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MEDIAÇÃO FAMILIAR: O RESGATE AO RECONHECIMENTO DA PESSOA


HUMANA NAS RELAÇÕES FAMILIARES

Lillian Virgínia Carneiro Gondim*1

RESUMO

A importância da pesquisa sobre a mediação familiar como resgate ao


reconhecimento da pessoa humana nas relações familiares está em esclarecer os
pontos relevantes sobre o assunto. Procura-se verificar que a mediação familiar
auxilia a solucionar conflitos de forma mais satisfatória e qualitativa para as
pessoasreferentea perspectiva da ressignificação da pessoa humana diante do
conflito como um acontecimento natural do ser. Aborda-se a mediação familiar,
explicando seu comprometimento no conflito familiar desde as alterações familiares
(no âmbito social e jurídico) no decorrer dos tempos até a família eudemonista e
plural que existe atualmente e com essa evolução, observar a existência darelação
normativa e interpretativa dos princípios humanos referentes aos direitos de família
presentes nas mediações familiares e sua relevância quanto aos aspectos positivos
refletidos na sociedade. A metodologia aplicadana pesquisa é bibliográfica,
documental, e qualitativa.

Palavras-chave: Família. Mediação de conflitos. Pessoa humana. Princípios


constitucionais.

1 INTRODUÇÃO

As famílias contemporâneas surgem com novas representações sociais,


novos arranjos familiares cuja função é cumprida como entidade de transmissão de
cultura e formação da dignidade da pessoa humana. Deste modo, a família do novo
milênio, ancorada na segurança constitucional é igualitária, democrática e plural,
apoiando todo e qualquer modelo de convivência afetiva e compreendida como
estrutura socioafetiva, baseada em laços de solidariedade.

*Graduada em Direito pela Universidade de Fortaleza - UNIFOR. Pós-Graduada em Direito de


Família, Registros Públicos e Sucessões, realizado na Escola do Ministério Público do Estado do
Ceará - ESMP pela Universidade Estadual do Ceará - UECE. Mediadora Comunitária do Núcleo de
Mediação Comunitária do Antônio Bezerra - CE. Mediadora de Conflitos do Centro Judiciário de
Solução de Conflitos e Cidadania do Fórum Clóvis Bevilaqua. Palestrante sobre Direitos Humanos,
dos Idosos, da Família e Mediação de Conflitos. E-mail: [email protected]
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As famílias enfrentam um processo de instabilidade, uma vez que as


mudanças ainda não foram assimiladas pela sociedade de um modo geral. Os
familiares ainda não conseguem administrar as diferenças que estão surgindo em
meio aos novos modelos de entidade familiar. Com as transformações de papéis
pré-estabecidos, os familiares precisam negociar a todo o instante suas diferenças.
Na verdade, o conflito é inerente às relações familiares, uma vez que a
família é dinâmica, composta por complexas relações entre os seus membros.
Nesse liame, estão presentes constantemente desavenças, ou seja, no cotidiano
das pessoas, as brigas familiares são uma realidade, gerando, em muitos casos a
violência doméstica, vitimando principalmente, mulheres, crianças e idosos.
Diante desta realidade, verifica-se a necessidade da utilização da
mediação nas relações familiares como instrumento adequado de solução de
conflitos. O presente trabalho abordará a mediação, que se apresenta como meio
para amenizar as desavenças familiares, uma vez que, através do diálogo, ocorre
uma compreensão dos conflitos, facilitando a continuação da relação entre os
parentes.
Vale salientar que a importância do uso da mediação familiar é
fundamentada como mecanismo de pacificação de lides sob a visão de que o
mesmo consolida o aprimoramento das soluções de conflitos familiares.
A mediação pode ser considerada com um dos instrumentos de solução
de desentendimentos nas famílias, os quais são fundados sob uma variada carga de
conflitos humanos (afetivos, sexuais, emocionais, dentre outrem) que marca,
particularmente, o Direito dessa área, visando sempre, a proteção constitucional da
privacidade de cada uma das pessoas envolvidas, servindo para arrefecer os ânimos
das partes, e, ao mesmo tempo, auxiliar a deliberação de decisões mais justas e
adequadas com os valores personalíssimos de cada um dos interessados.
A relevância do tema mediação familiar está no fato de que a mediação
constitui um importante instrumento de combate aos conflitos em geral, pois introduz
a cultura do diálogo, ressaltando a importância do resgate ao reconhecimento da
pessoa humana.
Na mediação não se procura adversário, as partes devem buscar a
solução do problema de forma pacífica, construindo conjuntamente uma solução
satisfatória, de modo que objetiva a pacificação social e previne a má administração
de novos conflitos.
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2 BREVE COMENTÁRIO À PESSOA HUMANA

Segundo Comparato (2008), após estudos de antropólogos se definiu o


que hoje se conhece por ser humano, um animal racional de valores. Diante de
várias comparações estabeleceu-se a diferença entre o homem e o animal,
enquadrando-se o homem como animal racional, e os bichos, animais irracionais.
Com o avançar da história, o conhecimento sobre o homem desenvolveu-se
gradativamente com a evolução do mundo.
O homem, agora, se encontrava não em meio aos outros animais, e sim,
com os da sua espécie, classificando, assim, um grupo de indivíduo. Os pensadores
e pesquisadores denominaram ser a origem da palavra ‘pessoa’ o valor humano de
cada um, o que diferencia cada homem existente num grupo de indivíduos.

[...] Toda pessoa humana tem direitos, pelo simples fato de ser uma pessoa
humana. Assim, por exemplo, todos têm direito à vida, não importando a
idade, a cor de pele, o lugar onde nasceu, a preferência política, a profissão,
a riqueza ou a pobreza, ou qualquer outro fator. Embora existam modos
diferentes de proteger esse direito, ele sempre é assegurado quando existe
um mínimo de respeito pela pessoa humana. (DALLARI, 1985, p.12).
......................................................................................................

Tudo o que estiver de acordo como o regime político do país e com os


princípios adotados pela Constituição constituem direitos da pessoa
humana. (DALLARI, 1985, p. 55).

Diante desse conceito, fica claro que existe em todas as dimensões dos
direitos fundamentais o reconhecimento e a proteção da dignidade da pessoa
humana como condição de valor fundamental; visto que, diante das necessidades
fundamentais das pessoas, a questão da sobrevivência e a relação entre elas é de
suma importância para manter sua dignidade; referentes ao seu respeito, ao seu
valor e suas diferenças sendo as mesmas iguais por natureza.

[...] No diálogo Alcibíades, por exemplo, o Sócrates de Platão procura


demonstrar que a essência do ser humano está na alma, não no corpo, nem
tampouco na união de corpo e alma, pois o homem serve-se de seu corpo
como de um simples instrumento. De onde se segue que a individualidade
de cada ser humano não pode ser confundida com a sua aparência,
estampada no rosto (prósopon), termo chamado de personalidade.
(COMPARATO, 2008, p. 15-16).
..........................................................................................................................

Alem disso, a essência do ser humano é evolutiva, porque a personalidade


de cada indivíduo, isto é, o seu ser próprio, é sempre, na duração de sua
vida, algo de incompleto e de inacabado, uma realidade em continua
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transformação. Toda pessoa é um sujeito em processo de vir-a-ser.


(COMPARATO, 2008, p. 30).

Quanto à Constituição Brasileira de 1988, observa-se que, dentro dos


direitos fundamentais, a figura da pessoa humana é estabelecida como o
reconhecimento dos princípios básicos defendidos a todos os homens, sejam esses
direitos à dignidade, à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade. E é
justamente sob essa visão axiológica interpretativa de valores humanos que a
mediação se insere como um instrumento que ressignifica a pessoa humana diante
do conflito.

3 DIREITO DE FAMÍLIA SOB A PERSPECTIVA DOS PRINCÍPIOS HUMANOS

Diante das inúmeras modificações que ocorreram nas famílias, ao longo


do século XX, a Constituição Federal de 1988 trouxe em seu texto um capítulo
exclusivo sobre a família, a criança, o adolescente e o idoso (capítulo VII, arts. 226 e
seguintes), procurando adequar o Direito à nova realidade familiar, pois sendo a Lei
Magna, nascida de um Estado Social.
Essa passou a proteger o Direito de Família com base na tutela
constitucional movida por princípios fundamentais, preservando a família e criando
condições para o seu saudável desenvolvimento, protegendo também, a sociedade.
Para a família atual foi de grande importância a proteção do Estado, o qual passou a
construir um direito amplo para todos os membros familiares, atribuindo diversas
funções reguladas em regras e princípios, conhecido como um fenômeno de
constitucionalização:

[...] Grande parte do Direito Civil está na Constituição, que acabou


enlaçando os temas sociais juridicamente relevantes para garanti-lhes
efetividade. A intervenção do Estado nas relações de direito privado permite
o revigoramento das instituições de direito civil e, diante do novo texto
constitucional, forçoso ao interprete redesenhar o tecido do Direito Civil à luz
da nova constituição. (DIAS, 2005, p.33)

É possível elencar algumas alterações provocadas pela Constituição


Federal no direito de família, as quais são bem visíveis na atualidade como a família
sendo a base da sociedade, presente em seu caput do artigo 226, contendo total
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proteção do Estado; o casamento civil que renovou o conceito de matrimônio, sendo


válido não só o religioso como refere-se os parágrafos 1º e 2º do mesmo artigo; o
reconhecimento da união estável como entidade familiar como demonstra o
parágrafo 3º; o reconhecimento da família monoparental, uma entidade familiar
formada por qualquer dos pais e seus descendentes, previsto no parágrafo 4º; a
consagração do divórcio; a proteção dos membros da família, o qual o Estado dará
assistência a cada pessoa da família e dentre demais artigos.
Entende-se que a constitucionalização no direito de família busca um
fundamento ético, humano, coletivo, digno e solidário, tendo como objetivo principal
a inclusão dos direitos humanos nas relações familiares, sob o efeito hermenêutico
que proporciona “uma proteção e promoção dos valores constitucionais centrado na
dignidade humana” (SARMENTO, 2004, p. 100).Dessa forma, pode-se afirmar que o
princípio da dignidade da pessoa humana, considerado um dos maiores princípios,
transmite um efeito no direito privado que supervaloriza a pessoa mais do que o
patrimônio.
Para o direito de família tem uma importância de valorização
incomparável, pois como comenta Facchini Neto (2003, p. 32) sobre o fenômeno de
repersonalização e despatrimonialização “o patrimônio deixa de ser o centro das
preocupações privatistas, sendo substituído pela consideração à pessoa humana”,
pois, devido à nova realidade social, a família renovou seu modelo patriarcal e de
sociedade patrimonialista.
Assim sendo, entende-se que a repersonalização do direito consiste no
reconhecimento de que o mesmo está pra servir ao indivíduo e não ao seu
patrimônio, reafirmando que isso para o direito de família representa a valorização
das relações afetivas e solidárias, voltadas para o desenvolvimento da pessoa
humana.

[...] A família tradicional aparecia através do direito patrimonial e, após as


codificações liberais, pela multiplicidade de laços individuais, como sujeitos
atomizados. Agora, é fundada na solidariedade, cooperação, no respeito à
dignidade de cada um de seus membros, que se obrigam mutuamente em
uma comunidade de vida. A família atual é apenas compreensível como
espaço de realização pessoal afetiva, no qual os interesses patrimoniais
perderam seu papel de principal protagonista. A repersonalização de suas
relações revitaliza as entidades familiares, em seus variados tipos ou
arranjos. (LOBO, 2010, online).
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O princípio da solidariedade, no direito de família, está previsto nos


artigos 227, 229 e 230 da Constituição Federal. Esse princípio alude à importância
que se tem à prática da solidariedade como dever de proteção e de assistência
imaterial, determinando os cuidados como atenção e apoio, não só financeiro, mas
também, moral e psicológico aos membros da família, proteção ao idoso, à criança e
ao adolescente:
A solidariedade é princípio e oxigênio de todas as relações familiares e
afetivas, porque esses vínculos só podem se sustentar e se desenvolver em
ambiente recíproco de compreensão e cooperação, ajudando-se
mutuamente sempre que se fizer necessário. (MADALENO, 2008, p. 64)

O princípio da igualdade fez efeito também na família em sentido amplo,


pois ele renovou, tanto a igualdade entre os cônjuges como estendeu para os
companheiros, entre filhos havidos ou não do casamento e, quanto ao papel de
chefe de família. Ao estabelecer que os cônjuges e companheiros têm os mesmo
direitos e deveres, seja no casamento ou na união estável, a função do casal passou
a ser objetivado a um direito de personalidade sem distinção como ocorria no Código
de 1916.
Para a igualdade entre os filhos, a Lei Magna defendeu tanto os que
vieram no casamento como fora dele e, também, os que são adotivos e aqueles
havidos por inseminação heteróloga (com material genético de terceiro), passando a
ter os mesmos direitos e vedando qualquer possibilidade de discriminação. De
acordo com estudiosos os filhos estão protegidos também pela dignidade humana,
já que a condição de filho não muda, independente de sua origem, pois o valor de
filiação é unitário, privilegiando assim, o vinculo afetivo.
Quanto à isonomia para chefiar a família, o princípio ressalta que entre os
cônjuges e companheiros deve haver um regime democrático de colaboração com
relação às funções familiares. É figurada nesse princípio a responsabilidade
assistencial de forma igualitária, não se esquecendo de observar que o poder
familiar, agora, pertence a quem formá-la. Vale ressaltar que esse poder na família,
também é protegido por limites que o próprio princípio alude ao referir-se à educação
da criança e do adolescente, sendo exigida a moderação na relação entre pais e
filhos. (OLIVEIRA, 2002).
O princípio da liberdade e da pluralidade de famílias tem a ver com o
direito de livre escolha e de autonomia, pois defende que as pessoas têm o direito
de casar ou não; de romper o vínculo matrimonial, mediante o divórcio; da livre
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escolha entre o casamento, a união estável, a família monoparental ou outra


entidade afetiva como a homoafetiva; as pessoas têm a liberdade de escolha se
desejam ter ou não filhos; de decidirem como será o planejamento familiar, fundado
nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável a qual
“representa a assunção de deveres parentais em decorrência dos resultados do
exercício dos direitos reprodutivos” (GAMA, 2003, p. 453).
Enfim, o exercício da liberdade nas relações familiares é amplo, não
podendo o Estado interferir nas escolhas pessoais de cada um, valendo destacar o
“limite intangível imposto pela dignidade humana”, segundo Sarlet (2005, p. 124).
Ainda sobre os princípios da família é preciso saber que existe o princípio da
convivência familiar no qual é direcionado a todos que integram a família como a
criança, o jovem e o idoso, necessitando observância ao melhor interesse dos
mesmos, implicando assim, numa prova de amor, de cuidado, além da proteção e
atenção que se deve ter.
Pesquisadores já argumentam que o princípio da afetividade está
presente na convivência familiar, pois este insere uma noção de estabilidade das
relações socioafetivas e de comunhão de vida. Assim, tem-se que sobre afetividade:

[...] Exatamente por ser uma relação entre os indivíduos, o afeto se


desenvolve e evolui como relação social. Progride socialmente. Obriga
crescentemente. Vincula. Gera responsabilidades entre sujeitos. Daí, por
que o direito o protege não apenas como fato individual, mas, também como
fato social. O afeto é fator de outros fatos que o direito protege. A afeição é
um fato social jurígeno, que gera direitos e obrigações acerca de vários
bens e valores, como alimentos, moradia, saúde, educação, etc. (BARROS,
2007, p. 885).

Com relação a este princípio, a família é protegida em todos os aspectos,


sejam eles social, moral, psíquicos ou material. A afetividade é tão ampla quanto a
dignidade da pessoa humana, pois, não se pode deixar de comentar sobre um
princípio sem referir-se ao outro. O afeto está sendo considerado um grande pivô da
transformação do que é a família constitucionalizada. Mudou completamente a idéia
e a figura de pai, adequando esse ser o pai verdadeiro, não por ser biológico e, sim,
por ser afetivo, amoroso, cuidador e protetor, quebrando os paradigmas e renovando
os conceitos da real função familiar.
Atrela-se ao mesmo princípio o de cuidado, este é recentemente notável
nas doutrinas, mas estudos indicam que tende a aumentar, cada vez mais, o
interesse sobre esse dois princípios.
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O cuidado é importante porque ele deriva de um ato, de uma atitude, ele é


presencial, formando um momento de atenção e zelo, de responsabilidade e
envolvimento com afeto, este último, sendo um sentimento (QUARESMA;
GUIMARAENS, 2001, p. 388). Daí, ser fácil entender que afeto é um sentimento,
enquanto que o cuidado é a prática da atitude do afeto.

[...] O que se opõe ao descuido e ao descaso é o cuidado. Cuidar é mais


que um ato; é uma atitude. Portanto, abrange mais que um momento de
atenção, de zelo, de desvelo. Representa uma atitude de ocupação,
preocupação, de responsabilização e de envolvimento afetivo com o outro.
(PEREIRA, 2006, p. 183).

E, diante desses princípios, falta argumentar sobre o da função social da


família, o qual reúne todos os princípios já expostos no presente capítulo. A função
social da família deriva do conceito de que a família é a célula da sociedade, e no
decorrer disso, o meio familiar é que passa a ser avaliado como o exemplo para o
meio social.
Por isso, a importância da prática dos princípios na família
constitucionalizada, porque a mesma será cobrada na sociedade, voltando-se mais
aos ideológicos da cidadania. E aí, que se faz menção do trabalho para com a
ressignificação da pessoa humana que, mediante os conflitos familiares, não deixa
de conter os valores morais protegidos, não só pela constituição como também pelo
direito de família ambos movidos pelos princípios humanos.

4 DA MEDIAÇÃO NAS RELAÇÕESFAMILIARES

O divórcio deixa marcas profundas e indeléveis entre pais e filhos, porém,


estes ressentimentos podem ser percebidos com mais naturalidade dependendo da
condição de como foi rompido o relacionamento conjugal. Teruel (1992, p.145)
ratifica que: “[...] considera-se que o conflito é inerente a todo e qualquer
relacionamento conjugal, contribuindo tanto para a dissolução quanto para o
fortalecimento do vínculo”. Em suma, tratado de forma adequada o conflito pode
ajudar a fortalecer os laços familiares, principalmente se forem concebidos como
processo natural de crescimento da relação marital.
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Não necessariamente um conflito existente signifique o fim de uma


relação, mas independente de qual fim ocorra, este deve ser concebido com uma
oportunidade de amadurecimento e crescimento da relação. Os mediados, por
exemplo, no caso de divórcio, deveriam recorrer a mediação no intuito de ser mais
uma ferramenta para enfrentamento das transformações decorrentes deste novo
cenário, com suas renúncias e responsabilidades próprias, afeitos às novas
mudanças. A mediação apresenta um sentido mais profundo no que tange ao seu
papel diante dos conflitos:

A mediação vai mais longe, à procura das causas do conflito, para sanear o
sofrimento humano que daí se origina ao casal e aos seus descendentes. O
objetivo é evitar a escalada de conflito familiar que nem sempre se extingue
com mero acordo imposto de cima para baixo. Por meio das seções de
mediação, chama-se o casal
à responsabilidade pelo reencontro, afim de que se preserve a convivência,
senão da sociedade conjugal, de pessoas separadas que sejam
conscientes dos efeitos que, inexoravelmente, advém da sociedade
desfeita.(OLIVEIRA, 2001, p.106-107)

Portanto, a mediação procura a origem do conflito, seu objetivo é evitar o


crescimento do conflito que na maioria das vezes não cessa através de um acordo.
Nas sessões de mediação busca-se a responsabilização das pessoas envolvidas e
não a culpabilidade pelo fim da relação. A mediação torna-se mais complexa quando
existem filhos, pois se procura resguardar os melhores interesses das crianças e dos
adolescentes:

Estes conflitos em torno da criança são, na maior parte do tempo, conflitos


não resolvidos pelo casal: a criança torna-se este instrumento privilegiado
permitindo aos pais, que não realizem o luto da relação, permanecer juntos
no conflito. Eles utilizam a criança como remédio para suas feridas
narcísicas e, às vezes, como um verdadeiro projétil na guerra a que eles se
entregam. Recompor-se, punir o outro, conduzem a comportamentos de
“apropriação” da criança, que se torna objeto, e há desvios, que vão da
desqualificação do outro progenitor até sua negação, para resultar, por
vezes, em uma verdadeira erradicação.(GANÂNCIA, 2001, p.8)

Os conflitos entre casais, potenciais casos de divórcio, resolvidos de


forma insatisfatória, na maioria das vezes, resvalam em torno dos filhos,
transformando-os em munição entre os cônjuges. A criança e/ou adolescente passa
a ser instrumento e lamento para compor os discursos de discórdia. Por vezes passa
a ser a própria causa raiz da dissenção entre o casal, seja pelo tipo de criança e da
lide de educar, seja pela falta de maturidade para enfrentar o processo de criar e
educar filhos.
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Manter uma relação infeliz em algumas vezes permeada de violências das


mais diversas, tendo como sustentação da permanência da vida marital a existência
dos filhos não irá resolver o problema do conflito. Pelo contrário pode gerar um
desconforto, quiçá até mesmo um trauma na criança e/ou adolescente, pois tem a
percepção de ser uma pedra de tropeça, cruz, ou ônus da relação (SALES, 2007).
Os cônjuges com esta atitude de preservação, tendo como álibe o filho,
podem estar cometendo um ato nocivo, posto que não gera amor, e o pior, o filho
encara uma falsa atribuição de estorvo na família, fruto da falta de amadurecimento
dos pais quanto a questão da paternidade e/ ou maternidade responsável e o seu
papel como gerador e educador de futuros cidadãos.
Nazareth (2001, p.54), a respeito da criança e/ou adolescente, salienta:
“Ela precisa que seus pais se reconhecem mutuamente, mesmo que separados. Ela
precisa de adultos que compreendam suas necessidades e que não satisfaçam suas
vontades, fazendo tudo o que quer, fazendo tudo em seu nome”.
A criança e/ou adolescente necessita que seus pais respeitem-se
mutuamente, a existência do divórcio não pode afastar o amor e a compreensão tão
necessários para o processo educacional dos filhos. A união do casal, por sua vez,
não deverá ser sustentada em função exclusiva da prole, pois em um
relacionamento desgastado é costumeiro haver mágoas, acusações, angústia,
desencadeando sofrimento para todos que fazem parte da relação familiar
(VEZZULLA, 2001).
As crianças e/ou adolescente necessitam de um ambiente saudável para
o seu crescimento físico e psíquico, sendo bem administrado o divórcio, será mais
saudável do que uma união infeliz e desgastada. A mediação oportuniza ao casal
uma reorganização da suas relações parentais de forma pacífica através da escuta
da realidade sobre as angústias e os anseios de ambos, possibilita-se a restauração
da confiança desfeita.
O procedimento da mediação busca enfatizar a importância da co-
parentalidade, e é importante frisar a necessidade dos filhos de manter relação,
envolvimento, proximidade e interação com seus pais. Portanto, a mediação
possibilita uma melhoria no relacionamento entre o casal desfeito, o que favorece de
sobremaneira a convivência, o relacionamento dos filhos com seus pais. Salienta-se
que a mediação é aplicável nos mais diversos conflitos familiares, e não apenas na
dissolução da vida conjugal.
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O objetivo da mediação é que os envolvidos resgatem o diálogo rompido,


no qual é ressaltado a solidariedade, boa fé e responsabilidade entre o casal, pois
na mediação familiar busca-se a preservação das relações continuadas, propondo
uma real mudança de paradigma. A mediação familiar incentiva as partes a
perceberem positivamente os conflitos, entendendo-os como fatos naturais e
pertinentes da relação entre as partes:

Podemos dizer que a mediação familiar tem um poder de operar mudanças


ou transformações, abrindo inúmeras portas e caminhos para que cada
pessoa envolvida no processo de mediação escolha o percurso mais
conveniente a si e ao seu adversário, na situação conflitiva daquele
momento.(BREITMAN; PORTO, 2001, p.67)

É possível afirmar que no Estado do Ceará os conflitos familiares são


resolvidos por meio do exercício da mediação familiar tanto no âmbito comunitário
como no judicial. A mediação familiar-comunitária é aplicada através do Programa
dos Núcleos de Mediação Comunitária do Ministério Público do Estado do Ceará
que, desde 1999, ainda quando eram Casas de Mediação, exercem a mediação sob
o trabalho voluntário de mediadores capacitados que auxiliam famílias e
comunidades a refletirem sobre a realidade do conflito, encontrando assim, a
possibilidade de identificar as reais necessidades para a busca do bom senso diante
da lide.
Diante dos procedimentos e dos princípios humanos que regem a
mediação comunitária pode-se afirmar que esta promove o elo da efetiva cidadania
na intenção de ampliar aos demais o acesso à justiça e de concretizar a participação
social como construção da pacificação entre todos. Nesse contexto assevera-se
que:

As casas de mediação comunitária oferecem às comunidades periféricas


um canal para o exercício da cidadania. Não é somente um projeto de
assistência, mas, além disso, visa a aproximar as comunidades para a
realização desse projeto, já que encontrou nos moradores locais e líderes
comunitários a equipe ideal de trabalho. Pretende-se com ele diminuir a
exclusão social vivida por esses indivíduos, pois não é possível existir
democracia ou direito de escolha quando parte da população vive à margem
de qualquer decisão. (SALES, 2010, p. 114 e 115).

É nesta perspectiva que se torna compreensivo que os conflitos familiares


sejam de qualquer natureza ou origem podem ser tratados e resolvidos na mediação
comunitária. A Mediação Familiar, ora existente na mediação comunitária, passa a
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ser um novo compromisso do Poder Judiciário, compromisso este que se manifesta


através da Resolução nº 125 do Conselho Nacional de Justiça - CNJ, a qual dispõe
sobre uma política pública como tratamento adequado aos litígios no âmbito judicial.
Assim, é possível auxiliar os processos das Varas de Família com a
Mediação Judicial, em prol da satisfação das pessoas envolvidas no conflito, por ser
um instrumento que mais se identifica com a busca de uma solução nos próprios
sentimentos pessoais.
Em suma, a mediação familiar opera nas mudanças, possibilitando
variadas posições onde as próprias pessoas envolvidas nos conflitos optam pela
melhor solução mutuamente satisfatória. Almeja-se desenvolver o protagonismo, a
responsabilização dos envolvidos, sensibilizá-los para a relevância da participação
de cada um nas decisões de reorganização da família.

CONCLUSÃO

Esse trabalho buscou expor a importância da mediação como um dos


meios de solução para os conflitos familiares, ampliando sua visão à pacificação,
inclusão social e o acesso à justiça, salientando assim, como benefício para a
sociedade.No decorrer da pesquisa, pode-se observar que a mediação trabalha em
solucionar, com selo da paz, conflitos existentes até mesmo no âmbito familiar.
E que esses conflitos são inerentes à evolução humana, ou seja, os
problemas que envolvem o homem são decorrentes de seu desenvolvimento natural.
Assim, comprovou-se que se trata de um processo de ressignificação da pessoa
humana no que se refere à teoria dos conflitos; rebuscando entender todo o
procedimento da evolução e das espécies de conflitos que se movem em cada
membro familiar.
Dessa forma, a mediação, por ser um dos instrumentos de solução
extrajudicial, consegue pacificar a lide dentro da família como um elo, sendo de uso
adequado da comunicação, ou seja, pelo diálogo, consolidando sentimentos como o
afeto entre as partes. Assim, constatou-se que a mediação familiar é possível e
eficiente, pois resgata o respeito e o afeto da humanização do conflito entre as
partes através do diálogo e que, com isso, pode-se afirmar que a mediação no meio
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familiar é um auxílio até para a pacificação no âmbito social.


Por fim, conclui-se que, sendo o conflito inerente ao processo natural do
homem, este passa a entendê-lo e resolvê-lo com a humanização dos problemas e
que com os princípios humanos, respaldados em meio ao diálogo da mediação, no
sentido de valorizar a pessoa humanadiante do litígio, torna-se capaz de solucionar
os conflitos do âmbito familiar, visandoa buscapela paz.

MEDIACIÓN FAMILIAR: El RESCATE AL RECONOCIMIENTO DE LA


PERSONA HUMANA EN LAS RELACIONES FAMILIARES

RESUMO

La importancia de lainvestigación sobre lamediación familiar como rescate


alreconocimiento de la persona humana enlas relaciones familiares está en
esclarecer lospuntos relevantes sobre elasunto. Se busca verificar que lamediación
familiar auxilia a solucionar conflictos de forma más satisfactoria y qualitativa para
las personas referentela perspectiva de la ressignificação de la persona humana
delantedelconflicto como unacontecimiento natural del ser. Se aborda lamediación
familiar, explicando su comprometimento enelconflicto familiar desde lasalteraciones
familiares (enelámbito social y jurídico) eneltranscurrir de lostiempos hasta
lafamiliaeudemonista y plural que existe actualmente y conesaevolución, observar
laexistencia de larelación normativa e interpretativa de losprincipios humanos
referentes a losderechos de familia presentes enlasmediaciones familiares y su
relevância cuanto a los aspectos positivos reflejadosenlasociedad. La metodologia
aplicada enlainvestigación es bibliográfica, documental, y qualitativa.

Palabras-llave: Familia. Mediación de conflictos. Persona Humana. Principios


Constitucionales.
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