Estudos de Gênero Na Educação Física Brasileira
Estudos de Gênero Na Educação Física Brasileira
Estudos de Gênero Na Educação Física Brasileira
2011v17n1p93
Artigo Original
Estudos de gênero na Educação Física Brasileira
Fabiano Pries Devide
Renata Osborne
Elza Rosa Silva
Renato Callado Ferreira
Emerson Saint Clair
Luiz Carlos Pessoa Nery
Grupo de Pesquisa Gênero na Educação Física e no Desporto, Mestrado em Ciências da
Atividade Física da Universidade Salgado de Oliveira, Niterói, RJ, Brasil
Resumo: A pesquisa objetivou mapear alguns aspectos relativos ao quadro teórico dos estudos de gênero
na Educação Física (EF) no Brasil: correntes teóricas, temáticas recorrentes, lacunas, grupos de pesquisa e
intelectuais cadastrados no CNPq, além dos livros sobre Gênero na EF e esporte. A literatura aponta que
os estudos de gênero na EF iniciam na década de 1980, organizando-se em três correntes centrais:
marxista, culturalista e pós-estruturalista. Abordam temáticas como: metodologias de ensino na EF escolar,
estereótipos nas práticas corporais, mecanismos de inclusão e exclusão na EF; História das Mulheres no
desporto; Representações sociais sobre Gênero na mídia esportiva; Mulheres em posições de comando no
desporto; e Identidades de gênero no desporto. Tais estudos têm abordado prioritariamente as mulheres,
apresentando algumas lacunas teóricas. Identificaram-se 14 livros sobre a temática na literatura da EF,
além de grupos de pesquisa consolidados na EF, intelectuais com doutoramento na área e um número
relevante de teses e dissertações.
Palavras-chave: Gênero. Educação Física. Pesquisa. Epistemologia.
os jogos, as brincadeiras etc.) têm sido uma via sofrem um processo de generificação que as
para a construção das identidades de gênero confere uma identidade masculina (p. ex. futebol)
masculina e feminina (SAYÃO, 2002; SABINO, ou feminina (p. ex. dança), contribuindo para que
2008; PEREIRA, 2008; FARIA, 2008; homens e mulheres que se inserem em
MONTEIRO, 2008; MELO; VAZ, 2008). Há um modalidades opostas ao seu gênero sofram
consenso em interpretar o desporto como uma discriminações.
área de reserva masculina, onde as mulheres Segundo Goellner (2001, 2005), os Estudos de
tendem a sofrer questionamentos em relação às Gênero na EF ainda estão em construção,
identidades de gênero e sexual, além de sofrerem apresentando equívocos de ordem
com o estereótipo da masculinização. epistemológica, analítica, conceitual e política,
Esta questão nos remeteu a uma última não retratando a produção acadêmica da área,
temática identificada nos estudos de gênero: as nem se referindo ao gênero como construto
reflexões sobre a construção sócio-histórica de social, cultural, histórico e relacional. Outros
Estereótipos relacionados às práticas corporais autores (LUZ JÚNIOR, 2003; DEVIDE, 2005)
na EF no Esporte (PEREIRA, 2004). Tais estudos apontam alguns desses equívocos, conforme
têm indicado que as modalidades esportivas tabela 1:
A partir destas reflexões, podemos enumerar de gênero nos currículos de cursos de formação
algumas áreas de sombra nos Estudos de superior em EF.
Gênero, que necessitam maiores reflexões: EF e Grupos de Pesquisa e Intelectuais nos
o Esporte como espaços de construção das Estudos de Gênero na EF brasileira
identidades de gênero; construção de identidades O mapeamento realizado no Diretório de
homoeróticas na EF e no Esporte; produção de Grupos de Pesquisa do CNP sobre os grupos de
sentidos nas imagens de homens e mulheres na pesquisa (GPs) consolidados na temática de
mídia esportiva; estratégias de resistência às Gênero na área de EF são apresentados na
relações de hierarquização de gênero constituídas tabela 2.
na EF e no Esporte; estudos sobre gênero e
O critério utilizado para identificação dos GPs
violência no esporte; e reprodução da hierarquia
foi a recorrência da palavra “gênero”,
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Exemplos de artigos com títulos fictícios (modificados): “Perfil do nível de atividade física em relação ao gênero de idosos” e
“Influência do gênero sobre a variação da estatura em atletas púberes”. Ambos os estudos sugerem o uso do termo “gênero” como
sinônimo do termo “sexo”, ao avaliarem, respectivamente, diferenças entre os sexos no que tange aos níveis de atividade física e
estatura.
Tabela 2. Grupos de Pesquisa em Educação Física que possuem interface com os Estudos de Gênero
CONSELHO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO CIENTÍFICO E TECNOLÓGICO
Diretório de Grupos de Pesquisa (GPs) - (www.cnpq.br)
“Gênero” nos
“Gênero” no
Total de “Gênero” Conteúdos Ausência da
Palavras – chave título das Linhas
GPs no título ou palavra “Gênero”
de pesquisa
Objetivos
Gênero e Educação Física 17 01 05 07 04
Gênero e Esporte 16 02 05 05 04
Gênero e Lazer 06 01 01 02 02
Gênero e Mulher 04 01 *** 01 02
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Apesar de haver dois projetos com títulos similares, a análise de sua descrição no sistema de avaliação dos cursos de pós-
graduação stricto sensu (Capes) permitiu identificar objetivos distintos nos mesmos.
Quanto aos projetos que abordam a temática Após a análise dos títulos e a descrição dos
de Gênero nos PPG Stricto Sensu em EF projetos de pesquisa associados aos PPG Stricto
(mestrado n=20; doutorado n=9), a análise Sensu em EF, classificamos os mesmos em
realizada no site da CAPES permitiu identificar Estudos de Gênero (EG, n=11).
projetos de pesquisas em sete Universidades.
Tabela 5. Obras de referência em Estudos de Gênero na EF brasileira - livros.
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Para fins de classificação, consideramos EG todos aqueles de estudo, mas não utilizavam o gênero como categoria de
que desenvolvessem uma reflexão utilizando o gênero análise.
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enquanto categoria analítica; EGM como aqueles que No entanto, é relevante identificar que já existem no Brasil
tivessem as mulheres como objeto de estudo e utilizassem o estudos de gênero com foco nos homens, como é o caso dos
gênero como categoria analítica; enquanto os EM foram estudos de Silva (2008), Pereira (2008), Monteiro (2008),
classificados como os que tivessem as mulheres como objeto Melo e Vaz (2008), Knijnik e Machado (2008).
que das 14 obras, 6 são coletâneas, sugerindo pesquisa e grupos de pesquisa em PPG stricto
que desde a primeira publicação, em 1995, há um sensu em EF.
número significativo de pesquisadores/as que
Observa-se que os únicos autores/as com
investigam as questões de gênero no âmbito da
mais de uma publicação no formato livro foram
EF.
Elaine Romero (1995, 1997, 2008), Antônio
A segunda questão é que dentre as 14 obras, Carlos Simões (2003, 2004) e Jorge Dorfman
11 estão relacionadas aos estudos de mulheres Knijnik (2003, 2004). A distribuição das
no contexto do esporte e da EF, o que reforça publicações reproduz uma concentração nos
dados oferecidos por Goellner (2001, 2005) e Luz estados do Rio de Janeiro [5], São Paulo [4] e Rio
Júnior (2003), sobre o fato de os Estudos de Grande do Sul [3], onde encontramos linhas de
Gênero na EF brasileira ainda estão focalizados pesquisa consolidadas em PPG stricto sensu
nas mulheres; por vezes confundindo estudos (vide Tabela 4).
sobre mulheres como sendo estudos de gênero.
No que tange às dissertações e teses
A terceira questão é que a maioria das obras – defendidas na área de Educação Física, o
10 – foi publicada após o ano 2000, refletindo um levantamento realizado no NUTESES indica um
aumento da produção acadêmica da área, em número relevante de trabalhos já defendidos em
conformidade com a abertura de linhas de diferentes instituições, conforme Tabela 6.
NUTESES - http://www.nuteses.ufu.br/