Poesia 56 - Ondinas

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ONDINAS

Ontem, no primeiro dia do ano, o tédio me consumia.


Mas de uma forma tão brutal que não suportaria
Não fosse ter tido a indomável ideia de ver o rio Uruguai.
Posto que Porto Lucena fique na beira desse rio,
E assim o faz divisa com nossa vizinha Argentina,
Tão cheia de mato do outro lado da costa,
Que me causa uma inveja da consciência ecológica deles.
No lado brasileiro, plantam soja, milho, trigo, fumo, até ao barranco.
São pessoas que não pensam na sustentabilidade do planeta.
Fui com minha irmã que antes chorara e tivera uma crise existencial.
Decidi que precisava tirá-la de casa e fazê-la caminhar,
Pois nada é melhor para a alma e o espírito que por aí vaguear, andar.
E assim fomos, e levamos meus cachorros conosco.
A tarde era quentíssima, mas já estava o sol no poente, mesmo nublado.
Do lado argentino viam-se feixes de luz, como se o nublado lá nada afetasse.
Então descemos a encosta e paramos bem na beira do rio
E nos sentamos nas pequenas pedras que ali habitam.
E refletimos, e um pouco conversamos, e muito contemplamos.
Eu fiquei absolutamente maravilhado com as ondinas do rio Uruguai,
Lentas, calmas, mansas, simpáticas, apaziguadoras.
E o reflexo daquele pouco de sol que vinha do lado vizinho,
Refletindo uma paixão, um sentimento nobre qualquer, uma esperança.
É muito diferente o rio do mar, porque o rio é calmo na maioria das vezes.
Mesmo assim tenho medo de ali banhar-me, porque há buracos fundos.
Mas logo no início havia pedras sob a água, que era quase cristalina,
Pois que não resisti e pus-me a pisar lá com tênis e tudo e meus cachorros.
Minha irmã não quis, preferiu fumar.
Contemplei com todo ardor aquela paisagem que não via há tempos,
Regozijei meu coração a ponto de escrever este poema.
Sabia que me faria bem e fazia tempos que não via o meu rio.
Chamo-o de meu, pois aqui é minha terra natal e este rio sempre fora meu.
E ele é tão lindo em seus meandros, sua calmaria, seus mistérios profundos.
Toda a tristeza, a angústia, o tédio, a instabilidade emocional dissiparam-se.
Voltamos para casa caminhando calma e lentamente, renovados.
Não éramos mais os mesmos, após ver o rio e suas ondinas.
Tínhamos experimentado qualquer coisa de mágica com nossos olhares,
Olhares de artistas, de poetas, de pessoas que sabem contemplar o simples.
E assim voltamos para casa caminhando lenta e vagarosamente, felizes.

G R TISSOT
2, Janeiro 2018.

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