PENTATEUCO
PENTATEUCO
PENTATEUCO
Sumário
Introdução
1 O Livro do Gênesis
2 O Livro do Êxodo
3 O Livro do Levítico
5 O Livro do Deuteronômio
6 Considerações finais
7 Referências bibliográficas
Introdução
A divisão atual em cinco livros, no dizer dos judeus: “cinco quintos da Torá”
(hamišā humšê hatōrâ), de onde deriva a tradução grega Pentateuco, é uma divisão
muito prática. Os judeus, ao invés de um único rolo de pergaminho, preferiram cinco
rolos menores, mais fáceis de serem manuseados, transportados, conservados e
reescritos quando se fazia necessário.
Em hebraico, cada uma das cinco partes, ou “rolos”, do primeiro corpus literário
da Bíblia, é designada pela primeira palavra importante do seu texto: berēšît (“no
princípio”); shemôt (“nomes”); wayyiqrā’ (“e chamou”); bemidbar (“no
deserto”); haddebārîm (“as palavras”). Já os judeus, residentes em Alexandria e
responsáveis pela tradução grega das Escrituras, designaram esses livros com nomes
que, de algum modo, fossem capazes de ajudar a lembrar o conteúdo de cada
livro: Génesis (Gênesis), porque trata das origens do mundo, das criaturas, do ser
humano e dos antepassados do antigo Israel; Éxodos (Êxodo), porque trata da saída do
Egito; Leuitikón (Levítico), porque trata da legislação relativa a tudo que envolve o
culto; Arithmoi (Números), porque trata do recenseamento dos filhos de Israel no
deserto; Deuteronómion (Deuteronômio), porque trata da “segunda lei” ou da “cópia da
lei” (cf. Dt 17,18), que Moisés deu aos filhos de Israel nas planícies de Moab, antes de
entrarem na terra prometida, e que completariam as prescrições recebidas no Sinai.
A divisão em cinco quintos não foi casual, mas foi realizada criando pontos de
ruptura e de sutura entre o final e o início de cada livro. O gráfico abaixo permite uma
visualização mais clara dessa afirmação. Início e final de cada livro se correspondem. A
dupla promessa, a da descendência numerosa e a da terra boa e fértil, é um fio condutor
importante. As citações não são exaustivas, mas apenas exemplos.
1 O livro do Gênesis
Este livro aborda temas universais: trata das origens do mundo, do surgimento do
ser humano, do seu pecado e desventuras. Este contexto serviu para introduzir a história
dos antepassados de Israel, segundo uma dinâmica familiar, falando da história que se
desenvolve com Abraão, Isaac, Jacó e José. Este é o elo entre o final do Gênesis e o
início do Êxodo. As “histórias” dos antepassados são ciclos narrativos que, inicialmente,
tiveram origem independente e só mais tarde foram unificados, servindo de fundamento
para se falar das origens do antigo Israel.
A reconstrução das etapas que deram origem aos textos autográficos é algo
impossível de ser alcançada, devido à ausência de fontes extrabíblicas que coadunem
com os relatos bíblicos. É preciso admitir que o livro do Gênesis tenha passado por um
longo processo de redação e que grande parte do seu conteúdo situa-se melhor durante o
exílio vivido na Babilônia ou, até mesmo, no pós-exílio, durante a dominação persa,
quando muitas tradições do antigo Israel alcançaram a sua redação final.
2 O livro do Êxodo
Este livro tem o seu foco principal na saída dos filhos de Israel da terra do Egito e
na sua marcha pelo deserto até chegar ao monte Sinai, no qual Deus selou
uma aliança com o povo liberto, tornando-o a sua propriedade peculiar (cf. Ex 19,5).
O livro pode ser dividido em cinco partes, considerando a natureza dos textos: 1)
Prescrições sobre os sacrifícios (Lv 1−7): elenco dos diversos tipos de sacrifícios que
agradam a Deus e são executados pelos ministros autorizados; 2) Investidura dos
sacerdotes (Lv 8−10): normas sobre o ofício dos que descendem de Levi a partir de
Aarão e de seus filhos. Esses são os que tornam possível o acesso de todo o povo a Deus
através do culto; 3) Prescrições sobre o puro e o impuro (Lv 11−16): elenco de animais,
pessoas e situações que podem comprometer a pureza da comunidade de fé. Se essa é
comprometida, a solução é um ritual de expiação que acontece uma vez por ano e
concede a todo o povo o perdão e a reconciliação com Deus; 4) “Código” da Santidade
(Lv 17−26): sublinha o aspecto positivo das coisas e das pessoas ligadas ao culto. Tudo
deve ser santo como Deus é santo; 5) Apêndice ao “Código” da Santidade (Lv 27): tudo
que pode ser oferecido, pessoas e bens, pode ser consagrado por um voto, mas só pode
ser retomado, quando possível, pelo valor estipulado. Apenas o que fora votado ao
anátema não podia ser resgatado. A dinâmica que anima estas cinco partes é bem clara:
o Deus Santo só pode ser devidamente cultuado por um povo que lhe corresponda em
santidade (cf. Lv 19,2).
Do ponto de vista da formação do livro, nota-se que nele estão contidas muitas leis
antigas e recentes. As leis mais antigas podem derivar de um período no qual o antigo
Israel ainda não possuía um culto e um templo únicos. Elas foram se consolidando e
recebendo atualizações nos santuários locais, até que as mais recentes fossem incluídas
pelo grupo proveniente da diáspora, que regressou para Judá durante o período persa
com a finalidade de reconstruir a cidade de Jerusalém e nela retomar o culto sacrifical.
Este livro completa algumas leis que não entraram nos dois livros precedentes e
descreve alguns fatos que se deram na segunda etapa da peregrinação do povo pelo
deserto. Dessa forma, o período do Sinai e o período do deserto se tornaram os
momentos singulares para a recepção da legislação do antigo Israel. Apesar disso, não
se encontra no livro dos Números uma lógica coerente e clara como nos livros do
Gênesis e do Êxodo.
No conjunto deste livro há muitas revoltas mencionadas, o que deu ocasião para
qualificar Moisés ainda mais, que aparece no seu importante papel de mediador e é
apresentado como o mais humilde dos homens (cf. Nm 12,3). Devido às grandes
resistências que sofreu, foi reconhecido como profeta e homem de Deus (cf. Nm 12,6-
8), servo íntegro na sua fé em Deus (cf. Nm 10,29-32) e no seu amor para com o povo
(cf. Nm 11,2.10-15; 21,7). Sobressai, então, o seu papel como intercessor em favor do
povo, apesar dos seus pecados (cf. Nm 11,27-29; 12). Apesar disso, o livro não oculta
as fraquezas de Moisés: recusa-se a interceder diante de uma rebelião de um grupo de
levitas (cf. Nm 16,15); titubeia na hora de executar uma ordem de Deus (cf. Nm 20,10-
12) e fica abatido pelo peso da missão (cf. Nm 11,11-15).
O último livro do Pentateuco inicia com a voz do narrador que, por sua vez, já está
do outro lado do Jordão, isto é, do lado da terra prometida (Cisjordânia). Por
conseguinte, o que narra olha para o outro lado do Jordão (Transjordânia), onde esteve o
povo e seu líder, nas planícies de Moab, diante de Jericó (Dt 1,1.5; Dt 34,1). A
totalidade do livro, porém, aparece como sendo um longo discurso de Moisés que se dá,
inclusive, no mesmo dia da sua morte na terra de Moab, após ter contemplado toda a
terra que Deus dispôs dar para o seu povo (cf. Dt 34,1-12). Assim, o livro foi concebido
como o testamento que Moisés, antes de morrer, deixou ao seu povo que estava prestes
a entrar e tomar posse da terra prometida. Neste testamento está a exigência da
fidelidade, sem a qual o povo não permanecerá na terra. Tudo o que Moisés fez e
ensinou deve ser colocado em prática, para que se prolongue a vida na terra prometida.
O livro pode ser dividido em introdução, três discursos de Moisés, a bênção dele
sobre o povo e a conclusão, na qual se narra a morte de Moisés e se anuncia Josué como
seu sucessor na condução do povo. A introdução, que se liga ao final do livro dos
Números pelo fato dos filhos de Israel estarem acampados nas estepes de Moab, orienta
todo o conteúdo ao dizer: “estas são as palavras que Moisés dirigiu a todo o Israel” (Dt
1,1-5). Os três discursos são iniciados por uma fórmula que lembra a usada na
introdução: “estas são as palavras”, abrindo o primeiro discurso (Dt 1,6–4,40); “esta é a
Torá”, abrindo o segundo discurso (Dt 4,41-49; 5,1–28,68); “estas são as palavras da
aliança”, abrindo o terceiro discurso (Dt 28,69–32,52). Segue-se a bênção, introduzida
pela frase “esta é a bênção” (Dt 33) e o livro termina com a narrativa da morte de
Moisés (Dt 34). O livro, aberto com as palavras de Moisés a todo o Israel, termina com
todo o povo pranteando a morte do seu incomparável líder.
7 Considerações finais
Portanto, o Pentateuco atesta o dom gratuito de Deus, pela forma como conduz os
eventos salvíficos a favor do seu povo, principalmente pela sua ação libertadora do
Egito, pela celebração da aliança do Sinai, pela manifestação da sua misericórdia ao
perdoar a grave falta do povo que elegeu um bezerro de ouro como seu Deus (cf. Ex
34,1-9) e, finalmente, por introduzir o povo na terra prometida. Nessa dinâmica
histórica, o Pentateuco mostra que Deus, após eleger Abraão e ter permitido que Jacó se
transferisse para o Egito, não esqueceu e muito menos deixou os descendentes dos
patriarcas em terra estrangeira. A razão aparece nas alusões às promessas feitas. A
libertação foi forçada porque houve opressão desmedida e cruel, ao lado da
intransigente resistência do faraó que levou o seu povo e o seu país ao caos. Com isso,
evidencia-se a grande característica de Deus: é fiel à sua palavra. Este é o fundamento
da fé e o critério da verdade salvífica que o Pentateuco quer transmitir. O ser humano
não só pode como deve confiar a sua vida nas mãos do Deus que cria, liberta e mantém
a vida no deserto, onde ela não poderia existir e muito menos prosperar. É o que o
Pentateuco testemunha e transmite em forma de lei e instrução.
Sobrenome "o quinto livro de Moisés" o Dt encerra o ciclo narrativo do Pen tateuco,
apontando para Moisés como o principio de sua unidade. No judais mo, ele geralmente
é designado segundo suas palavras iniciais d'barim "dis cursos". O nome
"Deuteronomio origina-se da tradução da Vulgata e da LXX (ÕEUTepovópuov) de Dt
17,18 (cf. Js 8,32), em que na verdade se lê "cópia dessa Tora" (para o rei), mas a LXX
interpreta "segunda lei" (a qual, depois da outorga da lei no Sinai, está sendo
promulgada agora na terra de Moab).
1-O Direito se apresenta como narrativa dos acontecimentos do dia da mor te de Moisés
(32,50: 34,5.7). É o dia 1° do 11° mês do ano 40 depois da saída do Egito (1,3; 32,48), e
liturgicamente é também o primeiro dia de preparação para a Páscoa em Canaã (Js
5,10). O narrador do livro, entretanto, via de regra ape nas constata que Moisés teria
dito algumas palavras. A maior parte da histó ria relatada é apresentada por Moisés. Nos
discursos de Moisés, a sequência dos relatos não coincide com a dos acontecimentos, a
"fábula". Nos caps. 1-3, por exemplo, já se aborda o tempo do deserto, enquanto no cap.
5 se trata dos eventos no Horeb. O próprio narrador nem sempre se atém à ordem da
fábula.
A assembleia do cap. 29,1, por exemplo, parece ser identica à de 5,1. A razão por que a
seqüência textual se afasta tanto da seqüência da fábula tem a ver com a história de
crescimento altamente complicada do Dt. Os caps. 5–30 tal vez sejam construídos como
grandeza própria porque o verdadeiro documento da aliança, apesar de todos os textos
inseridos, deveria ser conservado com sua característica própria.
16181822 "Projeto de constituição para Israel (leis sobre cargos concebidas com
subdivisão de poderes)
19-25 26,1-15 "Direito penal e civil" (de conteúdo diverso) / "Apêndice liturgico
As leis singulares desses blocos de leis são sistematizadas de acordo com princípios que
também eram comuns em outras codificações legais do antigo Oriente, mas obviamente
estranhos a uma moderna disposição de leis. É característico estruturar o material legal
segundo áreas de assuntos (p. ex., 12.4-28; 13,2-19), conectar as áreas consecutivas por
meio de casos limítrofes (p.ex., 12,29-31), con trator caso e caso aposto (p. ex., 19,1-10;
11-13), alinhar as leis segundo a posição social das pessoas envolvidas (p.ex., 22, 13-
29) ou segundo a seqüência cronológica de acontecimentos (p. ex., 16,1-17). Em
qualquer parte pode acontecer que seja associado material legal tematicamente próximo,
isto é, que seja feita uma inserção motivada por palavras-chave ou associação de
pensamentos, a fim de tratar de uma questão da maneira mais completa possível num só
lugar. Depois de tais digressões volta-se ao tema principal. Esses princípios de
organização servem à memorização. Mais que no antigo Oriente em geral, forma-se no
Dt uma unidade retórica de grupos inteiros de leis por meio de diferentes técnicas
estilísticas, como concatenação de tópicos, molduras, esquema A-B e estrutura
palindrômica (com posição circular). Isso talvez tenha a ver com o fato de que, como
"lei da aliança", esses textos destinavam-se a ser proferidos em público (31,9-13) e
recitados constantemente na família (6,6s).
A Tora" de 5-28, porém, pode ser igualmente entendida a partir da for ma de um texto
de "aliança", isto é, de contrato - assim como também se pode trocar a designação dos
caps. 5-28 como sefer hattöräh, "livro da Torá" por sefer habb'rīt "livro da aliança", no
ambiente linguístico do Dt, quando o contexto trata do estabelecimento de uma aliança
(2Rs 22s). Para um contrato interessa sobretudo assegurar a lealdade diante do parceiro.
Como modelo entra em cogitação o tipo "hitita" de contratos com vassalos. Seu
esquema básico e a correspondência em Dt são: pré-sacerdotal que criou o Tetrateuco
(v. infra, V.2), anteriormente do tempo de Ezequias.
Há vários indícios de que os autores do Dt devem ser localizados nos círculos da elite
dirigente de Jerusalém, que tinham competência literária, teológica e jurídica. Por
exemplo, ao ser encontrado o "livro da Torá" (2Rs 22s), estavam envolvidos de forma
determinante o sumo sacerdote Hilquias e o chanceler Shafan, os dois magistrados mais
importantes do rei. Mais tarde o profeta Jeremias estava ligado à família de Shafan
(sobretudo a Godolias). Além disso a prosa do Dt também possui parentesco com o
estilo de conversação na corte e com a linguagem da literatura sapiencial, tal como
certamente era cultivada entre os oficiais mais graduados. A isso se soma uma
proximidade tanto de conteúdo quanto de forma com a retórica de textos legais neo-
assírios, sobretudo de textos de contratos (v. infra, 3). Eles muitas vezes eram formula
dos de tal maneira que podiam ser apresentados em cerimônias públicas e causar
impressão sobre os ouvintes. Também as partes mais antigas do Dt de vem ter sido
(conforme postulam) ao mesmo tempo documentos legais fixados literalmente e textos
litúrgicos previstos para ser proferidos perante Israel numa assembleia cultural no fim
do período dos reis. Camadas posteriores do Dt (p.ex., 4,1-40) talvez tenham sido
formuladas com objetivos puramente literários. Elas continuaram cultivando o estilo
preestabelecido do Dt, que não pode ser incluído numa categoria de "pregação (levita)".
De fato uma série de leis contém jurisprudência específica para quase todos os
mandamentos do Decálogo. Num estágio posterior da redação, a estrutura do Decálogo
até se tornou princípio de apresentação da lei deuteronômica (v. infra).
Também o que mais tarde os profetas tiverem a comunicar a Israel como palavra de
Javé será, segundo 18,16-18, tão-somente nova explicação do Decálogo.