ANGERAMI
ANGERAMI
ANGERAMI
Atualidades em psicologia da
saúde. São Paulo: Thomson, 2004. 185 p. ISBN 852210428X.
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Atualidades em Psicologia da Saúde
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Dados internacionais de catalogação na publicação (CIP)
(câmara brasileira do livro, SP, Brasil)
Atualidades em Psicologia na Saúde / Valdemar augusto angerami – camon, (org.) – são
paulo: pioneira thomson leraning, 2004.
Vários autores
Bibiliografia
ISBN 85-221-0428-X
1. Psicologia clinica 2. psicologia da saúde 3. medicina e psicologia 4. Medicina
psicossomática I. Angerami – camon, valdemar augusto.
04-0535 CDD-155.916
Índice para catálogo sistemático:
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Atualidades em Psicologia da Saúde
Valdemar Augusto Angerami — Camon (Organizador)
Gildo Angeiotti
THOMSON
Página 4
Gerente Editorial: Adilson Pereira
Editor de Desenvolvimento: Marcio Coelho
Supervisora de Produção Editorial: Patrícia La Rosa
Produtora Editorial: Danielle Mendes Sales
Copidesque: Ornilo Aives da Costa Júnior
Revisão: Sandra Garcia Cortes e Andréa da Silva Medeiros
Composição: DesignMakers Ltda.
Capa: Evandro Linhares Angerami
Copyright © 2004 de Pioneira Thomson Learning Ltda., uma divisão da Thomson
Learning, mc. Thomson Learning TM é uma marca registrada aqui utilizada sob licença.
Impresso no Brasil.
Printed in Brazil.
1 234 06 05 04
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste livro poderá ser reproduzida sejam
quais forem os meios empregados sem a permissão, por escrito, da Editora. Aos
infratores aplicam-se as sanções previstas nos artigos 102, 104, 106 e 107 da Lei n°
9.610, de 19 de fevereiro de 1998.
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Vários autores.
Bibliografia.
ISBN 85-221-0428-X
1. Psicologia clínica 2. Psicologia da saúde 3. Medicina e psicologia 4. Medicina
psicossomática
1. Angerami — Camon,
Valdemar Augusto.
04-0535
CDD-1 55.916
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Apresentação
Este livro traz os mais recentes avanços na área da Psicologia da Saúde. O que existe de
mais significativo foi arrolado e os autores exponenciais apresentam aquilo que é a
atualidade na Psicologia da Saúde.
A presente obra soma-se às publicações anteriores que igualmente procuram resgatar a
dignidade do homem contemporâneo com o uso da psicologia. Novo livro. Um alento a
acalentar nossos sonhos. Um novo trabalho que exibimos em forma de livro e que,
certamente, será mais um pouco das nossas crenças rumo a novos horizontes
profissionais.
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Os Autores
Aidyl M. de Queiroz Pérez-Ramos
Professora Titular do Programa de Pós-graduação em Psicologia da USP (Área de
concentração Psicologia Clínica) e Membro Titular da Academia Paulista de Psicologia
e da New York Academy of Science. Tem participado como Perito de Projetos
Nacionais e Internacionais pela ONU, Unicef e Unesco, e também como docente em
cursos de pós-graduação em universidades espanholas.
Geórgia Sibele Nogueira da Silva
Psicóloga com Especialização em Antropologia pela UFRN, Mestre em Psicologia
Clínica pela UFRJ e Docente da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
Gildo Angelotti
Psicólogo Clínico, Docente da Universidade São Marcos e da Pós-graduação em
Medicina Comportamental do Depto. de Psicobiologia da
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Unifesp. Diretor Clínico do Instituto de Neurociência e Comportamento de São Paulo.
Maria Margarida M. J. de Carvalho — Magui
Professora Doutora do Instituto de Psicologia da USP e do Instituto Sedes Sapientiae.
Pioneira nas áreas de Arteterapia, Hipnoterapia e Psicooncologia no Brasil. Introdutora
do Programa Simonton em São Paulo. Autora de vários livros, entre eles Resgatando o
Viver, Introdução à Psicooncologia, Dor: um estudo interdisciplinar e A Arte Cura?
Recursos artísticos em Psicoterapia.
Silvia Martins lvancko
Especialista em Gestalt terapia pelo Instituto Sedes Sapientiae. Especialista em
Psicossomática pelo Ibehe. Especialista em Psicossomática Chinesa pela Universidade
de Ortopedia e Acupuntura de Pequim (China). Especialista em Psiconeuroimunologia
pelo IPSPP. Especialista em Estresse pelo IPSPP. Especialista em Psicologia Hospitalar
pelo Hospital das Clínicas da FMUSP. Mestranda em Psicossomática e Psicologia
Hospitalar pela PUC-SP.
Valdemar Augusto Angerami — Camon
Psicoterapeuta Existencial. Professor de Pós-graduação em Psicologia da Saúde na
PUC-SP. Professor do Curso de Psicoterapia Feno menológico-Existencial na PUC-
MG. Coordenador do Centro de Psicoterapia Existencial e Professor de Psicologia da
Saúde da UFRN. Autor com o maior número de livros publicados em Psicologia do
Brasil e também livros adotados nas universidades de Portugal, México e Canadá.
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Sumário
Capítulo 1 - 1
A Psicologia da Saúde no Século XXI — Contribuições, Transformações e
Abrangências
Capítulo 2 - 29
Gildo Angelotti
De um sorriso doce -129
Capítulo 6 -135
Demasiadamente Humano
Geórgia Sibele Nogueira da Silva
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Capítulo 1
A Psicologia da Saúde no Século XXI — Contribuições, Transformações e
Abrangências
Valdemar Augusto Angerami — Camon
Introdução
A idéia principal deste trabalho é traçar um breve panorama da psicologia da saúde e
suas perspectivas de desenvolvimento. No momento em que a psicologia trilha por
caminhos cada vez mais alvissareiros e, seguramente, por uma diversidade que sequer
era concebível alguns anos atrás, a reflexão sobre as novas perspectivas da psicologia da
saúde reveste-se de uma peculiaridade bastante promissora. A psicologia da saúde
caminha por atalhos e sendas visando sempre a uma maior compreensão da condição
humana em todas as especificidades e complexidades. Uma psicologia que se descortina
para uma nova compreensão da saúde humana como algo que possa transcender os
parâmetros de doenças vigentes em nossa sociedade.
Ao refletirmos os conceitos vigentes sobre os quesitos de saúde mental e seu
enfeixamento com outros campos da saúde, deparamo-nos com uma necessidade cada
vez maior de redefinirmos a abrangência da psicologia da saúde. Nesse sentido, este
trabalho coloca-se como sendo um ponto de reflexão em que tais aspectos terão um
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fórum privilegiado de discussão. É um trabalho que se soma a outros, escritos
igualmente sobre psicologia da saúde, que procura traçar novas perspectivas de
desdobramentos de atuação nessa área que se descortina como sendo a psicologia do
século XXI.
Breve Reflexão
Em um trabalho anterior’ fizemos um breve histórico da psicologia da saúde e suas
principais áreas de abrangência. É um trabalho, em que pesem divergências de alguns
colegas da área, que acabou se tornando referência a tantos que se debruçam em busca
de material acadêmico e didático sobre psicologia da saúde. E pela dinâmica de sua
estruturação conceitual, a classificação que efetivamos sobre as áreas de abrangência da
psicologia da saúde acabou permitindo um arcabouço teórico de amplitude de
dimensões bastante significativas para que novos enquadres e parâmetros fossem
acoplados em sua explanação inicial. Assim será possível enveredarmos por novos
caminhos e atalhos de reflexão para que aquela conceituação inicial seja ampliada e
possa contemplar as novas exigências teóricas e epistemológicas que se impõem à
psicologia contemporânea. Os desafios que se colocam diante das propostas de
intervenção psicológica, nos mais diferentes e variados contextos, estão a exigir uma
estrutura moderna que possa, assim, contemplar os mais diferentes matizes de
abrangência e, até mesmo, de sedimentação conceitual.
São muitos os aspectos que envolvem a tentativa de conceituação e de delimitação de
intervenção no campo da psicologia da saúde e, dessa forma, iremos apenas caminhar
no sentido de criar espaços reflexivos sem, contudo, impedir que se abram a novas
formas de reflexão e, até mesmo, de conceituação. É uma exigência cada vez maior
aquela que nos impele a expandir o nosso campo conceitual de modo a permitir que ele
possa se abrir às mais diferentes formas
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de intervenção reflexivas. Também é necessário que enfatizemos quantas vezes forem
necessárias que a nossa preocupação conceitual é com a concepção de uma psicologia
eminentemente brasileira e que possa, assim, contemplar as nossas necessidades
socioculturais. Respeitamos as reflexões feitas por colegas de outros países,
principalmente aquelas efetivadas em países latino-americanos, mas queremos, antes de
qualquer outro balizamento, o estabelecimento de parâmetros que sejam inerentes à
nossa realidade. Desse modo, divergências e excludência conceitual serão tidas,
simplesmente, como meras digressões teóricas que se excluem diante de nossa
realidade. O nosso olhar é totalmente direcionado para a realidade do homem brasileiro,
do excluído das teorizações realizadas no Primeiro Mundo. Falamos de um homem
desesperançado, que a cada eleição presidencial perde um pouco de sua esperança de
uma vida digna e sem o aviltamento das elites socioeconômicas. De um homem que
sofre na pele a sina de ser brasileiro, de ser alguém que sofre com os desígnios da
opulência e do arbítrio dos banqueiros. Uma gente que assiste à miséria se espraiando
por todos os cantos sem ter quem a defenda desse estado de coisas.
De um povo que sequer pode pensar em autocrescimento, pois está ainda preso ao
estágio de luta pela pura sobrevivência. De uma população desdentada, desnutrida e que
assiste a presidente após presidente curvar-se aos interesses do mercado financeiro,
enquanto desfia seu corolário de sofrimento, padecendo à míngua sem trégua nem
piedade de quem quer que seja. É fato que a nossa elite cultural simplesmente é
atendida, em termos de intervenção psicológica, por modelos teóricos advindos de
Viena, no final do século XIX, ou seja, em um total distanciamento da nossa realidade
sociocultural.
A nossa conceituação de psicologia da saúde é brasileira, apresenta em seu bojo toda a
nossa condição de desesperança, humilhação, dor, desamparo, submissão cultural,
açoitamento existencial, falta de dignidade humana, colonização, e, principalmente, de
sua falta de perspectivas diante de uma realidade tão turva e tão sem horizontes. E dizer
que as possíveis divergências com as conceituações de colegas de
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outros países nada mais são do que uma conversão que fazemos para o interior da nossa
própria realidade conceitual. E sem demérito a quem quer que seja estamos construindo
uma conceituação teórica sobre a nossa realidade por mais que possa desagradar a um
sem- número de estudiosos que vivem debruçados sobre teorias construídas em outras
realidades que sequer tangenciam a nossa condição sociocultural. Uma conceituação
que possa considerar o ranger de dentes da nossa precariedade existencial, na qual todos
os nossos esforços de construção teórico-filosófica esbarram em nossa própria pobreza
sociocultural, que, embora apresente em alguns segmentos requintes semelhantes
àqueles encontrados nos países de Primeiro Mundo, na maioria dos casos são revestidos
de uma quase total falta de embasamento de condições mínimas necessárias para
reversão desse quadro tão desolador. O que assistimos praticamente sem alternância é o
apego dos nossos profissionais a teorizações que sequer consideram a nossa
especificidade. Desse modo, encontraremos desde concepções teóricas estanques diante
de nossas mudanças estruturais até devaneios que impregnam a tudo e a todos de um
psicologismo simplista. É dizer que a cada dia necessitamos de uma nova reestruturação
de nossos postulados teóricos para não corrermos o risco de ficar à margem de nossa
própria história.
Uma psicologia que se mostre soberana diante de nossos anseios libertários e que
também possa considerar as especificidades de nossa população e contribuir para que
tenhamos no futuro uma população mentalmente sadia. Estamos trabalhando para
construir um nicho de saber e conceituação que possa dimensionar o aprisionamento do
homem contemporâneo diante da cultura do medo a que ele foi exposto e da qual não
tem como conseguir libertar-se. Uma concepção teórica que considere não apenas os
avanços obtidos ao longo dos últimos anos no campo da psicologia, mas também de
outras áreas do saber, e que de alguma forma contribuem para uma compreensão mais
ampla da própria condição humana.
Somos os artífices de uma nova estruturação conceitual que possa abranger uma nova
realidade de mundo, uma nova estruturação emocional
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diante dos desatinos que estão a se sedimentar na nossa realidade atual. E isso é o
desafio que se lança à nossa frente, ao mesmo tempo que nos lançamos na tentativa de
superação de nossas próprias limitações para construir algo que esteja solidamente
sedimentado em níveis teóricos e que possa, assim, ser sustentáculo teórico-prático de
tantos que sobre ele se lancem em busca de uma nova luz de compreensão da própria
realidade humana. Assim, é necessário que estabeleçamos em âmbitos epistemológicos
as bases de sustentação de nossa proposta conceitual, e, a partir disso, construir um
novo modelo de compreensão dessa realidade que se mostra ao nosso campo perceptivo.
Essa é a nossa alternância conceitual e o nosso desafio no sentido de refletir sobre o
enfeixamento de uma base teórica que considere os moldes sobre os quais o século XXI
se apresenta, e o modo particularmente enigmático que se mostra diante de nossos
olhares.
Sempre é bom lembrar que o século XX apresentou, desde sua metade até o final, um
teor de desenvolvimento tecnológico que supera todos os períodos da história. Assim,
qualquer previsão que se faça sobre o novo século que estamos vivendo é, no mínimo,
ingênua, pois a velocidade com que as transformações e avanços tecnológicos se
sucedem superam as mais otimistas das expectativas. E, no campo do conhecimento
envolvendo o comportamento humano, as novas descobertas da fisiologia estão
deixando muitas das teorizações efetivadas na tentativa de compreensão do homem
contemporâneo. E, de maneira estonteante, assistimos, igualmente, a uma sucessão
indescritível de necessidades que são impostas e que de alguma maneira acabam se
transformando em instrumento de pressão gerador de muito estresse emocional. Ou é
possível negar-se o sofrimento gerado pelo consumismo de nossa sociedade em nossos
adolescentes? Ou ainda a necessidade que se estabelece de consumos intermitentes dos
mais diferentes objetos impostos pela tecnologia moderna? Basta se considerar, por
exemplo, o paradoxo existente em nossa sociedade, na qual, ao lado de automóveis e
celulares importados, assistimos a um sem-número de pessoas lançadas na sarjeta sem
teto ou qualquer tipo de proteção. Falamos em uma nova sociedade e convivemos com
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situações medievais; falamos de teorizações libertárias ao mesmo tempo que estamos
submissos à cultura estadunidense; sonhamos com uma realidade decididamente
brasileira ao mesmo tempo que vivemos o american way of life.
Somos uma realidade que se mostra cada vez mais frágil e cada vez mais dependente de
modelos teóricos importados de outros centros acadêmicos. Não temos como construir
uma nova realidade teórica enquanto não voltarmos as nossas preocupações unicamente
para a nossa historicidade e para a peculiaridade de nossa população.
O simples fato de utilizarmos conceituações teóricas que foram construídas diante de
realidades estruturais sem a menor semelhança com a nossa já é indício de que a
reversão desse desvio conceitual implica a necessidade de grandes rupturas para que
possamos construir uma psicologia decididamente nacional. É dizer que não podemos
continuar a utilizar elementos conceituais estanques a nossa realidade, e que tampouco
consideram a nossa especificidade. Assistimos ao avanço de teorizações que tentam
enquadrar a nossa realidade sem, no entanto, sequer considerarmos o caráter absurdo
desses fatos. Exemplo desses abusos é o fato de muitas clínicas escolas, ligadas a cursos
de formação em psicologia, apresentarem em suas estruturações modelos de
atendimento que em nada atendem aos interesses da comunidade que pretendem
atender; ao contrário, os atendimentos visam única e exclusivamente completar suas
grades curriculares. Assim, é frequente assistirmos a tais clínicas oferecendo
atendimentos de ludoterapia, psicomotricidade e outras tantas modalidades, visando
muito mais cumprir com suas normas curriculares do que propriamente com a
estruturação de tipos de atendimento que sejam mais condizentes com a realidade da
comunidade em que tais clínicas se acham inseridas. A psicologia, nesse sentido, segue
o modelo médico no qual os acadêmicos de medicina treinam suas especialidades com a
população economicamente desfavorecida para, depois de se tornarem especialistas,
exercerem suas atividades com uma população que possa pagar por essas
especialidades. Na realidade, o modelo das faculdades de psicologia é ainda mais cruel
na
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medida em que impõe a essas populações um atendimento que, muitas vezes, sequer
tangencia sua real necessidade de atendimento. Ao menos os cursos de medicina focam
suas especializações em cima de necessidades reais das comunidades em que se
encontram inseridas. Também é bastante comum a tentativa de se acoplar às
teorizações, quase sempre construídas em outras realidades sociais, sobre a nossa
população, e isso em que pese sua peculiaridade. Entretanto, é fato que, na atualidade,
assistimos a um movimento muito intenso nos mais diferentes cantos do Brasil, no
sentido de se reverter esse quadro tão desolador.
O crescimento das grades curriculares das diferentes faculdades, espalhadas ao longo do
País, e que contemplam disciplinas como “psicologia comunitária”, “psicologia
hospitalar”, “psicologia judiciária” etc., é indício de que está havendo uma
movimentação, pequena ainda, que se propõe a reverter o atual panorama da realidade
da formação do psicólogo no Brasil. É fato, também, que essa mudança surge muito
mais por uma necessidade mercadológica do que propriamente por ter sido gerada a
partir de uma atitude reflexiva efetivada pelo psicólogo sobre as reais necessidades de
atendimento psicológico de nossa população.
O estrangulamento do mercado de trabalho, associado a um número muito grande de
faculdades oferecendo cursos de psicologia nos mais diferentes cantos do País, fez com
que a busca de novos nichos de atuação se fizesse necessária. Nesse sentido, o psicólogo
voltou-se, então, para diferentes campos de intervenção, e nessa empreitada passou,
inclusive, a perceber necessidades da nossa população, que não se faziam presentes na
estrutura curricular dos cursos de psicologia. Tomemos como ponto de reflexão dessas
afirmações a psicologia hospitalar, e seguramente os pontos que levantaremos servem
perfeitamente para outros modelos de intervenção psicológica.
A psicologia hospitalar tem seu início em uma data que se configura até mesmo como
precedente do próprio reconhecimento da
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psicologia enquanto profissão2. No entanto, ela ganha um dimensionamento de
especialização e mesmo de uma nova configuração da realidade do psicólogo clínico
quando este se vê asfixiado e sem espaço para se desenvolver profissionalmente. É
somente quando o modelo clínico começa a eliminar os excedentes que a busca da
psicologia hospitalar ganha intensidade e adquire formas específicas de especialização
para delimitarem-se modelos de intervenção. É no momento em que o psicólogo clínico
se vê sem condições de exercer sua atividade em seu próprio consultório que o hospital
surge como sendo o local onde todo o seu potencial clínico poderá ganhar consistência e
configuração. E isso sem contarmos com os inúmeros psicólogos que buscam o hospital
como forma de compensar possíveis rejeições nos vestibulares de medicina. Assim, a
psicologia hospitalar será buscada como compensação à frustração do vestibular, sendo,
dessa maneira, nada mais que uma mera forma de reparação emocional de desatinos
trazidos pela sua inoperância acadêmica. Temos então duas maneiras distintas de
encarar o surgimento da psicologia hospitalar como alternativa de trabalho do psicólogo
contemporâneo. A primeira delas nos remete ao total estrangulamento do mercado de
trabalho que o obrigou a procurar por novos espaços de intervenção psicológica, e a
segunda a que nos remete a uma busca que procura compensar a reprovação do
vestibular de medicina. A necessidade de atendimento psicológico do paciente
hospitalizado, que é indiscutível e está acima de qualquer balizamento teórico-filosófico
que se queira fazer, surge como uma pequena variável delineada ao longo do caminho.
As verdadeiras razões da busca e do próprio crescimento da psicologia hospitalar são as
apontadas acima. Tudo o mais que se colocar de acréscimo é mera digressão teórica.
A própria incongruência existente em outras áreas do saber também se faz presente na
psicologia. Assim temos, no Brasil, ao mesmo tempo que os avanços tecnológicos
permitem até mesmo a má formação
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congênita, um número absurdamente grande de mulheres que parem sem o menor
cuidado pré-natal; ao mesmo tempo que milhões de pessoas utilizam Internet para as
mais variadas atividades, incluindo-se aí até mesmo pesquisa bibliográfica e acadêmica,
temos um contingente enorme de analfabetos; ao mesmo tempo que assistimos em
nossas ruas ao desfile dos mais diferentes modelos de automóveis importados,
presenciamos um grande número de pessoas que se amontoam nas
ruas em busca de abrigo para o frio e a chuva; ao mesmo tempo que a mais avançada
tecnologia permite que nos comuniquemos com diversas pessoas simultaneamente, nos
mais diferentes lugares, assistimos igualmente ao espetáculo deprimente de crianças
fazendo malabarismo do mais rudimentar nos semáforos em busca de míseras moedas;
paralelamente à existência de requintadas mansões nos bairros nobres das nossas
principais cidades, existe um amontoado interminável de barracos compondo favelas da
mais triste configuração arquitetônica. E a psicologia também traz em seu bojo o reflexo
dessas contradições, pois ao mesmo tempo que se propõe a ser libertária, apresenta-se
com modelos estanques de compreensão da condição humana.
Nesse sentido, até práticas que se propõem a ser libertárias como a “psicologia
comunitária”, a “psicologia hospitalar” etc. estão, muitas vezes, solidificadas em
embasamentos teóricos distantes de maneira abismosa de nossa realidade social. É dizer
que até mesmo quando buscamos a libertação de nossa condição de estrangulamento
socioemocional vamos ao encontra de um instrumental teórico que perde sua eficácia
diante de nossas peculiaridades. A psicologia, assim, se alinha com outras áreas do
saber que, igualmente, estão sedimentadas em outras realidades sociais e se distancia
das especificidades brasileiras. É cada vez mais importante trazer-se à tona das
discussões sobre a eficácia de abrangência da intervenção psicológica o célebre
pensamento de Maslow, segundo o qual somente após realizar suas necessidades básicas
de sobrevivência é que o homem pode pensar em quesitos como autocrescimento e
autoconhecimento. O que não significa necessariamente afirmar-se que alguém que vive
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em péssimas condições socioeconômicas não tenha necessidades de sustentação
emocional. No entanto, vemos com frequência cada vez maior afirmações que nos
direcionam para ideias simplistas as quais mostram que pessoas expostas a estados
calamitosos de precariedade econômica não podem, igualmente, apresentar problemas
na área emocional. É como se essas pessoas não tivessem o direito de ter conflitos na
esfera emocional pelo simples fato de terem suas vidas estraçalhadas pela miséria
socioeconômica. Esse tipo de afirmação não apenas despreza a própria realidade da
condição humana como também, o que é muito pior, distancia-se de modo abismoso de
uma tentativa mais digna de compreensão do homem contemporâneo.
A psicologia, de outra parte, e na medida em que faz parte do rol das especialidades
incluídas na chamada área da saúde, também apresenta, além das contradições e dos
modelos teóricos de realidades de países de Primeiro Mundo, somo citamos
anteriormente, outro aspecto bastante complicador, que é a diversidade de suas
abordagens teóricas. Assim, se em alguns campos do conhecimento como a matemática,
a física, a engenharia etc. se busca com intensidade cada vez maior um denominador
comum, uma resposta única para os problemas, a psicologia convive com diferentes
tipos de compreensão representada pelas mais diferentes abordagens. E muitas vezes
não encontramos sequer congruência entre as diferentes tentativas de compreensão da
realidade humana com cada abordagem trazendo para si a “verdade” sobre a maneira
mais eficaz de intervenção psicológica. E com uma abrangência cada vez mais disforme
e repleta de controvérsia, a psicologia vai abrindo os mais diferentes espaços nos mais
diferentes campos de atuação. E sempre que se questiona a real importância da atuação
do psicólogo fica evidenciado que muitas dessas atuações são, como dissemos
anteriormente, uma necessidade ditada muito mais pelo estrangulamento de seu
mercado de atuação do que propriamente por uma real necessidade do paciente.
Não se questiona aqui neste espaço os avanços obtidos pelos experimentos e pesquisas
da psicologia nos mais diferentes campos, citando aí conquistas importantíssimas na
área da neurofisiologia,
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psiconeuroimunologia etc. Apenas estamos refletindo sobre a maneira muitas vezes
abrupta e desordenada como são buscadas novas frentes de atuação do psicólogo
contemporâneo. Exemplo dessas citações pode ser uma entrevista de um profissional da
área da psicologia do esporte publicada em uma revista especializada, na qual ele, que
era o psicólogo responsável por uma tradicional
equipe de futebol paulista, trazia para si os méritos da vitória da equipe que estava sob
seus cuidados profissionais. Assim, ele não era um dos coadjuvantes dessa vitória, e sim
o responsável maior, e não se trata aqui de se questionar a abrangência e eficácia de um
profissional da área da psicologia do esporte, mas sim de balizar que são os atletas quem
enfrentam o adversário e, portanto, devem ser considerados os principais responsáveis
pela eventual vitória ou derrota. E em que pese sabermos da importância da condição
emocional na influência de desempenho desses atletas, não é cabível o psicólogo
colocar-se como sendo o único responsável por essa vitória, ainda que de seu trabalho
tenha surgido o sustentáculo emocional dessa equipe. Trata-se apenas de equacionar
que, em um trabalho de equipe, todos têm sua parcela de contribuição. O depoimento do
nosso colega era descabido e sem propósito, parecendo, assim, algo forçado para
mostrar-se mais importante do que na realidade era, e isso a despeito das variáveis
presentes em um trabalho de equipe.
De outra parte, é também notório que, ao adentrarmos nas reflexões sobre a inserção da
psicologia nas mais diferentes áreas do conhecimento, estamos, igualmente, refletindo
sobre as circunstâncias que implicam essa junção do mesmo modo que construímos os
balizamentos teóricos que fundamentam a nossa prática profissional. Vivemos um
momento ímpar no qual a importância da psicologia é cada vez mais clara e ganha
repercussão que transcende toda e qualquer previsão que se fazia anteriormente por
mais otimista que pudesse ser. O que se torna realmente necessário é que a psicologia
consiga atender às solicitações de intervenção que lhe são feitas e que possa, assim, ir
ao encontro das reais necessidades sociais, e não, ao contrário, tentando impor à
comunidade modalidades de intervenção
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que digam respeito apenas ressaltar nesse ponto que não somos contrários aos avanços
obtidos pela psicologia nos mais diferentes segmentos sociais, apenas queremos
enfatizar ser preciso que essas conquistas representem uma nova dinâmica no quesito de
necessidades de intervenção psicológica, e não apenas um mero acoplamento
determinado pelas nossas necessidades mercadológicas. É na psicologia que se
depositam as esperanças de construção de uma sociedade mais saudável do ponto de
vista emocional, derivando daí, inclusive, uma nova configuração da saúde física em
sua totalidade.
A psicologia necessita assim de uma renovação contínua de seus postulados para que
possa acompanhar as demandas sociais e, dessa maneira, tornar-se coadjuvante no
processo de transformação social. Uma psicologia que, ao mesmo tempo que se mostre
libertária, seja também referência de reflexão sobre as vicissitudes humanas e ainda
sustentáculo e acolhimento para o sofrimento emocional contemporâneo. É sobre essa
abrangência que iremos refletir em seguida.
Contribuições, Transformações e Abrangência
No quesito contribuições há o fato de o raio de ação da psicologia na atualidade ser tão
amplo e abrangente que seria praticamente impossível delimitá-la em urna reflexão
isolada de um capítulo. Assim, vamos fazer um delineamento envolvendo apenas o
campo de atuação da psicologia da saúde. Estaremos então reduzindo nosso esboço de
intervenção para aspectos meramente conceituais, abrindo-o, inclusive, para
perspectivas que não tenham sido contempladas nesta reflexão e que, porventura,
possam igualmente fazer parte do delineamento de intervenção da psicologia da saúde.
É no interior das reflexões acerca da abrangência da psicologia na contemporaneidade
que iremos encontrar a tentativa de seu comprometimento com a demanda das
necessidades sociais. Assim, práticas como a psicologia comunitária serão encontradas
no bojo da tentativa
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de se estender o nosso raio de ação, em âmbitos de intervenção psicológica, para
realidades que igualmente se mostram carentes no campo da compreensão emocional.
Outras práticas também seguem nesse mesmo caminho com a busca
cada vez mais delineada da necessidade de um comprometimento da psicologia com as
reais necessidades da população.
Em nossa vivência cotidiana, envolta nos mais diferentes afazeres, a virada do século
XX para o século XXI nada mais significou que apenas uma mudança no calendário. No
entanto, e considerando a passagem de séculos anteriores, quando as referências das
criações teóricas são situadas a partir da intenção da realidade histórica dos séculos nos
quais se achavam inseridas, temos então de modo claro a projeção de que, igualmente
no futuro as nossas produções teórico- acadêmicas serão referendadas a partir do
momento dos séculos em que foram criadas. E no momento em que propomos uma
reflexão da abrangência da psicologia para o século XXI, temos uma tarefa que, além de
árdua, seguramente se mostrará estéril. O avanço vertiginoso da tecnologia na
atualidade, superando todas as expectativas mais otimistas, mostra que até mesmo no
campo da psicologia essas transformações se farão presentes. Ou então seria crivei que
as discussões envolvendo a psicologia dos anos 1990 previsse o surgimento das
psicoterapias por meio da Internet?! Ou ainda os recursos de videoconferências levando
os mais diferentes níveis de conhecimento para cantos onde a própria imaginação sequer
poderia conceber?! A própria realidade acadêmica contemporânea com os mais
diferentes cursos de graduação e pós-graduação com afinco e apuro cada vez mais
sofisticados no quesito das pesquisas científicas está igualmente a mostrar que o
surgimento d novos padrões epistemológicos e até mesmo investigativos exige cada vez
mais novos parâmetros de compreensão e abrangência.
A rapidez com que as informações circulam pela Internet, exigindo que todos aqueles
que minimamente tenham algum compromisso acadêmico estejam continuamente
ligados a essa rede, é indício da necessidade da constante atualização exigida na
realidade contemporânea. Basta se comparar, por exemplo, que apenas há uma década
para se fazer uma pesquisa acadêmica era necessário uma série de visitas
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a várias bibliotecas nos mais diferentes cantos da cidade, algo totalmente distante da
atualidade quando, com a facilidade proporcionada pela Internet, a partir de simples
comandos de botões temos todo o panorama mundial de pesquisas e publicações diante
de nós na tela do computador. E na medida em que esses avanços são incorporados ao
nosso cotidiano simultaneamente aos seus aparecimentos não nos surpreendemos com a
mudança que efetivaram em nossas práticas teórico-acadêmicas. Apenas e tão-somente
quando refletimos para o passado, embora não tão distante, é que vemos escancarado o
abismo que separa a área do conhecimento em apenas algumas décadas. Hoje não é
mais possível se conceber um pesquisador acadêmico que, mamamente, não possua o
seu e-mal e com o qual se relaciona e se mantém infoiimado com todos os avanços da
ciência. Apesar disso tudo, ainda não conseguimos desvincular a psicologia do
pejorativo de que se trata de uma área do conhecimento que tenta se impor enquanto
ciência, mas que, na realidade, apenas comprova com instrumentos ditos científicos
aquilo que a sabedoria popular já constatou livremente. Essas críticas, longe de estarem
distantes do real, ao contrário, mostram de modo contundente a necessidade de um
aprumo que incorpore não apenas as verdadeiras necessidades sociais, como também, e
principalmente, mostrem que o avanço das reflexões e das pesquisas em psicologia
estão à frente desses impropérios que nos são lançados livremente. É fato que uma
simples consulta ao conjunto de teses acadêmicas em psicologia constata nua e
cruamente o grande número de pesquisas efetivadas com animais como se fôssemos
apenas um ramo da zootecnia.
A psicologia caminha a passos céleres para ocupar seu lugar de destaque na construção
de uma ciência que decididamente possa entender a condição humana de modo mais
abrangente e que também esteja livre para abrir-se a novas perspectivas de
desdobramento e desenvolvimento. Não é mais possível conceber-se quaisquer tipos de
atividade que envolvam a condição humana na qual a psicologia não se faça presente de
modo irreversível e absoluto. Quando fazemos uma reflexão a partir do
desenvolvimento da psicologia e seus primeiros acordes ainda no início do século XX,
vamos perceber que de uma ciência que buscava formas e contornos para ser aceita
temos
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hoje, uma plenitude de produção teórica e acadêmica que lhe assegura lugar de destaque
na proeminência das ciências contemporâneas. E, ao contrário de outras áreas nas quais
se buscam o consenso e a uniformidade teórica, temos na psicologia um universo cada
vez mais amplo de ideias e teorizações que, debatidas, geram inúmeras outras
abordagens nesse fascínio e mistério que é a tentativa de compreensão da condição
humana.
A psicologia da saúde, de outra parte, ganha espaços cada vez mais significativos no rol
das teorizações contemporâneas. E seguramente desde as nossas primeiras publicações,
quando tartamudeávamos as nossas primeiras criações teóricas e práticas, certamente os
nossos universos e perspectivas de atuação se expandiram de modo absolutamente
alvissareiro. Um exemplo desse panorama são justamente os encontros e simpósios
realizados na tentativa de discussão das atividades empreitadas nessa área. Desde o
início dos anos 1980 são realizados os Encontros Nacionais de Psicólogos da Área
Hospitalar, aos quais se somaram também os Congressos Brasileiros de Psicologia
Hospitalar. Trata-se de encontros dos quais participam elementos de todas as áreas do
País, não apenas para se atualizarem sobre os avanços ocorridos na área, mas também
para efetivarem presença naqueles que são os mais significativos eventos da área. Em
2001, surge o 1 Congresso Brasileiro de Psicologia da Saúde e Psicossomática, ao qual
se somou também o 1 Simpósio Brasileiro de Psiconeuroimunologia. Esse congresso
marcou o início de uma junção de diferentes áreas que se acoplavam ao escopo da
Psicologia da Saúde. Igualmente, o encontro de muitos colegas dos mais diferentes
cantos do País em busca de diferentes matizes que pudessem embasar suas práticas
clínicas. No Quadro 1 podemos observar os diversos segmentos que se fizeram
presentes nesse congresso. Em 2003, ocorre o II Congresso Brasileiro de Psicologia da
Saúde e Psicossomática e novamente agregando o II Simpósio Brasileiro de
Psiconeuroimunologia. Novamente, colegas de todos os cantos do País comparecem ao
evento, fazendo com que ele passe a fazer parte do calendário dos principais eventos
ocorridos em âmbito nacional. E, o que é mais importante, contemplando os mais
diferentes matizes teóricos em uma perfeita complementaridade. No Quadro 2, podemos
observar o perfil do evento e a sua abrangência conceitual. E,
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na medida em que o primeiro desses eventos ocorre justamente no primeiro ano do novo
século, é como se iniciássemos o novo século dando uma nova formatação à psicologia
da saúde, enfeixando, assim, diferentes segmentos de sua abrangência em eventos
conjugados.
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Um novo tempo da psicologia que se imbrica com o novo século para determinar novas
perspectivas teóricas e também novas abrangências metodológicas. E para que não nos
percamos em nossa exposição é sempre importante ressaltar que a cada evento que
reúne os diferentes profissionais dos mais diferentes cantos, o somatório das discussões
sempre faz com que o enriquecimento estrutural da área seja não apenas promissor, mas
tenha também contornos e especificidades reais. É dizer, sem medo de erro, que
caminhamos muito a cada encontro. E que a perspectiva de novas publicações sempre
traz em seu bojo um pouco do que foi discutido nesses eventos. Em cada novo livro
temos um pouco da fragrância que restou de cada encontro. É importante ainda destacar
que, segundo levantamento dos conselhos regionais, é uma das abrangências da
psicologia da saúde, a psicologia hospitalar, a área que mais cresce em termos de
procura pelos acadêmicos em sua busca de espaços de atuação.
Citamos anteriormente a questão mercadológica como determinante da abertura de
novos espaços de atuação na psicologia, e a área hospitalar igualmente se destaca nesse
quesito. No entanto, infelizmente, assistimos a um quadro desolador na procura dos
acadêmicos em busca da psicologia hospitalar. Pois, se de um lado é fato notório o
crescimento da busca de interessados na temática, de outro constatamos que a inserção
do psicólogo no hospital na quase-totalidade dos casos se efetiva por meio de estágios
sem nenhuma remuneração. Ou seja, o psicólogo foi acolhido no hospital, mas como
estagiário, e temos diante de nós uma situação que apenas se agrava, pois juntamente
com outras áreas que partem em busca do estágio para a especialização profissional,
igualmente a psicologia hospitalar trilha esses caminhos do estágio profissional sem
remuneração. A agravante nesse tipo de situação é que a instituição hospitalar recebe
trabalhos altamente especializados sem ter a necessidade de contratação. Para se ter uma
ideia da gravidade, basta citarmos os principais cursos de São Paulo, que são ligados aos
principais hospitais da cidade. Esses cursos apresentam uma estrutura acadêmica com o
que existe de mais avançado na área e seus alunos estagiam nos hospitais
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que lhes dão chancela. Assim, esses hospitais possuem um trabalho de alto esmero sem
a necessidade de contratação, pois o serviço de psicologia é praticamente desenvolvido
pelos alunos sob a supervisão de alguns poucos profissionais contratados. Frise-se ainda
que alguns hospitais sequer apresentam profissionais contratados, pois a respectiva
coordenação e supervisão são feitos por profissionais pertencentes às instituições
acadêmicas que, no afã de ministrarem cursos de psicologia hospitalar, fazem convênio
com esses hospitais para que seus alunos possam efetivar o respectivo estágio. Ocorre
que dessa maneira temos a efetivação do estágio pelo estágio, pois esses alunos, ao
adquirirem seus certificados de conclusão, não possuem campo efetivo de atuação, na
medida em que a maioria dos hospitais sensíveis à atuação do psicólogo já possui
serviços de psicologia hospitalar estruturados a partir de estágios não remunerados. E é
evidente que a empresa hospitalar não pretende modificar essa estrutura na medida em
que tem um trabalho altamente especializado e totalmente sem ônus. As unidades
hospitalares que geralmente possuem psicólogos contratados são aquelas pertencentes à
rede pública de saúde e também aquelas que fazem parte da estrutura acadêmica de
algumas universidades. Ainda assim, no entanto, vamos encontrar, mesmo nesse
segmento, hospitais que têm sua estrutura de funcionamento de psicologia hospitalar
totalmente estruturada nos cursos de especialização em psicologia hospitalar mantidos
por essas instituições. Entretanto, é necessário que se ressalte ainda que essa estrutura
de estágios que praticamente viabiliza uma mão-de-obra especializada sem nenhuma
remuneração não é “privilégio” apenas da psicologia hospitalar. Vamos encontrar, dessa
maneira, em quase todos os segmentos universitários esse mesmo tipo de exploração
sem que nenhum organismo competente tome alguma providência para inibir esse
abuso.
As universidades, no afã de qualificar seus cursos, assinam convênios com diferentes
empresas para possibilitar que seus alunos possam adquirir experiência prática das
teorizações que estudam nas lides acadêmicas. Ressalte-se que essa nova estruturação
dos
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estágios é contrária ao que ocorria décadas atrás, quando o estágio era uma passagem de
experiência para uma possível efetivação contratual da empresa. Hoje, infelizmente, o
novo panorama solidifica, como vimos anteriormente, o estágio pelo estágio, sem
nenhum compromisso por parte da empresa que não seja apenas abrir seu espaço para
que o acadêmico possa, então, adquirir experiência em um ambiente profissional.
Evidentemente que a mudança desse estado de coisas irá depender de uma ação
conjunta dos acadêmicos e das universidades às quais pertençam.
A psicologia hospitalar apresenta números muito eloquentes da adesão de acadêmicos e
profissionais para a sua área de atuação, basta apenas que não nos deixemos levar pelas
propostas de estágios apresentadas pelos principais cursos de especialização, pois do
contrário teremos um contingente bastante significativo de psicólogos especializados na
área hospitalar e que não possuem espaço de desenvolvimento profissional com a
devida remuneração.
A psicologia da saúde, entretanto, não tem apenas a psicologia hospitalar em sua
abrangência, e outros segmentos apresentam desenvoltura e desempenhos profissionais
bastante significativos e alvissareiros. Basta refletirmos, como exemplo, sobre a
psicossomática que atinge diferentes âmbitos de abrangência penetrando nos mais
diversos segmentos do conhecimento com contribuições significativas para uma
verdadeira compreensão da realidade humana. Temos também a psiconeuroimunologia,
que se apresenta com perspectivas cada vez mais promissoras no esboço de
compreensão de quesitos imunológicos e seu enfeixamento com determinantes
psicológicos. Certamente, esse tipo de reflexão é bastante importante, pois faz com que
a psicologia possa, então, adquirir importância significativa em suas buscas de uma
compreensão mais abrangente da condição humana. É cada vez maior o número das
vertentes da psicologia da saúde que estão intervindo em pacientes que, até bem pouco
tempo, eram alvo de atenção apenas de organismos especializados em saúde pública.
Assim, casos como alcoolismo e mesmo outras formas de drogadicção são, hoje, objeto
de
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intensa reflexão dos instrumentos de intervenção da Psicologia e estão, cada vez mais,
disponíveis e a serviço da população necessitada. É que, concomitante ao aumento do
número de profissionais de houve também uma preocupação qualitativa sobre os
desígnios da psicologia e seu real comprometimento para construção de uma sociedade
libertária na qual os verdadeiros anseios da população sejam considerados em toda a sua
dimensão. E maneira bastante promissora teremos no século XXI, ao menos é que se
descortina nesses momentos iniciais, uma psicologia que esteja preocupada apenas e
tão-somente com as questões que permeiam a realidade de nossa elite socioeconômica.
Uma psicologia que se comprometa com a construção de teorias inerentes à realidade
brasileira e que possa estar, assim, disponível ao alcance de tantos quantos queiram
fundamentar se em seus princípios para um verdadeiro dimensionamento das condições
psicológicas de nossa População. Trata-se, sem dúvida alguma, de um desafio que
estará a exigir que os nossos esforços sejam contínuos desdobrados diante da nova
exigência que se impõe perante nossa realidade conceitual Esse desafio é, seguramente,
uma das maiores barreiras a serem superadas no percurso que implica a construção de
uma psicologia com traços e contornos decididamente brasileiros. Essa revisão de cada
etapa de nosso percurso é condição primeira para que possamos, a partir de reflexões
sistematizadas e contínuas, perceber a necessidade de eventuais mudanças de rumo e,
até mesmo, de horizontes e ‘perspectivas teóricas. Nesse sentido, inclusive as
observações citadas anteriormente, sobre a questão do estágio pelo estágio na prática do
psicólogo hospitalar, nos remetem à necessidade de uma reflexão bastante
pormenorizada sobre o sentido desses atalhos, em que, certamente, não se questiona o
papel da Psicologia em humanizar as relações ocorridas na instituição hospitalar, mas
colocamos em questionamento o sentido da exploração do psicólogo nesse emaranhado
de fatos nos quais sempre encontramos a figura de outros Psicólogos explorando e
tirando proveito desse estado de coisas. E o mais interessante, para não dizer dantesco, é
que a psicologia
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hospitalar surgia na década de 1980 como uma das possibilidades que tirariam a
psicologia da situação autofágica, ou seja, algo que vive de si mesmo, que come a si
próprio. Tentou-se ampliar o leque de possibilidades de intervenção do psicólogo, mas
acabou-se lançando- o nas garras de outros psicólogos que, de maneira ladina, souberam
explorar de modo ardiloso seu afã em busca dessa nova perspectiva de atuação.
Isso tudo mostra de modo bastante claro que a construção de um conjunto de teorias que
contemple a realidade brasileira também precisa contemplar uma reflexão minuciosa
sobre o modo de exploração da mão-de-obra dos profissionais de psicologia pelas
empresas que os recebem como estágio, e o exploram da maneira mais contundente
possível. E a empresa hospitalar não se difere em nada, nesse quesito de exploração, de
outras modalidades empresariais.
E na realidade quando fazemos tais reflexões sobre a psicologia hospitalar não estamos
fazendo referência à sua inviabilidade enquanto área de atuação do psicólogo, ao
contrário, tentamos trazer um pouco de luz para que, principalmente, os mais novos
possam fazer suas escolhas de modo lúcido. Dessa maneira, serão consideradas todas as
variáveis presentes nessa escolha, e não apenas a busca por uma atividade
extremamente prazerosa do ponto de vista de gratificação emocional, mas que se mostra
totalmente árida no tocante a uma remuneração digna. O que não podemos, incluindo-se
aí até mesmo a nossa responsabilidade de autor que possui uma grande quantidade de
títulos publicados sobre a área hospitalar, é nos calar diante desse estado de coisas.
Chegamos, inclusive, ao absurdo de ver cursos que reproduzem o modelo médico de
residência de especialização, e que, no entanto, ainda assim não remuneram esses
psicólogos. Ou seja, esses profissionais ou estão pagando para atuar na medida em que
esses cursos apresentam preços compatíveis com os cursos de graduação, ou
simplesmente depois de se especializarem fazem a chamada residência e atuam sem
nenhuma remuneração. Está em nossas mãos a mudança dessa perspectiva; apenas se
faz
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necessário que tais questionamentos sejam refletidos de modo amplo para que se
estabeleçam, então, novas diretrizes nessa área.
De outra parte, a psicologia da saúde apresenta um dimensionamento bastante
importante para a psicologia, na medida em que, ao caminhar em direção aos anseios da
comunidade, abre-se também para a perspectiva da criação de novos modelos de
intervenção bastante interessantes. Quando refletimos, por exemplo, sobre a psicologia
comunitária, vemos que o seu raio de abrangência contempla pessoas que estavam à
margem da psicologia até bem pouco tempo. Não há como negar a contribuição que
esse segmento está trazendo para a construção de uma sociedade mais justa e libertária
na medida em que, atuando junto aos excluídos, pode dar-lhes voz e guarida no sentido
de fazer com que seus anseios de uma vida mais digna se tornem realidade. Os trabalhos
que são produzidos nessa área já começam a se tornar referência na construção de
concepções teóricas que abarquem a nossa realidade social. E seguramente estarão na
vanguarda quando, efetivamente, adquirirmos a consciência da necessidade da
construção de teorias verdadeiramente brasileiras. Infelizmente, com o grande número
de desempregados que cresce a cada dia no Brasil, e isso sem incluirmos os mais jovens
que sequer conseguem adentrar no mercado de trabalho, temos, então, um panorama
que nos mostra que o contingente de excluídos sociais será cada vez maior sem que
possamos avaliar com precisão as consequências desses dados. A violência que se
espraia por todos os cantos do País, por exemplo, certamente ganhará dimensões ainda
mais desesperadoras, e isso sem dizermos da depauperação da nossa população que, a
cada dia, se vê privada das condições básicas mínimas para uma vida digna. A
sobrevivência passou a ser a única perspectiva de milhões de pessoas que, atiradas às
raias da desesperança e do desespero, não possuem outra perspectiva que não apenas e
tão-somente buscar o mínimo para continuar simplesmente sobrevivendo. E uma
psicologia para ser decididamente libertária não pode simplesmente desconsiderar tais
aspectos, pois eles fazem parte de modo indissolúvel da realidade de nossa população.
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Ao lançar seus raios de ação sobre a população excluída, a psicologia avança
significativamente rumo ao seu desígnio mais nobre, que é, justamente, o de ser um
instrumento colocado ao alcance das pessoas para que elas alcancem sua plenitude de
vida. E também rechaça um antigo preconceito o qual simplesmente afirmava que pelo
fato de essas pessoas estarem em total situação de penúria econômica não apresentam
problemas emocionais. É como se a vida totalmente carente de recursos econômicos
básicos determinasse uma gama tão grande de problemas e sofrimentos que não seria
possível também a existência de problemas emocionais. Mas como é possível, então,
uma vida sem a menor consistência de dignidade não apresentar os mais variados tipos
de sofrimentos emocionais? Esse tipo de questionamento passava ao largo da
psicologia, que não apenas ignorava tal asserção, como igualmente lhe virava as costas
da maneira mais simplista possível. A psicologia comunitária resgata esse modo
distorcido de compreensão da realidade, ao mesmo tempo que se coloca na vanguarda
no sentido de resgatar essa população para novas perspectivas existenciais. Dessa
maneira, o leque de possibilidades de intervenção psicológica atinge todos os segmentos
da população, e não apenas aquelas pessoas que possuem condições econômicas
privilegiadas.
É importante ressaltar, nesse aspecto, que a construção de uma psicologia da saúde
cujas pilastras atinjam todos os segmentos sociais certamente precisa considerar as
necessidades desses diferentes contextos sobre os quais, se deseja sua intervenção.
Citamos anteriormente os avanços da psicossomática e quanto ela contribui na
atualidade para que um novo diagnóstico sobre os sintomas apresentados pelos
pacientes também considere de maneira relevante os aspectos emocionais. E essa
conquista se mostra irreversível na medida em que determinados aspectos de certas
ocorrências meramente orgânicas já são vistos e analisados pela própria medicina como
decorrentes de disfunções emocionais. Assim, por exemplo, as patologias envolvendo o
trato gastrointestinal e mesmo cardiopatias são vistas e analisadas de modo indissolúvel
como comprometimentos orgânicos decorrentes única e
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exclusivamente de situações de estresse emocional que foram impostas ao organismo.
Dessa maneira, temos todos os motivos para acreditar que a psicologia ocupará seu
lugar no século XXI e corresponderá a todos os anseios daqueles que sonham com uma
condição humana mais digna. Uma psicologia que poderá enfeixar-se com outras áreas
do conhecimento e trabalhar para que a fragmentação contemporânea seja algo que
fique apenas como reminiscência de um passado distante, pois urge com cada vez mais
frequência a necessidade de uma compreensão global da condição humana na qual todas
essas áreas sejam contempladas. Uma abordagem psicológica que considere igualmente
os conhecimentos da sociologia, da economia, da antropologia, da medicina etc. Um
esboço teórico que traga em seu corpo as marcas do seu tempo; algo que possa
transcender o reducionismo que encontramos em muitas das teorias que são
apresentadas como modernas, mas que trazem, na realidade, traços de outras épocas,
ponteamentos em que não cabe contemporaneidade. Uma psicologia que traga para os
campos de discussão da realidade humana contribuições significativas para que
possamos avançar nesse detalhamento que é a compreensão humana em seus aspectos
emocionais.
Os avanços obtidos na área da psicologia da saúde estão iluminando os caminhos de
todos que se interessem pela compreensão humana em seus aspectos contemporâneos. E
na medida em que avança rumo a novas perspectivas teóricas, certamente, temos como
real a possibilidade de que está próximo o dia em que ela ocupará lugar de destaque em
todas as formas de discussão que envolvam o homem contemporâneo. E não é só. A
simples perspectiva de desdobramento que a psicologia da saúde apresenta em seu leque
de alternativas de atendimentos já é indício de que não apenas um novo tempo se inicia
na psicologia, mas principalmente que estamos construindo uma psicologia
decididamente brasileira, criada e teorizada sobre a nossa realidade. E esse aspecto é
bastante interessante para mostrar que não existe a necessidade de rejeitarmos teorias
criadas em outras realidades
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sociais, apenas precisamos estudá-las e considerá-las no momento de criarmos as nossas
formas de concepções teórico-práticas. Como dissemos anteriormente, temos de unir
todos os esboços de diferentes áreas do conhecimento, e isso tem de incluir,
naturalmente, outras teorizações psicológicas. Os modelos concebidos em outras
realidades não podem ser simplesmente desprezados em nome de uma possível
xenofobia, mas considerados em suas limitações, que são determinadas pela origem de
suas criações. A nossa realidade de Terceiro Mundo, e aí incluindo-se países das
Américas Latina e Central, se consideramos todo o atraso de nossas sociedades que
determina, inclusive, condições precárias de pesquisas universitárias, mostra-se
surpreendente no quesito de produção acadêmica em psicologia. Frise-se que até mesmo
publicações nossas, criadas e concebidas na realidade brasileira, são referência em
países da Europa, o que, seguramente, traz contornos de que, embora ainda tenhamos
muito para caminhar, certamente também temos muito para contribuir na construção de
novos parâmetros no campo da psicologia da saúde.
É fato que, ao produzirmos nossas publicações, não temos consciência nem mesmo
dimensionamento do alcance que esses escritos atingirão. No entanto, uma vez lançado,
o livro segue caminhos que nos surpreendem e mostram que a nossa contribuição,
embora pequena, soma-se a outras experiências na formação de novos parâmetros na
construção de uma nova psicologia. O nosso primeiro livro de Psicologia da Saúde,
publicado em 2000, já traz contribuições significativas do modo como concebemos
diferentes matizes da compreensão da realidade humana. Esse livro delimitou não
apenas aquelas áreas que julgávamos pertencer ao campo da psicologia da saúde, como
também estabeleceu parâmetros bastante dinâmicos para novas conceituações e
reflexões sobre o nosso campo de intervenção. Ao se tornar referência nacional e
mesmo internacional na psicologia, mais do que simplesmente estabelecermos novos
limites de atuação, ampliamos os horizontes de perspectivas que podem ser abarcados
pela psicologia da saúde. E ao constatarmos o tanto que avançamos nesse quesito, sem
dúvida alguma, espraiamos nossas ideias de modo amplo a ter, na retrospectiva
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teórica que fazemos, novos denominadores sobre possibilidades que se descortinam no
campo da psicologia. Temos um trabalho muito árduo pela frente, principalmente se
considerarmos que os fatos são dinâmicos e estão em constante mudança, de modo a
fazer com que determinados aspectos que prevaleciam em determinado período percam
sua importância em outros momentos. E a psicologia assim terá de, igualmente, ser
dinâmica para acompanhar os fatos e se instrumentalizar, inclusive, para poder alterá-
los. Novos aspectos que se formam em uma nova forma de concepção de valores e nos
quais a psicologia estará presente fazendo-se catalisadora e contribuindo para que os
avanços das diversas áreas do conhecimento direcionem seus avanços para a verdadeira
humanização da condição humana, tão aviltada e acachapada pelo tecnicismo que
assolapa a dignidade do homem contemporâneo de modo tão impiedoso e cruel. E
embora seja fato irreversível que os avanços tecnológicos estão determinando até
mesmo diferentes configurações inclusive nas relações interpessoais, é mister que os
avanços da psicologia caminhem no sentido de fazer com que não percamos ainda mais
a nossa característica humana diante desses avanços. Assim, estaremos de fato
caminhando para a construção de paradigmas teóricos que façam da psicologia um
instrumento eficaz em nossa busca libertária. Outras vertentes da psicologia da saúde
que trazem em seu bojo avanços da medicina, como a neuropsicologia, trazem
diferentes desdobramentos para o verdadeiro alcance do raio de ação da psicologia.
Vertentes como a psiconeuroimunologia, a neuropsicologia e o neurocomportamento,
certamente, estão trazendo à luz das discussões contemporâneas aspectos da condição
humana que, seguramente, a psicologia do século XX não ousava sequer conceber. E de
fato os avanços a que assistimos e que são fruto de diferentes pesquisas nos mais
variados campos de intervenção dão-nos a dimensão de que as mudanças que se
mostram ainda assim não nos permitem imaginar os contornos que terão os esboços
teóricos da psicologia dentro de apenas uma década. Muitas mudanças ocorrem em uma
velocidade incompatível com as nossas mais otimistas previsões. Nesse sentido, mais do
que nunca, é necessário repensar-se o apego que determinados estudiosos apresentam
diante de teorizações concebidas
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das no final do século XIX, pois esse modo de agir é por demais dogmático e está a
exigir uma completa revisão de posturas e atitudes.
Uma psicologia da saúde revigorada e que se atualize a cada nova conquista dos
avanços científicos e que se mostre na vanguarda do pensamento contemporâneo. Isso é
o que estamos construindo com nossas reflexões e digressões teóricas. Algo que seja
parte de sua historicidade, presença do seu tempo nos avanços dos instrumentos
utilizados na tentativa de compreensão da condição humana. Uma psicologia
verdadeiramente humana. Uma psicologia que pulse em nosso peito como o coração,
com vigor e irrigando a todos que sobre ela se debrucem em busca de conhecimento.
Uma psicologia que possamos escrever com a certeza de que ela será um pouco de nós,
é fato, mas também parte de todas as pessoas envolvidas em nosso tecido social.
Referências Bibliográficas
Apenas por uma visão sumária do que se tem escrito sobre os profissionais que
trabalham nas instituições hospitalares, pode-se deduzir que o eixo das atenções à sua
saúde mental vem sendo dirigido aos médicos e ao corpo de enfermeiros, embora
existam nesse contexto psicólogos, assistentes sociais e educadores, entre outros. Temas
de natureza psicológica constituem assuntos frequentemente referidos na bibliografia
especializada, não só em relação à clientela em atendimento, mas também aos
profissionais citados. Com respeito a estes últimos, são priorizados o seu
relacionamento com o usuário e com demais funcionários, os valores éticos em sua
defesa e os cuidados com sua saúde mental, incluindo o desgaste que lhes causa o
trabalho no hospital, em atenção especial o burnout (estado de exaustão), a que estão
sujeitos, entre outros fatores que podem estender-se também aos demais membros da
equipe clínica.
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Quanto ao psicólogo hospitalar, conotação que o diferencia dos outros na área, pouco se
tem escrito, nem mesmo são realizadas ações pertinentes, em prol de sua saúde mental,
apesar de sua incorporação nas instituições hospitalares, em nosso meio, ter acontecido
há mais de 50 anos. Acrescem-se a este fato o aumento cada vez maior de sua
representação numérica no referido ambiente, como também da abrangência de suas
funções. Esse profissional, entre outras funções importantes, integra-se plenamente na
equipe interprofissional de diagnóstico e tratamento; atua como promotor do
movimento de humanização hospitalar; participa da comissão de bioética; é agente de
mudanças na mentalidade dos funcionários, como também dos familiares do atendido, e
também destes últimos. Ademais, é porta-voz de esclarecimentos e conscientização em
tais mudanças, promovendo o acolhimento e a atenção às necessidades individuais da
clientela, como recurso propulsor na resolução ou minimização de muitos dos
problemas de natureza psicológica que esta apresenta. Ao sentir-se acolhida e
compreendida, a adesão às intervenções se mantém, evitando abandoná-las e de ir ao
encontro de vias alternativas sem base científica, nas quais poderia obter maior
receptividade.
O exposto é suficiente para se afirmar o quanto o psicólogo é profissional indispensável
nos programas de natureza clínica que se desenvolvem no contexto hospitalar. É
óbvio prever que, no exercício de suas funções, em um ambiente de risco, como é o do
hospital, ele esteja exposto continuamente a situações estressantes. O impacto que lhe
causa o contato com doentes portadores de enfermidades das mais diversas, muitas
vezes graves e sem perspectivas de cura, confrontado com as manifestações
angustiantes de sofrimento, dor, aflição, tristeza, desesperança, perante a doença e a
própria morte. Complementa-se a esta problemática o frequente desconhecimento das
reais funções, como psicólogo, por parte dos funcionários, até dos pertencentes à equipe
clínica; as resistências por sua inserção, mesmo na qualidade de estagiário ou de
residente nesse ambiente institucional, considerado equivocadamente de exclusivo
domínio
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médico; e o escasso reconhecimento de seu valor profissional, entre outras dificuldades.
Deve-se considerar, por outro lado, que nem sempre a formação do psicólogo hospitalar
e seu equilíbrio emocional são condizentes com as exigências de seu próprio
desempenho.
Perante este quadro de frustrações e de tensões emocionais, torna-se premente conhecer,
cientificamente, o fenômeno do stress2 a que o psicólogo hospitalar está sujeito,
causando-lhe preocupações, ansiedade e até transtornos psicossomáticos. E, em
complemento, saber quais as estratégias ou coping3 que desenvolve como defesa a essa
situação.
Trata-se de um chamado dirigido ao próprio psicólogo hospitalar para que centralize sua
atenção nessa problemática, a fim de resguardar seu equilíbrio emocional e, por
conseguinte, promover um satisfatório desempenho profissional em favor das pessoas
atendidas nessas instituições, propiciando relações apropriadas entre os membros da
equipe clínica e também com os demais funcionários, enfim, proporcionando um
ambiente harmônico indispensável em todo ambiente hospitalar. Tais iniciativas devem
ser fundamentadas cientificamente, conforme abordagens teóricas e procedimentos
metodológicos resultantes das escassas pesquisas existentes, tanto no âmbito
internacional como no local.
Considerações Teóricas e suas Aplicações
Analisam-se os temas referidos como consequência das aquisições mais atualizadas
sobre os fatores de stress que ocorrem no ambiente hospitalar e também sob o coping
que utiliza a equipe clínica, em especial o psicólogo como membro desta.
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Com base neste posicionamento, adota-se a concepção interacionista do stress, por ser
considerada a mais atual e por integrar-se melhor ao assunto em pauta. Com esse fim,
utiliza-se do Paradigma SOR, S (estímulo), O (organismo) e R (reação), que
compreende a relação entre agentes estressantes que incidem no organismo humano,
extrapolando as reservas adaptativas deste e dando origem a transtornos emocionais
e/ou fisiológicos específicos. O stress assim concebido é resultante do confronto entre
recursos individuais (equilíbrio emocional, capacidade cognitiva e fatores de proteção,
de resiliência, entre outros) e certas variáveis ambientais identificadas como
estressantes, provocando as reações referidas, acompanhadas, no melhor dos casos, de
estratégias de superação (Magnusun, 1986; Marin, 1999 e PérezRamos, 1992).
Interpretando o modelo em referência, considera-se como S (estímulo) o contexto
estressante de ambiente hospitalar, tanto para aqueles que aí trabalham, quanto para os
que usufruem de seus serviços. A própria natureza dessas instituições, o tipo de
atendimento que proporcionam e a condição de saúde física e emocional dos clientes
atendidos provocam a ocorrência de situações estressantes que afetam a estes e a
qualquer funcionário que presta seus serviços nesse contexto. O momento histórico em
que o contexto hospitalar está inserido é também fator condicionante.
Citam-se como exemplo dessas instituições consideradas mais estressantes as
psiquiátricas, as geriátricas, as oncológicas e as destinadas ao tratamento de
dependentes químicos. Destacam-se os serviços de pronto atendimento (PS), terapia
intensiva (UTI) e centros cirúrgicos, cujo clima emocional é expressivamente propício à
existência de intensos agentes estressores. Complementa-se o rol dessas unidades, como
intensamente traumatizante, a denominada Terapia de Dor e Cuidados Paliativos para
atendimento de pacientes com câncer avançado, já existentes em hospitais oncológicos
no Brasil. Kovács et ai. (2002) descrevem o sofrimento da equipe clínica, inclusive do
psicólogo hospitalar, manifestado por sentimentos de impotência,
Página 33
tristeza e angústia perante a luta entre a vida e a morte dos pacientes atendidos nesses
serviços. Situações que, mais uma vez, clamam por um apoio efetivo a esses
profissionais.
Na atualidade, é preocupante o aumento da violência, que ocorre também nas
instituições hospitalares, em diversos países e inclusive em nosso meio, segundo os
estudos realizados por Gbézo (2001), consultor da OIT (Organização Internacional do
Trabalho) sobre a mobilização de recursos humanos no contexto hospitalar. Para este
autor, os atos de violência estão presentes até em unidades mais protegidas, como são as
de medicina geral, pediatria e maternidade, colocando em perigo a vida dos usuários,
dos funcionários e até a segurança desses setores, aumentando, assim, os fatores
estressantes nesses contextos. São exemplos desses atos os ocasionados por grupos de
delinquentes e de dependentes químicos que penetram, pela força, nos serviços
hospitalares atraídos pela possível disponibilidade de drogas, equipamentos e valores.
Além disso, os funcionários dos hospitais vêm enfrentando, com maior freqüência,
hostilidade dos clientes e familiares, assim como assédio sexual, no caso das
enfermeiras, particularmente.
A situação de violência, conforme reitera o autor referido, tem sido mais intensa nos
grandes hospitais, onde é livre a movimentação das pessoas, há grande volume de
população a ser atendida, com extensas filas de espera, frequentemente com insuficiente
dotação de pessoal, entre outras circunstâncias que colocam os funcionários e os
assistidos em estado de tensão e de perigo iminente, aumentando, por conseguinte, a
interferência de outros agentes estressantes.
Baseando-se no exposto sobre a violência nessas instituições, as quais deveriam
caracterizar-se por ser um ambiente de tranquilidade, Gbézo faz um chamado à
implantação de políticas públicas de prevenção e controle dessa situação, com o
compromisso do envolvimento de todas as autoridades e profissionais responsáveis pelo
cumprimento de tais medidas. Condição que resultará em evidente diminuição da
intensidade de fatores estressantes, resultantes dessa situação perigosa.
Página 34
Voltando à análise do paradigma SOR, consideram-se como O (organismo) os
profissionais da equipe clínica, particularmente o psicólogo, e como R (reações), as
manifestações emocionais e/ou fisiológicas resultantes da incidência dos estressores
próprios do ambiente hospitalar. Acrescem-se, como reação, as estratégias defensivas, o
coping, que permitem a esses profissionais poder alcançar um razoável equilíbrio na sua
saúde mental. Tais profissionais estão sujeitos a maiores efeitos de impacto, somente
pelo fato de manterem contato direto e regular com clientes e familiares angustiados.
Situação que poderá ser mais intensa no psicólogo hospitalar, em razão de sua própria
formação profissional, o que ocasiona maior conhecimento e sensibilidade em relação
aos problemas humanos.
Para a integração do psicólogo nessa equipe, é importante que este esteja
convenientemente informado sobre os fatores de stress que, segundo estudos
específicos, mais incidem nos enfermeiros e nos médicos. Com respeito aos primeiros, a
bibliografia analisada informa que, independentemente do setor hospitalar em que
atuam e das funções que desempenham, os principais agentes estressores que aqueles
experimentam encontram-se nas dificuldades que sentem no relacionamento com os
profissionais e na inabilidade que apresentam para a resolução de problemas resultantes
da doença e da morte (Guppy e Gutteridge, 1991). Tratando-se de impactos ainda mais
intensos, tais funcionários os sentem, como se prevê, quando atuam em setores
hospitalares de maior risco (cuidados intensivos — UTI e centros cirúrgicos), como
também nas variações do turno de trabalho. Nessas situações, os fatores de stress de
maior intensidade são os referidos à gravidade da doença e ao risco de morte dos
atendidos, como também à subordinação ao médico, com expressiva falta de autonomia
na tomada de decisões (Bianchi, 1990; Jamal e Baba, 1992). Em relação aos médicos,
constatam-se como principais estressores a pressão do tempo, excessivo número de
clientes, contato direto e regular com doentes e também as dificuldades que apresentam
no relacionamento com outros profissionais (Richardsen e Burke, 1991).
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Quanto ao stress no psicólogo do ambiente hospitalar, dispõe-se de uma única pesquisa
realizada em nosso meio, referente à atuação daquele em um dos contextos
considerados altamente estressantes, isto é, hospitais psiquiátricos e centros-dia de
atendimento ao psicótico (Rego, 2000). Dos seus resultados se infere que do contato
deste profissional com os portadores de psicose, e seus familiares, derivam os mais
intensos e significativos estressores, seguidos dos relacionados com as dificuldades
inerentes ao relacionamento com os outros membros da equipe clínica; a falta de clareza
no desempenho de suas funções e as limitadas perspectivas de auto-realização; além dos
referentes à instabilidade da estrutura e dinâmica organizacionais. É de se estranhar que
tais fatores mostrem-se mais evidentes nos psicólogos que atuam em centros-dia,
embora seus usuários sejam portadores de quadros psicóticos menos pronunciados e
estejam convivendo na comunidade de onde procedem. Outras razões a serem
investigadas poderão explicar essa situação.
Com respeito ao coping, ainda em referência às instâncias O (organismo) e R (reação)
do modelo escolhido, dispõe-se também de outra pesquisa inovadora (Cunha, 2000)
orientada pela autora do presente artigo, referente ao psicólogo que exerce funções
clínicas em hospitais não psiquiátricos. Para a compreensão dessas reações defensivas
ao stress há necessidade, a princípio, de verificar qual é o conceito sobre esse construto
que a autora adotou no trabalho. Com tal finalidade, valeu-se de dois critérios: a
concepção mais atualizada sobre o tema, a partir de uma análise efetuada sobre sua
evolução, e o instrumento de avaliação do coping que mais se adaptasse à ideia
escolhida. Neste sentido, também estudou vários deles.
Foi nas contribuições mais atualizadas de Lazarus e Folkman (1996) e de Schaefer e
Moss (1993) que a autora encontrou respostas para empregar tais critérios. Quanto ao
coping, este é concebido como um conjunto de tentativas estratégicas, de natureza
cognitiva e comportamentais, utilizadas pelas pessoas para perceber os agentes
estressantes e sua intensidade, como também o impacto emocional
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que poderão experimentar em consequência. Para alcançar esses objetivos, realizam
avaliação cognitiva do estressor e preveem os seus possíveis efeitos, assim como os
recursos pessoais de que dispõem para tentar superá-los. Tendo uma ideia de ambos,
passam a empregar comportamentos defensivos de confronto ou de evasão (fight or
flight), sobre a causa e a intensidade da ameaça percebida. É importante considerar que
tais processos se desenvolvem tão rapidamente que nem sempre é possível diferenciá-
los.
No entanto, eles existem em forma individualizada e são avaliados por instrumentos
apropriados e caracterizados conforme dimensões de confronto e de evasão. A primeira
é compreendida pelo emprego de estratégias cognitivas de avaliação realística dos
estressores e de seus efeitos, como também dos recursos pessoais para enfrentá-los,
seguidos de decisões dirigidas diretamente à situação estressante. Por outro lado, a
dimensão evasão é concebida por avaliações racionalizadas e evasivas, por aceitação
resignada dos agentes estressantes, seguidas de alternativas depreciativas, de
extravasamento emocional, ou, ainda, de compensações satisfatórias estranhas à
situação. Da análise dessas dimensões, infere-se que a primeira é percebida como uma
estratégia saudável, e a segunda, como problemática.
Os resultados da pesquisa comprovam que, a julgar pela observação do Quadro 1, em
geral, os psicólogos participantes desta apresentam defesas saudáveis, perante o stress
(dimensão de confronto), com diferenças significantes a seu favor, quando comparadas
com aquelas consideradas problemáticas (dimensão de evasão). Observa-se também
neste quadro grande variabilidade nas pontuações, principalmente na primeira, a de
confronto. Neste quadro, quando analisadas as frequências individualmente, denotam—
se resultados atípicos, representados por inversão de valores (dimensão de evasão maior
que a de confronto), no número 13. Percebem- se, igualmente, semelhanças de ambas
estratégias no número 7 e diferenças pouco sensíveis nos números 28, 29 e 30. Quanto à
distribuição
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da dimensão evasão, encontram-se picos acima da linha média nos indivíduos
identificados com os números 7 e 23.
Quadro 1 – Distribuição Individual das Médias das Respostas dos Sujeitos nas
Dimensões de confronto e de Evasão
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Com o intuito de compreender o significado de tais variações, Cunha (2000) realizou
cruzamentos entre ambas dimensões de coping e as variáveis sociodemográficas e
situacionais no trabalho, apresentados pelo grupo de psicólogos participantes na
pesquisa. A autora encontrou diferenças significantes apenas no variável estado civil e
na da especialidade hospitalar. Em relação à primeira, os solteiros ou separados se
manifestaram muito mais evasivos do que os casados. Por outro lado, diferentemente do
que se espera, os psicólogos que trabalham em hospitais especializados, incluindo os de
moléstias infectocontagiosas e de oncologia, apresentam mecanismos de confronto
significantemente mais intensos do que aqueles que atuam em instituições hospitalares
de caráter geral. Em síntese, pode-se afirmar que esta pesquisa proporciona informações
e diretrizes para a realização de novos estudos sobre este importante tema.
Questões Metodológicas
Para fins de continuidade a novas pesquisas sobre a saúde mental do psicólogo
hospitalar, apresentam-se subsídios de natureza metodológica relativos às funções deste
profissional, focalizando os temas em referência, stress e coping, bem como a seleção,
adaptação ou elaboração de instrumentos utilizados para a coleta de dados.
Com respeito ao primeiro item, é importante reiterar, como requisito principal, o
cumprimento de normas éticas e, mais especifica- mente, da bioética nos estudos e
pesquisas que se realizam com pessoas humanas e, no caso particular, com os
psicólogos como funcionários dos hospitais. Tais normas se referem, principalmente, à
sua proteção como ser humano, em referência à sua saúde física e psicológica e ao sigilo
profissional, entre outros aspectos de real importância. Também prevê a preservação da
boa imagem da instituição, bem como a confiabilidade dos dados obtidos na pesquisa e
o necessário retorno dos resultados às suas origens. Antecipa-se, outrossim, em termos
de proteção à saúde mental dos funcionários, em especial dos
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profissionais da equipe clínica, destacada atenção ao stress a que estão sujeitos em um
ambiente de risco, como é a instituição hospitalar. Os códigos de Ética de Psicologia
(Conselho Regional de Psicologia, 1997) e de Medicina (Dailari, 1999) respaldam, em
seus respectivos campos, tais normas.
Percebem-se, em decorrência ou paralelamente a esses esforços, mudanças dos
procedimentos na realização de pesquisas no gênero, bem como na redação e publicação
dos trabalhos resultantes. Para fins de controle destas atividades, estão as comissões de
ética, e mesmo de bioética, que atuam nos hospitais e nas universidades. A elas
competem a supervisão e o controle dos procedimentos que possam garantir a proteção
dos participantes e dos pesquisadores, assim como a qualidade das contribuições que
nesse sentido se realizam e a divulgação pertinente. Esses grupos de trabalho estão no
dever de exigir, de um lado, termos de compromisso por parte do pesquisador e, de
outro, a necessária anuência, bem como a acessibilidade e a facilidade proporcionadas
pela instituição para obter as informações requeridas por aquele.
Em termos de redação e publicação são válidas as sugestões apresentadas por Pérez-
Ramos (2002), quanto aos cuidados no uso de designações e referências que possam
desvalorizar a pessoa humana. Nesse sentido, é aconselhável a substituição de “sujeitos
da pesquisa’ usual em muitos trabalhos, pela de “participantes da pesquisa”. Evita- se
dessa forma denegri-la ao designá-la como “sujeitos”, termo este que vem sendo
vulgarizado com conotação negativa. Acrescenta-se, ainda, a necessidade de esclarecer
devidamente o uso desta substituição para não confundi-la com as de “auxiliares” e
“colaboradores” da investigação, entre outras. Com tal propósito, considera-se como da
maior importância a motivação e o interesse dos participantes de tomar parte na
pesquisa, respeitando sempre a dignidade e o anonimato dos mesmos.
Com respeito aos instrumentos de coleta de dados, vários critérios são utilizados para a
seleção, adaptação e mesmo para sua elaboração, se for necessário. Citam-se os
considerados mais importantes:
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a disponibilidade em nosso meio; a atenção às normas éticas; a adaptabilidade ao objeto
da pesquisa e a sua fundamentação teórica; as características individuais dos
participantes e, por outro lado, as qualidades de validade, precisão, fidedignidade e,
também, a comprovação de sua pertinência mediante estudo piloto.
Dos instrumentos disponíveis no Brasil, que atendem às principais exigências citadas e
destinados a avaliar o stress e o coping experimentados pelo psicólogo no contexto
hospitalar, apresentam- se dois deles, recentemente elaborados: o Questionário S-1 de
Stress Ocupacional, de Juan Pérez-Ramos (Rego, 2000), e o Inventário sobre Superação
do Stress Profissional (ISSP), do mesmo autor, em uma adaptação do Coping Responser
Inventary — CRI, de Moos, 1993 (Cunha, 2000).
O primeiro instrumento, isto é, o Questionário S-1 de Stress Ocupacional (Anexo 1
deste artigo), tem por finalidade avaliar as situações identificadas como estressantes na
atuação do psicólogo em hospitais e centros-dia de atendimento às pessoas portadoras
de psicose. Constituiu instrumento de coleta de dados da pesquisa citada anteriormente
sobre o tema, realizada por Rego (2000), sob orientação de Juan Pérez-Ramos. Foi
elaborado baseando-se em um levantamento dos principais fatores estressantes que
sentiam os psicólogos, atuando nos contextos citados, bem como dos instrumentos
disponíveis para avaliar tais agentes no ambiente de trabalho. Serviram de exemplos,
neste sentido, o Scope-stress de Vasconceilos (Chaves, 1994) e o Índice de Stress de
Gmelch e colaboradores, adaptado por Juan Pérez-Ramos (Schimidt, 1992). Sua
validação foi assegurada não somente pela realização de um estudo piloto, mas também
pela pesquisa citada, efetuada por Rego (2000). Nesta se comprovou que o instrumento
em referência mostrou-se adequado à população estudada e metodologicamente
consistente.
Este instrumento, como pode ser observado no Anexo 1, consta de duas partes: a
primeira, referente aos dados sociodemográficas que investigam as características
individuais e a situação profissional, de modo a configurar um perfil do psicólogo
participante; a segunda,
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constituída por 56 afirmações com respostas tipo Likert, subdivididas em sete blocos
relativos às fontes de stress, de acordo com as categorias apresentadas na Tabela 1, com
os itens do questionário a elas referentes.
Tabela 1 - Categorias de estressores e seus respectivos itens
CATEGORIAS ITENS
Os dados pessoais a serem obtidos pelo primeiro bloco compreendem: sexo, idade,
estado civil e número de filhos, e os de natureza profissional, tipo de hospital, regime de
trabalho, situação funcional, tempo de trabalho, setor de atendimento e nível
hierárquico. Os itens que compõem o segundo bloco destinam-se à avaliação das
dimensões de confronto e de evasão, em suas categorias (Tabela 2). São distribuídos em
forma simulada para evitarem-se respostas influenciadas pela referida classificação.
CONFRONTO
CATEGORIAS ITENS
(2) Reavaliação positiva
Esforços cognitivas de construir ou reestruturar mentalmente
uma situação estressante aceitando sua realidade
positivamente
(5) Racionalização evasiva Esforços cognitivos para evitar pensamentos realísticos sobre
a situação estressante.
(6) Aceitação resignada Tentativas cognitivas para aceitar, com resignação a situação
estressante.
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Para avaliação dos resultados obtidos pela prova, relacionam-se os dados obtidos em
ambos os blocos, cuja pertinência foi comprovada na pesquisa de Cunha (2000).
Considerações Gerais
A compreensão integral deste trabalho conduz à inferência básica de que a relevância da
preservação da saúde mental do psicólogo hospitalar é comprovada cientificamente,
além de constatar a possibilidade de desenvolver esta área do conhecimento mediante
estudos e pesquisas, e suas aplicações no exercício clínico desse profissional.
Trata-se de um tema, a inferir pelo conteúdo desta exposição, complexo, abrangente e
de premência na continuidade dos esforços que se realizam sobre o mesmo, não
somente pela sua importância prática e teórica, como também pela escassez de estudos
que permitem fundamentar novos empreendimentos.
Atenta-se para a realização de pesquisas semelhantes em outros contextos hospitalares,
para poder generalizar as observações e inferências desta exposição. Questões mais
específicas e de necessidade prática clamam pela efetivação de trabalhos sobre a
resiliência dos psicólogos hospitalares e/ou sobre os fatores de proteção existentes no
contexto de trabalho, os quais, de alguma forma, possam contrastar a influência
negativa dos agentes estressantes incidentes. São estes exemplos de investigações que
poderão motivar os pesquisadores ou estudantes de pós-graduação na área de psicologia
da saúde, ou mesmo dos cursos de aprimoramento ou de especialização que se realizam
no próprio ambiente hospitalar.
Em termos de prática clínica na instituição hospitalar, há muito o que realizar. Constitui
sugestão importante a realização de treinamentos em serviço para os profissionais
referidos ou, ainda, para residentes ou estagiários em psicologia hospitalar, que
contemplem mecanismos de auto-aprendizagem relacionados com a sensibilidade
Página 44
aos fatores de stress provenientes dos diferentes setores e serviços do hospital e,
particularmente, das condições críticas das pessoas aí internadas. Por outro lado, devem
ser postos à reflexão os recursos pessoais para enfrentar tais agentes negativos, como
são o fortalecimento da autoestima, a avaliação do potencial resiliente, o equilíbrio
emocional e a habilidade cognitiva para avaliar situações estressantes e tomar decisões
realísticas de superação.
Nesses cursos são também propícios temas sobre a análise das condições do ambiente
hospitalar que possam compensar a influência negativa dos agentes estressores
existentes, como seriam a valorização das funções do psicólogo na equipe clínica, o
acolhimento do mesmo nesse contexto, a consideração que possa receber de seus
companheiros de trabalho e a clara identificação do seu rol profissional, entre outros.
Para concluir, segue-se uma mensagem aos psicólogos hospitalares:
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Anexo 1 — Questionário “5-1 de Stress Ocupacional”
Instruções
O presente questionário tem por finalidade identificar as principais fontes de stress
percebidas por você, na sua atuação, nos hospitais ou centros-dia que atendem
portadores de psicose. Ele consta de duas partes: a primeira se refere aos dados pessoais
e de seu emprego; a segunda compreende 56 itens especificativos de situações de stress
relacionados com o seu trabalho.
Não se trata de uma prova de rendimento ou de um teste de capacidade; por essa razão,
não há respostas certas nem erradas. O importante é que você, além de indicar os dados
referidos na primeira parte, expresse o grau de intensidade ou de freqüência com que
percebe as condições estressantes apresentadas na segunda parte deste instrumento.
Trata-se de um questionário que deve ser preenchido por você mesmo, com a maior
franqueza e naturalidade. Ao realizá-lo, evite, no caso de pesquisa, escrever seu nome
ou qualquer identificação de ordem pessoal, para assim assegurar o anonimato e o
caráter confidencial do conteúdo de suas respostas.
As informações da primeira parte devem ser preenchidas colocando um X nos
parênteses correspondentes de cada item, especificando sua resposta quando solicitada.
Os dados da segunda parte serão marcados por um círculo no número que corresponde
ao grau de freqüência ou intensidade percebido por você, em relação a cada uma das
situações estressantes indicadas.
Por exemplo: “Preocupam-me os comentários negativos em relação a minha profissão”:
Início da imagem
Fim da imagem
1. ( ) masculino
2. ( ) feminino
1.3 Estado civil
1.( )solteiro(a)
2. ( ) casado(a)
3.( )separado(a)
4. ( ) divorciado(a)
5.( )viúvo(a)
1.4 Filhos
0.( )nenhum
1.( )1 filho
2.( )2filhos
3.( )3filhos
4.( )4filhos
5. ( ) 5 filhos ou mais
1.5 Tipo de instituição
1.( )hospital
2.( )centro-dia
1.6 Área de atendimento
1.( ) ambulatório
2.( )internação
3. ( ) laborterapia
4. ( ) outras (indicar)
1.( )de6al0anos
2.( )dellal5anos
3.( )del6a2oanos
4.( )de2la25anos
5.( )de26a3oanos
1. ( ) tempo parcial
2. ( ) tempo integral
1.9 Nível hierárquico
2. ( ) profissional da equipe
3. ( ) outros (especifique)
2.0 Situação funcional
1.( ) efetivo
2. ( ) contratado
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2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
2. Minha atuação no trabalho é extenuante por causa do excesso de serviço sob minha
responsabilidade.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
3. O tempo de que disponho para minhas atividades profissionais é realmente
insuficiente.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
4. As atividades profissionais realizadas fora do horário de trabalho prejudicam minhas
responsabilidades pessoais e familiares.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
5. Eu me sinto insatisfeito (a) com as mudanças impostas às minhas atividades, sem a
conveniente preparação.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
6. Minhas atividades profissionais ficam prejudicadas pelo número excessivo de
atendimentos que tenho de realizar.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
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7. Sinto-me aborrecido (a) com o desinteresse dos outros profissionais pelo meu
desempenho,
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
8. Minhas atividades profissionais são prejudicadas pela realização de tarefas
administrativas (relatórios, formulários, reuniões etc.) a mim incumbidas,
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
9. Os recursos materiais e os instrumentos de que disponho no meu trabalho são e
superados.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
10. Minhas atividades profissionais no trabalho são rotineiras e pouco estimuladoras.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
11. Fico confuso (a) no meu trabalho porque verifico que minhas funções estão
insuficientemente definidas.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
12. As atividades paralelas, não específicas de minhas atribuições profissionais, minha
atuação no trabalho.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
13. Sinto-me perdido (a) no meu trabalho por não estar seguro(a) de minha posição na
estrutura da instituição
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
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14. Meu prestígio profissional fica prejudicado com a imagem negativa que os outros
têm da instituição em que atuo.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
15. Eu me sinto frustrado(a) com a desordem que se observa na rotina da minha
instituição.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
16. A ausência de programas de reconhecimento e de mérito no trabalho prejudicado
meu interesse profissional.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
17. A natureza dos serviços que são prestados pela instituição cria-me nervosismo e
desgaste nas minhas atividades profissionais.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
18. A falta de linhas de supervisão bem definidas atrapalha minha rotina de trabalho.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
19. A insuficiente atualização a estrutura organizacional de meu serviço desestimula
meu desempenho.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
20. As repetidas mudanças de atividades no meu serviço atrapalham minhas realizações.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
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21. A experiência que estou acumulando no trabalho atual limita minhas aspirações no
progresso profissional.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
22. As atividades repetitivas que realizo bloqueiam minhas aspirações profissionais.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
23. A limitação de oportunidades para atualizar-me no meu serviço prejudica minhas
perspectivas profissionais.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
24. Ao perceber que minha categoria profissional vem perdendo prestígio, sinto-me
diminuído (a) nas minhas aspirações.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
25. A falta de apoio no trabalho que exerço, para desenvolver minhas capacidades e
ideias, empobrece minhas perspectivas profissionais.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
26. A insuficiência da remuneração pelo meu trabalho desestimula meu crescimento
profissional.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
27. A falta de programas para o desenvolvimento de pessoal no meu serviço dificulta
minhas tentativas de atualização profissional.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
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28. Os conflitos e ciúmes entre colegas no meu serviço entorpecem meu progresso
profissional.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
29. A falta de identificação entre as metas da instituição em que trabalho e as do seu
pessoal bloqueia minhas aspirações profissionais.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
31. Na minha organização há reais situações de conflito entre grupos de funcionários
prejudicando meu desempenho.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
32. No meu trabalho há “panelas” ou “grupinhos” de colegas que se esforçam em
dominar o ambiente criando tensão.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
33. Fico nervoso (a) com os conflitos, de relacionamento entre as pessoas que são
atendidas na instituição e os profissionais desta.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
34. A evidente falta de cooperação existente entre meus colegas de trabalho repercute
negativamente em meu estado de ânimo.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
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35. Sinto-me tenso (a) com o excesso de atendimentos que impedem o bom
relacionamento com os atendidos.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
36. Quando me destaco no desempenho de meu trabalho os meus colegas se distanciam
de mim.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
37. Fico preocupado (a) porque certos colegas transgridem os princípios éticos no
trabalho.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
38. A falta de lealdade e cooperação dos meus colegas para comigo incide
negativamente no meu trabalho.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
39. Sinto-me preocupado (a) com a falta do conceito de equipe existente no meu
serviço.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
40. É prejudicial para o meu trabalho o distanciamento que existe entre os superiores e
os profissionais de minha categoria.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
41. Sinto-me decepcionado (a) com os resultados da avaliação de meu desempenho
profissional.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
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42. É frustrante para mim perceber a escassa importância que a instituição dispensa ao
meu desempenho no trabalho.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
43. A insegurança que tenho em conservar meu emprego atual afeta negativamente meu
estado de ânimo.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
44. Fico desanimado (a) ao verificar que as condições de minha instituição não
oferecem melhores possibilidades de crescimento profissional.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
45. Vejo-me obrigado (a) a continuar no meu trabalho atual pela falta de outras
oportunidades de emprego.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
46. E conflitante para mim sentir que a estrutura de minha organização não oferece
oportunidades de promoção.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
47. O clima emocional existente nmeu trabalho afeta minha produtividade.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
48. Sinto que não sou considerado (a) nas decisões de importância para meu trabalho.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
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49.0 que a instituição espera de minha atuação é realmente extenuante.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
50. É frustrante o fato de que a instituição em que trabalho não facilite a minha
participação em eventos que visem ao crescimento profissional.
1 – Nunca
2 – raramente
3 – às vezes
4 - frequentemente
5 – sempre
Comentários:
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Referências Bibliográficas
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centro cirúrgico. São Paulo, Tese de doutorado, ll8p., Escola de Enfermagem,
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Região. São Paulo: GraphBox-Caram Editoração Eletrônica e Gráfica, 1997.
DALLARI, D. A. Bioética e direitos humanos. In: COSTA, 5. 1. F.;
a nossa Claudinha
mulher de trinta
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que não haveria outros aniversários.., nem tampouco
de a todos conquistar...
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Fazer trinta e um anos é mais do que
Capítulo 3
Segurando firme nas mãos os envelopes de exames quase sempre indecifráveis, algumas
vezes acompanhados por pessoas próximos, outras vezes sozinhos por não haver
“pessoa próxima” ou por julgar ser esta uma tarefa solitária.
Os minutos são intermináveis...
A cada nome pronunciado há a expectativa de ouvir o seu.
E a espera continua, alimentando os temores cada vez mais.
Não é para menos, carregamos o estigma da palavra (quase sempre impronunciável) da
doença que assola o nosso século: o câncer.
O diagnóstico de câncer sempre vem associado à morte, perda de órgãos, perda de
cabelos com a quimioterapia, queimaduras na pele na radioterapia, sofrimento, dor,
perda de amigos, companheiros de trabalho, hospital, cirurgias, perda de peso, até o
encontro inevitável da morte indesejável.
É bem verdade que este fato ainda ocorre, com muito menos freqüência do que há
poucos anos, mas no momento em que se ouve o diagnóstico, estes “fantasmas” nos
invadem sem nos pedir licença.
Mas ainda estamos na sala de espera.
Esta cena é muito comum em clínicas e hospitais oncológicos, todos já vimos ou até
mesmo já vivemos cenas como esta.
Quando pensamos em termos psicossomáticos, entendemos que neste momento de
espera, em sala aguardando um “veredicto” existe com certeza um paciente.
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Independentemente de diagnóstico ou terapêutica, estamos diante do paciente
psicossomático, onde a doença pode ou não existir concretamente (mas é real para o
paciente), porém o quadro emocional já está caracterizado sem dúvida.
Diante da expectativa da consulta, já se concretizou um perfil psicossomático, esses
pacientes estão vivendo sintomas tais como: insônia, distúrbios alimentares, ansiedade,
tristeza, irritabilidade, angústia, depressão, medo, apatia, distúrbios gastrointestinais,
dores locais, enxaquecas, stress etc. É inegável, o paciente doente e sente-se desta
forma. Além disso, um sentimento de vergonha (em razão do estigma) envolve a baixa
autoestima, assim percebemos que os olhares são evitados em uma sala de espera, as
pessoas buscam sentar-se nos locais mais distantes uns dos outros e, em geral, evitam
conversas até para não se tocar no assunto. Às vezes, inquietas, dirigem-se à secretária,
perguntando sobre a demora, ou sobre quantas pessoas há na sua frente; retornando ao
seu lugar. Outras, impacientes, reclamam do atraso do horário e descarregam parte da
ansiedade e irritação nas secretárias, sem que haja possibilidade de se alterar a espera.
O clima fica tenso e constrangedor, mas quem poderia esperar outra coisa diante dessa
situação?
A espera é um dos momentos mais difíceis para o paciente, inclusive para seu
acompanhante e familiares. É o momento de “suspensão” quando não há um caminho
para dar vazão às emoções. Não há direção para se prepara todas as possibilidades são
viáveis e o paciente imagina tudo o que pode acontecer, mas não pode agir.
Depois de muito tempo de espera, às vezes horas, o encontro tão esperado e indesejável
com o médico acontece e então a temida palavra câncer é pronunciada. O mundo do
paciente desaba em questão de segundos!
Morte? Dor? Perda dos cabelos? Perda do emprego? Como fica a família?
Enfim, uma avalanche de imagens, medos, cenas desaba sobre a pessoa.
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As reações da pós-consulta são as mais diversas. Há pessoas que se entristecem e
tentam controlar o choro; existem aquelas que não conseguem controlar as lágrimas e
deixam a tristeza transparecer; as que negam o diagnóstico, nem chegam a ouvi-lo e
buscam um médico “mais competente”; há também as que deixam a raiva se aflorar,
demostrando a frustração e a decepção por terem sido surpreendidas pelo inimigo.
Reações naturais de quem vive um momento decisivo em sua vida.
Após a consulta, com o veredicto, encontra-se a “porta” de saída das emoções:
comemora-se a vitória de um tratamento, de uma cirurgia, uma biópsia negativa; ou se
iniciam os preparativos para uma cirurgia, quimioterapia, radioterapia; mas enfim a
angústia cessa.
Agora se tem um caminho de alívio ou de vazão das emoções, mas a espera chegou ao
fim!
Normalmente esses pacientes vivem essas emoções de forma solitária, sem apoio,
fragilizados, tentando demonstrar força, naturalidade, disfarçando até para si próprios o
momento que enfrentam, tanto na pré como na pós-consulta.
O câncer, nesse momento, só é percebido nos exames, como um nódulo, ou um sintoma,
muitas vezes não há dor física, mas sempre há uma enorme dor psíquica no nosso
paciente psicossomático. E é essa dor psíquica que deve ser tratada nesse momento.
“E se, de repente
E sente
Se, de repente
A gente distraísse
O ferro do suplício
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Então, eu te convidaria Pra uma fantasia
Do meu violão...”
Fantasia
“.. Quando a gente conversa passa o tempo rápido; calado, o tempo demora a passar,
aqui as horas passam e você nem vê... para mim sala de espera é aquela lá fora onde o
tempo não passa, essa aqui não; aqui o tempo passa rápido. É melhor do que lá fora
porque aqui o tempo passa e a gente nem num vê, num é verdade? Enquanto esperamos,
é melhor ficar conversando, ajuda a hora passar.”
Na categoria Catarse, os discursos se referem a sentir-se bem ao falar, ao elemento
catártico de que falar leva a um bem-estar.
“A gente expõe o que a gente sente, se está triste ou se está alegre... a gente põe para
fora a tristeza, é bom, falar é bom e poder colocar para fora o sentimento de cada um é
muito bom. Ficar se distraindo, ouvindo as emoções das pessoas, você se sente bem e
ficar calada esperando você junta um problema com o outro e só atordoa a cabeça da
gente. Aqui não enche a cabeça, até esvazia, tira o stress... Se não tivesse isso aqui, a
gente não suportava o problema da gente, porque aqui a gente amadurece, a gente
cresce, com o problema de cada um e a gente suporta carregar a cruz da gente com mais
facilidade. É diferente da
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outra sala, porque, às vezes, na outra sala alguém te conta um problema e você não
desabafa com ninguém e vai segurando o problema de um, o problema de outro e chega
uma hora que você fica pior do que já estava, e aqui já é um outro modo... dá pra
desabafar, ajuda muito nessa parte de medo, a gente conversa, descarrega um pouco os
problemas... ajuda. Ficar calado assim é neurótico, a gente desabafa, a pessoa desabafa,
eu acho muito importante falar tudo o que está acontecendo..., o desabafo faz bem! Eu
vou pensar em mais alguma coisa e confessar mais algumas outras; por exemplo, que
nem da outra vez que eu vim, tinha umas pessoas que estavam muito impressionadas,
um nervoso, até falando palavrão e no fim ele estava totalmente tranquilo, e se sentiu
bem no final da reunião, as pessoas têm medo e o medo é pior do que a doença...”
Na categoria Esclarecimento, os discursos relacionados são os que relatam algum tipo
de esclarecimento em Sala de Espera.
“Se tiver alguma dúvida, a gente pergunta e lá fora não; a pessoa fala do problema dela
e você do seu e fica na mesma ou até pior, né? Aqui se tem um esclarecimento maior, a
gente fica mais preparada, depois de ter passado aqui pelas reuniões. Eu me senti mais
segura, mais confiante, eu sei o que nós devemos fazer e estamos fazendo. Agora eu
estou mais preparada para enfrentar, não sou mais aquela pessoa nervosa, que ficava
ansiosa. A gente fica ciente de muitas palavras, de muitos conselhos, de muitas
explicações, muitas coisas que falaram, eu não sabia e aprendi hoje... Sobre reclamar, eu
não sabia... é um direito meu!...”
Na categoria Comparação, os relatos selecionados foram aqueles nos quais o paciente
cita comparações entre si e os outros ou entre dois outros pacientes como uma forma de
conforto ou de parâmetros para
Situar:
“Às vezes, a gente fica meio oprimido, achando que está sendo vítima, e conversando
aqui, a gente nota que tem pessoas que estão passando por situação ainda pior do que a
da gente; então é muito reconfortante. Tem gente que não tem nem um real para tomar
condução para vir aqui, então a gente se sente numa condição privilegiada. A gente se
emociona também com a emoção dos outros, você pensa na situação dos outros... a dele
está pior do que a minha ou a minha está pior do que a
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dele... eu já estive aqui chorando... A gente se sente bem melhor quando conhece o
problema dos outros...”
Na categoria Amizade, as frases selecionadas são as que associam a Sala de Espera com
o fato de se relacionar socialmente e conhecer novas pessoas.
“... Aqui a gente também fica amigo dos outros, conta o seu problema, ouve o problema
dos outros, fica conhecendo muita gente... as pessoas são amigas que ajudam a gente a
segurar a mesma barra... eu converso com o pessoal, é bom ver as pessoas.”
Na categoria Avaliação da Sessão do Dia, foram eleitas as frases relativas a uma
avaliação dos pacientes no que diz respeito à sessão de Sala de Espera do dia em
questão.
“Eu venho nessa reunião e eu gostei, aqui dá pra gente aquela força, aquela liberdade; é
um trabalho maravilhoso, eu acho vir aqui bom à beça... se ainda me for possível vir
aqui da próxima vez... eu acho que vale a pena... foi ótimo hoje... É muito importante o
trabalho que vocês fazem porque descontrai e ajuda muito as pessoas, então eu acho que
esse trabalho que vocês fazem é magnífico, eu gostei muito.”
Na categoria Mudanças de Atitude, foram preservadas as frases em que o discurso
indica mudança de atitude a partir da vivência em Sala de Espera.
“Agora eu estou rindo, mas eu cheguei nos nervos para falar com o médico, que eu
pensei: vou me embora, mas agora eu já mudei de atitude, vou falar mais alegre com o
homem... Eu tô me sentindo melhor agora, eu não tô tão inseguro, né, quanto tava,
realmente ajudou, agora eu tenho confiança, eu me trancava muito e sofria muito, mas
depois que eu passei a vir na sala de espera eu melhorei muito, hoje eu consigo falar,
antes eu não conseguia...”
Na categoria Equipe de Atendimento do Hospital, selecionou-se os discursos dirigidos
aos médicos, enfermeiros e psicólogos da Sala de Espera.
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“Vocês (coordenadores) compreendem a gente no nosso sofrimento e nos ajuda dessa
forma; ter uma comunicação assim de paciente e médico, isso é muito importante, né?
Eu acredito também na ciência, nos médicos, acredito... Os médicos que tratam a gente
com o maior amor e sei que eles fazem o máximo que eles podem, a gente aqui é muito
bem tratado também pelas enfermeiras, é espetacular, não tenho do que reclamar...”
Na categoria Expectativas de Continuidade da Sala de Espera, são narrados os discursos
relativos ao assunto.
“A reunião de vocês é muito boa, espero que vocês continuem porque é muito
importante! Eu espero que vocês levem esse projeto adiante... e que Deus ajude que
vocês possam levar esse trabalho em todas as outras áreas.”
Paciente 1 — “Neste mês, eu contei segundo por segundo para chegar a hora da
consulta porque isso (mostra o local do câncer) está me incomodando muito..., dói... e
me irrita muito a burocracia, faz seis meses que estou tentando curar isso só na espera
de falar com o médico. Porque o pobre é tratado de qualquer jeito, é um problema
político, o brasileiro não sabe reclamar nada’
Paciente 2 — “Estou muito preocupada por ter aparecido este outro tumor, não contei
para ninguém lá em casa (começa a chorar) ...”
Paciente 3 — “Esperei meu filho até as 6 horas da manhã, ele não apareceu e então eu
vim sozinha de ônibus... é difícil para mim, pois tenho muitas dores na perna e às vezes
ela endurece e não consigo andar. Minha vida é muito sofrida, moro sozinha, sou
separada desde muito tempo e tenho só um filho. Durante alguns anos, morei junto com
ele e minha nora, mas ela me tratava tão mal, que precisei ir embora de lá. Vocês
acreditam, que meu prato e os meus talheres ela separava dos outros da casa? Depois
que eu tomava banho, ela entrava no banheiro e ficava desinfetando, como se esta
doença fosse contagiosa.”
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Paciente 4 — “Faz tempo que eu venho aqui e nada é resolvido, este tumor vaza e faz
uma fedentina horrível, tem dia que chego a trocar quatro vezes de camisa.”
Paciente 5 — “É muito difícil, sou de Pernambuco, deixei lá meu marido, meus filhos e
minha mãe. Moro com meu pai aqui há um ano e meio.”
Paciente 6 — “Pra mim é difícil estar aqui para fazer este tipo de consulta, eu jogava
futebol como amador, e tive que parar o esporte... quando saio na rua, às vezes, minha
perna fica endurecida e os amigos me chamam de saci... estou oprimido, não posso mais
jogar bola, não posso fazer mais nada, enquanto estiver com este tumor, quero que seja
feito aqui o melhor, quero ser operado logo para retirar ele daqui... às vezes, tenho
vontade de rasgar isso com uma faca.., foi bom estar aqui porque pude desabafar a
história do saci, nunca contei isso a ninguém, só para vocês:’
Paciente 7 — “A notícia da doença pega a gente de surpresa, atrapalha nossos planos
futuros..., depois do diagnóstico passamos a pensar diferente..., fiquei muito triste.
Estava para me casar e adiei o casamento porque não sei o que vai acontecer, tenho um
tumor na perna. O câncer destrói os planos da gente e causa uma tristeza muito grande.
É muito bom poder dividir com a família os problemas. É a primeira vez que eu
venho..., eu achei bom, porque dá ânimo na gente, se ficamos sós na sala de espera,
ficamos pensando na doença e suas consequências, a expectativa para entrar no
consultório médico é muito alta.”
Paciente 8 — “Fiz a biópsia, porém não pude ser operado, pois o médico me disse que a
chance de morrer na cirurgia é grande, sinto muita dor, estou mal, não estou gostando
desta situação (da doença), na verdade eu tenho ódio do mundo por estar assim. Sei que
estou na clínica de hematologia, prefiro não saber o que tenho...”
Paciente 9 — “Quando soube do diagnóstico, reuni meus filhos na minha firma e contei
a eles e à minha mulher. Eu disse: ‘Está difícil falar sobre isso, hoje vocês estão me
vendo abatido e abalado, mas sei que vou superar e conto com vocês!’ Tenho ansiedade,
expectativa do resultado de qual o tratamento que terá que seguir daqui pra frente, acho
que talvez tenha que fazer radioterapia.”
Paciente 10 — “... Mas tem o seguinte, comentar aqui é uma coisa, para quem sabe do
nosso problema, fora daqui são poucas as pessoas que sabem que tenho câncer, pois as
pessoas são preconceituosas e temem que esta doença seja contagiosa.”
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Paciente 11 — “Nunca fiquei doente, nunca fui a um hospital, não gosto de falar em
doença e nem de ouvir coisas que de repente nem têm cura..., é ruim. Ninguém quer
ficar doente, todo mundo quer ter saúde. Mas errar o diagnóstico, é demais, deixar
chegar no estado em que chegou para mandar fazer biópsia... é para estar revoltado, eu
nem sei se o meu caso tem cura ou se vou morrer em três meses, mas com essa demora
ficou pior. Acho que não é bom ficar falando, queria voltar para a roça onde moro e
tocar a vida como sempre, esquecer isso.”
Os resultados obtidos a partir da observação dos relatos dos pacientes que frequentaram
a Sala de Espera da 3’ Clínica Cirúrgica do Hospital das Clínicas da Faculdade de
Medicina da Universidade de São Paulo nos leva a constatar que o espaço “Sala de
Espera” contribui positivamente para os pacientes.
Este resultado tem concordância com os objetivos de Melio Filho (1998), ao que se
refere a fazer um atendimento de qualidade à grande demanda de clientes que esperam
longo tempo pela consulta. Nesse seu trabalho, também afirma que “é mais fácil falar
das emoções com um igual a partir da relação que se institui no grupo e que a sala de
espera sensibiliza o paciente quanto às dimensões psicológicas da sua situação, trocando
a posição passiva e receptiva do paciente para uma posição ativa e participativa”.
Maldonado (1998) também refere que, em sala de espera, transforma-se o tempo ocioso
em tempo de trabalho e as vivências são compartilhadas, sua expressão incentivada e as
informações solicitadas pelo grupo são dadas de forma prática e informal.
Neste aspecto, Gonçalves (1998) ressalta que os pacientes apresentam um sofrimento
psíquico e que a necessidade de compartilhar com alguém este momento de espera,
tendo pelo menos uma escuta, pode refletir de forma positiva criando um alívio ao
sofrimento emocional.
Segundo Winnicott (1949), este seria o “espaço potencial”, ou seja, a “área onde se dão
as trocas entre o indivíduo e o meio e onde
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ocorre toda a experiência satisfatória mediante a qual o indivíduo pode alcançar
sensações intensas e a consciência de estar vivo’
Santos (1999) conclui em seu trabalho que o atendimento em grupos de sala de espera
atinge um número considerável de pacientes com problemas semelhantes de saúde,
dentro de um enfoque educacional, que permite a aquisição de estratégias eficazes para
enfrentar a doença.
Ferreira Santos (1999) afirma que o apoio vindo do terapeuta produz o alívio da
sensação de o paciente sentir-se absolutamente só e desamparado. Além disso, a
participação ativa do paciente no processo de tomada de decisão em relação ao
tratamento facilita sua cooperação com as intervenções propostas, assim como a adesão
ao tratamento.
“O mundo fere todas as pessoas,
Ernest Hemingway
A Sala de Espera
Concluído o trabalho do Hospital das Clínicas da FMUSP, fui convidada por um
Instituto de Cancerologia a apresentar um projeto de trabalho que se adequasse às reais
necessidades dele.
A sala de espera desse instituto é frequentada por pacientes de diversos planos de saúde,
o corpo médico constituído por médicos oncologistas e cirurgiões das mais diversas
especialidades.
Na minha primeira visita ao instituto, encontrei as mesmas expressões sombrias que
havia visto no Hospital das Clínicas. Apesar do nível socioeconômico diferente, o
sofrimento, a angústia, o medo, a tristeza eram os mesmos.
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Ao iniciar meu trabalho nessa clínica, notava certa curiosidade por parte dos
funcionários e alguns médicos não estavam bem certos do benefício que a atuação na
sala de espera pudesse trazer, mas aguardaram os resultados.
Comecei como no Hospital das Clínicas... Observando! Neste instituto há também uma
confortável sala para quimioterapia que comporta cinco pacientes em poltronas
reclináveis, com duas enfermeiras e uma TV. Apesar de todo o conforto, muitos
pacientes tinham medo até de olhar em direção àquela porta com a placa: “Sala de
Quimioterapia’
A sala de espera, finamente decorada, divide o ambiente em uma sala grande e outra
pequena com uma TV para cada uma das salas. Frequentemente, podia-se ver os
pacientes mais debilitados, em cadeira de rodas ou que perderam os cabelos na
quimioterapia, envergonhados, buscando a sala menor como refúgio, escondendo-se dos
demais.
Os pacientes chegam a esse instituto indicados pelos seus médicos, ou pelo livreto do
convênio, mas quando saem do elevador deparam-se com o nome do instituto; e a
palavra “CANCEROLOGIA”, fazendo com que os menos avisados sofram o primeiro
impacto do nome câncer. Foi então que me perguntei: o que poderia ser feito para
aliviar a dor emocional desses pacientes?
Voltei às categorias do meu trabalho no Hospital das Clínicas, e pensei muito em cada
uma delas. Decidi experimentar como início a categoria “Esclarecimento” porém, desta
vez, com um caráter intencional e não casual ou decorrente do encontro, como foi no
Hospital das Clínicas.
Cheguei então na sala de espera, apresentei-me a todos como psicóloga e disse que
estava lá para conversar. Quem quisesse participar iria para a sala grande, mas os que
preferissem ver TV, ler, ou não participar poderiam ficar na sala pequena. Senti as
pessoas muito surpresas com a minha “aparição” nunca tinham visto algo parecido.
Uma psicóloga conversando na sala de espera? Para quê? Ela quer me analisar? Será
que ela vai perceber como estou? Alguém para me
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dar atenção, para falar comigo? Que bom! Que medo! Essas foram algumas das frases
que ouvi, tempos depois, de alguns pacientes.
Mas, continuando, após me apresentar, refiro-me ao nome do instituto com a palavra
“Cancerologia” que visa desmistificar o estigma da doença, fazendo com que possamos
pronunciar câncer, assim como pronunciamos diabetes, hipertensão, gastrite,
reumatismo etc. com a mesma naturalidade. Além disso, o Instituto não trata apenas
pacientes de câncer, mas todos que pretendem fazer exames preventivos ou cirurgias de
tumores benignos e malignos. O caráter de esclarecimento alivia alguns medos advindos
do desconhecimento de um assunto, tabu conhecido até pouco tempo como “doença
ruim” e palavra jamais dita na frente de crianças. O medo do desconhecido diminui
quando se tem a informação necessária, portanto, dentre os assuntos de Sala de Espera
surgem temas tais como: por que o médico pede exames complementares, casos
cirúrgicos, anestesia, internação, pontos, drenos, indicação de quimioterapia, possíveis
efeitos colaterais da quimioterapia, tempo de aplicação, a palavra quimioterapia,
radioterapia, o que é mastectomia radical, parcial, de quadrante, cirurgia plástica de
reconstrução, próteses externas, perucas, beleza, estética, vaidade, cura, alta, metástases,
recidiva, avanços da medicina, atualidades em medicina diagnóstica, casos de cura etc.?
Os temas variam sempre de acordo com a demanda de cada Sala de Espera.
É possível se direcionar temas da Sala a partir da agenda médica que assinala se o
paciente vem para primeira consulta, se é retorno para trazer exames, se vai marcar
cirurgia, se vai fazer curativo pós- cirúrgico. Assim, já se tem um panorama de quem é
o paciente que vamos encontrar naquela Sala e os possíveis interesses, dúvidas e
esclarecimentos a serem dados.
A maioria dos pacientes vem acompanhados e, quando há demanda, é discutido o papel
da família no tratamento, os cuidados com o paciente e com o acompanhante. Os
esclarecimentos são dados em um clima descontraído, informal e natural, sem que
pareça uma
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aula, intercalando-se depoimentos espontâneos de pessoas que tenham vivido situações
citadas e que contam suas experiências.
Assim, podemos agrupar o caráter catártico com o de esclarecimento, em que os papéis
se invertem e se alternam, muitas vezes despertando uma compreensão do outro, uma
aproximação, troca de telefones, interesses mútuos, o que nos leva à lembrança da
categoria Amizade, encontrada também no Hospital das Clínicas.
A separação por categorias é meramente didática, pois elas ocorrem concomitantemente
e muitas vezes sem que se dê conta. Como ocorre na já citada categoria Tempo: o que se
observa é que, antes de se começar uma sessão de Sala de Espera, os pacientes estão
frequentemente se levantando e perguntando às secretárias se vai demorar.
Após iniciar a Sala de Espera, poucas pessoas levantam-se para saber sobre tempo de
espera, e ao serem chamadas, às vezes com muito atraso, dizem: “Já sou eu?” Outras
vezes chegam a não escutar seu nome ao serem chamadas, algumas pessoas chegam
mesmo a retornar à Sala de Espera após a consulta para ficar mais um pouco ou para
completar um depoimento com o resultado de sua consulta.
Um fato curioso é que, surpreendentemente, os pacientes que mais sofreram em número
de cirurgias, em mutilações, em perdas, são os que, com mais freqüência, dão apoio aos
pacientes fragilizados com a primeira consulta, ou com a primeira cirurgia. Pode-se
levantar a hipótese de que após o enfrentamento e inevitabilidade das situações por que
passou, não existe mais o medo do imaginário, mas a busca de soluções para-o
problema real. Então englobamos também o aspecto de Comparação entre os casos, que
também foi encontrado na experiência anterior. O paciente, ansioso com uma pequena
cirurgia, fica conformado ao ouvir um depoimento esperançoso de uma mastectomia
radical bilateral, ou quando vê um paciente chegar feliz exibindo o dreno pós-cirúrgico
na expectativa de deixar seu “cachorrinho” (assim chamamos carinhosamente O dreno)
com a enfermeira após o curativo. É inevitável a comparação, e a consequente
constatação de que “existem casos piores do que o meu, que não e tão grave”.
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No instituto, não foram gravados depoimentos, porém o conteúdo que foi ouvido em
Sala de Espera, nos corredores ou mesmo dito para os médicos, em nada difere do
primeiro estudo no Hospital das Clínicas. Informalmente, os depoimentos são ouvidos,
como esse dado a um médico:
“Doutor, o senhor deu o mesmo diagnóstico do outro médico, mas vou fazer a cirurgia
com o senhor, por dois motivos: gostei do senhor e gostei do trabalho na Sala de
Espera” (dito a um médico).
“Eu vim ontem trazer minha mãe para a quimioterapia e fiquei ouvindo o trabalho da
Sala de Espera, hoje trouxe minha mãe novamente para a quimio, mas também trouxe
minha avó e minha tia para participarem da Sala de Espera” (acompanhante de paciente
de quimioterapia na sala de espera).
“Vocês todos são maravilhosos, atenciosos, prestativos, preocupados conosco; mas o
convênio..., é por isso que estou bravo” (marido de paciente que retornou para resolver a
cirurgia de reconstrução de mama de sua esposa que o convênio não autorizou).
“Eu fiz cirurgia com o doutor..., e digo que você pode ficar tranquila porque está em
boas mãos” (paciente na Sala de Espera para outra paciente).
Ao que se refere à equipe médica, à Sala de Espera e ao atendimento, também temos
opiniões semelhantes às do primeiro estudo. Não há avaliação em relação à
continuidade da Sala de Espera, pois não se trata de um projeto experimental, como foi
no anterior; também não há exatamente uma “avaliação da sessão do dia”, pois não é
pedido como anteriormente, mas, mesmo assim, alguns pacientes avaliam como muito
positivo, onde aprenderam algo, e vêem como um diferencial do Instituto: “Não vi esse
trabalho em lugar nenhum! É muito bom!”
As mudanças de atitude são percebidas e assinaladas para os pacientes:
“Você percebeu que a tempos atrás você estava com medo e chorando aqui na Sala e
hoje, após a cirurgia, você está ensinando e encorajando as pessoas?” (feedback dado a
uma paciente na Sala de Espera)
“Ë que naquela época eu estava precisando receber; hoje, eu tenho para dar!” (resposta
da referida paciente)
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“Na primeira vez que eu estive aqui, só chorava... Hoje, estou muito ansiosa, nervosa,
mas não estou chorando! Quem sabe da próxima vez vou estar mais calma!”
Descrever essa experiência a empobrece muito, pois fica praticamente impossível
descrever o tom, o colorido, a emoção, o aroma, o sabor, por meio de palavras. Mas se
foi possível visualizar a cena anterior em uma sala de espera comum, dita normal, vou
ousar expor em palavras um pouco do que vivemos nessa Sala de Espera, digamos,
diferenciada.
No início, como já disse, havia surpresa, dúvida e desconfiança, tanto dos médicos e dos
funcionários como dos pacientes.
Hoje, vemos que apesar das dificuldades enfrentadas, é permitido sorrir, brincar, fazer
piadinhas, falar sério, chorar, compartilhar, estar VIVO apesar do câncer. Com certeza,
essa postura deixou o Instituto muito mais “barulhento” e leve, bem diferente da
conotação anterior da palavra câncer!
Mesmo antes da “sessão” de Sala de Espera, já se pode observar que os “veteranos”
assumiram uma nova postura, conversam com os “novatos”, perderam a vergonha de se
expor, de assumir o tratamento, a careca ou o “cachorrinho” Os pacientes que voltam
para o controle referem-se à “nossa revisão de quilometragem”.
O bom humor, a descontração e a retirada do “pré-conceito” são efeitos visíveis na Sala
de Espera.
Ter um câncer é diferente de Ser um câncer!
E ninguém É um câncer. Se o câncer é um aglomerado de células “malucas” que
perderam a sua função, o Todo, o Eu é maior que isso e pode vencer essas células.
Eu sou mais forte e melhor que essa parte minha que está doente; por que vou deixar
que o menor e mais fraco me vença?
Se eu preciso parar para fazer uma cirurgia e me restabelecer, eu paro, mas depois
continuo vivendo, trabalhando, amando, estudando, comendo, me divertindo, indo ao
cinema, viajando.
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Se eu tiver que fazer quimioterapia, eu vou, quando sair da aplicação vou me dar um
presente, fazer uma coisa bem gostosa. Se eu perder o cabelo, uso boné, peruca, lenço,
turbante, chapéu, assumo a careca como as atrizes; e não vou me envergonhar por estar
lutando pela minha vida; vergonha de quê?
Se enjoar, sei que vai passar, pois é só uma reação, e quando passar, vida normal!
Se eu tiver que fazer radioterapia, vou todos os dias, é rápido; depois tenho o dia todo, e
o fim de semana para viver a vida normalmente.
Jesus Cristo
Também existem fortes evidências de que o mecanismo genético das células é alterado
pela secreção aumentada do cortisol. A função dos genes é alterada, assim como a
síntese de proteínas, e a permeabilidade da membrana das células, podendo levar à
morte dos neurônios, se eles forem estimulados em excesso (excitotoxicidade).
Essas descobertas nos mostram que existe uma relação estreita entre mente e doença.
Quanto mais saudáveis formos, do ponto de vista emocional e psíquico, melhor será
para nossa saúde orgânica.
Os antigos já diziam que o bom humor afasta as doenças, “Quem canta seus males
espanta”, “Mens sana in corpore sano”, e isso é uma verdade, agora sabem os cientistas.
Se o sistema imunológico estiver saudável, reconhecerá as células defeituosas e as
destruirá, ou pelo menos as manterá encapsuladas, evitando a sua propagação. Se o
sistema não estiver saudável, as células imperfeitas continuarão a crescer.
E neste ponto interpõe-se a questão proposta pelos Simontons (1987):
“...o que impede que o sistema imunológico de uma pessoa, num determinado
momento, reconheça e destrua células anormais, permitindo, assim, que elas cresçam e
se convertam num tumor que ameaça a vida?”
Para respondê-la precisamos considerar os aspectos mentais e emocionais da saúde,
percebendo que a doença é um estado de desequilíbrio ou desarmonia gerado pelo stress
prolongado.
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Numerosos estudos sobre a causa do câncer sugerem que três situações podem provocar
tensões cruciais no ser humano e gerar sentimentos de desespero, desesperança ou
impotência. São eles a ameaça a algum papel da pessoa na sociedade, a ameaça a
alguma relação satisfatória central da sua identidade e uma sucessão de momentos nos
quais aparentemente não há saídas ou meios de superação.
O modelo psicossomático de câncer, estudado pelo casal Simonton e outros
investigadores, demonstra que o stress emocional inibe o sistema imunológico e ao
mesmo tempo acarreta desequilíbrios hormonais, provocando a produção de células
imperfeitas e malignas. E isso começa a ocorrer de 6 a 18 meses antes do diagnóstico do
câncer!
Assim, reconhecendo e compreendendo o contexto mais amplo das tensões, podemos
inverter o processo. De início, identificando as principais tensões que ocorreram em
nossa vida, de 6 a 18 meses atrás, sem sentimentos de culpa ou de recriminações, mas
criando uma base tranquila certa para inversão dos processos psicossomáticos que
levam à doença.
Simultaneamente, devemos desenvolver uma atitude positiva de esperança e
expectativa, sabendo que esses sentimentos influenciam nos processos biológicos
restauradores do equilíbrio e revitalizadores do sistema imunológico. Com esta
abordagem psicológica, a terapia física ou convencional toma outros rumos, fazendo
decrescer notavelmente o número de células cancerosas e fortalecendo o sistema
imunológico, com grandes e surpreendentes possibilidades de cura.
Conclusão
O espaço Sala de Espera não tem o intuito de curar o paciente, substituir a psicoterapia,
nem de se aprofundar em questões individuais, mas é fundamental no sentido de dar um
acolhimento geral, suporte, esclarecimento, amenizar a ansiedade, a depressão, o medo.
E aliviar a espera.
Página 82
Por outro lado, desenvolve naturalmente uma atitude positiva de esperança e
expectativa, já que esses sentimentos influenciam nos processos biológicos
restauradores do equilíbrio e revitalizadores do sistema imunológico. Então, podemos
dizer que:
“O tratamento se inicia na Sala de Espera”!
“Tenho a convicção de que, quando a fisiologia
se entenderão mutuamente.”
Claude Bernard
Referências Bibliográficas
BALLONE, G. J. Psiquiatria Oncológica. In: PsiqWeb Psiquiatria
Geral. Disponível em
matica/cancer.htmj>
BALTRUSCH, H. J.; STANGEL, W. e TITZE, 1. Stress, cancer and imrnurity
(4) nistagmo
D. Os sintomas não se devem a uma condição médica geral nem são melhor explicados
por outro transtorno mental.
Já os dependentes que experimentam a abstinência de álcool sofrem quando as
concentrações sanguíneas de álcool declinam de forma abrupta (4-12 horas) após a
cessação ou redução. Entretanto, alguns alcoolistas podem desenvolver períodos mais
longos de tempo. Os sintomas de abstinência atingem seu pico, em geral, no segundo
dia e tendem a apresentar melhoras no quarto ou quinto dia, enquanto os sintomas de
abstinência aguda (ansiedade, insônia e disfunção autonômica) persistem por um
período de três a seis meses em níveis inferiores de intensidade.
Critérios Diagnósticos para Intoxicação com Álcool
A. Cessação (ou redução) do uso pesado ou prolongado de álcool.
B. Dois (ou mais) dos seguintes sintomas, desenvolvendo-se dentro de algumas horas a
alguns dias após o Critério A:
(1) hiperatividade autonômica (p. ex., sudorese ou taquicardia)
(7) ansiedade
Existem outros transtornos induzidos por álcool, mas vou apenas citá-los, sem tecer
comentários: delirium por intoxicação com álcool; delirium por abstinência de álcool;
demência persistente induzida por álcool; transtorno amnéstico persistente induzido por
álcool; transtorno psicótico induzido por álcool; transtorno do humor induzido por
álcool; transtorno de ansiedade induzido por álcool; disfunção sexual induzida por
álcool e transtorno do sono induzido por álcool.
Além dos transtornos induzidos por álcool, há também aqueles relacionados e que estão
associados com a dependência ou abuso de substâncias (por exemplo, Cannabis,
cocaína, heroína, anfetaminas e sedativos, hipnóticos e ansiolíticos e, por fim, a
nicotina). A interação entre essas drogas pode levar o dependente a apresentar sintomas
de depressão, ansiedade e insônia, que muitas vezes precedem o
Página 109
Aspectos culturais, sociais, bioquímicos e psicológicos, quando unilaterais, deixam de
conceber um marco para o conhecimento e esclarecimento de suas múltiplas facetas,
que, unidas, promovem o desenvolvimento e aprimoramento de ideias. O conhecimento
profundo de uma cultura leva o pesquisador a investigar fatores divergentes entre outras
culturas de uma mesma população em diferentes níveis sociais.
13,3% —
bebedores excessivos
alcoolismo
14,2%—
consumo diário
21,2%-
consumo diário
19,1% —
embriaguez semanal
Página 116
Por meio dos dados citados na Tabela 1, podemos ter uma noção dos estudos realizados
no Brasil e, em razão da carência de recursos financeiros, torna-se impossível conduzir
pesquisas que envolvam estudos longitudinais, de modo que fica quase impossível
organizar e executar uma política de saúde voltada ao estudo do álcool.
Políticas do Álcool
Por se tratar de uma questão que atinge toda ou grande parte da população mundial,
políticas de saúde desenvolvidas em países desenvolvidos e em desenvolvimento, ao
longo do espaço e tempo históricos e dentro do contexto de sistemas de valores
determinados cultural- mente, de fórmulas administrativas e de crenças quanto à
natureza fundamental das questões-alvo, estes problemas deram origem a uma
diversidade de respostas políticas. Algumas políticas incluem: proibições quanto ao uso;
racionamento e monopólios estatais; impostos cobrados sobre a venda de bebidas
alcoólicas; leis dirigidas ao licenciamento a distribuidores; horários de consumo ou
definição da idade legal para fazer uso do álcool; campanhas de informação, educação
e, para finalizar, as crenças desenvolvidas quanto ao consumo de álcool e
comportamentos em geral, entre outras (Edwards, 1998).
Foram encontrados diferentes índices de mortalidade em diversos países, tendo como
causa a cirrose originária do álcool, entre eles, o campeão em mortalidade, com 54,0%,
a Hungria, sendo 79,7% homens e 32,6% mulheres. O segundo país é o México, com
48,6%, sendo 72,5% homens e 2 1,8% mulheres. Tais dados foram fornecidos pela
Organização Mundial de Saúde (OMS) e adaptados por Edwards (1998).
Nos Estados Unidos, em 1990, os gastos totais do abuso de álcool, relativos a
tratamento, morbidade e mortalidade, giram em torno de US$100 bilhões, e no Brasil,
Reino Unido, Austrália, Canadá e Japão, os dados fornecidos à OMS não foram
computados em razão de
Página 117
alguns elementos inclusos nas análises estatísticas não publicadas (Rice, 1993).
Quanto às tendências encontradas em vários países que consomem álcool per capita,
verificou-se que, na década de 1990, a França atingiu o índice de 12,7 litros de etanol,
seguido de Luxemburgo com 12,2 e de Espanha e Suíça, com 10,8, enquanto a Turquia
apresentou apenas 0,6 litro de etanol ( World Drink Trends, 1992).
Os problemas que as políticas do álcool priorizam deveriam ser definidos de modo
amplo. O objetivo da política não deveria ser limitado ao alcoolismo, ao dependente de
álcool ou a uma doença física grave. A definição-alvo que melhor fundamentará o
desenvolvimento das políticas deve tomar conhecimento dos problemas relacionados ao
álcool e da dependência do álcool; ela dará alta prioridade a problemas agudos ou
referentes a acidentes, assim como a patologias crônicas; lidará com problemas sociais e
psicológicos e com problemas físicos. Pesquisas também demonstram que uma política
deve abarcar a totalidade da população que bebe e definir o alcance da ação de saúde
pública.
Tratamento Cognitivo-Comportamental
A abordagem Cognitivo-Comportamental no tratamento do alcoolismo pressupõe que o
beber-problema é o que deve ser tratado. Implícita nesta abordagem está a crença de que
o beber-problema é principalmente um comportamento aprendido, e o tratamento
envolve substituir o padrão desadaptativo do comportamento de beber por um beber
mais apropriado ou pela abstinência. A Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC)
salienta o papel das expectativas em relação ao álcool no desenvolvimento da ingestão e
suas consequências (Edwards, Marshall e Cook, 1999).
Para a maioria das pessoas, a mudança de comportamento(s) indesejado(s) tornou-se
relativamente simples, mas sua
Página 118
manutenção é árdua e bem mais complexa. A dificuldade não está no parar de beber,
mas, sim, em manter-se em abstinência.
A TCC é baseada no modelo teórico de que afeto e comportamento são determinados
pelo modo que o indivíduo organiza e estrutura seu mundo. Tem como produto a
combinação de estratégias cognitivas e comportamentais, que visam à elaboração de
metas no intuito de atingir mudanças cognitivas e comportamentais.
Fim da imagem
Descrição da imagem: estímulos ativados (internos ou externos) -> ativação de crenças
-> pensamentos automáticos -> fissura -> crenças facilitadoras -> plano e estratégias de
ação -> lapsos/recaída.
Fim da descrição
Entrevista de Motivação (EM)
A Entrevista de Motivação (EM) desde 1983 é aplicada como uma técnica terapêutica
em adictos, por se tratar de uma abordagem prática e aceitável para os indivíduos
relutantes em mudar e ambivalentes em relação à mudança. Incorpora-se de estratégias
de aconselhamento, da TCC, da teoria dos sistemas e da psicologia social de persuasão
(Miler
Página 120
e Rollníck, 1991). Não faz parte do papel do terapeuta ser autoritário, muito menos
utilizar-se de confrontos com o cliente, mas conduzi-lo à mudança, criando urna base
positiva. A meta a ser estabelecida é aumentar a motivação do paciente, deixando-o com
a responsabilidade de efetuar a própria mudança, visto que a busca pela terapia é metade
do caminho que deverá ser percorrido.
Prochaska e Di Clemente (1982) descreveram cinco estágios de mudança separados, que
podem ser aplicados tanto ao entendimento do comportamento de ingestão quanto ao
trabalho prático do tratamento. Esses estágios são: pré-contemplação, no qual uma
pessoa não reconhece um comportamento como problemático; contemplação, os
indivíduos reconhecem que têm um problema e começam a pensar nas implicações da
mudança; segue-se o estágio de determinação, em que ocorre a pretensão de agir e
tentar a redução do álcool e decidir mudar, passando ao estágio de ação. No último
estágio considerado o de manutenção, o indivíduo tenta manter as mudanças para evitar
a recaída.
Avaliação
Um modelo conceitual que se faz necessário para uma melhor compreensão quanto ao
consumo de bebidas alcoólicas, utilizado para integrar os fatores que sustentam d
consumo individual ou relacionado a circunstâncias ambientais ou relacionamentos
interpessoais, por meio de repetidas combinações com reforço positivo ou negativo ou
mesmo por antecipação de reforço é conhecido como modelo Sorc. Esse modelo Sorc
integra considerações em um modelo específico ao consumo de bebidas alcoólicas. O S
indica os estímulos ambientais previamente à ingestão, evocando reações cognitivas,
afetivas e fisiológicas do — O — organismo. Segue-se a — R — resposta do ato de
ingestão a qual pode ser mantida pelas — C — consequências positivas do consumo.
Página 121
Fatores individuais, familiares e interpessoais, entre outros, podem estar relacionados à
ingestão de bebidas alcoólicas. No âmbito individual, antecedentes ambientais podem
estar associados com situações específicas de consumo, determinados momentos do dia
ou o próprio odor. As variáveis ligadas ao organismo, tais como a fissura, sintomas de
abstinência, afetos negativos, auto avaliações negativas ou mesmo as crenças irracionais
provenientes do (ab)uso do álcool, ou expectativas positivas quanto ao efeito
proporcionado pela bebida em situações particulares, quando reforçados
individualmente, podem diminuir os sintomas de desejo ou abstinência, reduzindo o
afeto negativo ou mesmo aumentos no afeto positivo, diminuindo as auto avaliações
negativas ou a idade de esquecer problemas (McCrady, 1999).
Técnicas Cognitivas e Comportamentais
Nos estágios de ação e manutenção, o treinamento das habilidades sociais e o
treinamento da assertividade são tidos como o primeiro foco dos estágios considerados
tardios. Os pacientes são prejudicados por uma incapacidade subjacente de funcionar
em situações sociais, e o tratamento mediante role-play, dessensibilização sistemática
ou outros métodos comportamentais, tais como a assertividade, que irá ensinar o
paciente a aprender a dizer não à bebida (Holder et al., 1991).
Outra técnica utilizada é o treinamento das habilidades de solução de problemas, que
consiste em ajudar o paciente a desenvolver estratégias alternativas de manejo para usar
em situações de alto risco (Monti et ai., 1989).
O treinamento em relaxamento ajuda os pacientes a aliviarem a ansiedade e a lidar com
o desejo intenso de beber. Muitos adictos apresentam dificuldades em lidar e expressar a
raiva que sentem. A técnica de manejo da raiva em conjunção com o treinamento da
assertividade pode ser benéfica nestes casos.
Página 122
A solução de problemas ajuda o paciente a identificar as situações que possivelmente
estimulam o paciente ao ato de beber e como manejá-las; utilizando-se de estratégias
para lidar com possíveis problemas e com as adicções, por meio do manejo do craving
(fissura).
A base da TCC no tratamento de adictos é a reestruturação cognitiva, que contempla a
identificação de pensamentos automáticos e crenças básicas, ajudando o indivíduo a
substituí-los por pensamentos positivos. Para isso, são usados os Registros Diários de
Pensamentos Disfuncionais (RDPD, na Figura 2), em que são registrados os eventos
situacionais, emocionais e cognitivos relevantes. A detecção desses pensamentos
durante a consulta é crucial para uma demonstração adequada das distorções cognitivas
em ocorrência, pois é por intermédio dessa experiência que o paciente aprende a
detectar seus pensamentos disfuncionais, como um primeiro passo para aprender a
manejá-los (Rangé, 1995).
Uma vez adquirida a compreensão lógica do processo, identificando pensamentos
disfuncionais e fazendo as reestruturações cognitivas de suas cognições, o terapeuta
passa a exercer papel de orientador, e não mais de interventor, apoiando o paciente fora
do contexto terapêutico a generalizar seus pensamentos, sentimentos e comportamentos
diante de situações consideradas de alto risco antes do processo de mudança.
Figura 2 — Registro Diário de Pensamentos Disfuncionais (RDPD — Beck et ai., 1997)
Início da imagem
Fim da imagem
Descrição da imagem
Dia/hora - Situação - Sentimentos Emoção(ões) - Pensamento(s) Automático(s) –
Resposta Racional
Fim da descrição
• assinalar a intensidade do sentimento (0 a 10);
Página 123
O Plano Semanal de Atividades Diárias (PAD, na Figura 3) irá contribuir com o
emprego de tarefas graduadas, na auto-exposição a situações específicas, na prevenção
de respostas e como técnica auxiliar na prevenção de recaída.
Os indivíduos que aprendem com as emoções e estão atentos, quando as crenças são
ativadas, conseguem reconhecê-las e neutralizá-las, evitando o ato de beber. A aplicação
clínica da TCC consiste na modificação do sistema de crenças do paciente, além de
ensina-lo a enfrentar ou evitar situações de alto risco (Beck et ai., 1993).
No final do tratamento, o paciente deverá apresentar o que aprendeu e concluiu por
meio de sua conduta e o que notou que não estava evoluindo, de modo que o terapeuta
se coloque à disposição para ajudá-lo.
Figura 3 — Piano Semanal de Atividades Diárias (PAD — Beck et ai., 1997)
Início da imagem
Fim da imagem
Descrição da imagem: tabela de compromissos de segunda a domingo com os horários
em uma lista de uma em uma hora, das 7:00 as 8:00 horas até as 23:00 – 24:00
Fim da descrição
Página 124
Conclusão
O amplo conhecimento a respeito da conceituação, etiologia e epidemiologia ajuda-nos
a compreender melhor o (ab)uso do álcool, não só como uma substância psicoativa, mas
todas as consequências devastadoras que ele provoca. Sua etiologia ainda desconhecida,
mas com teorias que buscam sustentação, favorece uma gama de hipóteses, que intrigam
a maestria das maiores autoridades no tratamento de adictos. Por sua vez, ajudam a
esclarecer fatos intimamente ligados à sintomatologia e ao estudo de diversas culturas
relacionadas ao comportamento de beber.
Os números obtidos em pesquisas recentes quanto ao consumo são estarrecedores, o que
fez com que muitos pesquisadores, em diversas regiões do planeta, se dispusessem a
promover campanhas educativas relativas à política do álcool.
Nota-se que, com a mobilização de toda a sociedade, se faz jus, a incansável tarefa de
prevenção de recaída, em razão dos danos causados pela ingestão excessiva dessa
substância, tanto em nível orgânico quanto psicológico, social, familiar etc.
A Terapia Cognitivo-Comportamental, uma das formas de psicoterapia mais eficazes no
tratamento e manejo de problemas relacionados ao abuso do álcool, juntamente com a
integração e utilização de técnicas comprovadamente eficazes na modificação de
comportamentos, auxiliada e calcada na resolução de problemas, acrescenta ao
tratamento farmacológico ganhos para o paciente e para a sociedade de modo geral,
permitindo que outras abordagens teóricas possam se utilizar dos princípios
fundamentais, que vão da educação ao manejo de crenças disfuncionais à readaptação
de pensamentos mais apropriados.
Página 125
Referências Bibliográficas
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Página 128 – página em branco
Página 129
De um sorriso doce...
Valdemar Augusto Angerami — Camon
Para Cacheadinha...
SERRA DA CANTAREIRA
Eu quero da vida o teu sorriso doce... o mesmo que você exibe quando te estreito em
meus braços... quero passear pelo teu corpo do mesmo modo como caminho pela serra
nas manhãs e madrugadas... sentindo cada detalhe da caminhada com um prazer que
nunca se exaure... e sempre se renova...
Página 130
eu quero da noite o teu sorriso meigo...
penetrante e abrangente...
Página 131
JOÃO PESSOA
A Lua nasce sob o horizonte e
Página 133
é a Cantareira... é o prazer de te estreitar
Página 150
Percurso este, que, ao realizar a fratura razão/emoção, negou sua própria paternidade: a
medicina hipocrática. Riechelmann (2000) declara:
A medicina ocidental moderna nasceu das mãos de um filósofo, no país onde nasceu a
filosofia. E mais: a medicina também já nasceu psicossomaticamente. Uma leitura
atenta aos Aforismos de Hipócrates (século VI a.C.) faz ver facilmente que o pai da
medicina nunca deixou de considerar as relações entre a lesão corporal, os estados
psíquicos (chamados “da alma’ na época) e os fatores ambientais (p. 171).
Para o referido autor, compreender sobre o que nos fala a medicina psicossomática é
empreender um retorno, um resgate ao berço hipocrático. O avanço tecnológico é
imprescindível nesse caminho aliado ao cuidado. Razão, emoção, técnica e cuidado
sinalizam pistas para outra racionalidade, ampliam a visão reducionista da medicina
tradicional, por isso Riechelmann fala em elos perdidos. Penso que inverter a lógica da
verdade estabelecida pela ciência clássica, como nos convida Nietzsche, pode promover
a criação de caminhos os quais, em vez de separar, possibilitem rejuntar os elos
perdidos, evitando que continuemos portadores de “negligência unilateral”
Analisando os relatos dos brilhantes estudos de Oliver Sacks, fui convidada a pensar
que muitas vezes atuamos como os pacientes portadores de “negligência unilateral’ ou
seja, só percebemos parte do que ocorre nas diversas situações.
Sacks anuncia a incompletude de nosso olhar científico, de nossas verdades. Dentre
tantos exemplos, o estudo da Sra. S., no livro O homem que confundiu sua mulher com
um chapéu, no capítulo 8, me remeteu à nossa cisão. Trata-se de uma sexagenária que,
depois de um derrame, teve afetada parte de seu hemisfério cerebral direito. Com sua
inteligência perfeitamente preservada, ela teve uma alteração curiosa em sua percepção
visual. Às vezes reclamava que as enfermeiras não punham a sobremesa ou o café em
sua bandeja. Quando elas replicavam: “Mas, Sra. S., está bem aqui, à esquerda” Ela
parecia não entender e não olhava para a esquerda. E sua cabeça
Página 151
era delicadamente virada, de modo que a sobremesa ficasse à vista, na metade
preservada do seu campo visual. Ela dizia: “Ah, está aqui — não estava antes”. Ela
havia perdido por completo a noção de esquerda com relação ao mundo e a seu próprio
corpo. Às vezes, ela se queixava de que as porções que lhe eram servidas eram
pequenas demais, mas isso acontecia porque ela só comia o que estava na metade direita
do prato — não lhe ocorria que também havia a metade esquerda. Ela sabia disso
intelectualmente, achava graça, mas, para ela, era impossível sabê-lo diretamente.
A nossa recusa em girarmos nossas cabeças para o outro lado da bandeja faz sentido
dentro do percurso realizado pela medicina e por todos nós, profissionais de saúde.
Engolimos verdades absolutas e irrefutáveis, cobrimos a nossa própria visão e
continuamos famintos.
Des-cobrir o que o pensar metafisico ocidental escondeu, estigmatizou, é o intuito de
Nietzsche, quando pretendeu “colocar a verdade de cabeça para baixo”, inverter seu
sentido, transformá-la em seu avesso. É disso que nos fala sua metáfora atrevida. O
argumento pavimentado por ele é a metáfora da verdade como mulher. O significado da
metáfora que identifica verdade e feminilidade não por acaso vai estar no prefácio do
livro Para além do bem e do mal, em que ele realiza a desconstrução fiel da condição
metafísica e o início da sua exposição sobre vontade de poder-perspectivismo.
Giacoia (2000), comentando sobre a inversão da verdade nietzscheana, nos diz:
Se a verdade for posta de “cabeça para baixo’ então o acesso da verdade platônica
consistirá precisamente na valorização positiva da aparência, dos véus, do disfarce, da
sedução, das paixões, do corpo e do desejo — isto é, de tudo aquilo que, ao longo da
tradição metafísica ocidental, esteve associado com o feminino, com o perigoso, com a
carne, as paixões, o mundo sensível (p. 49).
Coordenador do Projeto:
Gustavo Wanderley
Psicológica:
Assessoria Médica:
Diana Dantas
Atores:
Gustavo Wanderley: Doutor Cem
Página 158
A UPI! nasceu como um projeto do grupo de teatro Clowns de Shakespeare, em
parceria com a Unimed. Esta garante o apoio financeiro, o suporte humano e logístico
para sua realização. Os doutores são atores profissionais, treinados no teatro Clown, e
submetidos a um trabalho semanal de assessoria técnica e psicológica, realizado por esta
autora (professora do departamento de psicologia da UFRN).
O trabalho consiste de: estudos para a construção teórica, filosófica e técnica da UPI!,
supervisão dos atendimentos/visitas hospitalares, com estudo e discussões das
intervenções, e suporte emocional aos doutores da UPI!, por meio de um espaço de
reflexão e expressão das emoções vivenciadas no trabalho.
A assessoria psicológica treina, assiste e cuida dos cuidadores — os doutores da UPI! Já
a assessoria médica serve de apoio aos procedimentos médicos e ao conhecimento das
doenças e de suas terapêuticas.
A UPI! atua em dois hospitais públicos da cidade de Natal — Hosped (Hospital de
Pediatria da UFRN — Universidade Federal do Rio Grande do Norte) e no Hospital
Infantil Varela Santiago, em sua Unidade de Oncologia. As visitas acontecem uma vez
por semana, por uma dupla de doutores acompanhada por um membro da equipe “à
paisana” (que registra toda a visita para o estudo em grupo). Os pacientes da UPI! são,
em sua maioria, crianças portadoras de câncer.
Objetivo
• Utilizar o riso como recurso terapêutico na recuperação, no cuidar das crianças
hospitalizadas.
O riso, como recurso terapêutico, vem sendo discutido nas duas últimas décadas.
Doutores “palhaços” surgem no mundo todo e inspiram os doutores da UPI!. Não
estamos inventando a roda, mas temos um objetivo claro de como girar a roda, ou como
girar a cabeça para o outro lado da bandeja — o desejo de contaminar a racionalidade
médica ocidental com os ensinamentos dos doutores clowns. Os efeitos do riso nos
falam de um benefício físico e emocional dos pacientes. E nos falam também de outra
maneira de enxergar e praticar medicina — possibilitam a receita para uma autêntica
medicina psicossomática.
A esta altura é impossível não fazer a pergunta: como é possível? Antes de falar em
procedimentos e resultados, é oportuno indagar: o riso é terapêutico? Qual a relação
entre a técnica do clown ou a racionalidade dos doutores da UPI! e a racionalidade
médica ocidental? Em outras palavras, como entendemos o processo saúde-doença,
como percebemos a apreensão da realidade, que tipo de verdade perseguimos, nos
remete às crenças que guiam nossas ações.
O Riso como Recurso terapêutico
A medicina vem tentando esclarecer os efeitos do riso para a saúde. Somente mediante
comprovações científicas o riso poderá ser receitado como panacéia. Esquecemos que,
na realidade, ele é um recurso interno a ser despertado, faz parte da dimensão da Higéia,
e a comprovação de seus benefícios apenas reforça a importância de reunirmos essas
duas faces.
Página 160
Dar ciência ao riso é por si só engraçado, mas pode significar a possibilidade de um
novo conceito de ciência, que mais uma vez, insisto, pode ser um resgate ao berço
hipocrático.
Neste sentido, é interessante observar que Asclepius, pai de Higéia e de Panacéia,
possuía um santuário na cidade grega de Atenas, onde os doentes assistiam a
espetáculos musicais e comédias. Deliciar-se com piadas era a prescrição. Ler e ouvir
histórias engraçadas eram receitas da época. O argumento utilizado era a convicção de
que o riso e a alegria aqueciam o organismo, assim como a tristeza contrariava e
esfriava o corpo.
A psicossomática moderna cresce comprovando a interferência da tristeza, do
sofrimento emocional causado por grandes perdas, no aparecimento de doenças como o
câncer e no acometimento de problemas cardíacos. Da mesma forma, a
psiconeuroimunologia comprova a dependência do sistema imunológico aos fatores
emocionais.
O caminho inverso começa a ser vislumbrado também pela ciência médica, mesmo que
timidamente. O resultado de várias pesquisas, entre elas a de William Fry, vem
demonstrar que um dos maiores efeitos do riso é reduzir a liberação dos hormônios
associados ao estresse — o cortisol e a adrenalina. Com menos hormônios desse tipo
circulando no organismo, o sistema imunológico se fortalece. Produzidas nos gânglios
linfáticos e na medula óssea, as células de defesa do organismo não só aumentam em
quantidade como também se tornam mais ativas, com destaque sobretudo para os
linfócitos B, responsáveis pela produção de anticorpos, e os T, que detectam vírus ou
bactérias (Veja, 2001).
Muitos estudiosos já aceitam que o riso fortalece o sistema imunológico, estimula as
funções cardiovasculares e libera endorfinas que combatem a dor. Quem mais
contribuiu para divulgar as propriedades curativas do riso foi Norman Cousin. Nos anos
1960, esse
Página 161
jornalista americano curou-se de uma doença grave por meio do riso. Escreveu sua
história anos depois, lançando, em 1979, Anatomia de uma doença, tornou-se símbolo
da terapia do riso e inspirou pesquisas nessa direção.
Falar em cura pelo riso pode ser ainda uma interrogação, mas estou convencida de que
esta discussão pode contribuir para reafirmar a impossibilidade da separação entre
mente e corpo. A tentativa de entender e intervir no processo saúde-doença,
demonstrando que a alegria pode suscitar a vontade de potência ou de saúde, como diria
Nietzsche, pode aliar-se ao tratamento, devolvendo a dimensão humana da alegria,
apesar do momento de dor.
Se sorrimos é porque nos deixamos envolver. Resgatar essa experiência corporal e
emocional em um momento de dor, em situações de constrangimento e medo, é por
algum instante vivenciar outra dimensão das emoções da vida, vivenciar o prazer.
Masseti (1998) nos ajuda a entender a recuperação física de nossos pacientes, ao
pontuar aspectos psicológicos do sorriso. A referida autora afirma que o sorriso pode ser
um lugar de ação. Explica que um aspecto importante na recuperação física do paciente
está relacionado à energia despendida para lidar emocionalmente com a doença e com a
hospitalização. Em tais situações, é demandado um alto grau de elaboração, em razão da
ansiedade e dos medos, constantemente vivenciados no hospital. O humor aparece como
um recurso importante, permitindo que a criança explore fatos que, por obstáculos
pessoais, não se poderia revelar de forma aberta e consciente. A energia investida no
problema pode ser modificada, propiciando um bem-estar que levará a um melhor
enfrentamento da situação. A alegria libera a energia represada e, dependendo dos
procedimentos, mais do que liberar, permite transformar a experiência traumática.
Página 162
O riso funciona como um objeto transicional, representando para a criança a transição
da angústia à alegria. Os doutores da UPI! estão à disposição das crianças para
exercerem essa função. A teoria de Winnicott (1993) sobre espaço funcional e objetos
transicionais fortalece nosso pensamento. Ele diz que o espaço funcional é a área em
que o fenômeno lúdico opera, diz respeito à existência de uma região de potencialidade
— universo simbólico — capaz de promover o estabelecimento das relações do sujeito
com a realidade. Diz ainda que “o objeto transicional constitui uma defesa contra a
ansiedade, especialmente a ansiedade do tipo depressivo” (p. 392).
Fica claro que a criança, em sua brincadeira, seja com sua boneca particular, seja em
uma interação de ludoterapia ou na interação com os doutores da UPI!, está atuando
com objetos transicionais, fazendo uma catarse de seus problemas e equilibrando suas
emoções.
Melaine Klein (1993), estudando o brincar, também concluiu que as crianças sentem um
prazer muito intenso em suas brincadeiras, não apenas pelo prazer, “mas também
porque aí encontram um meio de dominar sua angústia” (p. 86).
Rir movimenta as nossas emoções positivas. Poder trazer essa experiência corporal e
emocional no momento da doença é tocar na centelha de vida que pode ficar embotada
na estrutura hospitalar. E, como gritou Nietzsche: “Sempre que encontrei vida, encontrei
vontade de poder’ Por que não dizer, vontade de saúde. Para a criança ou adolescente,
rir, mais do que efeito de um entretenimento, é fazer circular vitalidade e, para a
instituição, essa vida em ação pode suscitar mudanças. O riso devolve a vontade de
poder, no sentido nietzscheano, que significa uma vontade de crescer, de vir a ser, de
criar. Remete a criança à vida que ela tem em si.
E Wuo (2000), por sua vez, especifica:
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O ato de sorrir movimenta dimensões positivas, e a isso chamamos o riso de suscitador
da vida, O riso nasce naturalmente fazendo parte de um ciclo. Nasce abalando as
estruturas, movimenta o nosso lado errante (...) quando sentimos o movimento do riso
em nosso corpo, aliviamos uma porção de constrangimento, de contrações, e esse mover
uma estrutura corpórea pode mover uma estrutura social debaixo de uma lona de circo,
em teatro ou hospital (p. 67).
“Racionalidade” do Clown Versus Racionalidade Médica Ocidental
O riso permite demonstrar o quanto nossas emoções podem mudar de lugar — da dor ao
prazer, da tristeza à alegria; o quanto a seriedade pode dar lugar à descontração, o
quanto é possível mudar, inverter. Ele movimenta o corpo físico sim, mas também o
social. É exatamente porque ele ilumina vulnerabilidades, mediante sua lógica
subversiva, e aponta outras possibilidades, que foi proibido na Idade Média.
Humberto Eco (1983), em O Nome da Rosa, retrata a problemática do riso e do cômico.
O riso foi condenado na Idade Média pelo Clero; era considerado coisa do demônio,
heresia, como também era proibido na literatura. Enfim, conhecer o mundo por outra
lógica não era permitido. A Inquisição não permitia nada que contrariasse as regras
divinas. A risada 4enota senso crítico, fantasia, distanciamento do fanatismo, e, assim, a
possibilidade de quebrar regras. Denota um tipo de poder que o poder constituído vai
temer e, consequentemente, reprimir.
Portanto, dar passagem ao riso no hospital é dar passagem também a alguns ruídos.
Vamos entrar um pouco na lógica do clown para podermos apreender seus
ensinamentos e entendermos como os nossos doutores da UPI! se utilizam da lógica
clown para exercerem sua função terapêutica enquanto médicos; exatamente porque
suas
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palhaçadas ultrapassam a função do entretenimento, do humor e, desta forma, podem
gerar ruídos e até mudanças.
Clown se traduz por “palhaço” Apesar de palavras de origem diferente, as duas
confluem em essências cômicas. Ele tem suas raízes fincadas na ingenuidade e pureza,
sendo, portanto, puramente humano. Conhece a sua própria fragilidade, mas acredita
que pode enfrentar e mudar o mundo para melhor.
O doutor Clown sente que tem empatia pela dor de seu paciente, mas sabe que sempre
pode fazer algo, pode cuidar do sofrimento dele; ele se coloca à disposição dele para
lidar com sua dor e resgatar sua alegria. Ele enxerga sempre a essência de uma criança
que é a sua alegria e não a doença, o seu prognóstico. Já em seu diagnóstico, está
preocupado em como tocar nessa dimensão da criança. Como acender sua Higéia, seu
potencial interno de saúde, vida, prazer.
Tem em comum a lógica do raciocínio não-linear. Ele se relaciona com a realidade de
uma forma bastante complexa, inventando sempre novas saídas. Ele quebra com a
lógica do previsível ao propor soluções novas, como, por exemplo, receitar rizoel para
uma enfermeira, dar um adesivo calmante para um pai nervoso, transformar uma meia
em anestésico, estimular a fantasia das crianças receitando o uso do adesivo da fome.
Em outras palavras, a realidade das crianças hospitalizadas passa a incorporar novos
elementos para seu enfrentamento. Pela espontaneidade, ele espelha o que está vendo,
permitindo percebermos os fatos a partir de novos enfoques, ampliando nossa
percepção.
Masseti (1998) pontua:
Uma das características da atuação dos clowns doutores é transformar qualquer
acontecimento em um recurso para o seu trabalho: um enganchar de porta, um tropeço,
um “não”, tudo é incorporado como oportunidade e é canalizado para a linguagem
humorística. Essa capacidade carrega em si uma metáfora importante, em se tratando de
doença e hospitalização: a de que é possível transformar a dor e o sofrimento (p. 56).
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Colorir de sorrisos os hospitais é uma forma de transformar o sofrimento, de introduzir
elementos de humanidade nas relações entre equipe de saúde, pacientes e familiares. É a
quebra da solenidade da doença, é a troca da dor pelo sorriso. É a permissividade para
as emoções, mas como timidamente comentou uma enfermeira: “Se ela continuar, vai
contaminar tudo”, Ela se referia à colega continuar cantando um funk enquanto aplicava
injeção e a conseqüente contaminação de alegria por toda a enfermaria. O funk foi
criado pela enfermeira M., quando auxiliava o doutor Amado e o doutor Sushi em uma
visita e foi batizado como “Funk da enfermeira”
O episódio demonstrou o quanto, no hospital, principalmente nos que tratam de doenças
graves, existe uma solenidade em torno da doença, permeada por seriedade e tristeza.
Nietzsche dizia que “o ensinamento da arte é encontrar prazer na existência” (p. 61). Os
nossos doutores da UPI! buscam inserir e reintroduzir esse elemento na vida de todos
que circulam no hospital. Trata-se de um recurso a mais, mas que sem dúvida contamina
a todos.
Ele nos diz ainda sobre o caminho que impregnou a racionalidade científica ocidental:
A ciência repousa sobre o mesmo chão que o ideal ascético: um certo empobrecimento
da vida é aqui como lá o pressuposto das emoções tornadas frias, o tempo tornado lento,
a seriedade impressa nos rostos e gestos (p. 101).
Fragmentos da U P1!: Alguns Procedimentos e Resultados
Os doutores da UPI! utilizam-se de vários recursos artísticos, entre eles a música, a
mímica, a técnica clown à disposição dos pacientes, equipe e familiares. Eles acessam a
imaginação e a fantasia das crianças, possibilitando a catarse e a elaboração de
momentos difíceis, por meio da criatividade, do improviso, mas também de
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procedimentos estudados para servirem como objetos transicionais capazes de amenizar
tensões, medos e ansiedades pré-cirúrgicas, por exemplo. Neste sentido, são realizadas
cirurgias imaginárias, nas quais as crianças manipulam a parte doente (massa de
modelar retirada de seu corpo) e são levadas a acreditar que o outro “doutor” vai apenas
fechar a operação já realizada.
As clássicas cirurgias do nariz para trazer felicidade contam sempre com outros
pacientes como assistentes; a prescrição do uso do nariz vermelho, que se usado três
vezes ao dia traz felicidade; a fita métrica para medir a pressão e a meia de chulé
anestésico fazem parte de rotinas desses médicos. Bem como o pato purific, que purifica
a região que vai ser cirurgiada, gorila que suga a dor, o adesivo que dá fome de leão, o
adesivo calmante para pais irritados, brincadeiras de assistente de médico e prescrições
diversas.
Cada qual se dá conforme a demanda individual do paciente consultado, da enfermaria
como um todo ou de um membro da equipe ou familiar, sendo acompanhadas muitas
vezes de músicas criadas por um dos nossos doutores — doutor Amado — inspirado na
realidade vivenciada pelas crianças e em nossos procedimentos. Nos casos em que o
silêncio se faz necessário, a mímica é um grande aliado. O que interessa é que para eles
todos estão dentro de possibilidades terapêuticas.
O MUNDO VERMELHO
Vamos começara transformação
Refrão
É chegada a hora da consulta terminar
UPI!
Outro aspecto importante dos procedimentos é buscarem resgatar a autonomia, a
atividade e a possibilidade de escolha (até o não participar de uma brincadeira) em um
espaço onde eles têm de permanecer passivos.
Cabe destacar que os doutores da UPI! são solicitados por enfermeiros e médicos, para
ajudarem em procedimentos de outros médicos. Familiares remarcam exames nos dias
que os doutores da UPI! trabalham, para também terem seus filhos consultados por eles.
A equipe solicita que os doutores da UPI! trabalhem mais dias. Por tudo isso, podemos
também sorrir e falar em resultados para o paciente, familiares e para a instituição
hospitalar.
Assim como embaixo da lona do circo todos são envolvidos pelo riso, no hospital, os
cuidadores (equipe e família) também têm seus
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ganhos quando o riso cobre o dia-a-dia. Apesar de esta reflexão sobre a UPI! enfatizar
em primeiro plano os pacientes, são inegáveis os ruídos, e aprendizados da equipe, bem
como o contágio prazeroso das mães ou pais, ao verem o sorriso de seus filhos ou eles
próprios experimentarem tal dimensão da vida.
Ranier (2001) pontua:
As mães precisam da esperança para conseguirem viver o cotidiano de ter um filho com
câncer. É a esperança que lhes dá a condição de realizarem as tarefas físicas e
emocionais que sua vida pessoal e familiar requisita nesses tempos difíceis (p. 60).
Chiattone (1996) também nos convida a continuar seguindo essa direção quando revela:
É de fundamental importância não só para a criança, mas também para a sua família,
que receba da equipe de saúde o apoio necessário para enfrentar todo o processo de
doença e morte, pois o manejo de crianças terminais inclui a adaptação fisiológica e
médica e a adaptação psicológica e existencial à situação traumática em si. E é nessa
adaptação psicológica e existencial que entram em jogo sistemas intrapsíquicos
complexos constituídos pelos subsistemas dos pacientes, familiares e também equipe de
saúde (p. 135).
Vamos a alguns fragmentos de nossos resultados:
MELHOR ACEITAÇÃO DOS PROCEDIMENTOS DE ROTINA E EXAME
MELHOR COLABORAÇÃO COM A EQUIPE
O clima antes era de apreensão. Com a UPI! elas [as crianças ficam mais receptivas aos
procedimentos. “Os médicos da alegria” não só
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aliviam o sofrimento, como facilitam o nosso trabalho. (Ana Maria Guimarâes —
psicóloga do Hospital Varela Santiago.)
F., o Medo e a Cirurgia
“F. nos chamou [doutor Sushi e eu, doutor Labrô] e disse que estava com medo da
biópsia que tinha de fazer no outro dia. Então, com a ajuda de P. [outro paciente],
fizemos a cirurgia um dia antes, tirando um pedaço da massa de modelar [que seria a
parte da biópsia], de manipular, brincar e depois deixamos um adesivo no local para o
médico substituir pelo ponto. Ficou bem tranquilo e soubemos pelas enfermeiras na
outra visita que ele foi bastante calmo e confiante para a biópsia.”
Doutor Sushi
No relato desse ator ao descrever a visita do doutor da UPI! vemos uma pessoa humana
por trás do doutor, vivenciando os sentimentos provocados pela iminência da morte do
outro, enfrentando esse sentimento com atitudes de carinho, afeto, possibilidades
terapêuticas pouco usadas, mas eficientes no cuidar daquele que sofre. No silêncio e na
distância, a presença humana de nossos doutores Sushi e Amado.
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A Enfermeira do Funk e a Solenidade Hospitalar
Um episódio foi especial. Com E., quando ele estava com medo de tomar a injeção.
Pedimos que ele nos dissesse uma música que gostava, e ele atacou de funk. A
enfermeira, que acredito é a legítima enfermeira do funk, nos acompanhou, cantou,
dançou. Fizemos uma coreografia que virou hit no hospital, e o melhor — enquanto M.
aplicava o remédio, o pequeno E. dava gargalhadas, sem nem sentir a picada ou o
líquido.
A versão criada pela enfermeira começava assim: “Só uma injeçãozinha não dói, uma
injeçãozinha não dói”. Todos os pacientes só querem receber injeção acompanhada por
música e show coreografado.
Doutor Labrô
Apesar dos insistentes pedidos das crianças e dos doutores da UPI!, a enfermeira do
funk não cantou e dançou mais como “naquele dia”. Em outra ocasião em que a UPI!
pedia, ela timidamente cantava, mas com o cuidado para não contaminar o ambiente.
Como já relatou outra enfermeira (fato já descrito anteriormente): “Não pode, se não
contamina o ambiente”. Retratando o culto à tristeza e a solenidade da doença na
instituição hospitalar e a consequente não permissividade ao riso.
Inspirado pelos constantes sofrimentos de nossos pequenos pacientes, diante da
dificuldade da equipe de enfermagem “pegar” suas veias, doutor Amado cria a música
Veia Bailarina.
Veia Bailarina
Corre, salta, pula, pega a veia bailarina
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Venha, me ajuda, leva no corpo um pouco da vida
Refrão
Vamos fazer diferente quem se esconder agora perde
Doutor Labrô
Ele não ficou bom, mas alimentou-se na véspera de sua morte com um apetite e
felicidade como nos tempos de saúde. Houve intervenção terapêutica, porque os
doutores da UPI! acreditam que sempre é possível cuidar.
Naquele instante ele foi feliz, o tum-tum do tambor da vida bateu mais forte, e mais uma
vez inspirou doutor Amado a criar mais uma música para nossa UPI!.
Tambor da Vida
Hoje em silêncio eu ouvi um tum-tum
A festa do coração
Na festa do coração
Fernando Pessoa
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“Vamos começar a transformação. É muito divertido, não tenha medo não.”
É o que diz a canção primeira da UPI! É o convite lançado por seus doutores, diante de
uma sociedade marcada pela negação da morte, que não reconhece o prazer como fonte
de saúde, que vive sob o signo da poderosa medicina tecnológica, na qual qualquer
ruído é atacado de forma que a ordem seja estabelecida.
É em meio à solenidade da doença, à seriedade e à tristeza inculcadas no ambiente
hospitalar, a busca pela imortalidade e a expulsão dos afetos, elementos vitais para a
sobrevida da racionalidade médica ocidental, que os doutores da UPI! aliam-se ao
tratamento, espelham nossas práticas, nos apontam uma medicina psicossomática, nos
seduzem à assertiva de que, somente reinserindo a dimensão da morte (dor) e do riso,
podemos reinventar a realidade hospitalar e descobrir o que a racionalidade tradicional
teima em ocultar.
Para isso, precisamos de cientistas contrabandistas de saberes, capazes, como diria
Morin (1996), de promover uma reforma do pensamento. É preciso fazer dialogar as
áreas e disciplinas fragmentadas pela ciência e pelo pensamento simplificador/disjuntor.
É preciso religar homem e mundo, sujeito e objeto, natureza e cultura, mito e logos,
objetividade e subjetividade, ciência e arte (destaque meu).
Neste momento, gostaria de me despedir do texto buscando mais uma vez oxigênio para
meu desassossego. As metáforas realizam esse feito.
Abrem o caminho Guatarri e Deleuze (1993), os quais propõem a imagem do Homem,
sob um guarda-sol, no qual pintou o firmamento. E, ao olhar para cima, confunde o
firmamento com a pintura no guarda-sol. Ele faz isso porque, quando olha para o
Universo, depara-se com a sua limitação de compreender o que vê. Mas é justamente
nesse momento que os referidos autores propõem que filosofia, ciência e arte rasguem o
guarda-sol, e o homem se aventure a olhar sem tal proteção, para fazer passar um pouco
de caos livre e tempestuoso.
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Eles nos ensinam que o caos existente no interior de nossos sentimentos, que o
enfrentamento da morte, da dor e do delírio prazeroso, além de não nos destruir, é a
trilha possível para perceber a realidade. Um conhecer que junta as três filhas do caos
— arte, filosofia e ciência.
Penso que esse caminho só pode ser trilhado se o nosso pensamento praticar o abraço,
como nos seduz Almeida (1998). Saber praticar o abraço é promover a dialógica entre a
universalidade e a singularidade, é exercitar uma estrutura mental aberta ao acolhimento
e à hospitalidade, mas também às ruínas e à desordem.
O abraço é a aptidão para empreender a partilha, o consolo, a sou o afeto. Abraçar é
prover, pela relação dos corpos, a dialógica dos espíritos (p. 6).
Será que podemos pensar em uma medicina com paixão, capaz de acolher, como a um
pássaro, o sofrimento do doente? Esta pergunta me desassossega. Aquele paciente de
HIV positivo faleceu grávido de um abraço de seu médico; enquanto o personagem
Johnny sentiu sua alma abraçada nos gestos silenciosos da enfermeira.
E as cenas reais vivenciadas pelos pequenos pacientes dos doutores da UPI! nos
ensinam a reencontrar o que há de mais humano em nós. Primeiro passo para rasgar o
guarda-sol e inventarmos outras verdades, inventarmos uma racionalidade humana,
demasiadamente humana.
“Não quero ter a terrível limitação de quem vive apenas do que é passível de fazer
sentido. Eu não: quero é uma verdade inventada.”
Clarice Lispector
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Referências Bibliográficas
ALMEIDA, M. C. Complexidade e ética como estética de vida. Pales realidade. tra
proferida no Congresso Internacional pelo Pensamento Complexo. Rio de Janeiro, 1998.
ANGERAMI, V. A. (org.). A ética na saúde. São Paulo: Pioneira, 1997.
_______________. E a psicologia entrou no hospital. São Paulo: Pioneira, 1996.
Página 182
FELLINI, F. Felline por Felline. 3. ed. Tradução de José Antônio Pinheiro Machado,
Paulo Hecker Filho e Zilá Bernd. Porto Alegre: L&PM, 1986.
ArtMed, 1997.
MASUR, J. O frio pode ser quente? 16. ed. São Paulo: Ática, 1999.
MELLO FILHO, J. Psicossomática hoje. Porto Alegre: ArtMed, 1992.
Salamandra, 1989.
SACKS, O. O homem que confundiu sua mulher com o chapéu: e outras histórias
clínicas. Tradução de Laura Teixeira Mota. São Paulo: Companhia das Letras, 1997.
Calcula-se que 1 bilhão de pessoas, cerca de 240 o da população mundial, vêm sofrendo
de algum tipo de desordem neuropsiquiátrica e um terço delas pode estar comprometida
por mais de um tipo de doença. A cada ano, uma em cada 20 pessoas desenvolve
depressão. Um número expressivo de pessoas busca diariamente ajuda especializada
como resposta às suas angústias. Esse livro é,
assim, um grande avanço nos estudos que visam a uma melhor compreensão do
fenômeno da depressão. Trata-se de mais um lançamento da Editora Pioneira Thomson
Learnmg que se coloca, outra vez, na vanguarda das discussões contemporâneas
envolvendo temáticas tão presentes na condição humana. Essa obra certamente é
indispensável a todos que se debruçam para um melhor entendimento da depressão e de
suas sequelas na vida humana.
A Psicologia NO HOSPITAL — 2 EDIÇÃO
VALDEMARA. ANGERAMI — CAMON (ORG.)
Este livro mostra a Psicologia no hospital com todas as suas dificuldades, avanços e
conquistas. Abordando a realidade brasileira, a obra traça a trajetória dos autores na
conquista do espaço hospitalar pelo psicólogo e propõe-se a despertar inúmeras
reflexões acadêmicas sobre a questão da saúde no País. A Psicologia no Hospital
apresenta a riqueza dos trabalhos dos autores em uma performance artesanal e é um
verdadeiro marco na história da Psicologia no Brasil.