Admiravel Mundo Velho Barreto
Admiravel Mundo Velho Barreto
Admiravel Mundo Velho Barreto
Introdução
Ariès (1986), a partir de uma abordagem que toma o velho enquanto conceito,
identidade cultural em uma sociedade, acredita que há relação entre os dados demográficos
e o pensamento social sobre a velhice. A mentalidade de uma época, assim, sofreria
alterações de acordo com a estrutura demográfica da população. Em “História social da
criança e da família”, o autor, embora não se fixe na questão da velhice, fornece dados
pertinentes a respeito dela e mesmo que suas observações tratem realidade européia, é
possível aplicá-las ao Brasil:
- O corpo na velhice
Para os ricos, a quem inicialmente a velhice surge como ameaça, há uma “indústria
da juventude” para o cuidado com o corpo. Academias de ginástica, cosméticos e cirurgias
plásticas estão entre os itens a que o corpo burguês recorre até perceber a velhice como um
alívio para as pressões estéticas e dedicação excessiva à aparência.
Para as pessoas do campo, a velhice se afigura como a perda de força e disposição
para o trabalho: “O corpo velho do camponês é o corpo desempregado” (p.28). No caso do
operário, há uma situação semelhante, mas acompanhado do conflito social que decorre da
representação dominante do corpo através dos meios de comunicação, que propagam um
ideal de beleza burguês inatingível pelas pessoas simples.
- A solidão na velhice
Ainda que possa ser benéfica, permitindo a reflexão e a busca da interioridade, a
solidão pode ser dolorosa, ao aliar-se a outros fatores como o relacionamento com a família,
a mudança nas relações amorosas e a proximidade da morte. “Na velhice, a solidão pesa.
Não é apenas um sentimento, é um estado, uma maneira de ser – a solitária maneira de ‘ser-
velho’ em nossa sociedade” (p.30), de modo que a sensação de inutilidade torna-se
constante.
“A viuvez, a falta do companheiro ou da companheira, a ausência de um parceiro
amoroso tornam a solidão do idoso ainda mais profunda” (p.31). Tal situação é sentida com
mais intensidade pelas mulheres e é agravada pela repressão sexual da sociedade que toma
por ridículo as relações entre pessoas idosas, principalmente quando há diferença de idade.
Nas classes mais abastadas o preconceito é ainda mais visível, “parece que ele é
proporcional ao montante da herança que se teme perder ou repartir” (p.31).
As diferenças sociais também se revelam no que se refere à aposentadoria. Para
ricos e pobres, essa fase da vida é percebida de modo diferente pois pode representar
descanso e realização de sonhos ou o simples descarte de algo que não produz mais, a
marginalização e a sensação de foi “encostado”.
-A ideologia da velhice
O conceito de ideologia é discutido por diversos autores. Barreto busca em Haddad,
Marx e Gramsci as bases para enunciar seu objetivo de ouvir lado dos “dominados” e
“cotejar suas representações com as da ideologia dominante” (p.37).
- Síntese
O conto de Clarice fala sobre uma velhinha que completava seus 89 anos de idade.
A família reuniu-se em sua casa para a festa, e dispuseram as cadeiras ao longo da parede,
no centro da sala somente a mesa com o bolo. Ela devaneava, quieta, quando trouxeram o
bolo com a vela – assoprada por um bisnetinho – para que ela cortasse o primeiro pedaço.
Com as mãos trêmulas, ela deixa cair algumas passas, para chateação das crianças presentes.
Por ela, o bolo só não deveria ser a janta, em pensamentos indecifráveis.
Uma mãe é um seio que nutre, que age e é sujeito. A velha havia sido maquiada
como se fosse uma coisa, ao ser preparada para a festa. Na cabeceira da mesa de jantar,
remói rancores por ter perdido sua função de provedora, matriz. Os outros personagens
presentes só aumentam a intensidade desses rancores, ao se concentrarem nos seus próprios
problemas e relegarem a velha ao esquecimento.
Com exceção de Jonga, um filho que morrera, e Rodrigo, um neto de sete anos, ela
via toda sua prole como “seres opacos, com braços moles e rostos ansiosos, risinhos fracos,
sem austeridade, azedos e infelizes frutos de um tronco bom [ela mesma]” (p. 71). Já Jonga
não, esse era o filho cuja inexistência lhe permite fantasiar sobre uma vida que teria dado
certo. Rodrigo, de forma semelhante, representa a esperança de um futuro imaginado por
ela como perfeito.
Para a psicanálise, o filho dá à mãe a sensação máxima de importância, pois um
filho homem, viril, é o pênis que a mulher inveja – a concretização de algo que, como
mulher, ela nunca teve ou terá.
O tempo correu e ao crepúsculo a festa chegava ao fim. Os convidados foram se
retirando, cada um dando um “beijo cauteloso (...) como se sua pele tão infamiliar fosse
uma armadilha”, e ensaiavam ditos espirituosos e falsas declarações, como que temendo
que seu último tratamento para com a velha fosse rude. A velha, impassível, sentia só o
peso do tempo, representado pelo entardecer: “o crepúsculo de Copacabana, sem ceder, no
entanto se alargava cada vez mais e penetrava pelas janelas como um peso”.
Como presentes, os convidados não haviam trazido nada que pudesse ser
identificado com a velha: cactus, broches, saboneteiras, nada de fato útil para uma velha ou
para a filha que cuidava dela.
“Ela é mãe de todos e, impotente à cadeira, despreza-os. Imponente-impotente, ela é
um lapso: parece oca” (p. 75). Seu corpo traduz dezenas de aspectos de uma velhice
rancorosa pela impotência de ser a matriz: o punho é um cetro, os olhos vagam sem
curiosidade, o riso é frouxo, a pele é infamiliar.
Universal Subjetivo
A velhice pode nos ajudar a entender o valor da vida, que “pode nos ficar escondido
pelos desgastes sofridos pela nossa carne, nosso espírito” (p. 83). Tal como Jung, um
discípulo rebelde de Freud, descreve em suas memórias, a velhice significa ao mesmo
tempo “uma limitação, um estreitamento. E no entanto acrescentou em mim tantas coisas:
as plantas, os animais, as nuvens, o dia e a noite e o eterno no homem” (p. 82).
Assim, embora o envelhecimento traga suas agruras consigo, ele também nos
permite entender melhor a vida e o universo como um todo – como se passássemos a fazer
parte dele de modo mais íntegro, “um estado inicial, onde o eu dilacerado se reencontra
unido com todas as coisas, a definitiva pessoa” (p. 84).
Afinal, os tempos mudam e com isso vamos mudando também, mas ao final da vida
talvez estejamos mais próximos da “definitiva pessoa”, que não mais se abala tanto com o
fluxo constante do rio, com as transformações da vida.
Nesse sentido, podemos apreender melhor o sentido objetivo do que vivemos. Sabe-
se que “objetivo” é humanamente impossível, então mesmo o que pensamos, enquanto
homens, como “objetivo”, pode ser, historicamente subjetivo. E o que é historicamente
objetivo passa a ser, universalmente subjetivo.
Conforme vamos ficando velhos, nossa consciência sobre essa subjetividade se
amplia, “quer se trate de um velho camponês, quer se trate de um grande filósofo como
Lao-tse” (p. 82). Ao fazê-lo, nosso conhecimento sobre a realidade acaba se ampliando.
-Fantasia poética
A poesia é uma forma de expressão que nos remete a nossa própria interioridade.
Alguns escritores/poetas utilizam, então, a figura do velho para se auto-denominarem
futuramente. E, para os jovens, é difícil pensar no velho que um dia virá a ser. Colocar-se
nesse lugar não é das tarefas mais simples, mesmo porque, até mesmo para o idoso, é difícil
tomar por realidade sua posição de quem está velho.
O que se lê ou o que se canta sobre o velho, através da voz de um jovem, é
importante de ser analisado e entendido. Isso porque, “a representação do velho no
imaginário dos jovens é o elemento mais importante e mais urgente de resistência à
ideologia”. (p.87)
-Seleção musical
O estudioso Alfredo Bosi fala que, o poder de nomear “significava, para os antigos,
dar às coisas a sua verdadeira natureza, ou reconhecê-la”. (BOSI, 1983. In: BARRETO,
1992, p.90).
“Para Bosi, a poesia se constitui fora do discurso ideológico, ainda que, às vezes,
seja por ele penetrada.”(p.90) A poesia buscaria o além, procura resistir à ordem e criar seu
próprio mundo no horizonte da utopia.
“O autor aponta três formas de resistência à ideologia na obra poética (poesia
nostálgica, crítica e utópica), que Meneses (1982) identifica como três fases da obra de
Chico Buarque de Hollanda”(p.91).
A banda
Estava à toa na vida enfeitou
O meu amor me chamou Estava à toa na vida Pra ver a banda passar
Pra ver a banda passar O meu amor me chamou cantando coisas de amor
Cantando coisas de amor Pra ver a banda passar
Cantando coisas de amor Mas para meu
A minha gente sofrida desencanto
Despediu-se da dor A minha gente sofrida O que era doce acabou
Pra ver a banda passar Despediu-se da dor Tudo tomou seu lugar
Cantando coisas de amor Pra ver a banda passar Depois que a banda
Cantando coisas de amor passou
O homem sério que
contava dinheiro parou O velho fraco se E cada qual no seu canto
O faroleiro que contava esqueceu do cansaço e Em cada canto uma dor
vantagem parou pensou Depois da banda passar
A namorada que contava Que ainda era moço pra Cantando coisas de amor
as estrelas parou sair no terraço e dançou Depois da banda passar
Para ver, ouvir e dar A moça feia debruçou na Cantando coisas de
passagem janela amor...
Pensando que a banda
A moça triste que vivia tocava pra ela
(Chico Buarque)
calada sorriu
A rosa triste que vivia A marcha alegre se
fechada se abriu espalhou na avenida e
E a meninada toda se insistiu
assanhou A lua cheia que vivia
Pra ver a banda passar escondida surgiu
Cantando coisas de amor Minha cidade toda se
Nesta música, o velho também encontra seu espaço. “O velho fraco se esqueceu do
cansaço e pensou/ que ainda era moço para sair do terraço e dançou”.
“O velho de Buarque, neste primeiro momento, aparece com suas características
básicas e mais aparentes: é fraco (o corpo do velho é frágil); é cansado (ninguém
pode falar de velhice sem falar de fadiga); o mítico, o desejo, é ser como o moço, sair
dançando, ainda que seu par seja uma moça feia.”(p.91-92).
Essa música fala de um velho que não carrega nada além do que o peso da idade, pois ficou
se guardando, sem realmente viver. E é aí que começa o que podemos interpretar como
uma auto-crítica do autor, que teria medo de envelhecer e não deixar nenhum “legado”, não
viver efetivamente. E talvez por isso, a música marque o fim da 1ª fase de suas músicas, a
fase nostálgica. Chico vai a procura de um sentido para sua vida, e o encontra na poesia
crítica.
O velho é um espelho do jovem. Quando o jovem olha para o velho, ele acaba, sem
perceber, se vendo daqui alguns anos. E esse é o grande poder do velho, temido pela
ideologia. “É preciso esconder, disfarçar, tutelar, marginalizar a velhice, pois a presença do
velho origina no jovem um balanço e um questionamento- de sua obra, sua vida, seu
trabalho, seu posicionamento político. A significação da velhice não está no velho, mas em
sua relação com o jovem. O que se teme é o velho-diante-dos-jovens”(p.94)
Em sua música “Sem fantasia”, Buarque vai mostrar as marcas de sua luta. “Vem
meu menino vadio (...) que da noite para o dia você não vai crescer (...) Eu quero te
mostrar// as marcas que ganhei/ nas lutas contra o rei/ nas discussões com Deus”.
Buarque “abraça a utopia, entendendo que falar de uma coisa possível é torná-la
possível, grande é o poder da palavra.”(p.98). E a palavra, para ele, é sua canção.
O disco lançado em 1987, 20 anos depois do lançamento de “O Velho”, veio
nomear esse personagem “Francisco”. Buarque (Chico, ou Francisco) coloca-se como o
velho. Suas músicas, nesta fase, são em 1ª pessoa.
O velho Francisco
“e a meninada
respirava o vento
até vir a noite
e os velhos falavam
coisas desta vida”
[“Fazenda”]
“Volver a los 17
después de vivir un siglo
és como decifrar signos
[...]
el amor côn esmeros
al viejo lo vuelve nino.”
[“Volver a los 17”]
E, em contraponto ao que foi abordado neste disco, os jovens do Legião Urbana dão
uma sacudida em quem tem mais idade.
Em “Plantas embaixo do aquário”, os garotos criticam os velhos que governam o
mundo. Falam da sua pouca abertura para as novas idéias. “Acusam” esse velho poderoso:
“vive insatisfeito e não confia em ninguém/ E não acredita em nada/ E agora só cansaço e
falta de vontade...”. Por último, fazem um apelo a esses velhos, que não deixem a guerra
começar.
Já em “Tempo Perdido”, Renato Russo fala do tempo que passou. Podemos ver nela
um diálogo entre o velho e o jovem. O velho já não tem mais esperanças, enquanto o jovem
ainda vê possibilidades.
tao jovens
tao jovens
Caetano Veloso, por sua vez, liga a imagem do velho apenas à alegrias. Toda vez
que o idoso é retratado, é uma forma do compositor relembrar de seu pai, já morto.
O Homem Velho
Luz fria, seus cabelos têm tristeza de
O homem velho deixa a vida e morte para
néon
trás
Belezas, dores e alegrias passam sem um
Cabeça a prumo, segue rumo e nunca,
som
nunca mais
Eu vejo o homem velho rindo numa curva
O grande espelho que é o mundo ousaria
do caminho de Hebron
refletir os seus sinais
E ao seu olhar tudo que é cor muda de
O homem velho é o rei dos animais
tom
Ao falar de velhice, falamos de espelho. Quando vemos um velho, no vemos, mas daqui
alguns anos. Além disso, é o espelho que revela para o homem a sua velhice.
Cecília Meirelles dizia em sua poesia :”Se algum de nós avistasse o que seríamos com o
tempo, todos nós choraríamos, de mútua pena e susto imenso.”
-O outro (velho)
O velho e o Novo
Em seu dorso farto
Deixa o velho em paz Carrega o fardo de caracol
Com as suas histórias de um tempo bom Mas espera atento
Quanto bem lhe faz Que o céu cinzento lhe traga o sol
Murmurar memórias num mesmo tom
Ele sabe o mundo
A sua cantiga, revive a vida O saber profundo de quem se vai
Que já se esvai O que não faria
Uma velha amiga, outra velha intriga Pudesse um dia voltar atrás
E um dia a mais
Range o velho barco
Vão nascendo as rugas Lamento amargo do que não fez
Morrendo as fugas a as ilusões E o futuro espelha
Tateando as pregas Esse mesmo velho que são vocês
Se deixa entregue às recordações
[Taiguara]
A música sertaneja é uma forma de trazer a densidade da velhice para ser tratada
através de histórias e lendas do folclore brasileiro.
-Velhice Imaginária
“A velhice é espelho: se o jovem nele se mira, pode mudar o rumo de sua vida, da vida
de todos nós: o porvir torna-se possível; o que há de vir uma escolha. Hoje o futuro se faz: o
futuro é presente quando se pensa, ou se imagina, ou se canta um imaginário tempo” (p.117).
Nesse capítulo a autora transcreve uma série de gravações feitas por ela de pessoas
devaneando sobre seu futuro. Ela pede para que as pessoas, relaxadas e em um estado entre a
vigília e o sono, mais propício para fantasiar, visualizem como está sua vida dez anos após o
momento presente. Vai somando décadas a esses primeiros dez anos conforme necessário
para que a pessoa se acostume com a idéia dessa velhice.
A autora colheu as entrevistas em 1988, com pessoas de variadas idades, classes
sociais e graus de instrução. Deixou que cada um escolhesse seu próprio pseudônimo.
De um modo geral, as pessoas mais jovens se concentraram em suas carreiras ao se
imaginarem dez anos à frente: com trinta e poucos anos a maioria se visualizou mais
estabilizada; com quarenta, mais cansada; com cinqüenta, curtindo mais os frutos do trabalho,
viajando. Mas a partir dos sessenta anos, todos já se imaginam muito cansados para trabalhar,
e enquanto alguns se preocupam em ter uma ocupação (tocar um instrumento, jardinagem,
pintura) ou cuidar dos netos, muitos já se vêem lutando contra a solidão – seu maior medo.
“Vou passar uns dias em Caxambu, na mata, aquela roça” (Heitor, 69,
ferroviário, pensando em si com 79 anos, p. 150)
“O mais medo que eu tenho é de ficar assim, preciso de ir prum asilo,
nem sei o quê, castigado dos outros, os outros não importar com a gente”
(Manuel, 53, rodoviário, se imaginando com 63 anos)
“[O idoso] tem muita dificuldade de ficar parado e sozinho. Então tem
que se preparar bastante, porque mesmo parado e sozinho o sujeito pode se
relacionar muito, fazer muita coisa” (Ruy Soares, 65, aposentado jornalista,
advogado e administrador, visualizando-se com 75 anos, p.165).
“Eu gostaria de chegar aos 74 anos passeando muito, viajando,
trabalhando, aprendendo fazer... nadando. Gostaria muito. Gostaria.” (June,
64, doméstica, com imaginários 74 anos).
“Se morrer, pronto. Agora eu tenho receio de ficar inválido, ficar
assim em dificuldade pra sair, andar e pra coisa” (Terêncio, 77, aposentado
sapateiro, mecânico de automóvel, ferramenteiro, agente de estação,
telegrafista, pedreiro, músico, se imaginando com 87 anos, p. 187)
“Eu vejo que as mudanças vão ser muito grandes sob o ponto de vista
econômico. (...) As pessoas terão que competir no mundo. Como? Criando
novas ocupações, novas formas de ganhar a vida, novas formas de
relacionamento, novas maneiras de comer, de vestir, de pensar (...)” (Maria,
60, psicóloga, imaginariamente com 70 anos, p. 167).
“A situação econômica hoje, este desvario. As improvisações política e
social, num desvario. A família procurando novos rumos. Será que vamos
sair para novas composições?” (João, 65, psicólogo, imaginando a si mesmo
com 75, p. 154)
“Eu, por exemplo, tou usando um sistema que adotei de uns dias para cá, de
não ler jornal, não ouvir televisão nem nada; quer dizer: me afastar das
novidades” (Heitor, 69, se imaginando com 79, p. 151)
-Retrato malsim
Maria Luísa é uma senhora idosa entrevistada pela autora. Na entrevista ela nunca fala
sobre o corpo do velho, mas há uma alusão ao físico, ao fato de ela achar-se acabando.
“Parece que não é seu corpo que morre, mas seus sonhos- ou o prazer? E já estão meio
mortos: nem se refletem nesse espelho que é o futuro.” (Maria Luísa em Admirável Mundo
Velho, p.199)
“A impotência sexual impede o gozo do outro, então se coça o dedão do pé (a
masturbação é comum na velhice), e a mulher amada tem a imagem do passado. A cadeira de
balanço é imagem do colo da mão, a proteção, a sensação gostosa, o carinho, a compreensão
melhor na velhice, o homem esse ser narcísico, só quer retornar” (p.201)
Os jovens têm dificuldade em se imaginar no futuro. É difícil para ele pensar no seu
corpo velho. O idoso, quando se percebe na condição de alguém “com idade avançada”, quer
tentar manter-se jovem, a vaidade fica muito aflorada, na tentativa de recuperara a juventude
perdida.
Apesar da preocupação com o corpo ser bem exacerbada no velho, a saúde é o que
mais freqüentemente é citado nas entrevistas. Mais importante do que estar velho é estar bem
de saúde. A mulher já não se preocupa se suas roupas vão lhe fazer parecer velha, essa
situação já lhe é introjetada. O homem, não tem mais condições de se afirmar corporalmente
pelo trabalho braçal, sua condição não permite.
“Com tantas perdas, recordar o passado se impõe: é triste e é alegre olhar o que ficou
para trás” (p.218).
Os velhos vêem nos netos a possibilidade de não serem mais sós. Os filhos já
deixaram sua casa e eles têm nos netos a segunda oportunidade da paternidade sem a
obrigação de serem, efetivamente, os pais, com as responsabilidades que isso acarreta.
-À guisa de Conclusão
“Mas o que não fui, o que não fiz, o que nem sequer sonhei
O que só agora vejo que deveria ter feito,
O que só agora vejo claramente que deveria ter sido-
Isso é que é morto para além de todos os Deuses
Isso- e foi afinal o melhor de mim- é que nem os Deuses fazem viver...”