Aptece-Manual Prático de Turismo de Culinária - 2014

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Manual Prático

de Turismo de Culinária

Manual Prático de Turismo de Culinária - APTECE 2014


Ficha técnica

Coordenação técnica: APTECE


Conteúdos, grafismo e impressão: CPL Meetings & Events
Fotografias de capa e contracapa: Mário Cerdeira (100% Foto)
Fotografias de interior: Emanuele Siracusa
Exemplares produzidos: 500

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Manual Prático de Turismo de Culinária - APTECE 2014
Introdução
O comportamento do turista tem vindo a mudar e, com isso, Temos algumas carnes genuínas, produtos
têm surgido novas motivações de viagens e expectativas que hortícolas e frutas de excelência, um azeite
precisam ser satisfeitas. Num mundo globalizado, onde a que se distingue pelo “saber fazer” dos
diferenciação possui, a cada dia, maior importância, os nossos mestre lagareiros, pelo nosso clima e
turistas exigem mais atrações turísticas que se adaptem às solo e pelos olivais centenários.
suas necessidades, à sua situação pessoal, aos seus desejos e
preferências. Temos os queijos e os enchidos, uma grande variedade de
vinhos, tintos, brancos, rosé e verdes, mas também o do
A APTECE – Associação Portuguesa de Turismo de Porto, Pico, Moscatel e o vinho da Madeira, todos eles de
Culinária e Economia, reconhece essas tendências no excelência e reconhecidos mundialmente. Temos a Lourinhã,
turismo como oportunidades para valorizar Portugal. a 3ª região demarcada de aguardentes vínicas da Europa, a
par das regiões de Cognac e Armagnac.
Por isso, propõe a criação de produtos experienciais
singulares que permitam contar histórias, revelar segredos e Temos o nosso doce mel e a doçaria conventual portuguesa,
dar a conhecer técnicas da nossa culinária e gastronomia. única no mundo. Temos as conservas, as ostras e outras
iguarias, por vezes mais conhecidas lá fora que cá dentro e
Portugal é um país possuidor de um património cultural rico, depois temos as histórias únicas que dão a conhecer as
variado e original, no qual se enquadra a nossa culinária e heranças, as culturas culinárias e gastronómicas de cada
gastronomia. Um património cultural do qual, nós região, necessárias promover e preservar para defender
portugueses nos deveremos orgulhar, quer quanto ao seu identidades regionais, assentes na qualidade, autenticidade e
papel histórico, quer quanto à sua valia atual, como produto genuinidade.
estratégico para o desenvolvimento do turismo.
Mas para que estas oportunidades sejam efetivas, é
Temos pães feitos com farinhas de todos os melhores cereais, necessário conhecer profundamente as nossas características:
temos um fumeiro de uma riqueza e variedade incomuns, a oferta (atrativos, infra-estrutura, serviços e produtos
temos os melhores peixes e mariscos do mundo, temos o turísticos) e a procura (as especificidades dos turistas que já
bacalhau, que embora muitos digam que não é nosso, o é nos visitam ou visitarão). Ou seja, quem entende melhor a
sim, que o bacalhau salgado seco é criação nossa. procura e promove a qualificação ou aperfeiçoamento do seu
“ p ro d u t o ” , t e r á m a i o r f a c i l i d a d e d e i n s e rç ã o e
posicionamento neste mercado.

Por isso lançámos este Manual Prático de Turismo de


Culinária, para que motive o esforço coletivo, no intuito de
diversificar e interiorizar o turismo de culinária em Portugal,
com o objetivo de prestar informação e transmitir conceitos
que ajudem à percepção daqueles que atuam no processo
de promoção, desenvolvimento e comercialização dos
destinos, produtos e serviços turísticos em Portugal e que
possam preparar-se para atuar neste mercado no Turismo de
Culinária.

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Manual Prático de Turismo de Culinária - APTECE 2014
Objectivo e âmbito do manual
De acordo com o “Global Report on Food Tourism” da A referência à gastronomia (boa comida e bebida) passou
Organização Mundial de Turismo, o turismo gastronómico é o também a figurar nos factores mais importantes, na maioria
segmento de maior crescimento na indústria do turismo. dos estudos feitos, a nível mundial, sobre a matéria, surgindo
em que todos como o 3º factor mais importante a seguir à
Efetivamente, muitos países, destinos turísticos, agentes “segurança” e “relação qualidade/preço” satisfatória dos
promotores do turismo, empresas de eventos, operadores destinos.
turísticos, agentes de viagens e outros prestadores de
serviços no turismo, têm reconhecido a importância do Os efeitos do turismo associado à gastronomia devem ser
turismo gastronómico no desenvolvimento do turismo local, entendidos numa lógica de desenvolvimento regional,
regional e nacional. promovendo o consumo local, dos produtos, serviços e da
cultura local, podendo ser um motivador para a cooperação
O turismo associado à gastronomia é um segmento de local, criando plataformas de associativismo e prática de
mercado em rápida expansão, com uma curta história e que atividades conjuntas.
em Portugal dá o seus primeiros passos. É contudo, um uma
área com enorme potencial de crescimento, sobretudo se Por todos estes motivos, justificava-se a criação deste Manual
combinado com outros segmentos turísticos: aventura, Prático de Turismo de Culinária, cujo objetivo é de
saúde, desportos de inverno, cultura, entre muitos outros. proporcionar, às entidades interessadas, uma base para
melhor compreender o turismo de culinária e para o tornar,
A Comida, tal como as Viagens, são parte inevitável da em Portugal, mais competitivo e interessante, não apenas do
existência humana, logo a experiência gastronómica pode ser ponto de vista económico, mas com vista à preservação da
uma atração acrescida para qualquer tipo de atividade cultura local, regional e nacional. Nele abordamos a relação
turística e aparentemente atraente para uma ampla gama de entre comida e turismo, descodificamos conceitos e
clientes. tipologias dos turistas, identificamos os principais benefícios
e apresentamos dicas para os que rapidamente querem
“Comer fora” é uma das três principais atividades turísticas e envolver-se neste segmento.
quase 100% dos turistas “comem fora” durante as suas
viagens. Este Manual não é estanque, nem apresenta todas as
soluções ou caminhos, nem poderia, porque cada empresa,
Hoje, as atividades culinárias incluem festivais gastronómicos, cada negócio e cada agente que queira envolver-se em
visitas a mercados locais, atividades de pesca, escolas de turismo de culinária, possui as suas próprias características,
culinária, visitas a agroturismo, vindimas, acções de está inserido num determinado contexto e esse é essencial
degustação diversas e, claro, restaurantes. para determinar a melhor estratégia.

Os destinos de turismo de culinária mais O objectivo deste Manual é sensibilizar os vários agentes no
populares são a França, Itália e a Califórnia, terreno, sejam profissionais e empresários ligados ao turismo
constando a Croácia, Vietname, México e (a nível global, regional, nacional e níveis locais), decisores
Perú nos destinos emergentes, sendo políticos locais, responsáveis de promoção do turismo local,
de prestar atenção ao desenvolvimento ONGs, assim como agências de cooperação bilaterais e
que paulatinamente o Brasil tem vindo multi-laterais, para o potencial do turismo de culinária.
a sofrer.

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Manual Prático de Turismo de Culinária - APTECE 2014
1. A relação entre a comida e
o turismo

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Manual Prático de Turismo de Culinária - APTECE 2014
Consumo como parte da experiência
O consumo é um aspecto integral da experiência turística.
O turista consome não só imagens e sons, mas também o
gosto por um determinado lugar.

Quase todos os turistas comem fora (almoçam, lancham,


jantam) e a comida torna-se assim um importante meio para
penetrar noutra cultura.

A comida local é um dos atributos fundamentais de um


destino e que para além de servir o propósito do aumento
do numero de atrativos do destino, contribui igualmente para
o grau de satisfação final do turista, com o destino.

“Comer fora” é uma forma crescente de lazer, onde as


refeições são consumidas não por mera necessidade, mas
por prazer, onde a atmosfera e a ocasião fazem parte da
experiência, tanto quanto a própria comida.
Esta tendência de consumo das refeições fora do lar, já tinha
No entanto, quando se trata de turistas, uma refeição fora sido a motivação, para a industria alimentar globalizada,
tanto pode ser uma necessidade como um prazer. Enquanto tornar alimentos e culturas gastronómicas de todo o mundo,
alguns turistas o fazem somente para satisfazer a sua fome, mais acessíveis. Por consequência e associados a outros
outros fazem-no para experimentar a gastronomia local, fenómenos e tendências, tal estimulou, na mesma medida, o
porque, para estes últimos, estas experiências formam parte interesse pela a gastronomia como tema de revistas,
importante de seu itinerário de viagem. programas de rádio e de televisão, em especial a televisão
por cabo, com canais apenas dedicados a viagens e comida.

A popularidade de determinados canais como o Food


Network ou 24 Kitchen, abordam com tal perfeição viagens e
a gastronomia, que muitas vezes é difícil perceber se estamos
a assistir a um programa sobre gastronomia ou sobre
viagens.

Toda esta evolução contribuiu para estimular o interesse das


pessoas em experimentar receitas únicas e exóticas, produtos
alimentares étnicos e a cultura alimentar dos destinos, de tal
forma que muitas vezes viajamos para determinado local,
especificamente para experimentar receitas desse local ou
para saborear os pratos de determinado Chef.
Viajar para comer assumiu um novo significado.

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Manual Prático de Turismo de Culinária - APTECE 2014
Razões para a crescente Factos
importância do turismo de culinária ✤ O turismo de culinária pode ser, em grande parte, uma Os mercados emissores para o turismo de culinária estão
atividade de turismo interno, com os consumidores a maioritariamente na Europa e América do Norte, em
O turista de hoje é mais culto do que o de há 20 anos, possui Isto sugere que o consumo alimentar dos turistas contribui viajarem para lugares específicos para comer e beber particular:
mais informação, procura novas experiências, está substancialmente para os restaurantes e outros locais de produtos produzidos localmente; ✤ Alemanha
preocupado com o meio ambiente, interessa-se em participar refeições, indústria alimentar, entre outros, logo para a ✤ Reino unido
nas atividades, procura o bem-estar, aspira a um determinado economia local. ✤ Estudos nos EUA referem que 17% dos turistas americanos
✤ Benelux (Bélgica, Holanda, Luxemburgo)
estilo de vida e quer experimentar a cultura local quando vai se envolvem em atividades relacionadas com a culinária.
✤ Italia
de férias. Num mundo cada vez mais competitivo, cada região ou Para a WFTA (World Food Travel Association) esse número
✤ França
destino procura constantemente um produto único para se crescerá rapidamente nos próximos anos, dado que se
✤ Escandinávia
A comida assumiu um aspecto significativo na experiência diferenciar de outros destinos. As tradições alimentares, estima em 27 milhões o número de americanos que
✤ Estados Unidos
turística dos destino, impulsionada pelas tendências técnicas culinárias e a gastronomia única num determinado fizeram da experiência culinária o mote das suas viagens
Contudo as alterações na economia a nível mundial, na
crescentes de autenticidade e a necessidade de ter uma local, são dos recursos mais distintos e que podem ser nos últimos três anos;
última década, trouxe para este grupo a Rússia e a China.
experiência de alta qualidade. utilizados como ferramenta de marketing para obter mais ✤ No Reino Unido, o turismo de culinária é estimado em
visitantes. quase 8 biliões de dólares por ano, onde o street food Na Europa, os principais destinos em turismo de culinária e
A gastronomia tem assumido uma importância inegável para começa ter um lugar de evidência; reconhecidos como tal, são:
os turistas. Como tal, o turismo gastronómico ganhou um Isto é particularmente evidente a partir de vários estudos ✤ Espanha
enorme potencial nos últimos anos. Uma elevada sobre enoturismo que demonstram que os turistas viajam ✤ Os festivais gastronómicos constituem o único caso em
✤ França
percentagem de turistas considera a experiência alimentar para destinos que estabeleceram uma reputação como que a decisão de viajar é tomada exclusivamente com
✤ Italia
como atividade relevante durante as suas viagens, no local para experimentar produtos locais de qualidade. base nas experiências gastronômicas oferecidas. Por este
entanto, o papel da alimentação na comercialização dos Exemplo disso é a reputação criada por regiões como: Napa motivo estão a ter cada vez maior destaque, em particular
Na Ásia, destacam-se:
destinos recebeu até recentemente muito pouca atenção Valley (Califórnia), Provence (França), Toscânia (Itália), Niagara na Europa. Embora se trate de um segmento em
✤ Japão
global e localmente. (Ontário, Canadá), Yarra Valley (Victoria, Austrália). crescimento, de momento estimam-se em cerca de um
✤ Índia
milhão os turistas culinários internacionais que viajam por
✤ Tailândia
Todas as indicações, no entanto, são de que a comida local Outro exemplo é o caso de países como o Canadá e a ano;
tem muito potencial para aumentar a sustentabilidade do Austrália, que já trabalham há alguns anos e de forma ✤ Maioritariamente, os turistas culinários tendem a ser casais
turismo; contribuir para a autenticidade do destino e continuada, o segmento de turismo de culinária nas suas com poder de compra, entre os 35 a 55 anos ou idosos,
fortalecer a economia local. estratégias de marketing, promovendo a culinária local junto mas não se limitando exclusivamente a nenhum grupo
dos seus mercados potenciais. demográfico ou étnico;
Fisiologicamente temos a necessidade de nos alimentarmos
pelo menos 3 vezes por dia. Logo, do ponto de vista Um caso de sucesso é o do turismo do Canadá, que tem no ✤ A WFTA afirma que, em média, os turistas culinários
económico, existe praticamente um mercado com 100% de turismo de culinária um importante contribuinte para o gastam cerca de 980€ por viagem, com mais de um terço
potencial para explorar. crescente mercado de turismo cultural. Em 2002, o Canadá (36% ou 350€) do seu orçamento de viagem em atividades
adoptou como estratégia, para ir de encontro às tendências ligadas à gastronomia;
Dados globais, da WFTA (World Food Travel Association), mundiais, o desenvolvimento de vinho de alta qualidade e de ✤ Os considerados "deliberadamente" turistas culinários
dão-nos conta que cerca de 36% dos gastos dos turista são experiências de turismo de culinária envolvendo eventos e (ou seja, para quem as atividades culinárias são a principal
efetuados em alimentação e que dentre todas as áreas outras atividades com uma abordagem multi-regional. Dessa razão de viagem) tendem a gastar uma quantidade
possíveis de gastos, durante uma viagem, os turistas são estratégia resultaram estadias mais longas nas regiões e significativamente maior de seu orçamento total de
menos propensos a fazer cortes no seu orçamento com aumento das despesas dos visitantes, resultando em viagens (cerca de 50%) em atividades relacionadas com a
alimentação. benefícios para a agricultura e economia local. gastronomia.

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2. Turismo de Culinária

Manual Prático de Turismo de Culinária - APTECE 2014


Definição de Turismo de Culinária
Discute-se bastante e gera-se, por vezes, confusão, sobre as Na interpretação da definição da WFTA (2013),
diferenças entre o turismo gastronómico e turismo de este termo pode abranger e implicar toda a
culinária e se não são o mesmo. indústria alimentar, produtores primários ou
secundários (transformadores), restaurantes, eventos
Há diferenças e têm a ver sobretudo com a forma como é gastronómicos, hotéis e outros serviços de turismo, street
feito o envolvimento do turista e a forma como usufrui da food, venda ambulante, mercados locais, take away,
experiência. Comecemos por explicar a diferença entre restaurantes típicos ou de luxo, aulas de culinária,
gastronomia e culinária: demonstrações por chefs ou quaisquer atividades em que
receitas e produtos estejam envolvidos e possam constituir
A Gastronomia – a expressão nasce no grego antigo: gastros experiências exclusivas e inesquecíveis ao viajar.
= estômago e nomia = lei ou conhecimento – e refere-se a
uma arte que engloba a culinária (ofício de preparar Significa isto que há um público específico de pessoas que
alimentos, bebidas e a matéria-prima de que se valem os estão dispostas a viajar pelo mundo, a fim de provar e
profissionais para a elaboração dos pratos e todos os experimentar a autêntica cozinha internacional.
recursos culturais ligados a esta criação).
Contrariamente ao que muitos julgam, o turismo de culinária
A Culinária é a arte de cozinhar, ou seja, confeccionar não é:
alimentos e evoluiu ao longo da história dos povos, ✤ pretensioso ou exclusivo, nem propriedade ou destinado a
tornando-se parte da cultura de cada um dos povos. A um grupo de elites, nem poderia porque a própria culinária
culinária varia de região para região, não só nos ingredientes, é popular;
como também nas técnicas culinárias e nos próprios ✤ feito apenas em torno de restaurantes, comida, vinho ou
utensílios. receitas, abrange a produção, o território, a cultura e
muitos outros aspectos;
Neste sentido, as definições associadas ao turismo espelham ✤ apenas gourmet ou sobre fancy food ou em tornos de
igualmente dois tipos de realidade diferentes. restaurantes de luxo;
✤ apenas uma lista de restaurantes…
O turismo gastronómico está relacionado com a viajem feita
para destinos onde a comida e as bebidas do local são O turismo de culinária é:
atrativos suficientes para motivar a viagem, sem envolver ✤ mais que experiência agrícola, integra a produção, os
necessariamente a experiência culinária. valores e historia em seu torno, mas devidamente
transpostas para a prática culinária;
O turismo culinário está relacionado com a experiência em ✤ pensar primeiro na satisfação do turista e depois do
torno das artes culinárias, não apenas no usufruto da produtor, indo de encontra às suas expectativas;
refeição, mas na “procura de uma experiência única e ✤ uma experiência única e memorável que perdure nas
memorável” que perdure na mente do turista. recordações do turista e o motive a partilhá-la;
✤ dedicado também á comunidade local, envolvendo-a
genuinamente nas atividades como promotor e como
beneficiário, contribuindo para a sustentabilidade das
mesmas.

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Manual Prático de Turismo de Culinária - APTECE 2014
Origem do Turismo de Culinária
O turismo de culinária, como referido anteriormente, consiste É visível nas muita pessoas que desfrutam, hoje, do ambiente
na procura pela divertida e extraordinária experiência em natural, no regresso à cozinha, aos produtos típicos, à
torno da gastronomia local. procura do artesanal e fresco, com origem na terra e destino
na mesa.
O turismo de culinária tem origem no momento em que o
acto de comer e beber se tornaram fatores auxiliares, nalguns A alimentação, tornou-se um item de prazer e indulgência e
casos essenciais, para a satisfação geral do turista com o essa mudança tem vindo a ser visível na diversificação que
destino. sem vem operando no mundo rural.

Esse momento surge por força de um conjunto de factores O mundo agrícola vive excedentes de produção, pelo que se
que contribuíram para esta forma diferente de encarar a tem aos poucos aberto ao desenvolvimento de actividades
alimentação e que derivam de fenómenos da urbanização, os turísticas.
desenvolvimentos em torno da agricultura, a globalização
entre outros, ao qual o próprio desenvolvimento tecnológico Existem, já, empresas inovadoras que estão, a partir desses
não é alheio. excedentes, a gerar novos produtos e serviços para consumo
✤ a urbanização como causa da separação humana com a quer dos habitantes locais, quer dos turistas e que passam
cultura agrícola e rural, a partir do qual o alimento cria por atividades mais estruturadas como atrações turísticas,
raízes (visita às quintas, a colheita de frutos, vindima, etc.); alojamento (casas de campo, hostels em quintas) e
✤ o modo como a indústria agrícola encara a mudança para estabelecimentos (restaurantes locais, ranchos, vindimas,
alternativas mais turísticas (turismo de culinária como entre outros) e outras menos complexas e que incluem visitas
subsector do turismo rural); a lojas rurais, produtores e quintas.
✤ as respostas individuais no sentido da globalização e
localização e que justificam a mutação dos indivíduos
consoante os seus interesse para novas culturas,
absorvendo-as como suas ou cruzando-as com as suas;
✤ a forma como os consumidores estão cada vez mais bem
informados sobre o consumo alimentar e como a internet
facilita esse acesso;
✤ a evolução dos consumidores, mesmo os mais jovens, e a
curiosidade nas diferenças culturais e no intercâmbio;
✤ o modo como os consumidores utilizam a alimentação
como uma forma de consumo cultural, de definição de
estilo de vida, para aumentar a sua identidade individual.

Por outro lado, existe uma necessidade de retorno às


origens, manifestado por um forte desejo das pessoas
procurarem o vinculo perdido entre o ser humano e a
natureza, provocado por um cansaço provocado pelo stress
do quotidiano e muitas vezes pela necessidade de
referências do passado, familiares que transmitem o conforto.

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Manual Prático de Turismo de Culinária - APTECE 2014
Experiências em Turismo de Culinária
A pergunta que se coloca agora é: como se faz turismo de A figura ao lado ilustra a forma como produção e
culinária? ou como se serve comida a turistas envolvendo-a consumo se relacionam para promover
num contexto de experiência? experiências de turismo de culinária.

O turismo de culinária é uma parte integrante do turismo Tal como ilustrado a comida é conseguida a partir
cultural na medida em que promove a preservação da cultura da matéria-prima, transformada em produtos ou
gastronómica. Todavia há uma ligação estreita com o mundo pratos.
agro-alimentar, por via do contacto que proporciona com os matéria prima
elementos de produção. Em seguida, processa-se em refeições que os turistas
desfrutam durante as suas estadias no destino. Contudo, todo
O turismo culinário promove distintas e impressionantes o processo pode ser transformado numa experiência serviços
"experiências culinárias”, destaca a produção e a cozinha local gastronómica se criarmos as oportunidades para envolver o
como património não apenas agrícola, mas essencialmente turista e motivá-lo a participar nas actividades relacionadas produtos experiências
cultural. com a alimentação.

Dados recentes da Organização Mundial de Turismo indicam Existem muitas oportunidades para a prática de turismo de
que mais de 80% dos países consideram a gastronomia como culinária. Eis algumas:
produção
um elemento essencial para a definição da identidade de um 1. assistir à demonstração do chef durante a refeição; consumo
povo. 2. deslocar-se para participar num evento gastronómico;
3. procurar ingredientes únicos num mercado ou quinta e
Hoje, o turismo culinário é um importante nicho de mercado participar numa sessão culinária utilizando-os;
que promove o desenvolvimento económico e comunitário 4. usufruir de uma Rota de Vinhos;
para os produtores de culturas agrícolas especificas, vinícolas, 5. participar em aulas de cozinha local em férias;
oleícolas, no campo da hospitalidade e para os profissionais de 6. visitar locais que se constituam atrações culinárias (museus);
turismo em geral. 7. viajar para um destino para usufruir apenas de experiências
sobre determinados produtos ou sobre a gastronomia da
ingredientes pratos refeições experiência
Há alguns anos atrás foi criado o conceito de "economia da região;
experiência”, a partir da tese que o consumidor está mais 8. envolver-se com revistas e programas apenas focados em gastronómica
receptivo a consumir qualquer produto ou serviço, desde que gastronomia;
o mesmo lhe proporcione qualquer tipo de experiência. 9. procurar alojamento em espaços dedicados à gastronomia; Qualidade da Oportunidade Qualidade da Experiência
10.frequentar espaços de retalho especializados em ✤ Restaurantes
O conceito permanece actual e arriscaríamos a dizer que determinados produtos e ingredientes; ✤ Aulas de cozinha Aumenta
sempre existiu em turismo, pois há uma base de entrega de 11.participar em tours gastronómicos ou visitar quintas e ✤ Degustação
experiências através do consumo de produtos e serviços. mercados agrícolas;
valor
✤ Eventos gastronómicos
12.ser membro de clubes gastronómicos.
✤ Tours gastronómicos acrescentado
Com a gastronomia há uma inversão no sentido do
✤ Comércio alimentar
conceito, pois é a experiência gastronómica que O turismo de culinária oferece oportunidades inovadoras para
✤ Mercados locais
contribui pata o consumo dos produtos aumentar e expandir a sua base de clientes. O turismo de
✤ Outros
e serviços. culinária pode ser encontrado em áreas rurais ou urbanas e
pode estar disponível ao visitante durante toda a temporada.
(readaptado de Richards & Hjalager 2003)

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Manual Prático de Turismo de Culinária - APTECE 2014
Os turistas e a gastronomia
Antes de percebermos quem é o turista culinário, vamos
tentar perceber como se orienta o turista em termos
culinários, com o seu maior ou menor interesse.

Ian Yeoman, reconhecido guru do sector, classifica os turistas


de acordo com os seus interesses em gastronomia, da
seguinte forma:
✤ Gastro-turistas:
Especialistas em gastronomia e que adoram fazer o papel
de críticos. Geralmente adotam o gosto por uma ampla ✤ Cépticos à experiência:
gama de restaurantes com oferta de alta qualidade. São na Indivíduos que não têm interesse em saborear a
sua maioria de classe média. gastronomia local, mas procuram apenas a sua de origem.
Alguns podem ter em atenção a sua oferta gastronómica
✤ Foddies: nativa, na preparação de viagem.
Entusiastas semi-dedicados à gastronomia. As suas
atenções estão voltadas para os canais de tv É um facto que a maioria dos turistas usufruem das
especializados em gastronomia, assim como para revistas gastronomia de forma funcional, ou seja como mero
especializadas e destinos com a mesma cultura cumprimento de uma necessidade, razão pela qual se
gastronómica. O seu interesse está na comida sazonal de considera que apenas 10% dos turistas, composta pelos
boa qualidade e produzida localmente. gastro-turistas e pelos foodies, é potencialmente o alvo do
turismo de culinária. Contudo deve ter-se em conta que são
✤ Interessados: 10% de muitas dezenas de milhões de turistas a nível
Acreditam que a gastronomia é indispensável para as suas mundial.
férias. Consomem comida local sem qualquer pré-plano.
Uma visita a um mercado de produtores locais é É importante perceber que a maioria dos turistas culinários
simplesmente uma alternativa para eles. são exploradores, isto é, até há pouco tempo não conheciam
a existência desta vertente do turismo e por isso, não
✤ Desomprometidos: havendo ainda muita informação nos destinos, arriscam à
Acreditam que a gastronomia geralmente contribui para a procura de novas experiências e querem-nas interactivas.
sua satisfação nas férias. Saboreiam a gastronomia local,
mas sem qualquer iniciativa. Por isso, todos os que tenham oportunidade de criar
experiências que o façam com a preocupação de que as
✤ Desinteressados: mesmas permitam interacção e envolvam emocionalmente o
Não consideram a gastronomia como um turista e com a autenticidade esperada.
elemento que contribua para a sua satisfação
em férias. No entanto, não são negativos para
com degustação de comida local.

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Manual Prático de Turismo de Culinária - APTECE 2014
Classificação de turistas e relação com a gastronomia
A WFTA (2014) apresenta uma interessante classificação psicográfica, ilustrada na figura abaixo.

TIPO REPRESENTAM PROCURAM APRECIAM TIPO REPRESENTAM PROCURAM APRECIAM

AVENTUREIRO HEDONISTA 15% dos turistas Luxo e Requinte Cozinha Exótica e Alta EXPLORADOR INTELECTUAL Restaurantes de bairro e
procura prazer na aventura Cozinha 10% dos turistas Autenticidade
privilegia o autêntico e a cultura local agriturismo
✤ Disponíveis para gastar e divertirem-se, querem ser mimados e ter experiências culinárias exóticas e de alta cozinha
✤ Possuem um elevado poder de compra, formação e desejo de viajar ✤ Turistas maduros que procuram uma experiência cultural e por isso são atraídos para destinos com museus, história e beleza natural
✤ Não têm medo de experimentar novos destinos para encontrar o seu paraíso e estão mais orientados para a experiência do que para o ✤ Apreciam os momentos de refeição, privilegiando os restaurantes de bairro e experiências genuínas e autênticas “da quinta para a mesa” e
local ao ar livre
✤ É um segmento muito interessante para destinos culinários com oferta de restaurantes mais requintados ✤ Possuem elevado nível de formação e preferem alojamento e refeições a preços acessíveis, para poderem gastar mais nas suas atividades
culturais preferidas e viajar para longe das grandes cidades

TIPO REPRESENTAM PROCURAM APRECIAM


TIPO REPRESENTAM PROCURAM APRECIAM
HIPERATIVO URBANO 11% dos turistas O que esteja na moda Bistro /cafés; Cozinha
privilegia atividade em ambiente urbano Exótica; Locais na moda FAMILIAS INDULGENTES 11% dos turistas Prático e com ambiente familiar Refeições rápidas, familiares,
procuram o prático e fácil em família e buffets tudo incluido
✤ A experiência de jantar é a mais importante e gastam principalmente em restaurantes e compras, durante as férias
✤ Preferem a agitação urbana, lugares na moda, restaurantes exóticos, bistrôs e cafés ✤ Atraídos por viagens práticas e organizadas, consideram as refeições, mais importantes como função do que como diversão
✤ É um turista com idade entre os 35 e 55 anos, com formação e ainda jovem que visita museus, festivais e aprecia a vida nocturna como ✤ São geralmente famílias com crianças pequenas e é compreensível que procurem opções para refeições em família, incluindo refeições
forma de enriquecer a sua experiência de viagem rápidas e buffets “tudo incluido”, para de seguida partirem para qualquer outra actividade orientada para a família
✤ É um importante segmento para destinos culinários que ofereçam modernidade na experiência de viagem
TIPO REPRESENTAM PROCURAM APRECIAM
TIPO REPRESENTAM PROCURAM APRECIAM
CAMPO E PRAIA 13% dos turistas Ambiente familiar Refeições rápidas, familiares,
GOURMET URBANO Alta Cozinha e Cozinha para quem a gastronomia é secundária e pizzarias
9% dos turistas Pequenos prazeres
privilegia o urbano com requinte Exótica ✤ Privilegiam os destinos que ofereçam sol, campo e de preferência condições ideais para a prática de atividade náuticas
✤ Atribui grande importância ao jantar durante a viagem, escolhendo destinos que oferecem não só uma grande variedade de restaurantes ✤ São demograficamente muito diversos, mas possuem em comum a preferência pela conveniência e segurança quando viajam
de cozinha exótica e alta cozinha, mas outras atividades urbanas, tais como compras e passeios ✤ As refeições são uma preocupação secundária, onde a escolha recai quase sempre por restaurantes familiares, com opções básicas como o
✤ Procura o prazer e gasta menos com alojamento e transporte, para que possa desfrutar de um requintado jantar fast food e as pizzarias, de baixo custo e rápido
✤ Gosta do ambiente familiar e apresenta um elevado potencial de repetição de visita
✤ São geralmente de classe média e viajam e usufruem da gastronomia em casal TIPO REPRESENTAM PROCURAM APRECIAM

TIPO REPRESENTAM PROCURAM APRECIAM AVENTUREIROS 12% dos turistas Praticidade Refeições rápidas e
familiares
INDULGENTES 20% dos turistas Diversão Grelhados, Steakhouses e ✤ Famílias que querem sair da cidade e desfrutar de uma estadia em ambiente natural, não tendo qualquer objectivo de enriquecimento
procura o prazer em toda a viagem Cozinha Exótica cultural, nem contato com os habitantes locais ou a sua cultura gastronómica
✤ Viajam em casais e com amigos e dão muita importância ao jantar, mas acima de tudo gostam de ser mimados nas viagens que fazem ✤ A escolha dos restaurantes é feita com base na necessidade primária de comer, logo optam geralmente por espaços onde possam fazer
✤ Conhecidos como geração internet, possuem entre 20 e 35 anos, e procuram divertidas opções de refeições, desde o exótico às uma refeição básica em família, incluindo opções de fast food
steakhouses, churrasqueiras e tudo o que tenha ver com grelhados ✤ É um segmento sem qualquer interesse para a industria de turismo de culinária
✤ Seja o destino bem conhecido ou não, apreciam a mobilidade e são ativos
✤ Gostam de relaxar sem preocupações, querendo fazer de tudo: desde praia, jantares requintados e outras formas de entretenimento

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