As Quatro Questoes de Tinbergen-TEXTO

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As quatro questões de Tinbergen

KREBS, J.R. & DAVIES, N.B.. Introdução a Ecologia comportamental. 3 ed. São Paulo:
Atheneu, 2000. 420 p.

Niko Tinbergen, um cios fundadores da Etologia, enfatizou que


havia muitas maneiras diferentes de responder à questão "Por quê?" em Biologia. Estas
passaram a ser reconhecidas como as quatro pergunta!> de Tinbergen (Tinbergen, 1963). Por
exemplo, se perguntarmos porque os estorninhos cantam na primavera, nós poderíamos
responder da seguinte maneira:
1. Em termos de valor de sobrevivência ou função. Os estorninhos cantam para atrair parceiros
para o acasalamento.
2. Em termos de causalidade. Porque o aumento no comprimento
do dia desencadeia mudanças nos níveis hormonais, ou pela maneira em que o ar flui através da
siringe e provoca. vibrações na membrana. Estas são respostas sobre os fatores externos e
internos que levam os estorninhos a cantarem.
3. Em termos de desenvolvimento. Os estorninhos cantam porque eles aprenderam os cantos de
seus pais e vizinhos.
4. Em termos de história evolutiva. Esta resposta seria sobre como o canto evoluiu nos
estorninhos a partir de seus ancestrais. Os pássaros vivos mais primitivos emitem sons muito
simples, portanto é razoável supor que o canto complexo dos estorninhos e de outros pássaros
tenha evoluído a partir de chamados ancestrais mais simples.
É importante distinguir estes vários tipos de respostas, caso contrário o tempo será perdido em
debates estéreis. Se alguém disser que as andorinhas migram para o. sul no outono porque estão
procurando por suprimentos alimentares mais ricos, enquanto outra pessoa disser que o fazem
por causa no decréscimo no comprimento do dia, não teria sentido discutir sobre quem estaria
correto. Ambas as respostas podem estar certas, a primeira em termos de valor de sobrevivência
ou função, e a segunda em termos de causalidade. Os fatores que influenciam o valor de
sobrevivência são às vezes denominados "finais", enquanto os fatores causais são chamados de
"imediatos". Estas são as duas respostas mais freqüentemente confundidas e, por isso, para
tomar a distinção mais clara, iremos discutir um exemplo em detalhes.

COMPORTAMENTO REPRODUTIVO EM LEÕES

No Parque Nacional do Serengeti, Tanzânia, os leões (Panthera leo) vivem em bandos com 3
a 12 fêmeas adultas, 1 a 6 machos adultos e muitos jovens. O bando defende um território
onde caçam gazelas e zebras, especialmente. Em um bando, todas as fêmeas são aparentadas:
irmãs, mães e filhas, primas, etc. Todas nasceram e foram criadas no bando e todas
permanecem nele para reproduzir. As fêmeas se reproduzem entre 4 e 18 anos de idade,
desfrutando, portanto, de uma longa vida reprodutiva.
Para os machos, a vida é muito diferente. Quando atingem três anos de idade, os machos
jovens aparentados (às vezes irmãos) deixam o seu bando de origem. Após um par de anos
como nômades, eles tentam assumir o controle de outro bando, de machos velhos ou fracos.
Depois de uma tentativa bem sucedida de controle, permanecem no bando por dois a três anos,
quando, por sua vez, são expulsos por novos machos. Portanto, a vida reprodutiva de um
macho é curta.
O bando de leões consiste de um grupo permanente de fêmeas estreitamente aparentadas e
um grupo menor de machos interrelacionados, presente por um curto período de tempo.
Iremos considerar três observações interessantes sobre o comportamento reprodutivo de um
bando (Bertram, 1975).
1. Os leões podem procriar durante o ano todo, mas embora diferentes bandos possam procriar
em diferentes momentos, num mesmo bando todas as fêmeas tendem a entrar no cio ao
mesmo tempo. O mecanismo, ou explicação causal, pode ser a influência dos feromônios de
um indivíduo sobre o ciclo de estro de outras fêmeas no bando. Um fenômeno similar ocorre
nas escolas, onde
moças vivendo num mesmo dormitório podem também apresentar sincronização dos seus
ciclos menstruais, talvez devido ao efeito de feromônios (McClintock, 1971).
A função da sincronização do estro entre os leões é o nascimento ao mesmo tempo das
diferentes ninhadas do bando. Os filhotes nascidos sincronicamente sobrevivem melhor. Isso
acontece porque ocorre amamentação comunal e, com todas as
fêmeas apresentando lactação conjunta, um filhote pode mamar
em outra fêmea se sua mãe estiver caçando (Fig. 1.1). Além disso, com os nascimentos
sincrônicos, há maiores chances de que os jovens machos tenham companhia quando atingirem
a idade em que devem abandonar o bando. Com um companheiro o macho tem maiores
chances de ser bem sucedido na tentativa de assumir controle de outro bando (Bygott et ai.,
1979).
2. Uma leoa entra no cio a cada mês, ou menos, quando não está prenha. Ela permanece no cio
por 2 a 4 dias, e neste período ela copula a cada 15 minutos, durante todo o dia e noite. Apesar
desta taxa fenomenal de cópula, a taxa de natalidade é baixa. E mesmo entre os filhotes que
nascem, somente 20% irá sobreviver até a idade adulta. Pode-se calcular que há 3000 cópulas
para cada filhote que alcança o estágio adulto.
A explicação causal para o fato dos cruzamentos serem tão mal-sucedidos entre os leões não
é a falha na ejaculação dos machos, mas sim a elevada probabilidade de falhas na ovulação
das fêmeas ou a alta taxa de abortos. Mas, por que as fêmeas são modeladas desta forma
aparentemente tão ineficiente?
Uma hipótese é que pode ser vantajoso para as fêmeas serem receptivas, mesmo nos
períodos em que a concepção é improvável, e isto leva à depreciação de cada cópula. Para o
macho há somente uma probabilidade de 1/3000 de que uma dada cópula produza um filhote
sobrevivente, de modo que não é vantajoso lutar com os outros machos do bando por uma
única oportunidade de acasalamento. Dado que os machos também podem matar os filhotes
que não são seus (ver abaixo), pode haver uma vantagem para uma fêmea que copule com
todos os machos do bando, incrementando o grau de incerteza quanto à paternidade.
Idealmente, uma fêmea deve dar a cada macho chance suficiente de ser o pai dos filhotes dela,
de tal modo que não compense para ele matá-los.
3. Quando um novo macho, ou grupo de machos, assume o controle de um bando, algumas
vezes matam os filhotes já existentes (Fig. 1.1). A explicação causal para esse comportamento
pode ser o odor não familiar dos filhotes, que induz os machos a eliminá-los. Um efeito
similar, conhecido como Efeito Bruce, ocorre nos roedores onde a presença de machos
estranhos previne a implantação de ovos fertilizados ou induz ao aborto.
A vantagem do infanticídio praticado pelos machos ao assumirem o controle de um bando
está no fato de que, matando
os filhotes de um macho precedente, reconduzem as fêmeas à condição reprodutiva mais
rapidamente, e assim toma mais próximo o dia em que ele próprio poderá ser pai. Se os
filhotes fossem deixados intactos, a fêmea não entraria no cio outra vez por 25 meses.
Matando os filhotes, a fêmea estará pronta para
acasalar após somente 9 meses. Lembre que a vida reprodutiva dos machos no bando é curta,
portanto qualquer indivíduo que cometa infanticídio, quando assume o comando de um bando,
será pai mais vezes, de modo que a tendência para cometer infanticídio irá se espalhar por
seleção natural.
A conquista do controle de um bando por uma nova coalizão de machos adultos também
contribui para a sincronia reprodutiva das fêmeas, porque toda a prole ainda dependente será
morta ou expulsa durante a tomada de controle, e todas as fêmeas tenderão a entrar no cio
novamente ao mesmo tempo (Packer & Pusey, 1983a). De maneira muito interessante, a
exacerbação da atividade sexual das fêmeas é mais acentuada durante os primeiros poucos
meses após a tomada de controle do bando pelos novos machos. As fêmeas têm um papel ativo
na solicitação de cópulas por parte de vários machos, e isto parece incitar a competição entre
diferentes coalizões de machos pelo controle do bando, fazendo com que, finalmente coalizões
maiores se tomem residentes. Isto é adaptativamente
vantajoso para a fêmea, pois ela necessita de proteção durante mais de dois anos, contra a ação
molestadora de machos em relação aos seus filhotes, para que possa criá-los satisfatoriamente
(3,5 meses de gestação, mais 1,5 a 2 anos de desenvolvimento dos jovens), e somente coalizões
grandes de machos apresentam chances de permanecer no bando por mais de 2 anos. A elevada
atividade sexual das fêmeas pode, portanto, incitar a competição entre machos, fazendo com
que os melhores protetores conquistem o controle do bando (Packer & Pusey, 1983b).

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