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XV, logo depois da Guerra dos Cem anos, quando surgem diversas
Confrarias responsáveis pelas encenações.
Segismundo Spina, em Iniciação na cultura literária medie-
val (1973, p. 17), demonstra que as produções de intenção pedagógi-
ca, missionária, de moral religiosa denominam-se de literatura em-
penhada (Baixa Idade Média – sécs. XII-XV). Já a literatura de mo-
ral profana, semi-empenhada, em que se destacam as farsas, as sotti-
es (sotia) e os sermões burlescos.
A farsa tem suas origens nas festas dos bufões e nas recita-
ções dialogadas dos menestréis. Trata-se de uma peça curta do teatro
profano, que visa ao riso fácil, sem pretensões didáticas ou morali-
zantes. O riso é provocado pelo exagero de fatos, de comportamentos
cotidianos, evidenciando o povo. Não há, nessa modalidade teatral, o
desejo de se edificar o ser humano, nem tampouco moralizá-lo atra-
vés da alegoria.
De acordo com Margot Berthold (2003, p. 255), o marco ini-
cial desse tipo teatral é a obra Maître Pierre Pahtelin, de escritor
desconhecido, representada pela primeira vez por volta de 1465, cujo
tema é a trapaça em um negócio. Entretanto a crítica aponta o edito
de Preboste de Paris, de 1398, como prova histórica da origem da
farsa.
No gênero farsesco, a crítica social e a sátira têm lugar reser-
vado. Os diálogos de Maitre Pierre, por exemplo, são mordazes, as
frases sofisticadas, polidas, desembocam em brincadeiras grosseiras
que comprometem a classe dos advogados. Muitos autores, dentre
eles Rabelais e Grimmelshausen, apropriaram-se desse estilo de farsa.
Às associações de juristas conhecidas como Basoches devem
as melhores farsas em originalidade. As Basoches estabeleceram-se
em Paris e nas províncias durante o século XIV, realizando anual-
mente reuniões entretidas por pequenos diálogos farsescos e panto-
mimas, de cenas de casos jurídicos fictícios. Tal fato explica-se por
ser os fundadores da farsa, “advogados e escritores, estudantes e as-
sociações cênicas de cidadãos, eruditos errantes, mercadores e arte-
sãos” (Berthold, 2003, p. 256).
A inescrupulência da farsa é o motivo de sua eficácia: a auto-
ironia, a zombaria, a impudência com que são representados os con-
1 Também conhecido por entreato, intermezzo, interlúdio, o termo entremez designa generica-
mente qualquer tipo de entretenimento encenado entre atos ou as partes de uma peça maior.
Pode tomar forma de peças curtas, sketches, números circenses ou de pantomima ou núme-
ros musicais.
REFERÊNCIAS
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Coleção Letras.
BERNARDES, José Augusto Cardoso. Gil Vicente. Coimbra: Edições 70,
2008.
––––––. Sátira e lirismo no teatro de Gil Vicente I e II. 2ª ed. Lisboa: Im-
prensa Nacional, 2006.
––––––. Revisões de Gil Vicente. Coimbra: Angelus Novus, 2003.
BERTHOLD, Margot. História mundial do teatro. São Paulo: Perspectiva,
2003.
MONGELLI, Lênia Márcia de Medeiros et alii. A literatura portuguesa em
perspectiva: trovadorismo e humanismo. São Paulo: 1992, vol. 1.
SPINA, Segismundo. Iniciação na cultura medieval. Rio de janeiro: Grifo,
1973. Coleção síntese, vol. 1.
TEYSSIER, Paul. Gil Vicente – o autor e a obra. Tradução Álvaro Salema.
Lisboa: Instituto de Cultura e Língua Portuguesa, 1982. Coleção-Biblioteca
Breve – série literatura.
VASSALO, Lígia. O teatro medieval. In. CASTRO, Manuel Antonio. Tea-
tro sempre. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1983.
––––––. O grande teatro do mundo. In. Caderno de Literatura Brasileira.
Instituto Moreira Sales, nº 10, novembro, 2000.