Saeculum 33
Saeculum 33
Saeculum 33
REVISTA DE HISTÓRIA
N° 33 - Jul./Dez. 2015
ISSN 0104-8929
UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
Reitora: Margareth de Fátima Formiga Melo Diniz
Vice-Reitor: Eduardo Ramalho Rabenhorst
DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA
Chefe: Monique Guimarães Cittadino
Sub-Chefe: Mozart Vergetti de Menezes
Departamento de História
Programa de Pós-Graduação em História
Universidade Federal da Paraíba
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
Campus Universitário - Conjunto Humanístico - Bloco V
Castelo Branco - João Pessoa - Paraíba - CEP 58.051-970 - Brasil
Fone/ Fax: +55 (83) 3216-7915 - E-Mail: <[email protected]>
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ISSN 0104-8929
e-ISSN 2317-6725
CONSELHO EDITORIAL
Alberto da Silva (Univ. Sorbonne - Paris IV) José Miguel Arias Neto (UEL)
Alômia Abrantes Silva (UEPB) Lina Maria Brandão de Aras (UFBA)
André Cabral Honor (UnB) Luiz Geraldo Silva (UFPR)
Antonio Clarindo Barbosa de Souza (UFCG) Maria de Deus Beites Manso (Univ. Évora)
Antônio Paulo Resende (UFPE) Pedro Paulo Funari (UNICAMP)
Carlos Fico (UFRJ) Peter Mainka (Univ. de Wüzburg)
Durval Muniz de Albuquerque Jr. (UFRN) Ricardo Pinto de Medeiros (UFPE)
Gabriel Aladrén (USP) Sílvia Regina Ferraz Petersen (UFRGS)
Gisafran Mota Jucá (UECE) Tania Bessone (UERJ)
Itacir Marques da Luz (SEC-PE) Thereza Baumann (MN-UFRJ)
Itamar Freitas (UnB) Valdemir Zamparoni (UFBA)
Jorge Ferreira (UFF)
MISSÃO DA REVISTA
Sæculum - Revista de História é publicada pelo Departamento de História da UFPB desde 1995 e,
a partir de 2004, passou a ser também o periódico do Programa de Pós-Graduação em História da
mesma universidade. Sua frequência é semestral, e se trata de uma revista voltada à divulgação e
debate de pesquisas no campo da História e da Cultura Histórica e suas diversas interfaces, abrindo
espaço para pesquisadores do Brasil e do exterior.
ISSN 0104-8929
Semestral
417 p.
Sumário
Número Temático: “O Oitocentos”
Organizadora: Cláudia Engler Cury (UFPB)
Editorial .......................................................................................................... 9
VIAJANTES
ESCRITA DA HISTÓRIA
RESENHA
O ano de 2015 tem sabor especial para a revista Sæculum, porque estamos
justamente completando 20 anos de nosso periódico, cuja história foi permeada
por percalços e muitas alegrias. A principal delas deve-se ao esforço coletivo de
professores do Departamento de História da Universidade Federal da Paraíba e
dos professores vinculados ao Programa de Pós-Graduação História que também
completa dez anos de existência.
Em meio a um clima de comemorações escolhemos uma nova organização
editorial para a revista, em números temáticos que se alternarão com edições
de artigos livres. Para a presente edição, o número temático tem por mote os
Oitocentos, com o objetivo dar visibilidade aos esforços empreendidos pelos grupos
de pesquisa Sociedade e Cultura no Nordeste e História da Educação no Nordeste
Oitocentista, ambos alocados no PPGH da UFPB, assim como estimular o diálogo
com os pesquisadores dedicados a esse período histórico em outros centros de
pesquisa.
Apresentamos aos leitores os textos que foram aqui reunidos a partir de alguns
subtemas, o primeiro deles discute questões relativas à formação do Estado
Nacional, com cinco artigos: “Migrantes no Império do Brasil: a trajetória de Jean
Bazet nas origens da Vila de Nova Friburgo, 1820-1858”; “Projetos e perspectivas
na construção da nação brasileira (1822-1840)”; “Entre a Igreja e o Império: Dom
Marcos Antonio de Sousa, o primeiro bispo do Brasil independente”; “O herói da
Confederação do Equador volta do exílio: Manoel de Carvalho Paes de Andrade
e as lutas políticas regenciais (Pernambuco, 1831-1835)”; “Os Guaranis nas
precariedades da guerra: o impacto do recrutamento nas Missões Orientais (Rio
Grande de São Pedro, primeira metade do século XIX)”.
O segundo subtema relaciona-se ao universo prisional, às forças policiais e
aos dilemas que envolveram a Guerra do Paraguai e orienta os seguintes textos:
“Prisões no Brasil oitocentista: rotinas e vivências na Casa de Detenção do Recife
na década de 1860”; “A Guarda Cívica do Recife: a utopia de uma força policial
guiada pela cortesia nas décadas finais do Brasil Império (1876-1889)”; “Dramas
do Império chegam à República: a luta dos veteranos da “Guerra do Paraguai’’
pelos direitos socioeconômicos prometidos durante esse conflito – Ceará (1870-
1940)”.
Agrupados em torno do terceiro subtema estão sete textos relativos ao universo
da pobreza, da exploração do trabalho livre, das relações econômicas e de liberdade
envolvendo escravos, ex-escravos e senhores de escravos assim dispostos: “Sertão
proletário: o universo da pobreza e os limites da ordem no Ceará oitocentista”;
“População, compadrio e trajetórias de gente negra na Cidade da Paraíba
oitocentista”; “‘Carregando as pedras do pecado’: a reforma católica devocional
em Sergipe oitocentista”; “Uma riqueza nas matas meridionais: a extração da erva-
mate no século XIX na província do Rio Grande do Sul”; “Escravos e ex-escravos
na pecuária: a centralidade da escravidão na economia rural (Rio Grande do Sul,
sÆculum - REVISTA DE HISTÓRIA [33]; João Pessoa, jul./dez. 2015. 9
segunda metade do século XIX)”; “As redes de relacionamentos e o espaço de
atuação dos proprietários de escravos no Império do Brasil: Bananal, 1850-1888”;
e “Litigando pela liberdade no Brasil oitocentista: relações escravistas em um
contexto fronteiriço (Alegrete, província do Rio Grande do Sul)”.
Em seguida é contemplado o subtema dos viajantes, com dois textos: “Entre
a medicina, a política e a poesia: a trajetória do Dr. Antonio da Cruz Cordeiro
na Província da Paraíba na segunda metade do Oitocentos” e “Relatos de um
explorador inglês: uma perspectiva da viagem de Francis Galton pelo Sudoeste da
África (1850-1852)”.
Por fim, compondo reflexões sobre a escrita da História, apresentam-se quatro
artigos: “A escrita da História no Brasil oitocentista: o lugar da província do Ceará”;
“O ensino de história na escola de primeiras letras na Paraíba: pátria nacional e
pátria local (1837 a 1914)”; “A História contra a Revolução: Edmund Burke e a
crítica aos Direitos Naturais”; e “Os intelectuais: questões históricas e historiográficas
– uma discussão teórica”.
Fechando o enredo aqui traçado, temos a resenha do livro de Nayana Rodrigues
Cordeiro Mariano, Educação pela Higiene – a invenção de um modelo hígido de
educação escolar primária na Parahyba do Norte (1849-1886), fruto de sua tese
de doutorado defendida junto à linha de pesquisa em História da Educação do
Programa de Pós-Graduação em Educação da UFPB.
Dessa forma, esperamos que os leitores tirem proveito do número temático que
lhe entregamos e estabeleçam diálogo crítico com as perspectivas e abordagens
oferecidas pelos autores, no intuito de fomentar outros olhares e novas pesquisas
para/ sobre os Oitocentos.
A Comissão Editorial.
Organizadora:
Cláudia Engler Cury (UFPB)
MIGRANTES NO IMPÉRIO DO BRASIL:
A TRAJETÓRIA DE JEAN BAZET NAS ORIGENS
DA VILA DE NOVA FRIBURGO, 1820-1858
7
ERTHAL, Clélio. Cantagalo: da miragem do ouro ao esplendor do café. Niterói: Nitpress, 2008, p.
130.
8
ERTHAL, Cantagalo..., p. 93-97.
9
ARAÚJO, João Raimundo de & MAYER, Jorge Miguel (orgs.). Teia serrana: formação histórica de
Nova Friburgo. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 2003, p. 31.
QUADRO 1
POPULAÇÃO ESCRAVA NA VILA DE NOVA FRIBURGO19
1828-1850
28
DEBRET, Jean-Baptiste. Viagem pitoresca e histórica ao Brasil. Edição integral. Tradução e notas
de Sérgio Milliet. São Paulo: Círculo do Livro, 1981, p. 318.
29
DEBRET, Jean-Baptiste. Voyage pittoresque et historique au Brésil – Tome 2ème. Paris: Firmin Didot
Frères, 1835, p. 62. Acervo da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro. Disponível em: <http://
bndigital.bn.br/acervodigital/>. Acesso em: 15 mai. 2015.
30
O termo “Família-artificial” foi criado, pois o agente suíço rompeu o acordo estabelecido com a
Coroa e trouxe 161 famílias a mais. Deste modo, os administradores locais teriam que abrigar 261
famílias europeias nas 100 casas construídas. A “família-artificial”, portanto, consiste na reunião de
duas ou mais famílias com o objetivo de que todos os colonos pudessem ficar nas casas que lhes
foram destinadas.
A serra, por certo, foi ponto privilegiado para a formação desses núcleos de
resistência, primeiro pelas dificuldades impostas pelos acidentes geográficos, que
serviam como esconderijo e defesa natural. Em segundo pela distância, tanto de
Cantagalo, quanto da Corte. Quando os suíços constataram a infertilidade do solo
recebido e decidiram migrar para a região de Macaé encontraram o quilombo
citado. Renata Azevedo Lima vem pesquisando mais detidamente o caso do
quilombo32. A historiadora utiliza-se, além do documento citado, de duas outras
cartas assinadas pelo delegado dos assuntos suíços, o colono Quevermont.
Uma das conclusões da historiadora reside na aliança entre suíços e portugueses
para a destruição do quilombo, ou dos quilombos existentes nas Margens do Rio
Macaé, fronteira da vila de Nova Friburgo e da vila de Macaé. Os suíços desejavam
apoderar-se das terras concedidas por D. Pedro I em 1821, suas intenções ficam
explícitas em outro período da carta de Cretton de Martigny, “A terra que cultivamos,
não sendo própria para a cultura do café e do açúcar, eu [Antoine Cretton] quero
31
NICOULIN, A Gênese..., p. 222.
32
LIMA, Renata Azevedo. Conflitos de terra e quilombos na colonização do Rio de Janeiro (1808-
1831). Dissertação (Mestrado em História). Universidade Federal Fluminense. Niterói, 2013.
33
NICOULIN, A Gênese..., p. 222.
34
NICOULIN, A Gênese..., p. 222.
35
O Spectador, Rio de Janeiro, n. 224, 16 jan. 1826, p. 01-03. Acervo da Hemeroteca Digital da
Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro. Disponível em: <http://bndigital.bn.br/>. Acesso em: 15 abr.
2015.
36
O Spectador, Rio de Janeiro, n. 224, 16 jan. 1826, p. 01-03.
37
Gazeta do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 11 jul. 1822, n. 82, p. 440. Acervo da Hemeroteca Digital
da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro. Disponível em: <http://bndigital.bn.br/>. Acesso em: 15
abr. 2015.
38
Gazeta do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 11 jul. 1822, n. 82, p. 440.
39
Gazeta do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 11 jul. 1822, n. 82, p. 440.
40
Gazeta do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 11 jul. 1822, n. 82, p. 440.
41
Diário do Governo, Rio de Janeiro, 02 jun. 1824, n. 3, p. 536. Acervo da Hemeroteca Digital da
Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro. Disponível em: <http://bndigital.bn.br/>. Acesso em: 15 abr.
2015.
42
MATTOS, Ilmar Rohloff. O tempo saquarema. São Paulo: Hucitec, 1987, p. 270-273.
43
BON, Henrique. Imigrantes: a saga do primeiro movimento migratório organizado rumo ao Brasil
as portas da independência. Nova Friburgo: Imagem Virtual, 2004, p. 257, p. 464.
44
Arquivo do Cartório do 2° Ofício de Nova Friburgo, Livro III de Notas, fls. 112v, 113 e 113v.
QUADRO 2
PARTICIPAÇÃO NA VIDA POLÍTICA DA VILA DE NOVA FRIBURGO47
1820-1850
POSSE DA
NOME CARGOS OCUPADOS ESCRAVOS
TERRA
Vereador (1827)
Presidente da Câmara (1829, 1830, 1831, 1832)
Casa nº 18
João Comandante do Batalhão de Guardas Nacionais (1833)
39
Bazet Presidente da Câmara (1837-1840)
Fazenda Três Bicos
(1835-1844)
Cavalheiro da Ordem de Cristo
Para contribuir com essa observação, a respeito dos escravos de João Bazet,
aproveito-me do registro realizado em quatorze de maio de 1835, no qual o
reverendo Julho José Viviam Batista ministrou o sacramento a doze escravos
pertencentes ao médico. Em cada um dos registros constam dois padrinhos e
ao final está escrito que são “[...] todos escravos do doutor Jean Bazet”48. Se
considerarmos tanto os escravos batizados quanto os padrinhos como propriedades
de Bazet, o número de posses do médico se eleva para 39 cativos. De qualquer
45
Arquivo da Prefeitura Municipal de Nova Friburgo. Acervo Pró-Memória, Caixa 2-5, Doc. 444.
46
Este parágrafo também está baseado no livro de Henrique Bon. BON, Imigrantes..., p. 254-258.
47
Fontes: Atas da Câmara Municipal de Nova Friburgo, 1820-1850; CDH Pró-Memória, Documentos
da Colônia; Livros I e II de Batismo, Arquivo da Igreja de São João Batista.
48
Grifos nossos. Arquivo da Igreja de São João Batista de Nova Friburgo. Livro II de Batismo, fl. 88.
QUADRO 3
ESCRAVOS BATIZADOS PELO DR. JOÃO BAZET49
49
Fonte: Livro de Batismo II, Arquivo da Igreja de São João Batista.
50
BON, Henrique. Imigrantes: a saga do primeiro movimento migratório organizado rumo ao Brasil
as portas da independência. Nova Friburgo, Imagem Virtual, 2004, p. 258.
51
Os referidos livros encontram-se sob a guarda do Pró-Memória da Prefeitura Municipal de Nova
Friburgo. Trabalhei com uma transcrição feita por Carlos Jayme S. Jaccoud, que cobre toda a
primeira metade do século XIX e também se encontra arquivada no CDH Pró-Memória da PMNF.
Atas da Câmara Municipal de Nova Friburgo, 1820-1850, Livro V, Sessão extraordinária de 11 fev.
1853. Transcrição de Carlos Jayme S. Jaccoud, 2001.
52
Arquivos do Judiciário - SEGAP - Serviço de Gestão de Acervos Arquivísticos Permanentes. Partes:
João Bazet e outros; Ano: 1860; Ação: Inventário; Cartório do Juízo de Órfãos de Nova Friburgo,
p. 08.
53
Arquivos do Judiciário - SEGAP - Serviço de Gestão de Acervos Arquivísticos Permanentes. Partes:
João Bazet e outros; Ano: 1860; Ação: Inventário; Cartório do Juízo de Órfãos de Nova Friburgo,
p. 08v.
54
Arquivos do Judiciário - SEGAP - Serviço de Gestão de Acervos Arquivísticos Permanentes. Partes:
João Bazet e outros; Ano: 1860; Ação: Inventário; Cartório do Juízo de Órfãos de Nova Friburgo,
p. 27v.
55
MATTOSO, Kátia M. de Queirós. Bahia, século XIX: uma província do Império. Rio de Janeiro:
Nova Fronteira, 1992, p. 602-604.
56
FRAGOSO, João L. e LUGÃO, Ana Maria. “Um empresário brasileiro do oitocentos”. In: CASTRO,
Hebe Maria Mattos & SCHNOOR, Eduardo (orgs.). Resgate: uma janela para o oitocentos. Rio de
Janeiro: Topbooks, 1995, p. 201.
18
ANAIS do Império, 1823, Livro 1, p. 169. Disponível em: <http://www.senado.gov.br/>. Acesso
em: 02 jul. 2014.
19
ANAIS do Império, 1823, Livro 1, p. 91. Disponível em: <http://www.senado.gov.br/>. Acesso
em: 02 jul. 2014.
20
COSER, Ivo. “O conceito de federalismo e a ideia de interesse no Brasil do século XIX”. Dados –
Revista de Ciências Sociais, Rio de Janeiro, vol. 51, n. 4, 2008, p. 947.
21
Os participantes da Revolta Liberal em Minas Gerais e em São Paulo, ocorrida em 1842 – ou seja,
quase vinte anos após a primeira Constituinte – temiam ser acusados do crime de republicanismo,
além do crime de lesa-majestade. Cf: HORNER, Eric. Em defesa da Constituição: a guerra entre
rebeldes e governistas (1838-1844). Tese (Doutorado em História). Universidade de São Paulo. São
Paulo, 2010, p. 248.
22
HOLLANDA, História Geral..., p. 184.
43
ANGELO, Leonardo Bassoli. Guido Tomás Marlière e a política indigenista em Minas Gerais (1813-
1829). Dissertação (Mestrado em História). Universidade Federal de Juiz de Fora. Juiz de Fora,
2014.
44
ANGELO, Guido Tomás Marlière..., p. 45.
45
MARQUESE, Rafael de Bivar. “A dinâmica da escravidão no Brasil: resistência, tráfico negreiro e
alforrias, séculos XVII a XIX”. Novos Estudos, São Paulo, CEBRAP, n. 74, mar. 2006, p. 121.
46
Feijó se tornaria regente, enfrentando a oposição de Bernardo Pereira de Vasconcellos – este,
segundo Pandiá Calógeras (2009), o fundador e chefe de um grupo intermediário entre a reação
autocrática e os “excessos” do federalismo – e de Honório Hermeto Carneiro Leão. CALÓGERAS,
Formação histórica... Ver também: BASILE, “O laboratório...”, p. 79.
47
BASILE, “O laboratório...”, p. 86.
48
Esse estadista foi acusado de mudar substancialmente suas concepções em relação às ideias que
defendera nos primeiros anos do Império, ao que respondeu que, se antes sua luta era contra
o despotismo real, posteriormente os esforços se concentraram em combater as pretensões
democratizantes dos radicais. Cf: COSTA, Da Monarquia..., p. 121.
49
SALDANHA, Flávio Henrique Dias. Os oficiais do povo: a Guarda Nacional em Minas Gerais
oitocentista, 1831-1850. São Paulo: FAPESP, 2006, p. 72.
50
BASILE, “O laboratório...”, p. 94.
51
BOURDIEU, Pierre. Razões práticas: sobre a teoria da ação. Tradução de Mariza Corrêa. 9. ed.
Introdução
1
Doutoranda em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Maranhão. Bolsista da FAPEMA
– Fundação de Amparo à Pesquisa e ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Maranhão.
E-Mail: <[email protected]>.
2 NEVES, Guilherme Pereira das. “A religião do Império e a Igreja”. In: GRINBERG, Keila & SALLES,
Ricardo (orgs.). O Brasil Imperial – Vol. 1: 1808-1831. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2009,
p. 377-428.
3
SILVA, Joelma Santos da. Por mercê de Deus: Igreja e Política na trajetória de Dom Marcos
Antonio de Sousa (1820-1842). Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais). Universidade Federal
do Maranhão. São Luís, 2012; SOUZA, Françoise Jean de Oliveira. Do altar à tribuna: os padres
políticos na formação do Estado Nacional brasileiro (1823-1841). Tese (Doutorado em História).
Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2010.
4
SILVA, Por mercê de Deus...
5
BLAKE, Augusto Vitorino Alves Sacramento. Dicionário bibliográfico brasileiro. Rio de Janeiro:
Imprensa Nacional, 1883-1902; MARQUES, César Augusto. Dicionário histórico-geográfico da
Província do Maranhão. São Luís: Edições AML, 2008.
6
MEIRELES, Mário Martins. História da Arquidiocese de São Luís do Maranhão. São Luís: SIOGE,
1977; PACHECO, D. Felipe Condurú. História eclesiástica do Maranhão. São Luís: Departamento
de Cultura do Estado do Maranhão, 1968; SILVA, D. Francisco de Paula. Apontamentos para a
História Eclesiástica do Maranhão. Bahia: Typographia de São Francisco, 1922.
7
BEOZZO, José O. (coord.). História da igreja no Brasil: segunda época – século XIX. Petrópolis:
Vozes, 1992; HAUCK, João Fagundes. “A Igreja na emancipação (1808-1840)”. In: BEOZZO,
História da igreja no Brasil..., p. 07-139; SANTIROCCHI, Ítalo Domingos. Os ultramontanos no
Brasil e o regalismo do Segundo Império (1840-1889). Tese (Doutorado em História). Pontifícia
Universidade Gregoriana. Roma, 2010.
8
CARVALHO, M. E. Gomes de. Os deputados brasileiros nas Cortes Geraes de 1821. Porto: Livraria
Chardron, 1912; SOUZA, Do altar à tribuna..., p. 212.
9
LEVI, Giovanni. “Os usos da biografia”. In: AMADO, Janaína; FERREIRA, Marieta de Moraes
(orgs.). Usos e abusos da história oral. Rio de Janeiro: Editora FGV, 1996, p.167-182.
10
GOLDENBERG, Mirian. A arte de pesquisar: como fazer pesquisa qualitativa em Ciências Sociais.
Rio de Janeiro: Record, 2004, p. 36.
11
FARINHA, Maria do Carmo Jasmins Dias et al. Guia geral dos fundos da Torre do Tombo:
colecções, arquivos de pessoas singulares, de famílias, de empresas, de associações, de comissões e
de congressos. Lisboa: IAN/TT, 2005.
12
MARQUES, Dicionário histórico-geográfico..., p. 236.
13
SILVA, Apontamentos para a História..., p. 195.
14
Françoise Souza acrescenta que foi no Seminário de São Dâmaso, em Salvador, que D. Marcos fez
seus estudos secundários. Porém, de acordo com o site do Instituto de Patrimônio Artístico e Cultural
da Bahia, o Seminário de São Dâmaso foi fundado somente em 15 de agosto de 1815, sendo
batizado com esse nome em homenagem ao seu criador, o ex-bispo de Málaca e 14º arcebispo
Primaz do Brasil (1815-1816), D. Frei Francisco de São Dâmaso Abreu Vieira. Como a ordenação
de Marcos Antonio de Sousa aconteceu entre 1793 e 1794, não é possível que ele tenha estudado
nessa instituição. Ver: SOUZA, Do altar à tribuna..., p. 456.
15
FARINHA et al, Guia geral dos fundos..., p. 35.
16
BLAKE, Dicionário bibliográfico brasileiro, p. 221.
17
ALVES, Francisco José. “Contribuição à arqueologia de Sergipe colonial”. Revista do Instituto
Histórico e Geográfico de Sergipe, Aracaju, n. 34, 2003-2005, p. 39-53.
18
MARQUES, Dicionário histórico-geográfico..., p. 236.
19
SILVA, Apontamentos para a História..., p. 195.
20
MORAES, A. J. de Mello. Historia do Brasil-Reino e Brasil-Imperio. Rio de Janeiro: Typografia de
Pinheiro, 1871, p. 21.
21
BLAKE, Dicionário bibliográfico brasileiro, p. 221; CARVALHO, Os deputados brasileiros..., p.
181, p. 195, p. 237; MARQUES, Dicionário histórico-geográfico..., p. 236; MORAES, Historia
do Brasil-Reino..., p. 321; PACHECO, História eclesiástica do Maranhão, p. 139, p. 144, p. 155;
SANTIROCCHI, Os ultramontanos no Brasil..., p. 198, p. 270, p. 321; SILVA, Apontamentos para a
História..., p. 195; SOUZA, Do altar à tribuna..., p. 230, 256, 335; VARNHAGEN, Francisco Adolfo
de. História da independência do Brasil. Brasília: Senado Federal, Conselho Editorial, 2010.
22
CAMPANTE, Rubens Goyatá. “O patrimonialismo em Faoro e Weber e a Sociologia brasileira”.
DADOS – Revista de Ciências Sociais, Rio de Janeiro, vol. 46, n. 1, 2003, p. 153-193.
23
CARVALHO, Os deputados brasileiros..., p. 181, p. 195, p. 237.
24
MARQUES, Dicionário histórico-geográfico..., p. 237.
25
PACHECO, História eclesiástica do Maranhão, p. 139, 144,155.
26
MEIRELES, História da Arquidiocese..., p. 221.
27
COSTA, Emília Viotti. Da monarquia à república: momentos decisivos. São Paulo: Editora da
UNESP, 1999.
28
MORAES, Historia do Brasil-Reino..., p. 322.
29
MARQUES Dicionário histórico-geográfico..., p. 236; PACHECO, História eclesiástica do Maranhão,
p. 138; SILVA, Apontamentos para a História..., p. 203.
30
BEOZZO, História da igreja no Brasil..., p.14, p. 83; SANTIROCCHI, Os ultramontanos no Brasil...,
p. 85; SOUZA, Do altar à tribuna..., p. 212.
31
BLAKE, Dicionário bibliográfico brasileiro, p. 221; SILVA, Apontamentos para a História..., p. 203.
32
SOUZA, Do altar à tribuna..., p. 125.
33
GRAHAM, Richard. Clientelismo e política no Brasil do século XIX. Tradução de Celina Brandt. Rio
38
SANTIROCCHI, Os ultramontanos no Brasil..., p. 170.
39
O Voto de Graças era o discurso oficial que a Assembleia Legislativa formulava e proferia ao
Imperador como resposta da Fala do Trono, que era proferida deste para a Assembleia, na abertura
dos seus trabalhos legislativos.
40
BRASIL. Anais da Câmara dos Deputados: 1826-1829. Brasília: Câmara dos Deputados, s.d.
Disponível em: <http://www.camara.gov.br/>. Acesso em: 03 mai. 2012.
41
NEVES, “A religião do Império...”, p. 382-383.
42
O Padroado significava uma troca de obrigações e direitos entre a Igreja e um indivíduo, ou
instituição, que assumia assim a condição de seu padroeiro. O Padroado Régio e a função de
padroeiro do Grão-mestre da Ordem de Cristo foram concedidos e unificados pela Santa Sé na
figura do monarca português, o que implicou em uma série de obrigações entre a Igreja e o Estado,
em Portugal e nas suas colônias. Tratava-se de um instrumento jurídico que possibilitava um domínio
direto da Coroa nos negócios religiosos, especialmente nos aspectos administrativos, jurídicos e
financeiros. Os aspectos religiosos também eram afetados por tal domínio, pois padres, religiosos e
bispos eram também funcionários da Coroa portuguesa no Brasil colonial. Nesse sentido, religião e
religiosidade eram também assuntos de Estado, e vice-versa. No Império, além do Padroado Régio,
a Constituição de 1824 estabeleceu um Padroado civil, submetendo ao poder temporal toda a
instituição eclesiástica católica no Brasil, fonte potencial de diversos conflitos entre a Igreja e o Estado
no século XIX. O fim do regime de padroado no Brasil se deu com a Proclamação da República
48
BRASIL, Anais da Câmara..., p. 128.
49
BRASIL, Anais da Câmara..., p. 124.
50
BRASIL, Anais da Câmara..., p. 125.
51
SANTIROCCHI, Os ultramontanos no Brasil..., p. 73.
52
SANTIROCCHI, Os ultramontanos no Brasil..., p. 74.
53
BRASIL, Anais da Câmara..., p. 128.
54
SOUZA, Do altar à tribuna..., p. 377.
55
SERBIN, Kenneth P. Padres, celibato e conflito social: uma história da Igreja Católica no Brasil. São
Paulo: Companhia das Letras, 2008, p. 70.
56
NEVES, “A religião do Império...”, p. 395.
57
BRASIL, Anais da Câmara..., p. 93-96.
58
BRASIL, Anais da Câmara..., p. 95.
59
A penetração do Catolicismo ultramontano ganhou força com a vinda de alguns frades lazaristas,
ordem religiosa de carisma vicentino, cujo objetivo era o de promover a expansão das missões
populares e oferecer educação e formação em colégios e seminários como os de Caraça, em Minas
Gerais. Essa instituição primava pela moral dos sacerdotes e de lá saíram importantes agentes da
reforma católica ultramontana, como o bispo de Mariana, D. Antônio Ferreira Viçoso. OLIVEIRA,
Luciano Conrado & MARTINS, Karla Denise. “O ultramontanismo em Minas Gerais e em outras
regiões do Brasil”. Revista de Ciências Humanas, Viçosa, UFV, vol. 11, n. 2, 2011, p. 259-269.
60
BRASIL, Anais da Câmara..., p. 100.
61
BRASIL, Anais da Câmara..., p. 124.
62
BRASIL, Anais da Câmara..., p. 125.
A Diocese de São Luís do Maranhão foi criada pelo Papa Inocêncio XI, em
1677, por meio da Bula Super Universas Orbis Ecclesias, como sufragânea do
Patriarcado de Lisboa, abrangendo toda a Amazônia. Em cinco de julho de 1827
a Bula Romanorum Pontificum vigilantia, expedida pelo Papa Leão XII, sujeitou
as Dioceses do Maranhão e Pará, ao Arbispado da Bahia, tornando-as ponto de
difusão da catequese no norte do Império63.
D. Marcos Antonio de Sousa foi o décimo quinto bispo do Maranhão. Assumiu
uma Diocese que abrangia as províncias do Maranhão e Piauí, com uma superfície
aproximada de seiscentos mil quilômetros quadrados, divididos em 36 paróquias,
uma população com pouco mais de 260 mil habitantes e um clero muito reduzido.
Ele substituiu o bispo D. Frei Joaquim de Nossa Senhora de Nazaré, que foi
desligado da diocese em 15 de setembro de 1823, se retirando para a diocese de
Coimbra, em Lisboa, pelo seu envolvimento direto nas guerras de Independência
do Maranhão como presidente da Junta Provisória e Administrativa64 e por não
concordar com a adesão65.
O Maranhão, província com relevante importância geográfica e econômica, passou
por um conturbado processo de adesão à Independência, cujo reconhecimento
não significou um clima de paz, necessitando de um bispo que representasse os
interesses do governo central e auxiliasse na consolidação da unidade e afirmação
da figura do Imperador. Dentro do regime do Padroado, em um delicado processo
de consolidação do Império, não é de se estranhar que o Imperador, juntamente
aos seus conselheiros e ministros, considerasse Marcos Antonio de Sousa o mais
63
GARDEL, Luis D. Les Armoiries Ecclésiastiques du Brésil (1551-1962). Rio de Janeiro: s.r., 1963,
p. 52; SILVA, Apontamentos para a História..., p. 52; MEIRELES, História da Arquidiocese..., p. 59.
64
A primeira junta Provisória e Administrativa do Maranhão foi criada por decreto das Cortes
Portuguesas de 29 de setembro de 1821, sendo presidida pelo bispo D. Frei Joaquim de
Nossa Senhora de Nazaré, 14° bispo do Maranhão. A junta prestou juramento de fidelidade à
Constituição Portuguesa e à Casa de Bragança na figura de D. João VI, na Catedral de São Luís,
desconhecendo a autoridade de D. Pedro e retransmitindo para Lisboa as ordens que recebia do
Rio de Janeiro como prova de lealdade. Acordaram, também, com as províncias vizinhas do Piauí
e Pará um compromisso recíproco de assistência na manutenção da legalidade. Ver: BOTELHO,
Joan. Conhecendo e debatendo a história do Maranhão. São Luís: Fort Gráfica, 2007, p. 76-77;
MEIRELES, Mário Martins. História do Maranhão. São Paulo: Siciliano, 2001.
65
PACHECO, História eclesiástica do Maranhão, p. 127; SILVA, Apontamentos para a História..., p.
192-193.
66
HAUCK, “A Igreja na emancipação...”, p. 83.
67
SILVA, Apontamentos para a História..., p. 203.
68
Arquivo Público do Estado do Maranhão. Inventário de Avulsos (manuscritos), vol. 1. Secretaria
do Governo. Ofícios do Bispo Diocesano do Maranhão ao Presidente de Província do Maranhão,
1728-1850. 1831, f. 35.
69
SILVA, Por mercê de Deus..., p. 127.
70
Arquivo Público do Estado do Maranhão. Inventário de Avulsos (manuscritos), vol. 1. Secretaria
do Governo. Ofícios do Bispo Diocesano do Maranhão ao Presidente de Província do Maranhão,
74
BEOZZO, História da igreja..., p. 83-84; SANTIROCCHI, Os ultramontanos no Brasil..., p. 223.
75
SILVA, Por mercê de Deus..., p. 140.
76
BRASIL, Anais da Câmara..., p. 129.
77
SILVA, Apontamentos para a História..., p. 207.
78
APEM, 1831, f. 1.
79
COUTINHO, O poder legislativo..., p. 40; SILVA, Apontamentos para a História..., p. 210-211.
80
PACHECO, História eclesiástica do Maranhão, p. 148.
81
SILVA, Por mercê de Deus..., p.154.
Considerações Finais
82
COORDENADORIA do Arquivo e Documentos Históricos. Tribunal de Justiça do Maranhão.
Livros de Registro de Testamento 1840-1842. São Luís, p. 181.
83
Arquivo Público do Estado do Maranhão. Acervo da Arquidiocese do Maranhão. Inventário de
Códices. Livro de registro das Provisões, Alvarás e todos os mais documentos da Câmara Eclesiástica
ou Secretaria episcopal, n. 190-194, 1823-1847. PACHECO, História eclesiástica..., p. 162.
RESUMO ABSTRACT
Análise da biografia e trajetória política e religiosa Analysis of biography and political and religious
de Dom Marcos Antonio de Sousa, articulada trajectory of Don Marcos Antonio de Sousa,
ao contexto histórico e social de constituição do articulated to the social and historical context of
Império no Brasil e de estabelecimento de uma the constitution of the Empire in the Brazil and
nova relação entre Igreja e Estado. Relaciona establishing a new relationship between church
o seu destino particular e as condições de and state. Relate your particular destination and
possibilidade de ação às suas tomadas de the conditions of possibility of action to their
posição e dupla filiação, enquanto deputado positions and dual membership, while deputy
na Legislatura de 1826 e bispo do Maranhão. in Legislature in 1826 and bishop of Maranhão.
Destaca de que modo tentou empreender uma Highlights how tried to undertake a Catholic
reforma católica, utilizando o espaço de atuação reform, using the space of political action, to
política, para alcançar seus fins religiosos, e achieve their religious purposes, and the actions
as ações que o fizeram ser reconhecido pela that got him be recognized by historiography
historiografia como um dos precursores do as one of the forerunners of ultramontanism in
ultramontanismo no Brasil. Brazil.
1
Doutor em História pela Universidade Federal de Pernambuco. Professor de História do Instituto
Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Bahia, Campus de Vitória da Conquista. E-Mail:
<[email protected]>.
2
BASILE, Marcello. “O laboratório da Nação: a era regencial (1831-1840)”. In: GRINBERG, Keila
& SALLES, Ricardo (orgs.). O Brasil imperial – vol. II: 1831-1870. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 2009, p. 55-61.
3
MOREL, Marco. O período das Regências (1831-1840). Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2003,
p. 32.
4
NEEDELL, Jeffrey D. “Formação dos partidos políticos no Brasil da Regência à Conciliação, 1831-
1857”. Almanack Braziliense, São Paulo, n. 10, nov. 2009. Disponível em: <http://www.revistasusp.
sibi.usp.br/> Acesso em: 14 ago. 2012.
5
MOREL, O período das..., p. 33-38.
6
COSTA, Francisco A. Pereira da. Diccionario biographico de pernanmbucanos celebres. Recife:
Typographia Universal, 1882, p. 653-660; __________. Anais Pernambucanos – vol. 9. 2. ed. fac-
similar. Recife: Secretaria de Turismo, Cultura e Esporte; FUNDARPE, 1983, p. 443.
7
CARVALHO, Marcus J. M. “Cavalcantis e cavalgados: a formação das alianças políticas em
Pernambuco, 1817-1824”. Revista Brasileira de História, São Paulo, ANPUH, vol. 18, n. 36, 1998,
p. 331-366. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.1590/S0102-01881998000200014> Acesso em:
04 mai. 2012.
8
CARVALHO, “Cavalcantis e cavalgados...”, p. 341.
9
Os irmãos Cavalcanti eram: Manoel Francisco de Paula Cavalcanti de Albuquerque (Barão de
Muribeca), Luís Francisco de Paula Cavalcanti de Albuquerque, Antônio Francisco de Paula de
Holanda Cavalcanti de Albuquerque (Visconde de Albuquerque), Francisco de Paula Cavalcanti
de Albuquerque (Visconde de Suassuna) e Pedro Francisco de Paula Cavalcanti e Albuquerque
(Visconde de Camarajibe). Os três últimos foram Senadores por Pernambuco.
10
COSTA, Diccionario biographico..., p. 653-660. Bússola da Liberdade, Recife, 14 dez. 1831, p. 03.
11
A Matraca dos Farroupilhas, Rio de Janeiro, 17 jan. 1832, p. 03 e 05. Ver também: A Matraca dos
Farroupilhas, Rio de Janeiro, 06 mar. 1832, p. 07.
12
A Matraca dos Farroupilhas, Rio de Janeiro, 21 fev. 1832, p. 06.
13
ANDRADE, Manuel Correia de. A guerra dos cabanos. 2. ed. Recife: Editora Universitária da
UFPE, 2005, p. 36.
14
CARVALHO, Marcus J. M. “Movimentos sociais: Pernambuco (1831-1848)”. In. GRINBERG, &
SALLES, O Brasil Imperial, vol. II, p. 138 e p. 145.
15
Bússola da Liberdade, Recife, 14 dez. 1831, 04.
16
CARVALHO, Marcus J. M. “Um exército de índios, quilombolas e senhores de engenho contra
os ‘jacubinos’: a Cabanada, 1832-1835”. In. DANTAS, Monica Duarte (org.). Revoltas, motins,
revoluções: homens livres pobres e libertos no Brasil do século XIX. São Paulo: Alameda, 2011, p.
167-200.
17
Diário de Pernambuco, Recife, 20 jun. 1835, p. 01-02.
18
Diário de Pernambuco, Recife, 21 jan. 1834, p. 01-02; 29 jan. 1834, p. 01-02.
19
Diário de Pernambuco, Recife, 09 jan. 1834, p. 01.
20
Diário de Pernambuco, Recife, 02 jan. 1834, p. 01.
21
Diário de Pernambuco, Recife, 12 jan. 1834, p. 01-02.
22
Diário de Pernambuco, Recife, 17 jan. 1834, p. 01.
23
Diário de Pernambuco, Recife, 20 jun. 1835, p. 01-02.
24
Diário de Pernambuco, Recife, 20 jun. 1834, p. 02-03. PERNAMBUCO. Arquivo Público Estadual
Jordão Emereciano – APEJE. Atas do Conselho do Governo de Pernambuco (1821-1834). Recife:
Assembleia Legislativa de Pernambuco; CEPE, 1997, vol. 2, p. 276.
25
Diário de Pernambuco, Recife, 18 jan. 1834, p. 01-02. PERNAMBUCO, Atas do Conselho..., p.
276-277.
26
Diário de Pernambuco, Recife, 20 jan. 1834, p. 01-02; 20 jun. 1835, p. 01-02.
27
Quando morreu, o Coronel Suassuna deixou para cada filho 833$166 réis. Um dos filhos,
Francisco de Paula (futuro Visconde de Suassuna), ficou com parte do Engenho Suassuna. Este,
quando morreu em 1880, tinha sete engenhos e um palacete. Outro irmão, Pedro Francisco (futuro
Visconde de Camaragibe) morreu em 1875 dono de três engenhos. CADENA, Paulo Henrique
Fontes. Ou há de ser Cavalcanti, ou há de ser cavalgado: trajetórias políticas dos Cavalcanti de
Albuquerque (Pernambuco, 1801 – 1844). Recife: Editora Universitária da UFPE, 2013, p. 22-23,
p. 82-87.
28
Diário de Pernambuco, Recife, 14 mar. 1832, p. 02. O Velho Pernambucano, Recife, 19 mar. 1835,
p. 05; 4 abr. 1835, p. 21.
29
A Razão e a Verdade, Recife, 28 fev. 1835, p. 35.
30
Diário de Pernambuco, Recife, 04 fev. 1834, p. 04. A Quotidiana Fidedigna, Recife, 1º mar. 1834,
p. 02-04.
31
Diário de Pernambuco, Recife, 02 mai. 1834, p. 01; 28 abr. 1834, p. 01.
32
Diário de Pernambuco, Recife, 07 mai. 1834, p. 01-02.
33
Diário de Pernambuco, Recife, 17 mai. 1834, p. 01-02.
34
Diário de Pernambuco, Recife, 27 mai. 1834, p. 01.
35
Diário de Pernambuco, Recife, 13 mai. 1834, p. 01.
36
A Matraca dos Farroupilhas, Rio de Janeiro, 21 fev. 1832, p. 03.
37
A Matraca dos Farroupilhas, Rio de Janeiro, 17 jan. 1832, p. 03 e p. 05.
38
Diário de Pernambuco, Recife, 09 abr. 1834, p. 01.
39
Diário de Pernambuco, Recife, 26 ago. 1834, p. 01-02.
40
Diário de Pernambuco, Recife, 05 nov. 1834, p. 02; 06 nov. 1834, p. 03; 19 nov. 1834, p. 01.
41
Diário de Pernambuco, Recife, 06 nov. 1834, p. 01; 07 nov. 1834, p. 01-02; 17 nov. 1834, p. 02.
42
Diário de Pernambuco, Recife, 04 dez. 1834, p. 01-02.
43
Diário de Pernambuco, Recife, 06 dez. 1834, p. 01.
44
A Razão e a Verdade, Recife, 28 fev. 1835, p. 34-36.
45
A Razão e a Verdade, Recife, 21 dez. 1834, p. 09-12.
46
A Razão e a Verdade, Recife, 30 dez. 1834, p. 13-14; 05 jan. 1835, p. 20; 14 mar. 1835, p. 43.
47
Diário de Pernambuco, Recife, 20 jan. 1835, p. 2.
48
ANDRADE, A Guerra dos Cabanos..., p. 189-190, p. 192-194.
49
Diário de Pernambuco, Recife, 22 jan. 1835, p. 01-02.
50
Diário de Pernambuco, Recife, 27 jan. 1835, p. 02.
51
Diário de Pernambuco, Recife, 24 jan. 1835, p. 01-03.
52
Diário de Pernambuco, Recife, 04 fev. 1835, p.0 1; 27 mar. 1835, p. 01-02; 28 mar. 1835, p. 01;
23 mar. 1835, p. 02-03.
53
O Velho Pernambucano, Recife, 23 mar. 1835, p. 09-11.
54
A Razão e a Verdade, Recife, 17 fev. 1835, p. 31.
55
Diário de Pernambuco, Recife, 18 mar. 1835, p. 01-02; 20 mar. 1835, p. 01; 23 mar. 1835, p. 01-
02; 30 mar. 1835, p. 03.
56
Diário de Pernambuco, Recife, 31 mar. 1835, p. 01-02.
57
Diário de Pernambuco, Recife, 11 fev. 1835, p. 04; 31 mar. 1835, p. 01.
58
PERNAMBUCO. Processo contra o juiz de paz da Boa Vista, João Domingues da Silva. Recife,
1835, Fundo Instituto Arqueológico (FIA), CX 09/12 DOC/1842. Instituto Arqueológico, Histórico e
Geográfico Pernambucano – IAHGP.
59
Diário de Pernambuco, Recife, 04 fev. 1835, p. 02; 28 jan. 1835, p. 01; 02 mar. 1835, p. 01-02; 04
abr. 1835, p. 01-02; 08 abr. 1835, p. 02-03.
60
ANDRADE, Manoel de Carvalho Paes de. Ofício ao Ministro do Império. Recife, 1835, Registros de
Ofícios, vol. 7/1, p. 05-06. APEJE.
RESUMO ABSTRACT
Entre 1831 e 1840 o Império Brasileiro viveu uma Between 1831 and 1840 the Brazilian Empire
de suas fases mais conturbadas. Embora repleta lived one of its most troubled phases. Although
de crises e disputas intestinas, a Regência teve full of crises and internecine fighting, the Regency
uma rica disputa política onde diferentes partidos had a rich political dispute where different parties
procuravam direcionar os rumos do país a partir sought to direct the course of the country from
de seus interesses e projetos de Nação. Para their interests and Nation projects. To understand
entender a forma como estes partidos lutavam how these parties were fighting each other and
entre si e as suas estratégias políticas, tomamos their political strategies, we analyze the political
como objeto de análise a trajetória política de trajectory of Manoel de Carvalho Paes de
Manoel de Carvalho Paes de Andrade após o Andrade after his return to Brazil. Originally
seu retorno ao Brasil. Tido inicialmente como o considered the great hero of the Confederation
grande herói da Confederação do Equador, ele of the Equator, he was the representation of the
foi a representação das idas e vindas, das vitórias comings and goings, the victories and defeats of
e derrotas das elites políticas brasileiras naquele the Brazilian political elites during that period.
período. Keywords: Regency Period; Power Relations;
Palavras Chave: Período Regencial; Relações Party Politics.
de Poder; Política Partidária.
Introdução
1
Doutorando em História pela Universidade do Vale dos Sinos. Bolsista Capes/ PROSUP. E-Mail:
<[email protected]>.
2
DONGHI, Tulio Halperín. Revolucion y guerra: formación de una elite dirigente en la Argentina
criolla. 3. ed. Buenos Aires: Siglo XXI Editores, 1994.
3
Arquivo Histórico do Rio Grande do Sul – AHRS. Fundo Autoridades Militares, Francisco das
Chagas Santos, ago. 1810, maço 16.
4
AHRS. Fundo Autoridades Militares, Francisco das Chagas Santos, ago. 1810, maço 16.
5
AHRS. Fundo Autoridades Militares, Francisco das Chagas Santos, ago. 1810, maço 16.
6
Donghi destaca que a Gazeta de Buenos Aires foi um periódico, criado em 1811, pelos revolucionários
portenhos com propósito de espalhar a revolução e aumentar a adesão ao movimento. Ver:
DONGUI, “Revolución y guerra…”, 1994.
7
AHRS. Fundo Autoridades Militares, Francisco das Chagas Santos, ago. 1810, maço 16.
8
AHRS. Fundo Autoridades Militares, Francisco das Chagas Santos, ago. 1809, maço 16.
9
AHRS. Fundo Autoridades Militares, Francisco das Chagas Santos, ago. 1810, maço 16.
10
AHRS. Fundo Autoridades Militares, Francisco das Chagas Santos, dez. 1810, maço 16.
11
AHRS. Fundo Autoridades Militares, Francisco das Chagas Santos, dez. 1810, maço 16.
GRÁFICO 1
OFÍCIOS DOS MORADORES PORTUGUESES
E GUARANIS NAS MISSÕES EM 1810
O gráfico acima nos ajuda a visualizar a composição social geral nas Missões12.
Nota-se a esmagadora presença dos homens guaranis entre os agricultores, a
ausência de portugueses entre os peões e a forte presença dos índios nos trabalhos
manuais13. Por trabalhador manual se entende todos aqueles sujeitos classificados
na lista como tecelão, alfaiate, curtidor, oleiro, padeiro, carpinteiro, ferreiro,
sapateiro entre outros. Entre os capatazes de estâncias e militares há ausência de
guaranis, já entre os classificados como estancieiros encontra-se 69 portugueses e
sete nomes de guaranis.
O termo estancieiro, segundo o dicionário de Antonio Moraes Silva (1789), foi
peculiar no contexto da América do Sul14. Este termo está associado ao criador de
gado, não especificando se de pequeno, médio ou grande porte. Possivelmente, o
emprego desta expressão, na lista de ocupações, tenha sido feita de modo genérico,
estendendo-se a todos aqueles que desenvolviam a atividade da criação de gado.
12
Na lista consta os nomes de 53 escravos que foram excluídos da análise por não haver referências
aos seus ofícios.
13
Estes ofícios eram desenvolvidos por mão-de-obra especializada e exigiam habilidades manuais.
Roberto Guedes (2006) ao estudar os ofícios desempenhados por escravos no rio de Janeiro e São
Paulo, também notou semelhantes atividades, classificando-as como ofícios mecânicos. Nota-se,
com isso, uma correspondência entre o que foi postulado por Guedes e os dados presentes na lista
de ocupações. Contudo, optou-se em usar o termo trabalhos manuais. Para maiores detalhes sobre
os ofícios dos escravos, ver: GUEDES, Roberto. “Ofícios mecânicos e mobilidade social: Rio de
Janeiro e São Paulo (séc. XVII-XVIII)”. Topoi, Rio de Janeiro, PPGHIS-UFRJ, vol. 7, n. 13, jul./dez.
2006, p. 379-423.
14
SILVA, Antonio de Moraes. Dicionário da língua portuguesa composto pelo Padre Rafael Bluteau,
reformando e acrescentado por Antonio de Moraes Silva, natural do Rio de Janeiro. Lisboa: Oficina
de Simão Tadeu Ferreira, 1798, tomo segundo, p. 559.
15
GARCIA, Elisa Frühauf. As diversas formas de ser índio: políticas indígenas e políticas indigenistas
no extremo sul da América portuguesa. Tese (Doutorado em História). Universidade Federal
Fluminense. Niterói, 2007, p. 274.
16
AHRS. Fundo Autoridades Militares, Francisco das Chagas Santos, ago. 1810, maço 16.
17
GARAVAGLIA, Juan Carlo. Mercado interno y economia colonial: tres siglos de historia de la yerba
mate. Cidade do México: Grijalbo, 1983.
18
GARAVAGLIA, Juan Carlo. “Um modo de produção subsidiário: a organização econômica das
comunidades guaranizadas durante os Séculos XVII-XVIII na formação regional do Alto Peruano –
Rio Platense”. In: GEBRAM, Philomena (org.). Conceito de modo de produção. Rio de Janeiro: Paz
e Terra, 1978, p. 247-275.
19
WILDE, Guillermo. Religión y poder en las misiones de guaraníes. Buenos Aires: SB, 2009.
20
Sobre família no Rio da Prata, ver: MORENO, José Luís. Historia de la familia en el Río de la Plata.
Buenos Aires: Sudamericana, 2004.
21
AHRG. Fundo Autoridades Militares, Francisco das Chagas Santos, ago. 1809, maço 16.
22
Grifos nossos. SAINT-HILAIRE, Auguste de. Viagem ao Rio Grande do Sul. Tradução de Adroaldo
Mesquita da Costa. Brasília: Senado Federal, 2002, p. 366.
23
AHRG. Fundo Autoridades Militares, Francisco das Chagas Santos, abr. 1813, maço 37.
24
AHRG. Fundo Autoridades Militares, Francisco das Chagas Santos, ago. 1811, maço 24.
25
AHRG. Fundo Autoridades Militares, Francisco das Chagas Santos, abr. 1811, maço 24.
26
AHRG. Fundo Autoridades Militares, Francisco das Chagas Santos, ago. 1812, maço 26. A relação
de soldo representa apenas os milicianos com soldo a receber, não significando, portanto, que
houvesse apenas 470 índios no regimento.
27
AHRG. Fundo Autoridades Militares, Francisco das Chagas Santos, dez. 1813, maço 37.
GRÁFICO 2
OFÍCIOS DOS MORADORES GUARANIS NAS MISSÕES (%)
28
A vara de algodão refere-se à unidade de medida portuguesa conhecida como vara, a qual media
110 cm. No Dicionário da língua portuguesa de Antonio de Moraes Silva, de 1789, há esta mesma
relação da vara como medida de pano.
29
GARAVAGLIA, Mercado interno..., p. 243-252.
30
Este número foi obtido somando os cabildantes de todos os Povos.
GRÁFICO 3
PERFIL OCUPACIONAL DOS GUARANIS RECRUTADOS
31
Estima-se que este número possa ser bem maior, pois há muitos problemas em relação à grafia dos
sobrenomes guaranis, o que dificulta encontrá-los nos diferentes documentos.
32
Este resultado foi obtido através do cruzamento dos nomes propostos como oficias com os nomes
da lista de ocupações.
33
AHRS. Fundo Autoridades Militares, Francisco das Chagas Santos, abr. 1813, maço 37.
34
AHRS. Fundo Autoridades Militares, Francisco das Chagas Santos, dez. 1813, maço 37.
35
AHRS. Fundo Autoridades Militares, Francisco das Chagas Santos, jan. 1811, maço 24.
36
WILDE, Religión y poder…, p. 82-87.
37
Logo adiante será demonstrada a venda de uma estância feita pelo cabildo de São Miguel, em
1830, o corrobora com a hipótese da permanência da elite indígena e da continuidade dos cabildos.
38
SAINT-HILAIRE, “Viagem ao Rio Grande...”, p. 342.
39
Em 1820, estourou em Portugal a Revolução Liberal do Porto. As Cortes de Lisboa, além de
exigirem o retorno do rei Dom João VI, que havia migrado para o Brasil em 1808, desejavam
limitar os poderes do rei, impondo a ele uma nova Constituição. Sobre a Revolução do Porto e
suas repercussões no Brasil, especialmente em relação ao processo de Independência, ver: COSTA,
Emília Viotti da. Da Monarquia à República: momentos decisivos. 9. ed. São Paulo: UNESP, 2010.
40
AHRG. Fundo Autoridades Militares, Antonio José da Silva Paulet, jul. 1820, maço 79.
41
AHRS. Fundo Justiça, São Borja, Escrivão José de Abreu Vale Machado, 1830.
42
AHRS. Fundo Justiça, São Borja, Escrivão José de Abreu Vale Machado, 1830.
43
AHRS. Fundo Justiça, São Borja, Escrivão José de Abreu Vale Machado, 1830.
44
PADRÓN-FAVRE, Oscar. O caso de un pueblo de índio: historia del éxodo guarani-misionero al
Uruguai (Bella Union – San Borja del Yÿ). 2. ed. Durazno: Tierradentro, 2009.
45
PADRÓN-FAVRE, O caso de un pueblo..., p. 181-184.
Pelo que foi possível observar entre as informações esparsas sobre a estância
de São Vicente, sua venda foi anulada sendo restituída aos bens dos índios. Há
referências de que depois da guerra, muitos guaranis voltaram àquela estância
empregando-se como peões e agricultores. O administrador geral dos Povos,
Pereira Lago, registrou também que muitas famílias regressaram da colônia de
Bela União ao território missioneiro. Outras famílias dirigiram-se à Corrientes e ao
Paraná. Segundo Pereira Lago, os índios que retornaram às Missões o informaram
de que os guaranis de Bela União “[...] estão passando miseravelmente e que se
não vem todos é por não poderem [...]”47.
Esta situação já era percebida pelos corregedores dos Sete Povos Missioneiros que
transmigraram para Bela União. Em 1829, os chefes dos Sete Povos transmigrados
enviaram uma carta ao General Rivera dando conta do estado dos índios naquele
momento. Na, carta os índios disseram que:
46
AHRS. Fundo Autoridades Militares, Manuel da Silva Pereira Lago, out. 1830, maço 114.
47
AHRS. Fundo Autoridades Militares, Manuel da Silva Pereira Lago, out. 1830, maço 114.
48
PADRON-FAVRE, O caso de un pueblo..., p. 105.
49
Sobre a prática letrada guarani, ver: NEUMANN, Eduardo Santos. Práticas letradas Guarani:
produção e usos da escrita indígena (séculos XVII e XVIII). Tese (Doutorado em História).
Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2005.
50
Grifos nossos. AHRS. Fundo Autoridades Militares, Antonio José da Silva Paulet, mai. 1821, maço
69.
51
Sobre capital simbólico, ver: BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. Tradução de Fernando Tomaz.
Lisboa: Difel; Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1989.
52
WILDE, Religión y poder…, p. 350-355.
53
PADRON-FAVRE, O caso de un pueblo…, p. 96.
Considerações Finais
Enfim, são estes alguns exemplo que demonstram como alguns membros da
elite missioneira conseguiram ascender socialmente elevando-se aos cargos dos
cabildos e das milícias. Esta fração da elite guarani ajuda a perceber que houve a
permanência destes notáveis nas Missões até pelo menos 1828, quando ocorreu a
invasão do general Rivera. Os indícios mostram também que esta elite missioneira
conseguiu se manter no exercício de seus cargos mesmo fora do território
missioneiro, garantindo assim certa longevidade do cabildo, principal órgão político
de representação indígena ante a sociedade envolvente.
Contudo, é possível notar que os cabildos vinham perdendo seu espaço
de representação durante a administração luso-brasileira. Primeiro porque,
provavelmente, o órgão não garantia a representação de todos os índios e
segundo, porque o recrutamento para as milícias dava aos índios uma segunda via
de representação e ascensão social dentro das Missões alheia aos cabildos. Com
isso, podemos pensar que o poder da elite missioneira vinha se fragmentando e a
legitimidade do cabildo diminuindo devido à concorrência dos líderes guaranis que
ingressaram nas milícias.
Talvez, no discurso restaurador de Rivera, os guaranis da elite, ligados aos
cabildos, tenham visto a possibilidade de resgatar o papel político central que
o órgão ocupava, principalmente após a expulsão dos jesuítas quando o poder
desta instituição indígena cresceu consideravelmente. A transmigração pode
ser interpretada como uma estratégia na qual os índios visavam assegurar sua
autonomia frente a uma conjuntura de debilidade de sua organização social
tradicional.
Os índios que concentravam mais recursos buscavam sair das comunidades,
talvez porque tenham percebido que se tornava cada vez mais desfavorável
permanecer naquela situação. A produção comunitária se mostrava cada vez mais
incapaz de gerir a subsistência dos Povos. Os guaranis se viram envolvidos por
estas conjunturas adversas o que afetou diretamente as comunidades indígenas.
1
Doutor em História pela Universidade Federal de Pernambuco. Professor do Instituto Federal de
Pernambuco, Campus Caruaru. E-Mail: <[email protected]>.
2
Doutor em História pela Universidade Federal de Pernambuco. Professor do Instituto Federal de
Pernambuco, Campus Recife. E-Mail: <[email protected]>.
3 MELOSSI, Dario & PAVARINI, Massimo. Cárcere e fábrica: as origens do sistema penitenciário
(séculos XVI-XIX). Rio de Janeiro: Revan, 2006; RUSCHE, Georg & KIRCHHEIMER, Otto. Punição
e estrutura social. 2. ed. Rio de Janeiro: Revan, 2004.
4
ALBUQUERQUE NETO, Flávio de Sá Cavalcanti de. A reforma prisional no Recife oitocentista:
da Cadeia à Casa de Detenção. Dissertação (Mestrado em História). Universidade Federal de
Pernambuco. Recife, 2008.
Ainda no que tange aos sugeridos lucros de Rufino com as oficinas, as acusações
não se baseiam, apenas, nos ganhos em si, mas na forma como são auferidos.
Segundo as denúncias d’O Liberal, o administrador atuaria como atravessador na
aquisição das matérias primas, e o produto final era vendido numa loja, montada
5
Carta dos Presos Sapateiros ao Ministro da Justiça, 1865.
6
O Liberal, Recife, 21 nov. 1868.
7
O Liberal, Recife, 26 mai. 1866.
8
MAIA, Clarissa Nunes. Sambas, batuques, vozeiras e farsas públicas: o controle social sobre os
escravos em Pernambuco no século XIX (1850-1888). São Paulo: Annablume, 2008, p. 35.
9
Diligência puxada por quatro cavalos. SETTE, Mario. Maxambombas e maracatus. Recife:
Fundação de Cultura Cidade do Recife, 1981.
10
MAIA, Sambas, batuques..., p. 31-34.
11
SILVA, Maciel Henrique Carneiro da. Pretas de honra: vida e trabalho de domesticas e vendeiras
no Recife do século XIX (1840-1870). Recife: Editora da UFPE; EDUFBA, 2011, p. 37.
12
Erving Goffman define instituições totais como um local de residência ou trabalho onde um
grande número de indivíduos com situação semelhante, separados da sociedade mais ampla por
considerável período de tempo, levam uma vida fechada e formalmente administrada”. Entre estas
instituições, o autor destaca as prisões, os conventos e, principalmente, os manicômios, analisando
os efeitos psicossociais do isolamento nestes indivíduos. A partir deste conceito, Michael Ignatieff
propõe que devemos repensamos a história das instituições, levando-se em consideração que seu
foco não é apenas o que acontece dentro das paredes, mas a relação histórica entre o dentro e o
fora. Veja-se: GOFFMAN, Erving. Manicômios, prisões e conventos. 7. ed. São Paulo: Perspectiva,
2005; IGNATIEFF, Michael. “Instituições totais e classes trabalhadoras: um balanço crítico”. Revista
Brasileira de História, São Paulo, ANPUH, n. 14, 1987, p. 185-193.
13
THOMPSON, Edward Palmer. “Patrícios e plebeus”. In: __________. Costumes em comum: estudos
sobre a cultura popular tradicional. Tradução de Rosaura Eichemberg. São Paulo: Companhia das
Letras, 1998, p. 29-30.
14
Relatório do Administrador da Casa de Detenção do Recife, Rufino Augusto de Almeida, 1864.
15
Relatório do Administrador da Casa de Detenção do Recife, Rufino Augusto de Almeida, 1864.
16
Relatório do Presidente da Província de Pernambuco, João Silveira de Souza, 1863, p. 08.
17
Relatório do Presidente da Província de Pernambuco, João Silveira de Souza, 1864, p. 08
18
Relatório do Administrador da Casa de Detenção, 1864.
19
MAIA, Clarissa Nunes. “A Casa de Detenção do Recife: controle e conflitos (1855-1915)”. In:
MAIA, Clarissa Nunes; SÁ NETO, Flávio de; COSTA, Marcos & BRETAS, Marcos Luiz (orgs.).
História das prisões no Brasil – Vol. II. Rio de Janeiro: Rocco, 2009, p. 111-153.
20
Ofício do Administrador José Rufino Augusto de Almeida para o Chefe de Polícia José Antonio
Vaz, 24 mai. 1862.
21
Ofício do Administrador da Casa de Detenção, Rufino Augusto de Almeida, ao Chefe de Polícia
de Pernambuco, Abílio José Tavares, de 10 de agosto de 1864; Veja-se também: MAIA, Clarissa
Nunes. Policiados: controle e disciplina das classes populares na cidade do Recife, 1865-1915. Tese
(Doutorado em História). Universidade Federal de Pernambuco. Recife, 2001.
22
Relatório do Administrador da Casa de Detenção do Recife, Rufino Augusto de Almeida, 1864.
23
Ofício do Administrador José Rufino Augusto de Almeida para o Chefe de Polícia, 20 jun. 1866.
24
Ofício do Administrador José Rufino Augusto de Almeida para o Chefe de Polícia José Antonio
Vaz, 31 mai. 1862.
25
BRITTO, Aurélio de Moura. Fissuras no ordenamento: sociabilidades, fluxos e percalços na Casa
de Detenção do Recife (1861-1875). Dissertação (Mestrado em História). Universidade Federal de
Pernambuco. Recife, 2014.
26
Ofício do Administrador ao Chefe de Polícia, apud BRITTO, Fissuras no ordenamento..., p. 75.
27
Ofício do Administrador ao Chefe de Polícia, apud BRITTO, Fissuras no ordenamento..., p. 82.
28
SILVA, Pretas de honra..., p. 62.
29
SILVA, Pretas de honra..., p. 79.
30
SILVA, Pretas de honra..., p. 80.
31
Ofício do Administrador da Casa de Detenção ao Chefe de Policia, 20 ago. 1865.
32
CERTEAU, Michel de. A Invenção do Cotidiano – vol. 1: artes de fazer. Tradução de Ephraim
Ferreira Alves. Petrópolis: Vozes, 1994, p. 41-42.
33
Relatório do Administrador Rufino de Almeida, 1863.
34
Ofício do administrador da Casa de Detenção, Rufino Augusto de Almeida, ao Chefe de Polícia de
Pernambuco, Luiz Antonio Fernandes Pinheiro, 01 set. 1870.
35
Relatório do Administrador Rufino de Almeida, 1864.
36
Diário de Pernambuco, Recife, 20 out. 1874.
37
Ofício do Administrador ao Chefe de Polícia, apud BRITTO, Fissuras no ordenamento..., p. 84.
38
O Liberal, Recife, 17 jul. 1866.
39
Ofício do Administrador ao Chefe de Polícia, apud BRITTO, Fissuras no ordenamento..., p. 67.
40
BRITTO, Fissuras no ordenamento...
41
Relatório do Administrador da Casa de Detenção, 1865.
42
Relatório do Administrador da Casa de Detenção, O Liberal, Recife, 17 jun. 1866.
43
MAIA, Policiados...
44
Ofício do Administrador da Casa de Detenção, Rufino Augusto de Almeida, ao Chefe de Polícia de
Pernambuco, Francisco de Farias Lemos, 04 mai. 1869.
45
Ofício do Administrador da Casa de Detenção, Rufino Augusto de Almeida, ao Chefe de Polícia de
Pernambuco, Francisco de Farias Lemos, 04 mai. 1869.
46
Veja-se: BRITTO, Fissuras no ordenamento...
47
ALBUQUERQUE NETO, Flavio de Sá Cavalcanti. Punir, recuperar, lucrar: o trabalho penal na
casa de detenção do Recife (1862-1879). Tese (Doutorado em História). Universidade Federal de
Pernambuco. Recife, 2015.
48
HASSEN, Maria de Nazareth Agra. “O trabalho e os dias: enfoque antropológico sobre trabalho e
prisão”. Revista Transdisciplinar de Ciências Penitenciárias, Pelotas, UCPEL , vol. 1, n. 1, jan./ dez.
2002, p. 61-72.
49
ALBUQUERQUE NETO, Flavio de Sá Cavalcanti & MAIA, Clarissa Nunes. “O trabalho penal na
Casa de Detenção do Recife no século XIX”. Passagens, Niterói, UFF, vol. 3, 2011, p. 187-202.
Considerações Finais
50
Tempo, disciplina de trabalho e o capitalismo industrial. THOMPSON, “Patrícios e plebeus”, p.
284-285.
51
THOMPSON, “Patrícios e plebeus”, p. 283.
RESUMO ABSTRACT
Este artigo se propõe a analisar no cotidiano This paper aims to analyze the riddled everyday
eivado de tensões e conflitos que marcaram a tensions and conflicts that marked the course
trajetória dos diferentes sujeitos encarcerados na of the different subjects imprisoned at Recife’s
Casa de Detenção do Recife (CDR) na década House of Detention in the 1860s. Opened in
de 1860. Inaugurada em 1855, a CDR inseria- 1855, the House of Detention inserted itself
se no contexto da reforma prisional realizada into the context of the prison reform held in
no Brasil oitocentista, momento em que foram the nineteenth-century Brazil, when were built
construídas, nas principais capitais do Império, in the main capitals of the Empire, prisons for
penitenciárias para o cumprimento da pena de the fulfillment of imprisonment with labor,
prisão com trabalho, visto que o labor era tido since labor was seen as the principal element
como o principal elemento moralizador para moralizing to the criminal’s reintegration into
a reinserção do criminoso na sociedade após society after paying their debts with society .
o cumprimento da pena. Assim, no início dos Thus, in the early 1860s, there were mounted
anos 1860, foram montadas algumas oficinas some workshops in this institution, which directly
de trabalho nesta instituição, que afetaram affect the daily lives of prisoners, guards, also
diretamente o dia a dia de presos, guardas, as the outsider population that entered the prison
também da população externa que adentrava walls for buying and selling products, intimate
os muros da prisão para compra e venda visits, etc. These incursions and its impact on the
de produtos, visitas íntimas, etc. São nessas functioning the Recife’s House of Detention are
incursões e seu impacto no funcionamento da what we will look at.
Casa de Detenção do Recife que iremos nos
Keywords: Prisons; Daily Life; Social History.
debruçar.
Palavras Chave: Prisões; Cotidiano; História
Social.
1
Doutor em História pela Universidade Federal de Pernambuco. Professor do Departamento e do
Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal Rural de Pernambuco. E-Mail:
<[email protected]>.
2
BRETAS, Marcos. “As empadas do confeiteiro imaginário: a pesquisa nos arquivos da justiça
criminal e a história da violência no Rio de Janeiro”. Acervo, Rio de Janeiro, Arquivo Nacional, vol.
15, n. 1, jan./jun. 2002, p. 08.
3
OFÍCIO do Prefeito da Comarca do Recife, José Carlos Teixeira, para o presidente da província de
Pernambuco, Vicente Thomás Pires de Figueiredo Camargo, 27 fev. 1837. Prefeitos de Comarca,
cód. 2, fl. 87-87v. Arquivo Público Estadual Jordão Emerenciano (doravante APEJE).
4
“POR causa de um cão”, Diário de Pernambuco. Recife, 28 out. 1886, p. 02.
5
RELATÓRIO do ministro e secretário de Estado dos Negócios da Justiça, Lafayete Rodrigues
Pereira, 26 dez. 1878. Disponível em: <http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/u1871/000001.html>. Acesso
em: 25 jan. 2015.
6
RELATÓRIO do 1º vice-presidente da província de Pernambuco, Inácio Joaquim de Souza Leão,
10 nov. 1886. <http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/u667/000001.html.>. Acesso em: 25 jan. 2015.
7
RELATÓRIO do presidente da província de Pernambuco, Pedro Vicente de Azevedo, 02 mar. 1887.
Disponível em: <http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/705>. Acesso em: 26 jan. 2015.
8
“ATÉ onde será real?”, Diário de Pernambuco. Recife, 27 out. 1886, p. 03.
9
RELATÓRIO do presidente da província de Pernambuco, Pedro Vicente de Azevedo, 02 mar. 1887,
p. 21. Disponível em: <http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/705/000002.html>. Acesso em: 27 jan. 2015
10
MAIA, Clarissa Nunes. “O controle social no Recife oitocentista.” In: SILVA, Wellington Barbosa da
(org.). Uma cidade, várias histórias: o Recife no século XIX. Recife: Bagaço, 2012, p. 185.
11
MARTINS, Marcelo Thadeu Quintanilha. “‘Policiais habilitados não se improvisam’: a modernização
da polícia paulista na Primeira República (1889-1930)”. Revista de História, São Paulo, n. 164, jan./
jun. 2011, p. 245.
12
REINER, Robert. A política da polícia. Tradução de Jacy C. Ghirotti e Maria C. P. Da C. Marques.
São Paulo: EDUSP, 2004, p. 19.
13
Todas as leis, regulamentos e instruções referentes à Guarda Cívica utilizadas neste artigo fazem
parte do acervo do Arquivo Público Estadual Jordão Emerenciano – APEJE.
14
MONKKONEN, Eric H. “História da polícia urbana”. In: TONRY, Michael & MORRIS, Norval
(orgs.). Policiamento moderno. Tradução de Jacy Cárdia Ghirotti. São Paulo: EDUSP, 2003, p. 577-
612.
15
FALA do presidente da província de Pernambuco, Manoel Clementino Carneiro da Cunha, 02 mar.
1877. Disponível em: <http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/692>. Acesso em: 26 jan. 2015.
16
BAYLEY, David H. & SKOLNICK, Jerome H. Nova polícia: inovações nas polícias de seis cidades
norte-americanas. Tradução de Geraldo Gerson de Souza. São Paulo: EDUSP, 2006, p. 18.
17
VANAGUNAS, Stanley. “Planejamento dos serviços policiais urbanos”. In: GREENE, Jack R.
Administração do trabalho policial: questões e análises. Tradução de Ana Luísa Amêndola Pinheiro.
São Paulo: EDUSP, 2002, p. 46.
18
HOLLOWAY, Thomas H. Polícia no Rio de Janeiro: repressão e resistência numa cidade do século
XIX. Tradução de Francisco de Castro Azevedo. Rio de Janeiro: Editora FGV, 1997, p. 216.
19
CARVALHO, Marcus Joaquim Maciel de. Liberdade: rotinas e rupturas do escravismo no Recife,
1822-1850. Recife: Editora Universitária da UFPE, 2001, p. 87.
20
RELATÓRIO do presidente de província de Pernambuco, José Fernandes da Costa Pereira Junior,
06 mar. 1886. Disponível em: <http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/704/000002.html>. Acesso em: 28 jan.
2015.
21
FARIA, Regina Helena Martins de. Em nome da ordem: a constituição de aparatos policiais no
universo luso-brasileiro (séculos XVIII e XIX). Tese (Doutorado em História). Universidade Federal
de Pernambuco. Recife, 2007, p. 207.
22
BITTNER, Egon. Aspectos do trabalho policial. Tradução de Ana Luísa Amendola Pinheiro. São
Paulo: EDUSP, 2003, p. 20.
23
BRETAS, Marcos Luiz. A guerra das ruas: povo e polícia na cidade do Rio de Janeiro. Rio de
Janeiro: Arquivo Nacional, 1997, p. 22.
24
HOLLOWAY, Polícia no Rio de Janeiro..., p. 219.
25
FARIA, Em nome da ordem..., p. 207.
Sua proposta não foi encampada de imediato pelos deputados provinciais, mas
não se esvaiu como poeira ao vento. Em meados de 1889, já no lusco-fusco do
Império, um projeto de lei previu a sua extinção e, em sua substituição, a designação
de 180 praças do Corpo de Polícia para realizar o policiamento da comarca do
Recife. O presidente, Inácio Joaquim de Souza Leão, alegando a intromissão
26
RELATÓRIO do 1º vice-presidente da província de Pernambuco, Inácio Joaquim de Souza Leão,
10 nov. 1886, p. 17. Disponível em: <http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/u667/000001.html>. Acesso em:
29 jan. 2015.
27
RELATÓRIO do presidente da província de Pernambuco, Pedro Vicente de Azevedo, 02 mar. 1887.
Disponível em: <http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/705>. Acesso em: 30 jan. 2011.
28
RELATÓRIO do presidente Inácio Joaquim de Souza Leão, Barão de Souza Leão, 20 jun. 1889.
Disponível em: <http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/u673/000028.html>. Acesso em: 25 jan. 2011.
29
Grifos do autor. COTTA, Francis Albert. Matrizes do sistema policial brasileiro. Belo Horizonte:
Crisálida, 2012, p. 26-27.
Introdução
1
Doutora em História pela Universidade Federal de Pernambuco. Professora Substituta do Curso de
Graduação em História da Universidade Estadual do Ceará, Campus de Limoeiro do Norte. E-Mail:
<[email protected]>.
2
A Constituição, Fortaleza, 11 set. 1867, p. 03. Hemeroteca da Biblioteca Pública Meneses Pimentel
– BPMP, Fortaleza – CE. Todos os exemplares de periódicos cearenses do século XIX consultados
pertencem ao acervo da BPMP.
3
A Constituição, Fortaleza, 11 set. 1867, p. 03.
4
A Constituição, Fortaleza, 11 set. 1867, p. 04.
Segurança Pública
A freqüência, como que se repetem os homicídios e as
5
SOUZA, Maria Regina Santos de. A chama apagada, a chaga aberta: a “Guerra do Paraguai”, a
Sociedade e os Militares Regressos. Ceará (1865-1889). Tese (Doutorado em História). Universidade
Federal de Pernambuco. Recife, 2012.
6
Grifos nossos. Cearense, Fortaleza, 08 ago. 1875, p. 02.
7
Cearense, Fortaleza, 10 out. 1875, p. 03.
A confusão das informações militares (em qual força serviu e em que condição
aderiu à guerra) fez de João Nepomuceno um suspeito. Desconfiadas, as
autoridades ministeriais começaram a colocar em questão o asilamento do praça
cearense. Com o asilo superlotado de inválidos, quaisquer desencontros de dados
poderiam ser motivos para o deslocamento de contingente13. Sendo assim, o militar
foi interrogado sobre sua condição de alistamento, tendo alegado a qualidade de
“designado”, isto é, chamado pelo Estado para “servir a nação” na guerra.
A categoria de recruta, assuntada pelas autoridades da Corte, mas negada
pelo praça cearense, talvez tenha sido o principal motivo do ofício. Essa condição
poderia complicar a permanência do soldado João Nepomuceno no asilo, uma
vez que aos recrutados, os forçados, quase nada lhes era garantido. Infelizmente,
na documentação ministerial consultada não há mais indícios que pudessem levar
ao desfecho da história desse militar, mas, por meio da trajetória dele, algo ficou
esclarecido: a atuação de políticos e/ ou militares em pedidos de asilamentos de
veteranos inválidos não era incomum e nem se tratava de um ato de caridade.
Ao contrário, foi um recurso usado pelas autoridades para “livrarem” os grandes
centros urbanos da presença indesejada dos ex-combatentes da guerra14.
Em fevereiro de 1874, o presidente do Ceará, Francisco Teixeira de Sá, em oficio
ao ministro da guerra disse que “nessa data mandava dar sob a responsabilidade
do ministério”:
12
Grifos nossos. APEC/CE. Fundo: Ministério da Guerra à Presidência do Ceará [1873]. Livro n. 72.
Requerimento enviado em 24 nov. 1873.
13
GOMES, A espuma das províncias...
14
SOUZA, Maria Regina Santos de. “O fantasma da ‘Guerra do Paraguai’ e as oposições à ‘Lei do
Sorteio Militar’ no Ceará (1874-1875)”. Histariae, Rio Grande, FURG, vol. 5, n. 1, 2014, p. 237-
261.
15
Grifos nossos. APEC/CE. Fundo: Presidência do Ceará ao Ministério da Guerra. Livro n. 150.
Requerimento enviado em 04 fev. 1874.
16
SOUZA, A chama apagada...
17
SOUZA, Eusébio. História Militar do Ceará. Fortaleza: Editora do Instituto Histórico do Ceará,
1950.
18
RELATÓRIO do Chefe de Polícia da Província, Júlio Barbosa de Vasconcelos. Anexado à Falla do
presidente da província do Ceará, Francisco Faria Lemos, em 1° de julho de 1876. Disponível em:
<http://www.apps.crl.edu/brazil/provincial>. Acesso em: 17 jan. 2014.
19
Capitães, tenentes e alferes eram considerados baixos oficiais ou oficiais subalternos. Cf.:
ALMANAK do Ministério da Guerra (General em Chefe o Sr. Visconde da Gávea). Rio de Janeiro:
Imprensa Nacional, 1885. Nas documentações, civil e militar, da província do Ceará há também
alguns registros de transgressões e crimes cometidos por “baixos oficiais” regressos da guerra.
[...]
Art. 2º. Os voluntarios, que não forem Guardas Nacionaes,
terão, além do soldo que percebem os voluntarios do
Exercito, mais 300 rs. diarios e a gratificação de 300$000
quando derem baixa, e um prazo de terras de 22.500
braças quadradas nas colonias militares ou agricolas.
[...]
Art. 9º. Os voluntarios terão direito aos Empregos Publicos,
de preferencia, em igualdade de habilitações, a quaesquer
outros individuos.
Art. 10. As familias dos voluntarios que fallecerem no
campo de batalha, ou em consequencia de ferimentos
recebidos nella, terão direito á pensão ou meio soldo,
conforme se acha estabelecido para os Officiaes e praças
do Exercito. Os que ficarem inutilisados por ferimentos
recebidos em combate, perceberão, durante sua vida,
soldo dobrado de voluntario [...].20
A maioria dos veteranos cearenses requerentes, são e inválidos, era, de fato, ex-
voluntários da pátria, mas, em meio os requerimentos consultados, existem muitos
recrutas do Exército, da Guarda Nacional e da Polícia que alegaram ser voluntários,
tendo em vista, principalmente, os benefícios acima citados. Atitude perfeitamente
compreensível, uma vez que “a guerra do Paraguai calcinou, devastou e despedaçou
a vida de todos, inclusive a vida daqueles que estiveram ligados indiretamente a
ela, como era o caso dos parentes dos combatentes mortos nesse conflito”21.
20
COLEÇÃO das Leis do Império do Brasil de 1865. Tomo XXVIII, Parte II- Leis de 1865. Rio de
Janeiro: Typographia Nacional, 1865, p. 03. Conferir também a URL <http://www.lexml.gov.br/urn/
urn:lex:br:federal:decreto:1865-01-07;337>. Acesso em: 07 set. 2014.
21
ALAMBERT, Francisco. “Civilização e barbárie, História e cultura: representações literárias e
projetos da Guerra do Paraguai”. In: MARQUES, Maria Eduarda Castro Magalhães (org.). Guerra
do Paraguai: 130 anos depois. 2. ed. Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 1995, p. 85-96.
Cinco anos após esse requerimento, o soldado Pedro Rogério foi citado “num
Aviso do Ministério da Guerra como um dos militares reformados da infantaria do
15° batalhão, tendo suas provisões enviadas à província cearense”. A Reforma era
uma espécie de “aposentadoria”, mas outro ofício daquele ministério colocava em
dúvida a informação, uma vez que o benefício “[...] da pensão outrora requerida
22
Grifos nossos. APEC/CE. Fundo: Presidência do Ceará ao Ministério da Guerra. Livro n. 150.
Requerimento enviado em 18 abr. 1875. O 15º batalhão ao qual fora enviado o referido praça
estava estacionado no Ceará, sendo sua composição majoritária formada por militares de outras
províncias, como as do Amazonas e Pará. Segundo o relatório do presidente Francisco D’Assis
Oliveira Maciel, esse batalhão “cujo estado completo era de 683 praças, tendo em seu estado
efectivo 525, incluindo 120 praças e 2 oficiais do 14° batalhão que lhe foram adidas, por ordens
do ministro da guerra”, havia sido enviado da Corte à Fortaleza para substituir o 14º batalhão,
este “filho da Província”. Cf.: FALLA com que o Ex.mo Sr. Dr. Francisco D’Assis Oliveira Maciel
abriu a 2° Sessão da 21° Legislativa da Assembleia Provincial do Ceará, no dia 7 de julho de 1873.
Fortaleza: Typograpfia: Progresso, 1873, p. 03. Disponível em: <http://www.apps.crl.edu/brazil/
provincial/>. Acesso em: 17 jan. 2014.
23
APEC/CE. Fundo: Ministério da Guerra à Presidência do Ceará. Livro n. 75 (1878-1880).
Requerimento enviado em 04 out. 1880.
24
APEC/CE. Fundo: Presidência do Ceará ao Ministério da Guerra. Livro n. 150. Requerimento
enviado em 08 mar. 1871.
25
O Cearense, Fortaleza, 20 out. 1871, p. 01.
Tudo indica que, uma vez extinto o depósito, o oficial reformado que, certamente
recebia uma pequena, não conseguiu outra ocupação digna dentro dos trâmites
legais, sendo a penúria de sua família a constatação disso.
O drama vivido pelo voluntário “Antonio Maria de Castro, capitão da polícia
embarcado em 1865, voluntariamente, para o teatro da guerra junto com as tropas
de linha cearenses”, foi bastante similar ao do alferes Carvalho. O capitão buscava
a “Reforma no exército pela condição de voluntário que teve e que se julgava com
direito”; mas, deparou-se com várias dificuldades, a começar pelas desencontradas
26
A Constituição, Fortaleza, 10 out. 1870, p. 02.
27
Arquivo do Exército – AHEx/RJ. Fundo Ministério da Guerra: Secretaria do Estado dos Negócios
da Guerra à Presidência do Ceará (1863-1906). Livro n. 20. Ofício enviado a Thesouraria da
província do Ceará em 24 abr. 1868. Vale ressaltar que os preços altos dos gêneros básicos da
alimentação. Se em 1866, durante a guerra, a farinha de mandioca custava cerca de 60 a 80 réis,
depois do conflito, diante de outra crise econômica vivenciada pelo Império, não temos razões para
crer que os preços dos alimentos baixaram.
28
Arquivo Nacional – AN/RJ. Fundo: Ministério da Guerra. IG1. Requerimento enviado em 09 set.
1879.
29
APEC/CE. Fundo: Thesouraria da Fazenda da Província do Ceará (1835-1889). Caixa n. 9 (1868).
Requerimento enviado à Thesouraria da Província do Ceará em 21 ago. 1868.
30
Jornal da Fortaleza, Fortaleza, 08 fev. 1870, p. 01 (Gazetilha).
31
APEC/CE. Fundo: Thesouraria da Fazenda da Província do Ceará (1835-1889). Caixa n. 9 (1867).
Requerimento enviado à Thesouraria da Província do Ceará em 19 fev. 1867.
32
O Cearense, Fortaleza, 02 ago. 1875, p. 02 (Transcrição do Opinião Liberal Aos Voluntários da
pátria e às famílias dos que morreram na guerra).
33
Jornal Pedro II, Fortaleza, 14 jul. 1870, p. 01 (Parte Official – Requerimentos).
34
SOUZA, A chama apagada...
Alguns meses depois da guerra, “praças como Joaquim Guerra Passos, Luiz
Antonio Cabral e o músico da 3º classe Conrado Pereira da Silva”, exigiram “as
terras prometidas pelo governo por terem pertencido ao corpo de voluntários
da província do Ceará”. Todos obtiveram a mesma resposta do presidente da
província: “informe ao inspector da Thesouraria”. Ou seja, naquele momento não
foram ouvidos36.
Pode-se inferir, no entanto, que o sentimento de injustiça levou vários veteranos
à insistência nos pedidos. Além dos voluntários da pátria, outros militares incólumes
sentiram-se igualmente injustiçados. Praças que foram recrutados para a guerra,
por exemplo, não tinham direito à pensão, pois eram de uma “categoria” que,
devido a sua condição de engajamento forçada nas forças armadas, nada tinham a
receber dos cofres públicos. Mas, mesmo assim, muitos recrutas requereram alguns
benefícios financeiros.
Antonio Pereira da Silva, “que dizia ter se alistado voluntariamente no conflito
do Paraguai requerendo o prêmio de voluntário, não teve seu pedido enviado
às autoridades competentes por ordem do Barão de Ibiapaba, então presidente
interino da província do Ceará”. Segundo esta autoridade, aquele “individuo foi à
guerra como recruta, por isso não se acha no direito de receber benesse alguma”37.
Utilizando-se da mesma estratégia, o soldado de infantaria João Marcolino
Barbosa requereu os direitos de voluntário da pátria, mas seu pedido não convenceu
as autoridades militares, porque “desconfiou-se que ele era um recruta, portanto,
um forçado”. Por essa razão, o Ministério da Guerra exigiu da presidência cearense
explicações sobre a forma de ingresso desse ex-combatente:
Nesse caso, a desconfiança não foi confirmada e nem negada, mas o pedido foi
indeferido.
35
APEC/CE. Fundo: Presidência do Ceará ao Ministério da Guerra. Livro n. 149. 28 mai. 1867.
36
Jornal Pedro II, Fortaleza, 09 out. 1870, p. 02 (Parte Official - Requerimentos)
37
APEC/CE. Fundo: Presidência do Ceará ao Ministério da Guerra. Livro n. 150. 07 out. 1874.
38
APEC/CE. Fundo: Ministério da Guerra à Presidência do Ceará. Livro n. 73. 04 nov. 1874.
39
Gazeta de Notícias, Fortaleza, 03 set. 1940, p. 02.
40
Gazeta de Notícias, Fortaleza, 03 set. 1940, p. 03.
41
Gazeta de Notícias, Fortaleza, 03 set. 1940, p. 01.
42
Grifos nossos. Gazeta de Notícias, Fortaleza, 03 set. 1940, p. 02-03.
Considerações Finais
43
DORATIOTO, Francisco Fernando M. Maldita Guerra: uma nova história da guerra do Paraguai.
São Paulo: Companhia das Letras, 1996, p. 11.
44
GRANZIERA, Rui. Guerra do Paraguai e o capitalismo no Brasil. São Paulo: Hucitec, 1979, p. 102.
45
SOUZA, “O fantasma da ‘Guerra do Paraguai’...”.
2004, p. 1415.
24
“Garantias de que o Brasil seria diferente de outros países escravistas, uma espécie de país abençoado
por Deus, não havia nenhuma, pois aqui, assim como em toda a América, os quilombos, os assaltos
às fazendas, as pequenas revoltas individuais ou coletivas e as tentativas de grandes insurreições
se sucederam desde o desembarque dos primeiros negros em meados de 1500”. AZEVEDO, Célia
Maria Marinho de. Onda negra, medo branco: o negro no imaginário das elites, século XIX. Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 1987, p. 35.
28
KRAAY, Hendrik. “Repensando o recrutamento militar no Brasil imperial”. Diálogos, Maringá, DH-
UEM, vol. 3, n. 3, 1999, p. 116.
29
RAMOS, Xisley de Araújo. Por trás de toda fuga nem sempre há um crime: recrutamento “a laço” e
os limites da ordem no Ceará (1850-1875). Dissertação (Mestrado em História Social). Universidade
Federal do Ceará. Fortaleza, 2003.
30
Ofício de 25 jul. 1868, Ministério da Guerra, livro 149, APEC.
31
RAMOS, Por trás de toda fuga..., p. 159.
Podemos voltar agora, ainda uma última vez, aos episódios que envolveram
as famílias dos retirantes Honorato Pereira dos Santos e Luís Manuel da Silva,
apresentados no início desse artigo. A luz de tudo o que foi dito acima, um
enquadramento complexo sobre as atitudes e expectativas daqueles sertanejos
pobres faz-se possível. Ao verem malogrados seus planos de se estabelecerem
no sítio Monte Pilar, Honorato e Luís Manuel vivenciaram um desses momentos
em que as tradicionais relações de proteção paternalista eram questionadas.
Com a destruição do roçado de macaxeiras e a inoperância do juiz da comarca
de Baturité em restituir aos agricultores compensações pelos prejuízos sofridos o
poder do capitão João Nunes de Albuquerque em socorrer os retirantes arruinados
seria mais uma vez acionado como componente de uma tradição que orientava
as expectativas de senhores e trabalhadores sertanejos naqueles momentos em
que os pobres necessitavam da proteção material da aristocracia rural. Tratava-se,
portanto, de uma circunstância até certo ponto típica do universo cultural sertanejo.
Mas se o drama envolvendo Honorato e Luís Manuel era, de certa maneira,
conhecido, seu contexto de encenação apresentava-se como uma novidade para a
vida daqueles sujeitos.
De nada sabemos sobre experiências posteriores dos implicados naquele
processo criminal, mas a se considerar o que se passava com a grande maioria da
população dos sertões durante aquele tempo, é provável que as famílias daqueles
retirantes viessem a engrossar as multidões de flagelados que percorriam estradas
e caminhos secos em busca da salvação que acreditavam poder talvez encontrar
em vilas, povoados e cidades, especialmente naqueles pontos do litoral aonde
embarcações chegavam trazendo alimentos para serem distribuídos às aglomerações
de retirantes estacionadas em pontos como Aracati, Camocim e Fortaleza. Desses
portos, diariamente embarcavam milhares de pessoas em direção aos seringais ou
colônias agrícolas da Amazônia, aos cafezais e outros estabelecimentos rurais das
províncias do Sul, ou para alguma outra região em que os retirantes visualizassem
um refúgio possível para se verem livres da extrema miséria que reinava no Ceará
desde o ano de 1877, mas que só terminaria com o retorno das chuvas nos
primeiros meses de 1880.
Daí para frente, a cada período de estiagem prolongada as aglomerações de
retirantes provenientes dos sertões do semiárido ocupariam centros urbanos e outros
espaços do poder passando a cobrar do Estado um socorro que tradicionalmente
era uma atribuição dos proprietários rurais. As expectativas de proteção paternalista
dos retirantes passavam a se deparar, nesses momentos, com experiências derivadas
de circunstâncias divergentes aos padrões costumeiros de relações de reciprocidade
desigual prevalecentes ao longo do século XIX. As medidas de socorros públicos
promovidas pelos governantes desde a seca de 1877 configuravam, nas palavras
de Frederico de Castro Neves, “novas experiências” enfrentadas pelos retirantes.
A exigência de ter de trabalhar em alguma turma de operários nas diversas obras
de socorros públicos como maneira de restituir com a prestação de serviços os
“benefícios” distribuídos pelo Estado gerava constrangimentos vários, resistências
e era motivo de estranhamento por parte dos sertanejos pobres:
sÆculum - REVISTA DE HISTÓRIA [33]; João Pessoa, jul./dez. 2015. 179
O trabalho em turmas e sob o comando enérgico de um
superior contrastava radicalmente com o trabalho familiar
e autônomo desempenhado nas terras arrendadas e
representava uma divisão de trabalho mais aprofundada
entre executores e planejadores. Seja no carregamento de
pedras para o calçamento das ruas, seja na construção de
alvenaria dos prédios públicos, ou seja na construção de
linhas de trem, o saber relacionado ao trabalho acionado
pelos camponeses é inteiramente desprezado, com a
exceção do desbravamento das matas para a passagem
das linhas férreas. São atividades novas e desnecessárias
no contexto da vida rural do semiárido tal como praticado
na agricultura ‘tradicional’. Além disso, a presença de
engenheiros, muitas vezes vindos da capital do Império, ou
até do estrangeiro, aumentava a estranheza do retirante, já
que a fonte de poder exercido por eles era o saber e não
mais a propriedade.32
Uma nova dinâmica na vida sertaneja se configuraria, assim, durante as secas
que se sucederam na passagem do século XIX (1877-1879, 1888-1889, 1900
e 1915). Ao partirem do sertão, quando reconheciam a perda das safras ou a
impossibilidade de preservação do gado, os retirantes iniciavam uma trajetória
arriscada, pois, uma vez abandonado o local de moradia e trabalho, o retorno
ao fim da quadra seca não era garantido. A retirada representava, igualmente,
uma precarização nas relações de trabalho e dependência da sociedade tradicional.
Mesmo quando, ao fim da seca, os pobres conseguiam se restabelecer nas glebas
do sertão, nos novos vínculos possivelmente não mantinha expectativas de
fixação como no passado. Além disso, os retirantes, ao retornarem ao sertão após
empreenderem curtos ou longos deslocamentos, incorporavam a suas estratégias
pessoais a possibilidade de acionar as rotas que agora já conheciam, podendo
com isso optar pela emigração ao se depararem com circunstâncias opressivas do
cotidiano de trabalho, mesmo em tempos de chuva.
Pode-se dizer que as secas geraram consequências duradouras na dinâmica
sertaneja. Se, em 1877, a grande seca alcançou a população de certa forma
“desprevenida” – pois uma extraordinária ausência de fortes crises climáticas desde
1845 havia se combinado a um período de euforia econômica com o boom da
exportação do algodão na década de 1860 –, a partir de então o tempo de seca
passou a fazer parte do próprio horizonte de expectativa dessa sociedade, na medida
em que se reconhecia a inevitabilidade de uma nova grande estiagem vir a ocorrer
mais cedo ou mais tarde. Consequências das jornadas de seca repercutir-se-iam
nos tempos de regularidade climática, fazendo com que, de retirantes ocasionais,
os sertanejos se tornassem verdadeiros proletários das secas, pois suas experiências
nos meses de estiagem criariam marcas constantes na sua condição de trabalhador.
Em diversos aspectos, as experiências e as condições de vida e trabalho das
maiorias de trabalhadores rurais do Ceará durante as secas da passagem do
32
NEVES, A multidão e a história..., p. 54.
RESUMO ABSTRACT
Este artigo trata das transformações no cenário This paper shows the changes in Ceará’s
da pobreza do sertão cearense, enfocando as backland poverty scenario, focusing on the
relações entre proprietários rurais e trabalhadores. relations between landowners and workers.
Partindo de uma tentativa fracassada de um Starting from a failed attempt of sertanejos
grupo de sertanejos em cultivar macaxeiras nas (countrymen) group to cultivating macaxeira
terras de um proprietário na serra de Baturité, (Manihot esculent) in the lands of an owner
durante a seca de 1878 (caso que figurou in Baturité hills during the 1878’s drought
num processo criminal movido pelos próprios (case figured in a criminal case brought by the
agricultores), problematiza as expectativas dos sertanejos themselves), the text discusses the
pobres quanto à proteção paternalista diante expectations of the poor as the paternalistic
das circunstâncias históricas no transcurso protection given the historical circumstances in
do século XIX. Porém, a cada momento em the course of the 19th century. However, each
que as mudanças atreladas ao processo de time the changes linked to the hegemony process
hegemonização da agricultura comercial of commercial agriculture played the ways of life
tocavam os modos de vida das camadas of lower classes, these paternalistic ties tended to
subalternas esses laços paternalistas tendiam a be questioned. Some evidence from the point
ser questionados. Algumas evidências do ponto of view of the countrymen themselves, found
de vista dos próprios sertanejos, encontradas em in criminal cases in the official documentation
processos criminais, na documentação oficial and travelers records and memoirs suggest the
e em registros de viajantes e memorialistas, movement of poor people in a symbolic field
sugerem a circulação das populações pobres num in which the paternalistic order was sometimes
campo simbólico em que a ordem paternalista confirmed, sometimes challenged when
era por vezes confirmada, por vezes desafiada, casualization of labor relations and dependence
quando a precarização das relações de trabalho triggered resistance and conflict.
e dependência desencadeava resistências e
Keywords: Poor Countrymen; Paternalistic
conflitos.
Protection; Work Casualization.
Palavras Chave: Sertanejos Pobres; Proteção
Paternalista; Precarização do Trabalho.
Solange P. Rocha1
Introdução
1
Doutora em História pela Universidade Federal de Pernambuco. Professora Adjunta do
Departamento e do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal da Paraíba.
E-Mail: <[email protected]>.
2
LEVI, Giovani. “Comportamentos, recursos, processos: antes da ‘revolução’ do consumo”. In:
REVEL, Jacques (org.). Jogos de escalas: a experiência da microanálise. Tradução de Dora Rocha.
Rio de Janeiro: FGV, 1998, p. 203-224.
3
THOMPSON, Edward Palmer. A formação da classe operária inglesa – vol. 1. Tradução de
Denise Bottman. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987; e THOMPSON, Edward Palmer. Costumes em
comum: estudos sobre a cultura popular tradicional. Tradução de Rosaura Eichenberg. São Paulo:
Companhia das Letras, 1998.
4
Aproveito para agradecer o apoio recebido para o desenvolvimento do mencionado projeto.
Contei com o auxílio da Pró-Reitoria de Pós-graduação da UFPB e do Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico/ CNPq que financiaram bolsas de Iniciação Científica às/
aos graduandas/os do curso de História que estiveram (ou estão) sob a minha orientação.
5
No presente estudo, utilizo as designações “negro(a)” e “população negra”, seguindo as perspectivas
dos contemporâneos movimentos sociopolíticos negros(as) no Brasil, que reconhecem tanto
uma marca identitária quanto suas origens raciais e sociais, ou seja, descendem de africanos(as)
escravizados(as). Contudo, quando pertinente, farei referências aos termos da época em estudo, o
século XIX, ou seja, “preto”, “pardo”, “semibranco”, “cabras” ente outros.
6
KOSTER, Henry. Viagens pelo Nordeste do Brasil. Tradução de Luiz da Câmara Cascudo. 2. ed.
São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1942, p. 70.
7
MEDEIROS, Coriolano. O Tambiá da minha infância. João Pessoa: Conselho Estadual de Cultura/
SEC, 1994, p. 26.
8
RELATÓRIO de Presidente da Província da Paraíba, Antonio Coelho de Sá e Albuquerque, 1851,
Mapa 10 – Açúcar – Indústria. Disponível em: <http://brazil.crl.edu/>. Acesso em: 09 fev. 2015.
9
RELATÓRIO de Presidente da Província da Paraíba, Antonio Coelho de Sá e Albuquerque, 1851,
Mapa 5 – População – estatísticas. Disponível em: <http://brazil.crl.edu/>. Acesso em: 09 fev. 2015.
10
KARASCH, Mary. A vida dos escravos no Rio de Janeiro (1808-1850). Tradução de Pedro M.
Soares. São Paulo: Companhia das Letras, 2000, p. 39.
11
KLEIN, Herbert. “Os homens livres de cor na sociedade escravista brasileira.” Dados - Revista de
Ciências Sociais, Rio de Janeiro, IUPERJ, n. 17, 1978, p. 03-27.
12
NOVAIS, Fernando A. (coord.) & ALENCASTRO, Luiz Felipe (org.). História da vida privada no
Brasil – Vol. 2 – Império: a corte e a modernidade nacional. São Paulo: Companhia das Letras,
1997, p. 474; e FARIAS, Juliana B.; GOMES, Flávio dos S.; SOARES, Carlos Eugênio L. & ARAÚJO,
Carlos Eduardo M. Cidades negras: africanos, crioulos e espaços urbanos no Brasil escravista do
século XIX. 2. ed. São Paulo: Alameda, 2006, p. 11-14.
13
Grifos meus. BARICKMAN, Bert J. “As cores do escravismo: escravistas ‘pretos’, ‘pardos’, ‘cabras’
no Recôncavo baiano, 1835”. População e Família. São Paulo, CEDHAL/USP, n. 2, 1999, p. 16.
14
MEDEIROS, Maria do Céu & SÁ, Ariane Norma de Menezes. O trabalho na Paraíba: das origens à
transição para o trabalho livre. João Pessoa: Ed. Universitária/ UFPB, 1999, p. 55.
15
NOVAIS & ALENCASTRO, História da vida..., p. 474, p. 481.
16
GALLIZA, Diana S. O declínio da escravidão na Paraíba, 1850-88. João Pessoa: Ed. Universitária/
UFPB, 1979, p. 83-84.
17
GRAHAM, Richard. O clientelismo e a política no século XIX. Tradução de Celina Brandt. Rio de
Janeiro: Editora da UFRJ, 1997.
18
MEDEIROS & SÁ, O trabalho na Paraíba..., p. 82-84.
Nesta parte do artigo, primeiro apresento o perfil das 8.057 pessoas23, indicando
o sexo, faixa etária, cor/ grupo étnico-racial e a condição jurídica das pessoas
batizadas entre 1833 e 1860. Em seguida, selecionei o grupo composto por pardos
livres para investigar suas relações de compadrio na Cidade da Paraíba oitocentista.
Entre as pessoas batizadas, entre 1833 e 1860, constam 4.019 do sexo feminino,
4.025 do masculino e 13 registros estão danificados ou ilegíveis, por isso mesmo
não permite determinar se eram homens ou mulheres, mas percebe-se que não
havia desequilíbrio sexual. Acerca da faixa etária foi possível verificar apenas
que crianças predominavam entre os batizandos. Somente 21 adultos (africanos
escravizados, pardos e brancos) receberam o primeiro sacramento na paróquia em
estudo, mas ressalto que sobre 592 indivíduos nada foi registrado, alcançando um
índice de 6,3% batizados sem a variável idade.
Entretanto, 68% foram classificadas racialmente. Desses, uma maioria era de
mestiços, predominando os “pardos” (2959) e os “mulatos” (05), representando
36,8% (ou 2.964) dos indivíduos batizados, em seguida, vinham os brancos
(1.783, ou 22,1%). Entre os estrangeiros, procedentes da África Ocidental e
Centro-Ocidental, havia apenas 46 africanos (0,6%) que receberam o primeiro
sacramento na Cidade da Paraíba. É relevante destacar que em tal época o
19
As informações sobre o trabalhador Felipe Bezerra da Silva estão publicadas em: “O PRESIDENTE
Pedro Chaves: tentativa de morte”. Revista do Instituto Historico e Geographico Parahybano,
Cidade da Paraíba, IHGP, n. 4, ano IV, 1912, p. 287-343.
20
EISENBERG, Peter L. Modernização sem mudança: a indústria açucareira em Pernambuco, 1840-
1910. Tradução de João Maia. Rio de Janeiro: Paz e Terra; Campinas: Editora da UNICAMP, 1977,
p. 201.
21
GALLIZA, O declínio da escravidão...., p. 34; p. 43-44; GALLIZA, Diana S. de. Modernização sem
desenvolvimento na Paraíba: 1890-1930. João Pessoa: Idéia, 1993, p. 50.
22
GALLIZA, Modernização se mudança..., p. 53.
23
Os as informações batismais estão em uma base de dados, armazenados em CD-ROM e referem-se
aos Livros de batismo da freguesia de Nossa Senhora das Neves, numerados e datados da seguinte
maneira: I -1833-41; II -1846-50; III -1850-57; IV -1857-63, com algumas lacunas, faltando,
portanto, os anos de 1842 a 1845. Doravante, Livro de Batismo NSN – ano, fls, e sigla do acervo,
AEPB.
Gráfico 1
COR OU GRUPO RACIAL DE PESSOAS BATIZADAS
NA FREGUESIA DE NOSSA SENHORA DAS NEVES - 1833/1860
24
Análises incipientes sobre os semibrancos foram feitas por: MONTEIRO, Sandra. Pessoas negras
livres e libertas na freguesia de Nossa Senhora das Neves, 1851-1860. Monografia (Graduação em
História). Universidade Federal da Paraíba. João Pessoa, 2010; e GUIMARÃES, Matheus Silveira.
Famílias e laços de solidariedades negras: parentesco da população parda e semibranca da Cidade
da Parahyba do Norte (1833-1860). Monografia (Graduação em História). Universidade Federal da
Paraíba. João Pessoa, 2013.
25
KARASCH, A vida dos escravos..., p. 39.
26
Conforme Livro de Batismo NSN – 1833-1841, fls. 42, 148 e 185, AEPB.
27
ROCHA, Solange P. Gente negra na Paraíba Oitocentista: população, família e parentesco espiritual.
São Paulo: Editora da UNESP, 2009.
28
OLIVEIRA, Luiza Iolanda P. Cortez de. Entre casas, ruas e igrejas: crianças abandonadas na cidade
da Paraíba oitocentista. Dissertação (Mestrado em História). Universidade Federal da Paraíba. João
Pessoa, 2014; e GUIMARÃES, Matheus S. Diáspora africana na Paraíba do Norte: trabalho, tráfico e
sociabilidades na primeira metade do século XIX. Dissertação (Mestrado em História). Universidade
32
As referências sobre os batismos em oratórios estão no Livro III-1850-57, nas fls. 19, 41 e 241,
AEPB.
A população negra paraibana não era composta somente de gente negra livre
inserida no mundo do trabalho, exercendo funções que exigiam apenas o esforço
físico. Havia algumas exceções. Para tanto, apresento, de forma breve, as trajetórias
de dois homens negros – ou como eram denominados: “mulatos”, “mestiços” e
33
LIMA, Maria da Vitória B. Liberdade interditada, liberdade reavida: escravos e libertos na Paraíba
escravista, século XIX. Brasília: FCP, 2013, p. 87-89.
34
Requerimento do juiz e irmãos da Irmandade de Nossa Senhora Mãe dos Homens dos Pardos
Cativos da cidade da Paraíba, enviado ao rei de Portugal D. José I, solicitando esmolas para o
término da construção da capela para nela depositarem a imagem da mesma Senhora. AHU_ACL_
CU_014, Cx. 24, 09 nov. 1767. Ver, também, compromisso aprovado pela Assembleia provincial,
em 1874, referente à irmandade Nossa Senhora Mães dos Homens, com indicação de “pardos
livres e libertos”, Caixa 1874, no Arquivo Histórico Waldemar B. Duarte.
35
As informações estão em: LIMA, Liberdade interditada..., p. 80-87.
36
Mais informações no capítulo 2 de: LIMA, Liberdade interditada...
37
Os dados biográficos de Cardos Vieira estão em: MARTINS, Eduardo. Cardoso Vieira e o Bossuet
da Jacoca: nota para um perfil biográfico. João Pessoa: Secretaria da Educação e Cultura, 1979. Ver
o Anexo, onde constam os seus discursos parlamentares.
38
Algumas ideias sobre o debate da atuação política de liberais encontram-se em: CARVALHO, José
Murilo de. A construção da ordem: a elite política imperial. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,
2009. Em especial no capítulo intitulado “Os partidos políticos imperiais: composição e ideologia,”
p. 199-228.
39
MARTINS, Cardoso Vieira..., p. 104-105.
40
MARTINS, Cardoso Vieira..., p. 106-111.
41
MARTINS, Cardoso Vieira..., p. 224.
42
Informações mais detalhadas sobre a posse de cativos pela família de Cardoso Vieira estão em
artigo de minha autoria: ROCHA, Solange P. “Cardoso Vieira, um homem na composição das elites
da Paraíba oitocentista: biografia, memória e história”. Revista Crítica História, Maceió, CPDHis/
UFAL, Ano III, n. 6, dez. 2012, p. 01-18.
43
MARTINS, Eduardo. Elyseu Elias Cézar: notícia biográfica. João Pessoa: mimeo, 1975. (Discurso
de posse no Instituto Histórico e Geográfico da Paraíba, em 22 nov. 1975).
44
MARTINS, Elyseu Elias Cézar..., p. 20, p. 31.
45
NÓBREGA, Seráphico. “Discurso de posse na Academia Paraibana de Letras”. Revista da Academia
Paraibana de Letras, João Pessoa, n. 6, 1955, p. 275-302. As informações estão na p. 281.
46
Em 1935, mais de uma década após a morte de Eliseu E. César, o escritor Ascendino Leite (1915-
2010) o classificou como “pardo” e “figura mestiça” e “mulato”, em: LEITE, Ascendino. “O pardo
Elyseu Cesar”. In: ANUÁRIO da Parahyba. João Pessoa: Imprensa Oficial, 1935, p. 65-69.
47
Tal qualificativo atribuído a Eliseu E. César foi feito por Seráphico Nóbrega. Ver: NÓBREGA,
“Discurso de posse...”, p. 280, p. 292.
48
O assento de batismo de Eliseu E. César encontra-se no Livro de Batismo NSN VII-1871-75, fl. 47,
AEPB.
49
Os assentos batismais das crianças batizadas pelos avôs de Eliseu César, o senhor Christiano
de Fojos Correia Cezar, estão nos seguintes livros: I-1833-41, fls. 115, 120, 136, 143 e 181; III-
1850/57, fls. 62 e 113 e IV-1857-63, fl. 31, todos no AEPB. Considero interessante destacar que
uma das crianças batizadas, em 1851, é indicada como moradora do “lugar do Salgado do Paratibe,
desta freguesia [Nossa Senhora das Neves]”. Contemporaneamente, essa localidade é território
da Comunidade [Urbana de] Remanescente de Quilombos Paratibe, reconhecida pelo governo
brasileiro por meio da Fundação Cultural Palmares, em 2006.
50
Há registro de que Eliseu César concluiu o curso de Direito, em 1898. Ver: MARTINS, Henrique.
Lista geral dos bacharéis e doutores que têm obtido o respectivo grau na Faculdade de Direito
do Recife: desde sua fundação em Olinda, no anno de 1828, até o anno de 1931. 2. ed. Recife:
Typografia Diário da Manhã, 1931, p. 58.
51
MARTINS, Elyseu Elias Cézar..., p. 20. Henrique Martins publicou a “Primeira Conferência
Pública”, realizada no “Theatro da Paz, na manhã do dia 7 de setembro de 1900, pelo Sr. Dr. Elyseu
Elias Cezar”, em que podemos constatar que, em 1900, César residia em Belém.
52
MARTINS, Elyseu Elias Cézar..., p. 27.
53
Conforme consta no Estatuto da Academia Paraibana de Letras..., p. 01. Na ocasião da publicização
do Estatuto da Academia, divulgaram também o seu lema em latim, Decus et Opus, que significa
“Estética e Trabalho”.
1
Doutor em História pela Universidade Federal Fluminense. Mestre em Educação pela Universidade
Federal de Sergipe. Professor Titular da Faculdade Pio Décimo (Aracaju – SE). E-Mail:
<[email protected]>.
2
De acordo com Riolando Azzi, a reforma católica no Brasil, fortalecida ao longo da primeira
metade do século XX, “foi um movimento iniciado em meados do século XIX”. Cf. AZZI, Riolando.
“O início da restauração católica no Brasil: 1920-1930”. Síntese, vol. IV, n. 10, mai./ ago. 1977,
p.61-89.
3
SANTOS, Magno Francisco de Jesus. “O Prefácio dos Tempos”: caminhos da romaria do Senhor
dos Passos em Sergipe (séculos XIX e XX). Tese (Doutorado em História). Universidade Federal
Fluminense. Niterói, 2015.
4
TELLES, Manuel dos Passos de Oliveira. “Ao romper do século XX: o município de S. Christovam”.
O Estado de Sergipe, Aracaju, mar./ abr. 1917, p. 02.
5
Ainda na primeira metade do século XIX é possível encontrar ações restritivas às ações das
ordens religiosas regulares no Brasil pós-independência, como a proibição da entrada de religiosos
estrangeiros, a expulsão de ordens na qual os seus respectivos superiores não residissem no
país e a proibição de entrada de noviços nas ordens beneditinas e carmelitas, nos idos de 1822.
De acordo com Márcio Moreira Alves, o governo imperial “produziu, entre 1828 e 1830, uma
série de restrições ao funcionamento das ordens religiosas, mais independentes do Estado que o
clero secular: foi interdita a entrada de religiosos estrangeiros no território do Império; proibiu-se
a criação de novas ordens, dos dois sexos; expulsaram-se os religiosos ou as congregações que
obedeciam a Superiores não residentes no Brasil. Os Beneditinos e os Carmelitas não podiam mais
aceitar noviços. À medida que as ordens desapareciam, as suas propriedades eram incorporadas no
patrimônio nacional”. ALVES, Márcio Moreira. A Igreja e a política no Brasil. São Paulo: Brasiliense,
1979, p. 28.
6
Segundo Márcio Moreira Alves, “o parecer do ministro da Justiça de 19 de maio de 1855, que
deveria ser provisório, teve força de lei até ao fim do Império, trinta e quatro anos mais tarde:
proibia que as ordens religiosas aceitassem noviços sem o consentimento do Governo, garantindo
assim a sua extinção a longo prazo”. ALVES, A Igreja e a política..., p. 30.
7
Em 1859 existiam na cidade de São Cristóvão os seguintes conventos e hospícios: Nossa Senhora
do Carmo (carmelitas), Bom Jesus (franciscanos) e Nossa Senhora da Conceição (capuchinhos).
Cf. Correio Sergipense, Parte Official, Governo da Província, expediente do dia 21 de outubro de
1859, Aracaju, Anno XXII, n. 82, 07 dez. 1859, p. 01, col. 3.
8
WERNET, Augustin. “Crise e definhamento das tradicionais ordens monásticas brasileiras durante
o século XIX”. Revista Instituto de Estudos Brasileiros. São Paulo, n. 42, 1997, p. 125.
QUADRO I
DISTRIBUIÇÃO DAS PROPRIEDADES DA
ORDEM DO CARMO NO SERGIPE OITOCENTISTA
Por meio desses dados é possível observar como a Ordem do Carmo em Sergipe
era possuidora de importantes propriedades. Os frades precisavam administrar
duas aldeias10, três conventos, um hospício11, além de quatro engenhos. Na
9
Propriedades da Ordem do Carmo no Sergipe oitocentista. Quadro elaborado pelo autor. Fonte:
notas na imprensa sergipana do século XIX. Não foram inclusas as casas existentes na cidade de
São Cristóvão, nem os africanos e crioulos escravizados nos seus respectivos conventos e engenhos.
Foram localizadas notícias da existência de três mulheres escravizadas no Convento de Palmares
e seis no de São Cristóvão. Todavia, esse número era bem mais expressivo, pois a maior parte
encontrava-se nos engenhos.
10
Em 1850 as aldeias de Sergipe foram extintas pelo governo provincial, pois o mesmo alegou que
em Sergipe não existiam mais índios. Cf. DANTAS, Beatriz Góis. “Os índios em Sergipe”. In: DINIZ,
Diana Maria de Faro (coord.). Textos para a História de Sergipe. Aracaju: UFS/Banese, 1991, p. 19-
25; MOTT, Luiz. Sergipe colonial e imperial: religião, família, escravidão, e sociedade (1591-1882).
São Cristóvão: Editora UFS; Aracaju: Fundação Oviêdo Teixeira, 2008. No século XVII, a Ordem
do Carmo ainda possuía o engenho Ilha e as terras da Aldeia do Geru, posteriormente vendidas
aos padres jesuítas. Cf. SANTOS, Ane Luíse Silva Mecenas dos. Conquistas da fé na gentilidade
brasílica: a catequese jesuítica na aldeia do Geru (1683-1758). Dissertação (Mestrado em História).
Universidade Federal da Paraíba. João Pessoa, 2011.
11
Era um convento de pequenas proporções. Segundo o dicionário oitocentista, era “Convento
pequeno de Religiosos, onde se agasalhão os que vão de passagem, e são da mesma ordem”.
PINTO, Luiz Maria da Silva. Diccionario da Lingua Brasileira por Luiz Maria da Silva Pinto, natural
Resolução N. 95
De 12 de Março de 1842.
Sebastião Gaspar de Almeida Boto, Presidente da Província
de Sergipe: Faço saber à todos os seus habitantes, que a
Assembléa Legislativa Provincial Decretou e eu Sanccionei
a Resolução seguinte:
Art. 1º. Fica concedida aos Reverendos Provinciaes dos
Conventos do Carmo, e de São Francisco desta Cidade,
licença, para cada um delles, acceitar vinte Noviços,
naturaes desta Província, para os seus collegios nos
Conventos desta mesma Cidade, ou onde melhor convier.
13
Correio Sergipense, São Cristóvão, n. 351, 14 mai. 1842, Parte Official, Governo da Província,
Resolução n. 95, p. 01, col. 1 e 2.
14
“CONVENTO do Carmo”. Correio Sergipense, São Cristóvão, n. 354, 25 mai. 1842, p. 01, col. 1 e 2.
15
“A ORDEM-TERCEIRA do Carmo”. Correio Sergipense, São Cristóvão, n. 356, 11 jun. 1842, p.
03.
16
CHALHOUB, Sidney. Cidade febril: cortiços e epidemias na Corte imperial. São Paulo: Companhia
das Letras, 1996.
17
“A ORDEM-TERCEIRA...”, p. 03.
18
O Engenho Quindongá pertencia aos frades carmelitas de Sergipe e no início da década de 40 do
século XIX foi vendido ao Brigadeiro Domingos Dias Coelho e Mello, pai do Barão da Estância e
membro da Ordem Terceira do Carmo. Cf. “Correspondência”. Correio Sergipense, São Cristóvão,
n. 360, 15 jun. 1842, p. 04.
19
“FALLA com que o Exm. Sr. presidente da Província de Sergipe, Dr. Anselmo Francisco Peretti
Abrão, abrio a 2ª Sessão da Assembleia Legislativa Provincial em dia 22 de abril de 1843”. Correio
Sergipense, São Cristóvão, n. 443, 10 mai. 1843, p. 03.
20
“FALLA com que...”, p. 03.
21
“AOS CATHOLICOS”. Correio Sergipense, São Cristóvão, n. 589, 12 fev. 1845, p. 04.
22 PEDRO II. “Diário do Imperador Dom Pedro II na sua visita a Sergipe em janeiro de 1860”.
Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe. Aracaju, n. 26, vol. 21, 1961, p. 70.
23
CUNHA, Tatiane Oliveira da. Práticas e prédicas em nome de Cristo...: capuchinhos na “cruzada
civilizatória” em Sergipe (1874-1901). Dissertação (Mestrado em História). Universidade federal da
Bahia. Salvador, 2011.
24
Percebe-se essa preocupação em combater as chamadas ameaças da modernidade por meio das
Encíclicas papais publicadas ao longo da segunda metade do século XIX. Um caso elucidativo é a
Carta Encíclica Superiore Anno, do Papa Leão XIII, na qual defende a difusão do Rosário de Maria
no intuito de “Efetivamente, agora também se trata de um negócio bastante árduo e importante:
isto é, de abater o poder do antigo e astutíssimo inimigo, arrogante na sua força; de reivindicar a
liberdade para a Igreja e para o seu Chefe; de conservar e defender os fundamentos sobre os quais
deve apoiar-se a segurança e o bem-estar da sociedade. Grande deve, por isto, ser, nestes tempos
tão lacrimosos para a Igreja, a solicitude de manter com piedosa diligência o santo costume do
Rosário; sobretudo porque esta oração é composta de modo a evocar sucessivamente todos os
mistérios da nossa salvação, e portanto particularmente adequada para fomentar a piedade”. Cf:
LEÃO XIII. Carta Encíclica Superiore Anno de Sua Santidade Papa Leão XIII. Cidade do Vaticano,
30 ago. 1884. Disponível em: <http://w2.vatican.va/>. Acesso em: 28 nov. 2014.
25
SANTOS, Magno Francisco de Jesus. “O triunfo da Quaresma: práticas romanizadoras na Freguesia
de Nossa Senhora d’Ajuda”. Sæculum – Revista de História, João Pessoa, DH/PPGH/UFPB, n. 25,
jul./ dez. 2011, p. 195-213.
26
“NOTÍCIAS”. Correio Sergipense, Aracaju, n. 40, 03 mai. 1860, p. 04, col. 1.
27
“NOTICIÁRIO: Procissão de Penitência”. Correio Sergipense, Aracaju, n. 41, 15 mai. 1860, p. 04,
col. 1.
28
Nesse período Sergipe tinha como presidente provincial Manoel da Cunha Galvão, que governou
entre 7 de março de 1859 e 15 de agosto de 1860. Cf. DANTAS, Ibarê. Leandro Ribeiro de Siqueira
Maciel: o patriarca do Serra Negra e a política oitocentista em Sergipe. Aracaju: Criação: 2009, p.
470.
29
AVÉ-LALLEMANT, Robert. Viagens pelas províncias da Bahia, Pernambuco, Alagoas e Sergipe
(1859). Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: EDUSP, 1980, p. 336.
30
“NOTICIÁRIO: Procissão...”, p. 04, col. 1.
31
De acordo Amâncio Cardoso dos Santos Neto em 1860 viviam, no município de Aracaju, 6.364
habitantes. Esse número inclui os moradores do povoado Santo Antônio e da Vila do Socorro. Cf.
SANTOS NETO, Amâncio Cardoso dos. Sob o signo da peste: Sergipe no tempo do cholera (1855-
1856). Dissertação (Mestrado em História). Universidade Estadual de Campinas. Campinas, 2001,
p. 234.
32
“NOTICIÁRIO: Procissão...”, p. 04, col. 1.
33
AZZI, Riolando. “Do Bom Jesus Sofredor ao Cristo Libertador: um aspecto da evolução da Teologia
e da Espiritualidade Católica no Brasil”. Revista Perspectiva Teológica, Belo Horizonte, ano 18, n.
45, 1986, p. 215-233.
34
AGUIAR, Fernando José Ferreira. “Em tempos de solidão forçada”: epidemia de varíola, sistema
37
De acordo com Norbert Elias, “hoje sabemos como aliviar as dores da morte em alguns casos;
angústias de culpa são mais plenamente recalcadas e talvez dominadas. Grupos religiosos são
menos capazes de assegurar sua dominação pelo medo do inferno”. ELIAS, Norbert. A solidão dos
moribundos: seguido de envelhecer e morrer. Tradução de Plínio Dentzien. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar, 2001, p. 23. Diante disso, percebe-se como no Sergipe oitocentista existia uma preocupação
dos religiosos para indicarem aos devotos para cumprirem as disciplinas no universo privado, em
nome da civilização e do combate aos costumes tidos como desumano.
38
SEIXAS, D. Romualdo Antônio. “Pastoral”. Correio Sergipense, São Cristóvão, ano XIII, n. 76, 5
out. 1850, p. 03, col. 1-3.
39
“CORRESPONDÊNCIA”. Correio Sergipense, São Cristóvão, n. 42, 19 set. 1857, p. 03.
40
Rio que banha a cidade de Estância e integra a bacia do Pauí-Piauitinga.
41
CARDOSO, Severiano. “Notícias Religiosas: a Missão na Estância”. Correio Sergipense, Aracaju,
n.º 24, 23 mar. 1864, p. 04.
42
“ANNÚNCIOS”. Correio Sergipense, São Cristóvão, n. 11, 10 fev. 1855, p. 04.
43
Antônio Faustino denunciou “o Prior do Hospício Nossa Senhora do Carmo, Frei Joaquim Maria
do Sacramento, pelos factos criminosos por elle praticados quer em relação a pessoa do supplicante,
quer a de huma sua parente; e inteirado tanto do contexto d’esse requerimento e como do que a
respeito v. m. informa cabe-me em resposta dizer-lhe que cumpre que, tamanho de taes factos trate
de formar os respectivos summarios pelos crimes em que tiver logar o procedimentos officiais”.
Correio Sergipense, São Cristóvão, n. 82, 20 out. 1852, p. 02.
44
SANTIAGO, Serafim. “Igreja do Amparo”. In: Annuario Christovense ou Cidade de São Cristóvão:
manuscrito de Serafim Santiago [1920]. São Cristóvão: Editora UFS, 2009, p. 183.
45
SANTIAGO, “Igreja do Amparo”, p. 183.
46
Praticamente todas as irmandades da cidade participavam das procissões. No caso de São
Cristóvão, como a cidade possuía mais de 14 irmandades, as atividades dos irmãos variavam de
acordo com o prestígio e importância social da mesma.
47
Na Procissão do Encontro a Irmandade Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos
disponibilizava crianças vestidas de anjinhos para acompanharem a imagem do Senhor dos Passos,
provavelmente transportando as insígnias da Paixão. Cf. SANTIAGO, “Igreja do Amparo”, p. 186.
48
A Imagem do Senhor dos Passos era recebida na Igreja Matriz Nossa Senhora da Vitória pelo
vigário Barroso e irmãos da Confraria do Santíssimo Sacramento. A imagem pernoitava diante da
capela da referida irmandade. SANTIAGO, “Igreja do Amparo”, p. 184.
49
De acordo com o Compromisso da Ordem Terceira de São Francisco da cidade de São Cristóvão,
estavam “obrigados os Irmãos 3ºs de São Francisco a carregarem a charola do Senhor dos Passos na
procissão da 2ª Dominga da quaresma, assim como os Irmãos 3ºs do Carmo a carregarem a charola
da Virgem da Conceição na procissão de Cinzas”. SANTIAGO, “Igreja do Amparo”, p. 186.
50
Eram armações efêmeras montadas para expor cenas da Paixão de Cristo. No caso de São Cristóvão,
os sete Passos eram quadros com as seguintes representações: Jesus no Horto da Oliveiras, A prisão
de Jesus, Bom Jesus da Coluna, Senhor da Pedra Fria (coroação de espinhos), Ecce Homo ou cana
verde, Cruz as costas e Senhor Crucificado. Esses quadros atualmente encontram-se no acervo
do Museu de Arte Sacra de São Cristóvão. Cf. SANTOS, Magno Francisco de Jesus. Caminhos
da Penitência: a solenidade do Senhor dos Passos na cidade de São Cristóvão (1886-1920).
Aracaju: Casa de Sergipe, 2014; CAMPOS, Adalgisa Arantes. “Quaresma e tríduo sacro nas Minas
Setecentistas: cultura material e liturgia”. Revista Barroco, Belo Horizonte, n. 17, 1993, p. 209-219;
__________. “Piedade barroca, obras artísticas e armações efêmeras: as irmandades do Senhor
dos Passos em Minas Gerais”. In: Anais do VI Colóquio Luso-Brasileiro de História da Arte. Rio de
Janeiro: CBHA/ PUC-Rio/ UERJ/ UFRJ, 2004.
51
CARDOSO, Severiano. “Uma pétala todas as manhãs: XX. Os Passos”. O Republicano, Laranjeiras,
n. 41, 24 fev. 1891, p. 03.
52
Severiano Cardoso foi um dos mais ativos intelectuais sergipanos da segunda metade do século
XIX, com vasta publicação na imprensa sergipana e baiana. Filho do professor Joaquim Maurício
Cardoso e D. Joana Batista de Azevedo Cardoso, nasceu a 14 de março de 1840 na Estância e
faleceu no Aracaju a 2 de outubro de 1907. Além disso, atuou em importantes instituições escolares
de Sergipe e Minas Gerais, como o Atheneu Sergipense e o Pathernon. Cf. GUARANÁ, Armindo.
Dicionário bio-bibliográfico sergipano. Rio de Janeiro: Pongetti, 1925, p. 483; SANTOS, Maria
Fernanda dos. “A escrita da história de Severiano Cardoso no entardecer do século XIX”. Revista
do IHGSE. Aracaju, n. 42, 2012, p. 329-352.
53
PRADO, Paulo Brito do & BRITTO, Clóvis Carvalho. “A economia simbólica da Paixão Vilaboense”.
In: ROSA, Rafael Lino & BRITTO, Clóvis Carvalho (orgs.). Nos Passos da Paixão: a Irmandade do
Senhor Bom Jesus dos Passos em Goiás. Goiânia: Kelps/PUC-GO, 2011, p. 108.
54
É considerado um dos maiores oradores sacros de Sergipe. De acordo com Jacques, em texto
publicado sobre a festa de Nossa Senhora da Pureza de São Cristóvão, no jornal “O Guarany”,
o vigário Barroso era “um dos ornatos mais dignos do Clero sergipano”. “FESTA”. O Guarany,
Aracaju, anno II, .nº 45, 8 out. 1879, p. 03, col. 1. Para o Jornal do Aracaju, ao se referi a inauguração
do Asilo Nossa Senhora da Pureza destacou a relevância da prédica de Barroso, ao afirmar: “No
ato da coroação da Virgem Santíssima, o eloquente orador o sr. vigário Barroso trouxe o auditório
suspense e possuído de indisível entusiasmo, aos sons doces e convincentes de sua palavra, fazendo
o mais brilhante e justo elogio à pureza de Maria, nossa Divina Mãe. Honra ao sr. vigário Barros,
honra ao orador que nunca desceu da tribuna em que se faz ouvir há longos anos, senão cheio de
glória, rodeado de auréolas. “ASYLO de Nossa Senhora da Pureza”. Jornal do Aracaju, Aracaju,
anno VIII, n. 789, 7 abr. 1877, p. 02, col. 1.
55
GUARANÁ, Dicionário bio-bibliográfico..., p. 315.
56
ARQUIVO NACIONAL. Decreto de 21 de abril de 1853. Coleção Eclesiástica. Cx. 889, doc. 50, p.
3.
57
José Gonçalves Barroso foi aprovado com 17 pontos, nota considerada ótima. Cf. ARQUIVO
NACIONAL. Decreto de 21 de abril de 1853. Coleção Eclesiástica. Cx. 889, doc. 50, p. 6.
58
Vigário Colado é o “ Sacerdote que, após o concurso, foi constituído pela autoridade diocesana com
a régia apresentação”. O Vigário Encomendado era o pároco de freguesia aind anão reconhecido
oficialmente pelo Rei. Cf. NUNES, Verônica Maria Meneses. Glossário de termos sobre religiosidade.
Aracaju: Tribunal de Justiça; Arquivo Judiciário do Estado de Sergipe, 2008, p. 154.
59
ARQUIVO NACIONAL. Decreto de 21 de abril de 1853. Coleção Eclesiástica. Cx. 889, doc. 50, p. 1.
60
Os sermões inéditos escritos pelo vigário Barroso foram doados a padres de outras freguesias. De
acordo com Armindo Guaraná, “Deixou grande número de sermões inéditos, dos quais os seus
herdeiros ofereceram a maior parte ao falecido Padre José Joaquim Ludovice, vigário de Simão
Dias, e os restantes ao Padre José Joaquim de Brito, atual vigário de Vassoura, Estado do Rio de
Janeiro”. GUARANÁ, Dicionário bio-bibliográfico..., p. 315.
61
“Ofício de Dom Manoel sobre o pedido do vigário Barroso no dia 28 de agosto de 1866”. Arquivo
Nacional do Rio de Janeiro, Coleção Eclesiástica, Cx. 930, p. 04.
62
De acordo como requerimento imperial do dia 17 de julho de 1869, o vigário José Gonçalves
Barroso foi nomeado cônego honorário da Capella Imperial. Cf. “Despacho Imperial n. 829-69 de
1869”. Arquivo Nacional do Rio de Janeiro, Coleção Eclesiástica, Cx. 930, p. 22.
63
PEDRO II, “Diário do Imperador...”, p. 65.
64
REIS, João José. A morte é uma festa: ritos fúnebres e revolta popular no Brasil do século XIX.
São Paulo: Companhia das Letras, 2009; PEREZ, Léa Freitas. “Dionísio nos trópicos”. In: Anais do
I Colóquio Festas e Sociabilidades. Aracaju: UFS, 2008, p. 77-106.
65
ANDRADE, Sob o olhar diligente..., p. 79.
RESUMO ABSTRACT
Esse artigo discute o processo de reforma This article discusses the devotional reform
devocional em Sergipe ao longo da segunda process in Sergipe during the second half
metade do século XIX, com foco para as of the nineteenth century, focusing for the
aproximações e os distanciamentos entre as approximations and distances between the
práticas penitenciais na romaria do Senhor dos penitential practices in the procession of the
Passos de São Cristóvão e as recomendações do Lord of Saint Kitts Steps and recommendations
clero local, especialmente os frades capuchinhos of the local clergy, especially the friars Capuchin
e o vigário Barroso. Ao longo da segunda and vicar Barroso. Throughout the second
metade do século XIX, Sergipe passou a receber half of the nineteenth century, Sergipe started
religiosos capuchinhos que se instalaram na receiving Capuchin religious who settled in São
cidade de São Cristóvão, local de onde partiam Cristóvão, location from where they left to carry
para a realização das santas missões. Tais out the holy missions. Such celebrations have
celebrações se tornaram vitrines das práticas become showcases of the devotional practices
devocionais de cunho penitencial, bem como as of penitential nature and the cracks of the
frestas dos conflitos e tensões do campo religioso conflicts and tensions of the religious field in the
na província. A partir dos textos publicados na province. From the texts published in the local
imprensa local do oitocentos, torna-se possível press of eight, it becomes possible to understand
compreender as nuances entre religiosos e leigos the nuances between religious and laity in the
na redefinição das práticas devocionais. redefinition of devotional practices.
Palavras Chave: Romaria; Reforma Devocional Keywords: Pilgrimage; Catholic Devotional
Católica; Sergipe Oitocentista. Reform; 19th Century Sergipe.
1
Doutor em História pela Universidade Federal Fluminense. Professor Adjunto do Departamento
de História e Geografia da Universidade Estadual da Paraíba, Campus de Guarabira. Professor
colaborador do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Pernambuco.
E-Mail: <[email protected]>.
2
LINHARES, Temístocles. História econômica do mate. Rio de Janeiro: José Olympio, 1969.
3
SANTOS, Carlos Roberto Antunes dos. História da alimentação no Paraná. Curitiba: Fundação
Cultural, 1995.
4
MACHADO, Paulo Pinheiro. Lideranças do contestado: a formação e atuação das chefias caboclas
(1912-1916). Campinas: Editora da UNICAMP, 2004.
5
BANDEIRA, Luiz Alberto Moniz. O expansionismo brasileiro e a formação dos Estados na Bacia do
Prata: da colonização à Guerra da Tríplice Aliança. Brasília: Editora da UnB; Rio de Janeiro: Editora
Revan, 1985.
6
LINHARES, “História econômica do mate...”, p. 34.
7
GARAVAGLIA, Juan Carlos. Mercado interno y economia colonial: tres siglos de historia de la
yerba mate. 2. ed. Rosario: Prohistoria Ediciones, 2008.
8
As carnes passaram a ser aproveitadas em escala comercial a partir da implantação das charqueadas
na década de 1780.
9
AVILA, Ney Eduardo d’. Passo Fundo: terra de passagem. Passo Fundo: Aldeia Sul, 1996.
10 CHAVES, Antonio Gonçalves. Memórias ecônomo-políticas sobre a administração pública
do Brasil. 4 ed. São Leopoldo: Ed. UNISINOS/ COPESUL, 2004, p. 225.
11
ZARTH, Paulo Afonso. Do arcaico ao moderno: as transformações do Rio Grande do Sul rural no
século XIX. Ijuí: Editora da Unijuí, 2002.
12
Cf. Revista do Arquivo Público do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, n. 08, 1922. Apud ZARTH, Do
arcaico ao moderno..., p. 225-226.
13
Conforme mostram os registros paroquiais de terras e os processos de medições de Taquari e Rio
Pardo, resultantes da aplicação da Lei de Terras de 1850.
14
ZARTH, Do arcaico ao moderno..., p. 147.
15
CHRISTILLINO, Cristiano Luís. Litígios ao sul do Império: a Lei de Terras e a consolidação política
da Coroa no Rio Grande do Sul (1850-1880). Tese (Doutorado em História). Universidade Federal
Fluminense. Niterói, 2010.
16
Relatório do Padre Gay. Arquivo Padre Gay, lata 404, documento 37. Instituto Histórico e
Geográfico Brasileiro- IHGB.
17
ZARTH, Paulo Afonso. História agrária do Planalto Gaúcho (1850-1920). Ijuí: Fidene/ Unijuí, 1997,
p. 122.
18
Cf. Ata da Câmara de Cruz Alta, 14 fev. 1851. Arquivo Histórico da Câmara de Cruz Alta – AHCA.
19
OSÓRIO, Fernando Luís. História do General Osório. Rio de Janeiro: Typographia Leuzinger &
Filhos, 1894.
20
Cf. Atas da Câmara de Vereadores de Cruz Alta, 1860. AHCA.
21
Cf. Ata da Câmara de Cruz Alta, 24 jan. 1860. AHCA.
22
Cf. registros paroquiais de terras da Freguesia de Cruz Alta. Arquivo Histórico do Rio Grande do
Sul – AHRS.
23
Cf. registros paroquiais de terras da Freguesia de Cruz Alta, ns. 09 e 11. APERS.
24
Cf. registros paroquiais de terras da Freguesia de Cruz Alta, ns. 13; 14; 18; 19; 20; 21; 22; 23; 24;
25. APERS.
25
Registros paroquiais de terras da Freguesia de Cruz Alta, ns. 492, 496 e 512. APERS.
26
Registro paroquial de terras da Freguesia de Cruz Alta, n. 509. APERS.
27
Cf. os autos de legitimações de terras, ns. 194, 195, 196, 197, 198 e 737. AHRS.
28
Processos de legitimação de terras, correspondência das câmaras de vereadores, processos crimes,
relatórios de presidentes de província e memórias de época.
29
CHRISTILLINO, “Litígios ao sul do Império...”, p. 217.
30
LINHARES, “História econômica do mate...”.
31
MAESTRI, Mário (org.). O negro e o gaúcho: estâncias e fazendas no Rio Grande do Sul, Uruguai
e Brasil. Passo Fundo: UPF Editora, 2008.
32
Atas da Câmara de Cruz Alta, década de 1850. AHCA.
33
FRANCO, Maria Sylvia de Carvalho. Homens livres na ordem escravocrata. São Paulo: Kairós,
1983.
34
CANDIDO, Antônio. Os parceiros do Rio Bonito: estudo sobre o caipira paulista e a transformação
dos seus meios de vida. Rio de Janeiro: José Olympio Editora, 1964, p. 82.
35
MARTINS, José de Souza. Fronteira: a degradação do outro nos confins do humano. 2. ed. São
Paulo: Contexto, 2009.
36
Martins constrói seu conceito a partir da realidade da Amazônia no século XX, mostrando que
o capitalismo provoca a reprodução de relações não capitalistas de trabalho, como é o caso do
escravismo.
37
MATTOS, Hebe Maria Mattos de. Ao sul da história: lavradores pobres na crise do trabalho escravo.
São Paulo: Brasiliense, 1986, p. 15.
38
CUNHA, Jorge Luís. Os colonos alemães e a fumicultura: Santa Cruz do Sul, Rio Grande do Sul –
1849-1881. Santa Cruz do Sul: Livraria e Editora da FISC, 1991.
39
ZARTH, “História agrária...”, p. 122.
40
Ata da Câmara de Cruz Alta, 12 jun. 1849. AHCA.
41
Ata da Câmara de Cruz Alta, 28 abr. 1868. AHCA.
42
LINHARES, “História econômica...”, p. 267.
43
Mas as alterações no código de posturas municipais de Cruz alta não foram encontradas em nossa
pesquisa. O presidente provincial Homem de Mello citou o mesmo código de postura em 1867,
alegando que as demais câmaras deveriam seguir o seu exemplo. Entretanto, na correspondência
da Câmara e nas atas das reuniões dos vereadores, não constam esses artigos ou mesmo o novo
código.
44
MELLO, Francisco Ignacio Marcondes Homem de. Falla dirigida à Assembléa Legislativa da
Provincia de S. Pedro do Rio Grande do Sul pelo presidente Dr. Francisco Ignacio Marcondes
Homem de Mello, em a segunda sessão da 12ª legislatura. Porto Alegre: Typ. do Rio Grandense,
1867. AHRS.
45
Correspondência da Câmara Municipal de Taquari, 1873, n. 17. AHRS.
46
LINHARES, “História econômica do mate...”, p. 46.
47
Um estancieiro poderia ter em média até mil cabeças de gado numa légua de campo, do qual
obteria cerca de 100 cabeças para comercializar anualmente. O preço médio do novilho oscilou
entre 8$000 réis e 10$000 réis, na década de 1870, portanto 100 cabeças atingiriam um valor em
torno de 800$000 réis e 1:000$000 rs. Em determinados períodos, esse valor poderia ser obtido
com um volume inferior a 400 arrobas de erva-mate. Conforme: CHRISTILLINO, “Litígios ao sul
do Império...”, p. 189.
48
COSTA, Licurgo. O continente das Lagens. Florianópolis: FCC, 1982.
49
O Barão de Ornano atribuía a decadência do mercado de mulas às melhorias nas estradas no
Sudeste e à introdução de estradas de ferro, o que facilitou o transporte nas regiões cafeeiras e
dispensou, em parte, o tráfego muar. Como as mulas eram amplamente utilizadas no transporte de
cargas em todo o Brasil naquele momento, e a economia do Sudeste não se limitava à produção
cafeeira, é bem possível que a ruína do mercado às tropas muares do Sul também esteja vinculada
à superprodução local ou também à concorrência de outras áreas, inclusive do próprio Sudeste.
ORNANO, Paul Baptiste d’. Um barão na província: apêndice ao Relatório Geral, 1863. Tradução
de Fúlvia Moretto. Porto Alegre: EDIPUCRS; Brasília: INL, 1996.
50
Em parte, a diminuição da produção muar se deve à valorização do gado bovino no mercado
provincial. Seus preços eram mais atrativos, diante da desvalorização das mulas, além disso, ciclo
de reprodução dos bovinos era menor. CHRISTILLINO, “Litígios ao sul do império...”.
51
Cf. Revista do Arquivo Público do Rio Grande do Sul, n. 08, 1922. Apud ZARTH, Do arcaico ao
moderno..., p. 114.
52
Registro paroquial de terras da Freguesia de Cruz Alta, n. 667. APERS
53
Auto de medição n. 198. AHRS.
54
Francisco Rodrigues da Fonseca declarou duas áreas de terras que somavam mais de 7.600
hectares. Ângelo Rodrigues da Fonseca registrou meia légua de campo no Distrito da Vila de Cruz
Alta e aparece como confrontante de uma área de matos na Serra do Ijuí. Esse era o mesmo local
em que Porfírio Rodrigues da Fonseca aparece como vizinho de uma posse em terras de matas.
Esses três posseiros não efetuaram processos de legitimação de suas terras. Cf. registros paroquiais
de terras da Freguesia de Cruz Alta, ns. 44; 56; 57; 252; 262; 278. APERS.
55
CHRISTILLINO, Cristiano Luís. “Sob a pena presidencial: a Lei de Terras de 1850 no Rio Grande
do Sul e a negociação política”. Tempo, Niterói, vol. 16, 2012, p. 223-245.
56
CHRISTILLINO, “Litígios ao sul do Império...”, p. 219-222.
57
LINHARES, “História econômica do mate...”, p. 320.
58
LINHARES, “História econômica do mate...”, p. 286.
RESUMO ABSTRACT
O objetivo deste artigo é analisar a importância The purpose of this article is to analyze the
econômica da erva-mate no processo de economic importance of yerba mate in the
colonização do sul do Brasil no século XIX. process of colonization of southern Brazil in
Mostramos que, diante dos baixos lucros obtidos the nineteenth century. We show that, given
com a pecuária, a elite fundiária apropriou the low profits from livestock, the landed elite
vastas extensões de ervais, especialmente na appropriated vast tracts of herbal, especially
segunda metade do XIX. Na Província do Rio in the second half of the nineteenth. In the
Grande do Sul esta atividade extrativa permitiu Rio Grande do Sul Province this extractive
aos fazendeiros, e aos comerciantes, uma activity allowed farmers and traders, a rapid
rápida acumulação. A lucratividade com o mate accumulation. Profitability with yerba mate was
também foi o estímulo econômico à grilagem also an economic stimulus for grabs on forest
sobre as terras florestais. A exploração dos ervais lands. The exploitation of herbal located in the
localizados no oeste da Província de Santa west of the Province of Santa Catarina, by the
Catarina, pelos argentinos, levou o Governo Argentines, led the Imperial Government to
Imperial a intervir na região. A exploração da intervene in the region. The exploitation of yerba
erva-mate empregou uma mão-de-obra tão mate hired a skilled workforce as extensive
extensa quanto a pecuária, e permitiu a expansão as the one used in livestock, and allowed the
do universo social dos “homens livres e pobres”. expansion of the social universe of “poor free
men” in nineteenth-century Brazil.
Palavras Chave: Erva-Mate; Recursos Naturais;
História Agrária; Lei de Terras; Brasil Meridional. Keywords: Yerba Mate; Natural Resources; Law
of Land; Agrarian History; Southern Brazil.
59
LINHARES, Maria Yedda Leite. Pecuária, Alimentos e Sistemas Agrários no Brasil (Séculos XVII e
XVIII). Revista Tempo, Niterói, vol. 01, nº 02, 1996, p. 133.
Carina Martiny1
1
Doutoranda em História pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Bolsista Capes. E-Mail:
<[email protected]>.
2
Sobre a importância da escravidão na pecuária na região da Campanha ver os seguintes trabalhos:
FARINATTI, Luís Augusto. Confins meridionais: famílias de elite e sociedade agrária na fronteira
sul do Brasil (1825-1865). Santa Maria: Editora da UFSM, 2010; e MATHEUS, Marcelo Santos.
Fronteiras da liberdade: escravidão, hierarquia social e alforria no extremo sul do Império do Brasil.
São Leopoldo: Oikos; Editora da Unisinos, 2012. Sobre a relação escravidão e pecuária na região
do central do Rio Grande do Sul ver os seguintes trabalhos: ARAÚJO, Thiago Leitão de. Escravidão,
fronteira e liberdade: políticas de domínio, trabalho e luta em um contexto produtivo agropecuário
(Vila de Cruz Alta, Província do Rio Grande do Sul, 1834-1884). Dissertação (Mestrado em
História). Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, 2008; e CORRÊA, André do
Nascimento. Ao sul do Brasil oitocentista: escravidão e estrutura agrária em Caçapava, 1821-1850.
Dissertação (Mestrado em História). Universidade Federal de Santa Maria. Santa Maria, 2013.
3
Apesar de na listagem de herdeiros Júlio aparecer como o sétimo filho, era na realidade o oitavo.
Nascida dois anos antes de Júlio, Carolina acabou falecendo, motivo por não constar no título de
herdeiros.
4
Trata-se de: CARVALHO, José Murilo de. A construção da ordem: a elite política imperial/ Teatro
de sombras: a política imperial. 3. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2007. Sobre o envio
de sul-rio-grandenses para as escolas de Direito do Império, especialmente a Faculdade de Direito
de São Paulo ver: GRIJÓ, Luiz Alberto. Ensino jurídico e política partidária no Brasil: a Faculdade
de Direito de Porto Alegre (1900-1937). Tese (Doutorado em História). Universidade Federal
Fluminense. Niterói, 2005; e VARGAS, Jonas Moreira. Entre a paróquia e a Corte: os mediadores
e as estratégias familiares da elite política do Rio Grande do Sul (1850-1889). Santa Maria: Editora
da UFSM; ANPUH-RS, 2010.
5
Arquivo Público do Estado do Rio Grande do Sul – APERS. Inventário post-mortem de Francisco
Ferreira de Castilhos. Júlio de Castilhos (RS), n. 93, 1871.
6
APERS, Inventário post-mortem de Francisco Ferreira de Castilhos..., f. 43v.
7
Arquivo Histórico do Rio Grande do Sul – AHRS. Fundo Júlio de Castilhos, Série 2, Subsérie 4, cx.
2, m. 7, doc. 1.
8
ARAÚJO, Escravidão, fronteira..., p. 41-42.
9
APERS. Inventário post-mortem de Carolina Prates de Castilhos. Júlio de Castilhos (RS), processo
n. 277, 1890.
10
VELHO, Keter. Teu amigo certo: Júlio de Castilhos – correspondência inédita. Porto Alegre: Edijuc,
2013, p. 118.
11
VELHO, Teu amigo certo..., p. 126-127.
12
VELHO, Teu amigo certo..., p. 29.
13
VELHO, Teu amigo certo..., p. 55.
14
ARAÚJO, Escravidão, fronteira...
15
CORRÊA, Ao sul do Brasil...
16
FARINATTI, Confins meridionais...; ARAÚJO, Escravidão, fronteira...; CORRÊA, Ao sul do Brasil...
17
FARINATTI, Confins meridionais..., p. 353.
18
Considerou-se a idade de oito anos como baliza uma vez que parece ser já uma idade apta para o
trabalho no campo, visto que o escravo Basílio, de 8 anos, é descrito como campeiro.
19
Grifos nossos. APERS. Inventário post-mortem de Francisco Ferreira de Castilhos. Júlio de Castilhos
(RS), n. 93, 1871, f. 47.
20
OSÓRIO, Helen. O Império Português no sul da América: estancieiros, lavradores e comerciantes.
Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2007; e FARINATTI, Confins meridionais...
21
Arquivo da Cúria de Santa Maria – RS – ACSM. Batismos – São Martinho. Livro 2, 1855-1874.
22
O número de 18 crianças escravas nascidas no período de 1855-1862 e 1870 deriva da soma dos
batismos de filhas de escravas entre 1855 e 1862 e as 5 crianças escravas descritas no inventário de
Francisco com idade de um ano.
23 APERS. Inventário post-mortem de Francisco Ferreira de Castilhos..., f. 189.
Como apontava a notícia, a família Castilhos, menos de quatro anos antes da lei
Áurea que pôs fim à escravidão no país, realizava um ato que era comemorado pelo
jornal como patriótico e iniciante do movimento abolicionista em São Martinho.
Carolina Prates de Castilhos, seus filhos e o genro Revoredo Barros libertavam
seus escravos. Note-se que, naquele momento, Júlio de Castilhos era o diretor
de redação d’A Federação. Assim, é importante levar em conta o jornal no qual
a noticia foi vinculada. A Federação, fundado em 1884, era o jornal do Partido
Republicano Rio-Grandense (PRR) e, segundo Margareth Bakos, foi a primeira folha
republicana a radicalizar em relação à questão servil. Segundo a autora, os jornais
republicanos que existiram antes d’A Federação, nomeadamente A Democracia e
A Imprensa, reproduziam, em boa medida, “a posição dos republicanos paulistas
frente à situação servil”26.
Segundo Margaret Bakos, a posição de Júlio de Castilhos era distinta. O
político sul-rio-grandense fazia parte do grupo de positivistas que considerava a
necessidade do fim da escravidão se dar de modo imediato e sem indenização,
tendo sido também essa a posição de seus seguidores no PRR. Ao analisar os
textos escritos por Castilhos em A Federação, Bakos aponta que estes “Buscam
a formação de uma posição político-partidária coesa contra a escravidão e a
monarquia, fundamentada em seu conhecimento sobre o Positivismo de Auguste
24
APERS. Inventário post-mortem de Francisco Ferreira de Castilhos..., f. 38.
25
A Federação, Porto Alegre, n. 222, 26 set. 1884, p. 01. Disponível em: <http://memoria.bn.br/>.
Acesso em: 20 jan. 2015.
26
BAKOS, Margaret Marchiori. Júlio de Castilhos: positivismo, Abolição e República. Porto Alegre:
IEL; EDIPUCRS, 2006, p. 26.
27
BAKOS, Júlio de Castilhos..., p. 43.
28
Sobre seus textos publicados no jornal A Federação ver: BAKOS, Júlio de Castilhos...
29
BAKOS, Júlio de Castilhos..., p. 19.
30
VELHO, Teu amigo certo..., p. 45.
31
VELHO, Teu amigo certo..., p. 65-66.
Margaret Bakos, analisando o caso, apontou três razões que justificam a aflição
de Júlio expressa nas cartas:
Deste modo, a publicação feita pelo jornal em setembro de 1884, tinha o objetivo
de evidenciar a posição política favorável ao abolicionismo adotada pela família
Castilhos. Se antes era uma família escravista, o jornal a apresentava, naquele
momento, como abolicionista.
Em relação à dimensão concreta, duas questões são centrais. Primeiro a
adesão da família Castilhos ao movimento abolicionista que ganhava força deve
ser compreendida em seu contexto. Como explica Marcelo Santos Matheus, na
“província do Rio Grande do Sul, por exemplo, o ano de 1884 foi marcado por uma
concessão em massa de alforrias [...] em quase todos os municípios, acompanhando
o que as províncias do Ceará e do Amazonas já haviam feito”34. O próprio jornal
A Federação anunciava, na mesma edição, que em São Sepé (RS), 186 cartas de
liberdade haviam sido concedidas35. Assim, o comportamento dos membros da
família Castilhos não é descolado de outros proprietários da província.
A segunda questão em relação à dimensão concreta, diz respeito à efetiva
liberdade dos escravos dos Castilhos anunciada pelo jornal. Para tanto, é preciso
considerar o teor parcial da notícia d’A Federação, que não concedia detalhes
acerca do ato que descrevia como marco do início do movimento abolicionista em
São Martinho. A análise da documentação e correspondência familiar, entretanto,
pode nos conceder maiores indícios acerca das condições em que esta liberdade foi
concedida e do destino destes escravos libertados.
Ocupemo-nos, um pouco, dos escravos libertados por Carolina. Como
apontado na nota do jornal, Carolina libertava, em 1884, dezenove escravos.
Eram, certamente, muitos dos escravos que com ela permaneceram após a divisão
dos bens efetuada por ocasião da morte do marido, em 1871. Dos 56 escravos que
32
VELHO, Teu amigo certo..., p. 79.
33
BAKOS, Júlio de Castilhos..., p. 18.
34
MATHEUS, Fronteiras da Liberdade..., p. 19.
35
A Federação. Porto Alegre, n. 222, 26 set. 1884, p. 01. Disponível em: <http://memoria.bn.br/>.
Acesso em: 20 jan. 2015.
36
Grifos nossos. AHRS. Fundo Arquivo Particular Júlio de Castilhos. Série Assuntos Familiares, maço
8, doc. 13.
37
Grifos nossos. APERS. Inventário post-mortem de Francisco Ferreira de Castilhos. Júlio de Castilhos
(RS), n. 93, 1871, f. 46v.
38
Grifos nossos. AHRS. Fundo Arquivo Particular Júlio de Castilhos. Série Assuntos Familiares, maço
6, doc. 35.
39
Grifos nossos. AHRS. Fundo Arquivo Particular Júlio de Castilhos. Série Assuntos Familiares, maço
14, doc. 19.
40
APERS. Inventário post-mortem de Carolina Prates de Castilhos. Júlio de Castilhos (RS), n. 277,
1890, f. 32.
41
APERS. Inventário post-mortem de Carolina Prates de Castilhos. Júlio de Castilhos (RS), n. 277,
1890, f. 51-53v.
42
FRAGA FILHO, Walter. Encruzilhadas da liberdade: histórias e trajetórias de escravos e libertos na
Bahia, 1870-1910. Tese (Doutorado em História). Universidade Estadual de Campinas. Campinas,
2004, p. 236.
43
FARINATTI, Confins meridionais... p. 353.
Considerações Finais
44
FRAGA FILHO, Encruzilhadas da liberdade...
45
FRAGA FILHO, Encruzilhadas da liberdade...
46
FRAGA FILHO, Encruzilhadas da liberdade..., p. 238.
Esta artigo trata da presença de trabalhadores This paper deals with the presence of slave
escravos na produção pecuária no Rio Grande do labor in livestock production in Rio Grande
Sul, na segunda metade do século XIX. A análise do Sul, in the second half of the nineteenth
foca nos escravos da família de Júlio de Castilhos, century. The analysis focuses on the slave of the
importante político republicano brasileiro, a qual family of Júlio de Castilhos, important Brazilian
residia em São Martinho, distrito de Cruz Alta Republican politician, which resided in São
(RS). A família Castilhos tinha na produção Martinho, Cruz Alta district (RS). The family
pecuária sua principal atividade econômica, had Castilhos in livestock production its main
primeiramente voltada à venda de muares à economic activity, primarily focused on the sale
região sudeste do Brasil e, posteriormente, nas of mules to the southeastern region of Brazil
décadas finais do século XIX, dedicada à criação and later in the final decades of the nineteenth
de vacuns vendidos à produção charqueadora. century, dedicated to creating vacuns sold to
A análise da documentação familiar demonstra charqueadora production. The analysis of family
a centralidade do trabalho escravo nas documentation demonstrates the centrality of
propriedades dos Castilhos, sendo que estes slave labor in the properties of the Castillos,
constituíam o núcleo fixo de trabalhadores. Com and these were the fixed core workers. With the
o uso conjunto de fontes documentais variadas, joint use of various documentary sources, such
como inventários, registros batismais, periódicos as inventories, baptismal records, journals and
e correspondência familiar, a análise apresenta family correspondence, the analysis presents the
o papel desempenhado pelo trabalho escravo role of slave labor in the production dynamics,
na dinâmica produtiva, discute sua importância discusses its importance for the family business
para os negócios da família e caracteriza a and features the permanence of some of these
permanência de alguns destes trabalhadores nas workers in properties after the abolition of slavery.
propriedades após a abolição da escravidão. Shows that were ranching family, occurring
Demonstra que foram as atividades pecuárias via bonded labor, which ensured not only the
da família, que ocorriam via trabalho cativo, maintenance of rural business and also become
que garantiram não somente a manutenção an important source of income for many other
dos negócios rurais como também se tornaram family investments linked to the urban world.
importante fonte de renda para diversos outros Shows the relationship between the abolitionist
investimentos familiares, ligados ao mundo stance of the family with the political position
urbano. Evidencia a relação entre a postura connected with the republican movement of
abolicionista da família com a posição política one of its members, Jùlio de Castilhos. It also
ligada ao movimento republicano de um de shows that former slaves remained in the family
seus membros, Júlio de Castilhos. Demonstra properties after the abolition, provided that
também que ex-escravos permaneceram nas workers linked to domestic and pampas work.
propriedades da família após a abolição, na Keywords: Livestock; Slavery; Free Labor; Rio
condição de trabalhadores ligados ao trabalho Grande do Sul.
doméstico e campeiro.
Palavras Chave: Pecuária; Escravidão;
Trabalho Livre; Rio Grande do Sul.
1
Doutor em História Social pela Universidade de São Paulo. E-mails: <[email protected]> ou
<[email protected]>.
2
REVEL, Jacques, “Microanálise e a construção do social”. In: __________ (org.). Jogos de escala:
a experiência da microanálise. Rio de Janeiro: Editora FGV, 1996, p. 22.
3
Para a compreensão da escravidão no Brasil, a bibliografia é ampla e bastante diversificada. As
pesquisas acadêmicas que se debruçam sobre localidades específicas é igualmente vasta. Dentre os
autores que servem de referência para inúmeros trabalhos e focam seus estudos em determinadas
localidades procurando, por vezes, compreender o quadro econômico e político mais largo,
concentram seus esforços de pesquisa no Sudeste, especialmente na agricultura cafeeiro-escravista
do Vale do Paraíba. Dentre esses se pode destacar: STEIN, Stanley J. Grandeza e decadência do
café no Vale do Paraíba: com referência especial ao município de Vassouras. São Paulo: Brasiliense,
1961; FRANCO, Maria Sylvia de Carvalho. Homens livres na ordem escravocrata. São Paulo:
Editora da UNESP, 1997; MACHADO Maria Helena Pereira Toledo. Crime e escravidão: trabalho,
luta e resistência nas lavouras paulistas: 1830-1888. São Paulo: Brasiliense, 1987; WISSENBACH,
Maria Cristina C. Sonhos africanos, vivências ladinas: escravos e forros em São Paulo (1850-1880).
São Paulo: Hucitec, 1998; MOTTA, José Flávio. Corpos escravos vontades livres: posse de cativos
e família escrava em Bananal (1801-1829). São Paulo: Fapesp; Annablume, 1999; PAPALI, Maria
Aparecida C. R. Escravos, libertos e órfãos: a construção da liberdade em Taubaté (1871-1895).
São Paulo: Annablume; Fapesp, 2003; SALLES, Ricardo. E o Vale era o escravo: Vassouras, século
XIX – Senhores e escravos no coração do Império. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira: 2008.
Sobre as considerações teóricas e metodológicas da Micro-História presentes neste parágrafo, ver:
REVEL, “Microanálise e a construção do social”, p. 21-28.
4
AZEVEDO, Elciene. O direito dos escravos: lutas jurídicas e abolicionismo na província de São
Paulo. Campinas: Editora da UNICAMP, 2010; CARVALHO, José Murilo de. A construção da
ordem: a elite política imperial/ Teatro de sombras: a política imperial. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 2008; CONRAD, Robert. Os últimos anos da escravatura no Brasil: 1850-1888. Rio
de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978; FLORY, Thomas. El juez de paz y el jurado en el Brasil
imperial. Cidade do México: Fondo de Cultura Económica, 1986; DOLHNIKOFF, Miriam. O pacto
Imperial: origens do federalismo no Brasil. São Paulo: Globo, 2005; GOUVÊA, Maria de Fátima
Silva. O Império das Províncias: Rio de Janeiro, 1822-1889. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,
2008; COSER, Ivo. Visconde do Uruguai: centralização e federalismo no Brasil, 1823-1866. Belo
Horizonte: Editora da UFMG; Rio de Janeiro: IUPERJ, 2008; MACHADO, Maria Helena. O plano
e o pânico: os movimentos sociais na década da Abolição. Rio de Janeiro: Editora da UFRJ, 1994;
MENDONÇA, Joseli Maria Nunes. Entre a mão e os anéis: a lei dos sexagenários e os caminhos da
abolição no Brasil. Campinas: Editora da UNICAMP, 2008; MATTOS, Ilmar Rohloff de. O tempo
saquarema. 2. ed. São Paulo: Hucitec, 2004 [1987]; QUEIROZ, Jonas Marçal de. Da senzala à
República: tensões sociais e disputas partidárias em São Paulo (1869-1889). Dissertação (Mestrado
em História). Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 1995; TOPLIN, Robert Brent. The
abolition of slavery in Brazil. Nova York: Atheneum, 1975; AZEVEDO, Célia Maria Marinho de.
Onda negra, medo branco: o negro no imaginário das elites, século XIX. São Paulo: Annablume,
2004; CHALHOUB, Sidney. Visões da Liberdade: uma história das últimas décadas da escravidão
na Corte. São Paulo: Companhia das Letras, 1990.
Após a lei que suprimiu o tráfico de escravos entre a África e o Brasil (1850),
e até meados da década de 60, o clima político no Império era favorável àqueles
que defendiam a escravidão. Nessa época, os proprietários de escravos se sentiam
protegidos pelo Estado na delicada questão do elemento servil e não vislumbravam,
por parte das autoridades e do Imperador, nenhuma atitude contrária aos seus
interesses. Para Tâmis Parron, o momento vivenciou um arrefecimento das
publicações e das iniciativas contra a escravidão e conheceu uma significativa
“estabilidade discursiva” pautada pelo silêncio do Poder Legislativo nas questões
relativas ao trabalho escravo. Segundo Robert Conrad, pouco se fez a favor dos
escravos e dos africanos introduzidos ilegalmente no Brasil. Seguiu-se, então, “mais
de uma década de quase silêncio sobre o problema dos escravos”6.
5
Para entender a inserção do Vale do Paraíba na formação do mercado mundial do café, ver:
MARQUESE, Rafael & TOMICH, Dale. “O Vale do Paraíba escravista e a formação do mercado
mundial do café no século XIX”. In: GRINBERG, Keila & SALLES, Ricardo (orgs.). O Brasil
Imperial – Volume II: 1831-1870. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2011, p. 339-383. Versão
modificada desse artigo foi publicada em: MUAZE, Mariana & SALLES, Ricardo (orgs.). O Vale do
Paraíba e o Império do Brasil nos quadros da Segunda Escravidão. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2015,
p. 21-56.
6
PARRON, Tâmis. A política da escravidão no Império do Brasil: 1826-1865. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 2011, p. 299-300. Conforme Parron, um desembarque ilegal de escravos
em Sirinhaém, Pernambuco, no ano de 1856, rompeu por breves instantes os silêncios sobre a
escravidão que caracterizaram esse período. Contudo, tal fato não impediu que a escravidão se
tornasse um “não evento na agenda política imperial”, de acordo com os exemplos apresentados
por esse autor. PARRON, A política da escravidão..., p. 300-303. Ver também sobre esse momento
histórico: CONRAD, Os últimos anos..., p. 62; TOPLIN, The abolition…, p. 41.
7
ABREU, Marta, “O caso Bracuhy”. In: CASTRO, Hebe Maria Mattos de & SCHNOOR, Eduardo
(orgs.). Resgate: uma janela para o oitocentos. Rio de Janeiro: Topbooks, 1995, p. 169; Ver também:
LOURENÇO, Thiago Campos Pessoa. O Império dos Souza Breves nos oitocentos: política e
escravidão nas trajetórias dos Comendadores José e Joaquim Breves Dissertação (Mestrado em
História). Universidade Federal Fluminense. Niterói, 2010, p. 149-163.
8
ABREU, “O caso Bracuhy”, p. 171-176. Sobre a prisão de Breves em Bananal e o movimento de
1842, ver: HÖRNER, Erik. Em defesa da Constituição: a guerra entre rebeldes e governistas (1838-
1844). Tese (Doutorado em História Social). Universidade de São Paulo. São Paulo, 2010, p. 311.
O trabalho de Jaime Rodrigues analisa quais foram os mecanismos utilizados pelo governo imperial
para garantir o contrabando de africanos após a aprovação da lei de 1831 e, por outro lado,
estuda também quais foram as medidas tomadas pelo governo para coibir o tráfico após 1850. Ver:
RODRIGUES, Jaime. O infame comércio: propostas e experiências no final do tráfico de africanos
para o Brasil (1800-1850). Campinas: Editora da UNICAMP; CECULT, 2000, p. 131-155.
9
CARVALHO, A construção da ordem..., p. 254-255; GRAHAM, Richard. Clientelismo e política
no Brasil do século XIX. Rio de Janeiro: Editora da UFRJ, 1997. Sobre as medidas adotadas
pelo Gabinete de 29 de setembro, ver: MATTOS, O tempo saquarema, p. 183-189. O momento
histórico delineado neste parágrafo não foi isento de tensões e rivalidades partidárias, como
demonstra a análise feita por Tâmis Parron sobre o momento da Conciliação. Ver: PARRON, A
política da escravidão..., p. 276-287. Francisco Iglesias, ao traçar o perfil da “vida política” do
Império do Brasil entre 1848 e 1868, não deixou de salientar as divisões políticas características
do período. Tais dissensões produziram, em muitos momentos, longas séries de gabinetes instáveis.
Ver: IGLESIAS, Francisco. “Vida política, 1848/1868”. In: HOLANDA, Sérgio Buarque de (org.).
História Geral da Civilização Brasileira – O Brasil monárquico: reações e transações, tomo II, vol.
3. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1987, p. 09-112. Já Ricardo Salles observou que após a crise
política de 1868, malgrado o recrudescimento da oposição à hegemonia saquarema, “o sistema
continuou funcionando de acordo com as regras estabelecidas”. Ver: SALLES, Ricardo Henrique.
“O Império do Brasil no contexto do século XIX: escravidão nacional, classe senhorial e intelectuais
na formação do Estado”. Almanack, Guarulhos, UNIFESP, n. 4, 2012, p. 05-45. Um esboço da
oposição à hegemonia saquarema pode ser visto em: CARVALHO, José Murilo de. “As conferências
radicais do Rio de Janeiro: novo espaço de debate”. In: CARVALHO, José Murilo de (org.). Nação
e cidadania no Império: novos horizontes. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2007, p. 17-41.
10
É importante salientar que os efeitos da lei não se restringiram à centralização das atividades policiais
e judiciárias. Para Thomas Flory, a lei de 3 de dezembro provocaria também efeitos eleitorais,
uma vez que os agentes indicados pelo governo central teriam clara influência nas eleições, na
elaboração das listas de votantes, etc. Nesse sentido, esse autor entendeu que após as reformas da
início da década de 1840, passou a vigorar um “novo sistema eleitoral” que estruturou um “sistema
político viável”. Ver: FLORY, El juez de paz..., p. 279-280. Esse autor continua a analisar os efeitos
da lei de 3 de dezembro no capítulo seguinte, denominado “La politica de la justicia, 1841-1871”.
Nesse capítulo, destaca a importância das nomeações e a interferência do governo central nos
interesses locais e na magistratura. O papel dos juízes para garantir as conveniências do governo
central e a utilização política das remoções desses profissionais para localidades distantes foram
práticas que estão intimamente associadas ao funcionamento do sistema político do Império. Ver:
FLORY, El juez de paz..., p. 281-307.
11
Ver a discussão historiográfica sobre esse assunto em: CARVALHO, José Murilo de. “Mandonismo,
coronelismo, clientelismo: uma discussão conceitual”. Dados, Rio de Janeiro, vol. 40, n. 2, 1997, p.
229-250.
12
Correio Paulistano, São Paulo, 24 set. 1873, edição 5113, p. 01.
13
GRAHAM, Clientelismo e política..., p. 48. Esse assunto da dependência que muitos homens livres
tinham com os proprietários poderosos foi trabalhado por Maria Sylvia de Carvalho Franco, que
abordou a questão da dominação pessoal sobre os homens pobres e as estratégias de inserção
desses sujeitos na sociedade escravista da época. Essa autora apontou ainda as consequências
eleitorais dessas práticas de dominação. FRANCO, Maria Sylvia de Carvalho. Homens livres
na ordem escravocrata. São Paulo: Editora da UNESP, 1997, p. 65-113. Sobre as questões do
recrutamento e da força policial e os conflitos que surgiam entre a Assembleia Provincial e o
Presidente da Província, representante do governo central, ver: DOLHNIKOFF, O pacto Imperial...,
p. 191-200 e p. 254-261. Thomas Flory analisou o uso político do recrutamento para fins eleitorais
(ou recrutamento seletivo), prática que pode ser entendida como uma das consequências da lei de
3 de dezembro de 1841. Ver: FLORY, El juez de paz..., p. 292-293.
14
GRAHAM, Clientelismo e política..., p. 100.
15
FLORY, El juez de paz..., p. 244-246; DOLHNIKOFF, O pacto imperial..., p. 100-118; GOUVÊA,
O império das províncias... A expressão “relações entre o ‘local’ e o ‘central’” é empregada, neste
artigo, no sentido de articulação entre os três níveis de governo, quais sejam, o governo imperial, o
governo provincial e o município. Não se pode desconsiderar a política provincial como espaço de
atuação dos potentados locais que lutavam, na Assembleia Provincial, para a garantia dos interesses
de seu município e para a resolução dos conflitos internos entre as diversas facções locais. Para
Thomas Flory, o Ato Adicional de 1834 representou um processo de “centralização intermediária”.
Essa reforma constitucional foi uma resposta dos liberais que se desesperaram em governar o
país sem o controle da justiça local. Em suas palavras, “el echo de conferir esos poderes a los
gobiernos provinciales sólo podría considerasse como una medida descentralizante si el gobierno
central hubiera tenido esos poderes anteriormente”. O estudo de Jonas Marçal de Queiroz mostrou
como os proprietários se organizavam, especialmente com a fundação de Clubes da Lavoura, para
pressionar e cobrar os políticos no âmbito da Província e do governo central. Segundo esse autor,
a ideia de formar Clubes da Lavoura e confederações mais amplas se espalhou no final da década
de 1870. Ver: QUEIROZ, Da senzala à República (especialmente o capítulo III do volume I dessa
dissertação).
16
MUAZE, Mariana. As memórias da viscondessa: família e poder no Brasil Império. Rio de Janeiro:
Jorge Zahar, 2008; SALLES, “O Império do Brasil...”, p. 32. Ricardo Salles menciona os vínculos
que vários importantes homens do Império do Brasil estabeleceram com suas bases políticas e
sociais como, por exemplo, aqueles estabelecidos pelos saquaremas Joaquim José Rodrigues Torres e
Paulino José Soares de Sousa, que se casaram com as filhas do proprietário João Álvares de Azevedo.
Cf. SALLES, “O Império do Brasil...”, p. 08. Sobre o casamento de Paulino e de outros políticos
importantes, ver: CARVALHO, José Murilo de. “Entre a autoridade e a liberdade”. In: CARVALHO,
Jose Murilo de (org.). Visconde do Uruguai. São Paulo: Editora 34, 2002, p. 11-47. Sobre os interesses
recíprocos de fazendeiros de casarem suas filhas e de juízes de aceitarem esse matrimônio, facultando
assim uma ampliação dos contatos dos poderosos da localidade dentro do governo e da burocracia
central, ver: FLORY, El juez de paz..., p. 300-302. Esse autor cita também o exemplo de Paulino e os
do magistrado Albino José Barbosa de Oliveira e de Firmino Rodrigues Silva.
17
Sublinhe-se que esse é o momento da Guerra Civil americana. Os debates sobre esse acontecimento
também repercutiram no meio político brasileiro. Após o término da guerra nos Estados Unidos, D.
Pedro II passou a pressionar os membros mais progressistas dos ministérios e mesmo do Conselho
de Estado para reformar a escravidão. A esse respeito, ver: PARRON, A política da escravidão...,
p. 319-324. Robert Conrad disse que o resultado da Guerra Civil vai enfraquecer a escravatura
no Brasil e despertar a oposição ao trabalho escravo. Sobre a ação de D. Pedro II como reflexo da
situação do trabalho escravo no plano mundial, ver: CONRAD, Os últimos anos..., p. 88-91. Para
um estudo de história comparada em perspectiva atlântica, ver: BERBEL, Márcia; MARQUESE,
Rafael & PARRON, Tâmis. Escravidão e política: Brasil e Cuba, 1790-1850. São Paulo: Hucitec;
Fapesp, 2010. Ver também: ZEUSKE, Michael. “Comparing or interlinking? Economic comparisons
of Early Nineteenth Slave Systems in the Americas in Historical Perspective”. In: DAL LAGO, Enrico
& KATSARU, Constantina (orgs.). Slave Systems: ancient and modern. Cambridge: Cambridge
University Press, 2008, p. 148-183; TOMICH, Dale. Through the prism of Slavery: labor, capital,
and World economy. Boulder: Rowman & Littlefield, 2004, p. 56-71. Sobre a cultura de algodão
na Província de São Paulo e o interesse inglês em propagar o plantio dessa cultura em outras partes
do mundo com o objetivo de se “libertar da dependência quase exclusiva do mercado americano”,
ver: CANABRAVA, Alice P. O desenvolvimento da cultura do algodão na Província de São Paulo
(1861-1875). São Paulo: EDUSP; Associação Nacional de História, 2011. Essa autora analisa a
atuação da “Associação para o Suprimento do Algodão em Manchester”, fundada em 1857, e do
superintendente da estrada de ferro Santos-Jundiaí, Jean Jacques Aubertin, no desenvolvimento
da plantação de algodão na Província de São Paulo na década de 1860. CANABRAVA, O
desenvolvimento da cultura..., p. 79-87.
18
Arquivo do Estado de São Paulo (AESP). Ofícios diversos de Bananal: 1869-1891. Caixa 35.
Ordem 829. Pasta 1. Doc. 14. O ofício está assinado por Francisco Xavier Vahia Durão, Antonio
Caetano de Oliveira Carvalho, Henrique José da Silva, Candido Pereira Leite e João Candido de
Macedo.
19
Inventário de Manoel de Aguiar Vallim de 1878. O presente inventário encontra-se arquivado no
Museu Histórico e Pedagógico Major Dias Novaes, localizado em Cruzeiro, Estado de São Paulo,
Ver Museu Major Novaes (doravante MMN)/ Caixa 170/ nº de ordem 3472. 1° Ofício. Sobre o
casamento de José Leite de Figueiredo, ver: RODRIGUES, Píndaro de Carvalho. O caminho novo:
povoadores do Bananal. São Paulo: Governo do Estado, 1980, p. 135. Sobre a importância da
cidade do Rio de Janeiro, ver também: MATTOS, O tempo saquarema, p. 62-63.
20
Sobre os vínculos entre proprietários de café e comissários e a importância dos créditos agrícolas
para financiar a produção de café, com destaque para a centralidade da Corte, ver: SWEIGART,
Joseph E. Coffee factorage and the emergence of a Brazilian capital market, 1850-1888. Nova York
& Londres: Garland Publishing, 1987, p. 66-186. Sobre os comissários, ver também: FRANCO,
Homens livres...,p. 170-192.
21
FLORENTINO, Manolo. Em costas negras: uma história do tráfico de escravos entre a África e o
Rio de Janeiro. São Paulo: Companhia das Letras, 1997. Dentre esses mecanismos, destacam-se a
propriedade ou locação dos navios envolvidos no tráfico, a formação de estoques de mercadorias
que seriam usadas no escambo na África e a montagem de um “sistema de seguros marítimos” para
garantir a realização de um empreendimento marcado pela insegurança e pelo risco. FLORENTINO,
Em costas negras..., p. 120-137. Sobre a participação dos Estados Unidos no tráfico intercontinental
para o Brasil, ver: MARQUES, Leonardo. “Os Estados Unidos no tráfico ilegal para o Brasil”.
Disponível em: <http://www.escravidaoeliberdade.com.br/site/images/Textos.6/leonardomarques.
pdf>. Acesso em: 30 abr. 2015.
22
Conforme Inventário de 1878. MMN/ Caixa 170/ nº de ordem 3472. O registro sobre a Fazenda da
Bocaina não informou o número de pés de café e nem a quantidade de terras.
23
RAMOS, Agostinho. Pequena História do Bananal. São Paulo: Gráfica Sangirard, 1975, p. 395-396.
Deve-se sublinhar que Nogueira e outros potentados de Bananal participaram do desembarque
de africanos conhecido como “caso Bracuhy”, em 1852. Nesse episódio, Nogueira foi um dos
responsáveis por “distribuir” 250 “negros novos” para outras fazendas do Vale. Sem dúvida que
essa distribuição esteve facilitada pelas suas propriedades em Angra dos Reis, local do desembarque
dos africanos ilegalmente importados. Ver, a esse respeito: LOURENÇO, O Império dos Souza
Breves..., p. 152.
24
Eram eles o Dr. Marcos de Oliveira Arruda, que morava em São Paulo, o Dr. Ignácio José de
Oliveira Arruda, residente em Jundiaí e D. Helena Arruda Barbosa da Silva, casada com João
Barbosa da Silva e Sá e residente em Mar de Espanha, Minas Gerais. A neta chamava-se Alba
Nogueira Arruda, de dezessete anos de idade e filha do finado herdeiro Boas Ignácio de Oliveira
Arruda. MMN/ Caixa 12/ n° de ordem 252. 2° Ofício. Inventário de 1881.
25
TOPLIN, The abolition of slavery…, p. 45-47; CONRAD, Os últimos anos…, p. 103-106. Sérgio
Buarque de Holanda inicia seu livro sobre a Monarquia com esse evento político. Para esse autor,
houve uma “recomposição de forças e programas políticos” a partir de 1868, que vai fazer crescer
a oposição à Monarquia. 1868 teria sido um momento de “clivagem” na história política do regime
de D. Pedro II e marcaria “o ponto de partida mais visível da deterioração do regime”. HOLANDA,
Sérgio Buarque de. O Brasil Monárquico: do Império à República – Tomo II – Vol. 5. Rio de
Janeiro: Bertrand Brasil, 1997, p. 07. Francisco Iglesias entende que 1868 encerrou o período
de esplendor da Monarquia e iniciou o momento de crises que levarão à queda do Imperador D.
Pedro II. Ver: IGLESIAS, “Vida política”, p. 107-112. A ruptura de 1868 foi de fato um dos eventos
mais importantes da história política do Império do Brasil. É possível considerar que a partir desse
momento, por intermédio do Clube Radical – grupo político composto por dissidentes do Partido
Liberal – e da maçonaria, diversos atores importantes que defendiam o fim da escravidão, como
Luiz Gama, Ferreira de Menezes e Rui Barbosa, iniciaram uma militância política mais intensa pela
causa abolicionista. Ver, a esse respeito: AZEVEDO, O direito dos escravos..., p. 107-113.
26
CONRAD, Os últimos anos..., p. 106-116. Ver também: CARVALHO, A construção da ordem..., p.
308.
27
SALLES, E o Vale era o escravo..., p. 81.
28
CONRAD, Os últimos anos..., p. 114-116. Ver também a tabela 21, à página 362. CARVALHO,
A construção da ordem..., p. 308-311. Não se pode deixar de mencionar outras disjunções que
passaram a existir na década de 1860, fruto do recrudescimento do debate político, e que se
tornaram mais explícitas após o evento de julho de 1868. Esse é um ponto importante porque
senão corre-se o risco de simplificar o entendimento do processo político e empobrecer o debate
acerca do mecanismo de funcionamento da política imperial. Nessa época apareceu com força uma
série de discussões acerca de questões que estavam diretamente ligadas às reformas saquaremas
do início da década de 1840 e aos mecanismos de funcionamento da política imperial. Sobre esses
pontos e o fato de o republicanismo ter significado um retrocesso no debate político e na discussão
de reformas, ver: CARVALHO, José Murilo de. “Liberalismo, radicalismo e republicanismo nos anos
sessenta do século dezenove” [working paper]. Oxford: Centre for Brazilian Studies/ University of
Oxford, s./d., p. 01-22. Ver também: SALLES, Ricardo. “Abolição no Brasil: resistência escrava,
intelectuais e política (1870-1888)”. Revista de Indias, Madri, vol. 71, n. 251, 2011, p. 259-284.
As mudanças ocorridas na segunda metade do século XIX foram mais amplas e complexas, e não
podem ser restringidas a esse ou aquele assunto. Essas mudanças provocaram crescente insatisfação
e facultaram o surgimento de uma oposição ao Estado Imperial, à burocracia, ao patronato político,
etc. Ver, a esse respeito: COSTA, Emília Viotti da. “Brasil: a era da reforma, 1870-1889”. In:
BETHELL, Leslie (org.). História da América Latina – Vol. V: de 1870 a 1930. São Paulo: EDUSP;
Imprensa Oficial do Estado; Brasília: Fundação Alexandre de Gusmão, 2002, p. 705-760.
29
A Representação, com apenas 14 assinaturas, foi reproduzida em: CASTRO & SCHNOOR,
Resgate..., p. 245-250. Sobre a oposição dos cafeicultores do Vale do Paraíba à Lei do Ventre
Livre e o contexto geral das representações contrárias ao projeto em discussão, ver: PANG, Laura
Jarnagin. The State and Agricultural Clubs of Imperial Brazil, 1860-1889. Tese (Doutorado em
Filosofia da História). Vanderbilty University. Nashville, EUA, 1980, p. 84-124.
30
A Reforma, Rio de Janeiro, 20 jun. 1871, n. 138, p. 01.
31
IGLESIAS, “Vida política”, p. 112; TOPLIN, The abolition of slavery…, p. 46.
32
CONRAD, Os últimos anos..., p. 116. Conseguimos localizar uma manifestação pública de apoio
ao senador Nabuco de Araújo assinada pelos liberais de Bananal. Tal manifestação, de 1875,
elogia os seus “brilhantes discursos” proferidos no Senado, especialmente aqueles que diziam
respeito “ao projeto da reforma eleitoral”. A “justa manifestação” termina da seguinte maneira: “e
o Partido Liberal deste obscuro canto da nossa terra, [...] associa-se de corpo e alma aos patrióticos
sentimentos de v. ex., seu ilustre chefe, assegurando-lhe toda a sua dedicação na cruzada do futuro,
qualquer que seja o acometimento”. Encabeçava a lista de assinaturas o chefe do Partido Liberal de
Bananal, comendador Antonio José Nogueira. Correio Paulistano, São Paulo, 31 ago. 1875, edição
5669, p. 01.
33
Discussão da Reforma do Estado Servil na Câmara dos Deputados e no Senado. II, Apêndice, p.
151-154.
34
Sobre os conflitos políticos nas décadas finais do Império do Brasil, potencializados pelo movimento
abolicionista, ver: QUEIROZ, Da senzala à República...; VITORINO, Artur José Renda & SOUSA,
Eliana Cristina Batista de. ‘“O pássaro e a sombra’: instrumentalização das revoltas escravas pelos
partidos políticos na província de São Paulo nas últimas décadas da escravidão”, Estudos Históricos,
Rio de Janeiro, CPDOC-FGV, vol. 21, n. 42, 2008, p. 303-322. Para se entender as cruentas
rivalidades entre liberais e conservadores em Bananal, ver: SANTOS, Marco Aurélio dos. “Lutas
políticas, abolicionismo e a desagregação da ordem escravista: Bananal, 1878-1888”. Almanack.
Guarulhos, UNIFESP, n. 11, 2015, p. 732-756.
35
Esse desejo de não interferência do Estado nas relações entre senhor e escravo relaciona-se ao
“princípio da soberania doméstica”. Ver, a esse respeito: MARQUESE, Rafael de Bivar. Feitores do
corpo, missionários da mente: senhores, letrados e o controle dos escravos nas Américas, 1660-
1860. São Paulo: Companhia das Letras, 2004, p. 65-68.
36
Diário do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 22 jun. 1871, n. 171, p. 02. A Representação de Bananal
encontra apoio nas seguintes edições: Diário do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 25 jun. 1871, n. 174,
p. 02 (artigo assinado por “um lavrador”); Diário do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 29 jun. 1871, n.
178, p. 02 (defesa na Câmara dos Deputados em sessão de 28 de junho feita pelo deputado Rodrigo
Silva); Diário do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 27 jul. 1871, n. 206, p. 02 (mais 20 signatários
de Bananal manifestam apoio, totalizando, portanto, 164 assinaturas oriundas de Bananal); Diário
do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 17 ago. 1871, n. 227, p. 03 (apoio à Representação de Bananal
mandada publicar por lavradores e proprietários de São Luiz do Paraitinga, comarca de Paraibuna).
Esses apoios indicam a extensão em que se operava a luta política dos escravistas de Bananal, com
suas ligações na escala da política imperial. Sobre as representações e as tentativas dos proprietários
de se organizarem contra a lei do Ventre Livre, ver o trabalho já citado de Laura Janargin Pang.
37
MENDONÇA, Entre as mãos..., p. 138-159; CONRAD, Os últimos anos..., p. 119-120.
38
TOPLIN, The Abolition of Slavery…, p. 59; CONRAD, Os últimos anos..., p. 145-146.
Considerações Finais
39
CONRAD, Os últimos anos..., p. 351-353, Tabelas 9, 10 e 11. Tal disjunção não deve ser, contudo,
sobrevalorizada. Ela de fato existiu, mas o excelente artigo de Robert W. Slenes acerca do comércio
interprovincial no Brasil após 1850 demonstrou que muitos senhores de engenho do Nordeste
continuaram a comprar escravos na década de 1870 e que batalhas políticas foram travadas no
sentido de frear o tráfico para o Centro-Sul. Sobre esse assunto e o impacto do tráfico interno de
escravos sobre as áreas urbanas, ver: SLENES, Robert W. “The Brazilian internal slave trade, 1850-
1888: regional economies, slave experience, and the politics of a peculiar market”. in: JOHNSON,
Walter (org.). The Chattel Principle: the Internal Slave Trade in the Americas. New Haven & Londres:
Yale University Press, 2004, p. 305-370.
Introdução
1
Mestre em História pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos. Doutorando em História Social pela
Universidade Federal do Rio de Janeiro, com financiamento pela Capes. E-Mail: <msmportugues@
hotmail.com>.
2
Arquivo Nacional. Apelação de Ação de Liberdade. Caixa 3690, nº 13794, 1869. Todas as demais
informações citadas a seguir são provenientes deste processo, salvo nova referência.
3
A lei citada, de 7 de novembro de 1831, determinava que: “Art. 1º. Todos os escravos, que entrarem
no território ou portos do Brasil, vindos de fora, ficam livres. Excetuam-se – 1º) Os escravos
matriculados no serviço de embarcações pertencentes a país, onde a escravidão é permitida,
enquanto empregados no serviço das mesmas embarcações; 2º) Os que fugirem do território, ou
embarcação estrangeira, os quais serão entregues aos senhores que os reclamarem, e reexportados
para fora do Brasil. Para os casos da exceção nº. 1, na visita da entrada se lavrará termo do número
de escravos, com as declarações necessárias para verificar a identidade dos mesmos, e fiscalizar-se
na visita da saída se a embarcação leva aqueles, com que entrou. Os escravos, que forem achados
depois da saída da embarcação, serão apreendidos, e retidos até serem reexportados”. Arquivo
Histórico do Rio Grande do Sul (doravante AHRS). Coleção das Leis e Decretos do Império do
Brasil, 1830/1831, códice 050.
4
Grifos nossos.
5
Arquivo Público do Estado do Rio Grande do Sul (doravante APERS). Livros Notariais de
Transmissão e Notas (doravante LNTN), 1º Tabelionato, Fundo Uruguaiana, livro 6, p. 141r.
6
Grifos nossos.
7
CHALHOUB, Sidney. Machados de Assis historiador. São Paulo: Companhia das Letras, 2003;
SALLES, Ricardo. E o vale era o escravo: Vassouras, século XIX – senhores e escravos no coração
do Império. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2008.
8
Conforme Paulo Moreira, na ata de fundação da Sociedade Libertadora, constava que a mesma era
formada por “cidadãos nacionais e estrangeiros”, estimulados pelo “fim humanitário e patriótico”.
MOREIRA, Paulo Roberto S. Os cativos e os Homens de bem: experiências negras no espaço
urbano. Porto Alegre: EST, 2003, p. 98.
9
GINZBURG, Carlo & PONI, Carlo. “O nome e o como: troca desigual e mercado historiográfico”.
In: GINZBURG, Carlo (org.). A micro-história e outros ensaios. Tradução de António Narino. Lisboa:
Difel; Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1991, p. 169-178; LEVI, Giovanni. “Sobre a micro-história”.
In: BURKE, Peter (org.). A escrita da História: novas perspectivas. Tradução de Magda Lopes. São
Paulo: Editora da UNESP, 1992, p. 133-161.
TABELA 1
POPULAÇÃO ESCRAVA DO RIO GRANDE DO SUL E DE ALEGRETE
1858-187414
- 1858 1874
10
BARTH, Fredrik. O guru, o iniciador e outras variações antropológicas. Organização de Tomke
Lask. Tradução de John Cunha Comerford. Rio de Janeiro: Contracapa, 2000, p. 176.
11
GRAHAM, Richard. “Nos tumbeiros mais uma vez? O comércio interprovincial de escravos no
Brasil”. Afro-Ásia, Salvador, CEAO-UFBA, n. 27, 2002, p. 121-160.
12
“MAPPA Statístico da População da Província classificada por idades, sexos, estados e condições
com o resumo total de livres libertos e escravos”. In: De Província de São Pedro a Estado do Rio
Grande do Sul – censos do RS, 1803-1950. Porto Alegre: Fundação de Economia e Estatística,
1981, p. 65.
13
DIRETORIA Geral de Estatística. Relatório e Trabalhos Estatísticos. Rio de Janeiro: Typographia
Franco-Americana, 1874, p. 184. Disponível em: <http://memoria.nemesis.org.br/trf_arq.
php?a=00017002> Acesso em 08 de jun. de 2011. Para o Censo de 1872, ver: <http://www.
ibge.gov.br/>. Sobre as matrículas de escravos, ver: SLENES, Robert W. “O que Rui Barbosa não
queimou: novas fontes para o estudo da escravidão no século XIX”. Estudos Econômicos, São
Paulo, USP, vol. 13, n. 1, jan./ abr. 1983, p. 117-149.
14
Fontes: para o número de escravos em 1858, “MAPPA Statístico; para o número de escravos em
1874, DIRETORIA, Relatório e Trabalhos...
15
FARINATTI, Luís Augusto E. Confins meridionais: famílias de elite e sociedade agrária na fronteira
sul do Brasil (1825-1865). Santa Maria: UFSM, 2010; MATHEUS, Marcelo Santos. Fronteiras
da liberdade: escravidão, hierarquia social e alforria no extremo sul do império do Brasil. São
Leopoldo: Oikos/Unisinos, 2012.
16
APERS. LNTN, Fundo de Tabelionatos de Alegrete (doravante FA), 1831-1885; APERS. Livros
Notariais de Registros Diversos (doravante LNRD), FA, 1832-1886; APERS. LNRD, Fundo de
Tabelionatos de Quaraí, 1876-1886; APERS. LNRD, Fundo de Tabelionatos de Rosário, 1880-
1885.
17
Conforme Mariana Thompson Flores, esta circular, publicada em 2 de julho de 1856, “decretava
que todos os escravos residentes em países estrangeiros, ou vindos do exterior, que entrassem
no território do Império deveriam ser colocados em liberdade não podendo serem entregues aos
seus antigos senhores”. FLORES, Mariana Flores da Cunha Thompson. “Manejando soberanias: o
espaço da fronteira como elemento na estratégia de fuga e liberdade (relativa) de escravos no Brasil
Meridional na metade do século XIX”. In: V Encontro Escravidão e Liberdade no Brasil Meridional.
Anais. Porto Alegre: UFRGS, 2011, p. 17. Sobre o princípio de “solo livre”, ver: GRINBERG, Keila.
“Escravidão e relações diplomáticas Brasil e Uruguai, século XIX”. In: IV Encontro Escravidão e
Liberdade no Brasil Meridional. Anais. Curitiba: UFPR, 2009.
18
AHRS. Fundo Polícia. Alegrete. Maço 1. Correspondência Expedida, 1856.
19
Na realidade, Venâncio J. Pereira foi um daqueles membros da elite local que circulou por diversos
cargos importantes. Em 1847 ocupou a posição de juiz municipal (suplente) de órfãos e ausentes
no município de Uruguaiana, onde trocou um número bastante considerável de correspondências
com a presidência da província. No mesmo ano e localidade, também foi delegado de polícia. Na
década de 1860 foi eleito algumas vezes vereador em Uruguaiana. Nas décadas de 1870 e 1880
aparece representando, com advogado ou como procurador, uma série de pessoas em processos
judiciais ou negócios de compra e venda de terrenos, por exemplo. Também foi membro da Junta de
Emancipação de Alegrete, que funcionou ao longo da década de 1870. Ver: MATHEUS, Fronteiras
da liberdade...
20
Sobre as Listas de Classificação, ver: SLENES, “O que Rui Barbosa...”. Todas as próximas
informações são retiradas do artigo de Robert Slenes, salvo nova citação. Sobre as listas, ver
também: MARCONDES, Renato L. Diverso e desigual: o Brasil escravista na década de 1870.
Ribeirão Preto: Funpec, 2010.
21
SLENES, “O que Rui Barbosa...”, p. 142.
22
SLENES, “O que Rui Barbosa...”, p. 142.
23
Na lista de Alegrete há a data de encerramento de duas classificações: uma em 18 de novembro
de 1874 e outra em 20 de novembro de 1875. Por isso, alguns escravos foram classificados até três
vezes, sendo estes por nós eliminados.
24
Para a quantidade de escravos matriculados em Alegrete, ver: DIRETORIA, Relatório e Trabalhos...
10 a 19 34 4 421 15,5
25
Fonte: Centro de Pesquisas e Documentação de Alegrete. Lista de Classificação dos escravos para
serem libertados pelo Fundo de Emancipação – Alegrete, 1873-1874.
26
Ou seja, insignificantes 3% de repetidos. Cumpre destacar que essa repetição de escravos também
ocorre quando realizamos uma estrutura de posse a partir de inventários post mortem, por exemplo.
O número de 1.787 escravos advém do fato que somente os cativos com mais
de doze anos, com exceção da jovem Honória, de 11 anos, listada como costureira,
tiveram sua ocupação especificada. Focando apenas nos 682 campeiros (todos do
sexo masculino), temos que, se em relação ao total dos que tiveram sua profissão
indicada eles representam 38%, no que diz respeito apenas aos indivíduos do
sexo masculino, com 12 anos ou mais, eles representam cerca de 70%, isto é, a
absoluta maioria dos escravos do sexo masculino, quando em idade produtiva,
eram destinados à pecuária. Visto isso, passemos para a análise de alguns casos
de cativos que propuseram uma ação de liberdade e, por incrível que pareça,
seus proprietários preferiram não litigar com seus cativos – e o quanto isto está
relacionado com as características da escravidão na região.
27
Fonte: Centro de Pesquisas e Documentação de Alegrete. Lista de Classificação dos escravos para
serem libertados pelo Fundo de Emancipação – Alegrete, 1873-1874.
28
Grifos nossos.
Como é possível observar, Leonardo Ferreira fez questão de deixar claro sua
irritação e seu descontentamento com a ação proposta por Pedro. No texto da
manumissão, ele acusa o escravo de estar mentindo, já que, conforme o indignado
Leonardo, Pedro nunca teria ido ao Estado Oriental (Uruguai).
Outros senhores seguiram o mesmo caminho de Leonardo Ferreira. Em abril de
1879, Antônio Silveira Gomes registrou a alforria do pardo Emeliano, justificando
que assim procedia, pois desejava livrar-se “dos incômodos e despesas de uma
questão judicial, que o referido Emeliano provoca no juízo desta cidade, a pretexto
de ter sua mãe estado no Estado Oriental, segundo alega, e ser-lhe aplicável à Lei
de 07-11-1831”30. Mas o que temiam Antônio Silveira e Leonardo Dias e o Capitão
Azambuja Villanova em enfrentar seu cativo na justiça? Talvez o “incômodo” que
Antônio S. Gomes mencionou estivesse até certo ponto ligado a uma questão mais
prática: o gasto que a contenda judicial provocaria.
Uma informação extraída de um inventário é valiosa para pensarmos esta
questão. Durante a leitura do arrolamento de bens que deixou o finado Agostinho
Dorneles de Souza, um dado nos chamou a atenção. Em uma de suas declarações
ao juiz, a viúva (e inventariante) Senhorinha de Azevedo Dorneles afirmou
que “deixa de dar carregação a escrava Maria Luiza [...] por estar [a escrava]
litigando pela sua liberdade; e mesmo porque não está de posse dela, pois se acha
depositada a mais de dois anos”. Bem mais à frente, o advogado Franklin Gomes
Souto, o mesmo que representou o Capitão Villanova, se diz credor do inventário
na “quantia de 500 mil réis de honorários” por ter vencido “em duas questões
judiciais movidas pela escrava Maria Luiza”31. De fato, dois anos depois de aberto
o inventário, a preta Maria Luiza, de 31 anos, aparece na Lista de Classificação
pertencendo à “herança de Agostinho Dorneles de Souza”32. A título de exemplo,
a média do preço das dezoito alforrias pagas (em que consta o valor) por mulheres,
em Alegrete, durante a década de 1870 é de 562 mil réis. Ou seja, o valor gasto
por Agostinho Dorneles na contenda com Maria Luiza foi bastante significativo33.
29
APERS. 1º Tabelionato, Fundo Uruguaiana, livro 7, p. 91v. (grifos nossos)
30
APERS. LNRD, 1º Tabelionato, FA, livro 9, p. 8r (grifos nossos)
31
APERS. Inventários post mortem. Alegrete, Acondicionador 009.0193, Processo nº 347, 1873.
32
Centro de Pesquisas e Documentação de Alegrete. Lista de Classificação dos escravos para serem
libertados pelo Fundo de Emancipação – Alegrete, 1873-1874.
33
Certamente variáveis como idade, relação dos cativos com o senhor, ocupação do escravo, dentre
outras, interferiam no valor dos escravos. Fizemos este cálculo apenas para termos uma estimativa
do significado daquela quantia paga ao advogado – cálculo que foi possível graças ao trabalho
realizado pelo APERS e seus estagiários, em que todas as cartas de alforria para a província foram
coletadas e publicadas. Sobre isto, ver: RIO GRANDE DO SUL. Secretaria da Administração e
dos Recursos Humanos. Departamento de Arquivo Público. Documentos da escravidão: catálogo
seletivo de cartas de liberdade. Acervo dos tabelionatos do interior do Rio Grande do Sul. Porto
Alegre: CORAG, 2006.
34
GRINBERG, Keila. O fiador dos brasileiros: cidadania, escravidão e direito civil no tempo de
Antonio Pereira Rebouças. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002, p. 201; nota 18, p. 225.
35
Grifos nossos. AHRS. Documentação da Justiça. Alegrete. Juízo Municipal de Órfãos, agosto de
1867.
Enfim, àqueles escravos que alguma vez tivessem sido levados pelos seus senhores
para o Estado Oriental e, depois, retornado, abriu-se uma boa possibilidade de
alcançar a liberdade. Acreditamos que para aqueles que contavam com um amplo
leque de relações sociais, este caminho ficou um tanto menos difícil, ainda mais
que, chegando à justiça, esta lhes garantia alguém que os representasse – fosse qual
fosse a justificativa em prol da liberdade, e não somente ter ido ao Estado Oriental.
Com os senhores não funcionava desta forma. Quando um cativo entrava na justiça
em busca da liberdade, o seu proprietário tinha que contratar um advogado ou um
solicitador (indivíduo com permissão para representar outras pessoas perante a
justiça), o que às vezes podia ser bem complicado.
Isto ficou muito claro quando encontramos um número bastante razoável
de procurações nos livros de notas de Alegrete. Nestas, geralmente o senhor
de um escravo que litigava por sua liberdade delegava poderes para alguém
representá-lo no processo (como o fez João Xavier de Azambuja Villanova,
narrado anteriormente). Foi o caso de Dona Cândida Carolina Braga e seu filho
Serafim Luís de Meneses, que em novembro de 1878 passaram uma “Procuração
Especial”, na qual nomeavam e constituíam seu procurador na cidade de Alegrete
e seu Termo o solicitador Simeão Estelita da Cunha Soares para representá-los “na
ação de liberdade que lhe move sua escrava crioula de nome Cristina”37. Em julho
de 1881, Adolfo Telles de Souza instituiu ao Major Venâncio José Pereira (sim,
aquele mesmo que em 1856, então delegado de polícia, fez o questionamento
ao presidente da província quanto à condição dos escravos que atravessavam a
36
Grifos nossos. AHRS. Documentação da Justiça. Alegrete. Juízo Municipal de Órfãos, setembro
de 1867. Poderia citar outros casos iguais aos de Rosa Maria e Maria Estácia, mas em função do
espaço, fico por aqui nos exemplos.
37
APERS. LNTN, 2º distrito, FA, livro 2, pp. 87r e 87v. Como esta, encontramos mais sete procurações
de senhores que passaram poderes para serem representados em primeira instância.
38
APERS. LNTN, 2º Tabelionato, FA, livro 13, p. 78r.
39
Grifos nossos. APERS. LNTN, 2º Tabelionato, FA, livro 13, p. 101v.
40
APERS. Registro de Testamento, Uruguaiana, Cartório de Provedoria, Processo nº 133, Ubaldina
Rodrigues Barbosa Braga, 1877.
41
Grifos nossos. APERS. LNRD, 1º Tabelionato, FQ, livro 1, p. 24r.
42
Grifos nossos. APERS. LNTN, 2º Tabelionato, FA, livro 14, p. 86r.
Considerações finais
43
Não deixa de ser curioso verificar que Antônio Silveira alforriou, “sem ônus algum”, a mãe de
Emeliano, a crioula Maria Rita, de 36 anos, cerca de um ano e meio antes de sua contenda com
Emeliano. APERS. LNRD, 1º Tabelionato, FA, livro 8, p. 33r.
44
APERS. Registro de Testamento, Alegrete, Estante 67, Maço 5, Processo nº 149, Ana Maria do
Nascimento Rosa, 1871.
45
APERS. Inventários post mortem, Alegrete, Cartório de Órfãos e Ausentes, Estante 11, Maço 25,
Processo nº 336, 1872.
46
Grifos nossos. A motivação da ação movida pela família de Maurício era a dele “ser reconhecido
liberto sobre o fundamento de ter sua finada mãe residido algum tempo na República Oriental em
companhia de seus senhores, muito depois do ano de 1831”. APERS. LNRD, 1º Tabelionato, FA,
livro 7, p. 27r.
47
Arquivo da Diocese de Uruguaiana. Registros de Batismo da Igreja de Alegrete. Livro 2, pp. 132v,
204v e 398v e Livro 3, p. 44.
48
GÓES, José Roberto. O cativeiro imperfeito: um estudo sobre a escravidão no Rio de Janeiro da
primeira metade do século XIX. Vitória: Lineart, 1993, p. 118.
49
Mapa elaborado a partir do original da Fundação de Economia e Estatística referente aos limites
municipais do Rio Grande do Sul em 1872. Fonte: De Província de São Pedro...
O dia era 17 de junho de 1865, e o Dr. Antonio da Cruz Cordeiro2 foi aplaudido
de pé pelo público que lotava o teatro de São João, em Salvador, na província
da Bahia. A peça de sua autoria era um drama intitulado Prólogo da Guerra ou o
Voluntário da Pátria, que contava a história do homem, pai de família, irmão, filho,
esposo, que vai ao campo de batalha, como voluntário, em um ato considerado de
defesa da pátria e amor ao Brasil. O teatro estava todo ornamentado e recebeu um
grande público que foi prestigiar o médico. Ao final da peça, o Dr. Cruz Cordeiro foi
homenageado com uma coroa de flores e uma poesia, de Francisco Muniz Barreto,
para o homem que fez um “honroso trabalho de uma inteligência esclarecida e
um coração patriótico”. Após as apresentações formou-se uma grande fila e a
plateia se acotovelava para parabenizar o autor dos versos que em nome “da glória
nacional” representou os brios de um “povo livre e independente”. Alguns jornais
da Bahia teceram elogios e dirigiram felicitações àquele que conseguiu desenhar o
quadro do ser voluntário na guerra do Paraguai (1864-1870). Segundo as críticas
do Diário da Bahia:
1
Doutora em História pela Universidade Federal de Pernambuco. Pós-Doutora em História pela
Universidade Federal de Minas Gerais. Professora Adjunta do Departamento e do Programa de Pós-
Graduação em História da Universidade Federal da Paraíba. E-Mail: <[email protected]>.
2
Também conhecido como Dr. Antonio da Cruz Cordeiro Sênior, vale lembrar que a denominação
Sênior fora acrescida após o nascimento do seu filho, Antonio da Cruz Cordeiro Júnior, na cidade
da Parahyba, em 1859. A denominação foi importante para diferenciá-los, pois o filho também se
tornou médico e escrevia nos jornais da cidade.
3
Grifos meus. Diário da Bahia, Salvador, n. 138, jul. 1865.
4
Vale lembrar que o Corpo de Voluntários da Pátria foi criado em janeiro de 1865, pois no início da
luta armada não havia um efetivo militar suficiente para representar o Brasil. Segundo os dados da
época, a Paraíba teria enviado cerca de três mil homens para guerra, entre índios, escravos libertos
e homens livres.
5
Interessante que mesmo durante a guerra, no período em que estava no campo de batalha, o
Dr. Cruz Cordeiro continuou como deputado pelo Partido Liberal. MARIZ, Celso. Memória da
Assembléia Legislativa. 2. ed. João Pessoa: Assembleia Legislativa, 1987 [1946]; BITTENCOURT,
Liberato. Homens do Brasil – vol. II: parahybanos ilustres. Rio de Janeiro: Gomes Editora, 1949.
6
SCHMDIT, Benito Bisso. “História e biografia”. In: CARDOSO, Ciro Flamarion & VAINFAS,
Ronaldo (orgs.). Novos domínios da História. Rio de Janeiro: Campus; Elsevier, 2012, p.187-205.
7
BERNSTEIN, Serge. “A cultura política”. In: RIOUX, Jean-Pierre & SIRINELLI, Jean-François
(orgs.). Para uma história cultural. Tradução de Ana Moura. Lisboa: Estampa, 1998, p. 349-364.
8
O general e médico Alberto Martins da Silva, membro da Academia de História Militar do Brasil e
Academia Brasileira de Medicina Militar, escreveu texto, intitulado “Memória”, no qual apresenta
uma pequena biografia do Dr. Cruz Cordeiro Sênior, disponível no Portal Médico (ver em: <http://
www.portalmedico.org.br/>). Ver também: BARBOSA, Socorro de Fátima Pacífico (org.). Pequeno
dicionário dos escritores/ jornalistas da Paraíba do século XIX: de Antonio da Fonseca a Assis
Chateaubriand. João Pessoa: PPGL-UFPB, 2009. Disponível em: <http://www.cchla.ufpb.br/
jornaisefolhetins/>.
9
O Publicador, Cidade da Parahyba, 02set.1864, n. 600, p. 04. O Publicador, anos de 1864, 1865,
1866, 1867. Disponível em: <http://memoria.bn.br/>. Acesso em: 14 mar. 2015.
10
Segundo dados do Corpo de Saúde do Exército, outro paraibano que atuou na guerra do Paraguai
no batalhão composto de Segundos Cirurgiões foi o médico tenente Jacynto Silvano de Santa
Rosa. Já como cirurgião-mor de Brigada, também serviu na guerra o Major Dr. Tomaz Cardoso de
Almeida. Ver: ALMANAK administrativo, mercantil e industrial da Corte do Rio de Janeiro. Rio de
Janeiro: Eduardo & Henrique Laemmert, 1865, p.279-282.
11
O Jornal do Recife noticiava a chegada do vapor “Paraná” com várias pessoas que seguiam para
o Rio de Janeiro, dentre elas o médico Cruz Cordeiro, sua esposa e três filhos. Jornal do Recife,
Recife, 20 maio de 1865, p.2.
12
MARTINS, Maria Fernanda. “O círculo dos grandes: um estudo sobre política, elites e redes no
segundo reinado a partir da trajetória do visconde do Cruzeiro (1854-1889)”. Revista de História.
Juiz de Fora, vol. 13, n. 1, 2007, p. 93-122. Disponível em: <http://www.ufjf.br/>. Acesso em: 14
mar. de 2015.
13
CASTRO, Oscar. Medicina na Paraíba: flagrantes da sua evolução. João Pessoa: A União, 1945,
p.46.
14
O jornal O Publicador foi fundado em 1861, pelo tipógrafo José Rodrigues da Costa, teve como
redator editor o padre Lindolfo Correia das Neves e publicava-se diariamente. Para os anúncios
eram cobrados os valores de 400,00 réis por linha e 100,00 para os não assinantes, também o
valor de 100,00 réis para os “avulsos”, com pedido de espera. De tendência liberal, o jornal fazia
oposição ao conservador Jornal da Parahyba, este fundado pelo senador Frederico de Almeida
e Albuquerque e que tinha como redatores Silvino Elvídio Carneiro da Cunha (futuro barão de
Abiahy) e o padre Meira, tendo funcionado de 1862 até 1890. ARAÚJO, Fátima. Paraíba: imprensa
e vida. João Pessoa: Editora Ilustrada, 1986, p. 37.
15
Jornal criado e dirigido por Eugênio Toscano de Brito. Para maiores esclarecimentos, ver:
BARBOSA, Pequeno dicionário..., p.36.
16
SILVA, Carolina Paes da. A trajetória d’O Republico do Primeiro Reinado e início da Regência:
os discursos impressos de Borges da Fonseca sobre a política imperial (1830-1832). Dissertação
(Mestrado em História). Universidade Federal Fluminense. Niterói, 2010, p. 14.
17
Fonte: CASTRO, Medicina na Paraíba..., s. p.
18
No final do livro Batalha do Humaytá o autor apresenta os seus livros com os devidos valores:
Impressões da epidemia1 volume com 300 páginas (brochado 2$00 e encadernado 3$000);
Prólogo da Guerra ou Voluntário da Pátria 1 volume 170 páginas (brochado 2400 e encadernado
2$60); Estudo Biographico acompanhado de Alguns Estudos Oratórios do Vigário Marques 1
volume 304 páginas (brochado 2$500 e encadernado 3$200); Episodio da Esquadra Brasileira em
10 de Fevereiro – batalha de Humaytá. Poesia 1 folheto (500 réis). Todos a venda na Botica na rua
da Arêa n. 100 e na casa 43 da mesma rua. CORDEIRO, Antonio da Cruz. Batalha de Humaytá.
Cidade da Parahyba: Typographia Liberal Parihybana, 1869, p.399.
19
“HEALTH Public”. British Medical Journal, Londres, 14 jul.1894, p.107.
20
CORDEIRO, Antonio da Cruz. Instruções sanitárias populares, acompanhadas de prescrições
medicas para o caso de manifestar-se entre nós a epidemia do Cholera- Morbus. Parahyba: Typ. de
J. R. da Costa,1862, p. 01-04.
21
No relatório do Presidente da Província Antonio da Costa Pinto consta um quadro, intitulado
“Mapa da Mortalidade occasionada pelo choleramorbus na Provincia da Parahyba do Norte de
janeiro a junho de 1856”, com o total de 25.390 mortos.
22
CORDEIRO, Instruções sanitárias..., p. 04. Os principais sintomas do cólera eram o vômito, diarreia
e a supressão da urina, um diagnóstico que muitas vezes significava a morte. MARIANO, Serioja
R. C. & MARIANO, Nayana R. C. “O medo anunciado: a febre amarela e o cólera na província da
Paraíba (1850-1860)”.Fênix– Revista de História e Estudos Culturais, Uberlândia, UFU, vol. 9,ano
IX, n. 3,set./ dez. 2012,p. 01-20. Disponível em: <http://www.revistafenix.pro.br>.
23
Essas instruções foram enviadas ao presidente da província, Francisco de Araújo Lima, em 30 de
janeiro de 1862. CORDEIRO, Instruções Sanitárias Populares...1862, p.3.
24
Francisco de Araújo Lima foi presidente da província da Paraíba de maio de 1861 até fevereiro de
1864. “Relatorio apresentado a Assembléa Legislativa Provincial da Parahyba do Norte pelo exm.
sr.dr. Francisco d’Araujo Lima na abertura da sessão ordinaria de 1863. Parahyba, Typ. Parahybana,
[n.d.]” Relatórios dos Presidentes de Província da Paraíba. Disponível em: http://www.crl.edu/brazil/
Vale salientar que no ano de 1863, período em que ocorreu essa disputa política,
28
DOLHNIKOFF, Miriam. O pacto imperial: origens do federalismo no Brasil do século XIX. São
Paulo: Globo, 2005, p.107-108.
29
GRAHAM, Richard. O clientelismo e a política no século XIX. Tradução de Celina Brandt. Rio de
Janeiro: Editora da UFRJ, 1997, p. 156.
30
Para maiores esclarecimentos sobre o processo eleitoral na Paraíba nesse período, ver: SEGAL,
Myraí Araújo. Nas teias do poder: as elites paraibanas e a construção do Estado Nacional Brasileiro
(1840-1889). Monografia (Graduação em História). Universidade Federal da Paraíba. João Pessoa,
2014, p. 29-30.
31
MARIZ, Celso. Apanhados históricos da Paraíba. 2.ed. João Pessoa: Ed.Universitária/UFPB, 1980
[1922].
32
ARAÚJO, Nas teias..., p. 30. O presidente Araújo Lima foi exonerado por decreto de 23 de janeiro
de 1864, mas foi apenas em fevereiro que ele de fato deixou o cargo.
33
Ainda faziam parte do Diretório Liberal: Dr. João Leite Ferreira, Capitão Antonio da Costa Moura,
Dr. Francisco Alves de Souza Carvalho, Major Felinto Leoncio Victor Pereira, Dr. Jerônymo Cabral
Rodrigues Chaves, Tenente Coronel Antonio Vicente de Magalhães, Dr. Vicente do Rego Toscano
de Brito e o Capitão Simplício Narciso de Carvalho. O Publicador, 23 agos./1872. p.02.
34
Jornal do Recife, Recife, n. 187, 13agos./1868, p. 02.
35
CARVALHO, José Murilo de. A Construção da ordem: a elite política imperial; Teatro das Sombras:
a política imperial. 3ª Ed. Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 2007 [1980].
Após essas disputas de poder na política imperial, o Dr. Cruz Cordeiro adentrou
no cenário da guerra do Paraguai. Mesmo antes de chegar ao campo de batalha,
ainda em 1865, escreveu O Prólogo da Guerra ou o Voluntário da Pátria, texto
que mais tarde se transformou em peça de teatro.Com a publicação do poema
nos jornais do Rio de Janeiro, Recife, Alagoas, Paraíba, entre outras províncias,
e, diante do contexto de exaltação do patriotismo da guerra, o texto fez muito
sucesso, sendo em seguida transformado em peça de teatro. A peça foi encenada
na capital da Paraíba, no dia 25 de março de 1866, e o texto foi considerado, nas
publicações dos jornais, um ensaio dramático em versos, composto em três atos.
Em outubro de 1865 o jornal O Publicador noticiava:
36
Grifos meus. O Publicador, Cidade da Parahyba, 20 de out. 1865, p.03.
O Voluntario
37
Grifos de Cruz Cordeiro. O Publicador, Cidade da Parahyba, n. 846, 20 de out. 1865, p. 03.
Sabemos que esse tipo de escrita era mais uma ferramenta utilizada para tentar
convencer a população para se alistar, ou aceitar o recrutamento, para a guerra.
Com um sentimento de apelo ao patriotismo, os versos mostram o heroísmo
daqueles que mesmo estando longe dos seus entes queridos, estão ali por uma
“causa maior”, a defesa da pátria contra os povos “bárbaros”, os paraguaios. Nos
impressos que circulavam na Paraíba, de 1865 a 1870, eram divulgadas notícias
da guerra como: as deserções, as fugas, as doenças, entre outras. Com o tempo e
a guerra se prolongando, os pedidos de liberação para não lutar eram recorrentes,
um dos motivos alegados era a doença, uma estratégia muito usada para conseguir
38
O Publicador, Cidade da Parahyba, n. 846, 20 de out. 1865, p. 03.
39
O Publicador, Cidade da Parahyba, n. 846, 20 de out. 1865, p. 03.
40
Grifos meus. Informação publicada n’O Publicador, Cidade da Parahyba, n. 846, 20 de out. 1865,
p. 03.
41
CORDEIRO, Antonio da Cruz. Estudos biographicos: o vigário Joaquim Antonio e algumas de suas
peças oratórias. Parahyba: Typographia Liberal parahybana, 1866, p.IX.
42
Felizardo Toscano de Brito foi vereador, deputado provincial, deputado geral, vice-presidente da
província,tendo assumido o cargo por duas vezes. Era um dos fundadores e líderes do Partido
Liberal na Paraíba. Estudou na Faculdade de Direito de Olinda, uma formação acadêmica que
mostra como a elite política trilhava determinados caminhos para se manter no protagonismo da
cena política.
O livro A Batalha de Humaytá44 foi publicado em 1869, sendo recitado pela atriz
Izabel Cândido, no Teatro Phenix, na noite de 8 de outubro de 1873 e, na época,
as famílias se reuniam em suas casas para ouvir os dramas e patriotismo da guerra.
Diz alguns trechos do poema:
43
GRAHAM, Clientelismo e política..., p.15. Linda Lewin mostra como esse tipo de relação, bem como
os laços de parentesco foram importantes na configuração da política na província da Paraíba, entre
outras. Para maiores esclarecimentos acerca dessa temática, ver: LEWIN, Linda. Política e parentela
na Paraíba: um estudo de caso da oligarquia de base familiar. Tradução de André Villa Lobos. Rio
de Janeiro: Record, 1993; MARIANO, Serioja Rodrigues C. Gente opulenta e de boa linhagem:
família e relações de poder na Paraíba (1817-1824). João Pessoa: Editora da UFPB, 2013.
44
No discurso de posse de Higino da Costa Brito na Academia Paraibana de Letras, em 1947, o
Dr. Cruz Cordeiro foi citado como sendo “um patriota tão grande quanto o médico” e foram lidos
alguns trechos sobre a guerra, do livro A Batalha de Humaytá. BRITO, Higino da Costa.“Discurso
de Posse”. Revista da Academia Paraibana de Letras, João Pessoa, APL, ano I, n. 2, 1947. Cruz
Cordeiro é Patrono da Cadeira n. 11 da Academia Paraibana de Letras, ocupada atualmente pelo
professor José Jackson Carneiro de Carvalho, e da Cadeira n. 03, e da Academia Paraibana de
Medicina, ocupada hoje pelo médico Augusto de Almeida Filho.
Humaytá é um rochedo...
Que tem aos pés um torpedo
E amedronta as nações...
...........................................
Não faltava cousa alguma
Quando o Barão de Inhauma
Disse ao Delphim...Marchai...
O moço marchou adiante
Altivo como um gigante
Pr’as terras do Paraguay.45
45
BRITO,“Discurso de Posse”; e CASTRO, Medicina na Paraíba..., p.47.
46
CORDEIRO, Antonio da Cruz. A poesia- A Batalha de Humaytáe a Crítica lançada no Jornal
da Parahyba: análise publicada pelo Despertador, pelo Dr. Antonio da Cruz Cordeiro. Cidade da
Parahyba: Typographia Liberal Parahybana, 1869.
47
CORDEIRO, A poesia..., p. 08-09.
Continua reafirmando, ao longo do texto, que tudo não passa de uma disputa dos
seus adversários políticos do partido conservador. Não se pode esquecer que essas
acusações já vem, pelo menos, desde o início da década de 1860, principalmente
em 1863, com as acusações de que o médico havia feito um soneto contra o
então presidente da Paraíba, Araújo Lima, como já foi apontado anteriormente.
Um soneto que estava assinado por um tal de Bustamente.
Na publicação, os escritos de Cruz Cordeiro são vistos como um texto com “erro
de poética, de metricaficação da gramática”, na construção da estrutura dos versos,
inclusive de plágio. Acusação que deixou o médico indignado a ponto de escrever
um longo texto no jornal O Despertador de 11 de janeiro de 1869, respondendo
ao que ele acreditava ser um artigo com uma “linguagem baixa e de má fé”, um
texto cheio de calúnia escrito pelos seus adversários. As críticas foram assinadas
por Gustavo Bustamente, segundo o médico, esse nome seria um pseudônimo.
Na parte “Artigo III”, o Dr. Cruz Cordeiro diz que vai fazer algumas considerações
específicas acerca do que foi publicado no Jornal da Parahyba. O autor começa a
narrar o que considerava um dos acontecimentos mais esplêndidos da guerra, a
Batalha do Humaytá, ocorrida em 19 de fevereiro de 1868. Cruz Cordeiro continua
rebatendo a fala do Sr. Crítico (codinome Bustamente), por fazer correções
gramaticais e diz que o Sr. Crítico“é um ignorante” que não conhece os princípios
básicos da versificação. Ao longo dos outros artigos tece uma série de comentários
desqualificando os argumentos apresentados no Jornal da Parahyba,
48
CORDEIRO, A poesia..., p.20.
49
CORDEIRO, A poesia..., p.211.
Considerações Finais
50
O Publicador, Cidade da Parahyba, 03 de jul.1865, ano IV, n. 846, p. 03.
RESUMO ABSTRACT
No ano de 1865 o médico paraibano Antonio In the year 1865, Dr. Antonio da Cruz Cordeiro,
da Cruz Cordeiro, foi homenageado no teatro a physician who was born in province of
São João na cidade de Salvador (BA), após a Paraíba, was honoured at São João Theatre
apresentação de seu poema intitulado Prólogo in the city of Salvador, Bahia Province capital,
da Guerra ou o Voluntário da Pátria. Um drama after the presentation of his poem titled Prólogo
que virou peça de teatro e recebeu críticas de da Guerra ou O Voluntário da Pátria (“War
vários jornais, inclusive na província da Paraíba. Prologue or The Nation Volunteer”). A drama-
Portanto, através análise de jornais do século turned-play and received criticism from several
XIX, fragmentos de biografias, relatórios de newspapers, including at Paraíba province.
presidentes de província, poemas publicados Therefore, through the analysis of 19thcentury
pelo autor, entre outras fontes, este texto, com newspapers, biographies fragments, provincial
base na História Cultural e o conceito de Culturas president’s reports, and poems published by
Políticas, tem por objetivo analisar a trajetória do Cordeiro, among other sources, this paper,
Dr. Antônio da Cruz Cordeiro. Um homem das based on the ideas of Cultural History and the
letras que se destacou nos seus escritos acerca concept of Political Cultures, aims to analyse the
do cólera, foi deputado provincial pelo partido trajectory of this man. He was a man of letters
liberal, diretor do Hospital da Misericórdia, who stood out in his writings about the cholera,
voluntário na guerra do Paraguai (1864-1870), was provincial deputy for the Liberal Party,
escrevendo dois poemas que se destacaram director of Misericórdia Hospital, volunteer in
nos impressos da época: Prólogo da Guerra the Paraguayan War (1864-1870), writing two
ou o Voluntário da Pátria (1865) e Batalha de poems that stood out on these days: Prólogo da
Humaytá (1868). Guerra ou O Voluntário da Pátria (1865) and
Batalha de Humaytá(“Humayta Battle”, 1868).
Palavras Chave: Culturas Políticas; Trajetória;
Paraíba. Keywords: Political cultures; Trajectory; Paraíba.
1
Doutora em História Social pela Universidade de São Paulo. Professora Assistente dos Cursos de
Graduação em História e em Geografia (Campus Experimental de Ourinhos) e do Programa de
Pós-Graduação em História (Campus de Assis) da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita
Filho. Coordenadora do Centro de Documentação e Memória – CEDOM/UNESP. Líder do Grupo
de Pesquisa Patrimônios (UNESP/ Diretório CNPq) e vice-líder do Grupo de Pesquisa História &
Música (UNESP/ Diretório CNPq). E-Mail: <[email protected]>.
2
Doutorando em História das Ciências e da Saúde na Fundação Oswaldo Cruz. Bolsista Fiocruz.
E-Mail: <[email protected]>.
3
STEPAN, Nancy. A hora da eugenia: raça gênero e nação na América Latina. Rio de Janeiro:
Editora Fiocruz, 2005, p. 30.
4
“Grupos humanos” são entendidos por nós como povos de diferentes localidades com os quais
Galton esteve em contato. Como o próprio autor os diferenciará segundo critérios estéticos,
preferimos a adoção deste termo.
5
BOURDIEU, Pierre. “A ilusão biográfica”. In: FERREIRA, Marieta de Moraes e AMADO, Janaina.
(orgs.). Usos & abusos da história oral. 8. ed. Rio de Janeiro: FGV, 2006, p. 190.
6
Para uma melhor descrição sobre o desenvolvimento do termo e suas aplicações ver: BOURGUET,
Marie-Noëlle. “The explorer”. In: VOVELLE, Michel (org.). Enlightenment portraits. Chicago:
University of Chigago Press, 1997, p. 257-260.
7
GALTON, Francis. Narrative of an explorer in Tropical South Africa. Londres: John Murray,
Albemarle, 1853, p. VII.
8
GALTON, Francis. Memories of my life. Londres: Methuen & Co., 1908, p. 84-85; KEVLES, Daniel
J. In the name of eugenics: genetics and uses of human heredity. Berkeley e Los Angeles: University
of California Press, 1985, p. 06.
9
KEVLES, In the name of eugenics…, p. 06.
10
CAPEL, Horacio. Filosofía y ciencia en la Geografía contemporánea: una introduccíon a la
Geografía. Barcelona: Barcanova Temas Universitarios, 1998, p. 174.
11
CAPEL, Filosofía y ciencia…, p. 177; GEBARA, Alexsander Lemos de Almeida. A África presente
no discurso de Richard Francis Burton: uma análise da construção de suas representações. Tese
(Doutorado em História Social). Universidade de São Paulo. São Paulo, 2006, p. 106.
Como fora no século anterior, esta fase do XIX esteve aberta às explorações de
12
DOMINGUES, Ângela. “O Brasil nos relatos de viajantes ingleses do século XVIII: produção de
discursos sobre o Novo Mundo”. Revista Brasileira de História, São Paulo, ANPUH, vol. 28, n. 55,
2008, p. 148.
13
GEBARA, A África presente..., p. 110.
14
KURY, Lorelai. “Auguste de Saint-Hilaire, viajante exemplar”. Intellèctus, Rio de Janeiro, UERJ, vol.
2, n. 1, 2003, p. 01.
15
KURY, “Auguste de Saint-Hilaire...”.
16
A autora versa sobre o sentido de “filantropia” na atitude de alguns naturalistas em estar colaborando
para a humanidade como um todo por meio do seu trabalho. KURY, “Auguste de Saint-Hilaire...”,
p. 09-10.
17
CAPEL, Filosofía y ciencia..., p. 178.
18
CARNEIRO, Henrique Soares. “O múltiplo imaginário das viagens modernas: ciência, literatura e
turismo”. História: questões e debates, Curitiba, UFPR, n. 35, 2001, p. 231.
19
HOBSBAWM, Eric J. A era das revoluções: 1789-1848. Tradução de Marcus Penchel. 32. ed. Rio
de Janeiro: Paz e Terra, 2014, p. 431.
20
FERREIRA, Lúcio Menezes. “Ciência nômade: o IHGB e as viagens científicas no Brasil imperial”.
História, Ciências, Saúde – Manguinhos, Rio de Janeiro, Fiocruz, vol. 13, n. 2, 2006, p. 275.
21
GALTON, Memories of my life, p. 121.
22
HOBSBAWM, Eric J. A era do capital: 1848-1875. Tradução de Luciano Costa Neto. 21. ed. Rio
de Janeiro: Paz e Terra, 2014, p. 89.
23
Cf.: GALTON, Francis. Narrative of an explorer in Tropical South Africa. Londres: John Murray,
Albemarle, 1853. Ilustrações. Também é possível encontrar a imagem no sítio disponível em:
<http://www.galton.org/>. Acesso em: 29 abr. 2014.
Galton, em seu turno, expressou sua opinião sobre seu novo companheiro
de viagem da seguinte maneira: “I now began my preparations in good earnest.
Mr. Andersson, a Swedish gentleman and a naturalist, consented to accompany
me; and to his perseverance and energy I have since been in the highest degree
indebted”25. Pela parceria que mantiveram, Andersson é citado dezenas de vezes
no livro durante a narrativa da viagem. Posteriormente, ao chegarem à Cidade
do Cabo, África do Sul, no início de 1850, Galton e Andersson dirigiram-se para
Walfisch Bay onde se aproximaram da população Hotentotes, do qual tiveram
contato e certo tipo de ajuda.
O que pode ser notado nos meses iniciais da estadia de Galton na região é
a dificuldade com a adaptação climática bem como o receio dos animais locais.
Leões, por exemplo, percorrem grande parte das preocupações ao longo dos seus
escritos. Há também extensas descrições do contato com diversos povos como
Namaquas, Damaras e Ovampos. Abaixo se configura o trajeto da viagem do
explorador inglês ilustrado em suas memórias.
24
ANDERSON, Benedict R. Comunidades imaginadas: reflexões sobre a origem e a difusão do
nacionalismo. Tradução de Denise Bottman. São Paulo: Companhia das Letras, 2008, p. 21.
25
GALTON, Narrative of an explorer…, p. 02-03.
26
GALTON, Memories of my life…, p. 121; Cf.: GALTON, Narrative of an explorer…, Ilustrações.
27
GALTON, Narrative of an explorer…, p. 10.
Esta parece ser a única vez que Galton se preocupa em relatar as crenças
mitológicas dos habitantes. Ao que tudo indica nas fontes, os animais “reais” são
muito mais sedutores do que os “lendários”. Quanto à vida animal, a narrativa
de Galton é riquíssima, mas diante a impossibilidade em tratar em um único
artigo todos eles, selecionamos quatro, divididos em três grupos. O primeiro
seria composto pelo fator do medo de ataques (leões), o segundo atribuímos a
característica da necessidade de alimentação (girafas) e o terceiro a curiosidade
quanto ao animal (elefantes e rinocerontes). Forjamos esta nomenclatura para
facilitar o entendimento dos grupos que queremos destacar.
O medo de ataques de leões aparece em quase toda a narrativa. Galton
nitidamente preocupa-se com a possibilidade de ataques. Como viajavam com
grande quantidade de bois e outros animais, os ataques pareciam ser mais
intensificados por conta da fome dos leões. Apesar de sua preocupação, há algumas
situações em que teve que se confrontar diretamente com um desses animais30.
28
GALTON, Narrative of an explorer…, p. 283.
29
GALTON, Narrative of an explorer…, p. 283-284.
30
Segue o relato de seu quase enfrentamento com um dentre as dezenas de leões que encontrou em
sua estadia na África: “Andersson had gone to the other side of the river to reconnoiter something,
and I left my guns, &c., at the bottom of the rock, with Stewartson and the men, and ran up to fetch
the meat. I was busy tugging out the last shoulder of my trusty steed, when the men called out,
‘Good God, sir, the lion’s above you!’ I did feel queer, but I did not drop the joint, I walked steadily
down the rock, looking very frequently over my shoulder; but it was not till I came to where the men
stood that I could see the round head and pricked ears of my enemy, peering over the ledge under
which I had been at work. Stewartson made a very good shot at him, but too low, splintering the
stones under his chin. It was far too dark for a good aim. It then appeared that the creatures we had
thought were deer, were really the lions. It was now useless to lie out where we had intended, as the
lions knew all about us, and proved to be far better rock-climbers than ourselves; and, as we could
not get up the tree, we returned thoroughly out-generalled”. GALTON, Narrative of an explorer…,
p. 47-48.
31
GALTON, Narrative of an explorer…, p. 264-265.
32
GALTON, Narrative of an explorer…, p. 264-265.
33
GALTON, Narrative of an explorer…, p. 53-54.
34
GALTON, Narrative of an explorer…, p. 106.
35
GALTON, Narrative of an explorer…, p. 260.
36
GALTON, Narrative of an explorer…, p. 169.
37
GALTON, Narrative of an explorer…, p. 169.
38
GALTON, Narrative of an explorer…, p. 278.
39
GALTON, Narrative of an explorer…, p. 264.
40
GALTON, Narrative of an explorer…, p. 279.
O que pretendemos agora é trabalhar uma problemática que pode soar anacrônica
para aqueles que tomam Galton apenas como um estudioso direcionado às pesquisas
de eugenia. As análises das fontes nos rementem a algumas impressões de Galton
sobre vários povos locais. Intencionalmente destacamos determinadas passagens
a sua observação como viajante/ cientista dos “grupos humanos”. Assim, será um
problema para o leitor buscar associações e conclusões futuras de Galton nestes
excertos. Isto não exclui seu acúmulo de experiência no território africano para a
compreensão dos “tipos humanos” em tempos porvindouros, mas este trabalho
não tem o objetivo de considerá-lo após seus estudos estatísticos hereditários da
década de 1860, pelo contrário, nossa proposta é justamente perceber as visões de
viagem do até então Galton na função de explorador. Estas percepções corroboram
com o que podemos chamar da sua compreensão em diferenças “raciais” entre
ingleses e povos africanos, mas ela responde às particularidades das construções
“raciais” da aristocracia e do seu contexto temporal.
Em primeiro lugar, a partir da Fig. 2 podemos considerar a localidade ocupada
pelos Damaras para as nossas impressões iniciais. Esta região foi explorada por
Galton no curso da viagem e, não à toa, os relatos acabaram sendo constantes
sob seu modo de vida. Aliás, notaremos em muitas de suas falas o juízo de valor e
adjetivações congregadas a este grupo, o que, para nós, reflete no seu acúmulo de
experiências sociais inglesas.
As notas iniciais de Galton concernem ao interesse comercial dos Damaras
pelo ferro. Em uma breve comparação, ele expõe a importância do ferro para
os Damaras, pois, “The Damaras adore iron as we adore gold”43. Entretanto, ele
parece demonstrar certa irritação ao ter que negociar um espaço ou se comunicar
com este povo:
41
KEVLES, In the name of eugenics..., p. 06-07.
42
GALTON, Memories of my life..., p. 151.
43
GALTON, Narrative of an explorer..., p. 93.
Além desta crítica, ele também dissertou sobre os roubos feitos pelo grupo.
Esta dificuldade é relatada em nossa fonte durante toda a viagem, pois além dos
animais que poderiam matar o gado, os roubos seriam uma constante: “They
always crowded round us and hemmed us in, and then tried to hustle us away from
our bags and baggage. They have an impudent way of handling and laying hold
of everything they covet, and of begging in an authoritative tone, laughing among
themselves all the time”45. As preocupações com os furtos tornam-se compreensíveis
tendo em vista que Galton financiava a expedição e temia correr riscos de ficar sem
recursos.
As comparações entre seus valores da sociedade inglesa com o novo território
tornaram-se recorrentes. Talvez, uma forma de compreender aqueles o “Outro”
estaria em tentar definir semelhanças e diferenças com a sua própria sociedade.
Esta evidência aparece em sua apreensão com algumas práticas do Damaras e
também ao ouvir sobre a existência de um povo que seria “mais civilizado” e viveria
ao norte da região que estava. Galton mostra um grande êxtase em conhecê-los.
Assim, ao comparar os Damaras com Ovampos, dirá que os primeiros são relativos
aos trabalhadores ingleses:
44
GALTON, Narrative of an explorer..., p. 82.
45
GALTON, Narrative of an explorer..., p. 99.
46
GALTON, Narrative of an explorer..., p. 86.
47
ANDERSON, Comunidades imaginadas..., p. 210.
48
PRATT, Mary Louise. Os olhos do Império: relatos de viagem e transculturação. Bauru: EDUSC,
1999, p. 31.
49
GALTON, Narrative of an explorer..., p. 123-124.
50
BLANCKAERT, Claude. “Lógicas da antropotecnia: mensuração do homem e bio-sociologia
(1860-1920)”. Revista Brasileira de História, São Paulo, ANPUH, vol. 21, n. 41, 2001, p. 147.
The result is, that I believe Mrs. Petrus to be the lady who
ranks second among all the Hottentots for the beautiful
outline that her back affords, Jonker’s wife ranking as the
first; the latter, however, was slightly passee, while Mrs.
Petrus was in full embonpoint. I profess to be a scientific
man, and was exceedingly anxious to obtain accurate
measurements of her shape; but there was a difficulty in
doing this. I did not know a word of Hottentot, and could
never therefore have explained to the lady what the object
of my foot- rule could be; and I really dared not ask my
worthy missionary host to interpret for me. I therefore felt
in a dilemma as I gazed at her form, that gift of bounteous
nature to this favoured race, which no mantuamaker, with
all her crinoline and stuffing, can do other- wise than humbly
imitate The object of my admiration stood under a tree,
and was turning herself about to all points of the compass,
as ladies who wish to be admired usually do. Of a sudden
51
Cf.: SCHWARCZ, Lilia Moritz. O espetáculo das raças: cientistas, instituições e questão racial no
Brasil – 1870-1930. São Paulo: Companhia das Letras, 1993, p. 43-46.
52
GALTON, Francis. Inquiries into human faculty and its development. Londres: Macmillan & Co.,
1883, p. 314.
Esta questão pode esclarecer de maneira mais satisfatória a ânsia de Galton nas
medições. Ele se classificava como um “homem de ciência” e, consequentemente,
despertava o interesse em medir fisicamente aquela mulher para o qual viu em
suas formas um curioso interesse antropométrico e matemático. Contudo, dois
problemas surgem. O primeiro seria a dificuldade em se comunicar com as
populações que viviam na região, uma vez que não professava a língua matriz. O
segundo consistiria na complexidade em tentar transmitir as mensagens com seu
intérprete, pois não saberia como estas, simbolicamente, seriam recebidas. Daí em
diante, a descrição do viajante inglês sobressai na vontade em delimitar as medidas
imaginando as formas da mulher por meio de trigonometria e logaritmos. Havia
uma aspiração de compreender aqueles povos não unicamente no sentido as suas
constituições físicas, mas também em suas práticas de vivência.
A utilização de conceitos matemáticos – como as medidas do astrônomo Jean
Baptiste Joseph Delambre (1749-1822) – esteve presente entre os viajantes. A
trigonometria pode ser observada no uso de Humboldt, e que antecede a Galton.
Para ilustrar, “le 1er septembre 1799, écrivant de Cumana au baron de Zach, il
pouvait lui annoncer qu’il avait ‘déterminé trigonométriquement’ en se ‘servant
de quelques triangles’ la position de deux localités, tout en ajoutant qu’il faisait
plus confiance aux ‘expériences astronomiques’”54. Dessa forma, quando Galton
pensa na trigonometria e nos logaritmos, ele dispõe de uma maneira de enxergar o
“Outro” por seu conhecimento estatístico e matemático de sua formação.
Uma de suas observações mostrou como os Damaras são péssimos guias. No
documento ele diz que: “A Damara never generalizes; he has no one name for a
river, but a different name for nearly every reach of it”55. Isto se deve em comparação
à maneira como os Damaras observam seus referenciais de trajetos. Para Galton,
os europeus conseguiam discernir pontos distantes, já para os Damaras, essa
realização seria em curtas distâncias, somada com a atenção aos detalhes locais a
exemplo de uma pedra ou de alguma coisa que remetesse a objetos conhecidos.
Eles não faziam “mapas mentais”, o que para Galton, facilitaria.
Esta questão que aparenta ser casual e suscita elementos vistos na historiografia.
A desapropriação desses viajantes perante a noção do conhecimento africano
53
GALTON, Narrative of an explorer..., p. 88.
54
DROUIN, Jean-Marc. “Analogies et contrastes entre l’expédition d’Egypte et le voyage d’Humboldt
et Bonpland”. História, Ciências, Saúde – Manguinhos, Rio de Janeiro, Fiocruz, vol. 8, supl., 2001,
p. 845.
55
GALTON, Narrative of an explorer..., p. 177.
56
GEBARA, A África presente..., p. 110.
57
BARNETT, Clives. “Impure and Worldly Geography: the Africanist Discourse of the Royal Geographic
Society”. Transactions of the Institute of British Geographer, New Series, vol. 23, n. 2, 1998, p. 244.
Disponível em: <http://www.academia.edu/3768108/Impure_and_worldly_geography>. Acesso
em: 07 jul. 2014.
58
GALTON, Narrative of an explorer..., p. 138.
59
GALTON, Narrative of an explorer..., p. 190.
Considerações Finais
60
GEBARA, A África presente..., p. 33.
61
CONSTANTINO, Núncia Santoro de. “Introdução”. In: __________ (org.). Relatos de viagem como
fontes à história. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2012, p. 13.
62
GEBARA, A África presente..., p. 111.
63
STAFFORD, Robert A. Scientist of empire: Sir Rodrick Murchison, scientific exploration and
Victorian imperialism. Cambridge, UK: Cambridge University Press, 1989, p. 156.
64
GEBARA, Alexsander Lemos de Almeida. “As representações populacionais de Richard Francis
Burton: uma análise do processo de constituição do discurso sobre populações não europeias no
século XIX”. Revista de História, São Paulo, USP, n. 149, 2003, p. 204-205.
1
Doutorando em História pela Universidade Federal de Santa Catarina. Bolsista Capes-DS. E-Mail:
<[email protected]>.
2
CARVALHO, José Murilo de. A construção da Ordem: a elite política imperial/ Teatro de sombras:
a política imperial. 3 ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2007, p. 13.
Essas análises serviram de ponto de partida para que José Murilo de Carvalho
lançasse mão de sua tese sobre a unidade na formação do Estado brasileiro. Suas
proposições estão organizadas em A Construção da Ordem e o Teatro de Sombras.
Em A Construção da Ordem, o autor esteve mais interessado em perceber a
composição do Estado brasileiro, analisando a elite política imperial. No Teatro das
Sombras, o interesse foi de perceber a própria política imperial e seus mecanismos
de funcionamento.
A tese de José Murilo de Carvalho é que “a adoção de uma solução monárquica
no Brasil, a manutenção da unidade da ex-colônia e a construção de um governo
civil estável foram em boa parte consequência do tipo de elite política existente à
época da Independência, gerado pela política colonial portuguesa”6. A unidade
do caso brasileiro deveu-se, portanto, ao tipo de elite política. Essa elite, segundo
o autor, “caracterizava-se sobretudo pela homogeneidade ideológica e de
3
CARVALHO, A Construção da Ordem..., p. 15.
4
CARVALHO, A Construção da Ordem..., p. 15.
5
CARVALHO, A Construção da Ordem..., p. 19.
6
CARVALHO, A Construção da Ordem..., p. 21.
7
URICOECHEA, Fernando. O Minotauro imperial: a burocratização do Estado patrimonial brasileiro
no século XIX. Rio de Janeiro: Difel, 1978.
8
MATTOS, Ilmar Rohloff de. O tempo Saquarema. São Paulo: Hucitec; Brasília: INL, 1987.
9
DOLHNIKOFF, Miriam. O pacto imperial: origens do federalismo no Brasil. São Paulo: Globo,
2005.
10
DOLHNIKOFF, Miriam. “Elites regionais e a construção do Estado Nacional”. In: JANCSÓ, István
(org.). Brasil: a formação do Estado e da Nação (c. 1770-1850). São Paulo: Hucitec, 2003, p. 433.
11
GUIMARÃES, Manoel Luiz Salgado. “Nação e civilização nos trópicos: o IHGB e o projeto de uma
história nacional”. Estudos Históricos, Rio de Janeiro, CPDOC-FGV, vol. 1, n. 1, 1998, p. 05-27.
12
O critério de escolha se deu pela ordem de importância dos pronunciamentos, dois deles feitos
pelos sócios fundadores do IHGB, Januário da Cunha Barbosa e Raimundo José da Cunha Matos,
e por Martius, ganhador do concurso como se deve escrever a história do Brasil. São documentos
importantíssimos porque representam as posturas divergentes dentro do IHGB.
13
BARBOSA, Jannuario da Cunha. “Discurso”. Revista Trimensal de História e Geographia ou Jornal
do Instituto Historico e Geographico Brasileiro, Rio de Janeiro, IHGB, tomo 1, n. 1, 1839, p. 09-17.
14
MARTIUS, Karl Friederich Phillipe von. “Como se deve escrever a historia do Brasil”. Revista
Trimensal de Historia e Geographia ou Jornal do Instituto Historico e Brasileiro, Rio de Janeiro,
IHGB, tomo 6, n. 24, jan. 1845, p. 381-403.
15
MATTOS, Raimundo José da Cunha. “Dissertação acerca do sistema de escrever a história antiga
e moderna do Império do Brasil”. Revista do Instituto Histórico Geográfico e Etnográfico do Brasil,
Rio de Janeiro, IHGB, tomo XXVI, 1863, p. 121-143.
16
ARARIPE, Tristão de Alencar. História da Província do Ceará: desde os tempos primitivos até 1850.
2. ed. Fortaleza: Instituto do Ceará, 1958 [1867].
17
A leitura de autores como Manoel Luiz Salgado Guimarães e Lúcia Maria Paschoal Guimarães,
bem como a de Astor Antonio Diehl são imprescindíveis para o desenvolvimento desse tópico,
que pretende entender quais as ações empreendidas pelo IHGB para o fomento de uma escrita
da história nacional. DIEHL, Astor Antônio. A cultura historiográfica brasileira (do IHGB aos anos
1930). Passo Fundo: Ediupf, 1998; GUIMARÃES, “Nação e civilização...”; GUIMARÃES, Lúcia
Maria Paschoal. “Debaixo da imediata proteção de Sua Majestade Imperial: o Instituto Histórico e
Geográfico Brasileiro (1838-1889)”. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Rio de
Janeiro, IHGB, ano 156, n. 388, jul./ set. 1995, p. 459-613.
18
FURET, François. A oficina da História. Tradução de Felipe Jarro. Revisão da tradução de Adriano
Duarte Rodrigues. Lisboa: Gradiva, 1967.
19
BARBOSA, “Discurso”, p. 09-17.
20
O intuito das citações é destacar as menções sobre as histórias regionais (provinciais) bem como de
seus letrados.
21
Grifos meus. BARBOSA, “Discurso”, p. 09.
Nos grifos acima, destaco três aspectos importantes: o primeiro diz respeito ao
recolhimento dos elementos da geografia e da história espalhados pelas províncias,
“e por isso mesmo difíceis de se colher por qualquer patriota que tentasse escrever
exatamente tão desejada história [a história nacional]”. O segundo aspecto
chama atenção para o trabalho conjunto de vários profissionais das províncias
que colaborariam para “uma história geral e filosófica do Brasil”, levando em
consideração a dificuldade desse trabalho por um só homem. O terceiro aspecto é
do aproveitamento dos trabalhos já realizados por escritores que se detiveram em
escrever sobre questões vinculadas às províncias, como também de outros autores
que estivessem próximos ao projeto de história nacional pretendido pelo Instituto
e pudessem colaborar.
Temos nessas passagens, os primeiros elementos para pensar numa abertura
do Instituto para os elementos de histórias provinciais que colaborassem para a
história geral do Brasil. Nela, haveria espaço para as histórias das províncias e da
colaboração de literatos que se interessaram ou que se interessassem por essas
histórias.
Passemos agora para a monografia “Como se deve escrever a história do Brasil”,
de Karl Friederich Phillipe von Martius, escrita em 1843 e publicada na RIHGB em
184524. Esse trabalho foi ganhador do concurso lançado pelo IHGB, que pretendia
lançar as bases para a escrita da história nacional. Participaram do concurso apenas
dois estudiosos: o naturalista alemão Karl F. P. von Martius e Júlio de Wallenstein.
O projeto de Wallenstein não representou a novidade pretendida pelo Instituto,
propondo o estudo da história do Brasil por décadas. Martius, por sua vez, não
recomendou uma periodização, mas sim na apresentação dos principais elementos
que deveriam constituir a história nacional, bem como os principais problemas a
serem resolvidos pelo historiador interessado em tal projeto. Para Martius, a história
do Brasil teria que ser escrita pelo que lhe havia de mais particular, ou seja, “do
encontro, da mescla, das relações mutuas e mudanças d’essas três raças”, a saber,
22
Grifos meus. BARBOSA, “Discurso”, p. 10-11.
23
Grifos meus. BARBOSA, “Discurso”, p. 16-17.
24
MARTIUS, “Como se deve...”.
25
MARTIUS, “Como se deve...”, p. 382.
26
Grifos meus. MARTIUS, “Como se deve...”, p. 399-401.
Dito isso, podemos perceber qual a relação que as histórias províncias deveriam
ter para a unidade do país.
27
MARTIUS, “Como se deve...”, p. 400-401.
28
MARTIUS, “Como se deve...”, p. 402.
29
MATTOS, “Dissertação acerca...”.
Este documento guarda uma peculiaridade, que vale menção aqui. A “Dissertação
acerca do sistema de escrever a história antiga e moderna do Império do Brasil”,
escrita por Cunha Mattos em 1838, só foi publicada em 1863 na RIHGB, o que
pode demonstrar as tensões sobre os projetos de se escrever a história nacional no
interior do Instituto. Nessa dissertação, Cunha Mattos trata de um tema bastante
caro às discussões porvindouras da historiografia brasileira do século XIX, qual
seja, o sistema de se escrever a história antiga e moderna do Império do Brasil. A
periodização da história do Brasil era assunto recorrente entre os autores/ sócios
do IHGB, vide os casos de Henrique Júlio de Wallenstein (1843), Capistrano de
Abreu (1884) e Tristão de Alencar Araripe (1894), dentre outros textos publicados
na RIHGB.
No entanto, o que destaco na dissertação escrita por Cunha Mattos é a sua
defesa sobre o lugar que as histórias provinciais deveriam ter no projeto de história
do Império do Brasil no século XIX. Cunha Mattos, de acordo com o Sr. visconde
de São Leopoldo, defende que primeiro sejam levantados um número suficiente
de documentos e histórias das províncias, para que só assim fosse empreendido o
esforço de uma história geral do Brasil. Temos, portanto, uma postura diferenciada
com relação às histórias locais. Se para o Sr. Januário da Cunha Barbosa as histórias
sobre temas provinciais deveriam ser apenas consideradas pelo historiador nacional;
e para von Martius, elas teriam seu lugar de importância, mas que o historiador
deveria, com astúcia, retirar delas o que havia de singular e que contribuísse à
história geral; para Cunha Mattos, o intuito primeiro deveria ser o de conhecer e
pensar essas histórias. Enquanto para Januário Cunha Barbosa e von Martius a
história geral se utilizaria dos fatos históricos já escritos sobre as provinciais, para
Cunha Mattos essas histórias provinciais não eram, naquele momento, suficientes
para compor a história geral do Império do Brasil. Assim, “por ora não estamos
habilitados a escrever a história geral do império do Brasil, por nos faltarem muitos
elementos provinciais para isso necessários”. Cunha Mattos, ainda concordando
com o Sr. visconde de São Leopoldo, aponta que em primeiro lugar se deveriam
estudar as histórias provinciais, “para com bons materiais escrevermos a historia
geral do império brasileiro”.
Com isso, podemos entender um pouco do ambiente intelectual do IHGB e mais
30
MATTOS, “Dissertação acerca...”, p. 122.
O autor
31
Esses dados foram colhidos na cronologia da trajetória política de Tristão de Alencar Araripe. Ver:
SILVA, Ítala Byanca Morais da. Tristão de Alencar Araripe e a História do Ceará. Fortaleza: Museu
do Ceará; Secretaria da Cultura do Estado do Ceará, 2006, p. 102-103.
A obra
32
RODRIGUES, José Honório. “A historiografia Cearense na Revista do Instituto do Ceará”. In:
____________ & RODRIGUES, Leda Boechat (orgs.). Índice anotado da Revista do Instituto do
Ceará (do tomo I ao LXVIII). Fortaleza: ABC Editora, 2002, p. 28.
33
ARARIPE, História da Província...
34
ARARIPE, História da Província..., p. 27.
Mas o interesse de Tristão de Alencar Araripe com a escrita desse trabalho não
era só explicar o processo de independência da província do Ceará. O que estava
em jogo era a reputação da família Alencar, isso porque seu pai e seu tio foram as
personagens centrais no processo de independência das províncias do Piauí e do
Maranhão, além de terem se envolvido na Revolução de 1817 e na Confederação
do Equador, em 1824:
35
ARARIPE, História da Província..., p. 27.
36
ARARIPE, História da Província..., p. 27.
37
ARARIPE, História da Província..., p. 29.
38
ARARIPE, História da Província..., p. 29.
39
SILVA, Tristão de Alencar..., p. 80-81.
40
HRUBY, Hugo. O século XIX e a escrita da história do Brasil: diálogos na obra de Tristão de
Alencar Araripe (1867-1895). Tese (Doutorado em História). Pontifícia Universidade Católica do
Rio Grande do Sul. Porto Alegre, 2012. Defendida em março de 2012, a tese de Hruby oferece mais
questões sobre a inexistência desses textos. Nela, ele afirma que Tristão escreveu sobre o assunto,
ainda em 1862, e que o texto teria sido publicado no Diário de Pernambuco. Sendo assim, para
Hruby, a tão comentada 2ª parte da História da Província do Ceará já teria sido escrita e publicada.
Em pesquisa na Fundação Joaquim Nabuco, em Recife, pude confirmar a informação de Hugo
Hruby. Infelizmente, pelo péssimo estado com que se encontram os microfilmes do jornal Diário de
de Homem de Melo foi publicada na RIHGB, em 1896. SILVA, Tristão de Alencar...; HRUBY, O
século XIX...
43
GUIMARÃES, “Nação e civilização...”, p. 20.
44
ARARIPE, História da Província..., p. 55.
45
ARARIPE, História da Província do Ceará..., p. 15.
RESUMO ABSTRACT
O objetivo do presente artigo é perceber como The purpose of this paper is to understand
as histórias provinciais foram pensadas e (re) how the provincial stories have been thought
conhecidas por alguns dos pronunciamentos and (re) known to some of the most important
mais importantes do IHGB em relação a pronouncements of IHGB regarding the writing
escrita da história nacional no século XIX. Os of national history in the nineteenth century.
documentos analisados serão: “Discurso no ato The documents will be analysed: “Discourse on
de estatuir-se o Instituto Histórico e Geográfico the creation act of Historical and Geographical
Brasileiro”, de Januário da Cunha Barbosa, Brazilian Institute” by Januário da Cunha
publicado na RIHGB em 1839; a monografia Barbosa, published in RIHGB in 1839; the
“Como se deve escrever a história do Brasil”, monograph “How should write the history of
de Karl Friederich Phillipe von Martius, escrita Brazil”, by Karl Friederich von Martius Phillipe,
em 1843 e publicada na RIHGB em 1845; e a written in 1843 and published in RIHGB in
“Dissertação acerca do sistema de se escrever 1845; and the “Dissertation about to write the
a história antiga e moderna do Império do ancient and modern history of the Empire of
Brasil”, de Raimundo José da Cunha Matos, Brazil system”, by Raimundo José da Cunha
escrita em 1838 e publicada na RIHGB em Matos, written in 1838 and published in RIHGB
1863. Pretendo também apresentar um projeto only in 1863. I intend to submit a writing project
de escrita da história provincial subjugado ao of provincial history subjugated to IHGB. The
IHGB, que concedeu o posto de sócio ao seu work is called History of Ceará Province – from
autor, o cearense Tristão de Alencar Araripe. A the earliest times until 1850, published in 1867
by Tristão de Alencar Araripe.
obra chama-se História da Província do Ceará –
desde os tempos primitivos até 1850, publicada Keywords: 19th Century Brazil; History Writing;
em 1867. Tristão de Alencar Araripe.
Palavras Chave: Brasil Oitocentista; Escrita da
História; Tristão de Alencar Araripe.
46
SILVA, Leandro Maciel. Tristão de Alencar Araripe e a história da Província do Ceará: contribuição
à história nacional. Dissertação (Mestrado em História). Universidade Federal da Paraíba. João
Pessoa, 2013.
Considerações Iniciais
1
Uma primeira versão deste trabalho foi apresentada durante a realização do X Congresso Luso-
Brasileiro da História da Educação: percursos e desafios na História da Educação luso-brasileira,
ocorrido na cidade de Curitiba-PR, em 2014.
2
Doutor em Educação pela Universidade Estadual de Campinas, Mestre em Geografia pela
Universidade Federal de Pernambuco, Graduado em História pela Universidade Federal de
Pernambuco e em Geografia pela Universidade Católica de Pernambuco. Professor Associado III
do Departamento de Metodologia da Educação e do Programa de Pós-Graduação em Educação da
Universidade Federal da Paraíba. Membro do Grupo de Estudos e Pesquisas História da Educação
na Paraíba – HISTEDBR-PB (PPGE-UFPB/ Diretório CNPq) e do Grupo de Pesquisa História da
Educação no Nordeste Oitocentista – GHENO (PPGH-UFPB/ Diretório CNPq). E-Mail: <acfp@
terra.com.br>.
3
Tais documentos foram publicados na Coleção Documentos da Educação Brasileira, organizada
pela Sociedade Brasileira de História da Educação – SBHE. Ver: PINHEIRO, Antonio Carlos
Ferreira & CURY, Cláudia Engler (orgs). Leis e regulamentos da instrução da Paraíba no período
imperial. Brasília: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – INEP/
MEC; Sociedade Brasileira de História da Educação – SBHE, 2004.
4
Parte desse conjunto de documentos encontra-se também publicado na Coleção Documentos
da Educação Brasileira. Ver: CURY, Cláudia Engler, ANANIAS, Mauricéia & PINHEIRO, Antonio
Carlos Ferreira (orgs.). Fontes para a História da Educação da Paraíba imperial: documentos avulsos
(1821-1860). Vitória: SBHE; Virtual Livros, 2015 [recurso eletrônico].
5
CHERVEL, André. “Historia de las disciplinas escolares: reflexiones sobre um campo de
investigación”. Revista de Educación, n. 295, 1991, p. 59-111.
6
GOODSON, Ivor F. Currículo: teoria e história. Tradução de Attílio Brunetta e Hamilton Francischetti.
Petrópolis: Vozes, 1995.
7
GOODSON, Currículo..., p. 118.
8
Para um maior detalhamento dessa abordagem, ver: JULIÁ, Dominique. “A cultura escolar como
objeto histórico”. Revista Brasileira de História da Educação, n. 1, jan./jun. 2001, p. 09-43.
Assim, foi a partir da última questão elaborada pelo mencionado autor que
entendemos a importância em se conhecer um pouco dos processos que possibi-
litaram a efetivação do ensino de História como matéria escolar, hoje mais deno-
minada como disciplina escolar, nos programas institucionais destinados as aulas
de primeiras letras ou, como passou a ser comumente denominado, no ensino
primário10.
Além desses referenciais outras obras, tais como as de Baldin11, Mattos12,
Siman & Fonseca13, Fonseca14, Freitas15, Melo16, Bittencourt17 e Schueler, Chamon
& Vazquez18 nos auxiliaram no processo de compreensão das especificidades
paraibanas tomando-as como contrapontos ou referências ao movimento mais
amplo ocorrido no Brasil e que já foram abordados pelos autores acima mencionados.
Para tanto, centramos a nossa problematização apontando que diferentemente
de boa parte dos estudos sobre o ensino de história, que privilegiam as questões
relacionadas às políticas educacionais ou adentram aos aspectos metodológicos,
preferimos trabalhar a partir dos referenciais da história da educação, ou seja, sobre
9
O texto original: “¿Tiene algún sentido la noción de historia de las disciplinas escolares? ¿Presenta
analogías o nexos comunes la historia de las diferentes disciplinas? Y, para ahondar un poco más,
¿permite la observación histórica extraer normas de funcionamiento o incluso uno o varios modelos
disciplinarios ideales, cuyo conocimiento y aplicación podrían ser de alguna utilidad en los debates
pedagógicos presentes y futuros?”. CHERVEL, “Historia de las disciplinas...”, p. 59.
10
Tínhamos, inicialmente, a pretensão de discutir a questão do ensino de história também
considerando o nível secundário paraibano, especialmente no Lyceu Parahybano e na Escola
Normal, entretanto, em função das páginas as quais nos foram destinadas para a elaboração deste
artigo e considerando, ainda, que a maioria dos estudos sobre a história do ensino de história se
concentram no ensino secundário, especialmente, tomando como referencia o Colégio Pedro II, é
que resolvemos nos deter, neste estudo, apenas ao nível das primeiras letras ou primário.
11
BALDIN, Nelma. A história dentro e fora da escola. Florianópolis: Editora da UFSC, 1989.
12
MATTOS, Selma Rinaldi de. O Brasil em lições: a história como disciplina escolar em Joaquim
Manoel de Macedo. Rio de Janeiro: Access, 2000.
13
SIMAN, Lana Mara de Castro & FONSECA, Thais Nívia de Lima e (orgs). Inaugurando a História
e construindo a nação: discursos e imagens no ensino de História. Belo Horizonte: Autêntica, 2001.
14
FONSECA, Thais Nívia de Lima e. História e ensino de História. Belo Horizonte: Autêntica, 2003.
15
FREITAS, Itamar. Histórias do ensino de história no Brasil (1890-1945). São Cristovão: Editora da
UFS; Aracaju: Fundação Oviêdo Teixeira, 2006.
16
MELO, Ciro Flávio de Castro Bandeira de. Senhores da História e do esquecimento: a construção
do Brasil em dois manuais didáticos de História na segunda metade do século XIX. Belo Horizonte:
Argvmentvm, 2008.
17
BITTENCOURT, Circe. Livro didático e saber escolar (1810-1910). Belo Horizonte: Autêntica,
2008.
18
SCHUELER, Alessandra Frota Martinez de; CHAMON, Carla Simone & VAZQUEZ, Gabriel.
“Ensinar história na escola primária oitocentista: o ‘Resumo da História do Brasil’, de Maria
Guilhermina Loureiro de Andrade”. Gênero – Revista do Núcleo Transdisciplinar de Estudos de
Gênero – NUTEG, Niterói, UFF, vol. 11, n. 1, 2010, p. 15-34.
Assim, podemos inferir que tal obra circulou na Província paraibana, sendo
19
Grifo nosso. Cf. PINHEIRO & CURY, Leis e regulamentos..., p. 17.
20
CURY, Cláudia Engler & FERRONATO, Cristiano. “Em busca de leitores e suas práticas na Parahyba
dos oitocentos: espaços de leituras, locais de venda e constituição de acervos”. In: BERGER, Miguel
André & NASCIMENTO, Ester Fraga Vilas Bôas Carvalho do (orgs.). Imprensa, impressos e práticas
educativas: estudos em História da Educação. Fortaleza: Edições UFC, 2012, p. 67-91.
21
CURY & FERRONATO, “Em busca de leitores...”, p. 85.
Se por um lado identificamos que tais aspectos ainda nos são obscuros, por
outro, podemos inferir que o ensino de história, ou pelo menos, em alguns
momentos centrou-se na História do Brasil e não na História Geral ou Universal.
Nesse sentido, os autores acima mencionados nos informam ainda que a história
nacional na citada obra apresenta seis épocas:
22
CURY & FERRONATO, “Em busca de leitores...”, p. 85. Segundo Schueler, Chamon & Vazquez,
em seu estudo sobre o ensino de história nas escolas primárias da Corte, no ano de 1888 foi,
também, publicado em Boston, um livro intitulado Resumo da História do Brazil para uso das
escolas primárias brazileiras, de Maria Guilhermina Loureiro de Andrade e que teve três edições,
em 1888, 1894 e 1920. Todavia, até o momento, não temos a informação que o mesmo tenha sido
adotado nas escolas primárias da Paraíba.
23
FONSECA, História e ensino de História, p. 46.
24
Regulamento de 20 de janeiro de 1849. PINHEIRO & CURY, Leis e regulamentos..., p. 26.
25 Grifos nossos. Cf. PINHEIRO & CURY, Leis e regulamentos..., p. 28.
No ano seguinte, ou seja, em 1858, foi criado o Colégio Nossa Senhora das
Neves, na capital da Província da Parahyba do Norte. Tratava-se de “um internato
para o fim de promover a educação moral, religiosa e literária do sexo feminino”28.
Foi uma escola mantida pelo poder provincial e que teve vida efêmera, uma vez
que fechou as suas atividades em 1861. Apesar de promover o ensino primário
estavam previstas em seu Regulamento as seguintes matérias de ensino:
26
Grifos nossos. PARAHYBA DO NORTE, Provincia da. Relatorio recitado na abertura da Assemblea
Legislativa da Parahyba do Norte pelo Vice-Presidente da Provincia, o Dr. Manoel Clementino Carneiro
da Cunha, em 1 de Agosto de 1857. Parahyba: Typ. de José Rodrigues da Costa, 1857, s.p.
27
PARAHYBA DO NORTE, Relatorio..., s.p.
28
Ver a Lei n. 13, de 04 de novembro de 1858, e a Lei n. 437, de 15 de dezembro de 1858,
que regulamentou o funcionamento do Colégio Nossa Senhora das Neves. PINHEIRO & CURY,
Leis e regulamentos... Consultar, também, sobre a história dessa instituição, os seguintes trabalhos:
RIBEIRO, Domingos de Azevedo. Colégio de Nossa Senhora das Neves. João Pessoa: s.r., 1996.
EGITO, Philipe Henrique Teixeira do. “A instrução feminina na capital da Província da Parahyba
do Norte: o Colégio de Nossa Senhora das Neves (1858-1895)”. In: PINHEIRO, Antonio Carlos
Ferreira & FERRONATO, Cristiano (orgs.). Temas sobre a instrução no Brasil Imperial (1822-1889).
João Pessoa: Ed. Universitária/ UFPB, 2008, p. 125-144.
29
Conferir artigo 7º da Lei n. 439, de 15 de dezembro de 1858. PINHEIRO & CURY, Leis e
regulamentos..., p. 115.
Fig. 2 – Capa da edição de 1905 da obra de Joaquim Manoel de Macedo, Lições de História do
Brasil para o ensino primário. Acervo do autor.
30
PARAHYBA DO NORTE, Relatorio..., s.p. Wilson Xavier faz uma prodigiosa análise sobre os
ideários que foram construídos ao longo dos séculos XVIII, XIX e XX em torno da mulher como
o gênero mais indicado para exercer o magistério infantil e primário. Ver: XAVIER, Wilson José
Félix. Razões e sensibilidades: um estudo sobre a construção do imaginário da docência feminina
na Parahyba do Norte (1865-1917). Tese (Doutorado em Educação). Universidade Federal da
Paraíba. João Pessoa, 2015.
31
MACEDO, Joaquim Manoel de. Lições de Historia do Brazil: para uso das escolas de instrucção
primaria. 9. ed. Rio de Janeiro: Livraria Garnier, 1905. Sobre a discussão acerca da elaboração e
adoção desse livro, juntamente com aquele que foi elaborado com destino do ensino secundário,
consultar: MELO, Senhores da História...
32
PARAHYBA DO NORTE, Relatorio..., s.p.
33
É importante informarmos que antes da publicação dessa Lei foi publicado, em 27 de janeiro de
1860 um novo Regulamento da Instrução Primária e Secundária Pública e particular da Província
da Parahyba. Entretanto, na parte referente à instrução primária não aparece qualquer indicação
acerca das matérias que deveriam ser ensinadas, somente tendo algumas indicações na parte
referente ao ensino secundário. É interessante também informar ao nosso leitor que o referido
regulamento teve duração muito curta, uma vez que foi suspenso pela Lei nº 12, de 08 de agosto
do mesmo ano, ou seja, vigorou por apenas 5 meses e mais alguns dias.
34
FONSECA, História e ensino de História, p. 47.
- Leitura e escriptura
- Elementos da gramática portugueza
- Principios de arithmética compreendendo______ legal de
pezos e medidas
- Noções de história e geographia do Brazil
- Noções de história sagrada
- Trabalho de agulhas e prendas domesticas nas escolas do
sexo feminino.35
1º Leitura e escripta;
2º Elementos de grammaticaportugueza;
3º Principios de Arithmetica, comprehendendo o systema
legal de pesos e medidas;
4º Noções de história e geographia do Brasil;
5º Elementos de sciencias physicas e naturaes;
6º Elementos de desenho linear, calligraphia e música;
§ Único. Nas escolas do sexo feminino se ensinará também
trabalhos de agulha e prendas domesticas.36
35
Esse documento encontra-se na Caixa 65-B-1883, pertencente ao Arquivo Histórico Waldemar
Bispo Duarte, vinculado à Fundação Espaço Cultural – FUNESC.
36
PARAHYBA, Estado da. “Decreto nº 241, de 26 de agosto de 1904”. In: __________. Collecção
dos Actos dos Poderes Legislativo e Executivo. Parahyba: Imprensa Official, 1914, p. 45.
37
FONSECA, Thais Nívia de Lima e. “‘Ver para compreender’: arte, livro didático e a história da
nação”. In: SIMAN & FONSECA, Inaugurando a História..., p. 93.
38
Grifo nosso. CURY, Cláudia Engler. “As práticas instrucionais no Lyceo Parahybano (1836-1889):
a configuração dos planos de ensino e o ensino de história”. In: Anais eletrônicos do VI Congresso
Luso-brasileiro de História da Educação: percursos e desafios da pesquisa e do ensino de história
da educação. Uberlândia: Universidade Federal de Uberlândia, 2006, p. 4117.
39
CURY, “As práticas instrucionais...”, p. 4117. Encontra-se em andamento, no Programa de
Pós-Graduação em História da Universidade Federal da Paraíba – PPGH-UFPB, a pesquisa de
mestrado de Maday de Souza Morais, provisoriamente intitulada Uma história da cadeira de história
na Província da Parahyba imperial: diálogos interprovinciais.
40
Parte dessa discussão encontra-se em estudo por nós realizado e já publicado. Ver: PINHEIRO,
Antonio Carlos Ferreira. Da era das cadeiras isoladas à era dos grupos escolares na Paraíba.
Campinas: Autores Associados; Universidade São Francisco, 2002.
41
DIAS, Margarida Maria Santos. Intrepidaab origine: o Instituto Histórico e Geográfico Paraibano e
a produção da história local. João Pessoa: Almeida Gráfica, 1996, p. 33.
42
DIAS, Intrepidaab origine..., p. 36.
43
DIAS, Intrepidaab origine..., p. 46.
44
Boa parte dessa produção foi publicada nas revistas do Instituto Histórico e Geográfico Paraibano.
Há um estudo, já publicado, que tece algumas considerações sobre essa produção realizada pelos
historiadores da referida instituição. Ver: PINHEIRO, Antonio Carlos Ferreira. “O Instituto Histórico
e Geográfico Paraibano e a história da educação da Paraíba: apontamentos para um estudo
historiográfico”. In: SAVIANI, Dermeval; LOMBARDI, José Claudinei & SANFELICE, José Luis
(orgs.). Seminário Nacional de Estudos e Pesquisa “História, Sociedade e Educação no Brasil”: o
debate teórico-metodológico da história e a pesquisa educacional. (4º) Anais. Campinas: Autores
Associados; UNICAMP/HISTEDBR, 1997, p. 206-217 [CD-ROM].
45
PARAHYBA, Estado da. Mensagem apresentada á Assembléa Legislativa na abertura da 2ª sessão
ordinaria da 7ª legislatura, pelo João Pereira de Castro Pinto (presidente do Estado) em 1913.
Parahyba do Norte: Torre Eiffel, 1913, p. 13.
46
PARAHYBA, Mensagem apresentada..., p. 13.
47
PARAHYBA, Mensagem apresentada..., p. 13.
48
CAVALCANTI, Manoel Tavares. Epitome da Historia da Parahyba: para uso da escola primária.
Parahyba: Imprensa Official, 1914, p. 04.
Considerações Finais
49
MATTOS, O Brasil em lições...
50
GOODSON, Currículo...
51
Sobre a adoção dessa tipologia consular, ver: PINHEIRO, Da era das cadeiras...
52
Sobre essa questão há uma importante coletânea organizada por Luciano Faria Filho. Ver: FARIA
FILHO, Luciano Mendes (org.). A escola elementar no século XIX: o método monitorial/ mútuo.
Passo Fundo: EDIUPF, 1999.
1 Doutorando em Ciência Política pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro. E-Mail: <phpcas-
[email protected]>.
2 POCOCK, J. G. A. (org.). Reflection on the Revolution in France. Indianápolis: Hacket, 1995, p.
61.
3
Para mais sobre a interpretação de Burke como um autor do chamado “iluminismo inglês” e
sobre sua relação com a filosofia escocesa, ver: POCOCK, G. J. A. Barbarism and Religion – Vol.
1. Nova York: Cambridge University Press, 2003.
4
PARKIN, Charles. The moral basis of Burke’s political thought. Nova York: Cambridge University
Press, 2011, p. 08.
5
BURKE, Edmund. Select works of Edmund Burke. 4 vols. Prefácio e nota biográfica de Francis
Canavan. Indianápolis: Liberty Found, 1999, vol. 1, p. 55.
6
BURKE, Select works…, vol. 1, p. 56.
7
BURKE, Select works…, vol. 1, p. 57.
8
BURKE, Select works…, vol. 1, p. 63.
Assim, podemos ver como, para Burke, a sociedade não é fruto de um “salto”
corruptor do estado de natureza para o estado político, mas sim de um processo de
fundação cuja origem não nos chega senão através dos registros históricos.
Em 1782, Burke prepara uma curta intervenção no Parlamento referente a uma
moção de sir. William Pitt sobre a possibilidade de reforma nas regras de
divisão da representação da câmara dos comuns10. A preocupação de sir. Pitt era
rever a distribuição de cadeiras no Parlamento levando em conta as mudanças
populacionais na geografia eleitoral da Grã-Bretanha. Porém, Burke vê na proposta
uma perigosa possibilidade de infiltração no parlamento das ideias revolucionárias
que homens como Arthur Priestley e Richard Price (a quem Burke criticaria nas
Reflexões), que consideravam a Constituição Inglesa como uma barreira para
a realização dos verdadeiros direitos universais dos homens. Burke não nega a
possibilidade de reformar as regras de representação, mas ressalta que qualquer
mudança que atinja a Constituição Inglesa em sua essência devem ser rechaçadas.
9
STANLIS, P. J. Edmund Burke and the Natural Law. Louisiana: Huntington House, 1986, p. 128.
10
De acordo com os registros históricos do Parlamento Inglês o discurso nunca foi pronunciado.
Segundo alguns biógrafos, Burke, que estava envolvido na formulação de uma nova reforma
econômica para apresentar ao Parlamento, foi convencido por seus aliados, o grupo de whigs em
torno de Lord Fox, a não se indispor com Sir Pitt, pois buscavam seu apoio para a reforma que
estavam preparando. Ver mais em: BURKE, Select works…, vol. 4, p. 07.
11
BURKE, Select works…, vol. 1, p. 396.
12
BURKE, Select works…, vol. 1, p. 398.
13
BURKE, Select works…, vol. 1, p. 297.
14
Sobre o debate histórico sobre o nascimento da constituição inglesa, principalmente no século
XVIII, ver: POCOCK, G. J. A. Ancient constitution and feudal Law. Nova York: Cambridge University
Press, 1987. Nesse estudo Pocock investiga as disputas jurídicas e históricas em torno da fundação
da ordem política inglesa. Por um lado, alguns autores afirmavam que os privilégios e liberdades
estabelecidos na constituição precediam as invasões da ilha e não podiam ser estabelecidos com
precisão; por outro lado, alguns historiadores datavam da implantação da lei feudal, vinda com
as invasões, as prerrogativas inglesas e, portanto, podiam ser reconhecidas como fruto de um
determinado processo histórico bem definido.
15
BURKE, Select works…, vol. 1, p. 399.
Revolução e Tradição
16
Para mais discussões sobre o discurso dos direitos naturais e sua derivação no discurso da
democracia republicana dos jacobinos, ver: JAUME, Lucien. Le discours jacobin et la démocratie.
Paris: Fayard, 1989.
17
BURKE, Select works…, vol. 2, p. 94.
18
ARENDT, Hannah. Entre o passado e o futuro. Tradução de Mauro W. Barbosa. 5. ed. São Paulo:
Perspectiva, 2005, p. 132.
19
BURKE, Select works…, vol. 2, p. 142.
Todavia, o fato de Burke não atribuir à sanção divina a ordem política não
significa que ele tenha afastado a religião da estrutura social. Pelo contrário, a
ordem política está subsumida em uma ordem maior, a ordem do cosmos ou
ordem divina, que garante uma ordem moral, transmitida pela religião. É ela
que garante a observação da moralidade que compõe a formação da civilização
cristã. A religião, portanto, tem importância enquanto elemento fundamental para
qualquer civilização:
20
BURKE, Select works…, vol. 2, p. 114.
21
NISBET, Robert. O Conservadorismo. Tradução de M. F. Gonçalves de Azevedo. Lisboa: Editorial
Estampa, 1987, p. 116.
22
BURKE, Select works…, vol. 2, p. 192-193.
Ordem e História
23
KIRK, Russell. The conservative mind: from Burke to Eliot. Indiana: Gateway Edition, 1978, p. 36.
24
STRAUSS, Leo. Natural Right and History. Chicago: University of Chicago Press. 1971, p. 306.
25
BURKE, Select works…, vol. 1, p. 76.
26
BURKE, Select works…, vol. 1, p. 69.
27
BURKE, Select works…, vol. 1, p. 303.
28
BURKE, Select works…, vol. 2, p. 151.
29
BURKE, Select works…, vol. 2, p. 121.
30
BURKE, Select works…, vol. 2, p. 83.
31
BURKE, Select works…, vol. 4, p. 100.
Considerações Finais
32
BURKE, Select works…, vol. 2, p. 150-151.
33
BURKE, Select works…, vol. 2, p. 151.
Mesmo assim, muitos críticos de Burke afirmam que ele falhou em reconhecer
toda a extensão e gravidade da colisão entre os novos princípios e os antigos. O
próprio homem ao qual Burke se referia, o cavaleiro honrado e cioso das tradições,
já não era mais o tipo inglês dominante. Em plena revolução industrial, o homem
utilitarista e expansionista é que levaria a Inglaterra a tornar-se o maior império
da era moderna. Curioso o fato de que outro homem muito semelhante a Burke,
Benjamin Disraeli – pequeno burguês, político tradicionalista e escritor imaginativo
– seria o político que daria o título de Império à Inglaterra.
34
POCOCK, Reflection on…, p. 33.
35
BURKE, Select works…, vol. 2, p. 207.
36
BURKE, Select works…, vol. 2, p. 118.
37
BURKE, Select works…, vol. 2, p. 193.
38
BURKE, Select works…, vol. 2, p. 151.
Introdução
1
Doutor em História pela Universidade Paulista Júlio de Mesquita Filho – UNESP, Campus de
Franca. Professor do Colegiado de História da Universidade do Estado de Minas Gerais, Campus
de Passos. E-Mail: <[email protected]>.
2
ZANOTTO, Gizele. “História dos intelectuais e história intelectual: contribuições da historiografia
francesa”. Biblios, Rio Grande, vol. 22, n. 1, 2008, p. 31-45.
3
BASTOS, Elide Rugai & RÊGO, Walquíria D. Leão. “A moralidade do compromisso”. In:
__________ & __________ (orgs.). Intelectuais e política: a moralidade do compromisso. São Paulo:
Olho D’Água, 1999, p. 10.
4
BASTOS & RÊGO, “A moralidade...”, p. 50.
5
BASTOS & RÊGO, “A moralidade...”, p. 49.
6
Sobre a função do intelectual em Mannheim ver: MATIAS, Glauber Rabelo. “Intelectuais como
missão: revisitando Karl Mannheim”. Revista Urutágua, Maringá, DCS-UEM, n. 11, dez. 2006 –
jan./mar. 2007, p. 01-12. Publicação eletrônica. Disponível em: <http://www.urutagua.uem.
br/011/11matias.pdf>. Acesso em: 17 fev. 2015.
7
Ver: MALINA, André; OLIVEIRA, Vitor Marinho de & AZEVEDO, Ângela Celeste Barreto de.
“Uma discussão sobre o conceito de intelectual em Karl Mannheim e Antonio Gramsci”. Trabalho
& Educação, Belo Horizonte, Núcleo de Estudos sobre Trabalho e Educação, FAE-UFMG, vol. 18,
n. 2, jul./dez. 2007, p. 69-80.
8
Ver: MARTINS, Marcos Francisco. “Gramsci, os intelectuais e suas funções científico-filosófica,
educativo-cultural e política”. Pro-Posições, Campinas, FAE-UNICAMP, vol. 22, n. 3, set./ dez. 2011,
p. 131-148.
9
BOBBIO, Norberto. Os intelectuais e o poder: dúvidas e opções de homens de cultura na sociedade
contemporânea. Tradução de Marco Aurélio Nogueira. São Paulo: Editora da UNESP, 1997, p. 72.
10
BOBBIO, Os intelectuais..., p. 73-74.
11
BOBBIO, Os intelectuais..., p. 80-81.
12
BOBBIO, Os intelectuais..., p. 124-125.
13
RÉMOND, René. “Uma história presente”. In: __________ (org.). Por uma história política. Tradução
de Dora Rocha. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2003, p. 35-36.
14
ROSANVALLON, Pierre. “Por uma história conceitual do político”. Revista Brasileira de História,
São Paulo, ANPUH, vol. 15, n. 30, 1995, p. 10-12.
15
ROSANVALLON, “Por uma história...”, p. 09-22.
16
ROSANVALLON, “Por uma história...”, p. 16.
17
ROSANVALLON, “Por uma história...”, p. 15.
18
JULLIARD, Jacques. “A Política”. In: LE GOFF, Jacques & NORA, Pierre (orgs.). História – Vol. 3:
novas abordagens. Tradução de Henrique Mesquita. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1976, p. 180-
181.
19
JULLIARD, “A Política...”, p. 182.
20
JULLIARD, “A Política...”, p. 186.
21
RÉMOND, “Uma história presente...”, p. 14-15.
22
RÉMOND, “Uma história presente...”, p. 14.
23
RÉMOND, “Uma história presente...”, p. 20.
24
RÉMOND, “Uma história presente...”, p. 26.
25
SIRINELLI, Jean-François. “Os intelectuais”. In: RÉMOND, Por uma nova..., p. 26.
A despeito das dificuldades que cercam a execução de uma história dos intelectuais
– ausência de definições quanto aos objetivos e métodos, complicações envolvendo
a caracterização do termo intelectual e dos próprios contornos envolvendo o grupo
constitutivo, a diversidade de usos e acepções do termo intelectual complicando
uma definição conceitual, além da excessiva abundância de documentos – é
possível, de acordo com Sirinelli, avançar em termos metodológicos e teóricos.
Primeiramente, faz-se necessária a caracterização relativamente aos intelectuais
envolvendo duas noções: uma, mais ampla, de caráter sociocultural, segundo a
qual os intelectuais englobam agentes sociais criadores e mediadores culturais,
abrangendo jornalistas, escritores, professores secundários, eruditos; outra, mais
restrita, de caráter político, envolvendo a questão dos engajamentos dos intelectuais,
visando desvendar as causas que estes estão a serviço.
Em segundo lugar, impõe-se, ainda, a necessidade de uma proposta
metodológica de abordagem que possa envolver duas vertentes convergentes e
não excludentes, ou seja, as vertentes política e social dos intelectuais. A vertente
política contempla a pesquisa dos textos produzidos pelos intelectuais, ao passo
que, a vertente social, investiga a análise sistemática de elementos dispersos com
finalidades prosopográficas.
E, por fim, a abordagem sobre os intelectuais pode envolver, ainda, o emprego
das noções de itinerário, geração e sociabilidade. Particularmente, para o enfoque
que pretendemos adotar nessa pesquisa, as noções de itinerário e sociabilidade
elaboradas por Sirinelli são extremamente importantes.
A reconstituição dos itinerários, de acordo com Sirinelli, possibilita o mapeamento
dos territórios de engajamento intelectual, permitindo não só o estudo dos grandes
intelectuais como, também, dos de menor expressão em uma dada época, além de
permitir a identificação da evolução de um grupo de intelectuais oriundos de uma
matriz comum. Apesar de sua importância, o estudo dos itinerários intelectuais só
adquire relevância, enfatiza Sirinelli, quando vai além da mera reconstituição e
passa a envolver, também, a sua interpretação.
A noção de itinerários enquanto recurso metodológico empregado na investigação
sobre os intelectuais difere das ferramentas teóricas utilizadas pela sociologia do
meio intelectual, tal como a praticada por Pierre Bourdieu que enfatiza a análise
26
SIRINELLI, “Os intelectuais...”, p. 235.
27
Sobre o conceito sociológico de campo, em geral, e de campo intelectual, em particular, ver:
BOURDIEU, Pierre. “Campo intelectual e projeto criador”. In: POUILLON, Jean (org.). Problemas
do estruturalismo. Tradução de Rosa Maria R. da Silva. Rio de Janeiro: Zahar, 1968, p. 105-145;
BOURDIEU, Pierre. A economia das trocas simbólicas. São Paulo: Perspectiva, 1974.
28
SIRINELLI, “Os intelectuais...”, p. 248-249
29
SIRINELLI, “Os intelectuais...”, p. 254-255
RESUMO ABSTRACT
Busca-se, com o artigo, situar o objeto de estudo The paper intends to place the object of study – the
– os intelectuais – dentro das possibilidades intellectuals – within the theoretical possibilities
teóricas oferecidas pela história intelectual, offered by intellectual history, in particular, and
em particular, e pelas ciências sociais, em the social sciences in general. It is known that
geral. Sabe-se que a história intelectual ainda the intellectual history is still, today, a domain
é, nos dias de hoje, um domínio do campo historiographical field under construction,
historiográfico em processo de construção, in terms of methodological. That particular
em termos de metodológicos. Nesse particular option is to proceed in the understanding of the
opta-se em proceder pela compreensão da perspective adopted by Jean François Sirinelli
perspectiva adotada por Jean François Sirinelli offering as the intellectual approach of the tools
que oferece como ferramentas de abordagem itineraries notions of sociability and generation
dos intelectuais as noções de itinerários, de structures. Thus, it is proposed a theoretical
estruturas de sociabilidades e de geração. Desta discussion from the reconstitution of the various
forma, propõe-se uma discussão teórica a partir notions attributed to the role of intellectuals in
da reconstituição das diversas noções atribuídas Western society since the formal appearance of
ao papel do intelectual na sociedade ocidental the term in the French context of the Dreyfus
desde o aparecimento formal do termo no affair in the late nineteenth century.
contexto francês do caso Dreyfus no final do
Keywords: History of Intellectuals; Political
século XIX.
History; Historiography.
Palavras Chave: História dos Intelectuais;
História Política; Historiografia.
1
Doutor em Educação pela Universidade Federal da Paraíba e Professor Adjunto do Centro de
Ciências Agrárias da mesma instituição, Campus de Areia. E-Mail: <wilsonxavierufpb@gmail.
com>.
2
Segundo a própria autora, a Província da Parahyba do Norte possui sete Regulamentos Gerais da
Instrução, datados de 1849, 1852, 1860, 1879, 1881, 1884 e 1886. Contudo, os regulamentos de
1852, 1879 e 1881 não foram encontrados por pesquisadores em nenhum acervo documental até
o momento.
3
MARIANO, Nayana Rodrigues Cordeiro. Educação pela Higiene: a invenção de um modelo hígido
de educação escolar primária na Parahyba do Norte (1849-1886). João Pessoa: Ideia, 2015, p. 52-
53.
4
MARIANO, Educação pela Higiene..., p. 55.
5
Compêndio de autoria do bacharel em Direito maranhense Antonio Marques Rodrigues, publicado
pela primeira vez em 1865 e adotado nas escolas primárias da Parahyba do Norte.
6
A instituição foi criada em 1859, porém, somente em 1865 é que começou a ser organizada. A
razão de tal demora deve-se à ausência de recursos do governo provincial.
7
Um dos intelectuais mais importantes dessa “Geração”, José Veríssimo, dedica o capítulo IV da
obra “A Educação Nacional” (publicada pela primeira vez em 1890, e republicada no Rio de
Janeiro em 1906), à importância da Educação Física como proposta para a regeneração física,
moral e intelectual do povo.
8
MARIANO, Educação pela Higiene..., p. 261.