Teologia Dogmática - Os Anjos (Pe. Bujanda)
Teologia Dogmática - Os Anjos (Pe. Bujanda)
Teologia Dogmática - Os Anjos (Pe. Bujanda)
Tratado VI
Deus Criador
Capítulo II
Os Anjos
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A) Tradição. C ADeus... desde o princípio do tempo criou do nada duas espécies de
seres C os espirituais e os corporais, isto é, os anjos e o mundo e depois criou o homem,
que sendo constituído de corpo e espírito, como que é comum a ambos os seres@2
B) Escritura. C A Sagrada Escritura fala-nos de seres intelectuais, inferiores a Deus
e superiores aos homens; logo, segundo ela, existem os seres que nós denominamos
AAnjos@.
a) Existem seres intelectuais, chamados AAnjos@
1. O anjo S. Rafael fala com Tobias e sua família. 3
1 ) Actos, XXIII, 8
4 ) S. Lucas, I, 26 e segs.
5 ) S. Mateus, XXVIII, 5.
6 ) Colossenses, I, 16.
7 ) II S. Pedro, II, 4.
8 ) Judas, Vers. 6
9 ) Hebreus, II, 6 e 7.
10 ) S. Marcos, XIII, 32
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próprio Jesus Cristo, a S. João Batista11, aos bispos12, e até às criaturas irracionais, como o
faz o Salmista referindo-se aos ventos13.
A razão está em que todos eles são uma espécie de ministros enviados do Senhor, e
em hebraico a palavra que significa anjo tem propriamente o sentido de enviado.
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A) Tradição C Eis como se exprime o IV concílio de Latrão, já mais de uma vez
citado: ADeus... desde o princípio do tempo criou do nada duas espécies de seres, os
11 ) 20"Ecce mitto angelum meum, et praeparabit viam ante faciem meam... et angelus
testamenti quem vos vultis@ Malaquias, III, 1. A interpretação deste texto encontra-se em s. Mateus,
quando Jesus Cristo se refere a São João: AHic est enim de quo scriptum est: Ecce ego mitto angelum
meum ante faciem tuam, qui praeparabit viam tuam ante te@. S. Mateus, XI, 10.
12 ) Apocalipse, XXI; 3, 1.
13 ) Salmo, CIII, 4
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espirituais e os corporais, isto é, os anjos e o mundo, e depois criou o homem, que sendo
constituído de corpo e alma, como que é comum a ambos os [email protected]
O Concílio tinha em vista definir a criação de todos os seres, e não a espiritualidade
dos anjos. Portanto, este testemunho não prova que seja de fé católica a espiritualidade
dos anjos.
B) Escritura C Maneira como se expressam os livros sagrados:
11 A Sagrada Escritura, ao falar dos anjos, chama-lhes espíritos.
a) São Paulo, referindo-se aos anjos bons, diz que Atodos são espíritos ministros de
Deus, enviados em auxílio dos que se hão-de salvar@15.
b) S. Mateus, aludindo à cura de vários possessos que Jesus libertara do demônio C
dos anjos maus C escreve: Aexpulsava, com a sua palavra, os espíritos@16.
21 A Escritura nunca faz menção do corpo dos anjos; pelo contrário, aplica aos
anjos a designação de espíritos, à semelhança do que faz com Deus: ADeus é espírito@17.
Ora, sendo Deus imaterial, ou puramente espiritual, segue-se que também os anjos o são.
31 Confirma-o ainda a Escritura, que ao falar da alma humana, não lhe chama
simplesmente espírito como aos anjos, mas o meu espírito, o espírito do homem: Anas
tuas mãos encomendo o meu espírito @, diz Jesus a seu Eterno Pai, antes de expirar 18.
ASenhor Jesus, recebe o meu espírito@, exclamou o protomártir Santo Estêvão, quando o
apedrejavam19. AQuem dos homens sabe as coisas que são do homem (isto é, o que se
passa no seu interior), senão o espírito do homem, que nele reside?@20, pergunta o
Apóstolo São Paulo.
Conclusão C Vemos pois que a Escritura chama aos anjos Aespíritos@, pura e
simplesmente, à semelhança do que faz com Deus, que nem é matéria, nem a esta se une
por natureza, para constituir um novo ser; por outro lado, quando se refere à alma
humana, apesar de ser espiritual, nunca lhe chama simplesmente Aespírito@, mas Ameu
espírito@, etc., por não ser o homem só espírito; temos, portanto, de concluir que os anjos
são espíritos puros ou completamente imateriais, como Deus.
15 ) Hebreus, I, 14.
23 ) S. João, IV, 34
24 ) S. Lucas, III, 22
25 ) Actos, II, 3
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podia, é certo, fazer o milagre de nos conservar a vida perpetuamente; neste caso
seríamos imortais por graça ou favor. É a imortalidade que nos espera na outra vida,
depois da ressurreição.
A alma ao contrário do corpo, é imortal por natureza e assim, continuará a viver
eternamente, sem milagre de espécie alguma. É claro que Deus poderia, apesar de tudo,
tirar-lhe a vida, privando-a da existência.
Só Deus é de tal natureza que em caso nenhum pode perder a vida. Esta
imortalidade divina chama-se essencial.
Resumindo:
Imortalidade essencial, é a própria de um ser que em nenhum caso pode perder a
vida.
Imortalidade natural, é a própria de um ser que pela sua mesma natureza está livre
da morte, se Deus não lhe tirar a existência.
Imortalidade gratuita, é a própria de um ser, de natureza mortal, mas a quem Deus,
por milagre, conserva eternamente a vida.
Prova
Observação C Entre os Santos Padres alguns afirmam que os anjos são mortais,
outros que são imortais. Esta contradição é apenas aparente. Ao afirmar que os anjos são
mortais, querem os primeiros significar que Deus poderia aniquilá-los: ao dizer que são
imortais, pretendem os últimos ensinar que à semelhança de nossa alma, nada há neles
que lhes possa originar a morte. Por outras palavras: os primeiros negam a imortalidade
essencial, própria só de Deus; os segundo afirmam a imortalidade natural. Na prática,
não se faz hoje tal distinção; dizemos simplesmente que os anjos são imortais.
Notas Complementares
10. Número de Anjos C Ninguém sabe quantos anjos criou Deus, mas a Escritura
deixa entrever que o seu número é muito grande. Daniel diz-nos: AMilhares de milhões o
serviam, e centenas de milhares assistiam ante o seu trono@27. Jesus Cristo declara a São
Pedro, no horto de Getsemani, que seu Pai Lhe enviaria, se ele lho pedisse, mais de doze
legiões de anjos28, e S. Pedro refere-se ao seu grande número29.
20 Diversidade de categoria nos Anjos C Que nem todos os espíritos angélicos são
da mesma categoria,parece insinuá-lo claramente a Escritura, ao afirmar que São Miguel
é Aum dos principais@30, e também ao falar-nos de Arcanjos31, palavra que,
indubitavelmente, indica uma classe superior à dos simples anjos. Os mesmos livros
sagrados designam os anjos com nove nome diferentes: anjos 32, arcanjos33, principados,
potestades, virtudes, dominações34, tronos35, querubins36 e serafins37.
Por esta razão se contam ordinariamente nove coros ou graus na hierarquia
angélica. Contudo não está averiguado se esses nomes representam diversos graus de
perfeição ou diversos ofícios apenas. São conhecidas, a este respeito, as palavras de Santo
28 ) S. Mateus, XXVI, 53. O número de soldados na legião romana oscilava entre 4.000 a
6.000
29 ) Hebreus, XII, 22.
30 ) Daniel, X, 13.
34 ) Efésios, I, 21.
35 ) Colossenses, I, 16.
37 ) Isaías, VI, 2
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Agostinho: AComo se distribui essa altíssima dignidade, diga-o quem puder, eu confesso
que não sei@38.
30 Quando foram criados os Anjos? C Há diversidade de opiniões. Segundo a mais
corrente, foram criados no princípio do mundo, ao mesmo tempo que a matéria de onde
se formaram os céus e a terra.
39 ) ADeus não perdoou aos anjos prevaricadores@. Deus angelis peccantibus non pepercit@. II
S. Pedro, II, 4
40 ) AAngelos vero qui non servaverunt suum principatum... vinculis aeternis sub caligine
reservavit@. S.Judas, ver. 6.
TESE: Desde que terminou o tempo de prova, os anjos que não
pecaram gozam da clara visão de Deus.
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A) Tradição C Bento XII define que as almas dos que morrem em graça e
de nada têm que purificar-se, Aestão com Cristo no paraíso celestial,
associados à companhia dos Santos Anjos@41. Supõe-se, portanto, que, aos
anjos e aos homens, é concedido o mesmo prêmio. Ora, dado que as almas
dos bem-aventurados gozam da visão clara de Deus como se define no
mesmo documento, segue-se que os anjos também desfrutam dela.
B) Escritura C a) Cristo Nosso Senhor recomendou que se não
escandalizassem as crianças Aporque os seus anjos no céu incessantemente
estão vendo a face de meu Pai@42.
b) O Apocalipse apresenta-nos os anjos e os homens reunidos diante do
trono do Altíssimo43. Mas, gozando os homens, no céu, da visão clara de
Deus C na qual consiste a bem-aventurança eterna C, deduz-se claramente
do texto do Apocalipse, ao menos se o unimos ao anterior de S. Mateus,
que os anjos gozam da visão de Deus.
TESE: Uma parte dos anjos pecou e foi condenada a tormentos eternos.
I) Os Anjos Pecaram
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42 ) S. Mateus, XVIII, 10
Notas Complementares
10 Os anjos maus não tiveram possibilidade de fazer penitência depois do pecado,
para conseguirem a felicidade eterna.
Qualificação: É doutrina comum dos teólogos.
Os homens ainda que pequem muitas vezes, nem por isso ficam irremediavelmente
perdidos, porque Deus concede-lhes, ordinariamente, entre o pecado e a morte, tempo
suficiente para se arrependerem, e livrando-se , por esta maneira, do inferno, obterem a
glória. Aos anjos, pelo contrário, não lhes foi dado tempo de arrependimento; com o
pecado, acabou-se0-lhes o tempo de prova. Assim o ensinamos teólogos, apoiados no
46 ) II S.Pedro, II, 4.
20 O não ter sido concedido aos anjos, depois do pecado, tempo de arrependimento,
não repugna à misericórdia de Deus. C Os anjos não sentiam inclinações ao pecado,
como as que no homem provêm do corpo, e por outro lado a sua privilegiada inteligência,
via claramente o castigo a que se sujeitavam pecando.
Não obstante isso, e com plena deliberação do que faziam, ofenderam a Deus, Ora
bem, se os homens dificilmente abandonam uma resolução, que tomaram depois de
ponderarem com seriedade todos os inconvenientes que ela encerra, muito mais
dificilmente os anjos, cujo entendimento penetra incomparavelmente melhor que o do
homem, os motivos das suas decisões.
Negar tempo de penitência a quem pecara sem a isso se entir aliciado e conhecendo
perfeitamente as conseqüências a que se expunha, não é contra a misericórdia divina,
tanto mais se, dificilmente viria a ter arrependimento.
30 Qual foi o pecado dos anjos? C Não consta da Tradição nem da Escritura 50 em
que consistiu o pecado dos anjos. Os teólogos julgam tratar-se de um pecado de soberba,
ou seja, de complacência na própria excelência com menoscabo da honra e respeito
devidos a Deus. Estes elementos encontram-se aliás, em todo o pecado, pois quem ofende
a Deus prefere à divina a própria vontade, e nela se compraz.
49 ) II S. Pedro, II, 4.
50 ) 20N.D: Tal afirmação é rara, pois Vicente Risco, em sua AHistoria del diablo@, falando
sobre o mesmo tema, cita as seguintes passagens dos livros sagrados:
APero los textos del Eclesiástico 20X, 15: *El princípio de todo pecado es la soberbia +; de Tobías
20IV, 15.: *No permitas jamás que la soberbia domine en tu corazón o en tus palabras, porque de ella
tomó principio toda especie de perdición +; de Isaías 20XIV, 13-14. *Lucifer, tú decías en tu corazón:
escalaré el cielo, sobre las estrellas de Dios levantaré mi trono, sentaréme sobre el Monte del Testamento,
al lado del Septentrión; sobrepujaré a las nubes, seré semejante al Altísimo +, ha inclinado a la mayoría de
los Santos Padres y de los Doctores a creer que fue pecado de soberbia.
Según Santo Tomás, Lucifer quiso ser tanto como Dios: Elevatum est cor tuum, et dixisti: Deus
ego sum (Ezequiel, XXVIII.), y creyó que la bienaventuranza la era debida por naturaleza.@
TESE: Deus confia aos Anjos bons a guarda dos homens.
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A) Escritura C Diz-nos o Salmista que o anjo do Senhor Alevantará a sua tenda
(isto é, fixará a sua morada) no meio dos que temem a Deus e os tirará do perigo@51. Jesus
Cristo, referindo-se às crianças que certo dia tinha na sua frente, disse: AOs seus anjos no
céu incessantemente estão vendo a face de meu pai@52. O Apóstolo S. Paulo escreveu:
ATodos (os anjos bons) são espíritos, ministros de Deus, enviados em auxílio dos que se
hão-de salvar@53. Consta, pois, claramente da Escritura que, em geral, Deus envia os seus
anjos para guardar os homens.
É verdade, que o primeiro texto se refere diretamente aos Judeus tementes a Deus,
e o segundo às crianças israelitas que Jesus tinha diante de si: mas não havendo razão
para supor que se tratava de um privilégio, somos levados pela Escritura a concluir que
não só os predestinados mas todos os cristão, sejam ou não predestinados, têm o seu anjo
da guarda, já que eles formam atualmente o povo de Deus, como outrora os Judeus.
B) Liturgia C A Igreja na sua Liturgia, ao estender a todo o mundo a festa dos
Anjos Custódios, ensina-nos praticamente, que todos os fiéis têm o seu anjo da guarda.
Observação C Apesar de estar mais vulgarizada a doutrina de que cada fiel, tem o
seu Anjo da guarda próprio, não é, contudo, tão certa como o fato geral de que nos são
dados anjos da guarda. Poderia, muito bem, estar confiada a um, a guarda de várias
pessoas, como a um aio a de várias crianças.
52 ) S. Mateus, XVIII, 10
53 ) Hebreus, I, 14.
55 ) I S. Pedro, V, 8.
56 ) Efésios, VI, 12
TESE: Os anjos maus chegam às vezes a apoderar-se dos homens.
Qualificação: Que se tenham dado alguns casos, v. g. no Evangelho, é de fé; que depois se
tenham repetdio, é doutrina comum dos teólogos que não pode ser negada sem
temeridade.
Explicação C Diz-se que um homem está possesso quando nele entrou e mora o demônio.
Acreditar com facilidade que uma pessoa está possessa é próprio de ignorantes. Negar que se
tenham dado casos de verdadeira possessão, seria negar uma verdade claramente ensinada pela
Sagrada Escritura.
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A) Escritura C Prescindindo, por agora, de outros casos que refere a Sagrada
Escritura, é certo que alguns deles só podem explicar-se por verdadeira possessão; logo, a
possessão diabólica é um fato real.
11 S. Lucas narra como Jesus, ao expulsar de certo homem o demônio, lhe
perguntou: AQue nome é o teu? Ele então respondeu: Legião. Porque eram muitos os
demônios que tinham entrado nele@57. E pediram a Jesus, que em vez de os mandar para o
abismo os deixasse entrar numa vara de porcos que ali andava a pastar. Jesus
permitiu-lhes, e logo os animais correram a precipitar-se no lago vizinho. Não se pode
negar que se trata aqui de verdadeira possessão diabólica.
21 S. Marcos escreve que um dias, Asendo já sol posto, levaram (a Jesus) todos os
que estavam doentes e os possessos do demônio@, e Jesus Acurou a muitos que se
achavam oprimidos de diversas enfermidades e expulsou muitos demônios@58. É evidente
que o evangelista se refere, nesta passagem, à cura de doentes e à expulsão de demônios,
como a dois casos diferentes.
Nota
Nomes que se costumam dar aos anjos maus: diabo, demônio, satanás, lúcifer e
lusbel
Lemos no IV concílio de Latrão que Ao diabo e os outros demônios foram criados
bons por natureza, mas eles mesmos, por sua culpa, se fizeram maus@59.
Jesus Cristo declara que o fogo do inferno Afoi preparado para o diabo e para os
seus anjos@60.
Nestas passagens da Tradição e da Escritura, o diabo é apresentado como chefe dos
espíritos a que chamamos anjos maus ou demônios. ADiabo@, palavra de origem grega,
significa inimigo, caluniador, e seria a tradução do vocábulo hebraico ASatanás@, que tem
o sentido de adversário. Em latim e português é freqüente chamar Lúcifer ao diabo C
embora na Escritura nunca se lhe dê este nome.
Alúcifer@ é tradução do vocábulo grego Aeosfóros@ que significa portador da aurora e
vulgarmente AEstrela da manhã@, nome que o Profeta Isaías61 dá ao rei de Babilônia, ao
descrever como este rei caiu, do mais alto esplendor na mais profunda miséria. Os Santos
Padres usaram desse fato como exemplo da queda de satanás, e daí se ocasionou o nome
de lúcifer. Em português chama-se-lhe também Alusbel@.
A palavra Ademônio@, de origem grega, parece significar um ser privilegiado,
intermédio entre Deus e os homens.
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61 ) Isaías, XIV, 12