Artigo Cientifico - Luxação de Patela Lateral, Congênita, Bilateral em Cão

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https://doi.org/10.22256/pubvet.v12n1a9.

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Luxação de patela lateral, congênita, bilateral em cão: Relato de


caso
Ana Estelita Nascimento de Carvalho 1*, Adriana Elizabeth Cordeiro Barbosa 1,
Daniella Kaísa de Oliveira Bezerra 1, Claudina Rita de Souza Pires 1, Carolina Franchi
João 2, Maridelzira Betânia Moraes David 3, Luiz Fernando Moraes Moreira 3
1
Aluna de Pós-graduação da Universidade Federal do Pará, Instituto de Medicina Veterinária. Castanhal – PA Brasil
2
Professor da Universidade Federal do Pará, Instituto de Medicina Veterinária. Castanhal – PA Brasil. E-mail: [email protected]
3
Médico Veterinário da Universidade Federal Rural da Amazônia, Instituto de Saúde e Produção Animal. Belém – PA Brasil.
*Autor para correspondência: [email protected]

RESUMO. Foi diagnosticado um caso de luxação patelar lateral bilateral congênita em um


cão, macho, da raça Poodle, 2 anos de idade, que inicialmente apresentava grau 3,
evoluindo ao grau 4 no membro esquerdo após cirurgias para correção. A luxação patelar
lateral é pouco frequente e afeta principalmente cães de raças grandes e gigantes, sendo
condição rara em cães de raças pequena e miniatura.
Palavras chave: claudicação, luxação patelar congênita, luxação patelar lateral

Lateral luxation patellar, congenital, bilateral in dog: A case report


ABSTRACT. Congenital bilateral lateral patellar luxation was diagnosed in a 2-year-old,
Poodle, who initially presented grade 3 but who progressed to grade 4 in the left limb after
surgery for correction. Lateral patellar luxation is less frequent and affects dogs of large
and giant breeds. It is rare condition in small and miniature breeds dogs.
Keywords: claudication, congenital patellar luxation, lateral patellar luxation

Luxación de patela lateral, congénita, bilateral en perro: Reporte de


caso
RESUMEN. Se diagnosticó un caso de luxación patelar lateral bilateral congénita en un
perro macho de la raza Poodle, 2 años de edad, que inicialmente presentaba grado 3,
evolucionando al grado 4 en el miembro izquierdo después de las cirugías para corrección.
La luxación patelar lateral es poco frecuente y afecta principalmente a perros de razas
grandes y gigantes, siendo condición rara en perros de razas pequeña y miniatura.
Palabras clave: claudicación, luxación patelar congénita, luxación patelar lateral

Introdução para a determinação da escolha da terapia e do


prognóstico. A forma congênita é frequente e há
Os distúrbios da articulação femorotibiopatelar indícios de que seja uma doença hereditária,
são frequentes causas de claudicação e impotência provavelmente poligênica e multifatorial (Denny
do membro pélvico em cães, dentre elas se destaca and Butterworth, 2000).
a luxação patelar de origem traumática ou
congênita (Piermattei and Flo, 2009). É A luxação lateral é mais comum nas raças
classificada em graus de acordo com o tipo e a grandes e gigantes, sendo rara em cães de raças
severidade das anormalidades, sendo importante

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pequenas e miniaturas (Hayes et al., 1994, Slatter, membros pélvicos, relutância em saltar,
2007). dificuldade para subir degraus e postura
moderadamente encurvada. Na idade adulta,
A correção cirúrgica exige o alinhamento do
deambulava anormalmente, com os membros
mecanismo extensor - quadríceps femoral e a
arqueados, pés voltados para fora e região
estabilização da patela na tróclea femoral
posterior levemente agachada. Visivelmente,
(Villanova Júnior and Caron, 2010).
havia pouco desenvolvimento bilateral do
Anormalidades que gerem tensões anatômicas
quadríceps femoral, de forma mais acentuada no
com tendência à luxação patelar, devem ser
membro esquerdo, sobre o qual também
corrigidas para evitar recidivas e insucesso
apresentava menor apoio do peso corporal.
cirúrgico. Sugerem-se intervenções associadas
Quanto à postura, demonstrava maior sustentação
com a correção dos tecidos moles periarticulares e
do peso nos membros torácicos. Não demonstrava
a correção de tecido ósseo nos casos de alterações
dor ao exame físico das articulações
ósseas torcionais e angulares (Arthurs and
coxofemorais, femorotibiopatelares, tarsocrurais
Langley-Hobbs, 2006, Piermattei and Flo, 2009,
ou qualquer alteração em coxins e falanges. As
Fossum, 2014). Nesse contexto recorrem-se a
patelas apresentavam-se deslocadas lateralmente
técnicas como trocleoplastia ou condroplastia
em relação ao sulco troclear, podendo ser
(Piermattei and Flo, 2009, Souza et al., 2010). O
reposicionadas manualmente quando em
prognóstico depende da severidade dos sinais
extensão, mas tornando a luxar de forma
clínicos, da idade do paciente no momento da
espontânea à flexão do membro, caracterizando o
intervenção e do grau de luxação patelar (Fossum,
quadro de luxação patelar lateral bilateral, grau 3,
2014).
congênita. Após o diagnóstico, foi recomendado
Este trabalho relata o caso de um cão, macho, cirurgia corretiva no membro pélvico esquerdo,
2 anos de idade, da raça Poodle com luxação que apresentava maiores alterações
patelar lateral, congênita, bilateral, grau 3 que musculoesqueléticas.
evoluiu ao grau 4 após o tratamento cirúrgico.
Como protocolo pré-anestésico foi
administrado Acepromazina e Cloridrato de
Relato de caso
Tramadol. Propofol para indução anestésica;
Foi atendido no Hospital Veterinário Mario Isofluorano para manutenção e o bloqueio
Dias Teixeira da Universidade Federal Rural da epidural com Lidocaína e Morfina.
Amazônia um cão, macho, da raça Poodle, 2 anos
de idade, castrado. Aos 5 meses de idade Ao primeiro acesso cirúrgico, foi observada a
apresentava marcha instável com pouco apoio nos tróclea rasa, feita a condroplastia e o
pregueamento do retináculo medial (Figura 1).

Figura 1. Transoperatório em cão. A. Tróclea rasa. B. Condroplastia troclear – elevação de retalho cartilaginoso. C.
Pregueamento do retináculo medial.

Cinco meses após, constatou-se a reluxação da tuberosidade tibial em sua nova localização com
patela lateralmente, encaminhando o animal a fio de aço número 0 (Figura 2).
novo procedimento cirúrgico. Nesse momento, foi
Dez dias após, notou-se a reluxação com
observado o desalinhamento entre o sulco troclear
evolução do quadro de Grau 3 ao Grau 4. As
e a crista tibial, promovendo-se então a sua
alterações articulares foram evidenciadas nas
transposição medialmente com a estabilização da
radiografias dispostas na figura 3.

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cerclagem aderido ao côndilo lateral remanescente


da cirurgia anterior e instituídos o aprofundamento
do sulco troclear e a nova transposição da crista
tibial com fixação, desta vez, por um pino de
Steimann modificado artesanalmente no formato
de grampo (Figura 4).

Figura 2. Transoperatório em joelho esquerdo de cão. A.


Crista tibial desviada lateralmente com relação ao sulco
troclear. B. Crista tibial alinhada após transposição medial e
pregueamento do retináculo medial.

Figura 4. Transoperatório em joelho esquerdo de cão. A.


Aspecto do sulco troclear após o aprofundamento da borda
interna da crista tibial lateral. B. Utilização de um grampo de
aço confeccionado com pino intramedular de steinmann para
fixação da tuberosidade tibial.

Suturou-se a cápsula articular e procedeu-se o


pregueamento do retináculo medial e posterior
dermorrafia.
Ao exame clínico feito 10 dias após a cirurgia,
não houve reluxação patelar. Entretanto, 4 meses
após a cirurgia, à radiografia, verificou-se a
avulsão da crista tibial e a patela localizada
cranialmente ao sulco troclear (Figura 5 e 6).

Figura 3. Radiografias de cão. A. Projeção craniocaudal –


luxação patelar lateral bilateral. Não há alterações em
articulação coxofemoral ou deformação femoral ou tibial.
Patela esquerda luxada lateralmente com fio de cerclagem no
côndilo lateral esquerdo. B. Projeção mediolateral – patela
direita em posição anatômica normal. Não visibilização da
patela em membro esquerdo. C. Projeção axial – luxação
patelar lateral bilateral. Ausência de sulco troclear no membro
direito. Sulco troclear aprofundado no membro esquerdo. Fio
de cerclagem aderido ao côndilo lateral esquerdo.

Quatro meses após a segunda cirurgia, o animal


sustentava menos
A peso no membro quando
comparado anteriormente ao segundo acesso
cirúrgico, chegando a mantê-lo na maior parte do Figura 5. Radiografia de pós-operatório imediato em cão. A.
tempo suspenso, além da evidente atrofia Projeção Craniocaudal – Patela na posição proximal da
muscular pelo pouco uso. Demonstrava tróclea no membro esquerdo e a presença do implante
metálico na crista tibial.
sensibilidade dolorosa ao exame físico de
extensão e flexão nessa articulação. Foi submetido
à terceira cirurgia, onde foi retirado o fio de

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recomendam os mesmos autores.


Na segunda cirurgia foi feita a transposição da
tuberosidade tibial, fixada com fio de aço,
estabelecendo uma linha reta com o sulco troclear
como sugerem Villanova Júnior and Caron (2010)
e novamente o pregueamento do retináculo
medial. No pós-operatório, o fio de aço migrou da
crista tibial ao côndilo lateral, levando à reluxação
patelar e promovendo a evolução de grau 3 ao 4.
Essa situação foi citada por Arthurs and Langley-
Hobbs (2006), Slatter (2007) e Shaver et al. (2014)
Figura 6. Radiografia de pós-operatório imediato em cão. onde a reluxação patelar, a migração do implante
Projeção Mediolateral – Patela esquerda cranialmente ao da transposição da crista tibial e a incapacidade de
sulco troclear. Avulsão da crista tibial com deslocamento
cranial. estender o joelho são complicações que podem
acontecer em pós-operatório, inclusive com a
Discussão evolução a outros graus.
Neste estudo, o animal foi diagnosticado e Foi utilizado o grampo metálico no terceiro
reparado cirurgicamente aos 2 anos de idade, acesso cirúrgico sendo ineficaz para a fixação da
quando a postura e a dificuldade na marcha crista tibial o que permitiu sua avulsão e o
ficaram mais evidentes. Quanto à faixa etária, deslocamento cranial da patela ao sulco troclear,
Lara et al. (2013) observaram a predominância da apesar de Piermattei and Flo (2009) e Fossum
alteração em cães com até 1 ano de idade, na forma (2014) recomendarem que pinos de Kirschner, fios
congênita e, segundo Kowaleski et al. (2012) com de aço ou parafusos e, se necessário, em bandas de
sinais clínicos bilateralmente aos 5 ou 6 meses de tensão produzem bom resultado na fixação da
idade, semelhante ao que ocorreu neste caso. O crista tibial em seu novo leito.
paciente avaliado apresentou o grau 3, sendo um Não foram observadas as alterações ósseas
dos graus mais prevalentes nos estudos de Hayes torcionais características de cães com graus 3 e 4
et al. (1994). citadas por Fossum (2014) não exigindo, portanto,
Apesar da luxação lateral diagnosticada no a realização de osteotomias corretivas no fêmur ou
Poodle ser a raça de maior ocorrência nos estudos na tíbia.
feitos por Lara et al. (2013) a maior frequência
dessa condição é observada em cães de raça Conclusão
grande e gigante de acordo com Hayes et al. Trata-se de um caso de luxação patelar lateral
(1994) e Slatter (2007). E quanto à predisposição bilateral em um cão de raça pequena e porte
sexual, diferentemente deste relato, D’Andrade médio, cujos estudos informam ser de ocorrência
(2014) a observaram mais em fêmeas. rara nessa condição. Após as tentativas cirúrgicas
A correção cirúrgica foi feita no membro anteriores para a correção da luxação patelar,
esquerdo, que apresentava as alterações pôde-se constatar a necessidade de associar
musculoesqueléticas pré-operatórias mais técnicas cirúrgicas como a condroplastia, o
evidentes. No qual se associaram duas técnicas: a pregueamento do retináculo e a transposição da
condroplastia, a fim de preservar a cartilagem crista tibial visando alinhar o quadríceps femoral,
articular como citado por Piermattei and Flo ligamento patelar e a tíbia. Entretanto, a fixação da
(2009), no intuito de proporcionar rápido crista tibial primeiramente com fio de aço e,
restabelecimento da função do membro com posteriormente com grampo metálico, não foram
menor predisposição ao desenvolvimento de efetivos na estabilização articular ocasionando
doença articular degenerativa. Contrariando os inclusive a evolução da luxação patelar de grau 3
autores ao afirmarem que em animais entre 8 e 10 ao 4.
meses a técnica é mais viável, nesse caso, apesar
da idade, a condroplastia foi realizada de forma Referências Bibliográficas
satisfatória com facilidade na elevação do retalho. Arthurs, G. I. & Langley-Hobbs, S. J. 2006.
Além do pregueamento do retináculo medial para Complications associated with corrective
causar tensão patelar no lado oposto à luxação surgery for patellar luxation in 109 dogs.
evitando um novo deslizamento como Veterinary Surgery, 35, 559-566.

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D’Andrade, A. M. C. S. 2014. Prevalência da Shaver, S. L., Mayhew, K. N., Sutton, J. S.,


patologia luxação de patela em cães.. 71f. Mayhew, P. D., Runge, J. J., Brown, D. C. &
Dissertação (Mestrado). Medicina Veterinária, Kass, P. H. 2014. Complications after
Universidade Lusófona de humanidades e corrective surgery for lateral patellar luxation
tecnologia - Lisboa. in dogs: 36 cases (2000–2011). Journal of the
Denny, H. R. & Butterworth, S. J. 2000. A guide American Veterinary Medical Association,
to canine and feline orthopaedic surgery. 244, 444-448.
Blackwell Science. , Oxford Slatter, D. H. 2007. Manual de cirurgia de
Fossum, T. W. 2014. Cirurgia de pequenos pequenos animais. Manole, São Paulo.
animais, 4 edn. Elsevier Brasil, São Paulo. Souza, M. M. D., Rahal, S. C., Padovani, C. R.,
Hayes, A. G., Boudrieau, R. J. & Hungerford, L. Mortari, A. C. & Mendes, P. N. 2010. Estudo
L. 1994. Frequency and distribution of medial retrospectivo de cães com luxação patelar
and lateral patellar luxation in dogs: 124 cases medial tratados cirurgicamente. Ciência Rural,
(1982-1992). Journal of the American 40, 1341-1346.
Veterinary Medical Association, 205, 716-720. Villanova Júnior, J. A. & Caron, V. F. 2010.
Kowaleski, M. P., Boudrieau, R. J. & Pozzi, A. Trocleoplastia por ressecção associada à
2012. Stifle joint. Veterinary Surgery: Small transposição da tuberosidade tibial e
Animal, 1, 906-998. sobreposição da fáscia lata para o tratamento
da luxação patelar em cães. Archives of
Lara, J. S., Oliveira, H. P. & Alves, E. G. L. 2013.
Veterinary Science, 15, 43-48.
Caracterização dos aspectos clínicos,
epidemiológicos e lesões associadas à luxação Article History:
de patela em cães atendidos no Hospital Received 27 August 2017
Veterinário no período de 2000 a 2010: estudo Accepted 13 September 2017
Available on line 20 November 2017
retrospectivo. Arquivo Brasileiro de Medicina
Veterinária e Zootecnia, 65, 1274-1280. License information: This is an open-access article distributed under
the terms of the Creative Commons Attribution License 4.0, which
Piermattei, B. D. L. & Flo, G. L. 2009. Ortopedia permits unrestricted use, distribution, and reproduction in any
e tratamento das fraturas dos pequenos medium, provided the original work is properly cited
animais, 3 ed. edn. Editora Manolo, São Paulo.

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