Trave e Palha, Conto de Guilhermina Santos, Desconhecida Autora Brasileira (1883)
Trave e Palha, Conto de Guilhermina Santos, Desconhecida Autora Brasileira (1883)
Trave e Palha, Conto de Guilhermina Santos, Desconhecida Autora Brasileira (1883)
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Resumo
Conto: Trave e Palha, de estilo simples, leve e engraçado, publicado nos jornais:
Poema: A Uma Rola, publicado no Jornal das Senhoras (Rio de Janeiro, RJ), em 12
de novembro de 1854 (número 46, páginas 5 e 6); imagens mostradas neste artigo.
. Prêmio recebido pela carreira de tradutora: uma caneta e pena de ouro cravejada de
pérolas, ofertada pelo jornal Gazeta Suburbana e exposta em uma vitrine da rua do
Ouvidor, no centro do Rio.
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Apresentação
http://memoria.bn.br/docreader/363723/2073
A Federação (Porto Alegre, RS), 8/7/1884, número 155, página 2, penúltima coluna.
http://memoria.bn.br/docreader/388653/430
Repetindo um processo clássico da época, a tipografia da Folha Nova aproveitou o
sucesso do folhetim para lançar imediatamente o livro impresso com o romance de
Ohnet.
Brasil (Rio de Janeiro, RJ), 13/7/1884, número 162, página 1, penúltima coluna.
http://memoria.bn.br/DocReader/236055/137
O recorte abaixo informa que o livro foi colocado à venda em 10 de junho de 1884.
A Folha Nova (Rio de Janeiro, RJ), 10/6/1884, número 594, página 4, parte central.
http://memoria.bn.br/DocReader/363723/2364
http://memoria.bn.br/docreader/363723/2365
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http://memoria.bn.br/DocReader/704369/7422
Assim como se deu no caso de O Grande Industrial, a edição em livro de Sergio
Panine seguiu-se ao final da história nos folhetins da Folha Nova.
http://memoria.bn.br/DocReader/364568_07/11330
Revista Ilustrada (Rio de Janeiro, RJ), 26/11/1884, número 393, página 5, última
coluna.
http://memoria.bn.br/DocReader/332747b/2918
A Folha Nova (Rio de Janeiro, RJ), 27/9/1884, número 673, página 4, parte superior.
http://memoria.bn.br/DocReader/363723/2680
http://memoria.bn.br/DocReader/364568_07/16803
"Não, não foi nem o seu excelente jornal, nem o Anuário do Rio Grande do Sul que
teve a prioridade de apresentar ao leitor português as produções de Bret Harte. Em 1882
publicou a Folha Nova a novela californiana 'Flip', traduzida pela Sra. D. Guilhermina
Santos, cuja versão ligeiramente retoquei, na tentativa de aproximá-la do sabor estranho
do original. Como era natural, agradou muito aos cultos [...]."
http://memoria.bn.br/DocReader/364568_08/9500
O editor Manoel Carneiro errou apenas o ano: a tradução de Guilhermina Santos para
Flip, Cenas da Califórnia saiu de 8 a 20 de setembro de 1883.
A Folha Nova (Rio de Janeiro, RJ), 8/9/1883, número 289, página 2, em Folhetim.
http://memoria.bn.br/DocReader/363723/1146
O escritor estadunidense Bret Harte (1836-1902) tornou-se famoso por seus contos e
novelas sobre a Corrida do Ouro na Califórnia.
É provável que outros romances traduzidos do francês e publicados pela Folha Nova
em 1883, 1884 e 1885 tenham resultado do trabalho de Guilhermina Santos.
http://memoria.bn.br/DocReader/363723/2374
A poeta
http://memoria.bn.br/DocReader/700096/1369
http://memoria.bn.br/DocReader/700096/1370
A contista
A Folha Nova (Rio de Janeiro, RJ), 18/12/1883 (número 390) e 19/12/1883 (número
391), página 2, em Folhetim.
http://memoria.bn.br/DocReader/363723/1550
http://memoria.bn.br/DocReader/363723/1554
Gazeta do Norte (Fortaleza, CE), 29/2/1884 (número 46), 1/3/1884 (número 47),
4/3/1884 (número 49) e 15/3/1884 (número 50), página 2, em Folhetim.
http://memoria.bn.br/DocReader/103950/3539
http://memoria.bn.br/DocReader/103950/3543
http://memoria.bn.br/DocReader/103950/3551
http://memoria.bn.br/DocReader/103950/3555
"Por que é que você vê o cisco que está no olho do seu irmão e não repara na trave de
madeira que está no seu próprio olho? Como é que você pode dizer ao seu irmão: 'Me
deixe tirar esse cisco do seu olho', se você não repara na trave que está no seu próprio
olho? Hipócrita! Tire primeiro a trave que está no seu olho e então poderá ver bem para
tirar o cisco que está no olho do seu irmão."
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comenta-o-evangelho-de-hoje/
Como tantas outras escritoras brasileiras da época, Guilhermina Santos deixou uma
produção muito aquém de suas possibilidades devido à dominância dos espaços
literários pelos homens.
Vida pessoal
http://memoria.bn.br/DocReader/100439_02/3377
http://memoria.bn.br/DocReader/100439_02/3371
Este recorte revela que o marido de Guilhermina tinha o posto militar de major.
Faleceu em 13 de julho de 1883.
http://memoria.bn.br/DocReader/364568_07/8374
O filho mencionado no anúncio fúnebre não se chamava José Rodrigues dos Santos
Júnior. Este falecera em 1879, quando estava casado com Joana Flávia Viana dos
Santos.
Jornal do Commercio (Rio de Janeiro, RJ), 29/4/1879, número 118, página 6,
penúltima coluna.
http://memoria.bn.br/DocReader/364568_06/20808
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TRAVE E PALHA
D. Valentina Travassos adora seu marido; o Sr. Teófilo Travassos é fanático por sua
mulher; isto é a voz pública. Vistos em separado são excelentes; reunidos, são perfeitos.
Todos os estimam.
Bem poucos casos do seu conhecimento existem que não tenham experimentado da
sua solicitude, pelo bem dos outros.
As moças que vão ficando para tias; os filhos de família que estão em desarmonia
com pais exigentes; os esposos que uma incompatibilidade de gênios passageira
desuniu, podem, com toda a confiança, dirigir-se a eles.
Algumas línguas perversas têm pretendido que o Sr. e a Sra. Travassos são muito
fingidos e que se intrometem demasiado com o que não é da sua competência. Isso,
porém, não passa de boatos; são indignas acusações que sempre colhem, sem lhes dar
importância, as pessoas caridosas que espalham o bem em torno de si.
II
Em fins do mês passado entrou D. Valentina no quarto em que dormia seu marido ―
eram seis horas da manhã ―, foi direita à janela, correu com violência as cortinas,
abriu, sem nenhuma precaução, as venezianas, e dirigiu-se para o leito em que o Sr.
Travassos, com as sobrancelhas carregadas, perguntava a si mesmo por que o
acordavam tão bruscamente.
Sem incomodar-se com os olhares que lhe lançava seu marido, ela tomou a palavra:
Teófilo, que de boa vontade recomeçaria um sono interrompido, fez o gesto de quem
deseja adiar para mais tarde as confidências de quem está ameaçado.
― Luciana? Quem diabo pode chamar-se Luciana a esta hora? ― murmurou Teófilo,
aborrecido.
― Ah! Deveras! A Lucianinha! Mas eu nada tenho com isso... Eu não sou o marido
dela... Sou o teu... O que já é mais que suficiente ― acrescentou in petto.
― Ah! Tu nada podes fazer! Crês isto?... Pois eu penso exatamente o contrário.
― Sim! Nós devemo-nos a nós mesmos, não podemos perder a reputação de nos
envolver sempre à reconciliação do próximo.
― Também, ela tem uns olhos que parecem pedir esmola à porta de todos os
corações...
― Olha que sempre tens lembranças!... Pois fica sabendo que ela teve uma questão
com o marido. Exaltaram-se demais. Luciana ofereceu a Palhares uma bofetada que este
não teve tempo de recusar. Em suma, separaram-se de comum acordo e vão divorciar-
se!
Travassos, vendo que era impossível reatar o sono interrompido, disse esfregando os
olhos:
― Sempre pensei que isso acabaria assim. Essa moça tem um gênio detestável!
― Certamente! Demais [Além disso], não possuía um vintém quando casou com o
Palhares.
― Qual beleza... qual beleza... Não sei com que olhos a vês para achá-la bonita; é
uma boneca malfeita.
― Em todo o caso, sempre é melhor que o marido, que tem um ombro mais alto do
que o outro.
― Calúnia!
― Pois sim! É calúnia também que ele é jogador e que não pode ver um rabo de saia
sem correr-lhe logo no encalço? É um miserável e um monstro!
― Então, para que queres reconciliar a tua amiga com um ente tão abominável?
― Até que afinal! Soltaste a palavra! Vim importunar a tua preguiça. Eis o grande
crime!... Não é assim? Não se te pode arrancar da cama...
― Valentina, deixa-me em paz. Não estou disposto hoje a fazer coro com o teu mau
humor. Se queres disputar, vai procurar a tua cozinheira. Ela tem boa língua e faz-te
calar às vezes.
A Sra. Travassos apruma-se e vai responder; mas seu marido, retraindo-se, toma a
palavra e diz:
― Ah! Pensas que ela está lá? Pois não! Retirou-se para casa de sua mãe, a viúva
Sampaio.
― Pois irás visitá-la aí. Eu procurarei o Juca. Estou certo de encontrá-lo na rua do
Ouvidor. Tu convencerás Luciana de que fez mal. Eu provarei ao Juca que ele não tem
razão, e nós os convidaremos para jantar no sábado. À sobremesa eles hão de abraçar-se
ou perderemos a nossa fama! Em campo, pois, Valentina, e desenvolve toda a tua
diplomacia.
III
Luciana era uma graciosa moça de vinte e quatro anos, que Travassos caluniara, pois
que era realmente formosa e elegante.
Com tanta eloquência como precaução, com palavras confidenciais, mas sem abdicar
da autoridade que dá a consciência do próprio valor, Valentina expôs o motivo de sua
visita, Luciana exclamou:
― A senhora ofendeu-o.
― Pedirá.
― Que dia?
― Sábado.
― Se soubesse como ele foi violento!... A propósito, eu quer ser a primeira a chegar.
Às duas horas estou lá! Mas não conte muito comigo.
Pouco depois, Palhares recebia igual convite de Teófilo e aceitava-o com entusiasmo.
― Falemos condicionalmente, meu caro Palhares; espero que minha mulher consiga
convencer a sua, mas o caso ainda não é certo.
― Ah! Tem razão! A minha pobre Luciana é um pouco teimosa e, demais, sua mãe
mete-lhe na cabeça certas ideias... Deus queira que ela consinta em vir! Enfim, seja
como for, até sábado!
― Até sábado!
― Então, meu amigo, não me foi difícil convencê-la. Não era tarefa digna das
minhas qualidades.
― Tal qual como eu: o Juca quase saltou-me ao pescoço quando lhe fiz a proposta.
Lamentei, deveras, ter-me incomodado por tão pouco.
― O que eu não compreendo ― disse Valentina ― é como há gente que brigue com
tanta violência, para tão facilmente estarem prontos a abraçar-se...
― Quem sabe! Talvez que até sábado o rompimento tenha se tornado completo.
― Assim o devemos desejar para termos ocasião de ser mais úteis ― retorquiu
Valentina em tom beatífico.
IV
― Sim, minha queridinha ― respondeu Valentina, que tomava ares cada vez mais
maternos e protetores. ― Como está trêmula, minha filha! Que tens?
― Pois não sabe, minha cara Valentina ― disse Luciana, já impacientada com as
carícias exageradas da sua amiga ―, que o meu destino vai decidir-se dentro em pouco?
De que se admira?
E o seu olhar abateu-se amorosamente sobre o adorado esposo, que pelo seu lado
parecia dizer:
"Contemplem bem como se comportam dois esposos entre os quais nunca estalou a
menor tempestade"
Desde a sopa, Teófilo Travassos encetou a batalha. Dando a perceber quanto era feliz
no seu interior, deixava escapar algumas alusões à situação dos seus amigos.
Estes respondiam às meias palavras dos seus hóspedes com sorrisos constrangidos, e
assim foram indo até às aproximações da sobremesa, onde, segundo as previsões de D.
Valentina, aqueceria a conversação. De vez em quando saía uma palavrinha mais
chistosa, via-se um risinho mais expansivo.
Luciana, sem mostrar ainda francamente os seus lindos dentes, despira-se do seu ar
altivo e reservado. O Juca conversava deixando entrever suas esperanças.
A Sra. Travassos pensou que era chegada a hora de impelir os dois esposos a darem-
se as mãos. Já abria a boca para fazer o supremo esforço que devia assegurar-lhe a
vitória, quando seu marido, querendo servir-se de um prato que estava do lado oposto,
prendeu-se-lhe à manga a asa da saleira, que entornou na toalha todo o conteúdo.
— Desastrado!
O Juca Palhares tentou intervir, mas não sem pensar na esquisitice da situação.
Infelizmente nem teve tempo de começar. Teófilo, cada vez mais excitado, continuou:
— Bem sei, minha amiga, que não se pode pedir que acauteles a tua língua; ao
menos, porém, deverias dissimular tuas enfermidades morais diante de pessoas de
cerimônia...
Palhares quis de novo intervir. Voltou-se para um e para outro, com olhares
suplicantes, mas os ataques e respostas cruzavam-se com tal rapidez que apenas pôde
articular um:
— Pois não se admira — exclamou Travassos — como essa desgraçada quer dar-se
importância?
— E você? E você? — berrou Valentina. — Não me dirá o que quer dizer essa
expressão de "desgraçada"? Responde, eu o quero!
— Estão vendo, ela o quer. Esta expressão, minha cara, significa... o que tu és.
— Eu que o enriqueci...
— Eu que lhe perdoei...
A Travassos, que tinha suas razões para não querer ouvir mais, ergueu-se
bruscamente; seu marido, pouco senhor de si, fez o mesmo. Os Palhares imitaram-nos, e
desta vez fizeram o que puderam para acalmá-los.
A doce, meiga e impecável Valentina estende o dedo para aquele que apresentava
como o modelo dos maridos e diz, enfurecida:
Sufocada, esquece afinal todos os deveres de dona de casa e retira-se enquanto seu
marido, perdendo a cabeça, esquece também os convidados e sai atirando com as portas.
Mas, após um instante, Luciana pôs a mão na de seu marido e, rindo-se ainda,
perguntou-lhe:
— Dize, meu amigo, acaso nós fomos assim tão ridículos como estes?
— Ai, minha querida! Creio que sim! Porém, mais ridículos seríamos agora se não
nos disséssemos: Perdoa-me e ama-me!
...........................
VI
Algum tempo mais tarde, Travassos encontrou um amigo que já tivera também
ocasião de precisar dos seus bons ofícios. Este disse-lhe gracejando:
— Então, meu galhardo! Que foi isso? Vocês também dão maus exemplos!
— Ora! Que não sabe que tiveste uma desavença com tua mulher?
— E não querem crer no ditado: Queres tirar a palha do olho alheio, tira primeiro a
trave do teu!
FIM