Transtorno Borderline e Funções Executivas

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UNIVERSIDADE DO VALE DO RIO DOS SINOS

CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA
MESTRADO EM PSICOLOGIA CLÍNICA

DESEMPENHO COGNITIVO EM PACIENTES COM TRANSTORNO DE


PERSONALIDADE BORDERLINE COM E SEM HISTÓRICO DE TENTATIVAS DE
SUICÍDIO

Edilson Pastore
Mestrando

Dra. Carolina Saraiva de Macedo Lisboa


Orientadora

São Leopoldo, dezembro de 2012


DESEMPENHO COGNITIVO EM PACIENTES COM TRANSTORNO DE
PERSONALIDADE BORDERLINE COM E SEM HISTÓRICO DE TENTATIVAS DE
SUICÍDIO

EDILSON PASTORE

Dissertação apresentada como requisito


parcial para a obtenção do título de Mestre em
Psicologia Clínica pelo Programa de Pós-
Graduação em Psicologia da Universidade do
Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS.

Orientadora: Profa. Dra. Carolina Saraiva de Macedo Lisboa

São Leopoldo, dezembro de 2012


Ficha catalográfica

P293d Pastore, Edilson


Desempenho cognitivo em pacientes com Transtorno de Personalidade
Borderline com e sem histórico de tentativas de suicídio / por Edilson
Pastore. – 2012.
73 f. : il., 30cm.

Dissertação (mestrado) — Universidade do Vale do Rio dos Sinos,


Programa de Pós-Graduação em Psicologia, 2012.
Orientação: Profª. Drª. Carolina Saraiva de Macedo Lisboa.

1. Transtorno de Personalidade Borderline. 2. Desempenho cognitivo.


3. Funções executivas. 4. Suicídio. 5. Impulsividade.
I. Título.

CDU 616.89

Catalogação na Fonte:
Bibliotecária Vanessa Borges Nunes - CRB 10/1556
UNIVERSIDADE DO VALE DO RIO DOS SINOS
CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA
MESTRADO EM PSICOLOGIA CLÍNICA

DESEMPENHO COGNITIVO EM PACIENTES COM TRANSTORNO DE


PERSONALIDADE BORDERLINE COM E SEM HISTÓRICO DE TENTATIVAS DE
SUICÍDIO

Elaborada por
Edilson Pastore

Comissão Examinadora

Profª. Dra. Carolina Saraiva de Macedo Lisboa

(Orientadora)

Profª. Dra. Irani Iracema de Lima Argimon (PUCRS)

(Membro)

Profª. Dra. Clarissa Severino Gama (UFRGS)

(Membro)

Profª. Dra. Silvia Pereira da Cruz Benetti (UNISINOS)

(Relatora)

São Leopoldo, dezembro de 2012


DEDICATÓRIA

À memória dos meus pais, Affonso e Ignes, que me ensinaram a continuar persistindo, apesar
dos obstáculos que se interpõem no caminho.
AGRADECIMENTOS

Agradeço à Beatriz Blaya, coordenadora geral da Clínica Pinel, com quem tenho
convivido nos últimos 22 anos e compartilhado inúmeras experiências que têm sido
fundamentais para meu crescimento.
Aos colegas da Clínica Pinel que encaminharam seus pacientes para participar da
pesquisa.
Aos 82 pacientes que aceitaram participar da pesquisa, possibilitando o avanço do
conhecimento científico.
À Silvia Guarise, pelo apoio nos momentos mais difíceis.
Aos colegas de mestrado, Kelin Zabtoski e Guilherme Wendt, sempre muito
prestativos em todos os momentos.
Aos estudantes de psicologia, Cristian Bacchi Schwartz, Débora Martini e Juliana
Kruel, que foram importantíssimos na pesquisa empírica.
Um agradecimento especial à orientadora deste trabalho, a Profª. Drª. Carolina Saraiva
de Macedo Lisboa, que me ajudou a sair das “trevas da ignorância” em que me encontrava
antes da sua orientação, me conduzindo com ética, profissionalismo, conhecimento e,
sobretudo, com respeito e com humanidade.
À banca examinadora: Drª. Clarissa Gama, Drª. Irani Argimon e Drª. Silvia Benetti,
que contribuíram muito no exame de qualificação e se dispuseram a participar também da
banca de defesa.
“Quem passou pela vida em branca nuvem,
E em plácido repouso adormeceu;
Quem não sentiu o frio da desgraça,
Quem passou pela vida e não sofreu,
Foi espectro de homem, não foi homem,
Só passou pela vida, não viveu”.
Francisco Octaviano
SUMÁRIO

Apresentação.......................................................................................................................... 14
Referências...............................................................................................................................16
Seção I: Transtorno de Personalidade Borderline, aspectos cognitivos e suicídio........... 17
1 Introdução............................................................................................................................. 19
2 Transtornos de personalidade................................................................................................ 19
2.1 Transtorno de Personalidade Borderline............................................................................ 20
2.2 Aspectos cognitivos........................................................................................................... 23
3 Considerações finais............................................................................................................. 26
Referências............................................................................................................................... 28
Seção II: Desempenho cognitivo e impulsividade em pacientes com Transtorno de
Personalidade Borderline com e sem histórico de tentativas de suicídio.......................... 33
1 Introdução............................................................................................................................. 35
2 Método.................................................................................................................................. 39
2.1 Delineamento..................................................................................................................... 39
2.2 Participantes....................................................................................................................... 39
2.3 Instrumentos....................................................................................................................... 42
2.4 Procedimentos.................................................................................................................... 44
2.5 Procedimentos éticos.......................................................................................................... 44
3 Resultados............................................................................................................................. 46
4 Discussão.............................................................................................................................. 51
5 Considerações finais............................................................................................................. 55
Referências............................................................................................................................... 57
Considerações finais da dissertação..................................................................................... 61
Referências............................................................................................................................... 62
Anexos..................................................................................................................................... 63
Anexo A – Ficha de dados sociodemográficos........................................................................ 64
Anexo B – Checklist segundo o CID-10.................................................................................. 65
Anexo C – Escala Barratt de Impulsividade............................................................................ 69
Anexo D – Escala FAST.......................................................................................................... 70
Anexo E – Termo de cessão de dados...................................................................................... 71
Anexo F – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE)......................................... 72
Anexo G – Aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa......................................................... 73
LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Estimativas de erros e tamanhos de amostra.......................................................... 39


Tabela 2 – Dados sociodemográficos...................................................................................... 40
Tabela 3 – Comorbidades e tipo de medicação utilizada......................................................... 41
Tabela 4 – Método utilizado para tentativa de suicídio........................................................... 42
Tabela 5 – Valores mínimo, máximo, média e desvio-padrão das variáveis........................... 46
Tabela 6 – Número de tentativas de suicídio........................................................................... 47
Tabela 7 – Comparação de médias de resultado dos instrumentos entre G1 e G2.................. 48
Tabela 8 – Correlações entre fatores da Escala FAST e impulsividade.................................. 49
Tabela 9 – Correlação entre semelhança e informação do WAIS-III com impulsividade
por não planejamento............................................................................................................... 49
10

RESUMO

A presente dissertação de Mestrado investigou o desempenho cognitivo de


participantes com Transtorno de Personalidade Borderline (TPB) com e sem histórico de
tentativas de suicídio. A apresentação da revisão de literatura e dos resultados empíricos deste
trabalho foi descrita em um artigo teórico e um artigo empírico sobre o TPB, suicídio e
funções cognitivas. Primeiramente, apresenta-se o artigo teórico, que traz uma revisão
assistemática e crítica da literatura sobre o transtorno, abordando as particularidades do
desenvolvimento dessa patologia e discutindo sobre os aspectos cognitivos. Essa revisão teve
como foco as funções executivas, especialmente: atenção, concentração, tomada de decisões,
organização do pensamento e memória operacional, sugerindo que déficits nessas funções
podem ser fatores de risco para o suicídio em pacientes com esse diagnóstico. As conclusões
do artigo teórico apontam para a existência de déficits específicos na cognição, especialmente
na área de execução em participantes com diagnóstico de TPB. Discutiram-se artigos atuais
encontrados sobre a temática e problematizou-se a necessidade e relevância de investigações e
achados dessa natureza.
O artigo empírico apresenta os resultados de uma pesquisa quantitativa, transversal e
de comparação entre grupos realizada com uma amostra de 82 pacientes (M=31,80; DP=0,96)
diagnosticados com TPB internados em uma clínica psiquiátrica de Porto Alegre, Rio Grande
do Sul, Brasil. Foi aplicada a Escala Wechsler de inteligência para adultos (WAIS III), a
Escala Barratt de Impulsividade, a Escala Beck de Suicídio e a Escala FAST, além de um
questionário contendo dados sociodemográficos. Não foi encontrada diferença significativa
em termos de QI total entre os participantes com TPB com e sem histórico de tentativas de
suicídio, indicando assim que a heterogeneidade dos pacientes que apresentam esse
diagnóstico, assim como o grande número de comorbidades apresentadas por essa população,
podem ter sido fatores importantes para explicar esse resultado. Entretanto, verificou-se que
pacientes com histórico de tentativas de suicídio apresentam índice de impulsividade mais
elevado, especialmente abaixo de 30 anos de idade, o que salienta que nesta idade pacientes
com TPB podem ser mais vulneráveis tanto para tentativas de suicídio quanto para sua
efetivação. Embora não se tenha encontrado diferença significativa entre os grupos, as médias
na Escala Wechsler (funções cognitivas) quanto ao QI total situaram-se dentro do nível médio
de funcionamento cognitivo com QI de 92,73 (DP=14,39) para o grupo dos pacientes com
histórico de tentativa de suicídio e 96,06 (DP=17,8) para o grupo sem tentativas de suicídio.
Os níveis de impulsividade foram maiores no grupo de pacientes com histórico de tentativas
11

de suicídio, assim como o grau de adaptação medido pela Escala FAST se mostrou mais
prejudicado no mesmo grupo. Os resultados desta dissertação elucidam aspectos sobre o TPB
e permitem refletir sobre adequadas formas de tratamento. Fica também evidenciada a
necessidade da realização de outros estudos dentro dessa mesma temática, em virtude da
carência de pesquisas neuropsicológicas ou sobre funções cognitivas em pacientes com
diagnóstico de TPB no Brasil.

Palavras-chave: Transtorno de Personalidade Borderline, desempenho cognitivo, funções


executivas, suicídio, impulsividade.
12

ABSTRACT

The objective of the present Master's thesis was to investigate the cognitive
performance of participants with Borderline Personality Disorder (BPD) with and without a
history of suicide attempts. The review of the literature and the empirical results of this study
were described in a theoretical article and an empirical article about BPD, suicide, and
cognitive functions.
The theoretical article consisted of an asystematic and critical review of the literature
on the disorder, addressing the characteristics of the development of this pathology and
discussing its cognitive aspects. This review of the literature focused on executive functions,
especially: attention, concentration, decision making, organization of thought, and working
memory, suggesting that deficits in these functions may be risk factors for suicide in patients
with this diagnosis. The conclusions of the theoretical article indicate the presence of specific
cognition deficits, mainly in the executive functions of the participants diagnosed with BPD.
We discussed recent articles on the topic and approached the need and relevance of further
studies and similar findings.
The empirical article presents the results of a quantitative, cross-sectional and comparative
study conducted with a sample of 82 patients (M =31.80, SD =0.96) diagnosed with BPD and
admitted to a psychiatric clinic in Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brazil. The Wechsler
Adult Intelligence Scale (WAIS III), the Barratt Impulsiveness Scale, the Beck Suicide Scale,
the FAST scale, and a questionnaire containing sociodemographic data were administered to
the participants. There was no significant difference in terms of total IQ among the
participants with BPD with and without a history of suicide attempts, suggesting that the
heterogeneity of patients with this diagnosis, as well as the large number of comorbidities in
this population, may have been important factors to explain this result. However, we found
that patients with a history of suicide attempts have higher index of impulsivity, especially
patients younger than 30 years, leading to the conclusion that individuals of this age group
with BPD may be more vulnerable to both suicide and suicide attempts. Although there was
no significant difference between the groups, the means on the Wechsler Scale (cognitive
functions) in terms of total IQ were within the mean level of cognitive functioning with an IQ
of 92 for the group of patients with a history of suicide attempt and 96 for the group without
suicide attempts. Levels of impulsivity were higher in patients with a history of suicide
attempts; in addition, the degree of adaptation measured by the FAST Scale was lower in the
same group. These results explain aspects of BPD and provide the opportunity of developing
13

appropriate therapeutic methods. The need for further studies on this topic was also evidenced
by the lack of neuropsychological research or studies on cognitive functions in patients
diagnosed with BPD in Brazil.

Keywords: borderline personality disorder, cognitive performance, executive functions,


suicide, impulsivity.
14

Apresentação

Esta dissertação de Mestrado, intitulada “Desempenho Cognitivo em Pacientes com


Transtorno de Personalidade Borderline (TPB) com e sem Histórico de Tentativas de
Suicídio”, está inserida na linha de pesquisa “Processos Saúde-Doença em Contextos
Institucionais”, do Programa de Pós-Graduação em Psicologia Clínica da Universidade do
Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS). Fundamentalmente, este trabalho de pesquisa dirige-se
para o aprimoramento do conhecimento acerca do Transtorno de Personalidade Borderline,
especificamente abordando os aspectos cognitivos, a impulsividade e o risco de suicídio.
Na literatura atual o Transtorno de Personalidade Borderline destaca-se devido à
riqueza das manifestações clínicas inerentes a esses pacientes e ao grau de complexidade dos
casos (Freeman & Beck, 2000; Joyce, Light, Rowe, Cloninger, & Kennedy, 2010). E,
consequentemente, às inúmeras dificuldades que envolvem o tratamento de portadores desse
transtorno (Anestis, Selby, & Joiner, 2007). Essas dificuldades tornam-se mais acentuadas
quando esses pacientes apresentam tentativas de suicídio associadas (Romaro, 2002).
O Transtorno de Personalidade Borderline apresenta etiologia complexa e o
comportamento suicida, característico desse transtorno, provavelmente é dependente de
múltiplos fatores, tais como os neurobiológicos, intelectuais, psicológicos e estressores no
desenvolvimento (Brezo, Paris, & Turecki, 2006). Portanto, investigações acerca de aspectos
intelectuais podem auxiliar na compreensão das possíveis dificuldades psicológicas e
cognitivas associadas com esse transtorno, a fim de aprimorar as estratégias de tratamento.
Estudos recentes (Brodsky, Malone, Ellis, Dulit, & Mann, 2006; Gvion & Apter,
2011; O'Connor & Noyce, 2008) apontam que há comprometimento cognitivo maior nos
pacientes com Transtorno de Personalidade Borderline suicidas em relação à população geral
e a indivíduos com mesmo transtorno, mas sem ideação suicida, demonstrando que aspectos
de personalidade e de cognição podem determinar uma série de fatores implicados na
etiologia e no curso do suicídio. Esses fatores incluem predominantemente dificuldade na
resolução de problemas, déficits de memória e de atenção, estilo cognitivo negativo,
impulsividade e falta de esperança (O'Connor & Noyce, 2008).
Observou-se, a partir do material revisado, que na última década os pesquisadores têm
realizado esforços para verificar as diferenças cognitivas entre pacientes suicidas e não
suicidas em diferentes circunstâncias. Em relação ao Transtorno de Personalidade Borderline,
sabe-se que indivíduos suicidas demonstram maiores dificuldades com relação à regulação
emocional e à tomada de decisões, devido a alterações cognitivas referentes a déficits na
15

atenção, na memória e no processamento de informações complexas (Sprock, Rader, Kendall,


& Yoder, 2000). Contudo, ainda há carência de estudos nessa área, especialmente estudos
brasileiros, para que se possa descrever melhor esse fenômeno de importância clínica e
científica, tendo como finalidade a prevenção do comportamento suicida e, mais
especificamente, a efetivação do suicídio. Além disso, ao investigar o perfil cognitivo desta
população, pode-se contribuir para a melhoria de técnicas específicas, com vistas à promoção
da qualidade de vida de indivíduos com Transtorno de Personalidade Borderline.
Em função desses aspectos, inicialmente realizou-se uma revisão teórica tendo como
foco as funções executivas, especialmente: atenção, concentração, tomada de decisões,
organização do pensamento e memória operacional, verificando-se que déficits nessas funções
podem ser fatores de risco para o suicídio em pacientes com esse diagnóstico. O artigo
teórico, referente a essa revisão, é apresentado na Seção I desta dissertação. Por sua vez, a
Seção II apresenta o artigo empírico, no qual constam os resultados de uma pesquisa
quantitativa, transversal e de comparação entre grupos realizada com uma amostra de 82
pacientes diagnosticados com TPB internados em uma clínica psiquiátrica de Porto Alegre,
Rio Grande do Sul, Brasil. Nessa investigação, é apresentado um perfil neuropsicológico de
pacientes com diagnóstico de TPB e são discutidos, por consequência, possíveis fatores de
risco e indicadores que possam subsidiar ações preventivas e interventivas junto desta
população.
16

Referências

Anestis, M. D., Selby, E. A., & Joiner, T. E. (2007). The role of urgency in maladaptive
behaviors. Behavior Research and Therapy, 45, 3018-3029.
Brezo, J., Paris, J., & Turecki, G. (2006). Personality traits as correlates of suicidal ideation,
suicide attempts, and suicide completions: a systematic review. Acta Psychiatrica
Scandinavia, 113, 180-206.
Brodsky, B. S., Malone, K. M., Ellis, S. P., Dulit, R. A., & Mann, J. J. (2006). Characteristics
of borderline personality disorder associated with suicidal behavior. American Journal
of Psychiatry, 154, 1715-1719.
Freeman, J. B., & Beck, G. (2000). Cognitive interference for trauma cues in sexually abused
adolescent girls with posttraumatic stress disorder. Journal of Clinical and Child
Psychology, 29, 245-56.
Gvion, Y., & Apter, A. (2011). Aggression, impulsivity, and suicide behavior: A review of
the literature. Archives of Suicide Research, 15(2), 93-112.
Joyce, P. R., Light, K. J., Rowe, S. L., Cloninger, C. R., & Kennedy, M. A. (2010). Self-
mutilation and suicide attempts: Relationships to bipolar disorder, borderline
personality disorder, temperament and character. Australian and New Zealand Journal
of Psychiatry, 44(3), 250-257.
Sprock, J., Rader, T. J., Kendall, J. P, & Yoder, C. Y. (2000). Neuropsychological functioning
in patients with borderline personality disorder. Journal Clinical Psychology, 56, 587-
600.
O'Connor, R. C., & Noyce, R. (2008). Personality and cognitive processes: Self-criticism and
different types of rumination as predictors of suicidal ideation. Behaviour Research
and Therapy, 46, 392-401.
17

Seção I – Artigo Teórico

Transtorno de Personalidade Borderline, Tentativas de Suicídio e Desempenho


Cognitivo

Resumo

O presente artigo apresenta uma revisão crítica e assistemática da literatura sobre o


Transtorno de Personalidade Borderline (TPB), suicídio e funções cognitivas. As bases de
dados pesquisadas foram os portais Capes, Sciencedirect, Psichinfo, Cochrane, BVS-PSI,
Bireme e Medline, com os seguintes descritores: Borderline Personality Disorder, Cognition,
Suicidal Behavior. Em um primeiro momento, foram abordadas as características principais
do transtorno, início dos sintomas e suas principais manifestações sintomatológicas.
Posteriormente, foram enfocados os aspectos cognitivos de pacientes com TPB, abordando
especialmente as funções executivas, como a tomada de decisões. Nesse sentido, foi também
discutida a avaliação da impulsividade e o risco de suicídio em pacientes com TPB. Estudos
atuais revisados apontam que déficits em funções neuropsicológicas, especialmente nas
funções executivas, podem ser importantes fatores de risco para tentativas e também para a
efetivação do suicídio em pessoas com esse diagnóstico. A importância do estudo da
cognição, da impulsividade e dos níveis de ideação suicida nos pacientes com TPB é
fundamental para auxiliar os profissionais de saúde que trabalham com essa população a
identificar e prevenir o suicídio nesses pacientes e também para se aprimorarem estratégias de
tratamentos existentes. É de fundamental importância aprofundar o conhecimento acerca do
TPB a partir da realização de novos estudos sobre o tema, especialmente na América Latina,
onde as publicações específicas ainda são escassas.

Palavras-chave: Transtorno de Personalidade Borderline, cognição, suicídio.

Abstract

The objective of the present study was to perform a review of the literature about Borderline
Personality Disorder (BPD), suicide, and cognitive functions. The databases searched were:
Capes, Sciencedirect, Psichinfo, Cochrane, BVS-PSI, Bireme, and Medline. We used the
following keywords: Borderline Personality Disorder, Cognition, and Suicidal Behavior.
18

First, we discussed the main characteristics of the disorder, early onset of symptoms, and its
main manifestations. Later, we focused on the cognitive aspects of patients with BPD,
especially addressing the executive functions such as decision-making. In this sense, we also
discussed the assessment of impulsivity and suicide risk in patients with BPD. The recent
studies included in this review suggest that deficits in neuropsychological functions,
especially in executive functions, may be important risk factors for suicide and suicide
attempts in people with this diagnosis. Investigating cognition, impulsivity, and levels of
suicidal ideation in patients with BPD is critical to help health professionals to identify and
prevent suicide in these patients, as well as to improve the existing treatment strategies.
Therefore, it is extremely important to increase the knowledge on BPD based on new studies
about this disorder, especially in Latin America, where such studies are rare.

Keywords: Borderline Personality Disorder, cognition, suicide.


19

1 Introdução

Os transtornos de personalidade vêm ocupando cada vez mais espaço na literatura


científica, sendo objeto tanto de revisões teóricas quanto de estudos empíricos (Brooke &
Horn, 2010; Brodsky, Malone, Ellis, Dulit, & Mann, 2006; Paris, 2005). Esse movimento se
deve ao avanço das ciências humanas, biológicas e sociais no que tange ao maior
aprofundamento nesses complexos fenômenos psíquicos. Dentre os transtornos de
personalidade, pode-se afirmar que há um tipo de transtorno que ocupa um lugar de
importante destaque, devido a sua complexidade, heterogeneidade e dificuldade de
tratamento, denominado Transtorno de Personalidade Borderline (American Psychiatric
Association [APA], 2002).
O TPB tem despertado curiosidade e necessidade de maior compreensão em função da
riqueza das manifestações clínicas inerentes e ao grau de complexidade dos casos (Freeman &
Beck, 2000; Joyce, Light, Rowe, Cloninger, & Kennedy, 2010). Ao mesmo tempo em que há
maior interesse nesse transtorno, observado pelo crescente número de estudos, evidencia-se
que os profissionais que trabalham com essa população clínica evitam, muitas vezes, atender a
esses pacientes, pois se sentem impotentes, desmotivados e desgastados em função das
inúmeras dificuldades que envolvem o tratamento de portadores desse transtorno (Anestis,
Selby, & Joiner, 2007). Essas dificuldades referem-se a aspectos centrais que constituem o
TPB, tais como a instabilidade afetiva, a impulsividade e a agressividade (Nigg, Lohr,
Western, Gold, & Silk, 1992) e ficam ainda mais acentuadas quando esses pacientes
apresentam tentativas de suicídio associadas (Romaro, 2002). A partir disso, neste artigo
apresenta-se uma revisão crítica e assistemática da literatura sobre o TPB, os aspectos
cognitivos implicados nessa patologia, abordando relações interdependentes desses aspectos
com o risco de suicídio apresentado por essa população.

2 Transtornos de personalidade

Os transtornos de personalidade são definidos por uma série de critérios, sendo que o
principal é a identificação de um padrão persistente de vivências íntimas e de comportamentos
que se desviam de forma acentuada das expectativas da cultura do indivíduo. De acordo com
os critérios da American Psychiatric Association (APA, 2002), o transtorno de personalidade
consiste em um padrão global, rígido e inflexível com duração de mais de dois anos, com
início no final da adolescência ou nos primeiros anos da vida adulta e que afeta pelo menos
20

duas das seguintes áreas: 1) afeto, 2) cognição, 3) relacionamentos interpessoais, 4) controle


dos impulsos. Há também outros indicadores que podem auxiliar a caracterizar se uma pessoa
é portadora de um transtorno de personalidade, como por exemplo, a forma de perceber e de
interpretar a si e aos outros, assim como os acontecimentos a sua volta (Brodsky et al., 2006;
Gabbard, 1998). Observa-se também que um indivíduo com transtorno de personalidade tem
maior probabilidade de recusar e resistir ao tratamento e negar seus problemas, se comparado
com indivíduos com outras patologias (Kaplan & Sadok, 2008).
Segundo a classificação da APA (2002), os transtornos de personalidade são divididos
em categorias:
· Cluster A: paranoide, esquizoide e esquizotípico.
· Cluster B: antissocial, histriônico, narcisista e borderline.
· Cluster C: esquiva, dependente, obsessivo compulsivo e sem outra especificação.

2.1 Transtorno de Personalidade Borderline

O TPB é um distúrbio estrutural da personalidade que se caracteriza por um padrão


invasivo e conturbado de relacionamentos interpessoais, bem como alterações na forma de
perceber a si mesmo e em relação aos afetos (Kernberg, 1998; Malloney, Degenhardt, Darke,
& Nelson, 2009; Sollof et al., 2012). Observa-se também em pacientes com esse diagnóstico
um acentuado grau de impulsividade, sendo que as primeiras manifestações tendem a ocorrer
no final da adolescência ou no início da idade adulta, permanecendo presentes em vários
contextos da vida do paciente, com tendência à remissão parcial da sintomatologia a partir da
quarta década de vida (Lieb, Zanarini, Schmahl, Linehan, & Bohus, 2004). Segundo Kaplan e
Sadok (2008), esta condição diagnóstica era definida por termos como esquizofrenia
ambulatória, personalidade “como se”, esquizofrenia pseudoneurótica, transtorno psicótico de
caráter.
Para O’Donohue e Cucciare (2007), o TPB inclui um conjunto de fatores que explicam
sua etiologia, sendo que os principais são: a biologia/genética, experiências de separação e
perda, abuso infantil e ambiente familiar conturbado e caótico. A literatura aponta a separação
precoce das figuras parentais e as perdas na infância como componentes importantes na
determinação do TPB (Akiskal et al., 1985), sendo que de 20 a 40% dos pacientes que
possuem diagnóstico de TPB experimentaram separação traumática de pelo menos um dos
pais (Gunderson & Sabo, 1993).
21

Outra questão importante sobre a etiologia do TPB refere-se a casos de abuso sexual
na infância, sendo que Hermann, Perry e Van der Kolk (1989) identificaram em seu estudo
que 81% dos pacientes com TPB possuíam história de abuso físico e/ou sexual na infância.
Da mesma forma, Zelkovitz, Paris, Guzder e Feldman (2001) observaram que pessoas que
haviam sofrido abuso sexual apresentavam quatro vezes mais chance de desenvolver o TPB.
O abuso sexual e a concomitante severidade do TPB no futuro estariam mais ligados a fatores
como a idade em que ele ocorreu, a frequência em que acontecia e a gravidade/intensidade
existente e percebida pelos indivíduos (McLean & Gallop, 2003; Zanarini, Frankenburg, &
Vujanovic, 2002).
Ambiente familiar caótico e conturbado constitui também forte preditor para o
desenvolvimento do TPB, pois, segundo Johnson et al. (2001), relacionamentos com
vinculações problemáticas, abuso emocional e negligência por parte dos cuidadores são
fatores de risco para o desenvolvimento do TPB, tanto quanto o abuso sexual, que é um dos
aspectos mais abordados e apontados na literatura sobre o tema (Zelkovitz et al., 2001). A
vinculação insegura a figuras parentais e ambientes familiares conturbados e emocionalmente
instáveis e negligentes também podem explicar o TPB tanto quanto os demais fatores
apontados pela literatura (Salzman et al., 1993). Outro fator para tentar explicar a etiologia do
TPB diz respeito à questão da vinculação da criança com seus cuidadores e o
desenvolvimento de apego inseguro (Bowlby, 1969/1973). Pesquisas relacionando o TPB
com o apego inseguro são frequentes na literatura e apontam que experiências com cuidadores
inseguros, imprevisíveis, assustadores ou abusivos predisporiam a criança a um tipo de apego
que poderia ser um preditor para o desenvolvimento do TPB no futuro (Levy et al., 2006;
Lyons-Ruth, Jacobvitz, Cassidy, & Shaver, 1999).
Atualmente o DSM IV-TR (APA, 2002) denomina esse transtorno como Transtorno
de Personalidade Borderline e o CID-10 (Organização Mundial da Saúde [OMS], 1994) o
classifica como Transtorno de Personalidade Emocionalmente Instável, sendo ambas as
categorias diagnósticas clinicamente equivalentes. A prevalência do TPB é de
aproximadamente 2% a 7% da população, sendo três vezes mais comum em mulheres do que
em homens (Links, Heisel, & Garland, 2003). Encontra-se, ainda, entre os principais critérios
para definir o TPB, a identificação de esforços feitos pelo paciente para evitar abandonos,
reais ou imaginários, significativa instabilidade nos relacionamentos, alternância de extremos
de idealização e desvalorização, acentuada perturbação na identidade e na autoimagem,
desrregulação afetiva, assim como impulsividade em diversas áreas de sua vida (Kernberg,
1998). Convém salientar que devem constar pelo menos dois indicadores das seguintes
22

alterações: sexualidade, abuso de substâncias, direção imprudente ou comer compulsivo para


que o diagnóstico de TPB possa ser conclusivo (APA, 2002). Sentimentos crônicos de vazio,
raiva inadequada, dificuldades importantes nos relacionamentos, incluindo lutas corporais,
também estão, muitas vezes, presentes nesses pacientes (Gabbard & Wilkinson, 1994).
Um dos critérios mais importantes e também mais preocupantes do TPB diz respeito
às ameaças e tentativas de suicídio que acometem esses pacientes (Brodsky et al., 2006;
Linehan, 2010). Muitas dessas tentativas constituem-se como uma forma de chamar atenção
para o sofrimento emocional que vivenciam e não chegam a constituir risco real para que
cheguem a óbito. Ainda assim, toda tentativa de suicídio requer atenção cautelosa e cuidados
intensivos. No caso desses pacientes, essa atenção deve ser aumentada devido ao risco
potencial para automutilações denominados também como comportamentos parasuicidas e,
evidentemente, à possibilidade de ocorrer efetivamente o suicídio (Koenigsberg, 2002;
Linehan, 2010; Paris, 2005). De acordo com Links et al. (2003), resultados de autópsia
psicológica de mortes por suicídio estimam que entre nove e 33% dos pacientes que se
suicidaram preenchiam critérios diagnósticos para TPB. Ainda segundo os autores,
compreender os fatores que fazem o risco de suicídio aumentar, assim como o comportamento
suicida e a própria ideação suicida, são cruciais para o entendimento do TPB.
Entende-se por suicídio um ato deliberado do indivíduo contra si mesmo, com a
finalidade de morrer (Brodsky et al., 2006; OMS, 2001). Os suicídios consumados em
pacientes que apresentam TPB giram em torno de 10% e as tentativas de suicídio entre essa
população variam entre 37% a 73% (Black, Blum, Pfohl, & Hale 2004). Segundo Paris
(2005), um em cada dez pacientes com diagnóstico de TPB se suicida, igualando os índices de
patologias com alta letalidade como a esquizofrenia e a depressão maior. Esses dados levam a
questionar uma ideia preconcebida e estigmatizada de que pacientes com TPB tentam suicídio
apenas para manipular ou chamar a atenção (Linehan, 2010).
Em um estudo realizado por Brooke e Horn (2010), pacientes com TPB que
apresentavam automutilações e tentativas de suicídio também apresentaram baixa autoestima
e visão negativa de si. Observou-se que consequências psicológicas de abusos físicos e
emocionais foram determinantes ou desencadeantes para as tentativas de suicídio na amostra
estudada. Ainda segundo esse estudo, a impossibilidade de tolerar a solidão e o intenso vazio
mostrou-se associada ao aumento significativo da ansiedade, o que pode explicar que o
paciente queira atentar contra a própria vida.
Assim, de acordo com uma série de autores (Arza et al., 2009; Domes et al., 2006; Le
Gris & Van Reekum, 2006; Monarch, Saykin, & Flashman, 2004; Soler et al., 2009), a
23

relação entre TPB e o comportamento suicida pode ser mediada por aspectos cognitivos,
especialmente envolvendo dificuldades relacionadas a tomada de decisões, memória de
trabalho, capacidade para obter juízo crítico e formulação de insight (Le Gris & Van Reekum,
2006). Esses aspectos podem auxiliar na explicação de uma série de variáveis ainda obscuras
na literatura e servir de subsídios para melhores estratégias de tratamento.

2.2 Aspectos cognitivos

Achados neuropsicológicos em indivíduos com TPB demonstram que há falhas


importantes nessa esfera, ressaltando que mais estudos devem ser realizados para aprofundar a
investigação a respeito desse tema (Le Gris & Van Reekum, 2006; O'Connor & Noyce, 2008).
De acordo com Monarch et al. (2004), apesar das evidências acumuladas sobre possíveis
prejuízos em funções neuropsicológicas de pacientes com TPB, o mesmo ainda não se
constitui claramente como um transtorno que apresente características cognitivas específicas.
Assim, de acordo com esse autor, estudos que objetivem conhecer mais profundamente o TPB
e suas particularidades da cognição deveriam ser conduzidos.
Pesquisas sobre a etiologia do TPB referem que variáveis como genética e traumas
infantis, tais como negligência, abuso sexual e emocional, além de outros eventos estressores,
podem ser causas para esse transtorno e seriam responsáveis por falhas cognitivas (Mann,
2003). Por outro lado, autores como Le Gris e Van Reekum (2006) e Ruocco (2005) afirmam
que pacientes com TPB apresentam comprometimento de domínios cognitivos específicos
ligados a funções como atenção, flexibilidade cognitiva, memória de trabalho, capacidade de
planejamento e memória visoespacial. A partir desses resultados, verifica-se a necessidade de
uma compreensão acerca do funcionamento cognitivo de pacientes com TPB, pois trata-se de
uma doença complexa, na qual o comportamento dos pacientes é provavelmente dependente
de múltiplos fatores como os neurobiológicos, intelectuais, psicológicos e/ou ocorrência de
situações estressoras ao longo do desenvolvimento (Brezo, Paris, & Turecki, 2006). Portanto,
investigações da esfera cognitiva junto a pacientes com TPB podem contribuir para a
compreensão das possíveis dificuldades psicológicas associadas a esse transtorno,
aprimorando as formas de tratamento existentes.
Avançando dentro da complexa heterogeneidade do TPB, estudos apontam que há um
comprometimento cognitivo maior nos pacientes suicidas em relação à população geral e
também comparados com indivíduos com TPB sem ideação suicida (Le Gris & Van Reekum,
2006). Tais indicadores incluem dificuldade na resolução de problemas, déficits de memória e
24

na atenção, estilo cognitivo negativo, impulsividade e falta de capacidade de planejamento


(O'Connor & Noyce, 2008).
Estudos de neuroimagem cerebral mostram evidências de interrupção nos circuitos
neurais em áreas do cérebro responsáveis pelos mecanismos intelectuais, agressivos e de
regulação afetiva em pacientes com TPB (New, Goodman, Triebwasser, & Siever, 2008).
Corroborando esses resultados, Bazanis et al. (2002) afirmam que pacientes com TPB
apresentam déficits na capacidade de tomada de decisões e de planejamento. Além disso,
apresentam outras dificuldades intelectuais, respondendo de forma impulsiva a determinados
estímulos, realizando interpretações distorcidas de eventos cotidianos, bem como
apresentando ações equivocadas e prematuras. Observa-se, ainda, que esses indivíduos
suicidas sofrem de rigidez cognitiva, o que, possivelmente, os leva a acreditar que o suicídio é
a sua única opção (Le Gris & Van Reekum, 2006).
Segundo Gvion e Apter (2011), a presença de deficiências cognitivas tem sido
relacionada a disfunções nas áreas cerebrais responsáveis pelas funções executivas. Essas
funções podem interagir com aspectos emocionais, alterando a capacidade do indivíduo para
pensar e controlar seus impulsos comportamentais, podendo gerar uma maior propensão para
comportamento suicida. Polleti (2009) também aponta para disfunções cognitivas em funções
executivas, especialmente na memória autobiográfica e cognição social, o que poderia tornar
os pacientes com TPB mais propensos a cometer falhas no processo de avaliação e
julgamento. Esse autor também aponta que o início dos danos cognitivos em pacientes com
TPB pode ser observado ainda na infância e na adolescência.
Em estudo comparando os prejuízos cognitivos de 40 pacientes com TPB e 40
controles saudáveis, O’Leary, Brouwers, Gardner e Cowdry (1991) constataram que há sérios
prejuízos nos pacientes com TPB. Tais déficits encontravam-se em áreas relacionadas a
funções executivas que não estavam relacionadas com problemas motores, abuso de álcool,
depressão maior ou outros fatores que não devidos ao TPB. Assim, o autor aponta para a
existência de déficits específicos em domínios cognitivos de pacientes com TPB.
Em outro contexto de estudo, a fim de explanar mais sobre as diferenças entre
pacientes suicidas e não suicidas, uma investigação neuropsicológica em pacientes com
diagnóstico de depressão evidenciou que tentativas de suicídio estão relacionadas a déficits no
funcionamento executivo. Nessa pesquisa, Keilp et al. (2001) verificaram que pacientes
deprimidos com déficit cognitivo tentam em maior frequência o suicídio de alta letalidade
quando comparados a outros pacientes depressivos que não apresentaram dificuldades na área
cognitiva. Foi observado que os pacientes suicidas de alta letalidade tinham atenção, memória
25

e capacidade de resolução de problemas prejudicados. Outro estudo, desenvolvido por


Westheide et al. (2008), corrobora esses achados, constatando que os pacientes depressivos
com ideação suicida apresentam déficits no funcionamento executivo das funções cognitivas,
o que estaria relacionado principalmente aos comportamentos impulsivos e à dificuldade na
resolução de problemas.
Apesar de evidências que apontam alterações neurológicas a partir de estudos de
neuroimagem e de avaliações neuropsicológicas, o TPB não é considerado, ainda, uma
desordem neurocognitiva definida. No entanto, autores como Monarch et al. (2004), Le Gris e
Van Reekum (2006) afirmam que há uma clara falha na literatura acerca de estudos que
examinem adequadamente os aspectos cognitivos desses pacientes. Segundo esses mesmos
autores, há estudos demonstrando que os pacientes com TPB apresentam habilidades
cognitivas prejudicadas. Corroborando esses achados, Monarch et al. (2004) realizaram uma
bateria neuropsicológica em doze mulheres portadoras de TPB comparando com um grupo
controle de mulheres sem patologias mentais. Os resultados indicaram que as pacientes com
TPB apresentaram prejuízos em sete das nove áreas cognitivas avaliadas, especialmente na
atenção, vigilância, memória verbal e capacidade de aprendizado quando comparadas com o
grupo controle. Os autores sugerem que seja aplicada uma bateria de testes de inteligência
completa nos pacientes com TPB, para esclarecer seu funcionamento cognitivo e melhorar as
possibilidades de tratamento.
Outro estudo conduzido por Arza et al. (2009) demonstra que as alterações cognitivas
desempenham um papel muito importante nos pacientes com diagnóstico de TPB. Foram
avaliados 26 pacientes (14 mulheres e 12 homens) que, comparados a um grupo controle
saudável, apresentaram déficits nas funções executivas e em testes neuropsicológicos
complexos. Os prejuízos mais evidentes foram na memória imediata, memória de trabalho,
atenção, fluência verbal, controle do impulso, flexibilidade cognitiva, abstração e
planejamento. As conclusões desse estudo indicam que pacientes com TPB apresentam
prejuízos em funções neurocognitivas, apontando ainda que seriam necessários mais estudos
para aprofundar o conhecimento dessas alterações.
Em um dos mais importantes artigos de revisão sobre o TPB e comportamento suicida,
Le Gris e Van Reekum (2006) consultaram diversas bases de dados buscando artigos a partir
do ano de 1985. Foram encontrados 29 artigos discutindo aspectos neuropsicológicos do TPB
e sete artigos envolvendo a temática do suicídio. Dos estudos encontrados, 83% indicavam
prejuízos cognitivos em pacientes com TPB, especialmente em funções executivas, tais como
tomada de decisão, memória de trabalho e prejuízos na organização visoespacial. Essas
26

dificuldades parecem ser agravadas em pacientes que tentaram suicídio, nos quais os prejuízos
cognitivos parecem ainda mais acentuados. Essa revisão da literatura sugere que sejam
investigados aspectos globais da inteligência, como a avaliação de QI total, além de outros
domínios cognitivos, com o objetivo de identificar com mais clareza essas particularidades
que envolvem a cognição de pacientes com TPB que tentaram suicídio em comparação com
os que nunca tentaram.
Já Judd (2005) constatou que pacientes com TPB apresentam grande instabilidade em
seus relacionamentos interpessoais, alto grau de impulsividade, dissociação e paranoia,
características já bastante enfatizadas pela literatura. Entretanto, essa autora ressalta que as
dimensões cognitivas desses pacientes têm sido pouco estudadas, propondo que os prejuízos
neurocognitivos podem ser a chave para a compreensão dos aspectos do TPB. A autora
hipotetiza, ainda, que prejuízos cognitivos podem estar associados ao apego inseguro e que o
fator cognitivo pode ser responsável por muitos comportamentos patológicos das pessoas que
apresentam esse transtorno.
Em relação ao TPB, percebe-se que indivíduos suicidas demonstram maiores
dificuldades em relação à regulação emocional e à tomada de decisão, devido a alterações
neurológicas e cognitivas referentes a déficits na atenção, na memória e no processamento de
informações complexas (Le Gris & Van Reekum 2006; Sprock, Rader, Kendall, & Yoder,
2000). Contudo, ainda há carência de estudos nessa área, especialmente estudos brasileiros,
para que se possa descrever melhor esse fenômeno, a fim de gerar subsídios para se repensar
intervenções e tratamentos clínicos cada vez mais eficazes para esta grave condição
diagnóstica.

3 Considerações finais

O TPB é uma patologia de personalidade que necessita ainda de investigação em


várias áreas e, apesar de a instabilidade emocional ser sua característica central, muitos outros
aspectos ainda permanecem obscuros e pouco explorados em pesquisas. A literatura atual
aponta para uma estreita relação entre TPB e déficits cognitivos, sendo esses últimos
fundamentais para a compreensão e tratamento desse grave e complexo transtorno que inclui
automutilações e tentativas de suicídio como manifestações clínicas frequentes.
Vários domínios cognitivos parecem estar afetados em indivíduos que apresentam o
diagnóstico de TPB, especialmente no que se refere às funções executivas, como atenção,
concentração, memória de trabalho, tomada de decisões e controle dos impulsos. Em
27

pacientes com TPB com histórico de tentativas de suicídio, os déficits nas funções executivas
parecem ser ainda mais acentuados, gerando riscos elevados tanto para a consumação do
suicídio quanto para o aumento do número de tentativas cujas consequências são
extremamente danosas tanto para o paciente quanto para a família e a rede social da qual o
paciente faz parte.
A avaliação de aspectos cognitivos, nível de impulsividade e ideação suicida de
pacientes com TPB deve ser feita criteriosamente devido aos riscos inerentes a essa grave
psicopatologia de personalidade. A relevância em se avaliar aspectos cognitivos, a
impulsividade e o risco de suicídio em pacientes com TPB reside na possibilidade de gerar
subsídios para melhorar as formas de intervenção nesse transtorno, especialmente tentando
evitar o comportamento suicida e o grave risco de morte que os mesmos apresentam.
28

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33

Seção II – Artigo Empírico

Desempenho cognitivo em pacientes com Transtorno de Personalidade Borderline com e


sem histórico de tentativas de suicídio

Resumo

As funções cognitivas, a impulsividade e o comportamento suicida constituem aspectos


importantes na avaliação e no tratamento de pacientes portadores de Transtorno de
Personalidade Borderline (TPB). A adequada análise e identificação desses aspectos podem
auxiliar no manejo de situações envolvendo tanto o risco de morte quanto o estabelecimento
de condutas adequadas para o atendimento dessa população clínica. Desta forma, este estudo
teve como objetivo avaliar o desempenho cognitivo, a impulsividade e a ideação suicida em
82 (M=31,80; DP=0,96) pacientes internados em uma clínica psiquiátrica de Porto Alegre,
RS. Os pacientes foram divididos em dois grupos, sem (G1 =33) e com histórico de tentativa
de suicídio (G2=49). Foram aplicados os seguintes instrumentos: a Escala Wechsler de
Inteligência para adultos (WAIS III), a Escala Barratt de Impulsividade (BIS), a Escala Beck
de Suicídio (BSI), a Escala FAST e um questionário sobre dados sociodemográficos. Os
resultados não apontam diferenças significativas entre os dois grupos no que se refere ao QI
total e às funções executivas, em específico, contrariando alguns estudos existentes. Os níveis
de impulsividade, assim como a ideação suicida mostraram-se mais elevados no grupo de
pacientes com histórico de tentativas de suicídio, especialmente nos pacientes com idade
inferior a 30 anos. Entre as comorbidades, verificou-se que a dependência química foi a de
maior prevalência, seguida do transtorno de humor bipolar e depressão. Os resultados
sugerem similaridades entre os grupos de pacientes com e sem histórico de suicídio,
representando um alerta e um desafio. Evidências acerca da impulsividade corroboram dados
de estudos anteriores, assim como o que se refere às comorbidades identificadas. Os
resultados do presente estudo podem ser explicados também pela complexidade desse
transtorno e evidenciam a importância de mais estudos acerca das funções cognitivas junto a
essa população.

Palavras-chave: Transtorno de Personalidade Borderline, desempenho cognitivo, suicídio.


34

Abstract

Cognitive functions, impulsivity, and suicidal behavior are important aspects of the evaluation
and treatment of patients with Borderline Personality Disorder (BPD). Proper analysis and
detection of these aspects may help in the management of situations involving both the risk of
death and the design of appropriate care procedures for this clinical population. Therefore, the
objective of this study was to assess cognitive performance, impulsivity, and suicidal ideation
in 82 (M=31.80; SD=0.96) inpatients of a psychiatric clinic in Porto Alegre, RS. Patients were
divided into two groups without (G1 =33) and with a history of suicide attempt (G2=49). We
administered the following instruments: the Wechsler Adult Intelligence Scale (WAIS III),
the Barratt Impulsiveness Scale (BIS), the Beck Scale for Suicide Ideation (BSI), the FAST
Scale, and a questionnaire on sociodemographic data. The results showed no significant
differences between the two groups with respect to total IQ and executive functions
specifically, which is not in agreement with some previous studies. The levels of impulsivity,
as well as suicidal ideation, were higher in patients with a history of suicide attempts,
especially in patients younger than 30 years. Considering the comorbidities, we found that
chemical dependency showed the highest prevalence, followed by bipolar disorder and
depression. The results demonstrated that the similarities between the groups of patients with
and without a history of suicide attempt constitute a warning and a challenge. Evidences
toward impulsivity confirm previous studies, as well as what refers to comorbidities
identified. The results of the present study can be explained based on the complexity of this
disorder; thus, further studies of cognitive functions in this population are greatly important.

Keywords: Borderline Personality Disorder, cognitive performance, suicide.


35

1 Introdução

O Transtorno de Personalidade Borderline (TPB) caracteriza-se por um padrão


instável e intenso nos relacionamentos interpessoais, na autoimagem e na troca e expressão
dos afetos, com início na adolescência e/ou nos primeiros anos da vida adulta, causando
acentuados prejuízos em diversas áreas da vida do indivíduo (American Psychiatric
Association [APA], 2002).
Segundo Scott, Levy, Adams Jr. e Stevenson (2011), o TPB é um transtorno crônico e
debilitante, caracterizado por intensa instabilidade emocional, acentuada impulsividade,
propensão para automutilações, problemas com a identidade pessoal e tendências para o
suicídio. Autores como Grant, Stinson, Dawson, Chou e Ruan (2005) e Lenzenweger, Lane,
Loranger e Kessler (2004) estimam que o TPB afete entre 1 a 6% da população geral,
atingindo especialmente pessoas abaixo dos 35 anos de idade. Em populações clínicas e em
internações psiquiátricas, o índice se eleva de 30 a 70% (APA, 2002; Arza et al., 2009; Judd,
2005; Monarch, Saykinn, & Flashman, 2004).
A relação entre comportamento suicida e funcionamento cognitivo de pacientes com
TPB tem sido ainda pouco estudada (Le Gris & Van Reekum, 2006; Monarch et al., 2004) e
praticamente inexistem estudos na América Latina sobre o tema. Assim, alguns autores têm
procurado investigar associações entre suicídio, aspectos cognitivos e TPB (Le Gris & Van
Reekum, 2006; Linhehan & Mazza, 2009; Zweig-Frank & Paris, 2002) em vários contextos.
Dentre os pesquisadores interessados nessa temática, convém citar Burke e Stepp
(2012), que realizaram uma pesquisa longitudinal com o objetivo de identificar preditores na
infância e adolescência para o TPB. Participaram da pesquisa 142 crianças entre sete e 12
anos que apresentavam psicopatologias como transtorno de déficit de atenção, transtorno de
oposição desafiadora, hostilidade, agressividade e dificuldades cognitivas. Os participantes
foram acompanhados desde a infância até a idade adulta e foram avaliados no início da
pesquisa, ao completar 18 anos e aos 24 anos de idade. Os resultados mostraram que as
principais características psicopatológicas da infância e adolescência que poderiam levar ao
desenvolvimento do TPB na vida adulta seriam a presença de oposição desafiadora
sistematizada e a persistência de dificuldades emocionais e cognitivas.
Nesta mesma linha de pesquisa, Paris, Zelkowitz, Cuzder, Joseph e Feldman (1999)
estudaram aspectos neuropsicológicos específicos em 94 crianças, sendo que 41 apresentavam
indicadores relacionados a sintomas de TPB e 53 não apresentavam qualquer psicopatologia.
Os autores evidenciaram que aqueles participantes com sintomas de TPB apresentaram
36

também escores abaixo da média no teste de Wisconsin e no teste de performance motora


contínua, ambos testes cognitivos que avaliam funções executivas. Dentro deste mesmo
contexto, Soloff et al. (2012) apontam que disfunções cerebrais têm sido observadas em
pacientes com TPB, especialmente em regiões límbicas, frontais e pré-frontais, possíveis de
serem identificadas já na infância. Essas regiões cerebrais são responsáveis pela regulação das
emoções, do comportamento impulsivo e, fundamentalmente, referem-se às funções
executivas. Segundo esses pesquisadores, as funções executivas estão estreitamente
relacionadas ao comportamento suicida, pois incluem memória de trabalho e tomada de
decisão, predominantemente. Assim, prejuízos em funções executivas e na memória
operacional aumentariam de forma significativa a propensão para o comportamento suicida.
Investigando prejuízos cognitivos em pacientes com TPB e a relação com áreas
específicas do cérebro, Monarch, Saykin e Flashman (2004) identificam prejuízos frontais,
pré-frontais e límbicos, sendo que essas regiões estão relacionadas à tomada de decisões e
capacidade de avaliação e de julgamento das situações. Como descrito anteriormente, em
estudo realizado por Soloff et al. (2012), utilizando ressonância magnética computadorizada
cerebral, foram comparados 68 pacientes portadores de TPB com um grupo controle saudável.
Os pacientes com TPB foram subdivididos em indivíduos com e sem tentativa de suicídio,
diferenciando-se, também, o grau de letalidade dessas tentativas. Os resultados desse estudo
identificaram problemas cerebrais em maior frequência e gravidade no grupo de tentadores de
suicídio de alta letalidade, especificamente em regiões do córtex pré-frontal, temporal, giro do
cíngulo, ínsula e amígdala, corroborando outros estudos (Le Gris & Van Reekum, 2006;
Monarch et al., 2004) que também indicam que as tentativas de suicídio estão relacionadas
com um déficit e empobrecimento do repertório cognitivo. Outro achado importante desse
mesmo estudo se refere ao fato de que no grupo de pacientes com TPB que apresentaram
tentativa de suicídio, as concentrações de massa cinzenta estavam significativamente
diminuídas, sendo que aqueles pacientes que cometeram tentativas de suicídio de alta
letalidade apresentaram alterações cerebrais ainda mais severas; especificamente em giro
temporal, ínsula, giro fusiforme e giro parahipocampal.
Corroborando os achados anteriores, Le Gris, Links, Van Reekum, Tannock e Toplak
(2012) observam uma variedade de déficits nas funções executivas em pacientes com TPB
que podem estar associadas ao comportamento suicida. Em estudo realizado por esses autores
foram examinadas funções cognitivas como a inibição motora, a memória de trabalho e a
tomada de decisões em 42 mulheres com diagnóstico de TPB, comparando-as com grupo
controle saudável. Os resultados não demonstraram diferenças significativas entre os dois
37

grupos, exceto que nas pacientes com TPB a tomada de decisão se mostrou mais prejudicada
que no grupo controle. Ainda na comparação entre o grupo de pacientes com TPB com e sem
tentativa de suicídio não se identificou diferença significativa com relação à função cognitiva
referente a tomada de decisão. Além disso, nesse estudo o preditor mais significativo para a
efetivação do suicídio foi a presença de tentativas de suicídio prévias, o que também parece
ser consenso na literatura científica sobre suicídio (Lieb et al., 2004; Monarch et al., 2004).
Já no estudo realizado por Preissler et al. (2010), comparando mulheres com TPB com
um grupo controle, verificaram-se marcados prejuízos na cognição social, na regulação das
emoções, dos impulsos e pensamentos. Esse autor também identificou que quando o TPB
ocorre simultaneamente com o transtorno de estresse pós-traumático, impulsividade e abuso
sexual na infância, há maior risco de problemas na cognição e propensão para o
comportamento suicida. Reforçando esses achados, Sternbach et al. (1992) afirma que
distorções cognitivas como visão do tudo ou nada, catastrofismo e dificuldade de avaliação
adequada das situações são comuns em pacientes com TPB. Assim, a dificuldade na regulação
dos afetos e dos impulsos pode levar ao comportamento suicida em virtude de problemas na
tomada de decisões e no julgamento da realidade.
Segundo Zanarini et al. (2011), automutilações, tentativas de suicídio prévias e
problemas na cognição constituem forte risco de morte para pacientes portadores de TPB. Em
seu trabalho de investigação, foram avaliados 290 pacientes com TPB, elencando alguns
preditores para risco grave de suicídio nessa população, tais como: sexo feminino, presença de
sintomas dissociativos, transtorno de humor associado, especialmente depressão, história de
abuso sexual na infância, ter sofrido violência sexual na vida adulta e, por último, a
severidade das distorções cognitivas apresentadas. Já para Maloney, Degenhardt, Darke e
Nelson (2009), os principais fatores de risco para suicídio em pacientes com TPB também
incluem o fato de ser mulher, apresentar quadro de ansiedade e impulsividade, além de abuso
de substâncias associado. Esses pesquisadores destacam, ainda, a necessidade de se avaliar os
níveis de impulsividade em pacientes com TPB que tenham apresentado tentativa de suicídio
prévia, pois esses pacientes estariam mais propensos a efetivar o suicídio, confirmando
estatísticas que afirmam que um em cada dez pacientes com TPB comete o suicídio ao longo
do curso da doença (Le Gris & Van Reekum, 2006; Monarch et al., 2004; Zweig-Frank &
Paris, 2002). Convém salientar que esse índice é similar a patologias severas como
esquizofrenia e depressão maior (Bertolote & Feischamnn, 2002).
No que se refere à presença de comorbidades, Carpinello et al. (2011) afirmam que
quando o TPB está associado ao transtorno de humor bipolar, aumentam-se três vezes as
38

chances de suicídio, sendo o mesmo mais elevado quando o TPB apresenta comorbidade com
qualquer outra psicopatologia (Dziobek et al., 2011). Dentre as comorbidades mais
identificadas estão a dependência química, o transtorno de humor bipolar, a depressão e o
transtorno de estresse pós-traumático (Lieb et al., 2004).
Mesmo frente a todas essas evidências de estudos, pesquisas brasileiras ou latino-
americanas que investiguem as relações entre funções cognitivas, comportamento suicida e
TPB ainda são escassas. Assim, torna-se evidente a necessidade de estudos que avaliem
aspectos cognitivos, níveis de impulsividade e de ideação suicida de forma mais aprofundada
e detalhada em pacientes com TPB no nosso contexto, com vistas ao delineamento de práticas
preventivas e também no âmbito clínico. Conforme sugerido por autores que trabalham e
publicam dentro desse tema (Le Gris et al., 2012; Monarch et al., 2004; Le Gris & Van
Reekum, 2006), a exploração das questões cognitivas e comportamentais, além de ainda
necessitar de estudos e novas descobertas, é crucial para melhorar as formas de tratamento
para esta população.
A dificuldade de tratamento, os abandonos frequentes dos mesmos e o alto índice de
suicídio relacionado a esse transtorno motiva o desenvolvimento de estudos que revisem
aspectos já conhecidos do TPB, assim como se concentrem em áreas ainda pouco exploradas,
relacionadas a aspectos emocionais, mas também cognitivos. Desta forma, este estudo tem
como objetivo investigar o desempenho cognitivo, os níveis de impulsividade e a ideação
suicida de pacientes diagnosticados com TPB com e sem histórico de tentativas de suicídio,
internados em uma clínica psiquiátrica de Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil.
39

2 Método

2.1 Delineamento
Foi realizado um estudo transversal, quantitativo e de comparação entre grupos.

2.2 Participantes
Para determinação do tamanho de amostra utilizou-se como base os dados apontados
por Le Gris e Van Reekum (2006), onde foram detectadas diferenças nas pontuações médias
das subescalas da WAIS III entre investigados com e sem histórico de suicídio variando, de
modo geral, entre 15 e 45%. Assumindo que nos grupos a serem investigados a diferença
entre as médias esteja contida no intervalo entre 15 a 20% e, considerando um nível de
significância de 5% (α=0,05) e um poder de 80% (1-β), o tamanho mínimo de amostra foi
estimado em 34 ou 49 pacientes por grupo, totalizando um mínimo de 68 sujeitos até 98
investigados. Os cálculos foram realizados através do programa Stata 8.0. A Tabela 1
apresenta as estimativas de erro e tamanho amostral.

Tabela 1
Estimativas de Erros e Tamanhos de Amostra

Tamanhos de amostra
Erro máximo admissível (YY)*
Por grupo (XX) Total (HH)
10 77 144
15 49 98
20 34 68
25 25 50
30 16 32

*Coeficiente de variação para a diferença entre as médias dos dois grupos

A amostra foi composta por 82 participantes, sendo 30 homens (36,6%) e 52 mulheres


(63,4%), idade entre 18 a 59 anos (M=31,80; DP=0,96) com diagnóstico de Transtorno de
Personalidade Emocionalmente Instável segundo os critérios constantes na CID-10 (OMS,
1999). Todos os participantes estavam internados em uma clínica psiquiátrica particular,
localizada na cidade de Porto Alegre, RS. Foram excluídos os pacientes que apresentaram
diagnósticos de demência, esquizofrenia, dependentes químicos com menos de sete dias de
abstinência e psicoses agudas.
40

Quanto ao nível de escolaridade, 11 (13,8%) possuíam o ensino fundamental


completo, 42 (51,5%) ensino médio, 23 (28,8%), ensino superior e 4 (5,0%) possuíam pós-
graduação concluída. No que se refere à situação ocupacional, 27 (32,9%) estavam
desempregados, 26 (31,7%) possuíam emprego formal, 22 (26,8%) estavam em benefício de
saúde, 6 (7,3%) tinham emprego informal e 1 (1,2%) era aposentado.
Com relação ao nível socioeconômico, de acordo com o número de salários mínimos
informados pelos participantes, 12 (14,6%) eram de nível socioeconômico baixo, 63 (76,8%)
indicaram nível socioeconômico médio e 7 (8,5%) apresentam nível socioeconômico alto.
Referente ao estado civil, 50 (61,7%) estavam solteiros, 12 (14,8%) eram casados, 11 (13,6%)
estavam em união estável e 8 (9,9%) eram divorciados. Entre os participantes, 48 (58,5%) não
tinham filhos e 34 (41,5%) tinham um ou mais filhos. A Tabela 2 resume os dados
sociodemográficos da amostra estudada.

Tabela 2
Dados Sociodemográficos (N=82)
Frequência Porcentagem
Sexo Masculino 30 36,6%
Feminino 52 63,4%
Idade M=31,80 DP=10,96
Escolaridade E. Fundamental 11 13,8%
E. Médio 42 52,5%
E. Superior 23 28,8%
Pós-Graduação 4 5,0%
Situação Ocupacional Emprego formal 26 31,7%
Emprego informal 6 7,3%
Desempregado 27 32,9%
Benefício de saúde 22 26,8%
Aposentado 1 1,2%
Nível Socioeconômico Baixo 12 14,6%
Médio 63 76,8%
Alto 7 8,5%
Estado Civil Solteiro 50 61,7%
Casado 12 14,8%
Divorciado 8 9,9%
União estável 11 13,6%
Filhos Sim 34 41,5%
Não 48 58,5%
41

Do total da amostra (N=82), apenas 7 (8,5%) não apresentavam comorbidades


associadas ao TPB. As patologias identificadas foram: dependência química em 39 (48,8%)
participantes, transtorno de humor bipolar em 37 (45,1%), depressão em 26 (31,7%), TDAH
em 5 (6,1%), transtorno de ansiedade em 5 (6,1%) e psicoses em 2 (2,4%). Em relação ao uso
de medicação, apenas 2 (2,4%) dos pacientes não estavam utilizando nenhuma medicação na
época em que foram avaliados, sendo que os principais fármacos utilizados foram
antipsicóticos, por 32 (39,0%), antidepressivos por 26 (31,7%), estabilizadores de humor por
16 (19,5%), benzodiazepínicos por 25 (30,5%) e outros tipos por 16 (19,51%) participantes. A
Tabela 3 resume as comorbidades apresentadas e os tipos de medicações utilizadas pelos
participantes.

Tabela 3
Comorbidades (n=75) e Tipo de Medicação Utilizada (n=80)
Frequência Percentil
Comorbidades Dependência química 39 48,8%
Transtorno de humor bipolar 37 45,1%
Depressão 26 31,7%
TDAH 5 6,1%
Transtorno de ansiedade 5 6,1%
Psicoses 2 2,4%
Tipo de medicação Antipsicóticos 32 39,0%
Antidepressivos 26 31,7%
Estabilizadores de humor 16 19,5%
Benzodiazepínicos 25 30,5%
Outros 16 19,5%

Em relação ao uso de drogas, 41 (51,3%) dos participantes referiram não utilizar e 39


(48,8%) relataram uso recente, mas contavam com no mínimo sete dias de abstinência no
momento da avaliação. A droga de escolha mais identificada foi a cocaína por 28 (34,1%)
participantes, uso de maconha foi referido por 25 (30,5%), o álcool era droga de escolha de 23
(28,0%), o crack era utilizado por 6 (7,3%) participantes e o abuso de medicamentos foi
referido por 6 (7,3% ) participantes.
Quanto ao motivo da internação atual, 23 participantes (28%) internaram por tentativa
de suicídio, sendo que, desses, 3 (13,0%) foram internados por ideação suicida grave com
plano, 2 (8,7%) por automutilações, 8 (34,8%) por ingestão excessiva de medicação e 10
(43,5%) por outras maneirais, tais como tentativas letais com armas de fogo, enforcamento e
42

jogar-se de prédios. A Tabela 4 resume o método de tentativa de suicídio utilizada pelos


participantes.

Tabela 4
Método Utilizado para Tentativa de Suicídio (n=23)
Frequência Percentil
Ideação suicida grave 3 13,0%
Automutilações 2 8,7%
Ingestão de medicação 8 34,8%
Outros 10 43,5%

2.3 Instrumentos
2.3.1 Ficha de dados sociodemográficos (Anexo A)
Na ficha de dados sociodemográficos, elaborada para os fins da presente pesquisa,
foram investigadas características como: sexo, idade, escolaridade, nível socioeconômico,
estado civil, uso de medicação, comorbidades, doenças clínicas, história familiar de doença
mental e suicídio e uso de drogas.

2.3.2 Checklist segundo o CID-10 (Anexo B)


O checklist, segundo o CID 10 (OMS, 1994), é um instrumento semi estruturado que
tem por objetivo auxiliar os profissionais a detectar sinais e síndromes psiquiátricas nas
categorias de F0 a F6 do CID-10. Neste estudo, foi aplicado apenas o módulo F6, que é
direcionado para transtornos da personalidade e, mais especificamente, para o subtipo
Emocionalmente Instável, que corresponde ao TPB do DSM-IV (APA, 2002). Durante a
aplicação do checklist, são verificados os principais sintomas do transtorno, sendo que, para
confirmar o diagnóstico, o participante deve preencher cinco dos nove critérios do módulo
emocionalmente instável.

2.3.3 Escala de Inteligência Wechsler para adultos (WAIS-III)


A Escala de Inteligência Wechsler para adultos (Wechsler, 2004) é utilizada para
investigação do desempenho cognitivo em indivíduos com idades entre 16 a 89 anos. É
formada por 14 subtestes, possibilitando a mensuração do QI verbal, QI de execução e QI
total, podendo ainda fornecer informações sobre aspectos cognitivos de outros quatro
domínios: compreensão verbal, memória operacional, organização perceptual e velocidade de
43

processamento. Neste estudo, foram aplicados 11 subtestes, cinco da escala de execução e seis
da escala verbal permitindo assim a extração dos respectivos Q.I.s (α total=0,881).

2.3.4 Escala Barratt de Impulsividade (BIS-11 – Anexo C)


A Escala Barratt de impulsividade (Malloy-Diniz, Fuentes, Mattos, & Abreu 2010) é
um instrumento de autorrelato composto por 30 itens que descrevem comportamentos e
pensamentos que são avaliados pelos respondentes. É uma escala de tipo likert, cada um com
quatro alternativas, subentendendo graus crescentes de gravidade, com escores 1
(raramente/nunca), 2 (às vezes), 3 (frequentemente) e 4 (sempre ou quase sempre). A
pontuação da escala varia de 30 a 120 pontos e o escore total é o resultado da soma dos
escores individuais dos itens, identificando níveis distintos de comportamento impulsivo.
Além de um escore global, a escala permite o cálculo de escores parciais referentes a três
subdomínios da impulsividade: a impulsividade motora (itens 2, 3, 4, 16, 17, 19, 21, 22, 23,
25 e 30), a impulsividade atencional (itens 6, 5, 9, 11, 20, 24, 26, 28) e a impulsividade por
não planejamento (itens 1, 7, 8, 10, 12, 13, 14, 15, 18, 27, 29). α=0,438.

2.3.5 Escala de Ideação Suicida de Beck (BSI)


A Escala de Ideação Suicida de Beck (Cunha, 2001) é um instrumento de autorrelato
que investiga a presença de ideação suicida e mede a extensão da motivação e planejamento
do comportamento suicida em pacientes psiquiátricos com idades entre 17 e 80 anos. É
composto por 19 itens, com alternativas pontuadas como 0 (ausência total de indicador), 1
(presença de indicador moderado) e 2 (presença de indicador grave), além de dois itens
complementares, que não são incluídos no escore final, totalizando assim 21 itens. Investiga a
presença de ideação suicida e sua gravidade, planos e desejos de suicídio. Os dois últimos
itens informam sobre tentativas prévias de suicídio. Os 19 itens investigam o seguinte: 1.
desejo de viver, 2. desejo de morrer, 3. razões para viver ou morrer, 4. tentativa de suicídio
ativa, 5. tentativa de suicídio passiva, 6. duração das ideias de suicídio, 7. frequência das
ideias de suicídio, 8. atitude em relação à ideação suicida, 9. controle sobre atos suicidas, 10.
inibições a tentativa, 11. razões para tentativa, 12. planejamento, 13. oportunidade do método,
14. capacidade de realizar o método, 15. probabilidade de tentativa real, 16. extensão da
preparação verdadeira, 17. bilhete suicida, 18. atos e 19. despistamentos. O escore total é o
resultado da soma dos escores individuais dos itens. α=0,882
44

2.3.6 Escala FAST (Anexo D)


A escala The Functioning Assessment Short Test (FAST) é composta por 24 itens que
avaliam prejuízos em seis áreas psicossociais específicas: autonomia, trabalho, cognição,
finanças, relações interpessoais e lazer. A pontuação é determinada pela soma dos itens que
variam de zero, indicando ausência de prejuízos, a três, indicando prejuízo máximo (Cacilhas
et al., 2009).

2.3.7 Prontuário da internação


O prontuário do participante durante a internação também foi utilizado para identificar
a presença de comorbidades associadas ao TPB. Trata-se de um prontuário eletrônico, que
contempla os registros dos atendimentos realizados por diversos profissionais durante o
período de internação do paciente. A clínica psiquiátrica autorizou sua revisão, fornecendo o
termo de cessão de dados (Anexo E).

2.4 Procedimentos
Para a realização da coleta de dados, todos os pacientes que internaram na clínica
psiquiátrica com diagnóstico confirmado de TPB foram convidados a participar do estudo. O
diagnóstico de TPB foi confirmado a partir da avaliação psiquiátrica, com a presença do
diagnóstico de CID F60.31. Os pacientes que aceitaram participar do estudo tiveram todas as
suas dúvidas esclarecidas e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE
– Anexo F), informando seu consentimento. Em seguida, foi aplicada a ficha de dados
sociodemográficos. Os demais instrumentos – o checklist de sintomas da CID-10 para
Transtorno da Personalidade Emocionalmente Instável, o WAIS-III, a Escala de Ideação
Suicida de Beck, a Escala Barratt de Impulsividade e a Escala FAST – foram aplicados em
ordem aleatória, objetivando minimizar o cansaço e evitar influência da ordem das respostas.
A aplicação de todos os instrumentos foi realizada individualmente, em sala adequada da
Instituição. Foram realizados de 3 a 5 encontros com cada participante para a aplicação dos
instrumentos.

2.5 Procedimentos Éticos


O projeto de pesquisa foi encaminhado ao Comitê de Ética em Pesquisa da
UNISINOS e teve sua aprovação no dia 18 de maio de 2012, sob o número do processo
12/002 (Anexo G). Durante a aplicação do TCLE, foram explicados os objetivos e
procedimentos do estudo, enfatizando que a participação era voluntária e que os participantes
45

poderiam retirar o seu consentimento a qualquer momento, sem prejuízo no atendimento


padrão oferecido pela clínica. Além disso, foi assegurado que seria preservado o anonimato
dos participantes.
46

3 Resultados

Em um primeiro momento, foram realizadas as estatísticas descritivas, verificando-se


os escores da amostra em geral nos instrumentos utilizados. Abaixo, na Tabela 5, estão os
valores mínimo e máximo, média e desvio padrão para as variáveis do estudo.

Tabela 5
Valores Mínimo e Máximo, Média e Desvio Padrão das Variáveis
Mínimo Máximo M (DP)
Escala Barratt de Impulsividade (BIS-11) 63 93 76,55 (5,98)
Impulsividade motora 19 41 26,40 (3,68)
Impulsividade atencional 14 27 20,82 (2,91)
Impulsividade por não planejamento 21 36 29,32 (3,75)
Escala FAST 7 64 28,81 (14,37)
Autonomia 0 10 3,50 (2,61)
Trabalho 0 17 6,00 (4,59)
Cognição 0 15 7,53 (3,42)
Finanças 0 6 3,16 (2,14)
Relações interpessoais 0 18 6,29 (4,53)
Lazer 0 6 2,30 (1,96)
Escala de Ideação Suicida de Beck (BSI) 0 34 9,25 (10,39)
WAIS-III 64 136 94,07 (15,51)
Escala verbal 67 122 96,04 (14,62)
Escala de execução 63 148 91,90 (16,45)
Completar figuras 1 15 8,35 (2,76)
Vocabulário 4 16 10,26 (2,45)
Códigos 2 19 7,86 (3,57)
Semelhanças 3 19 11,41 (3,93)
Cubos 3 17 9,15 (3,24)
Aritmética 1 16 7,41 (3,01)
Raciocínio matricial 3 16 9,67 (3,01)
Dígitos 2 17 7,63 (3,26)
Informações 2 15 9,20 (3,32)
Arranjo de figuras 3 18 8,81 (3,09)
Compreensão 2 19 10,84 (3,73)

Para a análise inferencial, um primeiro procedimento foi separar os participantes em


grupos, sendo que o grupo 1 (G1) foi composto por pacientes sem histórico de tentativas de
suicídio e o grupo 2 (G2) por pacientes com histórico de tentativas de suicídio. O G1 foi
constituído por 33 (40,2%) participantes, sendo 16 do sexo masculino e 17 do feminino e o
G2 foi constituído por 49 (59,8%) participantes, sendo 14 do sexo masculino e 35 do sexo
47

feminino. No G2, 21 (25,6%) pacientes fizeram uma tentativa de suicídio e 28 (34,1%)


tentaram duas ou mais vezes. A Tabela 6 resume as tentativas de suicídio dos participantes.

Tabela 6
Número de Tentativas de Suicídio (n=82)
Frequência Percentil
Não tentaram 33 40,2%
Tentaram uma vez 21 25,6%
Tentaram duas ou mais 28 34,1%

Foi realizado o teste t de Student para verificar diferenças entre G1 e G2 no que se


refere às variáveis estudadas. Não foram encontradas diferenças significativas entre os sexos
quando comparados G1 e G2, porém, o teste de Qui-quadrado identificou uma tendência das
mulheres apresentarem maior porcentagem de tentativa de suicídio que os homens (x²=3,370
p<0,06). Com relação aos níveis de impulsividade (BIS-11), observou-se diferença
significativa (t=2,28, p<0,03) em relação à idade da amostra, sendo que os participantes com
menos de 30 anos de idade apresentaram médias maiores quando comparados aos
participantes com idade superior a 31 anos. Na subescala de planejamento, também foram
identificadas diferenças significativas (t=2,43, p<0,02) em relação à idade, sendo que os
participantes com menos de 30 anos de idade tiveram níveis mais elevados de impulsividade
(menores de 30 anos M=30,26; DP=3,00 e maiores de 31 anos M=28,48; DP=3,50).
Ao serem analisados os prejuízos nas áreas psicossociais (Escala FAST), identificou-
se diferença significativa (t=2,55, p<0,05) quanto à utilização de medicamentos em relação ao
fator ‘autonomia’, sendo que os usuários de medicamentos mostraram-se menos autônomos
que os não usuários. Identificou-se diferença significativa (t=2,84, p<0,05) também no fator
‘cognição’, sendo que os usuários de medicamentos apresentaram médias inferiores aos não
usuários. E ainda verificou-se diferença significativa (t=2,50, p<0,02) no escore total da
escala FAST (ajustamento psicossocial), sendo que os usuários de medicamentos
apresentaram médias inferiores aos não usuários (usuários de medicamentos M=28,11;
DP=13,91 e não usuários de medicamentos M=53,0; DP=9,89).
Ao especificar os tipos de medicamentos, identificou-se que os participantes que
faziam uso de antidepressivos apresentaram médias inferiores no fator ‘trabalho’ da escala
FAST (t=2,24, p<0,03), indicando dificuldades no trabalho para esses sujeitos. Também
verificou-se diferença significativa (t=1,93, p<0,02) no fator ‘finanças’, sendo que os usuários
de medicamentos apresentaram médias inferiores que os não usuários nesse fator. Na Escala
48

de Ideação Suicida de Beck (BSI), verificou-se diferença significativa (t=-6,96, p<0,01), entre
os grupos G1 e G2. Participantes sem tentativa de suicídio apresentaram médias inferiores aos
participantes com tentativa. Também houve diferença significativa (t=-2,87, p<0,01) na
escala BSI quanto ao sexo, sendo que as mulheres mostraram médias mais elevadas que os
homens. A Tabela 7 apresenta os resultados dos instrumentos utilizados comparando G1 e
G2.

Tabela 7
Comparação de Médias de Resultados dos Instrumentos entre G1 e G2
G1 (n=33) G2 (n=49)
M (DP) M (DP)
Escala Barratt de Impulsividade (BIS-11) 75,37 (5,19) 77,32 (6,38)
Impulsividade motora 25,59 (2,99) 26,93 (4,01)
Impulsividade atencional 21,09 (2,73) 20,65 (3,03)
Impulsividade por não planejamento 28,68 (3,54) 29,73 (3,23)
Escala FAST 27,46 (14,53) 29,80 (14,36)
Autonomia 3,56 (2,51) 3,46 (2,72)
Trabalho 6,13 (3,98) 5,90 (5,04)
Cognição 7,00 (3,47) 7,92 (3,37)
Finanças 2,60 (2,15) 3,58 (2,06)
Relações interpessoais 6,36 (4,53) 6,24 (4,59)
Lazer 1,80 (1,74) 2,68 (2,05)
Escala de Ideação Suicida de Beck (BSI) 1,37 (3,85)* 14,40 (10,09)*

WAIS-III 96,06 (17,08) 92,73 (14,39)


Escala verbal 97,15 (15,39) 95,32 (14,21)
Escala de execução 94,21 (18,70) 90,38 (14,82)
Completar figuras 8,57 (2,92) 8,20 (2,67)
Vocabulário 10,78 (2,63) 9,91 (2,29)
Códigos 8,21 (3,60) 7,63 (3,57)
Semelhanças 11,60 (4,44) 11,28 (3,58)
Cubos 9,90 (3,74) 8,65 (2,79)
Aritmética 7,75 (3,35) 7,18 (2,78)
Raciocínio matricial 9,66 (3,00) 9,67 (3,04)
Dígitos 8,39 (3,47) 7,12 (3,03)
Informações 9,30 (3,32) 9,14 (3,36)
Arranjo de figuras 8,78 (3,19) 8,83 (3,06)
Compreensão 10,60 (3,99) 11,00 (3,59)

*p<0,01

Foram calculadas correlações de Pearson entre as variáveis do estudo. Verificou-se


correlação positiva entre a escala Barratt de Impulsividade e o fator ‘finanças’ da escala
49

FAST (r=-0,265, p<0,05). Esse dado indica que quanto mais impulsividade menos finanças e
quanto menos finanças mais impulsividade. Identificou-se correlação negativa entre
‘impulsividade motora’ e o fator ‘lazer’ da escala FAST (r=-0,247, p<0,05). Esse dado indica
que quanto mais impulsividade motora, menos lazer e vice-versa. Também se verificou
correlação negativa entre ‘impulsividade atencional’ e o fator ‘autonomia’ da escala FAST
(r=-0,266, p<0,05) bem como em relação ao fator ‘trabalho’ da mesma escala (r=-0,237,
p<0,05). Esses dados indicam que quanto mais impulsividade atencional, menos a pessoa é
autônoma e também quanto menos a pessoa for autônoma, mais impulsiva pode se tornar.
Além disso, quanto mais impulsividade atencional, menos trabalho e quanto menos trabalho,
mais impulsividade atencional. Na Tabela 8, apresentam-se as correlações significativas.

Tabela 8
Correlações entre Fatores da Escala FAST e Impulsividade
Lazer Autonomia Trabalho Finanças
Impulsividade motora -0,247

Impulsividade atencional -0,266 -0,237

Impulsividade por não planejamento 0,379*

BIS-11 0,265
p<0,05 *p<0,01

No que se refere ao WAIS-III e seus subtestes, foram encontradas correlações


negativas entre ‘impulsividade por não planejamento’ e a escala de ‘semelhanças’ (r=-0,245,
p<0,05) e a escala de ‘informação’ (r=-0,234, p<0,05). Esses dados indicam que quanto mais
impulsividade por não planejamento, menos capacidade o indivíduo tem para estabelecer
semelhanças e quanto menor a capacidade de planejamento, mais impulsivo se torna. Além
disso, quanto mais impulsividade por não planejamento, menos informação e quanto menos
informação, mais impulsividade por não planejamento. A Tabela 9 demonstra a correlação
entre as subescalas do WAIS-III.

Tabela 9
Correlação entre Semelhanças e Informação do WAIS-III com Impulsividade por não Planejamento
Semelhanças Informação
Impulsividade por não planejamento -0,245 -0,234

p<0,05
50

Através de uma ANOVA, identificou-se diferenças significativas entre os níveis de


escolaridade e o escore total do WAIS-III (F=4,89 p<0,01), escala de ‘execução’ (F=3,08
p<0,03) e a escala ‘verbal’ (F=5,38 p<0,01). De acordo com esses resultados, pacientes com
ensino fundamental completo apresentaram médias mais baixas nestas escalas quando
comparados a pacientes com ensino médio, ensino superior e pós-graduação.
Em relação às comorbidades apresentadas pelos participantes, o teste t de Student
apontou diferença significativa (t=2,09, p<0,05) entre grupo de pacientes com e sem
diagnóstico de depressão no fator referente a ‘relações interpessoais’ da escala FAST.
Participantes com diagnóstico de depressão apresentaram médias inferiores nesse fator
quando comparados a participantes sem diagnóstico de depressão (participantes com
diagnóstico de depressão M=4,80; DP=3,94 e participantes sem o diagnóstico de depressão
M=7,10; DP=4,67).
51

4 Discussão

Em relação aos dados sociodemográficos, a amostra estudada vai ao encontro do que


preconiza a literatura, na medida em que se observam pacientes jovens com TPB, com média
de idade em torno de 31 anos. Autores que estudam o assunto concordam que o TPB tende a
entrar em remissão progressiva a partir da quarta década de vida, podendo chegar, em alguns
casos, a níveis não clínicos de psicopatologia (Bradley, Jenei, & Western, 2005; Links, 2007;
Links, Heslegrave, & Van Reekum, 1999; Soderberg, Kullgren, & Renberg, 2004). Deste
modo, a amostra estudada enquadra-se dentro do preconizado pela literatura em relação à
idade na qual o transtorno é mais frequente.
Observa-se que o grau de escolaridade dos participantes do estudo centralizou-se nos
níveis fundamental e médio, corroborando também a literatura. Para esses pacientes, é difícil
avançar para níveis superiores de escolaridade, o que pode ser explicado pela instabilidade
que é própria do TPB, dificultando o seguimento e a manutenção em ambientes educacionais
(APA, 2002; Arza et al., 2009; Kaplan, Sadock, & Greeb, 2007). O pior desempenho
apresentado pelos pacientes na área verbal do teste de WAIS-III demonstra que a escolaridade
está diretamente ligada a melhores escores nestas escalas, constatando-se que quanto mais
baixa a escolaridade de uma pessoa, mais baixo será seu desempenho na área verbal, uma vez
que a mesma trata de conhecimentos adquiridos.
A respeito da situação conjugal, a maioria dos pacientes eram solteiros ou divorciados,
refletindo, possivelmente, a dificuldade dessa população em vincular-se e manter-se em uma
relação estável devido a características do próprio transtorno, tais como oscilações de humor,
impulsividade e tendência a não confiar nas pessoas, oscilando entre extremos de idealização
e desvalorização (Kernberg, 1991). Assim, consequentemente, esses indivíduos podem contar
com uma rede de apoio mais restrita, o que empobrece seu repertório de habilidades sociais e
pode ser um complicador para os tratamentos e adequada inserção social dos mesmos. Nesta
mesma linha de pensamento, também se verificou muitos pacientes em situação de
desemprego, trabalhando na informalidade ou em benefício de saúde, o que também
corresponde ao perfil descrito de pacientes com TPB, uma vez que esse transtorno afeta
diretamente os relacionamentos sociais e pessoais, em função de, dentre outras características,
uma baixa tolerância à frustração, sendo este aspecto marcante nessa patologia (Gabbard &
Wilkinson, 1994; Kernberg, 1991; Paris, 2012).
Contrariamente ao esperado e retratado em alguns estudos internacionais, não se
verificou diferença significativa em termos de QI total entre os participantes sem histórico de
52

tentativa de suicídio e aqueles com histórico de tentativa de suicídio. Esse dado vai ao
encontro aos resultados de Le Gris et al. (2012), que em seu estudo também não observaram
diferença significativa entre estes grupos de pacientes estudados, à exceção de que o grupo de
tentadores de alta letalidade apresentou maiores prejuízos cognitivos que os tentadores de
baixa letalidade; variável que este trabalho não se propôs verificar. No entanto, as pesquisas
desses autores não deixam claro quais eram as comorbidades envolvidas na amostra
pesquisada, nem tampouco se os pacientes estudados estavam ou não internados, sendo que
esses fatores podem ter dificultado a observação das diferenças cognitivas no presente estudo.
Comorbidades podem prejudicar ainda mais o desempenho cognitivo de pacientes com TPB,
a exemplo do transtorno de humor bipolar e da dependência química, que apresentam curso
cognitivo claramente deteriorante. Ainda, na comparação entre os participantes com e sem
tentativa de suicídio, quanto à área de performance do teste de WAIS-III, que avaliou as
funções executivas, não se observou diferença significativa em termos de QI, o que no estudo
revisional de Le Gris e Van Reekum (2006) aparece como sendo uma tendência. O fato de
não haver diferença em termos de QI entre os participantes com e sem histórico de tentativas
de suicídio pode estar relacionado ao alto risco de suicídio relacionado ao TPB, indicando que
os participantes que até o momento da avaliação não haviam tentado suicídio, possam vir a
fazê-lo em algum momento, uma vez que há mais similaridades que diferenças entre a
amostra (Linehan, 2010). Além disso, aspectos socioculturais brasileiros podem ter
influenciado nos resultados da pesquisa, na medida em que os estudos existentes, comparando
grupos de pacientes com TPB com e sem tentativa de suicídio, foram encontrados apenas nos
Estados Unidos e na Europa (Arza et al., 2009; Le Gris & Van Reekum, 2006). Desta forma,
mais estudos devem ser realizados em nossa cultura para que se possa afirmar que há, de fato,
um impacto cultural interferindo nos resultados desta pesquisa.
Quanto ao nível de impulsividade, indo ao encontro do que demonstra a literatura
(Monarch et al., 2004), o grupo de pacientes com tentativas de suicídio apresentou índice mais
elevado quando comparado ao grupo de não tentadores. Há um consenso de que quanto maior
a impulsividade de um indivíduo, maior é o seu risco de suicídio. Desta forma, os resultados
da pesquisa estão de acordo com o que preconiza a literatura (APA, 2002; Linehan & Mazza,
2009; Links et al., 1999; Monarch et al., 2004). Também se observou que quanto mais
impulsivo é um indivíduo, menos autonomia e menos lazer ele terá, assim como seu
desempenho no trabalho também estará mais prejudicado. Consequentemente, menos
finanças, conforme já constatado em outros estudos e na experiência clínica (Brodsky et al.,
53

2006; Gvion & Apter, 2011). Assim, conclui-se que a impulsividade interfere negativamente
em vários aspectos da vida desses pacientes, acentuando inclusive o risco de suicídio.
Corroborando os achados atuais, os pacientes mais jovens apresentaram índices mais
elevados de impulsividade, inclusive por não planejamento, o que indica que esses pacientes
apresentam risco maior para ideação e tentativas de suicídio, na medida em que as duas
variáveis, planejamento e impulsividade, podem potencializar os efeitos uma da outra. Da
mesma forma, tais resultados indicam que há uma diminuição dos níveis de impulsividade e
dos principais sintomas do TPB a partir da quarta década de vida, culminando, em alguns
casos, com a remissão quase completa da sintomatologia (Zanarini et al., 2003). Esse dado
mostra que se os pacientes com TPB puderem chegar à quarta década de vida sem cometer
suicídio, mesmo apresentando tentativas prévias, estarão em menor risco para sua
consumação.
Ainda em relação às tentativas de suicídio, os dados corroboram a literatura, indicando
haver uma tendência maior em mulheres (Linehan & Mazza, 2009; Paris et al., 1999).
Também foi possível constatar a confiabilidade da escala de ideação suicida de Beck (Cunha,
2001) como um instrumento adequado para identificação do risco de suicídio, mostrando-se a
mesma com escores mais elevados no grupo de tentadores de suicídio.
Outro resultado relevante, que vai ao encontro da literatura, refere-se ao maior risco de
suicídio em pacientes com TPB que apresentam comorbidade com transtorno de humor
(Zanarini et al., 2011). A associação entre o TPB e os transtornos de humor parece ser um
indicador de severidade maior para o quadro, além de maior risco para ideação e tentativas de
suicídio, podendo aumentar o risco de suicídio em até três vezes (Carpinello, Piramba, &
Sarder, 2011). Corroborando os achados de Berk, Jeglic, Brown, Henriques e Beck (2007),
verificou-se que o TPB está associado a inúmeras comorbidades e que essas interferem
negativamente na evolução e no tratamento dessa população. No presente estudo, mais de
45% dos pacientes apresentava comorbidade com THB e mais de 31% apresentavam
depressão, confirmando o que a literatura preconiza sobre a associação entre o TPB e várias
outras psicopatologias (Carpinello et al., 2011; Lieb et al., 2004; Zanarini et al., 2011).
Em relação ao uso de medicamentos pela população estudada verificou-se que apenas
dois participantes não faziam uso de algum psicofármaco à época da avaliação, denotando a
gravidade da população que foi pesquisada, que se encontrava integralmente em regime de
internação psiquiátrica. Esse alto índice de uso de medicamentos pode ser explicado pela
associação do TPB com as inúmeras comorbidades associadas cujo tratamento é,
54

predominantemente, psicofarmacológico, a exemplo do THB, depressão e as primeiras


semanas de abstinência de substâncias químicas (Lieb et al., 2004).
55

5 Considerações finais

O TPB constitui-se como uma desordem emocional severa que atinge inúmeras áreas
do funcionamento da vida do paciente. É consenso que características do próprio transtorno
tais como a instabilidade emocional, as oscilações de humor, a ideação suicida, as
automutilações, a impulsividade e os estressores ambientais interferem significativamente no
curso e no tratamento dessa patologia. Mesmo com a utilização de instrumentos padronizados,
validados e referenciados mundialmente, ainda se mostra difícil encontrar diferenças entre
indivíduos com TPB, tanto para avaliação do risco de suicídio, quanto para alterações
cognitivas que podem ser essenciais para ajustar tratamentos mais adequados.
Este trabalho teve como objetivo avaliar o desempenho cognitivo, os níveis de
impulsividade e a ideação suicida de pacientes diagnosticados com TPB com e sem histórico
de tentativas de suicídio. Em relação ao desempenho cognitivo, os resultados demonstraram
que, com relação ao QI total, os valores encontrados não diferiram significativamente entre os
participantes com e sem histórico de tentativas de suicídio, estando o mesmo um pouco mais
baixo no grupo de pacientes com tentativas de suicídio. Em relação à impulsividade, o grupo
de pacientes com tentativa de suicídio mostrou níveis mais elevados na Escala Barratt de
Impulsividade, assim como na Escala de Suicídio de Beck, indicando maior risco tanto para
tentativas como para a efetivação do suicídio.
O que se confirmou neste estudo e que também está amplamente respaldado pela
literatura é a presença de tentativas de suicídio anteriores como um importante indicador para
novas tentativas e para a consumação do próprio suicídio em pacientes com TPB. Este dado é
preocupante, reforça a importância dos estudos e o desafio que representa o tratamento para
estes pacientes. De acordo com Paris (2009), os pacientes com TPB suicidas são instáveis e
inconstantes, e tanto as tentativas quanto a consumação do ato são bastante difíceis de serem
preditas.
As limitações deste estudo centram-se principalmente na questão de que toda a
amostra de pacientes estava internada em unidade psiquiátrica, constituindo assim uma
parcela da população de pacientes com TPB mais grave, necessitando de cuidados intensivos
e apresentando riscos iminentes. O fato de esta amostra também apresentar variadas
comorbidades, como THB, depressão e dependência química, também pode ter influenciado
os resultados, pois algumas dessas patologias apresentam curso grave e deteriorante se
sobrepondo clinicamente ao TPB. A abstinência de substâncias, por exemplo, no caso dos
dependentes químicos e as dificuldades no manejo e na aplicação dos instrumentos em
56

pacientes muito deprimidos ou em exaltação maníaca nos transtornos de humor, podem ter
sido variáveis que interferiram dinamicamente nos resultados.
Em virtude da heterogeneidade, da complexidade de suas manifestações e
especialmente da sua associação com inúmeras comorbidades, o TPB é uma desordem de
personalidade que demanda mais estudos que investiguem aspectos cognitivos, assim como
comportamentais, sociais, familiares, entre outros. Embora exista um número considerável de
estudos e adequada literatura, ainda são escassos estudos latino-americanos e especificamente
brasileiros que investiguem esse transtorno e todos os aspectos que com ele se
interrelacionam. Desta forma, sugere-se novas pesquisas no Brasil, a fim de identificar
maneiras mais adequadas e eficazes de tratar esta parcela da população que se coloca
constantemente em risco tanto para automutilações e tentativas de suicídio, quanto para a
efetivação do próprio suicídio. Devido a variação na intensidade dos déficits cognitivos em
pacientes com TPB, o perfil neuropsicológico pode suportar ações de reabilitação cognitiva,
aprimorando o tratamento desta doença e, em adição, assegurando um prognóstico mais
favorável e melhores índices qualidade de vida nesta população.
57

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61

Considerações finais da dissertação

Esta dissertação teve como objetivo investigar o desempenho cognitivo de


participantes com Transtorno de Personalidade Borderline (TPB) com e sem histórico de
tentativas de suicídio. A partir das referências revisadas, verificou-se que o TPB tem etiologia
complexa e o comportamento suicida, característico deste transtorno, é dependente de
múltiplos fatores, entre os quais os aspectos cognitivos (Andersson et al., 2008; Anestis,
Selby, & Joiner, 2007; Brezo, Paris, & Turecki, 2006; Brodsky et al., 2006; Freeman & Beck,
2000; Gvion & Apter, 2011; Joyce et al., 2010; O'Connor & Noyce, 2008; Sprock et al., 2000;
Romaro, 2002). Os resultados desta dissertação elucidaram alguns aspectos sobre o TPB,
permitindo refletir sobre a necessidade de aprimoramento e adequação das formas de
tratamento. Ressalta-se a necessidade da realização de outros estudos dentro desta mesma
temática, em virtude da carência de pesquisas neuropsicológicas ou sobre funções cognitivas
em pacientes com diagnóstico de TPB, especificamente no Brasil.
62

Referências

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63

ANEXOS
64

ANEXO A – FICHA DE DADOS SOCIODEMOGRÁFICOS


Entrevistador:
Data da entrevista:
Nome completo do paciente:
Sexo: (1)M (2)F
Data de nascimento:
Idade:
Cor:
Local do nascimento:
UF:
Lateralidade:
Data da internação atual:
Tentativa de suicídio como um dos motivos desta internação: ( ) sim ( ) não
Método da tentativa:
Uso de medicação atual: ( ) sim ( ) não
Tipo:
Dose:
Uso de drogas atual:
Tipo:
Quantidade:
Tempo de abstinência atual (dias):
Uso de drogas no passado:
Tipo:
Quantidade:
Período máximo de abstinência de drogas no passado:
Histórico de doenças clínicas:
Histórico de diagnósticos psiquiátricos:
Nível de instrução: ( ) fundamental ( ) médio ( ) superior ( ) pós-graduação
Estado civil: ( ) solteiro ( ) casado ( ) viúvo ( ) divorciado ( ) união estável
Situação ocupacional: ( ) empregado formalmente ( ) informalidade ( ) desempregado
( ) em benefício de saúde ( ) aposentado
Nível socioeconômico: ( ) baixo ( ) médio ( ) alto
Número de filhos:
65

ANEXO B - CHECKLIST DA CID-10


66
67
68
69

ANEXO C – ESCALA DE IMPULSIVIDADE DE BARRATT

Instruções: As pessoas são diferentes quanto à maneira como se comportam e pensam em


situações distintas. Este é um questionário para medir algumas formas como você age e
pensa, não existe resposta certa ou errada. Marque apenas uma alternativa para cada
questão. Não pense em nenhuma das questões. Responda rápida e honestamente.

Às vezes
Raramente/ nunca

Frequentemente

Sempre ou quase
sempre
1. Eu planejo minhas atividades com cuidado
2. Eu faço as coisas sem pensar
3. Eu sou despreocupado, “cuca fresca”
4. Meus pensamentos são rápidos
5. Eu planejo minhas saídas ou passeios com antecedência
6. Eu sou uma pessoa controlada
7. Eu me concentro com facilidade
8. Eu tenho facilidade para economizar dinheiro
9. Eu acho difícil ficar sentado por muito tempo
10. Eu costumo pensar com cuidado em tudo
11. Eu quero ter um trabalho fixo para poder pagar minhas
Despesas
12. Eu falo as coisas sem pensar
13. Eu gosto de ficar pensando sobre problemas
Complicados
14. Eu troco de trabalho frequentemente ou não fico muito
tempo com a mesma atividade (cursos, esportes)
15. Eu faço as coisas no impulso
16. Eu me canso com facilidade tentando resolver problemas
mentalmente, de cabeça
17. Eu me cuido para não ficar doente
18. Eu faço as coisas no momento em que penso
19. Eu tento pensar em todas as possibilidades antes de
tomar uma decisão
20. Eu troco de casa com frequência ou não gosto de viver
no mesmo lugar por muito tempo.
21. Eu compro coisas impulsivamente, sem pensar
22. Eu termino o que começo
23. Eu caminho e me movimento rápido
24. Eu resolvo os problemas com tentativa e erro
25. Eu gasto mais do que ganho ou do que posso
26. Eu falo rápido
27. Enquanto estou pensando um uma coisa, é comum que
outras ideias me venham à cabeça ao mesmo tempo.
28. Eu me interesso mais pelo presente do que pelo futuro
29. Eu me sinto inquieto em aulas ou palestras
30. Eu faço planos para o futuro
70

ANEXO D – Escala FAST


71

ANEXO E – TERMO DE CESSÃO DE DADOS


72

ANEXO F – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE)


73

ANEXO G – Aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa

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