Nocoes Basicas Oncologia

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Noções Básicas de

Oncologia para
Jovens Enfermeiros
Título
Noções Básicas de Oncologia
para Jovens Enfermeiros

Autores
Beatriz Domingues, Filipa Cardoso,
Joana Araújo, Inês Frade,
Mafalda Ferreira, Sara Costa,
Sara Torcato Parreira e Maria José Dias

Revisto por
António Mendes, Bruno Magalhães,
Cristina Lacerda, Elisabete Valério,
Emília Rito, Joana Silva, Jorge Freitas,
Paula Amorim, Paula Banha, Sandra Ponte,
Susana Pedro, Susana Silva

Design e Produção Gráfica


Medesign ­– Edições e Design de
Comunicação, Lda.

Imagem de capa
Freepik.com

setembro 2020
ÍNDICE
PREFÁCIO 04
NOTA INTRODUTÓRIA 05
ETIOLOGIA E EPIDEMIOLOGIA DO CANCRO 06
Carcinogénese 06
Metastização 10
Estadiamento 10
Epidemiologia 11
Referências bibliográficas 12

CIRURGIA ONCOLÓGICA 13
Cirurgia no diagnóstico e estadiamento
da doença 14
Cirurgia curativa 15
Cirurgia paliativa 16
Cirurgia para doença metastática 18
Cirurgia profilática 20
Referências bibliográficas 21

RADIOTERAPIA 22
Radioterapia externa 23
Radioterapia interna 26
Radioterapia intraoperatória 27
Irradiação de corpo inteiro 28
Potenciais efeitos secundários 28
Referências bibliográficas 33

QUIMIOTERAPIA 34
Tipos de quimioterapia 34
Mecanismo de ação 35
Principais classes de fármacos citotóxicos 35
Administração de quimioterapia 37
Efeitos secundários 39
Referências bibliográficas 43
TERAPÊUTICAS-ALVO 45
Possíveis efeitos adversos 47
Implicações para a prática de enfermagem 48
Imunoterapia 48
Inibidores de checkpoint 49
Células T CAR 51
Anticorpos monoclonais 52
Imunoterapia viral oncolítica 53
Implicações para a prática de enfermagem 54
Referências bibliográficas 55

HORMONOTERAPIA 56
Tipos de terapia endócrina 57
Resistência à terapia hormonal 60
Síntese 61
Cancro de mama 61
Cancro da próstata 61
Efeitos secundários da hormonoterapia 62
Conselhos/orientações 62
Referências bibliográficas 62

BIFOSFONATOS 63
Orientações 63
Referências bibliográficas 64
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 04

PREFÁCIO
Os enfermeiros oncologistas necessitam de saberes técnicos
e relacionais cada vez mais desafiantes e exigentes e em per-
manente atualização. Ao iniciar funções nesta área é funda-
mental procurar uma prática especializada, com resultados
de segurança e de qualidade, conhecimento fidedigno que
outorgue competências e melhoria do desempenho profis-
sional para cuidar das pessoas com doença oncológica.
Esta publicação é o resultado do empenho do Grupo de Jo-
vens Enfermeiros Oncologistas na sistematização de conhe-
cimento essencial aos pares que ingressam na área da on-
cologia, dando-lhes os alicerces necessários e fomentando
um investimento contínuo e sustentado na formação, contri-
buindo para a melhoria dos cuidados prestados aos doentes
oncológicos e família e para o reconhecimento da Enferma-
gem Oncológica.

Emília Rito
PRESIDENTE AEOP
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 05

NOTA INTRODUTÓRIA
Este livro “Noções Básicas de Oncologia para Jovens En-
fermeiros” tem por objetivo sintetizar informação relevante
e fundamental para apoiar todos os jovens enfermeiros que
iniciam a sua prática clínica em Oncologia.
A oncologia é uma área do cuidar especializada, complexa e
exigente, requerendo uma abordagem global e personalizada.
Trabalhar com pessoas portadoras de cancro e seus familia-
res/amigos é um desafio constante que acompanha toda a
trajetória da doença desde a prevenção, diagnóstico, trata-
mento e fim de vida.
Nenhum profissional de saúde possui todas as habilidades
necessárias para tratar todos os tipos de cancro, uma vez
que a complexidade das doenças, os respetivos tratamentos
e outras necessidades do doente inerentes à doença, são de-
masiado vastas e exigentes.
Este livro surge após conhecermos a realidade e os desafios
que os jovens enfermeiros enfrentam em termos de forma-
ção para dar resposta aos desafios que trabalhar em oncolo-
gia impõe.
Em 2016, a partir do projeto da European Oncology Nursing
Society (EONS) forma-se o grupo “Young Cancer Nurses” e
em Portugal é criado o Grupo dos Jovens Enfermeiros On-
cologistas (JEO), um grupo de trabalho da Associação de En-
fermagem Oncológica Portuguesa, que deram corpo a este
documento.
Esperamos que seja útil ao início do percurso clínico dos en-
fermeiros oncologistas.

Maria José Dias


COORDENADORA DO GRUPO DOS JOVENS ENFERMEIROS ONCOLOGISTAS, AEOP
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 06

ETIOLOGIA E EPIDEMIOLOGIA
DO CANCRO
Beatriz Lopes Domingues
A palavra cancro está habitualmente relacionada com o ter-
mo neoplasia maligna. Neoplasia refere-se à formação de
novas células e de novo tecido, podendo este ser benigno ou
maligno (Sobrinho Simões, 2014).
As neoplasias benignas são caracterizadas por células madu-
ras semelhantes ao tecido de origem que se mantêm frequen-
temente agregadas, sem capacidade metastática (Stephens
& Aigner, 2009) e com crescimento expansivo (Sobrinho Si-
mões, 2014). As neoplasias malignas são caracterizadas por
células que perdem a estrutura diferenciada, que se multipli-
cam sem controlo (Stephens & Aigner, 2009), apresentando
crescimento infiltrativo (Sobrinho Simões, 2014).
A proliferação celular é controlada através dos genes presen-
tes no ADN das células. Uma célula danificada pode dividir-se
e crescer descontroladamente, surgindo o tumor (Stephens
& Aigner, 2009). Todas as causas de tumor conhecidas da-
nificam direta ou indiretamente os genes responsáveis pelos
processos normais de supressão tumoral. O aumento da es-
perança média de vida aumenta também a probabilidade das
agressões externas provocarem dano nos genes supressores
de processos tumorais, o que explica o facto de haver can-
cros mais comuns com o envelhecimento (Stephens & Aig-
ner, 2009).
Há inúmeras causas evitáveis e fatores internos à pessoa que
podem resultar em agressões ao genoma. No que diz respeito
às causas evitáveis de cancro, o tabaco está no topo da lista.
Segue-se a obesidade e más escolhas alimentares, exposição
solar, abuso de substâncias e alguns vírus (Direção-Geral da
Saúde, 2017; World Health Organization, 2018).

Carcinogénese
Em relação aos fatores internos, a componente genética de
determinados indivíduos pode predispô-los ao desenvolvi-
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 07

mento de tumores. Há quatro genes identificados como res-


ponsáveis pela carcinogénese: genes supressores de tumo-
res, os proto-oncogenes, os genes reparadores do ADN e os
genes reguladores dos processos de apoptose.
Os genes supressores de tumores são genes responsáveis pela
codificação de proteínas reguladoras de mecanismos de inibi-
ção tumoral (Stephens & Aigner, 2009). Os proto-oncogenes
são genes responsáveis pela proliferação celular. Mutações ao
nível destes genes implicam replicação celular descontrola-
da (Stephens & Aigner, 2009; Cassidy, Bisset, Spence, Payne
& Morris-Stiff, 2015). Os genes reparadores de ADN são genes
responsáveis pela reparação de ADN de células danificadas.
Uma mutação nestes genes acelera o processo de acumula-
ção dos proto-oncogenes, aumentando a possibilidade de de-
senvolvimento de tumores (Cassidy et al, 2015). Em resumo, a
carcinogénese pode ocorrer pelo aumento da divisão celular,
pela diminuição/supressão de processos de apoptose ou por
uma conjugação de ambos os fatores (Sobrinho Simões, 2014).
Em relação aos fatores externos, identificam-se estilos de vida
(consumo de substâncias, exercício físico e dieta), infeções
crónicas e fatores ambientais (exposição solar, radiações).
No que diz respeito ao estilo de vida, o consumo de tabaco é
o carcinogéneo mais facilmente evitável (Stephens & Aigner,
2009). Está identificado como um dos principais fatores car-
cinogénicos, sendo responsável por 15% dos tumores diag-
nosticados a nível mundial. Este número aumenta para 90%
se nos focarmos no cancro do pulmão (Cassidy et al, 2015).
Para além de tumores do pulmão, é identificado como cau-
sa de outros cancros como mesotelioma, leucemia mieloide,
tumores do trato GI, pâncreas e fígado, tumores faríngeos,
laríngeos e da cavidade nasal, tumores cervicais e do trato
urinário (Stephens & Aigner, 2009; Cassidy et al, 2015).
O consumo de álcool, fortemente associado ao consumo de
tabaco, também está relacionado como causa de desenvol-
vimento tumoral, atuando em sinergismo, no que diz respeito
a tumores de cabeça e pescoço, da mama e hepatocelular
(Stephens & Aigner, 2009; Cassidy et al, 2015).
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 08

Em relação à dieta, a obesidade representa um fator de ris-


co relacionado com cancro colorretal, do endométrio, da
mama, rim e esófago. Apesar do mecanismo ainda não estar
totalmente clarificado, sabe-se que pode ter tido algum tipo
de influência em 20% das mortes por cancro no mundo (Cas-
sidy et al, 2015).
Aspetos dietéticos como a ingestão elevada de frutas, de vege-
tais e de fibras têm vindo a ser relacionados com a redução da
incidência de cancro do cólon. No entanto, não há evidência
que relacione a ingestão destes alimentos com o desenvolvi-
mento de outros tipos de cancro (Cassidy et al, 2015).
No que diz respeito à prática de exercício físico, esta relacio-
na-se fortemente com o estilo de vida sedentário e o desen-
volvimento de cancro da mama e do cólon, quer este seja
associado a obesidade, ou não (Cassidy et al, 2015).
As infeções são responsáveis por 16% dos cancros diagnosti-
cados no mundo, sendo a percentagem inferior a 9% no caso
dos países desenvolvidos (Cassidy et al, 2015). Estas podem
ser virais, bacterianas ou parasitárias.
Para que uma infeção viral possa ser relacionada com o de-
senvolvimento de cancro, é necessário que esta seja prolon-
gada no tempo e que existam concomitantemente outros
fatores como, por exemplo, influência genética, imunológica
ou exposição ambiental.
O vírus do papiloma humano (HPV) está fortemente associado
a cancro do colo do útero, sendo responsável por mais de 80%
dos casos mundiais (Stephens & Aigner, 2009; Cassidy et al,
2015). Está também relacionado com os tumores da cabeça e
pescoço em doentes não fumadores, com o cancro vaginal, da
vulva, do pénis e o carcinoma anal, sendo as estirpes 16 e 18 as
mais associadas à carcinogénese (Cassidy et al, 2015).
Em relação ao vírus da hepatite B (VHB) e ao vírus da hepatite
C (VHC), ambos estão associados à lesão hepática crónica e
consequentemente ao aumento do risco de desenvolvimen-
to de tumores hepáticos (Stephens & Aigner, 2009; Cassidy
et al, 2015).
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 09

O vírus Epstein-Barr está fortemente associado a tumores lí-


quidos, como é o caso do Linfoma de Hodgkin e do Linfoma
de Burkitt; assim como do carcinoma nasofaríngeo (Stephens
& Aigner, 2009; Cassidy et al, 2015).
No que diz respeito às infeções bacterianas, 1/3 dos adeno-
carcinomas gástricos são associados à infeção por Helico-
bacter pylori, aumentando o número de casos para 50% nos
países em desenvolvimento (Cassidy et al, 2015).
Quanto às infeções parasitárias, o parasita Schistosomiasis
haematobium está relacionado com múltiplas alterações do
pavimento celular da bexiga, sendo responsável por 8% dos
tumores de células escamosas da bexiga (Cassidy et al, 2015).
Outro fator fortemente associado ao desenvolvimento de
cancro é a exposição solar. Cerca de 90% dos melanomas
malignos são atribuídos à exposição solar. A grande maioria
dos carcinomas espinocelulares e basocelulares são também
relacionados com a exposição solar cumulativa. Os princi-
pais grupos de risco são os trabalhadores ao ar livre, atletas, e
crianças (Stephens & Aigner, 2009; Cassidy et al, 2015).
Outros tipos de exposição ao qual se atribui alto risco de de-
senvolvimento de cancro são as radiações, os produtos quí-
micos (industriais, etc.), nomeadamente os poluentes am-
bientais, por resultarem diretamente em mutações génicas
que levam à formação do tumor (Stephens & Aigner, 2009;
Cassidy et al, 2015).
Dependendo da localização inicial do crescimento celular,
assim se denomina o tumor. Há dois tipos de tumores sóli-
dos: os carcinomas são tumores que se desenvolvem inicial-
mente em células de origem epitelial; os sarcomas são tumo-
res que se desenvolvem no tecido conjuntivo como músculo,
cartilagem, osso, fáscia, nervos ou vasos (Stephens & Aigner,
2009; Sobrinho Simões, 2014). Quanto aos tumores líquidos,
os linfomas são neoplasias malignas das células linfóides dos
gânglios linfáticos, do baço e do timo; as leucemias são neo-
plasias malignas das células sanguíneas originadas na medula
óssea (Sobrinho Simões, 2014). Quando não é possível iden-
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 10

tificar a origem do tumor primário, estamos perante um tu-


mor oculto. A identificação do tumor primário é de extrema
importância para se decidir o tipo de tratamento.

Metastização
Sendo o cancro uma neoplasia maligna e com poder infiltra-
tivo, as células malignas podem invadir estruturas linfáticas
ou entrar na corrente sanguínea. Este processo denomina-
-se metastização. Se a metastização ocorre por via linfática,
são afetados os gânglios linfáticos regionais, ou seja, a ca-
deia mais próxima do tecido neoplásico. Um exemplo des-
te tipo de metastização ocorre no cancro da mama, em que
são afetados os gânglios da axila. Se, por outro lado, a via
de disseminação é através da corrente sanguínea, as células
neoplásicas podem ser transportadas até tecidos de órgãos
mais distantes do tumor primário, como no fígado, ossos,
pulmões ou cérebro. Outra hipótese de metastização pode
ocorrer através da disseminação do tumor inicial para a ca-
vidade abdominal, no caso de tumores do ovário, estômago
e cólon; ou para a cavidade torácica, no caso de tumores do
pulmão. Uma das consequências mais frequentes deste tipo
de disseminação são a acumulação de líquido com células
neoplásicas nas cavidades, surgindo os derrames (Stephens &
Aigner, 2009; Sobrinho Simões, 2014).

Estadiamento
O estadiamento definitivo da doença só surge após análi-
se imagiológica e anatomopatológica do tumor, podendo
ser alterado de acordo com o curso do tratamento e/ou da
doença. Classificar e estadiar tumores é de extrema impor-
tância após o diagnóstico para se poder decidir qual o curso
de tratamento a seguir.
A classificação TNM (T – tumor, N – nodes, M – methastasis),
elaborada pela Union for International Cancer Control (UICC),
que pretende categorizar o tumor tendo em consideração o
seu tamanho e invasão, o envolvimento de gânglios linfáticos
e se há ou não metástases à distância.
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 11

Epidemiologia
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), em 2017,
registaram-se, em todo o mundo, 18 milhões de novos ca-
sos, sendo 23,4% na Europa. Morreram 10 milhões de pessoas
no planeta, vítimas desta patologia. De acordo com a OMS,
na Europa, o cancro é a segunda causa de morte a seguir às
doenças cardiovasculares.
Estudos recentes apontam para uma nova transição epide-
miológica nos países mais desenvolvidos, onde a principal
causa de morte na faixa etária entre os 35-70 anos está as-
sociada ao cancro, colocando as doenças cardivasculares
como segunda causa de morte (Deganais et al, 2019)
De acordo com a Direção Geral de Saúde (DGS) tem-se vin-
do a observar um aumento constante do número de casos
de cancro em Portugal, a um ritmo de cerca de 3% por ano.
Vários fatores se relacionam com este aumento, dando-se
especial enfoque ao envelhecimento que se verifica na po-
pulação portuguesa e aos fatores evitáveis (Direção-Geral da
Saúde, 2017).
De uma forma geral, em Portugal, no ano de 2010, o tumor da
próstata foi o mais incidente, apresentando uma taxa de 120,3
por cada 100.000 habitantes; seguindo-se o cancro da mama
com uma taxa de 62,5/100.000 habitantes; e o cancro do cólon
com 47,6/100.000 habitantes (Direção-Geral da Saúde, 2016).
Os dados mais recentes relativos às doenças oncológicas em
Portugal mostram-nos que há um aumento mais significativo
da incidência de cancro em comparação com a mortalidade
(Direção-Geral da Saúde, 2017). Mostram ainda que não exis-
te relevância na diferença da variação dos números entre o
sexo feminino e masculino e entre pessoas com idade inferior
ou superior a 65 anos.
Entre 2011 e 2015 a taxa de mortalidade e o número de óbitos
por cancro aumentaram em Portugal de uma forma geral, de
acordo com a DGS (Direção-Geral da Saúde, 2017). Os Aço-
res são a região onde se verifica maior taxa de mortalidade
global por cancro (Direção-Geral da Saúde, 2017).
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 12

Os números relativos ao cancro do colo do útero e ao cancro


da próstata mostram uma diminuição no número de óbitos
e, consequentemente, na taxa de mortalidade, o que se pode
dever ao aumento do número e da eficácia dos rastreios. As
regiões onde a mortalidade é mais acentuada são os Açores
e o Médio Tejo e Beira Baixa, respetivamente (Direção-Geral
da Saúde, 2017).
No que diz respeito ao aumento da taxa de mortalidade e
do número de óbitos, verificou-se nos tumores malignos da
traqueia, brônquios e pulmão (mais acentuado nas mulheres),
no cancro da mama feminino e no cancro do estômago. A
maior taxa de mortalidade por estes tipos de tumor verifica-
-se nos Açores no que diz respeito ao sistema respiratório e
mama, e na região do Ave no que diz respeito ao estômago.
Relativamente ao cancro colorretal, verifica-se um aumento
do número de óbitos associado a uma discreta diminuição
da taxa de mortalidade. Os números mostram que ambos os
parâmetros são superiores nos homens, em cerca do dobro,
e que a região onde se verifica a maior taxa de mortalidade é
no Alentejo Litoral (Direção-Geral da Saúde, 2017).

Referências bibliográficas
Cassidy, J., Bissett, D., Spence, R. A., Payne, M., & Morris-Stiff, G. (2015). Oxford
Handbook of Oncology (4.ª ed.). Oxford: Oxford University Press.
Deganais, G.; et al. (2019). Variations in common diseases, hospital admissions,
and deaths in middle-aged adults in 21 countries from five continents (PURE): a
prospective cohort study .Lancet. 2020;395(10226):785-794. doi: 10.1016/S0140-
6736(19)32007-0.
Direção-Geral da Saúde. (2016). PORTUGAL. Doenças Oncológicas em Números -
2015. Lisboa: Direção-Geral da Saúde.
Direção-Geral da Saúde. (2017). Programa Nacional para as Doenças Oncológicas
2017. Lisboa: Direção-Geral da Saúde.
Sobrinho Simões, M. (2014). O Cancro. Lisboa: Fundação Francisco Manuel dos
Santos.
Stephens, F., & Aigner, K. (2009). Basics of Oncology. Berlim: Springer.
World Health Organization. (2018). Cancer. Disponível em http://www.who.int/
news-room/fact-sheets/detail/cancer (acedido em 28 de Agosto, 2018).
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 13

CIRURGIA ONCOLÓGICA
Filipa Cardoso
A cirurgia apresenta-se como sendo a base do tratamento e
simultaneamente a principal esperança dos doentes onco-
lógicos portadores de tumores sólidos. A cirurgia mostra ser
mais eficaz quando o cancro é localizado, no entanto, pen-
sa-se que a opção cirúrgica, perante alguns tumores metasti-
zados, possa ser benéfica para o doente (Cassidy et al, 2015).
A cirurgia possui cinco modalidades no tratamento de doen-
tes oncológicos, que são:
• Diagnóstico e estadiamento;
• Cirurgia curativa;
• Cirurgia paliativa;
• Cirurgia para doença metastizada;
• Cirurgia profilática.
O estadiamento do tumor é essencial para ponderar a perti-
nência da cirurgia como tratamento, tal como para planear
a abordagem cirúrgica mais adequada. Note-se que o com-
portamento dos tumores sólidos é diversificado, pelo que as
implicações para a cirurgia podem originar paradoxos, verifi-
cando-se que cada tumor é único e com exigências diferen-
tes. Assim, os tumores possuem a capacidade de dissemina-
ção através de três métodos:
• Linfático;
• Sanguíneo;
• Infiltração direta.
A maioria dos tumores disseminam-se pelos três processos
referidos anteriormente, no entanto, existe sempre uma via
predominante. O cancro da mama e coloretal disseminam-se
por via sanguínea e linfática enquanto o cancro do trato gas-
trointestinal superior e vias aéreas superiores metastiza pre-
dominantemente através da rede linfática.
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 14

É sabido que cancro decorrente do mesmo tipo de células


pode comportar-se de maneira diferente. Assim, a aborda-
gem cirúrgica depende do tipo e comportamento do tumor
em questão. Outro aspeto pertinente e que pode condicionar
a cirurgia é a relação entre o tumor e a resposta inflamatória
do hospedeiro. Esta relação, no caso de tumores sólidos,
deve ser estudada para que possam ser previstos resultados
e a possibilidade de serem necessárias terapias adjuvantes
(Cassidy, et al, 2015).

Cirurgia no diagnóstico e estadiamento da doença


A evolução dos meios auxiliares de diagnóstico, nomeada-
mente da ressonância magnética, da ultrassonografia ou da
tomografia computadorizada permitiu a melhor localização,
diagnóstico e estadiamento das doenças oncológicas. O pro-
gresso destas técnicas melhorou a precisão das biópsias cen-
trais e aspirativas, permitindo a confirmação de diagnósticos
suspeitos. Também as técnicas endoscópicas são meios que
possibilitam recolhas para análises histológicas, citológicas e
outras.
No que diz respeito às biópsias, as centrais são habitualmente
as preferidas e possuem um papel primordial, uma vez que
permitem a colheita adequada de tecido. No entanto, as as-
pirativas são também utilizadas, muitas vezes como comple-
mento para o diagnóstico.
Salienta-se que quando as biópsias são usadas para fim diag-
nóstico, é essencial que o cirurgião e a equipa patologista res-
ponsável pela análise das amostras estejam em sintonia, uma
vez que há diversos procedimentos posteriores à colheita
que exigem timings específicos. No estadiamento de diferen-
tes tipos de cancro, como o cancro da mama e melanoma, a
avaliação ganglionar por pesquisa do “gânglio sentinela” é um
dos mais importantes fatores de prognóstico que determina
um maior impacto no estadiamento, decisão terapêutica e
redução da morbilidade associada ao esvaziamento ganglio-
nar, assumindo-se a biópsia do gânglio sentinela atualmente
como procedimento cirúrgico standard, nomeadamente em
doentes com cancro da mama em estadio precoce sem evi-
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 15

dência clínica ou imagiológica de envolvimento ganglionar


axilar (Vaz, et al, 2018).
Atualmente, a laparoscopia revela-se uma ferramenta para
diagnóstico e estadiamento da malignidade. A biópsia por
imagem é um meio eficaz, fiável e frequentemente utilizado
para o diagnóstico, no entanto existem áreas inacessíveis e,
consequentemente, não visíveis na biópsia guiada por ima-
gem, pelo que a laparoscopia pode ser a solução nestes casos.
Sabe-se que quando a avaliação laparoscópica é tida como
uma parte integrante do estadiamento, a citologia da lavagem
peritoneal pode ser realizada. Outra vantagem do diagnóstico
por laparoscopia no estadiamento é o uso da ultrassonografia
intraoperatória através do laparoscópio, uma vez que torna
real a deteção, tal como a biópsia de massas, em órgãos só-
lidos. No que diz respeito a lesões pequenas, menores que
1 cm, estas podem ser sujeitas a biópsia, com possibilidade
de serem tratadas com técnicas de ablação por laparoscopia.
Quando é adicionada ultrassonografia doppler, as estruturas
vasculares são passíveis de ser identificadas e consequente-
mente evitadas.

Cirurgia curativa
As taxas de sobrevivência para alguns tipos de cancro melho-
raram ao longo dos anos devido à deteção precoce do tumor,
pela implementação de programas de sensibilização pública
e rastreios, como é o exemplo do cancro da mama e can-
cro do colo do útero. Na maioria dos casos diagnosticados
atempadamente, a cirurgia pode ter um papel curativo. Os
resultados obtidos a longo prazo, após a realização de cirur-
gia, dependem do estadio do tumor quando é descoberto e
do tipo de tumor em questão.
Os tratamentos neoadjuvantes e a evolução de técnicas
anestésicas e cirúrgicas possibilitou que resseções mais ex-
tensas possam ser efetuadas com menos risco, em termos
de morbilidade e mortalidade. No entanto, é possível perce-
ber que estes desenvolvimentos não são uniformes, pois não
são aplicáveis em alguns tipos de cancro e respetivas cirur-
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 16

gias implícitas, como é o caso de tumores do sistema nervo-


so central (SNC), onde as estruturas vitais são limitadoras da
resseção extensa.
A utilização das técnicas laparoscópicas no tratamento defi-
nitivo de tumores malignos está a evoluir e, para algumas si-
tuações, como, por exemplo, cancros do reto e da próstata, a
cirurgia robótica demonstra, também, excelentes resultados.

Cirurgia paliativa
A esperança de vida do doente depende do tipo e estadia-
mento da doença oncológica, podendo variar de semanas a
anos. Assim, é certo que algumas complicações e sintomas,
associados à degradação do estado de saúde, estarão pre-
sentes numa fase terminal e por isso necessitam de ser ate-
nuadas ou resolvidas, no sentido de melhorar a qualidade de
vida do doente. Quando a cirurgia é colocada como opção,
num ambiente paliativo, é essencial decidir qual o procedi-
mento adequado e avaliar os prós e contras da cirurgia tal
como a vontade do doente, pelo que uma reunião de equipa
multidisciplinar é essencial nestes casos.
Nos doentes com cancro do cólon, as obstruções intestinais
são mais comuns e podem ser causadas, por exemplo, por
massas pélvicas avançadas. Com a ajuda dos meios auxilia-
res de diagnóstico, neste caso em especial da tomografia
computorizada, estas situações podem ser diagnosticadas no
pré-operatório. No entanto, ocasionalmente, a incurabilidade
das mesmas pode apenas ser exposta aquando da realização
de laparotomia. Nos casos em que o tumor é inoperável, a
realização de colostomia ou ileostomia podem ser opções
consideradas para a descompressão da obstrução. Alguns
doentes apresentam várias obstruções a nível do intestino
delgado e/ou grosso, pelo que muitas vezes não há opção
cirúrgica.
No que respeita às fístulas, estas podem ser de vários tipos,
como retovaginais, vesicovaginais, entre outras. Em causa
podem estar vários processos, como o tumor invadir local-
mente um órgão adjacente ou como complicação associada
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 17

à realização de radioterapia prévia. É importante que o estudo


da fístula seja pormenorizado, no sentido de ser determinada
a sua origem, natureza, curso, etc. Em termos paliativos, um
estoma na extremidade proximal é a solução mais utilizada,
se a cirurgia definitiva não foi possível.
A icterícia também é comum em alguns doentes oncológi-
cos com doença avançada. Uma das soluções para alguns
doentes, conforme o tumor apresentado, pode passar pela
colocação de stent com auxílio de colangiopancreatogra-
fia retrógada endoscópica (CPRE). Os stents metálicos são
preferidos quando a sobrevida prevista para o doente for su-
perior a 3 meses; quando tal não se verifica os de plásticos
são utilizados, embora a icterícia possa ser recorrente. Outro
tratamento eficaz, dependendo do tipo de tumor, pode ser
a cirurgia, com a realização de hepatojejunostomia, embora
menos utilizada que a primeira opção abordada.
A ascite constitui outra complicação, pelo que o tratamento
da mesma passa por paracenteses evacuadoras, restrição de
sódio e controlo de diurese. Existem doentes que possuem
dreno abdominal com penso oclusivo, uma vez que a neces-
sidade de drenagem do líquido ascítico é frequente.
O controlo da dor eficaz nos doentes oncológicos é mui-
to complexo e exigente para os profissionais de saúde. Os
cirurgiões, para auxiliarem neste controlo, podem, depen-
dendo do estado de saúde atual do doente, realizar alguns
procedimentos cirúrgicos, como a estabilização de fraturas
patológicas. No entanto, em doentes paliativos, a prescrição
e administração corretas da medicação são a grande solução
para o controlo da dor.
No que concerne à hemorragia gastrointestinal, esta ocorre
quando a manipulação hemostática falha. Existe uma varie-
dade de processos que podem controlar a hemorragia de ori-
gem maligna ou benigna em doentes oncológicos paliativos,
como técnicas endoscópicas e radiológicas, por exemplo.
A cirurgia é tida como opção para os doentes que possuem
uma esperança de vida superior a 3 meses.
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 18

Quando a doença é extensa, a remoção de todas as massas


pode não ser possível. Assim, a resseção parcial torna-se uma
opção viável, pelo que é executada uma cirurgia citorredutora.
É uma realidade que muitos doentes possuem uma probabi-
lidade acentuada de desenvolverem metástases. As metásta-
ses, quando viscerais, apresentam um mau prognóstico para o
doente, no entanto, quando são ósseas estão associadas a uma
sobrevida média de 2 anos. Neste sentido, a resseção paliativa
do tumor primário provoca a melhoria da qualidade de vida dos
doentes, uma vez que alguns sintomas são diminuídos tal como
diminui a probabilidade de aparecerem novas metástases.

Cirurgia para doença metastática


É sabido que tanto os doentes com vários tipos de metas-
tização como os doentes com apenas um local de metas-
tização são candidatos à resseção das mesmas, sendo que
tudo depende da localização do tumor e da localização das
metástases. Exemplos de metástases ressecáveis e com pro-
babilidade de aumentarem a sobrevida dos doentes são as
que incluem o pulmão e fígado, sendo que a decisão acer-
ca da opção cirúrgica é tomada com base numa avaliação
pormenorizada e apoiada em meios auxiliares de diagnóstico.
Descrevem-se seguidamente algumas abordagens cirúrgicas
na doença metastática.
Metastização hepática:
• A maioria das metástases hepáticas são encontradas em
exames de vigilância realizados no pós-operatório, levando
à realização de exames mais específicos para avaliação do
fígado, como a ressonância magnética.
• O uso de quimioterapia neoadjuvante contribui para o au-
mento das taxas ressecabilidade, ao diminuir o tamanho
das metástases.
• Atualmente, cada vez mais a resseção hepática laparos-
cópica é utilizada, uma vez que, com programas de recu-
peração bem definidos, a permanência do doente no hos-
pital e a recuperação pós-operatória são reduzidos.
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 19

• Outro exemplo de tratamento é a ablação por radiofre-


quência, cada vez mais utilizada em pacientes seleciona-
dos. No entanto, mais recentemente, estão a estudar-se as
vantagens da utilização da ablação por micro-ondas sob a
anterior.
Metastização pulmonar:
• O pulmão é o segundo local mais afetado por metástases.
Sabe-se que um quinto dos doentes apenas possui metás-
tases pulmonares.
• Os critérios para a resseção pulmonar incluem o controlo
do tumor primário, um doente clinicamente apto e metás-
tases apenas a nível pulmonar.
• A resseção de metástases pode ser realizada com bai-
xa mortalidade e morbilidade e a sobrevida em 5 anos do
doente, após remoção de metástases, varia de acordo com
a lesão primária.
Metastização óssea:
• Apresentam-se, geralmente, como fraturas patológicas.
• O cancro da mama e próstata são os principais originários
deste tipo de metástases, seguidos do cancro do pulmão e
tiróide.
• A ressonância magnética e a tomografia computadorizada
são os meios de diagnóstico mais utilizados.
• As opções de tratamento passam pela estabilização, que
pode ser executada de duas maneiras: fixação interna (en-
volve materiais que são colocados internamente) ou exter-
na. A amputação, embora rara, pode ser aconselhada em
situações de dor incontrolável e infeções recorrentes.
• Atualmente, no caso das metástases na coluna vertebral, é
utilizado como tratamento minimamente invasivo a injeção
percutânea de cimento ósseo (polimetilmetacrilato) guiada
por radioscopia. Esta técnica é denominada vertebroplastia
percutânea.
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 20

Metastização cerebral:
É comum em alguns doentes, muitas vezes correlacionada
com os cancros de pulmão e mama.
• Os sintomas incluem dor de cabeça, astenia, confusão e epi-
lepsia. O diagnóstico pode ser feito através de ressonância
magnética e/ou tomografia axial computorizada (TAC).
• A cirurgia torna-se útil para confirmar o diagnóstico, bem
como aliviar alguns dos sintomas do doente e/ou resseção
de metástases, quando é possível e favorável a sua remoção.
• Pode dizer-se que a sobrevida média é de 2 meses sem
terapia e de 6 meses com radioterapia.

Cirurgia profilática
Em alguns casos, a cirurgia ocupa um lugar imprescindível no
que diz respeito à prevenção do cancro. Note-se que existem
condições, sejam herdadas ou adquiridas, que fazem da pes-
soa em questão um candidato a desenvolver a doença. Assim,
com aconselhamento médico, a cirurgia preventiva assume
um papel importante e decisivo na vida de algumas pessoas.
São exemplos de casos:
• Orquidopexia ou, ocasionalmente, orquidectomia;
• Colectomia total com procedimento de bolsa, em pessoas
com polipose ou colite ulcerativa.
• Tiroidectomia total em idade precoce, em pessoas com ris-
co de carcinoma de células medulares da glândula tiroide,
que apresentam a síndrome de neoplasia endócrina múltipla
(tipo 2).
• Pessoas portadoras do gene BRCA podem necessitar de
mastectomia bilateral profilática (e reconstrução). Com a
aprovação do tamoxifeno como droga profilática nos pa-
cientes com as mutações BRCA1 e 2, segundo o The Na-
tional Institute for Health and Care Excellence (NICE; 2013),
há a possibilidade de menos pessoas realizarem a cirurgia
profilática da mama, tal como doentes portadores de ante-
cedentes familiares de cancro do ovário podem realizar uma
ooforectomia laparoscópica.
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 21

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NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 22

RADIOTERAPIA
Mafalda Ferreira
A radioterapia consiste no tratamento de doenças benignas
ou malignas utilizando radiação ionizante, sendo os raios-X
os mais comuns (Cassidy et al, 2015). Desde a sua descoberta,
por volta de 1896, a utilização dos raios-X tem sido progres-
sivamente desenvolvida na área de investigação, diagnóstico
e tratamento (www.cancerresearchuk.org).
A radioterapia pode ser usada não só de forma isolada, mas
também em combinação com outros tipos de tratamento
das doenças oncológicas. Cerca de 60% dos doentes onco-
lógicos irão receber radioterapia ao longo do seu percurso
de vivência de doença, seja com intuito curativo ou paliativo.
Quando se utiliza a radioterapia para paliação pretende-se o
controlo sintomático e o aumento da qualidade de vida, sen-
do os seus objetivos, por exemplo, antiálgico, descompressi-
vo e hemostático (Gosselin, 2011).
A articulação da equipa multidisciplinar é, assim, vital para au-
mentar a qualidade dos cuidados prestados, bem como dos
resultados em saúde.
A radioterapia pode ser aplicada externa ou internamente,
sendo possível haver combinação das diferentes modalida-
des. A radioterapia externa visa a irradiação da área afetada
utilizando uma máquina própria para esse efeito. A radiotera-
pia aplicada de forma interna envolve que materiais radioati-
vos sejam colocados no interior do corpo da pessoa (www.
macmillan.org.uk). O tipo de radioterapia selecionado depen-
de de diversos fatores relacionados com a doença oncológi-
ca: histologia, tamanho, localização, proximidade a tecidos
saudáveis com sensibilidade à radiação, antecedentes pes-
soais e tratamentos oncológicos prévios (www.cancer.gov).
A unidade do Sistema Internacional para a dose de radiação
denomina-se de Gray (Gy). A radiossensibilidade das células
malignas à radioterapia depende igualmente de variados as-
petos. O tipo de célula em questão, o seu grau de diferen-
ciação, a fase de vida celular e a oxigenação são elementos
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 23

fundamentais. As células normais afetadas pela radiação e os


danos subjacentes são enquadrados como efeitos adversos
da radioterapia, pretendendo-se minimizar a sua destruição
(Iwamoto, 2000).
Os efeitos da radioterapia relacionam-se não só com a dose
de radiação em si, mas também com o tempo em que o tra-
tamento é aplicado e com a área do corpo irradiada.

Radioterapia externa
Antes do início do tratamento, procede-se a um planeamen-
to rigoroso. Para além de se ter em consideração os fatores já
acima mencionados e os exames de estadiamento, recorre-
-se à realização de exames auxiliares de diagnóstico, como,
por exemplo, a tomografia axial computorizada (TAC), a res-
sonância magnética nuclear (RMN) e a tomografia por emis-
são de positrões (PET) (Iwamoto, 2000). Existe uma consulta
de radio-oncologia onde é explicado o procedimento e seus
benefícios, são abordados os potenciais efeitos secundários,
esclarecidas dúvidas e realizados ensinos sobre as medidas a
adotar durante e após as sessões (www.cancer.gov). É igual-
mente realizada uma TAC de planeamento, onde são regis-
tadas as medidas e posicionamento adequado. Alguns re-
cursos utilizados são não só a realização de marcas de tinta
no corpo da pessoa (tatuagem), mas também a utilização de
equipamentos/moldes de suporte para a parte do corpo em
questão (como, por exemplo, máscaras de imobilização para
a cabeça, apoio para o braço e descanso de pescoço), de
modo a manter o posicionamento exato durante a sessão de
radioterapia, sem variações de posição, contribuindo para a
precisão do tratamento a realizar. Com a análise das imagens,
irá proceder-se ao planeamento através programas de com-
putador próprios, definindo-se o volume de tecido a irradiar
e a dosimetria.
É essencial esclarecer as pessoas submetidas a tratamento com
radioterapia externa de que não irão ficar radioativas e que po-
derão estar junto das outras pessoas sem preocupações (www.
cancer.gov).
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 24

Com o desenvolvimento deste tipo de tratamentos, a ex-


periência clínica indica que a aplicação da radioterapia em
pequenas frações diárias possibilita a administração de uma
dose final total superior àquela que seria possível aplicar em
apenas uma única fração. Assim, o fracionamento possibilita
estabelecer uma relação entre a dose da radiação e o perío-
do de tempo em que essa mesma dose deve ser dividida. Tal
é essencial para que seja possível uma maior destruição de
células malignas, reduzindo os riscos de destruição de teci-
dos saudáveis (Cassidy et al, 2015). Contudo há algumas si-
tuações em que está indicada a dose total em fração única.
O modelo linear quadrático é o mais utilizado para descrever a
sobrevivência celular e a formulação dos efeitos biológicos do
fracionamento aquando da utilização de radioterapia (Kogel,
2009). As células tumorais têm uma maior radiossensibilidade
ao apresentarem um metabolismo mais rápido, respondendo
de forma mais rápida à irradiação. Desta forma, ambiciona-
-se uma resposta positiva da radiação nas células tumorais
antes que surjam efeitos secundários nos tecidos saudáveis,
uma vez que o fracionamento possibilita que as células nor-
mais se reconstituam após a aplicação de cada fração. É com
base nesta premissa que a radioterapia é aplicada em peque-
nas doses diárias, ao longo de dias ou semanas, dependendo
de cada situação em particular (Perez, 1992). Contudo, é de
considerar que a radiossensibilidade das células cancerígenas
em si não é linear, variando de acordo com aspetos como o
tipo de célula, a sua taxa de divisão, fase de vida celular, grau
de diferenciação e oxigenação (Gosselin, 2011).
O efeito da radioterapia nos tecidos pode envolver dois tipos
de mecanismo: a morte celular por apoptose, geralmente
até 24 horas após a irradiação, e a perda da sua capacida-
de reprodutiva. Estes efeitos vão depender não só da dose
da radioterapia mas também do tipo de células em questão.
Quando existe morte celular, a reposição das células perdi-
das ocorre pela proliferação de outras células. Por sua vez,
quando a perda celular ocorre por incapacidade reprodutiva,
a taxa de renovação celular de um determinado órgão de-
termina o tempo de aparecimento do dano tecidual. Isto faz
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 25

com que seja possível haver efeitos agudos e tardios da ra-


dioterapia (www.cancer.org).
Os efeitos agudos da radioterapia são aqueles que se desen-
volvem durante o período das sessões ou até 8 semanas após
o seu término e envolvem particularmente o sistema hema-
topoético, a mucosa e a pele. Aparecem maioritariamente
pela perda de capacidade reprodutiva das células, dependen-
do também da dose e fracionamento de radiação. O tempo
de desenvolvimento pode variar entre dias e até meses (www.
cancer.gov). Os efeitos tardios da radioterapia surgem princi-
palmente em tecidos de proliferação lenta, como é o caso de
órgãos como o coração, os pulmões e o fígado. Estes efeitos
podem não ser previsíveis pelos efeitos agudos que ocorre-
ram e podem manifestar-se muito tempo depois. É de realçar
que, para além da dose total de radiação, a dose de radiação
por fração é igualmente determinante (www.cancer.gov).
Com a evolução tecnológica crescente, a radioterapia exter-
na tem-se tornado mais precisa e rigorosa, com a capacidade
de aplicar maiores doses de radiação ao tumor com maior
controlo e minimizando os riscos para os tecidos saudáveis
(Cassidy et al, 2015).
No âmbito da radioterapia externa, tem igualmente de se
considerar a radioterapia estereotáxica. Constitui um tipo de
radioterapia de alta precisão para tratar tumores pequenos e
bem definidos. Pode ser uma opção quando a cirurgia envol-
ve riscos elevados, seja pela localização do tumor, idade da
pessoa ou comorbilidades associadas. No caso de tumores
cerebrais, esta técnica denomina-se de radiocirurgia, sendo o
tratamento realizado numa única sessão ou até cinco sessões
(uma por dia). A radioterapia estereotáxica pode igualmen-
te ser utilizada em tumores externos ao cérebro, como por
exemplo, localizados no fígado ou no pulmão. Nestes casos,
geralmente o tratamento é realizado em mais do que uma
sessão, uma vez que não se consegue uma precisão tão ele-
vada como na radiocirurgia (Iwamoto, 2000).
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 26

Radioterapia interna
Consiste na colocação do material radioativo no interior do
corpo e divide-se em dois tipos: braquiterapia e tratamento
com radioisótopos.
Na braquiterapia, a fonte radioativa sólida é implantada dentro
ou próximo do tumor, aplicando-se uma alta dose de radiação
ao tumor em si, mas reduzindo a quantidade de tecido saudá-
vel que recebe radiação. Possibilita, assim, uma maior quanti-
dade de irradiação numa área mais pequena, relativamente à
radioterapia externa. Pode ser realizada isoladamente ou em
combinação com a radioterapia externa (Gosselin, 2011).
Para que a braquiterapia esteja indicada, é necessário saber a
extensão e dimensão precisas do tumor e o seu local tem de
ser acessível não só para colocar e retirar os implantes, mas
também para o seu correto posicionamento. A distribuição da
dose de radiação não é homogénea em todo o tumor, podendo
ser distribuída considerando a radiossensibilidade das células e
de modo a aumentar a eficácia terapêutica (Cassidy et al, 2015).
A braquiterapia é, normalmente, utilizada aquando de can-
cros da mama, cabeça e pescoço, olho, cérvix, útero e prós-
tata. Previamente ao tratamento em si, são realizados exames
de imagem, planeamento e anamnese em consulta. São es-
clarecidas dúvidas quanto ao procedimento em si, os poten-
ciais efeitos adversos e cuidados a ter (www.cancer.gov).
O procedimento é realizado em ambiente hospitalar, consi-
derando estar a manipular-se fontes radioativas. Os implantes
encontram-se guardados em locais adequados para conter a
radiação e os profissionais de saúde estão equipados com me-
didas de proteção individual apropriadas. A pessoa estará sob
anestesia geral ou local, dependendo da situação, e os implan-
tes são introduzidos com um aplicador através de um cateter.
Durante o procedimento são realizados exames de imagem,
de modo a que os implantes sejam posicionados corretamente
(www.cancer.gov).
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 27

Os implantes de braquiterapia podem ser:


• Implantes de baixa dose: permanecem no corpo de 1 a 7 dias
e a pessoa poderá ficar em regime de internamento durante
este tempo. Tal como foram introduzidos, no final são reti-
rados com um aplicador, através de um cateter;
• Implantes de alta dose: a fonte de radiação é implantada
durante cerca de 10 a 20 minutos e seguidamente retira-
da. O tratamento pode ser realizado durante um período
de tempo de dias a semanas. Apesar do material radioativo
não ficar no interior do corpo, o aplicador pode ficar co-
locado entre tratamentos ou ser colocado antes de cada
sessão;
• Implantes permanentes: após a sua colocação, os implan-
tes permanecem no interior do corpo sem que sejam re-
tirados. Contudo, conforme o tempo vai passando, vão
perdendo a sua radiação. Aquando do maior período de
radiação, há necessidade do doente ter precaução com as
pessoas com quem contacta, devendo ter cuidados redo-
brados face ao contacto com crianças e grávidas (www.
cancer.gov).
No tratamento com radioisótopos a administração pode ser
realizada através de via oral ou via intravenosa. As células
cancerígenas irão absorver a substância radioativa, causando
a sua morte (www.macmillan.org.uk).
Existem diferentes tipos de radioisótopos, estando a sua sele-
ção relacionada com o tipo de tumor. Por exemplo, no caso
da neoplasia da tiróide, é utilizado o iodo radioativo (iodo-
131). O objetivo do tratamento pode ser prevenir o apareci-
mento da doença ou destruir tecido tumoral que não tenha
sido possível eliminar através de cirurgia. Devido à radiação
emitida, é necessário que haja internamento em quartos com
condições físicas e sistema de esgotos adequados (www.
cancer.gov).

Radioterapia intraoperatória
A radioterapia intraoperatória permite realizar o tratamento du-
rante a cirurgia. Este tipo de radioterapia utiliza-se em cancros
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 28

abdominais localmente avançados, tais como, gástrico, co-


lorretal, pancreático, sarcomas retroperitoneais e bexiga. Não
existem dados que evidenciem maior risco de infeção pós-
-operatória ou dificuldade de cicatrização da ferida operatória
(Iwamoto, 2000).
Apesar de ser uma técnica promissora, os seus limites técni-
cos e logísticos, bem como os desenvolvimentos tecnológicos
de radioterapia externa fazem com que o seu uso seja restri-
to e que os seus benefícios terapêuticos sejam mais limitados.
A realização desta técnica exige que os profissionais tenham
equipamento de proteção específico, bem como a presen-
ça adicional de equipamento especializado. Para além disso,
é necessário um radioterapeuta e radio-oncologista no blo-
co operatório. Tem igualmente de se considerar os potenciais
efeitos adversos nos tecidos saudáveis (Cassidy et al, 2015).

Irradiação de corpo inteiro


A irradiação de corpo inteiro pode ser utilizada para elimi-
nar células malignas residuais ou fazer parte do esquema de
condicionamento de transplante de medula óssea. Os seus
efeitos secundários irão depender não só da dose da radia-
ção mas igualmente da combinação com outro tipo de tera-
pêuticas, como quimioterapia ou imunoterapia. É essencial
vigilância das funções renal, hepática, cardíaca e pulmonar,
de modo a que se consiga gerir a toxicidade associada. Neste
tipo de tratamento existe igualmente fracionamento da dose
a administrar após o seu cálculo rigoroso, podendo haver
efeitos secundários imediatos ou tardios (Cassidy et al, 2015).

Potenciais efeitos secundários


Abordam-se seguidamente alguns dos efeitos secundários
suscetíveis de surgir com a radioterapia, bem como a forma
de gestão dos mesmos (www.cancer.org):
• Fadiga: A fadiga decorrente de tratamentos de radioterapia
é distinta da que surge no quotidiano, podendo não me-
lhorar com o descanso. É importante avaliar este sintoma e
o seu padrão, bem como privilegiar momentos de repouso.
Estes devem ser combinados harmoniosamente com mo-
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 29

mentos ativos de exercícios leves, tais como exercícios ae-


róbicos (por exemplo caminhadas e jardinagem), exercícios
de flexibilidade e de equilíbrio (como yoga e taichi, pilates
ou alongamentos). Um plano nutricional adequado poderá
igualmente ser benéfico.
• Alterações na pele: Estas alterações cutâneas causadas pela
radioterapia denominam-se de radiodermite e podem ma-
nifestar-se de acordo com o seu grau de gravidade, desde
um simples eritema, irritação, edema, sensação de escaldão,
prurido, descamação seca e/ou húmida até necrose. É, as-
sim, fundamental alertar as pessoas submetidas a radiote-
rapia para a avaliação da integridade cutânea. É importante
evitar roupas apertadas, de textura agressiva ou elásticos que
friccionem a zona irradiada. A roupa interior deverá ser 100%
algodão. Poderá usar-se a roupa vestida do avesso para evi-
tar contacto com as costuras. A proteção solar é vital, dada
a sensibilidade cutânea. Se possível, proteger a pele com
roupa mais escura e, se aconselhado, utilizar protetor solar
(mas não na área irradiada para o tratamento). É desaconse-
lhada a exposição solar direta. Para além disso, é importante
manter a pele irradiada limpa e seca: aquando da higiene
deixar a água cair sem esfregar e usar sabão de pH neutro e
hidratante. Se possível, evitar a depilação, principalmente o
uso de lâminas. As áreas com pregas cutâneas (região axilar,
inframamária, inguinal, entre outras) têm maior risco de de-
senvolvimento de alterações face ao aumento de tempera-
tura e humidade. A hidratação da pele é fundamental, acon-
selhando-se os melhores produtos para cada situação. Ter
precaução com a utilização de cremes, pós e desodorizan-
tes, dado que podem causar irritação, ou mesmo influen-
ciar a dose de radiação absorvida. Neste sentido, devem-
-se evitar componentes suscetíveis de irritar a pele, como
perfumes e loções à base de álcool ou outros componen-
tes como o alumínio e o iodo. Para além disso, umas horas
antes e depois da sessão devem-se evitar produtos tópicos
à base de metal, como por exemplo óxido de zinco, bem
como outras pomadas ou emulsões, por poderem causar
aumento da dose de radiação na pele. Antes de cada sessão
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 30

é, assim, fundamental limpar e secar bem, com delicadeza, a


zona irradiada. Após a sessão a zona deve ser bem hidratada.
O risco de alterações cutâneas é maior quando existe com-
binação de quimioterapia com radioterapia.
• Mucosa oral: O risco de se desenvolver mucosite em pes-
soas com uma doença oncológica de cabeça e pescoço é
elevado. Deste modo, a vigilância e higiene da mucosa oral
são fundamentais. Poderá haver necessidade de se ajustar
a dieta, em termos de quantidade, consistência e tempera-
tura. Para além da mucosa oral em si, poderão surgir sinais
e sintomas como náuseas, vómitos, disgeusia, odinofagia,
disfagia e xerostomia. Existem conselhos nutricionais dedi-
cados a pessoas submetidas a radioterapia e, em casos em
que a produção de saliva diminua consideravelmente, exis-
te a opção de se recorrer a saliva artificial. Otalgias ou al-
terações dentárias são igualmente possíveis efeitos secun-
dários. Deste modo, durante a radioterapia, os cuidados à
cavidade oral, dentes, gengivas e orofaringe são essenciais.
Devem-se evitar: extremos de temperatura ao nível da co-
mida e da bebida ingerida; comida picante, açucarada ou
de textura agressiva; ingestão de bebidas alcoólicas ou ta-
baco. Privilegiam-se cuidados à mucosa oral com os ma-
teriais adequados e textura macia, evitando-se elixires à
base de álcool e mentol que possam contribuir para secar
e irritar a mucosa oral. Antes do início da radioterapia, é im-
portante uma consulta no dentista para avaliar a dentição.
Deve-se evitar o uso de próteses dentárias mal adaptadas
até avaliação ou sobre áreas mais sensíveis, dado que pode
aumentar risco de lesão. Em caso de prevenção e trata-
mento de eventual mucosite oral (da qual existem 4 graus),
existem disponíveis soluções com nistatina e lidocaína para
bochechos, bem como à base de fosfato de cálcio. Com
a utilização desta última, pretende-se hidratar, lubrificar e
limpar a mucosa oral, ajudando a repor minerais que são
importantes para a manutenção da sua integridade. Em ca-
sos de mucosite oral mais agravada, poderá haver neces-
sidade de analgesia, ou mesmo de implementar uma via
artificial de alimentação e hidratação, como por exemplo,
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 31

sonda nasogástrica (SNG) ou gastrostomia endoscópica


percutânea (PEG). Nestas situações é fundamental a articu-
lação com as equipas de nutrição. Nas pessoas submetidas
a iodo radioativo, é aconselhada a ingestão de limonada e
o consumo de pastilhas elásticas, para reduzir o risco de
inflamação das glândulas salivares.
• Sistema hematopoiético: A avaliação analítica é importan-
te, dado o risco de diminuição das células sanguíneas, a
que acresce o risco de hemorragia, infeção e fadiga. Altera-
ções ao nível hematopoiético encontram-se relacionadas
com o local de tratamento, a idade da pessoa, estadio de
doença oncológica e combinação com outras terapêuticas
mielossupressoras.
• Sistema gastrointestinal: Estes sintomas adversos ou secun-
dários ao nível do sistema gastrointestinal surgem apenas em
áreas irradiadas que compreendam a área pélvica, abdominal
e algumas áreas torácicas (p.e., pulmão e esófago). Existe a
possibilidade de surgirem náuseas e/ou vómitos, diarreia e,
no caso particular da irradiação do reto, tenesmo, emissão
de muco ou mesmo hemorragia. No caso das náuseas ou
vómitos, para além das medidas farmacológicas, existem op-
ções não farmacológicas que se podem aconselhar: evitar
comer algum tempo antes e/ou depois da sessão ou optar
por ingerir algo leve são exemplos. Técnicas de relaxamento
ou outras atividades de agrado da pessoa são igualmente po-
tenciais estratégias. Poderão existir queixas de anorexia. Ado-
tar uma dieta polifracionada, encontrar com o doente op-
ções alimentares do seu agrado e os suplementos proteicos
são algumas estratégias. A articulação multidisciplinar com
o nutricionista é essencial. A diarreia é outro dos efeitos se-
cundários suscetível de surgir, estando disponíveis medidas
farmacológicas e não farmacológicas. No que diz respeito às
intervenções não farmacológicas, deve-se evitar alimentos
ricos em fibra ou que contribuem para a existência de cólicas
ou aerocolia, bem como adaptar uma dieta polifracionada e
evitar produtos lácteos. Assim que a diarreia se inicia, tentar
uma dieta de líquidos claros poderá ser opção. Quando o
quadro começar a melhorar, tentar introduzir lentamente ali-
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 32

mentos como arroz, batata, banana, entre outros. No caso da


irradiação do reto, o tenesmo, emissão de muco ou mesmo
hemorragia poderão existir como efeitos secundários.
• Cérebro: A radioterapia holocraneana pode provocar náu-
seas, vómitos, cefaleias, convulsões e alterações da me-
mória, da fala ou do equilíbrio. Existe a possibilidade de ha-
ver alopécia. É importante proteger a cabeça do sol, devido
a uma maior sensibilidade. Em casos que ocorra alopécia,
quando o cabelo voltar a crescer, poderá ser mais fino ou
mesmo ter uma textura distinta. Para além dos efeitos a
curto prazo acima referidos, é importante salientar que po-
derão haver efeitos cerebrais da radioterapia a longo prazo.
Amnésia, deterioração da função cognitiva e aumento de
risco de desenvolver outro tumor são alguns desses efeitos.
• Pulmões: A irradiação dos pulmões que pode ocorrer, por
exemplo, aquando de sessões de radioterapia que abranjam
a região do tórax e mama, pode levar ao desenvolvimento
de pneumonite rádica. Para que se possa intervir adequada-
mente, é importante a realização de raio-X do tórax e que os
doentes estejam alerta para a existência de sintomas como
dispneia que agrava com o esforço, toracalgias, tosse, he-
moptises e febre. Em casos é que é necessário tratamento,
podem ser utilizados corticoides para diminuir a inflamação.
Pretende-se que este efeito secundário não ocorra ou que
seja tratado para que, a longo prazo, não conduza a situa-
ções de fibrose pulmonar.
• Coração: Irradiar regiões que abranjam o coração poderá
aumentar os riscos de pericardite ou cardiomiopatia. O ris-
co de ocorrência de enfarte agudo do miocárdio no futuro
torna-se igualmente mais elevado.
• Mama: Para além da pele poder ficar localmente seca e irri-
tada, poderá igualmente haver alterações da sua coloração
e sensibilidade. Dor e linfedema são outros dos sintomas
possíveis de surgir a curto prazo. Não usar sutiã ou optar
por sutiãs de algodão e sem aro são medidas que podem
ajudar a prevenir a irritação cutânea. Evitar manipulação de
cargas é igualmente importante.
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 33

• Região pélvica: Com a irradiação deste local, é possível sur-


girem efeitos secundários que envolvam a bexiga, a vida se-
xual ou a fertilidade. Ao nível da bexiga, a radioterapia pode
causar urgência urinária, disúria e hematúria. É expectável
que estes sintomas se resolvam. No entanto, incontinência
urinária, cistite rádica ou a existência de fístulas são compli-
cações que podem surgir tardiamente. A adequada ingestão
de líquidos é bastante importante, bem como detetar e tra-
tar infeções a nível urinário. Dada a radioterapia poder di-
minuir a fertilidade, é essencial que se aborde esta temática
com as pessoas em idade fértil antes do início das sessões.
O impacto do cancro e da radiação na sexualidade pode fa-
zer com que tanto as mulheres como os homens deixem de
conseguir aproveitar em pleno a sua vida sexual. Enquanto
nas mulheres a radiação pode provocar prurido, secura, ar-
dor e estenose, tornando o sexo algo doloroso, nos homens
poderá causar alterações ao nível da ereção. Neste sentido,
e apesar de muitas vezes ainda ser um tema tabu, o papel
da oncosexologia é vital, de modo a abordar estratégias que
podem ser usadas no sentido de melhorar a vivência da se-
xualidade.

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NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 34

QUIMIOTERAPIA
Sara Costa
A quimioterapia é um tratamento de efeito sistémico, muito
utilizada para combater o cancro. Este tratamento baseia-se
no uso de compostos químicos, fármacos citotóxicos, que
têm a capacidade de retardar ou parar o crescimento das
células tumorais, impedindo a divisão celular ou ativando as
vias apoptóticas (Freire, 2014). Isto é, através de uma intera-
ção com o ADN, consegue provocar danos que as células
malignas não têm capacidade para gerir de forma tão eficaz
como as células saudáveis, ou por interferirem com a divisão
celular (Freire, 2014).
A quimioterapia consiste na utilização de substâncias quími-
cas com atividade citotóxica, com intuito de tratar pessoas
com doença oncológica.

Tipos de quimioterapia
A quimioterapia pode ser utilizada em combinação com a ci-
rurgia e a radioterapia. Segundo Freire (2014), de acordo com
a sua finalidade, a quimioterapia é classificada em:
• Indução – Quimioterapia de doses mais elevadas que se
utiliza quando se inicia um procedimento com intuito cura-
tivo, com o objetivo de remissão completa da neoplasia.
• Adjuvante – Quando é realizada após a cirurgia, tendo o
objetivo de destruir células residuais locais ou circulantes,
diminuindo a incidência de metástases à distância;
• Neoadjuvante – É realizada antes do tratamento cirúrgico,
para se obter a redução parcial do tumor, visando permitir
uma complementaridade terapêutica com a cirurgia e/ou
radioterapia;
• Paliativa/Metastática – Não tem qualquer finalidade curativa,
é utilizada com a finalidade de melhorar a qualidade de vida
do doente e aumentar a sobrevida do mesmo. Para isso, visa
reduzir a massa tumoral e os sintomas associados.
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 35

Mecanismo de ação
O ADN atua como um modulador na produção de formas
específicas de ARN transportador, ARN ribossómico e ARN
mensageiro e, deste modo, determina as enzimas a serem sin-
tetizadas pela célula. As enzimas são responsáveis pela maio-
ria das funções celulares e a interferência nesses processos
irá afetar a função e a proliferação tanto das células normais
como das neoplásicas. A maioria dos fármacos utilizados na
quimioterapia interferem, de algum modo, nesse mecanismo
celular (Caley & Jones, 2012). Segundo Vieira (2012), foi a par-
tir dessa definição que os quimioterápicos foram classifica-
dos conforme a sua atuação sobre o ciclo celular:
• Ciclo-inespecíficos – Aqueles que atuam nas células que
estão ou não no ciclo proliferativo, como, por exemplo, a
mostarda nitrogenada;
• Ciclo-específicos – Os quimioterápicos que atuam apenas
nas células que se encontram em proliferação, como é o
caso da ciclofosfamida;
• Fase-específicos – Aqueles que atuam em determinadas
fases do ciclo celular, como o metotrexato (fase S), o eto-
posido (fase G2) e a vincristina (fase M).
Ressalva-se que estas classificações não são absolutas, e
muitos medicamentos podem encaixar-se entre as catego-
rias citadas.

Principais classes de fármacos citotóxicos


Na quimioterapia existem vários fármacos citotóxicos. Além
da classificação através da atuação do fármaco no ciclo celu-
lar (Caley & Jones, 2012), também podem ser classificados de
acordo com as suas propriedades bioquímicas que condicio-
nam mecanismos de ação semelhantes (Caley & Jones, 2012;
Ryan et al, 2013).
As principais classes são:
• Agentes alquilantes – Consistem em cinco subgrupos:
mostardas nitrogenadas (ex.: ciclofosfamida, ifosfamida),
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 36

nitrosureias (ex.: lomustina), metilhidrazinas (ex.: procar-


bazina), derivados da platina (ex.: cisplatina, carboplatina,
oxaliplatina) e triazinas (ex.: bussulfano). Cada subgrupo
engloba diferentes tipos de compostos, com um mecanis-
mo de ação semelhante (Freire, 2014; Harvey & Khuri, 2018;
DeVita et al, 2018).
• Antimetabolitos – Podem-se dividir em três subgrupos:
antagonistas dos folatos (ex.: metotrexato), análogos das
purinas e análogos das pirimidinas (ex.: fluoruracilo (5-FU)
e a gencitabina) (Freire, 2014; Harvey & Khuri, 2018).
• Inibidores da topoisomerase I e II – Os fármacos inibidores
da topoisomerase I são o topotecano e o irinotecano. Os
inibidores da topoisomerase II são o etoposido e o tenipo-
sido (Freire, 2014; Harvey & Khuri, 2018).
• Antibióticos anti-tumorais – As antraciclinas são um dos
principais subgrupos desta classe, sendo que os principais
fármacos são a doxorrubicina, daunorrubicina, epirrubicina
e idarrubicina. Outros fármacos que também pertencem à
classe anti-tumoral são a actinomicina D, bleomicina e mi-
tomicina C (Freire, 2014; Harvey & Khuri, 2018).
• Citotóxicos que interferem com a tubulina – Existem
duas classes de fármacos que têm a capacidade de inter-
ferir com a função da tubulina, causando alterações na
célula: os alcalóides de vinca e os taxanos. Os alcalóides
de vinca englobam a vincristina e a vimblastina. Os taxa-
nos englobam o paclitaxel, o doxetaxel, o cabazitaxel e o
nab-paclitaxel (Freire, 2014; Harvey & Khuri, 2018).
Os antineoplásicos podem ser específicos para o ciclo celu-
lar quando têm o seu efeito numa fase particular do mesmo,
sendo mais eficazes em tumores com um grande número
de células em divisão, ou podem ser não específicos, tendo
uma maior eficácia contra células em repouso ou em divisão,
como indicado na figura seguinte (Caley & Jones, 2012).
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 37

Retirado de Freire, 2014.

Administração de quimioterapia
Existem vários tratamentos de quimioterapia diferentes, sen-
do que pode ser utilizado apenas um fármaco (monoterapia),
bem como a combinação de vários fármacos (poliquimio-
terapia). Normalmente, as neoplasias não respondem total-
mente à utilização de apenas um fármaco, pelo que a maioria
dos protocolos utilizados consistem na combinação de vários
citotóxicos de diferentes classes de antineoplásicos. Os pro-
tocolos são nomeados através de siglas que identificam os
agentes utilizados na combinação (ex.: EOF - Epirrubicina,
Oxaliplatina, 5-FU).
O uso de múltiplos agentes citotóxicos possibilita uma maior
eficácia para eliminar as células malignas, uma vez que atuam
em diferentes fases do ciclo celular, obtendo-se um efeito si-
nérgico, bem como uma diminuição da resistência aos fárma-
cos (Caley & Jones, 2012). Os fármacos que são escolhidos
para serem utilizados em combinação devem ser utilizados nas
suas doses e esquemas adequados. Os diferentes esquemas
terapêuticos, quer em monoterapia ou poliquimioterapia, têm
indicações específicas, ou seja, indicações que foram aprova-
das por entidades reguladoras e são recomendadas interna-
cionalmente por sociedades científicas com base nos resulta-
dos de ensaios clínicos.
Outro critério que se deve ter em conta na seleção do fár-
maco é a toxicidade do mesmo. Quando existem vários cito-
tóxicos da mesma classe disponíveis, o tratamento deve ser
escolhido de modo a não ultrapassar a toxicidade dos outros
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 38

fármacos que vão ser combinados. O facto de existir uma so-


breposição mínima de toxicidades leva a que embora se este-
ja sujeito a uma maior variedade de efeitos secundários, haja
uma diminuição do risco de efeitos letais por atingir o mesmo
órgão através dos diferentes fármacos (Freire, 2014).
A administração da quimioterapia é realizada em intervalos
regulares de tempo, designados como ciclos de tratamento.
Os ciclos de tratamento, a sua duração e a frequência são
determinados pelo médico, segundo o tipo de neoplasia e os
agentes antineoplásicos utilizados. Após o ciclo de tratamen-
to é necessário um período de descanso para que o organis-
mo recupere. A dose dos fármacos citotóxicos a administrar
é determinada com base na superfície corporal do doente. O
valor da superfície corporal é obtido a partir dos valores do
peso (kg) e da altura (cm), sendo expresso na unidade metro
quadrado (m2).
A quimioterapia pode ser administrada por diversas vias (Frei-
re, 2014), sendo a intravenosa e oral as mais frequentes:
• Via intravenosa – a via mais utilizada na quimioterapia. O
fármaco entra diretamente na veia, sob a forma de bólus
ou no soro;
• Via oral – administração de comprimidos, cápsulas e so-
luções orais;
• Via intramuscular – o fármaco é administrado diretamen-
te no músculo;
• Via intra-arterial – o fármaco é administrado diretamente
numa artéria;
• Via intra-vesical – o fármaco é administrado diretamente
na bexiga;
• Via subcutânea – a administração é feita no tecido subcu-
tâneo. Esta via está a ser cada vez mais utilizada, principal-
mente para administração de alguns tipos de terapêuticas
dirigidas;
• Via intratecal – a administração é feita através de uma
injeção de medicamentos no canal raquidiano;
• Via intrapleural – a administração é feita no espaço pleural;
• Via intraperitoneal – a administração é realizada na zona
do peritoneu (zona abdominal).
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 39

A utilização da via endovenosa/intravenosa pode ser feita me-


diante cateterização periférica, implantação de acesso venoso
central, total ou parcialmente implantado, e mais recentemen-
te os PICC (cateter central de inserção periférica). Na admi-
nistração da quimioterapia endovenosa, para além dos bólus
ou soros, podem ser utilizados os DIB (drug infusion balloon).
Estes infusores são dispositivos utilizados para a administração
contínua da quimioterapia por um tempo prolongado, sendo
que o fármaco vai sendo administrado lentamente. Este dispo-
sitivo permite um grande avanço na qualidade de vida e como-
didade dos doentes pois possibilita o uso no domicílio.
Durante a administração de quimioterapia há que manter a
vigilância constante do doente, pela possibilidade de ocorrer
extravasamento (infiltração acidental dos tecidos peri-vascu-
lares de um local de punção por agentes citotóxicos) (Fidalgo
et al, 2012) ou reações ao tratamento, descritas como rea-
ções infusionais. A maioria das reações infusionais são ligeiras
com sintomas como tremor, arrepios, febre, náuseas, cefa-
leias, rash ou prurido e rapidamente são revertidas quando
diagnosticadas atempadamente. Contudo, as reações infu-
sionais graves, embora raras, podem ser fatais, se não forem
adequadamente abordadas.

Efeitos secundários
Os citotóxicos, idealmente deveriam eliminar as células tu-
morais sem danificar os tecidos normais. No entanto, ao nível
da quimioterapia isso não é possível, pelo que os medica-
mentos existentes afetam, de alguma forma, as células ditas
normais. O sucesso da quimioterapia é baseado na maior so-
brevida das células saudáveis com relação às tumorais.
Os efeitos secundários variam consoante o medicamento a
ser utilizado, no entanto as toxicidades e efeitos secundários
mais frequentes e relevantes são:
• Hematológica – A toxicidade hematológica ocorre quando
o processo da hematopoiese é alterado pela administração
da quimioterapia. Os fármacos citotóxicos podem ter um
efeito direto ou indireto na medula. O efeito indireto ocor-
re quando estes atuam no microambiente medular ou nos
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 40

reguladores da hematopoiese. O efeito direto resulta numa


interação entre o fármaco e as células, ou com as células
precursoras que lhes dão origem (Freire, 2014). A maioria
dos fármacos citotóxicos tem a capacidade de afetar a me-
dula óssea (mielossupressores), bem como a sua funciona-
lidade, sendo a toxicidade hematológica um dos principais
efeitos adversos que ocorre como consequência da qui-
mioterapia (Barreto et al, 2014, citados em Freire, 2014).
• Neutropenia febril – A ocorrência de febre em doentes
submetidos a quimioterapia representa uma emergência
oncológica, visto que pode ser indicativa de neutropenia
febril (NF), o que representa uma grave complicação, cuja
mortalidade pode alcançar níveis superiores a 50% (Bor-
ges et al, 2013, citados em Ferreira et al, 2016). Na pre-
sença de febre são realizadas análises laboratoriais e, caso
seja verificada a contagem de neutrófilos inferior que 500/
mm3, ou diminuição para menor que 500 neutrófilos/mm3
nas próximas 48 horas, está confirmado o diagnóstico de
NF (Ferreira et al, 2016). Esta síndrome é considerada uma
emergência médica e deverá merecer atenção clínica ime-
diata para avaliação e administração de antibioterapia em-
pírica e de largo espetro (Atalaia et al, 2015).
• Cardiotoxicidade – A cardiotoxicidade pode ocorrer de for-
ma aguda, subaguda ou crónica, podendo surgir anos após
a conclusão do tratamento (Adão et al, 2013; Errante, 2017).
A toxicidade aguda encontra-se relacionada com a dose
cumulativa do tratamento. Os principais sintomas associa-
dos à cardiotoxicidade são dispneia, ortopneia, cansaço, fa-
diga, anorexia, distensão abdominal e diarreia (Adão et al,
2013, citados em Errante, 2017). O padrão de cardiotoxici-
dade das terapêuticas oncológicas é a cardiomiopatia rela-
cionada com as antraciclinas (doxorrubicina, epirrubicina e
idarrubicina) mas também é um efeito secundário caracte-
rístico da ciclofosfamida e ifosfamida, do 5-FU e capecitabi-
na e ainda do docetaxel e paclitaxel (Errante, 2017).
• Alopécia – Nem toda a quimioterapia provoca alopécia. A
alopécia pode ser total ou parcial e costuma acontecer uma
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 41

a duas semanas após o início da quimioterapia. Deve-se à


falta de produção ou fragilidade do cabelo provocada pela
interrupção abrupta da atividade mitótica da matriz capilar,
o que leva ao enfraquecimento capilar, causando a queda
durante o ato de pentear, de lavar ou de manusear o cabelo
(Reis & Gradim, 2018). A alopécia acentua-se, aproxima-
damente, um a dois meses após o início do tratamento e
com a continuidade do mesmo pode levar à alopécia total,
dependendo do tipo de protocolo quimioterápico, como,
por exemplo, no caso de tratamentos com antraciclinas.
• Mucosite – A mucosite é definida como lesões inflama-
tórias, erosivas e/ou ulcerativas da via oral e/ou gastroin-
testinal, originando um grave desconforto que pode pre-
judicar a capacidade dos doentes para comer, deglutir e
falar (Lopes et al, 2016). Estas lesões podem levar a uma
diminuição significativa da qualidade de vida, uma vez que
podem prolongar o tempo de internamento hospitalar, in-
fluenciar o estado nutricional do doente, aumentar o risco
de infeções e aumentar a prescrição de opioides (Curra et
al, 2018). Assim sendo, o tratamento da mucosite é extre-
mamente necessário, com o objetivo de aliviar os sintomas,
acelerar a reparação da mucosa e controlar eventuais infe-
ções. Como tratamento não farmacológico, o doente pode
ser instruído a reforçar uma boa higiene oral, privilegiar o
uso de escova de dentes de cerdas macias, utilizar elixir
sem álcool, manter a boca húmida e lábios hidratados.
• Náuseas e vómitos – A ocorrência e severidade das náu-
seas e vómitos associados à quimioterapia depende do tipo
de fármacos, da dose e combinação utilizadas e das carac-
terísticas do doente. Estes sintomas são angustiantes para o
doente, e podem também levar a desidratação, desequilíbrios
eletrolíticos, perda de peso e desnutrição (Clark-Snow et al,
2018). Além disso, por este motivo, pode ser necessário pro-
ceder a reduções de dose ou atrasar a quimioterapia, o que
pode ter um impacto negativo nos resultados do utente e na
sua qualidade de vida. Atualmente, as náuseas e vómitos in-
duzidos pela quimioterapia e, em particular, os vómitos, po-
dem ser evitados em 65% a 85% dos doentes (Navari & Aapro,
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 42

2016, citados em Clark-Snow et al, 2018). Como medidas não


farmacológicas, o doente pode ser instruído a evitar odores
fortes, como o cheiro a cozinhados e evitar alimentos ricos
em gorduras ou carnes vermelhas. As bebidas gaseificadas
podem aliviar sintomas em alguns doentes, no entanto exis-
tem relatos de maior desconforto com estas bebidas.
• Obstipação e diarreia – A obstipação e diarreia induzidas
por quimioterapia apresentam um desafio constante no tra-
tamento eficiente e tolerável do cancro e são dos princi-
pais efeitos que contribuem para reduções de dose, atrasos
e cessação dos tratamentos. A diarreia associada à quimio-
terapia, persistente e grave, está correlacionada com des-
nutrição e desidratação significativas, resultando em perda
de peso concomitante (caquexia), fadiga, insuficiência renal,
hemorroidas e rutura da pele perianal (Mitchell, 2006; Shafi
& Bresalier, 2010, citados em McQuade et al, 2016). Segun-
do Freire (2014), o tratamento da diarreia passa por medi-
das não farmacológicas e farmacológicas. As medidas não
farmacológicas consistem em adotar uma dieta pobre em
fibra (evitar alimentos como frutas e vegetais), evitar alimen-
tos que exacerbam a diarreia, que irritem ou estimulem o
peristaltismo, como por exemplo comidas muito condimen-
tadas, laticínios, entre outros. É também essencial o aumen-
to da ingestão hídrica. Farmacologicamente, deve-se utili-
zar medicação antidiarreica. A obstipação define-se como
uma situação de dejeções pouco frequentes, durante mais
de três dias. A obstipação pode provocar dor abdominal e
desconforto, diminuindo a qualidade de vida do doente. O
tratamento da obstipação consiste em privilegiar uma dieta
rica em fibra (verduras, frutas) e em aumentar a ingestão hí-
drica, bem como adotar a administração de laxantes e ene-
mas (Freire, 2014).
• Neuropatia periférica – A neuropatia periférica trata-se
de uma deterioração no sistema nervoso periférico (SNP),
isto é, uma degeneração nos nervos que transmitem in-
formações do sistema nervoso central (SNC) para o resto
do corpo, além de conduzir a sensibilidade do organismo
para o SNC. A neuropatia periférica desvirtua e pode cessar
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 43

as informações recíprocas entre o SNC e as extremidades


do organismo (Afonseca et al, 2010, citados em Costa et al,
2015). A neuropatia periférica induzida pela quimioterapia
antineoplásica é um evento adverso que ocorre em apro-
ximadamente 38% dos pacientes que recebem tratamento
com múltiplos medicamentos, embora essa percentagem
varie consoante os fármacos utilizados, a dose, a duração
da exposição, as co-morbilidades e a associação com ou-
tros tratamentos (cirurgia, radioterapia, etc.) (Caponero et
al, 2016).
• Fadiga – A fadiga é um sintoma comum. A causa da fadiga
pode ser relacionada com anemia, muitas vezes provoca-
da por certos fármacos quimioterapêuticos que afetam a
medula óssea. Esta situação pode ter necessidade se ser
tratada com suplementos de ferro e transfusões de glóbu-
los rubros. Como tratamento não farmacológico pode ser
reforçada uma dieta rica em ferro, exercício ligeiro regular-
mente (diversas vezes por semana), repouso em tarefas da
atividade de vida diária e evitar bebidas com cafeina à noite.

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NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 45

TERAPÊUTICAS-ALVO
Inês Frade

Definição e Classificação
Por terapêuticas-alvo designam-se os fármacos que “de-
tetam” e “destroem” seletivamente as células cancerígenas,
preservando as células saudáveis. Esta terapêutica direcio-
nada tem vindo a ganhar cada vez mais importância devi-
do à sua especificidade em relação às células cancerígenas,
minimizando a toxicidade e os efeitos adversos indesejáveis​​
causados aos
​​ tecidos normais, proporcionando uma maior
qualidade de vida ao doente (Padma, 2015).
Ao contrário da quimioterapia citotóxica tradicional (que exer-
ce os seus efeitos danificando o ADN de praticamente qual-
quer célula), esta forma de tratamento bloqueia o crescimento
e disseminação do cancro, interferindo com moléculas espe-
cíficas envolvidas no crescimento e progressão do tumor, a
nível intra e extracelular das células cancerígenas, através da
identificação de alvos específicos, como recetor dos seus efei-
tos (Malinowsky et al, 2011; Cancer Council, 2018). “A terapia
direcionada envolve fármacos que bloqueiam a proliferação de
células cancerígenas, promovem a regulação do ciclo celular
ou induzem a apoptose ou autofagia e direcionam o forneci-
mento de substâncias tóxicas especificamente para as células
cancerígenas para as destruir” (Padma, 2015, p.1).
Cada tipo de terapêutica direcionada atua num alvo molecu-
lar específico do tumor. As mais comuns são as que têm por
base uma mutação/alteração presente no tumor tornando-o
assim mais sensível a um determinado tratamento.
Os biomarcadores são parâmetros que fornecem informação
da composição genética do doente e mostram se este possui
o gene ou a via alvo da terapia direcionada. Os biomarcadores
prognósticos proporcionam informação sobre o prognóstico
do doente, independentemente do tratamento, e os biomarca-
dores preditivos estão relacionados com os efeitos de um tra-
tamento específico e permitem identificar quais os doentes que
irão responder ou beneficiar de um tratamento em particular.
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 46

Os dois principais grupos de fármacos são os anticorpos mo-


noclonais e os inibidores de pequenas moléculas, que se en-
contram explicitados na tabela 1 (Cancer Council, 2018).
Tabela 1. Principais grupos e agentes das terapêuticas-alvo (adaptado de
Cancer Council, 2018).

anticorpos monoclonais
Anticorpos sintéticos que bloqueiam uma proteína na superfície das célu-
las ou tecidos adjacentes, para interferir no crescimento ou sobrevivência
das células cancerígenas. Podem ser classificados como terapia direcio-
nada ou imunoterapia, dependendo do tipo de anticorpo monoclonal.
Exemplos de anticorpos monoclonais das terapêuticas-alvo incluem:
Inibidores da angiogénese
Têm o objetivo de reduzir o suprimento de sangue a um tumor, para re-
tardar ou impedir o seu crescimento, sendo um exemplo o bevacizumab.
Agentes direcionados para HER2
O HER2 (human epidermal growth factor receptor 2) é uma proteína que
faz com que as células cresçam de forma incontrolável. Estes fármacos
destroem as células cancerígenas HER2 positivas ou reduzem a sua ca-
pacidade de se dividir e crescer. Exemplos incluem trastuzumab e per-
tuzumab (usados para tratar cancro da mama positivo para HER2).
Anticorpos monoclonais anti-CD20 (contra o antigénio CD20)
Visam uma proteína chamada CD20 encontrada em algumas leucemias
de células B e linfomas não-Hodgkin. São exemplos o rituximab e o
obinutuzumab.
inibidores de pequenas moléculas
Terapêuticas que podem entrar nas células cancerígenas e bloquear certas
enzimas e proteínas que estimulam o crescimento tumoral. Exemplos de
inibidores de pequenas moléculas incluem:
Inibidores da tirosina quinase
Impedem as enzimas tirosina quinases de enviar sinais às células cancerí-
genas para crescerem, se multiplicarem e se propagarem. Sem este sinal,
as células cancerígenas morrem. Exemplos incluem erlotinib, sunitinib,
lapatinib, pazopanib, sorafenib e ibrutinib.
Inibidor de mTOR (proteína alvo da rapamicina nos mamíferos)
mTOR é uma enzima que estimula as células cancerígenas a crescerem e
a propagarem-se, e estes agentes bloqueiam a mTOR. O everolímus é um
dos exemplos desta classe, um inibidor de mTOR que está indicado para
o tratamento de alguns tipos de cancro renal e cancro da mama avança-
do e tumores neuroendócrinos de origem pancreática e gastrointestinal.
Inibidores de PARP
Suspendem a proteína PARP [poly(ADP-ribose) polymerase] de reparar o
ADN danificado das células cancerígenas. O olaparib, por exemplo, é um
inibidor de PARP e está aprovado para o tratamento de alguns cancros do
ovário, trompas de Falópio, peritoneal, mama e pâncreas, na maioria das
situações se mutação BRCA1/2.
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 47

As terapêuticas-alvo são utilizadas mediante a alteração/mu-


tação no tumor e podem ser administradas isoladamente ou
em conjunto com quimioterapia ou outros tratamentos utili-
zados no tratamento de doenças oncológicas (Padma, 2015).

Possíveis efeitos adversos


Embora a terapia direcionada minimize o dano das células
saudáveis, podem verificar-se efeitos secundários que variam
de doente para doente, dependendo do fármaco e da res-
posta do organismo. As terapêuticas-alvo têm um perfil de
segurança diferente das outras terapêuticas anti-neoplásicas,
como a quimioterapia e a hormonoterapia. Os efeitos adver-
sos podem começar poucos dias após o início do tratamen-
to, mas mais frequentemente ocorrem semanas ou até me-
ses depois e podem durar desde semanas a meses (Cancer
Council, 2018). A terapêutica-alvo frequentemente causa
reações cutâneas, por isso o uso de protetor solar e emolien-
tes/cremes hidratantes é recomendado. As reações podem
caracterizar-se como, por exemplo:
• Sensibilidade à luz solar (fotofobia), vermelhidão, edema,
pele seca e escamosa, prurido;
• Erupção cutânea acneiforme no rosto, couro cabeludo ou
parte superior do corpo;
• Reações cutâneas nas palmas das mãos e região plantar,
causando sensibilidade e flictenas. Estas reações cutâneas
podem ser mais severas ou durar mais do que com outros
tipos de tratamento, e podem carecer da administração de
anti-histamínico ou aplicação tópica de corticosteroides
(Cancer Council, 2018).
Outros efeitos adversos comuns incluem febre, cansaço, do-
res nas articulações, náuseas, cefaleias, diarreia, hemorragia,
hematomas e hipertensão. Menos frequentemente, algumas
terapêuticas direcionadas podem afetar o funcionamento
cardíaco, tiroideu, hepático ou aumentar o risco de infeção
(Cancer Council, 2018).
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 48

Implicações para a prática de enfermagem


As terapêuticas-alvo são um tratamento atual e em evolução
para diversos tipos de cancro, estando a crescer de forma
contínua e extremamente rápida.
Os enfermeiros devem, então, conhecer e procurar uma atua-
lização constante sobre as diferentes categorias das terapias-
-alvo, bem como a sua farmodinâmica e efeitos secundários,
para sustentar uma prática de enfermagem segura e baseada
na evidência, ao cuidar de doentes sob estes tratamentos. Na
práxis, é essencial ensinar os doentes a reportarem precoce-
mente a ocorrência de efeitos secundários, de modo a mini-
mizá-los e otimizar o seu tratamento. Se não forem tratados,
os efeitos adversos podem tornar-se graves e o tratamento
pode ter que ser interrompido (Cancer Council, 2018). Im-
porta ainda compreender que estes fármacos podem inte-
ragir com diversos medicamentos comuns e causar efeitos
secundários prejudiciais (Cancer Council, 2018).

Imunoterapia
“Num organismo saudável, o sistema imunitário tem meca-
nismos reguladores internos que permitem identificar células
anormais que precisam ser atacadas enquanto protegem os
tecidos saudáveis” (Bayer et al, 2017, p. 13). A Imunoterapia
constitui uma abordagem ao tratamento do cancro, desen-
volvida com base na fisiopatologia do sistema imunitário e
consiste na utilização de fármacos que estimulam o próprio
sistema imunitário do doente, para identificar células cance-
rígenas anormais e combater diversos tipos de cancro, en-
quanto as células saudáveis não são danificadas (Farkona et
al, 2016; Bayer et al, 2017; Boseki et al, 2018).
As opções de Imunoterapia para o tratamento de doenças
oncológicas continuam a evoluir, oferecendo respostas du-
radouras e com menos toxicidade, beneficiando o aumento
da sobrevivência das pessoas com doença oncológica (Bec-
ze, 2017; Boseki et al, 2018). Pela sua eficácia e seletividade a
imunoterapia tem uma relação risco-benefício mais favorável
que a quimioterapia convencional, pelo que atualmente já é
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 49

utilizada como primeira linha, contudo nem todos os doentes


são elegíveis para este tipo de tratamento. Estas terapêuti-
cas tornam-se cada vez mais comuns como agente único ou
multimodal, prestando os enfermeiros cuidados a um núme-
ro crescente de doentes que recebem imunoterapia (Becze,
2017; Boseki et al, 2018). Esta realidade implica que os enfer-
meiros detenham um conhecimento cada vez mais profundo
das categorias e agentes imunoterapêuticos, mais especifica-
mente sobre os seus mecanismos de ação, indicações de tra-
tamento, princípios de administração, toxicidades ou efeitos
adversos, bem como gerir os seus efeitos secundários, para
que fomentem uma prestação de cuidados seguros, efeti-
vos e baseados na evidência, aos doentes sob Imunoterapia
(Bayer et al, 2017; Becze, 2017). Os agentes de imunoterapia
são atualmente classificados em quatro categorias principais.

Inibidores de checkpoint
Algumas células cancerígenas prosperam evitando os pon-
tos de controle inatos do organismo que normalmente ata-
cam as células malignas (Becze, 2017). Os inibidores de che-
ckpoint evitam que as células cancerígenas usem essas vias,
sinalizando-as para serem destruídas pelas células T ativadas
(Becze, 2017). Relacionado com a exacerbação da respos-
ta inflamatória provocada pelo sistema imunitário, as célu-
las saudáveis podem ser afetadas, levando a efeitos adversos
em vários sistemas (Bayer et al, 2017). Embora a maioria das
toxicidades possa ser tratada com a administração de cor-
ticosteroides, algumas podem exigir outros tratamentos e
hospitalização emergentes (Boseki et al, 2018). Na tabela 2
encontram-se descritos exemplos de fármacos inibidores de
checkpoint e respetivas indicações, bem como os seus efei-
tos secundários.
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 50

Tabela 2. Inibidores de checkpoint (adaptado de Bayer et al, 2017)

Principais efeitos
Fármacos Principais indicações
secundários
Erupção cutânea,
prurido, diarreia (colite),
hepatite, endocrinopatias,
Ipilimumab Melanoma
neurotoxicidade,
pancreatite, toxicidade
hematológica
Cancro do pulmão de
células não pequenas, Diarreia (colite), hepatite,
Nivolumab melanoma, carcinoma de endocrinopatias,
células renais, linfoma de pneumonia, pancreatite
Hodgkin
Cancro do pulmão de
células não pequenas, Vitiligo, hepatite,
melanoma metastizado, endocrinopatias,
Pembrolizumab
carcinoma de células pneumonia, pancreatite,
escamosas de cabeça e diarreia (colite)
pescoço
Cancro da bexiga, Fadiga, náusea, perda de
cancro do pulmão de apetite, prurido, erupção
Atezolizumab
não pequenas células cutânea, diarreia (colite),
metastizado endocrinopatias
Cancro gástrico,
Trombocitopenia,
colorretal, cancro
cefaleias, hipertensão,
Ramucirumab do pulmão de não
diarreias, edemas
pequenas células
periféricos
metastizado
Pneumonia, anemia,
diminuição do apetite,
cefaleia, hipertensão,
Daratumumab Mieloma múltiplo
dispneia, alterações
gastro-intestinais, fadiga,
artralgias
Pneumonite, pneumonia,
Cancro pulmão não tosse, hipotiroidismo,
Durvalumab
pequenas células diarreia, erupções
cutâneas, prurido, pirexia

• Cuidados de enfermagem: Os inibidores de checkpoint


têm apresentado um novo desafio aos enfermeiros que
cuidam dos doentes que recebem estes tratamentos, de-
correntes dos efeitos secundários por si causados (Bayer
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 51

et al, 2017). As reações variam de doente para doente, com


intensidade e duração variáveis consoante a imunoterapia
administrada. Em tratamentos combinados o risco de efei-
tos adversos é superior. Os efeitos adversos podem ocor-
rer a qualquer momento durante o tratamento e a dete-
ção precoce (por meio de avaliação física, psicológica e
comportamental e testes laboratoriais) e o seu tratamento
imediato são fundamentais (Bayer et al, 2017). Fazem par-
te da boa prática de cuidados de enfermagem educar os
doentes sobre as potenciais toxicidades esperadas, instruir
os doentes a reportarem de imediato o aparecimento de
efeitos secundários e ensinar sobre os cuidados gerais a ter
para evitar infeções, tais como uma boa higiene das mãos,
hidratação, práticas sexuais seguras e integridade cutânea.
(Bayer et al, 2017; Becze, 2017). “Os pacientes devem estar
ainda informados sobre os alimentos e bebidas que podem
exacerbar os sintomas gastrointestinais e evitá-los” (Bayer
et al, 2017, p.15).

Células T CAR
O tratamento com células T CAR (de Chimeric Antigen Re-
ceptor - Recetor Antigénico Quimérico) utiliza o reconhe-
cimento do antigénio específico do tumor, sendo os CARs
recetores sintéticos, geneticamente modificados, com capa-
cidade de reconhecer o antigénio específico do tumor para
atacar as células alvo (Bayer et al, 2017; Becze, 2017).
“Com a terapia CART-19, o cluster de diferenciação 19 é o
antigénio alvo” (Bayer et al, 2017, p. 15). Os linfócitos T são
colhidos do doente, modificados geneticamente, resultando
nas células T expressando o CAR que reconhece o antigénio
CD19 da célula B e posteriormente são infundidas no doente
(Bayer et al, 2017). Está principalmente indicado para a leu-
cemia linfoblástica aguda (recidivante ou refratária) e linfoma
das células B (Bayer et al, 2017). Como o CD19 é expresso na
célula B normal, a terapia com CART-19 erradica as células B
não malignas além das células cancerígenas, resultando no
efeito colateral esperado da aplasia das células B, que resulta
em hipogamaglobulinemia (Bayer et al, 2017). Outras reações
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 52

adversas podem ocorrer, como a síndrome de libertação de


citoquinas, a síndrome de lise tumoral, febre, mialgias, fadiga,
náusea e cefaleias; hipotensão e extravasamento capilar em
casos mais graves e outras neurotoxicidades em casos mais
severos, incluindo convulsões e encefalopatia (Bayer et al,
2017; Becze, 2017; Boseki et al, 2018).
• Cuidados de enfermagem: “Os cuidados de enfermagem
incluem a administração de pré-medicações, monitoriza-
ção de sinais vitais pré e pós-infusões de células T e mo-
nitorização de reações alérgicas” (Bayer et al, 2017, p. 15).
Vigiar e detetar precocemente a ocorrência de efeitos se-
cundários e complicações após a infusão de células T CAR
inclui avaliação física e a vigilância da febre, infeção, dor,
náusea, fadiga e outros efeitos adversos (Bayer et al, 2017).

Anticorpos monoclonais
Estes fármacos podem ser reconhecidos pelo sufixo “-mab”
no nome genérico. Têm a capacidade de agir como um anti-
corpo produzido naturalmente pelo organismo, mas são cria-
dos para atingir um antigénio específico, com o objetivo de
destruir células cancerígenas, através de vários mecanismos
de ação (Bayer et al, 2017; Becze, 2017). Embora uma rea-
ção aguda à infusão seja rara, quando ocorre, a sua gravidade
pode variar entre febre e anafilaxia e na sua maioria pode ser
tratada com corticosteroides (Becze, 2017).
• Cuidados de enfermagem: Os doentes devem ser infor-
mados que as reações adversas podem estar mascara-
das como sintomas comuns, que podem não se associar
com o tratamento e não podem ser ignorados (Bayer et
al, 2017). A maioria dos sintomas não se resolvem espon-
taneamente e devem ser tratados rapidamente para evitar
efeitos adversos mais graves e os doentes devem ser ins-
truídos a relatarem prontamente efeitos secundários, que
na maioria dos casos são tratados com corticosteroides
(Bayer et al, 2017; Becze, 2017). A prevenção de infeções é
fundamental, porque o sistema imunitário pode facilmente
ficar comprometido, dependendo do mecanismo de ação
do anticorpo monoclonal (Becze, 2017). Neste sentido, os
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 53

doentes devem ainda ser instruídos sobre os cuidados a


ter para prevenir infeções, tais como uma correta higiene
das mãos (Bayer et al, 2017). Os enfermeiros envolvidos na
administração de anticorpos monoclonais devem utilizar
equipamento de proteção individual ao manusear e admi-
nistrar estes fármacos.

Imunoterapia viral oncolítica


Consiste em vacinas que estimulam as células T, para que es-
tas reconheçam e atuem contra tipos específicos de cancro
ou induzindo a produção de anticorpos que se ligam a molé-
culas na superfície das células cancerígenas, causando morte
tumoral (Bayer et al, 2017; Boseki et al, 2018). “Estas vacinas
são compostas por células cancerígenas enfraquecidas ou
mortas que carregam um antigénio específico de determina-
do cancro ou uma célula imune que é modificada para agir
como um antigénio” (Boseki et al, 2018, p.7). Envolvem qua-
tro mecanismos de ação: resposta dos recetores de células
virais, libertação de citoquinas, replicação nuclear e resposta
imune extracelular (Bayer et al, 2017). O fármaco sipuleucel-T
(Provenge®) está indicado para o tratamento do cancro da
próstata metastático resistente e o talimogene laherparepvec
(Imlygic®) está indicado para o tratamento do melanoma me-
tastático (Bayer et al, 2017; Boseki et al, 2018).
Os efeitos secundários mais comuns destas terapêuticas são
respostas inflamatórias no local da injeção, como eritema,
dor, edema, calor, erupção cutânea e prurido. Outros even-
tos adversos potenciais incluem sintomas semelhantes aos
da gripe, febre baixa, náusea, vómito, mialgia, cefaleias e fa-
diga. Existe o risco de uma reação de hipersensibilidade e esta
deve ser considerada uma situação de emergência (Boseki et
al, 2018).
• Cuidados de enfermagem: As questões de segurança são
fundamentais, salientando-se a utilização de equipamen-
tos de proteção individual (luvas e batas) na manipulação
destes fármacos e a necessidade de descartar o material de
penso ​​e os sujos em recipientes de risco biológico (Bayer
et al, 2017; Becze, 2017). “Em algumas instituições é reco-
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 54

mendado que os doentes que recebem esta terapêutica se-


jam colocados em isolamento de contato pós-injeção para
minimizar o risco de transmissão de infeção viral” (Bayer et
al, 2017, p.19). É fundamental a educação do doente e do
cuidador para evitar a infeção cruzada. Os doentes devem
ainda evitar o contato com indivíduos imunodeprimidos,
incluindo crianças pequenas, adultos mais velhos e mulhe-
res grávidas (Becze, 2017).

Implicações para a prática de enfermagem


Considerando as complicações altamente exclusivas e poten-
cialmente fatais associadas à Imunoterapia, deter um profun-
do conhecimento sobre o mecanismo de ação dos agentes é
essencial para determinar os riscos potenciais, minimizar os
efeitos secundários e para prestar cuidados de enfermagem
seguros e efetivos (Wiley et al, 2017). “O papel mais impor-
tante dos enfermeiros na evolução da imunoterapia são a ad-
ministração segura desses agentes e a educação do doente”
(Bayer et al, 2017 p.20). Os efeitos adversos da Imunoterapia
são diferentes dos efeitos da quimioterapia tradicional. Em
todos os contactos com os doentes é importante reforçar
que é fulcral as pessoas reportarem de imediato o apareci-
mento de efeitos secundários e que não devem tentar tratar
estes efeitos autonomamente, para que possam ser tratados
com sucesso. Os padrões de segurança da administração de
quimioterapia existentes devem ser aplicados à administração
da Imunoterapia em todos os contextos (Wiley et al, 2017).
Finalmente, importa ainda compreender as principais limita-
ções e constrangimentos das imunoterapias atuais, as quais
englobam, entre outros aspetos, a heterogeneidade tumoral,
a toxicidade com terapias combinadas, os elevados custos e
o microambiente tumoral (Attarian et al, 2017).
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 55

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NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 56

HORMONOTERAPIA
Joana Araújo
A produção hormonal cada vez mais se tem correlacionado
com a etiologia e crescimento de certos tumores malignos
(incluindo ginecológicos, tiroideus, pancreáticos, gastroin-
testinais, melanomas e meningiomas). A constatação de que
a administração ou subtração de hormonas poderia interferir
no crescimento de alguns tumores ocorreu em 1896, quando
Beatson usou a ooforectomia para tratar o cancro da mama,
induzindo deste modo a regressão tumoral pela privação de
estrogénios (Costa et al, 2005).
Existe evidência de que as hormonas contribuem para o
crescimento tumoral, relacionando-se, essencialmente, com
hormonas esteroides sexuais que influenciam o desenvolvi-
mento de cancro em órgãos alvo, nomeadamente os estro-
génios e as progestinas no cancro de mama e endométrio e
os androgénios no cancro da próstata.
O objetivo principal da hormonoterapia, de forma geral, é
diminuir o nível em circulação da hormona que promove o
crescimento tumoral ou bloquear a sua ligação com os rece-
tores da célula tumoral. Ambos podem resultar em regressão
tumoral como resposta à redução da proliferação do número
de células hormono-dependentes e da indução da morte ce-
lular (apoptose).
A terapêutica endócrina parece funcionar através de mecanis-
mos citostáticos em vez de citotóxicos, pelo que, no geral, os
efeitos secundários estão confinados aos órgãos alvo dessa te-
rapêutica, resultando em poucos efeitos secundários fora des-
ses órgãos. Isto explica a tolerância elevada deste tratamento
quando comparado com a quimioterapia citotóxica. Para além
disso, a resposta tumoral ao tratamento pode ser duradoura,
mesmo em casos de doença avançada. Todavia, alguns tipos
de cancro em órgãos hormono-dependentes são resistentes
à terapia endócrina, seja num estadio inicial ou numa recidiva
da doença, tornando-se, progressivamente, menos responsivos
durante o decurso do tratamento e progressão da doença.
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 57

Tipos de terapia endócrina


• Ablação das glândulas endócrinas
A maioria das hormonas sexuais em homens e mulheres em
pré-menopausa são sintetizadas nas gónadas. A castração di-
minui a circulação de testosterona nos homens em 95% e a
circulação de estrogénio nas mulheres que se encontram na
pré menopausa em 60% (relativamente aos níveis na fase fo-
licular). Esta diminuição produz benefícios clínicos em cerca
de 80% dos homens com cancro de próstata metastático e
em cerca de 30 a 40% em mulheres pré-menopáusicas com
cancro da mama avançado.
Na fase pós-menopausa a ooforectomia não é benéfica pois,
nesta fase, a produção de estrogénio já é diminuta. Outras
cirurgias, como a hipofisectomia e adrenalectomia, têm sido
usadas em mulheres que se encontram em pós-menopau-
sa com cancro de mama avançado, pois a glândula supra-
-renal constitui uma fonte de produção de estrogénio nesta
fase. Estas cirurgias produzem efeitos benéficos em cerca de
um terço dos casos, mas os procedimentos acarretam uma
morbilidade significativa e, não sendo específicos, removem
a produção de outras classes hormonais, para além dos este-
róides sexuais.

Terapêutica Ablativa
Resseção ou destruição da função ovárica
Ooforectomia através de cirurgia ou radioterapia
Orquidectomia Resseção testicular
Técnica cirúrgica para abolição completa
Suprarenalectomia de esteroides sexuais em doentes
previamente castrados
Destruição da função hipofisária por
Hipofisectomia cirurgia, radioterapia, crioterapia e
ultrassons

• Agonistas/doses suprafisiológicas hormonais


A hormona luteinizante (LH) e a hormona folículo-estimulan-
te (FSH), duas gonadotrofinas, estimulam as gónadas a pro-
duzirem hormonas esteróides. Por sua vez, a sua síntese e
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 58

libertação da hipófise são regulados pelo fator hipotalâmico


GnRH (ou LHRH). Análogos agonistas altamente potentes de
GnRH têm sido sintetizados ao introduzir aminoácidos dife-
rentes no péptido nativo. Quando administrados por curtos
períodos causam uma rápida libertação de gonadotrofinas,
contudo, a longo prazo, esses agonistas levam a uma des-
sensibilização dos receptores da hipófise. Como resultado, os
níveis de gonadotrofinas em circulação são reduzidos e os
níveis de hormonas sexuais descem para níveis semelhantes
à castração. Formulações de depósito de agonistas de LHRH
estão disponíveis, para que uma única injeção possa man-
ter supressão clínica durante períodos prolongados. O uso
de análogos de GnRH em mulheres pré-menopáusicas com
cancro de mama e homens com cancro da próstata produziu
efeitos antitumorais equivalentes à castração cirúrgica.
A utilização de doses farmacológicas de hormonas esterói-
des, como o estrogénio, progesterona e androgénio, consti-
tuem um mecanismo similar de ação que sustenta a resposta
observada em tumores hormono-dependentes.
• Inibição de enzimas produtoras de esteróides
Esta abordagem é ilustrada pelos inibidores da atividade da
aromatase. Esta enzima converte andrógenios em estrogé-
nios, que constitui o último passo da cascata sintética. É a
principal fonte de estrogénio na fase da pós-menopausa na
mulher. A sua inibição representa o método de bloqueio da
produção de estrogénio mais específico, porque a sua bios-
síntese pode ocorrer em tecidos não endócrinos, como o te-
cido adiposo, e em certos tumores malignos (particularmente
em mulheres pós-menopáusicas).
Os inibidores da aromatase têm o potencial de suprimir os
níveis de estrogénio além daquele alcançável por adrenalec-
tomia, e foram desenvolvidos dois tipos:
Inibidores esteróides ou do tipo I ­– interferem na fixação do
substrato de andrógeno para o local catalítico;
Inibidores não esteroides do tipo II – interferem com a enzi-
ma do citocromo P450.
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 59

Os inibidores iniciais do tipo II, como a aminoglutetimida, não


eram potentes nem específicos, provocando a inibição de ou-
tras enzimas metabolizantes de esteróides e que tinham um
grupo prostético similar ao citocromo P450, de modo que a
terapia de reposição de esteróides era necessária. A atual gera-
ção de fármacos triazólicos (anastrozol, letrozol) é 2000 vezes
mais potente que a aminoglutetimida e possui uma afinidade
diferencial em relação ao citocromo P450 da aromatase, com
uma inibição altamente seletiva da biossíntese de estrogénio.
Estes fármacos podem reduzir o nível de estrogénio circulante
em mulheres na fase pós-menopáusica para níveis indetectá-
veis sem influenciar outras hormonas esteróides.
Entre os inibidores do tipo I, pensa-se que o exemestano atua
como um inibidor de “suicídio”, bloqueando a aromatase ir-
reversivelmente através do seu próprio metabolismo em in-
termediários ativos pela enzima. A biossíntese do estrogénio
só pode ser retomada quando as moléculas de aromatase são
sintetizadas de novo.
Da mesma forma, a conversão de precursores de esteróides
supra-renais em andrógenios é catalisada pela enzima cito-
cromo P450 17A1 (CYP17A1). Esta enzima é expressa não só
nas gónadas, mas também em outros tecidos, incluindo a
próstata. A inibição do CYP17A1 pela abiraterona resulta numa
redução significativa dos níveis de andrógenios no cancro de
próstata resistente à castração cirúrgica. Os efeitos adversos
mais comuns, associados ao aumento dos níveis de minera-
locorticoides, incluíram hipocaliemia, retenção de líquidos e
hipertensão. Estes eventos foram reduzidos em grande parte
pela administração concomitante de doses baixas de predni-
solona.
• Antagonistas de hormonas esteróides
Estes agentes bloqueiam os efeitos mediados por hormonas,
geralmente ao nível dos seus receptores. Têm sido desen-
volvidos antagonistas de estrogénios, progestinas e androgé-
nios. A experiência mais extensa diz respeito ao uso do tamo-
xifeno (com ação anti-estrogénica) no tratamento do cancro
de mama, com respostas mais eficazes em tumores que são
estrogen-receptor (ER) positivos.
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 60

O tamoxifeno bloqueia parcialmente as ações tróficas do es-


trogénio e pode demonstrar atividade agonista parcial, espe-
cialmente quando os estrogénios endógenos estão baixos.
Isto explica os seus efeitos protetores contra a osteoporose,
mas, também, a estimulação indesejada da proliferação en-
dometrial que pode causar pólipos e o desenvolvimento de
cancro do endométrio.
Fármacos com ação anti-estrogénica “puros” mais poten-
tes foram desenvolvidos, como o fulvestrant, que bloqueia
completamente a atividade transcricional do ER. Este medi-
camento produz respostas clínicas em alguns pacientes com
cancro de mama resistentes ao tamoxifeno.
No âmbito dos anti-androgénios, como a flutamida e a bi-
calutamida, estes possuem eficácia clínica no tratamento do
cancro prostático.
• Terapia hormonal de agente único vs. terapia combinada
Da mesma forma que a quimioterapia combinada se mos-
trou mais eficaz do que a quimioterapia de agente único em
diversos tipos de cancro, é possível presumir que os trata-
mentos hormonais combinados produzam, de igual modo,
melhores taxas efetivas de resposta. De facto, para a maioria
das combinações hormonais, a toxicidade é aumentada, sem
melhoria no resultado do tratamento, existindo exceções a
esta regra.

Resistência à terapia hormonal


O conceito de resistência à terapia hormonal, segundo as
orientações da ESO-ESMO (2014) pode ser primária (em que
existe recorrência nos 2 anos após o inicio da hormonotera-
pia adjuvante ou progressão em menos de 6 meses de hor-
monoterapia paliativa) ou secundária (em que a recorrência
existe após 2 anos do inicio da hormonoterapia adjuvante,
recorrência no primeiro ano após o fim da hormonoterapia
adjuvante ou progressão doença após 6 meses da hormono-
terapia paliativa).
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 61

Síntese
Como opções de tratamento de terapia hormonal temos:
• Castração (cirúrgica ou clínica).
• Bloqueio da via sintética (por exemplo, inibição da aromatase).
• Bloqueio do receptor de esteroides.
• Terapia combinada.
Cancro de mama
Para doentes cuja menopausa ainda não teve início (doen-
tes na pré-menopausa), os tratamentos mais comuns são o
tamoxifeno isolado durante 5 a 10 anos ou a combinação de
ooforectomia bilateral ou um fármaco da família análoga da
hormona libertadora de gonadotropina mais tamoxifeno du-
rante 5 anos.
Em doentes tratados com tamoxifeno, pode ser considerado
o switch para o inibidor de aromatase após 2 a 3 anos.
O tamoxifeno aumenta ligeiramente o risco de eventos trom-
boembólicos e deve ser interrompido se estiver planeada uma
intervenção cirúrgica.
O tamoxifeno associado ao inibidor da aromatase não é be-
néfico em relação ao inibidor da aromatase sozinho na doen-
ça avançada ou como terapia adjuvante.
Os doentes tratados com inibidores de aromatase têm um
risco mais elevado de desenvolverem osteoporose (esta deve
ser contrariada através da ingestão de cálcio e vitamina D em
quantidades suficientes e realização de densiometria óssea
regular).
A substituição sequencial de um tratamento hormonal por ou-
tro pode resultar na segunda e terceira respostas quando o tra-
tamento anterior falhou na doença avançada.
Cancro da próstata
A castração em associação com o bloqueio antiandrógeni-
co não produziu benefícios claros, comparados apenas com
a castração. A adição sequencial de antiandrogénios à cas-
tração pode resultar em segunda resposta quando a doença
está em progressão após a castração.
O cancro da próstata resistente à castração é frequentemen-
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 62

te ainda dependente da ativação do receptor de androgénios,


conforme demonstrado pela eficácia clínica do inibidor de
CYP17, a abiraterona. Este fármaco inibe a síntese de andro-
génios de precursores adrenais. Também a enzalutamida é um
inibidor forte da sinalização dos recetores de androgénios que
bloqueia vários passos da via de sinalização destes recetores.
Consequentemente, inibe a translocação nuclear dos receto-
res ativados e inibe a associação dos recetores de androgénios
ativados ao ADN, mesmo no caso de sobre-expressão dos re-
cetores de androgénios e nas células cancerosas prostáticas
resistentes aos antiandrogénios.
Efeitos secundários da hormonoterapia
Uma vez que a hormonoterapia visa eliminar o efeito que um
determinado tipo de hormonas tem no organismo, a sua ad-
ministração provoca sintomas relacionados com a falta des-
sas hormonas. Os mais frequentes são:
• Afrontamentos
• Impotência sexual
• Secura vaginal
• Diminuição da líbido
• Aumento de peso
Conselhos/orientações
• Praticar exercício físico, sob orientação médica/enfermagem
• Monitorizar a fadiga
• Manter uma vida sexual ativa
Referências bibliográficas
Cardoso F., Costa A., Norton L., et al. (2014). ESO-ESMO 2nd international consen-
sus guidelines for advanced breast cancer (ABC2). Breast 23, 489-502.
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Handbook of Oncology (4.ª ed.). Oxford: Oxford University Press.
Costa, C. et al. (2005). O Cancro e a Qualidade de Vida (1.ª ed.). Portugal: Ponti-
cor.
DeVita, V., Rosenberg, S., & Lawrence, T. (2018). Cancer: Principles & practice of
Oncology (11.ª ed). USA: Wolters Kluwer.
Harvey, R., & Khuri, F. (2018). Cytotoxic Chemotherapy - The American Cancer
Society’s Principles of Oncology Prevention to Survivorship. p. 220-235. Atlanta,
Georgia, USA: Wiley.
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 63

BIFOSFONATOS
Os bifosfonatos são medicamentos amplamente utilizados
no tratamento de doenças relacionadas com a perda de mi-
neral ósseo devido ao aumento da reabsorção óssea, sendo
as drogas de primeira escolha no tratamento para osteoporo-
se e demais doenças ósseas crónicas, como doença de Paget
ou metástases ósseas osteolíticas.
Estes medicamentos atuam, direta ou indiretamente, sobre os
osteoclastos e osteoblastos, o que resulta na diminuição da
remodelação óssea, além de apresentarem efeitos profiláticos
de eventos ósseos: fraturas patológicas, compressão medular,
hipercalcemia.
O alendronato, neridronato, ibandronato, pamidronato, rise-
dronato e ácido zoledrónico têm um grupo de nitrogénio e
são chamados de bifosfonatos contendo nitrogénio, em con-
traste com o etidronato e o tiludronato, que não o possuem.
O ácido zoledrónico e o pamidronato estão recomendados
na metastização óssea. A sua dose está sempre dependente
da clearence de creatinina.
Durante a administração de bifosfonatos é obrigatória a mo-
nitorização da função renal e calcemi. Recomenda-se a as-
sociação de vitamina D e cálcio, desde que não existam con-
traindicações.
No cancro de mama com metastização óssea existe evidên-
cia científica que demonstra que o ácido zoledrónico admi-
nistrado em intervalos de 12 semanas, após um período inicial
de administração mensal) poderá diminuir o risco de disfun-
ção renal ou osteonecrose da mandíbula.

Orientações
• Manutenção da condição de saúde oral, com visitas fre-
quentes de revisão no estomatologista.
• Antes do início da terapia com bisfosfonatos é imprescindí-
vel a aprovação por estomatologia.
• Incentivar boas práticas de higiene oral.
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 64

• Vigiar odontalgia, mobilidade dentária, edema, supuração


ou feridas que não cicatrizam.
• Durante o tratamento com bifosfonatos não devem ser
realizados procedimentos invasivos dentários.
Referências bibliográficas
Amadori D., Aglieta M., Alessi B. et al. (2013). Efficacy and safety of 12-weeky zole-
dronic acid for prolonged treatment of patients with none metástases from breast
cancer (ZOOM): a phase 3, open label, randomised, non-inferiority trial. Lancet
Oncology 14(7), 663.
Hortobagyi G.N., Van Poznak C., Harker W.G. et al. (2017). Continue treatment
effect of zoledronic acid dosing every 12 vs 4 weeks in women with breast cancer
metastatic to bone: The OPTIMIZE- 2 randomized clinical trial. JAMA Oncology
3(7), 906-912.
https://www.uptodate.com/contents/pharmacology-of-bisphosphonates/ab-
stract/1
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bisphosphonate therapy: a case series. Journal of Contemporary Dental Practice 9(1),
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Weaver MJ, Miller MA, Vrahas MS. (2010). The Orthopaedic implications of diphos-
phonate therapy. Journal of the American Academy of Orthopaedic Surgery 18,
367-374.
NOÇÕES BÁSICAS DE ONCOLOGIA PARA JOVENS ENFERMEIROS 65

O grupo Jovens Enfermeiros


Oncologistas

Maria José Dias


RN, MPH, Instituto Português de Oncologia - Porto
Especialista Enfermagem Comunitária
Mestrado em Informática Médica
Coordenação do JEO (Jovens
Enfermeiros Oncologistas)

Sara Torcato Parreira


RN, MPH, Instituto CUF Oncologia - Tejo
Gestora Especialista em Enfermagem Médico-Cirúrgica
Pós-Graduação em Gestão

Beatriz Lopes Domingues


RN, Centro Cirúrgico Fundação Champalimaud
Pós-Graduação em Saúde do Adulto e
Cuidados em Situação Crítica

Filipa Cardoso
RN, Instituto Português de Oncologia - Porto
Formação em Estomaterapia

Mafalda Ferreira
RN, Instituto Português de Oncologia - Lisboa
Especialista em Enfermagem Médico-Cirúrgica
Pós-Graduação em Cuidados Paliativos

Sara Costa
RN, Hospital Fernando da Fonseca
Especialista em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica

Inês Frade
RN, MPH
Instituto Português de Oncologia - Lisboa
Especialista em Enfermagem Médico-Cirúrgica

Joana Araújo
RN, MPH, Hospital CUF Infante Santo
Pós-Graduação em Nutrição Oncológica
Associação de Enfermagem Oncológica Portuguesa
Grupo de Jovens Enfermeiros Oncologistas

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