Teatro em Angola
Teatro em Angola
Teatro em Angola
Do que se conhece, e sabemos que isso pressupõe que o que ficou para a História foi a
história dos dominadores, a introdução do teatro (um certo código de ritual
performativo que se diferenciava de tantos outros praticados) em Angola deve-se aos
missionários. No interesse de evangelizar o pagão africano e torná-lo filho de Deus, a
igreja sempre se serviu de representações religiosas, realizadas em escolas de
missionários cristãos pelo país afora. A Igreja teve um papel de relevo no contacto
inicial com o teatro, mantendo, na actualidade, esse forte ascendente sob vários grupos
teatrais: só em Luanda são mais de cem os coletivos ligados a Igrejas.
A partir dos anos 80, o movimento teatral ganha fôlego muito pela mão de estudantes,
com a criação dos grupos: Os Makotes, da Escola 1º de Maio, da Faculdade de
Medicina, o Horizonte Nzinga Bande (1986), da escola homónima, o Oásis e o Elinga
Teatro, que provinha da filiação de Tchinganje e do Xilena.
Não falta teatro nas escolas, nas empresas e nas (omnipresentes em África) ONG com
as suas peças de sensibilização para as causas que também as alimentam. Existe uma
imensa proliferação de grupos (só em Luanda há 125 grupos amadores) que se
apresentam quase diariamente. O entusiasmo e vontade de fazer teatro, em salas
improvisadas e clubes de bairro, são arrebatadores. Numa fórmula que só vinga se
arrancar da plateia muitas gargalhadas com cenas de pancadaria se a mulher não
cozinhou o funge ou com as trapalhices durante o Comba (óbito), ou piadas sobre as
meninas de programa em troca de saldo para o telemóvel, as manobras do feitiço,
juntamente com algumas críticas não muito mordazes aos poderosos, acusação à
delinquência juvenil, violência doméstica, álcool, droga e outros problemas-hábitos
sociais, insistindo nos mesmos temas… este é o tipo de enfoque dos grupos que
compõem a maior parte do panorama. Sem meios técnicos nem formação, mostram uma
impressionante persistência em fazer teatro mas, na falta de referências, o
desconhecimento da história universal do teatro, o facto de não terem estudado ou
raramente poderem assistir a outro tipo de peças, os modelos ficam numa espiral que os
impossibilita de sair daquele imbróglio. As mesmas técnicas, personagens-tipo e
fórmulas de sucesso repetem-se até à exaustão. Muitas vezes são os próprios que
escrevem os seus textos dramáticos, vivem muito da improvisação e da auto-encenação,
quase sem cenários e sem obedecer às mínimas convenções teatrais de tempo e espaço.
A formação tem-se feito muito através de workshops pontuais, alguns com actores
brasileiros ou portugueses. O Complexo das Escolas de Artes, em Camama, dirigido
pelo artista Van, oferece a formação de quadros a nível médio nos domínios das Artes
Visuais e Plásticas, Dança, Música, Teatro e Cinema e apostou em alguns professores
de teatro cubanos.
Para as companhias é muito importante poder levar o seu trabalho além fronteiras,
mostrá-lo sem estas referidas condicionantes redutoras e ganhar referências teatrais. Os
festivais são assim um estímulo para profissionalizar as companhias. Mesmo que as
repercussões não se façam imediatamente sentir no trabalho, com a experiência da
circulação vai-se apurando uma série de insuficiências e carências. Essa
internacionalização credibiliza, desenvolve uma competição saudável, faz com que as
companhias se disciplinem para ensaios regulares, pois integrar o elenco que se desloca
a um festival é igualmente uma oportunidade para viajar e conhecer mundo.
Como em todos os sectores culturais, os Festivais não fogem à regra do ciclo vicioso e
dos monopólios dos territórios artísticos. As companhias que viajam mais são as que
têm mais acesso à oportunidades, ou se dinamizam mais, por sua vez, se são os mais
vistos naturalmente terão mais convites, e o ciclo repete-se. Mas trata-se de iniciativas
que aprofundam o conhecimento e a troca, artística e cultural, entre a
comunidade teatral.
Em Angola, o universo teatral mantem-se naquele estado de potencialmente, precisa de
se agarrar com acções concretas que o façam sair de advérbio para substantivo.