Brinquedos Do Brasil - Invenções de Muitas Mãos
Brinquedos Do Brasil - Invenções de Muitas Mãos
Brinquedos Do Brasil - Invenções de Muitas Mãos
SIL
Q Uu
Sesc | Serviço Social do Comércio
BRI
SIL
Uu
Rio de Janeiro
Sesc | Serviço Social do Comércio
Departamento Nacional
2018
sesc | serviço social do comércio produção editorial
PRESIDÊNCIA DO CONSELHO NACIONAL DIRETORIA DE COMUNICAÇÃO
Antonio Oliveira Santos Pedro Hammerschmidt Capeto
SUPERVISÃO EDITORIAL
departamento nacional Jane Muniz
FOTOGRAFIA
publicação Laura Jeunon
CONTEÚDO COPIDESQUE
Clarisse Cintra
GERÊNCIA DE EDUCAÇÃO
Cynthia Maria Campelo Rodrigues REVISÃO
Madalena Parisi Duarte
EQUIPE TÉCNICA
Anna Paula Jannuzzi Gasparri ARTE-FINALIZAÇÃO E PRODUÇÃO GRÁFICA
Claudia Santos de Medeiros Celso Mendonça
Gilvania Ferreira Porto
ESTAGIÁRIA DE PRODUÇÃO EDITORIAL
PESQUISA E TEXTO Juliana Marques
Adriana Klisys
CDD 371.33
agradecimentos
Agradecemos a colaboração de todos os Departamentos
Regionais do Sesc e convidamos a todos a continuarem
a pesquisa e o empenho para que o brinquedo artesanal
faça parte do currículo escolar, por uma escola na qual
a autoria infantil também se manifeste na construção
de seus próprios brinquedos. Deixamos aqui, também,
nosso especial agradecimento aos artesãos e artesãs
que não desistem de sonhar brinquedos para embalar
a infância e acordar a humanidade.
174 VIOLATA
Kaju e Junai (Leonardo Coutinho de Souza
e Luiz Gonzaga Araújo e Costa Júnior) | DF
A opção por privilegiar neste livro o brinquedo artesanal não é à toa. Seu
processo de construção transparente é generoso ao incentivar a autoria
na construção dos brinquedos, acionando a capacidade de pensar, sentir e
agir. Conhecer como se faz brinquedos é desvincular o brincar do consumo,
é uma forma de descobrir-se criador e não dependente de uma indústria
de divertimento para poder brincar.
MOBÍLIAS DE ARAME E LÃ
Paulo Socha | MA
BONECAS E MANDALA
DE BONECAS DE PANO
Maria de Lourdes Alves | PB CASINHA DE PAPEL
Jaime Correia Biliatário | BA
BONECAS ABAYOMI
Lena Martins ANIMAIS DE BALATA
(Waldilena Serra Martins) | RJ José Batista de Aragão | AC
O faz de conta é alimentado pela cultura, afinal a criança brinca com o que
conhece. Quanto mais ampla for a sua cultura, mais amplo será o faz de
conta. Uma criança que assiste a um espetáculo de circo, seja ao vivo, na
TV ou no cinema, ganha elementos para incluir em sua brincadeira os mui-
tos papéis dos artistas circenses: palhaço, bailarina, malabarista, trape-
zista etc. Do mesmo modo, quando vai à feira com seus familiares, quando
assiste a uma reportagem sobre astronautas no espaço, quando partilha
do conhecimento de um outro povo ou assiste a uma orquestra, está, por
tabela, alimentando o seu faz de conta. O vasto conhecimento do mundo
real amplia sua imaginação.
Suas bonecas começaram a fazer sucesso depois que recebeu uma encomenda
para decorar o Salão de Artesanato Paraibano, em 2006. Fez dez bonecas de
pano de 1,10 metro de comprimento, vestidas de moça, com muitos babados,
e uma mandala com mais de 58 bonecas pequenas que foram a grande atração
da feira de artesanato.
A boneca Abayomi, que hoje é uma marca registrada, tem sua origem nas
mãos de Lena Martins, maranhense que mora no Rio de Janeiro há 55 anos.
Ainda em 2011, Lena lançou seu primeiro livro todo ilustrado com tecido e
bonecas Abayomi. A narrativa trata de uma conversa levada ao balanço de
uma rede, com uma criança que está aprendendo a falar, inspirada na vivência
que teve com sua neta de 3 anos de idade, que hoje completa 18 anos: Vida
que Voa, Lena Martins, ilustrações de Carolina Figueiredo, Luciana Carvalho
e Lena Martins, Editora Escrita Fina, RJ, 2011.
Possibilidades lúdicas e educativas
Ter bonecas negras e também de diferentes culturas na escola é uma
maneira de valorizar a diversidade cultural, incluindo na brincadeira algo
que deveria ser natural nas relações: o afeto, o encontro precioso (abay =
encontro e omi = precioso) das diferenças.
Nesse sentido, procurar ter bonecas negras que não sejam estereótipos
ou que não sejam feitas na mesma forma das bonecas brancas, como as
grandes indústrias de brinquedos fazem, de certo modo é tratar de valo-
rizar as diferenças como qualidade e não com visão preconceituosa, ali-
mentada pela época da escravidão, que quis fazer acreditar na existência
de culturas inferiores e superiores. Todos nós só temos a ganhar e cres-
cer com este encontro efetivo, tão vital e precioso para a formação pes-
soal e social da Humanidade.
Essas reproduções de casas em miniatura eram tão fiéis ao modelo que demo-
ravam, por vezes, mais de ano para ficar prontas, contando com todos os
acessórios: pratas, porcelanas, lustres, candelabros, tapeçaria, quadros, mobi-
liário etc. Eram tantos detalhes que algumas dessas casas tinham até mesmo
roda de fiar de madeira, com roca de marfim em miniatura! Esses tesouros
de adultos eram tão bem cuidados que as crianças mal podiam chegar perto.
Grande parte das casinhas de bonecas feitas para crianças são de madeira
e sem nenhuma pintura. A garotada pode ser convidada a pintá-las, deco-
rá-las à sua moda. E por que não construir as suas próprias casinhas de
vários andares, juntando caixas de papelão resistentes ou caixas de fru-
tas e legumes de madeira? Pode também fazer móveis colando retalhos de
madeira, decorando com tinta ou colando algum tecido.
Quem se interessar pelo assunto pode consultar O grande livro das casas de
bonecas, de Faith Eath, com fotografias de Matthew Ward, ed. Civilização,
Portugal. De qualquer modo, a internet é uma boa fonte de pesquisa de
imagens; basta digitar palavras-chave, como “museu da casa de boneca”,
em várias línguas, para encontrar referências para as crianças conhece-
rem a história deste brinquedo:
Para fazer sua casa de 35 × 40 cm, que apelidou de Sítio Arizona por ter sido
inspirado num filme ao qual assistiu, o Sr. Jaime prepara vários canudos feitos
com folhas de revista, principal matéria-prima de seu brinquedo. Além de
papel, usa tesoura, cola e papelão para fazer a base da casa. Depois de pronta,
dá uma demão de verniz para durar. Com a estrutura dos canudos, cria também
as cadeiras, mesas e qualquer outra mobília para a casinha de boneca.
O Sr. José Batista de Aragão trabalha há 62 anos com balata, que é o látex
(espécie de goma elástica) extraído de uma árvore chamada balateira, comum
nas florestas da região Norte do Brasil, da mesma família da seringueira.
Essa seiva natural é extraída por meio de ranhuras no tronco da árvore, que
fornecem uma espécie de leite de borracha. É então defumada em fornalha à
lenha, o que dá uma cor marrom-avermelhada, de textura mais consistente
e pronta para que com ela sejam modeladas miniaturas de animais carac-
terísticos da fauna brasileira: tatu, jacaré, arara, jabuti, jacu, mutum, sapo,
tamanduá, peixe-boi, pirarucu, boto cor-de-rosa, macaco, cobra, búfalo da
Ilha de Marajó etc. Quando os animais ficam prontos, desprendem um cheiro
característico desse processo de defumação da borracha.
Além dos animais de balata, é possível fazer bolas, sapatos, galochas, bolsas
e mesmo outras tantas miniaturas, como figuras humanas e objetos de deco-
ração, moldando a balata à mão ou colocando-a em formas com desenhos do
que se quer produzir.
Este artesão de 76 anos faz sua parte para que os brinquedos não se tornem
“jurássicos” e se orgulha do tanto de crianças e adultos que têm os seus brin-
quedos no Brasil e no exterior. Entre eles, dois filhos baianos muito especiais:
Caetano Veloso e sua irmã, escritora e compositora, Mabel Velloso.
Quando iniciou este ofício, o Sr. Juracy fazia carrinhos, trenzinhos, aviões,
mas a concorrência da indústria de brinquedos plásticos era tamanha que
para continuar vivendo da profissão de artesão teve a ideia de fazer parqui-
nhos que não fossem confeccionados industrialmente. E deu certo. Fez e
continua a fazer milhares de parques de diversão, tendo confeccionado até
um em tamanho diminuto para uma colecionadora de miniaturas que mora
em Salvador.
MINIATURA DA
FICÇÃO
FAZ DE CONTA:
MUNDO
Em geral, no acervo lúdico das escolas estão presentes brinquedos minia-
turas relacionados apenas ao mundo da realidade. Nem sempre os brin-
quedos ligados ao mundo da ficção estão presentes: bruxas, sacis, fadas,
dragões, unicórnios, fantasmas e outros tantos seres imaginários acabam
fazendo parte do universo infantil via literatura e não por intermédio dos
objetos brinquedos em si em forma de objetos.
Até então, Maurício nunca havia pensado em fazer brinquedos, mas começou
a observar o interesse enorme do filho e de outras crianças pelo mecanismo
do boneco articulado. E foi dessa observação que nasceu a ideia de fazer brin-
quedos profissionalmente, abrindo a Magoobrinquedos, cujo nome vem de
seu apelido de infância: Magoo.
Sem dúvida, uma escuta atenta dos diálogos infantis criados durante suas
brincadeiras imaginárias ajudará os adultos a entenderem melhor a res-
peito da natureza do pensamento sincrético da criança, caracterizado pela
mescla de fantasia com realidade. Isso pode inspirar educadores a serem
“caçadores de diálogos imaginários” e a se aventurarem na escrita de crô-
nicas da vida cotidiana escolar, no que diz respeito aos improvisos lúdicos
infantis tão incríveis e tão pouco registrados nas escolas brasileiras.
Mundo miniatura da ficção 52 — 53
Mundo miniatura da ficção 54 — 55
máquina voadora
e animais alados
Gandhy Piorski | CE
Um brinquedo com caráter tão autoral, de certa forma, nos convida a lembrar
que não estamos sós em sua descoberta; alguém o concebeu para dividi-lo
conosco e com outros parceiros de brincadeira.
› gandhy.net
› abrinquedoteca.com.br/pdf/Entrevista_Gandhy_Piorsk.pdf
› projetobira.com/videos/boi-de-pedra/
› secult.ce.gov.br/noticias/o-ceara-desvendado-atraves-
dos-brinquedoswww.mapadobrincar.com.br
› gandhy.net/reportagens/reportagem8.htm
Mundo miniatura da ficção 58 — 59
FAZ DE CONTA:
MUNDO MINIATURA
PARA SE LOCOMOVER
NA TERRA, NA ÁGUA
E NO AR
CAMINHÃO DE TORA
Vasco (Francisco de Assis
da Silva Vasconcelos) | RO
JIPE, AVIÃOZINHO E
HELICÓPTERO DE BURITI
Renato da Silva Moura | TO
Desde menino, Renato Moura, 57 anos, fazia carrinhos de lata. Vendia-os aos
amigos e com o dinheiro comprava lanche na escola. Há 25 anos, começou a
fazer seus brinquedos profissionalmente, vendendo-os em lojas de artesanato.
Com muita habilidade, faz desde engenhocas como o boneco Mané-Gostoso,
bonecos de papel-machê em tamanho miniatura e gigante, piões de madeira,
até carrinhos e aviõezinhos de buriti. Esses últimos são de uma palmeira muito
comum na Região Norte do Brasil, mas também presente em Tocantins, de
onde o artesão retira matéria-prima para dar vida a seus veículos.
Os brinquedos que Guaracy faz hoje guardam relação com sua infância. Um dos
brinquedos que mais apreciava era o carrinho de corrida que sabia fazer, tanto
no tamanho miniatura como no tamanho que desse para brincar em seu inte-
rior: o carrinho de rolamento (carrinho de rolimã). Brincava de corrida dos dois
jeitos. Lembra que fazia uma travessura com os amigos – pegavam cavaletes de
manutenção da prefeitura para fechar viadutos só para brincarem de corrida.
Assim, os carros eram obrigados a dar passagem às brincadeiras infantis.
Em seu tempo de infância, todos os seus amigos com sete ou oito anos tinham
uma faquinha, instrumento importante para confeccionar brinquedos.
O carrinho que vemos na foto é um modelo muito próximo do que confec-
cionava quando menino. Selecionava madeiras moles que pudessem ser
trabalhadas com a faquinha. Usava cabo de vassoura para fazer o eixo do carro
com rodas, fazia uma fissura no centro da rodinha e passava um pedaço de
arame para travá-la.
Ronaldo Batista de Sales, conhecido como Magão, quando era criança inven-
tava seus próprios brinquedos com materiais reaproveitados. Um, especial,
era o aviãozinho com rabiola que fazia com o papelão de embalagens e papel
de embrulho. Preso a um fio, era só girá-lo por cima da cabeça para que
saísse voando!
FANTOCHES DE PERSONAGENS
DO BOI DE MAMÃO
Mónica Marcon | SC
TEATRO DE BONECOS
Juliana Bollini | SP
FAZ DE CONTA
DE MAMULENGOS,
MARIONETES
E FANTOCHES
Quantas histórias são capazes de colecionar os inúmeros personagens cria-
dos por adultos e crianças que se encantam com o mundo de faz de conta
de mamulengos, marionetes e fantoches!
Esses brinquedos que guardam íntima relação com o universo dos livros,
histórias e narrativas não podem faltar na vida das crianças, em especial
nas escolas, que deveriam ter lugar especial para eles em suas bibliotecas
e baús de faz de conta.
Miro dos Bonecos, como é conhecido Ermírio José, faz irreverentes mamu-
lengos dos três tipos. Desde criança quis aprender essa arte, e não esperou
muito para começar. Fez seus primeiros bonecos quando tinha sete anos,
usando cabo de vassoura, mangueiras, meias velhas e sua faquinha insepa-
rável de descascar laranja; mas sobretudo com muita imaginação, enriquecida
pela observação dos mestres bonequeiros com quem tinha contato. O menino
cresceu, mas a vontade de fazer bonecos e brincar com eles continuou. Passou
a fazê-los sempre dividindo a profissão de artesão de bonecos com outros
trabalhos que precisava fazer para completar a renda e hoje vive somente de
sua arte e apresentações em muitos lugares. Faz cerca de 100 bonecos por
semana, de madeira de mulungu e chita, com a ajuda de esposa, filhos e genro.
Já esteve até representando o país no ano Brasil-França. Lá levou vários dos
seus bonecos e uma personagem ilustre, da qual nunca se separa: a boneca
Maria Grande, do tamanho dele e com a qual bailava, dando vida à dançarina
mamulenga presa a seu corpo.
A criança que não brinca não é criança, mas o homem que não brinca
perdeu para sempre a criança que nele habitava e lhe fará muita falta.
(Neruda , [20??])1
Quem diria que uma simples caixa de fósforos pudesse falar? Nas mãos de
Joba Tridente, artista, bonequeiro, inventor de brinquedos e contador de histó-
rias, ela não só fala como se transforma no personagem que ele imaginar.
Usando recortes de revista, restos de embalagens, tesoura, cola e materiais
que podem ser reaproveitados, compõe rostos originais para seus bonecos-
-caixa de fósforo.
Para ele, nada é lixo; tudo vira arte. Não é à toa que o endereço de seu blog é
lixoquevirarte.blogspot.com. Lá, ele expõe suas criações com material reci-
clável e ensina o passo a passo de muitos de seus brinquedos, inclusive os
bonecos animados com caixas de fósforos, com pregadores de roupa e outras
técnicas mais, além de apresentar seus muitos filhos de criação, como as bone-
catrizes e os bonecatores que vivem pelos palcos da vida.
Para preparar a oficina de bonecos animados inspirados nos que Joba ensina
em seu site, vale uma preparação prévia de revistas que tenham muitos
olhos, bocas e narizes, além de embalagens de pasta de dente, gelatina,
achocolatados, bombons etc. As crianças podem brincar – como Joba faz
– de buscar na tipografia de letras das embalagens as que possam servir
de olhos, sobrancelhas e nariz para os bonecos. E, ainda, criar persona-
gens inusitados pelo próprio uso do material selecionado. Assim, ao usa-
rem a caixa de gelatina, podem ter ideia de fazer um cabelo em formato de
cubos de gelatina ou de letras impressas, recriando o inusitado que é ter
uma caixa de fósforos falante.
Juliana Bollini, artista plástica argentina que mora no Brasil há 20 anos, adotou
São Paulo como sua cidade, e se define como artista visual, sucateira (chatar-
rera) e louca por papel. Coleciona uma diversidade deles, de todas as texturas
e gramaturas, para compor sua arte.
Não é à toa que foi escolhida para preparar, especialmente para este livro, um
teatro de fantoches, por onde tanta imaginação transita ao abrir e fechar de
suas cortinas. Naturalmente, o teatro feito é de papel, matéria-prima eleita em
seu trabalho artístico. De fácil manuseio, poderá inspirar a criação de outros
teatros e, até mesmo, cenários para as encenações teatrais das crianças.
CAVALO DE BALANÇO
Manoel Severino dos Santos | DF
CAVALINHO DE CAULE
DE PÉ DE MILHO
Divino Jesus Moreira de Pinho | GO
CAVALO DE MIRITI
Valdeli Costa Alves | PA
FAZ DE CONTA
QUE CORREMOS
O MUNDO POR
MUITAS LÉGUAS
Sair a galope pelo pátio da escola pode ser uma aventura para
experimentar a velocidade da imaginação que transforma cabos
de vassouras, talos de palha de coqueiros ou qualquer pedaço
de pau em velozes cavalos de corrida.
Sua infância em Alta Floresta, com quintal de quase 1 hectare de pés de frutas
variadas e uma floresta exuberante ao lado de casa, a despertou para a natureza.
Atribui a essa experiência o fato de gostar de fazer brinquedos com elementos
naturais, como madeira, algodão e sisal, usados para confeccionar o cavalo
pantaneiro. Considera importante o contato com esse tipo de matéria-prima:
Desde pequeno, o artesão trabalhava na roça pela manhã e à noite fazia seus
brinquedos usando lata de óleo e caixa de sabão feita de ripa de madeira.
Na sua infância uma parte do que produzia era para brincar e a outra para
ajudar no orçamento. Acompanhava sempre seu pai na feira; enquanto este
vendia frutas, ele vendia seus brinquedos.
O Sr. Divino Jesus é um homem abençoado como o próprio nome o define, vive
a alegria e a harmonia no seu dia a dia. Em suas sábias palavras diz: “A gente
nasceu para brincar.” De fato, quando esquecemos nossa natureza primeira
que é a brincadeira, a vida fica um bocado chata. Quem não brinca com o
conhecimento, com a profissão, com a vida, tem menos a criação e a alegria
presentes em seu cotidiano.
Façamos uma viagem no tempo quando o menino Divino foi iniciado nas artes
da brincadeira por seus avós:
Foi com a avó que aprendeu a usar trança de palha de milho molhada para
fazer as amarrações de seu cavalo quando não tinha cordão. O processo
de fazer a trança, ensinado por ela, é o mesmo que se faz com fumo em
corda e com corda de sisal. Seus avós baianos sempre davam muitas dicas
e se orgulhavam do neto. O artesão lembra com carinho da forma como
seu avô costumava comentar sua vivacidade de garoto da roça: “Ó Maria,
este menino ladino cheio de estripulias, cheio de invenções!”.
Quem diria que uma palmeira de miriti poderia virar cavalo? Na imaginação,
nosso maior patrimônio, tudo é possível! Valdeli, ao ver um cavalo de miriti
no Museu do Folclore Edison Carneiro, lembrou-se de sua infância brincando
de cavalo e, ao mesmo tempo, vislumbrou uma possibilidade de usar seu
talento de construtor de brinquedos para que muitas crianças possam viajar
montadas no que a terra oferece.
Valdeli sempre usou com criatividade o miriti, material do qual eram feitas as
paredes de sua casa. Quando criança, fazia barcos e jangadas com miriti, mas
seu sonho mesmo era ser DJ e ter aparelhagem de som, então usava o próprio
miriti para fazer seus aparelhos e se tornar um profissional no faz de conta.
Da intimidade com a matéria desde a infância, hoje Valdeli tira seu sustento.
Tem uma grande demanda de trabalho criativo para transformar o talo da folha
do miriti, que mede cerca de 3 metros e meio, em diferentes brinquedos. Para
fazer o cavalinho, separa um pedaço do talo com cerca de 5 cm de diâmetro
e outro pedaço deste mesmo talo para esculpir a cabeça, encaixada com cola
branca, silicone ou cola de isopor, esta com maior aderência para o tipo de
material conhecido como “isopor amazônico”.
PETECA
Magali Aparecida Ono | MS
ESTILINGUE (BALADEIRA)
Demestre da Silva Bezerra | AC
DE HABILIDADE
E DESTREZA
BRINQUEDOS
As crianças são hábeis e exigentes consigo mesmas na supe-
ração de desafios. Constantemente estão exercendo maneiras
de ir além do que sabem, conhecem e podem fazer usando sua
capacidade física. Não é à toa que passam horas aprimorando-
-se em pular corda, jogar pião, bolinhas de gude e tantos outros
brinquedos que exigem habilidades específicas. Gostam de ser
desafiadas pelo brinquedo.
O corrupio requer ritmo dos dedos polegares, que devem segurar as extremi-
dades do fio para reger a peça central em contínuo movimento de rotação,
proporcionando um som inconfundível: um zumbido que vai aumentando
conforme o fio é tensionado e relaxado com maior frequência. Para dar início
à partida, no entanto, é preciso segurar as pontas do fio e fazer a peça central
girar num mesmo sentido, como se estivesse dando corda para o brinquedo
funcionar com a posterior regência das mãos que se aproximam e se afastam.
Quando tinha 6 anos, o Sr. Divino aprendeu com seu avô a fazer esse brinquedo
secular, confeccionado com um pedaço de cabaça. Aproveitava o barbante
que vinha no saco de juta do café para usá-lo no brinquedo e assim o confec-
cionava com materiais que encontrava por perto.
Além dos informantes da cultura lúdica que estejam por perto, pais e comu-
nidade educativa podem também pesquisar em livros que contam a his-
tória dos brinquedos. No livro Jogos e brincadeiras do povo Kalapalo, de
Marina Herrero, edições Sesc SP, podemos ver que no Alto Xingu o corru-
pio, conhecido lá como “holá”, também é feito com um pedaço de cabaça
furado no meio e com bordas dentadas, só que o fio é feito com corda de
buriti. Podemos apreciar no DVD que acompanha o livro como os kalapa-
los brincam com o holá. Várias outras etnias indígenas brasileiras também
fazem esse brinquedo. Os índios Ticuna também o conhecem pelo nome de
Tchera i mucü, confeccionado com elementos da natureza e fio de tucum.
Recentemente, têm usado lata recortada com fios dentados para cortar
folhas ou frutas moles e ainda caçar pequenos insetos.
Podemos descobrir com as crianças outros jeitos de brincar, não só indi-
vidualmente, mas em duplas, o que requer coordenação do movimento
para fazer o corrupio girar. E por que não conhecer outros brincantes que
recriam esse brinquedo, como é o caso de Chico dos Bonecos (Francisco
Marques), que criou uma versão gigante do corrupio feito com papelão e
fio de mais de metro de comprimento presos por um cabo no qual cada
participante segura com as duas mãos? E ainda uma versão do corrupio no
qual se prende uma parte do fio no pé e a outra é segura pela mão, permi-
tindo brincar ao mesmo tempo em que se anda? Imagens da criação desse
brinquedo estão em seu livro Muitos dedos, enredos, da editora Peirópolis.
Outro livro com boas histórias e sensível registro fotográfico desse brin-
quedo, confeccionado com escamas, ossos e conchas, é o Giramundo e
outros brinquedos e brincadeiras dos meninos do Brasil, de Renata Meirelles
(editora Terceiro Nome).
Em sua infância, a artesã fazia peteca com palha de milho e pena de galinha de
angola ou galo índio. Lembra que era comum na cultura indígena mato-gros-
sense fazer petecas usando penas de tucano, papagaio e arara. Hoje, afastada da
roça, faz petecas costurando corino, napa ou couro ecológico e usando penas
de pato tingidas, compradas especialmente para a confecção dos brinquedos.
Aprendeu a fazer peteca por volta dos 10 anos, quando se interessou por esse
jogo. Brincava com suas amigas ou mesmo sozinha batendo a peteca para
superar o tempo que ficava no ar sem cair no chão. A depender de Magali, a
brincadeira passa sempre de geração a geração. Continua partilhando o jogo
por meio da confecção de suas petecas. De mão em mão, a expressão “não
deixar a peteca cair” ganha vida na habilidade e agilidade da prática desse
divertimento.
Estilingue, baladeira, badogue ou badoque, seta, setra, funda são vários nomes
para um mesmo brinquedo de pontaria feito com uma forquilha (galho bifur-
cado em Y), tira elástica e couro, que usa munição encontrada facilmente no
meio ambiente como pedras, sementes de mamonas, caroços de frutas etc.
Como boa parte dos brinquedos que iniciaram sua trajetória nas mãos de
adultos, com o estilingue não foi diferente. Em sítios arqueológicos na Turquia,
foram encontrados exemplares de estilingues que datam do período neolí-
tico (8.000-4.000 a.C.). Como a história indica, nasce como arma de caça ou
defesa para atirar um projétil num alvo.
Vale ainda convidar os pais ou crianças mais velhas para ensinar a técnica
de fazer estilingues e buscar materiais ou adaptação deles para a con-
fecção. No lugar da mangueira de látex, conhecida como “tripa de mico”
ou “tubo de látex” de cor âmbar, vendida em farmácias para uso médico,
usar tiras de câmara de pneu encontradas em bicicletarias ou borracha-
rias. Enfim, não deixar em completo esquecimento um instrumento inven-
tado há tanto tempo.
Entre tantos brinquedos que confecciona, João tem em seu acervo o cami-
nhão itinerante, dirigido pela criança ao empurrá-lo por meio de sua torre de
direção, acoplada ao fundo da carroceria. Uma corrente por baixo do veículo
liga a torre de direção às rodas da frente, permitindo que a criança faça as
manobras ao empurrá-lo. O criativo brinquedo permite que a garotada se
transforme em verdadeiros motoristas de caminhão!
Quem conhece suas criações logo vê que Carlos gosta muito dos que se movi-
mentam com o uso de rodas. Seus brinquedos se caracterizam pela robustez
– aguentam o tranco do uso intenso das crianças – e pela criatividade em
reaproveitar materiais que consegue em sucatas, como rodas de carrinho de
bebê, de velocípedes, de patins, alça de mala de viagem e rodo, entre outros.
Pode ser uma boa ideia a escola manter contato com alunos de Mecânica e
Engenharia, para um projeto compartilhado com a universidade com o fim
de desenvolver inusitados brinquedos sobre rodas. Por exemplo, colocar
rodízio no fundo de uma caixa de água, transformando-a num barco rolante;
adaptar rodas em móveis velhos, estrados de cama; inventar novas formas
de fazer patinetes, carrinhos de empurrar e muitos outros.
COME-COME, ALIMENTANDO,
RIBEIRINHO NA CANOA, BOTO
ARTICULADO, SOCA-SOCA,
SERRA-SERRA E DANÇARINOS
Valdeli Costa Alves | PA
BRINQUEDOS
DE MIRITI
Escolher brinquedos frágeis para o acervo lúdico das
escolas não deixa de ser um exercício de sensibilidade
e delicadeza, já que todo o cuidado é pouco para que
não sejam danificados durante o ano.
O termo “móbile” foi cunhado pela primeira vez na História da Arte em 1932,
quando Marcel Duchamp o utilizou para nomear as esculturas móveis criadas
pelo artista Alexander Calder, compostas por placas planas de metal suspensas
no ar e equilibradas por finos fios de arame. A partir daí, passaram a ser assim
chamadas várias estruturas que brincam com o equilíbrio, criando inclusive
um novo sentido para a palavra “móbile”, de origem latina, que já existia há
muito tempo com o significado de movimento.
Hoje em dia, o termo está bastante associado a brinquedos para bebês, confec-
cionados para quartos, berços ou berçários.
O bom desse processo é que não precisa cortar a árvore! Novos braços do miri-
tizeiro crescem para poderem virar brinquedos futuramente!
Não se sabe ao certo quem teve a brilhante ideia de confeccionar esse tipo
de brinquedo. O fato é que são parte fundamental da tradição da maior festa
religiosa paraense, o Círio de Nazaré, que acontece há mais de duzentos anos
em Belém do Pará. Nessa ocasião, são comercializados inúmeros desses brin-
quedos, expostos em girândolas que parecem carrosséis erguidos nos ombros
dos artesãos-vendedores.
Fica aqui a dica para que acompanhem o noticiário (jornal, rádio ou TV)
sobre a festa do Círio de Nazaré, que acontece no segundo domingo de
outubro, para obtenção de mais conhecimento acerca dos diferentes brin-
quedos de miriti e seus artesãos. Também podem procurar no mapa onde
fica a cidade de Abaetetuba, principal polo de produção de brinquedos fei-
tos com este material por artesãos como Vamilson.
Valdeli Costa Alves faz brinquedos de miriti desde os 12 anos e como profissão
começou em 1999. Antes, trabalhava em fábrica de vassouras e na construção
civil. Quando ficou desempregado, começou a fazer os brinquedos profissio-
nalmente e daí em diante nunca mais parou. Participou de uma exposição no
Rio de Janeiro, no atuante Museu do Folclore Edison Carneiro, e desde então
fornece suas peças para venda na loja desse museu e para muitos outros
lugares. Depois disso, fez exposição em vários aeroportos do Brasil, cruzando
o oceano para uma exposição em Paris. Na ocasião levou brinquedos – alguns
grandes, como uma cobra de duas cabeças de cerca de 2 metros – e esculturas
de miriti de mesma metragem. Foi um sucesso a exposição: todas as criações
foram vendidas.
Hoje não mora mais em casa de parede de miriti, mas vive cercado por esse
material. Participa da Associação Arte Miriti de Abaetetuba (Miritong), que
agrega jovens de baixa renda que aprendem a trabalhar com o miriti para gerar
renda para a família, ao mesmo tempo em que preservam a cultura. Gosta
de lembrar que o brinquedo de miriti é biodegradável e não agride o meio
ambiente; ao contrário, contribui para melhorar a terra onde ele apodrecer.
E que adquirindo um brinquedo totalmente feito à mão, diferente daquele de
plástico, feito por máquina, ajuda-se a gerar renda para famílias que precisam.
ENGENHOCAS
Carro bate-bate e galinhas
Paulo Socha | MA
Para mais informações do autor, ver pp. 17 e 201.
Lembra que não havia plástico disponível, material amplamente usado pela
indústria de brinquedos atual. No seu tempo de infância as matérias-primas
para confeccionar brinquedos basicamente eram o couro, a madeira, o ferro
e o chifre de boi, que quando esquentado pode ser moldado, semelhante
ao plástico.
Engenhocas 162 — 163
Possibilidades lúdicas e educativas
Inspirando-se na arte da criação de brinquedos de Paulo, podemos lem-
brar das sobras fartas de retalhos de madeira que temos em marcenarias
por todos os cantos do Brasil, para incluir este material no planejamento
de construção de brinquedos.
Engenhocas 166 — 167
Possibilidades lúdicas e educativas
Ao brincar com o Mané-Gostoso e observar atentamente seu mecanismo
de funcionamento, fica fácil se arriscar a fazer tal brinquedo-engenhoca.
É possível adaptar materiais, usando papelão para a confecção do corpo
do boneco, arames encapados ou fechos plásticos (aqueles que fecham
pacote de pão de forma) para fazer as articulações do boneco, unindo par-
tes de seu corpo. Também podemos encontrar boas dicas do passo a passo
da montagem deste brinquedo no livro: Brinquedos & Engenhocas de Luise
Weiss, Ed. Scipione.
José Cícero da Silva (Mestre Zezinho), 47 anos de idade, faz brinquedos desde
menino, mas somente há 17 anos descobriu-se na profissão de artesão de brin-
quedos e hoje não imagina a vida sem fazê-los.
Para fazer seus brinquedos, Mestre Zezinho procura imaginar do que a criança
gosta. “Eu penso assim: criança gosta de movimento – numa peça parada ela
se distrai; já o movimento a deixa abismada, quer voltar a encontrar o brin-
quedo.” Assim, naturalmente seus brinquedos envolvem movimento. Tem
feito vários cata-ventos que movimentam brinquedos como rodas-gigantes
com bichos, jogadores de futebol, socadores de milho, cavalinhos correndo,
casal dançando etc. A hélice do cata-vento é que sempre dá movimento às suas
peças. Atualmente, tem até um cata-vento que movimenta uma bicicleta, ou
seja, movimenta as pernas do boneco que a pedala. Fez tal brinquedo inspi-
rado no desejo de infância de fazer uma bicicleta para si mesmo, de madeira,
já que não podia comprá-la.
Todos os seus brinquedos são feitos à mão, com a ajuda de ferramentas simples:
faca amolada, serrinha, foice, escopo, esquadro. Só usa máquinas, como serra
tico-tico, para fazer peças curvas, mas o acabamento de seu trabalho é todo
manual. Assim, orgulha-se dizendo: “Estou para descobrir uma máquina que
faça um bicho destes que uso em minha roda-gigante ou estes bonecos que
vou esculpindo na madeira!”
Engenhocas 170 — 171
Possibilidades lúdicas e educativas
Ter brinquedos-engenhocas cata-ventos como os de Mestre Zezinho pelo
pátio da escola é uma maneira prazerosa de apreciar a brincadeira dos ven-
tos, senti-la ao seu menor indício. Agora, confeccioná-los parece um tanto
difícil, já que requerem certa habilidade com a madeira. Mas se atentar-
mos à psicogênese da criação desses cata-ventos de Zezinho, veremos que
podemos experimentar com as crianças a confecção de outros tipos de
cata-ventos, sejam eles feitos com papel ou com outros materiais sugeri-
dos pelas lembranças de infância desse artesão alagoano.
Outra modalidade que sabia fazer quando menino era o cata-vento de lata.
Usava lata de óleo quadrada. Sentava-se num cantinho, cortando sosse-
gadamente a lata com uma faquinha afiada. Uma das etapas bem delica-
das deste processo era empenar a lata dos dois lados para fazê-la girar
bem. O cuidado em fazer as hélices simétricas era essencial para que o
brinquedo não ficasse mais pesado de um lado que do outro. Mas a preci-
são não ficava só nisso. Era preciso que continuasse vigente, para que o
conjunto de pás fosse preso por um ponto central a um eixo. Sendo assim,
para fazer o buraco no centro do cata-vento, era preciso medir muito bem
antes de bater um prego com a ajuda de um toquinho de madeira que tinha
a função de martelo. Depois, só faltava passar arame e prender o brinquedo
a um cabo de madeira.
Engenhocas 174 — 175
Possibilidades lúdicas e educativas
Começando pelas referências musicais da dupla, podemos compartilhar com
as crianças vídeos de músicos que inventam instrumentos e sons, como os
de Hermeto Pascoal, grande inventor e brincante musical, que tira som até
mesmo de chaleira! Há, inclusive, um livro destinado ao público infantil, que
conta sua história e ensina a fazer alguns instrumentos musicais. Trata-se
de O menino Sinhô – vida e música de Hermeto Pascoal para crianças, São
Paulo: Ática, 2007. Compartilhar o patrimônio musical de nosso país e de
outros contribui para que as crianças tenham uma riqueza de repertório
musical que as instigue em suas invenções sonoras.
Tais experiências podem nos instigar a criar, com as crianças, uma banda
alternativa com instrumentos idiofônicos e mesmo ensiná-las a construí-
rem seus próprios brinquedos sonoros.
Engenhocas 176 — 177
Pião gigante à manivela
Dim (Antônio Jader Pereira dos Santos) | CE
Para mais informações do autor, ver pp. 189.
Dim faz uma diversidade de brinquedos: joão-teimoso, rói-rói, 1 Título de uma animação com
trapezista de brinquedos de empurrar, de entrar, de tocar e seus brinquedos do artista plástico de
Camocim – CE, Antônio Jader Pereira
incríveis brinquedos de manivela, que fazem carrosséis girar, casais dos Santos (Dim). BRINQUEDIM,
dançarem, piões rodarem etc. brinquetu, brincamos nós! Direção: Rui
Ferreira. Ceará: Instituto Brinquedim,
2011. Disponível em: <https://www.
E, por falar em piões, Dim inventou não só uma caixa de piões youtube.com/watch?v=aeGWBetccJU>.
à manivela, como também um pião gigante de 80 centímetros, Acesso em: 15 nov. 2017.
que pesa quatro quilos e meio, confeccionado em isopor, tecido,
madeira e resina acrílica, e… o melhor de tudo: ele roda!
O interesse por fazer brinquedos movidos por manivela tem sua origem num
carrinho de algodão-doce, da infância. Conta ele que desde criança estuda
mecanismos e um, em particular, que o encantava: uma espécie de maqui-
ninha à manivela do carrinho de algodão-doce. Tamanha era sua curiosidade
que acabou desvendando o mistério daquele mecanismo que fazia nuvens
de açúcar e o adaptou para seus brinquedos terem um gosto de quero-mais,
como o doce desejado da infância.
Engenhocas 178 — 179
Possibilidades lúdicas e educativas
Para Dim, o brinquedo é o resultado da brincadeira:
Tanto que o menino não pôde mais parar de criar e hoje coleciona um vasto
repertório de brinquedos para imaginar, em sua maioria, peças interativas e
brinquedos autômatos, engenhocas que dão movimento de seres vivos a corpos
inanimados, como é o caso dos brinquedos que se movem ao se girarem mani-
velas (capoeiristas, forrozeiros, dançarinos etc.) e, ainda, muitos brinquedos
de mão, como ele próprio chama os brinquedos de empurrar (Pássaro Bate-
Bate, Cavalo Alado, Helicóptero, Monociclista e outros que podem ser vistos
no site www.albertobernardo.com.br).
Essa experiência infantil, aliada também a estar numa cidade rica em brin-
quedos artesanais, com representantes como Dim, Gandhy Piorski e Mestre
Zezito, o ajudou a aperfeiçoar sua técnica e a encontrar um caminho autoral.
Soma-se a estas condições favoráveis a sua curiosidade, que vem sendo alimen-
tada desde cedo, tanto pelo que vem de fora, como pela vontade interna de
encontrar vazão de conhecer o mundo. Exemplo disso ele mesmo nos conta,
ao dizer que foi atraído pela mecânica do movimento dos brinquedos quando,
ainda garoto, encantou-se com uma caixinha de bonecos russos de corda, e a
partir daí aprimorou a profissão de desvendar segredos lúdicos.
Engenhocas 182 — 183
de brinquedo têm suas raízes na Europa; afloraram no Iluminismo, no século
XVII, com a arte da relojoaria aperfeiçoada, criando escola de inventores de
autômatos que, inclusive, contribuíram para a Revolução Industrial, sendo
precursores de grande parte da tecnologia atual.
JACARÉ
Mestre Miro
(Ermirio José da Silva) | PE
JACARÉ E BORBOLETA
DE EMPURRAR
João Luiz de Souza Silva | SE
PÁSSARO BATE-BATE
Paulo Socha | MA
ENGENHOCA
DE EMPURRAR
Carlos Antonio Alves | MG
ENGENHOCAS
DE EMPURRAR
O que será que Zé Matutos, cavalos alados, pássaros, helicópte-
ros, borboletas e jacarés têm em comum? Ora! Todos gostam de
ser levados a passear! Vamos dar um empurrãozinho para esta
brincadeira virar realidade também nas escolas?
Pássaro bate-bate, cavalo alado,
helicóptero e monociclista
Dim (Antônio Jader Pereira dos Santos) | CE
Para mais informações do autor, ver pp. 179.
Interagir com brinquedos que têm uma sensibilidade estética e visão poética
do mundo, como o monociclista, o cavalo alado e o pássaro bate-bate, é brincar
com os sentidos, enriquecer a sensibilidade. E o melhor de tudo é convidar a
própria alma brincante a animar-se. Lembrando que a palavra “ânimo” vem de
anima, que significa alma. Brincar é, de certa forma, dar alma a coisas inani-
madas. É, portanto, colocar sua própria anima em movimento!
E não é preciso ser criança para dar alma aos brinquedos; quem se dispõe a
entrar no jogo, brinca de dar vida às coisas, dar sentido, usufruir da brinca-
deira. O brincante Dim não só faz seus brinquedos, mas, sobretudo, brinca
com eles. Diz ele:
Que tal criarmos o LIB (Ludicidade Interna Bruta) e nos inspirarmos no pró-
prio indicador do Butão (felicidadeinternabruta.org.br) para levantarmos
critérios de como anda o brincar na educação? Como podemos considerar
o brincar como indicador de bem-estar e desenvolvimento infantil? Para
tal desafio da equipe educativa seria interessante consultar a publicação:
Indicadores da Qualidade na Educação Infantil – Ministério da Educação,
Secretaria de Educação Básica – Brasília, 2009. Disponível no site: portal.
mec.gov.br/dmdocuments/indic_qualit_educ_infantil.pdf
Engenhocas de empurrar 190 — 191
Jacaré
Mestre Miro (Ermirio José da Silva) | PE
Para mais informações do autor, ver pp. 83 e 167.
O artesão ganhou o título de Mestre Miro pela inventividade com que faz seus
brinquedos que agradam crianças e adultos aficionados por essas criações.
Dentre estes, muitos colecionadores de brinquedos do Brasil, como David
Glat e Roberto Avritchir, que provavelmente têm mais peças suas do que os
poucos museus de brinquedos espalhados pelo país.
Os brinquedos deste artesão têm viajado bastante por este país afora. É comum
vê-los espalhados em muitas lojas de brinquedos artesanais ou então em
casas de artesanato brasileiro. Quem conhece suas peças saberá reconhecer
um brinquedo de sua autoria, sinal que suas criações têm um estilo próprio,
de quem leva uma vida dedicada a fazer o que gosta.
› museudasbonecas.com.br
(Museus das Bonecas e do Brinquedo – Cuiabá, MT)
› museudosbrinquedos.org.br
(Museu dos Brinquedos – Belo Horizonte, MG)
› museudobrinquedodailhadesc.blogspot.com.br
(Museu do Brinquedo da Ilha de Santa Catarina – SC)
› museudobrinquedopopular.com.br/contato.asp
› meb.fe.usp.br
Vale ter na escola uma coleção dessas preciosidades que temos no Brasil e
também procurar ver com os familiares das crianças se conhecem novos
brinquedos de empurrar e se sabem confeccioná-los para elas. Em enque-
tes como essa, podemos descobrir divertidas engenhocas feitas com sobras
de caixa de madeira de frutas, cabos de vassoura, rodos, rodas de carri-
nhos de bebês que perderam a utilidade ou de algum brinquedo quebrado.
E para os pais que não fazem brinquedos como esses vale essa socialização,
a fim de que estejam atentos às qualidades daqueles feitos para empurrar
quando levarem os filhos a parques infantis, feiras de artesanato e lojas
de brinquedos artesanais. Do mesmo jeito que algumas escolas sugerem
bons livros de leitura, por que não sugerir também bons brinquedos para
o desenvolvimento e a experiência sensível com o mundo?
Engenhocas de empurrar 198 — 199
pássaro bate-bate
Paulo Socha | MA
Para mais informações do autor, ver pp. 17 e 163.
Foi ainda na marcenaria de seu pai que, além de gostar de brincar de olhar
atentamente os objetos para ver no que eles iriam se transformar, descobriu
o gosto também pela fotografia aos 15 anos. Deixaram uma câmera fotográ-
fica empenhada pela troca de um trabalho que transformou a vida de Paulo;
da brincadeira de olhar nasceu também a profissão de fotógrafo. Seu trabalho
correu exposições no Brasil e na Europa.
No contexto em que viveu, criar tornou-se algo natural em sua vida. Sua escola
estava no cotidiano de sua casa.
PARA VER O BELO
BOX, POP ACQUA,
TETRIS E ALEGRIA
Heidi Xavier | PR
BRINQUEDOS
caleidoscópio acqua, linea,
pop star, pop box, pop acqua,
tetris e alegria
Heidi Xavier | PR
Heidi Xavier divide seu trabalho entre dar aulas de história e fazer caleidos-
cópios que aprendeu com seu pai, quando era criança. Hoje, encanta muitas
pessoas que passam, aos domingos, pela feirinha do Largo da Ordem, em
Curitiba. Tem admiração por este brinquedo óptico, porque forma infinitas
imagens que nunca se repetem.
Mesmo que alguém pudesse viver milhões de anos, ainda assim não conse-
guiria visualizar todas as combinações de formas e cores que um caleidoscópio
é capaz de proporcionar. Seu nome vem das seguintes palavras gregas: kalos
(bonito), eidos (forma ou imagem) e scopeo (ver). Pode ser traduzido como visua-
lizador de belas imagens, ou instrumento para ver o belo. Esse nome poético
foi batizado pelo inglês David Brewster, que patenteou essa invenção em 1816.
Nele, ela ensina como fazer caleidoscópios, mas há muitas outras manei-
ras de construí-los, usando, por exemplo, réguas translúcidas no lugar de
espelhos, lâminas espelhadas de plástico ou de CDs. Na internet, encon-
tramos vários vídeos que ensinam formas caseiras de construir este brin-
quedo óptico.
Para fazer um caleidoscópio, precisamos basicamente de três espelhos
planos com a mesma dimensão, por exemplo, 20 cm × 3 cm. Com a ajuda
de uma fita adesiva, unimos os espelhos, formando um triângulo equilá-
tero com a superfície espelhada voltada para dentro. Só com esta opera-
ção já poderemos olhar o mundo através destes espelhos e ver o princípio
da repetição das imagens.
E por que não convidá-las também a fazer uma arte caleidoscópica, dese-
nhando e fotografando as imagens criadas por seus respectivos caleidoscó-
pios? Afinal, desde a invenção desse artefato óptico, há inúmeros artistas,
estampadores de tecidos, bordadeiras, decoradores que usam essa fonte
de inspiração para seus trabalhos, como é o caso de M.C. Escher, com sua
obra Caleidociclos.
Quando não havia lojas de brinquedos, era muito comum estes improvisos
lúdicos maravilhosos que juntam latas com chinelo para formar automó-
veis. Eixo, carroceria e rodas são montadas com o que se acha pelo caminho
e o combustível para andar é o que se tem de sobra no mundo infantil. O que
não falta para as crianças é sobra de energia para colocar muita coisa em
movimento!
Também aprendeu com seu avô carpinteiro a fazer carrinhos de boi e mesmo a
esculpir bois com madeira de bálsamo, cheirosa e boa para a confecção desses
brinquedos. Diz ele que é preciso conhecer a ciência deles para fazê-los com
precisão. E isso aprendeu na faculdade da vida.
A energia das mãos da criança usada para colocar o pião em movimento faz
um mundo dançarino rodopiante acordar. Aos seus olhos, o movimento de
rotação da Terra se traduz no giro do brinquedo. Por isso é tão encantador,
por isso, por anos a fio, o convite ao movimento dos piões de cabaça, sucata,
plástico, semente, marfim, que continuam a rodar incansavelmente nas mais
variadas culturas. Não vamos quebrar esta tradição, não é? Vamos colocar
muitos piões na roda para dar continuidade ao movimento harmônico inven-
tado pela humanidade!
De sua invenção para cá, temos uma diversidade de formatos e materiais dos
quais os piões são feitos: madeira, casco de cavalo, plástico, metal, papelão etc.
Podemos apreciar a beleza do design dos piões de diferentes culturas no belís-
simo vídeo Tops, do casal Charles e Ray Eames, que filmaram uma coleção especial
de muitos anos (www.youtube.com/watch?=v=FujYoqBVf74&feature=related).
Para finalizar uma coleção de muitos piões feitos por artesãos deste imenso
Brasil para terminar o livro deslizando brinquedos sobre a Terra em per-
manente giro!
DO
BR
SIL ISBN 978-85-8254-068-8
9788582540688