Edinaldo Dos Santos Araújo - ANTEPROJETO DE TESE
Edinaldo Dos Santos Araújo - ANTEPROJETO DE TESE
Edinaldo Dos Santos Araújo - ANTEPROJETO DE TESE
Campinas, SP
2017
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RESUMO
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TEMA
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Para Freud, os sujeitos são, de saída, bissexuais. Com tal postulado, o pai
da psicanálise nos ensina que até há homens e mulheres relativamente bem demarcados
no sentido do estado civil, mas que eles não são feitos um para o outro como reza o
discurso religioso, científico e social. Porque a pulsão e o desejo, que estão na base de
todo ser falante, independem de qualquer orientação sexual.
Quanto ao conceito de pulsão, com seu objeto faltoso e sua força constante
pedindo repetitivamente esse mesmo objeto que não surge jamais, não se pode educá-la
e tampouco acomodá-la aos ideais da sociedade, a uma educação sexual.
Lacan nos diz, em seu O seminário, livro 19: ...ou pior (1971-72), que o
princípio do funcionamento de gênero feminino e masculino é a linguagem, pois “a
linguagem é tal que todo ser falante é ou ele ou ela. Isso existe em todas as línguas do
mundo”. Mas, para o psicanalista francês, a identidade sexual – quer dizer: ser homem
ou ser mulher – é resultado de um processo que ele qualificou de sexuação. Há aí uma
ação para poder indicar que se trata de um processo de linguagem, não um simples fato
de natureza. E isso distribui os sujeitos em duas categorias: aqueles que estão totalmente
na função fálica e aqueles que não estão totalmente inscritos nela. De modo geral, os
primeiros serão chamados homens, qualquer que seja a sua anatomia; os segundos, que
não estão totalmente inscritos na função fálica, serão chamados mulheres.
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A questão da genitalização é dupla, portanto.
Há, por um lado, um salto que comporta
uma evolução, uma maturação. Por outro, há
no Édipo a assunção do próprio sexo pelo
sujeito, isto é, para darmos os nomes às
coisas, aquilo que faz com que o homem
assuma o tipo viril e com que a mulher
assuma um certo tipo feminino, se reconheça
como mulher, identifique-se com suas
funções de mulher (LACAN, 1957-1958,
p.171).
O amor sempre achará, com certeza, quem o cante e quem o analise, não só
nas histórias dos costumes ou nos mitos; mas, a partir da contribuição desta tese, nas
descobertas que a psicanálise soube muito bem depositar. Para introduzir, trazemos aqui
o que está no magistral texto de 1914, Sobre o narcisismo: uma introdução, no qual
Freud afirma: “É preciso amar para não adoecer”.
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bem diz Roland Barthes: “Do ponto de vista do amoroso, o fato se torna conseqüente
porque se transforma imediatamente em signo [...]” (BARTHES, 2001, p.86). Assim
também ocorre no delírio, onde tudo significa: o olhar do outro; uma janela que bate;
um barulho na rua, etc. Quando o amor e o delírio se unem, como é o caso da
erotomania, a loucura pode engendrar as mais bizarras ideias e atos.
OBJETIVOS
Sendo assim, por que motivo não basta a anatomia e o nome próprio para
que o sujeito siga seu destino como homem ou mulher? Qual a lógica implicada aí?
Ainda que ela não organize toda a pulsão, como é no caso das mulheres,
como pensar a função fálica? Vai-se além: como pensar a função fálica onde ela não se
constitui – a não ser por suplência –, como na estrutura CLÍNICA da psicose?
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Nas fórmulas da sexuação, do lado da mulher, Lacan demonstra que ela
está não-toda inscrita na regulação fálica, visto que sua castração é logicamente
impossível: como ser ameaçada de castração se ela não tem pênis? É deste lado também
que Lacan sugere que estejam os místicos. Mas não os loucos: o psicótico, nas fórmulas
da sexuação, não estaria nem do lado masculino, que é aquele em que todos são sujeitos
barrados por estarem sujeitos à função fálica, e nem do lado feminino, visto que o
psicótico também não está não todo fora da função fálica (ele está literalmente fora da
função fálica).
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parisienses. Como conta Lacan, Aimée chegou até a enviar seus poemas ao príncipe de
Gales, acreditando que ele, por amá-la, a ajudaria a transformá-los em romance e
publicá-los. No entanto, Sua Alteza o recusou e mandou devolver-lhe, pois o protocolo
da realeza britânica o impedia de aceitar presentes de pessoas desconhecidas. Esse amor
platônico durou cinco anos.
A erotomania indica o ponto em que a função fálica falha naquilo que é sua
atribuição: regulação simbólica - das palavras e do pensamento; imaginária – da
realidade psíquica e fantasmática; real - da regulação do gozo do corpo. No homem,
quando esta função claudica, isso fica ainda mais evidente, visto que nele o quadro
erotômano revela muitas vezes o que Lacan nomeia, em O aturdito (1973), de
“empuxo-à-mulher”, que nada mais é do que o ponto, o signo dessa falha fálica. Ou,
melhor dizendo, ali onde não opera a função fálica, produzindo uma falha na
identificação masculina e a consequente identificação imaginária à Mulher. Mas indica
também onde é que o sujeito está tentando consertar essa falha identificatória – conserto
este que, sem a função fálica, não se dará no mesmo lugar em que está o defeito
(LACAN, 1975-1976).
Aliás, por que essa correção é em um lugar diferente? Por acaso, isso teria
alguma relação com a afirmação de Lacan, em O seminário, livro 3: as psicoses (1955-
1956), de que há “chumbo na malha, na rede do discurso do sujeito”?
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No homem neurótico é mais difícil encontrarmos casos de erotomania,
visto que o parceiro de um homem é o objeto de sua fantasia, o objeto a, o que implica o
gozo todo circunscrito pelo falo.
QUADRO TEÓRICO
Freud nos legou que, muito embora a “anatomia seja o destino”, ela não é,
no entanto, o único fator para a determinação do sexo de um sujeito. Ele nos deu as
referência teóricas para articularmos o processo de desenvolvimento da sexualidade nas
crianças até à fase adulta, revelando que a anatomia não é suficiente para que um
menino se torne homem, por exemplo. E não há, segundo ele, correspondência para o
masculino ou feminino no psiquismo. Nem sempre um homem nascido e nomeado do
sexo masculino identifica-se com seu nome e com seu sexo. O mesmo acontece com
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algumas mulheres. Nesse sentido, existem os homossexuais, os travestis, os transexuais.
E também os sujeitos que não se decidem quanto a serem homem ou mulher, como em
alguns casos de neurose obsessiva, assim como há na histeria um não saber quanto a ser
homem ou mulher. Como diz Freud, a histérica ora age como homem, quando com uma
das mãos descobre o seio, e ora age como mulher, quando com a outra mão ela tenta
tapar seu corpo, movida pelo pudor feminino.
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psiquicamente homem ou mulher.
Tomando O caso Dora, escrito por Freud em 1901 mas publicado apenas
em 1905, Lacan, em Diretrizes para um congresso sobre sexualidade feminina (1958),
escreve que ela, ao se interrogar o que é uma mulher, tenta simbolizar o órgão feminino
como tal. A escolha do nome Dora, que vem do grego (doron) e significa “presente”,
“dádiva”, não é casual. Dora revela a Freud o caráter homossexual do desejo
insatisfeito. Essa homossexualidade é resultado de uma identificação com o homem, via
pela qual a histérica se interroga sobre a feminilidade. Justamente por isso, em sua obra,
Lacan se refere à histérica como “mascarada”. A identificação de Dora com o homem, o
Sr. K., portador do pênis, é a maneira encontrada com ela para se aproximar dessa
definição que lhe escapa. O pênis se mostra, desse modo, como um instrumento
imaginário para apreender o que Dora não consegue simbolizar.
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As contribuições da psicanálise – na direção proposta por Freud e Lacan –
permitem situar o transexualismo em relação às estruturas clínicas, diferenciando-o do
homossexualismo e do travestismo. Em De uma questão preliminar a todo tratamento
possível da psicose, de 1958, Lacan, ao comentar o Caso Schreber, aponta o delírio de
se transformar em mulher como sendo mais da ordem de uma prática transexualista, do
que de uma fantasia homossexual, como quer Freud. Na verdade, é do significante que o
transexual procura livrar-se ao querer se desfazer de seu órgão. Com isso, ele se coloca
fora da norma fálica, deixando de participar da sexuação. Na psicose, a forclusão do
Nome-do-Pai exclui o significante fálico que permite ao sujeito situar-se na partilha dos
sexos como homem ou como mulher. Na ausência do Nome-do-Pai, o psicótico,
imaginariamente identificado ao falo da mãe, é levado a uma feminização.
Lacan chama de sexuação a maneira como cada sujeito vai subjetivar seu
sexo. Por sua vez, ela vai permitir ao sujeito a inscrição de um gozo masculino – ou
seja: sustentado por uma relação ao falo na ordem do ter – ou a inscrição de um gozo
feminino, que, mesmo tendo um vínculo com o falo, está na ordem do ser. Por isso,
utiliza o termo sexuação, em lugar de sexualidade, no sentido de que há aí uma
localização do sujeito e uma eleição.
Masculino Feminino
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Quem quer que seja falante, de acordo com Lacan, se inscreve de um lado
ou de outro da tábua da sexuação. Assim sendo, a coluna da esquerda descreve a
posição masculina, a da direita a posição feminina. Essa divisão não corresponde à
distinção anatômica entre os sexos, mas se trata de uma posição subjetiva deteterminada
no próprio discurso do sujeito, muitas vezes em desacordo com sua anatomia. Em
ambos os lados, a função Φx afirma que aquilo que traz relação com a sexualidade
provém da função fálica e que situar-se de um lado ou outro depende da maneira como
o sujeito está assujeitado a ela.
O gozo do Outro – simbolizado pelo corpo do Outro – será a via pela qual
Lacan se utilizará para falar, com certa restrição, do lado da mulher. Em O seminário,
livro 20: mais, ainda (1972-1973), Lacan diz que o Outro, na sua linguagem, é o Outro
sexo. O gozo outro é um gozo que escapa do domínio significante e, por isso, situa-se
fora da linguagem. Em outros termos, nenhuma palavra pode ser dita sobre ele. Dessa
maneira, o gozo Outro se opõe ao gozo sexual, na medida em que o gozo sexual é
determinado pela linguagem, pelo significante fálico.
O gozo sexual, que Lacan dirá tolo, se situa extracorpo: sua ligação com o
corpo se dá por um delicado fio que o une ao órgão sexual. Ao contrário do gozo Outro
ele não sustenta o ser ou o corpo em seu conjunto, apenas determinadas partes do corpo
podem funcionar como equivalente do órgão sexual. A esse respeito, assevera Lacan:
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Para o inconsciente, o Outro sexuado não existe, “a Mulher não existe”, na medida em
que carece um significante que fundamente seu ser com existe para o homem. Fazê-la
existir seria delirante, como nos mostrou o presidente Schreber, que queria ser a Mulher
de Deus.
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possibilidade de encontro, segundo Lacan, está no amor: “O que vem em suplência à
relação sexual é, precisamente, o amor” (LACAN, 1972-73, pág. 51).
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Na psicose, a erotomania é tentativa de cura, visto ser uma formação
delirante, podendo vir a ser uma suplência simbólica. É também o modo de amar dos
sujeitos psicóticos. Na neurose, a erotomania pode representar tanto a devastação
feminina, enquanto sintoma de fantasia excessiva, de um delirium, da desarticulação
entre o gozo fálico e o gozo suplementar, ou seja, de um desenquadre fantasmático. Mas
a erotomania pode ser o parceiro-sintoma da mulher (MILLER, 1998, p.), o que aponta
para uma erotomania normal e estrutural do sujeito feminino.
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(FREUD,1911, p.95). Uma tentativa de cura pela via delirante, visando reconstruir uma
nova realidade, e, portanto, nova realidade sexual e um novo laço com o mundo externo.
Na psicose, geralmente, com a zerificação da função fálica (Φ0), como Lacan formula
no texto “De uma questão preliminar a todo tratamento possível das psicoses”, no
Esquema I, o sujeito masculino tende a se feminizar, ocorrendo o que Lacan chama de
empuxo-à-mulher. Com a mulher psicótica, o phi-zero (Φ0) pode levar a dificuldades
ou impossibilidades de simbolização da maternidade e da relação amorosa.
ESQUEMA I
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A mulher, seja neurótica ou psicótica, é incompleta quanto ao falo. Com
efeito, ela é marcada por um “menos” com relação ao falo – o que faz com que a
estruturação de suas identificações e de seus semblantes seja mais vacilante, além de a
sua relação com o gozo tomar a forma erotomaníaca. Nessa direção, a erotomania
aponta para o que não se aloja no semblante; para o que não se inscreve pelo
significante fálico; e para a tentativa – tão feminina – de solucionar sua relação com os
semblantes e com o gozo, buscando no Outro onipotente da demanda, imaginariamente
completo, um significante que possa recobrir sua falta. Em outros termos, ao deparar-se
com o menos-phi (-φ), ela busca no Outro da linguagem um significante que a
complete.
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CRONOGRAMA
Estágio em docência X X
Revisão X X
bibliográfica
Redação inicial X X X X
Qualificação de X
área
Cumprimento dos X X
créditos
Publicação em
periódicos X X
científicos
Redação final X X
Exame de
qualificação de X
Tese
Defesa de tese X
REFERÊNCIAS
FREUD, S. Totem e Tabu (1913). ESB, v. XIII, Rio de Janeiro: Imago, 1995.
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__________. Três ensaios sobre a teoria da sexualidade (1905).
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LACAN, Jacques. A carta roubada
__________ O seminário, livro 18: de um discurso que não fosse semblante (1971).
Rio de Janeiro: Zahar, 2009.
__________ O seminário, livro 19: ...ou pior (1971-72). Rio de Janeiro: Zahar, 2012.
__________O seminário, livro 20: mais, ainda (1972-73). Rio de Janeiro: Zahar,1985.
__________. O seminário, livro 24: L’insu que sait de l’unebévue s’aile à mourre
PLATÃO. A república.
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DOR, Joel. Introdução à leitura de Lacan: o inconsciente estruturado como uma
linguagem. Vol. I e II. Porto Alegre: Artes Médicas, 1989.
O pai como nome não é o mesmo que aquele que nomeia (Lacan 1975-76: 163); veremos, então, algumas
conseqüências da redução indicada. Sabemos que o Nome-doPai é o que dá nome às coisas, entretanto, ao
reduzirmos o Nome-do-Pai em sua função radical é possível dar nome mesmo que não tenha com isso o
efeito de significação. Situamos aí uma primeira conseqüência.
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Lacan desde os anos 50 enfatiza ser a função do pai não condicionada à figura do genitor. O Nome-do-Pai
é o que vem de forma metafórica incidir sobre os significantes do desejo da mãe e sobre o seu gozo sob a
forma da substituição significante, produzindo a significação fálica. A sua função é amarrar a cadeia ao
ligar o significante e o significado como o explicitado na noção de ponto de basta; portanto, o significante
se introduz no significado e produz efeitos de significação (Lacan 1957).
Mas se o Nome-do-Pai é uma exigência da linguagem na medida em que amarra a cadeia significante,
como pensar, então, sua pluralização? O que pode, a partir daí, fazer a função de ponto de basta?
No ensino de Lacan dos anos cinqüenta o Nome-do-Pai é situado como aquele que insere o significante
da lei no lugar do Outro, lugar onde a fala se produz. O Nomedo-Pai como significante da lei é o que
ordena o sistema de significações e estrutura a linguagem a serviço da comunicação. Isto se articula à
clássica função de nomeação que está perfeitamente situada na língua (Basz 2006). Entretanto, quando
Lacan trata da nomeação como ato, ele já faz uso de seu conceito de lalíngua16 em que a fala serve ao
gozo e não à comunicação referida ao Outro do senso-comum.
Lacan em seu seminário sobre as psicoses (1955-56) aponta a foraclusão - a ausência de um significante
primordial, como impossibilidade do psicótico nomear-se, na medida em que demonstra uma dificuldade
em se fazer representar por um significante.
É possível, então, falar de nomeação na psicose? Qual a perspectiva trazida pela pluralização do Nome-
do-Pai nesse campo?
às leis que particularizam o ser falante devido a sua passagem pela castração
é a partir do simbólico que se pode fazer o diagnóstico diferencial estrutural por meio dos
três modos de negação do Édipo – negação da castração do Outro – correspondentes às três
estruturas clínicas.
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