A Reforma Protestante e o Advento Do Pentecostalismo

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A REFORMA PROTESTANTE E O ADVENTO DO PENTECOSTALISMO

Antecedentes Históricos e Principais Doutrinas


 Pr. Dr. Douglas Roberto de Almeida Baptista - E-mail:
[email protected]
4Bibliologia Vetero e Neo Testamentária, Pós-Graduado em Docência do Ensino
Superior, Mestrado em Teologia do Novo Testamento, Doutorado em Teologia
Sistemática.

1. INTRODUÇÃO
A Reforma Protestante se prepara para completar 500 anos e não há como negar sua
influência na história da religiosidade mundial. Qualquer livro de história que aborde
o período da Idade Média, tem, obrigatoriamente, a necessidade de discorrer sobre o
fato histórico que foi um dos principais marcos dessa época.
Neste trabalho, pretendemos expor uma sinopse dos principais antecedentes
históricos que culminaram na Reforma e no Advento do Pentecostalismo. Na mesma
ordem de relevância, também serão abordados os principais pontos doutrinários.
Embora, vários fatores tenham contribuído de forma significativa, os aspectos aqui
abordados dizem respeito única e exclusivamente as questões religiosas e teológicas.

2. O PAGANISMO NA IGREJA
Nos primórdios do cristianismo as igrejas eram independentes e administradas sob a
supervisão de um Bispo em cada região metropolitana. Os bispos eram perseguidos,
encarcerados, maltratados e agredidos. Aqueles que haviam sido torturados,
ostentavam grandes cicatrizes. Alguns estavam caolhos, aleijados e doentes. Apesar
disso, não negaram a fé em Jesus e a Igreja prosperava a cada dia. Para ser cristão,
nesse período, era necessário uma experiência pessoal e genuína com Cristo, do
contrário, não seria possível suportar a perseguição.
Ao perceber o avanço do cristianismo, o império aliou-se a “nova” religião. Em 313
d.C. o tetrarca ocidental Constantino I, o grande, e Licínio, o tetrarca Oriental,
promulgaram o Édito de Milão, também referenciado como: Édito da Tolerância,
declarando liberdade de culto aos cristãos e dando fim a perseguição religiosa.
Tempos depois, em 324 d.C, Licínio é assassinado e Constantino I passa a ser o único
Imperador. Para manter a Igreja sobre controle, o Imperador “converte-se” ao
Cristianismo. No final de maio de 325 d.C, ele convoca um concílio ecumênico em
Nicéia, e, ao total, reuniram-se trezentos e dezoito bispos. O concílio durou dois
meses e declarou o bispo de Alexandria como, "patriarca" dos bispos das regiões da
Àfrica do Norte e arredores e o bispo de Roma, o legítimo líder emérito dos bispos do
Ocidente1.
A partir desta data, para ocupar o Bispado precisava-se do aval do Imperador. E,
agora que a perseguição tinha cessado, para ser cristão não era mais obrigatório a
experiência pessoal e a conversão genuína.
O golpe total sobre a Igreja veio em 380/381 d.C. quando o Imperador Teodósio
promulga o Édito de Tessalônica declarando o cristianismo religião oficial do Império,
trazendo para dentro da Igreja multidões de pessoas não convertidas que, para se
tornarem ‘agradáveis’ ao Imperador, faziam-se cristãos nominais, sem
experimentarem a genuína conversão, introduzindo na igreja heresias e práticas do
paganismo reinante.
Dentre as heresias pode-se destacar no ano 400 d.C, o culto à Virgem e aos santos, o
fato de Maria passar a ser chamada Theotokos - mãe de Deus2, a invenção da oração
aos mortos e do sinal da cruz. Em 440 d.C, Leão Magno (Leão I) - Bispo de Roma,
declara que o episcopado romano é a autoridade suprema da Igreja no mundo3. Um
“constrangimento” que o catolicismo mantém a “sete chaves” são os onze anos de
pontificado da papisa Joana que teve início em 741 d.C.
_______________________
1OLSON. Roger . História da Teologia Cristã. São Paulo: Editora Vida, 2001. p. 156.
2RUBENSTEIN, Richard E. Quando Jesus se tornou Deus. Rio de Janeiro: Fisus, 2001.
p. 275.
3WOODROW, Ralph. Babilônia: a Religião dos Mistérios. Cap. 2, p. 18 e 19.

3. CISÕES E CORRUPÇÕES NA IGREJA


Com a entrada do paganismo, os interesses particulares passaram a sobrepujar a
doutrina cristã. A indicação para o papado era feita mediante suborno e muita
corrupção; por exemplo, após a morte do papa Cônon (687d.C), Pascoal subornou o
arcebispo de Ravena, no intuito de ser reconhecido como papa legítimo. Em Roma,
tinham sido eleitos, nesse ínterim, Teodoro e também Sérgio I. Como Pascoal não
pagasse a quantia acertada a Ravena, o arcebispo de lá se decidiu em favor de Sérgio
I. Teodoro submeteu-se a decisão e Pascoal foi parar no cárcere4.
No início do segundo milênio da Era Cristã, tanto a igreja católica ocidental, liderada
por Roma, como a ala oriental, liderada por Constantinopla, já haviam incorporado
em suas práticas e liturgias vários pontos que seriam questionados pela Reforma.
Assim, no ano de 1054, uma bula papal de excomunhão do Patriarca Oriental foi
depositada no altar de Santa Sofia, em Constantinopla5. Houve retaliação por parte
do patriarca de Constantinopla e o Cisma estava configurado. A partir daí a história
se divide e passamos a acompanhar muito mais a história da igreja romana, do que a
da igreja Grega Ortodoxa e de suas variações e ramos (Russa Ortodoxa, Maronitas,
etc.)6.
Um outro cisma no Catolicismo durou 40 anos (1377-1417). Nesse período houve
simultaneamente dois papas, um em Avignon, na França e outro em Roma. Os
cardeais dos dois partidos pensaram em resolver a situação através da convocação de
um Concílio em Pisa (1409). Os dois papas existentes são depostos e é designado um
novo, Alexandre V. A cristandade tem agora três papas, já que Bento XIII e Gregório
XII se recusam a abdicar. O imperador Sigismundo impõe então a João XXIII, sucessor
de Alexandre V, a convocação de um novo Concílio em Constância (1414).7
Durante o Concílio de Constança, 3 papas estiveram lá, toda a manhã, amaldiçoando-
se uns aos outros e chamando seus oponentes de anticristos, demônios, adúlteros,
sodomitas, inimigos de Deus e dos homens. Um deste papas, João XXIII (1410-1415)
‘foi acusado por 37 testemunhas (na maioria bispos e padres) de fornicação,
adultério, incesto, sodomia, roubo e assassinato. Foi provado, por uma legião de
testemunhas, que ele havia seduzido e violado mais de 300 freiras. Seu próprio
secretário, Niem, disse que ele havia em Boulogne montado um harém, onde não
menos de 200 meninas tinham sido vítimas de sua lubricidade.’ (Chiniquy. The Priest,
the Woman, and the Confessional. p. 139). ‘Ao todo, o Concílio condenou-o por 54
crimes da pior espécie.’ (Durant. The Story of Civilization: The Reformation. pág.
10). Um registro no Vaticano oferece esta informação: ‘Sua santidade, o papa João
XXIII, cometeu perversidade com [sic] a esposa do seu irmão, incesto [sic] com santas
freiras, relações sexuais com virgens, adultério com as casadas, e todos os tipos de
crimes sexuais [...] totalmente devotado ao sono e outros desejos carnais,
totalmente adverso à vida e ensino de Cristo [...] ele era chamado publicamente de
[sic] o Diabo encarnado’ (Sacrorum Conciliorium. Vol. 27, p. 663). Para aumentar sua
fortuna, João XXIII cobrou impostos sobre quase tudo – incluindo prostituição, o jogo
e a usura. Ele tem sido chamado de “o mais depravado criminoso que já sentou no
trono papal.”8
Os cismas e as imoralidades, acima relatadas, fragilizaram, gravemente a autoridade
pontifícia, acendendo duras críticas à Igreja. Deste modo, começaram a surgir
movimentos reformistas que pregavam uma vida cristã mais coerente com o
Evangelho1. Destes movimentos podem-se destacar: os valdenses, no século XII,
conhecidos como, "os pobres de Lyon" ou "os pobres de Cristo" - que questionaram a
autoridade eclesiástica, o purgatório e as indulgências. Os cátaros ou albigenses -
que defenderam nos séculos XII e XIII um ascetismo exacerbado e os Petrobrussianos -
que rejeitavam a missa e defendiam o casamento dos padres.
_________________
4FISCHER-WOLLPERT, Rudolf. Léxico de Papas. Petrópolis: Editora Vozes, 1991. p.
44.
5MARK A. Knoll. Momentos Decisivos na História do Cristianismo. São Paulo: Editora
Cultura Cristã, 1998.
6http://www.solanoportela.net/artigos/cisma_igreja.htm
7COMBY, Jean. Para Ler a História da Igreja I: das Origens ao Século XV. São Paulo:
Loyola. 1993. p. 176.
8WOODROW, Ralph. Babilônia: a Religião dos Mistérios. Cap. 12, p. 100.

3. PRINCIPAIS PRECURSORES DA REFORMA


Um dos grandes precursores da Reforma foi John Wycliff. Nascido na cidade de
Yorkshire, Inglaterra, em 1329. Atendeu à Universidade de Oxford e terminou o
doutorado de Teologia em 1372. Até 1378, Wycliff queria reformar a Igreja Romana
através da eliminação dos clérigos imorais e pelo despojamento de sua propriedade
que, segundo ele, era a fonte da corrupção.
As obras mais proeminentes foram: A Verdade das Sagradas Escrituras, O Poder do
Papa, Apostasia e Eucaristia. Convicto de que a Bíblia é a lei de Deus, resolveu dá-la
ao povo na sua própria língua. Entre 1382 e 1384 as Escrituras foram traduzidas da
Vulgata Latina para o Inglês. O arcebispo de Cantuária reuniu um sínodo em Londres
que condenou 24 teses de Wycliff. Ele não pode mais lecionar em Oxford e seus
‘sacerdotes pobres’ foram presos. Pessoalmente, Wycliff não foi atacado, em virtude
do forte apoio popular e da corte de que ainda gozava.
Morreu, no exercício de seu pastorado em Lutterworth, no último dia do ano de
1384.9 Tinha vivido 55 anos. Trinta anos após sua morte o Concílio de Constança
(1414-15) o condenou como ‘o pestilento canalha de abominável heresia, que
inventou uma nova tradução em sua língua materna’10. Em 1428, a Igreja Romana
deu ordem para cavar sua sepultura, queimar os seus ossos, e lançar suas cinzas no
rio Swift11. John Wycliff foi o principal expoente de medidas reformadoras e, por
isso, é chamado de: “Estrela d'Alva da Reforma”.
Um dos grandes seguidores de Wycliff, foi, João Huss. Nascido em 1369, em Husinec
(75 km de Praga) cursou bacharelado e mestrado em teologia ficando famoso por
divulgar as idéias de Wycliff e tornar-se reformador da Boêmia. Em 6 de Julho de
1415, em Constança, no dia de seu aniversário, foi queimado vivo por ordem da
Igreja Romana, estava completando apenas, 46 anos de idade. Antes de ser
queimado, Huss disse as seguintes palavras ao carrasco: "Vocês hoje estão queimando
um ganso (Huss significa "ganso" na língua boêmia), mas dentro de um século,
encontrar-se-ão com um cisne. E este cisne vocês não poderão queimar." Costuma-se
identificar Martinho Lutero com esta profecia (que 102 anos depois pregou suas 95
teses em Wittenberg).12
Vários outros clérigos passaram a difundir as idéias de Wycliff e Huss. Entretanto, em
virtude de nosso pouco espaço, apresentamos como, último precursor, Jerônimo
Savonarola. Nascido em Ferrara, no dia 21 setembro de 1452. Este reformador
dominicano por curto período, governou Florença. Em seus sermões atacou
violentamente os crimes de Roma e pregava como um dos profetas hebreus.
Savonarola terminou preso por ordem papal e foi condenado à morte. Em 25 de maio
de 1498 foi enforcado e, queimado na grande praça de Florença, aos 46 anos de
idade, dezenove anos antes das 95 Teses de Lutero.13
A título de informação, faço referência a Erasmo de Roterdã. Desidério Erasmo
nasceu em 1466 em Roterdã, Holanda, e, mais tarde, passou a ser conhecido como
Erasmo de Roterdã. Erasmo, embora secretamente apoiasse a reforma, permaneceu
o tempo todo “em cima do muro”13. Sua posição era intermediária entre a fidelidade
e a crítica a igreja romana. No entanto, seu profundo humanismo, conciliatório e
radicalmente oposto à violência, levou-o a dar passos importantes na direção da
Reforma, como a produção do texto crítico do Novo Testamento, grego em 1514,
afastando-se da versão oficial do catolicismo (Vulgata Latina)14.

________________
9WALKER, Williston. História da Igreja Cristã – Volume 1. São Paulo: ASTE, 1987. p.
376, 377.
10Bíblia World Net (2002) http://www.uol.com.br/bibliaworld/igreja/estudos/
inqu001.htm
11OLSON. Roger . História da Teologia Cristã. São Paulo: Editora Vida, 2001. p. 367.
12Ibid. p. 379.
13Ibid. p. 373.
14Ibid. p. 372.

4. AS INDULGÊNCIAS – O ESTOPIM DA REFORMA


No início do século XVI, a decadência moral do catolicismo romano era assustadora.
Alexandre VI (1492-1503) ganhou sua eleição para o papado subornando cardeais [...]
Muitos o consideram o mais corrupto dos papas da Renascença. Ele viveu em incesto
público com suas duas irmãs e com a própria filha, Lucrécia, de quem se diz que teve
um filho. Em 31 de outubro de 1501, promoveu uma orgia de sexo no Vaticano, ‘que
não teve igual em terrível horror nos anais da história humana’ (Diarium. Vol. 3, pág.
167)15.
Anos depois João de Médice, que assumiu o nome de Leão X, tornou-se Papa de
forma inusitada (1513-1521). Ele recebeu o chapéu do papa Inocêncio VIII, na idade
de 13 anos – tratava-se de um acordo entre o papa e o pai de João Médice, o
poderoso governante de Florença. Acontece que o papa Inocêncio VIII tinha um filho
natural que havia se casado com a irmã de João de Médice (Leão X). Mais tarde Leão
X, deu o chapéu de Papa a um neto de Inocêncio VIII, o qual era também sobrinho de
Leão X – esta ação também fazia parte do acordo firmado anteriormente. 16

Leão X tornou-se um grande corrupto. A venda de indulgências predominou durante o


seu papado. Tudo começou quando o Arcebispo de Madenburgo reivindicou junto ao
papado a acumulação das funções das Dioceses de Mayence e Halberstadt, na
Alemanha. A confirmação dada pelo papa Leão X (da família dos banqueiros Médice
de Florença), em agosto de 1514, custaria ao Arcebispo, à soma de 14 mil ducados,
acompanhada de uma "concessão voluntária" de mais 10 mil ducados.
A intermediação do negócio entre o Arcebispo e o papa foi reservada ao grande
banqueiro Jacob Fugger, o rico. Foi para pagar os adiantamentos de Fugger que o
papa Leão X concedeu ao Arcebispo permissão de vender indulgências ao preço entre
8 e 9 ducados cada uma, nas dioceses do seu arcebispado.
A concessão, conforme determinou a bula papal de 31 de março de 1515, se
estenderia por oito anos, sendo que o arcebispo e o pontífice dividiriam entre si os
proventos alcançados repassando-os ao credor Fugger. Sendo que Leão X, com o que
lhe cabia, pensava em acelerar as obras do Vaticano, então em construção. Todavia,
Maximiliano, o imperador do Sacro Império Romano-Germano, desde que fora
informado do acordo, exigiu sua participação, reclamando para si, durante os três
primeiros anos, 1/3 do que fosse recolhido entre os crentes temerosos das penas
eternas.17
John Tetzel, conhecido como homem de má conduta, mas que era habilidoso na arte
de levantar fundos, foi indicado para vender as indulgências na Alemanha [...] Diante
da cruz era colocado um grande cofre de ouro para receber o dinheiro e, em seguida,
o povo era induzido de várias maneiras, a comprar indulgências.
Tetzel levava consigo um quadro do diabo atormentando as almas no purgatório e
repetia freqüentemente as palavras que apareciam na caixa de dinheiro: ‘Sobald der
pfennig im kasten klingt, kie seel aus dem Fegfeuer springt’, que traduzido
livremente significa, ‘Assim que o dinheiro no cofre cai, a alma atribulada do
purgatório sai’. Os ricos davam grandes doações, enquanto os pobres camponeses
sacrificavam o que podiam a fim de ajudarem seus queridos no purgatório, ou para
obter perdão de seus pecados.18
Além disso, o alto clero, a começar pelo papa, explorava a crendice popular
praticando a simonia, ou seja, o comércio de artigos religiosos. Entre os produtos
comercializados encontravam-se tíbias do jumento montado por Jesus quando entrou
em Jerusalém, pedaços do manto da Virgem Maria, frascos contendo ar da gruta de
Belém e uma série de outras relíquias falsificadas.

________________
15WOODROW, Ralph. Babilônia: a Religião dos Mistérios. Cap. 12, p. 101-102.
16HUGHES, Philip. História da Igreja Católica. São Paulo: Dominus Editora S.A, 1962.
17http://educaterra.terra.com.br/voltaire/mundo/2005/09/13/000.htm
18WOODROW, Ralph. Babilônia: a Religião dos Mistérios. Cap. 9, p. 70-71

5. A REFORMA PROTESTANTE
Foi o desvario explícito de Tetzel que fez com que o desconhecido monge, Martinho
Lutero, doutor em teologia por Leipzig desde outubro de 1512, se insurgisse vindo a
publicar, no dia 31 de outubro de 1517, suas famosas 95 teses na porta da igreja do
castelo de Wittemberg denunciando a venda das indulgências como uma atividade
ilegal e imoral.
Lutero nasceu em 10 de novembro de 1483, em Eisleben, na Alemanha. Morreu na
mesma cidade durante uma viagem em 18 de fevereiro de 1546 aos 62 anos de idade.
O pai de Lutero queria que ele fosse advogado, por isso ele entrou para a
Universidade de Erfurt. Lutero quase morreu atingido por um raio. O raio derrubou-o
no chão e ele cheio de medo clamou à sua Padroeira: “Santa Ana, ajude-me e me
tornarei monge”. Foi então que vendeu os livros de Direito e bateu a porta do
mosteiro agostiniano em Erfurt19.
Após um período no Mosteiro foi autorizado a estudar Filosofia, Teologia e Bíblia na
Universidade de Erfurt. Em 1511 visitou Roma e lá encontrou obscenidades,
imoralidades, blasfêmia, fraqueza e apatia espiritual. Retornou à Alemanha
decepcionado e aflito disposto a encontrar uma saída para a letargia espiritual e
teológica da Igreja. Nesse período Lutero experimentou diversas crises espirituais até
que descobriu a verdade em Romanos 1.17: “Mas o justo viverá da fé.”
Em 31 outubro de 1517, as suas famosas 95 teses condenando o uso das indulgências,
desencadearam uma resposta imediata do papa Leão X, a bula papal “Exsurge
Domine” ameaçava Lutero de excomunhão. Mas já era tarde, pois as teses de Lutero
já haviam sido distribuídas por toda a Alemanha. Lutero foi excomungado pelo papa
em 1520 e chamado a comparecer a dieta de Worms (1521) para se retratar. Porém
respondeu ele que não poderia se retratar de nada do que disse.
Em setembro de 1522 Lutero publicou o Novo Testamento na língua alemã[...] em
menos de 10 anos nada menos de 53 edições se tinham publicado só na Alemanha.
Então foi adicionado também o Velho Testamento. O povo alemão possuia agora uma
Bíblia completa na sua própria língua, e isso contribuiu ainda mais para a
consolidação e propagação das doutrinas reformadas20.
Foi na dieta de Spira, em 1529, que os cristãos reformistas foram apelidados pela
primeira vez de “protestantes”, devido ao protesto que os príncipes alemães fizeram
ante o autoritarismo do catolicismo. Nessa época, os ideais da reforma já estavam
estourando em diversas partes como em Zurique - sob o comando de Zuinglio, na
França - sob a liderança de Calvino e, mais tarde na Escócia - sob o ímpeto de João
Knox.
Em todos esses países houve perseguição aos reformadores e aos novos protestantes.
A perseguição veio se intensificar ainda mais com a chamada “Contra Reforma”,
promovida pelo catolicismo - como método de represália. O movimento de reforma
foi seguido de cem anos de guerras religiosas dos reis católicos contra os
protestantes. Na Alemanha no início da Reforma aconteceu a Revolta dos
Camponeses que teve um saldo de 100 mil mortos21. Outro episódio aconteceu na
França e ficou conhecido como o massacre da noite de São Bartolomeu. As matanças
começaram a 24 de Agosto de 1572 e duraram vários meses, vitimando entre 70.000
e 100.000 protestantes franceses (chamados huguenotes). O Papa Gregório XIII ficou
muito feliz e os sinos de Roma ressoaram para um dia de graças, foi cunhada uma
medalha comemorativa em honra da ocasião e o papa encarregou o artista Giorgio
Vasari da pintura de um mural22.
Mas, a reforma prosperou e Igrejas protestantes foram fundadas em todas as partes
do mundo. Hoje, graças a Deus, uma grande parcela da população Ocidental é
protestante, e o Brasil caminha a passos largos para ser conquistado totalmente pelo
protestantismo23.
________________
19OLSON. Roger . História da Teologia Cristã. São Paulo: Editora Vida, 2001. p. 385-
388.
20KNIGHT, A.; ANGLIN, W. História do Cristianismo. Teresópolis: Casa Editora
Evangélica, 1955. p. 239.
21Apostila de História Sigma. Londrina, 2000. Teoria 2, p. 296.
22http://artigos.tiosam.com
23http://www.iacp.org.br/estudos/artigo.aspx

6. O ADVENTO DO PENTECOSTALISMO
Pentecostalismo é como se chama a doutrina originária no seio do protestantismo,
que se baseia na crença do revestimento de poder na vida do crente após o Batismo
do Espírito Santo, por meio da manifestação dos Dons Espirituais, começando com o
dom de línguas (glossolalia)24.
O principal avivamento teve início em 1901, no Colégio Bíblico Betel, em Topeka, e
era conduzido por Charles Fox Parham, mas teve seu apogeu inicial através de um de
seus principais discípulos, um pastor negro e leigo, chamado William Joseph
Seymour, na Rua Azusa, Los Angeles, em 1906.
Neste contexto, em 1909, o Pastor Gunnar Adolf Vingren (de nacionalidade sueca) foi
batizado no Espírito Santo, na cidade de Chicago. O Pastor Gunnar Vingren havia
obtido o título de Bacharel em Teologia pelo Seminário Teológico Batista Sueco, em
Chicago, no ano de 1904. Tempos depois, tendo sido consagrado Pastor, presidiu a
Igreja Batista em Menominee, Michigan. Mais tarde, mudou-se para presidir a Igreja
Batista de South Bend, lá permanecendo até Outubro de 1910.
Neste período, ainda em 1909, por ocasião de uma conferência em Chicago, um
obreiro leigo chamado Daniel Berg (também de nacionalidade sueca) após ser
batizado no Espírito Santo encontrou-se com o pastor Gunnar Vingren. Os dois
conversaram e se tornaram grandes amigos. Depois, Daniel Berg foi residir em South
Bend, onde começaram a estudar as Escrituras e a orar juntos.
O Pastor Vingren era candidato ao campo missionário de sua denominação na China,
mas, após o batismo no Espírito Santo, sentiu não ser esta a vontade de Deus. Como a
chama missionária ardia em seu coração e de seu amigo Daniel Berg, começaram a
orar e pedir uma direção para Deus.
Assim, por meio de uma profecia na casa do irmão Adolfo Uldim, Deus revelou que os
queria no Pará. Após a oração, já que ninguém sabia onde era o "Pará", foram a uma
livraria e consultando um Atlas, descobriram que Pará era um Estado do Norte do
Brasil e Belém, sua capital.
Após a revelação divina, em lances decisivos e até impossíveis para os homens, o
Senhor providenciou os meios para que chegassem ao Brasil. Desse modo, em 19 de
novembro de 1910, chegavam a Belém do Pará, os missionários, Daniel Berg e Gunnar
Vingren. Contavam então os missionários com 26 e 31 anos, respectivamente.
Quando desembarcaram em Belém, numa tarde ensolarada, ninguém os estava
esperando, não eram enviados por nenhuma missão. Eram encomendados pelo
Espírito Santo.
Caminharam pela então avenida 15 de Agosto, hoje Presidente Vargas, até a praça da
República e ali sentaram em um dos seus primeiros bancos aguardando orientação
divina. Ali fizeram também sua primeira refeição em solo brasileiro.
Naquela noite hospedaram-se em um modesto hotel. Em uma das mesas do hotel
encontraram um jornal que tinha o endereço do Pastor Metodista Justus Nelson. No
dia seguinte foram procurá-lo, ele os encaminhou até a Igreja Batista, situada na rua
João Balbi, 406, onde ficaram hospedados no porão do prédio, por algum tempo.
Um tempo depois, Adriano Nobre, crente presbiteriano, que falava inglês e era primo
do responsável pela Igreja Batista (foi Adriano o primeiro professor de português de
Gunnar e Daniel), ao visitar Belém os convidou para passar algum tempo em Boca do
Ipixuna. Logo após, ao retornarem para Belém, já podiam falar português. Nada
havia faltado até aquele momento25.
As denominações evangélicas existentes na época ficaram bastante incomodadas com
a nova doutrina dos missionários, principalmente, por causa de alguns irmãos que
mostravam-se abertos ao ensino pentecostal e interessavam-se em receber o Batismo
no Espírito Santo.
________________
24http://pt.wikipedia.org/wiki/Pentecostalismo
25CONDE, Emílio. História das Assembléias de Deus no Brasil. Rio de Janeiro: CPAD,
2003. p. 29-30.

Celina de Albuquerque, na madrugada do dia 02 de junho de 1911, foi a primeira


crente da igreja Batista de Belém a receber o batismo no Espírito Santo, o que não
demorou a ocorrer também com outros irmãos26.
A nova doutrina trouxe muita divergência naquela comunidade, pois um número cada
vez maior de membros curiosos visitavam a residência de Berg e Vingren, onde se
realizavam reuniões de oração. Enquanto um grupo aderiu, outro rejeitou.
Assim, em duas assembléias distintas, conforme relatam as atas das sessões, os
dezenove adeptos do pentecostalismo foram desligados da Igreja Batista (inclusive os
dois Missionários)27.
Os irmãos desligados, convictos do Batismo no Espírito Santo, resolveram se
organizar. Assim, em 18 de junho de 1911, juntamente com os missionários
estrangeiros, fundaram uma nova igreja e adotaram o nome de Missão da Fé
Apostólica28.
Esse foi o primeiro nome dado ao Movimento Pentecostal nos Estados Unidos a partir
de 1901 e, era também, empregado pelo movimento de Los Angeles, mas sem
qualquer vínculo administrativo da nova igreja brasileira com William Joseph
Seymour.
A partir de então, passaram a reunir-se na casa de Celina de Albuquerque. Mais
tarde, em 18 de janeiro de 1918, a nova igreja, por sugestão do Pastor Gunnar
Vingren, foi registrada como Assembléia de Deus, em virtude da fundação das
Assembléias de Deus nos Estados Unidos, em 1914, em Hot Springs, Arkansas, mas,
outra vez, sem qualquer ligação institucional entre ambas as igrejas.
Em poucas décadas, a Assembléia de Deus, a partir de Belém do Pará, onde nasceu,
começou a penetrar em todas as vilas e cidades até alcançar os grandes centros
urbanos como São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Porto Alegre.
As Assembléias de Deus se expandiram pelo Estado do Pará, alcançaram o Amazonas,
propagaram-se para o Nordeste, principalmente entre as camadas mais pobres da
população.
Chegaram ao Sudeste pelos idos de 1922, através de famílias de retirantes do Pará,
que se portavam como instrumentos voluntários para estabelecer a nova
denominação aonde quer que chegassem.
Nesse ano, a igreja teve início no Rio de Janeiro, no bairro de São Cristóvão, e
ganhou impulso com a transferência de Gunnar Vingren, de Belém (PA), em 1924,
para a então capital da República.
Em 1932, Gunnar Vingren retornou a Suécia para se tratar de uma enfermidade
(pneumonia) Mas, mesmo enfermo, ele ia à igreja, pouco a pouco a febre alta e
dores no peito, o enfraqueceram, dois dias antes de morrer, ele chamou toda a
família e com eles cantou um hino e leu a Bíblia. No dia 28 de junho de 1933, às
14h45, aos 54 anos de idade, ele partiu para estar com o Senhor.29
Anos mais tarde, o Senhor recolheu seu companheiro de missões. Era 28 de maio de
1963, quando, aos 79 anos, Daniel Berg entrou no descanso eterno. Quando a morte
chegou, encontrou o servo de Deus sorridente e feliz, ele não a temeu. Seu tesouro
estava bem guardado. Daniel Berg está sepultado na Suécia, onde moram seus filhos
e netos.
Em virtude de seu fenomenal crescimento, os pentecostais começaram a fazer
diferença no cenário religioso brasileiro. De repente, o clero católico despertou para
uma possibilidade jamais imaginada: o Brasil poderia vir a tornar-se, num futuro
próximo, uma nação protestante.
Tal possibilidade se tornou ainda mais real com a divulgação do censo entre o final
de 2006 e início de 2007, demonstrando que, com vinte milhões de fiéis, o Brasil é o
maior país pentecostal do mundo.

________________
26CONDE, Emílio. História das Assembléias de Deus no Brasil. Rio de Janeiro: CPAD,
2003. p. 30.
27Ibid. p. 32.
28BERG, Davi. Daniel Berg. Enviado por Deus. Rio de Janeiro: CPAD, 1995. p. 101.
29História da Convenção Geral das Assembléias de Deus no Brasil. Rio de Janeiro:
CPAD, 2004. p. 40.

7. PRINCIPAIS DOUTRINAS DA REFORMA


O ponto crucial do problema da religião medieval era a situação de distanciamento
do Evangelho em que se encontrava a Igreja. Os males da Igreja não eram apenas os
seus desvios morais, econômicos e políticos, que a colocavam em descrédito perante
o povo. Seu problema principal, responsável também por esses, era o afastamento
das doutrinas fundamentais da Palavra de Deus.
A Reforma trouxe a Igreja de volta às Escrituras e ao Evangelho pregado pelos
apóstolos. Foi o estudo da Bíblia que revelou quão longe a Igreja estava afastada da
verdade da fé e a trouxe de volta à pureza de sua crença primitiva. A Reforma
restituiu à Igreja a crença em doutrinas chaves, que se tornaram essenciais para a
sua pregação e para distingui-la dos erros que continuaram e, ainda, são mantidos
por algumas igrejas até os nossos dias. É sobre a importância dessas doutrinas,
conhecidas por sua designação latina: Sola Scriptura, Solus Christus, Sola Gratia, Sola
Fide e Soli Deo Gloria, que se discorre nos subitens abaixo:

7.1. Sola Scriptura – "Somente a Escritura"


Para os reformadores, somente a Escritura Sagrada tem a palavra final em matéria de
fé e prática. É o que ficou consubstanciado nas Confissões de Fé de origem
reformada. A Confissão de Fé de Westminster30, por exemplo, afirma: “Sob o nome
de Escritura Sagrada, ou Palavra de Deus escrita, incluem-se agora todos os livros do
Velho e do Novo Testamento, ... todos dados por inspiração de Deus para serem a
regra de fé e de prática”.

A autoridade da Escritura Sagrada, razão pela qual deve ser crida e obedecida, não
depende do testemunho de qualquer homem ou igreja, mas depende somente de
Deus (a mesma verdade) que é o seu autor; tem, portanto, de ser recebida, porque é
a palavra de Deus (...). O Velho Testamento em Hebraico (...) e o Novo Testamento
em Grego (...), sendo inspirados imediatamente por Deus e pelo seu singular cuidado
e providência conservados puros em todos os séculos, são por isso autênticos e assim
em todas as controvérsias religiosas a Igreja deve apelar para eles como para um
supremo tribunal (...). O Juiz Supremo, pelo qual todas as controvérsias religiosas
têm de ser determinadas e por quem serão examinados todos os decretos de
concílios, todas as opiniões dos antigos escritores, todas as doutrinas de homens e
opiniões particulares, o Juiz Supremo em cuja sentença nos devemos firmar não pode
ser outro senão o Espírito Santo falando na Escritura.(I, 2,4,8,10).

Martinho Lutero, em suas teses, proclamava que a Igreja Católica Romana de seu
tempo cometia uma injustiça para com a palavra de Deus quando, no mesmo sermão,
concedia tempo igual ou mais longo, às indulgências do que à palavra de Deus (tese
54) e que o verdadeiro tesouro da Igreja é o sacrossanto Evangelho da glória e da
graça de Deus (tese 62). Comparava o Evangelho como: "redes com que, desde a
antiguidade, se pescam homens de bem", enquanto que as indulgências eram "redes
com que agora se pescam os bens dos homens" (teses 65 e 66). Mas foi na Dieta de
Worms, em 1521, que demonstrou estar totalmente convencido de que as Escrituras
eram a sua única autoridade reconhecida. Quando perguntado se estava disposto a se
retratar das afirmações que fizera, negando autoridade a certas decisões de alguns
concílios, sua resposta foi:
“É impossível retratação, a não ser que me provem que estou laborando em erro,
pelo testemunho das Escrituras ou por uma razão evidente (...). Minha consciência
está alicerçada na Palavra de Deus, e não é seguro nem honesto agir-se contra a
consciência de alguém. Assim [sic] Deus me ajude. Amém.”31
___________
30WESTMINSTER, O Catecismo Maior. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2002.
31CAIRNS, Earle E. O Cristianismo através dos séculos. São Paulo: Vida Nova, 2003. p.
237

Tanto a autoridade única como, também, a suficiência das Escrituras têm sido
doutrinas preciosas para as igrejas reformadas. Só a Escritura e toda a Escritura. Não
precisamos de outra fonte para saber o que devemos crer e como devemos agir. Hoje
há, uma tendência, por parte de alguns grupos evangélicos, para se colocar a
experiência humana e supostas revelações do Espírito no mesmo nível de autoridade
das Escrituras. Na prática, às vezes essas experiências acabam se tornando mais
desejadas e tidas como mais valiosas do que o próprio ensino das Escrituras. Tomam,
hoje, o lugar que, no passado, tomava a tradição na Igreja Católica. É preciso que
voltemos ao princípio da Sola Scriptura, se quisermos ser, realmente, reformados em
nossas convicções e práticas. A Escritura, e não a nossa experiência subjetiva, deve
ser o nosso critério de verdade. Nossa pregação não deve visar o que agrada aos
homens, mas, o que agrada a Deus.
Já dizia Lutero que: “os tesouros das indulgências eram muito mais populares dos
que os tesouros do Evangelho” (teses 63 e 64), e isso, certamente, porque faziam as
pessoas se sentirem bem, aliviadas do sentimento de culpa, pela promessa, ainda
que falsa, de perdão de pecados. Só a pregação da Lei associada ao Evangelho pode
realmente trazer o homem ao arrependimento e ao perdão divino. As Escrituras são a
espada do Espírito. É por elas, e não independente delas, que o Espírito age. Nossas
experiências espirituais só têm valor se forem produzidas pela persuasão da Palavra.

7.2. Solus Christus – "Somente Cristo"


O Catolicismo Romano afastou-se do Evangelho e instituiu o culto a Maria, já em 431,
o culto às imagens, em 787, e a canonização dos santos, em 933. Instituiu, também,
a figura do sacerdote como vigário de Cristo, a quem deve ser confessados os
pecados e a quem supostamente foi conferido poder para perdoá-los, mediante a
prescrição de penitências.
Um dos pontos centrais das teses de Lutero tinha a ver, exatamente, com o poder do
Papa e dos sacerdotes de perdoar pecados, que ele questionava, pelo menos no que
diz respeito aos mortos.
Lutero dizia: “- O Papa não tem o desejo nem o poder de perdoar quaisquer penas,
exceto aquelas que ele impôs por sua própria vontade ou segundo a vontade dos
cânones” . O Papa não tem o poder de perdoar a culpa a não ser declarando ou
confirmando que ela foi perdoada por Deus; ou, certamente, perdoando os casos que
lhe são reservados. Se ele deixasse de observar essas limitações a culpa
permaneceria32.
Os cânones da penitência são impostos unicamente sobre os vivos e nada deveria ser
imposto aos mortos segundo eles (teses 5, 6 e 8). Mas admitia o sacerdote como
vigário de Deus, perante quem Deus podia perdoar a culpa, mediante humilhação do
penitente (tese 7). Só mais tarde Lutero se libertou totalmente de alguns desses
ranços de sua formação católica. Nem poderia ser diferente, pois, quando ele
escreveu as teses, era ainda um monge católico romano.
A Bíblia diz que: "há um só Deus e um só Mediador entre Deus e os homens, Cristo
Jesus, homem" (1Tm 2:5), que, "por isso, também pode salvar totalmente os que por
ele se chegam a Deus, vivendo sempre para interceder por eles" (Hb 7:25) e que "não
há salvação em nenhum outro; porque abaixo do céu não existe nenhum outro nome,
dado entre os homens, pelo qual importa que sejamos salvos" (At 4:12).
Por esses textos bíblicos, o cristão da reforma não acredita na intercessão de Maria
ou dos santos, e nem que eles possuem qualquer poder para tal. A obra de Cristo é
suficiente para a nossa salvação. Maria e todos os demais crentes só puderam ser
salvos pela graça e mediação eficaz de Cristo.

_________________
32SAUSSURE, A de. Lutero. São Paulo: Editora Vida, 2001.

Uma outra conseqüência do princípio do Solus Christus foi a doutrina que ficou
conhecida como a do "Sacerdócio Universal dos Crentes". Não necessitamos de outro
sacerdote ou mediador entre nós e Deus que não seja o Senhor Jesus Cristo. Cada um
pode chegar-se a Ele diretamente, sem intermediários humanos.
Como diz o autor aos Hebreus: "Tendo, pois, a Jesus, o Filho de Deus, como grande
sumo sacerdote que penetrou os céus, conservemos firmes a nossa confissão. Porque
não temos sumo sacerdote que não possa compadecer-se das nossas fraquezas; antes,
foi ele tentado em todas as coisas, à nossa semelhança, mas sem pecado.
Acheguemo-nos, portanto, confiadamente, junto ao trono da graça, a fim de
recebermos misericórdia e acharmos graça para socorro em ocasião oportuna" (Hb
4:14-16). A Reforma trouxe à Igreja o Evangelho simples dos apóstolos, centrado na
suficiência e exclusividade da obra de Cristo para a salvação. A velha confissão de
Paulo foi de novo a confissão dos reformadores: "Porque decidi nada saber entre vós,
senão a Jesus Cristo e este crucificado" (1Co 2:2).

7.3. Sola Gratia – "Somente a Graça”


Intimamente ligado ao princípio do Solus Christus está o da Sola Gratia. A Bíblia
ensina que o homem é totalmente incapaz de fazer qualquer coisa para a sua
salvação. Está espiritualmente morto em delitos e pecados. Um morto nada pode
fazer sem que antes seja vivificado. Paulo ensina como se operou a nossa salvação:
"Ele vos deu vida, estando vós mortos nos vossos delitos e pecados (...) e estando nós
mortos em nossos delitos, nos deu vida juntamente com Cristo, pela graça sois salvos"
(Ef 2:1,5). Foi "pela graça", diz Paulo, que fomos vivificados, estando nós mortos.
A Igreja Católica se julgava no direito de distribuir o perdão de pecados através da
venda das indulgências, pela prescrição de penitências e outros atos de contrição.
Foi a Reforma que trouxe à luz a verdade da Sola Gratia, ensinada nas Escrituras.
Onde a total inabilidade do homem for negada e os pretensos méritos humanos forem
cridos, não haverá verdade bíblica.
O homem nem mesmo pode cooperar com a graça regeneradora do Espírito. A
salvação não é, em nenhum sentido, obra humana. Não são os métodos ou técnicas
humanas que operam a salvação, mas tão somente a graça regeneradora do Espírito.
A fé não pode ser produzida por uma natureza decaída e morta33.
"Pois nós também, outrora, éramos néscios, desobedientes, desgarrados, escravos de
toda sorte de paixões e prazeres, vivendo em malícia e inveja, odiosos e odiando-nos
uns aos outros. Quando, porém, se manifestou a benignidade de Deus, nosso
Salvador, e o seu amor para com todos, não por obras de justiça práticadas por nós,
mas segundo sua misericórdia, ele nos salvou mediante o lavar regenerador e
renovador do Espírito Santo, que ele derramou sobre nós ricamente, por meio de
Jesus Cristo, nosso Salvador" (Tt 3:3-5).

7.4. Sola Fide – "Somente a Fé


Falando da eleição, Paulo argumenta: “E, se é pela graça, já não é pelas obras; do
contrário, a graça já não é graça” (Rm 11.6). A graça exclui totalmente as obras. O
homem nada pode e nada tem para oferecer a Deus por sua salvação. A única coisa
que lhe cabe fazer é aceitar o dom da salvação, pela fé, quando esta lhe é
concedida. Fé na obra suficiente de Cristo, que lhe é imputada (creditada em sua
conta) gratuitamente. Essa obra consiste na sua vida de perfeita obediência à lei de
Deus, em lugar do homem, obediência que nem Adão nem qualquer de sua
descendência pôde prestar, dada a sua condição de morte espiritual. Por isso Cristo é
chamado de o segundo ou o último Adão (1Co 15.45). Ela consiste também, e
principalmente, de sua morte sacrificial em lugar do pecador eleito, através da qual
é pago o preço exigido pela justiça de Deus para a justificação. A justiça de Deus
exige punição do pecado. Ele é aquele que "não inocenta o culpado" (Ex 34.7). Exige
justiça perfeita.
____________
33OLSON. Roger. História da teologia cristã. São Paulo: Editora Vida, 2001. p. 397-
401

Para que Deus pudesse punir o pecador, mas ao mesmo tempo declará-lo justo (que é
o significado bíblico de justificar), foi preciso que alguém, sem culpa e com méritos
divinos, assumisse o seu lugar. Foi o que o próprio Deus fez através de Cristo.
Assumiu a culpa do pecador eleito e morreu em seu lugar, satisfazendo, assim, a
justiça de Deus, ofendida pela pecado. Nada menos do que isso foi suficiente para
justificar o pecador. É o que se chama na teologia de "expiação". Desta forma, Paulo
pôde falar em Deus como "aquele que justifica o ímpio" (Rm 4.5) e da morte de Cristo
como a manifestação da sua justiça, para que ele pudesse ser justo e o justificador
daquele que tem fé em Jesus.
Diz Paulo: "sendo justificados gratuitamente, por sua graça, mediante a redenção
que há em Cristo Jesus, a quem Deus propôs, no seu sangue, como propiciação,
mediante a fé, para manifestar a sua justiça, por ter Deus, na sua tolerância,
deixado impunes os pecados anteriormente cometidos; tendo em vista a
manifestação da sua justiça no tempo presente, para ele mesmo ser justo e o
justificador daquele que tem fé em Jesus" (Rm 3. 24-26).
Esta foi a doutrina central da Reforma. Lutero, de início, não podia compreender
como a "justiça de Deus se revela no evangelho" ("visto que a justiça de Deus se
revela no evangelho, de fé em fé, como está escrito: O justo viverá por fé". Rm
1.17). Para ele, a justiça de Deus só poderia condenar o homem, não salvá-lo. Tal
justiça não seria "boas novas" (evangelho). Só quando compreendeu que a justiça de
que Paulo fala nesse texto não é o atributo pelo qual Deus retribui a cada um
conforme os seus méritos (o que implicaria em condenação para o homem), mas o
modo como Ele justifica o homem em Cristo, é que a luz raiou em seu coração e a
verdade aflorou em sua mente.
Lutero, tornou-se, então, um homem livre, confiante e certo do perdão dos seus
pecados. Compreendeu o evangelho. O Evangelho é a manifestação dessa justiça de
Deus, que é recebida somente pela fé. Não é produzida pelas obras, pois o homem
não as tem. ("Visto que ninguém será justificado diante dele por obras da lei, em
razão de que pela lei vem o pleno conhecimento do pecado" (...) "concluímos, pois,
que o homem é justificado pela fé, independentemente das obras da lei" Rm
3.20,28).
Quão longe estava a Igreja dessa verdade simples do Evangelho quando ensinava que
o perdão podia ser comprado com dinheiro e a salvação adquirida com o mérito dos
santos. Tetzel, o vendedor das indulgências do Papa Leão X na Alemanha, dizia que
"ao som de cada moeda que cai neste cofre, uma alma se desprende do purgatório e
voa até o paraíso", refrão que seus ridicularizadores rimaram no que em português
equivaleria a "no que a moeda na caixa cai, uma alma do purgatório sai”
A ênfase na doutrina da justificação somente pela fé é tão oportuna e necessária na
igreja atual quanto nos dias de Lutero. São poucos os evangélicos hoje que ainda dão
ênfase ao aspecto objetivo da justificação unicamente pela fé. Experiências
subjetivas, avivamentos emocionais, respostas a apelos e outras práticas estão
tomando o lugar da pregação dos temas chaves da Reforma. Desta forma, a doutrina
da justificação, somente pela fé, está sendo negada hoje por muitos evangélicos que
buscam uma acomodação à cultura da modernidade.

7.5. Soli Deo Gloria – "A Deus somente, a glória"


Coroando estes temas que a Reforma nos legou está o da "glória somente a Deus". Dar
glória somente a Deus significa que ninguém, nem homens nem anjos, deve ocupar o
lugar que pertence a Ele, no mundo e em nossa vida, porque somente Ele é o Senhor.
É o que exige o 1º mandamento: "Eu sou o SENHOR, teu Deus, que te tirei da terra do
Egito, da casa da servidão. Não terás outros deuses diante de mim" (Ex 20.1-2).
A história do homem é uma história de quebra desse mandamento. Depois do pecado,
o homem tem constituído deuses para si em lugar do Deus verdadeiro. Geralmente,
esse deus é ele próprio. Quando decide o que deve ou não crer, o que pode ou não
ser verdadeiro, está dizendo que ele é o seu próprio deus. Sua razão (distorcida pelo
pecado) é o seu critério de verdade.

Quando a Igreja se coloca na posição de julgar o que deve ou não aceitar da Bíblia, e
se arvora em sua intérprete infalível, está assumindo para si o lugar de Deus. Quando
ela prega e exalta líderes religiosos, catedrais e templos suntuosos, imagens e
objetos de fé, a igreja passa a usurpar de Deus a prerrogativa de sua glória exclusiva
(A minha glória, pois, não a darei a outrem, nem a minha honra, às imagens de
escultura - Is 42.8b).
A Reforma impulsionou o movimento teocêntrico que teve enormes efeitos sobre a
igreja. A orientação da vida e do pensamento centrados em Deus começou no culto,
em que o enfoque era na ação de Deus em sua Palavra, em vez de estar em
deslumbrar e entreter as pessoas com pompa, aparato, misticismo, uso de sal grosso,
fogueira santa, uso de quipá, toque do chofar e outros modismos. Quando os crentes
estavam centrados em volta de Deus e sua obra salvífica em Cristo, seus cultos
ajustavam sua visão a outro grau: deixavam de servir como pessoas mundanas para
verem-se como pecadores redimidos, cuja vida só poderia ter um propósito: glorificar
a Deus e louvá-lo para sempre34.
Esta visão teocêntrica da Reforma encontra-se na Bíblia Sagrada. Depois de tratar das
doutrinas da salvação, Paulo declara: "Porque dele, e por meio dele, e para ele são
todas as coisas. A ele, pois, a glória eternamente. Amém!" (Rm 11.36) e, ao concluir
sua epístola aos Romanos, louva ao Senhor com estas palavras: “ao Deus único e
sábio seja dada glória, por meio de Jesus Cristo, pelos séculos dos séculos. Amém!
(16.27)”. A glória de Deus também foi o tema do cântico dos anjos ao redor do trono,
dos seres viventes e dos anciãos, e de todas as criaturas que João ouviu em suas
visões, os quais diziam: "Digno é o Cordeiro que foi morto de receber o poder, e
riqueza, e sabedoria, e força, e honra, e glória, e louvor" (Ap 5.12) e ‘"Àquele que
está sentado no trono e ao Cordeiro, seja o louvor, e a honra, e a glória, e o domínio
pelos séculos dos séculos" (Ap 5.13).
Infelizmente, na igreja evangélica atual, embora se fale muito sobre a necessidade
de renovação e avivamento, percebe-se que a glória de Deus foi, em grande parte,
esquecida por esta mesma igreja. Por essa razão, não é muito provável que os
avivamentos genuínos aconteçam de novo enquanto a igreja não recuperar as
verdades que exaltam e glorificam a Deus na salvação. Como esperar que Deus se
mova entre o povo, enquanto esse povo não disser de novo, com verdade: "Só a Deus
seja a glória"?
O mundo não pode dizer isso. Ao contrário, está preocupado com sua própria glória.
Mesmo aquelas pessoas que dizem ser cristãs não podem dizê-lo, se o principal que
estão tentando fazer nos seus ministérios é edificar seus próprios reinos e tornarem-
se importantes no cenário religioso. A Reforma nos legou esses grandes temas, que
são doutrinas preciosas da Bíblia. Cabe aos cristãos de hoje, dizerem o quanto são,
ou não, dignos herdeiros dessa herança e continuadores dessa obra. O que uma igreja
crê, ensina e prega, representa sua resposta e seu compromisso com a genuína fé
cristã.

8. PRINCIPAIS DOUTRINAS DO PENTECOSTALISMO


Após a reforma, o cristianismo viveu mais tarde uma outra crise. As pessoas passaram
a ter um cristianismo intelectual, e se esqueceram de que era necessário passar pela
experiência do novo nascimento para ser salvo. Surgiu, então, o movimento pietista
(Séc XVII) que restabeleceu o lado experimental e espiritual da reforma. Entre os
pietistas, os principais foram: João Wesley, Carlos Wesley e George Whitlfield.
A maioria das igrejas pentecostais da atualidade retêm muitas das doutrinas do
pietismo que acabaram culminando no grande avivamento da Rua Azusa no Séc XX. A
ênfase recai na experiência pessoal de uma genuína conversão que deve redundar
basicamente em três práticas fundamentais: 1). A realidade do Batismo com o
Espírito Santo; 2). A contemporaneidade dos Dons Espirituais; e 3). A busca da
Santificação como um processo contínuo. Analisaremos abaixo estas três importantes
doutrinas. Convém ressaltar que além das doutrinas citadas, o Pentecostalismo
mantém simultaneamente as doutrinas da reforma como regra de fé e prática.
__________________________
34BOICE, James Montgomery (org.). Reforma Hoje. São Paulo: Editora Cultura Cristã,
1999. p.124.

8.1. A Realidade do Batismo com o Espírito Santo


A experiência do batismo com o Espírito Santo tem-se constituído numa das pedras
basilares da doutrina pentecostal. O batismo com o Espírito Santo, como promessa, é
algo não apenas para ser desejado e buscado pelo crente, mas deverá ser
corretamente compreendido.
Registros históricos demonstram a experiência de alguns dos reformadores em
relação a essa doutrina. Sobre Martinho Lutero, diz Souer, na História da Igreja
Alemã: "O Dr. Martinho Lutero, foi um profeta, evangelista, falador em línguas e
intérprete, tudo em uma só pessoa, dotado de todos os dons do Espírito." Para
Calvino, o batismo no Espírito Santo era a recepção da graça visível (através das
línguas) e a introdução do cristão no mundo dos dons espirituais:
"... batismo no Espírito Santo, isto são as graças visíveis do Espírito Santo concedidas
pela imposição de mãos."Não é novidade indicar essas graças pela palavra 'batismo'
Como no dia de pentecostes, é dito que os apóstolos relembraram as palavras do
Senhor sobre o batismo de fogo e do Espírito. E Pedro menciona a mesma coisa
quando viu essas graças derramadas sobre Cornélio, a sua casa e seus parentes ( Atos
11 : 16 )( Institutas IV, XV. 18)
Os Propósitos do Batismo com o Espírito Santo podem ser resumidos sob três grandes
aspectos principais:
1). Viver abundantemente para Deus (Jo 7.38,39);
2). Identificar a vida do crente com Cristo (Lc 4.18,19); e
3). Poder para testemunhar (At 1.8).
A evidência inicial do batismo com o Espírito Santo na doutrina pentecostal é o falar
em línguas estranhas. Estas línguas podem ser não-identificáveis (glossolalia) ou
identificáveis (xenolalia). A principal fonte é o livro de Atos dos Apóstolos onde
temos cinco exemplos registrados:
1). O Dia de Pentecostes (Atos 2.1-4);
2). A Casa de Cornélio (Atos 10.44-48);
3). Paulo em Éfeso (Atos 19.1-7);
4). Reavivamento em Samaria (Atos 8); e
5). Saulo de Tarso (Atos 9).
Em princípio podemos falar línguas estranhas toda vez que o Espírito Santo nos
permitir. Entretanto existem algumas orientações bíblicas que devem ser observadas:
1). Deve-se evitar ensinar ou pregar falando em línguas estranhas (1 Co 14.6);
2). O que fala em variedades de línguas deve orar pedindo a interpretação (1 Co
14.13);
3). Não se deve falar em línguas todos ao mesmo tempo (1 Co 14.23); e
4). Durante o culto deve-se falar em línguas no máximo dois ou três (1 Co 14.27).
É de relevada importância entender a diferença das línguas estranhas como Batismo
no Espírito Santa e a Variedade de Línguas como Dom Espiritual. A diferença básica
entre o fenômeno das línguas em Atos e em 1ª Coríntios está no propósito. Em Atos,
as línguas visam a edificação pessoal, deixando evidente que os discípulos realmente
haviam recebido o dom prometido do Espírito santo, para revesti-los “do poder do
alto” (Lc 24.49; At 1.4,5,8; 2.4). Não precisavam ser interpretadas. Em 1ª Coríntios,
o propósito é a bênção para outras pessoas na congregação, por isso é necessário a
interpretação35.
A experiência do batismo com o Espírito Santo, apesar de ajudar-nos a viver
abundantemente para Deus, de identificar-nos com Cristo, e de comunicar-nos poder
para testemunhar do Evangelho, não se constitui numa espécie de apólice de seguro
contra o pecado. Mais que qualquer outro, o crente batizado com o Espírito Santo
tem o sagrado dever de permanecer humilde na presença do Senhor, estudando a sua
Bíblia, orando e primando por viver uma vida santa diante de Deus e dos homens.

_________________
35HORTON, Stanley M. Teologia Sistemática. Uma Perspectiva Pentecostal. Rio:
CPAD, 1997. p. 476.

8.2. Contemporaneidade dos Dons Espirituais


Algumas Igrejas originárias da Reforma Protestante se autodenominam de “Igrejas
Históricas” ou recebem a alcunha de “Igrejas Tradicionais”. Parte dessas Igrejas
desenvolveram a teoria da “Cessação dos Dons Espirituais”. Em contrapartida as
“Igrejas Pentecostais” estabeleceram a doutrina da “Contemporaneidade dos Dons
Espirituais”.
Essa doutrina foi desenvolvida sobre um dos os princípios da reforma de Sola
Scriptura, ou seja, se está escrito na Palavra de Deus, então, está em vigor e deve
ser colocada em prática. “O ensino bíblico sem a prática é decepcionante; a prática
sem o ensino sólido é perigosa. Por outro lado, o estudo deve levar à prática, e a
prática pode iluminar o estudo”36.
Uma das maneiras do Espírito Santo manifestar-se é através de uma variedade de
dons espirituais concedidos aos crentes (1Co 12.7-11). Essas manifestações do
Espírito visam à edificação e à santificação da igreja. Paulo disse à Igreja em Corinto:
"Acerca dos dons espirituais, não quero irmãos, que sejais ignorantes" (1 Co 21.1). Em
1Co 12.8-10, Paulo apresenta uma diversidade de dons que o Espírito Santo concede
aos crentes:
a) Dons de Revelação: (1) Dom da Palavra da Sabedoria (1Co 12.8); (2) Dom da
Palavra do Conhecimento (1Co 12.8); (3) Dom de Discernimento de Espíritos (1Co
12.10).
b) Dons de Poder: (1) Dom da Fé (1Co 12.9); (2) Dons de Curas (1Co 12.9); (3) Dom de
Operação de Milagres (1Co 12.10).
c) Dons de Inspiração: (1) Dom de Profecia (1Co 12.10); (2) Dom de Variedades de
Línguas (1Co 12.10); (3) Dom de Interpretação de Línguas (1Co 12.10).
As manifestações do Espírito dão-se de acordo com a vontade do próprio Espírito (1Co
12.11), ao surgir à necessidade, e, também, conforme o anelo do crente na busca dos
dons (1Co 12.31; 14.1). Certos dons podem operar num crente de modo regular, e um
crente pode receber mais de um dom para atendimento de necessidades específicas.
O crente deve desejar “dons”, e não apenas um dom (1Co 12.31; 14.1).
É antibíblico pensar que quem tem um dom de operação exteriorizada (mais visível)
é mais espiritual do que quem tem dons de operação mais interiorizada (menos
visível). Também, quando uma pessoa possui um dom espiritual, isso não significa
que Deus aprova tudo quanto ela faz ou ensina. Não se deve confundir dons do
Espírito, com o fruto do Espírito, o qual se relaciona, mais diretamente, com o
caráter e a santificação do crente (Gl 5.22,23).

8.3. A busca da Santificação como um processo contínuo


No princípio, os Pentecostais debateram acerca do modo em que se dava a
santificação: Instantânea ou Progressiva?37 Após exaustivos estudos o resultado foi
que a santificação é tanto instantânea quanto progressiva. No entanto ela se
apresenta sob três aspectos distintos:
1. Santificação posicional - Nesse sentido ela é imediata e se dá na conversão.
("Bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que, segundo a sua grande
misericórdia, nos gerou de novo para uma viva esperança, pela ressurreição de Jesus
Cristo dentre os mortos, para uma herança incorruptível, incontaminável e que se
não pode murchar, guardada nos céus para vós. 1Pe 1.3-4).
2. Santificação progressiva - Essa acontece no decorrer da vida cristã. Quanto mais o
crente se consagrar, mais santificado ele se torna. A santificação é aperfeiçoada
através da oração, do jejum, leitura da palavra e dedicação à obra de Deus. (Ler Ap
22.11 - 1Co 7.1 - Rm 6.12,13, 22).
3. Santificação completa - Acontecerá por ocasião da redenção do corpo, na
ressurreição, ou no arrebatamento quando transformados. ("Porque sabemos que
toda a criação geme e está juntamente com dores de parto até agora. E não só ela,
mas nós mesmos, que temos as primícias do Espírito, também gememos em nós
mesmos, esperando a adoção, a saber, a redenção do nosso corpo. Rm 8.22,23).
_________________
36HORTON, Stanley M. Teologia Sistemática. Uma Perspectiva Pentecostal. Rio:
CPAD, 1997. p. 466.
37Ibid. p. 20

9. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os teólogos protestantes sempre enfatizaram que a fé envolve certo relacionamento
pessoal com Cristo, como parte da conversão (constituída por arrependimento e fé),
tudo como operação do Espírito Santo. No entanto, observamos na atualidade, uma
avalanche de “novos convertidos” invadindo certas igrejas evangélicas sem nenhuma
prova de conversão. Tais “novos convertidos” não possuem um relacionamento
pessoal com Cristo, não sabem o que significa arrependimento. É um povo que age
como se os padrões de santidade não fossem necessários.
Na realidade, tais pessoas, buscam apenas a “bênção” e não querem se comprometer
com o “Senhor da bênção”. Gastam seu tempo em formalidades e práticas religiosas
ensinadas por seus dirigentes. A busca dos tais é pela prosperidade e cura de
enfermidades. A fé de tais pessoas é supérflua pois a igreja que freqüentam
banalizou a fé, e seus líderes não se importam com isso, desde que os tais fiéis
deixem polpudas ofertas e dízimos em suas respectivas igrejas.
Infelizmente, a fé tem sido reduzida a crença em um conjunto de credos (tal como
no catolicismo romano), atitude essa que prevalece poderosamente no mundo
evangélico de muitas igrejas dos nossos dias. Os credos, muitas vezes, são estranhos
às doutrinas cristãs, são palavras de ordem, como: quebra de maldições, determinar
a bênção, teologia da prosperidade, cura interior, regressão até ao nascimento,
tomar banho de luz, portar objetos consagrados e outras atitudes e procedimentos
extra-bíblicos.
Diante destes fatos, entendemos que existe uma necessidade urgentíssima de
resgatarmos para o Brasil a fé genuinamente bíblica. Quando esta fé for resgatada,
então, todas as virtudes e valores cristãos deixarão de ser apenas teoria para
tornarem-se realidade prática na vida de todos os cristãos. Doutrinas como a
Salvação, Pecado, Batismo nas águas, Batismo no Espírito Santo, Dons Espirituais,
Santificação, Juízo Eterno, Vinda de Cristo e outros temas de relevada importância
ocuparão os espaços de nossos púlpitos, levando o povo de volta para a Palavra.
É verdade, que em meio a essa banalização toda, existem os remanescentes fiéis. Os
fiéis não se dobraram diante de doutrinas estranhas. Não abandonaram a prática da
fé verdadeira. Não se intimidaram com o crescimento assustador de igrejas sem
compromisso com a Palavra. Esses fiéis continuam bramindo a Espada do Espírito.
Continuam pregando contra o pecado e a corrupção do gênero humano. Continuam
anunciando a salvação por meio de arrependimento e fé em Cristo Jesus. Continuam
ensinando e praticando a santidade cristã. E são com estes fiéis que Deus conta nesta
última hora, para renovar e restaurar a sua igreja que se encontra bombardeada por
um sem número de doutrinas estranhas.
O protestantismo, não é meramente o protesto contra a corrupção eclesiástica e o
falso ensinamento católico do século XVI; é muito mais do que isso. Ser protestante:
é viver debaixo de um avivamento integral, é resgatar os valores indispensáveis da fé
bíblica através da Palavra, é proclamar incondicionalmente a mensagem da graça de
Deus em Cristo Jesus.
Os líderes, os teólogos e todos os cristãos comprometidos com a verdade precisam
unir-se com a Igreja e dar um basta à efervescência da graça barata, o mercantilismo
gospel, a banalização da fé. É necessário combater com as Escrituras, as loucuras e
os atos proféticos feitos em nome de Deus. Precisamos refutar biblicamente, o
aparecimento das mais diversas unções em nosso meio evangélico; isso sem falar da
hierarquização do reino, onde apóstolos, bispos e bispas, “levitas”, Pai apóstolos,
príncipes e reis, têm oprimido substancialmente o povo do Senhor.
A Igreja Evangélica Brasileira precisa voltar a viver e pregar o evangelho integral.
Necessita ser uma igreja santa, ética, justa e profética, mas uma igreja que não se
corrompa diante das loucuras desta era. Não podemos jamais deixar apagar a chama
Pentecostal e precisamos voltar aos princípios e doutrinas da Reforma Protestante:
Sola Scriptura, Solus Christus, Sola Gratia, Sola Fide e Soli Deo Gloria, ou seja,
Somente a Escritura, Somente Cristo, Somente a Graça, Somente a fé e a Deus
Somente, a Glória.

10. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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