Influencia Dos Jogos Eletronicos e Virtuais No Com

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PSICOLOGIA ARGUMENTO ARTIGO

doi: ISSN 0103-7013


Psicol. Argum., Curitiba, v. 31, n. 72, p. 155-163, jan./marc. 2013

[T]

Influência dos jogos eletrônicos e virtuais no


comportamento social dos adolescentes1
[I]
Influence of electronic and virtual games in social behavior of the adolescents
[A]
Franciely da Silva Cavalli[a], Maria Teresa Ceron Trevisol[b], Thiago Vendrame[c]

[R]

Resumo
[a]
Psicóloga, pós-graduanda em O jogo constitui-se uma atividade universal que contribui para o desenvolvimento social, cogni-
Psicopedagogia na Universidade do
tivo e afetivo do ser humano. A percepção dos adolescentes em relação ao significado dos jogos
Oeste de Santa Catarina (Unoesc),
Joaçaba, SC - Brasil, e-mail: eletrônicos e virtuais em seu cotidiano é a chave para a busca de respostas abordando algumas
[email protected] questões que caracterizem variáveis significativas como definição e importância, discriminação
[b]
Docente da graduação e do de quantidade de tempo, substituição de relações virtuais por reais, isolamento e possíveis com-
Programa de Pós-Graduação em portamentos agressivos. Nesse sentido, a investigação buscou verificar a influência dos jogos
Educação, Mestrado em Educação
da Universidade do Oeste de Santa
eletrônicos e virtuais no comportamento social e interpessoal dos adolescentes. A parte empí-
Catarina (Unoesc), doutora em rica dessa investigação se deu por meio de um estudo exploratório de natureza quantitativa e
Psicologia pelo Instituto de Psicologia
qualitativa. A amostra desse estudo foi composta por 203 adolescentes de duas escolas públicas
da Universidade de São Paulo (USP),
São Paulo, SP - Brasil, e-mail: do município de Herval d’Oeste (SC). Como procedimento de coleta de dados, utilizou-se um
[email protected] questionário composto por questões objetivas e subjetivas; e para a análise, utilizou-se o conte-
[c]
Fisioterapeuta pela Universidade do údo das respostas dos sujeitos participantes. Nos dados analisados, evidenciou-se que os adoles-
Oeste de Santa Catarina (Unoesc), centes jogam por diversão, não percebendo componentes cognitivos e físicos que afetam o ato
Joaçaba, SC - Brasil, colaborador da
pesquisa, e-mail:
de jogar. A maior parte dos adolescentes, independente de gênero, apresentam preferências por
[email protected] jogos com componentes violentos. Conclui-se que os jogos eletrônicos e virtuais possuem carac-
terísticas positivas e negativas de acordo com a percepção e significação do conceito subjetivo de
Recebido: 19/04/2010 cada indivíduo, tornando-se necessária a atenção ás reações disfuncionais do comportamento
Received: 04/19/2010
derivadas de sinais, sintomas e reações emocionais relacionadas com essa prática. [#]
[P]
Aprovado: 13/10/2011
Approved: 10/13/2011 Palavras-chave: Adolescência. Comportamento social. Videogame. Relações interpessoais. [#]

[A]

Abstract
The game is a universal activity that contributes to social, cognitive and affective development
of the human being. The perception of the adolescents regarding the meaning of the electronic
and virtual games in his daily life is the key for the answers search boarding some questions

1
Este artigo representa uma faceta de uma investigação intitulada “Play the Game: a influência dos jogos eletrônicos e virtu-
ais no comportamento social e interpessoal dos adolescentes”, realizada no Curso de Pós-graduação em Psicopedagogia pela
Universidade do Oeste de Santa Catarina (Unoesc).

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that characterize significant variables as definition and importance, discrimination of quantity


of time, substitution of virtual for real relations, isolation and possible aggressive behaviors. In
this sense, the investigation looked to check the influence of the electronic and virtual games in
the social and interpersonal behavior of the adolescents. The empirical part of this investigation
happened through a study exploratory of quantitative and qualitative nature. The sample of this
study was composed by 203 adolescents of two public schools of the local authority of Herval
d’Oeste (SC, Brazil). How proceeding of collection of data was used a questionnaire composed by
objective and subjective questions and for analysis the content of the answers of the subject par-
ticipants. In the analyzed data it showed up what the adolescents play for amusement, without
realizing component cognitive and physical that they affect the act of playing. Most of the ado-
lescents independent of type present preferences for games with violent components. Concluded
that the electronic and virtual games have positive and negative characteristics in accordance
with the perception and signification of the subjective concept of each individual, becoming nec-
essary pay attention to dysfunctional reactions of the behavior derived from signs, symptoms and
emotional reactions related to this practice.[#]
[K]

Keywords: Adolescence. Social behavior. Videogames. Interpersonal relations. [#]

Introdução A ascensão da interatividade tem cativado os


jovens a explorar o mundo virtual. Inicialmente,
Vários fatores contribuem para o desenvolvi- trata-se de curiosidade, divertimento e motivação
mento social, cognitivo e afetivo do ser humano, profissional, logo após a interatividade, torna-se
dentre eles o jogo, que constitui uma atividade uni- uma constante, sendo que consequências com-
versal (Huizinga, 2001), que permite a significação portamentais e físicas podem aparecer de forma
e ressignificação de conceitos. Percebe-se que, par- gradativa e perceptível na medida em que são uti-
tindo dessa prática, somos capazes de manifestar lizados ao extremo. Esses aspectos têm sido explo-
alguns conteúdos emocionais que estão diretamen- rados por algumas pesquisas que caracterizam os
te associados às características de personalidade e efeitos a curto e longo prazo, indicando em quem
de relações sociais. provoca danos maiores, as consequências do uso
O brincar é uma atividade que apresenta vários sem limites e a falta de monitoramento dos pais e
significados e assume várias funções como a apren- responsáveis.
dizagem de regras e a sujeição às ações impulsivas Os jogos adentraram nosso contexto com de-
pela via do prazer; ensinar a desejar (Vygotsky, terminação lúdica e com intuito de desenvolver
Barreto & Afeche, 1994); forma mais espontânea habilidades, no entanto, percebe-se que o foco foi
de pensamento, fazendo com que o desejável pare- deslocado e o objetivo perdeu-se em meio à disse-
ça possível de ser obtido (Piaget, 1993); atividade minação do poder aquisitivo que mantém e moti-
que possibilita a estruturação como sujeito (Freud, va a propagação de conteúdos violentos. O estudo
1976). Para as teorias psicogenéticas, o brincar en- realizado por Gentile e Anderson (2003) revela
fatiza a impulsividade, característica do pensamento que os jogos violentos podem ter consequências
intuitivo, marcando o início do pensamento lógico, negativas, embora não seja provado que os efeitos
isto é, da heteronomia para autonomia individual no são idênticos em todas as crianças. Outros estu-
exercício das situações do cotidiano (Alves, 2004). dos apontam que indivíduos que tem por hábito
Como o brincar, os jogos virtuais surgem nos a prática de jogos violentos, possuem a cognição
moldes da nossa cultura como sinônimo de prazer, e o comportamento agressivo aumentado (Brady
de atualidade, e de inclusão social. O jogo, em sua & Mattews, 2006; Carnagey & Anderson, 2005;
essência, conduz o jogador a uma realidade parale- Lynch, Gentile, Olson & Brederode, 2001). Além
la à sua, ou uma segunda realidade onde ocupa uma disso, a exposição do indivíduo a conteúdos vio-
postura de fantasia lúdica. lentos, independente do tempo, possui implicação

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em associações lesivas ou negativas relativas ao e) percepção dos adolescentes em relação a es-


desempenho escolar; estes são mais hostis, entram sas práticas.
em conflitos e discussões com maior frequência e são
mais suscetíveis a agressões físicas (Gentile, Lynch, Após a coleta de dados, os questionários foram
Linder & Walsh, 2004; Sharif & Sargent, 2006). selecionados e previamente triados. Adotou-se
A prática também influencia ações metabólicas como critério de exclusão o questionário dos alunos
e fisiológicas como frequência cardíaca e pressão que responderam que não jogavam.
arterial, em virtude da intensificação das atividades Os dados foram analisados de forma a interpre-
sedentárias (Wang & Perry, 2006). tar e explorar a percepção dos adolescentes em re-
A problemática que constitui o foco deste estu- lação às práticas dos jogos virtuais. O procedimento
do vem ao encontro da discussão sobre a globaliza- de análise de dados se baseou no registro do ques-
ção e evolução tecnológica que a humanidade vem tionário semiestruturado sendo que a informação
experimentando nos últimos anos. Nesse sentido, foi fornecida diretamente pela população pesqui-
buscou-se investigar se há influência dos jogos ele- sada. Finalmente, a avaliação dos dados deu-se de
trônicos e virtuais no comportamento social e inter- forma qualitativa visando à análise biopsicossocial
pessoal dos adolescentes. do fenômeno investigado.

Método Resultados

Trata-se de uma pesquisa descritiva, de cunho Participaram do estudo 203 estudantes do


exploratório e de abordagem qualitativa e quanti- Ensino Médio, sendo 62,56% do gênero feminino
tativa. Este estudo contou com uma amostra com- e 37,44% do gênero masculino, com média de ida-
posta por 203 adolescentes que frequentam duas de de 18,15 ± 4,35 anos. Dentre os entrevistados,
escolas do Ensino Médio, no período noturno, do 79,31% afirmaram ter jogado algum tipo de jogo
município de Herval d’Oeste (SC). eletrônico. Quando observados os gêneros, 72,44%
O início do processo se caracterizou pelo conta- das mulheres e 90,79% dos homens afirmaram já
to com a direção das escolas e a entrega do Termo terem experimentado essa prática.
de Consentimento Livre e Esclarecido previamente O significado atribuído pelos adolescentes aos jo-
aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP), gos evidencia que 71,19% definiram diversão como
da Universidade do Oeste de Santa Catarina sob característica principal da ação de jogar, 15,88% rela-
Resolução n. 016/2009. Esse termo foi entregue aos cionaram como um modo de interação com os amigos,
alunos visando à autorização de seus responsáveis 4,70% descreveram como modo de extravasar senti-
e a proteção ética e sigilo em relação à identificação mentos, 4,70% consideraram parte integrante de seu
dos sujeitos de pesquisa. cotidiano e 3,53% atribuíram outros significados.
Para a coleta de dados, foi elaborado um ques- Para a prática dos jogos, o meio mais citado foi
tionário semiestruturado a partir da análise das va- o computador, mencionado por 44,95% dos partici-
riáveis constituintes do fenômeno a ser investigado. pantes; o videogame vem em seguida com 27,18%; o
O conjunto das variáveis explicitadas foi norteador celular com 26,48% e os que utilizam outros meios
para a elaboração das perguntas que compuseram somam 1,39%.
o mesmo. Os aspectos orientadores para a formula- O tempo destinado diariamente aos jogos, se-
ção das perguntas foram: gundo os adolescentes pesquisados, é de menos
de uma hora por dia para 64,28%; uma hora por
a) características gerais dos alunos – idade, gê- dia para 16,43%; duas a quatro horas diárias para
nero, turma; 13,86%; mais de quatro horas ao dia para 5%; e ou-
b) representação e significação do conceito de tros períodos de tempo para 1,43%.
jogo; Quanto à frequência semanal relatada pelos ado-
c) substituição de relações reais por virtuais; lescentes, 47,95% dizem jogar uma vez na sema-
d) tempo gasto nessas atividades; na; 27,40% duas ou três vezes por semana; 7,53%

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jogam quatro ou cinco vezes por semana e 17,12% Em relação à transferência dos sentimentos,
afirmam jogar todos os dias. 70,39% dizem nunca ter manifestado esse compor-
Ao levantar os aspectos sobre o entendimen- tamento por ter perdido um jogo, porém 15,13%
to dos adolescentes sobre o que consideram jogar afirmam já ter desenvolvido esse comportamento
demasiadamente: 43,75% afirmam não importar o uma vez, 12,5% afirmam já ter desenvolvido algu-
tempo que a pessoa joga e sim se o indivíduo aban- mas vezes, 1,32% geralmente, e 0,66% sempre.
dona atividades para fazê-lo, 22,92% dizem que é
jogar todo dia, 26,25% afirmam que se torna evi-
dente o jogo excessivo quando a pessoa fica nervosa Discussão
por não estar jogando, e 2,5% responderam que é
quando se joga mais de uma vez na semana. Com o avanço da tecnologia, os jogos eletrônicos
Para as situações já vivenciadas: 28,26% já per- e virtuais invadiram o cotidiano do homem, estan-
deram a hora de refeições para jogar; 20,65% já dei- do presentes em televisores, celulares, computado-
xaram pessoas esperando por atenção após findar a res, videogames e demais aparelhos eletrônicos que
fase ou o jogo; 13,04% deixaram de ir a passeio com apresentam facilidades e conforto ao homem. A in-
amigos e familiares; 11,41% preferem jogar a sair serção desses meios na vida social vem tornando-se
de casa; 8,70% preferem jogar a praticar atividade uma constante quando falamos em relações huma-
física; 5,44% preferem jogar a parar para conversar; nas principalmente com crianças e adolescentes.
4,89% já seguiram um modelo virtual transportan- O jogo dá ao jogador a possibilidade de construir
do-o para a vida real; 4,35% preferem as relações representações do cotidiano ou da fantasia em um
virtuais às relações reais; e 3,26% já mudaram de mundo virtual em que se podem expressar desejos
ideia em relação a algum assunto com o conheci- internos desenvolvendo realidades subjetivas que
mento que adquiriu com os jogos. o influenciam fazendo que sua relação com o outro
Quando questionados sobre as regras, observa- e com as regras morais sejam flexibilizadas. Deste
-se que estão sendo pouco praticadas conforme res- resultam realidades heterogêneas singulares a cada
postas dos adolescentes: 77,12% dizem não haver um (Ramos, 2008).
regras quanto à prática de jogos eletrônicos; 18,30% Os adolescentes deste estudo relataram que jo-
afirmam que existem regras, seus pais acompanham gam, em sua maioria, com intuito de diversão e in-
e cobram; e 4,58% afirmam que existem regras, mas teração com os amigos, o que caracteriza questões
como não há cobranças, fica a critério deles seguir típicas do período da adolescência de testagens,
a regra ou não. descobertas e satisfação egoica, são momentos em
Quanto à preferência de categorias de jogos, os que se desencadeiam processos físicos, químicos e
adolescentes descrevem altos percentuais em es- psíquicos, os quais são difíceis de compreender e
portes (30,84%), tiro em 1ª e 3ª pessoa (29,34%), com os quais é difícil lidar. Para exemplificar, sele-
e ação, estratégia e luta (19,46%). Os jogos consi- cionamos a resposta do aluno 41 (C.C.C., 18 anos,
derados violentos pelos adolescentes caracterizam masculino); segundo ele, é uma “... forma de se diver-
categorias de tiro em 1ª e 3ª pessoa (67,43%), ação, tir, passar o tempo”. O adolescente busca construir
estratégia e luta (28,03%), esporte (1,89%). conceitos morais para formar sua identidade social,
Com relação aos sentimentos vivenciados du- por isso utiliza recursos de confrontação e simula-
rante a prática, os adolescentes pesquisados afir- ções, utilizando o jogo como um motivador, estimu-
maram que sentem irritabilidade (11,96%), ner- lando o processo cognitivo (Oliveira, 2007).
vosismo (8,49%), sentimento de sucesso (8,84%), Podemos destacar também a função socializa-
raiva (8,32%), que estão em condições de aprendi- dora do jogo que reproduz, mesmo que de maneira
zagem (7,80%), confiança (7,28%), poder (5,37%), lúdica, os padrões, papéis e valores sociais no jogo,
euforia (5,55%), sentimentos de companheirismo favorecendo a apropriação e a experimentação da
(5,37%), alívio (5,02%), excitação (4,51%), autoes- vida na realidade, como um exercício para a vida
tima (4,33%), medo (3,81%), sentimentos agressi- em sociedade. Em outro exemplo, identificamos na
vos (3,47%), ambição (3,47%), frustração (2,43%), resposta do aluno 41 (C.C.C., 18 anos, masculino),
inclusão no grupo de amigos (1,73%), fracasso quando afirma “... No meu celular, videogame, jogo
(1,73%), isolamento (0,35%) e fraqueza (0,17%). com meus primos”.

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Como no estudo de Ferreira e Ribeiro (2000), apresentam conteúdos subliminares imersos em


o computador é o meio mais utilizado por ambos dubiedades escondidas do foco principal de atenção
os gêneros (44,98%), o que se justifica, já que este do jogador que propiciam confusão no indivíduo,
proporciona alto nível de interatividade ao jogador, pois são captadas pelo seu subconsciente memori-
podendo optar por realidades alternativas, a quan- zando ou expressando valores contrários aos acei-
tidade de jogadores e condições de jogo. As múlti- tos no cotidiano real (Batista et al., 2008).
plas opções virtuais e as novas tecnologias que se A dependência dos jogos eletrônicos e virtuais
atualizam diariamente favorecem que outros meios, ocorre à medida que as atividades sociais são subs-
como aparelho de videogame e celular, sejam extre- tituídas pelas atividades nos jogos eletrônicos e o
mamente utilizados por jovens com intuito de inte- indivíduo passa a negligenciar atividades de bem
ratividade lúdica. comum para interagir somente com situações de
Os resultados da investigação realizada se apro- cunho eletrônico ou virtual, necessitando deste
ximam dos encontrados por Hoff e Wechsler (2002) como método de fuga do real. Para exemplificar essa
e Silva, Zapata, Moraes, Doria-Filho e Leone (2006), posição, selecionamos a resposta do aluno 17 (P.C.,
no que se refere ao tempo de jogo e ao gênero que 24 anos, feminino), que afirma “... o significado dos
mais joga. Nesse sentido, evidenciou-se que o gêne- jogos é a exclusão do mundo real”. Essa prática apre-
ro masculino joga mais e constantemente se compa- senta-se como problema de saúde pública mundial,
rado com o gênero feminino. considerando que alguns países como Coreia do Sul,
Os jogos possuem a maioria de seus formatos Alemanha, Holanda e Estados Unidos já possuem
integrados com personagens do gênero masculino, Centros de Tratamento especializados e exclusi-
como relata a organização Children Now (2001), vos para jovens dependentes de meios eletrônicos
que avaliou personagens de videogame em relação (Batista et al., 2008).
ao gênero. Seus resultados indicam que a possibili- Por vezes, um adolescente que gasta horas com
dade de interagir com figuras femininas é menor do os jogos da internet ou videogames poderá per-
que com figuras de animais. Isso torna a figura mas- der oportunidades de construir habilidades so-
culina o ideal de poder e agressividade, na medida ciais com pessoas reais ou perder oportunidades
em que os comportamentos desses personagens de atividade física saudável (Cabral, 2006). Esse
giram em torno de agressividade física. Quanto aos dado em relação aos jogos também foi caracteri-
personagens femininos, estes são marcados pela zado pelos adolescentes em segundo plano, com
agressividade verbal e pela estereotipia do corpo, 8,51% da amostra total, e apresentando porcen-
descrito e exposto como extremamente sexualizado tagem significativa em relação ao gênero feminino
(Alves, 2008). (12,63%), o que pode demonstrar a alteração de
Os adolescentes deste estudo descreveram ca- hábitos saudáveis em decorrência da integração
racterísticas associativas entre a frequência de jogo, cotidiana da tecnologia.
sentimentos negativos latentes e atividades so- Atividades como deixar de realizar refeições, de
ciais em stand-by. Segundo Batista, Quintão e Lima participar de passeios, deixar pessoas esperando e
(2008), a frequência inadequada dos jogos pode de- dar prioridade aos jogos, citadas como opção prefe-
senvolver problemas de saúde, emocionais, poden- rencial na vida dos adolescentes, podem prejudicar
do até configurar-se como vício. O jogador passa a seu convívio social e familiar. Pensando coletiva-
necessitar do prazer de jogar, que o deixa ansioso mente, em sociedade, esses comportamentos geram
e provoca fugas ou abandono de comportamentos uma gama de complicações em relação ao diálogo,
sociais reais, além de insônia, baixo rendimento es- sistema familiar e social funcional, pois o indivíduo
colar, falta de paciência para resolver questões que acaba por satisfazer-se mais com relações virtuais
necessitem de elaboração mental mais complexa. do que com as reais, gerando desconforto nas pes-
Ao exercer a prática dos jogos, os adolescentes soas que fazem parte do seu sistema.
podem perceber ou não a intensidade dos senti- Os sentimentos relatados pelos adolescentes em
mentos, predispondo-se a comportamentos violen- relação à prática dos jogos apontam uma questão
tos, transportando a agressividade para o contexto dúbia, pois, mesmo os jovens dizendo que jogam
social, chegando até a acreditar que essa seja uma para se divertir, os sentimentos mais citados foram
prática comum do convívio social. Alguns jogos negativos, como irritação e nervosismo. Seria essa

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uma forma de catarse ou a influência dos jogos pro- desejos de comportamentos violentos (Anderson
voca esse tipo de reação? & Bushman, 2001), podendo resultar em episódios
As principais críticas aos jogos tratam exatamen- como o atentado em Columbine, ocorrido em 1999
te dessa questão: os modelos simbólicos estimulam, onde dois jovens, Eric Harris, de 18 anos, e Dylan
ensinam ou desinibem comportamentos agressi- Klebold, de 17 anos, atiraram em colegas e profes-
vos? A dessensibilização das situações de violência sores motivados por jogos de videogame. Uma sé-
torna o indivíduo resiliente a ela, banalizando as si- rie de tiroteios que aconteceram em Washington
tuações e distorcendo a realidade, criando uma ver- levou o caso também de dois jovens de 17 anos a
são paralela e uma percepção paranoide do mundo. júri; partes afirmavam que os jovens foram trei-
Também há a hipótese de que a ativação emocional nados para matar enquanto se entretinham com
pode mediar comportamentos entre jogos violentos jogos de videogame (Anderson & Dill, 2000).
e agressividade, por aumento da atividade e parti- Segundo Alves (2004), Olson (2004), Ferreira e
cipação ativa do indivíduo ao vivenciar atividades Ribeiro (2000) e Ramos (2008), a exposição aos
com conteúdos violentos, o emocional interage com conteúdos de violência promove pensamentos e
a forma interpretativa das situações, desencadean- ações violentas que podem desenvolver esse tipo
do irritabilidade e agressividade. Ferreira e Ribeiro de comportamento.
(2000) defendem a hipótese da catarse, em que o A falta de regras pela figura de autoridade pode
jogo contribui para liberação da descarga latente da gerar interpretações nas quais os adolescentes
agressividade do indivíduo. acreditam poder ter o controle sobre a prática. Essa
A exposição de crianças e adolescentes a conteú- atitude também pode ser observada em estudo rea-
dos violentos, com dubiedade de interpretação ou lizado por Ferreira e Ribeiro (2000); a maioria dos
estereotipagem de conteúdos latentes do cotidiano pais permite que os filhos pratiquem jogos tanto
como forma de estímulo, pode favorecer pensa- tempo quanto quiserem, deixando-os livres para
mentos e ações hostis e desarmônicas em relação decidir o tempo dispensado, categoria a ser jogada e
às aceitas em sociedade (Bushman & Huesmann, se essa corresponde à faixa etária adequada às suas
2006; Gentile et al., 2004; Haninger, Ryan & necessidades.
Thompson, 2004; Lynch et al., 2001; Olson, 2004). Diante dessa situação, a atitude dos pais pode
Stateri (2007) remete-se ao critério de que a indi- ser compreendida como um descompromisso em
vidualidade do jogador está associada a valores e relação às escolhas de seus filhos; isso, porém, pode
subjetividade da qual será constituída sua identida- ser explicado pelo fato de que a modernidade trou-
de de acordo com sua realidade, tendo plena liber- xe distorções às atitudes parentais, agora marcadas
dade de escolha para aceitar regras e definições do por abnegações de atitudes repreensivas e pela ên-
jogo, sendo assim responsáveis pela opção e reação fase em atitudes permissivas. Isso denota, inclusive,
decorrentes do ato de jogar. Para Cabral (2006), os o entendimento equivocado do Estatuto da Criança
jogos constituem espaços de elaboração de confli- e do Adolescente (ECA), que prevê a seguridade em
tos, medos e angústias. Esses jogos ajudam a lidar aspectos biopsicossociais.
com emoções e agressividade, prepotência e rebel- Outro motivo para esse comportamento é o fato
dia, de um ponto de vista individual e psicológico, de os pais acreditarem que se o filho está dentro de
com o agravante de banalizar a violência, na medida casa, em frente ao computador ou videogame, está
em que estetizam a morte, a brutalidade e o sangue, seguro. Infelizmente, esses pais podem estar enga-
tendendo naturalizar aquilo que é essencialmen- nados, pois o perigo pode estar nas associações e
te social, reafirmando e generalizando a violência leituras que esses adolescentes fazem e a materia-
como um dado da natureza humana. lização que efetuam dessas informações. É impor-
A violência está propagada nos meios eletrôni- tante estar atento às reações derivadas da prática,
cos e virtuais com conotação simbólica maior do pois é possível observar comportamentos disfun-
que a relacionada com a violência física, em razão cionais como consequências de sentimentos como
de imagens mentais que são desenvolvidas no cog- a frustração.
nitivo do sujeito e alimentadas por questões indi- Segundo Alves (2004) e Ramos (2008), os jo-
viduais e sociais. Essas influências podem invocar gos eletrônicos e virtuais são divididos por temas
a memória do pensamento agressivo, despertando como ação, estratégia, luta, tiro, RPG, simuladores e

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envolvem em suas entrelinhas uma série de carac- É importante ressaltar que os adolescentes des-
terísticas associadas ao processo cognitivo. Alguns se estudo descreveram alguns dos efeitos negativos,
exemplos constituem características das categorias: porém não demonstram a capacidade de percepção
o RPG (Role Play Game) demanda habilidades sim- da situação vivenciada em relação à da situação
ples até complexas avaliações e tomada de decisões; discutida.
jogos de competição, lutas que definem vencedores
e perdedores, produzem sentimentos de inferiori-
dade e de fracasso, superioridade e poder; jogos de Considerações finais
tiro ao alvo estimulam a capacidade visual e motora;
esporte e corrida são caracterizados por detalhes e Com base nos dados obtidos e mediante os
precisão; e os simuladores colocam os jogadores em métodos utilizados nesta investigação, é possível
situações vivenciais, proporcionando liberdade de perceber as diferenças entre as diversas faces e in-
escolha e práticas sequenciais. terpretações dos adolescentes entrevistados, carac-
Nesse estudo, observou-se que a maioria dos terizando a prática dos jogos eletrônicos e virtuais.
adolescentes mergulha no mundo virtual sem per- Os adolescentes entendem que os jogos funcio-
ceber que a maioria dos jogos citados por eles como nam como métodos para extravasarem seus sen-
violentos são os mesmos que, em alguns casos, eles timentos e se divertirem. Eles descrevem passar
praticam diariamente. Jogos que inicialmente carac- grande quantidade de tempo em frente a máquinas,
terizamos como ação, esporte, ou em sua descrição deixando atividades sociais e familiares em segundo
já indicam a prática de tiros em primeira ou terceira plano, visando à satisfação da conclusão do jogo ou
pessoa, também direcionam a vontade do adoles- fase naquele momento. Não demonstram perceber
cente em satisfazer conteúdos agressivos latentes, que as características que citam como negativas na
podendo transformá-los em comportamento vio- utilização dos meios eletrônicos são os comporta-
lento real. mentos que efetivamente praticam no seu dia-a-dia.
Adolescentes acometidos por sinais e sintomas É importante ressaltar a utilização dos meios
de dependência apresentam comportamentos de tecnológicos de forma adequada e com orientação
frustração e desapontamento quando não jogam para o desenvolvimento de habilidades como o ra-
ou atingem seus objetivos (Abreu, Karam, Góes & ciocínio, a lógica, a percepção motora, agilidade de
Spritzer, 2008). Parte desses adolescentes afirma pensamento, atenção, reflexão, estratégias de jogo,
perceber os sintomas físicos e psicológicos como planejamento, curiosidade, criatividade, ludicidade,
consequência do uso excessivo dos jogos. Batista organização, compromisso, respeito e aprimora-
et al. (2008) indicam que os sintomas do convívio mento de escolares.
diário com meios eletrônicos e virtuais é percebido Estudar esses comportamentos, desenvolver
quando da descrição de efeitos fisiológicos e psico- trabalhos preventivos, de orientação e de resgate do
lógicos. Esses trazem como efeito negativo cansaço cotidiano social real, é de impreterível necessidade
físico e mental interferindo na produtividade do co- para que se desenvolvam adolescentes aptos a viver
tidiano e no desenvolvimento social. relações saudáveis, mesmo estando em contato efe-
Percebe-se que, como em outros estudos (Alves, tivo com os meios eletrônicos e virtuais.
2008; Bushman et al., 2006; Ferreira e Ribeiro,
2000; Lynch et al., 2001; Ramos, 2008), os jogos ele-
trônicos e virtuais possuem efeitos positivos como Referências
reforço para aprendizagem por meio de jogos edu-
cacionais, efeitos terapêuticos relativos à catexis dos Abreu, C. N., Karam, R. G., Góes, D. S., & Spritzer, D. T. (2008).
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