ALONSO, Luisa - Formação Ao Longo Da Vida e Aprender A Aprender
ALONSO, Luisa - Formação Ao Longo Da Vida e Aprender A Aprender
ALONSO, Luisa - Formação Ao Longo Da Vida e Aprender A Aprender
Luísa Alonso
Universidade do Minho – Braga
18 de Dezembro de 2006
O contexto
A emergência do conceito de formação ao longo da vida (Life-long learning) é uma
realidade actual que afecta todas as profissões e cidadãos, enquanto forma de confronto
com os desafios do mundo actual – sociedade da globalização e do conhecimento, em que
a necessária combinação do desenvolvimento intelectual (educação para a compreensão e
a reflexão) e do desenvolvimento social (aprendizagem da solidariedade e a colaboração)
torna-se mais do que evidente numa disposição positiva para confrontar a mudança
constante e a complexidade social, ou seja a capacidade de aprender a aprender.
Inovação e educação/formação
Neste pequeno testemunho, que pretende contribuir para o debate sobre como
melhorar a educação, tecerei algumas considerações retiradas de várias experiências de
inovação em que tive o privilegio de participar ao longo da minha carreira, como docente
universitária e como investigadora, particularmente interessada nas questões de como é
que se podem produzir mudanças em educação, com a participação activa de diferentes
actores: investigadores, professores/formadores, alunos/formandos, técnicos
diversificados, administração e diferentes parceiros sociais, e quais as condições
necessárias para isso.
Estas experiências, embora pertencendo a contextos de educação/formação
diferenciados, umas dentro do sistema educativo formal como é o caso do projecto
PROCUR e do projecto de Gestão Flexível do Currículo , outras no âmbito da
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traços comuns sobre os quais gostaria aqui de reflectir, porque penso que são
representativos dos desafios que o paradigma de formação ao longo da vida nos coloca.
Por outro lado, são exemplos de “boas práticas” que deixaram uma marca de qualidade e
de confiança, em que se demonstrou que a mudança – por natureza lenta e complexa – é
possível, quando se reúnem algumas condições políticas, curriculares, organizacionais, e
formativas, com potencial para confrontar a cultura estabelecida e em que as pessoas com
o seu capital de conhecimento (conceptual, procedimental e atitudinal) marcam sempre a
diferença.
Todos estes projectos, assumiram como bases epistemológicas de sustentação as
abordagens social-construtivistas e ecológicas, cujas ideias-chave podemos resumir nos
seguintes princípios:
o currículo/referencial para a formação como projecto aberto, flexível e integrado;
A escola/centro de formação como organização que aprende com base na reflexão
e avaliação participada e em interacção com o meio/comunidade;
Os professores/formadores como construtores críticos de currículo com base na
investigação-acção-colaborativa;
começou a questionar o insucesso da reforma curricular, enquadrada, em 1986, pela LBSE e orientada pelo
Decreto-Lei 286/89. O Projecto inicia-se no terreno, com uma pequena experiência em algumas escolas,
alargando-se progressivamente, entre 1997 e 2001, a uma rede de escolas de todo o país que, por iniciativa
própria, se vão integrando no Projecto e que abriu o caminho para a Reorganização Curricular do Ensino
Básico. Como foi evidenciado no Parecer sobre esta inovação (Alonso, Peralta e Alaiz, 2001) e nos
resultados do estudo realizado sobre as Tendências da Reorganização Curricular, realizada no âmbito do
Projecto PIIC (Alonso, Peralta, Alaiz e outros, 2006), apesar do enorme investimento e das realizações e
expectativas criadas pela GFC, com a generalização apressada da Reorganização Curricular a todas as
escolas, verificou-se uma progressiva inversão de marcha no modelo de inovação que orientou a GFC,
abandonando algumas ideias centrais que o caracterizaram, tais como a avaliação continuada, o
acompanhamento formativo às escolas, a recolha e divulgação de experiências de sucesso e a clarificação
do Projecto Curricular Nacional.
3 No ano 2000, por iniciativa da ANEFA, foi elaborado o Referencial de Competências-chave para a
Educação e Formação de Adultos (Alonso, L; Imaginário, L; Magalhães, J. e outros (2000). Referencial de
competências-chave. Educação e Formação de Adultos. Lisboa: ANEFA) que serviu de base para a criação
dos Centros de Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências (RVCC), que funcionam em
estreita articulação com os Cursos de Educação e Formação de Adultos (EFA), os quais têm vindo a
desempenhar um papel fulcral na elevação dos níveis de qualificação e empregabilidade dos adultos com
níveis baixos de escolarização.
Os alunos/formandos como construtores de conhecimento sobre o mundo, numa
perspectiva de desenvolvimento de competências, do aprender a aprender e da
cidadania activa.
A inovação como um processo complexo, dinâmico, evolutivo e aberto de
construção cultural, social e política da mudança.
A ideia de que todas as pessoas têm capacidade para aprender ao longo da sua vida
(desde o nascimento até a morte), sempre que lhes sejam oferecidas condições para
aprender com e através da experiência, valorizada e reflectida, é central neste paradigma
e reflecte-se nos casos em apreço. O entendimento do conhecimento como complexo,
integrado, dinâmico e aberto, que tem que ser construído e transformado nos processos de
aprendizagem em saber significativo e relevante para a vida (competências), é outra
premissa essencial. A criação de contextos ecológicos acolhedores da diversidade de
experiências/saberes e desafiadores da procura, da critica, da partilha e da autonomia no
desenho dos percursos de vida e de formação, é condição indispensável.
Deste modo, o aprender a aprender e a continuar aprendendo constitui-se como
uma competência-chave central, com implicações substanciais na organização dos
ambientes e processos de aprendizagem, seja na educação de crianças, jovens ou adultos
ou em contextos formais, informais ou não formais de educação/formação.
O projecto CCAA – Construção da Competência de Aprender a Aprender , em que 4
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O Relatório para a UNESCO da Comissão Europeia "Educação: um Tesouro a
Descobrir" (1996), acentuou a importância dos quatro pilares da educação ao longo da
vida: aprender a conhecer, isto é, adquirir os instrumentos para a compreensão do
mundo; aprender a fazer, para poder agir sobre o meio envolvente; aprender a viver em
comum, a fim de participar e cooperar com os outros em todas as actividades humanas e,
finalmente, aprender a ser, via essencial que integra as três precedentes".
É neste contexto que ganha acuidade a aquisição e o desenvolvimento de
competências de vida ou competências-chave que permitam às pessoas compreender e
participar na sociedade do conhecimento, mobilizando através delas o saber, o ser e o
saber resolver os problemas com que o mundo actual em mudança as confronta
constantemente. O conceito de competência-chave ultrapassa assim, o seu sentido
tecnicista original, adquirindo uma orientação mais construtivista e ecológica que aponta
para a capacidade de agir e reagir de forma apropriada perante situações mais ou menos
complexas, através da mobilização e combinação de conhecimentos, atitudes e
procedimentos pessoais, num contexto determinado, significativo e informado por
valores.
Muito se tem escrito acerca de quais as competências necessárias para navegar ou
movimentar-se nesta sociedade, tomando como referência os conceitos de cidadania e
empregabilidade. Assim, atitudes e capacidades como a flexibilidade, a reflexão sobre a
experiência pessoal, a abertura à inovação e à pesquisa, o aprender a aprender, o diálogo
e trabalho colaborativo e o respeito pela diferença, revelam-se condições fundamentais
para o desenvolvimento destas duas dimensões.
A este respeito, o pensamento da OCDE identifica quatro domínios principais de
competências que se requerem desenvolvidas em todos os jovens: resolução de
problemas; capacidades de comunicação e negociação; conhecimento e compreensão dos
mecanismos sociais, de noções de cidadania e de economia; capacidade de auto-avaliação
e de auto-responsabilização pela sua aprendizagem e seu próprio desenvolvimento.
Por outro lado, constata-se o crescente desajustamento entre os conhecimentos e as
competências que os jovens trazem da escola e da sua formação vocacional para o
mercado de trabalho e os saberes e as competências que, de uma análise das mudanças na
área do emprego, têm sido identificadas como mais importantes. A falta de
significatividade e funcionalidade das aprendizagens é uma das grandes questões com
que hoje se defrontam os currículos escolares, sendo também uma das justificações da
desmotivação e exclusão escolar de amplas camadas de alunos, especialmente daqueles
provenientes das classes sociais mais desfavorecidas. A falta de relevância das
aprendizagens escolares para a vida e para o mundo do trabalho, com a consequente
desmotivação da população escolar e uma competição cada vez maior entre o
conhecimento adquirido dentro da escola e o adquirido fora desta, são alguns dos
problemas fulcrais da escolarização actual. Reclama-se, então, um tipo de escolaridade
mais "substanciada" não para incluir no currículo mais conteúdos, comprimindo ainda
mais a experiência, mas antes para os tornar mais relevantes para a vida e o trabalho.
Do ponto de vista qualitativo não há duvida de que as competências a desenvolver,
pela acção educativa são as exigidas pelos sectores mais avançados do mundo produtivo,
mas são também aquelas exigidas no exercício da vida política, da vida cultural e da
actividade social em geral, pelo que cada vez mais a escola deve desempenhar um papel
mediador entre os saberes académicos que fazem parte do património disciplinar da
humanidade e os saberes requeridos pelos problemas e exigências da empregabilidade e a
participação social.
Importa, assim, identificar algumas competências que são essenciais ou nucleares,
enquanto processos cognitivos e sociais que facilitam o aprender a aprender tornando as
pessoas mais autónomas no acesso ao conhecimento e mais esclarecidas na participação
social. São também denominadas de competências transversais já que elas se encontram
na intersecção das diferentes disciplinas, atravessando os diversos campos académicos e
sociais e permitindo às pessoas a comunicação e transferência de saberes, em contextos
diversificados.
Construção de competências
Pensar, como parece estar implícito nas práticas escolares, que a aprendizagem
sequencial e compartimentada de conhecimentos provoca espontaneamente a sua
integração e mobilização operacional é uma ilusão. Por isso, defendemos que o
desenvolvimento de competências requer uma inversão radical nos pressupostos que
impregnam o pensamento curricular dos professores e que passa fundamentalmente por
descentrar o foco do ensino dos conteúdos/conhecimentos, entendidos como uma
finalidade em si mesmos (como objectos inertes), para os colocar ao serviço da
aprendizagem de estratégias que os permitam integrar, relacionar e mobilizar em
situações de acção significativa e eficaz.
Assim, a construção de competências nos processos formativos requer o respeito
pelas seguintes condições:
é inseparável da formação de esquemas de mobilização de conhecimentos,
de forma consciente, num tempo e contexto determinados e ao serviço de uma
acção eficaz;
implica integrar conhecimentos diversificados (disciplinares,
interdisciplinares e transversais) na resolução de problemas específicos ligados a
situações pessoal e socialmente significativas;
requer um equilíbrio entre o trabalho isolado dos conhecimentos e a
integração dos mesmos em situações de operacionalização;
exige, também, uma intencionalidade pedagógica continuada para criar
contextos significativos em que os alunos/formandos possam conscientemente
realizar actividades de transferência dos conhecimentos.
6 No modelo curricular que construímos no âmbito do projecto PROCUR, que se articula em torno destes
constructos, e que foi apropriado com as devidas adaptações na formação inicial de professores do IEC da
Universidade do Minho e em muitos programas dos Cursos EFA, em que se desenvolveram experiências
muito inovadoras de trabalho com uma abordagem integradora do currículo e da educação/formação, o que
tem contribuído para o desenvolvimento de competências-chave nos alunos e formandos e também nos
professores e formadores. Existem vários estudos de investigação (na sua maioria, teses de mestrado e
doutoramento) realizados nestes contextos, que claramente evidenciam esta tendência.
7 Perrenoud, Ph. (2001). Porquê construir competências a partir da escola?. Porto: ASA Editores.
situações reais da vida, na escola ou fora dela, desde a infância e ao longo de todos os
ciclos de vida”.
Mejoremos las pequeñas cosas […] Evítese que formen a los profesores quienes no lo
han sido antes. Hagamos políticas para resolver problemas concretos, elaborando
programas ad hoc, proveyendo médios y adoptando estratégias adequadas, sin perder de
vista la totalidad de un proyecto. Hagamos programas, desarrollémoslos y veamos sus
resultados. No llenemos los textos legales de buenas intenciones que no puedan cumplirse.
Establezcamos prioridades entre los retos pendientes […] hagamos que el sistema funcione
innovando de manera natural; permitase que eso sea posíble y que pueda continuarse;
facilítese y apóyese. Ábranse caminos, apóyense iniciativas, protéjanse derechos, dense
medios, vigílense y corríjanse los incumplimientos. Demos y exijamos responsabilidades al
profesorado, lo qual implica dejarles autonomia (la petición, em cambio, de autonomia no
siempre se acompaña de responsabilidades).