revela<;iio sobrenatural e
dispensa<;6es cheias de gra<;a, e sobretudo na revela<;iio pessoal
de Deus em Seu filho Jesus Cristo.
Todos estes metodos concordam entre si, suplementam-
-se e limitam-se mutuamente. A ideia da perfei<;iio absoluta e
infinita, que em certo sentido nos e inata, auxilia-nos na
interpreta<;:iio das Escrituras, e estas corrigem as inferencias da
raziio natural e poem o selo da autoridade divina em nossas
opini6es sobre a natureza divina.

2. Ate onde podemos ter a certeza que a realidade objetiva


corresponde com as nossas concepfi5es subjetivas da natureza divina?
A respeito deste ponto ha duas posi<;6es extremas e opostas

170
Atributos de Deus
que e necessaria evitarmos:
1a. A primeira posis;ao extrema de supormos que as nossas
·onceps;6es de Deus sao, quer em especie quer em grau,
adequadas para representar a realidade objetiva de Suas
perfeis;6es. Deus e incompreensfvel por nos no sentido de que
(a) fica sempre uma parte imensuravel da Sua natureza e da
Sua excelencia da qual nao temos nem podemos ter conheci-
mento; e (b) mesmo aquila que sabemos dEle, sabemos muito
imperfeitamente e concebemos muito inadequadamente. A
esse respeito, a imperfeis;iio do conhecimento que os homens
tern de Deus e analoga em especie, em bora infinitamente maior
em grau aimperfeis;ao do conhecimento que uma crians;a pode
tcr da vida de urn grande fil6sofo ou estadista, morando na
rnesma cidade. A crians;a nao s6 sabe que o fil6sofo ou estadista
vive - mas sabe tambem, ate certo ponto real, a que eessa vida
e, contudo, o seu conhecimento e muito imperfeito, tanto
porque apreende s6 uma parte muito pequena dessa vida, como
1am be rn porque com preen de s6 muito imperfeitamente
mcsmo essa pequena parte.
za. A segunda posis;ao extrema que devemos evitar eo de
supor que o nosso conhecimento de Deus e ilus6rio, que nossas
·onceps;6es das perfeis;6es de Deus nao correspondem, em grau
nlgum, a realidade objetiva. "Sir" William Hamilton, o Sr.
Mansel e outros, depois de provarem que somas obrigados a
J ·nsar em Deus como "causa prirnaria", como "infinito" e
11
absoluto", procedem a dar definis;6es destes termos abstratos,
los quais tirarn, entao, a conclusao necessaria de que esses
1 ·rmos envolvem contradis;6es mutuas que a razao hurnana
uuo pode tolerar. Em seguida, tiram a conclusao de que as
nossas conceps;6es de Deus nao podem corresponder a real
·xist<! ncia objetiva do Ser divino. "0 pensarmos que Deus seja
I tuilo que pensamos que e, e blasfemia." A ultima e rnais
o· rna consagras;ao da verdadeira religiao nao pode ser outra
nisa que urn altar "ao Deus desconhecido e a quem nao nose
1nssfvcl conhecer" ("Sir" William Hamilton,Discussions, pag.

171
Capitulo 8
22). Sustentam eles que todas as representa~6es de Deus
comunicadas nas Escrituras, e as melhores concep~6es que n6s,
como auxilio das Escrituras, podemos formar dEle, de modo
algum correspondem a realidade objetiva, e que nao tern por
fim dar-nos conhecimento real e cientifico, e sim, servir-nos
'
como postulados reguladores "muito instrutivos para o
sentimento e para a a~ao", e suficientes, praticamente, para as
nossas necessidades atuais; "suficientes para dirigir a nossa
vida, mas nao para satisfazer anossa inteligencia -niio nos dizem
o que Deus eem Si, e sim o que Ele quer que pensemos a Seu respeito"
-Mansel, Limits of Religious Thought, pag. 132.
Esse modo de pensar leva realmente ao ceticismo, se nao
ao ateismo dogmatico, se bern que nao era esse o fim que
tinham em vista esses autores. (1) Baseia-se numa definis;ao
artificial e inaplicavel de certas no~6es abstratas mantidas por
alguns fil6sofos a respeito do "absoluto" e do "infinito". Como
mostraremos logo afrente (Pergunta 6) uma defini~ao verda-
deira do absoluto e do infinito, no sentido em que as Escrituras
e OS homens nao sofisticados dizem que Deus e absoluto e
infinito, nao envolve contradi~ao ou absurdo algum. (2)
Demonstrar-se-a abaixo (Pergutas 3 e 5) que temos born funda-
mento para o postulado segundo o qual, como seres morais e
inteligentes, fomos real e verdadeiramente criados a imagem
de Deus, e que por isso podemos conhece-10 como Ele
realmente e. (3) Sea nossa consciencia intimae as Escrituras
Sagradas nos apresentam conceps;6es ilus6rias quanto ao que
Deus e, nao temos motivo algum para confiar nelas quando
nos dizem que Deus e, ou que existe. (4) Esse principia leva
ao ceticismo absoluto. Se o nosso Criador quer que pensemos
nEle de urn modo diverso da verdade, nao temos motivo para
confiar em nossos instintos ou faculdades constitutivas quanto
aos outros ramos do conhecimento. (5) Esse principia eimoral,
porque faz de falsas representa~6es dos atributos divinos o
principia regulador da vida morale religiosa dos homens. (6)
Os ditames mais exaltados e mais certos da razao humana

172
Atributos de Deus
produzem necessariamente a convic~ao de que OS princfpios
marais e a natureza essencial de quaisquer atributos marais
nao podem deixar de ser os mesmos em todos os mundos e em
todos os seres possuidores, em qualquer sentido, de urn carater
moral. A verdade, a justi~a, o am ore a benevoH~ncia nao podem
deixar de ser no Criador aquila mesmo que sao na criatura, e
em Deus aquila mesmo que sao no homem.

3. Que eantropomorfismo, e quais os diversos sentidos em que


se emprega essa palavra?
Antropomorfismo e palavra empregada para designar
qualquer opiniao sobre a natureza de Deus que o considere
como se possuisse ou exercesse quaisquer atributos seme-
lhantes aos do homem.
Os antropomorfistas antigos sustentavam que Deus tern
partes e 6rgaos corporais como os nossos, e que devem ser
tomadas em sentido literal todas as passagens das Escrituras
que falam em Seus olhos, maos etc.
Os panteistas, "Sir" W Hamilton, e alguns outros fil6sofos,
dizem que todas as nossas concep~6es de Deus como urn
Espirito pessoal, etc., sao antropomorfisticas- isto e, sao modos
de conceber que nao estao em conformidade com a verdade
objetiva, e sim sao determinados necessariamente pelas
condi~6es subjetivas dos modos humanos de pensar.
Segue-se, pois, que enecessaria tomar-se a palavra em do is
sentidos:
1°. No hom sentido, no qual, des de que o hom em foi criado
aimagem de Deus como urn espirito racional e livre, e bibli-
co, racional, e esta de acordo com a verdade objetiva, que
pensemos em Deus como possuindo, em perfei~ao absoluta
quanta a especie, e em perfei~ao absoluta quanta ao grau, e
sem nenhuma limita~ao, todos os atributos essenciais que
pertencem aos nossos espiritos. Quando dizemos que Deus
sabe, quer e sente, que Ele e jus to, verdadeiro e misericordioso,
o senti do dessas afirma~6es eque Lhe atribuimos atributos da

173
Capitulo 8
mesma especie que os atributos que tern esses nomes e que
pertencem aos homens, mas, em Deus, em perfei~ao absoluta
e sem limites.
zo. A palavra e empregada em mau sentido quando utilizada
para designar urn modo de pensar em Deus como se houvesse
nEle qualquer imperfei~ao ou limita~ao. Pensar em Deus, por
exemplo, como se tivesse maos ou pes, ou experimentasse em
Si as perturba~6es das paix6es humanas, ou de qualquer outro
modo semelhante, seria urn antropomorfismo falso e indigno
dEle.

4. Como devemos entender as passagens das Escrituras que


atribuem a Deus membros corporais e as fraquezas pr6prias da
paixao humana?
As passagens a que se faz referencia sao aquelas em que se
fala norosto ouface de Deus, como em Ex. 33:11 e 20; em Seus
olhos, 2 Cron. 16:9; em Suas narinas, 2 Sam. 22:9; em Seus
brafos oupes, Is. 52: 10; Sal.18:9. E as passagens que falam dEle
arrepender-Se, entristecer-Se e estar cansado, como Gen, 6:6,
7; Jer. 15:6; Sal. 95:10; em enfurecer-Se, como Deut. 29:20,
etc. Estas express6es devem entender-se como metaforas.
Representam s6 analogicamente a verdade a respeito de Deus,
e como nos parece, de nosso ponto de vista. Que Deus nao
pode ser material demonstraremos adiante, na pergunta 20.
Quando o texto diz que Ele Se arrepende, Se entristece,
que ezeloso, que esta irado, etc., s6 quer dizer que Se com porta
para com os homens como urn homem se comportaria quando
agitado por essas paix6es. Essas metciforas encontram-se,
principalmente, no Velho Testamento, e ali, nas passagens
muito ret6ricas dos livros poeticos e profeticos.

5. Quais as provas de que nao so sao necessdrias, mas tambem


sao vdlidas, as concepfi5es antropom6rficas de Deus, tomada essa
palavra no seu bam sentido?
0 fa to fundamental em que se baseia toda a ciencia, toda a

174
Atributos de Deus
teologia e toda a religiao e que Deus fez o homem alma viva, a
Sua propria imagem. A nao ser assim, o homem nao poderia
compreender mais das obras de Deus do que da Sua natureza,
e todas as rela<;6es de pensamentos e sentimentos entre eles
seriam impossiveis. Que o homem tern o direito de pensar em
Deus como a fonte original e totalmente perfeita das qualidades
morais e racionais que nEle se acham, provam os seguintes
fatos:
1°. E determinado assim pelas leis necessarias da nossa
natureza. (1) E materia da nossa consciencia intima. Se cremos
em Deus, e-nosforfoso crer nEle como espirito pessoal, racional
e reto. (2) Mesmo nas adultera<;6es aviltantes da mitologia paga
as concep<;6es que se fazem de Deus sao universalmente
semelhan tes a essa. ;I,.·: · · · t· •
2°. Nao ha outro modo possivel de conhecermos a Deus.
Haveremos sempre de fazer a nossa escolha entre o principia
que sustentamos eo ateismo absoluto.
3°. 0 mesmo e determinado tambem pelas leis necessarias
de nossa natureza moral. A natureza moral do homem, inata e
indestrutivel, inclui o sentimento de sujei<;ao a uma vontade
reta superior a nossa, e de responsabilidade perante urn
Governador moral. Mas isso seria urn absurdo se o Governador
moral nao fosse, no nosso sentido das palavras, urn espirito
pessoal inteligente e reto. '·
4°. 0 argumento mais duravel e satisfat6rio para estabelecer
o fa to da existencia de Deus, eo argumento a posteriori baseado
nas provas de "designio" que vemos nas obras de Deus. E se
este argumento e valido para estabelecer o fato da existencia
de Deus, e valido tam bern para provar que Ele possui e exerce
inteligencia, inten<;ao benevola e a faculdade de escolher, ou
seja, que Ele e, em nosso sentido dos termos, urn espirito
pessoal e inteligente.
5°. As Escrituras atribuem caracteristicamente esses
mesmos atributos a Deus, e em toda parte propugnam Sua
existencia. ·· :.• !.i.;<'(Jl
j " ••• :;.'··

175
Capitulo 8
6°. Deus, manifestado na Pessoa de Jesus Cristo, que e a
1
imagem expressa da Pessoa do Pai, exibiu em todas as situa~6es
esses mesmos atributos, e tambem o fez de tal modo que
demonstrou sempre ser Deus tao verdadeiramente como era
;
hom em. 1

6. Qual e0 sentido dos termos "infinito" e "absoluto", e qual 0


sentido em que eles sao aplicados a natureza de Deus e a cada um
dos Seus atributos?
A defini~ao que Hamilton e Mansel dao de infinito e:
"aquilo que esta livre de toda limitac;;ao possivel; aquilo que e
tamanho que nao se pode conceber urn maior. e que, por
conseguinte, nao pode receber atributos adicionais, ou urn
modo de existencia adicional que nao possuisse ja, desde toda
a eternidade"; e sua definic;;ao doabsoluto e: "aquilo que existe
de per si, nao tendo nenhuma relac;;ao necessaria para com
outros seres". Baseados nestas definic;;6es, argumentam (1) que
aquilo que e infinito e absoluto deve incluir em si a soma total
de todas as coisas, o bern e o mal, o atual e o possivel; porque,
se estivesse excluido dele alguma coisa real ou possivel, nao
seria mais infinito e absoluto e sim, finito e relativo; (2) que
nao pode ser objeto de conhecimentos, porque aquilo que e
conhecido fica, por isso mesmo, limitado, porque fica definido;
e etam bern estabelecida assim uma relac;;ao entre o conhecido
e a pessoa que o conhece; (3) que nao pode ser pessoa, porque
a consciencia pessoal implica limitac;;ao e mudanc;;a; (4) que
nao pode conhecer outras coisas, porque o conhecer implica
relac;;ao, como ja foi dito - Discussions por Hamilton, Art. 1;
Limits of Religious Thought, por Mansel, Lectures 1, 2 e 3.
Todos estes devaneios 16gicos nascem do fa to de tomarem
esses fil6sofos, como ponto de partida, a premissa falsa de urn
abstrato "infinito" e "absoluto" e substituindo isso pela Pessoa
verdadeiramente infinita e absoluta revelada nas Escrituras e
na consciencia humana como a causa primaria de todas as
coisas, o Governador morale Redentor dos homens.

176
Atributos de Deus
"Infinito" quer dizer o que nao tern limites. Quando
dizemos que Deus e infinito no Seu Ser, conhecimento, ou
poder, queremos dizer que Sua essen cia e as propriedades ativas
desta nao tern limita~6es que envolvam imperfei~6es de
qualquer especie que seja. Ele transcende todas as limita~6es
do tempo e do espa~o, e conhece todas as coisas de urn modo
absolutamente perfeito. Pode fazer tudo quanto quer por
intermedio de meios ou sem eles, e com facilidade e sucesso
perfeitos. Quando OS homens dizem que Deus e infinito na
Sua justi~a, bondade ou verdade, isso significa que na Sua
natureza inexaurivel e imutavel possui esses atributos em
perfei~ao absoluta.
''Absoluto", quando aplicado a Deus, quer dizer que Ele e
uma Pessoa eterna e auto-existente, que existia antes de todos
os demais seres, e que e a causa inteligente e voluntaria de
tudo quanto mais existiu, existe agora, ou em qualquer tempo
ha de existir em todo o universo, etc., e que por isso Ele niio
mantem relar;iio necessaria com nada que existia fora dEle. Tudo
quanto existe esta condicionado a Deus, assim como o drculo
esta condicionado a seu centro; mas Deus, seja quanto a Sua
existencia, seja quanto a qualquer dos modos dela, nao esta
condicionado a nenhuma das Suas criaturas, nem a cria~ao
como urn todo. Deus eo que eporque e, e Ele quer aquilo que
quer porque "assim e do seu agrado". Tudo o que mais existe
e o que e porque Deus queria que fosse o que e. Toda rela~ao
que Ele sus tern para com aquilo que esta fora dEle foi por Ele
tomada voluntariamente.

7. Quais os diversos modos pelos quais as Escrituras revelam


Deus?
Revelam Deus -1°. Por meio de Seus nomes. 2°. Por meio
das obras que Lhe sao atribuidas. 3°. Por meio de Seus
atributos. 4°. Por meio do culto que elas requerem que Lhe
seja prestado. 5°. Pela manifesta~ao de Deus em Cristo.

177
Capitulo8
8. Qual a etimologia e a significafao dos diversos names dados
a Deus nas Escrituras?
1°. JEOVA, do hebraicoHayah, ser. Exprime auto-existencia
e imutabilidade; e 0 nome incomunicavel de Deus que OS
l
judeus, por motivo supersticioso, nunca pronunciam,
substituindo-o, na sua leitura do Velho Testamento, no origi-
nal, pelo nomeAdonai, SENHOR. E este ultimo nome substitui
o de J eova tam bern na vulgata e em diversas outras vers6es.
JAH, provavelmente abreviatura de Jeova, e empregado
principalmente nos Salmos.- Sal. 68:4, no original. Ea ultima
sllaba da palavra "aleluia" , louvai a Jeova.
A Moises Deus deu a conhecer Seu nome peculiar - EU
SOU 0 QUE SOU- Ex. 3:14, da mesma raiz que Jeova, e com a
mesma significa~ao fundamental.
2°. EL, poder, forfa, traduzindo Deus, e aplicado tanto a
deuses falsos como ao Deus verdadeiro- Is. 44:10.
3°. ELOIM e ELOAH, sen do os do is o mesmo nome, o ultimo
sendo a forma singular, eo primeiro, a forma plural. Ederivado
de Alah, temer, reverenciar. N a sua forma singular e usa do s6
nos livros poeticos enos menos antigos. Na sua forma plural e
usado, as vezes, no sentido plural de deuses; mais comumente,
porem, como umpluralis excellentice, aplicado a Deus. Eaplicado
tambem a deuses falsos, mas de preferencia, a Jeova como o
grande objeto de adora~ao.
4°. ADONA!, o Senhor pluralis excellentice aplicado
exclusivamente a Deus, exprimindo possessao e dominio
absoluto, equivalente a Senhor, aplicado tantas vezes a Cristo
noN ovo Testamento.
5°. SADDAI, onipotente, urn pluralis excellentice. As vezes
aparece s6, como em J 6 5: 17; e, as vezes, e precedido de EL,
como em Gen. 17:1.
6°. ELY ON, o EZEBAexcelso, adjetivo verbal de alach- subir
-Sal. 9:2; 21:7. . . <i' ·1l.1~; .
7°. 0 termo TZEBAOTH, dos exercitos, e usado freqi.iente-
mente como epiteto qualificativo de urn dos names

8
Atributos de Deus
supramencionados de Deus, como: Jeova dos Exercitos, Deus
dos Exercitos,JeovaDeus dos Exercitos- Amos 4: 13; Sal. 24:10.
Alguns tomam isso como o equivalente de: Deus das batalhas.
Mas o verdadeiro sentido e: "Soberano das estrelas, dos
exercitos materiais do ceu, e dos anjos, seus habitantes"- Dr.
J. A. Alexander, Com. on the Psalms, 24:10, e Gesenius, Heb.
Lex. 1 ···-~r;p /! ~t~. £ ~, ·_, · •

8°. Muitos outros epftetos sao aplicados a Deus, em senti do


metaf6rico, para expor a relac;ao que sustenta para conosco
e os oficios que Ele desempenha,e.g. Rei, Legislador, Juiz.
Is. 33: 17; Sal. 24:8; Sal. 50:6; Rocha, Fortaleza, Redentor: 2
Sam. 22:2,3; Sal. 62:2; Pastor, Agricultor: Sal. 23: 1; Joao
15:1; Pai:Mat.6:9; Joao20:17,etc. ""'·· .,._,c __ , ·

9. Que siio atributos divinos ?


Os atributos divinos sao as perfeic;6es atribuidas aessencia
divina nas Escrituras, ou exercidas visivelmente por Deus, nas
Suas obras da criac;ao, da providencia e da redenc;ao. Nao sao
propriedades ou estados da essen cia divina separaveis, de fa to
ou na hipotetica, dessa mesma essencia divina, como sao
separaveis da essencia da criatura as propriedades e modos de
tudo o que foi criado. 0 conhecimento de Deus e Sua essencia
conhecendo; Seu amor e Sua essencia amanda; Sua vontade e
Sua essencia querendo; e todos estas qualidades nao sao
capacidades latentes de ac;ao, nem estados que mudam, mas
estados coexistentes e eternamente imutaveis da essencia
divina, a qual, tanto a respeito do estado e modo, como a
respeito da existencia, e "a mesma de on tern, hoje, eo sera por
todos os seculos", e "sem mudanc;a, nem sombra de variac;ao".
A respeito da natureza e das operac;6es de Deus, podemos
saber tao-somente o que Lhe aprouve revelar-nos, e em todas
as nossas concepc;6es, quer da Sua natureza, quer dos Seus atos,
havera sempre, e necessariamente, urn elemento de incom-
preensibilidade que e inseparavel da infinidade. 0 Seu
conhecimento e o Seu poder excedem tanto a compreensao

179
Capitulo 8
como a Sua eternidade e imensidade- }611:7-9; 26:14; Sal.
139:5,6; Is. 40:28. Os elementos morais da Sua natureza
gloriosa sao a norma ou o tipo original de nossas faculdades
morais; e assim e que nose possivel compreender os supremos
prindpios de verdade e justi~a sobre os quais Ele opera. A
verdade, a justi~a e a bondade sao naturalmente os mesmos
atributos, quer em Deus, quer nos anjos, quer no homem. Ao
mesmo tempo, aquilo que Deus faz, de conformidade com
esses principios, e, muitas vezes, uma prova para a nossa fe, e
da ocasiao para 0 adorarmos maravilhados - Rom . 11 :33-36;
Is. 55:8,9.

10. Que quer dizer o termo SIMPLICIDADE, quando aplicado


a Deus pelos te6logos?
0 termo "simplicidade" e empregado, primeiro, em
oposi~ao a composi~ao material, quer mecanica, organica ou
quimica; em segundo lugar, em senti do metaflsico, para negar a
rela~ao de substancia e propriedade, de essencia e modo. No
primeiro sentido da palavra, a alma humana e simples, porque
nao e composta de elementos, partes ou 6rgaos. No segundo
sentido da palavra, nossas almas sao complexas, porque ha
nelas distin~ao entre Sua essencia e Suas propriedades, e Seus
modos ou estados sucessivos de existencia. Sen do Deus, porem,
infinito, eterno, autoexistente desde toda a eternidade,
necessariamente sempre o mesmo sem sucessor, os te6logos
sustentam que nEle a essencia, as propriedades e os modos sao
uma s6 e a mesma coisa. Esempre aquilo que e; e Seus diversos
estados de intelec~ao, emo~ao e voli~ao nao sao sucessivos e
transit6rios, e sim coexistentes e permanentes; e Ele e essen-
cialmente aquilo que e, e tao necessariamente como o e a Sua
existencia. 0 que haem Deus, quer seja pensamento, emo~ao,
voli<;;ao, ou urn ato, e Deus.
Alguns pensam em Deus como passando por diversos
modos e estados transit6rios, como passam os homens, e por
conseguinte sup6ern que as propriedades da natureza divina

180
Atributos de Deus
sao relacionadas com a essencia divina como as propriedades
das coisas criadas sao relacionadas com as coisas dotadas com
elas. Outros levam tao longe a ideia de simplicidade que negam
haver distin<;;ao alguma nos pr6prios atributos divinos, e
sup6em que a unica diferen~a entre eles esta no modo pelo
qual se manifestam externamente, enos efeitos produzidos.
Ilustram sua ideia pelos diversos efeitos que o mesmo raio de
luz do sol produz em diversos objetos.
Para evitar estes dois extremos, os te6logos costumam
dizer que os atributos divinos diferem uns dos outros e da
essencia divina, 1°. naorealiter, ou assirn como urna coisa difere
de outra, ou de qualquer modo que irnplique composi<;;ao ern
Deus. Nern, 2°. meramentenominaliter, como se niio houvesse
em Deus coisa alguma que corresponda realrnente a nossas
concep<;;6es de Suas perfei<;;6es. Mas, 3°. diz-se que diferern
virtualiter, de modo que ha nEle base ou rnotivo adequado
para todas as representa<;;6es feitas nas Escrituras a respeito
das perfei<;;6es divinas, e para as concep<;;6es que por isso nos
ternos delas- Turretino,Institutio Theologicce, Locus 3; Quaes.
5 e 7; e Dr. C. Hodge, Lectures.

11. Quais os diversos principios segundo os quais se tem pro-


curado classificar os atributos divinos? ',!_, ··' •
A irnensidade do assunto e a incornensurabilidade de
nossas faculdades tornarn evidente que nenhurna classifica<;;ao
que possarnos fazer pode ser rnais do que aproxirnadarnente
exata e cornpleta. A classifica~ao cornum tern por base os
seguintes principios:
1°. Distinguern-se como absolutos e relativos. Urn atributo
absoluto e urna propriedade da essencia divina considerada
em si: e.g., auto-existencia, imensidade, eternidade, inteli-
gencia. Urn atributo relativo e uma propriedade da essencia
divina considerada em rela~ao a cria~ao: e.g., onipresen~a,
onisciencia, etc. ;...,, '>.ur;,;nln:?~" ·
2°. Distinguern-se tarnbem como afirmativos e negativos.

181
Capitulo8
Urn atributo afirmativo euma qualidade que exprime alguma
perfeic;ao positiva da essencia divina: e.g., onipresenc;a,
onipotencia, etc. Urn atributo negativo e uma qualidade que
nega qualquer defeito ou limitac;ao de qualquer modo nas
perfeic;6es divinas: e.g., irnutabilidade, infinidade, incompre-
ensibilidade, etc.
3°. Distinguern-se cornocomunicaveis eincomunicaveis. Os
atributos cornunicaveis sao aqueles corn os quais os atributos
do espirito hurnano tern algurna analogia: e.g., poder, conhe-
cimento, vontade, bondade e retidao. Os incomunicaveis sao
aqueles quanta aos quais nao ha na criatura nada que lhes seja
analogo: e.g., eternidade, irnensidade, etc. Esta distinc;ao,
porem, necessariarnente nao deve ser levada lange demais.
Deus e infinito em relac;ao ao espac;o e ao tempo; nos somos
finitos ern relac;ao a urn e a outro. Mas Ele nao emenos infinito
quanta ao Seu conhecimento, a Sua vontade e a Sua retidao
ern todos os Seus rnodos, enos somas finitos em todos estes
aspectos. Todos os atributos divinos que conhecemos ou que
podernos conceber sao cornunicaveis, por terern suas analogias
ern nos; entretanto todos sao igualrnente incomunicaveis, por
serern todos infinitos ern Deus.
4°. Os atributos de Deus distinguern-se como naturais e
morais. Os naturais sao todos os que Lhe pertencern por ser
Ele urn Espirito infinito e racional: e.g., eternidade, irnensi-
dade, inteligencia, vontade, poder. Os marais sao os dernais
atributos, que Lhe pertencern por ser Ele Espirito infinito e
reto: e.g., justic;a, misericordia, verdade.
Eu proporia, sern rnuita seguranc;a, a classificac;ao
seguinte:
(1) Os atributos que qualificarn igualrnente todos os outros
- injinidade, aquila que nao tern lirnites: absolutidade, *aquila
que nao e deterrninado, nern quanta a Sua existencia, nern

* N eologismo usado por Odayr Olivetti para fins exclusivamente tecnico-


-teol6gicos.

182
Atributos de Deus
quanto ao modo da Sua existencia ou da Sua a9ao, por coisa
alguma que haja fora dEle proprio. Isso inclui a imutabili-
dade. ' ·' .r :· t r '1 i t':{ 1 _-; ¥ ' ~ .- •' • .I ••• " _; ~ ~
;- • ;-;_.. ><"

(2) Os atributos naturais: Deus e Espfrito infinito, auto-


existente, eterno, imenso, simples, livre na vontade, inteligente,
poderoso.
(3) Os atributos morais. Deus e Espirito infinitamente
reto, verdadeiro e fiel.
(4) A gloria excelsa de todas as perfei<;6es divinas em uniao:
a formosura da SANTIDADE de Deus.

A UNIDADE DE DEUS .. ''

12. Quais os dais sentidos da palavra em que UNIDADE eum


predicado de Deus?
1°. Deus e(mico: ha urn so Deus, com exclusao de qualquer
outro.
2°. Embora haja tripla distin<;ao pessoal na unidade da
Deidade, essas tres Pessoas sao numericamente uma so
substancia ou essencia, e constituem urn so Deus indivisivel.

13. Como se pode provar a proposifiiO de que Deus e um e


indivisivel? .. · "' .<·:T .• ,. :; .-
1°. Parece haver na razao uma necessidade de concebermos
a Deus como urn so. Aquilo que einfinito e absoluto nao pode
deixar de ser urn so, indivisivel em essencia. Se Deus nao e
urn so, segue-se que ha mais de urn Deus.
2°. A representa<;ao uniforme das Escrituras - Joao 10:30.

14. Como se prova pelas Escrituras que a proposifiiO segundo


a qual ha um s6 Deus everdadeira?
Com passagens como as seguintes: Deut. 6:4; 1 Reis 8:60;
Is. 44:6; Mar. 11 :29,32; 1 Cor. 8:4; Ef. 4:6. <::,·~,

183
Capitulo 8
15. Que argumenta se tira da harmonia da criafiiO a favor da
unidade divina?
A cria<;ao inteira entre os dois extremos, ate onde chega a
observa<;ao telesc6pica e microsc6pica, e manifestamente urn
s6 sistema indivisivel. Ja provamos, porem (Cap. 2), a existencia
de Deus, pelos fenomenos do universo; e argumentamos agora,
partindo do mesmo principia, que, se urn efeito e prova da
opera9ao previa de uma causa, e se evidencias de inten9ao e
designio provam a existencia de quem tencionava, entao a
singeleza e a unidade de urn plano e sua operas;ao nesse designio
e na sua execu<;ao provam tambem que quem teve o designio
foi UMS6.

16. Sabre este ponto, que argumento se tira da existencia


necessaria de Deus?
Diz-se que a existencia de Deus e necessaria porque desde
toda a eternidade tern sua causa em si mesma. E a mesma em
todo o tempo e no espa<;o inteiro. E urn absurdo pensar em
Deus como nao existindo em qualquer tempo e em qualquer
parte do espa<;o, enquanto que, com respeito a todas as demais
existencias, elas dependem pura e simplesmente da vontade
de Deus, e por isso sao contingentes. No entanto, a necessidade
que e uniforme em todos OS tempos e em qualquer parte do
espa<;o e evidentemente uma s6 e indivisivel, e s6 pode ser a
base da existencia de urn s6 Deus.
Este argumento e 16gico, e muitos distinguidos te6logos
o valorizam em muito. Parece, porem, envolver o erro de
supor-se que a 16gica humana pode sera medida da existencia.

17. Que argumento se tira da perfeifiio infinita para provar


que s6 pode haver um Deus?
Deus e infinito em Seu Sere em todas as Suas perfei<;6es.
Mas o que e infinito, por incluir tudo, exclui tudo o mais da
mesma especie. Se houvesse dois seres infinitos, cada urn deles
incluiria necessariamente o outro, e seria por este incluido, e

184
Atributos de Deus
seriam assim urn s6 e o mesmo ser identico. E certo que a
ideia da coexistencia de dois seres infinitamente perfeitos
repugna tanto a razao humana como as Escrituras. ''!
- } ' • :. • , J"·l> Jl ~ . J!,J> .• - ! ~

18. Que epoliteismo? E dualismo?


Politeismo, como indica a etimologia da palavra, e urn
termo geral que designa todos os sistemas de religiao que
ensinam a existencia de mais de urn Deus.
Dualismo e o nome que se da ao sistema que reconhece a
existencia de dois principios originais e independentes no
universo, urn borneo outro mau, e que atualmente esses dois
prindpios estao numa rela<;:ao de antagonismo incessante,
esfor<;:ando-se sempre o born prindpio por opor-se ao mau
principia e por livrar o mundo da sua intrusao malefica.

A ESPIRITUALIDADE DE DEUS

e e
19. Que que se ajirma, e tambem que que se nega na proposifGO
segundo a qual Deus eEspirito?
N ada sabemos de uma substancia, senao o que se manifesta
por suas propriedades. Materia e a substancia cujas proprie-
dades se manifestam diretamente aos nossos sentidos corporais.
Espirito ea substancia cujas propriedades se manifestam a nos
diretamente na autoconsciencia, e s6 inferencialmente por meio
de palavras e outros sinais ou modos de expressao, mediante
os nossos sentidos.
Quando dizemos que Deus e Espirito, o sentido e:
1°. Negativamente, que Ele nao possui partes nem paix6es
corporais; que nao Se comp6e de elementos materiais; que
nao esta sujeito a nenhuma das condi<;:6es que limitam a
existencia material; e que, por conseguinte, nao pode ser
apreendido por nenhum de nossos sentidos corporais.
2°. Positivamente, que Ele e urn ser racional que distingue
com precisao infinita entre o verdadeiro eo falso; que e urn
ser moral, que distingue entre o born e o mau; que e agente

185
Capitulo8
livre, cujas a<;:6es sao determinadas s6 por Sua propria vontade;
e, enfim, que todas as propriedades essenciais de nossos
espiritos podem tambem realmente ser asseveradas a respeito
dEle, e em grau infinito.
Esta grande verdade e inconciliavel com a doutrina
segundo a qual Deus e a alma do mundo (anima mundi), uma
for<;:a plastica, organizadora, inseparavel da materia; e tam bern
com a doutrina gn6stica da emana~ao, e com todas as formas
do materialismo e do panteismo modernos.

20. Quais as provas de que Deus eEspirito?


P. As Escrituras o afirmam expressamente - Joao 4:24.
2a. Nossa ideia das perfei<;:6es infinitas e absolutas de Deus.
A materia e obviamente inferior ao espirito, e dela sao
inseparaveis muitas imperfei~oes e limita~oes. A materia,
consistindo em atomos separados e atuando incessantemente
uns sobre os outros, nao pode ser "uma", nem "infinita", nem
"imutavel", etc. E sente-se que a ideia de que a materia esta
em uniao como espirito em Deus, como eo caso do homem,
avilta a Deus e 0 sujeita as limita<;:6es do tempo e do espa<;;o.
3a. Nao haem parte alguma nenhum ind1cio de proprie-
dades materiais no Criador e Governador providencial do
universo- enquanto que todas as provas da exisH~ncia de Deus
testificam tambem que Ele e uma pessoa de sabedoria, benevo-
lencia, retidao e poder supremos - isto e, que e urn espirito
pessoal.

A RELA<_;AO DE DEUS COM 0 ESPA(_;O

21. Que eque se en ten de pela imensidade de Deus?


"Imensidade de Deus" ea frase empregada para expressar
o fato de que Deus einfinito em Sua rela<;;ao como espa<;;o, isto
e, que a inteira essencia indivisivel de Deus esta sempre
presente concomitantemente em toda parte do espa~o inteiro
e 1menso.

186
Atributos de Deus
Nao se acha presente assim em virtude de alguma
multiplica~ao infinita do Seu Espirito, porque o Espirito e
eternamente urn so e individual; nem e isso resultado de
alguma difusao infinita da sua essencia pelo espa~o imenso,
assim como o ar esta difuso sobre a superficie da terra; porque,
sen do Espirito, nao ecomposto de partes, nem se pode estender;
mas a Deidade inteira, em Sua essencia (mica e indivisivel,
esta sempre presente igualmente, a todo momento da dura~ao
eterna, em todo o espa~o infinito e em cada parte dele.

22. Como difere imensidade de onipresenfa? ··


Imensidade ea caracteristica de Deus em rela~ao ao espa~o
tornado em sentido abstrato. Onipresen~a ea caracteristica de
Deus em rela~ao as Suas criaturas como estas ocupam, cada
qual por si, certo lugar no espa~o. A essencia divina (Deus) e
absolutamente imensa em Sua propria natureza; eonipresente
em rela~ao a todas as Suas criaturas.

23. Quais os diversos modos da presenfa divina, e como se


pode provar que Deus esta presente em toda parte quanta a Sua
essencia?
Podemos pensar em Deus como presente em qualquer
parte ou com qualquer criatura, de diversos modos: 1°. Quanto
a Sua essencia; 2°. Quanto ao Seu conhecimento; 3°. Manifes-
tando a Sua presen~a a qualquer criatura inteligente; 4°.
Manifestando o Seu poder de qualquer modo na criatura
humana ou sobre ela. Quanto a Sua essencia e ao Seu conhe-
cimento, a Sua presen~a e sempre e em toda parte a mesma.
Quanto a Sua automanifesta~ao e ao exercicio do Seu poder, a
Sua presen~a manifesta-se de inumeros modos e graus
diferentes. Assim, por exemplo, esta presente para a Sua Igreja
de urn modo diverso daquele pelo qual o esta para o mundo;
esta presente no inferno na manifesta~ao e execu~ao da Sua
justa ira, e no ceu o esta na manifesta~ao e comunica~ao da
Sua gra~a, do Seu amor e da Sua gloria.

187
Capitulo 8
24. Como provar que Deus eonipresente quanta aSua essencia?
Que Deus e onipresente quanto aSua essencia fica provado:
1°. Pelas Escrituras (1 Reis 8:27; Sal. 139:7-10; Is. 66: 1; Atos
17:27,28). 2°. Pe1a razao. (1) E conseqiiencia necessaria da
Sua infinidade. (2) Pelo fato de que o Seu conhecimento e
Sua essencia conhecendo, e Suas a~6es sao Sua essencia agindo.
Contudo, o Seu conhecimento eo Seu poder estendern-se a
todas as coisas.

25. Como expor as diversas relafi5es que as corpos (que sao


espiritos criados) e Deus tem com o espafo?
Turretino diz: "entendernos que os corpos existern
circunscritivamente no espa~o, porque, ocupando certa porfao
do espa~o, acharn-se cercados por todos os lados pelo espac;:o;
os espiritos criados nao ocuparn parte a1gurna do espa~o, nern
sao abarcados pelo espa~o, e, contudo, estao no espac;:o
definidamente, como aqui, e nao acola; Deus, porern, esta no
espa~o repletivamente, porque de urn modo transcendente a
Sua essencia enche o espa~o todo. Nao esta incluido ern parte
algurna, nern excluido de parte algurna. Inteirarnente pre-
sente ern toda parte, cornpreende ao rnesrno tempo o espa~o
inteiro."
0 tempo eo espa~o nao sao nern substancias, nern quali-
dades, nern sirnplesrnente rela~6es. Eles constituern urn genero
separado, absolutarnente distinto de todas as dernais entidades,
e por conseguinte irnpossivel de classificar. "Sabernos que o
tempo e o espac;:o existern; sabernos tarnbern, por provas
suficientes, que Deus existe; mas nao ternos rneios de saber
como o tempo e o espa~o se acharn relacionados corn
Deus."' A ideia de "Sir" Isaac Newton - Deus durat semper e
adest ubique, et, existendo semper et ubique, durationem et spatium
constituit * - e por certo urna ideia sublime; porern duvido
*Deus dura para sempre e esta presente em toda parte, e, existindo sempre e
em todo lugar, constitui a durafiiO eo espafO. Em latim no original. Nota de
Odayr Olivetti.

188
Atributos de Deus
muito que a inteligencia humana possa afirmar ditatorial-
mente que e uma ideia Hio verdadeira quanto sublime" -
McCosh,Intuitions of the Mind, pag. 212.

A RELA<;Ao DE DEUS COM 0 TEMPO

26. Que ea eternidade?


A eternidade edura~ao infinita; dura~ao despida de todos
os lirnites, sern principia, sern sucessao, sern firn. Os esco-
lasticos charnavarn-na punctum stans, isto e, urn presente que
perrnanece sernpre e para sernpre.
Podernos, porern, conceber a eternidade positivarnente
como dura~ao estendida infinitamente do rnomento atual ern
duas dire~6es, para o passado e para o futuro, charnadas irnpro-
priarnente eternidade a parte ante, ou passada, e eternidade a
parte post, ou futura. A eternidade de Deus e, porem, urna s6
e indivisivel. Eternitas est una individua et tota simul.

27. Que e0 tempo?


Tempo e dura~ao lirnitada, rnedida pela sucessao, ou do
pensarnento ou do rnovirnento. Distingue-se ern referencia a
nossas percep~6es ern passado, presentee futuro.

28. Que relafiiO tem o tempo com a eternidade?


A eternidade, o presente sem mudan~a, sem principia e
sem fim, cornpreende o tempo inteiro, e coexiste como urn
momento nao dividido, junto corn todas as sucess6es do tempo
a medida que aparecern e passam em sua ordern.
Podernos pensar, porern, s6 sob as lirnita~6es do tempo e
do espa~o. Podemos pensar em Deus s6 do modo finito de
deterrninar primeiro e executar depois, de prorneter ou amea~ar
prirneiro, e curnprir depois a Sua palavra, etc. Aquele que
habita na eternidade transcende infinitamente a nossa
inteligencia. Is. 57:15.

189
Capitulo8
29. Quando dizemos que Deus eeterno, que eque afirmamos, e
que eque negamos? ~
Afirmamos, JO. que, quanto a Sua existencia, nunca teve
principia e nunca teni fim; 2°. que, quanto ao modo da Sua
existencia, Seus pensamentos, emo~6es, prop6sitos e atos, eles
sao invariaveis, unos e inseparaveis, sempre os mesmos; e 3°.
Que Ele e imutavel. J
Negamos, 1°. Que Deus teve principia ou que tera fim;
2°. que ha varia~ao nos Seus estados ou modos de ser; e 3°.
que a Sua essencia, os Seus atributos e os Seus prop6sitos em
qualquer tempo mudadio.

30.Em que sentido eque sefala nos atos de Deus como passados,
presentes efuturos?
No tocante a Deus, os Seus atos nunca sao passsados,
presentes ou futuros, senao somente quanto aos objetos e aos
efeitos produzidos na criatura. 0 prop6sito eficiente,
compreendendo o objeto, o tempo e todas as circunstancias,
estava-Lhe presente sempre e sem mudan~a; o evento, porem,
sucedendo no tempo, eassim passado, presente ou futuro para
nos.

31. Em que sentido e que OS eventos sao futuros ou passados


para Deus?
Sendo infinito o conhecimento de Deus, segue-se, 1°. que
todos os eventos estao sempre igualmente presentes ao Seu
conhecimento, e desde toda a eternidade para toda a eternidade;
mas, 2°. esses eventos Lhe sao conhecidos como realmente
sucedem, e.g., em Sua natureza e em Suas rela<;:6es e sucess6es
verdadeiras. E, pois, real e verdadeira esta distin<;:ao - o
conhecimento que Deus tern dos eventos e sem principia, fim
ou sucessao; nao obstante, Ele os conhece assim como sao em
si, sucedendo-se no tempo como passados, presentes ou futuros,
em sua rela<;:ao entre si.

190
Atributos de Deus
A IMUTABILIDADE DE DEUS

32.Que i que se entende por imutabilidade de Deus?


Por Sua imutabilidade entendemos que e conseqti.encia
da perfei~ao infinita de Deus; que Ele nao pode ser mudado
por coisa alguma fora dEle, e que nao mudani por causa de
nenhum principia que haja nEle; que, quanta a Sua essencia,
a Sua vontade e aos Seus modos de existencia, E1e e sempre,
de eternidade a eternidade, o mesmo. Assim, e absolutamente
imutavel em Si mesmo. E e imutavel tambem em rela~ao as
Suas criaturas, pais no Seu conhecimento, no Seu prop6sito e
na Sua verdade, como nos os concebemos e nos sao revelados,
nao ha mudan~a nem sombra alguma de varia~ao.- Tia. 1:17.

33. Como se prova pelas Escrituras e pela raziio que Deus i


imutavel?
1°. Pelas Escrituras: Mal.3:6; Sal.33: 11; Is. 46: 10; Tia. 1:17.
2°. Pela razao: (1) Deus e auto-existente. Como nao e
causado por nada e e a causa de tudo, nao pode ser mudado
por nada, porem muda tudo. (2) Eo Ser absoluto. Nem a Sua
existencia, nem o modo dela, nem a Sua vontade, sao
determinados por nenhuma rela~ao necessaria que eles
sustenham com coisa alguma fora dEle. Assim como Ele
precedeu tudo e causou tudo, assim tambem a Sua vontade
soberana determinou livremente as relac;oes que Ele permite
que essas coisas tenham com Ele. (3) E infinito em durac;ao, e
por isso nao pode sofrer variac;ao ou mudanc;a. (4) E infinito
em todas as Suas perfeic;oes, em conhecimento, sabedoria,
retidao, benevolencia, vontade, poder, e por isso nao pode
mudar, porque ao infinito nada se pode acrescentar e dele nada
se pode tirar. Qualquer mudanc;a 0 tornaria ou menos do que
infinito antes, ou menos do que infinito depois.

34. Como conciliar com a imutabilidade de Deus a criafiio do


mundo e a encarnafiio do Filho? . ,·. i i~ :

191
Capitulo 8
1°. Quanta acria<;:ao. 0 proposito eficaz, a determina<;:ao e
o poder de criar o mundo residiram em Deus desde a
eternidade, mas esse mesmo proposito eficaz era ode produzir
efeito no tempo e na ordem apropriados. 0 efeito foi produzido
por Deus, porem isso nao implica nem sombra de mudan<;:a
em Deus, pois nada Lhe foi tirado nem acrescentado.
2°. Quanta aencarna~ao. 0 Filho divino assumiu, numa
uniao pessoal conSigo, uma natureza humana criada. Sua
essencia incriada nao sofreu mudan<;:a alguma. Sua Pessoa
eterna nao mudou, mas so entrou numa nova rela<;:ao. A
mudan<;:a efetuada por esse even to estupendo ocorreu somente
na natureza criada do hom em Jesus Cristo.

A INTELIGENCIA INFINITA DE DEUS

35. Em que aspectos o modo de conhecer de Deus difere do


nosso?
0 conhecimento de Deus e, 1°. Sua essencia conhecendo;
2°. Urn so ato eterno, totalmente compreensivo e indivisivel.
(1) Nao e discursivo, isto e, nao procede logicamente do
conhecido para 0 desconhecido; e sim intuitivo, is toe, discerne
tudo diretamente asua propria luz.
(2) Eindependente, isto.e, nao depende de modo algum das
criaturas ou de suas a<;:6es, e sim unicamente da Sua propria
intui<;:ao infinita de todas as coisaspossiveis aluz da Sua propria
razao, e de todas as coisas atuais efuturas aluz do Seu proprio
proposito eterno.
(3) E total e simultanaeo, nao sucessivo. E urn so ato
indivisivel de intui<;:ao, vendo todas as coisas em si mesmas,
suas rela<;:6es e sucess6es, como sempre presentes.
(4) E perfeito e essencial, nao relativo, isto e, Ele conhece
todas as coisas diretamente, em suas essencias ocultas, enquanto
nos as conhecemos so por suas propriedades e em suas rela<;:6es
com os nossos sentidos.
(5) Nos conhecemos imperfeitamente o presente e im-

192
Atributos de Deus
perfeitamente nos recordamos do passado, enquanto que do
futuro nada sabemos. Deus, porem, conhece perfeitamente
todas as coisas presentes, passadas e futuras por urn olhar
total, nao sucessivo e totalmente compreensivo.

36. Como os te6logos definem esta perfeifiiO divina?


Diz Turretino, Locus 3, 2:12- ''A respeito do conhecimento
de Deus, deve-se, antes de tudo, tomar em considera~ao duas
coisas, a saber, o seu modo eo seu objeto. 0 modo do conheci-
mento divino consiste em que Deus conhece todas as coisas
perfeita, imunivel, individual e distintamente, e assim
distingue-se o Seu conhecimento daquele dos homens e dos
anjos. 1. Ele conhece todas as coisas perfeitamente, porque as
conhece por Si mesmo ou por Sua propria essencia, e nao
pelos fenomenos das coisas, como as criaturas conhecem
objetos. 2. Ele conhece todas as coisas individualmente, porque
as conhece intuitivamente, por urn ato direto de cogni~ao, e
nao inferencialmente, por meio de urn processo de raciodnio
discursivo, ou pela compara~ao de uma coisa com outra. 3.
Ele conhece todas as coisas distintamente, isto e, nao reline OS
diversos predicados das coisas por meio de uma concep~ao
diferente, mas ve atraves de todas as coisas por urn so a to muito
distinto de intui~iio, e nada, nem a menor coisa, Lhe escapa.
4. Ele conhece todas as coisas imutavelmente, porque nEle niio
ha nem sombra de mudan~a, e, permanecendo Ele mesmo
imutavel, muda todas as coisas, e percebe assim todas as diversas
mudan~as das coisas, por urn so ato imutavel de cogni~ao.

37. Como se pode classificar os objetos do conhecimento di-


vino?
1°. Deus mesmo, em Seu proprio ser infinito. E evi-
dente que este, transcendendo a soma de todos os demais
objetos, e 0 unico objeto adequado de urn conhecimento
realmente infinito.
2°. Todos os objetos possfveis, quer existam ou tenham

193
Capitulo 8
existido, quer nao existam e nunca venham a existir, vistos a
luz da Sua propria razao infinita.
3°. Todas as coisas reais que ja existiram, existem agora,
ou virao a existir, Ele compreende num so ato eterno e simul-
tanaeo de conhecimento, como atualidades sempre presentes
a Ele, e conhecidos como tais aluz de Seu proprio proposito
soberano e eterno.

38. Qual a designar;ao tecnica do conhecimento de coisas


possiveis, equal a base Jesse conhecimento?
Sua designa~ao tecnica escientia simplicis intelligentice, isto
e, conhecimento de simples inteligencia, chamado assirn porque 0
concebemos como simplesmente urn ato da inteligencia divina,
sem que concorra urn ato da vontade divina. Pela rnesma razao
tern sido chamado scientia necessaria, is to e, nao voluntaria, ou
nao determinada pela vontade. A base desse conhecimento eo
conhecimento essencial e infinitamente perfeito que Deus tern
da Sua propria onipotencia.

39. Qual a designafiiO ticnica do conhecimento das coisas rea is,


passadas ou presentes au futuras, e qual a base Jesse conhecimento?
Echamadoscientia visionis, ou seja, conhecimento de vista, e
scientia Iibera, quer dizer, conhecimento livre, porque neste caso
en ten demos que a Sua inteligencia e determinada por urn ato
concorrente da Sua vontade. A base desse conhecimento eo
conhecimento infinito que Deus tern do Seu proposito eterno,
todo ele- compreensivo e imutavel.

40. Como se prova que o conhecimento de Deus estende-se a


eventos futuros que sao contingentes?
Para nos os homens os eventos contingentes o sao por dois
motivos: 1°. Suas causas imediatas podem ser para nos
indeterminadas, como no caso do lan~amento de dados; 2°.
Suas causas imediatas podem consistir na voli~ao de urn agente
livre. Mas, para Deus, os eventos da primeira destas duas classes

194
Atributos de Deus
nao sao, de modo algum, contingentes; e os da segunda Ele
"preconhece" como contingentes quanto acausa, todavia nem
por isso com menor certeza de que venham a suceder.
Que Ele preconhece todos os esses eventos e certo -
1°. Porque as Escrituras o afirmam -1 Sam. 23: 11,12; Atos
2:23; 15:18; Is. 46:9,10.
2°. Muitas vezes Ele predisse eventos contingentes futuros,
e as profecias cumpriram-se- Mar. 14:30.
3°. Deus e infinito em todas as Suas perfei~6es; por isso o
Seu conhecimento deve ser (1) perfeito, e pode compreender
todas as coisas futuras como tambem passadas; (2) independente
das criaturas. Ele conhece todas as coisas em si mesmas a Sua
propria luz, e de maneira nenhuma depende da vontade de
qualquer criatura tornar o conhecimento de Deus mais certo
ou mais completo.

41. Como se pode conciliar a certeza da presciencia de Deus


com a liberdade dos agentes m6veis?
Note-se, primeiro, a dificuldade que aqui se apresenta: a
presciencia de Deus e certa; por conseguinte, urn evento, urn
ato, previsto, e com certeza futuro; mas, see certo que e futuro,
is toe, see certo que se hade praticar o ato, como pode ser livre
o agente quando o pratica?
Para evitar esta dificuldade, alguns te6logos negam a
realidade da liberdade do homem, e outros afirmam que, sendo
livre o conhecimento de Deus, Ele Se abstem voluntariamente
de conhecer aquilo que vao fazer as Suas criaturas dotadas de
liberdade.
Observamos sobre isso-
1°. Que Deus preconhece com certeza todos os eventos
futuros, e que 0 homem e livre, sao dois fatos estabelecidos
inabalavelmente sobre provas independentes. E necessario,
pois, que os aceitemos como verdades, tanto urn como o outro,
quer nos seja possivel concilia-los, quer nao.
2°. Embora a necessidade seja inconciliavel com a

195
Capitulo 8
liberdade, a certeza moral nao o e, como sera demonstrado
detalhadamente no Cap.l5, Perg. 25.

42. Que escientia media?


Esta e a designa<;ao tecnica do conhecimento que Deus
tern dos eventos contingentes futuros, e que, segundo sup6em
os autores desta distin<;ao, nao depende do prop6sito eterno de
Deus tornando certo o evento, e sim do livre ato da criatura
previsto por Deus mediante uma intui<;ao especial. E chamada
scientia media por supor-se que ocupa lugar intermediario en-
tre a scientia simplicis intelligentice e a scientia vision is. Difere da
primeira em nao ter por objeto todas as coisas possiveis, e sim
uma classe especial de coisas realmente futuras. E difere da ~
segunda em nao ter sua base no prop6sito eterno de Deus, e
sim na a<;ao livre das criaturas, simplesmente prevista.
i•'

... ·. 43. Par quem foi introduzida essa distinfiio, e com que fim?
Pelo jesuita Luiz Molina, que nasceu em 1535 e faleceu
em 1601, e foi professor de teologia na Universidade de Evora,
Portugal, em sua obra intituladaLiberi arbitrii cum gratice donis,
divina prescientia, prcedestinatione et reprobatione concordia.* Foi
excogitada com o fim de explicar como Deus podia pre-
conhecer com certeza o que as Suas criaturas livres fariam na
ausencia de qualquer preordena<;ao soberana da parte dEle,
determinando as suas a<;6es; fazendo assim a preordena<;ao
divina dos homens para a felicidade ou para a infelicidade
depender da presciencia divina da fe e da obediencia dos
hom ens, e negando que a presciencia de Deus dependa da Sua
preordena<;ao soberana.

44. Quais as argumentos contra a validade dessa distinfiio?


1°. Os argumentos em que se baseia essa distin<;ao sao
insustentaveis. Seus defensores alegam - (I) As Escrituras-
* Harmonia do livre-arbitrio com o dom da grafa, a presciencia divina, a
predestinafiio e a reprovafiio. Em latim no original. Nota de Odayr Olivetti.

196
Atributos de Deus
1 Sam. 23:9-12; Mat. 11:22,23. (2) Que essa distin~ao eobvia-
mente necessaria para tornar o modo da presciencia de Deus
conciliavel com a liberdade do homem.
Ao primeiro argumento respondemos que os eventos
mencionados nas passsagens supracitadas das Escrituras niio
eram futuros. Ensinam simplesmente que Deus, conhecendo
todas as causas, tanto as livres como as necessarias, sabe o que
qualquer criatura fara em quaisquer condi~6es. Mesmo n6s
sabemos que se pusermos fogo a p6lvora, seguir-se-a uma
explosao. Este conhecimento pertence, pois, aprimeira classe
das citadas acima (Perg. 38), ou seja, ao conhecimento de todas
as coisas possiveis. Ao segundo argumento respondemos que
a presciencia certa de Deus envolve tanto a certeza do futuro
a to livre da criatura como o envolve a Sua preordena~ao; e que
a preordena~ao soberana de Deus, com respeito aos atos livres
dos homens, s6 torna certamente futuros esses atos, e de modo
algum determina que sejam praticados, a nao ser pela livre
vontade da criatura agindo livremente.
2°. Essa scientia media e desnecessaria, porque todos OS
objetos possiveis do conhecimento, todas as coisas possiveis, e
todas as coisas que realmente hiio de ser, ja foram compreendidas
nas duas classes ja citadas (Pergs. 38, 39).
3°. Se Deus preconhece com certeza qualquer evento fu-
turo, entao e com certeza futuro, e Ele o preconheceu como
futuro com certeza, ou porque ja era certo anteriormente, ou
porque a Sua presciencia o tornou certo. Se a Sua presciencia
o tornou certo, en tao a presciencia envolve a preordena~ao. Se
ja era certo anteriormente, entao gostariamos de saber o que
foi que o podia tornar certo, se nao foi o decreta de Deus
determinando uma de tres coisas. (1) Sera que Deus mesmo
causaria o evento imediatamente? (2) Sera que o causaria por
meio de alguma segunda causa necessaria? (3) Sera que algum
agente livre o causaria livremente? S6 temos a escolha entre a
preordena~ao de Deus e uma fatalidade cega.
4°. Esta teoria faz o conhecimento de Deus depender dos

197
Capitulo 8 1

atos de Suas criaturas fora dEle. Isso e, ao mesmo tempo, ~


absurdo e impio, porque Deus e infinito, eterno e absoluto. ~
5°. As Escrituras ensinam que Deus nao so preconhece, 1

1
mas tambem preordena os atos livres dos homens. Is. 10:5-15;
Atos 2:23; 4:27,28.

45. Qual a diferenfa entre sabedoria e conhecimento, e em que


eque consiste a sabedoria de Deus?
Conhecimento eo simples ato da inteligencia apreendendo
o que uma coisae, e compreendendo sua natureza e suas rela~6es
ou como e.
Sabedoria pressup6e conhecimento, e eo uso pratico que
a inteligencia, determinada pela vontade, faz do material do
conhecimento. A sabedoria de Deus e infinita e eterna. A
concep~ao que fazemos dela e que Ele escolhe o fim, o mais
exaltado possivel - a manifesta~ao da Sua propria gloria - e
que escolhe e dirige, em todas as Suas opera~6es, os melhores
meios possiveis para conseguir esse fim. Sua sabedoria
manifesta-se-nos de urn modo glorioso nos grandes teatros da
cria~ao, da providencia e da gra~a.

0 PODER INFINITO DE DEUS

46. 0 que se entende pela onipotencia de Deus?


Poder e a eficiencia que, em virtude de uma lei essencial
do pensar, reconhecemos como inerente a uma causa em rela~ao
ao seu efeito. Deus e a causa primaria nao causada, e a eficiencia
causal da Sua vontade eabsolutamente nao limitada por coisa
alguma fora das proprias perfei~6es divinas.

47. Que distinfiio se faz entre a potestas absoluta e a potestas


ordinata de Deus?
As Escrituras e a razao ensinam-nos que a eficiencia causal
de Deus nao esta limitada ao universo de causas secundarias e
as suas propriedades ativas e as Suas leis. A frase potestas

198
Atributos de Deus
absoluta exprime a onipotencia de Deus considerada absoluta-
mente em si mesma - e especificamente essa reserva infinita
de poder que permanece nEle como urn livre atributo pessoal,
acima e alem de todas as for~as da natureza e Suas ordimirias
opera~6es providenciais sobre elas e por meio delas. Cria~ao,
milagres, etc., sao opera~6es deste poder de Deus. A potestas
ordinata, porem, e o poder de Deus que Ele exerce no sistema
estabelecido de causas secundarias no curso ordinario da
Providencia, e por meio desse sistema. Os racionalistas e os
defensores do mero naturalismo, que negam os milagres e toda
interferencia divina no sistema estabelecido da natureza,
naturalmente admitem s6 esta segunda, e negam a primeira
forma do poder divino. ~'· ' · / ' · .. -'·

48. Em que sentido o poder de Deus elimitado, e em que sentido


nao 0 e?
Quanto anossa eficiencia causal, estamos conscios: 1°. De
que e muito limitada. Temos poder direto s6 sobre o curso de
nossos pensamentos e a contra~ao de uns poucos musculos.
2°. De que dependemos do uso de meios para produzirmos os
efeitos desejados. 3°. De que dependemos de circunstfmcias
exteriores que nos limitam sempre e sempre nos imp6em
restri~6es.
0 poder inerente na vontade divina, porem, pode produzir
quaisquer efeitos que Ele deseje imediatamente, e quando
condescende em empregar meios, da-lhes livremente a eficacia
que nesse caso demonstram possuir. Todas as circunstancias
exteriores, sejam quais forem, sao crias:ao dEle, e dependem
da Sua vontade, e por isso nao podem limita-10 de nenhum
modo. Deus nao e limitado de nenhum modo que seja no
exercicio do Seu poder. Ele nao pode cometer pecado, nem
produzir contradi~6es, porque o Seu poder ea eficiencia causal
de uma essencia infinitamente racional e reta. Por isso o Seu
poder so e limitado por Suas pr6prias perfei~6es.
49. A distinfao que existe entre o nosso poder e a nossa vontade

199
Capitulo 8
seria uma perfeifiiO ou um defeito? E ela existe em Deus?
Objeta-se que, se o nosso poder fosse igual aos nossos
designios, e se cada voli<;:ao tivesse como resultado imediato a
obra desejada, nao estariamos conscios de nenhuma diferen<;:a
entre o poder e a vontade. Admitimos que e urn defeito no
homem quando seu poder nao esta comensurado asua vonta-
de, e que este nunca eo caso com Deus. Por outro lado, porem,
quando urn homem esta conscio de possuir for~as que podia
empregar, mas nao quer empregar, esta conscio de que isto e
uma excelencia, e de que a sua natureza esta roais perfeita por
possuir essa reserva de for<;:as, do que estaria se nao a possuisse.
Dizer-se, pois, que o poder nao se estende alem da Sua vontade
de exerce-lo, que nao ha em Deus nada que nao exer~a, e o
mesmo que dizer que Ele nao e maior do que a Sua cria<;:ao.
Os atos de urn grande homem nos impressionam,
principalmente quando olhados como os indicios de for<;:as
muito maiores que ele guarda, em reserva. Assim e com Deus
tam bern.

50. Como se pode provar que a Deus pertence a onipotencia


absoluta?
l 0 .AsEscriturasoafirmam - Jer.32 :17; Mat.l9:26; Luc.
1:37; Apoc. 19:6.
2°. Esta verda de esta envolvida na propria ideia de Deus,
como urn Ser infinito.
3°. Em bora tenhamos visto apenas parte dos Seus caminhos
(J 6 26: 14), a nos sa experiencia estendendo-se, cada vez mais,
nos esta revelando, constantemente, provas novas e mais
estupendas do Seu poder, que indicam sempre uma reserva
inexaurivel.

A VONTADE DE DEUS

51. Que i que se entende pela vontade de Deus?


A vontade de Deus e a essencia infinita e eternamente

200
Atributos de Deus
sabia, poderosa e reta de Deus exercendo o Seu querer. Em
nossa concep<;ao dela e aquele atributo da Deidade ao qual
referimos os Seus prop6sitos e decretos, como seu principio.

52. Em que sentido se diz que a vontade de Deus elivre, e em


que sentido se diz que enecessaria?
A vontade de Deus e a essencia sabia, poderosa e reta de
Deus exercendo o Seu querer. Por conseguinte, Sua vontade,
em todos os Seus atos, e certa e, ao mesmo tempo, muito
livremente, tanto sabia quanto rera. :E evidente que a liberdade
da indiferen<;a esta alheia a natureza de Deus porque a perfei<;ao
da sabedoria consiste em escolher, do modo mais sabio; e a
perfei<;ao da retidao consiste em escolher do modo mais reto.
Por outro lado, porem, a vontade de Deus e, desde toda a
eternidade, independente de todas as Suas criaturas e de todos
os Seus atos.

53. Que se entende pela distinfiiO entre a vontade decretat6ria


e a vontade preceptiva de Deus?
Pela vontade decretat6ria Deus detemina eficazmente a
futuri<;ao certa dos eventos. Pela Sua vontade preceptiva, Deus
como Governador moral ordena as Suas criaturas morais que
fa<;:am aquilo que Ele julga hom e sabio que elas fa<;:am nas
circunstancias em que se achem.
Nisso nao ha nada que seja inconciliavel. Aquilo que Ele
quer como nosso dever pode ser hem diverso daquilo que Ele
quer como Seu prop6sito. Aquilo que Ele permite pode estar
bern longe de ser aprovado por Ele, e pode muito bern ser
pecado se o fizermos.

54. Que se entende pela distinfiio entre a vontade secreta e a


vontade revelada de Deus?
A vontade secreta de Deus e Sua vontade decretat6ria,
chamada secreta porque, embora seja as vezes revelada aos
homens nas profecias e nas promessas da Biblia, na sua

201
Capitulo 8
maior parte nos fica oculta.
A vontade claramente revelada de Deus e Sua vontade
preceptiva, que nos erevelada sempre como a regra do nosso
dever- Deut. 29:29.

55. Em que sentido os arminianos mantem a distim;;iio entre a


vontade antecedente e a vontade conseqiiente de Deus, e quais as
objefi5es contra essa distinfiio?
E uma distin<;:iio inventada pelos escolasticos, e adotada
pelos arminianos, na tentativa de conciliar a vontade de Deus
com a teoria deles sobre a liberdade do homem.
Chamam ato antecedente da vontade de Deus aquilo que
precede a a<;:iio da criatura; e.g., antes de Adao pecar, Deus
queria que ele fosse feliz. Chamam ato conseqiiente da vontade
de Deus aquilo que se segue ao ato da criatura, e que e a
consequencia desse ato; e.g., depois do pecado de Adao, Deus
queria que ele sofresse a pena devida ao seu pecado.
E evidente que essa distin<;:iio nao representa verda-
deiramente a natureza da vontade de Deus e Sua rela<;:iio com
OS atos de Suas criaturas. 1°. Deus e eterno, e por isso nao
pode haver nos Seus prop6sitos distin<;:ao de tempo; 2°. Deus
e eternamente onisciente e onipotente. Se, pois, Ele quer
alguma coisa, quer necessariamente desde o prindpio os meios
de efetua-la, e consegue assim o fim desejado. Se nao fosse
assim, Deus teria ao mesmo tempo e em rela<;:iio ao mesmo
objeto, duas vontades inconciliaveis. A verdade eque Deus,
por urn s6 a to compreensivo da Sua vontade, determinou eterna
e imutavelmente que tudo o que sucedeu com Adao, do
prindpio ao fim, sucedesse nessa mesma ordem e sucessao em
que cada evento ocorreu. 3°. Deus e infinitamente indepen-
dente. Aviltamos a Deus se pensarmos nEle como alguem
que determina aquilo que Ele nao tern poder para efetuar,
e depois muda de vontade em consequencia dos atos
independentes das Suas criaturas.
E verdade que, em consequencia dos limites naturais das
202
Atributos de Deus
nossas capacidades, concebemos as diversas inten~6es do
prop6sito (mico, eterno e indivisivel de Deus, como se susten-
tassem entre si uma certa rela~ao 16gica, nao temporal, como
algo principal e conseqiiente. Formamos, assim, a concep~ao
de que Deus primeiro, na ordem l6gica, decretou ou
determinou criar o homem e depois permitir que ele caisse, e
a seguir preparar uma reden~ao- Turretino.

56. Em que sentido os arminianos mantem a distinfiio entre a


vontade absoluta e a vontade condicional de Deus, e quais as objef6es
contra ela?
Segundo eles, a vontade absoluta de Deus e a que nao
depende de nenhuma condi~ao fora dEle, e.g., a determina~ao
de criar o homem. Sua vontade condicional e a que depende
de alguma condi~ao, e.g., Sua determina~ao de salvar os que
creem, isto e, sob a condi~ao da fe deles.
E evidente que essa distin~ao e inconciliavel com a
natureza de Deus como urn Ser eterno, auto-existente,
independente, infinito em todas as Suas perfei~6es. Avilta-0 a
posi~ao segundo a qual a Sua vontade e simplesmente parte
coordenada da cria~ao, limitando a criatura e sendo por esta
limitada. 0 erro eo resultado de destacar urn fragmento da
vontade de Deus do prop6sito unico, inteiro, e absolutamente
compreensivo, eterno. E evidente que, quando considerado
como eterno e urn s6, o prop6sito de Deus deve incluir tanto
as condi~6es todas como as suas conseqiiencias. A vontade de
Deus nao depende de nenhuma condi~ao, mas Ele determina
eternamente o evento como dependente da sua condi~ao, e a
condi~ao como determinando o evento.
Todos admitem que a vontade preceptiva de Deus,
expressa em mandamentos, promessas e amea~as, depende
muitas vezes de condi~6es. Se crermos, seremos com toda a
certeza salvos. Esta e a rela~ao estabelecida imutavelmente
entre a fe, como a condi~ao, e a salva~ao, como conseqiiencia,
isto e, a fe e a condi~ao da salva~ao. Mas isso e coisa muito

203
Capitulo 8
diversa do que dizer que a fe que Paulo tinha foi a condic;:ao do
prop6sito eterno de Deus de salva-lo; porque o mesmo
prop6sito determinou tanto a fe, a condic;:ao, como a salvac;:ao,
a sua consequencia. Veja algo mais no Cap. 10, sobre os
decretos.

57. Em que sentido se diz que a vontade de Deus eeterna?


Eurn s6 ato eterno, nao sucessivo, totalmente compreen-
sivo, determinando absolutamente ou efetuar ou permitir todas
as coisas, em todas as suas relac;:6es, condic;:6es e sucess6es, que
sucederam, sucedem e virao a suceder.

58. Em qu£' sentid.o se pode dizer que a vontade de Deus i a


regra de retidiio?
E evidente que, no sentido mais elevado, a respeito da
vontade de Deus, nao se pode considerar essa vontade como a
base fundamental de toda a retidao, como igualrnente nao se
pode considerar como a base fundamental de toda a sabedoria.
Porque, nesse caso, seguir-se-ia, 1°. que nao ha diferenc;:a
essencial entre o berne o mal propriamente ditos, mas somente
urna diferenc;:a constituida arbitrariarnente pelo proprio Deus;*
e 2°. que nao ha nenhum sentido em que se possa atribuir
retidao a Deus; porque seria o rnesmo que dizer que Ele quer
como quer. A verdade e que a Sua vontade opera conforme a
Sua sabedoria infinitamente reta ve estar correto.
Por outro lado, porem, a vontade revelada de Deus e para
nos a regra absoluta e principal da retidao, tanto quando nos
rnanda fazer o que ern si mesrno e indiferente, e assim o torna
reto, como quando nos manda fazer o que em si mesmo e
essencialmente e reto, porquee reto.

- - . ,., .. )

* Veja Charles Hodge, Systematic Theology, Cap. 5, § 9s.,pag. 405. Nota do


tradutor.

204
Atributos de Deus
A JUSTI<:;A ABSOLUTA DE DEUS ..
• .··-,--Lr•
. ·' ~

59. Que se entende pelas distinfi5es de justifa absoluta e justifa


relativa, rectoral, distributiva e punitiva ou vingadora de Deus?
A justi<;:a absoluta de Deus e a infinita perfei<;:ao moral ou
retidao universal do Seu proprio Ser.
A justi<;:a relativa de Deus e a Sua natureza infinitamente
reta, considerada como se manifesta em rela<;:ao a Suas criaturas
morais, como Seu Governador moral.
A justi<;:a de Deus e chamada rectoral quando considerada
como se manifesta na administra<;:ao geral do Seu governo
universal pelo qual Ele cuida das Suas criaturas e governa as
suas a<;:6es. Echamada distributiva quando considerada como
se manifesta na a~ao de Deus pela qual Ele da a cada criatura
exatamente aquilo que lhe e devido, como premio ou como
pena; e e chamada punitiva ou vingadora quando considerada
como se manifesta nos atos de exigir e infligir a pena adequada
e proporcional por todo pecado, por causa do seu demerito
intrfnseco.

60. Quais as divers as opinii5es a respeito da justifa punitiva de


Deus, isto e, quais OS diversos motivos alegados para explicar por
que Deus pune o pecado?
Os socinianos negam inteiramente a justi~a punitiva de
Deus e sustentam que Ele s6 pune o pecado pelo bern do
pecador individual, e pelo bern da sociedade, unicamente ate
onde esta possa estar interessada no refreamento ou no
melhoramento do pecador. Os te6logos que sustentam a teoria
governamental da propicia<;:ao (ou da expia~ao), sustentam que
Deus nao pune o pecado por causa de qualquer prindpio
imutavel que haja em Si mesmo e que exija a puni~ao dEle,
mas simplesmente pelo bern do universo, com base em certos
grandes principios imutaveis de polltica governamental.
Reduzem assim a justi~a a uma forma de benevolencia geral.
Leibnitz afirmava que "a justi~a e a bondade dirigida pela

205
Capitulo 8

sabedoria". Este principia pressup6e que a felicidade eo maior


bern; que a essencia da virtude consiste no desejo de prom over
a felicidade, e que, por conseguinte, o (mico fim da justi<.;a
pode sera preven<.;ao da miseria. Este eo fundamento da teoria
governamental da propicia<.;ao. Veja Cap. 25. Tambem Park,
Atonement (ExpiafdO ).
Alguns afirmam que a necessidade de puni<.;ao do pecado
e somente hipotetica, isto e, que e tao-somente urn resultado
do decreta eterno de Deus.
A verdade e que a propria retidao eterna e essencial de
Deus determina que Ele imutavelmente castigue rodo pecado
com uma pena proporcional.

61. Como se prova que a benevolencia desinteressada ndo


constitui a totalidade da virtu de?
1°. Algumas manifesta<.;6es de benevolencia desinteres-
sada, e.g., o amor natural paterna, sao puramente instintivas, e
nada tern de caniter moral positivo.
2°. Algumas manifesta<.;6es de benevolencia desinteres-
sada sao positivamente imorais, como, e.g., quando urn juiz
cede a sua simpatia para com urn criminoso, ou cede as
instancias dos amigos deste.
3°. Ha principios virtuosos que nao se pode reduzir a
benevolencia desinteressada, como, e.g., possuirmos na devida
considera<.;ao prudencial o nosso proprio bern; termos
aspira<.;6es e empregarmos esfor<.;os para alcan<.;:ar excelencia
pessoal; termos urn santo odio ao pecado por causa do proprio
pecado, eo santo desejo de ver o pecado punido para que fique
vindicada a justi<,;a.
4°. A ideia de dever e a ideia essencial constitutiva da
virtude. Nenhuma analise possfvel da ideia de benevolencia
dara como resultado a ideia de obriga<.;:ao moral. Esta e simples,
irredutfvel, nitida. 0 dever e 0 genera, e a benevolencia e uma
das especies que ele abrange.

206
Atributos de Deus
62. Quais as provas derivadas dos principios universais da
natureza humana que mostram que a justifa de Deus niio pode deixar
de ser um principia fundamental e imutavel da Sua natureza,
determinando-o a castigar o pecado por causa do demerito intrinseco
deste?
A obrigafiio que todo governador justo tern de castigar o
pecado, o demerito intrinseco do pecado, eo principia de que
opecado deve ser punido, sao fatos determinantes da consciencia
moral. Nao podem ser reduzidos a outros principios, quaisquer
que sejam. Prova-se isso -
1°. Porque estao envolvidos na consciencia do seu proprio
demerito que tern todo pecador despertado- " ... fiz o que a
teus olhos parece mal, para que sejas justificado quando falares,
e puro quando julgares" (Sal. 51: 4.) No seu grau superior, este
sentimento vern a ser o remorso, e este s6 pode ser apaziguado
por uma expiac;ao. Por isso e que muitos assassinos nao tiveram
paz enquanto nao se entregaram as autoridades, sentindo entao
alfvio imediato. E milh6es de almas tern achado paz na
aplicac;ao do sangue de Cristo a suas consciencias perturbadas.
2°. Todos os homens julgam assim os pecados dos outros.
As consciencias de todos os homens bons sao gratificadas
quando a pena justa caiu sobre o ofensor, e tais homens ficam
irados quando ele escapa. · , .· ·
3°. Esse principia e testemunhado por todos OS ritos
sacrificiais comuns a todas as religi6es antigas, pelas peni-
tencias que, numa ou noutra forma, sao quase universais ainda
nos tempos modernos, por todas as leis penais, e pelos
sin6nimos das palavras culpa, castigo, justic;a, etc., comuns a
todos os idiomas.
4°. E auto-evidente que a aplica<;ao de urn castigo injusto
e urn crime, nao importa quao benevolo seja 0 motivo que 0
inspirou, nem quao born seja o resultado que o segue. E nao e
menos auto-evidente que e a justic;a de urn castigo merecido
que torna born o seu efeito na sociedade, e nao e este efeito que
torna justo o castigo. A execuc;ao da pena capital num homem

207
Capitulo 8
pelo bern da sociedade sera urn crime, urn grave erro, a nao
ser que essa execuc;ao seja justificada pelo demerito do homem.
Nesse caso seu demerito sera vista por toda a sociedade como
o motivo real da sua execuc;ao.

63. Como se prova a mesma verdade pela natureza da lei


divina?
Grotio, em sua grande obra, Defensio Fidei Catholicce de
Satisfactione Christi (Defesa da Fe Cat6lica sabre a Satisfac;ao
Realizada por Cristo), na qual se origina a Teo ria Governa-
e
mental da Propiciac;ao, sustenta que a lei divina produto da
vontade divina e que, por conseguinte, Deus pode abrandar
essa lei tanto nos seus elementos preceptivos como nos penais.
Mas a verdade e que (a) a pena eparte essencial da lei divina;
(b) a lei de Deus, quanta a todos os seus principios essenciais
do certo e do errado, niio e produto da vontade divina, e sim
urn transcrito imutavel da natureza divina; (c) logo, a lei e
imutavel e enecessaria que se cumpra cada i dela.
Prova-se isso - 1°. Porque os principios fundamentais
tern necessariamente a sua base imutavel na natureza divina,
ou (a) doutro modo a distinc;ao entre o certo eo errado seria
puramente arbitraria - ao passo que sao discernidos pelas
nossas intuic;6es marais a serem absolutos e independentes de
qualquer volic;ao divina ou humana; (b) doutro modo nao
teriam sentido as palavras quando se diz que Deus e reto, sea
retidao fosse criac;ao arbitraria da Sua vontade; (c) porque Deus
declara que "niio pode mentir", que "nao pode negar-se".
2°. As Escrituras declaram que nao epassive! afrouxar a
lei, que enecessaria que se cumpra - Joao 7:23; 10:35; Luc.
24:44; Mat. 5:25,26.
3°. As Escrituras declaram que Cristo veio cumprir a lei,
e nao afrouxa-la - Mat. 5: 17,18; Rom. 3:31; 10;4.

64. Que argumento se pode tirar da independencia e da abso-


luta auto-sujiciencia de Deus para provar que a justifa punitiva de

208
Atributos de Deus
Deus eatributo essencial da Sua natureza?
0 conceito de que o Ser de Deus e obrigado pelas exigencias
exteriores da Sua cria~ao a seguir qualquer curso de a~ao e
inconciliavel com os Seus atributos essenciais. Existem nEle,
necessariamente, tanto o motivo dos Seus atos como os fins
que Ele tern em vista- Col. 1: 16; Rom. 11 :36; Ef. 1 :5,6; Rom.
9 :22,23. Se Ele castiga o pecado porque assim o determinam
os principios da Sua propria natureza, E1e age indepen-
dentemente. Masse recorre ao castigo somente como o meio
necessario para refrear e governar as Suas criaturas, entao os
Seus atos dependem dos atos delas.

65. Como se pode provar a mesma verdade pelo amor que Deus
tern a santidade e pelo 6dio que tern ao pecado?
Nas Escrituras o amor que Deus tern asantidade eo odio
que tern ao pecado sao representados como essenciais e
I intrfnsecos nEle. Ele ama a santidade por amor dela propria, e
odeia o pecado e tern a determina<;;ao de castiga-lo por causa
do seu proprio demerito intrinseco. Ele odeia o pecado nos
rna us todos os dias - Sal. 5: 6; 7: 11. ''A mim me pertence a
vingan<;;a, a retribui~ao, a seu tempo ... " - Deut. 32:35. Ele
rctribui a cada urn segundo as suas obras- Is. 59:18; 2 Tess.
1:6: "Se de fa toe justo diante de Deus que de em paga tribula~ao
I
aos que vos atribulam"- Rom. 1:32: " ... conhecendo a justi~a
de Deus que sao dignos de morte os que tais coisas praticam,
l nao somente as fazem, mas tambem consentem aos que as
l~1zem"- Deut. 7:5,6; 21:22.

66. Como se pode provar esta verdade pelo que as Escrituras


cnsinam a respeito da natureza e da necessidade da propicim;ao de
( :risto?
Quanto a sua natureza as Escrituras ensinam que Cristo
sofreu a pena do pecado vicariamente como substituto do seu
povo eleito, e que assim expiou a sua culpa, reconciliou-o a
l>cus e remiu as suas almas dando-Se a Si mesmo como
t
209
Capitulo8
o pre~o de remissao exigido em lugar deles. As Escrituras em
toda parte e de todos os modos ensinam que o designio da
morte de Cristo foi produzir sobre o Governador do universo
moral urn efeito expiador do pecado, e nao produzir, nem no
cora~ao do pecador, nem na consciencia moral do universo
inteligente, uma impressao moral. Isso tudo sera provado
detalhadamente nos capitulos 25 e 33.
Quanto anecessidade da propicia~ao as Escrituras ensinam
que era absoluta. Ensinam que era necessaria que Cristo
morresse ou, doutra forma, os pecadores haveriam de perecer
-Gal. 2:21; 3:21. Mas a propriedade de pr9duzir uma
impressao moral em cada pecador pessoalmente, ou no animo
publico do universo em geral,nao pode ter como resultado uma
necessidade absoluta da parte de Deus - visto que Deus, que
criou o universo e todos os seus membros componentes, podia
naturalmente, se quisesse, produzir neles impress6es morais
de qualquer especie, ou sem meios ou servindo-se de quaisquer
meios que quisesse. Uma necessidade absoluta precisa estar
baseada na natureza imutavel de Deus, a qual e a base da sua
vontade em todos os seus atos, e a determina.Logo, a natureza
eterna de Deus 0 obriga, imutavelmente, a punir todo pecado.

Political Science -"President Theodore D. Woolsey",


vol. 1, pags. 330-335.
"A teoria de que a corres;ao e o fim principal do castigo
nao resiste a exame. (1) 0 estado nao e instituis;ao
benevola (humane). (2) Essa teoria nao faz distins;ao en-
tre os crimes. Se urn assassino parecesse reformado ao
fim de uma semana, ter-se-iam conseguido os fins da sua
detens;ao e ele deveria ser solto; enquanto que outro
ofensor muito menos culpado poderia bern ter que
permanecer preso durante meses e anos antes que se
manifestasse nele a inoculas;ao de bons prindpios. (3)
Qual a especie de corres;ao que se devera desejar conseguir?
Seria uma corres;iio que de segurans;a a sociedade da niio
repetis;iio do crime? N esse caso e a sociedade, e niio o

210
Atributos de Deus

criminoso, que tira proveito do processo corretivo. Ou


seria preciso que se procure conseguir uma transforma~ao
radical, de modo que o criminoso deixe de ser egoista e
cobi~oso, e que se despertem nele os prindpios mais
excelsos e puros? N esse caso sera necessaria transformar
a casa de corre<;:ao em igreja para o ensino do evangelho.
"A explica~ao de que o Estado protege a sua propria
existencia, ou os habitantes inocentes do pais, infundindo
em seus suditos o terror e refreando-os de cometerem
crimes pelo medo do castigo, respondemos que, se bern
que este efeito e real e importante, ainda nao esta provado
que o estado tern o direito de faze-lo. E necessaria
pressupor o crime e que o criminoso merece castigo an-
tes que o senso moral aprove que lhe seja infligida uma
pena. E a medida da puni<;:iio exigida pelo bern publico na
ocasiao flutua muito, e as vezes e ate tiranica; alem disso,
o simples terror, se nao se desperta ao mesmo tempo o
sentimento de justi~a, e tanto uma fonte de odio quanto
motivo para a obediencia.
''A teoria de que o estado, infligindo castigo ao malfeitor
so lhe da 0 que ele merece, e a unica que parece ter
fundamento solido. Pressup6e que, desobedecendo-se a
alguma lei reta e justa, cometeu-se urn mal moral, e que,
de acordo com uma particularidade que tern o apoio da
nossa natureza moral, convem que o malfeitor sofra algum
mal ffsico ou mental, e que em todas as formas de governo
exercido sobre criaturas morais deve haver urn poder
capaz de decidir quanto de castigo deve seguir-se a pratica
de certas e determinadas transgress6es. 0 estado, como
Paulo diz, e realmente ministro de Deus, vingador em ira
contra aquele que procede mal (Rom. 13:4). Contudo,
somente o e numa esfera muito limitada, e para fins
especiais... 0 Estado castiga atos, e nao pensamentos;
inten~6es manifestando-se em atos, nao sentimentos;
castiga as pessoas dentro de urn certo territorio sobre o
qual tern jurisdi~ao, e talvez aqueles seus suditos que
cometam crime noutra parte, e mais ninguem; castiga os
atos prejudiciais a sua propria existencia e a comunidade

211
Capitulo 8
dos seus suditos; nao castiga segundo uma escala exata de
merecimentos, porque, sem uma revela<;:ao divina, nao
pode saber quais sao os merecimentos dos individuos, nem
0 que e a culpa relativa que OS diverSOS atOS provocam nas
diferentes pessoas." *

A BONDADE ABSOLUTA DE DEUS

67. Que distinf6es sao indicadas pelos termos benevolencia,


complacencia, misericordia e grafa?
A bondade infinita de Deus e uma perfei<;ao gloriosa que
carateriza proeminentemente a Sua natureza, e que Ele, de urn
modo infinitamente sabio, justo e soberano, exerce para com
as Suas criaturas de varios modos segundo as suas rela<;oes e
condi<;oes.
Benevolencia e a bondade de Deus considerada generica-
mente. Estende-se a todas as suas criaturas, com exce<;ao das
condenadas judicialmente por causa de seus pecados, e faz
provisao para o bem-estar delas.
A complacencia e a afei<;ao aprobat6ria com que Deus
aprecia as Suas pr6prias perfei<;oes infinitas, e toda imagem e
reflexao delas nas Suas criaturas, especialmente nos santificados
da nova cria<;ao.
A misericordia de Deus, cujas formas mais passivas sao do
e compaixao, e a bondade divina manifestada com respeito a
miseria de Suas criaturas, sentindo-as e fazendo provisao para
o alivio delas, e, no caso dos pecadores impenitentes, tratando-
-os com paciencia longanima.
A grafa de Deus e sua bondade procurando comunicar
seus favores e, sobretudo, a comunhao da Sua propria vida e
felicidade, a Suas criaturas morais- as quais, como criaturas,
necessariamente nao tern nenhum merecimento - e pro-
eminentemente Seu amor eletivo, obtendo, mediante urn pre<;o

* Esta cita'!aO eapresentada de forma resumida.

212
Atributos de Deus
infinito, a felicidade deles, sendo que eles merecem
positivamente o castigo divino, por serem criaturas peca-
mmosas.

68. Exponha a definiriio fa/sa da benevolencia divina feita


freqiientemente, e demonstre a sua definirao verdadeira.
Define-se muitas vezes a benevolencia infinita de Deus
como aquele atributo em virtude do qual Ele comunica a todas
as Suas criaturas a maior soma possfvel de felicidade, isto e, a
maior medida que sao capazes de receber, ou a medida que e
compativel com a aquisi~ao da maior soma de felicidade
agregada ao universo moral.
Mas isso pressupoe que Deus esta 1imitado por alguma
coisa fora de Si; que nao podia ter assegurado para as Suas
criaturas maior felicidade do que a de que realmente gozam.
Pressup6e tam bern que Deus considera a felicidade como bern
superior aexcelencia moral.
A verdadeira defini~ao da benevolencia divina e que e
aquele atributo em virtude do qual Deus produz no universo
toda a felicidade compatfvel com os fins supremos que tinha
em vista na cria~ao. Estes fins colocam-se nesta ordem: 1. A
manifesta~ao da Sua propria gloria. 2. A suprema excelencia
moral de Suas criaturas. 3. A suprema felicidade de Suas
criaturas racionais.

69. Quais as fontes do nosso conhecimento de que Deus i


benevolente?
1a. A razao. Benevolencia e elemento essencial da perfei~ao
moral. Deus e infinitamente perfeito, e por isso infinitamente
benevolo.
za. A experiencia e a observa~ao. A sabedoria de Deus
rnanifestada em idealizar, e Seu poder manifestado em executar
o Seu desfgnio nas diversas esferas da cria~ao, da providencia
e da religiao revelada, foram evidentemente determinadas
sempre por inten~6es benevolas.

213
Capitulo 8
3a. As assen;:6es diretas das Escrituras - Sal. 145:8,9;
1 Joao 4:8.

70. Como se pode provar que Deus ebondoso e esta sempre


pronto a perdoar o pecado?
Nem a razao nem a consciencia podem ensinar-nos que
Deus quer perdoar o pecado. E evidentemente dever dos
homens perdoar-se mutuamente as ofensas que recebem, mas
o perdao do pecado como pecado nao e da nos sa alqada.
Parece claro que nao pode haver prindpio moral que
obrigue qualquer governador soberano a perdoar o pecado
como transgressao da lei. Tudo quanto a razao e a consciencia
nos asseguram a esse respeito e que nao pode haver perdao
do pecado sem uma propiciaqao. A afeiqao bondosa que levasse
urn governador a preparar uma propiciaqao seria, de sua
natureza essencial, perfeitamente livre e soberana, e s6 poderia
ser conhecida amedida que fosse bondosamente revelada. Por
isso o evangelho e boas novas, confirmadas por sinais e
maravilhas -Ex. 34:6,7; Ef. 1:7-9.

71. Quais siio as diversas teorias inventadas na tentativa de


conciliar a existencia do pecado com a bondade de Deus?
1a. Alguns argumentam que a aqao livre e essencial a urn
sistema moral, e que a independencia absoluta da vontade e
essencial aa<;;ao livre; que, comoobjeto do poder, dirigir a vontade
de agentes livres nao e superior a operar contradiq6es; e que
por isso Deus, em bora onipotente, nao poderia impedir que o
pecado entrasse num sistema moral, sem que violasse a
natureza desse sistema.
za. Outros argumentam que Deus, em sua sabedoria
infinita, permitiu que o pecado entrasse por ser isso urn meio
necessario para promover a maior soma possfvel de felicidade
no universo como urn todo.
Sobre essas teorias dizemos:
1°. Que a primeira tern por base urn a falsa ideia das

214
Atributos de Deus
condi<;6es da liberdade e da responsabilidade humanas (veja
abaixo, Cap.l5); e mais, que limita de urn modo indigno o
poder de Deus, representando-0 como querendo e procurando
fazer o que nao consegue efetuar, e tambem que 0 torna
dependente das suas criaturas.
2°. Quanto asegunda teoria acima, devemos estar sempre
lembrados de que a gloria de Deus, e nao o bern supremo do
universo, eo fim supremo de Deus na cria<;ao e na providencia.
3°. A permissao do pecado, em sua rela<;ao tanto com a
religiao como com a bondade de Deus, e urn misterio inson-
davel, e todas as tentativas de solve-lo so servem para misturar
palavras com discursos de ignorantes (Jo 38:2). E urn dos
privilegios da nossa fe, porem, sabermos que, embora a nossa
filosofia nao 0 possa compreender, e uma permissao muito
sabia, reta e misericordiosa; e que redundara na gloria de Deus
e no bern dos Seus escolhidos.

72. Como se pode mostrar que niio ha incongruencia entre os


atributos de bondade e de justir;a?
Bondade e justi<;a sao aspectos diversos de uma so
perfei<;ao moral imutavel, infinitamente sabia e soberana. Deus
nao e as vezes misericordioso e outras vezes justo, nem
misericordioso ate certo ponto e jus to ate certo ponto, porem e
eterna e infinitamente misericordioso e justo. Em rela<;ao a
criatura, esta perfei<;;ao infinita da Sua natureza apresenta
diversos aspectos, conforme determinado pelo juizo que a
sabedoria infinita faz em cada caso individual.
Mesmo em nossa experiencia achamos que, em principia;
nao ha nenhuma inconseqtiencia nestes atributos da nossa
natureza moral, apesar de que a nossa falta de sabedoria e de
conhecimento, o sentimento do nosso demerito, e uma simpatia
meramente ffsica, muitas vezes perturbam tanto o nosso juizo
como o nosso cora<;ao quando queremos ajustar esses
prindpios aos casos individuais da vida.

215
Capitulo 8
A VERDADE ABSOLUTA DE DEUS

73. Que ea verdade, considerada como atributo divino?


A verdade de Deus, no seu sentido mais lato, e uma
perfeic;ao que qualifica todos os seus atributos morais e
intelectuais. Seu conhecimento e infinitamente verdadeiro em
relac;ao aos seus objetos, e Sua sabedoria nao esta sob a
influencia nem de preconceitos nem da paixao. Sua justic;a e
Sua bondade, em todas as suas operac;oes, estao em harmonia
com a norma perfeita da Sua natureza. Em todas as mani-
festac;oes que Deus faz das Suas perfeic;oes a Su,as criaturas,
Ele sempre age de conformidade com a Sua verdadeira
natureza, e sempre perfeitamente consequente. Em seu sentido
mais especial, esse atributo de verdade qualifica todas as
relac;oes que Deus tern com Suas criaturas racionais. E
verdadeiro, fiel, tanto para conosco quanto para conSigo; e
assim esta posto urn fundamento seguro para toda a fee to do o
conhecimento. Eo fundamento, a base, de toda a confianc;a
que temos, 1°. em nossos sentidos; 2°. em nossa inteligencia
(intellect) e em nossa consciencia; 3°. em qualquer revelac;ao
sobrenatural devidamente autenticada.
As duas formas em que essa perfeic;ao se manifesta em
relac;ao a nos sao: 1a. a verdade inteira que Ele man tern em
todas as Suas comunicac;oes; za. sua perfeita sinceridade ao fazer
todas as Suas promessas e Sua fidelidade em cumpri-las.

74. Como se pode conciliar a verdade de Deus como aparente


niio cumprimento de algumas de Suas amearas?
As promessas e as ameac;as de Deus as vezes sao absolutas,
e neste caso Ele as cumpre no sentido exato em que foram
feitas. Muitas vezes tambem elas sao condicionais, dependentes
da obediencia ou do arrependimento da criatura - Jon.
3:4,10,11; Jer.18:7,8. Essa condic;ao pode ser expressa
explicitamente, e pode tambem ser condic;ao implicita, por
entender-se que o caso individual esta naturalmente sujeito

216
Atributos de Deus
ao principia geral de que o verdadeiro arrependimento e
a fe livram de todas as amea<;:as e alcan<;:am todas as ben<;:aos
prometidas.

75. Como se pode conciliar com a sinceridade de Deus os convites


e as exortar;i5es das Escrituras dirigidas aqueles que Deus niio tenciona
salvar?
Veja acima (Perg. 53), a distin<;:ao entre a vontade pre-
ceptiva de Deus e a Sua vontade decretatoria. Seus convites e
exorta<;:6es Ele dirige de boa fe a todos os homens: 1°. porque
e clever de todo homem arrepender-se e crer, e a vontade
preceptiva de Deus e que todos o fa<;:am; 2°. porque nao ha
coisa algurna que irnpe<;:a o pecador de o fazer, senao a sua
propria falta de vontade; 3°. em todos os casas ern que alguern
curnprir a condi<;:ao, Deus curnprira tam bern a Sua promessa;
4°. Deus nunca prometeu habilitar todos a crerem; 5°. esses
convites e exorta~6es nao sao dirigidos aos reprobos como tais,
e sirn a todos os pecadores como tais, corn o firn declarado de
salvar desse modo os eleitos.

A SOBERANIA INFINITA DE DEUS

76. Que se entende pela soberania de Deus?


Seu direito absoluto de governar todas as Suas criaturas
simplesrnente segundo a Sua propria boa vontade, e de dispor
de las.

77. Como se prova que esse dire ito eafirmado nas Escrituras?
Dan. 4:25, 35; Apoc. 4:11; 1 Tim. 6:15; Rom. 9:15-23.

78. Em que se baseia a soberania absoluta de Deus?


1°. Ern Sua superioridade, em Seu Sere ern todas as Suas
perfei<;:6es ern rela<;:ao a todas as Suas criaturas. . t;UoJ
2°. Estas foram por Ele criadas do nada, e sao agora
rnantidas ern existencia por Seu poder, para a Sua propria

217
Capitulo 8
gloria e segundo a Sua propria boa vontade- Rom. 11:36.
3°. Os beneffcios infinitos que Ele nos concede, e a nossa
dependencia dEle, bern como a nossa bem-aventurans;a nEle,
sao motivos para que nos nao so reconhes;amos essa verdade
gloriosa, como tam bern nos regozijemos nela. 0 Senhor reina;
regozije-se a terra!

79. Haveria algum sentido em que ha limites a soberania de


Deus?
E evidente que, considerada em sentido abstrato, como
urn dos atributos de Deus, entre outros, a Sua soberania e
qualificada por todos OS demais. Nao pode senao ser uma
soberania infinitamente sabia, reta e misericordiosa.
Mas Deus, considerado em sentido concreto como
soberano infinito, nao esta limitado por coisa alguma fora dEle
proprio. "Todos os moradores da terra sao por ele reputados
em nada; e segundo a sua vontade ele opera como exercito do
ceu e OS moradores da terra; nao ha quem lhe possa deter a
mao, nem lhe dizer: que fazes?" (Dan. 4:35).

A SANTIDADE INFINITA DE DEUS

80. Que se entende pela santidade de Deus?


Nao se deve entender a santidade de Deus como se fosse
urn atributo entre outros; antes, 0 vocabulo e urn termo geral
que representa a conceps;ao da Sua perfeis;ao consumada e a
Sua gloria total. E a sua infinita perfeis;ao moral coroando
a sua infinita inteligencia e o Seu infinito poder. Ha uma
gloria que pertence a cada atributo, considerado por si so,
e ha uma gloria que pertence a todos eles juntos. A natureza
intelectual e a base essencial da natureza moral. A infinita
perfeis;ao morale coroa da Deidade. A santidade e a gloria
total assim coroada.
A santidade no Criador e a perfeis;ao total de uma inteli-
gencia infinitamente reta. A santidade na criatura nao e mera

218
Atributos de Deus
perfei~ao moral, e sim perfei~ao da natureza criada de agentes
morais segundo a sua especie, em uniao e em comunhao
espirituais como Criador infinito- 1 Joao 1:3.
A palavra santidade, aplicada a Deus nas Escrituras,
representa, 1°. pureza moral - Lev. 11:44; Sal. 145:17; 2°.
majestade transcendentemente augusta e venenivel - Is. 6.3;
Sal. 22:3; Apoc. 4:8.
"Santificar ao Senhor" e faze-10 santo, quer dizer, declarar
e adorar a Sua santidade venerando a Sua majestade augusta
em toda parte e em tudo aquilo em que e por que a Sua Pessoa
ou o Seu caniter e representado - Is. 8:13; 29:23; Ez. 38:23;
Mat. 6:9; 1 Ped. 3:15 .
... _· ;;:;:· ...,_. .,

',_: : l ~ -.

219
9
.. );i

A Santissima Trindade

1. Quais sao a etimologia e a signijicafiiO da palavra Trindade,


e quando foi introduzida na linguagem da lgreja?
A palavra Trindade (Trinitas) e derivada detres-unus, trinus
- tres em urn, ou o urn que e tres, e os tres que sao urn; nao
triplo -trinitas e nao triplicitas. A palavra nao se acha nas Escri-
turas. Mas os termos tecnicos sao uma necessidade absoluta
em todas as ciencias: e, neste caso, tornaram-se especialmente
essenciais por causa das pervers6es sutis que sofreram as
exposi<;:6es simples e nao tecnicas da Biblia as maos dos
incredulos e dos hereges. Esse termo, como definido acima,
exprime bern o fato central da grande doutrina de uma s6
essencia subsistindo eternamente como tres Pessoas, todos os
elementos da qual as Escrituras ensinam explicitamente. A
palavra grega que significa trindade foi empregada primeiro
nesta conexao por Te6filo, bispo de Antioquia, na Siria, de
168 a 183. 0 termo latino Trinitas foi usado primeiro por
Tertuliano, por volta do ano 220- Eccl. Hist., Mosheim, vol. 1,
pag. 121, nota 7.

2. Qual o significado teol6gico do termo substantia, e qual a


mudanr;a que ocorreu no seu usa?
Substantia, no uso atual da palavra, e equivalente a essencia,
a existencia independente. Assim, na Deidade, as tres Pessoas
sao o mesmo em substi'mcia, is toe, de uma s6 e mesma essencia
numerica, indivisivel.

220
A Santissima Trindade

A palavra foi utilizada, no prindpio, como equivalente a


subsistentia ou modo de existencia. Neste sentido, enquanto ha
na Deidade uma s6 essen cia, ha nela tres substantice ou Pessoas.
Veja Turretino, Torno 1, locus 3, perg. 23.

3. Que outros termos sao empregados como os equivalentes de


substantia, nas dejinifoes desta doutrina?
Os termos latinosessentia e natura. Em portugues: essencia,
substiincia, natureza, ser.

4. Quale 0 sentido teol6gico da palavra subsistentia?


E empregada para designar o modo de existencia que
distingue qualquer coisa individual de todas as demais coisas,
ou qualquer pessoa de todas as demais pessoas. Aplicada a
doutrina da Trindade, subsistencia eo modo de existencia que
e peculiar a cada uma das tres Pessoas divinas, e que em cada
uma dElas constitui a essencia unica em Pessoa distinta.

5. Qual o significado que, no Novo Testamento, tem a palavra


((hypostasis"?
Esta palavra, quanto a sua etimologia, e exatamente
equivalente ao termo substancia (sub-stare); vern da palavra
grega que significa "estar sob" ou "debaixo de".
A palavra e empregada cinco vezes no Novo Testamento:
1°. Em sentido figurado, significando confian<;;a, ou esse
estado de animo em que se esta conscio de que se tern uma
base firme e segura: 2 Cor. 9:4; 11: 17; Heb. 3:14, que vern da
fe, He b. 11:1.
2°. Em sentido literal, significando natureza essencial -
Heb. 1:3. Veja Com. on Heb., de Sampson.
·. ~ ;

6. Em que sentido a palavra e empregada pelos escritores


eclesiasticos?
Ate meados do seculo 4 esta palavra foi empregada geral-
mente, em conexao com a doutrina da Trindade, em seu sentido

221
Capitulo 9
primario, como equivalente ao termo substancia. Eempregada
neste sentido no Credo publicado pelo Concilio Niceno, em
325, e tambem nos decretos do Concilio de Sardica, na IHria,
em 347. Estes concordaram em afirmar que, na Dei dade,
ha s6 uma hypostasis. Como porem, alguns, naquele tempo,
tomassem a palavra no sentido de pessoa, seu uso foi mudado,
por consenso geral, principalmente gra~as ainfluencia de
Atanasio e, dai por diante, seu sentido, na linguagem teol6gica,
e o mesmo que pessoa, em distin<_,;ao da palavra grega que
significa essen cia. Foi transferida para a lingua portuguesa
na forma de urn adjetivo, para designar a uniao hipostatica,
ou pessoal, de duas naturezas no Deus--homem, Jesus
Cristo.

7. Que e essencial apersonalidade, e como se deve definir a


palavra pessoa, em conexao com a doutrina da Trindade?
A palavra latina suppositum - uma existencia distinta e
individual; e.g., uma arvore ou urn cavalo, em particular. Uma
pessoa esuppositum intellectuale, uma existencia distinta e indi-
vidual a qual pertencem as propriedades da razao e da livre
vontade. No circulo inteiro da nossa experiencia e observa~ao
da existencia pessoal entre as criaturas, a personalidade
descansa sobre a distin<_,;ao de essencia e parece ser inseparavel
desta. Cada pessoa distinta e uma alma distinta, com ou sem
corpo.
Esse modo distinto de existencia que constitui a unica
essencia divina coordenadamente em tres pessoas separadas, e
urn misterio infinito que nao podemos compreender e que,
por isso, nose impossivel definir adequadamente, e s6 podemos
conhece-lo ate onde nose revelado. Tudo o que sabemos a res-
peito e que essa distin<_,;ao, chamada personalidade, abrange
todas essas propriedades incomunicaveis, que pertencem
eternamente ao Pai, ao Filho e ao Espirito Santo, separada-
mente, e nao a todos em comum; que ela e a base para Eles Se
congregarem em conselhos, para Se arnarern rnutuarnente e
A Santissima Trindade
para atuarem uns sobre ·os outros, isto e, para interagirem,
como, e.g., para o Pai enviar o Filho, e para o Pai e o Filho
enviarem o Espirito Santo, e para o uso dos pronomes pessoais
Eu, Tu, Ele, na revelac;ao que qualquer das Pessoas faz de Si e
das outras.
Gerhard define pessoa assim: "Persona est substantia
individua, intelligens, incommunicabilis, qure non sustentatur
in alia, vel ab alia". Em relac;ao a este grande misterio da
Trindade divina de Pessoas na unidade de essencia, a definic;ao
que Calvina oferece e melhor, por ser mais simples: "Por
pessoa, pois, entendo, uma subsistencia na essencia divina-
uma subsistencia que, em bora relacionada com as outras duas,
distingue-se delas por propriedades incomunicaveis" -
Institutas, Liv. 1, Cap. 13, § 6. -., ....

8. Que outros termos tem sido empregados pelos te6logos como


equivalentes de Pessoa, nesta conexiio?
Em grego, hypostasis, e prosopon - aspecto; em latim:
persona, hypostasis, subsistentia, aspectus; em ingles: person,
hypostasis; em portugues: pessoa, hip6stase.

9. Que eque se entende pelos termos:"homoousios" (da mesma


substancia) e ((homoiousios" (de substancia semelhante)?
No primeiro concilio ecumenico da Igreja, o qual, cons-
tando de trezentos e dezoito bispos, foi convocado pelo
imperador Constantino em Niceia, na Bitinia, em 325, havia
tres grandes partidos que mantinham outras tantas opini6es a
respeito da Trindade.
1°. 0 partido ortodoxo, que mantinha a opiniao, agora
sustentada por todas as igrejas cristas, de que o Senhor Jesus,
quanto a Sua natureza divina, e da mesma substancia, iden-
tica, ao do Pai. Esses insistiram em que se Lhe aplicasse o
termo especifico "homoousios", composto de (homos) - o
mesmo, e (ousia)- substancia, para ensinar a grande verdade
de que as tres Pessoas da Dei dade sao urn s6 Deus, por serem

223
Capitulo 9
da mesma essencia numerica.
2°. Os arianos, que mantinham que o Filho de Deus e a
maior de todas as criaturas, mais semelhante a Deus do que
qualquer outra, o unigenito Filho de Deus, criado antes de
todos os seculos, por quem Deus criou todas as coisas, e di-
vinos6 nesse sentido. Sustentavam que o Filho era "heteroousion"
- de essencia diferente, ou genericamente dissemelhante do
Pai.
3°. 0 partido medio, chamado semiarianos, que man-
tinham que o Filho nao e criatura, mas negavam que fosse
Deus no mesmo sentido em que eo Pai, afirmavam que o Pai
e o (mico Deus absoluto e auto-existente; e que, ao mesmo
tempo e desde toda a eternidade, fez proceder de Si, da Sua
propria livre vontade, uma Pessoa divina, com amesma natureza
e as mesmas propriedades que Ele mesmo possui. N egavam, pois,
que o Filho fosse da mesma substancia (homoousios) como
Pai, mas admitiam que e de uma essencia realmente semelhante
e derivada do Pai ("homoiousio's", de semelhante, e "ousia",
substancia) urn s6, genericamente, mas nao numericamente.
N aquele concilio prevaleceram as opinioes do primeiro
partido, ou seja, do partido ortodoxo, e desse tempo em diante
tern sido representadas sempre pelo termo tecnico - opini6es
homoousianas.
Quanto ao credo promulgado por esse concilio, veja o
cap.7.

10. Quais as proposifoes envolvidas essencialmente na doutrina


da Trindade ?
1a. Ha urn s6 Deus, e Ele e urn s6, isto e, e indivisfvel.
za. A (mica essencia divina e indivisivel existe, como urn
todo, eternamente como Pai, como Filho e como Espirito
Santo; possuindo, cada Pessoa, a essencia toda e sendo
constituida em Pessoa distinta por certas propriedades
incomunicaveis, nao comuns a ela e tambem as outras.
3a. A distin<;:ao entre as tres e distin<;:aopessaal, no sentido

224
A Santissima Trindade

de que ocasiona (1) o uso dos pronomes pessoais Eu, Tu, Ele,
(2) uma concorrencia em conselho e urn amor mutuo, e (3)
uma ordem distinta de opera~ao.
4a. Havendo s6 uma essencia divina, e sendo todos os
atributos ou todas as propriedades ativas inerentes na essencia
a que pertencem, e inseparaveis dela, segue-se que todos os
atributos divinos devem ser identicamente comuns a cada uma
das tres Pessoas que subsistem em comum na unica essencia
divina. Entre as criaturas, cada pessoa distinta e uma distinta
substancia numerica, e possui uma inteligencia distinta, uma
vontade distinta, etc. Na Deidade, porem, ha s6uma substan-
cia,uma inteligencia,uma vontade, etc., e, contudo, co-existem
eternamente nessa (mica essencia tres Pessoas, cuja inteligencia,
vontade, etc., e uma s6. Em Cristo, pelo contrario, ha dois
espiritos, duas inteligencias, duas vontades, e, contudo, ao
mesmo tempo, s6 uma indivisivel Pessoa.
sa. Sendo essas Pessoas divinas urn s6 Deus, todos OS
atributos divinos sao comuns a cada uma dElas no mesmo
sentido; nao obstante isso, porem, revela-se-nos nas Escrituras
que existe entre Elas uma certa ordem de subsistencia e
operafaO. (1) Desubsistencia, de modo que 0 Pai nem e gerado,
nem procede, enquanto o Filho e eternamente gerado pelo
Pai, eo Espirito procede eternamente do Pai e do Filho; (2)
De operafiio, de modo que a primeira Pessoa envia a segunda,
e opera por meio dEla, e a primeira e a segunda enviam a
terceira e operam por meio dEla.
Por is so e que se diz sempre que o Pai e a primeira Pessoa,
o Filho asegunda eo Espirito Santo aterceira.
6a. Apesar do fato de que todos OS atributos divinos sao
igualmente comuns as tres Pessoas, e que todas as opera~6es
divinas realizadas ad extra, tais como a criac;:ao, a providencia e
a reden~ao, sao atribuidas ao unico ser divino- ao Deus unico,
considerado em sentido absoluto- e tambem em separado ao
Pai, ao Filho e ao Espirito Santo, contudo, as Escrituras atri-
buem algumas operac;:6es divinas realizadas ad intra

225
Capitulo 9

exclusivarnente a cada urna das Pessoas divinas, respectiva-


rnente, e.g., gera<;:ao ao Pai, filia<;:ao ao Filho, processao ao
Espirito Santo; e ha tambem algumas opera<;:6es realizadasad
extra que as Escrituras atribuem proeminentemente a cada
Pessoa, respectivamente,e.g., cria<;:ao ao Pai, reden<;:ao ao Filho
e santifica<;ao ao Espfrito Santo.
Portanto, a fim de estabelecermos esta doutrina em todas
as suas partes sabre o testemunho das Escrituras, e necessaria
que provemos, em sua ordem, as seguintes proposi<;:6es:
P. Que Deus e urn s6.
2a. Que Jesus de Nazare, quanta aSua natureza divina, era
verdadeiramente Deus e, ao mesmo tempo, Pessoa distinta do
Pai. 1
3a. Que o Espirito Santo e verdadeiramente Deus e, ao
mesmo tempo, Pessoa distinta.
4a. Que as Escrituras ensinam diretamente que ha uma
Trindade de Pessoas em uma s6 Deidade.
sa. Restara reunir tudo o que as Escrituras ensinam a
respeito das rela~6es necessarias e eternas que estas tres Pessoas
divinas mantem umas com as outras entre si. Essas rela<;6es
podem ser assim distribuidas: (1) A rela<;ao que a segunda
Pessoa man tern com a primeira, ou a gerac;ao eterna do Filho;
(2) A relac;ao que a terceira Pessoa man tern com a primeira e a
segunda, ou a processao eterna do Espfrito Santo; e (3) Suas
propriedades pessoais e a ordem da Sua operaqao ad extra.

1. DEUS E UM SO E HA UM SO DEUS

As provas desta proposic;ao, tiradas da razao e das


Escrituras, foram expostas acima, Cap. 8, sabre os atributos de
Deus, perguntas 12-18.
A resposta a pergunta: como se pode conciliar com esta
doutrina fundamental da unidade divina a existencia
coordenada de tres Pessoas distintas na Trindade, achar-se-a
abaixo na pergunta 94 deste capitulo.

226
A Santissima Trindade
2. JESUS DE NAZARE, QUANTO A SUA
NATUREZA DIVIN A, ERA VERDADEIRAMENTE
DEUS E, AO MESMO TEMPO,
PESSOA DISTINTA DO PAl

11. Quais as diversas opinioes mantidas a respeito da Pessoa


de Cristo? ··
A doutrina ortodoxa a respeito da Pessoa de Cristo e que
Ele existia desde toda a eternidade como o Filho coigual ao
Pai, constituido da mesma essencia infinita e autoexistente que
caracteriza o Pai eo Espirito Santo.
A doutrina ortodoxa a respeito da Pessoa de Cristo, como
Ele Se acha constituido agora, depois da Sua encarna<;ao, vern
exposta no Cap. 23. Uma exposi<;ao das diversas opini6es
hereticas a respeito da Sua Pessoa achar-se-a abaixo nas
perguntas 96-99, deste capitulo.

12. Ate onde esperavam os judeus do tempo de Cristo que o


Messias viesse como Pessoa divina?
E certo que, quando Cristo apareceu, a grande multidao
do povo judaico ja nao conservava mais a expecta<;ao escritu-
ristica de urn Salvador divino, e desejava que s6 viesse urn
principe temporal, que fosse, num sentido proeminente, o
predileto do ceu. Diz-se, porem, que em alguns dos escritos
rabinicos acham-se espalhados alguns indicios de que alguns
dos judeus mais ilustrados e espirituais mantinham-se ainda
fieis afe antiga.

13. Como se pode provar pelas Escrituras a preexistencia de


Jesus em relarJio ao Seu nascimento ((de mulher"?
1°. Pelas passagens que afirmam que Ele foi o Criador do
mundo- Joao 1:3; Col. 1:15-18.
2°. Pel as passagens que declaram expressamente que Ele
estava como Pai antes de haver mundo; que era rico e possuia
gloria- Joao 1: 1,15,30; 6:62; 8:58; 2 Cor. 8:9.

227
Capitulo 9
3°. Pelas passagens que declaram que "veio ao mundo",
"desceu do ceu"- Joao 3:13,31; 13:3; 16:28; 1 Cor. 15:47.

14. Como se pode provar que o SENHOR (Jeova; Yave), que


Se manifestou como o Deus dos judeus (o Deus da Alianfa)
sob a antiga economia, era a segunda Pessoa da Trindade, que
Se encarnou em Jesus de Nazare?
Este fato nao e afirmado expressamente nas Escrituras,
mas pode ser comprovado pela comparas;ao de rnuitas
passagens. Veja:
1°. Todos os aparecimentos divinos da economia antiga
sao referidos a uma s6 pessoa- Cf. Gen. 18:2,3,17,18; 32:9,29;
Ex. 3:14,15; 13:21; 20:1,2; 24:1,2; 25:1,21; Deut. 4:32,35,39;
Nee. 9:7-38. Essa Pessoa tmica echam ada J eova * (Senhor, na
tradus;ao portuguesa de Figueiredo (SENHOR, na Versao de
Almeida), nome incornunicavel de Deus, e, ao mesmo tempo,
anjo, ou enviado- Cf. Gen. 31: 11,13; 48: 15,16; Os. 12:2,5.
Comparem tambem Ex. 3:14,15 com Atos 7:30-35; Ex. 13:21
com Ex. 14:19; Ex. 20:1,2 com Atos 7:38 e Sal. 62:7,11,12.
2°. Mas ninguem jarnais viu a Deus Pai (Joao 1: 18; 6:46);
nem podia essa Pessoa ser urn anjo, ou outro enviado
semelhante; todavia Deus o Filho foi visto (1 Joao 1: 1,2) e
enviado (Joao 5:36).

* Modernamente descobriu-se que o nome "Jeova" e resultado da leitura do


nome por excelencia de Deus (o tetragrama inefavel, impronunciavel) com
OS sinais vocalicos doutra palavra. Os judeus, por respeito, nao pronun-
ciavam o Nome; em seu lugar liam Adonai (Senhor) ou Elohim (Deus). E
os massoretas, especialistas judeus que criaram o fabuloso sistema de sinais
vocalicos e outros sinais, porque o hebraico escrito so constava de consoantes,
seguiram aquela tradi~ao e ao Nome juntaram OS sinais vocalicos de
Adonai ou de Elohim. Assim e que "Jeova" e nome inexistente no
hebraico. Numa tentativa de aproxima<;iio, tern sido comum o emprego
de Yave ou lave. Na sequencia, manteremos a forma "J eova", utilizada na
edi~ao original desta obra. Nota de Odayr Olivetti.

228
A Santissima Trindade
3°. Jeova, que era ao mesmo tempo o anjo ou o enviado da
economia antiga, foi tambem exposto pelos profetas como o
Salvador de Israel eo Autor da nova dispensa~ao. Em Zac.
2:11,12 vemos que urn Jeova e enviado de outro. Veja Miq.
5:2. Em Mal. 3:1 declara-se que "o SENHOR", "o Anjo da
alian~a", vira ao Seu proprio templo; e is to e aplicado a Jesus
em Mar. 1:2. Comparem Sal. 97:7 com Heb. 1:6 e Is. 6:1-5
com Joao 12:41.
4°. Referindo-se a passagens do Velho Testamento, algumas
passagens do Novo parecem implicar diretamente esse fato.
Compare Sal. 78:15,16,35 com 1 Cor. 10:9.
5°. A lgreja euma s6 sob ambas as dispensa~6es, e desde o
principia Jesus eo Redentor e a Cabe~a da Igreja; e, por isso,
mais coerente com tudo o que nos foi revelado a respeito dos
oficios das tres Pessoas divinas na obra da reden~ao, que se
acate a opiniao agora apresentada. Veja tam bern Joao 8:56,58;
Mat. 23:37; 1 Ped. 1:10,11.

15. De que forma no Velho Testamento se fizeram as primeiras


indicafoes da existencia e da operafiio de uma Pessoa distinta de
Deus e ao mesmo tempo divina?
Nos livros mais antigos fala-se em urn Anjo, enviado da
parte de Deus, aparecendo muitas vezes aos homens, e sendo
ao mesmo tempo Deus- Gen. 16:7-13. 0 Anjo deJeova aparece
a Agar, fala como quem tern poder divino e echamado Deus-
Gen. 18:2-33. Tres anjos aparecem a Abraao, e urn deles e
chamado Jeova, versiculo 17- Gen. 32:24-30. Urn Anjo luta
com Jac6 eo aben~oa como Deus, e em Os. 12:3-5 esse Anjo e
chamado Deus- Ex. 3:2. 0 Anjo de Jeova aparece a Moises na
sar~a ardente, enos versiculos seguintes esse Anjo echamado
J eova, e lhe sao dados outros titulos divinos. Esse Anjo
conduziu OS israelitas no deserto- Ex. 14:19; Is. 63:9. Jeova e
representado como salvando Seu povo medianteoAnjo da Sua
Presenfa. Assim Mal. 3:1- " ... de repente vira ao seu templo o
SENHOR (Adon, no hebraico), a quem v6s buscais, o Anjo da

229
Capitulo 9
alian~a, a quem v6s desejais ... "; aplicado a Cristo em Mar. 1:2.

16. Que provas da deidade do Messias apresenta-nos o


Salmo 2?
0 referido salmo declara que Ele e o Filho de Deus e que
como tal Lhe sera dado o dominio do mundo inteiro e dos
seus habitantes. E exorta a todos a se submeterem a Ele e a
confiar nEle, sob pena de incorrerem em Sua ira. Em Atos
13:33, Paulo declara que este salmo refere-se a Cristo.

17. Que provas temos no Salmo 45? .


Os judeus antigos entenderam que este salmo foi dirigido
ao Messias) e este fato e estabelecido em Reb. 1:8,9. Nele,
portan to, Jesus e chama do Deus, e Seu trona urn trona eterno.

18. Que provas temos no Salmo 11 0?


Que este salmo se refere ao Messias fica provado por Cristo
(Mat. 22:43,44), e pelo autor da Epistola aos Rebreus (Reb.
5 :6; 7: 17). N ele o Messias echama do Senhor (Adonai) de Davi,
e e convidado a assentar-Se a mao direita de Jeova, ate que
todos os Seus inimigos se tenham tornado escabelo de Seus
pes.

19. Que provas temos em Isaias 9: 6?


Eevidente que esta passagem se refere ao Messias, o que e
confirmado por Mat. 4:14-16. Declara explicitamente que o
menino nascido e tambem "Deus forte, Pai do futuro seculo
(Figueiredo; literalmente, Pai da eternidade, ou Pai eterno ),
Principe da paz".

20. Que provas temos em Miqueias 5:2?


Os judeus entenderam que a referencia e a Cristo, o que
fica confirmado por Mat. 2:6 e Joao 7:42. A passagem declara
que as Suas "origens sao desde OS tempos antigos, desde OS
dias da eternidade"' is to e, des de a eternidade.

230
A Santissima Trindade

21. Que provas temos em Malaquias 3: 1,2? ~·.


E 6bvio que esta passagem se refere ao Messias, o que e
confirmado por Mar. 1:2.
0 templo, que era Iugar consagrado a presen<;:a e ao culto
de J eova, e chamado "seu templo". E no versiculo do is Lhe e
atribuida uma obra divina de juizo .
. ~ .. - "''·"'·:-
22. Que provas temos na maneira pela qual os escritores do
Novo Testamento aplicam a Cristo as Escrituras do Velho Testa-
mento?
Os ap6stolos muitas vezes aplicam a Cristo a linguagem
do Velho Testamento, mesmo quando e evidente que os
escritores originais queriam falar em J eova, e nao no Messias
como tal.
0 Salmo 102 e evidentemente uma ora<;:ao dirigida ao
Senhor supremo, atribuindo-Lhe eternidade, cria<:;:ao, governo
providencial, culto, bern como aten<;:ao as ora<;:6es e suas
respostas. Mas o texto de Heb. 1:10-12 afirma que o salmo foi
dirigido a Cristo. Em Is. 45:20-25 Jeova fala e afirma a Sua
soberania suprema. Mas em Rom. 14:11 Paulo cita uma parte
da declara<:;:ao de J eova a respei to de Si, para provar que teremos
todos que comparecer ante o tribunal de Cristo. Compare
tambem Is. 6:3 com Joao 12:41.

23. Qual o carater geral do testemunho dado a respeito deste


ponto pelo Novo Teestamento?
Esta doutrina fundamental nose apresentada em cada urn
dos livros e em cada paragrafo separado do Novo Testamento,
ou por afirma<;:ao direta ou por implica<;:ao necessaria, como
qualquer lei tor sincero podera verificar pessoa1mente. A massa
inteira deste testemunho e tamanha, e ele se acha tao
in tim amen te en trela<;:ado com todos os demais temas de cada
passagem, que aqui s6 tenho lugar para apresentar uma amostra
geral do testemunho, classificado sob os titulos costumeiros.
AUBREY ClABI(

231
Capitulo 9
24. Provas de que o Novo Testamento da titulos divinos a Cristo:
Joao 1:1; 20:28; Atos 20:28; Rom. 9:5; 2 Tess. 1: 12; 1 Tim.
3:16; Tito 2:13; Heb.l:8; 1 Joao 5:20.

25. Provas de que o Novo Testamento atribui titulos divinos


a Cristo:
Eternidade- Joao 1:2; 8:58; 17:5; Apoc. 1:8,17,18; 22:13.
Imutabilidade - Heb. 1:11,12 e 13:8.
Onipresen<;a- Joao 3:13; Mat. 18:20; 28:20.
Onisciencia- Mat. 11:27; Joao 2:23-25; 21:17; Apoc.
2:23.
Onipotencia- J oao 5: 17; Heb. 1 :3; Apoe. 1: 8; 11:17.

26. Provas de que o Novo Testamento atribui obras divinas


a Cristo:
Cria<;ao- Joao 1 :3,10; Col. 1:16,17.
Conserva<;ao e Providencia-Heb.1:3; Col.1:17; Mat.
28:18.
Milagres- Joao 5:21-26.
Juizo- 2 Cor. 5:10; Mat. 25:31,32; Joao 5:22.
Obras da gra<;a, a elei<;ao inclusive- J oao 1:17; 13: 18; 15:19.
Santifica<;ao- Ef. 5:26.
0 enviar o Espirito Santo- Joao 16:7,14;
0 dar a vida eterna- Joao 10:28.

27. Provas de que o N avo Testamento ensina que se deve pres tar
culto supremo a Cristo:
Mat. 28:19;Joao 5:22,23; 14:1; Atos 7:59,60; 1 Cor.1:2; 2
Cor. 13:14; Fil. 2:9,10; Heb. 1:6; Apoc. 1:5,6; 5:11,14; 7:10.

28. Provas de que o Filho, sendo Deus como e, ePessoa distinta


do Pai.
Este fato e ensinado tao claramente nas Escrituras, e se
acha implicito tao universalmente, que o sistema sabeliano,
que onega, nunca conseguiu muita aceita<;ao.

232
A Santissima Trindade
Cristo foi enviado pelo Pai, veio dEle, voltou para Ele,
recebeu mandamentos dEle, fez a Sua vontade, ama-0, e dEle
amado, dirigiu-Se a Ele em ora<;:ao, empregou os pronomes Tu
e Ele quando falava a Ele ou a respeito dEle. Isso tambem os
titulos relativos, Pai e Filho, implicam necessariamente. Veja
o Novo Testamento todo.
Ao estabelecer a doutrina da Trindade, no que diz respeito
a segunda Pessoa, o ponto principal e provar a deidade absoluta
de Cristo, pois tao 6bvia e a Sua personalidade distinta que
praticamente nao ha discussao sobre isso. Quando, porem, se
quer estabelecer a veracidade da doutrina a respeito da terceira
Pessoa, o ponto principal e que se prove a Sua personalidade
distinta, por ser revelada tao claramente a Sua divindade
absoluta que a respeito dela nao ha controversia.

3. 0 ESPIRITO SANTO E VERDADEIRAMENTE


DEUS E, AO MESMO TEMPO, PESSOA DISTINTA.

29. Que seitas sustentavam que o Espirito Santo euma criatura?


A deidade do Espirito Santo e revelada tao clararnente
nas Escrituras que poucos se tern atrevido a po-la ern questao.
As antigas controversias dos ortodoxos com os arianos, antes e
depois do concilio niceno, 325 d.C., a respeito da deidade do
Filho, ocupararn de tal modo OS anirnos dos dois partidos que
se prestou pouca aten<;:ao naquele tempo as questoes relacio-
nadas corn o Espirito Santo. Diz-se, porern, que Ario ensinava
que, assirn como o Filho e a prirneira e a rnaior criatura do
Pai, assirn tarnbem o Espirito Santo e a prirneira e a rnaior
criatura do Filho. Veja Neander, Church Hist., vol. 1, pags.
416-420.
Diz-se que alguns dos discipulos de Macedonia, bispo de
Constantinopla, 341-360 d.C. sustentavarn que o Espirito Santo
nao e Deus supremo. Essa opiniao foi condenada pelo Segundo
Concilio Geral de Contantinopla, 381 d.C. Esse concflio defi-
niu e resguardou a fe ortodoxa acrescentando clausulas defini-

233
Capitulo 9
das a referencia simples que o credo antigo fazia ao Espirito
Santo. Veja o Credo do Condlio de Constantinopla, Cap.7.

30. Par quem o Espirito Santo foi considerado s6 como uma


energia de Deus?
Todas aquelas seitas antigas chamadas geralmente monar-
quianas e patripassianas, ensinavam, com algumas distin<;6es
subordinadas, que na Deidade ha somente uma Pessoa, assim
como uma s6 essencia, e que essa Pessoa, em diversas rela<;6es,
e chamada Pai, Filho ou Espirito Santo. No seculo 16, Socino,
que ensinava que Jesus Cristo era mero homem, sustentava
que a expressao Espirito Santo e empregada nas Escrituras
como designativo da energia divina quando opera de urn modo
particular. Essa e agora a opiniao de todos os unitarios e
racionalistas modernos.
; ! _f ;. '.I ' • :. f ·-; • •

31. Como se pode provar que todos as atributos de personali-


dade sao atribuidos ao Espirito Santo nas Escrituras?
Os atributos de personalidade sao os seguintes: inteli-
gencia, voli<;ao, opera<;ao independente. Cristo emprega os
pronomes Eu, Tu, Ele, quando fala da rela<;ao do Espirito Santo
para com Ele ou para com o Pai: "Eu o enviarei". "E1e dara
testemunho de si." "A quem o Pai enviara em meu nome."
Assim, pois, Ele e enviado; da testemunho; recebe do que ede
Cristo e no-lo an uncia. Ensina e conduz averdade. Sabe, tern
conhecimento, porque esquadrinha as coisas profundas de
Deus. Opera todos os dons sobrenaturais, repartindo-os entre
os hom ens segundo a Sua boa von tade- J oao 14: 17 ,26; 15: 26;
1 Cor. 2:10,41; 12:11. Ele argui, g1orifica, ajuda, intercede-
Joao 16.7; Rom. 8:26.

32. Como se pode provar Sua personalidade pelos oficios que


as Escrituras dizem que Ele desempenha?
0 Novo Testamento, em todo o seu ensino, mostra que o
plano de reden<;ao envolve essencialmente a opera<;ao do

234
A Santissima Trindade

Espirito Santo em aplicar a salva<;;ao que foi a obra realizada


pelo Filho e com a qual Ele visava alcan<;;ar-nos. Ele inspirou
os profetas e os ap6stolos; ensina e santifica a lgreja; escolhe os
oficiais da Igreja, preparando-os pela comunica<;;ao de dons
especiais segundo a Sua boa vontade. E o advogado, e todo
cristao e Seu cliente. Traz-nos todas as gra<;;as do Cristo assunto
ao ceu e as torna eficazes em nossas pessoas em cada momenta
da nossa vida. E 6bvio que a Sua distin<;;ao pessoal acha-se
envolvida na propria natureza dessas fun<;;6es que Ele
desempenha-Luc.12:12; Atos 5:32; 15:28; 16:6; 28:25; Rom.
15:16; 1 Cor. 2:13; Heb. 2:4; 3:7; 2 Ped. 1:21. : .r·,

33. Que argumento se pode deduzir da formula do batismo a


favor da personalidade do Espirito Santo?
Os cristaos sao batizados em nome do Pai e do Filho e do
Espirito Santo. Nao seria possivel conciliar todas as leis da
linguagern e da razao corn esse suposto a to de falar ern "nome"
de urna energia, ou ode associar urna energia coordenadarnente
com duas pessoas distintas.

34. Como se pode provar Sua personalidade pelo que se diz do


pecado contra o Espirito Santo?
Ern Mat. 12: 31,32; Mar. 3:28,29; e Luc. 12:10, esse pecado
e charnado "blasfernia contra o Espirito Santo". Ora, blasfernia
e pecado cornetido contra urna pessoa, e nessas passagens
distingue-se essa blasfernia do rnesrno pecado cornetido
contra as outras Pessoas da Trindade.

35. Como conciliar com a Sua personalidade expressoes como


''dar" au "derramar" o Espirito?
Essas e outras express6es sernelhantes sao ernpregadas
figuradarnente para indicar a nossa participac;:ao nos dons e
operac;:6es do Espirito. E urna das figuras mais naturais e
comuns a de designar o dorn pelo nome de quem o da. Assirn
e que se fala ern "revestir-nos de Cristo", ern serrnos "batizados

135
Capitulo 9
em Cristo", etc.- Ef. 5:30; Rom. 13:14; Gal. 3:27.

36. Como se prova que as names de Deus sao aplicados ao


Espirito Santo?
Comparando-se, por exemplo, Ex. 17:7 e Sal. 95:7 com
He b. 3:7-11. Veja Atos 5: 3,4.

37. Que atributos divinos as Escrituras Lhe atribuem?


Onipresenc;,:a- Sal. 139:7; 1 Cor. 12:13.
Onisciencia - 1 Cor. 2: 10, 11.
Onipotencia - Luc. 1:35; Rom. 8:11.

38. Que operafi5es no mundo exterior as Escrituras Lhe atribuem?


A criac;,:ao -Gen. 1:2; J6 26: 13; Sal. 104:30.
0 poder de realizar milagres - Mat. 12:28; 1 Cor. 12:9-11.

39. Como fica estabelecida a Sua deidade suprema pelo que


as Escrituras dizem da Sua afao na obra de redenfao?
Dizem as Escrituras que Ele e o agente imediato da
regenerac;,:ao: Joao 3:6; Tito 3:5; e da ressurreic;,:ao de nossos
corpos: Rom. 8:11. Sua ac;,:ao na gerac;,:ao da natureza humana
de Cristo, na ressurreic;,:ao dEle e na inspirac;,:ao das Escrituras
foram manifestac;,:6es do Seu poder divino em preparar a
redenc;,:ao que agora Ele aplica.

40. Como conciliar com Sua deidade expressi5es como "ele nao
fa lara de si mesmo "?
Essa expressao e outras semelhantes devemos entender
como se referindo aobra oficial do Espirito; do mesmo modo
como entendemos o que se diz de Cristo, que "foi enviado"
pelo Pai e que Lhe esta subordinado. 0 fim que o Espirito
Santo tern em vista em Sua obra oficial nos corac;,:6es dos
homens nao e o de revelar as relac;,:6es da Sua Pessoa com as
outras Pessoas da Deidade, e sim simplesmente o de revelar o
carater e a obra mediatarias de Cristo.

236
A Santissima Trindade
4. AS ESCRITURAS ENSINAM DIRETAMENTE
QUE HA UMA TRINDADE DE PESSOAS
NUMA SO DEIDADE •
1
t
••
:

41. Como e ensinada diretamente esta trindade de Pessoas na


formula do batismo?
0 batismo em nome de Deus implica o reconhecermos a
autoridade divina de Deus, Sua promessa de dar-nos a vida
eterna e a nossa obriga<;;ao de Lhe prestarmos culto divino e
obediencia. Os cristaos batizados en tram assim numa rela<;;ao
de pacto ou alian<;a com tres Pessoas nomeadas distintamente
em sua ordem. A linguagem implica necessariamente que cada
urn desses nomes representa uma Pessoa; e a natureza do
sacramento (da ordenan<;a) prova que cada uma delas edivina.
VejaMat. 28:19.

42. Como e ensinada esta doutrina diretamente na formula da


benr;ao apostolica?
Veja 2 Corintios 13:13. Temos ai nomeadas distintamente
tres Pessoas, e cada uma comunicando uma ben<;;ao separada,
segundo a Sua propria ordem e maneira de opera<;ao. 0 amor
do Pai em idealizar, a gra<;a do Filho em alcan<;ar, e a
comunica<;;ao do Espirito Santo em aplicar a salva<;;ao. Sao tres
nomes pessoais distintos de a<;:ao pessoa1, e cada urn igualmente
divino.

43. Que prova nose dada pela narrar;ao do batismo de Cristo?


Veja Mateus 3:13-17. Ai tambem sao apresentadas a nos
tres Pessoas nomeadas dis tin tamente e descri tas como
operando cada uma segundo a Sua propria maneira: o Pai
falando do ceu, o Espirito descendo em forma de pomba e
pousando sobre Cristo, e Cristo reconhecido como o Filho
amado de Deus, saindo para fora da agua. J;"v'OJ i

44. Veja o argumento apresentado par Joao 15:26 e seu contexto.

237
Capitulo 9
Nessa passagem tambem temos tres Pessoas distintas
mencionadas ao mesmo tempo, e afirmada a Sua a~ao relativa.
0 Filho e a Pessoa que fala sobre o Pai e sobre o Espirito, e
que esta reivindicando a respeito de Si o direito de enviar o
Espirito. 0 Pai e a Pessoa de quem procede o Espirito. A
respeito do Espirito o Filho diz que Ele "vira", que "sera
enviado", que "procede", que "testificara".

4 5. Que dizer sabre a prova da genuinidade de 1 J oao 5:7?


Nao disponho de espa~o para apresentar urn born resumo
dos argumentos a favor e contra a genuinidade daclausula em
disputa. VejaHorne's Introd., vol. 4, Parte 2, cap. 4, sec. 5.
Limito-me a dizer:
1°. Que a clausula em disputa e como se segue: "no ceu: a
Pai, a Palavra, e o Espirito Santo; e estes tres siio um. E tres siio
as que testificam na terra".
2°. Entre os homens ilustrados e piedosos ha diferen~a de
opini6es quanto a preponderanCia das evidencias; as mais
abalizadas inclinam-se contra a genuinidade da clausula.
3°. A doutrina ensinada nessa passagem e tao biblica, e e
tao intima a conexao gramatical e 16gica da clausula com o
contexto, que, para edificafiio, e no estado atual do nosso
conhecimento, devemos rete-la, mas nao devemos cita-la para
estabelecer doutrina.
4°. A rejei~ao dessa passagem de modo algum diminui a
for~a irresistivel das provas fornecidas pelas Escrituras a favor
da doutrina ortodoxa sobre a Trindade.

46. Que passagens do Velho Testamento implicam existir mais


de uma Pessoa na Deidade?
Note-se o uso do plural nas passagens seguintes: Gen. 1:26;
3:22; 11:7; Is. 6:8. Confira-se a tripla repeti~ao do nome de
Jeova em Num. 6:24-26 com a ben~ao apost6lica em 2 Cor.
13:13. Note-se tambem em Is. 6:3 a tripla repeti~ao da
atribui~ao de santidade.

238
A Santissima Trindade
47. Que passagens do Velho Testamento falam do Filho como
Pessoa distinta do Pai e, ao mesmo tempo, como Deus?
No Salrno 45:6,7 ternos o Pai dirigindo-Se ao Filho como
Deus e ungindo-0. Veja tarnbern Salrno 110:1 e Isaias
45:6,7,14.
Nas profecias fala-se do Filho sernpre como urna Pessoa
distinta do Pai e, ao rnesrno tempo, Ele e charnado "Deus
Forte", etc.- Is. 9:6; Jer. 23:6.

48. Que passagens do Velho Testamento falam do Espirito Santo


como Pessoa distinta do Pai e, ao mesmo tempo, como Deus?
Gen. 1;2; 6:3; J6 26:13; Sal. 104:30; 139:7; Is. 48:16.

5. RESTA-NOS CONSIDERAR 0 QUE AS


ESCRITURAS ENSINAM A RESPEITO DAS
RELA<;OES ETERNAS E NECESSARIAS QUE AS
TRES PESSOAS DIVINAS SUSTENTAM ENTRE SI.

A. A RELA<;:AO QUE A SEGUNDA PESSOA MANTEM COM


A PRIMEIRA, OU A GERA<;:AO ETERNA DO FILHO.

49. Qual o uso idiomatico da palavra hebraica ben (filho)?


E usada no sentido- 1°. De filho. 2°. De descendente; e
aqui, no plural, "filhos de Israel", ern vez de israelitas. Tarnbern
unida, no plural, ao nome de urn Iugar ou nas;ao, para denotar
seus habitantes ou os cidadaos, como "filhos de Siao", etc. 3°.
De discipulo, pupilo, adorador, como "filhos dos profetas" (1
Reis 20:35); e "filhos de Deus" aplicado (1) a reis, Sal. 2:7; (2)
aos anjos, Gen. 6:2; J6 38:7; (3) ao povo de Deus, Seus
adoradores, Deut. 14:1; 4°. Ern cornbina<;:ao corn substantivos,
para exprirnir ida de, qualidade, etc., como "filho de urn ano",
ern vez de: corn a idade de urn ano, Lev. 12:6, no hebraico ;
"filhos de Belial", ern vez de rnalvados, Deut. 13:13; "filho da
rnorte", ern vez de digno de rnorte, 1 Sam. 20:31; "outeiro,
filho da gordura" ern vez de ou teiro fertilissirno, Is. 5: 1, no

239
Capitulo 9
hebraico. 0 mesmo idiotismo acha-se tambem no grego do
Novo Testamento. Veja Gesenius,Heb. Lex.

50. Em que sentido os homens sao chamados "filhos de Deus"


nas Escrituras?
A ideia geral expressa pela palavra "filho", compreende-
1°. semelhan~a e deriva~ao de natureza; 2°. amor paterna e
filial; e 3°. estado de herdeiro.
Nesse sentido geral, todas as criaturas santas e inteligentes
de Deus sao chamadas Seus filhos. 0 termo e aplicado em
sentido eminente aos reis e magistrados, que rece~em de Deus
o seu poder de regen cia- Sal. 82:6, e aos cristaos, que sao objetos
da regenera~ao espiritual e da adoc;:ao - Gal. 3:26, objetos
especiais do favor divino- Mat. 5:9, e sao semelhantes a Deus
-Mat. 5:45. Quando aplicada a criaturas, quer sejam homens
quer anjos- ]6 1:6; 38:7, a palavra esta sempre no plural. No
singular eaplicada somente asegunda Pessoa da Trindade, com
a unica excec;:ao da aplica~ao feita a Adao em Luc. 3:38, eviden-
temente para denotar a sua deriva~ao direta de Deus, sem a
intervenc;:ao de urn pai humano.

51. Quais os motivos alegados pelos socinianos para a aplicafiiO


da expressao "Filho de Deus" a Cristo nas Escrituras?
1o. Alguns socinianos dizem que o nome Filho de Deus e
aplicado a Cristo somente como urn titulo oficial, do mesmo
modo como e aplicado no plural a reis e magistrados.
2°. Outros socinianos dizem que Cristo foi chamado Filho
de Deus somente porque Deus 0 fez nascer de modo
sobrenatural, e nao por gera~ao natural. Em apoio disso eles
citam Lucas 1:35.

52. Que resposta se deve dar ao argumento baseado em Lucas


1:35, de que Jesus foi chamado Filho de Deus somente par causa
do S eu nascimento miraculoso? ' , -' - - : -
1°. Se esse fosse o motivo fundamental pelo qual o nome

240
A Santissima Trindade

"Filho de Deus" e aplicado tantas vezes a Cristo, Ele deveria


ser chamado "Filho do Espirito", pois foi o Espirito Santo
que desceu sobre a virgem. Mas nunca e chamado assim,
nem ha indicia algum nas Escrituras de tal relac;ao.
2°. Mesmo que esse tenha sido urn dos motivos pelos quais
Cristo e chamado Filho de Deus, nao se segue que nao haja
outros e mais poderosos motivos revelados nas Escrituras para
se Lhe dar esse nome. Provaremos abaixo que ha.
3°. E provavel que o verdadeiro motivo pelo qual o anjo
disse avirgem o que consta dessa passagem era fazer-lhe saber
que, em conseqiit~ncia da gerac;ao sobrenatural de seu filho, o
menino que havia de nascer dela seria chamado o "Filho de
Deus". Nao seria urn menino comum: o que havia de nascer
deveria ser considerado como relacionado de urn modo pecu-
liar com Deus, ate que se fizesse a completa revelac;ao da Sua
filiac;ao eterna como Pessoa divina.

53. Quais as motivos alegados pelos arianos para a aplicafiiO


desse titulo a Cristo?
Os arianos dizem que e chamado assim porque Deus 0
criou mais a Sua semelhanc;a do que a de qualquer outra
criatura, e antes de qualquer outra criatura.

54. Qual o motivo alegado par alguns trinitarianos, que quanta


a este ponto afastam-se da fi ortodoxa, para a aplicar;iio desse
titulo a Cristo, e em que passagens se ap6iam?
Eles afirmam que o titulo "Filho de Deus" nao pertence a
Cristo como o Logos, a eterna segunda Pessoa da Trindade, e
sim como o Theantropos (o Deus-homem). Objetam contra a
doutrina ortodoxa da filiac;ao eterna de Cristo, alegando:
1°. Que filiac;ao implica em derivac;ao, e, por conseguinte,
em inferioridade.
2°. Que a expressao "Filho de Deus" Lhe e aplicada em
muitas passagens como urn sinonimo de "Cristo" e de outros
titulos oficiais, pertencendo a Seu oflcio mediatorial e nao as

241
Capitulo 9
Suas rela<;:6es eternas dentro da Deidade. Suas referencias
bfblicassaoMat.16:16;Joao 1:49,etc.
3°. Que no Sal. 2:7 e declarado expressamente que Cristo
foi constituido "Filho de Deus" no tempo, contrariamente a
sua coexistencia como tal desde a eternidade com o Pai por
necessidade da Sua natureza.
4°. Tiram o mesmo argumento de Rom. 1:4.

55. Demonstre que nao tem fundamento a objeftiO feita contra


a doutrina ortodoxa pela representaftiO da segunda Pessoa como
inferior aprimeira.
Essa obje<;:ao s6 parece plausivel quando se for<;:a muito a
analogia entre as rela<;:6es humanas de pai e filho e as rela<;:6es
divinas a que se aplicarn os rnesrnos terrnos. Mas essas rela<;:6es
hurnanas podern sera rnelhor analogia que nos e conhecida
das rela<;:6es divinas de Pai e Filho, e servir de base para a
aplica<;:ao apropriada desses terrnos, sern que deixe de ser
verdade que as duas realidades indicadas sao necessaria-
mente tao diversas como o material ediverso do espiritual, o
temporal do eterno eo finito do infinito. Alern disso, a obje<;:ao
reside nurna erronea cornpreensao da doutrina ortodoxa quanta
aos seguintes pontos:
1°. A doutrina da lgreja e que aPessoa, e nao a essencia do
Filho, e gerada do Pai. A essencia auto-existente da Deidade
pertence ao Filho e ao Pai igualrnente, desde toda a eternidade.
2°. 0 Pai gera ao Filho por urn eterno e necessaria ato
constitucional (nao voluntario ). Assirn, o Filho de modo algurn
depende do Pai ou Lhe e inferior, e e isso que distingue esta
doutrina do ensino da lgreja dos serni-arianos. Veja abaixo,
perg.97. .J.,., ,, .

56. Demonstre que nao tem fundamento a objeftiO feita contra


a doutrina da Igreja, objeftiO base ada em Mateus 16: 16; Joao
1:49,etc. ' ,_ :·:,·'liP,,,,)
Ern nenhurna dessas passagens se afirrna que Ele e Filho

242
A Santissima Trindade
como o Cristo, isto e,como o Mediador, mas que, sendo o Filho
eterno de Deus, e o Cristo, o Rei de Israel, etc.

57. Prove que nem o Salrno 2 nem Rornanos 1:4 ensinam que
Cristo foi feito filho de Deus.
Quanto ao Salrno 2:7, o Dr. Alexander (veja Com. on
Psalms), afirrna que significa sirnplesrnente: "Tu es rneu Filho,
sou hoje, agora, sernpre, eternarnente Teu Pai. Mesrno que
relacionernos "hoje" com o principia da rela~ao filial, a
prirneira clausula do versiculo, por sua forma de rerninisd~ncia
ou de narra~ao, lan~a isso para urn passado indeterrninado. "0
Senhor me disse", mas quando? Se entendermos que o disse
desde a eternidade, deveni ver-se que a forma da expressao
seria perfeitarnente analoga as outras forrnas figuradas por cujo
rneio as Escrituras representarn verdades realmente inefaveis
na linguagern hurnana".
Quanto a Rornanos 1:4, diz o texto: "Declarado (horisthen-
tos, de horizo) Filho de Deus em poder, segundo o Espirito de
santifica~ao, pela ressurrei~ao dos rnortos". (A versao utilizada
pelo tradutor da edi~ao de 1895 (que e a de Figueiredo) diz:
"Que foi predestinado Filho de Deus ... ) A palavra horizo,
ernpregada oito vezes no Novo Testamento, significa sernpre
constituir, designar, ao passo que aqui se insiste em que
significa rnanifestar. Seu significado restrito elirnitar, definir,
e bern pode ser tornada no sentido depropor, caracterizar, e este
o sentido ern que o Dr. Hodge (Com. on Rom.) inforrna que o
terrno e tornada pela grande rnaioria dos cornentadores, alguns
dos charnados Pais gregos inclusive. Mas, rnesrno que se
conceda a interpreta~ao que os nossos oponentes dao a essa
passagem, ficarao intactas as provas indubitaveis que rnuitas
outras passagens dao a favor da doutrina ortodoxa. Nao seriam
inconciliaveis OS dois motivos pelos quais Cristo e charnado 0
Filho de Deus. y; <JI.1
E muito evidente que Cristo charna-Se a Si mesmo Filho
de Deus e que foi reconhecido como tal por Seus disdpulos

243
Capitulo 9
antes da ressurrei~ao, e por isso esta 0 podia revelar ou
manifestar como sendo o Filho de Deus, mas nao 0 podia
constituir em Filho de Deus.

58. Demonstre que Atos 13:32,33 niio prova que Jesus foi
feito Filho de Deus.
Des sa passagem tira-se o argumento segundo o qual Jesus,
por Sua ressurrei~ao, foi constituido em Filho de Deus como
o primeiro passo na Sua exalta~ao oficial. Isso nao pode ser:
1°. Porque Ele foi enviado ao mundo como o Filho de
Deus.
2°. Porque a palavra anastesis, tendo suscitado (tendo dado
surgimento ), nao ressuscitado (a Jesus), refere-se a suscita~ao
de Jesus no Seu nascimento, e nao aSua ressurrei~ao dentre os
mortos. Quando a palavra e empregada para designar a
ressurrei~ao de Jesus, e quase sempre acompanhada da frase
dentre os mortos, como no versiculo 34. 0 versiculo 32 declara
que foi cumprida a promessa a que se faz referencia no versiculo
23. Veja Alexander, Com. on Acts.

59. Qual a resposta ortodoxa a pergunta: par que Cristo e


chamado "Filho de Deus"?
A doutrina ortodoxa e que Cristo e chamado "Filho de
Deus" nas Escrituras para indicar a Sua eterna e necessaria
rela~ao pessoal como a segunda Pessoa da Deidade com a
primeira Pessoa, que e chamada Pai para indicar a rela~ao
reciproca.

60. Como se acha exposta a doutrina nos credos niceno e


atanasiano, e na Confissiio de Westminster?
Credo Niceno: "Filho de Deus, gerado de Seu Pai antes de
todos OS seculos; Deus de Deus, Luz de Luz, verdadeiro Deus
de verdadeiro Deus; gerado, nao feito, sendo de uma s6
substancia com o Pai". : :· :
Credo Atanasiano: "0 Filho e somente do Pai, nao feito,

244
A Santissima Trindade
nem criado, mas gerado". ·' J
Confissao de Westminster: "0 Pai nao e de ninguem- nao
e gerado, nem procedente; o Filho e eternamente gerado
do Pai; o Espirito Santo e eternamente procedente do Pai e do
Filho". A traduc;ao que consta no "Livro de Confiss6es",
publicado pela Missao Presbiteriana do Brasil Central,
principia a parte pertinente dizendo: "0 Pai nao e nem gerado,
nem procedente de ninguem ... " (Capitulo 2, Sec;ao 3).

61. Que exposifiiO e explicafiio comuns os escritores ortodoxos


diio desta doutrina?
A gerac;:ao eterna do Filho e definida comumente como
sendo urn eterno ato pessoal do Pai, no qual, por necessidade
da Sua natureza, e nao por querer, Ele gera a pessoa (nao a
essencia) do Filho, comunicando-lhe a inteira substancia
indivisfvel da Deidade, sem divisao, alheac;ao ou mudanc;a, de
modo que o Filho e a imagem expressa da Pessoa do Pai, e
continua eternamente, nao do ou pelo Pai, e sim no Pai, eo
PainoFilho. VejaespecialmenteHeb.1:2;Joao 10:38; 14:11;
17:21. 0 principal apoio bfblico da doutrina acha-se em Joao
5:26 - Turretino, Tom. I. L. 3, Question 29.
Os te6logos que insistem nessa definic;ao creem que a ideia
de derivac;ao esta necessariamente implicada na de gerac;ao;
que ela e indicada pelos termos redprocos Pai e Filho, e por
todas as representac;6es dadas nas Escrituras quanto arelac;ao e
ordem das Pessoas da Deidade, sendo sempre o termo Pai
empregado para representar a Deidade absolutamente
considerada; e julgam que essa teoria e necessaria para manter
a unidade essencial das tres Pessoas. Os te6logos antigos
chamavam por isso ao Pai pegetheotetos, "fonte da Deidade",
aitia huion, "principia" ou "causa" do Filho, e ao Filho e ao
Espfrito Santo chamavamaitiatoi, "causados" (os que dependem
de outrem como seu principia ou sua causa).
Resguardavam ao mesmo tempo a igualdade essencial do
Filho e do Espirito Santo como Pai, dizendo:

245
Capitulo 9
1°. Que a inteira essen cia divina, sem divisao ou mudans;:a,
e par isso todos os atributos divinos, lhes era comunicada.
2°. Que essa comunicas;:ao era operada par urn a to eterno e
necessaria do Pai, e nao da Sua livre vontade. Em todos os
antigos credos essa identidade quanta a essencia, e subor-
dinas;:ao quanta ao modo de subsistencia e comunicas;:ao, e
expressa do modo indicado acima: "Deus de Deus; Luz de
Luz"; "do Pai"; "verdadeiro Deus de verdadeiro Deus";
"gerado, nao feito"; "da mesma substancia como Pai".

62. Demonstre como os escritores ortodoxos procuravam


resguardar sua doutrina contra toda irreverencia antropom6rfica.
Para resguardar sua doutrina de derivas;:ao e de geras;:ao
eternas contra todas as conceps;:oes grosseiras e antropom6rficas,
sustentavam cuidadosamente que a derivas;:ao e a geras;:ao
referidas eram - I. achron6s, acronicas, atemporais, eternas;
2. asomat6s, nao corporais, mas espirituais; 3.aorat6s, invisiveis;
4. ach6rist6s, nao uma transferencia local, nem uma comu-
nicas;:ao fora, e sim dentro da Deidade; 5. apath6s, sem paixao
nem mudans;:a; 6. pantel6s akatalept6s, totalmente incom-
preensiveis.

63. Que e essenciaf a doutrina b£bfica da gerafiiO eterna do


Filho?
Na exposis;:ao acima feita da doutrina ortodoxa nao ha nada
que seja incompativel com a verdade revelada. Mas a ideia de
derivas;:ao, como envolvida naquela da geras;:ao eterna do Filho
pelo Pai, parece antes ser uma explanas;:ao de fatos revelados
do que urn fato revelado. Num assunto como este, pais, e
melhor que nao se fale positivamente. Tudo quanta erevelado
explicitamente e, 1°. que o termo Filho e aplicado a segunda
Pessoa da Trindade; 2°. que esse termo, como o que lhe e
equivalente, "unigenito", revela alguma relas;:ao, dentro da
Deidade, da Pessoa do Filho com a do Pai; e que a designas;:ao
de Pai ereciproca ade Filho; 3°. que essa relas;:ao etal que Pai

246
A Santissima Trindade
e Filho sao o mesmo em substancia, e sao iguais pessoalmente;
que o Pai eprimeiro eo Filho e segundo na ordem de revela~ao
e opera~ao, que o Filho e a imagem expressa da Pessoa do Pai,
nao o Pai a da Pessoa do Filho, e que o Filho nao e do nem
pelo Pai, e sim no Pai, e o Pai no Filho.

64. Como se pode mostrar que a doutrina comum niio se


contradiz a si mesma?
E evidente que nao ha nada de incompativel na simples
exposi~ao biblica dada na resposta aultima pergunta. Contro-
versistas heterodoxos, porem, tern dito que a doutrina ortodoxa
ensina 0 que e manifestamente inconciliavel quando diz que
o Pai comunica a inteira essencia divina ao Filho sem alhea-la
de Si mesmo, e sem dividi-la ou muda-la de outra maneira.
Todo este assunto esta fora do drculo da 16gica humana; mas,
ao mesmo tempo, e evidente que esta doutrina nao envolve
nenhuma contradi~ao, nem misterio maior do que o que se
acha envolvido na verdade segundo a qual toda a essencia de
Deus acha-se presente ao mesmo tempo, sem divisao nem
difusao, em toda parte do espa~o.

65. Quais os termos, alem do vocabulo "Filho", empregados


para designar as caracteristicas da segunda Pessoa e Sua relar;iio
com a prime ira?
A Palavra, ou o Verbo, com Deus, e que e Deus- Joao 1: 1;
A imagem do Deus invisivel- 2 Cor. 4:4; Col. 1:15; A imagem,
ou impressao, do Seu ser ou substancia- He b. 1:3; A forma de
Deus- Fil. 2:6; 0 resplendor da Sua gloria- Heb. 1:3.

66. Que distinr;iio alguns dos chamados "Pais da Jgreja" faziam


entre a gerar;iio eterna, a antemundanal e a mundanal do Filho?
1°. Por Sua gera~ao eterna entendiam a rela~ao essencial
do Filho para com o Pai como Seu Filho consubstancial e
eterno. ,., ..,.
2°. Por Sua gera~ao antemundanal entendiam o come~o

247
Capitulo 9
das opera<;:6es da Sua energia e a manifesta<;:ao da Sua Pessoa
fora do seio da Deidade, na esfera da cria<;:ao externa, etc. -
Col. 1:15.
3°. Por Sua gera<;:ao mundanal entendiam Seu nascimento
sobrenatural em carne- Luc. 1:35.

67. Que distinfiiO alguns dos chamados Pais faziam entre


''a logos endiathetos" (ratio insita, a razao) e a "logos prophorikos",
(ratio prolata, a razao produzida au expressa)?
Os "pais" ortodoxos empregavam a frase logos endiathetos
para designar o Verbo, que consideravam como Pessoa dis-
tinta, que habita desde toda a eternidade como Pai·. 0 motivo
pelo qual usavam essa frase era uma analogia que imaginavam
existir entre a rela<;:ao do logos (verbo ou razao) eterno como
Pai (J oao 1: 1), e a rela<;:ao da razao do hom em com a sua alma
racional. Assim, segundo eles, o logos endiathetos e a ideia
refletiva de Deus mesmo "hipostatizada". Foram levados a
filosofar assim, sobre urn tema incompreensfvel, pela
influencia que exerciam sobre eles os fil6sofos platonicos
daquele seculo, que ensinavam que ha uma especie de trindade
metafisica, e.g., que no Deus unico ha tres princfpios
constitutivos, to agathon, bondade, nous, inteligencia, psuche,
vitalidade. Seu fito imediato era ilustrar a unidade essencial
da Trindade e provar, contra os arianos, pel a aplica<;:ao que Joao
faz a Cristo do epiteto logos theos, o Verbo de Deus, que Ele e
essencialmente divino.
Designavam o Verbo pela frase logos prophorikos como a
razao de Deus revelada, quando Ele procedeu do Pai na obra
da cria<;:ao.
Os arianos, aproveitando-se da imperfei<;:ao essencial desta
representa<;:ao, embaralharam a controversia admitindo que a
fraselogos prophorikos tinha realmente aplica<;:ao a Cristo, porque
(em Cristo) havia sido produzida por Deus a Sua primeira e
mais exaltada de todas as criaturas e a imagem do Seu intelecto;
mas, ao mesmo tempo, declararam, com alguma aparencia de

248
A Santissima Trindade
verdade, que a frase logos endiathetos, quando aplicada a
Cristo, ensina puro sabelianisrno, porque nao indica distin<;ao
pessoal, e nada rnais significa senao unicarnente o proprio
intelecto do Pai.

68. Se Deus e "ens a se ipso", auto-existente, como pode o


Filho ser Deus) se Ele eTheos ek TheouJ Deus de Deus?
A obje<;ao apresentada nesta pergunta nao se aplica a
exposi<;ao bfblica da gera<;ao eterna do Filho apresentada acirna
(Perg. 63), e, sirn, sornente a teoria de deriva<;ao envolvida na
defini<;ao corn urn (veja Perg. 61). Os que insistern na validade
dessa defini<;ao respondern a obje<;ao dizendo que autoexis-
tencia e atributo de essencia, e nao de Pessoa. 0 Pai, como
Pessoa, gera a Pessoa, nao a essencia, do Filho, cuja Pessoa e
constitufda da rnesrnfssirna essencia auto-existente que a do
Pai. Assirn o Filho e Deus a se ipso quanto a Sua essencia, e
Deus de Deus quanto aSua Pessoa.

69. Que argumento a favor da filiafiio eterna de Cristo pode


ser tirado da designafiiO das Pessoas da Trindade como o PaiJ o
Filho eo Espirito Santo? : :J ; · :: • ,. ·:r
Na ben<;ao apostolica e na formula do batisrno o Deus
(mico e designado como o Pai, o Filho e o Espfrito Santo. 0
terrno Filho, porern, nao pode ser aplicado a Cristo nesta
conexao como titulo oficial, ou como designativo de urn
hornern gerado rniraculosarnente, porque, 1°. echarnado assim
como urna das tres Pessoas divinas que constituern a Deidade;
2°. o terrno Filho e redproco do de Pai, e, por conseguinte,
indica a rela<;ao da segunda Pessoa corn a prirneira. Raja o que
rnais houver envolvido nessa rela<;ao, so pode ser necessaria e
eterno, incluindo a paternidade da parte da prirneira Pessoa, e
filia<;ao da parte da segunda.

70. Que argumento se pode apresentar em apoio desta doutrina


do uso da palavra "Filho" em Mateus 11:27 e em Lucas 10:22?

249
Capitulo 9
E evidente que nestas duas passagens 0 termo Filho e
empregado para designar a natureza divina da segunda Pessoa
da Trindade em Sua rela<;:ao aprimeira. 0 Filho, como Filho,
conhece o Pai e e conhecido do Pai, como Pai. E infinito em
conhecimento, e por isso conhece o Pai. Einfinito em Seu Ser, 1
e por isso nao pode ser conhecido por ninguem, senao pelo 1,,
Pai. j

71. Exponha a argumento de J oao 1: 1-14.


l
i

Nesta passagem o Verba eterno, que era Deus, descobriu-


Se como tal a Seus discipulos pela manifestaS?iio da Sua propria
gloria divina, "gloria como do (Filho) unigenito do 'Pai". Por
conseguinte, era o Filho "unigenito" como Deus, e nao como
o Mediador nem como homem.

72. Exponha a argumento que se extrai da aplicafiio feita


nas Escrituras dos termos monogenes (unigenito) e idios (proprio)
afiliafiiO de Cristo.
Embora muitas criaturas de Deus sejam chamadas Seus
filhos, a frase "Filho de Deus", no singular, e quando limitada
pelos termos "proprio" e "unigenito", e aplicada unicamente
a Cristo.
Este echamado "Filho unigenito de Deus"- Joao 1: 14,18;
3:16,18; 1 Joao 4:9.
Em Joao 5:18 Cristo chama Deus "Seu proprio Pai" (assim
no grego). Em Romanos 8:32 e chamado "Seu proprio Filho",
isto e, o proprio Filho de Deus.
0 uso destes termos qualificativos mostra que Cristo e
chamado Filho de Deus num sentido diverso daquele em que
outros sao chamados assim. Por conseguinte, echamado assim
como Deus, e nao como homem, nem como titulo oficial.

73. Que argumento ederivado de J oao 5: 22, e contexto, e de


Joao 10:33-37?
'Na primeira destas passagens OS termos Pai e Filho sao

250
A Santissima Trindade

empregados para designar duas Pessoas iguais e divinas.


Como Filho, Cristo faz tudo o que faz o Pai, e e objeto de igual
honra.
N a segunda passagem Jesus toma o titulo "Filho de Deus"
como equiva1ente a assen;ao de que e Deus, e OS judeus 0
acusam por isso de blasfemar.

74. Qual a prova fornecida pelas passagens que falam da


manifestafiio do dam ou da missao do Filho?
Veja 1 Joao 3:8; Rom. 8:3; Joao 3:16, etc.
Dizer que o Filho foi enviado ou manifestado implica que
ja era Filho antes de ser enviado ou manifestado como tal.

75. Qual o argumento baseado em Romanos 1:3,4?


0 argumento e duplo: 1°. Diz-se que o Filho de Deus foi
feito carne; par conseguinte, preexistia como Filho. 2°. Por
Sua ressurrei~ao foi manifestado com poder que Ele e o Filho
de Deus quanta aSua natureza divina. Eevidente que as frases,
segundo a carne, esegundo o espirito de santificafiio) sao antiteticas,
indicando a primeira a Sua natureza humana, e a segunda a
Sua natureza divina.
. ..'·"
76. Qual o argumento baseado em Romanos 8:3?
Aqui Deus envia o Seu Filho em semelhan~a da carne do
pecado. E evidente, pais, que ja era Filho quando Deus 0
enviou, e que o fa to dEle assumir a carne nao 0 podia constituir
em Filho de Deus.

77. Qual o argumento base ado em Colossenses 1: 15-21?


Nesta passagem o ap6stolo fala extensamente da natureza
e da gloria dAquele a quem, no versiculo 13, chama "Filho
muito amado" de Deus (Figueiredo). Prova, assim, que Cristo,
como Filho, e a imagem do Deus invisivel, que par Ele todas
as coisas subsistem, etc.

251
Capitulo 9

78. Qual o argumento baseado em Hebreus 1:5-8?


Nesta passagern o au tor da Epistola exp6e a superioridade
de Cristo como Pessoa divina, e Lhe chama "o Filho" e "o
Prirnogenito". Este Filho e introduzido na redondeza da terra
e, por conseguinte, ja existia como Filho quando foi intro-
duzido. E, como Filho, edeclarado que Ele e Deus e que Seu
trono e eterno.

79. Como se pode conciliar com esta doutrina as passagens


e
que parecem inferir que o Filho inferior e sujeito ao Pai?
A alegas;ao e que tais passagens provarn que Jesus, como
l
j
1

Filho, e inferior e sujeito ao Pai.


Respondernos que ern Joao 3:13 se diz que "o Filho do
horn em" desceu do ceu, e esta no ceu. Mas, por certo, Jesus,
como Filho do homem, nao era onipresente. Ern Atos 20:28 se
diz que Deus adquiriu a Igreja pelo Seu proprio sangue;
mas, por certo, Cristo, como Deus, nao derrarnou Seu sangue.
A explicas;ao e que e de uso cornurn nas Escrituras dar a
Pessoa (mica do Deus-hornern urn titulo que Lhe pertence
como possuidor de urna natureza, enquanto que aquilo que se
afirrna a respeito dEle s6 e verdade corn respeito a outra
natureza. Eassirn que nas passagens a que se refere a pergunta
acirna, Jesus e chama do "Filho de Deus" porque e o Verbo
eterno, enquanto, ao rnesrno tempo, nelas parece inferir que
Ele e inferior ao Pai, porque e tarnbern hornern e Mediador.

B. A RELA<::.AO QUE TERCEIRA PESSOA DA DEIDADE


MANTEM COM A PRIMEIRA E COM A SEGUNDA, OU A PRO-
CESS.AO ETERNA DO ESPIRITO SANTO.

80. Qual a etimologia da palavra Espirito, e qual o uso dos


seus equivalentes no hebraico e no grego?
A palavra portuguesa "espirito" vern do latimspiritus, que
significa sopro, halito, vento, ar, vida, alma. A palavra hebraica
equivalente, ruach, tern uso inteirarnente analogo. 1°. Seu

252
A Santissima Trindade
sentido primario evento, ar em movimento, Gen. 8:1; dai, 2°.
sopro, respira~ao, Gen. 6:17; J6 17:1; 3°. alma animal, prin-
cipia vital nos homens enos animais, 1 Sam. 30:12; 4°. alma
racional do homem, Gen. 41:8, e dai, metaforicamente,
disposi~ao, indole, Num. 5:14; 5°. Espirito de Jeova, Gen.
1:2;Sal.Sl:ll. I!;;

A palavra grega equivalente, pneuma, tambem tern o


mesmo uso. Vern de pne6, respirar, soprar. Significa, 1°. bali to,
Apoc. 11:11; 2°. ar em movimento, vento, Joao 3:8; 3°. o
principia vital, Mat. 27:50; 4°. a alma racional, falando-se (1)
das almas de homens falecidos, Heb. 12:23; (2) dos demonios,
Mat. 10:1; (3) dos anjos, Heb. 1:14; (4) do Espirito de Deus,
falando-se de Deus: (a) absolutamente, como urn atributo da
Sua essencia, Joao 4:24; e (b) como a designa~ao pessoal da
terceira Pessoa da Trindade, que echamada Espirito de Deus,
ou do Senhor, e Espirito Santo, e o Espfrito de Cristo, ou de
Jesus, ou do Filho de Deus, Atos 16:6,7; Rom. 8:9; 2 Cor. 3: 17;
Gal. 4:6; Fil. 1:19; 1 Ped. 1:11.

81. Par que a terceira Pessoa da Trindade echamada Espirito?


Sendo igualmente espiritual a essencia divina {mica e
indivisfvel que ecomum a cada uma das Pessoas divinas, nao
pode ser que esse termo seja aplicado a terceira Pessoa como
Sua designa~ao pessoal, como fim de dar-nos a conhecer assim
que essa Pessoa eespiritual quanto a Sua essencia, mas, antes,
com o fim de denotar assim o que e peculiar aSua Pessoa, isto
e, Sua rela~ao pessoal com o Pai e o Filho, e o modo peculiar
de sua opera~ao ad extra. Sendo empregados os epitetos
reciprocos Pai e Filho para indicar, a certos respeitos, as rela~6es
mutuas da primeira e da segunda Pessoas, assim tambem OS
epitetos Espirito, Espirito de Deus, Espirito do Filho, o
Espirito que procede do Pai, sao aplicados a terceira Pessoa
para indicar, a certos respeitos, a rela~ao da terceira Pessoa com
as outras duas.

253
Capitulo 9 ·'''\ ,
82. Par que Ele echamado Espirito Santo?
Sendo a santidade urn atributo da essencia divina, e a
gloria tanto do Pai e do Filho como do Espirito Santo, o termo
Santo nao pode ser aplicado a terceira Pessoa em nenhum
sentido proeminente como Sua caracterfstica pessoal. E, por
conseguinte, indicativa da natureza peculiar de Suas opera<;6es.
Edesignado Espirito Santo porque e 0 au tor da santidade por
todo o universo. Assim como o Filho e tambem chamado
Logos, ou Deus Revelador, assim tambem o Espirito Santo e
Deus Operador, o fito e gloria de cuja obra no mundo morale
a santidade, como no mundo fisico eo belo.

83. Por que Ele echamado Espirito de Deus?


Esta frase exprime Sua deidade, Sua rela<;ao com a Dei dade
como Deus, 1 Cor. 2: 11; Sua intima rela<;ao pessoal com o Pai
como Seu espirito consubstacial procedendo dEle, Joao 15 :26;
e o fato de que Ele e o Espirito divino, que, procedendo do
Pai, opera sobre as criaturas, Sal. 104:30; 1 Ped. 4:14.

84. Par que a terceira Pessoa echamada Espirito de Cristo?


Veja Rom. 8:9; Gal. 4:6; Fil. 1:19; 1 Ped. 1:11. Sendo
identicas em forma as frases Espirito de Deus e Espirito de
Cristo, e afirmando as Escrituras uniformemente, com uma
unica exce<;ao em J oao 15:26, aquilo mesmo quanto arela<;ao
com o Pai, parece evidente que e chamado Espirito de Cristo
pelos mesmos motivos pelos quais e chamado Espirito de
Deus. . .,
Esta frase manifesta tambem a rela<;ao oficial que o
Espirito, em Suas opera<;6es na obra da reden<;ao, man tern com
o Deus-homem, no fato de receber do que e dEle e no-lo
anunciar, Joao 16:14.

85. Que e que se entende pela frase teol6gica ''Processao do


Espirito Santo"?
Os te6logos chamam assim a rela<;ao que a terceira Pessoa

254
A Santissima Trindade
man tern com a primeira e a segunda, rela~ao na qual, por urn
ato eterno e necessaria, is to e, nao decorrente de uma a~ao da
vontade do Pai e do Filho, Sua inteira e identica essencia divina,
sem alhea~ao, divisao ou mudan~a, e comunicada ao Espirito
Santo.
,,
86. Que distinfiiO os te6logos estabelecem entre processiio e
gerafiio?
Como este assunto inteiro transcende infinitamente a
medida de nossas faculdades, apenas podemos classificar e
COntrastar OS predicados que a inspira~ao tern aplicado arela~ao
do Espirito como Pai eo Filho. !'-:·;_: . ~; ·
Assim diz Turretino, vol. 1, L. 3, Q. 31: Diferem -
" 1°. Quanto aSua origem; o Filho pro vern s6 do Pai, mas o
Espirito procede do Pai e do Filho ao mesmo tempo.
"2°. Quanto ao modo. 0 Filho provem por gera~ao, que
nao s6 efetua personalidade, mas tambem semelhan~a, em
virtude da qual o Filho e chamado imagem do Pai, e em
conseqiiencia da qual recebe a propriedade de comunicar a
mesma essencia aoutra Pessoa; mas o Espirito, por "spira~ao"
(espira~ao *), que s6 efetua personalidade, e em conseqiiencia
da qual a Pessoa que procede nao recebe a propriedade de
comunicar a outra Pessoa a mesma essencia.
"3°. Quanto aordem. 0 Filho e a segunda Pessoa, eo Espirito
e a terceira; e, embora ambos sejam eternos, sem principia
nem sucessao, contudo, segundo o nosso modo de conceber as
coisas, a gera~ao precede a processao". Os termos tecnicos
utilizados para exprimir estes dois misterios sao generatio,
"gera~ao" ;processio missio, "processao".
"Os escolasticos procuraram em vao fun dar uma distin~ao
entre gera~ao e espira~ao sobre as opera~6es diferentes da

* Neologisrno tecnico ernpregado por Odayr Olivetti ern sua traduc;:ao da


obra Teologia Sistematica, de Louis Berkhof (Luz para o Carninho
Publicac;:oes, Carnpinas, 1990), pag. 98.

255
Capitulo 9
inteligencia divina e da vontade divina. Dizem que o Filho e
gerado per modum intellectus, e que por isso echamado Verbo
de Deus. 0 Espirito, per modum voluntatis, e que por isso e
chama do Am or." *

87. Quale a base biblica desta doutrina?


0 que dissemos acima (Perg. 53) em rela~ao a defini~ao
teol6gica co mum da gera~ao eterna do Filho, everdade tam bern
em referencia a defini~ao comum da processao eterna do
Espirito Santo, a saber, que, para tornarem mais inteligivel o
metoda da unidade divina em Trindade, OS te6logos tern levado
lange demais a ideia de deriva~ao e subordina~ao na ordem da
subsistencia pessoal. Este terreno e ao mesmo tempo sagrado
e misterioso. Os pontos dados nas Escrituras nao devem ser
for~ados, nem se deve especular sabre eles, porem devem ser
aceitos e confessados em sua nudez.
Os dados revelados por inspira~ao sao simplesmente os
seguintes: 1°. 0 Pai, o Filho e o Espirito Santo, tres Pessoas
divinas, possuem desde a eternidade a unica essencia inteira,
identica, indivisivel, imutavel. 2°. 0 Pai, a julgar do Seu nome
caracteristico e pessoal, da ordem em que Seu nome seen contra
uniformemente nas Escrituras, do fato de que o Filho e
chamado Seu e Seu unigenito, do fato de que o Espirito e
chamado Seu e procedente dEle, e da ordem da Sua
manifesta~ao e opera~ao ad extra, e evidentemente de algum
modo o primeiro na ordem de subsistencia pessoal em rela~ao
ao Filho e ao Espirito Santo. 3°. Pelas mesmas raz6es, o Filho
(veja abaixo, Perg. 89), na ordem de subsistencia pessoal, e
antes do Espirito. 4°. Qual seja a natureza real destas distin~6es
na ordem de subsistencia pessoal, nos e revelada s6 de modo

* Sobre isso ver Augustus Hopkins Strong, Systematic Theology, Three


Volumes in One, The Judson Press, 12a. ed., julho de 1949, pag. 342, notas,
principalmente a nota sobre "Edwards, Essay on the Trinity". Nota de Odayr
Olivetti.

256
A Santissima Trindade
que e evidente- (1) Que nao envolve nenhuma distin<;ao de
tempo, porque todos, o Pai, o Filho e o Espirito Santo, sao
igualmente eternos. (2) Nao depende de nenhuma a<;ao
voluntaria, porque isto tornaria a segunda Pessoa dependente
da primeira, e a terceira da primeira e da segunda, sen do certo
que todas sao "iguais em poder e gloria". (3) Euma rela<;ao tal
que a segunda Pessoa e eternamente o Filho unigenito da
primeira Pessoa, e a terceira e eternamente o Espirito da
primeira e da Segunda Pessoas.

88. Qual a diferem;a entre as igrejas grega e latina quanta a


esta doutrina? -' _, : ' L·._ :')

0 celebre Concflio Niceno (325 d.C.) definiu acurada-


mente a doutrina da deidade do Filho, mas deixou o
testemunho quanta ao Espirito Santo na forma vaga em que
estava no credo antigo, chamado apost6lico: "creio no Espirito
Santo". Todavia, tendo-se levantado a heresia de Macedonia,
que negava a deidade do Espirito Santo, o Concilio de Cons-
tantinopla (381 d.C.) completou assim o tetemunho do credo
niceno: "Creio no Espirito Santo, o Senhor, o Autor da vida,
que pro cede do Pai".
Suscitou-se depois uma controversia sabre a questao se
as Escrituras ensinam ou nao que o Espirito Santo tern
exatamente a mesma rela<;;ao com o Filho que a que tern com
o Pai. Os latinos o afirmavam, e na terceira assembleia ecle-
siastica realizada em Toledo (589 d.C.)* acrescentaram a palavra
filioque (e do Filho) aversao latina do credo constantinopolitano,
dando a seguinte reda<;;ao aclausula: "Credimus in Spiritum
Sanctum qui a Patrefilioque procedit". A Igreja grega opos-se
a isso com violencia, e ate ao dia de hoje o rejeita. Por algum

* Apud H. Bettenson, in Documentos da Igreja Crista, ASTE, S. Paulo,


1967, pag. 56, a "clausula filioque" ja fora utilizada no Condlio de Toledo
realizado em 477, tornou-se cada vez mais popular no Ocidente, e foi
inserida em diversas versoes do credo. Nota de Odayr Olivetti.

257
Capitulo 9
tempo contentaram-se com o compromisso: "0 Espirito 1
procedente do Pai mediante o Filho" (Spiritum Sanctum qui
a Patre per Filium procedit); mas isso foi afinal rejeitado por
ambos os partidos. 0 credo constantinopolitano, conforme a
emenda feita no Condlio de Toledo, e o atualmente adotado
pela igreja romana, e tambem por todos os protestantes. Tern
o titulo de "credo niceno".

89. Como se pode provar, ate onde nose revelado, que o Espirito
Santo tem como Filho exatamente a mesma relafiiO que tem com
o Pai?
0 epiteto "Espirito" e a designa<;;ao pessoal caracteristica
da terceira Pessoa. Tudo quanta nos e revelado da Sua eterna e
necessaria rela<;;ao pessoal com o Pai ou com o Filho e indicado
por essa palavra. Contudo e chamado Espirito do Filho como
igualmente Espirito do Pai. Possui a mesma essencia, identica,
do Filho como do Pai. 0 Filho envia o Espirito e opera por
meio dEle, assim como o faz tambem o Pai. Onde quer que
esteja o Seu Espirito, ai revelam e manifestam o Seu poder
tanto o Filho como o Pai- Joao 14: 16,26; 15:26; 16:7. Com a
unica exce<;;ao da frase "que procede do Pai" * (Joao 15:26), as
Escri turas aplicam a rela<;;ao do Espiri to com o Filho
exatamente os mesmos predicados que aplicam aSua rela<;;ao
como Pai.

90. Que oficio o Espirito exerce na economia da redenfiiO?


Na economia da reden<;;ao, assim como universalmente,
em todas as opera<;;6es da Deidade sabre a criatura, Deus o
Filho eo Deus revelado, Deus como Se fez conhecido, e Deus
o Espirito e a Pessoa divina que exerce a Sua energia
imediatamente sobre a criatura e nela. No referido credo e

* De certa forma abrandada pela expressao "que eu vos enviarei" (ARA),


presente na mesma passagem citada. Nota de Odayr Olivetti.

258
A Santissima Trindade
chamado, nesta rela<;:ao, "o Senhor e Doador de vida". (Veja
resposta mais detalhada no Cap.24, "0 Oficio Medianeiro de
Cristo", Perg. 9).
C. AS PROPRIEDADES PECULIARES A CADA UMA DAS
TRES PESSOAS DA DEIDADE, E SUA ORDEM DE OPERA<;AO
''AD EXTRA:'.

91. Qual o significado teol6gico da palavra "propriedade" quando


aplicada adoutrina da Trindade, e quais sao as propriedades pessoais
de cada uma das Pessoas da Deidade? ,.
Os atributos de Deus sao as perfei<;:6es da essencia divina,
e, por isso, comuns as tres Pessoas, que sao "da mesma
substancia"' e, por is so, iguais em poder e gloria". Ja for am
discutidos no Cap. 8. No entanto, as propriedades de cada uma
das Pessoas divinas sao os modos peculiares de subsistencia
pessoal que fazem de cada Pessoa aquilo que ela e, e que
tambem constituem aquela ordem peculiar de opera<;:ao que
distingue cada Pessoa das outras. As propriedades peculiares e
distintivas que pertencem a cada uma das Pessoas da-se o nome
tecnico de character hypostaticus - carater pessoal.
0 quanto nos sao reveladas, as propriedades pessoais do
Pai sao as seguintes: "Nao e gerado de ninguem, nem procede
de ninguem; e o Pai do Filho, tendo-0 gerado desde a
eternidade; o Espirito procede dEle, e e Seu Espirito". Assim
o Pai eo primeiro em ordem e opera<;:ao, enviando o Filho e o
Espirito Santo, e operando por meio dEles.
As propriedades pessoais do Filho sao as seguintes: e o
Filho, desde a eternidade, o unigenito do Pai. 0 Espirito e o
Espirito do Filho assim como o e do Pai; eenviado pelo Pai, a
quem revela; e, assim como o Pai, en via o Espirito e opera por
meio dEle.
As propriedades pessoais do Espirito sao as seguintes: eo
Espirito do Pai e do Filho, procedendo dEles desde a
eternidade; e enviado pelo Pai e pelo Filho, que operam por
meio dEle; ele opera imediatamente sobre a criatura.

259
Capitulo 9
92. Que especie de subordinafiiO as escritores antigos atribuiam
a segunda e aterceira Pessoas em relafiiO a primeira?
Afirmavam, como mostramos acima, que a gera<;iio eterna
do Filho pelo Pai, e a processao eterna do Espirito, vindo do
Pai e do Filho, envolviam em ambos os casos deriva<;ao da
essencia. Ilustravam sua ideia deste ato eterno e necessario de
comunica<;ao como exemplo de urn corpo luminoso que lan~a
raios de luz durante o tempo inteiro de sua existencia. Assim
o credo niceno define o Filho como "Deus de Deus, Luz de
Luz". Assim como o brilho do sole coevo com sua existencia
e tern a mesma essencia do sol como fonte, eles queriam por
meio desta ilustra~ao dar expressao da sua fe na identidade e
consequente igualdade das Pessoas divinas quanto a Sua
essencia, e na subordina<;ao relativa da segunda a primeira e
da terceira a segunda, quanto a Sua subsistencia pessoal e
consequente ordem de opera~ao.

93. Que e que se exprime pelo usa dos termos primeira, segunda
e terceira, em referencia as Pessoas da Trindade?
Estes termos sao aplicados as Pessoas da Trindade, por-
que- 1°. As Escrituras dao sempre Seus nomes nesta ordem.
2°. As designa<;6es pessoais de Pai, Filho e Espirito do Pai e
do Filho, indicam esta ordem de subsistencia pessoal. 3°. Seus
respectivos modos de opera~ao estao sempre nesta ordem. 0
Pai envia o Filho e opera por meio dEle; e o Pai e o Filho
enviam o Espirito e operam por meio dEle. As Escrituras
nunca, nem direta nem indiretamente, indicam ordem
diferente.
Quanto a rela<;ao externa da Deidade com a criatura, parece
que o Pai nos e revelado s6 como o vemos no Filho, que e o
Logos eterno ou o Verbo divino, a imagem expressa da Pessoa
do Pai. "Ninguem jamais viu a Deus: o Filho unigenito, que
esta no seio do Pai, equem o revelou"- Joao 1:18. Eo Pai eo
Filho operam diretamente sobre a criatura somente mediante
o Espirito.

260
A Santissima Trindade
"0 Pai e toda a plenitude da Dei dade invisivel, sem forma,
a quem ninguem viu nem pode ver."
"0 Filho e toda a plenitude da Deidade manifestada."
"0 Espirito e toda a plenitude da Deidade operando
imediatamente sobre a criatura e tornando assim manifesto o
Pai na imagem do Filho, e pelo poder do Espirito."

94. Como se pode conciliar com a unidade da Deidade a idiia


de distinfoes pessoais na Deidade?
Ainda que a constitui~ao trinopessoal da Deidade esteja
inteiramente alem do alcance da razao humana, como de fato
esta, e nos seja conhecido unicamente por meio de uma
revela~ao sobrenatural, como de fato e, e evidente que nao ha
contradi~ao na proposi~ao dupla segundo a qual Deus e urn s6
e, ao mesmo tempo, o Pai, o Filho eo Espirito Santo sao esse
Deus unico. Sao urn s6 num sentido, e td~s num sentido
inteiramente diferente. A essencia eterna, auto-existente,
divina, constituindo todas essas perfei~6es divinas chamadas
atributos de Deus, e, no mesmo sentido e no mesmo grau,
comum a todas as tres Pessoas. Nesse sentido sao urn s6.
Entretanto essa essencia divina existe eternamente como Pai e
Filho e Espirito Santo, distintos por propriedades pessoais.
Nesse sentido sao tres. Cremos nisso, nao porque o entendamos,
mas porque Deus Se nos revelou assim.

95. Como se pode conciliar a encarnafiio do Filho com a uni-


dade divina?
0 Filho e identico ao Pai e ao Espirito quanto aessencia,
mas distinto dEles quanto a subsistencia pessoal. Na
encarna~ao nao foi feita homem a essencia divina do Filho,
porem Ele, como Pessoa divina, entrou numa rela~ao pessoal
com a natureza humana do homem Cristo Jesus. Isto nao
constituiu uma nova pessoa, mas simplesmente introduziu urn
novo elemento na Sua Pessoa eterna. Foi uma uniao pessoal
do Filho com uma alma e urn corpo humanos, e nao houve

261
Capitulo 9
nenhuma mudan<;a nem na essencia divina, nem na rela<;ao
pessoal do Filho com o Pai e com o Espirito Santo.

OPINIOES HERETICAS

96. Quais sao OS tres grandes pontos que, juntos, constituem 0


misterio da Trindade como Ela nos e revelada nas Escrituras, e cuja
inconciliabilidade aparente ocasiona a grande objer;ao contra esta
doutrina na mente dos hereges de todas as classes?
Os tres grandes pontos sao OS seguintes: 1°. Ha absoluta-
mente s6 urn Deus, s6 uma substancia auto-existente, eterna,
imutavel, espiritual. 2°. Pai, Filho e Espirito Sarito sao cada
urn igualmente este Deus tinico- sao, cada urn em comum,
constituidos da totalidade dessa essencia indivisivel e
inalienavel, tendo a rnesrna e identica essen cia nurnerica, e os
rnesrnos e identicos atributos. 3°. Nao obstante isso, o Pai, o
Filho eo Espirito Santo sao tres Pessoas distintas, sendo que
cada urna Se distingue por Suas diversas propriedades pessoais.
A dificuldade para nos esta ern que, no caso dos unicos espiritos
criados de que ternos qualquer conhecimento, cada pessoa e
urna essencia espiritual distinta, e sua personalidade distinta
esta discrirninada definitivarnente por diferen<;a numerica de
atributos. Nao podernos conceber como tres pessoas podem
ter entre si urna s6 inteligencia e vontade.
Por conseguinte, todas as heresias sobre este ponto tiveram
origem nurna ou noutra de tres tendencias distintas, ou na
tentativa de desernbara<;ar a doutrina de suas inconciliabili-
dades aparentes negando ou abatendo urn ou outro de seus
elementos constitutivos. Assirn, 1°. Uma tendencia e cortaro
n6 da dificuldade negando a deidade do Senhor Jesus Cristo e
a personalidade do Espirito Santo, tornando assirn Deus o
Pai na unica Pessoa divina e possuidor exclusivo da unica
substfmcia divina. 2°. Urna segunda tendencia heretica e a de
negar a unidade divina e manter a existencia de tres Deuses,
distintos tanto ern essencia como ern Pessoa. 3°. A terceira

262
A Santissima Trindade
tendencia heretica e a de levar tao longe a unidade divina que
o Pai e o Filho e o Espirito Santo tornam-Se uma essencia
identica, s6 se admitindo que sao tres diversos nomes, aspectos
ou func,;:6es da unica Pessoa divina.

97. Quais as divers as opinioes mantidas por aqueles que negam


a deidade de Cristo e a deidade ou a personalidade do Espirito
Santo?
1a. A dos antroponianos, * que afirmam que Cristo era mero
homem. Na Igreja Primitiva eram conhecidos pelos nomes de
ebionitas e alogi- negadores do Logos, enquanto que na Igreja
moderna sao conhecidos pelo nome de socinianos. Veja a
exposic;ao da hist6ria e doutrina dos socinianos acima, Cap. 6,
Perg. 11-13. Entre os que afirmam que Jesus era mero homem
ha diferenc;a de opiniao quanta a Sua concep'Sao, se foi
sobrenatural ou nao, sobre a questao de Seus dons sobrenaturais
como profeta, e sobre o grau de honra e obediencia que Lhe
devemos. Alguns admitem que Ele teve uma comissao
sobrenatural e divina, e qualifica~S6es divinas e sobrenaturais
superiores as de qualquer outro profeta. Outros negam
inteiramente o elemento sobrenatural, e 0 tern em conta de
mero homem dotado de urn genio moral e religioso muito
supenor. · .... · · · • ···'
Toda esta classe sustenta que Deus e uma s6 Pessoa, como
e uma s6 essencia, e a maior parte toma a expressao Espirito
Santo somente como a designa<;;ao da energia divina mani-
festada nas coisas humanas. Alguns dos racionalistas alemaes,
que na maior parte concordam com os socinianos, afirmam
que a expressao Espirito Santo assinala a unica Pessoa divina
operando no mundo da natureza - cria<;;ao e providencia.
Outros sustentam que assinala Deus na Igreja.

* Neologismo criado por Odayr Olivetti para substituir o termo


"humanitarianos", termo de sentido ambiguo, empregado pelo tradutor
original.

263
Capitulo 9 ., , .
za. Osgn6sticos, em geral, afirmavam que o Deus supremo
e urn s6, tanto em essencia como em Pessoa, e que dEle
emanavam diversas ordens de seres espirituais, sendo que
nenhum deles e realmente Deus e, contudo, sao divinos, por
procederem dEle mediante emana<;:ao. Chamavam-nos aeons,
e destes Cristo era o maior. A soma total desses aeons constituia,
na opiniao dos gn6sticos, o pan to pleroma tes theotetos, a soma
inteira de todas as auto-revela<;:6es ou auto-comunica<;:6es atuais
ou possiveis da Dei dade inacessivel, e que, segundo o ap6stolo
Paulo, se haviam realizado (mica e plenamente em Cristo -
Col. 2:9.
3a. Os primeiros trinitarios nominais. "Na sua constru<;:ao
da doutrina da Trindade, o Filho nao e uma subsistencia na
essencia, mas somente uma efluencia ou energia procedendo
dela; por isso nao podiam afirmar logicamente a uniao da
natureza divina, ou da propria substancia da Deidade com a I
humanidade de Jesus. Uma simples energia efluente, proce- 1
dendo de Deus e entrando na humanidade de Cristo, nao seria
mais do que uma inspira<;:ao imanente semelhante a dos
profetas"- Shedd, Hist. Christ. Doc., Liv. 3, Cap. 5, § l.
4a. Os arianos, nome proveniente de Ario, presbitero de
Alexandria durante a primeira parte do quarto seculo, o grande
oponente de Agostinho. Afirmava que a Deidade consiste
numa s6 Pessoa eterna a qual, no principia, antes de todos os
seculos, criou aSua imagem urn ser sobreangelico (heteroousion,
de essencia diversa), seu Filho unigenito, o principia da cria-
<;:ao de Deus, por meio de quem tambem fez os mundos. A
primeira e maior das criaturas assim criadas pelo Filho foi o
1
Espirito Santo. No cumprimento do tempo, esse Filho
encarnou na Pessoa de Jesus de Nazare.
sa. A doutrina dos semiarianos. Este partido foi chamado
assim por ocupar urn terreno intermedio entre os arianos e os
ortodoxos. Sustentavam que o Deus absoluto e auto-existente
e uma s6 Pessoa, porem que o Filho e pessoa divina, de uma
essencia gloriosa e semelhante mas nao identica a do Pai, e

264 t
A Santissima Trindade
que foi gerado desde a eternidade pelo Pai no livre exercicio
da Sua vontade e do Seu poder, e, por isso, e subordinado ao
Pai e dEle dependente. Esta foi a ideia disseminada primeiro
por Origenes e defendida com muita eloquencia no Concilio
Niceno por Eusebio, bispo de Cesareia, e por Eusebio, bispo
da Nicomedia.
Parece que alguns dos semiarianos concordavam com os
arianos em considerar o Espirito Santo como a primeira e mais
gloriosa criatura do Filho, mas que a maioria deles tomava as
palavras "Espirito Santo" como o nome de uma energia de
Deus ou como sinonimo da palavra "Deus".

98. Qual era a posifiiO daqueles que procuravam diminuir


de suas dificuldades a doutrina da Trindade negando a unidade
divina?
Eram os triteistas, que afirmavam que ha na Deidade tres
ousiai, essencias, consideradas numericamente, como tam bern
tres hypostaseis, Pessoas. Sustentavam que se devia en tender a
ousia, a essencia, como que na mera concep~ao de genera, do
qual a hipostasis, a pessoa, e urn individuo ou uma especie;
que "ha tres Deuses, genericamente urn, porem individual-
mente distintos". Joao Ascusuages, de Constantinopla, e Joao
Filopono, de Alexandria (na segunda parte do sexto seculo)
foram cabe~as dos triteistas.

99. Qual era a posifiio daqueles que foram tiio lange em sua
defesa da unidade divina, em oposifiio aos triteistas, que levaram a
ideia de que o Pai, eo Filho eo Espirito Santo siio uma s6 Pessoa
como tambem uma s6 essencia?
Os monarquianos, assim chamados porque rejeitavam a
triada e mantinham a monada ou a unidade absoluta quanta
as Pessoas como tambem a essencia da Deidade, eram de
diversas classes; alguns, como, e.g., os alogi, eram muito
semelhantes aosunitarios modernos, devendo estes dois termos
exprimir a mesma ideia. Outros, como Praxeas, da Asia Menor,

265
Capitulo 9
de cerca de 200 d. C., Noeto, de Esmirna, de cerca de 230 d.C.,
e Berilo, de Bostra, na Arabia, de cerca de 250 d. C., sustentavam 1
que essa (mica Pessoa divina encarnou no homem Cristo, e
por isso se lhes deu o nome depatripassianos. Sabelio, presbitero
de Ptolomais, em meados do terceiro seculo, adotou as ideias
dos monarquianos e, em oposi<,;iio a doutrina promulgada por ·
Origenes e seus disdpulos, afirmava que os titulos de Pai, Filho
e Espirito Santo eram tao-somente outros tantos nomes e
manifesta<,;6es de urn so e do mesmo Ser divino. Converteu
assim a distin<,;ao real e objetiva de Pessoas (uma Trindade de
essencia) numa distin<,;iio meramente subjetiva e modal
(Trindade de manifesta<,;6es). "Afirmavam que· so ha uma
iinica Pessoa divina. Esta Pessoa unica, entendida em Sua
simplicidade e em Sua eternidade abstratas, chama-Se Deus o
Pai; mas em Sua encarna<;:ao chama-Se Deus o Filho. As vezes
era empregado urn modo diverso de apreender e de expor a
doutrina. Deus, em Sua natureza e em Seu modo de ser ocultos
e nao revelados, chama-Se Deus o Pai, e quando sai das profun-
didades da Sua essencia, criando o universo e revelando-Se e
comunicando-Se a este, toma assim sobre Si uma rela<,;iio
diversa e tam bern urn nome diverso, que eo de Deus o Filho,
ou o Logos."

100. Por quais consideraf6es se pode mostrar que a doutrina


da Trindade eum elemento fundamental do evangelho?
Nao se pode afirmar que as sutilezas das especula<;,:6es
teologicas sobre este ponto sejam essenciais a fe, e sim que e
essencial a salva<;,:ao que se creia nas tres Pessoas em urn so
Deus, nos termos em que sao reveladas nas Escrituras.
Considera<,;6es: 1a. 0 unico Deus verdadeiro eAquele que Se
nos tern revelado nas Escrituras; e a propria finalidade do
evangelho e levar-nos a conhecer esse Deus precisamente no
aspecto em que Se nos revelou. Qualquer outra concep<,;iio que
fizermos de Deus apresentara ao nosso espirito e a nossa
consciencia urn deus falso. Neste sentido nao pode haver

266
A Santissima Trindade

compromisso ou concessao sem trai~ao. Os socinianos, os


arianos e os trinitarios prestam culto a deuses diferentes.
2a. As Escrituras declaram explicitamente que o conheci-
mento do Deus verdadeiro e de Jesus Cristo que Ele enviou
e a vida eterna; e que e necessaria que honremos o Filho
como honramos o Pai- Joao 5:23; 14: 1; 17:3; 1 Joao 2:23;
5:20.
3a. No rito de inicia~ao na Igreja Crista somos batizados
no nome de cada uma das tres Pessoas da Trindade- Mat. 28: 19.
4a. 0 plano inteiro da reden~ao e baseado sobre esta
doutrina. A justifica~ao, a santifica~ao, a ado~ao, e tudo mais
que torna o evangelho a sabedoria e o poder de Deus para a
salva~ao, s6 se pode entender aluz dessa verdade fundamen-
tal.
sa. Como fato hist6rico, nao se pode negar que sempre
que em qualquer igreja foi abandonada ou obscurecida a
doutrina da Trindade, sofreram as mesmas consequencias todas
as demais doutrinas caracterfsticas do evangelho .

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267
10

Os Decretos de Deus em Geral

1. Quais sao OS decretos de Deus?


Veja Con! de Fe, Cap. 3; Cat. Maior, pag. 12, e Breve Cat.,
pag. 7.
0 decreta de Deus e Seu prop6sito soberano, eterno,
imutavel, santo e sabio, abrangendo ao mesmo tempo todas
as coisas que existiram, existem agora e em qualquer tempo
existidio, com suas causas, condi~6es, sucess6es e rela~6es, e
determinando sua futuri~ao certa. Nos, em conseqiiencia da
limita<:;ao das nossas faculdades, concebemos as diversas partes
desse prop6sito unico e eterno sob aspectos diversos e em
rela~6es 16gicas, e por isso o chamamos DECRETOS.

2. Como se classificam os atos de Deus, e em que classe os


te6logos colocam os decretos?
Todos os atos divinos imaginaveis podem ser classificados
do modo seguinte:
1°. A~6es imanentes e intrinsecas, pertencentes essen-
cialmente a perfei<:;ao da natureza divina, sem nenhuma
referencia a qualquer coisa que existe fora da Deidade. Sao os
atos da gera<:;ao eterna e necessaria, pela qual o Filho vern do
Pai, e a processao eterna e necessaria, pela qual o Espirito
procede do Pai e do Filho, e todas as demais a~6es envolvidas
na associa~ao mutua das tres Pessoas divinas.
2°. A~6es extrinsecas e transit6rias, isto e, a<:;6es livres que,
procedendo de Deus e terminando na criatura, dao-se

268
Os Decretos de Deus
sucessivamente no tempo, como sejam os atos de Deus na
cria<;:ao, na providencia e na gra<;:a.
3°. A terceira classe e semelhante a primeira, por serem
imanentes e intrinsecas, essenciais a perfei<;:ao da natureza
divina e aos estados permanentes do animo divino, mas ao
mesmo tempo diferem das a<;:6es da primeira dasse por dizerem
respeito ainteira cria<;:ao dependente, exterior aDeidade. Esses
atos sao os decretos eternos e imut<iveis de Deus a respeito de
todos os seres e eventos exteriores em rela<;:ao a Ele.

3. Quais sao a natureza e a fonte essenciais das dificuldades


que oprimem a razao humana quando cogita sabre este tema?
Todas essas dificuldades tern sua origem nas rela<;:6es
inteiramente inescruuiveis do eterno com o temporal, do
infinito com o finito, da soberania absoluta de Deus com a
livre agencia do homem, e do fato indubitavel da origem do
pecado com a santidade, a bondade, a sabedoria eo poder de
Deus. Nao sao peculiares a nenhum sistema de teologia, e se
encontram em qualquer sistema que reconhe<;:a a existencia e
o governo moral de Deus e a a<;:ao livre do homem. Causaram
muita perplexidade aos fil6sofos pagaos da antiguidade, e os
deistas dos tempos modernos, juntamente com os socinianos,
com os pelagianos e com os armm1anos, acham-nas tao
insoluveis como os calvinistas.

4. De que ponto de vista fixo devemos partir no estudo deste


assunto?
Urn Deus auto-existente, independente, todo-perfeito e
imutavel, existindo sozinho desde toda a eternidade, come<;:ou
a criar o universo fisico eo universo moral num vacuo absoluto,
sendo levado a faze-lo por motivos e com referencia a
finalidades, e segundo ideias e pianos, todos interiores a Ele e
originados unicamente por Ele. Tambem, se Deus governa o
universo, e certo que, sendo ele urn Ser inteligente, governa-o
segundo urn plano; e este plano deve ser perfeito em sua

269
Capitulo 10
compreensao, abrangendo todos os pormenores. Se Ele tern
urn plano agora, e evidente que teve esse mesmo plano sem
nenhuma altera<;;:ao desde o principia. 0 decreta de Deus e,
portanto, o ato de urn Ser pessoal soberano, infinito, absoluto,
eterno e imutavel, compreendendo urn plano que inclui todas
as obras, sejam quais forem, grandes e pequenas, desde o
principia da cria<;;:ao ate aeternidade sem fim. Por isso tem que
ser incompreensivel, e niio pode depender de coisa alguma
exterior a Deus mesmo, porque ja estava formado antes que
existisse coisa alguma fora Deus, e por is so abrange e determina
todas as coisas exteriores e todas as suas respectivas condi<;;:6es,
para sempre.

5. Qual a distinfiiO entre presciencia* e preordenafiio, equal a


posifiiO geral dos socinianos sabre este ponto?
Presciencia eo ato da inteligencia infinita de Deus, pelo
qual Ele conhece desde toda a eternidade, e sem mudan<;;:a, a
futuri<;;:ao certa de todos os eventos~ de qualquer especie que
fossem, e que em qualquer tempo houvessem de acontecer.
Preordena<;;:ao e urn ato da vontade infinitamente inteli-
gente, pre-conhecedora, reta e benevola de Deus,determinando,
desde toda a eternidade, a futuri<;;:ao certa de todos os eventos,
de qualquer especie que fossem, e que em qualquer tempo
houvessem de acontecer. A presciencia reconhece a futuri<;;:ao
certa dos eventos, e a preordena<;;:ao os torna com certeza futuros.
Os socinianos admitem que a presciencia e a preordena<;;:ao
de Deus sao co-abrangentes, mas limitam uma e outra aos
eventos pertencentes a cria<;;:ao e a providencia que Deus
determinou fazer acontecer, ou por Sua propria agencia
imediata, ou por meio das causas secundarias que operam sob
a lei da necessidade. Eles negam que a presciencia e a

* Melhor seria o termo pre-conhecimento, mas mantemos "presciencia" por


ter sido utilizado pelo tradutor original, e por ser de uso geral. Nota de Odayr
Olivetti.

270
Os Decretos de Deus
preordena<;ao de Deus se estendam aos atos voluntarios dos
agentes livres, e dizem que tais atos sao, por sua propria
natureza, contingentes e s6 podem ser conhecidos depois de
praticados.

6. Quale a posifiiO dos arminianos sobre este ponto?


Os anninianos concordam com os socinianos em negar
que Deus preordene os atos voluntarios de agentes livres, ou
que de algum modo os predetermine de maneira que sejam
com certeza futuros. Mas diferem dos socinianos e concordam
conosco em sustentar que a presciencia certa de Deus estende-
-se igualmente a todos os eventos, quer sejam contingentes
em sua natureza, quer sejam produzidos por causas secundarias
que operam sob a lei da necessidade. Sustentam que Deus preve
com certeza absoluta e desde toda a eternidade a futuri<;ao dos
atos livres dos agentes morais, e que os abrange e os ajusta ao
Seu plano eterno - plano que abrange todas as coisas, as a<;6es
livres dos agentes morais como apenas previstas, e as a<;6es dos
agentes necessarios como preordenadas absolutamente.

7. Podemos expor, sob diversos titulos, a doutrina calvinista


sobre este ponto.
1°. Deus pre-conhece todos os eventos como futuros com
certeza,porque os decretou e assim os tornou futuros com certeza
absoluta.
2°. Os decretos de Deus referem-se igualmente a todos os
eventos futuros de qualquer especie que sejam, as a<;6es livres
dos agentes morais, como tambem as a<;6es dos agentes
necessarios, as a<;6es pecaminosas como tambem as que sao
moralmente boas.
3°. Algumas coisas Deus decretou eternamente fazer
pessoalmente, e.g., a cria~ao; outras fazer acontecer por meio
da a<;ao de causas secundarias operando sob uma lei de
necessidade; e outras ainda decretou mover agentes livres para
faze-las, ou permitir que as fizessem no uso da sua liberdade;

271
Capitulo 10
ao mesmo tempo, estes ultimos eventos o decreta to rna tao ·. ·
certamente futuros como qualquer dos outros.
I
4°. Deus decretou os fins como tambern os meios, as causas
como tambem os efeitos, as condi~oes e os instrumentos como
tambem os eventos que deles dependem.
5°. 0 decreta de Deus determina so a futuri~ao certa dos
eventos, e de modo algum efetua ou causa urn evento. Mas o
proprio decreta em todos os casos determina que o even to seja
efetuado por causas operando de uma maneira perfeitamente
em harmonia com a natureza do evento que vai ser efetuado.
Assim, por exemplo, no caso dos atos livres de urn agente
moral, o proprio decreta determina ao mesmo tempo - (1)
Que o agente seja livre. (2) Que os seus antecedentes e tambem
todos os antecedentes do ato em questao sejam o que sao ou
foram. (3) Que todas ascondifi5es atuais do ato sejam o que sao.
(4) Que o a to seja inteiramente espontaneo e livre da parte do
agente. (5) Que seja com certeza futuro.
6°. Os prop6sitos de Deus, dizendo respeito a todos os
eventos de qualquer especie, constituem uma so inten~ao todo-
compreensiva, abrangendo todos os eventos, os livres como
livres, os necessarios como necessarios, bern como todas as suas
causas, condi~oes e rela~oes, como urn so sistema indivisivel
de coisas, sendo cada elo essencial a integridade do sistema
to do.

8. Quanta ao que diz respeito ao plano eterno de um Criador


onisciente e onipotente, mostre que a presciencia e equivalente a
preordenafiio.
Deus, possuindo presciencia e poder infinito, existiu so,
desde a eternidade, e no tempo, movido somente por Si,
come~ou a criar num vacuo absoluto. Quaisquer causas ou
condi~oes limitantes posteriormente existentes, Ele mesmo
produziu intencionalmente, com perfeita presciencia de sua
natureza, de suas relac;:6es e de seus resultados. Se Deus, pois,
prevendo que, se criasse certo agente livre e o colocasse em

272
Os Decretos de Deus
certas rela<;:6es, esse agente agiria livremente de certo modo,
mesmo assim, com essa previsao certa, criou esse mesmo agente
livre eo colocou precisamente nessas rela<;:6es, e evidente que
Deus, agindo assim, predeterminaria a futuri<;:ao certa do ato
previsto. E impossivel que Deus, na realiza<;:ao de Sua obra,
seja em qualquer tempo obrigado a escolher entre dois males,
porque o sistema inteiro, e cada finalidade, cada causa par-
ticular, e cada condi<;:ao, foram previstos claramente e, por
escolha deliberada, admitidos por Ele mesmo ..

9. Que raziJes temos para ver os decretos de Deus como uma


s6 intenfdo todo-compreensiva?
1°. Porque, como mostrarernos abaixo, sao urn ato eterno,
e ceternitas est una, individua et tota simul. *
2°. Porque todo evento que realmente acontece no sistema
das coisas acha-se entrela<;:ado com todos os demais eventos
num envolvimento interminavel. Nenhum evento e isolado.
A cor de uma flor eo ninho de urn passaro acham-se relacio-
nados com o inteiro universo material. Mesmo em nossa
ignorancia, podemos ver como urn fenomeno quimico esta
em rela~ao com uma miriade de outros fenomenos, classi-
ficados sob os titulos de mecanica, eletricidade, luz e vida.
3°. Deus decreta os eventos como realmente sucedem, isto
e, eventos produzidos por causas e dependentes de certas
condi<;:6es. 0 decreto que determina o evento nao pode deixar
fora a causa ou a condi<;:iio da qual depende o evento. Mas a
causa de urn even toe o efeito de outro, e cada evento que sucede
no universo e mais ou menos imediata ou remotamente a
condi<;:ao de todos os dernais, de modo que urn prop6sito eterno
da parte de Deus e for<;:osamente urn ato todo-abrangente.
Sendo finitas as nossas mentes, e sendo-nos impossivel
abarcar num s6 ato de compreensao inteligente urn numero

* Uma possivel tradU<;:iio seria: a eternidade e una, em seus elementos


individuais e em sua totalidade, simultaneamente. Nota de Odayr Olivetti.

273
Capitulo 10
infinito de eventos em todas as suas rela~6es e conex6es, somos
obrigados a contemplar os eventos em grupos parciais, e
concebemos o prop6sito de Deus em rela~ao a eles como atos
distintos e sucessivos. Por isso as Escrituras falam dos con-
selhos, prop6sitos e jufzos de Deus no plural, e, para indicar a
rela~ao que Deus quer que urn evento tenha com outro, elas
falam como se Deus Se propusesse a fazer suceder urn even to
como o meio ou a condic;ao do qual outro depende. Isso tudo e
verdade, porque esses eventos todos tern essas relac;6es entre
si; mas, ao mesmo tempo, todos se acham inclufdos, e nenhum
esta fora, desse prop6sito unico e eterno de Deus que abrange
igualmente todas as causas e todos os efeitos, todos 'os eventos
e todas as suas condifoes.
Todos os erros especulativos dos homens a respeito deste
ponto nascem da tendencia da mente humana de prestar
atenc;ao exclusiva s6 a uma parte do prop6sito eterno de Deus
e de considerar essa parte isolada das demais. Os decretos de
Deus nao separam even to algum de suas causas ou condi<;:6es,
como tambem nao estao separados na natureza. E-nos tao
impossivel abranger por urn s6 ato compreensivo da
inteligencia todas as obras realizadas por Deus na natureza
como no-lo e abranger todos os Seus decretos. Somos obrigados
a estudar Suas obras parte por parte. Mas nenhum observador
inteligente que estuda a natureza julga que haja even to isolado.
Assim tam bern somos obrigados a estudar Seus decretos parte
por parte; porem nenhum te6logo inteligente deve supor que
neles ha elos quebradas ou conexao imperfeita em parte alguma.

10. Como se pode provar que OS decretos de Deus sao eternos?


1°. Sendo Deus infinito, Ele e necessariamente eterno e
imutavel, desde a eternidade infinito em sabedoria e conhe-
cimento, enos Seus pensamentos e prop6sitos absolutamente
independente de qualquer criatura. Nao pode nunca haver
acrescimo aSua sabedoria, nem surpresa para a Sua presciencia,
nem resistencia contra o Seu poder, e, por conseguinte, nao
I
274
Os Decretos de Deus

pode nunca haver motivo para que Ele revogasse ou revogue


urn decreto Seu ou modificasse ou modifique esse prop6sito
infinitamente sabio e reto que, pela perfeis;ao da Sua natureza,
formou desde a eternidade.
2°. As Escrituras o afirmam- (desde toda a eternidade)
Atos 15: 18; (antes da fundas;ao do mundo) Ef. 1:4; (ja antes da
criac;:ao do mundo) 1 Ped. 1:20 (Figueiredo); (des de o prindpio,
segundoo grego (assimAlmeida) 2 Tess. 2:13, mas, na tradu~ao
de Figueiredo, "como primicias", 2: 12; (antes dos tempos dos
seculos) 2 Tim. 1:9; (antes dos seculos) 1 Cor. 2:7; (o eterno
prop6si to) Ef. 3: 11; etc.

11. Provamos que OS decretos sao imutaveis. ;iJ:1' . •. 'I

1°. Lembrando que sao eternos, como acabamos de


mostrar.
2°. Lembrando que Deus e eterno, absoluto, imutavel e
perfeito em sabedoria e poder.
3°. E ensino das Escrituras- Sal. 33:11; Is. 46:10; etc.
;. ·...
12. Provamos, pela razao, que os decretos de Deus abrangem
todos os eventos.
Como mostramos acima, nao ha evento isolado. Por
conseguinte, se urn s6 evento foi decretado absolutamente,
todos o deviam ser. Se urn deles foi deixado indeterminado,
todos os eventos futuros serao indeterminados com ele, em
grau mawr ou menor.

13. Provamos o mesmo ponto pelas Escrituras.


1°. Elas afirmam que os decretos divinos abrangem
completamente todo o sistema - Ef. 1:11; Atos 17:26; Dan.
4:34,35.
2°. Afirmam o mesmo a respeito dos eventos fortuitos-
Prov. 16:33; Mat. 10:29,30.
3°. Tambem a respeito das ac;:6es livres dos homens- Ef.
2:10,11; Fil. 2:13. ..,.J.~'P.'··" .-r·ML~.JfJ-·I

27S
Capitulo 10
4°. Mesmo a respeito das mas a<;;:6es dos homens. "A este
1
J

(Cristo) que vos foi entregue pelo determinado conselho e


presciencia de Deus, tomando-o v6s, o crucificastes e matastes
pelas maos dos injustos"- Atos 2:23. "Porque verdadeiramente
contra o teu santo Filho Jesus, que tu ungiste, se ajuntaram,
nao s6 Herodes, mas Poncio Pilatos, com os gentios e os povos
de Israel; para fazerem tudo o que a tua mao eo teu conselho
tinham anteriormente determinado que se havia de fazer" -
Atos 4:27,28. Veja tambem Atos 13;29; 1 Ped. 2:8; Jud. vers.
4; Apoc. 17:17. Quanto ahist6ria de Jose, compare Gen. 37:28
com Gen. 45:7,8 e 50:20. "Nao fostes v6s que me enviastes
para ca, senao Deus." "V6s bern intenstastes mal contra mim,
porem Deus o tornou em bern." Veja tam bern Sal. 17: 13,14;
Is. 10:5-15; etc.

14. Como se prova a universalidade dos decretos de Deus


pela providencia?
Segue-se da eternidade, imutabilidade, sabedoria, prescien-
cia e poder infinitos de Deus, que a Sua opera<;;:ao temporal na
providencia procede em tudo segundo o Seu prop6sito eterno
- Ef. 1:11e Atos 15:18. Mas, tanto as Escrituras como a razao
nos ensinam que o governo providencial de Deus compreende
tudo o que esta nos ceus e na terra como um todo, e todos os
eventos em detalhe - Prov. 16:33; Dan. 4:34,35; Mat. 10:29,30.

15. Podemos provar esta doutrina a partir da profecia.


Deus predisse nas Escrituras a ocorrencia certa de muitos
eventos, sendo muitos deles as a<;;:6es voluntarias de homens, e
sucederam segundo a predi<;;:ao. Ora, a base da profecia e a
presciencia, e a base da presciencia de urn evento dado como
futuro com certeza eo decreto de Deus que o torna futuro. A
imutabilidade eterna do decreto e a (mica base, tanto da infali-
bilidade da presciencia como da profecia. Mas, se Deus decretou
certos eventos futuros, segue-se que incluiu nesse decreto todas
as causas, condi<;;:6es, fatos correlatos e conseqiiencias. Nao ha

276
Os Decretos de Deus

evento isolado; para que Deus torne certamente futuro urn s6


evento, e necessaria que determine toda a concatena~ao das
causas e efeitos que constituem o universo.

16. Em que sentido sao livres os decretos de Deus?


Os decretos de Deus sao livres no sentido de que, ao
decretar, Deus foi determinado unicamente por Sua boa
vontade infinitamente santa, sabia, reta e benevola. Escolheu
sempre como quis, e sempre quis de conformidade com a
perfeic;ao da Sua natureza.

17. Em que sentido os decretos de Deus sao soberanos?


Sao soberanos no sentido de que, enquanto determinam
absolutamente tudo quanto sucede fora de Deus, todos os seus
motivos e raz6es estao dentro da natureza divina, e nao sao
sugeridos nem ocasionados por nada do que esta fora dEle,
nem dependem eles de coisa alguma que haja fora dEle.

18. Que distinfao ha entre decretos absolutos e decretos


condicionais?
Decreta absoluto e o decreta que, embora possa incluir
condic;6es, nao depende delas, isto e, torna certamente futuro
o evento decretado, seja qual for, quer seja uma necessidade
mecanica, quer seja urn ato voluntario, e todas as suas causas e
condic;6es, seja qual for a sua natureza, e das quais o evento
depende.
Decreto condicional eo que decreta que urn even to suceda
sob a condic;ao de ser possfvel suceder outro evento, mas nao
certo (nao decretado).
Os socinianos negavam que pudessem ser previstas as ac;6es
livres dos homens por serem intrinsecamente incertas, e por
isso afirmavam que Deus nao as pode prever. Sustentavam que
Deus decretou absolutamente criar a rac;a humana, e que, depois
da queda de Adao, decretou salvar todos os pecadores que se
arrependessem e cressem, mas que nada decretou a respeito

277
Capitulo 10
de pecar e nem da salva~ao de homens individuais.
Os arminianos, admitindo que Deus preve com certeza
os atos de agentes livres, como tambem todos os demais
eventos, sustentam que Deus decretou absolutamente criar o
homem, e, prevendo que ele cairia, decretou absolutamente
preparar uma salva~ao para todos e salvar realmente todos os
que se arrependem e creem, e que decretou condicionalmente
a salva~ao de hom ens individuais, sob a condi~ao, prevista mas
nao decretada, da sua fe e obediencia.

19. Quais as objefoes a atribuifiio de decretos condicionais a


Deus?
Os calvinistas admitem que o decreto totalmente abran-
gente de Deus determina todos os eventos segundo a sua
natureza inerente, as a~6es de agentes livres como livres, e a
opera~ao de causas necessarias, necessariamente. Abrange
tambem o sistema inteiro de causase efeitos de todo tipo, dos
motivos e condi~6es das a~6es livres, como tambem as causas
necessarias dos eventos necessarios. Deus decretou a salva~ao
sob a condi~ao da fe, e, ao mesmo tempo e nesse mesmo ato,
decretou a fe daqueles cuja salva~ao determinou efetuar. "E
aos que predestinou, a estes tambem chamou." Assim o Seu
decreto desde o principia abrangeu a agencia livre dos homens
e dela cuidou, como tambem cuidou do proceder regular da
natureza segundo as leis estabelecidas. Assim tambem os Seus
pactos, ou promessas condicionais, que faz no tempo, sao em
todas as suas partes a execu~ao do Seu prop6sito eterno, que
compreendia a promessa, e a condi~ao nos seus diversos lugares,
como meios para o fim em vista. Mas e evidentemente
impossivel que se possa considerar o decreto de Deus como
baseado em condi~6es que nao sejam elas mesmas
determinadas pelo decreto.
1°. Ja mostramos acima (Pergs. 3-7) que o decreto divino e
eterno e totalmente abrangente. Uma condi~ao implica possi-
bilidade de mudan~a. Ora, sendo urn s6 sistema o universo

278
Os Decretos de Deus

inteiro, se uma parte e contingente, 0 todo 0 e tambern, porque,


se falhasse uma s6 condis:ao, toda a concatenas:ao de causas e
efeitos ficaria desarranjada. Se o arminiano responder que,
embora Deus nao preordenou OS atos livres dos homens, Ele
os previu infalivelmente e proveu a esse respeito, e por isso
Seus pianos nao podem falhar; o calvinista dira que, se Deus
previu que certo homem, em certas circunstancias, agiria de
urn certo modo em certa conjuntura, neste caso Deus,
decretando criar esse homem e coloca-lo nessas circunstancias
e nessa mesma con juntura, preordenou a futuris:ao certa desse
evento, daquilo que o homem fez, e todas as suas conse-
quencias. Que o decreto de Deus e imutavel e nao depende de
condi<;;6es incertas, fica provado (1) por sua eternidade; (2)
pelas assen;oes diretas das Escrituras- Is. 14:24,27; 46:10;
Sal. 33:11; Prov. 19:21; Rom. 9:11; Ef. 3:11.
2°. Os arminianos admitem que a presciencia de Deus e
eterna e certa, e abrange todos os eventos, os livres bern como
os necessarios. Mas, (I) como mostramos no paragrafo
precedente, essa presciencia envolve preordenas:ao, e (2) certeza
na presciencia implica em certeza no evento; certeza implica
em determinas:ao, determinas:ao nos deixa a escolha entre o
decreto de urn Deus infinitamente sabio, reto e benevolo, ou
urn destino cego. ·' ;·, :. ,,.lr: -,! , · .,t· ... ·
3°. Urn decreto condicional subverteria a soberania de Deus
e, quanto a administra~ao de todo o Seu governo e aexecus:ao
de todos os Seus pianos, torna-10-ia dependente das a~6es
voluntarias de Suas pr6prias criaturas. Contudo os decretos de
Deus sao soberanos- Is. 40:13,14; Dan. 4:35; Rom. 9:15-18.
4°. As Escrituras declaram que o decreto de Deus depende
somente do Seu "beneplacito" (Figueiredo: "da sua bene-
valencia") e "do conselho da sua vontade".- E£ 1:5,11; Rom.
9:11; Mat.ll:25,26.
5°. 0 decreto de Deus inclui os meios e as condis:oes
-2 Tess. 2: 13; 1 Ped. 1:2; Ef. 1:4.
6°. 0 Seu decreto determina absolutamente as as:6es livres

279
Capitulo 10
dos homens- Atos 4:27,28; Ef. 2;10.
7°. E Deus mesmo quem opera no Seu povo a fe e a
obediencia, as chamadas condi~6es da sua salva~ao - Fil.
2: 13; Ef. 2:8; 2 Tim. 2:25.

20. Ate onde sao eficazes os decretos de Deus, e ate onde sao
permissivos?
Todos os decretos de Deus sao igualmente eficazes no
sentido de determinarem infalivelmente a futuric;ao certa do
even to decretado. Os teologos, porem, classificam os decretos
de Deus assim: 1°. Eficazes, corn respeito aos eventos que Ele
determinou efetuar por meio de causas necessarias,' ou por Sua
propria ac;ao imediata; 2°. Permissivos, com respeito aos
eventos que Ele determinou permitir que agentes livres
efetuassem.

21. Como se pode provar que o decreta de Deus torna certo o


evento?
1°. Pela natureza do proprio decreto, que e soberano e
imutavel (veja acima).
2°. Pela natureza essencial de Deus em Sua relac;ao com
Sua criac;ao, como soberano infinitamente sabio e poderoso.
3°. A presciencia de Deus considera como certos os eventos
futuros. A razao de ser desta certeza esta necessariamente, ou
em Deus mesmo, ou nos proprios eventos, e esta ultima
suposic;ao e 0 fatalismo.
4°. As Escrituras atribuem certeza de futuri~ao aos eventos
decretados. Importa que o evento suceda assim como foi
"determinado"- Luc. 18:31-33; 24:46; Atos 2:23; 13:29; 1
Cor. 11 :29; Mat. 16:21.

22. Como difere esta doutrina- que o decreta universal de Deus


torna certa a ocorrencia de todos os eventos futuros - da antiga
doutrina do fatasismo?
A doutrina calvinista dos decretos concorda so num ponto

280
Os Decretos de Deus
como fatalismo, e este e em sustentar que os eventos em questao
sao com certeza futuros. Mas a doutrina arminiana da pres-
ciencia divina faz exatamente o mesmo. Em todos os outros
aspec-tos a nossa doutrina difere da doutrina paga do destino
cego.
0 fatalismo ensina que todos os eventos sao determinados
com certeza por uma lei universal de causa~ao necessaria,
operando cegamente e, por meio de uma for<;a simples e nao
inteligente, efetuando seus fins, irresistivel e irrespectivamente
da livre vontade dos agentes livres envolvidos. Nao deixa lugar
para fins ou prop6sitos finais, nem para motivos e escolha,
meios ou condi~6es, mas e simplesmente uma evolu<;ao
necessaria.
A doutrina calvinista dos decretos, porem, postula o plano
infinito e totalmente abrangente de urn Pai infinitamente sabio,
reto, poderoso e benevolo, cujo plano nao e determinado por
mera vontade, e sim segundo "o conselho da sua vontade",
alcan~ando os melhores fins e adotando os melhores meios
para alcan~ar esses fins - e cujo plano nao e executado s6 por
for~a e sim por meio de todo tipo de causas secundarias, tanto
livres como tambern necessarias, sen do cada uma pre-adaptada
para o seu lugar e fun<;ao, e operando cada uma sem constran-
gimento, segundo a sua natureza.
Ha uma diferen<;a infinita entre uma maquina e urn
homem, entre a opera~ao de motivos, inteligencia, livre escolha,
e as for~as mecanicas que operam sobre a materia. E ha
exatamente a mesma diferen~a entre o sistema de decretos
divinos e a doutrina paga do destino cego.

23. Qual a objefiio que, contra esta doutrina dos decretos


incondicionais, se faz do fa to admitido de serem livres os homens?
OBJE<;Ao- Presciencia implica na certeza do evento. 0
decreto de Deus implica em que Deus o determinou como
certo. Todavia o fato de determina-lo como certo implica, da
parte de Deus, nalguma a~ao ou agencia eficaz para produzir

281
Capitulo 10
ou efetuar o evento, o que e inconciliavel com a agencia livre
doshomens.
RESPONDEMOS: e evidente que e s6 aexecufiiO do decreto,
e nao o decreto em si mesmo, que pode impedir a livre agencia
dos homens. Sobre o assunto geral do modo como Deus
executa Seus decretos, veja abaixo, os capitulos sobre a
providencia, a voca~ao eficaz e a regenera~ao.
Temos espa~o aqui s6 para a seguinte exposi~ao geral:
1°. As Escrituras atribuem a Deus tudo quanto hade born
no homem; isso Ele opera em nos o querer eo fazer segundo o
Seu beneplacito. Todos os pecados que os homens cometem,
as Escrituras atribuem totalmente aos mesmos homens.
Contudo, o decreto permissivo de Deus realmente determina
a futuris;ao certa do ato; porque Deus, sabendo com certeza
que o homem em questao, colocado em certas circunstancias,
agiria desse modo, colocou-o nessas mesmas circunstancias em
que agiu assim e cometeu o pecado. No en tanto, em caso algum,
nem quando opera em nos o que eborn, nem quando nos poe
onde sabe que com certeza havemos de fazer o mal, Ele nem
viola nem restringe, na execu~ao do Seu prop6sito, a perfeita
liberdade do agente.
2°. Temos o fato distintamente revelado que Deus
decretou os atos livres de homens, e que, ao mesmo tempo, os
homens nao eram menos responsaveis, nem menos livres nos
atos que praticaram- Atos 2:23; 3: 18; 4;27,28; Gen. 50:20;
etc. Nunca poderemos compreendercomo e que o Deus infinito
opera sobre o espfrito finito do homem, mas nem por isso e
menor o nosso dever de o crer.
3°. Segundo a teoria da vontade, que faz a liberdade do
homem consistir naliberdade da indiferenfa, is toe, que em todos
os casos em que a vontade faz uma escolha, ela esta em estado
de equilfbrio perfeito, igualmente independente de todos os
motivos pr6 ou contra, e tao livre para escolher em oposis;ao a
todos os desejos como em harmonia com eles, e evidente que
neste caso a propria essencia da liberdade consistiria em

282
Os Decretos de Deus

incerteza. Se esta e a verdadeira teoria da vontade, Deus nao


pode executar os Seus decretos sem violar a liberdade do agente,
e a presciencia certa e impossivel.
Mas, como demonstramos abaixo, no Cap. IS, a verdadeira
teoria da vontade e que a liberdade do agente consiste em que
este, em qualquer caso, age como lbe apraz, isto e, segundo os
desejos e disposi~6es do seu cora~ao, segundo a avalia~ao
imediata que sua razao fa~a do caso em particular. Esses desejos
e disposi~6es sao, por sua vez, determinados pelo caniter do
agente em rela~ao a suas circunsrancias, e esse caniter e essas
circunstancias nao estao, por certo, fora da influencia do Deus
infinito. ,,

24. Em que sentido e que alguns ensinam que Deus eo autor


do pecado?
Muitos pensadores de tendencias panteisticas,e.g., o Dr.
Emmons, afirmam que, assim como Deus e infinito em
soberania, e por Seu decreto deterrnina tudo, assim tambem
por Sua providencia efetua tudo o que sucede, de modo que
Ele e o unico agente real do universo. Ao mesmo tempo,
sustentam que Deus e urn agente infinitamente santo quando
efetua aquilo que, produzido par Deus, e reto, mas produzido
em nos, e pecado.

25. Como se pode demonstrar que Deus niio eo autor do pecado?


A admissao do pecado na cria<;:ao, por urn Deus infinita-
mente santo, sabio e poderoso, e urll grande misterio, do qual
nao se pode dar nenhuma explica<;:ao. Entretanto, que Deus
nao e 0 au tor do pecado fica provado -
1°. Pela natureza do pecado, o qual, quanto asua essencia,
e anomia, falta de conformidade coJll a lei, e desobediencia ao
Legislador.
2°. Pela natureza de Deus, que, quanto a Sua essencia, e
santo, e na administra<;:ao do Seu reino sempre proibe e pune
o pecado.

283
Capitulo 10
3°. Pela natureza do homem, que e agente responsavel e
livre, e origina os seus pr6prios atos. As Escrituras atribuem
sempre a gra<;:a divina as a<;:6es moralmente boas, e ao mau
cora<;:ao as a<;:6es pecaminosas dos homens.

26. Como se pode demonstrar que a doutrina dos decretos


incondicionais nao represent a Deus como o autor do pecado?
A dificuldade toda esta no tremendo fato de existir o
pecado. Se Deus o previu e, apesar disso, criou o agente e o
colocou nas circunstancias em que previu que ele cometeria o
pecado, e evidente que o predeterminou. Se nao o previu, ou,
prevendo-o, nao podia impedir que o pecado entrasse, entao
nao e infinito no conhecimento e no poder, porem foi
surpreendido e estorvado por Suas criaturas. A doutrina dos
decretos incondicionais nao apresenta nenhuma dificuldade
especial. Representa Deus como decretando que o pecado
resulte do ato livre do pecador, e nao de Deus levando-o ou
induzindo-o a pecar mediante qualquer forma de a<;:ao ou
tenta<;:ao.

27. Que obje<;ao contra esta doutrina e derivada do usa de


meios?
Esta e a forma mais comum de obje<;:ao na boca de genre
ignorante e irreligiosa. Dizem que, se urn decreto imutavel
torna certos todos os eventos futuros, "se ha de suceder aquila
que deve suceder", en tao se segue que nenhum meio empregado
por nos pode impedir que suceda, nem e necessario que
empreguemos meios para conseguir o resultado.
Segue-se dai, pois, que, sendo o uso de meios ordenados
por Deus, e instintivamente natural para o homem, tendo
muitas coisas sido o efeito dos meios empregados, e sendo
evidente que muitas no futuro dependem deles, Deus nao
tornou certa nenhuma dessas coisas que dependem do uso de
meios da parte dos homens.

284
Os Decretos de Deus
_;. ·. ~ j t: .l '

28. Em que base sefundamenta o usa de meios?


Este uso fundamenta-se no mandamento de Deus e
naquela propriedade existente no uso de meios para conse-
guirmos o resultado desejado que os nossos instintos, inteli-
gencia e experiencia nos ensinam. Mas, nem a propriedade
nem a efic:kia dos meios para conseguirem o resultado residem
inerente e independentemente nos pr6prios meios, porem
foram estabelecidas originariamente por Deus e sao mantidas
atualmente pelo proprio Deus; e na opera~ao de todos os meios
Deus preside sempre e sempre dirige providencialmente. Isso
acha-se envolvido necessariamente em toda e qualquer teoria
crista da providencia, em bora nunca possamos explicar a a~ao
relativa, a concorrencia, de Deus sobre o homem, o infinito
sabre o finito.

29. Como se pode demonstrar que a doutrina dos decretos


niio da fundamento racional para desencorajar alguem no usa
de meios?
Esta dificuldade (exposta acima, Per g. 27) tern sua raiz no
costume de isolar uma parte do decreta eterno de Deus do
todo (Perg. 7), e no de confundir a doutrina crista dos decretos
com a doutrina paga do destino cego (Perg. 22). Mas, quando
Deus decretou urn evento, decretou-o futuro com certeza, nao
como isolado de outros eventos, ou como independente de
meios ou agentes, e sim como dependente de meios e de agentes
ernpregando livremente esses meios. 0 rnesrno decreta que
torna certo o evento, deterrnina tarnbem o modo pelo qual
tenha que ser efetuado, e cornpreende tanto os rneios como os
fins. Esse ato eterno e totalmente abrangente cornpreende a
existencia toda durante o tempo todo, eo espa~o inteiro como
urn s6 sistema, e, ao mesmo tempo, cuida do todo ern todas a
suas partes e de todas as partes em todas as suas rela~6es urnas
com as outras e como todo. Urn evento, pais, pode ser certo
com respeito ao decreto e apresciencia de Deus e, ao mesrno

285
Capitulo 10
tempo, verdadeiramente contingente na apreensao dos homens
e na sua rela<;;:ao com os meios de que depende.
30. Que distinfiio sempre devemos fazer entre as objefoes
contra a prova de uma doutrina e as ob}efoes contra uma doutrina
comprovada?
E evidente que sao legitimas as obje<;;:6es razoaveis, quer
biblicas quer outras, que se possa fazer contra as provas em
que se baseia qualquer doutrina; e sempre se deve dar o devido
peso a essas obje<;;:6es contra as provas alegadas a favor da
doutrina. Entretanto, uma vez provado que uma doutrina e
ensinada nas Escrituras, e igualmente evidente que todas as
obje<;;:6es feitas contra essa doutrina nao terao peso algum,
enquanto nao tiverem for<;;:a bastante para provar que as
Escrituras Sagradas nao sao a Palavra de Deus. Nao chegando
a fazer isso, as obje<;;:6es feitas contra uma doutrina biblica-
mente comprovada, se nao afetarem as provas em que ela se
fundamenta (e a maioria das obje<;;:6es feitas contra a doutrina
calvinista dos decretos sao dessa natureza), so servirao para
ilustrar a verdade obvia segundo a qual o intelecto finito do
homem nao pode compreender plenamente as coisas
parcialmente reveladas e parcialmente escondidas na Palavra
de Deus.

31. Quais sao OS ejeitos praticos desta doutrina propriamente


ditos?
Humildade, avista da grandeza e da soberania infinitas
de Deus, e da dependencia do homem. Confian<;;:a implicita
na sabedoria, na retidao, na justi<;;:a, na bondade e na imuta-
bilidade dos propositos de Deus, e pronta obediencia aos Seus
mandamentos; devendo nos estar sempre lembrados de que
os preceitos de Deus, revelados claramente, e nao os Seus
decretos, sao a regra do nosso clever.

'f""

286
·:,; i

11
; ~ ... '

Predestina~ao
,_,,_

1. Em que diversos sentidos a palavra predestinafiiO e


empregada pelos te6logos?
1°. Como equivalente a palavra generica decreto, incluindo
todos os prop6sitos eternos de Deus.
2°. Como abrangendo somente aqueles prop6sitos de Deus
que dizem respeito especialmente as Suas criaturas morais.
3°. Como denominativo do conselho de Deus que diz
respeito somente aos homens decaidos, incluindo a elei~ao
soberana de alguns e a justissima reprova~ao dos demais.
4°. As vezes o seu uso e tao restrito que e aplicada somente
a eleis;ao eterna do povo de Deus para a vida eterna.
0 terceiro sentido dado acima eo uso mais apropriado.
Veja Atos 4:27,28.

2. Em que sentidos as palavras proginosco (pri-conhecer) e


prognosis (presciencia) sao empregadas no Novo Testamento?
Proginosco e composta de pro, antes, eginosco, cujo sentido
primario e conhecer, saber, e cujo senti do secundario e aprovar,
e.g., 2 Tim. 2:19; Joao 10:14,15; Rom. 7:15. Essa palavra
encontra-se cinco vezes no Novo Testamento. Duas vezes, em
Atos 26:5 e em 2 Ped. 3:17, significa conhecimento previo,
apreensiio, simplesmente. Nos tres casos restantes, Rom. 8:29;
11:2 e 1 Ped. 1:20, e empregada no sentido secundario de
aprovar anteriormente. Isso se torna evidente pelo contexto,
porque e empregada para designar 0 motivo da predestina~ao

487
Capitulo 11
divina de individuos para a vida eterna, e a respeito da qual se
nos diz em outras passagens que nao e "segundo as nossas obras,
mas segundo o Seu proprio proposito e gra~a", "segundo o
benephicito de sua vontade"- 2 Tim. 1 :9; Rom. 9: 11; Ef. 1:5.
Prognosis encontra-se somente duas vezes no Novo Testa-
mento, em Atos 2:23 e 1 Ped. 1:2, e em ambos os casos significa
evidentemente aprova~ao, ou escolha previa. 0 termo e
explicado pela frase equivalente "decretado conselho" ou
"determinado conselho".

3. Que sentidos tern no Novo Testamento as palavras eclego


(eleger) e ecloge (eleifiio)?
Eclego encontra-se vinte e uma vezes no Novo Testamento.
E empregada no senti do de, 1°. A escolha que Jesus fez dos
Seus disdpulos- Luc. 6: 13; Jofw 6:70. 2°. A escolha que Deus
fez da na~ao judaica para Seu povo peculiar- Atos 13:17. 3°.
A escolha de certos homens, feita por Deus ou pela Igreja, para ·
algum servi~o especial- A tos 15:7,22. 4°. A escolha que Maria l
fez da melhor parte- Luc. 10:42. 5°. Na maioria dos casos, a
elei~ao feita por Deus de individuos para a vida eterna- Joao
15:16; 1 Cor. 1:27,28; Ef. 1:4; Tia. 2:5.
Ecloge encontra-se sete vezes no Novo Testamento. Uma
vez significa elei~ao para o oficio apostolico- Atos 9:15. Uma
vez o termo se refere aos que foram escolhidos para a vida eterna
- Rom. 11:7. Em todos os demais casos significa o proposito
ou ato de Deus escolhendo o Seu proprio povo para a salva~ao
-Rom. 9: 11; 11 :5,28; 1 Tess. 1 :4; 2 Ped. 1:10.

4. De que outras palavras mais o Espirito de Deus Se serve


no Novo Testamento para expor a verdade sabre este ponto?
Das seguin tes:
Proorigein (limitar, marcar, tencionar definitivamente de
an temao, preordenar ), en contra- se seis vezes no Novo Testa-
mento. Em todos os casos significa preordena~ao absoluta da
parte de Deus- Atos 4:28; Rom. 8:29,30; 1 Cor. 2:7; Ef. 1:5,11.

288
PredestinafiiO
Protithemi, encontra-se tres vezes noN ovo Testamento. Em
Romanos 1: 13 significa urn prop6si to de Paulo, e em Romanos
3:25 e Efesios 1:9, urn prop6sito de Deus.
Proetomazein, encontra-se duas vezes, em Romanos 9:29 e
Efesios 2:10, significando preparar ou designar anteriormente.

5. A quem se atribui a eleifiio nas Escrituras?


0 decreta eterno, como urn todo e em todas as suas partes,
e, sem duvida, o ato concorrente de todas as tres Pessoas da
Trindade em Sua perfeita unidade de conselho e vontade.
Mas, na economia da salva<:;ao, como nose revelada, o ato
de elei<:;ao soberana e atribuido especialmente ao Pai, como
Sua parte pessoal, assim como a reden<:;ao e atribuida ao
Filho e a santifica<:;ao ao Espirito Santo- Joao 17:6,9; 6:64,65;
1 Tess. 5:9.

6. Como se pode expor a teoria da predestinafiio chamada


"Teoria da Eleifiio Nacional" por seus defensores?
E a teoria segundo a qual a unica elei<:;ao de que falam as
Escrituras, a respeito da salva<:;ao dos homens, consiste na
predestina<:;ao divina de comunidades e na~6es para o
conhecimento da religiao verdadeira e os privilegios exteriores
do evangelho. Esta forma de elei~ao, que sem duvida alguma
representa urn grande fato evangelico, e ilustrada eminente-
mente pelo caso dos judeus. · ·'~ · r>' ·

7. Como se pode expor a "Teoria do Individualismo


Eclesiastico", assim chamada por seus defensores?
Esta teoria, advogada par Stanley Faber, pelo arcebispo
Whately, e por outros, envolve a afirma~ao de que Deus
predetermina a rela<:;ao dos homens com a lgreja visivel e com
os meios de gra<:;a. Par seu nascimento, e pela providencia
subseqiiente, faz o quinhao de alguns cair nas circunstancias
as mais favon'iveis, e o de outros, nas menos favoraveis.
) 'I , ;, . ,

289
Capitulo 11
8. Em que consiste a doutrina arminiana da eleifao?
Os arminianos admitem a presciencia de Deus, mas negam
a Sua preordenac;ao absoluta em referencia a salvac;ao de
individuos. Sua doutrina distintiva e que Deus nao escolheu
certas pessoas desde a eternidade, determinando que fossem
sal vas, mas sim escolheu certos caracteres, os que fossem santos,
crentes e obedientes; ou certas classes de pessoas que tivessem
semelhantes caracteres, e.g., crentes que perseverassem ate o
fim.
No entanto, visto que admitem que Deus preve desde a
eternidade com certeza absoluta quais as pessoas que haveriam
de arrepender-se, crer e perseverar na fee na obediencia ate o
fim, segue-se que a sua doutrina e equivalente ao seguinte:
prevendo Deus que certas e determinadas pessoas haveriam
de arrepender-se, crer e perseverar na fee na obediencia ate 0
fim, Ele predestinou desde a eternidade essas pessoas para a
vida e para a salvac;ao, por causa da sua fie perseveranfa assim
previstas. . ....
;

9. Quais os diversos principios em que as teorias acima


mencionadas concordam, e quais aqueles em que diferem?
As teorias da "Eleic;ao N acional" e do "Individualismo
Eclesiastico" ensinam fatos que todos admitem, a saber, que
Deus predestina individuos, comunidades e nac;6es para os
privilegios exteriores do evangelho e para o uso dos meios de
grac;a. Isso nem os arminianos nem os calvinistas negam. Mas
ambas essas teorias sao viciosas e identicas a arminiana em
negarem que Deus predestina absolutamente as ac;6es livres
dos homens e a salvac;ao final de individuos. As tres teorias
admitem que Deus coloca alguns em circunstancias mais
favoraveis do que outros para a salvac;ao, porem, ao mesmo
tempo, sustentam que nao eo decreto de Deus que determina
o destino final de cada homem, e sim, que Deus o deixou
dependente da livre vontade dos pr6prios homens. Todavia,
embora concordem estas tres teorias no principia fundamen-

290
Predestinar;iio
tal, diferem entre si quanta ao modo pelo qual procuram
harmonizar as declara~6es das Escrituras com esse principia.
Diferem entre si quanta aos objetos, aos fins e aos motivos da
elei~ao. Quanta aosobjetos da elei~ao de que falam as Escrituras,
as teorias calvinista, arminiana e do "Individualismo Ecle-
siastico" concordam em dizer que sao indivfduos. A teoria da
"Elei~ao N acional" afirma que os objetos sao na~6es ou
comunidades.
Quanta ao objetivo da elei~ao, as teorias calvinista e
arminiana dizem que e a salva~ao eterna dos individuos eleitos.
As teorias do "Individualismo Eclesiastico" e da "Elei~ao
Nacional" dizem que o objetivo da elei~ao e a admissao ao
uso dos meios de gra~a. Quanta ao motivo da elei~ao de que
falam as Escrituras, os defensores das teorias calvinista, da
"Elei~ao Nacional" e do "lndividualismo Eclesiastico"
concordam em dizer que e a boa vontade soberana de Deus,
enquanto que os arminianos dizem que os eleitos sao tais por
causa da sua fe, seu arrependimento e sua perseveran~a
previstos com certeza em cada caso individual.
Eevidente que a doutrina calvinista dos decretos inclui a
elei~ao absoluta tanto de comunidades e na~6es como de
indivfduos para o uso dos meios de gra~a e para os privilegios
exteriores da lgreja. E evidente tambem que todos os
arminianos tern que admitir ate esse ponto, bern como os
calvinistas, o principia da elei~ao absoluta, e por isso essa
admissao s6 nao discrimina entre os dois grandes sistemas
opostos. A (mica questao realmente em disputa entre os
calvinistas e OS arminianos, quanta a elei~ao, e esta: qual 0
motivo da predestina~ao eterna de certos e determinados
indivfduos para a vida eterna? Sao a fe e o arrependimento
previstos dos pr6prios indivfduos, ou e a boa vontade soberana
de Deus? E for~oso que todo cristao tome lugar de urn ou do
outro lado desta questao. Se disser que o motivo e a sua fe
prevista, sera arminiano, sejam quais forem as doutrinas que
sustentar alem dessa; se disser que o motivo da sua elei~ao foi

291
Capitulo 11
a boa vontade soberana de Deus, sera calvinista.
Esta divisao entre si, e esta concordancia das suas posi~6es
com os calvinistas, alternando com divergencias, sao uma
ilustra~ao muito sugestiva da dificuldade extrema com que os
defensores dos prindpios arminianos tern que lutar em suas
tentativas de acomodar as palavras das Escrituras asua doutrina.
De urn ponto de vista polemico, os calvinistas gozam da
vantagem capital de poderem dividir os seus oponentes e refuta-
-los separadamente. - . ,. ~ . 1 1 r 1

10. Quais os tres pontos envolvidos na doutrina calvinista sabre


este assunto?
Os calvinistas afirmam, como mostramos no capitulo
anterior, que os decretos de Deus sao absolutos e dizem respeito
a toda especie de eventos, sejam quais forem. Sustentam, por
conseguinte, que, embora sejam as na~6es, as comunidades e
os individuos predestinados absolutamente a toda forma de
berne mal que lhes sobrevem, todavia as Escrituras ensinam
tambem e especificamente que ha uma elei<;ao (1) de indivfduos
determinados, (2) para a gra<;a da salvac;ao, (3) nao baseada na
fe prevista das pessoas eleitas, e sim unicamente na boa vontade
soberana de Deus.

11. E passive! demonstrar a presum;iio da veracidade do que


acima foi dito, e que o pressuposto des sa verdade tem par base o jato
de que imparciais intirpretes incredulos e racionalistas admitem que
a letra das Escrituras so pode ser adequadamente interpretada no
sentido calvinista.
Alem do pressuposto que a favor do calvinismo provem
do fato mencionado no fim da resposta a Pergunta 9, de se
verem os interpretes anticalvinistas obrigados a recorrer a todo
tipo de hip6teses diversas para desviar a for<;a 6bvia do
testemunho biblico a favor da predestina~ao absoluta, citamos
ainda o pressuposto adicional que a favor da mesma doutrina
provem do fa to de que os racionalistas e os incredulos em geral,

292
Predestinafiio
que concordam com os arminianos na sua oposic;ao intensa
aos principios calvinistas, mas nao se acham restringidos por
nenhuma fe na inspirac;ao divina da Bfblia, tern, contudo,
bastante franqueza para admitir que esse Livro s6 pode ser
logicamente interpretado no sentido calvinista. Eis, pois, o
testemunho imparcial de inimigos: Wegscheider, em suas
Instituciones Theologice Christiance Dogmaticce, Parte 3, cap. 3, §
145, a maior autoridade que ha quanta aos resultados a que
chegaram os racionalistas alemaes em teologia dogmatica,
declara que as passagens citadas de Paulo ensinam a doutrina
calvinista, porem que esse ap6stolo foi levado ao erro pelas
noc;6es erroneas e imperfeitas do seu seculo, e muito
especialmente pelo espirito acanhado do particularismo
judaico. Veja tam bern Gibbon, Decline and Fall of the Roman
Empire, Cap. 33, Nota 31: "Talvez alguem que raciocine com
mais independencia chegue a rir quando le urn comentario
arminiano da Epistola aos Romanos".

12. Como se pode provar pelas Escrituras que os eleitos sao


individuos, e que a final ida de da sua eleifiio ea vida eterna?
1°. As Escrituras falam deles sempre como individuos, e
da eleic;ao deles falam sempre como tendo por fim a gra~a ou a
gloria- Atos 13:48; Ef. 1:4; 2 Tess. 2:13. 2°. As Escrituras
distinguem explicitamente entre os eleitos e a massa em geral
da Igreja visivel, e, por conseguinte, sua eleic;ao nao podia ser
limitada aos privilegios exteriores da Igreja -Rom. 9:7. 3°.
Dizem as Escrituras que os names dos eleitos estao escritos
"nos ceus" e "no livro da vida" - Heb. 12:23; Fil. 4:3. 4°.
Tambem e dito explicitamente que as benc;aos que essa elei~ao
torna seguras sao dadas pela grafa de Deus, sao salvadoras, sao
os elementos resultantes da salvaqao e dela inseparaveis, e nao
pertencem a naq6es, e sim a individuos, e.g., "a adoqao de
filhos", "para serem conformes aimagem de seu Filho", etc. -
Rom. 3:29; 8:15, 29; 9:15,16; Ef. 1:5; 1 Tess. 5:9; 2 Tess. 2:13.

293
Capitulo 11
13. Como se pode mostrar que essa eleir;iio niio se fundamenta
em obras, quer previstas quer niio?
Isto segue-se- 1°. Da doutrina geral dos decretos, estabe-
lecida no capitulo anterior. Se os decretos de Deus referem-se
a todos os eventos, de qualquer especie que sejam, e os
determinam, segue-se que nao restam mais eventos que
pudessem constituir a condi~ao dos decretos ou de qualquer
elemento neles presente, e segue-se tam bern que Deus decretou
a fee o arrependimento dos eleitos como tambem a salva~ao
da qual sao a condi~ao.
2°. As Escrituras declaram explicitamente que os decretos
nao tern por condi~ao obras de nenhuma especie -Rom. 9:4-
7; 2 Tim. 1:9; Rom. 9:11.

14. Como se pode demonstrar que as Escrituras declaram


habitualmente que a predestinar;iio e fundada na "boa vontade" au
no "beneplacito de Deus" e no "conselho da Sua vontade"?
Citando textos como os seguintes: Ef. 1:5-11; 2 Tim. 1 :9;
Joao 15: 16,19; Mat. 11 :25,26; Rom. 9:10-18.

15. Como se pode expor o argumento derivado da afirmar;iio


de que "a je", "o arrependimento" e "a obediencia evangelica" sao
frutos da eleir;iio?
E auto-evidente que as mesmas a~6es nao podem ser ao
mesmo tempo motivos da elei~ao e frutos dela resultantes.
Ensinando, pois, a Biblia que "a fe", "o arrependimento" e "a
obediencia evangelica" sao frutos, nao podem ser os motivos.
As Escrituras ensinam essa verdade em Ef. 1:4: "Elegeu-nos
nele mesmo antes do estabelecimento do mundo, pelo amor
que nos teve, para sermos santos e imaculados diante de seus
olhos" * -2 Tess. 2: 13; 1 Ped. 1:2; Ef. 2:10.

1
Esta e a versao de Figueiredo; mas nao e fiel, nem segundo o grego,
nem mesmo segundo a Vulgata. A tradw;ao fiel do grego e da Vulgata e:
"Elegeu-nos nele mesmo antes do estabelecimento do mundo, para que>>

294
PredestinafiiO
16. Fafa-se a exposifiiO do mesmo argumento derivado do Jato
de serem a je e o arrependimento chamados dons de Deus.
Sea fee o arrependimento sao "dons de Deus", o fato de
urn homem os possuir e resultante de urn ato de Deus. Se sao
resultantes de urn ato de Deus, sao resultantes do Seu prop6sito
eterno. Se sao resultantes do Seu prop6sito, nao podem ser as
condi~6es de que depende esse prop6sito. As Escrituras
afirmam que a fe e o arrependimento sao "dons de Deus" em
Ef. 2:8; Atos 5:31 e 1 Cor. 4:7.

17. Como expor o argumento derivado daquilo que as Escrituras


ensinam quanta anatureza e aextensiio da depraVafiiO inata e da
incapacidade? .'.:) ii · · ',, ..
0 ensino das Escrituras sobre estes pontos achar-se-a
expos toe estabelecido nos capitulos 19 e 20. Ora, se os homens
nascem com uma natureza cuja tendencia universal e para o
pecado, e se sao sempre, enquanto nao regenerados pelo
Espirito de Deus, total e inalienavelmente avessos a e incapazes
de tudo 0 que e born, segue-se que a natureza humana nao
regenerada nao e capaz, nem de tender para a fe e o arrepen-
dimento como condi~6es da elei~ao, nem de aperfei~oar estes
dons. Se, pois, a elei~ao tern por condi~6es a fe e o arrepen-
dimento, e necessario que 0 homem OS produza OU ajude a
produzi-los em si. Contudo, sea natureza humana nao pode
nem produzi-los nem ajudar a produzi-los, segue-se, ou que
ninguem pode ser eleito, ou que a fee o arrependimento niio
podem ser as condi~6es da elei~ao.
, } . •• t - • ' ·, ;,: .' • ~

18. Como expor o mesmo argumento pelo que as Escrituras


ensinam sabre a natureza e a necessidade que o homem tem da
regenerafiiO?

< <f6ssemos santos e imaculados diante dele no amor". 0 texto da Vulgata


e:"Elegit nos in ipso ante mundi constitutionem, ut essemus sancti et
immaculati in conspectu ejus in charitate". Nota do tradutor.

295
Capitulo 11
No capitulo 24 sera provado que as Escrituras ensinam:
(1) que a regenera<;:ao e ato de Deus; (2) que, com respeito ao
referido ato, a alma e passiva; (3) que ela e absolutamente
necessaria no caso de todos os homens vivos. Disso segue-se
que, sea regenera<;:ao em nenhum senti doe obra realizada pelo
homem, e sim, em todos os sentidos, e obra realizada
unicamente por Deus, nao pode sera condi<;:ao de que dependa
o prop6sito de Deus, mas e uma obra determinada por esse
prop6sito.

19. Como se prova pelas Escrituras que todos os eleitos, e


SO MENTE os eleitos, creem?
Todos OS eleitos creem- Joao 10:16, 27-29; 6:37-39;
17:2,9,24. Somente OS eleitos creem - Joao 10:26. E OS que
creem o fazem porque sao eleitos- Atos 13:48 e 2:47.

20. Qual o argumento derivado do Jato de que todos os cristiios


evangelicos, seja qual for sua escola teol6gica, em suas orar;oes e em
seus hinos exprimem sempre os sentimentos pr6prios da doutrina
calvinista da eleifiiO incondicional?
S6 pode ser falsa aquela forma de doutrina que nao pode
ser incorporada 16gica e conseqiientemente na experiencia
pessoal e no culto divino. E s6 pode ser verdadeira aquela forma
de doutrina que todos os cristaos, de todas as opini6es te6ricas,
se acham sempre impelidos a exprimir na sua comunhao com
Deus. Ora, todos os salmos, hinos e ora<;:6es, quer escritos quer
espontfmeos, de todos os cristaos evangelicos, incorporam os
principios e respiram o espfrito do calvinismo. Todos em suas
ora<;:6es pedem a Deus que fa<;:a os homens arrepender-se e crer,
chegar-se ao Salvadore aceita-10. Mas, se Deus da a todos os
homens gra<;:a comum e suficiente, e se a razao pela qual urn
homem arrepende-se e outro nao, e que urn faz born uso dessa
gra<;:a e outro nao, e sea unica diferen<;:a esta nos homens, segue-
-se que devemos pedir aos homens que se convertam a si
mesmos, isto e, que se fa<;:am diferen<;:ar a si mesmos. Mas todos

296
PredestinafiiO
concordam em pedir a Deus que os salve, e em render-Lhe
grac;as quando o faz.
•:.

21. Como se pode mostrar, pela natureza das objefoes feitas


contra a doutrina de Paulo, e pelas respostas que lhes deu, que a
posifiio sustentada par esse ap6stolo, a respeito da eleifiiO, ea mesma
que a nossa?
A doutrina de Paulo e identica a calvinista, 1°. porque a
ensina distintamente; 2°. porque as objec;6es notadas por ele,
feitas contra a sua doutrina, sao as mesmas que se fazem con-
tra a nossa (Rom. 9:6-24). 0 fim que o apostolo tinha em vista
em toda esta passagem era provar o soberano direito que Deus
tinha de rejeitar os judeus como Seu povo peculiar e de chamar
pelo evangelho todos os homens indistintamente.
Ele argumenta: 1°. que as antigas promessas de Deus nao
diziam respeito aos descendentes naturais de Abraao, como
tais, e sima sua posteridade espiritual; 2°. que Deus esoberano
absoluto na distribuic;ao dos Seus favores.
Mas contra esta doutrina da soberania divina o apostolo
exp6e duas objec;6es, e da-lhes resposta.
1a. Deus seria injusto se, so da Sua boa vontade, mani-
festasse a Sua misericordia a alguns e rejeitasse outros (versiculo
14). Esta mesma objec;ao e feita hoje contra a nossa doutrina.
"Ela representa o Deus santissimo como pior do que o diabo,
mais falso, mais cruel e mais injusto."- Methodist Doctrinal
Tracts, pags. 170,171. A isso Paulo responde mediante dois
argumentos: (1) Deus reclama para Si esse direito: "Terei
misericordia de quem eu tiver misericordia"- Rom. 9:15,16.
(2) Deus, em Sua providencia, exerce esse direito, como no
caso de Farao (versiculos 17,18).
2a. A segunda objec;ao e que esta doutrina eincompativel
com a liberdade e a responsabilidade dos homens. Essa objec;ao
e na verdade absurda contra a doutrina de Paulo, mas e feita
todos os dias pelos arminianos contra a nossa doutrina.
Paulo, respondendo a essa objec;ao, nao condescende em

297
Capitulo 11
apelar para a razao humana, e sim, afirma simplesmente (1) a
soberania de Deus como Criador, e a dependencia do homem
como criatura, e (2) o fa to de estarem todos os homens expostos
com toda a justi~a a ira, por serem pecadores (versiculos 20-
24). Veja a analise de Rom. 9:6-24 no Commentary on Romans,
por Hodge.

22. Como se pode discriminar acuradamente as dais elementos


envolvidos na doutrina da reprovm;iio?
Reprova~ao e o aspecto que o decreto eterno de Deus
apresenta relativamente aquela parte da ra~a humana que sera
finalmente condenada por causa dos seus pecados.
A doutrina e, 1°. negativa, porque consiste em passar por
alto essa parte e em deixar de elege-la para a vida eterna; e 2°.
positiva, porque OS homens envolvidos sao condenados a
miseria eterna.
Quanto ao seu elemento negativo, a reprova~ao e simples-
mente soberana, porque aqueles que o decreto passa por alto
nao sao piores do que OS eleitos, e 0 motivo simples pelo qual
alguns sao eleitos e outros passados por alto e a boa vontade
soberana de Deus.
Quanto ao seu elemento positivo, a reprova~ao e soberana,
mas simplesmente judicial, porque Deus, em todo e qualquer
caso, inflige miseria somente como a justa puni~ao do pecado.
"0 resto dos homens aprouve a Deus nao contemplar e ordena-
-los para a desonra e ira por causa de seus pecados"- Conf de
Fe, Cap. 3, Se~ao 7.
23. Como se pode demonstrar que as referidas posifoes acham-
-se envolvidos necessariamente na doutrina geral dos decretos e na
doutrina especifica da eleifiiO de alguns para a vida eterna?
Como ja dissemos acima, a doutrina da reprova~ao e auto-
-evidentemente elemento insepanivel da doutrina dos decretos
e da eleic;ao. Se Deus elege incondicionalmente a quem Lhe
apraz, e evidente que tambem deixa entregues a si mesmos

298
Predestinafiio
incondicionalmente os que Lhe apraz. Ele tern que preordenar
os que nao creem como tambem os que creem, embora estes
eventos sejam resultantes de causas bern diversas.

24. Como se prova que isso eensinado nas Escrituras?


Pela cita<;ao de textos como os seguintes: Rom. 9:18,21;
1 Ped. 2:8; Jud. vers. 4; Apoc. 13:8. Notem estas palavras do
Senhor I esus Cristo: "Gra<;as te dou, o Pai, Senhor do ceu e da
terra, porque ocultaste estas coisas aos sabios e entendidos, e
as revelaste aos pequeninos. Sim, o Pai, porque assim te
aprouve" - Mat. 11: 15,26; "V os nao ere des porque nao so is
das minhas ovelhas"- Joao 10:26. · ·· '>. · . '•;c!., ·

25. Como demonstrar que contra a doutrina de Paulo se fez a


mesma objefiio que se faz contra a nossa?
Citando Romanos 9:19. "De que se queixa ele ainda?" Se
Ele nao deu capacidade para obedecer, como pode man dar?
Veja tambem Methodist Doctrinal Tracts, pag. 171.
0 apostolo responde mostrando, 1°. que Deus nao tern
obriga<;ao alguma de manifestar misericordia para com todos,
e nem mesmo para com alguns- versiculos 20,21; e, 2°., que
"os vasos da ira" foram condenados por seus proprios pecados,
a fim de manifestar-se neles a justa ira de Deus, enquanto que
"os vasos de misericordia" foram escolhidos, nao por haver
neles qualquer coisa que fosse boa, e sim unicamente para
manifestar-se neles a Sua gra<;a gloriosa- versiculos 22,23.

26. Como se demonstra a identidade da doutrina de Paulo com


a nossa pelas ilustrafi5es de que ele se serve no capitulo nove da
Epistola aos Romanos?
"Nao tern o oleiro poder (exousia) sobre o barro, para da
mesma massa fazer urn vaso para honra e outro para desonra?
- versiculo 21. Aqui a for<;a inteira da ilustra<;ao esta no fato de
nao havernenhuma diferen<;a na massa, no barro; a massatoda
e barro, e a {mica causa da diferen<;a dos vasos e a vontade do

299
Capitulo 11
oleiro. No caso de Jac6 e Esau (9-13), o ponto ilustrado e que
urn dos filhos era tao born como o outro, que nao havia neles
diferen<;a alguma, e que a diferen<;a posterior entre eles era
devida ao "decreta de Deus segundo a elei<;ao" - "Porque, niio
tendo eles ainda nascido, nern tendo feito bern au mal (para que o
prop6sito de Deus, segundo a eleifiio, ficasse firrne, niio par causa
das obras, mas par aquele que chama ... - versiculo 11, ARC.

27. Ern que sentido se diz que Deus endurece as hornens?


Veja Romanos 9:18 e Joao 12:40.
Este e, sem duvida, urn ato judicial no qual Deus, em
justo castigo dos pecados dos homens maus, nao eleitos para a
vida, retira deles todas as influencias da Sua gra<;a, e os deixa
entregues as tendencias desenfreadas de seus cora<;6es e as
influencias nao contrariadas do mundo e do diabo .
. I"''· .,

28. Qual a objefiiO feita contra a doutrina calvinista sob o


fundarnento de que eincornpativel corn a justifa?
Ha os que afirmam que se Deus, por urn decreta soberano
e absoluto, passa por alto alguns homens e nao lhes concede a
gra<;a necessaria para habilita-los a arrepender-se e a crer em
Cristo, seria injusto da parte de Deus torna-los responsaveis e
puni-los por sua falta de fe.

29. Garno expor a ideia fundamental ern que repousa


necessariarnente todo o arrninianisrno a respeito da relafiio que a
obra rernediadora (terapeutica) de Cristo sustenta para corn a justifa
de Deus, e a respeito da relafiio que a rafa hurnana sustenta para
com o governo divino?
Quando se analisa o sistema arminiano penetrando ate os
seus principios fundamentais, acha-se que o referido sistema
repousa sobre o postulado de que o dom de Cristo foi dado aos
homens como compensac.;ao necessaria pelos males que sobre
eles trouxe o pecado de Adao. Os arminianos admitem que
esse pecado foi a causa que tornou pecadora a ra<;a inteira, e

300
Predestinar;iio

que todos os descendentes de Adao nascem com uma natu-


reza tao depravada que sao moralmente incapazes de amar a
Deus, e se disp6em naturalmente para o mal. Sustentam,
porem, que os homens a princfpio nao sao responsaveis por
sua condis,:ao moral, porque nascem nessa condis,:ao anterior a
toda as,:ao pessoal. Por isso afirmam que o homem nao pode
ser punido pelo pecado original, nem poderia homem algum
ser responsabilizado por qualquer ato de desobediencia que
fosse resultado inevitavel dessa depravas,:ao original, se Deus
nao houvesse por Cristo provido urn remedio, dando a todos
os homens capacidade, recebida pela gras,:a, para fazer tudo
quanto deles exige como condis,:ao da sua salvas,:ao. Essa
redens,:ao e essa capacidade recebida pela gras,:a para crerem e
obedecerem, Deus deve a todos os homens, e sao necess:irias
para que eles se tornem responsaveis e puniveis por seus
pecados, vis to que s6 assim os hom ens, no que se refere a esses
atos de crer, arrepender-se e obedecer, ficam habilitados para
escolher o contrario. · ·'
Diz o Dr. D.D.Whedon: "Somente quando se concede ao
homem redentoramente o que chamamos uma capacidade
dada pela gras,:a para fazer 0 bern, e que ele pode restritamente
ser responsavel por fazer o mal". Diz ele ainda que, depois de
Adao pecar, Deus tinha a escolha entre somente duas
alternativas compativeis com a justis,:a: 1a. Enviar aperdis,:ao
Adao e Eva antes de terem filhos; ou, 2a. Permitir que propa-
gassem a ra~a sob as incapacidades resultantes do pecado e
prover urn sistema redentor para todos.
Essa corrente distingue entre a culpae a responsabilidade
moral pelo carater e pela corrup~ao moral da natureza. Ensina
que somente Adao e Eva foram culpados, e por isso respon-
saveis, como tambem corruptos, porque, tendo sido criados
moralmente livres, corromperam-se voluntariamente por seu
proprio ato. Seus descendentes, porem, estao todos poluidos
moralmente e mortos espiritualmente, porque herdaram de
Adao uma natureza corrompida; mas nao sao culpados nem

301
Capitulo 11
responsaveis pelo pecado original, nern por nenhurna de suas
conseqiiencias, porque o seu estado foi deterrninado inevita-
velrnente por urn ato que nao era seu. No estado atual das coisas,
ern conseqiiencia do dorn de Cristo, todos os hornens sao
responsaveis, porque todos tern a gra<;;:a suficiente.
Desta doutrina segue-se: 1°. Que a obra de reden<;;:ao nao
foi urna obra da gra<;;:a infinita, e sirn urn simples ato de
justi~a ern cornpensa<;;:ao pelos males que Adao trouxe sobre
a nossa natureza. 2°. Que is so e devido a todos os hom ens,
sern nenhurna exce~ao. "Rejeito", diz Joao Wesley (Doctrinal
Tracts, pags. 25,26), "a asser<;;:ao de que Deus corn justi<;;:a me
podia ter passado por alto, a rnirn e a todos os hornens, como
asser<;;:ao atrevida e prediria, que nao e sustentada pelas
Escrituras Sagradas." 3°. Segue-se rnais, que o auxilio do
Espirito Santo, por Sua gra<;;:a, e tao necessario para tornar OS
homens "pecadores responsaveis" como 0 e para traze-los a
salva<;;:ao. 4°. Segue-se ainda que ea gra<;;:a que envia OS homens
para 0 inferno, assirn como OS leva para 0 CCU, e que a ela e
devida a condena<;;:ao de maior numero de almas do que ode
almas que por ela foram salvas.

30. Como demonstrar que a posifiio dos arminianos a este respeito


eabsolutamente incompativel com aquila que as Escrituras e a lgreja
Crista inteira ensinam sabre a natureza e a necessidade da
SA TISFA<;Ao dada ajustifa divina par Cristo?
No capitulo 25 sera demonstrado que as Escrituras e a
Igreja inteira ensinam que para a salva<;;:ao do homem era
absolutamente necessaria dar-se plena satisfa~ao ao inalienavel
principia de justi<;;:a essencial anatureza divina, de modo que,
se nao fosse satisfeita a justi<;;:a de Deus, Ele nao poderia
manifestar Sua gra<;;:a a homem algum. Mas isso seria absurdo
se os homens nao fossem antecedentemente responsaveis pelos
pecados pelos quais era necessario que dessern satisfa<;;:ao. Qual
o sentido de uma "capacidade dada pela grafa e concedida
redentoramente" a respeito de pessoas que nada perderarn porque

302
PredestinafiiO
nao sao responsaveis por nada? Nao seria uma impertinencia
falar, no caso delas, em "reden~ao" e em "gra~a"?
·. ·;;.

31. Como se prova pelas Escrituras que a salvafiio vem da


grafa?
Gra~a e favor livre, nao merecido, isto e, concedido a quem
nao o merece. Se a reden~ao e algo que todos os homens
merecem receber, ou se e uma compensa~ao necessaria para
que sejam responsaveis, entao o dom de Cristo nao pode ser
uma manifesta~ao suprema do livre favor e am or de Deus. Pode
ser somente uma manifesta~ao da Sua retidao.
Mas as Escrituras declaram que o dom de Cristo e uma
manifesta~ao sem igual do livre amor de Deus, e que a salva~ao
nos vern da gra~a de Deus- Lam. 3:22; Joao 3: 16; Rom. 3:24;
11:5,6; 1 Cor. 4:7; 15:10; Ef. 1:5,6; 2:4-10, etc. E todo cristao
verdadeiro reconhece como elemento inseparavel da sua
experiencia que a salva~ao e toda da gra~a de Deus. Esta e
tam bern a explica<;ao das doxologias do ceu- 1 Cor. 6: 19,20; 1
Ped. 1: 18,19; Apoc. 5:8-14.
Se, porem, a salva~ao vern s6 da gra~a de Deus, eevidente-
mente compativel com a Sua justi~a que Ele salve todos,
muitos, uns poucos, ou nenhum, como Lhe apraz.

32. Como se prova que eabsurda e anticristii a objefiio segundo


a qual a eleifiiO incondicional eincompativel com a justifa de Deus?
A justi~a considera necessariamente todos os homens como
igualmente sem nenhum direito ao favor de Deus. E injusto
justificar os injustos. Seria incompativel com a retidao que
urn hom em pecador exigisse ou que Deus concedesse a salva~ao
a qualquer pessoa como algo que lhe edevido. De outro modo
negar-se-ia a senten<;a condenat6ria da consciencia e a cruz de
Cristo ficaria sem nenhum efeito. Se tomarmos, pois, como
fundamento a propria justi<;:a, chegaremos aconclusao de que
a salva<;:ao s6 pode vir da gra<;:a divina, e que depende unica-
mente da vontade soberana de Deus se hade ser aplicada a

303
Capitulo 11
muitos, a poucos ou a ninguem. Ou a salva~ao de nenhum
individuo e compativel com a justi~a ou o sacrificio de Cristo
foi o pagamento de uma divida, e nao uma gra~a. E a salva<;ao
de urn pecador que nao a merece, evidentemente nao pode
tornar-se motivo pelo qual outro pecador igualmente culpado
possa exigi-la como urn direito seu.

33. Como expor e refutar a obje<;iio de que a nossa doutrina e


incompativel com a retidao de Deus como GOVERNADOR
IMPARCIAL?
Muitas vezes os arminianos dizem que a razao nos ensina
a esperar que o Criador e Governador onipotente· de todos os
homens seja imparcial no modo por que trata os individuos -
que conceda a todos as mesmas vantagens essenciais e as
mesmas condi<;6es de salva<;ao. Dizem tambem que esta justa
pressuposi<;ao da razao se acha confirmada nas Escrituras, as
quais declaram que "Deus nao faz acep<;ao (ou exce<;ao, como
em 2 Cr6n.l9:7 Figueiredo, presumivelmente em edi<;ao
antiga) de pessoas" -Atos 10:34; 1 Ped. 1:17. Na primeira destas
passsagens o ap6stolo fala simplesmente da aplica<;ao do
evangelho aos gentios bern como aos judeus; e na segunda
afirma-se que Deus, no Seu julgamento das obras humanas, e
absolutamente imparcial. Na elei<;ao, porem, a questao versa
sobre a gra<;a, e nao sobre o juizo feito a respeito de obras, e as
Escrituras em parte alguma dizem que Deus e imparcial na
comunica<;ao da Sua gra<;a. , ....
Alem disso, devemos sempre interpretar as pressuposi<;6es
da razao e OS textos das Escrituras aluz dos fatos palpaveis da
hist6ria humana e das dispensa<;6es diarias da providencia de
Deus. Se e injusto em principia que Deus seja parcial na Sua
distribui<;ao de bens espirituais, nao pode ser menos injusto
que seja parcial na Sua distribui<;ao de bens temporais. Como
materia de fato, Ele faz as maiores distin~6es possiveis entre
os homens, desde o seu nascimento e independentemente dos
seus merecimentos, na distribui<;ao, nao so de bens temporais,

304
Predestinar;iio

mas tam bern dos meios essenciais asalva'Sao. Urna crian'Sa nasce
para a saude, para honras e riquezas, para a posse de urn cora'.;aO
e de uma consciencia suscetiveis, e para todos os melhores meios
de gra'.;a, como sua heran'.;a segura e certa. Muitas outras nascem
para molestias, para a vergonha, a pobreza, a posse de urn
cora'.;aO duro e de uma consciencia obtusa, e para as trevas
absolutas do paganismo e da ignorancia a respeito de Cristo.
Se Deus nao pode ser parcial para com individuos, por que e
que o pode ser para com na<;_:6es, e como se pode explicar o Seu
proceder para com as na($6es pagas e para com as crian'.;aS das
classes criminosas de paises nominalmente cristaos?
0 arcebispo Whately dirige a seguinte admoesta'.;aO
excelente a seus amigos arminianos: "Sugiro cautela no uso
que se fizer de uma serie de obje($6es tiradas dos atributos
marais de Deus, feitas freqiientemente contra os calvinistas.
Devemos acautelar-nos muito para nao empregarmos armas
que podem virar-se contra n6s. Euma verdade terrivel, porem
inegavel, que grandes multid6es, mesmo nos paises evangeli-
zados, nascem e sao criadas em circunstancias que nao somente
tornam improvavel, mas ate impassive!, que obtenham
qualquer conhecimento de verdades religiosas, ou adquiram
o habito de comportamento moral, e sao ate criadas, desde
crian($as, em erros supersticiosos e na pior deprava'Sao. Por que
e que isso epermitido, nem OS calvinistas nem OS arminianos
podem explicar; realmente, por que e que o Todo-poderoso
nao faz morrer no ber'.;O toda crian'.;a cuja malvadez e miseria,
se viver, Ele preve, e coisa que nenhum sistema de religiao,
quer natural quer revelado, nos habilita a explicar de modo
satisfat6rio" - Essays on some of the Difficulties of St. Paul,
Ensaio 3°, sabre a elei<:;ao.

34. Como refutar a objer;iio tirada de textos como 1Tim6teo


2:4?
Eis os seus termos: "0 qual deseja (quer) que todos os
homens sejam salvos, e cheguem ao plena conhecimento

305
Capitulo 11
da verdade". _ ··"'> <'- -
A palavra querer tern dois sentidos- (a)desejar; (b )propor-
-se, ter a intenfiiO de, determinar-se a. Em contextos como o da
passagem acima e evidente que 0 sentido nao pode ser que
Deus tern a inten<;:ao de salvar ou que Ele Se determinou a
salvar a todos, porque (a) nem todos sao salvos, e nenhuma
das inten<;:6es ou prop6sitos de Deus pode falhar (b) porque a
afirma<;:ao e que Elequer que todos "venham ao conhecimento
da verdade" no mesmo sentido em que "quer que todos sejam
salvos" - e, apesar disso, deixa que a imensa maioria dos
homens nas<;:a, viva e morra nas trevas do paganismo, indepen-
dentemente da Sua participa<;:ao ativa no caso deles.·
Passagens como essa declaram simplesmente a bene-
valencia essencial de Deus. Ele nao tern prazer na morte dos
impios, e tern muito prazer na salva<;:ao dos homens. E, ao
mesmo tempo, e em perfeita consonancia com a Sua
benevolencia, por motivos suficientes mas que nao nos sao
revelados, nao proveu reden<;:ao para os anjos caidos, nem gra<;:a
eficaz para OS nao eleitos entre OS homens. As passagens dessa
natureza afirmam simplesmente que, se nao fossem aqueles
motivos, seria do agrado da Sua natureza benevola que todos
os homens fossem salvos.

35. Como provar que a nos sa doutrina niio injlui no animo dos
pecadores, tirando-lhes o incentivo para fazerem usa de meios?
Objeta-se que, se Deus determinou desde toda a eternidade
que urn homem seja convertido e seja salvo e que outro seja
deixado a perecer em seus pecados, nao ha mais lugar para o
uso de meios. Assim e que Joao Wesley, na obra Methodist
Doctrinal Tracts, representa falsamente a doutrina de Toplady,
dizendo: "Ha, suponhamos, vinte homens, dos quais dez
foram preordenados para que sejam salvos, fa<;am o que
fizerem, e os outros dez foram preordenados para serem
condenados, fa<;:am o que fizerem". Is so e, porem, uma
caricatura da doutrina, tao absurda quanto perversa.

306
Predestinafiio
CONSIDEREMOS:
1°. 0 decreto da elei~ao nao assegura a salva~ao sem a fee
a santidade, e sim, a salva~aomediante a fee a santidade, sendo
decretados tanto os meios como o fim. Os calvinistas creem
tao firmemente como os arminianos que todo o que praticar o
mal sera condenado, independentemente da consideras;ao see
eleito ou nao.
2°. A doutrina da eleis;ao nao ensina que Deus constrange
os homens de urn modo incompativel com a sua liberdade. Os
nao eleitos Ele simplesmente deixa fazer o que for de
conformidade com os impulsos dos seus pr6prios coras;6es
maus. Os eleitos Ele, no dia do Seu poder, faz com que 0
queiram. Opera neles tanto o querer como o efetuar, segundo a
Sua boa vontade. (Fil. 2: 13). E certo e que Deusfazer que urn
homem queira nao o to1he de sua liberdade!
3°. 0 decreto da eleis,:ao s6 torna certos o arrependimento
e a fe dos eleitos. Todavia, a certeza antecedente de urn ato
livre nao e incompativel com a sua liberdade, de outro modo
seria impossivel a presciencia de urn ato livre. 0 decreto da
eleis,:ao nao produz a fe, e de modo algum tolhe a as,:ao do agente,
e tampouco o exime da pratica de obras.

36. Ate onde podemos estar convencidos de que somas eleitos, e


em que se baseia essa convicfiio?
E-nos possivel alcan~ar nesta vida uma convic~ao
inabalavel e certa da nossa eleis,:ao, porque aos que Deus
predestina a estes tambem chama; e aos que chama, a estes
tambem justifica; e sabemos que aos que justifica, a estes
tambem santifica. Assim, pois, os frutos do Espirito com-
provam a santificas,:ao, esta comprova a vocas,:ao eficaz, e esta
comprova a eleis,:ao. Veja 2 Ped. 1:5-10 e 1 Joao 2:3.
A1em dessas provas fornecidas por nosso estado de gras,:a e
por nossos atos, temos ainda o Espirito de ados,:ao, que da
testemunho como nosso espirito enos sela- Rom. 8:16,17;
Ef. 4:30.

307
Capitulo II
Em confirmac;ao disso temos o exemplo de Paulo (2 Tim.
1: 12) eo de muitos cristaos.

37. Como se pode demonstrar que esta doutrina ecompativel


com a benevolencia de Deus?
A unica dificuldade a este respeito esta em conciliar a
benevolencia geral de Deus com o fato de que Ele, sendo
infinitamente born e poderoso, tenha admitido urn sistema
que envolve o pecado, a impenitencia final e a conseqiiente
condenac;ao de certos hom ens. Entretanto a mesma dificuldade
aperta tambem o sistema arminiano.
Os fatos provam que nao e incompativel corn a bene-
valencia geral de Deus permitir que alguns sejam condenados
por causa dos seus pecados. Isso e tudo quanto quer dizer
reprovac;ao. A eleic;ao gratuita, ou a escolha positiva de alguns
para a vida eterna, nao descansa na benevolencia geral de Deus,
e sim no am or especial que Ele dedica aos Seus - Joao 17:6,23;
Rom. 9:11-13; 1 Tess. 5:9.

38. Como se pode demonstrar que esta doutrina ecompativel


com a oferta geral do evangelho?
No evangelho, Deus oferece sinceramente a todos os que
o ouvem, sem nenhuma excec;ao, uma salvac;ao suficiente para
todos e exatamente adaptada a todos, e apresenta todos os
motivos para o dever, para a esperanc;a, para o temor, etc., que
deveriam induzir todos a aceita-la, e pro mete solenemente que
todo aquele que vier a Ele, seja quem for, de modo nenhum
sera lanc;ado fora . .E, pois, so e unicamente a pecaminosa falta
de vontade que impede qualquer pessoa que ouve o evangelho
de recebe-lo e goza-lo.
0 evangelho e para todos; a eleic;ao e uma grac;a especial
acrescentada aquela oferta. Os nao eleitos poderiam vir e ser
salvos, se quisessem. Os eleitos vern. Mas o decreto da eleic;ao
nao p6e nenhum obstaculo no caminho de ninguem, impe-
dindo-o de aceitar as ofertas feitas no evangelho. Qualquer

308
Predestinaftio
pessoa, seja eleita ou nao, sera salva se aceitar essas ofertas. Os
nao eleitos Deus simplesmente deixa fazer aquilo que seus
pr6prios cora<;:6es lhes determina que fa<;:am.
Nao e menor a transparente dificuldade que se encontra
na tentativa de conciliar a presciencia certa de Deus da
impenitencia final da grande maioria daqueles a quem Ele
oferece o Seu amor e por toda forma de argumentos procura
persuadir a aceita-10, como fa to de Lho oferecer; especialmente
a vista da considera<;:ao de que Ele preve que os Seus ofere-
cimentos aumentam muito e com toda a certeza a culpae a
miseria final dos que os rejeitam. . •i'~,-~,,·,;;'J!I'.'';

39. Como se pode conciliar a doutrina da reprovaftiO com a


santidade de Deus?
A reprova<;:ao deixa os nao eleitos nos seus pecados, e assim
resulta no aumento do pecado durante toda a eternidade. Como,
pois, pode Deus, de urn modo compatfvel com a Sua santidade,
formar urn prop6sito cujo efeito e inten<;:ao e deixar esses nao
eleitos no pecado e, assim, deixar que o seu pecado aumente
inevitavelmente?
Mas os arminianos, como tambem os calvinistas, reco-
nhecem que Deus criou a ra<;:a humana apesar de prever com
toda a certeza que daria assim ocasiao a muito pecado, e criou
tam bern certos individuos, apesar da Sua presciencia certa de
que esses mesmos indivfduos continuariam a pecar eter-
namente. A verdadeira dificuldade esta no problema
humanamente insoluvel da permissao do mal. Por que e que
Deus, sendo infinitamente sabio, reto, misericordioso e
poderoso, permite que exista o pecado no Seu universo? Os
arminianos nao podem responder a esta pergunta melhor do
que os calvinistas.

40. Qual a legitima influencia pn:itica desta doutrina sabre a


experiencia e a conduta cristas?
Devemos lembrar, 1o. Que esta verdade nao e incompativel

309
Capitulo 11
com este sistema baseado na gra~a de Deus, e sim, faz parte
integrante dele. Fazem parte deste sistema os prindpios
igualmente certos da liberdade e da responsabilidade moral
dos homens, e as ofertas livres do evangelho feitas a todos.
2°. Que a nos sa (mica regra de clever e a que se comp6e
dos mandamentos, das amea~as e das promessas de Deus
expressos claramente nas Escrituras, e nao o decreta da elei~ao,
o qual Ele nunca revela, exceto nos seus elementos conse-
qi.ientes de voca~ao eficaz, fee vida santa.
Quando e sustentada nesses termos, a doutrina da
predestina~ao ...
1°. Exalta a majestade e a soberania absoluta de Deus e, ao
mesmo tempo, ilustra as riquezas da Sua gra~a e o Seu justo
desprazer pelo pecado.
2°. Imp rime em n6s com mais for~a a verdade essencial
de que a salva~ao e inteiramente obra da gra~a de Deus,
e que ninguem pode queixar-se se for passado por alto, nem
jactar-se se for salvo. ~'-· ·. ,'i .- ·
3°. Leva ao inquiridor a desesperar absolutamente de si e
a aceitar cordialmente a oferta livre de Cristo.
4°. No caso do crente que tern o testemunho em si, esta
doutrina o torna mais humilde e, ao mesmo tempo, aumenta a
sua confian~a, chegando aesperan~a certa e segura.

41. Como se pode expor a verdadeira natureza da questiio


discutida pelos te6logos a respeito da ORDEM DOS DECRETOS
DIVINOS?
Des de que cremos que o decreta de Deus euma s6 inten~ao
eterna, nao pode haver ordem de sucessao nos Seus prop6sitos,
nem (a) no tempo, como se urn prop6sito realmente precedesse
a outro, nem (b) na delibera<;;ao distinta, ou op~ao, da parte de
Deus. 0 todo e urn s6 prop6sito. Mas, determinando a
existencia do sistema inteiro, Deus compreendeu naturalmente
todas as partes do sistema, determinadas por Ele em suas
diversas sucess6es e rela<;;6es. E como urn homem que por urn

310
Predestinafiio
s6 ato da sua inteligencia reconhece uma maquina complicada
que lhe e familiar, e no mesmo ato distingue acuradamente
suas diversas partes e compreende a sua unidade, as suas
rela<;6es no sistema, e a inten<;ao do todo. Por isso, a questao
quanto a ordem dos decretos niio e questao quanto a ordem
dos atos de Deus ao decretar, e sim, e questao quanto a
verdadeira rela<;ao que sustentam entre si as diversas partes do
sistema decretado. Isto e, que rela<;ao estabeleceu o unico
prop6sito eterno de Deus entre cria<;ao, predestina~ao e
reden<;ao? Que ensinam as Escrituras a respeito do prop6sito
de Deus no sentido de dar Seu Filho, e a respeito do fim e
motivo da elei<;ao? Do motivo e fim da elei<;ao ja tratamos por
extenso acima. Do designio que Deus tinha em vista ao dar-
-nos Cristo, trataremos na divisao 4 do capitulo 25.

42. Qual e a teoria arminiana quanta a ordem dos decretos


que se referem arafa humana?
1°. 0 decreto de criar o homem. 2°. Sendo o homem fall vel,
por ser urn agente moral e ter a sua vontade essencialmente
contingente, e sendo por isso impossivel prevenir ou impedir
o seu pecado, Deus, prevendo que o homem cairia com certeza
na condena<;ao e na corrup<;ao do pecado, decretou preparar
uma salva<;ao gratuita para todos os homens, mediante Cristo,
e preparar meios suficientes para aplicar eficazrnente essa
salva<;ao asitua<;ao de todos. 3°. Decretou absolutamente que
fossern salvos todos os que cressem ern Cristo, e que fossem
reprovados por seus pecados todos os que nao cressem. 4°.
Prevendo que certos indivfduos haveriam de arrepender-se e
crer, e que outros haveriam de continuar impenitentes ate ao
fim, Deus elegeu desde toda a eternidade para a vida eterna
aqueles cuja fe previa, sob a condi<;ao da sua fe, e reprovou
aqueles que previa que continuariarn impenitentes, sob a
condi<;ao dessa impenitencia.
,_
43. Que ideias a esse respeito ensinaram os te6logos protestantes

311
Capitulo 11
franceses Cameron, Amyrant e outros?
Estes professores teologicos em Saumur, durante o
segundo quarto do seculo 17, ensinaram que Deus decretou-
1°. Criar o homem. 2°. Permitir que ele caisse. 3°. Preparar, na
medias;ao de Cristo, salvas;ao para todos. 4°. Mas, prevendo
que, se os homens fossem deixados a si mesmos, nenhum deles
se arrependeria nem creria, por isso elegeu soberanamente
alguns, aos quais decretou conceder as gras;as necessarias do
arrependimento e da fe.

44. Que ea teoria infralapsariana da predestinafiiO?


A teoria infralapsariana (infra-lapsum) da predestinas;ao,
ou o decreto da predestinas;ao considerado como subseqiiente,
no proposito divino, ao decreto que permitiu a queda do
homem, representa este como objeto da eleis;ao depois de
criado e decaido. A ordem dos decretos e entao a seguinte: 1°.
0 decreto de criar o homem. 2°. 0 de permitir que caisse. 3°.
0 de eleger certos homens dentre a ras;a inteira decaida e com
justis;a condenada, para a vida eterna, e de passar por alto os
outros, deixando-os entregues as justas conseqiiencias dos seus
pecados. 4°. 0 decreto de preparar a salvas;ao para os eleitos.
ESTA E A TEORIA COMUM As IGREJAS REFORMADAS,
CONFIRMADA PELO SINODO DE DORT E PELA ASSEMBLEIA
DE WESTMINSTER.

45. Que ea teoria suprafapsariana da predestinafiiO?


Chama-se supralapsariana (supra lapsum) a teoria das
diversas provisoes do decreto divino nas suas relas;6es logicas,
que sup6e que o supremo fim que Deus Se propos na salvas;ao
de uns e na condenas;ao de outros, foi a Sua propria gloria, e
que, como meio para alcans;ar esse fim, decretou criar o hom em
e permitir que caisse. Segundo esta teoria, o objeto da eleis;ao
e da reprovas;ao e so o homem capaz de ser criado e de cair, e
nao o homem criado e decaido. A ordem dos decretos seria
en tao esta: 1°. Dentre todos os homens possiveis Deus primeiro
Predestinafao
decretou a salva~ao de uns e a condena~ao de outros, a fim de
promover assim a Sua propria gloria. 2°. Para alcan<;:ar esse
fim, decretou criar os que ja havia escolhido ou reprovado. 3°.
Decretou permitir que caissem. 4°. Decretou preparar a
salva<;:ao para os eleitos. Esta foi a teoria de Beza, sucessor de
Calvino em Genebra, e de Gomaro, o grande oponente de
Arminio.

46. Como expor os diversos pontos de acordo e de diferenfa


entre essas divers as teorias?
1°. A teoria arminiana comparada com a calvinista:
Segundo o arminiano, o decreto da reden<;:iio precede ao
da elei<;:iio, e este tern por condi<;:iio a fe prevista do individuo.
Segundo o calvinista, porem, o decreto da elei<;:iio precede
ao da reden<;:ao, e o da elei<;:ao depende tao-somente da boa
vontade de Deus.
zo. A teo ria frances a ou saumuriana (da escola de Saumur)
comparada com a teoria legitima das igrejas reformadas e com
aarmm1ana:
A teoria da escola de Saumur esta de acordo com a refor-
mada, e difere da arminiana porque sustenta que a elei<;:ao
depende unicamente da boa vontade soberana de Deus; difere,
porem, da teoria reformada e concorda com a arminiana em
sustentar que o decreto da reden<;:ao precede ao da elei<;:ao.
3°. A teoria supralapsariana comparada com a infralap-
sariana, sustentada pelas igrejas reformadas:
Segundo a teoria supralapsariana, o decreto de eleger uns
e reprovar outros precede ao decreto de criar o homem e
permitir que caisse. Segundo a teoria infralapsariana, o decreto
da elei<;:ao sucede ao decreto de criar e permitir a Queda. A
teoria supralapsariana considera como objeto da elei~ao ou da
reprova<;:ao, nao o homem como ja criado e decaido, e sim o
homem como capaz de ser criado e de cair. A teoria infralap-
sariana considera como unico objeto desses decretos o homem
como ja criado e decaido.

313
Capitulo II
47. Como expor os argumentos contra a teoria supralapsariana?
Nao ha duvida de que esta e a teoria mais 16gica de todas.
E postulada sobre o princfpio de que aquilo que se faz por
ultimo tencionava-se fazer desde 0 prindpio, e isso, sem duvida
nenhuma, e verdade em todas as esferas compreendidas na
experiencia humana. Argumenta-se, pois, que, se o resultado
final da questao toda e a glorifica~ao de Deus na salva~ao dos
eleitos e na perdi~ao dos nao eleitos, este resultado deve ter
sido o prop6sito deliberado de Deus desde o prindpio. Mas a
causa em apre~o edemasiado elevada para que se lhe apliquem
a priori as regras ordinarias do jufzo humano, :muito menos
para que se insista nelas; a seu respeito s6 podemos saber aquilo
que nose positivamente revelado.
As obje~6es contra a teoria supralapsariana sao as
seguintes ...
1a. 0 homem capaz de ser criado e uma nonentidade,*
coisa que nao existe. Nao poderia ser amado nem eleito, a nao
ser que fosse considerado como ja cfiado.
za. A linguagem inteira das Escrituras em rela~ao a este
assunto implica em que "os eleitos" o foram como objetos do
amor eterno, nao do numero de homens criaveis, capazes de
ser criados, e sim do numero inteiro de homens pecadores
realmente existentes- Joao 15: 19; Rom. 11:5,7.
3a. As Escrituras declaram que os eleitos o foram para a
santifica~ao e para a aspersao do sangue de Cristo. Segue-se,
pois, que, quando foram eleitos eram como culpados e
manchados pelo pecado- 1 Ped. 1:2; Ef. 1:4-6.
4a. A predestina~ao inclui a reprova~ao. A teoria supra-
lapsariana representa Deus como reprovando os nao eleitos

* 0 termo "nonentidade" traduz literalmente o ingles non entity, que


modernamente significa nulidade (algo ou alguem sem caracteristicas
pr6prias, definidas, valiosas ). No presente texto justifica-se o uso do termo
por sua deriva<;:ao latina do adverbio non (nao) acrescido do participio
pres en te do verbo ser, sum (ens, entis, sendo, existindo, existente, en te ). Dai,
algo ou alguem inexistente. Nota de Odayr Olivetti.

314
Predestinafiio

por urn ato soberano, nao por causa dos pecados deles, e sim
para a Sua propria gloria. Isto parece incompativel com a
retidao divina e tambem com o ensino das Escrituras. Os nao
eleitos foram preordenados por Deus para a desonra e ira
par causa de seus pecados e para louvor de Sua gloriosa justifa.
Conf de Fe, Cap. 3, Se'!6es 3-7; Cat. Maior, Perg. 13;Breve Cat.,
Perg. 20.

48. Como se pode demonstrar que a exegese correta de :Efesios


3:9,10 niio da apoio ateoria supralapsariana?
Ha os que dizem que essa passagem e uma afir-ma'!ao
explicita da teoria supralapsariana. Se o para que do versiculo
dez se referisse aclausula imediatamente anterior, a passagem
ensinaria que Deus criou todas as coisas para que a Su~
multiforme sabedoria fosse patenteada pela lgreja aos ~njos. E
evidente, porem, que para que refere-se aos versiculoS 8 e 9,
nos quais Paulo declara que foi incumbido de pr-egar o
evangelho aos gentios e de esclarecer os homens a respeito do
misterio * da redenqao. Tudo isso ele foi comissionado para
fazer, para que fosse manifestada a gloria de Deus, e assim por
diante. VejaHodge on Ephesians.

49. Como expor os argumentos contra a teoria da escola de


Saumur?
1°. Nao e compativel com 0 fato de que OS prop6Sitos de
Deus constituem urn so.** Segundo essa teoria, Deus, num so
ato determinou preparar as condiq6es objetivas da salvaqao
(reden~ao pelo sangue de Cristo) para todos, e conceder as
condi~6es subjetivas da salva~ao (gra~a eficaz) sornente a

* Nao "sacramento", como diz Figueiredo. Nota do tradutor.


** Em sua "Teologia Sistematica" (Systematic Theology, Vol.2, 9ag. 323),
Charles Hodge argumenta dizendo que essa teoria "sup6e murabilidade
nos prop6sitos divinos; ou que o prop6sito de Deus pode deiJ'ar de ser
cumprido". Nota de Odayr Olivetti. ... · , -

315
Capitulo 11
alguns. Isso e realmente uma tentativa de reunir num s6 sistema
o arminianismo eo calvinismo. 2°. As Escrituras declaram
que a finalidade para a qual Cristo veio foi executar o prop6sito
da elei<;ao. Veio para dar a vida eterna a todos quantos o Pai
Lhe desse- Joao 17:2,9; 10:15. Por conseguinte, a reden<;ao
nao pode preceder a elei<;ao. 3°. A verdadeira doutrina da
propicia<;ao (veja Cap. 25) nao e que Cristo veio para tornar
possiyel a salva<;ao, e sim para efetmi-la para todos aqueles por
quem Ele morreu. Para esses a propicia<;;ao alcan<;;a a remissao
dos pecados, a fe, o arrependimento e todos os frutos do
Espirito. Por isso, todos os que sao remidos arrependem-se e
creem. ''\ ~

SO. Em que sentido os luteranos ensinam que Cristo ea razao


da eleifiio?
Ensinam que Deus elegeu Seu povo para a vida eterna
por amor de Cristo, e citam em apoio Efesios 1:4: "Como
tambem nos elegeu nele (em Cristo) antes da funda<;;ao do
mundo".* Eevidente que esta teoria pode ser explicada, ou de
acordo com a teoria arminiana dos decretos, ou com a francesa
(de Saumur), teorias acima expostas; isto e, que OS eleitos fo-
ram escolhidos em Cristo e por amor dEle, ou que o foram
porque Deus, tendo provido por Cristo salva<;ao para todos,
queria, elegendo certos individuos, que pelo menos no caso
destes a morte de Cristo Se tornasse eficaz para a salva<;ao deles.
Esta teoria e evidentemente refutada pelos mesmos
argumentos apresentados acima contra as duas teorias que

* Einteressante comparar as seguintes vers6es do versiculo 4 completo:


ARC (que nesta passagem segue a VA inglesa): "Como tambem nos elegeu
nele antes da fundas;ao do mundo, para que f6ssemos santos e irrepreen-
siveis diante dele em caridade". ARA: "Assim como nos escolheu nele antes
da fundas;ao do mundo, para sermos santos e irrepreensiveis perante ele;
e em amor... ". Figueiredo: "Assim como nos elegeu nele mesmo antes do
estabelecimento do mundo, pelo amor que nos teve, para sermos santos e
imaculados diante de seus olhos". Nota de Odayr Olivetti.

316
Predestinafiio
acabamos de mencionar. Os elei tos o foram "nele", niio par amor
de Cristo, e sim porque a alian~a eterna da gra~a inclui todos os
eleitos como membros do corpo do qual Ele e a cabe~a. As
Escrituras apresentam sempre o amor de Deus como o motivo
do dom de Cristo, e nao a obra realizada por Cristo como o
motivo do amor de Deus- Joao 3:16; 1 Joao 4:10.

DIVERSAS EXPOSI<;OES DAS IGREJAS

EXPOSI<;AO LUTERANA - "0 que primeiro deve-se


notar acuradamente e a diferen~a entre a presciencia e a
predestina~ao ou a elei~ao eterna de Deus. Porque "a
presciencia de Deus" nada mais e do que o fato de que
Deus conhecia e sabia todas as coisas antes que
existissem ... Essa presciencia de Deus diz respeito aos
homens bons tanto quanto aos maus, mas nem por isso e
a causa do mal, nem a do pecado, que impele os homens a
cometerem crimes. Pois o pecado tern por origem o diabo
e a vontade depravada e rna do homem. Nem e essa
presciencia de Deus a causa pela qual os homens perecem;
porque disso eles devem culpar-se a si mesmos; mas a
presciencia de Deus disp6e do mal e o limita, deter-
minando para onde va, e ate quando tenha que durar, de
modo que, embora em si seja o mal, contribui para a
salvac;:ao dos eleitos de Deus.
"Por outro lado a "predestinac;:ao", is to e, a eleic;:ao
eterna operada por Deus, diz respeito tao-somente a Seus
. filhos bons e escolhidos, e e a causa da sua salvac;:ao. Porque
lhes consegue a salvac;:ao e os disp6e para as coisas que
Lhe pertencem. A nossa salvac;:ao e baseada de tal modo
sobre essa predestina~ao que as portas do inferno nunca a
poderao subverter. Essa predestinac;:ao operada por Deus
nao se deve procurar no conselho secreto de Deus, e sim
na Sua Palavra, onde se acha revelada. A Palavra de Deus
conduz-nos a Cristo; este e aquele livro da vida em que se
acham inscritos e eleitos todos os que alcanc;:am a salvac;:ao
cterna - porque assim esta escrito: "elegeu-nos em Cristo

317
Capitulo 11

antes do estabelecimento do mundo" (Ef.1 :4). A Palavra


de Deus, o "livro da vida", Cristo nos oferece, e este nose
aberto e desdobrado mediante a prega~iio do evangelho,
assim como esta escrito: "aos que escolheu, tambem
chamou" (Rom. 8: 30). Em Cristo, pais, e que se deve
procurar a elei~ao eterna operada pelo Pai. Ele, em Seu
conselho eterno, decretou que fossem salvos so e
unicamente aqueles que conhecessem Seu Filho Jesus
Cristo e cressem nEle verdadeiramente" - Formula
Concordice, Hase Collect., pags. 617-619.
Joao Gerhard (1532-1637), Loci 2, 86 B- "Dizemos que
todos aqueles, e somente aqueles que Deus previa que
haveriam de crer em Cristo, o Redentor, mediante a
eficacia do Espfrito Santo e o ministerio do evangelho,
e de perseverar na fe ate ao fim da vida - somente
aqueles foram por Ele, e desde a eternidade, eleitos para
a salva~iio".
A DOUTRINA DAS IGREJAS REFORMADAS- Os trinta e
nove artigos da lgreja da lnglaterra. Artigo 17. Veja acima,
Cap.7.
Confissfio de Fe de Westminster, Cap. 3, Se~iio 7. -
"Segundo o conselho de Sua propria vontade, pela qual
Ele concede ou recusa misericordia, como Lhe apraz, para
a gloria de Seu soberano poder sobre as Suas criaturas,
para louvor de Sua gloriosa justifa, o resto dos homens
aprouve a Deus nfio contemplar e ordena-los para a desonra
e ira por causa de seus pecados".
Canones do Sfnodo de Dort, Cap. 1, § 7 - "A elei~iio,
porem, e o proposito imutavel de Deus, pelo qual, antes
de se estabelecerem os fundamentos do mundo, Ele,
segundo a Sua muito livre boa vontade, e so da Sua gra~a,
escolheu, dentre toda a ra~a humana, decaida por sua
propria culpa da sua integridade primitiva, no pecado e
destrui~iio, urn certo niimero de homens, nem melhores
nem mais dignos do que os outros, mas estando na mesma
miseria como os demais, para a salva~iio em Cristo, a quem
constituira desde a eternidade como o Mediador e a
Cabe~a de todos os escolhidos, e o fundamento da salva~iio.

318
PredestinafiiO

§9. Esta mesma eleis;ao nao e feita em conseqiH~ncia de


qualquer fe, obediencia de fe, santidade ou qualquer outra
boa qualidade ou disposis;ao previstas, como causa ou
condis;ao antecedente no homem que haveria de ser eleito,
e sim para a fe e para a obediencia da fe, e a santidade. E,
verdadeiramente, a eleis;ao e a fonte de todo beneficia
salvador; e dela emanam como seu fruto e efeito a fe, a
santidade e outros dons salutares, e, afinal, a propria vida
eterna. § 15. Alem disso, as Escrituras Sagradas ilustram
e nos recomendam esta gras;a livre e eterna da nossa
eleis;ao, mais especialmente porque testificam tambem
que nem todos os homens sao escolhidos, mas que alguns
nao sao, ou Deus OS passou por alto na Sua eleis;ao eterna,
aos quais Deus, verdadeiramente, da Sua boa vontade
muito livre, justa, irrepreensivel e imutavel, decretou
viverem na miseria comum a qual, por sua propria culpa, se
haviam lans;ado, e nao conceder-lhes viva fe nem a gras;a
da conversao".
OS REMONSTRANTES * - Remonstrantia etc. Cinco
artigos preparados pelos defensores holandeses da
redens;ao universal (1610). Art. 1.- "Deus, por urn decreta
imutavel, antes de lans;ar os fundamentos do mundo,
ordenou em Jesus Cristo, Seu Filho, salvar dentre a ras;a
humana decafda, exposta ao castigo por causa do pecado,
aqueles que, em Cristo, por causa de Cristo e por Cristo,
pela gras;a do Espirito Santo, cressem em Seu Filho, e que,
pela mesma gras;a, perseverassem ate o fim na obediencia
da fe. E (decretou) tambem deixar no pecado e expostos a
ira aqueles que nao sao convertidos e sao incredulos, e
condena-los como estando fora de Cristo, segundo Joao
3:36.

' Remonstrantes (queixosos), nome de uma seita calvinista holandesa,


fundada por Armfnio. Em 1610 a seita recebeu esse nome porque os seus
membros enviaram uma "remonstrance" (uma representac;ao queixosa)
ans estados, negando que desejavam causar conflito na igreja. Nota de
Odayr Olivetti.

319
12

A Cria~ao do Mundo

1. Qual a origem da doutrina da criafiio ex nihilo?


A prevalencia, senao a concep<;ao, da ideia de uma cria<;ao
absoluta, ou de uma cria<;ao ex nihilo, deve-se a influencia da
Palavra inspirada de Deus. Anterior a revela<;ao havia duas
causas prevalentes que impediam a aceita<;ao dessa ideia. (a) A
ideia entao universalmente aceita era que o axioma ex nihilo
nihil fit era verdadeiro. A conseqiiencia foi que todos os teistas
tanto como os ateistas deixavam de conceber a ideia de uma
cria<;ao absoluta, ou a rejeitavam como absurda. (b) A segunda
causa que exercia grande influencia sobre os teistas era a ideia
de que a admissao de semelhante cria<;ao prejudicaria a teologia
natural, porque nessa hip6tese seria impossivel conciliar a
existencia do mal com as perfei<;6es de Deus.

2. Quais as opinioes defendidas pelos grandes teistas Platiio e


Arist6teles?
Platao sustentava que ha dois prindpios eternos e auto-
existentes, Deus e a materia, que existem coordenadamente
numa eternidade indivisfvel e nao sucessiva; que o tempo eo
mundo presentee fenomenico que existe no tempo sao obra
de Deus, que livremente molda a materia em formas que dao
imagens de Suas pr6prias ideias eternas e infinitamente
perfeitas. Arist6teles tambem sustentava que Deus e a materia
sao coordenadamente auto-existentes e eternos; mas diferia de
Platao em considerar Deus como eternamente auto-ativo em

320
organizar da materia o mundo, e, por conseguinte, em consi-
derar o universo assim organizado como eterno, como tambem
considerava eterna a materia da qual e formado. ·'

3. Quais as opinioes defendidas a este respeito pelos gn6sticos?


Alguns dos gn6sticos ensinavam que o universo procede
de Deus por meio de emana~ao, explicada por eles como "urn
desenvolvimento necessaria e gradual ad extra do germe de
existencia que estava em Deus", assim como os raios de luz
procedem do sol, etc. A maioria dos gn6sticos sustentava, junta-
mente com esta teoria de emana~ao, a doutrina do dualismo,
isto e, da auto-existencia coordenada de dois principios
independentes, Deus e a materia. De Deus procederam por
emana~6es sucessivas os l£ons, o Demiurgo, o Criador do
mundo, o Jeova do Velho Testamento, e finalmente Cristo. 0
universo material veio de materia auto-existente, organizada
pelo Demiurgo. Todas as almas emanaram do mundo da luz,
mas ficaram enredadas na materia, e dai e que vern a contenda
hist6rica entre o bern e o mal, a qual Jesus Cristo veio extinguir
dan do as almas 0 poder de livrar-se afinal dos la~os da materia.

4. Qual a teoria a este respeito que ecomum a todos os sistemas


panteistas?
Os panteistas identificam Deus como universo. Deus eo
Ser absoluto, do qual as coisas sao os modos especiais e
transit6rios. Deus eo principia persistente e auto-existente de
todas as coisas, o qual, por uma lei inerente e auto-operativa
de desenvolvimento, esta passando por ciclos incessantes de
mudan~as. . .. · "•'

5. Expor a verdadeira doutrina da criafiio.


A doutrina crista a respeito da criac;ao envolve os seguintes
pontos:
1°. "No principia", em algum ponto de comec;o definido
no tempo.

321
Capitulo 12
2°. Deus chamou a existencia, do nada, todas as coisas,
is to e, os prindpios originais e causas de todas as coisas. Assim,
pois, tudo quanto existe, venha a existir ou pode existir, exte-
rior a Dei dade, deve a sua existencia e a sua subs tan cia, como ~-:
tambem a sua forma, a Deus.
3°. Esse ato criativo foi urn ato de vontade livre e auto-
determinada. Nao foi urn ato necessaria e constitucional
analogo aos atos imanentes e eternos da gera<;:ao do Filho e da
processao do Espirito Santo.
4°. Nao foi necessaria esse ato para completar a excelencia
e a felicidade divinas, as quais sao eternas, completas e
insepaniveis da essen cia divina. Mas foi executado no exerdcio
de uma discri<;:ao abso1uta e por motivos infinitamente sabios
- Dr. Charles Hodge.
Esta doutrina e essencial ao teismo. Todas as teorias quanto
aorigem do mundo opostas a esta sao essencialmente panteistas
ou ateistas.

6. Qual a distinfiio assinalada pelas expressoes "creatio prima


seu immediata", e "creatio secunda seu mediata", e par quem
foi ela introduzida?
A frase "creatio prima seu immediata" signfica o ato originario
da vontade divina pelo qual Ele trouxe ou traz aexistencia, do
nada, os prindpios e as essencias elementares de todas as coisas.
A frase "creatio secunda seu mediata" significa o ato subsequente
de Deus originando diversas formas de coisas, e especialmente
diversas especies de seres vivos, das essencias ja criadas das
coisas. A Igreja Crista sustenta am bas essas ideias. Essas frases
foram utilizadas primeiramente nas obras de certos te6logos
luteranos do seculo 17,e.g., Gerhard, Quenstedt etc.

7. Qual a significafiio primaria, e qual o usa biblico da palavra


hebraica bara?
Restritamente, 1°. talhar, cortar. 2°. Formar,fazer, produzir
(quer do nada, quer de material ja existente- Gen. 1: 1,21,27;

322
2:3,4; Is. 43:1,7; 45:7,18; Sal. 51:12; Jer. 31:22; Amos 4:13.
Niphal, 1°. Ser criado- Gen. 2:4; 5:2. 2°. Nascer- Sal. 102: 18;
Ez. 21:35. Piel, 1°. Talhar, derrubar, e.g., uma floresta- Jos.
17:15,18. 2°. Derrubar (com espada), matar - Ez. 23:47. 3°.
Parmar, esculpir, demarcar - Ez. 21:24 - Gesenius, Lexicon
(presumivelmente uma edi~ao antiga).

8. Expor prova direta da veracidade desta doutrina que temos


nas Escrituras.
1°. Sendo a ideia mesma inteiramente novae alheia a todos
os modos anteriores de pensar, s6 podia ser comunicada nas
Escrituras por meio de termos antigos, empregados anterior-
mente em sentido diverso, mas servindo-se deles de tal modo
que sugerissem urn senti do novo. A palavra "bar:i", porem, e
a melhor das que possui a lingua hebraica para exprimir a
ideia defazer absolutamente.
2°. Essa nova ideia e sugerida inevitavelmente pelo modo
em que a palavra e utilizada pela primeira vez por Moises na
narras;ao que faz, logo no principia, da genese do ceu e da terra.
Como introdu<;ao geral da hist6ria da forma<;ao do mundo e
seus habitantes vern a declara<;ao de que "No principia- no
principia absoluto - Deus fez o ceu e a terra". Nao h:i ai o
menor indicia de qualquer material que j:i existisse. No
principia Deus fez o ceu e a terra; depois disso existiu o caos,
porque se diz en tao que "a terra era va * e vazia", eo Espirito
de Deus pairava sabre o abismo.
3°. Essa mesma verdade e tambem sugerida inevitavel-
mente nas diversas formas de expressao empregadas nas
Escrituras para designar a as;ao de Deus em Sua obra de originar
o mundo. Em caso algum se acha o menor indicia de alusao a
qualquer material preexistente ou a quaisquer condis;6es

* Assim Figueiredo. Devia ser, porem: "estava em desolac;ao, em estado


ca6tico". Nota do tradutor.

323
Capitulo 12
precedentes de cria~ao. Em todos os casos as Escrituras
relacionam toda a a~ao causal da cria~ao s6 e unicamente a
"Palavra", ao mandado deJeova- Sal. 33:6 e 148:5,6. "Pela fe
e que nos entendemos que foram formados OS mundos (o
universo) pela palavra de Deus, para que o visivel fosse feito
do invisivel" (Heb. 11:3, Figueiredo). Veja Rom. 4:17; 2 Cor.
4:6.
9. De que maneira esta inferida nas Escrituras esta doutrina
da criafiiO absoluta do mundo par Deus?
1°. Em todas as passagens que ensinam que Deus eo Sobe-
rano absoluto e que as criaturas dependem dEleabsolutamente,
sendo que "nele vivemos, enos movemos, e existimos" - Atos
17:28; Nee. 9:6; Rom. 9:36; 1 Cor. 8:6; Col. 1:16; Apoc. 4:11.
Ora, e evidente que, se os elementos essenciais e os
principios primordiais de todas as coisas nao sao criados
imediatamente por Deus do nada, mas existem eternamente
por si e independentemente dEle, segue-se entao que Ele, em
Seus oficios de Criador e Governador providencial, esta
condicionado e limitado pelas propriedades efor~as essenciais
e preexistentes desses elementos primordiais, e Ele nem seria
o Soberano absoluto, nem as coisas feitas dependeriam
absolutamente da Sua vontade.
2°. Em todas as passagens que ensinam que o cosmos, isto
e, que "todas as coisas" tiveram principia- Sal. 90:2; Joao
17:5,24.

10. Que argumentos derivados da raziio, da consciencia e


da constituifiiO elementar da materia podem ser aduzidos em
prova de uma criafiio absoluta?
1°. S6 esta doutrina condiz com o sentimento de
dependencia absoluta em que a criatura esta de Deus, senti-
menta inerente ao cora~ao de todas as criaturas racionais e na
realidade do qual as Escrituras tanto insistem. Elas nao
poderiam dizer que Ele sustenta "todas as coisas, pela palavra
do seu poder" (Heb. 1:3), nem "que nele e que vivemos, nos

324
A Criafiio
movemos, e existimos" (Atos 17 :28), se Ele nao fosse absolu-
tamente o Criador e tambem o Formador de todas as coisas.
2°.0 testemunho da consciencia torna manifesto: (1) Que
as nossas almas sao entidades individuais e distintas, e nao
partes ou particulas de Deus; (2) que nao sao eternas. Segue-
-se, pois, que foram criadas. E uma vez que se admita a cria<;:ao
ex nihilo dos espiritos dos hornens, nao havera rnais dificuldade
especial quanto acria<;:ao absoluta da materia.
3°. Ernbora nos seja inconcebivel a cria<;:ao absoluta de
algurna coisa do nada, nao 0 e rnais do que 0 e a rela<;:ao da
presciencia infinita de Deus, ou da Sua preordena<;:ao, ou do
Seu governo providencial, corn a liberdade da a<;ao dos homens,
e nem o e mais do que inconcebiveis sao muitas outras verdades
que todos se veern obrigados a crer.
4°. Adrnitida a auto-existencia necessaria de urn Espirito
pessoal infinitarnente sabio e poderoso, cuja existencia, na
hip6tese de que Ele possui o poder de criar absolutarnente, e
suficiente para explicar a existencia de todos os fenomenos do
universo, nao e filos6fico rnultiplicar causas gratuitarnente,
como se faz na suposi<;:ao de que a materia e eterna, auto-exis-
tente e independente.
5°. Depois que o fil6sofo rnaterialista analisou a materia
ate aos seus atornos finais e determinou as suas propriedades
prirnarias e essenciais, achou neles provas tao fortes de urna
causa antecedente e poderosa, e de urna inteligencia corn
designios sabios, como as encontra nas organiza~6es rnais
cornplexas da natureza; pois que outra coisa seriarn as pro-
priedades fundarnentais da materia senao os constituintes
elementares das leis universais da natureza, e as condi<;:6es finais
de todos os fenornenos? Se inten~ao ou designio, descoberto
na constitui<;:ao do universo concluido, prova a existencia de
urn Forrnador divino, en tao corn igual razao a rnesrna inten~ao
ou designio, descoberto na constitui~ao elementar da materia
prova a existencia de urn Criador divino.
Segundo a afirrna<;:ao de Sir John Herschel, todos os

325
Capitulo 12
atomos da mesma substancia elementar, por serem todos iguais,
parecem "objetos fabricados".
"Quer seja autocontradit6ria a concep~ao de uma multi-
dao de seres existentes desde toda a eternidade, quer nao seja,
essa concep~ao torna-se palpavelmente absurda quando
atribuimos uma rela~ao de igualdade quantitativa a todos esses
seres. N esse caso, somas obrigados a olhar para alem deles e
ver alguma causa comum, ou alguma origem comum, como
explica~ao do motivo pelo qual existe essa rela~ao singular...
Temos chegado ao limite extrema das nossas faculdades de
pensar quando admitimos que, por nao poder ser eterna e auto-
existente, a materia teve necessariamente urn Criador"- Prof.
].Clerk-Maxwell, artigo ''Atom", Encyclopcedia Britannica, 9a.
edi~ao.
,,._.

11. Como se pode expor e refutar a objefiio contra esta doutrina,


baseada no axioma: "Ex nihilo nihil fit"?
Objeta-se que eurn principia original e auto-evidente da
razao que do nada nada pode proceder. Respondernos que essa
asser~ao e indefinida. Se quer dizer que nenhurna coisa nova,
e nenhurna rnudan~a nurna coisa ja existente, podern principiar
sern urna causa adequada, adrnitirnos que isso everdade, mas
nao tern aplica<;,:ao ao caso de que estarnos tratando. Nossa
doutrina nao e que o universo corne<;,:ou a existir sern causa
adequada, e sirn que as substancias, como tarnbern as formas
das coisas, tiverarn principia no tempo, e que sua causa existe
sornente na vontade de Deus. 0 poder infinito inerente a urn
Espirito auto-existente eprecisarnente a Causa aqual referirnos
a origem de todas as coisas. Mas se a obje~ao acima quer dizer
que esse Deus infinito nao tern o poder de criar entidades no-
vas, respondernos que 0 principia e falso e nao auto-evidente;
nao traz nenhurn dos indicios de urna intui~ao valida- nem
auto-evidencia, nern necessidade, nern universalidade. 11

12. Como se pode expor e refutar a doutrina daqueles que

326
baseiam em razi5es marais a auto-existencia da materia?
Aqueles dentre os pensadores teistas que se sentiram
tentados a tomar a materia como eterna e auto-existente,
foram levados a isso pela va esperan~a de explicar assim a
existencia do mal moral em harmonia com a santidade de
Deus.
Queriam referir todos os fenomenos do pecado a urn
principia essencialmente mau, inerente a materia, e assim
justificar Deus, sustentando que Ele tinha feito tudo quanto
Lhe era possivel para limitar esse mal. Ora, alem da incon-
seqti.encia da tentativa que faz essa teoria de vindicar a
santidade de Deus acusta da Sua independencia, OS principios
sabre os quais ela opera sao absurdos, como se tornarao
evidentes nas seguintes considera~6es:
1°. 0 mal morale, na sua essencia, urn atributo do espi-
rito. 0 referi-lo a uma origem material conduz logicamente ao
mais crasso materialismo.
2°. 0 inteiro sistema cristao de religiao, e o exemplo de
Cristo, estao em oposic;ao a esse ascetismo e "mau tratamento
do corpo", cuja conseqti.encia sera necessariamente a ideia de
que a materia e a base do pecado- Col. 2:16, Figueiredo.
3°. Tendo Deus criado o universo material, disse que era
muito born- Gen. 1:31.
4°. A Segunda Pessoa da santissima Trindade tomou urn
corpo real e material em uniao conSigo.
5°. A cria~ao material, por ora "sujeita a vaidade" em
conseqti.encia do pecado dos homens, havera de ser renovada e
tornada o templo em que habite o Deus-homem para sempre.
Veja abaixo, Cap. 39, Perg. 17.
6°. A obra realizada por Cristo para salvar Seu povo dos
seus pecados nao contempla a renuncia da parte material da
nos sa natureza, mas os nossos corpos, que sao agora "membros
de Cristo" e "templos do Espirito Santo", serao transformados
na ressurrei~ao asemelhan~a do Seu corpo glorioso. E, contudo,
nada poderia ser mais absurdo do que a ideia de que o soma

327
Capitulo 12
pneumatikon, traduzido "corpo espiritual", nao e coisa tao
literalmente material como o e o soma psyquikon, traduzido
"corpo animal" - 1 Cor. 15:44. Se a causa do mal e essencial-
mente inerente a materia, e se no passado este desenvolveu-se
sempre, apesar dos esfon;;os feitos por Deus para limita-lo, que
motivo de confian~a pode qualquer de noster para o futuro?

13. Como se pode provar que nas Escrituras a obra da criafiiO


eatribuida a Deus absolutamente, isto e, a cada uma das tres Pessoas
da Trindade coordenadamente, e niio a qualquer delas como Sua
funfiiO pessoal e especial?
1°. A Dei dade absolutamente- Gen. 1:1,26. 26 . Ao Pai-
1 Cor. 8:6. 3°. Ao Filho- Joao 1:3; Col. 1:16,17. 4°. Ao
Espirito Santo - Gen. 1:2; Jo 26: 13; Sal. 104:30 (Sempre
coordenadamen te ).

14. Como se pode provar que nenhuma criatura pode criar


absolutamente?
1°. Pela natureza da obra. E patente que uma cria~ao
absoluta ex nihilo e obra que so pode efetuar quem disponha
de poder infinito. Eobra inconcebivel para nos, porque e obra
de urn poder infinito, e esse poder so pode pertencer aquele
Ser que, pela mesma razao, eincompreensivel.
2°. As Escrituras distinguem Jeova das criaturas e dos
deuses falsos, e estabelecem a Sua soberania e os Seus direitos
como o Deus verdadeiro, afirmando que Ele eo Criador- Sal.
96: 5; Is. 37: 16; 40:12,13; 44:5; Jer. 10:11,12.
3°. Se fosse admitido que uma criatura pode criar (em
termos absolutos), entao as obras da cria~ao nao serviriam para
levar-nos ao conhecimento infalivel de que o nosso Criador e
o Deus eterno e auto-existente.

15. Par que e importante que saibamos, se nos for passive!


alcanfar este conhecimento, qual foi o jim principal que Deus teve
em vista na criafiio?

328
A Criafiio
Esta nao e pergunta de va curiosidade. E evidente que,
sendo Deus eterno, imutavel e de inteligencia absolutamente
perfeita, Ele invariavelmente haveria de manter em vista o
grande fim ou prop6sito final para o qual criou todas as coisas
no principia, de forma que todas as Suas obras devem ser, mais
direta ou mais remotamente, meios para esse fim. Ora, n6s
somas constituidos de tal modo que podemos entender urn
sistema somente quando entendemos o seu fim ou o seu
prop6sito final. Assim,e.g., podemos compreender as diversas
pe~as de urn rel6gio ou de uma maquina a vapor, suas rela~oes
e fun~oes, somente depois de compreendermos o fim a que
deve servir o rel6gio ou a maquina por inteiro. E, em bora Deus
nos tenha ocu1tado muitos dos Seus prop6sitos secundarios,
cremos que Ele nos revelou esse grande designio final, sem o
conhecimento do qual nunca poderiamos compreender o
verdadeiro carater da sua administra~ao geral. Ninguem pode
negar que, se Ele revelou o prop6sito final da Sua cria~ao,
deve ser para n6s ponto da maior importancia sabermos
qual e.
Epor si mesmo evidente quen6s nunca poderemos chegar
a uma generaliza~ao tao sublime como essa por nenhum
processo de indu~ao daquilo que sabemos ou podemos saber
das obras de Deus. E-nos necessaria, pois, extrair todas as nossas
conclus6es a esse respeito, em primeiro lugar, ao menos,
daquilo que sabemos dos atributos de Deus e do ensino
explicito da Sua Palavra.

16. Qual o significado do termo TEODICEIA, e par quem foi


primeiro explorado este ramo da teologia especulativa?
0 termoteodiceia ("theos dike") expressa uma justifica~ao
especulativa do modo pelo qual Deus trata a ra~a humana,
especialmente no que diz respeito aorigem do male ao governo
moral do mundo. Foi primeiro elevado a urn ramo da ciencia
teol6gica pelo fil6sofo alemao Leibnitz, em sua grande obra
inti tulada Teodiceia, au a Bon dade de Deus, a Liberdade doHomem

329
Capitulo 12
e a Origem do Mal, publicada em 1710.

17. Qual a opiniiio de Leibnitz a respeito do fim que Deus teve


em vista na criafdo, e par quem mais foi adotada?
Leibnitz sustentava que se pode resolver em benevolencia
toda a excelencia moral, e que o grande fim totalmente
abrangente que Deus teve em vista na crias;ao do universo, e
que tern em vista na Sua preservas;ao e no Seu governo, e a
promos;ao da felicidade das Suas criaturas. Concluiu disso que
Deus escolheu o melhor sistema possivel para conseguir esse
fim no mais alto grau possivel. Este sistema e quali:Gcado como
otzmzsmo.
Essa teoria foi adotada por grande numero de te6logos da
Nova Inglaterra, juntamente com a teoria, tambem aceita por
muitos, que considera a virtude como consistindo de
benevolencia des in teressada.
As objes;6es a essa teoria sao: .
1a. A virtude niio consiste somente em benevolencia
desinteressada - Veja acima, Cap.8, Perg. 61. E a felicidade
niio e 0 maior bern.
za. Subordi~a o Criador acriatura, o maior ao menor, como
o meio para conseguir-se urn fim. Quando Deus formou desde
a eternidade o prop6sito de criar, nao existiam criaturas que
devessem ser tornadas felizes ou infelizes. 0 motivo para criar,
pais, nao poderia ter origem naquilo que nao existia, e s6
poderia ter origem e objeto no proprio Ser divino.
3a. As Escrituras (veja a pergunta seguinte) em parte
alguma, nem direta nem indiretamente, ensinam que alguma
coisa na criatura eo fim principal de Deus, nem prop6em elas
em parte alguma qualquer bern publico ou pessoal da criatura
como o fim principal que deve ter em vista a criatura mesma.

18. Como se pode expor a doutrina verdadeira? Citar as


exposifi5es da Confissiio de Fe que lhe dizem respeito.
A doutrina verdadeira e que o grande fim que Deus teve

330
em vista na crias;ao foi a Sua propria gloria. Gloria e excel en cia
manifestada. A excelencia dos atributos de Deus e manifestada
por Sua operas;ao. Por conseguinte, esse fim nao foi o aumento,
nem da Sua excelencia nem da Sua felicidade, e sim Sua
manifestas;aoad extra.
''Ao principia aprouve a Deus o Pai, o Filho e o Espirito
Santo, para manifestas;ao da gloria de Seu eterno poder,
sabedoria e bondade, criar ou fazer do nada, no espas;o de
seis dias, e tudo muito born, o mundo e tudo o que nele ha,
quer as coisas visiveis quer as invisiveis" - Confissiio de Fe,
Cap.4, § I. Ela afirma tambem que a Sua gloria e o fim prin-
cipal que Deus tern em vista em todos os Seus propositos
e nas obras da providencia e da reden~ao- Cap. 3, § 3,5,7;
Cap. 5, § 1; Cap. 6, § 1; Cap.33, § 2; CatecismoMaior, Pergs. 12
e 18; Breve Cat., Per g. 7.

19. Quais sao os argumentos que a raziio e as Escrituras


apresentam a favor da doutrina verdadeira?
I 0 • Tendo Deus formado o proposito de criar antes de
existir criatura alguma, e evidente que o motivo para criar teve
necessariamente sua origem e objeto no Criador preexistente,
e nao na criatura nao existente. 0 Criador nao pode estar
subordinado acriatura finita e dependente, nem pode depender
dela. '·
2°. Sendo Deus mesmo infinitamente mais digno do que
a soma de todas as criaturas, segue-se que a manifestas;ao da
Sua propria excelencia e urn fim infinitamente mais digno e
mais exaltado do que o seria a felicidade das criaturas; seria
realmente o fim mais exaltado e mais digno que nose possivel
1magmar.
3°. Nada pode exaltar tanto a criatura e tornar-se fonte da
sua felicidade como o fato de que Deus fez dela urn meio de
promover a Sua gloria como Criador infinito, e testemunha
da Sua gloria; e por isso propor Deus essa gloria como "o fim
principal" da crias;ao e 0 penhor mais seguro do progresso da

331
Capitulo 12
criatura em exceH~ncia e bem-aventuran<;a.
4°. As Escrituras declaram explicitamente que esse e o
fim principal de Deus na cria<;ao- Prov. 16:4; Col. 1:16, e das
coisas como criadas- Rom. 11: 36; Apoc. 4:11.
5°. Elas ensinam que esse e tambem o fim principal de
Deus nos seus decretos- Ef. 1:5,6,12.
6°. Elas tambem ensinam sobre Seu governo e Sua dire<;ao ~
providenciais de Suas criaturas, por Sua gra<;a - Rom. ~
9: 17,22,23; Ef. 3:10.
7°. As Escrituras imp6em como dever a toda criatura
moral que adotem esse mesmo fim como o seu fim pessoal em
todas as coisas -1 Cor. 10:31; 1 Ped. 4:11.

20. Qual a atitude atual da ciencia geologica em relafiio a


narrafiio mosaica da criafiio?
Os resultados modernos da ciencia geologica estabelecem
as seguintes conclus6es: (a) Que os materiais elementares de
que o mundo e composto ja existiam por urn nurnero indefinido
de seculos. (b) Que o estado ern que se acha o rnundo atualrnente
foi produzido providencialrnente por rneio de urna progressao ~
gradual, e que, durante longos tempos, esta progressao deu-se
ern condi<;6es fisicas bern diversas entre si. (c) Que o mundo
foi habitado sucessivarnente por rnuitas ordens diversas de seres
organizados, sendo cada ordern por sua vez adaptada as
condi<;6es fisicas ern que o globo se achava durante a perrna-
nencia dessa ordern, e notando-se tarnbem em cada ordem
sucessiva, como regra geral, uma organiza<;ao superior a da
ordern anterior, passando elas das formas rnais elernentares para
as mais perfeitas e cornplexas. (d) Que o homern completa a
pirarnide da cria<;ao, 0 rnais perfeito e 0 ultimo forrnado de
todos OS habitantes do rnundo. A unica dificuldade que se
encontra em se conciliarem estes resultados corn a narra<;ao
rnosaica da criaqao esta nos porrnenores, a cujo respeito e
obscuro o sentido verdadeiro da narra<;ao inspirada, e as
conclus6es da ciencia sao irnaturas. Por isso eque tern falhado

332
todas as tentativas, como, e.g., a que fez Hugh Miller em sua
obra Testimony of the Rocks (0 Testemunho das Rochas), de
acomodar a hist6ria bfblica em todos os seus pormenores as
conclus6es mais ou menos certas da geologia.
Quanto a relaqao entre aquilo que diz a ciencia a respeito
da antigiiidade do homem e a cronologia bfblica, veja abaixo,
Cap.l6. Em geral, porem, ha concordancia muito notavel en-
tre a narraqao mosaica e os resultados dos estudos da geologia
quanto aos seguintes pontos: a narraqao concorda com aquilo
que a ciencia diz, ensinando - (a) A criaqao dos elementos
num passado muito remoto. (b) A existencia intermedia do
caos. (c) 0 passar o mundo por diversas mudanqas antes de
chegar a sua atual condiqao fisica. (d) As criaq6es sucessivas
de diversos generos e especies de seres organizados - dos
vegetais antes dos animais- das formas inferiores antes das
formas superiores - em adaptaqao as condiq6es cada vez
melhores da terra - e do homem como 0 ultimo de todos.
Se lembrarmos quando, onde e para que fim essa narraqao
bfblica foi escrita e a compararmos com todas as demais
cosmogonias antigas, ficaremos convencidos de que essa
concordancia maravilhosa com os ultimos resultados dos
estudos da ciencia moderna e uma contribuiqao muito
importante para as provas da sua origem divina. Ve-se com
certeza que, mesmo quando se le essa narraqao aluz da mais
severa critica moderna, ela e suficiente para o fim que o seu
Autor divino teve em vista, a saber, que servisse como
introduqao geral da hist6ria da reden<;:ao, a qual, embora tivesse
suas rafzes na cria<;:ao, foi em seguida levada avante como urn
sistema de revela<;:6es e influencias sobrenaturais.

21. Como expor os diversos principios que sempre devemos


ter em mente quando consideramos questoes que envolvem um
conjlito aparente entre a ciencia e a revelafao?
1°. Tanto as obras como a Palavra de Deus sao revelaq6es
Suas. Por conseguinte, as duas sao igualmente verdadeiras,

333
Capitulo 12
igualmente sagradas, e devem ser tratadas com igual reverencia.
E absolutamente impossivel que haja conflito entre as duas
revelac.;:6es, quando adequadamente interpretadas. Preferencia
da nossa parte de uma ou de outra e traic.;:ao contra o Autor e
Senhor de ambas.
2°. A ciencia, como interpretac.;:ao das obras de Deus, e,
portanto, urn ramo legitimo e obrigat6rio dos estudos
humanos. Tern seus direitos que devem ser respeitados, e seus
deveres que ela deve observar. Todas as ciencias tern o direito
de prosseguir nas suas investigac.;:6es legitimas segundo os seus
pr6prios metodos legitimos. Nao podemos exigir que o
quimico prossiga nas suas pesquisas segundo os m~todos do
fil6logo, nem do ge61ogo que va procurar seus fatos na hist6ria,
quer sagrada quer profana. Contudo e tambem dever dos
estudantes de qualquer ciencia que se conservem dentro dos
seus limites, e que reconhec.;:am o fato de que a sua ciencia e
uma provincia apenas no imenso imperio da verdade, e que,
por isso, devem respeitar todas as diversas ordens de verdades,
tanto as verdades hist6ricas e inspiradas como as cientificas, e
tanto as verdades mentais e espirituais como as materiais.
3°. Da limitac.;:ao das faculdades humanas segue-se como
conseqiiencia pratica que os homens que se dedicam a urn ramo
especial de pesquisas adquirem habitos especiais de pensar,
como tambem peculiares associac.;:6es de ideias, segundo os
quais tornam-se propensos a medir e julgar todas e quaisquer
verdades. Sucede assim que o homem cientifico primeiro
interpreta male en tao tern ciumes do te6logo, e este tam bern
interpeta male entao tern ciume do homem cientifico. Isso,
porem, e acanhamento, e nao conhecimento superior; e
fraqueza, e nao forc.;:a.
4°. Sendo a ciencia tao-somente uma interpretac.;:ao humana
das obras de Deus, e sempre imperfeita e comete muitos erros.
Os interpretes da Biblia sao humanos tambem, e por isso
podem cometer erros, e nunca devem afirmar que as suas
interpretac.;:6es sao realmente as ideias que Deus quis revelar.

334
5°. Todas as ciencias, em sua condis;ao imatura, tern sido
consideradas como opostas aPalavra de Deus. No entanto, ao
passo que se tornaram mais amadurecidas, achou-se que
estavam em perfeita harmonia com essa Palavra. As vezes e a
ciencia que se emenda e se torna assim combinada com as ideias
dos te6logos; outras vezes sao as opini6es dos te6logos que se
emendam e se tornam assim combinadas com a ciencia
aperfeis;oada e demonstrada, como, e.g., foi o caso do sistema
astron6mico de Copernico, sistema primeiro odiado pela igreja,
mas depois aceito universalmente por ela, e com gratidao.
6°. No caso de muitas ciencias, particularmente no da
geologia, ainda nao chegou o tempo para que se procure ajustar
suas conclus6es a revelas;ao das Escrituras. Assim como
acontece com a hist6ria contemporanea em sua relas;ao com as
profecias, a geologia, em sua relas;ao com a narras;ao mosaica
da crias;ao, esta in transitu (em transis;ao ). Suas conclus6es ainda
sao incertas. Quando todos os ge6logos estiverem de acordo
entre si, todos os fatos acessiveis da ciencia tiverem sido
observados, analisados e classificados, a generalizas;ao estiver
completa, todos os seus resultados tiverem sido recolhidos e
se tiverem tornado parte indubitavel e permanente da herans;a
intelectual dos homens, ver-se-a en tao exposta por si mesma a
concordancia entre a ciencia e a revelas;ao, e que a ciencia
sustenta e ilustra a Palavra escrita de Deus, em vez de lhe ser
oposta.
7°. Ha, pois, duas tendencias opostas que sao igualmente
prejudiciais acausa da religiao, e que mostram a fraqueza da
fe que caracteriza muitos dos seus amigos professos. Aprimeira
e a fraqueza de se aceitar imediatamente como verdade liquida
e certa qualquer conclusao hostil a Palavra de Deus, se for
anunciada por especuladores cientificos; a constante confis-
sao que assim se faz de que a luz da revelas;ao e inferior a luz
da natureza, e a certeza das conclus6es da exegese biblica
e da teologia crista inferior a dos resultados dos trabalhos da
ciencia moderna; os constantes esfors;os para acomodar as

335
Capitulo 12

interpreta~6es das Escrituras, como urn nariz de cera, a cada


1'
fase nova que tomam as interpeta~6es correntes da natureza.
A segunda tendencia e a de ir ao extremo oposto, de nutrir
preconceitos e suspeitas contra todas as conclus6es averiguadas
da ciencia, com temor de serem, provavelmente, ofensas con-
tra a dignidade da revela~ao, e de atacar com impaciencia
mesmo aquelas fases passageiras da ciencia imperfeita que por
enquanto parecem inconciliaveis com as nossas opini6es.
Estando em pe sobre a rocha da verdade divina, os cristaos
nada tern que temer e podem bern esperar o resultado. A
je perfeita, bern como o amor perfeito, lanfa fora o temor.
Todas as coisas sao nossas, quer sejarn naturais, quer sobre-
naturais, quer sejam ciencia, quer revela~ao. Veja Isaac Taylor,
Restoration ofBelief(Restaurac;ao da Fe), pags. 9,10.

336
... ~ ~. _·· ;

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13

Os Anjos

1. Quais os diversos sentidos em que a palavra grega aggelos


(anjo, mensageiro) e empregada nas Escrituras?
"Mensageiros comuns,J61:14; Luc. 7:24; 9:52; profetas,
Is. 42;19; Mal. 3: 1; sacerdotes, Mal. 2:7; ministros do Novo
Testamento, Apoc. 1:20; tambem agentes impessoais, como a
col una de nuvem, Ex 14.19; a pestilencia, 2 Sam. 24: 16,17; os
ventos, Sal. 104:4; pragas, chamadas "anjos maus"
(Figueiredo), Sal. 78:49; o espinho na carne de Paulo, chamado
"anjo de satanas", 2 Cor.12:7." Tambem a segunda Pessoa da
Trindade, chamada "o anjo da sua face", "o anjo do concerto",
Is 63.9; Mal. 3:1. Mas a palavra e aplicada principalmente a
seres celestes, Mat. 25:31- Veja Kitto,Bib. Encyc.

2. Quais os designativos biblicos dos anjos, e ate onde expressam


eles sua natureza e seus oficios?
Os anjos bons (quanto aos maus veja Perg. 15), em
referencia a sua natureza, dignidade e poder, sao chamados,
nas Escrituras, "espiritos", Heb. 1: 14; "tronos, domina<;:6es,
principados, potestades, poderes", Ef. 1:21; Col. 1: 16; "filhos
de Deus", ]6 1:6; Luc. 20:36; "anjos seus, magnificos em
poder", "os anjos do seu poder", Sal. 103:20; 2 Tess. 1:7; "santos
anjos", "anjos eleitos", Luc. 9:26; 1 Tim. 5 :21; e com referencia
aos oficios que desempenham em rela<;:ao a Deus e aos homens,
sao chamados "anjos", ou mensageiros, e "ministradores", Heb.
1:13,14.

337
Capitulo 13
3. Quem eram os querubins?
Eram criaturas idealizadas, compostas de quatro partes, a
saber, as de urn hom em, de urn boi, de urn leao e de urn a aguia.
Sua aparencia predominante era a de homem, mas o numero
de rostos, pes e maos diferia segundo as circunstancias - Ez.
1:6 comp. com Ez. 41:18,19, e Ex. 25:20.
As mesmas criaturas idealizadas aplica-se tambem o
designativo "seres viventes" (ARA), traduzido por "animais" nas
vers6es de Almeida, Revista e Corrigida, e outras - Ez. 1:5-
22; 10: 15,17; Apoc. 4:6-9; 5:6-14; 6: 1-7; 7: 11; 14:3; 5:7; 19:4.
Os querubins eram seres simb6licos das propriedades
mais elevadas da vida das criaturas, e delas como indicios e
l
manifesta\S6es da vida divina; e eram seres tipicos do estado do .
homem redimido e glorificado, ou representa\S6es profeticas
dele, como o estado em que essas propriedades seriam
combinadas e manifestadas. Foram colocados no jardim do
Eden imediatamente depois da queda de Adao, cabendo-lhes
guardar o caminho da arvore da vida- Gen. 3:24.
Outra conexao, e mais com urn, em que aparece o querubim
e quando se fala no trono da habita\SaO peculiar de Deus. No
mais santo lugar do tabernaculo, Ex. 25:22; Jeova era chamado
o Deus que estava assentado sobre, ou entre, os querubins, 1
Sam. 4:4; Sal. 80:1; Ez. 1:26,28; cuja gloria estava sobre os
querubins. No Apoc. 4:6 fala-se nos animais (seres vivos) que
estavam no meio do trono e ao redor dEle.
Que significa tudo isso, senao o fato maravilhoso, revelado
mais claramente na historia da reden<;:ao, de que a natureza
humana haveni de ser exaltada a habita<;:ao da Deidade? Em
Cristo ela ja foi assunta, por assim dizer, ao proprio seio de
Deus; e por ser honrada tanto assim em Cristo, havera de, nos
seus membros, alcan\Sar uma gloria maior do que ados anjos
-Fairbairn, Tjpology, Part. 2, Ch. 1, Sec. 3.

4. Qual a etimologia da palavra serafim, e que ensinam as


Escrituras a seu respeito?

338
OsAnjos
A palavra serafim significa ardente, brilhante, refulgente.
Encontra-se na Biblia somente em Isaias 6:2,6. Eprovavel que
seja outro designativo, sob aspecto diverso, dos seres idealizados
chamados comumente querubins e seres vivos.

5. Haveria alguma prova de que os anjos sao seres de diversas


ordens e hierarquias?
Que ha semelhantes distin<;:6es parece evidente- 1°. Pela
linguagem das Escrituras. Diz-se que Gabriele urn dos que
assistem diante de Deus, evidentemente em algum sentido
proeminente - Luc. 1: 19; e Miguel e chamado "urn dos
primeiros prfncipes"- Dan. 10:13. Note-se tambem os epitetos
arcanjo, tronos, domina<;:6es, potestades, principados, poderes
- Ef. 1:21; Col. 1:16; Jud., vers. 9. 2°. Pela analogia dos anjos
decafdos. Veja Mat. 9:34; Ef. 2:2. 3°. Pela analogia da sociedade
humana e da criac;;ao universal. Em todo o universo conhecido
ha gradua<;:ao de ordem.
; i

6. Falariam as Escrituras em mais de um arcanjo, e este deve


ser considerado como criatura?
0 referido termo e empregado somente duas vezes no Novo
Testamento, e em ambos os casos esta no numero singular, e
vern precedido pelo artigo definido,ho, no grego- 1 Tess. 4: 16;
Jud., vers. 9. Assim, pois, o termo parece ser o titulo de uma s6
pessoa, chamada Miguel em Judas, vers. 9, e a mesma que em
DaniellO: 13; 12:1, e chamada "urn dos primeiros principes"
e "grande principe", e de quem se diz no Apocalipse 12:7 que
pelejou com seus anjos contra o dragao e seus anjos.
Muitos sup6em que o arcanjo e o Filho de Deus. Outros
acham que pertence a classe mais elevada das criaturas, por
ser chamado "urn dos primeiros principes" em DaniellO: 13,
e porque nunca lhe sao atribuidos atributos divinos.

7. Que ensinam as Escrituras a respeito do numero e do poder


dos anjos?

339
Capitulo 13
1°. A respeito do seu numero as Escrituras s6 ensinam
que e mui to grande: "milh6es de milh6es"- Dan. 7: 10; "mais
de doze legi6es de anjos"- Mat. 26:53; "uma multidao dos
exercitos celestiais"- Luc. 2: 13; "muitos milhares de anjos"-
Heb. 12:22.
2°. A respeito do seu poder as Escrituras ensinam que e
muito grande, tanto quando exercitado no mundo material
como no espiritual. Sao chamados anjos do poder de Jesus em
2 Tessalonicenses 1:7, e no Salmo 103:20, "magnificos em
poder"; veja tambem 2 Reis 19:35. Nao tern, porem, o poder
de criar, e assim como os homens, s6 podem exercer o seu
poder conectivamente com as leis gerais da natureza, no sentido
absoluto dessa palavra.

8. Em que se ocupam eles?


1°. Veem a face de Deus no ceu, adoram as perfeic;6es
divinas, estudam todas as revelac;6es que Deus faz de Si nas
obras da providencia e da redenc;ao, e sao perfeitamente felizes
na Sua presenc;a e no Seu servic;o -Mat. 18: 10; Apoc. 5: 11; 1
Ped. 1:12.*
2°. Deus os emprega como Seus servos na administrac;ao
da Sua providencia - Gen. 28:12; Dan. 10: 13: ( 1) A Lei foi
ordenada por anjos- Atos 7:53; Gal. 3: 19; He b. 2:2. (2) Sao
ministros do bern, a favor do povo de Deus - Sal. 91: 10-12;
Atos 12:7; Heb. 1:14. (3) Sao executores dos juizos de Deus
contra os Seus inimigos- 2 Reis 19:35; 1 Cr6n. 21:16; Atos
12:23- (4) No juizo final os anjos separarao os rna us dos bons,
recolherao os eleitos e os elevarao para encontrar Cristo nos
ares- Mat. 13:30,39; 24:31; 1 Tess. 4:16,17.

*convem notar que a ultima chiusula deste versiculo, traduzida por


Figueiredo: "ao qual os mesmos anjos desejam ver", deve ser traduzida:
"as quais coisas os mesmos anjos desejam perscrutar". Nota do tradutor.

340
OsAnjos
9. Os anjos tern corpos? E como se pode explicar o seu
aparecimento? · ,; ' ~ .
Nas Escrituras OS anjos sao chamados "espfritos" (Heb.
1: 14), palavra empregada tambem para designar as almas dos
homens quando separadas dos corpos- Luc. 8:55. Mas nao ha
nada no sentido dessa palavra, nem nas opini6es dos judeus
do tempo de Cristo, nem em coisa alguma do que nos dizem
as Escrituras a respeito das ocupa~6es dos anjos, que prove
que os anjos nao tern corpos de especie nenhuma. E como se
diz que o Filho de Deus tern agora urn "corpo glorioso", urn
"corpo espiritual" para sempre, e como todos os remidos hao
de afinal ter corpos como o de Cristo, e os anjos sao associados
com os homens remidos como membros do mesmo reino
infinitamente exaltado, parece provavel que os anjos tenham
sido criados com organiza~ao fisica nao totalmente disse-
melhante desses "corpos espirituais" dos remidos. Nos tem-
pos biblicos anjos apareceram e falaram aos homens sempre
na forma corporal de homens, e tambem a semelhan~a de
homens comuns comeram e abrigaram-se em casas- Gen. 18:8;
19:3.
Alguns sup6em, por conseguinte, que os anjos tern corpos
semelhantes aos atuais corpos "naturais" ou animais dos
homens- 1 Cor. 15:44, compostos de carne, ossos e sangue,
com cabe~a e fei~6es, pes e maos, e que, quando urn anjo
aparecia a qualquer pessoa, nao havia mudan~a ne1e, e sim ele
simplesmente entrava na esfera da percep~ao dos sentidos dessa
pessoa, apresentando-se-lhe assim como habitualmente e.
Isso, porem, e inconciliavel com os fatos narrados nas
Escrituras. Segundo esta, os anjos "apareceram" as vezes
exatamente como homens comuns, outras vezes, porem, de
modos bern diversos- Niim. 22:31; Atos 12:7-10, passando
atraves de muros de pedra, aparecendo e desaparecendo a
vontade, etc. Alem disso, urn dos tres hom ens que apareceram
a Abraao em Manre, cujos pes ele lavou e que comeram o que
lhes havia preparado, era Jeova, a segunda Pessoa da Trindade,

341
Capitulo 13
que nao tinha corpo antes de o tomar seculos depois no ventre
da virgem Maria. Se, pois, o corpo humano de uma dessas
pessoas nao era corporeal, nao somos autorizados a concluir,
dos fatos ali registrados, que os das outras o eram- Gen. 18:4-
33.
Ademais, a teoria manifesta absurda confusao de pensa-
mentos. 0 corpo humano animal, assim como o conhecemos,
e uma organiza<;ao fisica que esta em equilibrio com certas
condi<;6es fisicas definidas e exatamente ajustadas, e pode
existir s6 nessas condi<;6es. Os animais vertebrados, dos quais
o homem e a forma superior, foram mudados sempre quando
se mudaram as condi<;6es fisicas da terra, e deixam sempre de
existir quando essas condi~6es se mudam muito. A concep~ao
de urn corpo humano vivendo na agua ou no fogo seria absurda,
e mais absurda ainda parece sera concep<;ao de uma criatura
com sangue como o do homem, e comendo alimento, existindo
indiferentemente na terrae no ceu, atravessando avontade 0
espa<;o entre as estrelas, e como verdadeiro cosmopolita
vivendo alternada e indiferentemente em todos os mundos e
em todos OS elementos, 0 eter, 0 ar e a agua, e em todas as
temperaturas, desde a temperatura de milhares de graus do
sol, ate ao zero absoluto do vacuo entre as estrelas.
A aparencia corporal dos anjos deve, pois, ter sido alguma
coisa nova que assumiram, ou entao alguma coisa preexis-
tente e permanente, mas bastante modificada com o fim de
torna-los capazes de manifestar-se em forma humana aos
homens.

10. Qual a doutrina e a pratica romanas quanta ao culto


prestado aos anjos?
Diz o Catechismus Romanus, 3:2,9,10- "Porque o Espirito
Santo que diz: ao Deus uno seja honra e gloria- 1 Tim. 1:17,
manda-nos tambem honrar a nossos paise aos velhos- Lev.
19:32, etc.; e dos homens santos que deram culto s6 ao Deus
uno se diz nas Sagradas Escrituras que adoraram- Gen. 23:7,12,

342
OsAnjos
etc., isto e, veneraram suplicantemente, a reis. Se, pois, reis,
por cujo ministerio Deus governa o mundo, sao tratados com
tanta honra, nao daremos aos espiritos angelicas uma honra
tanto maior em propor~ao quanta esses seres felizes excedem
aos reis em dignidade; (a esses espiritos angelicas) os quais
aprouve a Deus constituir Seus ministros; de cujo ministerio
Se serve nao s6 no governo da Igreja, mas tambem no do res to
do universo; por cuja assistencia, ainda que nao os vejamos,
somos libertos diariamente dos maiores perigos da alma e do
corpo? Acrescentai a isso o amor com que nos amam, e que os
leva, segundo nos dizem as Escrituras -Dan. 2: 13,* a oferecer
suas ora~6es pelos paises sabre os quais a Providencia os
colocou, e sem duvida tam bern por aqueles cujos guardas sao,
porque apresentam diante do trona de Deus as nossas ora<;:6es
e higrimas- ]6 3:25; 12:12; Apoc. 8:3. Por isso nosso Senhor
nos ensinou no evangelho a nao escandalizar os pequeninos,
porque nos ceus os seus anjos incessantemente estiio vendo a
face de seu Pai, que esta nos ceus- Mat. 18:10.
"Sua intercessao devemos, pois, invocar, porque veem
sempre a Deus, e recebem dEle com muito boa vontade a defesa
da nossa salva<;:ao. Desta sua invoca<;:ao as Sagradas Escrituras
dao testemunho"- Gen. 48:15,16.

ll. Que ideias tem sido sustentadas quanta a "anjos da


guarda"?
"Foi opiniao predileta dos santos Pais, que cada individuo
esta sob a guarda de urn anjo particular, que lhe e designado
como protetor. Costumavam falar tambem em dois anjos -
urn born e o outro mau - que eles supunham que acompa-
nhavam a cada individuo, incitando-o o born anjo a tudo
quanta e born e desviando dele o mal; e incitando-o o mau
anjo ao male desviando dele o bern (Hermas 11 :6). Os judeus,

* Parece que deve ser Dan. 10:13. Nota do tradutor.

343
Capitulo 13
com exces;ao dos saduceus, criam nisso, e os mus;ulmanos creem
nisso ainda. Os antigos pagaos criam nessa ideia sob uma forma
modificada - pois os gregos tinham seus demonios tutelares
(bons ou maus) e os romanos seus genios. N a Bfblia, porem,
nao ha nada que ap6ie essa ideia. As passagens que costumam
citar a seu favor (Sal. 34:7; Mat. 18:10) e certo que nao
significam nada disso. A primeira simplesmente ensina que
Deus Se serve do ministerio dos anjos para livrar Seu povo de
aflis;6es e perigos; e a segunda, que os filhos dos crentes,
enquanto crians;as, ou os mais pequenos entre os disdpulos
de Cristo, dos quais os ministros da Igreja poderiam estar
inclinados a descuidar-se, sao tidos em tao alta estima em outra
parte que nem os anjos julgam abaixo da sua dignidade
ministrar-lhes"- Kitto,Bib. Encyclop.

12. Quais os names dados a satanas, eo que significam?


Satanas, que quer dizer adversario, Luc. 10:18. 0 diabo,
sempre no singular no grego, que significa caluniador,
difamador, Apoc. 20:2. Abadom (em gregoApoliom), que quer
dizer destruidor, Apoc. 9:11. Belzebu, o principe dos demonios,
do deus dos ecronitas, principal das divindades pagas, todas
as quais os judeus tinham na conta de demonios, 2 Reis 1:2
(Baal-Zebu); Mat. 12:24. 0 anjo do abismo, Apoc. 9:11. 0
principe deste mundo, Joao 12:31. 0 principe destas trevas
(na tradus;ao de Figueiredo, "governadores destas trevas"), Ef
6:12. Leao que ruge, 1 Ped. 5:8. Pecador desde o principia, 1
Joao 3:8. Acusador, Apoc. 12:10. Belial, 2 Cor. 6:15. Enganador,
Apoc. 20:10. Dragao, Apoc. 12:7. Mentiroso e homicida, Joao
8:44. Leviata, Is. 27:1. Lucifer, Is. 14:12 (Figueiredo). Serpente,
Is. 27: 1. Algoz (Figueiredo: algozes ), Mat. 18:34. Deus deste
seculo (deste mundo), 2 Cor. 4:4. 0 que tinha o imperio da
morte, He b. 2:14.

13. Como se pode provar que satanas e um ser pessoal, e niio


mera personificafiio do mal?

344
OsAnjos

Em todos os diversos livros das Escrituras Sagradas


fala-se sempre conseqiientemente em satanas como uma
pessoa, e se lhe atribuem atributos pessoais. Passagens como
Mateus 4:1-11 e Joao 8:44 sao decisivas.

14. Que ensinam as Escrituras a respeito da relar;iio de satanas


com outros esp£ritos maus e como nosso mundo?
Outros espiritos maus sao chamados "seus anjos", Mat.
25:41; e ele e chamado "principe dos demonios", Mat. 9:34, e
principe das trevas e dos espiritos de malicia espalhados por
esses ares, Ef. 6:12. Isso mostra que ele eo principal espirito
do mal, o chefe.
Sua relaqao com o mundo e indicada pela hist6ria da
Queda, 2 Cor. 11 :3; Apoc. 12:9, e por express6es como "deus
deste seculo" (mundo), 2 Cor. 4:4, e "principe das potestades
do ar, do espirito que agora opera nos filhos da desobediencia",
Ef. 2:2; e-nos dito que OS homens maus sao filhos dele, 1 Joao
3:10; ele cega os entendimentos dos que nao creem e conduz
os cativos asua vontade, 2 Tim. 2:26; tam bern aflige, in quieta,
persegue e tenta o verdadeiro povo de Deus ate onde lhe e
permitido para o bern final desse mesmo povo - Luc. 22:31;
2 Cor. 12:7; 1 Tess. 2:18.

15. Quais os nomes dados nas Escrituras aos esp£ritos deca£dos?


A palavra grega, ho diabolos, o diabo, e aplicada no origi-
nal somente a Belzebu. Outros espiritos maus sao chamados
daimones, demonios, Mat. 8:31; espiritos imundos, Mar. 5: 13;
anjos do diabo, Mat. 25:41; principados, potestades, principes
das trevas deste seculo, hostes espirituais da maldade, Ef. 6: 12;
anjos que pecaram, 2 Ped. 2:4; anjos que nao guardaram o seu
principado, mas deixaram a sua propria habitas;ao, Jud., vers.
6; espiritos de mentira, 2 Cron. 18:21.

16. Que poder ou influencia sobre os corpos e as almas dos


homens lhes eatribu£do?

345
Capitulo 13
Assim como todos os seres finitos, satamis s6 pode estar
num lugar a qualquer tempo; mas, sendo-lhe atribuido tudo o
que fazem os seus agentes, parece praticamente ubiquo.
E certo que ao menos as vezes exerceram uma influencia
inexplicavel sobre os corpos dos homens, porem inteiramente
sujeita ao dominio de Deus- J6 2:7; Luc. 13:16; Atos 10:38.
Eles tern produzido e agravado molestias, e excitado apetites e
paix6es- 1 Cor. 5:5. Em alguns casos, satan as tern poder sobre
amorte-Heb. 2:14.
Com relas;:ao as almas dos homens, satanas e seus anjos
nao tern poder nenhum para mudar o coras;:ao ou coagir a
vontade; sua influencia e simplesmente moral, e exercida
mediante sedus;:6es enganosas, sugestao, embaimento e
persuasao. As frases descritivas da sua operas;:ao, empregadas
nas Escrituras, sao como as que se seguem - "poder, e sinais e
prodigios de mentira", "o engano da injusti<;a", 2 Tess. 2:9,10;
"se transfigura em anjo de luz", 2 Cor. 11:14. Quando pode
enganar, emprega "ciladas", Ef. 6:11; "las;:o", 1 Tim. 3:7;
"profundezas", Apoc. 2:24; "cegou os entendimentos", 2 Cor.
4:4; mantem presos a sua vontade os que nao se desprendem
dos seus la~os, 2 Tim. 2:26; e assim "engana todo o mundo",
Apoc. 12:9. Quando nao pode persuadir, lans;:a mao de "dardos
inflamados", Ef. 6:16, e de bofetadas, 2 Cor. 12:7.
Como exemplos da sua influencia em tentar os homens
ao pecado, as Escrituras citam os casos de Adao, Gen. capitulo
3; Davi, 1 Cron. 21: 1; Judas, Luc. 22:3; Ananias e Safira, Atos
5:3; e a tentas;:ao a que se submeteu o nosso bendito Salvador,
Mat. capitulo 4.

17. Qual a prova de que os pagiios adoram demonios?


"0 daimon e 0 objeto do seu culto, deisidaimonia e 0 culto,
e deisidaimon e quem presta 0 culto." Paulo declarou que OS
"var6es atenienses" eram deisidaimonesterons' is to e,
excessivamente dados ao culto dosdaimones, demonios- Atos
17:22. Davi afirma que OS idolos dos pagaos sao demonios

346
OsAnjos
-Sal. 106:36,37,e Paulo, que as coisas sacrificadas pelos gentios,
estes as sacrificam aos demonios, e nao a Deus -1 Cor. 10:20.
Moises, falando dos israelitas ap6statas- Deut. 32:17, diz:
"Sacrificios ofereceram aos demonios, nao a Deus; a deuses
que nao conheceram, novos deuses que vieram ha pouco dos
quais nao se estremeceram seus pais" (ARA). (Figueiredo:
" ... deuses novos e recentes, que seus pais nao tinham adorado.")

18. Onde residem, e qual a verdadeira interpretafiio de Efesios


2:2 e 6: 12?
Estas passagens declararn sirnplesrnente que os espi-
ritos maus pertencem ao mundo invisivel e espiritual, e nao
ao sistema do nosso rnundo. As Escrituras nada nos ensi-
nam quanto ao Iugar onde residem esses espfritos: ensinarn
tao-sornente que eles habitavam originalrnente no ceu, donde
cairam, que agora tern acesso aos habitantes do mundo, e que
seriio afinal lan~ados no lago de fogo preparado para eles -
Mat. 25:41; 2 Ped. 2:4; Apoc. 20:10.

19. Como eram chamados os que estavam possessos de espiritos


maus?
"Endemoninhados", termo traduzido assim em Mat. 4:24;
"lunatico", Mat. 17: 15; "urn hom em que tinha urn espirito
imundo" (Figueiredo: "possesso do espirito imundo"), Luc.
4:33; "oprimidos do diabo", Atos 10:38.

20. Quais os argumentos apresentados por aqueles que


consideram os endemoninhados mencionados no Novo Testamento
como simplesmente doentes ou alienados?
Que nao podemos distinguir entre os efeitos da possessao
demonfaca e os de molestias. Que os rnesmissirnos sintomas,
noutros casos, tern sido tratados como molestias, e curados.
Que, como tambem a feiti~aria, a suposta existencia de
semelhantes possess6es limita-se aos seculos de maior
ignorancia.

347
Capitulo 13
Dizem tambem que essa doutrina e inconciliavel com os
seguintes principios claramente revelados: 1°. Que as almas
dos falecidos vao imediatamente para 0 ceu ou para 0 inferno.
2°. Que os anjos decaidos ja estao presos "as cadeias da
escuridao, ficando reservados para o juizo" -2 Ped 2:4; Jud.,
vers. 6.
Procuram dar outro sentido as palavras de Cristo e Seus
ap6stolos, dizendo que, nao tendo sido parte do designio deles
ensinar aos homens a verdadeira ciencia da natureza e das
molestias, adotaram nesses aspectos a linguagem comum dos
seus contemporaneos, e chamaram as molestias por seus nomes
populares, sem quererem, porem, dar assim o seu apoio a teoria
comurn quanto anatureza da causa produtora dessas molestias.

21. Como se pode provar que os endemoninhados do Novo


Testamento estavam real mente possessos de espiritos maus?
As narrativas singelas de todos os evangelistas nao deixam
a minima duvida de que Cristo e Seus ap6stolos realmente
criam, e queriam que outros cressem tambem, que os
endemoninhados estavam de fato possessos de demonios.
Distinguem entre possessao e molestias- Mar. 1:32; Luc.
6: 17' 18; Os "demonios", e nao s6 OS "possessos" deles falavam
(Mar. 5: 12), e Cristo lhes dirigia a palavra, impunha-lhes ordens
e os repreendia-Mat. 8:32; 17:18; Mar. 1:25,34; 9:25. Seus
desejos, pedidos e paixoes distinguem-se dos dos possessos-
Mat. 8:31; Mar. 9:26, etc. 0 numero dos que estavam numa s6
pessoa e mencionado - Mar. 5:9. Sairam do "possesso" e
entraram nos porcos- Luc. 8:32,33. Nunca se diz que a lua
entrou num homem, atormentando-o, ou que ela foi lan~ada
fora de urn lunatico, ou que a lua deu altos gritos, etc. Peca
pela base, portanto, o argumento daqueles que querem dar
outro sentido as palavras de Cristo e seus ap6stolos a esse
respeito.

348
,.-.
,~. ....

14

A Providencia

1. Qual a etimologia e o usa tecnico do termo "Providencia",


e qual a relafao desta com o decreta eterno de Deus?
Providencia, de pro e video, quer dizer, literalmente,
previsao, e depois, urn arranjamento cuidadoso, preparado
antecipadamente para alcan~ar certos fins predeterminados.
Turretino define este termo como incluindo, no seu sentido
mais lato, (a) presciencia, (b) preordena~ao, e (c) a admin-
istra~ao eficaz da co is a decretada. No uso tecnico e teol6gico,
como tam bern no uso com urn da palavra, seu sentido restringe-
-se ao ultimo dos tres acima citados, a saber, a execu~ao por
Deus do Seu decreto eterno, no tempo e por meio das causas
secundarias originadas por Ele na cria~ao. A preordena~ao da
o plano, e e eterna, totalmente compreensiva e imutavel. A
cria~ao da o come~o absoluto das coisas no tempo. A
providencia inclui os dois grandes ramos: (a) A preserva~ao
continua de todas as coisas como criadas; e (b) o governo
continuo de todas as coisas assim preservadas, de modo que se
efetua tudo aquilo para o que foram criadas. Veja Conf de Fe,
Cap. 5, Cat. Maior, Perg. 18, eBreve Cat., Perg. 11.

2. Como se pode expor a doutrina da preservafdo?


Turretino,L. 6, Quaes. 4, diz: "Conservatio est, qua Deus
creaturas omnes in statu suo conservat, quod fit conservatione
essentiae in especiebus, existentiae in individuis, et virtutis in
operationes".

349
Capitulo 14
A preserva~ao e aquela opera~ao continua da energia divina
ern virtude da qual o Criador rnantern todas as criaturas ern
existencia e na posse de todas essas propriedades e qualidades
inerentes de que as dotou ern sua cria<;ao, e tarnbern na posse
daquelas que porventura tenharn adquirido depois, ern virtude
dos seus habitos ou do seu desenvolvirnento. Isto e, tanto a
existencia como os atributos de toda especie, bern como a forma
e as faculdades de toda criatura individual sao rnantidas
constanternente ern existencia por Deus.

3. Que argumentos estabelecem a conclusiio de que a operar;ao


constante da energia divina e essencial para a preservafiio de todas
as criaturas?
1°. Esta verdade parece estar envolvida na propria con-
cep<;;iio de urna criatura ern sua rela<;;iio de dependencia do seu
Criador. Criatura eaqui1o que depende ern tudo e por tudo s6
da vontade do seu Criador. Sendo assirn abso1utarnente
dependente, nao pode continuar por si rnesrno a sua existencia,
como igua1rnente niio a pode originar.
2°. Acha-se irnplicita no sentirnento de dependencia
absoluta, que e urn elernento essencial do sentirnento religioso,
o qual eurna caracteristica invariavel da natureza hurnana.
3°. E ensinada nas Escrituras. - "Nele vivernos, e nos
rnovernos, e existirnos"- Atos 17: 28; "Todas as coisas subsistern
por ele"- Col. 1:17; "Sustentando todas as coisas, pela palavra
do seu poder"- Heb. 1:3. Veja tarnbern Nee. 9:6; Sal. 41 :8;
50:10,11.

4. Qual a ideia dos deistas e dos racionalistas a respeito da


Preservar;iio?
Eles considerarn como rnerarnente negativa a a<;;iio de Deus
na preserva<;;iio continua das criaturas - s6 niio quer destrui-
-las. Segundo esta opiniao, o Criador rnantern-Se fora da Sua
cria<;;iio do rnesrno modo como urn rnecanico acha-se fora da
rnaquina que fabricou e pos ern rnovirnento. Considerarn o

350
A Providencia
sistema de causas secundarias como dependentes da Causa
Primaria somente no principia do longo curso dos aconteci-
mentos, num passado infinitamente remoto. Eles sustentam
que no principia Deus criou todas as coisas, dotou-as de suas
diversas fon;:as como causas secundarias, e ajustou-as num
sistema equilibrado, mas entao as deixou operar independente-
mente de todo suporte ou direc;:ao de fora, segundo a sua
natureza, em suas diversas relac;:6es, assim como urn homem
deixa urn rel6gio ao qual acaba de dar corda.

5. Quais as objefi5es contra a opiniiio acima exposta?


1a. Como mostramos acima, essa opiniao e inconciliavel
com a relac;:ao essencial da criatura (como urn efeito) com o
Criador (como urn a causa). Deus eo unico ens a seipso. A unica
e exclusiva causa da existencia da criatura e a vontade de Deus.
Enquanto Ele quiser, essa causa (visando a esse efeito) existiri
Deixando Ele de exercer a Sua vontade (com vistas a urn efeito
particular), a causa nao existiria mais e, em conseqti.encia, o
efeito deixaria tambem de existir.
za. Essa opiniao e antropom6rfica ate a urn grau indigno
de Deus. Envolve a omissao anti-intelectual de apreender a
diferenc;:a essencial que existe entre a relac;:ao de Deus com a
criac;:ao e a do homem com a obra de Suas maos. 0 homem
mantem-se necessariamente exterior a sua obra, e mesmo
quando se acha presente, pode dirigir a sua atenc;:ao a urn s6
ponto em qualquer tempo. Deus, porem, e onipresente, e nao
somente quanto a Sua essencia, senao tambem quanto ao Seu
conhecimento, Sua sabedoria, Seu amor, Sua retidao e Seu
poder infinitos, e com cada atomo da criac;:ao e em cada
momenta da durac;:ao do tempo. A criatura esta sempre
interpenetrada como tambem abrangida no pensamento e na
vontade divinas, e e sempre o que e e esta como esta, unica-
mente por causa de Deus.
3a. E6bvio que essa opiniao afasta Deus para tao longe da
criac;:ao que se torna irreligiosa em seus efeitos pr:iticos. E,

351
Capitulo 14
segundo o testemunho da hist6ria, esta tern sido sempre a
influencia exercida por ela.
4a. Esta obviamente em oposi~ao ao espirito inteiro das
Escrituras, da qual vemos exemplos nos textos especiais acima
citados.

6. Qual a opiniiio extremo-oposta aultima acima considerada,


quanta anatureza da operar:iio divina envolvida na preservafiio?
A opiniao extremo-oposta aque acabamos de expor e que
a preserva~ao e uma cria~ao continua: que as criaturas e as
causas secundarias nao tern existencia real e continua, mas sao
reproduzidas do nada em cada momento sucessivo, nos seus
respectivos estados, condic;6es e ac;6es sucessivos, pela perpetua
emanac;ao davis creatrix (forc;a criadora) de Deus. Assim, pois,
o estado ou ac;ao de qualquer coisa criada num momento nao
tern nenhuma rela~ao causal com o seu estado ou a~ao em outro
momento, mas a causa (mica, perpetua e imediata de tudo
quanta existe e Deus mesmo.
Os fundamentos desta doutrina foram lanc;ados por
Descartes (1596-1650) na exposi~ao de suas ideias sobre a
rela~ao da criac;ao com o Criador, considerando aquela como
mantida por este mediante uma criac;ao continua. Essas ideias
foram levadas ao extremo maximo compativel com o teismo
por Malebranche, na doutrina das "causas ocasionais" e na de
"vermos todas as coisas em Deus", e foram levadas a sua
l
l

i'
l
conclusao legitima e 16gica no panteismo absoluto por Spinoza ~
-Morell, Hist. of Mod. Phil., Parte 1, Cap. 2, § 1.
Incidentalmente, o presidente Edwards ensina a mesma
doutrina em sua grande obra Original Sin, Parte 4, Cap. 3. Diz
ele que nem a existencia da substfmcia, nem a do modo, nem a
da a~ao de qualquer coisa criada, em qualquer momento de
tempo, tern conexao causal com a sua existencia, ou como seu
estado ou com a sua ac;ao no momento subseqiiente; e que
aquilo que chamamos "curso da natureza" nao e coisa separada
da opera~ao de Deus. Ele ilustra a sua doutrina assim: ''As

352
A Providencia
imagens das coisas que vemos num espelho, enquanto conser-
vamos os olhos fixos nelas, parecem sempre as mesmas, e
parecem conservar uma identidade perfeita e continua. Mas e
sabido que nao e assim. Os fil6sofos sabem muito bern que
essas imagens sao renovadas constantemente pela impressao e
reflexao de novos raios de luz; de modo que a imagem
produzida por raios anteriores esta sempre desaparecendo e
uma nova imagem e produzida por novos raios a cada instante,
tanto no espelho como nos olhos ... A imagem que existe neste
momento nao foi derivada daquela que existiu no momento
anterior... a existencia passada da imagem nao tern influencia
alguma para mante-la nem por urn instante ... Assim e com os
corpos como com essas imagens ... sua existencia atual nao e,
falando em termos restritos, efeito da sua existencia passada, e
sim inteiramente, a cada instante, efeito de uma nova agencia
ou opera~ao de causa poderosa da sua existencia".

e
7. Como se pode mostrar que essa doutrina falsa e perigosa?
1°. Se Deus esta continuamente criando de novo cada
criatura em cada momento em seus estados e a<;6es sucessivos,
e se o estado ou ato de uma criatura num momento nao tern
rela<;ao causal com o seu estado ou ato no momento posterior,
e evidente que Deus eo unico Agente real no universo, e causa
unica e imediata de tudo quanto sucede. E evidente que isso
envolve logicamente o panteismo, e, como fato hist6rico,
conduz asua ado<;ao.
2°. E inconciliavel com as nossas intui~6es originais e
necessarias de toda especie de verdades, quer sejam fisicas, quer
intelectuais, quer morais. Nossas intuiq6es originais certificam-
-nos da existencia real e permanente de substancias espirituais
e materiais exercendo for<;as, e dade nossos pr6prios espiritos
como causas reais e autodeterminantes de a<;ao, e, em conse-
qiiencia, como agentes morais. Mas, se fosse verdadeira essa
doutrina, en tao as nossas intuiq6es primitivas e constitucionais
nos enganariam, o universo inteiro seria uma ilusao, nossa

353
Capitulo 14
propria natureza uma falsidade e o ceticismo universal seria 1
!
inevitavel. l

3°. Desmorona imediata e radicalmente os fundamentos


da agencia livre, da responsabilidade moral, do governo moral
e, por conseguinte, da religiao.

8. Como expor os diversos pontos da verdadeira doutrina da


preservafiio providencial?
A verdadeira doutrina esta entre as duas extremidades
acima expostas. Envolve as seguintes proposi<;oes:
1a. As substancias criadas, tanto espirituais como materiais,
possuem existencia real e permanente; isto e, sao entidades
rems.
za. Todas possuem certas propriedades ativas e passivas,
de que foram dotadas por Deus.
3a. As propriedades ou for<;as ativas tern eficacia real, e
nao s6 aparente, como causas secundarias, na produ<;ao dos
efeitos que lhes sao pr6prios; e OS fenomenos, tanto da
consciencia intima como do mundo exterior, sao produzidos
realmente pela opera<;ao de causas secundarias, assim como
no-lo dizem as nossas intui<;oes inatas e necessarias.
4a. Mas essas substancias criadas nao sao autoexistentes,
isto e, o motivo da sua existencia continuada esta em Deus, e
nao nas substancias.
sa. Continuam a existir, nao meramente em virtude de
urn ato negativo de Deus, o de apenas nao determinar a sua
destruis;ao, e sim em virtude do exerdcio positivo e continuo
do poder divino, man tendo-as em existencia e na posse de todas
as propriedades e fors;as de que Deus as dotou.
6a. Assim como sao inescrutaveis todos os demais modos
pelos quais o infinito atua sobre o finito, assim o e tam bern a
natureza exata da a<;ao divina que se manifesta na manuten<;ao
de todas as coisas em existencia e em a<;ao.

354
A Providencia
9. Como expor a doutrina biblica do GOVERNO providencial
de Deus?
Tendo Deus decretado absolutamente e desde a eternidade
tudo o que sucede; tendo no prindpio criado do nada todas as
coisas, pela palavra do Seu poder, e continuando depois a estar
presente em cada :itomo da Sua cria<;ao, mantendo todas as
coisas em existencia e na posse e exercicio de todas as suas
propriedades, Ele TAMBEM governa e dirige as a<;6es de todas
as criaturas assim preservadas, de modo que, sem nunca violar
as leis de suas diversas naturezas, faz, contudo, que cada urn e
todos os eventos e a<;6es sucedam segundo o plano eterno e
imutavel abrangido em Seu decreto. Ha designio na provi-
dencia. Deus escolheu Sua grande finalidade- a manifestac;;ao
da Sua propria gloria - mas, para alcan<;ar esse fim, escolheu
tam bern inumeraveis fins subordinados; estes sao fixos; e Ele
determinou todos os eventos e a<;6es nas suas diversas rela<;6es
para esses fins, e dirige continuamente e de tal modo as a<;6es
de todas as criaturas que esses fins gerais e especiais efetuam-
-se exatamente no tempo, pelos meios estabelecidos, da
maneira e nas condi<;6es que Ele determinou desde a
eternidade.
Turretino,L.6.Quaes.l, diz: "0 termo providencia abrange
tres aspectos expressos pelos vocabulos gregos prognosin,
prothesin e disikesin- o pre-conhecimento da mente, o decreto
da vontade e a administra<;ao eficaz das coisas decretadas- o
conhecimento dirigindo, a vontade ordenando e o poder
executando ... Por conseguinte, pode-se considerar a provi-
dencia, ou no decreto antecedente, ou na execu<;ao subseqi.iente:
aprimeira e a destina<;ao eterna de todas as coisas; asegunda e 0
governo temporal de todas as coisas segundo esse decreto; a
primeira eurn ato imanentedentro de Deus; asegunda eurn ato
transitorio fora de Deus. Tratamos aqui da providencia, na
maior parte, no segundo sentido do tenno". Veja aConf. de Fe,
Cap. 5, o Cat. Maior, Perg. 18 eo Breve Cat., Perg. 11.

355
Capitulo 14
10. Que prova a considerafiio das perfeifi5es divinas fornece a
favor do Jato de que h(t semelhante governo universal?
Prova-se pelas seguintes considera~6es:
1a. 0 fa to estupendo de que Deus e infinito em Seu Ser,
em Sua relac;ao com o tempo e o espac;o, e em Seu poder e
sabedoria, torna evidente que Lhe e possivel exercer provi-
dencia universal, e que devemos atribuir a capacidade muito
limitada de nossa compreensao todas as dificuldades e
contradic;6es aparentes que para n6s parecem achar-se
envolvidas em semelhante providencia.
za. A sabedoria infinita de Deus certifica que Ele tinha
em vista certa finalidade quando criou o mundo; e que nao
deixara de empregar os melhores meios para alcanc;ar esse fim
em todas as suas partes.
3a. Sua bondade infinita torna certo que Ele nao deixara
Suas criaturas sensiveis e inteligentes entregues aos la~os de
urn destino mecanico e cego; nem que as Suas criaturas
religiosas sejam isoladas dEle, sendo que a sua vida mais
elevada consiste na comunhao com Ele.
4a. Sua retidao infinita garante que Ele continuara a
governar, recompensar e punir as criaturas que Ele fez sujeitas
a obrigac;6es marais.

11. Que argumento se tira da inata constituifiiO religiosa dos


homens?
Ve-se que o sentimento religioso, quando analisado,
com preen de (a) urn sentimento de dependencia absoluta, e (b)
urn sentimento de responsabilidade moral. 0 sentimento de
dependencia absoluta leva, natural e verdadeiramente, todos
os homens em todas as nac;6es e condic;6es aconvicc;ao da pre-
senc;a imediata e do governo providencial de Deus em todo o
universo e em todos os eventos. Estar sem Deus no mundo e
estar numa condic;;ao em que sao negadas as convicc;;6es
elementares da natureza humana. 0 sentimento de responsa-
bilidade moral leva todos os homens a crerem num governo

356
A Providencia
moral supremo e universal, presente no mundo, protegendo
os bons e restringindo e castigando os maus. Se Deus nao
cstivesse real e imediatamente presente na natureza e na hist6ria
da humanidade, nao 0 poderiamos conhecer, e tampouco Ele
nos dirigiria enos protegeria, e, em conseqiiencia, a obediencia
a Ele nao Lhe seria devida nem seria possivel, e a moralidade,
a religiao e a ora<;ao, todas estas igualmente nao passariam de
ilus6es.

12. Que argumento se tira da inteligencia manifestada nas


opera foes da natureza?
0 grande argumento indutivo que prova a existencia de
um Deus pessoal baseia-se nas provas claras de que ha designio
no universo. Ora, do mesmo modo que as provas de designio
na constitui<;ao da natureza constatam a existencia de um
espirito que tem certos designios e os levou a efeito numa
cria<;ao, assim tambem as provas de designio nas opera<;6es da
natureza constatam a existencia de um espirito que tem certos
designios e os leva a efeito no governo providencial.
Os elementos materiais, com suas diversas propriedades,
sao todos incapazes de formar um designio; e, contudo, vemo-
-los todos ajustados de tal modo, em todas as suas propor<;6es
e rela<;6es, que operam harmoniosamente na ordem de certas
leis gerais, e vemos que essas leis gerais sao ajustadas de tal
modo em todas as suas coincidencias e interferencias intrin-
cadas que, por movimentos simples e outros complexos,
regulares e outros fortuitos, produzem em toda parte, harmo-
niosamente, os resultados idealizados de modo o mais sabio e
benefico. As propriedades mecanicas e quimicas dos atomos
materiais; as leis da vida vegetal e animal; os movimentos do
sol, da lua e das estrelas no ceu; os raios calorificos, luminosos
e quimicos do sol; os movimentos instintivos, como tambem
os voluntarios, de tudo quanta vive na terra, estao todos agindo
e reagindo sem concerto ou designio possivel da parte deles;
e, apesar disso, estao produzindo os resultados mais sabios e

357
Capitulo 14
beneficos. E, assim como o espirito que tern o designio nao
pertence a nenhum dos elementos, e evidente que tampouco
pertence areuniao de todos eles. S6 pode pertencer a urn Deus
pessoal, presente, totalmente sabio e todo-poderoso, que dirige
e governa todas as coisas pelo exerdcio presente do seu poder
inteligente nas criaturas e por intermedio delas.

13. Como se pode estabelecer esta doutrina mediante provas


derivadas da hist6ria do mundo?
Sea constituir;ao da natureza humana (alma e corpo), em
suas relac;6es elementares com a sociedade humana, prova a
existencia de urn Criador com certos designios, exatamente
do mesmo modo os resultados da associac;ao humana, sabia-
mente idealizados, em geral e em casos individuais provam a
existencia de urn Governador providente que tern certos
designios.
Ecerto que os homens, quer como individuos, quer como
reunidos em comunidades e nac;6es, diferem dos elementos
do mundo material em seus modos de ac;ao, porque agem, 1°.
livremente, por impulso proprio; e 2°. com designio. Ao
mesmo tempo, e tao limitada a esfera, tanto da previsao como
do designio de cada agente individual, tao grande a multi-
plicidade dos agentes, e tao inumeraveis as complicac;6es de
diversas influencias que atuam entre si e sobre cada comuni-
dade, tanto dentro de uma como tambem da parte de outras
comunidades, e da natureza exterior, que, afinal, quaisquer
individuos ou comunidades s6 conseguem levar a efeito os seus
desfgnios em escala muito limitada, e quase se perdem de vista
no resultado geral, resultado que igualmente esta alem da
previsao e da direc;ao eficaz de todos. Mas quem estuda a hist6ria
geral, e se serve da chave da revelac;ao, ve claramente os trac;os
de urn desfgnio geral em todos os gran des movimen tos da
hist6ria humana, e em certos pontos ate se interligando
visivelmente com as ac;6es de agentes individuais. Por conse-
guinte, a providencia de Deus, como urn todo, compreende e

358
r A Providencia
dirige as pequenas providencias dos homens.

14. Qual o argumento biblico, derivado das profecias, promessas


e amear;as de Deus?
Em inumeniveis casos Deus predisse nas Escrituras, com
muitos pormenores e absolutamente, a ocorrencia certa de
determinados eventos, e prometeu ou amea~ou contingente-
mente que outros eventos aconteceriam sob certas condi~6es.
Isso, porem, seria iludir os homens, se Deus nao empregasse
os meios necessarios para cumprir a Sua palavra.
Nao e razoavel contender, dizendo que Deus simplesmente
previa os eventos e assim os predisse, prometeu ou amea~ou
porque, a respeito de muitos, a promessa ou amea~a e
condicional, sendo baseada numa condi~ao que nao estava na
rela~ao de causa para como evento. E Deus nao podia prever
urn even to como contingente de outro que nao tenha com Ele
a rela~ao causal. N esse caso, a verdade da promessa ou amea<;;a
certamente nao pode depender de nenhuma conexao natural
entre os dois eventos, e sim, unicamente, da determina<;;ao de
Deus de fazer urn seguir-se ao outro.

15. Como se prova pelas Escrituras que a providencia de Deus


estende-se a todo o mundo natural?
J6 9:5,6; 21:7-9; 37:6; Sal. 104:14; 135:5-7; 147:8-18;
148:7,8; Atos 14:17.

16. Como se prova pelas Escrituras que a providencia de Deus


compreende os animais irracionais?
Sal. 104:21-29; 146:9; Mat. 6:26; 10:29.

17. Como se prova pelas Escrituras que a providencia divina se


estende aos quefazeres gerais dos homens?
1 Cron. 16:31; J6 12:23; Sal. 10:12-15; 47:7; 116:7; Prov.
21:1; Dan. 2:21; 4:25. ~ q.
Capitulo 14
18. Como se mostra pelas Escrituras que as circunstancias dos
individuos sao dirigidas par Deus?
1 Sam. 2:6; Sal.18:30; Prov.16:9; Is,45:5; Luc.1:53; Tia.
4:13-15.

19. Como se prova que os eventos par nos considerados fortuitos


estiio sob a direfiio de Deus?
1°. Chamamos fortuito o evento cujas causas proximas,
quer por serem muito complexas, quer por serem muito sutis,
escapam anossa observa<;:ao. Todos os eventos dessa natureza,
porem, como, e.g., a queda de uma folha, acham-se ligados ao
sistema geral - tanto por seus antecedentes como por suas
conseqiiencias.
2°. As Escrituras afirmam o fato - Ex. 21:13; Jo 5:6; Sal.
75:6,7; Prov. 16:33.

20. Que distinfiio se tem feito entre providencia geral e


providencia particular, e qual ea doutrina verdadeira?
A maioria dos homens admite que Deus exerce uma pro-
videncia geral diretora sobre os quefazeres humanos, dirigindo
o seu curso geral e determinando os grandes e importantes
eventos, mas considera supersticiosa e derrogatoria da sublime
dignidade e grandeza de Deus a concep<;:ao segundo a qual Ele
Se importa com todos os pormenores triviais. E muitos outros,
cujas ideias sobre este ponto nao sao muito claras, nutrem esse
mesmo sentimento, julgando praticamente do mesmo modo
todos os eventos em sua rela<;:ao aprovidencia divina.
Mas esse sentimento e essa concep<;:ao nascem de ideias
muito inadequadas e antropomorficas sobre os atributos de
Deus e Seu modo de operar, como se para a Causa absoluta e o
Governador infinito pudesse existir a mesma diferen<;:a entre
coisas pequenas e grandes que existe para nos; como se tam-
bern para Ele, assim como para nos, uma multidao de
pormenores fosse mais incomoda ou menos digna de aten<;:ao
do que o e algum grande resultado. Uma providencia geral e
A Providencia
11 1lla especial nao podem ser dois diversos modos de operas;ao
divina. A mesma administra~ao providencial e necessaria-
ll l<.:nte ao mesmo tempo geral e especial, porque se estende
'I'Ualmente e sem exce~ao a todos os eventos e a todas as
l riaturas do universo. Uma providencia geral eespecial porque

1 onsegue resultados gerais pela dires;ao de todos os eventos,

~·randes e pequenos, que contribuem para esses resultados; e


ll ma providencia especial egeral porque dirige especialmente
tndos os seres e todas as a~6es individuais em todo o universo.
'lhuos os eventos acham-se de tal modo relacionados uns com
ns outros como urn sistema encadeado de causas, efeitos e
ondis;6es, que uma providencia geral que nao seja ao mesmo
I mpo especial nao e mais concebivel do que o eurn todo que
IIllO tenha partes OU uma COrrente que nao tenha elos.

21. Como se prova que o governo providencial de Deus estende-


IL' as afOes livres dos homens?
1°. As as;6es livres dos homens sao causas potentes com
i nfl uencia sobre o sistema geral das coisas exatamente do
lll<.:smo modo como se da com todas as outras classes de causas,
·, por conseguinte, segundo o principia indicado na resposta a
pcrgunta anterior, devem estar sujeitas a Deus, ou, de outro
modo, ser-Lhe-a impossfvel qualquer forma de providencia.
2°. As Escrituras afirmam esta verdade- Ex. 12:36; 1 Sam.
24:9- 15; Sal. 33: 14,15; Prov. 16:1; 19:21; 20:24; 21:1; Jer. 10:23;
Fil. 2: 13.

22. Como se prova pelas Escrituras que a agencia providencial


cle Deus eexercida sabre as afi5es pecaminosas dos homens?
2 Sam. 16: 10; Sal. 25:3; 76: 10; Atos 4:27,28; Rom. 11:32.

23. Que ensinam as Escrituras quanta aagencia providencial


ell' Deus nas boas afi5es dos homens?
As Escrituras atribuem tudo quanta hade born no homem
a liv re gras;a de Deus, operando tanto providencial como

361
Capitulo 14
espiritualmente, e influindo tanto no corpo como na alma e ·.
nas relac;6es externas do indivfduo- 2 Cor. 12:9,10; Gal. 5:22-
I
25; Ef. 2: 10; Fil. 2: 13; 4:13.
Devemos estar lembrados, porem, de que, embora uma
causa material possa ser analisada e decomposta na interac;ao
mutua de dois ou mais corpos, a alma humana age espon-
taneamente, isto e, gera ac;ao. E tambem de que a alma, em
todos os seus atos voluntarios, e determinada por seus pr6prios
desejos e disposic;6es predominantes.
Quando, pois, as Escrituras atribuem a Deus todas as boas
ac;6es dos homens, isso nao quer dizer, 1°. que Ele as cause,
nem, 2°. que Ele determine o homem a pratica-las indepen-
dentemente da livre vontade do mesmo homem; e sim que
Deus opera de tal modo sobre o hom em, de dentro e espiritual-
mente, e por fora, por meio de influencias morais, que produz
a disposic;ao livre e boa. Ele opera primeiro em n6s o querer,
e entao tambem o fazer a Sua boa vontade.

24. Que ensinam as Escrituras sabre a relafiio da providencia


com as ar;oes pecaminosas dos homens?
As Escrituras ensinam:
1°. Que as ac;6es mas dos homens esdio sob a direc;ao
eficaz de Deus no sentido de que elas s6 sao praticadas com a
Sua permissao e segundo o Seu prop6sito- Gen. 37:28; 45:5;
50:20. Confira 1 Sam. 6:6; Ex. 7:13; 14:17; Is. 46:4; Atos
2:23; 3: 18; 4:27,28; 2 Tess. 2:11.
2°. Susta e dirige eficazmente o pecado- Gen. 50:20; Sal.
76: 10; Is. 10:15.
3°. Domina-o para o bern- Gen. 50:20; Atos 3:13.
4°. Deus nem causa nem aprova o pecado. Tao-somente o
permite, o dirige, o restringe, o limita, o governa. 0 homem,
agente livre, e a unica causa responsavel e culpada dos seus
pr6prios pecados.
Turretino exp6e do modo seguinte o testemunho das
Escrituras a respeito deste assunto:

362
A Providencia
1°. Quanta ao comefo do pecado. ( 1) Deus o permi te
livremente. Mas essa permissao nem e moral, is toe, em bora o
permita, nao o aprova nunca; nem meramentenegativa, isto e,
Ele nao concorda simplesmente com o resultado, mas
determina positivamente que, para certos fins sabios e santos,
seja permitido aos maus homens que ajam segundo suas
naturezas mas- Sal. 81: 12; Atos 4:27,28. (2) Abandona OS que
pecam, ou tirando-lhes a gra<;:a de que abusaram, ou nao lhes
dando mais. Esse abandono pode ser (a) parcial, para provar o
cora<;:ao do homem- 2 Cron. 32:31, ou (b) corretivo, ou (c)
penal- Jer. 7:29; Rom. 1:24-26. (3) Deus ordena as
circunstancias providenciais de modo que a maldade inerente
aos homens se manifeste como Ele determinou permitir que o
fa<;:a- Atos 2:23; 3:18. (4) Deus entrega os homens a satanas,
(a) como tentador- 2 Tess. 2:9-11, ou (b) como atormentador
- 1 Cor. 5:5.
2°. Quanta ao progresso do pecado, Deus limita a sua
intensidade, a sua dura<;:ao e a sua influencia sobre outros. Isso
Ele efetua tanto por influencias internas sobre o cora<;:ao, como
pela dire<;:ao das circunstancias externas- Sal. 76:10.
3°. Quanta ao jim ou ao resultado do pecado, Deus sempre o
dominae o dirige para o bern- Gen. 50:20; J6 1: 12; 2:6-10;
Atos 3: 13; 4:27,28.

25. Em que tres classes gerais se pode dividir todas as teorias


quanta ao governo providencial de Deus?
1a. As que afastam Deus de toda a<;:ao atual no universo, e
afirmam a independencia completa das causas secundarias. 2a.
As que mais ou menos explicitamente negam a opera<;:ao real
das causas secundarias e aceitam Deus como o (mico agente
ativo no universo. 3a. A teoria intermedia ou crista, que sus-
tenta todos os prindpios que a este respeito ensinam as
Escrituras, como sejam: a eficacia real das causas secundarias,
especialmente a liberdade do homem nas suas a<;:6es e sua
responsabilidade moral por elas, e, ao mesmo tempo, a dire<;:ao

363
Capitulo 14
universal e eficaz de Deus, pela qual, em perfeita conformidade
com os atributos da Sua natureza, e com as diversas proprie-
dades de Suas criaturas, Ele determina e disp6e todos os eventos
e todas as a~6es segundo o Seu prop6sito soberano.

26. Como se pode expor a teoria mecanica da providencia?


Esta teoria sup6e que, quando Deus criou o universo,
dotou todos os diversos elementos rnateriais e espirituais de
suas propriedades e fon;:as respectivas, que depois as reuniu
ern certas cornbina~6es e propor~6es, e assirn os tornou sujeitos
a certas leis gerais. 0 rnundo e assirn urna rnaquina cujas
diversas pe~as o Criador calculou de tal modo que ela efetua
agora de per si todos os prop6sitos que o Criador teve ern vista.
Tendo-lhe dado corda, Deus deixou o rnundo entregue a si
proprio. Deus e a Causa prirnaria no senti do de sera primeira
de urna serie interrninavel de causas que se afastam cada vez
mais da sua origem. Alguns fil6sofos lirnitam este mecanismo
rijo ao mundo fisico e consideram a vontade livre dos homens
como urn fator absolutarnente indeterrninado compreendido
no rnecanisrno geral do rnundo. Mas a rnaioria dos que adotarn
esta teoria rnecanica nega a liberdade do homern eo considera
como urn dos elementos c6smicos nao essencialmente diferente
dos demais.
Portanto, todas as interven~6es providenciais e todos os
milagres seriam irnpossfveis. Supor que ha necessidade de
semelhantes interven~6es seria supor que houve algurn defeito
radical na obra criadora de Deus- que era incapaz de precalcu-
lar todas as cornbina~6es necessarias, ou entao, que era incapaz
de produzir urna rnaquina que trabalhasse por si rnesrna. Diz
o professor Baden Powel: "E derrogante ao poder e asabedoria
infinitos a suposi<;ao de que a ordern de coisas foi estabelecida
tao irnperfeitarnente que se torna necessaria de vez em quando
interrornpe-la e viola-la". E Theodore Parker diz: "Os hom ens
servern-se de expedientes precarios; mas o Infinito nao lan<;a
mao de artificios e subterfugios: nao ha caprichos ern Deus, e,

364
A Providencia
por conseqi.H~ncia, nao ha milagres na natureza". · -:.:1 . · 1~. ·'
27. Como se pode demonstrar que esta teoria efalaz? --~ "fi·';,,
1o. Esta em oposic;ao ao ensino claro da Palavra de Deus,
exposto nas respostas as perguntas 15-21. 2°. Eessencialmente
irreligiosa e materialista. Deixa de reconhecer que a educac;ao
e a disciplina de agentes inteligentes e livres e 0 grande fim ao
qual esta adaptado o universe como urn sistema de meios.
Separa de Deus as almas dos homens, torna irris6ria a orac;ao,
impossivel a revelac;ao, a responsabilidade moral em pre-
conceito, e a religiao em ilusao. 3°. Baseia-se numa ideia
antropom6rfica de Deus, antropom6rfica e nimiamente
mesquinha. Concebe o universo simplesmente como urn
sistema med'mico de causas e como se tivesse com Deus a
mesma relac;ao que uma maquina humana tern com o seu
fabricante, que esta necessariamente fora da sua obra. Deixa
inteiramente- (1) De apreender a imanencia do Criador na
criac;ao como espirito onipresente e sempre ativo e diretor,
como agente pessoal, que faz leis operando segundo leis como
fim de efetuar prop6sitos por Ele escolhidos; (2) De apreender
a verdadeira natureza do universo em relac;ao aos seus fins
supremos como sistema moral estabelecido com a intenc;ao de
instruir e desenvolver agentes morais, livres e pessoais, criados
a imagem de Deus.
Urn sistema que envolva uma ordem estabelecida da
natureza, e que proceda com sabia adaptac;ao dos meios para
efetuar certos fins, e necessario como meio de comunicac;ao
entre o Criador e a criac;ao inteligente, e para efetuar a educac;ao
morale intelectual dessa criac;ao. Esomente assim que se pode
exercitar e manifestar os atributos divinos de sabedoria, retidao
e bondade, e esomente assim que os anjos e os homens podem
compreender o carater de Deus e antecipar a Sua vontade, ou
cooperar inteligente e voluntariamente como Seu plano.
Parece necessario, porem, que em conexao com urn
sistema geral de meios e leis haja ocasionalmente exerdcios
diretos de poder, nao s6 "no prindpio, para criar causas

365
Capitulo 14
secundarias e inaugurar a sua opera<;:ao, mas tambem subse-
qiientemente, para dar aos suditos do Seu governo moral a
revela<;:ao da Sua personalidade livre e de Seu interesse imediato
nos afazeres deles. Em todo caso, tal a<;:ao direta e ocasional e
necessaria para a educa<;:ao do homem no seu estado atual. Urn
milagre, embora efetuado pelo poder divino sem meios, e em
si mesmo urn meio para efetuar urn fim, e faz parte de urn
plano. Todas as leis naturais tiveram origem na razao divina, e
sao express6es da vontade de levar a efeito urn prop6sito -Apud
Duque de Argyle, em sua obra Reign of Law. A "ordem da
natureza" e tao-somente urn instrumento da vont.ade divina,
instrumento utilizado em subordina<;:ao a esse governo moral
superior em cujos interesses sao realizados os milagres. Assim,
pois, "a ordem da natureza", a providencia comum de Deus, e
os milagres, em vez de estarem em conflito entre si, sao os
elementos intimamente correlacionados de urn s6 sistema
universalmente compreensivo.

28. Que classes de fil6sofos tem real ou virtualmente negado a


eficacia das causas secundarias?
Todos os panteistas, como e natural, consideram todas as
causas secundarias como modifica<;:6es da Causa Primaria, e a
Deus como o unico agente real no universo. Descartes, apesar
de crer em Deus e na real existencia objetiva de agentes mate-
riais como tambem espirituais, nao obstante, sustentava que
esses agentes eram criados de novo em cada momento
sucessivo, e em todos os seus sucessivos estados e a<;:6es, de
modo que realmente fazia das causas secundarias outras tantas
modifica<;:6es da Causa Primaria. Dai seus disdpulos deduzi-
ram a teoria das causas ocasionais, dizendo que as mudan<;:as
ocorridas nas causas secundarias sao simplesmente as ocasi6es
em que a Causa Primaria exercita a Sua agencia eficaz e produz
o respective efeito. Isso levou ao panteismo de Spinoza. 0 Dr.
Emmons, da Nova Inglaterra, sustentava, em conexao com
uma "teoria do exerdcio", a doutrina da eficacia divina. Tudo

366
A Providencia
quanto sabemos que ocorre na alma humana e uma serie de
exercicios ligada a urn fio obscuro de consciencia. Deus e a
causa real, criando em cada momenta cada urn desses exerdcios
em suas sucess6es, tanto os maus como os bons, do mesmo
modo como urn musico produz num instrumento de sopro as
notas sucessivas, a Sua vontade.
A esta classe de especula<;6es pertence a teoria do "con-
curso", que por tanto tempo esteve em voga na lgreja.

29. Qual a doutrina representada pela frase "CONCURSUS geral


e indiferente ", e quais foram os seus defens ores?
Durante muitos seculos os te6logos discutiram as quest6es
relacionadas como CONCURSUS, ou seja, o influxo e a coopera<;ao
de Deus nas causas secundarias.
Os jesuitas, e com eles os socinianos e os remonstrantes,
sustentam que esse "concursus" e s6 "geral" e "indiferente";
isto e, que e igualmente com urn a todas as causas, incitando-as
a a<;ao, mas indiferentemente, isto e, a Causa Primaria e, por
assim dizer, simplesmente urn estimulo as causas secundarias,
deixando entao a cada uma a iniciativa de determinar o seu
modo particular de a<;ao. Ilustram isso referindo-se ao poder
vivificador do sol, que espalha os seus raios universal e
indiferentemente sobre todos os objetos terrestres, raios que
sao o principio comum de toda vida e de todo movimento.
On de esses raios nao chegam nao ha vida. Ao mesmo tempo, o
sol conserva-se indiferente a qualquer forma particular de vida
ou de movimento- e cada germe em particular brota segundo
a sua propria especie sob o poder vivificador do mesmo sol.
E evidente que esta teoria admite que Deus conserva as
essencias e as for<;as ativas de todas as coisas, mas, por omissao,
nega virtualmente todo real governo providencial. Segundo
ela, Deus criou e conserva todas as coisas, e estas, por sua vez,
operam espontaneamente e sem Sua dire<;ao eficaz, conforme
a sua natureza e as suas tendencias.

367
Capitulo 14
30. Qual a doutrina representada pela frase "CONCURSUS
simultaneo e imediato"?
Esta frase exprime urn ato de Deus em que Ele coopera
com a criatura no ato dela, como concausa, na produc;ao do ato
como entidade. Nesta teoria, e na oposic;ao ao "CONCURSUS geral
e indiferente" acima explicado, concordaram os disdpulos de
Tomaz de Aquino na igreja romana e todos os te6logos luteranos
e reformados. Ainda restava, porem, como ponto dificil e de
divergencia, a questao a respeito de quem e 0 fator determi-
nante nessa causalidade dual. Seria Deus quem determina a
criatura em todos os casos a agir, e a agir do modo como age e
nao de outro modo, ou seria a criatura que se determina a si
mesma?

31. Qual a doutrina expressa na frase "CONCURSUS previa e


determinante", e quais foram as seus defens ores?
Em razao da questao acima pendente, os te6logos refor-
mados ou calvinistas sustentavam ein acrescimo a doutrina do
"praecursus", ou seja, de urn "CONCURSUS previo e deter-
minante", quer dizer, uma energia atuando sobre a criatura e
determinando-a em cada caso a agir, e exatamente do modo
como age. Alguns aplicaram isso unicamente as boas ac;6es
dos homens; outros, mais logicamente, aplicaram-no a todas e
quaisquer ac;6es.

32. Como procuraram as te6logos reformados conciliar essa


doutrina com a liberdade do homem e a santidade de Deus?
Quanto a liberdade do homem, diziam - 1°. Que e urn
misterio. 2°. Que OS dois fatos, (a) de que a ac;ao humana e
livre, e (b) de que Deus dirige eficazmente essa ac;ao, sao
claramente revelados nas Escrituras, e por isso nao podem
deixar de ser conciliaveis, quer isso nos seja possivel quer nao.
3°. Alegavam que omodus operandi desseconcursus divino varia
segundo a natureza da criatura em que atua, e que esta sempre
em perfeita conformidade com a natureza dessa criatura e com

368
A Providencia
os seus modos de a<;ao. "Desde que, pois, a Providencia nao
concorre com a vontade humana, nem por via de coa<;ao,
obrigando uma vontade que nao o queira, nem por via de
determina<;ao fisica, como se fosse coisa brutal e cega, sem juizo
algum, e sim racionalmente, dirigindo a vontade de uma
maneira congruente com ela, para que se possa determinar a
si mesma, segue-se que, achando-se a causa proxima da a<;ao
de cada homem no juizo da sua propria inteligencia e na
escolha espont:1nea da sua propria vontade, a Providencia nao
constrange a liberdade de ninguem, mas antes a sustem" -
Turretino, L. 6, perg. 6.
"Moveri voluntarie est moveri ex se, i.e., a principia
intrinseco. <<Sed illud principium intrinsecum potest esse ab alia
principia extrinseco. Et sic moveri ex se non repugnat si, quod move-
tur ex alia. Illud quod movetur ab alia dicitur cogi, si moveatur
contra inclinationem propriam; sed si moveatur ab alia quod sibi
dat propriam inclinationem, non dicitur cogi. Sic igitur Deus maven-
do voluntatem non cogit ipsam, quira dat ei ejus propriam inclina-
tionem"- Tomaz, vol. 1, pags. 105,4, citado por Dr. Charles
Hodge.
Quanto a santidade de Deus em rela<;ao as a<;6es pecami-
nosas das criaturas, esses teologos sustentavam - 1°. Que a
origem do pecado esta num defeito ou numa causa secreta. 2°.
Que ha uma diferen<;a entre urn ato de per si como entidade, e
sua qualidade moral. Deus e a concausa eficaz daquele, mas
nao desta, sese tratar de urn ato mau. Citavam como ilustra<;ao
disso o caso de urn instrumento musical mal afinado nas maos
de urn musico peri to. 0 musico e a causa de cada urn dos sons
produzidos em sua ordem, porem o desarranjo no instrumento
e o unico fator causante da desarmonia. 3°. Segue-se que a
rela<;ao da providencia de Deus com as a<;:6es mas dos homens
e muito diversa da sua relaqao com as aqoes boas. No caso
destas, Deus nao somente coopera na sua produqao, mas da
tambem a gra<;a que lhes comunica a sua qualidade moral. No
caso das mas a<;6es, porem, o concursus e limitado ao ato, e a

369
Capitulo 14
qualidade rna e derivada unicamente da criatura.

3 3. Expor as divers as objefoes feitas contra esta teoria de CON-


CURS US.
1. E uma tentativa sem sucesso, de ultrapassar os fatos
ensinados pelas Escrituras, em sua busca de uma explanac.;:ao
da maneira que Deus age sobre a criatura para efetuar Seus
objetivos.
2. Esta teoria tende a negar a eficiencia de causas secun-
darias e, portanto, tende ao panteismo. Este perigo foi menos
apreciado pelos grandes reformadores e seus sucessores, nos
seculos 16 e 17, do que, necessariamente, chegqu a ser em
nossos dias. E de suma importancia que sustentemos ambas
as verdades correlatas da eficiencia de causas secundarias, e da
providencia controladora de Deus da liberdade humana e da
soberania divina, deixando entao a questao de reconcilia-las
para o futuro.

34.Ate onde as Escrituras nos ofirecem algum ensino acerca da


natureza do governo providencial de Deus?
Nada absolutamente explicam quanto amaneira pela qual
Deus exercita a Sua agencia, mas afirmam explicitamente, e
em toda parte postulam, o fato de que Ele governa todas as
Suas criaturas e todas as ac.;:6es delas, e tambem exp6em muitas
das caracteristicas desse governo.
Afirmam que:
1°. E universal- Sal. 22:28,29; 103: 17-19; Dan. 4:34,35;
2°. E particular- Mat. 10:29-31;
3°. Compreende os pensamentos e as volic.;:6es dos homens,
e muitos eventos que parecem contingentes- 2 Cron. 16:9;
Prov.16:9,33; 19:21; 21:1.
4°. E eficaz- J6 23: 13; Sal. 33: 11; Lam. 2:17.
5°. Ea execuc.;:ao do Seu prop6sito eterno, compreendendo
em urn s6 sistema inteiro todas as Suas obras, desde o principio
-Sal. 104:24; Is. 28:29; Atos 15: 17,18; Ef. 1:11.

370
A Providencia
6°. Seu fim principal e a gloria de Deus, e, subordi-
nadamente a isso, o bern supremo da Sua Igreja redimida
-Rom.8:28; 9:17; 11:36.
7°. As Escrituras ensinam que e impossivel que a maneira
pela qual Deus executa o Seu governo providencial nao seja
conciliavel com as Suas proprias perfei<;6es, porque Deus "nao
pode negar-se a si mesmo"- 2 Tim. 2:13.
8°. Etambem congruente com a natureza de toda criatura
sujeita a esse governo, porque todos os agentes livres continuam
livres e igualmente responsaveis.
9°. As Escrituras ensinam tambem que, no caso das boas
a<;6es dos homens, Deus da a gra<;a e o motivo, e coopera nos
atos desde o principia ate ao fim- Fil. 2:13. E, no caso das
mas a<;6es dos homens, permite-as simplesmente, restringe-
-as, e domina sabre elas para a Sua propria gloria e o bern
supremo da criac;ao.

35. Como se pode conciliar como governo providencial de Deus


a existencia do mal fisico e do mal moral?
A origem e a permissao do mal moral sao urn misterio
que nao sabemos explicar.
Quanta ao mal fisico, respondemos:
1°. Que nunca e enviado como urn fim em si mesmo, mas
sempre como urn meio para alcanc;ar urn bern maior.
2°. Que nas suas rela<;6es atuais com o mal moral, como
corretivo e punitivo, a existencia do mal fisico e justificada
tanto pela razao quanta pela consciencia como perfeitamente
digna de urn Deus sabio, reto e misericordioso.

36. Como se pode demonstrar que a distribuifiiO aparentemente


anomala da felicidade e da miseria neste mundo niio e inconciliavel
com a doutrina da providencia?
1°. Cada agente moral neste mundo recebe mais bens e
menos males do que merece.
2°. A felicidade e a miseria acham-se distribuidas muito

371
Capitulo 14
mais igualmente neste mundo do que a principia parece
num exame superficial.
3°. Como regra geral, a virtude e recompensada eo vicio
e punido mesmo neste mundo.
4°. A dispensa~ao atual e tempo de educa~ao, prepara~ao
e prova, e nao de recompensas e castigos- Veja Sal. 73.

PROVIDENCIAS EXTRAORDINARIAS
E MILAGRES

37. Em que sentido se diferenciam as providencias extra-


ordinarias dos eventos ordinarios em sua relafiio co~ a direfiio
providencial de Deus?
Eventos como o v6o de codornizes e a pesca mencionados
em Numeros 11:31,32 e Lucas 5:6, ate onde nos sabemos,
diferem dos eventos que sucedem sob o normal governo
providencial de Deus somente na conjun~ao divinamente
prearranjada das circunstancias. Os eventos sao extraordinarios,
mas nao sao sobrenaturais, e sua peculiaridade consiste somente
em sucederem em conjun<;ao eminentemente aprazivel com
certos outros eventos como, e.g., o aperto em que se achavam
os israelitas ou os ap6stolos, com os quais eventos, porem, eles
nao tinham nenhuma conexao natural.

38. Como sao designados as milagres no Novo Testamento?


Sao chamados - (1) terata, prodigios, Atos 2: 19; (2)
dunameis, obras de poder sobre-humano; e (3) semeia, sinais,
Joao 2: 18; Mat. 12:38. Essa ultima designa<;ao exprime o seu
verdadeiro fim, que eo de serem "sinais", impossiveis de imitar
ou falsificar, de que alguem foi comissionado e autenticado
por Deus para ser mestre religioso e ensinar sua doutrina.

39. Como se deve, pais, definir o milagre, no sentido biblico da


palavra, de modo que fique assinalada a sua diferenfa especifica
tanto de eventos sobrenaturais em geral, como das providencias

372
A Providencia
extraordinarias definidas sob a Perg. 37? ;.·;., : iifJ
0 milagre e (1) urn evento·que sucede no mundo fisico e
que pode ser notado e discriminado com certeza pelos sentidos
corporais de testemunhas humanas (2) de car:her tal que nao
possa ser referido racionalmente a nenhuma causa que nao seja
a voli<;ao imediata de Deus, (3) essa voli<;ao acompanhando
urn mestre religioso como fim de autenticar a sua comissao
divina e a veracidade do seu ensino.

40. Em que termos se pode expor a objefiio a priori contra a


possibilidade do milagre, por envolver essencialmente a violafiio das
leis da natureza? Como lhe dar resposta?
Diz-se que tanto a experiencia universal como a inte-
gridade da razao humana concordam em garantir que e
absolutamente inviolavel a lei da continuidade - que todo
even to possivel tern sua explica<;ao plena em causas adequadas
que o precederam, e que cada evento, por sua vez, e a causa de
uma serie interminavel de conseqiiencias subseqiientes.
Nenhum evento pode ser isolado de seus antecedentes e das
respectivas conseqiiencias, nem de suas condi<;6es, e toda causa
opera segundo uma lei inteligivel da natureza.
Tudo is so e verdade, eo e tanto em referencia aos milagres
como em referencia a quaisquer outros eventos.
Se por "lei da natureza" entendemos as for<;as fisicas que
produzem efeitos, entao nenhum milagre envolve a suspensao
ou viola<;ao de tal lei. E da experiencia geral que as for<;as
modificam umas as outras, e cada for<;a adicional combina-se
com outras na produ<;ao de efeitos de outro modo impossiveis.
Se por "lei da natureza" entendemos o curso comum dos
eventos observados na natureza, en tao o milagre e, segundo a
defini<;ao dada, uma suspensao notavel desse curso. Mas a
mesma coisa e efetuada todos os dias pelos homens, que
interferem na ordem natural dos eventos que ocorrem na
natureza.
Em todo evento fisico ha uma combina<;ao de concausas

373
Capitulo 14
que o efetuam. A vontade humana nao viola nenhuma lei
quando opera, e nao aniquila nenhuma for~a; simplesmente
combina em condi~6es especiais diversas for~as naturais, e
interp6e na soma das concausas uma concausa nova- a voli~ao
humana.
Quando Eliseu "cortou urn pau, eo lan~ou ali, e fez nadar
o ferro"- 2 Reis 6:6, nao foram mudados os pesos espedficos
nem do ferro nem da agua, nem foi suspensa a lei da gravita<;ao.
0 milagre consistiu unicamente na interposi~ao, por uma
voli<;ao divina, de uma nova for<;a transit6ria, igual adiferen~a
dos pesos especificos da agua e do ferro, e agindo no sentido
oposto ao da gravita~ao. Isso e exatamente analogo a a~ao da
vontade humana sobre objetos fisicos - com esta exce~ao - a
vontade do homem atua sobre objetos exteriores s6 indireta-
mente, mediante o mecanismo de seu corpo, e diretamente s6
sobre os seus musculos voluntarios; enquanto que a vontade
de Deus opera diretamente sobre todos os elementos do mundo
que Ele criou. E poder-se-ia mostrar que aquilo que e realmente
verdade neste milagre simples, tambem o e nos mais
complexos, como, e.g., a ressurrei~ao de Lazaro, se tivessemos
conhecimento suficiente da quimica e da fisiologia da vida
humana.
John Stuart Mill (Essay on Theism, Parte 4) diz: "Pode-se
dizer que "o poder da voli~ao sobre OS fenomenos e tambem
uma lei, e uma das leis da natureza de que os homens adqui-
riram primeiro o conhecimento e de que primeiro se serviram ...
S6 nao e uma exce~ao alei a interferencia da vontade humana
no curso da natureza quando incluimos entre as leis a rela~ao
de motivos para a voli~ao; e, segundo a mesma regra, a
interferencia da vontade divina nao seria tampouco uma
exce~ao, porque nao podemos deixar de supor que a Deidade,
em todos os Seus atos, e determinada por motivos". A analogia
alegada e boa; mas 0 que ela prova e s6 0 que tenho sustentado
desde o principia- que se poderia provar a interferencia divina
no curso da natureza se tivessemos a seu favor a mesma especie

374
A Providencia
de pro vas que temos a favor das interferencias humanas".
Isto e, o maior de todos os racionalistas filos6ficos sustenta
que nao ha motivos a priori para que se julgue impossfvel o
milagre. Esimplesmente uma questao de suficiencia de provas.
Todo cristao esta perfeitamente convencido de que as provas
(hist6ricas, morais e espirituais) a favor da cren<;;a na ressur-
rei<;;ao de Jesus Cristo e dos milagres associados historicamente
a esse evento sao completas e suficientes.

41. Que diz a ob}efdo contra os milagres, tirada do equilibria


do universo, e como responder-the?
E urn fato que o universo fisico inteiro forma urn s6
sistema, e que, como se acha ajustado atualmente, esta num
estado de equilibria tao delicado que a adi<;;ao ou a subtra<;;ao
de urn s6 atomo em qualquer parte perturbaria esse equilibria
no sistema inteiro. Uma perturba<;;ao, por urn minuto que fosse,
ab extra- a entrada de urn agente nao pertencente ao sistema
das coisas, seria destrutiva para o todo.
E evidente que esta obje<;;ao teria peso, se o universo
material fosse urn todo exclusivo por si s6, e se nao estivesse
em rela<;;ao constitucional com Deus. Todavia, se Deus e a
cria<;;ao juntos formam urn todo- urn completo universo de
coisas- entao a obje<;;ao e absurda. A soma das atividades de
Deus e o necessaria complemento da soma das atividades de
todas as Suas criaturas, e s6 assim e que o equilibria e mantido.
Tambem e evidente que a vontade de Deus nao esta fora
da soma das coisas que constituem o universo mais do que o
esta a vontade do homem. E o homem esta constantemente
modificando a natureza em extensas areas, e cada momenta
esta fazendo a sua vontade atuarab extra, como nova concausa,
sob as leis fisicas do universo, dando-lhes novas dire<;;6es e novas
condi<;;6es.
Demais disso, o equilibria do universo nao e equilibria
permanente, mas esta em muta<;;ao perpetua, especialmente em
conseqti.encia da dissipa<;ao do calor e da concentra<;;ao da

375
Capitulo 14
materia nos centros de atra~ao.

42. Expor e contestar a objer;iio segundo a qual assumir a


necessidade de interferencia miraculosa seria coisa derrogat6ria a
sabedoria e ao poder do Criador.
Alega-se que a pericia de urn artifice humano manifesta-
-se sempre na medida em que a maquina construida faz o que
deve fazer sem necessidade de consertos, emendas ou dire~ao
da parte do artifice ou de outrem; que a necessidade de inter-
ven~ao ab extra, para qualquer fim, e prova de defeito da
maquina, ou ao menos de limita~ao da pericia do construtor.
Por isso se diz que nao pode haver necessidade de milagres,
senao sob a suposi~ao de que Deus mudou Seu prop6sito ou
de que ha algum defeito radical na cria~ao. Disse Theodora
Parker: "Nao ha caprichos em Deus e, por conseguinte, nao
ha milagre na natureza".
Esse argumento teria for~a se o designio dos milagres fosse
o de remediar dessa maneira qualquer defeito que porventura
se houvesse descoberto no universo flsico. Contudo, com isso
nenhum cristao jamais sonhou.
0 designio do milagre e simplesmente dar a conhecer as
criaturas inteligentes que o seu Criador intervem ativamente
no universo moral como fim de restaurar a ordem perturbada
pelo pecado. 0 sistema moral e essencialmente diferente do
sistema flsico. Este e mecanico, aquele abrange a razao, a
consciencia, a VONTADE LIVRE, e a lei dos motivos. A vontade
livre tornou possivel o pecado, e este tornou necessaria a direta
interven~ao divina, ou para remir ou para condenar.
Todos os milagres biblicos acham-se agrupados ao redor
de grandes crises ocorridas na obra da reden~ao, ou da restau-
ra~ao da lei original e natural perturbada pelo pecado. Por isso
os milagres biblicos, em vez de serem como todos os "milagres"
dos gentios, ou da igreja papal, ou do espiritismo moderno, os
quais sao simples prodigios, exibi~6es de poder, fazendo
ostenta~ao da sua viola~ao da ordem natural, sao eminente-

376
A Providencia
mente curas de moh~stias, atos cuja tendencia e cujo espirito
implicam a restaura~ao e a confirma~ao, nao a viola~ao, da lei.
0 melhor sentido da palavra LEI e ordem, disposi~ao
ordenada, atribui~ao de alguma fun~ao, com o jim de levar a
efeito um prop6sito.
Segue-se que a suprema essencia de toda lei eo prop6sito
eterno de Deus. Nao ocorreu nenhuma interven~ao miraculosa
em conseqi.iencia de urn pensamento posterior. Urn s6 ato
eterno de voli~ao absolutamente inteligente abrangeu o sistema
inteiro de seres e eventos em todo o espa~o e em toda a dura~ao,
instituindo ao mesmo tempo todos os fins, meios e metodos,
os necessarios e os livres, os fisicos e os morais, os atos das
criaturas em obediencia a lei e as interven<_;6es do Criador
impondo a lei.

43. Como se pode saber com certeza se um evento erealmente


um milagre no sentido desta palavra como foi definida acima?
1°. Milagre, segundo a defini~ao acima, e "urn evento que
sucede no mundo fisico, capaz de ser notado e discriminado
com certeza pelos sentidos corporais". Os milagres biblicos,
particularmente os mais importantes deles, preenchem essa
condi~ao, pois foram realizados (1) a clara luz do dia, (2) em
ocasi6es diferentes, (3) em circunstancias muito diversas, (4)
na presen~a de muitas testemunhas e (5) sujeitos ao exame de
diversos sentidos- a vista, o ouvido, o tato- corroborando-se
mutuamente.
2°. Segundo a mesma defini<_;ao, e necessaria que o milagre
"acompanhe urn mestre religioso como fim de autenticar a
sua comissao divina e a veracidade do seu ensino". Segue-se,
pois, que e necessaria que todo evento semelhante, para ser
crivel, seja (1) em si mesmo, de carater racional e moralmente
congruente com a sua alegada origem divina. (2) Que o carater
do mestre religioso, cuja comissao o even to autentica, e tam bern
o car:iter da sua doutrina, sejam tais que se torne crivel o
representarem eles os sentimentos e a vontade de Deus. (3) E

377
Capitulo 14
necessaria que o mensageiro e sua mensagem estejam em har-
monia, hist6rica e doutrinariamente, como organismo inteiro
de revela<;;:6es e interven<;;:6es divinas que os precederam.
3°. E necessaria, em terceiro lugar, que o milagre seja "de
carater tal que nao possa ser referido racionalmente a nenhuma
causa que nao seja a voli<;;:ao imediata de Deus".
Aqui se tern objetado que nunca podemos ter a certeza de
que urn evento e realmente urn milagre, mesmo que o seja,
porque- (1) Nenhum ser humano conhece todas as leis da
natureza, nem sabe onde esta exatamente a linha de separa<;;:ao

l
entre o natural e o sobrenatural. Aquila que e novo e inex-
plicavel e relativamente sobrenatural, isto e, e incapaz de ser
por n6s reduzido as categorias da natureza. (2) Os maus espiritos j
muitas vezes realizaram obras sobrenaturais- e, por conse-
guinte, e-nos impossivel determinar seem qualquer caso dado
a causa do evento e ou nao uma voli<;;:ao direta de Deus.

RESPONDEMOS: 1°. Quanta ao que diz respeito aos


espfritos rna us, o reino de satanas e facil de reconhecer por seu
carater. Nunca se deve reconhecer como milagre urn evento
isolado. 0 homem, sua doutrina e sua rela<;;:ao como sistema
de revela<;;:6es e interven<;;:6es miraculosas do passado, serao em
todos os casas suficientes para se poder discriminar urn
verdadeiro de urn falso. 2°. Quanta ao que diz respeito a questao
de determinar com certeza quais os efeitos que transcendem
as for<;;:as da natureza, temos a dizer- (1) Que ha certas classes
de efeitos a cujo respeito e impossivel que alguem duvide,e.g.,
a ressurrei<;;:ao de Lazaro e a multiplica<;;:ao de paes e peixes;
podemos estar em duvida quanta aos limites exatos do
sobrenatural- mas nao se pode errar quanta aquila que tanto
excede os limites do natural. (2) Esses efeitos foram produzidos
ha dois mil anos, em epoca nao cientffica e por indivfduos
sem instru<;;:ao. (3) Foram produzidos repetidas vezes,por simples
palavras, sem emprego de outros meios, e em divers as condifi5es fisicas.
(4) As obras eram divinas em seu carater, e as ocasi6es eram
A Providencia
dignas delas; nos mestres religiosos e nas suas doutrinas
viam-se provas espirituais corroborativas dos milagres que
realizaram, e estes ocupam lugar apropriado no sistema inteiro
da revela<;,:ao de Deus.

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379
15

A Constitui~ao da Alma,
a Vontade, a Liberdade, etc.

1. Em que sefiio geral da teologia estamos entr'ando agora,


e quais as principais t6picos abrangidos par ela?
A se~ao geral ea daANTROPOLOGIA, e OS principais t6picos
nela cornpreendidos sao a constitui~ao moral do hornern,
considerado psicologicarnente, a condi~ao moral do hornern
quando foi criado, e as rela~6es providenciais ern que ele foi
introduzido na sua cria~ao - a natureza do pecado, o pecado
de Adao, os efeitos que o seu pecado produziu sobre ele e sobre
a sua posteridade, e a condi~ao moral e as rela~6es legais ern
que, como conseqiiencia, os seus descendentes sao introduzidos
ern seu nascirnento.
E 6bvio que, para que se entenda bern a natureza do
pecado, original e atual, da influencia da gra~a divina e da
rnudan~a operada na alma regenerada, enecessaria que se tenha
algurn conhecimento das faculdades constitucionais da alma,
e especialrnente daquelas quest6es psicol6gicas e rnetafisicas
que sao inseparaveis das discuss6es teol6gicas.

2. Que principia geral enecessaria ter sempre em mente quando


se trata das diversas faculdades da alma humana?
A alma do hornern e urn s6 agente indivisivel, e nao urn
conjunto organizado constando de diversas partes; ern
conseqiiencia, aquilo que descrevernos como suas diversas
faculdades e, antes, a capacidade desse agente (mico para

380
A Constituifiio ...
desempenhar, simultanea ou sucessivamente, as diversas
fun<;6es envolvidas, e nunca devemos concebe-las como se
fossem partes ou 6rgaos que existem separadamente. Essas
diversas fun<;6es exercidas pela alma sao tao variadas e
complexas que e necessaria que se fa<;a uma analise minuciosa
delas, para que tenhamos uma ideia definida da sua natureza.
Ao mesmo tempo, convem que estejamos lembrados de que
grande parte dos erros em que cairam os fil6sofos em suas
interpreta<;6es da constitui<;ao moral do homem, foram o
resultado do abuso desse mesmo processo de analise. Isso e
verdade especialmente com respeito a interpreta<;ao dos atos
voluntaries da alma humana. Na prossecu<;ao da sua analise, o
fil6sofo chega a reconhecer separadamente as diferen<;as e as
semelhan<;as dessas varias fun<;6es da alma, e muitas vezes nao
se lembra de que essas mesmas fun<;6es nunca estao assim em
opera<;ao isoladamente, e sim concorrentemente, por sera alma
urn s6 agente indivisivel, e que, por isso, as suas fun<;6es
diversas sempre se restringem mutuamente. Assim tambem
nao e, de fato, verdade que a inteligencia raciocina, que 0
cora<;ao sente, a consciencia aprova ou condena e a vontade
decide do mesmo modo como os diversos membros do corpo
operam juntos, e os diversos membros de urn conselho
deliberam e decidem mediante a<;ao conjunta de suas partes;
porem a verdade e que a alma, que e uma s6 e indivisivel,
racional, sensivel, morale autodeterminante, raciocina, sente,
aprova ou condena e decide.
0 poder autodeterminante da vontade, como faculdade
abstrata, e urn absurdo como doutrina, e seria funesto como
experiencia; mas o poder autodeterminante da alma humana
como urn agente fatual, racional e sensivel, e urn fato de
consciencia universal e uma doutrina fundamental da filosofia
moral e da teologia crista. A questao real nao versa sobre a
liberdade da vontade, e sim sobre a liberdade do homem em
determinar-se ou em escolher. E6bvio que somos livres se temos
a liberdade de nos determinarmos como nos convem, isto e,

381
Capitulo IS
segundo nos parece bern, tomando tudo em considera<;ao.

3. Como classificar as principais faculdades da alma humana,


e quais constituem a sede da nossa natureza moral?
1°. As intelectuais. Esta classe abrange todas as faculdades
que de modos diversos concorrem para o exerdcio da fun<;ao
geral do conhecimento; sao elas a razao, a imagina<;;ao, os
sentidos corporais eo senti do moral (quando considerado como
simples fonte de conhecimento dan do parte ao entendimento ).
2°. As emocionais. Esta classe abrange todos os sentimentos
que de algum modo acompanham o exerdcio das outras
faculdades.
3°. A vontade.
Notar-se-a que as fun<;;6es da consciencia envolvem
faculdades que pertencem em parte aprimeira classe e em parte
asegunda. (Veja abaixo, Perg. 5.)
Pergunta-se muitas vezes: qual de nossas faculdades e a
sede da nossa natureza moral? Pois bern, embora haja urn
sentido em que todas as quest6es morais concernem arela<;;ao
dos estados ou atos da vontade com a lei de Deus revelada na
consciencia, e nos quais, em conseqiiencia, a vontade e a
consciencia sao proeminentemente o fundamento da natureza
moral do homem, nao obstante e verdade que todas as
faculdades da alma humana, como acima classificadas, estao
em exerdcio em todas as distin<;;6es morais; por exemplo, o
intelectual na percep<;:ao e no julgamento; o emocional quando
experimentamos prazer ou desprazer; a vontade esta operando
quando escolhemos ou rejeitamos, e quando agimos. Cada
estado ou ato, pois, de qualquer das faculdades da alma
humana, quer diga respeito ao julgar, quer ao escolher ou
recusar ou desejar a respeito de qualquer questao puramente
moral, ou do sentimento que lhe corresponda, eurn ato ou urn
estado moral, e assim, todas as faculdades, consideradas em
suas rela<;:6es com a distin<;:ao entre o bern e o mal, sao
faculdades morais.

382
A ConstituifiiO ...
4. Que ea vontade?
0 termo "vontade" e empregado muitas vezes para
designar a simples faculdade da volic;:ao, mediante a qual a
alma escolhe, ou se recusa, ou se determina a agir, designando
tambem o exerdcio dessa faculdade. E empregado tambem
em sentido lato, e e neste que o emprego aqui, para incluir a
faculdade da volic;:ao junta com todos os estados espontaneos
da alma (que Sir William Hamilton, em Lectures on Metaphys-
ics, Lect.ll, chama faculdades de conac;:ao, excitativas, procu-
rantes, e que possuem, como caracteristica comum, "uma
tendencia para a realizac;:ao do seu fim"), as disposic;:6es, os
afetos, os desejos, que determinam o homem no exerdcio da
sua livre faculdade da volic;:ao. Devemos lembrar-nos, porem,
de que estes dois sentidos da palavra {{vontade" sao essencial-
mente distintos. E necessaria que se distinga essencialmente
entre a vontade, como incluindo todas as faculdades de conac;:ao
(as disposic;:6es e os desejos), e a faculdade singela da alma,
cuja operac;:ao tern como resultado uma volic;:ao, isto e, uma
escolha ou urn ato que esta de acordo com o seu desejo
prevalecente. -~ ;·)~ ... ,. .,, ... ,,. ·
0 termo "vontade" e utilizado no sentido extenso neste
capitulo. 0 homem e perfeitamente livre nas suas deter-
minac;:6es,* isto e, exerce sempre a sua volic;:ao em conformi-
dade com a disposic;:ao ou com o desejo da vontade que

* Parece necessaria ao tradutor advertir aqui ao lei tor de que, na tradu\;iio


do ingles para o portugues de uma discussao como esta sobre a vontade,
encontra-se uma dificuldade peculiar, devida afalta, na lingua portuguesa,
de urn verbo que corresponda exatamente ao substantivo "vontade". No
ingles, the will e a faculdade da alma que chamamos vontade; "to will" e0
verbo correspondente, do qual nao temos sinonimo preciso em portugues.
Portanto, o tradutor ve-se obrigado a empregar o verbo "determinar-se" (ou
seu correspondente substantivo verbal, "determina~;ao") como tradu~;ao de
to will, embora longe esteja de ser sinonimo do verbo ingles. Com esta
explica~;ao talvez se tornem menos dificeis de en tender certas partes deste
capitulo.Notadotradutor. _, . ,·.. :;~;·~~~ ,;~:, j l .

383
Capitulo 15
prevalece no momento da voli<;ao. Esta e a rnaior de todas as
liberdades, e a unica que condiz com a racionalidade e com a
responsabilidade moral.

5. Como se define o termo volit;iio?


Pela expressao "faculdade da voli<;ao" entendemos a
faculdade executiva da alma, a faculdade de escolher ou de
autodecidir-se; e pelo termo "voli<;ao" entendemos o exercfcio
dessa faculdade em qualquer ato de escolha ou de autodecisao.

6. Que ea consciencia?
A consciencia, como faculdade, compreende (a) urn
sentido ou uma intui<;ao moral, urn poder de discernir entre o
berne o mal, poder que, em combina<;ao como entendimento,
ou seja, com a faculdade de comparar e julgar, faz o jufzo
quanto a serem bons ou maus os nossos atos livres e as nossas
disposi<;6es morais, e tambem as disposi<;6es morais e os atos
voluntarios de outros agentes livres. (b) Esta faculdade julga
segundo uma lei divina do bern e do mal, e essa lei se acha
dentro de si (e uma lei para si mesma, a lei original escrita no
cora<;ao, Rom. 2:14,15), e (c) esta acompanhada de emoc;6es
vi vas, agradaveis avista do que e born, e penosas avista do que
e mau, especialmente quando a nossa consciencia esta ocupada
em rever os estados ou as a<;6es de nossa propria alma. Esta
faculdade e soberana em sua esfera, e nao pode ter nada nem
ninguem superior que nao seja a Palavra revelada de Deus.
Veja McCosh, Divine Government, Livro 3, Cap. 1, sec. 4.

7. Quais as verdadeiras provas pelas quais se pode determinar


a qualidade moral de qualquer ato ou estado mental?
As unicas verdadeiras provas da qualidade moral de
qualquer ato ou estado sao: 1a. A Palavra inspirada de Deus, e
za. Os ju1zos espontaneos, praticos e universais dos homens.
Os juizos morais dos homens, assim como todos os nossos
ju1zos intuitivos, sao dignos de confian<;a somente quando

384
A Constituifiio ...

dizem respeito a juizos categ6ricos e individuais. As propo-


si~6es abstratas e generalizadas que se pode derivar por
abstra~ao e por generaliza~ao desses juizos individuais, podem
ser verdadeiras ou nao, mas em caso algum podem ser aceitas
como base segura para a constru~ao de urn sistema de provas
sobre elas. Muitas vezes tern sido feitas absurdas tentativas de
demonstrar o caniter moral ou amoral de algum principia, por
meio de formularios gerais representando verdades parciais
expostas imperfeitamente, e por meio de outras considera~6es
a priori, ou falsas, absurdas, ou irrelevantes. • -. -

8. Em que classes se dividem os afetos espontaneos da alma,


e quais as caracteristicas distintivas de cada classe?
Os desejos e afetos espontaneos da alma sao de duas classes
distintas: 1a. Os desejos e afetos animalescos, ou os que nascem
cegamente, sem inteligencia, e.g., os apetites e os afetos
instintivos. Esses nao tern em si mesmos nenhuma qualidade
moral intrinseca, e s6 se tornam causas de a~ao moral quando
refreados ou satisfeitos desordenadamente. za. Os afetos e
desejos racionais, despertados por objetos apreendidos pelo
intelecto.

9. Quais os afetos racionais e espontaneos que possuem qualidade


moral, e a que essa qualidade einerente?
Os afetos racionais e espontaneos sao intrinseca e essencial-
mente ou bons, ou maus, ou moralmente indiferentes, e sua
qualidade moral depende daquela dos objetos pelos quais sao
atraidos. Sao bons ou maus ou moralmente indiferentes
conforme sejam bons ou maus ou indiferentes os seus objetos.
Sua qualidade moral, seja qual for, lhes e intrinseca. Quando
sao bons, todos os homens os consideram dignos de aprova<;:ao,
e quando sao maus, todos os homens os consideram dignos de
condena<;:ao e de justa indigna<;:ao, por causa da sua natureza
essencial de bons ou maus, e sem levar em conta, de modo
algum, a sua origem. Quando sao bons, esses afetos espontaneos

385
Capitulo 15
determinam as voli<;6es para o bern, e quando sao maus,
determinam-nas para o mal.

10. A que i que aplicamos a designafiiO de "principios ou


disposifi5es permanentes" da alma? Quando i que eles possuem
carater moral) e donde provim esse carater?
Existem na alma, subjacentes a seus estados e afetos
passageiros, certos habitos ou disposi<;6es permanentes, que
envolvem uma tendencia ou uma facilidade para certas
especies de opera<;6es. Alguns desses habitos ou disposi<;6es
sao inatos, outros sao adquiridos. Constituem o carater do
homem e sao a base, o fundamento, para todas as suas sucessivas
opera<;6es dos sentimentos, afetos, desejos, voli<;ao e a<;ao. Ate
on de sao bons, o hom em e born e boas sao as suas a<;6es; e ate
onde sao indiferentes moralmente, isto e, dizem respeito a
objetos moralmente indiferentes, as a<;6es que deles nascem
tam bern sao indiferentes moralmente. 0 carater moral dessas
tendencias morais inerentes a alma e intrinseco e essencial.
Sao as tendencias finais da propria alma, e sua bondade ou
mal dade e urn fa to final da consciencia.

11. Como se demonstra que OS atos do intelecto podem ter carater


moral?
Em suas opera<;6es, o intelecto esta de tal modo envol-
vido com os afetos e emo<;6es morais que os seus juizos e
opini6es a respeito de todas as quest6es morais tambem tern
carater moral. 0 hom em e responsavel por seus juizos morais,
e tambem por suas cren<;as e sentimentos morais, por serem
todos determinados imediatamente pelo estado geral ou pelo
carater moral da alma. Quem esta cego para a excelencia mo-
ral ou para a fealdade do pecado e condenado por todas
as consciencias esclarecidas. As Escrituras pronunciam "ai"
sobre aqueles "que ao mal chamam bern, e ao bern mal; que
fazem da escuridade luz, e da luz escuridade" - Is. 5:20;
e cham am ao pecado "cegueira" e "estulticia" - 1 Joao 2: 11;

386
A ConstituifiiO ...
Ef. 4:18; Apoc. 3:17; Mat. 23:17; Luc. 24:25.

12. Quais as condifoes essenciais da responsabilidade moral?


Para que o homem seja responsavel moralmente e
necessario que ele seja urn agente livre, morale racional (veja
a resposta apergunta antecedente). Veja: 1°. E necessario que
esteja de posse real da sua razao, para distinguir a verdade da
mentira. 2°. Que tenha em opera<;:ao urn senso moral para
distinguir o bern do mal. 3°. Que sua vontade, em suas voli<;:6es
ou atos executivos, tenha capacidade real de autodecisao, isto
e, seja determinada por seus pr6prios afetos e desejos
espontaneos. Faltando qualquer destes requisitos, o homem
esta louco e nao e nem livre nem responsavel.

13. Sera que se pode dizer que a consciencia eindestrutivel e


infalivel?
:E possivel tornar latente e perverter virtualmente, is toe,
quanto a seus efeitos e fenomenos, e temporariamente, a
consciencia, que e o 6rgao da lei de Deus na alma. Por conse-
guinte, neste sentido fenomenico, ela nao e nem indestrutivel
nem infalivel. No entanto, se o sentido moral for considerado
simplesmente em si mesmo, e infalivel; e se pudessemos ler a
hist6ria inteira do homem mais perverso que ja existiu,
veriamos que a consciencia e verdadeiramente indestrutivel.
OBSERVE:
1o. Quan to a sua indestrutibilidade. N as crian<;:as a
consciencia, como todas as demais faculdades da alma, nao
esta desenvolvida, e nos selvagens o esta muito imperfeita-
mente; tambem, depois de contrair o habito de nao prestar
aten<;:ao avoz da sua consciencia e de violar a sua lei, o pecador
individual em muitos casos fica entregue judicialmente a
indiferen<;:a moral; sua consciencia se torna latente tempo-
rariamente. Ao mesmo tempo, e certo que ela nunca e
destruida, porque- (1) Muitas vezes desperta com uma ener-
gia terrivel no cora<;:ao dos reprobos mais endurecidos, nas

387
Capitulo 15
agonias do remorso. (2) Porque esse remorso ou consciencia
acusadora constitui o tormento essencial das almas dos
perdidos. Este e o bicho que r6i e nunca morre. Se nao fora
assim, o seu castigo perderia o seu carater moral.
2°. Quanto a sua infalibilidade. No ato pelo qual a
consciencia julga estados ou atos morais acha-se envolvida a
ac;;ao conjunta do entendimento e do sentido moral. 0
entendimento e sempre falivel, especialmente quando afetos e
desejos depravados influem em sua ac;;ao. Assim, de fato, a
consciencia esta constantemente dando decis6es erroneas,
devido a urn mau juizo dos fatos e relac;;6es do caso, e esse jufzo
erroneo pode ser causado por uma propensao egoistica, sen-
sual ou maligna. Daf existirem consciencias enganadoras, como
tambem consciencias latentes. Apesar disso, porem, o
sentimento de que ha uma distinc;;ao entre o bern e o mal e
uma lei eterna para o proprio ser moral, e indestrutivel mesmo
nos corac;;6es mais depravados, e assim como nao pode ser
destrufdo tampouco pode ser mudado. Quando despertado para
agir, e niio sendo enganado quanto ao verdadeiro estado do
caso em foco, sua linguagem e sempre a mesma. Veja McCosh,
Divine Government, Livro 3, Cap.2, Sec. 6, e Dr. A. Alexander,
Moral Science, Caps. 4 e 5.

14. Qual a natureza essencial da virtude?


''A virtude e uma qualidade peculiar a" certos estados da
vontade, isto e, disposi<;:6es permanentes ou afetos temporarios
da vontade, e a "certas ac;;6es voluntarias de urn agente moral,
qualidade que e percebida pela faculdade moral de que todo
homem e dotado, e a percep<;:iio da qual e acompanhada de
uma emo<;:iio que e diversa de todas as demais emo<;:6es, e e
chamada moral" - Dr. A. Alexander, Moral Science, Cap.26.
A essencia da virtude eque obriga a vontade. Se uma coisa
e moralmente boa, deve ser feita. A essencia do mal morale
que intrinsecamente merece desaprovac;;ao, eo agente merece
castigo.

38.8
, A Constituifiio ...
Este ponto e de grande importancia, porque e aqui que
muita filosofia falsa perverte muitas vezes a verdade, e porque
csta e a unica teoria, quanta ao bern moral, que esta em
conformidade com a doutrina biblica de recompensas e
castigos, e sobretudo com ada propicia~ao realizada por Cristo.
A ideia de virtu de e que se trata de uma intui~ao simples
e final; a tentativa de analisa-la a destruiria. 0 que e born e
born porque e born. E sua propria razao suprema. Tern sua
norma na natureza imutavel de Deus.

IS. Que eque constitui um carater virtuoso ou vicioso?


A virtu de, como definida na ultima resposta acima,
pertence somente a vonrade do hom em (jncJujndo neJa rodas
as faculdades conativas), e 1°. A sua disposi~ao permanente.
2°. A seus afetos. 3°. A suas voli~6es. Alguns desses estados e
atos da vontade nao sao marais, isto e, nao sao nem aprovados
nem condenados como virtuosos ou viciosos pela consciencia.
Mas virtude ou vicio pertence so aos estados marais da alma e
a atos voluntarios. Carater virtuoso e, portanto, aquele em que
as disposi~6es permanentes, os afetos e desejos temporarios e
as voli<;:6es da alma estiio em harmonia com a lei divina.
Vicioso, porem, e o carater em que esses estados e atos da
vontade nao estao em harmonia com a lei divina.
Os atos de voli<;:ao serao virtuosos ou viciosos segundo
forem os afetos ou desejos que os determinarem. Os afetos e
desejos sao como as disposi<;:6es permanentes, ou como o
carater. Este ultimo e natureza da propria vontade, e e urn fato
final e indissoluvel. Quer esse carater seja inato, quer seja
adquirido pelo costume, o fato de a sua qualidade moral ser
virtuosa ou viciosa permanece o mesmo, e a responsabilidade
moral que pesa sabre o agente por seu carater nao muda.
Devemos estar lembrados de que o fato de que alguem
tern uma consciencia que aprova o bern e condena o mal, e de
que ele experimenta emo<;:6es mais ou menos vivas e penosas
ou agradaveis quando condena ou aprova, nao torna 0 carater

389
Capitulo 15
virtuoso; porque neste caso os proprios demonios e as almas
perdidas seriam muito virtuosos. Mas o homem virtuoso e
aquele cujo corafao e cujos atos, na linguagem das Escrituras,
o u cujas disposifi5es, afetos e volifoes, na lingua gem dos filosofos, ~~
estao em harmonia com a lei de Deus.

16. Quais as duas formas da teoria utilitaria da virtude?


A primeira, e inferior, e a que sustenta que a virtude consiste
do desejo inteligente de felicidade. Diz o Dr. N. W Taylor:
"Nada e born senao a felicidade e os meios de adquiri-la, e
nada e mau senao a miseria e seus meios".
A segunda e superior forma da teoria utilitaria da virtude
e a que a faz consistir de benevolencia desinteressada, e que
afirma que to do pecado e uma forma de egoismo. Ja se mostrou,
nos capitulos 8 e 12, como se vera tambem no capitulo 18, que
esta teoria e defeituosa e, por isso, falsa.

17. Em que sentido afirmamos que o homem eagente livre?


Respondemos explicando:
1°. Que, sendo espirito, origina a<;,:ao. A materia age so na
medida em que se atua sobre ela. 0 homem age por sua propria
for<;,:a ativa.
2°. Que, em bora seja possivel obrigar urn homem, pelo
medo, a determinar-se a fazer e tambem a fazer efetivamente
muitas coisas que nao se determinaria a fazer nem faria de fa to
se nao fosse o medo, contudo, nunca podera ser for<;,:ado a
determinar-se no sentido em que ele mesmo nao queira
determinar-se, a vista de todas as circunstancias do caso (he
never can be made to will what he does not himself desire to will -
literalmente: ele nunca podera ser levado a querer o que ele
proprio nao deseja querer).
3°. Que ele e dotado de uma razao para distinguir entre 0
verdadeiro e o falso; e de uma consciencia, orgao de uma lei
moral inata, para distinguir entre o berne o mal, para que os
seus desejos nao somente sejam racionais, mas tambem retos.

390
A Constituifiio ...
E, contudo, os seus desejos nao sao necessariamente nem
racionais nem retos, porem se formam sob a luz da razao e da
consciencia, ou de conformidade com elas ou contnirios a elas,
segundo as disposic;6es permanentes e habituais do homem,
isto e, segundo o seu car:iter.

18. Como se pode mostrar que este atributo da natureza humana


einalienavel?
E conceito geral que urn homem esta livre na sua deter-
minac;ao quando se determina de conformidade com as
disposic;6es e desejos que nele prevalecem num dado momenta.
Pode ser que o jufzo do homem esteja enganado, que as suas
ac;6es sejam constrangidas, mas a sua vontade enecessariamente
livre porque, see realmente sua vontade, e como ele deseja que
seja, no estado atual do seu espirito, e tomadas em consideras;ao
todas as circunstfmcias do caso.
Segue-se que as volic;6es sao livres por sua propria essen cia,
quer o agente determinando ou o a to determinado seja de born
sensa quer nao o seja, quer seja born quer mau.

19. Acaso niio ensinam as Escrituras que o homem esta


escravizado acorrupfiio, e que perdeu a sua liberdade?
Como acima demonstramos, o homem e sempre livre em
suas volic;6es responsaveis, tanto quando escolhe o que e contra
a lei de Deus e da consciencia, como quando escolhe de
conformidade com essa lei. Contudo, no caso das criaturas nao
caidas e dos homens santificados perfeitamente, o estado
permanente da vontade, os afetos e os desejos voluntarios (o
corac;ao, na linguagem biblica) estao em harmonia com a luz
da razao e com a lei interior da consciencia, e tambem com a
lei exterior de Deus que temos na revelac;ao objetiva. Nao ha
conflito de princfpios dentro da alma, e a lei de Deus, em vez
de constranger a vontade por meio de seus mandamentos e
ameac;as, recebe obediencia espontanea. Esta e "a liberdade
dos filhos de Deus"; e a lei torna-se a "lei real" (Tia. 2:8) da

391
Capitulo 15
liberdade quando a lei que esta no cora<;ao do sudito corres-
ponde perfeitamente alei do Governador moral.
No caso dos anjos e dos homens decaidos, porem, as
disposi<;6es dominantes da vontade op6em-se a razao, a
consciencia e a lei de Deus; e em geral se diz que o agente,
apesar de ser livre, porque se determina como lhe apraz, esta
sob a escravidao de uma natureza rna, e que "e escravo do
pecado" porque e impelido por suas disposi<;6es corrompidas
a escolher aquilo que ve e sente que e prejudicial, e porque as
amea<;as da lei de Deus tendem a constranger a vontade pelo
medo.
As Escrituras nao ensinam que o homem irregenerado nao
e livre em seu pecado, porque, neste caso, ele nao seria
responsavel. Mas o contraste entre a liberdade dos regenerados
e a escravidao dos irregenerados deve-se ao fato de que nos
regenerados os desejos e tendencias habitualmente dominantes
nao estao em conflito com os ditames da consciencia e da lei
de Deus. Os nao regenerados, considerados psicologicamente,
sao livres quando pecam, porque se determinam do modo que,
tudo considerado, lhes apraz; porem, considerados teologica-
mente em sua rela<;ao para com a lei de Deus, aprovada pela
razao e pela consciencia, pode-se dizer que estao sob a
escravidao dos maus desejos e disposi<;6es de seu proprio
cora<;ao, que eles veem que e mau e insensato, mas que, apesar
disso, sao incapazes de mudar.

20. Qual a distinfiiO entre liberdade e capacidade?


A liberdade consiste em poder urn agente determinar-se
como lhe apraz, por ser a voli<;ao determinada somente pelo
carater do agente determinante. A capacidade consiste em
poder urn agente mudar seu proprio estado subjetivo, fazer-se
preferir aquilo que nao prefere, e agir num dado caso em
oposi<;ao aos desejos e preferencias coexistentes do cora<;ao e
do proprio agent e.
Assim, pois, o homem e tao verdadeiramente livre depois

392
A Constituifiio ...
da Queda como o era antes dela, porque se determina como
apraz ao seu mau cora<;ao. Entretanto perdeu toda a capacidade
de obedecer alei de Deus, porque o seu mau cora<;ao nao esta
sujeito a essa lei, nem pode o homem muda-lo.

21. Como definem liberdade Turretino eo presidente Edwards?


Turretino, L. 10, Qua:s. 1- ''Achando-se na alma s6 tres
coisas junto com sua essencia, a saber, faculdades, habitos e
atos, a vontade (arbitrium) e comumente considerada como urn
ato da mente; mas aqui niio significa propriamente nem urn
ato nem urn habito que se possa separar do homem individual
c que o determina tambem no sentido de uma de pelo menos
duas coisas contrarias; porern significa uma faculdade, todavia
niio uma faculdade vegetativa ou sensual e com urn a nose aos
irracionais, na qual niio haveria lugar nem para a virtude nem
para o vicio, e sim uma faculdade racional, cuja posse certa-
mente niio nos torna nem bons nem maus, mas por meio de
cujos estados e a<;6es somos capazes de nos tornar ou bons ou
rna us."
Qua:s. 3- "Niio consistindo, pois, na indiferen<;a a natureza
essencial da liberdade, niio se pode achar em outro principia
que niio seja no desejo ou prontidiio racional (lubentia rationali)
em virtude da qual o homem faz aquila que prefere ou se
determina a fazer conforme urn juizo previa da raziio (facit
quod lubet prcevio ration is judicio). Segue-se que do is elementos
juntos sao necessarios para constituir esta liberdade. (1) Io
proaireticon (o prop6sito), de modo que aquila que se faz nao e
determinado por urn cerro impulso cego e brutal, e sim ek
proaireseos, e conforme a raziio previamente iluminada e urn
juizo pratico do intelecto. (2) Io ekousion (o espontaneo), de
modo que aquila que se faz e determinado espontanea e
livremente, e sem constrangimento."
0 presidente Edwards, On the Will, Sec. 5, define a
liberdade como "o poder, oportunidade ou vantagem que
qualquer pessoa tern para agir como lhe apraz".

393
Capitulo 15
22. Quais os dois sentidos em que se emprega a palavra motivo,
como influindo sabre a vontade? E qual o sentido em que everdade
que a vontade esta sempre em conformidade com o motivo mais
forte?
1°. Urn motivo para agir pode ser alguma coisa que se
acha fora da alma, como sejam o valor do dinheiro, os desejos
de urn amigo, a sensatez ou a insensatez, a bondade ou a
malvadez de urn ato considerado em si mesmo, ou os apetites
ou impulsos do corpo. Neste senti do eevidente que os hom ens
nem sempre agem segundo o mesmo ou o melhor motivo.
Aquilo que atrai uma pessoa pode repelir outra, ou a pessoa
pode repelir a forc;:a atrativa de urn motivo externo pela forc;:a
superior de alguma considera<;;ao tirada de dentro da propria
alma. Assim, pois, everdadeiro 0 dito: "E 0 homem que faz 0
motivo, nao o motivo que faz o homem".
2°. Urn motivo para agir pode ser o estado de animo do
proprio homem, isto e, 0 desejo ou a aversao a vista do objeto
exterior; ou seja, motivo no primeiro sentido. Eevidente que
este motivo interno influi necessariamente na voli<;;ao, e
igualmente evidente e0 fato de que isso de modo algum torna
o homem menos livre em sua autodetermina<;;ao, porque o
motivo interno e nada mais que o homem mesmo desejando
ou recusando, segundo a sua propria disposi<;;ao ou o seu caniter.

23. Nao seria possivel que haja ao mesmo tempo na mente


diversos desejos ou motivos internos contrarios? E, quando eeste o
caso, como fica determinada a vontade?
Muitas vezes sucede que ha na mente ao mesmo tempo
desejos ou afetos impelindo em sentidos contrarios, e nestes
casos o desejo mais forte, ou o grupo mais forte de desejos que
puxem num mesmo sentido, determina a voli<;;ao. Aquele que
e o mais forte fica manifesto somente pelo resultado, e nao
pela intensidade do sentimento que desperta ou move. Alguns
desses motivos internos, como, e. g., a sede de vinganc;:a, sao
muito vivos, e outros, como, e. g., o sentimento do clever, sao

394
A Constituifiio ...
muito calmos, e, contudo, o motivo calmo muitas vezes
manifesta-se como o mais forte e atrai a vontade para o seu
lado. Mas isso depende do carater do agente. E este conflito
interno de principios opostos que constituem a luta da vida
crista. E e esta mesma experiencia que ocasiona grande parte
dessa confusao de consciencia que se encontra entre os homens
a respeito do problema da vontade e das condi<;:6es da agencia
livre (ou do sujeito da a<;:ao). Muitas vezes os homens agem em
oposi<;:ao a certos motivos que tern, porem nunca sem motivos;
eo motivo que afinal determina a vontade num dado caso pode
bern ser o motivo menos claramente apreendido pelo intelecto
eo que se manifesta menos vivamente nos sentimentos. Este e
o caso especialmente das surpresas subitas e das coisas de pouca
importancia; pois nestes a voli<;:ao e determinada constante-
mente e quase automaticamente por impulsos vagos ou pela
for<;:a do costume. Nao obstante, seem qualquer caso refletir-
mos bern em tudo o que se passou em nossa mente na ocasiao
em que decidimos fazer alguma coisa, descobriremos que
determinamos fazer aquilo a luz de todas as circunstancias que
o nosso entendimento nos apresentou a respeito do caso.

24. Se o estado mental imediatamente anterior ao ato da vontade


determina com certeza esse ato, como pode ser livre esse ato, se foi
determinado assim com certeza?
Esta obje<;:ao baseia-se unicamente na confusao das duas
ideias inteiramente distintas da liberdade da vontade, como
uma faculdade abstrata, e da liberdade do homem que exerce
a vontade. 0 homem nunca e determinado a querer ou a
determinar-se por alguma coisa que esteja fora de si mesmo.
E ele mesmo quem da livremente e segundo o seu proprio
carater, as circunstancias externas que sobre ele influem, todo
o peso que possuem. Mas, por outro lado, o mero ato de voli<;:ao,
considerado em abstrato, edeterminado pelo estado mental,
morale emocional do homem no momento em que se decide.
Sua liberdade racional, com efeito, nao consiste em alguma

395
Capitulo 15
incerteza quanto ao seu ato, e sim no fato de que a sua alma
inteira, como agente indivisivel, inteligente, sensitivo e moral,
determina seus proprios atos como lhe apraz.

25. Como se prova que a certeza de uma voliriio de modo algum


eincompativel com a liberdade do agente desse ato?
1°. Deus, Cristo e os santos na gloria sao todos eminente-
mente livres nas suas santas voli~6es e a~6es e, contudo, nada
pode haver de mais certo do que o fato de que eles, durante
toda a eternidade, determinar-se-ao segundo a retidao.
2°. 0 homem e agente livre, contudo e certo que, desde 0
nascimento de uma crian~a, se continuar a viver, pecani.
3°. Deus, desde a eternidade, previu como certas todas as
a~6es livres, e as preordenou, ou tornou-as certas. Nas profecias
predisse muitas delas como certas. E na regenera~ao Seu povo
torna-se "feitura sua, criados em Cristo Jesus para as boas obras,
as quais Deus preparou (proetoimasen, preparou com antece-
dencia, preordenou) para que andassemos nelas".
4°. Mesmo nos, se tivermos perfeito conhecimento do
carater de urn amigo, e de todas as circunstancias sob as quais
ele age, poderemos muitas vezes ter plena certeza do modo
como ele agira, mesmo em nossa ausencia. Esta e a base de
toda a fe humana, e, por isso, a de toda a sociedade humana.

26. Em que consiste a teoria da liberdade moral chamada


"Liberdade da Indiferenra", "Poder Autodeterminante da Vontade",
"Poder de Escolher o Contnirio", "Liberdade de Contingencia", etc.,
sustentada pelos arminianos e outros?
Esta teoria afirma que na ideia de agencia livre acha-se
envolvido essencialmente o seguinte- 1°. Que a vontade do
homem em qualquer voli~ao pode decidir-se nao so em
oposi~ao a todos os induzimentos externos, mas tambem em
oposi~ao a todos os juizos e desejos internos, e ao inteiro estado
inferior e coexistente do proprio homem. 2°. Que em todas as
suas voli~6es livres o homem esta conscio de que poderia ter

396
A Constituifiio ...

se decidido em sentido diametralmente oposto, sem que


houvesse altera<;ao alguma nem nas suas circunstancias
exteriores nem no seu estado interior. 3°. Que todas as voli<;6es
livres sao contingentes, isto e, incertas, antes do evento, porque
nao sao determinadas por coisa alguma que nao seja s6 e
unicamente a faculdade de voli<;ao da parte do agente -
Hamilton's "Reid", pags. 599-624.
A verdadeira teoria da certeza moral, porem, e que a alma
e uma unidade; que a vontade nao se determina a si mesma,
mas e 0 homem que, quando determina, determina-se a si
mesmo; e que sua voli<;ao e determinada com certeza pelo
estado interno, racional, morale emocional, tornado como urn
todo, em que o homem esta no rnornento ern que se determina.
Ern oposi<;ao a primeira destas duas teorias e a favor da
segunda, afirmarnos -
1°. Que 0 carater do agente determina corn certeza 0 carater
de suas a<;6es livres, e que a certeza de urn ato nao e
incompatfvel corn a liberdade do agente que o pratica. Veja
acirna, Perg. 12.
2°. Que as doutrinas cristas da presciencia (ou do pre-
-conhecirnen to), da preordena<;ao, da providencia e da regene-
ra<;ao divinas provarn, todas elas, que as voli<;6es dos hornens
nern sao incertas nern indeterminadas. Quanto as provas
biblicas destas doutrinas, veja os respectivos capitulos.
3°. Concordarnos com os defensores da primeira teoria ern
sustentar que em qualquer ato livre que praticarnos estamos
conscios de 0 podermos praticar ou deixar de praticar segundo
a nossa vontade. "Mas, ao rnesmo tempo, sustentarnos que nao
estamos menos conscios de que essa convic<;ao intima de
possuirmos o poder para nao praticar o ato e condicional. Is to
e, estamos conscios de que 0 ato poderia ter sido diferente se
outras e diversas opini6es, ideias ou sentirnentos tivessern sido
presentes em nossa mente, ou se lhes tivessernos dado seu peso
devido. Mas o homern nao pode preferir contra a sua pre-
ferenda, ou escolher contra a sua escolha. Pode ter uma

397
Capitulo 15
preferencia numa ocasiao e outra em ocasiao diversa; e pode
ter em a~ao ao mesmo tempo diversos sentimentos e prindpios
opostos e em conflito mutuo, porem nao pode ter ao mesmo
tempo preferencias opostas e em conflito mutuo."
4°. A teoria do "poder autodeterminante da vontade"
considera a faculdade da vontade ou da voli~ao como isolada
das outras faculdades da alma, como urn agente independente
dentro de outro agente. Mas a alma e uma unidade. Tanto a
consciencia como as Escrituras ensinam que o homem e urn
agente livre e responsavel. Desligando-se a faculdade de voli~ao
das disposi~6es e desejos morais, as voli~6es nao teriam mais
carater moral; e desligando-se essa faculdade da razao, as
voli~6es nao teriam mais carater racional. Se nao forem
determinadas pelo estado interno do proprio homem, serao
fortuitas e estarao fora do seu dominio. 0 homem nao podera
ser livre, se a sua vontade estiver independente tanto da sua
inteligencia e da sua razao como do estado do seu cora:~ao, e
nao devera ser tido como responsavel.

27. Par que o homem eresponsavel par suas afoes externas, par
suas volifoes e par seus afetos e desejos? Como se prova que ele e
responsavel par seus afetos?
0 homem e responsavel por suas a~6es externas por serem
determinadas por sua vontade; e responsavel por suas voli~6es
por serem determinadas pelos principios, sentimentos e desejos
do proprio homem; e e responsavel por seus principios, senti-
memos e desejos por causa da sua natureza de bons ou rna us, e
porque sao dele e constituem o seu caniter.
As Escrituras ensinam e eo juizo universal dos homens
que "o homem born tira" ou produz " boas coisas do seu born
tesouro" e que "o homem mau do mau tesouro tira coisas mas".
Urn ato deriva o seu carater moral do estado do cora~ao do
qual provem, e o homem e respons:ivel pelo estado do seu
cora~ao, seja esse estado inato, ou formado pela gra~a regene-
radora, ou adquirido.

398
A ConstituifiiO ...
1°. Por causa da natureza obrigat6ria daquilo que e
moralmente borne por causa do desmerecimento do pecado.
2°. Porque os afetos e desejos do corac;;ao do homem sao
ele mesmo amando ou recusando aquilo que e born. Eopiniao
de todos que urn homem profano ou malevolo merece
desaprovac;;ao, seja qual for a causa que o leva a ser assim.

28. Como o Dr. D. D. Whedon expoe e contrasta a posifiio das


filosofias arminiana e calvinista?
Diz ele: ''A esta maxima segundo a qual somos respon-
saveis por nossas mas volic;;6es, disposi<_;:6es ou natureza, seja
qual for o modo pelo qual as obtivemos, contanto que as
possuamos reaJmente, nos (os metodjsras) opomos esta outra
maxima segundo a qual, para que um agente seja responsavel por
qualquer ato ou estado, enecessaria que tenha poder de praticar 0 ato
contrario ou de produzir o estado contrario. Noutras palavras, o
poder e a base da responsabilidade". A (mica limitac;;ao que ele
admite e o caso de uma incapacidade produzida voluntaria-
mente pelo proprio agente. Esta, acrescenta ele, e uma maxima
fundamental segundo a qual se deve decidir todos os pontos
em discussao entre o arminianismo e o calvinismo.

29. Como se pode mostrar que essa teoria arminiana leva a


consequencias incompativeis com o evangelho, e que a teoria calvinista
everdadeira?
0 Dr. Whedon admite que Adao, depois da sua queda,
perdeu toda a capacidade de obedecer alei de Deus, e que era
responsavel por essa incapacidade e por todas as suas conse-
qiH~ncias, porque, tendo sido criado com plena capacidade,
perdeu-a por seu proprio ato livre. Admite tambem que cada
filho de Adao nasce com uma natureza corrompida e destituida
de capacidade de obedecer a lei de Deus. Nega, porem, que
uma crianc;;a seja responsavel ou punivel poressa incapacidade
ou por qualquer ac;;ao pecaminosa que dela resulte, porque veio
sobre ela, sem culpa da sua parte, pelo pecado de Adao. A

399
Capitulo 15
titulo de justa compensac;ao, porem, pelo grande infortunio
de serem pecadores inocentes, o Dr. Whedon afirma que Deus
em Cristo da a todos os homens grac;a suficiente e, por
conseguinte, capacidade, advinda dessa grac;a, de obedecer a
lei evangelica. Se urn homem fizer uso da capacidade advinda
dessa grac;a, sera salvo e sua fee obediencia evangelica lhe seriio
imputadas como justic;a perfeita; se, porem, niio fizer uso dessa
capacidade advinda da grafa, sera condenado como responsavel
por esse abuso (ou mau uso) da capacidade, e, por is so, como
responsavel tambem por todos os seus sentimentos e ac;6es
pecaminosas, e pela incapacidade subseqiien~e em que
redunda esse abuso.
Respondemos que dessa teoria arminiana segue-se:
1°. Que a salvac;ao alcanc;ada para n6s por Cristo nao foi
obra da grac;a livre, e sim uma compensac;ao tardia e
incompleta concedida aos homens pelos males imerecidos que
em conseqiiencia do pecado de Adao vieram sobre eles ao
nascerem.
2°. A "grac;a" concedida a todos e tao necessaria para tornar
OS pecadores puniveis como 0 e para salva-los. Assim, pois,
segundo este prindpio, a grac;a, tornando os homens
responsaveis, porque opera neles a sua capacidade, en via para
0 inferno maior numero de almas do que leva para 0 ceu
mediante a fe em Cristo.
3°. Nao sendo responsaveis pela culpa original, e por isso
nao puniveis, OS que morrem na infancia vao para 0 CeU em
virtude do seu direito natural.
Sustentamos, pelo contrario, que todo homem, a nao ser
que seja urn louco, e responsavel pelos seus afetos, desejos e
disposic;oes morais, seja qual for a sua origem; e que este e urn
fato final da consciencia, confirmado pelas Escrituras e pelo
juizo universal dos homens. Urn ato deriva seu carater moral
do estado do corac;ao de on de origina, mas o estado do corac;ao
nao adquire do atoo seu carater moral; pois a qualidade moral
do estado do corac;ao lhe e inerente, e responsabilidade moral

400
A Constituifiio ...
e insepad.vel de qualidade moral.
Assim e-
1°. Em con sequencia da natureza essencial do bern e do
mal. A essencia do bern, isto e, no sentido moralmente born, e
que deve ser - obriga a vontade. A essencia do mal - daquilo
que e moralmente mau - e que niio deve ser, que a vontade e
obrigada ao contnirio e que o pratica-lo merece castigo.
2°. Porque os afetos e desejos morais de urn homem nada
mais sao do que o homem mesmo amando ou aborrecendo a
bondade. E opiniao de todos os homens que urn individuo
profano ou malevolo merece reprova<;;ao, sejam quais forem as
causas que o levam a ser assim. Eo car:iter e niio a origem da
disposi~ao moral do cora~ao que ea questao verdadeira. Cristo
disse: "0 homem born do born tesouro do seu cora<;;iio tira o
bern, e o homem mau do mau tesouro do seu cora<;;iio tira o
mal"- Luc. 6:45.

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401
16

A Cria~ao e o Estado Original do


Hom em

1. Como provar que a rafa humana teve origem num ato direto
de crim;ao da parte de Deus? ·~
1a. As Escrituras o afirrnarn explicitarnente- Gen. 1:26;
2:7.
za. Esse fato acha-se irnplicito no abisrno irnensuravel que
separa o hornern no seu fnfirno estado brutal da ordem rnais
proxima da cria<;,:ao inferior, indicando urna superioridade J
rnaravilhosa quanto as qualidades ern que o hornern e os ani- 1
rnais irracionais sao cornparaveis, e urna diferen<;a absoluta de
especie quanto a natureza intelectual, moral e religiosa do
hom em e a sua capacidade para urn progresso irrestrito. Mesrno
o Prof. Huxley, que sustenta ternerariarnente urna posi<;ao
extrema a respeito das rela<;,:6es anatornicas do hornern para
corn os anirnais inferiores, admire que quando se torna ern
considera<;ao a natureza superior do hornern, existe entre ele e
os irracionais rnais pr6xirnos "urn abisrno enorrne, urna
divergencia irnensuravel e praticarnente infinita"- Primeval
Man, de autoria do Duque de Argyle.
3a. Esta irnplicito no fato revelado nas Escrituras e realizado
na hist6ria que o hornern estava destinado a exercer dorninio
universal sobre todas as outras criaturas e sobre o sistema da
natureza. Nao podia, pois, ser urn rnero produto da natureza,
urn de urna serie de entes coordenados.
4a. Esta irnplicito no fato de serern os hornens charnados

402
Criafiio e Estado Original
"filhos de Deus" e de serem tratados como tais no sistema
inteiro da providencia e da reden<;ao. A natureza moral e
religiosa do homem tambem da testemunho disso univer-
salmente, e tanto mais quanto mais se acham esclarecidos e
desenvolvidos esses elementos da sua natureza. E essa verdade
foi assinalada proeminentemente pela uniao pessoal da nossa
natureza com a Deidade.
Eobvio que, sendo transmitidos por descendencia natural
tanto as naturezas e os habitos intelectuais, morais, religiosos
e sociais dos homens, como o e a sua estrutura anat6mica, nao
somente e uma arbitrariedade mas e tambem urn absurdo
tomar em considera<;ao apenas esta e deixar de considerar
aqueles, numa investigaqao cientifica da origem do homem,
ou do seu lugar e das suas rela<;oes na ordem da natureza.

2. Como expor o estado atual da questiio da antiguidade da


rafa humana?
1°. As Escrituras e todos os resultados seguros da ciencia
moderna ensinam acordemente que o homem foi o ultimo de
todos os seres organizados que apareceram na terra. Nao foi
introduzida nenhuma especie nova depois da introdu<;ao do
homem.
2°. Os sistemas de cronologia biblica geralmente aceitos
foram deduzidos das indica<;oes prima facie que nos sao
conservados nos incompletos registros historicos e genealogicos
do periodo anterior a Abraao, contidos nos primeiros capitulos
de Genesis. 0 sistema que indica o periodo mais curto,
deduzido por Usher do texto hebraico, poe a cria<;ao do hom em
numa ocasiao proxima de 4.000 anos antes do nascimento de
Jesus Cristo, ou de 6.000 anos da epoca atual. 0 sistema que
indica o periodo mais longo, deduzido por Hales e outros do
texto daSeptuaginta e de J osefo, poe a cria<;ao do hom em numa
ocasiao proxima de 5.500 anos antes do nascimento de Jesus
Cristo, ou de 7.500 anos antes da epoca atual.
A respeito desses sistemas de cronologia, o Prof. W H.

403
Capitulo 16
Green, D. D., de Princeton, diz (Pentateuch Vindicated, pag. 128)
- "Nao devernos esquecer que ha urn elernento de incerteza
nurna cornputa<;ao de tempo baseada ern genealogias, como e
o caso ern tao alto grau da cronologia sagrada. Quem nos podera
certificar de que as genealogias antediluvianas e das gera<;;6es
anteriores a Abraao nao forarn condensadas do rnesrno modo
que o forarn as de gera<;6es posteriores a Abraao? Se Mateus
ornitiu alguns nornes dos avoengos do nosso Senhor Jesus Cristo
para tornar iguais OS tres grandes periodos que rnenciona, nao
podia Moises fazer o rnesrno, a firn de apresentar sete gera<;;6es
de Adao ate Enoque e dez de Adao ate Noe? Nossa cr9nologia
cornurn e baseada na impressaoprimafacie dessas genealogias.
A ela aderiremos enquanto nao tivermos bons motivos para
abandona-la. Mas, seas indica<;;6es recenternente descobertas,
da antigiiidade do hornern, a cujo respeito os circulos
cientificos se acharn tao entusiasrnados, dernonstrarern, depois
de bern investigadas e ponderadas, tudo o que se tenha
irnaginado que dernonstrarn, qual seria o resultado? Dernons-
trariarn sirnplesrnente que a cronologia popular se baseia nurna
interpreta<;;ao errada, e que urn registro parcial das gera<;6es
anteriores a Abraao foi por engano considerado registro
cornpleto".
3°. As pesquisas rnodernas tern trazido a luz urna soma
irnensa e sernpre crescente de provas de que a ra<;a hurnana
existia na terra rnuitos seculos antes da data fixada para a
cria<;ao do hornern rnesrno na cronologia deduzida do texto da
Septuaginta. As classes principais ern que se pode dividir essas
pro vas sao as seguintes:
(1) Nos rnonumentos egipcios tern-se descoberto pin-
turas etnol6gicas, rnostrando que todas as peculiaridades
divergentes dos tipos caucasiano e africano ja se achavarn
desenvolvidas cornpletarnente como eles estao agora, e isso
mais de 1.900 anos antes de Cristo. Durante todo o tempo
hist6rico nenhurna rnudan9a de clirna ou de costumes tern
produzido rnudan9a apreciavel em qualquer variedade da

404
CriafiiO e Estado Original
ra~a humana e, por isso, devemos concluir que muitos seculos
e tam bern gran des mudan~as foram necessaries para produzir
tao gran des varia~6es permanentes nos descendentes de urn s6
casal. 0 duque de Argyle diz muito bern: "Exatamente na
mesma propon;ao em que avaliamos a nossa fe na unidade da
ra~a humana, devemos estar prontos a aceitar quaisquer provas
da sua antigiiidade. Quanta mais antiga se provar que a rac;,:a
humana e, tanto mais possivel e provavel sera que ela descende
de urn s6 casal"- Primeval Man, pag. 128.
(2) A filologia, ciencia que estuda em grande amplitude
as linguas, prova que em tempos muito remotos deviam ter
vivido juntas e ter falado a mesma lingua as nac;,:6es que agora
falam linguas analogas, e que as nac;,:6es e suas linguas se
dividiram no transcurso dos seculos em diversos ramos. Para
se desenvolverem, porem, tantos e tao diversos dialetos devem
ter sido necessaries muitos e muitos seculos.
(3) A geologia, ciencia que, entre outras coisas, estuda a
origem, a formac;,:ao e as transformac;,:6es sucessivas do globo
terrestre, tem descoberto restos de corpos humanos e de obras
de arte humana em depositos de aluviao e cascalho, enterrados
fundo, e em cavernas e covas, junto com os restos de animais
de especies desde ha muito extimas, o que prova suficiente-
mente que, depois da criac;,:ao do homem, grupos inteiros de
grandes quadrupedes foram extintos; e tambem que o clima
da zona temperada do norte passou por uma transformac;,:ao
revolucionaria, e que a geografia fisica de todos os paises
examinados a este respeito sofreu mudanc;,:as radicais depois
de criado o homem.

3. Como se pode provar a unidade da rafa humana, e que


descende de um s6 casal?
Ate o momenta em que escrevemos, Agassiz e o unico
naturalista de primeira ordem que ensina que todas as diversas
especies de variedades e seres organizados devem ter tido
origem independente e ter se propagado de paises diversos.

405
Capitulo 16
Ele afirma, par conseguinte, que a ra<;a humana e urn genera,
e que foi criado originariamente em diversas variedades
espedficas. A mesma teoria esustentada com muita habilidade
numa obra recente que tern atraido a aten~ao na Inglaterra;
tern por titulo- The Genesis of the Earth and of Man.
Que o homem, genericamente diverso de todas as demais
criaturas, e de uma s6 especie, prova-se-
1°. Pelas Escrituras - Atos 17:26; Rom. 5: 12; 1 Cor.
15:21,22.
2°. Pela propaga~ao de Adao, pela imputa'5ao e pela
descendencia, da culpa e da corrup~ao. 0 fato de ser Cristo o
Cabe~a representativo do Seu povo, e de Sua obediencia e Seus
sofrimentos vicarios, implica essencialmente a unidade
absoluta da ra~a humana e sua descendencia de urn s6 casal.
3°. A natureza moral e religiosa de todas as variedades da
ra'5a humana e especificamente identica.
4°. 0 mesmo fato e indicado geralmente pela hist6ria e
pela ciencia chamada filologia comparativa.
5°. No processo de domestica'5ao de diversos ramos da
mesma especie de animais irracionais, e. g., pombas e caes,
tern se verificado, como resultado, diferen~as maiores do que
as que existem entre as diversas variedades da ra~a humana.
6°. Efa to admitido universalmente pelos naturalistas que
a uniao entre animais de especies diversas nem sempre e fertil,
e que o produto de tal uniao rarissimas vezes pode propagar-
-se - talvez nunca! Entre as homens, porem, par maior que
seja a diferen'5a nas variedades a que os pais pertencem, isso
em nada influi no numero de seus filhos, e estes, par sua vez,
podem propagar-se indefinidamente.

4. Como se pode mostrar que, segundo as Escrituras, a natureza


humana ecompasta de duas, e s6 duas, substfmcias distintas? *

* Teo ria chamada "dicotomia" ou "dicotomica", em oposi<;;ao atricotomia"


ou teoria "tricotomica". Nota de Odayr Olivetti.

406
Criafiio e Estado Original
As Escrituras ensinarn que o hornern e cornposto de dois
elementos, charnados respectivarnente ern hebraico, grego,
latirn e portugues, biisiir, soma, corpus, corpo; e ruach, psyche,
pneuma, pnoe, dzoe, animus, mente, animo, alma, espirito. Is so
eclaramen te revelado:
1°. Na narrativa da cria~ao- Gen. 2:7. 0 corpo foi forrnado
da terra e, entao, Deus insuflou no homem urn sopro de vida,
e assim ele se tornou alma vivente.
2°. No que se diz a respeito da rnorte, Eel. 12:7, e do estado
da alma imediatamente depois da morte, enquanto os corpos
estao se corrompendo na terra- 2 Cor. 5:4-8; Fil. 1:23,24; Atos
7:59.
3°. Em toda a linguagem usual das Escrituras sao pos-
tulados esses dois elementos, e nao sao mencionados outros.

5. Como se pode expor a teoria daqueles que dizem que a nossa


natureza compreende tres elementos distintos, e sua suposta base
biblica?
Pit<'igoras, e depois dele Platao, e subseqtientemente os
fil6sofos gregos e romanos, sustentavam que o homem consiste
de tres elementos constitutivos: o espirito racional, nous,
pneuma, mens; a alma animal, psyche, anima; eo corpo, soma,
corpus. Assim ficou sendo de uso vulgar essa divisao, e o
ap6stolo Paulo adotou-a, empregando os tres termos quando
queria designar em linguagem popular o homem cornpleto e
tudo o que lhe pertence como homem. "Todo o vosso espirito,
e alma, e corpo, sejam plenamente conservados irrepreensiveis
para a vinda de nosso Senhor Jesus Cristo" -1 Tess. 5:23; Heb.
4: 12; 1 Cor. 15:44. Dai alguns te6logos tiram a concl usao de
que a doutrina segundo a qual a natureza humana ecomposta
de tres elementos distintos erevelada na Palavra de Deus.

6. Como se pode refutar a teoria acima e mostrar que os termos


psyche e pneuma sao empregadas no Novo Testamento como
sinonimas?

407
Capitulo 16
0 uso que os ap6stolos fizeram desses tres termos prova
somente que empregaram palavras no seu sentido comum e
popular para exprimir ideias divinas. A palavra pneuma
designa a alma, acentuando sua qualidade racional. A palavra
psyche designa a mesma alma, acentuando sua qualidade como
o principia vital e animador do corpo. As duas sao empregadas
juntas para designar em linguagem popular o homem por
inteiro.
Nao pode ser doutrina do Novo Testamento que pneuma e
psyche sejam duas coisas distintas, porque sao trocadas
habitualmente uma pela outra, sendo muitas vezes ernpregadas
indistintamente. Assim, a palavra psyche, como tambem
pneuma, e empregada para designar a alma como sede das
faculdades intelectuais e superiores- Mat. 10:28; 16:26; 1 Ped.
1:22. E assim tambem a palavra pneuma e empregada, como
igualmente a palavra psyche, para designar a alma como o
principia animador do corpo- Tia. 2:26. Pessoas falecidas sao
chamadas indistintamente psychai, Atos 2:27,31; Apoc. 6:9;
20:4; epneumata, Luc. 24:37,39; Heb. 12:23.

7. Que ensinam os nossos livros normais e oficiais (isto e, os


nossos simbolos de je) quanta ao estado em que o homem foi criado?
A Confissiio de Fe, Cap. 4, § 2, 0 Catecismo Maior, Perg. 17,
e o Breve Catecismo, Perg. 10, ensinam os seguintes pontos -
1°. Deus criou o homem a Sua imagem; 2°. Dotou-o de alma
racional e imortal, por sua vez dotada de conhecimento, justi<;a,
retidao e verdadeira santidade, e deu-lhe dominio sobre as
demais criaturas; 3°. 0 homem foi criado com a lei de Deus
inscrita em seu cora<;ao e com o poder de cumpri-la, e, ao
mesmo tempo, sob a possibilidade de transgredi-la, sendo
deixado a liberdade da sua propria vontade, que era sujeita a
mudan<;a.
A imagem de Deus dizia respeito- 1°. Aespecie da sua
natureza; o homem foi criado semelhante a Deus urn espirito
livre, racional e pessoal. 2°. Foi criado semelhante a Deus

408
CriafiiO e Estado Original
quanto a perfei~ao da sua natureza- no conhecimento, Col.
3:10, na retidao, justi~a e verdadeira santidade, Ef. 4:24. 3°.
Foi criado semelhante a Deus quanto ao poder, expresso em
seu dominio sobre a natureza, Gen. 2:28.

8. Como se pode expor, em termos psicol6gicos, o verdadeiro


estado da questfio? 1 . .-., '·. ·, . 1 .
No capitulo anterior mostramos que a voli~ao e deter-
minada pelo carater moral dos desejos e afetos que a estimulem,
e destes a voli~ao deriva seu caniter moral; mostramos igual-
mente que os afetos e desejos temponirios que estimulam e
motivam as voli~6es em qualquer caso dado, vern eles mesmos
dos habitos e disposi~6es permanentes e da tendencia da
vontade, que constituem o caniter moral do homem. Mostra-
mos ainda que o caniter mo~al dessas disposi~6es permanentes
da vontade, e a responsabilidade do homem por elas, sao urn
fato final que nao se pode referir a outro principia mais
fundamental ou essencial, e que esse fato e confirmado pelo
juizo universal dos homens.
Do acima exposto segue-se que a justi~a e a santidade
originais com as quais Adao foi criado consistiam na
conformidade perfeita em que estavam todos os seus afetos e
todas as disposi~6es morais da sua vontade (em linguagem
biblica, seu cora~ao) com a lei de Deus- cujo 6rgao era a sua
consciencia clara e fiel.
Em conseqiiencia, nao havia cisma ou cisao na natureza
do homem. A vontade, operando livremente de conformidade
com as luzes da razao e da consciencia, conservava em sujei~ao
harmoniosa todos os principios inferiores do corpo e da alma.
Em equilibria perfeito morava uma alma perfeita num corpo
igualmente perfeito.
Essa justi~a original era natural no sentido (1) de que era
a perfei~ao original da natureza do homem como havia saido
das maos do Criador. Pertencia originariamente a essa natureza,
e (2) esempre essencial asua perfei~ao quanto aqualidade. (3)

409
Capitulo 16
Teria sido propagada sempre se o homem nao tivesse caido, do
mesmo modo como agora a depravas;ao inata e propagada, por
descendencia natural. Por outro lado, porem, nao era natural
no mesmo sentido em que a razao, a consciencia e a agencia
livre sao elementos especiais criados para constituir alguem
em homem real. Como qualidade, e essencial a perfeis;ao da
natureza humana, mas como elemento, nao e essencial a
realidade dessa natureza.
I .' :: •

9. Como se prova que Adiio foi criado santo no sentido explicado


acima?
Pertence a essencia da natureza do homem que ele seja
agente moral responsavel. Consideremos, porem:
1°. Como criatura moral, o hom em foi criado a imagem
de Deus- Gen. 1:27.
zo. Deus declarou que todas as Suas obras, o homem
inclusive, eram muito boas- Gen. 1:31. A bondade de uma
obra humana consiste essencialmente em sua adaptac;ao ao fim
proposto por quem a fez. A "bondade" de urn agente moral
nao pode consistir em outra coisa que nao seja a conformidade
da sua vontade a lei moral. Indiferen~a moral em urn agente
moral ja e da natureza do pecado.
3°. As Escrituras declaram que o homem foi criado santo
-Eel. 7:29.
4°. Na regenerac;ao o homem e renovado a imagem de
Deus; na criac;ao o homem foi feito a imagem de Deus; essa
imagem, nos dois casos, deve ser a mesma, e inclui santidade
- Ef. 4:24.
5°. Em 1 Corintios 15:45, Cristo e chamado "o ultimo
Adao", e no versiculo 47 "o segundo homem". Cristo e reco-
nhecido por amigos e inimigos como o unico homem perfeito
encontrado na hist6ria inteira do mundo, o homem exemplar
da humanidade normal. E, no entanto, a Sua natureza humana
foi formada pelo Espirito Santo, antes de as;ao alguma da parte
dEle, e absolutamente santa. Quando ainda estava no ventre

410
CriafiiO e Estado Original
de Sua mae foi chamado "o Santo"- Luc. 1:35.

10. Em que consiste a doutrina pelagiana com respeito ao estado


original do homem?
Os pelagianos afirmam -1°. Que o homem pode com razao
ser tido como responsavel s6 por suas voli~6es nao influen-
ciadas; e 2°. Que se segue que e urn absurdo dizer que o homem
tern urn carater moral anterior a qualquer a~ao moral da sua
parte; porque s6 e moral aquela disposi~ao que se formou como
costume por meio da previa a~ao da sua livre vontade nao
influenciada por nada; quer dizer, e necessario que 0 homem
escolha o seu carater, ou nao pode ser tido como responsavel
por ele.
Eles sustentam, pois, que quando o homem foi criado,
sua vontade nao somente era livre, mas, alem disso, seu estado
era de equilibrio moral, estando igualmente disposta para a
virtude e para o vicio.

11. Como se pode expor e contrastar a posifiio dos pelagianos,


a do Dr. D. D. Whedon (arminiano) e a dos calvinistas, quanta a
justifa e ao peeado inatos?
Os pelagianos afirmam: 1°. Que Adao foi criado agente
moral, porem sem carater positivamente moral; que era
primeiro indiferente tanto para o bern como para o male que
Deus o deixara livre para formar seu car:iter segundo esco-
lhesse, e sem que fosse influenciado por nada. 2°. Que agora
todos os homens nascem, quan to a todas as particularidades
essenciais, no mesmo estado moral em que Adao foi criado.
3°. Que o homem e mortal por natureza, e que a mortalidade
da ra~a humana nao e conseqiiencia do pecado.
0 Dr. D. D. Whedon (arminiano), conquanto concorde
com os pelagianos naquilo que e mais importante quanto ao
estado moral em que Adao foi introduzido originariamente
por sua cria~ao, difere deles quanto a condi~ao moral em que
os descendentes de Adao sao introduzidos por seu nascimento.

411
Capitulo 16
Admite que uma inclina~ao "criada" pode ser boa ou rna, e,
por isso, amavel ou odiosa, entretanto nega que no primeiro
destes casos o agente possa ser com razao recompensado ou no
segundo castigado, par sua disposi<;:ao, o caniter da qual ele
nao determinou para si por previas voli<;:6es nao influenciadas.
Se Adao tivesse formado para si urn carater santo, seria borne
digno de premia; e, tendo formado para si urn carater mau,
tornou-se mau e mereceu castigo. Mas os seus descendentes
sao gerados com natureza corrompida sem culpa sua, e par
isso sao maus e corruptos, porem nao merecem castigo por
causa disso.
Em oposi<;:ao a esses conceitos, os que tern posi<;:ao
doutrinaria ortodoxa afirmam - 1°. Que ha disposi<;:6es e
inclina<;:6es permanentes que determinam as voli<;:6es. 2°.
Muitas dessas inclina<;:6es sao boas, muitas sao mas, e outras
muitas sao moralmente indiferentes na sua natureza essencial.
3°. Essas disposi<;:6es marais podem ser inatas bern como
adquiridas, mas em qualquer dos casos o agente e tao
responsavel por elas como o e par outro qualquer estado ou
ato da sua vontade. 4°. Adao foi criado com disposi<;:6es santas,
que o incitavam a a<;:6es santas. Nao se tornou santo, porem foi
feito assim par Deus.

12. Por que eque julgamos os homens responsaveis moralmente


por disposifi5es inatas e concriadas?
1°. As crian~as nascem com disposi~6es e tendencias
marais muito diversas. Nao obstante, e juizo espontaneo e
universal dos homens que os que sao par natureza malevolos,
crueis e falsos nao somente merecem que sejam detestados por
todos, mas tambem que devem ser tidos como moralmente
responsaveis par suas disposi~6es e a~6es.
2°. As Escrituras ensinam, como mostraremos no Capitulo
19, sabre o "Pecado Original", que todos os homens nascem
com uma ten den cia inerente para pecar, tendencia que, inerente
asua natureza, e em si mesma pecado e digna de castigo.
412
Criar;iio e Estado Original
3°. 0 presidente Edwards, em sua obra On the Will, Parte
4, § 1, diz: ''A essencia da virtude ou do vicio das disposi<;:6es
do cora<;:ao e dos atos da vontade niio esta na sua causa, e sim na
sua natureza". E ate Joao Wesley, arminiano como era, disse,
segundo cita<;:ao feita por Ricardo Watson: "A santidade nao
consiste no born uso que fizermos de nossas faculdades, e sim
no born estado dessas faculdades, na boa disposi<;:ao da nossa
alma. Levem isto com voces, e nao dirao mais que Deus nao
podia criar o hom em com justi<;:a e verdadeira santidade" ... "Que
e santidade? Nao seria essencialmente o amor? E nao poderia
Deus derramar esse amor em qualquer alma sem a concordancia
dessa alma anterior ao seu conhecimento ou ao seu
consentimento? E se Ele o fizer, porventura o amor mudani
de natureza? Deixani de ser santidade? Esse argumento jamais
podeni ser sustentado".

13. Como se pode provar que um estado de indiferentismo moral


eem si mesmo pecado, e que, se niio fosse assim, niio seria passive!
que o exercicio de uma faculdade volitiva assim condicionada
resultasse num ato au carater moral?
E auto-evidente que o indiferentismo moral da parte de
urn agente moral avista de uma obriga<;:ao morale em si mesmo
pecado. A essencia da moralidade e que obriga a vontade de
urn agente moral. Urn agente amoral pode sem culpa
conservar-se indiferente para com coisas morais. Urn agente
moral pode sem culpa conservar-se indiferente para com coisas
indiferentes. Mas, pela propria natureza do caso, e urn absurdo
dizer que urn agente moral pode conservar-se indiferente a
respeito de uma obriga<;:ao moral conhecida por ele como sua
e que, apesar disso, esse indiferentismo nao e moral e sim o
pre-requisito de toda moralidade.
Alem disso, uma disposi<;:ao moralmente indiferente nao
pode resultar num ato ou costume santo. A bondade ou
maldade de urn ato depende da bondade ou maldade da
disposi<;:ao ou dos afetos que o incitaram. Eo estado moral da

413
Capitulo 16
vontade (ou o corafiio, veja Mat. 7:17-20 e 12:33) que torna o
a to born ou mau, nao o ato que torna esse estado born ou mau.
Os motivos pelos quais o homem faz uma coisa podem ser
muito bans, e, apesar disso, por ignorfmcia ou loucura, pode
estar em grande erro quanta a natureza dessa coisa; contudo,
se todas as disposic;6es e desejos que prevalecem no corac;ao
em qualquer caso dado forem bans, a volic;ao necessariamente
sera moralmente boa; se forem maus, a volic;ao sera neces-
sariamente rna; se for em indiferentes, a volic;ao sera forc;osamente
indiferente tambem. Isso mostra o absurdo das posic;6es acima
indicadas. Se, como dizem os pelagianos, Adao foi c;riado com
uma vontade igualmente disposta para o bern e para o mal,
seu primeiro ato nao podia ter canher moral de nenhuma
qualidade. E, nao obstante, dizem que o primeiro ato de Adao,
que nao tinha caniter moral, determinou o carater moral do
proprio homem, eo de todos os seus atos e do seu destino para
todo o tempo futuro. Se isso fosse verdade, teria sido irijusto
da parte de Deus, porque envolve a imposic;ao de uma pena
terrivel por urn ato que em si nao foi nem born nem mau.
Como teoria e absurda, vista que faz evoluir toda moralidade
daquilo que e moralmente indiferente.
Ricardo Watson, vol. 2, pag. 16, diz muito bern: "Em Adao
aquela retidao da qual emanaram boa escolha e bans atos, ou
foi criada com ele, ou emanou de suas pr6prias volic;6es. Se se
afirmar a ultima hip6tese, seguir-se-a que Adao determinou-
-se para 0 bern antes de ter urn principia de retidao - 0 que e
absurdo; sese afirmar a primeira hip6tese, ficara estabelecido
que ele foi criado em estado de retidao, com aptid6es e
disposic;6es para o bern".

14. Como demonstrar que a teoria pelagiana niio pode basear-


-se na experiencia?
Essa teoria e toda construida sobre certas noc;6es formadas
a priori, e e contraria aexperiencia universal. Se Adao foi criado
sem carater positivamente moral, e seas crianc;as nascem assim

414
CriafiiO e Estado Original
tambem, entao as condi~6es de uma agencia livre, nesses
supostos casos, devem ser diversas das de uma agencia livre,
no caso de todos os homens e mulheres adultos, cuja cons-
ciencia e a (mica fonte de onde podemos recolher os fatos
necessarios para deduzirmos deles alguns conhecimentos
corretos a respeito deste ponto. Todos os que tern pensado ou
escrito sobre esta questao estavam conscios de que s6 pode
existir liberdade sob as condi~6es de urn carater moral ja
formado. Mesmo que a teoria pelagiana fosse verdadeira, nunca
poderiamos ter certeza disso, porque nunca estivemos
cientemente em tal estado de indiferentismo. Nada mais eque
uma hip6tese imaginada para que os interessados pudessem
sair de uma dificuldade - dificuldade que e resultado do fato
de que o nosso poder de pensar e limitado. Veja Sir William
Hamilton, Discussions, pag. 587 etc.

15. Que distinfiiO faziam os chamados santos Pais entre a


imagem e a semelhanfa de Deus em que o homem foi criado? -
Gen. 1:26.
Por "imagem" de Deus os Pais entendiam os poderes
naturais e constitutivos do homem, os poderes ou faculdades
intelectuais e morais, quais sejam a razao, a consciencia e a
vontade livre (o livre-arbitrio). Por "semelhan~a" de Deus eles
entendiam a perfei~ao moral amadurecida e desenvolvida da
natureza humana, resultante de o homem exercer santamente
as suas faculdades.
Neander, Hist. Christ. Dogmas, pag. 180, afirma que esse
foi o germe da subseqtiente doutrina medieval e romana sobre
o estado original do homem.
Belarmino, De Gratia et Lib. Arbitrio, 1, cap. 6, diz: "Por
estes testemunhos dos Pais, somos obrigados a concluir que a
imagem e semelhan~a nao sao iguais em todos os aspectos, e
sim que a imagem diz respeito a natureza, e a semelhan~a as
virtudes (perfei~6es morais); de onde se segue que Adao, por
seu pecado, perdeu a imagem mas nao a semelhan~a de Deus".

415
Capitulo 16 4
16. Que ensina o Catecismo do Concilio de Trento quanta ao
estado em que Adiio foi criado? ~
Veja abaixo, no fim deste capitulo, as doutrinas das diversas
igrejas sobre este ponto. 4
17. Quale a doutrina romana a respeito dos dona naturalia e
dona supernaturalia?
Segundo essa doutrina: 4
1°. Deus dotou o homem, em sua cria~ao, dedona naturalia,
isto e, de todos os poderes e faculdades naturais e constitu-
tivos do corpo e da alma sem pecado, em estado de inocencia
perfeita.
2°. Deus ajustou devidamente esses poderes uns aos outros,
pondo os inferiores na devida subordina~ao aos superiores. E
a esta harmonia dos poderes que se chamava]ustitia- retidao
natural.
3°. Ravia, porem, pela propria natureza das coisas, nos
apetites e paix6es inferiores, uma tendencia natural para
rebelar-se contra a autoridade dos poderes superiores da razao
e da consciencia. Essa tendencia em si nao e pecado; torna-se
pecado somente quando a vontade consente nela, e ela se
manifesta em algum ato. Isso e concupiscencia: nao e pecado,
mas e suprimento e ocasiao para o pecado.
4°. Para impedir a desordem que seria o resultado dessa
tendencia natural de se rebelarem os elementos inferiores da
constitui~ao humana contra os superiores, Deus concedeu ao
homem 0 dom adicional, isto e osdona supernaturalia, ou dons
extraconstitutivos. Consistem na retidao ou justi~a original,
que era urn dom extraordinario, acrescentado a constitui~ao
do homem, por meio do qual ele podia conservar na devida
sujei~ao e ordem os seus poderes naturais devidamente
ajustados. Alguns dos te6logos romanos sustentam que esses
dons sobrenaturais foram concedidos ao homem imediata-
mente, em sua cria~ao, no mesmo momenta em que lhe foram
dados os seus poderes naturais. A opiniao geral, porem, e mais

416
Criafiio e Estado Original
coerente com essa doutrina, eque lhe foram concedidos depois,
como recompensa pelo born uso dos seus poderes naturais.
Veja Mohler, Symbolism, pags. 117,118.
5°. Tanto a justitia como os dona supernaturalia eram
propriedades acidentais e acrescentadas anatureza humana de
Adao, e ele os perdeu em conseqtiencia da Queda.

18. Como essa doutrina injlui na teoria dos cat6licos romanos


quanta ao pecado original e ao carater moral dessa concupiscencia
que permanece nos regenerados?
Eles afirmam que o homem, por sua queda, perdeu
somente os dons acrescentados de "retidao original" (dona
supernaturalia), enquanto que a propria natureza humana em
si, os dona naturalia, compreendendo todas as suas faculdades
constitutivas de razao, consciencia, vontade livre (em que eles
incluem a "capacidade moral") permanecem intactos. Assim,
pois, o efeito produzido pela Queda sobre a natureza moral do
homem foi tao-somente negativo. Os Reformadores o defini-
ram como "falta da justic;;a original e corrupc;;ao da natureza
inteira".
Por isso eles afirmam tambem que a concupiscencia, ou a
tendencia de se rebelarem os poderes inferiores contra os
superiores, que permanece ainda nos regenerados, sendo
natural e parte constitutiva da natureza humana, nao e da
natureza do pecado. Veja a exposic;;ao dada logo a seguir.

EXPOSI~OES PUBLICAS E AUTORIZADAS


DAS DIVERSAS IGREJAS

DOUTRINA CATOLICO-ROMANA- Cat. do Cone. de


Trento, Parte 2, cap. 2, Perg. 19: "Em ultimo lugar, Ele
formou o homem do limo da terra, criado e qualificado
de tal modo em corpo que fosse imortal e impassive!, nao,
porem, em virtude da for<;a da natureza, e sim em virtude
do dom divino. Mas quanta ao que diz respeito a alma do

417
Capitulo 16
homem, criou-a a Sua imagem e semelhan~a: dotou-a com
vontade livre, e de tal modo ajustou todos os seus apetites
e atividades que estivessem sempre sujeitos ao dominio
da razao. Acrescentou entao o dom admiravel de justi~a
original; e depois deu-lhe o dominio sobre todos os demais
animais". Tambem Parte 2, Cap.2, Perg. 42, e Parte 4,
Cap.l2, Perg. 3.
Belarmino- Gratia Primi Hominis, 5- "Deve-se entender,
em primeiro lugar, que o homem consta naturalmente de
carne e espirito, e que por isso sua natureza assemelha-se
em parte aos animais e em parte aos anjos; e, em
consequencia da sua carne e semelhan~a aos animais, tern
uma certa propensao para o bern corp6reo e sen.sivel, ao
qual e induzido por seus sentidos e apetites; e, em
consequencia do seu espirito e semelhan~a aos anjos, tern
uma propensao para o bern espiritual e racional, ao qual e
induzido por sua razao e vontade. Mas, em consequencia
dessas propens6es diversas e contnirias, existe no mesmo
homem urn certo conflito, e, em resultado desse conflito,
o homem acha muita dificuldade em agir, enquanto uma
propensao op6e-se a outra. Deve-se entender, em segundo
lugar, que a divina providencia, no principia da cria~ao,
como remedio desta molestia ou languidez da natureza
humana, devida a condi~ao da sua "materia", acrescentou
o excelente dom da justi~a original, a qual, como freio de
ouro, conservasse a parte inferior em sujei~ao a parte
superior, e esta em sujei(,:ao a Deus; posto que a carne
estivesse de tal modo sujeita ao espirito, que nao podia
mover-se contra a vontade do espirito, nem rebelar-se
contra o espirito, a nao ser que esse se rebelasse contra
Deus; contudo, estava no poder do espirito rebelar-se ou
nao rebelar-se".
Quanto a doutrina de Belarmino sobre a atual condi<;;ao
moral em que nascem os descendentes de Adao, veja
adiante, no fim do Cap.l9.
DOUTRINA LUTERANA- Formula Concordice (Hase),
pag. 640. (Pecado original) "e a priva(,:iio daquela justi(,:a
com a qual a natureza humana foi criada no Paraiso, ou

418
CriafiiO e Estado Original

daquela imagem de Deus a qual o homem no principia


foi criado em verdade, santidade e retidiio.
DOUTRINA REFORMADA- Canon Dordt, 3:1 - "0
homem, no principia, foi criado a imagem de Deus, ornado
no seu espirito como conhecimento verdadeiro e salvador
do seu Criador e das coisas espirituais, com justi~a e
retidao no seu cora~ao e vontade, e pureza em todos os
seus afetos, e assim era inteiramente santo.
Veja tambem : Conf de Fe da Ass. De W'estminster, Cap.
4; at. Maior, Perg. 17; Breve Cat., Perg. 10.
OUTRINA DOS REMONSTRANTES - Limborch, Theol.
Anist. 2: 24,5 - "Costumam dizer que a justi~a original
uu. istia na ilumina~ao e retidao do cspirito, na santidade
iu tic.; da vontad , na harmonia dos sentidos e afetos, e
111111111 prontitF"o para o bcm.1~, com cfeito, muito evidente
Ill · llolisos prim ·iros pais, no scu estado primitivo,
•stavam numa condi~ao muito mais perfeita do que a em
que nos cstamos quando nascemos. Vista que seu espfrito
nao era como tabua rasa e vazio de todo o conhecimento;
pois Deus lhes havia dado conhecimento verdadeiro e a
sabedoria necessaria para seu estado; possufam tambem
capacidade para adquirir mais conhecimento mediante a
razao, a experiencia e a revela~ao.
Sua vontade nao era neutra, igualmente indiferente para
o bern e o mal, mas antes de Deus haver-lhes impasto a
lei, tinham uma retidao natural, de modo que nao podiam
nem desejar nem agir desordenadamente. Porque onde
nao ha lei, af o uso mais livre da vontade nao traz culpa -
2: 24,10. Nao sofre duvida que, se o primeiro homem nao
houvesse pecado, nao teria morrido, porque a morte e a
pena do pecado. Mas daf nao se pode inferir corretamente
a imortalidade (natural) do homem ... Contudo, Deus teria
conservado esta mortalidade em imunidade perpetua da
morte real, se o homem nao tivesse pecado".
DOUTRINA SOCINIANA- F. Socino, Prcefectionesh Teo!.,
cap. 3: "Concluimos, pois, que Adao, rnesmo antes de
transgredir esse mandamento de Deus, nao era verda-
deiramente justo e reto, porque nao era nem impecavel,

419
Capitulo 16
nem havia ainda sido sujeito a nenhuma ocasiao para
pecar; ao menos nao e possivel afirmar que era certamente
justa, porque nao consta que por qualquer motivo se
houvesse abstido de pecar. No entanto, ha quem diga que
a justi~a original do primeiro homem consistia nisso, que
possuia uma razao dominando sabre seu apetite e seus
sentidos e cobrindo-os, e que nao havia divergencia entre
eles. Mas isso dizem sem razao, porque o pecado cometido
por Adao torna evidente que seu apetite e seus sentidos
dominaram sabre sua razao, e nem antes disso havia
perfeito acordo entre des".
Cathecismo Racov., Perg. 18: "Desde o principia o
homem foi criado mortal, isto e, de modo que nao s6 podia,
em harmonia com sua natureza, morrer, como tambem
nao podia fazer outra coisa senao morrer, se fosse deixado
a sua natureza, embora fosse possivel que, em virtude de
uma ben~ao divina especial, fosse conservado sempre em
vida".

420
17

A Alian~a das Obras

lilt I\ m div rso sentidos em que a palavra alianfa ou pacta


,,,,,, •'111/ll't'J!lUla tuzs E rituras?
111ulo d lllll 'l onl · nan ~a natural - Jer. 33:20.
1111do d 11111:1 prom •ssa incondicional - Gen.

~~~ . N11 II lido dL· u ma promcssa condicional- Is. 1: 19,20.


1". No s ' 11 1ido de uma dispcnsa~ao ou modo de adminis-
lt 11 ·b. 8:6,9.
''W I()
uanto ao uso do termo diatheke, traduzido as vezes por
lt'llamc nto c outras vezes poralianfa, no Novo Testamento, veja
o :ap.22, Pcrg. 4.
N as frases teol6gicas "alian~a das obras" e "alian~a da
pn11;:a", esse termo e empregado no terceiro sentido acima
111 ·ncionado, ou seja, no sentido de uma promessa dependente
d~.: co ndi~6es .

2. Quais sao os elementos essenciais de uma alianfa?


1°. Partes contratantes. 2°. Condic;6es. Estas, numa alian~a
fcita entre iguais (pessoas/entidades) imp6em-se e se obrigam
mutuamente, mas numa constitui~ao soberana, imposta pelo
riador sobre a criatura, sera melhor dizer que essas "condi-
c.;ocs" sao (1) promessas da parte do Criador, cujo cumprimento
dcpende de (2) condic;6es que devem ser cumpridas pela
criatura. E (3) uma pena que sera infligida seas condic;6es nao
fore m cumpridas.

421
Capitulo 17
3. Como se pode mostrar que a constituifiio sob a qual Adiio
foi posto por Deus na sua criafiiO pode com raziio ser chamada
alianfa?
A narrativa inspirada daquilo que se passou entre Deus e
Adao apresenta claramente todos os elementos essenciais de
uma alianc;a como coexistentes nessa constituic;ao. Veja:
1°. As "partes contratantes" - (1) Deus, o Governador
moral, exigindo, por necessidade de Sua natureza e relac;ao,
conforrnidade absoluta a lei moral. (2) Adao, o livre agente
moral, por necessidade de sua natureza e relac;ao, sob a
obrigac;ao inalienavel de obedecer alei moral. .
2°. As "prornessas", vida e favor - Mat. 19: 16,17; Gal. 3:12.
3°. As "condic;;6es", de que estavam suspensas as promessas,
obediencia perfeita; no caso de Adao, sujeito sornente aprova
especial de que ele nao cornesse do fruto da "arvore da ciencia".
4°. A "pena", para o caso de nao se curnprirem as condic;6es.
"No dia ern que dela comeres, certamente morreras" - Gen.
2:16,17. .
Essa constituic;ao e chamada concerto (pacto, alianc;a) -
Os.6:7.

4. Como as nossas exposifoes oficiais definem isso?


Conf De Fe, Cap. 4 § 2; Cap. 7: § § 1 e 2; Cap. 19: § 1. Cat.
Maior, Perg. 20; Breve Cat., Perg. 12.

5. Por que niio e absurdo chamar de "Concerto" au de


'54lianfa" uma constituifiio que o Criador impos a criatura sem
consulta-la a respeito?
1°. Apesar de ser uma constituic;ao soberana imposta por
Deus, nao ha motivo algum para supor que Adao nao se
sujeitou a ela voluntariamente. Ele era uma criatura santa, eo
arranjo era muitissimo vantajoso para ele.
2°. Chamamo-lo concerto ou alianc;a porque estas palavras
sao pr6prias para exprimir uma promessa condicional feita a
urn agente livre.

422
A A lianfa das Obras
3°. Destas palavras, principalmente o termo "alian<;a"
I utodcrnamente), muitas vezes e aplicado a outras constitui-
11 s sobcranas e de car:her semelhante aque o Criador impos
111. · homcns. Se Deus pode fazer alian<;as com N oe, caido e
ulpado, Gen. 9:11,12, e com Abraao, Gen. 17:1-21, por que
11 to pod ria fazer uma alian<;a com Adao nao caido?

(• nomc•s foram dados a essa alianfa, e por que?


lit'
11
1 T ·m sido l:hamada alian<;a da natureza, porque exprime
It 11 qu o hom •m, no seu estado natural em que acabava
1 t 11 1d1 I om! nii tinha caido, sustentava para como
l1 c' ' '' mlm lo univ r · . ~oi ajustado ao homem
1 1111 I 11 1 " 111ln, u.. im omo a ulian~a da gra<;;a ajusta-se
111 ltt)J I Ill IIIII II IIIII 111111 ' II ln.

'", I 111 1 lu hnn111 Ia alian<.;:a legal ou judicial porque a


11
II II 1111 II llll Ill II <:onformidade perfeita a lei da absoluta
al i~ to nwral.
\ • T ·m sido chamada alian<;;a das obras, porque suas
11

Jl ·ins 'S tcndiam-se somente aquilo que 0 proprio homem


lu , · fi zcssc.
41). E tern sido chamada alian<;a de vida, porque a promessa
n xu uobcdiencia era a vida.
Era tambcm, essencialmente, uma alian<;;a fundada na
l''l<;ll, porque, embora seja dever de toda criatura, como tal,
rvir ao Criador ate onde lhe e possivel, nao pode ser dever
lo riador conceder a criatura, como alguma coisa devida, a
·omunhao conSigo, ou a exalta<;;ao a infalibilidade no seu
poder moral, ou a felicidade eterna e inaliem1vel.

7. Quais eram as partes dessa alianfa, e como se pode provar


que Adiio era nela o representante de toda a sua descendencia natural?
As "partes" eram Deus e Adao, e Adao representava toda
a sua posteridade natural. Isso se torna evidente-
1°. Pelo paralelo tra<;;ado nas Escrituras entre Adao em sua
rcla<;;iio para com os seus descendentes, e Cristo em Sua rela<;;iio

423
Capitulo 17
para com os Seus escolhidos - Rom. 5: 12-19; 1 Cor. 15:22,47.
2°. Pelo fato de que a pena denunciada contra Adao, se
desobedecesse, tern se tornado efetiva no caso de cada urn dos
seus descendentes- Gen. 2: 17; 3:17,18.
3°. Pela declara<;ao biblica de que o pecado, a morte e todo
o mal penal vieram sobre o mundo em conseqiiencia do pecado
de Adao- Rom. 5:12; 1 Cor. 15:22. Veja o Cap. 21, sobre ''A
lmputa<;ao do Pecado de Adao".

8. Qual foi a promessa anexa a alianfa?


A "promessa "foi "vida" -
1°. Porque se acha implicita necessariamente na pena que
consistia na "morte", que foi proferida expressamente. Se
desobediencia trouxe rnorte, e evidente que obediencia teria
trazido vida.
2°. Esta verdade e ensinada claramente noutras passagens
das Escrituras- Lev. 18:5; Nee. 9:29; Mat. 19: 16,17; Gal. 3: 12;
Rom. 10:5.
Essa vida nao era simplesmente a continua<;ao da
existencia que Deus lhe dera como agente moral falivel, e sim
urn dom adicional de excelencia moral infalivel e de felicidade
inalienavel, sob a condi~ao de obediencia durante urn periodo
de prova~ao.
1°. Isso e evidente porque a recompensa prometida no caso
de se cumprirem as "condi<;6es" deveria necessariamente
compreender alguma coisa mais, alem daquilo que ja havia
sido dado.
2°. Porque o homem, assim como havia sido criado, era
sujeito a pecar, e nesse estado nao podia haver felicidade
permanente e segura, nem excelencia muito elevada.
3°. Porque, com a concessao da recompensa termina
necessariamente o prazo da prova~ao, acabam as condi<;6es e a
felicidade inalienavel torna-se certa e segura.
4°. Porque os anjos quenao abandonaram a sua habita<;ao
(Jud., vers. 6), foram premiados com vida dessa natureza.

424
A Alianfa das Obras
5°. Porque a vida prometida devia corresponder a morte
prcnunciada, e essa morte envolvia separa<;ao eterna de Deus e
I ·strui<;ao irremediavel do pecador.
6°. Porque a vida que nose oferecida no "Segundo Adao"
dcssa natureza.

9. Que e "provafiio" e quando e onde esteve a rafa humana


wjt>ita ii provafiiO sob a alianfa das obras?
I rova~ao e prova. A palavra e empregada em diversos
111 idos, J ara cxprimir o estado, o tempo ou o a to da prova. 0
1 '''Ill d 1 rova~ao, sob uma constitui<;ao tal qual foi a alian<;a
I nl 1 1 1 new podia deixar de er urn tempo definidamente
lt11111 1d1 1 pm qu ' uH - ·vidcntc que a aplica<;ao da pena ou a
lllll Ill In pt I i< P< ria tcrmo, ipso facto, e para sempre, a
JH ova~· ao , o 1 r m io nao podia scr con cedi do antes de finda a
provac.;ao.
A prova da ra<;a humana foi feita na pessoa de Adao no
.Jardim do Eden. Teve como resultado a Queda, e, tornando-se
dai por diante impossiveis as condi<;6es da alian<;a, estando o
homcm incurso em sua pena, e impossivel outra prova. Os
homens sao agora por natureza filhos da ira.

10. Qual foi a condifiiO des sa alianfa? E por que foi escolhida
como prova a arvore da ciencia do hem e do mal?
Perfeita conformidade do cora<;ao avontade inteira de Deus
ate on de fora revelada, e perfeita obediencia a essa vontade nos
atos- Deut. 27:26; Gal. 3: 10; Tia. 2:10. 0 mandamento de
abs ter-se de comer do fruto proibido foi dado simplesmente
como prova especial e decisiva dessa obediencia geral. Como
era moralmente indiferente em si a coisa proibida, o manda-
mento estava muito bern adaptado para servir como prova clara
e absoluta da prontidao de Adao para submeter-se a vontade
absoluta de Deus s6 porque era Sua vontade. A arvore vedada
foi sem duvida chamada arvore da ciencia do bern e do mal
porque, comendo do seu fruto em desobediencia a Deus, os

425
Capitulo 17
homens chegaram pela experiencia a conhecer o valor da
bondade eo mal infinito do pecado.
A obediencia exigida pela lei como regra do dever e
naturalmente perpetua. Mas a exigencia de obediencia, feita
pela lei como condi<;;ao da alian<;;a das obras, fora limitada ao
perfodo da prova<_;ao. A palavra "perpetua", na Conf de Fe, Cap.
19, § 1, e Cat. Maior, Perg. 20, foi admitida sem duvida por
inadvertencia.

11. Qual a natureza da morte prenunciada no caso de


desobediencia?
As palavras "certamente morrenis", literalmente "morreras
de morte", incluem evidentemente, nesta conexfw, todas as
conseqti.encias penais do pecado. Estas sao-
1°. A morte natural- Eel. 12:7.
2°. A morte morale espiritual- Mat. 8:22; Ef. 2: 1; 1 Tim.
5:6; Apoc. 3:1.
3°. A morte eterna- Apoc. 20:6-14. ~
No mesmo instante em que foi violada a lei, come<_;ou a
operar a sua pena; mas, em virtude da in terven<_;ao da
dispensa<;;iio da gra<;;a, o efeito pleno da senten<;;a fica suspenso
durante a presente vida. Logo que o homem caiu, retirou-se
dele o Espirito de Deus, e ele tornou-se morro espiritualmente,
mortal fisicamente, e sujeito asenten<;;a de condena<;;iio amorte
eterna.
Isso torna-se evidente-
1°. Pela natureza do homem como ser espiritual. "E a vida
eterna e esta: que te conhe<_;am, a ti s6, por unico Deus
verdadeiro, e a Jesus Cristo, a quem enviaste" (J oao 17: 3). * No

*A versao de Figueiredo, citada no original desta obra, eambfgua porque


traduz, no versfculo 2, a expressao "poder sobre toda carne" (literal) por
"poder sobre todos os homens". En tao, no versiculo 3, o lei tor desavisado
pode confundir a quem se refere o termo "eles" do versiculo 3. Nota de
Odayr Olivetti. (' . .:, ,;: .

426
A Alianfa das Obras
mesmo instante em que a alma separa-se de Deus, morre,
torna-se sujeita a Sua ira e maldis;ao, e a pessoa inteira- corpo
e alma- fica envolvida numa serie sem fim de mas condis;6es.
2°. As Escrituras declaram que o salario do pecado e a
morte- Rom. 6:23; Ez. 18:4.
A natureza des sa morte e determinada- (1) Pela narras;ao
dos efeitos produzidos em nossos primeiros pais, e.g., vergonha
por se reconhecerem nus, medo, alheas;ao de Deus, increduli-
dade, e, depois de algum tempo, a dissolus;ao do corpo, etc. (2)
Pela perceps;ao experimental dos seus efeitos nos seus
descendentes,e.g., corrups;ao da natureza, mortalidade do corpo,
as miserias da vida, segunda morte.

12. Que eque os aniquilacionistas afirmam a respeito da pena


denunciada na alianfa das obras? ,
Eles afirmam que a pena exata com que Deus ameas;ou
Adao foi expressa assim: "Tu, tu mesmo, tua pessoa inteira, es p6
e ao p6 voltaras". Citam Num. 23: 10; Jui. 16:30, etc. Sustentam
que "morte" quer dizer precisa e unicamente cessas;ao da
existencia. Dizem eles que Adao nao podia ter outra ideia em
conexao com essa palavra. A morte nesse sentido ja havia
existido no mundo inumeros seculos antes de Adao entre os
animais inferiores, e isso era tudo o que Adao sabia quanto a
esse ponto.
E inutil que especulemos sobre a questao de qual foi a
linguagem original em que Deus falou com Adao, e qual foi
precisamente o significado da palavra correspondente anossa
palavra "morte" que Ele empregou. E provavel que Adao
entendesse simplesmente que, se pecasse, perderia irre-
mediavelmente o favor divino. E foi exatamente isso que
aconteceu. Os fatos sao claros-
1°. A palavra morte e empregada nas Escrituras, nao para
exprimir cessas;ao da existencia, e sim uma certa condis;ao rna
de existencia- Apoc. 3: 1; Ef. 2: 1-5; 5.14; 1 Tim. 5:6; Rom.
6: 13; 11 : 15; J oao 5: 24; 6:4 7.

427
Capitulo 17
2°. Mais adiante, Capitulos 37 e 40, sera demonstrado
que as Escrituras nao admitem, nem a no<;:ao do sono da alma
durante o intervalo entre a morte eo Juizo Final, nem ada
aniquila<;:ao dos maus depois do J uizo.

13. Que quer dizer o selo de uma alianfa, e qual foi o selo da
alianfa das obras?
0 selo de uma alian<;:a e urn sinal exterior e visivel,
instituido por Deus como penhor da Sua fidelidade, e das
ben<;:aos prometidas na alian<;:a.
Assim, o arco-iris e o selo da alian<;:a fei ta com N oe - Gen.
9:12,13. A circuncisao foi o selo original da alia~<;:a feita com
Abraao (Gen. 17:9-11; Rom. 4: 11), em substitui<;:ao da qual
foi depois instituido o batismo - Col. 2: 11,12; Gal. 3:26,27. A
arvore da vida foi o sinal e selo exterior e visivel da vida
prometida na alian<;:a das obras, e da qual o homem foi excluido
por causa do pecado, e aqual e de novo admitido mediante 0
segundo Adao no Paraiso celeste: Compare Gen. 2:9 e 3:22,24
com Apoc. 2:7; 22:2-14.

14. Segundo Witsius, em sua grande obra sobre as alianfas,


quais foram os selos ou sacramentos da alianfa das obras?
No Vol. 1, Cap. 6, Witsius enumera quatro - 1°. 0 Paraiso.
2°. A arvore da vida. 3°. A arvore da ciencia do berne do mal.
4°. 0 Sabado, ou o dia de descanso.
Todas estas realidades foram, sem duvida, institui<;;6es
simb6licas ligadas a dispensa<;:ao divina original da qual a
alian<;:a das obras era a base. Mas nao parece haver motivo para
dizer que pertenciam a classe particular das institui<;;6es
simb61icas chamadas sacramentos sob a dispensa<;;ao do Novo
Testamento. A arvore da ciencia do berne do mal selou a morte
e, por conseguinte, nao podia ser urn selo da alian<;:a das obras,
que oferecia a vida.

428
A Alianr;a das Obras
15. Em que sentido se acha revogada a alianr;a das obras, e
em que sentido esta ainda em pe?
Tendo sido quebrada esta alian<;a por Adiio, nern urn s6
de todos os seus descendentes naturais pode jarnais curnprir
suas condi<;6es; e, tendo Cristo curnprido todas as suas
condi<;6es a favor do Seu povo, a salva<;iio e oferecida agora sob
a condi<;iio da fe.Neste sentido a alian<;a das obras foi revogada
sob o evangelho, porque Cristo curnpriu as suas condi<;6es.
Niio obstante isso, sendo baseado nos principios irnutaveis
da justi<;a, essa alian<;a e ainda obrigat6ria sobre todos os que
nao se recolherarn ao refUgio que nos e oferecido ern Cristo.
Ainda hoje e verdade que "o que observar estes preceitos,
achara neles vida", e "a alma que pecar, essa morrera". Neste
sentido essa lei ainda esta ern pe, e condena os hornens por
causa dos seus pecados; e, ao rnesrno tempo, ern conseqiH~ncia
da sua incapacidade absoluta de cumprir os seus preceitos,
opera como pedagogo (aio ou preceptor) para conduzi-los a
Cristo. Porque Cristo, tendo curnprido tanto a condi<;iio ern
que Adiio falhou, como tarnbern tendo sofrido a pena ern que
Adiio incorreu, tornou-Se o fim dessa alian<;a para justificar a
todo aquele que ere e que nEle e tido e tratado como se
houvesse guardado a alian<;a e rnerecido a recornpensa nela
prornetida.

429
,

18

A Natureza do Pecado
e o Pecado de Adao

1. Quais sao as {micas provas que servem para determinar a


resposta apergunta: "Que epecado?))
1a. A Palavra de Deus.
2a. Os juizos intuitivos dos homens. As provas da validade
destes juizos sao (a) a auto-evidencia; (b) a universalidade; e
(c) a necessidade. Esses juizos intuitivos dos homens nao
julgam imediata e diretamente partindo de no~6es abstratas
ou de proposi~6es gerais, e sim de casos concretos e
individuais. E o entendimento que, de muitas convic~6es
intuitivas e individuais, tira maximas gerais e as generaliza, e
essas maximas gerais serao verdadeiras ou falsas segundo tiver
sido bern ou mal feito esse processo de generaliza~ao. A soma
imensa de confusao e erro que existe a respeito da natureza do
pecado e do que se deve considerar como pecado e devida a
uma viciosa generaliza~ao de prindpios gerais deduzidos de
intui~6es individuais, e a aplica~ao indiscriminada das
maximas deduzidas assim a casos que se acham fora dos limites
a que se estendem as intui~6es. As maximas de que todo pecado
consiste em a~ao voluntaria, e de que a nossa capacidade ea
medida da nossa responsabilidade, sao maximas desse genero
e exemplos desse abuso. E tao absurdo querer que o entendi-
mento decida de uma questao que pertence ao dominio do
sentido moral, como o seria querer que o olfato decidisse de
uma questao de sons. Veja McCosh, Intuitions of the Mind

430
A Natureza do Pecado ...
(Intui~6es da Mente), Livro 1, cap.2: § § 4 e 5, e Livro 4, cap.
3: § § 1-3. . ' .'

e
2. Que necessaria que uma verdadeira definifiiO da natureza
do pecado abranja?
E necessaria que uma defini~ao do pecado abranja-
1°. Tudo o que a Palavra de Deus e a consciencia esclarecida
declaram ser pecado.
2°. Nao deve abranger mais nada. Sea defini~ao nao estiver
de conformidade com estas duas regras, sera falsa.

3. Quais as definifi5es de Turretino, dos nossos livros oficiais e


de Vitringa?
Turretino,Locus 9, Quces. 1.- "Inclinatio, actio vel omissio
pugnans cum lege Dei, vel carens rectitudine legali debita in
esse".
Conf de Fe, cap. 6, § 6; Cat. Maior, Perg. 24; Breve Cat.,
Perg. 14- "Pecado e qualquer falta de conformidade com a lei
de Deus, ou qualquer transgressao dessa lei".
Campegio Vitringa, professor de teologia em Franeker,
falecido em 1722- "Forma peccati est desconvenientia, actus,
habitus, aut status hominis cum divina lege".
Esta ultima defini~ao, excelente, abrange duas proposi<;:6es
constitutivas-
1a. 0 pecado etoda e qualquer falta de conformidade com
a lei moral de Deus, quer seja de excesso quer de deficiencia,
quer de comissao quer de omissao;
za..E qualquer falta de conformidade que haja nos estados
e costumes morais, como tambem nas a<;:6es da alma humana,
com a lei de Deus.

4. Que elei? Que ea Lei de Deus?


A palavra lei e empregada em muitos e variadfssimos
sentidos. Os fisicos a empregam muitas vezes como designa~ao
de-
:~!SUOIECA AUBREY CLABIC

431
Capitulo 18
1°. Urn fato geral, e.g., o fato geral de que todos os corpos
se atraem mutuamente na razao inversa dos quadrados das
distancias.
2°. Uma ordem estabelecida da sequencia em que certos
eventos sucedem, como, e.g., as esta~6es do ano, e qualquer
ordem estabelecida da natureza.
3°. 0 modo de opera~ao de uma forma especifica, como a
lei da indu~ao eletrica, etc.
4°. Uma ordem espontanea de desenvolvimento, como a
lei interna e auto-operativa do crescimento dos animais e
plantas dos seus germes ou sementes.
A lei moral de Deus, porem, nao e urn principio interno e
auto-regulador da natureza moral do homem, como a fingida
luz interna dos quacres, e sim urn padrao imperativo de
excelencia moral imposto aos homens de fora e de cima, pela
autoridade suprema de urn Governador morale pessoal sobre
suditos morais e pessoais. Envolve (a) urn certo grau de
esclarecimento quanto averdade eao dever, (b) uma regrade
a~ao que regula a vontade e obriga a consciencia, (c) san~6es
ou motivos imperativos que constrangem a obediencia.

5. Como se prova que qualquer falta de conformidade com a


"Lei" epecado?
1°. Sempre que pecamos, a consciencia nos condena por
nao nos conformarmos a urn padrao que reconhecemos
intuitivamente como sendo obrigatorio para nos. A consciencia
implica (a) responsabilidade moral, e, por isso, sujei~ao a urn
Governador moral, e (b) urn padrao ao qual nos devemos
conformar. A propria consciencia, como orgao da lei de Deus,
con tern a lei escrita no cora~ao.
2°. Esta impHcito na linguagem empregada pelo Espirito
San to nas Escri turas para exprimir a ideia de pecado: set, setim,
de satah, "afastar-se do caminho", hata, hamartano, "errar 0
alvo" ,parabasis (Gal. 3: 19), "urn desviar-se, urn a transgressao".
3°. Afirma-se tambem explicitamente nas Escrituras.

432
A Natureza do Pecado ...
"Todo o que comete pecado, comete igualmente ten anomian,
a ilegalidade, porque 0 pecado e ilegalidade" - 1 Joao 3:4.
"Porque on de nao ha lei tam bern nao ha transgressao"- Rom.
4:15.

6. Como se prova que qualquer falta de conformidade com a


lei moral de Deus epecado?
Como se mostrou acima, isso esta implicito nas opera<;,:6es
da consciencia. Esta da testemunho da lei que nos e imposta
por uma autoridade exterior em rela<;ao a nos - a autoridade
suprema de Deus. N a falta de qualquer revela<;ao sobrenatural,
ela tern levado todas as na<;,:6es gentilicas a reconhecerem a
autoridade de Deus ou de deuses exercendo governo, a crerem
em recompensas e castigos administrados por Deus, e a
praticarem certos ritos expiatorios.
Davi assevera que toda e qualquer especie de pecado e
desobediencia e uma desonra feita a Deus. Veja o Salmo 51.
Segue-se que urn pecado nao e simplesmente uma viola<;ao
da lei da nossa propria constitui<;,:ao, nem do sistema das coisas,
e sim uma ofensa contra urn Legislador pessoal e urn Gover-
nador moral que vindica sua Lei com penas. A alma que peca
esta sempre conscia de que seu pecado (a) e intrinsecamente
vile maculador, e (b) que com justi<;a merece castigo e chama
sobre o pecador a justa ira de Deus. Por isso o pecado traz
sempre consigo duas caracteristicas inalienaveis- (a) desme-
recimento, culpa, reatus, (b) corrup<;ao, macula.

7. Como se pode mostrar que essa Lei (qualquer falta de


conformidade com a qual epecado) exige perfeifiiO moral absoluta?
Isso se acha envolvido necessariamente na propria essencia
da obriga<;ao moral. A propria essencia do bem moral i que este
deve ser. A propria essencia do mal moral e que este nao deve
ser. Se qualquer coisa for indiferente moralmente, nao sera
moral, e se for moral, sera coisa de obriga<;ao. Sendo isso da
essencia do bern moral, e evidente que e tao verdadeiro a

433
Capitulo 18
respeito de cada parte como do todo. Por conseguinte, qualquer
grau de falta de plena conformidade com o bern moral no mais
alto grau e da natureza do pecado, "Porque qualquer que
guardar toda a lei, e trope<;:ar em urn s6 ponto, tornou-se
culpado de todos"- Tia. 2:10. E verdadeira a antiga maxima:
omne minus bonum habet rationem mali.
Deste principia segue-se evidentemente que a doutrina
romana de obras de supererroga<;:ao nao e somente impia, mas
tambem absurda; porque se essas obras sao obrigat6rias, nao
sao supererrogat6rias; e se nao sao obrigat6rias, nao sao morais,
e se nao sao morais, nao podem ter valor moral.. E segue-se
tambem que todos os perfeccionistas que, embora admitam
que os homens nesta vida nao sao capazes de guardar per-
feitamente a lei de absoluta perfei<;:ao moral, sustentam ao
mesmo tempo que os cristaos podem nesta vida viver sem
pecado, empregam, evidentemente, linguagem incorreta e
enganadora.

8. Como se prova que qualquer falta de conformidade com


essa Lei, nos estados e habitos permanentes da alma, como tam-
hem nos seus atos, epecado?
1°. Isso fica provado pelo juizo comum de todos os homens.
Todos julgam que o estado moral do cora<;:ao determina o
carater moral das a<;:6es, e que o carater moral destas torna
manifesto o estado do cora<;:ao, e que o homem cujos atos sao
habitualmente profanos, malevolos ou impuros, e ele mesmo
quem, no estado permanente do seu cora<;:ao, e profano,
malevolo ou impuro.
2°. 0 mesmo fica provado pela comum experiencia
religiosa de todos os cristaos. Esta experiencia envolve sempre
convic<;:ao do pecado, e esta envolve como seu elemento mais
uniforme e proeminente, nao s6 a convic<;:ao de nao estarem
os nossos atos em conformidade com a lei de Deus, mas
tambem o sentimento de que nas profundezas da nossa
natureza, debaixo e alem do alcance da voli<;:ao, estamos mortos

434
A Natureza do Pecado ...
cspiritualmente e manchados, impotentes e insensiveis para
as coisas divinas, e por isso merecedores da condena~ao. Todo
verdadeiro cristao ja tern dito com Paulo: "Miseravel homem
que eu sou! Quem me livrara do corpo desta morte?"- Rom.
7:24. Este sentimento acha expressao, e deste principia da-se
testemunho em todas as ora~6es, suplicas e confiss6es, enos
hinos e na literatura devocional dos cristaos de todos os seculos
e de todas as igrejas.
3°. As Escrituras chamam explicitamente "pecado" a todos
os estados permanentes da alma quando nao estao de confor-
midade com a lei de Deus. Diz que o pecado e suas paix6es
reinam no corpo mortal; que os membros do corpo sao os
instrumentos do pecado; que os irregenerados sao os servos do
pecado- Rom. 6:12-17. A disposi~ao ou "tendencia" perma-
nente para pecar chama-se "carne, em oposi~ao ao "espirito",
Gal. 5:17; tambem "concupisd~ncia", Tia.1:14,15; "homem
velho", "corpo do pecado", "ignorancia", "cegueira do cora~ao",
"aliena~ao da vida de Deus", Ef. 4:18-22.

9. Como se pode mostrar que mesmo os primeiros movimentos


espontaneos da concupiscencia constituem pecado?
1°. 0 cora~ao do cristao muitas vezes tern, momentanea e
espontaneamente, desejos maus, quando a consciencia logo os
condena, e a vontade os proibe e refreia, e deles desvia a aten~ao.
Mesmo quando o homem assim nao consente com o pecado
que esta nele, o cristao, contudo, sente que tais movimentos
da concupiscencia sao pecaminosos e dignos de condena~ao, e
nao somente resiste a eles, como tambem os condena e se
aborrece por causa deles, e procura logo lavar-se no sangue
expiat6rio e pelo Espirito purificador de Jesus.
2°. Concupiscencia e chamada "pecado" nas Escrituras.
"Eu nao conheci o pecado senao pela lei; porque eu nao
conheceria a concupiscencia (epithumian), sea lei nao dissesse:
nao cobi~aras (epithumeseis), Rom. 7:7. Tambem "as paix6es
(os movimentos) dos pecados", a "outra lei nos meus

435
Capitulo 18
membros", e "o pecado que habita em mim" e que, sem o
meu consentimento, agiu produzindo "em mim toda a con-
cupisd~ncia", etc.- Rom. 7:5-24.

10. Qual o primeiro grande misterio em conexiio com a origem


do pecado?
Como e por que foi permitida a existencia do pecado na
cria<;ao realizada por urn Deus ao mesmo tempo eterno, auto-
existente e infinito em Sua sabedoria, poder, santidade e
bondade?
Todas as solu<;6es propostas para este enigma, e que ainda
em nossos dia tern seus defensores, sao resumidas do modo
seguinte pelo professor Haven, de Chicago:
"Ou Deus nao podia impedir que entrasse o pecado (a)
em sistema algum, ou (b) num sistema que envolvesse agencia
livre.
"Ou Deus, por algum motivo, nao quis impedir a entrada
do pecado, ou (a) por ser sua existencia desejavel em si mesma;
ou (b) em bora nao sen do desejavel em si e o meio necessaria
para produzir a maior soma de bern; ou (c) embora nao
propenda para o bern, pode ser dominado de modo que
concorra para produzir a maior soma de bern; ou (d) porque,
em termos gerais, a sua permissao sera urn mal menor do que
o seu impedimenta absoluto".
Eevidente (a) que Deus permitiu que entrasse o pecado, e
(b) que por isso esta bern feito. Mas como pode estar bern feito,
e e sempre sera urn misterio que exige submissao da nossa
parte e que desafia a que lhe achemos solu<;ao satisfat6ria.

11. Qual foi a doutrina dos maniqueus a respeito da origem


do pecado?
Eles sustentavam que o pecado tern sua razao de ser em
algum principia auto-existente e eterno, independente de
Deus - ou na materia ou em algum demonio auto-existente.
Mas esta doutrina e incompativel, (a) com a independencia,

436
A Natureza do Pecado ...
infinitude e soberania de Deus; (b) com a natureza do pecado,
que e essencialmente a rebeliao contra Deus de uma livre
vontade (livre-arbitrio) criada. 0 pecado e urn elemento de
agencia moral pervertida. Considera-lo atributo da materia e
nega-lo. Todos os chamados "santos pais" unanimemente se
opuseram ao maniqueismo, e sustentaram a doutrina ortodoxa
de que o pecado neste mundo s6 e produto do livre-arbitrio do
homem.

12. Que diz a teoria de Agostinho a respeito da natureza do


pee ado considerado como privafiiO?
Agostinho afirmava- 1°. Que Deus eo Criador de todas
os seres eo Governador absolutamente soberano de todos os
agentes marais e de todas as suas as;6es; e 2°. Que nao obstante
isso, Deus em nenhum sentido, nem eo au tor, nem a causa do
pecado. A fim de conciliar estes dois pontos, ele sustentava,
3°. Que o pecado nao e urn ser, uma entidade, e sim, na sua
essencia, e simplesmente urn defeito. Seu pronunciamento,
que circula geralmente entre todas as classes de te6logos, e:
Nihil est malum nisi privatio beni. (Literalmente: Nada e mal,
senao privas;ao do bern.) Os te6logos distinguem propriamen te
entre "negas;ao" e "privas;ao". N egas;ao e a au sen cia daquilo
que nao pertence a natureza de urn objeto, como , e.g., a
faculdade da visao a uma pedra. Privas;ao e ausencia daquilo
que, pertencendo anatureza do objeto, e necessaria para a sua
perfeis;ao, e.g., a faculdade da visao a urn homem.
Portanto, o pecado e privas;ao porque tern sua origem na
ausencia das qualidades marais que devem achar-se presentes
nos estados e as;6es de urn agente moral, livre e responsavel.
Devemos estar lembrados, porem, de que a depravas;ao
inerente que "vern de uma causa defectiva ou privativa" toma
imediatamente uma forma positiva, por causa da natureza
essencialmente ativa (dinamica) da alma humana. Num estado
passivo de existencia, urn defeito poderia continuar sendo
puramente negativo. Todavia num ser sempre ativo (dinamico ),

437
Capitulo 18
e que esta sempre com obrigac,;:6es morais, urn defeito moral
nao pode senao tornar-se imediatamente em vicio positive.
Nao amar a Deus e odia-10. Nao estar conformado em tudo
a Sua vontade e rebelar-se contra Ele e violar a Sua lei
em todos os pontos. Veja Edwards, Original Sin (0 Pecado
Original), Parte 3, sec. 2.

13. 0 que diz a doutrina pelagiana a respeito da natureza do


pecado?
A teoria pelagiana do pecado, que e rejeitada por todos OS
ramos da Igreja Crista, e-
1°. Que uma lei pode comandar volic,;:6es.
2°. Que os estados da alma s6 podem ser comandados ate
onde forem o efeito direto de previas volic,;:6es.
3°. Que, portanto, o pecado consiste somente em atos de
volic,;:ao.
4°. Que 0 homem nao tern obrigac,;:ao alguma de fazer aquilo
que nao tern capacidade plena para fazer.
5°. Que, portanto, nao ha coisa semelhante aquilo que se
chama depravac,;:ao inata.
6°. Que, sendo necessaria que uma volic,;:ao seja determinada
s6 e unicamente pela vontade para que tenha cad.ter moral ou
possa ser aprovada ou condenada, segue-se que o pecado esta
fora do dominio absolute de Deus.

14. Em que sentido e verdadeira a declarafiiO de que "todo


pecado evoluntario", e em que sentido efalsa?
Tudo depende do sentido em que se tomar a palavra
"voluntario". Se, no sentido pelagiano, se restringir aos "atos
de volic,;:ao", en tao a declarac,;:ao de que "todo pecado e volun-
tario" sera falsa. Se, porem, a palavra for tomada no senti do de
incluir as disposic,;:6es, tendencias e afetos espontaneos que
constituem o carater permanente da alma, que incitam as
volic,;:6es e decidem da sua natureza, entao todo pecado e
voluntario, porque todo pecado tern sua razao de sere sua fonte

438
A Natureza do Pecado ...

nessas tendencias e disposi<;;6es espontaneas, isto e, nos estados


marais permanentes da alma.

15. Quais sao as peculiaridades da teoria cat6lico-romana a


este respeito, e tambim as dos perfeccionistas arminianos?
A igreja cat6lica romana concorda com todos os protes-
tantes em sustentar que sao pecaminosos os habitos e
disposi<;;6es permanentes, como tambem as a<;;6es da alma, que
nao estejam em conformidade com a lei de Deus. Mas e uma
caracteristica proeminente da sua doutrina que eles afirmam
que nao sao propriamente da natureza do pecado essa condi<;;ao
moral da alma que permanece nos regenerados em conse-
qiiencia do pecado original, e ofomes* ou alimento de pecado
real. Eles sustentam que o primeiro movimento espontaneo
dessa concupiscencia nao e pecado em si mesmo e nao deve
ser tratado como tal - porem que se torna causa de pecado s6
quando a vontade entretem as suas solicita<;;6es e as traduz em
a<;;6es- Cat. do Cone. de Trento, Parte 2, cap. 2, Perg. 42.
Os arminianos servem-se mais ou menos das mesmas
distin<;;6es em defesa da sua doutrina da perfei<;;ao crista. Wesley
(Meth. Doc. Tracts (Tratados sobre a Doutrina Metodista), pags.
294-312) distingue entre "o pecado propriamente assim
chamado, is toe, transgressao voluntaria de uma lei conhecida,
e 0 pecado impropriamente assim chamado, isto e, transgressao
involuntaria de uma lei conhecida ou niio", e declara: "Creio
que nesta vida niio ha perfei<;;iio que exclua essas transgress6es
involuntarias, que acho serem conseqiiencia natural da
ignorancia e dos erros inseparaveis da mortalidade".

0 PECADO DE ADAO

16. Qual o segundo misterio em conexfio com a origem do


pecado?
-.,"'I

*Latim fames- lenha, combustive!. Nota de Odayr Olivetti. '·

439
Capitulo 18

Como pode o pecado originar-se num ser criado com uma


disposi<;:ao positivamente santa?
A dificuldade consiste em conciliar de urn modo inte-
ligivel o fato de que o pecado originou-se assim-
1°. Com a conhecida constitui<;ao da vontade humana. Se
as voli<;6es sao como sao os afetos e desejos, e se estes, estimu-
lados por causas externas, sao bons ou rnaus, conforme o estado
moral e permanente da vontade, como entao uma voli<;ao
pecaminosa pode originar-se numa vontade santa? Ou, como
e que 0 estado permanente da alma pode tornar-se mau?
2°. Com a experiencia universal. Sendo impossivel que
uma voli<;ao ou urn desejo pecaminoso se origine na santa
vontade de Deus, ou na dos santos e dos anjos, ou que urn
afeto ou uma voli<;ao verdadeiramente santa se origine, sem
que tenha ocorrido uma regenera<;ao sobrenatural, nas vontades
depravadas dos homens decaidos (Luc. 6:43-45), como e que
uma voli<;ao pecaminosa pode originar-se na vontade santa de
Adao?
Que Adao foi criado com uma vontade santa mas falivel,
a qual decaiu, sao fatos estabelecidos pelo testemunho divino.
Temos a obriga<;ao de crer neles, apesar de nao podermos
explica-los racionalmente. Enos e impossivel explica-los-
1°. Permanece sempre na vontade humana urn elemento
inescrutavel para n6s, seja qual for a teoria que a seu respeito
adotarmos.
2°. Porque todo o nosso raciodnio baseia-se necessa-
riamente em nossa consciencia intima, e nenhum outro
hom em jamais teve na sua consciencia a experiencia de Adao.
A origem de nossas pr6prias voli<;:6es pecaminosas e muito
evidente; faltam-nos, porem, alguns dos dados necessarios para
explicar a situa<;ao de Adao.
No entanto, por via de aproxima<;:ao, devemos no tar-
1°. Que nao e 16gico deduzir da vontade independente de
Deus alguma conclusao a respeito da vontade dependente de
uma criatura.

440
A Natureza do Pecado ...

2°. Que a infalibilidade dos santos e dos anjos nao lhes e


inerente, e sim e urn a gra<;a confirmadora acrescen tad a por
Deus. Nao esta mais em estado de prova<;ao (ou de prova) como
estava Adao - a vontade dele era livre, porem nao estava
confirmada.
3°. A vontade depravada do homem caido nao pode
originar afetos e voli<;6es santos, porque e necessaria que se
ache presente urn prindpio positivamente santo que os
constitua santos. Mas, por outro lado, no caso de Adao, ja se
achavam nele, na sua vontade santa, muitos principios
moralmente indiferentes, em si mesmos nem bans nem maus,
e somente se tornando rna us quando, na falta de sua boa dire<;ao
da parte da razao e da consciencia, incitassem a indulgencia
de algum modo proibido por Deus, e.g., incitassem o homem,
Adao, a admirar e desejar comer do fruto proibido, ou a
adquirir ciencia (conhecimento) de urn modo proibido. 0
pecado come<;ou no momenta em que, levado pelas palavras
persuasivas de satanas, Adao demorou-se em pensar nesses dais
motivos, apesar da proibi<;ao feita por Deus, e permitiu assim
que eles prevalecessem em sua alma ao ponto de neutralizar
temporariamente tanto a sua reverencia pela autoridade de
Deus como o receio de sua amea<;a.
4°. Adao, conquanto dotado de uma disposi<;ao santa, estava
sem a experiencia de tenta<;6es.
5°. A tenta<;ao dirigiu-se a urn principia da sua natureza
que era mormente indiferente, e o tentador era urn ser de
inteligencia muito superior a de Adao, e a ele e necessaria
referir a origem de todos os pecados.

17. Qual foi, segundo se pode inferir da narrativa da Queda,


a natureza exata do primeiro pecado de Adiio?
Segundo se pode inferir da narrativa (Gen. 3: 1-6), os
movimentos iniciais cuja influencia resultou no primeiro
pecado dos nossos primeiros pais, eram, considerados em si
mesmos, moralmente indiferentes. Eram -1°. Apetite natural

441
Capitulo 18
pelo fruto atraente. 2°. Desejo natural de adquirir ciencia (ou
conhecimento). 3°. 0 poder persuasivo de satanas sobre Eva,
junto com a conhecida influencia de uma inteligencia e de
uma vontade superiores. 4°. 0 poder persuasivo de satanas e
de Eva juntos sobre Adao. Seu terrivel pecado, infere-se,
consistiu essencialmente- 1°. Na incredulidade: trataram
virtualmente a Palavra de Deus como mentira. 2°. N a desobe-
diencia, cometida deliberadamente; arvoraram em lei a sua
vontade, em vez da vontade de Deus.

18. Que relm;iio Deus sustentava para com o pecado de Adiio?


A respeito da rela~ao de Deus para como pecado de Adao,
tudo quanto sabemos e-
1°. Que Deus criou Adao santo, com todas as faculdades
morais necessarias para fazer dele urn agente responsavel.
2°. Que com todo o direito deixou de conceder-lhe, du-
rante o tempo da sua prova~ao, qualquer dom sobrenatural
necessaria para torna-lo infalivel.
3°. Nem causou nem aprovou o seu pecado. 4°. Decretou
soberanamente permitir que pecasse, determinando, pois, que
pecasse, como pecou.

19. Que efeito o pecado de Adiio produziu sabre ele?


1°. Na rela~ao natural que Adao mantinha para com Deus
como sudito sob o Seu governo moral, seu pecado nao podia
deixar de produzir imediatamente o efeito de (1) desagradar a
Deus e aliena-10, e (2) de depravar sua propria alma.
2°. Em virtude da rela~ao estabelecida entre Deus e Adao
pela alian~a das obras, Adao incorreu na pena sentenciada nessa
alian~a, isto e, a morte, a qual compreendeu (1) mortalidade
do corpo, (2) corrup~ao da alma, e (3) senten<;a de morte eterna.

20. Em que sentido o homem tornou-se totalmente depravado,


e como pode a depravafiiO total ser resultado de um s6 pecado?
Quando se afirma que a deprava<;ao total foi o resultado

442
A Natureza do Pecado ...

imediato do primeiro pecado de Adao, nao se quer dizer


que ele se tornou tao mau quanto lhe foi possfvel, nem tao
corrompido como o e o melhor dos seus descendentes nao
regenerados; mas 0 senti do e-
1°. Que a sua apostasia de Deus foi completa. Deus exige
obediencia perfeita, e Adao foi rebelde.
2°. Que Deus retirou dele o Seu favor e a Sua comunhao
com ele, as (micas condi~oes que lhe permitiam ter vida
espiritual.
3°. Que urn cisma se introduziu em sua propria alma. Sua
consciencia passou a acusa-lo, e nunca mais poderia calar-se,
sem que houvesse uma expia~ao. 0 resultado disso foi que
ele passou a ter medo de Deus, desconfian~a, cometer pre-
varica~ao e, como conseqiii~ncia necessaria, inumeros outros
pecados.
4°. Assim, tornou-se depravada a natureza inteira do
homem. A vontade passou a estar em guerra contra a cons-
ciencia e, dessa maneira, o entendimento ficou obscurecido; a
consciencia, sujeita constantemente a ultrajes e desprezo, ficou
endurecida; os apetites do corpo tornaram-se desordenados e
os membros do corpo se transformaram em instrumentos de
iniquidade.
5°. Nao ficou na natureza do homem nenhum prindpio
recuperativo; iria de mal a pior, se Deus nao interviesse.
Assim, pois, sen do essencialmente ativa (dinamica) a alma
humana, embora urn s6 pecado nao estabelecesse urn habito
confirmado, esse pecado alienou Deus e produziu confusao na
alma do homem, e desse modo levou a urn curso interminavel
de pecado.

CONSEQlJ:ENCIAS DO PECADO DE ADAO


SOBRE A SUA POSTERIDADE

Sao elas-
1a. Que a responsabilidade legal desse pecado pesa

443
Capitulo 18

judicialmente, e desde o primeiro momenta da sua existencia,


sabre todos aqueles de quem Adao fora o representante na
alian<;:a das obras.
2a. Que, em conseqtiencia, cada urn dos seus descendentes
nasce em estado de exclusao da comunhao vivificadora do
Espfrito divino.
3a. Que, em conseqtiencia, nasce sem a justi<;:a original e
com uma tendencia inerente que infalivelmente leva todos e
cada urn dos seus dependentes a pecarem, desde o seu
nascimento.
4a. Que OS homens sao absolutamente incapazes
moralmente de mudar sua natureza ou de cumprir suas
obriga<;:6es.
Por motivos que aparecerao depois, discutiremos os pontos
ligados anatural corrup<;:ao e incapacidade moral do homem
antes do ponto que se relaciona com a imputa<;:ao, ou a razao e
o modo por que as conseqtiencias do pecado de Adao passam
dele para os seus descendentes.

444
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0 Pecado Original
(Peccatum H abituale)

1. Como se deve definir o pecado original?


VejaConf de Fe, Cap.6; Cat. Maior, Perg. 25,26;Breve Cat.,
Perg. 18.
A expressaopecado original e ernpregada as vezes no sentido
de incluir tanto a irnputa<;:ao judicial da culpa do pecado de
Adao, como tam bern a corrup<;:ao moral hereditaria, que e urna
das conseqiiencias dessa irnputa<;:ao. Mais restritarnente, porern,
a expressaopecado original designa sornente a corrup~ao moral
hereditaria com urn a todos os hornens desde o seu nascirnento.
Ao definirrnos esta doutrina,NEGAMOS:
1°. Que essa corrup<;:ao seja ern qualquer sentido fisica e
que seja inerente a essencia da alma ou a qualquer das suas
faculdades naturais, como tais.
2°. Que consista prirnariarnente na rnera suprernacia da
parte sensual da nossa natureza. E urn habito depravado ou
urna tendencia rna da vontade.
3°. Que consista s6 na ausencia de disposi<;:6es santas;
porque, ern conseqiiencia da atividade inerente a alma, o
pecado rnanifesta-se desde o principio por via de uma
tendencia positiva para o mal.
Por outro lado,AFIRMAMOS:
1°. Que o pecado original e puramente moral, sendo a
tendencia inata da vontade para o mal.
2°. Que, tendo sua sede na vontade oposta a santa lei de

445
Capitulo 19
Deus, desvia o entendimento e assim engana a consciencia,
conduz a juizos morais errados, acegueira do entendimento, a
urn a sensibilidade deficiente e pervertida em rela~ao as coisas
morais, a a~ao desordenada da natureza sensual e, assim, a
corrup<;:ao da alma inteira.
3°. Que apresenta dois aspectos: (1) A perda do original
habito reto da vontade. (2) A presen<;:a de urn habito positiva-
mente mau.
4°. Contudo, do fato de nao abranger esta deprava~ao inata
uma disposi<;:ao positiva para o mal, nao se segue que nao tenha
sido infundida na alma uma qualidade rna positiva. Porque,
da natureza essencialmente ativa (dinamica) da 'a lma, e da
natureza essencial da virtude, como aquilo que obriga a
vontade, segue-se evidentemente que e impossivel que a alma
seja indiferente moralmente; e assim essa deprava<;:ao que,
como diz o Presidente Edwards*, "vern de uma causa defectiva
e privativa", toma imediatamente uma forma positiva. Nao
amar a Deus e rebeWio contra Ele;e nao obedecer avirtude e
calca-la aos pes. 0 amor por nos mesmos em breve nos leva a
temer, e depois a odiar o vingador da justi<;:a- Edwards, Origi-
nal Sin (0 Pecado Original), Parte 4, sec. 2.

2. Par que esse pecado echamado original?


Nao porque pertencesse a constitui~ao original da nossa
natureza assim como esta saiu das maos de Deus, e sim, 1°.
Porque e derivado por gera~ao ordinaria de Adao, estirpe
original da ra<;:a humana; e 2°. Porque e a raiz interna ou a
origem de todos os pecados efetivos que maculam a nossa vida.
Esse pecado chama-se tambem, tecnicamente, Peccatum
Habituale, ou urn pecado que consiste num habito ou estado

*Jonathan Edwards, grande te6logo e pregador, e urn dos maiores, senao o


maior fil6sofo norte-americana. Foi Presidente do Colegio de Nova Jersey,
atual Universidade de Princeton. Nota de Odayr Olivetti.

446
0 Pecado Original
moralmente corrompido da alma, em distin~ao do pecado
imputado e do pecado efetivo.

3. Como se pode provar que a doutrina do pecado original niio


envolve corrupfiiO da substfincia da alma?
E juizo universal dos homens que existem na alma, alem
da sua essencia e de suas faculdades naturais, certos habitos,
inatos ou adquiridos, que qualificam (ou condicionam) a a~ao
uessas faculdades e constituem o carater do homem. Esses
habitos, ou disposi~6es inerentes, que determinam os afetos e
uese jos da vontade, governam as a~6es do homem e, quando
bons, sao aprovados e, quando rna us, sao reprovados por todos.
Urn habito moral inato da alma, e.g., o pecado original, nao e
uma corrup~ao fisica como tam bern qualquer habito adquirido
(sej a habito intelectual, seja moral) nao e uma mudan~a fisica.
Alem disso, as Escrituras distinguem entre o pecado eo
agente de urn modo que prova que o habito de pecar (o habito
pecaminoso) nao e alguma coisa consubstancial como proprio
pecador- Rom. 7:17, "o pecado que habita em mim"- Heb.
12:1.

4. Como se pode provar que o pecado original niio consiste em


alguma molestia, nem somente na supremacia da parte sensorial
da nossa natureza?
Embora seja verdade que os apetites desordenados do
corpo dao ocasiao a muitos pecados, e contudo evidente que a
origem ou a raiz do pecado nao pode estar neles -
1°. Pela propria natureza do pecado, o qual tern necessaria-
mente sua sede no estado moral do prindpio voluntario. Uma
molestia, ou qualquer forma de desordem fisica, nao e
voluntaria e, por conseguinte, nao pode ser elemento de
responsabilidade moral. E, alem disso, obriga~ao da vontade
regular a natureza inferior e sensorio-sensual, eo pecado deve
sua origem afalta desses afetos morais que seriam supremos
sc ainda continuassem a reinar na vontade.

447
Capitulo 19
2°. Pelo fato de nao terem nenhum elemento sensoria-
sensual os pecados mais graves, e.g ., o orgulho, a 1ra, a
malevolencia, e a A VERSAO A DEUS .

5. Como se pode provar que esse habito ou disposifdo inata da


alma, que leva os homens a cometerem maus atos, eem si mesmo
pecado?
1°. Esse habito inato da alma e urn estado da vontade, e
e urn principia final que os estados, bern como os atos da
vontade, em relafdo a lei da consciencia, sao marais, isto e, ou
bons ou maus. Veja acima, Cap.15, Perg. 9 e 10.
2°. Esses habitos ou estados permanentes 'da vontade
constituem 0 carater do homem, que todos OS homens julgam
merecer louvor ou censura.
3°. Essa disposi<_;ao inerente para co meter atos pecaminosos
e chamada "pecado" nas Escrituras- Rom. 6:12,14,17; 7:5-17.
E chamada "carne" "carnal" em oposi<_;ao a "espirito" ou
"espiritual", Gal. 5:17 ,24; tam hem "concupiscencia", Tia.
1: 14,15; "o nos so hom em velho" e "corpo do pecado", Rom.
6:6; tambem "ignorancia", "cegueira do cora<_;ao" e "separados
da vida de Deus", Ef. 4:18,19.

6. Como se pode mostrar que o pecado original nao consiste


somente na falta da retidiio original?
1°. Da atividade inerente a alma humana e da natureza
inerentemente obrigat6ria do que e moralmente born, segue-
-se que a ausencia de boas disposi~.;6es conduz imediatamente
aforma~.;ao de disposi~.;6es positivamente mas. Nao amar a Deus
e odia-10; nao obedecer-Lhe e desobedecer-Lhe. A desobedi-
encia conduz ao me do, amentira e a todas as formas de pecado.
Veja acima, Perg. 1.
2°. Como materia de fato, a deprava~.;ao inata manifesta
seu carater positivo pelos pecados positivos, tais como o
orgulho, a malevolencia, etc. que dela provem mesmo nas
crian~.;as de idade muito tenra.

448
0 Pecado Original
3°. As Escrituras lhe atribuem carater positivo quando lhe
nplicam termos como "carne", "concupiscencia", "homem
vclho", "lei nos meus membros", "corpo do pecado", "o pecado
tomando ocasiao", "me enganou", e "obrou toda a concupis-
cencia''- Romanos, capitulo 7.

7. Como se pode mostrar que o pecado original afeta o homem


inteiro?
0 pecado original tern sua sede na vontade, e consiste
primariamente nesse pendor para disposic;;6es e afetos ilicitos
que e o habito inato da alma humana. Mas, as diversas
raculdades da alma nao sao outros tantos agentes separados . .E
a alma em sua unidade que opera em cada func;;ao como o agente
indivisivel, qualificando -se mutuamente uma a outra suas
diversas faculdades segundo a sua especie. Quando a alma esta
ocupada em en tender alguma coisa,e.g., a matematica, em que
scus afetos nao se acham interessados, entao nao ha na sua ac;;ao
ncnhum elemento moral. Entretanto, quando esta ocupada em
cntender alguma coisa a respeito da qual seus afetos depra-
vados se acham interessados de urn modo perverso, sua ac;;ao
imparcial sera necessariamente prejudicada. As consequen-
cias, pois, da propensao pecaminosa da vontade na sua
influencia governadora sobre as operac;;6es da alma, em todas
as suas faculdades, serao -
1°. 0 entendimento, tornado parcial pelos afetos perver-
tidos, operando concorrentemente com o sentido moral em
form ar juizos morais, dara como resultado juizos errados, uma
consciencia enganadora e uma geral "cegueira do entendi-
mento" a respeito de coisas morais.
2°. As emoc;;6es e os sentimentos que acompanham os
juizos da consciencia em aprovar o bern e condenar o mal,
sendo muitas vezes ultrajados e tratados com negligencia, vao
sc tornando menos vivos, e isso redundara numa consciencia
cndurecida e numa insensibilidade moral em geral.
3° . N urn curso prolongado de ac;;ao pecaminosa, a memoria

449
Capitulo 19
ficara poluida pelos materiais amontoados das experiencias
corruptoras, e delas a imagina~ao tam bern tirara material para
o seu uso.
4°. 0 corpo tambem se tornara corrompido. (1) Seus
apetites naturais, na falta de dire~ao e governo apropriados, se
tornarao desordenados. (2) Seus poderes ativos serao empre-
gados como "instrumentos de iniqiiidade".
5°. As Escrituras ensinam - (1) Que o entendimento do
"homem natural" e depravado, bern como os seus afetos - 1
Cor. 2: 14; 2 Cor. 4:4; Ef. 4: 18; Col. 1:21. (2) Que a regenera~ao
envolve nao somente a renova~ao do cora~ao, mas tambem a
sua ilumina~ao- Atos 26: 18; Ef. 1: 18; 5:8; 1 Ped. 2:9. (3) Que
a verdade dirigida ao entendimento eo meio principal de que
se serve o Espirito Santo nas obras de regenera~ao e de
santifica~ao- Joao 17: 17; Tia. 1:18.

8. Que se entende pela afirrnar;iio de que 0 homem e, par natureza,


totalmente depravado?
Por essa frase ortodoxa NAO SE DEVE ENTENDER-
1°. Que o hom em depravado nao tern consciencia. A
bondade de urn agente nao consiste em ter consciencia, e sim
em estarem suas disposi~6es e afetos em conformidade com a
lei da qual a consciencia eo 6rgao. Mesmo os demonios e as
almas perdidas sabem o que e borne mau, e sen tern essas emo-
~6es vindicativas das quais a consciencia esta armada.
Nem, 2°. que os homens nao regenerados, possuindo uma
consciencia natural, nao admirem muitas vezes o carater
virtuoso e as boas a~6es dos outros.
Nem, 3°. que sejam incapazes de a~6es ou afetos interes-
sados em suas diversas rela~6es com os outros seres humanos.
Nem, 4°. que qualquer homem seja tao depravado quanto
e possivel que se tome, nem que todos tenham uma disposi~ao
propensa para todas as formas de pecado.
Mas, ENTENDE-SE -
1°. Que, desde que a virtude consiste na conformidade

450
0 Pecado Original
das disposis;6es da vontade corn a lei de Deus, e que a propria
alma da virtude consiste ern sera alma leal a Deus, segue-se
que todo hornern, por natureza, esta, ern sua disposis;ao geral,
separado de Deus e que, por conseguinte, todos os seus atos,
quer sejarn rnoralrnente indiferentes, quer sejarn conforrnados
a principios subordinados do bern, sao viciados pelo estado de
rebeliao contra Deus ern que se acha o agente.
2°. Que esse estado da vontade da como resultado urn cisrna
na alma, e a perversao moral de todas as faculdades da alma e
do corpo (veja a resposta aPerg. irnediatarnente anterior).
3°. Que esse estado tende a resultar ern rnais corrups;ao,
ern progressao sern firn, ern todas as partes da nossa natureza,
e que esta deterioras;ao seria incalculavelrnente rnais rapida
do que e, se Deus nao a restringisse por rneio do Seu Espirito.
4°. Nao resta rnais nenhurn elernento recuperativo na alma.
0 hornern s6 pode tornar-se cada vez rnais e para sernpre pior,
se nao experirnentar urna recrias;ao rniraculosa.

9. Que prova da doutrina do pecado original se pode extrair


da narrativa da Queda?
Deus criou o homem aSua imagem e declarou que, como
agente moral, era rnuito born. Ameas;ou-o com a morte no dia
em que comesse do fruto proibido, e esta ameas;a cumpriu-se
literalmente s6 no sentido da morte espiritual. A vida espiritual
do homem depende de estar ele ern comunhao com Deus; mas
Deus, em Sua ira, baniu-o da Sua presens;a. Em consequencia
disso, e declarado que 0 estado espiritual do homem agorae a
"morte", a mesma pen a que fora sen tenciada - Ef. 2: 1; 1 Joao
3:14.

10. Que descrifiio as Escrituras fazem da natureza humana,


e como se pode inferir dai a existencia de uma depravafiiO inata
e hereditaria?
Segundo as Escrituras, todos os homens estao total-
mente separados de Deus, e depravados moralmente em

451
Capitulo 19
seu entendimento, coras;ao, vontade, consc1encia, corpo e
as;6es- Rom. 3: 10-23; 8:7; }614:4; 15: 14; Gen. 6:5; 8:21; Mat.
15:19; Jer. 17:9; Is. 1:5,6. Diz-se que essa depravas;ao diz
respeito, 1°. aos atos; 2°. ao coras;ao; 3°. que e desde o nasci-
mento, e que e por natureza; 4°. que afeta a todos os homens,
sem exces;ao - Sal. 51 :5; Joao 3:6; Ef. 2:3; Sal. 58:3.

11. Que testemunho desta doutrina edado par Romanos 5: 12-


21?
Nessa passagem Paulo prova a culpa - a obrigas;ao legal
de sofrermos a penalidade - do pecado de Adao imputada a
n6s, pelo fa to indiscutivel de que a penalidade da lei, que Adao
violou, e infligida a todos. Mas essa pena toda consistiu no
mal penal - a morte fisica, espiritual e eterna. 0 pecado original,
junto com a morte natural, e declarado nessa passagem como
urn fato inegavel, e o ap6stolo tomou-o como base de seu
argumento para provar a imputas;ao do pecado de Adao.

12. Como fica estabelecida a verdade desta doutrina pelo Jato


da existencia geral do pecado?
Todos os homens, em todos os seculos, e sejam quais forem
as suas circunstancias ou as influencias educacionais que os
cercaram na sua mocidade, principiam a pecar logo que se
tornam capazes de as;6es morais. Ora, urn efeito universal deve
ter causa universal tambem. Assim, pois, como julgamos que
o homem e, por natureza, uma criatura inteligente, porque as
as;6es de todos os homens envolvem urn elemento de
inteligencia, assim tambem julgamos com certeza que o
homem e, por natureza, depravado, porque todos OS homens
pecam.

13. Se Adao pecou, apesar de estar livre de qualquer corrupr;iio


de sua natureza, como entiio oJato de sua posteridade pecar poderia
provar que a sua natureza ecorrompida?
0 pecado de Adao prova que urn agente moral pode ser

452
0 Pecado Original
ao mesmo tempo santo e falivel, e que tal criatura, entregue a
si m esma,pode pecar; mas, quanto asua posteridade, a questao
·: qual e a causa uniforme e universal por que todos, sem
·xce<;ao, pecam logo que se tornam agentes morais? No caso
de Adao, a questao e: como ele p6de pecar? No de seus descen-
den tes: por que eque todos com certeza pecam des de crianfas?

14. Com quais outras ob}efi5es os pelagianos e outros procuram


diminuir a forfa do argumento base ado na universalidade do pecado?
1°. Os que afirmam que a liberdade do indiferentismo e
cssencial a agencia responsavel, e que as voli<;6es nao ficam
dcterminadas pelo precedente estado moral do espirito,
atribuem todas as a<;:6es pecaminosas ao fato alegado de nao
·star condicionada a vontade do homem, e insistem em que o
hno dele agir como age seja tornado como faro final.
Em resposta, reconhecemos que o homem se determina
scmpre como lhe apraz, mas a questao e: por que e que todos
sc aprazem em determinar-se para o pecado? Uma causa
ind iferente nao pode explicar urn resultado uniforme. A
doutrina do pecado original ensina simplesmente que o car:iter
ucpravado da propria vontade ea causa uniforme do resultado
uniforme.
2°. Outros procuram explicar os fatos alegando a influencia
universal do mau exemplo.
Respondemos: (1) As crian<;as uniformemente manifestam
disposi<;6es depravadas numa idade tao tenra que nao se pode
racionalmente atribuir esse pecado a influencia do exemplo.
(2) Mesmo as crian<;as que desde o nascimento se acharam
l:crcadas de influencias que s6 podiam inclina-las para a
santidade, manifestam disposi<;6es depravadas.
3°. Outros ainda procuram explicar OS fatos referindo-os a
ordem natural que se segue no desenvolvimento de nossas
faculdades, e.g., as faculdades animais, depois as intelectuais,
· por ultimo as morais; e assim as inferiores, antecipando-se
as supenores, pervertem-nas.

453
Capitulo 19
Em resposta, referimo-nos a Perg. 4, acima. E, ademais,
essa explica~ao nao somente e imperfeita, porem tambem
admite virtualmente o fato da deprava~ao inata e hereditaria.
Pois tal ordem de desenvolvimento, dando em resultado
conseqiiencias tao uniformes, e em si mesma uma corrup~ao
total da natureza.

15. Que argumento a favor da doutrina do pecado original


pode-se deduzir da universalidade da morte?
A penalidade da lei foi a morte, abrangendo a morte
espiritual, a morte fisica e a morte moral. A morte fisica e
universal; a morte eterna, suspensa temporariament'e por amor
de Cristo, foi sentenciada contra todos os impenitentes. Mas,
vendo que uma parte da pena tornou-se efetiva, mesmo no
caso de crian~as que nunca pecaram pessoalmente, somos
obrigados a crer que a outra parte tornou-se efetiva tambem.
Os animais irracionais, que tambem sofrem e morrem, nao
sao agentes morais, e nunca estiveram incluidos numa alian~a
de vida, e por isso o seu caso, embora apresente certas
dificuldades peculiares, nao tern analogia com o dos homens.
A geologia afirma que os animais irracionais sofreram e
morreram em gera~6es sucessivas antes da cria~ao e apostasia
do homem; e isso e ainda urn dos problemas nao resolvidos da
providencia de Deus.

16. Como se pode provar esta doutrina pelo que as Escrituras


dizem a respeito da regenerafiio?
As Escrituras declaram -
1°. Que a regenera~ao e uma mudan~a radical de carater
moral, operada pelo Espirito Santo no exercicio de poder
sobrenatural. E chamada "nova crias;ao"; os regenerados sao
chamados "feitura de Deus, criados para as boas obras", etc.-
Ez. 36:26; Ef. 1:19; 2:5,10; 4:24; 1 Ped. 1:23; Tia. 1:18.
2°. Diz-se que e absoluta e universalmente necessaria -
Joao 3:3; 2 Cor 5:17.

454
0 Pecado Original
17. Como se pode provar esta doutrina pelo que as Escrituras
dizem a respeito da redenfiio?
A respeito da reden~ao as Escrituras afirrnarn-
1°. Quanta a sua natureza, que o designio do sacrificio de
Cristo e seu efeito elivrar todo o Seu povo, por rneio de urna
propicia~ao, tanto do poder como da culpa do pecado- Ef.
5:25-27; Tito 2:14; Heb. 9:12-14; 13:12.
2°. Quanta a sua necessidade, que era absolutarnente
necessaria para todos - nao sornente para os adultos, mas
tarnbern para as crian~as que nunca corneterarn pecado efetivo
- Atos 4: 12; Rom. 3:25,26; Gal. 2:24; 3:21,22; Mat. 19: 14;
Apoc. 1:5; 5:9.
Alguns dizern que Cristo s6 rerniu as crian~as libertando-
-as da sujei~ao ao pecado. No entanto, sendo a reden~ao urna
propicia~ao feita por sangue, ern que sofreu "o Justo pelos
injustos", se as crian~as nao sao pecadoras, nao podern ser
rernidas. 0 estado de inocencia resultante da liberta~ao da
sujei~ao ao pecado nao adrnite reden~ao. Veja Dr. Taylor, Cancio
ad Clerum (New Haven, 1828), pags. 24,25; tarnbern Harvey's
Review, do rnesrno autor (Hartford, 1829), pag. 19.

18. Qual a prova derivada do batismo das crianfas?


0 batisrno, como foi corn a circuncisao, eurn rito externo
que significa as gra~as internas da regenera~ao e da purifica~ao
de natureza espiritual- Mar. 1:4; Joao 3:5; Tito 3:5; Deut.
10: 16; Rom. 2:28,29. Ambos esses ritos deviarn ser aplicados
as crian~as. Todavia a aplica~ao do rito externo seria inutil e
profano se as crian~as nao precisassern e nao fossern capazes
daquilo que o rito significa.

19. Se Deus eo autor da nossa natureza, e se essa natureza e


pecaminosa, como podemos evitar a conclusiio de que Deus e o
au tor do pecado?
Essa conclusao seria inevitavel se, 1°. 0 pecado fosse ele-
rnento essencial da nossa natureza, ou se, 2°. Fosse inerente a

455
Capitulo 19
essa natureza originariamente, como saiu das maos de Deus.
Mas sabemos, 1°. que o pecado teve origem no livre ato
do homem, criado santo, porem ao mesmo tempo falivel; 2°.
que a corrup~ao inteira da nossa natureza veio do pecado; e,
3°. que, em conseqiiencia do pecado e com toda justi~a, Deus
tirou de n6s as influencias conservadoras do Seu Espirito
Santo e deixou os homens entregues as conseqiiencias naturais
e penais do seu pecado. Veja Calvino, Instit., Lib. 2, Cap. 1,
sec. 6 e 11.

20. Como se pode conciliar esta doutrina com a li[Jerdade do


homem e sua responsabilidade par seus atos?
1o. A nos sa consciencia afirma que o hom em e sempre
responsavel por seus atos livres, e que seu ato e sempre livre
quando ele se determina como, tudo considerado, lhe apraz.
2°. 0 pecado original consiste ern mas disposi~6es e, por
conseguinte, o hornern, pecando, age livrernente, porque age
exatarnente como quer agir.
3°. A nossa consciencia declara que a incapacidade nao e
incornpativel corn a responsabilidade. 0 habito ou a disposi~ao
inerente a vontade e 0 que deterrnina a sua a~ao; mas hornern
algurn pode rnudar a sua disposi~ao por urn ato da voli~ao, ou
sirnplesrnente por querer rnuda-la. Veja Cap.18, Perg. 4 e 25.

21. Como se propaga essa corrupfiio da natureza?


Veja abaixo, sob o Cap.21.

22. Em que sentido o pecado pode sera castigo do pecado?


1°. Por via de conseqiiencia natural (1) nas opera~6es
in tern as da propria alma, no desordenarnento de suas
faculdades; (2) na confusao das rela~6es entre o pecador e Deus.
2°. Por via de abandono judicial. Por causa do pecado,
Deus retira o Seu Espirito, e a conseqiiencia disso e rnais
pecado- Rom. 1:24-28.

456
0 Pecado Original

23. Que ensinam as Escrituras a respeito do pecado contra o


Espirito Santo?
Veja Mat. 12:31,32; Mar. 3:29,30; Heb. 6:4,6; 10:26,27; 1
Joao 5:16.
Estas passagens dao a entender que esse pecado consiste
ern rejeitar rnalignarnente o sangue de Cristo eo testernunho
do Espirito Santo, apesar de provas e contra a propria
convic<;:ao. E charnado pecado contra o Espirito Santo porque
eo testernunho e a influencia dEle, presente no cora<;:ao, que o
pecador rejeita direta e a que resiste desdenhosarnente. E
irnperdoavel, nao porque a sua culpa exceda aos rnerecirnentos
de Cristo, nern porque o estado do pecador seja tal que o
Espirito Santo nao tenha poder para transforrna-lo, e sirn
porque o pecado consiste na rejei<;:ao deliberada e final de Cristo
e Seu Espirito, e porque Deus deterrninou soberanarnente que
este seria o limite final da Sua gra<;:a.

24. Quais as ideias principais envolvidas na doutrina pelagiana


do pecado original?
0 sistema charnado pelagiano originou-se corn Pelagio,
ern suas controversias corn Agostinho, no prindpio do quinto
seculo, e foi depois desenvolvido cornpletarnente pelos
disdpulos de Fausto e Lrelio Socino no seculo 16. E0 sistema
explicado no Catecisrno Racoviano*, e e o dos unitarios da
Inglaterra e dos Estados Unidos dos seculos 18 e 19. Abrange
os pontos seguintes:
1o. 0 pecado de Adao so afetou a ele proprio.
2°. As crian<;:as nascern no rnesrno estado moral ern que
Adao foi criado.
3°. Todo hornern possui capacidade plenaria para pecar

*De Racov, Pol6nia, onde foram disseminadas as ideias socinianas. Nota


de Odayr Olivetti.

457
Capitulo 19
ou para arrepender-se e obedecer sempre que lhe aprouver.
4°. A responsabilidade esta na razao exata da capacidade;
e as exigencias de Deus estao na razao das diversas capacidades
(marais e constitutivas) e circunstancias dos homens.

25. Quais as ideias principais envolvidas na doutrina


semipelagiana?
Segundo a aprecia<_;ao crftica feita par Wiggers em sua
Historical Presentation of Augustinianism and Pelagianism
(Apresenta<_;ao Hist6rica do Agostinianismo e do Pelagianismo ),
o pelagianismo considera o homem como morale espiritual-
mente sao, o semipelagianismo o considera como enfermo, eo
agostinianismo como morto.
Eis aqui urn resumo das doutrinas peculiares que os
semipelagianos ensinavam na idade media-
1°. Negavam a imputa<_;ao do pecado de Adao.
2°. Reconheciam que o homem herda de Adao uma
condi<_;ao m6rbida da sua natureza.
3°. Essa condi<;ao, porem, nao e pecado, mas e a causa
certa de pecados.
4°. Essa condi~ao envolve as faculdades marais da alma a
tal ponto que ninguem pode, sem auxilio divino, cumprir as
exigencias nem da Lei nem do evangelho. 0 homem possui,
porem, o poder de comefar a viver bern, e entao Deus, vendo
os seus esfor<;os, e sabendo que sem a Sua gra<;a esses esfor<;os
serao infrutiferos, da-lhe, par Sua gra<;a, o auxilio de que ele
necessita.
A doutrina de Arminio eo "sinergismo" de Melanchthon
reduzem-se praticamente a doutrina que acabamos de expor,
com a (:mica diferen<;a de que os semipelagianos sustentavam
que o homem pode e necessariamente tern que iniciar em si a
obra do arrependimento e obediencia, e que Deus entao
coopera imediatamente com ele; e que os arminianos e os
sinergistas sustentam que 0 homem e tao depravado que precisa
da gra<;a de Deus para dispo-lo e habilita-lo a come<;ar como

458
r 0 Pecado Original
tambem a continuar e levar a efeito essa obra; mas que, ao
mesmo tempo, todos os homens realmente tern a mesma gra<;a
comum operando neles, a qual, porem, nada efetua enquanto
o homem nao coopera voluntariamente com ela, quando entao
essa gra<;a comurn se torna eficaz em virtude dessa coopera<;ao.
A Igreja Grega ocupa a mesma posi<;ao geral a respeito do
pecado original, e sustenta-
1°. Que 0 pecado original nao e voluntario e por isso nao e
verdadeiramente pecado.
2°. Que a influencia de Adao estende-se somente anatureza
sens6rio-sensual dos seus descendentes, e nao a sua natureza
racional, nem asua natureza espiritual, estendendo-se, por isso,
asua vontade somente mediante a natureza sens6rio-sensual.
3°. As crian<;as estao sem pecado, porque possuem s6 uma
natureza fisica e propagada.
4°. A vontade humana tern a iniciativa na regenera<;ao,
mas precisa do auxilio divino. Isso e semipelagianismo;
enquanto a posi<;ao correspondente do arminianismo e que a
gra<;a tern a iniciativa na regenera<;ao, porem que a sua eficacia
depende da coopera<;ao humana.

26. Quale a teoria de "New Haven" a este respeito?


0 Dr. Nathaniel W Taylor, de New Haven, o principe da
teologia da escola nova da America, ensinava que o pecado
consiste unicamente nos atos da vontade: que "o pecado original
e ato do proprio hom em, e consiste em ele escolher livremente
como seu bern principal algum outro objeto e nao Deus". Essa
defini<;ao inclui a preferencia permanente que predomina na
vontade e que determina os atos de escolha especiais e
transit6rios; que a respeito dessa preferencia cada ser humano
determina-se logo que se torna agente moral, e que e sempre
uma preferencia de algum bern menor, em vez de Deus.
Sustenta igualmente que a natureza do homem, na condi<;ao
em que comes;a a existir agora, em conseqiiencia do pecado de
Adao, e a ocasiiio e nao a causa de os homens fazerem unifor-

459
Capitulo 19
memente rna escolha moral, e que o pecado original e, assim,
por natureza, somente no sentido de que a vontade o comete
livremente, apesar de uniformemente, como ocasionado por
natureza, mas que a propria natureza, ou sua tendencia inerente
de ocasionar o pecado, nao eem si pecado nem merece castigo.
Veja Cancio ad Clerum, New Haven, 1828, e Harvey's Review,
do mesmo autor.

27. Quale a doutrina concernente a mudanra efetuada pela


Queda na natureza moral do homem?
Veja abaixo as exposi~6es publicas das divers<;I.S igrejas.

28. Que distinfdO os catdlicos romanos fazem entre pecados


mortais epee ados venia is?
Dizem eles que mortais sao os pecados que separam de
Deus a alma e fazem perder a gra~a batismal; e que veniais sao
os que s6 impedem o acesso da alma a Deus. Veja abaixo,
Belarmino, nas "Exposi~6es autorizadas das diversas igrejas".
As obje~6es sao- 1a. E uma distin~ao que as Escrituras
nunca fazem. 2a. Se nao fosse o sacrificio de Cristo, todo pecado
seria mortal- Tia. 2: 10; Gal. 3:10.

EXPOSH;6ES AUTORIZADAS
DAS DOUTRINAS DAS DIVERSAS IGREJAS

DOUTRINA CATOLICO-ROMANA- Concilio de Trento,


Sess. 5, Can. 2.- "Se alguem disser que o pecado de Adao
s6 foi nocivo a ele mesmo, e nao a sua descendencia; e
que a santidade que recebeu de Deus e a justic;a que perdeu,
para si s6 a perdeu e nao para nos; e que manchado com 0
pecado de desobediencia s6 transfundira por todo o genera
humano a morte e molestias do corpo, e nao o pecado,
que e morte da alma- anathema sit". Jb.6, Cap. 1. "Declara
em primeiro lugar o Santo Condlio que, para se entender
bern e sinceramente a doutrina da justificac;ao, convem
que cada urn conhec;a e confesse que, tendo todos os

460
0 Pecado Original
homens pela prevarica<;ao de Adao perdido a inocencia e
se tornado imundos ... em tal forma sao servos do pecado,
e sujeitos ao poder do diabo e da morte ... posto que o livre
arbitrio nao ficou neles extinto, e sim atenuado de for<;as
e inclinado". lb. Sess. 6: Can. 5. "Se alguem disser que o
livre arbitrio depois do pecado de Adao foi perdido e
extinguido ... - anathema sit". Can. 7. "Se alguem disser
que todas as obras que se fazem antes da justifica<;ao
(regenera<;ao), de qualquer modo que se fa~am, verdadei-
ramente sao pecados, ou merecem o 6dio de Deus; e que
com quanto maior veemencia forceja alguem em se dispor
para a gra<;a, tanto mais gravemente peca- anathema sit".
Belarmino, '?'!miss. Gratia", 3:1 - "A penalidade pro-
priamente imposta em conseqiiencia do primeiro pecado
foi a perda da retidao original e dos dons sobrenaturais
que Deus tinha concedido a nossa natureza" - "De Gratia
primi Hom." 1: "Eles (os cat6licos romanos) ensinam que
pelo pecado de Adao o homem inteiro ficou deteriorado,
mas nao perdeu nem o livre-arbitrio nem nenhum dos
dona naturalia, mas unicamente os dona supernaturalia". lb.
C. 5 - Por isso o estado do homem depois da queda de
Adao nao difere do seu estado in puris naturalibus (isto e, o
estado em que foi criado e em que estava antes de receber
os dona supernaturalia - veja as "Exposi<;6es" no fim do
Cap. 16) mais do que o estado de urn homem a quem
roubaram a roupa difere do estado de urn homem origi-
nalmente nu, nem e pior a natureza humana (se tirardes a
culpa original), nem labora ela em maior ignorancia e
enfermidade do que era e laborava quando criada in puris
naturalibus. Dai seguir-se que a corrup<;ao da natureza nao
e o resultado da perda de dom algum, nem a do acrescimo
de nenhuma qualidade rna, e sim unicamente o resultado
da perda do dom sobrenatural em conseqiiencia do pecado
de Adao".
Amiss. Gra., 5, 5: "A questao entre n6s e nossos
adversarios nao e se a natureza humana ficou gravemente
depravada em conseqiiencia do pecado de Adao: porque
isso confessamos livremente. Nem e se essa deprava<;ao

461
Capitulo 19

pertence de qualquer modo ao pecado original, de maneira


que se possa dizer que e o material desse pecado. Mas a
controversia toda versa sobre este ponto - se essa corrup-
~ao da natureza, e especialmente a concupiscia per se e em
sua propria natureza, como se acha nos batizados e
justificados (regenerados) e propriamente pecado original.
E isto que os catolicos romanos negam.
DOUTRINA LUTERANA- "Formula Concordice", pag. 640
- (Deve-se crer) - 1°. "Que esse mal hereditario e culpa
(desmerecimento) mediante a qual, por causa da desobe-
diencia de Adao e Eva, nos todos estamos sujeitos a ira de
Deus e somos por natureza filhos da ira, como testificou
o apostolo Paulo (Rom. 5:12, ss. Ef. 2:3). 2°. Que haem
todos falta, defeito e priva~ao totais da justi~a original
criada no Paraiso, ou da imagem de Deus a qual o homem
foi no principia criado em verdade, santidade e justi~a; e
que ha, ao mesmo tempo, a impotencia e incapacidade, a
fraqueza e estupidez, que tornam o homem totalmente
incapaz de tudo quanto e espiritual e divino... 3°. Alem
disso: que o pecado original na natureza humana nao so
envolve a perda e a ausencia totais de tudo quanto e born
nas coisas espirituais e que dizem respeito a Deus; mas
que, em vez da imagem perdida de Deus, ha tambem no
homem uma corrup~ao interior, pessima, profunda,
inescrutavel e indescritivel da natureza inteira e de todas
as faculdades, e primariamente nas faculdades principais
e superiores da alma, na mente, no intelecto, no coras;ao
e na vontade".
lb. pag. 645 - "Mas, ainda que esse pecado original
infeccione e corrompa a natureza inteira do homem,
como uma especie de veneno ou lepra espiritual (como
diz o Dr. Lutero), de modo que em nossa natureza
corrompida nao e possivel apresentar separadamente aos
olhos esses dois, a natureza em separado e o pecado
original em separado; contudo, essa natureza corrompida,
ou substancia do homem corrompido, o corpo e a alma,
ou o proprio homem como criado por Deus, no qual
habita o pecado original, nao e urn e o mesmo que esse

462
0 Pecado Original
pecado original que habita na natureza ou na essencia
do homem e a corrompe; como no corpo do leproso, o
corpo leproso e a lepra que esta no corpo nao sao uma e
a mesma coisa".
DOUTRINA REFORMADA - "Conf Belga", Art. 15:
"(Peccatum originis) e essa corrup~ao da natureza inteira e
esse vicio hereditario que os torna corruptos mesmo no
ventre de suas maes, e que, como raiz, produz toda especie
de pecados no homem e e por isso tao vil e execravel a
vista de Deus, que e suficiente para condenar a ra~a
humana".
"Conf Gallica", Art. 11: "Cremos que este vicio (originis)
e verdadeiramente pecado, que torna a todo e qualquer
homem, sem exce~ao mesmo das crian~as escondidas
ainda no ventre de suas maes, reus diante de Deus, da
morte eterna".
"Os 39 Artigos da Igreja Anglicana. ", Art. 9: "(0 pecado
original) e urn vicio e corrup~ao da natureza de todo
homem da gera~ao de Adao; pelo que o homem esta distan-
ciado muitissimo da justi~a original, e e de sua propria
natureza inclinado ao mal; de forma que a carne tern
sempre desejos sensuais contrarios ao espirito; e por isso
toda pessoa que nasce neste mundo merece a ira de Deus
e a condena~ao".
DOUTRINA REMONSTRANTE - "Apol. Conf Remon-
strante", pag. 84: "Eles (os remonstrantes) nao consideram
o pecado original como pecado propriamente dito, nem
como urn mal que, como pena, no sentido restrito dessa
palavra, passe de Adao para a sua posteridade, e sim como
urn mal, uma enfermidade ou vicio ou qualquer nome que
se lhe queira dar, que de Adao, privado da sua justi~a
original, vern por propaga~ao sobre a sua posteridade".
Limborch, "Theol. Christ.", 3, 3,4: "Confessamos
tambem que as crian~as nascem menos puras do que era
Adao quando foi criado, e com uma certa propensao para
pecar, mas isso nao lhes advem tanto de Adao como de
seus pais imediatos, porque, se viesse de Adao, devia ser
igual em todos OS homens. Contudo e agora desigual no

463
Capitulo 19
mais alto grau, e os filhos pendem comumente para os
pecados de seus pais".
DOUTRINA SOCINIANA - "Cat. Racoviano", pag. 294:
"E a queda de Adao, tendo sido urn so ato, nao podia ter o
poder de corromper nem a natureza do proprio Adao, e
muito menos a da sua posteridade. Nao negamos, porem,
que, em consequencia do costume constante de pecar, a
natureza do homem esta agora infeccionada de uma certa
queda e de uma tendencia excessiva para pecar. Mas
negamos que isso seja pecado per se, ou que seja da natureza
do pecado".

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Incapacidade

1. Quais siio os tres elementos principais envolvidos nas


conseqiiencias que o pee ado de Adiio trouxe sobre a sua posteridade?
Sao-
1°. A culpa, o reato* ou a justa responsabilidade legal do
primeiro pecado ou ato de apostasia de Adao, que eimputada
ou imposta judicialmente sobre os seus descendentes, e em
virtude da qual cada crian~a nasce em estado de condena~ao.
2°. A deprava~ao total da nossa natureza, envolvendo uma
disposi~ao pecadora inata e levando inevitavelmente a trans-
gress6es efetivas.
3°. A inteira incapacidade da alma de mudar sua natureza
ou de fazer coisa alguma que seja espiritualmente boa, em
obediencia alei divina.

2. Quais os tres tipos de doutrina que, a respeito da incapacidade


humana para cumprir a lei de Deus, sempre existiram na lgreja?
1°. 0 tipo pelagiano- (a) Carater moral s6 pode ser predi-
cado de voli~6es. (b) A capacidade e sempre a medida da
responsabilidade. (c) Por conseguinte, todo homem possui
sempre pleno poder de fazer tudo quanto e de seu dever fazer.
(d) Por isso e s6 a vontade de cada urn que, com exclusao da
interferencia de qualquer influencia interna que venha de Deus,
tern que decidir sobre o carater e o destino do homem. A unica

* Estado ou condi~ao de reu, de acusado. Nota de Odayr Olivetti.

465
Capitulo 20
influencia divina de que 0 homem precisa e que ecompativel
com o seu caniter como agente autodeterminado e uma
influencia externa, providencial e educativa.
2°. 0 tipo semipelagiano - (a) A natureza do homem ficou
enfraquecida pela Queda de modo que, nas coisas espirituais,
ele nao pode agir bern sem auxilio divino. (b) Esse estado moral
enfraquecido que as crian<;as herdam de seus pais ea causa do
pecado, mas niio eem si mesmo pecado no sentido de merecer
a ira de Deus. (c) Enecessaria que o homem procure cumprir
todos os seus deveres e, neste caso, Deus lhe da a Sua gra~a
cooperativa e to rna bem-sucedidos os seus esfor<;os. (d) 0
homem s6 eresponsavel pelos pecados cometidos por ele depois
de receber e abusar das influencias da gra<;;a.
3°. 0 tipoagostiniano - Este foi adotado por todas as igrejas
protestantes originais, luteranas e reformadas. (a) 0 homem e
por natureza tao inteiramente depravado que e totalmente
incapaz de fazer alguma coisa e.spiritualmente boa, ou de
come<;;ar ou dispor-se em qualquer grau para isso. (b) Mesmo
sob as influencias incitantes e persuasivas da gra<;a divina, a
vontade do homem e totalmente incapaz de agir bern, em
coopera<;;ao com a gra<;;a, enquanto a propria vontade nao e,
radical e permanentemente, renovada pela energia da gra<;;a.
(d) Mesmo depois de renovada, a vontade fica sempre
dependente da gra<;a divina, no sentido de que ela o incite,
dirija e habilite a fazer qualquer boa obra.

3. Qual ea diferenfa entre os escritores protestantes antigos e


os modernos quanto ao usus loquendi das palavras "liberdade"
e "capacidade "?
Os antigos muitas vezes empregavam a palavra "liberdade"
no mesmo sentido em que empregamos agora a palavra
"capacidade", e negavam que, depois da Queda, o hornem
tivesse qualquer "liberdade" de vontade a respeito das coisas
divinas.
Os te6logos modernos sustentam, a esse respeito,

466
I Incapacidade
exatamente a mesma doutrina que os antjgos; mas julgam que
e mais judicioso fazer uma distin~ao no uso dos dois termos.
Entendem, pois, pelo termo "liberdade" a propriedade
inaliemivel de qualquer agente morale livre, seja born ou mau,
de exercer voli~6es segundo lhe apraz; isto e, segundo as
disposi~6es e tendencias predominantes da sua alma. Por
"capacidade", porem, entendem o poder de uma alma humana
depravada, e indisposta por natureza para qualquer bern
espiritual, de mudar suas disposi~6es e tendencias predomi-
nantes por meio de qualquer voli~ao, por mais que procure
muda-las assim, ou de obedecer aos preceitos da lei na ausencia
de quaisquer disposi~6es santas. Os afetos permanentes da
alma governam as voli~6es; mas estas nao podem mudar os
afetos. E quando dizemos que ninguem depois da Queda tern
capacidade para prestar a obediencia espiritual que a lei exige,
o sentido e (a) que as radicais disposi~6es marais de todos
op6em-se por natureza a essa obediencia, e (b) que o homem e
absolutamente incapaz de muda-las, ou (c) de exercer volic;6es
contrarias a elas.

4. Como se pode expor a doutrina ortodoxa tanto negativa como


positivamente?
A doutrina ortodoxa niio ensina -
1°. Que o homem tenha perdido na Queda qualquer de
suas faculdades constitutivas necessarias para fazer dele urn
agente moral e responsavel. Essas faculdades sao (a) a razao,
(b) a consciencia, e (c) a livre vontade (o livre-arbitrio). Essas
todas o homem possui e tern em exercicio. Ele tern o poder de
conhecer a verdade; reconhece e sente as distin~6es e as
obriga~6es marais; seus afetos, tendencias e habitos de a~ao
sao espontaneos; em todas as suas voli~6es ele prefere, escolhe
e rejeita livremente o que lhe apraz e como lhe apraz. Portanto,
e responsavel.
2°. Nem, que o homem nao tenha o poder de sentir e fazer
muitas coisas que sao boas e dignas de amor, benevolas e justas,

467
Capitulo 20
nas suas rela~6es com os seus semelhantes. Muitas vezes isso e
admitido nas confiss6es protestantes e nas obras chissicas dos
seus te6logos, onde se concede que o homem, mesmo depois
da Queda, ainda tern capacidade para a humana justitia, o bern
civil, etc.
Mas a doutrina ortodoxa ensina -
..
1°. Que, depois da Queda, a incapacidade do hom em diz
respeito as coisas que envolvem as nossas rela~6es, como seres
espirituais, para com Deus- a apreensao e amor da excelencia ,.I
espiritual e uma vida em conformidade com ela. Nas confiss6es ,
de fe essas coisas sao chamadas "coisas de Deus", "coisas do
Espirito", "coisas que dizem respeito a salva~ao".
2°. Que 0 homem, depois da Queda, e inteiramente incapaz
de saber, sentir ou agir em conformidade com essas coisas. Urn
hom em natural pode estar esclarecido intelectualmente, porem
espiritualmente esta cego. Pode possuir afetosnaturais, mas o seu
cora~ao esta morto para com Deus e einvencivelmente avesso
a Sua Pessoa e a Sua Lei. Pode obedecer a letra desta, entretanto
nao pode obedece-la em espfrito e em verdade.

5. Em que sentido essa incapacidade eabsoluta, em que sentido


enaturale em que sentido emoral?
1°. E absoluta no sentido proprio deste termo. Nenhum
homem nao regenerado tern o poder de fazer aquilo que a esse
respeito Deus exige dele- quer direta quer indiretamente; nem
pode mudar a sua natureza de modo que tenha mais poder;
nem pode preparar-se para a gra~a; nem pode principiar a
cooperar com a gra~a enquanto Deus, no ato da regenera~ao,
nao lhe mudar a natureza e, mediante a Sua gra~a, nao lhe der
capacidade graciosa de agir graciosamente e em constante
dependencia de Sua gra<;a.
zo. Enatural no senti do de nao ser acidental ou adventicia,
e sim inata, e que pertence anossa natureza decafda como ela
se propaga por lei natural de pais a filhos.
3°. Niio enatural num sentido, porque nao pertenceu a

468
Incapacidade
natureza do homem como foi criado. Ele foi criado com plena
capacidade de fazer tudo quanto lhe era exigido, e a posse dessa
capacidade esempre necessaria para a perfei<;ao moral da sua
natureza. Pode ser urn homem real sem ela, contudo nao
hom em perfeito. A capacidade concedida ao homem pela gra<;a
de Deus na regenera~ao nao e urn dote extranatural, mas
consiste numa parcial restaura~ao da sua natureza a sua con-
di<;ao de integridade original.
4°. Ntio e natural ainda noutro sentido- porque nao e de
modo algum resultado de qualquer deficiencia da natureza
humana, como existe agora, nas faculdades morais e racionais
da alma.
5°. Essa incapacidade epuramente moral, porque, enquanto
todo homem responsavel possui todas as faculdades, tanto
morais como racionais e intelectuais, necessarias para agir bern,
0 estado moral dessas faculdades e tal que e impossivel ao
homem agir bern. Sua essencia esta na incapacidade da alma
de conhecer, escolher e amar o que e espiritualmente born, e
seufundamento esta nessa corrup<;ao moral da alma que a torna
cega, insensivel e totalmente avessa a tudo quanto e espiri-
tualmente born.

6. Qual a historia da celebre distinftiO entre capacidade natural


e capacidade moral?
Essa distin~ao foi primeiro apresentada explicitamente
nesta forma por Joao Cameron, que nasceu em Glasgow,
Esc6cia, em 1580, foi professor na escola teol6gica de Saumur,
Fran~a, em 1618, e faleceu em 1625.
0 Presidente (Jonathan) Edwards (dafutura Universidade
de Princeton), em sua grande obra intituladaOn the Will (Sobre
a Vontade), Parte 1, C. 4, adotou os mesmos termos, afirmando
que, depois da Queda, os hom ens tern capacidade natural para
fazer tudo 0 que deles e exigido, mas que nao tern capacidade
moral para faze-lo. Por capacidadenatural ele entendia que todo
homem natural esta de posse, como condi<;ao necessaria para

469
Capitulo 20

o tornar urn agente responsavel, de todas as faculdades


constitutivas necessarias para habilita-lo a obedecer a lei de
Deus. Por capacidade moral entendia esse estado moral e
inerente dessas faculdades, essa disposi~aoreta eboa do cora~ao
que e necessaria para 0 cumprimento desses deveres.
Nao ha por que questionar a validade e a importancia dessa
exposi~ao feita pelo Presidente Edwards e do modo com ele
faz essa distin~ao; eo mesmo principio e reconhecido acima,
na exposi~ao da doutrina ortodoxa, nas respostas as perguntas
4 e 5. Apesar disso, porem, temos serias obje~6es contra a
fraseologia empregada, e pelos seguintes motivos: ·
1°. Essa fraseologia nao e autorizada pela analogia das
Escrituras. Estas nunca dizem que o homem tern uma especie
de capacidade e que nao tern a outra. Ensinam coerentemente
em toda parte que 0 homem nao pode fazer 0 que e exigido
dele; e nunca ensinam que o possa fazer em algum sentido.
2°. Nunca foi adotada pelas confiss6es de fe promulgadas
pelas igrejas reformadas.
3°. E essencialmente ambigua, e assim tern sido empre-
gada muitas vezes para exprimir, e outras para encobrir, erros
semipelagianos. 0 seu emprego tende naturalmente a fazer
errar e a confundir o pecador convicto de seus pecados; pois
afirma que ele pode (fazer o que lhe e exigi do), em certo senti do,
enquanto a verdade e que ele s6 possui alguns dos requisitos
essenciais da capacidade. Dizer que urn passaro morto tern
capacidade muscular para voar e que s6lhe falta a capacidade
vital e brincar com palavras. A verdade do ca.so e que o pecador
e absolutamente incapaz por causa de uma deficiencia moral.
E certo que essa incapacidade e pura e simplesmente moral.
Mas nao e verdade, e e enganador, dizer ao pecador que ele
tern capacidade natural, quando 0 fato e que ele e incapaz de
fazer o que deve fazer. A obra realizada pelo Espirito Santo na
regenera~ao nao e uma persuasao moral, e sim uma nova cria~ao
moral.
4°. "Natural" nao e a antitese propria de "moral"; porque

470
Incapacidade
uma coisa pode ser ao mesmo tempo naturale moral. A incapa-
cidade do homem, como demonstramos acima, e com certeza
inteiramente moral, porem e ao mesmo tempo, e num sentido
importante, natural, istoe, pertence asua natureza no seu estado
atual e assim e transmitida dos pais aos filhos.
5°. A linguagem empregada nao exprime acuradamente a
distin<;:ao importante que se quer assinalar. A incapacidade e
moral, e nao e nem fisica nem constitutiva. Nao tern seu
fundamento na falta de nenhuma faculdade, mas sim no estado
moral e corrompido das faculdades, na desinclina<;:ao inve-
terada dos afetos e disposi<;:6es da natureza voluntaria.

7. Como se pode provar pelas Escrituras o jato dessa


incapacidade?
Como exame de passagens como as seguintes: Jer. 13:23;
Joao 6:44,65; 15:5; Rom. 9:16; 1 Cor. 2:14.

8. Como se pode provar o mesmo jato pelo qual as Escrituras


ensinam a respeito do estado moral do homem por natureza?
E urn estado de cegueira e de trevas espirituais- Ef. 4: 18; de
morte espiritual- Col. 2:13. Os nao regenerados sao "servos
(escravos) do pecado"- Rom. 6: 20; estao "fracos"- Rom. 5:6.
A Biblia afirma que os homens estao nos la<;:os do diabo e que
estiio "presos a vontade dele"- 2 Tim. 2:26; e que o unico
modo por que se pode mudar o carater de nossas obras e que
se mude o caniter de nossos cora<;:6es- Mat. 12:33-35.

9. Como se pode provar a mesma verdade pela qual as Escri-


turas ensinam acerca da natureza e necessidade da regenerar.;iio?
Quanto a sua natureza, ensinam que a regenera<;ao e urn
"novo nascimento", uma "nova cria<;ao", urn gerar de novo, o
dar-nos Deus urn novo cora<;ao; os que a experimentam sao
"novas criaturas", "feitura de Deus", etc. Eefetuada pela "sobre-
excelente grandeza do seu poder" (do poder de Deus)- Ef.
1:18-20. Elas afirmam que todas as gra<;:as cristas, como sejam

471
Capitulo 20
o amor, a fe, a paz, a alegria etc., sao "fruto do Espirito"- Gal.
5:22,23. "Deus eo que opera em vos tanto o querer como o
efetuar,* segundo a sua boa vontade"- Fil. 2:13.
Quanto a sua necessidade, ensinam que esta mudan~a
radical dos estados e propens6es predominantes da propria
vontade e, no caso de todo filho de Adao, sem nenhuma
exce~ao, absolutamente necessaria para a salva~ao .
Eclaro, pois, que, antes dessa mudan~a operada nele pelo
poder divino, o homem so pode estar absolutamente impotente
espiritualmente, e que toda capacidade que em qualquer tempo
possa ter, mesmo para cooperar com a gra~a que o salva, so
pode ser conseqi.iencia dessa mudan~a.

10. Como se pode provar o mesmo Jato pela experiencia?


1°. Pela experiencia de todo pecador convicto de seu pecado.
Toda convic~ao verdadeira do pecado abrange estes dois
elementos: (a) Uma completa convic~ao de responsabilidade
e culpa, que faz o pecador justificar a Deus e prostrar-se ele
mesmo diante de Deus em confissao, na completa renuncia
da confian~a em si, e na maior auto-humilha~ao. (b) Uma

* Figueiredo, seguin do a Vulgata, tern aqui "perfazer". Mas ede no tar que
no original a palavra traduzida aqui "perfazer" por Figueiredo e''perficere"
na Vulgata. Acha-se ainda, no Novo Testamento, em Mat.14: 12; Mar. 6: 14;
Rom. 7:5; 1 Cor. 12:6,11; 2 Cor. 1:6; 4.12; Gal. 2:8; 3:5; 5:6; Ef. 1: 11,20; 2:2;
3:20; Fil. 2: 13; Col. 1:29; 1 Tess. 2: 13; 2 Tess. 2:7; Tia. 5:16, e em nenhuma
outra passagem; e que em todas essas passagens, excec;:ao feita de Fil. 2:13
e Tia. 5: 16, a Vulgata traduz a palavra grega por "operari "; e Figueiredo
a traduz por "obrar", com excec;:ao de Ef. 1:20, onde a traduzpor "effeituam"
(efetuam), Ef. 2:2, por "exercitam o seu poder", e Tia. 5:16, onde a Vulgata
traduz a palavra, que no original esta na forma de partidpio passivo, por
"assidua", e Figueiredo por "fervorosa". E e de notar ainda que em Fil.
2: 13, na primeira parte do versfculo, a Vulgata traduz o original grego por
"operatur" e Figueiredo por "obra", a mesmissima palavra grega que na
segunda parte do mesmo versiculo, e s6 e unicamen te neste lugar- de to do
o Novo Testamento - a Vulgata o traduz por "perficere" e Figueiredo por
"perfazer", evidentemente por motivos doutrinarios. Nota do Tradutor.

472
I ncapacidade
completa convicc,;:ao da nossa impotencia moral e inteira
dependencia tanto da grac,;:a divina para habilitar-nos como dos
merecimentos de Cristo para justificar-nos. E necessaria que
o pecador chegue nos dois sentidos, isto e, a respeito da sua
culpa e tambem a respeito da sua completa impotencia
espiritual, a desesperar-se inteiramente de si- ou nao podera
ser conduzido a Cristo.
2°. Pela experiencia de todo cristao verdadeiro. Sua
convicc,;:ao mais intima e (a) que estava absolutamente sem
forc,;:as espirituais e que foi salvo por uma intervenc,;:ao divina,
ab extra, (b) que as forc,;:as que agora ele goza, por mais fracas
que sejam, sao sustentadas s6 e unicamente mediante as
comunicac,;:6es constantes do Espirito Santo, e que ele s6 vive
espiritualmente na medida em que se apega a Cristo.
3°. Pela experiencia universal da familia humana. Con-
cluimos que todo homem esta absolutamente sem nenhuma
capacidade espiritual porque nunca, desde que o mundo existe,
se descobriu caso algum de urn unico homem que exercesse
essa capacidade.

11. Como se pode expor e refutar a objefiio feita contra a nossa


doutrina, e baseada na alegafiiO de que "a capacidade ea medida
da responsabilidade"?
Nao ha duvida de que o axioma segundo a qual a capaci-
dade e a medida da responsabilidade e verdadeira nalguns casos
e falsa noutros. 0 erro que vicia completamente a objec,;:ao acima
citada contra a doutrina biblica da incapacidade humana
consiste na falta de ~iscriminac,;:ao entre as circunstancias em
que 0 axioma e verdadeiro e aquelas em que e falso.
E uma verdade auto-evidente- uma que ninguem nega
que uma incapacidade que consiste (a) na ausencia das
faculdades absolutamente necessarias para o cumprimento de
urn clever, ou (b) na ausencia de qualquer ocasiao para o seu
emprego, e totalmente incompativel com responsabilidade
moral no caso. Se urn homem nao tiver olhos, ou, se os tiver

473
Capitulo 20
mas estiver irremediavelmente sem luz, nao pode ser moral-
mente obrigado aver. Assim tambem urn homem sem
intelecto, ou sem consciencia natural, ou sem qualquer das
outras faculdades constitutivas e essenciais para agencia moral,
nao pode ser responsavel por nao agir como agente moral.
E e evidente tambem que essa ausencia de responsabili-
dade vern s6 e unicamente do simples fato da incapacidade.A
este respeito nao importa nada se a incapacidade e devida a urn
ato voluntario ou a urn ato praticado por outrem, contanto que
a incapacidade seja real. Por exemplo, urn homem que
arrancasse os pr6prios olhos para eximir-se ao recrutamento,
poderia com justi~a ser responsabilizado por esse aio, mas nao
por nao ver, isto e, por nao empregar olhos que ja nao tern.
Por outro lado, porem, nao e menos evidente que quando
a incapacidade consiste unicamente na falta de disposi~6es
e afetos convenientes e pr6prios, em vez de ser, neste caso,
incompativel com a responsabilidade, ela se torna motivo de
uma justa condena~ao. Nada ha que seja mais certo ou mais
universalmente concedido do que os fatos de que os nossos
afetos e disposi<;;:6es (1) nao estao sob o governo da nossa von- .
tade. Uma voli~ao nossa nao os pode mudar mais do que pode
mudar a nossa natureza. (2) Apesar disso, somos responsaveis
por eles.
Os que sustentam que a nossa responsabilidade e limitada
por nos sa capacidade devem, por conseguin te, sus ten tar ( 1)
que todo homem, por mais degradado que seja, pode imedi-
atamente, por urn ato de voli<;;:ao, conformar-se, e de cora~ao,
ao mais sublime padrao da virtude, o que e absurdo; ou (2)
que o padrao de obriga~ao moral fica rebaixado mais e mais a
medida que o homem peca, e em consequencia dos seus
pecados torna-se cada vez mais incapaz de obedecer, isto e,
que a obriga<;;:ao moral diminui amedida que a culpa aumenta,
ou, por outra, que OS direitos de Deus diminuem a medida
que aumenta a nossa rebeliao contra Ele - o que tambem e
absurdo, porque este prindpio acabaria evidentemente com a

474
Incapacidade
Lei, tornando de nenhum efeito tanto os seus preceitos como
a sua penalidade; pois o pecador, rebaixando-se mais e mais,
rebaixaria consigo tambem a Lei. 0 prindpio acima tiraria a
lei das maos de Deus e a colocaria nas do pecador, que
determinaria sempre a extensao das exigencias da Lei segundo
a extensao da sua propria apostasia.

12. Como se pode provar que os homens sao responsaveis por


seus afetos?
1°. As Escrituras todas dao testemunho do fato de que Deus
exige que os homens tenham bons afetos, e que Ele julga e
trata os homens segundo os seus afetos. Cristo declara (Mat.
22:37 -40) que toda a lei moral se resume nos do is mandamentos
de amarmos a Deus de todo o cora<;;ao e ao proximo como a
nos mesmos. "Destes dois mandamentos depende toda a lei e
os profetas." Mas o "amor" e urn afeto, e nao uma voli<;;ao, e
nem esta ele sob o governo imediato das voli<;;6es.
2°. E juizo instintivo de todos que os afetos e disposi<;;6es
morais sao intrinsecamente bons ou maus, e que em todos os
casos, independentemente da sua origem, e so segundo o seu
carater, merecem louvor ou censura. Verdade e que alguns afetos
sao em si mesmos moralmente indiferentes e se tornam bons
ou maus so quando adotados pela vontade como principio de
a<;;ao em preferencia a outros principios c:ompetidores, como,
e.g., o afeto do amor de si mesmo. Ha outros afetos, porem,
que sao intrinsecamente bons, como, e.g., o amor a Deus e a
benevolencia desinteressada para com os nossos semelhantes;
e ha outros que sao intrinsecamente maus, como, e.g., a
malevolencia, ou a desconfian<;;a a respeito de Deus; e sao bons
ou maus sem que nisso influa de modo algum a sua origem-
Rom. 7:14-23. Toda voli<;;ao deriva sua qualidade moral do afeto
que a incita; mas a qualidade moral do afeto e original,
independente e absoluta.
3°. As Escrituras e a experiencia crista universal ensinam
que a condi<;;ao comum dos homens e, ao mesmo tempo,

475
Capitulo 20
condi~ao de impotencia moral e de responsabilidade. Segue-
-se, pois, que as duas coisas nao podem ser incompativeis.

13. Como podem conciliar-sea incapacidade dos homens e os


mandamentos, promessas e ameafas de Deus?
Com toda a justi~a, Deus trata o pecador segundo a medida
da sua responsabilidade, e nao segundo a medida da sua
incapacidade pecaminosa. Teria sido uma concessao inteira-
mente indigna de Deus se Ele baixasse as Suas exigencias em
propor~ao aos pecados dos homens. E, alem disso, sob a
dispensa~ao do evangelho, Deus faz uso de Seus mandamentos,
promessas e amea~as como meios de atua~ao da Sua gra~a, a
fim de esclarecer os entendimentos, vivificar as consciencias e
santificar o cora<;:ao dos homens, sob a influencia do Seu
Espirito.

14. Como se pode mostrar que o usa racional de meios niio e


incompativel com a incapacidade dos .homens?
A eficacia de todos os meios depende do poder de Deus, e
nao da capacidade do homem. Deus estabeleceu uma conexao
entre certos meios e o fim que se deseja alcan~ar; manda-nos
emprega-los e prometeu aben<;:oa-los; e a experiencia tern
demonstrado que Ele e fiel a Suas promessas e tambem que
existe uma conexao instrumental entre os meios e o fim.

15. Como se pode mostrar que o legitimo efeito pratico desta


doutrina niio e o de levar o pecador a procrastinar a obra da sua
salvafiio?
Essa doutrina tende, obviamente e com razao, a extinguir
as falsas esperan~as de todo pecador e a paralisar as suas
tentativas de salvar-se empregando suas pr6prias for~as e
confiando nos seus pr6prios recursos. Mas, tanto a razao como
a experiencia nos asseguram que o efeito naturale real dessa
grande verdade e- 1°. Tornar humilde a alma e faze-lades-
esperar-se de si. 2°. Faze-la sentir que a sua unica esperan~a

476
Incapacidade
racional esta em confiar imediatamente e sem reserva na gra~a
soberana de Deus em Cristo. 3°. Esta verdade leva o cristao,
depois de convertido, a desconfiar habitualmente de si, a ser
diligente e vigilante, e a confiar habitualmente em Deus e ser-
-Lhe grato.

EXPOSI<;OES AUTORIZADAS
DAS DIVERSAS IGREJAS

DOUTRINA ROMAN A- Cone. de Trento, Sec. 6, can. 7:


"Se alguem disser que todas as obras que se fazem antes
da justifica~ao, de qualquer tipo que se fa~am, verda-
deiramente sao pecados, ou merecem o 6dio de Deus ...
anathema sit (seja anatema)." Sobre este assunto o lei tor
podera ver algo mais sob os titulos de "Pecado Origi-
nal" e "Voca~ao Eficaz."
DOUTRINA LUTERANA-Conf deAugsburgo, pag. 15:
"A vontade humana possui certa capacidade (libertatem)
para produzir retidao civile escolher as coisas aparentes
aos sentidos. Mas, sem o Espirito Santo, nao tern o poder
de produzir a justic;:a de Deus ou a justi~a espiritual,
porque o hom em natural nao percebe aquelas coisas que
sao de Deus."
Formula Concordice, pag. 579: "Cremos, pois, que tanto
como a urn cadaver falta o poder de revivificar-se e
restaurar-se avida corp6rea, igualmente faltam a quem,
por causa do pecado, esta morto espiritualmente, todas
e cada uma das faculdades de restaurar-se a vida
espiri tual."
Ibidem, pag. 656 - Cremos que o intelecto, o cora~ao
e a vontade do homem nao regenerado sao inteiramente
incapazes, nas coisas espirituais e divinas, e por seu
proprio vigor natural, de en tender, crer, abra~ar, pensar,
determinar-se, aperfei~oar, fazer, operar ou cooperar em
coisaalguma." ·:· ,., •. )i. ·'

477
Capitulo20
DOUTRINAREFORMADA- Os Trinta e Nove Artigos
da lgreja Anglicana, Art. 10: "A condi<;:ao do hornern,
depois da queda de Adao, e tal que ele nao pode mover-
-se nern preparar-se a si rnesrno por sua propria for<;:a
natural e boas obras, para a fe e a invoca<;:ao de Deus;
portanto, nao ternos poder para fazer boas obras
agradaveis e aceitaveis a Deus, sern a gra<;:a divina a n6s
provinda por rneio de Cristo, para que tenharnos vontade
realrnente boa, e agindo conosco quando ternos essa boa
vontade."
Conf Helvetica Posterior: "No hornern nao renovado
nao ha vontade livre para o bern, nem for<;:a para o fazer...
Ninguern nega que a respeito de coisas exteriores tanto
os nao regenerados como os regenerados tenharn do
rnesrno modo a vontade livre; porque o hornern tern esta
constitui<;:ao ern cornurn corn os outros anirnais, que
algumas coisas ele se deterrnina a fazer e ou tras
deterrnina-se a nao fazer... A respeito deste ponto, conde-
narnos os rnaniqueus, que negarn que o mal tenha sua
origem no exercicio da livre vontade (livre-arbitrio) de
urn hornern born. Condenarnos tarnbern os pelagianos,
que dizern que ate os hornens rnaus possuern livre
vontade suficiente para fazer o bern que Deus nos rnanda
fazer."
Formula Consensus Helvetica, Cass. 22: "Sustentarnos,
pois, que falarn corn pouca exatidao e nao sern perigo os
que charnarn a esta incapacidade de crer incapacidade
moral, e que nao a considerarn natural, acrescentando que
o hornern, seja qual for a condi<;:ao ern que seja colocado,
pode crer, contanto que queira, e que a fe realrnente e de
algurn modo produto do proprio hornern; enquanto o
ap6stolo rnuito distintarnente afirrna que e dorn de Deus
(Ef. 2:8)."
Artigos do Sinodo de Dart, Cap. 8, sec. 3, Art. 3: "Todos
os hornens sao concebidos ern pecado e nascern filhos

478
~
Incapacidade
da ira, indispostos para qualquer bern salvador, propen-
sos para o mal, estao mortos nos pecados e sao escravos
I
do pecado, e sem a gra<;a do Espirito Santo regenerador
nem querem nem podem voltar para Deus, corrigir sua
natureza depravada, nem dispor-se para a sua corre<;ao."
Conf de Fe (de Westminster), Cap.9, § 3: "0 homem,
por sua queda e por seu estado de pecado, perdeu
totalmente todo o poder de vontade para qualquer bern
espiritual que acompanhe a salva<;ao; de maneira que o
homem natural, por ser inteiramente avesso a esse bern,
e por estar morto no pecado, nao pode, por seu proprio
poder, converter-se nem preparar-se para a sua
conversao."
DOUTRINA REMONSTRANTE - Limborch, Thea!.
Christ., Lib. 4, cap. 14, § 21: ''A gra<;a de Deus ea causa
primaria da fe, sem a qual o hom em nao pode fazer born
uso da sua livre vontade ... Portanto, a livre vontade
coopera com a gra<;a, de outro modo a obediencia ou a
desobediencia do homem nao teria lugar... A gra<;a nao
e a unica causa, e sim a causa primaria da salva<;ao ...
porque a propria coopera<;ao da livre vontade com a gra<;a
vern da gra<;a como causa primaria; porque, se a livre
vontade nao fosse incitada pela gra<;a preveniente, nao
poderia cooperar com a gra<;a."
DOUTRINA SOCINIANA- Cat. Racoviano, Perg. 422:
"Nao nos seria concedida vontade livre para que
obede<;amos a Deus? Sem duvida; porque ecerto que o
primeiro homem foi constituido por Deus de tal modo
que se achava dotado de uma vontade livre; nem, por
certo, tern sobrevindo causa alguma pela qual Deus
privasse o homem daquela livre vontade depois da sua
queda."

479
,
21

A Imputa~ao do Pecado Original


de Adao asua Posteridade
1. Como podemos expor os fatos ja provados pelas Escrituras,
pela consciencia e pela observafdO, e reconhecidos geralmente em
todos os credos das igrejas protestantes, quanta ao estado moral e
espiritual do homem, desde o nascimento e por natureza?
1°. Todos os homens, sem nenhuma exce<;;ao, come<;;am a
pecar logo que exercem agencia moral.
2°. Todos nascem com uma natureza cuja tendencia
antecedente e preponderante epecar.
3°. Essa tendencia inata e em si mesma urn pecado no
sentido mais rigoroso da palavra. Merece castigo e ecorruptora
e destruidora e, sem nenhuma referencia asua origem em Adao,
merece plenamente a ira e a maldi<;;ao de Deus e, quando nao
eexpiada pelo sangue de Cristo, carrega sempre essa maldi<;;ao.
0 Presidente Jonathan Edwards, em sua obra Freedom of the
Will (A Liberdade da Vontade), pt. 4, sec. 1, diz: ''A essencia
da virtude e do vicio das disposi<;;6es do cora<;;ao nao esta na
sua causa, e sim na sua natureza".
4°. Portanto, OS homens sao, por natureza, totalmente
avessos a todo bern espiritual, e incapazes de por si s6s mudar
essa rna tendencia inerente asua natureza e de escolher o bern
em preferencia ao mal.
5°. Por conseguinte sao, por natureza, filhos da ira e seu
carater e formado e seu mau destino determinado antes de
qualquer a<;;ao pessoal sua.

480
A Imputafiio do Pecado Original
i 2. Como podemos mostrar que e nestes fatos incontestaveis
que esta a verdadeira dificuldade na conciliafiiO dos caminhos de
Deus para com o homem; e mais, que o reconhecimento destes fatos
em sua inteireza ede muito maior importancia doutrinaria do que
pode ser qualquer explicafiio da sua origem?
0 fato de que, antes de nos ser possfvel qualquer ac.;:ao
pessoal, comec.;:amos a existir com uma natureza que com justic,;:a
nos exp6e a condenac.;:ao e infalivelmente nos predisp6e para o
pecado, e urn misterio assombroso, urn mal indizfvel e,
contudo, urn fato certo e universal. Nenhuma teoria possfvel
quanto a sua origem pode agravar o misterio ou sua significac.;:ao
terri vel. Nao dizemos que na doutrina de sermos responsaveis
pelo pecado original de Adao nao haja dificuldades muito
graves. Dizemos, porem, (a) que ela e ensinada nas Escrituras,
e (b) que ela e mais satisfat6ria a nos sa razao e aos nossos
sentimentos morais do que qualquer outra explicac.;:ao dada
em qualquer tempo.
Nem e menos evidente que o pleno conhecimento desses
fatos e de muito maior importancia doutrinaria e pratica do
que o pode ser qualquer explicac.;:ao da sua origem ou causa.
Nossas opini6es a respeito desses fatos determinarao imediata
e necessariamente a nossa relac.;:ao com Deus, o carater inteiro
da nossa experiencia religiosa, e tambem as nossas ideias sobre
a natureza do pecado e da grac.;:a, a necessidade e natureza da
redenc,;:ao, da regenerac.;:ao e da santificac.;:ao; e qualquer
explicac.;:ao destes ultimos fatos s6 servira para esclarecer e
expandir as nossas ideias quanto a conformidade que existe
entre as perfeic,;:6es de Deus e o modo como Ele trata a rac.;:a
humana; e tambem quanto as relac,;:6es em que estao umas com
as outras as diversas partes do plano divino.
Achamos, portanto- (1) Que as Escrituras insistem mais
e falam mais freqiientemente nesses fatos que dizem respeito
ao estado inato de pecado do homem, do que em nossa
responsabilidade pelo a to de apostasia de Adao. (2) Que todos
os grupos da Igreja Crista, em todos os periodos, tern definido

481
Capitulo 21
e concordado nesses fatos, enquanto que, a respeito da nossa ..
conexao com Adao tern sempre havido opini6es muito vagas
e contrarias umas as outras- Thea. of the Ref, "Essay" 7:1, de
autoria do Diretor Cunningham.

3. Como expor os principios marais auto-evidentes pressupostos ~


necessariamente em todas as investigar,;oes no modo pelo qual Deus ,
trata Suas criaturas responsaveis?
1°. Deus nao pode ser o autor do pecado. 2°. Nao devemos
crer que Deus pode criar uma criatura de novo com natureza
pecadora. 3°. A perfei<;:ao de justi<;:a e retidao, nao mera
soberania, e a grande distin<;:ao de todo o Seu procedimento
para conosco. 0 erro de que a voli<;:ao de Deus determina
distin<;:6es marais foi por motivos opostos mantido pelos
supralapsarios Twisse, Gomar, etc., e por arminianos tais como
Grotius, querendo mostrar, uns que Deus podia condenar a
quem quisesse, mesmo sem que houvesse culpa real, e outros
que Ele podia salvar a quem quisesse, mesmo sem que hou-
vesse uma propicia<;:ao real. A verdade fundamental, porem,
admitida agora por todos OS cristaos, e que as imutaveis
perfei<;:6es marais de Deus e que constituem a norma absoluta
do que e justa, e que elas determinam a Sua vontade em todos
os Seus atos e se manifestam em todas as Suas obras. 4°. Euma
no<;:ao paga, adotada pelos racionalistas naturalistas, a ideia de
que "a ordem da natureza", ou "a natureza das coisas", ou "a
lei natural", e urn agente real independente de Deus, limitando
a Sua liberdade ou operando com Ele como cooperador na
produ<;:ao de efeitos. A "natureza" nada mais e que uma cria-
tura e urn instrumento de Deus. E Ele quem faz o que ela
gera. 5°. Nao podemos crer que Deus infligiria urn mal fisico
ou moral a uma criatura que nao estivesse incursa com justi<;:a
na pena da perda de seus direitos naturais. 6°. A justi<;:a exige
que todo agente moral passe por uma prova equitativa, cujas
condi<;6es sejam tais que lhe deem ao menos tanto ensejo de
sair-se bern quanta o perigo de sair-se mal.

482
A Imputafiio do Pecado Original
4. Como poderiamos expor as duas questoes distintas que dai
se derivam e que, embora muitas vezes confundidas, precisamos
conservar separadas?
1a. Como e que se origina uma natureza rna, inata, em
cada ser humano no come~o da sua exisH~ncia, e de modo que
o Criador do hom em nao e a causa do pecado? Se essa corrup~ao
da natureza originou-se em Adao, como nose transmitida?
za Por que, e sob que fundamento de justi~a, inflige Deus
esse mal terrivel, a raiz eo motivo de todos os demais males,
logo no come~o da nossa existencia pessoal? Qual a prova equi-
tativa pela qual foi permitido as crian~as passarem? Quando e
por que perderam elas seus direitos como criaturas que
acabaram de ser criadas?
E auto-evidente que estas quest6es sao distintas e que
devem ser tratadas como tais. Para a primeira talvez se possa
achar resposta em base fisiol6gica. A segunda, porem, diz
respeito ao governo moral de Deus e a justi~a de Suas
dispensa~6es. A indevida desaten~ao a essa distin~ao, e porque
nem sempre foi conservada proeminente, resultaram em muita
confusao na hist6ria da teologia de todas as epocas e escolas.

A. COMO SUCEDE QUE TODAS AS ALMAS


HUMANAS SAO CORRUPTAS DESDE 0 NASCI-
MENTO? SE ESSA CORRUP~AO VEM TRANS-
MITIDA DE ADAO, COMO E TRANSMITIDA?

5. Que respostas tem sido dadas a esta pergunta, negando ou


niio fazendo caso da origem adamica do pecado?
1a. A teoria dos maniqueus, originariamente adotada por
Manes (240 d.C.) mas procedente do dualismo de Zoroastro,
da eterna auto-existencia de dois prindpios, urn deles born,
identificado como Deus absoluto, eo outro mau, identificado
com a materia, ou com o principio do qual a materia e uma
das manifesta~6es. Os nossos espiritos tern sua origem primaria
em Deus, e o pecado e o resultado necessario de se acharem

483
Capitulo 21
eles enredados com a materia. E 6bvio que este sistema destr6i
o carater moral do pecado, e sofreu zelosa oposi~ao de todos os
antigos "Pais" da lgreja Crista.
za. A teoria panteista, segundo a qual o pecado eo incidente
necessaria de uma natureza limitada e finita. Alguns escritores,
nao absolutamente panteistas, tern o pecado na conta de urn
incidente inevitavel num certo grau de desenvolvimento e
como o meio determinado para produzir uma perfei~ao
supenor.
3a. Os pelagianos e outros racionalistas, negando que
haja corrup~ao inata, atribuem a liberdade da VOJ;ltade (ao
livre-arbitrio), ainfluencia dos rnaus exemplos, etc., o fa to geral
de que todos os homens pecam logo que se tornam agentes
livres.
4a. Outros atribuem essa corrup~ao culpavel da nossa
natureza, inerente a toda alma humana desde o nascimento, a
uma apostasia efetiva de cada alma, cometida antes do
nascimento, ou num estado de preexistencia individual, como
ensinam Origenes e, modernamente, o Dr. Edward Beecher
em sua obra intitulada The Conflict of the Ages (0 Conflito das
Eras); ou como transcendental e fora do tempo, como ensina
Julio Muller no livro de sua autoria, The Christian Doctrine of
Sin (A Doutrina Crista do Pecado), vol. 2, pag. 157. Esta e,
evidentemente, uma pura especulas;ao nao apoiada nem por
fatos da consciencia nem da observa~ao; tern contra si o
testemunho das Escrituras, Rom. 5:12 e Gen. capitulo 3, e
nunca foi aceita pela lgreja.

6. Quais as diversas teorias, sustentadas por diversos te6logos


cristiios, que admitiam a origem adamica do pecado humano, sabre
a maneira pela qual epropagado de Adiio para os seus descendentes?
E 6bvio que esta e uma questao de importancia muito
menor do que a da questao moral que ainda fica por discutir,
quanto as bases de direito e de justis;a que Deus tern para trazer
esse mal direta ou indiretamente sobre todos os homens no

484
A ImputafiiO do Pecado Original

seu nascimento. Por isso, nem as Escrituras explicam este ponto


explicitamente, nem da a seu respeito uma explica~ao uni-
forme a maior parte dos te6logos.
Desde o principia os te6logos ortodoxos se dividem em
traducionistas e criacionistas. Tertuliano advogou a teoria
segundo a qual os filhos derivam sua alma por gera~ao natural
da de seus pais (traducionismo ). Jer6nimo era de opiniao que
Deus cria cada alma independentemente quando nasce a
crian~a (criacionismo ). Agostinho est eve indeciso entre estas
duas opini6es. A maioria dos te6logos cat6licos romanos tern
sido criacionista; a maior parte dos te6logos luteranos, e os da
Nova lnglaterra, seguin do o Dr. Hopkins, tern sido traducio-
nistas. Quase todos os te6logos da lgreja Reformada tern sido
criacionistas. Veja:
1°. A teoria co mum dos traducionistas nao e "que a alma e
gerada de outra alma, nero o corpo de outro corpo, e sim que o
homem inteiro egerado de outro homem inteiro"- D. Pareus
(Heidelberg, 1548-1622), sobre Romanos 5:12. Segundo essa
teoria, e evidente que a corrupta natureza moral de nossos
primeiros pais seria transmitida inevitavelmente a todos os
seus descendentes por gera~ao natural.
2°. A doutrina do realismo puro e que a humanidade e,
genericamente, uma s6 substancia espiritual que se corrompeu
por seu proprio ato de apostasia em Adao. A alma dos homens
individuais nao e substancia distinta, e sim manifesta~ao dessa
unica substancia generica e espiritual atraves de suas diversas
organiza~6es corporais. E, sendo corrompida a alma universal,
corrompidas sao tambem, desde o nascimento, as suas diversas
manifesta~6es.
3°. Os que sustentam que Deus cria cada alma separa-
damente, sustentam em geral tambern que ele, como justa pena
pelo pecado de Adao, priva as almas das influencias do Espirito
Santo das quais depende toda a vida espiritual na criatura, e
que, em considera~ao a justi<;a de Cristo, restitui aos eleitos,
no ato da sua regenera<;ao, essa influencia vivificadora. 0 Dr.

485
Capitulo 21
T. Ridgely (Londres, 1667-1734) diz (em sua obra teol6gica),
vol. 1, pags. 413, 414: "Deus cria os hom ens sem dons celestiais
e sem luz sobrenatural; e, com justi~a, porque Adao perdeu
esses dons para si e para a sua posteridade".
Alguns poucos criacionistas, como Lampe (Utrecht, 1683-
1729), Tom. 1, pag. 572, ensinam que o corpo derivado dos
pais "e corrompido por emo~6es desregradas e perversas, por
meio do pecado", e que assim comunica aalma colocada nele
por Deus iguais afetos desregrados. Essa teoria, porem, nunca
prevaleceu, porque 0 pecado nao pertence amateria e s6 pode
pertencer ao corpo em virtu de de ser este o 6rgao instrumental
da alma. Contudo, muitos criacionistas atribuem a propaga~ao
de pecados habituais a gera~ao natural; num sentido geral,
como uma lei estabelecida por Deus, em virtude da qual os
filhos serao como os pais, sem indagarem sobre o modo. Assim
De Moer, Cap. 15, § 33, e "Canones do Sinodo de Dortrecht".

B. POR QUE, E FUNDADO EM QUE BASE DE


JUSTI(:A E RETIDAO, DEUS FARIA COM QUE TODOS
OS SERES HUMANOS NASCESSEM PERDIDOS
ANTES DE POSSUIREM QUALQUER AGENCIA
PESSOAL E PROPRIA?

7. Quale a explicac;iio arminiana desse Jato?


1°. Eles todos admitem que todos os homens herdam de
Adao uma natureza corrompida que os predisp6e para o
pecado, mas negam que essa condi~ao inata seja em si mesma
pecado propriamente dito, ou que envolva culpa ou demerito
digno de castigo.
2°. Afirmam que est<1 em harmonia com a justi~a de Deus
permitir que este grande mal viesse sobre todos os homens ao
nascerem, somente a vista do fato de que Ele se havia deter-
minado a introduzir uma compensa~ao adequada na reden~ao
em Cristo, destinada imparcialmente a todos os homens, e as
influencias suficientes da Sua gra~a, que todos os homens

486
A I mputar;iio do Pecado Original
experimentam, e que restitui a todos a capacidade de fazer o
bern e, por isso, plena responsabilidade pessoal. Por conse-
guinte, as crian<;;as nao estao sob a condena<;;ao; esta nao pesa
sobre nenhum ser humano enquanto nao tiver abusado da gra<;;a
que lhe e concedida. No dom de Cristo, Deus retifica o mal
que sofremos permitindo Ele que Adao usasse da sua natureza
depravada como o meio pelo qual gerar filhos pecadores. - Cf.
Dr. D. D.Whedon, em Bibliotheca Sacra, abril 1862, Conf
Rem.,7: 3; Limborch, Theol. Christ., 3:3, 4, 5, 67.
OBJETAMOS contra essa doutrina afirmando- 1°. Que a
nossa condena<;;ao em Adao e dejustir;a, e que a nossa reden<;;ao
em Cristo vern da GRA<;A. 2°. Que o remedio do sistema
compensador nao e aplicado a muitos gentios, etc. 3°. Que essa
teoria nao concorda com as doutrinas das Escrituras sobre o
pecado, a incapacidade humana, a regenera<;;ao, etc.

8. Quale a resposta dada geralmente pelos te6logos da Nova


Inglaterra posteriores ao tempo do Dr. Hopkins?
0 Dr. Hopkins ensinou a doutrina da eficacia divina na
produ<;;ao do pecado (ou seja, que Deus e a causa eficiente do
pecado). Isso naturalmente dissolve a questao quanto a justi<;;a
de Deus em introduzir no mundo os descendentes de Adao
como pecadores, porque Deus seria a causa final de todo o
pecado. Os te6logos da Nova lnglaterra, posteriores a Hopkins,
abandonaram a doutrina de Deus como causa eficiente, mas
concordam com ele em negar a imputa<;;ao e em referir a uma
divina constitui<;;ao soberana a lei que faz com que cada urn
dos descendentes de Adao herde a sua corrup<;;ao.
Se os que adotam essa teoria, embora reconhecendo que
essa divina constitui<;;ao soberana e infinitamente justa e reta,
querem simplesmente confessar que nao tern conhecimento
claro de Seus motivos e raz6es, respondemos tao-somente que,
enquanto simpatizamos em parte com ela, nao podemos, no
en tanto, recusar a luz parcial que as Escrituras projetam sobre
o problema, e que patentearemos abaixo. Mas se o designio

487
Capitulo 21
desses te6logos e afirmar (1) que essa constituic;ao nao e justa,
ou (2) que e s6 a vontade divina que a torna justa, e que o fato
de ser soberana e 0 fundamento sobre 0 qual podemos declarar
que e reta, protestamos contra a teoria como uma heresia grave.

9. Qual e a resposta ortodoxa a pergunta acima, e em que


concordam geralmente as te6logos roman as, luteranos e reformados?
E certo que, embora tenha havido diferen<;;a de opiniao e
falta de clareza nas exposic;oes sobre as bases da nossa respon-
sabilidade justa pelo pecado original de Adao, a Igreja toda
tern sempre sustentado que a perda da justi<;;a original e a nossa
deprava<;;ao moral e inata sao a justa e reta, nao soberana,
consequencia penal do ato de apostasia de Adfw. Esta e a
DOUTRINA, a qual nao s6 esta de acordo com as Escrituras,
mas tambem presta honra aos atributos morais de Deus e a
equidade do Seu governo moral, e esta de conformidade com
a ortodoxia hist6rica. N a explicac;ao desta doutrina tern havido
diferenc;a de opiniao entre os ortodoxos. E urn simples fato
que Deus, como Juiz justo, condenou a rac;a inteira por causa
do pecado de Adao, e ser condenado por Deus, a fonte de vida,
envolve a morte moral e espiritual, e com justic;a e seguido
por ela.

10. Onde, nas Escrituras, e afirma do o fa to de que Deus


condenou a rm;a inteira par causa da apostasia de Adiio?
Em Romanos 5: 17-19- "Porque, se pela ofensa de urn s6,
a morte reinou por esse ... Pois assim como por uma s6 ofensa
veio o juizo sobre todos os homens para condenac;ao ... Porque,
como pela desobediencia de urn s6 homem, muitos foram feitos
pecadores ... ".

11. Como se pode mostrar que a Jgreja inteira esta de acordo


quanta a esta doutrina?
0 pecado de Adao foi urn ato de apostasia. A deserc;ao
espiritual e a conseqiiente corrupc;ao espiritual que ocorreram

488
A Imputafiio do Pecado Original

imediatamente em sua experiencia pessoal (a propria pena


denunciada) foram evidentemente uma justa conseqtiencia
penal desse ato. Agostinho diz (De Nupt. et Concup. 2:34)- "E,
pois, for~oso concluir que se entende que naquele primeiro
homem todos pecaram, porque todos estavam nele quando
pecou; e assim o pecado entra como nascimento, e nao e tirado
senao pelo novo nascimento".
0 Dr. G. F. Wiggers, o erudito expositor de Augustinia-
nism and Pelagianism, from the Original Sources (0 Agosti-
nianismo eo Pelagianismo, com Base nas Fontes Originais),
diz, em sua exposi~ao das ideias de Agostinho sobre o
pecado original, capitulo 5, divisao 2, § 2: "A propaga~ao do
pecado de Adao entre a sua posteridade e urn castigo desse
mesmo pecado. A corrup~ao da natureza humana, na ra~a
inteira, e 0 castigo justo da transgressao do prirneiro hornern,
no qual todos os hornens ja existiarn".
0 Concilio de Trento, Sec. 5, 1 e 2, afirrna que "o pecado,
que e rnorte da alma", foi parte da pena ern que Adao incorreu
por sua transgressao, e e transfundido por todo 0 genero
hurnano, e nao foi nocivo a ele s6.
Belarmino,Amiss. Grat. 3, 1, diz: "A pena que corresponde
propriarnente ao pecado original e a perda da justi~a original
c dos dons sobrenaturais dos quais Deus supriu a nossa
natureza".
Lutero (sobre Genesis 1, pag. 98, cap. 5) afirrna que a
imagern de Adao segundo a qual foi gerado Sete "incluiu o
pecado original e a pena da rnorte eterna infligida por causa
do pecado de Adao".
Melanchthon (Explicatio Symboli Niceni, Corp. Refor., 23 :
403 e 583) diz: "Adao e Eva trouxerarn sobre seus descendentes
culpae deprava~ao".
Formula Concordiae, pags. 639 e 643 - "Especialrnente
desde que, pela sedu~ao de satanas, mediante a Queda, pelo
jus to juizo de Deus no castigo dos hornens, perdeu-se a justi~a
concriada ou original... e corrornpeu-se a natureza hurnana".
Capitulo 21
A pol. Aug. Conf, pag. 58: "No livro de Genesis esta descrita
a pena imposta pelo pecado original. Porque ai a natureza
humana ficou sujeita nao s6 a morte e aos males corporais,
senao tambem ao dominio do diabo ... Defeito e concupiscencia
sao tanto males penais como pecados".
Quenstedt (falecido em 1688), Quaes. Thea. Did. Pol. 1,
pag. 994: "Nao foi simplesmente da vontade ou da soberania
absoluta de Deus, e sim da maior justi~a e eqiiidade que o
pecado, que cometeu Adao, como a raiz e a origem de toda a
ra~a humana, nos fosse imputado e propagado em n6s de modo
que nos constituisse culpados". ·
Tan to a Segunda Confissiio Helvetica, Cap. 8, como a Galica,
Art. 9, dizem que Adao, "por sua propria culpa, tornou-se
sujeito ao pecado, e tal como ele depois da Queda, tais sao
tambem todos OS por ele propagados, sujeitOS ao pecado, a
morte e a diversas calamidades".
Pedro Martir, professor em Zurique (1500-1561), citado
por Turretino (Locus 9: 2, 9, § 43), diz: "Nao ha por certo
ninguem que possa duvidar de que o pecado original (inerente)
e infligido sobre n6s como vingan~a e castigo da primeira
queda".
Calvina: "Deus, por urn juizo justo, condenou-nos a ira
em Adao, e determinou que nascessemos depravados por causa
do seu pecado".
Ursina (1534-1583), amigo de Melanchthon e autor do
Catecismo de Heidelberg, diz (Quast. 7, pags. 40,41): "0 pecado
original" (inerente) "passa para" os seus descendentes, "nao
mediante o corpo nem mediante a alma, e sim mediante a gera-
~ao impura do homem inteiro, por causa da culpa de nossos
primeiros pais, por cuja causa Deus, por urn juizo justo, en-
quanta cria nossas almas, ao mesmo tempo as priva da retidao
original e dos dons originais que havia conferido aos pais".
L. Danaeo (1530-1596)- "Ha tres coisas que constituem
urn homem culpado diante de Deus: 1. 0 pecado emanando
do fato de termos todos pecado no primeiro homem. 2. A

Ar\f\
A Imputafiio do Pecado Original
corrup<;;ao, que eo castigo desse pecado, e que caiu sobre Adao
e toda a sua posteridade. 3. Pecados pr6prios".
Teodoro de Beza (1519-1605), sobre Romanos, capitulo 12
etc., diz: "Assim como Adao, pela comissao do pecado, tornou-
-se primeiro culpado da ira de Deus e, depois, por ser culpado,
sofreu como castigo do seu pecado a corrup<;;ao da alma e do
corpo, assim tambem transmitiu a sua posteridade uma
natureza em primeiro lugar culpada, e em segundo depravada".
J. Arminio, de Leyden (1560-1609) - "0 mesmo castigo,
pois, que foi infligido a nossos primeiros pais, desceu para
toda a sua posteridade e pesa agora sobre esta; de modo que
todos sao, por natureza, filhos da ira, sujeitos acondena<;;ao ... e
a uma priva<;;ao da retidao e da santidade verdadeira", falta-
-lhes a justi<;;a original, pena geralmente chamada perda da
imagem divina, e pecado original".
G. J. V6ssio, Leyden (1577-1649),Hist. Pelag., Lib., 1 -1:
"A igreja cat6lica romana tern sempre decidido assim, que o
pecado original e imputado a todos; isto e, que OS seus efeitos
sao, segundo o justo juizo de Deus, transmitidos a todos os
fil hos de Adao ... por cuja causa nascemos sem a justi<;;a
original".
Sfnodo de Dort (1618) - Tal como foi o homem depois da
Queda, tais os filhos que gerou ... pel a propaga<;;ao de uma
natureza viciada, segundo o justo juizo de Deus".
Francisco Turretino, Genebra (1623-1687),Locus 9, Q. 9,
§§ 6, 14.*
Amesio, Medulla Theolog., Lib., prim., cap. 17: "2. Esta
propaga<;;ao do pecado consta de duas partes, deimputafiio e de
com unicafiio real. 3. Pela imputafiio esse ato unico de

• Turretino, apud Hodge, System. Theol., 2, p. 211: "Recaiu sobre n6s a pena
do pecado de Adao, tanto de priva~ao como de puni~ao positiva. Primeiro e
a falta e priva~ao da justi~a original; depois a morte, nao s6 temporal mas
tambem eterna, e para todo o genero humano pecaminoso, que imita os
pecados". Em latim no original. Acrescimo e tradw;;ao de Odayr Olivetti.

LI.Ol
Capitulo 21
desobediencia que Adao cometeu e tornado nosso tambern. 4.
Pela comunicafiiO real, nao somente pelo pecado unico. 5. 0
pecado original, vis to que consiste essencialmente na priva~ao
da justi~a original, e visto que essa priva~ao segue ao primeiro
pecado como urn castigo, entao o pecado original tern em
primeiro lugar a natureza de urn castigo, mais do que a de urn
pecado. E urn castigo, porque a justi~a de Deus nos nega essa
justi~a original; mas e tam bern urn pecado, porque essa justi~a
deveria achar-se presente, e acha-se ausente por culpa humana.
6. Por conseguinte, essa priva~ao nos vern de Adao como
demerito ate onde e castigo, e como causa eficiente real ate
on de se acha ligada a ela a natureza do pecado".
H. Witsio (1636-1708), Economy, Liv. 1, cap: 8, §§ 33 e
34: "E,pois, necessaria que, em virtude da alian~a das obras, o
pecado de Adao seja de tal modo carregado sobre os seus
descendentes, que se achava incluida com ele na mesma
alian~a, que, por causa do demerito do seu pecado, eles nas~am
sem a justi~a original, etc."
Formula Consensus Helvetica (1675), Canone 10: "Parece,
porem, que de modo algum a corrup~ao hereditaria poderia
cair, como morte espiritual, sobre toda a ra~a humana pelo
justo juizo de Deus, se nao fosse precedida por algum pecado
des sa ra~a trazendo sobre ela a pena des sa morte. Porque Deus,
o Juiz supremamente justo de toda a terra, s6 castiga os
culpados."
Confissiio e Catecismos de Westminster- Confissiio, cap. 7, §
2, e cap. 6, § 3; Cat. Maior) Pergs. 22 e 25;Breve Cat., Perg. 18.
0 Presidente Witherspoon, Works (Obras), vol. 4, pag. 97:
"Parece claro que o estado de corrup~ao e maldade em que os
homens se acham agora e, segundo as declara~6es das
Escrituras, efeito e castigo do pecado original de Adao".
Veja tambem a verdade desta doutrina afirmada pelo Dr.
Thomas Chalmers,lnstitutes of Theology, Parte 1, Cap. 6; pelo
Dr. William Cunningham, Theology of the Reformation, Ensaio
7, § 2; pelo Dr. James Thornwell, Collected Writings, Vol. 1,

492
A JmputafiiO do Pecado Original
pags. 479, 559, 561, etc.; e urn artigo de alta erudi<;_:ao escrito
pelo Prof. George P. Fisher, de New Haven, no "New Eng-
lander" de julho de 1868.
Temos, pois, o consenso de catolicos romanos e protestan-
tes, luteranos e reformados, supralapsarios e infralapsarios, de
Gomar e Arminio, do Sinodo de Dortrecht e da Assembleia
de Westminster, da Escocia e da Nova lnglaterra.

12. Par que se deu a esta doutrina o nome tecnico de imputafiio


do ato de apostasia de Adiio? Qual o significado destes termos?
No Concflio de Trento, Alberto Pighio e Ambrosio
Catherina (Hist. Cone. Trent, por Padre Paulo, Lib. 2, sec. 65)
sustentaram que a culpa imputada do pecado original de Adao
constituia a unica base da condena<;,:ao que pesa sobre os
homens em seu nascimento. 0 Concilio nao admitiu essa
heresia, mas, apesar disso, sustentou antes uma teoria negativa
mais do que positiva da corrup<;_:ao culpada que e inerente ao
homem. Em conseqti.encia, Calvina e todos os primeiros
reformadores e credos acentuaram muito o fato de que o pecado
original inerente, em distin<;_:ao do pecado original imputado, e
intrinsecamente e com justi<;,:a, por ser corrup<;,:ao moral,
merecedor da ira e da condena<;,:ao de Deus. Eo motivo pelo
qual se atribui a salva<;_:ao das crian<;,:as agra<;,:a soberana de Deus
e aos merecimentos expiatorios de Cristo, enos adultos continua
como fonte de todo pecado proprio e pessoal, e ea base principal
da condena<;,:ao a morte eterna. Crian<;_:as e adultos sofrem, e
adultos sao condenados por causa da culpa do pecado inerente,
mas nunca por causa do pecado imputado de Adao.
Mas quando se pergunta por que e que Deus, direta ou
indiretamente, nos introduz no mundo corrompidos assim, a
lgreja inteira responde, como mostramos acima: porque Deus
nos castiga assim pela apostasia de Adiio.
Essa verdade exprime-se tecnicamente como a "imputa<;,:ao
a nos da culpa do ato de Adao".
"Culpa" e o que nos exp6e com justi<;,:a ao castigo. 0

493
Capitulo 21
reconhecimento da culpae urn ato judiciale nao impasto pela
soberania de Deus.
"Imputa~ao"( o termo hebraico hasab e o grego logizomai
encontram-se freqiientemente e sao traduzidos por "ter em
conta", "reputar como", "imputar", etc.) e simplesmente levar
alguem sabre os seus ombros urn delito como motivo justo
para que contra ele se proceda segundo a lei, quer o delito
imputado tenha sido cometido pela pessoa que o leva sabre si,
quer haja outro motivo valido para fazer dele, com justi~a,
responsavel por esse deli to. Assim, pois, nao imputar o pecado
a quem o cometeu e deixar, como urn ato da gra~a, de fazer
pesar sobre essa pessoa a culpa do seu ato ou do seu estado
como fundamento para o castigo; e imputar a justi~a sem obras
e por a credito do crente uma justi~a que nao e pessoalmente
dele. -Rom. 4:6,8; 2 Cor. 5:19. Veja Num. 30:15; Lev. 5:17,18;
7: 18; 16.22; (2 Sam. 19: 19; Sal. 32:2); Rom. 2:26; 2 Tim. 4:16,
etc.
A imputa~ao a n6s do pecado de Adao, isto e, a coloca~ao
dele sobre n6s judicialmente, deve ser considerada como se
Deus contemplasse a ra~a humana como urn s6 todo, como
urn s6 corpo moral, antes do que como uma serie de indivfduos.
A ra~a foi condenada como urn s6 todo, e por isso cada indivf-
duo nasce num estado de rufna pre-natal e justa. Turretino o
chama commune peccatum, communis culpa, L.9, Quaes.9. Isso,
e somente isso, eo que a lgreja entende por esta doutrina. A
imputa~ao a n6s em comum do ato de apostasia de Adao leva
o homem, judicialmente, ao desamparo espiritual em parti-
cular, e este o leva, como conseqiiencia necessaria, adeprava~ao
inerente. Por outro lado, a imputa~ao dos nossos pecados em
comum a Cristo resultou em Seu desamparo (Mat. 27:46), mas
o Seu desamparo temporario nao trouxe consigo nenhuma
tendencia para pecado inerente, porque Cristo e o Deus-
-homem. A imputa~ao a n6s da justi~a de Cristo e a condi~ao
da restitui~ao do Espfrito Santo, e essa restitui~ao leva, como
conseqiiencia necessaria, a regenera~ao e asantifica~ao. "E s6

494
r
,
A I mputafiiO do Pee ado Original
enquanto a justijicatio forensis manH~m a posi~ao que teve na
Reforma, precedendo o processo da salva~ao que (esta verdade
doutrinaria) ocupa lugar firme e seguro"- Hist. Prot. Theol.,
de autoria do Dr.]. A. Dorner, vol. 2, pag. 160.

13. Qual a origem da distinfiiO entre a imputafiiO mediata e a


imediata do pecado de Adiio, e qual tem sido o usa feito dessas
expressoes entre os te6logos?
Como mostramos acima, a Igreja, desde o principia, tern
estado de acordo em sustentar que a culpa do pecado original
de Adao foi lan<;ada diretamente na conta da ra<;a humana por
inteiro, do mesmo modo que foi lan<;:ada sobre ele; e foi pu-
nida na ra<;a pelo desamparo e pela conseqiiente deprava<;:ao,
do mesmo modo que o foi nele. Isso os teologos exprimem
uniformemente pela frase tecnica: a imputa<;:ao da culpa do
pecado original de Adao aos seus descendentes.
Na primeira metade do seculo 17 entendeu-se universal-
mente que Josue Pla<;:ao, professor em Saumur, negava qual-
quer imputa<;:ao do pecado de Adao a sua posteridade, e que
admitia somente uma corrup<;:ao inerente derivada de Adao
por gera<;;ao ordinaria. Isso foi condenado explicitamente pelo
Sfnodo Nacional frances, reunido em Charenton, em 1645; e
foi repudiado por todos os teologos ortodoxos, tanto luteranos
como reformados. Pla<;:ao subseqiientemente originou a
distin<;ao entre imputa<;:ao mediata e imediata. Chamou por
aquele nome o ato de Deus fazer pesar diretamente sobre os
homens, e anteriormente ao seu proprio estado de pecador, a
culpa do pecado de Adao. E por este designou a teo ria segundo
a qual Deus nos ve culpados da apostasia de Adao juntamente
com ele, porque nos tambem somos apostatas em virtude da
corrup<;:ao ineren te. N egava a primeira destas teorias, e admi tia
a segunda.
E obvio - 1°. Que essa doutrina de uma so imputa<;:ao
mediata e virtualmente ados teologos da Nova Inglaterra, ja
discutida na resposta a Perg. 8, que atribui a soberania e nao

495
Capitulo 21
ao juizo justo de Deus o abandono da ra~a humana aopera~ao
da lei naturale hereditaria.
2°. Essa doutrina euma nega~ao da doutrina universal da
lgreja de que o pecado de Adao foi imposto com justi~a aos
seus descendentes como sobre ele mesmo, e que neles epunido
por deprava~ao como o foi nele. Aquela imputa~ao, fosse qual
fosse o seu motivo, foi evidente e puramente imediata e
antecedent e.
3°. E evidente que o pecado de Adao nao pode ser
imputado mediata e imediatamente ao mesmo tempo e para o
mesmo efeiro. Seria quase urn absurdo supor que os homens
sao punidos judicialmente tendo a corrup<;:ao inerente como
castigo justo do pecado de Adao, e que, ao mesmo tempo, te-
-los como culpados desse pecado porque sofrem aquele castigo.
E por isso que tantos defensores da doutrina da Igreja quanto
a imputa~ao imediata negam que em algum sentido a
imputa<;:ao possa ser mediata.
4°. Mas a pena do pecado de Adao foi a "morte"; isto e,
todos os males penais, tanto os temj:)Orais como os eternos. Os
defensores mais estrenuos da imputa<;:ao imediata, para
explicarem a infli<;:ao do pecado inato e inerente, admitem que
todos os demais elementos da pena imposta a Adao vieram sobre
nos por causa de nossos pr6prios pecados inerentes e realmente
cometidos - Veja Turretino, L. 9, Quaes. 9, § 14, e Princeton
Essays (Ensaios de Princeton).
5°. A culpa do pecado de Adao eimputada imediatamente
ara<;:a como urn s6 todo, e essa imputa~ao diz respeito a cada
individuo anteriormente a sua existencia em uma condi~ao
depravada. Quando se considera cada homem individual em
si mesmo, pessoal e subseqiientemente a seu nascimento, todos
concordam em que econdenado junto com Adao por causa de
uma comum deprava<;:ao e vida inerentes.
6°. Muitos tern dificuldade em conceber como e que a
corrup~ao inerente e herdada pode ser ao mesmo tempo culpa
e corrup~ao. Pensam que urn estado pecaminoso deve ter

496
.
r A Imputafiio do Pecado Original

necessariamente sua origem na escolha livre da pessoa


interessada, para que lhe possa ser imposta a responsabilidade
LlUe a culpa traz consigo. Mas todos reconhecem que a
' corrup<;ao inerente e culpa. Alguns explicam isso tacitamente
pelo principia de Edwards, segundo o qual "a essencia das
disposi<;6es virtuosas ou viciosas do cora<;;iio niio esta na sua
causae sim na sua natureza". Outros, porem, sustentam que a
culpa inerente ao pecado inato se deve ao fato de estar ligado
este pecado como urn efeito com a apostasia de Adiio. Se, pois,
se perguntar: por que e que a ra<;;a esta sob maldi<;iio, e por que
Deus permite que principiemos a nossa atividade moral numa
condi<;;ao depravada? - todos os ortodoxos responderiio
explicita ou virtualmente: "E por causa da justissima impu-
ta~ao imediata do pecado original de Adao".
Sese perguntar: por que e que cada urn de n6s, depois de
nascer, e julgado culpado e nao s6 corrompido, e por que e
que somos punidos com todos os males penais, tanto temporais
como eternos, que foram aplicados a Adiio? Muitos dos
ortodoxos responderao: "E porque o nosso proprio pecado
inerente medeia a plena imputa<;;iio do pecado de Adiio".
Andre Quenstedt (falecido em 1688), Theo. Did. Pol.,
Wittenberg, 1.998: "0 pecado original de Adao nose imputado
imediatamente porquanto existimos ate aqui em Adao. Mas o
seu pecado nos e imputado mediatamente, ate o de somos
tratados individualmente e na propria pessoa de cada urn de
n6s".
F. Turretino (falecido em 1687), Genebra, Locus 9, Quaes.
9, § 14- "A pena que o pecado traz sabre n6s ou e de priva<;;ao
ou e positiva. Aquela e a falta ou priva<;;iio da justi<;;a original.
Esta e a morte, tanto temporal como eterna, e em geral todos
os males que sobrevem ao pecador... A respeito da primeira,
podemos dizer que o pecado de Adao nos e imputado
imediatamente quanta ao efeito da pena, porque e a causa da
priva<;;iio da justi<;;a original, e assim deve preceder aprivas;iio,
ao menos na ordem da natureza; entretanto a respeito da

497
Capitulo 21
segunda, pode-se dizer que a pena positiva e imputada
mediatamente, porque lhe ficamos expostos s6 depois de
nascermos enos acharmos corrompidos".
Segue-se- (1) Que todos admitem efetivamente a impu-
ta~ao imediata e negam que haja somente imputa~ao mediata.
(2) Muitos nao fazem caso da distin<;;:ao, na qual nunca se falou
antes do tempo de Pla~ceo. (3) Alguns afirmam uma e outra,
no sentido explicado acima.

14. Que prova desta doutrina nos da a analogia que em


Romanos 5: 12-21 Paulo assevera existir entre a nossa condenafiio
em Adiio e a justificafiio em Cristo?
o
"Pois assim como por uma s6 ofensa veio juizo sobre
todos os homens para condenac;;ao, assim tambem por urn s6
ato de justi<;;a veio a grac;;a sobre todos os homens para
justificac;;ao de vida."
A analogia afirmada nessas palavras diz respeito ao fato e
a natureza da imputac;;ao nos dois casos, e nao ao motivo ou
base dela. Cristo eurn com OS Seus eleitos porque Seu Pai, por
Sua gra<;;:a, 0 designou para isso e porque Ele assumiu
voluntariamente a nossa natureza. Adao foi urn com os seus
descendentes porque foi o seu cabe<;;:a natural e porque Deus,
por Sua grac;;a, o designou para is so. N estes aspectos ha diferenc;;a
nos dois casos. Mas sao identicos quanto aunidade que subsiste
nos dois casos, e em virtu de da qual pesa sobre n6s, com justi<;;a,
a culpa do pecado original de Adao e somos punidos por causa
dele, e Cristo leva com justi<;;a sobre Si as nossas "muitas
ofensas" e epunido por causa delas, ao passo que n6s recebemos
o credito de Sua justi<;;a e por causa dela somos aceitos,
regenerados e salvos. Veja acima, Perg. 12.
Sea imputac;;ao da justi<;;:a de Cristo e imediata, imediata
deve ser tambem a do pecado de Adao; e, embora o motivo
daquela seja a gra<;;a, nem por isso e menos justa; e, embora o
motivo desta seja a justic;;a, nem por isso emenos impregnada
da grac;;a a constitui~ao original de onde deriva.

498
A I mputafiiO do Pecado Original
15. Como tem explicado os te6logos ortodoxos o MOTIVO ou o
FUNDAMENTO desta imputafiiO judicial, universalmente
pressuposta, da culpa do pecado original de Adiio aos seus
descendentes?
Concordam geralmente que a ra~a e com justi~a respon-
savel pelas consequencias judiciais desse pecado. Afora isso,
as explica~6es dadas do caso tern sido diversas e muitas vezes
vagas. Veja:
1°. Agostinho entendeu a ra~a como essencialmente uma
s6 unidade. Ate onde se considera Adao como uma pessoa,
seu pecado foi s6 dele; mas ate onde a ra~a inteira estava nele
em sua forma de existencia essencial, nao distribuida e nao
individualizada, o seu ato de apostasia foi a apostasia da ra~a
inteira e, sendo culpada e tambem depravada a natureza
comum, esta e com justi~a distribuida nesta condi~ao e sob a
co ndena~ao a cada individuo. A ra~a inteira coexistia e era
coativa em Adao, nao pessoal ou individualmente, e sim virtual
ou potencialmente. Veja o que dizem o Dr. Philip Schaff, no
Comentario de Lange sabre Romanos, pags. 191-196, eo Dr.
Jorge P. Fisher, em New Englander, julho de 1860. Este e urn
mo do de pensar que ao menos pressup6e a verdade do
realismo; e a linguagem empregada neste sentido tornou-se
tradicional na lgreja e tern sido empregada num sentido geral
por muitos que estavam lange de serem realistas em filosofia,
quando tratavam da nossa rela~ao com Adao. Ate entre te6logos
que rejeitaram explicitamente o realismo e o substituiram
definitivamente por outra explica~ao dos fatos, tern sido
conservadas formas de expressao que tiveram origem nesse
realismo. A ra~a inteira tern sido considerada como uma s6
unidade organica, e tem-se dito que estivemos em Adao como
os ramos estao numa arvore, etc. Explica~6es como esta e
outras tern continuado ate aos tempos ulteriores, e tern sido
mescladas com outras essencialmente diversas, como, por
exemplo, a da representa~ao, etc. Esta, por pouco satisfat6ria
que seja como explica~ao da nossa culpa, e muito ortodoxa,

499
Capitulo 21
nao s6 pelo numero e pela autoridade dos escritores que a
adotaram, mas tambem porque nela se acha incluido, no mais
alto grau concebivel, o motivo da imputa<;ao imediata. 0 ato
de apostasia de Adao nose imputada como foi a Adao "porque
fomos co-agentes culpados com ele nesse ato" - Essays
(Ensaios ), de Shedd.
2°. A teoria federal pressup6e a rela<;ao natural. Adao era,
diante de Deus no Paraiso, urn agente moral, livre, responsavel,
falivel, com urn corpo animal e uma natureza geradora,
procriadora. Se nao interviesse urn milagre, levaria seus filhos
consigo em seus destinos. Tomando-se em considera<;ao
somente a lei, o seu estado dependia, e nao podia deixar de
depender sempre, da sua livre vontade (do seu livre-arbitrio).
Por isso Deus, como o Curador benevolo e justo de todas as
criaturas morais, por Sua gra<;a constituiu Adao como cabe<;a
e representante federal da ra<;a como urn todo e lhe prometeu,
para ele e para todos, a vida eterna, ou seja, a santidade e a
felicidade confirmadas, sob a condi<;ao de obediencia
temporaria em condi<;6es favoniveis, e o amea<;ou, para ele e
para todos, com a pena de morte, ou seja, a condena<;ao e o
desamparo, se desobedecesse. Este foi urn ato de gra<;a em favor
de Adao, porque substituiu uma prova<;ao eterna por uma
temporaria. E foi tambem urn ato de gra<;a em nosso favor,
pelas raz6es mencionadas abaixo.
Esta "teologia federal" foi desenvolvida e introduzida em
toda a sua plenitude de pormenores e rela<;6es por Cocceio
( 1602-1669), lente em Franecker e em Leyden. Foi considerada
como urn sistema muito biblico, substituiu o escolasticismo
tanto em voga, destruiu para sempre a influencia das especu-
la<;6es supralapsarias e, com certas modifica<;6es, foi aceita
gradativamente tanto por luteranos e arminianos como por
calvinistas.
Duas coisas, porem sao historicamente certas:
1a. Que a ideia de uma alian<;a com Adao, seus descen-
dentes inclusive, havia sido concebida claramente e proposta

500
A I mputafiiO do Pee ado Original
enfaticamente muito tempo antes dessa ocorrencia. Isso fora
feito por Catherina diante do Condlio de Trento (Hist. Cone.
de Trento, de autoria do padre Paul, pags. 175, 177), e entre os
protestantes por homens como Hyperio Ct 1567), Oleviano
(cerca de 1563) e Rafael Eglin (Hist. Prot., Theol., de Dorner,
vol. 2, pags. 31 -45).
za. Que as ideias essenciais da teoria da representa~ao
fed eral prevaleceram muito geralmente entre os te6logos
protestantes desde o principia. 0 Dr. Carlos P. Krauth, falan-
do da teologia luterana como urn todo, diz: "Os motivos
assinalados para a irnputa~ao e a transrnissao tern como centro
o carater representativo de Adao (e Eva). As rninudencias
tecnicas da ideia federal aparecerarn rnais tarde, mas a ideia
essencial ern si existia ja no corne~o da nossa teologia".
Melanchthon disse: "Adao e Eva rnerecerarn culpae deprava~ao
para sua posteridade, porque os nossos prirneiros pais haviarn
sido dotados de integridade, para que a conservassern para a
sua posteridade inteira, e nesta prova~ao representaram a ra~a
hurnana inteirarnente" - Explicatio Symboli Niceni, Corp.
Refor.23: 403 e 583.
Chernnitz (1522-1586),Loci theol., fol. 213,214, diz: "Deus
depositou ern Adao os dons corn os quais quis adornar a
natureza hurnana, sob a condi~ao de que, se Adao os guardasse
para si, guarda-los-ia para a sua posteridade; e que, se os per-
desse e se tornasse depravado, geraria filhos a sua irnagern".
H utter, Ct 1616),Lb. Chr. Com. Expli. 90, Wittenberg, diz: ''Adao
representou a ra~a hurnana toda inteira" . Assirn tarnbern Tiago
Arrnfnio Ct 1609) - (Disp. 31, Thes. 9); Joao Owen (1616-1683)
- (Justification, pag. 286); a Confissiio de westminster, Cap. 7, § 2,
e Cat. Maior, 22 (1646 e 1647).
Parece, pois, que quando os escritores teol6gicos, poste-
riorrnente ao predornfnio da filosofia realista, explicarn a nossa
unidade moral corn Adao por rneio das frases gerais e nao
interpretadas de "que n6s pecarnos nele estando na sua coxa",
ou "sendo ele a nossa raiz", nao se deve entender estas frases

501
Capitulo 21
como se excluissem toda referencia a representac;;ao ou a
responsabilidade que pesava sobre ele em virtude da alianc;;a.
Essa linguagem exprime a verdade segundo qualquer das duas
teorias, ou mesmo quando as duas sao combinadas numa s6
noc;;ao. E pela substitui~ao indiscriminada dos termos ve-se
que muitas vezes as duas teorias estavam latentes debaixo de
uma no~ao geral.

16. Que se pode aduzir com justifa em apoio do modo


agostiniano de explicar a nossa unidade moral com Adiio?
Essa teoria explica a nossa unidade moral unicamente
sobre o fundamento de que ele e o cabec;;a e a raiz natural da
rac;;a, e da conseqiiente unidade fisica ou orgfmica da ra~a
inteira nele.
A favor dessa teoria se pode alegar corn justic;;a:
1°. Que, se puderrnos provar que n6s fornos "co-agentes
culpados corn Adao no seu pecado", terernos apresentado o
rnelhor rnotivo possivel, e o rnais satisfat6rio, para nos ser
irnputada corn justi~a e irnediatamente a culpa desse pecado.
2°. A analogia, ate onde ela se estende, de todo o proceder
providencial geral e especial de Deus corn os hornens. As
alian~as feitas por Deus corn Noe, Abraao e Davi incluem os
filhos junto corn os paise se ap6iarn nas rela~6es naturais de
gerador e gerados. A constitui~ao da congrega~ao judaica, e
tarnbern a da lgreja Crista, deterrninam que os direitos das
crian~as sejarn predeterrninados pelo estado de seus pais. Este,
ecerto, edeterrninado por urna alian~a baseada na grac;;a; mas,
ao rnesrno tempo, essa alian~a pressup6e a rnais fundamental
e geral rela~ao natural de gerac;;ao e educa~ao. Toda condic;;ao
e todo caniter hurnano, independenternente de qualquer
interven~ao sobrenatural, sao deterrninados por condic;;6es
hist6ricas. Hugh Miller- Testimony ofthe Rocks (0 Testern unho
das Rochas), falando como cientista cristao, diz: "E urn fato
arnplo e palpavel, como o e a econornia da natureza, que ...
progenitores decaidos, quando separados cornpletamente da

502
A I mputafiio do Pecado Original
civiliza~ao e de toda interven~ao de carater missionario,
tornam-se fundadores de uma ra~a decaida. As iniquidades
dos pais sao visitadas nos filhos". E ainda: "Uma das conse-
quencias inevitaveis da natureza do homem que o Criador lhe
deu e que, tendo deixado livre a sua vontade, a vontade do pai
se tornasse o destino do filho".

17. Que argumentos se pode apresentar com justifa contra a


suficiencia dessa explicafiio do motivo da imputafiiO imediata da
culpa do pecado original de Adiio?
1o. Note- se (1) que a congrega~ao judaica , a quem foi dado
o segundo mandamento- Ex. 20:5, e os filhos de Noe, Abraao
e Davi, como tambem a Igreja Crista, foram incluidos em
alian~as especiais baseadas na gra~a; (2) que, nos casos em que
Deus visita nos filhos a iniquidade dos pais, na providencia
naturale sem nenhuma considera~ao por quaisquer obriga~6es
especiais baseadas em alian~a, Deus age com discri~ao
realmente justa, embora soberana, tratando com rebeldes que
ja estavam sob uma previa condena~ao justa.
2°. Quando se refere ao fato de que Adao foi nosso cabe~a
natural, e diz que nos estivemos nele como "raiz" e "os galhos
de uma arvore", a no~ao nao e satisfat6ria, (1) porque e muito
indefinida; (2) porque e uma explica~ao material e mecanica
e, por isso, deixa inteiramente de explicar a responsabilidade
moral, que e essencialmente espiritual e pessoal; (3) alem disso,
essa no~ao baseia-se, ao menos veladamente, na falacia de que
as leis do desenvolvimento natural constituem os limites
necessarios da opera~ao divina, ou como agentes independentes
de Deus, ou como co-causas com Ele. A verdade, porem, e
que a constitui~ao da natureza e criatura de Deus e Seu
instrumento. (4) Essa teo ria nao da nenhuma explica~ao, nem
por meio de algum principia nem por alguma analogia, porque
somente o primeiro pecado (o original) de Adao nose imputado
e porque nao nos e imputado nenhum dos pecados
subsequentes de todos os nossos antepassados.

503
Capitulo 21

3°. A ideia de uma coexistencia e coopera<;;:ao nao pessoal


(veja Essays e Histor. Christ. Doc./Ensaios e Hist6ria das
Doutrinas Cristas- por Dr. W. G. T. Shedd, eo comentario de
Romanos em Lange's Commentary, pags. 192-194, por Dr.
Philip Schaff) como a unica base de uma justa responsa-
bilidade moral nao tern apoio algum no testemunho da
consciencia, que e a nossa unica cidadela de defesa contra o
materialismo, o naturalismo e o panteismo. A unica concei-
tua<;:ao do pecado que a consciencia intima nos da e de que e 0
estado ou o ato de urn agente pessoallivre. Mesmo que fosse
uma coopera<;:ao moral de natureza impessoal, virtual, poten-
cial, transcenderia a nossa consciencia e a nossa inteligencia,
e, sendo ela mesma ininteligivel, nao poderia lan<;:ar luz sobre
OS fatos misteriosos para cuja explica<;:ao e justifica<;:ao ela e
invocada.
4°. Quando se procura explicar essa teoria segundo a
filosofia realista, o resultado das tentativas nao nos parece mais
feliz. Veja:
( 1) Segundo o realismo pu'ro, a humanidade e uma
subs tan cia simples, generica, espiritual, que voluntariamente
apostatou e se corrompeu em Adao. Cada pessoa humana e
uma manifesta<;:ao individual desse espirito comum, em
conexao com uma organiza<;;:ao corporal e separada. Mas- (a)
Se fizermos tao pouco caso da nossa consciencia intima, como
poderemos defender-nos contra o panteismo? (b) Como podem
ser justificados e santificados espiritos individuais, enquanto
o espirito geral permanece corrompido e culpado? (c) Como
foi que o Logos encarnou? (d) Em ultimo Iugar, como uma
parte dessa substancia espiritual sera glorificada para sempre,
enquanto que outra parte sera para sempre condenada?
(2) 0 Dr. Shedd explica que a subs tan cia espiritual generica
que pecou foi depois, pela agencia de Adao, distribuida e
desenvolvida numa serie de individuos. Todavia, pode
porventura urn espirito ser dividido, e as suas partes podem
ser distribuidas, tornando-se cada parte urn agente ativo da

504
A I mputafdo do Pecado Original

J mesma forma como foi o todo de onde essa parte foi separada?
Nao sera isso confundir os atributos de espirito e materia, e
cxplicar o pecado como material? E nao eo pecado eminente-
mente espiritual e pessoal?

I 18. Que razoes estabelecem o carater mais satisfat6rio da


teoria federal da nos sa unidade com Addo?
1a. A teoria de que Adao foi nosso cabe~a federal pressup6e
o fato de que ele foi nosso cabe~a natural e nesse fato se ap6ia.
Ele era nosso cabec;;a natural antes de ser nosso cabec;;a federal.
Sem duvida ele foi feito nosso representante federal porque
era nosso progenitor natural e estava em circunstancias tais
que os seus atos nao podiam deixar de afetar os nossos destinos,
e porque a nossa natureza estava sendo provada (tipica, senao
essencialmente) nele. Portanto, tudo quanto de virtude que
segundo esta explica~ao se pode supor que contem o fato de
Adao ser nos so cabec;;a natural, tudo is so a teo ria federal retem.
za. Como ja mostramos, a alian~a foi urn ato da grac;;a
suprema de Deus para com Adao mesmo. E o foi mais ainda
para com os seus descendentes. Todas as criaturas morais de
Deus sao introduzidas na existencia em estado de integridade
moral que e real, mas instavel. E evidente que, quanto aos
homens e aos anjos, isso e verdadeiro e tambem equitativo. E
necessaria, pois, que passem por uma provac;;:ao limitada ou
ilimitada. Adao estava na condi~ao mais vantajosa possivel de
passar inc6lume por essa prova~ao limitada pela gra~a divina.
Parece, porem, que os seus descendentes nao poderiam pas-
sar por uma provac;;ao justa, a nao ser na pessoa de Adao. "S6
eram possiveis tres pianos: (1) Deus poderia ter deixado a ra~a
inteira em sua rela~ao natural para com Ele. (2) Cada indivi-
duo poderia ser sujeito a uma prova individual, sob uma ali-
anc;;a de obras proposta pela gra~a divina. (3) A ra~a como urn
todo poderia ser representada por algum termo limitado na
pessoa de seu cabe~a natural. Oprimeiro plano teria com certeza
tido como resultado o pecado universal. 0 segundo e o que os

505
Capitulo 21
pelagianos sup6em que foi adotado. 0 terceiro e, sem
compara~ao, o plano mais vantajoso para os homens." -
Syllabus (Sumario) do Dr. Robert L. Dabney. A prova~ao
separada das almas nascentes das crian~as nao era de certo
preferivel.
3a. Deus, decerto, como materia de fato, sujeitou Adao a
uma prova especial e temporariamente limitada, e fez-lhe uma
promessa de "Vida" eo amea~ou de "Morte". E esta mesma
pena, da qual ele foi amea~ado, em seu sentido geral e em seus
termos especiais (Gen. 2: 17; 3: 16-19) tern sido infligida a toda
a sua posteridade.
4a. Esta teoria e confirmada tambem pela anaiogia que as
Sagradas Escrituras afirmam existir entre a imputa~ao a nos
do pecado original de Adao e a imputa~ao a Cristo dos nossos
pecados e da Sua justi~a a nos. Isso mostra que a ra~a e uma
unidade com Adao e que os eleitos sao uma unidade com
Cristo. Esta analogia e por certo mais completa segundo a teoria
federativa da uniao intima entre Adao e a ra~a do que segundo
qualquer teoria que nao fa~a caso dessa uniao. Tanto a alian~a
da gra~a, que incluiu os eleitos, como a alian~a das obras, que
incluiu a ra~a, vieram da gra~a divina. Cristo, pelo amor que
nos teve, tornou-se voluntariamente o Cabe~a do Seu povo;
Adao, pela obediencia que devia a Deus, e por interesse e
dever, nao se recusou a tornar-se o cabe~a federal da ra~a
humana. Deus, por Sua gra~a, escolheu os eleitos pelo amor
que lhes tern, e tambem por Sua gra~a incluiu os descen-
dentes de Adao em sua representa~ao, como ato de beneficencia
para com eles.
Nao sera verdade que o que restar de misterioso nesta
doutrina perde-se nesse abismo aberto pelo Jato da permissao
para que entrasse opecado, diante do qual todas as diversas escolas
de tefstas deste lado do veu severn obrigados a prostrar-se em
silencio?

506
I
22

A Alian~a da Gra~a

Todas as quest6es que dizem respeito ao assunto geral da


reden<;ao pertencem a urn ou outro dos seguintes titulos:
1°. 0 plano da reden<;ao, incluindo a alian<;a da gra<;a e a
elei<;ao eterna, de que ja se tratou acima, no Cap. 11.
2°. A Pessoa e a Obra de Cristo na consecu<;ao da reden<;ao.
3°. A aplica<;ao e a consuma<;ao da reden<;ao pela opera<;ao
do Espirito Santo, junto com os meios da gra<;a divinamente
instituidos para esse fim.

A ALIAN(:A DA GRA(:A

E evidente-
1°. Que, sendo Deus uma inteligencia infinita, eterna e
imutavel, deve, desde o prindpio, ter formado urn plano
totalmente abrangente e imutavel, de tudo quanto iria fazer
no tempo, plano no qual deviam achar-se incluidas Suas obras
de Criac;ao, Providencia e Redenc;ao.
2°. U m plano forma do pelas tres Pessoas, e que, nas suas
diversas partes redprocas, devia ser distribuido entre Elas e
por Elas ser executado, como Aquele que enviou e Aquele
que foi enviado, como Dirigente e Mediador, como Executor
e Aplicador, deve necessariamente possuir todos os atributos
essenciais de uma alianc;a eterna entre essas Pessoas.
3°. Desde que Deus, em todos os diversos ramos do Seu
governo moral, trata o homem como urn ser moral, inteligente,
voluntario e responsavel, segue-se que a execuc;ao do plano da

507
Capitulo 22
reden~ao deve ser etica e nao magica em seu carater geral, deve
proceder pela revela~ao de verdades e pelas influencias de
motivos, eo plano deve ser apropriado voluntariamente por
aqueles que lhe estao sujeitos, como uma gra~a oferecida a eles,
e lhe devem obedecer como a urn dever imposto, sob pena de
reprova~ao. Dai se segue que a sua aplica~ao deve possuir todos
os atributos essenciais de uma alian~a feita no tempo entre
Deus e Seu povo.

1. Qual o uso da palavra berith nas Escrituras hebraicas?


Essa palavra encontra-se mais de duzentas e oitenta vezes
no Velho Testamento e e traduzida pelas palavrasalianfa, concerto
epacto.
E empregada para exprimir -
1°. Uma ordem natural estabelecida divinamente. A
alian~a de Deus como dia, com a noite, etc. Veja Jer. 33:20.
2°. A alian~a de urn homem com outro. }6natas com Davi
- 1 Sam. 18:3 e capitulo 20. Davie Abner - 2 Sam. 3:13.
3°. A alian~a que Deus fez com N oe quanto asua familia,
Gen. 6:18,19, quanto a ra~a humana, Gen. 9:9. Tomou-se o
arco-iris como urn sinal dessa alian~a- Gen. 9:13.
4°. A "Alian~a da Gra~a" feita com Abraao, Gen. 17:2-7,
que Paulo chama "a promessa", Gal. 3:17. Como sinal desta
alian~a foi es tabelecida a circuncisao - Gen. 17: 11; cf. A tos
7:8.
5°. A mesma alian~a, feita geralmente, com Abraao, Isaque
e Jac6- Ex. 2:24, etc.
6°. A mesma alian~a, com modifica~6es especiais e
temporarias de forma, constituindo a alian~a nacional-eclesi-
astica de Deus com o povo de Israel. A lei desta alian~a fo i
escrita por Moises, do seu lado legal, primeiro num livro ("o
livro do concerto" - Ex. 24:7), e depois sobre tabuas de pedra
("destas palavras tenho feito concerto contigo", "as palavras do
concerto, os dez mandamentos"), o Decalogo, depois deposi-
tado numa caixa de ouro, "a area do concerto" - Num. 10:33.

508
A Alianfa da Grafa
7°. A alian~a feita com Arao, de urn sacerd6cio eterno ou
perpetuo- Num. 25:12,13.
8°. A alian~a feita com Davi- Jer. 33:21,22; Sal. 89:4,5.

2. Qual o uso da palavra diatheke no Novo Testamento?


Essa palavra acha-se trinta e tres vezes no Novo Testa-
mento, e e quase sempre traduzida por concerto ou alianfa
quando se refere a qualquer ato divino em rela~ao a igreja
antiga, e por testamento quando se refere a urn ato divino em
rel a~ao a igreja sob a dispensa~ao evangelica. Seu sentido
fundamental eo de dispor, arranjar; nos ch'issicos essa forma
especifica de arranjar ou dispor refere-se ao ato de fazer urn
testamento; este sentido, porem, a palavra tern propriamente
numa s6 passagem do Novo Testamento, a saber, em Heb.
9: 16,17. Apesar de nunca ser empregada para designar a alian~a
eterna da gra~a que o Pai fez com o Filho como o segundo
Adao em favor do Seu povo, contudo, designa sempre ou a
antiga ou a nova dispensa~ao, isto e, o modo de administrar
essa alians;a inalteravel ou en tao alguma alian~a especial feita
por Cristo com Seu povo mediante a administras;ao da alian~a
da gra~a, como, por exemplo, as alian~as feitas com Abraao e
com Davi.
Assim, a disposi~ao feita por Deus com a igreja antiga por
meio de Moises, a diatheke antiga, contrastada no Novo
Testamento com a nova- Gal. 4:24; Heb. 8:8, foi realmente
uma alian~a, tanto civil como religiosa, feita entre Jeova (lave)
e os israelitas; ao mesmo tempo, tanto no seu elemento legal,
que, "por causa das transgress6es foi posto, ate que viesse a
semente, a quem havia sido feita a promessa", como tambem
no seu elemento simb6lico e tfpico ensinando verdades a
respeito de Cristo, era, em sentido mais exaltado, uma
di spensa~ao ou urn modo de administrar a alian~a da gra~a.
Assim tam bern a dispensa~ao evangelica atual introduzida por
Cristo, que toma a forma de uma alian~a entre Ele e Seu povo,
in cluindo muitas promessas pela gra~a, dependendo de

509
Capitulo 22

condi~6es, e, contudo, no seu aspecto rnais exaltado, esse modo


de adrninistrar a alian~a inaltenivel da gra~a que e charnada
"dispensa~ao novae rnelhor", ern contraste corn a cornparativa-
rnente irnperfeita "dispensa~ao antiga e prirneira" dessa rnesrna
alian~a. Veja 2 Cor.3:14; Heb. 8:6,8-10; 9:15; Gal. 4:24.
A dispensa~ao atual da alian~a da gra~a por rneio do nosso
Salvador tern, evidenternente, nurn aspecto, grande analogia
corn urna disposi~ao testarnentaria, porque dispensa ben~aos
que s6 depois poderiarn ser plenarnente gozadas, e por rneio
da Sua rnorte. Por conseguinte, a palavradiatheke e em pre gada
nurna (mica passagern para designar a dispensa~ao atual da
alian~a da gra~a neste seu interessante aspecto- Heb. 9:16,17.
Contudo, desde que as diversas dispensa~6es dessa alian~a
eterna sao sempre representadas nos outros lugares das
Escrituras sob a forma de alian~as especiais administrativas, e
nao sob a forma de testamentos, e para larnentar que essa palavra
grega seja tantas vezes traduzida _pela palavra espedfica de
testamento, em vez de alian~a, ou da palavra mais geral, que e
dispensa~ao.* Veja 2 Cor. 3:6, 14; Gal. 3:15; Heb. 7:22; 12 :24;
13:20.

3. Quais sao as tres opinioes sustentadas pelos calvinistas, a


respeito das partes componentes da alianfa da grafa?
N estas diferen~as nao se acha envolvida de modo algum a
verdade de qualquer doutrina ensinada nas Escrituras, mas
elas dizem respeito sornente a forma pela qual essa verdade
pode ser apresentada com maior ou menor clareza.
1a. A primeira opiniao diz respeito aalian~a da gra~a como
feita por Deus com pecadores eleitos, prometendo Deus salvar
os pecadores como tais sob a condi~ao da fe, e prometendo
eles, quando convertidos, crer e obedecer. Segundo esta

*As versoes e as edi~oes modernas da Biblia em geral tern corrigido esse


engano de uma forma ou de outra. Nota de Odayr Olivetti.

510
opiniao, Cristo nao euma das partes da alianc.;:a, e e, sim, o seu
Mediador a favor dos Seus eleitos, e seu Fiador; isto e, Ele
garante que todas as condic.;:6es exigidas dos eleitos serao
cumpridas por eles mediante a grac.;:a divina.
2a. Conforme a segunda opiniao, houve duas alianc.;:as, das
quais a primeira, chamada alianc.;:a da redenc.;:ao, foi feita desde
toda a eternidade entre o Pai eo Filho como partes. Nela o
Filho prometeu obedecer e sofrer, e o Pai prometeu dar-lhe
urn povo e conceder a este, no Filho, todas as benc.;:aos espiri-
tuais e a vida eterna. A segunda, chamada alianc.;:a da grac.;:a, e
feita por Deus com os eleitos como partes, sendo Cristo o
Mediador e o Fiador a favor do Seu povo.
3a. Falando as Escrituras em dois Adaos, dos quais urn
representa a rac.;:a inteira na economia da natureza, eo outro o
corpo inteiro dos eleitos numa economia baseada na grac.;:a,
parece mais simples considerar como o fundamento de todo o
proceder de Deus em relac.;:ao aos homens, somente as duas
alianc.;:as contrastadas, das obras e da grac.;:a. A primeira destas,
feita por Deus no jardim do Eden com Adao como cabec.;:a e
representante federal de toda a sua posteridade. Das promessas,
condic,;:6es, penas e resultados dessa alianc.;:a ja falei sob titulo
anterior (veja o Capitulo 17). A segunda, ou seja, a alianc.;:a da
grac.;:a, feita nos conselhos da eternidade entre o Pai eo Filho
como partes contratantes. Segundo esta opiniao, o Filho entrou
nesta alianc.;:a na qualidade de segundo Adao, representou todo
o Seu povo como seu Mediador e Fiador, assumiu o seu lugar
e tomou sobre Si todas as obrigac,;:6es que eles tinham debaixo
da alianc.;:a das obras, violada, e tomou sobre Si o aplicar-lhes
todos os beneficios alcanc.;:ados por esta eterna alianc.;:a da grac.;:a
e fazer com que eles cumprissem todos os deveres envolvidos
nesta mesma alianc.;:a. Assim, pois, sob urn aspecto, esta alianc.;:a
pode ser considerada como se fosse feita pela cabec,;:a para a
salvac.;:ao dos membros, e, sob outro, como se fosse feito com os
membros em sua cabec.;:a e seu abonador. Porque aquila que e
uma grac.;:a vinda de Deus e para n6s urn clever, como ora

511
Capitulo 22

Agostinho: "Da quodjubes, etjubes quod vis"; e dai resulta esta


complexa ideia da alians;a.

Aos olhos de Deus, todo homem do mundo esta como
que contemplado numa ou noutra destas grandes alians;as, ou
das obras ou da gras;a. Devemos estar lembrados, porem, de
que nas diferentes dispensas;oes, ou modos de administrar a
eterna alians;a da gras;a, Cristo contratou com Seu povo diversas
alians;as especiais, como provisoes administrativas para levar
a efeito os compromissos e para aplicar-lhe os beneficios de
Sua propria alians;a como Pai. Houve assim a alians;a feita por
Jeova (lave) (a segunda Pessoa, veja acima, Cap. 9, Per g. 14)
com Noe, o segundo cabes;a natural da ras;a hurhana, Gen.
9:11,15; a alians;a feita com Abraao, o creme tipico, tendo o
sinal e selo visivel da circuncisao, e sendo fundada assim a
Igreja visivel como urn agregado de familias. Esta alians;a
continua ate o dia de hoje a sera carta constitucional da Igreja
visivel, e as ordenans;as do Batismo e da Ceia do Senhor, que
agora lhe sao anexos, significam e selam para os crentes os
beneficios da alians;a da gras;a, a saber, a vida eterna, o
arrependimento, a obediencia etc., da parte de Deus, como ~·
coisas prometidas; da nossa parte, porem, como coisas que sao
do nosso dever, isto e, ate onde devem ser feitas por nos -
com pare Gen. 17:9-13 com Gal. 3: 15-17. A alians;a nacional J

feita com os judeus, que constituiam entao a Igreja visivel,


Ex. 34:27; a alians;a feita com Davi, tipo de Cristo como Rei
mediatario, 2 Sam. 7: 15,16; 2 Cron. 7:18. As ofertas universais
do evangelho durante a dispensas;ao atual sao tambem
apresentadas sob a forma de uma alians;a. A salvas;ao e ofere-
cida a todos sob a condis;ao da fe, mas a fe e dom de Deus,
adquirido por Cristo para os eleitos e a esses prometido e por
eles exercido quando 1hes e dado. Todo crente, quando chega
ao conhecimento de Deus, faz alians;a com Ele e a renova em
todos os atos de fee oras;ao. Mas todas e cada uma destas alians;as
especiais sao provisoes para a administras;ao da eterna alians;a
da gras;a, e 0 seu unico designio e COIDUnicar OS beneficios que

512
asseguram aqueles a quem pertencem.
Para as exposis;6es de nossos livros simb61icos (nossos
simbolos de fe) sabre este assunto, comparem-se a Confzssiio de
Fe, cap.7, ses;ao 3, como Catecismo Maior, Pergs. 30-36.

4. Como se pode provar pelas Escrituras que realmente foi


formada na eternidade uma "alianfa da grafa" entre as Pessoas
Divinas, em que "o Filho" representou os eleitos?
1°. Como se mostrou no principia deste capitulo, seme-
lhante alians;a se acha virtualmente implicita na exisH~ncia de
urn plano eterno de salvas;ao formado mutuamente por tres
Pessoas pelas quais deveria ser executado.
2°. Que Cristo representou os Seus eleitos nessa alians;a
esta necessariamente implicito na doutrina da soberana eleis;ao
pessoal para a gras;a e a salvas;ao. A respeito de Suas ovelhas,
diz Cristo: "Eram teus, e tu mos deste", e "Tenho guardado
aqueles que tu me deste, e nenhum deles se perdeu" - J oao
17:6,12.
3°. As Escrituras afirmam a existencia da promessa e das
condis;6es de semelhante alian<;:a e as apresentam juntas- Is.
53:10,11.
4°. As Escrituras afirmam expressamente a existencia de
semelhante alians;a- Sal. 89:4; Is. 42:6.
5°. Cristo se refere constantemente a uma comissao previa
que recebera de Seu Pai- Joao 10:18; Luc. 22:29. ..
6°. Cristo pede a recompensa, tendo Ele cumprido essa
comissao- Joao 17:4.
7°. Cristo assevera constantemente que Seu povo e a gloria
esperada Lhe sao dados por Seu Pai como recompensa- J oao
17:6,9,24; Fil. 2:6-11.

5. Quais foram as partes contratantes desta alianfa da grafa?


Quais suas promessas ou condifoes da parte do Pai? E quais as
suas condifoes da parte do Filho?
1°. As partes contratantes foram o Pai, representando a

513
Capitulo 22

Deidade integralmente em Sua soberania indivisivel, e por


outro lado, Deus o Filho, como o Mediador, representando
to do o Seu povo elei to e, como administrador da alian<;;a,
fazendo-Se seu Fiador pelo cumprimento de todos os deveres
envolvidos da parte deles.
2°. As condi<;;6es as quais o Paise impos foram, (1) toda a
prepara<;;ao necessaria, Heb. 10:5; Is. 42:1-7; (2) apoio a Sua
obra, Luc. 22:43; (3) uma recompensa gloriosa, primeiro
consistindo na Sua Pessoa teantr6pica, "o nome que esta acima
de to do nome", Fil. 2:6-11 (ARA), e o dominio uni versa!
entregue a Ele como o Mediador, Joao 5:22; Sal. 110:1; e a
entrega em Suas maos da administra<;;ao de todas as provisoes
da ahanfa da graf.a a favor do Seu povo, Mat. 28: J 8; Joao J: J 2;
7:39; 17:2; Atos 2:33; e, ern segundo lugar, a salva<;;ao de todos
aqueles pelos quais fez a alian<;;a, incluindo as provisoes para a
regenera<;;ao, a justifica<;;ao, a perseveran<;;a e a gloria- Ti to 1:2;
Jer. 31 :33; 32:40; Is. 35: 10; 53:10,11 (Dick,Lect. on Theol., vol.
1, pags. 506-509).
3°. As condi<;;6es a serem cumpridas pelo Filho foram, (1)
que encarnasse, nascesse de mulher, nascesse debaixo da lei,
Gal. 4:4,5; (2) que assumisse e cumprisse perfeitamente, por
Seus eleitos, todas as condic;6es violadas e todas as penas
impostas pela alianc;a das obras e nas quais eles incorreram,
Mat. 5:17,18; o que Ele devia fazer,primeiro, prestando uma
obediencia perfeita aos preceitos da Lei, Sal. 40:8; Is. 42:21;
Joao 9:4,5; 8:29; Mat. 18: 17; e,emsegundo lugar, sofrendo toda
a penalidade em que Seu povo incorreu por seus pecados -
Is. cap. 53; 2 Cor. 5:21; Gal. 3:13; Ef. 5:2.

6. Em que sentido seafirma que Cristo eo Mediador da alianfa


da grafa?
1°. Como o unico Mediador entre Deus eo homem, Ele 0
contratou.
2°. Como Mediador, Ele cum pre todas as condi<;;6es
previstas na alian<;;a ern favor do Seu povo.

514
A Alianfa da Grafa

3°. Como Mediad or, Ele administra a alian~a e dis pen sa


todas as Suas ben~aos.
4°. Em tudo isso Cristo nao foi urn mero internuncio
mediatario, expressao aplicavel a Moises - Gal. 3:19, mas foi
Mediador ( 1) plenipotenciario - Mat. 28: 18, e (2) Sumo
Sacerdote, realmente efetuando reconcilia~ao por sacrificio
-Rom. 3:25.
5°. A frasemesites diathekes, mediadorda alianfa, e aplicada
tres vezes a Cristo no Novo Testamento- He b. 8:6; 9: 15; 12:24;
mas, como em cada um desses casos a palavra que significa
alian~a e qualificada pelo adjetivo "novo" ou "melhor", e evi-
dente que nao e empregada nesses casos para designar a alian~a
da gra~a propriamente dita, e sim a nova dispensa~ao dessa
alian~a que Cristo introduziu em Sua propria Pessoa em
contraste com a menos perfeita administra~ao dela que foi
introduzida instrumentalmente por Moises.
Na administra~ao geral da alian~a da gra~a, Cristo age
como Mediador sacerdotal desde a funda~ao do mundo- Apoc.
13:8. Por outro lado, porem, a primeira ou "antiga dispensa~ao"
ou modo especial de administrar essa alian~a visivelmente
entre OS homens, 0 era instrumentalmente e, quanto aforma,
era ordenada por anjos na mao de urn mediador, que foi Moises
(Gal. 3: 19). Eprecisamente em distin~ao desta rela~ao mantida
por Moises com a revela~ao externa dessas institui~6es
simbolicas e tipicas, por meio das quais era en tao administrada
a alian~a da gra~a, que se declara que a excelencia superior da
administra~ao "nova" e "melhor" consiste em que Cristo, o
"Filho em sua propria casa", descobre-se agora visivelmente
como o verdadeiro Mediador na administra~ao espiritual e
pessoal da Sua alian~a. Por isso, Aquele que desde o principio
fora "o unico mediador entre Deus e OS homens" (1 Tim. 2:5)
e revelado agora, como por via de eminencia; o Mediador e
Fiador dessa alian~a eterna sob sua dispensa~ao "nova" e
"melhor", porque agora Ele e tornado visivel na plenitude de
Suas gra~as espirituais como o administrador imediato dessa

515
Capitulo22
alian~a,enquanto que sob a "primeira" e "antiga" ou "velha"
dispensa~ao Ele estava oculto. Veja Comm. on Hebrews, de
Sampson.
6°. Como Mediador Cristo obriga-Se tambem a dar a Seu
povo a fe, o arrependimento e todas as gra~as, e garante por
eles que da sua parte exercerao a fe, arrepender-se-ao e
cumprirao todos os seus deveres.

7. Em que sentido Cristo e chamado Fiador da alianfa da


grafa?
No unico caso em que o termo fiador e aplicado a Cristo
no Novo Testamento (Heb. 7:22), "Jesus se tern tornado fiador
de superior alian~a" (ARA), a palavra traduzida por "testa-
mento" (modernamente traduzida par "alian~a") significa
evidentemente a nova dispensa~ao da alian~a da gra~a, em
contraste com a antiga. Paulo esta contrastando o sacerd6cio
de Cristo com o dos levitas. Cristo e Sacerdote ou Fiador
segundo uma ordem superior, sob lima revela~ao mais clara e
uma administra~ao mais real e mais direta da gra~a do que era
o caso com os sacerdotes tipicos, descendentes de Arao. Cristo
e nosso Fiador ao mesmo tempo como Sacerdote e como Rei.
Como Sacerdote porque, como tal, Ele toma sabre Si e cum pre
todas as nossas obriga~oes sob a transgredida alian~a das a bras.
Como Rei (OS do is oficios sao inseparaveis nEle; Ele e sempre
urn Sacerdote real), porque, como tal, Ele administra a Seu
povo as ben~aos da Sua alian~a, para este fim entra em alian~a
com eles, oferece-lhes gra~a sob as condi~oes de fee obediencia,
e en tao, como seu Fiador, da-lhes as gra~as da fee da obediencia
para que eles cumpram a sua parte.

8. Que metoda geral caracteriza o modo pelo qual Cristo


administra a Sua alianfa sob todas as dispensafoes?
Os beneficios adquiridos pela alian~a estao postos nas maos
de Cristo para serem concedidos a Seu povo como dadivas
gratui tas e soberanas. Da parte de Cristo sao dadivas, da nos sa
parte, porem, para com Ele, muitos deles sao deveres. Assim,
na administrac;ao da alianc;a da grac;a, muitas dessas benc;aos
adquiridas, e que devem tornar-se efetivas por atos nossos,
como, por exemplo, a fe, etc., Ele exige de n6s como deveres, e
promete outros beneficios como uma recompensa que tern por
condic_;ao a nossa obediencia. Pode-se dizer, pois, que Ele
recompensa a grac;a com grac;a, e faz da grac;a uma condic;ao da
grac;a. Promete a fe a Seus eleitos e en tao opera neles a fe, e em
seguida da-lhes em recompensa a sua fe a paz de consciencia, a
alegria no Espirito Santo, a vida eterna, etc.

9. Qual a ideia arminiana da alianfa da grafa?


Os arminianos sustentam:
1°. Quanto as partes da alianc;a da grac;a, que Deus a oferece
a todos, e que firma contrato realmente com todos os crentes.
2°. Quanto as suas promessas, que estas incluem todos os
beneficios temporais e eternos da redenc;ao realizada por Cristo.
3°. Quanto as suas condic_;6es, que Deus agora aceita, por
Sua grac;a, a fe e a obediencia evangelica como justic;a, em vez
de aceitar como tal somente essa perfeita obediencia legal que
Ele exigiu do homem sob a alianc;a das obras, a obra merit6ria
de Cristo tendo tornado compativel com os prindpios c1a justic;a
divina que Ele fac;a isso. Eles ensinam que todos 's homens
recebem grac;a suficiente para torna-los capazes de cumprirem
tais condic_;6es, se quiserem.

10. Em que sentido pode-se chamar a fi uma condifiio da


salvafiio?
A fee uma condic_;aosine qua non da salvac;ao; isto e, nenhum
adulto pode ser salvo se nao crer, e todo homem que ere sera
salvo. Ela e, porem, uma dadiva que vern de Deus, e e a
primeira parte ou o primeiro passo da salvac;ao. Vista do lado
divino, ela eo principio eo indice da obra salvadora de Deus
em nos. Vista do lado humano, ela e urn dever da nossa parte e
e urn ato nosso. Como a to nosso, ela e, portanto, o meio que

517
Capitulo 22
nos une a Cristo e, assim, eo antecedente necessaria, mas nunca
,
a causa merecedora da salva~ao gratuita que se segue. A fe,
como condi~ao, e naturalmente fe viva, que necessariamente
produz "confissao" e obediencia.

11. Quais sao as promessas que Cristo, como o Administrador


da afianfa, jaz a todos OS que creem? ~
A promessa feita por Deus a Abraao de que seria o seu
Deus eo da sua posteridade depois dele (Gen. 17:7) abrange
todas as demais. Todas as coisas, tanto fisicas como morais, na
providencia e na gra<;a, para o tempo e para a eternidade,
contribuirao, segundo as promessas, para o nosso bern. "Tudo
e vosso, e v6s de Cristo, e Cristo de Deus"- 1 Cor. 3:22,23.
Esta alian~a do evangelho e muitas vezes chamada "alian~a
da reden~ao". Veja acima, Pergunta 3, § 2. "Quem crer e for
batizado sera salvo; mas quem nao crer sera condenado"- Mar.
16:16. ><;:I ~

12. Como se pode provar que Cristo era o Mediador dos


homens tanto antes como depois do Seu advento em carne?
1°. Como Mediador Ele e tanto Sacerdote como Sacrificio,
e como tal temos a afirma<;iio de que Ele eo "Cordeiro que foi
morto desde a funda<;iio do mundo", e de que Ele e a vftima
"para que, intervindo a morte para remissao das transgress6es
que havia debaixo da primeira alian<;a, os chamados recebam
a heran~a eterna"- Apoc. 13:8; Rom. 3:24; Heb. 9:15.
2°. Foi prometido a Adao- Gen. 3:15. ~
3°. No capftulo 3 da Epfstola aos Galatas Paulo prova que
a promessa fei ta a Abraao (Gen. 17:7; 22: 18) e o mesmfssimo
evangelho que o ap6stolo mesmo pregava. Assim Abraao
tornou-se 0 pai dos que creem.
4°. Em Atos 10:43 lemos: ''A este dao testemunho todos
os profetas, de que todos os que nele creem receberao o perdao
dos pecados pelo seu nome". Veja tambem Is. cap. 53, todo o
capftulo, e 42:6.

518
5°. As institui~6es cerimoniais de Moises eram simbolos
e tipos da obra realizada por Cristo; como simbolos, elas
figuravam para os antigos, e para a sua salva~ao, os mereci-
mentos e a gra~a de Cristo; e como tipos, elas profetizavam a
substancia daqui1o que haveria de vir - Heb. 10: 1-10; Col.
2:17.
6°. Cristo eo Jeova (lave) da antiga dispensa~ao. Veja
acima, Cap. 9, Perg. 14.

13. Como se prova que a je era a condifiiO da salvafiio antes


da vinda de Cristo, no mesmo sentido em que o i agora?
1°. Isso e afirmado no Velho Testamento- Hab. 2:4; Sal.
2:12.
2°. Os escritores do Novo Testamento e1ucidam sua
doutrina da justifica~ao pela fe como exemplo de cremes do
Velho Testamento. Veja Rom. cap. 4 e Heb. cap. 11.

14. Como se pode demonstrar que Cristo, como o Administrador


da alianfa da grafa,fez aos membros da Igreja do Velho Testamento
as mesmas promessas que Ele nos faz?
1°. As promessas feitas ao antigo povo de Cristo abrangem
claramente todas as ben~aos espirituais e eternas; por exemp1o,
a promessa feita a Abraao, Gen. 17:7, e explicada por Cristo,
Mat. 22:32, e a promessa feita a Abraao, Gen. 22: 18; 12:3, e
explicada por Paulo, Gal. 3:16. Veja tambem Sal. 73:25; Ez.
36:27; Dan. 12:2,3.
2°. Tambem deixam clara essa verdade as expectativas e as
ora~6es do povo de Deus- Salmos 51 e 16; J6 30:24-27; Sal.
73:24-26.

15. Como foi administrada a alianfa da grafa do tempo de


Adiio ao de Abraiio?
1°. Por promessa. . '. -_ ..t -· ·
2°. Por meio de sacriffcios tipicos instituidos na familia
de Adao.

519
Capitulo 22 '
3°. Por meio de revela<;;6es imediatas e manifesta<;;6es
pessoais de Jeova (lave) ou do Mediador divino. Assim "o
Senhor" e representado nos onze primeiros capftulos de
Genesis como "falando" aos homens. Que essas promessas e
sacriffcios eram entendidos em sua verdadeira significas:ao
espiritual fica provado pelo que se le em Heb. 11 :4-7. E que
essa administra<;;ao da alianc;a da grac;a estendeu-se a muitos
povos da terra durante esse periodo fica provado pela hist6ria
de J 6, na Arabia, de Abraao, na Mesopotamia, e de Melquise-
deque, em Canaa.

16. Como foi ela administrada desde as dias de Abraao ate


aos de Moises?
1°. A promessa feita durante o periodo anterior (Gen. 3: 15)
foi revelada na forma de uma alianc;a mais definida, revelando
que o Salvador prometido deveria vir da linhagem de Abraao
e Isaque, e foi exposto mais plenamente o fato de que o mundo
inteiro estava interessado na salvac;ao que ele haveria de receber
Gen.17:7; 22:18. Este foi o evangelho anunciado primeiro
-GaL 3:8.
2°. Os sacrificios continuaram do mesmo modo.
3°. A lgreja, ou seja, a congregac;ao de cremes, que existira
desde o principia nos seus membros individuais, foi entao
formada numa congregac;ao geral como urn agregado de
familias, pela instituic;ao da circuncisao, como urn sfmbolo
visivel dos beneficios da alian<;:a da grac;a, e como urn sinal de
que se pertence algreja.

17. Quale a verdadeira natureza da alianfa feita par Deus


com as israelitas par meio de Moises?
Podemos considera-la sob tres aspectos- ~
1°. Como urn pacto nacional e politico, pelo qual os
israelitas, num sentido politico, tornaram-se o povo de Deus,
reconheceram-se sob o Seu governo teocratico, e tornando-se
Ele, neste sentido peculiar, o seu Deus. Sob um aspecto, o

520
sistema todo tinha referencia a essa rela<;:ao. ·1 •
2°. Sob outro aspecto, foi urn pacto legal, porque a lei
moral, obediencia aqual foi a condi<;:ao imposta na alian<;:a das
obras, figurou nele proeminentemente, e conformidade a essa
lei foi imposta como a condic;ao de gozarem os israelitas do
favor divino e de todas as benc;aos nacionais. Mesmo o sistema
cerirnonial, no seu aspecto rneramente literal, e sern referencia
a seu aspecto simb61ico, foi tambern uma regrade obras; porque
"maldito aquele que nao confirmar as palavras desta lei, nao
as cumprindo"- Deut. 27:26.
3°. Na significa<;:ao simb6lica e tipica de todas as insti-
tui<;:6es mosaicas, elas foram uma revela<;:ao mais clara e mais
completa do que nenhuma anterior, das provisoes da alian~a
da gra<;:a. Isso e cornprovado abundantemente por toda a
Epistola aos Hebreus. Veja Hodge on Romans (Hodge sobre
Romanos).

18. Quais as diferenfas caracteristicas existentes entre a


dispensafiiO da alianfa da grafa debaixo da lei de Moises e depois
da vinda de Cristo?
E evidente que essas diferenc;as se referem somente aos
modos da administra<;;ao, e nao amateria das verdades reveladas,
nern da gra<;;a adrninistrada.
1°. Antes da vinda de Cristo, a verdade era ensinada por
meio de sfmbolos que eram ao mesmo tempo tipos da
propicia<;;ao real pelo pecado que se deveria fazer depois. Agora
a verdade e revelada na clara hist6ria evangelica.
2°. Essa revela<;;ao era menos completa e tambem menos
clara.
3°. Estava embara<;;ada com tantas cerimonias que era uma
dispensa<;;ao comparativamente carnal. A dispensa<;;ao atual e
espiritual.
4°. Estava limitada a urn s6 povo. A dispensa<;;ao atual,
livre de todas as organiza<;;6es nacionais, abrange o mundo
inteiro.

521
Capitulo 22

5°. E evidente que o modo anterior de administra~ao foi


preparat6rio para 0 atual, que e 0 modo final. ~
Quanto as opini6es calvinistas sobre a alian~a da gra~a,
veja Turretino,Jnst. Theo. Blench., Loc. 12; Witsio,A?con. of the
Covs. Quanto as arminianas, veja as obras de Fletcher elnst. of
Theo., de Ricardo Watson.
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A Pessoa de Cristo

1. Como se pode provar que ja veio o Messias prometido nas


Escrituras judaicas, e que Jesus Cristo eessa Pessoa?
Provamos anteriormente que Ele ja veio, mostrando que
as condi~6es da epoca e as circunstancias que, segundo as
declara~6es profeticas haveriam de assinalar o Seu advento,
nao sao mais possiveis. Provamos, em segundo lugar, que Jesus
de Nazare foi essa Pessoa, mostrando que todas aquelas
condi~6es foram cumpridas nEle.

2. Como se pode mostrar que Gen. 4: 10 se refere ao Messias,


e como essa passagem prova que o Messias ja veio?
A palavra traduzida por Shilo (Figueiredo) Silo (Almeida),
"aquele que deve ser enviado", significa paz e e aplicada ao
Messias - Cf. Miq. 5:2,5 com Mat. 2:6. Alem disso, e s6 o
Messias que foi "a expecta~ao das gentes", ou a quem serao
congregadas as gentes ou na~6es. Veja Is. 55:5; 60:3; Ag. 2:7.
Alem disso, os judeus sempre entenderam a passagem como
se referindo ao Messias.
Ate ao nascimento de Jesus Cristo, Juda retinha o cetro e
tinha legislador, ou, como diz Figueiredo, General; mas na
destrui~ao de Jerusalem, seten ta anos depois, Juda perdeu to do
o poder politico. Se, pois, o Messias nao tivesse vindo antes
dessa catastrofe, a profecia seria falsa. . , , . ,,

3. E quanta aprofecia de Daniel 9:24-27? _, ; _.· .·

523
Capitulo23
Essa profecia refere-se explicitamente ao Messias e a Sua
obra peculiar e exclusiva. Que as setenta semanas mencionadas
aqui devem ser interpretadas como semanas de anos, e certo,
1°. Porque era costume judaico dividir assim o tempo; 2°.
Porque eo uso comum nos livros profeticos. Veja Ez. 4:6; Apoc.
12:6; 13:5; e 3°. Porque a interpreta~ao literal das palavras,
como setenta semanas, e impraticavel. ~
A profecia e que em sete semanas de anos, ou em quarenta
e nove anos depois de findo o cativeiro, a cidade seria reedifi-
cada; que em sessenta e duas semanas de anos, ou quatrocentos
e trinta e quatro anos depois de reedificada a cidade, apareceria
o Messias; que Ele, durante o periodo de uma semana de anos,
confirmaria a alian~a, e que, no meio da semana, seria cortado.
Ha alguma duvida quanto a data exata da qual se deve
come~ar calcular; mas a maior diferen~a nao e mais de dez
anos, e a data mais provavel faz a profecia coincidir exatamente
com a hist6ria de Cristo.

4. Quais as profecias sabre a data, o Iugar e as circunstancias


do nascimento do Messias, que foram cumpridas em Jesus de Nazare?
Quanto a data, foi predito que Ele viria antes que se tirasse
o cetro de Juda (Gen. 49: 10), no fim de quatrocentos e noventa
anos depois de sair o edito mandando reedificar Jerusalem e
enquanto existia ainda o segundo templo- Ag. 2:9; Mal. 3:1.
Quanto ao lugar e as circunstancias, devia nascer em
Belem (Miq. 5:2) da tribo de Juda e da familia de Davi (Jer.
23:5,6). Devia nascer de uma virgem (Is. 7: 14) e ser precedido
de urn precursor (Mal. 3: 1). Tudo isso cumpriu-se em Jesus
Cristo, e nunca mais se poderia cumprir em outrem porque
todas as genealogias de familias e tribos se perderam.

5. Quais caracteristicas notaveis, descritas no Velho Testamento,


verificaram-se em nosso Salvador?
Ele deveria ser Rei e Conquistador de urn imperio univer-
sal (Sal. 2:6 e 45; Is. 9:6,7), e, ao mesmo tempo, ser "objeto de

524
A Pessoa de Cristo
desprezo e o ultimo dos hom ens, urn varao de do res", e ser
"cortado da terra dos viventes" - Is. cap. 53 (Figueiredo).
Deveria ser uma luz para os gentios e sob a Sua administra~ao
deveria mudar-se a condi~ao moral do mundo inteiro- Is.
42:6; 49:6; 60:1-7. Sua morte deveria ser expiat6ria- Is.
53:5,9,12. Ele deveria entrar na cidade montado num
jumentinho - Zac. 9:9, e ser vendido por trinta moedas de
prata.- Zac. 11:12,13. Suas vestes deveriam ser repartidas por
sorteio.- Sal. 22:19. Deveriam dar-lhe vinagre a heber- Sal.
49:22. As pr6prias palavras que deveria pronunciar na cruz
foram preditas- Sal. 22:2. Poi predito tambem que Ele seria
traspassado, Zac. 12:10, e que a Sua morte e a Sua sepultura
seriam com os impios e com os ricos- Is. 53:9. VejaEvidences
of Christianity (Evidencias do Cristianismo ), do Dr. Alexander.

6. Que obra peculiar o Messias deveria realizar e que foi


realizada par Cristo?
Todos os Seus oficios mediatarios foram substancialmente
preditos. Ele deveria realizar a obra de urn profeta (Is. 42:6;
9: 3) e a de urn sacerdote (Is. 53:1 0), para fazer expia~ao pelo
pecado (Dan. 9:24). Como Rei, deveria administrar as diversas
dispensa~6es do Seu reino, pondo termo a uma e introduzindo
outra, selando as vis6es e as profecias, fazendo cessar os
sacrificios e obla~6es (Dan. 9:24), e fundando urn reino que
nunca teria fim (Dan. 2:44).

7. Cinco pontos envolvidos na doutrina da lgreja quanta a


Pessoa de Cristo:
1o. Jesus de Nazare e verdadeiro Deus, possuindo a
natureza divina e todos os atributos essenciais da Deidade.
2°. E tambem verdadeiro homem, sendo a sua natureza
humana derivada por gera~ao (comum) do tronco de Adao.
3°. Estas duas naturezas continuam unidas em Sua Pessoa,
mas sempre sendo verdadeira divindade e verdadeira huma-
nidade, sem mistura nem mudan~a quanto aessen cia, de modo

525
Capitulo 23
que Cristo possui ao mesmo tempo, na unidade da Sua Pessoa,
dois espfritos, com todos os seus atributos essenciais, a
consciencia, a mente, os sentimentos e a vontade humanos, e a
consciencia, a mente, os sentimentos e a vontade divinos.
CGemina substancia, gem ina mens, gem ina sapientia robur et virtus"
- Admonitia Neostadtiensis, 1581, da qual Ursinus foi o au tor
principal). Mas nao convem que procuremos explicar a
maneira pela qual os dois espiritos afetam mutuamente urn ao
outro, nem ate onde eles se unem numa s6 consciencia, nem
como as duas vontades cooperam numa s6 atividade na uniao
da Pessoa (mica.
4°. Nao obstante isso, eles, unidos assim, constituem uma
s6 Pessoa, e a esta (mica Pessoa pertencem os atributos das duas
naturezas.
5°. Esta Personalidade nao e personalidade nova consti-
tuida pela uniao das duas naturezas no ventre da virgem, mas
e a Pessoa eterna e imunivel dologos,_a qual no tempo assumiu
uma nascente natureza humana e sempre depois abrange a
natureza humana com a divina na Personalidade que pertence
eternamente adivina.

8. Como se pode provar que Cristo erealmente homem?


E chamado homem -1 Tim. 2:5. Seu titulo mais comum
e "o Filho do homem", Mat. 13:37; tambem posteridade ou
descendencia (semente) da mulher, Gen. 3:15, de Abraao, Atos
3:25; Filho de Davi, e fruto dos seus lombos, Luc. 1:32; Atos
2:30; feito de mulher, Gal. 4:4. Ele tinha urn corpo, comia,
bebia, dormia, crescia em estatura (idade), Luc. 2:52, e durante
uma vida de trinta e tres anos era reconhecido por todos como
urn verdadeiro homem. Morreu em agonia na cruz, foi
sepultado, e provou a Sua identidade por meio de sinais fisicos
- Luc. 24:36-44. Tinha urn a alma racional, dado que Ele crescia
em sabedoria. Tinha os sentimentos comuns da nossa natureza,
visto que Ele "moveu-se muito em espirito", perturbou-Se e
chorou - Joao 11:33,35. Ele amava Marta, Maria, Lazaro eo

526
A Pessoa de Cristo
disdpulo que estavarecostado em Seupeito- Joao 11 :5; 13:23.
A absoluta deidade de Cristo ja foi provada acima, Cap.9.

9. Como se pode provar que as duas naturezas em Cristo


constituiam somente uma Pessoa?
Em muitas passagens e feita referencia as duas naturezas,
quando e evidente que a referencia e a uma s6 Pessoa - Fil.
2:6-11. Noutras muitas passagens fala-se nas duas naturezas
como unidas. Nunca se diz que a deidade abstratamente, ou
que urn poder divino, fosse reunido ou manifestado numa
natureza humana, mas o que se diz concretamente da natureza
divina e que uma Pessoa divina foi unida a uma natureza
humana- Heb. 2:11-14; 1 Tim. 3:16; Gal. 4:4; Rom. 8:3 e
1:3,4; Joao 1: 14; 1 Joao 4:3.
A uniao de duas naturezas em uma s6 Pessoa e ensinada
claramente tam bern nas passagens em que os atributos de uma
das naturezas sao afirmados da Pessoa, enquanto, ao mesmo
tempo, esta e designada por urn titulo derivado da outra
natureza. Assim, sao atribuidos a Cristo atributos e a<;6es
divinos em certas passagens, enquanto que a Pessoa a quem
sao atribuidos e designada por urn titulo divino- Atos 20:28;
Rom. 8:32; 1 Cor. 2:8; Mat. 1:23; Luc. 1:31,32; Col. 1:13,14.
Por outro lado, ha passagens nas quais sao atribuidos a
Cristo atributos e a<;6es divinos, enquanto que a Sua Pessoa e
designada por urn titulo humano- Joao 3: 13; 6:62; Rom. 9:5;
Apoc. 5:12.

10. Que principia geral se deve seguir na explicafiiO das


passagens em que se atribuem a Cristo os atributos de uma das
naturezas mas que pertencem a outra?
0 seguinte: a Pessoa de Cristo, constituida de duas
naturezas, e uma s6. Ele pode, portanto, ser designado indi-
ferentemente por titulos humanos ou divinos, e atributos tanto
divinos como hurnanos podern ser-Lhe atribuidos verda-
deiramente. Quando Ele rnorreu, ainda era Deus, e quando

527
Capitulo23
chama para a vida OS mortos, ainda e homem.
As a<;:6es mediatarias pertencem a ambas as naturezas.
Devemos lembrar, porem, que, enquanto a Pessoa e uma s6, as
naturezas, como tais, sao distintas. 0 que pertence a qualquer
das naturezas e atribuido aPessoa unica, aqual as duas naturezas
pertencem; mas o que e peculiar a uma delas nunca e atribuido
a outra. Deus, isto e, a Pessoa divina, que e ao mesmo tempo
Deus e homem, deu Seu sangue por Sua Igreja, isto e, morreu
quanta a sua natureza humana (Atos 20:28). Mas nunca se
afirma que as a<;:6es e os atributos humanos sao da natureza
divina de Cristo, nem que as a<;:6es e os atributos divinos sao
da Sua natureza humana.

1
I

11. Como os te6logos definem as designafoes "natureza" e


"pessoa" conforme se acham elas envolvidas nesta doutrina?
N a doutrina da Trindade, a dificuldade e que urn s6 Ser
espiritual existe como tres Pessoas. Na doutrina da Encarna<;:ao,
a dificuldade eque dois espiritos existern reunidos ern urna s6
Pessoa.
"Natureza", nesta conexao, tern sido definida como
"essencia" ou "substfmcia".
"Pessoa", nesta conexao, tern sido definida como "urna
substancia individual que, nern e parte de algurna outra coisa,
nern e sustentada por ela", ou como "urna subsistencia
individual e inteligente,per se subsistens" (auto-subsistente). A
natureza hurnana de Cristo nunca foi "per se subsistens", mas,
tendo cornec;ado a ser como urn germen gerado numa uniao
pessoal com a eterna Segunda Pessoa da Deidade, pode,
portanto, ser desde o principia, "in altero sustentatur" (ser
sustentado por outrern).

12. Que efeitos esta uniiio pessoal produziu na natureza divina


de Cristo?
Sua natureza divina, sendo eterna e imutavel, e, por con-
seguinte, incapaz de aumento, nao sofreu mudan<;:a essencial

528
A Pessoa de Cristo
por esta uniao. A inteira essencia divina e imunivel continuou
a subsistir como o eterno Verba pessoal, abrangendo entao uma
perfeita natureza humana na unidade da Sua Pessoa e como o
orgao da Sua vontade. Contudo, em conseqiiencia desta uniao,
foi alterada a rela~ao da natureza divina com a cria~ao toda,
porque Cristo tornou-se, assim, Emanuel, "Deus conosco",
"Deus que se manifestou em carne".

13. Que efeitos esta uniiio pessoal produziu na natureza humana


de Cristo?
A natureza humana, sendo perfeita segundo a sua especie,
come<;:ou a existir em uniao com a natureza divina e como uma
parte constitutiva da Pessoa divina, e como tal continua sendo
para sempre uma natureza humana sem mistura e sem
mudan~a essencial.
0 efeito produzido por essa uniao na natureza humana de
Cristo foi, portanto-
1°. Uma exalta~ao de todas as excelencias humanas acima
do nivel da natureza dos homens e de outras criaturas - Joao
1:14; 3:34; Is. 12:2.
2°. Uma exalta<;:ao sem igual a dignidade e gloria, sobre
todo nome que se nomeia, e uma comunhao de honra e gloria
com a Deidade, em virtude da Sua uniao com ela numa Pessoa
divina.
3°. Como se dacoma uniao de alma e corpo no homem, a
alma, embora privada absolutamente de extensao em si
mesma, nem por isso deixa de estar presente ao mesmo tempo,
desde a cabe~a ate as plantas dos pes, em virtude da sua uniao
como corpo- is toe, est<! virtualmente, se nao essencialmente,
presente na percep~ao e na voli~ao ativas- assim tambem a
natureza humana de Cristo, em virtude da sua uniao pessoal
como Verba eterno, esta (a) presente virtualmente (apesar de
localmente no ceu) com Seu povo ate as partes mais remotas
da terra ao mesmo tempo, simpatizando (isto e, em empatia
real) com cada membra do Seu povo como alguem que tambem

529
Capitulo 23
foi tentado; (b) praticamente inexaurivel, apesar de tudo
quanto se Lhe pede no exerdcio constan~e das fun~6es
mediatarias que envolvem ambas as naturezas.
Dai vern a doutrina da lgreja a respeito da "communicatio
idiomatum vel proprietatum" (comunicac;ao de peculiaridades ou
de propriedades) das duas naturezas de Cristo. Esta doutrina e
afirmada no concreto a respeito da Pessoa, mas negada noabstrato
a respeito das naturezas; e afirmada utrius naturce ad personam
(das duas naturezas para com a Pessoa), mas e negada utrius
naturce ad naturam (das duas naturezas para com esta ou aquela
natureza).

14. Ate onde esta incluida a natureza humana de Cristo no


culto que Lhe e devido?
E preciso que distingamos entre o objeto e os motivos de
culto. 0 (mico motivo por que devemos culto a alguem e que
possui atributos divinos. 0 objeto de culto nao e a excelencia
divina no abstrato, e sim a Pessoa divina de quem essa
excelencia e urn atributo. Ao Deus-homem, existindo Ele em
duas naturezas, devemos culto na perfeic;ao de Sua Pessoa
inteira, unicamente em razao de Seus atributos divinos.

15. Qual a analogia apresentada na uniiio de duas naturezas


nas pessoas dos homens?
1°. Todas as pessoas humanas compreendem duas
naturezas: (a) urn espirito c6nscio, auto-operando, auto-
determinando, absolutamente sem extensao no espac;o, e (b)
urn corpo altamente organizado, composto de materia passiva.
2°. Estes constituem uma so pessoa. 0 corpo e parte da
pessoa.
3°. Estas naturezas permanecem distintas, nunca se tor-
nando comuns ao corpo material os atributos do espirito, nem
os atributos do espirito ao corpo, mas os atributos, tanto do
espirito como do corpo, sao comuns a uma e amesma pessoa.
Esta muitas vezes e designada por urn titulo proprio de uma

530
A Pessoa de Cristo
das naturezas, sendo que aquilo que se afirma e proprio da
outra. , - ·· ·· ,
4°. 0 espirito ea pessoa. Quando ele deixa 0 corpo, este e
sepultado como cadaver, enquanto que o espirito vai para o
Juizo. Na ressurrei~ao, o espirito reassumira o corpo correspon-
dente asua pessoa.
5°. Enquanto estes se acham unidos, a pessoa possui e
manifesta os atributos de ambas as naturezas; e, em virtude
da uniao, o espirito sem extensao acha-se presente onde quer
que o corpo esteja, com extensao, e a materia inerte e insen-
sfvel dos tecidos nervosos exulta com sensa~6es e palpita com
desejos pois esses nervos sao sensores da alma que sente e
deseja.

16. Qual a opiniiio peculiar introduzida na teologia pelos


luteranos quanta a communicatio idiomatum? Quais as razoes
para rejeita-la?
Junto com o processo, e nele, pelo qual eles mantem sua
opiniao peculiar sobre a presen~a da propria substancia do
corpo e do sangue de Cristo em, com e sob o pao eo vinho na
Eucaristia, Lutero e os que o seguiram introduziram e elabo-
raram a doutrina de que, em conseqiiencia da uniao hipostatica
das naturezas humana e divina na Pessoa unica de Cristo, cada
uma das duas naturezas participa dos atributos essenciais da
outra.
Quando se explicavam mais completamente a esse
respeito, nao afirmavam que a natureza divina participa de
qualquer atributo distintivo da natureza humana, nem que a
natureza humana tern parte em todos os atributos da Sua
deidade, mas afirmavam simplesmente que a humanidade de
Cristo tinha parte em Sua deidade nos atributos de onisciencia,
onipresen~a e do poder de dar a vida.
Os defensores dessa doutrina dividem-se em duas escolas:
1a. A escola mais extrema, e, logicamente, mais conse-
qiiente, representada por Joao Brentz e os te6logos de Tubingen.
:IU~lfOTI=f'A
. -,., ¥ "·, '"' r·;
.-,,
·~-,, ~-

531
Capitulo23
Estes sustentavam que o proprio ato de encarna~ao efetuou,
como sendo a essencia da uniao pessoal, que cada uma das
naturezas participasse das propriedades da outra. Desde a sua
conceps:ao no ventre da virgem, a natureza humana de Cristo
foi dotada inalienavelmente de toda a majestade divina e de
todas as propriedades que a constituem. Estas estavam
necessariamente em exerdcio desde o prindpio, mas nao se
manifestaram durante a Sua vida terrestre, estando ocultas. Os
fatos da vida de Cristo durante o Seu estado de humilha<;;ao
tern, portanto, sua explica~ao numakrypsis voluntaria, ou seja,
num ocultamento das propriedades divinas da Sua natureza
humana. ·
za. A outra opiniao, menos extrema, e a representada por
Martinho Chemnitz e os teologos de Giessen. Eles tambem
sustentavam que, pelo proprio ato de encarna~ao, a humani-
dade de Cristo foi dotada de perfei~6es divinas. Que, quanto a
sua rela~ao ao espas_:o, Logos non extra carnem, et caro non extra
Logon (ou seja, o Logos nao sai dos limites da carne, e esta nao
sai dos limites do Logos). Ensinavam, contudo, que o exerdcio
dessas perfeis;6es nao era necessario (no sentido filosofico da
palavra), e, sim sujeito avontade da Pessoa divina, a qual fazia
a Sua natureza humana achar-se presente onde e quando quer
que o quisesse, e a qual, durante o periodo da Sua humilhas_:f10
na terra, voluntariamente esvaziou (kenosis) a Sua natureza
humana do seu uso e do exerdcio de seus atributos divinos.
Diz o Prof. A. B. Bruce, D.D., em Humiliation of Christ, Lect. 3
(A Humilha~ao de Cristo, Pales. 3) - "Os luteranos sustentaram
a exalta~ao da humanidade de Cristo para encontrar a Sua
deidade e (enquanto estava na terra) a kenosis da Sua huma-
nidade. Os reformados insistiram na realidade da vida humana
de Cristo e no auto-esvaziamento(kenosis) da Sua deidade para
encontrar a Sua humanidade. Os luteranos sustentaram a vida
dupla da Sua humanidade glorificada (a presen~a local e a
onipresen~a nao local). A tendencia reformada foi reconhecer
a vida dupla do Logos - totus extra Jesum e totus in Jesus"

532
A Pessoa de Cristo
(totalmente fora de Jesus e totalmente em Jesus). 'i !
Nos rejeitamos a opinHio luterana:
1°. Porque nao eensinada na Biblia. Funda-se realmente
em sua erronea interpreta~ao das palavras de Cristo: "Is to eo
meu corpo".
2°. E impossivel concilia-la com os fenomenos da vida
terrena de Cristo. Aumenta a dificuldade do problema para
cuja explica~ao ela foi inventada.
3°. Ela virtualmente destr6i a encarna~ao, porque, segundo
essa doutrina, a natureza divina assimila a natureza humana
atribuindo a esta certas propriedades daquela, ab-rogando-a
assim virtualmente e deixando efetivamente s6 a divina.
4°. Envolve a falacia de se conceber que as propriedades
sao sepaniveis das substancias das quais elas sao as for~as ativas,
e assim se exp6e as mesmas criticas a que se exp6e a doutrina
da transubstancia~ao.

17. Como se pode provar que a doutrina da encarnafiio e


doutrina fundamental do evangelho?
1°. Esta doutrina e todos os seus elementos sao ensinados
nas Escrituras com suma clareza e proeminencia.
2°. Sua verdade se acha envolvida em todas as demais
doutrinas de todo o sistema de fe crista; em todos os atos
mediatarios de Cristo, como Profeta, Sacerdote e Rei; na
hist6ria inteira do Seu estado de humilha~ao, e em todos os
aspectos do Seu estado de exalta~ao; e, sobretudo, na
significa~ao e valor do Seu sacrificio vicario, que e o cora~ao
do evangelho. Se Cristo nao e na mesma Pessoa tanto Deus
como hom em, ou nao poderia morrer, ou a Sua morte nao teria
valor. Se Ele nao fosse homem, a Sua hist6ria seria urn mito;
se nao fosse Deus, seria idolatria pres tar-Lhe culto, e, ao mesmo
tempo, nao Lhe pres tar culto seria desobedecer ao Pai - J oao
5:23.
3°. As Escrituras declaram expressamente que essa
doutrina eessencial- 1 Joao 4:2,3.

533
Capitulo 23
18. Quais os credos em que esta doutrina tern sido mais
acuradamente definida? E por quais concilios?
1°. 0 Credo do Concilio de Niceia, ernendado pelo Concilio
de Constantinopla, como tarnbern o Credo de Atamisio eo de
Calcedonia, sao exposic;6es acuradas e autorizadas de toda a
Igreja quanto a esta doutrina. Eles se acharn no Cap. 7, acirna.
2°. A decisao do Concilio de Efeso a respeito, 431 d.C.,
condenando os nestorianos e afirrnando a unidade da Pessoa;
a decisao do Concilio de Calcedonia (451) contra Eutico,
afirrnando a distinc;ao das naturezas (contra a ideia de fusao,
de Eutico).
3°. A decisao do Concilio de Constantinopla (681) contra
os rnonotelitas (que afirrnavarn urna s6 vontade na Pessoa (mica
de Cristo), afirrnando que a natureza hurnana de Cristo retern
na cornpleta integridade urna vontade separada como tam bern
urna inteligencia separada. Essas decis6es conciliares
concluirarn a definic;ao, aperfeic;oada pouco a pouco, da Igreja
sobre a Pessoa de Cristo, e tern sido aceitas por todos OS
protestantes.

19. Como se pode classificar todas as heresias sobre este assunto?


No sentido de que elas procurarn evitar a irnpossibilidade
que a razao hurnana encontra na tentativa de cornpreender
perfeitarnente a cornpatibilidade mutua de todos OS elementOS
desta doutrina, (1) na negac;ao do elernento divino; ou (2) na
negac;ao do elernento hurnano ern sua realidade e integridade;
ou, (3) na negac;ao da unidade da Pessoa abarcando arnbas as
naturezas.

20. Quais partidos sustentam que Jesus era mero homem?


Na Igreja Prirnitiva os ebionitas e os alogi. No tempo da
Reforrna, os socinianos. Ern nossos dias os racionalistas e os
unitarios. Quanta a sua hist6ria e suas doutrinas, veja acirna,
Cap. 6, Pergs. 11 e 13, e abaixo, no firn deste capitulo.

534
A Pessoa de Cristo
21. Quais partidos negam a verdadeira humanidade de
Cristo) e par quais motivos?
Estas especula<;:6es tiveram todas uma origem gn6stica.
Dai veio a convic<;:ao de que a materia e rna em si mesma, e
que inumerosceons, ou grandes emana<;:6es espirituais de Deus,
que eo Absoluto, medeiam entre Este eo mundo. Ospneumata
vern de Deus, mas a materia existe por si mesma e as almas
animais vern de urn ser men or do que Deus. Por is so os docetce
(docetistas; dedokeo, supor, pensar, parecer) sustentavam que
a natureza humana (corpo e alma) de Cristo era urn mero
fantasma ou aparencia, sem nenhuma existencia real e
substancial; que nao passava de uma visao ou fantasma atraves
do qual o Logos quis manifestar-se aos homens por algum
tempo.

22. Em que consiste a heresia apolinariana?


Apolinario, bispo de Laodiceia, cerca do anode 370, tido
como ortodoxo e erudito, ensinava que, assim como o homem
se constitui de urn corpo, de uma alma animal e de uma alma
racional, todos compreendidos em uma s6 pessoa, assim em
Cristo o Logos divino to rna o lugar do pneuma humano, e Sua
Pessoa unica se constitui do pneuma divino, ou alma racional,
e da alma animal e corpo humanos. Livrou-se ele assim da
dificuldade ligada a existencia de do is espiri tos racionais,
autoconscientes e autodeterminantes na mesma pessoa, mas,
ao mesmo tempo, anulou o fato revelado de que Cristo e ao
mesmo tempo verdadeiro homem e verdadeiro Deus. A
doutrina de Apolinario foi condenada pelo Concilio de
Constantinopla, em 38ld.C.

23. Em que consiste a heresia nestoriana?


0 termo nestoriano exprime uma tendencia exagerada
de especular sobre este assunto, antes que uma falsa dou-
trina positiva e definivel. E a tendencia de acentuar tanto
a distin<;:ao das duas naturezas completas e nao unificadas

535
Capitulo23
de Cristo que se torna obscuro o fato igualmente revelado
da unidade da Sua Pessoa.
Essa tendencia foi mais conspicua nos escritos de Teodoro
de Mopsuestia, chefe da escola antioquiana, e, em razao da sua
influencia, ela tornou-se a caracteristica geral dessa escola. A
teologia da Igreja Oriental dos seculos quarto e quinto estava
dividida entre as duas grandes escolas rivais de Alexandria e
de Antioquia. "Na escola de Alexandria predorninava urn
modo intuitivo de pensar, inclinando-se para o misticisrno;
na de Antioquia predorninava uma inclinas;ao 16gica e
reflexiva da inteligencia"- Neander,Hist., Tradw;ao de Torrey,
vol. 2, pag. 352.
Nest6rio, que havia sido rnonge ern Antioquia, veio a ser
patriarca de Constantinopla. Ele censurou a aplica<;;ao da frase
"Mae de Deus" a virgern, afirrnando que Maria dera a luz ao
Cristo e nao a Deus. Cirilo, patriarca de Alexandria, contestou-
-o, e ambos lans;ararn-se anaternas rnutuos. Nest6rio, segundo
o modo antioquiano de pensar, julgiJ.Va que se devia distinguir
clararnente entre as naturezas divina e hurnana de Cristo e
adrnitia sornente umasynafeia (jun<;;fw) de urna e outra, e urna
enoikesis (presen<;;a permanente) da deidade. Cirilo, ao contrario,
foi levado pelas tendencias da escola egipcia (de Alexandria) a
sustentar a perfeita uniao das duas naturezas. Nest6rio, como
representante do seu partido, foi condenado pelo Concilio de
Efeso, ern 431 d.C. -Hist. ofDoct., de Hagenbach, Vol. 1, § 100.

24. Em que consiste a heresia eutiquiana ou monofisita?


Eutico era abade em Constantinopla e discipulo extremo
de Di6scuro, sucessor de Cirilo. Ele levou a sua oposi<;;ao aos
nestorianos ao ponto de confundir as duas naturezas de Cristo,
sustentando, por isso, que Ele possuia urna s6 natureza,
resultante da uniao da deidade com a humanidade. Os que
adotaram esta opiniao forarn chamados monofisitas. Foram
condenados pelo Concilio de Calcedonia, 451 d. C., que adotou
a formula comunicada por Leao, o Grande, bispo de Rorna, a

536
A Pessoa de Cristo
Flaviano, patriarca de Constantinopla: "Totus in suis, totus in
nostris"(que afirma a totalidade da natureza divina e a totalidade
da natureza humana na Pessoa de Cristo).

25. Quale a doutrina dos monotelitas?


0 lmperador Heraclio procurou reunir a lgreja OS
monofisitas adotando, por conven~ao, a decisao do Condlio
de Calcedonia quanta acoexistencia de duas naturezas distintas
na Pessoa unica de Cristo, com a emenda de que, em
conseqiiencia da uniao pessoal, havia em Cristo uma s6 energia
divino-humana e uma s6 vontade. Em oposi~ao a isto, o Sexto
Concilio Ecumenico de Constantinopla (681 d.C.), com a
coopera~ao do bispo de Roma, adotou a doutrina de duas
vontades em Cristo, duas energias, como doutrina ortodoxa,
mas decidiu que sempre se deve conceber a vontade humana
dEle como subordinada a vontade divina- Hagen bach, Hist.
ofDoct., § 104. Com esta decisao completou-se a defini~ao desta
doutrina como esta e recebida pela lgreja toda, tanto romana e
grega como protestante.

26. Em que consiste a doutrina moderna de Kenosis?


A antiga doutrina sociniana ensinava que Jesus, verdadeiro
homem, depois da Sua ascensao passou por uma apoteose, pela
qual foi exaltado a uma condi~ao e a uma ordem intermediarias
entre Deus e o universo. Os eutiquianos ensinavam que a
natureza humana de Cristo foi absorvida pela divina e assimi-
lada a esta. Os luteranos ensinavam que a natureza humana foi
dotada de propriedades da divina. A doutrina moderna de
kenosis (quenose) e que, no caso de Jesus, o homem se tornou
Deus e nao foi unido pessoalmente adivindade, mas que Deus
tornou-se literalmente homem. Esta doutrina e ensinada com
diversas modifica~6es pelos doutores Thomasius, Hoffmann,
Ebrard, Martensen e outros, e mui claramente pelo Dr. W. F.
Gess, numa obra muito bern traduzida (para o ingles) pelo Dr.
J. A. Reubelt. ,

537
Capitulo 23
0 termo kenosis significa urn despejar voluntario de Si
,
mesmo, da Sua deidade, pelo Logos. E derivado de Fil. 2:7:
"aniquilou-se a si mesmo", e tern o apoio de declarac;;6es como
a de Joao 1:14: "o Verbose fez carne, e habitou entre n6s".
1. 0 Pai s6 e de Si mesmo. Ele comunica eternamente a
plenitude da Sua essencia e das perfeic;;6es divinas ao Filho,
dando-Lhe assim o ter vida em Si mesmo. 0 Filho, dimanando
assim eternamente do Pai, une-Se ao Pai na comunicac;;ao da
Sua plenitude ao Espirito, e ea vida do mundo.
2. "Mas o Logos e Deus; tern vida em Si assim como a
tern o Pai; a Sua volic;;ao quanto a receber a vida .do Pai e a
fonte da Sua vida; Sua consciencia de Si e Seu proprio ato.
Daqui se segue que Ele pode suspender Sua consciencia de
Si."
3. Condescendendo em ser concebido no ventre da vir-
gem, o Logos despiu-Se temporariamente da Sua consciencia
de Si e com ela da comunicac;;ao davida do Pai ao Filho, pela
qual o Filho tern vida em Si assim como a tern o Pai, e por isso
estiveram suspensas a Sua onisciencia, a Sua onipresenc;;a eo
Seu governo onipotente do mundo.
4. Quando a substancia do Logos recobrou a Sua cons-
ciencia de Si como o menino Jesus, o foi como urn verdadeiro
menino humano, e Ele cresceu e se desenvolveram o Seu
conhecimento e as Suas faculdades como urn verdadeiro
homem sem pecado, dotado de grac;;a preeminente e da
plenitude do Espirito de Deus que nEle habitava.
5. Quando Jesus foi glorificado, tornou a comec;;ar a eterna
e anteterrena comunicac;;ao da plenitude da vida divina, do Pai
ao Filho, e Este, embora continue a ser verdadeiramente
humano, nao e menos verdadeiramente Deus. E outra vez
eterno, onisciente, onipresente, onipotente. ''Assim urn homem
eadmitido a vida trinitaria da Deidade, da glorificac;;ao do Filho
e por ela"- Reubelt, Script. Doct. Per. Christ.- Gess.
Essa doutrina- 1°. Euma ofensa fei ta as infini tas perfeic;;6es
e a imutabilidade da natureza divina.

538
A Pessoa de Cristo
2°. Nao ecompatfvel como fato de que Cristo, quando na
terra, era Deus real e absoluto.
3°. Tampouco e compatfvel com o fato de que a
humanidade de Cristo foi uma humanidade real, gerada da
semente de Abraao.
4°. Admite-se em geral que e uma doutrina diversa da fe
imemorial e universal da lgreja.
Para uma discussao completa, veja Humiliation of Christ
(A Humilha<;:ao de Cristo), de autoria do Dr. A. B. Bruce.

EXPOSH_;6ES AUTORIZADAS ,

As igrejas romana, grega e protestante concordam todas


em aceitar as defini~oes dos credos de Niceia e de Cake-
dania, e o Credo de Atanasio (assim chamado ). Veja acima,
Cap.7.
A doutrina LUTERANA quanta as rela~oes das duas
naturezas:
Formula Concordice, Parte 1, Epitome, cap. 8, §§ 11 e 12:
"Por isso, nao somente como Deus, senao tambem como
homem, Ele sabe todas as coisas e tern o poder de fazer
tudo, esta presente com todas as criaturas, e tern nas Suas
maos e debaixo dos Seus pes todas as coisas que estao no
ceu, na terra e debaixo da terra. "E-rne dado todo o poder
no ceu e na terra", e "subiu acima de todos OS ceus, para
cumprir (ou "encher") todas as coisas". Estando presente
em toda parte, Ele pode exercer este poder, e nao ha coisa
alguma que Ele nao possa fazer ou que Lhe seja desco-
nhecida. Segue-se, alem disso, e muito facilmente, que
Ele, achando-Se presente, pode distribuir Seu verdadeiro
corpo e Seu verdadeiro sangue na Ceia do Senhor. Isso,
porem, nao se efetua segundo o modo e a propriedade da
Sua natureza humana, e sim segundo o modo e a pro-
priedade da mao direita de Deus... E esta presen~a de
Cristo na Ceia nao e fisica, nero terrena, nero
"capernaitica" (veja Joao 6: 52-59), e, contudo, e verdadeira
e substancial."
Capitulo 23
Parte 2 ("Solida Declaratio"), cap. 8, § 4: "Porque essa
cornunhao de naturezas e propriedades nao e resultado de
alguma efusao essencial ou natural das propriedades da
natureza divina sobre a humana, como se a humanidade
de Cristo as tivesse subsistindo independentemente e
separadas da Sua deidade; ou como se, por essa comunhao,
a natureza humana de Cristo se tivesse despido de suas
propriedades naturais, ou fosse convertida na natureza
divina, ou fosse em si e per se feita igual a natureza divina
por meio dessas propriedades comunicadas dessa forma,
ou que as propriedades e operac;:6es naturais fossem
identicas ou mesmo iguais. Porque estes e semelhantes
erros tern sido rejeitados", etc.
Disse Lutero: "Onde quer que colocardes Deus, ai e
necessaria que coloqueis a humanidade (de Cristo); nao
podem ser separados nem desunidos; e uma s6 Pessoa, e a
hurnanidade esta unida mais intimamente a Deus do que
a nossa pele esta unida a nossa carne, sim, mais intima-
mente do que 0 corpo a alma". 1
·~
A doutrina das IGREJAS REFORMADAS:
Confessio Helvetica Posterior, cap. 11: "Reconhecemos,
pois, que em urn e o mesmo Senhor Jesus Cristo ha duas
naturezas, e dizemos que estas se acham juntas e unidas
de tal modo que elas nao sao absorvidas, nem confundidas,
nem misturadas; mas sao, antes, unidas e juntas em uma
s6 Pessoa, sendo conservadas com suas propriedades
permanentes; de modo que n6s adoramos a urn s6 Senhor,
o Cristo, e nao dois; urn s6, dizemos, verdadeiro Deus e
hornem, segundo a Sua natureza divina consubstancial
com o Pai, e segundo a Sua natureza humana consubs-
tancial conosco, homens, e em todas as coisas semelhante
a n6s, exceto no pecado. Portanto, assim como aborni-
namos o dogma nestoriano, que faz dois Cristos de urn
s6, e dissolvendo a uniao da Pessoa; assim tambem
execramos de corac;:ao a loucura de Eutico, dos monofisitas
e dos monotelitas, que apagam a propriedade da natureza
humana. Por isso n6s de modo algum ensinamos que a

540
A Pessoa de Cristo
natureza divina em Cristo tenha sofrido, nem que Cristo,
segundo a Sua natureza humana, tenha ate agora estado
no mundo e assim em toda parte."
Confissiio de U7estminster, Cap. 8, § 2: "0 Filho de Deus,
a segunda Pessoa da Trindade, sendo verdadeiro e eterno
Deus, da mesma substancia e igual ao Pai, tomou sabre
Si, quando havia chegado a plenitude do tempo, a natureza
do homem e todas as suas propriedades essenciais e suas
enfermidades comuns, mas sem pecado; sendo concebido
pelo poder do Espirito Santo no ventre da virgem Maria,
da sua substancia. De modo que duas naturezas inteiras,
perfeitas e distintas, a deidade e a humanidade, foram
unidas inseparavelmente em uma s6 pessoa, sem con-
versao, composi~ao ou confusao. A qual Pessoa e
verdadeiro Deus e verdadeiro homem, e, contudo, urn s6
Cristo, o (mica Mediador entre Deus e o homem."

/1.1

541
24

0 Oficio Medianeiro de Cristo

1. Quais as diversos sentidos da palavra Mediador, e em qual


destes sentidos e ela especialmente empregada quando aplicada a
Cristo?
1°. 0 sentido de internuncio ou mensageiro, para explicar
a vontade e cumprir os mandados de uma das partes contra-
tames ou de ambas, e.g., Moises, Gal. 3:19.
2°. 0 sentido de simples advogado ou intercessor, advo-
gando a causa da parte ofensora na presen<;a da parte ofendida.
3°. 0 sentido em que a palavra e especialmente empregada
quando aplicada a Cristo. Neste sentido, Cristo, o pacificador
eficiente, como Mediador, (1) tern entregues em Suas maos
todo o poder e todo o juizo- Mat. 28:18 e 9:6; Joao 5:22,25-
27; e, (2) Ele faz eficazmente reconcilia<;ao entre Deus e o
homem por meio de uma expia<;iio plenamente satisfat6ria e
de uma obediencia perfeita.

2. Par que foi necessaria que a Mediador possuisse uma natu-


reza divina, como tambem uma natureza humana?
1°. E evidente que era necessaria que o Mediad or fosse
Deus; (1) Para que fosse independente e nao uma simples
criatura de uma das partes, pois, de outro modo, nao poderia
fazer eficazmente a paz. (2) Para que revelasse Deus e a salva-
<;ao que dEle vern aos homens, porque "ninguem conhece o
Pai, senao o Filho, e aquele a quem o Filho o quiser revelar" -
Mat. 11:27; Joao 1:18. (3) Para que, estando, quanta a Sua

542
0 Oficio Medianeiro de Cristo
Pessoa, acima de toda a lei, e sendo, quanta adignidade da Sua
natureza, infinito, pudesse, a favor do Seu povo, prestar a lei
uma obediencia voluntaria e que nao lhe devia por Sua pro-
pria conta, e para que a Sua obediencia e os Seus sofrimentos
tivessem valor infinito. (4) Para que possuisse a sabedoria, o
conhecimento eo poder necessarios para a administrac,;ao dos
reinos infinitos da providencia e da grac,;a que se acham
entregues nas Suas maos como o Principe medianeiro.
2°. Era evidentemente necessaria que fosse homem. (1)
Para que representasse verdadeiramente os homens como o
segundo Adao. (2) Para que fosse feito debaixo da lei, a fim de
tornar possiveis a Sua obediencia, os seus sofrimentos e as Suas
tentac,;6es- Gal. 4:4,5; Luc. 4:1-13. (3) "Foi conveniente que
ele se fizesse em tudo semelhante a seus irmaos, para vir a ser
urn pontifice* compassivo e fiel no seu ministerio ... " (Figuei-
redo)- Heb. 2:17,18; 4:15,16. (4) Para que, em Sua
humanidade glorificada, fosse o cabec,;a da lgreja glorificada,
e exemplo e modelo ao qual os que pertencem ao Seu povo
foram predestinados "para serem conformes aimagem de seu
Filho; a fim de que ele seja o primogenito entre muitos irmaos"
-Rom. 8:29.

3. Qual a diversidade de opinioes que existem sabre a questiio


sabre se Cristo age como Mediador em uma so natureza au nas
duas?
Os cat6licos romanos sustentam que Cristo foi Mediador
somente em Sua natureza humana, dizendo que era impossivel
que Deus intermediasse entre Si mesmo e os homens.
Tambem tern sido sustentada a opiniao oposta, a saber,
que Cristo foi Mediador somente em Sua natureza divina.
A doutrina biblica e que Cristo foi Mediador como o Deus-
-homem, nas duas naturezas.
, ... ·~ ~ .

*sumo sacerdote

543
Capitulo 24
4. Como se pode classificar os atos de Cristo com referencia
a Suas duas naturezas?
Os te6logos tern distinguido com propriedade (veja
Turretino, in loco) entre a Pes so a que age e a natureza ou a
energia interna pela qual ela age. Afirmamos assim a respeito
do proprio homem, que pensa e que anda. Neste caso, a mesma
pessoa faz estas duas classes de a~6es tao radicalmente distintas,
em virtude das duas naturezas abrangidas por ela. Assim
tambem a Pessoa unica do Deus-homem realiza todos OS atos
que envolvem os atributos de uma natureza divina, em virtude
da Sua natureza divina, e todos os atos que envolvem os
atributos de uma natureza humana, em virtude da Sua natureza
human a.

5. Como se pode provar que Cristo era Mediador e que agia


como tal tanto em Sua natureza divina como na humana?
1°. Pelo fato de que o desempenho de cada uma das tres
gran des fun~6es do oficio medianeiro - a profetica, a sacerdotal
e a real - envolvem os atributos de ambas as naturezas, com
foi provado plenamente sob a Pergunta 2.
2°. Pelo fa to de se atribuirem na Biblia todos os atos de
Cristo como Mediador a uma s6 Pessoa, considerada como
abrangendo as duas naturezas. A Pessoa e muitas vezes
designada por urn termo derivado de uma das naturezas,
enquanto a a~ao medianeira atribuida a essa Pessoa e feita
evidentemente em virtude da outra natureza abrangida na
Pessoa. Veja Atos 20:28; 1 Cor. 2:8; Heb. 9:14.
3°. 0 fato de que o Mediador o e desde a funda~ao do
mundo (veja Cap. 22, Perg. 11), mostra evidentemente que
nao o era s6 em Sua natureza humana; e o fato de que o
Verba eterno encarnou-Se a fim de Se preparar adequadamen-
te para a Sua obra medianeira (Heb. 2: 17,18), mostra com igua1
clareza que nao era Mediador somente em Sua natureza divina.

544
0 Oficio Medianeiro de Cristo
6. Qual o sentido em que os cat6licos romanos tem os santos e
os anjos na conta de mediadores?
Eles nao atribuem, nem aos santos nem aos anjos, a obra
de propicia~ao propriamente dita. Contudo, afirmam que os
merecimentos dos santos sao o motivo e a medida da efic:icia
da sua intercessao, da mesma forma como se da no caso de
Cristo. ·•r;~ :'.~~J ,.;. ~··· .·

7. Ate onde atribuem eles um carater medianeiro a seus


sacerdotes?
0 protestante sustenta que a Igreja e composta de uma
companhia de homens unidos uns aos outros em virtude da
uniao imediata de cada urn deles com Cristo, a Cabe~a. 0
romano, ao contrario, afirma que cada membro individual e
unido imediatamente aIgreja, e, por meio da Igreja, a Cristo.
Por isso os seus sacerdotes, da verdadeira sucessao apost6lica,
como dizem, sujeitos aos bispos apost6licos, assim chamados,
sendo os (micos despenseiros autorizados dos sacramentos, e,
por meio destes, da gra~a de Cristo, sao mediadores -
1°. Entre o individuo e Cristo- o elo necessaria de uniao
com Ele. ' · ·
2°. Porque oferecem o sacrificio da missa e fazem nela,
segundo dizem, uma verdadeira propicia~ao pelos pecados
veniais do povo, tendo o grande sacrificio de Cristo feito
propicia~ao pelo pecado original e lan~ado o fundamento para
a virtu de propiciat6ria que pertence amiss a. t '-! ;

3°. Porque, segundo dizem, sao intercessores poderosos.

8. Como se pode provar que Cristo e o nosso unico Mediador


no sentido proprio desta palavra?
1°. Pelo testemunho direto das Escrituras- 1 Tim. 2:5.
2°. Porque, segundo as Escrituras, Cristo desempenhou
por nos todas as fun~6es necessarias, tanto de propicia~ao como
de intercessao, 1 Joao 2:1, na terrae no ceu- Heb. 9:12, 24;
7:25.

545
Capitulo 24
3°. Porque, em virtude da dignidade da Sua Pessoa e da
perfei~.;aoda Sua natureza, todas essas fun~oes foram por Ele
desempenhadas exaustivamente- Heb. 10: 14; Col. 2:10.
4°. Porque nEle ha salva<_;ao perfeita, nao ha salva<;ao em
nenhum outro, e ninguem pode vir ao Pai senao por Ele -
Joao 14:6; Atos 4:12.
5°. Nao ha lugar para nenhum outro mediador entre o
individuo e Cristo- (1) porque Ele e nosso "irmao" e "sacer-
dote compassivo", que convida todos a chegar-se a Ele
imediatamente, (diretamente), Mat. 11 :28; (2) porque a obra
de atrair os homens trazendo-os a Cristo pertence a~ Espirito
Santo- Joao 6:44; 16:14.

9. Segundo as Escrituras, qual a relafiiO do Espirito Santo


com a obra medianeira de Cristo?
1°. A de gerar e dar preenchimento a Sua natureza hu-
mana. Luc. 1:35; 2:40; Joao 3:34; Sal. 45:8.
2°. Cristo cumpriu no Espirito todas as Suas fun<;6es
medianeiras com o Seu ensino profetico, Seu sacrificio
sacerdotal e Suas administra~6es reais. 0 Espirito desceu sobre
Ele no Seu batismo, Luc. 3:22; levou-o para o deserto para ser
tentado, Mat. 4:1; "pela virtude do Espirito, voltou Jesus para
a Galileia", Luc. 4: 14; "pelo Espirito eterno (Jesus) se ofereceu
a si mesmo imacu1ado a Deus"- Heb. 9:14.
3°. Cristo, como Mediador, e como parte das condi~6es da
alian<;a da gra<;a, e revestido da dispensa<;ao do Espirito como
"o Espirito da verdade", "o Santificador", e "o Consolador"-
Joao 15:26; 16:7; 7:39; Atos 2:33.
4°. N as ministra<;6es do Espiri to por Cristo, como
Mediador, opera por Ele e dirige para Ele, ensinando, vivificando,
santificando, conservando e operando todas as gra<;as em Seu
povo. Assim como Cristo, quando no mundo, conduzia,
somente Ele, ao Pai, assim o Espirito Santo agora conduz,
somente Ele, a Cristo- Joao 15:26; 16:13, 14; Atos 5:32; 1
Cor.l2:3.

546
0 Oficio Medianeiro de Cristo
5°. Enquanto se diz que Cristo, como Mediador, e nosso
"advogado" para como Pai- 1 Joiio 2:4, tambem se diz que o
Espirito Santo e nosso "advogado", traduzido "Consolador",
sobre a terra, para ficar conosco para sempre, mostrar-nos as
coisas de Cristo, e ter controversia como mundo- Joiio 14:16,
26; 15:26; 16:7-9.
6°. Enquanto se diz que Cristo e nosso Mediador para
interceder por n6s no ceu, Heb. 7:25; Rom. 8:34, tambem se
diz que o Espirito Santo, formando dentro de n6s pensamentos
e desejos segundo a vontade de Deus, intercede por n6s, orando
por n6s com gemidos inexprimiveis- Rom. 8:26,27.
7°. A soma de tudo e que temos acesso ao Pai, mediante o
Filho, pelo Espirito- Ef. 2:18.

10. Qual o fundamento em razao do qual se aplicam a


Cristo os tres oficios de profeta, sacerdote e rei?
1o. Porque estas tres fun~6es sao todas igualmente neces-
sarias, e juntas exaurem toda a obra medianeira.
2°. Porque a Biblia atribui todas essas fun~6es a Cristo. A
profetica, Deut. 18:15, 18; conferir Atos 3:22; 7:37; Heb. 1;2;
a sacerdotal, Sal. 110:4, e toda a Epistola aos Hebreus; a real,
Atos 5:31; 1 Tim. 6:15; Apoc.17:14.
Devemos lembrar-nos sempre de que esses realmente nao
siio tres oficios, e sim tres fun~6es do oficio unico e in divisive!
de Mediador. Estas fun~6es siio facilimas de distinguir no
abstrato, mas no seu exerdcio elas se qualificam mutuamente
em todos os atos. Assim, quando Cristo ensina, e essencialmente
Mestre real e sacerdotal; quando reina, e Rei sacerdotal e
profetico, e quando expia ou intercede e Sacerdote profetico e
real.
Foi Eusebio, 261-340 d.C., quem primeiro agrupou estes
tres oficios como pertencendo a Cristo (Livro 1, cap. 3)- "De
modo que todos estes tern referencia ao verdadeiro Cristo,
o Verbo divino e celeste, o unico Sumo Sacerdote de todos
OS homens, 0 unico Rei de toda a cria~ao, e do Pai 0 unico

547
Capitulo24
supremo Profeta dos profetas".

11. Qual o sentido biblico da palavra profeta?


Seu sentido geral e de alguem que fala por outrem com
autoridade como interprete. Assim Moises foi profeta para seu
irmao Arao - Ex. 7: 1.
Profeta de Deus e quem esta qualificado e autorizado a
falar por Deus aos homens. 0 ato de predizer eventos futuros e
apenas incidental.

12. Como executa Cristo o oficio de profeta?


1°. lmediatamente, em Sua propria Pessoa, como quando
(1) no mundo com os Seus disdpulos e (2) como a luz da nova
Jerusalem no meio do trono- Apoc. 21:23.
2°. Mediatamente, (1) por Seu Espfrito, (a) por inspira~ao,
(b) por ilumina~ao espiritual. (2) Pelos oficiais da Sua lgreja,
(a) os inspirados, como apostolos e profetas, e (b) os dotados
naturalmente, como o ministerio estabelecido- Ef. 4: 11.
3°. Tanto externamente, como por Sua palavra e por Suas
obras dirigidas ao entendimento, como tambem ...
4°. lnternamente, pela iluminas;ao espiritual do coras;ao
-1 Joao 2:20; 5:20.
5°. Em tres grandes passos sucessivos de desenvolvi-
mento. (1) Antes da Sua encarna~ao; (2) depois da Sua
encarna~ao; (3) durante a eternidade na gloria- Apoc. 7:17;
21:23.

13. Como se pode provar que Ele agiu como tal antes da Sua
encarnafiio?
1°. Por Seu titulo divino de Logos, "Verbo", como o eterno
Revelador por natureza e tambem por oficio.
2°. Ja foi provado (Cap.23, Perg. 11, e Cap. 9, Perg. 14)
que Ele e 0 J eova (lave) da economia do Velho Testamento. E
chamado Conselheiro- Is. 9:6. Anjo do testamento (alian~a)-

548
0 Oficio Medianeiro de Cristo
Mal. 3:1. Interprete*- J6 33:23. -, · ;l, ~
3°. 0 fato e afirmado diretamente no Novo Testamento-
1 Ped. 1:11.

14. Que eessencial ao oficio sacerdotal, ou, que eum sacerdote


no sentido biblico desta palavra?
Assim como, no sentido geral, profeta e quem e quali-
ficado e autorizado a falar por Deus aos homens, assim tam bern,
no sentido geral, sacerdote e quem e qualificado e autorizado
a tratar com Deus a favor dos homens.
E necessario, pois, que o sacerdote- ,,- ·
1°. Seja tornado dentre os homens para representa-los -
Heb. 5: 1,2; Ex. 27:9,12,21,29.
2°. Seja escolhido por Deus como Sua elei~ao e Sua
propriedade especiais- Num. 16:5; Reb. 5:4.
3°. Seja santo, moralmente puro e consagrado ao Senhor-
Lev. 21 :6; Sal. 106: 17; Ex 39:30,31.
4°. 0 sacerdote tern o direito de aproximar-se de Deus,
oferecer sacrificios e fazer intercessao- Num. 16;5; Ex. 19:23;
Lev. 16:3, 7, 12, 15.
0 sacerdote era, pois, essencialmente mediador, admitido
dentre os homens para apresentar-se a Deus, (1) a fim de
propiciar por meio de sacrificios, Heb. 5:1-3 e (2) a fim de
fazer intercessao- Luc. 1:10; Ex. 30:8; Apoc. 5:8; 7:3,4.
Tornado da Tipologia de Fairbairn, Vol. 2, Parte 3, Cap. 3.

15. Como se pode provar pelo Velho Testamento que Cristo


foi verdadeiramente Sacerdote?
1°. E declarado expressamente. Comparar Sal. 110:4 com
Heb. 5:6; 6:20; Zac. 6:13.
2°. Sao-lhe atribuidas fun~6es sacerdotais- Is. 53: 10,12;
Dan. 9:24,25.
. .."'

*Em vez de "interprete", nesta passagem, a Vulgata traz somenteloquens,


que Figueiredo traduz, "que fale a seu favor".

549
Capitulo 24
3°. Toda a significac;ao e virtude do templo, do seu servic;o,
e do sacerd6cio levftico estava no fa to de serem tipicos de Cristo
e da Sua obra como Sacerdote. lsto a Epfstola aos Hebreus
prova claramente.

16. Como se pode provar pelo Novo Testamento que em Cristo


se achavam todos os requisitos de um sacerdote?
1°. Cristo foi tornado dentre os homens para representa-
-los diante de Deus- Heb. 2:16; 4:15.
2°. Foi escolhido por Deus- Heb. 5:6.
3°. Era perfeitamente santo- Luc. 1:35; Heb. 7:26.
4°. Tinha o direito de perfeito acesso ao Pai, e corn a maior
influencia- J oao 16:28; 11 :42; Heb. 1:3; 9:11,14,24.

17. Como demonstrar que Ele realmente desempenhou todos os


deveres do oficio sacerdotal?
0 clever de urn sacerdote e mediar por meio (1) de
propiciac;ao, e (2) de intercessao.
1°. Ele mediou no sentido geral da palavra- Joao 14:6; 1
Tim. 2:5; Heb. 8:6; 12:24.
2°. Ofereceu umapropiciac;ao-Ef. 5:2; Heb. 9:26; 10:12;
1 Joao 2:2.
3°. Fez (e faz) intercessao- Rom. 8:34; Heb. 7:25; 1 Joao
2:1.
Que esta obra intercess6ria realizada por Cristo foi real e
nao metaf6rica torna-se evidente pelo fato de que ela substituiu
o servic;o do templo, que era tao-somente urn tipo dela. Urn
tipo e sombra pressup6e necessariamente uma substfmcia literal
-Heb. 9:10-12; 10:1; Col. 2:17.

18. Na realizafiiO de Sua obra sacerdotal, que parte Cristo


executou na terrae que parte executa no ceu?
Na terra apresentou obediencia, propiciac;ao e intercessao
-Heb. 5:7-9; 9:26,28; Rom. 5:19.
No ceu apresentou Seu sacriffcio no mais santo lugar e

550
0 Oficio Medianeiro de Cristo
vive sempre para interceder por n6s- Heb. 7:24,25; 9:12,24.

19. Em que aspectos foi mais excelente o sacerd6cio de Cristo


do que ode Ariio?
1°. Na dignidade de Sua Pessoa. Os sacerdotes araonicos
eram s6 homens. Ele era o Filho eterno. Eles eram pecadores
que tinham necessidade de oferecer sacrificios primeiro pelos
seus pr6prios pecados e depois pelos do povo. Ele era santo,
inocente, imaculado- Heb. 7:26,27. Era perfeito homem e,
contudo, podia aproximar-Se de Deus infinitamente mais do
que qualquer outro ser- Joao 10:30; Zac. 13:7.
2°. No valor infinito do Seu sacrificio. Os sacrificios dos
outros sacerdotes nao podiam tirar os pecados, Heb. 10:4, e
era preciso repeti-los continuadamente - Heb. 10:1-3. 0
sacrificio de Cristo foi perfeitamente eficaz, e foi oferecido uma
s6 vez, sem necessidade de repeti<;;:ao- Heb. 10:10-14. Assim,
pois, os deles eram apenas uma sombra do de Cristo - Heb.
10:1.
3°. Na maneira da Sua consagra<;;:ao. Eles sem juramenta;
Ele com juramento- Heb. 7:20,22.
4°. Eles, sendo muitos, sucederam-se por gera<;;:ao. Ele
permanece para sempre- Heb. 7:24.
5°. 0 sacerd6cio de Cristo esta ligado a "urn tabernaculo
maior e mais perfeito", do qual a terra e 0 atrio e 0 ceu 0
verdadeiro santuario- He b. 9:11-24.
6°. Cristo faz intercessao estando sobre urn trona- Rom.
8:34; Heb. 8: 1,2.
7°. Enquanto alguns dos servos de Deus do Velho Testa-
mento foram ao mesmo tempo profetas e reis, como Davi, ou
Profeta e Sacerdote, como Esdras, somente Cristo foi ao mesmo
tempo, e com perfei<;;:ao divina, profeta, sacerdote e Rei. Deste
modo as Suas divinas perfei<;;:6es profeticas e reais qualificaram
e real<;;:aram a virtude transcendental de todos os Seus atos
sacerdotais- Zac. 6:13.
(, c'. -~1 '···

551
Capitulo 24
20. Em que sentido Cristo foi sacerdote segundo a ordem de
Melquisedeque?
0 sacerd6cio araonico foi tfpico de Cristo; mas em dais
principais aspectos deixou de representar o grande Antftipo.
1°. Constava de sucessivas geras:oes de homens mortais.
'
2°. Constava de sacerdotes que nao eram de linhagem real.
Por outro lado, o Espfrito Santo nos apresenta subitamente,
na hist6ria patriarcal, Melquisedeque, sacerdote real, com os
names significativos de "Rei de Justis:a"e "Rei de Paz", Gen.
14:18-20, e tambem subitamente o retira. De onde verne para
onde vai nao sabemos. Como homem particular, ele tinha uma
hist6ria nao escrita, assim como a tern os outros. Mas, como
sacerdote real, ele permanece para sempre sem pai, sem mae,
sem origem, sucessiio ou fim; e par isso, como diz o Espfrito
Santo em Heb. 7:3, foi suscitado antecipadamente, como tipo
exato da eternidade do sacerd6cio de Cristo- Sal. 110:4. A
profecia foi: "Tu es (ou seras) urn sacerdote eterno, segundo a
ordem de Melquisedeque".
Foram duas, pais, as verdades prefiguradas a respeito de
Cristo neste tipo: (1) urn sacerd6cio eterno; (2) a uniao das
fun<;;oes reais e sacerdotais numa s6 pessoa. - Fairbairn,
Typology, Vol. 2, Parte 3, Cap. 3.

21. Como se pode provar que o ministerio cristao niio e


sacerd6cio?
1°. Em qualquer tempo os sacerdotes humanos eram
possfveis somente como tipos; mas tipos sao possiveis somente
antes da revela<;;ao do antftipo. 0 fim por que foi institufdo o
sacerd6cio araonico cumpriu-se em Cristo, e por isso a insti-
tui<;;ao sacerdotal foi abolida para sempre por Cristo - Heb.
10:1,9,18.
2°. Cristo cumpre perfeitamente todos os deveres e fins
j
do offcio sacerdotal, de modo que qualquer sacerdote humano
(assim chamado) e urn anticristo- Heb. 10:14; Col. 2:10.
3°. Nao pode haver necessidade de sacerdote para

552
0 Oficio Medianeiro de Cristo
abrir-nos caminho para Cristo, porque as Escrituras nos
ensinam que e somente por Cristo que podemos chegar ao Pai,
J oao 14:6, e com igual enfase nos ensinam que nos e neces-
saria chegar direta e imediatamente a Cristo- Mat. 11 :28; Joao
5:40; 7.37; Apoc. 3:20; 22:17.
4°. No Novo Testamento nunca se atribui nenhuma fun-
~ao sacerdotal a qualquer dos oficiais nele mencionados, quer
inspirados quer nao, quer ordinarios quer extraordinarios.
Todos os deveres de todos esses oficiais constavam s6 das
fun~6es de ensinar e governar- 1 Cor. 12:28; Ef. 4: 11,12; 1
Tim. 3;1-3; 1 Ped. 5:2.
5°. Sao chamados constantemente por nomes indicativos
de uma classe inteiramente diversa de fun~6es, tais como
"mensageiros, atalaias, arautos da salva~ao, mestres, governa-
dores, administradores, pastores e presbiteros". Veja Bibl.
Repertory, Janeiro, 1845.

22. Em que sentido todos os crentes sao sacerdotes?


Apesar de nao poder existir na Igreja Crista uma classe de
sacerdotes que intervenham entre seus irmaos e Cristo,
contudo, em conseqii<~ncia da uniao, tanto federal como vital,
que existe entre cada cristao e Cristo, a qual envolve comunhao
com Ele em todas as Suas grac;as humanas e em todas as Suas
fun~6es medianeiras, todo crente tern parte no sacerd6cio do
Seu Cabe~a num sentido tal que tern acesso imediato a Deus
por Cristo, ate ao mais santo lugar- Heb. 10: 19-22; e que,
sendo santificado e qualificado espiritualmente, pode oferecer
ali, como "sacerdote santo", "sacerdote real", sacrificios
espirituais, nao expiat6rios, e sima obla~ao de louvor, suplicas
e a~6es de gra~as, por Jesus Cristo, e pode fazer intercessao por
seus amigos vivos- Heb. 13:15; 1 Tim. 2:1,2; 1 Ped. 2:5,9.
Pelo mesmo motivo eles sao tambem profetas e reis em
comunhao com Cristo- 1 Joao 2:20; Joao 16:13; Apoc. 1:6;
5:10. . . "'c!""

553
Capitulo 24
EXPOSI<:;OES AUTORIZADAS

A doutrina CATOLICO-ROMANA do sacerd6cio crisHio ...


Concilio de Trento, Sess. 23, Cap. 1: "0 sacrificio e o
sacerd6cio de tal modo sao unidos por determina~ao de
Deus, que urn e outro se encontram em todas as leis. Como,
pois, no Novo Testamento a igreja cat6lica recebeu por
institui~ao do Senhor o santo e visivel sacramento da
eucaristia; devemos tambem confessar que nela ha urn
novo e visivel sacerd6cio, ao qual o antigo se transferiu.
Este sacerd6cio, como mostram as Sagradas Letras, e
ensinou sempre a tradi~ao da igreja cat6lica, foi institl,lido
pelo mesmo Salvador nosso, o qual deu aos ap6stolos e
seus sucessores no sacerd6cio o poder de consagrar,
oferecer e ministrar o Seu corpo e Seu sangue, e tambem
de remitir e reter os pecados".
A doutrina PROTESTANT£ ...
Conf Helv., 2: cap. 18: "0 oficio sacerdotal e o oficio
ministerial diferem muitissimo urn do outro. Aquele e
comum a todos os cristaos; este nao. No Novo Testamento
de Cristo nao ha mais urn sacerd6cio tal como o que existiu
entre o povo antigo, que tinha uma un~ao externa,
vestimentas santas e numerosas cerimonias, que eram
tipos de Cristo, o qual, vindo e cumprindo-os, tern ab-
,rogado todas estas coisas. Mas Ele permanece eterna-
mente o (mico Sacerdote, e para que nada derroguemos
dEle, nao damos o nome de sacerdote a ninguem da classe
dos ministros. Porque o proprio Senhor nosso nao ordenou
na lgreja do Novo Testamento nenhum sacerdote para
oferecer diariamente o sacrificio do Seu corpo e do Seu
:sangue, e sim, unicamente ministros para pregarem e
administrarem os sacramentos".
A doutrina SOCINIANA sabre os oficios medianeiros
de Cristo ...
0 Catecismo Racoviano ensina que Cristo e tanto
Sacerdote como Profeta e Rei. Mas ocupa cento e oitenta
:paginas (Se~ao 5) com a discussao do Seu oficio profetico,
e s6 onze paginas (Se~ao 6) com a discussao do Seu oficio

554
0 Oficio Medianeiro de Cristo
sacerdotal, e nove (Se<;ao 7) com a discussao do Seu oficio
real. Sua morte e a maneira pela qual ela contribui para a
nossa salva<;ao sao discutidas (Se<;:ao 5 do cap. 8) sob o
titulo de Seu oficio profetico, enquanto que a Sua obra
sacerdotal, discutida muito vagamente, e representada
como constando principalmente da Sua apresenta<;ao de
Si no ceu como nosso Advogado, sendo eficaz para com
Deus a Sua intercessao em decorrencia de Suas virtudes e
de Seus sofrimentos como martir.

·.·;,

) : ~ ... k. :·' . • ,•

555
25

A Propicia~ao: sua Natureza,


N ecessidade, Perfei~ao e Ext en sao

A NATUREZA DA PROPICIA<;AO

1. Como se pode definir o usa e o verdadeiro significado dos


diversos termos empregados na discussiio deste t6pico?
1°. A palavra agora empregada para designar a natureza
precisa da obra realizada por Cristo oferecendo-Se na cruz e
"propiciac;;:ao".
No Velho Testamento e empregada muitas vezes como
traduc;;:ao da palavra hebraicakafar, cobrir par meio de um sacrificio
expiat6rio. No Novo Testamento (no ingles) a palavra encontra-
-se apenas uma vez- Rom. 5: 11. Af a palavra grega e traduzida
por reconciliac;;:ao. Seu significado correto e fazer reparac;;:ao
moral ou legal por uma falta cometida ou urn mal praticado.
Segundo o seu uso no Velho Testamento, e tambem no seu uso
correto e teol6gico, ela nao exprime a reconciliac;;:ao efetuada
por Cristo, e sim a satisfa~ao legal que e o motivo dessa
reconcilia~ao.
Seu sentido e muito limitado para exprimir adequada-
mente a natureza completa da obra que Cristo realizou como
nosso Substituto; porque, conquanto signifique propriamente
expia~ao de culpa, efetuada no sofrer a pena do pecado, deixa
inteiramente de exprimir o fato de que Cristo tambem
adquiriu para nos, mediante Sua obediencia ativa, o premia
positivo da vida eterna.

556
A PropiciafiiO ...
2°. A palavra antiga empregada pelos te6logos do seculo
17 era "SA TISF A<;AO". Des sa forma se expressa a cur ada e
adequadamente o que Cristo fez. Como o segundo Adao, Ele
cumpriu todas as condi~6es da quebrada alian~a das obras,
como foi deixada pelo primeiro Adao. (a) Ele sofreu a pena da
transgressao. (b) Prestou a obediencia que foi a condi~ao para
que houvesse "vida".
3°. Distin~ao entre SATISFA<;AO PENAL e SATISFA<;Ao
PECUNIARIA. A primeira diz respeito a crimes e pessoas; a
segunda a dividas e coisas. Elas diferem: (1) Em crimes a
exigencia de se fazer expia~ao termina na pessoa do criminoso;
em dividas, na coisa devida. (2) Em crimes exige-se urn sofri-
mento que, em qualidade, grau e dura~ao, a razao esclarecida
julga exigida pela justi~a; em dividas exige-se exata e
unicamente a coisa devida, urn quid pro quo* exato. (3) Em
crimes e admissivel urn sofrimento vicario somente adiscri~ao
absoluta do soberano; e a conseqi.iente soltura do criminoso e
questao de gra~a; em dfvidas o pagamento da coisa devida,
seja quem for que o fa<;;a, livra ipso facto; e sua aceita<;;ao e a
soltura do devedor nao sao questao de gra<;;a. (Turretino, L.l4;
Qs. 10).
4°.0 significado do termo PENA, e a distin<;;ao entre
CALAMIDADES, CASTIGOS e MALES PENAIS. Calamidades sao
sofrimentos considerados sem referencia alguma ao designio
com que sao infligidos ou permitidos. Castigos sao sofrimentos
como fim de melhorar moralmente o sofredor. Males penais
sao sofrimentos infligidos com o desfgnio de satisfazer as
exigencias da justi<;;a e da lei. Pena e essa especie e grau de
sofrimento que o legislador e juiz supremo determina como
legalmente e, com justi<;;a, devido no caso de qualquer crimi-
noso espedfico. Se urn substituto submeter-se a esses sofrimen-
tos, nao deixarao de ser a pena da lei, se de fato satisfizerem a

* Isto por aquilo (urn pelo outro). Em latim no original. Nota de Odayr
Olivetti.

557
Capitulo 25
lei. A natureza e o grau dos sofrimentos podem com justi~a
ser mudados com a mudan~a da pessoa que os padece, porem
o carater deles como pena permanece, ou o substituto incorre
em falta.
5°. Significado das palavras SUBSTITUI<;Ao e VICARIO.
Substitui~ao eo a to de gra~a de urn soberano, quando permite
que uma pessoa nao obrigada desempenhe urn servi~o ou sofra
urn castigo no lugar de uma pessoa obrigada. 0 desempenho
desse servi~o e o padecimento da pena pelo substituto, e o
substituto que desempenha o servi~o e padece a pena sao
vicarios, is toe, em vez de (vice), como tam bern a favor ~a pessoa
originalmente obrigada. .~
6°. EXPIA<;,AO e PROPICIA<;AO. Estas duas palavras repre-
sentam o termo gregohilaskethai. Quando empregado com ton
the6n, taus theous, como eo caso constantemente nos classicos,
significa fazer propicia~ao pelo pecado por meio de urn
sacrificio de expia~ao. No Novo Testamento e empregado com
tas hamartias- Heb.2: 17, e significa expiar a culpa do pecado.
Expia~ao tern referencia arela~ao da satisfa~ao com o pecado
ou com o pecador. Propicia~ao tern referencia ao efeito
produzido pela satisfa~ao em remover assim o desprazer
judicial de Deus.
7°. IMPETRA<;Ao e APLICA<;Ao. Impetra~ao significa a
obten~ao merit6ria, por meio de sacrificio, dessa salva~ao que
Deus prepara para Seu povo, e aplica~ao refere-se aos atos pelos
quais Deus aplica a salva~ao a Seu povo no processo que
principia com a justifica~ao e a regenera~ao, e termina com a
glorifica~ao.
8°. 0 uso das palavras PROPICIA<::AO e REDEN<::AO. (1) Durante
os seculos 16 e 17 as palavras reden~ao e propicia~ao foram
empregadas por todos, calvinistas e arminianos, como
equivalentes, como, e.g., nos tratados de Baxter e do Dr. Isaac
Barrows sobre Universal Redemption. (Veja Cunningham, Hist.
Theol., Vol. 2, pag. 327, eo Dr. H. B. Smith, em Hist. ofDoct.,
por Hagen bach, Vol. 2, pags. 356, 357. Tam bern a Confissiio de

558
A PropiciafiiO ...
Fe, cap.8, § 1, eo Catecismo Maior, Perg. 59.) (2) Nos tempos
modernos alguns defensores calvinistas de uma propicia<;;:ao
indefinida distinguem assim entre os dois termos: dizem que
a propicia<;;:ao, ou a impetra<;;:ao sacrificial da salva<;;:ao, foi feita
indefinidamente a favor de todos os homens; mas que a
reden<;;:ao, entendendo-se por este termo a aplica<;;:ao que Deus
tencionava fazer da salva<;;:ao, como tam bern a sua impetra<;;:ao,
e limitada aos eleitos (Dr. W B. Weeks, em Atonement, por
Park, pag. 579). (3) Nas Escrituras propicia<;;:ao (kippurim)
significa a expia<;;:ao da culpa por meio de uma pama vicaria, a
fim de propiciar a Deus. Mas o uso biblico da palavra reden<;;:ao
e menos definido e mais compreensivo. Significa livramento
de perda ou de ruina pelo pagamento de urn resgate, que o
nosso substituto (Cristo) fez por nos. Por isso ela pode significar
ou, (a) o ato de urn so substituto pagando esse resgate, e en tao
significa o mesmo que propicia<;;:ao - Gal. 3: 13; ou, (b) pode
significar o nosso conseqiiente livramento especial do nosso
estado de perdidos, como a "morte" ou o "diabo" -Col. 2:15;
Os. 13: 14; ou, (c) o nosso completo revestimento da plena
salva<;;:ao assim alcan<;;:ada- Ef. 1:14; 4:30; Rom. 8:23; etc.
9°. MERITUM e SATISFACTIO. Esta distin<;;:ao foi primei-
ramente assinalada por Tomas de Aquino (l227-l274),Summa
Theologit£, Parte. 3: Q. 48,49. Cristo, como o segundo Adao,
cumpre por nos todas as condi<;;:6es da alian<;;:a das obras, que
fora rompida.Satisfactio exprime a qualidade eo efeito de toda
a Sua obra terrena de obediencia sofredora, mesmo ate a morte,
considerada como urn padecimento da pena, a fim de livrar
dela o Seu povo. Meritum exprime a qualidade eo efeito da
mesma obra considerada como a presta<;;:ao daquela obediencia
que era para o Seu povo a condi<;;:ao para terem a vida. N a
teologia protestante exprime-se esta distin<;;:ao empregando-se
as express6es obediencia ativa e passiva, ou referindo-se a uma
so obra vicaria de Cristo, considerada (a) como urn sofrimento
de males penais, e (b) como obediencia as exigencias da alian<;;:a.

559
Capitulo 25
2. Qual a diferenfa entre as relafoes "natural", "federal" e
"penal" que os homens mantem com a lei divina?
1°. Toda criatura moral, no momento da sua cria<;;ao e em
conseqiiencia da sua natureza, fica necessariamente obrigada
a conformar-se em estado e em ato a lei divina de perfei<;;ao
moral absoluta, e qualquer falta de conformidade e pecado.
Esta rela<;;ao e"natural", perpetua e inalienavel, e e impossivel
que uma pessoa a tome sobre si em lugar de outra, ou como
seu representante.
2°. Aprouve a Deus, por Sua gra<;;a, por o homem, quando
da sua cria<;;ao, sob uma alian<;;a especial, na qual, sob a condi<;;ao
de obediencia perfeita, para a qual estabeleceu uina prova
especial, em condi<;;6es favoraveis e por urn periodo limitado,
Ele prometeu do tar a ra<;;a humana de "vida eterna", com o
estabelecimento, inclusive, de urn carater indefectivel e santo,
e de uma heran<;a celeste para sempre, sendo a alternativa a
pena de "morte" imediata. Esta e a rela<;;ao "federal" com a lei,
da qual a ra<;;a in teira, representada ·por Adao, cai u original-
mente, e na qual os eleitos, representados por Cristo, sao
subseqiientemente habilitados a conservar-se firmes.
3°. Pela queda de Adao todos os homens se encontram
numa rela<;;ao "penal" a Lei, da qual os eleitos estao isentos,
devido ao fato que Cristo a assumiu voluntariamente a favor
deles.

3. Que eantinomismo? E como se pode mostrar que essa heresia


abomimivel niio esta, de maneira alguma, envolvida na doutrina
geral dos reformadores protestantes e dos que os seguem?
0 "antinomismo", como a palavra o da a conhecer, e a
doutrina segundo a qual Cristo satisfez todas as exigencias da
lei moral a favor de todos os eleitos, ou de todos os crentes,
num senti do tal que eles nao tern mais nenhuma obriga<;;ao de
cumprir os seus preceitos como o padrao do carater e dos atos.
Essa doutrina horrivel, da qual Paulo foi caluniosamente
acusado, foi por ele repudiada - Rom. 3:8; 6: l.

560
A Propiciafiio ...

Em sua rea<;:iio natural contra a doutrina papal de uma


justi<;:a de obras, Lutero e Melanchthon no prindpio usaram
algumas express6es menos pensadas que parecem sugerir essa
heresia. Todavia, todo o seu sistema teol6gico, o espirito de
sua vida eo grosso dos seus escritos estiio afastados dela o
mais que e possivel. Quando 0 verdadeiro antinomismo foi
conseqti.entemente ensinado por Joiio Agricola Ct 1566), Lutero
se opos a ele vigorosamente, refutou-o com exito eo obrigou a
retirar-se. Alguns hipercalvinistas ingleses do seculo 17,e.g., o
Dr. Crisp, rei tor de Brinkworth Ct 1642), foram acusados dessa
heresia, porem eles negaram as inferencias que outros tiraram
da sua doutrina. Muitas vezes o calvinista tern sido acusado
pelos arminianos de antinomismo (maliciosa ou ignorante-
mente) como uma inferencia necessaria. Como tendencia, ele
naturalmente assalta o cora<;:iio humano, quando o entusiasmo
religioso niio e moderado pelo conhecimento biblico e pela
verdadeira santifica<;:iio, e a essa tendencia estiio em perigo de
sucumbir os fanaticos ignorantes e todas as classes de per-
feccionistas.
Eevidente que as doutrinas da satisfa<;:iio feita por Cristo e
da justifica<;:iio pela imputa<;:iio da Sua justi<;:a, nos termos
mantidos pelas igrejas luteranas e reformadas, nada tern em
comum como antinomismo. Elas ensinam- (1) Que Cristo
cumpriu por Seu povo somente as obriga<;:6es federais e penais
da Lei, e que a Sua obediencia e os Seus sofrimentos nessa
relafiio constituem Sua justi<;:a, que e imputada ao que nEle
ere. (2) Que a propria finalidade da satisfa<;:iio feita por Cristo
e "nos remir de toda iniquidade, e purificar para si urn povo
seu especial, zeloso de boas obras" - Tito 2:14. (3) Que os
cremes permanecem toda a sua vida sob a rela<;:iio "natural"
com a lei, e esta e intransferivel pessoalmente e nela seriio
gradativamente aperfei<;:oados por aquela santifica<;:iio que a
justi<;:a de Cristo impetra para eles. Veja Julio C. Hare,
Vindication ofLuther.

561
Capitulo 25
4. Como se pode mostrar que a perfeita satisfafiio realizada par
Cristo abrange tanto a Sua obediencia "ativa" como a "passiva", e
tambem a relafiio de cada um destes elementos com a nossa
justificafiio?
Cristo, conquanto fosse hornern, foi urna pessoa divina.
Como tal, Ele voluntariarnente subrneteu-Se a condi<;ao de
"nascido sob a lei", e toda a Sua obediencia terrestre a lei ern
condi<;6es hurnanas foi tao vicaria como o forarn os Seus
sofrirnentos. Sua obediencia "ativa" abrange Sua vida inteira e
Sua rnorte, consideradas como urna obediencia vicaria. Sua
obediencia "passiva" abrange Sua vida inteira e especialrnente
a Sua rnorte sacrificial, considerada como urn padecirnento
vicario.
Adao representava a ra<;a sob a alian<;a original das obras,
feita segundo a gra~a de Deus. Ele caiu, perdendo o direito a
vida eterna, cuja condi<;ao era obediencia perfeita, e incorreu
na pena de rnorte, que era a pena irnposta a desobediencia.
Cristo, o segundo Adao, assurniu por Seus eleitos a alian<;a
que Adao tinha abandonado. Cristo (a) sofreu a pena- "a alma
que pecar, essa rnorrera", (b) adquiriu o prernio- "aquele que
fizer estas coisas vivera por elas". Toda a Sua obediencia
sofredora e vic:iria, como tarnbern os Seus sofrirnentos obedi-
entes sao urna s6 justi~a. Como obediencia "passiva", a justi<;a
de Cristo "satisfaz" a exigencia penal da Lei. Como obediencia
"ativa", ela adquiriu para n6s a vida eterna, desde a regenera<;ao
ate a glorifica<;ao. A irnputa<;ao a n6s dessa justi<;a e nossa
justifica<;ao.

5. Como se pode expor a verdadeira doutrina da satisfafiio


realizada par Cristo?
1°. Negativamente: (1) Os padecirnentos de Cristo nao fo-
rarn urn substitute posto ern lugar da execu<;ao da pena da
Lei aos pecadores ern suas pr6prias pessoas, mas forarn a
propria pena infligida ao seu Substitute. (2) Esta pena nao foi
da natureza de urn pagarnento pecuniario, urn quid pro quo

562
A Propiciafiio ...
exato; mas foi uma verdadeira satisfa<;;:ao penal, sendo urn
substituto a pessoa que a sofreu. (3) Nao foi urn mero exemplo
de castigo. (4) Nao foi urn a simples exibi<;;:ao de am or ou de
consagra<;;:ao heroica.
2°. Positivamente: ( 1) Seu MOTIVO foi o am or inefavel que
Deus tern para com os eleitos- Joao 10: 16; Gal.2:20. (2) Quanto
a sua NATUREZA, (a) Cristo e Pessoa divina, mas tomou sobre
Si as responsabilidades legais de Seu povo nas condi<;;:6es de
urn ser humano. (b) Ele obedeceu e sofreu como seu Substituto.
Sua obediencia e Seus sofrimentos foram vicarios. (c) A culpa,
ou a justa responsabilidade legal de nossos pecados, foi-Lhe
imputada, isto e, foi imposta a Ele e punida nEle. (d) Ele nao
passou pelos mesmos sofrimentos, nem quanto a qualidade,
nem quanto ao grau ou dura<;;:ao, que teriam sido infligidos a
nos pecadores, porem passou precisamente pelos sofrimentos
exigidos pela justi<;;:a divina de Sua Pessoa sofrendo em nosso
Iugar. (e) Seus sofrimentos foram os de uma Pessoa divina
sofrendo numa natureza human a. (3) Quanto aos seus EFEITOS,
(a) Foi o efeito, e nao a causa do amor de Deus. Satisfez Sua
justi<;;:a e tornou o exerdcio do Seu amor compativel com Sua
justi<;;:a. (b) Expiou a culpa do pecado e reconciliou Deus
conosco como Governador justo. (c) Alcan<;;:ou a salva<;;:ao
daqueles por quem Ele morreu, adquirindo para eles o dom
do Espirito Santo, os meios de gra<;;:a e a aplica<;;:ao e consuma<;;:ao
da salva<;;:ao. (d) Nao livra ipso facto, como seria no caso de uma
satisfa<;;:ao pecuniaria, mas, como uma satisfa<;;:ao penal e vicaria,
os seus beneficios sao aplicados as pessoas nos tempos e sob as
precondi<;;:6es prescritos pela alian<;;:a feita entre o Pai eo Filho.
Sua aplica<;;:ao e ass unto de direito da parte de Cristo, entretanto
de gra<;;:a, no que diz respeito a nos. (e) Sendo ela uma execu<;;:ao
de justi<;;:a perfeita e castigo vicario, e exemplo muito eficaz e
real de castigo para o universo moral. (f) Sendo ela urn exerdcio
de amor imenso, produz legitimamente a mais profunda
impressao moral, amolecendo o cora<;;:ao, subjugando a rebeliao
e dissipando os receios dos pecadores convictos.

563
Capitulo25
PROVA BIBLICA DA DOUTRINA j
6. Como expor o argumento derivado da natureza da justifa
divina, em apoio desta doutrina?
E evidente que Deus pune o pecado (1) por causa do
demerito intrfnseco dele, que e oposto a retidao essencial e
imutavel da natureza divina; ou, (2) por causa do mal que o
pecado faz as criaturas de Deus, sendo Ele levado a fazer isso
por urn principia de sabia benevolencia que 0 leva a restringir
o pecado, fornecendo motivos dissuasivos; ou, (3) de Sua pura
soberania.
Mas, ja temos provado (veja acima, Cap. 8, Pergs. 59-66)-
(1) Que a perfeifao moral de Deus eessencial e fundamental, e
nao produto da Sua autodetermina~ao. (2) Que em Sua essencial
perfei~ao moral se acha inclufdo urn principia de justi~a que
faz da puni~ao do pecado urn fim em si mesmo. (3) Que a
virtude, e especialmente a justi~a, nao pode ser concebida
como benevolencia desinteressada. ·
Os atributos essenciais de justi~a e benevolencia nao se
acham em conflito. Benevolencia para os que nada merecem e
grafa, que essencialmente da lugar a uma Opfao. A justifa e
livre, mas nao da lugar a uma op~ao.

7. Como expor a prova derivada da imutabilidade da lei divina,


e da verdade absoluta de Deus?
A vontade de Deus e determinada livremente por Sua
natureza. Sua lei, incluindo preceitos e castigos, e a expressao
e revela<;;iio, tanto da Sua natureza quanta da Sua verdade. Ate
onde a Lei representa a Sua natureza e o Seu prop6sito, nao
pode deixar de ser imutavel. Ate onde e uma revelafiiO desse
prop6sito, sua imutabilidade e garantida pela verdade
inviolavel de Deus.
Mas- ·,HLH•hr<'.' ._.
1°. Ele declarou que a Sua Lei e imutavel, Luc. 16:17,
isto e, a Lei revelada, em todos os seus elementos; se a lei

564
A Propiciafiio ...
cerimonial e imutavel, a fortiori a lei moral 0 e. . .
2°. E declarado que Cristo veio cumprir, e nao suspender
ou rebaixar, a Lei- Mat. 5: 17,18; Rom.3:31; 10.4
3°. E afirmado que Deus ha de punir o pecado- Gen.
2: 17; Ez. 18:4; Rom.3:26.

8. Como se pode mostrar que as Escrituras ensinam que Cristo


sofreu como nosso Substituto no sentido definido desse termo?
Substituto e quem e nomeado ou aceito para agir ou sofrer
em lugar de outrem, e seus atos ou sofrimentos sao vicarios.
Que Cristo obedeceu e sofreu como o Substituto de Seu povo
fica provado pelos fatos de que- · · ,.. · · · ~ ~·l ·'· ' · ··· ·
1o. A preposi~aohyper, como caso genitivo, significa "em
vez de", "em lugar de", Joao 11 :50; 2 Cor. 5 :20; Fm., vers. 13;
e esta constrw;:ao e empregada para expor a rela<;:ao em que
esta para conosco a obra realizada por Cristo- 2 Cor. 5: 14,21;
Gal. 3: 13; 1 Ped. 3:18
2°. A preposi<;:ao anti sempre e definidamente exprime
substitui<;:ao (Winer, N. T. Graus, Parte 3, § 47)- Mat. 2:22;
5:38. Is to se torn a ainda mais enfatico por ser ela associada a
lytron, resgate, pre<;:o redentor. Cristo veio como resgate em lugar
de muitos - Mat. 20:28; Mar. 10:45; 1 Tim. 2:6. Cristo e
chamadoantilytron, isto e, resgate substitutivo.
3°. 0 mesmo fica provado pelo que as Escrituras ensinam
quanta ao fato de que os nossos pecados sao postos sobre
Cristo. Veja abaixo, Perg. 9.
4°. Tambem fica provado pelo que elas ensinam quanto a
natureza dos sacrificios e quanta anatureza sacrificial da obra
realizada por Cristo. Veja abaixo, Pergs. 10 e 11.

9. Como igualmente se pode mostrar que Cristo morreu como


nosso Substituto, com respeito as passagens que falam em termos
de "fez cair sabre ele a iniquidade" ou de "levou sabre si o pecado"
(cf., e.g., Is. 53: 6 e 12)?
0 pecado pode ser considerado (1) em sua natureza formal,
Capitulo 25
como "transgressao da lei", 1 Joao 3:4 (ARA); ou (2) como
qualidade moral inerente ao agente (macula), Rom. 6: 11-13;
ou (3) com respeito a sua obriga<;;ao legal de sofrer puni<;;ao
(reato). E s6 neste ultimo sentido que se fala em termos de o
pecado "cair sobre" ou de "ser levado por outrem".
1°. Imputar o pecado a alguem e simplesmente coloca-lo
em sua conta como o fundamento da puni<;;ao. (1) A palavra
hebraica hasab significa estimar, ter como, imputar, creditar
algo a alguem como I he pertencendo - Gen. 31: 15; Lev. 7: 18;
Num. 18:27; Sal. 106:31. (2) Os mesmos significados tern a
palavra grega loguizomai- Is. 53: 12; Rom. 2:26; 4:3.-9; 2 Cor.
5:19. (3) As Escrituras afirmam que os nossos pecados sao
imputados a Cristo- Mar. 15:28: Is. 53:6,12; 2 Cor. 5:21; Gal.
3:13.
2°. (1) A palavra hebraica saba! tern o sentido exato de
levar, carregar, nao de tirar ou remover, Lam. 5:7. E aplicada a
Cristo levando (sobre Si) os nossos pecados - Is. 53:11. (2)
Tam bern a palavranasa, construida como vocabulo "pecado",
tern o sen tido de ser "penalmen te responsavel" por ele- N urn.
30: 15; Lev. 5: 17,18; 16:22. (3) A Septuaginta traduz essas
palavras as vezes por hairo, levar, carregar, e as vezes por fero
e anajero, que nesta conexao sempre tern o sentido de levar
sabre si, como fim de tirar, remover- Robinson, Lex. Cf Mat.
8:17 com Is. 53:4.

10. Como se pode mostrar que os sacrificios judaicos (as vitimas


oferecidas em sacrificio) eram sofredores vicarios das penas a que
estavam expostos os que os ofereciam, e que, no sentido literal, eram
tipos do sacrificio de Cristo?
Eadmitido por todos que, desde os tempos mais remotos,
ofereciam-se sacriffcios entre as na<;;6es pagas, e como fim de
propiciar a justi<;;a ofendida.
A. 0 fato de que as vitimas dos sacrificios cruentos dos
judeus sofriam vicariamente as penas devidas aos pecados dos
ofensores fica provado:

566
A PropiciafiiO ...

1°. Por suaocasiao- Lev. 4:1 a 6:13. Sempre, nesses casos,


a rela~ao era com algum pecado, alguma transgressao moral
ou cerimonial.
2°. Pelas qualificafoes das vitimas. Era preciso que fossem
da melhor classe de animais associados estreitamente aos
homens,e.g., ovelhas, touros, novilhos, cabras, bodes, pombas;
os especimes escolhidos tinham que ser os melhores do seu
genero quanto aidade, ao sexo e acondi~ao flsica- Lev. 22:20-
27; Ex. 22:30; 29:1.
3°. Pelo proprio ritual do sacrificio. Esse abrangia (1) A
imposifiiO das miios, com confissao do pecado- Lev. 1:4; 3:2;
4:4; 16:21; 2 Cron. 29:23. Este ato exprime sempre nas Escri-
turas uma transferencia da pessoa que imp6e as maos para a
pessoa ou animal ou coisa que recebe essa imposi~ao, e.g., de
autoridade oficial, Deut. 34:9; Atos 6.6; ou de virtude curadora,
Mat. 9: 18; Atos 9: 12,17; ou do pecado, Lev.16:7-22. 0 rabi
Arao Ben Chajim diz: "Onde nao ha confissao do pecado, nao
ha imposi~ao das miios"- Outram,De Sacrificiis, Div. 1., Ch.15,
§§ 8, 10, 11. Por isso a vitima, embora perfeita em si, sempre
foi chamadahattahth,pecado, Lev. 4;3, ehasam, culpa, Lev. 5:6.
(2) A imolafiio da vitima. Era oferecida pelo pecador e "aceita
em lugar dele para fazer expia~iio por ele", Lev., cap. 4, e depois
imolada, "porque e pelo sangue que se faz expia~iio pela alma"
- Lev.17:11. (3) A aspersiio do sangue, no caso de sacrificios
comuns, sobre os chifres do altar, mas no dia da propicia~iio o
sangue da vitima oferecida pelos pecados de todo o povo era
levado para dentro do veu e aspergido sobre 0 propiciat6rio,
Lev. 4:5 etc., significando isto sua aplica~iio para cobrir os
pecados e sua aceita~iio da parte de Deus.
4°. Por seu efeito, que era sempre o perdiio. "E lhe sera
perdoado" era a promessa constante- Lev. 4:20-31; 6:30, etc.
Eexpresso sempre pela palavra hebraicakafar, cobrir o pecado,
e pela palavra grega ilaskesthai, expiar ou propiciar. Veja Lev.,
caps. 4 e 5; Heb. 2:17. A tampa da area santa chamava-se
kapporeth, ilasterion,propiciat6rio, ousede de expiafiio.

567
Capitulo 25
5°. Esta e a exposi~ao que todos OS judeus instruidos fazem
destes ritos em todos os tempos subsequentes. Veja Outram,
De Sac., Div. 1., Caps. 20-22.

B. 0 fato de que, no sentido rigoroso, eram tipos do


sacrificio de Cristo fica provado ...
1°. Sao expressarnente charnados "sombras", das quais
Cristo eo "corpo", e "figuras"- He b. 9; 13-24; 10: 1,13; 11:12.
2°. Cristo assevera que a Lei, como igualrnente os profetas,
fala dEle e da Sua obra- Joao 1:45; 5:39; Luc. 24:27.
3°. Declara-se que "Cristo, nossa pascoa, foi sacrificado
por n6s"- 1 Cor. 5:7; Luc. 24:44. Cf Ex. 12:46 e Nurn. 9:12.
4°. Declara-se que Ele foi "oferecido" por Seu povo, que
Seu "sangue" foi urn sacrificio pelo pecado, etc.- Joao 1:29;
Reb. 9:26,28; 10: 12,14; 1 Ped. 1: 19; Ef. 5:2; 2 Cor 5:21.
5°. Declara-se ern toda parte que, para chegar-se por Ele a
Deus, Cristo fez precisarnente-aquilo que os antigos sacrificios
faziarn ern esfera inferior- Gal. 3: 13; Mat. 20:28; 1 Joao 2:2;
4:10; Rom. 3:24,25; 5:9,10; Ef. 1:7; 2:13; Col. 1:14-20.

0 SACERDOCIO

11. Exponha o argumento derivado do Jaw de que Cristo fez


satisfar;iio por Seu povo como seu Sumo Sacerdote.
1. 0 sacerdote era -
1°. Urn hom em escolhido dentre os hornens para
representa-los nas coisas pert en centes a Deus - He b. 5:1. Is so
era verdade especialrnente no caso do sumo sacerdote. "Ele
representava o povo todo; Israel todo era considerado como
estando nele" - Vitringa, Obs. Sac., pag. 292; Ex. 38:9-29. Se
ele pecava, o seu pecado era considerado como pecado de todo
o povo - Lev. 4:3. Ele levava sobre o peitoral do juizo* os

*Em Figueiredo: "o Racional". Ver Exodo 28:29.

568
A PropiciafiiO ...
nomes de todas as tribos. Impunha as maos sobre o bode de
propicia~ao (ou "da expia~ao") que levava o pecado, e confessava
os pecados de to do o povo - Lev. 16: 15 ,21.
2°. Tinha o direi to de se apresentar a Deus, e to do o povo
s6 tinha acesso a Deus por meio dos sacerdotes, especialmente
do sumo sacerdote. Num. 16:5.
3°. Isso os sacerdotes efetuavam por meio de sacrificios
propiciat6rios e de intercessao. Veja acima, Perg. 10. Heb. 5:1-
3; Num. 6:22-27.
2. E declarado que Cristo salva o Seu povo na qualidade
de Sumo Sacerdote.
1°. Tanto no Velho como no Novo Testamento se diz
expressamente que Ele e Sacerdote- Sal. 110:4; Zac. 6: 13;
Heb. 5:6.
2°. Ele possui todas as qualifica~6es necessarias para esse
oficio. (1) Foi escolhido dentre os homens para representa-los.
Comparar Heb. 5:1 com 2:14-18 e 4:15. (2) Foi escolhido por
Deus-Heb. 5:4-6. (3) Foi santo-Reb. 7:26. (4) Tinhao direito
de aproximar-Se de Deus- Heb. 1 :3; 9:11-14.
3°. Ele exerceu todas as fun~6es de urn sacerdote. Dan.
9:24-26; Ef. 5:2; Heb. 9:26; 10:12; 1 Joao 2:1.
4°. No momento em que se consumou a obra realizada
por Cristo, rasgou-se o veu do templo e acabou-se todo o tipico
sistema sacrificial como functus officio (como missao cumprida)
-Mat. 27:50,51.

12. Como se pode provar a verdade da doutrina acima exposta


quanta a natureza da satisfafiiO feita par Cristo, pelos efeitos que
'lhe siio atribuidos nas Escrituras?
1°. No que estes efeitos dizem respeito a Deus, declara-se
que constituem propicia~ao e reconcilia~ao. (1) Hilaskesthai
significa propiciar uma deidade ofendida por meio de urn
sacrificio expiat6rio- Heb. 2: 17; 1 Joao 2:2; 4: 10; Rom. 3:25.
(2) A palavra hebraica kajar significa, quanto ao pecado, uma
coberta, e quanto a Deus, propicia~ao. Etraduzida muito bern

569
Capitulo 25
em nossas Bfblias por fazer propiciafiio ou expiafiio, aplacar,
reconciliar, perdoar, purgar, limpar, Ez. 16:63; Gen. 32:20,21; Sal.
45:4,5; 78:38; 1 Sam. 3:14; Num. 35:31,32;resgatar, Sal. 49:8;
fazer satisfafiio (receber prefo), Num. 35:31. (3) Katallasso,
reconciliar - pela morte de Cristo, nao imputando as trans-
gress6es, justificando por sangue, etc., Rom. 5:9,1 0; 2 Cor. 5:18-
20.
2°. No que estes efeitos dizem respeito ao pecado, declara-
-se que constituem umaexpiafiio, oupropiciafiiO- Reb. 2: 17; 1
Joao 2:2; 4.10; Lev. 16:6-16.
3°. No que dizem respeito ao pecador, decla~a-se que
consti tuem redenfiio, is to e, livramento median teresgate- 1 Cor.
7:23; Apoc. 5:9; Gal. 3:13; 1 Ped.1:18,19; 1Tim. 2:5; Sal. 51:11;
62:12.
Nas mesmas frases declara-se que a obra realizada por
Cristo e(1) uma ob1as;ao expiat6ria, (2) o pres;o de urn resgate,
e (3) uma satisfas;ao dada a Lei. Portanto, somos "remidos (au
resgatados) pelo sangue precioso de Cristo como de um cordeiro
imaculado e sem contaminafiio alguma". Cristo "deu sua vida em
redenfiiO por muitos". E1e "nos remiu da maldifiio da lei, feito ele
mesmo maldifiiO por nos". '?'lquele que niio havia conhecido o
pecado, Deus fez pecado (is to e, sacrificio pelo pecado) par nos,
para que nos fossemos feitos justifa de Deus nele" (Figueiredo).
Assim, pois, nao se diz que Cristo foi feito urn sacrificio, resgate
e objeto da maldis;ao da Lei, e sim que Ele eesse genera especial
de sacrificio que e urn res gate- que a Sua obra de redens;ao e
de tal natureza que eefetuada pelo fato dEle levar a maldis;ao
da lei em nosso lugar, e que Ele nos resgata oferecendo-Se como
sacrificio cruento a Deus.

13. Em que sentido e por quais motivos foi necessaria a satisfafiio


prestada por Cristo? E como e que a verdadeira resposta a essa
pergunta confirma a doutrina ortodoxa quanta aSua natureza?
Desde que a salvas;ao dos homens e objeto da gras;a
soberana, nao poderia haver necessidade de que Deus

570
A PropiciafiiO ...
providenciasse os meios necessarios para alcan<;a-la; mas, se
Deus determinou salvar pecadores, qual o sentido em que,nesse
caso, a satisfa<;:ao prestada por Cristo foi necessaria?
1°. Os defensores da teoria sociniana ou da influencia
moral dizem que ela foi necessaria s6 contingente ou relativa-
mente, como o melhor meio imaginavel de comprovar o amor
de Deus e veneer a oposi<;:ao dos pecadores.
2°. Os defensores da teoria governamental da propicia<;ao
sustentam que ela foi relativamente necessaria unicamente
porque era o melhor exemplo que, para desviar-nos do pecado,
Deus podia dar da Sua determina<;:ao de puni-lo. · ' " ·
3°. Alguns supralapsarios, como o Dr. Twisse, presidente
da Assembleia de Westminster, a fim de exaltarem a soberania
de Deus, tern mantido que havia somente uma necessidade
hipotetica, isto e, que a satisfa<;:ao foi necessaria unicamente
porque Deus tinha determinado perdoar o pecado s6 sob essa
condi<;:ao.
4°. A doutrina verdadeira e que foiabsolutamente necessaria
como ounico meio possivel de satisfazer a justi<;:a de Deus com
referencia ao perdao do pecado. E evidente que os motivos
para uma necessidade absoluta da parte de Deus s6 podem
estar na justi<;:a imutavel da Sua natureza, justi<;:a que esta por
tras da Sua vontade e a determina.
Que a satisfa<;:ao foi absolutamente necessaria fica pro-
vado-
(1) Se fosse possivel alcan<;:ar-nos a salvac;ao de qualquer
outra maneira, Cristo teria morrido em vao- Gal. 2:21; 3:24.
(2) Deus declarou que a Sua dadiva de Jesus Cristo e a
medida do Seu grande amor ao Seu povo. Sendo assim, e
evidente que nao havia outra alternativa, porque de outro modo
o Seu amor nao teria sido o motivo do sacrificio- Rom. 5:8;
Joao 3: 16; 4:9.
(3) Paulo afirma que foi necessaria como justifica<;:ao da
justi<;:a de Deus em rela<;:ao aos pecados passados - Rom.
3:25,26.

571
Capitulo 25
E clara que, se era absoluta a necessidade de satisfa<;;ao,
deveria ter seu motivo na natureza de Deus. Sen do assim, nao
poderia ser outra coisa senao, em sua essencia, uma satisfa<;;ao
dada a justi<;;a ou retidao essencial dessa natureza. Mas uma
satisfm;iio a justi<;;a ofendida e sofrimento penal.

14. Como se pode provar que a satisfa~iio dada par Cristo inclui
tanto a Sua obediencia "ativa" como a "passiva"?
Veja acima, Perg. 1 § 8. Cristo, como o segundo Adao,
toma sabre Si as obrigas,:6es que a alians;a das obras imp6e sabre
o Seu povo no estado em que foram deixadas pela queda do
primeiro Adao. As sans;6es dessa alians;a eram- (1) "0 homem
que fizer estas coisas vivera por elas"- Lev. 18:5, comparado
com Rom. 10:5; Gal. 3:12 e Mat. 19:17. (2) A pena de morte.
Se Cristo sofresse somente a pena de morte e nao prestasse a
obediencia federal exigida de Adao, seguir-se-ia necessaria-
mente, ou (1) que Deus rnudou as condi<;;6es da lei e da "a vida
eterna" sem que fosse curnprida a condi<;;ao irnposta; ou (2)
que n6s nunca poderiarnos alcan<;;ar essa vida; ou (3) que n6s
teriarnos que comes;ar como Adao antes da sua apostasia e
curnprir ern nossas pessoas as condis,:6es da alians;a das obras.
Isso, porem, nos e impossivel, e por isso Cristo as cumpriu
por n6s por Sua obediencia.
Isso e provado -
1°. Pelas Escrituras, que declaram que Ele nao so mente
sofreu a pena, mas tambem, por Seus merecimentos, adquiriu
para n6s "a vida eterna", "a ado<;;ao de filhos" e uma "herans;a
eterna"- Gal. 3:13,14; 4:4,5; Ef. 1:3-13; 5:25-27; Rom. 8:15-
17.
2°. Pela declaras;ao expressa de que Ele nos salva tanto por
Sua obediencia como por Seus sofrimentos- Rom. 5:18,19.

15. Quale a doutrina da Jgreja quanta aperjeifiiO da SatisfafiiO


dada par Cristo?
A. Quanta ao seu valor intrinseco de satisfazer a justi<;;a,

572
A Propiciafiio ...
tern sido sustentado- ··,uc.'i';;.·. t.·. ,ru,.y~ ;~·.:~, -: ·
1°. Por Duns Scotus Ct 1308), que referiu a necessidade de
propicia<_;ao a vontade e nao a natureza, afirmando que cada
obla<_;ao criada tern o valor que a Deus apraz dar~lhe". Aprouve
a Deus, em Sua gra<_;a, aceitar os sofrimentos da natureza
humana de Cristo como suficientes, segundo o principia de
accepti latio, "tamar, segundo a vontade e voluntariamente,
nada por alguma co is a, ou urn a parte por tudo".
2°. Grotio Ct 1645), em sua grande obra De Satisfactione,
etc., afirmou que, por sera lei urn produto da vontade divina,
Deus tinha a prerrogativa inalienavel de relaxa-la (relaxatio), e
que por Sua gra<_;a relaxou-a, aceitando nos sofrimentos de
Cristo alguma coisa diversa e menor do que aquila que a lei
exigia, urn aliud pro quo, e nao urn quid pro quo.
3°. Limborch e Curceloea (t 1712 e t 1659) -Apol. Thea!.,
3:21,6, elnst. Rel. Christi, vol. 5, cap.19: § 5- sustentaram que
Cristo niio sofreu a pena da Lei, mas nos salva como urn
sacrificio que nao foi o pagamento de uma divida e, sim, uma
condi<_;ao que Deus em Sua gra<_;ajulgou suficiente, perdoando,
entao, por Suagrafa, a pena.
4°. As igrejas romana, luterana e reformada sempre tern
sustentado que a satisfa<_;ao dada por Cristo foi a de uma Pessoa
divina e, por isso, foi (1) supererrogat6ria, nao devida a Ele
proprio e podendo ser creditada a outros; (2) de valor infinito.
Desde os tempos de Tomas de Aquino, a igreja cat6lica romana
tern sustentado que e de valor superabundante e, por conseguinte,
satisfaz as exigencias da lei no estrito rigor da justi<_;a.

B. Quanta asua intenfiio e ao seu efeito-


1o. As igrejas reformadas concordam todas em sua oposi<;ao
aos romanistas e aos arminianos, defensores de uma propicia<_;ao
indefinida, sustentando que a satisfa<;ao dada por Cristo e
perfeita no sentido de nao s6 tornar possivel a salvas:ao daqueles
a favor de quem foi oferecida, mas tambem de tornar certas,
pelos merecimentos de Cristo, a aplicas:ao dessa satisfas:ao a

573
Capitulo 25 J
Seu povo e a sua completa salva~ao. ~~
2°. Os romanistas sustentam que, por meio do batismo, os .
merecimentos de Cristo (1) anulam a culpa de todos os pecados
originais e pr6prios cometidos antes do batismo, e (2) alteram
a pena dos pecados cometidos depois do batismo de morte
eterna para penas temporais. Contudo, as pessoas que depois
de batizadas cometem pecados, tern que expia-los mediante
penitencias ou obras de caridade neste mundo, ou mediante
penas sofridas no purgat6rio, no outro- Cone. de Trento, Sess.
14, cap.S, e Sess. 6, canones 29, 30.
3°. Os arminianos sustentam que a satisfa~ao dada por
Cristo torna possivel a salva~ao de todos OS homens eadquiriu
para eles gra~a suficiente, mas que o seu pleno efeito depende
da livre escolha que eles fizerem.
A verdade da doutrina reformada fica provada ( 1), pelo
fato de que as Escrituras referem o livramento da condena~ao
unicamente a morte de Cristo, e que representam como
disciplinares todos os sofrimentos dos crentes- Rom. 8:1-34;
Heb. 12:5-11. (2) Elas declaram que o sangue de Cristo "nos
purifica de todo pecado" e que "estamos perfeitos nele" que,
por "urn unico sacrificio" nos aperfei~oa - Col. 2:1 0; Heb.
10: 12-14; 1 Joao 1:7. (3) Aunica condi~ao imposta para a nossa
salva~ao e que tenhamos confian~a na obra realizada por Cristo,
e esta mesma confian~a (fe) nose dada como urn resultado dos
merecimentos de Cristo- Ef. 2:7-10. (4) Provamos acima (Perg.
14) que a satisfa~ao dada por Cristo, e como merecimento dela,
adquiriu real e perfeita salva~ao sob certas condi~6es. Veja
abaixo, Perg. 21.

16. Como se pode expor e responder as ob}efi5es que tem sido


feitas contra a verdade da doutrina ortodoxa?
1°. Os socinianos e outros objetam que, enquanto e urn
dever imperativo e uma virtude crista que os homens perdoem
livremente as ofensas, a nossa doutrina atribui a Deus o erro
maligno de ser vingativo.

574
A PropiciafiiO ...
RESPONDEMOS- (1) Que nos perdoamos o mal que se nos
faze nada temos a fazer com a puni<;:ao dos pecados, enquanto
Deus pune o pecado e nao pode sofrer males. (2) Provamos
acima (Cap.8, Pergs. 53-58), que nao se pode resolver toda
virtude em benevolencia, que a justi<;:a eatributo essencial de
Deus e que o pecado edesmerecimento intrinseco.
2°. Socino (1539-1604) e outros sustentavam que, se o
pecado epunido, nao pode ser perdoado, e se eperdoado, nao
pode ser punido, e que por isso a nossa doutrina exclui o
exerdcio da gra<;:a livre da parte de Deus em nossa salva<;:ao.
RESPONDEMOS: (1) A livre gra<;:a manifesta-se na soberana
admissao e aceita<;:ao, da parte de Deus, da substitui<;:ao feita
por Cristo, e (2) na soberana imputa~ao de Seus merecimentos
aoa pecador individual. (3) 0 fato de serem livres o amor de
Deus e Sua gra<;:a que levou Cristo a oferecer-Se, e mil vezes
mais conspicuo, a vista dos fatos de que os homens sao con-
denados com justi<;:a e de que ela inexoravelmente exigiu satis-
fac:;ao na auto-humilha<;:ao do nosso Substituto, do que poderia
ser em qualquer soberana relaxa<;:ao da lei ou por qualquer
simples perdao concedido aos arrependidos.
3°. Outra obje<;:ao e que Cristo nao sofreu a pena da lei,
porque nela foram incluidos essencialmente (a) o remorso, (b)
a morte eterna.
RESPONDEMOS: a pena da lei e essencialmente o simples
desprazer divino, envolvendo a retirada da comunhao vivifi-
cadora do Espirito Santo. Tal pena, no caso de toda criatura,
tern por conseqiiencia (a) a morte espiritual, (b) e por isso e
naturalmente eterna. Cristo sofreu esse desprazer e abandono,
Mat. 27:46, mas, sendo Pessoa divina, era impossivel que
sofresse a morte espiritual.
Ele sofreu exatamente esse genero, grau e durac:;ao de dor
que a sabedoria divina, interpretando a justi<;:a divina, exi-
giu de uma Pessoa divina sofrendo vicariamente a pena
dos pecados humanos; pela mesma razao, o sofrimento tem-
ponirio de uma s6 Pessoa divina eurn pleno equivalente legal

575
Capftulo25
do desmerecimento de toda a rac;:a humana.
4°. A objec;:ao feita por Piscator (Professor em Herborn,
1584-1625) e outros contra o reconhecimento da obediencia
ativa de Cristo como elemento componente da satisfac;:ao por
Ele prestada consiste em afirmar: (1) Que, segundo a lei, obe-
diencia e sofrimentos penais eram alternativas. Sese obedece
ao preceito, nao se deve sofrer a pena. (2) Que Cristo, como
hom em, precisava da Sua justic;:a ativa para Si proprio, como a
qualificac;:ao essencial do Seu carater pessoal.
RESPONDEMOS: (1) Como se mostrou acima, Pergs. 2 e
14, Cristo foi o nosso Representante em nossa relac;:aofederal a
lei, e nao em nossa relac;:ao natural. A Sua obediencia ativa e
passiva tern fins diversos, merecendo a primeira os premios
positivos que tern por condic;:ao a obediencia, e a segunda a
benc;:ao negativa da remissao da pena. (2) Cristo, conquanto
homem, e Pessoa divina e, por isso, nunca esteve sujeito
pessoalmente a alianc;:a das obras feita com Adao. Sendo
essencialmente jus to, nasceu debaixo da lei unicamente como
nosso Representante, e Sua obediencia debaixo das condic;:6es
da Sua vida terrestre, assumida voluntariamente, foi pura-
mente vicaria.
5°. Outra objec;:ao dos arminianos e de outros e que a
doutrina segundo a qual Cristo satisfez por n6s as exigencias
preceptivas da lei por Sua obediencia ativa, e tambem sofreu
as suas penas, conduz ao antinomismo.
A RESPOSTA a isso acha-se acima, Perg. 3.
6°. Socino e todos os demais oponentes da doutrina
ortodoxa objetam ainda que, quando a justic;:a exige satisfac;:ao
penal, essa exigencia e essencialmente pessoal. 0 que a justic;:a
ofendida exige e especificamente a punic;:ao da pessoa que
pecou. Como, entao, podem os sofrimentos infligidos a uma
pessoa que substitui arbitrariamente, pela vontade divina, o
criminoso, satisfazer as exigencias da natureza divina? Como
podem os sofrimentos de urn homem inocente substituir, aos
olhos da justic;:a, os do homem culpado?

576
A Propiciafiio ...
RESPOSTA- A substitui<;ao de Cristo, realizada a favor de
pecadores eleitos, nao foi urn ato arbitrario. Ele deu satisfa<;ao
por eles como o Cabe<;a verdadeiramente responsavel de uma
comunidade que constitui uma corpora<;ao moral, constitufda
de pessoas morais. Esta uniao responsavel com Seu povo foi
estabelecida (a) tomando Ele sobre Si, voluntariamente, as suas
responsabilidades legais, (b) reconhecendo Deus, a fonte de
toda a Lei no universo, a Cristo como Fiador, e (c) assumindo
Ele a nossa natureza. Esse e, ao menos, o testemunho da
revela<;ao, testemunho que, se nao pode ser explicado, nao pode
ser desmentido.

0 DESIGNIO DA PROPICIA<:;AO

17. Como expor, primeiro negativa e depois positivamente) a


verdadeira doutrina quanta ao designio com que o Pai e o Filho
proveram uma satisfafiio?
Negativamente-
1°. Nao ha duas opini6es entre os cristaos quanto a sufi-
ciencia dessa satisfa<;ao a fim de adquirir a salva<;ao para todos
os homens, seja grande quanto for o seu numero. E
absolutamente ilimitada.
2°. Nem quanto asuaaplicabilidade a qualquer de todos OS
pecadores humanos que em qualquer tempo tenham existido,
existam ou venham a existir. As rela<;6es de todos com a lei sao
identicas, e aquilo que salvaria urn salvaria os outros.
3°. Nem quanto aoferta que no evangelho Deus faz a "todo
o que quer". E aplicavel a todos e sera aplicada infalivelmente
a todos os cremes.
4°. Nem quanto a sua aplicafiio efetiva. Os arminianos
concordam com os calvinistas no ensino de que, dos adultos,
somente os que crerem serao salvos, e os calvinistas, como
tambem os arminianos, ensinam que todas as crian<;a que
morrem sao remidas e salvas.
5°. Nem ha diversidade de opini6es quanto ao alcance

577
Capitulo25
universal de alguns dos beneffcios adquiridos por Cristo. Os
calvinistas creem que toda a dispensac;ao de longanimidade ~
sob a qual vive a rac;a humana depois da Queda, abrangendo
justOS e injustos para benc_;aos temporais e OS meios de grac_;a, e
parte do que em nosso favor o sangue de Cristo adquiriu. Eles
admitem tambem que Cristo morreu por todos os homens
num sentido tal que por Sua morte Ele tirou todos os obstaculos
legais que impediriam a salvac;ao de todo e qualquer homem
e que a satisfac;ao dada por Ele pudesse ser aplicada a qualquer
pecador, se Deus assim quiser.
2. Mas, positivamente, a questao e qual foi o desfgnio, o
prop6sito, que o Pai eo Filho tiveram em vista na morte vicaria
de Cristo? Esse prop6sito foi tornar certa a salvac;ao dos eleitos,
ou s6 tornar possfvel a salvac;ao de todos? Sua satisfac;ao
abrange a todos indiferentemente, tanto a urn homem como a
qualquer outro? Essa satisfac;ao adquiriu e tornou certa a sua
propria aplicac;ao e todos os meios necessarios para isso, para
todos aqueles em favor dos quais foi especificamente dada? A
impetrac;ao e a aplicac;ao desta propiciac;ao abrangeram a
mesma classe de objetos? Na ordem do prop6sito divino, foi
ela urn meio para alcanc;ar o prop6sito da eleic;ao, ou e esta urn
meio para levar a efeito a satisfac;ao de Cristo, de outro modo
inoperante?
A nossa Confissao de Fe responde-
Cap. 8, § 5: "0 Senhor Jesus, por Sua perfeita
obediencia e pelo sacrificio de si mesmo ... nao somente
adquiriu a reconciliac;:ao, mas tambem uma heranc;:a
perduravel no reino dos ceus para todos os que o Pai Lhe
deu" - Cap. 8, § 6. "Como Deus tern destinado os eleitos
para a gloria, assim tambem, pelo eterno e muito livre
prop6sito da sua vontade, Ele preordenou todos os meios
para isso. Portanto, OS que sao eleitos, tendo caidos em
Adao, sao remidos por Cristo ... Nem ha outros quaisquer
que sejam remidos em Cristo ... senao s6 os eleitos."
Cap. 8, § 8. ''A TODOS aqueles para quem Cristo adqui-
riu a salvac;:ao, ele com certeza e eficazmente aplica e

578
A Propiciar;iio ...
comunica a mesma." Tambem os Artigos do Sinodo de
Dort, Cap. 2, §§ 1, 2, 8.
0 prop6sito com que Cristo morreu foi efetuar aquila que
realmente efetua no resultado. 1°. Incidentalmente, tirar todos
os obstaculos legais do caminho de todos os homens e tornar
objetivamente possivel a salvac;ao de todos os que ouvem o
evangelho, de modo que cada urn tern o direito de apropriar-
-se dela avontade; impetrar benc;aos temporais para todos e OS
meios de grac;a para todos os que deles sao supridos na
providencia divina. Todavia, 2°.Especificamente, Seu prop6sito
foi impetrar a efetiva salvac;ao do Seu povo, em todos os seus
meios, condic;6es e partes, e torna-la infalivelmente certa.
Segundo a maneira dos escolasticos agostinianos, Calvino diz
sabre Joao 2:2: "Cristo morreu suficientemente por todos, mas
eficientemente s6 pelos eleitos". Assim tambem o arcebispo
Usher, numeros 22 e 23 das Cartas publicadas por seu capelao,
Ricardo Parr, D.D.

18. Como se pode expor a doutrina arminiana sabre este assunto?


Segundo essa doutrina, Cristo tinha o prop6sito de
oferecer uma oblac;ao sacrificial a favor de todos os homens
indiscriminadamente, alcanc;ando assim para todos grac;a
suficiente e tornando os seus pecados perdoaveis, conforme os
termos da alianc;a evangelica, isto e, sob a condic;ao de terem fe
-Watson, Theol. Institutes, parte 2, Cap.25.

19. Qual era a doutrina dos ((Marrow Men", na Esc6cia?


0 livro Marrow of Modern Divinity (Medula da Teologia
Moderna) foi publicado na lnglaterra em 1646, e reeditado na
Esc6cia por Tiago Hogg, de Carnock, em 1726. Os "Marrow
Men" eram Hogg, Thomas Boston e Ralph e Ebenezer Erskine,
e os seus adeptos, naSecession Church (lgreja Dissidente). Eram
perfei tam en te ortodoxos com respei to a referencia da
propiciac;ao aos eleitos. A sua peculiaridade consistia em
acentuarem a referencia geral da propiciac;ao a todos os hom ens.

579
Capitulo25
Diziam que Cristo nao morreu por todos, mas que e morto,
isto e, e aproveinivel, por todos. "Deus deu o dom de Cristo a
todos os homens", diziam eles. Eles distinguiam entre o Seu
"amor que da", que e universal, eo Seu "amor que elege", que
e especial (Marrow of Mod. Divinity). 0 Dr. John Brown disse
perante o Sfnodo da United Secession Church (lgreja Dissidente
Unida), em 1845: "No sentido dos universalistas, que dizem
que Cristo morreu para adquirir a salva~ao, eu sustento que
Ele morreu so pelos eleitos. No sentido dos arminianos, que
dizem que Cristo morreu para alcan~ar condi~oes mais faceis
de salva~ao, e gra~a comum para habilitar os h()mens a
cumprirem essas condi~oes, mantenho que Ele nao morreu
por ninguem. No sentido da maioria dos calvinistas, que dizem
que Cristo morreu para tirar os obstaculos legais do caminho
da salva~ao humana, dando satisfa~ao perfeita pelo pecado, eu
sustento que Ele morreu por todos os homens" - Rev. A.
Robertson, History of Atonement Controversy in Secess. Church
(Hist6ria da Controversia sabre a Expia~ao na lgreja Dissi-
dente).

20. Como se pode expor a doutrina de Amyraldus, da escola


francesa de Saumur, e de Baxter, na Jnglaterra?
Sua doutrina e a teoria do universalismo hipotetico ou
condicional, que sustenta que Deus entregou Seu Filho a
morte a fim de prover reden~ao para todos os homens
indiscriminadamente, fazendo depender o seu gozo efetivo da
sua livre apropria~ao dela. Ao mesmo tempo, Ele quer dar
soberanamente a gra~a eficaz que determina somente os eleitos
para a apropria~ao pessoal da reden~ao.
A doutrina comum dos calvinistas logicamente faz do
decreta de provisao da reden~ao o meio para levar a efeito o
decreta de elei~ao. A teoria francesa e de Baxter faz do decreta
da elei~ao o meio pelo qual se leva a efeito o prop6sito geral da
reden~ao. Estas "novidades" os seus defensores procuraram
explicar de conformidade com as doutrinas ortodoxas perante

580
A PropiciafiiO ...
o sinodo frances de 1637, e foram virtualmente condenadas.
Vcja Richard Baxter, Universal Redemption of Mankind by the
Lord Jesus Christ (A Reden<;;iio Universal da Humanidade pelo
Senhor Jesus Cristo) e a resposta de John Owen em sua obra
Death of Christ (A Morte de Cristo), etc.

21. Como expor as provas biblicas em que se ap6ia a doutrina


calvinista quanta ao "Prop6sito da Propiciafiio"?
1°. Comprova-a o fato de que s6 esta doutrina condiz com
a doutrina biblica de que Deus, soberanamente e desde a
ctcrnidade, elegeu certas pessoas para a vida eterna e todos os
meios necessarios para produzirem este resultado. Eclaro que
dar satisfa<;;iio especialmente pelos eleitos e urn meio racional
para levar a efeito o decreta de elei<;;iio. Por outro lado, porem,
a elei<;;iio de alguns para a fee o arrependimento nao e provisao
racional para levar a efeito o prop6sito de remir todos os homens.
R. Watson (Institutes, vol. 2, pag. 411) declara que a teoria de
Baxter, etc. "e a teoria mais inconseqiiente a que tern ensejado
os esfor<;;os feitos no sentido de modificar o calvinismo". Claro
csta que, se Deus tinha o prop6sito de que fossem com certeza
salvos os eleitos, e os outros deixados a sofrer as justas conse-
qiiencias de seus pecados, Cristoniio poderia ter o prop6sito de
que todos os homens indiferentemente gozassem dos beneficios
da Sua morte.
2°. Seu prop6sito manifesta a propria natureza da
propicia<;;iio, como acima foi provado. ( 1) Cristo expiou os
nossos pecados como nosso Substituto no sentido restrito. Ora,
urn substituto representa pessoas definidas, e seu servi<;;o,
quando aceito, realmente livra de suas obrigas;6es as pessoas a
favor de quem o servi<;;o foi prestado. (2) Cristo, sendo o nosso
Substituto debaixo da "alian<;;a das obras", satisfez real e
perfeitamente todas as exigencias da alian<;;a. Neste caso, as
pr6prias condi<;;6es da alian<;;a estipulam que as pessoas a favor
das quais essas condi<;;6es foram cumpridas gozem a
rccompensa merecida pelo Substituto. Nao e a possibilidade

581
Capitulo25
de vida, e sim a vida mesma que e prometida.
3°. As Escrituras declaram em toda parte que o designio e
o efeito legal da obra de Cristo nao foram para que se tornasse
possivel a salva~ao do pecador, e sim salva-lo efetivamente;
reconcilia-lo com Deus, e nao sornente torna-lo reconciliavel
-Mat. 18:11; Rom. 5:10; 2 Cor. 5:21; Gal. 1:4; 3:13; Ef. 1:7;
2:16.
4°. As Escrituras ensinarn ern toda parte que Cristo, por
Sua obediencia e rnorte, adquiriu a fe, o arrependirnento e as
influencias do Espirito Santo. Segue-se que deve ter adquirido
estes dons para aqueles por quem Ele obedeceu e sofreu, e por
conseguinte, nao podern ser as condi~6es de que depende o
gozo dos beneficios da Sua rnorte. "Deus ... nos aben~oou corn
todas as benfdos espirituais nos lugares celestiais em Cristo." 0
Espirito Santo "abundanternente Ele derrarnou sobre n6spor
Jesus Cristo nosso Salvador"- Tito 3:5,6; Gal. 3: 13,14; Fil. 1:29;
Tito 2: 14; Ef. 5:25,27; 1 Cor. 1:30.
5°. Cristo rnorreu ern conforrnidade corn os terrnos de urna
alian~a eterna entre Ele eo Pai. Isso e certo- (1) Porque tres
Pessoas eternas e inteligentes s6 podern ter tido urn plano
rnutuo compreendendo todas as Suas obras, prescrevendo a
cada urna delas a Sua parte nele. (2) As Escrituras referern-se
rnuitas vezes a essa alian~a- Sal. 89:4,5; Is. 42:6,7; 53:10,12.
(3) Cristo referiu-Se constanternente a ela enquanto a executava
- Luc. 22:29; Joao 6:38; 10:18. (4) Cristo reivindica o prernio
ou recornpensa estipulada- Joao 17:4-9. (5) Cristo fala sobre
os que Lhe haviarn sido dados pelo Pai- Joao 10:25-29; Joao
17:11 etc. Portanto, Jesus Cristo rnorreu especificarnente por
aqueles que o Pai Lhe dera.
6°. Declara-se sernpre que aquilo que rnotivou esse
sacrificio de Si rnesmo ea rnais exaltada forma de amor pessoal
- Joao 15:13; Rom. 5:8; 8:32; Gal. 2:20; Ef. 3:18,19; 1 Joao
3:16; 4:9,10. ~/'".:·' '
7°. A doutrina de que Cristo rnorreu especificarnente pelos
eleitos acha-se exposta ern toda parte nas Escrituras - Joao

582
A Propiciafiio ...
10:11,15; Atos 20:28; Rom. 8:32-35; Ef. 5:25-27.

22. Se Cristo morreu unicamente par Seu povo,em que eque


se ap6ia a oferta geral do evangelho?
"0 Senhor Jesus, para alcan~ar a salva~ao do Seu povo, e
com este fim especificamente em vista, cumpriu as condi~6es
da lei ou da alian~a sob a qual o Seu povo e todos os homens
estavam colocados. Essas condi~6es eram - (1) Perfeita
obediencia; (2) Satisfa~ao dada a justi~a divina. A justi~a de
Cristo consta, pois, da Sua obediencia e morte. Essa justi~a e
precisamente aquila que a lei exige de todo pecador para a sua
justifica~ao perante Deus. Esta, pois, em sua natureza, adaptada
a todos os pecadores que estavam debaixo dessa lei. Sua
natureza nao ficou mudada pelo fato de que foi adquirida s6
para uma parte de tais pecadores, nem pelo que lhes foi
alcan~ada em virtude de uma alian~a entre o Pai eo Filho. 0
que e necessaria para a salva~ao de urn s6 homem e necessaria
para a salva~ao de outro e de todos. Etam bern de valor infinito,
por sera justi~a do Filho eterno de Deus, e por isso suficiente
para todos"- Hodge, Essays, pags. 181 e 182.
A todos os homens se deve, pois, oferecer de boa fe o
evangelho-
1°. Porque a satisfa~ao dada alei e suficiente para todos.
2°. Porque e exatamente adaptada areden~ao de todos.
3°. Porque e do prop6sito de Deus salvar a todos OS que
creem em Cristo. Assim, a propicia~ao torna objetivamente
possivel a salva~ao de todo aquele a quem for oferecida. 0
designio da morte de Cristo foi adquirir a salva~ao do Seu povo;
mas e incidental que essa obra inclua tambem a oferta livre, e
feita de boa fe, da salva~ao a todos os homens, sob a condi~ao
de terem fe em Cristo. Ninguem se perde por falta de uma
propicia~ao, nem porque haja outro obstaculo que lho impe'5a,
a nao ser sua propria vontade liberrima e rna.

23. Como se pode conciliar a condenafiio dos homens par

583
Capitulo 25
rejeitarem a Cristo com a doutrina de que Ele s6 morreu pelos eleitos?
Uma salva~ao totalmente suficiente e exatamente adaptada
as suas necessidades e oferecida de boa fe a todo homem
a quem chega o evangelho, e nao ha como nao seja dele, se
ele crer, senao unicamente por sua propria rna disposi~ao. E
claro que ele nada tern a fazer com o designio que Deus teve
em vista provendo essa salva~ao, alem da promessa positiva
de que Deus a tenciona dar-lhe, se crer. Se urn homem e res-
ponsavel por seu maucora~aoe pelo exercicio detodas as suas
faculdades, e por certo digno de condena~ao por rejeitar
urn Salvador tao bondoso.

24. Como se deve explicar as passagens que falam em Cristo


levar ou tirar os pecados do MUNDO e em morrer por TODOS?
Sao passagens como Heb. 2:9; 1 Cor. 15:22; 1 Joao 2:2; 1
Tim. 2:6; Joao 1:29; 3: 16,17; 6:51. Os termos "mundo" e "todos"
inquestionavelmente sao empregados com graus muito diversos
de latitude nas Escrituras. Em muitas passagens essa latitude
e evidentemente limitada pelo contexto,e.g., 1 Cor. 15:22; Rom.
5:18; 8:32; Joao 12:32; Ef. 1:10; Col. 1:20; 2 Cor. 5:14,15.
Noutras passagens a palavra "mundo" e empregada em oposi-
~ao a na~ao judaica, povo de privilegios exclusivos - Rom.
11:12,15; 1 Joao 2:2. E evidente que afirma~6es quanto ao
designio da morte de Cristo, envolvendo semelhantes termos
gerais, e preciso limitar pelas afirma~6es mais definidas acima
referidas. As vezes e empregada esta forma geral de afirma~ao
para real~ar o fato de que, sendo Cristo uma s6 vitima, fez
expia~ao por tantos mediante urn s6 sacrificio. Compare Mat.
20:28 com 1 Tim. 2:6 e Heb. 9:28. E conquanto Cristo nao
tenha morrido com a inten~ao de salvar todos, mesmo assim
sofreu a pena dessa lei, debaixo da qual todos se achavam, e
agora oferece a todos a justi~a assim adquirida.

25. Como devemos entender as passagens que falam da


possibilidade de perecerem aqueles par quem Cristo morreu?

584
A Propiciafiio ...
Tais passagens sao hipoteticas e exp6em com verdade a
natureza e tendencia do ato contra o qual nos admoestam, e
sao meios utilizados por Deus, sob a administra~ao do Seu
Espfrito, para cumprir Seus prop6sitos. Deus trata os homens
sempre dirigindo motivos asua inteligencia e asua vontade, e
assim cumpre Seus pr6prios designios por meio dos homens.
No caso do naufragio de Paulo, era certo que ninguem
pereceria; contudo, todos pereceriam se os marinheiros nao
permanecessem no navio- Atos 27:24-31. Segundo o mesmo
principio se deve explicar passagens como Heb.10:27-30; 1
Cor. 8: 11 e todas as demais semelhantes a essas.

HISTORIA DAS DIVERSAS OPINIOES


MANTIDAS NA IGREJA

26. Como se pode expor o carater geral da soteriologia dos


chamados santos pais?
1°. Desde o principio os "Pais" cristaos representativos
ensinavam de maneira indigesta e nao cientifica que Cristo
sofreu como Substituto do Seu povo, para expiar o pecado e
propiciar a Deus. Aplicavam livremente a obra realizada por
Cristo a linguagem sacrificial das Escrituras. Outram,Disc. 1,
cap. 17: "Quanto ao que diz respeito aobra de Cristo como o
Redentor dos homens, achamos ja na linguagem empregada
sobre este ponto pelos "Pais" da Igreja, no periodo que
consideramos, todos os elementos fundamentais da doutrina
como essa veio depois a ser definida pela lgreja"- Neander,
Ch. Hist., vol. 1, pag. 640; veja os testemunhos abaixo
registrados.
2°. Junto com estes sentimentos houve, em combina~ao
com eles, durante todos os primeiros seculos ate ao tempo de
Anselmo, mna teoria acentuada especialmente por Origenes
(185-254) e Irineu (c. 120-200), segundo a qual Cristo foi
oferecido por Deus como pre~o do res gate do Seu povo, res gate
pago a satanas, a cujo poder estavam sujeitos por ele os haver

585
Capitulo25
conquistado. Essa teoria fundava-se em passagens como Col.
2:15 e Heb. 2:14.

27. Como se pode expor, em termos gerais, as quatro teorias sob


uma ou outra das quais se pode agrupar todas as opinioes mantidas
em qualquer tempo sabre a natureza da reconciliar;iio efetuada por
Cristo?
1a. AMISTICA. Esta teoria, embora tenha assumido diversas
formas, pode ser exposta, em termos gerais, assim: a recon-
cilia<;:ao efetuada por Cristo foi operada pela uniao misteriosa
de Deus e o homem realizada na Sua encarna<;:ao, e .nao por
Sua morte sacrificial. Esta e a teoria defendida por alguns dos
santos "Pais" que adotaram a filosofia de Platao, pelos disc:i-
pulos de Scotus Erfgena durante a Idade Media, por Osiander
e Schwenkfeld no tempo da Reforma, e pela escola de
Schleiermacher, entre os te6logos alemaes modernos.
2a. A TEORIA DA INFLUENCIA MORAL, distintivamente
elaborada primeiro por Abelardo (1079-1142) e mantida pelos
socinianos e por trinitarios tais como Maurice, Young, Jowett,
Bushnell, etc. Os pontos envolvidos sao- (1) Nao haem Deus
urn prindpio tal como a justi<;:a vindicativa. (2) A benignidade
eo prindpio unico, supremo e determinante que leva Deus a
cuidar da reden<;:ao dos seres humanos. (3) A unica finalidade
da vida e da morte de Cristo e produzir urn efeito moral sobre
o pecador individual, subjugando a sua obstinada aversao a
Deus e a sua teimosa desconfian<;:a da Sua prontidao em per-
doar - reconciliando assim o homem com Deus, antes que
Deus como hom em. (4) Os socinianos sustentavam, alem disso,
que a morte de Cristo foi a necessaria condi<;:ao para a Sua
ressurrei<;:ao, pela qual Ele trouxe aluz a imortalidade.
3a. A TEORIA GOVERNAMENTAL, a qual, pressupondo todas
as verdades positivas contidas na Teoria da Influencia Moral,
sustenta- (1) Que em Deus a justi<;:a nao e vindicativa, mas
deve ser relacionada com uma retidao governamental geral,
baseada numa considera<;:ao BENEVOLA pelo melhor e mais

586
A Propiciar,;iio ...

geral bem-estar final dos suditos do Seu governo moral. (2) A


lei e urn produto da vontade divina e por isso Deus pode relaxa-
-la. (3) As prerrogativas soberanas de Deus incluem o direito
de perdoar. (4) Mas a retidao governamental acima explicada,
tendo em vista que urn perdao indiscriminado haveria de
estimular o pecado, determina a Deus que fa<.;:a o perdao dos
pecados depender de urn exemplo imponente de sofrimento numa
vitima relacionada com os homens e com Ele, de modo que
manifeste eficazmente a Sua determina<;;iio de que ninguem
pode entregar-se com impunidade ao pecado. Por isso- (a) Os
sofrimentos de Cristo nao constituiram puni<;;iio, e sim urn
exemplo de uma determina<;;iio de punir o pecado no futuro.
(b) Cristo nao sofreu com o propos ito de satisfazer a justi<;;a
divina, e sim o de dar a todo o universo moral urn motivo
poderoso para evitar o pecado. A teoria governamental foi
elaborada primeiro por Hugo Grotio Ct 1645) em sua grande
obra intituladaDefensio Fidei Catholicae de Satisfactione Christi
(Defesa da Fe Cat6lica acerca da Satisfa<;;iio de Cristo), na qual
abandonou a fe cuja defesa tinha assumido. Essa teoria nunca
foi incorporada no credo de nenhuma igreja hist6rica, mas tern
sido sustentada por divers as escolas de te6logos, como, e.g., os
sobrenaturalistas do seculo passado na Alemanha (Staudlin,
Flatt, Storr e outros) e, na America, por Jonathan Edwards Jr.,
Smalley, Maxey, Dwight, Emmons e Park.
OBSERVA(:OES - Essa teoria contem muitas verdades
preciosas, mas, ao mesmo tempo, falha no ponto essencial do
qual depende a integridade do todo. Porque- (1) Somente
uma real e verdadeira puni<;;ao pode ser exemplo de uma
puni<;;iio ou uma prova da determina<;;iio de Deus de punir o
pecado. (2) Ela nao faz caso da justi<;;a essencial de Deus, nem
(3) do fato de que o pecado e urn mal essencial em si, nem (4)
do fato de que Cristo sofreu como a CABE(:A a quem todos os
seus membros estavam UNIDOS.
4a. A TEORIA DA SATISFA<;Ao, que abrange coerentemente
os elementos positives das teorias da Influencia Moral e

587
Capitulo25
Governamental acima expostas. Foi analisada e exposta de
maneira cientifica primeiro por Anselmo, arcebispo de
Cantaria ( 1093-11 09), em seu celebre livro Cur Deus Homo (Por
que Deus Homem?), e tern formado a base das doutrinas sote-
riol6gicas de todos os credos e da literatura teol6gica classica
de todas as igrejas hist6ricas, desde o tempo em que foi
originariamente formulada ate agora. Foi exposta e comprovada
suficientemente na primeira parte deste capitulo.
LITERATURA.- Hase, Libri Symbolici Eccle. Evangelicae;
Niemeyer, Collectio Confessionum etc.; Streitwolf,Libri Symbolici
Eccle. Catholicae, De Sacrijiciis, Gulielmo Outramo Auctores;
Neander e Schaff, Church Histories; Archb. Magee, The
Atonement; Shedd, History of Christian Doctrine; Owen, Works,
vol. lO,Redemption; Ritschl, Crit. Hist. of the Christ. Doctrine
of Reconciliation; Candlish, The Atonement; Watson,Institutes.

AUTORIDADES CLASSICAS E CONFESSIONAlS

Origenes, Homil. ad Lev., 1, falando sobre Cristo, diz:


"lmpos as maos sobre cabe~a do novilho, isto e, deitou
os pecados dos homens sobre a Sua propria cabe~a, porque
Ele e a Cabe~a do corpo, a lgreja".
Atanasio (298-373), Contra Arianos, 1, 45-60. "A morte
do Logos encarnado e o resgate pelos pecados dos homens
e uma morte da morte" ... "Carregado de culpa, o mundo
estava condenado pela Lei, mas o Logos tomou sobre Si a
condena~ao e, sofrendo na carne, deu salva~ao a todos".
Gregorio, o Grande (c. 540-604), Moralia in Jobum, 17,
46: "A culpa s6 pode ser extinta por uma oferta penal feita
a justi~a ... Segue-se que se deveria oferecer urn homem
sem pecado ... Era preciso, pois, que o Filho de Deus
nascesse de uma virgem e Se tornasse homem por n6s.
Ele tomou sobre Si a nossa natureza sem a nossa corrup~ao
(culpa). Ele Se fez sacrificio por n6s e expos pelos pecadores
o Seu proprio corpo, vitima sem pecado e capaz, tanto de
morrer em virtude da Sua humanidade, como de purificar

588
A Propiciar;ao ...

os culpados, com base na justi~a".


Bernardo de Claraval (1 091-11 53), Tract. contra Err.
Abadardi, caps. 6 e 15: "Se Urn morreu por todos, por
conseqiH~ncia, logo todos morreram"(2 Cor. 5: 14), is to e, a
satisfa~ao prestada por Urn e imputada a todos, porque
esse Urn levou os pecados de todos; e nao se diga que quem
ofendeu foi urn e quem fez a satisfa~ao foi outro, porque a
cabe~a e o corpo sao urn so em Cristo. Por isso a Cabe~a
fez satisfa~ao por Seus membros".
Wyclijfe (1324-1384),De Incarn. et Mort. Christi: "E, desde
que, segundo a terceira suposi~ao, e necessaria que se de
satisfa~ao pelo pecado, assim tambem era necessaria que
essa mesma ra~a de homens desse uma satisfa~ao tao
grande como foj grande no primeiro paj (Adao) a ofensa,
0 que nao poderia fazer homem algum que nao fosse ao
mesmo tempo homem e Deus".
Os valdenses do Piemonte, em 1542, apresentaram a
Francisco I, rei da Fran~a, por intermedio do cardeal
Sadoleto, uma confissao na qual diziam: "Esta Confissao
e a que recebemos de nossos antepassados, passada de mao
em mao, segundo os seus predecessores ensinaram e
relataram em todos os tempos e idades ... Nos cremos e
confessamos que a gratuita remissao dos pecados procede
da misericordia e imerecida bondade do nosso Senhor
Jesus Cristo, que morreu uma so vez por nossos pecados,
o justa pelos injustos; que levou os nossos pecados em
Seu proprio corpo na cruz; que Ele e o nosso Advogado
junto a Deus, sendo Ele mesmo o pre~o da nossa recon-
cilia~ao; que deu satisfa~ao em favor dos crentes, aos quais
os pecados nao sao imputados como imputados sao aos
incredulos e reprobos".
Joiio Wessel (1419-1489), De Causis Incarnationis.
Verdadeiramente, Ele mesmo Deus, sacerdote e vitima,
deu satisfa~ao por Si, de Si e para Si". Exempla Scalce
Meditationis, Exemplo 1, fig. 544: "0 nosso Pai aman-
tissimo quis que Tu, Seu proprio Filho amantissimo,
fosses o fiador e a garantia no sentido de que fosse feito e
sofrido o suficiente, com base em justa penhor, por meu

589
Cap£tulo25
fracas so total e meu inteiro malogro". · '· 1 • - · •
CONFISSAO ORTODOXA DA IGREJA ORIENTAL
CATOLICA E APOSTOLICA, composta por Petrus Mogilas,
Metropolitano de Kiev, em 1642, e sancionada pelo Sinodo
de Jerusalem em 1672, pag. 85. A morte de Cristo foi morte
muito diversa da morte de todos os demais homens, nestes
aspectos: primeiro, por causa do peso dos nossos pecados;
em segundo Iugar, porque Ele cumpriu o sacerd6cio
completo, mesmo ate a cruz; Ele Se ofereceu a Deus o Pai
para resgate da ra~a humana. Por isso ate a cruz Ele
cumpriu a media~ao entre Deus e os homens".
DOUTRINA ROMANA- Cone. de Trento, Sess. 6, cap. 7:
"Cristo que, sendo n6s inimigos, pela nimia caridade com
que nos amou, adquiriu por n6s a justificat;:ao e satisfez
por n6s ao Pai eterno, com Sua santissima paixao no lenho
da cruz ... ". Catecismo do Cone. de Trento, Parte 2, cap. 5,
Perg. 60: "A primeira e mais excelente satisfa~ao e aquela
pela qual tudo quanta e devido por n6s a Deus por causa
de nossos pecados, foi pago abundantemente, ainda que
Ele nos tratasse segundo o restrito rigor da Sua justic;:a.
Esta e aquela satisfa~ao que n6s dizemos que aplacou a
Deus e no-10 tornou propicio, e isso devemos somente a
Cristo o Senhor que, tendo pago na cruz o pre~o dos nossos
pecados, muito plenamente satisfez a Deus".
CONFISSOES LUTERANAS - Hase, Collection, pag. 684,
Formula Concordice: "Aquela justi~a que, diante de Deus,
somente por Sua gra~a e imputada a fe, ou ao crente, e a
obediencia, o sofrimento e a ressurrei~ao de Cristo, pelos
quais Ele, por amor de n6s, satisfez a lei e expiou os nossos
pecados. Porque, sendo Cristo nao somente homem, e sim
Deus e homem numa s6 Pessoa nao dividida, nao estava
sujeito a Lei nem ao sofrimento e morte por causa de Si
mesmo, porque era o Senhor da Lei. Por isso a Sua
obediencia (nao somente em que Ele obedeceu ao Pai nos
Seus sofrimentos e morte, mas tambem em que Ele, por
amor de n6s, fez-Se voluntariamente sujeito a Lei e
cumpriu-a por Sua obediencia) nos e imputada, de modo
que Deus, por causa des sa inteira obediencia (que Cristo

590
A Propiciafiio ...

por Seus atos e sofrimentos, em Sua vida e em Sua morte,


por amor de nos prestou a Seu Pai que esta no ceu) remite
os nossos pecados, reputa-nos como bons e justos e nos
da a salva~ao eterna".
DOUTRINA REFORMADA- Os Trinta e Nove Artigos,
Arts. 11 e 31.
"A obla~ao de Cristo, feita uma so vez, e a completa
reden~ao, propicia~ao e satisfa~ao de todos os pecados,
tanto o original como os atuais, do mundo todo; e
nenhuma satisfa~ao ha para os pecados, senao unicamente
esta". Homil. 3a. Da SalvafiiO- "Deus enviou a este mundo
Seu Filho unico, nosso Salvador Jesus Cristo, para cumprir
a lei por nos e, pelo derramamento do Seu preciosissimo
sangue, oferecer urn sacrificio e dar satisfa~ao a Seu Pai
por nossos pecados". Catecismo de Heidelberg, Pergs. 12-18
e 40. Conf. de Fe, de Westminster, cap.8, § 5; cap.ll, § 3.
Form. Cons. Helvetica, cans. 13-15. Cocceio, De Foed. et
Testam. Dei, cap. 5, 92. "Assim esse maior de todos os
misterios (a alian~a eterna entre o Pai e o Filho) e reve-
lado, de que maneira somos justificados e salvos por Deus,
de que maneira Deus pode ser tanto aquele que julga como
aquele que age como fiador, e que e Ele mesmo julgado,
que absolve e que intercede, que envia e e enviado. Isso e,
de que maneira Deus mesmo satisfaz-Se por Seu proprio
sangue."
DOUTRINA REMONSTRANTE - Limborch, A pol. Thes.
3, 22, 5: "Talvez se pergunte aqui como e que o sacrificio
de urn so homem pode ser suficiente e com efeito foi
suficiente para expiar os inumeros pecados de tantas
miriades de homens. Resposta: Foi suficiente por dois
motivos. Primeiro, com respeito a vontade divina, que nada
mais exigia para o livramento da ra~a humana, mas
satisfez-Se com este unico sacrificio. Em segundo lugar,
com respeito a dignidade da Pessoa, Jesus Cristo ... ". 21, 6.
A satisfa~ao de Cristo e chamada assim porque livra de
todas as penalidades devidas aos nossos pecados e,
ouvindo-as e esgotando-as, satisfaz a justi~a divina. Mas
este sentimento nao tern apoio nas Escrituras. Chama-se

591
Capitulo 25

a morte de Cristo urn sacrificio pelo pecado; porem os


sacrificios nao sao pagamentos de dividas, nem
constituem plena satisfa<;:ao pelos pecados; no entanto uma
remissao gratuita e concedida quando sao oferecidos".
Remonstrantia, etc., cinco artigos preparados pelos
defensores holandeses da reden<;:ao universal (1610). Art.
2: "Por conseguinte, Jesus Cristo, o Salvador do mundo,
morreu por todo e qualquer homem, de modo que
impetrou para todos, por Sua morte, a reconcilia<;:ao e a
remissao dos pecados; mas, nao obstante isso, sob a
condi<;:ao de que somente quem fosse crente, e isso tambem
segundo o evangelho, teria a frui<;:ao real .des sa
reconcilia<;:ao".
DOUTRINA SOCINIANA -Rae. Cat., Sec. 5, cap.8: "Qual
foi o prop6sito da vontade divina que Cristo sofresse por
nossos pecados? Resposta: em primeiro lugar, a fim de que
se criasse por este meio para todos os pecadores urn direito
muito real e, por conseguinte, uma esperan<;:a segura de
lhes serem remitidos os pecados (Rom. 8:32; 5:8-10. Em
segundo lugar, para que todos os pecadores fossem incitados
para irem a Cristo e atraidos por Ele, buscando a sua salva-
<;:ao somente nAquele e por Aquele que por eles morreu.
Em terceiro lugar, para que Deus desta maneira testificasse
o amor ilimitado que tern pela ra<;:a humana e a
reconciliasse inteiramente conSigo (Joao 3:16)" .

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592
...
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26

A Intercessao de Cristo

1. Em que sentido Cristo permanece sacerdote para sempre?


Isso e declarado em Hebreus 7:3,24, para contrastar o
sacerdocio de Cristo com o de Arao, que constava de uma
sucessao de homens mortais nas suas gera<;6es. 0 sacerdocio
de Cristo e perpetuo porque -
1°. por urn so sacrificio pelo pecado aperfei<;oou para
sempre aqueles pelos quais o sacrificio foi oferecido.
2°. Ele vive sempre para interceder por nos.
3°. Sua Pessoa e obra como Mediador continuariio a ser,
durante toda a eternidade, o motivo pelo qual somas aceitos, e
o meio da nossa comunhao com o Pai.

2. Cristo intercedeu no mundo por Seu povo?


Exerceu no mundo essa fun<;ao do Seu sacerdocio, Luc.
23:34; Joao 17:20; He b. 5:7; exerce-a, porem, principalmente
no Seu estado de exalta~ao, no ceu.

3. Que ensinam as Escrituras a respeito da intercessiio de Cristo?


1°. Ele apresenta-Se por nos diante de Deus como o
Advogado sacerdotal do Seu povo, e apresenta o Seu sacrificio
- Heb. 9:12,24; Apoc. 5:6.
2°. Ele age como Advogado junto ao Pai e, apoiando-Se
na Sua propria obra perfeita enos termos da alian<;a da gra~a,
exige como Seu direito, mas como uma gra<;a infinitamente

593
Capitulo 26
livre quanto a nos, o cumprimento de todas as promessas da
Sua a1ian~a -1 Joao 2: 1; Joao 17:24; 14:16; Atos 2:33; Heb.
7:25.
3°. Tendo comunhao de natureza com Seu povo e expe-
riencia pessoa1 das mesmas tribula~6es e tenta~6es que as que
os afligem agora, Ele tern empatia com eles, vela por eles e
socorre-os em todas as suas diversas circunstancias, e adapta as
Suas incessantes intercess6es ao curso inteiro da Sua experiencia
-1 Ped. 2:5; Ef. 1:6; Apoc. 8:3; Heb. 4:14-16.

4. Par quem Ele intercede?


j
Nao pelo mundo, e sim por Seu povo, de todos os rebanhos
e de todos os tempos- Joao 10: 16; 17:9,20.

5. Como se pode mostrar que a intercessao de Cristo faz parte


essencial de Sua obra sacerdotal?
Eabsol utamente essencial, Heb. 7:25, porque e necessario
que E1e, como Mediador, nao somente abra o caminho de uma
sa1va~ao possivel, mas que realmente alcance a salva~ao de todos
os que o Pai Lhe deu, e que forne~a a cada urn deles uma
"apresenta~ao" ao Pai- Joao 17: 12; Ef. 2: 18; 3:12. A comunhao
do Seu povo com o Pai sera sustentada sempre por Ele como
sacerdote medianeiro- Sal.110:4; Apoc. 7:17.

6. Qual a relafiiO existente entre a obra do Espirito Santo e a


intercessao de Cristo?
Cristo e Sacerdote real- Zac. 6:13. Do mesmo trono Ele,
como Rei, dispensa Seu Espirito a todos os objetos do Seu
cuidado, enquanto, como Sacerdote, intercede por eles. 0
Espirito realiza Sua obra por E1e, tomando unicamente de Suas
coisas. Ambos agem de mutuo acordo, Cristo como quem
dirige, o Espirito como Seu agente. Cristo intercede por n6s
estando fora de n6s, como o nosso Advogado no ceu, segundo
os termos da alian~a eterna. 0 Espirito Santo, como o nosso

594
A Intercessiio de Cristo
Advogado dentro de n6s, age sabre o nosso entendimento eo
nosso cora~ao, iluminando e vivificando, e assim determinando
os nossos desejos "segundo a vontade de Deus". A obra de urn
e o complemento da do outro, e juntas formam urn todo
completo- Rom. 8:26,27; Joao 14:26.

· .....

595
27

0 Reinado Medianeiro de Cristo

1. Como difere a soberania de Cristo como Mediador da Sua


soberania como Deus?
Sua soberania como Deus eessencial aSua natureza; nao
foi derivada e eabsoluta, eterna e imutavel.
Sua soberania como Rei medianeiro e derivada, foi-Lhe
dada pelo Pai como premio por Sua obediencia e por Seus
sofrimentos; eespecial e diz respeito asalva<;ao do Seu povo e
a administra<;ao das provisoes da alian<;a da gra<;a; e ela nao
pertence a Sua natureza divina como tal, e sim a Sua Pessoa
como Deus-homem, ocupando o oficio de Mediador.
Seu reino e assunto muito proeminente nas Escrituras-
Dan. 2:44; Mat. 13: 1-58; 20:20-29; Luc. 13:23-30; 17:20, 21;
Rom. 14: 17; 1 Ped. 3:22; Ef. 1:10,21,22.

2. Qual ea extensao do reino medianeiro de Cristo, e quais os


seus diversos aspectos?
A autoridade medianeira de Cristo abrange o universo -
Mat. 28:18; Fil. 2:9-11; Ef. 1:17-23. Apresenta dois grandes
aspectos.
1°. N a Sua administra<;ao geral, como abrangendo o
universo como urn todo.
2°. Na Sua administra<;iio especial, como abrangendo a
Igreja.
Tern sido distinguido como- (1) Seu reino de poder, que
abrange o universo inteiro em Sua administra<;ao providencial

596
Reinado Medianeiro de Cristo
e judicial. Seu fim e a sujei<;ao dos Seus inimigos,(Heb.
10:12,13; 1 Cor. 15:25), a vindica<;ao da justi<;a divina (Joao
5 :22-27; 9:39) eo aperfei<;oamento da Sua Igreja. (2) Seu reino
degrafa, que eespiritual tanto a respeito de Seus suditos, como
de Suas leis, modos de administra<;ao e meios empregados. (3)
Seu reino de gloria, que e a consuma<;:ao da Sua administra<;:ao
providencial e pela gra<;:a, e ha de permanecer para sempre.

3. Quais osfins da Sua autoridade medianeira sabre o universo,


e como eela administrada?
Seu fim geral e alcan<;:ar a salva<;:ao da Sua igreja na
execu<;:ao de todas as provisoes da alian<;a da gra<;:a, que recaiem
sobre Ele como Mediador- Ef. 1:23. Constituindo o universo
urn sistema morale fisico, era necessaria que a Sua supremacia
como Mediador se estendesse a tudo, para que todas as coisas
contribufssem para o bern do Seu povo, Rom. 8:28; para
estabelecer urn reino para eles, Luc. 22:29; Joao 14:2; para
subjugar todos os seus inimigos, 1 Cor. 15:25; Heb. 10:13; e
para que todos 0 adorassem- Heb. 1:6; Apoc. 5:9-13. Seu
governo geral medianeiro do universo e administrado, 1°.
providencialmente; 2°. judicialmente- Joao 5:22,27; 9:39; 2
Cor. 5:10.
Efesios 1: 10 e Colossenses 1:20 parecem ensinar que a
supremacia medianeira de Cristo tern rela<;6es muito abran-
gentes como universo moral em geral, que de outro modo nao
sao de maneira alguma reveladas.

4. Quando Cristo tomou formalmente sobre Si o Seu reino


medianeiro?
1°. Os defensores do advento premilenario e do reino
pessoal de Cristo aterra admitem que Ele reina agora adireita
de Seu Pai, sobre o trono de Seu Pai e pelo direito que a Seu
Pai pertence; mas sustentam tambem que somente no Seu
segundo advento Ele to mara posse efetiva do Seu proprio reino,
Se assentara em Seu trono como Mediador e ocupara en tao o

597
Capitulo 27
trona literal de Davi, e de Jerusalem, como sua capital, consti-
tuira Seu reino.
2°. A verdade, como e sustentada por todos os ramos da
Igreja his to rica, e que, conquanto Jesus tenha sido virtualmente
Rei medianeiro, como tambem Profeta e Sacerdote desde a
queda de Adao, contudo, a ocasiao em que tomou posse publica
e formal do Seu trona e inaugurou Seu reino espiritual foi
quando subiu ao ceu e assentou-Se a destra de Seu Pai. A prova
disso e que as predi~6es do Velho Testamento sabre o Seu reino
(Sal. 2:6; Jer. 23:5; Is. 9:6; Dan. 2:44) sao aplicadas no Novo
Testamento ao primeiro advento. Joao Batista declarou que o
reino dos ceus estava proximo. Cristo declarou que e"chegado
a v6s o reino de Deus" e o assemelhou ao campo em que
cresciam juntos o trigo e a cizania, etc.- Mat. 12:28; Atos 2:29-
36.

5. Quais os diversos titulos aplicados nas Escrituras a esse reino,


e quais os sentidos em que esses titulos sao empregados?
E chamado- (I) 0 "reino de Deus", Luc. 4:43, porque e
proeminentemente de origem divina, e Deus exerce a Sua
autoridade muito direta e plenamente em sua administra~ao.
(2) 0 "reino de Cristo" e do "Filho do seu amor" (do amado
Filho de Deus), Mat. 16:28; Col. 1:13, porque Cristo e
pessoalmente o Soberano imediato. (3) 0 "reino dos ceus",
Mat. 11:12, porque a sua origem e as suas caracteristicas sao
do ceu e ali sera consumado.
Essas frases as vezes sao empregadas para exprimir- ( 1) A
autoridade medianeira de Cristo, ou Sua administra~ao, como
quando nos Lhe atribuimos "o reino, o poder e a gloria" ou
afirmamos que "o seu reino nao tera fim". (2) As ben~aos e
vantagens de toda especie, internas e externas, que caracterizam
essa administra~ao, como quando se diz que "o reino e justi~a,
e paz, e alegria no Espirito Santo". Ilustra isso o que Napoleao
III disse: "0 Imperio e a paz". (3) Os suditos do reino coleti-
vamente, como quando se diz que se "entra no reino", ou
Reinado Medianeiro de Cristo
quando se fala nas "chaves do reino'' que dao acesso a essa
comunidade ou excluem dela. Neste ultimo sentido a frase
"reino de Deus" ou "dos ceus" e urn sinonimo da palavra
"igrej a".
A palavra basileia (reino), nesta conexao, acha-se cento e
trinta e sete vezes no Novo Testamento, sendo cento e dez vezes
nos quatro Evangelhos, e cinquenta e tres s6 no Evangelho
Segundo Mateus, que e o Evangelho mais intimamente
relacionado como Velho Testamento, e somente vinte vezes
nas Epistolas, enquanto o vod.bulo ekklesia (igreja), quando
se refere a lgreja de Cristo, encontra-se s6 uma vez nos
Evangelhos e oitenta e oito nas Epistolas e no Apocalipse.

6. Qual a natureza da administraffio de Cristo como Rei do


Seu povo, isto e, do Seu reino em distinfiiO do universo?
1°. Eprovidencial. Ele exerce o Seu governo providencial
sabre o universo com o fim de alcan~ar assim o sustento, a
defesa, o enriquecimento e a glorifica~ao do Seu povo.
2°. Consegue este fim pela dispensa~ao de Seu Espirito
chamando eficazmente, santificando, consolando, preservando,
ressuscitando e glorificando o Seu povo- Joao 15:26; Atos
2:33-36.
3°. Consegue-o tambem prescrevendo a forma, a ordem
e as fun~6es de Sua lgreja, os oficiais que devem exercer
essas fun~6es, e as leis que eles devem administrar - Mat.
28:18,19,20; Ef. 4:8,11. ; ~-: ,-, :r:
4°. Consegue-o ainda designando as pessoas que devem
tamar sucessivamente sabre si essas fun~6es, por meio de urn
chamado espiritual, expresso no testemunho do Espirito, no
seu encaminhamento providencial e na chamada de seus irmaos
- Atos 1:23,24; 6:5; 13:2,3; 20:28; 1 Tim. 1:12; 4:14.
Sob essa administra~ao esse reino apresenta dois aspec-
tos- 1°. como militante, Ef. 6: 11,16; 2°. como glorificado-
Apoc. 3:21. De conformidade com isso, Cristo apresenta-Se
como desempenhando, na administra~ao dos quefazeres do

599
Capitulo 27
Seu reino, as fun<:;6es de urn grande comandante, Apoc.
19:11,19, e de urn soberano reinando assentado em seu trona-
Apoc. 21:5,22,23.
0 trona em que esta assentado e de onde reina nos e
apresentado em tres aspectos diversos, correspondendo as
diversas rela<:;6es que Cristo mantem com Seu povo e com o
mundo; como urn trono de gra<:;a, Heb. 4: 16; urn trono de juizo,
Apoc. 20: 11-15; e urn trona de gloria- Comp. Apoc. 4:2-5
com Apoc. 5:6.

7. Em que sentido o reino de Cristo eespiritual?


1°. 0 Rei e Soberano espiritual, e nao terreno- Mat. 20:28;
Joao 18:36.
2°. Seu trono esta a direita de Deus- Atos 2:33.
3°. Seu cetro e espiritua1- Is. 53:1; Sal.l10:2.
4°. Os cidadaos do Seu reino sao homens espirituais- Fil.
3:20; Ef. 2:19.
5°. 0 modo como exerce o Seu governo e espiritual- Zac.
4:6,7.
6°. Suas leis sao espirituais- 1 Cor. 5:4-11; 2 Cor. 10:4;
Ef. 1:3-8; 2 Tim. 4:2; Tito 2:15.

8. Qual a extensiio dos poderes de que Cristo tern investido Sua


Igreja visivel?
Com rela<;ao ao magistrado civil, a lgreja e absolutamente
independente. Em sujei<;aO a autoridade suprema de Cristo 0
Cabe<;a, OS poderes da Igreja sao unicamente-
1°. Declarativos, isto e, consistem em explicar as
Escrituras, que sao a regra perfeita de vida e fe, e assim dar
testemunho da verdade e promulga-la em credos e confiss6es,
no pulpito e pela imprensa.
2°. Ministeriais, isto e, consistem em organizar-se segundo
o modelo fornecido na Palavra, e entao administrar, por meio
dos oficiais pr6prios, os sacramentos, as leis e a disciplina
prescritas pelo Mestre, e fazer provisao para a proclama<;ao do

600
Reinado Medianeiro de Cristo
cvangelho do reino a toda a criatura humana- Is. 8:20; Deut.
4:2; Mat. 28:18-20; Heb. 13:17; 1 Ped. 2:4.

9. Quais siio as condiroes de admissiio no reino de Cristo?


Simplesmente o reconhecimento pratico da autoridade do
Soberano. Como Ele eo modo inteiro da Sua administra~ao
sao espirituais, e claro que e preciso en tender a sua autoridade
e sujeitar-se praticamente a ela, de conformidade com a sua
natureza espiritual. E esta a fe espiritual que envolve
iluminac;ao espiritual- Joao 3:3,5; 1:12; 1 Cor. 12:3.

10. Qual a doutrina romana quanta arelariio da Igreja com o


Estado?
Segundo a doutrina romana estritamente l6gica, o Estado
e tao-somente uma fase da Igreja. Sendo a na<;ao inteira, em
todos os seus membros, uma parte da Igreja universal, a
organiza<;ao civil esta compreendida na Igreja para certos fins
especiais e subordinados, e e responsavel ante a lgreja pelo
exercicio de todos os poderes que lhe foram delegados.
A Primeira Constituifao sabre a Igreja, Concilio do Vaticano,
1870, cap.4, afirma que o juizo do papa, pronunciadoex-cathe-
dra, como pastor e doutor de todos os cristaos, sobre qualquer
questao de je ou de moral, e infalivel e irreformavel. Esta
infalibilidade e pessoal, independente, separada e absoluta. Isso
abrange todas as materias de fa toe doutrinas reveladas, e todas
as demais materias de fato e de verdades nao reveladas, mas
que se acham envolvidas na defesa daquilo que esta revelado.
No capitulo 3 declara-se que a autoridade suprema do papa
infalfvel estende-se "ao supremo e pleno poder de jurisdic;ao
sobre a Igreja universaL nao somente nas coisas pertencentes a
fee amoral, mas tambem nas que dizem respeito asua disciplina
e ao seu governo".
No "Silabo papal de Erros'~ 1864, enviado a todos os bispos
pela autoridade do papa, e condenada a liberdade religiosa, e
afirmado 0 direito da igreja (romana) de obrigar pela for<;a a

601
Capitulo 27
obediencia a seus decretos, e e declarado nulo o casamento
daqueles que se recusam a aceitar o sacramento romano do
matrimonio. (Veja as proposi<;;6es afirmativas publicadas, com
a aprova<;;ao do papa, por P. Clemens Schrader).
0 proprio Pio IX, em sua resposta aMensagem daAcademia
da Religiiio Cat6lica (21 de julho de 1873) declarou que o papa
possui o direito, do qual se vale com propriedade, de, em
circunstancias favor:lveis, "poder passar juizo mesmo sobre os
neg6cios civis e sobre os atos dos principes e das na<;;6es".
0 arcebispo Manning, em Ccesarism and Ultramontanism,
p. 35, diz: "Se, pois, o poder civil nao e competente p~ra definir
os limites do poder espiritual, e se o poder espiritual pode,
com certeza divina, definir os seus pr6prios 1imites, este e
evidentemente divino. Ou, por outra, o poder espiritual
conhece, com certeza divina, os limites da sua propria }uris-
di<;;ao, e por isso conhece os limites e a competencia do poder
civil". E mais: "Qualquer poder que seja independente e o
unico que pode fixar OS limites da .SUa propria jurisdi<;;ao, e
que, assim, pode fixar os limites de outra jurisdi<;;ao qualquer,
e ipso facto supremo". Veja ''The Vatican Decrees in their bearing
on Civil Allegiance", de autoria de Wm. E. Gladstone, e sua
'?! nswer to Reproofs and Replies".

11. Qual a doutrina erastiana quanto arelafii.O da Igreja com


o Estado?
Essa doutrina, cujo nome deriva de Erasto, medico que
residia em Heidelberg, no seculo 16, e precisamente o contrario
da doutrina romana, e considera a Igreja somente como uma
fase do Estado. 0 Estado, instituido divinamente como fim
de cuidar de todas as necessidades, quer temporais quer
espirituais, dos homens, esta, pois, encarregado do dever de
cuidar da dissemina<;;ao da doutrina pura e da administra<;;ao
devida dos sacramentos e da disciplina. E, portanto, dever do
Estado sustentar a Igreja, nomear seus oficiais, definir suas
leis e velar sobre a sua administras;ao.

602
Reinado Medianeiro de Cristo
12. Qual e a doutrina comum das igrejas reformadas sabre
esteponto? .-;,:/~·:~ ~_!_.:·~~:. 4~,;~~.s~ ·._.
·l ;;:~~·):.= ·
Que a Igreja e o Estado sao ambos institui<;:6es divinas,
tendo fins diversos e, em todos os aspectos, independentes uma
da outra. Os membros e os oficiais da Igreja sao, como homens,
membros do Estado e tern o dever de serem bons cidadaos; e
os membros e os oficiais do Estado, se sao cristaos, sao
membros da Igreja e, como tais, sujeitos as suas leis. Mas, nem
os oficiais nem as leis de qualquer das duas institui<;:6es tern
qualquer autoridade dentro da esfera da outra.

13. Qual a ideia e a finalidade do Estado? ., ·> • ,

0 governo civile institui<;:ao divina, e tern por fim proteger


os homens no gozo de seus direitos civis. Portanto, recebeu de
Deus autoridade para definir os direitos que dizem respeito a
todas as quest6es de pessoa e de propriedade, cuidar da sua
vindica<;:ao, regular a intercomunica<;:ao e cuidar de todos os
meios necessarios para a sua propria seguran<;:a.

14. Qual a finalidade da lgreja Visivel?


E uma institui<;:ao divina e tern por fim servir de meio
para conseguir a salva<;:ao dos homens. Com este fim ela foi
instituida especialmente-
1°. Para levar os homens ao conhecimento da verdade.
2°. Para torna-los obedientes averdade e exercer suas gra<;:as
pela profissao publica de fe em Cristo, pela comunhao com
seus irmaos e pela administra<;:ao das ordenan<;:as e da
disciplina.
3°. Para constituir o testemunho visivel eo tipo profetico
da Igreja invisivel e espiritual.

15. Quais OS deveres dos oficiais do Estado com relafiiO algreja?


0 Estado e institui<;:ao divina e seus oficiais sao ministros
de Deus - Romanos 13: 1-4. Cristo o Mediador e, como fa to
revelado, o "Governador das Na<;:6es", o "Rei dos reis e Senhor

603
Capitulo 27
dos senhores", Apoc.19:16; Mat. 28:18; Fil. 2:9-11; Ef. 1:17-
23; e as Escrituras Sagradas sao regra infalivel de vida e fe para
todos os homens em todas as condi~6es.
Segue-se, pois-
1°. Que todas as na~6es deveriam reconhecer expli-
citamente ao Cristo de Deus como o Governador supremo, e
Sua vontade revelada como a lei suprema do pais, aos
principios gerais da qual se deveria conformar toda a legisla~ao
~~. I

2°. Que todos os oficiais civis deveriam fazer da gloria de 1


Deus o seu fim e tomar como seu guia a vontade rev~lada de
Deus.
3°. Que, posto que nao se devesse fazer distin~ao entre as
diversas denomina~6es cristas, e se devesse conceder a todos
os seres humanos perfeita liberdade de consciencia e de culto,
contudo, o magistrado civil deveria procurar promover a
piedade bern como a ordem civil (Conf de Fe, cap.23, § 2).
Nao deveriam fazer isso tomando sobre si fun~6es eclesiasticas,
nem procurando patrocinar ou dirigir a Igreja, e sim, por meio
do seu exemplo pessoal, dando prote~ao imparcial as
propriedades das igrejas, facilitando os seus trabalhos, fazendo
e tornando eficazes leis concebidas no verdadeiro espirito do
evangelho, e especialmente mantendo inviolaveis o domingo
eo casamento cristaos, e fornecendo ensino cristao nas escolas
publicas.

16. Qual a relafiiO que nos Estados Unidos da America a lei


civil mantem com as constituif6es, a disciplina e as propriedades
das divers as igrejas?
A. FATOSDAHISTORIA-
1°. Na Inglaterra a Igreja estabelecida (Anglicana) e uma
corpora~ao criada e dirigida pelo Estado.
2°. Na maior parte das colonias americanas, no principia
o Estado tomou sabre si a dire~ao absoluta dos neg6cios
eclesiasticos e concedeu os direitos de cidadao somente aos

604
Reinado Medianeiro de Cristo
que professavam certas doutrinas religiosas.
B. FATOS ATUAIS-
1°. A Constitui~ao dos Estados Unidos declara que "Nunca
sera exigida uma prova religiosa como qualifica~ao para
qualquer oficio ou emprego publico sob a chancela dos Estados
Unidos, e o Congresso nao fara lei alguma a respeito do
estabelecimento de religiao ou proibindo seu livre exerdcio".
As constitui~6es dos diversos estados contem declara~6es no
mesmo sentido.
2°. Num sentido geral, o cristianismo e, como fato hist6-
rico, elemento essencial da lei comum da Inglaterra, bern
como da dos Estados Unidos (com exce~ao de alguns estados,
como os de Luisiana, Texas, Novo Mexico, e California),
incorporado em nossos costumes, prindpios, precedentes, etc.*
3°. 0 cristianisrno e reconhecido pela lei civil como a
religiao hist6rica e atual de irnensa rnaioria dos cidadaos dos
Estados Unidos. A fe crista e as institui~6es pelas quais se
rnanifesta devern, portanto, ser respeitadas e protegidas pela
lei civil.
4°. A lei civil reconhece, pois, a Igreja, e tarnbern que ela
tern urn carater hist6rico e que e urn elernento irnportante da
sociedade. Reconhece e protege seu direito de existir e de gozar
da posse de seus privilegios e poderes legitirnos. Assirn a lei
civil reconhece e protege (1) a autonornia da Igreja quanto a
(a) seu modo geral de governo e (b) sua disciplina das pessoas;
(2) os direitos de cada igreja, como organiza~ao, sobre seus
bens.
5°. Os tribunais civis reconhecern como finais as decis6es
dos tribunais eclesiasticos quanto (1) aos que devarn ser
considerados como rnernbros da igreja, e (2) aos que devarn
ser considerados como oficiais espirituais da igreja. Os tribunais

* Caso de "Updegraffcontra a Commonwealth da Pensilvania", 11 S. e R. 400,


perante o Tribunal Supremo. Juizes; Duncan, Tilghman e Gibson; 1824.

605
Capitulo 27
civis nao tern a pretensao de reformar as decis6es de nenhum
tribunal eclesiastico, com o fim de determinar (1) se foi
devidamente constitufdo (isto e, se o tribunal eclesiastico em
questao e reconhecido pela autoridade superior existente na
igreja), nem (2) se, depois de constituido, observou e confor-
mou-se em tudo a suas pr6prias regras~
0 Juiz Rogers, do Supremo Tribunal da Pensilvania, no
caso da Igreja Alema Reformada do Condado de Lebanon,
Pensilvania, disse: "As decis6es dos tribunais eclesiasticos,
como as de qualquer outro tribunal judicial, sao finais, porque
eles sao os melhores juizes para a determina~ao do que constitui
uma ofensa contra a Palavra de Deus e contra a constitui~ao da
Sua Igrej a".
0 Supremo Tribunal dos Estados Unidos, quanta ao caso
que envolveu a Igreja da Rua Walnut, Louisville, Kentucky,
1872, decidiu-
(1) Quando a disputa versar sabre materia estrita e
puramente eclesiastica em seu carater, materia que diga respeito
a controversias teol6gicas, a disciplina da Igreja, ao governo
eclesiastico ou a conduta moral dos membros, e sabre a qual
os tribunais eclesiasticos disserem que tern jurisdi~ao, os
tribunais civis nao assumirao jurisdi~ao - nem mesmo
inquirirao do direito de jurisdi~ao do (respectivo) tribunal
eclesiastico.
(2) Urn tribunal espiritual eo juiz exclusivo da sua propria
jurisdi<;ao; sua decisao sabre essa questao compromete os
tribunais seculares. Veja Dr. Wm. E. Moore, em Presbyterian
Digest, pag. 251.
6°. A lei civil reconhece o direito da Igreja de disciplinar
seus membros. Mesmo a declara~ao publica, feita de
conformidade com as regras de ordem (govern a) de uma igreja
da qual urn membra tenha sido excomungado (excluido) por
ter cometido uma ofensa tida como infame pela lei, e justificada,
e perante a lei tal publica~ao nao e injuria.
7°. A igreja ou "sociedade eclesiastica" propriamente dita

606
J Reinado Medianeiro de Cristo
cdistinta da "sociedade religiosa", criada e incorporada como
fim de possuir bens para uso daquela. Estas sociedades
religiosas incorporadas sao regidas segundo as suas cartas de
incorpora<;:ao e os regulamentos internos formulados de
conformidade com as cartas; elas possuem bens por meio de
curadores, e sao virtualmente sociedades civis, tanto como os
bancos ou as companhias de estradas de ferro. Estao sujeitas a
lei como as outras corpora<;:6es. Estao sujeitas a serem visitadas.
Ha remedio legal contra a intrusao nos seus escrit6rios, mas
elas podem sofrer restri<;:ao por administrarem mal ou
empregarem mal os bens a seu cuidado. Seus artigos de
associa<;:ao e os regulamentos feitos de conformidade com suas
cartas de incorpora<;:ao, providenciando sobre elei<;:6es, reuni6es,
e sobre a dire<;:iio de seus neg6cios temporais, podem ser
mudados, contanto que nada se fa<;:a contnirio as cartas de
incorpora<;:iio; porem, enquanto existirem (tais artigos), seriio
obrigat6rios para todos os membros. Conformidade substancial
com eles e indispensavel para a validade das transa<;:6es seculares
e podem ser revistos pelos tribunais civis.
8°. Quando o "Testamento" ou a "Escritura de Doa<;:iio"
ou os "Termos de Subscri<;:ao", ou a carta de incorpora<;:ao de
uma igreja nao prescrever nem (1) alguma doutrina especifica,
nem (2) alguma forma especial de governo eclesiastico, nem
(3) conexao com alguma denomina<;:ao religiosa definida, a
maioria dos membros dessa igreja dirigira o emprego dos bens
seculares e, no caso de mudan<;:a de doutrina, disciplina ou
conexiio denominacional, levara consigo a posse da
propriedade.
Mas quando a doutrina, a forma de governo ou a conexao
eclesiastica se achar definida pelos donos originais ou pela carta
de incorpora<;:ao da igreja, os tribunais civis farao respeitar todos
os termos e condi<;:6es mencionados nas diversas escrituras
publicas. Em tal caso, se a maioria dos membros fizer qualquer
mudan<;:a em qualquer desses pontos essenciais, ela, por maior
que seja, perdera todos os direitos sobre a dire<;:iio dos bens da

607
Capitulo27
igreja, e a minoria, por menor que seja, sera mantida na posse
deles. E, em todos os casos semelhantes, os tribunais se
conformarao, em suas decis6es, as dos tribunais eclesiasticos
superiores como finais. Veja Lectures by Wm. Strong, LL.D.,
Juiz do Supremo Tribunal dos Estados Unidos, 1875.

17. Quais sao as jurisdifoes relativas das "Mesas de Curadores"


e das "Sessoes" de nossas igrejas presbiterianas sobre as casas de
culto perten centes as suas respectivas congregafoes?
A "Sessao" e a (mica corporac;:ao de oficiais congregacionais
reconhecida em nossa constituic;:ao eclesiastica. A "Mesa de
Curadores" e produto dos tribunais civis, a qual foi instituida
com o fim de ser o guardiao dos bens congregacionais.
Quanto as suas respectivas jurisdic;:6es, as decis6es dos
tribunais civis e as da Assembleia Geral estao de acordo. Os
curadores sao investidos do direito legal as propriedades, e sao
seus guardas "para os usos e fins para os quais lhes foram
confiadas", a saber, o culto divino etc., segundo a ordem da
igreja a qual as propriedades pertenc;:am, inclusive as reuni6es
para tratar dos neg6cios temporais da congregac;:ao. A sessao
esta encarregada da direc;:ao dos interesses espirituais da
congregac;:ao, inclusive o direito de dirigir e regular o uso do
edificio para semelhantes fins. No Supremo Tribunal dos
Estados Unidos, no caso da Igreja da Rua Walnut, de Louisville,
foram enunciados os seguintes prindpios: "1. Pelos atos da
legislatura criando os curadores de uma igreja, em corporac;:ao,
e pelas regras reconhecidas da Igreja Presbiteriana, os
curadores sao mera e nominalmente portadores dos titulos e
os guardas dos bens da igreja. 2. No uso dos bens para servic;:os
religiosos, ou fins eclesiasticos, os curadores estao sujeitos a
direc;:ao da sessao da igreja". Numa contenda entre os curadores
e a sessao de uma igreja em Filadelfia, a respeito de urn
organista, a questao foi levada perante o Supremo Tribunal da
Pensilvania, que decidiu que o culto da congregac;:ao estava
sob a direc;:ao da sessao, que o servic;:o de canticos era parte do

608
Reinado Medianeiro de Cristo
culto, e que, por isso, era s6 a sessao que podia nomear o
organista. Os tribunais civis mantem com muita firmeza os
direitos e privilegios do culto religioso e das igrejas, e exigem
fidelidade aos compromissos aceitos.

18. Quais os deveres da lgreja com relariio ao Estado?


1°. A lgreja deve obediencia ao Estado no exerdcio da sua
autoridade legal sabre as propriedades publicas da lgreja.
2°. Esta com a obriga~_;:ao de usar todos os meios legais ao
seu alcance para levar o evangelho a todos os membros do
Estado. Alem disso ela nao tern clever algum para com o
Estado.

19. Em que sentido Cristo vai restituir Seu reino ao Pai, e em


que sentido ha de permanecer para sempre a Sua soberania
medianeira?
Parece-nos que a suma do que nos esta revelado sabre estes
pontos e que, depois da plena glorifica<;:ao do Seu povo e da
destrui~_;:ao dos Seus inimigos, Cristo abdicara da Sua autori-
dade medianeira sabre o universo, que Ele administrou como
Deus-homem, para que a Deidade absoluta seja imediatamente
tudo em tudo para a criatura (para que Deus seja tudo em todos)
-1 Cor. 15:24-28. Mas a Sua soberania medianeira sabre o Seu
proprio povo, inclusive os oficios de profeta, sacerdote e rei,
ha de permanecer para sempre. lsto ecerto -
1°. Porque Ele e sacerdote para sempre, e do Seu reino
nao havera fim- Sal. 110:4; Dan. 7: 14; Luc. 1:33.
2°. A uniao pessoal entre as Suas naturezas divina e humana
hade permanecer para sempre.
3°. Como Mediador Ele eo Cabe~_;:a da Sua lgreja, que e a
plenitude (complemento) dEle, e a consuma<;:ao das bodas do
Cordeiro eo principia do ceu- Apoc. 19:7; 21:2,9.
4°. As Escrituras nos dizem que Ele, como "urn Cordeiro
que foi morto", esta no ceu e no trona; que Ele sera sempre o
templo e a luz da cidade; que apascentara sempre o Seu povo

609
Capitulo27

eo levara as fontes das aguas vivas-Apoc. 5:6; 7:17; 22:22,23.

CRISTO EXECUTOU 0 SEU OFICIO


DEMEDIADOR TANTO NO SEU ESTADO
DE HUMILHA<;;Ao COMO NO DE EXALTA<;;Ao.

20. Em que consiste a humilhafiiO de Cristo?


Veja o Catecismo Maior, Pergs. 46 e 50, e oBreve Catecismo,
Perg. 27.

21. Em que sentido Cristo foi sujeito a lei, e como isso foi um
ato de humilhac;ao?
Em Sua encarna<;ao, Cristo nasceu substituindo exata-
mente o Seu Povo em sua rela<;ao com a lei, e manteve com a
lei exatamente a mesma rela<;ao mantida por Seu povo. Nasceu,
pois, sujeito a lei, como se ve , I o. Como regra de dever; 2o.
Como alian<;a de vida; 3°. Como alian<;a violada, em cuja
maldi<;ao a ra<;a humana ja incorrera. Assumir Ele volun-
tariamente essa posi<;ao foi proeminentemente urn ato de
humilha<;ao: 1°. 0 ato pelo qual Ele assumiu a natureza
humana foi voluntario. 2°. Depois da Sua encarna<;ao, Sua
Pessoa permaneceu divina, e, cumprindo as exigencias da lei
sobre pessoas e nao sobre naturezas, Sua submissao a essas
exigencias foi PUramente gratuita. 3°. Esta Sua condescendencia
ereal<;ada infinitamente pelo fato dEle aceitar a maldi<;ao da
lei como alian<;a de vida ja violada- Gal. 3: 10-13; 4:4,5.

22. Em que sentido sofreu Cristo a maldic;iio da lei, e como foi


isso possivel ao Filho amado de Deus?
0 Pai declarou muitas vezes que Cristo, em Sua propria
Pessoa, absolutamente considerada, era Seu "Filho amado",
do qual disse: "em quem me comprazo", Mateus 3:17; 2 Ped.
1: 17; e Ele sempre fez o que era do agrado de Deus Pai- Joao
8:29. Contudo, no exerdcio do Seu oficio de Mediador, Ele
tinha tornado o nosso lugar e tinha assumido a culpa de nossos

610
Reinado Medianeiro de Cristo
pecados. Portanto, a ira de Deus, que Cristo levou sabre Si, foi
o desagrado infinito de Deus causado pelos nossos pecados, e
esse desagrado concretizou-se vicariamente na Pessoa de Cristo,
porque sabre Ele foi pasta a iniquidade de todos n6s - Mat.
26:42,54; Luc. 24:44-46; Joao 19:30.

23. Quais as diversas interpretafi5es da frase do Credo dos


Ap6stolos, "desceu ao inferno" ou "ao Hades"?
A frase katabasis eis adon, descensus ad inferos, foi uma das
ultimas a serem incorporadas no antigo Credo. Sup6e-se que
foi derivada de Sal. 16: 10; Atos 2:27; 1 Ped. 4:18-20. Veja:
1°. A igreja cat6lica romana, sabre o fundamento de uma
antiga tradic;ao, interpreta essa frase no sentido de que Cristo,
depois de Sua morte, foi, em Sua Pessoa inteira, como Deus-
-homem, aoLimbus Patrum, imaginaria parte do Hades em que
os santos do Velho Testamento estariam esperando a revelac;ao
e a aplicac;ao a eles da salvac;ao por Ele alcanc;ada. Ali Ele teria
pregado o evangelho e os teria levado para o ceu. Veja abaixo,
Cat. do Cone. de Trento.
2°. Os luteranos sustentam que a morte de Cristo foi o
ultimo passo da Sua humilhac;ao e que a Sua descida ao Hades
foi o primeiro da Sua exaltac;ao, porque foi revelar e consumar
Sua vit6ria sabre satanas e sabre os poderes das trevas, e
pronunciar Sua sentenc;a de condenac;ao.
3°. A lgreja da lnglaterra (Anglicana) afirma em seu 3°.
artigo: "Assim como Cristo morreu por nos e foi sepultado,
assim tambem devemos crer que Ele desceu ao inferno". No
primeiro livro de Eduardo VI acha-se a seguinte exposic;ao,
mais completa: "0 corpo de Cristo ficou no sepulcro ate aSua
ressurreic;ao, mas Seu espirito partiu dEle e esteve com os
espiritos que estavam no carcere, ou no inferno, e pregou aos
mesmos, como testifica a passagem de Pedro". 0 bispo Pearson,
em suaExposition of the Creed, ensina que Cristo realmente foi
ao Iugar dos condenados para consumar a expiac;ao dos pecados
humanos e destruir o poder do inferno sabre os Seus remidos.

611
Capitulo 27
4°. Calvino (Jnstitutas, Liv. 2, cap.16, § 10) interpreta essa
frase metaforicamente, dizendo que exprime os sofrimentos
penais de Cristo na cruz. Nossa Conf. de Fe afixa ao Credo a
clausula explicativa, "permaneceu no estado dos mortos", e a
Igreja Episcopal Americana afixa a clausula equivalente, "foi
ao lugar dos espiritos dos mortos". Isto e, Cristo era verdadeiro
homem, consistindo de corpo e alma, e Sua morte foi uma
verdadeira morte, e, deixando Seu corpo, a alma foi para o
mundo invisivel dos espiritos, onde teve uma existencia
separada mas conscia, ate a Sua ressurrei~ao.

24. Qual o verdadeiro sentido de 1 Pedro 3: 19-21?


E passagem muito obscura. A interpreta~ao romana, ja
dada na resposta apergunta anterior, e que Cristo foi aoLimbus
Patrum e pregou o evangelho aos espiritos presos que espe-
ravam o Seu advento.
A interpreta~ao comum dos protestantes e que Cristo foi
morto fisicamente, mas vivificado, ou restaurado avida, pelo
Espirito, Espirito pelo qual, inspirando a Noe como pregador
da justi~a, Cristo, muitos seculos antes, tinha descido do ceu e
pregado aos homens daquela gera~ao. Estes, em seus pecados
e em sua incredulidade, eram os "espiritos em prisao". Somente
oito pessoas creram e foram salvas; por isso os cristaos professos
e os pregadores do evangelho nao devem ficar desanimados
face a incredulidade dos homens atualmente.
Outra interpreta~ao, sugerida pelo arcebispo Leighton
numa nota, como sua ultima opiniao, e explicada largamente
pelo falecido Dr. Brown, de Edimburgo, e que Cristo,
morrendo fisicamente como sacrificio vicario, e vivificado no
espirito, isto e, vivificado espiritualmente, manifestado como
Salvador perfeito num grau muito superior ao que foi possivel
antes; morrendo como urn grao de trigo, Ele come~ou a
produzir muito fruto; e vivificado assim, Ele agora, por meio
da inspira~ao do Espirito, prega aos "espiritos em prisao", isto
e, aos prisioneiros do pecado e de satanas, do mesmo modo

612
Reinado Medianeiro de Cristo
como tinha feito anteriorrnente, posto que corn rnenor poder,
por rneio de Noe e de todos os profetas, quando os espiritos
cram desobedientes; sob o rninisterio de Noe forarn salvas s6
oito alrnas; porern depois de vivificado Cristo no espirito, is to
e, depois de rnanifestado como o Salvador perfeito, rnultid6es
tern crido.

25. Ern que consiste a exalta~ao de Cristo?


Veja oBreve Cat., Perg. 28, eo Cat. Maior, Pergs. 51-54.

26. Como era possivel que o Filho coigual a Deus fosse exaltado?
Como Filho coigual a Deus era irnpossivel, mas a Sua
Pessoa, como Deus homem, podia ser exaltada em diversos
aspectos. Veja:
1°. Em consequencia da uniao de Suas naturezas divina e
humana, a manifesta~ao externa da gloria da Sua Pessoa tinha
sido escondida aos olhos das criaturas.
2°. Como Mediador, Ele ocupou oficialmente uma posi~ao
inferior a do Pai, pois condescendeu em ocupar o lugar dos
pecadores. Tinha sido hurnilhado rnais do que podemos
conceber e, como premia da Sua auto-hurnilha~ao voluntaria,
o Pai 0 exaltou muitissirno- Fil. 2:8,9; Heb. 12:2; Apoc. 5:6.
3°. Sua alma humana e Seu corpo foram exaltados em grau
para n6s inconcebivel- Mat. 17:2; Apoc. 1: 12-16; 20:11.

27. Quais as diversas fontes que estabelecem a ressurreifiiO de


Cristo?
1°. 0 Velho Testamento a predisse. Compare Sal: 16.10
com Atos 2:24-31. Todas as dernais predi~6es a respeito do
Messias foram curnpridas ern Cristo, o que confirma o
cumprimento desta tambem.
2°. Cristo mesmo a predisse e, por conseguinte, sendo Ele
o profeta verdadeiro, Sua predi~ao cumpriu-se ern Sua
ressurrei~ao- Mat. 20: 19; Joao 10:18.
3°. Tornando-se em considera~ao a origem e o carater

613
Capitulo 27 ,
extraordinarios de Cristo, o evento em apre<;o nao tinha contra ·
si nenhuma improbabilidade antecedente.
4°. 0 testemunho dos onze ap6stolos. Os escritos destes
homens provam que eles eram bons, inteligentes e serios, e
cada urn deles teve muitas oportunidades para verificar o fa to;
e eles selaram o seu testemunho como seu sangue- Atos 1:3.
5°. 0 testemunho independente de Paulo. Este, como
quem nasceu fora do tempo devido, viu seu Senhor ressuscitado
e recebeu dEle, pessoalmente, Sua revela<;fw e Sua comissao -
1 Cor. 15:8; Gal. 1:12; Atos 9:3-8.
6°. Foi visto por mais de quinhentos irmaos juntos, e Paulo
apela para eles- 1 Cor. 15:6.
7°. A mudan<;a do dia de descanso semanal do ultimo para
o primeiro dia da semana e urn monumento do testemunho
concorde de toda a primeira gera<;ao de cristaos do fa to da sua
fe na ressurrei<;ao de Cristo.
8°. Os milagres operados pelos ap6stolos foram os selos
postos por Deus no testemunho dado por eles de que Ele
ressuscitou a Cristo- Heb. 2:4.
9°. 0 testemunho do Espirito Santo, acompanhando a
prega<;ao dos ap6stolos e honrando a sua doutrina e os seus
trabalhos, nao somente por meio de milagres, e sim tambem
por Seu poder de santificar, elevar e consolar- Atos 5: 32 (Dr.
Hodge).

28. Pelo poder de quem Cristo ressurgiu?


As Escrituras atribuem a ressurrei<;ao de Cristo-
1°.AElemesmo-Joao 2:19; 10:17.
2°. Ao Pai- Atos 13:33; Rom. 10:9; Ef. 1:20.
A concilia<;ao dessas duas proposi<;6es e feita pelo principia
de que todos os atos do poder divino, concretizando-se em
objetos externos a Deidade, podem ser atribuidos a qualquer
das Pessoas divinas, ou, em termos absolutos, aDei dade- Joao
5:17-19.

614
Reinado Medianeiro de Cristo
29. Qual o fundamento da declarafiio feita pelo ap6stolo de
que a nossa fie vii se Cristo niio ressuscitou (1 Cor. 15: 14 )?
1°. Se Cristo ressuscitou, Ele eo verdadeiro Messias e todas
as profecias de ambas as dispensa~6es tern nesse fato urn
penhor do seu cumprimento. Se Ele nao ressuscitou, todas elas
sao falsas.
2°. Por Sua ressurrei~ao ficou provado que Ele eo Filho
de Deus, Rom. 1:4, porque (1) Ele ressurgiu por Seu proprio
poder, e (2) Sua ressurrei~ao autenticou tudo quanto Ele dissera
a respeito de Si mesmo.
3°. Em Sua ressurrei~ao o Pai manifestou publicamente a
Sua aprova~ao e aceita~ao da obra realizada por Ele, Seu Filho,
como fiador do Seu povo.- Rom. 4:25.
4°. Se Cristo ressurgiu, temos urn advogado junto ao Pai-
Rom. 8:34; Heb. 9:11,12,24.
5°. Se Cristo ressurgiu, temos certeza da vida eterna; se
Ele vive, n6s tambem viveremos- Joao 14:19; 1 Ped. 1:3-5.
6°. Em conseqiiencia da uniao entre Cristo e Seus
membros, que e tanto federal como espiritual, a Sua ressur-
rei~ao e penh or certo e seguro da nos sa, ( 1) porque, assim como
morremos em Adao, seremos vivificados em Cristo, 1 Cor.
15:21,22; e (2) em razao do Seu Espirito, que mora em n6s-
Rom. 8:11; 1 Cor. 6:15; 1 Tess. 4:14.
7°. A ressurrei~ao de Cristo elucida e determina a nossa, e
a torna certa e segura-1 Cor. 15:49; Fil. 3:21; 1 Joao 3:2- Dr.
Hodge.

30. Quando, onde e na presenf_a de quem Cristo subiu ao ceu?


Subiu quarenta dias depois da Sua ressurrei~ao, de urn
certo lugar situado no Monte das Oliveiras, perto da vila de
Betania, na presen~a dos onze ap6stolos e talvez de outros
disdpulos, enquanto Ele os aben~oava e enquanto eles 0 viam
e olhavam atentamente para Ele. Lucas diz, alem disso, que se
achavam dois var6es glorificados; estes o Prof. J. A. Alexander
conjetura que foram Moises e Elias. Estava acompanhado

615
Capitulo 27
tambem de anjos celebrando Sua vitoria sobre o pecado, e Sua
exalta9ao ao Seu trono de Mediador- Luc. 24:50,51; Mar.
16:19; Atos 1:9-11; Ef. 4:8; Col. 2:13-15; Sal. 24:8-11; 78:19.
i
1

31. Quais as diversas opinioes quanta a natureza da ascensao


de Cristo?
Aqueles que, como os luteranos, creem que o corpo de
Cristo esta onipresente para a Sua Igreja sustentam, como e
natural, que em Sua ascensao Ele nao mudou de local e sim
retirou-Se do anterior trato sensorial que Ele mantinha com
Seus disdpulos.
0 certo e, porem, que Sua alma e Seu corpo passaram
realmente da terra para a morada dos bem-aventurados, e que
a Sua Pessoa inteira, como Deus-homem, foi gloriosamente
exaltada. Ele subiu como Mediador, triunfando sobre os Seus
inimigos e concedendo dons aos Seus amigos,- Ef 4:8-12; para
completar Sua obra medianeira- Joao 14:2,3; como o Precur-
sor do Seu povo, Heb. 6:20; e para encher o universo com as
manifesta96es da Sua gloria e do Seu poder- Ef. 4:20.

32. Que eque a"sessao"de Cristo adireita de Seu Pai abrange?


Veja Sal. 110:1; Mar. 16:19; Rom. 8:34; Ef. 1:20,22; Col.
3:1; Heb. 1:3,4; 10:12; 1 Ped. 3:22.
E evidente que a palavra "sessao" (que se refere ao ato de
assentar-se) e empregada figuradamente neste contexto. No
entanto, ao mesmo tempo exp6e expressivamente a suprema
glorifica9ao de Cristo no ceu. Apresenta-0 como o Deus-
homem, e no Seu offcio de Mediador exaltado a gloria e a
felicidade supremas e universais, como tambem dotado de
poder sobre todos os principados e potestades e sobre todo
nome que se nomeia- Heb. 2:9; Sal.15:12; Mat. 26:64; Dan.
7: 13,14; Fil. 2:9,11; Apoe. 5:6; assumindo assim, publica-
mente, o Seu trono como Sacerdote e Rei medianeiro sobre o
universo, a bern da Sua Igreja.

616
Reinado Medianeiro de Cristo
CRISTO, ASSENTADO SOBRE ESSE TRONO, DURANTE A
l'RESENTE DISPENSA<;AO, COMO MEDIADOR, APLICA EFI-
<:AZMENTE AO SEU POVO, POR MEIO DO SEU ESPIRITO, A
SALVA<;AO QUE PREVIAMENTE HAVIA ADQUIRIDO PARA ELES
EM SEU ESTADO DE HUMILHA<;AO.

EXPOSI<;::OES AUTORIZADAS DE DOUTRINAS

DOUTRINA ROMANA - Cat. Cone. de Trento, Parte 1,


cap. 6: "Professamos, pais, que, logo depois da morte de
Cristo, Sua alma desceu ao inferno ... Mas confessamos ao
mesmo tempo, por estas palavras, que a mesma Pessoa de
Cristo estava ao mesmo tempo no inferno e no sepulcro,
porque ... posto que Sua alma partisse do Seu corpo, Sua
deidade nunca esteve separada nem do corpo nem da
alma ... A palavra "inferno" refere-se aquelas moradas
ocultas onde sao detidas as almas daqueles que nao
alcan~aram a bem-aventuran~a celestial... Essas moradas
nao eram todas da mesma natureza ... Uma terceira especie
de receptacula e aquele em que foram recebidas as almas
dos santos que morreram antes da vinda de Cristo, nosso
Senhor; e onde, sem sentimento algum de dor, sustentadas
pela bem-aventurada esperan~a de reden~ao, elas gozaram
morada tranqiiila. As almas, pois, desses homens piedosos,
que, no seio de Abraao, esperavam o Salvador, Cristo, o
Senhor, livrou, descendo ao inferno ... Ele nao desceu para
sofrer alguma coisa, e sim para livrar do lastirnoso
abatirnento desse cativeiro os santos e justos, e para
comunicar-lhes o fruto da Sua paixao".
DOUTRINA LUTERANA- Form. Concordia: (Hase), p:ig.
788: "Crernos, pais, sirnplesrnente, que a pessoa inteira,
Deus e homem, depois de sepultada, desceu as regi6es
inferiores, venceu a satan:is, derrubou os poderes infernais
e tirou do diabo toda a for~a e toda a autoridade". "Ern
virtude desta uniao e comunhao pessoal, Ele operou todos
os Seus milagres e manifestou Sua divina majestade,
segundo a Sua liberrirna vontade, no tempo e do modo
que bern lhe pareciam, nao sornente depois da Sua

617
Capftulo27

ressurrei<;ao e ascensao ao ceu, porem ate mesmo em Seu


estado de humilha<;:ao. Ja tinha, com efeito, esta majestade
logo em Sua concep<;:ao, ainda no ventre de Sua mae; mas,
como diz o ap6stolo (Fil. 2:7), despiu-Se (aniquilou-Se) a
Si mesmo; e, como ensina o Dr. Lutero, Ele tinha esta
majestade secretamente no estado de Sua humilha<;ao, e
nem sempre fez uso dela, mas, sim, todas as vezes que
Lhe aprouve. Todavia agora, tendo subido ao ceu, nao de
maneira comum, como qualquer pessoa santa, e sim como
o ap6stolo testifica (Ef. 4:1 0) subiu acima de todos os ceus,
enche verdadeiramente todas as coisas e se acha presente
em toda parte, e, nao somente como Deus, mas tambem
como homem, Ele reina e governa de mar a mar e ate as
extremidades da terra ... Estas coisas, porem, nao se
fizeram de urn modo terreno, e sim, como o Dr. Lutero
costumava dizer, do modo e maneira da mao direita de
Deus (pro modo et ratione dexterce Dei), que nao e urn lugar
limitado e fixo no ceu; entretanto significa nada menos
que o poder onipotente de Deus, que enche o ceu e a terra
- na posse do qual Cristo entra real e verdadeiramente
quanto a Sua humanidade, sem nenhuma confusao ou
iguala<;:ao de Suas naturezas (divina e humana), nem
quanta a Sua essencia au aos Seus atributos essenciais" -
pags. 767,768.

618
28

A Aplica~ao da Reden~ao Feita


por Cristo Como Rei Medianeiro
por Meio da Opera~ao Pessoal
do Espirito Santo

VOCA<;Ao EFICAZ

1. Qual eo uso geral, no Novo Testamento, das palavras kalein


(chamar), klesis (vocafiio, chamamento) e klet6s (chamado)?
A pa1avrakalein e ernpregada nos sentidos, 1°. de charnar
corn a voz, Joao 10:3; Mar. 1 :20; 2°. de charnar para fora,
intirnar corn autoridade, Atos 4:18. 24:2; 3°. de convidar, Mat.
22:3; 9: 13; 1 Tim. 6:12. Muitos sao charnados, mas poucos sao
escolhidos. 4°. Da voca~ao eficaz do Espirito- Rom. 8:28-30;
1 Ped. 2:9; 5:10. 5°. Da designa~ao para urn oficio-Heb. 5:4.
6°. No sentido de dar-se urn nome, Mat. 1:21.
Klesis encontra-se onze vezes no Novo Testamento, e ern
todos os casos significa a voca~ao eficaz do Espirito Santo, corn
exce~ao de 1 Corintios 7:20, onde o terrno eernpregado como
sin6nirno de oficio ou ocupa~ao. Veja Rom. 11 :29; 1 Cor. 1:26,
etc. -Lexicon de Robinson.
Klet6s encontra-se dez vezes no Novo Testamento. E
ernpregado como designa~ao -
1°. Dos norneados para algurn oficio - Rom. 1: 1.
2°. Dos que recebern o charnado externo da Palavra- Mat.
20:16.

619
l
Capitulo 28
3°. Dos chamados eficazmente- Rom. 1:7; 8:28; 1 Cor.
1: 2,24; Jud., vers. 1; Apoc. 17:14.
A propria palavra ekklesia (igreja), designando a compa-
nhia dos fieis, os herdeiros das promessas, significa, etimolo-
gicamente, a companhia chamada para fora, a corpora~ao
constitufda pela "voca<;:ao".

2. Que eque a VDWfiiO externa inclui?


1°. Uma declara~ao do plano de sa1va<;ao.
2°. Uma declara<;:ao do dever que o pecador tern de
arrepender-se e crer.
3°. Uma declara<;;ao dos motivos que devem'influir no
espirito do pecador, como sejam o temor, a esperan<;a, o remorso
ou a gratidao.
4°. Uma promessa de que serao aceitos todos os que se
conformarem com as condi<;;6es - Dr. Hodge.

3. Como se pode provar que a vocafiiO externa para a salvafiio


efeita unicamente por meio da Palavra de Deus?
A lei de Deus, como se acha impressa na constitui<;:ao
moral do homem, e natural no homem e insepanivel dele como
urn ser responsavel - Rom. 1: 19,20; 2:14,15. 0 evangelho,
porem, nao faz parte dessa lei natural. .E da gra<;;a, e nao da
natureza, e e s6 por meio de uma revela<;:ao especial e
sobrenatural que podemos chegar ao seu conhecimento.
Isso e evidente- 1°. porque as Escrituras declaram que o
conhecimento da Palavra e essencial a salva<;:ao, Rom. 10:14-
17; e, 2°. porque declaram tambem que os que fazem pouco
caso da Palavra, quer escrita quer pregada, cometem o grande
pecado de rejeitar a possibilidade de salva<;:ao- Mat. 11 :21,22;
Heb. 2:3.

4. Segundo qual principia essa vocafiio e dirigida aos niio


eleitos bern como aos eleitos?
Que e dirigida indiscriminadamente as duas classes

620
A Aplicafiio da Redenfiio ...
l 1c1 provado-
1°. Pela declara~ao expressa das Escrituras- Mat. 22:14.
2°. Pelo mandamento que ordena pregar o evangelho a
toda criatura- Mar. 16: 15.
3°. Pela promessa feita a todos os que o aceitam- Apoc.
22:17.
4°. Pelo juizo terri vel pronunciado sobre os que o rejeitam
- Joao 3:19; 16:9.
E dirigida de igual modo aos nao eleitos como aos eleitos
porque e de igual modo seu dever e do seu interesse aceitar o
cvangelho; porque as provisoes de salvac;ao sao de igual modo
adaptadas ao seu caso, e sao abundantemente suficientes para
todos; porque Deus quer que nos beneficios do evangelho
tcnham parte todos os que o aceitarem.

5. Como se pode provar que ha uma vocafiio interna espiritual


distinta da vocafiiO externa?
1°. Pelas passagens que distinguem entre a influencia do
Espirito e ada Palavra- Joao 6:45,64,65; 1 Tess. 1:5,6.
2°. Pelas passagens que ensinam que a influencia do
Espirito e necessaria para a aceitac;ao da verdade- Ef. 1:17.
3°. Pelas passagens que atribuem a Deus tudo quanto de
born ha no homem- Fil. 2: 13; Ef. 2:8; 2 Tim. 2:25, e.g., a fe
eo arrependimento.
4°. As Escrituras distinguem entre os dois chamamentos:
dos que recebem urn, dizem elas: "muitos sao chamados, mas
poucos escolhidos"; dos que recebem o outro, dizem: "aos que
chamou a estes tambem justificou". Daqueles Deus diz:
"Porque eu vos chamei e v6s nao quisestes ouvir"- Prov. 1:24
(Figueiredo). Dos outros Ele diz: "Todo aquele que do Pai
ouviu e aprendeu vern a mim"- Joao 6:45.
5°. Ha uma necessidade absoluta de semelhante vocac;ao
interna, espiritual: 0 homem por natureza e "cego" e "morto"
nas transgress6es e pecados -1 Cor. 2:14; 2 Cor. 4:4; Ef. 2:1.

621
Capitulo28
6. Quale a ideia pelagiana sabre a vocar;ao interna?
Os pelagianos negam que haja pecado original e sustentam
que os termos born e mau so podem ser aplicados aos atos
executives da vontade. Afirmam, pois-
l
1°. Que como o homem tern perfeita liberdade da vontade,
pode a qualquer tempo tanto deixar o pecado como continuar
na pnitica dele.
2°. Que a unica mudan~a interna efetuada pelo Espirito
Santo no cora~ao dos que sao convertidos edevida aos fatos de
ser Ele o Autor das Escrituras e delas apresentarem estas
verdades e motivos morais que, por sua propria natureza,
exercem influencia moral sobre a alma. Eles negam inteira-
mente a existencia da "gra~a" no sentido biblico.

7. Quale a ideia semipelagiana?


Os semipelagianos sustentam que a gra~a enecessaria para
habilitar o hom em a voltar-se efetivamente para Deus e viver;
contudo, ao mesmo tempo afirmam que, segundo a propria
natureza da vontade humana, epreciso que 0 homem primeiro
deseje estar livre do pecado e que escolha a Deus como o seu
bern supremo, podendo entao esperar o auxilio divino para
levar esse desejo e essa escolha a efeito. Eles negam a existencia
da gra~apreveniente, mas admitem ada cooperativa.

8. Quale a ideia arminiana?


Os arminianos admitem a doutrina da deprava~ao total
do homem e que, em consequencia dela, ele e inteiramente
incapaz de fazer bern algum no desajudado exerdcio de suas
faculdades naturais. Contudo, tendo Cristo morrido igual-
mente por todos, todos recebem gra~a suficiente para habilita-
-los a fazerem tudo o que lhes eexigi do. Esta grar:;asuficiente so
se torna eficiente quando o pecador coopera com ela e dela se
vale- Apol. Conf Remonstr., pag. 162, b; Limborch, Theol.
Christ., pags. 4, 12, 8.

622
A Aplicm~iio da Redenfiio ...
9. Qual a doutrina ensinada sobre este assunto pelos simbolos
da lgreja Luterana?
Concordarn absolutarnente corn os dos reforrnados ou
l:alvinistas ern ensinar-
1°. Que todos os hornens estfio por natureza rnortos
cspiritualrnente e que sao totalrnente incapazes tanto de
cornec;;ar a voltar-se para Deus como de cooperar corn a Sua
grac;;a para isso antes da sua regenerac;;ao.
2°. Que a operac;;ao que o Espirito Santo por Sua grac;;a
rcaliza na alma hurnana e a (mica e exclusiva causa eficiente
que vivifica a alma marta. Por isso -
3°. 0 fundarnento ern que descansa a salvac;;ao dos que
creern ea eleic;;ao eterna que por Sua gra<;:a Deus realizou para
a salva<;:ao. Eles se recusarn, porern, a dar o passo que se segue
logicarnente, que e 0 de reconhecer que a razao pela qual OS
que nao creern nao sao vivificados e que Deus, corn igual
soberania, nao lhes da a grac;;a regeneradora. Eles insistern ern
atribuir isso unicarnente aresistencia crirninosa contra a gra<;:a,
que todos recebern nos graus iniciais - Hase, Formula
Concordice, pags. 579-583, 662-666 e 817-821.
Fulano e Sicrano sao igualrnente pecadores; F. ere e S.
perrnanece reprobo. Os pelagianos dizern que e porque F.
deterrninou-se a crer e S. a recusar-se. Os sernipelagianos
dizern que e porque F. cornec;;ou a procurar crer e foi ajudado,
cnquanto S. nao fez esforc;;o algurn. Os arrninianos dizern que
c porque F. cooperou corn a gra<;a cornurn a todos e S. nao
cooperou. Os luteranos dizern que e porque ambos erarn
totalrnente incapazes de cooperar, mas que S. resistiu
persistenternente a gra<;a, enquanto que F. cedeu afinal. Os
calvinistas dizern que e porque F. foi regenerado pelo poder
regenerador do Espirito de Deus e S. nao foi.

10. Quale a ideia sinergista* sobre este ponto?

* Na deriva<;ao grega da palavra temos a preposi<;ao syn (com) e o > >

623
Capitulo 28
A convite de Mauricio, o entao novo Eleitor da Saxonia,
os teologos de Wittenberg e de Leipzig reuniram-se em
conferencia em Leipzig, em 1548 d.C., e foi nessa ocasiao que
se susci tou a controversia sinergista. A palavra significa
coopera~ao. Os sinergistas eram teologos luteranos que sobre
este (mico ponto se afastaram do seu proprio sistema e adotaram
a posi<;ao arminiana. Melanchthon ensinou que "concorrem
tres causas de uma boa a~ao - a Palavra de Deus, o Espirito
Santo e a vontade humana anuindo e nao resistindo a Palavra
de Deus"- Loci Communes, pag. 90.

11. Qual a doutrina comum das igrejas reformadas sabre a


vocafiiDinterna?
Que e simplesmente uma manifesta~ao do poder divino
sobre a alma, imediata, espiritual e sobrenaturalmente, comu-
nicando uma nova vida espiritual e tornando assim possivel
urn novo modo de atividades espirituais. Que o arrepen-
dimento, a fe, a confian~a, a esperansa, o am or, etc., sao pura e
simplesmente atos do proprio pecador, mas que, como tais,
estes atos sao possiveis unicamente em virtude da mudan<;a
operada no estado moral de suas faculdades pelo poder
regenerador de Deus. Veja Conf de Fi, Cap. 10, Se~6es 1 e 2.
Antes da regenera~ao, a gra~a comum produz sobre o
carater e a vida externa uma superficial impressao moral, con-
tra a qual geralmente o pecador resiste. Com o ato de gra~a
que regenera, agindo dentro das energias espontaneas da alma
e mudando o seu carater, o homem nao pode nem cooperar
nem resistir-lhe. Mas, no momento em que a alma e rege-
nerada, comes;a a cooperar com as subsequentes influencias
prevenientes e cooperativas da gra~a, e as vezes, infelizmente,

< <substantivo ergon (a<;:ao, trabalho). Dai, o sinergista, seguidor do


sinergismo, acredita na a<;:ao con junta da gra<;:a divina e a capacidade humana.
Nos contextos cientificos emprega-se a palavra sinergia; nos religiosos ou
doutrimirios,sinergismo. Nota de Odayr Olivetti.

624
A Aplicafiio da Redenfiio ...
tambem a resistir-lhes. Todavia, de maneira geral, a gra~a tern
valor preservativo, e finalmente ela vence e salva. Os te6logos
reformados chamam a regenera~ao Conversio habitualis seu
passiva, is toe, a mudan~a de carater, em cuja efetiva~ao a alma
eo objeto, e nao o agente da a~ao. Aconversao eles chamam
Conversio actualis seu activa, isto e, a mudan<;a instantaneamente
subsequente de a~ao, em que a alma, sugerindo ainda e
ajudando a gra~a, e 0 unico agente.

12. Qual a diversidade de opinioes que sobre este ponto existem


entre os romanistas?
Os disdpulos de Agostinho na igreja romana, dos quais
os jansenistas foram os mais proeminentes, sao ortodoxos; mas
tern sido quase universalmente derrubados e substituidos por
seus adversarios, os jesuitas, que sao semipelagianos. 0
Condlio de Trento procurou satisfazer a ambos os partidos.-
Concilio de Trento, Sess. 6, Caps. 3 e 4. As doutrinas de Quesnel,
que defendeu a verdade sobre este ponto, foram condenadas
naBulla "Unigenitus", 1713 d.C. Belarmino ensinou que todos
os homens recebem a mesma gra~a, que s6 pelo evento se
verifica see praticamente congruente com a natureza de urn, e
por isso eficaz no seu caso, e incongruente com a natureza de
outro, e por isso ineficaz no seu caso.

13. Que eque se entende por "grafa comum", e como se pode


provar que o Espirito San to realmente opera nas almas daqueles
cujo corafiiO niio erenovado?
A gra~a comum e a influencia restritiva e persuasiva do
Espirito Santo, operando somente por meio das verdades
reveladas no evangelho, ou por meio da luz natural da razao e
da consciencia, aumentando o natural efeito moral dessas
verdades sobre o cora~ao, a inteligencia e a consciencia. Nao
envolve mudan~a do cora~ao, e, sim, unicamente urn aumento
do poder natural da verdade, uma a<;ao restritiva das mas
paix6es e urn aumento das emo~6es naturais em face do

625
Capitulo28
pecado, do dever e do interesse proprio.
Que Deus realmente opera desse modo sobre o coras;ao
dos nao regenerados fica provado -1°. Pelas Escrituras, Gen.
6:3; Atos 7:51; Heb. 10:29; 2°. Pela experiencia e pela
observas;ao universais.

14. Em que a grar;a comum difere da grar;a eficaz? ~


1°. Quanto a seus objetos. Todos os homens, em maior ou
menor escala, sao objetos da gras;a comum; somente os eleitos
sao objetos da gras;a eficaz- Rom. 8:30; 11 :7; 2 Tess. 2:13.
2°. Quanta a sua natureza. A gras;a comum e .somente
mediata, agindo por meio da verdade, e e somente moral,
aumentando a influencia moral que a verdade exerce natu-
ralmente, e estimulando somente as faculdades morais da alma,
tanto as racionais como as morais. No en tanto, a gras;a eficaz e
imediata e sobrenatural, porque e operada diretamente na alma
pela energia imediata do Espirito Santo, e porque ela implanta
uma nova vida espiritual e a capacidade de exercer de urn novo
modo as faculdades naturais.
3°. Quanto a seus efeitos. Os efeitos da gras;a comum sao
superficiais e transitorios, modificando a vida externa, mas sem
mudar a natureza, e sua influencia sempre sofre resistencia
mais ou menos conscientemente, por estar oposta as disposis;6es
prevalecentes da alma. A gras;a eficaz, porem, nao operando
ela sabre, e sim, em a propria vontade, mudando os desejos
dominantes e dando nova dires;ao as faculdades ativas da alma,
nem e resistive! nem irresistivel, mas sim muito livre,
espontanea e, nao obstante, muito certamente eficaz.

15. Como se pode provar que a grar;a eficaz e limitada aos


eleitos?
1°. As Escrituras apresentam os eleitos como chamados e
os chamados como eleitos- Rom. 8:28,30; Apoc. 17:14.
2°. Ha textos que mostram que a vocas;ao eficaz e baseada
no decreta da eleis;ao- 2 Tess. 2: 13,14; 2 Tim. 1:9,10.

626
A Aplicafiio da Redenfiio ...
3°. Ha tambem os que mostram que a santifica~ao, a
justifica~ao e todos os beneficios temporais e eternos da uniao
~om Cristo sao efeitos da voca~ao eficaz -1 Cor. 1 :2; Ef. 2:5;
Rom. 8:30.

16. Como se pode provar que a grafa econcedida par amor


de Cristo?
1°. Todas as ben~aos espirituais sao concedidas por amor
de Cristo- Ef. 1:3; Tito 3:5,6.
2°. As Escrituras declaram especificamente que somos
chamados em Cristo- Rom. 8:2; Ef. 2:4-6; 2 Tim. 1:9.

17. Que eque se entende quando se declara que esta injluencia


divina eimediata e sobrenatural?
Entende-se, 1°., que nega, (1) que ela e nada mais que a
influencia moral da verdade; (2) que e unicamente a influencia
moral do Espirito, aumentando a influencia moral da verdade
apresentada objetivamente; (3) que estimula meramente as
faculdades naturais da alma. Entende-se, 2°., que afirma, (1)
que o Espirito Santo opera imediatamente na alma a partir do
intimo; (2) que o Espirito Santo, exercendo o Seu poder
regenerador, implanta uma nova natureza moral, ou urn novo
principia de a~ao.

18. Quais os argumentos que provam que, alem da injluencia


exercida por meio da verdade, o Espirito exerce na alma uma
injluencia imediata?
1°. E feita distin~ao entre a influencia do Espirito e ada
Palavra- Joao 6:45,64,65; Rom. 15:13; 1 Cor. 2:12-15; 1 Tess.
1:5,6.
2°. :E declarado que uma influencia divina e necessaria
para a recep~ao da verdade- Sal. 119: 18; Atos 16: 14; Ef. 1:17.
3°. Essa opera~ao interna no cora~ao e atribuida a Deus-
Fil. 2: 13; 2 Tess. 1: 11; Heb. 13:21.
4°. Ha distin~ao entre o dom do Espirito eo da Palavra-

627
Capitulo28
Joao 14:16; 1 Cor. 3:16; 6:19; Ef. 4:30.
5°. A natureza desta influencia eevidentemente diferente
da natureza da influencia produzida pela verdade- Ef. 1:19;
3:7. Eo efeito echamado "nova criac;;ao" (ou "nova criatura"),
"novo nascimento", etc.
6°. Os hom ens estao por natureza mortos no pecado e
precisam de tal intervenc;;ao direta dopoder divino- Turretino,
Theol. Instits., Lo.l5, Quaes. 4. ·~

19. Quais os diversos motivos alegados para dar-sea esta grafa


o nome de <<grac;;a eficaz"?
I 0 • Os jesuitas e os arminianos, sustentando que todos os
homens recebem grac;;a suficiente para habilita-los a obede-
cerem ao evangelho, se quiserem, afirmam que esta grac;;a torna-
-se eficaz quando a vontade do individuo coopera com ela, e
em todo caso e s6 0 evento que prova que e eficaz.
2°. Belarmino e outros sustentam que a mesma grac;;a, dada
a todos, e congruente com a natureza moral de urn, e neste
caso eeficaz, e incongruente com a natureza moral de outro, e
nesse caso eineficaz.
3°. Alguns romanistas tern sustentado o que se chama
doutrina da influencia cumulativa. A influencia suas6ria do
Espirito, tornada eficaz por uma constante repetic;;ao e longa
continuac;;ao, efetua afinal o consentimento da alma.
4°. A doutrina ortodoxa e que a eficacia desta grac;;a e
inerente a sua propria natureza, por ser o exerdcio do poder
onipotente de Deus na execuc;;ao do Seu prop6sito eterno e
imutavel.

20. Em que sentido a grafa eirresistivel?


Devemos lembrar-nos de que o cristao eao mesmo tempo
objeto das influencias morais mediatas da grac;;a sobre a
vontade, que sao comuns a ele e aos incredulos, e tam bern das
influencias especiais da grac;;a dentro da vontade, que sao
certamente efi.cazes. Aprimeira classe de influencias os cristaos

628
A Aplicafiio da Redenfiio ...
r
podem resistir, e constantemente resistem, por causa da lei do
pccado remanescente em seus membros. A segunda classe de
influencias e certamente eficaz, mas nem sao resistiveis nem
irresistiveis, porque operam de dentro e levam espontanea-
mente a vontade consigo. Elamentavel que a expressao "grac;a
irresistivel" seja de uso corrente, porque sugere a ideia de uma
influencia medinica e coerciva sobre uma criatura contra a sua
vontade, enquanto que e realmente urn ato transcendente do
Criador infinito, que faz com que a criatura deseje espon-
taneamente a grac;a divina. *

21. Como se pode provar que esta grafa ecertamente eficaz?


1°. Pelas provas acima apresentadas, quanto asua natureza,
de que euma operac;ao imediata do poder onipotente de Deus.
2°. Pelas descric;6es da obra da grac;a. Os homens sao por
natureza "cegos", "mortos", "escravos", etc. A mudanc;a
cfetuada e uma "nova criac;ao", etc.
3°. Pelas promessas de Deus, que sao seguras. Os meios
que Ele utiliza para vindicar a Sua fidelidade nao podem deixar
de ser eficazes- Ez. 11: 19; 36:26; Joao 6:45. ,:. -. J
4°. Pela conexao que, segundo as Escrituras, existe entre a
vocac;ao e a eleic;ao. Os chamados sao os eleitos; os eleitos sao
os chamados. Como os decretos sao certos, a vocac;ao nao pode
deixar de ser eficaz. Veja acima, Perg. 15.
5°. A fe e o arrependimento sao dons de Deus, e quem
verdadeiramente se arrepende e ere e salvo. Segue-se que a
grac;a que comunica esses dons e eficaz- Ef. 2:8; Atos 11: 18; 2
Tim. 2:25.

22. Como se pode provar que esta injluencia econgruente com


a nossa natureza?
Apesar de nos descartarmos inteiramente da distinc;ao feita
* Eperfeitamente valida a preocupac;ao do au tor. Apenas tomo a liberdade
de opinar que a grac;a eficaz eirresistivel somente no sentido de que nao ha
criatura que possa frustrar sua eficacia. Nota de Odayr Olivetti.

629
Capitulo 28
por Belarmino (veja acima, Perg. 19), dizemos que a gra<;a
eficaz e "congruente com a natureza humana como tal, no
sentido de que o Espirito de Deus, posto que exer<;a na alma
uma influencia imediata e regeneradora, opera contudo em
perfeita harmonia com a integridade daquelas leis da nossa
natureza livre, racional e moral, que Ele mesmo constituiu.
Mesmo na obra miraculosa do novo nascimento Ele opera em
nossa razao e em nossa vontade de perfeito acordo com a
constitui<;ao de cada uma delas. Isto ecerto:
1°. 0 mesmo Deus cria e regenera; Seu objetivo nao e
destruir, e sim restaurar Sua propria obra.
2°. As Escrituras e a nossa propria experiencia ensinam
que os atos da alma que se seguem imediatamente depois da
implanta<;ao da gra<;a sao eminentemente livres e racionais. 0
fato e que nunca antes a alma havia operado normalmente -
Sal. 110:3; 2 Cor. 3:17; Fil. 2:13. 3°. Esta influencia divina
acha- se descrita por termos como "atrair", "ensinar",
"iluminar"- Joao 6:44,45; Ef. 1:18.

23. Que nos ensinam as Escrituras quanta aconexao entre esta


injluencia e a verdade?
E evidente que no caso da regenera<;ao de crian<;as a
verdade nao eempregada. Na regenera<;ao de adultos a verdade
ew1 sempre presente. No ato de regenera<;ao o Espirito opera
imediatamente na alma e muda o seu estado subjetivo,
enquanto que a verdade e o objeto apreendido consciente-
mente, sobre o qual se exercem as novas faculdades de discer-
nimento espiritual e os novos afetos. 0 Espirito prove vista, a
verdade ea luz discernida. 0 Espirito da sentimento, a verdade
apresenta o objeto amado- Rom. 10: 14,17; Tia. 1: 18; Joao
17:17.

24. Que motivos podem ser apresentados para a crenfa em que


0 Espirito nao regenera OS adultos por quem a verdade nao e
conhecida?

630
A Aplicafiio da Redenfiio ...
Negativamente: a Biblia nao apresenta base para a
csperan~a de tal extensao da gra~a, e nem nela nem em nossa
cxperiencia entre os gentios modernos encontram-se casos de
scmelhante obra.
Positivamente: as Escrituras associam sempre toda a
influencia espiritual com a verdade, e declaram que a prega~ao
(da verdade revelada) enecessaria para a salva~ao dos pecadores
-Rom. 10:14.

25. Quais as objefoes contra a doutrina arminiana da grafa


suficiente?
Os arminianos sustentam que Deus tern o prop6sito de
salvar a todos e que por isso chama a todos do mesmo modo,
dando a todos gra~a suficiente, se quiserem aproveita-la.
OBJETAMOS -1°. Relativamente poucos tern tido ocasiao
de ouvir o chamamento externo do evangelho. Os gentios sao
responsaveis com base na luz da natureza e estao sob a lei das
obras, mas ao mesmo tempo nao tern os meios da gra~a- Rom.
1:18-20; 2:12-15.
2°. Essa doutrina e incompativel como prop6sito divino
de elei<;ao. Veja acima, Cap.11.
3°. Segundo o sistema arminiano, depende da livre vontade
do homem (do livre-arbitrio) o tornar a gra~a suficiente da
parte de Deus, com urn a todos, em gra~a eficiente no seu caso.
Mas as Escrituras ensinam que a salva~ao etotalmente de gra<;a
e urn dom de Deus- Ef. 2:8; 2 Tim. 2:25; Rom. 9:15,16.
4°. As Escrituras declaram expressamente que nem todos
os que recebem o chamamento externo tern gra~a suficiente-
Rom. 9: 16-24; 11:8.

EXPOSI<;;OES AUTORIZADAS DE DOUTRINA


'' .. {~ 1\
DOUTRINA ROMANA- Cone. de Trento, Sessao 6, Can.
1: "Se alguem disser que o homem pode justificar-se para
com Deus" (por justifica<;:ao os romanos entendem a
li~BliOlECA AUBREY CLABI<
631
Capitulo28
remo<;;ao do pecado e a infusao de uma disposi<;;ao na alma
resultante da gra<_;;a) "pelas suas obras, feitas com as fon;as
da natureza, ou com a doutrina da Lei, sem a gra<;;a divina
por Jesus Cristo, seja anatema. Can. 2 - Se alguem disser
que a gra<;;a divina por Jesus Criso se da somente para que
o homem possa mais facilmente viver justificadamente e
merecer a vida eterna; como se pelo livre-arbitrio, sem a
gra<_;;a, pudesse conseguir uma e outra coisa, ainda que com
trabalho e dificuldade, seja anatema. Can. 3. - Se alguem
disser que sem a inspira<_;;ao proveniente do Espirito Santo
e Sua ajuda o homem pode crer, esperar e amar como J
convem, para lhe ser conferida a gra<_;;a da justifica<_;;ao, seja
anatema. Can. 4. - Se alguem disser que o livre-arbitrio
do homem, movido e estimulado por Deus, devido Deus
o estimular e chamar, em nada coopera a fim de que se
disponha para alcan<_;;ar a gra<;;a da justifica<_;;ao; nem pode
dissentir, se quiser, mas, como uma coisa morta, nada faz,
e meramente passivo, seja an:itema. Can. 5. - Se alguem
disser que o livre-arbitrio, depois do pecado de Adao, se
perdeu e se extinguiu; ou que e coisa s6 de titulo, ou antes,
titulo sem realidade, e enfim uma fiq:ao introduzida na
lgreja por satanas, seja anatema".
DOUTRINA DA IGREJA GREGA- Jerem. in Act. Witem.-
"Mesmo depois da Queda, nada impede o homem de voltar-
-se do mal e, acrescentado a isso, de fazer o bern e escolher
o que e justa, como quem possui o livre-arbitrio ... De tudo
isso e clara que e da nossa parte acordar e obedecer, e
somas capazes de escolher o bern como tambem o mal. S6
precisamos de uma coisa, e esta e o auxilio de Deus para
que possamos ser bern sucedidos no bern e ser salvos, e
sem esse auxllio nao temos for<_;;as para concluir a obra".
DOUTRINA LUTERANA- Form. Concordice, pag. 662-
Mas antes de ser o homem iluminado, convertido,
regenerado e atraido pelo Espirito Santo, ele nao e capaz,
de per si e por suas pr6prias for<_;;as naturais, nas coisas
espirituais e (tendentes) a sua propria conversao e
regenera<;;ao, de produzir ou cooperar em coisa alguma,
mais do que o poderia urn paste ou urn torrao de terra".

632
A Aplicafiio da RedenfiiO...

lb., pag. 589: "0 que escreveu o Dr. Lutero - ''A vontade
do homem conserva-se puramente passiva na conversao",
e necessaria recebe-la reta e convenientemente, a saber,
com respeito a grat;a divina fazer surgir os novos
movimentos, isto e, deve-se entender no sentido de que,
quando o Espirito de Deus opera na vontade do homem
pela Palavra ouvida, ou pelo uso dos sacramentos, produz
no homem a conversao e a regenerat;ao. Porque, depois
de o Espirito Santo produzir isso mesmo, e depois de,
unicamente por Sua energia, mudar e renovar a vontade
do homem; entao, sim, esta nova vontade e urn instru-
mento do Espirito Santo de Deus, de modo que ela nao so
pode lant;ar mao da grat;a, mas tambem cooperar com o
Espirito nas obras subsequentes".
DOUTRINA REFORMADA- Conf de Fe, Cap. 10, § 1:
"Todos aqueles que Deus predestinou para a vida, e
somente aqueles, aprouve a Ele, no tempo por Ele deter-
minado e aceito, chamar eficazmente por Sua Palavra e
por Seu Espirito, daquele estado de pecado e morte em
que se acham por natureza, para a grat;a e a salvat;ao por
Jesus Cristo; iluminando espiritualmente e de urn modo
salvador o entendimento deles para compreenderem as
coisas de Deus, tirando-lhes o corat;ao de pedra e dando-
-lhes urn corat;ao de carne; renovando-lhes a vontade e
por Seu poder onipotente determinando-os para aquilo
que e born, e atraindo-os eficazmente para Cristo; mas ao
mesmo tempo de tal modo que eles vern muito livremente,
sen do para is so dispostos por Sua grat;a". § 2: "E esta
vocat;ao eficaz e s6 da grat;a livre e especial de Deus, e nao
de coisa alguma que fosse de qualquer modo prevista no
homem, 0 qual em tudo isso e inteiramente passivo, ate
que, sendo vivificado e renovado pelo Espirito Santo, fica
assim habilitado a corresponder a esta vocat;ao e a receber
a grat;a oferecida e comunicada nela" - Cat. Maior, Perg.
67. Breve Cat., Pe:rg. 31.
Canones do Sinodo de Dort, Caps. 3 e 4, Rejec. Er., Eno.
4: "(Sao rejeitados aqueles) que ensinam que o homem
nao regenerado nao esta estrita e totalmente morto nos

633
Capitulo 28
pecados, nem vazio de toda a for~a quanto ao que e born
espiritualmente; mas que pode ter fome e sede de justi~a e
oferecer o sacrificio de urn espirito quebrantado e contrito
que seja aceito por Deus". Art.l2: "(A regenera~ao) e
claramente sobrenatural, uma opera~ao muito poderosa e
ao mesmo tempo muito suave, maravilhosa, secreta e
inefavel, nao inferior a uma cria~ao, nem menor do que
uma vivifica~ao dos mortos; de modo que todos aqueles
em cujo cora~ao Deus opera desta maneira maravilhosa,
sao com certeza regenerados infalivel e eficazmente, e
manifestam fe. E entao a vontade, sendo renovada, nao
s6 tern operado Deus sabre ela e e por Ele movida, mas
sendo movida assim por Ele, ela mesma se move. Por isso
tambem se diz com razao que e o proprio homem que,
por meio desta gra~a recebida, ere e se arrepende".
DOUTRINA REMONSTRANTE- Conf Remonstr., 17,6:
"Decidimos, pois, que a gra~a de Deus e o principia, o
progresso e 0 remate de tudo 0 que e born, de modo que
mesmo a pessoa regenerada nao pode pensar, determinar
nem fazer coisa boa e salvadora, sem esta gra~a previa,
preveniente, estimulante, subseqiiente e cooperativa".
Apol. Conf Remonstr., pag. 162, b: "A gra~a e chamada
eficaz por causa do resultado, o que, porem se pode tomar
em sentido duplo: primeiro, do modo que se julga que a
gra~a nao tern, de per si, poder algum para produzir
consentimento na vontade, mas que toda a sua eficacia
pode depender da vontade humana; ou em segundo lugar,
do modo que se julga que a gra~a tern, de per si, poder
suficiente para produzir consentimento na vontade,
porem, por ser parcial este poder, nao pode manifestar-se
em atos sem a coopera~ao da livre vontade humana, e por
isso ela, para produzir efeitos, depende da livre vontade
(do livre-arbitrio). Os remonstrantes desejam que se tome
o segundo como o seu modo de entender".

634
29

A Regenera~ao

1. Quais os diversos termos e expressi5es empregados nas


Escrituras para designar esta obra?
1°. "Criar" de novo- Ef. 4:24. 2°. "Gerar"- Tia. 1:18. 3°.
"Dar vida"- Joao 5:21; Ef. 2:5. 4°. "Chamar das trevas para
uma maravilhosa luz" -1 Ped. 2:9. A respeito dos regenerados
dizem as Escrituras: 1°. Que sao "ressuscitados dos mortos" -
Rom. 6:13. 2°. Que sao "novas criaturas"- 2 Cor. 5:17. 3°.
Que "nasceram de novo" - Joao 3:3,7. 4°. Que sao "feitura de
Deus" - Ef. 2:10.

2. Qual a opiniiio pelagiana a respeito da regenerafiio?


Eles sustentam que s6 as voli<;;6es podem ser pecamino-
sas, e que e essencial a liberdade e a responsabilidade dos
homens que eles sejam sempre capazes tanto de deixar o pecado
como de permanecer nele. Por isso a regenera<;;ao nada mais e
que uma reforma da vida e dos costumes. 0 homem que dantes
se compraz1a em transgredir a lei, compraz-se agora em
obedecer-lhe.

3. Qual a doutrina da igreja cat6lica romana sabre este assunto?


Os cat6licos romanos -
1°. confundem a justifica<;;ao com a santifica<;;ao, fazendo
delas urn s6 ato de Deus no qual, para a Sua gloria, por amor
dos merecimentos de Cristo, pelo poder eficaz do Espfrito
Santo e por meio do batismo, Ele apaga uma vez por todas a

635
Capitulo 29
culpa dos nossos pecados e nos livra do poder inerente ao
pecado original e tarnbern da sua macula - Cone. de Trento,
Sessao 6, cap.7.
2°. Eles sustentam a doutrina de que a regenera<:;ao e
operada unicamente por meio do batismo. Este e eficaz em
todos os casos da sua aplica<:;ao a crian<:;as. No caso dos adultos,
estes podem resistir asua eficacia ou anula-la. No batismo (1)
OS pecados SaO perdoados; (2) a natureza moral do batizado e
renovada; (3) ele e feito filho e herdeiro de Deus- Cat. Rom.,
Parte 2, Cap.2.

4. Quais as diversas opinioes mantidas na lgreja Anglicana


sabre a regenerafiiO batismal?
1a. A teoria do partido chamado puseita, e que eessencial-
mente a mesma da igreja cat6lica romana. Eles sustentam em
geral que o Espirito Santo, servindo-Se do batismo, implanta
na alma urn germen de vida espiritual, e que este pode
permanecer latente por muito tempo, e depois ser desenvolvido
ou destruido.
za. A opiniao de urn grande partido muito habilmente
representado pelo falecido bispo H. U. U nderdonk, em seu
Essay on Regeneration, Filadelfia, 1835. Este sustentava que ha
duas regenerac;:6es distintas, constando uma de uma mudanc;:a
deestado oucondifiio, e a outra de uma mudan<:;a de natureza. A
primeira e batismal, a segunda, moral, a medida que ambas
sejam espirituais por serem obra do Espirito Santo. A primeira,
ou a regenera<:;ao batismal, e urn novo nascimento, porque nos
torna filhos de Deus, assim como a alian<:;a que tinha por selo
a circuncisao tornou OS judeus Seu povo peculiar. A segunda e
urn novo nascimento ou uma nova cria<:;ao em sentido supe-
rior, porque e uma gradual mudan<:;a santificadora operada no
caniter moral pelo Espirito Santo, e nao e necessariamente
ligada ao batismo.

636
A RegenerafiiO

5. Qual a opiniiio sabre a regenerafiiO mantida par aqueles que,


ua America, sustentam a "Exercise Scheme"?
Esses te6logos negam que existam na alma quaisquer
habitos ou disposi~6es morais permanentes, e s6 admitem a
cxistencia da alma ou agente e seus atos ou "exercises"
(cxerdcios). No homem natural a serie de atos e totalmente
depravada. No homem regen era do urn a nova serie de atos santos
e criada pelo Espirito Santo e continuada por Seu poder -
Emmons, Sermao 64, sobre o "Novo Nascimento".

6. Qual a opiniiio caracteristica de "New Haven", defendida


pelo Dr. N. W Taylor, sabre este assunto?
0 Dr. Taylor concordou com os defensores do "Exercise
Scheme" em que nao ha na alma nada alem do agente e seus
atos; mas divergiu deles sustentando que o homem, e nao Deus,
e o au tor independente das a<;6es humanas. Ele sustentava que,
quando Deus e o mundo se apresentam a contempla~ao do
espirito do homem, a regenera~ao consiste do ato do pecador
pelo qual ele escolhe Deus como o seu bern supremo,
confundindo assim a regenera~ao com a conversao. 0 Espirito
Santo, de algum modo desconhecido, ajuda a refrear a opera~ao
ativa do prindpio natural e egoistico que prefere o mundo
como o seu bern supremo. "Urn espirito assim apartado do
mundo como seu bern supremo escolhe logo a Deus por sua
po r~ao, sob o impulso desse desejo inerente de alcan~ar a
feli cidade, sem o qual nenhum objeto nunca poderia ser
considerado como bam, desejavel ou amavel". Este motivo
original para fazer essa escolha de Deus, que ea regenera~ao, e
meramente natural, e moralmente nao e nem born nem mau.
Assim - 1°. A regenera~ao eurn ato do proprio homem. 2°. 0
Espirito Santo ajuda o homem, (1) suspendendo o poder domi-
nador da sua disposi~ao egoistica e pecadora; (2) apresentando
ao seu espirito, aluz clara da verdade, a superioridade de Deus
como objeto de sua escolha. 3°. 0 pecador escolhe en tao a Deus

637
Capitulo 29 I
como o seu bern supremo sob a convic~ao da sua inteligencia
e impelido por urn motivo natural, mas nao pecaminoso, de
amor proprio, que se deve distinguir do egoismo, sendo este a
essen cia do pecado. Veja Christian Spectator, dezembro de 1829,
p~gs.693,694,etc.

7. Qual i a doutrina comum dos cristiios evangilicos?


1°. Que na alma, alem de suas diversas faculdades, existem
tam hem h~bitos ou disposi~6es, alguns dos quais sao inatos e
outros adquiridos, e que dao o fundamento ou a base para a
alma exercer suas faculdades de urn modo particular. Assim
julgamos ser permanentemente rna a disposi~ao moral de urn
homem quando o vemos agir habitualmente de urn modo
pecaminoso, e permanentemente boa quando o vemos agir
habitualmente de urn modo moralmente hom.
2°. Estas disposi~6es precedem as a~6es morais, e deter-
minam o caniter destas como boas ou mas.
3°. Na cria~ao Deus fez santa a disposi~ao do cora~ao de
Adao.
4°. Na nova cria~ao Deus torna a criar santa a disposi~ao
dominan te do cora~ao do hom em regenerado.
Por isso e propriamente chamada "regenera~ao", "nova
cria~ao", "novo nascimento".

8. Quando se diz que a regenerafiio consiste em dar um novo


corafdD, ou em implantar um novo principia ou uma nova disposifiiO,
o que i que se entende pelos termos "corafiio", ('principia" e
((disposifiio"?
0 Presidente Edwards (de Princeton) diz: "Por urn prin-
cipia da natureza entendo, neste ponto, essa base posta na
natureza, quer velha quer nova, para qualquer modo ou
maneira particular pela qual se exer~am as faculdades da alma.
Assim, pois, este novo "sentido espiritual" nao e uma nova
faculdade da inteligencia, e sim uma nova base posta na alma
para uma nova especie de exercicio dessa mesma faculdade

638
A Regenerafiio

da inteligencia. Assim tambem essa nova disposi<;ao do


·ora<;ao, que acompanha esse novo sentido, nao e uma nova
f'aculdade da vontade, e sim uma base pasta na natureza da
alma para uma nova especie de exerdcio dessa mesma facul-
uade da vontade- Edwards, sabre Religious Affections (Afetos
Rcligiosos), Parte 3, Se<;ao 1.
0 termo "cora<;ao", significando essa prevalecente dispo-
si<;ao moral que determina as voli<;6es e as a<;6es, e o termo
mais comumente empregado nas Escrituras- Mat. 12:33,35;
15: 19; Luc. 6:43,45.

9. Como se pode mostrar que esta idiia sabre a regenerafiio niio


a representa como envolvendo alguma mudanfa na essencia da alma?
Essa e a acusa<;ao feita contra a doutrina ortodoxa por todos
os que negam que haja na alma outra coisa alem de suas
fac uldades constitutivas e seus exerdcios. Argumentam, pois,
que, se for mudada qualquer coisa alem dos meros exerdcios
da alma, sua constitui<;ao fundamental sera mudada fisica-
mente. Em oposi<;ao a isso, nos argumentamos que temos
precisamente as mesmas provas de que existe na vontade uma
permanente disposi<;ao moral, ou uma disposi<;ao inerente a
ela, como a razao pela qual urn homem born segue habitual-
mente o bern, e o homem mau o mal. Argumentamos que
temos as mesmas provas de que existe a propria alma invisivel,
ou qualquer das suas faculdades, como a razao pela qual urn
hom em faz qualquer coisa, ou pela qual as suas a<;6es sao, e.g.,
urn pensamento, uma emo<;ao ou uma voli<;ao. E-nos
impossfvel conceber a escolha produzida em nos pelo Espfrito
Santo, de mais de tres modos diversos: "Primeiro, por sua
opera<;ao direta em produzir a escolha, caso em que esta nao
seria ato nosso. Em segundo Iugar, apresentando aos nossos
prindpios constitutivos e naturais de amor proprio motivos
tais que eles nos levam a fazer a escolha, caso em que nao haveria
moralidade no ato. Ou, em terceiro Iugar, produzindo em nos
urn tal gosto pelo carater divino que a alma se regozija tao

639
Capitulo29
espontanea e imediatamente em Deus como sua por~ao como
se regozija na percep~ao do belo".
"Se o nosso Criador nao somente nos dotou de susceti- ~
bilidade geral para amar, mas tambem da disposi~ao especifica ~
para amar nossos filhos, somente Ele nos pode dar discer-
nimento e suscetibilidade para a percep~ao da beleza natural,
e pode dar-nos tambem gosto pela beleza moral. E se este gosto,
por causa do pecado, esta viciado e pervertido, Ele o pode
restaurar por Seu Espfrito na regenera~ao"- Hodge, Essays.

10. Em que sentido se pode dizer que a alma epassiva na


regenerar;iio? ·
0 Dr. Taylor sustentou que a regenera~ao eo ato da alma
em que o homem escolhe a Deus como sua por~ao. Assim, o
autor eo homem, e nao Deus.
A Igreja Crista, ao contrario, sustenta que na regenera~ao
o Espirito Santo e o Autor e o homem e o objeto. 0 ato do
Espfrito Santo, implantando urn novo principia, nao estorva
a atividade essencial da alma, mas somente da nova dire~ao a
essa atividade, porque, conquanto seja ativa a alma, ao mesmo
tempo e possfvel agir sobre ela. E, posto que seja necessaria-
mente ativa no mesmo instante da sua regenera~ao, afirma-se
com razao que ela epassiva com rela~ao a esse ato do Espirito
Santo pelo qual e regenerada. Considere:
1°. A alma, sob a convic~ao do Espirito Santo, e no
exercfcio de sentimentos meramente naturais, considera algum
aspecto da verdade salvadora, e procura aceita-la.
2°. 0 Espirito Santo, pelo exerdcio do Seu poder criador,
muda a disposi<;ao dominante do cora~ao de uma maneira
inexplic:ivel e mediante uma influencia que a pessoa einca paz
de apreender.
3°. A alma exerce simultaneamente novos afetos e aceita
experimentalmente a verdade.

640
A Regenerafiio
11. Qual a diferenfa entre a regenerafiiO e a conversiio?
0 termo conversao e empregado muitas vezes num sentido
lato, incluindo tanto a mudanc;;a da natureza como tambem o
cxerdcio dessa natureza depois de mudada. Mas, quando se
faz distinc;;ao entre ela e a regenerac;;ao, significa o primeiro
cxerdcio da nova disposic;;ao implantada na regenerac;;ao, isto
c, o ato de voltar-se livremente para Deus.
I A regenerac;;ao e ato de Deus; a conversao e ato nosso. A
regenerac;;ao e a implantac;;ao de urn principia concedido pela
grac;;a; a conversao eo exercicio desse principia. A regenerac;;ao
nunca e materia de consciencia direta de quem eregenerado;
a conversao o e para o convertido. A regenerac;;ao e urn s6 a to,
completo em si, e nunca repetido; a conversao, sendo o comec;;o
de uma vida santa, eo comec;;o de uma serie constante de atos,
sem fim e progressiva. "Leva-me tu, correremos (correrei) ap6s
ti" - Cant. 1 :4. Esta distinc;;ao e assinalada pelos te6logos do
seculo 17 (e.g., Turretino, Lo. 15, Qures. 4, § 13) com as frases
conversio habitualis seu passiva, isto e, a infusao feita por Deus
de urn habito na alma, fruto da grac;;a, a cujo respeito ela e
passiva; e conversio actualis seu activa, isto e, os atos de fe e
arrependimento, que sao a conseqiiencia, produzidos pela grac;;a
cooperativa e que, ao mesmo tempo, sao atos do homem
mesmo.

12. Como se pode provar que existe o que se chama comumente


regenerafiio?
1°. Pelas passagens das Escrituras que declaram que e
necessaria tal mudanc;;a- Joao 3:3; 2 Cor. 5: 17; Gal. 6:15.
2°. Pelas passagens que descrevem a mudanc;;a- Ef. 2:5;
4:24; Tia. 1: 18; 1 Ped. 1:23.
3°. Pelo fato de que ela enecessaria tanto para OS homens
caracterizados pela maior moralidade como para os que levam
vida dissoluta-1 Cor. 15:10; Gal. 1:13-16.
4°. Pelo fato de que esta mudanc;;a interna nao e uma simples
reforma externa, como fica provado pelo fato de que e atribuida

641
Capitulo 29
ao Espirito Santo-Ef.1:19,20; Tito 3:5.
5°. Pela compara~ao entre o estado do homem na gra~a e
seu estado como e por natureza - Rom. 6: 13; 8:6-10; Ef. 5:8.
6°. Pela experiencia de todos os cristaos e pelo testemunho
de sua vida.

13. Qual a natureza da iluminaftiO sobrenatural?


A alma do homem e uma unidade: urn estado radical-
mente defeituoso ou pervertido de qualquer de suas faculdades
afeta para o mal todas as demais faculdades. A essencia do
pecado consiste no fato de que as disposi~6es e os sentimentos
morais da vontade estao pervertidos. Mas o estado pervertido
destes sentimentos afeta necessariamente os exercicios da
inteligencia, a respeito de todos os objetos morais, tanto como
as pr6prias voli~6es. Nao podemos amar ou desejar urn objeto
se nao percebermos a sua beleza, e nao podemos perceber
intelectualmente a sua beleza seas suas qualidades nao forem
amilogas ao nosso gosto inerente ou a nossa disposi~ao. 0
pecado e, pois, essencialmente enganoso, e o homem, como
pecador, e espiritualmente cego. Isso nao consiste em nenhum
defeito fisico. Ele possui todas as faculdades necessarias para
vera beleza e sentir o poder da verdade, porem a sua natureza
inteira esta pervertida em conseqiiencia das suas mas
disposi~6es. Logo que tais disposi~6es forem mudadas ele
passara aver e, vendo, amara a verdade e lhe prestara obedi-
encia, sem que se opere em sua natureza nenhuma mudan~a
constitutiva, is toe, sem que se lhe de nenhuma faculdade nova,
mas somente sendo retificadas moralmente as suas faculdades
pervertidas.
Esta ilumina~ao e chamada sobrenatural - 1°. Porque,
tendo-se perdido, pode ser restaurada unicamente pelo poder
imediato de Deus. 2°. Em contradistin~ao do estado defei-
tuoso da atual natureza depravada do homem. Ela nao
comunica, porem, novas verdades ao espfrito, nem diminui
de modo algum o clever do cristao de estudar a Palavra de Deus

642
A Regenerafiio
com diligencia e ora~ao, nem conduz a interpreta~6es fanta-
siosas das Escrituras, e alheias ao sentido claro da letra: ela
simplesmente conduz a percep~ao e a aprecia~ao da beleza
natural e do poder espiritual da Palavra inspirada e das
vcrdades nela reveladas.

14. Como se pode provar que os crentes recebem essa iluminafiio?


1°. E necessaria- 1 Cor. 2: 14; 2 Cor. 3: 14; 4:3; Joao 16:3.
Pela constitui~ao da nossa natureza e necessaria que apre-
cndamos urn objeto como amavel antes de podermos ama-lo
por amor de si mesmo.
2°. As Escrituras afirmam essa verdade expressamente.
Conhecer a Deus evida eterna- Joao 17:3; 1 Cor. 2: 12,13; 2
Cor. 4:6; Ef. 1:18; Fil. 1:9; Col. 3:10; 1 Joao 4:7; 5:20; Sal.
19:9,10; 43:3,4.
Sendo a alma uma unidade, uma mudan~a em suas
radicais disposi~6es morais muda necessaria e simultanea-
mente o exerdcio de todas as suas faculdades, em rela~ao aos
objetos morais e espirituais. A alma nao pode amar aquilo cuja
beleza nao percebe, nem pode ver beleza naquilo que nada
tern de analogo asua natureza. 0 primeiro objeto, pois, pro-
duzido na ordem da natureza pela regenera~ao, ou por uma
mudanc;a radical da disposi~ao moral, e que se abram os olhos
do nosso entendimento para verem a excelencia da verdade
divina; o segundo efeito e que amemos a excelencia assim
percebida. Isto eo que o Presidente Edwards (Religions Affec-
tions) chama "o sentido do cora~ao".

15. Qual o sentido da convicfiiO de pecado que acompanha


a regenerafiio?
A ilumina~ao espiritual conduz o homem nao regenerado
imediatamente apercepc;ao da justi~a, da bondade e do imenso
alcance e exatidao da lei de Deus, e tambem, por contraste, a
percep~ao da grande culpabilidade do pecado no abstrato, Rom.
7:7,13, e, sobretudo, do seu proprio pecado- revelando-lhe

643
Capitulo 29
assim, em contraste com a pureza e com a justic;:a divinas, a
corrupc;:ao do proprio corac;:ao, que ele merece a condenac;:ao, e
que, em todas as suas relac;:6es com Deus, etotalmente incapaz
de fazer algo que seja born - J6 42:5,6. Este eurn conhecimento
pratico e experimental - produzido pela luta do Espirito Santo
como homem (Joao 16:8) - da sua culpa, da sua corrupc;:ao e
da sua impotencia morale espiritual.

16. Qual a natureza dessa convicfiiO de pecado quemuitas vezes


ocorre antes da regenerafiiO ou sem ela, e como se pode distinguir
essa falsa convicfiiO daquela que everdadeira?
A consciencia naturale urn elemento essencial e indestru-
tivel da natureza humana, e nela se acham incluidos o
sentimento do berne do mal, e emoc;:6es dolorosas associadas
como sentimento do mal. Conquanto esta faculdade possa ser
pervertida por algum tempo e possa tornar-se endurecida a
sensibilidade associada com ela, contudo, pode ser e muitas
vezes e vivificada, no caso dos nao regenerados, para uma
atividade penosa, levando aconvicc;:ao do desmerecimento, da
corrupc;:ao, da impotencia e do perigo. No mundo futuro isso
constituira em grande parte os sofrimentos dos perdidos.
Por outro lado, a convicc;:ao de pecado que e peculiar aos
regenerados distingue-se por ser acompanhada do sentimento
da beleza positiva da santidade e de urn desejo ardente de nao
somente ver-se livre das angustias do remorso, mas princi-
palmente da corrupc;:ao e do dominio do pecado.

17. Qual a natureza desses novas afetos que siio a conseqiiencia


da renovafiio do corafiio, e como se distinguem dos exercicios dos
homens niio renovados?
A iluminac;:ao espiritual produz a percepc;:ao daquela
beleza que os afetos renovados do corac;:ao aceitam e em que
encontram prazer. Sao espirituais, porque sao formados dentro
de n6s e mantidos em exercicio pelo Espirito de Deus. Sao
santos, porque os seus objetos sao santos, e porque tern prazer

644
A Regenerafiio

nos seus objetos por serem santos. Por outro lado, os afetos dos
homens nao regenerados, por mais puros e ate religiosos que
scjam, sao apenas naturais em sua origem e terminam u n ica-
mente em objetos naturais. Tais homens podem ser gratos a
Deus pelos beneficios dEle recebidos, mas nunca 0 amam
simplesmente pelas perfei<;6es da Sua natureza.

18. Qual a natureza da nova obediencia resultante da


regenerafiio, e em que difere da moralidade?
A lei perfeita e espiritual e, por conseguinte, exige perfeita
conformidade quanto a ser, como tambem quanto a agir; e
necessaria que os prindpios centrais e dominantes de vida
estejam em harmonia com ela. Portanto, o homem regenerado
pensa, sente e age de conformidade com o espirito de toda a
Palavra de Deus, ate on de lhe esta revelada, e isso ele faz porque
c Palavra de Deus, e porque deseja sobretudo glorifica-10. Os
afetos san tificados sao a origem, a lei perscrutadora do cora<;ao
ca regra, a gloria de Deus eo fim, eo Espirito Santo eo coope-
rado r em todos os atos de obediencia crista.
A moralidade, ao contrario, tern sua origem nos afetos
meramente naturais; sua (mica mira e a conformidade dos atos
cxternos com a letra da lei, enquanto que o eu, em alguma
fo rma de justi<;a propria, reputa<;ao, fama ou felici dade, e 0
fi m determinador.

19. Como se pode provar a absoluta necessidade da regenerafiio?


1°. As Escrituras afirmam essa necessidade- Joao 3:3;
Rom . 8:6; Ef. 2: 10; 4:21-24.
2°. E provada pela natureza do homem como pecador -
Rom. 7:18; 8:7-9; 1 Cor. 2:14; Ef. 2:1.
3°. Pela natureza do ceu - Is. 35 :8; 52: 1; Mat. 5 :8; 13:41;
Heb. 12: 14; Apoc. 21:27. A restaura<;ao da santidade eo grande
fim que o plano inteiro da salva<;ao tern em vista - Ef. 1:4;
5: 5,26,27.

645
Capitulo 29
1
20. As crians;as podem ser regeneradas? Se podem, qual a
natureza da sua regeneras;ao? · r.1
As crian~as, bern como os adultos, sao agentes racionais e
morais, e por natureza totalmente depravadas. A diferen~a e
que nas crian~as as faculdades estao em germen, ao passo que
nos adultos se acham desenvolvidas. Sendo a regenera<;ao uma
mudan~a operada pelo poder criador na inerente condi<;;ao
moral da alma, e claro que essa mudan<;;a pode ser efetuada
nas crian<;;as exatamente no mesmo sentido em que se efetua
nos adultos; em ambos os casos a opera<;;ao emiraculosa e, por
isso, inescrun1vel.
0 fato eestabelecido pelo que as Escrituras ensinam quanto
a deprava<;;ao inata, a salva<;;ao das crian<;;as que morrem, a
circuncisao e ao batismo de crian<;;as- Luc. 1: 15; 18: 15,16;
Atos 2:39. Veja abaixo, Cap.42.

·· DECLARA(:OES AUTORIZADAS

DOUTRINA ROMANA- Cone. de Trento, Sessao 6, Cap.


7: "A justifica<;ao (regenera<;ao) nao e so mente a remissao
dos pecados, mas a santificac;:ao e renovac;:ao do homem
interior, pela voluntaria recepc;:ao da grac;:a e dos dons; pelo
que o homem passa de injusto para justo, e passa de inimigo
para amigo, a fim de ser herdeiro segundo a esperanc;:a da
vida eterna. As causas desta justificac;:ao sao as seguintes:
a causa final, a gloria de Deus e de Cristo, e a vida eterna;
a causa eficiente, a misericordia de Deus que, gratuitamente,
lava e santifica, assinalando e ungindo com o Santo
Espfrito da promessa, que e o penhor da nossa heranc;:a;
quanto a causa merit6ria, e esta o Seu diletissimo Filho
unigenito, nosso Senhor Jesus Cristo, que, sendo n6s
inimigos, pelo nimio amor com que nos amou, nos
mereceu a justifica<;ao, e satisfez por n6s ao Pai eterno,
com Sua santissima paixao no lenho da cruz. A causa
instrumental e 0 sacramento do batismo, que e 0 sacra-
mento da fe, sem a qual ninguem jamais se justificou.

646
A Regenerafiio

Finalmente, a (mica causa formal e a justi<;:a de Deus; nao


aquela com a qual Ele e justa, mas aquela com a qual nos
faz justos; par ela, sendo-nos concedida pelo Senhor, a
nossa alma fica espiritualmente renovada, e nao somente
somas reputados justos, porem verdadeiramente se nos
da este nome, e o somas".
DOUTRINA LUTERANA - Hase, Formula Concord., pag.
379: "Porque a conversao e tal mudan<;:a do homem
mediante a opera<;:ao do Espfrito Santo na inteligencia,
na vontade e no cora<;:ao do homem que este pode (isto e,
mediante a opera<;:ao do Espfrito Santo) aceitar a gra<;:a
oferecida". lb., pag. 681: "Mas a inteligencia e a vontade
do homem ainda nao renovado constituem os (micas
objetos da conversao, porque sao a inteligencia e a vontade
do homem morto espiritualmente, em quem o Espfrito
Santo opera a conversao e a renova<;:ao; para esta obra o
homem que vai ser convertido nao contribui com nada,
todavia ela e realizada nele ate que seja regenerado. Mas
depois, permanecendo noutras boas obras, ele coopera com
o Espfrito Santo, fazendo as coisas que agradam a Deus,
daquela maneira que ja foi exposta plenamente neste
tratado".
DOUTRINA REFORMADA e DOUTRINA REMONS-
TRANT£. Veja Cap. 28, acima.

647
30

A Fe

1. Qual e, segundo a sua etimologia e o uso do Novo Testa-


mento, o significado da palavra pis tis, ''fi", "crenfa"?
E derivada da palavra peith6, persuasiio ou convicfiio. No
Novo Testamento e ernpregada-
1°. Para significar o estado do espirito que e induzido pela
persuasao- Rom. 14:22.
2°. Muitas vezes significa boa fe, fidelidade, sinceridade-
Rom. 3:3; Tito 2:10.
3°. Assentirnento averdade- Fil. 1:27; 2 Tess. 1:13.
4°. Fe para corn Deus ou ern Deus- Heb. 6: 1; 1 Tess. 1:8;
1 Ped. 1:21; Marcos 11:22. Fe ern Cristo, Atos 24:24; Gal. 3:26;
e no Seu sangue, Rom. 3:22,25; Gal. 2:16,20.
5°. E ernpregada no sentido de objeto da fe, a saber, a
revela<;ao do evangelho - Rom. 1:5; 10:8; 1 Tim. 4: 1. -
Robinson, Lex. of the New Testament.

2. Quais os diversos significados do verbo pisteuein (crer) e


dafrase pisteuein eis ou epi (crer em)?
1°. Assentir a verdade, ser persuadido dela- Luc. 1:20;
Joao 3:12.
2°. Dar credito a urna pessoa e asua verdade- Joao 5:46.
3°. Confiar outer confian<;a ern - Atos 27:25.
A frase pisteuein eis ou epi e ernpregada sernpre para
exprirnir confian<;a culrninando ern Deus, ou ern Cristo
como Mediador. Diz-se rnuitas vezes que cremos ou damos

648
APe
credito a Moises e a outros que ensinaram a verdade, mas
podemos crer s6 em Deus ou em Cristo. Em Deus, J oao 14: 1;
Rom. 4:24; 1 Ped. 1:21. Em Cristo,Joao 14:1; Atos 16:31; Joao
3: 15-18.

3. Como se pode definir je?


Fee urn ato complexo da alma, que envolve a a~ao con-
corrente da inteligencia e da vontade, sendo modificada em
diversos casos do seu exercicio pela natureza do seu objeto e
pelas provas em que se baseia. A definic;ao mais geral e
"assentimento a verdade, depois de apresentadas as provas
apropriadas. Mas e claro que a sua natureza deve variar segundo
a natureza da verdade crida, e especialmente segundo a natureza
das provas sobre as quais se baseia o nosso assentimento. 0
assentimento dado a uma verdade abstrata ou especulativa e
urn ato especulativo; o assentimento dado a uma verdade moral
e urn ato moral; o assentimento dado a uma promessa feita a
n6s e urn ato de confian~a. Nossa cren~a em que a terra gira
sobre o seu eixo e urn mero assentimento; nossa cren~a na
excelencia da virtude e da natureza de urn juizo moral; nossa
cren~a numa promessa e urn ato de confian~a". Assim tam bern
com respeito as provas em que se baseia a nossa fe . "0 mesmo
homem pode crer na mesma verdade por motivos diversos.
Urn pode crer na verdade do sistema cristao somente porque
outros ao seu redor creem nela, e porque foi criado de modo
que nela cresse sem questionar; essa fe e na verdade cre-
dulidade. Outro pode crer nela por causa de suas provas
externas,e.g., milagres, profecias, hist6ria, harmonia 16gica com
o sistema ou plausibilidade como teoria para explicar os
fenomenos da cria~ao e da providencia. Esta e uma fe
especulativa. Outro pode crer porque as verdades da Biblia
recomendam-se a sua razao e a sua consciencia, e concordam
com a sua experiencia interna. Esta fe e baseada em provas
morais. Existe ainda outra fe que, porque o homem sente e
ama a excelencia moral das verdades cristas, e baseada em sua

649
Capitulo 30
intrinseca excelencia, beleza e adapta~ao as nossas necessidades.
Esta e fe espiritual, que e dom de Deus"- Hodge, Way of Life.
Fe religiosa e «crenr;a na verdade sob o testemunho de Deus".
Abrange, (l)Notitia, conhecimento; (2)Assensus, assentimento;
(3)Fiducia, confian~a. · '

4. Ate onde a fi i um ato da inteligencia, e ate onde i um ato ·


da vontade?
A alma una e indivisivel sabe, conhece e ama, deseja e
decide, e estes diversos atos da alma reunem-se sabre o mesmo
objeto. A alma nao pode amar, nem desejar, nem escolher
aquila que nao conhece, nem pode ela conhece:r urn objeto
como born ou verdadeiro sem que haja alguma afei~ao da
vontade para com ele. 0 assentimento dado a uma verdade
especulativa pode ser simplesmente urn ato da inteligencia;
mas a cren~a numa verdade moral, num testemunho, em
promessas, e necessariamente urn ato complexo, abrangendo
a vontade bern como a inteligencia. A inteligencia apreende a
verdade a crer, e avalia a validade das provas; mas a disposi~ao
para crer no testemunho, ou nas provas marais, tern sua base
na vontade. A real confian~a numa promessa e urn ato da
vontade, e nao somente urn juizo da inteligencia sabre a fe
que a promessa merece. Ha uma rela~ao exata entre o juizo
moral e os afetos, e a vontade, como a sede dos afetos marais,
determina os juizos marais. Por isso, assim como o homem e
responsavel por sua vontade, tambem o e por sua fe.
Ate onde a fe inclui em si urn ato de "cogni~ao", ela e
evidentemente urn ato da inteligencia. Entretanto ate onde
inclui em si "assentimento" e "confian~a", envolve tambem as
faculdades espontaneas e ativas da alma- "a vontade"- enos
seus exerdcios superiores envolve muitas vezes a propria
voli~ao proposital.

5. Qual a diferenfa entre conhecimento e fi?


Falando em termos gerais, conhecimento e a apreensao
650
A Fe

de urn objeto como verdadeiro, e fee o assentimento dado a


sua verdade. E evidente, pois, que neste sentido geral do termo,
todos os exercicios da fe incluem em si o conhecimento do
objeto ao qual se da assentimento. E impossivel distinguir entre
a apreensao da verdade, de uma verdade puramente especu-
lativa, eo assentimento que se lhe da reconhecendo-a como
verdadeira. Em tais casos, fe e conhecimento parecem
identicos. Mas, conquanto a apreensao da confiabilidade de
uma promessa merece fe seja conhecimento, a confian<;:a na
promessa e fe. A apreensao da verdade moral de urn objeto e
conhecimento; o assentimento dado a ele, reconhecendo-o como
born e desejavel, e fe.
As vezes e empregada a palavra conhecimento nas Escri-
turas como equivalente a fe- Joao 10:38; 1 Joao 2:3.
Geralmente, porem, as Escrituras empregam o termo
conhecimento s6 para designar a apreensao daquelas ideias que
derivamos mediante as fontes naturais da razao, da sensa<;:ao e
do testemunho humano, enquanto 0 termo fe e aplicado
somente ao assentimento dado as verdades que se ap6iam no
testemunho direto de Deus somente, e reveladas objetivamente
nas Escrituras e apreendidas mediante a ilumina<;:ao espiritual.
Assim a fe e "urn argumento (a prova) das coisas que nao
aparecem" - Heb. 11:1, Figueiredo. E-nos ordenado que
an demos "por fe, e nao por vista" - 2 Cor. 5:7. A qui a distin<;:ao
entre fee conhecimento tern referencia especialmente ao modo
de conhecer. Urn e naturale discursivo, o outro e sobrenatural
e intuitivo.

6. Qual a distinfiiO que os cat6licos romanos fazem entre je


implicita e explicita?
Os cat6licos e os protestantes concordam em que nao e
essencial a fe que o seu objeto seja compreendido pela inte-
ligencia. Mas, por outro lado, os protestantes afirmam e os
cat6licos negam que e essencial que o objeto em que se ere
seja apreendido pela inteligencia, isto e, que 0 conhecimento

651
Capftulo30
daquilo em que se ere e essencial afe. Os cat61icos romanos
inventaram, entao, a distin~ao entre fe explicita, que termina
em urn objeto distintamente apreendido pela inteligencia, e
fe implicita, que e a de quem ere na verdade de uma proposi~ao
a cujo respeito nada sabe. Eles sustentam que aquele que exerce
fe expllcita numa proposi~ao geral, exerce assim fe implicita
em tudo quanto se acha incluido nela, quer saiba o que e, quer
nao o saiba. Se, por exemplo, urn hom em tern fe explicita em
que a igreja cat6lica e mestra infalivel, ele exerce desse modo
fe virtual ou implicita em todas as doutrinas ensinadas pela
igreja, mesmo seas ignorar. Alem disso, eles distinguem entre
as verdades que e preciso considerar com fe explicita, e as que
podem ser sustentadas implicitamente. Seu ensino comum e
que o povo precisa crer explicitamente somente em tres
doutrinas: 1a. que ha Deus; 2a. que Ele eremunerador, inclu-
sive de recompensas e castigos futuros; 3a. que e salvador.
"Esta doutrina foi recentemente ressuscitada pelos puse-
itas, sob o titulo de reserva. Diziam eles que as verdades
distintivas do evangelho, em vez de serem claramente apre-
sentadas, deveriam se escondidas ou mantidas em reserva. 0
povo pode olhar para a cruz como o simbolo da reden~ao, mas
nao e necessario que saiba see asua forma, ao seu material ou
ao grande sacrificio que foi oferecido uma vez por todas sobre
ela que se deve a eficacia da reden~ao. ''A luz religiosa sao trevas
intelectuais", dizia o Dr. Newman. Essa teoria baseia-se na
mesma suposi~ao falsa de que e possivel haver fe sem
conhecimento"- Dr. Hodge.

7. Qual i a diferenfa entre conhecer e compreender uma coisa,


e ate onde o conhecimento eessencial a[e?
Sabemos ou conhecemos uma coisa quando a apreen-
demos simplesmente como verdadeira. Somente a compre-
endemos quando compreendemos perfeitamente a sua
natureza, e a perfeita harmonia de todas as suas propriedades
umas com as outras e com todo o sistema das coisas de que ela

652
, taz parte. Conhecemos a doutrina da Trindade quando as suas
A Fe

diversas partes nos sao expostas; porem nao ha criatura que a


possa compreender.
Que o conhecimento ou uma simples apreensao do objeto
em que se ere ou confia e essencial a fee evidente da propria
natureza dela. Fee esse estado de espirito que tern a rela<;;ao de
assentimento dado a certo objeto, envolvendo aquela a<;;ao da
inteligencia e da vontade que e apropriada ao dito objeto.
Quando alguem ama, teme ou ere, e necessario que arne, tema
ou creia em algum objeto, porque e claro que estes estados de
espirito so podem existir em rela<;;ao a seus objetos apropriados.
Se nao se achar presente urn objeto real, a imagina<;;ao podera
apresentar urn objeto idealizado; mas e necessario que essa
mesma fic<;;ao da imagina<;;ao seja apreendida (ou conhecida)
como verdadeira, antes que se lhe possa dar o assentimento
como verdadeira (ou que se possa crer nela). Assim como e
impossivel que alguem goze do belo sem que o apreenda em
algum objeto do espirito, ou que exer<;;a amor complacente
num ato virtuoso sem que perceba o ato, assim tambern, e pelos
mesmos motivos, e impossivel que urn homem exer<;;a fe sem
que saiba o que ou em que e que ele ere. "Fe implicita" e uma
formula inteiramente sem sentido.

8. Como se pode provar pelas Escrituras que conhecimento e


essencial aje?
1°. Pela etimologia da palavra pistis, de peito, persuadir,
instruir. Fee urn estado de espirito resultante da instru<;;ao.
2°. Pelo uso nas Escrituras do termo conhecimento como
sin6nimo de fe- Joao 10:38; 1 Joao 2:3.
3°. Pelo que as Escrituras ensinam quanto as fontes da fe.
Esta vern pela instru~ao- Rom. 10:14-17.
4°. As Escrituras declaram que OS regenerados sao
esclarecidos, receberam a un<;;ao e sabem todas as coisas- Atos
26:18; 1 Cor. 2:12-15; Col. 3:10.
5°. Os meios de salva~ao consistem na dissemina~ao da

653
Capitulo30 ·~.
verdade. Cristo eo grande instrutor. Os ministros do evange-
lho sao instrutores-1 Cor. 4:1; 1 Tim. 3:2; 4:13. Os cristaos
sao gerados pela verdade, sao santificados pela verdade -
Joao 17: 19; Tiago 1:18- Dr. Hodge.

9. Como se deve explicar as passagens que fa lam do


conhecimento como distinto da je?
Conquanto todo ato de fe pressuponha urn ato de conhe-
cimento, contudo, tanto a fe como o conhecimento variam
muito, tanto com relar;:ao a natureza do objeto conhecido e
crido, como a maneira pela qual se recebe o conhecimento, e
tam bern com relar;:ao a evidencia em que se apoia a fe. A fe
que as Escrituras distinguem do conhecimento e a forte
persuasao de coisas nao vistas. E a convic<;ao da verdade de
coisas que estao alem do circulo da nossa observa<;ao, que
podem transcender inteiramente as faculdades da nossa
inteligencia e cuja existencia so e garantida pelo testemunho
de Deus. Neste testemunho a fe descansa, apesar de tudo
quanto pare<;a inconseqi.iente ou impossivel arazao humana.
Posta que o conhecimento seja essencial a fe, pode-se
distinguir dela- 1°. A fe abrange em si tam bern urn ato da
vontade assentindo, alem do ato da inteligencia apreendendo.
2°.0 conhecimento derivado de uma fonte natural distingue-
-se do que e derivado de uma fone divina. 3°. Como atual
apreensao imperfeita das coisas divinas, apreensao que e fe,
esta difere do conhecimento perfeito das coisas divinas que
teremos no ceu - 1 Cor. 13: 12.

10. Se na fi se acha necessariamente compreendido o


conhecimento, como se pode ordenar aos homens que creiam?
1°. A ninguem jamais se ordena que creia naquilo que
nao lhe foi revelado, ou pela luz da natureza, ou pela Palavra
inspirada.
2°. A ninguem jamais se ordena que creia numa verdade
meramente especulativa. As verdades da religiao ap6iam-se

654
r
no testemunho de Deus. Este erefon;ado por provas mor~::
a fe nessas verdades envolve conhecimento moral e espiritual
delas e gozo nelas. Provas morais so podem ser devidamente
apreciadas por quem possui sensibilidade moral; e a insen-
sibilidade moral que leva a cegueira quanto a distin~ao entre
o bern e o mal, e ela mesma urn estado de deprava~ao extrema.
As Escrituras, pois, luminosas pela sua propria luz
evidencial, apresentam a verdade a todos a quem chega o seu
conhecimento, e exigem que eles aceitem a verdade ao
receberem o testemunho de Deus. Se alguem sentir que a
evidencia nao e conclusiva para ele, a causa nao pode deixar
de ser a cegueira pecaminosa do seu espirito. Por isso Jesus
Cristo diz; "Nao quereis vir a mim para terdes vida"- Joao
5:40. E a incredulidade e sempre lan~ada a culpa do "cora~ao
mau".

11. Quais os motivos fundamentais do assentimento dado a


verdade, que eda essencia da je?
Em geral, a base fundamental em que se funda o nosso
assentimento a verdade de qualquer objeto de conhecimento
e a veracidade de Deus. 0 testemunho dos nossos sentidos e as
intui~6es da nossa razao firmam-se todos em Sua veracidade
como Criador. Praticamente somos levados a dar este
assentimento pela confian<;a universal e instintiva que temos
na constitui<;ao da nossa propria natureza.
A fe religiosa funda-se, 1°. na fidelidade de Deus como
essa nose garantida em Sua revela<;ao sobrenatural, Joao 3:33;
2°. na evidencia da ilumina<;ao espiritual, da experiencia
pessoal do poder da verdade, e do testemunho do Espirito
Santo, o Santificador, e, assim, nao "em sabedoria dos homens,
mas no poder de Deus"- 1 Cor. 2:5-12.

12. Quais as duas especies de provas pelas quais sabemos que


Deus revelou certas verda des como objetos de je?
1a. A evidencia que reside na propria verdade moral,

655
Capitulo30 ,
espiritual, experimental, racional- Joao 6:63; 7:17,26; Jer.
33:29.
2a. A evidencia abonadora da presen<;a e do poder de Deus
acompanhando a propaga<;ao da verdade e provando que esta
veio dEle. Consta de milagres, dispensa<;6es providenciais,
cumprimento de profecias, etc.- Joao 5:36; Heb. 2:4.

13. Como se pode mostrar que a autoridade da lgreja nao e


base para a fe?
Veja acima, Cap. 5, Perg. 13.

14. Qual a natureza da fe hist6rica, e qual a evidencia em que


sefunda?
A especie de fe puramente racional, que se chama fe
hist6rica, e aquela apreen sao da verdade, eo assentimento dado
a ela, que a considera unicamente em seus aspectos puramente
racionais como meros fatos hist6ricos, ou meras partes de urn
sistema l6gico de opiniao. Sua evidencia apropriada e
puramente racional, isto e, a explica<;ao dada pelas Escrituras
dos fatos da hist6ria e da experiencia, e a evidencia dos milagres,
das profecias, da hist6ria, etc.

15. Qual a natureza da je temporaria, e qual a evidencia em


que sefunda?
Fe temporaria e o estado de espirito em que se acham
muitas vezes neste mundo os impenitentes que ouvem o
evangelho, e que e induzido pela evidencia moral da verdade,
pelas influencias comuns do Espirito Santo, e pelo poder da
simpatia religiosa. As vezes a imagina<;ao exaltada apropria-se
com regozijo das promessas do evangelho- Mat. 13:20. Outras
vezes, o homem, a semelhan<;a de Felix, ere e treme. Muitas
vezes e impossivel, a principia, distinguir entre este estado de
espirito e a fe verdadeira e salvadora. Mas, nao nascendo de
uma obra divina de regenera<;ao, ela nao tern raiz nos prindpios
permanentes do cora<;ao. E, pois, sempre, 1°. ineficaz, nao

656
APe
purificando o cora~ao nem vencendo o mundo; 2°. tempor:iria.

t
' 16. Qual a evidencia especifica em que se funda a fi salva-
dora?
t E a luz que o cora~ao recebe do Espirito Santo em Sua
obra de ilumina~ao espiritual. Assim sao apreendidas a beleza,
a excelencia e a adapta<;ao da verdade as suas necessidades
pr:iticas por quem d:i entrada a essa luz. Com isso o testemunho
do Espirito Santo coopera com a verdade e por meio dela- 1
Cor. 2:4,5; Rom. 8: 16; 2 Cor. 4:6; Ef. 2:8.

17. Como se pode provar pelas Escrituras e pela experiencia


que a iluminafiio espiritual e· a base da fi salvadora?
1°. As Escrituras, onde quer que cheguem, exigem incon-
dicional, imediata e universalmente de todos, tanto dos mais
inteligentes como dos mais ignorantes, que as recebam e nelas
creiam, e a incredulidade e sempre taxada de pecado, e nao
como se fosse mera ignorancia ou incapacidade mental. A fe
que elas exigem deve, pois, ser urn ato moral e deve depender
da congruencia espiritual do crente com a verdade.
2°. Por natureza os homens sao cegos espiritualmente, eo
seu cora<;ao e "urn cora~ao mau e infiel"- 2 Cor. 3:14; 4:4;
Heb. 3:12.
3°. Os cremes sao descritos como esclarecidos e capazes
de discernir as coisas do Espirito- Atos 13:48; 2 Cor. 4:6; Ef.
1: 17,18; 1 Joao 2:20,27; 5: 9,10.
4°. Os homens creem porque sao ensinados por Deus-
Joao 6:44,45.
5o. To do cristae tern consciencia do que ere porque ve que
a verdade crida e verdadeira, bela, poderosa e satisfat6ria.
6°. Provam-no os efeitos da fe. "Diz-se que vivemos por
fe, que somos santificados pela fe, que vencemos pela fe
e que somos salvos pela fe. Urn consentimento cego a
autoridade, ou uma convic<;ao racional, nao produzem
semelhantes efeitos; se os efeitos sao espirituais, segue-se

657
Capitulo 30
que a sua ongem deve ser espiritual."

18. Quais as diversas opinioes a respeito da relafiio entre a fe


e a conjianfa?
Em consequencia da sua doutrina da fe implicita, segundo
a qual nada se exige alem de urn assentimento cego ao ensino
da igreja, os romanistas (catolicos) negam necessariamente que
a confian~a e da essencia da fe salvadora.
Os sandemanianos, como os campbelitas, sustentando que
a fee simplesmente urn juizo afirmativo da inteligencia, urn
juizo a respeito da verdade, em conformidade com a evidencia,
negam tam bern que a confian~a e urn elemento 'essencial da fe
salvadora.
Alguns teologos ortodoxos tern sustentado que a confian~a
deve antes ser considerada como uma imediata e invariavel
consequencia da fe salvadora, em vez de urn elemento dessa
propria fe.
A fe religiosa, sendo resultado da ilumina~ao espiritual,
respeita a Palavra total e completa de Deus e Seu testemunho,
e, como tal, eurn estado complexo do espirito, variando com a
natureza da parte especial das verdades reveladas que e
contemplada em qualquer ato especial. Muitas das proposi~6es
das Escrituras nao sao objetos de confian~a, e entao a fe que as
aceita e somente urn assentimento complacente e reverente
dado a elas como verdadeiras e boas. Mas o ato espedfico de fe
que nos une a Cristo e e o comer;o, a raiz e o orgao de toda a
nossa vida espiritual, culmina na Pessoa e na obra de Cristo
como Mediador, como nos sao apresentadas nas ofertas e nas
promessas do evangelho. Isso por certo inclui em sua propria
essencia a confianr;a, e a esta fe se chama, por via de
proeminencia, "fe salvadora", porque e a fe que salva, e porque
e so por ela, como seu prindpio, que sao possfveis outros
quaisquer exercicios mais gerais da fe salvadora.

658
APe
19. Como se pode provar pela linguagem das Escrituras que
11 fi salvadora inclui em si a confianfa?
A condic;ao uniforme e (mica que as Escrituras imp6em
omo necessaria asalvac;ao e a expressa nas palavras "ere em
Cristo" - Joao 7:38; Atos 9:42; 16:31; Gal. 2:16.0 ato de crer
m uma pessoa envolve necessariamente confianc;a bern como
·redito.
0 mesmo fica provado abundantemente pelo uso da frase
"pela fe em Cristo"- 2 Tim. 3: 15; Atos 26: 18; Gal. 3:26; He b.
11:1 . A fe e a substfmcia das coisas esperadas, mas o funda-
mento da fe e a confianc;a.

20. Como se pode provar a mesma verdade pelas expressoes


empregadas nas Escrituras equivalentes a frase "crer em Cristo"?
"Receber a Cristo"- J oao 1: 12; Col. 2:6. "Olhar para Ele"
- Is. 45:22; comparar Num. 21:9 com Joao 3:14,15. "Por nosso
refugio nEle" - Heb. 6:18. "Vir a Ele" - Joao 6:35; Mat. 11:28.
"Confiar- Lhe (o deposito) para o guardar"- 2 Tim. 1: 12. Todas
cssas express6es nao s6 comunicam mas tambem elucidam o
ato da fe salvadora, e todas envolvem confianc;a como elemento
cssencial; porque nao podemos "receber", "ira Cristo", "olhar
para Ele" senao em func;ao do caniter de uma propiciac;ao
realizada por Cristo como advogado e libertador, em que Ele
Se nos oferece.

21. Como se pode provar a mesma verdade pelos efeitos que


as Escrituras atribuem afi?
As Escri turas declaram que pel a fe os cristaos "alcanc;am
as promessas", "sao persuadidos das promessas", "de fracos
tornam-se fortes", "sao fortes no combate", "confessam que
sao estrangeiros e peregrines que buscam uma patria melhor".
Assim como a fe numa ameac;a necessariamente envolve medo,
assim tambem a fe numa promessa necessariamente envolve
confianc;a.
Alem disso, a fe funda-se na fidelidade de Deus e, por

659
Capitulo 3D
isso, necessariamente envolve confian~a- Heb. 10:23, e todo o
capitulo 11.

22. Como se pode mostrar que estas ideias a respeito da je niio


confundem a je e a esperanfa?
Contra a nossa doutrina de que a fe salvadora envolve
confian~a, os cat6licos romanos objetam que desse modo
confundimos a fee a esperan~a, que as Escrituras distinguem
- 1 Cor. 13:13, porque a esperan~a e somente uma forte
confians;a. Entretanto a esperans;a nao e somente uma forte
confians;a. A confians;a funda-se na base que nos da certeza,
enquanto que a esperans;a contempla o objeto futuro, a cujo
respeito nose dada certeza. A esperanc;a e fruto da confianc;a.
Quanta maior a confianc;a, tanto mais segura a esperanc;a.

23. Quais as diversas opinioes a respeito da relafiio entre a je


eo amar, e da distinfiio romanista (cat6lica) entre "fides informis"
e "fides formata"?
1a. Para manterem a sua doutrina de que a fe, so, nao e
salvadora, os cat6licos distinguem entre uma fe perfeita, ou
formada, e uma fe nao formada. Reconhecem que a fe e coisa
distinta do amor, mas sustentam que o amor e essencial para
tornar a fe merit6ria e eficaz como o meio da nossa salva<;:ao.
Fides informis e urn simples assentimento, expllcito ou
implicito, dado ao ensino da igreja. Precede necessariamente
a "justifica~ao" como sua condi~ao. Fides [armata e fruto da
primeira justifica~ao e e a condi~ao daquelas boas obras que
merecerem mawr grac;a.
2a. Alguns dizem que o amor e a raiz de onde nasce a fe.
3a. A doutrina verdadeira e que o arnor e efeito irnediato e
necessaria da fe. A fe inclui ern si a apreensao espiritual da
beleza e excelencia da verdade, e urn ato da vontade aceitando-
-a e confiando nela. Contudo, essas duas grac;as nao podern ser
separadas analiticarnente, porque se envolvern rnutuarnente.
Nao pode haver fe sern am or, nern am or sem fe. A fe apreende

660
r a beleza do objeto, e o cora~ao ama-o espo:ntaneamente. E
A Fe

assim que "a fe obra pelo am or", porque esses afetos sao a
origem dos motivos que dirigem a vontade.
E impossivel conciliar a doutrina roU:J.anista com os
principios essenciais do evangelho. A fe nao e obra, e nao pode
ter merecimento algum, quer formada quer nao formada; e
essencialmente urn ato em que nos despejamos inteiramente e
que nos salva porque nos valemos dos merecimentos de Cristo.
Ela nos leva a fazer boas obras e manifesta-se nos seus frutos,
mas em sua rela~ao com a justifica~ao e, em sua propria
natureza, urn protesto solene contra o merito de todas as obras
humanas- Gal. 3:10,11; Ef. 2:8,9.
A doutrina protestante, de que o amor e fruto da fe, fica
estabelecida pelo que as Escrituras declaram a respeito da fe,
no sentido de que ela "santifica", "obra pelo amor" e "vence o
mundo"- Gal. 5:6; Atos 26: 18; 1 Joao 5:4. Isso e efetuado do
seguinte modo - pela fe somos unidos a Cristo, Ef. 3: 17, e
assim somos feitos participante do Seu Espirito, 1 Joao 3:24,
urn dos frutos do Espirito eo amor, Gal. 5:22, eo amor leva a
obediencia- Rom. 13:10.

24. Qual e0 objeto da fe salvadora?


A ilumina~ao espiritual da inteligencia e a renova~ao dos
afetos, que lan~am a base para a alma exercer fe em qualquer
parte do testemunho de Deus, lan~am a base para ela exercer
fe em todo esse testemunho. Toda a Palavra rf!velada de Deus,
pois, ate onde e conhecida do individuo, aexclusao de todas as
tradi~6es, doutrinas de homens e revela~6es particulares, e
objeto da fe salvadora. Aquele ato particular de fe, porem, que
nos une a Cristo, chamada, por via de distin~ao, fe justificadora,
tern por seu objeto a Pessoa e obra de Cristo como Mediador-
Joao 7:38; Atos 16:31.

25. Que quer dizer um artigo de je em distinr;ao de um artigo


de opiniao?

661
Capitulo 30
Os cat6licos sustentam que todo cristao e obrigado, sob
pena de condena<_;ao eterna, a crer como artigo de fe, fe explicita
se lhe for conhecido, fe implicita se nao lhe for conhecido,
todo e qualquer dogma decidido pela igreja (cat61ica) como
verdadeiro, quer seja derivado das Escrituras, quer da tradi<_;ao.
Por outro lado, a respeito de todas as quest6es nao decididas
pela igreja, todos sao livres para crer ou nao, como materia de
opiniao.

. 26. Qual e 0 criteria anglicano ou puseita para distinguir as


doutrinas que e necessaria conhecer e crer para que alguem seja salvo?
Os anglicanos ou puseitas concordam com os romanistas
(veja acima, Perg. 6) em sustentar que o conhecimento nao e
essencial a fe; mas discordam deles quanto a regra de fe. Os
cat6licos tomam por essa regra o ensino da igreja papal; os
puseitas, ao contnirio, tomam por regra o testemunho uniforme
da tradi<_;ao conservada na linha de sucessao dos bispos
apost6licos.

27. Qual a doutrina comum aos protestantes quanta as coisas


fundamentais em religiiio, e par meio de que provas se pode saber
quais siio essas causas fundamentais?
Toda a doutrina ensinada na Biblia e objeto de uma fe
esclarecida e espiritual. Nenhum principia revelado, por mais
subordinado que pare<_;a comparativamente, pode ser tido como
indiferente, e adotado ou rejeitado avontade. Todo homem e
obrigado a dar credito ao testemunho todo de Deus. Contudo,
o evangelho e urn sistema logicamente conseqiiente de
verdades, de cujos prindpios algumas verdades sao essenciais
asua integridade, enquanto que outras verdades sao essenciais
unicamente asimetria e aperfei<_;ao; e a ignorancia, a fraqueza
de compreensao 16gica e os preconceitos podem levar, e
constantemente levam, bons homens a apreenderem imper-
feitamente este sistema de verdades.
Uma doutrina fundamental, pois, seria uma doutrina que

662
A Fe

todos precisariam apreender mais ou menos claramente


para que pudessem ser salvos, ou e uma doutrina que, quando
conhecida, acha-se tao evidentemente envolvida com aquelas
essenciais asalva~ao, que nao se pode rejeitar aquela se se ere
realmente nessas.
Uma doutrina fundamental e determinada-
1°. Do mesmo modo como se determinam os prindpios
essenciais de qualquer outro sistema, isto e, por sua rela~ao
com o sistema como urn todo.
2°. Todas as doutrinas fundamentais sao claramente
reveladas.
3°. As pr6prias Escrituras as declaram essenciais- Joao
3:18; Atos 16:31; 1 Cor. 5:17; Gal. 2:21; 1 Joao 1:8.

28. Qual o objeto da "fides specialis", ou do ato especifico de


je pelo qual somas justificados?
A Pes so a e a obra do Senhor Jesus Cristo como Mediador.
Isso fica provado da seguinte maneira:
1°. As Escrituras declaram expressamente que somos
justificados por aquela fe da qual Cristo e o objeto - Rom.
3:22,25; Gal. 2:16; Fil. 3:9.
2°. A Bfblia diz que somos salvos pela fe em Cristo- Joao
3: 16,36; Atos 10:43; 16:31.
3°. A fe justificadora e representada como urn "olhar para
Cristo", urn "vir a Cristo", etc.- Joao 1: 12; 6:35,37; Is. 45:22.
4°. E declarado que a rejei~ao de Cristo, isto e, a recusa a
sujeitar-se a justi~a de Deus, eo motivo da reprova~ao- Joao
8:24; 3:18,19.

29. De que maneira a doutrina cat6lica sabre este ponto e


oposta adoutrina protestante?
Os cat6licos, confundindo a justifica~ao e a santifica~ao,
sustentam que a fe justifica mediante a virtude santificadora
da verdade. Visto que toda a verdade revelada possui essa
virtude santificadora, segue-se que toda a revela~ao de Deus,

663
Capitulo 30 4
como e compreendida conforme as decisoes da igreja, eo objeto.,
da fe justificadora. Isso, porem, e refutado por tudo quanto
temos estabelecido por meio das Escrituras, a respeito da
justifica~ao, da santifica~ao e da fe.

30. Seria Cristo, em todos os Seus oficWs, objeto imediato da ~


fe justificadora, ou somente em Seu oficio de Sacerdote?
No ato de fe o crente apropria-se de Cristo e funda-se nEle
como Mediador, o que inclui todas as Suas fun~6es como tal.
Essas fun~6es podem ser distinguidas analiticamente, mas de
fato acham-se sempre reunidas inseparavelmente nEle.
Quando Ele age como Profeta, ensina como Rei e Sacerdote.
Quando reina, esta assentado como Profeta e Sacerdote em Seu
trono. Alem disso, a alma despertada sente-se conscientemente
necessitada das obras profetica e real de Cristo, e estas sao
necessariamente apreendidas por ela como inseparaveis da
Sua obra sacerdotal, no ato de fe.
E verdade, porem, que, sendo a obra substitutiva que
Cristo realizou como Sacerdote o fundamento merit6rio da
nossa salva~ao, por isso o Seu carater sacerdotal e o mais
proeminente, tanto nas Escrituras como na experiencia do povo
de Deus.

31. Ate onde a paz de consciencia e a paz com Deus sao


conseqiiencias necessarias daje?
A paz com Deus e a reconcilia~ao com Ele. Paz de
consciencia quer dizer, ou a consciencia dessa reconcilias;ao,
ou o apaziguamento da nossa consciencia, que nos condena.
Em todo caso, a fe nos da paz com Deus porque nos une a
Cristo, Rom. 5: 1; e a medida que a fe em Cristo for clara e
constante, igualmente o serao a nossa consciencia da recon-
cilia~ao com Deus e a satisfas;ao do nosso sentido moral de
que a justis;a foi cumprida e que estamos perdoados. Ao mesmo
tempo, assim como a fe pode ser obscurecida pelo pecado>
assim tambem o verdadeiro crente pode cair no desagrado de

664
APe
,
,· seu Pai e perder a convic~ao de que esta perdoado, como
tambem perder a sua satisfa~ao moral na perfei~ao da
prop1c1a~ao.

~
I
I
32. Quais seriam as tres classes de opiniao nutridas a respeito
I
da relafiio entre fie certeza?
1°. Os reformadores sustentaram geralmente que a fe
justificadora consiste na apropria~ao das promessas de salva~ao
por Cristo, feitas no evangelho, isto e, consiste em conside-
rarmos Deus como propicio a nos por amor de Cristo.
2°. Ha quem tenha sustentado que a certeza da salva~ao e
inatingivel nesta vida. Os catolicos, sustentando que a fe crista
e principalmente o assentimento implicito ao ensino de uma
sociedade infalivel e visivel chamada igreja, e a conformidade
obediente com esse ensino, negaram estrenuamente que os
indivfduos particulares tenham qualquer autoridade bfblica
para nutrirem uma persuasao segura de que sao objetos
especiais do favor divino. Costumavam asseverar que nem e
"obrigatorio", nem "possfvel", nem "desejavel", que alguem
nutra tal convic~ao sem alguma revela~ao especial e sabre-
natural. Veja Belarmino, etc., abaixo citados.
3°. A verdadeira doutrina e que "posto que esta conviq:ao
infalivel nao perten~a de tal modo aessencia da fe que nao seja
possfvel que urn crente verdadeiro tenha que esperar muito
tempo e lutar com muitas dificuldades antes de possui-la,
contudo, sendo habilitado pelo Espirito a conhecer as coisas
dadas gratuitamente por Deus, ele pode alcan~a-la, sem
nenhuma revela~ao extraordinaria, no uso devido dos meios
ordinarios. E, pois, dever de todos agir diligentemente para
tornarem certa a sua voca~ao e elei~ao". Todos concordam em
que a verdadeira fe nao pode admitir nenhuma duvida quanto
ao seu objeto. 0 que se ere, cre-se com certeza. Mas o objeto da
fe salvadora e Cristo e Sua obra como Mediador garantida a
nos nas promessas do evangelho, sob a condi~ao da fe. A
verdadeira fe, pois, inclui essencialmente a convic~ao segura

665
Capitulo 30 '
de- 1°. Que Cristo nos pode salvar. 2°. Que Ele efiel enos ha
de salvar, se crermos. Queremos dizer que isso e da essencia da
fe, nao que todo crente verdadeiro esteja sempre em tal estado
de espirito que exclua toda duvida quanta ao poder ou ao amor
de Cristo; porque a ilumina<;;ao espiritual de que depende a fe
emuitas vezes imperfeita em grau e variavel em seu exercicio. •
Contudo, toda duvida semelhante e do pecado, e e alheia a
natureza da fe. No entanto, a condi~ao se crermos, da qual
depende toda convic<;;ao segura da nos sa salva<;;ao, nao e materia
de revela<;;ao, e sim de experiencia, nao de fe, e sim de
consciencia intima. I
Os te6logos distinguem, pais, entre a conviG<;;ao segura da
fe- Heb. 10:22; e a convic<;;ao segura da esperan~a- Heb. 6:11.
A primeira e da essencia da fe salvadora e e a convic~ao intima
de que Cristo e tudo quanta diz que e, e fara tudo quanta
promete. A segunda e a convic<;;ao intima da nossa salva<;;ao
pessoal, e e uma das aquisi<;;6es superiores da vida crista.

33. Como se pode provar que a certeza da nossa salvafiiO pessoal


niio eessencial aJe salvadora?
1°. Pelo verdadeiro objeto da fe salvadora, como apre-
sen tado acima.
2°. Pelos exemplos apresentados nas Escrituras de santos
proeminentes que duvidaram a respeito de si- 1 Cor. 9:27.
3°. Pe1as exorta<;;6es dirigidas aos que ja eram crentes, no
sentido de que alcan~assem a convic<;;ao segura como urn grau
de fe superior ao que ja gozavam.
4°. Pela experiencia do povo de Deus em todos os seculos.

34. Como se pode provar que epossivel alcanr;ar nesta vida


uma convicr;ao segura?
1°. E assegurado por afirma<;;6es divinas- Rom. 8: 16; 2
Ped. 1:10; 1 Joao 2:3; 3:14; 5:13.
2°. As Escrituras dao exemplos que mostram que essa
con vic<;;ao segura foi alcan~ada- 2 Tim. 1: 12; 4:7 ,8.

666
.c · APe

3°. Muitos cristaos proeminentes tern gozado de uma


permanente convic~ao segura, de cuja verdade sua santa vida
e conversa~ao foi selo indubitavel.

35. Em que base o homem pode ser certamente convencido da


sua salvafiio?
"E uma convic~ao infalivel, fundada, 1°. na verdade
divina das promessas de salva~ao; 2°. na evidencia interna das
gra~as as quais sao feitas essas promessas, e 3°. no testemunho
do Espirito de ado~ao, Rom. 8:15, testemunhando como nosso
espirito que somos filhos de Deus, sendo o Espirito, Ef. 1: 13,14;
2 Cor. 1:21,22, o penh or da nos sa heran~a, por quem somos
selados para o dia da reden~ao - Conf de Fe, Cap. 18 §, 2.
Pode-se distinguir essa convic~ao legitima daquela va e
presun~osa confian~a que e uma ilusao de satanas, distin~ao
que pode ser notada por estas caracteristicas:a convic~ao
legitima, 1°. gera humildade nao fingida, 1 Cor. 15: 10; Gal.
6: 14; 2°. leva o homem a uma a~ao diligente cada vez maior
na religiao pnitica, Sal. 51: 13,14,20; 3°. ao estrito exame de si
mesmo e ao desejo de ser examinado e corrigido por Deus,
Sal. 139:23,24; 4°. a constante aspira~ao de maior confor-
midade e mais intima comunhao com Deus- 1 Joao 3:2,3.

36. Como se pode mostrar que uma fe viva conduz


necessariamente a boas obras?
1°. Pela natureza da fe. Ea apreensao espiritual e aceita~ao
voluntaria da verdade inteira de Deus - as promessas, os
mandamentos, as amea~as das Escrituras- consideradas como
verdadeiras e boas. Essa fe induz necessariamente o exerdcio
dos afetos renovados, e o amor manifestado em atos e
obediencia. Cada verdade, assim apreendida, produz seu efeito
apropriado no cora~ao, e, por conseguin te, na vida.
2°. Pelo testemunho das Escrituras- Rom. 15: 18; Gal. 5 :6;
Tia. 2:18; 1 Joao 5:4.
3°. Pela experiencia da igreja universal. --, '~ ' 'f' '

667
Capitulo 30

EXPOSH_;6ES AUTORIZADAS

Agostinho - "Quid est fides nisi credere quand nov nides?"


(sic)
DOUTRINA CATOLICO-ROMANA
Cat. do Cone. de Trento, 1:1: "Falamos aqui daquela fe
em virtude da qual damos o nosso consentimento inteiro
a tudo quanto tern sido divinamente revelado ... em virtude
da qual mantemos como certo que tudo o que a autoridade
de nossa santa madre igreja ens ina foi revelado por Deus".
Belarmino, Justif., 1: 4- (Os catolicos romanos) ensinam
que fe historica, tanto de milagres como de pr()messa, e
uma e a mesma coisa, e que esta coisa nao e propriamente
urn conhecimento ou conviq;:ao segura, e sim um
assentimento certo e muito firme, fiado na autoridade
suprema da verdade... Objeto da fe justificadora, que os
hereges limitam ao objeto (mica de misericordia especial
(pessoal), os catolicos romanos desejam estender tao
largamente como se estende o mundo; e, mais ainda, eles
contendem que a promessa de misericordia especial nao
pertence tanto a fe como a presunc;ao. Diferem, pais, (dos
protestantes) quanta a faculdade do espirito que seja a sede
da fe. Porque eles (os protestantes); colocando a fe na
vontade, definem-na como convicc;ao segura (jiducia (ou
confianc;a)), e assim confundem-na com a esperanc;a,
porque a confianc;a (ou convicc;ao segura) nada mais e do
que uma esperanc;a forte, como ensina o piedoso Tomas.
Os catolicos romanos ensinam que a fe tern sua sede na
inteligencia. Finalmente, eles diferem quanta ao ato da
inteligencia (em que consiste a fe). E verdade que eles (os
protestantes) definem a fe como urn a forma de conhe-
cimento; nos (catolicos romanos, a definimos como uma
forma) de assentimento. Porque assentimos a Deus, ainda
que Ele proponha coisas em que crer, as quais nao
compreendemos. Cap. 7- Naquele que ere ha duas coisas,
apreensao e urn juizo ou assentimento. Alem disso,
apreensao nao e propriamente chamada conhecimento.
Porque pode acontecer que urn catolico romano pouco

668
A Fe
instruido apreenda s6 muito confusamente os tres nomes
(da Trindade), e, nao obstante isso, pode crer nela verda-
deiramente. Mas o jufzo ou assentimento e duplo, seguindo
urn a razao e a evidencia de uma coisa, e o outro a
autoridade de quem prop6e; o primeiro chama-se conhe-
cimento; o segundo, fe. Por isso os misterios da fe, que
transcendem a razao, n6s os cremos embora nao os
compreendamos, de modo que a fe e distinguida como
oposta a ciencia e e mais definida como ignorancia do
que como conhecimento".
Cone. de Trento, Sessao 6, Cap. 9: "Porque, assim como
nenhuma pessoa piedosa deve duvidar da misericordia
de Deus, do merecimento de Cristo, da virtude e eficacia
dos sacramentos; assim tambem, quando cada urn olha
para si mesmo, para a sua fraqueza e falta de disposis;ao,
pode recear, pode temer por sua gras;a; pois ninguem pode
saber com certeza de fe (a qual niio pode estar com
falsidade) que conseguiu a amizade de Deus".
Belarmino, ]ustif., 3, 3, diz: "A questiio debatida entre
os cat6licos e os reformados foi: se alguem deve ou pode,
sem uma revelas;ao especial, ter a certeza de uma fe divina,
sobre a qual niio pode incidir erro nenhum de que os seus
pecados tern sido perdoados".

A DOUTRINA PROTESTANT£ DA FE E DA
CERTEZA INABALAVEL
Calvi no, Institutas, Liv. 3, Cap. 2, 87: "Teremos uma
completa definis;ao de fe se dissermos que e urn
conhecimento firme e certo da benevolencia divina para
conosco, o qual, sendo fundado na verdade da promessa
gratuita em Cristo, niio s6 e revelado ao nosso espirito,
mas e tambem confirmado aos nossos coras;6es pelo
Espirito Santo".
Cat. de Heidelberg, Perg. 21: "Que e fe verdadeira? Niio
s6 e urn mero conhecimento, pelo qual concordo
firmemente com tudo quanto Deus nos tern revelado na
Sua Palavra, mas e tambem uma plena confians;a, acesa
no meu coras;iio pelo Espfrito Santo, mediante o

669
Capitulo30
evangelho, que nao s6 a outros, senao a mim tambem, o
perdao dos pecados, a justi<;a e a vida eterna foram dados
gratuitamente pela misericordia de Deus, unicamente por
causa dos merecimentos de Jesus Cristo".
Apol. da Conf de Augsburgo, Perg. 68: "Mas a fe que
justifica niio e meramente o conhecimento da hist6ria; e
sim assentimento a promessa de Deus em que, por amor
de Cristo, sao oferecidas gratuitamente a remissao dos
pecados e a justifica<;ao... Esta fe especial, pois, pela qual
cada urn ere que os seus pecados lhe foram perdoados por
amor de Cristo, e que Deus e reconciliado e tornado
propicio por Cristo (e a fe que) alcan<;a a remissiio dos
pecados e (que) justifica".
Conf de Fe de Westminster, Cap. 18, § 2: "Esta certeza
nao e uma mera persuasao conjectural e provavel, fundada
numa esperan<;a falivel, e sim uma convic<;iio infalivel de
fe, fundada (a) na verdade divina das promessas, (b) na
evidencia interna daquelas gra<;as a que sao feitas essas
promessas, (c) no testemunho do Espirito Santo... § 3:
Esta convic<;ao infalivel niio pertence de tal modo a
essencia da fe que nao seja possivel que urn verdadeiro
crente tenha de esperar muito tempo e lutar corn rnuitas
dificuldades antes de participar dela ... Contudo, ele pode
adquiri-la sem nenhuma revela<;ao extraordinaria, no uso
dos meios comuns. E por isso e dever de todos aplicar-se
diligentemente a fazerern certa a sua voca<;ao e elei<;ao".
Turretino, Livro 15, Quaes. 10: "A diversidade (de
express6es) que se encontra entre os ortodoxos proveio
da diversidade de sentidos em que se ernpregou a palavra
fiducia (confian<;a), que pode ser tomada em tres sentidos:
1. No sentido de assentimento seguro, ou persuasao, que
tern por origem o juizo pnitico da inteligencia, a respeito
da verdade e da bondade das promessas evangelicas, e a
respeito do poder, da vontade e da fidelidade de Deus em
Suas promessas. Neste sentido, peismone (persuasao), Gal.
5:8, e termo empregado como seu sinonimo, e a plerofia
(plena certeza) e atribuida a fe, Col. 2:2; Heb. 10:22. 2. No
sentido do ato de fugir para e de aceitar a Cristo, pelo qual o

670
A Fe

crente, conhecendo a verdade e a bondade de Cristo, foge


para Ele, recebe-0, abra~a-0 e s6 se fia nos Seus mereci-
mentos. 3. No sentido de confianfa, satisfafiio e tranqiiilidade
de espirito, que provem de refugiar-se o espirito em Cristo
e de recebe-10. Porque aquele que se funda firmemente
em Cristo e 0 recebe, niio pode deixar de comprazer-se
nEle seguramente, e de considerar-se como tendo achado
nEle e recebido dEle aquila que procurou. No primeiro e
no segundo sentidos, confian~a (fiducia) e da essencia da
fe, e e apropriadamente chamada pelos te6logos a sua
forma*; porque, como sera provado mais adiante contra
as ideias papistas, e uma confiante apreensiio de Cristo e
de todos os beneficios oferecidos na palavra do evangelho.
Mas no terceiro sentido outros dizem acertadamente que
ela niio e a forma e sim o fruto da fe; porque nasce dela,
porem niio a constitui".

*No senti do etimol6gico de "substancia", aquilo que constitui algo. Nota


de Odayr Olivetti.

:.· . . ..-! . .) i

671
31

A Uniao dos Crentes com Cristo

1. A quem estiio todos os homens unidos em seu estado natural?


A Adao. A nossa unHio com ele inclui, 1°. sua capitania
federal sob a alian<;a das obras- Rom. 5:12-19. 2°. Sua capitania
natural, como, por for~a da gera~ao co mum, a origem da nossa
natureza e da sua corrup<;ao moral- Gen. 5:3; 1 Cor. 15:49.
Mas, tendo sido morta por Cristo a lei que se baseava na
alian<;a das obras, pela qual nos achavamos em uniao com
Adao, agora "morremos para aquilo em que estavamos retidos",
e estamos livres para ser "de outto marido", a saber, Cristo-
Rom. 7:1-6.

2. Qual i a natureza geral da nossa uniiio com Cristo?


E uma uniao singela, inefavel e muito intima, apresen-
tando anossa vista dois aspectos e dando lugar a duas diversas
classes de conseqiiencias.
1°. 0 primeiro aspecto desta uniao e seu carater federal e
representativo, em que Cristo, como o segundo Adao- 1 Cor.~··
15:22, assume na alian<;a da gra<;a as obriga<;6es violadas da
alian<;a das obras que o primeiro Adao deixou de cumprir, e
cumpre-as a favor de todas as Suas "ovelhas", a favor de todos
"os que o Pai lhe deu". As conseqiiencias que provem da nossa
uniao com Cristo sob este aspecto sao tais como a imputa<;ao a
Ele dos nossos pecados, e a nos da Sua justi<;a, e todos os
beneficios forenses de justifica~ao, ado<;ao etc. Veja os capitulos
33 e 34.

672
A Uniiio dos Crentes com Cristo
2°. 0 segundo aspecto desta unHio eseu caniter espiritual
c vital, cuja natureza e cujas conseqiiencias havemos de discutir
neste capitulo.

3. Quale a base desta uniiio?


(1) 0 prop6sito eterno do Deus triuno, expresso no
decreta da elei<;:ao (elegeu-nosnele mesmo antes da funda<;:ao do
mundo - Ef. 1:4 ), providenciando o seu cumprimento na
alian<;:a da gra<;:a feita entre o Pai, como Deus absoluto, e o
Filho, como o Mediador - Joao 17: 2-6; Gal. 2:20; (2) na
encarna<;:ao do Filho, em que assumiu semelhan<;:a conosco em
comunidade de natureza, e Se fez nosso irmao- Heb. 2: 16,17;
e (3) na missao e obra oficial do Espirito de Cristo (1 Joao
4: 13), mediante cuja opera<;:ao poderosa nos corpos e nos
cora<;:6es do Seu povo o ultimo Adao efeito espirito vivificador
(1 Cor. 15:45), e sao todos constituidos em corpo de Cristo e
Seus membros em particular- 1 Cor. 12:27.

4. Par quais analogias, tiradas das relaf6es terrenas, esta uniiio


dos crentes em Cristo e ilustrada nas Escrituras?
A designa<;:ao tecnica desta uniao epelo termo "mistica"
em linguagem teol6gica, porque ela transcende tanto todas as
anal ogias das rela<;:6es e parentescos terrenos, como na
intimidade da sua comunhao, no poder transformador da sua
influencia e na excelencia das suas conseqiiencias. Contudo,
as Escrituras Sagradas ilustram diversos aspectos desta fonte
de gra<;:as com muitas analogias aptas, mas parciais.
Como, 1°. os alicerces de urn edificio e o proprio
edificio- 1 Ped. 2:4-6. 2°. Uma videira e seus ramos- Joao
15:5. 3°. A cabe<;:a e os membros do corpo - Ef. 4:15,16. 4°.
Marido e mulher- Ef. 5:31,32; Apoc. 19:7-9. 5°. Adao e seus
descendentes, tanto em sua rela<;:ao federal como natural -
Rom. 5:12-19; 2 Cor. 15:22,49.

673
Capitulo 31
5. Qual a natureza essencial desta uniao?
Por urn lado, esta uniao nao envolve nenhuma confusao
misteriosa da Pessoa de Cristo com as pessoas do Seu povo; e,
por outro, nao e uma simples associa~ao de pessoas semelhante
a que existe nas sociedades humanas. Mas e uma uniao que,
1°. determina ter o nosso estado ou posi~ao legal a mesma base
que tern o seu; 2°. vivifica e sustem, pela influencia do Seu
Espfrito morando em nos, a nossa vida espiritual, da fonte da
vida de Cristo, e transforma os nossos corpos e as nossas almas
para terem semelhan~a com a Sua humanidade glorificada.
E, pois-
1°. Uma uniao espiritual. Sua fonte ativa e seu vinculo
sao o Espiri to de Cristo, a Cabe~a, que mora e opera nos
membros- 1 Cor. 6: 17; 12: 13; 1 Joao 3:24; 4:13.
2°. Uma uniao viva, isto e, a nossa vida espiritual e
mantida e determinada em sua natureza pela vida de Cristo
por meio da morada em nos do Seu Espiri to - J oao 14: 19; Gal.
2:20.
3°. Abrange a nossa pessoa inteira, o nosso corpo
mediante o nosso espirito -1 Cor. 6:15,19.
4°. E uniao legal ou federal, de modo que todas as
obriga~oes legais ou federais estao sobre Cristo, enos recebemos
o beneficia de todos os Seus merecimentos legais ou federais.
5°. E uniao indissoluvel - Joao 10:28; Rom. 8:35,37;
1 Tess. 4:14,17.
6°. E uma uniao entre o crente e a Pessoa do Deus-
-homem em Seu offcio como Mediador. Seu orgao imediato e
o Espirito Santo, que mora em nos, e por Ele somos unidos a
Deidade inteira e temos comunhao com Ela, porque Ele e o
Espirito do Pai bern como do Filho- Joao 17:21,23.

6. Como eestabelecida esta uniao entre Cristo eo cristao?


Foi estabelecida desde a eternidade no proposito e decreto
de Deus, e na alian~a do Pai como Filho- Ef. 1:4; Joao 17:2,6.
Contudo, os eleitos, quanto a seu carater pessoal e as suas

674
A Uniiio dos Crentes com Cristo
rela<;6es atuais, antes da sua voca<;ao eficaz pelo Espfrito,
nasceram e foram "por natureza filhos da ira, como os outros
tambem", e "estranhos aos concertos da promessa"- Ef. 2:3,12.
No tempo determinado por Deus esta uniao e estabelecida
mutuamente com cada urn dos Seus escolhidos. -1°. Pelo inicio
das opera<;6es eficazes e permanentes do Espirito Santo dentro
deles (da-lhes vida juntamente com Cristo); no ato do novo
nascimento, abrindo-lhes os olhos e renovando-lhes a vontade;
e lan<;ando assim em sua natureza o fundamento para o
exercicio da fe salvadora. 2°. A fe salvadora eo segundo vinculo
pelo qual e estabelecida esta uniao mutua, por cujas opera<;6es
continuas e sustentada a sua comunhao com Cristo e sao
desenvolvidas as suas ditosas conseqiH~ncias- Ef. 3:17. Assim
"chegamo-nos a ele", "recebemo-lo", "comemos a sua carne e
bebemos o seu sangue", etc.

7. Quais sao para as crentes as consequencias desta uniiio?


1a. Tern em comum com Cristo a Sua posi<;:ao e os Seus
direitos federais. Em termos forenses, sao feitos "completos
nele". Sua justi<;:a e a justi<;:a deles e Seu Pai e o Pai deles.
Recebem nEle a ado<;:ao e sao aceitos no Amado, quanto as
suas pessoas como tambem quanto a seus servi<;os. Sao selados
pelo Espirito Santo da promessa; nEle adquirem uma heran<;a;
tern as sen to com Ele em Seu trono e veem a Sua gloria- Rom.
8: 1; Col. 2:10; Ef. 1:6,11,13; Fil. 2:8-11; 3:8,9.
Como Mediad or Jesus e "o Cristo", o ungido, e o crente e
o cristao, aquele que recebe "a un<;ao" - Atos 11:26; 1 Joao
2:20. Seu oficio medianeiro abrange tres fun<;:6es principais-
(1 ) A de profeta, e, em comunhao com Ele, o crente e profeta-
Joao 16: 13; 1 Joao 2:27. (2) A de sacerdote, e tambem o crente
e sacerdote nEle- Sal. 61 :6; 1 Ped. 2:5; Apoc. 20:6. (3) A de
rei, e nEle o crente e rei- 1 Ped. 2:9; Apoc. 2:21; 5:10.
2a. Tern comunhao com Elena virtude transformadora e
assemelhadora da Sua vida, tornando-os semelhantes a Ele;
"todos n6s recebemos tambem da sua plenitude, e gra<;:a por

7
Capitulo 31
gra<;:a", Joao 1:16. Isto e verdade (1) com respeito anossa alma,
Rom. 8:9; Fil. 2:5; 1 Joao 3:2; (2) com respeito ao nosso corpo,
fazendo com que seja agora templo do Espirito Santo, 1 Cor.
6: 17,19; e que a Sua ressurrei<;:ao seja a causa da nossa res-
surrei<;:ao eo Seu corpo glorioso o tipo do nosso corpo.- Rom.
6:5; 1 Cor. 15:47,49; Fil. 3:21. E assim os crentes se tornam
frutiferos em Cristo, tanto em seu corpo como em seu espirito,
que sao dEle - Joao 15:5; 2 Cor. 12:9; 1 Joao 1:6.
3a. 0 resultado disso e sua comunhao com Cristo em sua
experiencia e em seus trabalhos, sofrimentos, tenta~6es e morte
-Gal. 6:17; Fil. 3:10; Heb. 12:3; 1 Ped. 4:18; desse modo
tornando ate mesmo a nossa vida terrena sagrada e gloriosa.
4a. Conduz tambem acomunhao justa de Cristo com eles
em tudo quanto possuam- Prov. 19:17; Rom. 14:8; 1 Cor.
6:19,20.
sa. Conduz tambem a conseqi.iencia de que, na recep<;:ao
espiritual das santas ordenan<;:as, eles realmente tenham
comunhao com Ele. Sao "batizados com Cristo" - Gal. 3:27.
"Porventura o calice de ben<;:ao, que aben<;:oamos, nao e a
comunhao do sangue de Cristo? 0 pao que partimos nao e
porventura a comunhao do corpo de Cristo?" - 1 Cor. 10: 16;
11:26; Joao 6:51,56.
6a. Conduz tambem a comunhao dos crentes uns com os
outros, por Ele, isto e, acomunhao dos santos.

8. Qual a natureza da "comunhiio dos santos" que nasce da


uniiio de cada crente como Senhor?
Veja a Conf de Fe, Cap. 26. Estando todos os crentes
unidos a uma s6 Cabe<;:a, segue-se naturalmente que por Cristo,
a Cabe<;:a, acham-se relacionados mutuamente uns com os
outros na mesma comunidade de espirito, vida, estado e
privilegios espirituais.
Isso envolve, da parte de todos os crentes-
1°. Obriga<;: 6es e deveres reciprocos, segundo a gra<;: a espe-
cial concedida a cada urn. Ecomo no corpo: todos os diversos

676
A Uniiio dos Crentes com Cristo
6rgaos tern parte na mesma vida geral e, ao mesmo tempo,
cada urn tern uma adaptas;ao individual e especial, diversa dos
outros e, conseqiientemente, urn dever diverso: "Porque
tambem o corpo nao e urn s6 membro, mas muitos" - 1 Cor.
12:4-21; Ef. 4:11-13.
2°. Tern comunhao uns com os outros em seus dons e
gras;as complementares, contribuindo cada urn com a sua
beleza especial para a beleza do todo- Ef. 4:15,16.
3°. Esses deveres redprocos dizem respeito ao corpo e aos
interesses temporais dos irmaos, bern como aos interesses de
sua alma- G:H. 2:10; 1 Joao 3:16-18.
4°. Tern comunhao na fee na doutrina- Atos 2:42; Gal.
2:9.
5°. No respeito e na subordinac;ao miituos- Rom. 12: 10;
Ef. 5:21; Heb. 13:17.
6°. No amor e na simpatia miituos- Rom. 12:10; 1 Cor.
12:26.
7°. Essa comunhao existe sem interrups;ao entre os crentes
na terra e no ceu. E uma s6, de "toda a familia nos ceus e na
terra"- Ef. 3:15.
8°. Na gloria a comunhao dos santos sera perfeita, quando
havera "urn rebanho e urn pastor", e todos os santos serao urn,
como o Pai eo Filho sao urn- Joao 10:16; 17:22.

677
32

0 Arrependimento e a Doutrina
Catolico-Romana das Penitencias

1. Quais as palavras empregadas no original para exprimir


esta mudanfa de espirito e de sentimentos?
1a. metamilethai, de milomai, importar-se com; combinada
com meui, mudar de cuidado. Palavra empregada s6 cinco vezes
no Novo Testamento.
za. metanoein, de noio, perceber, entender, considerar;
combinada com meui, mudar de intenc;ao ou prop6sito. Esse e
o verbo empregado constantemente no Novo Testamento para
designar essa mudanc;a.
3a. Da mesma origem vern o substantive metlmoia,
arrependimento, mudanfa de intenfiiO ou prop6sito. No uso que
no Novo Testamento se faz dessas palavras, elas incluem as
ideias de luto e de contric;ao.

2. Que earrependimento salvador?


Veja Conf de Fe, Cap. 15; Cat. Maior, Perg. 76: Breve Cat.,
Perg. 87.
0 arrependimento salvador inclui -
1°. Urn sentimento de culpa, de corrupc;ao e de incapa-
cidade pessoais.
2°. Uma apreensao da misericordia de Deus em Cristo.
3°. Abatimento, como tambem 6dio ao pecado, o ato de
voltar-se resolutamente dele para Deus, e urn esforc;o persistente
no sentido de levar nova vida, de santa obediencia.

678
0 Arrependimento ... Penitencias
3. Como se pode provar que o arrependimento edam de Deus?
1°. Isso e evidente pela propria natureza do arrependi-
mento. Este inclui: (1) urn sentimento da odiosidade do
pecado; (2) urn sentimento da beleza da santidade; (3) a apre-
ensao da misericordia de Deus em Cristo. Pressup6e, portanto,
a fe, que e dom de Deus- Gal. 5:22; Ef. 2:8.
2°. As Escrituras afirmam-no expressamente-Zac.l2:10;
Atos 5:31; 11:18; 2 Tim. 2:25.

4. Qual a natureza do sentimento de pecado, que e elemento


essencial do arrependimento?
A ilumina~ao espiritual e a renova~ao dos afetos que sao
efetuadas na regenera~ao levam o crente a ver e a apreciar a
santidade de Deus revelada tanto na Lei como no evangelho,
Rom. 3:20; Jo 42:6, e tambem aver e a sentir nessa luz a ex-
trema culpabilidade de todo pecado e a inteira corrup~ao
pecaminosa da sua natureza, como esta na verdade e. Esse
sentimento de pecado, correspondendo assim aos fatos proprios
do caso, inclui: 1°. consciencia de culpa, isto e, de que se ewi
exposto ao justo castigo, por oposi~ao ajusti<;:a de Deus - Sal.
51:5,10; 2°. consciencia de corrup~ao oposta a santidade de
Deus- Sal. 51 :4,8,11; 3°. consciencia de incapacidade- Sal.
51:12,13; 109:22. Veja 0 Caminho da Vida- C. Hodge

5. Quais as frutos e as provas deste sentimento de pecado?


Urn sentimento de culpa, especialmente quando acom-
panhado do sentimento de incapacidade, produzini percep9ao
de perigo. Este sentimento penoso ocorre em graus e
modifica<;:6es de uma diversidade infinita, dependendo do
temperamento natural, da instru~ao e das opera~6es especiais
do Espirito Santo. Estes termos legais, porem, sao comuns ao
arrependimento verdadeiro e ao falso, e os sentimentos em si
nao possuem nenhuma virtude santificadora.
0 sentimento de corrup~ao produz vergonha quando
pensamos em Deus, e causa aborrecimento de nos mesmos

679
Capitulo 32
quando pensamos em n6s.
A confissao do pecado, tanto em particular, diante de Deus,
como tambem diante dos homens, e urn modo natural e
indispensavel pelo qual este sentimento de pecado se
manifestara legitirnarnente- Sal. 32:5,6; Prov. 28:13; Tia. 5: 16;
1 Joao 1:9.
A unica prova incontestavel de que tal sentirnento e
verdadeiro e genuino eo desejo de ver-se livre do pecado e
esfon;:os sinceros e perrnanentes nesse sentido.

6. Mostre que uma apreensiio da misericordia de Deus em


Cristo e essencial ao arrependimento.
1°. A consciencia despertada ecoa a lei de Deus e nao pode
ser apaziguada por nenhuma propicia~ao que seja menor do
que a que a propria justis;a divina exige, e enquanto isso nao
for efetuado, com sua aplicas;ao feita com fe ern Cristo, ou o
indiferen tismo fara adorrnecer a alma, ou o rernorso havera de
atormenta-la.
2°. Fora de Cristo Deus e fogo consurnidor, e urn ternor
inextingufvel afugenta desse fogo a alma- Deut. 4:24; Heb.
12:29.
3°. Urn sentirnento da adrniravel bondade que Deus
rnanifestou para conosco na dadiva de Seu Filho, e da ingra-
tidao com que lho pagarnos, e necessaria para despertar e
fornen tar na alma que se arrepende a vergonha eo pesar devidos
ao fa to de que foi contra Deus que ela pecou- Sal. 51:4.
4°. Isso fica provado pelo ensino e pelos exernplos apre-
sentados na Palavra de Deus - Sal. 51:1; 130:4.

7. Qual a natureza dessa ((volta para Deus" que constitui a


essencia do arrependimento?
E o abandono voluntario do pecado como mau e odioso,
corn pesar, hurnilhas;ao e confissao sinceros; eo regresso para
Deus, porque Ele tern direitos sobre nos e porque e rniseri-
cordioso e pronto a perdoar; junto corn a deterrninas;ao de,

680
0 Arrependimento ... Penitencias
ajudados por Sua gra~a, viver em obediencia a Seus man-
damentos. '·'t···i ,

8. Quais as provas do verdadeiro arrependimento?


1a. A concordancia da nossa propria experiencia interna
com o ensino da Palavra de Deus sobre este assunto. Para
determinar isso e necessaria que estudemos com ora~ao as
Escrituras em conexao com o cuidadoso exame de nos mesmos.
za. Os efeitos permanentes manifestados na vida. Estes sao
o odio eo abandono dos pecados patentes, como tambem dos
ocultos, a escolha do servi~o a Deus como born e desejavel, a
profissao publica e inteira consagra~ao pratica- "Se em vos
houver e abundarem estas coisas, nao vos deixarao ociosos
f nem estereis no conhecimento de nosso Senhor Jesus Cristo"
I -2 Ped. 1:8.
t:
~ 9. Quais as relar;{Jes mutuas existentes entre os termos ''fe",
"arrependimento", "regenerar;iio" e "conversiio"?
Regenera~ao eo ato inefavel de Deus implantando uma
nova natureza. 0 termo conversao e empregado geralmente
para exprimir os primeiros exerdcios dessa nova natureza,
deixando a vida antiga e principiando a nova. Fe designa o
primeiro ato da nova natureza e tambem o estado ou habito
permanente do espirito que permanece como a condi~ao
essencial de todas as demais gra~as. E a apreensao espiritual
da verdade pela mente, e a aceita~ao leal da verdade pela
vontade. Sem isso nao pode haver, nem amor, nem esperan~a,
nem paz, nem alegria, nem arrependimento. 0 sentido com urn
ligado apalavraarrependimento e muito semelhante ao sentido
ligado ao termo conversiio; mas em seu emprego difere dela
em duas particularidades.- 1a. Conversao e uma palavra mais
geral e e empregada para incluir OS primeiros exerdcios da fe,
hem como todas as experiencias de amor, santidade, etc., que
sao a sua consequencia. 0 termo arrependimento e mais
espedfico, e exprime o odio ao pecado e a renuncia a ele, e o

681
Capitulo 32
regresso para Deus, que acompanham a fe como conseqiiencia
dela. 2a. A palavra conversiio e empregada geralmente para
designar somente as primeiras opera<;:6es da nova natureza no
come<;:o de uma vida religiosa, ou, quando muito, os primeiros
passos para Deus depois de uma reincidencia notavel no
pecado, Luc. 22:32, enquanto que a palavra arrependimento e
empregada para exprimir a constante a<;:ao de levar a cruz, que
e uma das principais caracterfsticas da vida do crente na terra
-Sal. 19:13,14; Luc. 9:23; Gal. 6:14; 5:24.

10. Qual a doutrina a respeito do arrependimento que foi


ensinada par muitos dos reformadores?
Alguns deles definiram o arrependimento como con-
sistindo, 1°. em mortifica<;:ao, em urn morrer para o pecado;
2°. em vivifica<;:ao, urn viver para Deus. Isso corresponde a
nossa doutrina sobre a santifica<;:ao. Os luteranos fazem o
arrependimento consistir, 1°. em contri<;:ao, ou pesar pelo
pecado; e 2°. em fe no evangelho, ou absolvi<;:ao. - Conf de
Augsb., Art. 12. Essa, posto que seja empregada uma fraseologia
peculiar, e a doutrina verdadeira.

11. Qual a doutrina cat6lico-romana da penitencia?


No sistema romanista de salva<;:ao, a verdadeira analogia
da doutrina protestante da justifica<;:ao nao se acha na doutrina
romanista da justifica<;:ao (assim chamada), e sim em sua
doutrina da penitencia. Por justifica<;:ao os protestantes
entendem uma mudan<;:a de rela<;:ao para com a lei divina, da
condena<;:ao para o favor de nosso Juiz e Rei, cuja razao de ser
e a satisfa<;:ao dada por Cristo. Os cat6licos, porem, nao
entendem por justificafiio "somente a remissao dos pecados,
mas tambem a santifica<;:ao e a renova<;:ao do homem interior,
por meio da aceita<;:ao voluntaria da gra<;:a e dos dons; pelo que
o homem de injusto se torna justo, e de inimigo, amigo". E
mais: "Posto que ninguem pode ser jus to, senao aquele a quem
se comunicam os meritos da paixao do nos so Senhor Jesus

682
.
r
0 Arrependimento ... Peniteneias
Cristo; isso, contudo, assim sucede, nesta justifica~ao do impio,
cnquanto pelo merito dessa mesma sacratissima paixao o
Espirito Santo derrama a caridade de Deus no cora~ao daqueles
que sao justificados, sendo ela inerente a paixao" - Cone. de
Trento, Ses. 6, cap. 7. Is so e efetuado pelo batismo, e a cada
passo dado pressup6e a satisfa~ao e OS meritos de Cristo. Sua
satisfa~ao faz propicias;ao por todos os pecados cometidos antes
do batismo e pelo castigo eterno de todos os pecados dos
batizados. Os meritos dEle alcans;am gras;a preveniente, a
regeneras;ao batismal, e sao a base posta para os cremes mere-
cerern, por sua obediencia graciosa e seus sofrimentos
temporais, o perdao dos pecados, a perrnanencia, a restauras;ao
eo aurnento da gras;a, bern como as recornpensas do ceu.
Justificados assirn, e feitos arnigos de Deus, eles vfw
adiante, de virtude ern virtude, e sao renovados de dia em dia
mediante a observancia dos rnandarnentos de Deus e da igreja
(catolica), e estas suas boas obras merecern verdadeiramente, e
recebern, como premio justo, aurnento de gras;a e justificas;ao
(santificas;ao) cada vez mais perfeita. Aprimeira justificas;ao do
cristao, efetuada no batisrno, o foi por amor de Cristo, sern a
coopera~ao do seu proprio rnerito, em bora pela coopera~ao da
sua vontade (se for adulto ). Mas a sua justifica~ao (santificas;ao)
eontinuada e cada vezaumentando e efetuada por arnor de Cristo
mediante seu proprio rnerecirnento e na propon;ao deste, cres-
cendo este rnerecirnento a propors;ao (a) da sua santidade, e (b)
da sua obediencia as regras rnorais e eclesiasticas - Cone. de
Trento, Sess. 6, Cap. 10, Can. 32.
No caso daqueles que pelo pecado cairam da gra~a
recebida da "justificas;ao", o SACRAMENTO DA PENITENCIA,
concedido como segunda prancha (de salvarnento ), depois do
naufragio da gras;a perdida, recobra essa gra~a pelos rneritos
de Cristo. Essa penitencia inclui (1) pesar pelo pecado, (2) a
confissao desses pecados, (3) a absolvis;ao sacerdotal, (4) uma
satisfa~ao, consistindo (a) neste mundo ern jejuns, esrnolas,
ora~6es, etc., e (b) depois da rnorte, no fogo do purgatorio.

683
Capitulo 32
Eles distinguem a penitencia - 1°. Como uma virtude,
equivalente adoutrina protestante da gra<;;a do arrependimento.
2°. Como urn sacramento. A penitencia, como uma virtude, e
interna; e uma mudan<;;a de espirito, incluindo pesar pelo
pecado e regresso para Deus. A penitencia externa, ou a
expressao externa desse estado interno, e o que constitui o
SACRAMENTO DA PENITENCIA. 0 que constitui a materia desse
sacramento sao os atos praticados pelo penitente por via de
contri<;;ao, confissao e satisfa<;;ao. Contrift:io epesar pelos pecados
passados e aversao por eles, junto como prop6sito de nao pecar
mais. Confissao e a acusa<;;ao de si mesmo feita a urn sacerdote
que tern a respectiva jurisdi<;;ao eo poder das chaves.Satisfaft:io
e alguma pena imposta pelo sacerdote e cumprida pelo
penitente para dar satisfa<;;ao ajusti<;;a pelos pecados cometidos.
Essas praticas efetuarn (a) a expia<;;ao da culpa dos pecados
passados, e (b) a disciplina eo crescirnento da vida espiritual
da alma. A forma do sacramento e a absolvi<;;ao proferida
judicialmente, e nao s6 declarativarnente, pelo sacerdote. Eles
sustentarn que "e sornente por rneio deste sacramento que
podern ser perdoados os pecados cornetidos depois do batisrno"
- Cat. Rom., Parte 2, Cap. 5, Pergs. 12 e 13; Cone. de Trento,
Sess. 6, Caps. 14-16; Sess. 14, Caps. 1- 9, Sess. 6, Can. 30.

12. Como se pode provar que a penitencia nao e sacramento?


1°. Nao foi instituida por Cristo. As Escrituras nada
ensinam a seu respeito.
2°. Econseqiiencia essencial da falsa teoria da regenera<;;ao
batismal.
3°. Nao significa, nern sela, nern cornunica os beneficios
de Cristo e da nova alian<;;a. Veja abaixo, Cap.41, Pergs. 2-5.

13. Qual a doutrina romanista a respeito da confissao?


A confissao e urna acusa<;;ao de si mesmo, feita a urn
sacerdote que tern a respectiva jurisdi<;;ao eo poder das chaves.
E necessaria que sejarn confessados todos os pecados, sern
684
0 Arrependimento ... Penitencias
reserva alguma, com todos os seus pormenores e circunstancias
qualificantes. Se qualquer pecado mortal nao for confessado,
nao sera perdoado, e sea omissao for proposital, e sacrilegio e
a pessoa incorre em culpa maior- Cat. Rom., Parte 2, Cap. 5,
Pergs. 33,34 e 42.

14. Quais os argumentos protestantes contra a confissiio


auricular?
1°. Nao e autorizada pelas Escrituras. Elas nos mandam
"confessar-nos uns aos outros"- Tia. 5:16.
2°. Perverte o plano inteiro da salva<;:ao, porque torna
necessaria a media<;:ao de urn sacerdote entre o cristao e Cristo,
o que foi refutado acima. Veja o Cap. 24, Pergs. 8 e 21.
3°. As Escrituras nos mandam confessar os nossos pecados
a Deus diretamente, sem intermediarios -Mat. 11:28; 1 Tim.
2:5; 1 Joao 1:9.
4°. Os resultados praticos desse sistema sempre tern sido
maus, e essa invasao grosseira de todos os direitos sagrados da
personalidade e coisa que s6 pode causar revolta a toda alma
culta e honesta.

15. Qual a natureza da absolvir;iio que os sacerdotes cat6licos


dizem que tem o poder de conceder?
A pretensao e a de que o sacerdote absolve judicial, e nao
s6 declarativamente, e pel a autoridade de Jesus Cristo, de todas
as consequencias penais dos pecados confessados. Em prova
citam Mat. 16:19; 18:18; Joao 20:22,23. Cat. Rom., Parte 2,
Cap. 5, Pergs. 13 e 17; Cone. de Trento, Sess. 14 "De Prenitentia",
Can. 9.

16. Quais os argumentos contra a posse de tal poder de absolver,


por parte do ministerio cristiio?
1°. 0 ministerio cristao nao e sacerd6cio. Veja acima, Cap.
24, Perg. 21.
2°. Mesmo que fosse, nao se seguiria a conclusao que os

685
Capitulo 32
romanistas tiram. A absolvi<;;ao e ato soberano e nao sacer-
dotal. Isso fica provado claramente pela defini<;;ao do sacerd6cio,
dada em He b. 5:1-6, pela pratica levitica, e pela propria
natureza do ato.
3°. A concessao do poder das chaves, seja ele qual for, nao
foi feita ao ministerio como tal; porqueem Mat. 18:1-18 Cristo
nao Se dirigiu ao corpo dos disdpulos (note especialmente
Mat. 18:15-22), e os ministros da Igreja Primitiva nunca
reivindicaram para si, nem exerceram tal poder.
4°. 0 poder de perdao absoluto e incomunicavel em si, e
de fa to nunca foi dado; as palavras em questao nao podem ser
entendidas nesse sentido, e nao foram entendidas assim. A
pratica dos ap6stolos prova que eles as entenderam como
comunicando simplesmente o poder de declararem as condi-
<;;6es sob as quais Deus perdoaria o pecado, e, de conformidade
com essa declara<;;ao, admitirem os homens aIgreja de Cristo
ou exclui-los dela. : ,
5°. S6 esse principia falso ja torna Cristo sem nenhum
efeito, e perverte o evangelho inteiro- "Bib. Rep .",janeiro de
1845.

17. Qual a doutrina cat6lico-romana a respeito da satisfafiiO


como parte da penitencia?
Pela satisfa<;;ao entendem eles as obras impostas pelo
sacerdote depois da confissao, a cujo respeito se sup6e que elas,
contrapostas aos pecados confessados e pelos quais (o confes-
sante) se professou contri<;;ao, constituem uma compensa<;;ao
da viola<;;ao da lei de Deus, e em aten<;;ao a elas os pecados sao
perdoados -Cat. Rom., Parte 2, Cap. 5, Pergs. 52 e 53; Cone. de
Trento, Sess. 14, "De Prenitentia", Caps. 1-9.

18. Quais as objef6es contra essa doutrina?


1a. Nao tern o apoio de nenhuma autoridade bfblica.
za. :E uma desonra a(mica satisfa<;;ao perfeita dada por nosso
Sumo Sacerdote uma vez por todas- Heb. 10:10-14.

686
0 Arrependimento ... Penitencias

3a. A distin~ao feita entre castigos temporais e eternos dos


pecados e destituida de autoridade. A pena do pecado e a ira
judicial de Deus - e enquanto esta durar, nao havera paz; e
quando for propiciada, nao haveni mais condena~ao (Rom. 8: 1).
Os sofrimentos temporais dos que creem em Cristo sao
corre~6es, nao puni~6es nem satisfa~6es.
4a. As pretensas "satisfa~6es", ou nos sao impostas por
mandamento (do padre), ou nao. Se sao, constituem simples-
mente deveres, e o cumprimento delas nao pode ser uma
"satisfa~ao" pela viola~ao de outro dever. Se nos sao impostas
por mandamento, sao uma forma de culto voluntario que
Deus odeia- Col. 2:20-23.

19. Qual a doutrina papal das indulgencias?


A doutrina papal das INDULGENCIAS-
1°. Ap6ia-se nos mesmos prindpios nos quais se baseia a
PENITENCIA. (1) Na distin<;ao entre as penas temporais e as
eternas exigidas em satisfa~ao pelos pecados. (2) No mere-
cimento superabundante adquirido pelo Chefe da lgreja e por
Seus membros (Cristo, a "virgem" e os santos), e pertencendo-
-lhes, constituindo urn tesouro de merecimentos que esta a
disposi<;ao discricionaria da autoridade competente a bern de
qualquer crente pendente que nao esteja em pecado mortal.
(3) No poder dispensador da igreja (cat6lica romana), em
virtude do qual urn oficial eclesiastico com competente
jurisdi~ao tern autoridade para dispensar, fazendo as vezes de
Deus e da igreja, quaisquer ou todas as satisfa<;6es temporais
devidas pelo penitente, quer na terra, quer no purgat6rio, e
nao curnpridas ainda por ele pessoalrnente.
2°. Estas indulgencias devern ser concedidas por "rnotivos
razoaveis", isto e, "e necessario que 0 rnotivo seja piedoso, nao
urna obra rneramente temporal, ou va, nao respeitando a gloria
de Deus, e sirn toda e qualquer obra que tenda para a honra de
Deus e para o servic;:o da igreja". A eficacia das indulgencias
"nao depende da irnportancia da obra ordenada, e sirn do

687
Capitulo32
tesouro infinito dos meritos de Cristo e dos santos". Os "moti-
vos" sao dinheiro dado para fins piedosos, ora<;6es especiais,
peregrina~6es a certos lugares santos, etc.
3°. As indulgencias sao de diversas classes. (l)Gerais, para
toda a igreja, concedidas unicamente pelo proprio papa a todos
os fieis em todo o mundo; ou particulares, concedidas pela
competente autoridade a certas pessoas. (2) Podem serplenarias,
concedendo remissao de todos os castigos temporais neste
mundo e no purgat6rio; ouparciais, remitindo somente parte
das penas devidas. (3) Podem sertemporarias, para urn numero
especificado de dias ou meses. (4) Perpetuas, sem nenhuma
limita~ao de tempo. (5) Locais, legadas a certas igrejas ou a
outros lugares. (6)Reais, ligadas a certos objetos portateis, tais
como rosarios, medalhas, etc. (7)Pessoais, concedidas a certas
pessoas ou comunidades. Veja Enciclopedia, por McClintock
e Strong, e abaixo, Cone. de Trento, etc.

EXPOSH_;6ES AUTORIZADAS

Cone. de Trento, Sess. 14, Cap. 1: "En tao instituiu o


Senhor principalmente este sacramento da penitencia
quando, depois que ressuscitou dos mortos, bafejou a Seus
discipulos, dizendo: "Recebei o Espirito Santo: aqueles
cujos pecados perdoardes, lhes serao perdoados, e OS que
retiverdes, serao retidos". Com esta a<;ao tao insigne e
palavras tao claras, o consenso de todos os padres entendeu
sempre que fora comunicado aos ap6stolos e seus legitimos
sucessores o poder de perdoar e reter os pecados, de reconciliar
os fieis que caissem depois do batismo".
lb. Cap. 3: "Ensina ainda o santo sinodo, (1) que a
FORMA do sacramento da penitencia, em que princi-
palmente consiste a sua eficacia, se acha nestas palavras:
"EU TE ABSOLVO, etc ... ". Mas (2) os atos do proprio
penitente, a saber, a contri<;ao, a confissao e a satisfa<;ao,
sao como que a SUBSTAN CIA deste sacramento; os quais
atos de penitencia, vista que sao, por institui<;ao de Deus,

688
I 0 Arrependimento ... Penitencias
exigidos do penitente, para a inteireza do sacramento, e
para perfeita remissiio dos pecados, se chamam partes da
penitencia. Mas (3) o intento, o efeito deste sacramento,
quanta ao que pertence a sua virtude e eficacia, e a
reconcilia<;:iio com Deus".
lb. Cap. 4: "A contri<;:iio, que tern o primeiro lugar entre
OS mencionados atOS do penitente, e uma tristeza da alma,
e aversiio pelo pecado cometido, com o prop6sito de nao
tornar a pecar".
lb. Cap. 5: "Os penitentes devem relatar na confissiio
todos os pecados mortais que, depois de diligente exame,
tiverem na consciencia, ainda que sejam os mais ocultos,
e cometidos somente contra os dois ultimos preceitos do
Decalogo ... Quanta aos veniais, pelos quais niio somas
excluidos da gra<;:a de Deus, em que frequentemente
caimos, posto que seja conveniente e util, e de nenhum
modo presun<;:oso, confessa-los, contudo, pode-se calar a
respeito deles sem culpa, e podem ser expiados com outros
remedios ... Quanta aos demais pecados (mortais) que nao
ocorrem a quem faz esta diligente considera<;:ao, se
entendem geralmente que sao incluidos na mesma
confissiio: pelos quais dizemos fielmente com o profeta:
"purifica-me, Senhor, de meus ocultos delitos".
!d. Cap. 6: "(0 concilio) declara tambem que os
sacerdotes, ainda que estejam em pecado mortal, pela
virtude do Espirito Santo, dada na ordem, exercitam como
ministros de Cristo a fun<;:iio de perdoar os pecados ...
Ainda que a absolvi<;:ao do sacerdote seja a dispensa<;:iio de
urn beneficia alheio, contudo, nao e s6 urn mero
ministerio de anunciar o evangelho, ou de declarar que
estao perdoados os pecados; mas uma semelhan<;:a de ato
judicial, no qual ele, a maneira de juiz, pronuncia
senten<;:a... Nem a fe sem a penitencia causaria remissao
alguma dos pecados; nem deixaria de ser negligentissimo
na materia da sua salva<;:ao aquele que, sabendo que o
sacerdote o tenha absolvido por zombaria, deixasse de
buscar com todo o cuidado outro que agisse seriamente".
lb. Cap. 8: "Enfim, quanta a satisfa<;:iio, que, assim como

689
Capitulo32
entre todas as partes da penitencia, foi sempre e em todo
o tempo por nossos pais recomendada ao po'!o crisHio ... ".
Cap. 9: "Nao s6 podemos satisfazer a Deus Pai por Cristo
Jesus, com as penas que de livre vontade aceitamos em
vingaw;;a do pecado, ou impostas por arbitrio do sacerdote
a medida do delito, mas tambem (o que e maior prova de
amor) com castigos temporais, que Deus nos da, sofridos
por nos com paciencia".
Sessao 6, Cone. 29: "Se alguem disser que aquele que
caiu depois do batismo nao pode se levantar com a gra<;;a
de Deus, ou que na verdade o pode, mas que com a fe
somente recupera a justi<;;a que perdera, sem o sacramento
da penitencia... seja anatema. Can. 30. - Se alguem disser
que, depois de recebida a gra<;;a da justifica<;;ao, a qualquer
pecador penitente e perdoada a culpa, e a puni<;;ao eterna
e apagada de tal modo que nao lhe fica resquicio algum de
pena temporal a ser paga ou neste mundo ou no purgat6rio,
antes que possa entrar no reino do ceu, seja anatema".
INDULGENCIAS - Cone. de Trento, Sess. 25, "De
Indulgentiis".
0 papa Leao X, Bulla "De Indulgentiis" (1518)- "Para
que ninguem no futuro possa alegar ignorancia da doutrina
da igreja cat6lica romana a respeito das indulgencias e
sua eficacia ... o pontifice romano, vigario de Cristo sobre
a terra, pode, por motivos razoaveis, em virtude do poder
das chaves, da superabundancia dos meritos (expres-
samente chamados tesouro) de Cristo e dos santos,
conceder indulgencias aos fieis, quer nesta vida, quer no
purgat6rio; e que os que tern verdadeiramente alcan<;;ado
essas indulgencias, (sao) aliviados tanto do castigo
temporal devido por seus pecados reais a justi<;;a divina,
quanta e equivalente a indulgencia concedida e alcan<;;ada".

690
r
33

A Justifica~ao
J
1. Em que sentido a palavra dfkaios, justa, e empregada no
N avo Testamento?
Sua ideia fundamental e a de perfeita conformidade com
todas as exigencias da lei moral. Consideremos:
1°. Dito a respeito de coisas ou pessoas- Mat. 20:4; Col.
4:L
2°. Di to a respei to de Pessoas (1) como pessoalmen te san tas,
conformadas em seu carater a lei - Mat. 5:45; 9:13. (2) A
respeito de possufrem elas uma s6 qualidade exigida pela lei-
Mat. 1: 19; Luc. 23:50. (3) Como justas no sentido forense,
isto e, como conformadas as exigencias da Lei consideradas
como condic;ao da alianc;a de vida - Rom. 1:17. (4) Dito a
respeito de Deus como possuindo os atributos de justi<;a
distributiva na administra<;ao das provisoes da Lei e das
alian<;as- Rom. 3:26; 1 Joao 1:9. (5) Dito de Cristo, com respeito
ao Seu car:her como o unico homem perfeito, e a Sua posi<;ao
representativa em satisfazer todas as exigencias da Lei a favor
do Seu povo- Atos 3: 14; 7:52; 22:14.

2. Quale o usa do verba dikai6o, justijicar, no Novo Testa-


mento?
Significa declarar que uma pessoa e justa.
1°. Pessoalmente conformada a Lei quanto ao carater
moral- Luc. 7:29; Rom. 3:4.
2°. Justa em termos forenses, isto e, significa que, a seu

691
Capitulo 33
respeito, foram satisfeitas todas as exigencias da Lei, tida
como a condis;ao de vida- Atos 13:39; Rom. 5: 1,9; 8:30-33; 1
Cor. 6: 11; Gal. 2:16; 3:11.

3. Como se pode provar que a palavra dikai6o e utilizada


em sentido forense quando as Escrituras a empregam em referencia
ajustificafaO do pecador debaixo do evangelho?
P . Em muitos casos eo unico sentido que pode ter. Diz-
-se que os impios sao justificados sem as obras da Lei, pelo
sangue de Cristo, pela fe, livremente e de grac;a, mediante a
intervenc;ao de urn advogado, por meio de uma satisfac;ao e da
justi<;;a imputada- Rom. 3:20-28; 4:5-7; 5: 1; Gal. 2: 16; 3: 11;
5:4; 1 Joao 2:2.
2°. Eempregada para exprimir o contrario de condenac;ao
-Rom. 8:33,34.
3°. A mesma ideia e comunicada por muitas outras
express6es equivalentes e permutaveis entre si - Joao 3: 18; 5:24;
Rom. 4:6,7; 2 Cor. 5:19.
4°. Se o termo em apres;o nao tivesse esse sentido, nao
haveria diferen~a entre a justifica~ao e a santifica~ao -
Turretino, Loc. 16, Qures. 1.

4. Qual o uso do termo dikaiosyne,justifa, e da /rase ')"ustifa


de Deus" no Novo Testamento?
0 termo "justo" e concreto, designando a pessoa que esta
parcialmente conformada a lei, ou a cujo respeito foram
satisfeitas perfeitamente todas as exigencias da lei. 0 termo
"justic;a", porem, eabstrato, designando qualidade, obediencia
ou sofrimento que satisfaz as exigencias da Lei, e que constitui
o motivo da justificac;ao.
Por con seguin te, significa, 1°. santidade de carater, Mat.
5 :6; Rom. 6: 13; 2°. aquela perfeita conformidade de pessoa e
vida a Lei, que foi a base original para a justificac;ao, sob a
alianc;a das obras, Rom. 10:3,5; Fil. 3:9; Tito 3:5; 3°. a
obediencia e os sofrimentos vicarios de Cristo, o nosso

692
A Justificafiio
Substituto, alcan~ando assim para nos uma justi~a que,
sendo-nos imputada, torna-a nossa, ou faz dela a base da
nossa justificac;ao, Rom. 4:6; 10:4; 1 Cor. 1:30, e e por nos
recebida e aceita mediante a fe, Rom. 3:22; 4: 11; 10:5-10; Gal.
2:21; Heb. 11:7.
A frase "justi~a de Deus" encontra-se em Mat. 6:33; Rom.
1:17; 3:5,21,22,25,26; 10:3; 2 Cor. 5:21; Fil. 3:9; Tia. 1:20; 2
Ped. 1:1.
Significa evidentemente aquela perfeita justi~a ou
satisfa~ao dada aLei inteira, tanto a seus preceitos como a suas
penas, que Deus proveu e que Ele aceitara, em contraste com
os nossos servi~os imperfeitos ou penitencias infligidas a nos
mesmos, que Deus rejeitara se forem oferecidos como base
para a nossa justifica~ao.

5. Qual o usa do termo dikaiosis,justificafiio, no Novo Testa-


mento?
Encontra-se somente em Rom 4:25; 5:16,18. Significa a
relac;ao com a Lei na qual somos introduzidos quando a justic;a
de Cristo se torna legalmente nossa. Somos entao absolvidos,
nao incorrendo na pena. E as Escrituras declaram que nos
pertencem as recompensas prometidas aos obedientes.

6. Como se deve definir justificafiiO em seu sentido evangelico?


Deus, como Soberano, elegeu Seu povo escolhido e o deu
a Seu Filho na alian~a da grac;a, e como Soberano leva a efeito
essa alianc;a quando, por imputac;ao, faz da justi~a de Cristo a
justic;a do Seu povo eleito. A justificac;ao, porem, e urn ato
judicial de Deus pelo qual Ele declara que, em virtude dessa
imputac;ao soberana, a lei foi perfeitamente cumprida a nosso
respeito. Isso envolve, 1°. perdao; 2°. restaurac;ao ao favor
divino, como pessoas a cujo respeito serao cumpridas todas as
promessas que tern como condic;ao a obediencia aos
mandamentos da Lei. E urn ato estritamente legal, posto que
Deus nele admita e ponha em nossa conta uma justi~a vicaria,

693
Capitulo 33
porque esta justi<;a vicaria e exatamente aquila que, em todos
os aspectos, a Lei exige e pelo qual ela e cumprida. Veja abaixo,
Perg. 28.

7. Que exige a Lei para a justificm;ao do pecador?


A Lei consta essencialmente de uma regrade dever e de
uma pena anexa a ser aplicada no caso de desobediencia. No
caso do pecador, que ja se tornou culpado, a Lei exige, pois,
que, alem de prestar-lhe perfeita obediencia, seja tambem
sofrida a pen a que lhe cabe - Rom. 10:5; Gal. 3: 10-13.
I
8. Como se pode provar que as obras nao podem constituir
base para a justificar;ao do pecador?
Paulo repetidamente assevera isso (Gal. 2: 16), e declara
que nao somas justificados por nossa propria justi~a, provinda
da obediencia da Lei- Fil. 3:9. Tambem o mesmo ap6stolo
prova essa verdade mediante diversos argumentos-
1°. A Lei exige obediencia perfeita. Por isso todas as obras
nao perfeitas levam acondena<;ao, e nenhum ato de obediencia
praticado numa ocasiao pode expiar a culpa por urn ato de
desobediencia praticado noutra- Gal. 3: 10,21; 5:3.
2°. Se fOssemos justificados pelas obras, Cristo teria
morrido em vao- Gal. 2:21; 5:4.
3°. Se fosse pelas obras, nao seria pela gra<;a- Rom. 11 :6;
Ef. 2:8,9.
4°. Se fosse pelas obras daria ocasiao para blasonar- Rom.
3:27; 4:2.
5°. Paulo cita o Velho Testamento para provar que todos
OS homens sao pecadores, Rom. 3:9,10, e que, por isso, nao
podem ser justificados pelas obras- Sal. 143:2; Rom. 3:20.
Cita Hab. 2:4 para provar que "o justa vive da (pela) fe"; e cita
tambem o exemplo de Abraao- Gal. 3:6.

9. Quais as diversas opinioes quanto a classe de obras que,


segundo o ensino das Escrituras, nao bastam para a justificar;ao?

694
A JustificafiiO
Os pelagianos admitem que as obras de obediencia a lei
cerimonial sao dessa natureza, mas afirmam que as obras de
obediencia a lei moral sao a propria e unica base para a
justifica<;ao. Os cat6licos admitem que as obras praticadas pelas
fon;;:as naturais do homem, antes da sua regenera<;ao, nao tern
merito e nada val em para a justifica<;ao, mas, ao mesmo tempo,
sustentam que, tendo sido perdoados por amor a Cristo, no
batismo, o pecado original e as transgress6es pr6prias pre-
viamente cometidas, as boas obras praticadas depois, mediante
a gra<;a, tern a virtude, em conseqiiencia dos meritos de Cristo,
de 1°. merecer o ceu, e 2°. dar satisfas;ao pelos pecados. Somos,
pois, justificados pel a obediencia evangelica- Cat. Rom., Parte
2, Cap. 5; Cone. de Trento, Sess. 6, Canones 24 e 32. Os protes-
tantes negam a eficacia justificadora de todas e quaisquer obras.

10. Como se pode mostrar que nenhuma classe de obras, quer


cerimoniais quer marais ou espirituais, pode justificar?
1°. Quando as Escrituras negam que a justificas;ao possa
vir das obras, o termo "obras" e sempre empregado no sentido
geral de obediencia a inteira vontade de Deus revelada, seja
qual for a maneira pela qual foi revelada. Obras praticadas em
obediencia a qualquer lei, como base para a justifica<;ao, nunca
sao contrastadas com obras praticadas em obediencia a outra
lei, mas sim com a gra<;a- Rom. 11 :6; 4:4. Deus exige perfeita
obediencia a Sua vontade inteira, como revelada a qualquer
ho mem. Todavia, sendo todos os homens pecadores, a
justificas;ao pelas obras da Lei e igualmente impossivel para
todos- Rom. 2: 14,15; 3:9,10.
2°. 0 crente e justificado sem as obras da Lei, Rom. 3:28;
e Deus justifica os impios, por amor de Cristo- Rom. 4:5.
3°. Segundo as Escrituras, a justificas;ao baseia-se em
fundamento inteiramente diferente. E "em nome de Cristo",
1 Cor. 6:11; "por seu sangue" (ou "pela sua vida"), Rom. 5:9;
"gratuitamente", "pela sua gras;a", "pela fe" - Rom. 3:24,28.
4°. Paulo prova que, em vez de sermos justificados por

695
Capitulo 33
boas obras, essas se nos tornam possiveis somente em virtude
da nova rela~ao para com Deus em que a justifica~ao nos
introduz- Ef. 2:8-10; Rom., capitulos 6 e 7.

11. Como se pode conciliar Tiago 2: 14-26 com esta doutrina?


Tiago nao esta falando da base merit6ria da justifica~ao, e
sim da rela~ao em que as boas obras estao para com a fe
verdadeira como seus frutos e como sua evidencia ou compro-
va~ao. A base merit6ria da justifica~ao e a justi~a de Cristo -
Rom. 10:4; 1 Cor. 1:30. A fee o requisito essencial eo meio
instrumental para que se possa receber essa justi~a - Ef. 2:8.
Tiago, na citada passagem, simplesmente declara e argumenta
sobre a verdade de que a fe, que e assim a causa instrumental
da justifica~ao, nunca e uma fe morta, porem e sempre uma fe
viva e urn principio que produz frutos. Paulo muitas vezes
ensina a mesma verdade: "a fe opera por caridade", Gal. 5:6;
"0 cumprimento da lei eo amor", Rom. 13:10.

12. Qual e, segundo as Escrituras, a verdadeira e unica base


da justificac;iio?
A justifica~ao e uma declara~ao, da parte de Deus infinita-
mente sabio e santo, de que a Lei esta satisfeita. A Lei, como o
seu Autor, e absolutamente imutavel, e nao pode satisfazer-se
com coisa alguma que nao seja uma justi~a absolutamente
perfeita, a qual ao mesmo tempo cumpre os seus preceitos e
cumpre a sua pena. Isso foi feito por Cristo o nosso
Representante, e Sua justi~a, imputada a nos, e a base \mica e
estritamente legal da nossa justifica~ao. Assim Ele foi feito o
fim da lei para a nossa justifica~ao , e n6s somos feitos nele
justi~a de Deus - Rom. 3:24; 5:9,19; 8; 10:4; 1 Cor.1:30; 6.11;
2 Cor. 5:21; Fil. 3:9.

13. Como se pode provar que a obediencia ativa de Cristo aos


preceitos da Lei se acha incluida na justifa pela qual somas
justificados?

696
A Justificar;iio
1°. A condi<;ao da alian<;a das obras era a obediencia
perfeita. Tendo fa1hado essa alian<;a na pessoa de Adao, foi
necessaria que o segundo Adao cumprisse essa condi<;ao,
porque na alian<;a da gra<;a Cristo assumiu todas as obriga<;6es
nao cumpridas que o Seu povo tinha sob a alian<;a das obras.
Ele, por Seus sofrimentos, tirou a pena, mas somente Sua
obediencia ativa cumpriu a condi<;ao.
2°. Todas as promessas de salva<;ao acham-se ligadas a
obediencia e nao a sofrimentos- Mat. 19:16,17; Gal. 3:12.
3°. Cristo veio cumprir a Lei toda- Is. 42:21; Rom. 3:31;
1 Cor. 1:30.
4°. A obediencia de Cristo e expressamente contrastada
com a desobediencia de Adao- Rom. 5:19.

14. Como se pode mostrar que a obediencia de Cristo foi


espontanea (e niio forr;ada)?
Embora Cristo tenha sido feito sujeito a Lei nascendo de
uma mulher e tenha prestado obediencia a essa Lei nos
exercicios da Sua assumida natureza humana, todavia Ele nao
devia essa obediencia por si, entretanto prestou-a livremente,
para que OS Seus meritos pudessem ser imputados a Seu povo,
porque as exigencias de qualquer lei nao terminam em
naturezas, e sim em pessoas; e Ele sempre foi e e Pessoa divina.
Assim como Ele sofreu, o Jus to pelos injustos, assim tam hem
obedeceu, o Autor da Lei em lugar daquele que esta sujeito
a Lei. .' I •,

15. Em que sentido a justir;a de Cristo eimputada aos crentes?


A imputa9ao e urn ato de Deus como Juiz soberano, ao
mesmo tempo judicial e soberano, no qual (1) Ele faz com
que sejam realmente de Cristo a culpae as responsabilidades
legais dos nossos pecados, e pune a Cristo por causa deles. "Ele
foi ferido pelas nossas transgress6es, e moido pelas nossas
iniqiiidades: o castigo que nos traz a paz estava sobre ele, e
pelas suas pisaduras fomos sarados"- Is. 53:5,11. "Cristo nos

697
Capitulo33
resgatou da maldi~ao da lei, fazendo-se maldi~ao por nos"
-Gal. 3:13. "Aquele que nao conheceu pecado, o fez pecado
por nos; para que nele fossemos feitos justi~a de Deus" - 2
Cor. 5:21; Joao 1:29. (2) Ele torna nossa a justi<;;:a de Cristo
(isto e, torna nosso 0 direito legal arecompensa pela alian<;;:a da
gra<;;:a, cuja condi<;;:ao foi a justi<;;:a), e entao nos trata como pessoas
que fazem legalmente jus a esses direitos. ''Assim tambem Davi
declara bem-aventurado o homem a quem Deus imputa a
justi<;;:a sem as obras"- Rom. 4:6. "Porque o fim da lei e Cristo
para justi<;;:a de todo aquele que ere" - Rom. 10:4; 1 Cor. 1:30;
2 Cor. 5:21; Fil. 3:9.
"lmputa<;ao" e creditar ou por na conta de alguem alguma
coisa como o motivo pelo qual se lhe da tratamento judicial.
"Culpa" ea obriga<;ao justa de sofrer castigo. Oreatus pamce,
ou "acusac;ao para castigo", e imputado a Cristo em nosso lugar.
0 reatus culpce, ou "acusac;ao de culpa", permanece nos so.
"Justic;a imputada" e 0 cumprimento vicario de todas as
exigencias da alianc;a que constituem a condic;ao para rece-
bermos a vida eterna.
"Merito" e aquila que merece recompensa por causa das
promessas feitas numa alianc;a. 0 merecimento da recompensa
nose imputado em func;ao de Cristo, ode ser digno de louvor
Lhe pertence para sempre.
Da mesma maneira como Cristo nao se to rna pecador pela
imputa<;ao a Ele dos nossos pecados, tambem nao nos tornamos
santos pela imputac;ao a nos da Sua justic;a. A transferencia e
unicamente da nossa culpa para Ele e do Seu merito para n6s.
Ele com justi<;;:a sofreu o castigo devido aos nossos pecados, e
nos com justic;a recebemos a recompensa devida a Sua justic;a
- 1 Joao 1:9. Para a explica<;;:ao de "imputac;ao", veja acima,
Cap. 21, Perg. 12, e Cap. 25, Perg. 9.

16. Sobre que fundamento pro cede esta imputafiiO?


Procede sabre o fundamento da uniao federal, espiritual
e vital que subsiste entre Cristo e Seu povo. Esta uniao, por

698
A Justificafiio

' sua vez, est:'i baseada no eterno decreta de elei~ao, comum a


todas as Pessoas da Deidade, e em Sua eterna alian~a da grac;a
feita entre o Pai como Deus Abso1uto, e o Fi1ho como
Mediador. Assim e que o fundamento supremo da imputa~ao
consiste na natureza eterna e na vontade imperativa de Deus, a
fonte de toda a lei e de tudo 0 que e born.

17. Como se pode provar pelas Escrituras o Jato desta


imputafiio?
Veja Rom. 5:12-21. Compare Rom. 4:6 e 3:21 com Rom.
5:19.
A doutrina da imputac;ao esta envolvida essencialmente
na doutrina da substituic;ao. Se Cristo obedeceu e sofreu em
nosso Iugar, isto s6 pode acontecer por Lhe haverem sido
imputados os nossos pecados, o que e afirmado diretamente
nas Escrituras, Is. 53:6; 2 Cor. 5:21; 1 Ped. 2:24; e, sendo assim,
o merito da Sua obediencia e dos Seus sofrimentos s6 pode
redundar em nosso proveito- Mat. 20:28; 1 Tim. 2:6; 1 Ped.
3:18. Veja acima, Cap. 21, Perg. 12.
Esta doutrina e ensinada tambem nas passagens que
afirmam que Cristo cumpriu a lei, Rom. 3:31; 10:4; e pelas
que asseveram que somos justificados pela justic;a de Cristo, 1
Cor. 6:11; Rom. 8:1, etc.
Alem disso, esta doutrina fica em pe ou cai com todo o
sistema de doutrinas por nos apresentado a respeito do
sacerd6cio de Cristo, da justic;a de Deus, das alians;as das obras
e da gras;a, e da natureza da propicias;ao; aos quais assuntos,
sob seus respectivos titulos, remetemos o lei tor.

18. Quais OS dois efeitos atribuidos a imputafiiO da justifa de


Cristo?
A justi~a de Cristo 1°. satisfaz a pena da Lei, e 2°. cumpre
as condis;6es positivas impostas na alians;a das obras, isto e,
obediencia aos preceitos da Lei. A imputas;ao dessa justis;a
alcans;a, pois, para o creme, 1°. a remissao da pena, o perdao

699
Capitulo 33
dos pecados; e 2°. o reconhecirnento e tratarnento dele como
pessoa a cujo respeito forarn curnpridas todas as condi<;6es da
alian<;a das obras e que tern direito legal a todas as suas
prornessas e vantagens. Veja abaixo, Perg. 28.

19. Acaso os pecados dos crentes, cometidos depois da sua


justificafao, acham-se incluidos no perdao concedido em
consequencia da imputafao da justifa de Cristo? Se a resposta i
"sim", de que maneira sucede?
Os eleitos, posto que incluidos no prop6sito de Deus e na
alian<;a feita desde a eternidade corn Seu Filho, s~o efetiva-
mente unidos a Cristo somente no memento da sua rege-
nera<;ao, quando, em conseqiH~ncia da sua uniao a Ele e da
irnputa<;ao a eles feita da Sua justi<;a, sua rela<;ao corn a Lei
fica rnudada permanenternente. Conquanto a lei imutavel con-
tinue sernpre a ser a regra e o padrao perfeito para a sua
experiencia e para a sua vida, nao e mais para eles uma condi<;ao
da alian<;a de vida, porque foi cuinprida para eles por seu
Fiador. Deus nao lhes imputa mais o pecado corn o fim de
castigo judicial; e todo o sofrirnento que ainda lhes sobrevenha
e da natureza de corre<;ao, cujo fim e corrigi-los e torna-los
melhores, e, em rela<;ao a eles, nao forma parte algurna da pena
da Lei.

20. Quais as diversas opinioes a respeito da classe de pecados


que sao perdoados quando 0 pecador i justificado?
Os cat6licos romanos ensinam que o pecado original e
todas as transgress6es pessoais cometidas antes do batismo sao
perdoados por amor de Cristo pelo meio instrumental desse
sacramento, e que, depois do batismo, os pecados, a medida
que se cometem, sao, mediante OS meritos de Cristo, perdoados
na observancia do sacramento da penitencia. Veja acima, Cap.
32, Perg. 11.
0 Dr. Pusey fez reviver uma antiga doutrina segundo
a qual se perdoam no batismo todos os pecados passados,

700
A JustificafiiO
original e reais ou fatuais; mas o seu sistema nao faz provisao
para o perdao dos pecados cometidos depois.
Muitos protestantes tern sustemado que no primeiro ato
da justifica<;:ao se perdoam someme os pecados passados e
presemes, e que os pecados cometidos depois da regenera~ao
sao perdoados a medida que sao cometidos, depois de novos
atos de fe.
A verdadeira opiniao, porem, e que, em conseqiiencia da
imputa<;:ao da justi<;:a de Cristo ao creme, este esta emancipado
da sua previa rela<;:ao federal com a Lei, e, por isso, dai por
diante nenhum pecado e mais lan<;:ado em sua conta com o
fi m de condena<;:ao judicial. Isso segue-se da natureza da
imputa<;:ao, como foi anteriormente exposta, e fica ilustrado
pela experiencia registrada de Paulo, o qual, posto que
lamentasse que uma lei nos seus membros repudiava a lei do
seu espirito, todavia nunca duvidou da sua rela<;:ao filial com
Deus, nem do perdao dos seus pecados.

21. Quais as divers as opinioes a respeito da relafiio entre a fe


e a justificafiio?
Os socinianos sustentam que a fe, inclusive a obediencia,
e a propria base meritoria para a justifica<;:ao -Cat. Rae., Pergs.
418-421 e 453.
Os arminianos ensinam que, posto que a fe nao tenha
merecimento proprio, por ser dom de Deus, contudo, sendo
urn prindpio vivo, incluindo obediencia evangelica, ela, por
amor dos merecimentos de Cristo, nose irnputada pela gra<;:a
de Deus, como justi~a, isto e; e aceita como justi<;:a e, por
isso, somos declarados justos- Lirnborch, Theol. Christ., 6:4,22
e 6:4,26.
A opiniao ortodoxa e que a obediencia de Cristo, passiva
e ativa, que satisfaz tanto ao preceito como a pena da Lei e
constitui assim urna justi~a perfeita, e, pela irnputas;ao ao
creme, realmente feita justis;a dele, no sentido legal, quando
se apropria dela no a to de crer. N ossa fe constitui, pois,

701
Capitulo33
simplesmente o meio pelo qual participamos da justi<;:a de
Cristo, sendo esta a verdadeira base da nossa justifica<;:ao.

22. Como se pode provar que a je esomente a causa instrumental


da justificafiiO?
1°. Pela propria natureza da fe. (1) Ela nao e de nos, mas
e dom de Deus- Ef. 2:8; Fil. 1:29. (2) E urn dos frutos do
Espfrito e, por isso, nao pode ser o motivo meritorio para
recebermos ben~aos espirituais- Gal. 5:22. (3) E urn ato da
alma e, por isso, e uma obra; porem, posto que sejamos
justificados mediante a fe, nao o somas por obras.- Rom. 4:2-
5; 11:6. (4) A fe justificadora culmina em Cristo ou sabre Ele,
em Seu sangue, em Seu sacrificio e nas promessas de Deus;
em sua propria essencia, pois, envolve confian<;:a e, negando
que tenha valor justificador em si, so afirma o merecimento
unicamente daquilo (ou daquele) em quem confia - Rom.
3:25,26; 9:20,22; Gal. 3:26; Ef. 1:12,13; 1 Joao 5:10. (5) A Lei
exige necessariamente uma justi<;:a perfeita, mas a fe, mesmo
quando combinada com a obediencia evangelica que ela
produz, nao e uma justi<;:a perfeita.
2°. As Escrituras, quando se referem a rela<;:ao da justi-
fica<;:ao com a fe, empregam as express6es ek pisteos, pela fe, e
dia pisteos, pela fe ou mediante a fe, entretanto nuncadia pistin,
por causa da fe, Gal. 2: 16.
3°. A fee distinguida da justi<;:a que ela apreende- Rom.
1: 17; Fil. 3:8-11. Turretino, Loc. 16, Quaes. 7.

2 3. Qual o objeto especifico da je justificadora?


Segundo os socinianos, que negam a deidade de Cristo, o
ato da fe justificadora culmina "em Deus por Cristo" - Cat.
Rae., Sec. 5, Cap. 9.
Os catolicos romanos, que confundem a justifica<;:ao e a
santifica<;:ao, fazem da revela<;:ao inteira de Deus o objeto da fe
que justifica- Cat. Rom., Parte 1, Cap. 1.
A doutrina biblica e que, posto que o corac;;ao renovado

702
r, creia igualmente em toda aPalavra de Deus conh:;:,:::::
o ato espedfico da fe, pelo qual somas justificados, tern como
objeto a Pessoa de Cristo e Sua obra como Mediador.
Prova-se isso- )-., .·"
1°. Pelas declara<;;6es terminantes das Escrituras- Rom.
3:22,25; Gal. 2:16; Fil. 3:9.
2°. Pelas declara<;;6es de que somas salvos pela fe nEle-
Atos 10:43; 16:31; Joao 3:16,34.
3°. Por aquelas express6es figuradas que ilustram o ato de
fe salvadora como "olhando para Cristo" etc.- Is. 45:22; Joao
1:12; 6:35,37; Mat. 11:28.
4°. Incredulidade e recusar aceitar a justi<;;a que Deus
proveu, isto e, Cristo- Rom. 10:3,4.

24. Qual a natureza da paz que provem da justificafiio?


1°. Paz com Deus, por estar perfeitamente satisfeita a
Sua justi~a pela justi~a de Cristo - Rom. 5:1; 2 Cor. 5: 19;
Col. 1:21; Ef. 2:14. Em testemunho de que Ele nos da Seu
Espirito- Rom. 8: 15,16; Heb. 10:15,17. Derrama Seu amor
em nossos coras;6es, Rom. 5:5, e estabelece comunhao habitual
entre nose Ele- 1 Joao 1:3.
2°. Paz interior de consciencia, incluindo a consciencia
intima de estarmos reconciliados com Deus mediante a
opera<;;ao do Seu Espirito, como acima se viu, eo apazigua-
mento da nossa consciencia acusadora mediante a apreensao
da justi<;;a pela qual somas justificados- Heb. 9:14; 10:2,22.

25. Que outros beneficios mais nos vem da justificafiio?


Sendo justificados na base de uma justi<;;a perfeita, toda a
nossa rela<;;ao com Deus e com a Lei fica mudada; eo resultado
e que recebemos o dom do Espirito Santo, a ado<;;ao, a
santifica<;;ao, a perseveran<;;a, a garantia de que todas as coisas
contribuem para o nosso bern, livramento na morte, a
ressurrei<;;ao do corpo e a glorifica<;;ao final.
r. '·

703.
Capitulo 33
RESPOSTAS A OBJE<;OES

26. Como se pode expor e refutar as principais objer;oes contra


a doutrina protestante da justificar;iio?
1°. Objeta-se que ela e legale, por isso, exclui a gra<;:a.
RESPONDEMOS- Na verdade, edoutrina transcendental-
mente caracterizada pela gra~a. (1) A admissao de urn substi-
tuto dos pecadores culpados foi ato de gra<;:a. (2) A obediencia
e os sofrimentos vicarios do Deus-homem foram atos de gra<;:a
infinita. (3) A imputa~ao da Sua justi<;:a a pessoas eleitas dentre
toda a massa da humanidade decaida epuramente urn ato de
gra~a. Logo, (4) o fato grandioso de que Deus depois considera
e trata o crente como justo eobra da gra~a.
2a. Que essa doutrina eimpia porque declara que 0 pecador
e justo e que e possuidor da propria justi<;:a de Cristo.
RESPONDEMOS: Nao e impia porque- (1) Esta justi~a foi
planejada livremente com a inten~ao de que fosse nossa, enos
e dada livremente. (2) Nao se trata da justi~a pessoal e subjetiva
de Cristo, a qual e incomunicavel, mas o que nos e imputado
e o Seu cumprimento vicario da alian~a de vida, sob a qual
nascemos. (3) 0 merito de louvor e retido por Cristo; s6 nose
dado o merito de recompensa. (4) A dadiva da justi~a nose
feita gratuitamente, para que o louvor da gra<;:a gloriosa reflua
unicamente a Cristo.
Y. Que a justifica<;:ao gratuita, pela fe, leva alicenciosidade.
PAULO RESPONDE: Romanos 6:2-7-
(1) proposi<;:ao: onde o pecado foi abundante, a gra~a foi
muito mais abundante- Romanos 5:20.
(2) proposi~ao: concluiremos, pois, que devemos continuar
no pecado para que a gra<;:a seja abundante? De modo nenhum
- Romanos 6:1, 2.
(3) proposi~ao: a uniao federal do crente com Cristo, a
qual assegura a nossa justifica~ao, eo fundamento inseparavel
daquela uniao espiritual e vital com Ele que assegura a nossa
san tifica<;:ao.

704
A ]ustificarao
(4) proposis;:ao: este metodo de justificas;:ao, longe de levar
a licenciosidade, adquiriu as (micas condis;:6es sob as quais
podemos ser Santos. (a) Este metodo de justificas;:ao, devido a
mudans;:a que opera em nossa relas;:ao com Deus, habilita-nos
a retornar a Ele prestando-Lhe urn servis;:o espontaneo e feito
por am or- Romanos 6: 14; 7: 1-6. (b) So mente este metodo de
justificas;:ao nos liberta de urn espfrito de escravidao e de temor,
enos dao deados;:ao edeamor-Romanos 8:1-17; 13:10; Galatas
5:6; 1 Joao 4: 18; 2 Joao, versiculo 6.

27. Em que aspecto diferiu a doutrina de Piscator sabre este


assunto da doutrina das igrejas reformadas?
Piscator, te6logo protestante, lente em Herborn (1584-
1625), ensinou, 1°. que, quanto aSua natureza humana, Cristo
estava sujeito aLei no mesmo sentido em que o esta qualquer
outra criatura humana, e que, por isso, Ele podia obedecer a
lei somente por Si; 2°. que, se Cristo tivesse obedecido a Lei
em nosso lugar, ela nao poderia exigir de n6s urn segundo
cumprimento dela e, conseqiientemente, os cristaos nao teriam
nenhuma obrigas;:ao de obedecer alei de Deus; 3°. que, se Cristo
tivesse obedecido aos preceitos da Lei e tambern sofrido a pena,
a Lei teria sido cumprida duas vezes, por serem alternativas e
nao coincidentes as exigencias dos preceitos e a pena da Lei.
Essa doutrina foi expressamente condenada nas igrejas
reformadas da Sufs;:a e da Rolanda, e pelos sinodos franceses
celebrados nos anos de 1603, 1612 e 1614.
Em 1615, porem, o sinodo permitiu tacitamente que essas
opini6es passassem sem condenas;:ao -Hist. Eccl. de Mosheim.

28. Como se pode mostrar que ajustificarao nao esimplesmente


perdao?
Piscator errou, deixando de distinguir-
1°. Que as exigencias da Lei nao terminam em naturezas,
e sim em pessoas. Cristo foi Pessoa divina e, por isso, Sua
obediencia foi espontanea.

705
Capitulo 33
zo. Que ha uma diferen<;a evidente entre uma rela<;ao fede-
ral com a Lei como condi<;ao da salva<;iio e uma rela<;iio
natural com ela como regrade vida. Com a Lei como con-
dis;iio, Cristo a cumpriu como nosso Representante federal;
porem, como regra de vida, ela e obrigat6ria para o creme e
para todas as criaturas marais para sempre.
A justifica<;iio e mais que perdiio -
1°. Porque a propria palavra "justificar" o prova. "Perdoar"
e desistir, no exerdcio de uma prerrogativa soberana, da
execu~iio das sans;6es penais da Lei. "Justificar" e declarar que
as exigencias da Lei sao satisfeitas, niio que se desistiu delas. 0
perdiio e ato soberano; a justificas;iio eato judiciaL'
2°. Como ja provamos no capitulo 25, Cristo, no rigor
estrito da justi~a, satisfez vicariamente por n6s as exigencias
da Lei. Sua satisfas;iio e a base requerida para a nossa justi-
fica~iio. Mas perdao e remissiio da pen a sem satisfa<;iio.
3°. Se a justifica<;iio fosse mero perdiio, livrar-nos-ia
simplesmente dos sofrimentos pemiis, todavia niio nos proveria
nenhum outro bern. Mas "a justificas;iio pela fe em Cristo" niio
somente traz como resultado o perdiio, porem tambem a paz,
a gras;a, a reconcilias;iio, a ados;iio de filhos, a bens;iio de sermos
co-herdeiros com Cristo, etc. Veja acima, Perg. 13, e Rom. 5:1-
10; Atos 26: 18; Apoc. 1:5,6.
No caso dos cremes justificados, a "justifica<;iio" inclui o
"perdiio". A nossa justificas;ao tern por fundamento uma
"satisfa<;iio", e, por is so, niio e mero perdiio, e sim uma satisfa<;iio
"vicaria", lan~ada pela gra<;a de Deus a credito de indignos, e,
por isso, efetua o perdiio de n6s pecadores que cremos em Cristo.

29. Acaso Calvina niio teria empregado muitas vezes uma


linguagem que indica que a justijiCafiiO e 0 perdiio SfiO a mesma
coisa?
Empregou. No en tanto, na interpreta<;iio da sua linguagem
devemos estar lembrados-
1°. Do fato de que ele estava argumentando com os

706
A JustificafiiO
romanistas, que ensinavam que a "justifica~ao consiste na
remissao dos pecados e na infusao da gra~a". Em oposi~ao a
isso, ele argumentava que a justifica~ao consiste na remissao,
contudo nao inclui a infusao.
2°. Do fato conclusivo de que as suas defini<;6es completas
de "justifica~ao" compreendem a verdade toda, definida mais
acuradamente nos simbolos das igrejas luterana e reformada.
Entretanto, vejamos:
Joao Calvina, Institutas, Livro 3, Cap. 2, § 2: "Diz-se
que urn homem e justificado diante de Deus quando, no
juizo de Deus, ele e decretado justa e e aceito por causa da
sua justi~a... Do mesmo modo dir-se-a que urn homem e
justificado par abras, se em sua vida, ou pela perfei~ao de
suas obras, ele pode responder e satisfazer a justi~a divina.
Se, porem, urn homem quiser justificar-se pela fe, quando
excluido da justi~a de obras, ele pela fe lan~a mao da justi~a
de Cristo e, dela revestido, nao aparece diante de Deus
como pecador, e sim como justa. Assim, pais, n6s
interpretamos a justifica~ao simplesmente como a
aceita~ao pela qual Deus nos recebe em Seu favor, e
dizemos que esta justifica~ao consiste no perdao dos
pecados e na imputa~ao da justi9a de Cristo.
Calvina, Com., 1 Cor. 1:30 - "Cristo nos e feito justi9a,
e por estas palavras ele (o ap6stolo) entendeu que somas
aceitos por Deus em Seu nome (de Cristo), porque Ele
expiou os nossos pecados, e Sua obediencia nos e imputada
como justi9a. Porque, consistindo a justi9a da fe na
remissao dos pecados e na aceitac;ao gratuita, n6s obtemos
as duas coisas por Cristo".

30. Em que sentido a teoria governamental modifica a doutrina


da justificafiio?
Veja acima, Cap. 25, Per g. 27.
1°. Daquela teoria segue-se que a justifica~ao e urn ato
soberano e nao judicial de Deus. Cristo nao satisfez aLei, mas
somente alcan~ou que fosse compativel como governo de Deus

107
Capitulo 33
que Ele pusesse de lado a Lei no caso dos cremes. E mero
perdao, urn ato de clemencia executiva.
2°. Devido Cristo nao ter morrido como urn substituto,
segue-se que Sua justi~a nao e imputada; e a ocasiao, mas nao
a base da justifica~ao.
3°. Devido Cristo nao ter morrido como urn substituto,
nao ha uniao estritamente federal entre Ele e Seu povo, e a fe
nao pode ser o meio da salva~ao, unindo-nos a Cristo, mas e
tao-somente a condi~ao arbitraria sob a qual se nos concede a
justifica~ao, ou eo meio de recomendar-nos a Deus.
4°. Sendo a justifica<;ao mero perdao, s6 poe de lado a
condena~ao, e assim to rna possivel a salva~ao. Contudo, nada
faz para conseguir a posi~ao futura do crente e suas rela~6es
com Deus, sob a alian~a da salva~ao.
0 Dr. Emmons (1745-1840), urn dos mais habeis te6logos
da Escola da Nova Inglaterra, diz (Sermons, Vol. 3., pags. 3-67)
- (1) "A justifica~ao, no sentido do evangelho, nao significa
nem mais nem menos que o perdao ou remissao dos pecados".
(2) "Perdao eo unico favor que Deus concede aos homens por
amor de Cristo". (3) "A plena ou final justifica~ao dos cremes,
ou o seu direito a heran~a eterna, e condicional. E: necessaria
que eles fa~am certas coisas, que Ele especificou como termos
ou condi~6es, cumprindo os quais eles podem tomar posse
dos seus diversos legados". (4) "Deus com efeito promete a
vida eterna a todos os que obedecem a Seus mandamentos ou
exercem os santos e benevolos afetos que os Seus mandamentos
exigem".

31. Como a teoria arminiana modifica a doutrina dajustificafiiO


quanta a natureza e ao designio da satisfafiio dada par Cristo?
Os arminianos sustentam - 1°. Quanto a natureza da
satisfa~ao dada por Cristo, a qual, posto que fosse uma
propicia~ao real feita a nosso favor atendendo ajusti~a, a rigor
nao foi perfeita, no que diz respeito a justi~a, mas foi aceita
por Deus, por Sua gra~a, e como tal foi tratada por Deus -

708
A ]ustificafiio

'
Limborch, Apol. Theol., 3, 22, 5. 2°. Que essa satisfac;:ao nao
foi estritamente a substituic;:ao dos eleitos por Cristo, mas an-
tes, que Ele sofreu a ira de Deus a favor de todos os homens, a
fim de fazer com que fosse compativel com a justic;:a, para que
Deus pudesse oferecer a salvac;:ao a todos os homens sob a
condic;:ao da fe.
Consideram, pois, a justificac;:ao como urn ato soberano e
nao judicial- 1°. Em aceitar Deus os sofrimentos de Cristo
como suficientes para habilini-10, sem quebra das Suas
perfeic;:6es, a oferecer aos homens a salvac;:ao sob condic;:6es da
nova alianc;:a de grac;:a, is toe, a condic;:ao da fe. 2°. Em imputar
ao crente a sua fe como justic;:a, por amor de Cristo.
Esta fe, segundo eles- 1°. Inclui obediencia evangelica,
isto e, o inteiro principia de religiao no corac;:ao e na vida. 2°.
Eles a consideram mais como a base admitida pela grac;:a, do
que como simplesmente o meio de justificac;:ao, sendo a fe
imputada como justic;:a, pela qual Cristo morreu- Limborch,
Theol. Christ., 6:4, 22 e 6: 4, 26.
Essa teoria (arminiana) tern contra si todos os argumentos
que acima apresentamos estabelecendo a doutrina ortodoxa,
mas alem disso labora sob as seguintes objec;:6es-
1a. Ela deixa de tornar claro como e que a satisfac;:ao dada
por Cristo tornou compativel com a justic;:a divina que os
homens sejam salvos sob a condic;:ao da fe. Se Cristo nao
obedeceu nem sofreu estritamente como o Substituto de Seu
povo, e dificil entender como, quanto ao que lhes diz respeito,
a justic;:a de Deus poderia ser aplacada; e se se disser que Ele
realmente cumpriu assim em seu lugar as exigencias da justic;:a,
isto sera admitir a teoria ortodoxa, acima exposta.
2a. Ela deixa de tornar clara a relac;:ao da fe com a
justificac;:ao- (1) Porque a fe em Cristo, incluindo a confianc;:a,
necessariamente implica que os meritos de Cristo, nos quais
se deposita finalmente a confianc;:a, constituem o fundamento
da justificac;:ao. (2) A fe deve ser ou o fundamento ou
simplesmente o meio da justificac;:ao. See o meio, a justic;:a de

709
Capitulo 33
Cristo, que e o objeto da fe, e o fundamento. Todavia se a fe e
o fundamento, onde ficam os meritos de Cristo em que a fe
se baseia?

32. Como definem os eatolieos a justifieafao?


Eles a confundem com a santifica~ao. Para eles, e, 1°. per-
ciao dos pecados, 2°. a remo<;:ao do pecado inerente, por amor
de Cristo, e 3°. a infusao positiva da gra<;:a.
A respeito desta justifica~ao ensinam que a causa finale a
gloria de Deus e a vida eterna. A causa eficiente e o poder do
Espirito Santo. A causa meritoria e a obra realizad~ por Cristo.
A causa instrumental eo batismo. A causa formal e a influencia
da gra<;:a, pela qual nos nao so nos tornamos justos no sentido
forense, mas tambem inerentemente - Cone. de Trento, Sess. 6,
Cap. 7.
A fe, em sua rela<;:ao com a justifica<;:ao, eles definem como
o principia da salva~ao humana, fonte e raiz de toda a justi-
fica<;:ao, isto e, da vida espiritual. Sustentam, por conseguinte,
que a justifica<;:ao e progressiva e que, depois de receber 0
hom em uma nova natureza eo perdao e a remo~ao dos pecados
no batismo, e necessaria levar avante a obra pelo exercicio da
gra<;:a implantada, isto e, pela pratica de boas obras. Confun-
dindo eles a justifica<;:ao com a santifica<;:ao, negam neces -
sariamente que os homens seja justificados pela imputa<;:ao da
justi~a de Cristo, ou somente pela fe, sem obras - Cone. de
Trento, Sess. 6, Cans. 9 e 11, "De J ustificatione".
Eles admitem que a justifica~ao e inteiramente gratuita,
isto e, que vern so da misericordia de Deus, e por amor dos
meritos de Jesus Cristo, por nao terem merecimento algum
nem os exercicios espirituais, nem as obras dos homens,
praticadas antes da sua justifica<;:ao- Cone. de Trento, Sess. 6,
Cap. 7. Deve-se distinguir cuidadosamente entre (a) aquilo
que no caso de urn adulto o prepara para a justifica<;:ao, (b) a
realiza<;:ao da justifica<;:ao em primeira instancia, (c) sua
subseqtiente realiza<;:ao progressiva no adiantamento da alma

710
A Justificafiio
,
beneficiada pela gra~a na justifica~ao para a perfei~ao, e (d) a
restaura~ao do cristao batizado a urn estado de gra~a depois de
ter voltado para o pecado.
. Veja:
1°. A prepara~ao do pecador para a justifica~ao procede
J da gra~a preveniente de Deus, sem nenhum merecimento da
i parte do preparando. Essa gra~a, operando pelo ato de ouvir a
Palavra, conduz aconvic~ao do pecado, ao arrependimento, a
apreensao da misericordia de Deus em Cristo, (a igreja), e assim
adetermina~ao de receber o batismo e levar vida nova- Cone.
de Trento, Sess. 6, Caps. 5 e 6. · ··
2°. A justifica~ao efetiva do pecador e a infusao de habitos
mediante a gra~a, depois de haver sido limpo da corrup~ao do
pecado pelo poder de Deus, por amor dos meritos de Cristo,
por meio do batismo, que produz seus efeitos em virtude de
uma energia inerente a ele, segundo a sua institui~ao por Deus.
Depois disso, estando removido o pecado inerente, a remissao
da culpa segue-se necessariamente como seu efeito imediato.
Culpa e a rela~ao do pecado com a justi~a de Deus. Sendo
removida a causa (o pecado ), a rela~ao deixa de existir ipso
facto- Belarmino, De Amiss. Gratice etc., v: 7.
3°. Tendo sido justificado assim e tendo sido feito amigo
de Deus, o cristao vai adiante, de virtude em virtude, e e
renovado dia a dia mediante a observancia dos mandamentos
de Deus e da igreja (catolica), cooperando a fe com as boas
obras, tornadas possiveis entao em virtude da previa justi-
fica~ao, e merecendo elas realmente, e recebendo como sua
justa recompensa, aumento de gra~a e justifica~ao cada vez
mais perfeita. Aprimeira justifica~ao do pecador foi por amor
de Cristo, sem nenhuma coopera~ao de seu proprio mereci-
mento, mas como consentimento da sua vontade. A suasegunda
justifica~ao, ou a justifica~ao continuada e aumentando sempre,
e por amor de Cristo, por meio e a propor~ao do seu proprio
merecimento, e este merece aumento de gra~a e aceita~ao a
medida (a) da sua santidade pessoal, e (b) da sua obediencia as

711
Capitulo 33
regras eclesiasticas- Cone. de Trento, Sess. 6, Cap. 10 e Can. 32.
4°. No caso dos que pecaram, depois de justificados, a grac;:a
perdida da justificac;:ao e restaurada, por amor de Cristo,
mediante o sacramento da penitencia, provido como segunda
tabua para aqueles em quem a grac;:a naufragou. Esta penitencia
inclui (a) pesar pelo pecado, (b) confissao feita a urn sacerdote
da respectiva jurisdic;:ao, (c) absolvic;:ao sacerdotal, (d) satisfac;:ao,
constando de esmolas, jejuns, etc., e se esta satisfac;:ao nao for
toda dada nesta vida, completar-se-a nas chamas do purgat6rio.
Todas estas satisfac;:6es, terrenas e purgatoriais, sao satisfac;:6es
merit6rias dadas ajustic;:a divina, cancelam os castigostemporais
devidos pelos pecados em cuja remissao se penitenciam, e cujo
castigo eterno ja foi perdoado gratuitamente, ou no proprio
sacramento ou no sincero desejo de participar dele- Cone. de
Trento, Sess. 6, Caps. 14 e 16, Can. 30, e Sess. 14, Caps. 1 a 9.

33. Quais os pontos de diferenfa entre os protestantes e os


cat6licos a respeito de toda esta questiio?
1°. Quanto anatureza da justificac;:ao. N6s a consideramos
como urn ato judicial de Deus, declarando que o crente e justo,
em termos forenses, com base na justic;:a de Cristo, que e feita
justic;:a dele por imputac;:ao. Os romanistas a consideram como
a infusao da grac;:a inerente.
2°. Quanto a sua base merit6ria. Eles, como n6s, dizem
que sao OS meritos de Cristo. Mas n6s dizemos que esses meritos
se tornam nossos por imputac;:ao, por meio da fe; e eles dizem
que se tornam nossos pela santificac;:ao.
3°. Quanto anatureza e ao oficio da fe. N6s dizemos que e
o meio da justificac;:ao; eles, que eo seu principio e a sua raiz.
4°. Eles dizem que a justificac;:ao eprogressiva.
5°. Dizem tambem que a podemos perder cometendo
algum pecado mortal, e que ela pode ser recobrada e
aumentada mediante o sacramento da penitencia, e que sera
aperfeic;:oada no purgat6rio. Veja acima, Cap. 32, sobre "0
Arrependimento e a Penitencia".

712
r 34. Quais OS principais argumentos contra a te::.U::::::
sabre este assunto?
1°. A doutrina catolico-romana e toda confusa. (1) Ela
confunde numa so definiqao duas coisas inteiramente distintas,
a saber, a nossa remissao forense da condenaqao que merecem
os pecados, com a nossa purificaqao do pecado inerente, e a
nos sa introduqao num estado em que, em consequencia da Sua
alianqa com Cristo, gozamos do favor de Deus, com a infusao
da graqa inerente. (2) Deixa de dar uma explicaqao satisfatoria
da maneira pela qual o merito de Cristo nos propicia a justiqa
divina.
2°. A definiqao catolico-romana e refutada por todas as
provas acima apresentadas de que os termos "justificaqao" e
"justiqa" sao empregados nas Escrituras em sentido forense.
3°. Essa teoria, dizendo que a nossa graqa inerente, operada
pelo Espirito Santo, por amor de Cristo, e a base, o motivo, de
sermos aceitos por Deus, subverte o evangelho todo. E da
propria essencia do evangelho que a base da nossa aceitaqao
por parte do Pai seja a obra medianeira do Filho, sendo que
Ele, e nao a nossa graqa inerente, eo fim da Lei para a justiqa
em nosso favor.
4°. A teoria romanista do merecimento das obras prati-
cadas por nos, mediante a graqa divina, depois do batismo,
nao condiz com aquilo que as Escrituras e a propria igreja
catolica romana ensinam a respeito do pecado e da culpa
originais, e a respeito da gratuidade essencial da salvaqao
operada por Cristo. 0 proprio Tomas de Aquino diz (Summa,
Quaes. 114, Art. 5): "Sea graqa for tomada no sentido de urn
dom gratuito, todo o merecimento sera excluido pela graqa".
Logo, cai por terra todo o sistema papal de justificaqao.
5°. E legal em seu espirito e em seu metodo, e assim, ou
induz ao orgulho espiritual ou ao desespero, mas nunca pode
nutrir a verdadeira e segura confianqa evangelica, que e ao
mesmo tempo humilde e inabalavel.
6°. As Escrituras declaram que Deus, por causa dos meritos

713
Capitulo 33 IJ
de Cristo, justifica o creme em sua condit;;:ao defmpio, e nao de
santificado. Certamente nao poderia haver necessidade de uma
propiciat;;:ao para que Deus Se tornasse jus toe ao mesmo tempo
santijicador dos impios- Rom. 4:5.
7°. As express6es imputar, con tar como ou por pecado ou
justi~a sao compativeis absoluta e unicamente com uma
interpretat;;:ao forense. Imputar justit;;:a sem obras no sentido
forense, e visto como racional no capitulo 4 da Epfstola aos
Romanos. Imputar gra~a inerente sem obras eabsurdo.
8°. A defini~ao romanista e refutada por todos os
argumentos que estabelecem a verdadeira teoria a respeito
da natureza e do oficio da fe justificadora. Veja acima, Pergs.
21-23.
EXPOSH;6ES AUTORIZADAS

DOUTRINA CATOLICO-ROMANA - Para a exposi~ao


sobre a natureza, a base e os meios da justifica~ao, ver acima,
no Cap. 29. Para a exposic;ao sobre a doutrina romanista
das boas obras e das obras de supererroga~ao, veja abaixo,
no Cap. 35, ever o que e dito sobre a doutrina da penitencia
no Cap. 32.
Cone. de Trento, Sess. 6, Cap. 8 - "Diz-se que somos
justificados pela fe porque a fe e 0 principia da salvac;ao
dos homens, eo fundamento e a raiz de toda a justificac;ao".
lb., Can. 23.- "Se alguem disser que o homem, uma vez
justificado, nao pode pecar mais, nem perder a grac;a; e
por isso aquele que cai e peca nunca fora verdadeiramente
justificado; ou se, ao contnirio, disser que o homem pode
durante toda a vida evitar todos os pecados, ainda os
veniais, salvo por especial privih~gio, como da bem-
-aventurada virgem Maria entende a igreja: seja an:hema".
Can. 24: "Se alguem disser que a justi~a recebida nao se
conserva, nem tambem aumenta para com Deus pelas boas
obras; mas que as boas obras somente sao frutos e sinais
da justificac;ao que se alcanc;ou: seja amitema". Can. 29:
"Se alguem disser que aquele que caiu depois do batismo,

714
A Justificaffio
nao pode levantar-se com a gra<;a de Deus; ou que na
verdade pode, mas que com a fe somente recupera a justi<;a
que perdera, sem o sacramento da penitencia ... seja
anatema". Can. 30: "Se alguem disser que, depois de
recebida a gra<;a da justifica<;ao, a qualquer pecador
penitente e perdoada a culpa, e a puni<;ao eterna e apagada,
de tal modo que nao lhe fica nenhum resquicio de pena
temporal a ser paga, ou neste seculo ou no futuro, no
purgat6rio, antes de poder entrar no reino do ceu: seja
anatema". Can. 32: "Se alguem disser que as boas obras
do homem justificado de tal modo sao dons de Deus que
nao sao tambem bans merecimentos do mesmo
justificado; ou que este, com as boas obras que pratica,
pela gra<;a de Deus e pelos meritos de Jesus Cristo, de Quem
ele e urn membra vivo, nao merece verdadeiramente
aumento de gra<;a, a vida eterna e, se morrer em gra<;a, a
consecu<;ao da mesma vida eterna e aumento de gloria:
seja amitema".
Belarmino, "De Justificatione", 5, 1: "A opiniao comum
de todos os catolicos sustenta que todas as boas obras das
pessoas justificadas sao verdadeira e propriamente
meritorias, e nao somente merecem alguma recompensa,
mas a propria vida eterna". 4, 7. - "Dizemos que as boas
obras sao necessarias ao homem justificado para a sua
salva<;ao, nao so de modo que estejam presentes, mas
tambem porque sao eficazes; porque elas efetuam a
salva<;ao, e sem elas a fe nao a efetua". lb. 5, 5: "Os meritos
das pessoas justificadas nao estao opostos aos de Cristo,
porem tern nestes a sua origem, e todo o louvor que
mere<;am os merecimentos dos justificados, redunda
inteiramente no louvor dos merecimentos de Cristo".
DOUTRINA LUTERANA- Apologia Confessionis -
"Justificar significa neste lugar (Rom. 5:1) absolver, em
sentido forense, uma pessoa acusada e declara-la justa, mas
por causa da justi<;a de outrem, isto e, de Cristo; sendo
que esta justi<;a de outrem e lan<;ada em nossa conta
mediante a fe".
Form. Concordia:! (Edi<;ao de Hase), pag. 685: "Nesta

715
Capitulo33
transa<;:ao o termo justifica<;:ao significa declarar justos,
absolver dos pecados e do castigo eterno os pecadores,
por causa da justi<;:a de Cristo, que e imputada por Deus a
fe". lb., pag. 684: "0 homem pecador pode ser justificado
diante de Deus ... sem nenhum merecimento nosso, e
independentemente de quaisquer obras, precedendo ou
acompanhando a mera gra<;:a de Deus ou desta decor-
rendo". lb., pag. 584: "Confessamos que unicamente a fe
e o meio ou instrumento com que apreendemos a Cristo,
nosso Salvador e, em Cristo, aquela justi<;:a que pode
suportar o juizo de Deus". lb., pag. 689: "Nem o arrepen-
dimento, nem o amor, nem outra virtude qualquer~ mas
sim somente a fe e 0 unico meio e instrumento com que
somos capazes de apreender e aceitar a gra<;:a de Deus, os
meritos de Cristo e a remissao dos pecados".
DOUTRINA REFORMADA -Conf. de Fe, de Westminster,
Cap. 11.
Cat. de Heidelberg, Perg. 60: "Todavia, posso agora
aceitar todos esses beneffcios com yerdadeira ousadia de
espirito; sem nenhum merecimento meu, somente da
gra~a de Deus, a perfeita satisfa~ao, justi~a e santidade de
Cristo me sao imputadas e dadas como se eu mesmo nunca
houvesse pecado ou me houvesse manchado; sim, como
se eu mesmo tivesse prestado essa perfeita obediencia
que Cristo prestou par mim".
DOUTRINA REMONSTRANTE- Limborch, Christ.
Theol., 6: 4, 22: "Entenda-se que, quando dizemos que
somas justificados pela fe, nao excluimos as obras, que a
fe exige e, como mae prolifica, produz, mas n6s as
incluimos ... nem se deve entender pela fe uma mera fe,
em contrastante distin<;:ao das obras que a fe produz, e
sim, junto com a fe, toda aquela obediencia que Deus
prescreve no Novo Testamento, e que e suprida pela fe
em Jesus Cristo ... " pag. 31. Mas a fee a condi<;:ao em n6s
e de n6s exigida para que obtenhamos a justifica<;:ao. E,
pois, urn ato que, quando considerado em si mesmo, de
modo algum e perfeito, e sim defeituoso em muitos
aspectos; todavia, e aceito gratuita e livremente por Deus

716
A Justificafiio

como completo e perfeito, e por causa dela Deus da


gratuitamente a remissao dos pecados e a recompensa da
vida eterna ... " pag. 29. 0 objeto da fe (justificadora) decla-
ramos que Jesus Cristo e, em toda a Sua Pessoa, como
Profeta, Sacerdote e Rei; nao somente a Sua propicia<;;ao,
mas tambem os Seus preceitos, promessas e amea<;;as; por
ela, pois, aceitamos o Cristo integral, Sua Palavra e todos
os Seus beneficios salvadores".
DOUTRINA SOCINIANA- Cat. Racoviano, Sec. 5, Cap.
9: "A fe que e de per si acompanhada da salva<;;ao e urn tal
assentimento a doutrina de Cristo que a aplicamos ao seu
objeto apropriado; isto e, que confiamos em Deus por
Cristo e nos entregamos inteiramente a obediencia a Sua
vontade, alcan\;ando assim as Suas promessas... Se, quando
a vida tern continuidade depois do reconhecimento de
Cristo, a piedade e a obediencia sao exigidas como
indispensaveis para a salVa\;aO, e necessaria que a fe, a
qual s6 e verdadeiramente e atribuida a salva<;;ao, com-
preenda a obediencia... ". lb., Cap. 2: "Somas justificados
quando Deus nos considera como justos, ou quando nos
trata como se fOssemos inteiramente justos e inocentes.
Isso Ele faz na Nova Alian<;;a, perdoando os nossos pecados
e outorgando-nos a vida eterna".

-.; l ;

717
34

A Ado~ao e a Ordem Observada pela


Gra~a na Aplica~ao da Reden~ao, nas
Diversas Partes da Justifica~ao, da
Regenera~ao e da Santifica~ao

1. A que classes de criaturas eaplicada a expressiio "filhos de


Deus" nas Escrituras, e por quais motivos se faz essa aplicafiio?
1o. No singular eaplicado em ;;entido superior e incomu-
nicavel unicamente aSegunda Pessoa da Trindade.
2°. No plural, aos anjos, (1) porque sao as criaturas favore-
cidas de Deus, (2) porque, como inteligencias santas, sao
semelhantes a Ele- }6 1:6; 38:7.
3°. Aos magistrados entre os homens, porque possuem
autoridade delegada por Deus, e a esse respeito se Lhe asse-
melham- Sal. 82:1,6.
4°. Aos homens que foram objetos da ado~ao divina.
Essa ado<;:ao, eo estado de filhos que esua conseqiiencia, e
dupla, (1) geral e externa, Ex. 42:2; Rom. 9:4; (2) especial,
espiritual e imortal- Gal. 4:4,5; Ef. 1:4-6.

2. Que ea adofiio que os crentes tem em Cristo, equal a relafiio


que a ideia representada por essa palavra nas Escrituras tem com
as ideias representadas pelos termos justificafiio, regenerafiiO e
santificafiio?
Turretino faz da ado<;:ao uma parte integrante da justi-
fica<;:ao. Diz ele que na execu<;:ao da alian<;:a da gra<;:a, Deus

718
A Adofiio ...

soberanamente imputa aos eleitos, quando primeiro creem, a


justi~a de Cristo, que foi o cumprimento de toda a Lei e, por
isso, a base legal, sob a alian<;:a das obras, a fim de obter para o
Seu povo tanto a remissao da pena como o direito legal a todas
as promessas que dependem da obediencia. Fundado nesta
imputa~ao soberana, Deus declara judicialmente que a Lei,
em suas rela<;:6es federais, foi cumprida perfeitamente a respeito
deles e, por outro lado, justifica-os, o que envolve duas classes
de ben<;:aos, 1a. a remissao da pena merecida por seus pecados,
e za. a concessao de todos os direitos e rela~6es que resultam
do cumprimento positivo, da parte de Cristo e a favor dos
eleitos, da alian~a das obras. Esta segunda parte integrante da
justifica~ao Turretino chama ado<;:ao, e isso concorda essen-
cialmente com a defini<;:ao de ado<;:ao dada em nossa Confissiio
de Fe, Cap. 12, no Cat. Maior, Perg. 74, e no Breve Cat., Per g.
34- Turretino, L. 16, Pergs. 4 e 6.
0 grande Amesio (t 1633), ern sua Medulla Theologica,
Cap. 28, representa a ado<;:ao como uma nova gra~a, rnais adian-
tada que a justifica<;:ao, e nao como urn dos seus elementos: a
senten<;a de Deus, baseada ern Sua gra<;:a, na qual o creme,
tendo sido justificado, e recebido por arnor de Cristo para a
rela~ao e os direitos de filho.
A n6s, porern, nos parece que as palavras "ado<;:ao" e "esta-
do de filhos", como ernpregadas nas Escrituras, exprirnern
rnais do que urna rnudan<;:a de rela<;:ao, e que urna concep<;:ao
mais adequada delas ea de que elas exprimem uma ideia com-
plexa, incluindo a rnudan<;:a da natureza junto com a da rela-
~ao e mostrando-nos o que e a nova criatura em suas novas
rela<;6es.
No instante em que urn pecador e unido a Cristo no
exerdcio da fe, operarn-se nele simultanea e inseparavelrnente,
1°. uma mudan<;:a radical em sua rela<;:ao com Deus e com a
Lei como urn a alian<;:a; zo. uma mudan<;:a em seu estado inte-
rior, ou em sua natureza. Esta rnudan<;:a de rela<;:ao e chamada
justifica<;:ao. A REGENERA(:AO e urn ato de Deus no qual uma

719
Capitulo 34
nova cria~ao da origem a mna nova vida espiritual no cora~ao
do regenerado. 0 primeiro a. toe o imediato dessa nova criatura,
depois da sua regenera~ao, e FE, ou seja, a aceita~ao genuina e
confiante da Pessoa e obra de Cristo. Quando entao a pessoa
regenerada exerce fe, segue~se a]USTIFICA(:AO como ato ime-
diato de Deus, com base naquela justi~a perfeita que a fe
habilitou o pecador a apreender, e Deus o declara livre de toda
a condena~ao e com direito a todas as rela~6es e beneficios
prometidos na alian~a que Cristo cumpriu a seu favor. A
SANTIFICA(:AO e o crescimento progressivo para a maturi-
dade aperfei~oada da nova vida implantada na regenera~ao. A
ADO(:AO apresenta a nova criatura em suas novas rela~6es,
exercendo-as de todo o seu cora~ao, desenvolvendo sua nova
vida no meio de uma familia congenial, cercada de rela~6es
que promovam o seu crescimento e a coroem com a bem-
-aventuran~a. A justifica~ao e tao-somente urn ato forense, e
s6 diz respeito a rela~6es, imunidades e direitos. A regenera~ao
e a santifica~ao sao obras totalmente marais e espirituais, e s6
dizem respeito a qualidades e estados inerentes. A ado~ao
compreende a condi~ao complexa do crente ao mesmo tempo
como regenerado e como justificado.

3. Quale a ordem da grafa na aplicafiiO da redenfiio?


1°. Os dois principios que fundamentalmente caracterizam
a soteriologia protestante sao-
(1) A clara distin~ao entre a mudan~a de rela~ao, chamada
justifica~ao, e a mudan~a de carater, chamada regenera~ao e
san tifica~ao.
(2) 0 fato de que a mudan~a de rela~ao, a remissao da
pena e a restaura~ao ao favor de Deus, envolvida na justifica~ao,
necessariamente precede e torna possivel a real mudan~a moral
chamada regenera~ao e santifica~ao. Enquanto permanece a
condena~ao judicial, nao ha lugar para o exercicio da gra~a. E
preciso que a remissao da pen a preceda aopera~ao do Espfri to.
Somas perdoados para que sejamos bons, e nunca somas

720
AAdofilo ...
tornados bons para que sejamos perdoados. ·: ~~rm;
"E evidente que era necessaria que Deus mesmo ja fosse
em secreta favoravelmente disposto, por Sua gra<;a, para com
o homem, e que ja o tivesse perdoadoforum divinum, por amor
de Cristo e da Sua rela~ao com a natureza humana, para que
lhe pudesse conceder o dom da regenera<;;ao. De fato,
considerada a regenera~ao como actus Dei forensis, havia
necessidade de que fosse considerada como existindo ja antes
do homem ser conscio dela, e ate ja antes da sua fe"- Dr. J. A.
Dorner, Hist. Prot. Theology, Vol. 2, pags. 156, 160.
zo. Dai vern o aparente circulo (vicioso) na ordem da gra~a.
Diz-se que a justi~a de Cristo e imputada aocrente, e ao mesmo
tempo que a justificaqao e pela ji. Mas a fo e ato da alma
regenerada, e a regenera~ao e somente possivel no caso da alma
ja reconciliada com Deus pela aplicac;ao da satisfac;ao prestada
por Cristo.
Assim, a satisfac;ao e os meritos de Cristo sao a causa
antecedente da regenera<;:ao e, por outro lado, a participa<;:ao
do crente na satisfa<;:ao enos meritos de Cristo (sua justifica~ao ),
tern como condi<;:ao sua fe, que e urn efeito da regenera<;:ao. E
necessaria que tenhamos parte em Cristo, para que sejamos
regenerados, a fim de que tenhamos parte nEle para alcan<;:ar a
justifica~ao.
Nao se trata de ordem cronol6gica, porque a regenera<;:ao
e a justifica<;:ao sao atos da grac;a de Deus absolutamente
sincronicos. A questao versa somente sobre a verdadeira ordem
das causas: seria imputada a n6s a justi<;:a de Cristo para que
possamos crer, ou ela nos e imputada porque cremos? Seria a
justificac;ao urn juizo analitico, no sentido de que o homem e
justificado como crente, apesar de ser pecador, ou seria ela urn
juizo sintetico, no sentido de que esse pecador e justificado
por amor de Cristo?
3°. A solu<;:ao acha-se no fato de que Cristo impetrou que
a Sua salva<;:ao e todos os seus meios, condi<;:6es e passos, fossem
aplicados aos "Seus", e que isso se fez em conseqiiencia de

721
Capitulo 34
uma alianc;a em que Ele entrou como Pai e na qual se pro-
videnciou que a redenc;ao fosse aplicada a pessoas especificas
em certos tempos e debaixo de certas condic;6es. A relac;ao em
que, des de o seu nascimento, uma pessoa eleita esta com Adao,
o pecado e a condenac;ao, e exatamente a mesma em que estao
todos os demais homens. Mas a sua relac;ao com a satisfac;ao e
com os meritos de Cristo, como tambem com as grac;as que
tudo isso outorga, e analoga a de urn herdeiro com a heranc;a
que lhe e legada num testamento. Enquanto o herdeiro e
menor, 0 testamento da-lhe de jure 0 direito em principia a
heranc;a. Para prepara-lo para ela, o proprio testamento faz
pro vi sao para a sua educac;ao, a expensas da heranc;a; determina
quais os pagamentos em prestac;6es que os executores dotes-
tamento lhe devem fazer; determina em certo sentido a sua
condic;ao atual como herdeiro em perspectiva; e determina
quando e sob que condic;6es se lhe pode entregar a posse
absoluta da propriedade. Ele possui certos direitos e goza de
certos beneficios desde o prindp.io; mas tern os direitos e os
poderes absolutos de proprietario somente quando chega a
idade propria e cumpre as condic;6es prescritas no testamento.
E assim tambem que OS meritos de Cristo sao imputados ao
herdeiro eleito desde o seu nascimento, ate onde eles constituem
a base para 0 tratamento que pela grac;a lhe e dado como
preparac;ao para a sua plena posse.
Os teologos protestantes dizem que a justificac;ao eo ato
final de Deus como Juiz, pelo qual Ele declara que o herdeiro
esta de plena posse dos direitos a sua heranc;a, e que, dai por
diante, ele deve ser reconhecido e tratado como herdeiro de
posse, ainda que a consumac;ao do ato de dar-lhe posse so
seja efetuada no dia da ressurreic;ao. Cristo e Sua justic;a nao
sao dados ao crente por causa da sua fe. Ela e a conscia e
confiante aceitac;ao daquilo que ja lhe foi dado. 0 nossoBreve
Catecismo diz, Perg. 33: "A justificac;ao e urn ato da livre grac;a
de Deus, no qual Ele perdoa todos os nossos pecados, e nos
aceita como justos diante dEle, unicamente pela justic;a de

722
AAdofiio...
Cristo (1) imputada a n6s e (2) aceita somente pela fe".
A regenera~ao e, por conseguinte, a fe sao operadas em
n6s por am or de Cristo e como resultado que tern por condi~ao
uma previa imputa~ao da Sua justi~a para este fim. A
justifica~ao sobrevem a fe e implica uma tal imputa~ao da
justi~a de Cristo que ela efetua uma mudan~a radical e
permanente nas rela~6es do justificado com a lei como condi~ao
de vida.

4. Segundo as Escrituras, que e que se acha envolvido no jato


de alguem ser filho de Deus por essa adofiio?
1o. Natureza derivada de Deus - J oao 1:13; Tia. 1: 18; 1
Joao 5:18.
2°. 0 renascer a imagem de Deus, a Sua sernelhan~a­
Rom. 8:29; 2 Cor. 3: 18; Col. 3: 10; 2 Ped. 1:4.
3°. 0 fato de trazer o Seu nome- 1 Joao 3: 1; Apoc. 2: 17;
3:12.
4°. 0 serern objetos do Seu amor peculiar- Joao 17:23;
Rom. 5:5-8; Tito 3:4; 1 Joao4:7-ll.
5°. A habita~ao ern n6s do Espirito de Seu Filho (Gal.
4: 5,6), que forma ern n6s urn espirito filial, ou urn espirito
que con vern aos filhos de Deus,obediente, 1 Ped.l: 14; 2 Joao 6;
livre do sentimento de culpa, do cativeiro da Lei, do medo da morte,
Rom. 8:15, 21; 2 Cor. 3:17; Gal. 5:1; Heb. 2:15; 1 Joao 5:14; e
elevado por uma confianfa santa a uma dignidade real, Heb.
10:19,22; 1 Ped. 2:9; 4:14.
6°. Prote~ao, consola~6es e abundantes provisoes presentes
-Sal. 125:2; Is. 66: 13; Luc. 12:27-32; Joao 14:18; 1 Cor. 8:21-
23; 2 Cor. 1:4.
7°. Corre~6es paternais presentes, incluindo afli~6es
ternporais e espirituais- Sal. 51: 11,12; Heb. 12:5-11.
8°. A segura heran~a das riquezas da gloria de nosso Pai,
como herdeiros de Deus e co-herdeiros corn Cristo, Rom. 8: 17;
Tia. 2:5; 1 Ped. 1:4; 3:7; inclusive a exalta~ao de nossos corpos
para cornunhao corn Ele- Rom. 8:23; Fil. 3:21.

723
CapituW34 ,
5. Qual a relafiiO das tres Pessoas da Trindade com esta adofiio,
e em que relafiio ela nos introduz com cada uma das tres Pessoas
respectivamente?
Esta ado<;:ao procede do eterno proposito do Pai, em
considera<;:ao aos meritos do Filho e e efetuada pela opera<;:ao
eficaz do Espirito Santo- Joao 1: 12,13; Gal. 4:5,6; Tito 3:5,6.
Por ela Deus o Pai torna-Se nosso Pai, o Deus-homem
encarnado torna-Se nosso irmao mais velho, enos nos tornamos
- (1) semelhantes a Ele; (2) intimamente associados com Ele
em comunidade de vida, posi<;:ao, rela<;:6es e privilegios; (3)
co-herdeiros com Ele da Sua gloria- Rom. 8: 17,29; Heb. 2: 17;
4:15. 0 Espirito Santo mora em nos como Mestre, Guia,
Advogado, Consolador e Santificador. Todos os crentes
recebem a mesma ado<;:ao e, por conseguin te, sao todos irmaos
- Ef. 3;6; 1 Joao 3: 14; 5: I.

724
' .. ~ '

35

A Santifica~ao

1. Qual o sentido que as palavras hagios, santo, e hagiazein,


santificar, tem nas Escrituras?
0 verbohagiazein e empregado em dois sentidos diferentes
no Novo Testamento:
1°. No de tornar limpo, flsica ou moralmente. (1) Purifi-
ca~ao cerimonial- Heb. 9: 13; (2) Tornar limpo em sentido
moral-1 Cor. 6: 11; Heb. 13:12. Por isso as palavras "os santifi-
cados" significam o mesmo que cremes- 1 Cor. 1:2.
2°. Separar de urn uso comum para urn uso sagrado;
consagrar. (1) dito de coisas, Mat. 23:17; (2) dito de pessoas,
Joao 10:36; (3) ter e venerar como santo, Mat. 6:9; 1 Ped. 3:15.
Hagios, como adjetivo,limpo,puro, santo; como substantivo,
o santo, e tambem empregado em dois sentidos diferentes,
correspondendo aos do verba:
1°. Puro, limpo: (1) cerimonialmente, Mat. 24: 15; Heb.
9:1, (2) moralmente, Ef. 1:4; (3) como substantivo, os santos,
os santificados, Rom. 1:7; 8:27.
2°. Consagrado, devotado- Mat. 4:5; Atos 6: 13; 21 :28;
Heb. 9:3. Esta palavra e empregada tambem em louvor a Deus
- Joao 17: 11; Apoc. 4:8.

2. Quais as diferentes opinioes sustentadas a respeito da natureza


da santificafdo?
1a. Os pelagianos, negando o pecado original e a incapa-
cidade moral do homem, e sustentando que o pecado pode ser

725
Capitulo 35

tido como predicado de atos da vontade, somente, e nao de


estados ou disposi~6es inerentes, consideram, por conseguinte,
a santifica~ao apenas como uma reforma moral da vida e dos
costumes, operada sob a influencia da verdade pelo proprio
pecador no uso da sua for~a natural.
za. Os defensores do "modelo de exercicios" (exercise scheme)
afirmam que nada podemos achar na alma alem de urn agente
ou au tore seus exercicios. A regenera~ao, portanto, nada mais
e que a cessa~ao de uma serie de exerdcios rna us e a inaugura-
~ao de urn a serie de exerdcios santos. U rna fac~ao, representada
pelo Dr. Emmons, afirma que Deus efetua imediatamente estes
exercicios santos. Outra fac~ao, representada pelo Dr. Taylor,
de New Haven, declarou que eo proprio homem que deter-
mina o caniter dos seus exercicios pessoais, escolhendo a Deus
como o seu bern supremo e tendo o auxilio do Espirito Santo
de uma maneira nao explicada. Veja acima, Cap.29, Pergs. 5
e 6.
3a. Muitos membros da Igreja Anglicana, em distin~ao
do seu segmento evangelico, sustentam que, quando urn
homem se conforma com a igreja, o que constitui a condi~ao
da alian~a evangelica e introduzido no USO de todos OS
beneficios dessa alian~a, e, se cumprir decentemente os seus
deveres relativos e participar das ordenan~as, ficani habilitado
a fazer tudo o que se exige dele atualmente, e conseguira toda
a bondade moral que e possivel ou desejavel no presente.
4a. A doutrina ortodoxa e que o Espirito Santo, por Suas
influencias constantes sobre a alma, em todas a suas faculdades,
por meio da verdade, nutre, exerce e desenvolve os principios
e as disposi~6es santas que implantou por ocasiao do novo
nascimento, ate que, sendo mortificadas e extirpadas as
disposi~6es pecaminosas e plenamente desenvolvidas as
disposi~6es santas, num progresso constante, o objeto desta
gra~a alcan~a imediatamente apos a morte a medida da estatura
de hom em perfei to em Cristo- Conf de Fe, Cap.l3; Cat. Maior,
Perg. 75;Breve Cat ., Perg. 35.

726
A SantificafiiO

3. Como se pode mostrar que a santificafiiO envolve mais que


mera reforma? · ·; ,t:;··
Veja acima, Cap.29, Perg. 12.

4. Como se pode mostrar que a santijicafiio envolve mais que a


produfiio de santos exercicios?
Veja acima, Cap.29, Pergs. 7-10.
Alem dos argumentos apresentados no capitulo acima
referido, podemos estabelecer esta verdade pela evidencia
contida nas passagens das Escrituras que distinguem entre a
mudan~a operada no cora~ao e os efeitos que ela produz na
vida- Mat. 12:33-35; Luc. 6:43-45.

5. Qual a relafiio da santificafiio com a regenerafiio?


A regenera~ao eurn ato criador do Espirito Santo, implan-
tando na alma urn novo principia de vida espiritual. A
conversao eo primeiro exerdcio desse novo prindpio originado
pela gra~a, voltando-se o pecador renascido espontaneamente
para Deus. A santifica~ao e a obra realizada constantemente
pelo Espirito Santo pela qual Ele sustenta e desenvolve
espiritualmente o regenerado, sujeitando todas as faculdades
da alma cada vez mais perfeitamente ainfluencia purificadora
e reguladora do prindpio de vida espiritual implantado.

6. Qual a relafiio reciproca da justificafiio e da santificafiio?


N a ordem da natureza, a regenera~ao precede ajustifica~ao;
quanto ao tempo, porem, sao sempre e necessariamente
concomitantes. No mesmo momento em que Deus regenera
urn pecador, o pecador exerce fe em Cristo; e no mesmo
momento em que exerce fe em Cristo, eregenerado, e a santi-
fica~ao, que e a obra pela qual e levado adiante e aperfei~oado
aquilo que tern por come~o a regenera~ao, e efetuada sob as
condi~6es daquelas novas rela~6es nas quais o pecador e
introduzido pel a justifica~ao. N ela somos libertados das
conseqti.encias penais do pecado e introduzidos num tal estado

727
Capitulo 35
de reconcilia~ao com Deus e comunhao como Espirito Santo,
que ficamos emancipados da escravidao e do temor legal, e
revestidos daquele espirito de confian~a e amor fi1iais que eo
principia essencial de toda obediencia aceitavel. Alem disso,
somas justificados em virtude da nossa uniao federal com
Cristo pela fe, que e a base daquela uniao viva e espiritual da
alma com Ele - da qual procede a nossa santifica~ao. Veja
acima, Cap.31, Perg. 3.

7. Como se pode mostrar que esta obra se estende a todo o homem,


integralmente, ou seja, ainteligencia, avontade e aos afetos?
A alma e uma unidade, uma e a mesma autora ou agente
pensando, sentindo e decidindo. Urn homem nao pode amar
algo se nao percebe que e merecedor do seu amor, nem pode
perceber a beleza, quer natural quer moral, que nao seja
congenial com o seu cora~ao. Sua natureza esta por inteiro
depravada, 1°. cega e insensivel para a beleza espiritual; 2°.
adversa ao bern moral, nas disposi~6es dominantes da vontade,
e por isso e desobediente. A ordem em que as faculdades
operam e a seguinte: a inteligencia percebe as qualidades do
objeto que ocupa a aten~ao; o cora<:;ao amaas qualidades que
lhe sao congeniais; a vontade escolhe aquilo que e amado.
Isso fica provado: 1°. Pela experiencia. Amedida que o
espirito se torna mais depravado, torna-se tambem mais
insensivel a luz espiritual. Por outro lado, a medida que OS
olhos percebem mais e mais claramente a beleza da verdade,
tanto mais vivos se tornam os afetos e mais obediente a vontade.
2°. Pelo testemunho das Escrituras. Por natureza o homem
todo esta depravado. A inteligencia esta obscurecida e os afetos
e a vontade estao pervertidos- Ef. 4:18.
Sendo assim, e evidente que a santifica~ao s6 pode
estender-se anatureza inteira do homem.
1°. Pela necessidade do caso.
2°. Pelo testemunho das Escrituras- Rom. 6: 13; 2 Cor.
4:6; Ef. 1:18; Col. 3:10; 1 Tess. 5:23; 1 Joao 4:7.

728
A Santificaf.iio
8. Em que sentido esantificado o corpo?
1°. Como consagrado: (1) por ser templo do Espirito Santo,
1 Cor. 6:19; (2) por ser membra de Cristo -1 Cor. 6:15.
2°. Como santificado: sendo o corpo parte integrante da
nossa pessoa, seus instintos e apetites operam imediatamente
sabre as paix6es da alma, e, por isso, e necessaria que os
sujeitemos a direc;:ao da alma santificada e que fac;:amos de
todos os membros, como 6rgaos da alma, instrumentos de
justic;:a para Deus- Rom. 6:13; 1 Tess. 4:4.
3°. Nossos corpos hao de tornar-se semelhantes ao corpo
glorificado de Cristo- 1 Cor. 15:44; Fil. 3:21.

9. A quem as Escrituras atribuem a obra de santificar;iio?


1°. Ao Pai- 1 Tess. 6:23; Reb. 13:21.
2°. Ao Filho- Ef. 5:25,26; Tito 2:14.
3°. Ao Espirito Santo -1 Cor. 6:11; 2 Tess. 2:13.
As tres Pessoas da Trindade sao sempre representadas
como concorrendo em todas as Suas operac;:6es externas, o Pai
operando pelo Filho e pelo Espirito Santo, e o Filho pelo
Espirito. A obra de santificac;:ao eatribuida com proeminencia
especial ao Espirito Santo porque Ele enela o Au tor ou Agente
imediato e porque esta e, em especial, Sua obra oficial no plano
da redenc;:ao.

10. Que nos ensinam as Escrituras a respeito da operar;iio da


verda de na obra de santificar;iio?
Todo o processo de santificac;:ao consiste no desenvolvi-
mento e na confirmac;:ao do novo principia de vida espiritual
implantado na alma por ocasiao da regenerac;:ao, e e dirigido
pelo Espirito Santo de conformidade com a operac;:ao das leis
e dos habitos de ac;:ao naturais da alma humana como autora
ou agente inteligente, moral e livre, e mediante a referida
operac;:ao dessas leis e desses habitos. Assim como as faculdades
naturais do corpo e do espirito, e os habitos naturais que
modificam a ac;:ao dessas faculdades, sao desenvolvidos pelo

729
Capitulo 35

exerdcio, assim tambem se da com as gra~as cristas, ou com


os habitos espirituais, sendo as verdades do evangelho os
objetos sobre os quais operam essas gra~as e pelos quais elas
sao estimuladas e dirigidas. Assim, a sublime beleza de Deus
apresentada na verdade, que eimagem dEle, eobjeto do nosso
amor satisfeito e prazeroso; Sua bondade, da nossa gratidao;
Suas promessas, da nossa confian~a; Seus juizos, do nosso temor
salutar; e Seus mandamentos promovem em nos a obediencia
filial em suas diversas e muitissimas formas- Joao 17:19; 1
Ped. 1 :22; 2:2; 2 Ped. 1 :4; Tia. 1:18. J
11. Que eficacia atribuem as Escrituras aos sacramentos
(ordenanfas) nesta obra?
1°. A teoria mais simples e que os sacramentos apresentam
a verdade aos olhos de uma maneira muito viva, meramente
como simbolos, e que sao eficazes somente como urn modo de
apresentar o evangelho objetivamente.
2°. A teoria do extrema oposto e que eles, por sua eficacia
propria, comunicam gra~a santificadora ex opere operata,
"porque comunicam gra~a em virtude do proprio ato sacra-
mental, instituido por Deus para este mesmo fim, e nao pelo
merito do administrador (sacerdote), nem pelo de quem OS
recebe" - Belarmino, De Sac., 2, 1.
3°. A teoria verdadeira e "que os sacramentos sao meios
eficazes de gra~a, nao so exibindo e sim realmente conferindo
aos que os recebem dignamente, os beneficios que eles
representam"; todavia, esta efid.cia nao reside propriamente
neles, mas acompanha o seu uso devido em virtude da divina
institui~ao e promessa, mediante a opera<;ao do Espirito Santo
que os acompanha, e dependendo isso da fe daquele que os
recebe, fe que, ao mesmo tempo, e a condi<;ao e o meio de se
receber o beneficia- Mat. 3: 11; Atos 2:41; 10:47; Rom. 6:3; 1
Cor. 12:13; Tito 3:5; 1 Ped. 3:21.

730
A SantificafiiO
12. Na santificafiio, que oficio as Escrituras atribuem aje?
Quanto ao numero de ordem, a fe e a primeira gra~a
exercida pela alma depois de regenerada; quanto ao principio,
e a raiz de todas as demais- Atos 15:9; 26:18. E0 instrumento
pelo qual obtemos a santifica~ao. Portanto ...
1°. 0 de conseguir que se mude a rela~ao do crente com
Deus e com a Lei, como a condi~ao de obter a vida e o favor.
Veja acima, Perg. 6.
2°. 0 de conseguir a uniao do crente com Cristo- 2 Cor.
13:5; Gal. 2:20; Col. 3:3.
3°. Por sua propria natureza a fe nos santifica, porque, em
seu sentido mais lato, a fee aquele estado espiritual da alma
em que ela tern comunhao viva e ativa com a verdade espiritual.
"Por esta fe o cristao ere que e verdadeiro tudo quanto e
revelado na Palavra, pela autoridade do proprio Deus falando
nela; e atua diferentemente, segundo aquilo que cada passa-
gem dela contem; prestando obediencia aos mandamentos,
tremendo as amea~as e aceitando as promessas de Deus para
esta vida e para a que hade vir- Conf de Fe, Cap.14, § 2.

13. Segundo as Escrituras, o que seria necessaria para que


uma obra seja considerada boa?
1°. Que tenha como origem urn born motivo, is toe, que
seja praticada por amor ao carater de Deus, por respeito a
Sua autoridade e por zelo pela Sua gloria; o amor como fruto
do Espirito, mesmo que nao esteja sempre presente conscien-
temente, todavia imperando como prindpio permanente e
dominante na alma.
2°. Que esteja em consonancia com a Sua Lei revelada-
Deut. 12:32; Is. 1: 11,12; Col. 2:16-23.

14. Quale a doutrina papal a respeito dos "conselhos de Cristo"


que niio se acham incluidos nos preceitos positivos da Lei?
Os mandamentos positivos de Cristo sao apresentados
como obrigatorios a todas as classes de cristaos de modo igual,
·;~\~l$l~on:c.,'-l; ~ l' ·

731
Capitulo 35
e sua observancia como necessaria asalvac;ao. Seus conselhos,
porem, obrigam somente aqueles que, buscando urn grau mais
exaltado de perfeic;ao e uma recompensa mais excelente,
assumem-nos voluntariamente. Sao tais como o celibato, a
pobreza voluntaria, etc., e a obediencia a regras (monasticas)-
Belarmino, De Monachis, Cap.7.
A impiedade desta distin~ao e evidente.-
1°. Porque Cristo exige a consagrac;ao total de todos os
cristaos: depois de termos feito tudo, somos servos inuteis. As
obras de supererrogac;ao sao, pois, impossfveis.
2°. Todo culto semelhante e indevido e e uma abominac;ao
para Deus- Col. 2:18-23; 1 Tim. 4:3. ·

15. Que juizo se deve fazer das boas obras dos niio regenerados?
Os homens nao regenerados retem algumas disposic;6es e
alguns afetos relativamente bons em si e fazem muitas coisas
que em si sao boas e estao em harmonia com a letra da lei.
Todavia -
1°. Quanta asua pessoa, todo homem nao renovado esta
sob a ira e maldic;ao de Deus e, por conseguinte, nada pode
fazer que Lhe seja agradavel. 0 rebel de com armas nas maos e
rebelde em tudo, enquanto nao se submete a quem e seu
soberano legal.
2°. Amor a Deus e respeito por Sua autoridade nunca sao
o motivo supremo dos atos do homem nao regenerado. Assim
e que, posto que muitos dos seus atos sejam civilmente bons
com respeito a seus semelhantes, todavia nenhum deles pode
ser espiritualmente born com respeito a Deus. 0 pecador, antes
da justificac;ao e renovac;ao, e rebelde; cada urn dos seus atos e
ato de urn rebelde, ainda que, considerado em si, qualquer
dos atos possa ser born, indiferente ou mau.

16. Em que sentido as boas obras sao necessarias para a


salvafiio?
Como os frutos necessarios e invariaveis tanto da mudanc;a

732
A Santificafiio

de rela~ao operada na justifica~ao, como tam hem da mudan~a


de natureza operada na regenera~ao, mas nunca como o
fundamento merit6rio ou a condi~ao da nossa salva~ao.
Essa necessidade resulta:
1°. Da santidade de Deus; 2°. do Seu prop6sito eterno,
Ef. 1:4; 2: 10; 3°. do designio e da eficacia redentora da morte
de Cristo, Ef. 5:25-27; 4°. da uniao do crente com Cristo e da
energia do Seu Espirito morando nos cristaos,Joao 15:5; Gal.
5:22; 5°. da propria natureza da fe, que primeiro leva a amar e
en tao pratica obras por amor, Gal. 5:6; 6°. do mandamento de
Deus, 1 Tess. 4:6; 1 Ped. 1:15; 7°. da natureza do ceu, Apoc.
21:27.

17. Quale a teoria dos antinomistas a esse respeito?


Os antinomistas sao, como o seu nome indica, os que
negam que os cristaos tenham a obriga<;:ao de guardar a Lei.
Argumentam que, tendo Cristo cumprido, em nosso lugar,
tanto as partes preceptivas como as partes penais da lei de Deus,
segue-se que o Seu povo est<i livre da obriga~ao de guarda-la,
quer como regrade vida, quer como condi~ao de salva~ao. Veja
acima, Cap. 25, Perg. 3.
Eevidente que todas as teorias perfeccionistas que (como
as teorias pelagiana e de Oberlin), ensinam que a capacidade
do homem para obedecer ea medida da sua responsabilidade,
ou (como as teorias papal e arminiana), que Deus, por amor a
Cristo, em Sua gra<;:a, nao exige mais absoluta perfei<;:ao moral,
mas sim a fee a obediencia evangelica, sao teorias essencial-
mente antinomistas; porque todas concordam em ensinar que
os cristaos nesta vida nao tern mais a obriga<;:ao de cumprir a
lei adamica de absoluta perfei~ao moral.
Paulo, no capitulo 6 da Epistola aos Romanos, declara que
naquele tempo diziam que esta heresia condenavel era
conseqiiencia 16gica de sua doutrina. Ele, porem, nao s6 onega,
mas afirma que, ao contrario, a justifica<;:ao mediante uma
justi~a imputada, sem o merecimento de obras, e a (mica

733
Capitulo 35
condi~ao possivel em que o pecador pode aprender a produzir
boas obras como frutos do amor filial. 0 proprio fim que
Cristo teve em vista foi remir para Si urn povo peculiar, ze-
loso de boas obras, e isso Ele efetuou livrando-os do cativeiro
federal da Lei, a fim de tormi-los capazes de conformar-se
moralmente a ela, como libertos do Senhor, cada vez mais
nesta vida e absolutamente na vida que ha de vir.

· 18. Quais os diversos significados que tem sido dados ao termo


((merecimento "?
0 termo tern sido empregado tecnicamente em dois
srnti~silifrren~: ·
1°. Estritamente, para designar a qualidade com urn de
todos os servi~os a que se deve uma recompensa, ex-justitia,
por causa do seu valor e da sua dignidade intrinsecos.
2°. Impropriamente, foi empregado pelos chamados "Pais"
como equivalente daquilo que da como resultado uma recom-
pensa ou coisa conseqti.ente, sem especifica~ao do motivo ou
virtude por cuja causa se obtem - Turretino, Loc. 17, Ques. 5.

19. Que distinfiio a igreja cat6lica romana quer assin alar com
as expressoes ((merecimento de condignidade" e ((merecimento de
congruencia"?
Essa igreja ensina que "merecimento de condignidade"
s6 pertence a obras feitas depois da regenera~ao como auxilio
da gra~a divina, e que esse auxilio e aquele grau de mereci-
mento que intrinsecamente e por eqti.idade, e nao so mente por
causa de uma promessa ou alian~a, merece a recompensa que
recebe das maos de Deus. 0 "merecimento de congruencia",
ensinam OS romanistas, pertence as boas disposi~6es e as obras
que o homem, antes de sua regenera~ao, pode nutrir e praticar
sem auxilio da gra~a divina e que fazem com que seja
congruente com Deus ou especialmente conveniente que Ele
recompense o autor infundindo a gra~a em seu cora~ao.
E muito dificil determinar a posi~ao exata da igreja
734
A SantificafdO
catolica romana a respeito deste assunto, porque as diversas
escolas de seus teologos divergem muito e as decis6es do Con-
cilia de Trento sao de proposito ambiguas. Parece que a cren<;a
geral eque a capacidade de praticar boas obras tern sua origem
na gra<;a infundida no cora<;ao do pecador por am or de Cristo,
por meio dos sacramentos, mas que depois estas boas obras
merecem, isto e, colocam para nos uma base para exigirmos
com justi<;a a salva<;ao e a gloria. Alguns, entre eles Belarmino,
De]ustific., 5, 1 e 4, 7, dizem que este merecimento pertence
intrinsecamente as boas obras dos cristaos, bern como em
conseqiiencia das promessas divinas; outros dizem que estas
obras merecem a recompensa somente porque Deus prometeu
a recompensa sob a condi<;ao da pnitica de boas obras- Cone.
de Trento, Sess. 6, Cap. 16 e Cans. 24 e 32.

20. Que enecessaria para que uma obra seja merit6ria no conceito
verdadeiro deste termo?
Segundo Turretino, ha cinco condi<;6es necessarias para
esse fim. 1°. Que a obra nao seja devida, ou que a pessoa que a
pratica nao tenha a obriga<;ao de pratica-la- Luc. 17:10. 2°.
Que seja uma obra propriamente nossa, isto e, praticada por
nossas for<;as naturais. 3°. Que seja perfeita. 4°. Que seja igual
a recompensa merecida. 5°. Que a recompensa seja de justi<;a
devida a tal obra - Turretino, Loc.17, Ques. 5.
Conforme essa defini<_;ao, e claro que, em conseqiH~ncia
da absoluta dependencia e obriga<;ao da criatura, ela nunca
pode merecer recompensa alguma por qualquer obediencia
que possa pres tar aos mandamentos de seu Criador. 1°. Porque
toda a for<_;a com que 0 homem age lhe e dada gratuitamente
por Deus. 2°. To do o servi<_;o que ela possa pres tar, ja o deve a
Deus. 3°. N ada que ela possa fazer pode ser igual a recompensa
do favor de Deus e da bem-aventuran<_;a eterna.
N a alian<_;a das obras, Deus graciosamente prometeu
recompensar a obediencia de Adao com a vida eterna. Mas
essa recompensa nao foi por merecimento, e sim, da livre gra<_;a

735
Capitulo 35
e da promessa. Sob aquela constitui~ao, tudo dependia da
posi~ao que a pessoa ocupava diante de Deus. Enquanto Adao
permaneceu sem pecado, os seus servi~os foram acei tos e
recompensados segundo a promessa. Todavia, desde o momento
em que perdeu 0 direito acoisa prometida e perdeu a posi~ao
que ocupava diante de Deus, nenhuma obra sua, fosse qual
fosse o carater dela, podia merecer coisa alguma das maos de
Deus.

21. Como se pode provar que as nossas boas obras, mesmo


praticadas depois de termos sido restaurados ao favor de Deus pela
justificafiio, niio merecem a vida eterna? ·
1°. A justifica~ao tern por base os meritos ou merecimentos
infinitos de Cristo, e sobre esta base descansa o nosso direito
ao favor de Deus e a todas as suas infinitas conseqiiencias. Os
meritos de Cristo, sendo eles a base de tudo e abrangendo tudo,
excluem a possibilidade de n6s merecermos alguma coisa.
2°. A lei exige obediencia perfeita- Rom. 3:23; Gal. 5:3.
3°. Somos salvos pela gra~a, e nao por obras- Ef. 2:8,9.
4°. Todas as boas disposi~6es sao gra~as ou dons concedidos
por Deus -1 Cor. 15:10; Fil. 2:13; 1 Tess. 2:13.
5°. Dizem as Escrituras que a propria vida eterna e dom
de Deus - 1 Joao 5: 11.

22. Que ensinam as Escrituras a respeito das boas obras


praticadas pelos crentes e sabre as recompensas que lhes siio
prometidas?
Tanto a obra como a recompensa sao ramos da mesma raiz
benigna da gra~a . A alian<;a da gra<;a faz provisao tanto para a
infusao de gra<;a no cora<;ao como para o exerdcio dessa gra<;a
na vida e para as recompensas dessa gra<;a assim exercida. E
tudo de gra<;a, gra~a por gra<;a, gra<;a acrescentada a gra~a, e a
recompensa nose apresentada desta forma:
1°. Para que opere sobre n6s como motivo racional para
uma obediencia diligente.

736
A S antificar;iio
2°. Para assinalar que o dom da bem-aventuranc;a eterna e
urn ato de estrita justic;a legal (1) com respeito aos meritos ou
merecimentos perfeitos de Cristo, (2) com respeito a fidelidade
com que Deus ad ere as Suas pr6prias promessas livres- 1 Joao
1:9.
3°. Para indicar que a recompensa celestial, pela gras;a
divina, esta numa certa proporc;ao com a grac;a dada para a
obediencia na terra, (1) porqueDeus assim o quer, Mat. 16:27;
1 Cor. 3:8; (2) porque a gra<;a dada na terra prepara a alma
para receber a grac;a dada no ceu, 2 Cor. 4:17.

PODEM OS QUE CRimM EM CRISTO ALCAN<;AR


NESTA VIDA A SANTIFICA<;AO PERFEITA?

23. Em termos gerais, que i o perfeccionismo?


As diversas teorias sobre o perfeccionismo concordam
todas em sustentar que e possivel a urn filho de Deus neste
mundo tornar-se, 1°. perfeitamente livre do pecado, 2°.
conformado a lei debaixo da qual vivemos agora. Diferem
muito entre si, porem, 1°. quanta a definic;ao do pecado; 2°.
quanta a lei que temos a obriga<;ao de cumprir; 3°. quanta aos
meios pelos quais se poderia alcanc;ar a perfeic;ao, se e pela
natureza ou pela grac;a.

24. Como i que a teoria pelagiana quanta anatureza do homem


e da grar;a conduz ao perfeccionismo?
Os pelagianos afirmam:
1°. Quanta a natureza do homem, que ela nao ficou
radicalmente corrompida pela Queda, e que todos os homens
possuem o poder de cumprir todos os deveres exigidos deles,
pelo motivo de que Deus nao pode com justi~a exigir nada
que 0 homem nao tenha pleno poder de fazer.
2°. Quanta a grac;a de Deus, que esta nao e nada mais que
a constituic;ao favoravel de nosso espirito, a influencia da
verdade que Ele nos revelou, e as circunstfmcias propicias em

137
Capitulo 35
que Ele nos colocou. Assim, na lgreja Crista, e de posse da
revela~ao crista, os homens acham-se de fato colocados nas
circunstancias mais propicias para serem persuadidos a
cumprirem os seus deveres. Desse sistema segue-se direta-
mente que todo aquele que quiser podera com certeza alcan~ar
a perfei~ao, se usar com o devido cuidado as suas for~as ou
faculdades naturais e as vantagens da sua posi~ao- Wigger's
Hist., View ofAugustinianism andPelagianism.

25. Quale, segundo a teoria pelagiana, a natureza do pecado


do qual o homem pode livrar-se perfeitamente; qual a lei que o homem
pode cumprir perfeitamente; e quais os meios pelos q~ais se pode
alcanfar essa perfeifiio?
Eles negam a corrup~ao original e inerente da natureza
do homem e sustentam que pecado e somente alguma trans-
gressao voluntaria de uma lei conhecida, e que dis so qualquer
homem pode abster-se, se quiser.
Quanto a lei que 0 homem pode cumprir perfeitamente
em seu estado atual, eles afirmam que ela e a (mica e original
lei de Deus, de cujas exigencias, porem, a capacidade de cada
homem e as oportunidades tidas para adquirir conhecimento,
sao a medida.
Quanto aos meios pelos quais afirmam eles que o homem
pode alcan<5ar esta perfei<5ao, sustentam a capacidade plenaria
da vontade natural do homem para cumprir todas as suas
obriga<56es, e admitem o auxilio da gra<5a de Deus s6 no sentido
de ser ela a influencia da verdade e de outras circunstancias
propicias persuadindo o homem a empregar as suas pr6prias
for<5as. Assim, pois, os meios pelos quais se pode alcan<5ar a
santifica<5ao perfeita sao, 1°. a vontade do homem; 2°. ajudada
pelo estudo da Biblia, pela atitude de evitar prudentemente as
tenta~6es, etc.

26. Em que sentido os cat6licos romanos sustentam a doutrina


da perfeifiiO?

738
A Santificafao
As decis6es do Condlio de Trento sobre este assunto, assim
como sobre todos os pontos crfticos, sao deprop6sito ambiguas.
Elas enunciam o prindpio de que a guarda da Lei deve ser
possivel aqueles a quem a Lei obriga, porque Deus nao manda
fazer impossibilidades. Os justificados (santificados) podem,
pela gra<;a de Deus habitando neles, satisfazer alei divina,pro
hujus vitce statu, isto e, pela gra~a de Deus ajustada, por amor
de Cristo, as nossas capacidades atuais. Mas ao mesmo tempo
confessam que os justos podem todos os dias cair em pecados
veniais e que, enquanto estamos na carne, ninguem pode viver
inteiramente sem pecado (salvo por especial privilegio conce-
dido por Deus); e, todavia, que os renovados podem nesta vida
guardar perfeitamente a Lei divina; e observando os conselhos
evangelicos, podem ate fazer mais do que Deus manda e, dessa
maneira, entesourar, como o fizeram muitos santos, urn fundo
de merecimento supererrogat6rio -Cone. de Trento, Sess. 6. Cf.
Caps. 11 e 16, e Cans. 18,23 e 32. Veja acima, Perg. 14.

27. Em que sentido sustentam os romanistas que os renovados


podem nesta vida viver sem pecado; em que sentido podem satisfazer
plenamente alei; e pelo usa de que meios se pode alcanfar, segundo
o seu ensino, esta perfeifiio?
Quanta ao pecado, eles sus ten tam a distin~ao entre pecados
mortais e veniais, e que a concupiscencia que ainda resta no
cora~ao dos renovados, como resul tado do pecado original e o
que alimenta o pecado atual, nao e pecado em si mesmo, por
consistir este s6 no consentimento da vontade aos impulsos da
concupiscencia. De conformidade com essas teorias, eles
sustentam que o cristao pode nesta vida viver sem cometer
pecado mortal, porem que nunca pode estar livre dos movi-
mentos internos da concupiscencia, nem da possibilidade de
cair em pecados veniais por ignorancia, falta de aten~ao ou
paixao.
Quanta a lei a qual 0 crente pode satisfazer plenamente
nesta vida, eles sustentam que, sen do Deus justo e nao podendo

739
Capitulo 35
exigir de n6s o que e impossivel, Sua Lei foi bondosamente
ajustada anossa capacidade presente, ajudada por Sua gra<;:a, e
que e essa Lei pro hujus vitce statu que podemos cumprir.
Quanta aos meios pelos quais se pode alcan<;:ar esta perfei<;:fw,
eles sus ten tam que a gra<;:a divina precede, acompanha e segue
a todas as nossas boas obras, e que esta gra<;:a devemos conseguir
por meio dos canais sacramentais e sacerdotais que Cristo
instituiu em Sua igreja, e especialmente por meio da ora<;:ao,
do jejum, das esmolas e da aquisi<;:ao de meritos supererroga-
t6rios, seguindo OS conselhos de Cristo quanto a castidade, a
obediencia e a pobreza voluntaria- Cone. de Trento, Sess. 14,
Cap. 5; Sess. 6, Caps. 11 e 12; Sess. 5, Can. 5; Cat. Rom., Parte
2, Cap. 2, Perg. 32; Parte 2, Cap. 6, Perg. 59; e Parte 3, Cap. 10,
Pergs. 5-10.

28. Em que forma as primeiros arminianos ensinaram essa


doutrina?
Arminio declarou que estava ern duvida a respeito deste
assunto- Writings ofArminius, tradu<;:ao de Nichols, Vol. 1, pag.
256. Seus sucessores imediatos na chefia teol6gica do partido
remonstrante desenvolveram uma teoria de perfeccionismo
aparentemente identica aque foi depois ensinada por Wesley
e professada por seus discipulos. "0 homem pode, ajudado
pela gra<;:a divina, guardar perfeitamente todos os mandamentos
de Deus, segundo o evangelho ou a alian<;:a da gra<;:a. A maior
perfei<;:ao evangelica (porque nao estamos ensinando uma
perfei<;:ao legal, que inclui inteira isen<;:ao do pecado em todos
os aspectos e no mais alto grau, e exclui toda imperfei<;:ao e
fraqueza, pois isto cremos ser impossivel), abrange duas coisas,
1a. uma perfei<;:ao que esta na propor<;:ao das for<;:as de cada
individuo; 23 • urn desejo de fazer cada vez mais progresso e
de crescer cada vez mais em for<;:as" - Episcopius, citado pelo
Dr. G. Peck, em Christian Perfection, pags. 135 e 136.

740
A Santificar;iio
29. Qual a doutrina wesleyana sabre este assunto?
1°. Que, posto que todo crente seja regenerado logo que e
justificado, e de os passos iniciais na santificac;ao, todavia is so
nao exclui os restos de muito pecado inerente, nem o combate
da carne contra o Espirito, que pode continuar durante longo
tempo, mas que nao pode deixar de cessar algum tempo antes
do homem estar preparado para 0 ceu.
2°. Este estado de santificac;ao progressiva nao e de persia
perfeic;ao, que e propriarnente chamada "santificac;ao inteira"
ou "perfeita". Desta e necessaria que, mais cedo ou mais tarde,
cada herdeiro da gloria tenha experiencia, e, posto que a maioria
nao a alcance muito tempo antes da morte, todavia alguns a
alcanc;am em plena vida e, por isso, e dever e privilegio de
todos procura-la e esperar que a alcancem agora.
3°. Este estado de perfeic;ao evangelica nao consiste na
capacidade de guardar perfeitamente a Lei original e absoluta
de santidade sob a qual Adao foi criado, nem exclui toda a
possibilidade de errar, de estar sujeito as enfermidades (ou
fraquezas) da carne e do temperamento natural, porem exclui,
sim, toda disposic;ao in tern a de ceder ao pecado, bern como a
comissao externa dele, porque ela consiste num estado em que
uma fe perfeita em Cristo e urn amor perfeito a Deus enchem
a alma inteira e governam a vida toda, e cumprem assim todas
as exigencias da "lei de Cristo", a (mica sob a qual o cristao
passa a sua provac;ao.

30. Em que sentido os wesleyanos ensinam que os homens


podem viver sem pecado?
Nao foi Wesley quem pessoalmente fez o emprego da frase
"perfeic;ao sem pecado", mas tambem nao fez objec;ao ao seu
emprego. Ele distinguia entre "o pecado propriamente assim
chamado, isto e, uma transgressao voluntaria de uma lei
conhecida, eo pecado impropriamente assim chamado, is to e,
uma transgressao involuntaria de uma lei, quer conhecida quer
nao", e declarou: "Creio que nesta vida nao ha perfeic;ao tal

741
Capitulo 35 I
que exclua estas transgress6es involuntarias, que me parecem ~
ser conseqiiencias naturais da ignorancia e dos erros inse-
paraveis da mortalidade". Declarou tambem que a obediencia ,
do cristao perfeito "nao pode suportar o rigor da justi~a de
Deus, mas precisa do sangue expiador", e, por conseguinte, os
mais perfeitos "tern sempre motivo para dizer: "Perdoa-nos os
nossos pecados"; eo Dr. Peck afirma que "quanto mais santos
sao os homens, tanto mais se detestam e se aborrecem a si
mesmos". Mas, por outro lado, eles sustentam que o cristao
pode nesta vida chegar a urn estado de amor perfeito e cons-
tame, o que cumpre perfeitamente todas as exigencias da
alian~a evangelica. Viola~6es da lei original e absoluta de
Deus nao sao imputadas ao crente como pecados, por haver
Cristo sido feito em seu favor o fim dessa lei para justi~a, e
ele foi libertado dessa lei por amor de Deus e foi feito sujeito
a "lei de Cristo", e, pecado, para o cristao, e s6 aquilo que e
viola~ao desta lei do amor. Veja o tratado de Wesley sobre
Christian Perfection (A Perfei~ao Crista), na obra sobreMethodist
Doctrinal Tracts (Tratados Doutrinarios Metodistas), pags. 294,
310,312, e a obra do Dr. Peck intitulada The Christian Doctrine
of Perfection (A Doutrina Crista da Perfei~ao ), pag. 204.

31. A que lei, como eles dizem, o cristiio pode obedecer


perfeitamente nesta vida?
0 Dr. Peck diz, na pagina 244, de sua citada obra: "A huma-
nidade decaida, ainda quando renovada pela grac;:a, perfeita
obediencia a lei moral e impraticavel durante 0 estado atual
de provac;:ao. Segue-se que a perfeic;:ao crista nao implica em
obediencia perfeita alei moral".
Eles sustentam que esta lei morale universal e imutavel,
que todas as criaturas morais estao com obrigac;:ao perpetua de
cumpri-la e que de modo algum ficam livres dessa obrigac;:ao
por terem perdido as forc;:as por causa do pecado. Peck, pag.
271. Esta lei, porem, tern dupla relac;:ao com a criatura. 1°. E
uma regrade carater e de procedimento. 2°. E uma condic;:ao

742
A Santificafiio
para sermos aceitos. Em conseqi.iencia do pecado, tornou-se
impossivel aos homens obterem a salva~ao pela Lei, e, por
isso, Cristo veio e ofereceu a essa lei em nosso lugar uma
satisfa~ao perfeita, e assim Ele e, em nosso favor, o fim da Lei
para justi~a. Esta Lei, pois, posto que permane~a para sempre
como regra de dever, foi ab-rogada por Cristo como condi<;ao
da nossa aceita~ao.
"N em e hom em vivo algum obrigado a guardar a lei
adamica mais que a mosaica (quero dizer que ela nao e a
condi<;ao quer da salva<;ao presente quer da futura)." -Doctrinal
Tracts (Tratados Doutrinarios), pag. 332.
"0 evangelho, que e a lei do amor, 'a lei da liberdade',
oferece a salva<;ao sob outros termos e ao mesmo tempo prove
a vindica<;ao da lei quebrada. A condi~ao da justifica<;ao e, a
principio,somente afi, e a condi<;ao da aceita<;ao permanente e
a fi agindo pelo amor. Ha diversos graus de fee tambern de
amor... Fe perfeita e amor perfeito sao a perfei<;ao crista."
"0 carater cristao envolve o perfeito cumprimento dessas
condi<;oes, e mais nada."

32. Segundo o ensino wesleyano, par que meio se pode alcanfar


essa perfeifiio?
Wesley diz: "Creio que esta perfei<;ao e sempre operada
na alma por urn simples ato de fe; por conseguinte, num
instante. Entretanto, creio tambem que ha uma obra realizada
gradativamente, tanto antes como depois desse instante" -
Citado pelo Dr. Peck, op. cit., pags. 47 e 48.
Os wesleyanos sustentam que essa santifica<;ao nao pode
ser efetuada nem pelas for<;as nem pelos merecimentos do
homem, mas unicamente pela gra<;a, por amor de Cristo, pelo
Espirito Santo, mediante a fe no Senhor Jesus Cristo, fe que
inclui crermos, 1°. "na suficiencia das provisoes do evangelho
para livrar a alma completamente do pecado". 2°. "Que essas
provisoes foram feitas para nos"; 3°. "Que essa ben<;ao epara
nos agora"- Peck, Chr. Doct., Sanct., pags. 405-407.

743
Capitulo 35
33. Quale a doutrina oberlinense da santijiCafiiO?
"Eo plena e perfeito cumprimento do nosso clever inteiro,
de todas as nossas obrigac;6es para com Deus e para com todos
OS outros Seres. E obediencia perfeita a lei moral." Esta e a lei
original e universal de Deus, a qual, porem, nao devido agrac;a
e sim simplesmente devido a justic;a, sempre ajusta as suas
exigencias a medida da capacidade presente dos que estao
debaixo dela. A lei de Deus nao pode com justic;a exigir agora
que amemos a Deus tanto como 0 poderiamos amar se
tivessemos sempre empregado bern o nosso tempo, etc. Con-
tudo, o cristao pode agora alcanc;ar urn estado de "benevolencia
perfeita e nao interesseira"; pode ser, "segundo 0 seu conhe-
cimento, tao reto como Deus o e"; e pode estar "conformado
perfeitamente a vontade de Deus igualmente como o esta a
vontade dos habitantes do ceu". E isso, Finney parece ensinar,
e essencial ate nos primeiros passos da experiencia crista. Em
suma, tudo parece ser que Deus tern o direito de exigir somente
aquila que temos o poder de fazer; e dai se segue, pois, que
temos o plena poder de fazer tudo o que Deus exige, e, por
isso, podemos estar conformados tao perfeitamente avontade
de Deus a nosso respeito como seres celestais o estao a seu J
respeito. Pres. Mahan, Scripture Doctrines ofChristian Perfection, I
(Doutrinas Biblicas sabre a Perfeic;ao Crista), e Finney, Oberlin
Evangelist (0 Evangelista de Oberlin), Vol4, N°. 19, e Vol. 4,
N°. 15. Citado pelo Dr. Peck.
!
34. Quais os pontos de ac01·do e de desacordo entre as teorias J
pelagiana, cat6lico-romana, arminiana e oberlinense? j
1°. Todas concordam em sustentar que e possivel aos 1
homens chegarem nesta vida a urn estado em que podem l
habitual e perfeitamente cumprir todas as suas obrigac;6es, isto
e, ser e fazer tudo o que Deus exige que sejam ou fac;am agora.
2°. A teo ria pelagiana difere de todas a outras em negar a
deteriorac;ao das nossas forc;as marais naturais, e, por con-
seguinte, em negar a necessidade da intervenc;ao de qualquer

744
A Santificafiio
gra~a sobrenatural, a fim de tornar os homens perfeitos. ·
3°. As teorias pelagiana e oberlinense concordam em tomar
como padrao a original lei moral de Deus. Os te6logos ober-
linenses, porem, enquanto admitem que as nossas for~as estao
deterioradas por causa do pecado, sustentam que a lei de Deus,
como materia de simples justi~a, ajusta as suas exigencias as
for~as presentes dos que estao debaixo dela. A teoria cat6lico-
-romana toma a mesma Lei como padrao de perfei~ao, mas
difere da teoria pelagiana em sustentar que as exigencias dessa
Lei foram ajustadas as for~as deterioradas dos homens, e da
teoria oberlinense difere em sustentar que a acomoda~ao as
for~as enfraquecidas do homem nao foi questao de simples
justi~a, mas decorre da gra~a, por amor dos meritos de Cristo.
A teoria arminiana difere de todas as outras em negar que
a Lei original seja o padrao da perfei~ao evangelica, e em
sustentar que, tendo sido cumprido essa Lei por Cristo, o
cristao tern agora somente a obriga~ao de cumprir as exigencias
da alian~a evangelica da gra~a. Isso, porem, parece diferir
mais em forma do que em essencia da teoria romanista a
respeito disso.
4°. As teorias cat6lico-romana e arminiana concordam-
(1) Em admitir que o cristao perfeito ainda esta sujeito ao perigo
de transgredir as provisoes da lei moral original e que esta
sujeito a erros e fraquezas. 0 cat6lico romano chama-os pecados
veniais; o arminiano, erros e fraquezas. (2) Em referir toda a
obra de tornar OS homens perfeitos a efi.cacia do Espirito Santo,
que e dado por amor de Cristo. Mas, por outro lado, diferem,
(1) quanto a natureza da fe pela qual e efetuada a santifica~ao,
e (2) quanto ao merito das boas obras.

35. Com quais argumentos os perfeccionistas sustentam sua


teoria, e como se lhes pode dar resposta?
1°. Os argumentos apresentados a favor da teoria de que e
possivel conseguir esta perfei~ao nesta vida sao: (1) Os manda-
mentos de Deus, que nunca mandaria fazer impossibilidades

745
Capitulo 35
- Mat. 5:48. (2) 0 fato de que no evangelho foram feitas
abundantes provisoes para se conseguir a santificac;;ao perfeita
do povo de Deus; fez-se, com efeito, tudo o que se poderia
fazer neste sentido em qualquer tempo. (3) As promessas que
Deus fez de remir Israel de todas as suas iniqiiidades, etc. -
Sal. 130:8; Ez. 36:25-29; 1 Joao 1:7,9. (4) As orac;;6es dos santos
registradas nas Escrituras com aprovac;;ao implicita- Sal. 51 :2;
Heb. 13:21.
2°. Os argumentos no senti do de que esta perfei~ao foi de
fato alcanc;;ada sao: (1) Exemplos biblicos, como Davi- Atos
13:22. Veja tambem Gen. 6:9; J61:1; Luc. 1:6. (2) Exemplos
modernos- Peck, Christian Perfection, pags. 365-396.
RESPONDEMOS:
1°. As Escrituras nunca dizem que urn cristao pode nesta
vida alcan~ar urn estado em que possa viver sem pecado.
2°. E preciso interpretar o sentido de passagens especiais
de conformidade como testemunho global das Escrituras.
3°. A linguagem das Escritunis nunca implica que o
homem possa viver aqui sem pecado. Os mandamentos de
Deus estao ajustados a nossa responsabilidade, e as aspira~6es
e ora~6es dos san tos remetem o hom em a seus deveres e
privilegios, e nao a sua capacidade atual. A perfei~ao eo verda-
deiro alvo dos esfor~os do cristao em todos os periodos do seu
crescimento e em todos os seus atos. Os termos "perfeito" e
"irrepreensivel" muitas vezes sao relativos, ou sao empregados
para significar simples sinceridade ou verdade. Isso se torna
evidente pelo seguinte fato registrado:
4°. Todos OS homens perfeitos, segundo as Escrituras, as
vezes pecavam; disso dao testemunho as hist6rias de Noe, J6,
Davie Paulo. Compare o lei tor Gen. 6:9 com Gen. 9:21; J6 1:1
comJ6 3:1 e9:20. Veja tambem Gal. 2:11,14; Sal.l9:13; Rom.,
capitulo 7; Gal. 5:17; Fil. 3:12-14.

36. Que objef6es especiais pode-se fazer contra a teoria pela-


giana da perfeifiio?

746
A Santificafiio
Essa teoria faz parte de urn sistema inteiramente anti-
cristao. Seus elementos constituintes sao a negac;ao do
testemunho biblico a respeito do pecado original e da obra do
Espirito Santo na vocac;ao eficaz, e a assen;ao do poder do
homem de salvar-se a si mesmo. Envolve uma teoria fraca a
respeito da culpa e da torpeza do pecado, e da extensao,
espiritualidade e imutabilidade da santa lei de Deus. Ea unica
teoria da perfeic;ao perfeitamente coerente em todos os tempos,
e, na mesma proporc;ao, e a mais anticrista.

37. Que objefoes especiais pode-se fazer contra a teoria cat6lico-


-romana?
Essa teoria esta em desarmonia ...
1°. Com a verdadeira natureza do pecado. Nega que a
concupiscencia seja pecado e afirma que s6 sao pecados os atos
propositais da vontade que dao assentimento aos impulsos da
concupiscencia. Faz distin<;ao entre pecados mortais e veniais.
A verdade e que todos OS pecados sao mortais, e que a
concupiscencia, "o pecado que habita em mim", e da propria
essencia do pecado- Rom. 7:8-23.
2°. Esta em desarmonia com a natureza da santa lei de
Deus, que e essencialmente imutavel e cujas exigencias nunca
foram rebaixadas para acomodac;ao as faculdades enfraquecidas
dos homens.
3°. Ewi em ligac;ao essencial com a teoria do merito das
boas obras e do merito superior das obras de supererroga<;ao, o
que e radicalmente destrutivo as doutrinas essenciais do
evangelho.

38. Que ob}efoes especiais pode-se fazer contra a teoria


oberlinense?
Essa teoria parece assemelhar-se mais que as outras a
terrivel regularidade 16gica e ao espirito anticristao da teoria
pelagiana. Difere, porem, dessa heresia em sustentar-
1°. Que a lei de Deus foi acomodada, como materia de

747
Capitulo35
!

simples justi~a, as faculdades debilitadas dos homens. ~


2°. Que aquelas coisas que, julgadas pela lei original de
Deus, seriam faltas da parte dos homens, nao sao pecados,
porque a capacidade do homem e a (mica medida do seu clever. 1
3°. Que o principio desta perfei~ao consiste na "benevo- ·
lencia perfeita e nao interesseira". Em todos estes aspectos essa
teo ria tambem esta em desarmonia com a verdadeira natureza
da lei de Deus, do pecado e da virtude.

39. Que objefi5es pode-se fazer contra a teoria arminiana? J


Essa teoria, como a apresentam os escritores wesleyanos ~
mais autorizados, esta em muito menor desarmonia com os
prindpios e o espfrito do cristianismo do que qualquer das ~
outras, e, por isso, na mesma propor~ao e menos coerente
consigo mesma como teoria, e e menos exata no uso que faz de
linguagem tecnica. Esses irmaos cristaos merecem ser hon-
rados por suas ideias elevadas e pelo zelo com que insistem no
clever dos homens de irem sempre avante ate alcan~arem os
mais ricos de todos os dons espirituais, e, ao mesmo tempo,
sera sempre motivo de lastima que o seu grande fundador
tenha sido tao desviado pelos preconceitos de urn sistema que
chegou a ligar em alian~a antinatural muita verdade preciosa
a uma teoria e a uma terminologia singularmente pr6prias de
erros radicais. Direi, pois, aqui, uma vez por todas, em termos
gerais, que, quando exponho a doutrina arminiana sobre
qualquer ponto, tenho preferido em geral faze-lo na forma
em que a doutrina foi definida explicitamente pelos remons-
trantes holandeses, a faze-lo na forma modificada e, segundo
me parece, menos logicamente definida, em que ela se acha
exposta nas obras das autoridades das igrejas wesleyanas,
cujos componentes se chamam propriamente "arminianos
evangelicos". A peculiar falta de exatidao te6rica que obscurece
as suas defini~6es, especialmente as que dizem respeito a
justifica~ao e a santifica~ao, eu atribuo ao espfrito de urn
cristianismo ardente, ativo e cheio de amor em verdadeira

748
A Santificafiio
luta com as falsas premissas da filosofia arminiana. ':">l''l ,.,.

CONSIDEREMOS: :-,~i'i' · :, ,
1°. Conquanto insistam e tornem a insistir na distin~ao
de estar a lei original de Deus numa rela~ao dupla com os
homens (1) como uma regra de carater e de conduta, e (2)
como uma condi~ao de alcan~arem o favor de Deus, sua teoria
inteira esta baseada numa confusao logica dessas duas coisas
tao distintas. 0 Dr. Peck ensina com solicitude, e confirma
com muitos testemunhos wesleyanos, excelente doutrina
calvinista quanto aos seguintes pontos: a lei original de Deus
e universal e imutavel, e suas exigencias nunca podem ser
alteradas nem comprometidas. A obediencia a esta Lei foi a
condi~ao da alian~a original das obras. Esta condi~ao foi violada
por Adao, mas foi cumprida perfeitamente a nosso favor por
Cristo, e assim foi conservada a inteireza da lei imutavel de
Deus. Por isso, continua ele a argumentar, o crente nao esta
mais debaixo da Lei, mas sim debaixo da alian~a da gra~a,
isto e, para servir-nos do parentese qualificador ou restritivo
do proprio Wesley, "como a condi~ao da salva~ao presente ou
futura". Com certeza, respondemos nos, Cristo nos eo fim da
Lei para justi~a em seu senti do forense, is to e, para alcan~ar a
nossa justifica~ao, porem e certo que Cristo nao satisfez em
nosso lugar aquela Lei imutavel em sentido tal que ela nao
seja mais para n6s a regra de vida, e a qual nao seja mais nos so
clever conformar-nos pessoalmente. A questao da perfei~ao e
questao que diz respeito ao nosso carater pessoal e nao as nossas
rela~6es: e morale inerente, e nao forense. Provar, pois, que a
lei original de Deus, sob a alian<;;a do evangelho, nao e mais a
condifiio da nossa salva~ao, o que n6s tambem nos regozijamos
em crer, nao serve de nada absolutamente para provar que
Deus, estando n6s debaixo do evangelho, exige somente uma
obediencia ajustada a urn padrao mais facil do que o anterior.
2°. Essa teoria faz parte da teoria arminiana da alian~a da
gra~a, que julgamos estar em grande desarmonia com o
evangelho e que Watson (vejalnstitutes, Parte 1, Cap.23) parece

749
Cap£tulo35
procurar evitar, recusando-se ao mesmo tempo a admitir a
imputa~ao da justi~a de Cristo ao crente. Diz essa teoria que,
tendo Cristo cumprido a lei original de Deus, por Sua
propicia~ao, e agora compative1 com a justi~a divina apre-
sentar-nos a salva~ao sob condi~6es mais Hiceis, que se resumem
na obediencia evangelica, nao exigindo a perfei~ao crista mais
do que o cumprimento perfeito destas novas condi~6es
benevolas. Ora, essa teoria, alem de confundir as ideias de lei e
alian~a, de regra e condi~ao, de fundamento da justifica~ao e
padrao de justifica~ao, e incompativel com os ensinos gerais
do evangelho a respeito da justi~a de Cristo e do oficio da fe na
justifica~ao. Torna os meritos de Cristo, de urn modo incerto e
distante, em simples ocasiiio da nossa sa1va~ao, e torna a fee a
obediencia evangelica, em vez de obediencia perfeita sob a
alian~a antiga, no fundamento, em vez de simples meio e fruto
da nossa justifica~ao. Desenvolvida logicamente, essa teoria
nao pode deixar de levar adoutrina cat6lico-romana do merito
das boas obras.
3°. Essa teoria nega que os erros e fraquezas, que resultam
dos efeitos do pecado original, sejam em si mesmos pecados, e
ao mesmo tempo admite que devem ser confessados, que se
deve pedir perdao deles, que e necessaria que lhes seja aplicada
a propicia~ao do sangue de Cristo e que, quanto mais santo se
torna urn homem, tanto mais ele aborrece o seu estado interior.
Isso de certo e uma confusao de linguagem e urn abuso da
palavra pecado. Que sera pecado senao (1) uma transgressao
da lei original de Deus, (2) que precisa da propicia~ao de Cristo,
(3) que deve ser confessada e precisa de perdao, (4) e e urn
motivo proprio para o homem ter horror de si mesmo?

40. Com quais declaraf6es expressas das Escrituras esta em


contradifiio qualquer modificafiiO possfvel da teoria da perfeifiiO
crista?
1 Reis 8:46; Prov. 20:9; Eel. 7:20; Tia. 3:2; 1 Joao 1:8.

750
A Santificafiio
41. Como se pode provar que esta em oposifiio a experiencia
dos santos, como se acha registrada nas Escrituras?
Veja o que Paulo diz de si mesmo, Rom. 7: 14-25; Fil. 2:12-
14. Veja o caso de Davi, Sal. 19: 12; 51; ode Moises, Sal. 90:8;
ode Jo, 42:5,6; ode Daniel, 9:20. Veja Luc. 18:13; Gal. 1:11-
13; 6:1; Tia. 5:16.

42. Como esta ela em conjlito com a experiencia comum do


povo de Deus?
Quanto mais santo se torna urn homem, tanto mais ele se
torna humilde, mais renuncia a si proprio, mais sensivel se
torna a todo pecado, e tanto mais se apega a Cristo. Sente que
as imperfei~6es morais que ainda lhe aderem sao pecados,
lamenta-as e procura vence-las. Os crentes sabem que sua vida
eurn combate constante, que e so fazendo violencia que podem
arrebatar o rei no dos ceus, e que lhes e necessaria vigiar e orar
sempre. Estao sempre sujeitos as constantes corre~6es da mao
amorosa de seu Pai, as quais so podem visar corrigir suas
imperfei~6es e confirmar suas gra~as. E e fato notorio que os
melhores cristaos tern sido aqueles que se manifestaram menos
dispostos a dizer que tinham alcan~ado para si a perfei~ao.

43. Quais os legitimos efeitos praticos do perfeccionismo?


A tendencia de toda doutrina semelhante e necessaria-
mente rna, exceto ate onde for modificada ou retificada por
outras verdades mantidas em conexao com ela, e que a limitem
ou estejam em desarmonia com ela. Este e proeminentemente
o caso em rela~ao a teoria wesleyana, porque nela a fic~ao do
perfeccionismo se acha ligada a grande quantidade de
evangelho puro. Contudo, o perfeccionismo de per si nao pode
deixar de tender, 1°. a opini6es pouco dignas sobre a lei de
Deus; 2°. a opini6es inadequadas sobre a torpeza do pecado;
3°. a urn padrao baixo de excelencia moral; 4°. ao orgulho e ao
fanatismo espirituais.

751
Capitulo 35 ~
EXPOSI<;OES AUTORIZADAS DE DOUTRINAS
DE DIVERSAS IGREJAS

DOUTRINA ROMANA A RESPEITO DA PERFEI<:;:AO


MORAL DOS REGENERADOS, DAS BOAS OBRAS, E DAS
a
OBRAS DE SUPERERROGA<:;:A.O. Quanto sua teoria do
MERITO DAS BOAS OBRAS, veja acima, Cap. 33.
Cone. de Trento, Sess. 5, "Dec. do Pee. Original": "Se
alguem negar que a culpa do pecado original e perdoada
pela gra~a do nos so Senhor Jesus Cristo, conferida no
batismo; ou ate afirma que nao e extinguido tudo 0 que
tern verdadeira e propria condi~ao de pecado, mas diz que
apenas e raspada, ou que nao e imputada: seja anatema ...
Confessa, porem, este santo concilio que nos batizados
fica a concupisd!ncia ou incentivos (para o pecado )... Essa
concupiscencia, a que o ap6stolo algumas vezes chama
pecado, declara o sagrado concilio: que a igreja nunca
entendera, se lhe dava o nome de pecado, por que
verdadeira e propriamente seja pecado nos renascidos;
mas porque procede do pecado e inclina para o pecado.
Se, porem, alguem julgar o contrario, seja anatema".
Cone. de Trento, Sess. 5, Can. 18- "Se alguem disser que
ao homem justificado, e que se acha em estado de gra~a, e
impossivel observar os preceitos de Deus; seja anatema".
Belarmino, De Justif., 4: 10, segs. - "Se OS preceitos sao
impossiveis, nao obrigam a ninguem, e entao os preceitos
nao sao preceitos. Nem e possivel imaginar como e que
se peque naquilo que e impossivel evitar".
Id., De Monaehis, Cap.7: "Chamamos "conselhos de
perfei~ao" a uma obra declarada boa mas cuja pratica nao
e ordenada por Cristo; nao e prescrita, e sim recomendada.
Difere de urn preceito quanta a sua materia, assunto, forma
e finalidade. (1) A respeito da sua materia (a diferen~a) e
dupla. Primeiro, porque a materia do preceito e mais facil,
a do conselho mais dificil, porque aquele e derivado dos
principios da natureza, enquanto este, em certo sentido,
excede a natureza; e.g., a natureza inclina a pessoa para a
conserva~ao da fidelidade conjugal, porem nao para a

752
A SantificafiiO

abstenc;rao da relac;rao conjugal. Em segundo Iugar, a materia


do preceito e boa... porque o conselho inclui o preceito
que diz respeito a rnesma materia e acrescenta mais alguma
coisa alern do preceito. (2) Quanto ao assunto, os preceitos
diferem dos conselhos; porque os preceitos obrigam a
todos os homens em comum, e os conselhos nao os obri-
gam. (3) Quanto a sua forma, diferem, porque 0 preceito
obriga em virtude de sua obrigatoriedade inerente, en-
quanta o conselho obriga somente como consentimento
do homem. (4) A respeito de seus fins ou efeitos, eles dife-
rern, porque o preceito guardado tern uma recompensa, e
quando nao e guardado, uma penalidade; mas 0 conselho,
quando nao e guardado, nao sofre pena, mas quando e
guardado, tem rnaior recornpensa". Cap. 8: "E opiniao de
todos os cat6licos que ha muitos verdadeiros e pr6prios
conselhos evangelicos, mas especialrnente o celibato, a
pobreza e a obediencia (rnonastica), que Deus nern manda
a todos observar, nem sao coisas indiferentes, e sim agra-
daveis a Ele e por Ele recomendadas (Mat. 19:11-21; 1 Cor.
7:1-7).
DOUTRINA LUTERANA Apologia da Conf. de Augsburgo,
pag. 21: ''As Escrituras por inteiro e a lgreja toda declaram
que a Lei nao pode satisfazer-se (com coisa algurna do
poder do homem depois da Queda). Este cumprimento
imperfeito da Lei e aceito, nao por si mesmo, mas
unicarnente mediante a fe em Cristo. Doutro modo, a Lei
nos acusa sempre ... Nesta fraqueza sempre ha pecado que
pode ser lanc;rado ern nossa conta (para condenac;rao )".
Formula concordice, pag. 678: "A doutrina papal e
monastica, de que 0 homem, depois de regenerado, e
capaz de guardar perfeitarnente a lei de Deus nesta vida,
deve ser rejeitada".
lb. pag. 589: ''A nossa confissao e que as boas obras
se seguem certissima e indubitabilissimarnente a uma
fe verdadeira, como os frutos de urna arvore. Cremos
tambem que nao se deve, de modo algum, levar em
conta as boas obras, nao so quando se trata da
justificac;rao, porem ate quando estamos discutindo a

753
Capitulo 35

respeito da nossa vida eterna".


lb., pag. 700: "Porque nao sao boas obra~ aquelas que
qualquer pessoa invente com boa inten<;ao, ou que se fa<;am
segundo as tradi<;6es humanas; mas aquelas que Deus
mesmo tern prescrito e mandado em Sua propria Palavra.
Porque obras verdadeiramente boas nao podem ser
praticadas pelas for<;as naturais, porem somente quando
a pessoa esta reconciliada com Deus pela fe, esta renovada
pelo Espfrito e foi criada de novo para boas obras, em
Jesus Cristo".
DOUTRINA REFORMADA Catecismo de Heidelberg, Perg.
62: "N ossas melhores obras nesta vida sao tod~s imper-
feitas e estao manchadas pelo pecado".
Os Trinta e nove Artigos da lgreja da lnglaterra, Art. 12:
''Ainda que as boas obras, que sao o fruto da fe, e seguem
a justifica<;ao, nao possam expiar os nossos pecados, nem
suportar a severidade do jufzo de Deus; sao todavia agra-
daveis e aceitaveis a Deus, em Cristo, e brotam necessa-
riamente de uma verdadeira e viva fe; de modo que por
elas se pode conhecer a fe viva tao evidentemente como
uma arvore se conhece pelo fruto".
lb., Art. 14. - "Sera impiedade e arrogancia ensinar
que obras arbitrarias, que nao se acham compreendidas
nos mandamentos divinos, sao boas obras, chamadas obras
de supererroga~ao; porque por elas os homens declaram
que nao s6 rendem a Deus tudo aquila a que sao obrigados,
mas tambem que por amor dEle fazem mais do que aquilo
que, como rigoroso dever, lhes e exigido, apesar de Cristo
ter dito claramente: "Quando fizerdes tudo o que vos for
mandado, dizei: somas servos inuteis, porque fizemos
somente o que deviamos fazer"- Lucas 17:10.
Confissiio Helvetica Posterior, pag. 498: "Ensinamos que
Deus da uma recompensa ampla aos que praticam boas
obras. Contudo, nao atribuimos esta recompensa que o
Senhor da ao merecimento dos homens que a recebem,
mas sim a bondade, liberalidade e verdade de Deus, que a
promete e a concede; o qual, conquanto nao deva nada a
ninguem, todavia prometeu que dara recompensa aos

754
A Santificafiio

que 0 ado rem fielmente".


Confissiio de Fe, de Westminster, Cap. 16, § 4.- "Os que
alcan.;;am em sua obediencia o maior grau possivel nesta
vida, acham-se tao longe de poder fazer algo de
supererroga~ao e de fazer mais do que Deus requer, que
ainda lhes falta muito daquilo que em seu dever tern a
obrigas;ao de fazer". (Veja o capitulo inteiro.)
lb., Cap. 13, § 2: "Esta santificas;ao tern lugar no homem
todo, e, todavia, e imperfeita nesta vida; permanecem
ainda alguns restos da corrup~ao em toda parte, donde
nasce uma guerra continua e irreconciliavel, lutando a
carne contra o Espirito e o Espirito contra a carne".
lb., § 3:- "Nesta guerra, posto que as corrups;6es
remanescentes possam por algum tempo prevalecer,
todavia, mediante o suprimento continuo de for~as do
Espirito de Cristo, a parte regenerada vence; e assim os
santos crescem em gra.;;a, sendo aperfei.;;oados na santi-
dade e no tern or de Deus".

755
36
1
A Perseveran~a dos Santos

1. Que ea doutrina bib lie a quanta aperseveranfa dos santos?


"Os que Deus aceitou em Seu Bern-amado, eficazmente
chamados e santificados pelo Seu Espirito, nao podem cair do
estado de gra<;;:a, nem total nem finalmente; mas com toda a
certeza hao de perseverar nesse estado ate ao fim, e estarao.
eternamente salvos"- Confissiio de Fe, Cap.17, § 1; Cat. Maior,
Perg. 79.

2. Por quais argumentos se pode estabelecer a certeza da


perseveranfa final dos santos?
1°. As asser<;;:6es diretas das Escrituras- Joao 10:28,29;
Rom. 11 :29; Fil. 1:6; 1 Ped. 1:5.
2°. Esta certeza e inferencia necessaria das doutrinas
biblicas (1) da elei<;;:ao, Jer. 31 :3; Mat. 24:22-24; Atos 13:48;
Rom. 8:30; (2) da alian<;;:a da gra<;;:a, na qual o Pai deu o Seu
povo a Seu Filho como recompensa de Sua obediencia e de
Seus sofrimentos, Jer. 32:40; Joao 17:2-6; (3) da uniao dos
cristaos com Cristo, no aspecto federal, sendo Cristo o seu
Fiador, razao pel a qual eles nao pod em falhar (Rom. 8:1 ), e no
aspecto espiritual e vital, por cuja uniao eles permanecem nEle,
e necessariamente viverao porque Ele vive, Joao 14: 19; Rom.
8:38,39; Gal. 2:20; (4) da propicia<;;:ao, na qual Cristo cumpriu
todas as obriga<;;:6es que eles tinham para com a lei como alian<;;:a
de vida, e alcan<;;:ou para eles todas as ben<;;:aos prometidas na
alian<;;:a; se, pais, urn deles falhasse, o seguro fundamento de

756
Perseverenfa dos Santos
todos seria abalado, Sal. 53:6,11; Mat. 20:28; 1 Ped. 2:24; (5)
da justifica~ao, que declara cumpridas todas as condi~6es da
alian~a de vida, e coloca o justificado para sempre numa nova
rela~ao com Deus, de modo que ele nao pode cair sob conde-
na~ao, porque nao esta mais debaixo da lei mas sim debaixo
da grac;:a, Rom. 6.14; (6) da habitac;:ao do Espirito Santo nos
que comp6em o povo de Deus, (a) como selo assinalando que
pertencem a Deus, (b) como penh or ou primeira prestac;:ao da
redenc;:ao prometida, em penhor do cumprimento completo,
Joao 14:16; 2 Cor. 1:21,22; 5:5; Ef. 1:14; (7) da eficacia da
intercessao de Cristo- Joao 11 :42; 17: 11,15,20; Rom. 8:34.

3. Quale a doutrina cat6lico-romana sabre este ponto?


Cone. de Trento, Sess. vi, Can. 23: "Se alguem disser que o
homem, uma vez justificado, nao pode perder a grac;:a, e que
por isso aquele que cai e peca nunca fora verdadeiramente
justificado, seja anatema".- Veja abaixo, na apresentac;:ao da
doutrina cat6lico-romana, neste capitulo, suas ideias quanto
aos "pecados veniais".

4. Qual a doutrina arminiana sabre este ponto?


Faz parte inseparavel do seu sistema, dimanando neces-
sariamente das suas teorias sobre a eleic;:ao, o designio e os
efeitos da morte de Cristo, a grac;:a suficiente eo livre- arbftrio,
que os que foram uma vez justificados e regenerados, se se
descuidarem da grac;:a e entristecerem o Espirito Santo, podem
cair em pecados que nao condizem com a verdadeira fe
justificadora e, permanecendo e morrendo neles, podem por
isso cair definitivamente na condenac;:ao - Confissiio dos
Remonstrantes, xi, 7. Os luteranos e os arminianos concordam
neste ponto. Uns e outros creem que os "eleitos" (os que Deus
escolheu para a vida eterna porque previra com certeza a sua
perseveranc;:a na fe e na obediencia ate ao fim) nao podem
apostatar definitivamente. A verdadeira questao entre eles e
OS calvinistas niio e, pois, Se OS "eleitos" podem apostatar

757
Capitulo 36 l
finalmente e perecer, masse os "verdadeiramente regenerados
e justificados" o podem. ~

5. Qual a objefiio que, baseada no livre-arbitrio do homem,


se faz contra a doutrina ortodoxa?
Os que negam a certeza da perseveran<;;a final dos santos
sustentam a falsa teoria segundo a qual o livre-arbitrio consiste
na indiferen<;;a, ou na faculdade de se poder escolher o contrario,
e que, por conseguinte, certeza e incompativel com a liberdade.
Essa falacia ja foi refutada acima, Cap.l5; veja especialmente
as Pergs. 25 e 26.
Que Deus dirige as a<;;6es livres de Suas criaturas e urn
fato provado claramente pela hist6ria, pelas profecias e pela
consciencia e experiencia crista universal, e pelas Escrituras-
Atos 2:23; Ef. 1:11; Fil. 2:13; Prov. 21:1.
E claro tambem que Deus assegura a perseveran<;;a final
de Seu povo de urn modo perfeitamente compativel com a sua
liberdade. Ele muda os afetos do Seu povo e determina assim
a sua vontade mediante a sua propria livre espontaneidade.
Ele os introduz no estado de filhos pela ado<;;ao, cerca-os de
todos os meios santificadores, e quando caem em pecado
castiga-os zelosamente e os restaura. Ve-se, pois, que a doutrina
biblica niio e que o hom em que uma vez creu verdadeiramente
tern segura a salva<;;ao, sejam quais forem os seus sentimentos
e os seus atos subseqiientes; mas, ao contrario, e que Deus
garante a salva<;;ao final de todos os que foram uma vez
verdadeiramente unidos a Seu Filho pela fe, assegurando, pelo
poder do Espirito Santo, a sua perseveran<;;a, perfeitamente
livre, nos sentimentos e obediencia cristaos ate ao fim.

6. Qual a objefiio que, baseada em sua hipotetica influencia


imoral, se faz contra a doutrina ortodoxa?
A obje<;;ao feita e que esta doutrina de "uma vez na gra<;;a,
sempre na gra<;;a", s6 pode ter como resultado natural tornar os
homens descuidados, produzindo neles urn falso sentimento

758
Perseverenfa dos Santos
de que se acham seguros em sua posi~ao atual, e de confiarem
em que Deus osha de salvar afinal, independentemente dos
seus pr6prios esfor~os.
Posto que seja certo que, da parte de Deus, se somos eleitos
e fomos chamados, seremos salvos, sao todavia necessarias, da
nossa parte, vigilancia, diligencia e ora~ao constantes, para que
se torn em firmes para n6s essa elei~ao e voca~ao- 2 Ped. 1:10.
0 fato de que Deus age poderosamente conosco e assim nos
assegura a vit6ria em nossa Iuta contra o pecado e apresentado
nas Escrituras como motivo poderoso, nao para que sejamos
pregui<;:osos, e sim diligentes- Fil. 2:13. A doutrina ortodoxa
nao afirma a certeza da salva~ao daqueles que uma vez creram,
e sim a perseveran<;:a na santidade dos que creram ou creem
verdadeiramente; e esta perseveran~a na santidade, pois, em
oposi~ao a todas as suas fraquezas e tenta~6es, que e a (mica
prova certa da verdade da experiencia crista passada do crente,
e da validade da sua confian~a a respeito da sua salva~ao futura,
e por certo o fa to de termos uma certeza como esta nao pode de
modo algum promover nem o descuido nem a imoralidade.

7. Qual a objefiio fundada nas exortafoes dirigidas nas Escrituras


aos crentes para que sejam diligentes; e nos avisos de que estarao
em perigo se se tornarem descuidados?
A obje<;:ao alegada e que as exorta<;:6es e os avisos neces-
sariamente envolvem a contingencia da salva~ao do crente, de
ter ela como condi<;:ao sua fidelidade permanente, e que, por
conseguinte, elas envolvem tambem a possibilidade de sua
apostasia.
RESPONDEMOS-
1°. A palavra externa fala necessariamente do mesmo
modo a todos, dirigindo-se a eles nas classes a que julgam
pertencer; e como muitos dos que se professam cristaos, ou
"os que creem estar em pe", enganam-se a si mesmos, essa
palavra externa envolve necessariamente a diminuta segu-
ran<;:a da sua posi~ao (ate onde e dado aos homens julgarem),

759
Capitulo 36
e a possibilidade de cairem.
2°. Deus garante a perseveranc;a na san tidade de Seu
verdadeiro povo pelo emprego de meios adaptados a sua
natureza como criaturas racionais, morais e livres. Vistos em
si mesmos, sao sempre, como Deus lhes diz, instaveis, e por
isso Ele os exorta a que se apeguem com diligencia aSua grac;a.
E tambem sempre verdade que, se apostatarem, estarao
perdidos; mas e por meio, em parte, de tais ameac;as que o
Espirito de Deus, por Sua gra~a, os preserva, impedindo-lhes
a apostasia.

8. Quais os principais textos em que os opositores se ap6iam


para refutar os argumentos dos ortodoxos sabre este assunto?
Ez.l8:24; Mat. 13:20,21; 2 Ped. 2:20,21; e especialmente
Heb. 6:4-6 e 10:26.
Todas essas passagens podem ser explicadas de urn modo
natural em perfeita harmonia com a doutrina ortodoxa, que
se ap6ia na muito extensa evidencia biblica que se acha
apresentada acima, Perg. 2. Essas passagens, ou 1°. apresentam
avisos hipoteticos das conseqiiencias da apostasia com o fim
de impedi-la, mostrando quais seriam as conseqiiencias da
indiferen~a e do pecado, e mostrando tambem quao grande e
a necessidade de cuidado e esfor~os serios; ou, 2°. mostram
quais serao as conseqiiencias terriveis do mau uso ou do abuso
das influencias da gra~a comum, as quais, posto que envolvam
grande responsabilidade, todavia nao chegam a redundar numa
mudan~a radical da natureza ou na conversao verdadeira.

9. Que argumento os oponentes desta doutrina deduzem de


exemplos biblicos e da nossa experiencia relacionada com a apostasia?
Citam das Escrituras casos como os de Davie de Pedro, e
se referem aos muitos exemplos de apostasia de bern abona-
dos cristaos professos de que, infelizmente, todos temos
conhecimento.
Todos esses exemplos, porem, pertencem evidentemente

760
Perseverenfa dos Santos
a uma ou outra de duas classes: ou, 1°. Eles nunca sentiram
em seu sera virtude real da piedade, apesar de parecer tao bela
sua vida aos olhos dos seus semelhantes, Rom. 2:28; 9:5; 1
Joao 2:19; Apoc. 3:1; ou, 2°. Sao cremes verdadeiros que, em
conseqiiencia de urn afastamento temporario da gra~a restrin-
gente, desviaram-se por algum tempo, mas, nao obstante isso,
sao todos restaurados pela gra<;:a divina, e isso geralmente por
meio de corre<;:6es- Apoc. 3:9. A esta classe pertenceram Davi
e Pedro. N enhum cristao verdad~iro e capaz de apostasia
proposital; e o seu maior desvio da justi~a e ocasionado por
impulsos subitos de paixao ou medo- Mat. 24:24; Luc. 22:31.

EXPOSI(:OES AUTORIZADAS
DA DOUTRINA ECLESIASTICA

DOUTRINA CATOLICO-ROMANA- Concilio de Trento,


Sess. 6, Cap. 15: "Tambem se deve asseverar que nao s6
com a infidelidade, pela qual se perde a mesma fe, mas
tambem por qualquer outro pecado mortal, ainda que se
nao perca a fe, perde-se a gras;a da justificas;ao, que se
havia recebido".
lb., Can. 23: "Se alguem disser que o homem, uma vez
justificado, nao pode pecar mais, nem perder a gras;a, e
por isso aquele que cai e peca nunca verdadeiramente fora
justificado ... seja amitema".
lb., Cap. 11: "Ainda que nesta vida mortal, por mais
justos e santos que sejam, (os homens) caiam algumas vezes
em pecados leves e cotidianos, que tambem se chamam
veniais, nem por is so deixam de ser justos".
lb., Sess. 14, Cap. 5: "Quanta aos (pecados) veniais,
pelos quais nao somas excluidos da gras;a de Deus, e em
que frequentemente caimos, posto que com retidao e
utilidade se digam na confissao, fora de toda presuns;ao,
como mostra a praxe das pessoas piedosas; contudo, po-
dem calar-se sem culpa e ser expiados com outros reme-
dios. Mas, como todos os pecados mortais, mesmo os

761
Capitulo 36

pensarnentos, tornarn os hornens filhos da ira e inirnigos


de Deus, e necessaria buscar o perdao de Deus, corn urna
clara e rnodesta confissao".
Belarmino,DeAmiss. Gra., Sess. 14, Cap. 5: "(1) 0 pecado
venial se distingue do pecado mortal par sua propria
natureza, e sern nenhurna rela<;ao corn a predestina<;ao,
ou corn a misericordia de Deus, ou corn o estado dos
regenerados, rnerecendo urn certo castigo, porern nao
eterno. (2) Estes pecados ou sao veniais por sua propria
natureza, tendo por seu objeto uma coisa rna ou
desordenada, mas que nao se opoe ao arnor de Deus e do
proximo - como uma palavra ociosa; ou sao veniais pela
imperfei<;aO da a<;aO, isto e, (a) OS que nao SaO inteirarnente
voluntarios (propositais), como os que nascem de urn
rnovirnento subito de cobi<;a ou de ira, e (b) os que dizern
respeito a ninharias, como o furto de urn 6bolo (pequeno
donativo ou esmola)".
DOUTRINA LUTERANA- Formula Concordice, Pag. 705:
"Deve-se refutar e rejeitar zelosarnente a falsa opiniao de
alguns segundo a qual nao se pode perder a fe, a justifica<;ao
alcan<;ada e a propria salva<;ao ern conseqiiencia de
nenhurn pecado ou crime, seja qual for".
lb., pag. 591: "Condenamos o dogma segundo o qual o
hornern nao perde a fe e o Espirito Santo continua a
habitar nele, rnesrno quando ele consciente e voluntaria-
rnente cornete pecado, e de que os santificados e eleitos
retern o Espirito Santo, ainda que cornetarn adulH!rio ou
outros crimes e perseverern neles".
A pol. Aug. Conf, pag. 71: "A fe nao pode coexistir corn
pecados rnortais".
Jb.,pag. 86: "A fe que recebe a rernissao dos pecados ...
nao perrnanece nos que se rendern a suas paix6es, nern
pode coexistir corn pecados rnortais".
DOUTRINA REFORMADA -Gin. Do Sfnodo de Dart, Cap.
5, c. 3: "Por causa dos restos do pecado que neles habita ...
os convertidos nao poderiarn perrnanecer nesta gra~a se
fossern entregues as suas pr6prias for<;as. Todavia Deus e
fiel e os confirrna na gra<;a que urna vez lhes foi concedida e

762
Perseverenra dos Santos
misericordiosamente, e poderosamente os conserva nela,
ate o fim. Can. 4: "Mas, apesar desse poder de Deus, que
confirma os fieis na gra~a e os conserva, ser maior do que
o que pode ser vencido pela carne, contudo, os convertidos
nero sempre sao de tal modo influenciados e movidos por
Deus que nao possam desviar-se, em certas a~oes especiais,
da dire~ao e da gra~a e ser seduzidos pelas paix6es da
carne, e obedecer-lhes. Podem ate cair em pecados graves
e atrozes ... " Can. 5: "No entanto, com esses pecados
enormes, eles ofendem muito a Deus, incorrem em culpa
de morte, entristecem o Espfrito Santo, interrompem o
exercfcio da fe, ferem gravemente a consciencia, e as vezes
perdem por algum tempo a consciencia de estarem na
gra~a, ate que, voltando para o caminho com arrepen-
dimento sincero, o rosto paternal de Deus torne a brilhar
para eles." Can. 6: "Porque Deus, que e rico em mise-
ricordia, por causa do Seu imutavel proposito de elei~ao,
nao tira inteiramente o Espfrito Santo dos que Lhe per-
tencem, mesmo nas quedas lamentaveis, nero permite que
escorreguem de tal modo que caiam da gra~a da ado~ao e
do estado de justifica~ao, ou que cometam o pecado que e
para morte, ou contra o Espfrito Santo, para que, aban-
donados por Ele, se lancem a perdi~ao eterna ... " Can. 8:
"De modo que nao e por seus proprios merecimentos ou
for~as, e sim pela gratuita misericordia de Deus, que eles
(os eleitos) alcan~am tal posi~ao que nero caem totalmente
da fe e da gra~a, nero permanecem ate o fim em suas
quedas e assim pere~am".
Conf de Fe, de U!estminster, Cap. 17 § P: "Os que Deus
aceitou em Seu Filho amado, os que Ele chamou
eficazmente e santificou pelo Seu Espfrito, nao podem
cair do estado de gra~a, nero total, nero finalmente; mas
com toda a certeza perseverarao nesse estado ate o fim e
serao eternamente salvos." § 2: "Essa perseveran~a dos
santos nao depende do seu livre-arbftrio, porem da
imutabilidade do decreta da elei<;:ao, que brota do livre e
imutavel amor de Deus Pai, da eficacia do merito e
intercessao de Jesus Cristo, da permanencia do Espfrito e

763
Capitulo 36
da semente de Deus neles, e da natureza da alian~a da
gra~a; de todas estas coisas vern a sua certeza e a sua
infalibilidade".

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764
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37

A Morte e o Estado da Alma


depois da Morte

1. Qual a parte da teologia em que entramos agora, e quais as


materias nela incluidas?
A parte chamada ESCATOLOGIA, ou a discussao das
ultimas coisas.
Inclui a morte, o estado da alma depois da morte, o
segundo advento de Cristo, a ressurrei<;ao dos mortos, o juizo
final, o fim do mundo, o ceu e o inferno.

2. Quais as diversas formas de expressiio empregadas para


descrever a morte na Biblia?
Urn partir do mundo-2 Tim. 4:6. Urn entrar no caminho
de toda a terra- Jos. 23:14. Urn unir-se a seus pais, Jui. 2: 10; e
a seu povo- Deut. 32:50. Urn desfazer-se a casa terrestre desta
morada- 2 Cor. 5:1. Urn voltar ao p6- Eel. 12:7. Urn sono-
Joao 11:11. Urn expirar (render o espirito)- Atos 5:10. Urn
estar ausente do corpo e presente como Senhor- 2 Cor. 5:9.
U m dormir em Jesus - 1 Tess. 4: 14.

3. Que ea morte?
A morte e a suspensao da uniao pessoal entre o corpo e a
alma, seguida da resolu<;ao do corpo em seus elementos
quimicos, e da introdu<;ao da alma naquele estado separado
de existencia que lhe seja designado por seu Criador e Juiz-
Eel. 12.7.

765
Capitulo 37
4. Qual a relafiio existente entre a morte e o pee ado?
A plena pena da lei, inclusive todas as conseqi.iencias
eternas do pecado - espirituais, fisicas e penais, e charnada
rnorte nas Escri turas. A senten<;a foi: "No dia ern que del a
co meres, certarnente rnorrenis" - Gen. 2: 17; Rom. 5: 12. Que
isso incluiu a rnorte natural fica provado por Rom. 5: 13,14; e
tarnbern pelo fato de que, quando Cristo tornou sobre Si
a pena da lei, foi necessario que rnorresse- Heb. 9:22.

5. Por que morrem os justificados?


A justifica<;ao rnuda toda a rela<;ao federal do justificado
corn a lei, eo eleva para sernpre acirna de todas as conseqi.iencias
penais do pecado. A rnorte, pois, posto que perrnane<;a como
parte da pena da lei violada ern rela<;ao ao injusto, e, como
todas as dernais afli<;6es, rnudada ern rela<;ao aos justificados
ern elernento de disciplina proveitosa. Ela lhes e necessaria
por causa da constitui<;ao presente de seus corpos, mas e, tanto
para seus corpos como para suas alrnas, a porta do ceu. Estao
livres do aguilhao da rnorte e do seu ternor- 1 Cor. 15:55,57;
Heb. 2:15. Sao agora "bern-aven turados" ern sua rnorte porque
"rnorrern no Senhor"- Apoc. 14:13, e serao afinallibertados
perfeitarnente do seu poder quando for destrufdo 0 ultimo
inirnigo - 1 Cor. 15:26.

6. Que provas temos da imaterialidade da alma, e que


argumento se pode tirar dai para provar a sua existencia continua
depois da morte?
Para a cornprova<;ao da irnaterialidade da alma, veja as
provas no Cap. 2, Perg. 18.
Ora, conquanto a existencia continua de qualquer cria-
tura dependa unicarnente da vontade do seu Criador, essa
vontade pode tornar-se conhecida por rneio de urna revela<;ao
direta, ou, ern qualquer caso especial, pode-se inferir por rneio
de urn raciocfnio anal6gico baseado naquilo que sabernos do
seu modo de agir noutros casos. Ate onde esse argurnento

766
A Mortee ...
anal6gico tern aplica~ao, ele confirma decisivamente a cren~a
.em que uma substancia espiritual e, como tal, imortal. Nao ha
; . arte alguma do campo da experiencia humana que nos de
onhecimento de urn s6 caso de aniquila~ao de urn atomo de
' ateria, isto e, da materia como tal. Vemos quecorpos materiais,
(brganizados ou compostos quimicamente, ou formados por
simples agrega<;:oes mecanicas, estao constantemente entrando
em existencia e por sua vez desaparecendo, mas nunca pelo
aniquilamento de suas partes elementares constituintes ou
componentes, por simples dissolu<;:ao da rela<;:ao que essas
partes haviam mantido umas com as outras. 0 que e espirito,
porem, e essencialmente simples e uno, por isso incapaz
daquela dissolu<;:ao das partes a que estao sujeitos os corpos
materiais. Inferimos, portanto, que OS espiritos sao imortais
porque nao podem estar sujeitos a unica forma da morte da
qual temos conhecimento.

7. Que argumento a favor da imortalidade da alma se pode


tirar do seu imperfeito desenvolvimento neste mundo?
Em todas as se<;:oes da vida organizada, cada criatura
individual, em seu estado normal, tende a desenvolver-se ate
chegar a urn estado que e a perfei~ao do seu genera. A bolota
germina e se desenvolve, tornando-se carvalho. Mas cada ser
humano esta conscio de que nesta vida nunca alcan~ara a
perfei<;:ao que o Criador teve em vista quanta ao ideal do seu
tipo; possui faculdades nao desenvolvidas, capacidades e
desejos naturais nao satisfeitos; sabe que foi destinado a ser
muito mais do que e, e a preencher uma esfera mais elevada.
Assim como a razao profetica do Criador faz provisao para a
borboleta mediante o instinto da lagarta, assim tambem o
Criador revela a existencia imortal da alma numa esfera mais
elevada mediante suas limita~oes conhecidas e seus movi-
mentos instintivos na esfera atual.

767
Capitulo 37
8. Que argumento sabre este ponto pode ser tirado da justifa
distributiva de Deus?
E urn juizo invariavel da razao natural e uma doutrina
fundamental da Biblia que o bern moral esta associado a
felicidade, e o mal moral a infelicidade, pela natureza e pelo
prop6sito invariaveis de Deus. Mas a hist6ria, tanto de todos
os homens como de todas as comunidades, estabelece o fato de
que esta vida nao constitui urn estado de retribui~ao; que
aqui a maldade muitas vezes se acha associada aprosperidade,
e a excelencia moral a afli<;ao; devemos, pois, tirar dai a
conclusao de que ha urn estado (numa esfera transcendental) a
ser conhecido por nos no futuro em que sera ajusnido tudo o
que aqui parece incompativel com a justi<;a de Deus . Veja
Salmo 73.

9. Como parecem indicar um estado futuro as operafi5es da


consciencia?
A consciencia ea voz de Deus na alma, dan do testemunho
do nosso pecado e desmerecimento, e da justi~a divina essencial.
Exceto no caso dos que buscaram refugio na justi~a de Cristo,
todos os homens sentem que suas rela<;6es morais com Deus
nunca sao adequadas nesta vida, e por isso o testemunho
caracteristico da consciencia humana, apesar de grandes
diferen~as individuais a respeito da luz, da sensibilidade, etc.,
sempre coincide como da Palavra de Deus, no sentido de que
depois da morte segue-se o juizo- Heb. 9:27.

10. Como fica estabelecida esta doutrina pelo consenso geral


da humanidade?
Essa tern sido a cren~a universal de todos os homens, de
todas as ra~as e em todas as idades. Urn consenso universal,
assim como qualquer outro efeito universal, e necessaria
reportar-se a uma causa, igualmente universal, e este consenso,
uniforme entre homens que diferem entre si em todos os outros
aspectos e sentidos, nao pode reportar-se a nenhuma outra

768
A Mortee ...
origem que nao a constitui~ao da natureza do hom em, que eo
testemunho do seu Criador. ',,m. ,

11. Como se pode mostrar que o Velho Testamento ensina a


mesma distinfiio entre o corpo e a alma ensinada no Novo
Testamento?
1°. Na narrativa da cria~ao. Deus formou o corpo com o
po da terra, mas a alma (ou o espirito) Ele fez a Sua propria
imagem- Gen. 1:26; 2.7.
2°. Na defini~ao da morte- Eel. 12:7: "0 po volte aterra,
como o era, eo espirito volte a Deus, que o deu". Veja tambem
Eel. 3: 21. . . . _· , , ,. ! • ' •

12. Que ensina o Velho Testamento a respeito do sheol? E como


se pode mostrar, pelo uso dessa palavra, que a imortalidade da
alma edoutrina da antiga alianfa?
0 substantivosheol vern do verboshaal, pedir, exprimindo
o sentido do adagio ingles: "A cova grita: dai, dai". A palavra e
empregada no Velho Testamento para designar, em sentido
vago e geral, o estado dos mortos, tanto dos bons como dos
maus, intermediario entre a morte e a ressurrei~ao dos justos-
Os. 13: 14, ao qual se achavam associadas em geral ideias tristes,
e que se julgava, em sentido indeterminado, nas partes
inferiores da terra- Deut. 32:22; Amos 9:2.* E empregada
assim para designar a sepultura como o receptacula do corpo
depois da morte- Gen. 37:35; Jo 14:13, mas principalmente
para designar o receptacula dos espiritos separados do corpo,
sem nenhuma referencia explicita a uma divisao entre a parte
destinada aos justos e a destinada aos maus. Que os espiritos se
mantem ativos e conscientes nesse estado ve-se pelo que nose
revelado com rela~ao a Samuel- l Sam. 28:7-20; Is. 14:15-17.

* Cf. o texto hebraico. Urn modo facil de verificar o termo conforme o


original hebraico e utilizar a Tradw;ao Brasileira, que nao traduz sheol,
mas simplesmente o trans litera. Nota de Odayr Olivetti.

769
Capitulo 37
Quanto aos bons, porem, a sua residencia no sheol era
considerada como algo intermediario entre a morte e uma
1
ressurrei~ao feliz- Sal. 49:16. Quando tratam deste assunto,
as Escrituras do Velho Testamento falam antes como se a
existencia continua da alma fosse coisa concedida, e nao a
afirmam explicitamente- Fairbairn, Hermeneutical Manual;
Josefo, Antiguidades, 18.1.

13. Qual e o tear do argumento de nosso Salvador a respeito


deste assunto, contra as saduceus?
Veja Luc. 20:37,38. Muito tempo depois da morte de
Abraao, Isaque e Jac6, 0 Senhor (Yave) continua a chamar-se
seu Deus - Ex. 3:6. Mas Cristo, argumentando contra os
saduceus, que negavam a ressurrei~ao dos mortos, declara:
"Deus nao e Deus de mortos, e sim de vivos". Isto prova antes
a imortalidade da alma deles; mas, desde que Deus eo Deus
pactual de pessoas, e desde que as pessoas desses patriarcas
incluiam tanto o seu corpo como a sua alma, o argumento
estabelece tambem a imortalidade final do corpo, isto e, da
pessoa inteira.
.'
. •,

14. Quais as passagens do Velho Testamento que afirmam


explicita au implicitamente a esperanfa de um estado de bem-
-aventuranfa de pais da morte?
Num. 23:10; J619:26; Sal.16:9-ll; 17:15; 49:15,16; 73:25-
28; Is. 25:8; 26:19; Os. 13:14; Dan.12:2,3,13.

15. Que provas mais fornece o Velho Testamento da existencia


continua da alma?
1a. A trasladac;;ao de Enoque e de Elias, e a temporaria
reapari~ao de Samuel (sese en tender que foi de fa to Samuel)-
Gen. 5:24; Heb. 11:5; 2 Reis 2:11; 1 Sam. 28:7-20.
2a. A proibi~ao da pratica da necromancia implica a
existencia geral da crenc;;a em que os mortos continuarao a
existir noutro estado- Deut. 18:11,12.

770
A Mortee ...
3a. Em seu sistema simb61ico, a terra de Canaa representa
a heran~a permanente do povo de Cristo, e todo o prop6sito da
revela~ao completa do Velho Testamento, como foi apreendida
pe1os crentes daquela dispensa~ao, dizia respeito a uma
existencia futura e a uma heran~a depois da morte. Isso e
asseverado diretamente no Novo Testamento- Atos 26:6-8;
Heb. 11:10-16; Ef. 1:14.

16. Que nos ensina o Novo Testamento a respeito do estado da


alma logo depois da morte?
"As almas dos justos, sendo entao aperfei~oadas na
santidade, sao recebidas nos mais altos ceus, on de veem a face
de Deus em luz e gloria, esperando a plena reden~ao de seus
corpos"- Luc. 23:43; 2 Cor. 5:6,8; Fil. 1:23,24. "E as almas
dos impios sao lan~adas no inferno, onde ficarao em tormentas
e em trevas espessas, reservadas para o juizo do grande dia
final"- Luc. 16:23,24; Jud., vers. 6 e 7. Conf de Fe, de West-
minster, Cap.32, § 1.
Esta exposi~ao representa a doutrina das igrejas luteranas
e reformadas.
Inclui os seguintes pontos:
1°. Ao estado das almas, entre a morte e a ressurrei<;ao,
pode-se com propriedade chamar intermediario, quando
considerado com rela<;ao aos estados que lhe precedem e que
se lhe seguem.
2°. Se tambem ha ou nao urn lugar intermediario, as
Escrituras nao declaram definidamente, mas o sugerem. Veja
abaixo, Cap.40, Perg. 3.
3°. As almas, tanto dos justos como dos perdidos, perma-
necem ativas e conscientes durante esse estado.
4°. 0 carater eo destino espirituais e morais de cada urn
ficam decididos irrevogavelmente para o bern ou para o mal
no momento da morte.
5°. Os justos sao aperfei<;oados imediatamente na santidade.
6°. Passam logo para a presen<;a de Cristo e em Sua presen<;a

771
Capitulo37
permanecem durante todo o periodo.
7°. Este estado intermediario difere do estado final dos
remidos - (1) Por causa da ausencia do corpo. (2) Porque a
reden<;:ao ainda nao se consumou de maneira completa.

17. Qual o significado e usa da palavra ades, hades, nas


Escrituras?
0 termo ades, formado pela particula privativa ou nega-
tiva a e pelo verbo ver, designa em geral o mundo invisivel
habitado pelos espiritos dos mortos. Entre os antigos pagaos
classicos, esse mundo invisivel era considerado como con-
sistindo de duas regi6es contrastadas, a uma das quais
chamavam eliseu ou elisio, a morada dos bem-aventurados, e
a outra tartaro, morada dos viciosos e infelizes.
Os tradutores da Septuaginta empregaram essa palavra
grega para traduzir a palavra hebraica sheol. Cf. Atos 2:27 e
Sal. 16:10. No Novo Testamento encontra-se somente onze
vezes, em Mat. 11 :23; 16: 18; Luc. 10: 15; 16:23; Atos 2:27,31;
1 Cor. 15:55; Apoc. 1: 18; 6:8; 20:13,14. Em todos estes casos,
exceto em 1 Cor. 15:55, onde as edi<;:6es mais criticas do original
tern aanate em vez de ades, 0 termo e sempre traduzido por
inferno e, certamente, representa sempre o mundo invisivel
sob o dominio de satanas, em oposi<;:ao ao reino de Cristo, e
finalmente subjugado por Seu poder vitorioso. Veja Fairbairn,
Herm. Manual.

18. Qual o significado e uso das palavras paradeisos, paraiso,


e geena, geena?
Paradeisos, paraiso, derivada de alguma lingua orientale
adaptada as linguas hebraica e grega, significa parque, jardim
de recreio- Nee. 2:8; Eel. 2:5. Os tradutores da Septuaginta
empregaram essa palavra para representar o jardim do Eden-
Gen. 2:8, etc. Encontra-se apenas tn~s vezes no Novo Testa-
mento- Luc. 23:43; 2 Cor. 12:4; Apoc. 2:7, onde seve, pelo
contexto, que ela se refere ao "terceiro ceu", o jardim do Senhor

772
A Marte e...
em que esta a "arvore da vida", junto ao rio que sai do trono
de Deus e do Cordeiro- Apoc. 22:1,2.
Geena e palavra hebraica composta, transcrita na Septua-
ginta e no Novo Testamento com letras gregas, e significa "vale
de Hinom, J os. 15:8, o vale que ladeia Jerusalem ao sui e segue
do vale de Josafa para o oeste, ao pe do monte Siao. Ali se
estabelecera o culto de Moloque, falso deus ao qual eram
sacrificadas crians;as pelo fogo- 1 Reis 11:7. Josias deu cabo
desse culto e dessacralizou o lugar - 2 Reis 23:10-14. Depois
disso, consta que esse lugar tornou-se o receptaculo para toda
a imundicie da cidade, e para os corpos dos animais mortos e
dos malfeitores justis;ados. Para a queima dessas coisas faziam-
-se ali de tempos a tempos grandes fogos. Por essa razao deram
ao lugar o nome de Tofete, que significa abominas;ao, vomito,
J er. 7: 31,"- Robinson, Greek Lexicon. Como uma figura muito
natural foi, pois, empregada essa palavra como designativo do
lugar do castigo final, sugerindo com muita fors;a a ideia de
degradas;ao e infelicidade. Encontra-se doze vezes no Novo
Testamento, e sempre para designar o lugar dos tormentos finais
-Mat. 5:22,29,30; 10:28; 18:9; 23:15,33; Mar. 9:43,47; Luc.
12:5; Tia. 3:6.

19. Quais as diversas opinii5es mantidas a respeito do estado


intermediario das almas dos homens entre a morte eo juizo?
1°. Muitos protestantes, especialmente da lgreja da lngla-
terra, retendo a significas;ao classica da palavra hades como
equi valente ada palavra hebraica sheol (como dada acima, Per g.
12), sustentam que ha uma regiao intermediaria:, consistindo
de dois distritos distintos, num ou no outro dos quais as almas
separadas do corpo, tanto dos perdidos como dos remidos,
respectivamente, esperam a ressurreis;ao de seus corpos, a
decisao do J ufzo, e sua trasladas;ao para suas moradas finais de
bem-aventurans;a ou de infelicidade. Sua doutrina difere da
doutrina comum dos protestantes, principalmente- (1) Em
afirmar positivamente que o lugar, e nao somente o estado, e

773
Capitulo 37
intermediario. (2) Em afirmar que esse lugar se acha "embaixo"
em rela<;:ao a este mundo. (3) Em sustentar que nao se trata de
"os mais altos ceus", onde Deus manifesta a Sua presen<;:a
especial e onde Cristo habitualmente reside. Veja Yesterday,
To-day and Forever, pelo Rev. E.H. Bickersteth, e Hades and
Heaven, or The State of the Blessed, pelo mesmo autor. ~
2°. Quanto a exposi<;:ao completa da doutrina dos roma-
nistas, veja abaixo, Perg. 22.
3°. As seitas de enfase materialista e alguns socinianos
sustentam que as almas dos homens ficam em estado
inconsciente ou de vida interrompida desde a morte ate ao
momenta da ressurrei<;:ao.
4°. Essa opinii:io e sustentada tambem pelos defensores da
aniquila<;:ao final dos maus, e e defendida muito habilmente
por C. F. Hudson na America, e provavelmente pelo falecido
arcebispo Whately na Inglaterra- View ofScripture Concerning
a Future State. .v·;~;r '··'- · · ,,, l
Os argumentos sao: (1) Nao temos experiencia e nem
podemos formar ideia de uma atividade mental consciente
num estado separado do corpo. (2) Sao obscuras e nao conclu-
sivas as provas biblicas apresentadas em apoio da doutrina das
igrejas. (3) 0 significado original e simples da palavra morte
e "extin<;:ao de existencia". Deus disse a Adao: "No dia em que
dela comeres, certamente morreras"; nao o teu corpo, mas tu
mesmo morreras. Veja Mat. 10:28. (4) Que a grande
proeminencia dada noN ovo Testamento afutura ressurrei<;:ao
do corpo, como efeito da reden<;:ao e como objeto da esperan<;:a
crista, prova que a (mica vida futura esperada pelos ap6stolos
era posterior aressurrei<;:ao e dependia dela. Veja 1 Cor. 15: 14.
(5) Citam muitas passagens para provar que, segundo as
Escrituras, os mortos ficam por enquanto em estado de
inatividade corporal e espiritual. Veja Sal. 6:5: "Pois, na morte,
nao ha recorda~ao de ti; no sepulcro (sheol), quem te clara
louvor?"- Sal. 146:4; Jer. 51:57.
5°. Essa doutrina foi ensinada primeiro por certos hereges

774
A Marte e...
da Arabia, chamados tanatopsiquitas, no tempo de Origenes.
Ressuscitou depois como opiniiio de alguns te6logos nos seculos
13 e 14, mas foi condenada pela Universidade de Paris em
1240, e pelo papa Benedito XII em 1366. Foi ressuscitada outra
vez por alguns anabatistas e refutada por Calvina em sua obra
Psicopaniquia, etc. Nunca foi sustentada por nenhuma igreja
ou escola permanente de te6logos.
Isaac Taylor, em sua Physical Theory ofAnother Life, Cap.
17, tira a conclusiio, fundada somente nas Escrituras, de que o
estado intermediario das almas remidas "niio e urn estado
realmente inconsciente, mas de relativa inatividade e de energia
suspensa- urn estado de transic;iio durante cuja permanencia
devem acordar antes as faculdades passivas da natureza que as
ativas". - · ·' - "'"''

20. Como se pode expor as provas biblicas em que se baseia a


doutrina protestante exposta acima (Perg. 16)?
1°. A aparic;ao de Samuel no uso de todas as suas faculdades
- 1 Sam. 28:7-20. ., · · . J
2°. A aparic;ao de Moises e Elias por ocasiao da trans-
figurac;ao de Cristo- Mat. 18:3.
3°. As palavras dirigidas por Cristo ao ladrao na cruz -
Luc. 23:43.
4°. A parabola do homem rico e Lazaro- Luc. 16:23,24.
5°. A orac;ao de Estevao quando morria- Atos 7:59.
6°. Em 2 Cor. 5:1-8 Paulo afirma que estar ausente do cor-
poe estar presente ao Senhor, e por isso declara (Fil. 1:21-23)
que para ele morrer seria lucro, e que estava constrangido de
urn e outro lado, "tendo o desejo de partir e estar com Cristo, o
que e incomparavelmente melhor" e ''por vossa causa perma-
necer na carne".
7°. Ele declara (1 Tess. 5: 10) que o sono da morte eo viver
sempre com Cristo. Veja tambem Ef. 3: 15; Heb. 6:12-20; 12:23;
Atos 1:25; Jud. 1:6,7; Apoc. 5:9; 6:9-11; 7:9; 14:1,3.

775
Capitulo 37
21. Como se pode mostrar que o estado intermediario niio
I
l

constitui mais tempo de provafiio para os que sairam desta vida sem
terem sido unidos a Cristo?
Entre algumas classes de protestantes esta se tornando em
voga* a opiniao de que entre a morte e a ressurrei~ao as almas
nao unidas a Cristo terao mais uma oportunidade para arre-
pender-se e alcan~ar a fe nEle. Que isso nao tern fundamento
ve-se-
1°. Do fato de nao ser ensinado em parte alguma das
Escrituras. E, quando muito, uma esperan~a sugerida pelo
desejo, mas sem fundamento algum na Palavra de Deus.
Mesmo que o fa to de Jesus Cristo ter pregado "aos espiritos
em prisao" (1 Ped. 3: 19) significasse realm en te o ministerio
pessoal de Cristo na esfera do estado intermediario, e certo
que nao teria aplica~ao aos que 0 tinham rejeitado como seu
Salvador aqui na terra, e, nesse caso, provavelmente s6 teria
aplica~ao aos verdadeiros crentes que viveram sob a dispensa-
~ao do Velho Testamento, como a igreja cat6lica romana sempre
tern ensinado.
2°. A teoria funda-se no prindpio fortemente anticristao
de que Deus tern o dever de conceder a todos os homens ocasiao
propicia para conhecerem e aceitarem a Cristo. Se isso fosse
verdade, o evangelho seria uma divida, e nao uma GRA(_;A.
3°. To do o en sino de Cristo e dos ap6stolos envolve o
contrario. "Aos homens esta ordenado morrerem uma s6 vez,
vindo, depois disto, o juizo" - Heb. 9:27. "Disse-lhes, pois,
Jesus outra vez: Eu retiro-me, e buscar-me-eis, e morrereis no
vosso pecado. Para on de eu vou, nao podeis v6s vir" - Joao
8:21. "E, alem disso, esta posto urn grande abismo entre n6s e
v6s, de sorte que os que quisessem passar daqui para v6s nao

* Hodge escreveu essas palavras em fins do seculo XIX (o prefacio traz a


data de 6 de agosto de 1878). A tradw;:ao da qual estamos fazendo revisao e
atualiza<_;ao foi publicada em Lisboa, em 1895. Do nome do tradutor s6
constam as iniciais: F. J. C. S. Nota de Odayr Olivetti.

776
A Marte e...
poderiam, nem tampouco OS de la passar para ca"- Luc.
16:26; Apoc. 22:11.
4°. A lei do habito e do carater moral confirmado tornaria
naturalmente o estado moral do pecador muito mais insensivel
e baldo de esperan<;;a no estado intermediario do que estivera
durante a sua vida terrena, mesmo que lhe fossem oferecidas
condi<;;6es de arrependimento. A razao nao e melhor funda-
mento para a "Esperan<;;a" do que sao as Escrituras.

22. Que ensinam as romanistas a respeito das almas depois


da morte?
1°. Que as almas das crian<;;as nao batizadas viio para urn
Iugar preparado expressamente para elas, chamado "limbus
infantum", onde nao estao sujeitas a sofrimentos positivos, mas
tambem nao gozam da presen<;;a de Deus. Esse Iugar (imagi-
nario) acha-se colocado numa parte superior do inferno, aonde
nao chegam as chamas, e elas sofrem so mente a pcenam damni
(pena de priva<;;ao ), e nao tern parte na pcenam sensus (pena de
sofrimentos positivos), que aflige os pecadores adultos.
2°. Que todos OS adultos nao batizados, e todos OS que
perderam a gra<;;a batismal em conseqiiencia de pecado mortal,
e morreram sem que estivessem reconciliados com a igreja,
vao imediatamente para 0 inferno.
3°. Que OS fieis que alcan<;;aram 0 estado de perfei<;;ao vao
imediatamente para 0 ceu. ·.. ,; i
4°. Que a grande multidao de cristaos parcialmente san-
tificados, morrendo na comunhao da igreja, mas ainda
embara<;:ados com imperfei<;:6es, vao para o purgat6rio, onde
ficam durante urn periodo mais ou menos Iongo, ate que os
seus pecados sejam expiados e tam bern purgados, sen do entao
trasladados para o ceu. Durante esse periodo intermediario
podem ser socorridos eficazmente por seus amigos na terra,
mediante ora<;;6es e obras.
5°. Que os fieis do Velho Testamento foram recolhidos a
uma regiao chamada "limbus patrum", descrita como "o seio de

777
Capitulo 37
Abraao", onde ficaram sem a visao beatifica de Deus, mas
tambem sem sofrimento, ate ao tempo em que Cristo, durante
os tres dias em que Seu corpo estava no sepulcro, foi
liberta-los -1 Ped. 3:19,20. Cat. Rom., Parte 1, Cap. 6, Perg. 3;
Cone. De Trento, Sess. 25, do Purgat6rio.
Quanto ao purgat6rio, o Condlio de Trento s6 decidiu dois
pontos: 1°. Que ha purgat6rio; 2°. "que as almas ali detidas
sao ajudadas com os sufragios dos fieis, e principalmente com
o gratissimo sacrificio do Altar".
E opiniao geral, porem, que as suas penas sao tanto
negativas como positivas. Que o meio instrumental dos seus
sofrimentos e fogo material. Que estes sao terriveis e iridefinidos
em extensao. Que os termos pelos quais se pode fazer satisfa~ao
neste mundo sao muito mais faceis de cumprir. Que no
purgat6rio as almas nem podem incorrer em culpa nem ganhar
merecimento algum; s6 podem expiar seus pecados por meio
de sofrimentos passivos.
Confessam que essa doutrina nao se acha ensinada
diretamente nas Escrituras, mas afirmam, 1°. Que se deduz
necessariamente da sua doutrina geral quanto a satisfa~ao
devida pelo pecado; 2°. Que Cristo e os ap6stolos a ensinaram
incidentalmente, assim como ensinaram a doutrina do batismo
das crian~as, etc. Fazem referencia a Mat. 12:32; 1 Cor. 3:15.

23. Como se pode mostrar que essa doutrina e de carater


anticristiio? · · ·. v· ;
1 t • •.
'; .

1°. E confessado que ela nao tern fundamento direto nas


Escrituras, e e 6bvio que tambem nao tern nela nenhum
fundamento real. S6 esta considera~ao e suficiente.
2°. Efundada numa teoria inteiramente anticrista a respeito
do modo de dar satisfa~ao a justi~a divina pelos pecados
cometidos. (1) Que, apesar de serem infinitos os merecimentos
de Cristo, sao uma expia~ao somente do pecado original. (2)
Que e necessaria que os fieis fa~am expia~ao por seus pr6prios
pecados pessoais, cometidos depois do batismo, por meio de

778
A Mortee ...
penitencia aqui ou das penas do purgat6rio. Isso e contrario a
tudo quanto as Escrituras ensinam, como ja provamos acima,
sob os seus respectivos titulos. (1) quanto a satisfa~ao dada a
justi~a divina por Cristo; (2) a natureza da justifica~ao; (3) a
natureza do pecado; (4) a rela~ao que tern com a lei os
sofrimentos e as boas obras dos justificados; (5) ao estado das
almas dos fieis depois da morte, etc. etc.
3°. E doutrina paga, derivada dos egipcios por via dos
gregos e romanos, e corrente em todo o imperio romano -
Eneida, de Virgilio, Liv. 6, pags. 739, 43.
4°. Seus efeitos praticos sempre tern sido (1) sujei~ao abjeta
do povo ao sacerd6cio; (2) vergonhosa desmoraliza~ao do povo.
A igreja e o autonomeado depositario e despenseiro dos
merecimentos superabundantes de Cristo, e dos merecimentos
supererrogat6rios de seus santos proeminentes. Tomando isso
por fundamento, ela dispensa das penas do purgat6rio os que
pagam por seus pecados ja cometidos, ou vende indulgencias
aos que pagam pela licen~a de cometer pecados no futuro.
Assim o povo vai pecando e pagando, e o sacerdote vai rece-
bendo o dinheiro e remitindo a pena. A fic~ao de urn purgat6rio
do qual o sacerdote tern as chaves e a origem principal da
influencia que ele tern sobre o povo por via dos seus temores.
Veja Cap.32, Perg. 19.

EXPOSI<;OES ECLESIASTICAS AUTORIZADAS

DOUTRINA ROMANA- Cat. do Cone. de Trento, Parte 1,


Cap. 6 § 3: "Ha tambem o fogo do purgat6rio, no qual as
almas dos justos sao purificadas durante urn certo tempo
por meio de penas, a fim de que sejam admitidas na sua
patria eterna, na qual nao pode entrar nada que contamine.
E da verdade desta doutrina, que santos condlios
declararam ser confirmada pelos testemunhos das
Escrituras e pela tradic;:ao apost6lica, o pastor tera ocasiao
de tratar mais diligente e freqi.ientemente, por termos

119
Capitulo 37

chegado aos tempos em que OS homens nao sofrem a Sa


doutrina".
Belarmino, Purgator, 2.10: "E certo que no purgat6rio,
como tambem no inferno, ha castigo pelo fogo, quer se
entenda esse fogo literal, quer metaforicamente". Sua
propria opiniao e que e fogo corp6reo.
DOUTRINA DA IGREJA GREGA- Catecismo Maior da lgreja
Oriental, Ortodoxa, Cat6lica, agora o simbolo mais
autorizado da Igreja Ortodoxa Grego-Russa. Pergs. 372-377,
sabre o Art. 1 P: "Desde a morte ate a ressurrei<;ao geral as
almas dos justos estao na luz e no descanso, com gozo
antecipado da felicidade eterna; mas as almas dos maus
estao num estado que e o contnirio disso. Sabemos isso
porque e ordenado que a retribui<;ao perfeita, segundo as
obras, sera recebida pelo homem perfeito depois da
ressurrei<;ao do corpo e do ultimo juizo de Deus - 2 Tim.
2:8; 2 Cor. 5:10. Mas que elas tern urn gozo antecipado da
bem-aventuran<;a nos diz o testemunho de Jesus Cristo,
que, na parabola, afirma que o justa Lazaro foi levado para
o seio de Abraao imediatamente depois da sua morte -
Luc. 16:22; Fil. 1:23. A respeito das almas, porem, que
partiram daqui com fe, mas nao tiveram 0 tempo necessaria
para produzir frutos dignos de arrependimento, dizemos
que elas podem ser ajudadas para alcan<;arem uma
ressurrei<;ao bem-aventurada por ora<;6es oferecidas a seu
favor, e especialmente pelas oferecidas em uniao com a
obla<;ao do sacrificio incruento do corpo e do sangue de
Cristo, e por obras de misericordia feitas na fe em memoria
delas".
DOUTRINA PROTESTANTE- Artigos de Esmalcalda
(Luteranos). Pag. 307: "0 purgat6rio, e quaisquer ritos
religiosos, culto ou outra coisa que lhe digam respeito, e
somente urn disfarce do diabo".
Os Trinta e Nove Artigos da lgreja da Inglaterra, art. 22°:
"A doutrina romana relativa ao purgat6rio, as indulgencias,
a venera<;ao e adora<;ao tanto de imagens como de reliquias,
e a invoca<;flO dos santos, e uma coisa futil, vamente
inventada, que nao se funda em testemunho algum das

780
A Mortee ...

Escrituras, mas antes e repugnante a Palavra de Deus".


Breve Cat. da Ass. de Westminster, Perg. 37: "As almas dos
fieis na hora da morte sao aperfei~oadas na santidade, e
imediatamente entram na gloria; e os corpos, que con-
tinuam ligados a Cristo, descansam na sepultura ate a
ressurrei~iio".

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781
38

A Ressurrei~ao

1. Qual o significado das frases, "ressurreir;iio dos mortos" e


"dentre as mortos", empregadas nas Escrituras? ·
Anastasis significa, etirnologicarnente, "urn levantar ou
levantar-se". Essa palavra e ernpregada nas Escrituras para
designar o futuro levantarnento geral dos corpos de todos os
hornens, do sono da rnorte, que ha de ser efetuado pelo poder
de Deus.

2. Quais passagens do Velho Testamento tem aplicar;iio a este


assunto?
}619:25-27; Sal. 49:15; Is. 26:19; Dan.12:1-3.

3. Quais passagens do Novo Testamento aplicam-se a este


assunto?
Mat.5;29; 10:28; 27:52,53; Joao 5:28,29; 6:39; Atos 2:25-
l
36; 13:34; Rom. 8:11,22,23; Fil. 3:20,21; 1 Tess. 4:13-17; eo
capitulo 15 de 1 Corintios.

4. Qual o significado das expressoes soma psyquik6n, corpo


natural, e soma pneurnatik6n, corpo espiritual, como empregadas
par Paulo em 1 Cor. 15:44?
A palavra psyque, em contraste corn pneuma, significa
sernpre o principia da vida animal; ern distin<;:ao do prindpio
de inteligencia e de atividade moral, que eopneuma. Umsoma
psyquik6n, traduzido por corpo natural (animal), significa

782
A RessurreiftiO
evidentemente urn corpo dotado de vida animal e adaptado ao
estado atual da alma e a presente constitui<;;ao fisica da esfera
em que ela se acha. Urn soma pneumatik6n, traduzido corpo
espiritual, eurn corpo adaptado ao uso da alma em seu estado
futuro glorificado, e as condi<;;6es morais e fisicas do mundo
celeste, e com este fim assemelhado pelo Espirito Santo, que
nele habita, ao corpo glorificado de Cristo- 1 Cor. 1S:4S-48.

S. Como ressuscitara o mesmo corpo depositado na sepultura?


As passagens das Escrituras que tratam deste assunto
ensinam claramente que deverao ressuscitar os mesmos corpos
que foram depositados nas sepulturas, porque as frases que
empregam para designar os corpos ressuscitados sao: 1°. "o
nosso corpo"- Fil. 3:21; 2°. "este corpo corruptivel" -1 Cor.
1S:S3,S4; 3°. "todos os que se acham nos tumulos"- Joao S:28;
4°. "os que dormem"- 1 Tess. 4;13-17; S0 • "os vossos corpos
sao membros de Cristo" -1 Cor. 6: 15; 6°. A nossa ressurrei<;;ao
ocorrera gra<;;as a ressurrei~ao de Cristo e sera semelhante a
ela, que foi do Seu corpo identico- Joao 20:27.

6. Por que se pode pensar que a ressurreifao final sera simultanea


e geral?
Veja mais adiante, Cap. 39, Pergs. 9 e 10.

7. Que ensinam as Escrituras a respeito do corpo ressurreto?


1°. Hade ser espiritual-1 Cor. 15:44. Veja acima, Perg. 4.
2°. Hade ser semelhante ao corpo de Cristo- Fil. 3:21.
3°. Sera glorioso, incorruptivel e poderoso -1 Cor. 1S:S4.
4°. Jamais morrera- Apoc. 21:4.
S0 • Nunca sera dado em Casamento- Mat. 22:30.
. .....
·~. . ' ~

8. Como se pode provar que o corpo material de Cristo ressurgiu


dos mortos?
1°. Cristo o predisse- Joao 2:19-21.
2°. Faz-se referencia aSua ressurrei~ao como uma atestas;ao

783
Capitulo 38
miraculosa da verdade da Sua missao; se o Seu corpo nao tivesse
ressuscitado literalmente, nao haveria nada de miraculoso no
fato dEle viver depois da crucifixao.
3°. Toda a linguagem das narrativas inspiradas necessa-
riamente envolve isso, quando falam de haver-se tirado a pedra,
de haver estado dobrado o len~ol, etc.
4°. Ressurgiu somente no terceiro dia, o que prova que foi
uma mudan~a fisica, e nao uma simples continua~ao de uma
existencia espiritual-1 Cor. 15:4.
5°. Seu corpo foi visto, tocado e examinado, durante o
espa~o de quarenta dias, para que se estabelecesse precisamente
esse fato- Luc. 24:39. Veja Dr. Hodge. ·

9. Como se pode conciliar a materialidade da ressurreifdO de


Cristo com o que se diz a respeito dos modos da Sua manifestafdo
e com a Sua ascensdo ao ceu?
Os aparecimentos subitos dEle e tambem OS desapare-
cimentos, narrados em Lucas 24:31; Joao 20:19; Atos 1:9,
for am efetuados por meio de uma in terferencia nas leis
ordinarias que regulam no caso dos corpos materiais, e sao
exatamente da mesma ordem dos muitos milagres realizados
por Jesus quando em Seu corpo, antes da Sua morte; e.g., an dar
sobre o mar - Mat.14:25; Joao 6:9-14.

10. Como a ressurreifdO de Cristo torna certa a do Seu povo e


a ilustra?
0 corpo e a alma juntos constituem uma pessoa, e e o
hom em, em sua pessoa inteira, que e abrangido tanto na alian~a
da gra~a como o foi na das obras, e esta em uniao federal e viva
tanto com o Segundo como com o primeiro Adao. A ressur-
rei~ao de Cristo torna certa a nossa -
1°. Porque a Sua ressurrei~ao sela e consuma o Seu poder
redentor; e a reden~ao das nossas pessoas envolve a reden~ao
do nosso corpo - Rom. 8:23.
2°. Gra~as anossa uniao federal e viva com Cristo- 1 Cor.

784
A Ressurrei~:iio
15: 21,22; 1 Tess. 4:14.
3°. Gra<;as ao Seu Espirito, que habita em n6s (Rom. 8: 11),
tornando nossos corpos em membros de Cristo - 1 Cor. 6: 15.
4°. Porque Cristo, em virtude da alian<;a com o Pai, e
Senhor tanto dos mortos como dos vivos- Rom. 14:9. Esta
mesma uniao federal e viva do cristao com Cristo (veja acima,
Cap. 31) tambem fad. com que a ressurrei<_;ao do creme seja
semelhante a de Cristo, e nao s6 a conseqiiencia dela- 1 Cor.
15:49; Fil. 3:21; 1 Joao 3:2.

11. Ate onde podem ser consideradas de peso as objefoes


cientificas contra a doutrina da ressurreifiiO do corpo?
Todas as verdades concordam entre si e sao de Deus e
necessariamente compativeis umas com as outras, quer sejam
reveladas por meio dos fen6menos da natureza, quer pelas
palavras da inspira<;ao. Por outro lado, do nosso conhecimento
parcial dos dados, tanto da ciencia como da revela<;ao, e do
modo errado pelo qual muitas vezes as interpretamos, segue-
-se que muitas vezes somos incapazes de perceber a harmonia
de verdades que sao de fato intimamente relacionadas entre si.
Nao podemos crer que seja verdade qualquer coisa que vemos
ser incompativel com outra verdade ja estabelecida firme-
mente. Mas, por outro lado, no estado atual do nosso
desenvolvimento, a maior parte das materias do nosso
conhecimento tern por base provas independentes, e aquila
que nose provado por provas conclusivas n6s aceitamos como
verdade, mesmo que nao saibamos conciliar cada fato com
todos os outros nas harmonias de suas leis superiores. Os
prindpios das ciencias fisicas merecem fe em virtude das
provas que temos a seu favor, isto e, ate onde as ciencias se
baseiam em provas e nao em hip6teses, e tam bern o testemunho
da revela<;ao merece fe em virtude das provas que temos da
sua veracidade. As ciencias podem modificar a nossa
interpreta<_;ao da revela<;ao, porem o mais certo de todos os
prindpios e que toda ciencia fundada em provas indiscutiveis

785
Capitulo 38
hade corroborar sempre a revela~ao corretamente interpretada.

12. Como se pode conciliar a identidade de nosso futuro corpo


como nosso corpo atual com 1 Corintios 15:42-50?
Nos versiculos 42 a 44 de 1 Corintios, capitulo 15, essa
identidade e afirmada expressamente. 0 corpo sera o mesmo,
posto que mudado em diversos aspectos -
1°.Agora e corruptivel,entao sera incorruptivel.
2°. Agora esta em desonra, entao sera glorificado.
3°. Agorae fraco, en tao sera poderoso. ~
4°. Agora e natural (animal), isto e, adaptado a condi~ao
atual da alma e aconstituis;ao do mundo; entao seraespiritual,
adaptado a condis;ao glorificada da alma e a constitui~ao dos
"novos ceus e nova terra".
0 versiculo 50 declara simplesmente que "a carne e o
sangue", is to e, a atual consti tuis;ao corrupt! vel, fraca e
depravada do corpo, "nao podem herdar (ou possuir) o reino
de Deus". Contudo, a passagem ramada globalmente ens ina
com clareza a transformas;ao do velho corpo, e nao a substitui~ao
por urn novo.

13. Quais os fatos estabelecidos pela ciencia fisiol6gica a res-


peito das mudan~as perpetuas que se efetuam em nosso corpo atual,
equal a rela~ao em que estesfatos estao com esta doutrina?
Por urn processo continuo de assimilas;ao do material novo
e de excres;ao do velho, as particulas que comp6em o nosso
corpo mudam sem cessar desde o nosso nascimento ate anossa
morte, efetuando, segundo se tern computado, uma subs-
tituis;ao de todos os atomos do corpo inteiro de sete em sete
anos. Nao havera, pois, no organismo de urn adulto, uma s6
particula que constituisse parte da sua pessoa quando era
menino, e no corpo de urn homem velho nao havera nada
daquilo que lhe pertencia quando era de idade mediana.
Desde a meninice ate a velhice o corpo esta sujeito univer-
salmente a grandes mudans;as de tamanho, forma, expressao,

786
A Ressurreifiio
condi~ao, e sofre diversas vezes uma mudan~a total das suas
particulas constitutivas. Tudo isso e certo; mas nao e menos
certo que, apesar de todas essas mudan~as, o homem possui o
mesmo e identico corpo desde a juventude ate a velhice. Isso
prova que, nem a identidade do mesmo homem desde a
juventude ate avelhice, nem a identidade do nosso corpo atual
com o da ressurrei~ao, consistem em serem as mesmas
particulas. Se estamos certos da nossa identidade num caso,
nao e necessaria trope~ar nas dificuldades do outro.

14. Qual a objefiiO contra esta doutrina que se baseia no Jato


conhecido da dispersiio das particulas do nosso corpo depois da morte,
e tambem no da sua assimilafiio por outros organismos?
No instante em que o prindpio de vida entrega os
elementos do corpo ao domfnio exclusivo das leis de afinidade
qufmica, dissolvem-se as combina~6es atuais e espalham-se
no espa~o os elementos, que, por sua vez, outros animais e
organismos vegetais tomam e assimilam. Assim, as mesmas
particulas formam, no decurso do tempo, parte dos corpos de
mirfades de homens, nos perfodos sucessivos do desen-
volvimento dos indivfduos e em gera~6es sucessivas. Por isso
tem-se objetado contra a doutrina bfblica da ressurrei~ao do
corpo, alegando que sera impossfvel determinar a qual dos
milhares de corpos de que essas partfculas formaram
alternadamente uma parte, elas serao atribuidas na ressurrei~ao;
e que sera impossivel tambern vestir cada alma com seu proprio
corpo, por haverem muitos corpos tido parte nos elementos
constitutivos de cada urn. N6s respondemos que a identidade
corporal nao consiste no fato de serem suas partfculas
constitutivas sempre as mesmas. Veja acima, Perg. 13. Exata-
mente assim como Deus, por meio do nosso conhecimento
interior, nos tern revelado que o nosso corpo, apesar de
mudados muitas vezes os seus elementos constitutivos, sao
identicos desde a meninice ate a velhice, assim tam bern, com
igual clareza e racionalidade, nos tern revelado, por meio da

787
Capitulo 38
Sua Palavra inspirada, que o nosso corpo ressuscitado em
gloria sera identico ao nosso corpo semeado em desonra, apesar
de poderem terse espalhado ate aos confins do mundo as suas
partfculas constitutivas.

15. Que eessencial para a identidade?


1°. "E evidente que em casas diversos a identidade depende
de condi~6es diversas. A identidade de uma pedra ou de
qualquer outra materia nao constituida organicamente consiste
em sua substancia e em sua forma. Por outro lado, a identidade
de uma planta, desde a semente ate ao seu comp~eto desen-
volvimento, e em grande parte independente de serem sempre
as mesmas sua substancia e sua forma. Neste caso~ a identidade
parece consistir no fato de ser cada planta urn s6 todo consti-
tuido organicamente, e na continuidade da sucessao de seus
elementos e de suas partes. A identidade de urn quadro nao
depende de serem sempre as mesmas as particulas da materia
colorida de que e composto, ponjue podemos imaginar que
essas mudam continuadamente, porem depende do desenho,
das cores, das partes claras e escuras, da expressao da ideia
que nele se acham incorporadas, etc.
zo. ''A identidade corporal nao e conclusao inferida de uma
compara~ao ou combina~ao de outros fatos, mas e em si mesmo
urn s6 fato irredutivel da consciencia intima. A crian~a, o
selvagem eo fil6sofo, todos tern igual certeza de que os seus
corpos sao os mesmos nos diversos periodos da sua vida, e todos
tern, para a sua certeza, os mesmos fundamentos. Essa convic-
~ao intuitiva, assim como nao e resultado da ciencia, assim
tambem nao tern a obriga~ao de dar conta de si a ciencia, ou,
por outra, nao temos mais obriga~ao de explicar isso antes de
cre-lo do que temos de explicar qualquer outro dos simples
dados da nossa consciencia. t •·
3°. ''A ressurrei~ao do nosso corpo, posto que seja fa to certo
da revela~ao, e para n6s urn fa to do qual nao temos experiencia,
urn fenomeno nao observado. E impossivel, pois, que

788
A Ressurreifiio
compreendamos agora ascondifoesfisicas da identidade do nosso
"corpo espiritual" corn o nosso "corpo animal", porque nao
ternos nern a experiencia, nern a observa~ao, nern a revela~ao
dos fatos que tal conhecimento envolve. Os seguintes pontos,
porern, sao certos, quanta ao resultado- (1) 0 corpo da ressur-
rei~ao sera tao estritarnente identico ao corpo corn que
rnorrerrnos quanta este e identico ao corpo com que nascernos.
(2) Cada alma tera o conhecimento intuitivo e indubitavel de
que o seu novo corpo e identico ao velho. (3) Cada amigo
reconheceni as caracteristicas individuais da alma na expressao
perfeitarnente transparente do novo corpo- Dr. Hodge.

16. Ate onde os judeus sustentaram a doutrina da ressurreifiio


do corpo?
Corn exce~ao de algumas seitas hereticas, como a dos
saduceus, os judeus sustentararn essa doutrina no rnesrno
sentido ern que nos a sustentarnos. Isso e evidente-
1°. Porque e clararnente revelada ern seus escritos inspi-
rados. Veja acirna, Perg. 2.
2°. E afirrnada ern seus escritos nao inspirados- Sabed.
3:6,13; 4: 15; 2 Mac. 7:9,14,23,29.
3°. Cristo, ern vez de provar essa doutrina ern Seus dis-
cursos, fa1a dela como ja reconhecida- Luc. 14:14; Joao
5:28,29.
4°. Paulo afirrna que tanto os judeus antigos (Heb. 11 :35)*
como os seus conternporaneos (Atos 24: 15) criarn nessa
doutrina.

17. Na lgreja Crista, quais antigas seitas hereticas rejeitaram


a doutrina da ressurreifiiO do corpo?
Todas as seitas que tinharn a designa~ao generica de

*Tanto Hodge como Calvino admitiam a autoria paulina de Hebreus. Em


geral o protestantismo tern preferido deixar aberta essa questiio, pre-
dominando a ideia de que Paulo niio eo seu au tor. Nota de Odayr Olivetti.

789
Capitulo 38
gn6sticas e que, debaixo de diversos nomes espedficos,
incorporaram em sua doutrina o fermento da filosofia oriental
que infeccionou a Igreja Crista durante muitos seculos, desde
os seus primeiros dias, criam: 1°. Que a materia e essencial-
mente rna e constitui a origem de todo pecado e de toda a
miseria para a alma; 2°. Que a santifica~ao perfeita e consu-
mada unicamente na dissolu~ao do corpo e na emancipa~ao
da alma; 3°. Que, por conseguinte, qualquer ressurrei~ao lite-
ral do corpo e repugnante ao espirito e destruiria o prop6sito
global do evangelho.

18. Qual e a doutrina ensinada por Swedenbori sabre este


assunto?
Em substancia, e a mesma que o professor Bush exp6e
em seu outrora celebre livro Anasthasia. Eles ensinam que o
corpo literal e dissolvido e afinal perece (deixa de existir, e
destruido, desaparece) na morte. Mas que, por uma lei sutil da
nossa natureza, e elaborado urn corpo etereo e luminoso da
psyque (a sede da sensibilidade nervosa, que ocupa (ou forma)
o elo intermediario entre a materia eo espirito), de maneira
que a alma nao sai do seu tabernaculo de carne como uma
mera capacidade de pensar, porem e imediatamente revestida
desse corpo psiquico.Esta ressurreic,;:ao do corpo, ensinam eles,
ocorre em todos os casos no momento da morte e acompanha
a alma que sai. VejaReligion and Philosophy of Swedenborg, por
Theophilus Parsons. . , .. ). '.,; · ·

19. Como explicam os racionalistas modernos as passagens das


Escrituras que dizem respeito a essa doutrina?
Explicam-nas de modo que dela nada fica, negando seu
sentido claro e dizendo: 1°. Que sao modos puramente aleg6-
ricos de ensinar a verdade da existencia continua da alma depois
da morte; ou, 2°. Que sao concess6es feitas aos preconceitos e
supersti~6es dos judeus.
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790
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39

0 Segundo Advento e o Juizo Geral

1. Qual i o significado das expressoes "a vinda" e "o dia do


Senhor", como empregadas tanto no Velho como no Novo Testa-
mento?
ro. Qualquer manifesta~ao especial da presen~a ou do
poder de Deus- Joao 14.18,23; Is. 13.6; Jer. 46.10.
2°. Sao empregadas, por via de proeminencia: (1) No Velho
Testamento, para exprimir a vinda de Cristo em carne e a
ab-roga~ao da economia judaica- Mal. 3.2; 4:5. (2) No Novo
Testamento, para exprimir a segunda e definitiva vinda de
Cristo. ' • •:: I

Os diversos termos que se referem a este ultimo grande


even to sao: 1°.Apokalypsis, apocalipse, revela~ao -1 Cor. 1:7;
2 Tess. 1:7; 1 Ped. 1:7,13; 4:13. 2°.Parousia, presen~a, advento
-Mat. 24:3,27,37,39; 1 Cor. 15:23; 1 Tess. 2:19; 3:13; 4:15;
5:23; 2 Tess. 2:1,8; Tia. 5:7,8; 2 Ped. 1:16; 3:4,12; 1 Joao 2:28.
3°. Epifaneia, apari~ao, aparecimento, manifesta~ao- 2 Tess.
2:8; 1 Tim. 6: 14; 2 Tim. 4: 1,8; Tito 2:13.
0 tempo daquela vinda echamado: "o dia de Deus" e "o
dia do Senhor"- 2 Ped. 3:12; 1 Tess. 5:2; "o dia de nosso
Senhor Jesus Cristo" - 1 Cor. 1:8; Fil. 1:6,10; 2 Ped. 3: 10;
"aquele dia"- 2 Tess. 1: 10; 2 Tim. 1: 12,18; "o ultimo dia"-
J oao 6:39-54; "o grande dia"' "o dia da ira"' "do juizo" e "da
revela~ao"- Judas, vers. 6, Apoc. 6: 17; Rom. 2:5; 2 Ped. 2:9.
Cristo e chamado o erq6menos, o vindouro, o que ha de
vir, "o que vern", com referencia aos do is adventos- Mat. 21 :9;

791
Capitulo 39
Luc. 7:19,20; 19:38; Joao 3:31; Apoc. 1:4; 4:8; 11:17.

2. Que provas podem ser apresentadas de que a Biblia ensina


um advento literal e pessoal de Cristo aindafuturo?
1°. A analogia do prirneiro advento. Tendo sido curnpridas
literalrnente por urna vinda pessoal as profecias que a Ele se
referiarn, podernos estar certos de que serao curnpridas no
rnesrno sentido as profecias inteirarnente sernelhantes que se
referern ao segundo advento.
2°. A linguagern de Cristo predizendo tal advento nao
adrnite outra interpreta~ao racional. A vinda, sua rnaneira eo
firn visado nela sao todos definidos. Ele vini acornpanhado de
urna rnultidao celeste, corn poder e ern grande gloria. Vini na
ocasiao da ressurrei~ao e do juizo gerais e co~ o firn de
consurnar Sua obra medianeira pela condena<;ao e perdi~ao
finais de todos os Seus inirnigos e pelo reconhecirnento e
cornpleta glorifica<5ao de todos os Seus arnigos- Mat. 16:27;
24:30; 25:31; 26:64; Mar. 8:38; Luc. 21:27.
3°. Os ap6stolos entenderarn que essas predi<56es diziarn
respeito a urn advento literal e pessoal de Cristo. A seus disdpu-
los os ap6stolos ensinararn que forrnassern o habito de olhar
para esse advento como urn rn'otivo solene para que fossern
fieis, e para operar neles anirna~ao e resigna<5ao ern suas prova-
<56es. Ensinararn tarnbern que essa vinda de Cristo sera visivel
e gloriosa, e que sera acornpanhada da ab-roga~ao da presente
dispensa~ao evangelica, da destrui<5ao dos Seus inirnigos, da
glorifica<5ao dos Seus arnigos, da conflagra~ao do rnundo e do
surgirnento de "novos ceus e nova terra". Veja as passagens
citadas no capitulo anterior, e Atos 1:11; 3;19-21; 1 Cor. 4:5;
11 :26; 15 :23; Heb. 9:28; 10:37- Dr. Hodge ern Lectures.

3. Quais os tres modos de interpretafiio adotados em referencia


a Mateus, capitulos 24 e 25?
"E de notar que estes capitulos contem respostas a tres
perguntas distintas.

792
0 Segundo Advento...
"1 a. Quando seriam destruidos o templo e a cidade.
"2a. Quais seriam os sinais da vinda de Cristo.
"3a. A terceira pergunta refere-se ao fim do mundo. A
dificuldade esn1 na separa~ao das partes da resposta concer-
nentes a cada uma destas perguntas. Ha tres metodos adotados
para a explica~ao destes capitulos. (1) 0 primeiro entende que
eles se referem exclusivamente ao derrubamento do Estado e
da religiao judaicos e ao estabelecimento e progresso do
evangelho. (2) 0 segundo entende que aquilo que se diz ali
cumpriu- se em certo senti do na destrui~ao de Jerusalem, e se
cumprira num sentido superior no ultimo dia. (3) 0 terceiro
sup6e que algumas partes referem-se exclusivamente ao
primeiro desses eventos, e outras partes exclusivamente ao
segundo. :E claro que a primeira destas tres teorias e insus-
tentavel, e quer se adote a segunda, quer a terceira, as
dificuldades que se encontram nestes capitulos nao devem
levar-nos a rejeitar o ensino claro e constante do Novo
Testamento a respeito do segundo advento pessoal e visivel do
Filho de Deus" - Dr. Hodge.
y .-

4. Em quais passagens se declara que niio i conhecido o tempo


do segundo advento de Cristo?
Mat. 24:36; Mar. 13:32; Luc. 12:40; Atos 1:6,7; 1 Tess.
5:1-3; 2 Ped. 3:3,4,10; Apoc. 16:15.

5. Quais as passagens geralmente citadas para provar que os


ap6stolos esperavam que o segundo advento aconteceria durante
a vida deles?
Fil. 1:6; 1 Tess. 4:15; Heb. 10;25; 1 Ped. 1:5; Tia. 5:8.

6. Como se pode mostrar que eles niio tinham essa expectafiio?


1°. Os ap6stolos, como individuos, em nao se tratando do
seu oficio publico como mestres inspirados, estavam sujeitos
aos preconceitos comuns do seu seculo e da sua na~ao, e s6
gradativamente chegaram ao pleno conhecimento da verdade.

793
Capitulo39 I
Durante a vida de Cristo eles esperavam que Ele estabelecesse
o Seu reino em sua gloria naquele tempo, Luc. 24:21; e depois
da Sua ressurrei<;;ao a primeira pergunta que Lhe fizeram foi:
"Senhor, sera este o tempo em que restaures o reino a Israel?"
-Atos 1:6.
2°. Em seus escritos inspirados os ap6stolos nunca ensi-
naram que a segunda vinda do Senhor haveria de acontecer
durante a vida deles, nem a qualquer tempo determinado.
Ensinaram somente (1) que devemos deseja-la habitualmente,
e (2) que, por ser indeterminada quanto ao tempo, deve ser
sempre considerada como iminente.
3°. Amedida que lhes foram concedidas revela<;;6es mais
completas, eles aprenderam e ensinaram explicitamente que
nao somente era incerto o tempo do segundo advento, mas
tambem que antes dele aconteceriam muitos eventos, entao
ainda futuros, e.g., a apostasia anticrista, a prega~ao do
evangelho a todas as na<;;6es, a plenitude dos gentios, a conversao
dos judeus, a prosperidade milenaria da lgreja e a destrui~ao
final (da presente ordem de coisas)- Rom. 11:15-32; 2 Cor.
3: 15,16; 2 Tess. 2:3. Isso esta claro, mesmo porque se declara
que a vinda de Cristo sera acompanhada da ressurrei~ao dos
mortos, do juizo geral, da conflagra<;;ao geral e da restitui<;;ao
(ou renova<;;ao) de todas as coisas. Veja abaixo, logo a seguir.

7. Qual a doutrina biblica a respeito do milenio?


1°. As Escrituras, tanto do Velho como do Novo Testa-
mento, revelam claramente que o evangelho hade ainda exercer
uma influencia sobre todos os ramos da famflia humana, muito
maior e mais transformadora do que a que exerceu em
qualquer tempo passado. Esse resultado sera conseguido
mediante a presen<;;a espiritual de Cristo nas dispensa~6es
comuns da Providencia e nas ministrac;6es da Sua Igreja- Mat.
13:31,32; 28: 19,20; Sal. 2:7,8; 22:28,29; 72:8,11; Is. 2:2,3;
11 :6,9; 60: 12; 66:23; Dan. 2:35,44; Zac. 9: 10; 14:9; A poe.
11:15.

794
0 Segundo Adventa...

2°. 0 periodo dessa prevalencia do evangelho deve durar


mil anos e por isso e chamado milenio- Apoc. 20:2-7.
3°. Os judeus serao convertidos ao cristianismo no come~o
ou durante o decorrer desse periodo- Zac. 12:10; 13;1; Rom.
11:26-29; 2 Cor. 3:15,16.
4°. No fim desses mil anos e antes da vinda de Cristo havera
urn tempo relativamente curta de apostasia e de conflitos en-
tre os reinos da luz e das trevas- Luc. 17:26-30; 2 Ped. 3:3,4;
Apoc. 20:7-9.
5°. 0 advento de Cristo, a ressurrei~ao geral eo juizo final
ocorrerao simultaneamente, e serao seguidos imediatamente
pela conflagra~ao do velho ceu e da velha terrae pela revela~ao
de novas ceus e nova terra- Conf de Fe, Caps. 32 e 33.

8. Qual a teoria dos que sustentam que a vinda de Cristo sera


''premilenaria" *, e que Ele reinara pessoalmente na terra durante
mil anos antes do Juizo?
1°. Muitos dos judeus, cometendo erro total quanta ao
carater espiritual do reino do Messias, criam que, assim como
a Igreja tinha existido dois mil anos antes de se lhe dar a Lei,
assirn tarnbern haveria de existir dois mil anos debaixo da Lei,
que o Messias corne~aria en tao o Seu reino pessoal, e que este,
por sua vez, haveria de continuar dois mil anos, ate ao corne~o
do dia eterno do Senhor. Eles esperavarn que o Messias reinaria
visivel e gloriosarnente ern Jerusalern, como capital, sabre
todas as na~oes do rnundo, e que os judeus, como Seu povo
escolhido, seriarn exaltados arnaior dignidade e gozariarn de
privilegios proerninentes.
2°. Os "pais" apost6licos do ramo judaico-cristao da Igreja
- Barnabe, Hermes, Papias e outros- adotararn essa opiniao.

* Popularmente se empregam os termos "milenista", "premilenista", etc.


Em portugues o certo ecomo esta no texto acima, o que se aplica aos seus
cognatos. As vezes cedemos aquelas formas, por amor do lei tor comum.
Nota de Odayr Olivetti.

795
Capitulo 39

Permaneceu geralmente na lgreja desde o anode 150 ate ao de


250, sendo defendida por Irineu e Tertuliano. Depois desse
tempo a doutrina ensinada neste capitulo tern sido a doutrina
geralmente reconhecida por toda a lgreja, ao passo que o
milenarismo ou quilianismo tern se limitado a individuos e
partidos transit6rios. Seus defensores fundavam sua doutrina
na interpreta~ao literal de Apoc. 20:1-10, e sustentavam- (1)
Que, depois do desenvolvimento da apostasia anticrista, num
tempo determinado de muitos e diversos modos, Cristo viria
subitamente e come~aria Seu reino pessoal de mil anos em
Jerusalem. Os que tivessem morrido em Cristo (alguns, porem,
diziam que s6 os martires) ressuscitariam entao e reinariam
com Ele na terra, a maioria de cujos habitantes estaria con-
vertida, e viveria durante esse periodo em grande prosperidade
e felicidade, sendo convertidos durante esse tempo tambem
os judeus, que seriam todos reunidos em seu proprio pais. (2)
Que, depois dos mil anos, viria por urn curto espa~o de tempo
a apostasia final, que seria seguida da ressurrei~ao dos demais
mortos, isto e, os maus, seguida do seu julgamento e con-
dena~ao no ultimo dia, da conflagra~ao final e dos novos ceus
e nova terra.
3°. Os premilenaristas modernos, conquanto difiram
entre si sobre os pormenores das suas interpreta~6es, con-
cordam substancialmente com a teoria acima exposta.
Chamam-se premilenaristas porque creem que o advento de
Cristo aconteceraantes do milenio.

9. Quais os principais argumentos contra o premilenarismo?


1°. E evidentemente judaica em sua origem e em suas
tendencias.
2°. Nao concorda com o que as Escrituras ensinam, (1)
Quanto anatureza do reino de Cristo, e.g., (a) que nao e deste
mundo, e sim, espiritual, Mat. 13:11-44; Joao 18:36; Rom.
14:17; (b)quenaoselimitaaosjudeus,Mat.8:11,12; (c)que
a regenera~ao e a condi~ao de admissao a ele, Joao 3:3,5;

796
0 Segundo Advento...
(d) que as ben<;aos do Reino sao puramente espirituais, sendo
o perdao, a santifica<;ao, etc., Mat. 3:2,11; Col. 1:13,14. (2)
Quanto ao fato de que o reino de Cristo ja veio. Desde a Sua
ascensao ate agora Ele esta assentado sobre o trono do patriarca
Davi -Atos 2:29-36; 3: 13-15; 4:26-28; 5:29-31; Heb. 10: 12,13;
Apoc. 3:7-12. Segue-se que as profecias do Velho Testamento
que predizem este reino referem-se apresente dispensa<;ao da
gra<;a, e nao a urn reino futuro de Cristo exercido por Sua
propria Pessoa entre os homens em carne na terra.
3°. 0 segundo advento nao se dara antes da ressurrei<;ao,
quando todos os mortos, tanto maus como bons, ressuscitarao
ao mesmo tempo- Dan. 12:2; Joao 5:28,29; 1 Cor. 15:23; 1
Tess. 4: 16; Apoc. 20:11,15. Ha somente uma passagem (Apoc.
20:1-10) que, na aparencia, da a impressao de que esta em
desarmonia com o fa to aqui afirmado. Para a verdadeira inter-
preta<;ao dessa passagem, veja a pergunta subseqiiente.
4°. 0 segundo advento nao se clara antes do julgamento de
todos os homens, dos bons e dos maus juntos- Mat. 7:21-23;
13:30-43; 16:24,27; 25:31-46; Rom. 2:5,16; 1 Cor. 3:12-15; 2
Cor. 5:9-11; 2 Tess. 1:6-10; Apoc. 20:11-15.
5°.0 segundo advento sera acompanhado da conflagra<;ao
geral e da gera<;ao de "novos ceus e nova terra"- 2 Ped. 3:7-13;
Apoc. 20:11; 21:1. Brown, sobre o segundo advento.

10. Quais consideraf6es favorecem a interpretafiiO espiritual


e se opoem a interpretafiiO literal do Apocalipse 20:1-1 0?
Eisa interpreta<;ao espiritual desta dificil passagem: Cristo
tern em reserva para a Sua lgreja uma epoca de expansao uni-
versal e de imensa prosperidade espiritual, quando o espirito
e 0 carater do "nobre exercito dos martires" tornara a ser
produzido, de urn modo nunca visto, na grande multidao
componente do povo de Deus, e quando esses martires, na
vit6ria geral da sua causae no derrubamento dos seus inimigos,
receberao o beneficia do juizo sobre os seus inimigos e reinarao
na terra; nesse periodo, o partido de satanas, "os outros mortos",

797
Capitulo39
nao tornarao a florescer ate que sejam cumpridos os mil anos,
quando tornara a florescer por urn pouco de tempo.
Considera~6es a favor dessa interpretac;;ao:
I a. Acha-se num dos livros mais figurativos ou simb6licos
da Biblia.
2a. Essa interpretac;;ao esta em perfeito acordo com aquila
que noutras passagens as Escrituras ensinam mais explicita-
mente sobre os diversos pontos envolvidos.
3a. A mesma figura, isto e, a de tornar o morto a vida, e
empregada muitas vezes nas Escrituras para exprimir a ideia
de revivificac;;ao espiritual da Igreja- Is. 26: 19; Ez ..37: 12-14;
Os. 6:1-3; Rom. 11:15; Apoc. 11:11.
Considera~6es contrarias a interpretac;;ao literal dessa
passagem:
1a. A pretensa doutrina de duas ressurreic;;6es, primeiro a
dos justos e, depois de urn intervalo de mil anos, a dos maus,
nao se acha ensinada em nenhuma outra parte da Biblia, e essa
(mica passagem em que (aparentemente) se encontra e pouco
clara. Este e urn forte pressuposto contra a veracidade da
doutrina contra a qual nos opomos.
2a. Esta em desacordo com o que as Escrituras ensinam
uniformemente quanta a natureza do corpo da ressurrei~ao,
isto e, que sera "espiritual", nao "animal", nem de "carne e
sangue"- 1 Cor. 15:44. Contrariamente a esse ensino das
Escrituras, constitui parte essencial da doutrina associada a
interpreta~ao literal da referida passagem, que os santos, ou ao
menos os martires, deverao ressurgir e reinar com Cristo
durante mil anos em sua carne e neste mundo, como este se
acha constituido presentemente.
3a. A interpretac;;ao literal dessa passagem contradiz o claro
e uniforme ensino das Escrituras de que todos os mortos, bons
e maus, ressurgirao e serao julgados juntos (ou concomitante-
mente) por ocasiao da segunda vinda de Cristo e da completa
subversao da presente ordem da criac;;ao. Veja os testemunhos
biblicos reunidos sob a pergunta anterior.

798.
0 Segundo Advento...
11. Como se pode mostrar que a futura conversiio dos judeus e
ensinada nas Escrituras? r· ·

Isso Paulo, em Romanos 11:15-29, nao somente assevera,


porem tambem prova pelas profecias do VelhoTestamento,
e.g., Is. 59:20; Jer. 31:31. Veja tambem Zac. 12: IO; 2 Cor. 3:15,16.

12. Como expor os argumentos a favor e contra a opiniiio de


que os judeus seriam reconduzidos a seu proprio pais?
Argumentos a favor dessa restaura~ao ou recondu~ao:
1°. 0 sentido literal de muitas profecias do Velho Testa-
mento- Is. 11: 11,12; Jer. 3: 17; 16: 14,15; Ez. 20:40-44; 34:11-
31; 36:1-36; Os. 3:4,5; Amos 9:11-15; Zac. 10:6-10; 14:1-20;
3: 1-17.
2°. Que o territ6rio prometido por Deus a Abraao nunca
foi totalmente possuido, Gen. 15:18-21; Num. 34:6-12, e a
promessa foi repetida por boca de Ezequiel, 47:1-23.
3°. 0 pais, posto que possa sustentar uma popula~ao
imensa, esta agora pouco ocupado, evidentemente aespera de
habitantes. Veja Keith, Land ofIsrael.*
4°. Os judeus, embora espalhados entre todas as na~6es,
tern sido preservados miraculosamente como urn povo separado
e evidentemente a espera de urn destino tao assinalado e
peculiar como tern sido a sua hist6ria.
Argumentos contra a sua restaura~ao ou recondu~ao ao
pais de seus pais:
1°. 0 Novo Testamento absolutamente nada diz sabre tal
restaura~ao, e isso seria uma omissao inexplicavel nessa
revela~ao mais clara, se esse evento estivesse realmente no
porv1r.
2°. A interpreta~ao literal das profecias do Velho Testa-
mento que dizem respeito a esta questao seria muito for~ada ~
(1) Porque, para que a interpreta~ao seja consequente, e preciso

*Hodge escreveu no fim do seculol9; a reocupac;ao da Palestina por Israel


deu-se oficialmente a partir de 1948. Nota de Odayr Olivetti.

799
Capitulo 39

que seja literal em todas as suas partes. Seguir-se-ia entao que


o proprio Davi ha de ser ressuscitado para reinar pessoal-
mente em Jerusalem, Ez. 37:24, etc.; que hade ser restabelecido
do o sacerd6cio levitico, e serao oferecidos sacrificios cruentos
a Deus, Ez., capitulos 40 a 46; Jer. 17:25,26; que Jerusalem ha
de ser o centro do governo, que os judeus hao de constituir
uma classe superior na Igreja Crista e que dos confins da
terra hao de ir, semana ap6s semana, todos os adoradores
prestar culto na cidade santa- Is. 2.2,3; 66.20-23; Zac. 14:16-
21. (2) Porque essa in terpreta~ao conduz ao restabelecimen to
de todo o sistema ritual dos judeus e esta em desacordo com a
espiritualidade do reino de Cristo. Veja acima, Perg. 9. (3)
Porque essa interpreta~ao esta em desacordo com o que o
Novo Testamento ensina claramente a respeito da aboli~ao de
todas as distin~6es entre judeu e gentio: os judeus, quando
convertidos, tornarao a ser enxertados na mesma Igreja- Rom.
6:19-24; Ef. 2:13-19. (4) Porque essa interpreta~ao esta em
desacordo como que o Novo Testamento ensina quanto ao
designio temporario, a insuficiencia virtual e a aboli~ao final
do sacerd6cio levitico e seus sacrificios, e quanto asuficiencia
infinita do sacrificio de Cristo e a eternidade do Seu sacer-
d6cio- Gal. 4:9,10; 5:4-8; Col. 2: 16-23; Heb. 7: 12-18; 8.7-13;
9:1-14.
3°. Por outro lado, a interpreta~ao espiritual dessas profecias
do Velho Testamento- interpreta~ao que as considera como
predi~6es da pureza e da extensao futuras da Igreja Crista,
indicando estes assuntos espirituais por meio das pessoas, dos
lugares e dos ritos da antiga economia que eram tipos deles- e
naturale tambern esta de acordo com a analogia das Escrituras.
No Novo Testamento os cristaos sao chamados semente de
Abraao, Gal. 3:29; israelitas, Gal. 6:16; Ef. 2:13,19; os que
chegam ao monte de Siao, Heb. 12:22; cidadaos da Jerusa-
lem celeste, Gal. 4:26; a circuncisao, Fil. 3:3; Gal. 2:11, e em
Apoc. 2:9 sao chamados judeus. Ha tambem urn sacerd6cio
cristao e urn sacrificio espiritual-1 Ped. 2:5,9; Heb. 13: 15,16;

800
0 Segundo Advento ...

Rom. 12:1. Veja Fairbairn, Typology Appendix, Vol. 1.

13. Quem sera 0 juiz do mundo?


Jesus Cristo, em Seu carater oficial como Mediador, em
Suas duas naturezas, como o Deus-homem. Isso e evidente-
1o porque, em Mat. 25:31,32 o Juiz e chamado "Filho do
homem", e em Atos 17:31, "o varao que (Deus) destinou".
2°. Porque as Escrituras declaram que Deus "deu ao Filho
todo o juizo" e "o poder de exercer o juizo"- Joao 5:22,27.
3°. Porque, como Mediador, cabe-Lhe aperfei<;oar,
completar e manifestar publicamente a salva<;ao do Seu povo
e a destrui<;ao dos Seus inimigos, junto com a gloriosa justi<;a
da Sua obra a respeito de uns e outros, 2 Tess. 1:7-10; Apoc.
1:7; e efetuar, assim, "a restaura<;ao de tudo"- Atos 3:21. E
isso Ele fara pessoalmente, para que se torne mais manifesta a
Sua gloria, seja maior a humilha~ao dos seus inimigos vencidos,
e sejam mais completas as esperan<;as e o regozijo dos Seus
remidos.
. ·; '._,,_ : . ' .·

14. Quem serajulgado?


1°. A ra<;a inteira de Adao, sem nenhuma exce<;ao, de todas
as gera<;6es, condi<;6es e caracteres, devendo comparecer cada
individuo na inteireza da sua pessoa, "corpo, alma e espirito".
Os mortos serao ressuscitados e os vivos serao transformados
simultaneamente- Mat. 25:31-46; 1 Cor. 15:51,52; 2 Cor. 5: 10;
1 Tess. 4: 17; 2 Tess. 1:6-10; Apoc. 20:11-15.
2°. Todos os anjos maus- 2 Ped. 2:4; Jud., vers. 6. Os anjos
bons estarao presentes como assistentes e ministros - Mat.
13:41,42.

15. Em que sentido se diz que os santos julgariio o mundo?


Veja Mat. 19:28; Luc. 22:29,30; 1 Cor. 6:2,3; Apoc. 20:4.
Em virtude da uniao dos crentes com Cristo, a vit6ria eo
dominio dEle sao deles. Sao co-herdeiros com Ele, e, se
sofrerem com Ele tambem reinarao com Ele- Rom. 8: 17;

801
Capitulo 39
2 Tim. 2:12. Ele julgara e condenani os Seus inimigos como
Cabec;a e Campeao da Sua Igreja, e todos os Seus membros
darao assentimento ao Seu juizo e se gloriarao em seu triunfo
-Apoe. 19: 1-5. Hodge, Comm. on First Corinthians. (Comentario
de 1 Corintios).

16. Mediante qual principio sera exercido o Seu juizo? ''


Em Apocalipse (20: 12) o Juiz e representado figurada-
mente como, segundo a analogia dos tribunais humanos,
abrindo "os livros" (conforme as coisas escritas neles os mortos
deverao ser julgados), e tambem "outro livro", que e 0 "da
vida". Os livros mencionados primeiro sem duvida repre-
sentam em figura a Lei ou o padrao segundo o qual cada urn
devera ser julgado e os fatos que lhe dizem respeito, ou "as
suas obras". 0 "livro da vida" (veja tambem Fil. 4:3; Apoc.
3:5; 13:8; 20: 15) eo livro do eterno am or de Deus, que 0 levou
a escolher os Seus. Aqueles cujos names se acharem escritos
no "livro da vida" serao declarados justos por terem parte na
justic;a de Cristo. A respeito de suas boas obras, porem, e do
seu carater santo, sera declarado que sao as provas da sua eleic;ao,
da sua relac;ao com Cristo, e da gloriosa obra efetuada neles
por Cristo- Mat. 13:43; 25:34-40.
Aqueles cujos nomes nao se acharem escritos no "livro da
vida" serfw condenados por motivo das mas obras que
praticaram estando no corpo, julgadas segundo a lei de Deus,
nao como aprouve a cada urn imaginar essa Lei, e sim como
foi mais ou menos claramente revelada a cada urn pelo Juiz. 0
gentio que pecou sem a Lei escrita, sem a Lei sera julgado,
isto e, sera julgado pela "obra da lei escrita em seu corac;ao"
fazendo-se ele mesmo lei para si- Luc. 12:47,48; Rom. 2:12-
15. 0 judeu que pecou, tendo a Lei, "com a lei sera julgado"-
Rom. 2:12. Cada individuo que vive sob a luz da revelac;ao
crista sera julgado em estrita conformidade com toda a vontade
de Deus, como esta lhe foi revelada, sen do tambem modificada
a responsabilidade individual de cada urn por todas as

802
0 Segundo Advento...
vantagens especiais de qualquer genero que cada qual gozou-
Mat.ll:20-24;Joao3:19.
Os segredos de todos os cora~6es, o estado interno de cada
urn e os mais bern ocultos motivos de suas a~6es, bern como
cstas mesmas, tudo isso sera apresentado como materia de
julgamento, Eel. 12: 14; 1 Cor. 4:5, e sera declarado publica-
mente para vindicar a justi~a do Juiz e tornar manifesta a
vergonha a qual sera levado o pecador- Luc. 8:17; 12:2,3;
Mar. 4:22. Se os pecados dos santos serao ou nao apresentados
no Juizo e ponto nao decidido pelas Escrituras, embora seja
muito discutido por certos teologos. Se forem apresentados,
temos a certeza de que sera feito isso unicamente com a
finalidade de aumentar a gloria do Salvadore a consola~ao
dos salvos.

17. Que revelam as Escrituras a respeito da futura conflagrafiio


da nossa terra?
As principais passagens que dizem respeito a esse ponto
sao: Sal. 102:26,27; Is. 51:6; Rom. 8:19-23; Heb. 13:26,27; 1
Ped. 3: 10-13; Apoc., capitulos 20 e 21.
Muitos dos teologos antigos foram de opiniao que essas
passagens indicam que devia ser destruido inteiramente o
universo fisico que agora existe. Mas essa ideia foi abandonada
universalmente. Houve tam bern quem afirmasse que esta terra
haveria de ser aniquilada.
A opiniao mais comum e provavel e que na "restaura<;:ao
de tudo", Atos 3:21, a terrae sua atmosfera serao expostos a
urn calor intenso, que mudara radicalmente sua atual condi<;:ao
fisica, produzindo em lugar da presente ordem de coisas uma
ordem superior, que aparecera como "novos ceus e nova terra",
nos quais "a mesma criatura sera libertada da servidao da
corrup<;:ao, para a liberdade da gloria dos filhos de Deus", Rom.
8:19-23, e nos quais a constitui<;:ao do novo mundo estara
adaptada aos corpos "espirituais" dos santos, 1 Cor. 15:44, para
ser o teatro da sociedade celeste, e sobretudo o templo e palacio

803
Capitulo 39
do Deus-homem para sempre-Ef. 1:14; Apoc. 5:9,10; 21:1-5.
Veja tarnbern Fairbairn, Tjpology, Vol. 1, Parte 2, Cap. 2,
Se<;ao 7.

18. Qual deve ser o efeito moral da doutrina biblica do segundo


advento de Cristo? 'l
Deve ser urn consolo para os cristaos em suas tristezas e
urn estirnulo para que cumpram seus deveres- Fil. 3:20; Col.
3:4,5; Tia. 5:7; 1 Joao 3:2,3. E tambem seu deveramar, vigiare
esperar pela vinda do seu Senhor e apressar-se para ela - Luc.
12:35,37; 1 Cor. 1:7,8; Fil. 3:20; I Tess. 1:9,10; 2 Tim. 4:8; 2
Ped. 3: 12; Apoc. 22:20. ·
Quanro aos jncreduJos, esra dourrjna deve encbe-Jos de
apreensao e terror e leva-los ao arrependirnento imediato -
Mar. 3:35,37; 2 Ped. 3:9,10; Jud., vers. 14,15. Brown, Second
Advent. ~·'

EXPOSI<;OES ECLESIASTICAS AUTORIZADAS

Agostinho (De Civitate Dei, 20, 7) informa que ja sustentara


a doutrina de urn sabado milenario, mas que depois a
rejeitou, e defende a doutrina exposta neste capitulo, que
daf por diante tern sido a da igreja cat6lica romana.
Conf De Augsburgo, Parte 1, Art. 17: "Ensinam tambem
que Cristo aparecera no fim do mundo para executar juizo,
e que ressuscitara os mortos e clara vida e felicidade eternas
aos justos eleitos, mas condenara os homens maus e os
demonios para serem atormentados para sempre. Con-
denam os anabatistas que creem que teni fim o castigo
futuro dos homens e dos dem6nios perdidos. E condenam
outros que espalham opini6es judaicas, ensinando que antes
da ressurrei<;:ao dos mottos os justos ocuparao o governo
do mundo e os maus estarao em sujei<;:ao em toda parte".
A Confissfio Jnglesa de Eduardo VI: "Os que procuram
ressuscitar a fabula dos milenaristas op6em-se as Sagradas
Escrituras e se precipitam em loucuras judaicas."

804
0 Segundo Advento...
Conf Belgica, Art. 37: "Em ultimo lugar, cremos, segundo
a Palavra de Deus, que o nosso Senhor Jesus Cristo voltara
corporal e visivelmente do ceu, na maior gloria, quando
chegar o tempo predeterminado por Deus, porem nao
conhecido por nenhuma criatura, quando estiver completo
o numero dos eleitos ... Naquele tempo todos os que terao
morrido no mundo ressurgirao".
Conf de Westminster, Cap. 32 e 33; Cat. Maior, Pergs. 87-
89. Estes (simbolos de fe) ensinam - 1. No ultimo dia
havera uma ressurrei~ao geral, tanto dos justos como dos
injustos. 2. Todos OS que estiverem vivos serao trans-
formados imediatamente. 3. Logo depois da ressurrei~ao
acontecera o julgamento geral e final dos homens e dos
anjos bons e maus. 4. A data desse dia e hora Deus de
prop6sito mantem em segredo. Nas Perguntas 53-56 ainda
nos e ensinado que a segunda vinda de Cristo s6 ocorrera
no "ultimo dia", no "fim do mundo", e que Ele vira entao
"para julgar o mundo com justi~a".

; ~ .

0 T t

. ~ i . J.-
. r, ,

805
40

0 Ceu e o Inferno 1
1. Qual o sentido em que os ,termos ouran6s, "ceu", e ta
epourania, "lugares celestiais", sao empregados no Novo
Testamento? ~
Ouran6s e termo empregado principalmente em tres
sentidos-
1°. A atmosfera em que voam os passaros - Mat. 8:20;
24:30.
2°. A regiao em que revolvem as estrelas.- Atos 7:42; Heb.
11:12.
3°. A morada da natureza humana de Cristo, o teatro da
manifesta<;iio especial da gloria divina e da bem-aventuran<;a
eterna dos Santos- Heb. 9:24; 1 Ped. 3:22. Este e chamado as
vezes "terceiro ceu" - 2 Cor. 12:2. As frases "novos ceus" e
"nova terra", em contraste com 0 "primeiro ceu" e a "primeira
terra", 2 Ped. 3:7,13; Apoc. 21:1, referem-se a alguma mudan<;a
niio explicada, que dar-se-a na catastrofe final, quando Deus
vai revolucionar a nossa parte do universo fisico, limpa-la da
mancha do pecado e prepara-la para ser morada dos bem-
-aventurados.
Quanta ao uso da frase "reino dos ceus", veja acima,
Cap.27, Perg. 5.
Afrase ta epourania e traduzida "coisas celestiais" em Joiio
3:12, onde significa os misterios do mundo invisivel. Em Ef.
1:3; 2:6 e 6:12 e traduzida "lugares celestiais", e significa o
estado em que o crente e introduzido pela regenera<;iio; veja

806
0 Ceu eo Inferno
tam bern Ef. 1:20, on de a tradu~ao e "nos ceus". A referencia e
sempre ao universo extraterreno.

2. Quais as expressi5es principais, tanto figuradas como literais,


empregadas nas Escrituras para designar a bem-aventuranr;a futura
dos santos?
Express6es literais: a vida, a vida eterna- Mat. 7:14;
19:16,29; 25:46. A gloria, a gloria de Deus, urn peso eterno
de gloria- Rom. 2:7,10; 5:2; 2 Cor. 4:17. A paz- Rom. 2:10.
A salva~ao, a salva~ao eterna- Heb. 5:9". Veja Hitto, Bibl.
Encycl.
Express6es figuradas: "0 Paraiso- Luc. 23:43; 2 Cor. 12:4;
Apoc. 2:7. AJerusaU~m Celestial- Gal. 4:26; Apoc. 3:12. Reino
dos ceus, reino celestial, reino eterno, reino preparado desde o
principia do mundo- Mat. 25:34; 2 Tim. 4:18; 2 Ped. 1:11.
Heran~a eterna-l Ped. 1:4; Heb. 9:15. E-nos dito que os bem-
-aventurados assentam-se com Abraao, Isaque e Jaco, e que
estao no seio de Abraao, Luc. 16:22; Mat. 8:11; que reinam
com Cristo, 2 Tim. 2: 11,12; que gozam urn descanso sabatico,
He b. 4: 11,12"- Kitto, ibid.

3. 0 que nose revelado a respeito do ceu como um Iugar?


Todas as representa~6es biblicas envolvem a ideia de urn
lugar definido, bern como a de urn estado de bem-aventuran~a.
A respeito daquele lugar, porem, nada mais nos e revelado,
senao somente que edefinido pela presen~a local da alma e do
corpo finitos de Cristo, e que e o teatro da manifesta~ao
proeminente da gloria de Deus- Joao 17:24; 2 Cor. 5:9; Apoc.
5:6.
Segundo Rom. 8:19-23; 2 Ped. 3:5-13; Apoc. 21:1, parece
provavel que, depois da destrui~ao geral da forma atual do
mundo, por meio do fogo, que acompanhara o Juizo, este
mundo sera reconstituido e adaptado gloriosamente para sera
morada permanente de Cristo e Sua Igreja. Assim como ha-
vera urn "corpo espiritual", talvez haja, no mesmo sentido,

807
Capitulo 40 ~
I
urn mundo espiritual, isto e, urn mundo adaptado para ser o
teatro dos espiritos glorificados dos santos aperfei~oados. Assim
como a natureza foi amaldi~oada por causa do homem, e a
criatura esta, por culpa dele, "sujeita avaidade", pode ser que j
elas tambern tenham parte com ele em sua reden~ao e exalta~ao.
Veja TYpology, Parte 2, Cap. 2, Sec. 7, de Fairbairn.

4. Em que consiste a bem-aventuranfa do ceu, ate onde nos e ,


revelada?
1°. Negativamente: no livramento perfeito do pecado e de
todas as suas conseqiH~ncias, fisicas, morais e soci:;1is - Apoc. J
7: 16,17; 21:4,27. '
2°. Positivamente: (1) Na perfei~ao da nossa natureza,
material hem como espiritual; no pleno desenvolvimento e
exerdcio harmonioso de todas as nossas faculdades morais e
intelectuais, e no progresso desimpedido, durante toda a
eternidade-1 Cor.13:9-12; 15:45-49; 1 Joao 3:2. (2) Em vermos
o nosso bendito Redentor, em desfrutarmos de comunhao
com a Sua Pessoa, de participa~ao em toda a Sua gloria e
bem-aventuran~a e, por intermedio dEle, de comunhao com
todos os santos e anjos- Joao 17:24; 1 Joao 1:3; Apoc. 3:21;
21:3-5. (3) Naquela "visao beatifica de Deus" que, consistindo
em descobrirmos cada vez mais claramente a excelencia
divina apreendida com amor, transformara a alma a mesma
imagem, de gloria em gloria- Mat. 5:8; 2 Cor. 3: 18.
Quando meditarmos naquilo que as Escrituras revelam
das condi~6es da excelencia celestial, devemos evitar dois erros:
(1) 0 extremo de considerar o modo de existencia que
desfrutam os santos no ceu como muito semelhante ao da nossa
vida terrena; (2) 0 extremo oposto de considerar as condi~6es
da vida celestial como inteiramente diversas das pertencentes
anossa vida presente. 0 primeiro desses extremos produzira
naturalmente o mau efeito de rebaixar, mediante associa~6es
indignas, as nossas ideias sobre o ceu; e o outro extremo
produzira o mau efeito de destruir em grande parte o poder

808
0 Ceu e o Inferno
moral que a esperan~a do ceu deveria ter sobre o nosso cora~ao
e a nossa vida, tornando vagas as ideias que formarmos sobre
ele e, por conseguinte, distante e fraca a nossa simpatia por
suas caracteristicas. Para evitarmos tanto urn como o outro
extremo, Cnecessaria que fixemos OS limiteS dentro dos quais
devem conter-se as nossas ideias sobre a existencia futura dos
santos, distinguindo entre aqueles elementos da natureza do
homem e das suas rela~6es com Deus e com os outros hom ens,
que sao essenciais e imutaveis, e aqueles que terao que ser
modificados para que se torne perfeita a sua natureza em suas
rela~6es. : ... : l. ·', ;,; ; 1
CONSIDEREMOS: ~. ;;, .;,,.- ,1 c.~:;.;.: .';
1°. Ocorrerao necessariamente as seguintes mudan~as: (1)
Todo o pecado e suas conseqiiencias terao que ser tirados; (2)
"Corpos espirituais" terao que substituir nossa carne e nosso
sangue; (3) Os novos ceus e a nova terra terao que substituir os
ceus e a terra atuais como teatro da vida do homem; (4) As leis
da organiza~ao social terao que ser mudadas radicalmente,
porque no ceu nao havera casamentos, porem sera introduzida
uma ordem social analoga a dos anjos de Deus.
2°. Os seguintes elementos sao essenciais, e por isso
imutaveis: (1) 0 homem continuara a existir sempre como
composto de duas naturezas, espiritual e material. (2) Ele e
essencialmente intelectual, e necessariamente vive pelo conhe-
cimento. (3) E tambem essencialmente ativo, e e necessaria
que tenha alguma coisa para fazer. (4) 0 hom em, como criatura
que e, so pode conhecer a Deus indiretamente, isto e, por meio
de Suas obras de cria~ao e providencia, da experiencia da Sua
obra de gra~a em nossos cora~6es, e por meio de Seu Filho
encarnado, que e a imagem da Sua Pessoa e a plenitude da
Dei dade, corporalmente. Segue-se que no ceu Deus continuara
a ensinar os homens por meio de Suas obras, e a operar neles
por meio de motivos dirigidos a sua vontade mediante a sua
inteligencia. (5) A memoria do homem nunca perde para
sempre nem a mais leve impressao, e sera parte da perfei~ao

809
Capitulo 40
celestial o fato de que toda a experiencia adquirida estara t
sempre perfeitamente a servi~o da vontade. (6) 0 homem e ~
essencialmente urn ser social. Isso, tornado em conexao como
ponto anterior, indica que as associa~6es, bern como a expe-
riencia da nossa vida terrena, levarao consigo para o novo modo 1
de existencia todas as suas conseqiiencias, exceto onde forem ·
necessariamente modificadas (nao perdidas) pela mudan~a.
(7) A vida do homem e essencialmente urn progresso eterno
para a perfei~ao infinita. (8) Todas as conhecidas analogias das
obras de Deus na cria~ao, na Sua providencia, nos mundos
material e espiritual, e na Sua dispensa~ao da gra~a (1 Cor.
12:5,28), indicam que entre os santos no ceu haveni diferen~as
quanto as suas capacidades e qualidades inerentes e tambem
quanto a sua ordem relativa e aos seus oficios. Essas diferen~as
serao, sem duvida, determinadas (a) por diferen~as consti-
tucionais de capacidade natural; (b) por recompensas providas
pela gra~a de Deus no ceu correspondendo em grau e genero a
fidelidade, sob a gra~a, do individuo na terra, e (c) pela
soberania absoluta do Criador-Mat. 16:27; Rom. 2:6; 1 Cor.
12:4-28.

5. Quais sao as principais expressi5es literais e figuradas,


aplicadas nas Escrituras a condir;iio futura dos reprobos?
Como lugar, e as vezes designada literalmente por ades,
hades, e as vezes por geena; am bas as palavras sao traduzidas
por inferno- Mat. 5:22,29,30; Luc. 16:23 (VA). Tambem pela
frase "lugar de tormentas" - Luc. 16:28. Como condir;iio de
sofrimento, e designada pelas frases "ira de Deus", Rom. 2:5, e
"segunda morte", Apoc. 21:8.
Express6es figuradas: Fogo eterno, preparado para o diabo
e seus anjos- Mat. 25:41. "Para o inferno, para o fogo que
nunca se apaga; onde o seu bicho nao morre, e o fogo nunca
se apaga"- Mar. 9:44. 0 lago que arde com fogo e enxofre-
Apoc. 21:8. 0 abismo- Apoc. 9:2. A natureza terrivel dessa
morada dos maus e revelada por express6es como "trevas

810
0 Ceu eo Inferno
cxteriores", o Iugar onde ha "choro e ranger de dentes", Mat.
8:12; "estouatormentadonestachama",Luc.16:24; "fogo que
nunca se apaga", Luc. 3: 17; "fornalha de fogo", Mat. 13:42; "a
negrura das trevas", Judas, vers. 13; "atormentado com fogo e
enxofre", Apoc. 14: 10; "o fumo do seu tormento sobe para todo
o sempre; e nao tern repouso nem de dia nem de noite", Apoc.
14: 11 -Bib. Ency., de Kitto.

6. Que nos ensinam as Escrituras quanta anatureza da punifiio


futura?
E evidente que sao figurados os termos empregados nas
Escrituras para descrever esses sofrimentos; todavia, esta-
belecem com certeza os seguintes pontos: esses sofrimentos
consistirao-
1°. Na perda de todo o bern, quer natural, concedido por
intermedio de Adao, quer resultante da gra~a, oferecido por
Cristo.
2°. Em todas as conseqiiencias naturais do pecado des-
enfreado, no abandono judicial, no 6dio total a Deus e na
terri vel sociedade dos homens perdidos e dos espiritos malignos
- 2 Tess. 1:9.
3°. Na infli~ao positiva de tormentas, naira e na maldi~ao
de Deus executadas tanto na natureza moral como na natureza
fisica dos seus objetos. As Escrituras estabelecem tambem o
fato de que esses sofrimentos serao- (1) Mais terriveis do que
nos e dado imaginar. (2) Sem fim, interminaveis. (3) De
diversos graus, proporcional ao demerito de cada pessoa (em
fun~ao da menor ou maior gravidade dos pecados de cada
pessoa)- Mat. 10: 15; Luc. 12:48.

7. Qual o usa das palavras ai6n, eternidade, e ai6nios, eterno,


no Novo Testamento, e qual o argumento que, baseado nelas,
estabelece a durafiio sem fim da punifiio futura?
1°. A lingua grega nao possui termos mais enfaticos que
esses para exprimir a ideia de dura~ao sem fim.

811
Capitulo 40
2°. Posta que sejam empregados as vezes no Novo
Testamento para designar uma dura~ao limitada, todavia, na
maioria imensa dos casas, evidentemente designam dura~ao
ilimitada.
3° Sao empregados para exprimir a dura~ao sem fim de
Deus. (1) A palavraai6n eassim empregada em 1 Tim. 1:17, e
eaplicada a Cristo em Apoc.1: 18. (2) A palavraai6nias e assim
empregada em Rom. 16:26, e aplicada ao Espirito Santo- Heb.
9:14.
4°. Ambos os termos sao empregados para exprimir a
dura~ao sem fim da felicidade futura dos santos. (1) 0 vocabulo
ai6n e assim empregado em Joao 6:57,58; 2 Cor. 9:9. (2) 0
vocabuloai6nios eassim empregado em Mat. 19:29; Mar. 10:30;
Joao 3: 15; Rom. 2:7.
5°. Em Mat. 25:46 a mesmissima palavra e empregada
numa s6 clausula para definir tanto a dura~ao da felicidade
futura dos santos como da miseria dos perdidos. Assim, pois,
as Escrituras declaram explicitamente que a dura~ao da miseria
futura sera sem fim, no mesmo sentido em que sao sem fim a
vida de Deus e a bem-aventuran~a dos santos. Veja o exame
erudito, independente, critico e conclusivo que do uso dessas
palavras no Novo Testamento fez o falecido professor Moses
Stuart, na obra Stuart's Essays on Future Punishment (Ensaios
de Stuart sabre o Castigo Futuro- ou, sabre as penas eternas).

8. Qual a prova que a favor da verdade sabre este assunto e


fornecida pelo usa da palavra aidios no Novo Testamento?
Essa palavra, em cuja forma~ao entra o vocabuloaei, sempre,
para sempre, significa no grego classico,eterno. Encontra-se duas
vezes no Novo Testamento: em Romanos 1:20, "tanto o seu
eterno poder, como a sua divindade"; e em Judas, vers. 6, "E
aos anjos que nao guardaram o seu principado, mas deixaram
a sua propria habita~ao, reservou na escuridao, e em pris6es
eternas...". Mas os homens que se perdem compartilham do
destino dos anjos que se perderam- Mat. 25:41; Apoc. 20:10.

812
0 Ceu eo Inferno

Assim, a mesma palavra exprime a dura~ao da Deidade e a


dura~ao dos sofrimentos dos perdidos.

9. Que outras provas mais fornecem as Escrituras sabre este


assunto?
1a. Nao ha nada nas Escrituras que, mesmo de Ionge, su-
gira a ideia de que os sofrimentos dos perdidos terao fim.
2a. A constante aplica~ao a este assunto da linguagem
figurada, expressa em termos como "o fogo que nunca se apaga",
"o seu bicho nao morre", "abismo", a necessidade de se pagar
ate o "ultimo ceitil", "e o fumo do seu tormento sobe para
todo o sempre"- Luc. 3: 17; Mar. 9:45,46; Apoc. 14:11, s6 e
compativel com a conviq:ao de que Deus quer que nos
creiamos, baseados na Sua autoridade, que a puni<;;ao futura e
literalmente sem fim. Dos que cometerem o pecado
irremissfvel se diz que nunca lhes sera perdoado, "nem neste
mundo nem no porvir"- Mat. 12:32 (ARA).
Tem-se argumentado que a linguagem e figurada, e cita-
-se o dito: "Theologia symbolica non est demonstrativa". Everdade.
Mas o que representam essas figuras? Que e que Deus quer
ensinar por meio desses sfmbolos? E inquestionavel que cada
urn deles, tomando-se urn por urn, pode ser feito em peda<;;os
e tornar duvidoso o seu sentido. Mas devemos 1embrar- (1)
Que essa linguagem e caracterfstica de todas as revela<;;6es
divinas que temos do porvir daqueles que morrem impe-
nitentes. Descri<;;6es como essas colorem uniformemente a
representa~ao inteira. (2) A Bfblia foi destinada a instru<;;ao
publica; por isso, o sentido 6bvio deve ser o que o seu Autor
queria comunicar e, por conseguinte, e o sentido garantido
pela veracidade divina. Esta e uma considera~ao de peso
especial no caso desta doutrina, porque- (a) Edoutrina pratica,
e diz respeito a cada pessoa, individualmente. (b) A linguagem
encontra-se frequentemente e capta a aten~ao de todos os
leitores. (c) A Igreja hist6rica, toda ela (com algumas exce<;;6es
individuais), tern, como materia de fato, interpretado essa

813
Capitula40
linguagem no sentido de sofrimento interminavel, e isso ape-
sar da pressao constante e tremenda dos desejos humanos a
favor de uma conclusao contraria.

10. Qual a supasiftia pravavel que sabre este assunta aferecem


a raziio e a experiencia?
As Escrituras nos ensinam- (1) Que o homem esta morto
no pecado e que e mora1mente impotente. (2) Que o arre-
pendimento e a fe sao operados na alma pelo Espirito Santo.
A experiencia nos ensina que, como deveres, o arrependimento
e a fe sao coisas muito dificeis, mesmo nas condi~6es mais
favoraveis. A razao e a experiencia juntas nos ensinam que,
quanto mais tempo uma pessoa vive, tanto mais dificeis e raros
se tornam o arrependimento e a fe, e tanto mais definidamente
fixos se tornam o seu carater morale os seus costumes. Dai:
1°. As condi~6es mais favoraveis possiveis sao aquelas em
que estamos nesta vida, isto e, juventude, carater ainda imaturo,
a Palavra, o Espirito Santo, a providencia de Deus e a Igreja
Crista. Demonstra~6es sobrenaturais e penas purgatoriais nao
teriam efeito moral igual ao das condics6es que acabamos de
mencionar. "Se nao ouvem a Moises e aos profetas, tampouco
acreditarao, ainda que algum dos mortos ressuscite"- Luc.
16:31.
2°. A lei dos habitos e do carater moral fixo conduz a
conclusao de que a esperan~a de uma mudan<;;a favoravel nao
pode deixar de diminuir rapidamente, amedida que se adie o
arrependimen to.

11. Quais as duas tearias que sabre esta questiia tem sida
SUStentadas par diversas pessaas, em apasiftiO aji proclamada par
toda a lgreja Cristti e aa clara ensina da Palavra de Deus?
1°. Ada extin~ao total da existencia dos reprobos, como a
senten~a da "segunda morte", depois do juizo final. Essa
doutrina, popularmente descrita em termos de "aniquila~ao
dos maus", e por seus defensores, "imortalidade condicional",

814
0 Ceu e o Inferno

e defendida habilmente por C. R Hudson em seu livro Debt


and Grace as Related to the Doctrine ofa Future Life (0 Debito e
a Gra<;:a em Rela<;:ao a Doutrina de uma Vida Futura), por
Henry Constable em The Duration and Nature of Future
Punishment (Dura<;:ao e Natureza da Puni<;:ao Futura), pelo
arcebispo Whately em View ofScripture Revelation Concerning
a Future State (0 Conceito da Revela<;:ao das Escrituras
Concernente a urn Estado Futuro) e por Edward White em
Life of Christ (A Vida de Cristo).
Eles argumentam que a palavra "morte" significa sempre
"cessa<;:ao de existencia", e que "destrui<;:ao eterna" significa
sempre "por fora da existencia".
RESPONDEMOS-(1) Eles nao conseguem, de modo algum,
demonstrar que as palavras e frases supracitadas tern em
qualquer caso, e menos ainda que tern sempre, o sentido que
eles lhes atribuem. (2) Sua doutrina esta em aberta contradi<;:ao
com a apresenta<;:ao uniforme das Escrituras quanto ao estado
final dos impenitentes, como foi ilustrado acima, Perg. 9. (3)
A doutrina deles esta em contradi<;:ao com o instinto natural e
universal de imortalidade, de que dao testemunho as religi6es
e a literatura de todas as na<;:6es, quer pagas, quer judaicas,
quer cristas.
2°. A opiniao dos que em geral concordam em ensinar a
futura restaura<;:ao dos pecadores, ap6s urn periodo indefinido
de disciplina purificadora depois da morte, quer no estado
intermediario, quer depois do Jufzo (veja acima, Cap.37, Perg.
21). Essa opiniao baseia-se (1) numa classe de passagens
biblicas que, segundo se diz, ensinam a restaura<;:ao de todas
as coisas, como sejam Atos 3:21; Ef. 1:10; Col. 1:19,20, etc.
(2) Naquilo que eles chamam intui<;:ao moral de que urn castigo
eterno seria indigno de Deus. . '·-, ;, r" J
RESPONDEMOS- (1) As passagens das Escrituras em que
se baseia o argumento s6 seriam compativeis com essa teoria
de final salva<;:ao universal se nao existissem nas Escrituras
declara<;:6es explicitas no sentido contn1rio. E necessaria que

815
Capitulo40
se interprete cada classe de textos biblicos com referencia a
outros, e e evidente que 0 explicito e definido e a regra para 0
que e geral e indefinido. :E axiomatico que as palavras "tudo"
e "todas as coisas" abrangem mais elementos ou menos, segundo
o assunto de que se trata. Admitimos com prazer - (a) que
TO DOS os que estao em Cristo serao vivificados, e (b) que Ele
Se tornara o Cabe<;;a de TODAS AS COISAS, absolutamente sem
exce<;;ao, no sentido de que o universo inteiro, incluindo os
amigos e os inimigos do Senhor, se tornarao sujeitos a Sua
supremacia real, que toda revolta sera vencida, e que a cada
classe sera atribuida a sua propria esfera. Veja abaixo, Perg. 14.
(2) Quanto a "intui<;;ao" ou as "intui<;;6es" em que se funda a
doutrina em apre<;;o, abaixo se mostrarii que nao merecem
confian<;;a (Pergs. 12 e 13). (3) Assim como a esperan<;;a de
uma reforma moral, numa outra vida, nao esta de acordo com
as apresenta<;;6es das Escrituras, assim tampouco e confirmada
pelo que ensinam a razao e a experiencia. Veja acima, Perg. 10.

12. Quais as objefoes que, derivadas da justifa de Deus, se


fazem contra esta doutrina?
A justi<;;a de Deus exige- (1) Que ninguem pade<;;a por
aquilo pelo que nao e responsavel. (2) Que o castigo esteja em
todos os casos a medida exata da culpa de quem o sofre.
Existe quatro obje<;;6es -
1°. Ha multi does nos paises pagaos, e ate nos cristaos, que
nao tern nenhuma responsabilidade por serem impenitentes,
porque nunca, em toda a sua vida, tiveram a oportunidade de
conhecer ou receber a Cristo.
RESPONDEMOS - As declara<;;6es diretas da Bfblia, a
analogia inteira do sistema cristao, e a experiencia de todos os
cristaos, sao unanimes em declarar que toda a ra<;;a humana e
culpada e merece a ira e a maldi<;;ao procedentes de Deus ja
antes da dadiva de Cristo e de ser Ele rejeitado. Se nao fosse
assim, nao seria necessaria que Cristo vi esse paraexpiar a culpa.
E, se nao fosse assim, Cristo teria morrido em vao, e a salva<;;iio

816
0 Ciu eo Inferno
seria uma divida paga, e nao uma GRA<;A concedida.
2°. Nenhum pecado de uma criatura finita pode merecer
uma pena infinita; mas urn castigo sem fim e uma pena infinita.
RESPONDEMOS - A palavra infinito nesta conexao induz
ao erro. E claro que pecado sem fim merece castigo sem jim, e
isso e tudo o que as Escrituras e a Igreja ensinam. Urn s6 pecado
merece a ira e a maldi~ao procedentes de Deus. Ele nao tern,
em justi<;;a, a obriga~ao de prover reden~ao. No momento em
que uma alma peca, ela e cortada da comunhao e da vida de
Deus. Enquanto permanecer nesse estado, continuara a pecar.
Enquanto continuar a pecar, continuani a merecer a ira e a
maldi~ao que procedem de Deus. E evidente que as mas
disposi<;;6es nutridas e os maus atos praticados no inferno
merecerao e receberao tao estritamente o devido castigo como
o mereceram e receberam os praticados e nutridos nesta vida.
Se nao fosse assim, seria verdadeiro o principio monstruoso
de que quanto pi or se tornar urn pecador, tanto menos merecera
e1e censura e castigo.
3°. 0 infinito nao admite graus, todavia a culpa dos
diversos pecadores e maior ou menor. < '":;'i "' .,.;, :;

RESPONDEMOS- Esta e uma cavila<;;ao sumamente desleal.


E evidente que penas igualmente eternas podem variar
indefinidamente em grau.
4°. A diferen<;;a moral entre o pior santo salvo eo melhor
pecador perdido pode ser imperceptive!, e, no entanto, a
diferen<;;a dos seus destinos e infinita.
RESPONDEMOS - E verdade, mas o tratamento do mais
indigno crente tern por fundamento a justi<;;a de Cristo, e o
tratamento do menos indigno incredulo tern por fundamento
seu proprio carater e conduta.

13. Qual a objefiiO que, extraida da benevolencia de Deus, se


faz contra esta doutrina?
Ha duas reivindica~6es-
1o. Que a benevolencia de Deus 0 levara a fazer tudo

817
Capitulo 40
quanto esta em Seu poder para promover a felicidade de Suas
criaturas; e que, como nao temos nenhum direito de limitar
esse poder, temos o direito de esperar que Ele afinal pro-
porcionara a felicidade de todos.
RESPONDEMOS- (1) A benevolencia de Deus 0 leva a
proporcionar a felicidade de todas as Suas criaturas ate onde
isso ecompativel com estes Seus outros atributos- sabedoria,
santidade e justi<;,:a. (2) Sabemos pela experiencia de todos que
Ele inflige sobre Suas criaturas males que nao tern nenhuma
tendencia nerri influencia alguma para prom over finalmente
a felicidade dos individuos que os sofrem. (3) A benevolencia
do supremo Governador Moral, interessado que e na paz e na
pureza do universo, esta de acordo com Sua justi<;,:a em exigir a
execu<;,:ao da pena total da lei sobre todos os que quebrantam a
lei, e especialmente sobre todos os que aumentam a sua culpa
rejeitando o Filho de Deus que morreu na cruz.
2°. Que as apuradas intui<;,:6es dos cristaos lhes asseguram
que e incompativel com as perfei<;,:6es morais de Deus,primeiro
trazer a existencia seres imortais sob as condi~6es comuns a
maioria dos homens, edepois condena-los a uma vida posterior
de miseria eterna.
RESPONDEMOS - (1) A permissao para que o pecado
entrasse no mundo e um grande misterio. Que os seres
humanos, ja antes de nascerem, perdessem sua inocencia em
Adao e urn grande misterio. Todavia, todo ser humano
esclarecido sabe que esta sem desculpa e que merece a ira de
Deus. (2) Deus, por meio da pena que executou em Seu proprio
Filho, quando Ele sofreu em nosso lugar, mostrou em que
conta Ele tinha a terri vel culpa dos homens. (3) Eurn absurdo
dizer que as nossas intui<;,:6es sao adequadas para determinar o
que sera justo que o Governador Moral de todo o universo
fa<;,:a com os pecadores que permanecem impenitentes ate ao
fim. Sem duvida, a justi~a nEle e exatamente a mesma que a
justi<;,:a num homem perfeitamente justo. Mas nos nao sabemos
todas as condi<;,:6es do caso, e as nossas "intui<;,:6es" acham-se

818
0 Ceu e o Inferno
obscurecidas pelo pecado- Heb. 3: 13. Por conseguinte, a unica
fonte de conhecimento seguro que temos e a Palavra de Deus,
e ela, como ja vimos, nao nos da fundamento algum para a
esperan<;a de que haja arrependimento no alem-tumulo. (4) E
uma grande crueldade seguir o exemplo do diabo quando
enganou Eva, e persuadir o povo de que afinal de contas pode
ser que Deus seja mais benevolo do que a linguagem da Sua
Palavra da a en tender- Gen. 3:3,4.

14. Qual o argumento a favor da futura restaurafiio de todas


as criaturas racionais asantidade e afelicidade, que se fundamenta
em Romanos 5:18,19; 1 Codntios 15:22-28; Efesios 1:10;
Colossenses 1: 19,20? , ' ,.~, ''~1L< 1· ~_;-:·• ">
.·')iJ <~H
1

Com base em Rom. 5:18,19, argumenta-se que a frase


"todos os homens" tern exata e necessariamente aplica<;ao tao
ampla numa das clausulas como na outra.
RESPONDEMOS-
1°. Que a frase "todos os homens" e muitas vezes utilizada
nas Escrituras em passagens em que o contexto lhe limita
necessariamente o sentido.- Joao 3:26; 12:32.
2°. No presente caso, a frase "todos os homens" e evidente-
mente definida pela frase qualificadora ou restritiva do
versiculo 17, "os que recebem a abundancia da gra~a, e do dom
da justi<;a".
3°. Este contraste entre "todos os homens" que estiveram
em Adao e "todos os homens" que estao em Cristo esta em
harmonia com a analogia de todo o evangelho.
A respeito de 1 Cor. 15:22-28, o argumento e o mesmo
que o tirado de Rom. 5:18,19. Com base nos versiculos 25-28,
argumenta-se que o grande fim do reino mediatario de Cristo
deve sera restaura<;ao de todas as criaturas asantidade e abem-
-aventuran<;a.
RESPONDEMOS-
1°. Que essa e uma interpreta<;ao for<;ada dessas palavras,
que nao e sua interpreta<;ao necessaria ou obrigat6ria, e que e

819
Capitulo40
refutada pelos muitos testemunhos que temos citado ante-
riormente das Escrituras. ·· · ··· . · ·
2°. Que ela e incompativel como escopo do assunto de
que o ap6stolo trata nessa passagem. Ele declara que desde a
'·1 ,
eternidade ate a ascensao Deus reinou absolutamente. Da
ascensao ate a restaura~ao de todas as coisas, Deus reina na
Pessoa do Deus-homem como Mediador. Da restaura~ao ate a
eternidade, Deus tornara a reinar como Deus absoluto.
Tamhem de Efesios 1: 10 e Colossenses 1: 19,20 tira-se urn
argumento a favor da salva~ao final de todas as criaturas.
Respondemos que em ambas as passagens a expressao ."todas
as coisas" significa toda a companhia dos anjos e dos homens
remidos e reunidos sob o dominio de Cristo. Porque, 1°. Em
ambas as passagens o assunto do discurso nao eo universo,
mas sima Igreja; 2°. Em ambas as passagens as palavras "todas
as coisas" sao limitadas pelas frases qualificativas "os predes-
tinados", "nos fez agradaveis a si no Amado", "n6s, os que
primeiro esperamos em Cristo", "se, na verdade, permane-
cerdes fundados e firmes na fe", etc. (nos respectivos contextos).
Veja os comentarios sobre Romanos, 1 Corintios e Efesios, por
Dr. Hodge.
.,.,.
15. Quais as opinioes que sobre este assunto tern prevalecido
entre os arminianos extremistas?
Os seus principios fundamentais a respeito da rela~ao da
capacidade com a responsabilidade os obrigam a sustentar que
nao pode perecer ninguem que nao tenha tido, sob uma ou
outra forma, e num ou noutro grau, alguma ocasiao para valer-
-se da salva~ao mediante Cristo.
Para evitarem as inferencias 6bvias que se poderia tirar
dos fatos evidentes do caso, alguns tern suposto que Deus talvez
estenda o tempo da prova de alguns para alem da vida presente
-Scot., Christian Life.
Limborch (Lib. 4, Cap. 11) julga provavel que se sal vern
todos os que neste mundo fazem born uso da luz que tern; mas

820
0 Ceu eo Inferno
que, se rejeitarrnos esta ideia, dando preferencia a crer que a
bondade divina condenaria estes (os ignorantes) ao fogo do
inferno, parece que seria rnelhor sustentar que, assirn como
ha tres estados para os hom ens neste mundo- o dos crentes, o
dos incredulos eo dos ignorantes- assim tam bern hade haver
tres estados no mundo futuro: o da vida eterna para os fieis,
o das penas do inferno para os incredulos, e, alern desses, o
status ignorantium (o estado dos ignorantes).

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821
41

Os Sacramentos

1. Qua[ e a etimofogia, e quais OS USOS cfassico e patristico da


palavra sacramentum?
1°. E derivada desacro, sacrare, tornar sagrado, dedicar aos
deuses, ou a usos sagrados.
2°. Ern seu uso classico significava- (1) Aquila pelo qual
urna pessoa se obrigava a fazer algurna coisa por outra. (2)
U rna soma deposi tada ern juizo como penhor, e que, no caso
do nao curnprirnento das palavras estipulados no contra to, era
dedicada a usos sagrados. (3) Tarnbern urn juramenta,
especialrnente o do soldado, de dedicar-se fielrnente ao servis;:o
da patria -Dictionary (Dicionario) de Ainsworth.
3°. Os "pais" da lgreja ernpregavarn essa palavra nurn
sentido convencional, como equivalente a palavra grega
mysterion, rnisterio, is to e, algurna coisa desconhecida antes de
ser revelada, e assirn urn ernblerna, urn rita, urn tipo, tendo
algurna significaS?ao espiritual latente, s6 conhecida dos
iniciados ou instruidos.
Os "pais" gregos aplicavarn o termomysterion as ordenans;:as
cristas do Batisrno e da Ceia do Senhor, por terern esses ritos
urna significas;:ao espiritual e serern assirn urna certa forma de
revelas;:ao de verdades divinas.
Os "pais" Iatinos ernpregavarn a palavrasacramentum como
palavra latina no seu sentido proprio, como designa~;;ao de
qualquer coisa sagrada ern si rnesrna, ou que tivesse o poder
de obrigar ou consagrar os hornens; e, alern disso, ernpregavarn-
-na como o equivalente da palavra grega mysterion, isto e, no

822
Os Sacramentos
sentido inteiramente diverso de uma verdade revelada, ou de
urn sinal ou simbolo que revela uma verdade que de outro
modo permaneceria oculta. Este fato deu ao uso da palavra
sacramentum, na teologia escolastica, uma danosa latitude de
significa<;;ao e a tornou muito indefinida. Assim, em Ef. 3:3,9;
5:32; 1 Tim. 3:16; Apoc. 1:20, a palavra mysterion tern verda-
deiramente o sentido de "revela<;;ao de uma verdade que a razao
nao poderia descobrir, e e traduzida por mystery na versao
inglesa e sacramentum na Vulgata Latina (em Almeida, por
misterio ). Assim e que a igreja cat6lica romana emprega a
mesma palavra em dois sentidos inteiramente diversos, pois a
aplica indiferentemente ao Batismo e a Ceia do Senhor como
"ordenan<;;as que obrigam", e a uniao dos fieis com Cristo
como uma verdade revelada- Ef. 5:32. Dessa forma tiram a
absurda inferencia de que o matrimonio e urn sacramento.

2. Como definem o sacramento os "pais", os escolasticos, a igreja


cat6lica romana, a Igreja da Inglaterra e os nossos pr6prios simbolos?
Veja as seguintes defini<;;6es:
1a. De Agostinho: "Signum rei sacrce", ou: "Sacramentum
est invisibilis gratice visibile signum, ad nostram justificationem
institutum"; "accedit verbum ad elementum, et fit sacramentum".
2a. De Victor de S. Hugo: "Sacramentum est visibilis forma
invisibilis gratice in eo collatce".
3a. Do Concilio de Trento: "Urn sacramento e alguma coisa
apresentada aos sentidos que, por institui<;;ao divina, nao s6
tern o poder de significar, mas tambem ode transmitir gra<;;a
eficazmente"- Cat. Rom., Parte 2, Cap. 1, Perg. 6.
4a. Da Igreja Anglicana (Igreja da Inglaterra), conforme o
seu 25°. artigo da religiao: "Os sacramentos (ordenan<;;as)
instituidos por Cristo nao sao somente designa<;;6es ou indf-
cios da profissao dos cristaos, mas antes uns testemunhos
firmes e certos, e uns sinais eficazes da gra<;;a e da boa vontade
de Deus para conosco, pelos quais Ele opera invisivelmente
em n6s, e nao somente vivifica, mas tambem fortalece e

823
Capitulo 41
con firma a nos sa fe nele".
5a. Do Catecismo Maior da Assembleia de "Westminster, Pergs.
162 e 163: "0 sacramento e uma santa ordenan~a instituida
por Cristo na Sua Igreja, para significar, selar e conferir aos
que estao dentro da alian~a da gra~a, os beneffcios da Sua
media~ao; para os fortalecer e aumentar a sua fee todas as suas
outras gra~as; para obriga-los a obediencia, para testificar e
nutrir sua comunhao uns com os outros, e para distingui-los
dos que estao fora"; ''As partes de urn sacramento sao duas:
uma o sinal exterior sensivel utilizado segundo a institui~ao
de Cristo, e a outra uma gra~a interior e espiritual por ele
representada".

3. Segundo quais principios se deve formular tal definifiio?


1°. E preciso lembrar que a palavra sacramento nao se
encontra na Biblia.
2°. A extrema largueza com que este termo tern sido
empregado, tanto em sentido proprio como palavra latina,
como no sentido que se lhe tern atribuido como o equivalente
convencional da palavra grega mysterion, torna evidente que,
nem por meio da etimologia da palavra sacramentum, nem
por meio do seu uso eclesiastico, e possivel chegar a uma
defini<;:ao acertada de uma ordenan~a evangelica.
3°. 0 unico modo proprio de formular urn a defini<;:ao
acertada de uma classe de ordenan<;as evangelicas e fazer uma
compara<;;ao de tudo quanto as Escrituras ensinam a respeito
da origem, natureza e proposito das ordenan<;as universalmente
reconhecidas como pertencentes a essa classe, determinando
assim os elementos essenciais que sao comuns a todos os
membros da referida classe, e que os distinguem como classe
de todas as demais ordenan<;;as divinas.
4°. As ordenan<;as "uni versalmente reconhecidas" como
sacramentos sao o Batismo e a Ceia do Senhor. "Tomas de
Aquino concordou com outros teologos em ter o Batismo e a
Ceia do Senhor como potissima sacramenta"- Summa, P. 3,

824
Os Sacramentos
Quaes. 62, Art. 5, apud Hagenbach. A verdadeira questao e,
pois: haveria outras ordenanfas divinas que tenham as caracte-
risticas essenciais que siio comuns ao Batismo e aCeia do Senhor?

4. Quantos sacramentos as romanistas criaram, e como se


podera decidir a controversia entre eles e as protestantes?
A igreja cat6lica romana ensina que ha sete sacramentos,
a saber, o batismo, a confirma<;ao ou crisma, a Ceia do Senhor,
a penitencia, a extrema un<;ao, as ordens eo matrimonio.
N6s, porem, sustentamos que somente o Batismo e a Ceia
do Senhor podem propriamente ser chamados sacramentos
(isto e, ordenan<;as), quer se aceite a defini<;ao protestante deste
termo, quer se aceite ados romanistas, como a damos acima,
Perg. 2. Veja por que:
1°. A crisma, a penitencia e a extrema un<;ao nao sao de
institui<;ao divina, nao se fundamentando de modo algum nas
Escrituras.
2°. 0 matrimonio, instituido por Deus no paraiso, e a
ordena<;ao ao ministerio do evangelho, instituida por Cristo,
embora tanto aquele como esta sejam institui<;6es divinas,
evidentemente nao sao ordenan<;as do mesmo genero que o
Batismo e a Ceia do Senhor e nao cabem nas condi<;6es de
nenhuma das defini<;6es de urn sacramento, porque nem signi-
ficam nem comunicam nenhuma gra<;a interior.

5. Quais as dais componentes de todo sacramento?


1°. "Urn sinal exterior sensivel utilizado segundo a insti-
tui<;ao de Cristo; 2°. Uma gra<;a interior e espiritual por ele
representada"- Cat. Maior, Perg. 163. Veja abaixo,Apol. Conf
DeAugsb. (Rase), pag. 267.
Os romanistas, na linguagem dos escolasticos, distinguem
entre a materia e a forma de urn sacramento. Amateria e aquela
parte do sacramento que esta ao alcance dos sentidos e que e
significativa da gra<;a, e.g., a agua eo a to de aplica-la no Batis-
mo,e o pao e o vinho, e os atos de partir o pao e de derramar o

825
Capitulo 41
vinho na Ceia do Senhor. A forma e a pa1avra divina pro-
nunciada pelo ministro quando administra os elementos,
dedicando-os assim ao oficio de significar uma gra<;a.

6. Segundo os cat6licos romanos, qual ea relafiio entre o sinal


e a grafa que ele significa?
Eles sustentam que, em conseqiiencia da institui~ao
divina, e em virtude do "poder do Todo-poderoso que neles
existe", a gra~a significada acha-se contida na propria natureza
dos sacramentos, de modo que ela e conferida sempre,ex opere
operata (isto e, ex vi ipsius actionis sacramentalis- pe1o poder do
proprio ato sacramental), a todo aquele que o recebe e nao lhe
oponha urn obstaculo positivo. Entendem, pois, que a "uniao
sacramental", ou a rela~ao existente entre o sinal e a gra~a que
ele significa, e ffsica, ou como a que subsiste entre uma
subs tan cia e suas propriedades, is toe, o poder de conferir gra~a
esta nos sacramentos assim como o poder de queimar esta no
fogo- Cone. de Trento, Sess. 7, Cans. 6 e 8; Cat. Rom. Parte 2,
Cap. 1, Perg. 18; Belarmino, De Sacram., 2,1.

7. Quale a doutrina zwingliana sobre assunto?


Zwinglio, o reformador da Sui9a, ensinou uma doutrina
que era o extremo contnirio ada igreja catolica romana, a saber,
que o sinal simplesmente representa por simbolos apropriados
e por a<;;6es simbolicas a gra~a a qual ele esta relacionado.
Assim, os sacramentos sao unicamente meios eficazes para a
apresenta<;;ao objetiva da verdade simbolizada.

8. Em que sentido acha-se empregada a palavra "exibir" * em


nossos livros simb6licos, em referencia a este assunto?

* Termo empregado nos textos em ingles. Na Perg. 162 do Cat. Maior, e.g.,
temos em portugues o verba "conferir" em lugar de "exibir". Nota de Odayr
Olivetti. •.. ,

826
i Os Sacramentos
Cf. Conf De Fe, Cap.27, Sec. 3, e Cap. 28, Sec .. 6, e Cat.
Maior, Perg. 162.
Essa palavra vern do verbo latinoexhibeo, que tinha os dois
sentidos, de comunicar e de descobrir ou revelar. E evidente
que o termo exibir tern em nossos simbolos o primeiro desses
sentidos: ode comunicar, conferir.

9. Qual a doutrina comum das igrejas reformadas quanta a


relafao do sinal com a grafa significada?
As confiss6es reformadas concordam em ensinar que essa
rela<;:ao e-
1°. Simplesmente moral, isto e, e estabelecida somente
em virtude da institui~ao e da promessa de Cristo, e depende
da devida administrac;,:ao da ordenanc;,:a e da fee conhecimento
do participante.
2°. :E real, is toe, quando edevidamente administrado, eo
participante o recebe com conhecimento e fe, o sacramento,
em conseqi.H~ncia da promessa de Cristo, realm en te sela ao
participante a gra<;:a significada e lha comunica; isto e, ele recebe
a gra<;:a junto como sinal dela.
Esta doutrina inclui, pois- · · .; ·
1°. A teoria zwingliana, de que o sinal externo e visivel
verdadeiramente significa ou simboliza a gra<;:a. .
2°. Que os sacramentos, como ordenanc;,:as instituidas por
Deus, sao selos afixados apromessa para autentica-la, como o
fenomeno natural do arco-iris, em virtude da instituic;,:ao divina,
tornou-se o selo da promessa feita por Deus a Noe. · ~·-
30. Que, como selos que assim acompanham por autoridade
divina uma promessa divina, eles realmente comunicam a
grac;,:a que significam aqueles a quem essa grac;,:a e destinada e
que se acham em estado espiritual proprio para recebe-la,
"como uma chave transmite o direito de entrada, uma escritura
publica transmite uma propriedade, ou a cerimonia de
casamento confere direitos maritais". Veja Turretino, Loc.l9,
Ques. 4; Conf de Fe, Cap.27; Cat. Maior, Pergs. 162 e 163; Cat.

827
Capitulo 41
de Gen., Sec;. sa.De Sacramentis; Con! da !gr. Francesa, Art. 34;
Antiga Conf Escocesa, Sec;. 21.

10. Qual ea finalidade dos sacramentos?


1°. Para que signifiquem (ou simbolizem, ou representem),
selem e confiram aos que estao dentro da alianc;a da grac;a os
beneficios da redenc;ao realizada por Cristo e assim sejam urn
dos principais meios de edificar a lgreja- Mat. 3: 11; Gen.
17:11,13; 1 Cor.10:2-21; 11:23-26; 12:13; Rom. 2:28,29; 4:11;
6:3,4; Gal. 3:27; 1 Ped. 3:21.
2°. Que sejam insignias visiveis dos que pertencem algreja,
e estabelec;am uma diferenc;a visivel entre o murido e os que
professam seguir a Cristo- Gen. 34: 14; Ex. 12:48; Ef. 2:19-
Conf de Fe, Cap.27, Sec;. 1.

A DOUTRINA CATOLICO-ROMANA A RESPEITO


___ DA EFICACIA DOS SACRAMENTOS

11. Qual e a doutrina cat6lico-romana a respeito da eficacia


dos sacramentos?
1°. Como mostramos acima, Perg. 6, os cat6licos romanos
sustentam que os sacramentos contem a grac;a que significam;
que esse poder de conferir grac;a e inseparavel de urn
sacramento verdadeiro; e que, como fato objetivo, eles a contem
sempre e a apresentam do mesmo modo a todos os partici-
pantes, seja qual for 0 carater deles. ·-' -
2°. Em todos os casos da sua aplicac;ao, a nao ser que se
fac;a oposic;ao positiva e assim se anule a sua eficacia, eles
efetuam a grac;a que significam, como urn opus operatum, isto
e, pelo simples poder inerente apropria ac;ao sacramental.
: :. [; ~_)! ~; • ! I 1 ' , t !. . i < ' ,

12. Da parte do administrador, de que condifi5es depende a


eficacia do sacramento, segundo a doutrina cat6lico-romana?
Segundo os romanistas, a validade de urn sacramento,
quanto ao que diz respeito ao administrador, depende-

828
Os Sacramentos
1°. De ser ele autorizado canonicamente. No caso dos
sacramentos de ordem e confirma<;;ao, enecessaria que ele seja
urn bispo em comunhao como papa. No caso dos outros sacra-
memos, que seja urn sacerdote papal devidamente ordenado.
0 carater pessoal do bispo ou sacerdote, ainda que esteja em
pecado mortal, nao impede a realiza<;;ao do efeito- Cone. de
Trento, Sess. 7,De Sacr., Can. 12.
2°. E necessaria que o administrador tenha, no ato de
administrar o sacramento, a inten<;;ao positiva de fazer o que a
igreja tern a inten<;;ao de fazer quando celebra cada sacramento.
0 te6logo cat6lico-romano Pedro Dens (Vol. 5, pag. 127)
diz: "Para que a celebra<;;ao do sacramento seja valida, e
necessaria que o ministro celebrante tenha a inten<;;ao de fazer
o que a igreja faz. A inten<;;ao necessaria no ministro consiste
num ato da sua vontade, pelo qual ele se determina a realizar o
ato externo com a inten<;;ao de fazer o que faz a igreja"; isto e,
celebrar urn sacramento valido. A nao ser assim, o ato enulo,
mesmo quando se realizam regularmente todos os atos
externos. Veja Cone. De Trento, Sess. 7, Can. 11. Isso deixa o
participante inteiramente amerce do ministro, por depender
a validade do ato inteiro da sua inten<;;ao secreta, vindo a ser
isto uma das muitas inven<;;6es daquela igreja anticrista para
tornar o povo dependente do sacerdote.

13. Em que sentido os protestantes admitem que "intem;iio"


enecessaria?
Eles admitem que, para tornar o servi<;;o externo em sacra-
mento, enecessaria que seja feito como prop6sito ostensivo e
professo de cumprir o mandamento de Cristo e de fazer o que
Ele exige que fa<;;am os que aceitam a alian<;;a evangelica.

14. Qual a condifiiO que os cat6licos romanos afirmam ser


essencial a eficacia do sacramento, da parte do participante?
1°. No caso do batismo de crian<;;as nao e necessaria
nenhuma condi<;;ao da parte delas.

829
Capitulo 41
2°. Da parte dos adultos, a unica condic;;ao e que eles nao
se lhe oponham com incredulidade absoluta ou com resisten-
cia da vontade (non ponentibus obicem). Sendo a fe e o
arrependimento possiveis a alma nao regenerada, eles sao
tambem exigidos como necessarios para produzir o efeito do
batismo (Cat. Rom., Parte 2, Cap. 2, Perg. 39). Belarmino,De
Sacram., 2, 1, diz que a vontade de ser batizado, a fee o arrepen-
dimento sao disposic;;6es necessarias para tornar o sacramento
capaz de produzir seus efeitos, exatamente como estar seca a
lenha e a condic;;ao para o fogo poder queima-1a, mas nunca e a
causa do fogo.

15. Quais siio, segundo a igreja papal, os efeitos dos


sacramentos? .J
1°. Grac;;a justificadora (santificadora).
2°. Tres dos sacramentos, a saber, o batismo, a confirmac;;ao
e a ordem, imprimem tambem no participante urn "carater"
(da palavra grega character, urn sinal ou divisa, gravado ou
impresso como urn selo- como com urn sinete). Este "caniter
sacramental" e uma impressao distintiva e indelevel estampada
na alma, "cujo duplo efeito e que nos prepara para receber ou
fazer alguma coisa sagrada, e distingue uns dos outros". Epor
isso que nunca se repete o batismo ou a confirmac;;ao, e que
urn sacerdote nunca pode desfazer-se da autoridade e dos
privilegios do sacerd6cio- Cat. Rom., Parte 2, Cap.l, Pergs.
21-25; Cone. de Trento, Sess. 7, Can. 9.

16. Como se pode refutar essa doutrina?


Que os sacramentos nao tern o poder de comunicar grac;;a
a todos, quer estejam, quer nao estejam incluidos na alianc;;a
da grac;;a, e quer possuam, quer nao possuam fe, e certo,
porque-
1°. Sao selos da alianc;;a evangelica (veja abaixo, Perg. 20).
Mas urn selo so ratifica uma alianc;;a como alianc;;a. Pode
comunicar a grac;;a prometida somente na suposic;;ao de se

830
Os Sacramentos
haverem cumprido as condi<_;6es da alian~a. No entanto, essa
alian<_;a declara que a salva<_;ao e toda ben<_;ao espiritual
dcpendem da fe como sua condi<_;ao.
2°. Conhecimento e fe sao exigidos como as condi<_;6es
previas, e e necessaria que se achem em todos os que desejam
participar dos sacramentos, como as qualifica<_;6es essenciais
para recebe-los- Atos 2:41; 8:37; 10:47; Rom. 4:11.
3°. A fee essencial para tornar eficazes os sacramentos-
Rom. 2:25-29; 1 Cor. 11:27-29; 1 Ped. 3:21.
4°. Muitos que recebem os sacramentos estao notoriamente
sem a gra<_;a que eles significam. Atente-se para o caso de
Simao, o mago, Atos 8:9-21, e para os de muitos dos corintios
e dos galatas, e para a maioria dos cristaos nominais do tempo
atual.
5°. Muitos tern tido a gra<_;a sem os sacramentos. Disso
dao testemunho os casos de Abraao, do ladrao na cruz, de
Cornelio, o centuriao, e de uma multidao de cristaos proemi-
nentes entre os quacres.
6°. Essa doutrina amarra blasfemamente a gra<_;a do Deus
soberano e sempre vivo, e a coloca completamente adisposi<_;ao
das maos de homens fallveis e muitas vezes maus.
7°. Essa doutrina e urn elemento essencial daquele sistema
cerimonial e sacerdotal que prevalecia entre os fariseus, e contra
o qual to do o Novo Testamento e urn protesto.
8°. 0 efeito uniforme desse sistema tem sido ode aumentar
o poder dos sacerdotes e de confundir todo o conhecimento a
respeito da natureza da religiao verdadeira. Como os batizados
nem sempre e geralmente nao produzem de fato os frutos do
Espirito, todos os ritualistas concordam em nao considerar esses
frutos como essenciais para a salva<_;ao. Onde prevalece esse
sistema, morre a piedade.
Jll!II~ILJOTECA AUBBEY ClABIC

831
Capitulo 41
A DOUTRINA DAS IGREJAS PROTESTANTES
QUANTO A EFICACIA DOS SACRAMENTOS

17. Qual i a doutrina luterana quanta a eficiicia dos


sacramentos?
1°. Os luteranos rejeitam a doutrina papal de que os
sacramentos (as ordenans_:as) efetuam gras_:aex opere operata.
2°. Eles sustentam que a sua efidicia em conferir gras_:a
reside nos sacramentos intrinsecamente.
3° Sustentam igualmente que, como fato objetivo, a gras_:a
e comunicada a todo aquele que recebe o sacramento, quer
tenha quer nao tenha fe. '
4°. Mas a gras_:a comunicada s6 tern efeito naqueles que
tern verdadeira fe para recebe-la. Como o poder para curar
residia em Cristo, quer a mulher tocasse nEle quer nao tocasse
(Mat. 9:20); todavia, esse poder nao teria sido aproveitado pela
mulher se ela nao tivesse crido e tocado.
5°. Eles sustentam que esta eficacia nao reside no sinal
nem na cerimonia, e sim na Palavra que acompanha o sinal e
o constitui sacramento. A eficacia nao e devida ao simples
poder moral da verdade, nem afe do participante, mas e sabre-
natural, residindo no poder do Espirito Santo; nao porem no
poder do Espirito Santo extrinsecamente a verdade, entre-
tanto residindo na verdade e permanecendo inseparavel dela
- virtus Spiritus Sancti intrinsicus accedens. Veja Conservative
Reformation, de Krauth, pags. 825-830.

18. Qual i a doutrina zwingliana e remonstrante quanta a


mesma?
A tendencia intelectual que, a respeito deste assunto,
Zwinglio primeiro desenvolveu, foi depois desenvolvida mais
amplamente pelos remonstrantes no seculo seguinte, e mais
ainda pelos socinianos. Opini6es ultramoderadas a respeito da
natureza e eficacia dos sacramentos tern prevalecido muito
tambem no seculo atual (seculo 19) nas igrejas evangelicas,

832
Os Sacramentos
em consequencia da rea~ao contra as teorias extremas dos
romanistas e dos ritualistas em geral. Para uma exposi~ao geral
desse modo de pensar veja acima, Perg. 7.

19. Como se pode expor a doutrina das igrejas reformadas sabre


este assunto?
Quanto a doutrina sobre a rela~ao do sinal com a gra~a
significada ou simbolizada, veja acima, Perg. 9.
Quanto aeficacia dos sacramentos, os reformados-
1°. Negam que eles confiram gra~a como umopus operatum.
2°. Afirmam que os sacramentos nao comunicam gra~a
alguma ao participante indigno.
3°. Que sua eficacia nao vern de urn mero poder moral da
verdade que simbolizam.
4°. Que eles realmente conferem gra~a ao participante
digno.
5°. Mas isso eles fazem instrumentalmente, porque a
eficacia sobrenatural nao e devida a eles, nem a quem os
administra, e sim ao Espirito Santo que, como operador livre
e pessoal, serve-Se deles soberanamente para fazer a Sua
vontade (virtus Spiritus Sancti extrinsicus accedens).
6°. Que, como selos da alian~a da gra~a, eles comunicam e
confirmam gra~a aqueles a quem ela pertence, isto e, aqueles
que estao dentro daquela alian~a, e, no caso dos adultos,
somente mediante uma fe viva.
7°. Que a gra~a conferida pelos sacramentos e muitas vezes
conferida a verdadeiros crentes antes de usa-los e sem o seu
uso.

20. Par quais provas e estabelecida a verdade da doutrina


reformada?
A verdade da dou trina reformada e estabelecida, de urn
lado, pelas provas que refutam a doutrina cat6lico-romana,
cxpostas sob a Perg. 16. De outro lado, a sua verdade, como
oposta ateoria escassa de Zwinglio, e estabelecida como segue:

833
Capitulo 41

1°. Que os sacramentos nao somente sao sinais da gra<;;a de


Cristo, mas tambem sao selos da alian<;;a evangelica, oferecendo-
-nos aquela gra<;;a sob a condi<;;ao de termos fe, "e evidenciado
pelo fa to de que Paulo diz que a circuncisao foi o selo da justi<;;a j
da fe" -Rom. 4: 11. E que o apostolo pensava do mesmo modo ,
a respeito do batismo torna-se evidente de Colossenses, 2:11.
Com referencia a Ceia do Senhor, o Salvador disse: "Este c:ilice
eoN ovo Testamento no meu sangue", is toe, a nova alian<;;a foi
ratificada por Seu sangue. 0 calice desse sangue eo memorial
instituido por Cristo e e, por conseguinte, o memorial e tambem
a confirma<;;ao da propria alian<;;a ... 0 evangelho nos e apre-
sentado sob a forma de uma alian<;;a. Os sacram'entos sao os
selos dessa alians;a. Deus, por sua institui9ao, obriga-Se ao
cumprimento das Suas promessas; Seu povo, recebendo-os,
obriga-se a confiar nEle e a servi-10. Esta ideia esta incluida
na representa<;;ao dada na formula do batismo (Rom. 6:3,4) e
em todas as passagens em que se diz que a participa<;;ao nas
ordenan<;;as cristas inclui a profissao do evangelho".
2°. Como selos afixados a alian<;;a, segue-se que realmente
transmitem a gras;a significada, como forma legal de inves-
tidura, aqueles a quem ela pertence - segundo OS termos da
alian<;;a. Assim como se diz que os titulos de uma propriedade,
quando assinados e selados, transmitem a propriedade que eles
representam, por serem eles a forma legal pela qual a inten9ao
do proprietario original fica expressa publicamente e ratificado
o seu ato. Epor esse motivo que nas Escrituras, como tambem
na linguagem geral, os nomes e os atributos das gra<;;as seladas
sao atribuidos aos sacramentos pelos quais eles sao selados e
transmitidos aos seus legitimos possuidores- Conf de Fe, Cap.
27, Ses;. 2. Diz-se que os sacramentos (as ordenan9as) lavam-
-nos do pecado, que nos unem a Cristo, que nos salvam, etc.
- Atos 2:38; 22: 16; Rom. 6:2,6; 1 Cor. 10: 16; 12: 13; Gal. 3:27;
Tit. 3:5-0 Caminho da Vida, Dr. Hodge.

834
Os Sacramentos
A NECESSIDADE DOS SACRAMENTOS

21. Qual a doutrina mantida pelos cat6licos romanos quanta


anecessidade dos sacramentos?
Os romanistas distinguem-
1°. Entre uma condi~ao abso1utamente necessaria para
ulcan~ar urn fim, e uma que s6 e muito conveniente e ajuda
muito em sua consecu~ao.
2°. Entre a necessidade que pertence a meios essenciais, e
aquela obriga<_;:ao que vern de urn mandamento positivo de
Deus. De conformidade com isso, eles sustentam que os
diversos sacramentos sao necessaries em sentidos diferentes.
o BATISMO, dizem, e necessaria abso1utamente - sua
administra~ao positiva ou ao menos o sincero desejo de recebe-
-lo- tanto para as crian~as como para os adultos, como o unico
meio de alcan~ar a salva~ao.
A PENITENCIA, dizem, e absolutamente necessaria no
mesmo sentido, mas somente para os que cairam em pecado
mortal depois de batizados.
A ORDEM, dizem, e absolutamente necessaria no mesmo
sentido, porem nao para todas as pessoas, como meio de
sal va~ao, mas sim com respei to a igrej a in teira como
comunidade.
A CONFIRMA<;AO, a EUCARISTIA e a EXTREMA UN<;AO sao
necessarias somente no sentido de terem sido ordenadas e de
ajudarem muito.
o MATRIMONIO, dizem, e necessaria somente neste segundo
senti do, e unicamente para os que entram na rela~ao conjugal
-Cat. Rom., Parte 2, Cap. 1, Perg. 13.
Os pusseitas e em geral os extremistas da lgreja Anglicana
sustentam o dogma da regenera~ao batismal e, assim, a
conseqiiencia de que o batismo e absolutamente necessaria
como o unico meio de salva~ao.

835
Capitulo 41
22. Qual a doutrina protestante quanta a necessidade dos
sacramentos?
1°. Que os sacramentos do Batismo e da Ceia do Senhor
foram instituidos por Cristo e que sua observancia perpetua e
obrigat6ria para a Igreja em razao do preceito divino. Isso se
torna evidente (1) da narrativa que temos da sua institui<;:ao,
Mat. 28:19; 1 Cor. 11:25,26; (2) do exemplo dos ap6stolos-
Atos 2:41; 8:36,37; 1 Cor. 11 :23-28; 10:16-21.
2°. Que, nao obstante isso, a gra<;:a oferecida na alian<;:a
evangelica nao reside fisicamente nesses sacramentos, nem esta
ligada inseparavelmente a eles, de modo que, posto que sejam
obrigat6rios como deveres, e ajudem muito como meios aos
que estao preparados para recebe-los, todavia nao sao em
sentido algum os meios essenciais sem os quais seria impossivel
alcan<;:ar a salva<;:ao. Isso fica provado pelos argumentos apresen-
tados acima, sob a Perg. 16.

A VALIDADE DOS ·sACRAMENTOS

Isso inclui tudo quanto e essencial a legitimidade de urn


sacramento, para que possa servir afinalidade da sua institui<;:ao.

23. Quais as diversas opiniiJes sabre este assunto?


Todos os segmentos eclesiasticos concordam que e
necessaria que haja-
1°. A "materia" verdadeira, os elementos e a<;:6es
apropriados.
2°. A "forma" verdadeira, as palavras prescritas que
acompanham a celebra<;:ao e que, acrescentadas a "materia",
constituem o sacramento.
3°. A "inten<;:ao" verdadeira, o prop6sito serio de fazer
aquilo que Cristo mandou fazer quando instituiu o rito.
Diversas igrejas divergem em suas opini6es a respeito do
que sao a "materia", a "forma" e a "inten<;:ao" verdadeiras.
Parece certo que nao pode de modo algum ter a "inten<;:ao"

836
Os Saeramentos
verdadeira ninguem que nao creia na deidade suprema de
Cristo, no Seu oficio como Redentor e na personalidade do
Espirito Santo. Por isso a Assembleia Geral, em 1814 (Moore's
Digest, pag. 660) decidiu: "E opiniao decidida e unanime desta
Assembleia que os que renunciam as doutrinas fundamentais
da Trindade e negam que Jesus Cristo eo mesmo em subs tan cia
e igual em poder e gloria ao Pai, nao podem ser reconhecidos
como ministros do evangelho, e que as suas ministra<;6es
(batismo etc.) nao sao validas". Todas as igrejas concordam que
"a eficacia de urn sacramento nao depende da piedade de quem
o administra" -Conf de Fe, Cap. 27, § 3; Cone. de Trento, Sess.7,
Can. 11. E a Conf Galica, Art. 28, exp6e a opiniao e a pratica
comuns de todas as igrejas protestantes com respeito ao batismo
cat6lico romano: "Nao obstante isso, permanecendo ainda no
romanismo alguns vestigios da verdadeira Igreja, e especial-
mente a substancia do batismo, cuja eficacia nao depende de
quem o administre, reconhecemos que os que foram batizados
por eles nao precisam ser rebatizados, embora, por causa da
corrup<;ao contagiosa, ninguem possa oferecer seus filhos para
serem por eles batizados sem que tambem quem o fizer se
con tamine".
Com rela<;ao as qualifica<;oes das pessoas que administram
os sacramentos, os papistas sustentam que, para a validade de
urn sacramento e essencial que seja administrado por urn
ministro ordenado canonicamente; para os da ordem e da
confirma<;ao e essencial que o administrador seja bispo; para
os demais, que seja sacerdote. Mas, por ser o batismo absoluta-
mente necessaria (como eles dizem) para a salva<;ao, eles admi-
tem que "todos, mesmo de entre os leigos, quer seja homem
quer seja mulher, e seja qual for a seita que professe (podem
batizar). Porque isso e permitido quando a necessidade obriga,
mesmo aos judeus, aos incredulos e aos hereges, con tanto, po-
rem, que o fa<;am como prop6sito de fazer aquila que a igreja
cat6lica romana faz nesse ato de seu ministerio" -Cat. do Cone.
de Trento, e Cone. de Trento, Sess. 7, "Do batismo", Can. 4.

837
Capitulo 41
Os protestantes consideram os sacramentos (as ordenan~as)
como uma prega~ao da Palavra, tambem como selos auto-
rizados e insignias que atestam que se pertence a igreja. Por
conseguinte, a sua administra~ao deve ser limitada aqueles
oficiais da igreja que possuam, por comissao divina, o oficio
de ensinar e governar, "nem urn nem outro dos quais (sacra-
memos) pode ser celebrado por quem nao for ministro da
Palavra, legalmente ordenado" -Con! de Fe, Cap. 27, § 4. Nao
considerando o batismo como essencial para a salva~ao, os
protestantes em geral nao fazem nenhuma exce~ao a favor do
batismo leigo- Diret6rio para o Culto Divino, .Cap. 7, § 1;
Calvina, Institutas, Livro 4, Cap. 15, § 20.

EXPOSH;6ES ECLESIASTICAS AUTORIZADAS

DOUTRINA CATOLICO-ROMANA- Cat. do Cone. de


Trento, Parte 2, Cap. 1, Perg. 8: "Urn sacramento e coisa
exposta aos sentidos, a qual, por instituic;ao de Deus, tern
o poder tanto de significar como de efetuar santidade e
justic;a".
Cone. de Trento, Sess. 7, "De Sacramentis", Can. 1: "Se
alguem disser que os sacramentos da nova lei nao foram
todos instituidos por Jesus Cristo, Senhor nosso, ou que
sao mais ou menos do que sete, a saber: Batismo, Con-
firmac;ao, Eucaristia, Penitencia, Extrema-Unc;ao, Ordem
e Matrimonio; ou que algum desses sete sacramentos nao
e verdadeira e propriamente sacramento; seja am1tema".
Can. 4 - "Se alguem disser que os sacramentos da nova
lei nao sao necessarios para a salvac;ao, mas (sao) superfluos;
e que sem eles, e sem o desejo deles, s6 pela fe os homens
alcanc;am de Deus a grac;a da justificac;ao; ainda que nem
todos sejam necessarios a cada urn; seja anatema".
Can. 6- "Se alguem disser que os sacramentos da nova
lei nao encerram a grac;a que significam, ou que nao
conferem a mesma grac;a aos que lhes nao poem 6bice; e
que s6 sao sinais externos da grac;a, ou justic;a, que se recebe
pela fe, e certos sinais da profissao crista, com que entre

838
Os Sacramentos

os homens se distinguem os fieis dos infieis; seja anatema"


Can. 8 - "Se alguem disser que pelos mesmos sacra-
mentos da nova lei nao se confere gra<;a ex opere operata,
mas que a fe na divina promessa somente basta para
conseguir a gra<;a; seja anatema".
Can. 9 - "Se alguem disser que por estes tres
sacramentos, a saber, Batismo, Confirma<;ao e Ordem, nao
se imprime carater na alma; isto e, urn sinal espiritual e
indelevel, pelo que eles nao podem ser repetidos; seja
anatema".
Can. 11 - "Se alguem disser que dos ministros, quando
celebram e conferem sacramentos, nao se requer ao menos
a inten<;ao de fazer o que a igreja faz; seja anatema".
Cat. do Cone. de Trento, Parte 2, Cap. 1, Pergs. 24,25: "0
outro efeito do Batismo, da Confirma<;ao e da Ordem e o
carater que eles imprimem na alma. Este carater e, por
assim dizer, urn certo sinal distintivo impressa na alma, o
qual, apegando-se, como sempre faz, nunca se pode
apagar... tem efeito duplo: porque nos prepara para poder-
mos empreender e fazer alguma coisa santa, e tambem
serve para distinguir-nos uns dos outros por meio de algum
sinal".
Berlarmino, De Sacr., 2, l: "Aquila que ativa, proxima e
instrumentalmente efetua a gra<;a da justifica<;ao e aquele
unico ato externo a que se chama sacramento, e este se
chama opus operatum, porque e recebido passivamente
(operatum), de modo que e a mesma coisa para urn
sacramento conferir gra<;a ex opere operata, que e conferir
gra<;a em virtude da propria a<;ao sacramental, instituida
por Deus para esse fim, e nao do merecimento nem do
administrador nem de quem o recebe ... E verdade que a
vontade de Deus, que se serve do sacramento, concorda
ativamente, de fato e a causa principal. Os merecimentos
de Cristo tambem concordam, sendo a causa meritoria,
nao, porem a (causa) eficiente, porque nao esta no ato mas
no passado, visto que permane<;a objetivamente na mente
de Deus. 0 poder e a vontade do ministro estao de acordo
necessariamente, todavia eles sao causas remotas, porque

839
Capitulo 41

sao necessarios para efetuar a ac;ao sacramental propria-


mente dita, que depois opera imediatamente... Vontade,
fe e arrependimento sao necessariamente exigidos como
disposic;oes do adulto que receber urn sacramento, nao
como causas ativas, porque nem mesmo a fe, nem o
arrependimento, podem efetuar grac;a sacramental, nem
dar eficacia aos sacramentos, mas so (podem) tirar os
obstaculos que impediriam os sacramentos de exercerem
a sua propria eficacia; par conseguinte, no caso das
crianc;as, nao sendo exigida delas disposic;ao, a justificac;ao
se efetua sem essas coisas. Se, para queimar lenha, seca-se
primeiro a lenha, tira-se depois fogo da pedern\!ira, aplica-
-se em seguida o fogo a lenha, dando entao em resultado a
combustao, ninguem diria que a causa imediata da
combustao e, ou a sequidao, ou o ato de tirar o fogo da
pederneira, ou sua aplicac;ao a lenha, e sim que a causa J
primaria e so o fogo, e a causa instrumental so o aque-
cimento".
DOUTRINA LUTERANA -Conf deAugsb., Pag.13 (Hase):
"Os sacramentos foram instituidos, nao somente para
serem sinais da profissao (de fe em Cristo) entre os
homens, mas, antes, para serem sinais e testemunhos da
vontade de Deus para conosco, expostos para estimular e
confirmar a fe das pessoas que deles se servem". ~
Apol. da Conf de Augsb., Pag. 267: "E par haver duas
coisas num sacramento, o sinal e a palavra; esta e a
promessa do Novo Testamento de remissao do pecado ... e
a cerimonia e como que uma representac;ao pictorica da
Palavra, ou como urn selo pondo em distinc;ao a promessa.
Par isso, assim como a promessa sera inoperante se nao
for aceita com fe, assim tambem a cerimonia nao produzira
efeito se nao houver fe. E assim como a Palavra foi dada
para estimular a fe, assim tambem o sacramento foi
instituido para que essa representac;ao, sendo percebida,
mova o corac;ao levando-o a crer".
lb., pag. 203 - "Condenamos toda a classe de doutores
escolasticos que ensinam que os sacramentos conferem
grac;a ex opere operata a quem nao lhes oponha obstaculos,

i40
Os Sacramentos
sem nenhuma a<;:iio pos1t1va do participante. Mas os
sacramentos sao sinais de promessas, e, por isso, e preciso
que a fe esteja presente em sua celebra<;:iio ... Falamos aqui
da fe especial que confia numa promessa presente, niio
somente crendo em geral que Deus existe, mas que ere
que a remissiio dos pecados e oferecida".
Quenstedt (Wittenberg,~ 1688), Vol. 1, pag. 169: "A Palavra
de Deus, pela vontade e pela institui<;:iio do proprio Deus,
tern, antes mesmo e alem de todo uso legitimo, urn poder
divino, que e intrinseco e COillUill a todos OS homens, e
suficiente para produzir imediata e propriamente efeitos
espirituais e divinos, tanto de ben<;:iio da gra<;:a como de
puni<;:iio". , 1 ' ,,,
Conf de Augsb., Art. 9: "Eles condenam os anabatistas,
que desaprovam o batismo de crian<;:as e afirmam que as
crian<;:as podem ser salvas sem o batismo".
Apol. da Conf de Augsb., pag. 156: "Aprova-se o nono
artigo, em que confessamos que 0 batismo e necessaria
para a salva<;:iio, que as crian<;:as devem ser batizadas, e que
0 batismo de crian<;:as niio e ocioso, e sim necessaria e
eficaz para a salva<;:iio".
Art. de Esmalcalda, Part. 3, Cap. 8: "E, quanto as coisas
que dizem respeito a Palavra falada ou externa, deve-se
manter firmemente que Deus niio concede a ninguem o
Seu Espirito ou a Sua gra<;:a, a niio ser por meio da Palavra
e com a Palavra externa precedendo ... Portanto, e neces-
saria que perseveremos nisso constantemente, porque
Deus niio quer tratar conosco por outro modo que niio seja
pela Palavra falada e pelos sacramentos (ordenan<;:as), e
porque tudo aquilo de que as pessoas se gabem como sendo
do Espirito sem a Palavra e os sacramentos, e o proprio
diabo".
DOUTRINA REFORMADA- Cat. de Genebra, pag. 519:
"0 sacramento e urn atestado externo da benevolencia
divina para conosco, o qual, por urn sinal visivel, repre-
senta gra<;:as espirituais para selar em nossos cora<;:6es as
promessas de Deus, podendo assim a sua virtude ser mais
bern confirmada. Voces pensam que a virtude e eficacia

841
Capitulo 41
do sacramento nao se acham no elemento externo mas
que vern unicamente do Espirito de Deus? Eu verdadei-
ramente assim julgo, porque agrada mais ao Mestre exercer
o Seu proprio poder por Seus pr6prios instrumentos, seja
qual for o prop6sito para o qual Ele os destinou".
Cat. de Heidelberg, Perg. 66: "Os sacramentos sao sinais
visfveis e santos estabelecidos por Deus, para que, por meio
do seu uso, a promessa do evangelho se nos torne mais
clara e seja selada; a saber, que Deus, por amor da oblas;ao
(mica de Cristo, da-nos o perdao dos pecados e a vida
eterna".
Os Trinta e Nove Artigos, Art. 25: "Os sacramentos
instituidos por Cristo nao sao unicamente designas;6es ou
indicios da profissao (de fe) dos cristaos, mas, antes, sao
testemunhos firmes e certos, e sinais eficazes da gras;a e
da boa vontade de Deus para conosco, pelos quais Ele age
invisivelmente em n6s, e nao somente vivifica, porem
tambem fortalece e confirma a nossa fe nEle. ... e somente
nas pessoas que os recebem dignamente que produzem
saudavel efeito ou as;ao; todavia os que os recebem indig-
namente adquirem para si mesmos condenas;ao, como diz
o ap6stolo Paulo".
Conf de Fe, de W'estminster, Cap. 27; Cat. Maior, Pergs.
161-168; Breve Cat., Pergs. 91-93.Veja acima, Perg. 2.
DOUTRINA ZWINGLIANA E REMONSTRANTE -
Limborch, Christ. Theol., 5, 66, 31: "Resta dizer que Deus,
por meio dos sacramentos, exibe-nos a Sua gras;a, nao
conferindo-a de fato por meio deles, mas representando-a
e colocando-a diante de nossos olhos por meio deles como
sinais claros e evidentes ... E essa eficacia nao e mais que
objetiva, exigindo (da nossa parte) uma faculdade cognitiva
que possa apreender aquilo que o sinal apresenta
objetivamente a (nossa) mente ... Eles operam sobre n6s
como sinais, representando a mente a coisa da qual sao
sinais. Nao se deve procurar neles nenhuma outra eficacia".

·, t J ; ) ;;-; t..,' ':l·

842
42

0 Batismo: Natureza, Prop6sito,


Objetos, Modo, Eficacia
e Necessidade

A NATUREZA E 0 PROPOSITO DO BATISMO

1. Como expor os fatos que dizem respeito ao costume que existia


entre os judeus e as nafi5es gentilicas antes da vinda de Cristo, de
lavar com agua como simbolo de purificafiio espiritual?
Nenhum outro simbolo religioso e tao naturale 6bvio, e
nenhum outro tern sido empregado tao universalmente.
Indicios claros nos ensinam que esse costume existia entre os
discipulos de Zoroastro, os bramanes, os egipcios, os romanos,
os gregos e especialmente entre os judeus. No tabernaculo
original, cujo modelo Deus mostrou a Moises no monte,
achava-se uma grande bacia, colocada entre o altar sobre o qual
se fazia expias;ao pelo pecado, eo tabernaculo do testemunho,
e alios sacerdotes deviam lavar-se sempre, antes de entrarem
na presens;a de Deus - Ex. 30:18-21. Este simbolismo
entranhou-se em sua linguae em seu culto religioso, Sal. 26:6;
Heb. 9:10, e no tempo de Cristo entrou em todos os detalhes
da vida secular- Mar. 7: 3,4.
Portanto, a lavagem religiosa do corpo com agua ja estava
pronta para ser empregada como simbolo por Joao Batista e
pelos discipulos do nosso Senhor.

843
Capitulo 42
2. 0 batismo de Joiio foi cristiio?
0 Concilio de Trento (Sess. 7, "De Baptismo': Can. 1) deci-
diu que, "Se alguem disser que o batismo de Joao Batista
teve a mesma efid.cia que o batismo de Cristo, seja amitema".
Por motivos controversiais, muitos protestantes, principal-
mente os das escolas de Zwinglio e de Calvino, tomaram
partido conwirio e decidiram que os dois eram identicos
(Institutas, Livro 4, Cap. 15 §§ 7-18; Turretino,Jnstit., Loc. 19,
Qmes. 16).
Cremos que Calvino e os demais laboraram em erro, pelos
seguintes motivos -
1o. J oao Batista pertenceu aeconomia do Velho Testamento,
e nao ado Novo. Ele viera "no espirito e virtude de Elias",
vestido como urn dos antigos profetas, com os modos deles e
ensinandoadoutrinadeles-Mat.11:13,14; Luc.1:17.
2°. Seu batismo foi o ''de arrependimento", obrigando os
batizandos ao arrependirnento, mas nao a fe em Cristo e a
obediencia a Ele.
3°. A igreja judaica ainda ficava em sua forma antiga. A
lgreja Crista, como tal, ainda nao existia. Joao pregava, "e
chegado o reino dos ceus", Mat. 3:2, mas ele nao reuniu nem
selou, por meio do batismo, suditos desse reino numa
sociedade visivel e separada.
4°. Seu batismo nao era ministrado em nome da Trindade.
5°. Alguns dos que foram batizados por ele foram
rebatizados pelo ap6stolo Paulo- Atos 18:24-19:7.

3. Porventura os batismos ministrados pelos discipulos de Cristo


antes da crucificafiio foram identicos aos ministrados pelos ap6stolos
depois da Sua ascensiio?
Ate ao tempo da Sua rnorte, Cristo, como tambem o havia
feito Joao, conformou-se aos usos e ensinou as doutrinas da
dispensa<;ao judaica. Sua crucifica<;ao e Sua ressurrei<;ao
demarcam a real transi<;ao da antiga dispensa<;ao para a nova.
A natureza do Seu reino e a Sua propria deidade, e por isso a

844
OBatismo...
doutrina da Trindade, nao eram ainda percebidas clara-
mente, e a Igreja Crista, como comunidade, nao estava ainda
organizada. Ele pregou, como Joao pregara: ''Arrependei-vos,
porque e chegado o reino dos ceus", Mat. 4:17, e enviou Seus
disdpulos para que pregassem: "E chegado a v6s o reino de
Deus"- Luc. 10:9.
Cremos, pois, que o batismo ministrado pelos disdpulos
de Cristo antes da Sua crucifixao foi, como ode J oao, simples-
mente urn rito preparat6rio e purificador, obrigando ao
arrependimento.

4. Onde esta registrada a narrativa da verdadeira instituifiiO


do batismo do cristiio?
Em Mateus, 28:19,20: "Portanto ide, ensinai todas as
na~6es, batizando-as ern nome do Pai e do Filho, e do Espfrito
Santo; ensinando-as a guardar todas as coisas que eu vos tenho
mandado; e eis que eu estou convosco todos os dias, ate a
consuma~ao dos seculos. Am em".

5. Como se pode provar que a sua observancia ide obrigafiio


perpitua?
Isso tern sido negado pelos socinianos por motivos
racionalistas, e pelos quacres (Barclay,Apol. Prop., 12, corn.§
6), em razao de urna falsa espiritualidade, e por alguns partidos
de anti-batistas (ou anabatistas), que sustentarn que o batisrno
foi institufdo para a inicia~ao na Igreja dos que estao fora dela,
e, por isso, nao deveria ser aplicado aos que nasceram dentro
dela, em comunidades cristas ja estabelecidas.
Que foi institufdo com o fim de ser observado ern toda
parte e sernpre deixam-no claro-
1°. 0 rnandarnento dado nas palavras da sua institui~ao:
( 1) "todas as na~6es", e (2) "todos os dias, ate aconsuma~ao dos
seculos".
2°. Os preceitos e a pratica dos ap6stolos- Atos 2:38;10:47;
16:33, etc.

845
Capitulo 42
3°. A razao de ser e a necessidade da ordenan<;a, que
determinaram a sua existencia no principia, permanecem e
sao universais.
4°. A pratica uniforme da Igreja, toda e1a, em todos os
seus ramos, desde o principia.

6. Como os nossos livros simb6licos definem o batismo?


Conf de Fe, Cap. 28; Cat. Maior, Perg. 165; Breve Cat.,
Perg. 94.
Os pontos essenciais da sua defini<;ao sao -
1o. :E urn "lavar corn agua".
2°. Ern nome do Pai e do Fi1ho e do Espirito Santo.
3°. E feito corn o prop6sito de significar e se1ar "a nossa
uniao corn Cristo, a participa<;ao das ben<;aos do pacta da gra<;a,
e a prornessa de pertencermos ao Senhor".

7. Que e essencial a ((materia" do batismo?


Quanta asua "materia", 0 batisrno e essencia1rnente urn
"lavar corn agua". Nenhurn modo especial de lavar e essencial.
1°. Porque o rnandarnento nao prescreve nenhurn modo
especial. Veja abaixo, Pergs. 12-21.
2°. Porque nenhurn modo especial de adrninistra<;ao e
essencial para o sirnbo1isrno proprio deste sacramento. Veja
abaixo, Perg. 11. Por outro lado, a agua e essencial para o
sirnbolisrno do rito. Eo sirnbolo natural de purifica<;ao moral,
Ef. 5:25,26; e foi estabelecida como tal nas leis de Moises.

8. Que enecessaria quanta aformula de palavras empregadas


na administra~ao do batismo?
Para a validade do sacramento, e essencia1 que seja
rninistrado "ern nome do Pai e do Fi1ho e do Espirito Santo".
Isso e certo - 1°. Porque esta incluido no rnandarnento- Mat.
28:19. 2°. Pela significa<;ao do rito. Alem de ser urn simbolo
de purifica<;ao, e tam bern, essencialmente, o rito de inicia<;ao
na Igreja Crista, urna ordenan<;a com for<;a de alian<;a, ern que

846
I o batizando reconhece seus deveres para com Deus e promete
OBatismo ...

ser-lhe fiel naquele caniter e naquelas rela<;6es em que Ele Se


nos tern revelado nas Escrituras. A formula do batismo e, pois,
uma resumida exposi<;ao de toda a doutrina biblica do Deus
Triuno (Yave), como Lhe aprouve revelar-Se a nos, e em todas
as rela<;6es que cada uma das Pessoas da Trindade, por Sua
gra<;a, man tern como crente, no plano da reden~ao. Por isso e
nulo o batismo de todas as seitas que rejeitam a doutrina biblica
da Trindade.
As frases que dizem batizar "em nome de Jesus Cristo",
ou "em nome do Senhor", ou "em nome do Senhor Jesus",
Atos 2:38; 10:48; 19:5, nao apresentam a formula de palavras
empregada pelos apostolos na administra~ao deste sacramento,
mas sao empregadas simplesmente para designar o batismo
cristao em distin~ao ao de Joao, ou para indicar o efeito
uniforme daquela gra<;;a espiritual que o batismo simboliza, a
saber, a uniao com Cristo- Gal. 3:27.

9. Qual a significafiio da formula com a qual se batiza "em"


ou ''no nome de alguem"?
Ser batizado "em nome de Paulo", 1 Cor. 1: 13, ou "em
Moises" (i Moyse, segundo a Vulgata* ), 1 Cor. 10:2, e, da parte
do batizado, tornar-se discipulo crente e obediente de Paulo
ou de Moises, objetos do seu cuidado e participantes de
quaisquer ben<;aos que eles possam conceder. Sermos batizados
em nome da Trindade (Mat. 28: 19), ou "em nome do Senhor
Jesus", Atos 19:5, ou "em Jesus Cristo", Rom. 6:3, e sermos
unidos a Cristo, ou aTrindade, por Cristo, por meio do batismo,
ou, antes, pela gra<;;a da qual 0 batismo cerimonial e simbolo,
como Seus discipulos, crentes em Sua doutrina, herdeiros de
Suas promessas, e participantes de Sua vida espiritual.

*Figueiredo afasta-se muito disso. Nota do tradutor. (Figueiredo diz: e todos


foram batizados debaixo da conduta de Moises, na nuvem e no mar.
Acrescimo de Odayr Olivetti.)

847
Capitulo42
10. Qual e 0 prop6sito do batismo?
0 batismo tern por prop6sito-
1°. Primariamente, significar, selar e comunicar aqueles a
quem pertencerem, os beneficios da alian<;:a da gra<;:a. Assim,
pois, (1) Simboliza a "lavagem da regenera<;:ao" (Tit. 3:5,
lavacrum, segundo a Vulgata), a "renova<;:ao do Espirito Santo",
que une o crente a Cristo e assim o torna participante da vida
de Cristo e de todos os demais beneficios. - 1 Cor. 12: 13; Gal.
3:27. (2) No batismo Cristo sela, de urn modo visivel, as Suas
promessas aqueles que 0 recebem com fe, e lhes da a gra<;:a
prometida.
2°. Tern por prop6sito, em segundo lugar: · (1) Ser uma
insignia visivel do nosso voto de pertencermos ao Senhor, isto
e, de aceitarmos a Sua salva<;:ao e de nos dedicarmos a Seu
servi<;:o. (2) E, por isso, ser uma insignia da nossa profissao
publica, da nossa separa<;:ao do mundo e da nossa inicia<;:ao na
Igreja Visivel. Como insignia, assinala-nos como pertencentes
ao Senhor e, por conseguinte, (a) o batismo nos distingue do
mundo, e (b) simboliza a nossa uniao com os cristaos, nossos
irmaos.

11. Quale 0 ensino emblematico do batismo?


Em todo sacramento ha urn sinal visivel representando
uma gra<;:a invisivel. 0 sinal representa a gra<;:a porque Cristo,
com Sua autoridade, o estabeleceu e designou para esse fim.
Mas a escolha por Ele feita de qualquer sinal em particular
deveria fundar-se em sua idoneidade para ser emblema natu-
ral da gra<;:a que deveria representar. Assim e que, na Ceia do
Senhor, o pao partido pelo ministro oficiante, e o vinho
derramado, sao emblemas naturais do corpo de Cristo
quebrado e do Seu sangue derramado como sacrificio por
nossos pecados.
Do mesmo modo, no sacramento do batismo, a aplica<;:ao
da agua a pessoa do batizando e emblema natural da "lavagem
da regenera<;:ao"- Tit. 3:5. Por isso nose dito que nascemos

848
OBatismo ...

"da agua e do Espirito",Joao 3:5, isto e, que somas regenerados


pelo Espirito Santo, regenera~ao da qual o batismo com agua
e o emblema; e que somas "batizados em urn s6 Espirito em
urn corpo",* isto e, que somas batizados no corpo espiritual
de Cristo, 1 Cor. 12: 13; que somas "batizados em Cristo", de
modo que nos revestimos de Cristo, Gal. 3:27; e que somas
"batizados na sua morte (de Cristo)" e "sepultados com ele
pelo batismo na morte",** para que "andemos n6s tambem
em novidade de vida", Rom. 6:3,4, porque o sacramento do
batismo eo emblema daquela regenera~ao espiritual que nos
une a Cristo tanto federal como espiritualmente, de modo que
temos parte com Ele tanto em Sua vida como em Sua morte, e
que, assim como Ele morreu para o pecado como sacrificio,
assim tam bern n6s morremos para o pecado, deixando o pecado
de ser o principia diretor da nossa vida; e assim como Ele
ressuscitou para tornar a assumir Sua vida natural, n6s res-
surgimos para tamar posse e para o exercicio de uma nova
vida espiritual.
Os interpretes batistas, porem, insistem em que a Biblia,
ensinando ser o sinal externo deste sacramento a imersao do
corpo inteiro na agua, ensina que o sinal e tanto urn emblema
de purifica~ao como tambim da nossa morte, sepultamen to e
ressurrei~ao com Cristo. 0 Dr. Carson, na pagina 381 de sua

*In unum Spiritu ... in unum corpus, segundo a Vulgata, da qual Figueiredo
se afasta muito. Nota do tradutor. (Figueiredo diz: "fomos batizados todos
n6s, para sermos urn mesmo corpo"; Almeida (Revista e Corrigida): "fomos
batizados em urn Espirito formando urn corpo"; Almeida, Atualizada:
"em urn s6 Espirito, todos n6s fomos batizados em urn corpo"; Versao
Autorizada, inglesa: "por urn s6 Espirito somos todos batizados num s6
corpo"; Grego: "kai gar en eni pneumati hemefs, pantes eis hen soma
ebaptisthemen". Acrescimo de Odayr Olivetti.

** Aqui tambem Figueiredo afasta-se inteiramente ate da Vulgata, que


professa traduzir. Ela diz: Consepulti sumus cum illo per baptismum in
mortem. Ele: "Fomos sepultados com ele para morrer ao pecado pelo
batismo". Nota do tradutor.

849
Capitulo42

obra, diz: ''A imersao do corpo inteiro e essencial ao batismo,


nao porque nada senao a imersao possa ser emblema da
purifica<;ao, mas sim porque a imersao e o que Cristo nos
manda fazer, e porque sem a imersao nao ha emblema da
morte, sepultamento e ressurrei~ao, que estao no emblema
juntamente com a purifica<;iio". Ele fundamenta a sua asser<;ao
de que o sinal externo do sacramento do batismo haveria de
ser o emblema da morte, sepultamento e ressurrei<;iio do crente
em uniao com Cristo, em Rom. 6:3,4 e em Col. 2:12.
Impugnamos essa interpreta<;ao -
1°. Em nenhuma das passagens citadas diz Paulo que o
nosso batismo na agua eo emblema do nosso sepultamento
com Cristo. Ele esta falando evidentemente do batismo
espiritual do qual 0 com agua e 0 emblema; e e este batismo
espiritual que nos faz morrer para o pecado e viver para a
santidade, e nesta morte e vida nova ficamos conformados a
morte e ressurrei<;ao de Cristo. 0 que a Palavra de Deus diz e
que somos "batizados em Cristo", que e obra realizada pelo
Espirito Santo, e nao "no" ou "em nome de Cristo", que e a
frase empregada sempre que se fala do batismo cerimonial. -
Mat. 28:.19: Atos 2:38; 19:5.
2°. Ser "batizado na sua morte" (Rom. 6:3) e frase perfeita-
mente analoga a ser batizado "no arrependimento" (Mat. 3:11,
- ARA, veja margem inferior; in pmnitentiam, Vulgata); "na
remissao dos pecados" (Mar. 1:4; veja a Vulgata e Mat. 3:11,
margem inferior), "em urn corpo" ou "num s6 corpo", 1 Cor.
12:13, isto e, para que, ou para 0 efeito de que participemos
dos beneficios da Sua morte.
3°. A interpreta<;ao dos batistas envolve uma completa
confusao com respeito ao emblema. Quererao eles acaso dizer
que o sinal externo da imersao e emblema da morte, sepulta-
mento e ressurrei<;ao de Cristo, ou da morte, sepultamento e
ressurrei<;ao espirituais do crente? Mas o ap6stolo, nas
passagens citadas, evidentemente nao faz compara<;ao entre o
nosso batismo e a morte, sepultamento e ressurrei<;iio de Cristo,
OBatismo ...

porem entre a nossa morte para o pecado e ressurrei~ao para a


santidade, e a morte e ressurrei~ao do Redentor.
4°. Os batistas concordam conosco na afirma~ao de que o
batismo com agua e emblema de purifica~ao espiritual, isto e,
da regenera~ao, mas insistem em que o batismo tambem e
emblema (na imersao) da morte do crente para o pecado e da
sua nova vida para a santidade- Dr. Carson, pag. 143. Contudo,
qual a distin~ao entre regenera<;:ao, morte para o pecado e vida
para a santidade?
5°. Os batistas dizem conosco que o batismo com agua e
emblema de purifica~ao. Mas e por certo impossivel que o
mesmo ato seja ao mesmo tempo emblema de uma lavagem e
de urn sepultamento e ressurrei~ao! E possivel associar uma
dessas ideias a outra em conseqiiencia de suas rela~6es
espirituais, entretanto nao e possivel que o mesmo sinal visivel
seja emblematico das duas.
6°. A nossa uniao com Cristo por obra do Espirito, e suas
conseqiiencias espirituais, acham-se representadas nas Escri-
turas por meio de muitas figuras, como sejam -a substitui<;:ao
do cora~ao de pedra por urn de carne, Ez. 36:26; a edifica~ao
de uma casa, Ef. 2:22; a enxertia de urn ramo numa videira,
Joao 15:5; o despir-se da roupa suja e vestir-se de roupa limpa,
Ef. 4:22-24; uma morte, sepultamento e ressurrei<;:ao espiri tuais,
eo ser plantado asemelhan<;:a da morte de Cristo, Rom. 6:3-5;
e a aplica~ao ao corpo de urn elemento purificador, Ez. 36:25.
Ora, o batismo com agua representa todas estas coisas, porque
e o emblema de purifica<;:ao espiritual, da qual todas essas
figuras sao ilustra<;:6es anal6gicas. Por isso nose dito que somos
"batizados em um corpo", 1 Cor. 12:13, e que pelo batismo
nos revestimos de Cristo, Gal. 3:27. Ao mesmo tempo, seria
urn absurdo ter o batismo com agua como emblema literal de
tudo isso, e os nossos irmaos batistas nao tern nenhuma base
biblica para a asser~ao de que o sinal externo deste sacramento
e um emblema de uma das analogias mais do que da outra.
Veja Doctrine ofBaptisms, Parte 2, Cap. 2, do Dr. Armstrong.

851
Capitulo 42
0 MODO DE BATIZAR

12. Quais sao as palavras empregadas no idioma original das


Escrituras para transmitir o mandamento para ministrafiio do
batismo?
A palavra primaria, bapto, encontra-se quatro vezes no
Novo Testamento, Luc. 16:24; Joao 13:26 (duas vezes); Apoc.
19: 13, mas nunca em conexao com o assunto do batismo
cristao. Seu (multiplo) significado classico e, 1°. Mergulhar,
imergir; 2°. Tingir; 3°. Lavar, quer mergulhando na agua, quer
derramando agua sabre 0 que se lava.*
A palavra baptizo, que e na forma, mas nao segundo o uso,
o freqiientativo de bapto, encontra-se setenta e seis vezes no
Novo Testamento, e e a palavra empregada pelo Espirito Santo
para transmitir o mandamento para a ministra<;:ao do batismo.
Seu (multiplo) significado classico e, 1°. Mergulhar, submergir,
afundar; 2°. Molhar bern; 3°. Derramar sabre.
Alem desses dois verbos, temos os substantivos derivados
da mesma raiz e tendo o mesmo uso,baptisma, que se encontra
vinte e duas vezes e e traduzido batismo, e baptism6s, quatro
vezes, traduzido batismos em He b. 6:2, lavar em Mar. 7 :4,8,**
e em Heb. 9:10 (sempre no plural).
A unica questao de que temos que tratar e o uso biblico
dessas palavras, porque e principia importante e reconhecido
universalmente que muitas vezes ha grande diferen<;:a entre os
usos biblico e classico da mesma palavra.
Este efeito e devido a influencia de tres causas. VejaBap-
tism, its Modes and Subjects, por Dr. Alex. Carson;Meaning and
Use of the Word Baptizein (Baptizo ), pelo Rev. Dr. Conant; e
Classic, Judaic, Johannic and Christian Baptism, por Rev. James

* Raramente seve referencia ao fato de que em Daniel4.33, naSeptuaginta,


o verbo traduzido por "foi molhado" ("o seu corpo foi molhado do orvalho
do ceu") eeblife, 2°. aoristo passivo debdpto. Nota de Odayr Olivetti.
**No texto grego mais geralmente em uso nao consta. Nota de Odayr Olivetti.

852
OBatismo ...
W Dale. Consideremos as referidas causas:
1a. As principais obras ch1ssicas foram escritas no dialeto
atico. Mas a lingua em geral usada pelos povos que falavam
grego no come~o da era crista era o dialeto comurn ou helenico
do grego do tempo de Cristo, que resultou da fusao dos diversos
dialetos que existiam anteriormente. ··
za. 0 idioma utilizado pelos escritores doNovo Testamento
veio a ser mais modificado ainda por estes fatos: sua lingua
vernacula era uma forma do hebraico- o siro-caldaico (ou ara-
maico ); o uso constante que fizeram da tradus;:ao das Escrituras
hebraicas para o grego, a Septuaginta, influiu muito em seu
modo de falar e escrever em grego, particularmente quando
tratavam de assuntos religiosos; e, no proprio ato de comporem
o Novo Testamento, eles estavam ocupados na exposi<;ao de
ideias religiosas, e na inaugura<;ao de institui<;6es religiosas
que tiveram seus tipos e simbolos na velha dispensa<;ao, como
essa se achava revelada na lingua sagrada das Escrituras
hebraicas.
3a. Os escritos do Novo Testamento sao a publica~ao de
novas ideias e revela<;6es, e, por isso, as palavras e frases pelas
quais esses novos pensamentos sao comunicados tern que ser
muito modificados quanto ao seu sentido etimol6gico anterior
e seu uso pagao, e, "se quisermos apreender a profundidade e
o alcance completo da significa~ao que elas tern em sua nova
aplica~ao, e preciso que procuremos isso noN ovo Testamento,
conferindo passagem com passagem e examinando a lin-
guagem empregada aluz das gran des coisas que ela traz anossa
apreensao".
Como exemplos desse contraste entre os usos biblico e
classico de muitas palavras, examinem-se angelos, anjo,
presbyteros, presbitero ou anciao,ekklesia igreja; basileia tau Theou,
ou ton ouranon, reino de Deus ou dos ceus, palinguenesia,
regenera~ao, charis, gra~a, etc.- Fairbairn,Herm. Manual, Parte
1, Se~. 2.

853
Capitulo 42
13. Qual a posir;iio das igrejas batistas com respeito ao significado
da palavra biblica baptizo, e por quais argumentos elas procuram
provar que a imersiio e0 unico modo valido de ministrar 0 batismo?
" ... ela significa sempre imergir, e nunca exprime outra
coisa senao o modo"- Carson, on Baptism, pag. 55. Quanta a
essa afirma~ao ele confessa: "Tenho contra mim TODOS os
lexic6grafos e comentadores". Os batistas insistem, portanto,
em traduzir sempre as palavrasbaptizo ebaptisma pelas palavras
imergir e imersao.
Os argumentos com os quais procuram provar que a
imersao e 0 unico modo valido de batizar sao-
1°. 0 significado constante da palavrabaptizo.
2°. 0 significado simb6lico do rito, como sendo emble-
matico do sepultamento e ressurrei~ao.
3°. A pratica dos ap6stolos.
4°. A hist6ria da lgreja Primitiva.

14. Qual a posir;iio mantidd sabre este ponto por todos os


demais cristiios?
1°. E costume estabelecido pelo uso biblico atribuir aos
sinais as coisas sacramentais que esses sinais significam ou
simbolizam; e, por outro lado, empregar o nome do sinal para
designar a gra~a significada. Eassim que, em Gen. 17: 11, 13, a
circuncisao e chamada pacta ou alian~a; em Mat. 26:26-28,
Cristo chama o pao Seu corpo, eo vinho Seu sangue; e em Tit.
3:5 (segundo o grego e a Vulgata), o batismo e chamado "lava-
gem da regenera~ao" (como ARC). E assim tambem as palavras
BATIZAR e BATISMO muitas vezes sao empregadas para designar
aquela obra efetuada na regenera<;ao pelo Espirito Santo da
qual 0 batismo com agua e0 sinal significativo ou simb6lico-
Mat. 3: 11; 1 Cor. 12: 13; Gal. 3:27; Deut. 30:6. Segue-se, pois,
que essas palavras muitas vezes sao empregadas em sentido
espiritual.
2°. Quando essas palavras se referem ao batismo ceri-
monial, ou ao sinal que representa a coisa significada, elas

854
OBatismo ...
envolvem a aplica~ao de agua em nome da Trindade, como
emblema de purifica~ao ou de regenera~ao espiritual, e nunca,
no seu uso biblico, significam coisa alguma a respeito do modo
pelo qual se deva aplicar a agua.
Este eo ponto exato em discussao: os batistas insistem em
que o mandamento que Cristo deu para a ministra~ao do
batismo e urn mandarnento para "irnergir". Todos OS dernais
cristaos* sustentarn que 0 rnandarnento e para "lavar ern agua",
como sirnbolo de purifica~ao espiritual.
Dos argurnentos dos batistas expostos sob a Perg. 13 dei
resposta ao segundo sob a Perg. 11; ao prirneiro e ao terceiro
darei resposta ern seguida. , . . ·.. .. . . . . -· . ·.

15. Como se pode provar, por seu uso biblico, que as palavras
baptizo e baptisrna niio significam imersiio e sim LAVAGEM para
significar PURIFICA<;Ao, sem referencia alguma ao modo?
1°. 0 verbo encontra-se quatro vezes na Septuaginta
(tradu~ao grega do Velho Testamento), e ern tres desses casos
refere-se ao batisrno corn agua. Veja: 2 Reis 5: 14 - 0 profeta
man dar a dizer aN aama: "Vai, e lava-te ... e ficaras purificado".
E ele "rnergulhou (literalrnente: batizou-se) no J ordao ... e ficou
purificado". Eclesiastico 34:30 (Matos Soares) - "Se alguern
se lava depois deter tocado urn rnorto ... " (literalrnente: "Se
alguern se batiza ... ") Essa purifica<;:ao se fazia borrifando ou
espargindo "a agua da separa~ao"- Nurn. 19:9,13,20. Judite
12:7 (Matos Soares) - Judite "lavava-se nurna fonte de agua"
(literalrnente: batizava-se). Entre aqueles povos nao se tornava
banho irnergindo-se na agua; e as circunstancias ern que Judite
se achava aurnentarn a irnprobabilidade ern seu caso. Lavava-
-se (batizava-se) para purifica~ao. "E, entrando, perrnanecia
pura ... " (versiculo 9).

*No tempo de Hodge ainda niio tinham nascido as igrejas pentecostais.


Nota de Odayr Olivetti.

855
Capitulo 42
2°. A questao agitada entre alguns dos discipulos de Joao
e os judeus, J oao 3:22-30; 4: 1-3, a respei to do batismo era acerca
da purifica<;ao, peri katharismou.
3°. Mat. 15:2; Mar. 7: 1-5; Luc. 11:37-39- Nessas passagens
a palavra baptizo e empregada (1) para designar 0 costumeiro
ato de lavar as maos antes das refei<;6es, para limpa-las (ou
purifica-las), e se fazia habitualmente derramando agua sabre
elas, 2 Reis 3: 11 . (2) E trocada pela palavra nipto, que sempre
significa urn lavar parcial. (3) Declara-se que o seu efeito era
purificar, katharizein. (4) As maos batizadas, ou lavadas, acham-
-se opostas as imundas ou impuras, koinais.
4°. Marcos 7:4,8, " .. .lavar os capos (grego: "b~nismos de"),
e os jarros, e os vasos de metal, e as camas" - klinai, camilhas
dispostas em roda da mesa, nas quais os judeus se recostavam
enquanto comiam, varias pessoas em cada uma delas. Esses
batismos tinham por fim a purifica<;ao e, no caso das mesas,
das camilhas, etc., nao podiam ser "batizadas" por imersao.
5°. Em Hebreus 9:8,10 lemos que no "primeiro taber-
naculo" havia "manjares, e bebidas, e varias ablu<;6es" (literal-
mente: varios batismos). Nos versiculos 13, 19 e 21 sao
especificados alguns desses "varios batismos" ou dessas "varias
ablu<;6es": "Porque, se o sangue dos touros e bodes, e a cinza
duma novilha esparzida sabre os imundos os santifica quanta
a purifica<;ao da carne; Moises "tomou o sangue dos bezerros
e dos bodes, com agua, la purpurea e hissopo, e aspergiu tanto
o livro como todo o povo"; e ainda: "E semelhantemente
aspergiu com o sangue o tabernaculo e todos os vasos do
ministerio".- Doctrine ofBaptisms, Parte 1, do Dr. Armstrong.

16. Que argumento a favor deste modo de considerar o assunto


se pode tirar daquilo que a Biblia diz do batismo com o Espirito
Santo?
Mat. 3: 11; Mar. 1:8; Luc. 3: 16; Joao 1:26,33; Atos 1 :5;
11:16; 1 Cor. 12:13.
Se a palavra baptizo s6 significasse imergir, nao seria

856
OBatismo ...
aplicavel ao uso figurado que nessas passagens se faz dela. Mas
sc, como nos dizemos, ela significa purificar, limpar, entao o
batismo com agua, como urn ato de lavar, porem nunca como
uma imersao, pode bern representar a obra purificadora
realizada pelo Espirito Santo. Veja a Perg. subsequente.

17. Que argumento se pode tirar do jato de se dizer que as benfiios


simbolizadas pelo batismo sao aplicadas par aspersiio e derra-
mamento?
0 dam do Espirito Santo e a gra~a simbolizada- Atos
2:1-4, 32, 33; 10:44-48; 11:15,16. 0 fogo, que nao OS imergiu
mas lhes apareceu como "linguas repartidas ... as quais
pousaram sobre cada um ddes", foi o sinal dessa gra~a. Jesus
mesmo foi o batizador (foi quem ministrou o batismo),
cumprindo entao a profecia de Joao Batista de que Ele haveria
de batizar com o Espirito Santo e com fogo. A respeito do
dom do Espirito Santo, diz a Biblia que "veio do ceu", "Deus ...
derramou" (veja Atos 2:17 ,18,33), "caiu sabre todos", "caiu
sabre eles".
Essas mesmas ben~aos haviam sido preditas no Velho
Testamento, em linguagem semelhante- Is. 44:3; 52:15; Ez.
36:25-27; Joel 2:28,29. Argumentamos, pais, que, se essas
ben~aos espirituais foram preditas no Velho Testamento por
meio das figuras de aspersao e derramamento, e se no Novo
Testamento foram expostas simbolicamente sob as mesmas
formas, e clara que a Igreja pode simboliza-las agora por meio
dos mesmos atos emblematicos ou figurados.

18. Que argumento se pode tirar do modo de purificafiiO ado-


tado sob o Velho Testamento?
Os ritos de purifica~ao prescritos na lei levitica nao deviam,
em nenhum caso de pessoas, ser celebrados por meio de
imersao. A lei prescreve atos de lavar e banhos, mas nem as
palavras empregadas, nem outra coisa alguma, indicam que
as pessoas deviam ser imergidas, sendo que a imersao niio era

857
Capitulo 42
o modo usual de tomar banho naqueles paises. Os sacerdotes,
porem, deviam lavar as maos e os pes sempre que ministras-
sem perante o Senhor, Ex. 30:18-21, e suas ablw;6es pessoais
eles faziam junto do "mar de fundi<;ao", 2 Cron. 4:2-6, de onde
a agua corriapor tubos ou torneiras-1 Reis 7:38-45. Poroutro
lado, havia muitos preceitos que mandavam efetuar purifi-
ca<;6es borrifando ou aspergindo sangue ou agua, ou espa-
lhando cinza- Lev. 8:30; 14:7 e 51; Ex. 24:5-8; Num. 8:6,7;
Heb. 9:12-22. Ora, sen do o batismo cristao uma purifica<;ao, e
tendo sido instituido dentre os judeus, acostumados aos modos
judaicos de purificar, segue-se que o conhecil:llento desses
modos deve lan<;ar muita luz sobre a natureza essencial e sobre
o modo proprio de administrar o rito cristao.

19. Como se pode mostrar, com base em 1 Corin ti os 10: 1,2 e 1


Pedro 3:20,21, que batizar (ness as passagens) niio quer dizer imergir?
Em 1 Corintios 10:1,2 lemos que os israelitas foram
''batizados ... na nuvem e no mar"- Cf. Ex. 14:19-31. Os israe-
litas foram batizados e, no entanto, passaram ape enxuto. Os
egipcios foram imersos, mas nao foram batizados. Diz o Dr.
Carson, pag. 413 que Moises "recebeu uma imersao seca".
Em 1 Pedro 3:20,21 Pedro declara que o batismo e o
antitipo da salva<;ao das oito almas que estavam na area. Mas a
sua salva<;ao consistiu em niio serem imergidos.

20. A respeito do verdadeiro modo de batizar, que argumento


se pode tirar das narrativas dos batismos feitos par Joiio?
1°. 0 batismo de Joao nao era o sacramento (a ordenan<;a)
cristao, mas sim urn rito de purifica<;ao, administrado por urn
judeu a judeus, sob a lei judaica. Disso inferimos (1) que esse
batismo nao foi praticado por imersao, porque nao se efetuava
a purifica<;ao levitica de pessoas desse modo; (2) que, nao
obstante, era preciso, para o firn ern vista, ou de urn rio de
agua corrente, como o Jordao, ou de muita agua, como ern
Enom, que significa "fontes", porque, segundo essa lei, tudo o

858
OBatismo ...
que uma pessoa tocasse antes da sua purifi.ca<;:ao tornava-se
imundo, Num. 19:21,22. Ravia "fontes, cisternas e depositos
de agua", Lev. 11:36, mas nao no deserto onde Joao Batista
pregou. Depois da introdu<;:ao da dispensa<;:ao evangelica,
nada ouvimos sobre os ap6stolos batizarem em rios ou de
precisarem de "muita agua" para a administra<;:ao do sacra-
mento do batismo.
2°. Em nenhuma das narrativas ha urn s6 caso em que se
diga que Joao batizou por imersao. A linguagem empregada
tern aplica<;:ao natural e exata ao batismo ministrado por
aspersao (o batizando em pe na agua pouco funda, e o
ministrante derramando agua sobre ele com a mao). Neste caso,
as frases "batizou no Jordao", "sairam da agua", etc., tern
aplica<;:ao de igual peso tanto ao batismo por imersao como
por aspersao. Que o batismo de Joao foi mais provavelmente
ministrado por meio de aspersao ve-se (1) pelo fato de que era
uma purifica<;:ao feita por urn judeu em judeus, e que as
ablu<;:6es judaicas eram feitas derramando agua com as maos.
Era costume geral, e esse costume tern permanecido ate aos
nossos tempos. (2) Aspersao ou derramamento eo modo mais
provavel, em vista das grandes multi does batizadas por urn s6
homem. -Mat. 3:5,6; Mar.l;S; Luc. 3:3-21. (3)As mais antigas
obras de arte crista ainda existentes representam o batismo de
Cristo, ministrado por J oao, como ministrado por afusao * -
Doctrine of Baptisms, Parte 2, Cap. 3, do Dr. Armstrong.

21. Que provas se pode tirar dos casas de batismo cristiio


mencionados no N avo Testamento?
1a. Foi demonstrado acima que o mandamento para
batizar e mandamento para purificar pelo ato de lavar com
agua, e dai se segue que, mesmo que fosse provado que os
ap6stolos batizaram por imersao, isso nao provaria que esse

*Como o quadro cujo original esta em Ravenna e que as primeiras edi~6es


do Dicionario de Biblia, de Davis traziam impressa. Nota de Odayr Olivetti.

859
Capitulo42

modo particular de lavar e essencial avalidade da ordenan~a,


a nao ser que fosse provado tambem que, segundo as analogias
das outras institui~6es evangelicas, Deus tornou o mero modo
de obedecer a urn mandamento tao essencial como aquilo que
Ele manda. Mas e not6rio que o contrario disso e a verdade. A
lgreja foi organizada e o culto publico do evangelho foi
ordenado segundo certos prindpios gerais, mas nao foram
prescritos os pormenores do modo pelo qual se deveria alcan~ar
esses fins. Cristo instituiu a Ceia anoite, reclinado em camilha
e com pao sem fermento. Contudo, em nenhum desses aspectos
e essencial 0 "modo".
2a. Nao ha de fato urn s6 caso em que a narrativa torne
provavel que os ap6stolos batizassem por imersao, e em quase
todos os casos essa suposi~ao e muitissimo improvavel.
(l) 0 batismo do eunuco, ministrado por Filipe, Atos 8:26-
39, e 0 unico caso que parece favorecer a teoria da imersao.
Entretanto, note-se (a) que a linguagem empregada por Lucas,
mesmo quando a tradu~ao nao e muito clara, tern aplica~ao
tao natural ao batismo efetuado por afusao como por imersao.
(b) As preposi~6es gregas eis, aqui traduzida por a, e ek, aqui
traduzida por da, acham-se empregadas em inumeros casos a
fim de exprimir movimento para ou de algum lugar - Atos
26: 14; 27:34,40. E provavel que Filipe e o eunuco ten ham
descido como "carro" ate amargem da agua. De Filipe tam bern
se diz que desceu "a agua" e que saiu "da agua"' mas ele
certamente nao foi imerso. (c) Na propria passagem que o
eunuco estava lendo, Is. 52:15, esta escrito que o Messias, em
quem ele cria, iria borrifar "muitas na~6es". (d) Lucas informa
que a regiao estava "deserta'', e ate hoje nao se descobriu naquele
caminho urn lugar com agua suficiente para a imersao de uma
pessoa.
(2) Todos os outros casos de batismo cristao registrados
nas Escrituras trazem provas positivas contra a imersao. Veja:
(a) 0 batismo dos tres mil em Jerusalem numa s6 ocasiao, no
dia de Pen tecoste - Atos 2:38-41; (b) 0 batismo de Paulo -

860
OBatismo ...
Atos 9:17,18; 22:12-16. Ananias lhe disse: "0 Senhor Jesus ... ,
me enviou, para que tornes aver e sejas cheio do Espirito Santo.
E logo ... recuperou a vista; e, levantando-se, foi batizado". (c)
0 batismo de Cornelio- Atos 10:44-48. (d) 0 do carcereiro de
Filipos- Atos 16:32-34. Em todos esses casos o batismo foi
administrado imediatamente no mesmo lugar em que os
convertidos aceitaram o evangelho. Nada se diz de rios nem
de muita agua, mas multid6es ao mesmo tempo, e familias
inteiras, e individuos foram batizados em suas casas, ou no
carcere, on de quer que se achassem na ocasiao.

22. Qual tem sido no passado, e qual e no presente, o uso das


igrejas quanta ao modo de batizar?
Nos primeiros tempos da Igreja Crista o modo comum
foi o de imergir o corpo nu. Durante alguns seculos batizava-
-se imergindo tres vezes o corpo, ou s6 se derramava ou aspergia
agua na cabes;a da pessoa em pe na agua. Em casos de grande
perigo de morte, eon de escasseava agua, considerava-se valido
o batismo por afusao ou aspersao (Christian Antiquities, de
Bingham, Liv. 3, Cap.ll; Ch. Hist., de Neander, vol1, tradus;ao
de Torrey, pag. 310; Ch. Hist., de Schaff, vol. 2, § 92). A Igreja
Grega insiste na imersao. A igreja cat6lica romana e as igrejas
protestantes admitem uma e outra forma (mas em geral
praticam a aspersao ). Os costumes modernos favorecem a
aspersao.
Os batistas sustentam que a imersao e o unico batismo
valido.* Todas as demais igrejas ocidentais negam isso e
sustentam a validade igual do derramamento e da aspersao-
Conf de Fe, Cap. 28, § 3.
Nenhum defensor da aspersao pode, se for coerente com
os seus principios fundamentais e com os usos hist6ricos da

* Lembremo-nos de que no tempo de Hodge nao existiam OS pentecostais


de hoje, entre os quais predomina a pratica do batismo por imersao. Nota
de Odayr Olivetti.

861
Capitulo42
Igreja Crista, negar a validade do batismo por imersao. A
oposi~ao da maioria das igrejas a esse modo de batizar tern sua
origem nas pretens6es acanhadas e arrogantes dos batistas (em
geral) e na sua teoria errada a respeito da significa~ao emble-
matica ou figurada do batismo, fazendo dele urn "sepulta-
mento" em vez de urn "ato de lavar"; e contra isso que n6s
protestamos.

AS PESSOAS QUE DEVEM SER BATIZADAS

23. Quem deve ser batizado?


Conf de Fe, Cap. 28, Se~. 4; Cat. Maior, Perg. 166; Breve
Cat., Perg. 95.
Todos aqueles, e somente aqueles, que sao membros da
Igreja visivel devem ser batizados. Esses sao, 1°., os que fazem
profissao digna de credito da sua fe em Cristo; e, 2°., os filhos
cujos pais, ou urn deles, sao cremes. · · ··,

24. No caso dos adultos, quais sao os requisitos necessarios


para o batismo?
Uma profissao digna de credito da sua fe em Jesus como
seu Salvador. Isso e evidente - 1°. Pela propria natureza da
ordenan<;a como simb6lica de dons espirituais, e como selo do
nosso pacto de que pertencemos ao Senhor. 2°. Pela pratica
uniforme dos ap6stolos e dos evangelistas- Atos 2:41; 8:37.
Para a resposta completa a esta pergunta, veja abaixo, Cap. 43,
Perg. 25, sobre as condi~6es de admissao a mesa da Ceia do J
Senhor, que sao identicas as necessarias para o batismo. 4
25. Em que principia essencial e constitutivo da natureza humana
baseia-se esta instituifao? E como se pode mostrar que este prin-
cipia e reconhecido em todo o tratamento providencial que Deus,
por Sua grafa, da a rafa humana?
A grande peculiaridade da humanidade e que, enquanto
cada individuo e urn livre agente moral e responsavel, n6s

862
OBatismo...

constituimos uma ra<;;a, reproduzida segundo a lei da gera<;;ao,


c cada novo agente recem-nascido e educado eo seu carater se
forma debaixo de condi<;;6es sociais. Segue-se que em toda parte
a "a livre vontade do pai se to rna o destino do filho", e o
resultado e 0 carater representativo dos progenitores e 0 carater
e destino herdados que distinguem todas as ra<;;as, na<;;6es e
familia.
I E segundo esse principia que Deus sempre tern tratado a
ra<;;a humana na economia da reden<_;ao. A familia, e nao o
individuo, e a unidade compreendida em todas as alian<;;as e
dispensa<;;6es. Pode-se notar esse fato em todo o procedimento
de Deus para com Adao, N oe, (Gen. 9: 9) Abraao, (Gen. 17:7 e
Gal. 3:8) eo povo de Israel (Ex. 20:5; Deut. 29:10-13). Esse
mesmo principia continua a reger tambern a dispensa<;;ao crista,
como Pedro assevera em seu primeiro sermao- Atos 2:38,39.

26. Qual e a Igreja visivel, a qual o batismo e o rito que da


entrada?
r. 1°. A palavra igreja, ekklesia, e empregada nas Escrituras
no sentido geral de comunidade do povo de Deus, chamado
para fora do mundo e ligado a Ele em rela<;;6es pactuais.
2°. Portanto, a verdadeira lgreja espiritual, em distin<;;ao
da lgreja visivel organizada na terra, consiste na comunidade
inteira dos eleitos, incluidos na alian<;;a eterna da gra<;;a feita
entre o Pai eo segundo Adao- Ef. 5:27; Heb. 12:23.
3°. Mas a lgreja visivel e universal consiste em "todos
aqueles que, no mundo inteiro, professam a religiao verda-
deira, juntamente com seus filhos, e eo reino do Senhor Jesus
Cristo, a casa e familia de Deus, fora da qual nao ha
possibilidade ordinaria de salva<;;ao" - Conf de Fe, Cap. 35,
Sc<;;. L Este reino visivel Cristo, como Mediador da alian<;;a
da gra<;;a, instituiu como provisao administrativa, como fim
de, por meio dele, administrar as provisoes dessa alian<;;a; e
cste reino, como sociedade externa e visivel de pessoas que se
professam cristas, Ele estabeleceu na alian<;;a que fez com

863
Capitulo 42

Abraao-Gen.12:1-3; 17:1-14.
4°. Cristo tern administrado essa alianc;:a por tres modos,
ou em tres dispensac;:6es sucessivas. (1) No periodo entre Abraao
e Moises, durante o qual lhe afixou o selo comprobat6rio,
ratifi,cando a circuncisao. (2) No periodo entre Moises eo Seu
advento (porque a lei que lhe foi acrescentada temporariamente
nao tornou nula a promessa, mas antes administrou-a de urn
modo especial, Gal. 3:17, acrescentou-lhe urn novo selo, a
Pascoa, emblematica da obra propiciat6ria da semente
prometida, como exposta na revelac;:ao mais clara que entao
lhe foi concedida. (3) No periodo entre Cristo eo fim do mundo,
em que, sen do a promessa explicada por meio de unia revelac;:ao
muito mais perfeita, os selos originais se acham substituidos
pelo Batismo e pela Ceia do Senhor. Veja abaixo, Perg. 27.
5°. Segundo o prop6sito divino, a alian~a feita com Abraao
abrangia a Igreja visivel de Cristo, e nao somente sua poste-
ridade natural em seu carater de familia ou nac;:ao. Isto se ve
claramente pelas seguintes pondera~6es: (1) Nessa alianc;:a Deus
prometeu salva<;:iio mediante Cristo e tendo a fe como condi<;:ao.
Comparar Gen. 12:3 com Gal. 3:8,16; Atos 3:25,26. (2) 0 sinal
e selo afixado a ela simbolizava benc;:aos espirituais e selava a
justificac;:ao pela fe - Deut. 10: 15,16; 30:6; Jer. 4:4; Rom.
2:28,29; 4:11. (3) A alianc;:a feita com Abraao como o
representante da Igreja vis1vel e universal tinha estas carac-
teristicas: (a) Foi feita com ele como o "pai de muitas nac;:oes",
e Paulo afirma que Deus o constituiu "herdeiro do mundo" e
"pai de todos OS que creem"' Rom. 4:11,13, e que todos OS que
creem em Cristo agora, quer judeus quer gentios, sao "des-
cendencia de Abraao, e herdeiros conforme a promessa", Gal.
3:29. (b) Continha provisao para que fossem incluidos em seus
privilegios outras pessoas nao nascidas como posteridade
natural de Abraao- Gen. 17:12. Multid6es de tais proselitos
haviam sido introduzidas dessa forma (na esfera da alianc;:a)
antes do advento de Cristo, e muitos deles achavam-se presentes
em Jerusalem como membros da lgreja em sua forma antiga,

864
OBatismo ...

no dia de Pentecoste, procedentes "de todas as na~6es que estao


debaixo do ceu"- Atos 2:5-11.
6°. Esta claro que a Igreja assim compreendida nessa
alian~a administrativa nao e composta s6 dos eleitos, como
tais, e sim consiste na Igreja visivel composta de pessoas que
se professam cristas, e seus filhos, porque, (1) a alian~a contem
a oferta do evangelho, inclusive a apresenta~ao de Cristo, e a
oferta da salva~ao realizada por Ele a todos os homens (todas
as familias da terra), tendo a fe como condi~ao- Gal. 3:8. Mas
isso pertence a Igreja visivel e s6 pode ser administrado por
meio de oraculos inspirados e de urn ministerio visivel. (2)
Como fa to incontestavel, existia semelhante sociedade visivel
sob a antiga dispensa~ao; e sob a nova dispensa~ao, todos os
cristaos, sejam quais forem as suas teorias, procuram tornar
realidade o ideal de semelhante sociedade visivel, para conse-
guirem a comunhao cristae ministerial. (3) Sob uma e outra
dispensa~ao Cristo entregou a Sua Igreja, como a urn reino
visivel, documentos escritos, ordenan~as sacramentais, insti-
tui~6es eclesiasticas e urn ministerio que ensina e governa.
Posto que tudo isso tenha por designio ministrar as provisoes
da alian~a da gra~a e efetuar como seu fim supremo a salva~ao
dos eleitos, e evidente que sinais e selos visiveis, a palavra
escrita e urn ministerio visivel s6 podem, como tais, pertencer
a uma Igreja visivel- Rom. 9:4; Ef. 4:11. (4) No Novo Testa-
mento da-se a mesma representa~ao da lgreja, na parabola do
joio, etc.- Mat. 13:24-30, e 47-50; 25:1-13. Ela deveria consistir
numa comunidade mista de bons e maus, de cremes verda-
deiros e de outros somente professos, e a separa~ao deveria
efetivar-se s6 no fim do mundo, "na consuma~ao dos seculos".
7°. Esta lgreja visivel tern sido transmitida e propagada,
desde o prindpio, de dois modos: (1) Os que nasceram
"estranhos aos concertos da promessa", ou "h6spedes dos
testamentos (das alian~as) da promessa", e "separados da
comunidade de Israel", Ef. 2:12, eram introduzidos nessa
rela~ao somente pela profissao de sua fee pela conformidade

865
Capitulo 42 ~
de sua vida. Debaixo da velha dispensa~ao eles eram chamados ,
proselitos,- Atos 2: 10; Num. 15:15. (2) Todos os nascidos dentro
da alian~a tinham parte em todos os beneficios pr6prios do j
fato de pertencerem por heran<;;a aIgreja visivel. A alian<;;a foi ,
fei ta com Abraao para si e para os seus "vindouros no decurso
das suas gerafoes, como alianfa eterna", e por isso eles receberam
o sacramento que era o sinal e o selo dessa alian<;;a. Por isso
tam bern o clever de ensinar e de educar foi impasto na alian~a
-Gen. 18: 18,19; e a Igreja ficou sendo escola ou institui~ao de
educa<;;ao, Deut. 6:6-9. De conformidade com essa verdade,
Cristo deu a Seus ap6stolos a comissao ou incumbencia de J
fazer disdpulos de todas as na~6es, batizando-as e ensinando- ~
-as- Mat. 28:19,20. Vemos, pois, que a Igreja e representada
sob a figura de urn rebanho que inclui cordeiros e ovelhas, Is.
40:11, e sob a de uma videira de cujos renovos se cuida,
podando-se e cultivando-se a planta infrutifera ou cortando-a,
se for de to do imprestavel- Is. 5: 1-7; Luc. 3:7 ,8.

27. Como se pode mostrar que a Igreja e identica sob as duas


dispensafoes, e que argumento se pode tirar dai para provar que
as crianfas, quando filhos de crentes, devem ser batizadas?
1°. A Igreja, sob ambas as dispensa~6es, tern a mesma
natureza e tern em vista o mesmo fim. A Igreja do Velho
Testamento, compreendida na alian<;;a feita com Abraao,
confiava na oferta evangelica de salva<;;ao pela fe- Gal. 3:8;
Heb., cap. 11. Tinha por fim preparar uma semente espiri tual
para o Senhor. Por conseguinte - (1) Seu fundamento era o
mesmo - o sacrificio e a media~ao de Cristo. (2) As condi<;;6es
impostas aos membros eram as mesmas. (a) Todo verdadeiro
israelita era verdadeiro crente- Gal. 3:7. (b) Todos os israelitas
ao menos professavam a verdadeira religiao. (3) Seus sacra-
memos simbolizavam e selavam a mesma gra<;;a que os da Igreja
do Novo Testamento. A Pascoa, assim como a Ceia do Senhor,
representava o sacrificio de Cristo -1 Cor. 5:7. A Circuncisao,
assim como o Batismo, representava o "despojo do corpo da

866
r OBatismo...
carne", e ao batisrno Paulo chama "circuncisao de Cristo"-
Col. 2:11,12. Ate os ritos da lei rnosaica nao erarn senao urna
revela<;ao sirnb6lica do evangelho.
2°. Elas tern exatarnente o rnesrno nome. A expressao
ekklesia kyriou, igreja do Senhor' e a tradu<;aO exata para 0 grego
das palavras hebraicashal Yave, traduzidas ern nossa versao (a
versao utilizada pelo au tor) por "congrega<;:ao do Senhor". *
Comparar o Salmo 22:22 com Hebreus 2:12. Vemos, pois, que
Estevao chamou acongrega<;ao do povo de Israel que estava ao
pe do Sinai "a congregafiio (ou igreja) no deserto"- Cornparar
Atos 7:38, no grego, com Ex., cap. 32. Assim tambem Cristo e
a forma grega deMessias, e osanciiios oupresbiteros da Igreja do
Novo Testamento sao identicos, ern fun~ao e nome, aos das
sinagogas.
3°. Nos escritos apost6licos nao se acha prova algurna de
haver sido abolida a Igreja antiga e de haver sido organizada
em lugar dela uma Igreja novae diferente. Os ap6stolos nunca
dizern uma s6 palavra a respeito de sernelhante organiza<;ao
nova. A preexistencia de tal sociedade visivel e sernpre pres-
suposta como urn fato. Seus disdpulos sempre forarn
acrescentados a"igreja", ou a"corpora<;:ao" ja existente- Atos
2:47. Verdade e que estava abolida a lei cerimonial de Moises,
por rneio da qual o carater abraamico da Igreja havia sido
administrado durante cerca de mil e quinhentos anos. Mas
Paulo argumenta que a introdu<;ao dessa lei, quatrocentos e
trinta anos depois, nao podia fazer nula a promessa, Gal. 3:17,
e, por conseguinte, a anula<;ao da lei s6 podia dar lugar a urna
adrninistra<;:ao mais perfeita da alian<;a e a urn maior desen-
volvimento da Igreja nela compreendida.
4°. Ha rnuitas provas positivas de que a Igreja antiga,
baseada em sua constitui<;:ao original, nao foi abolida pela nova
dispensa<;:ao.

*Figueiredo traz -igreja. Nota do tradutor. (Almeida: congregafiio; Versao


Autorizada (inglesa): igreja.)

867
Capitulo42
(1) Muitos dos profetas do Velho Testamento declaram
explicitamente que a Igreja visivel que em sua epoca existia,
em vez de ser ab-rogada pelo advento do Messias, ficaria, em
conseqiiencia disso, fortalecida e aumentada gloriosamente,
de molde a abranger tambem os gentios- Is. 49: 13-23; 60:1-
14. Eles declaram tambem que a constitui~ao federal, abran-
gendo o filho com o pai, haveria de permanecer sob a nova
dispensa~ao da Igreja, quando viesse o "Redentor a Siao"- Is.
59:20,21. Pedro, em Atos 3:22,23, explica aprofecia de Moises
(Deut. 18:15-19) no senti do de que toda alma que nao quisesse
ouvir aquele Profeta (o Messias) seria "exterminada dentre o
povo", is to e, cortada da Igreja, dan do assim a conhecer que
permanece a Igreja da qual tal pessoa haveria de ser cortada.
(2) De perfeito acordo com essas profecias, Paulo declara
que a Igreja judaica nao foi ab-rogada, mas que os judeus
incredulos foram cortados da sua propria oliveira e que os
ramos gentilicos foram enxertados em seu Iugar; e prediz que
chegara o tempo em que Deus totnara a enxertar os judeus na
sua propria oliveira, e nao noutra - Rom. 11:18-26. Diz ele
tambem que OS gentios adventicios sao feitos cidadaos junto
com os judeus crentes, e domesticos de Deus na antiga familia
dafe-Ef. 2:11-22.
(3) A alian~a que constituiu a Igreja antiga constituiu
tambem a Abraao pai de muitas na~6es. A promessa da alian~a
foi que Deus seria "o seu Deus e o da sua posteridade depois
dele". Essa alian~a abrangia, pois, as "muitas na~6es" junto
com seu pai Abraao. Por conseguinte, nunca poderia ter sido
cumprida antes do advento do Messias e da aboli<_;;ao da lei
restritiva, e a alian~a feita com Abraao, em vez de haver sido
substituida pelo evangelho, esta so agora principiando a
cumprir-se realmente. Por isso foi que, no dia de Pentecoste,
Pedro exortou a todos a se arrependerem e a que fossem
BATIZADOS, PORQUE A ALIAN(:A FEITA COM ABRAAO AINDA
ERA VALIDA para todos os judeus, e para seus filhos, e para
todos OS que estavam Ionge, isto e, OS gentios, quantos 0 Senhor

868
OBatismo ...
haveria de chamar a Si- Atos 2:38,39. Por isso e tambem que
Paulo argumenta com tanta seriedade que, sendo ainda valida
a alian<;:a feita com Abraao, por essa razao, por seus pr6prios
termos, os gentios que criam em Cristo tinham o mesmo direito
que os judeus tinham a urn Iugar naquela antiga lgreja que
nEle tinha o seu fundamento. "Todas as na<;:6es serao benditas
em ti. DE SORTE QUE" (ou ASSIM QUE"), diz Paulo, "os que
sao da fe sao benditos como crente Abraao", e todos os que
creem em Cristo, quer judeus quer gentios, sao, segundo a
inten<;:ao da alian<;:a, "descendencia de Abraao, e herdeiros
conforme a promessa" - Gal:l 3.6-29. E essa promessa foi:
"SEREI 0 TEU DEUS E 0 DA TUA DESCENDENCIA DEPOIS DE
Tr'.
Esse argumento tern aplica<;:ao direta e conclusiva aquestao
do batismo de crian<;:as. Veja:
1°. Em rela<;:ao a alian<;:a e algreja, o batismo ocupa agora
o mesmo Iugar que a circuncisao ocupava. (1) Ambos os ritos
representam a mesma gra<;:a espiritual, a saber, a regenera<;:ao-
D eut. 30:6; Col. 2: 11; Rom. 6:3,4. (2) 0 batismo e agora o que
a circuncisao foi: o selo ou sinal comprobat6rio da alian<;:a feita
com Abraao. Diz o ap6stolo Pedro, em resumo: "Sede bati-
zados, PORQUE A PROMESSA e para v6s e para vossos filhos"-
Atos 2:38,39. Paulo diz explicitamente que o batismo eo sinal
daquela alian<;:a, "Porque todos quantos fostes batizados em
Cristo ... sois descendencia de Abraao, e herdeiros conforme a
promessa", Gal. 1 3:27,29; e que o batismo e a circuncisao de
Cristo- Col. 2:10,11. (3) Ambos os ritos foram estabelecidos
para, nas eras sucessivas, servirem de meio de entrada na lgreja,
e esta, como ja provamos, e a mesma sob as duas dispensa<;:6es.
2°. Sendo a lgreja a mesma, e nao havendo mandamento
contrario, os membros sao os mesmos. Os filhos dos crentes
eram membros da lgreja antiga, e, por isso, devem ser
reconhecidos como membros agorae devem receber o rito de
inicia<;:ao. Isso os ap6stolos pressupunham como evidente e
universalmente concedido; urn mandamento explicito de

869
Cap£tulo42
batizar as crian<_;;:as teria sugerido duvidas quanta ao seu antigo
~I

direito na lgreja.
3°. Sendo declarado expressamente que a alian<;:a, com sua
promessa, "serei o Deus do crente e de sua posteridade", ainda
esta firme debaixo do evangelho, os filhos dos crentes tern
direito ao selo des sa promessa- Dr. John M. Mason,Essays on
the Church.
~I

28. Quais as provas de que Cristo reconheceu que as crianfas


tem direito a um lugar na lgreja?
1°. A respeito dos pequeninos (Mateus,paidfa;,Lucasbrefe
4
(pi ural de brefos ), crian<_;;:as) Jesus Cristo declarou que "dos tais
eo reino de Deus" ou "dos ceus"- Mat. 19: 14; Luc. 18:15,16.
A frase "reino de Deus" ou "dos ,¢eus" significa a Igreja Visivel
sob a nova dispensa~ao- Mat. 3:2; 13:47. ~
2°. Na comissao ou incumbencia que deu a Pedro depois
da sua apostasia, o nosso Senhor o mandou apascentar os
cordeiros, bern como as ovelhas do rebanho- ]ofw 21:15-17.
3°. Na comissao geral que deu aos ap6stolos, ordenou-lhes
que fizessem disdpulos das na~6es (que sempre se comp6em
de familias), batizando-as e depois ensinando-as - Mat.
28:19,20.

29. Como se pode mostrar que os ap6stolos sempre agiram


segundo o principia de que o filho e membra da lgreja se um dos
pais 0 e? f-

Os ap6stolos (em geral) nao cram pas to res estabelecidos


no meio de uma comunidade crista estavel, e sim missionarios
itinerantes enviados a um mundo incredulo, nao para batizar,
mas sim para pregar o evangelho- 1 Cor. 1: 17. A consequencia
e que temos em Atos e nas Epistolas men~ao feita de apenas
dez casos espedficos de batizados. Em dois deles, os do eunuco
e de Paulo, Atos 8:38; 9:18, nao havia familias para serem
batizadas. No caso dos tres mil do dia de Pentecoste, no do
povo de Samaria e no dos disdpulos de Joao em Efeso, foram

870
~
OBatismo ...
batizadas multid6es de pessoas no mesmo lugar onde fizeram
sua profissao de fe. Em quatro dos cinco casos restantes e dito
expressamente que as familias foram batizadas. Sao os casos
de Lidia, de Tiatira (em Filipos), do carcereiro de Filipos, de
Crispo e de Estefanas- Atos 16:15, 32, 33; 18:8; 1 Cor. 1:16.
No unico caso que resta, o de Cornelio, a narrativa da a entender
que sua familia foi batizada com ele. Assim, pois, os ap6stolos,
sem que seja mencionada uma s6 exce'Sao, batizavam imedi-
atamente os que professavam fe em Cristo, onde quer que se
achassem, e, quando tinham familias, tambem batizavam estas,
como tais.
Note-se ainda que eles, em suas Epistolas, dirigiram-se a
meninos como membros da Igreja. Comparem-se Ef. 1:1 e
Col. 1:1,2 com Ef. 6:1-3 e Col. 3:20; e Paulo declarou que,
mesmo nos casos em que somente urn dos pais fosse crente, os
filhos deveriam ser considerados "santos", ou consagrados ao
Senhor, isto e, como membros da Igreja- 1 Cor. 7:12-14.

30. Que argumento se pode inferir do fato de serem prometidas


e concedidas a crianfaS as benfiios simbolizadas pelo batismo?
0 batismo representa a regenera'Siio em uniao com Cristo.
As crian'5as nascem na condi'5ao de filhos da ira, como os
demais. Nao podem ser salvas, pais, a nao ser que nas<;am de
novo e tenham parte nos beneficios da morte de Cristo.
Portanto, e evidente, pela propria natureza do caso, que elas
podem ser regeneradas no mesmo sentido que os adultos o
podem. "Dos tais eo reino dos ceus"- Mat. 21: 15,16; Luc.
1:41,44.

31. Que argumento se pode tirar da pratica da Igreja Primitiva?


0 batismo de crian<;as e institui<;ao que existe de fato em
todos os segmentos da Igreja universal, com a (mica exce'!;aO
dos batistas modernos (e dos pentecostais, que surgiram no
inicio do seculo vinte). Os batistas modernos estao histo-
ricamente ligados aos anabatistas da Alemanha do anode 1537,

871
Capitulo 42

aproximadamente. Ora, a institui~ao do batismo de crian~as,


ou veio dos ap6stolos, ou teve come~o definido depois, como
novidade ou inova~ao, que necessariamente deveria suscitar
oposi~ao e controversias. 0 fa to, porem, e que nos documentos
mais antigos ja se fala dessa inova~ao como costume universal
e tradi~ao apost6lica. J ustino Martir, que escreveu por volta
do ano 138, afirma que "Entre os cristaos do seu tempo havia
muitas pessoas de ambos os sexos, algumas com sessenta e
outras com setenta anos de idade, crue haviam sido feitas
discipulos de Cristo desde a sua infa~cia". Irineu, que nasceu
por volta do ano 97, diz: "Ele veio salvar todos par(;l Si; todos,
digo, OS que por Ele sao regenerados para Deus, crian~as,
meninos e mo~os". Essa insti tui~ao e reconhecida por
Tertuliano, que nasceu em Cartago em 160, ou seja, s6 sessenta
anos depois da morte do ap6stolo Joao. Origines, nascido de
pais cristaos no Egito, em 185, declara que era "uso da lgreja
batizar crian~as", e que "a lgreja tinha recebido dos ap6stolos
a tradi~ao". Cipriano, bispo de Cartago de 248 a 258, junto
com urn sinodo inteiro que ele presidiu, resolveu que se
administrasse 0 batismo as crian~as antes do oitavo dia.
Agostinho, nascido em 358, declarou que esta "doutrina e
mantida pela lgreja toda, nao foi instituida por concilios, mas
retida sempre". Pelagio admitiu isso, depois de haver visitado
todas as partes da lgreja, desde a Britannia (a Gra-Bretanha)
ate a Siria, apesar de ser essa pratica tao contraria ao seu sistema
de doutrina. Veja Hist. of Infant Baptism, por Wall, e Christ.
Antiquities, por Bingham, Liv. 11, Cap. 4.
Nosso argumento e que o costume de batizar crian~as tern
existido (a) desde o seculo apost6lico, (b) em todas as diversas
partes da lgreja Primitiva, (c) sem interrup<:;ao ate ao tempo
presente, (d) em todas as grandes lgrejas hist6ricas da Reforma;
ao passo que os seus impugnadores (a) tiveram origem depois
da Reforma, (b) cometem geralmente o grave pecado cism:ltico
de nao permitirem que os pedobatistas comunguem com eles.

872
r
OBatismo...
32. Como se deve responder aobjefiiO de que a fee necessaria
para o batismo?
Os batistas argurnentarn-
1°. Que, tendo o Senhor dito, "Ide, pregai ... quern crer e
for batizado sera salvo; mas quem nao crer sera condenado",
Mar. 16:15,16, por isso as crian~as nao devem ser batizadas,
porque nao podem crer.
2°. Que, sendo o batismo o sinal de urna gra~a espiritual e
o selo de uma alian<:;a, por isso as crian<:;as nao devern ser
batizadas, por nao poderern entender o sinal nern fazer urna
alian~a.
-~ t.'.- -.-
RESPONDEMOS- .
~
-

1°. E evidente que Cristo Se referiu somente a adultos


quando falou da necessidade de crerem; porque disse tam bern
que a fe era necessaria para a salva<:;ao, e as crian<:;as sao salvas
rnesrno que nao possarn crer.
2°. A circuncisao era sinal de urna gra<:;a espiritual; para
que urn adulto a recebesse, exigia-se dele que fizesse profissao
de fe; e a circuncisao era tam bern o selo de uma alian<:;a. Apesar
disso, porern, Deus rnandou circuncidar as crian<:;as. A verdade
e que a fee necessaria, porem (no caso das crian<:;as) a fee ados
pais ou de urn deles, representando seu filho. A alian<:;a, da
qual 0 batisrno e 0 selo, efeita COlli OS pais a favor da crian<:;a, a
quem se aplica entao com propriedade o selo.
Alem disso, devemos estar lembrados de que a crian<:;a
nao e uma coisa, e sirn uma pessoa que nasceu com urna
natureza moral rna, inteiramente suscetivel de ser regenerada
na infancia e de receber do Espirito Santo o "habito" ou estado
da alma do qual a fe e a expressao. Por isso e que Calvino diz
(Institutas, Liv. 4, Cap. 16, § 20): ''A sernente do arrependimento
e tambem da fe jaz escondida nelas pela opera<:;ao secreta do
Espirito".

873
Capitulo 42
33. Como devemos evitar a conclusao de que devemos admitir
as crianfas aCeia do Senhor, seas admitirmos ao Batismo?
Nao tern aplica<;ao aos dois sacramentos os motivos acima
exarados. Vejamos por que:
1°. 0 Batismo e urn ato que reconhece e sela o fato de que
o batizado pertence aIgreja; a Ceia do Senhor e urn ato come-
morativo.
2°. No Batismo quem recebe o sacramento e passivo; na
Ceia e ativo.
3°. As crian<;as nunca foram admitidas aPascoa, enquanto
nao fossem capazes de compreender a natureza da qrdenan<;a.
4°. Os ap6stolos batizaram familias, mas nunca admitiram
famllias, como tais, aCeia do Senhor.

34. Os filhos de quem devem ser batizados?


"Os filhos daqueles que sao membros da lgreja visivel
devem ser batizados" Breve Cat., Perg. 95; is toe, teoricamente,
os filhos cujos pais, ou s6 urn deles, sao crentes "(embora s6
urn deles o seja)", Conf de Fe, Cap. 28, Se<;. 4; e, praticamente,
"as crian<;as cujos pais, ou urn s6 deles, professarem fe em Cristo
e obediencia a Ele", Cat. Maior, Perg. 166. Os episcopais, os
cat6licos romanos, os protestantes do continente europeu e os
presbiterianos da Esc6cia (e antigamente os deste pais - os
Estados Unidos da America) seguem o principia de que toda
pessoa batizada, e nao excomungada, sendo ela mesma membro
da Igreja Visivel, tern o direito de ter tambem seus filhos
reconhecidos e tratados como tais. Mesmo quando os pais sao
incredulos, os cat6licos romanos e os episcopais mandam
batizar seus filhos sobre a fe professa de padrinhos.
E evidente, porem, que s6 devemos batizar os filhos de
pais, ou tutores efetivos, que fa<;:am profissao digna de credito
de fe pessoal em Cristo. Motivos desta restri<;:ao:
1°. Por causa da natureza do ato. A fee a condi<;:ao da alian<;:a
cujo selo e o batismo. A Assembleia Geral de 1794 decidiu
(definir) que o nosso Diret6rio para o Culto Divino exige que

874
OBatismo ...
o pai, ou a mae, ou os dais, se comprometam expressamente
diante de Deus e da Igreja "a orar com a crian~a e par ela, que
lhe sirvam de born exemplo de piedade e religiao", etc. E o
Sinodo Geral de 1735 afirma que, se fosse permitido a outros
que nao os pais assumirem esses compromissos, "o selo seria
afixado como que num papel em branco" (Moore's Digest, pags.
665 e 666). Par isso e evidente que as condi~6es necessarias
para que alguem tenha seus filhos batizados sao exatamente as
mesmas que sao necessarias para que ele proprio seja batizado
ou admitido a Ceia do Senhor, as quais se resumem numa
profissao digna de credito de verdadeira fe. " ' ' ' c!:;;, .•
2°. Padrinhos que nao sejam os pais ou tutores efetivos, e
que provavelmente nunca 0 serao, evidentemente nao sao OS
representantes providencialmente designados da crian~a, e nao
estao em condi~6es de cumprir suas promessas.
3°. Aqueles que, tendo sido batizados, nao cumprem, pela
fee obediencia, seus votos batismais quando chegados aidade
madura, estao ipso facto suspensos os privilegios da alian~a, e
par isso (seus pais ou responsaveis) nao podem recorrer a eles
a favor de seus filhos.
4°. Os ap6stolos batizaram somente as familias daqueles
que professavam fe em Cristo.

A EFICACIA DO BATISMO

35. Qual a doutrina cat6lico-romana e dos ritualistas em geral


quanta aeficacia do batismo?
A doutrina cat6lico-romana, com a qual o tractarianismo
(ou o "Oxford Movement", tentativa de estabelecer o catoli-
cismo romano na Igreja da Inglaterra, iniciado ali em 14 de
julho de 1833) concorda oficialmente, consiste nos seguintes
pontos:
1°. Que o batismo confere os merecimentos de Cristo eo
poder do Espirito Santo, e que, par isso, (1) ele purifica da
corrup~ao inerente; (2) consegue a remissao da pena do pecado;

875
Capitulo 42
(3) consegue a infusao da gra~a santificadora; (4) une a Cristo;
(5) imprime na alma urn canher indelevel; (6) abre as portas
do ceu - Newman, Lectures on Justification, p:ig. 257; Cat. Rom.,
Parte 2, Cap. 2, Pergs. 32-44.
2°. Que a eficacia da ordenan~a e inerente a ela mesma em
virtude da institui~ao divina. Seu poder nao depende, nem do
merecimento do ministro oficiante, nem do de quem recebe o
sacramento, e sim do proprio ato sacramental, como urn opus
operatum. No caso das crian~as, a unica condi~ao da sua efic:icia
e que o sacramento seja devidamente administrado. No caso
dos adultos, sua efid.cia depende da condi~ao adicional de que
0 batizando nao esteja em pecado mortal e que nao resista de
von tade oposta - Pedro Dens, De Baptismo.

36. Quale a doutrina luterana sabre este assunto?


Os luteranos estavam de acordo com as igrejas reformadas
em repudiar a doutrina romanista da eficacia magica deste
sacramento como opus operatum. Mas foram muito alem dos
reformados em manter a uniao sacramental entre o sinal e a
gra~a significada. Lutero, em seu Pequeno Catecismo, Parte 4,
Se~;;. 2, afirma que "o batismo opera o perdao dos pecados, livra
da morte e do diabo, e confere a salva~ao eterna a todos os que
creem", e na Se~. 3, que "nao e, de fato, a agua que produz
esses efeitos, e sima Palavra de Deus que esta ligada aagua e a
acompanha. Porque a agua sem a Palavra s6 e agua, nao o
batismo, isto e (nao) e a agua da gra~a da vida, nem 0 ato de
lavar da regenera~;;ao". Esta eficacia, no caso dos adultos,
depende da fe verdadeira e salvadora: ''Alem disso, nao haven do
fe, permanece sendo urn mero sinal inoperante".
Por conseguinte, os luteranos sustentam -
1°. 0 batismo e meio eficaz de conferir 0 perdao dos
pecados e a gra~a de Cristo.
2°. Ele contem a gra~;;a que confere.
3°. Sua eficacia nao reside na agua, mas sim na Palavra e
no Espfrito Santo na Palavra.

876
OBatismo ...
4°. Sua eficacia, no caso dos adultos, depende da fe do
batizando -Conservative Reformation, de Krauth, pags.545-584.
37. Quale a doutrina zwingliana sabre este assunto?
Que o rito externo e urn mero sinal, uma representa~ao
objetiva da verdade por meio de urn simbolo, mas sem ter
eficacia alguma alem da que e devida a verdade representada.

38. Quale a doutrina das igrejas reformadas, e, entre elas, da


nossa, sabre este assunto?
Todas elas concordam em afirmar-
1°. Que a doutrina zwingliana e incompleta.
2°. Que o batismo, alem de ser urn sinal, e tambem o selo
da gra~a e, por conseguinte, uma presente e sensivel comu-
nica~ao e confirma~ao da gra~a ao crente que tern o testemunho
em si mesmo, e para todos os eleitos e urn selo dos beneficios
da alians;a da gras;a, que, mais cedo ou mais tarde, serao
comunicados no tempo que for do agrado de Deus.
3°. Que essa comunica~ao nao e efetuada pela a~ao do ato
sacramental, mas sim pelo Espirito Santo, que acompanha a
Sua propria ordenan~a.
4°. Que, no caso de urn adulto, a recep~ao da bens;ao
depende da sua fe.
5°. Que os beneficios comunicados pelo batismo nao lhe
sao peculiares, porem pertencem ao crente anteriormente ao
batismo, ou sem ele, e lhe sao muitas vezes renovados depois.
A nossa Conf de Fe, Cap. 28, Se~oes 5 e 6, afirma que:
"1 °. Pelo devido uso desta ordenan~a, a gra~a prometida
nao somente e oferecida, mas realmente exibida e conferida
pelo Espirito Santo aqueles (quer sejam adultos quer crians;as)
a quem esta gra~a pertence.
"2°. 0 batismo nao consegue em todos os casos as ben~aos
da alian~a.
"3°. Nos casos em que as consegue, o dom nao esta neces-
sariamente ligado ao momento da administra~ao da ordenan~a.
"4°. 0 recebimento dessas ben~aos depende de duas coisas:

877
Capitulo 42 ~
(1) o uso devido da ordenan<;a; (2) o prop6sito secreto de Deus"
-Dr. Hodge.
39. Em que consiste a doutrina da regenerafao batismal,
1.
geralmente assim conhecida? Em que fundamento se baseia? Como
se pode mostrar que efalsa? l
Os defensores protestantes da regenera<;aob-atismal, sem i
admitir a teoria cat6lico- romana de umopus operatum, susten-
tam que o batismo eo meio que Deus instituiu para comunicar
os beneficios da reden<;ao em primeiro lugar. Que qualquer
experiencia da gra<;a desfrutada pelos nao batizados e ben~ao
decorrente de uma misericordia nao prometida em alian<;a
alguma. Que a culpa do pecado original e tirada eo Espfrito
Santo e dado no batismo, e seus efeitos ficam como semente
na alma, para ser depois desenvolvida pela livre vontade da
pessoa batizada, ou, sendo negligenciada, tornar-se inoperante.
Toda crian~a e regenerada pelo batismo. Se morrer na inffincia,
a semente desenvolve-se no paraiso. Se chegar aidade adulta,
o resultado dependera do uso que dela fizer- Diet. of Theology,
de Blunt, Art. "Baptism". Veja acima, Cap. 29, Perg. 4.
Fundam essa doutrina numa numerosa classe de passagens
das Escrituras, como sejam: "Cristo amou a igreja, e a si mesmo
se entregou por ela, para a santificar, purificando-a com a
lavagem da agua, pela palavra",* Ef. 5:25,26; "Levanta-te, e
batiza-te, e lava os teus pecados", Atos 22:16. E tam bern Joao
3:5; 1 Ped. 3:21; Gal. 3;27; etc.
Os reformados explicam essas passagens segundo os
seguintes prindpios:
1°. Em todo sacramento ha duas coisas: (1) urn sinal
externo e visivel; (2) uma gra<;a interna e invisfvel, significada
pelo sinal. Entre essas duas coisas existe uma rela<;ao sacra-
mental ou simb6lica que da lugar a urn modo de falar pelo

* Figueiredo e Matos Soares dizem, no versiculo 26: "Para a santificar,


purificando-a no batismo da agua, pela palavra da vida", mas no original
grego nao consta "batismo". Nota de Odayr Olivetti.

878
OBatismo ...

qual as propriedades e os efeitos da gra~a sao atribuidos ao


sinal. Todavia, nao se segue dai que OS dois sao inseparaveis,
como tampouco que sao identicos.
2°. Os sacramentos sao insignias de fe religiosa e neces-
sariamente envolvem a profissao dessa fe. Na linguagem
comum, presume-se que essa fe se acha presente e que e
verdadeira, e, nesse caso, a gra~a significada pelo sacramento
nao somente e oferecida, mas tambem e realmente comunicada
-Breve Cat., Pergs. 91 e 92.
Que o batismo nao pode ser o unico meio, e nem mesmo
o meio comum, regular, de comunicar a gra~a da regenera-
~ao (isto e, de iniciar a alma num estado de gra~a), e evidente.
Veja-
1°. A fee o arrependimento sao frutos da regenera~ao. Mas
a fe e o arrependimento sao as condi~6es necessarias para que
se possa receber o batismo- Atos 2:38; 8:37; 10:47; 11:17.
2°. Essa doutrina e identica a dos fariseus, que Cristo e
Seus ap6stolos censuraram constantemente- Mat. 23:23-26.
Diz o ap6stolo Paulo: "Porque em Jesus Cristo nem a circun-
cisao nem a incircuncisao tern virtude alguma; mas sim a fe
que opera por caridade", e "mas sim o ser uma nova criatura"
-Gal. 5:6 e 6:15 Veja tam bern Rom. 2:25-29. As Escrituras
dizem que somente a fe salva, e que somente a sua ausencia
condena- Atos 16:31; Mar. 16:16.
3°. 0 espirito e 0 metodo do evangelho inteiro sao eticos,
e nao magicos. 0 grande meio de que o Espirito Santo Se serve
e a VERDADE, e tudo quanto se diz nas Escrituras da eficacia
dos sacramentos tambem se diz da eficacia da verdade. Sao,
pois, meios de gra~a em comum com a Palavra, e somente na
medida em que eles a contem e a selam - 1 Ped. 1:23; J oao
17:17,19. 0 nosso Senhor diz: "Pelos seusfrutos os conhecereis"-
Mat. 7:20.
4°. Essa doutrina e refutada pela experiencia. !mensas
multid6es de batizados, de todas as idades e em todas as na~6es,
nunca produzem nenhum dos frutos do arrependimento. Os

879
Capitulo 42
seculos e as comunidades em que essa doutrina tern estado
mais arraigada tern sido os que se tornaram mais conspicuos
por sua esterilidade espiritual.
5°. 0 grande mal do sistema do qual faz parte a doutrina
da regenera~ao batismal esta em sua tendencia de tornaca
religiao uma coisa de formas externas e magicas, de criar e
nutrir assim urn ceticismo racionalista entre os inteligentes e
uma supersti~ao entre os ignorantes e os m6rbidos, como
tambem de efetuar, entre todas as classes, o div6rcio entre a
religiao e a moralidade.

A NECESSIDADE DO BATISMO

40. Qual e a doutrina cat6lico-romana sabre a necessidade


do batismo?
Que ele e, por instituic;ao de Deus, o unico meio sine qua
non da justificac;ao (regenera~ao, etc.), tanto para as crianc;as
como para os adultos. No caso dos adultos, eles excetuam
somente aqueles que formaram o sincero prop6sito de rece-
ber o batismo sem que, na providencia de Deus, lhes fosse
possivelleva-lo a efeito. No caso das crianc;as, nao admitem
nenhuma excec;ao.

41. Quale a doutrina luterana sabre este ponto?


Seus livros simb61icos afirmam a necessidade dos
sacramentos aparentemente sem qualificac;ao (sem restric;6es
ou reservas). Veja a Conf de Augsb., Art. 9, e A pol. da Conf de
Augsb., pag. 156, citada no Cap. anterior deste livro. Mas o Dr
Krauth provou, por citac;6es das obras de Lutero e de outros
escritores autorizados, que a sua doutrina realmente era que
(1) 0 batismo nao e essencial (nos termos em que, e. g., a pro-
piciac;ao de Cristo o e), mas que (2) enecessaria como algo que
foi instituido para ser o meio comum, normal, de conferir
gra~a; todavia, (3) niio absolutamente, porque a "necessidade" e
limitada (a) pela possibilidade de te-lo, de modo que nao e

880
OBatismo ...
a privas;ao, mas sim o desprezo do batismo, que condena o
homem, e (b) pelo fa to de que todas as bens;aos sao prometidas
sob a condis;ao da fe. (4) 0 batismo nem sempre eseguido pela
regeneras;ao, e ela nem sempre eprecedida pelo batismo, e os
homens podem ser salvos mesmo sem o batismo. (5) Todas as
crians;as que se acham dentro da igreja sao salvas, mesmo que
nao sejam batizadas. (6) Quanta as crians;as entre os pagaos, o
ponto fica sem decisao, porque nao esta revelado, mas nutrem-
se esperans;as- Conserv. Reform., por Dr. Krauth, pags. 557-
564.

42. Quale a doutrina reformada?


Que o batismo e"necessaria", porque Cristo o ordena, e e
universalmente obrigat6rio, porque e urn meio de gras;a
divinamente ordenado e muito precioso, do qual seria impio
fazer pouco caso consciente e propositalmente; e porque e a
insignia ordenada e geralmente reconhecida por meio da qual
reconhecemos publicamente a fidelidade a Cristo. Sen do assim,
fazer conscientemente pouco caso dos sacramentos e muito
parecido com uma trais;ao.
Mas, geralamente o batismo nao confere gras;a em primeiro
lugar, porem a pressup6e, e a gras;a que ele simboliza e sela e
conferida muitas vezes antes do batismo e mesmo sem ele-
Conf de Fe, Cap. 28;Institutas, de Calvina, Liv.4, Cap.l6, § 26.

EXPOSH_;6ES DOS CREDOS AUTORIZADOS

DOUTRINA CATOLICO-ROMANA- Cat. do Cone. de


Trento, Parte 2, Cap.2, Perg. 5: "Segue-se que se pode definir
o batismo acurada e convenientemente como o sacramento
da regenerac;ao pela agua na Palavra. Porque par natureza
nascemos de Adao filhos da ira e pelo batismo renascemos
em Cristo filhos da misericordia".
lb., Parte 2, Cap.2, Perg. 33: "Porque, nao havendo
outro meio de salvac;ao para as crianc;as, exceto o batismo,

881
'
Capitulo 42
1

e facil entender quanto e enorme a culpa em que in-


correm os que permitem que elas sejam pri"adas da grac;a
do sacramento por mais tempo do que a necessidade
exige".
Berlarmino, De Bapt., l, 4: "A igreja (cat6lica romana)
tern sempre crido que as crianc;as perecem se saem desta
vida sem o batismo. Embora as crianc;as deixem de ser
batizadas por nenhuma culpa sua, todavia elas nao perecem J
sem culpa sua, porque tern o pecado original". I
DOUTRINA LUTERANA- Veja as citac;oes registradas no
capitulo anterior.
Quenstedt, 4, 147: "Pelo batismo e no batismo o Espirito
Santo infunde nas crianc;as uma fe verdadeira, salvadora,
vivificadora e real, seguindo-se dai que tambem as crianc;as
batizadas creem verdadeiramente".
Art. Esmalcalda, Parte 3, Art. 5, "De Batismo" - "0
batismo nada mais e do que a Palavra de Deus junto com a
imersao na agua, segundo a sua instituic;ao e manda-
mento ... A Palavra e acrescentada ao elemento e torna-se
em sacramento".
Cat. Minor, 4, Qures. 3 - "0 batismo opera a remissao
dos pecados, livra da morte e do diabo, e da a bem-aven-
turanc;a a todos e a cada urn dos que creem no que a Palavra
e as promessas divinas revelam".
DOUTRINA REFORMADA- Cat.Geneb., pag. 522: "A
significac;ao do batismo tern duas partes, porque nele e
representada a remissao dos pecados ... Acaso alguem
atribui a agua nada mais do que a func;ao de ser ela a
figura de urn ato de lavar? Penso que e tal figura e que,
ao mesmo tempo, uma verdade esta ligada a ela. Pois
Deus nao nos engana quando nos promete os Seus dons.
Por isso e certo que o perdao dos pecados e a novidade
de vida nos sao oferecidos e sao por n6s recebidos no
batismo".
Institutas de Calvino, Liv. 4, Cap. 16, § 26: "Nao desejo
que me entendam como que insinuando que se possa
desprezar impunemente o batismo. Longe de desculpar
tal desprezo, sustento que com isso se viola a alianc;a do

882
OBatismo ...

Senhor. A passagem (Joao 5:24) tao-somente mostra que


nao devemos julgar o batismo tao necessaria que nos leve
a supor que todo aquele que nao teve ocasiao de obte-lo
tenha perecido".
Os Trinta e Nove Artigos da lgreja da Inglaterra, Art. 27:
"0 batismo nao e somente sinal de profissao e marca
distintiva pela qual se distinguem os cristaos dos nao
cristaos, mas e tambem sinal de regenera~ao ou novo
nascimento pelo qual, como por instrumento, os que
recebem retamente o batismo, sao enxertados na lgreja:
as promessas da remissao dos pecados e da nossa ado~ao
como filhos de Deus pelo Espirito Santo sao visivel-
mente assinaladas e seladas, a fe e confirmada, e a gra~a
e aumentada em virtude de ora~ao a Deus. 0 batismo
das crian~as deve ser mantido integralmente na lgreja
como plenamente conforme a institui~ao de Cristo".
Conf de Fe, Cap. 28; Cat. Maior, Pergs. 165-167; Breve
Cat., Pergs. 94 e 95.
§ 1- "0 batismo e urn sacramento do Novo Testamento,
insti tuido por Jesus Cristo, nao s6 para solenemen te
admitir na lgreja a pessoa batizada, mas tambem para
servir-lhe de sinal e selo da alian~a da gra~a, de sua uniao
com Cristo, da regenera~ao, da remissao dos pecados e
tambem da sua consagra~ao a Deus por Jesus Cristo, a fim
de andar em novidade de vida. Este sacramento, segundo
a ordena~ao de Cristo, ha de continuar em Sua lgreja ate
ao fim do mundo".
§ 5 - "Posto que seja grande pecado desprezar ou
negligenciar esta ordenan~a, contudo, a gra~a e a salva~ao
nao se acham tao inseparavelmente ligadas a ela que
ninguem possa ser regenerado e salvo, ou que sejam
indubitavelmente regenerados todos OS que sao batizados".
§ 6- "A eficacia do batismo nao se limita ao momenta
em que e administrado; contudo, pelo devido uso desta
ordenan~a, a gra~a prometida e nao somente oferecida,
mas realmente manifestada e conferida pelo Espirito Santo
aqueles a quem ele pertence, adultos ou crian~as, segundo
o conselho da vontade de Deus, em Seu tempo apropriado".

883
Capitulo 42
DOUTRINA SOCINIANA- Socino acreditava que o
batismo tinha sido praticado pelos ap6stolos depois da
morte de Cristo, e que era aplicado somente aos conver-
tidos, vindos de fora da lgreja. Os socinianos em geral
sustentavam que o batismo e apenas uma insignia da
profissao de seguir a Cristo, que s6 o batistno por imersao
e valido e que s6 OS adultos devem ser batizados - Cat.
Rae., Se~. 5, Cap. 3.

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884
43
• . --~. -, · .''T · ~i;F' • .

A Ceia do Senhor

1. Em que passagens do Novo Testamento consta a instituir;iio


da Ceia do Senhor?
Mat. 26:26-28; Mar. 14:22-24; Luc. 22: 17-20; 1 Cor.
10: 16,17; 11:23-30.

2. Como se prova que a sua observancia e de obrigar;iio


perpetua?
Provam-no:
1°. As palavras da instituis;ao: "Fazei isto em memoria de
mim".
2°. As palavras de Paulo - 1 Cor. 11:25,26: "Fazei isto,
todas as vezes que comerdes, em memoria de mim. Porque
todas as vezes que comerdes este pao e beberdes este d.lice
an unciais a morte do Senhor, ate que ele venha".
3°. 0 exemplo apostolico- Atos 2:42,46; 20:7; etc.
4°. As muitas referencias feitas a ela nos escritos apostolicos
como de obrigas;ao perpetua- 1 Cor. 10: 16-21; etc.
5°. A pratica da lgreja Crista, toda ela, em todos os seus
ramos, desde o principia.

3. Quais as diversas /rases empregadas nas Escrituras para


designar a Ceia do Senhor, equal o seu sentido?
1a. "Ceia do Senhor" - 1 Cor. 11:20. A palavra grega
defpnon, traduzida "ceia", designava o jan tar, ou a refeis;ao
principal dos judeus, que se comia de tarde ou pouco antes
do anoitecer, e dai este sacramento recebeu esse nome, tendo

885
Capitulo 43
sido instituido na ocasiao dessa refei<;,:ao. Chama-se "do Senhor" l
porque foi por Ele instituido, para comemorar Sua morte e ~.~
significar e selar a Sua gra<;,:a.
2a. "0 calice de ben<;,:ao" -1 Cor. 10:16.0 calice foi aben-
<;,:oado por Cristo, e a ben<;,:ao de Deus e agora invocada sabre
ele pelo ministro oficiante- Mat. 26:27.
3a. ''A mesa do Senhor"- 1 Cor. 10:21. "Mesa", aqui, por
uma figura comum, representa as provisoes pastas em cima
dela. E a mesa para a qual o Senhor convida Seus h6spedes e a
qual Ele preside.
4a. ''A comunhao" -1 Cor. 10:16. 0 a to de participar deste
sacramento, em que se da e se recebe mutuamente, estabelece
e exerce a comunhao do crente com Cristo e, por conseguinte,
tambem ados cremes uns com os outros, por Cristo.
sa. "0 partir do pao"- Atos 2:42. Aqui o ato simb6lico do
ministro oficiante e usado para designar o ato completo da
celebra<;,:ao.

4. Por quais outros termos ela foi designada na lgreja Primitiva?


1°. "Eucaristia",de eukaristeo, dar gra<;,:as. Veja Mat. 26:27.
Esta palavra qualifica com muita propriedade este sacramento
como urn oficio divino de a<;,:ao de gra<;,:as. E tanto o calice de
a<;,:ao de gra<;,:as, com o qual celebramos a gra<;,:a de Deus e
prometemos ser-Lhe gratos, como o calice de ben<;,:ao, ou calice
consagrado.
2°. "Reuniao",synaxis, porque o sacramento era adminis-
trado nas reuni6es publicas.
3°. ''Administra<;,:ao santa", leiturguia, aplicada ao sacra-
mento como expressao de. eminencia. Dessa palavra,
obviamente, e derivada a palavra liturgia.
4°. "Obla<;,:ao de sacrificio", thusia. "Nao se aplicava este
termo ao sacramento no sentido de urn verdadeiro sacrificio
propiciat6rio; aplicava-se porque (1) a sua celebra<;,:ao era
acompanhada de uma coleta e de ofertas de esmolas (dona-
tivos para sus ten to da obra do Senhor e para beneficencia);
A Ceia do Senhor
porque (2) comemorava o verdadeiro sacrificio de Cristo na
cruz; porque (3) era verdadeiramente urn sacrificio de louvor
e de a<;,:ao de gra<;,:as, Heb. 13: 15; porque (4) no estilo dos
antigos, todos os atos religiosos em que se consagrava qual-
quer coisa a Deus para a Sua gloria e para a nossa salva<;,:ao
eram chamados sacrificios.
5°. "Agape",agape. Os agapes, ou festas de amizade, eram
refei<;,:6es para as quais se reuniam todos os comungantes, e em
conexao com as quais eles recebiam os elementos consagra-
dos. Essa e a razao pela qual foi dado esse nome tambem ao
sacramento.
6°. Misterio,mystirion, ou revela<;,:ao simbolica da verdade,
que tinha por fim o proveito especialusufruido pelos cristaos
iniciados. Este nome era aplicado aos dois sacramentos. Nas
Escrituras e aplicado a todas as doutrinas da revela<;,:ao- Mat.
13: 11; Col. 1:26.
7°. Missa, (termo derivado do partidpio passado do verbo
latino mitto, que significa, entre outras coisas, despedir), e a
designa<;,:ao principal usada pela igreja latina (catolica). A
deriva<;,:ao mais provavel deste termo (em conexao com o
sacramento) e da antiga formula de despedir os irmaos reunidos.
Quando estavam concluidos os ritos sagrados, os diaconos
diziam em voz alta: "Ite, missa est", Ide, despedida esta -
Turretino, Lib. 19, Quaes. 21.

5. Como se define este sacramento, e quais os pontos essenciais


incluidos na definifiio? .'
Veja Cat. Maior, Perg. 168; Breve Cat., Perg. 96.
Eis os pontos essenciais dessa defini<;,:ao:
1°. Os elementos, pao e vinho, dados e recebidos segundo
a insti tui<;,:ao de Jesus Cristo.
2°. 0 proposito de quem os recebe de faze-lo em obediencia
a institui<;,:ao de Cristo, em come:rnora<;,:ao dele, para anunciar
a Sua morte ate quando Ele venha.
3°. A prometida presen<;,:a de Cristo no sacramento, por

887
Capitulo 43
Seu Espirito, "de modo que aqueles que o recebem dignamente
tornam-se participantes do corpo e do sangue de Cristo, com
todos os seus beneficios, nao de uma maneira corporal e carnal,
e sim pela fe, para seu alimento espiritual e crescimento na
gras;a".

6. Que qualidade de piio deve-se usar no sacramento, e qual e


o uso das diversas igrejas a este respeito?
0 essencial e que seja pao, desta ou daquela qualidade -
1o. Em consequencia do mandamento de Cristo.
2°. Em consequencia da significa~ao do simbolo; porque
o pao, sendo o principal alimento natural de nosso corpo,
representa a carne dEle, a qual, como o Pao vivo, Ele deu
para sera vida do mundo- Joao 6:51. Mas a qualidade do
pao, se deve ser Ievedado ou nao, nao esni especificada no
mandamento, e a natureza do sacramento nao torna isso
essencial.
Cristo serviu-Se de pao asmo ou nao levedado porque este
estava na mesa, tendo-se acabado de celebrar a Pascoa. Os
primeiros cristaos celebravam a comunhao na ocasiao de uma
refei~ao comum, com o pao comumente usado, que era
levedado. Desde o seculo oitavo, a igreja cat6lica romana tern
usado pao nao levedado e manda que se fa~a uso dele como o
unico que convem (na verdade, criou o elemento espedfico
para esse uso, chamado "h6stia"), mas nao o torna essencial
(Cat. do Cone. de Trento, Parte 2, Cap. 4, §§ 13 e 14). A lgreja
Grega insiste no uso de pao nao levedado, e e deste que a lgreja
Luterana faz uso. As igrejas reformadas, a lgreja Anglicana
inclusive, consideram mais proprio o uso de pao fermentado,
por ser o pao da vida comum, e porque, na Ceia do Senhor, o
pao e simbolo de alimento espiritual. 0 uso do bolo,
introduzido nalgumas de nossas igrejas, e provinciano e
arbitrario, e nao se funda nem nas Escrituras, nem na tradi<;;ao,
nem no born gosto.

888
A Ceia do Senhor

7. Qual o significado da palavra h6inos, vinho, no Novo


Te_s_tamento, e como se ve que se deve usar vinho, e niio algum
outro liquido, na celebraftiO da Ceia?
0 uso dessa palavra no Novo Testamento torna evidente
que era prop6sito dos escritores sagrados designar por ela o
suco fermentado da uva -Mat. 9:17; Joao 2:3-10; Rom. 14:21;
Ef. 5:18; 1 Tim. 3:8; 5:23; Tit. 2:3.
Isto se acha estabelecido pelo testemunho unanime de
todos OS eruditos e dos missiomirios residentes no oriente. Veja
o artigo do Dr. Lindsay W Alexander naCycloptedia, de Kitto;
o artigo intitulado "Wine", por Dr. William L. Bevan, no
Smith's Bible Diet.; o que diz o Dr. Ph. Schaff sobre J oao 2:1-
11, na pag. 111 do Comm. onJohn, de Lange; o que diz o Rev.
Dr. T. Laurie, missionario, na revista Bibliotheca Sacra, de
janeiro de 1869; a obra Residence of Eight Years in Persia, por
Dr. Justin Perkins, pag. 236; o artigo por Dr. Eli Smith, na
Bib!. Sacra, 1846, pags. 385 et alia; e o por Rev. J. H. Shedd
(missionario) em Interior, de 20 de julho de 1871.
A igreja cat6lica romana, fundada na tradi~ao, pleiteia que
se deve misturar agua com o vinho (Cat. do Cone. de Trento,
Parte 2, Cap. 4, Pergs. 16 e 17). Mas isso nao consta do manda-
mento, nem esta envolvido de nenhum modo na significa~ao
simb6lica do rito. Que e vinho, e nenhum outro Hquido, que
se deve usar ficara evidente para quem ler as palavras da
institui~ao, Mat. 26:26-29, eo que o Novo Testamento diz sobre
o uso dos ap6stolos.

8. Como se ve que 0 partir do pao e parte importante da


celebraftio do sacramento?
Pelas seguintes considera~6es:
1a. 0 exemplo de Cristo no a to da institui~ao, que se pode
observar em cada uma das narrativas inspiradas que temos
sobre o assunto- Mat. 26:26; Mar. 14:22; Luc. 22: 19; 1 Cor.
11:24.
2a . .E ponto proeminente na referencia que os apostolos

889
Capitulo 43
fazem ao sacramento nas Episto1as- 1 Cor. 10: 16. Todo o oficio
e designado pelo nome deste (mico ato- Atos 2:42.
3a. Pertence a significa~ao simb61ica do sacramento. (1)
Representa o corpo de Cristo quebrado por n6s -1 Cor. 11:24.
(2) Representa a comunhao dos crentes, sendo eles muitos num
s6 corpo - 1 Cor. 10:17. Isso a Igreja Luterana nega, susten-
tando que "o partir e somente urn ato preparat6rio para a
distribui~ao". Veja Conservative Reformation, por Dr. Krauth,
pags. 719-722.

9. Quale a verdadeira interpretafiiO de 1 Corintios 10:16,


e em que sentido se deve abenfoar ou consagrar os elementos?
A palavraabenfoar oubendizer e empregada nas Escrituras
somente em tres sentidos: 1°. Bendizer a Deus, isto e, declarar
Seu louvor e exprimir-Lhe a nossa gratidao; 2°. Conferir
rea1mente uma ben~ao, como Deus confere ben~aos as Suas
criaturas. 3°. Invocar a ben~ao de Deus sobre a1guma pessoa
OU COlsa. ~'· · ·of•
0 "calice de ben~ao que aben~oamos" e 0 calice consagrado
sobre o qual o ministro invocou a ben~ao divina. Assim como
se invoca a ben~ao de Deus sobre o alimento, que e assim
consagrado para seu uso natural, 1 Tim. 4:5, assim tambem na
Ceia do Senhor se separam os elementos como sinais
sacramentais de uma gra~a invisivel e espiritual, para
anunciarem a morte de Cristo e ministrarem gra~a ao
comungante crente, invocando o ministro a ben~ao de Deus
que ai consiste na presen~a de Cristo prometida por Seu
Espirito.
A igreja cat6lica romana ensina que, quando o sacerdote
pronuncia as palavras de consagra~ao, com a devida inten~ao,
ele realmente opera a transubstancia~ao do pao e do vinho no
corpo e no sangue de Cristo. A forma, em latim, que se deve
usar na consagra~ao do pao e, "Este e meu corpo", e a que se
deve usar na consagra~ao do vinho e, "Porque este eo calice do
meu sangue, do testamento novo e eterno, o misterio da fe,

890
A Ceia do Senhor
que sera derr~mado por v6s e por muitos para a remissao
dos pecados" -"Cat. do Cone. de Trento, Parte 2, Cap. 4, Pergs.
19-26. . .· -<,' ._ .•_.·_:;,·~;urJt;::;c-

10. Como se mostra que a distribuifiiO dos elementos entre o


povo, e sua aceitafiio deles, eparte essencial deste sacramento?
Tendo a igreja cat6lica romana desenvolvido completa-
mente as doutrinas da transubstancia<;:ao e do sacrificio da
missa, logicamente chegou a conclusao de que e conseguido
o fim essencial da ordenan<;:a no momenta em que ocorre a
consagra<;:ao, e por isso julga que a distribui<;:ao dos elementos
entre o povo nao e essencial. Conservam, portanto, o pao (a
h6stia), como o verdadeiro corpo do Senhor, fechado no hos-
tiario, levam-no em prociss6es e lhe prestam culto. Afirmam
tambem que o sacerdote, na celebra<;:ao da missa, tern o direito
de comungar sem o povo, e de levar a h6stia aos doentes que
estiverem ausentes do lugar da comunhao- Cone. de Trento,
Sess.13, Cap. 6, canones 4-7, e Sess. 20, can. 8.
Os protestantes, ao contrario, sustentam que e da essencia
desta ordenan<;:a santa que seja uma afiio, principiando e
terminando no uso divinamente ordenado dos elementos.
''Tomai e comei", disse Jesus Cristo. "Fazei isto em memoria de
mim." Eurn "partir do pao", urn "comer e heber" em memoria
de Cristo; e uma "comunhao". Todos OS protestantes sustentam,
pois, que a distribui<;:ao e a recep<;:ao dos elementos sao partes
essenciais do sacramento, e que, quando isso se tern feito,
concluiu-se o sacramento. Os luteranos sustentam que a
presen<;:a da carne e do sangue no sacramento limita-se ao
tempo do uso sacramental dos elementos, isto e, ao tempo
durante o qual sao distribuidos e recebidos, e que o que sobra
nao edepois senao pao e vinho comuns- Form. Concord., Parte
2, Caps. 7, 82 e 108; Conf de Fe, Cap. 29, § 4.
As igrejas reformadas sustentam que se deve por os
elementos na mao do comungante, e nao em sua boca, como
fazem os cat6licos romanos. Cristo disse, "tomai e comei", eo

891
Capitulo 43
ato e simb6lico, representando a apropria~ao pessoal por
parte de cada comungante.
Sendo este sacramento uma ''comunhao" (1 Cor. 10: 16,17)
dos membros uns com os outros e de todos com Cristo, e urn
abuso do rito enviar os elementos a pessoas ausentes da
companhia em que e celebrado, e urn absurdo a comunhao
particular de ministros ou leigos. Em caso de necessidade, todas
as igrejas reformadas permitem que os seus pastores e
presbiteros, acompanhados de tantos irmaos em Cristo quantos
as circunstancias permitirem, celebrem a comunhao nas casas
de crentes enfermos ou de outro modo incapacitados de
comparecer ao culto publico -Gen. Assemb., 0. S., 1863,Moore's
Digest, pag. 668.

11. Qual deve sera natureza dos exercicios praticados durante


a distribuifiiO dos elementos?
"Os sacramentos sao selos da alian~a da gra~a" feita entre
Cristo e Seu povo, e na Ceia do Senhor "os participantes
dignos real e verdadeiramente recebem e aplicam a si mesmos
Cristo crucificado", sendo cada crente "feito sacerdote para
Deus" (1 Ped. 2:5; Apoc. 1:6), "tendo liberdade de entrar no
santuario pelo sangue de Cristo" (Heb. 10: 19). De tudo isso
segue-se necessariamente que neste sacramento os comungantes
devem fazer tudo, sem mediafiio, na alianfa que fazem com o
Senhor.
0 ministro nunca deve, pois, tornar os comungantes rece-
bedores passivos de instru~oes ou exorta~oes. Nas reunioes
preparat6rias e no sermao pregado logo antes da celebra~ao da
Ceia, o ministro pode tratar de ensinar e de exortar o povo;
mas na celebra~ao o ministro deve limitar-se a dirigir os
comungantes no ato de comunhao por meio de exercicios de
culto direto, como sejam ora~oes e hinos apropriados. E todas
as ora~oes e hinos associados a esta santa ordenan~a devem ser
especificamente apropriados, e nao s6 terem simplesmente urn
caniter religioso.

892
A Ceia do Senhor
A RELA<;AO DO SINAL
COM A GRA<;A SIGNIFICADA

12. Qual e a doutrina cat6lico-romana sabre este ponto? E


como eela expressa pelo termo transubstanciafiio?
Os antigos pais falavam em linguagem geral da presen~a
de Cristo na'Ceia, e geralmente com a tendencia de exagerar.
Sua linguagem metaf6rica tendia a confundir os simbolos do
culto religioso e as ideias espirituais representadas. A medida
que se veio a considerar o ministerio como urn sacerd6cio e
como o unico canal da gra~a para o povo, os sacramentos (as
ordenan~as) passaram a ser exaltados cada vez mais e a ser
considerados como os instrumentos necessarios para o
recebimento dessa gra~a. Da ideia de urn sacerd6cio real veio
necessariamente a ideia de ser necessario urn sacrificio real; e
para que o sacrificio fosse real, atribuiu-se-lhe a presen~a real
de uma vitima divina encarnada.
A doutrina foi ensinada explicitamente primeiro, em sua
forma atual, por Paschasio Radberto, abade de Corobet, em
831. Foi combatida por Ratramno, mas pouco a pouco ganhou
terreno. 0 termo transubstantio, conversao da substancia, foi
empregado primeiro por Hildeberto de Tours, falecido em
1134, para definir a doutrina. Esta foi decretada primeiro,
como artigo de fe, por influencia de Inocencio III, pelo
Quarto Concilio de Latrao, em 1215.
A doutrina declara que quando o sacerdote pronuncia as
palavras da consagra~ao -
1°. A inteira substancia do pao fica mudada no mesmo
corpo de Cristo que nasceu da virgem, e se acha agora assentado
a destra do Pai no ceu, e que toda a substancia do vinho fica
mudada no sangue de Cristo.
2°. Que, assim como em sua Pessoa teantr6pica a alma
nao e separavel do corpo, nem a deidade 0 e da alma, assim
tambem no sacramento a alma eo corpo do Redentor estao
presentes, junto com Sua carne e Seu sangue.

893
Capitulo 43 J
3°. Que somente as especies, ou qualidades sensiveis do ~
pao e do vinho permanecem, accidentia sine subjecto, e que a
substancia da carne e do sangue esta presente sem seus
acidentes.
4°. Que esta conversao das substancias e permanente, de
modo que a carne eo sangue permanecem para sempre e devem
ser conservados e adorados como tais. Baseiam essa doutrina
nas Escrituras (Hoc est corpus meum), na tradic;;ao e na au tori dade
de certos condlios.

13. Por quais motivos a igreja cat6lica romana recusa o calice


ao povo e s6 o concede ao sacerdote oficiante? E qual e sua
doutrina sabre "concomitancia"? ~
Desde o tempo da lgreja Primitiva a Igreja Crista, durante
seculos, a Igreja Grega e as igrejas protestantes, ate ao tempo
presente, seguem o exemplo de Cristo e Seus ap6stolos
distribuindo entre todos os comungantes tanto o vinho como
o pao, "sub utraque forma". A igreja: cat6lica romana, porem, l·.·
temendo que, sem intenc;;ao alguma, seja profanada parte da
Pessoa do Senhor, concede o calice somente ao minis~ro
oficiante. A (mica excec;;ao admitida e quando o papa da o calke l
aos cardeais na quinta-feira (chamada) santa. A guerra hussita
teve por finalidade principal conseguir para o povo o privi-
legio de receber ambas as especies na comunhao. Em defesa
do seu costume, os te6logos inventaram a doutrina de que
Cristo acha-se totalmente presente em cada urn dos elementos.
A essa dou trina Tomas de Aquino foi quem primeiro deu o
nome de concomitdncia. No corpo acham-se incluidos os
nervos, os musculos e tudo o mais que e necessaria para urn
corpo inteiro; e como o sangue e inseparavel da carne, e a
alma 0 e do corpo, como tambem a deidade 0 e da alma,
segue-se que a Pessoa inteira do Redentor se acha presente em
qualquer porc;;ao dos dois elementos, ao se fazer a separac;;ao.
Aquele, pois, que recebe qualquer frac;;ao do pao recebe sangue
bern como carne, porque recebe o Cristo todo.

894
A Ceia do Senhor

' 14. Quais os argumentos que provam que a doutrina cat6lico-


-romana da relarJio do sinal com a coisa significada e contraria
as Escrituras e tambim arazao?
1°. 0 unico argumento biblico dos cat6licos romanos e
tirado das palavras da institui<;:ao: "Este e meu corpo"- Mat.
26:26. Os protestantes respondem: "Essa frase, nesse Iugar, quer
dizer necessariamente, "este pao representa, ou simboliza, meu
corpo". Isso e evidente- (1) Porque muitas vezes nao se pode
deixar de interpretar assim linguagem semelhante nas
Escrituras,e. g., Gen. 41:26- ''As sete vacas formosas sao* sete
anos; as sete espigas formosas tambem sao sete anos". Dan.
7:24- "Os dez cornos serao dez reis" (Figueiredo, aqui mais
de acordo como hebraico; igualmente a NIV: "Os dez chifres
sao dez reis ... ". Ez. 37:11: "Estes ossos sao toda a cas a de Israel".
Mat. 13:19,38 - "Este e o que foi semeado"; "0 campo e o
mundo; e a boa semente sao os filhos do reino". Apoc. 1:20-
"As sete estrelas sao os anjos das sete igrejas, e os sete casti<_;:ais
sao as sete igrejas". (2) No caso em foco, o fato de Cristo achar-
-Se corporalmente presente, assentado a mesa, quando
pronunciou as palavras, eo fato dEle mesmo comer do pao,
torna outra qualquer interpreta<_;:ao impossivel. (3) Tambem o
que Cristo disse do calice torna impossivel outra interpreta<_;:ao:
"Este calice e o Novo Testamento no meu sangue" - Luc.
22:20. "Isto (o calice) e o meu sangue" -Mat. 26:28. Diz o
ap6stolo Paulo (1 Cor. 10: 16) que o calice e akoinonia do sangue,
e que o pao e a koinonia do corpo de Cristo.
2°. Paulo chama pao urn dos elementos, tanto antes como
depois da sua consagra<_;:ao - 1 Cor. 10: 16; 11: 26-28.
3°. Essa doutrina contradiz a sua propria defini<_;:ao de
sacramento. Os cat6licos romanos, bern como os protestantes
e os antigos pais, distinguem duas coisas em qualquer
sacramento, a saber, o sinal e a coisa significada. Veja acima,

*A Vulgata Latina aqui temsunt, sao. Figueiredo afastou-se e p6s "denotam".


Nota do tradutor.

895
Capitulo 43
Cap. 41, Perg. 2. Mas a doutrina da transubstancia~ao confunde
essas cmsas.
4°. Os sentidos, dentro da esfera que lhes e propria, sao
uma forma de revela~ao de Deus como qualquer outra.
Nenhum dos milagres narrados na Biblia contradizia os
sentidos, mas, ao contrario, a realidade dos milagres ficava
estabelecida pelo testemunho dos sentidos. Veja a trans-
forma~ao da agua em vinho- Joao 2:1-10, e tambem Luc.
24:36-43. Mas a doutrina da transubstancia~ao contradiz
absolutamente os sentidos, porque para a vista, o cheiro, o sabor
e o tato os elementos sao pao e vinho depois da qmsagra~ao
como o eram antes.
5°. Tambem a razao, na esfera que lhe e propria, e uma
forma de revela~ao divina; e, posto que outra revela~ao, quer
sobrenatural quer nao, possa transcende-la, nunca pode estar
em contradi~ao com ela. Veja acima, Cap. 3, Perg. 14. Mas a
doutrina da transubstancia~ao COntradiz OS principios da razao
(1) com respeito anatureza do corpo de Cristo, ensinand~ que,
apesar de ser material, pode estar, sem divisao, no ceJ e em
muitos lugares diferentes deste mundo ao mesmo tempo. (2)
Sustentando que o corpo eo sangue de Cristo estao presentes
no sacramento, sem nenhuma de suas qualidades sensiveis, e
que todas as qualidades sensiveis de pao e de vinho estao
presentes, apesar de se acharem ausentes as substancias a que
elas pertencem. Todavia qualidades nao podem ter existencia
aparte dos corpos a que pertencem.
6°. A doutrina da transubstancia~ao e parte insepanivel
de urn sistema de astucia sacerdotal que e inteiramente
anticristao e que inclui a adora~ao da hostia, o sacrificio da
missa, e assim a substitui~ao completa de Cristo e Sua obra
pelo sacerdote e suas obras. Essa doutrina tambem sujeita de
maneira blasfema a majestosa divindade de nosso Salvador ao
dominio de Suas criaturas pecadoras, para que a seu bel-prazer
0 fas;am vir do ceu, e 0 deem ou se recusem a da-lo ao povo.

896
A Ceia do Senhor
15. Como se pode expor a teoria luterana quanta a natureza
da presenga de Cristo na eucaristia?
Os luteranos sustentam -1°. A communicatio idiomatum,
ou seja, que a uniao pessoal das naturezas divina e humana
envolve ao menos o fato de a humanidade participar da
onipresen<;:a da Deidade. Por isso a Pessoa inteira do Deus
encarnado, em corpo, alma e deidade, esta presente em toda
parte. 2°. Que se deve entender literalmente a linguagem de
que se serviu o nosso Senhor na institui<;:ao: "Este (pao) eo
meu corpo".
Logo, eles afirmam- 1°. Que a Pessoa inteira, o corpo eo
sangue de Cristo, esta real e corporalmente presente em, com
e sob os elementos sensiveis. 2°. Que sao recebidos na boca. 3°.
Que tanto o incredulo como o crente os recebem, com a ressalva
de que o incredulo os recebe para sua propria condena~ao.
Por outro lado, eles negam - 1°. A transubstancia<;:ao,
sustentando que o pao eo vinho permanecem (quanto a sua
substancia) o que parecem ser. 2°. Que a presen<;:a de Cristo no
sacramento e efetuada pelo ministro oficiante. 3°. Que a
presen<;:a de Cristo nos elementos e permanente. Afirmam que,
sendo sacramental, cessa quando se conclui o sacramento. 4°.
Que o pao eo vinho s6 representam o corpo de Cristo. 5°. Que
a presen~a do corpo e do sangue verdadeiros e "espiritual", no
sentido de ser mediada ou (a) pelo Espirito Santo, ou (b) pela
fe daquele que recebe o sacramento.
. . ~

16. Como expor a doutrina das igrejas reformadas?


A atividade de Lutero como reformador estendeu-se do
anode 1517 ao anode 1546; a de Melanchton, de 1521 a 1560;
a de Zwinglio, de 1518 a 1531; a de Calvino, de 1536 a 1564.0
"Col6quio de Marburgo ocorreu em outubro de 1529; a
Confissiio de Augsburgo foi publicada em junho de 1530, e a
primeira edi<;:ao daslnstitutas de Calvino foi lan<;:ada em Basileia,
em 1536, e a obra completa, em Genebra, em 1559.
1 o. Zwinglio afirmava que o piio e o vinho sao

897
Capitulo 43
simplesmente memoriais do corpo de Cristo ausente, no ceu.
Esta sua opiniao prevaleceu primeiro entre as igrejas
1
reformadas e foi incorporada na obraFidei Ratio, de Zwinglio,
enviada adieta (assembleia) realizada em Augsburgo, em 1530;
na Confessio Tetrapolitana, de Martinho Bucer, 15 30; naPrimeira
Confissiio de Basileia, de Oswaldo Mic6nio, 1532; e naPrimeira j
Confissiio Helvetica, de Bullinger, Mic6nio e outros, 1536. I
2°. Calvina situou-se num terreno intermediario entre os
zwinglianos e os luteranos. Sustentava- (1) Em comum com
Zwinglio e com todas as igrejas reformadas que as palavras,
"Este e o meu corpo", significam "este pao representa o meu
corpo". (2) Que neste sacramento Deus oferece a todos, e a todos
os comungantes da, mediante o seu ato de comerem o pao e
beberem o vinho, todos os beneficios sacrificiais da reden~ao
realizada por Cristo. (3) Ensinava tambem que, alem disso, o
proprio corpo e sangue de Cristo, posto que ausentes, no ceu,
comunica ao crente, no ato de receber os elementos, uma
influencia vivificadora. Essa influencia e real e viva, mas (a) e
mistica, nao fisica; (b) e comunicada por intermedio do I

Espirito Santo, e (c) tern como condi~ao, da parte do comun- ~


gante, fe para recebe-la. Esta doutrina acha-se exposta princi-
palmente nas Institutas de Calvino, Liv. 4, Cap. 17; na Conf
Galica, Art. 36, formulada por urn Sinodo em Paris, em 1559;
na Conf Escocesa, Art. 21, por Joao Knox, 1560; e na Conf
Belga, Art. 35, de Von Bres, 1561.
3°. Depois de perdida toda a esperan~a de reconcilia~ao
dos ramos luteranos e reformados da igreja sobre este assunto,
Calvina compos o Consensus Tigurinus, em 1549, com o fim
de unir o partido zwingliano de Zurich e o calvinista de
Genebra numa s6 doutrina sobre a eucaristia. Foi aceito pelos
dois partidos, e a doutrina nele apresentada dai por diante
tern sido recebida como a doutrina das igrejas reformadas.
Predomina naSegunda Confissiio Helvetica, de Bullinger, 1564;
no Catecismo de Heidelberg, por U rsino, discipulo de
Melanchton, 1562; nos Trinta e NoveArtigos dalgreJaAnglicana,

898
A Ceia do Senhor
1562, e na Confissiio de Fe, de "Westminster, 1648.
Todas elas estao de acordo-
1°. Quanto a "presens;a" da carne e do sangue de Cristo,
(1) Sua natureza humana esta somente no ceu. (2) Sua Pessoa
como De.us-home.m e <mipre.se.nte. e., portanto, e.sta em toda
parte e sempre, e a nossa comunhao e com Sua Pessoa inteira,
e nao (somente) com Sua carne e sangue. (Veja acima, Cap.13,
Pergs. 13 e 16.) (3) A presens;a da Sua carne e do Seu sangue no
sacramento nao e fisica nem local, e sim somente pelo Espirito
Santo, que pela gras;a influencia neste sentido a alma.
2°. Quanto aquila que o crente come e de que se sustenta,
elas (as Confiss6es) todas concordam em que nao e a
"substancia", mas sim a virtude (poder) e a efid.cia do Seu
corpo e do Seu sangue, isto e, sua virtude sacrificial, como
quebrado e derramado pelo pecado.
3°. Quanto aos crentes "comerem" esse "corpo e sangue",
elas concordam em que- (1) Nao e de modo algum com a
boca. (2) E sornente com a alma. (3) E pela fe, que e a boca ou
a mao da alma. (4) Pelo ou mediante o poder do Espirito Santo.
(5) Nao se limita a celebras;ao do sacramento, mas acontece
sempre que se exerce fe ern Cristo.- Bib. Rep., abril de 1848.

A EFICACIA DO SACRAMENTO
DA CEIA DO SENHOR

17. Qual a doutrina da igreja cat6lica romana quanta a eficacia


da eucaristia, em que sentido ela sustenta que e tambem um
sacrificio, e em quefundamento se baseia para ensinar isso?
Os cat6licos rornanos distinguern entre a eucaristia como
sacramento e como sacrificio. Como sacramento, seu efeito e
que ex opere operata 0 cornungante que nao lhe poe 6bice e
nutrido espiritualmente, santificado e provido de rnerecimento
pela real e verdadeira substancia do Redentor cornida e bebida.
Por outro lado - "0 sacrificio da missa e urna oblas;ao
externa do corpo e do sangue de Cristo oferecidos a Deus em

899
Capitulo 43
reconhecimento do Seu dominio supremo, sob a aparencia de
pao e de vinho mostrados visive1mente por urn ministro
legitimo, com o acrescimo de certas ora~oes e cerimonias
prescritas pela igreja para assim dar-se melhor culto a Deus e
edificar-se mais o povo"- Pedro Dens, vol. 5, pag. 358.
Com respeito asua finalidade, esta deve distinguir-se nos
seguintes atos e aspectos:
1°. Latreuticum, ato de adora~ao suprema oferecida a Deus.
2°. Eucharisticum, a~ao de gra~as.
3°. Propitiatorium, expia~ao dos pecados e propicia~ao de
Deus, efetuadas pelo sacrificio que se torna a fazer do corpo e
do sangue de Cristo. ·
4°. Imperatorium, porque por meio dele alcan~arnos rnuitas
ben<;aos espirituais e ternporais- Pedro Dens, vol. 5., pag. 368.
A diferen~a entre a eucaristia como sacramento e como
sacrificio e muito grande e e dup1a. Como sacramento, a
consagra~ao p6e-lhe firn; como sacrificio, toda a sua eficacia
consiste ern sua obla<;ao (oferecimen to). Como sacramento, e
fonte de merito para o comungante digno; como sacriffcio,
nao s6 e fonte de merito, mas tambem de satisfa~ao, porque
expia os pecados dos vivos e dos mortos- Cat. Rom., Parte 2,
Cap. 4, Perg. 55; Cone. de Trento, Sess. 22.
Fundamentam essa doutrina na autoridade da igreja e
recorrem absurdamente a Malaquias 1:11, como se houvesse
ai uma profecia deste sacriffcio repetido perpetuamente, e a
declara<;ao encontrada em Hebreus 7:17, de que Cristo e
"sacerdote eternamente, segundo a ordem de Melquisedeque",
o qual, dizem eles, desempenhou as fun<;6es de sacerdote
oferecendo pao e vinho a Abraao- Gen. 14:18.

18. Como se pode refutar essa doutrina?


1°. Nao tern fundamento algum nas Escrituras. 0 apelo
para a profecia de Malaquias e para a rela<;ao tipica de Mel-
quisedeque com Cristo epatentemente urn absurdo.
2°. Fundamenta-se unica e exclusivamente na doutrina

900
l A Ceia do Senhor
da transubstancia<;ao, a qual foi refutada acima, Perg. 14.
~, 3°. 0 sacrificio de Cristo na cruz foi sacrificio perfeito e,
por sua propria natureza essencial, exclui todos e quaisquer
outros- Heb. 9:25,28; 10:10-14,18,26,27.
4°. Nao esta em harmonia com as palavras da institui<;ao
proferidas por Cristo- Luc. 22:19; 1 Cor. 11:24-26.0 sacra-
mento comemora o sacrificio de Cristo na cruz, e, por
conseguinte, nao pode ser, ele mesmo, urn novo sacrificio
propiciatorio. Pela mesma razao, a essencia de urn sacramento
e diferente dade urn sacrificio. Os dois nao podem coexistir
na mesma ordenan<;a.
5°. Pertencia a propria essencia de todos OS sacrificios
propiciat6rios, tanto dos sacrificios tipicos do Velho Testamento
como do sacrificio totalmente perfeito de Cristo, que se tirasse
vida, que se derramasse sangue, porque a vitima sofria vica-
riamente a pena da lei- Heb. 9:22. Mas os pr6prios papistas
chamam amissa urn sacrificio incruento, e nela ninguem sofre
dor ou morte.
6°. On de ha sacrificio deve haver sacerdotes para o
oferecerem; mas o ministerio crisHio nao e sacerd6cio. Veja
acima, Cap. 24, Perg. 21. 'nr: ,Hnmlr;~!., rJ, r·.'

19. Quale a teoria luterana quanto aeficacia do sacramento?


A teoria luterana quanta a este ponto e que a eficacia do
sacramento nao esta nos sinais, e sim na Palavra de Deus que
os acompanha, e que ela s6 e operante quando o comungante
tern verdadeira fe. Este efeito e identico ao da Palavra e pela fe
inclui os beneficios da comunhao viva com Cristo e todos os
frutos dela. A teoria da, porem, muita importancia a virtude
ou poder do corpo e do sangue verdadeiros, presentes em, com
e sob as especies do pao e do vinho. Este corpo e seu sangue
sao recebidos fisicamente tanto pelos incredulos como pelos
fieis, mas e so nestes que, pela gras;:a divina, eles se tornam
eficazes -Pequeno Cat., de Lutero, Parte 5; Conserv. Reform.,
por Krauth, pags. 825-829.

901
Capitulo43
20. Qual a teoria chamada zwingliana, remonstrante e soci-
niana quanto aeficacia da eucaristia?
Zwinglio faleceu prematuramente. Sua teoria a respeito
dos sacramentos era, sem duvida alguma, muito imperfeita.
Se nao morresse tao cedo, teria por certo acompanhado seus
disdpulos em unir-se a Calvina na aceita<_;ao do Consensus
Tigurinus. A doutrina conhecida por seu nome e realmente
sustentada pelos socinianos e pelos remonstrantes, difere da
dos reformados- 1°. Em fazer dos elementos meros sinais; e
em negar que Cristo esteja presente na eucaristia de algum
modo. 2°. Em negar que os sacramentos sao meios de gra<_;a, e
em sus ten tar que sao apenas atos de comemora<_;ao e insignias
da prf!ssao crista.

21. Qual ea teoria das igrejas reformadas sobre este assunto?


Elas rejeitam a teoria cat6lico-romana, segundo a qual a
eficacia do sacramento e-lhe inerente fisicamente como sua
propriedade intrinseca, assim como 0 calor e inerente ao fogo.
Rejeitam tambem a teoria luterana, ate onde ela atribui ao
l
sacramento uma virtu de ou poder sobrenatural e inerente, nao
devida realmente aos sinais e sim a Palavra de Deus que os
acompanha, mas que, todavia, e sempre operante, contanto que
o comungante tenha fe. E, em terceiro lugar, elas rejeitam a
doutrina dos socinianos e outros, de que o sacramento nada
mais e do que uma insignia de profissao da religiao crista, ou
urn vago sinal de Cristo e Seus beneficios. Elas ensinam que o
sacramento e urn eficaz meio de gra<_;a; porem a sua eficacia
nao e atribuida a alguma virtude nele existente, nem ao que o
administre, e sim, unicamente, a opera<_;ao do Espirito Santo
(virtus Spiritus Sancti extrinsecus accedens), exatamente como no
caso da Palavra. 0 sacramento possui, sem duvida, a virtude
moral e objetiva de urn emblema significativo e, como selo,
ele realmente comunica a todo creme a gra<5a da qual e sinal, e
ocupa urn lugar especial como o rito em que Cristo e Seu povo
se encontram; mas a sua virtude de comunicar ou transmitir

902
A Ceia do Senhor
gra~a depende inteiramente, como sucede com a Palavra, da
coopera<;:ao do Espirito Santo. Segue-se que essa virtude nao
esta de modo algum ligada ao sacramento, e pode ser exercida
sem ele; nao o acompanha sempre, e nao se limita ao tempo e
ao lugar onde se celebra o sacramento, enema este-Bib. Ref,
abril de 1848; veja Conf Gal., Arts. 36 e 37; Helv., ii, c.21;
Conf Escocesa, Art. 21; Os Trinta e Nove Artigos da Igreja
Anglicana, Arts. 28 e 29; e tambem os nosso simbolos, e. g.,
Conf de Fe, Cap. 29, § 7.

22. Que ensinam os nossos simbolos a respeito das qualificafoes


necessarias para admissiio amesa do Senhor?
1°. Somente aqueles que foram verdadeiramente regene-
rados pelo Espirito Santo tern as qualifica<;:6es necessarias, e
somente aqueles que professam fe em Cristo e andam em
conformidade com essa profissao devem ser admitidos a
participa~ao na Ceia do Senhor.
2°. Pessoas mas ou ignorantes, e as que sabem que nunca
foram regeneradas, nao possuem as qualifica~6es necessarias e
nao devem ser admitidas pelos oficiais das igrejas - Conf de
Fe, Cap. 29, § 8; Cat. Maior, Perg. 173.
3°. Mas, apesar do fato de que ha muitos que duvidam
que estao em Cristo, todavia, sao cristaos verdadeiros; por isso,
se aquele que duvida assim realmente deseja ser achado em
Cristo e apartar-se da iniqiiidade, ele deve procurar meios de
resolver as suas duvidas e, fazendo isso, chegar-se a mesa do
Senhor para receber mais fort;;a espiritual- Cat. Maior, Perg.
172.
4°. "As criant;;as nascidas no gremio da Igreja visivel e
dedicadas a Deus no batismo, quando chegam a idade da
discrit;;ao, se nao tiverem dado motivo para escandalo, pare-
cerem s6brias e cordatas, e tiverem conhecimento suficiente
para discernir o corpo do Senhor, deve-se ensinar que e seu
clever e privilegio chegar-se aCeia do Senhor". "Nao se pode
fixar precisamente os anos da discrit;;ao nos cristaos jovens.

903
Capitulo43
E necessaria deixar isso ao criterio da sessao da igreja (o
conselho)" -Diret6rio para o Culto, Cap. 9.

23. Qual costume a este respeito prevalece nas diversas igrejas,


e quais os principios em que se funda?
1°. Segundo os cat6licos rornanos, a salva~ao depende de
a pessoa estar ern uniao corn a igreja e de ser-lhe obediente, e,
por conseguinte, eles adrnitern aos sacrarnentos todos os que
exprirnern o desejo de conforrnar-se e obedecer. "Ninguern",
porern, "corn consciencia de pecado mortal, ainda que se julgue
surnarnente contrito, se houver oportunidade de recorrer a
urn confessoF, deve chegar-se a sagrada eucaristia 'sern antes
proceder a~onfissao sacramental"- Cone. de Trento, Sess. 13,
Cap. 7 e Can. 11. Os luteranos concordarn corn eles ern adrni-
tirern todos os que se conforrnarn as exigencias externas da
igreja.
2°. Os episcopais extrernos e outros que considerarn os
sacrarnentos como ern si rnesrnos rneios eficazes de gra~a
sustentarn que rnesrno aqueles que sabern que nao tern ern si
nenhurn dos frutos do Espirito, mas que tern fe especulativa
no evangelho, e estao livres de escandalo, devern ser adrnitidos,
se desejarern participar.
3°. Segundo a doutrina e a praxe de todas as igrejas
evangelicas, a Ceia do Senhor foi instituida unicarnente para
os crentes e, por isso, deve-se exigir de todos os que quiserern

l
participar urna profissao digna de credito de fe ern Cristo e a
prornessa de Lhe obedecerern. (1) As igrejas batistas, negando
inteiramente as crian~as o direito de serern rnernbros da igreja, j

recebern como vindos do rnundo todos os que pedem


admissao, e por isso exigem de todos pro vas positivas do novo
nascirnento. (2) Todas as igrejas pedobatistas, sustentando que
todas as crian~as batizadas ja sao rnernbros da igreja, fazern
urna distin~ao entre a admissao dos filhos da igreja a Ceia do
Senhor e a adrnissao a igreja dos nao batizados que eram do
rnundo e inteirarnente estranhos a igreja. Com rela~ao aos

904
A Ceia do Senhor
primeiros, presume-se que virao a mesa do Senhor quando
chegarem "a idade da discri~ao, se nao tiverem dado motivo
para escandalo, parecerem s6brios e cordatos, e tiverem
conhecimento suficiente para discernir o corpo do Senhor".
No caso dos mundanos nao batizados, presume-se que sao
estranhos enquanto nao fizerem profissao digna de credito de
que foram transformados. ,. · ··.- ~~,

24. Como se pode provar que, segundo a intenfiio de Cristo,


a Ceia do Senhor nao epara OS nao renovados?
E evidente que foi instituida somente para os que tern a
prepara~ao espiritual necessaria para fazer aquilo que todo
comungante professa fazer no proprio ato de participar do
sacramento. Esta ordenan~a e essencialmente-
1°. Uma profissao de (fe em) Cristo.
2°. Urn pacto solene em que o comungante professa aceitar
a Cristo e Seu evangelho e promete fazer o que deve fazer todo
disdpulo do Senhor.
3°. Urn ato de comunhao espiritual com Cristo.
As qualifica~6es necessarias para comungar dignamente
sao_, pois_, tal conhecimento e tal estado espiritual que habilitem
o comungante a discernir inteligente e verdadeiramente nos
emblemas (ou sinais, ou simbolos) o corpo do Senhor como
sacrificado pelo pecado, a fazer pacto com Ele na alian~a do
evangelho, e a ter comunhao com Ele por Seu Espirito.

25. Que e que a igreja e seus oficiais tem o direito de exigir


daqueles que eles admitem a Ceia do Senhor?
"Os oficiais da igreja sao os juizes das qualifica~6es daque-
les que eles admitem a participa~ao nos sacramentos." Eles
"examinarao sobre o seu conhecimento e piedade aqueles que
forem assim admitidos"- Diret6rio para o Culto, Cap. 9. Nao
tendo Deus dado a nenhum desses oficiais o poder de ler o
cora~ao, segue-se que as qualifica~6es das quais eles sao juizes
sao simplesmente as de conhecimento suficiente, pureza de

905
Capitulo43
vida e uma profissao digna de credito de fe em Cristo. (Por
"digna de fe" nao se entende aquilo que convence, e sim aquilo
que se pode considerar como verdadeiro.) E de seu dever exa-
minar o candidato quanto ao seu conhecimento, observar a
sua vida e indagar a respeito dela, explicar-lhe com fidelidade
quais as qualifica~6es espirituais e internas necessarias para
se comungar dignamente, e ouvir a sua profissao de fee o seu
prop6sito espirituais. A responsabilidade do ato fica entao com
a pessoa que (az a profissao, e nao com a sessao ou conselho da
igreja, a cujo tespeito nunca se deve entender que OS oficiais
passam juizo ~obre as provas apresentadas, ou sobre a validade
delas.

26. Qual a diferenfa que a respeito deste ponto ha entre as


igrejas presbiteriana e congregacional?
Entre essas duas corpora~6es de cristaos existe uma dife-
ren~a em suas opini6es tradicionais e sua pratica a respeito da
capacidade, do direito e do dever dos oficiais das igrejas de
formarem e afirmarem urn juizo oficial positivo sobre o carater
interno e espiritual dos que lhes sao apresentados para serem
admitidos aos privilegios da igreja. Por uma "profissao digna
de credito" os congregacionais entendem provas positivas de
experiencia religiosa tais que produzam nos oficiais juizes a
convic~ao de que as pessoas admitidas sao regeneradas. Os
presbiterianos, porem, entendem por essa frase somente uma
profissao inteligente de verdadeira fe espiritual em Cristo, e
que nao seja desmentida pela vida.
0 Dr. Candlish, em Edinburgh Witness, de 8 de junho de
1848, diz: "0 prindpio (de comunhao), como e not6rio que
sempre foi mantido pela Igreja Presbiteriana, nao constitui os
pastores, os presbiteros ou os demais membros em juizes da
conversao verdadeira do candida to, mas, pelo contrario, lan~a
sobre o proprio candidato grande parte da responsabilidade.
E preciso que o ministro e a sessao ou conselho da igreja se
satisfac;am quanto ao conhecimento, a profissao digna de

906
I A Ceia do Senhor

credito e avida santa de quem pede que seja recebido na igreja.


E: preciso que eles determinem negativamente que nao ha
motivo para dizer que ele nao e cristao; mas eles nao tomam
sobre si a responsabilidade de julgar positivamente a sua
conversao. Esta e a regra presbiteriana de disciplina e, quer se
considere boa ou rna, difere muito da dos congregacionais. Na
pratica, tanto uma regra como a outra dao lugar a que se fale
seriamente aconsciencia, e as pessoas sem conhecimento e cuja
profissao nao seja digna de credito sao excluidas (ou nao sao
recebidas ).

EXPOSH,;:6ES ECLESIASTICAS AUTORIZADAS


DOUTRINA ROMANA - DOUTRINA DA EUCARISTIA
COMO SACRAMENTO ECOMO SACRIFiciO-Canc. de Trento,
Sess. 13, Can. 1: "Se alguem negar que no santissimo
sacramento da eucaristia se conH!m verdadeira, real e
substancialmente o corpo e o sangue, juntamente com a
alma e a divindade de nosso Senhor Jesus Cristo, e, por
conseguinte, todo o Cristo, e disser que (Cristo) esta nele
somente como em sinal, figura ou virtude; seja anatem".
Can. 2 - "Se alguem disser que no sacrossanto
sacramento da eucaristia fica a substancia do pao e do
vinho, juntamente como corpo eo sangue de nosso Senhor
Jesus Cristo; e negar aquela singular e admiravel conversao
de toda a substancia de pao em corpo e de toda a substancia
de vinho em sangue, ficando somente as especies
(acidentes) de pao e de vinho; cuja conversao a igreja
romana com suma propriedade chama transubstancia~ao;
seja anatema".
Can. 3- "Se alguem negar que no veneravel sacramento
da eucaristia, debaixo de cada uma das especies, e debaixo
de cada parte destas especies, quando elas se dividem,
encerra-se todo o Cristo; seja anatema".
Can. 4- "Se alguem disser que no admiravel sacramento
da eucaristia, depois da consagra~ao, nao estao o corpo e o
sangue de nosso Senhor Jesus Cristo, mas somente no uso,

907
Capitulo43
quando se recebe, e nem antes nem depois; e que nas
h6stias ou particulas sagradas, que se guardam, ou sobejam,
nao fica o verdadeiro corpo do Senhor; seja am1tema".
Can. 6 - "Se alguem disser que o Unigenito Filho de
Deus no santo sacramento da eucaristia nao se deve adorar
com culto de latria tambem externo; e que por isso nem
se deve venerar com festividade particular, nem se deve
levar solenemente nas procissoes, segundo o louvavel rito
e costurhe da igreja universal (cat61ica); ou que se nao
deve e~por publicamente ao povo, para ser adorado, e que
seus adoradores sao id6latras; seja anatema".
Can. 7- "Se alguem disser que nao e licito reservar no
sacrario a sagrada eucaristia, mas que imediatamehte ap6s
a consagrac;ao deve ser distribuida aos circunstantes; ou
que nao e licito leva-la aos enfermos pomposamente; seja
anatema".
Can. 8 - "Se alguem disser que Cristo, na eucaristia, s6
e comido espiritualmente, e nao tambem sacramental e
realmente; seja anatema".
Can. 10 - "Se alguem disser que nao e licito ao sacerdote
que celebra, dar a Comunhao a si mesmo; seja anatema".
Sessao 21, Can. 1 - "Se alguem disser que todos e cada
urn dos fieis de Cristo, por preceito de Cristo, e necessidade
de salvac;ao, devem receber ambas as especies do ss.
sacramento da eucaristia; seja anatema".
Can. 2 - "Se alguem disser que a santa igreja cat6lica,
sem ter justas causas e raz6es, se resolvera a conceder a
comunhao aos leigos e aos clerigos que nao celebram,
debaixo da especie de pao somente, ou que nisto errara;
seja anatema".
Can. 3 - "Se alguem negar que Cristo, todo inteiro, fonte
e autor de todas as grac;as, se recebe debaixo da especie s6
de pao; porque, como muitos afirmam com falsidade, nao
se recebe conforme a instituic;ao de Cristo, debaixo de
ambas as especies; seja anatema".
Sessao 22, Can. 1 - "Se alguem disser que na missa nao
se oferece a Deus verdadeiro sacrificio; ou que oferece-lo
nao e outra coisa do que dar Cristo a n6s para o comun-

908
A Ceia do Senhor

garmos; seja anatema".


Can. 2 - "Se alguem disser que Cristo nao instituiu OS
ap6stolos sacerdotes, naquelas palavras: fazei isto em
minha comemora~ao; ou que nao ordenou que eles e os
demais sacerdotes oferecessem o seu corpo e o seu sangue;
seja amitema".
Can. 3 - "Se alguem disser que o sacrificio da missa e
somente de louvor e a~ao de gra~as, ou mera comemora~ao
do sacrificio feito na cruz; mas nao propiciat6rio; ou que
s6 aproveita ao que comunga; e que nao se deve oferecer
pelos vivos e pelos defuntos, pelos pecados, penas,
satisfa~6es e outras necessidades; seja amitema".
Can. 8 - "Se alguem disser que as missas em que
comunga s6 o sacerdote sao ilicitas ... seja anatema".
Cap. 2 - "Como neste divino sacrificio, que na missa se
exercita, encerra-se e e sacrificado incruentamente aquele
mesmo Cristo que uma vez cruentamente no altar da cruz
se ofereceu a si mesmo ... portanto, com razao, conforme a
tradi~ao apost6lica, se oferece, nao s6 pelos pecados, penas,
satisfa~6es e outras necessidades dos fieis vivos, mas
tambem pelos que morreram em Cristo, nao estando
plenamente purificados".
Belarmino, Controv. de Eucharistia, v. 5: "0 sacrificio da
missa nao possui eficacia ex opere operata segundo a maneira
de urn sacramento. 0 sacrificio nao opera eficaz e
imediatamente, nem e ele propriamente 0 meio de que
Deus Se serve para tornar alguem justa. Nao o torna justa
imediatamente como o fazem o batismo e a absolvi~ao,
mas impetra o dam da penitencia, por meio da qual se
opera no pecador a vontade de chegar-se ao sacramento
para ser por ele justificado ... 0 sacrificio da Miss a e o
que alcan~a, nao s6 beneficios espirituais, mas tambem
temporais, e por isso pode ser oferecido pelos pecados,
pen as e quaisquer necessidades".
DOUTRINA LUTERANA- Conf de Augsb., Parte 1, Art.
10; Apol. da Conf de Augsb., pag. 157 (Rase); Form.
Concordice, Parte 1, Cap. 7, § 1: "N6s cremos, ensinamos e
professamos que, na Ceia do Senhor, o corpo e o sangue

909
Capitulo 43
de Cristo estao verdadeira e substancialmente presentes e
que se distribuem e se recebem verdadeiramente junto com
o pao e o vinho. § 2. As palavras de Cristo (isto e o meu
corpo) devem ser entendidas somente no seu sentido
estritamente literal; de maneira que, nem o pao significa
o corpo ausente de Cristo, nem o vinho o sangue ausente
de Cristo, e sim de modo que, por causa da unHio
sacramental, o pao e o vinho sao verdadeiramente o corpo
e o sangue de Cristo. § 3. - Quanto ao que diz respeito a
consagrac;ao, nos cremos, etc., que nenhum ato humano,
e nenhuma das palavras pronunciadas pelo ministro da
igreja, sao a causa da presenc;a do corpo e do sangue de
Cristo na Ceia, mas que isso deve ser atribuido unicamente
ao poder onipotente de nosso Senhor Jesus Cristo". § 5:
"Os motivos, porem, pelos quais contendemos a este
respeito contra os sacramentalistas, sao estes ... 0 primeiro
motivo e urn artigo da nossa fe crista, e vern a ser que
Jesus Cristo e verdadeiro, essencial, natural e perfeito Deus
e homem, e em unidade de pessoa inseparavel e indivisivel.
0 segundo e que a destra de Deus esta em toda parte;
mas ai Cristo foi posto real e verdadeiramente, quanto a
Sua humanidade, e, por conseguinte, achando-Se presente,
Ele reina e tern em Suas maos e debaixo de Seus pes todas
as coisas que estiio no ceu e na terra. 0 terceiro e que a
Palavra de Deus niio pode ser falsa. 0 quarto e que Deus
conhece e tern em seu poder diversos modos pelos quais
lhe e possivel estar num lugar (presente), e nao esta limi-
tado a urn (mico modo de presenc;a, a que os fil6sofos
costumam chamar local ou circunscrito. § 6: Nos cremos,
etc., que o corpo e o sangue de Cristo nao sao recebidos
so espiritualmente mediante a fe, mas tambem pela boca,
nao de uma maneira fisica, e sim de uma maneira sabre-
natural e celeste, em virtude de uma uniao sacramental...
§ 7: Nos cremos, etc., que nao somente os que creem em
Cristo se aproximam dignamente da Ceia do Senhor, mas
tambem os incredulos e indignos recebem o verdadeiro
corpo e sangue de Cristo, de tal modo, porem, que eles nao
tiram dai ne;m consolac;ao nem vida, mas, antes, de modo

910
A Ceia do Senhor

que esta recep~ao vini a ser para seu juizo, a nao ser que
sejam convertidos e se arrependam".
DOUTRINA DAS IGREJAS REFORMADAS -Conf Galica,
Art. 36: "Ainda que Cristo esteja agora no ceu para ficar ali
ate quando vier para julgar o mundo, cremos, todavia, que
Ele, pelo poder oculto e incompreensivel do Seu Espirito,
nos nutre e nos vivifica com a substancia do Seu corpo
e do Seu sangue, apreendidos pela fe".
Conf Escocesa: "E ainda que haja grande distancia de
lugar entre o Seu corpo glorificado, que esta agora no ceu,
e nos mortais, que estamos agora na terra, todavia cremos,
apesar disso, que o pao que partimos e a comunhao do Seu
corpo, e que 0 calice que aben~oamos e a comunhao do
Seu sangue ... Assim tambem confessamos que os crentes,
no uso devido da Ceia do Senhor, comem assim o corpo
e bebem o sangue de Jesus Cristo; e cremos firmemente
que Ele permanece neles e eles nEle, e, mais ainda, que se
tornam de tal modo carne da Sua carne e osso dos Seus
ossos que, assim como a Deidade da vida e imortalidade a
carne de Jesus Cristo, assim tambem a Sua carne quando
comida, eo Seu sangue, quando bebido por nos, conferem-
-nos os mesmos privilegios".
Conf Belga, Art. 35.
Institutas, de Calvina, Livro 4, Cap. 17, § 10: "Em suma,
a carne e o sangue de Cristo alimentam a nossa alma do
mesmo modo que o pao e o vinho mantem e sustentam a
nossa vida corporal... Mas, ainda que pare~a coisa incrivel
que a carne e o sangue de Cristo, embora tao distantes de
nos quanto a lugar, sejam alimento para nos, lembremos
quanto o poder secreto do Espirito Santo excede a nossa
debil capacidade. Aquilo, pois, que o nosso espirito nao
compreende, conceba-o a fe; e e que o Espirito Santo une
verdadeiramente coisas separadas pelo espa~o. Aquela
sagrada comunhao de carne e sangue pela qual Cristo nos
comunica Sua vida, exatamente como se ela penetrasse
os nossos ossos e a nossa medula, Ele testifica e sela em
Sua Ceia; e isso Ele nao faz apresentando-nos urn sinal
vao e vazio, mas o faz exercendo no sacramento uma

911
Capitulo 43
eficacia do Espirito pela qual Ele cumpre o que promete.
E verdadeiramente a coisa ai significada ela mostra e
oferece a todos os que se assentam para tomar parte naquele
festim espiritual, ainda que somente pelos crentes recebida
com proveito".
Os Trinta e Nove Artigos, Art. 28: "A Ceia do Senhor e
urn sacramento da nossa reden~ao pela morte de Cristo;
de modo que, para os que reta e dignamente, e com fe, o
recebem, o pao que partimos e uma participa~ao do corpo
de Cristo; e, do mesmo modo, o Gilice de ben~ao e uma
participa~ao do sangue de Cristo... 0 corpo de Cristo da-
-se, toma-se e come-se na Ceia de urn modo unicamente
celestial e espiritual. E o meio pelo qual se recebe e se come
o corpo de Cristo na Ceia e a fe. 0 sacramento da Ceia do
Senhor nao se reserva, nem se leva em procissao, nem se
exp6e, nem se adora, em virtude do mandamento de
Cristo".
Cat. de Heidelberg, Perg. 76: "Que e comer o corpo
crucificado de Cristo e beber o Seu sangue derramado? E
nao somente apropriar-nos com cora~ao grato da paixao
de Cristo, e receber assim o perdao dos pecados e a vida
eterna, mas tambem ficarmos, por esse ato, mediante o
Espirito Santo, que habita em Cristo e em nos, unidos
mais e mais ao Seu corpo bendito, de modo que, conquanto
esteja Ele no ceu e nos na terra, nos, apesar disso, somas
carne da Sua carne e ossa dos Seus ossos, e vivemos sempre
urn so espirito com Ele".
Conf de Fe, de W'estminster, Cap. 29, § 5: "Os elementos
exteriores deste sacramento, devidamente consagrados aos
usos ordenados por Cristo, tern tal rela~ao com Cristo
crucificado que, verdadeira mas so sacramentalmente, sao
as vezes chamados pelos names das coisas que representam,
a saber, o corpo e o sangue de Cristo; porem em substancia
e natureza conservam-se verdadeira e somente pao e
vinho, como eram antes". !d., § 7: "Os que comungam
dignamente, participando exteriormente dos elementos
visiveis deste sacramento, tambem recebem interiormente,
pela fe, a Cristo crucificado e todos os beneficios da

912
A Ceia do Senhor

Sua morte, e dEle se alimentam, nao carnal ou corporal-


mente, mas real, verdadeira e espiritualmente, nao estando
o corpo e o sangue de Cristo, corporal ou carnalmente
nos elementos pao e vinho, nem com eles ou sob eles, mas
espiritual e realmente presentes a fe dos crentes nessa
ordenanc;a, como estao os pr6prios elementos aos seus
sentidos corporais".

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913
indice

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Indice de Autores e de A~suntos
A Priori, Argumento - Veja Deus
Abelardo - 586
Absoluto, 0- 171, 176, 177
Acaso, ultima prova que mostra ser absurda a hip6tese da
evolw;:ao - 47
Ado~ao -718-724
a palavra definida - 718-720
vantagens - 723
Advento, Segundo- Veja Segundo Advento
Agricola, Joao - 561
Ainsworth - 822
Alexander, Dr A - 75, 388, 525
Alexander, Dr J A - 20, 29, 243, 244
Alexander, Dr Lindsay W - 889
Alian~a da Gra~a- 507-522
Cristo como mediador- 514-516
emprego da palavra berith- 508-510
fe como condi~ao - 517
hist6ria da administra~ao - 519-522
ideia arminiana - 517
opini6es diferentes sustentadas por calvinistas -
510-513
Alian~a das Obras - 421-429
Adao representou a ra~a - 423, 424
diferentes sentidos da palavra - 421
doutrina definida- 421-425
doutrina provada - 422, 423
em que sentido ainda em vigor - 428, 429
natureza da morte prenunciada - 426, 427
partes e condi~6es - 423-426
selo da alian~a - 428
Alogi - 263, 265
Ambrosio de Milao- 123
Amesio- 491, 719

914
r Amyrant- 312
indice

Aniquilacionismo - 427
depois do juizo final- 814-816
durante estado intermediario - 774
Anjos- 337-348
arcanjo - 339
corpos- 341, 342
da guarda - 343
doutrina romana quanta ao culto prestado - 342
mau- 344-346
natureza, carateres, titulos, oficios, ordens e poder -
337-340
personalidade de satanas- 344, 345
possessao demoniaca - 34 7, 348
Anselmo - 54, 585, 587
Antinomianismo- 560, 561, 733, 734
Antropologia- 22, 132, 138, 141, 143, 380
da Igreja Grega- 123
Antropomorfismo: born e mau sentidos - 173, 174
textos biblicos explicados - 174
Antroponianos - 263
Apol. Conf. Remonstrante - 463, 622
Apolinariana, Heresias - 535
Apolinario - 535
Apologetica- 16
Apologia da Confissao de Augsburgo- 163, 490, 670, 753, 762,
825,840,841,880,881
Ap6stolos nao tiveram sucessores - 113
Aquino, Tomas de- 129, 559, 573, 713, 824, 894
Arcanjo - Veja Anjos
Argyle, Duque de - 366, 402, 405
Arianos - 135,224,241,264
Ario- 233
Arminianismo- 125, 128, 300-302, 311, 140-143
voca<;:ao eficaz - 622, 628, 631
fe justificadora - 701
perfei<;:a - 439
pecado original- 458, 459

915
indice
justi<;:a original - 414
perseveran<;:a - 757
propicia<;:ao - 573, 576
doutrina da vontade - 399-401
justi<;:a de Deus e os seres humanos perdidos antes de
nascerem - 486
justifica<;:ao - 708-710, 716, 717
puni<;:ao futura- 820, 821
Arminianos- 202, 203, 271, 278
Arminio, J - 491, 501, 740
Arminius, James- 136
Armstrong, Dr Wm- 851, 859
Arnaulos - 130
Arqueologia - 15
biblica - 19
Arrependimento e a doutrina cat61ico-romana das penitencias
-678-690
a respeito da confissao - 684, 685
a respeito de absolvi<;:ao - 686 .
apreensao da misericordia de Deus em Cristo - 680
dom de Deus - 679
doutrina cat6lico-romana de penitencia - 682-684
doutrina de indulgencias- 687, 688
exposi<;:ao - 682-684
exposi<;:6es autorizadas - 688-690
frutos - 679, 680
provas - 679, 680
refuta<;:ao da doutrina cat6lico-romana - 685-687
Artigos de Esmalcalda - 134, 163, 780, 841, 882
Artigos, 39 da lgreja da Inglaterra - 134, 148, 165, 318, 463, 478,
591,754,780,823,842,882,883,898,912
Ascensao de Cristo - Veja Cristo
Atanasio - 588
Ateismo -55, 56
Atributos divinos - 141, 170-219
Averroes - 63

916
fndice
Barclay, Robert - 845
Barnabe - 795 ·.
:~

Barnes, Albert - 76 ...,


Barrow, Dr Isaac- 558
Batismo - 843-884
a aplica~ao da gra~a simbolizada por aspersao e derrama-
mento- 857
a ordem para batizar e uma ordem para lavar, significando
purifica~ao - 855, 856
a ordenan~a e de obriga~ao perpetua- 845, 846
agua 0 simbolo de purifica~ao - 843 ; -··

batismo de Joao, nao cristao- 844 :!'X


batismo ministrado pelos disdpulos antes da ressurrei~ao,
invalido- 844, 845
batismos feitos por Joao e pelos ap6stolos- 858-861
definido quanto a substancia e formula- 846, 847
definido quanto ao prop6sito - 848
doutrina batista quanto ao ensino emblematico do modo
de batismo - 852-862
ensino emblematico - 848-851
modo- 852-862
modos de purifica~ao do Velho Testamento- 857, 858
uso classico e biblico de- 852, 853
Pessoas que devem ser batizadas:
e a eficacia do batismo (doutrinas cat6lico-romana,
luterana, zwingliana e reformada) - 875-880
batismo de crian~as baseado na constitui~ao da
natureza humana- 862, 863
batismo ocupa o lugar que a circumcisao ocupava
-869
Cristo e Seus ap6stolos reconheceram que crian~as
podem se membros de igreja - 870, 871
doutrinas cat61ico-romana, luterana e reformada
-880, 881
exposi~6es autorizadas - 881-884
filhos de quem deve ser batizados?- 874,875
lgreja identica sob as duas dispensa~6es- 866-870
lgreja Visivel, sua natureza e seu prop6sito - 863-866

917
fndice
obje<;;6es declaradas e respondidas - 871-873
pratica da lgreja Primitiva - 871, 872
regenera<;;ao batismal - 878-880
Batistas - 851, 854
Baur, Cristiano - 70
Baxter, Richard- 138,558,580
Beecher, Dr Edward - 484
Belarmino- 415, 418, 461,489,625,628,665,668,669,711,715,
730,732,752,762,780,826,830,839,840,881,882,909
Berilo- 266
Bernardo de Claraval - 588
Bevan- 889
Beza- 313, 491
Bickersteth, Rev E H- 774
Bingham- 861, 872
Bissel, E Cone- 76
Blunt- 878
Bolingbroke- 57 '·•~•. :. .\::,. :.. · ,..
Bossuet- 62
Boston, Thomas - 579
Brentz, Joao -531
Bretschneider - 70
Brown, Dr - 797
Brown, Dr John- 580, 612
Bruce, DrAB- 532, 539
Bruno, Giordano - 62
Bucer, Martino - 898
Buchanan, Dr James - 56, 63
Bula, Unigenitus- 625
Bullinger- 898
Bushnell - 586
Butler, Bispo - 58

Calced6nia, Credo de - Veja Credos


Calvinismo- 143-145,271
doutrina de justi<;;a original- 411, 412, 419
doutrina do designio da propicia<;;ao - 577-579
Calvina - 130, 133, 223, 456,490, 580,612, 707, 838, 844, 873,

918
indice
881,882,898,911,912 . ,·' :lr'<}~~:-- _ .'_~:,;1:-r;·fi'.:i
Cambridge, plataforma - 167 · r -; ., ;;\ ,.:_-:;; ·:;: ;~, r·''
Cameron, J- 312,469 ., ~: .; '"'·'-' ') u~·, ... ,:_:; ,_,
Candlish, Dr- 588 · · · ,·, · . ···:.· ·
Capacidade e liberdade distinguidas - 466, 467 ·, ·' • : -
Carater virtuoso - 389, 390
responsabilidade moral - 398-401
Carlyle- 57
Carson, Dr A - 849, 852, 854
Caso da Igreja da Rua Walnut - 606
Catecismos:
Assembh~ia de Westminster- 134, 148, 150, 268, 331, 349,
355,419,422,426,431,445,492,501,513,558,559,613,
678, 719, 722, 726, 781, 874, 887, 888
Concilio de Trento -157,417,418,439,636,668,684,685,
686,695,702,778,779,826,830,838-840,881,888,891
Genebra - 827, 841, 882
Escoces - 827
Grandee Pequeno de Lutero- 134, 163, 882
Heidelberg- 134, 148, 164,591,669,716,754,842,898,912
Maior, da Igreja Oriental - 780
Racoviano - 135, 420, 464, 479, 554, 555, 592, 701, 702, 717,
884
Russos de Philaret- 161
Catherina, A- 493, 501
Cat6lico-romana, doutrina:
autoridade e infalibilidade do papa- 119, 120
concomitancia- 894, 907-909
conselhos de Cristo - 731, 752, 753
"descida ao inferno" por Cristo - 611, 617
eficacia e necessidade do batismo - 875-884
fe- 658, 660, 663
gra~a- 631, 632
incapacidade - 477
merecimento de condignidade e de congruencia - 734, 735
missa- 899, 900, 907-909
pecado- 439
pecado original - 460-462

919
fndice
perfeic;ao- 738-740, 744, 747
perseveranc;a- 757, 761, 762
purgat6rio e estado intermediario - 777-779
regenerac;ao - 682-690
sacerd6cio cristao - 554
sacramentos- 825, 826, 828-831, 834-840
/ sacramentos, sua eficacia - 828, 829
transubstanciac;ao - 890-896, 907-909
Ceia do Senhor- 885-913
designac;6es bib1icas e eclesiasticas - 885-887
distribuic;ao dos elementos, essencial - 891,892
doutrina cat61ico-romana (transubstanciac;ao), exposta e
refutada - 893-896
doutrina cat6lico-romana, como sacramento e sacrificio
(missa), exposta e refutada - 899-901
doutrina de concomitancia - 894
doutrina luterana - 897
doutrina luterana da presenc;a de Cristo na- 897
doutrina reformada- 897-899, 902,903
doutrina zwingliana - 902
eficacia de - 899-907
exposic;6es autorizadas - 907-913
instituic;ao e obrigac;ao perpetua - 885
maneira correta de ministni-la -892
motivos por recusar 0 calice ao povo - 894
o partir do pao - 889, 890
qualificac;6es necessarias para admissao - 903-907
relac;ao do sinal com a grac;a significada - 893-899
tipo de pao e vinho a serem usados - 888, 889
Celestio - 125
Cerinto - 135
Certeza da fe - 665-667
Ceu e Inferno- 806-821
ceu- 806-810
eternos- 811-814 ' ,- · .t
natureza da punic;ao futura- 811
0 estado do reprobo- 810, 811
objec;6es expressas e refutadas - 816-821

920
indice
teoria de aniquila~ao ou imortalidade condicional - 814
teoria de restaura~ao - 815, 816
termos biblicos- 806, 807, 810, 811
urn lugar - 807
uma condi~ao- 807, 810 - L .., . ·' .~.l

Chalmers, Dr Thos- 21, 75, 492


Channing, Dr Wm- 136
Chemnitz - 501, 532
Christlieb, Dr - 76
Ciencia e revela~ao - 333-336
Ciencias fisicas - 16
Cipriano - 872
Cirilo- 536
Clark Maxwell, Prof}- 38 .:-·~~- ,
Clarke, Dr Samuel- 55 t. ~'i; . ,., . ~ . r• : , '" ·:·-
Clarke, J F - 57 ,,
Cocceio - 500, 591
Coleridge, S T- 71,79
Communicatio Idiomatum- 531-533
Compara~ao de sistemas - 122-145
Comunhao dos santos- 676,677
Conant, Dr - 852
Concilios:
Calcedonia- 124, 534, 536, 537
Cartago- 125
Constantinopla- 233, 257, 535, 537
Constantinopla I - 123
Constantinopla VI - 124
Efeso- 123, 125, 534, 536
Latrao IV - 893
Milevo- 125
Niceia 123, 151,223,233,257,534
Toledo- 123, 257
Trento, decretos- 101, 118, 156, 460, 477, 489, 554, 590, 574,
617,625,636,646,683,684,685,686,688,690,695,
710-712,714,735,738,739,740,752,757,761,778,823,
826,829,830,837,844,891,900,904,907-909
Vaticano, decretos- 102, 118, 119, 120, 121, 159,601

921
indice
Conferencia de Leipzig- 131
Confiss6es:
Augburgo- 131, 133, 134,148, 162, 163,477,682,804,840,
841,880,897,909-911
Basilt~ia - 898
Belga- 103, 134,463, 805, 898,911
Igreja Grega Ortodoxa- 160, 589
Remonstrantes - 634, 757
Escocesa - 134, 148, 898, 903
Galica- 134, 463, 490, 837, 898, 903, 911
Inglesa de Eduardo VI - 804
Primeira Helvetica - 898
Segunda Helvetica- 102, 134, 148, 164, 478,490, 540, 554,
754,903,
Tetrapolitana- 164, 898
Westminster- 103, 166, 244, 245, 268, 315, 331, 349, 355,
419,422,426,431,445,479,492,501,513,541,558,559,
578,591,633,670,676,678,716,726,755,756,771,795,
805,824,826,827,828,837,842,846,874,877,881,883,
891,903,912,913
Consciencia - 384-388
Consensus:
Genevensis - 168
Tigurinus- 167, 898, 902
Constable, Rev Henry- 815
Conviq;ao de elei~ao possivel - 307
Cosmol6gico, Argumento - Veja Deus
Cousin - 63, 136
Credos:
Atanasiano- 148, 153, 154, 155,245
Calcedonia - 15 5
dos ap6stolos- 148, ISO
Papa Pio IV- 157-159
Credos e Confiss6es- 146-169
autoridade - 148, 149
como produzidos?- 146
por que necessarios?- 146
usos- 148

922
fndice
Crellio, J- 135 ,,:-p,.

Cria<;:ao do mundo - 320-336


creatio prima e secunda - 322
doutrina provada- 323-328 (_,_

doutrinas do absoluto - 320-322


fim principal a gloria de Deus- 328-332
narra<;:ao mosaica e ciencia - 332-336
Cria<;:ao e estado original do homem - 402-420
Criacionismo - 484-486
Crisp, Dr Tobias - 561
Cristianismo, provas - 17
Cristo, oficio medianeiro - 542-555
exposis;oes eclesiasticas autorizadas - 554,555
ministerio cristao nao e sacerd6cio - 552
sacerd6cio dos crentes - 553
Cristo, Pessoa de- 523-541
doutrina de kenosis - 537-539
doutrina declarada - 526, 527
doutrina luterana de communicatio idiomatum- 531-533
efeitos de uniao sobre a natureza humana- 529, 530
exposi<;:6es eclesiasticas autorizadas - 539-541
opinioes hereticas declaradas - 534-539
profecias do advento- 523-525
Cristo, reinado medianeiro - 596-618
diferentes aspectos - 596
doutrina das igrejas reformadas - 603
doutrina erastiana - 602
doutrina romana da rela<;:ao entre igreja e estado- 601, 602
finalidade de Igreja e Estado - 603
fins- 597
jurisdis;6es relativas de "Mesas de Curadores" e de
"Sess6es" - 608, 609
lei americana - 604-608
quando Cristo tomou sobre Si - 597,598
uso de frases "reino de Deus", "reino dos ceus", etc.
-598,599 •. , '•
natureza e administra<;:ao - 599, 600
exposi<;:6es eclesiasticas autorizadas - 617, 618

923
indice
Cristo, Seu estado de exalta<;ao - 613-617
Sua "sessao" a direita de Seu Pai- 616, 617
Sua ascensao - 615, 616
Sua ressurrei<;ao- 613-615
Cristo, Seu estado de humilha<;ao- 613-617
Sua descida ao inferno - 611,612
Cristo, uniao dos crentes com - 672-677
base- 674, 675
comunhao dos santos- 676, 677
conseqi.H~ncias - 675, 676
natureza- 672, 673, 674
Cristo, intercessao de - 593-595
Cristo, Sua deidade- 227-233
Cristologia- 131, 138, 143
Critica, alta, - 18
Critica, textual - 18
Cunningham, Dr Wm- 482,492, 558
Curceloea - 138, 573 .1 •• - .• • •• ···

' <

Dabney, Dr Robert L - 506


Dale, Rev James W- 852, 853
Danaeo, L- 490
Darwin, Charles - 45, 47, 56
De Moor- 486
Declara<;ao de Savoy - 167
Decretos de Deus - 268-286
ate onde eficazes e permissivos - 280
com o uso de meios - 284, 285
consistentes com livre agencia do homem - 281, 282
diferem da antiga doutrina do fatalismo- 280, 281
dificuldades - 269
doutrina calvinista declarada - 271, 272
doutrina provada- 274-277
efeitos praticos desta doutrina - 286
eternos - 272
incondicionais - 278-280
ordem dos decretos - 310-317
ponto de vista arminiano- 271, 279

924
fndice
santidade de Deus - 283, 284
soberanos - 277
urn prop6sito- 273, 274 • ; ,i· q~·-~J.f ~' •!_: I n .

Deismo-57,58 ·,·;·) J
Dens - 829, 876, 900
Descartes- 54, 79, 352, 366 · · · ··
Descida ao inferno- 611,612
Designio, Argumento de- Veja Deus
Deus, Seus atributos- 141, 143, 170-219
bondade abso1uta- 212-215
classifica~ao - 181-183
espiritualidade- 185, 186 _l •.

imutabilidade- 191,192
(·.· f
in teligencia infini ta - 192-198 ~ . . ~

justi~a absoluta- 205-212 - ....... , fi•:

metodos de determinar -170


natureza dos atributos- 179, 180
nomes, etimologias e significados - 178, 179
poder infinito- 198-200
realidade objetiva do nosso conhecimento - 170-173
rela~ao com o espa~o - 186-189
rela~ao com o tempo- 189, 190
sabedoria - 198
santidade- 218, 219
simplicidade- 180, 181
soberania- 217, 218
unidade- 183, 226
verdade- 216, 217
vontade - 200-204
Deus, Sua existencia- 30-32
argumento a priori- 53-55
argumento biblico - 52,53
argumento cosmol6gico - 35
argumento cosmol6gico, obje~6es e respostas - 36-38
argumento moral - 48
argumento moral, obje~oes e respostas - 49-52
argumento teleol6gico, obje~oes e respostas - 41-48
argumento teleol6gico, em duas formas - 38-41

925
indice
/ argumentos formais, valor e classifica~ao - 34, 35
defini~ao nominal - 30
em que sentido inata e em que sentido intuitiva - 32-34
ideia, ate onde se deve tradi~ao - 31
origem da ideia - 30
teorias antiteistas - 55-63
Deus, decretos de - Veja decretos
Deus, Seus atos classificados - 268, 269
nao 0 autor do pecado - 283, 284
Dick, Dr John- 514
Dollinger - 63
Dominicanos - 129, 130
Dona Naturalia e Supernaturalia- 416, 417
Dorner, Dr J A- 58,495, 501,721
Doutrina reformada - 368, 369
Pessoa de Cristo - 540, 541
Doutrina zwing1iana:
Ceia do Senhor, sua eficacia - 902
sacramentos - 827, 832
batismo e sua eficacia - 877
Doutrinas, Hist6ria das - 23
Dualismo - 56, 57
Dwight- 587

Ebionitas - 263, 534


Ebrard, Dr- 537
Eclesiologia - 22, 140
Edwards, Jonathan- 63, 352, 393,413,438,446,469,497,638,
643
Eglin, Rafael- 501
Eichhorn - 58, 70
Emmons, Dr- 366, 587, 637, 708, 726
Enciclopedia - 11
Episcopais - 134
Episc6pio - 138
Episcopius - 740
Erastianismo - 602
Erasto- 602 'J;
: .•.. i

926
indice
Erigena, Scotus - 62, 586
Erskine, Ebenezer- 75, 579
Erskine, Ralph - 579
Escatologia - 22, 140, 765
Escolasticos, Teologia dos - 128, 129
Escri turas:
acessfveis - 110
autoridade nao vern da igreja- 115, 116
completas- 107, 108
doutrina cat6lico-romana quanta a interpreta~ao - 118
inspira~ao - 80-103, 107
interpreta~ao nao vern da igreja- 115, 116 II:

juiz de controversias - 110, 111, 114-117


perspicuas- 108, 109
regra infalfvel de fe e pratica
Espfrito Santo, Sua deidade e personalidade - 233-236
Estatistica - 16
Estetica - 16
Etica crista - 22
Etnologia - 15
Eucaristia - 133
Eusebio de Cesareia - 27, 265
Eusebio de Nicomedia- 265
Eutico - 534, 536
Eutiquianismo - 536
Evolu~ao, teorias da - 44-48
Exalta~ao, estado de- Veja Cristo
Exegese- 19

Faber, Stanley - 289


Fairbairn, Dr Patrick- 338, 552, 801,808,853
Farrar, A S- 71, 76
Farrar, F W- 58, 76, 136
Fe- 648-671
"Fides informis" e "fides formata" - 660, 661 1 ·

"Fides specialis" e seu objeto - 663


artigos de fe e artigos de opiniao- 661, 662
como relacionada com a confian~a - 658

927
indice
definida- 648-650
distinc;ao cat6lico-romana entre fe implicita e explicita -~
651,652
doutrina cat6lico-romano - 658, 660, 663
doutrina provada - 659
exposic;6es autorizadas - 668-671 .·~

fe conduz a obras - 667


fe e conhecimento- 650-655
motivos fundamentais da fe - 655
relac;ao com justificac;ao - 701
relac;ao entre fe e certeza- 665-667
temporaria e viva - 656
Feuerbach - 62
Fichte - 70, 79
Filologia biblica- 18
Filologia Comparativa - 15 .l

Filosofia - 16
sua relac;ao com teologia - 78, 79
.!
Filosofia Aristotelica - 79
Finney, Prof - 744
Fisher, Dr G P - 76, 493, 499
Flatt- 587
Fletcher - 522
Flint, Prof Robert - 34, 43, 54, 56
Formula Concordiae- 102, 131, 163, 318, 418,462,477,489,
539, 590,617,618, 623,632,633,647, 716,753, 762, 891,
909-911,
Formula Consensus Helvetica- 168, 169, 478, 492, 591
Franciscanos - 129
Frederico o Grande - 69

Gerhard, Joao - 318, 223, 322


Gess, Dr W F- 537, 538
Gibbon- 293
Gladstone, Hon Wm E - 602
Gn6sticos - 56, 264
Gomaro- 313, 482
Grac;a- 126

928
fndice
Green, Prof Wm H - 403, 404
Gregorio, o Grande - 588
Grotio- 138, 208, 573, 587 . .. '~ t I.

Hagenbach- 71, 536, 537, 825


Hales- 403
Hamilton, Sir Wm- 58, 171, 176, 383, 397, 415 · . ,.
Hardwicke - 57
Hare, Julio C- 561
Harvey, Review deN W Taylor- 455
Rase- 588, 623 ;r .!

Haven, Prof- 436


Hegel- 61, 62, 70, 79 ll'
. . \ , (.
Heidegger, J H- 168 ilk - i
Herbert de Cherbury- 57 .'l ·.

Hermeneutica- 19
Hermes- 795
Hersch ell, Sir John - 325
Hetherington - 76
Hilario de Poitiers - 123
Hildeberto de Tours - 893
Hist6ria: .: ~

biblica- 27 I.,·

das doutrinas - 28
eclesiastica - 27
fontes da - 27
Hist6ria Universal - 15
Hobbes- 57
Hodge, Dr Charles- 181, 243, 369, 521, 583, 614, 615, 620, 640,
652,654,784,792,820
Hoffman, Dr- 537
Hogg, Tiago - 579
Homem, criac;ao e estado original - 402-420
antigtiidade- 403-405
arminiano- 411, 412 .·. ·
criado justa- 408-410 .._,:,,.,,,.
diretamente criado por Deus - 402, 403
distinc;ao entre imagem e semelhanc;a de Deus - 415

929
indice
doutrina romana do estado original do homem - 416, 417
exposi<;;6es autorizadas - 417-420
responsabilidade por disposis;6es inatas - 411-415
teoria pelagiano de justi<;;a original- 411, 414
"-_tricotomia desprovada - 407
unidade da ras;a provada - 405, 406
Homilias Clementinas - 135
Hopkins, Dr- 76, 485, 487
Hudson, C F- 774, 815
Humanitarianos - 263
Hume, David- 41
Humilias;ao, estado de- Veja Cristo
Hurst- 58, 70
Hutter- 501
Huxley- 47
Hyperio - 501

ldealismo - 58, 59
lgreja:
doutrina cat6lico-romana de infalibilidade da igreja,
expressa - 111
sem fundamento- 112
ideia, constitui<_;;ao, oficiais, etc. - 23, 24, 25
identica sob as duas dispensas;6es - 866-870
visivel - 863-866
Igreja da lnglaterra e lgreja Episcopal dos EUA, doutrina
delas em relas;ao a "descida ao inferno" - 611, 612
lgreja e Estado- 601-610
lgreja Grega, doutrina quanta ao modo de batismo- 861
quanta a gras;a - 632
doutrina de pecado original- 459
lgreja Oriental, doutrina de, quanta ao estado intermediario
-780
lgrejas:
arminianas - 135
batistas - 134
independentes - 134
luteranas - 133

930
indice
presbiterianas- 134 r ;_ ,-,;.1 1:! r-nnwob f.b ~:~·,.rrrq
reformadas- 134 -,,::'- !>-\;;; t'J;on''i ·,h n~:?c'1~r 11i!:
unitarias - 136
Imortalidade da alma- 767-772
lmputa~ao do pecado original de Adao- 480-506
dos nossos pecados para Cristo - 565, 566
imputa<;:ao definida - 493, 494
justi<;:a de Cristo para nos - 697-700
mediata - 495
Incapacidade - 465-479
distin<;:ao entre capacidade e liberdade - 466, 467
distin<;:ao entre capacidade moral e natural- 469-471 ·
doutrina agostiniana - 466 : ';_,; n~; n~ ·
doutrina pelagiana- 465, 466 ·-~ ,·· '
doutrina provada- 471-473 ,._ . ,,,,. ·:··•·
doutrina semipelagiana - 466
doutrinas expostas- 465, 466
exposi<;:6es eclesiasticas autorizadas - 477-479
obje<;:6es declaradas e respondidas - 473-475
Indulgencias - 687, 688
Inferno - Veja Ceu e Inferno
Infinito, 0 - 171, 176
Infralapsarianos - 312
Inocencio III - 893
Inspira<;:ao - 19, 80-103
"plena", 0 que e?- 82 :,i

"verbal", 0 que e? - 82
a a<;:ao providencial de Deus - 83
a doutrina provada - 85, 86
como difere da ilumina<;:ao espiritual? - 85
como difere da revela<;:ao? - 84
declara<;:6es defeituosas da doutrina- 98
doutrina da igreja- 81
exposi<;:6es autoritarias- 101-103
falsas doutrinas sobre inspira<;:ao - 100 • •.t:'

natureza e extensao da inspira<;:ao definida - 85


obje<;:6es e respostas - 93-97
pressuposi<;:6es necessarias - 80
atBtVJTc:· 'tn :~y ClARI'
931
fndice
provas da doutrina da Igreja - 85-93
Intercessao de Cristo - 593-595
lnterpreta9ao profetica - 20
Interpreta9ao, hist6ria da - 19
Introdui5ao de Horne - 238
Introdu9ao Especial -18, 19
Introduc;ao Geral- 18
Irineu- 585, 796, 872

Jacobi- 62
Jamblico - 62
J ansenio - 130
Jansenistas - 130, 625
Jesuitas- 129, 367
Joao Ascusuages- 265
Joao Filopono - 265
Josefo- 403
Jowett, Prof- 71, 586
Judeus, futura conversao e restaurac;ao - 799, 800
·'
Jufzo Final- 801-805 ,;
J ufzo Particular - 117
Juliano - 125
Justificar;ao - 691-717
Calvina justificado - 707
doutrina cat6lico-romana- 683, 684, 694, 695, 710-712
expressa e refutada- 710-714
doutrina definida e provada - 693-699
doutrina errada - 704-714
efeitos - 703
exposi96es eclesiasticas autorizadas - 714-717
imputac;ao de justic;a provada- 697-700
mas pela justic;a ativa e passiva de Cristo - 696, 697
modificado pela teoria governamental da propiciac;ao e
pela teoria arminiana- 707-710
nao baseado em obras- 694
objec;6es expostas e respondidas - 704
objeto espedfico da fe justificadora - 702, 703
relac;ao com fe- 701

932
fndice
teoria de Piscator - 705
uso noetestamentario de - 691-693

Kahnis- 71
Kant -79
Kitto- 337, 807, 811
··/
Knox, Joao- 898
Krauth, Dr C P- 59, 163, 501, 832, 876, 881, 890, 901
Kurtz- 27

:. ; .. ) 'j'J ~'
Lampe- 486 j • '

Le Clerc - 138
Leao, o Grande- 536
Leathes, Stanley- 76
Leibnitz - 79, 329 ~;~oo -- oq.
: ._,
Leipzig, Conferencia de - 624
Leland- 58
Lessing- 58
Limborch -138,419,463,479,487, 573, 591,622,701,709, 716,
820,842
Livre Agencia- 380-401
consistente com certeza - 396 ., I
distin9ao entre liberdade e capacidade- 392, 393 .nl;, . ·
falsas teorias de contingencia- 396-398 :u.;; J'.J. ,H' · ·, -··
motivos definidos - 394
teoria arminiana incompativel com o evangelho - 399-401
vontade definida - 383
. ,:
Livre-arbitrio - 126 __

Locke, John - 79 ... ,•.'-./1


..
Loyola, Inacio de- 129
Luteranismo- 161, 162, 130-133, 368
descida ao inferno- 611, 612,617, 618
eficacia da Ceia do Senhor- 901, 909-911
eficacia dos sacramentos- 831, 832, 840, 841
incapacidade - 477 ~ J').
. ' : : ! J

justi9a original- 418, 419


justifica9ao - 715, 716 lo,!:_,·J

necessidade de batismo- 876, 880, 881

933
fndice
pecado original - 462
perseveran~a - 762
Pessoa de Cristo- 531-533, 539, 540
predestina~ao - 317, 318
presen~a de Cristo na eucaristia- 897, 909-911
regenera~ao - 647
voca~ao eficaz - 623
Lutero- 130, 133, 489, 531, 561, 618, 876, 897
Luz interior - 67

Macedonia - 233
Mahan, Prof - 744
Malebranche- 352
Manes - 56, 483
Manning, Arcebispo - 602
Manning, Cardeal - 120
Mansel- 171, 176
"Marrow Men" - 579, 580
Marburgo, Col6quio de - 897
Martensen - 537
Martineau, James - 136
Martir, J ustino - 872
Martir, Pedro - 490
Mason, Dr John M- 870
Materia, niio eterna - 325-328
Materialismo - 59-61
Maurice -70
Mauricio - 624
Max Muller- 57, 63
McClintock, Dr John- 26, 27, 29, 688
McCosh, Dr James- 189, 384, 388, 430
Melanchthon- 130, 489, 501, 624, 897, 898
Merecimento:
conceito verdadeiro- 735, 736
doutrina cat6lico-romana de merecimento de
condignidade e de congruencia - 734, 735
Metodistas wesleyanos - 134, 138
Metodologia - 11

934
indice
Miconio, Oswald- 898 .('f .·'-~-c.\(~":"· :~~·
.· ...-
Milagres- 372-379
ate onde consistentes com perfei<;6es divinas - 376, 377
ate onde pode ser reconhecido- 377-379
possiveis - 373-375
Milenio, doutrina biblica do - 794, 795
Mill, J S- 37, 50, 56, 374
Mill, James - 50
Miller, Hugh- 502
Missa, doutrina da- 887, 899, 900, 907-909
Moehler - 417
Molina, Luiz- 129, 196
Molinistas - 130
Monarquianos - 234, 265, 266
Monofisitas - 537 '";;-
Monotelitas - 537
Moore, Dr Wm E- 606, 836, 875, 892
Moral, Argumento - Veja Deus
Morte eo estado da alma depois da mo:t:te- 765-781
doutrina anglicana - 773
doutrina cat6lico-romana- 777-779
doutrina da alma, descanso ou aniquila<;ao - 773, 774
doutrina do Velho Testamento- 769-771
doutrina neotestamentaria - 771
doutrina refutada - 775
: l
estado intermediario - 771-779
Geena - 772, 773 .. -;:.. -' •-"

( .i
Hades -772
•.• :,i
imortalidade da alma- 767-772
morte definida - 765
nao ha segunda proba<;ao - 776
paraiso - 772
por que morrem os justificados? - 766
qual a relac.,:ao entre morte e pecad()?- 766
~ ~
uso biblico de sheol - 769, 770 ,• (, . .I ) •

.' ~

Mosheim - 220, 705 ._. !,'

~: .;~ ~!.
Muller, Julio - 484 '' j

- I ~ ' . ' ''

935
indice
Neander, Augustus- 27, 57, 233,415, 536, 585, 861 ,,
N eo-platonicos - 62, 79 ,,
Nestoriana, Heresia- 535, 536 ,. ·
Nest6rio- 536
New Haven doutrina de pecado original- 459, 460
Newman, J H- 876
Newton, Sir Isaac- 188 .'
Niceno, Credo- Veja Credos ,',.,
Nicole- 130 . I/,

Niemeyer, Dr H A- 169 '}

Noeto- 266 '-~

Oberlinense, doutrina da perfeic.,:ao - 744-748


Ochino- 135
Oficio - Veja Cristo
Oleviano - 501
Origenes - 265, 266, 585, 775, , 872
Osiander - 586 '''
Outram- 585,568 :· .. ,,,1 ; ::
Owen, Dr J - 501

Paine, Thomas- 58
Paley -75
Panteismo- 61-63
Papa:
Alexandre VII - 130
Clemente XI- 130
Inocencio - 125
Inocencio X - 130
Leao X- 690
Pia IX- 602
Z6simo- 125
Papa, infalibilidade e autoridade- 119, 120
Papias- 795 ~'- . _ .
1 ;
1

Pareus, D - 485
Park, Prof Ed A - 206, 587
Parker, Teodoro- 58, 71
Parsons, Dr Theophilus - 790

936
indice
Pascal - 62, 130
Patripassianos - 234
Paulo de Samosata - 135
Paulo, Padre - 493 . ~· .}

Paulus - 58, 70 1 :· !

Pearson, Bispo- 76, 611


Pecado:
concupiscencia constitui pecado - 435, 436
defini<;:ao - 431
doutrina pelagiana - 438
em que sentido sempre voluntario- 438 -.:: ,,,, r;. ~,;:;
falta de conformidade com a lei- 432, 433
origem do pecado- 436,437
previsivel de estados permanentes como tambem de atos
-434
provas- 430
sua natureza- 430-439
Pecado, de Adao - 439-444
efeito sabre ele mesmo - 442
sabre sua posteridade - 443-444
Pecado, imputa<;:ao do original de Adao- 480-506
dificuldade esta nos fatos- 81-482
doutrina agostiniana- 502, 503 tJf,1H•Jmo::, .Pnv;;,~..,:u~: ,<t
doutrina da igreja provada- 498
duas quest6es distintas: como e porque? - 483
explica<;:ao arminiana da justi<;:a de Deus e os seres
humanos perdidos antes de nascerem - 486 ;•.:· , ·
fundamento da imputa<;:ao- 499-506
igrejas de acordo quanta a essa doutrina - 488-493
imputa<;:ao definida - 493, 494
imputa<;:ao mediata - 495-498
prindpios auto-evidentes - 482
teoria da igreja - 488
teoria da Nova lnglaterra- 487, 488 . · ;:.-.
teorias de origem que ignoram a origem adamica
-483,484 ......
·-"-· ,
·;

teorias diferentes quanta a propaga<;:ao do pecado ..


-484-486 i .. 1

937
indice

l
teoria federal- 500-506

·..~.' .
Pecado, original- 126, 445-464
afeta o homem inteiro- 449, 450
·- ~ .
doutrina definida- 445, 446
doutrina provada - 451
doutrinas pelagiana e semipelagiana - 457-459
e verdadeiramente pecado - 448
em que sentido "total" - 450, 451
exposi<;6es eclesiasticas autorizadas - 460-464
nao envolve corrup<;ao da substancia - 447
nao simplesmente perda de retidao original - 448, 449
New Haven, doutrina de- 459, 460
pecado contra o Espirito Santo - 457
Peck, Dr. George- 740, 742, 743, 744, 746, 749
Pelagianismo:
de pecado original - 453, 454, 458, 459
de regenera<;ao - 635
doutrina da justi<;a original- 411, 414 · . ·'''; -, · ., ,
incapacidade - 465, 466
pecado- 438
perfei<;ao- 737, 738
voca<;ao eficaz - 622
Pelagianismo, comparado com Agostinianismo - 124, 125
Pelagia- 125, 872
Penitencia - Veja Arrependimento
Perfeccionismo - Veja Santifica<;ao
Perfei<;ao, doutrina cat6lico-romana - 738-740, 744, 747
Perkins, Dr Justin- 889
Perseveran<;a dos santos - 756-764
arminiano - 757
doutrina cat6lico-romana - 757, 761, 762
doutrina exposta e provada - 756, 757
exposi<;6es autorizadas - 761-764
luterano - 762
obje<;6es declaradas e respondidas - 758-764
Pighio, Alberto - 493
Piscator - 575, 705 :,
Pla~ao, Josue - 495

938
fndice
Plotino- 62
Polernica - 23
Politeisrno - 57
Porfirio - 62
Posi~ao de igrejas batistas quanto ao modo batisrnal, e a de
todas as outras igrejas - 854, 855
Possessao dernoniaca - Veja Anjos
Pnixeas - 265
Predestina~ao- 127, 287-319
diferentes sentidos da palavra - 287
doutrina arrniniana - 290 ...... ry
• oJ... ,:, ,

doutrina calvinista- 292


doutrina provada- 293-300
nao baseada ern obras e sirn na soberana vontade de Deus
-294
obje~oes expressas e respondidas - 300-302 .r~- ;::.r·, · -, · ·
"teo ria da elei~ao nacional" - 289 , · ··
"teoria do individualisrno eclesiastico" - 289
Preordena~iio, como difere da presciencia e como equivale a
ela- 272 _
Pressense, Dr Edward- 57 -r:J,~::',(J ,;_ .:;~d. : :;, , ' .
Priestley- 136 (1! - i:;•~nl;;:.,p"'

Professio Fidei Tridentinae- 119 ?slll'i1~ ;;,nn;ul .~:":'?~·.·./


Propicia~iio- 556-577 . :·~ :1
autoridades cbissicas e confessionais - 588-592
da Escola Francesa e de Baxter- 580, 581
de "Marrow Men"- 579, 580 •·.. d . J;<:JL::~
designio-577-585 :o-· -:··i''::::,··
doutrina arrniniana- 579 ,.~ I::l:t::.J/,:

doutrina declarada- 562, 563, 577-579


doutrina provada - 564
doutrina reforrnada, provada - 581, 582
hist6ria de teorias que tern prevalecido- 585-588 '· ·• .,__,
inclui obediencia ativa e passiva - 572 1 ~· .£H-.
natureza- 556-577 <.nm~•~· :-
necessidade - 570-572
obediencia ativa e passiva - 561, 562
obje~oes declaradas e respostas - 574-577 ,.-,H:···· .~: i-

939
indice
obje<_;:oes expressas e respostas - 583-585 )• '
perfeic;ao - 572-574
teoria da satisfac;ao - 587, 588
teorias mistica, da influencia moral e governamental
-586-588
termos definidos - 556-559
Provas do cristianismo - 17 I
Providencia - 349-379
caracterfsticas expostas pelas Escrituras - 370
doutrina biblica do governo providencial expressa e
provada- 355-361
extende-se a ac;oes livres e pecaminosas - 361-363
ideia dos deistas - 350, 351
preserva<_;:ao - 349, 350
providencia particular - 360, 361
providencias extraordimirias e milagres - 372-379
teoria da cria<_;:ao continua - 352, 353
teoria das causas ocasionais - 366, 367
teoria de concursus- 367, 368 · r,.,l' · ;:
teoria mecanica da providencia - 364-366
verdadeira doutrina da preservac;ao exposta - 354
Psicologia - 16
Puni<_;:oes, futuras, eternas- 811-821
Purgat6rio - 777-779
Pusey, Dr - 700

Quenstedt, Andre- 490, 497, 882, 322


Querubins - 338
Quesnel - 130, 625
Quilianismo - 795-797

Racionalismo - 8-71
Racionalistas - 234
Radberto, Paschasio - 893
Ratramno - 893
Rawlinson- 76
Razao: '.,
diferentes sentidos - 68

940
fndice
niio e, em ultima instancia, argumento de verdade
religiosa - 72, 73
Realismo- 499-502
Redens;iio - 127
Regeneras;iio - 635-647
absoluta necessidade da - 645
'. , .... .. -
distinta da conversiio - 640, 641
doutrina cat6lico-romana - 682-690
doutrinas corretas - 638-642
. 1:
doutrinas erradas - 635-638 .. .., ;,.•

exposis;oes autorizadas - 646, 647, 688-690


Regeneras;iio batismal - 878-880
Regra de fee pnhica- 104-121
doutrina cat61ico-romana - 104
doutrina protestante - 68, 104
~
Reid- 79, 397 I ; • : ,- • '\ -

Reimarus - 58, 70
Reinado de Cristo - Veja Cristo
Religiiio:
0 que e?- 11 ... -..
comparativa, ciencia da - 15
crista: 0 que e? - 11
Remonstrance: . . ...
doutrina da predestinas;iio - 319
doutrina da propicias;iio - 591, 592
doutrina de eficacia dos sacramentos - 832, 842 - iJ.,<;>•,_;
doutrina da incapacidade- 479
doutrina de justis;a original - 419
doutrina do pecado original - 463
Remonstrantes- 137, 367
i. ' ,-
Renan -70
Responsabilidade moral- 398-401
Ressurreis;iio 782-790
condis;oes de identidade pessoal - 788, 789 "-1 i·nuoL
doutrina dos judeus- 789
doutrinas hereticas - 789, 790
objes;oes cientificas expressas e respostas - 785-787
ressurreis;iio de Cristo - 783-785 ·~h · ::1 •!.:: •") .... :·'

941
indice
simultanea e geral - 783
Revela~ao, sobrenatural, necessaria, possivel e provavel
-73-76
sua natureza - 84
Ridgely, Dr T - 486
Ritschl- 588
Ritter- 63
Robertson, Rev A- 580
Robinson, Dr Ed- 566, 619, 648, 773
Rogers, Henry- 76
Rogers, Juiz, Supremo Tribunal de Pensilvania- 606
Row -76 -'

Sabelio - 266
Sacramentos - 822-842
definic;ao de - 822-824
doutrina cat6lico-romana da eficacia - 828-831
doutrina protestante- 831-834 o~·-~ ·- r;r::''l ) )~J
doutrina zwingliana - 827, 832 · • ·
etimologia e uso da palavra - 822, 823
exposi~oes autorizadas - 838-842
necessidade de - 834-836
rela~ao do sip.al com a grac;a significada- 827 .>i
'
validade -836-838
veja Batismo e Ceia do Senhor
Saisset- 63
Sampson- 221
Sandemanianos- 658 ;;
Santificac;ao- 725-755 ;,_,
boas obras, sua natureza e necessidade - 732, 733
conceito verdadeiro de merecimento - 735, 736
diferentes conceitos - 725, 726
doutrina antinomiana - 733, 734
doutrina cat6lico-romana- 731, 732, 738-740
doutrina definida - 725, 726
e fe- 730, 731
exposic;oes autorizadas - 752-755
merecimento de condignidade e congruencia - 735

942
fndice
opera<;;ao da verdade- 729, 730 ~s. i -· ~t-,;n-,;-
opera<;;ao dos sacramentos (orde11an<;;as) - 730
perfeita santifica<;;ao- 737-755 __ .. ,
teoria arminiana - 740-743 · ·'
teoria arminiana, refutada- 744~751
teoria cat6lico-romana, refutada- 744-751
teoria pelagiana de, declarada- 737, 738 f' ,·:)

teoria pelagiana, refutada- 744-751


Satanas - Veja Anjos
Schaff, Dr Philip- 27, 71, 146, 150, 153, 163, 169,499, 504, 588,
861,889
Schelling- 61, 62, 70, 79
Schleiermacher - 62, 65, 586
Schwenkfeld- 586
Scientia media- 129, 196
Scotus, John Duns - 129, 573
Segundo Advento e Juizo Geral- 791-805
advento literal ainda futuro- 792
como os santos julgarao o mundo - 801, 802
conflagra<;;ao final do mundo - 803 -·- • -.!-,

exposi<;;6es autorizadas - 804, 805


futura conversao e restaura<;;ao dos judeus- 799, 800
interpreta<;;ao do Apocalipse 20:1-10- 797, 798
juizo final- 801-805
milenio, doutrina biblica do - 794, 795
o Juiz e os que serao ju1gados- 801
os ap6stolos nao ensinavam que a vincla seria imediata
-793,794 ,- - ,;·~,
os principios do juizo - 802,803 "" :;• -(
teoria premilenaria declarada e refutada- 795-797 1 • : :· •
uso da palavra no Novo Testamento - 791 ·· "-
varias interpreta<;;6es de Mateus, capitulos 24 e 25
-792,793 •. '-.... ::::r;
Semiarianos - 224, 264 . · :u;·.l ~ ."t.)inh ·
Semipelagianismo- 125, 128,458,459 ·\r.z. -- ai;bii .. '
voca<;;ao eficaz- 622 i -,u,'l ,1JoW'J~,
doutrina da incapacidade - 466 :_de . u ·
Semler- 69 < .~,) _ [,.-·· ,_}•0 - ,··lll;·; ·

943
fndice
Serveto - 135
Shaftesbury - 57
Shedd, Dr Wm G T -162, 264, 500, 504, 588
Shedd, Rev J H - 889
Silabo Papal- 601
Simb6lica - 28
Simbolos doutrinarios:
da igreja de Roma- 156-160
da lgreja Grega- 160
da igreja luterana- 161-163
da igreja reformada- 163-169
Sinergismo - 623, 624
Sinergistas - 131
Sinodo:
de Charenton - 495
de Dort- 137, 578
canones e decretos- 148, 166, 318, 319, 478, 479, 486,
491,633,634,762,763 ~Ji':JJ.(l t;;~\'·'·;·~

de Orange -128 ··dc:c:.· ·• · :"


de Valence - 128
Smalley- 587
Smith, Dr Henry B - 558
Socinianismo- 125, 138-140, 457, 479
de eficacia do batismo - 883, 884
de justifica~ao - 717
de propicia~ao - 575, 576, 586
doutrina do sacerd6cio de Cristo- 554, 555
fe justificadora - 702, 703
Socinianos- 124, 134, 263, 271, 277, 367, 534
Socino, Fausto- 135, 234,457, 575, 576
Soteriologia- 22, 125, 138, 142, 144
Spencer, Herbert - 56
Spinoza- 61, 62, 352, 366
Stanley, Dean Edward - 71
Staudlin - 587
Stewart, Prof B - 38
Storr- 587
Strauss- 56, 61, 62, 70

944
indice
Streitwolf- 588 - (IJil

Strong, Juiz Wm- 608


Stuart, Dr Moses- 812
Supralapsarianos- 312-315, 571
'
Swedenborg- 790 .(

Taylor, Dr N W- 455, 637, 640, 726


Taylor, Isaac - 336, 775
Teleol6gico, Argumento- Veja Deus
Tennemann - 57 ·i
Teodiceia - 329 1'

Teodoro de Mopsuestia- 536 (}'\


Teodoto - 135
Teologia: ·
as principais divis6es da classifica<;;ao proposta - 14
ate onde possivel?- 12 :;: ·'
biblica- 20
da media<;;ao - 70
exegetica - 17
federal - 500-506
fontes- 65, 66 b r;iH~·~q:J;' .:.,.::.;~.
hist6rica - 26-29
natural- 17, 64
0 que e? -11 -~···' ;;·•'iTi•.':q{!, G.Li,!·u.~t ~ :. ·
por que desejavel?- 12 ·' :;,
pratica - 23 ,·' ·
prOpria- 131 · .~ ,. ,.,·
ramos do conhecimento humano, auxiliares no estudo de
teologia- IS, 16
razao nao e, em ultima instancia, fonte da - 72, 73
revelada - 64
sistematica - 20
sabre quais perguntas fundamentais se baseia? - 13 '.: ·:
sua posi<;;ao em rela<;;iio a outras ciencias - 13
sua rela<;;iio com filosofia - 78, 79 (_ vA , f \ t)
tres sistemas que sempre subsistiram - 124, 125 - •·· ··: 1
Teoria: . · d ·'');.,;
da influencia moral da propicia<;;iio- 586 l\/• - :i.i ·· ·

945
indice
de advento premilemirio - 795-797
mistica da propicia~ao - 586
utilitaria da moral - 390
Teorias antiteistas - 55-63
Tertuliano - 220, 796, 872
Tertuliano de Cartago- 123
Tholuck, Prof- 26
Thomasius, Dr Gottfried- 537
Thornwell, Dr James- 493
Tillemont - 130
Tipologia - 20
Tischendorf- 76
Titcomb- 76
Tradi~ao, doutrina cat6lico-romana- 104-107, 119
Traducionismo - 484-486
Transubstancia~ao, doutrina cat6lico-romana - 890-896,
907-909
Trindade: ',:._- '-· _ ·: __ ,,_
doutrina da- 220-267
defini~ao de termos - 220-224
deidade e personalidade separada do Espirito Santo
-233-236
deidade e personalidade separada do Logos- 227-233
doutrina ensinada diretamente nas Escrituras - 237-239
doutrina fundamental do evange1ho- 266
eterna gera~ao do Filho- 239-252
opinioes hereticas - 262-267
processao eterna do Espirito Santo- 252-259
proposi~6es envolvidas - 224-226
significado da palavra - 220
Tubingen - 70
Tulloch - 56, 71
Turretino, Francisco- 168, 181, 193, 203, 221, 245, 255, 349, 355,
362, 369, 393, 431,490, 491, 496, 497, 522, 557, 628, 641, 670,
671,692,702,718,719,734,735,827,844,887
Twisse- 482, 571
Tyler, Prof- 57
Tyndal- 60 '.
-;'

946
fndice
Ulrici- 56
Underdonk, Bispo H U- 636
Uniao com Cristo- Veja Cristo
Unitarios- 134, 234, 265 . :-
Universalismo condicional - 580 ..
, :!·
·.
Updegraff, Caso de- 605
Ursino - 490, 526, 898 I i";

Usher, Arcebispo James- 579, 403

Valdenses- 589
Van Mildert, Wm- 58
Virchow- 46
Virtude- 388, 389
Vitringa- 431 ~(".:_
-- _ .. l.jJ •• ' ..:YY

Vocac;;ao:
conceitos de diferentes facc;;oes expressas e comparadas
-622-625
congruente com a nossa natureza - 629, 630
doutrina arminiana- 631
doutrina reformada de, explicada e provada - 624-630
eficaz- 619-634
exposic;;oes eclesiasticas autorizadas da doutrina - 631-634
vinculo com a verdade - 630
vocac;;ao externa- 620 \-1 ; ,, ..· .· ·n•..·
vocac;;ao interna provada- 621
Vocac;;ao Eficaz- Veja Vocac;;ao
Voltaire- 58
Von Bres - 898
Vossio, G J - 491

Wace- 76
Wall, Dr Wm - 872
Wardlaw, G - 76
Watson, Ricardo- 138, 413, 414, 522, 579, 581, 588, 749
Weeks, Dr W B - 559
Wegscheider - 58, 70, 293
Wesley- 138, 302,413,439,741,742,743
Wessel, John- 589

947
indice
Westcott, Rev B F- 76
Westein - 138
Whately, Arcebispo- 289, 305, 774, 815
Whedon, Dr D D- 300, 399,411,487
White, Rev Ed- 815
Wiggers, Dr G F- 458, 489, 738
Williams - 71
Wissowatis, Andre - 135
Witherspoon, Presidente- 492
Witsio, H - 428, 492, 522
Wolf- 69
Wolfenbiittel, o Fragmentista - 70
Woolsey, President Theodore D - 210-212
Wycliffe- 589

Young, Dr John- 586

Zoroastro - 56
Zwinglio- 131, 897, 898

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948

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