Ainda Bem Que Nos Restou A Poesia
Ainda Bem Que Nos Restou A Poesia
Ainda Bem Que Nos Restou A Poesia
1
ainda bem que nos restou a poesia
antologia
primeira edição
obra independente
2020
2
diagramação:
francisco ramai
capa:
arthur diogo
3
Agradeço à Clarice Sabino,
Kaio Bruno Dias e Arthur Diogo
pela prestatividade.
4
“O que ponho de cerebral nos meus escritos
é apenas uma vigilância
para não cair na tentação
de me achar menos tolo que os outros.”
(Manoel de Barros)
5
Sumário
6
7
1. Francisco Ramai
8
toda mosca que passa
meu cachorro tadinho
tenta pegar e não consegue
me identifico
meu cachorro sou eu
a mosca é a felicidade
9
no estado que estamos
de avanço tecnológico
já é tanta coisa que se pode
fazer num computador
que a gente vai morrer
sem saber de tudo
mas mesmo assim
todo mundo hoje em dia
tá sempre meio entediado
essa coisa não me desce
isso que a gente sente
não é tédio não senhor
é tristeza
10
não gosto do escuro
mas o luto e a saudade
me obrigam a manter
as luzes apagadas
pra ver se teu fantasma
aparece no meio da noite
pra me dar um susto
11
eu sinto por você
um amor tão forte
mas tão forte
que toda vez
que digo que te amo
é um desabafo
12
acho que entendi o motivo
de falarmos com voz de criança
quando estamos apaixonados:
13
tem noite que não
tenho tempo pra nada
a não ser pensar em você.
quer dizer, pensar em você
até que é uma ocupação e tanto:
exige nuances, técnicas, horas,
e muita maturidade
pra não morrer de sem você.
mas o problema é que só eu
entendo o trampo que isso dá.
então quando você me pergunta
o motivo deu ter sumido ontem à noite,
respondo com meias verdades:
“acontece que andei ocupado...”
14
minha maior angústia é ter pressa:
eu só quero os meus sonhos pra ontem
mas a vida, essa lerda, só me dá amanhãs e amanhãs…
15
é como se nada fosse capaz de matar a tristeza.
nem o gozo mais prazeroso
nem o sonho mais iludido
nem a cachaça mais forte.
é como se nada fosse
tão forte.
eu tenho uns amigos
que são tão tristes quanto eu
e sei que eles são tristes
pois quando a gente sai pra beber
a gente ri de uma forma patética.
como se de uma maneira desesperada
absurdamente desesperada
a gente necessitasse
gargalhar.
talvez assim
a tristeza pareça ter fim
mas no fundo
bem no fundo
a gente sabe
que não tem…
16
quando eu tinha oito anos
escrevi num bilhete
que amava minha vizinha
e joguei no quintal da casa dela.
17
nesses jantares de natal
o que mais dói
é esse clima tenso
quase imperceptível
essa saudade
que todo mundo sente
em silêncio
dos parentes que já não
ocupam mais a mesa...
18
eu não chamo de amor
o que acontece comigo
quando olho pra você.
é que seria muito simples
limitar essa sensação disrítimica
com um termo assim, tão corriqueiro.
quer dizer, eu até te amo,
mas pra nós dois,
só o amor
não basta.
é muito mais do que isso.
é no mínimo
desespero.
19
rapidinhas
*
a nossa infância acaba
assim que choramos com razão pela primeira vez
*
a tristeza só é uma coisa bonita por insistência dos poetas
*
não há absolutamente nada mais poético do que um sorriso triste
*
as estátuas são pedras que apanharam até se tornarem heróis
*
quem diz que a vida passa rápido
nunca parou pra observar um relógio de parede
*
ler poesia é chamar a dor pra uma valsa
*
meus últimos sonhos andam sendo lembranças
*
com saudade do filho a mãe suspira
sempre que põe no fogo um bife a menos
20
eu sou eu
aí você chega
e eu sei lá
21
mesmo sendo ateu convicto
me sinto muito querido
quando alguém deseja
que deus cuide de mim.
é que por mais que eu não acredite
saber que alguém deseja
que um ser supremo e poderoso me cuide
é um carinho tão bonito
parece até eu te amo...
22
eu teria tanta coisa bonita pra te dizer!
coisas que talvez até fizessem
você se apaixonar por mim…
mas acontece que não sou muito bom
em correr atrás dos meus sonhos.
eu só sei ficar no meu canto
criando conversas imaginárias contigo
que nunca irão acontecer,
mas deveriam…
23
enquanto nos falávamos
por telefone a noite inteira
eu rabiscava círculos num bloco de papel.
o som da sua voz no meu ouvido.
a gente contando estrelas por telefone.
agora que você se foi faz uns dias
e tua voz só existe na minha cabeça,
eu lembro que já fiz suas pernas tremerem
e digo que tá tudo bem, não vou morrer.
mas olho pra estes rabiscos horrorosos
e choro.
24
é no mínimo curiosa
a admiração que nós humanos
temos pelo céu
pois todo dia ele é
praticamente igual
mas mesmo assim
ficamos diariamente abestalhados
tiramos fotos pintamos quadros
observamos por horas…
inclusive penso
que é daí que vem o amor:
essa linda admiração imbecil non sense
por uma coisa tão monótona…
25
hoje passei um café
pra tomar sozinho
mas ficou forte demais.
26
tenho certeza
que você não é psicopata
pois me disseram
que psicopatas
não deixam rastros
e eu vejo um pedaço teu
em todo lugar
que vou
27
deve haver
um código oculto
em cada outdoor
de cidade grande
que deixa todo
mundo no ônibus
meio deprimido
28
a família que mora
no apartamento vizinho
briga quase todo dia
e eu, que hoje moro sozinho,
fico ouvindo a gritaria da janela
morrendo de inveja
e saudade do povo lá de casa.
29
tem dia que parece difícil ser feliz.
como se o sorriso
ficasse entalado na garganta
feito um pedaço de bolo muito grande.
mas tem dia que é tão fácil ser feliz,
que todos os dias que passei chorando
parecem não fazer nenhum sentido.
queria saber explicar isso,
mas é coisa que não se explica.
é só meu coração moleque
tentando lidar com o tempo...
30
2. Erick Saraiva
31
tudo é a lembrança de algo ou alguém
32
fico parado no lugar
mais solitário que há
meus próprios pensamentos
e é como se eu observasse
a Terra sozinho na lua
33
não tem mais poesia
não tem mais paixão
você era os traços que eu desenhava
os versos que eu escrevia
não tem mais sentido ou razão
você está mais longe do que
diz a geografia
onde não alcança
nem sequer
a última esperança
34
seu nome é comum o bastante
para eu ouvir constantemente
porém não é o suficiente
para que não seja o seu rosto
o primeiro a vir à minha mente
35
me dê licença porque agora vou ficar sozinho
para poder reclamar da solidão
36
se me falassem que vou morrer amanhã
eu teria uma lista de arrependimentos
cantaria epitáfio dos titãs
mas se me falassem
que vou viver mais cem anos
eu esperaria cem anos para fazer
essa mesma lista
37
eu sinto que cada um de nós
é um idioma à parte
e por mais que possamos
aprender o idioma do outro
nunca saberemos como é
ser nativo de outra língua
38
quando me deito de bruços
sempre acabo pensando em você
e te desejo tanto
que parece que vai se
tornar realidade
39
tenho terminado as noites
com um gosto amargo
em meus lábios
porque não tenho mais dito
coisas doces a seu respeito
e por causa do vinho barato
40
talvez a maneira como tenho expressado
sobre como vejo belezas no presente
e tenho raízes no passado
te deixaram com a impressão errada
sobre mim
eu penso no que falo e falo muito
sobre o que penso
mas se tenho você
somos só eu e você
e fim
41
podemos voltar algumas conversas atrás
para quando falamos eu te amo
pela primeira vez?
42
não quero viver em uma constante
procura ao bilhete premiado
quero ter sorte na vida
sem deixar minha vida à própria sorte
eu sei que não é o que parece
enquanto você me vê
aqui sentado
43
ouvir no fone de ouvido novo
após o anterior ter estragado
tomar uma cerveja
depois de passar o dia estressado
por que gostamos mais
de matar a sede
do que nos manter hidratados?
44
no aniversário de sessenta anos de Brasília
meu avô me perguntou como será que uma
pessoa consegue criar uma cidade
pois ele que não sabe que criei
um mundo inteiro pensando em você
45
fico pensando se nessas sextas
quando você não sai, se você
fica lembrando de mim
mas daí fico triste de imaginar
que eu só existo
nos seus dias vazio
46
me imagino arremessando
copos de vidro ao chão
enquanto eles se estilhaçam
eu ainda espero alguém
me gritar em repressão
mas nada acontece
além de mais um estrago
que eu fiz por não saber
exatamente o que dizer
47
eu vesti o seu rosto
e às vezes vejo a vida
como se fosse através
dos seus olhos e os meus
azul turquesa e noite escura
48
há ideias que precisam sair
do papel
porém
primeiro
há pesos que precisam sair
das costas
49
dia desses a gente vai estar
na mesma cidade, ao mesmo tempo
e mesmo assim estaremos
centenas de lembranças atrás
50
eu acordaria às quatro da manhã
a pessoa mais feliz do mundo
se fosse pra pegar o avião
que me levasse até você
51
3. Bárbara Seidel Bittencourt
52
pouco ou nada
senhor de mim
sigo tentando
encontrar sentido
que compõem
este eu
de tudo
o que me resta
são os sonhos
onde não
fechei os olhos
53
finjo saber
o que poupo
quando me calo
sei que
não há falo
que cale
54
cada ser é infinito
55
é preciso calma
e preciso alma
para receber
quando chegar
56
uma ruga
aparece
quando
franze a testa
ou
quando chora
a lágrima
cai
e demora
forma um
ca
mi
nho
e aprendo
a nadar
em correnteza
57
se você
não tivesse
que entrar
na minha mente
primeiro
acima
do coração
58
antes de
ser fortaleza
fui uma
pedra pequena
59
podem procurar
a fundo
nas entranhas
no íntimo escondido
encontrarão
tuas digitais
não nego
60
anseio a hora
de te ver
mas a saudade
meu peito
não perdoa
os teus atrasos
61
por entre
a fresta
espio
a festa
ir além
das arestas
sopro solto
infinitas reticências
única urgência
62
ao tempo
queremos
dar a função
aguda
de nos resolver
63
quero ir
no curioso lugar
e a pegamos no colo
no surgimento da palavra
do artista desconhecido
é na
queda
no tropeço
da fratura exposta
que percorro
carrego em mim
do filho prematuro
do útero
65
quando nossas
veias
artérias
estiverem entupidas
de balas
lembre-se que
anda assim
haverá a poesia
mãos e bocas
e a nossa voz
66
4. Davi Melo
67
amo escrever versos
pela manhã assim como
amo quando o sol bate nos
teus olhos e eles refletem uma
nova luz originada a partir da simples
certeza de que você está aqui.
68
hoje eu acordei
e lembrei de você.
amanhã também.
69
paixão é tinta no balde.
amor é aquarela na parede.
70
apesar da distância
física, você é a pessoa
mais poesia de mim.
71
viva o amor livre
e o poema no livro.
72
abraça ela, tira
uma selfie e deixa o
amor sair bonito na foto.
73
amar é alcançar o peito
de alguém e continuar
correndo para perto.
74
é que ao seu lado
todo instante
é tudo.
75
dormir entre os teus lençóis.
acordar entre as tuas pernas.
76
se for ao lado de
quem você ama,
enfrente.
77
ainda que me tirassem
tudo e me deixassem somente
com a tua risada, então não
me tirariam nada.
78
você é um caminho sem volta.
79
que seja sua prioridade
mas nunca a sua propriedade.
80
torço para que o amor
te encontre e para que
você comemore ao lado
dele como se tivesse
ganho um campeonato.
81
apaixonei-me pelos teus olhos
antes mesmo de enxergar que
você seria minha paixão.
82
um dia estarei
sentado na calçada
em frente da casa que
o amor fará morada.
83
adoro quando estamos
a sós na cama e o amor
bate na aorta e nos chama.
84
coloque reciprocidade em tudo,
inclusive naquilo que fizeram
questão que não desse em nada.
85
e que cada estrela
incontável do céu
seja um beijo que
eu ainda não te dei.
86
em tão pouco tempo, tanto.
87
5. Saulo Pessato
88
Ele não
89
Linha dura
90
Poeminha esquisito
Segundo me consta:
terceira esposa
e primeira dama.
Somos
nos costumes
conservadores,
mas liberais
nos numerais
ordinais.
91
Sem paciência
Sem paciência
com gente incompetente,
com mensagem só de ida
e resposta rarefeita,
fugidia, intransigente.
Sem paciência
com estupidez lisonjeada,
ignorância convencida
e pequenez de si contente...
Sem paciência
a ponto de travar o dente
e sentir o palavrão se anunciar
árvore frondosa
que arrebenta calçada, destrói a frente
da casa e entorta até o asfalto,
ainda que, sem paciência para brotar,
seja só semente.
92
Messias
Bruta piada!
Elegeram um messias
o Messias...
Gente tapada
ou tapeada?
93
Fake News (a mentira e o ódio)
A mentira
tem perna curta,
é dura e não dura,
usa botina;
a verdade
é bailarina.
94
Substrato
ódio envenena
amor fertiliza:
aplica-se ódio
e a vida perece;
aplica-se amor
e a vida floresce.
95
Hipocrisia – Acróstico
Honrado
incorruptível
pragmático
ousado
confiável
rigoroso
inovador
sincero
idôneo
amanhã descobrirão ser tudo errôneo.
96
Cargo público
Eleição, no Brasil,
é dar porcos
às pérolas.
97
Comitiva
98
Embaixaduque
Quem diria
que para o cargo mais alto
almejado no salto
da diplomacia
a disciplina a ser dominada
era algo tão nada
como a fidalguia.
99
Decreto das armas
Presidente imprevisível
- Compre um fuzil!
Falta um fusível...
100
Inteligente
Político honesto,
inteligente,
não dá vexame,
acaba com o problema,
a doença,
rasgando o exame.
101
Destorcida
Brasileiro médio
é mesmo uma comédia:
para desfilar contra
a corrupção
veste a camisa da Seleção,
mas, desde que roube
para o seu time,
grita até gol
para Juiz ladrão.
102
O espelho
103
ASSASSINATO DE LÍDER INDÍGENA
Sinais de fumaça
Líder Waiãpi
é morto no Amapá.
A tribo pede socorro
ao governo brasileiro,
mas o líder dos governantes,
que era antes garimpeiro,
ignora a dor das facadas
e sente que a vista embaça
para ler sinais de fumaça.
104
ASSASSINATO DA FLORESTA AMAZÔNICA
O sono do omisso
A alma da floresta
à cidade escurece,
deixa-a noturna,
faz-te uma prece
para que durmas
à luz de candeia
enquanto seu corpo,
longe, incendeia.
105
ASSASSINATO DE UM MÚSICO CARIOCA
Oitenta tiros
106
ASSASSINATO DE UMA VEREADORA
Não se chateie
com a quantidade de coisas ruins
prevalecendo sobre as boas
na música, no cinema, na arte.
Na política!
Sempre foi mais fácil produzir lixo
do que que cultivar flores.
108
6. Arzírio Cardoso
109
Lunix
Como se saltasse
De trás de uma grande moita
A luz irrompeu aflita
Afoita
Rompendo a noite com seu machado
Com sua foice
Com seu açoite.
Tomado de assalto
Sem tempo para apelos
Atropelos, sobressaltos
De seus alvéolos, subtraído
Seus elos, desintegrados.
¡Quanto alvoroço
Por nada!
Soubesse o dia
Que o alvo da noite
É a alvorada.
110
Oásis III
Descansa.
111
Amuletos
Amuletos?
Nem de muletas!
Milagres?
Me larguem!
Aqui, trevos não se atrevem
Figas não me fisgam
Ferraduras não me ferram.
Em abrir portas a murro
Fio-me mais do que em sussurros
Enviados a ninguém.
Para que a porta sucumba
Não tem reza
Nem macumba.
Aos diabos, seu abracadabra.
Meu pé de coelho
É um pé-de-cabra.
112
Alvos
Salvo ressalvas
Ninguém estará a salvo.
Sua pele pode ser escura
Ou muito alva,
A morte não vê cores
Só alvos.
113
Corônicas de quarentena: ¿Até tu, barão?
115
7. Vandei Oliveira
116
Vim à vida a passeio,
eu passarinho
Bem te vi a vida
Passar...
117
Estou um caramujo existencial,
cada vez mais concha.
118
Tinha medo de amar
trancou-se,
jogou a chave fora
e ficou com medo de achar.
119
Tinha o coração tão mole
que derreteu-se,
escorreu entre os dedos,
virou mar
120
O desejo mais fundo que tu sente
Que o hálito, que o cheiro de teus dentes
Minha língua também deseja e não mente
(nem amigo, nem parente)
Não dispenso seu abraço, mas prefiro teu beijo com rima.
121
O tempo sopra
As flores de abril
E faz o inverno
Chegar mais cedo
Aqui dentro.
O vento sopra
As dores de abril
E faz o inverno
Ir embora a tempo.
122
Do silêncio
E deserto
Nasce uma
certeza,
é preciso
ser casulo
pra depois
ser borboleta.
123
Em meio
Ao caos
Faça de
Sua casa
Um cais
Se puder
Ame mais.
124
Existe
Um
eu
dentro
de
Deus
125
Na solidão
O silêncio
Grita mais
Que mil
Poemas
126
Não basta
Preencher
Meu vazio
É preciso
Transbordar
127
No vazio que me deito
Até fazer cama
Cada parte do
Meu peito
Devora a
Solidão
A
Solidão
Devora
cada parte
do meu peito
até fazer cama
no fazio que me deito
128
O sertão
Me fez
Ser tão
Humano
Que ser
Humano
Me faz
Sertão
129
Eu passarinho
Bem ti vi chegar,
Com a beleza
Da beija flor
E a cantoria
Do sabiá
130
Quem diria, que um dia desse chegaria,
O mundo isolado em casa,
Devido a uma grande pandemia?
Quem diria, que a coisa inverteria,
As casas cheias de gente
E as ruas todas vazias?
132
Dias que
acordo Cinza,
Por ser só.
Tua poesia
Me faz luz,
Por ser sol.
133
A poesia
é como
o canto
da cigarra,
incomoda,
encanta e
transforma.
134
Uma mulher
semente
Quando Nasce
Flor de luta
Mesmo depois
Do luto
Continua a ser
Presente!
135
Você
me
faz
Cor
Ação
Flor
E ser.
136
O verbo se
fez carne
Na cor do
Povo Oprimido
Na dor do
povo sofrido
No verso
encarnado
De sangue.
137
8. Brunno Leal
138
Gosto
Do beijo demorado
Do beijo de reencontro
Do beijo que guardava
Uma saudade
Pra muito além
Daqueles lábios
139
Revirei a casa inteira
De ponta a ponta
Todos os cômodos
Todos os cantos
O armário que você gostava
O closet que você usava
Pus a casa do avesso
Em vão.
Não encontrei roupas
Nem objetos
Nem pretextos.
Da sua ausência
Você só esqueceu de vir buscar
A minha saudade.
140
Se isso que você pensa
Ser amor
Só te leva às lágrimas
E em momento algum
Te levou a sério
Então isso que você pensa
Ser amor
Não te levará
A lugar nenhum
141
Quando você desejar partir
Por favor avise-me.
Desde criança aprendi
Que quando alguém vai embora
Da nossa casa
Precisamos acompanhá-la até a porta
Pra que mais cedo ou mais tarde
Essa pessoa retorne.
Por isso quando estiver de saída
Avise-me
Porque assim como eu
Meu coração foi criado
À moda antiga.
142
Acho que você não percebeu
Mas no nosso último beijo
Eu debrucei sobre a tua boca
Pra ver se dali avistaria
Os segredos dessa coisa tua
Que inventaram de chamar
Saudade
143
O amor é uma montanha-russa
Onde quem não fecha os olhos
E não se arrepia
Com as suas quedas
Com os seus loopings
144
Estou trancado dentro de um coração
Cujo dono atirou as chaves fora
Mesmo que eu grite ninguém ouvirá
Chuta com força a porta de saída
E nada.
Não sei onde mora a lógica nessa prisão
O amor não é absolutamente nada além
Da liberdade
E da espontaneidade de querer ficar.
Socorro!
145
Olhar para o fim de uma história
Uma história como tantas outras
De muitos momentos bonitos
E alguns nem com tanto
Lembrar de toda a trajetória feita
Os pontos altos e baixos
E ter a tranquilidade de dizer
Não guardo mágoa de ninguém
146
Você é a mulher mais bonita do mundo.
Sim, é exatamente isso que você é
Você é do mundo
É do mundo porque escolheu ser
(ou foi o mundo que te escolheu?)
Adeus.
Adeus, meu amor.
147
O amor
É uma atitude tomada
No gargalo
Num botequim sujo
Numa conta pendurada
Numa ressaca de dia seguinte
Num juramento pra nunca mais
Num arrependimento
Ou numa felicidade
De continuar insistindo
E querer mais uma dose
148
(Re) amar é
Superar os orgulhos
Reconhecer os excessos
Respeitar o tempo a só
Perdoar palavras erradas
Silenciar sentimentos negativos
E construir pouco a pouco
Tijolo por tijolo
Um novo recomeço
149
Amar é lar pra morar no outro
Amarelar os dias nublados
Amar é ler seus pensamentos
Amar é linha torta
Amarelinha
Até o céu
150
Dobrei a esquina
Diversas vezes
Até fazer um barquinho
Que navegasse na saudade
E me levasse até você
151
Passado toda aquela dor
Olhou-se no espelho
Viu aquele reflexo
-um mero reflexo?-
Arregalou os olhos
E perguntou a si mesma
“Deus do céu,
Por onde andei?”
152
Essa ponta de esperança
Que carrego dentro de mim
É uma despensa pequenina
Com tudo que acumulei de ti
Na expectativa de atravessar
O inverno dos próximos meses
Que o coração inventou de chamar
Saudade
153
Às vezes tenho a impressão
De que os dias passaram
Mas esqueceram de me levar
Fiquei preso nesse eterno hoje
Onde a saudade
Insiste em me lembrar
De toda essa tua
Existência
154
Por vezes o amor demora
Porque o caminho precisa ser tortuoso
Necessita vencer as intempéries
E superar as adversidades
(Quem já viu um amor sem qualquer dificuldade?)
Pra quando enfim esse amor chegar
Apenas pedir colo
E sem nenhuma palavra, dizer
Me cuida
155
Às vezes
A única coisa de que preciso
É da sua mão
Pra acabar com o medo
E do coração
Pra acalmar o peito
156
Olhos que dançam dizem adeus
Quando adormecem
Se não esquecem
O colo do tempo
É o teu colo.
157
Quero ser dono de uma paixão bêbada.
158
9. José Danilo Rangel
159
01.
O SILÊNCIO COMO ALARME
160
02.
UMA ESPERANÇA
161
03.
VELHO TEIMOSO
162
04.
NINGUÉM DIRIA
Tamanho 2020,
Ninguém diria que a gente ia tá banhando
as compras, pacotes de arroz, feijão,
caixa de leite;
Mas é isso...
Ninguém diria que a gente ia tá lavando
tanto as mãos
com água e sabão e álcool em gel,
Que álcool em gel seria o novo ouro,
Que espirro e tosse iam causar
tantos olhares e medo,
Mas é isso...
Ninguém diria que a gente ia ter
que escolher entre viver ou salvar
a economia,
Ninguém diria...
E ninguém poderia imaginar
que nem assim existe trégua,
Em plena pandemia,
mais que a vida, importa
a ideologia.
163
05.
SEXTA SANTA, MEDOS E O MERCADO
02. O medo arrasta as pessoas para os pés dos deuses. Medo e haver
necessidades e mais o medo de
não conseguir atendê-las. Cultuar por medo e ainda mais quando
com mais medo. Daí, de haver o
medo e deuses contra o medo, pra enfrentar o medo. E se acabasse
o medo, tais deuses seriam
aposentados?
04. Muitas pessoas creem nisso de “só uma gripezinha!”, afinal, foi o
atleta que disse, o mito. O bom de
ser fanático é isso: não precisa se dar ao trabalho de questionar, é só
vendar os olhos e seguir,
ignorando o mundo e a gente toda morrendo de gripezinha...
164
06.
EFEITO CRISE
165
7.
DENTRO DE CASA
Me impressiona o modo
como os muros se apropriam
da gente, seus limites, sua dureza,
o cinza do reboco,
E como o avanço disso
me inquieta.
166
08.
O DISCURSO DO LOBO
167
09.
SELVAGEM
168
10.
DEPOIS
Depois
ainda seremos
nós,
Mas já
seremos outros.
169
11.
TENSO
170
12.
MITO DO MOTOBOY
Os sísifos de hoje
não sobem pedras,
fazem entregas,
Rodam
pra máquina rodar.
Assim
os deuses do capitalismo
condenam:
Suas penas não são leves,
mas como a vida,
são breves,
Os sísifos de hoje
gozam dessa sorte:
Da morte.
171
13.
O QUE PERDEMOS
A capacidade de sonhar?
Não perdemos.
A capacidade de confiar
completamente?
Não perdemos.
A capacidade de amar
numa total entrega?
Não perdemos.
Ao longo dessa vida,
às vezes, tão dura,
Se perdemos algo
é a capacidade
de ignorar
A realidade.
172
14.
NÃO A CARNE
Coisas
que não confessarei,
sombras, lâminas,
angústias,
Andam a me espreitar
como lobos famintos,
sanguinários
Ansiando o momento
de me dilacerar!
Não a carne,
mas a outra parte
viva.
173
15.
MANHÃ, CHUVA, DESÂNIMO
01.
A noite toda embaixo dágua,
a cidade acorda úmida e fria,
mas vivamente mal educada,
Minha irmã revida, xinga,
buzina, espragueja.
Vamos pro trabalho.
Com um pouco de dor
nas costas e vontade zero
de me levantar, momentos
antes, me levanto.
A primeira vitória do dia
é contra mim mesmo,
venço e me sinto derrotado.
02.
A vida era mais leve quando
eu não percebia o risco
de poder durar um século,
A vida.
Pode ser que sim,
eu tenho medo.
Cem anos disso.
“Você está vivendo a vida
que viveria pela Eternidade?”
Porra, Nietzsche,
tá ruim aguentar a semana...
Cala a boca!
03.
Muitas vezes sentimentos
me afundam bem fundo
em suas atmosferas,
174
Me inundam e afogam.
O que não é nada ruim
com a alegria,
Tem vez que estou contente
e a vida é carnaval.
Mas tem dia, meu amigo,
que é osso.
Hoje estou desanimado
e chove, chove muito
E sinto que essa chuva
não para nunca mais.
175
16.
GESTO DE AMOR
No amor
tem muito mais
valor
O que se diz
sem dizer nada.
A mão que busca
a outra,
Os olhares rindo
num encontro.
O gesto de amor
é ele mesmo
manifesto.
176
17.
TRANSVERSAL
177
18.
BOA NOTÍCIA
178
19.
A DOR E DESCAMINHOS
01.
Há dores que não podem
ser aproveitadas, pensei,
dores que apenas doem,
mais nada.
02.
A farmácia tem muita luz
e todos os farmacêuticos
parecem saber do que falam,
Entro andando com cuidado,
meu joelho dói e não quero
que ninguém saiba.
Não quero que ninguém
me veja puxando a perna,
andando estranho,
Tenho vergonha.
179
Disfarço.
Talvez esse joelho
(que reclama)
me ensine isso:
Disfarçar é preciso,
disfarçar a dor
pra não passar vexame.
Penso.
A dor de pisar,
de andar, seguir em frente.
Abstração demais,
eu acho e rio.
03.
Talvez
alguém puxando a perna
seja menos estranho
que alguém rindo só,
É o que penso
entrando na farmácia
e rindo só, penso.
Disfarçar é preciso.
04.
Há dores que não podem
ser aproveitadas?
Dores que apenas doem,
mais nada?
Penso.
A dor do joelho me
atrapalhando o passo,
me obrigando aos disfarce.
180
05.
Chego no mercado cheio,
vozes, preços, risos,
E aí, beleza?
Beleza!
Já peguei o frango,
o cuscuz, o leite,
e já tô na fila.
O que será bom
pra um joelho que dói?
Penso.
Talvez esse joelho
que reclame me ensine
que cuidar é preciso.
Talvez.
06.
Chego em casa pensando
em todas as dores do caminho,
eu querendo andar em linha
reta
E sem poder, por que
doía.
Muitas dores me ensinaram
a andar errado
E me ensinaram a disfarçar,
pra que não rissem de mim.
(Eu pensava que iriam
rir de mim.)
Até pensar em ouvir
a dor e falar da dor,
penso,
Quantos descaminhos...
181
20.
NADA MAIS DE SONHO
182
10. Brendow H. Godoi
183
com ou sem mim
na prateleira da lembrança
restará apenas a sensação
empoeirada
de que conhecê-la fez do passado
um mero ensaio,
um treino antes de ser exposto à
sua incandescência.
185
triste em legítima defesa
eu te amo
te mastigo, te tolero
te odeio
e fico assim,
triste em legítima defesa,
sem saber onde enfiar cada quilômetro
de mágoa do meu peito que sussurra teu
nome toda noite.
agarro-me
186
à toda e qualquer
vírgula que me lambe a cara por pena
enquanto exumo as lembranças
desse amor sem caráter
tentando me convencer de que alguns
poemas
terminam antes de virar a página.
187
malária
juro
é todo dia
todo santo
dia.
188
aquele ordinário dá uns trocados para
um pivete
bater boquete e fazer o nome do pai
ajoelhado
diante do altar sagrado.
é, pescoço
não posso te ajudar, estou no fundo do poço
e estou chateado,
quero cortar o meu pescoço, é verdade,
bem lembrado.
189
psicanalista
190
porque
no verão é sempre uma correria
e o consultório não parava limpo nem por
reza braba.
191
nota
192
jornal local,
mas no meu coração,
não.
canibal de estrelas
revisitei a minha
infância
debruçado na janela do meu
quarto.
tudo
mudou
muito muito muito
muito [mas eu continuo o mesmo].
194
[até então intransponível].
195
poema branco
logo eu.
eu.
pequenininho dentro de uma
gaiola
querendo colocar o mundo
dentro do bolso
ou em poemas atemporais ou
no termo de posse de um
concurso foda
ou no reencarnar daquilo que eu
não pude ou deixei
de fazer.
197
evangelho segundo lucas
pro inferno.
199
poema de amor
mostre-me os peitos
e eu te escrevo
um
poema de amor.
201
meu grande amigo
“caramba”
disse espremendo um sorriso de
criança e tentando arrumar a bagunça.
202
perguntou de mim
mal comecei a falar e me pus
a chorar.
203
pedimos a conta
e mais uma vez [como em todas]
ele fez questão de pagar sozinho.
meu grande
e melhor amigo.
204
11. Arthur Diogo
205
1.
Pensando bem
a imortalidade
não é tão burra assim.
A lembrança
que deixamos aqui
nos mantém
vivos.
Vivos,
vivos,
vivos...
207
2.
16 anos de casamento.
Tarde demais para desistir;
tarde demais para recomeçar;
tarde demais para o amor.
16 anos de casamento
e tudo o que sobrou
foram insultos
e noites mal dormidas
e contas para pagar.
208
Ele fica em casa
sem ninguém para ligar,
sem ninguém para ligar.
16 anos de solidão.
Tarde demais
para voltar atrás;
cedo demais
para o amanhã
que nunca virá.
Tarde demais
para dizer
eu
te
amo.
209
3.
Ela gritava
e não tinha medo
da vizinhança escutar.
210
Puxou pelo cabelo
e o jogou no chão.
Ele levantou
com mais ódio ainda,
tirou a peixeira
que estava em sua cintura
e foi pra cima.
211
O sangue jorrava
e ele gritava em agonia
antes de finalmente morrer:
Ela corria,
possuída pelo ódio.
Era ali
que ele a traía
quase todas as noites
com uma viúva.
212
Hoje vive numa solitária
e dizem que todas as noites
ela grita em desespero
ao sentir os bagos do seu marido
em suas mãos.
213
4.
É assim que é.
A merda
sobe cada vez mais
na latrina
e chega cada vez mais perto
do nosso rabo.
O ‘pensar no pior’
nunca foi tão real.
Somos bombardeados
diariamente
por péssimas notícias
e não sabemos
em que lugar
podemos encontrar abrigo.
Nesses dias
eu penso em todas as pessoas perdidas,
que se sentem fodidas <ainda mais>
e choro junto delas.
215
O pior
é constatar
que estamos abandonados
por aqueles que deveriam
nos amparar.
Talvez o melhor
seja fugir disso tudo,
para o bem
da nossa saúde mental.
216
6.
É claro,
esse negócio de amor
é complexo falar.
Estamos praticamente
todos muito ferrados nesse assunto,
mas não custa acreditar
que um dia vamos esbarrar
com uma pessoa
que vai nos fazer tão bem,
que vai dar vontade de foder com ela
pro resta da vida.
217
7.
Por medo
ou por puro
capricho.
É só aceitar os termos
e se jogar
torcendo
218
para que não acabe
novamente
em tragédia.
219
8.
Gozar a carne
com quem goza
por nossa alma.
Não há nada
mais excitante
que isto.
E até mesmo
os mais doloridos,
desapegados
e descrentes
ainda desejam
sentir esse sabor.
220
9.
Essa garota
que me capturou
em algum lugar perdido,
onde as paredes dos labirintos
são repletas de mistério
e de lembranças
doloridas.
- Você é diferente
do que eu pensava -
ela diz.
- Como assim? -
eu pergunto.
- Eu já estou quebrado,
mas quase ninguém consegue ver.
No fim
ela acende outro cigarro
e se vira sorrindo
para mim.
Ficam passando
na nossa cabeça
como um filme bom
que a gente não cansa
de assistir.
O foda
é que esse mais
parece distante.
223
10. Quando falo em solidão.
224
11.
Sorrisos
e mais sorrisos.
No ônibus,
no trem,
no metrô.
Nas lojas,
nas lanchonetes,
no centro da cidade.
Nas universidades,
nas empresas,
nos chão de fábrica
<mais raro, é verdade>.
Sorrisos
e mais sorrisos.
Em casa,
no facebook,
no instagram.
Sorrisos
e mais sorrisos
e nada mais
que sorrisos.
Eu vejo
também
uma angústia
e uma tristeza
que tomam conta
dos olhares.
De noite,
eu tenho certeza,
essas angústias
e tristezas
e soltam
e se libertam
pelos mesmos olhos
que passaram o dia
sendo prisão.
Sorrisos
e mais sorrisos.
Me perguntaram
porque eu
não sou de sorrir.
Bem,
o mundo já tem
sorrisos falsos
226
o suficiente.
Sorriso
não é sinônimo
de felicidade.
E eu
não me permito sorrir
enquanto por dentro
eu estou morrendo.
227
12.
A vida real
não tem filtro
e nela
estamos todos
de certa forma
fodidos.
228
13.
Por isso,
meu bem,
cuidado no próximo amor.
229
14.
Você chegou,
beijou,
chupou,
sentou,
gozou.
Foi repentino,
explosivo.
não estávamos
preparados.
Foi intenso,
porém,
efêmero.
Ou de acender
um cigarro perto de você
e te escutar reclamar
da fumaça.
Nem mesmo
de desenhar teu corpo nu.
De marcar
tuas iniciais
em alguns poemas
de desilusão.
As duas letras
que minha cabeça gritam
quando estou em frente
àquela pousada.
231
Mas aceito o fato
de ter sido apenas
uma transa,
um caso.
Eu só não aceito
essa tua mania
de entrar nas minhas lembranças
e foder comigo
quando já estou perto
de esquecer
nosso momento.
E o pior
é que você
nem sabe disso.
232
15.
- Você tem cara de safado - dizia ela subindo no meu colo - e o me-
lhor é que seu membro mostra exatamente o mesmo.
233
16.
M era uma criatura singular, por assim dizer. Tinha muito o que ofe-
recer, mas o pouco já satisfazia seus homens. E era isso que a in-
comodava. Ela se sentia insuficiente, sem perceber que insuficiente
eram os homens.
Todos eles se assustavam com o jeito M de ser. Isto é: livre, sem me-
dos, sem preconceitos, impulsiva. Fazia todos eles se sentirem pre-
sos, até mesmo aqueles que se julgavam mais livres. E era isso que
eles evitavam. A sua liberdade. Eles não queriam voar com ela. Eles
temiam que a volta fosse dolorosa. E de fato era. Aqueles que ousa-
ram acompanhar o seu ritmo acabaram por descobrir que era algo
impossível. Ficaram pelo caminho, todos de quatro por ela, aos pran-
tos.
234
17.
O que nós não sabemos é que nossa força permanece aqui. Ela não
desapareceu. Apenas está descansando, e te obrigando a ter um des-
canso também. Nós não precisamos ser fortes o tempo todo. Nós
não somos feitos de pedra. Somos feitos de carne, osso e, no caso das
melhores pessoas, também de sentimentos. E por isso sangramos. E
não há nada de errado nisso.
Não, não vou falar pra você levantar, enfrentar as merdas da vida.
Tampouco para você se acomodar e aceitar a condição. Mas eu que-
ro dizer que esses momentos são mais do que normais. São também
necessários. É claro que não é bom chorar, paralisar. Mas esses dias
também são cruciais para te lembrar que você é humano (a), e não a
porra de um robô programado para não sentir. Sinta sim. Dá alegria
até a tristeza. Permita-se ir do céu ao inferno e do inferno ao céu. E
assim descubra que você não nasceu para se foder <mais>.
235
12. Giovanna Vieira
236
1.
237
2.
Estou deitada
mas a casa não me deixa dormir
ela balbucia algumas palavras
que de início não consigo entender
então ela grita seu nome dizendo que
sente saudades de você
e rangendo as portas meu coração respondem:
“eu também, eu também”.
238
3. Fusão nuclear
239
4. O poema mais bonito do mundo
240
5. Me desculpe por não poder ficar
Me desculpe por não poder ficar, preciso que você entenda que
eu quero mas nós estamos em tempos diferentes e eu não posso te
machucar, não posso te quebrar, não posso te fazer desacreditar no
amor, não quero ter em minhas mãos o sangue de um coração par-
tido.
241
6.
243
8.
Venho te sentindo das mais diversas formas.
Esses dias te senti na ponta da língua, quando ela tocou o brigadei-
ro pelando e logo te senti ali, quente, e sorri ao lembrar em como
você vivia se queimando por comer tudo direto da panela com o
fogo ainda aceso.
Te senti nas gotas da chuva que tocaram minha pele como você
tocava enquanto dançávamos na sala em um dia frio. As gotas bor-
raram minha maquiagem como você borrava meu batom...
É incrível como venho te sentindo das mais diversas formas, cores
e sons... sexta-feira por exemplo, te senti naquela música que toca-
va sempre na rádio e você aumentava no último e cantava, a como
você cantava, e eu era sua fã número um, voz alguma me fazia sor-
rir como a sua me fazia.
Antes de dormir também te sinto... te sinto no cheiro que ficou no
teu travesseiro que agora está ali, sem uso, e que aos pouco vai per-
dendo seu cheiro que se dissipa com todas as outras coisas que você
deixou pra trás...
É impossível não sentir o gosto do teu beijo quando tomo uma
xícara de café ou como o último pedaço de pizza. Mas de todos os
momentos que venho te sentindo, o que mais me dói é quando te
sinto na saudade...a e como te sinto...
Mas tudo bem, amanhã talvez eu sinta um pouco menos ou um
pouco mais, não sei, mas tenho certeza que vou ficar bem, pois
por mais amor que eu senti e ainda sinto por você, eu venho me
reconstruindo ainda mais forte do que já sou e buscando me sentir
mais até que eu me sinta por completo como sempre deveria ter me
sentido...
Adeus.
244
9.
Você sente falta dos beijos não dados e das noite não dormidas ao
meu lado ?
Me faço essa pergunta desde que o seu lado da cama ficou repleto de
lembranças e um vazio que tem o teu tamanho.
Os cômodos da casa ainda não se acostumaram com sua ausência, a
prateleira anda perguntando sobre os livros que ali ficavam e minha
escova no banheiro agora vive só.
A noite ouço ruídos de saudades pelas paredes e tua voz ecoando em
alguma dessas lembranças que você esqueceu de levar.
Na porta da geladeira ainda tem um dos post-its que você me escre-
via e colava pelos cômodos toda manhã com recadinhos e piadas
nossas, e seu cereal favorito ainda está fechado bem ali no balcão da
cozinha.
Tem um pedaço teu em cada canto dessa casa que antes era palco do
nosso amor e agora se tornou um relicário de momentos bons que
vivi ao seu lado.
A casa Ainda não está pronta pra dizer adeus ...
E eu também não...
245
10.
Esquecer você não é como se eu pudesse enfiar a mão no meu peito
te arrancar de lá, esquecer não é fácil.
Ontem eu achei que tinha conseguido mas hoje, hoje eu vi uma
foto tua e tudo aquilo que venho tentando afastar da minha mente
voltou.
Voltou tão rápido que eu não fui capaz de conter e de repente feito
um parasita você havia se instalado na minha mente.
Não fui capaz de comer porque havia um nó em minha garganta e
borboletas ocupando todo meu estômago.
Não fui capaz de pensar porque todos os meus mecanismos de de-
fesa tentavam te expulsar da minha mente.
Dessa mesma mente que desmente todos os dias a esperança que
ainda tenho de você voltar...
Mas você não vai voltar né?
Você escolheu partir e eu não posso impedir isso.
Eu tentei eu juro que eu tentei mas a cada tentativa de te esquecer
era uma lembrança a mais que eu tinha de reviver.
É que você faz tanta falta
Eu sinto falta do teu cabelo
Eu sinto falta da tua risada irônica
Eu sinto falta de te ver me olhando mesmo quando eu estava desca-
belada...
Acho que te esquecer não vai ser possível, mas eu prometo que vou
tentar te transformar.
Vou tentar transformar tudo isso que eu sinto por você em uma
lembrança boa.
246
E assim quando a falta virar saudade vou colocar aquele nosso úni-
co disco de vinil pra tocar pela última vez, aquele vinil que a gente
comprou por cinco reais e o deixamos tocar a noite toda...
E finalmente eu vou sorrir sem dor ou mágoa de nós dois, e então
vou me despedir...
mas te esquecer pode ter certeza que não vou...
247
11.
13 de Setembro
Quando os abraços diminuírem
E as certezas forem morrendo
Quando tudo se resumir a vagas lembranças
E a vontade de estar perto não for suficiente
Quando o amor não for suficiente
E a noite tiver cor de desesperança
Deixe que teus olhos conduzam as lágrimas
248
12.
Ainda vai doer
Vai doer tanto que você vai desejar nunca tê-lo conhecido
Ainda vai sonhar inúmeras vezes com os momentos que não pude-
ram viver
E vai suplicar aos céus pedindo pra que leve a saudade embora
Antes mesmo dela chegar
E quando você achar que acabou
Que a dor dissipou
Ela vai voltar pra se despedir
Vai te fazer chorar uma ultima vez
E reler a aquela carta de amor que ele não te entregou
Mas você encontrou ali na segunda gaveta da escrivaninha
E então em um dia qualquer
Você vai acordar, lavar o rosto
Ouvir alguma canção
E finalmente perceber
Que a dor fechou as portas,
Entregou a chave do teu coração
E part iu
Deixando a casa pronta para um dia
Outro alguém entrar e fazer morada.
249
13.
Essa falta que você me faz
É um escárnio para meu peito
Que em prantos se desfaz
Aqui jaz um coração partido...
250
14.
“Obrigada pela visita”
Antes de sair devo lhe agradecer por ter feito do meu peito morada,
mas agora está na hora de organizar alguns móveis que ficaram fora
do lugar desde o dia em que você partiu.
Foi doloroso te ver saindo pela porta da frente do meu coração, dei-
xando a chave bem ali pendurada no átrio direito para que o próxi-
mo morador pudesse encontra-la com mais facilidade.
Não sei quando estarei pronta pra deixar outro alguém entrar pois
ainda preciso reestruturar muitas coisas que se quebraram com seu
adeus mas sei que se deixar a porta aberta eventualmente alguém
pode me oferecer uma mão (e um coração quem sabe) pra me ajudar
na reforma.
Sabe, quando você chegou eu não imaginava que seria um simples
visitante e com o tempo me acostumei com tua presença ali dentro
de mim e agora que a casa está vazia meus sentimentos gritam lá
dentro e o eco é a única voz que ouço.
Agora você partiu mas devo dizer que de certa forma uma parte sua
ficará comigo, vou emoldura-lá pra que o próximo morador saiba
que você passou por aqui e acrescentou muito em minha vida.
aproveite sua nova jornada e obrigada pela visita.
251
15.
Obstrui minha artéria com um amor inexistente...
Infartei.
252
13. Alf
253
quis tanto te encontrar
em cada rua, em cada canto
em cada pessoa, em todo lugar
de tanto te procurar
me encontrei.
254
fui embora protestando, fazendo o maior barulho
para que você soubesse que não queria ter ido.
mas é isso, quando um não quer dois não amam.
255
quem faz teus olhos brilharem
quem faz você sorrir de orelha a orelha
e te alegra o coração
quem faz você feliz
é feliz contigo ?
256
amor não é o que você diz ou escreve para alguém. isso é fácil e o
amor vai além.
amor é tudo aquilo que você faz pela pessoa
amor é gesto
é ação.
257
não existe uma fórmula para fazer dar certo. a reciprocidade é es-
sencial, claro. entretanto, mesmo que seja reciproco não há a cer-
teza de que a coisa toda vai acontecer. o amor não é o resultado de
uma fórmula já pronta, ele é uma dessas contas que tomam o qua-
dro inteiro e misturam letras, números e símbolos que a gente não
sabe de onde veio e nem para onde vai.
o amor é simples, a formula dele que é complexa
258
eu estou sempre esgotado
dormindo pelos cantos
exausto da faculdade, do ônibus lotado de manhã cedo, do trabalho
e da rotina
mas eu nunca me canso de estar com você.
259
sempre que olho pra você
a escola de samba que carrego no peito
faz um desfile de carnaval.
é que quando a gente se encontrou
teu cheiro ficou grudado em mim
e não saiu mais,
como amaciante de roupas.
depois do nosso beijo
teu gosto perdurou na minha boca.
o sol do teu sorriso que me ilumina a vida
agora aquece os dias mais frios.
é que você chegou e então tudo me cabe
tudo me é possível.
260
algumas feridas levam mais tempo que outras para cicatrizar, tudo
bem por isso. é importante acompanhar todo o processo de cicatri-
zação e perceber como a dor vai diminuindo com o passar dos dias,
assim como não vai doer para sempre, tocar na ferida uma hora
não te afetará mais.
261
você precisa aprender, para o seu próprio bem, a ir embora quando
não há mais reciprocidade, quando o esforço e interesse vem só de
um lado, quando a vontade de estar, de fazer acontecer é só de um.
você não pode empurrar tudo com a barriga morando em dores e
amando por dois.
262
cultivamos a mania de querer tudo pra ontem, do dia pra noite,
colocando sempre a carroça na frente dos bois. esse imediatismo,
atrapalha a real percepção de que tudo tem seu tempo. calma, um
dia por vez. não se planta a semente hoje para colher o fruto ama-
nhã. mudanças precisam de tempo, umas mais tempo que outras
até.
263
mais importante que o destino é o percurso, é toda a caminhada e
o tempo que você levou para chegar. não é do dia pra noite, é um
processo. crescer requer tempo e paciência.
264
a vida é um ciclo e pessoas entram e saem de nossas vidas o tempo
todo. Aquele laço que achamos que é forte e duradouro se desfaz
com a brisa mais leve e pouco tempo depois surgem outros laços.
precisamos reconhecer e aceitar que as coisas terminam mas nós
continuamos, a vida e os ciclos continuam. tudo bem demorar um
pouco pra entender isso. a vida acontece com aqueles que ficam.
265
a falta é tudo o que sobrou do que fomos um dia.
sinto sua falta,
depois de acordar
e antes do dormir.
da pontinha dos teus pés
até teu último fio de cabelo.
sinto sua falta por inteiro
como o filho chora a falta da mãe,
o alcoólatra a falta do álcool
e o drogado a abstinência da droga
sinto sua falta.
266
quem parte sempre deixa algo. uma camisa na bagunça do guarda-
-roupa, um sms que não foi apagado do celular, fotos e vídeos em
uma pasta qualquer no computador, compras na fatura seguinte do
cartão de crédito, o par de meias que nunca era encontrado e que
agora está sempre no mesmo lugar: no fundo da gaveta. quem parte
nunca vai, quem parte sempre deixa algo pela casa ou no coração
de quem fica.
267
morro de inveja desse cigarro barato que a fumaça te impregna as
vestes e o cabelo
morro de inveja desse cigarro barato que você segura nas mãos
com tanta destreza e prazer
morro de inveja desse cigarro barato que te toca os lábios e entre
um trago e outro te rouba um beijo.
268
aqui na comunidade saimos todos os dias sem saber se voltamos vi-
vos para casa. pra quem não sente na pele, é exagero. mas aí a gente
morre e vira só números mesmo. é tiroteio, abordagem da polícia
só com preto em busu cheio, levar tapa na cara por causa do cabe-
lo, morrer sendo inocente porque preto é tudo bandido né? farda,
caderno e carteira de estudante no bolso e ainda assim sentir o ba-
culejo da pm por fazer nada e ser suspeito, sem falar no racismo de
todo dia que vai matando a gente por dentro... coisas demais nos
matam diariamente, mas pra quem não sente na pele é so exagero.
e agora tem um vírus aí que quando subir na comunidade vai ser
um carnaval, onde quem queima na quarta somos nós. aqui todo
beijo, tchau, bençã e abraço dado soa como despedida. cê louco tio.
269
14. Lineker Campos
270
sempre achei que estaria
destinado a solidão.
no fundo, sempre imaginei que nenhum
dos meus sonhos seriam realizados.
talvez as pessoas tivessem razão,
era preciso me submeter
ao que não me fazia feliz.
Mas o que seria de mim?
271
Vinícius,
ele me esperou debaixo
de chuva.
Seu chinelo estava molhado.
Quando nossos
olhos se encontraram
sai daquela lanchonete.
O sorriso entremeio a barba,
aqueceu aquele dia frio.
Em frente ao subway da
rua principal seu abraço
me salvou.
Foi como ser desenhado delicadamente
por suas mãos.
O nome dele, você já sabe.
272
Me apego,
sem anseios,
sem medos.
Me afago no teu toque
e me briso em cada
gota da chuva.
Você, Guaia
canto que nasce
da natureza,
olhos serenos.
do último
orvalho que cai.
Pés, raízes que
são sustento,
alento.
Tu, verbo.
Saudade, presente.
Me habita,
e que agora
faz cócegas
no meu peito.
273
no fundo, mesmo que não
admita, ele te espera.
Sempre esperou.
Ainda espera.
Longos anos se passaram
em meio a crises de ansiedade
e lapsos de saudade,
de coisas que nem sequer
aconteceram.
274
Você se silenciou
quando abri meu peito.
quando desnudei
minha alma.
E se foi.
E aqui, eu fiquei.
275
Eu e minha mania boba de me apaixonar
Eu e minha mania boba de acreditar no melhor das pessoas.
De achar que quem chega demonstrando gentileza
vai ser diferente dos outros...
Mesmo que seja.
É uma incerteza dramática que carregamos,
que descobrimos com tempo.
Aquele famoso benefício da dúvida.
Uma inexistência de realidade.
Eu e minha mania insaciável de tentar mergulhar em águas rasas.
Em lugares que a superficialidade cintila ofuscando
a verdade que transcende os raios do sol.
Deixando me tonto pelas invariáveis
Deixando me anestesiado por conta da nicotina.
Fotografia preto e branca. Silêncio.
Eu e minha mania boba de sentir com a alma.
De sentir com minh’alma.
De acreditar que a profundeza que habita
em mim habitará outros corpos.
Eu e minha mania boba de transbordar enquanto
os outros apenas chegam pra molhar os pés.
Eu e minha mania boba de mergulhar
em águas rasas.
276
eu me perdi durante tanto tempo,
esqueci como era sair sozinho pra ver o pôr do sol.
estava numa espécie de transe,
anestesiado por sua obsessão em me ferir.
em querer me mudar.
preso em uma ilusão criada por
alguma expectativa, ou pelos meus próprios medos;
o da solidão, o de não ser bonito o suficiente,
o de não ser especial, o de não conseguir ser alguém.
sempre ouvi de você que era amor,
quantas vezes me disse “eu te amo”.
a noite quando meus olhos se fechavam
com você me olhando era quando as traições soberbas aconteciam.
eu não via. E em meus sonhos eu tentava fugir.
numa dessas agruras eu consegui, me vi livre de você.
foi a melhor sensação.
me vi livre de algo que nunca existiu,
de um sentimento que não era real.
277
Amei, mas deixei
para me amar novamente
e em atos reais.
Muitas das vezes é
preciso partir,
para se reencontrar.
278
De tempo em tempo
eu me pego sonhando
de olhos abertos,
imaginando o que o
universo me reserva
no próximo segundo.
279
Estão a diluir
o amor,
ou o pouco
que sobrou dele.
280
de um dia para o outro
as coisas mudaram.
e agora me sinto preso
no tempo.
sufocado pela obrigatoriedade
do caos.
ansiando por um abraço que
não sabe quando será
desenhado.
281
esqueceram como se abraça
esqueceram como olhar nos olhos.
a tecnologia sucumbiu as relações
distanciando todos e enfraquecendo
os laços.
agora, quando todos precisam
acordar estão a dormir.
redescobrindo espero o que
jamais deveria ter sido esquecido,
o amor.
282
nas ruas não há ninguém
não se ouve mais os barulhos
das noites boêmias
todos se refugiaram dentro de si.
e diante os dias caóticos
a única coisa que todos sabem é
que o amor os salvará.
283
tem dias que sento
na beirada da calçada
para poder ver os poucos
carros passarem.
quase sempre é noite.
é a única maneira que
encontro de enxergar
as estrelas e não pensar
em você.
284
minha terapeuta sempre me
tranquilizou
em relação as ansiedades que me
entorpeciam.
aprendi com ela a não antecipar
o que ainda estaria por vir.
agora a única coisa que penso é que
não há o que antecipar,
a não ser esperar. esperançar.
285
em dias de amargura me disponho
a dispersar.
apago conversas sem sentido.
é minha maneira
de desvencilhar do que jamais
existiu.
286
em meio ao nada, percebo que
nunca fui bom com encontros
sempre fui o que ficou do lado
oposto da margem.
escrevendo sobre eles e tecendo
momentos bonitos que poderiam
ser palpáveis algum dia
287
A verdade é que ninguém sabe
O poder que tem de causar
Algum sentimento n’outro
Quando se fala de sentimentos
Não há culpados.
Apenas expectativas frustradas
E quem sabe reciprocidade.
288
Minha alma
inconstante
variável,
vaga por aí.
289
14. Wally Wilde
290
Desenvolvendo teorias absurdas a cem por hora em uma mesa
de bar
(ou simplesmente “Darín”)
292
Quase um Frankstein
Te dei meu coração
você levou fígado, rins, pulmão.
Não acho ruim não,
acho até bom.
Sei que em algum lugar longe daqui
você anda tentando me reproduzir
293
BALADA PARA BAUMAN
Me espera parada na porta
sai de roupa muda
pisa leve na escada
vamos ter mil filhos no caminho
vamos ser dois putos
vamo sair do mundo
vamo cair nos fundos
me deixa desaguar seu rio
deixa eu ser seu pobre amigo
morrer 22 vezes
correr atrás de você
deixa eu me fuder
me fode você
vamos cozinhar pro amigos nos domingos
falar sobre filmes bonitos
envelhecer com calma
desejar com pressa
vamos sentir fome
eu vou beber seu canto
devorar seu pranto
eu vou beijar seus sonhos
vou sonhar seus planos
calar sua fome
vou matar seu nome
desenhar um apelido pra você
eu vou te dar motivos
te querer pra um infinito
e pra isso acontecer
só falta você
me dar match no tinder.
294
Mal vital
A paixão é um suicídio lento
Um grande mal vital e indispensável
Como eu e você,
oxidando a cada vez que respira.
295
Vísceras
O que a maioria de nós está fazendo?
pensando que pode enfiar
quilos e quilos de gente dentro do peito.
Achando que a carne aguenta
fingindo que não é de vísceras que a gente é feito.
Que o diesel que aquece os motores
não é um viscoso mar vermelho.
Porque tu andas rabiscando corações nas paredes?
Como se tua casa fosse ter espaço para sempre
Como se sequer fosse possível guardar um incêndio.
Nenhum amor que eu conheço
cabe em um poema
escorre pelos cantos da boca
queima a ponta dos dedos
Por isso vamos morar em outro estado
Por isso mudamos de apartamento
porque nenhum amor que eu conheço cabe em um poema.
E não tem músculo que não arrebente
Eu ouvi dizer que a esperança
era o martírio do naufrago
e que beber cada gota do oceano
era o único meio
o único jeito
de sair inteiro da terra deserta onde atracamos com os dentes
na ilusão de estar se salvando
E não tem músculo que descanse
Quando eu cheguei na tua praia
já desprovido de tudo
Já sem esposa, sem dinheiro
sem amigos e sem um nome
para me valer ou negociar com o diabo.
296
Quando eu me tornei o teu estado
de lábios salgados e os braços surrados
eu me dei ao chão e rezei para o único deus daquela ilha que era eu.
O que a maioria de nós está fazendo?
Enterrando as unhas no peito
A procura de um âmago
Quando eu..
Eu só sei amar com o estômago.
297
Já jurei pelo meu nome tantas vezes no espelho
que nem sei mais como me chamo
Quando ela pronunciou meu nome
de imediato atendi o seu chamado.
Sei que havia jurado; “Nunca mais”
mas fico com teus beijos
minha honra que se dane.
298
Instruções para se falar de amor
299
Estranho bonito
estranho bonito
você não sabe, mas eu ontem te vi na rua
cruzando a avenida entre os carros
de sapatos nas mãos.
me faltam argumentos que expliquem como,
mas tive a impressão de já te saber
como sei dos meus livros.
fiquei olhando em segredo por trás dos olhos você se afastar
]descalço.
com a planta dos pés lambendo o chão.
ainda que você mesmo não soubesse
eu sei onde ias.
ao primeiro bar abarrotado de figurantes bêbados falando em voz
alta
onde pudesse curar com bandaids
teus calcanhares feridos
onde pudesse ascender um cigarro
com teus magros dedos bonitos
e acalmar a garganta com bebida.
eu lá estaria
não para ser tua companhia,
porque como toda uma vida
você estaria só,
mas para ser o copo
que ao interromper devaneios tolos
sobre a arrogância das fronteiras
te beijaria os lábios num gole de cerveja.
de que lugares você vem?
quais foram teus nomes?
o que teu corpo quer?
me aportei perto o bastante para fisgar informação tua,
mas você respondia a quase tudo com silêncio.
tua boca não usa palavras.
investigo,
com a tenacidade de um menino.
mas não ouso, não ainda,
300
a reduzir a distância
contudo fantasio
que no meio de uma noite abafada
você gire a maçaneta do quarto
me invada
e ali, naquela cama vermelha
teu peito nu toque minhas costas nuas
com a textura dos teus pelos
com o cheiro forte das tuas axilas
depois, só depois adormeceríamos e
o mundo ao acordar não saberia nossos sonhos.
estranho bonito que vi outro dia na rua
tenho pensado em teus detalhes
como quem pensa em um parente próximo,
como quem conhece teus bairros, tuas esquinas e o limite da tua
matéria.
faz pouco sentido, eu sei,
mas também os sentidos e a razão
tudo mais tem sido pouco depois de ti.
fiz longas viagens
como me era desejável fazer
peregrinei pela beirada do continente
por terras quentes e distantes de casa
como um dia eu disse que faria
é verdade que me encontrei no mar
descobri que eu era mais forte do que dizia,
mas nada disso foi o bastante para não pensar em você atravessan-
do aquela rua.
cada praia onde estive eram para mim fotografias
nós
dois estranhos imediatistas
com os braços trançados para se proteger do frio
mais sujeitos homem que qualquer outro homem
mais ricos que qualquer barão.
em roupas de banho
sem querer com bolsos
em roupas de banho
mas cheios de vontade
301
certa e derradeira
para dizer teu nome
para pronunciar palavras grandes
para tentar explicar um para o outro
[quem nos dera o mundo]
essas coisas todas que ainda agora não sabemos bem.
logo você
me olharia nos olhos e confessaria
_tenho medo de enlouquecer.
ao que eu responderia
_seremos então dois loucos
um
a curar a febre do outro.
e um dia, após os anos talvez
você questionaria enfim o que somos.
ora, nos somos a fome do mundo
a vida marinha se debatendo no litoral
as raízes crescendo por sob a terra
o motivo das guerras
e a esperança de paz.
somos nossos pais que um dia morrerão
os filhos que virão e
depois deles, somos nós
até o fim apenas.
estranho bonito que vi na rua
de sapatos nas mãos a curar feridas
quando você se for
quando entrar em um carro ou dobrar uma esquina e eu te perder-
de vista
vou te imprimir na memória e carregar a espera comigo
tua ausência ocupará o espaço que era seu
e as ruas onde eu andar
e os lugares onde eu entrar
esperarão também por você.
porque hoje a distância é coisa real
tenho nas vértebras o peso das quilometragens.
e quando por acaso eu te encontrar
terei comigo a vida embaixo dos braços
302
terei os cabelos molhados e a alma lavada
pronto para ir contigo onde não fui,
com o devido cuidado de não mais te perder de vista outra vez.
O teu caminho é só de ida
não voltarei de lá.
303
Quimeras
As Quimeras
tem um jeito que é só delas
de te comer pelas beiradas.
Por uma estrada longa e reta
Tão quieta que você se reduz a ruído
Sussurrando
aumentando gradualmente
possuindo seus braços
sua nuca, sua mente
o coração pulsa infreável
tão rápido,
[não, mais rápido]
que a batida para
passa a pressionar os pulmões contra o peito,
não é um musculo
é um homúnculo
uma criatura imunda
alada
uma besta de asas e garras que quer sair
e você junta saliva espessa
que o faça descer outra vez
Referências obvias
se desprendem da sua cabeça
feito aves que abandonam
a copa de uma arvore
O universo se torna minúsculo
em exata proporção enorme
tourette
os seus bracinhos encolhem
as suas perninhas encolhem
agora um serzinho afundado no banco do carro
Você cai na real
Alice não era narcoléptica
o que ela teve foi uma crise de pânico
“eat me”
O motorista ri muito alto
304
os dentes dele vão te tragar por engano
Dedinhos longos se esticam no espaço
você alcança a maçaneta do carro
sabe que faria qualquer coisa para parar
até abrir a porta e saltar
_Pula, morrer interrompe qualquer história
_Ninguém morre pulando do carro.
Respira
encaixa a cabeça no lugar
se acalma
conta ate três
1, 3, 7
mão na porta
você salta
_Bom descanso senhor, obrigado!
É a fachada do seu prédio
não tem cura
não tem atalho
lama preta
flui da sua cabeça
e se projeta pela boca e nariz
_Espresso essa hora?
_De dentro pra fora não faz mal
Alguns animais dormem de pé
você não dorme
os músculos rejeitam a cama
A pupila dilata
o cérebro dilata
o tempo dilata
o coração de lata
A fé contrai
Mente é impulso elétrico
isso gera palavras que combinadas
correm nas veias e
envenenam o seu corpo.
Eu ontem vi deus
ele me disse “já era”.
Os pensamentos em movimento
305
que começaram lá atrás na estrada
não pararam de acelerar
Movimento retilíneo uniforme
Pane
A soma de todas as forças
é igual a zero
O cabo cessa
o tempo para
para lisia [com amor e verdade]
as orbitas arregaladas
a respiração curta, quase parada
inércia
Acho que em determinada hora
toda guerra é silenciosa
o dia nasce por debaixo na porta
e um mosca pousa em seus olhos.
306
Hey Amigo
hey amigo
não sei bem se por causa dos tempos sombrios que cruzamos
mas tenho pensado em um conto que ouvi na infância
ou que simplesmente inventei e
por causa dos tempos sombrios que cruzamos atribui a minha in-
fância.
Mas ha esse conto
sobre dois homens que se encontram em uma campina e se amam
como só se podem amar dois verdadeiros homens
e seguem ate que acabe
como só se pode acabar entre dois verdadeiros homens
com coragem!
Não
os que vieram antes de nós
e os que vieram antes dos antes de nós não sabiam nada
coragem não é essa enfermidade
que cala a voz e da vida a punhos cerrados
coragem, meu irmão
é humanizar-se.
Vê aquela rua lá fora?
derramaram petróleo e brita no chão
pintaram faixas com suas leis
levantaram concreto alto dos dois lados.
Aquela avenida que você pegou ate aqui
já foi um dia um rio.
Embruteceram essa cidade
fizeram-na crer que precisava ser forte para seguir adiante
o mesmo fizeram com você
Você é triste como o asfalto frio.
Outro dia, durante uma viagem
uma criança se aproximou de mim
com um punhado de terra e grama sobre as mãos e perguntou:
_Tio, isso é uma flor?
Não soube o que dizer, mas aquela criança me lembrou você
que não distingue o pasto seco de um forte a beira-mar
Tua espada e teu canhão não servem a nada
307
pois o medo é teu capitão.
Hei amigo
é cedo ainda
acorda
mesmo que a lua esteja alta
acorda
é cedo ainda
não existe atalho para uma vida mais tranquila
e a velhice prematura não é desculpa para a covardia.
A terra em torpor sob o asfalto
cobra das raízes que sejamos o que somos nós
homens e mulheres
iguais perante a relva
como cavalos selvagens
e não só mais um canalha.
Acorda amigo
que o bundamolismo já adormece outros tantos
e viver enquanto um homem
é apenas muito mais do que isso.
308
Canção para um diabo na estrada
311
RECEITA PARA UM MANIFESTO
Não leve a mal
leve vinho
pense em sacanagem
leve o que for vontade
e deixe em casa o que pesar.
Não dê desculpas
se faça de puta
faça loucuras
dê o que tiver que dar
e deixem que falem o que quiser falar
Não faça sentido
não faça pedidos
sonhe acordado
fuja pela escada
force uma entrada
dê lírios aos que sonham em padecer no paraíso
vem que eu te sigo
no caminho acaba comigo
lambe os dedos
raspa o tacho
mas não nos deixe sobrar pedaços
312
Solidão é uma cidade da janela para fora
Há uma certa solidão
em ver do alto a cidade.
Como se as paredes do peito
nos fosse pouco e não bastasse.
E eu acho isso lindo.
313
.
Deu no rádio que há
uma forte tempestade vindo.
Espero que seja você.
314
.
Meu poema favorito
É você
Dando em cima de mim
315
.
Não acredito em poesia
passando receita
Dando dica de não sofrer.
São duas coisas em que não confio
Na cura
e em poeta
316
15. Manoel de Areia
317
DESEJOS DO DIA-A-DIA
por um dia só
ser um observador
eu queria
por um dia só
me ver no espelho
queria eu morrer
por um dia só
318
VELÓRIOS NO VERÃO
morria
fogo
a chuva caiu.
os dias de sol
319
INDIVI...DUAL
só hoje
fui do céu
ao inferno
tantas vezes...
a maldição
de ter
mas um corpo de pé
320
CASUALIDADES
e confianças despreparadas
eu havia me esquecido
321
ALFÂNDEGA
a vida é movimento
as suas passagens
322
PROTANOPIA
sinais vermelhos.
ainda bem
que nasci
daltônico dicromático
323
DORMIR PELADO
um banho
um chá
uma coragem.
e reclinei sedento
da minha humanidade
324
MITOS
se as sereias
da chuva
um pingo de alegria
325
BEBEDOURO
326
FLORES PÓSTUMAS
levei-as à tristeza
e eu lhe digo:
327
PEQUENAS ILUSÕES HUMANAS
caminhamos
como se infinitos
fôssemos
coisa
alguma
da vida
como se a morte
só fosse
uma
328
PÁSSAROS CEGOS
contemplam o eterno.
veem
o abismo da existência
constantemente
ser julgado
escutam os gritos
sob a gravidade
do voo
solitária
e desenha
329
coisas eternas
[enfim]
e contemplam o eterno
são cegos
[e espelhos]
330
FAIXA-PRETA
a ansiedade
vem passado
vai futuro
alta velocidade
e nessa agonia
a gente é só pedestre
para
atravessar
331
ANARQUIA
descendo a ladeira
ou freios
o tempo perdeu
seu relógio
de pulso
quem poderá
332
SILÊNCIO SEPULCRAL
...
...
...
...
...
333
16. Kaio Bruno Dias
Kaio Bruno Dias usa de linguagem simples, delicada e marcada
pela juventude, para vasculhar as miudezas do cotidiano e da vida
prosaica, para falar da ausência, da perda, da saudade, da solidão, dos
desencontros amorosos, da impossibilidade de contato verdadeiro e
de comunicação profunda nos dias atuais, do vazio existencial e da
curta duração da vida; publicou Peg & Pag (2012), Respeite a solidão
alheia (2016), De surto em surto (2019), dois poemas de sua autoria
foram incluídos na mostra Poesia Agora, realizada no Museu da
Língua Portuguesa, São Paulo (2015). Compositor e intérprete
de músicas que tem seus poemas como letras, Kaio costuma se
apresentar em pocket-shows e recitais solos, tendo atraído a atenção
pela qualidade melódica de suas composições e pelas parcerias que
articula com outros artistas.
334
é fácil gostar de mim quando está tudo bem
é fácil me desejar de longe
quando estou com a minha melhor roupa
no alto dos meus melhores dias
mas e nos dias tristes e densos?
e as minhas fragilidades e defeitos?
você se apaixonaria por eles?
conseguiria acordar ao meu lado
mesmo sabendo que não sou perfeito?
335
a gente se mata todos os dias
em doses conta-gotas
de suicídios não violentos
morremos um pouco
quando deixamos de ser quem gostaríamos
quando silenciamos as nossas verdades
quando amamos e não somos amados
quando os vícios se tornam nossos melhores momentos
quando fazemos coisas por obrigação e não por vontade
morremos.
336
a gente acabou assim
na base da indiferença
te mandei algo
você nem respondeu
não busquei saber o porquê
talvez por medo, ansiedade
não sei
337
ao invés de tomar a sua mão em casamento
gostaria de ser envolvido por ela
e levado a lugares e sensações
que nem as minhas tremulas palavras
conseguirão retratar, enfim
aceita morar comigo?
338
às vezes me sinto
igual a uma folha
que após se soltar da árvore
vai de acordo com o vento
voando rumo ao chão
num voo lindo e breve
para a folha
foram cinco segundos
da melhor viagem de sua vida.
339
17. Clarice Sabino
340
Deusa do amor
os braços da aphrodite
não foram encontrados antes
porque eu não te conhecia antes
e agora que te conheço
a deusa do amor
pode fazer o favor
de recuperar seus membros
e mostrar pra todo mundo
que obviamente
uma de suas mãos
apontava
pra mim
e a outra
pra você
342
hay que aceitar o fim do mundo, pero sin perder la ternura ja-
más
tragédia anunciada
nos horóscopos
nas profecias
no jornal da madrugada
o sinal oscila mas dá pra ouvir
a nasa descobrindo um novo meteoro
a pandemia varrendo a terra
aumenta o volume aí
não tem mais vinho no supermercado
o dia dos meus anos talvez não chegue
escuta
o papa cancelou a páscoa?
e o futebol?
dudu fez birra na embaixada
vê se pode
alguém segura esse menino
alguém faz parar o choro
alguém atende o telefone
alguém avisa
ô motorista
preciso voltar para casa
para esse ônibus
por favor
eu vou descer
343
geografia do coração
344
Se existe, usa
trocar carinho
sussurrar meu amor entre dentes
gritar vontades
me declarar nesse pequeno espaço
345
Regra
na natureza
tudo o que é forte
dura pouco:
terremoto
furacão
a vida das formigas
um dos eventos mais fortes de todos
(você já viu como nasce uma formiga?)
no entanto
não pode ser generalizada
porque algumas duram
horas outras décadas
e outras morrem antes porque
são atropeladas pelos pezinhos descalços
de rinocerontes bebês
o amor também
346
Obsessão barroca
347
Ideia
348
Memória
escondo no armário
mas não muito bem
a vontade de mexer no seu cabelo
dentro da geladeira
do lado do leite
me deparo com o ritmo dos seus olhos
piscando junto a luzinha da porta
349
eu te quero como quero que o bar da esquina abra mais cedo
e como quero acordar às 8h quando tenho que levantar às 5h
te quero com o mesmo fervor dos torcedores do boca
depois do gol do benedetto na final da libertadores
(e com a mesma angústia
quando outros três do river vieram)
te quero como os dinossauros esperaram o meteoro chegar na terra
enquanto a luz rasgava o céu em duas partes
te quero como quero que quem fez os arcos da lapa aprenda bem
com o seu sorriso
porque perto dele as curvas daquela merda são meros ângulos retos
te quero como quero que parem de colocar purê no cachorro quen-
te
te quero como quero comprar guaravita em qualquer posto de ga-
solina de São Paulo
te quero como quero ver o mar agora
te quero como quero dormir mais um pouquinho
te quero como quero parar a obra do meu vizinho só pra poder res-
pirar em silêncio
te quero como quero mudar de ideia
e bater no peito com orgulho dizendo
já que nada dessa porra é para nós
não me interessa
nem um pouco
A felicidade é companhia
para quem sabe
por onde ir
351
Extra Extra
352
Não precisa repetir,
353
Vem pra casa
354
Merci
355
Livre
vou equilibrando
com um guarda-chuva nas mãos
meu corpo estranho
nesse fio longo
entre o poste e o prédio
356
Lista manoélica para o fim dos tempos
357
diga-me seu endereço
359
meu coração,
essa pedra
carne dura atropelada
no meio do caminho
da avenida
vi(d)a de mão única
360
peito-labirinto
361
a vida não pode ser tão feliz assim
a vontade de sentir
a ternura infantil
dos nossos filhos
me olhando nos olhos
me escapa nas mãos
como o sabonete no banho
363
meu amor
364
“Apesar de você
amanhã há de ser outro dia”
(Chico Buarque)
365