Jacques Maritain Rumos Da Educacao PDF
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RUMOS
DA EDUCACÃO
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R U M O S DA
EDUCAÇÃO
TRADUÇÃO DE
INÈS FORTES DE OLIVEIRA
2.a EDIÇÃO
1959
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ÍNDICE
Pág.
I O S F IN S D A E D U C A Ç Ã O
1. A N a tu r e z a d o H o m e m e a E d u c a çã o 13
Educação do hom em , 13. — l.° Êr-
ro: desprêzo dos fins, 15. — 2.° Êr-
ro: idéias falsas concernentes aos
fins, 17. — A concepção científica e
a concepção filosófico-religiosa do
hom em , 18. — A concepção cristã do
hom em , 20. — Personalidade hu m a
na, 22 — Personalidade e individua
lidade, 24
2. R e la tiv o a o s F in s d a E d u ca çã o . . . 27
A conquista da liberdade interior,
28. — 3.° Êrro: pragm atism o, 30.
— As potencialidades sociais da pes
soa, 32 — 4.° Êrro: sociologismo, 34
— 5.° Êrro: intelectualism o, 38 —
6. ° Êrro: voluntarism o, 41
3. O s P a ra d o x o s d a E d u c a ç ã o ........... 45
7. ° Êrro: pode-se aprender tudo, 45
8 R um os da E ducação
— As esferas educacional e extra-
educacional, 47. — O sistem a edu
cacional n a form ação da vontade e
n a dignidade do intelecto, 49.
II. A D IN Â M IC A D A
EDUCAÇÃO
1. O s F a to re s D i n â m ic o s ......................... 57
A inteligência do aluno e a arte do
professor, 57. — A educação pela
palm atória e a educação progressis
ta, 60 — A verdadeira e a falsa liber
tação da personalidade, 63.
2. As D isp o siçõ es F u n d a m e n ta is a S e
re m C u ltiv a d a s ........................................ 68
Em relação à verdade e à justiça,
69. — Em relação à existência, 69.
— Em relação ao trabalho, 71. —
Em relação aos outros, 72.
3. As N o rm a s F u n d a m e n ta is d a E d u
ca çã o ........................................................ 73
l.a Regra, 73. — 2.a Regra, 74. —
A libertação do poder intuitivo, 77
— 3.a Regra, 82 — A unidade espi
ritual e a sabedoria, 85 — 4.a Regra,
88 — Conhecim ento e treino, 91. —
A estru tu ra intrínseca do currículo,
96.
I ndice 9
III. A S H U M A N ID A D E S E A
E D U C A Ç Ã O L IB E R A L
O s R u d im e n to s .................................... 103
As esferas do conhecim ento, 103 —
A criança, 106.
As H u m a n id a d e s .................................... 108
O adolescente, 108 — O caráter u n i
versal da educação liberal, 111. —
O currículo, 114 — Filosofia e Teo
logia, 121.
A U n iv e r s id a d e ...................................... 128
Plano de um a universidade ideal,
128 — A consum ação da educação
liberal, 132 — Os institutos superio
res de pesquisa, 139 — As escolas n a
vida espiritual, 140 — Nossa respon
sabilidade p ara com a juventude,
143.
IV. A S F U N Ç Õ E S D A E D U C A
ÇÃO CONTEM PO RÂN EA
A E d u ca çã o L ib era l e o N o vo H u m a
n ism o a q u e a sp ira m o s .................... 147
U m a educação integral p ara um h u
m anism o integral, 148 — As diver
sões hum anas e a educação liberal,
149.
10 R umos da E ducação
2. A lg u m a s F u n çõ es E sp ecia is d a E d u
ca çã o n o M u n d o d e A m a n h ã ........... 152
A tarefa norm al da educação e seus
encargos adicionais, 152 — O siste
m a educacional e o Estado, 153 — O
ensino da Moral, 155 — As necessi
dades da com unidade política e a
educação, 161
3. O s P ro b lem a s E d u c a cio n a is n a C rise
d a C iviliza çã o A tu a l ......................... 170
Como tra ta r a perversão m ental,
causada pela "Educação p ara a Mor
te ”, 170 — M edidas preventivas ou
de proteção, 171 — T rabalho cons
trutivo, 175 — Sôbre a Europa, 178
— A inspiração renovadora de nossa
educação, 184.
OS FINS DA EDUCAÇÃO
1. A NATUREZA DO HOMEM
E A EDUCAÇÃO
E d u c a çã o d o H o m em
*
II
A DINÂMICA DA EDUCAÇÃO
;
!
No presente capítulo, ao estudar os agen
tes e a dinâm ica da educação, vou abordar o
seguinte: 'prim eiro, os fatores dinâm icos ou
agentes de trabalho n a educação (a vitalida
de interior da inteligência do aluno e a ativi
dade do professor); se g u n d o , as disposições bá
sicas a serem cultivadas no aluno; terceiro , as
norm as fundam entais de educação p ara o pro
fessor.
1. OS FATÔRES DINÂMICOS
A I n te lig ê n c ia d o A lu n o e a A rte d o P ro fesso r
Ao pretender discutir os fatores dinâm icos
em educação, lem brem o-nos da concepção pla
tônica : a aprendizagem depende do aluno, não
do professor. Q ualquer leitor do F éd o n sabe
que, para Platão, o conhecim ento sem pre exis
tiu n a alm a hum ana. E que esta, antes de h a
b itar o corpo, contem plou as Idéias eternas.
Depois disso não pôde m ais considerar livre
m ente as verdades que já conhecia. Dêste mo
do, o estudante não adquire conhecim entos
graças ao professor, que não exerce um a in
fluência causal. E ’, no m áximo, um agente
58 R um os da E ducação
ocasional. D esperta a atenção do aluno p ara
as coisas que êle já conhece, de modo que
aprender se to rn a sinônim o de recordar.
Há grandes verdades nessas concepções
exageradas de Platão. Elas nos dão idéia da
nobreza e da delicadeza de seu modo socrático
de ensinar, que tan to eleva o aluno, pois o
tra ta como a um anjo, um anjo que ainda não
despertou. Essas concepções foram adotadas
por m uitos educadores m odernos, em bora das
m ais variadas correntes filosóficas. Na reali
dade, porém, as coisas não se passam assim.
Platão ao tra ta r, em suas L eis, do aspecto po
lítico da educação, exagerou, de modo surpre
endente, seu lado autoritário. O professor
possui um conhecim ento que o aluno ainda
não tem. É sua função transm iti-lo ao estu
dante, cuja alm a n ã o contem plou as Idéias
divinas, antes de se u n ir ao corpo. E cujo in
telecto, antes de ser fecundado pela percep
ção e pela experiência dos sentidos, é u m a ta
b u la ra sa , no dizer de Aristóteles.
E ntretanto, qual a espécie de causalidade
ou ação dinâm ica exercida pelo professor? E n
sinar é um a arte. E o professor, um artista.
Será êle, então, como um escultor, um Miguel
Ângelo poderoso que cinzela o m árm ore ou que
modela, despoticam ente, n a argila passiva, a
form a que concebeu? Tal concepção não foi
A D inâmica da E ducação 59
l . a R eg ra
6
82 R um os da E ducação
Com tais métodos, o currículo talvez per
ca um pouco em quantidade. T anto m elhor. *
Finalm ente, a própria m aneira de ensi
n a r é, aqui, de grande im portância. Se um
professor prefere discernir e perceber a coligir
fatos e opiniões; e se m aneja seus conheci
m entos, de modo a ver, através dêles, a reali
dade das coisas, poderá despertar, n a m ente do
estudante, o poder de intuição que se fortifi
cará inesperadam ente, graças à própria in tu i
ção do professor.
3.a R eg ra
\
A D inâmica da E ducação 85
C o n h e c im e n to e T rein o
Defrontam os, aqui, a noção de treinam en
to m ental — no tem po de John Locke 5 já re
alçada pelos adversários das artes liberais — e
a oposição, tão freqüentem ente estabelecida,
entre valor do conhecim ento e valor do treino.
Será que a libertação da m ente significa que
o m ais im portante não é a posse do conheci
m ento, m as o desenvolvim ento da energia, da
habilidade e da destreza dos podêres m entais
do hom em , sem que se leve em conta o que se
aprende? E sta perg u n ta é de grande significa
ção. A resposta errada que se deu a ela con
tribuiu m uito p ara prejudicar a educação con
tem porânea.
Observou-se que, de acordo com a psico
logia m oderna, é m uito duvidoso que o exercí
cio de um a faculdade, através de determ inada
m atéria, aperfeiçoe tal faculdade em relação
a qualquer outra m atéria a que se aplique.
H erbert Spencer afirm ava, h á m uito tem po,
que, se transm itirm os a nossos alunos o conhe
cim ento “de m aior valia”, é incrível que não
se produza tam bém a m elhor disciplina m en
tal. 6
5. Cf. Cardeal John Henry Newman, On the Scope
and Nature ot University Education, Discurso VI, págs.
151-153. Everyman’s Library.
6. Cl. Sir T. Percy Nunn, “Education”, Encyclopae
dia Britannica.
92 R umos da E ducação
De um ponto-de-vista com pletam ente di
ferente do de Spencer, acho que é lapidar a
sua frase. O conhecim ento “de m aior valia” —
não quero dizer o de m aior valor prático, m as
o que faz a m ente com preender o que é m ais
rico em verdade e inteligibilidade — tal conhe
cim ento produz, por si mesmo, o m elhor trei
nam ento m ental. E ’ ao procurar um objeto
e ao conseguir alcançá-lo, vitalizado pela ver
dade, que a m ente hu m an a adquire sua ener
gia e sua liberdade. Não é com a ginástica de
suas faculdades, e sim com a verdade, que ela
se liberta, quando a verdade é realm ente co
nhecida, isto é, vitalm ente assim ilada pela ati
vidade insaciável que se oculta em seu íntim o.
A oposição entre valor do conhecim ento e va
lor do treino vem da ignorância do que seja
o conhecim ento. Da suposição de que o conhe
cim ento é como com prim ir objetos em m a
la. E não a ação vital, por meio da qual as
coisas se espiritualizam , p ara se tornarem um
todo único com o espírito. A tendência n a tu
ral e vital da m ente se deturpa, se, no conhe
cim ento de “m aior valia”, principalm ente nas
artes liberais, se der m ais im portância ao
treinam ento m ental e à investigação m era
m ente dialética de como foram feitas as g ran
des obras ou como se exprim iram os grandes
A D inâmica da E ducação 93
AS HUMANIDADES E A
EDUCAÇÃO LIBERAL
I
Neste terceiro capítulo, vou tra ta r dos três
principais graus da educação: a educação ele
m entar, as hum anidades, o ensino superior.
Q uanto ao segundo grau — as hum anidades
— tem os que discutir alguns problem as rela
tivos ao colégio e ao currículo; e quanto ao
terceiro grau — o ensino superior — vou es
boçar a idéia de um a universidade m oderna,
como a consum ação da educação liberal.
1. OS RUDIMENTOS
As E sfera s d o C o n h e c im e n to
Aos principais graus da educação corres
pondem três grandes períodos: os rudim entos
(ou educação elem entar), as hum anidades
(ou educação ginasial e colegial) e o ensino
superior (as faculdades e o ensino superior es
pecializado). Êsses três períodos correspon
dem, não só a três períodos cronológicos da
vida do jovem, m as, tam bém , a três esferas,
n aturalm ente distintas e qualitativam ente de
term inadas, de seu desenvolvimento psicoló
gico. De seu conhecim ento, por conseguinte.
104 R umos da E ducação
A estru tu ra física da criança não é um a
estru tu ra de adulto em ponto pequeno. A cri
ança não é um anão. Nem o adolescente. E
isto é m uito m ais verdade e m ais im portante,
quando se tra ta da estru tu ra psicológica do
jovem. Nos domínios do exercício físico, ou do
treinam ento psicofísico, ou da psicologia ani
m al e experim ental, a educação contem porâ
nea com preendeu perfeitam ente que um filho
do hom em não é um hom únculo. Mas não o
com preendeu assim no dom ínio espiritual do
conhecim ento. Pois não dem onstra interêsse
pela psicologia das atividades espirituais. Que
fazer, senão ignorar êste domínio? O êrro é
duplo. Esquecemos, em prim eiro lugar, que
a ciência e o conhecim ento não são noções
que se bastem e que existem por si m esm as,
abstraindo-se e separando-se do hom em . A
ciência e o conhecim ento não estão nos livros,
m as n a m ente. São energias vitais e internas
e devem desenvolver-se de acordo com a estru
tu ra intrínseca da m ente em que vivem. Em
segundo lugar, agimos como se a tarefa da
educação fôsse infundir, n a criança ou no ado
lescente, a ciência e o conhecim ento do adulto,
resum idos e concentrados. Isto é, a ciência e
o conhecim ento do filólogo, do historiador, do
gram ático, do cientista, etc., dos m ais especia
lizados dos especialistas. Levamos, assim, os
H umanidades 105
O A d o le sc e n te
X
H umanidades 135
mia, a Política, a Pedagogia, intrinsecam ente.
A verdade de todo conhecim ento relativo à
conduta h u m an a im plica julgam ento per
feito de suas finalidades. Isto é, no conheci
m ento real da Filosofia ética e política que,
por sua vez, pressupõe a M etafísica. Essas
exigências provêm dos objetivos em que o co
nhecim ento tom a form a. Nem o cientista,
nem o historiador, nem o escolar, nem o h u
m anista, nem o artista podem dispensar ins
piração filosófica. Precisam de instrução filo
sófica, ao menos p ara poderem avaliar, exata
m ente, a posição que ocupam suas atividades
entre as outras atividades do espírito.
Como conseqüência, cada estudante deve
ser obrigado a assistir a certo núm ero de cur
sos, nas Cidades universitárias de puro conhe
cim ento e de conhecim ento universal. Certos
cursos — como os de Ciências, H istória, Lite
ra tu ra antigas e m odernas, Belas-Artes devem
ser facultativos, conform e a inclinação n atu ral
do aluno e a necessidade de com plem ento ou
contraste em sua aprendizagem especial. Ou
tros devem ser obrigatórios. Principalm ente
os de Filosofia geral, Filosofia ética e política,
H istória da Civilização.
Como o Professor Nef o observou, tal m e
dida será insuficiente se não fôr com pletada
por um a e stru tu ra orgânica, que ab ran ja o
136 R um os da E ducação
sentido de unidade e de universalidade que
deve predom inar na vida universitária. Co
m itês especiais, de professores pertencentes
aos vários Institutos, hão de assegurar a
cooperação norm al entre êsses Institutos. E
orientar o trabalho do aluno, ajudando-o a
pesquisar as relações existentes entre sua pró
pria especialidade e as dos outros setores do
ensino superior. Por exemplo, as relações
entre a Física, a Biologia, a Psicologia, a
M edicina e a H istória das ciências, a H istória
da Civilização, a Filosofia da natureza, a Teo
ria do conhecim ento. As relações entre a
Economia, as Ciências sociais, o Direito, a
Educação, a L iteratura, a Arte e a H istória da
civilização, a Filosofia ética e política, os
grandes problem as m etafísicos e teológicos.
Assim, serão facilitados “os estudos e as pes
quisas em que várias disciplinas, atualm ente
separadas, sejam confrontadas pelos universi
tários e colegiais, em suas atividades criado
ras”. ,5 Seu conhecim ento se to rn a m ais pro- 15
15. John U. Nef, The Universities Look for Unity,
pág. 36. O autor diz que, para que se obtenha sucesso
neste trabalho progressivo de reíundição, “a unificação
deve começar modestamente, quando há necessidade
disto, em duas ou três matérias consideradas, tanto quanto
possível, em relação com a Filosofia e, particularmente,
com a Etica”. Idem, pág. 37. De acordo com estas obser
vações, a iniciativa tomada pelo ‘Commitee on Social
Thought” da Universidade de Chicago é digna de elogios.
Com o fito de conceder os títulos de “licenciado” e de
“doutor”, esse comitê interdepartamental combinou, de
H umanidades 137
fundo e vital, pela avaliação do propósito e da
estru tu ra lógica das disciplinas agora conca
tenadas .
Pelos argum entos que apresentei, a pro
pósito das hum anidades, os cursos de Teologia,
por im portantes que sejam , devem ser facul
tativos. A questão do ensino teológico vem
à baila, tan to n a educação universitária quan
to n a colegial. E as considerações que fize
mos a êste respeito são ainda oportunas.
Aquêles que acreditam que Deus revelou à
hum anidade. Seus segredos íntim os conside
ram a Teologia ou desenvolvim ento racional e
com preensão das prem issas reveladas, como
conhecim ento real, no senso estrito da pala
vra. Em bora tal conhecim ento se baseie n a
fé e atin ja seu objetivo, m ediante conceitos
que transcende e excede. Procurando to rn ar
autônom a a Filosofia, D escartes julgou neces
sário considerar a fé como m era obediência.
Recusou-se a ver qualquer característico real
de conhecim ento n a Teologia. Desprezando
o acidental, perdeu o principal. E stou certo
diversos modos, os cursos de estudo sob sua orientação.
De um lado, o Pensamento social, os assuntos históricos
(antigas civilizações do Oriente Próximo e do Extremo
Oriente, a civilização medieval, a da Renascença, a do
século XVIII, a americana); de outro lado, os setores
analíticos e teóricos (Antropologia e Sociologia, Política,
Economia, Jurisprudência e Ética, Educação, Psicologia e
desenvolvimento humano).
138 R umos da E ducação
de que um dos principais deveres de nossa era
é reconhecer a distinção e, ao mesmo tem po, o
parentesco orgânico existente entre a Teolo
gia, baseada na fé, e a Filosofia, baseada na
razão que não procura m ais sua autonom ia.
Não é provável que Deus tenha falado p ara
não dizer nada à inteligência hum ana. New-
m an estava com a razão, quando disse que,
se a universidade considera um dever cientí
fico excluir a Teologia de seu currículo, “tal
Instituição não pode ser o que afirm a, se
existe D eus” .
Os que não têm essas idéias a respeito da
Teologia podem tam bém obter grandes van
tagens estudando-a. D escortinariam , assim,
horizontes de problem as altam ente racionais,
que os levariam a m elhor com preender as ba
ses de nossa cu ltu ra e de nossa civilização.
Nas universidades não-sectárias, o ensino
teológico seria m inistrado por In stitu to s de
filiações religiosas diversas, considerando-se a
população estudantil. Tal ensino seria com
pletam ente diferente do que se dá nos sem i
nários, pois se adaptariam às necessidades
intelectuais dos leigos. Sua finalidade não
seria form ar padres, nem pastores, nem rabis.
Mas apresentar, aos estudantes, as controvér-
vias seculares nas grandes doutrinas e as pers
pectivas do saber teológico. A H istória das
H umanidades 139
AS FUNÇÕES DA EDUCAÇÃO
CONTEMPORÂNEA
Neste últim o capítulo, vamos considerar
algum as tarefas e funções da educação de
hoje. Prim eiro: devo realçar a im portância da
educação liberal no novo hum anism o que se
inicia. Segundo: as tarefas principais que o
m undo de am an h ã h á de exigir da educação,
especialm ente no ensino da M oral e nas ne
cessidades da com unidade política. Terceiro:
os dificultosos problem as com que a crise atu al
da civilização sobrecarrega a educação: a per
versão m ental, conseqüência da “educação pa
ra a m orte”, e a inspiração renovadora de nos
sa própria educação.
O S is te m a E d u c a cio n a l e o E sta d o
E ’ de se esperar que, no m undo de am a
nhã, o sistem a educacional adquira m aior im
portância e am plitude. E se tom e, m ais ainda
do que hoje, a função básica e essencial de
um a com unidade civil, preocupada com a dig
nidade do povo e sua valorização. Sendo as
sunto de interêsse público, não lhe deve o Es
tado ficar indiferente. Sua ajuda e fiscaliza
154 R umos da E ducação
ção são necessárias, portanto. Provàvelm ente,
hão de ocorrer m uitas m udanças nos estatu
tos dos colégios e universidades. E será aum en
tado o núm ero de instituições educacionais
fundadas e m antidas pelo Estado. O que, em
si, é processo norm al, que se deve m anifestar
n a liberdade e p ara a liberdade e deixar bem
definidas as relações entre o Estado e a es
cola.
Vemos, de novo, a im portância do princí
pio pluralista, que dá a m aior autonom ia pos
sível aos diversos grupos que se originam de
associações livres. A autoridade superior do
Estado se baseia, assim, no reconhecim ento
dos direitos dêsses grupos. No sistem a educa
cional, o princípio pluralista im plica a liber
dade acadêm ica. Não se contenta em reconhe
cer o direito que tem qualquer pessoa idônea
de fundar escolas, um a vez que se subm eta às
leis do Estado. Mas, tam bém , que as diversas
instituições de ensino possam ligar-se, em as
sociações ou organizações várias. Im pedidas,
por lei, de ofender as liberdades básicas de
seus m embros, podem, entretanto, form ular
regulam entos gerais, válidos p ara cada união.
E ’ pelo contrato firm ado entre o Estado e al
guns com itês gerais, constituídos por repre
sentantes dessas associações (incluindo-se as
associações de escolas e colégios m antidos pelo
A E ducação C ontemporânea 155
12-A
180 R umos da E ducação
encarar êsse trabalho construtivo. Consideram
como coisas do passado as feições particulares
da propriedade privada e da livre iniciativa ca
pitalista. N a realidade, o liberalism o de M an-
chester passou. A E uropa aspira a um a nova
civilização. Não pelo com unism o, m as por um a
ordem em que as pessoas desfrutem da liber
dade social e política e as classes trabalhado
ras alcancem sua em ancipação histórica. Espi
ritualm ente, os povos europeus sentem , de mo
do m ais ou menos obscuro, que êsse novo im
pulso construtivo só será possível se a cris
tandade se libertar de qualquer usurpação dos
interêsses hum anos, por p arte das classes di
rigentes m oralm ente falidas. E se a própria de
m ocracia se libertar de qualquer tem or cego e
vão, com respeito aos valores do Evangelho.
Resum indo: os povos da Europa não vêem a
necessidade de serem reeducados. Acham que
devem ser libertados, p ara aju d ar as Américas
n a reconstrução do m undo.
Vemos assim que im enso esforço de adap
tação m ú tu a p aira sôbre ta l situação. Se o
povo am ericano tivesse que subestim ar a difi
culdade da tarefa comum; ou esperar, d a in
feliz Europa, aquela espécie de docilidade e de
gratidão servil que é a retribuição dos pobres
à benevolência dos ricos; ou esquecer que am ar
A E ducação C ontemporânea 181
os povos europeus é, tam bém , arranhar-se nos
espinhos, m eu grande mêdo é que o desapon
tam ento e a desilusão conseqüentes façam êste
país se refugiar no isolam ento. E será um de
sastre para o m undo. Vossos antepassados dei
xaram a Europa e a opressão, por um novo
m undo de liberdade e fraternidade. Chegou a
vez de voltardes os olhos p ara a velha terra de
tristeza e sofrim entos. Os europeus sem pre
olharam a América como a T erra da Prom is
são. Considerai a grandeza de sua esperança.
Êles não são ingratos. Sua gratidão antecipada
é grande, como a esperança. Se lhes derdes ali
m entos, auxílio econômico e meios técnicos,
um sincero “m uito obrigado” será sua respos
ta. E não cuidarão m ais disso. M as querem
vossa confiança, tam bém . Que acrediteis nêles,
nas atividades que se propõem a em preender.
A grandeza espiritual de vossa tarefa não de
ve, portanto, ser dim inuída. E ’ um a tarefa de
am izade heróica. Por outras palavras, o de que
todos os povos precisam , antes de tudo, é de
participar de trabalho com um , m aior do que
êles mesmos e ao qual se dedicam com since
ridade. Um trabalho comum, espiritual e m a
terial, ao mesmo tem po, que as nações consi
deram como a construção de u m a nova civili
zação cristã. A Europa e a Am érica têm , cada
um a, suas idéias a respeito dêste trabalho e
182 R umos da E ducação
suas concepções sôbre o regime econômico in
terno que m ais lhes convém. Em bora m an
tendo suas características, essas idéias devem
ser ajustadas, essas concepções devem trab a
lh ar juntas. N enhum bem duradouro pode ser
feito ao m undo, se o sentim ento da tragédia da
vida e a qualidade de heroísm o que a Europa
deve m ostrar para dom inar sua tragédia e se
o sentim ento da grande aventura h u m an a e a
qualidade de heroísm o que a América deve
m ostrar p ara levar à plenitude sua aventura,
não se unirem um ao outro pela confiança e
pela fé.
Vou citar um as passagens da página pro
fética, escrita em 1939, por aquêle inspirado e
m agnânim o sábio quáquer, Thom as R. Kelly.
“A gente volta da E uropa”, escreve êle, “com
um som de chôro nos ouvidos, como se alguém
dissesse: “Não se desiluda. Você deve encarar
o Destino...”. Há um a solenidade terrível no
m undo, pois o últim o vestígio de segurança
terren a se foi. Êle já p artiu de h á m uito e a
religião não se cansou de o repetir. Mas nós
não acreditam os... A gente volta da Europa es
pantado de ter visto como vidas tão cultivadas
como a nossa, m as baseada no tem po, n a pro
priedade e na reputação somente..., estão ago
ra condenadas ao desespêro, ao desespêro sem
A E ducaçao C ontemporânea 183
esperança”. 7 Êsse sentim ento da tragédia da
vida — privilégio terrível da Europa — Tho-
m as Kelly o com preendeu em seu coração. E,
talvez, fôsse esta a causa de sua m orte.
A segunda coisa de que os povos neces
sitam é a com preensão m útua. E ’ lam entável
como as nações se ignoram reciprocam ente.
Q uando vier a paz e se criar u m a agência su
perior de educação m undial, essa agência deve
prom over vasto sistem a de intercâm bio, de
bolsas de estudo e de cursos gratuitos, de tal
modo organizados, que os jovens de todos os
países e, especialm ente, os am ericanos e eu
ropeus, adquiram perfeito conhecim ento de
suas respectivas nações, ao participar não só
da vida universitária ou social, m as da vida de
trabalho, da vida n a fazenda ou n a fábrica. O
conhecim ento que se adquire com as viagens
é, com freqüência, m uito superficial. Lim itado
às cam adas sociais menos características ou
m ais decepcionantes. O problem a é penetrar
em meio m ais profundo do que o da burgue
sia. E ’ participar da existência real e dos in-
terêsses do povo. E ’ descobrir a sua alm a com
am or e não com críticas e condescendências.
Sei que a atitude m ental de certos tu ristas eu
ropeus e, até, de certos refugiados, não corres
7. Thomas R. Kelly, A Testament of Devotion (Har-
per & Bros., New York, 1941), pág. 69. Douglas V.
Steere, ed.
184 R umos da E ducação
ponde à generosidade dêste país. M al desem
barcam , começam a reprovar tudo o que difere
da cozinha, dos hábitos e m étodos de sua terra
natal. E ’ o reverso dessa atitude que parece
decepcionar m uitos am ericanos, adm iradores
da Europa. Desculpam tudo ou defendem as
idéias e preconceitos dos círculos sociais que,
p ara agradá-los, se desfazem em am abilidades
e cortesias. Desprezam , no entanto, o dinam is
mo real daquele solo secreto, daquele solo de
profunda tensão e conflitos, que é a Europa.
Aquêles, de entre vós, que se m ostraram m ais
indulgentes p ara com o fascismo italiano e o
vichiismo francês, foram os que residiram n a
F ran ça ou n a Itália. E que, por afeição e ex
cesso de am or, não ousaram repudiar os ho
m ens e as classes que traíram o espírito dêsses
nobres países. Não perceberam o fogo que es
tava ali, queim ando.
A In sp ira ç ã o R e n o v a d o ra d e N o ssa E d u ca çã o
Procurei discutir o trabalho de cura m en
tal de que necessitam os povos contam inados
pela educação nazista. Mas não nos devemos
esquecer que, às vêzes, tam bém os médicos
precisam de tratam ento. Ninguém pode dar
o que não tem . Há m uitas deficiências n a edu
A E ducação C ontemporânea 185
cação dos países democráticos. Enum erei, ao
correr destas páginas, as que me pareceram
principais. Um perigo a ser revelado. E ’ que
a educação, em vez de form ar um hom em real
m ente hum ano, procure transform á-lo em ór
gão de um a sociedade tecnocrática.
Não se tra ta de negar ou de dim inuir a
grande necessidade da Tecnologia. Necessidade
que a guerra atu al aum entou e que a paz de
ve desenvolver ainda mais. Temos de aceitá-la
prontam ente. T rata-se de conhecer o signifi
cado exato da Tecnologia, p ara o homem. E
não de considerá-lo como sabedoria suprem a e
diretriz da vida hum ana, a transform ar os
meios em fins. E sta guerra não é um a te n ta
tiva de dom ínio sôbre o hom em nem sôbre a
m atéria mesmo. E ’ um a ten tativ a p ara a li
berdade e p ara a justiça, p ara direitos iguais,
p ara dar expansão ao m ovim ento progressista
da H istória hum ana, é um a ten tativ a p ara a
civilização cristã. Êsses valores são principal
m ente espirituais. Se a única coisa que a ra
zão h u m an a pode fazer é m edir e controlar
a m atéria, — por quê lutam os, então? Não
tendo meios p ara determ inar em que consis
tem a liberdade, a justiça, o espírito, a per
sonalidade h u m an a e a dignidade; não saben
do porque m erecem que m orram os por êles, —
186 R umos da E ducação
lutam os e m orrem os por palavras, n ada mais.
Se a juventude a ser educada pelas dem ocra
cias fu tu ras considerar como m itos tôdas as
coisas que não se podem calcular ou transfor
m ar; se só acreditarm os num m undo tecno-
crático, podemos conquistar a A lem anha n a
zista m ilitar e tècnicam ente. Mas, m oralm en
te, fomos conquistados por ela. O prefácio do
nazism o e do fascismo é desprêzo absoluto
pela dignidade espiritual do hom em e a con
vicção de que só os fatores m ateriais ou bioló
gicos governam a vida hum ana. Já que o ho
m em não pode passar sem um ídolo, a m ons
truosa adoração do Leviatã totalitário terá o
seu dia. A Tecnologia é um bem, como meio
de que se serve o espírito hum ano e p ara os
fins do homem. Mas a Tecnocracia, isto é, a
Tecnologia com preendida e venerada de modo
a negar qualquer sabedoria superior e qual
quer o u tra com preensão, que não seja a dos
fenôm enos ponderáveis, só deixa, n a vida h u
m ana, a sensação de fôrça ou no m áxim o de
prazer. E term ina, necessariam ente, num a fi
losofia im perialista. Um a sociedade tecnocrá-
tica é sem pre totalitária. Um a sociedade tec
nológica pode ser dem ocrática, se tiver um a
inspiração supratecnológica. E reconhecer,
com Bergson, que “o corpo m ais desenvolvido”
A E ducação C ontemporânea 187
exige “um a alm a m aior”, e que o “m ecânico”
subentende o “m ístico”. 6
Nossa necessidade e nosso problem a essen
cial é redescobrir a fé n atu ral da razão, na
verdade. Visto que somos hum anos, guarda
mos esta fé em nosso instinto subconsciente.
Mas não a tem os m ais em nossa razão cons
ciente, porque filosofias errôneas nos ensina
ram que a verdade é noção desusada, a ser
substituída pelo apriorism o de K an t ou equi
valentes. E pela praticabilidade de um a idéia
ou do êxito de um processo de pensam ento a
se exprim ir em atos. Um m om ento de ad ap ta
bilidade feliz, entre nossas atividades m entais
e sanções práticas. E nquanto que o universo
e o valor real de tôdas essas coisas que a ex
periência sensorial não pode verificar ou que
são hum anam ente praticáveis perderam seu
significado. Com tal filosofia pragm ática, um
grande pensador, como o Professor John De-
wey, é capaz de m an ter a im agem ideal de tudo
o que é caro ao coração dos hom ens livres. Mas
fora do sistem a ideológico, a lu ta histórica en
tre essa filosofia e a cu ltu ra levará, n a tu ra l
m ente, a um a em pedernida negação positivis-
8. Les Deux Sources de la Morale et de la Religion,
pâgs. 334-335; The Two Sources of Morality and Religion
(tr. by R. A. Andra and C. Brereton), pâgs. 298-299.
/
188 R umos da E ducação
ta ou tecnológica do valor objetivo de qualquer
necessidade espiritual.
Devemos com preender, assim, por que
conflito interno a dem ocracia está hoje enfra
quecida. Seu motivo principal é de n atureza
espiritual — o desejo de justiça e o am or fra
terno. Mas sua filosofia confundiu-se m uito
tem po com o pragm atism o, que não pode ad
m itir um a fé real em tal inspiração espiritual.
Como h á de, então, a dem ocracia defender seu
próprio ideal histórico-heróico ideal — con
tra os m itos totalitários? “Por esta razão”,
afirm a o Dr. M eiklejohn, “o dia do pragm atis
mo passou. O m ovim ento que, durante 50 anos,
tão alegrem ente fêz com que se esquecessem
teorias m ais antigas, por estarem fora de mo
da, por não terem m ais razão de ser, é tratado,
hoje, do mesmo modo. Tornou-se arcaico, tam
bém...” 9
Mas o caso do pragm atism o é feição p ar
ticular de problem a m aior. Temos que consi
derar, em últim a análise, de que modo se
acusou a Filosofia. E quem a acusou não foi
a Ciência, m as um a falsa M etafísica da Ciên
cia. Julian Huxley acha que as asserções filo
sóficas e religiosas são hipóteses absurdas e
9. Meiklejohn, op. cit., pág. 140.
A E ducaçao C ontemporânea 189
inúteis. São absurdas e inúteis p ara êle, con
cordo. Os filósofos podem com preender as con
tribuições de Ju lian Huxley e reconhecer a
verdade da Biologia, assim como a verdade da
Filosofia e da Religião. Mas não tenho dúvida
em afirm ar que Julian Huxley não com preen
de nossos livros. Por isso é tão categórico ao
negar à Filosofia qualquer participação no
cam po do conhecim ento. Mas a Filosofia está
ap ta a revidar o desafio. Condena o m étodo de
tais cientistas anti-filosóficos, como incom pa
tível com o próprio m étodo científico e como
sim plista dem ais. Pois se êles criticam a Filo
sofia e a Religião em nom e da Ciência, esta,
de acordo com sua própria confissão, não pos
sui conhecim entos nem critérios em tais as
suntos. Só pode julgá-los se se to rn ar Filosofia.
Êstes hom ens são como um chofer de autom ó
vel que afirm asse que os aviões não valem n a
da, porque êle sabe guiar autom óvel e voar não
é guiar automóvel. Viver num estado de dú
vida é atitude altam ente civilizada, com rela
ção às potencialidades infinitas e às realiza
ções da ciência, n a decifração dos fenômenos.
Mas viver num estado de dúvida em relação,
não aos fenômenos, m as às realidades últim as,
cujo conhecim ento é um a possibilidade n a tu
ral, um privilégio e um dever da inteligên
cia hum ana — é viver m ais m iseràvelm ente
190 R um os da E ducação
do que os anim ais. Pois êles, pelo menos, ten
dem com certeza instintiva e anim ada p ara os
fins de sua vida efêmera.
E ’ um grande infortúnio que tan to a cul
tu ra quanto a educação sofram d a separação
entre o ideal — que constitui sua razão de vi
da e ação e que supõe coisas em que não acre
ditam — e a realidade — de acordo com a qual
vivem e agem, m as que nega o ideal que a
justifica. Tôdas as dem ocracias m odernas fo
ram vítim as disso. O dever e a m issão da ju
ventude é resolver o problem a à sua própria
custa. E ’ ligar o real ao ideal e fazer com que
o pensam ento e a ação m archem juntos.
Chegando ao fim dêste livro, acho que )
posso apelar, confidencialm ente, p ara os jo
vens am ericanos. H á m uito que os estimo, co
mo estim o sua grande pátria. G ostaria de di
zer-lhes o seguinte: O m undo que tem fome,
não só de pão, m as da palavra libertadora da
verdade, precisa de vós. Pede que sejais tão
corajosos no cam po do intelecto e da razão,
quanto nas batalhas da terra, do m ar e do ar.
Vossa inteligência tem de g anhar um a coisa
que não pode ser m edida ou m anipulada pelos
instrum entos científicos. Mas que é dada pela
intuição racional que surge do que vossos olhos
vêem e do que tocam vossas mãos. Um uni
verso de realidades, que atualiza vossos pen-
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