MATOS, Alderi - O Movimento Pentecostal - Parte 1 PDF
MATOS, Alderi - O Movimento Pentecostal - Parte 1 PDF
MATOS, Alderi - O Movimento Pentecostal - Parte 1 PDF
O MOVIMENTO PENTECOSTAL:
REFLEXÕES A PROPÓSITO DO SEU PRIMEIRO CENTENÁRIO – PARTE 1
Alderi Souza de Matos
Introdução
Por essas e outras razões, é oportuno fazer-se uma nova reflexão sobre esse tema
já tão estudado. O enorme crescimento do pentecostalismo e o impacto que tem
causado nas igrejas e na sociedade, particularmente no Brasil, tornam necessário
um reexame da história e características, bem como das possibilidades e limitações,
desse movimento que completa um século de trajetória histórica. A argumentação
deste artigo obedecerá a seguinte seqüência: inicialmente será apresentado um
panorama dos antecedentes do pentecostalismo e das origens históricas e
teológicas desse movimento nos Estados Unidos; em seguida, se fará uma breve
síntese da história, evolução e peculiaridades do pentecostalismo brasileiro; por fim,
será feita uma avaliação dos problemas e contribuições do movimento, sugerindo-se
como as igrejas reformadas devem relacionar-se com ele.
Assim como ocorre em outras religiões, o cristianismo tem, ao longo da sua história,
testemunhado muitas vezes em suas fileiras a ocorrência de manifestações de
entusiasmo religioso, em especial os movimentos chamados carismáticos. O termo
“entusiasmo” (do grego en = “em” e theós = “Deus”) aponta para situações em que
as pessoas afirmam receber revelações diretas de Deus, muitas vezes
acompanhadas de êxtases místicos, visões e outros fenômenos associados a uma
experiência religiosa de grande fervor e intensidade. Por sua vez, a palavra
“carismático” lembra os carismas ou dons espirituais mencionados no Novo
3
5
CAMPOS, Leonildo Silveira. As origens norte-americanas do pentecostalismo brasileiro:
observações sobre uma relação ainda pouca avaliada. Revista USP, n° 67 (set.-nov. 2005), p. 100-
115.
6
Vocês encontrarão as minhas idéias sobre essa questão nos sermões do Sr. Wesley sobre
Perfeição Cristã e sobre o Cristianismo Bíblico, com a seguinte diferença: eu distinguiria mais
precisamente entre o crente batizado com o poder pentecostal do Espírito Santo e o crente
que, como os apóstolos após a ascensão de nosso Senhor, ainda não está revestido desse
7
poder.
Outra ênfase peculiar de Fletcher, novamente em contraste com Wesley, foi sua
divisão da história em três dispensações: do Pai, do Filho e do Espírito Santo, esta
última tendo iniciado no Pentecoste e se estendendo até a segunda vinda de Cristo.
É significativo que essa perspectiva também passou a ser usada para descrever os
estágios de desenvolvimento espiritual pelos quais cada indivíduo devia passar. Em
suma, a orientação cristocêntrica, centrada na tradição bíblica paulina e joanina, que
era característica de Wesley, passou a ter em Fletcher uma orientação
pneumatocêntrica e lucana, com destaque especial ao livro de Atos dos Apóstolos.
Todavia, a transição efetiva de uma cosmovisão para a outra somente iria se
consumar no contexto norte-americano.8
6
Ver DAYTON, Donald W. Theological roots of Pentecostalism. Peabody, Massachusetts:
Hendrickson, 1991 (1987).
7
Ibid., p. 50.
8
Ibid., p. 54. Dayton afirma: “O metodismo iria encontrar o seu verdadeiro destino na América” (p.
63).
7
especial do Espírito que restaura os dons nos últimos dias como parte da
preparação para a colheita, o retorno de Cristo em glória”.11 O mesmo autor observa
que a estrutura da “chuva tardia” transforma o maior problema apologético do
pentecostalismo – sua descontinuidade com as formas clássicas do cristianismo –
em um valioso recurso apologético: “A longa estiagem desde o período pós-
apostólico até o tempo presente é vista como parte do plano dispensacional de Deus
para as eras”.12 Em suma, o pentecostalismo foi entendido pelos seus primeiros
simpatizantes como o derramamento final do Espírito de Deus que iria preparar a
igreja para o derradeiro esforço pela evangelização do mundo antes da volta do
Senhor.
Em 1905, Charles Parham mudou-se para o Texas e iniciou uma escola bíblica em
Houston. Um dos estudantes atraídos por essa escola foi um ex-garçom negro e
pregador holiness, William Joseph Seymour (1870-1922).13 Era o período da
discriminação racial no sul dos Estados Unidos e Parham era simpatizante desse
sistema. Seymour assistia às aulas sentado em uma cadeira no corredor ao lado da
sala. Algumas semanas mais tarde, ele recebeu o convite para visitar um pequeno
grupo batista em Los Angeles. Esse grupo de afro-americanos, pastoreado por uma
mulher, Julia Hutchins, havia sido expulso de sua igreja por esposar doutrinas
holiness. Seymour, então com trinta e cinco anos, era filho de escravos, tinha pouca
cultura, limitados dotes de oratória e era cego de um olho. Escolheu o texto de Atos
2.4 para o seu primeiro sermão em Los Angeles, embora ele mesmo nunca tivesse
falado em línguas. A pastora não gostou do seu ensino, mas ele, acompanhado por
boa parte do grupo, passou a fazer as reuniões na casa onde estava hospedado.
Quando esta se tornou pequena, foram para outra um pouco maior, na Rua Bonnie
Brae, onde o avivamento começou no dia 9 de abril de 1906.14
11
DAYTON, Theological roots of Pentecostalism, p. 27. O simbolismo das primeiras e últimas chuvas
é tirado de textos como Atos 2.17-18; Joel 2.23, 28-29; Tiago 5.7-8.
12
Ibid., p. 28.
13
Para mais informações sobre Parham e Seymour, ver CAMPOS, As origens norte-americanas do
pentecostalismo brasileiro, p. 108-112.
14
O autor teve a oportunidade de visitar esse local em outubro de 2003. A casa da Rua Bonnie Brae
está muito bem preservada, sendo administrada por uma instituição denominada Pentecostal
Heritage Inc.
11
Com o passar dos dias, várias pessoas começaram a falar em línguas, primeiro
negros, depois brancos, e finalmente o próprio Seymour teve essa tão-sonhada
experiência (12 de abril). Nesse mesmo dia, a varanda da frente dessa residência
desabou devido ao peso da multidão. Com isso, os líderes alugaram um rústico
edifício de madeira na Rua Azusa, perto do centro de Los Angeles. Esse prédio
havia abrigado uma igreja metodista negra e posteriormente tinha sido usado como
cortiço e estábulo. Imediatamente as reuniões atraíram a atenção da imprensa. O
principal jornal da cidade mandou um repórter ao local e este escreveu
ridicularizando os fenômenos presenciados. Esse artigo, intitulado “Estranha babel
de línguas”, foi publicado no mesmo dia em que um terremoto seguido de um
incêndio destruiu a cidade de San Francisco (18 de abril de 1906), no norte na
Califórnia. O artigo funcionou como propaganda gratuita e logo em seguida ocorreu
o Avivamento da Rua Azusa.
Uma característica marcante dessas primeiras reuniões foi o seu caráter multi-racial,
com a participação de negros, brancos, hispanos, asiáticos e imigrantes europeus. A
liderança era dividida entre negros e brancos, homens e mulheres. Um artigo do
jornal A Fé Apostólica, fundado por Seymour, dizia no número de novembro de
1906: “Nenhum instrumento que Deus possa usar é rejeitado por motivo de cor,
vestuário ou falta de cultura”. Outro artigo informava que em um culto de comunhão
que durou toda a noite havia pessoas de mais de vinte nacionalidades. Uma frase
comum na época dizia que “a linha divisória da cor havia sido lavada pelo sangue”.
Diante da longa e terrível história de racismo e segregação nos Estados Unidos,
esse fato só podia deixar encantados os participantes e observadores do
avivamento, que viam nisso mais uma prova de que o movimento vinha de Deus.
12
Todavia, desde o início também houve uma série de problemas: médiuns espíritas
tentavam realizar sessões durante os cultos; enquanto muitas pessoas sentiam a
presença de Deus, outras ficavam no fundo do salão discutindo e condenando; havia
muitas críticas de jornais e de líderes eclesiásticos. Houve também algumas crises
internas: choques de personalidade, fanatismo, divergências doutrinárias e
separação racial. Com o passar do tempo, Seymour e outros líderes negros
acabaram assumindo o controle da missão, excluindo os brancos e os hispanos. O
próprio Parham visitou o local em outubro de 1906 e ficou chocado com certas
manifestações que presenciou.15
Missão da Rua Azusa – Esta placa comemora o local da Missão da Rua Azusa, que estava
localizada na Rua Azusa, 312. Formalmente conhecida como Missão da Fé Apostólica, ela
serviu como nascedouro do Movimento Pentecostal internacional de 1906 a 1931. O pastor
William J. Seymour superintendeu o “Avivamento da Rua Azusa”. Ele pregou uma mensagem
de salvação, santidade e poder, recebeu visitantes de todo o mundo, transformou a
congregação em um centro multicultural de adoração e comissionou pastores, evangelistas e
missionários para levaram ao mundo a mensagem do Pentecoste (Atos 2.1-41). Hoje os
membros da Movimento Pentecostal/Carismático totalizam meio bilhão ao redor do mundo.
16
Fevereiro de 1999 – Comissão Memorial da Rua Azusa.
15
OLSEN, American Pentecost, p. 16s.
16
Dados colhidos pessoalmente pelo autor em outubro de 2003.
13
3.2 Controvérsias
Como foi visto, o Avivamento da Rua Azusa uniu negros e brancos, tornando-se, nos
seus primeiros anos, um modelo de cooperação inter-racial. Em 1910, destacados
líderes pentecostais brancos e negros se esforçavam para tornar essa visão inter-
racial um elemento básico do pentecostalismo. Com o tempo, muitos líderes brancos
acharam difícil manter esse impulso inicial. O racismo e as leis de segregação racial
17
Vários autores. Pentecostal quilt: key events and people who‟ve made the movement as unique as
it is diverse. Christian History, Vol. XVII, No. 2 (1998), p. 18-25.
14
do sul dos Estados Unidos (leis Jim Crow) prevaleceram. Ficou difícil realizar
convenções multi-raciais, pois havia leis proibindo reuniões desse tipo e
acomodações em hotéis para ambas as raças. Por causa dos obstáculos culturais,
sociais e institucionais, muitas igrejas negras começaram a se retirar de
denominações multi-raciais já em 1908. Da mesma maneira, uma associação branca
ligada à Igreja de Deus em Cristo formou as Assembléias de Deus como uma
denominação predominantemente branca em 1914 (Hot Springs, Arkansas). Em
1924, a maior parte das igrejas brancas de outra denominação mista, as
Assembléias Pentecostais do Mundo, se retiraram para criar uma denominação
branca, que mais tarde veio a ter o nome de Igreja Pentecostal Unida (Missouri). Os
pentecostais hispanos, muito numerosos, também se organizaram separadamente.
Desde o final dos anos 60, as denominações pentecostais têm tentado sanar
algumas dessas divisões.
3.2.4 Pacifismo
A maior parte dos primeiros pentecostais eram resolutos pacifistas, por duas razões:
obediência a preceitos bíblicos como “Amai os vossos inimigos” e “Não matarás”, e a
18
Ver MATOS, Alderi S. O batismo “em nome de Jesus” no livro de Atos: uma reflexão
bíblicoteológica. Fides Reformata 5/2 (jul.-dez. 2000), p. 99-114.
15
3.2.6 Os latinos
estereótipo de que ser latino é o mesmo que ser católico romano. Em 1998, cerca de
um milhão de latinos freqüentavam 10.000 igrejas e grupos de oração em 40
tradições pentecostais e carismáticas nos Estados Unidos e em Porto Rico, sem
contar o número muito maior de pentecostais existentes em muitos países latino-
americanos.
3.3 Mulheres
Essa famosa pregadora teve uma vida difícil até os 35 anos. Cinco de seus seis
filhos morreram e o seu primeiro marido foi surpreendido em adultério. Em aflição,
ela uniu-se aos quacres e tornou-se uma pregadora avivalista. Nos seus cultos, as
pessoas clamavam e choravam em alta voz; muitos participantes entravam em
transe ou tinham visões que podiam durar várias horas. Em 1912, aos 68 anos, ela
abraçou o movimento pentecostal mais amplo ao pregar por seis meses em Dallas.
Tornou-se uma das evangelistas pentecostais mais conhecidas do início do século e
o seu ministério possibilitou o surgimento posterior de outras mulheres pregadoras e
ministradoras de curas.19
19
Maria Beulah Woodworth-Etter. Christian History, Vol. XVII, No. 2 (1998), p. 35s.
17
da imprensa. Depois que o marido pediu divórcio, ela aceitou em 1918 um convite
para pregar em Los Angeles. Dedicou as suas energias à recuperação do
“cristianismo da Bíblia”, usando como tema Hebreus 13.8. Em 1919, iniciou uma
série de conferências que a tornaram famosa. Dentro de um ano, os maiores
auditórios dos Estados Unidos não comportavam as multidões que queriam ouvi-la.
As orações pelos enfermos tornaram-se marcas de suas campanhas. Em rápida
sucessão, ela foi à Austrália, a primeira de suas viagens ao exterior (1922),
consagrou o Templo Ângelus (1923), fundou uma estação de rádio (1924) e sua
escola bíblica mudou-se para uma sede própria (1925). “Sister”, como era chamada,
também iniciou projetos na área social em diversas cidades.
Conclusão
20
BLUMHOFFER, Edith L. Sister: Aimee Semple McPherson was the first Pentecostal to become a
national sensation. Christian History, Vol. XVII, No. 2 (1998), p. 31-34.
21
DAYTON, Theological roots of Pentecostalism, p. 21s.