Parte 1 - Introdução Ao Kemetismo
Parte 1 - Introdução Ao Kemetismo
Parte 1 - Introdução Ao Kemetismo
Egiptosofia: um pouco sobre Kemet
De acordo com o historiador grego Heródoto, os antigos egípcios eram
“escrupulosos além de toda a medida em matéria de religião.” Não há dúvidas sobre
o enorme débito que nós ocidentais temos em relação a esta antiga civilização, a
qual poderíamos considerar como uma das bases filosóficas, culturais e ontológicas
da nossa atual sociedade. E em se tratando de abordar especificamente o campo de
estudo do simbolismo e do metafísico que, ainda presentes, se preservam no
Ocidente, como um fio de Ariadne, conservando intacta a continuidade
“subterrânea” dessa influência desse povo “misterioso” e fascinante.
Sinesio, filósofo neoplatonista líbio, que morou muitos anos da sua vida em
Alexandria; discípulo de Hipátia (a qual considerava-a carinhosamente como sua
mãe), antes de tornar-se bispo gnóstico, escreveu que “as origens da nossa época
atual encontram-se no próprio Egito.”
Podemos perceber, por exemplo, que este fenômeno da egitomania está presente
até os dias atuais sob diversas formas tal como na literatura, arquitetura, arte,
cinema, política e até na religião. Muitos elementos da cultura egípcia acabaram se
tornando, ou melhor, transformaram-se, em outra representação simbólica, com
ícones característicos e emblemáticos. Damos como exemplo, a significativa imagem
da múmia - sugerindo o estranho interesse dos estadunidenses pelos mortos-vivos -,
as tumbas e sarcófagos, que fazem alusão direta, única e exclusivamente aos ricos
tesouros e bens materiais; as pirâmides, no sentido de reforçar essa ideia central da
vida além-túmulo, o que poderíamos chamar de f uturocentrismo; sem contar as
tramas dinásticas de faraós, reis e rainhas, que recordam em muito as histórias de
bastidores das atuais cortes da elite; entre outros.
Resta-nos dar uma resposta a uma indagação que um estudante incauto faria a si
mesmo: por que estudar velhas tradições, escondidas e sopradas pelos ventos do
deserto? Qual é o propósito de abarcar um estudo sistemático de uma civilização
que sequer sua língua é falada atualmente? Talvez sim, estiver certo tal
questionamento...
Por várias razões, há de supor que esta tradição, assim como tantas outras, sequer
registradas nos anais da pré-história humana, fosse importante para perdermos
tempo com seus estudos. Poderíamos apenas citá-la como já bem os fazem nos
livros escolares de História, e nada mais. Porém, as atuais condições morais,
históricas, sociais, culturais, nos permitem reavaliar determinadas passagens e
rediscutir alguns valores que parecem terem permanecido esquecidos ao longo do
trajeto da experiência humana coletiva. Como a grande massa de conteúdo
significativo da cultura egípcia foi sistematizada e registrada ao longo de seus mais
longínquos milênios da nossa própria história, por que não buscarmos ali uma fonte,
ou o fio de Ariadne perdido no tempo? Não será válida esta procura pelo verdadeiro
tesouro perdido - não aqueles outros tesouros que os aventureiros sempre buscaram
-, que também não deixaria de ser, uma grande busca pela verdade? Não disse o
historiador uruguaio Eduardo Galeano que o mundo é construído por histórias, e que
estas histórias são contadas por outras pessoas, multiplicando-as? Se não
conhecermos o nosso passado, com certeza não poderemos pensar num futuro
melhor.