Prática Discursiva

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PRÁTICA DISCURSIVA: UMA REFLEXÃO SOBRE LÍNGUA, LINGUAGEM,


IDEOLOGIA E DISCURSO NA CONCEPÇÃO DA ANÁLISE DO DISCURSO DE
FILIAÇÃO FRANCESA

DISCURSIVE PRACTICE: A REFLECTION ON LANGUAGE, LANGUAGE,


IDEOLOGY, AND DISCOURSE IN THE CONCEPTION OF DISCOURSE
ANALYSIS OF FRENCH AFFILIATION

Kenner Roger Cazotto Terra


Doutor em Ciências da Religião
Faculdade Unida de Vitória
([email protected])

Sonia Maria da Fonseca Souza1


Mestre em Educação Doutoranda em Cognição e Linguagem
Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro – UENF
([email protected])

Clodoaldo Sanches Fófano2


Faculdade Unida de Vitória
([email protected])

RESUMO: O presente artigo tem por objetivo apresentar, para discussão, uma reflexão sobre
a prática discursiva que se constrói por meio de textos, linguagem como instrumento de
interação discursiva, como único canal de comunicação do ser humano que se concretiza por
intermédio da língua, integrando todo ato de enunciação. Além disso, apresenta a linguagem
como código ideológico dentro do universo discursivo, elemento importante na formação da
compreensão de mundo de grupos sociais. Para isso, realizou-se uma pesquisa bibliográfica
de base qualitativa, considerando as contribuições de teóricos como Brandão (2004), Fiorin
(1993), Orlandi (2008) entre outros. Desse modo, inferiu-se que cada formação ideológica
corresponde a uma formação discursiva, a qual é ensinada para cada componente de uma
sociedade ao longo do processo de aprendizagem linguística. Sendo assim, o discurso
dominante vai ser a base que refletirá no comportamento do homem. Portanto, língua,
linguagem, ideologia e discurso fazem parte de uma teia indispensável para a construção da
concepção da Análise do Discurso de filiação francesa (ADF), que é uma teoria especializada
em analisar ideologias que permeiam situações discursivas de textos impressos.
Palavras-chave: Prática Discursiva. Língua. Linguagem. Ideologia. Discurso.

ABSTRACT: This article aims at presenting, for discussion, a reflection on the discursive
practice that is constructed through texts, language as an instrument of discursive interaction,
as the only channel of communication of the human being that is concretized through
language, integrating every act of enunciation. Moreover, it presents language as an
ideological code within the discursive universe, an important element in the formation of the
world understanding of social groups. For this, a qualitative bibliographical research was
carried out, considering the contributions of theoreticians like Brandão (2004), Fiorin (1993),
Orlandi (2008), among others. In this way, it was inferred that each ideological formation
corresponds to a discursive formation, in which each component of a society is taught

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Doutoranda em Cognição e Linguagem
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Mestrando em Ciências das Religiões

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throughout the process of linguistic learning. Thus, the dominant discourse will be the basis
that will reflect on the man’s behavior. Therefore, language, ideology, and discourse are part
of an indispensable web for the construction of the French Discourse Analysis (FDA)
conception, which is a theory specialized in analyzing ideologies that permeate discursive
situations of printed texts.
Keywords: Discursive Practice. Language. Language. Ideology. Speech.

Introdução

Toda prática discursiva se dá por meio de textos. A produção de um texto será


o resultado da atividade comunicativa, que se faz seguindo regras e princípios
discursivos. Dentro da prática discursiva, língua e linguagem são vocábulos de
diferentes significações. Mas ao mesmo tempo são elementos que fazem parte do ato
comunicativo. Assim sendo, linguagem significa capacidade de comunicação que
apenas os seres humanos possuem. Meio que viabiliza o processo de comunicação
entre sujeitos discursivos. Já língua, deve ser definida como conjunto de sinais, um
sistema de signos, utilizados para se comunicarem socialmente. De tal forma, o
processo de interação verbal passa a ser uma realidade fundamental da língua.
Assim, língua e linguagem se manifestam no exercício da comunicação
interacional e dialógico envolvendo enunciador e enunciatário, entre os quais se
firmam valores e crenças a ser compartilhadas. Isso se torna uma realidade quando o
enunciador estabelece um diálogo com o enunciatário não como um decodificador de
mensagem, mas como um elemento ativo na construção do significado.
É nesse método de interação comunicativo que surge o discurso, que por sua
vez, é muito mais representação do que criação. Por isso, dentro da prática discursiva,
encontra-se a manifestação das ideologias, que nada mais é do que a forma de ver o
mundo de um determinado grupo social, um conjunto de representações. Seguindo
esse raciocínio, a linguagem vai ser o veículo das ideologias, o instrumento de
mediação entre os homens.
Nessa dimensão, ideologia não é um conjunto de ideias que surge do nada ou
da mente privilegiada de apenas muitas pessoas. Na verdade, as ideologias
dominantes vão ser determinadas por grupos sociais que desejam manipular os
indivíduos de forma que eles permanecem no controle, no poder. Para perceber as
ideologias presentes em uma prática discursiva, o analista precisa penetrar nas
entrelinhas do texto e interpretar as diversas visões de mundo dos diferentes grupos
sociais, mas em especial, das classes dominantes.

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Prática discursiva no universo discursivo

A Linguística Textual quando surgiu teve um progressivo afastamento da


influência da Linguística Estrutural saussuriana. Para tanto, a Linguística Textual em
seu primeiro instante voltou-se para a análise transfrástica, para fenômenos que não
conseguiam ser explicados pelas teorias sintáticas e/ou semânticas, que ficassem
limitados ao nível da frase. Nesse primeiro momento a Linguística Textual estava
preocupada com a relação entre frases e período, sem levar em consideração o
contexto, assim, o texto era visto como uma estrutura acabada e pronta, com único
início e o fim mais ou menos explícito.
Conforme Mussalin & Bentes (2001, p. 247):

Na análise transfrástica, parte-se da frase para o texto. Exatamente


por estarem preocupados com as relações que se estabelecem entre
as frases e os períodos, de forma que construa uma unidade de
sentido, os estudiosos percebem o fenômeno que não consegue ser
explicado pelas teorias sintáticas: o fenômeno da co-referenciação,
por exemplo, ultrapassa a fronteira da frase e só pode ser melhor
compreendido no interior do texto.

Em um segundo momento, com a euforia produzida com o sucesso da


gramática gerativa, postulou-se a descrição da competência textual do falante, assim,
a construção das gramáticas textuais. Nesse período, passaram a postular o texto
como unidade teórica formalmente construída, em oposição ao discurso, unidade
funcional, comunicativa e intersubjetivamente construída. Mussalin & Bentes (2001, p.
249) ressaltam, outra vez, que

O fato de ter sido necessário considerar, na construção do sentido


global do enunciado, o conhecimento intuitivo do falante acerca das
relações a serem estabelecidas entre sentenças, e o fato de nem todo
texto apresentar o fenômeno da co-referenciação, constituíram-se em
fortes motivos para a construção de uma outra linha de pesquisa, que
não considerasse o texto apenas como uma simples soma ou lista
dos significados das frases que o constituem. Passou-se, então, ao
objeto de elaborar gramáticas textuais.

Em um terceiro momento, o texto passa a ser estudado dentro do seu contexto


de produção e passa a ser entendido, não como um objeto acabado, mas como um
processo, resultante de operações comunicativas e processos linguísticos
sociocomunicativos. Dessa forma, parte para a elaboração de uma teoria do texto. É
nesse momento, que os estudiosos passam a dar particular importância ao tratamento

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do texto no seu contexto pragmático. Assim, no final da década de setenta, a palavra


de ordem não era mais a gramática de texto, mas a noção de textualidade. Assinala,
ainda, Mussalin e Bentes (2001, p. 247) que

em vez de dispensarem um tratamento formal e exaustivo ao objeto


“texto”, os estudiosos começaram a elaborar uma teoria do texto, que,
ao contrário das gramáticas textuais, preocupadas em descrever a
competência textual de falantes/ ouvintes idealizados, propõe-se a
investigar a construção, o funcionamento, a produção e a
compreensão dos textos em uso.

A noção de textualidade ou textura pressupõe que não existe texto sem coesão
e coerência, portanto, são esses elementos que fazem a sequência linguística ser
reconhecida como texto, e não um amontoado aleatório de frases. Reconhecer a
sequência como texto significa dizer que aquele que a recebe é capaz de percebê-la
como unidade significativa global.
A coesão está relacionada com a construção de sentido do texto, ao modo
como os elementos linguísticos presentes na superfície do texto encontram-se
interligados, por meio de recursos também linguísticos, formando sequências
condutoras de sentido. E a coerência, de acordo com Koch (1997, p. 256), “diz respeito
ao modo como os elementos subjacentes à superfície textual vêm a construir, na
mente dos interlocutores, uma configuração veiculadora de sentidos”.
Assim, os estudiosos passam a postular que a comunicação é estabelecida por
meio de textos e o trabalho da competência comunicativa corresponde ao
desenvolvimento da capacidade de produção e compreensão de textos nas mais
diferentes situações de interação comunicativa a fim de que se representem situações
discursivas de enunciação.
No sentido de corroborar com o assunto exposto, Fonseca F. e Fonseca J.
(1997, p. 84-85) enfatizam que

O texto tem de ser visto como produto de um ato de fala, como


discurso, isto é, como enunciado que traz em si as marcas do
processo de enunciação, as marcas da adequação às finalidades
próprias de cada intento de comunicação em situação específica, as
marcas de ações cumulativas desenvolvidas em cada ato verbal.

Para se compreender texto como prática discursiva, faz-se necessário


conceituar discurso, que por sua vez é toda atividade comunicativa produtora de
efeitos de sentido de um enunciador em uma situação de comunicação determinada,

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reunindo não só o conjunto de enunciados por ele produzido em tal situação, como
também o evento de enunciação, que é regulada por uma exterioridade sócio-histórica
e ideológica, que determina as regularidades linguísticas e seu uso, sua função.
Segundo Koch e Travaglia (2000, p. 67):

Texto será entendido como uma unidade linguística de sentido


concreto (perceptível pela visão ou audição), que é tomada pelos
usuários da língua (falante, escritor/ouvinte, leitor), em uma situação
de interação comunicativa específica, como uma unidade de sentidos
e como preenchendo uma função comunicativa reconhecível,
independente da sua extensão.

Nesse sentido, texto será o resultado da atividade comunicativa, que se faz


seguindo regras e princípios discursivos. Tal unidade comunicativa é de sentido
complexo, todo significativo em relação à situação em que ele é produzido. O sentido
está relacionado com a intenção comunicativa e com a situação sócio-histórica.
Para os estudos do texto, pode-se citar a escola de semiótica da cultura de
Tartú-Moscou, que tem I. Lótman como principal representante. O texto, para Lótman,
tem três funções: (1) função comunicativa; (2) função geradora de sentido; (3) função
mnemônica (LÓTMAN, 2007). A primeira função foi a mais observada pelos linguistas
durante muito tempo. Essa mostra o texto como processo de realização da língua
natural. A função da linguagem seria transmitir a mensagem de um emissor ao
receptor — qualquer ruído atrapalharia a função do texto. Tal função se refere aos
textos monossêmicos, manualísticos. A segunda função tem relação com o seu
potencial polissêmico, o que proporciona a produção de novos textos no ato da
comunicação de textos não mecânicos/manuais.
Os códigos que decifram os textos deformam o texto do emissor. No encontro
dos códigos, para decifrá-los, acontece o ruído que seria o potencializador da
renovação. O código do emissor A é diferente daquele do emissor B e, no contato do
código A com o B, gera-se um novo texto: quem lê o texto tem pressupostos, questões
e conhecimentos diferentes do emissor (NOGUEIRA, 2012, p. 22). O ruído, na
verdade, é o necessário corolário do encontro dos códigos de quem produz e quem lê
o texto. Dessa maneira, o ruído, enquanto resultado das complexas relações inerentes
ao poliglotismo interno do texto, torna-se o responsável pela gestação de novos
sentidos (RAMOS et.al., 2007, p. 32).

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A terceira função do texto é a mnemônica. Como bem diz Lótman, “o texto não
é somente o gerador de novos significados, mas também um condensador de
memória cultural. Um texto tem a capacidade de preservar a memória de seus
contextos prévios” (LÓTMAN, 2007, p. 22). Esse processamento se faz possível por
meio da tradução de tradições (LÓTMAN, 1993, p. 19). Por isso, os textos que estão
na cultura estão em encontros explosões semiótica.
Koch e Travaglia (2012, p. 79) apontam que

A intencionalidade refere-se ao modo como os emissores usam texto


para perseguir e realizar suas intenções, produzindo, para tanto,
textos adequados à obtenção dos efeitos desejados. Para os autores
a intencionalidade tem uma relação estreita com a argumentatividade.

Os elementos da língua têm um valor significativo preferencial, que estão


relacionados a determinados recursos da língua (fonema, morfema, palavra,
entonação, sintagma, frase, sequência de frases), quando usados como texto em uma
dada sociedade, em um dado momento de sua história. O efeito de sentido fica no
signo, que seria o resultado de todas as forças que atua no signo.
Dessa forma, o sentido preferencial de determinado elemento da língua seria
aquele em que o componente é mais comumente empregado em virtude de
determinadas condições de produção mais frequente na sociedade. Em textos
extremos, que envolvem tabus e fortes preconceitos da ideologia de uma sociedade,
a percepção dessa ideologia pelo interlocutor fica mais fácil.
Mister se faz destacar que o texto não é definido pela sua extensão, ele pode
ser, desde uma só palavra até muitas frases, enunciados e páginas, como por
exemplo, um romance, portanto, o que delimita o que é um texto para a Análise do
Discurso (AD) é o fato de, ao se referindo à discursividade, constituir uma unidade em
relação à situação.
Discini (2005, p. 29) afirma: “O texto é, em princípio, um signo, o que quer dizer
que possui um significado por meio de uma expressão quer pode ser verbal, visual,
entre outros tipos”. É na tentativa de análise desse signo que o receptor vai buscar e
perceber o implícito no texto, as informações que estão nas entrelinhas, como se fosse
um palimpsesto, que pode ser definido como uma página manuscrita cujo conteúdo
foi apagado (mediante lavagem ou raspagem) e escrito novamente, normalmente nas
linhas intermediárias ao primeiro texto ou em sentido transversal. Para ampliar o

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entendimento sobre o implícito, faz-se necessário observar o que ressalta Orlandi


(2008, p. 11):

Quando se lê, considera-se não apenas o que está dito, mas também
o que está implícito: aquilo que não está dito e que também está
significando. E o que não está dito pode ser de várias naturezas: o
que está suposto para que se entenda o que está dito; aquilo a que o
que está dito se opõe; outras maneiras diferentes de dizer o que se
disse e que significa com nuances distintas etc.

Portanto, verifica-se que os textos apresentam mensagens linguísticas com


graus diferentes de explicitude que às vezes não podem ser previstos apenas com
base no sentido literal. Desta forma, as mensagens linguísticas se manifestam de
forma implícita ou explícita.
Para Ilari (2006, p. 85),

podem ser consideradas implícitas todas as informações que uma


sentença vincule, sem que o falante se comprometa explicitamente
com sua verdade. Essas informações precisam ser “inferidas” a partir
da sentença por meio de algum raciocínio que parte da própria
sentença.

Assim, o implícito só pode ser descoberto por meio de um trabalho realizado a


partir de uma avaliação global da situação comunicativa em que o receptor procura
recuperar as possíveis intenções do enunciador. Somente um receptor sensível vai
perceber que no sentido literal de um texto contém frequentemente informações
implícitas, embora previsíveis.
Essas informações se apresentam de duas formas, denominadas casos de
pressuposição e do acarretamento. Ilari (2006, p. 85) esclarece ainda:

[...] uma informação é pressuposta quando ela se mantém mesmo


que neguemos a sentença que a veicula. [...]. Sempre que um certo
conteúdo está presente tanto na sentença como em uma negação,
dizemos que a sentença pressupõe esse conteúdo. [...]. Temos
acarretamento toda vez que a verdade de uma sentença implica a
verdade de uma outra, simplesmente pela significação de suas
palavras. Geralmente, os acarretamentos resultam do uso de
palavras de sentido específico [...].

Sendo assim, através da inferência, produz-se uma interpretação, uma


construção de significado integral, que vai além do arranjo de palavras. Esse
significado desperta o receptor, na produção discursiva, para algo que com simples
olhares não seria possível dar ao texto uma interpretação dotada de sentidos.

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Igualmente, para alcançar esse objetivo, será preciso que o receptor ponha em
funcionamento todos os componentes e estratégias cognitivas que tem a disposição.

Língua/ linguagem: uma abordagem interacionista

O termo linguagem apresenta uma variedade de significados. Entre eles o mais


utilizado é aquele que se refere a qualquer processo de comunicação, como a
linguagem corporal, a linguagem da sinalização, a linguagem escrita etc.
Nesse sentido, os linguistas, estudiosos da linguagem, geralmente
estabelecem uma distinção entre os conceitos de língua e linguagem. Assim,
entendendo linguagem como uma habilidade; a linguística define o termo como
capacidade que apenas os seres humanos possuem como instrumento de se
comunicar por intermédio de línguas. Do mesmo modo, tal palavra "língua" é
geralmente definida como um sistema de signos vocais utilizados como meio de
comunicação por membros de uma comunidade linguística ou grupo social.
Para Cunha, Costa e Martellota (2008, p. 18), “a linguagem é um dos
ingredientes fundamentais para a vida em sociedade. Dessa maneira ela está
relacionada à maneira como interagimos com os nossos semelhantes, refletindo
tendências de comportamento delimitadas socialmente”. Quando se fala em
linguagem, logo se remete a Saussure, quer tomando seus postulados como ponte
de partida, quer rejeitando-os. Esse estudioso em suas teorias parte do princípio que
a língua, como um sistema que contém um conjunto de regra, é uma instituição social,
cuja concretização se concebe por meio da necessidade de comunicação, assim, é
preciso ter um emissor e um receptor (interação), para que haja comunicação entre
os homens.
A transmissão da linguagem pode ser desempenhada de diversas formas, tanto
por meios linguísticos, como a fala e a escrita, como por meios não linguísticos, como
os gestos, mímicas etc., que por vezes tentam imitar a linguagem falada. É partindo
do pressuposto saussuriano que se deve dizer que a linguagem é o meio de
comunicação mais importante. Para justificar esta afirmação, Benveniste (1988, p. 284
-293) sugere duas razões importantes:

Uma consistiria em que a linguagem, sem dúvida, se encontra de fato


assim empregada porque os homens não encontram um meio melhor
nem mesmo tão eficaz para comunicar-se. [...]. Poderíamos também
pensar em responder que a linguagem apresenta disposições tais que

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a tornam apta a servir de instrumento: presta o que lhe confio - uma


ordem, uma pergunta, um anúncio -, e provoca no interlocutor um
comportamento, cada vez, adequado.

Diante disso, observa-se que a linguagem produz um comportamento


behaviorista, em termos de estímulo e resposta. Dessa maneira, verifica-se que a
linguagem através do estímulo e resposta, cumpre sua função, que de acordo com
Roman Jakobson (2015), vai muito mais além do que transmitir uma informação, pois
é preciso que a mensagem transmitida seja compreendida.
A linguagem se manifesta no exercício da comunicação, por isso dizer que a
linguagem, na prática do cotidiano, sugere uma troca ao assumir uma função veicular.
E o sujeito é a pedra angular para a AD dentro desse constituindo comunicativo, pois
é por meio dele que surge os discursos, embora ele não seja o centro do seu discurso.
Assim, o processo de interação verbal passa a ser uma realidade fundamental
da língua. Essa compreensão da linguagem como instrumento de interação social,
que o outro desempenha papel fundamental, integra todo ato de enunciação individual
num contexto mais amplo, relevando as relações intrínsecas entre linguístico e o
social.
Bakhtin (1979) trilhou um caminho diferente de Saussure (1974), ao criticar a
objetividade abstrata do linguista, que trata a língua como um sistema monológico.
Para tanto, o filósofo afirma que a verdadeira substância da língua não é constituída
por um sistema abstrato de forma linguística, mas pelo fenômeno social da interação,
realizada por meio da enunciação e das enunciações.
Segundo Bakhtin nas palavras de Brandão (2004, p. 62),

não tomo consciência de mim mesmo senão através dos outros, é


deles que eu recebo as palavras, as formas, a tonalidade que forma
a primeira imagem de mim mesmo. Só me torno consciente de mim
mesmo, revelando-me para o outro, através do outro, com a ajuda do
outro.

Sendo assim, para o filósofo a palavra não é monológica, mas plurivalente. E a


dialogização do discurso tem uma dupla orientação: uma voltada para os "outros
discursos" como processo constitutivo do discurso, outra voltada para o outro da
interlocução - o destinatário. Isso se torna uma realidade à medida que o locutor
estabelece um diálogo com o destinatário não como um decodificador de mensagem,
mas como um elemento ativo.

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Para ampliar tal ideia vale ressaltar que em todo discurso existe um sujeito
destinador e um sujeito destinatário, entre os quais se firmam valores e crenças a ser
compartilhadas. Um sujeito sempre responde ao outro, a outros sujeitos, por isso todo
texto é dialógico. Também importa saber que todo texto é discursivo, portanto, importa
considerar o discurso como práxis enunciativa. Discini (2005, p. 33) destaca que:

A propósito, cabe destacar que o sujeito da enunciação, depreensível


do enunciado, passa a ser concebido não mais como um mero
emissor, aquele que simplesmente fala, nem mais como um mero
receptor, aquele que simplesmente escuta. [...] Todos os textos
supõem na enunciação sujeitos alterados por quereres, deveres,
poderes, saberes; sujeitos dados pela falta de um objeto de desejo a
ser buscado; sujeitos complexos, sujeitos em contínua construção [...]

Seguindo essa linha de raciocínio, pode-se afirmar que todo texto deve ser
considerado situação de comunicação, o que supõe um enunciador em relação a um
enunciatário. A enunciação, sempre pressuposta ao anunciado, compreendendo o
sujeito do dizer, que se biparte entre enunciador, projeção do autor, e enunciatário,
projeção do leitor. Para Fiorin (2008, p. 56):

A enunciação define-se como a instância de um eu-aqui-agora. O eu


é instaurado no ato de dizer: eu é quem diz eu. A pessoa a quem o
eu se dirige é estabelecida como tu. O eu e o tu são os atacantes da
enunciação, os participantes da ação enunciativa. Ambos constituem
o sujeito da enunciação, porque o primeiro produz o enunciado e o
segundo, funcionando como uma espécie de filtro, é levado em
consideração pelo eu na construção do enunciado.”

Ao se produzir um enunciado, o enunciador o faz de forma persuasiva, procura


fazer de forma que o enunciatário aceita o que ele diz, à medida que o enunciatário
realiza um fazer interpretativo. A fim de exercer a persuasão, o enunciador utiliza-se
de um conjunto de procedimentos argumentativos, que se torna parte integrante das
relações entre o enunciador e o enunciatário. Ainda, de acordo com Fiorin (2008, p.
75):

A finalidade última de todo ato de comunicação, não é informar, mas


persuadir o outro a aceitar o que está sendo comunicado. Por isso, o
ato de comunicação é um complexo jogo de manipulação com vistas
a fazer o enunciatário crer naquilo que se transmite. Por isso, ele é
sempre persuasão.

Além disso, dentro do processo de enunciação, segundo Benveniste nas


palavras de Brandão (2004, p. 56) “Imediatamente, desde que ele se declara locutor

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e assume a língua, ele implanta o outro face a ele, qualquer que seja o grau de
presença que ele atribuía a esse outro”. Logo toda enunciação é, explicitamente ou
implicitamente uma alocução (discurso breve).
Assim, dentro tal processo, declara-se que existe uma relação de interação
entre esses sujeitos. Segundo Travaglia (2000, p. 69) “[...] quando usamos a língua
para comunicar agimos sobre o outro. Mas essa ação não é unilateral, tem mão dupla,
o que acontece é uma interação, uma ação entre o produtor e o receptor do texto”.
Bakhtin chamou tal relação de dialogismo. Por outro lado, a crítica literária contribuiu
com esse postulado ao dizer que o escritor deveria se preocupar com a estética da
recepção.

Língua, linguagem, ideologia e discurso

A AD tem suas origens na Filosofia da Linguagem. Foi essa vertente da


Filosofia que proporcionou uma preocupação com a linguagem enquanto código
ideológico. Brandão (2004, p. 30) define de forma ampla ideologia “[...] como uma
visão, uma concepção de mundo de uma determinada comunidade social numa
determinada circunstância histórica”. Fiorin (1993, p. 28) acrescenta “a esse conjunto
de ideias, a essas representações que servem para justificar e explicar a ordem social,
as condições de vida do homem e as relações que ele mantém com os outros homens
é o que comumente se chama ideologia”.
Em Bakhtin (1992) se observa grandes contribuições para a AD ao inserir nela
a Filosofia da Linguagem. Segundo esse filósofo a primeira tendência da linguística
interessava apenas pelo ato da fala, deixando de lado o efeito de sentido entre os
interlocutores. Porém, por intermédio dos estudos de Bakhtin começou-se a aproximar
linguística com filosofia na tentativa de externar aquilo que o sujeito representa e
pensa, ou seja, sua ideologia. A linguagem é o veículo das ideologias, o instrumento
de mediação entre os homens.
Ideologia é um termo que ainda hoje apresenta uma noção confusa de
significados. Por isso observa-se que esse termo é abordado por vários pensadores.
Sendo assim, cabe aqui destacar alguns.
Segundo Chauí citada por Brandão (2004, p. 19):

o termo “ideologia”, criado pelo filósofo Destutt de Tracy em 1810 na


obra Elements de idéologie, nasceu como sinônimo da atividade

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científica que procurava analisar a faculdade de pensar, tratando as


ideias “como fenômeno naturais que exprimem a relação do corpo
humano, enquanto organismo vivo, com meio ambiente”.

Contrariando esse significado original, Napoleão na concepção de Brandão


(2004, p. 19): aplica a esse termo um significado pejorativo, ao qualificar os
ideológicos franceses de “abstratos, nebulosos, idealistas e perigosos (para o poder)
por causa do seu desconhecimento dos problemas concretos”. Desse modo, a
ideologia passa a ser vista como uma doutrina irrealista e sectária, sem
fundamentação objetiva, e perigosa para ordem estabelecida.
Marx e Engels citados por Brandão (2004, p. 19) empregam o termo ideologia
com uma carga semântica negativa, semelhante a Napoleão, “condenam a maneira
de ver abstrata e ideológica” dos filósofos alemães que, perdidos na sua fraseologia,
não buscam a “ligação entre filosofia alemã e a realidade alemã, o laço entre sua
crítica e seu próprio meio material”.
Marx e Engels, para Brandão (2004, p. 21),

identificam “ideologia” com a separação que se faz entre a produção


das ideias e as condições sociais e histórias em que são produzidas.
Por isso é que eles tomam como base para suas formulações apenas
dados possíveis de uma verificação puramente empírica [...]

Portanto, para esses pensadores o que as ideologias fazem é colocar os


homens e suas relações de cabeça para baixo, desviando o percurso que consiste em
partir das ideias para chegar à realidade.
Brandão (2004, p. 21) apoiando-se em Chauí destaca que “Ela é um
instrumento de dominação de classes, nesse sentido, a classe dominante faz com que
sua ideologia seja a de todos os outros. É neste momento que nasce a ideologia
propriamente dita”.
E para Marx e Engels, segundo Chaui corroborando com Brandão (2004, p.
21):

As ideias da classe dominante são, em cada época, as ideias


dominantes, isto é, a classe que é forçada material dominante da
sociedade é, ao mesmo tempo, sua força espiritual. A classe que tem
à sua disposição os meios de produção material dispõe, ao mesmo
tempo, dos meios de produção espiritual. [...] Na medida em que
dominam como classe e determinam todo o âmbito de uma época
histórica, é evidente que o façam em toda a sua extensão e,
consequentemente, entre outras coisas, dominem também como

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pensadores, como produtores de ideias; que regulam a produção e


distribuição de ideias de seu tempo e que suas ideias sejam, por isso
mesmo, as ideias dominantes da época.

Em Althusser na obra “Ideologia e aparelhos ideológicos do Estado” (1970) –


citado por Brandão (2004, p. 21): “para manter sua dominação, a classe dominante
era mecanismo de perpetuação ou de reprodução das condições materiais,
ideológicas e políticas de exploração”.
Na opinião do autor, é dessa maneira que entra o estado, através de seus
aparelhos repressores (compreendendo o governo, a administração, o exército, a
polícia, os tribunais, as prisões etc.) e aparelhos ideológicos (compreendendo
instituições tais como: a religião, a escola, a família, o direito, a política, o sindicato, a
cultura, a informação), intervém ou pela pressão ou pela ideologia, com o objetivo de
tentar fazer com que a classe dominada submeta às relações e condições de
exploração.
Brandão apoiando-se em Ricoeur (2004, p. 26) destaca que

Sem querer combater Marx ou ir ao seu favor, Paul Ricoeur alerta


para uma tendência que se faz sentir sob a influência de se fazer
interpretação redutora do fenômeno ideológico partindo de uma
análise em termos de classes sociais. Interpretação redutora porque
ela define ideologia apenas por sua função de justificação dos
interesses de uma classe dominante.

Dessa forma, uma concepção de ideologia redutora, faz com que o termo seja
visto apenas com as noções de erro, mentira, ilusão, ou até mesmo instrumento de
dominação. Para Fiorin (1993, p. 28):

A esse conjunto de ideias, a essas representações que servem para


justificar e explicar a ordem social, as condições de vida do homem e
as relações que ele mantém com os outros é o que comumente se
chama ideologia. Como ela é elaborada a partir das formas
fenomênicas da realidade, que oculta a essência da ordem social, a
ideologia é “falsa consciência”.

Assim, se existe inversão na realidade, a ideologia está presente no objeto, no


social, não podendo ser reduzida a consciência. Ela existe independente da
consciência dos agentes sociais. Portanto é uma forma fenomênica da realidade, que
oculta as relações mais profundas e expressa-as de uma forma invertida. Essa
inversão da realidade é a ideologia.

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Ainda de acordo com Fiorin (1993, p. 29), “nem toda ideologia é uma ‘falsa
consciência’. Numa perspectiva histórica, há aquelas que são consciência invertida
da realidade e aquelas que não são”.
Ao visualizar um conceito mais amplo, a ideologia é uma visão de mundo, ou
seja, o ponto de vista de uma classe social, de um determinado grupo a respeito da
realidade. Logo se pode dizer que existem tantas visões de mundo numa dada
formação social quanto forem às classes sociais.
O homem aprende a ver o mundo pelos discursos que assimila e, na maioria
das vezes, reproduz esse discurso em sua fala. Nesse sentido afirmar-se que o
discurso não é a expressão da consciência, mas a consciência é formada pelo
conjunto de discurso recebido e interiorizado pelo indivíduo no decorrer da vida.
A consciência é social, porque o homem não é apenas uma individualidade que
reside no espírito e a consciência é construída por meio do discurso assimilado por
cada membro de um grupo social, onde o homem está limitado, por isso falar que o
discurso tem uma função citativa e que a liberdade discursiva é muito pequena, pois
o enunciador é suporte da ideologia, seu dizer é na maioria das vezes o dizer reproduz
inconsciente do dizer de seu grupo social. Seguindo esse raciocínio, Fiorin ressalta
(1993, p. 44) que “na medida em que o homem é suporte de formações discursivas,
não fala, mas é falado por um discurso”. A linguagem condensa, cristaliza e reflete as
práticas sociais, ela é governada pelas práticas ideológicas.
A ideologia é constituída pela realidade e da realidade, porque o indivíduo não
pensa, nem fala o que quer, mas o que realidade impõe que ele pense e fale a partir
dos conflitos e das contradições existentes na realidade. A ideologia não é um
conjunto de ideias que surge do nada ou da mente privilegiada de muitas pessoas.
Por vezes declara-se que ela é determinada, em última instância, pelo nível
econômico. Embora não signifique que a ideologia seja mero reflexo do nível
econômico.
Para Engels, em carta a Bloch (1890) diz que “o elemento determinante da
história, em última instância, é a produção e a reprodução da vida real”. Assim,
demonstra que nem ele, nem Marx disseram que o elemento econômico é o único
determinante, pois as formas políticas das lutas de classe e os seus resultados, as
formas jurídicas, as teorias políticas, jurídicas, filosóficas e as concepções religiosas
exercem também influência nas lutas históricas e podem até determinar sua forma.

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Apesar de o elemento econômico não ser determinante único das lutas históricas, é o
determinante em última instância, que significa que o modo de produção determina as
ideias e os comportamentos dos homens e não ao contrário.
Embora exista, em uma formação social, tantas visões de mundo quanto forem
as classes sociais, a ideologia dominante é a ideologia da classe dominante. No modo
de produção capitalista, a ideologia dominante é a ideologia burguesa. Por isso dizer
que o homem não é senhor absoluto de seu discurso, uma vez que temas, figuras,
valores, juízos etc., provêm das visões de mundo estabelecidas na formação social.
Diante de todos esses conceitos e posicionamentos apresentados sobre a
ideologia, deve-se levar em conta que essa visão de mundo não existe dissociada da
linguagem. Logo, cada formação ideológica corresponde a uma formação discursiva,
na qual é ensina a cada componente de uma sociedade ao longo do processo de
aprendizagem linguística. E o discurso dominante vai ser a base dominante que
refletirá no comportamento do homem.
Conforme evidencia Fiorin (1993, p. 55),

A linguagem tem influência também sobre os comportamentos do


homem. O discurso transmitido contém em si, como parte da visão de
mundo que veicula, um sistema de valores, isto é, estereótipos dos
comportamentos humanos que são valorizados positivamente ou
negativamente. Ela veicula os tabus comportamentais.

A ideologia é vista como algo inseparável da realidade, as ideias e, por


conseguinte, os discursos são expressões da realidade. Portanto, é impossível pensar
fora dos quadros da linguagem, pois o que caracteriza o pensamento humano é o seu
caráter conceptual. Isso não significa identidade entre pensamento e linguagem, pois
como adverte Schaff citado por Brandão (2004, p. 34) “o pensamento e linguagem são
dois aspectos de um único processo: o do conhecimento do mundo, da reflexão sobre
esse conhecimento e da comunicação sobre os seus resultados”.
Para Vygotsky apesar do pensamento e a linguagem serem iguais na sua
origem, são indissociáveis, inseparáveis. A partir desse entendimento, assegura-se
que o discurso materializa as representações ideológicas. Por conseguinte, as
formações ideológicas só ganham existência nas formações discursiva, pois nenhum
discurso é descomprometido de ideologia.

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Considerações finais

Diante do estudo realizado, percebeu-se a importância de refletir sobre prática


discursiva, língua, linguagem, ideologia e discurso. Essa reflexão foi proposta a partir
dos postulados da ADF.
Inicialmente observou-se que toda situação comunicativa se manifesta por
intermédio de textos e envolve uma técnica que ao mesmo tempo é interacionista e
dialógico. Nele encontra-se a manifestação de um enunciador e um enunciatário que
estão comunicando algo que não apresenta apenas uma função informativa, mas
também produzir um sentido que tem a finalidade de influir sobre o outro. Portanto, a
linguagem é determinada por fatores ideológicos.
Essa forma de comunicação é de sentido mais amplo. O enunciador representa
em seu discurso uma visão de mundo dominante. Ele deseja que o enunciatário
acredite no que diz e mude o com comportamento ou opinião, mesmo que isso
aconteça de forma involuntária.
Por isso que comunicar é agir sobre o outro. Um discurso pode mudar uma
situação, o mundo. Por isso, independente do seu tamanho, um texto é um
instrumento poderoso de intervenção na sociedade. Como exemplo é importante
destacar que foi por intermédio de um texto que se “acabou” com a escravidão no
Brasil.
Refletir sobre língua, linguagem, ideologia e discurso e prática discursiva não é
para inferir que a linguagem é instrumento de poder e que os seguimentos sociais
dominantes tentam ridicularizar a palavra dos dominados. Isso já não faz sentido nos
dias atuais. O que se deve levar em consideração é que o discurso ao mesmo tempo
em que é prática social cristalizada, é também modelador de uma visão de mundo.
Assim, sem a pretensão de que o discurso possa transformar o mundo, vale
ressaltar que a linguagem pode ser o instrumento de libertação ou opressão, de
mudança ou de conservação. O homem não é senhor absoluto do seu discurso. Ele
se encontra em uma situação de servidão, uma vez que valores, juízos, crenças, etc.,
derivam das visões de mundo presentes na sociedade.

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Recebido em 05 de abril de 2017


Aprovado em 27 de setembro de 2017

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