Resenha Da Obra:: Cegueira Moral: Desumanização e Insensibilidade Uma Reflexão Na Sociedade de Consumo
Resenha Da Obra:: Cegueira Moral: Desumanização e Insensibilidade Uma Reflexão Na Sociedade de Consumo
Resenha Da Obra:: Cegueira Moral: Desumanização e Insensibilidade Uma Reflexão Na Sociedade de Consumo
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Nossos tempos, sem dúvida alguma, serão desejo de conhecer a privacidade, o segredo das
contados através da história, como tempos de pessoas, a intimidade de suas vidas, numa total
solidão, de falta de privacidade, de novos padrões falta de sentido para tal comportamento.
de consumo, onde nossa capacidade de conviver O livro traz uma reflexão sobre uma (...)”
com o outro se torna cada dia mais intolerante. possibilidade de redes cobertas do sentido de
Segundo os autores: pertencimento como alternativa viável a frag-
mentação, a atomização e a resultante perda
Tudo é permeado pela ambivalência. Não há
de sensibilidade. ”(...) (DONSKIS,2014.p 19).
mais nenhuma situação social inequívoca, da
mesma forma que não há mais atores infle- Da necessidade de revermos valores e nossa
xíveis no palco da história. Tentar interpretar condição humana.
esse mundo em termos de categorias como O texto é construído em cinco diálogos en-
bem e mal, pela ótica política e social do preto tre os autores Donskis e Baumann. Inicia com a
no branco e das separações quase manique- Introdução onde dialogam sobre a teoria da priva-
ístas, é hoje tanto impossível quanto grotesco cidade e da impenetrabilidade humana. Donskis
(...)(DONSKIS,2014.p 11) afirma que a sociologia de Baumann busca re-
construir todas as camadas da realidade e tornar
A vida social que se faz no cotidiano, tem
a forma de transmissão de ideias universal e
através das mídias impressas, mas fundamen-
acessível a todos os leitores e não somente ao
talmente nas redes sociais, proporcionado aos
espaço acadêmico. Donskis aponta que Baumann
indivíduos espaços em que os sujeitos são desti-
(2014, p 20) (...)“observa o observador, propõe
tuídos de rostos de sua individualidade, atuando
ao proponente e fala com o falante”(...), pois se-
como atores, pessoas anônimas globais.
gundo ele as personalidades que se aproximam
As relações sociais hoje se constroem nas
de Baumann não são imaginárias, mas pessoas
redes sociais, onde não só se estabelecem rela-
que foram deslocadas pela globalização.
ções inter-humanas, mas alteram-se também as
A introdução traz a indicação de que o autor
relações como consumidores. Nas redes sociais
não é um teórico que relata os fatos de maneira
não temos fidelidade permanente a aquilo que ad-
linear, mas de forma pontilista, envolvendo as
quirimos para satisfazer algumas necessidades.
pessoas comuns e não os grandes pensadores
O sociólogo polonês Zygmunt Baumann
ou sujeitos representados como heróis. A simpatia
através de seus escritos tem indicado a desu-
de Baumann está, de forma manifesta, do lado
manização de nossos tempos. Na obra Cegueira
dos perdedores da modernidade, não de seus
Moral, dialoga com Leonidas Dosnkis, sobre a in-
heróis. (DONSKIS, 2014, p.10)
sensibilidade diante da dor e sofrimento do outro,
Donskis, afirma que vivemos uma época
da naturalização da violência, onde a tecnologia
em que através das redes sociais é possível um
e o avanço das redes sociais têm levado a um
*
Administrador formado pela Universidade Estadual de Ponta Grossa-Pr, Mestre em Administração pela Universidade Federal do Paraná-
-PR. E-mail: [email protected]
**
Assistente Social formada pela Universidade Estadual de Ponta Grossa, Doutora em Serviço Social pela PUC São Paulo.Professora do
Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais Aplicadas da Universidade Estadual de Ponta Grossa e do curso de graduação em
Serviço Social - UEPG. Ponta Grossa, Brasil. E-mail: [email protected]
drama social tornar-se conhecido e partilhado da conduta humana, buscando na origem grega
por muitos que não tem nada em comum com do termo Adiaphoron, algo desimportante, ou
eles. Na política as redes sociais são usadas seja, coisas que não merecem atenção. Afirma
para despertar paixões e ódios. Esse mundo que tal expressão nos traz uma saída temporária
deixou de controlar a si mesmo, embora busque para nossa zona de sensibilidade.
enfaticamente controlar os indivíduos, não conse- Baumann aponta que a adiaforização para
gue responder suas dúvidas nem diminuir suas ele, significa construir estratégias intencionais
tensões, mesmo sendo criada por ele mesmo. ou não para declarar determinadas ações ou
O autor afirma que vivemos uma realidade inações moralmente neutras, impedindo que as
de possibilidades, não de dilemas. “É obrigatório escolhas entre elas sejam submetidas a um jul-
espionar e vazar, embora não esteja claro por gamento ético. Na linguagem , segundo o autor
que motivo e com que finalidade. Isso é algo que ,há um reforço da ideia de que “os fins justificam
deve ser feito apenas porque é tecnologicamente os meios”, ou “embora esse ato possa ter sido
viável. Há aí um vácuo moral criado por uma ruim, ele era necessário para defender ou pro-
tecnologia que sobrepujou a política.”(DONSKIS, mover o bem maior.” Baumann difere de Donskis
2014, p.13) quando afirma que para ele tal termo não significa
Assim, a obra busca numa variação de “desimportante”, mas “irrelevante ou indiferente.”
Milan Kundera, indicar que: (BAUMNN, 2014.p.52).
No tópico dois, intitulado: “A crise da política
(..)a globalização é a última esperança fra-
e a busca de uma linguagem da sensibilidade,”
cassada de que, em algum lugar, ainda exista
uma terra para a qual se possa fugir e onde surge um interessante debate entre os dois au-
encontrar a felicidade. Ou a última esperan- tores, de como os intelectuais têm futuro e com-
ça fracassada de que, em algum lugar, ainda partilham as ideias de outros autores que afirmam
exista uma terra diferente da sua, opondo-se que os intelectuais continuam sendo bons na
ao senso de insignificância, à perda de crité- formação de comunidades críticas. Vivemos,
rios e, em última instância, à cegueira moral segundo os autores, uma época de obsessão
e à perda da sensibilidade. (DONSKIS, 2014, pelo poder. Baumann traz nesse diálogo o papel
p.20) da tecnologia, e como temos atribuído a ela pro-
No tópico um intitulado: “Do diabo a pes- blemas sociais, mas nesse momento nos lembra,
soas assustadoramente normais e sensatas”, os (..) machados podem ser usados para cortar
autores trazem um panorâmico histórico sobre lenha ou decepar cabeças. A escolha não
como surgiu o conceito de “mal” e a figura do é dos machados, mas de quem os segura.
“diabo”. Destaca a organização da burocracia Qualquer que seja a escolha, o machado não
na estrutura de poder e como a política perdeu vai se importar’, ou seja, “ a tecnologia em si
importância diante da tecnologia. não vai “ promover o avanço da democracia
A reflexão sobre tudo que é privado torna-se e dos direitos humanos” por você (e em seu
lugar).(BAUMANN,2014 p.73)
potencialmente público, disponível até o fim dos
tempos, pois segundo os autores a internet não No diálogo três intitulado: “Entre o medo e a
pode ser forçada a esquecer de nada que tenha indiferença: a perda da sensibilidade” os autores
sido registrado em algum de seus servidores. O trazem um novo componente aos nossos tempos,
resultado disso é uma sociedade confessional o medo. Há uma critica a exposição pública do
com situações vividas no cotidiano e divulgadas reality show e outras formas de autoexposição
em praça pública. E os que relutam em ingres- em troca de atenção e fama. Os autores afirmam
sar nesse mundo são ensinados que a versão que por trás dessa exposição está o medo de
atualizada do Cogito de Descartes é “Sou visto, desmoronar, o medo da desimportância, de es-
logo sou” e quanto mais pessoas me veem mais tar distante do mundo da TV e da mídia, o que
eu sou (BAUMANN 2014, p.37). equivale e se tornar um ninguém.
Dosnkis, afirma nesse tópico, que dificilmen- Segundo Baumann a cultura do medo gera
te é possível compreender o fenômeno da perda uma política do medo. Advém dai a necessidade
de sensibilidade sem o conceito de adiaforização constante de consumir segurança, nos aparatos
cada vez mais sofisticados de proteção contra mesmo tempo, as contradições presentes nesse
outros seres humanos. O autor afirma que o trata- avanço, como exposição pública, sentimento de
mento dado aos estrangeiros hoje, é tratado como pertencimento pelo acolhimento nas redes sociais
simples problema de segurança, mas há uma (facebook, twitter, whatsapp), contradições entre a
tendência a estereotipar todos eles, ou mesmo importância da tecnologia e suas consequências
tratá-los com sujeitos estranhos ao nosso dia a à humanidade.
dia. Esse item propicia um diálogo intenso entre A temática da universidade instiga o leitor
os dois autores, como um ir e vir harmonioso e a pensar sobre o futuro da educação e impor-
complementar de uma fala e outra convidando tância da reflexão sobre o papel dos docentes
a uma reflexão profunda sobre nossos tempos. nesse universo global, qual será o futuro de tal
No diálogo apresentado no item quatro instituição? Qual o papel do Estado diante da
“Universidade do consumo: o novo senso de necessidade de investimentos em tal espaço
insignificância e a perda de critérios”, os autores de formação?
indicam a dúvida presente (...) “ a universidade A obra requer leitura atenta, cuidadosa e
vai sobreviver no século XXI como instituição com muita motivação para abertura as inquie-
clássica e identificável de educação e cultura”?. tações dos autores, abertura ao outro. Enfim
(DONSKIS,2014 p.163). Para o autor tal questão nos convida a refletir sobre temas atuais, signi-
não parece mais ingênua nem incorretamente ficados, e conceitos que fariam a humanidade
formulada. se humanizar e se colocar diante dos desafios
A concepção de que somente as melhores atuais com mais sensibilidade e generosidade,
instituições resistam e sobrevivam, passa ainda permitindo ao leitor rever conceitos e abrir-se a
pela ideia geral que os docentes consigam eles novas possibilidades.
mesmos recursos para estudos e pesquisa, inde-
pendente da ajuda do Estado ou da universidade. Referência Bibliográfica
Tal postura segundo o autor endossa uma lógica
de realizações e resultados rápidos. BAUMANN,Zygmunt e DONSKIS,Leonidas. Cegueira
Moral: a perda da sensibilidade na modernidade
Em essência, uma universidade, que em teo- liquida. Tradução de Carlos Alberto Medeiros. 1ª-ed.-
ria deve seguir uma lógica (fielmente seguida Rio de Janeiro: Zahar, 2014.
durante séculos) de pensamento deliberado,
criatividade paciente e existência equilibrada,
é agora forçada a se tornar uma organização
capaz de reagir depressa às flutuações do
mercado, assim como às mudanças da opi-
nião pública e do ambiente político. Esse é o
preço que pagamos pela educação superior
das massas numa democracia e numa socie-
dade de massas. (DONSKIS,2014 p.165).