Divisoes Perigosas Politicas Raciais No Brasil Con
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All content following this page was uploaded by Carlos Linhares on 29 January 2015.
raça, com a presença da mão do Estado produzindo possuem condições sociais e econômicas de despres-
identidades étnico-raciais com trágicos exemplos his- tígio. Os autores avaliam que as cotas não atingem o
tóricos. problema central da falta de vagas na educação básica
Foi no bojo desse acalorado contexto que um gru- e gratuita para toda a população, principalmente para
po de antropólogos, sociólogos, historiadores, geneti- a população pobre, que inclui indivíduos de todas as
cistas e ativistas organizou Divisões Perigosas: Políticas cores.
Raciais no Brasil Contemporâneo. A proposta foi reunir O quarto bloco, Saúde, faz referência às políticas
reflexões, com base em perspectivas variadas sobre tais afirmativas inseridas no contexto do Sistema Único de
temas em efervescência, e analisar as legislações e polí- Saúde (SUS), bem como situa historicamente a relação
ticas públicas recentes no país. O livro está organizado raça e saúde, que se iniciou com o contexto da escra-
em cinco blocos temáticos, no total de quarenta e seis vidão. Os autores mostram os problemas e as limita-
artigos escritos por trinta e oito autores das mais dife- ções dessa associação, por ter contribuído para o for-
rentes áreas. Esses artigos são oriundos, em sua maio- talecimento das teorias do determinismo biológico no
ria, da imprensa escrita de circulação diária, publica- campo da medicina e da saúde pública no Brasil, e pela
dos entre os anos de 2002 e 2007. Os textos são curtos, estigmatização das populações negras. Desse modo,
de fácil leitura, porém densos e instigantes. apontam o evidente isolamento da categoria cor/raça
O primeiro bloco, Raça, Ciência e História, oferece como único meio de se entender as condições de saúde
uma perspectiva histórica sobre o conceito de raça e do e vulnerabilidade para o adoecimento em contextos de
racismo na sociedade brasileira. O ponto de consenso profundas desigualdades sócio-econômicas. Deveriam
reside na afirmação de que não existem raças humanas ser consideradas as condições de educação, renda, mo-
do ponto de vista biológico, ainda que permaneça exis- radia, alimentação, transporte, entre outros aspectos.
tindo como fato ideológico e cultural. Mas, para tanto, Setores do movimento negro, da comunidade científi-
a ciência teria um papel importante de instrução da ca e do governo, com o apoio do Ministério da Saúde,
esfera social, em especial por ter consolidado historica- defendem uma política de saúde focada na “população
mente a existência do conceito de raça. Os argumentos negra”. Entretanto, essa tese permite que agravos sejam
desse bloco giram em torno da crítica de que as políti- transformados em doenças “raciais”, como é o caso da
cas públicas de recorte racial que estão sendo implan- anemia falciforme. Portanto, ao invés da introdução de
tadas no Brasil são fortemente marcadas por tradições uma política pública racializada específica para a po-
e influências de outros países (como, por exemplo, os pulação negra, os argumentos enfatizam que deveriam
Estados Unidos), que se apóiam na identificação de ser aperfeiçoados os mecanismos de humanização do
grupos “raciais” bem definidos – condição oposta à re- SUS, de forma a garantir acesso de qualidade para to-
alidade brasileira. Os autores defendem a necessidade dos os cidadãos.
de se observar historicamente a questão racial brasilei- Raça em Tudo?, é o último bloco e traz uma revisão
ra, de modo a recuperar os fatos do passado para me- das idéias centrais do livro que perpassam em todos os
lhor instruir atualmente a população brasileira sobre artigos. A questão, portanto, se concentra principal-
esta questão, particularmente no ensino escolar. mente na aprovação do Estatuto da Igualdade Racial,
No segundo bloco, Quem é Negro no Brasil?, o pró- em tramitação no Congresso Nacional, que, na visão
prio título introduz a questão, problematiza as estra- dos autores, caminha na contramão do princípio de
tégias utilizadas para a classificação étnico-racial no cidadania da Constituição Federal de 1988. O ponto de
país no âmbito das atuais políticas de recorte racial. Os consenso é o entendimento de que o principal proble-
argumentos se sustentam no conhecido processo his- ma da questão racial atualmente é o processo de racia-
tórico da miscigenação, para além da história da dis- lização em curso no país, que não parte da compreen-
criminação racial. Por conseqüência, entende-se que são sobre a realidade brasileira do modo como o racis-
aplicar a classificação racial dos brasileiros por meio de mo aqui se manifesta, e sim, em estratégias adotadas
categorias fixas tomadas com base na cor da pele é des- em outros países. Por isso, conseqüentemente, a insti-
considerar a herança de brancos, indígenas e negros tuição do negro como entidade jurídica perante o Esta-
que formam a sociedade brasileira. O principal proble- do torna-se um problema, em especial por transformar
ma apontado é o de que a classificação racial incidirá classificações gerais (como as do IBGE) em identidades
na garantia de direitos civis e políticos por meio de po- sociais com direitos específicos.
líticas afirmativas compensatórias, mediante a divisão Divisões Perigosas: Políticas Raciais no Brasil Con-
racial da sociedade brasileira, embora na prática não temporâneo é um dos poucos livros que, no atual ce-
esteja dividida racialmente. nário de discussões, se coloca criticamente em relação
O terceiro bloco, Educação, levanta as questões re- à implementação de políticas de recorte racial no Bra-
ferentes a este campo, no que diz respeito às políticas sil. Assim sendo, não teria como não ser controverso.
adotadas pelo Ministério da Educação (MEC) tanto pa- Isso fica evidente nas palavras dos organizadores, ao
ra o ensino escolar quanto na implantação do sistema indicarem que o objetivo da obra é colaborar para o
de cotas raciais nos vestibulares de algumas universi- amadurecimento da discussão e contribuir para um
dades públicas. A atenção concentra-se nesse último melhor encaminhamento das ações afirmativas, de
aspecto, por se tratar de um assunto bastante polêmico forma a abranger as desigualdades sociais no Brasil:
no contexto brasileiro. O posicionamento crítico parte “reconduzir o debate para o terreno ao qual ele de fato
da preocupação de que a adoção de cotas baseando- pertence: a possibilidade de explicitação de opiniões e a
se em critérios raciais prejudica a grande maioria dos defesa de pontos de vista sem rotulações preconcebidas.
concorrentes dos vestibulares, em especial aqueles que Ao criticarmos a racialização em curso, tomamos a mais
radical posição antirracista – solapar os pressupostos mento de dados utilizando-se o trabalho interdiscipli-
que embasam a idéia de raça” (p. 18). Pluralidade de nar em equipe.
opiniões é essencial para o debate democrático, marca O capítulo 4 descreve o processo de estruturação
deste livro. da Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo, por meio
da organização das ações de saúde bucal através de
Carlos Linhares Veloso Filho linhas de cuidado, assegurando o acesso universal e
Juliana Fernandes Kabad
igualitário aos serviços de promoção, prevenção e re-
Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Os-
waldo Cruz, Rio de Janeiro, Brasil. cuperação como um direito à saúde. Aborda a neces-
[email protected] sidade de reorganização da Atenção Básica por meio
de ações de planejamento das ações, monitoramento e
ATENÇÃO BÁSICA NO SISTEMA ÚNICO DE avaliação. No capítulo 5 são descritas as ações em saú-
SAÚDE: ABORDAGEM INTERDISCIPLINAR PARA de bucal na esfera municipal pelo desenvolvimento de
OS SERVIÇOS DE SAÚDE BUCAL. Botazzo C, novas tecnologias com base na discussão realizada nos
Oliveira MA. São Paulo: Páginas e Letras Editora dois capítulos anteriores.
e Gráfica; 2008. 292 pp. Os capítulos 6 e 7 discutem a importância da infor-
ISBN: 978-85-86508-72-1 mação para a gestão, ressaltando a necessidade de um
sistema de informação de qualidade que proporcione
Este livro organizado por Carlos Botazzo e Maria Apa- dados adequados para viabilizar ações de diagnóstico,
recida de Oliveira apresenta um compilado de 19 capí- programação, avaliação e monitoramento em saúde.
tulos, fruto de seminários de pesquisa do Observatório Enfatizam ainda a necessidade de prover um sistema
de Saúde Bucal Coletiva do Instituto de Saúde de São de informação sanitária com enfoque epidemiológico,
Paulo. A obra tem como intuito discutir algumas rela- de maneira a melhorar a organização das ações e servi-
ções entre a clínica odontológica e o Sistema Único de ços à saúde no Estado de São Paulo. O capítulo 7 apre-
Saúde (SUS). Para tanto, relata experiências e proble- senta a experiência do processo de construção, implan-
matiza conteúdos vivenciados no cotidiano de trabalho tação e avaliação do uso do Sistema de Monitoramento
dos profissionais de saúde bucal, abordando, panora- e Avaliação da Atenção Básica (SisMasus) no estado.
micamente, assuntos que tratam de dificuldades rela- Com base nessa construção, ressalta a importância das
cionadas à implantação, gestão, informação em saúde gestões estadual e municipal na Atenção Básica, e su-
e formação profissional no âmbito da Atenção Básica. peração do planejamento fragmentado e baseado na
O capítulo 1 traz algumas considerações sobre cui- lógica de financiamento.
dados primários em saúde e suas implicações. Com O capítulo 8, intitulado Informação em Saúde e
base nas conferências internacionais, discute a evolu- Cidadania, problematiza a questão da informação
ção do conceito de promoção da saúde e faz críticas em saúde e seu papel na sociedade para o exercício
quanto ao processo de adoecimento como fenômeno da cidadania. O autor levanta questões relacionadas à
natural, além de conceituar e tecer comentários sobre utilização da informação como recurso essencial pa-
a Atenção Básica no Brasil, no que tange à sua capaci- ra educação e para o estabelecimento de uma política
dade operativa. de saúde consistente e coerente com os princípios do
O capítulo 2, por meio de um estudo de caso sobre SUS, de modo a gerar ações transformadoras e mobi-
a assistência às pessoas com lesões de pele numa equi- lizadoras para o cuidado em saúde. Reflete sobre o uso
pe de saúde da família, demonstra a importância da da informação nos serviços de saúde para a conquista
reorganização da Atenção Básica para a implantação dos direitos sociais e construção coletiva dos processos
do SUS. Foi evidenciada a necessidade de maior capa- comunicativos que favoreçam a cidadania.
citação e atualização dos profissionais de enfermagem, No capítulo 9 são apresentados os indicadores re-
integralidade das ações e serviços, e do envolvimento centemente utilizados para caracterizar a experiência
das famílias por meio de maior participação na toma- de cárie e as limitações do seu uso. Por se originar de
da de decisões para a garantia de uma maior adesão ao discussões de seminários, os índices são tratados de
tratamento. Os autores realçam a importância do uso forma resumida em relação à sua construção e signifi-
de tecnologias leves na relação profissional/usuário, de cado. No capítulo 10, tomando como referência o indi-
modo a atender às suas necessidades de saúde. cador CPO – que trata da contagem de dentes cariados,
Nos capítulos 3, 4 e 5 são levantadas questões re- perdidos e obturados – é abordada a crescente melhora
lacionadas à saúde bucal nas esferas de gestão do SUS. nos delineamentos amostrais, utilização e aprimora-
O capítulo 3 aborda a inserção da saúde bucal no pro- mento de índices e indicadores baseando-se na pro-
cesso de consolidação do SUS. Apresenta algumas con- posta da Organização Mundial da Saúde. A leitura des-
siderações sobre o conceito de saúde, o histórico da se capítulo é indicada para quem busca análise crítica e
saúde bucal, reflexões sobre sua forma de organização reflexão sobre o índice CPO.
e a “mudança de modelo assistencial” na consolidação A discussão acerca da cidadania e democracia, ten-
do SUS (modelo biomédico para o modelo da promo- do como foco a participação popular, é retomada no
ção da saúde). Enfatiza ainda, a Política Nacional de capítulo 11 por meio da apresentação da trajetória de
Atenção Básica e seus desafios para a gestão, e a neces- conformação do Programa Estadual de DST/AIDS de
sidade da atenção à saúde bucal voltada para a aborda- São Paulo. Nesse contexto, são demonstradas as mu-
gem integral aos cidadãos com ações direcionadas para danças ocorridas na atenção em saúde bucal com base
promoção à saúde, prevenção de doenças, controle das nas transformações no quadro epidemiológico da AIDS
patologias bucais, planejamento estratégico, levanta- no Brasil.