CONTRIBUIÇÕES DE PAULO FREIRE PARA O DEBATE SOBRE A FO RMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES.p FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES
CONTRIBUIÇÕES DE PAULO FREIRE PARA O DEBATE SOBRE A FO RMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES.p FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES
CONTRIBUIÇÕES DE PAULO FREIRE PARA O DEBATE SOBRE A FO RMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES.p FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES
CONTRIBUIÇÕES DE PAULO FREIRE PARA O DEBATE SOBRE A FORMAÇÃO CONTINUADA DE
PROFESSORES
Andréia Nunes Militão
Doutoranda em Educação ‐ FCT/UNESP/PP. E‐mail: [email protected]. Bolsista FAPESP
RESUMO
A análise das políticas de formação de professores aponta insuficiências que ainda não foram
superadas, sobretudo, o reduzido impacto sobre a qualidade da educação. Neste trabalho
problematiza‐se esta realidade a partir da discussão das obras de Paulo Freire, destacando o lugar
da formação continuada nas políticas públicas atuais. Freire teoriza e experiencia a formação de
professores, denominada pelo autor de ‘formação permanente’. Partindo da análise da obra
Educação na Cidade, entendemos que Freire se antecipa ao debate intelectual, ao implementar
durante o período que exerceu a função de secretário municipal (1989‐1991), a ‘formação
permanente’ no interior das escolas, considerando os saberes dos professores numa relação
reflexiva junto com intelectuais de diferentes universidades paulistas.
Palavras‐chave: Formação Permanente; Formação Continuada; Desenvolvimento Profissional;
Paulo Freire; Política Educacional.
INTRODUÇÃO E OBJETIVO
Nas últimas décadas, a formação de professores assumiu novo significado, em
especial, com regulação dada a partir da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(LDB/1996) e pelo FUNDEF/FUNDEB, impulsionando a proliferação da formação continuada para
os professores em exercício.
O estado da arte realizado por Gatti, Barreto e André (2011, p. 265) sobre a produção
das políticas docentes em âmbito nacional, evidencia “o predomínio do caráter individualizado das
ações formativas, na maioria dos modelos adotados nessas redes; nas secretarias de Educação
examinadas, não há focalização na equipe escolar como um todo”.
Para Gatti (2008) não existe clareza sobre o que é considerado como formação
continuada. Assim, encontra‐se sob esta mesma denominação, desde cursos realizados após a
graduação até atividades genéricas encaradas como possibilidade de contribuir para o
desenvolvimento profissional como reuniões pedagógicas, participação na gestão escolar, horas
de trabalho coletivo na escola, congressos, seminários e cursos de diferentes formatos oferecidos
pelas secretarias da educação ou outras instituições presenciais ou à distância.
Observa‐se que muitos programas de formação continuada acabaram por adquirir caráter
mais compensatório do que propriamente de atualização. Gatti (2008, p. 58) ressalta que outro
aspecto ainda presente nos cursos de formação continuada é a preocupação em resolver “os
problemas dos baixos resultados das avaliações externas, responsabilizando indiretamente os
docentes pelo problema da qualidade”.
Temos, portanto, um movimento em que se opõe e convivem diferentes concepções
sobre a formação docente, ora na perspectiva de reflexão sobre a prática, ora na perspectiva de
treinamento e, ainda, na visão tradicional de suprir possíveis falhas e lacunas da formação inicial.
Os estudos mais recentes 1 sobre formação continuada de professores sinalizam para
“a importância de os professores serem propositores dos programas de formação contínua, a
partir das necessidades que apontam”. Para Di Giorgi (et. al., 2010, p. 15), a formação contínua
pode ser definida como “um processo constante do aprender a profissão de professor, não como
mero resultado de uma aquisição acumulativa de informação, mas como um trabalho de seleção,
organização e interpretação da informação”.
Pretendemos, portanto, analisar um pouco mais detidamente estas visões sobre a
formação docente que de forma, explícita e/ou implícita, embasam as políticas públicas na área.
METODOLOGIA
A metodologia que percorre a construção do presente trabalho centra‐se em pesquisa
bibliográfica e análise de conteúdo a partir da obra “A educação na cidade” de Paulo Freire. Busca‐
se apreender a concepção de formação permanente de Freire ao se referir aos processos de
formação continuada efetivados no interior da escola. A partir dessa análise, defende‐se que
Freire antecipa‐se ao debate acadêmico ao tratar da formação, pois no final dos anos 1980 e início
da década de 1990 já defendia a formação centrada na escola e com ênfase no processo de
reflexão sobre a prática, posicionamento que só ganhou maior aceitação nos últimos anos.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Partimos da premissa de que a formação inicial não se esgota em si mesma, ou seja, a
formação continuada cumpre também a função articuladora entre a formação inicial e as
mudanças tanto no interior da escola, como do próprio sistema escolar.
Alguns autores apontam que as políticas públicas atuais caminham em sentido
contrário à implantação de uma verdadeira prática reflexiva, sobretudo, porque a formação de
1
DI GIORGI, Cristiano Amaral Garboggini et. al. Necessidades formativas de professores de redes municipais:
contribuições para a formação de professores crítico-reflexivos. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2010. GATTI, B. A.
e BARRETO, E. S. de Sá (coord.). Professores do Brasil: impasses e desafios. Brasília: UNESCO, 2009. GATTI, B.
A.; BARRETO, E. S. S.; ANDRÉ, M. E. D. A. Políticas docentes no Brasil: um estado da arte. Brasília: UNESCO,
2011.
docentes em cursos superiores tem sido realizada de maneira aligeirada e com caráter de
certificação e não de formação. Destacam, ainda, a desqualificação dos professores com a
transformação de seus saberes e saberes‐fazeres, diretamente ligados a operacionalização do
ensino, transformando‐os em tutores e monitores da aprendizagem (PIMENTA e GHEDIN, 2002,
p.46).
Nessa mesma direção, Freire destaca que “[...] na formação permanente dos
professores, o momento fundamental é o da reflexão critica sobre a prática. É pensando
criticamente a prática de hoje ou de ontem que se pode melhorar a próxima prática.” (1996, p. 43‐
44).
Freire (2001a, p.72) já alertava na década de 1990 para os perigos dos modelos de
formação que “em lugar de apostar na formação dos educadores o autoritarismo aposta nas suas
‘propostas’ e na avaliação posterior para ver se o ‘pacote’ foi realmente assumido e seguido”.
Antecipando‐se ao debate dos especialistas, Freire defendia que “[...] formar é muito mais do que
puramente treinar o educando no desempenho de destrezas”. (FREIRE, 1996, p. 15).
Freire acrescenta a essa concepção que a própria “natureza formadora da docência,
que não poderia reduzir‐se a puro processo técnico e mecânico de transferir conhecimentos [...].”
(2001a, p.39). Destaca, ainda, que
A melhora da qualidade da educação implica a formação permanente dos
educadores. E a formação permanente se funda na prática de analisar a
prática. É pensando sua prática, naturalmente com a presença de pessoal
altamente qualificado, que é possível perceber embutida na prática uma
teoria não percebida ainda, pouco percebida ou já percebida, mas pouco
assumida. (FREIRE, 2001a, p.72).
Neste sentido, mantém a coerência ao ocupar o cargo de governo, ao defender a
necessidade de “reorientar a política de formação dos docentes, superando os tradicionais cursos
de férias em que se insiste no discurso sobre a teoria [...]”. (FREIRE, 2001a, p.75).
Ao ser questionado sobre quais práticas constroem a competência do educador, Freire
destaca “[...] a prática de ensinar que envolve necessariamente a de aprender a de ensinar. A de
pensar a própria prática, isto é, a de, tomando distância dela, dela se ‘aproximar’ para
compreendê‐la melhor. Em última análise, a prática teórica de refletir sobre as relações
contraditórias entre prática e teoria”. (2001b, p. 205).
Destaca, ainda, que a formação do professor não é um processo que se restringe a
formação inicial, sendo mais do que uma necessidade do professor, trata‐se de uma necessidade
ética da qualidade de ensino e crítica da própria atividade.
por imprimir um caráter de treinamento à prática de formação que se mostra totalmente
contrário à tarefa da educação nos moldes pensados por Freire.
Como educador, eu sei o que significa a formação. É por isso que
brigo tanto com os americanos, pois resisto a aceitar que training
equivale a formação. Formação é muito mais que training. Então, a
formação dos educadores e a análise sobre ela tem muita
importância. (FREIRE, 2001b, p. 227).
Pimenta e Ghedin (2002) analisam as origens, pressupostos, e características dos
conceitos professor reflexivo e professor pesquisador, surgidos em diferentes países nos anos
1990. Donald Shön, valendo‐se de estudos de Dewey, propõe a mudança na formação de
professores, valorizando a experiência e a reflexão da experiência, rompendo o modelo anterior
que propunha a apresentação da ciência, depois sua aplicação e, por último, um estágio de
aplicação pelos alunos dos conhecimentos técnico‐profissionais (PIMENTA e GHEDIN, 2002, p.19).
Freire em sua experiência como gestor municipal também afirma que
Será privilegiada a formação que se faz no âmbito da própria escola,
com pequenos grupos de educadores ou com grupos ampliados,
resultantes do agrupamento das escolas próximas. Este trabalho
consiste no acompanhamento da ação‐reflexão‐ação dos educadores
que atuam nas escolas; envolve a explicação e análise da prática
pedagógica, levantamento de temas de análise da pratica
pedagógica que requerem considerando a reflexão sobre a prática e
a reflexão teórica (FREIRE, 2006, p. 81).
Em concordância com esse posicionamento, Almeida destaca que “como o professor
trabalha em um contexto determinado e sua prática desenvolve‐se de maneira institucionalmente
articulada, a melhora profissional leva à melhora institucional e vice‐versa.” (ALMEIDA, 1999, p.
40). Portanto, somente uma ação articulada no interior das organizações escolares pode levar a
melhoria profissional e, ao mesmo tempo, à transformação institucional.
Para García (1999, p. 144), o desenvolvimento profissional pode ser “[...] entendido
como um conjunto de processos e estratégias que facilitam a reflexão dos professores sobre a sua
própria prática, que contribui para que os professores gerem conhecimento prático, estratégico e
sejam capazes de aprender com a sua experiência”.
Outro aspecto defendido por Almeida (1999, p.41) assinala que “[...] o
desenvolvimento pessoal e profissional do professor é produzido dentro do contexto de
desenvolvimento da organização em que trabalha e, nessa medida envolve não apenas o
professor, mas toda pessoa com responsabilidade ou implicação na melhora da escola, sejam
administradores, coordenadores, pessoal de apoio, etc.”
Partindo‐se do pressuposto de que a ‘educação é um ato político’, não podemos
desconsiderar que a dimensão da formação também o é. Neste sentido, articular a questão da
formação continuada, com a valorização da escola pública, como um espaço de afirmação da
democracia e das oportunidades para as classes populares.
É urgente que engrossemos as fileiras da luta pela escola pública
neste país. Escola pública e popular, eficaz, democrática e alegre
com suas professoras e professores bem pagos, bem formados e
permanentemente formando‐se. Com salários em distância nunca
mais astronáutica, como hoje, frente aos de presidentes e diretores
estatais. (FREIRE, 2003, p. 49).
Este não é um processo que depende unicamente do professor, pois é necessário que
os sistemas de ensino criem as condições próprias para que isso se torne possível, rompendo‐se
assim com a imputação ao professor de toda a responsabilidade pela sua própria formação que
deve, portanto, ser uma preocupação coletiva articulada com a política do Estado.
O Estado pode ajudar, como tentamos na prefeitura de São Paulo,
pagando horas para que os professores estudem. Se a educação é
realmente uma prioridade, então é preciso conseguir o dinheiro para
que os professores, em sua casa ou na escola, tenham horas para
estudar dentro da jornada de trabalho. Os cursos de formação
permanente devem ser pagos. A compreensão que o poder público
tem do trabalho do magistério deve incluir as horas nas quais o
professorado está se preparando para ser melhor professor. (FREIRE,
2001b, p. 219‐20).
Uma nova construção sobre o conceito de desenvolvimento profissional docente
destaca que o mesmo deve considerar‐se “como um processo que tem lugar em contextos
concretos”. Essa premissa rompe com antigas práticas de formação que obliteravam as situações
de formação do cotidiano da sala de aula.
CONCLUSÃO
Os programas de formação continuada têm sido implantados a partir do olhar dos
gestores municipais e/ou estaduais desconsiderando as reais necessidades formativas dos
professores. Entendemos que a formação continuada só pode ser de fato efetivada quando os
professores passarem a ser proponentes e agentes das transformações a partir do seu local de
trabalho.
Para Freire, a formação permanente, enquanto uma necessidade do fazer profissional
deve estar centrada na escola sem, no entanto, se esquivar do diálogo com os pesquisadores.
Concluímos que o debate atual sobre a formação continuada possui certo consenso:
primeiro de que a forma preponderante tem pouca efetividade no cotidiano escolar, sobretudo,
por que a concepção não procura ligar a teoria com a prática e parte do pressuposto de que
ministrando ‘altas doses’ de teoria aos docentes, esta automaticamente se refletirá em sua
prática; segundo e, talvez mais importante, é que também existe um consenso sobre modelos de
formação mais efetivos, que parte da reflexão sobre a prática cotidiana dos professores em seu
próprio meio de trabalho.
Sobre esses aspectos, Paulo Freire em sua vasta produção pode ser revisitado, pois é
presente em seus escritos esta preocupação em articular teoria e prática, conforme ele mesmo
afirmava para evitar o ‘ativismo sem bases’ e, por outro, lado o verbalismo sem conseqüência.
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, Maria Isabel de. O sindicato como instância formadora dos professores: novas
contribuições ao desenvolvimento profissional. 1999. Tese (Doutorado em Educação) – Faculdade
de Educação, Universidade de São Paulo.
DI GIORGI, Cristiano Amaral Garboggini et. all. Necessidades formativas de professores de redes
municipais: contribuições para a formação de professores critico‐reflexivos. São Paulo: Cultura
Acadêmica, 2010.
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e Terra, 1996.
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Maria Araújo Freire).
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FREIRE, Paulo. Professora sim, tia não: cartas a quem ousa ensinar. 14ª ed. São Paulo: Editora
Olho d’Água, 2003.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da tolerância. São Paulo: Editora UNESP, 2004. (org. e notas de Ana
Maria Araújo Freire).
FREIRE, Paulo. A educação na cidade. 7ª ed. São Paulo: Cortez, 2006.
GATTI, Bernadete Angelina; BARRETO, Elba de Sá (coord.). Professores do Brasil: impasses e
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______. Saberes pedagógicos e atividade docente. São Paulo: Cortez, 2002.