Missão Cruls PDF
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Diplomado em engenharia civil pela Universidade de Gand, que cursou de 1863 a 1868.
Admitido como aspirante de engenharia militar, permaneceu no exército belga até 1873.
Cria a Comissão Luiz Cruls, destinada a estudar e difundir a vida e a obra do astrônomo
belga, de mesmo nome, e sua importância na história de Brasília.
————
CRISTOVAM BUARQUE
Governador do Distrito Federal
MÁRIO TINOCO
Secretário da Fazenda e Planejamento
SANDRA LOUISE
Diretora Administrativa e Financeira
EQUIPE TÉCNICA
EQUIPE DE APOIO
RELATÓRIO DA COMISSÃO
EXPLORADORA
DO PLANALTO CENTRAL
DO BRASIL
Relatório Cruls
LUIZ CRULS
6ª EDIÇÃO
BRASÍLIA - 1995
RELATÓRIO CRULS
1ª edição 1894
2ª edição 1947
3ª edição 1957
4ª edição 1984
5ª edição 1987
* edição especial 1892/1992
6ª edição 1995
C955r Cruls, Luiz.
Relatório da Comissão Exploradora
do Planalto Central: Relatório
Cruls / Luiz Cruls. — 6ª ed. — —
Brasília: CODEPLAN, 1995.
380p: il.
APRESENTÇÃO ................................................................................................3
RESUMO ................................................................................................7
INTRODUÇÃO ................................................................................................1
RELATÓRIO DA COMISSÃO EXPLORADORA DO PLANALTO CENTRAL DO
BRASIL.....................................................................................................................................12
ÍNDICE DAS MATÉRIAS ................................................................................................5
INTRODUÇÃO ..............................................................................................17
ÍNDICEHELIOGRAVURAS ..............................................................................................23
RELATÓRIO DO Dr. LUIZ CRULS, CHEFE DA COMISSÃO.................................................25
MEDIÇÃO DOS RIOS ............................................................................................113
DISTÂNCIAS QUILOMÉTRICAS DOS ITINERÁRIOS..........................................................143
ANEXO I ...........................................................................................................................151
ANEXO II ...........................................................................................................................163
ANEXO III ...........................................................................................................................175
ANEXO IV ...........................................................................................................................237
ANEXO V ...........................................................................................................................293
ANEXO VI ...........................................................................................................................329
CAMINHAMENTOS .........................................................................................................345
RESUMO
O grupo dividiu-se em quatro turmas, tendo, cada uma delas, a missão de determinar no
terreno a posição de um dos vértices do quadrilátero.
A turma que assinalou o vértice noroeste foi chefiada por Augusto Tasso Fragoso; a turma
sudoeste foi chefiada por Luiz Cruls; a nordeste, por Julião de Oliveira e a sudeste, por
Henrique Morize.
O equipamento utilizado se compunha de teodolitos, sextantes, cronômetros e relógios,
barômetros, aneróides, podômetros, instrumentos meteorológicos e material fotográfico.
Além da demarcação da área da futura Capital, em sete meses de trabalho, de meados
de 1892 a princípios de 1893, foram percorridos mais de quatro mil quilômetros e feito um
levantamento minucioso sobre topografia, clima, hidrología, geologia, fauna, flora,
pedologia, recursos minerais e materiais de construção existentes na região.
O produto desse trabalho resultou no "Relatório da Comissão Exploradora do Planalto
Central do Brasil", composto por um volume de textos descritivos (português e francês, na
versão original), fotografias, tabelas, cálculos e croquis, além de um Atlas, contendo 83
caminhamentos (mapas) da região percorrida.
SOMMAIRE
RAPPORT DE LA COMMISSION DU PLATEAU
CENTRAL DU BRASIL - Rapporte CRULS
L' article 3ème de la Constitution Féderal de 1891 a déterminé que: "Une zone de 14.400
Km² située au plateau central de la République et à être opportunément demarquée,
appartiendra à l´Union, qui a 1'intention d' y établir la fúture capitale fédérale”.
Ayant pour but délimiter la région où devrait s'établir la nouvelle Capitale du Brésil, a été
nomée cette même arméc, 1891 une commission. constituée de 22 membres, dirigée par
l'astronome Luíz Cruls, directeur de l'Observatoire National.
On a choisi une partie du Plateau Central où se trouve la source des affluents de trois
grands fleuves brésiliéns: le Maranhão affluent du Tocantins, le Preto affluent du São
Francisco et le São Bartolomeu et Descoberto affluents du. Paraná.
Le nouveau District Fédéral a pris la forme d'un quadrilatère formé par deux lignes de
paralléle et deux lignes de méridien, ce qui rend facile la demarcation et ne pose pas de
problémes de limites.
Le points de fonction NW, NE, SE e SW, designés respectivement A, B, C et D devraient
avoir les coordonnés suivantes:
Le groupe s'est divisé en quatre sous-groupe ayant chacun la mission de marquer sur le
terrain la position dun des points de fonction du quadrilatère.
Ceux qui ont signalé le point de fonction nord-ouest ont été dirigé par Augusto Tasso
Fragoso; ceux du Sud-ouest par Luiz Cruls; ceux du nord-est par Julião de Oliveira et
ceux du sud-est par Henrique Morize.
L'équipement utilisé se composait de théodolites, sextants, chronomètres, baromètres,
anéroides, podomètres, des instruments météorologiques et du matériel photographique.
Pendant sept mois de travail, la moitié de 1892 et le début de 1893, on. a demarqué
1'espace de la future capitale et on a aussi parcouru plus de quatre mil quilomètres en
faisant une étude de la topographie, climat, hydrologie, géologie, faune, flore, pédologie,
ressouces mineraux et materiaux de construction existent dans la région.
Le résultat de ce travail a été le "Rapport de la Commission de I'Exploitation du Plateau
Centrall du Brésil", composé par un volume de textes decriptifs, (en portugais et en
françaís; dans le version originale) photos, tableaux, calculs, croquis et un Atlas contient
83 plans de la région parcourue.
SUMMARY
REPORT OF THE EXPLORER COMISSION OF THE
CENTRAL PLATEAU OF BRASIL - CRULS Report
The 3rd article of the Federal Constitution of 1891 determined that: "From this date on, it is
part of the Union's property, an area of 14.400 km² in the central plateau of the Republic,
that will be later delimited, where the future Capital of lhe Country will be stablished".
With this objective in mind, a comission formed by 22 members, and headed by the
astronomer Luis Cruls, director of the National Observatory was nominated in this same
year of 1981 to delimitate the area where the new capital of Brazil should be built.
The location chosen was a part of the central plateau, where we find the headwaters of the
confluents of the three major Brazillian rivers, the Maranhão, confluent of the Tocatins, the
Preto, confluent of the São Francisco, and the rivers São Bartolomeu and Descoberto,
confluents of the Paraná.
The way chosen to delimitate the lands of the new Federal District was a quadrilateral,
formed by two arcs of the parallel and two arcs of the meridian, justified not only by the
possibility of the appearance of fewer problems of delimitation, but also because of the
fácility of demarcation.
The vertex NW, NE, SE and SW, called respectively A, B, C and D should have the
following coordinates:
The major group was divided into four teams, each one having the incumbency of
determining the position of one of the vertices of the quadrangular area.
The group that marked the northwest vertex was headed by Augusto Tasso Fragoso; the
southwest group was; headed by Luis Cruls, the northeast group by Julião de Oliveira and
the southeast group by Henrique Morize.
The equipement used was composed of theodolites, sextants, chronometers and
timepieces, barometers, aneroid barometers, pedometers, meterological tools an
photographic materials.
Besides the demarcation of the of the future Capital, more than four thousand quilometers
were explored and a detailed study was made on the topography, climate, hidrology,
geology, fauna, flora, pedology, mineral resources and raw material for construection
existing in the location.
The proceeds of this work resulted in a "Report of the explorer comission of the Planalto
Central do Brasil" composed of one volume of descriptive texts (the original version in
Portuguese and French), photographs, charts, computations and croquis, besides one
Atlas containing 83 maps of the explored region.
RESUMEN
INFORME DE LA COMISIÓN EXPLORADORA DE LA
MESETA CENTRAL DEL BRASIL - Relatório Cruls
O Visconde de Porto Seguro fez vários manifestos a respeito. Inicialmente, ele sugeriu
São João Del Rei. Depois, preferiu o Planalto Central por considerá-lo mais importante.
Como resultado de toda a campanha pró-mudança (da Capital) Holanda Cavalcante
apresenta ao Senado, em 1852, um projeto de lei dispondo sobre a construção da nova
Capital, sendo mantido o topônimo Brasília, sugerido por José Bonifácio.
Com o advento da República, foi inserido na Constituição Federal, em 24 de fevereiro de
1891, o seguinte texto: "Art. 3º - Fica pertencente a União, no Planalto Central da
República, uma zona de 14.400 Km², que será oportunamente demarcada, para nela
estabelecer-se a futura Capital Federal".
Em maio de 1892, foi finalmente efetivada a escolha da área destinada a futura capital, e
para isso foi constituída uma comissão com a finalidade de demarcar os 14.400 Km2
estabelecidos na Constituição de 1891. Denominada "Comissão Exploradora do Planalto
Central do Brasil', foi confiada sua chefia ao astrônomo Luiz Cruls, diretor do Observatório
Astronômico do Rio de Janeiro.
Todos os fatos que estão ligados, de uma forma ou de outra ao "nascimento" de Brasília
compõem a memória da cidade e, portanto, não devem ser esquecidos. Este volume
apresenta a íntegra do Relatório da Comissão Exploradora do Planalto Central - Relatório
Cruls, excluída a versão francesa, que compõe também o volume original.
Todos os mapas correspondentes a área levantada (14.400 Km² ) estão reunidos em
outro volume - Atlas, de onde foram selecionados os 17 mapas - caminhamentos, que
fazem parte desta publicação e são referentes à área do atual Distrito Federal.
Além dos mapas, foi incluída uma síntese do Sistema Cartográfico do Distrito Federal -
SICAD - implantado em 1975 e, conforme o artigo 2º do Decreto nº 4.008 de 26 de
dezembro de 1977, passou a "constituir referência oficial obrigatória para todos os
trabalhos de topografia, cartografia, demarcação, estudos, anteprojetos, projetos,
implantação e acompanhamento de obras de engenharia em geral, bem como para o
controle de uso de solo do Distrito Federal".
O relatório dessa Comissão - que ora está sendo reeditado - é de grande importância
para a memória histórica e cartográfica do Distrito Federal, de vez que nele estão contidos
todos os passos da primeira demarcação da área, as técnicas empregadas na época e
seus resultados.
A justificativa desta publicação se faz pela grande importância desse documento: -foi o
primeiro levantamento e mapeamento do sítio da Capital e são poucos os exemplares à
disposição do público nas maiores bibliotecas do País.
Assim sendo, a CODEPLAN através do seu projeto "Memória Cartográfica", que tem por
objetivo divulgar fatos históricos e documentos cartográficos, e o Departamento de
Patrimônio Histórico e Artístico, com o projeto "Raízes', que pesquisa, preserva e divulga
os bens patrimoniais do Distrito Federal, empenharam-se na publicação do Relatório
Cruls.
COMMISSÃO EXPLORADORA DO PLANALTO CENTRAL DO
BRAZIL
RELATORIO
APRESENTADO A
POR
L. CRULS
Chefe da Commissão
______
RIO DE JANEIRO
1894
Quando, em Maio de 1892, o Governo mandou nos chamar, afim de nos confiar a missão
de explorar o Planalto Central do Brazil e n'elle demarcar a área que, segundo o que
prescreve a Constituição, deve ser reservada ao futuro Districto Federal, e ahi ser
opportunamente mudada a nova Capital da União, não nos illudimos a respeito da
magnitude do assumpto, e ao mesmo tempo da responsabilidade que ia pesar sobre nós
perante o paiz inteiro, aceitando tão honrosa quão espinhosa tarefa.
Agora que podemos dar por concluida a nossa missão, com a publicação do presente
Relatorio, em que se encontram os resultados dos nossos trabalhos, convenientemente
desenvolvidos, talvez não seja fóra de proposito mostrar que, procedendo á exploração e
demarcação da área pelo modo e na localidade onde foi feita, procurámos seguir o
espirito que animou o legislador quando inseriu na Constituição vigente o Art. 3º que
reproduzimos á pagina 69, d’este Relatorio.
Não ha negar que os membros da Constituinte, ou melhor a Commissão dos 21,
escolhida no seu seio, e a quem ficou incumbida a elaboração do projecto da
Constituição,
aguas obstruido em muitos pontos. Devemos, esperar que, com o correr dos tempos, ráie
o dia em que elles virão a tornar-se navegaveis em todo o seu percurso; quando chegar
este dia, e que um systema de vias ferreas ligar a nova Capital com os grandes rios, cujas
aguas descem para o Norte, a o Sul e para Léste, então achar-se-ha realisada a palavra
prophetica do visconde de Porto-Seguro, mencionada á pag 28 d’este Relatorio.
Por ahi vê se que, de todo o planalto brazileiro, a parte que, a priori, podia ser
considerada a unica que satisfizesse a dupla condição de ser a mais central e visinha das
cabeceiras dos grandes rios, é aquella a que a Commissão restringio sua exploração, e
onde demarcou a área reservada para o futuro Districto Federal.
Em summa, acreditamos que procedendo á demarcação na região onde a fizemos,
correspondemos ao que o legislador tivera em mente, quando inseriu na actual
Constituição o Art. 3º. E o nosso modo de pensar parece encontrar confirmação na
propria resolução do Congresso Nacional, mandando agora proceder á fixação do local
para a futura Capital da Republica na zona demarcada no planalto Central, Votando, esta
resolução, os Membros do Congresso, aliás os mesmos que, em 1891, mandaram
proceder à exploração e demarcação a área no planalto central, sanccionaram e
ratificaram com o seu voto, a demarcação feita pela Commissão. E tanto mais
fundamento parece ter esta nossa convicção, quanto o mesmo Congresso rejeitou um
projecto de Lei apresentado a 23 de Agosto de 1893 por diversos illustres deputados,
propondo que o Governo mandasse fazer os estudos de outra zona na região cortada
pelas linhas de limites dos Estados de Goyaz, Bahia e Piauhy no planalto central e com o
fim especial de para ella mudar a Capital da Republica.
Nutrimos pois a convicção de que a zona demarcada apresenta a maior somma de
condicções favoraveis possiveis de se realisar, e proprias para n'ella edificar-se uma
grande Capital, que gozará de um clima temperado e sadio, abastecida com aguas
potaveis abundantes, situada em região cujos terrenos, convenientemente tratados
prestar-se-hão ás mais importantes culturas, e que, por um systema de vias-ferreas e
mixtas convenientemente estudado, poderá facilmente ser ligado com o littoral e os
diversos pontos do territorio da Republica.1º de julho de 1894.
Oeste onde campêa a Serra dos Pyreneus, tão pittoresca. A léste, extende-se o bello e
grandioso valle que vai prolongando-se até aos pequenos montes do Rio Parnauá,
ramificando-se, em outros pontos, em todas as direcções. Esta planicie immensa, de
superficie tão suavemente sinuosa, é riquissima de cursos d'agua limpida e deliciosa que
manam da menor depressão do terreno. Essas fontes, como os grandes rios que regam a
região, são protegidas por admiraveis capões aos quaes nunca deveria golpear a
machada do homem, senão com a maior circumspecção. São magnificas de verdura os
pastos e certamente superiores a todos os que vi no Brazil Central. Todos esses
elementos cuja disposição se poderia attribuir á inspiração de um artista sublime dão á
paizagem o aspecto mais aprazivel e de que não ha nada comparavel, a não ser em
miniatura os antigos parques inglezes, desenhados por Le Notre ou Paxton. Tão
profundamente gravou-se-me na memoria a belleza do clima que de continuo o tenho na
mente.
Em consequencia da constituição geologica do solo, não é absolutamente fertil a
totalidade do territorio, porém as localidades desprovidas dessa qualidade são cobertas
de excellentes especies de gramineas principalmente dos generos Paspalum e Panicum.
A essas hervas espontaneas é que a região deve a superioridade do gado vaccum e de
seu producto lacticinio certamente igual aos melhores da Europa. Eis a razão porque a
criação do gado, que não acarreta senão desembolços minimos, será indubitavelmente a
industria agricola mais vantajosa do paiz. Á margem dos rios, dos bosques assim como
das innumeras cabeceiras existem ainda vastos terrenos aptos para o cultivo de muitas
especies de arvores fructiferas dos climas temperados, taes como as pereiras, as
macieiras, as figueiras, etc. e principalmente a vinha cujo futuro é garantido por todas as
condições que a sua prosperidade exige. A estação aqui chamada – fria - que
corresponde ao tempo secco, dá simultaneamente logar á queda das folhas exactamente
como na Europa succede com o inverno obstando o movimento ascendente da seiva, e
impõe ao vegetal uma inacção indispensavel á maturidade dos galhos novos para a
fructificação vindoura. A ser licita a esperança da prosperidade das arvores fructiferas,
não é menos fundada a de todos os legumes indisdispensavais ao consumo diario. Além
do cultivo em maior e menor escala dos differentes generos, o das florestas que,
certamente, não será de menor vantagem para a economia geral pela producção das
plantas industriaes, é igualmente digna da attenção do agronomo. Com bastante sorpreza
observei a existencia de numerosas Sapotaceas susceptiveis de fornecerem a -Guta-
Percha,- substancia mui procurada, hoje rara no estado de pureza. Por toda a parte nas
mattas marginaes dos rios encontram-se especies congeneres taes como Lucuma,
Chryzophyllum, Bassia, Mimusops, etc., das que produzem as melhores Gutta de
Sumatra inconsideradamente quasi destruidas pela cobiça dos indigenas que da
exportação auferiram grande lucro. Com essas Sapotaceas associam-se outros muitos
vegetaes cuja utilidade tão pouco não é para desprezar, como sejam as plantas de
gomma, fibrosas, etc., e mais a introducção de especies exoticas que tambem seriam de
muita vantagem para o paiz.
Agora que tenho a dita de viver sob o clima ameno do Planalto, cada dia o acho melhor
pela temperatura perfeitamente constante, a leveza e pureza do ar : ahi tudo é amavel e
calmo; quanto á configuração, os vegetaes não lembram nem os das regiões quentes
nem os dos paizes frios; ás vezes verifico a existencia de especies pertencentes á flora
alpestre do Itatiaia, do cume da Serra dos Orgãos ou a regiões distantes do equador, taes
como o Chili, a Plata, etc. Muitas d'essas plantas brazileiras provenientes de sementes
que remetti para Europa haverá 20 ou 30 annos, acham-se hoje perfeitamente acclimadas
em Nice e nos contornos, prova evidente da analogia que existe entre regiões não raro
afastadissimas umas das outras. Ora se os vegetaes das regiões altas do Brazil tem vida
normal, ao ar livre, no sul da França e da Italia, estou firmemente convencido que o
mesmo se ha de dar no Planalto quanto ás essencias mencionadas. Para se conseguir
este fim, convem, evidentemente, renunciar á rotina e recorrer á intel-
Acceite o Illm. Sr. Dr. Cruls a homenagem dos meus respeitosos sentimentos e sincera
dedicação. - A Glaziou.
L. Cruls.
Dezembro de 1894.
Página originalmente deixada em branco..........................................................................22
DO PLANALTO CENTRAL DO BRASIL............................................................................23
Preambulo
Quando, no começo do anno de 1893, o pessoal da Commissão Exploradora do Planalto
Central do Brazil, terminou os seus trabalhos de campo, apenas de volta á Capital, cuidou
immediamente dos trabalhos de gabinete, abrangendo todos os calculos de reducção das
posições geographicas determinadas durante a exploração, os da differença de longitude
entre Goyaz, Uberaba, São Paulo e Rio de janeiro, assim como dos desenhos dos
caminhamentos dos itinerarios percorridos, e cujo desenvolvimento total excedia a 4.000
kilometros. Exigindo esses trabalhos de gabinete, até, a completa conclusão, consideravel
lapso de tempo, e convindo, por outra parte, que o mais breve possivel fossem
informados o Governo e o Congresso dos resultados mais importantes colhidos pela
Commissão, resolvemos redigir um resumido Relatorio dos trabalhos effectuados e dos
principaes resultados obtidos.
Esse Relatorio, intitulado “ Relatorio parcial ” , foi publicado em junho de 1893.
Ao passo que nos occupavamos da publicação do “ Relatorio parcial ”, curavamos
activamente da redacção do Relatorio geral;
Historico
Não é nova a idéa da transferencia da Capital do Brazil: vemol-a mencionada em varias
publicações, das quaes as de data mais antiga é o jornal Correio Braziliense, do qual
reproduzimos adiante um artigo publicado em 1808, ha quasi um seculo. Mais tarde
vamos encontral-a de novo na obra em dous volumes do Visconde de Porto Seguro, de
que tambem damos alguns extractos. Convém notar que os autores que se têm occupado
com este projecto são unanimes em considerar a zona onde têm os mananciaes os rios
Araguaya, Tocantins. São Francisco, Paraná, isto é, sobre o Planalto Central, por cerca
de 15º de latitude austral como sendo a mais vantajosa, sob todos os pontos de vista.
Eis a reproducção integral das differentes publicações relativas a tão magno assumpto:
“Não nos demoraremos com as objecções que ha contra a cidade do Rio de Janeiro, aliás
mui propria para o commercio e outros fins, mas summamente inadequada para ser a
Capital do Brazil: basta lembrar que está a um canto do territorio do Brazil que a sua
communicação com o Pará e outros pontos d'aquelle estado é de immensa difficuldade, e
que sendo um porto de mar, está o governo alli sempre sujeito a uma invasão inimiga de
qualquer potencia maritima. Quanto ás difficuldades da creação de uma nova Capital,
estamos convencidos de que todas ellas não são mais do que méros subterfugios.”
Annos depois accrescentava. “A côrte não deve residir no porto ou logar que se destina a
ser emporio do commercio, porque os negociantes illudidos com o brilhante da côrte
desejam fazer-se cortezões, em vez de serem commerciantes; procuram habitos,
condecorações e titulos em vez de procurarem sobresahir em seu commercio, que é o
que lhes convém e interessa o Estado; e sahindo assim aquelles individuos da esphera
em que tão uteis eram, de negociantes da primeira ordem passam talvez a ser nobres na
infima graduação no que não utilisam a si nem fazem bem ao Estado.
“ Essa paragem, bastante central onde se deve collocar a Capital do Imperio parece,
quanto a nós, está indicada pela natureza na propria região elevada do seu territorio,
d’onde baixariam as ordens, como baixam as aguas que vão pelo Tocantins ao norte, pelo
Prata ao sul e pelo S. Francisco a léste. ”
Nesta obra do Dr. Joaquim Alexandre de Mello Moraes, acha-se pag. 85, § 9, cap. II, com
o titulo “ Negocios do Brazil ” que aos deputados de São Paulo foram ministradas
instrucções do Governo provisorio concernentes aos interesses do Brazil e entre outros :
“ Parece-nos tambem muito util que se levante uma cidade central, no interior do Brazil,
para assento da côrte ou da regencia o que poderá ser na latitude, pouco mais ou menos,
de 15 gráos, em sitio sadio, ameno, fertil, e regado por algum rio navegavel. Deste modo
fica a côrte ou assento da regencia livre de qualquer “ assalto ” e “ surpreza ” extrema. e
se chama para as provincias centraes o excesso da povoação vadia das cidades
maritimas e mercantis. Desta côrte central dever-se-hão logo abrir estradas para as
diversas provincias e portos de mar para que se communiquem e circulem com toda a
promptidão as ordens do Governo e se “ favoreça ” por ellas o commercio interno do vasto
Imperio do Brazil. ”
Foi apresentada esta proposta em sessão de 9 de Outubro de 1821, no Palacio do
Governo de São Paulo e approvada no dia immediato.
Alguns annos mais tarde, em 1834, o Visconde de Porto Seguro fez renascer esta
questão, e escreveu em sua obra em dous volumes - Historia Geral do Brazil, tomo II,
pag. 814:
“ E a primeira lição que devemos colher é a de, já em tempo de paz, attendermos mais
aos meios de resistencia que deve offerecer este importante porto, do qual permitta Deus,
que seja “ quanto antes ” retirada a Capital do Imperio tão “vulneravel”, ahi na fronteira e
tão “ exposta ” à ser ameaçada de um bombardeio e soffrêl-o com grande prejuizo de
seus proprietarios, por “ qualquer inimigo ” superior no mar que se proponha a arrancar do
Governo, pela ameaça, concessões em que não poderia pensar se o mesmo Governo “
ahi ” se não achasse.
E isto quando a propria Providencia concedeu ao Brazil uma paragem mais central, “mais
segura”, mais sã e propria a ligar entre si os tres grandes valles do Amazonas, do Prata e
S. Francisco, nos elevados chapadões, de ares puros de “ aguas boas ” é até de
abundantes marmores, visinho ao triangulo formado pelas tres lagôas Formosa, Feia e
Mestre d'Armas, das quaes manam aguas para o Amazonas, para o São Francisco e para
o Prata”.
Mais recentemente, querendo o mesmo autor, conhecer de visu as condições da
localidade, fez uma excursão a Goyaz, e da cidade Formosa dirigio ao Ministro das Obras
Publicas a communicação que transcrevemos:
“Na extensão que acabo de percorrer ha, porém, outra região não menos apropriada á
colonisação européa, e para a qual eu creio que poderiamos desde já dar algumas
providencias, afim de a ir preparando pouco a pouco para a missão que a Providencia
parece ter-lhe reservado, fazendo della partir aguas para os tres rios maiores do Brazil e
da America do Sul - o Amazonas, o Prata e o S Francisco, e constituindo, por assim dizer,
o nucleo que retine entre si as tres grandes conchas ou bacias fluviaes do paiz.
Refiro-me a bella região situada no triangulo formado pelas tres lagôas - Formosa, Feia e
Mestre d'Armas, com chapadões elevados a mais de 1.000 metros, como nesta paragem
requer, para a melhoria do clima a menor latitude, favorecidos com algumas serras mais
altas da banda do norte, que não só os protegem de alguns ventos menos frescos deste
lado, como lhes fornecerão, mediante a conveniente despeza, os necessarios
mananciaes.
Não entrarei aqui na questão da alta conveniencia para o Imperio, e até para o Rio de
janeiro, da mudança da Capital, questão
que me reservo para discutir em uma publicação não official. Mas não posso deixar de
aproveitar esta occasião para recommendar importancia, em todo o sentido, da
mencionada paragem, como sólo fecundo, em e tem de vingar e prosperar muito
quaesquer sementes que nella se lançarem.
................................................................................................................................................
.......................
Entre outras localidades proprias para o estabelecimento de povoações, que ainda
poderiam encontrar-se nesta paragem, única em relação ao Brazil todo, reconheço e me
atrevo desde já a recommendar duas, das quaes deveria merecer preferencia aquella
que, por exames feitos expressamente, promette vir a receber, com a maior facilidade,
necessaria abundancia de boas aguas.
São dous chapadões de facil accesso, qualquer dos quaes prestaria assento a uma
povoação, desde logo com a perspectiva de poder estender até mais de um milhão, de
almas.
Qualquer delles fica acima de 1.000 metros sobre o mar, em sólo firme, secco, de faceis
escoantes e offerece a vista, de um lado ao menos, horizontes mui dilatados.
É o primeiro denominado por alguns - o da Gordura, a perto de quatro leguas ao O. N. O.
da Formosa. na paragem onde, a um tiro de fuzil, se veem, uma das outras, as cabeceiras
dos ribeirões Santa Rita vertente do rio S. Francisco, pelo Rio Preto, Bandeirinha, vertente
do Amazonas pelo Paraná e Tocantins, e Sitio Novo, vertente do Prata pelo São
Bartholomeu e grande Paraná!
Mas, bem que sem estes predicados, que aliás não é essencial que sejam aceitos tanto
ao pé da lettra e digamos quasi mathematicamente, encontra-se logo adiante obra de
legua e meia ao N O, outra localidade ainda mais alta e muito superior a esta tanto pela
maior facilidade de conduzir a ella as primeiras aguas potaveis, como pela maior
ventilação e vastidão de seus horizontes e pontos de vista.
Fica sobre a chapada em declive, que fórma o paredão ao nascente da Lagôa Formosa, a
menos de uns cento e tantos metros antes de acabar a subida do caminho que d'ahi
segue para o norte pelo dorso da mesma chapada, em direcção á denominada - Serra do
Cocal.”
Pelo que precede, vêmos que, ha quasi um seculo, foram assignaladas as vantagens da
necessidade de se mudar a Capital brazileira. Não nos devemos pois admirar de que, em
1891, de novo a discutiram os membros da Constituinte e lhe consagraram um artigo
especial na nova Constituição do Brazil.
Conformando se com a determinação da Constituinte, o Congresso consignou em 1891,
uma verba para que se procedesse á demarcação de 14.400 kilom. quadrados no planalto
central do Brazil. Foi pois, em cumprimento desta determinação que o Governo nomeou a
“ Commissão Exploradora do Planalto Central do Brazil ”.
Instrucções
A 17 de Maio de 1892, dirigio-nos S. Ex. o Ministro das Obras Publicas o seguinte aviso,
contendo as instrucções destinadas á Commissão.
“Em observancia á disposição do art. 3º da Constituição Federal, e para dar cumprimento
à resolução do Congresso Nacional que consignou na lei do orçamento em vigor a verba
destinada à exploração do planalto central da Republica e demarcação da área, que tem
de ser occupada pela futura. Capital dos Estados Unidos do Brazil, é n'esta data nomeada
a commissão encarregada de taes trabalhos, cuja direcção é confiada ao vosso
conhecido zelo e provada competencia.
“ No desempenho de tão importante missão deveis proceder aos estudos indispensaveis
ao conhecimento exacto da posição astronomica da área a demarcar, da orographia,
hydrographia, condições climatologicas e hygienicas, natureza do terreno, quantidade e
qualidade das aguas, que devem ser utilisadas para o abastecimento, materiaes de
construcção, riqueza florestal, etc. da região explorada e tudo mais que directamente se
ligue ao assumpto que constitue o objecto da vossa missão.
No decurso de taes trabalhos e tanto quanto possivel, podereis realisar não só os estudos
que julgardes de vantagem e utilidade para mais completo desempenho do vosso
encargo, mas ainda os que possam concorrer para a determinação de dados de valor
scientifico com relação a essa parte ainda pouca explorada do Brazil.
“ Da inclusa copia da Portaria d'esta data consta o pessoal que faz parte da referida
commissão.
Saude e Fraternidade. (Assignado) Antão Gonçalves de Faria. - Sr. Dr. Luiz Cruls.
Pessoal da Commissão
Luiz Cruls Chefe
J.de Oliveira Lacaille Astronomo
Henrique Morize Astronomo
Antonio Martins de Azevedo Pimentel Medico Hygienista
Pedro Gouvêa Medico
Celestino Alves Bastos Ajudante
Augusto Tasso Fragoso Idem, servindo de secretario
Hastimphilo de Moura Ajudante
Alipio Gama Ajudante
Antonio Cavalcante de Albuquerque Ajudante
Alfredo José Abrantes Pharmaceutico
EugenioHussak Geologo
Ernesto Ule Botanico
Felicissimo do Espirito Santo Auxiliar
Antonio Jacintho de Araujo Costa Auxiliar
João de Azevedo Peres Cuyabà Auxiliar
JoséPaulodeMello Auxiliar
EduardoChartier' Mecanico
Francisco Souto Ajudante de mecanico
Pedro Carolino Pinto de Almeida Commandante do contingente
Joaquim Rodrigues de Siqueira Jardim Alferes do contingente
HenriqueSilva Idem, idem
Material
Compunha-se o material destinado aos trabalhos da Commissão do seguinte: circulo
meridiano, theodolítos, sextantes, micrómetro de lugeol, luneta astronomica, heliotrópios,
chronometros e relogios, barometros de fortin, aneróides, bussolas, podómetros,
instrumentos meteorologicos, material photographico. Havia mais uma collecção de
apparelhos mechanicos para o concerto dos instrumentos, dado o caso de algum
accidente.
Todo o material, inclusive barracas, armas, mantimentos, occupava 206 caixas e fardos
pesando ao todo 9.640 kilogrammas.
Primeiramente effectuou-se, pelo caminho de ferro o transporte d'esse material do Rio de
janeiro para Uberaba, e d'ahi por deante, em animaes cargueiros.
A 9 de junho partia a Commissão do Rio de janeiro para Uberaba, ponto terminal da linha
ferrea da Companhia Mogyana. Chegando a Uberaba cuidou-se immediatamente da
organisação dos meios de transporte quer para o pessoal quer para o material, o que,
como só e acontecer, apresentou sérias difficuldades, tanto maiores que, no caso
occorrente, tratava-se de uma commissão numerosa acompanhada de consideravel,
material.
Só a 29 de junho acharam-se terminados todos os aprestos e a Commissao poiz-se a
caminho.
Levantamento dos caminhamentos
Todos os itinerarios percorridos pela Commissão foram levantados pelo processo ame-
DO PLANALTO CENTRAL DO BRAZIL.....................................................................................31
Commissão Exploradora do planalto central do Brasil
d’onde
Tomemos como ultimo exemplo um caminhamento de 200 kilometros, com visadas de
0k.5, e seja e = 5º, teremos para a ultima estação do caminhamento
Erro linear:
Erro em azimuth:
Cliché H. Morize
ACAMPAMENTO NAS CABECEIRAS
do Pindahyba
DO PLANALTO CENTRAL DO BRAZIL..........................................................................................41
Commissão Exploradora do Planalto central do Brasil
BRAZIL...........................................................................................................................................43
No seu Clima, Geologia, etc., do Brazil, (pag. 48) o Sr. Liais se refere a este trecho do
modo seguinte: «Todavia não é certo ser o pico de Itatiaya o ponto mais alto do Brazil.
Incontéstavelmente é o ponto culminante das serras da Mantiqueira e do Mar, mas em
Goyaz o Sr. Thomaz Ward calcula em 9.500 pés inglezes a altura dos montes Pyreneus,
perto da cidade de Goyaz, o que corresponde a 2.896 metros e o Sr. Hartt cita uma carta
do Sr. H. R. des Genettes declarando que medío o pico mais alto dessas montanhas e
encontrou 2.932metros. »
Outros autores mais modernos, desprezando as reservas de Hartt e Liais, dão os
Pyreneus como sendo effectivamente os pontos mais elevados do Brazil.
Pelas citações acima vê-se que a unica autoridade para a altitude dos Pyreneus é o
Padre H. R. des Genettes, visto que não existe a determinação attribuida pelo Sr. Liais ao
Sr. Thomaz Ward. Convem, portanto, examinar cuidadosamente essa autoridade.
Não consta haver outra publicação sobre o assumpto, além da do jornal bahiano citado
por, Hartt, que hoje difficilmente se póde encontrar. Existia, porém, na Bibliotheca do
Imperador, um manuscripto do Padre des Genettes, com data de II de Outubro de 1873,
que foi apresentado na Exposição da Sociedade de Geographia, e pemitte ajuizar da
exactidão d'esta determinação. Descrevendo o planalto de Goyaz, d'onde, se erguem os
montes Pyrenêos, diz o autor da manuscripto: « A altura da Mão de Páo, perto do rio
Paranahyba, na estrada de Catalão, sendo de 1.283 metros, o planalto se acha elevado
1.493 metros acima do Oceano. O grupo dos Pyreneus apresenta contra-fortes
caracterisados Elle não se levanta inopinadamente sobre as altas chapadas. O pico que
domina parece ter pouca altura, por causa mesmo d’esta disposição. Comtudo eleva-se a
2.932 metros acima do nivel do Oceano». E mais adiante: « A serra das Vertentes ou dos
Pyreneus attinge a sua maior altura no pico por 15º48’ de latitude sul e 7º28' de longitude,
do Rio de Janeiro. O cume que pizei é de uma rocha granitoide e tem no ponto teminal.
15m.32 comprimento sobre 3m.43 de largo. A base é larga, a altitude de 500 metros
acima do dorso da serrania é de 2.932 metros acima do mar. ”
D'estas citações resulta, claramente que serviu de base para a determinação da altitude
dos Pyreneus a elevarão dada ao leito do Paranahyba, no porto Mão de Pau. Ora, esta
altitude não combina de modo algum com os outros dados que possuimos sobre este rio.
Na explorarão do prolongamento da estrada de ferro paulista em direcção a Matto-
Grosso, pelo engenheiro Francisco Pimenta Bueno, cujo recente fallecimento abre tão
sensivel lacuna n'esta sociedade, a elevação da confluencia dos rios Paranahyba e
Grande, perto de Sant'Anna do Paranahyba, é dada em 320 metros.
Mesmo sem outros dados seria impossivel admittir que do porto Mão de Pau até este
ponto, o rio Paranahyba tivesse o declive de 963 metros exigido pela determinação de
des Genettes.
Na passagem pelo mesmo rio, perto da villa de S. Francisco das Chagas, algumas leguas
apenas abaixo das cabeceiras determinei com o aneroide a elevação de 909 metros.
Conquanto este numero não possa ser considerado rigorosamente exacto, é provavel que
só se afaste umas dezenas de metros da verdade, visto que ao chegar a S. João d'El-
Rey, o meu instrumento combinava quasi exactamente com o nivelamento da via-ferrea.
Em toda a região ao oeste do rio S. Francisco, por mim atravessada, só encontrei
elevação egual a dada para o porto Mão de Pau (1.283 metros em meio curso do
Paranahyba) no alto da serra da Canastra, visivelmente mais elevada do que as proprias
cabeceiras do Paranahyba.
Dados mais positivos são fornecidos por um trabalho ainda inedito do engenheiro de
minas, Chrispiniano Tavares, que me foi obsequiosamente communicado.
Em três viagens para Goyaz partindo do Rio de janeiro, de Ouro Preto e do Ribeirão
Preto, o Dr. Tavares accumulou grande copia de determinações de alturas, feitas com
aneroide, que combinam entre si nos pontos
DO PLANALTO CENTRAL DO BRAZIL..........................................................................................45
Commissão Exploradora do Planalto Central do Brasil
Porto Velho
Therm barom
1892, Julho 0 mm
11 - 1h 45m da tarde 27.0 721.0
27.0 721.3
27.0 720.5
12 - 1h 15m da manhã 13.6 725.0
Média 23.7 721.8
Santa Rita
Therm barom
1893, Janeiro 0 mm
12 – 7h 20m da manhã 21.1 724.8
OS PYRENEOS
A numeração dos picos é indicada do Norte para Léste : o pico III cuja ascensão
effectuámos é o mais alto.
O nosso acampamento ficava alguns cem metros ao Sul e dous ou tres kilometros a
Oeste do pico III; segundo-as nossas observações, era de 257 metros inferior a sua
altitude a d'este pico.
Vamos agora tratar da determinação da altitude dos Picos dos Pyreneus relativá à de
Pyrenopolis:
Quatro barometros de mercurio serviram para a operação: os ns. 1584; 786; 789 e 790.
Os dous primeiros ficaram, em Pyrenopolis, onde fizeram-se leituras de hora em hora: os
dous últimos nos acompanharam: sendo deixado no acampamento o 790 e transportado
ao alto do Pico o 789.
A 8 de Agosto, sahimos do acampamento: chegando á base do pico, nos apeamos e
fizemos a ascensão ate o alto. Como se deprehende do relatorio do geologo, Dr. Hussák,
o grupo dos picos dos Pyrenêos é essencialmente constituido de Itacolumite, cujos blocos
escalavrados, e mais ou menos enredados, bastante difficultam a subida.
Cumpre notar ainda que o pico mais elevado não excede 70 metros de altura, a contar da
base, por outra, do ponto d’onde procedemos à ascensão.
Chegando ao cume, fizemos uma serie de leituras do barometro, e, ao meio dia, tomamos
a altura meridiana do sol para a determinação exacta da latitude do Pico. Eis as leituras
do sextante, verificadas por tres observadores:
117º 8' 10" Cruls
” ” 0 Morize
” ” 35 Fragoso
Dedúz-se d'ahi para a latitude do Pico
15º 47' 44''
o que concorda com o valor
15º 48'
obtida pelo Padre des Genettes. Se, quanto á latitude, ha concordancia quasi absoluta, já
não succede assim com a longitude do Pico, que segundo o mesmo observador. é de
7º28' W. do Rio de Janeiro. Ora, se tomarmos por base uma série de dez culminações
lunares observadas comum opti no circulo meridiano, collocando-nos visivelmente no
meridiàno de Pyrenopolis. e attendendo á differença de longitude entre essa cidade e os
Pyreneus, acharemos para longitude desses picos :
5'.41' Oeste do Rio de Janeiro.
Por ahi vêmos que a longitude achada pelo Padre des Genettes está exagerada de cerca
de 1º.47'.
Eis as leituras dos barometros feitas no acampamento e no cume dos Pyreneus:
PICO DOS
PYRENEUS barom 789.00
meio dia 24.0 barom 653.65
25.0 653.40
25.2 652.40
Na seguinte tabella acham-se as leituras dos dous barometros que tinham ficado em
Pyrenopolis.
BAROM 1584 BAROM 786
Agosto T B T B
º mm º mm
7.7h tarde 23.0 701.39 23.0 702.50
8 21.1 1.40 21.2 2.30
8.8h. manha 18.3 2.10 18.0 2.60
9 19.9 3.10 19.4 3.60
10 23.3 3.70 22.5 3.90
11 24.7 3.70 24.0 3.80
12 25.8 3.40 25.1 3.60
1 h tarde 26.8 2.50 26.8 2.80
2 28.0 1.70 27.3 2.20
3 28.4 1.19 27.9 1.70
4 28.8 1.29 28.2 1.50
5 28.4 0.90 27.9 1.30
6 26.7 0.80 26.0 1.40
7 24.2 0.90 23.8 1.50
DO PLANALTO CENTRAL DO BRAZIL..........................................................................................57
Commissão Exploradora do Planalto Central do Brasil
Dous d'esses barometros 1.854 e 789, (o ultimo servira no cume dos Pyreneus),
convenientemente comparados deram os resultados seguintes:
pois baixar a 15º. Pouco depois da meia noite, reproduzio-se o phenomeno, na occasião
em que observavamos o eclipse do 1º satellite de jupiter. A temperatura elevou-se a 18º
C. (seria 1 hora da manhã) ao passo que era de II o minimum nocturno observado
algumas horas depois. Não é facil de explicar esse phenomeno - o nosso guia, mui
conhecedor da região, dizia que nessa quadra do anno soía produzir-se regularmente.
porém não conhecia a causa provavel
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Demarcação da zona
O problema da demarcação da zona não deixava de ser complexo e podia receber várias
soluções entre as quaes convinha escolher aquella que satisfizesse o mais
completamente possivel o desideratum que o leggislador teve em vista quando inserio na
Constituição o seguinte:
« Artigo 3º.– Fica pertencente á União, no planalto central da Republica, uma zona de
14.400, kilom. quadrados, que será opportunamente demarcada para n'ella estabelecer-
se a futura Capital Federal.
Paragrapho unico. – Effectuada a mudança da Capital, o actual Districto Federal passará
a constituir um Estado. »
O planalto central indicado no art. 3º da Constituição é formado na realidade por uma
série de chapadões cujas altitudes vão crescendo de Sul a Norte, e embora occupe
realmente uma extensão bastante consideravel, tem a sua região central localisada na
zona onde se encontram as cabeceiras dos principaes rios do systema hydrographico
brazileiro: o Araguaya, o Tocantins, o São Francisco e o Paraná.
A altitude média, segundo as nossas observações, oscilla entre 900, e 1.300 metros e um
numero não pequeno de rios torna esta região rica em aguas potaveis.
Além d'estas considerações, não podiamos perder de vista as origens historicas da
questão, que, como vimos acima, data do começo d'este seculo, e sem duvida, o
legislador as tinha na mente quando designou o planalto central para o local onde mais
tarde se fundaria a nova Capital. E' pois indubitavel que era a região proxima dos
Pyreneus que cumpria explorar, e, com effeito, os resultados ulteriores confirmaram a
nossa opinião.
Uma segunda questão que convinha resolver era a fórma a adoptar para a zona do futuro
Districto Federal.
Devia-se adoptar uma forma irregular tomando como limites os que os systemas
orographico e hydrograplúco pareciam indicar como mais convenientes? Ou seguindo o
exemplo dos Estados-Unidos da America do Norte, onde os limites dos estados são
simplesmente arcos de meridiano e arcos de pa-
rallelo, não era preferivel adoptar para a área a demarcar a forma de um quadrilatero
tendo por lados esses mesmos arcos?
A primeira solução, isto é, a fórma irregular, além de outras desvantagens, necessitava
muito maior tempo para sua demarcação, pois tornava-se indispensavel o levantamento
de todo o perimetro da zona, assim como a medição de uma base, operações demoradas,
visto o gráo de precisão relativamente moderado que requeria uma primeira demarcação,
pois era evidente que depois, com tempo e cuidado, se procederia á demarcação
definitiva e absoluta por meio de um levantamento geodesico.
A segunda solução, iste é o quadrilatero espheroidal, preenchia melhor o fim que nos
propunhamos, e pelo seu perimetro constituido por uma figura geometrica regular, tinha a
vantagem de evitar para o futuro questões litigiosas, que não raras vezes suscitam-se
entre estados limitrophes, acerca dos proprios limites.
Com effeito, dadas as latitudes de dous arcos de parallelo bem como as longitudes de
dous arcos de meridiano que limitam a área demarcada, torna-se possivel verificar a todo
o tempo, a posição exacta no terreno dos limites da zona.
Além d'isso, a fórma e as dimensões do espheroide terrestre, permittem determinar com
sufficiente rigor, a área de um quadrilatero limitado por arcos de meridiano e de parallelo,
cujas respectivas longitudes e latitudes são conhecidas. Tambem é de facil solução o
problema inverso isto é, dada a área, determinar as coordenadas dos vertices do
respectivo quadrilatero espheroidal que a encerra. Excusado é observar que, d'esta
fórma, o problema seria indeterminado, pois a uma mesma área, corresponderiam
innumeros quadrilateros, porém, no caso presente se podia impor mais a condicção de
ser o quadrilatero limitado por arcos de meridiano com differença de longitude conhecida,
assim como a latitude de um dos parallelos. N'esta hypothese, determina-se pelo calculo
a latitude do segundo parallelo.
Foi pois a segunda solução a que preferimos: Restava adtoptar a fórma do quadrilatero.
Resolvêmos esta nova questão inspirando-nos em considerações concernentes a propria
zona, seu systema hydrographico, e orographico, suas riquezas naturaes, etc.
Pelas considerações acima vimos que a fórma mais conveniente para o quadrilatero seria
aqueIla cujos arcos de parallelo e de meridiano teriam cerca de 160 e 99 kilometros, pois
que pondo de parte a fórma espherica da terra, esse quadrilatero teria uma superficie de
14.400 kilometros quadrados e um perimetro de 500.
As observações feitas em Pyrenopolis e Formosa deram-nos as seguintes coordenadas
approximmadas :
Latitude Longitude
oeste de Greenwich
Pyrenopolis 15º51'35'' S 3h 15m 25s
Formosa 15º32'7'' S 3 9 25
Como vê-se, a differença de longitude approximada é de 6m ou de um gráo e meio, seja
cerca de 160 kilometros, na latitude média. Foi pois esse valor que adoptámos para
différença entre as longitudes dos arcos de meridiano. Para latitude do parallelo mais
septentrional, adoptámos 15º20'0''. Com esses dados, limitando-nos ao numero inteiro de
segundos, procurámos qual seria a latitude do segundo parallelo.
A formula conhecida:
que assim vêm a ser as latitudes dos arcos de parallelo do quadrilatero cujos meridianos
acham-se afastados 1º.5.
Como vimos acima, a differença da longitude entre Formosa e Pyrenopolis quasi que era
de 1º e meio; por outra parte, conhecendo tambem proximamente as longitudes d'esses
pontos, resolvêmos demarcar o quadrilatero de modo que os arcos de meridiano
passassem perto d'estas duas cidades e os arcos de parallelo ao norte de Formosa e ao
sul de Pyrenopolis.
Achando-se o pessoal todo reunido em Formosa, dividimol-o em quatro turmas, das
quaes a cada uma incumbia determinar no terreno a posição de um dos vertices
correspondentes ás coordenadas indicadas nas instrucções reproduzidas adiante.
Instrucções
RIO AREIAS
Ambas as coordenadas geographicas serão fornecidas cada uma pelo menos por dez
determinações distinctas, não podendo os valores extremos da latitude differirem de mais
de 20" e os da longitude de mais de 3ºs5. Neste caso o erro provavel do resultado final
não ,excedera para aquella de 2".5 e para esta de 3s 5
Uma vez conhecidos os valores da latitude e da longitude da estação de observação,
tomar-se-hão as differenças entre estas e os das coordenadas dos vertices indicados
n'estas instrucções e depois de transformal-as em comprimentos expressos em unidades
metricas, servindo-se para isto da tabella annexa, ter se-hão os lados AB e aB de um
triangulo rectangulo em que A é o vertice e a a estação de observação. Segundo as
grandezas d'estes lados e a conformação do terreno, uma simples operação topographica
permittirá determinar com sufficiente approximação a posição no terreno do vertice A em
relação a estação a. Conhecida esta posição tratar-se-ha de fixal-a do seguinte modo:
Abrir-se-ha no terreno uma excavação, tendo um metro de lado e 1m.30 de profundidade
e em coincidencia com o respectivo vertice. Esta excavação encher-se-ha de pedras até
um metro de altura e sobre estas será feito um revestimento de leivas, de, modo que a
vegetação em poucos dias, possa encobrir o logar.
No centro da excavação será depositado um documento assignado pelo chefe e membros
da turma, em que serão escriptas as coordenadas do vertice, determinadas pela
observação e que será mettido dentro de um envólucro convenientemente lacrado.
Em seguida a posição do vertice será ligada por meio de visadas feitas sobre serras,
morros ou edificios e por triangulação topographica com quaesquer accidentes naturaes
do terreno como sejam rios, cabeceiras, etc., etc., de modo que em toda e qualquer época
seja possivel descobrir o logar onde se acham os vertices da área demarcada.
Durante a permanencia da turma na estação da observação, far-se-hão caminhamentos
na região circumvisinha dentro de um raio de 5 kilometros.
Igualmente será feito o caminhamento ao voltar cada turma do respectivo vertice até
Pyrenopolis.
Todas as reducções e calculos concernentes à determinação das coordenadas
geographicas bem como os caminhamentos desenhados de Formosa até o vertice e
d'este até Pyrenopolis, serão entregues ao Chefe, quando as turmas estiverem de volta
em Pyrenopolis, afim de permittir as verificações indispensaveis antes de poder
considerar como concluidos os trabalhos de demarcação.
As turmas deverão estar de volta em Pyrenopolis o mais tardar até o dia 10 de Novembro,
ACAMPAMENTO EM MACACOS
TURMA NE
Julião de Oliveira Lacaille, Dr. Pedro Gouvêa, A. Cavalcante de Albuquerque, A. J. de
Araujo Costa, Alferes Joaquim Jardim.
TURMA SE
Henrique Morize. Alipio Gama. José Paulo de Mello.
Deduz-se d'ahi para a altitude d'este ponto que parecia o culminante da chapada dos
Veadeiros : 1.555 metros.
No cume de dous morros proximos do acampamento, os aneróides marcaram:
Morto A Morro B
Aneróide n. 6072 630.0 628.0
Feiglstok 628.0 628.0
Respectivamente são pois as altitudes destes dous morros 1.673 e 1.678 metros.
Por estas observações fica demonstrado que não é justificada a altitude supposta
segundo as indicações do Snr. Moreira. Todavia é bastante consideravel a altitude
determinada e apresenta todas as garantias de exactidão compativeis com o emprego do
aneróide; a chapada excede de 170 metros a do cume dos Pyreneus, e de 290 metros,
nos morros.
A 15 de Setembro seguiram de, Formosa as turmas de N. W. e S.W., indo porém, antes
de separarem-se em Mestre d'Armas, explorar a Lagôa Formosa e percorrendo o mesmo
itinerario que fôra outr'ora percorrido pelo Visconde de Porto Seguro. Pretendendo visitar
a cachoeira do Itiquira que nos fôra recommendada como digna de se vêr, desviamo-nos
um tanto do nosso itinerario e a 16 acampámos em Itiquira, proximo à cachoeira. O
Itiquira é um ribeirão, affluente do rio Paranan; suas aguas regam o valle do mesmo
nome, mas, na região proximo a For-
SALTO DO ITIQUIRA
(120° de alto)
DO PLANALTO CENTRAL DO BRAZIL..........................................................................................93
Por ahi vê-se que as aguas, são abundantissimas mormente na parte meridional da zona
demarcada, tornando-se facil abastecer uma cidade, por mais populosa que seja, a razão
de 1.000 litros d'agua por dia e por habitante.
A qualidade das aguas d'esses diversos rios varia de um a outro. Em geral pode-se
considerar as aguas do sul como sendo melhores do que as do norte, em relação á serra
das Divisões e as dos affluentes do Corumbá como superiores as do São Bartholomeu.
Madeiras. - Comquanto a região explorada do Planalto não seja por sua natureza
extremamente rica em florestas, encontram-se estas em varios pontos e mais abundantes
na parte occidental da zona demarcada, onde se prolonga o matto grosso.
Pedras.- As pedras que se podem aproveitar para as construcções são de diversas
especies e encontram-se em abundancia sufficiente para suas diversas applicações.
A melhor d'estas é o granito de Barreiros, cujas amostras colhidas na superficie, são um
tanto decompostas, mas é fora de duvida segundo o Dr. Hussak, geologo da Commissão,
que a pouca profundidade, se encontrará rocha completamente fresca.
Ainda se encontra ao norte da serra dos Pyrineus e das Divisões, calcareo em
abundancia, muito aproveitavel para construcções bem como, entre Santa Luzia e
Formosa, boa argila para a fabricação de tijolos.
Conclusão
Um dos resultados mais importantes que a Commissão colheu e sobre o qual ousamos
chamar a attenção, é concernente ao clima da região explorada.
Sem receio de errar, podemos asseverar que bem pequeno é o numero dos Brazileiros
que a conhecem sob este ponto de vista, e quanto aos exploradores estrangeiros, bem
poucos são aquelles, que a tenham convenientemente explorado.
Isto explica-se facilmente, pois, procurando geralmente, e de preferencia, os valles onde
correm os grandes rios, seus itinerarios deixaram, na maior parte, de cortar a região mais
caracteristica do Planalto Central do Brazil.
Entre os exploradores estrangeiros, que mais se approximara d'ella, ou em parte a
percorreram, devemos citar Augusto de Saint-Hilaire 6 e Francis de Castelnau 7.
D'estes dois naturalistas transcreveremos aqui o que a respeito do clima da região,
explorada por nós, escreve o segundo.
Diz elle:
« O julgado de Meia-Ponte8: é atravessado na parte sul pela grande serra commummente
chamada Espigão-Mestre; nas visinhanças da cabeça da comarca o clima é agradavel
não sendo nunca excessivos nem o calor nem o frio; o ar é puro e de noite reina uma
brisa constante. Os ventos geraes fazem-se sentir desde, Maio até Setembro, sua
direcção é de léste para oeste, e sopram das quatro horas da manhã ás onze.
Só no Morro-Grande que faz parte do Espigão-Mestre manifesta-se a nevoa, e affirmam
que as vezes gela; porém é raro esse phenomeno meteorologico.
E' , frio o clima e puro o ar do territorio que jaz a leste e ao sul de Meia-Ponte, os ventos
geraes ahi sopram todo o anno; de Maio a Agosto é espessa a nevoa, e gela em Junho e
Julho.
E' ameno o clima da parte que se estende a oeste e ao norte do arraial mesmo e são
desconhecidas ahi as nevoas e a geada; os ventos são variaveis e quentes.
Geralmente esta região é menos salubre que o resto do julgado, porém o noréste e mais
insalubre que o oeste. De ordinario as chuvas começam em Outubro prolongando-se até
Abril.»
Eis como se exprime Castelnau a respeito do clima do antigo julgado de Meia Ponte, que
se pode considerar como o da região demarcada e difficilmente poder-se-hia em tão
poucas palavras e tão fielmente descrevel-o, como elle o fez.
Pela nossa parte não podemos deixar de manifestar a admiração que se experimenta ao
encontrar, em latitude tão pequena, região tão salubre, onde o emigrante europeu póde
acclimar-se sem necessitar nenhuma hygiene
Provado, pois, como está, por esses algarismos, que se poderá percorrer a distancia
entre a nova Capital e o porto do Rio de Janeiro, em vinte horas, vê-se que a objecção da
distancia não é sustentavel.
De semelhante estrada de ferro, com um traçado o mais directo possivel, não poupando
as necessarias obras d'arte, dependerá o bom ou o mau exito do importante projecto da
mudança da Capital Federal, encarado pelo lado dos beneficios que sua realisação póde
trazer para o desenvolvimento da região central do Brazil.
E' certo, pois, que assim ligada ao porto do Rio de Janeiro, a futura Capital Federal não
tardará a tornar-se um centro industrial e commercial, cuja vitalidade será um factor
importante e poderoso para a futura prosperidade d'este rico paiz.
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RELATORIO DA COMMISSÃO EXPLORADORA.......................................................................116
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8 RIO Alagado
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ORlO Sala Velha
8 Rio MeSQUita
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O Rio Papuda
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O Rio Piripâo
8 Rio Mes tre d'Armas
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DO PLANALTO CENTRAL DO BRAZIL.......................................................................................139
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DO PLANALTO CENTRAL DO BRASIL......................................................................................143
De Uberara a Pyrenopolis
POUSOS Distancias parciaes Distancias totaes
Km. Km.
De Uberara a Pyrenopolis
Km. Km.
Km. Km.
10. Rio Alagada 26.6 227.6
11. Fazenda da Alagoinha 11.1 238.7
12. Fazenda dos Barreiros 30.5 269.2
13. Santa Roza 21.8 291.0
14. Carurú 30.0 328.0
15. Fazenda do Capivary 14.4 335.3
16. Vertice SW 17.9 305.2
17. Pyrenopolis 35.8 382.0
Km. Km.
3. João de Moraes 21.0 64.7
4. Monjolinho 25.8 90.5
5. Curralinho 21.3 111.8
6. Póvoa 23.5 135.7
7. Goyaz 16.9 152.2
De Goyaz a Uberaba
Km. Km.
12. S. Bernardo 25.7 291.1
13. Rio Tocantins 7.1 298.3
14. Limoeiro 36.7 334.9
15. Muquem 15.6 350.5
16. Rio do Peixe 21.1 371.6
17. Villa de S. José de Tocantins 26.6 398.2
18. Arraial das Trahiras 12.6 410.8
19. Capão das Antas 37.2 448.0
20. Rio Maranhão 20.0 468.0
21. Retiro 12.3 480.3
22. Fidalgo 32.2 512.5
23. Acampamento NW 12.6 525.1
De Pyrenopolis a Morrinhos
De Formosa a Uberaba
Km. Km.
20. Ponte Nova 29.9 489.8
21. Fanecos 32.4 522.2
22. Uberaba 50.0 572.2
De Formosa ao Vertice NE
ANNEXO I
CHEFE DA TURMA SE
RELATORIO DA COMMISSÃO EXPLORADORA.........................................................................152
ANNEXO I
SNR. CHEFE DA COMMISSÃO.
No dia 2 partimos tarde e fizemos cerca de quatro leguas sob tempo borrascoso,
chovendo copiosamente na direcção N do horisonte. Nosso ponto de pouso foi a fazenda
da Lagoinha, da propriedade de D. Fortunata Roiz do Nascimento.
Dia 3 de Outubro. -Na primeira parte da noite ventou fortemente e a poeira que cahia
pelos intersticios do telhado nos cobriu de espessa camada. Choveu desde as 2 horas da
noite até o amanhecer. A's 2h.20m, seguimos para o proximo pouso situado na margem
do Rio Jardim, quatro leguas adiante da Lagoinha, onde chegámos ás 5 h. da tarde.
Aproveitamos o tempo para medir rapidamente a despeza do Rio Jardim, importante
affluente da margem direita do rio Preto. O resultado encontra-se reunido aos
congeneres, na secção respectiva.
Dia 4 de Outubro. -Partimos com tempo encoberto por nevoeiro, e chegámos ás 2h.30 m
da tarde à Fazenda do Palmital após haver atravessado o Rio Preto n'uma ponte de
madeira. Mandando as instrucções descer cerca de 68 kilometros na direcção Norte-Sul,
approximadamente seguida por nosso caminhamento, e dando este, rapidamente
reduzido, as seguintes distancias:
km.
Formosa a Santa Rita 5.7
Santa Rita a Lagoinha 24.9
Lagoinha a Jardim 20.9
Jardim a Palmital 17.6
Total. 19.1
Julgámos dever parar para verificar por algumas observações astronomicas a exactidão
de nossa posição. Havendo antes da partida feito 3 determinações da latitude de Formosa
com sextante e horizonte artificial, as quaes deram 15º32'40'' e tendo o ponto procurado a
latitude de 16º8'35" apenas deveriamos, andar 64 kilometros em linha recta, que mais ou
menos seguimos. Portanto na mesma noite de nossa chegada aproveitámos alguns
claros entre as nuvens e observámos 2 distancias zenithaes duplas de Jupiter que
forneceram um estado absoluto inicial dos relogios.
No dia seguinte observei com theodolito o sol para hora e latitude ficando os calculos para
serem feitos com mais vagar. Na tarde do mesmo dia determinámos o valor do passo da
mula montada pelo Dr. Alipio Gama, que levava o podometro. Pela mesma occasião
determinámos tambem o valor de nosso passo. Encontrámos os seguinte resultados:
Besta do podometro, sobre 250 metros de comprimento, média de quatro determinações:
m
Em terreno plano 0.740
Em declive 2.5% subindo 0.732
'' '' descendo 0.758
m
Passo do Sr. Morize 0.757
Alipio Gama 0.811
Paulo de Mello 0.751
Choveu á tarde e continuou o mau tempo por toda a noite, e todo o dia seguinte. A noite
de 6 para 7 conservou-se encoberta, mas não chuvosa, impossibilitando fazer
observações. No dia 7 de manhã consegui observar algumas alturas do sol, mas não sua
passagem meridiana por estar o céo encoberto. Neste mesmo dia acabou o Dr. Alipio
Gama de desenhar o caminhamento que mostrou estarmos na visinhança do vertice
procurado.
O dia 8 passou com chuva forte, e noite encoberta.
No dia 9, tendo calculado algumas das observações de latitude, achámos que estavamos
por 16º 7' e portanto deviamos caminhar mais 2kms.8 correspondentes a 1'35''.
Fiz novas observações para hora e latitude no dia 10 e a 11, em companhia do Dr. Alipio
Gama, fui em reconhecimento para achar esse ponto, o qual vimos que cahia em um
chapadão a 1 km.500 da cabeceira do corrego Retiro onde assentámos nosso
acampamento no dia seguinte, ficando as barracas de bagagem e a cosinha perto do
corrego e os instrumentos no ponto de observação.
Começaram as observações no dia 13, com muita difficuldade e incommodo. Durante os
dias 14 e 15 não foi possivel ver nem o sol, devido ao mau tempo. Na noite de 16
conseguimos algumas observações de Canopus, que poderão ser utilisadas para a
latitude.
O mau tempo continua com fortes pancadas de chuva que tornam muito penosa a estadia
nas barracas de observação por não serem estanques, e ficarmos, o Dr. Alipio Gama e
eu, frequentemente impossibilitados de dormir pelas goteiras que caem de todos os lados
sobre nossas camas de campanha.
Passamos as tardes no acampamento da cabeceira onde tomamos nossas refeições e
cada noite voltamos ao observatorio improvisado, para observar e dormir. Durante o dia
calculamos as observações anteriores abrigados em tosco rancho coberto com couros
crus que exhalam cheiro fetido e attraem innumeras moscas. A presença de uma multidão
de borrachudos cuja mordedura é muito dolorosa contribue para tomar o trabalho lento e
penoso.
O ponto em que estamos fica a 2 ou 3 kilometros na margem esquerda do Rio Preto,
n'uma planicie inclinada francamente de Léste para Oeste, e apenas ondulada pelas
erosões das aguas atmosphericas. Os corregos que a sulcam têm agua de boa qualidade
e a região é extremamente sadia, porém pouco mais adiante, na direcção do Sul,
encontra-se uma depressão muito forte, por onde se atira encachoeirado, o Rio Preto, que
até ahi corria entre margens assaz elevadas e com bastante rapidez, porém sem quedas
notaveis; n'essa depressão, existem segundo as informações locaes, febres de mau
caracter. Toda via, é preciso concordar que, acima do Palmital, recebe o Rio Preto
diversos affluentes, entre outros o Jardim, que não gozam de boa reputação entre os
moradores. A região que percorrêmos n'esta viagem é bastante sympathica pelo aspecto.
E' uma successão de pequenas collinas com perfil arredondado, mas de pouca elevação,
que separam o leito do Rio Preto do São Marco . Esta pequena cadeia extende-se ainda
bastante a Sul de Arrependidos que indica o ponto em que o Rio Preto se curva
accentuadamente para Léste, para formar a celebre Serra dos Crystaes.
A zona que cerca a Fazenda do Palmital, que formava nosso centro de operações, pela
maior facilidade de alli obter os escassos recursos necessarios a nossa alimentação e a
de nossos camaradas, possue boas terras, em que crescem com abundancia todos os
cereaes, mas que são cultivadas pelos processos os mais rudimentares. As mattas vão
desapparecendo rapidamente em todo o Estado de Goyaz, devido ao systema das
queimadas e apenas resiste a vegetação em torno dos rios e ribeirões cuja humidade a
protege contra o incendio. Esta circumstancia que facilita o estudo da topographia, pois
cada curso d'agua assignala-se de longe pela orla de verdura que o cerca, faz com que os
terrenos cultivaveis pelos processos ahi usados tradicionalmente se tornem cada vez
mais raros, e mais abundantes, os terrenos descampados, cujos melhores vão se
transformando em verdes campinas. Resulta disto que a criação do gado bovino tem-se
tornado a principal das industrias agricolas locaes ; todavia, por occasião de nossa
estada, a alta que tivéra o gado no mercado fluminense havia determinado forte
exportação e o quasi total desapparecimento dos rebanhos, havendo sido o Governo local
obrigado a prohibir a sahida das vaccas afim de impedir o despovoamento das pastagens,
de forma que um observador desprevenido difficilmente poderia considerar o Estado de
Goyaz como um dos maiores productores de gado do Brazil.
Continuando o tempo invernoso, tornam-se de todo impossiveis as observações; nos dias
17, 18, 19 e 20 aproveitamos o tempo calculando os estados absolutos dos relogios e os
primeiros valores da latitude. No dia 21, nossa tropa de animaes de sella e carga estando
descançada e não havendo pastos fechados, espalha-se por toda a parte, sendo
necessario enviar camaradas até muito longe a procural-os.
De 21 a 25 choveu com poucas interrupções sendo totalmente impossivel observar. As
manhãs são habitualmente serenas, mas do meio dia em diante, e especialmente á noite,
temos chuva, vento e trovoada. Durante estes dias enviei o Sr. J. Paulo de Mello ao
Registro de Arrependidos afim de comprar alguns mantimentos que estão se tornando
muito escassos na visinhança, e tambem para verificar a collocação de uma lagôa que
DO PLANALTO CENTRAL DO BRAZIL 155
figura em muitos mappas como cabeceira do Ribeirão dos Arrependidos e cuja existencia
é posta em duvida pelos moradores da redondeza. Ao regressar, communicou-me não ter
achado tal lagôa, que o Sr. Dutra, agente da arrecadação fiscal, morador antigo nessa
localidade, não a conhece, e, mais, que nenhum dos habitantes a viu jamais. Creio pois
que a existencia d'esta Lagôa marcada em mappas de conspicuos autores como Moraes
Jardim, por exemplo, é uma ficção que deve desapparecer da geographia de Goyaz.
Em compensação fui informado pelos moradores, e isto com uniformidade de palavras,
que existem na margem esquerda do Rio Preto, duas lagoas notaveis e até hoje ineditas
nos melhores mappas. A primeira de nome Lagôa Grande é formada pelo corrego Fundo,
e desagoa na margem direita do Rio Bezerra que me dizem ser maior que o Jardim.
Acima da Fazenda do Palmital, existe outra que desemboca na margem esquerda do
Bezerra e é chamada Formosa. Ha assim duas lagoas Formosas: esta e a que fica a N da
cidade de Formosa, sendo que a nova é, segundo dizem, maior que a antiga. A
configuração destas lagoas e de seus sangradouros fica patente pelo croquis junto.
Havendo começado o tempo a restabelecer-se a 25, observou-se o sol para hora e
latitude e à tarde fez se com o transito algumas pontarias para a cabeceira dos
Arrependidos que se vê do observatorio e que nos é apontada pelo Sr. Mello. D’essas
observações resulta que a cabeceira tem o azimuth 14º.10' magnetico a SW.
A noite tendo sido clara e, favorecendo-nos o luar, começou-se a observar para a
longitude, mas rio dia seguinte, 26, recomeça o mau tempo que dura até o dia 28 em que
tendo subitamente clareado a noite, observo para hora e longitude, sendo, porem,
impossivel proceder como mandam as instrucções, por alturas iguaes da Lua e de uma
estrella por não haver na visinhança d'este astro nenhuma de sufficiente brilho que a isto
se prestasse.
A chuva recomeçou no dia seguinte, 29 de Outubro, com crescente intensidade,
acontecendo na noite de 30 a 31 que no acampamento da cabeceira houvesse durante
diversas horas uma verdadeira inundação que entrou pelas barracas a dentro e molhou
toda nossa roupa e papeis. Ao meio dia reproduziu-se outra enxurrada egual. Mandei
então fazer em torno do acampamento vallas que offerecem um mais facil escoamento as
aguas e que espero possam evitar a reproducção de igual facto.
O mau tempo continuando sem cessar, tendo já perdido esperança de poder observar
novamente a lua na presente lunação, e as mordeduras dos borrachudos tornando o
trabalho do calculo muito penoso, resolvi a 4 de Novembro levantar o acampamento e ir
aboletar-me com os companheiros na fazenda do Palmital onde poderiamos mais
tranquillamente acabal-o. Deixei todavia as barracas do observatorio com dous guardas e
os instrumentos para voltar na proxima lunação se os calculos mostrassem que fossem
insufficientes as observações de longitude.
No dia 8, chegou-me um portador enviado pelo Dr. Cruls recommendando maior presteza
e dizendo-me que á vista do mau tempo podia reduzir, a 5 as 10 determinações de
longitude ordenadas pelas instrucções. Como já houvesse 7 calculadas e com resultado
aceitavel, resolvi dar por concluidos os serviços de observação e calculo, restando o da
fixação do marco. O resultado das observações foi o seguinte:
Latitude austral 16º8'14" S.
Longitude 3h 9m 6s.7 W de Greenwich.
Como a posição do ponto procurado ficava, segundo as instrucções, 16º8'35'' o de latitude
e 3h 9m 25s de longitude, um calculo simples mostrou logo que tinha que ficar a 8.124m.6
do observatorio no azimuth S 85º28'29" W, ou, 640m 6 em latitude, na direcção do Sul e
8.099m.2 em longitude na direcção W.
Parti no dia 10 com o Dr. Alipio Gama em reconhecimento do ponto procurado, fazendo
para isto o levantamento do caminhamento seguido, e verificámos que o ponto ficava
proximo do Corrego Marianna na margem direita do Rio Preto. Nos dias 11, 12 e 13,
havendo voltado o mau tempo, tivemos que interromper o serviço até o dia 14. N'este dia
tomámos a deliberação de aproveitar uma elevação que permittia vêr, da zona provavel
do marco, as barracas brancas, para medir uma base e fixar por um triangulo, o seu logar
no solo. A chuva porém interrompeu o serviço e o dia 15 foi empregado no levantamento
topographico da visinhança.
No dia 16, recomeçou-se a medição da base que depois de balisada, foi duas vezes
corrida com fita de aço achando-se um comprimento de 1345".75. Das duas extremidades
da base apontou-se para as barracas, em seguida tomou-se o azimuth da base, e
calculou-se a distancia ac em que a recta OV cortava, assim como a distancia cV a que
ficava o vertice, e o angulo acV. Mediu-se então directamente no terreno a distancia ac e,
collocando alli o transito, descreveu-se o angulo acV, (por não se enxergar o ponto O do
ponto c), e tomou se na linha cV, balisada convenientemente, a distancia cV em cuja
extremidade fixou-se com uma estaca a posição procurada.
O mau tempo trazendo continuas interrupções nos trabalhos, só se conseguiu acabar este
serviço no dia 18 á tarde quando se implantou o marco respectivo.
Devido á falta de material apropriado vi-me obrigado a não cumprir á risca as instrucções
no que diz respeito á substancia do marco. Este consiste em um tronco de aroeira
cuidadosamente descascado, madeira esta de difficil destruição, de 2m.50 de
comprimento, tendo sido na extensão de um metro desbastado em forma de prisma
quadrado com 18 centimetros de lado. O marco está enterrado até 20 centimetros acima
do ponto em que começa a parte lavrada. Está elle orientado com as faces dirigidas para
os quatro pontos cardeaes. Na face Norte, abaixo do nivel do sólo, existe uma cavidade
fechada em que foi collocado, depois de convenientemente arrolhado e lacrado, um vidro
contendo um documento assignalando a posição geographica do vertice, assignado pelo
pessoal da turma e por diversas pessoas presentes.
De accordo com as ordens escriptas recebidas do Dr. Cruls, não havendo mais serviço a
fazer na localidade, partimos no dia 21 de Novembro, para voltar a Pyrenopolis passando
por Santa Luzia onde deveriamos determinar o valor da latitude, e em seguida seguirmos
rumo Norte até encontrar a estrada das Cabeceiras da fazendola do Sr. Chico Costa.
No primeiro dia de viagem, 21, fizemos pouco mais de 2 leguas e pousámos em uma
casa abandonada, na margem do corrego Vereda, onde soffrêmos grande chuva. No dia
seguinte, partimos muito tarde por terem faltado animaes e chegámos com forte temporal
á fazenda da Samambaia, em que fomos muito bem recebidos e tratados pelo seu
proprietario Sr. Manoel Gonçalves. A serem exactos os mappas existentes, deveriamos
atravessar aqui a celebre Serra dos Crystaes, que entretanto fica muito a Sul e nos é
apontada no horizonte pelo Sr. Gonçalves.
Continuando muito a chuva no dia seguinte, resolvêmos falhar e partimos a 24 para a
Fazenda de Suruby, guiados pelo Sr. Manoel Gonçalves.
No dia 25 chegámos sem mais novidade á cidade de Santa Luzia, onde deviamos nos
demorar por alguns dias para determinar a latitude e onde fomos cordial e
cavalheirosamente recebidos pelo Sr. Pedro Lully, delegado de Policia. Passaram-se os
dias 26 e 27 sem que o tempo melhorasse e fosse possivel tomar qualquer observação,
de sorte que havendo o Chefe recommendado evitar demoras, e não esperando mudança
de tempo, resolvi proseguir nossa viagem, que, por ordem superior, em vez de continuar
em rumo de Meia Ponte onde se achava a Commissão, teve de ir para Norte até
encontrar a fazenda do Sr. Chico Costa, na estrada que vae de Meia Ponte a Formosa,
passando pelas cabeceiras.
No dia 28 partimos, porém os camaradas e dous dos soldados sorrateiramente ficaram na
cidade onde embriagaram-se, deixando nossa tropa entregue ao cabo Calixto. A' chegada
ao pouso appareceram dous camaradas e um soldado que pretenderam terem estado
incommodados. O pouso é na fazenda do Sr. Camello situada proxima do corrego. No dia
seguinte continuámos a viagem com pessoal desfalcado, faltando especialmente o
arrieiro; o resultado foi que perdeu-se a tropa, e tivemos que pousar na margem do
ribeirão Brechó ou Guariroba, sem bagagens nem cosinha.
A 30 ao meio dia, appareceu a tropa muito cançada, e julguei acertado deixa -la repousar
de forma que a 1 de Dezembro chegámos ao ponto denominado Chico Costa onde
terminava nosso serviço, restando-nos apenas voltar a Meia Ponte.
A região que atravessámos de Palmital a Santa Luzia e d'esta a Chico Costa pareceu-nos
fertil e sadia, ainda que em alguns pontos, obstaculos ao curso natural das aguas tenham
determinado a formação de pantanos e o consecutivo apparecimento das febres
palustres.
Encontrámos grande numero de cursos d'agua em qualquer dos trajectos, sendo os
maiores o São Bartholomeu e o São Marcos, entre Palmital e Santa Luzia, e em seguida o
Rio Descoberto, formado pela confluencia, proximo do Chico Costa, dos rios Maria do O´,
das Pedras e Jatobá.
A zona entre Santa Luzia e Chico Costa pareceu-me fertil : é de aspecto agradavel e
abundantemente irrigada. A pesar de estarmos na estação chuvosa, não encontrámos
nos moradores nenhum caso de febre, se bem que alguns dissessem que nas cabeceiras
eram frequentes as sezões.
Creio que esta região merece ser estudada de novo e mais detalhadamente do que
podiamos fazel-o, tendo em vista especialmente um chapadão elevado que fica entre
Chico Costa e Guariroba, a Sul do Rio das Pedras e do Jatobá.
Partimos a 2 de Dezembro de Chico Costa em direcção a Meia Ponte, sem mais
tomarmos o levantamento do itinerario, por ter sido executado este trabalho nesta zona
pela turma do Dr. Cruls, e chegámos sem mais novidade, no dia 5, encontrando com
alegria os companheiros que alli estavam.
Tendo sido executados os trabalhos de que fôra encarregada nossa turma, deu o Dr.
Cruls novas ordens: tinhamos que seguir para a Capital de Goyaz, levantando sempre o
caminhamento e ahi esperarmos a chegada da turma em Uberaba para observar a
posição geographica da Capital, aproveitando para isto o telegrapho do Estado na
determinação da longitude.
Seguimos de Meia Ponte ou Pyrenopolis no dia 23, sempre com mau tempo. Pousámos
na margem do Ribeirão Santa Rita onde tivemos que ficar o dia seguinte por faltarem
animaes. Chegámos no dia 25 á pequena e decrepita cidade de Jaraguá que ainda
conserva traços de uma passada prosperidade.
Continuámos a viagem no dia 26 e atravessámos o Rio das Almas por uma ponte de 30
metros de largo. Em consequencia da continua chuva está reduzida a estrada a um
verdadeiro atoleiro. Dormimos na casa da viuva de J. de Moraes e seguimos no dia 27
para a Fazenda de Monjolinho.
Apesar das fortes pancadas de chuva que nos apanham, admiramos o aspecto gracioso
d'esta região coberta de mattas cortadas de verdes campinas onde pasta muito gado.
Desde que sahimos de Jaraguá penetrámos na zona chamada de «Matto-Grosso», por
conter verdadeiras florestas que contrastam com a raridade de arvores grandes dos
campos do resto de Goyaz meridional.
Pousámos a 28 na cidade de Currallinho em casa do Sr. Belisario, presidente da
Intendencia. No dia seguinte dormimos na fazendola do Póvoa e a 30 de Dezembro, ás 2
horas da tarde, entravamos na Capital Goyana, tendo-nos causado agradabilissima
impressão o apparecimento dos primeiros postes da linha telegraphica.
O primeiro aspecto da cidade, quando vista da estrada de Meia Ponte, não é muito
lisongeiro; esta impressão porém muda á medida que se penetra nas primeiras ruas, e
desapparece de todo quando se, chega ao largo principal onde se gosa de excellente
vista sobre toda a cidade.
RELATORIO DA COMMISSÃO EXPLORADORA.......................................................................158
O fundo do quadro é formado pelos contrafortes da Serra Dourada, cujos contornos muita
se assemelham aos da collina de Santa Thereza, no Rio de Janeiro. Entre os cumes
distinguem-se o de Cantagallo, notavel por sua forma ponteaguda, e o de Santa Barbara
onde se construiu uma capella sob a invocação da Santa do mesmo nome, e da qual tem-
se admiravel, ponto de vista sobre a cidade. Esta é cortada em duas partes desiguaes
pelo Rio Vermelho que tira o nome e a côr da argila que arrasta após as enxurradas. Suas
marpens são cobertas de casas pittorescamente dispostas, e entremeiadas de grupos de
coqueiros cujo verde brilhante atira uma nota alegre no meio das côres sombrias dos
velhos telhados.
A margem esquerda possue um caes estreito, mas bem calçado, que vae até o Mercado
e no qual apoiam-se duas pontes de madeira bem construidas.
Na margem direita existem diversos edificios publicos de importancia: os dois hospitaes,
civil e militar, a Relação, hoje Tribunal Supremo, o Thesouro do Estado, o Convento dos
Benedictinos, etc., etc., e muitas igrejas. Todas estas construcções são antigas e em
geral mal conservadas, mas algumas têm aspecto pittoresco e são dignas de attenção por
serem testemunhas do tempo colonial. Na margem esquerda encontra-se mais o Palacio
da Presidencia, velho casebre com pretenciosa fachada, que hoje está quasi
abandonado, e no qual esteve Saint-Hilaire por occasião de sua viagem em 1819 Existiam
egualmente no seu tempo o Quartel, a Cadeia e um chafariz de architectura
genuinamente portugueza, que ainda hoje orna o largo principal da cidade e dá-lhe o
nome popular.
A Sé ou Cathedral que existia do tempo de Saint-Hilaire foi demolida e em seu logar
ergueram os alicerces de enorme templo. Sobreveio a Republica e com a suppressão do
orçamento do culto catholico os esforços dos fieis não foram sufficientes para continuar a
construcção; hoje jazem n'este montão de pedras, mais de cem contos de reis que
poderiam ter sido melhor aproveitados.
As ruas da cidade, ainda que geralmente estreitas, são soffrivelmente limpas e
margeadas de cada lado por calçadas formadas de lages irregulares. Por entre muitas
d'ellas cresce verdejante gramma que, assim como nos largos publicos, não encontra
obstaculos a seu desenvolvimento no pisar descançado do raro e pacato viandante que
deambula, de uma para outra casa á cata da indispensavel palestra.
A superficie coberta pela cidade é grande e o aspecto de seu conjuncto agrada á vista.
Deixa atraz de si, e longe, Formosa e Meia Ponte, se bem que esta ultima esteja em
melhores condições sob o ponto de vista climatologico e da abundancia d'agua potavel.
Em quanto a do Rio das Almas é excellente, tanto no verão como no inverno, o Rio
Vermelho arrasta uma agua cujo gosto lodoso a torna impropria para a alimentação e que
desapparece quasi na estação secca. A Capital Goyana tem para prover-se o chafariz de
que fallei, cujo producto é ligeiramente salobro, e as bicas da Carioca e Biquinha que
estão um pouco arredadas da cidade, mas fornecem agua irreprehensivel. Na verdade
cada casa possue poços ou cacimbas, porém suas aguas são geralmente tão salobras
que são improprias a todo o uso culinario.
Os poucos membros da sociedade goyana, que tivemos o prazer de frequentar foram de
extrema amabilidade e graciosamente prestaram-nos todos os serviços que estavam a
seu alcance. Existe um certo nucleo de pessoas intelligentes e instruidas; que ahi se
acham reunidas por força de suas funcções publicas e constituem um pequeno centro de
vida intellectual. Devida á iniciativa de alguns desses cavalheiros fundou-se uma pequena
bibliotheca, muito bem provida de obras litterarias e scientificas de que muito me
aproveitei durante nossa estada.
O tempo conservou-se bom desde nossa chegada, havendo apenas algumas chuvas de
pouca duração até o dia 10. De 10 a 20 choveu continuadamente.
No dia 22 recebi telegramma do Dr. Cruls, communicando ter chegado a Uberaba, e
ordenando começar o trabalho da determinação da posição geographica.
Na mesma noite comecei, auxiliado pelo Dr. Alipio Gama, a observar no Largo do
Palacio. A primeira troca de signaes para longitude teve logar no dia 23. O tempo tendo-
se conservado firme e boa a linha telegraphica, observei no dia 24 e 25 em que fiz a
ultima comparação. A 26 troquei egualmente signaes com Cuyabá, para determinar a sua
longitude.
Do dia 27 a 31 tratei de levantar a planta topographica da cidade, o que fiz auxiliado , pelo
Dr. Alipio, empregando uma bussola prismatica para os angulos e medindo as distancias
a podometro.
No dia 5 de Fevereiro, recebi ordem telegraphica de regressar com toda a urgencia ao Rio
para d'ahi seguir em outra Commissão. Parti no dia 6 de Goyaz, no dia 21 estava em
Uberaba e a 28 no Rio de janeiro.
HENRIQUE MORIZE,
Chefe da turma SE.
RELATORIO DA COMMISSÃO EXPLORADORA.........................................................................160
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ANNEXO II
CHEFE DA TURMA NW
ANNEXO II
uma variedade de outros rios que regam quasi todo o sul do Estado.
Tendo suas origens no Planalto Central do Brazil, e por elle deslizando-se, pelo menos
em certa parte dos seus cursos, apresentam alguns rios d'essas bacias, nomeadamente
os que, desprendendo-se do N da divisora, correm pela direita do rio das Almas e do
Tocantins, verdadeiro contraste com os que se destacam da outra vertente.
Emquanto o plateau goyano, na phrase do distincto Dr. Hussak, geologo da Commissão e
meu digno companheiro de turma, parte integrante do Planalto Central, se vae
expandindo para o Sul, para o Oriente e para o Occidente, em ondulações suaves e
pequenas variações de altitude, permittindo assim que de algum modo a maior parte dos
rios, que o regam por esse lado mansamente deslisem, para ao Paranahyba, quasi
bruscamente se quebra ao Norte, apresentando uma nova topographia de terreno, por
cujas grandes depressões as aguas do plateau se precipitam em uma só ou em varias
quédas.
Não ha certamente um goyano d'essas zonas que não se tenha, apercebido d'esse
contraste.
E' commnum ouvil-os dizer, quando fallam de viajar para o Norte, que vão descer o Vão -
de tal ou tal rio, que tal é a palavra com que designam as depressões a que nos
referimos. O Vão do Paranan de um lado e a cachoeira do Itiquira do outro, são os
exemplos mais caracteristicos d'essas particularidades.
Taes circumstancias, porém, não impedem que, em dados logares, entre os valles de
certos rios, o plateau, com os caracteriscos que lhe são proprios, abra caminho para o
Norte, como o reconhecimento da chapada dos Veadeiros, devido ao meu intelligente
collega Celestino Alves Bastos revelou de um modo concludente.
Era para uma d'essas depressoes, appellidada - Vão dos Angicos - que nós desciamos no
dia 23 de Setembro. Por esse modo penetrámos na bacia do Maranhão e viemos pousar
no Desterro, fazenda do cidadão Victor de Abreu. Transpuzemos durante o trajecto o Rio
do Sal muito perto da sua nascente. A denominação dada a esse rio é a mais bem cabida,
ao contrario do que geralmente acontece.
A sua agua é quasi intragavel, tão salgada se apresenta ao paladar. O pouso está cerca
de 935 metros acima do nivel do mar e possue grande numero de moradores. A unica
cultura existente é a dos cereaes e são quasi todos destinados á manutenção dos
cultivadores. A industria da creação, conforme os habitos goyanos, é a principal
preoccupação dos habitantes d'essa zona. Quasi todo o commercio é feito com a cidade
de Santa Luzia onde elles vão á busca do sal e por onde vêm do Sul os boiadeiros fazer
acquisição de gado. Parte d'ahi para Santa Luzia uma boa estrada de rodagem com o
conveniente desenvolvimento, pela qual sobem a serra os carros de bois, que são o
principal meio de transporte do sal. No dia 24 abandonámos a fazenda do Desterro e
viemos acampar á margem esquerda do Corrego do Pé da Serra, affluente do rio
Monteiro, após um percurso de 19kms.2.
Este trecho da estrada é muito curioso. Orientado em geral para NE até transpôr o rio do
Sal, por cujo valle desenvolveu-se, dá o caminho, passado esse rio, quasi urna volta
sobre si e segue para o novo acampamento rio rumo de W.O terreno um tanto ondulado
nada offerece de notavel e é coberto de crescida vegetação.
Os rios do Sal e Monteiro têm n'essa parte dos respectivos cursos trajectos caprichosos.
Vão orlando as quebradas quasi verticaes pelas quaes o plateau se destaca
magestosamente aos olhos do viajante.
Gigantescos paramentos por onde a natureza geologica do logar se está denunciando,
vem pela esquerda morrer perto das margens dos rios, emquanto, pela direita, o horizonte
se abre n'uma alegre perspectiva de terrenos, que aplainando-se sempre em declive, vão
se descortinando para diarite. Transpuzemos em caminho o corrego Curralinho, affluente
do rio do Sal e o corrego Bonito affluente do rio Monteiro. Este ultimo, como o rio do Sal
tem as suas aguas extraordinariamente salobras.
No dia 25 viemos acampar na margem direita do Rêgo d'agua, após um trajecto de
16kms.6.
DO PLANALTO CENTRAL DO BRAZIL.......................................................................................167
Commissão Exploradora do Planalto Central do Brasil
A estrada vae com inflexões mais ou menos consideraveis sempre no rumo de W e pelo
vale do Monteiro. Transpuzemos até, ahi o corrego Fundo, o ribeirão da Porteira, os
corregos Canna Brava e Pontinha, todos affluentes da margem esquerda do Monteiro. O
Pontinha, antes de sua foz, une-se ao Rêgo d'Agua, cuja agua de pessima qualidade é
quasi imbebivel de salobra. Fomos obrigados durante o tempo em que pousámos perto da
margem direita do corrego a beber com assucar a sua agua, para assim vencer a
repugnancia que ella nos inspirava.
Munido de um sextante, consegui observar durante a noite algumas alturas meridianas de
estrellas, que me permittiram conhecer com alguma segurança o parallelo em que nos
achavamos.
Depois de uma viagem de 17 kms.3, fomos, no dia 26, acampar na fazenda do Padre
Simeão, á margem esquerda do rio Monteiro.
Cerca de metade do caminho a estrada corre na direcção NW e a outra metade no rumo
de N. O terreno semelha o do plateau: tem ondulações pouco pronunciadas e explendidas
pastagens.
São os melhores campos que vi em Goyaz, muito bem aproveitados para a creação do
gado, que é ahi numerosissima. Elegantes cabeceiras, com os seus aprumados e verdes
renques de buritys, poem uma nota alegre á monotonia do campo.
A casa da fazenda fica na extremidade de um suave e grande chapadão, perto da
margem esquerda do rio Monteiro, que ao percorrer esses terrenos já leva as suas aguas
consideravelmente avolumadas e sempre salobras.
As más condições atmosphericas durante a viagem não me tendo permittido observar
como desejava, resolvi que ficassemos alguns dias n'esse pouso, não só para esperar
uma mudança propicia de tempo, como para pôr em ordem as minhas cadernetas.
A fazenda do padre Simeão está cerca de 16 leguas distante de Pyrenopolis e, segundo
informações ministradas por um vaqueano dos arredores, a uma legua do nosso
acampamento tomam-se visiveis os Picos dos Pyreneus.
Obedecendo ás instrucções recebidas do Dr. Cruls, desenhei na escala de 1/100000 todo
o percurso que fizemos de Formosa á referida fazenda e tendo assignalado
simultaneamente no desenho o ponto, cuja demarcação nos fôra confiada, reconheci que
estava ainda distante do meridiano de 3hs.15m.25s W de Greenwiche e um pouco ao Sul
do parallelo de 15º20' S ambos prescriptos pelo nosso Chefe.
No dia 26 logrei observar algumas distancias da lua ao sol. Em quasi todas as noites
consecutivas o ceu manteve-se encoberto, acontecendo mesmo chover por vezes.
Do nosso acampamento poderiamos continuar o reconhecimento para W por dous
modos: proseguir pelo valle do Monteiro até a sua confluencia com o Rio Verde, e assim
penderiamos mais para o Sul ou transpondo o Monteiro n'esse ponto e trilhando rumo do
N, ir passar o Rio Verde muito abaixo da citada confluencia.
Resolvi aceitar o segundo alvitre, e com essas disposições, levantámos acampamento no
dia 30.
O Monteiro tem 2ms.58 de largura na superficie das aguas, no ponto em que o
atravessámos, na fazenda do padre Simeão. A sua maior profundidade attingia n'essa
época 0m.791. Segundo as nossas determinações elle tem uma velocidade de 33ms.2
por minuto.
A estrada até Quilombo, perto do corrego Agua Fria, onde fómos acampar no dia 20, vae
na direcção geral do N. Nada apresenta de particularmente notavel.
Logo após o Monteiro, transpuzemos o corrego Palmital, seu affluente, em uma altitude
de 627 metros e chegámos a Quilombo, depois de uma viagem de 15kms.6, por uma
successão de chapadões.
Durante a noite consegui felizmente observar a altura meridiana de Achenar e por ella
verifiquei que estavamos muito para o Norte, do parallelo de 15º20'S.
De Quilombo fomos até o Rio Verde, sempre no rumo W, e com um trajecto de 13kms.9
O terreno, de planuras a principio, tornava-se bastante accidentado a proporção que
avisinhava-se da margem do rio.
No dia 6 reconheci pelo meu caminhamento que não estava muito afastado, em longitude,
da posição que procurava.
Caminhámos no rumo de NW até São Bentinho, atravez de bonitos campos,
extraordinariamente adaptaveis á creação do gado.
Atravessámos n'esse percurso o Fidalgo, rio de pessima agua, bem como os corregos Pai
José e Salobro, seus affluentes. Como o nome do ultimo está indicando, são muito
salobras as suas aguas.
São Bentinho é um ajuntamento de moradores á beira da estrada que vae de Pyrenopolis
para o norte do estado de Goyaz. Fica collocado n'uma situação aprazivel, na fralda de
um chapadão delimitado a Léste pelo Salobro e a Norte pelo corrego São Bentinho.
Tem uma pequena capella, construida pelo Sr. Umbelino, principal fazendeiro das
redondezas, na qual, o vigario de Pyrenopolis celebra em certas épocas do anno
cerimonias do culto catholico.
A casa da fazenda está n'uma altitude de 648 metros; cerca de 100 metros abaixo de
Pyrenopolis.
O Sr. Umbelino é um grande creador, e, apezar das affirmações que elle faz em contrario,
é quem maior quantidade de gado vaccum possue n'um raio de 10 leguas.
A sua principal creação, porém, é feita n'uma outra fazenda, perto da margem do
Maranhão, onde são magnificos os campos de pastagens.
A unica cultura nas roças proximas é a dos cereaes. Grande parte D’ella é consumida
pelos moradores, emquanto o restante desapparece no commercio com os viajantes, que
percorrem a estrada.
A partir de São Bentinho seguimos rumo geral de NW, transpondo corregos insignificantes
e terreno de relevo pouco caprichoso. Todos esses corregos são tributarios do Rio
Fidalgo, no qual desaguam pela margem, esquerda.
No dia 8 de Outubro consegui finalmente acampar de um modo definitivo na encosta de
um chapadão suave, coberto de pequenas arvores, regularmente espacejadas, que os
Goyanos distinguem pela denominação de cerrado.
O logar destinado a servir-nos de ponto de observação, nada apresentava de
excepcionalmente attrahente.
Para o N e W ascendia em elevações pouco escarpadas, que fechavam-nos o horisonte
por esse lado e punham uma linha de separação evidente ás aguas tributarias do Rio
Fidalgo e do Rio dos Patos. Ambos esses rios passavam a uns 9 kilometros do nosso
acampamento, o primeiro pelo Oriente e o segundo pelo Occidente; fechando um
triangulo de magnificas pastagens corriam a juntar-se a NW da posição que
occupavamos. Levantámos as nossas barracas propriamente na bacia do Fidalgo perto
da garganta em que a estrada corta a divisoria a que acabamos de alludir.
Raros moradores existem pelas circumvisinhanças, o que equivale dizer que as grandes e
vastas superficies de terreno muito pouco têm sentido a acção benefica do homem A
cultura do sólo quasi que não existe pois mal se póde decorar com esse nome o esforço
inevitavel que faz o pobre sertanejo para arrancar do seio fecundo d’essa parte do
Planalto os indispensaveis alimentos. A creação do gado constitue, como sempre, a
principal occupação d'esses Goyanos: elles esperam pacientemente a chegada annual
dos boiadeiros, que ahi organisam as suas boiadas, pondo-se depois a caminho para
Minas Geraes.
N'essa época o gado vaccum attingiu uma cotação nunca vista nos annos anteriores.
Dir-se-ia, vendo a procura excepcional e o modo leviano por que em geral faziam
acquisição do gado, que estava-se ante um longinquo echo das especulações mercantis
da Bolsa do Rio.
Dei desde logo começo ás observações astronomicas, tendentes ao conhecimento das
coordenadas geographicas do ponto determinado pelo caminhamento.
Um sextante de Hurlimann, um thermometro commum, um thermometro de maxima e
minima, de Casella, um aneroide e um pequeno transito de Gurley — taes eram os
instrumentos que tinha a meu dispor.
Como não me devia demorar muito tempo, segundo as prescripções do Chefe, e eram
limitados os meus recursos materiaes, resolvi
A população é ahi muito menos condensada e quasi toda entregue aos labores da
creação.
ANNEXO III
RELATORIO DE A. CAVALCANTI
CHEFE DA TURMA NE
ANNEXO III
que, devido á mesma causa, ainda hoje se formam, deram logar ás primeiras
explorações. Assim é que, levados pela sede do ouro, os bandeirantes (exploradores que
serviram-se de bandeiras á procura do rumo que deviam seguir tomando o em que o
vento as dirigia), atravessaram o Paranahyba, e proximo aos ribeirões onde o ouro se
mostrava mais abundante, logo construiram habitações e um nucleo se formava. Multas
cidades de Goyaz assim tiveram o seu principio.
A fundação da cidade de Formosa, porém, parece não ter sido uma applicação litteral do
auri sacra fames, pelo menos não nos consta que em suas immediações exi stam
minereos auriferos. O commercio de cereaes e principalmente de pelles, como o indica o
seu primitivo nome «Villa dos Couros» é que julgo explicar sua origem.
Em antithese ao seu nome, esta cidade não se torna notavel, nem pelas construcções
que são em geral mal feitas e sem elegancia, nem por uma posição que permitta
descortinar bellos horisontes.
A agua de que se servem os habitantes é má e em quantidade insufficiente, entretanto o
Bandeirinha pode fornecel-a boa e em grande abundancia para o abastecimento da
cidade, sem sobrecarregar com pesado onus os cofres publicos, a crêr nas affirmações
de alguns interessados que com pessoas entendidas têm ido fazer tal reconhecimento.
A Lagôa Feia que fica 4 a 5 kilometros a Léste de Formosa, em desaccordo com o que
indica o seu nome, é bastante pittoresca; orlada de arvores mais ou menos frondosas e
cobertas as proximidades de suas margens por menuphares e outras plantas aquaticas
onde vivem as libellulas e outros insectos, povoada ainda pelas marrecas, mergulhões,
jacanans, etc., ella produz agradavel impressão ao visitante.
Deixemos porém, as descripções que se poderiam ter como divagações e procuremos
dar, embora de modo arido, apenas uma noticia do nosso trajecto até Uberaba,
E' a referida lagôa formada pelas cabeceiras de um dos affluentes do São Francisco, o
Rio Preto, nos approximando de cujo valle fizemos a nossa viagem quando sahimos de
Formosa,
No primeiro dia em que sahimos desta cidade, 4.700 metros adiante, passámos o Santa
Rita e fômos pousar no sitio Olhos d'Agua, tendo antes atravessado o ribeirão deste
nome. Estes ribeirões são os dous primeiros affluentes da margem direita do Rio Preto.
Em Tabatinga, fazenda do Sr. Francisco Venancio, pousamos no dia 3 a menos de um
kilometro distante deste rio nas cabeceiras de cujo ultimo affluente, o São Bernardo,
armámos nossas barracas na tarde do dia 4.
Já muito nos tinhamos afastado d’aquelle rio tributario, da bacia de Léste, e nos
dirigiamos para o valle do Samambaia, perto do qual pousámos no dia seguinte na
fazenda do mesmo nome.
O Sucury e mais galhos deste rio, que encontrámos em nosso trajecto nos impressionou
de modo agradavel, pois vimos então burityzaes10 que altos se erguiam desde as
nascentes e os seguiam de modo a indicar, até onde a vista alcançava, o curso das suas
aguas.
No dia 6, atravessámos o Samambaia e levantámos nossas barracas no Arrasta Burros.
Ahi, devido a terem desapparecido alguns animaes fômos obrigados a nos demorar 3
dias. Aproveitámos esta demora para fazermos um caminhamento do nosso pouso
situado na margem direita do ribeiro Arrasta Burros, no ponto em que elle desagua no
Samambaia
O terreno por onde fizemos o nosso trajecto até este ponto apresenta extensos
chapadões e campos vastos muito proprios para creação e agricultura.
O café, a mandioca11 , o milho, o feijão, a canna, etc., são cultivados com feliz exito
nestes logares
Em 10 de Fevereiro, depois de um itinerario de perto de 22 kilometros, deixámos a
estrada real e fónios pousar 1.700 metros ao lado na fazenda do Capim Pubo, onde o
nosso aneroide dava uma differença de altitude de 65 metros, para menos, comparada
com a que tinhamos ao deixar a estrada.
Já haviamos muito nos distanciado do valle do Samambaia e nos approximado do
Pamplona, affluente do São Bartholomeu,
tendo atravessado, proximo ás suas cabeceiras, o ribeiro Poção que é galho d'aquelle rio.
Em 11 de Fevereiro, deixámos a fazenda Capim Pubo. A altitude marcada por nosso
aneroide, ao chegarmos a estrada real, variou pouco até o logar denominado Barreiros
onde uma vegetação abundante de um e outro lado denunciava as cabeceiras de dous
ribeirões que seguiam direcções oppostas: o Capão e o Matto Grande. Seis kilometros
adiante tinham os ganho em altitude 80 metros e mais fômos subindo de modo a ter nos
elevado mais 295 metros, 9 kms.5, além deste ultimo ponto. Estavamos na Serra Nova
dos Crystaes, um kilometro distante do Almocafe, onde ao chegarmos accusava o nosso
aneroide uma perda da 70 metros em altitude.
No dia 12 deixámos este povoado, e fômos pousar na Estevinha, 35 kilometros além.
Ao galgarmos o dorso da serra, tinhamos subido 40 metros e adiante, cerca de 1km.5, de
0m.001, havia diminuido a pressão accusada naquelle ponto.
Relativamente plana a estrada se nos apresentou em seguida, e na Serra Velha dos
Crystaes a altitude encontrada era equivalente a do Almocafe. D' ahi vae o terreno pouco
sensivelmente descendo, e francamente poucos kilometros além de modo a estarmos no
ribeirão dos Ciganos 358 metros abaixo da altitude da Serra Velha.
A Serra dos Crystaes cuja lombada seguimos, estende-se na direcção NM. E' a divisora
das aguas dos rios São Marcos e São Bartholomeu os quaes recebem diversos ribeirões
que sulcam os flancos da serra e brotam, em sua quasi totalidade, das proximidades do
seu extenso cume.
Os crystaes de rocha existem ahi em veeiros mais ou menos profundos, pelo menos os
que são aproveitados para o commercio.
Foi na Serra Velha que foram feitas as primeiras explorações, e ultimamente estavam
sendo emprehendidas nas immediações do Almocafe. Crystaes limpidos e de tamanhos
notaveis se encontram nestes logares; mas são raros os em que sejam notadas todas as
faces, pelo menos não obtivemos uma só amostra. São estes crystaes vendidos a 6800 a
arroba, sendo regeitados todos os de pequenas dimensões e os que têm jaça ou são
coloridos, por não se prestarem ao fabrico de instrumentos opticos. Explica-se por este
modo encontrar-se montes deste quartzo em que abundam pequenos crystaes, nos
logares explorados.
Continuemos nossa noticia tornando-a ainda mais breve, procurando apenas satisfazer
seu principal fim.
Por entre o valle do São Marcos e o do São Bartholomeu, affluente do Corumbá, fizemos
a nossa viagem até a Larga do Estevão. Continuando o nosso trajecto avistámos á direita
as cabeceiras do Embiruçú de cujo valle nos approximámos e acompanhámos n'uma
pequena extensão, tendo-o depois deixado á esquerda. A nossa estrada até Catalão
seguiu então mais ou menos o rumo da linha divisora dos tributarios do São Marcos e do
Verissimo.
Muito accidentado mostra-se o terreno desde o ponto que fica uns 7 kilometros antes do
Rio Pirapetinga até proximo do sitio dos Picos.
A 18 de Fevereiro chegámos em Catalão e a 20 continuámos a viagem. Atravessámos o
Paranahyba no porto Mão de Pau a 21 e avançámos até o sitio dos Furados onde
pousámos.
Barreiros (sitio), Larga do Estevão (fazenda) cabeceiras do Pau Terra, Rio Pirapetinga,
Pires (fazenda), Catalão e Ranchos foram os nossos pousos depois do da Estevinha.
Retiro dos Macacos (fazenda), Bagagem (cidade), Agua Suja (villa) Ponte Nova (cidade),
Fanecos (sitio) e Uberaba (cidade), foram os nossos pousos nos dias seguintes ao em
que sahimos do sitio dos Furados, tendo portanto chegado em Uberaba a 28 de
Fevereiro.
Alem dos Furados 15 kms.5 avistámos o Rio Bagagem cuja agua era de um vermelho
escuro devido ao barro em suspensão que trazia das minerações de diamantes feitas em
Agua Suja.
Atravessa este rio, pouco além do Retiro dos Macacos, o caminho de Bagagem. Esta
cidade está dividida em 2 districtos, o da Estrella do Sul, onde foi encontrado o celebre
brilhante, e o da Cachoeira, nome devido a uma pequena cascata que o rio faz neste
logar. Ahi o atravessámos pela segunda vez; a 2 kms.5 além de Agua Suja elle corta
novamente a estrada. A sua agua é ahi limpida e bôa. A mineração do diamante
completamente abandonada em Bagagem é feita com resultado nesta villa. No relatorio
do Sr. E. Hussak, geologo, além de um estudo do terreno desta região, vem a descripção
do processo ahi empregado na mineração.
O Rio Brejão, das Velhas, Claro, Guariba e os ribeirões Atalho e Uberaba foram os mais
importantes cursos d'agua. que encontramos depois do Rio Bagagem.
O nosso caminhamento de Formosa a Catalão começa no Rio Jardim, visto como o
astronomo Sr. H. Morize já havia levantado a primeira parte quando foi determinar o
vertice SE.
A. CAVALCANTI,
Chefe da turma NE
CÁLCULOS
Concernentes a determinação das coordenadas do vertice NW
POR
AUGUSTO TASSO FRAGOSO
Chefe de turma
x = -15º20'7".4
L= 3hs.24m.16s.6 W Pariz
ou 3hs.14m.55s.6 W Greenwich
Observação preliminar
Nas paginas que seguem vêm todos os calculos effectuados para a determinação das
coordenadas do acampamento da turma designada para assignalar no terreno o vertice
NW da figura que define o futuro Districto Federal.
Para a realisação do trabalho astronomico servi-me do relogio E e de um sextante
Hurlimann.
A latitude foi calculada por meio de dez observações distinctas de alturas meridianas de
estrellas, escolhidas entre as que melhor se prestavam ao trabalho e conforme
permittiram as condições atmosphericas.
Para a longitude, utilisei-me de distancias da lua ao sol, medidas com o sextante, pouco
antes da conjuncção d'esses dous astros.
Parte das distancias foi observada no dia 12 e as restantes no dia 14 de Outubro.
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CALCULOS
Concernentes a determinação das coordenadas do vertice SW
POR
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ANNEXO IV
RELATORIO DO DR. ANTONIO PIMENTEL
(SUB-TEMA)MEDICO HYGIENISTA DA COMMISSÃO
ANNEXO IV
O Planalto Central do Brazil ou da
America do Sul
Todo o mundo sabe que o povoamento do Brazi1 quasi que se limita exclusivamente á
facha do littoral, com o extenso desenvolvimento desde o Rio Grande do Sul á
embocadura do Rio Amazonas.
Justamente nesta região é a salubridade subordinada, em geral, ao gráo do paludismo
visto ser baixa, humida, quente e palustre toda essa zona.
Nas terras altas do interior tudo é differente.
E´ exuberante a fertilidade do solo; a salubridade proverbial; grande a abundancia de
excellente agua potavel; rios navegaveis; extensos plainos sem interrupções importantes;
soberbas madeiras de construcção de suas grandes florestas, abundancia de preciosos
mineraes e essencias diversas; elevação do terreno determinando um menor gráo de
seccura atmospherica e uma temperatura mais fresca do que á primeira vista se poderia
suppor, em face da sua latitude geographica; tudo, emfim, que tem as mais estreitas
rejações com os progressos materiaes de uma grande cidade, e com o bem estar dos
seus habitantes
Infelizmente, porém, tudo isto é desconhecido, e todo o interior longinquo do Brazil ainda
hoje passa por ser paiz doentio, muito quente e mesmo inhospito.
Entretanto, o contrario é que é exacto, e do que se segue claramente deduz-se que a
natureza fez desigual a repartição dos beneficios do solo do Brazil (como em toda a
parte), e os primeiros povoadores desconhecendo a sabedoria desta distribuição,
preferiram as regiões menos ferteis e menos salubres na comprida e estreita zona do
littoral, sem duvida pela maior facilidade do commercio maritimo e das relações politicas
com a antiga metropole e o resto do mundo civilisado.
Os chapadões do Brazil Central sobrelevam os da Europa Central e Meridional,
approximam-se dos da Africa Meridional, não attingem os da Asia nem os da America,
dentro dos limites andinos.
A Suissa, a Saboia e o Tyrol são considerados paizes mui elevados; mas, esta opinião é
fundada sobre o aspecto que offerece o grupamento de grande numero de cumes
perpetuamente cobertos de neve e dispostos em cadeias muitas vezes parallelas á cadeia
central. Os cimos dos Alpes elevam-se a 3900 e mesmo 4.700 metros de altura, ao passo
que as planicies visinhas do Cantão de Berne não tem mais de 400 a 600 metros. Esta
primeira elevação muito mediocre póde ser considerada como a da maior parte das
chapadas de extensão consideravel na Suabia, Baviera e Silesia, perto das nascentes do
Wartha e do Piliza.
Na Hespanha, o solo das duas Castellas tem um pouco mais de 580 metros de elevação;
e em França, a chapada a mais elevada, é a de Auvergne, sobre a qual repousam o Mont
Dore, o Cantal, o Puy de Dome, etc. e cuja elevação, segundo Leopoldo de Buch, é de
720 metros.
Estes exemplos provam que, em geral, na Europa, os terrenos elevados, que apresentam
o aspecto de planicies, não têm mais de 400 a 800 metros de altura acima do mar.
Do Cabo da Boa-Esperança até 21º de latitude austral, o solo da Africa, conforme as
observações de Gordon, se eleva insensivelmente até 2.000 metros.
Todo o chapadão africano, ao norte do parallelo de 31° habitado pelos Betchouanas, os
Korannas e os Bosjesmans, tem cerca de 800 a 900 metros acima do nivel do Oceano; e
esta altura, com pequena differença, póde ser considerada a mesma em Angola Central,
para baixar um pouco no Estado Livre do Congo, constituido, por assim dizer, só pela
vasta e pouco elevada bacia do Rio Congo.
Na Asia tem-se prestado mais attenção aos picos e ás gargantas ou passagens das
cadeias de montanhas do que, propriamente, às planuras elevadas Entretanto, como
refere Humboldt, entre os parallelos de 34º e 37º de latitude boreal encontram-se
chapadas analogas às do Mexico, e acredita este notavel naturalista que a altura média
das chapadas comprehendidas entre o Himalaya e o Kouen-Lun não vae além de 3.500
metros; mais ao norte, o grande deserto de Gobi' segundo o Padre Duhalde, não attinge a
1.400 metros. Mas, Schrader diz, que a região do NW da China fórma um enorme
chapadão interior, completamente cercado de montanhas, e que sob a fórma de grandes
terraços vem descendo por degráos da vertente septentrional do Himalaya, onde se
acham em uma altitude média de 4.000 metros, passa pelo Thibet com 3.000 a 3.500
metros até a grande superficie ligeiramente concava que forma o deserto de Gobi e as
esteppes da Mongolia, cujo nivel inferior não vae abaixo de 900 a 1.100 metros.
Nos Estados Unidos, na região comprehendida entre as Montanhas Rochosas e a cadeia
littoral da California, extende se uma intumescencia do solo, de 1.800 a 2.000 metros de
altura, formando o que o capitão Fremont e Walker chamaram a grande bacia.
E' um vasto terreno arido, pouco habitado, não interrompido por accidente algum, cheio
de lagos salgados, dos quaes o maior tem a altitude de 1.280 metros e communica com
um menor, o Yuta, que recebe um rio abundante, denominado Timpanogo.
E' palpavel o contraste entre estas terras elevadas do occidente norte-americano e as
planicies baixas, ligeiramente onduladas, bastante regadas, ferteis, cheias de habitantes,
proximas do Mississipi, entre as Montanhas Rochosas e os Alleghanys, cujos vertices, o
monte Washington e o monte Marcy, segundo Lyell, levantam-se a 2.027 e 1.642 metros;
sendo que a maior parte dessas terras baixas attinge apenas á elevação variavel de 138 a
195 metros.
Em geral, o chapadão mexicano, de direcção norte-sul, é tão pouco interrompida por
valles, tem o declive tão brando e uniforme, que em distancia superior a 800 kilometros o
solo conserva-se com a altura entre 1.700 e 2.700 metros sobre o nivel do Oceano
visinho.
Este chapadão inclina-se insensivelmente para o norte até os Estados Unidos, e para o
sul tambem; mas, para o oeste, para Acapulco, Tepic, etc ., e para léste até Vera-Cruz, a
descida é mais rapida e durante muito tempo servio de serio obstaculo ao
desenvolvimento do paiz.
Com o rapido progresso do Mexico, as difficuldades de transporte desappareceram com a
construcção de uma linha ferrea que partindo de Vera-Cruz e Alvarado, vae à cidade do
Mexico, e d'ahi, seguindo a geral direcção longitudinal do chapadão, procura os Estados
Unidos, onde penetra, com a altura de 1.148 metros, na chapada de La Sierra Madre, no
Novo Mexico.
Na America Meridional a Cordilheira dos Andes, a principio dividida em tres ramos, (o
oriental, o central e o occidental) reduz-se depois a dous no Equador e Perú, e assim
continúa com afastamentos differentes até ás proximidades do vulcão Copiapo, mais ou
menos, entre a provincia chilena de Atacama e a argentina de Catamarca, onde de novo
forma um só systema até ás terras de Magalhães.
Por toda a parte a Cordilheira é cortada e interrompida por fendas semelhantes a filões
abertos e não obstruidos por substancias heterogeneas.
Se ha plainos de 2.700 e 3.000 metros, como no Equador, Colombia, Bolivia, etc., são de
pequenas dimensões, podendo mesmo ser antes considerados como valles limitados
pelas cordilheiras secundarias, cujos picos mais elevados constituem as cristas dos
Andes tambem.
Os valles transversaes do Perú e da Colombia, mais do que os das outras republicas sul-
americanas, têm ás vezes profundidade vertical de 1.400 metros. Isto até hoje tem
impedido, talvez, a construcção de vias ferreas transandinas nesses paizes, obrigado os
viajantes a andar só a cavallo ou ás costas dos indios chamados carregadores, e reduzido
a nada a exportação agricola, mineral, ou outra, para as regiões orientaes pela
impossibilidade do transporte.
Pela succinta descripção que fiz de diversos plainos do mundo, em comparação com o
nosso Planalto, conforme o exposto neste livro, se inferirá a incontestavel superioridade
deste, visto que das tres zonas em que que Humboldt dividio a America Meridional, as
duas, do norte e do sul, são esteppes e planuras hervosas, de pouca altura; em quanto a
do meio, de um lado em contacto com a da serra de Parima e do outro com o systema
das elevadas montanhas do Brazil, póde ser considerada como uma planura selvatica,
que na porção mais elevada tem a altitude média de 1.000 metros sobre o nivel do mar, e
dimensões iguaes a quasi tres vezes o territorio de toda a Republica Franceza.
A conformação physica e climatologica do vasto planalto central do Brazil, facilita sobre-
maneira a acclimação do trabalhador europeu, sem os prejuizos das regiões torridas,
cujos predicados ahi desapparecem pela grande altitude média; pelos seus rios
navegaveis e brandos declives favorece o movimento commercial, interno e as demais
relações dos Estados brazileiros entre si e do Brazil com as republicas visinhas, a
America do Norte, a Europa e a Africa, bem como garante ao Governo Federal innumeros
pontos estrategicos para a defeza militar do Districto.
A fertilidade do solo combinada com a altitude, etc., concorre para o bom exito na cultura
do frumento, como em minima escala se observa perto de Cavalcanti ao norte do Estado
de Goyaz; e todas as plantas da zona temperada poderão bem se acclimar nesta região.
que, embora pequena em relação ás dos tres grandes citados rios da America do Sul, é
todavia uma das mais importantes do systema hydrographico brazileiro.
Este ramo concentra-se entre Piumhy, a léste, e o Araxá e Desemboque (conhecido pela
exuberante fertilidade do seu solo), a oeste, formando a Serra da Canastra, de direcção
septentrional, e da qual brota o magestoso Rio São Francisco, na cachoeira da Casca
d’Anta, de uma quéda de altura superior a 203 metros (S. Hilaire), e 24 kilometros apenas
distante do Rio Grande ou Paraná, já então bastante caudaloso e de mais de 400 metros
de largura média.
A Serra da Canastra, além da nascente do São Francisco, caminha para o norte quasi a
prumo, com o nome de Serra da Matta da Corda, até as cabeceiras principaes do rio
Paranahyba, perto de Patos; d'ahi em diante continúa mais ou menor o rumo de NE até
extinguir-se perto da confluencia do rio Paracatú com o São Francisco; e a das Vertentes
perlonga com a margem aquilonar do Paranahyba até o ponto de encontro deste com o
rio São Marcos, que do norte vem perpendicularmente.
Forma então a serra um angulo recto e passa a dividir os Estados de Minas Geraes e
Goyaz, nos limites septentrionaes, ao mesmo tempo que separa as aguas dos rios
Paranahyba ao sul, São Marcos ao norte e os tributarios do São Francisco, Paracatú,
Urucuia, etc., ao nascente.
As profundas inflexões da Serra das Vertentes mais importantes pelas suas articulações
na superficie accidentada do terreno do que pelas suas relações com a configuração
hypsometrica do mesmo terreno, nos levam a estudo mais detalhado; visto como o que é
meramente um appendice, um prolongamento do grande massiço divisor das aguas, por
muitos é tido como o proprio massiço, em virtude da engrenagem que formam as
cabeceiras dos rios do norte com os do sul, chegando mesmo em alguns logares a se
communicar, na estação das chuvas. ou guardar insignificante distancia entre si. Isto
acontece com as nascentes do Jaurú e Agoapehy de um lado, do rio Alegre e Guaporé do
outro; com o Paraguay e o Arinos, o Cuyabá e o Xingú, em Matto Grosso; com o Rio das
Almas e o Corumbá em Goyaz; com o Rio Preto e o São Marcos, nas divisas de Goyaz
com Minas Geraes.
Não muito acima, deste ultimo ponto, mais ou menos onde o Rio Preto corta a Serra das
Vertentes, cerca de 40 kilometros a léste de Formosa,a cadeia dobra para o occidente, ao
mesmo tempo emitte para o norte um braço que na latitude de 11º a 12º, se reparte para
NE e NW, separando os Estados da Bahia e Pernambuco do Piauhy e este do Maranhão
e Goyaz, e circunscrevendo as bacias dos rios Parnahyba, Itapicurú e outros que
desaguam no mar, nas costas septentrionaes.
Com o rumo geral de W, a Serra das Vertentes vai desapparecer perto da confluencia do
rio Beni com o Guaporé, no Estado de Matto Grosso, no principio da secção
encachoeirada deste ultimo rio.
Devo aqui tornar patente a impropriedade do nome de serra dado ao massiço central
divisor das aguas, ao divortium aquarum do finado geographo brazileiro Thomaz Pompeu
de Souza Brazil, por isso que verdadeiramente serras não ha ao occidente das da
Canastra e da Matta da Corda. Somente sobre as altas lombadas do grão massiço umas
vezes se elevam cristas isoladas ou seriaes, cumeadas mais ou menos uniformemente
dispostas, de diversos comprimentos, em geral pequenos; outras vezes o proprio massiço
mais não é do que um taboleiro largo, comprido e rectilineo, ou estreito, tortuoso e ligeira
ou profundamente accidentado quer no sentido transversal, quer no longitudinal, na sua
curta extensão.
Com os diversos ramos do massiço central o mesmo se dá, tanto para o norte como para
o sul, sobretudo para o norte, onde, é mais franca a differença de desnudação de um
chapadão a outro e mais fundos os valles produzidos pela lenta erosão das aguas no
correr de muitos seculos.
Entre Formosa e os Pyreneus ha uma porção de massiço, erradamente conhecida
nastra, segundo o Dr. Gorceix, até os arredores da cidade de Matto Grosso, segundo
Castelnau.
Como acontece com o grés e o itacolumito, tambem é constante a existencia simultanea
do itabirito, ferro oligisto e de schisto argiloso, sendo que neste schisto, de ordinario, se
encontram intercalações de calcareo diversamente corado.
Os calcareos das bacias do rio São Francisco e Rio das Velhas tomam importancia
consideravel e bem assim em varios logares dos Estados de Goyaz e Matto Grosso.
Após a formação do complexo fundamental dos schistos crystallinos, houve movimentos
orogenicos em virtude dos quaes os schistos foram levantados, fortemente dobrados e
metamorphoseados, ao mesmo tempo que provavelmente se produzio a zona granitica do
Rio Claro, Goyaz, Barreiros e os diques de pegmatito encontrados em varios pontos do
caminho (Dr. Hussack).
É possivel que fosse o mesmo o phenomeno que em Matto Grosso, na Serra dos Parecys
e na sua ramificação da Serra do Agoapehy, levantou os schistos talcosos pertencentes á
época dos schistos micaceos e outros do periodo de transição. De formação identica é o
calcareo que na antiga capital de Matto Grosso se usa para a construcção e caiação de
casas.
Ainda mais, o granito roseo de grãos finos commum nessa região, fórma, com toda a
probabilidade, a massa inferior, a base de todas as elevações de terreno desse canto do
longinquo Estado.
Mais perto da antiga capital, o terreno apresenta uma crosta superficial de 12 metros de
espessura, de ganga; uma camada inferior de quartzo fragmentado e de grés
itacolumitico, de cerca de 3 metros, em que se encontra ouro; e, emfim, mais abaixo vêm-
se pissarra, argilla roxa, amarella e branca, em ordem decrescente de sua riqueza
aurifera (Castelnau).
Em Goyaz, a referida constituição vai até o chapadão dos Veadeiros ao N, até Caldas
Novas e Velhas de Goyaz a SW, e chega tambem aos Estados visinhos do da Bahia,
Piauhy, Maranhão, Matto Grosso, Minas, e, como já vimos, São Paulo e Paraná.
As deslocações produzidas pela acção das forças internas do nosso planeta, elevando,
inclinando e modificando as camadas estratificadas, acarretam sérias difficuldades para a
determinação da idade absoluta destas rochas. Mesmo para a idade relativa dos diversos
grupos que se podem estabelecer, torna-se difficilima essa determinação em face da falta
absoluta de fosseis.
Em todo o caso, o deposito maritimo desses sedimentos, a horisontalidade da sua
disposição e o facto de não serem estas camadas cobertas por outras do mesmo periodo
geologico, formam os elementos essenciaes para uma interessantissima conclusão, que
mui agradavel até poderá ser para nós Brazileiros.
Vem a ser o que diz Gerber: “... Tendo Elias de Beaumont com evidencia demonstrado
que a idade das diversas partes do nosso globo, isto é, a época do levantamento das
mesmas acima do nivel do mar, deve ser anterior á mais antiga formação limitrophe, cujas
camadas se conservam horizontaes, assim como posterior á idade das formações que por
effeito do proprio levantamento se acham inclinadas, é claro que em vista do referido
facto, de se acharem as formações de transição (paleozoicas) horizontalmente
estratificadas sem serem cobertas por formações secundarias ou terciarias, phenomeno
de que não consta haver semelhante exemplo em outra parte do mundo, é claro, repito,
que esta parte do continente sul-americano já se achava elevada acima do nivel dos
mares em uma época anterior ao tempo em que começaram os depusitos sub-marinos;
ou, em outros temos, o Brazil central já existia como um continente extenso, quando o
resto do mundo ainda estava submergido no oceano universal, ou apenas surgiam partes
delle como ilhas insignificantes.
E' pois o Brazil, e em particular a provincia de Minas Geraes, a quem toca a honra de ser
o mais antigo continente no nosso planeta.”
Ao redor desta região, diz o Dr. Hussack, porém, ao N e W, na bacia do To
metros (Eschwege), e o Rio São Francisco com o mesmo comprimento tem na barra do
Rio Pará, 576 metros apenas.
Se compararmos, agora, essa altitude das nascentes do Rio Grande com as do Rio Preto
e do Parahybuna, affluentes do Parahyba do Sul, e com o leito deste ultimo rio, então a
differença excederá de 500 metros.
Com effeito, o Parahyba, em Campo Bello, nas contravertentes do Rio Grande e do Rio
Preto, está na altitude de 408 metros.
Na cachoeira do Pirapora, o rio São Francisco desce cerca de seis metros na extensão de
um kilometro e alguns metros, e nas barras dos rios Paracatú e Urucuia a altura é
respectivamente de 503 e 495 metros (Halfeld); notando se que o primeiro tem uma das
suas principaes nascentes, Rio Preto, dentro da cidade de Formosa e o segundo nasce
ao oriente da Serra das Vertentes, perto desta cidade, cuja altitude é de cerca de 850
metros. Ora, regulando o curso destes dous rios o comprimento pouco maior de 200
kilometros, vê se que os chapadões entre elles collocados, sobre serem de dimensões
pequenas, são sulcados em todos os sentidos pelos valles dos seus numerosos e
caudalosos affluentes.
Os dados relativos aos chapadões que dos rios Urucuia e Pardo vão até os limites do
norte do Estado de Minas Geraes, não me parecem sufficientes para uma boa noticia e a
elles me refiro com reserva.
O que se observa em Minas Geraes com referencia ás cabeceiras do Rio Grande, com as
do São Francisco, e com o Rio Parahyba, etc., se nota em Goyaz em relação ás
cabeceiras dos rios das vertentes do norte com as dos rios das vertentes do sul.
O ribeirão de Itiquira, que vai formar o Paranan, precipita-se da altura vertical de 120
metros, e corre ainda em borbotões em plano inclinado de 30 metros para alcançar o nivel
da corrente placida e tranquilla. Apezar desta grande queda, o Rio Paranan, após sinuoso
e longo curso, vai desaguar no Tocantins, cuja torrente mui pedregosa tem sido até hoje
talvez o maior obstaculo á navegação fluvial desta parte do Estado; isto não se dá com o
Araguava que, depois de tornar-se navegavel, apresenta-se completamente
desembaraçado em extensão talvez superior a 1.200 kilometros, como ficou dito.
Relativamente aos chapadões de Matto Grosso, me fallecem dados precisos para uma
exacta descripção minuciosa. Assignalo de passagem que, neste limite do planalto central
onde já é notavel a depressão do solo, provavelmente devido a isso e tambem á lentidão
das correntezas e ás grandes inundações dos rios, o paludismo assola cruelmente no
extremo occidental; tanto que a capital de Matto Grosso foi mudada da cidade deste nome
para a de Cuyabá por causa da sua insalubridade. Identica insalubridade se nota no
proprio Alto Tapajoz, onde o Dr. Langsdorf contrahiu (e alguns dos seus companheiros de
expedição tambem) tão grave intoxicação palustre com violentos symptomas de
perturbação cerebral, que na pequena estada de onze dias no Tucurisal, no Salto
Augusto, perdeu completamente o uso da razão, a acreditar-se no que diz Hercules
Florence, intelligente companheiro do inditoso explorador e escriptor da noticia da viagem.
Os irmãos Steinen, ha muito poucos annos, só a custa do acido arsenioso e rigorosos
cuidados puderam explorar o Alto Xingú.
A Commissão do Planalto, neste sentido, foi de excepcional felicidade, porquanto apezar
da sua grande quantidade de petrechos therapeuticos, só delles se aproveitou para
soccorrer a pobreza dos logares visitados, quasi nada servindo para o pessoal, não
obstante nos tres ultimos mezes supportar, além da fadiga, muita chuva.
Os dados relativos a São Paulo e Paraná infelizmente se resentem da mesma
insufficiencia que os de Matto Grosso, pelo que nada ouso affirmar de positivo.
Em summa, os chapadões afastados das proximidades do massiço central, collocados, ás
vezes, estreitamente entre valles de rios caudalosos, sem concorrer para separar as
cabeceiras dos grandes cursos d'agua, propria
mente fallando têm perdido grande parte dos attributos physionomicos do dito massiço
central, e em todos os sentidos têm as dimensões reduzidas, de modo a tornarem-se
individualisados ou, por assim dizer, independentes pela sua disposição topographica.
A W, o terreno baixa sem cessar e o paludismo domina a pathologia, local; ao NW, além
do paludismo, as depressões do terreno nas regiões inferiolres dos grandes rios fazem
perder ao todo o caracter dos altos chapadões; ao NW as terras elevadas, além de muito
afastadas do centro, e, como já disse, individualisadas, no S do Maranhão, Piauhy,
Pernambuco, a NW de Bahia estão sujeitas á acção devastadora das seccas, que de
tempos a tempos arruinam, essas paragens.
A Léste, encontra-se logo a bacia do São Francisco, que apezar dos chapadões do
Paracatú e Urucuia é baixa e está afastada do centro, como tambem se obseva com o Sul
e Sudoeste, abrangendo São Paulo e Paraná.
Pelo que tenho exposto até aqui, a meu ver, e so no proprio centro do Planalto, aliás
vasto, isto é, só por onde andou a Commissão, com pequenissima differença, é que se
acha o local que o legislador teve em vista quando incluiu na Constituição Federal o art.
3º.
traiçoeiramente os chefes uns aos outros, usando de argolas de ferro com correntes, no
intuito enganador de os fazer dansar, como falsamente havia feito com alguns dos seus.
Mal os chefes ficaram encorrentados pelo pescoço, o astuto Bueno os prendeu e grande
numero dos mais, durante a immensa confusão em que se viu a tribu, uma vez
descoberto o embuste.
Por estes e outros factos, teve dos indios o astucioso explorador o nome de Anhanguéra,
que quer dizer-Diabo velho.
Depois destes dous aventureiros, outros procuraram o ouro de Goyaz, destacando-se o
filho do velho Anhanguéra, dotado de juizo prudencial, de experiencia e inteireza, o qual
exerceu o cargo de capitão-mór regente das minas, em que prestou grandes serviços ao
Estado, vindo depois a morrer pobre em 19 de Setembro de 1740, com 70 annos de
idade, não obstante haver possuido mui ricas lavras.
Das grandes e riquissimas descobertas do capitão-mór regente a fama correu
promptamente, e por toda a parte echoou.
De Pernambuco, Bahia, Minas Geraes, São Paulo, Matto Grosso, etc., a immigração
irrompeu, e tal foi que,dentro de dous annos, o povo cresceu prodigiosamente. No dizer
de Cunha Mattos, numerosas caravanas de 25.000 e 30.000 pessoas levavam verdadeira
vida nomade em barracas, a cada nova descoberta transladando-se de um para outro
ponto.
Em 1752, fundou-se na capital a casa da fundição, que no anno seguinte, só de imposto
do quinto, rendeu 202:886$. Em 1767 a renda foi de 984:196, na época do fastigio, e em
1807, em plena decadencia, o quinto do ouro só rendeu 14:272.000.
Assim descahiu rapidamente a mineração goyana. Hoje, póde se dizer, todo o ouro
extrahido em Goyaz o é somente pelos faisqueiros.
Durante os annos de maior producção do ouro, a agricultura cahiu em tão completo
abandono, que os generos alimenticios alcançaram preços fabulosos: o sacco de milho
custava seis e sete oitavas de ouro, o de farinha de milho dez e onze; o primeiro porco
que lá appareceu foi vendido por oitenta e a primeira vacca de leite por duas libras de
ouro, ou 256 oitavas; o que importa dizer que só tiraram solidos e avultados lucros os
vivandeiros que de continuo estavam a chegar de São Paulo.
A illimitada avidez dos primeiros descobridores das minas auriferas parece ter extinguido
nelles toda a noção de economia, visto que havendo desprezado totalmente a agricultura,
todo o ouro extrahido despendiam em troca dos generos de que precisavam. Como a
maior parte delles eram dominados pela ignorancia, de baixa educação e anteriormente
viviam sem fortuna, tornaram-se altivos e orgulhosos vendo-se rapidamente na posse de
uma riqueza a que nunca tinham aspirado; e como o jogador afortunado, que desprende
com profusão o que venceu sem trabalho, entregaram-se ao luxo, creando assim milhares
de necessidades. Os costumes ficaram cada vez mais corrompidos, o ouro corria dos
cofres com a mesma presteza com que entrava, o que com elle se obtinha era de curta
duração; e emquanto assim se aluiam os alicerces da ephemera opulencia, era
completamente descurada a educação dos filhos, que, entregues ás escravas, em cujo
collo se criavam e levavam uma vida ociosa, mais tarde se atiravam ao luxo desregrado
em que predominavam puramente os instinctos dos prazeres animaes (Alincourt).
Facilmente se comprehende que, com este systema de vida, em pouco tempo sobreviria a
decadencia, o que de facto aconteceu. A agricultura em nada lhes pôde aproveitar e a
escravatura tambem, por isso que cada vez mais padecia, visto os proprietarios afastarem
a bem da manutenção do seu fasto, apparente, os já diminutos jornaes destinados á
alimentação dos escravos.
Assim acabaram todas as grandes casas que haviam firmado o forte dos seus cabedaes
exclusivamente na mineração.
Durante a expedição, encontrámos muitas lavras abandonadas, ou pela sensivel
diminuição do precioso metal ou, o que constitue a causa mais geral, pela deficiencia ou
falta completa de trabalhadores e de boa administração.
metros; que é innumeravel a quantidade de capões das nascentes; e, finalmente, que nas
vastissimas regiões das vertentes do N, NW e SW, onde a acção perenne de uma clima
mais humido favorece o seu desenvolvimento, a vegetação florestal é grandiosa e
abundantissima de arvores apropriadas ás construcções civis e navaes, a todos os ramos
da actividade industrial, á medicina, etc.
Como já disse, os capões representam uma das modalidades dos terrenos generativos
dos rios, ribeirões, etc.; além desta, ha tambem os brejos ou alagados, as lagoas e o
buritysaes.
Nada de interesse offerecem as nascentes brejosas ou lacustres, o que não acontece
com o buritysal.
O buritysal tem a superficie circular ou oblonga, ligeiramente concava com uma
depressão linear no centro em forma de rego; é coberto em toda a sua área de um tapete
de verdejante relva, homogenea na altura e na côr, emprestando-lhe por esse facto o
aspecto risonho de um prado artificial onde o trabalho do artista é objecto de cuidados
constantes e ternos.
O sólo pantanoso do buritysal, extremamente compressivel e movediço, se apresenta
como perigoso atoleiro lamacento, meio liquido, sob os enfeites da graciosa combinação
dos buritvs de differentes alturas e idades, ora em grupos magnificos de verdura fresca,
ora indistinctame nte isolados, ora arruados e indicando pela sua direcção a do curso
d'agua ahi originado sempre em grande abundancia.
O burity, a arvore da vida do padre José Gumila, a Mauritia Vinifera dos botanicos, é uma
bella palmeira dos sitios humidos, de cerca de 25 a 40 centimetros de grossura e 9 a 10
metros de altura, com folhas grandes em forma de leque aberto na extremidade livre de
longo e resistente peciolo.
O tronco presta para fazer casas e aqueductos de longa duração, as folhas para cobrir tão
bem como a telha de melhor fabrico, e as nervuras das folhas novas, não desabrochadas,
dão a seda do burity, que serve para tecidos diversos.
Antes de se entreabrir na palmeira masculina a cobertura delicada das flores, e só neste
periodo de metamorphose, o tronco provê-se de uma fecula, parecida com o sagú, e que
endurece formando pães delvados e redondos; da seiva fermentada faz-se o vinho de
palma, com que os indios costumam em briagar se; os fructos dos cachos colossaes,
cobertos de estreitas escamas imbricadas em castanhos estrobilos, semelhantes á pinha
européa, dão como quasi todos os fructos tropicaes alimentos diversos, conforme são
consumidos depois do desenvolvimento completo do principio assucarado, ou antes delle,
quando ainda se acha em estado farinaceo
Alem de todas estas qualidades de arvore providencial, o burity tem a propriedade (como
se diz em Goyaz) de chamar agua para o logar em que vegeta, o que motivou o costume
de só excepcionalmente se cortar uma dessas palmeiras.
Quem das folhas precisa, sóbe pelo tronco, tira as aproveitaveis, mas a arvore fica em pé
para não seccar a fonte.
Sendo fastidioso expôr aqui todas as plantas uteis deste bellissimo Estado, tomarei
apenas algumas d'aquellas que á qualidade excellente da madeira juntam a grande
abundancia, ou apresentam qualquer propriedade que as torne dignas de nota.
A aroeira, dita da matta, sem duvida occupa o primeiro logar não só pela extraordinaria
quantidade, em que se encontra em qualquer matta de Goyaz, como porque póde-se com
afoiteza dizer, é indestructível. O tronco aromatico e resinoso do colosso vegetal engrossa
muito, tem a rigidez de ferro e a duração admiravel, pois, que se tem achado em edificios
seculares a aroeira em perfeitissimo estado.
Em Pyrenopolis vi um grosso baldrame de aroeira perfeito, não obstante ter servido de
alicerce de uma casa por espaço de 50 annos.
O jatobá ou jatahy é um dos mais volumosos especimens das florestas goyanas, e entre
os enfezados vegetaes dos cerrados tambem avulta pelo porte, sem todavia. dar uma
idéa approximada, ao menos, da magnifica apparencia que tem a matta virgem. O tronco,
cuja grossura não poucas vezes excede de
um metro, dá bem como os galhos e ramos, a resina animada dos antigos, a resina de
jatahy de tanta applicação na therapeutica das affécções catarrhaes, broncho-
pulmonares, etc. Além desta propriedade, a resina animada, sob o nome de gomma copal
amarellada e aromatica, serve para fazer verniz.
A madeira é forte e muito procurada para moendas de engenhocas, eixos de carros etc.
O balsamo, que entre nós tem o nome de oleo vermelho, e cujo tronco muitas vezes
excede ao do jatobá em grossura, é uma das mais valiosas madeiras de leite que, pela
sua durabilidade, tem, ao lado da aroeira e do jatobá, preferencia sobre qualquer outra
nas construcções duradoras, no preparo das moendas, rodas de carro, etc.
Uma das mais interessantes arvores que vi em Goyaz: foi o tamboril.
E' semelhante ao cedro, um pouco mais escuro, de bonitos ondeados; engrossa muito e
tem o lenho tão leve, que em leveza ganha certamente o nosso louro de forro.
Um tecto de tamboril envernisado e artisticamente trabalhado levará de certo vantagens
ao proprio estuque.
Augmentam a riqueza florestal goyana o páo-brazil, jacarandá, guarabú, tambem
chamado Gonçalo-Alves e páo-roxo, a braúna, garapa, vinhatico, páo-marfim, cedro, páo-
rosa, tambem denominado Sebastião Arruda, ipé ou páo d'arco, peroba, angelim,
maçaranduba, etc., etc.
Das plantas medicinaes, em cujo numero se acham entre outras muitas, a copahiba,
cabureicica (balsamo do Perú), coca, cajú, icicariba (gomma elemi), caroba, sassafraz,
andaiassú, jurubeba, manacá, jaborandi, poaia, jalapa, rhuibarbo, nhandiroba, etc.,
destaco a plumeria, tambem chamada herva santa em alguns logares.
Esta planta herbacea, mucilaginosa, rasteira é uma polygonacea, e apresenta duas
variedades: uma roxa e outra branca, sendo aquella de mais energica acção therapeutica
do que esta.
Vegeta em logares humidos e em margens de correntes d'agua.
A acção curativa da plumeria nos casos de mordeduras de cobras, por mim verificada no
Estado do Rio de Janeiro, é admiravel, seja administrado o remedio sob a fórma de
extracto alcoolico fluido, seja socada a herva e ingerido o succo puro ou de mistura com
aguardente, seja, em recurso extremo, simplesmente mascada; e nos dous ultimos casos,
então o bagaço deve ser applicado sobre o logar da mordedura.
Tambem se encontra a plumeria em Matto Grosso, de onde vem em estado de tintura,
segundo ouvi dizer. Em Goyaz, onde era completamente desconhecida, vi-a, pela
primeira vez nas margens do Rio Padre Souza e depois em alguns dos seus pequenos
affluentes, quando viajava em companhia do Dr. Antonio Cavalcanti, e dos fazendeiros
Joaquim de Araujo e Francisco Rodrigues Chaveiro, a quem dei a conhecer a planta,
salientando o seu valor medicamentoso.
Entre os vegetaes celebres pela sua acção violentamente venenosa, occupa sem
contestação o primeiro plano a - tangaraca - dos indios, conhecida tambem pelo nome de
- herva de rato - ou, simplesmente pelo de - herva .
São conhecidas tres especies de tangaraca, e todas se acham nas capoeiras e nas
mattas virgens, tanto na sua espessura como na beira dos caminhos.
Tem o poder deleterio em tão alto gráo esta herva, que mesmo em pequena quantidade
ingerida, ou secca ou fresca, é logo seguida de phenomenos indicativos da mais grave
intoxicação.
Pouco depois da ingestão do veneno, o corpo da victima começa a inchar, principalmente
o abdomen, cujos musculos parecem fortemente contrahidos; a marcha é profundamente
alterada; a vista perturba-se; manifestam-se vertigens e aquebrantamento geral das
forças; o animal nada come; tem sêde excessiva, e em tempo relativamente curto, morre
no meio de angustiosa inquietação.
E' raro escapar um animal hervado.
Tão grande estrago produz a herva no Estado de Goyaz que o gado exportado do
Vão do Paranan em numero de 30 a 40.000 rezes por anno, perde cerca de 3.000, isto é
10%. mais ou menos, segundo as informações que na Formosa me foram ministradas por
um dos principaes criadores do Vão.
O fumo goyano, que, por assim dizer, até hoje, além do gado, e o unico genero da
diminuta exportação do Estado, chegou a ganhar fama mesmo aqui no Rio de Janeiro; e
não ha fumante algum que não conheça o cigarro e fumo goyano, ao menos pelos dizeres
do envoltorio do maço.
A canna de assucar, o café e o fumo dão perfeitamente em Goyaz, e os productos
industriaes resultantes são de excellente qualidade.
A soqueira da canna da seis e oito annos seguidos sem outro trabalho que não seja a
brutal queimação do cannavial, após a colheita; e quando este recebe trato, dura o dobro.
O cafezeiro tambem é de mui longa duração, embora as dimensões das arvores não me
parecessem differentes das de São Paulo.
A serem verdadeiras as informações que tive na cidade de Santa Luzia, vi um quintal todo
plantado de pés de café de 70 a 80 annos de idade, dando sempre mais ou menos
regularmente.
Os productos da canna e do café não são em quantidade sufficiente para a exportação, e,
talvez, nem mesmo para o consumo estadoal, porquanto em muitos logares em vez do
assucar ainda se usa da rapadura, e do Estado de S. Paulo é importado algum café.
Ha em Goyaz um capim muito procurado pelo gado, denominado jaragua, nimiamente
abundante, que passa por ter mais elevado valor nutritivo do que o capim gordura e o
chamado capim de Angola.
Finalmente, muitas gramineas, as cyperaceas e algumas outras plantas dos campos que
hoje são uma verdadeira praga, algum dia terão muito apreço, quando, por exemplo, o
fabrico do papel em Goyaz, na éra de progresso e de paz, dispensar o importado
europeu.
Fernando Delgado, ultimo governador de Goyaz, com o uso das suas aguas conseguiu
curar se de uma dôr rheumatica com paralysia incompleta do braço direito.
Apezar da fama que disto lhe adveio, o logar progrediu lentamente, e era pequena a
frequencia dos enfermos que ahi buscavam o restabelecimento da saude ou o allivio dos
seus males. Entre elles avultavam em numero os morpheticos, por isso que corria mundo
a fama de que aquellas aguas curavam tão triste doença.
Ao lado da povoação passa um aurifero corrego de aguas frias, em cujo leito e bordas
tambem se encontram alguns olhos d’agua quente, e cuja origem tem logar em um
burytisal distante cerca de quatro kilometros a SW.
Em 1838 constou ao director da Factildade de Medicina elo Rio de Janeiro a existencia
destas aguas, tidas então como sulphurosas, e com a fama de haver curado grande
numero de morpheticos e melhorado tambem alguns, que não obtiveram cura completa.
O Governo teve logo noticia das vitudes medicinaes das aguas de Santa Cruz, e officiou
ao presidente da provincia, José de Assis Mascarenhas, em fins de Julho de 1838,
ordenando as mais escrupulosas indagações, uma vez que não tinha havido dos factos
propalados averiguações exactas por pessoas profissionaes.
Em 16 de Outubro o presidente respondeu ao Governo affirmando a existencia das
afamadas aguas; encarregou ao Dr. Vicente Moretti Foggia, medico italiano de origem, do
exame das aguas e suas virtudes therapeuticas, e em Setembro do anno seguinte (1839,
o Dr. Foggia apresentou ao Governo provincial o resultado dos seus trabalhos.
Foggia ainda vivia nonagenario na cidade de Goyaz, em Dezembro de 1892, quando ahi
esteve a Commissão do Planalto. Goza de muita estima e justa reputação tanto na capital
como no Estado.
Em Agosto de 1838, tendo de partir para Goyaz o Dr. Manoel de Mello Franco, ao
governo pareceu conveniente aproveitar a opportunidade, e incumbiu-lhe de proceder a
analyse das referidas aguas no proprio logar das suas nascentes, de colher as
informações precisas para um juizo seguro e decisivo, sobre a sua virtude medicinal na
enfermidade em questão, e facilitou-lhe todos os meios.
O relatorio do Dr. Mello Franco pouco se fez esperar, pois em Agosto de 1840 o Governo
o submetteu ao juizo da Faculdade de Medicina, que nunca deu resposta!
Em 1842, o marquez de Barbacena convidou por parte do Governo, o Dr. Faivre, que se
achava em Goyaz, a fazer a analyse das aguas thermaes de Caldas Novas e, ao mesmo
tempo, a observar e julgar o seu pretendido effeito sobre os doentes de morphéa, em
grande numero attrahidos áquellas fontes pela voga de sua efficacia.
No anno seguinte, o medico francez apresentou o seu relatorio, composto de duas partes:
a primeira tratava das aguas e a segunda do seu effeito curativo sobre a morphéa. Deste
relatorio uma cópia foi remettida a Academia das Sciencias de Pariz, e, submettida ao
exame de uma commissão composta de Royer Collard, Rayer, Henry, Pariset e Delens,
teve um parecer muito interessante. Infelizmente as opiniões discordantes dos dous
medicos impediram qualquer resultado definitivo sobre o valor therapeutico das Caldas no
caso vertente em questão, e as duvidas permanecem até hoje.
Entretanto, devo consignar aqui, para melhor juizo dos mais competentes, que o Dr.
Faivre não negou de todo a acção dynamica das ditas aguas, apezar das infimas
quantidades dos seus residuos solidos, e especificou a sua acção topica; quanto á
morphéa, não acreditou no seu effeito curativo, embora fosse a sua opinião provisoria, e
attribuiu as melhoras de alguns doentes não á diminuição do seu estado morphetico, mas
à benefica modificação de affecções secundarias.
Eis, em synthese, o resultado das observações do Dr Foggia:
“Na parte do relatorio baseada sobre informações de pessoas de criterio, deduz-se que
com o uso das aguas thermaes sararam perfeitamente, desde 1835 até o fim de 1838,
além de 1 syphilitico e 1 darthroso, 9 morpheticos ; que obtiveram consideravel me
lhora 17 enfermos desta ultima molestia; que o uso das aguas foi infructifero a 7; que,
finalmente, falleceram 4. Na parte do mesmo relatorio, baseada sobre a propria
observado Dr. Foggia, se infere que em julho de 1839 existiam em Caldas Novas, em
tratamento, 60 pessoas, em Caldas Velhas 9 e em Caldas de Pirapetinga 7, perfazendo o
total de 76 pessoas.
Deste total 2 morpheticos estavam perfeitamente curados; 4 enfermos da mesma molestia
e 1 darthroso quasi sãos; 3 morpheticos com melhoras consideraveis; 22 morpheticos, 2
darthrosos e 1 syphilitico com melhoras sensiveis; 16 morpheticos com poucas melhoras;
finalmente 23 no mesmo estado em que tinham ido, dos quaes 19 morpheticos e 4
syphiliticos, sendo que 12 d'elles alli se achavam havia pouco tempo.
Os dous que faltam para completar os 76 falleceram na presença do medico, em
consequencia de inflammação aguda dos intestinos.”
Caldas Novas está situada a 17º 15" de latitude austral e a 50º 30" de longitude occidental
do meridiano de Pariz, segundo o Dr. João Mauricio Faivre.
Sua posição é agradavel e muito bonita, extensa a vista e bem distribuidos os terrenos
circumjacentes.
O clima é ameno, secco e mui saudavel; os ventos reinantes na estação chuvosa não são
regulares, predominando, entretanto, os dos rumos NW, W, e SW, e limpando o tempo
sopram geralmente os de NE e SE, como sóe acontecer em todo o sul de Goyaz.
Posto que a latitude não seja muito afastada do equador terrestre, todavia está a notavel
distancia do equador thermico, o que, unida a grande elevação do terreno, torna branda e
supportavel a temperatura média local.
“E' ahi moderado o calor pela posição elevada do terreno, diz o Dr. Faivre, e pela
ausencia de altas cadeias de montanhas, que poderiam impedir os ventos reinantes de
soprar livremente sobre toda a extensão do paiz, e de assim refrescar o ar e o sólo,
abrazados pelo sol. A temperatura observada á sombra, tres vezes ao dia, não deu senão
a média de 24º cent. nos mezes de Dezembro Março, e pelo meio indicado por
Boussingault a temperatura média annual seria de 22º cent.
O abaixamento da temperatura durante a noite, na superficie da terra. foi de 61º cent. nas
vezes em que a observação se fez.”
Todo o chapadão que circumda a região dos poços, desde o Rio Corumbá até a Serra de
Caldas é formado pelo grés argiloso, entremeiado cá e lá de uma grande serie de
manchas de argila pura. Nos morros, serras e serrotes encontram-se grés de varias
côres, ás vezes o proprio itacolumito, o quartzo e em muitos pontos o tauá e a canga.
Grandes jazidas de schisto micaceo tambem existem na direcção NW-SE, particularmente
no Rio Corumbá e seus affluentes, que atravessei.
O steaschisto, ou schisto hydromicaceo de Gorceix, tambem abundante, é empregado até
no rudimentar calçamento do povoado e nas sepulturas, onde talvez substitua com
vantagens o marmore e o granito.
No logar das fontes, sobre o itacolumito, se encontram recentes alluviões, depositadas em
fina camada, em que predominam fragmentos arredondados de quartzo rolado, etc.
O Dr. Faivre, que é um dos mais illustres representantes da geração medica passada, fez
uma analise chimica qualitativa das aguas de Caldas Novas; mas a fallar a verdade, essa
analyse pouco adianta, porquanto a existencia, nos insignificantes residuos solidos, do
chloro, dos acidos silicico e carbonico, e das bases potassa, soda, cal, magnesia e
alumina, nada exprime, visto serem estas substancias encontradas em todas as aguas
naturaes ou doces.
O oxygenio ou ar atmospherico, que o illustre medico a principio suppoz ter achado, por
causa da luminosidade e dos vapores brancos de acido phosphorico formados de tempos
a tempos, em um eudiometro de phosphoro cheio de gaz, não existia de facto, e a isso se
oppoem as experiencias de Barkmann, pelas quaes ficou provado que o
das tropas; e finalmente, a estrada de Therezopolis ahi está, como estas ultimas, bem
perto do Rio de Janeiro para attestar as grandes difficuldades de conducção nas regiões
do littoral em tempos felizmente remotos, em comparação com o que se observa na
actualidade do Goyaz.
A serra do Rio dos Bois não apresenta difficuldade alguma no transporte; a do Abbade, na
descida para a fazenda do Sr. Hermano, na base dos Picos dos Pyrenêos, a da
Contagem, perto do Sobradinho, e a de Caldas Novas, não ha duvida têm muitas pedras
destacadas que embaraçam sobremaneira a marcha; a falar a verdade, essas descidas
nem caminhos são, porquanto não havendo leito de estrada, desce-se a granel por sobre
essas pedras soltas; a serra dos Macacos, perto do riacho dos Paulistas, e a que passa
na fazenda do Parnauá, do coronel Valeriano de Castro, perto dos riachos da Taboca e
da Taboquinha, são de flancos muito inclinados e tornam incommoda a descida. O
mesmo acontece com a Serra do Corumbá e do Rio Ponte-Alta.
Porém em umas e outras não se encontram os declives abruptos tão communs nas
regiões montanhosas da zona do littoral.
A denominada Serra Dourada, fronteira a capital goyana, não é mais do que uma baixa
intumescencia do massiço central das terras brazileiras, assentada sobre uma larga base
que se estende das visinhanças da fazenda do Povoa até a povoação das Areias, na
base da face septentrional da mesma serra, 3 a 4 kilometros de Goyaz.
E' visivelmente impropria, geralmente fallando, a denominação de serra dada ás
lombadas, ás elevações do terreno no interior do Brazil, ao menos por onde andou a
Commissão. O que melhor parece definir essas elevações é sem duvida, o nome de
massiço. em que se encontram ora cristas e picos isolados ou não, ora espigões de
flancos mais ou menos escarpados, ora finalmente, verdadeiras chapadas e chapadões,
de largura variavel entre algumas dezenas de metros naquellas e muitos kilometros
nestes.
Os picos dos Pyreneus, cuja maior altura relativa não excede á do morro do Castello, me
pareceram cumes de altissima montanha, quando de viagem de Caldas Novas de Goyaz
com os meus companheiros Dr. Alipio Gama e José Paulo de Mello, os avistei nadistancia
de cerca de 50 a 60 kilometros, achando-me defronte da capellinha da aldeia da Posse a
meio caminho, mais ou menos, da fazenda das Antas ao sitio do Carurú, na estrada que
de Bomfim conduz a Pyrenopolis.
Esta perspectiva é completamente illusoria, pois que esses picos, com a altura ha pouco
mencionada, descansam sobre um chapadão de mais de 1.300 kilometros acima do nivel
do mar, e nem ao menos se constituem em cristas ininterrompidas por causa das
saliencias e depressões que dão á divisora das aguas o aspecto pittoresco que tem no
seu extenso desenvolvimento.
O atalho das Furnas, na estrada de Pyrenopolis a Antas, na fazenda do commendador
Barbo, representa uma verdadeira crista cortante no dorso do massiço central, sem ter 10
kilometros, talvez, de superficie plana, e, de um e outro lado, vêm-se respectivamente as
aguas que vão para o Pio Capivary, ao sul, e para o Rio das Almas e Padre Souza, ao
norte.
Esta estrada, tres leguas distante da povoação das Antas, percorre o chapadão unido das
Duas Oitavas e da Forquilha, com muitos kilometros de largura e ligeira inclinação, entre
os rios Capivary e Piancó, seu affluente, se desprezarmos a baixada formada pelo
corrego do Andréquicé, onde esteve a turma SW, do Chefe da Commissão.
A estrada se dirige para SW, e o chapadão toma o rumo WNW e mesmo NW, passando
pela antiga lavra do Gongo, pelas fazendas de Joaquim e Manoel de Araujo, Manoel
Mendes e outros, até que, reduzindo-se gradativamente, transforma-se de novo em
espigão cada vez mais estreito.
Soffreu este espigão uma funda ruptura no sentido da vertical, com o afastamento talvez
de 500 kilometros de face a face, e os depositos modernos, que lentamente vão
obstruindo a brecha , formam um perfeito arco de circulo no logar denominado Tira-
Chapeu,
onde as aguas das chuvas correm indifferentemente para os rios do sul ou do norte.
Alargando-se ainda, o espigão recebe a denominação de espigão do Jurema, e póde ser
considerado como o inicio do esplendido e alto espigão da Samambaia, que procura a
SW ou WSW os limites do Estado de Matto Grosso, e cuja vista alcança, para as bandas
do sul, uma extensão talvez maior de 70 kilometros, e abrange em ampla, immensa e
pouco profunda bacia as vertentes de todos os affluentes da margem esquerda do
caudaloso Rio Meia Ponte, até a confluencia do Rio João Leite.
Mais ou menos um kilometro distante das nascentes do primeiro affluente do Rio Meia
Ponte, o riacho dos Cedros, brota na face do norte a principal cabeceira do Rio Padre
Souza, o envenenador das aguas puras e crystallinas do Rio das Almas.
Quando exploravamos, os primeiros, estas paragens sertanejas, o Dr. Antonio Cavalcanti
e eu, alguns kilometros antes de passarmos pelas cabeceiras do ribeirão das Trahiras,
affluente do rio Padre Souza, subimos os morros dos Dous Irmãos e descortinámos uma
das mais bellas e attraentes paizagens que, é dado ao homem gozar.
Voltados para a direcção geral W ou WSW do curso do Rio João Leite, depois que,
abandonando as encostas do espigão, se deslisa pela planicie, vimos o terreno baixar
insensivelmente na extensão de mais de 6 a 8 kilometros até ao confluente do unico
tributario importante desse rio, o ribeirão Jurubatuda, e com a vista acompanhamos os
cordões de mattas marginaes ás duas correntes, que no meio do campo se fundem em
uma só, em busca do Rio Meia Ponte, após um curso de mais de 60 kilometros, pouco
além da extremidade da serra do mesmo nome.
Ao norte, acompanhando o espigão até perde-lo de vista, pudemos ver delineados, como
ramificações do grande massiço, os pequenos contrafortes que separam uns dos outros
os affluentes da margem esquerda do Rio Meia Ponte até a sua cabeceira principal; e ao
sul, a campina ondulada, verdejante e forrageal de excellente relva, ligeiramente se eleva
para encontrar-se com outras que a continuam seguindo a região adjacente do Rio Meia
Ponte.
apenas nas cabeceiras, o que sempre se nota, ha capões mais ou menos extensos, na
razão directa da quantidade d'agua que nasce.
Mais ou menos no meio da chapada que da Serra dos Macacos vae ao Sobradinho, se
acha o pouso das Tres Barras, (altitude 1.240 metros), e cujo nome provém de nascerem
a pequena distancia um do outro, os rios Torto, Gama e Riacho Fundo, os quaes, por sua
vez, têm as nascentes perto das dos rios Alagado e Descoberto ou Montes Claros.
Cerca de 1.200 metros de altitude tem o logar d'estas fontes, e a não ser já proximo da
serra fronteira ao Sobradinho, onde as oscillaçóes do terreno se vão tomando cada vez
mais fortes, a proporção que vae baixando um pouco, so se notaria o brando declive das
terras que acompanham o leito do Rio Parnauá, resultante da fusão dos rios Torto e
Gama, do Alagado, Descoberto e Areias, e seus affluentes.
Além d'estas depressões, ha ainda accidentes devidos aos corregos e ribeirões, que
nascem já um pouco mais afastados do espigão mestre, como sejam entre outros, os
corregos da Taboca e Taboquinha, com o leito em apertados e fundos valles, os rios da
Papuda, Sant'Anna, Mesquita, Lages, Saia Velha, antes de Santa Luzia, e os de Palmital,
Santa Maria, Jacobina, etc., depois.
Esse abaixamento do terrreno não excede talvez de 100 a 150 metros, na direcção de
NW a SE, qual é geralmente a dos citados rios com excepção, porém, da região
percorrida pelos dous componentes do Parnauá (o Torto e o Gama) porque o chapadão
do Gama com cerca de 1.130 metros tem a estrada de rodagem que conduz para a velha
cidade de Santa Luzia.
O chapadão do Gama, com a referida altitude e com a extensão SW de mais de 8
kilometros, termina-se tanto no lado do rio Gama, como no da Papuda, cujas nascentes
n'elle se acham encravadas, em suaves declives medindo approximadamente dous
kilometros.
No seu desenvolvimento para Santa Luzia, este chapadão se une com o da tapéra de
Sant'Anna, e formam assim uma das mais bellas regiões, que se póde imaginar, com
bastante vegetação, notavel abundancia d'agua potavel de excellente qualidade, planicies
de muitas dezenas de kilometros com insignificantes oscillações de superficie, rios
encachoeirados, altura variavel de 900 e 980 a 1.180 e 1.240 metros, e onde a natureza
prodigalisou admiravel fertilidade cobrindo uma grande extensão de terreno com a terra
roxa, como em quasi toda metade oriental do districto, e que tanta fama, riqueza e
desenvolvimento agricola tem dado ao adeantado estado de São Paulo.
Se não fôra a solução de continuidade causada pelos rios Mesquita, Lages e Saia Velha,
immenso plaino se estenderia uniforme desde as margens do Torto, Gama e Paranauá
até bem perto de Santa Luzia, onde começa a descer um pouco mais o algarismo das
alturas dos soberbos chapadões desta parte central do Brazil.
A partir d'esta cidade para W, conservam os chapadões a altura approximada de 900
metros, sem contar os morros que attingem até 1.030 metros perto de Barreiros, sendo
que n'esta extensão se acham as excavações de terreno produzidas pelos leitos dos rios
Santa Maria, Alagado, Descoberto e Areias ; não mencionamos outros menores, e cujas
margens são revestidas de espessa vegetação em grande extensão.
Perto dos Barreiros, as fortes ondulações do solo dão-lhe o aspecto de sopé de
montanhas visinhas, sem que, entretanto, isto se verifique ; ao contrario, a essas
ondulações suceede uma baixada mui rasa, onde se encontra o granito, que não é
commum em todo Goyaz.
Dos Barreiros ao Capivary todo o terreno é fortemente accidentado e nas partes mais
declives percorrem os rios Cachoeira, das Gallinhas, do Ouro, Congonhas, Corumbá,
Carurú e Capivary, que recebe na margem o Corrego das Duas Oitavas, originado no
chapadão do mesmo nome (1.000 metros de altura), nas contravertentes do corrego
Andréquicé.
O alto chapadão das Duas Oitavas continua com pequenas depressões até o arraial das
Estes baixos algarismos de temperatura coincidiram com a geada, que havia dez annos
não se fazia sentir no Estado de Goyaz de modo apreciavel, sendo que depois de 1872
em que houve uma tão forte como a de 1892, só em 1882 ou 1883 teve logar outra,
porém fraca e pouco extensa.
A de 1892 foi de extraordinarias dimensões em todos os sentidos, porquanto da capital do
Estado a Uberaba, desde Formosa até o espigão da Samambaia, em toda essa grande
área restam ainda vestigios de tão destruidora geada.
Com effeito, em todos os logares por onde passou a Commissão referiram os moradores
que a duração deste phenomeno foi de seis dias, com pequenas differenças em um ou
outro ponto.
Tabella n. 1
O exame d'esta tabella mostra que a proporção que adeantavamos para léste, no fim do
mez de Agosto que, por assim dizer, é o inicio da época de transição da estação secca
para a chuvosa, algumas perturbações se notavam nas indicações instrumentaes: é
assim que se vê que a regularidade observada dos dias 24 e 25 cessou no immediato,
descendo o thermometro de 24.º a 20º.8. subindo o barometro de 673mms.2 a 682mms.6,
a humidade relativa de 52º.0 a 61º.0, e a tensão do vapor d'agua passou de 12mms.2 a
12mm8.0.
A atmosphera enfumaçada em excesso, por causa das grandes queimadas dos campos
durante toda a estaçao secca, de manhã esttava ordinariamente despida de nuvens, do
meio dia para a tarde começavam a apparecer nos ritmos do sul, ora grandes cirrus ora
cumulus, ora nimbus, ou cumulus-nimbus, que umas vezes perduravam algum tempo
durante o qual se desprendiam algumas faiscas electricas, outras se transformavam em
stratus, que por sua vez vinham quasi sempre a desapparecer sob a influencia dos ventos
do norte, os quaes não variavam de espaço comprehendido entre NE e NW.
No Pichoá, a 25 de Agosto, estando o céo carregado para as bandas do S de pesados
nimbus, ouvimos os primeiros trovões durante essa longa viagem, chegando mesmo a
chover algumas gottas que não bastaram para molhar o solo, sendo que ao sul d'esta
localidade a chuva foi bastante fórte, segundo informações obtidas.
Com esta chuva pouco se modificou o estado ennevoado da atmosphera.
Do Pichoá em deante nada de notavel se encontra n'estas observações, a não ser que a
temperatura minima foi baixando cada vez mais, até que, na villa do Mestre d'Armas foi de
10º.5 e no Sobradinho 12º.2.
Tabella n. 2
Na cidade da Formosa, a regularidade e constancia dos elementos meteorologicos, nos
poucos dias em que, ahi a Commissão permaneceu. foram taes que a differença entre as
minimas extremas observadas foi de 4º.5, de 14º.2 a 18º.7, sendo a média 16º.0 assim
como foi de 3º.2 a que se manifestou entre a maior maxima e menor, entre 33º.0 e 28º.8,
sendo a média 38º.9.
A humidade relativa variou termo médio entre 44º.5 e 55º.1; o barometro entre 684 mms 1
e 686 mms.5.
O céo, de ordinario , apresentava-se do meio dia para a tarde em parte coberto de cirrus,
cumulus e algumas vezes nimbus, sem, no entretanto, chover, excepto no dia 8 de
Setembro em que a quántidade d'agua cahida foi inapreciavel.
O vento conservou-se sempre brando e na direcção de L, com excepção do dia 9, depois
da pequenia chuva em que soprou de S.
A julgar pela comparação d'estes dados com as informações prestadas pelos antigos
moradores da Formosa, essa regularidade e constancia são habituaes alli, o que torna o
clima local secco e bom.
Tabellas ns. 3 a 6
Inaugurados os trabalhos da demarcação do vertice SW do Districto Federal, algumas
interrupções se deram nas observações astronomicas, pois tendo-se firmado
definitivamente a estacão das chuvas muitos
dias houve sem que nos fosse dado ver o azul sereno do nosso céo tropical; apezar
d’isto, as observações meteorologicas, attenta a sua natureza, se fizeram
continuadamente, como vamos ver examinando a tabella n. 3.
As variações diurnas do thermometro tiveram logar entre 19º.0 e 26º.0 com a média geral
de 22º.4, no mez em que o sol passa pelo zenith do ponto de observação; a minima
absoluta foi de 9º.0, a maxima 34º.8, respectivamente nos dias 7 e 9 de Outubro; e a
excursão nychthemerica teve a amplitude de 23º.5. determinada pelos extremos 9º.0 e
32º.5.
A média das minimas alcançou 15º.7 e a das maximas 29º.5. A média do percurso da
pressão do ar foi de 671mms.4 a 676mms.3 o que dá insignificante oscillação média de
4mms.9, notando-se que a pressão minima foi de 670mms.4 e a maxima 677mms.9.
A temperatura do ar que variou entre a minima de 14.º.5 e a maxima de 32º.0, teve a
média de 21º.2; assim também a humidade relativa que oscillou entre a minima de 40º.2 e
a maxima de 90º.0 tem a média de 71º.7.
Durante os 40 dias de observação no vertice SW predominaram os cirrus-cumulus e os
cumulus-nimbus sobretudo de tarde, e de manhã os cirrus.
Em algumas tardes appareceram os stratus-cumulus, quasi sempre no poente.
O estado do céo manteve-se, na média, a 5º.9, sendo que no principio da estada da
Commissão ahi, o céo mostrou-se maior numero de vezes coberto no todo ou na maior
parte, do que nos ultimos dias.
Ordinariamente, a segunda metade do dia era mais farta de nuvens espessas do que a
primeira, e, não poucas vezes, a uma tarde tempestuosa succedia uma noite serena e
clara, em que o brilho intenso das estrellas e a transparencia e pureza da atmosphera
tocavam ao auge, particularmente nas noites de luar.
Nos dias 24, 25 e 27 de Outubro, ao amanhecer, havia cerração intensa bastante para
nada deixar ver a poucos metros de distancia, soprando fresco o vento N W.
Os ventos dominantes em toda a região explorada (e ao que parece em todo o sul de
Goyaz), com especialidade na de que me occupo agora, vêm do rumo N W, raramente de
W e mais raramente ainda de NE e E.
Pela primeira vez no dia 10 de Outubro soprou do S, depois a 12, 13 e 15; a 19 ventou de
SE e de 27 em deante a frequencia dos ventos d'este rumo foi gradativamente
augmentando até exceder em numero, no mez seguinte, aos que reinaram no principio do
mez de Outubro.
A velocidade de todos estes ventos foi sempre fraca, sendo a intensidade commnum de 4
a 6 metros por segundo, marcando o anemometro só uma vez a velocidade de 10 metros,
com o vento de S, de 12 de Outubro.
A quantidade d'agua cahida chegou a 245mms.3, occorrendo 22 dias de chuva e 22 de
trovoada; porém, nem sempre esta coincidia com aquella, de modo que houve dias em
que choveu e não trovejou e vice-versa.
Tabellas ns. 7 a 9
Em Pyrenopolis, a temperatura minima absoluta observada de 18 de Novembro a 10 de
Dezembro, foi de 18º.2 e a maxima de 32º.0; a menor temperatura média foi de 22º.3 e a
maior de 26º.1, e foi a média geral de 23º.5. O thermometro indicou para ora as
temperaturas extremas de 17º.5 e 31º.7, sendo a média de 24º.5.
O barometro differençou apenas na média de 9mms.0, pois sendo a menor pressão de
688mms.2, foi a maior de 697mms.2.
O céo esteve quasi sempre coberto, em cerca de dous terços, sob a acção constante dos
pluviosos ventos de NW e NE. Houve 16 dias de chuva com 278mms.1, e dous dias de
trovoada, a 21 de Novembro e 2 de Dezembro.
Tabellas ns. 10 e 11
Na capital do Estado de Goyaz, em sete dias de observações, de 19 a 25 de Dezembro, a
menor minima foi de 20º.6 e a maior de 21º.8, sendo a média das minimas 20º.8.
A menor e a maior maxima foram respectivamente 24º.0 e 31º.5, com a média de 29º.2,
sendo que a média geral foi de 24º.2. A menor temperatura do ar foi de 20º.5 e a maior
28º.0.
A pressão atmospherica tem a média de 717mms.9 e a humidade relativa 71º.4.
Do dia 20 a 25 choveu constantemente até o meio dia do ulitimo, ora de manhã só, ora de
tarde, ora todo o dia, conservando-se o céo sempre, na sua quasí totalidade, coberto de
nimbus, Cumulus-nimbus, cumulus e cirrus, sob a influencia invariavel dos ventos W, NW
e NE.
phera resvalando pelos planos inclinados ou encostas das terras altas do interior, e, pela
dupla razão de chegarem a regiões altas da atmosphera com temperaturas inferiores ás
suas e de se dilatarem em virtude de mais fraca pressão do ar, a humidade se, condensa
e formam-se as nuvens, ao mesmo tempo que grande producção de electricidade tem
logar; e é no meio de relampagos e trovões que estas nuvens. quasi sempre-se desfazem
em diluvianas chuvas tão communs no interior do Brazil, de Outubro a Março.
Propositalmente me extendi sobre a altitude, temperatura, humidade relativa, chuva e
ventos, e deixei em segundo plano a pressão barometrica, que no caso vertente pouco
exprime em face da altitude média da zona estudada, a tensão do vapor, etc., que
representam na constituição dos climas, papel menos importante a despeito da opinião de
Borius e Treille, que acreditam que não é sobre a temperatura que devem recahir as
accusações pelo facto das sensiveis variaçoes de calor e de frio, que experimenta o corpo
humano, e, sim, sobre as oscillações dos hydrometeoros, especificadamente da tensão
do vapor d'agua ou humidade absoluta.
Pathologia
Nenhuma affecção constante da pequena estatistica por mim organisada, é particular á
parte do Estado de Goyaz visitada pela Commissão, e nem tão pouco depende do clima.
As molestias alli indicadas, entre as quaes algumas graves, como a syphilis, a bouba, a
morphéa e diversas outras em que a anemia predomina, observam-se tambem em varios
pontos de toda a zona intertropical em medida desigual para as differentes raças, para os
differentes gráos de receptividade morbida individual, e, bem assim, para as influencias
mesologicas, etc.
A isto, de certo, não são estranhas a altitude média dos chapadões, que tambem o é do
da America do Sul; a excellencia das condições meteorologicas e atmospherologicas; a
constituição do solo até hoje absolutamente indemne do paludismo; a grande abundancia
e pureza da agua potavel, etc.
Ao contrario do que se dá com a georaphia botanica, a geographia medica é mui pobre e
mui imperfeitamente póde, mutatis mutandis, recordar a maior variedade relativa da flora
goyana.
Outrosim, o cunho pathologico da região do norte, especialmente das vertentes dos rios
caudalosos e de curso lento, ainda maior simplicidade acarreta á estatistica nosologica,
pois que o paludismo domina a pathogenia de toda a porção boreal do Estado, em que o
solo é baixo e formado por terrenos de alluvião recente, como se nota na grande facha
florestal que corre entre Pyrenopolis e Goyaz, conhecida geralmente pela denominação
de matto-grosso, e que constitue uma parte importante da vasta bacia do Alto Araguaya.
Como se vê, de 146 doentes, dos quaes 84 homens e 62 mulheres, sendo adultos 132 e
crianças 14, soffriam 18 ou 12, 3%,de dispepsia gastrica, ou gastro-intestinal com ou sem
dilatação do estomago; 13 ou 8, 9%, de boubas seccas ou humidas, em diversos gráos de
gravidade; 2 ou 7.5%, de neurasthenia de fórma cerebro-espinhal e gastro intestinal: 8 ou
5.4 % de bronchites e broncho-pneumonias; 7 ou 4.7%. de dismenorrhéa; 5 ou 3.4% de
manifestações agudas da intoxicação syphilitica; 4 ou 2,7% de hystero-epilepsia, sendo 3
mulheres e um homem; o mesmo numero de leucorrhéa e paludismo chronico e hypoemia
intertropical.
Entre as enfermidades mais communs em Goyaz, o grupo das venereas occupa um dos
primeiros logares, tendo na frente a syphilis, o gallico como lá se diz, debaixo de todas as
suas formas clinicas, desde a infecção hunteriana recente até as manifestações terciarias,
a heredo-syphilis, e outros effeitos remotos representados por lesões visceraes graves,
etc.
As manifestações agudas da infecção syphilitica dos cinco doentes apontados na
estatistica eram, em dous, exacerbações de molestia antiga, e em tres significavam
recente contaminação.
Assim tambem os doentes sob a rubrica de lesão cardio-aortica erão ambos syphiliticos; e
um, além disso, soffria de paludismo chronico de forma, intermittente, já quasi no declinio
cachetico. Apresentava este individuo uma endocardo-arterite proliferante syphili
DO PLANALTO CENTRAL DO BRAZIL.......................................................................................269
tica tão avançada que o sopro presystolico se ouvia a mais de vinte centimetros da
parede anterior do thorax, semelhando a um assobio e impedia o doente de conciliar o
somno. Applicando-lhe o tratamento especifico, em poucos dias melhorou sensivelmente.
O outro syphilitico tinha um vasto aneurisma da crossa da aorta causando tão profundas
perturbações na circulação e nutrição do braço direito, que este já tinha tomado
proporções gigantescas em relação ao outro.
Uma das mais interessantes manifestações da syphilis encontrei em um amaurotico que,
havia quatro annos tinha deante da vista uma nuvem branca que o impedia de distinguir
pessoas e cousas, o qual ficou relativamente curado dentro dos poucos dias em que nos
demorámos na Formosa.
Mais communs ainda do que as multiplas variedades das molestias venereas em Goyaz
são as que dependem das alterações da nutrição organica, sejam estas alterações
devidas ás substancias alimentares, a evolução anormal da digestão em suas diversas
phases, ou a vicios e defeitos dos phenomenos physicos ou chimicos, ou aos processos
intimos da nutrição intersticial.
Em qualquer das hypotheses, porém, a modificação da constituição chimica do organismo
implica fatalmente a diminuição da resistencia dos meios organicos contra a invasão dos
agentes da nossa destruição, para os quaes o homem são não é hospitaleiro, na bella e
exacta phrase de Bouchard.
E, pois, essa prévia modificação da nutrição organica representa o franco determinismo
de uma vasta serie de molestias differentes, das quaes se destacam: as diversas
dispepsias, a neurasthenia com todas as suas modalidades clinicas, o arthritismo, a
anemia, a chlorose, ete.
Muito mais frequentes são as affecções gastro-intestinaes idiopathicas, do que as
symptomaticas ou protopathicas. Um dos phenomenos mais constantemente observados
consistia no desenvolvimento de gazes no estomago e intestinos, com producção de forte
tympanismo que desapparecia pela expulsão ou absorção dos gazes, ou comprimia
mecanicamente o diaphragma para cima, e produzia subsequentemente oppressão
sempre penosa, sobretudo durante a digestão.
Nos casos de neurasthenia, os soffrimentos das faculdades intellectuaes eram patentes, e
em um doente que examinei manifestavam-se por uma inexplicavel indecisão em suas
resolucões.
Muitas vezes o abatimento era devido ao meteorismo, ás difficeis eructações, e a um
sentimento de tristeza acabrunhadora, que, quando era acompanhado de desarranjos
sensoriaes, levava o doente a falsa crença de congestão cerebral, e originava tambem
vertigens, cephalalgia, hypochondria, etc.
Facilmente se deduz que este estado de cousas, que acabo de descrever, existindo
permanentemente acarreta certo gráo de desnutrição seguido de anemia, chlorose, etc.
Conheci um neurasthenico, de forma gastro-cerebral, em que a scena morbida
apresentava manifestações psychicas apparentemente inquietadoras, e mui interessantes
para o neurologista. Semelhante ao maniaco, sempre que áquella cidade (Formosa) ia
uma pessoa da Commissão, aprazia-se o nesrasthenico em visitar o recem-chegado,
tendo-se previamente perfumado todo e vestido com todo o rigor, e durante a visita
achava se tão perturbado, em verdedeiro estado da excitação nervosa, que não podia
sustentar a conversaçao sem grande embaraço de palavra e difficuldade de ideiação.
Tendo de fazer uma viagem ao Rio de Janeiro, sentiu-se possuido de tal nervosismo, que
foram de todo infructiferas duas tentativas de iniciação da dita viagem. Para realizal-a foi
mister sahir incognito e, só a mais de meio caminho, é que se soube do destino tomado.
E', portanto, nas molestias deste grupo que avultam em numero as variedades, devido,
em geral, à alimentação impropria de grande parte dos habitantes particularmente além
dos limites ethnographicos marcados pela população mineira.
A natureza das substancias alimentares; o abuso dos condimentos fortemente excitantes,
alguns mesmo irritantes, pelo que se tornam verdadeiros causticos do estomago
e intestinos ; o pouco cuidado que se tem na escolha da agua para beber ; e a geral falta
das elementares noções de hygiene privada concorrem directamente para o
apparecimento de algumas das doenças que acabo de citar.
Apezar de ser a região abundantissima de excellente agua potavel, em geral a do uso
commum é má, ou porque é colhida em pontos ruins, ou porque antes de chegar ao logar
do consumo, tem atravessado chiqueiros de porcos, curraes de gado, etc.. ou em fim,
porque é tirada de uma pequena bacia cavada no chão, não obstante passar um corrego
ou um ribeirão distante algumas dezenas de metros apenas. A infecção palustre, que na
opinião de todos os medicos é a nota caracteristica da pathologia intertropical, é
excepcionalmente rara na região destinada a receber a futura Capital, e a que constitue a
raridade excepcional póde desapparecer em curto lapso de tempo, dependendo apenas
de insignificantes trabalhos de saneamento de alguns rios e deseccamento de alguns
brejos.
Os seis casos constantes da estatistica são todos exoticos, isto é, dous são de doentes
encontrados na minha viagem de Caldas Novas de Goyaz á cidade de Bomfim , tres são
do Vão do Paranan, e o ultimo contrahio a molestia em um pantanal do ribeirão Carirú,
com as nascentes na Serra do Mestre d'Armas, affluente do Rio Jardim que desemboca
no Rio Preto. Este vai ter no Paracatú e o Paracatú no São Francisco.
Segundo informações de pessoas que merecem fé, ha quarenta annos, houve uma
epidemia grave e mortifera de malaria nas margens do Rio Corumbá, após extraordinaria
enchente, epidemia que não passou para cima do porto do Pechincha.
N'aquelle porto, foram atacadas durante a referida epidemia, de preferencia, as pessoas
que, aproveitando os poços abundantes de peixes na retirada das aguas, iam nelles
pescar e se expunham sob os raios solares ardentes a contrahir facilmente a doença; as
que imprudentemente se banhavam nas aguas estagnadas e lodosas do rio transbordado,
etc.
Dos affectados, em numero de sete nesse porto, tres falleceram durante a evolução da
molestia, dous restabeleceram-se e os restantes vieram a fallecer cacheticos, após tres
annos de continuos soffrimentos.
Em toda a área demarcada, só ha um logar, esse mesmo muito pequeno, em que
observei pantano. Foi perto da villa de Mestre d'Armas, no rumo dos morros do
Catingueiro, na planicie humida que acompanha as sinuosidades do ribeirão do mesmo
nome, e onde se havia installado, por occasião da nossa passagem, o novo cemiterio,
contra tudo o que a sciencia e o senso commum indicam; sendo de notar que o minusculo
pantano promptamente desapparecerá desde que o curso do ribeirão fôr livre, e
desembaraçado o leito dos innumeros troncos e raizes de arvores que o atranvacam em
todos os sentidos.
Entretanto, em Mestre d'Armas não se conhece a febre palustre, e o aspecto da
população, na sua quasi totalidade mui pobre, é indicativo de boa saude.
Fóra do futuro Districto, a Lagôa Feia. que mais é uma expansão ovalar do Rio Preto, tres
kilometros abaixo da sua nascente dentro da cidade da Formosa, póde ser desseccada
pela colmatagem ou pela mudança do curso do rio, então pequenino corrego, e larga
abertura da extremidade meridional da Lagôa para o seu franco e completo esgoto.
O começo do mal afamado Vão do Paranan, em que se acha o vertice NE da área, é
perfeitamente salubre como a Commissão verificou, e como palustre só existe na
imaginação do ignorante ou em alguns dos muitos infundados preconceitos populares, tão
abundantes em quasi todos, senão em todos os legares atrazados.
E' corrente em todo o sul de Goyaz, que na época do começo dos ventos boreaes,
succedem-se casos de bronchites, bronchopneumonias, pneumonias, etc., originados,
regra geral, pelos descuidos pessoaes, etc.
Uma mulher adoeceu gravemente de pneumonia, comprehendendo a totalidade dos dous
pulmões, por haver lavado a cabeça
em uma bica d'agua corrente ao meio dia; tendo o corpo banhado de copioso suor, em
consequencia de serviço que fazia perto do fogo.
Este resultado é tanto mais natural, quanto tivemos na Commissão um exemplo claro do
que vale o cuidado, visto que a despeito da milita bondade de um clima, os abusos,
todavia têm mais força para produzir o mal do que o clima para o evitar.
Foi o caso de um dos nossos mais distinctos companheiros, que soffrehido ha longo
tempo de uma pharyngite granulosa, conseguio atravessar todos os mezes de frio e secca
e os de calor e chuva sem o menor incommodo; isto é mais uma prova de que aos effeitos
physiologicos do clima de regiões como a explorada, se junta o de grande força de
resistencia da maior parte das pessoas nelle residentes contra os resfriamentos (Weber).
-A dismenorrhéa, cujas fórmas predominantes foram a congestiva e nevralica originou-se
principalmeute na falta de cuidado na ultima phase de puerperio, ou has épocas do fluxo
catamenial; e não foram outras as razões pelas quaes pude encontrar esta doença em
uma menina de 14 annos.
-A leucorrhéa em grande parte é devida a má alimentação, á vida sedentaria de quasi
todas as mulheres, e, segundo penso, ao uso das aguas de brejo e de corregos
immundos para banhos.
- Dos casos observados, um dos mais curiosos foi o da hemato-chyluria do capitão V, que
antigamente teve febres intermittentes apanhadas no Vão do Paranan, e soffre
actualmente tambem de uma bronchite chronica. Tem tido melhoras duraveis sem
comtudo obter até agora cura permanente da hemato-chyluria. Accresce que esta
molestia no tempo quente cede mais facilmente a acção dos medicamentos e recrudesce
no tempo fresco, o que está em desaccordo com a theoria que admitte a acção do calor
solar dos tropicos dominando a etiologia e presta, pois, apoio a theoria parasitaria de
Bilharz e Wucherer.
-Não é, muito raro o papo em Goyaz, e as pessoas que o tem, salvo uma ou outra, não
ligam a menor importancia á doença.
O papo, em geral indolente, é pediculado ou não. No primeiro caso, a extensão do
pediculo varia de alguns centimetros a alguns decimetros e quasi sempre é fino; no
segundo, o papo é adherente e se apresenta com formas e dimensões variadas, seja elle
uniloculado ou multiloculado.
Algumas vezes, no periodo inicial, dóe a ponto de incommodar o paciente.
Dá em todas as idades e sexos, e de ordinario não tem cura.
Vi em Pyrenopolis um homem que possuia um incipiente doloroso. Acontecendo ir á
cidade de Goyaz, no fim de vinte dias notou que o papo havia desapparecido
completamente sem deixar o menor vestigio, para reapparecer com a sua volta para
aquella cidade.
A natureza do papo até hoje conserva-se ignorada, mas acredito que não lhe é extranha a
influencia da agua, da alimentação e das intemperies.
-A tuberculose é quasi desconhecida nos sertões, e os dous doentes que encontrei na
Formosa eram ambos de fora, e haviam procurado essa cidade por causa da excellencia
do seu clima. Uma moça mineira que anteriormente havia exercido o officio de cigarreira,
e um moço vindo de São Paulo por Araxá.
Estatistica pathologica
ORGANISADA PELO DR. ANTONIO PIMENTEL
Dyspesia 18
Bouba 13
Neurasthenia 11
Dismenorrhéa 7
Bronchite 8
Syphilis 5
Leucorrhéa 4
Paludismo 4
Hypohemia intertropical 4
Pneumonia 3
Idiotismo 3
Onanismo 3
Estreitamento da urethra 2
Escorbuto 2
Chloro-anemia 5
Prolapso do utero 1
Deslocamento parcial da retina 1
Hemato-chyluria 1
Amygdalite 1
Scrofulose 1
Verminose 1
Furunculose 1
Mania 1
Ozena 1
Amenorrhéa 1
Lymphatite suppurada 1
Amputação do 2º artelho direito 1
Ophtalmia blenorrhagica 1
Congestão cerebral 1
Hemorrhoides 3
Nevralgia facial 2
Hystero- epilepsia 4
Senectude 2
Dysenteria e diarrhéa 2
Gastrite chronica 3
Alimentação insufficiente 2
Lesão cardio-aortica 2
Congestão retiniana 1
Metrorrhagia 1
Keratite intersticial parenchymatosa 1
Mordedura de cobra 1
Conjunctivite purulenta 1
Sclerose lateral em placas 1
Polypo uterino 1
Phlebite traumatica 1
Congestão pulmonar 1
Psoriasis (lepra vulgar) 1
Hepatite traumatica 1
Retenção de placenta 1
Gonorrhéa 2
Tuberculose pulmonar 2
Herpes ulcerada 1
Facada 1
Tiro de garrucha 1
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Observações diversas
Dia 5 -Choveu inap. às 6 horas da manhã e ás 8. A 1 hora da tarde, soprava de N com a
força de 5ms..5, passando, ás 4, para WNW, com 5 metros por segundo. As 5 1/2
choviscou ligeiramente, embora houvesse ameaça de grande chuva.
6 -Durante a noite não choveu. A 1 hora da tarde soprava N com 3 metros. As 10 da noite
K-N a NE.
7 -Ar calmo. Céo limpido e vento fraco durante parte do dia. De noite, bello luar, calma.
Pequenos cirrus.
8 - Vento brando. N . De noite, luar.
9 - Ligeira viração de NW ; poucas nuvens C, K principalmente.
10 – Vento fraco do NW, de manhã. Pela primeira vez, appareceu vento de S, post
meridien. Chuva e trovoada..
11 - Pequena chuva ás 3 horas, Relampagos a W e S. Vento fresco de NW. Consigno
aqui o facto interessante de que, dentro da minha barraca, a variação thermometrica
oscillou entre a minima de 18º. 5 e a maxima de 41.ºo, no alto da tolda.
12 - As 1 1/2 da manhã cahiram algumas gottas grossas acompanhadas de trovoada de
N. A 1 hora da tarde, trovejava ao mesmo tempo de S e SW, soprando fresco de S com
28- Choveu e ventou fresco de NW até o meio-dia. 0 resto do dia, e de noite, algumas
nuvens, tempo melhor.
29 - Cumulus e cirrus durante o dia. De tarde, relampagos fracos a WSW, SE e S longe.
30 -Grandes cumulus a NE. Stratus a W e SE. Trovejou post meridien a NE. Cumulus-
nimbus em quasi todo o horizonte, com relampagos frequentes.
31 - Chuva forte com intermittencia desde 11 horas da noite, com trovoada: 31 millimetro.
Aguaceiro forte entre 2 3 horas com 17 millimetros.
NOVEMBRO DE 1892
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DEZEMBRO DE 1892
Dia 1. -0 dia veio, pela primeira vez, todo coberto de espessa cerração. Continúa
choviscando de vez em quando. Á tarde, cobrio-se o céo totalmente de nimbus e grandes
cumulus a NW, N, NE.
2.-Ás 10 horas, começou a trovejar e chover nas cabeceiras do Rio das Almas.
3.-Continúa o tempo coberto e choviscando por intervallos, não obstante a noite passada
parecer querer melhorar. O Rio das Almas amanheceu muito cheio e torrentoso.
4, 5 e 6.-Continúa o mesmo tempo chuvoso. Ao amanhecer de 6, chuva torrencial de 51
millimetros.
7, 8, 9 e 10. -Continua o mesmo tempo, porém, com alguns intervallos de limpidez. Ás 10
horas de 10 choveu 20 millimetros. Sahimos de Pyrenopolis com tempo chuvoso ainda.
RELATORIO DA COMMISSÃO EXPLORADORA........................................................................290
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ANNEXO V
____
RELATORIO DO DR. EUGENIO HUSSAK
GEOLOGO DA COMMISSÃO
ANNEXO V
—
Primeira parte
vegetação, tendo a fôrma de plateau e coberta com espesso manto vegetal, nas partes
onde se apresenta o micaschito.
Em virtude da maior resistencia que o itacolumito offerece à erosão pela agua e aos
effeitos da acção do tempo. ha na subida para “ os Picos” uma alternação tres vezes
repetidas de plateaux (micaschisto) e serrotes ingremes rochosos (itacolumito).
Os rios das Almas e Corumbá, que nascem ao pé dos Picos dos Pyreneus,
precipitam-se em bellas cascatas sobre as camadas de itacolumito.
As camadas de micaschisto avermelhado e decomposto, cheias de filões e massas
lenticulares de quartzo, são as que contém ouro e são trabalhadas nas grandes lavras do
Abbade e Vendinha: são ellas que fornecem este metal para as areias e cascalhos dos
rios das Almas e Corumbá.
Indo de Meia-Ponte para Santa Luzia, caminha-se sobre a formação de micaschisto, que.
na passagem do Rio Descoberto. apresenta intercalações de quartzito schistoso listrado.
A orientação des schistos muda-se gradualmente para NS sendo para 0 a inclinação perto
de Santa Luzia.
É para notar n'esta região o apparecimento de muscovito-granito, em Barreiros.
De Meia-Ponte para Santa Luzia predomina o caracter topographico dos chapadões,
interrompido, porém, perto de Barreiros, por um largo valle de contornos ligeiramente
concavos, com serrotes isolados cobertos de vegetação rica e é alli que se vê no meio
dos micaschistos um granito de grão grosso.
Este granito se apresenta sobre uma grande extensão e é, sem duvida, o prolongamento
do que se encontra perto da cidade de Goyaz e na zona granitica do Rio Claro explorada
pelo Dr. Pohl.
Na visinhança de Santa Luzia, o micaschisto é outra vez aurifero e acha-se coberto por
possante deposito de cascalho que, desde o seculo passado, tem sido extensamente
lavrado, dando hoje occupação apenas a uns poucos garimpeiros, visto ser o cascalho
relativamente pobre em ouro, e este de granulação excessivamente fina.
O schisto subjacente tambem mostra os signaes de antigos trabalhos de mineração.
De Santa Luzia até Formosa, passando os rios Mesquita e Parnauá, muda o caracter da
formação geologica, sendo o micaschisto substituido por schisto e grés argilosos,
alternados. com a orientação geral de NS e inclinação para 0. Não pude descobrir fosseis,
mas essas rochas indubitavelmente representam uma formação mais moderna do que o
micaschisto, provavelmente da idade paleozoica, sendo talvez equivalente à associada
com os calcareos da bacia de São Francisco, descriptos por Derby-. nos seus Relatorios
sobre este rio e o das Velhas.
O grés muitas vezes se assemelha a certas variedades de itacolumito e, em alguns
logares, é rico em crystaes de pyrito.
De Formosa para o norte predomina este grés argilloso formando o alto chapadão de
Porto Seguro, ( 1.ooo metros de altura), que, no Itiquira, apresenta uma descida abrupta
para o Vão do Paranan.
Na continuação da viagem de Mestre d'Armas, Rio Torto, Rio do Sal, no Vão dos Angicos,
até o Rio Verde, 15 léguas ao norte de Meia-Ponte, e no rumo de léste para oeste, a
formação de grez e schisto argilloso foi seguida até a fazenda do Padre Simeão.
No Vão dos Angicos (Rio do Sal e Pé da Serra) encontra-se no schisto, calcareo massico
de côr cinzenta escura e branca avermelhada, com intercalações finas de schisto
argilloso.
Da fazenda do Padre Simeão passando pelo Rio Verde e, d'ahi, para o sul até Meia-
Ponte, encontra-se de novo o micaschisto com orientação NS e inclinação para N.
N'esta paragem, é especialmente digna de nota a occorrencia extraordinariamente
possante de ferro oligisto massiço e schistoso no schisto totalmente decomposto do Vão
do Rio Verde, duas leguas distante de Quilombo e sobre o qual terei de dizer alguma
cousa adiante, bem como o cascalho aurifero do
DO PLANALTO CENTRAL DO BRAZIL........................................................................................297
Segunda parte
1º. Ouro. - Indubitavelmente pertence Goyaz, com Minas Geraes e Matto Grosso ao
grupo dos Estados mais auriferos do Brazil
Ha mais de 150 annos que em Goyaz, se lavra o metal precioso e com quanto hoje esteja
quasi extincta a mineração, limitada ao trabalho de poucas centenas de garimpeiros,
pelos methodos mais primitivos, é certo que a sua riqueza aurifera não está exgotada.
Todos estes phenomenos indicam que o ouro foi formado no mesmo tempo e do mesmo
modo que os filões de quartzo, no meio do micaschisto.
A theoria de Egleston da formação de ouro em filões ou dos cascalhos, pela deposição de
soluções, não encontra apoio n'esta lavra.
Onde os filões de quartzo, que se acham intercalados parallelamente á estratificação do
schisto são mais possantes, maior é o conteúdo do ouro.
Conforme as observações do Dr. Arena. um metro cubico da rocha dá um mil reis de
ouro, producto este apparentemente diminuto, porém bastante para dar resultado a um
bem dirigido serviço pelo systema hydraulico com amalgamação.
É evidente que alli o trabalho com batéa não compensará as despezas.
Outra lavra da Serra dos Pyreneus é o morro da Vendinha. Esta tambem é no
micaschisto, porém n'um horizonte inferior ao da lavra do Abbade.
São tambem auriferos os depositos de cascalho dos rios Corumbá e das Almas, sendo
em parte já lavrados como no Rio das Almas, perto de Meia-Ponte, ainda trabalhados por
uns poucos de garimpeiros.
O ouro destes rios é de côr mais escura e mais lamellar do que os das lavras
mencionadas e, por isso, parece ser proveniente de alguma outra parte da serra.
Tambem em Bomfim, o ouro se apresenta em formação primitiva em filões de quartzo no
meio do micaschisto decomposto, avermelhado, podendo-se distinguir dous filões
diversos.
O morro de Santo Antonio, cujos filões lenticulares de quartzo aurifero foram quasi
completamente exgotados, ha umas dezenas de annos, é interessante pelos restos dos
antigos trabalhos de mineração, como um grande poço, os pilões com que se triturava o
quartzo, o rego d'agua, etc.
Ainda resta intacto um grosso lenticulo de quartzo de cerca de um metro de grossura, que
os antigos mineiros deixaram por não poder abrir galeria, ou, talvez, por não achal-o
bastante rico em ouro.
Procurei em vão, com a batéa, encontrar ouro neste quartzo triturado.
É de interesse scientifico a occorrencia n'este quartzo de lamellas esverdeadas de
fuchisto, mineral, que em Minas. por exemplo, é companheiro frequente do ouro.
Em Santa Luzia, o ouro se apresenta num possante deposito de cascalho sobreposto ao
micaschisto e, em grande parte, já lavrado.
Cada prova de batéa dava-me ouro, bem que em quantidade muito pequena e
excessivamente fino.
Na occasião da minha visita alli havia alguns garimpeiros trabalhando com a batéa.
Sobre o modo de occorrencia do ouro, no estado de Goyaz e especialmente sobre a sua
origem, modo de formação e as suas complicadas formas crystallinas, terei mais a dizer,
depois de um estudo crystallographico e microscopico d’este metal e dos mineraes que o
acompanham.
2º. Diamante. -O deposito diamantifero de Agua Suja, no estado de Minas Geraes, ja foi
descripto na primeira parte d'este trabalho.
O estado de Goyaz é tambem rico de diamantes, porém, até o presente, estes não têm
sido regularmente trabalhados, sendo apenas lavrados por uns poucos de garimpeiros
nas arêas dos rios, principalmente nos affluentes do Rio Cayapó, no seu curso superior, e
no Rio Claro, cerca de 30 leguas distante da capital.
Tambem, em Trahiras, ao norte de Meia Ponte, encontram-se diamantes nas arêas do rio,
porém, conforme informam os garimpeiros, somente pequenos e pela maior parte
coloridos, portanto de pouco valor.
Na impossibilidade de visitar estas localidades, o que seria de grande interesse, só os
pude conhecer por diamantes comprados e por amostras de cascalho.
3º. Minereo de ferro -Tive occasião de examinar jazidas de duas especies: 1º. ferro
magnetico; 2º, ferro oligisto.
Interessante para o estudo da genesis do magnetite e pela analogia que apresenta com o
de Jacupiranga e São João de Ipanema, em São Paulo é a occorrencia de ferro
magnetico (Fe3 O4) de Catalão.
Na fazenda do Sr. Vicente Bernardo Pires, tres leguas distante de Catalão, encontram-se
grandes blocos de minereo de ferro, espalhados sobre a superficie, numa grande
extensão. Ahi consegui descobrir a rocha ferrifera.
A matriz original do magnetite, não foi, infelizmente, encontrada em condição de boa
conservação, sendo completamente transformada em massa terrosa de côr parda
avermelhada-escura, muito rica em grandes lamellas alteradas de hydrobiotite e
pequenos octaedros de magnetite. N'estes caracteristicos, esta massa terrosa concorda
inteiramente com a de lpanema e como magnetite-pyroxenite (jacupirangite) alterado de
jacupiranga12; sendo que neste ultimo logar é indubitavel a formação no hydrobiotite da
alteração de pyroxenio.
Lavando na batéa esta terra vermelha em que se encontram numerosos blocos, muitas
vezes angulares, de magnetite, que attingem até o volume de um metro cubico, obtem-se
um residuo de cerca de 40 % da massa lavada, consistindo de arêa fina de magnetite
com limonite e ferro titanifero; raramente encontram-se prismas de apatite e grãos de
quartzo. Estes ultimos são seguramente de origem secundaria, visto que nas massas de
magnetite puro se encontram pequenos filões de quartzo secundario e, exactamente
como em Ipanema, grandes massas de jaspe com geodes de crystaes de quartzo.
Finalmente encontram-se espalhadas pequenas massas de uma rocha esverdeada que, á
primeira vista parece ser serpentina, dentro da qual vêm-se crystaes de 1 a 2 millimetros
de diametro de magnetite e massas irregulares maiores, e veias da mesma substancia. A
principio julguei que esta rocha era a parte não alterada da matriz do magnetite, porém o
exame microscopico mostra que é uma rocha pura de perowskite consistindo de
innumeros crystaes de perowskite emittidos no magnetite e alterados em um mineral
verde e amarellado.
Como mostra o esboço junto, a matriz da rocha é de magnetite que, pela maior parte em
laminas muito finas, se extende em redor dos crystaes de perowskite de modo a
conservar os contornos crystallinos d'estes, mesmo quando estão completamente
alterados. Tres quartas partes dos crystaes de perowskite estão ainda bem conservados,
de côr vermelha-escura pardacenta, e de cerca de 2 millimetros em diametro. Têm dupla
refracção muito forte e, entre nicols cruzados, mostram côres de interferencia muito vivas,
fazendo lembrar as de brookite. Mostram tambem numerosas estrias de maclação, e não
raras vezes em luz polarizada convergente, a sahida obliqua de um eixo optico. A
clivagem conforme as faces do cubo é regularmente boa.
O producto de alteração que circumda os crystaes de perowskite é de côr verde
amarellada e em aspecto se assemelha ao leucoxenio, consiste em innumeros granulos
muito finos, de côr esverdeada e com forte dupla. refracção. As massas maiores de
magnetite mais puro, que se apresentam na rocha, tambem se acham cheias de crystaes
de perowskite alterados nas margens.
Pulverisando, peneirando e lavando, pode-se obter o perowskite, que facilmente se
separa da massa alterada, quasi puro e, pela fusão não muito prolongada em carbonato
de soda, pode-se purifical-o dos restos de magnetite e producto de alteração de modo a
verificar pela analyse qualitativa que o mineral é de facto puro titanato de cal, isto é,
perowskite.
N'uma solução de pó da rocha inteira, notou-se uma ligeira reacção de silica que,
seguramente, provem das pequenas veias de quartzo secundario que com a lente se vê
no magnetite.
Tambem a proporção de agua, determinada quantitativamente em 1.1 %, na rocha meia
decomposta, é demasiado pequena, tendo em vista a presença de limonite proveniente
da alteração do magnetite, para poder ser considerado como oxydo hydratado de
titaneo13 este producto de alteração do perowskite.
A questão da composição d'este producto de decomposição pôde ser resolvida pela
descoberta de fragmentos de magnetite de massas maiores, puras, em que a proporção
de perowskite ainda conservada era muito pequena, mas que apresentando a forma do
cubo e do octaedro, se mostraram claramente serem provenientes d'aquelle mineral.
Fundindo estas massas com bisulfato de potassa, obtive uma reacção fraca, porém
distincta, de acido silicico depois de dissolvido o producto da fusão em agua fria; fervendo
a solução, cahiu quasi todo o acido titanico sendo o resto precipitado com ammoniaco,
mostrando o precipitado traços de ferro. Este resultado estabelece claramente que o
producto da alteração do perowskite de Catalão é puro acido titanico, correspondendo
completamente ao producto de alteração, amarellado, pulverulento do ferro titanado,
como, por exemplo, em jacupiranga e Agua Suja, onde este producto tambem consiste de
pequenos grãos arredondados, amarellos, birefringentes, de acido titanico puro (anataz?).
Quanto á formação n'estas massas de rocha e perowskite na rocha matriz do magnetite
de Catalão, parece-me mais que provavel que estas, como as descriptas por Sauer de
Oberweisenthal, na Saxonia14, devem ser consideradas como segregações n'uma
magma eruptiva extremamente basica.
Em relação á genesis do magnetite, ha completa concordancia com os depositos de
Jacupiranga e Ipanema, sendo esta occorrencia de Goyaz o terceiro exemplo brazileiro do
grupo de depositos de minereo de ferro “Ekersund-Taberg” conforme a classificação de J.
H. L. Vogt15 do typo de «segregações de oxydos de ferro ricos em acido titanico.»
Uma analyse chimica feita pelo Dr. Dafert: sobre material relativamente puro, deu o
seguinte resultado:
H2O = 0. 29 %
O(directo) = 24.54 %
Fe = 62.14 %
Ti O2 = 11.27 %
Insoluvel = 2.29 %
__________
Somma = 99.70 %
Vê-se que o minereo é livre de acido phosphorico e, por este lado, muito apropriado ao
fabrico de ferro. O teor em titaneo, no qual se assemelha aos mineraes, parece não ser
demasiado elevado.
Combinando que fica uma parte de Fe O2 substituido pelo Ti O2 será a formula do
magnetito de Catalão (Fe3 O4) :
Determinado / Theoricamente
Fe = 71.30 % 72.41 %
O= 28.70 % 27.59 %
Terceira parte
Itacolumite e itabirite
Com o nome de itacolomite (da Serra de Itacolumi perto de Ouro Preto) é designada uma
rocha quartzosa, tendo como elemento accessorio lamellas de mica, intercallada entre
schistos crystallinos, sendo portanto da mesma idade que estes aos quaes passa por
graduações insensiveis. Achando-se o elemento micaceo substituido por ferro micaceo, o
itacolumite passa a itabirite (schisto de ferro micaceo) . Na Serra dos Pyreneus todas
estas transições podem ser observadas de modo
Calcareo
Como já foi dito, na parte da área demarcada para a nova Capital Federal predominam os
schistos paleozoicos entre os quaes se apresenta calcareo cinzento, compacto, que
corresponde em caracteres com o em
contrado no valle de São Francisco e referido pelo Prof. O. A. Derby á edade siluriana.
No Ribeirão do Sal, descobri um calcareo branco, compacto, semelhante ao marmore
com delgadas intercalações de schisto argilloso, que merece ser estudado relativamente
ao seu emprego para a fabricação de cal hydraulica.
O exame microscopico mostra entre as partes brancas calcareas numerosos crystaes de
um mineral monoclinico, incolor, que possue clivagem perfeita na direcção do eixo vertical
e mostra sobre as superficies da clivagem um ilustre de madre-perola, semelhante ao do
gesso. A dureza é entre 4 e 5.
Debaixo do microscopio, o mineral apresenta conforme a lei, secções hexagonaes e
rhombicas de grandes maclas, e plano de maclação; e orthopinacoide (100); o angulo de
extinção, com o eixo vertical é, no maximo, de 35º. É notavel a falta de clivagem distincta
pelas faces prismaticas, o que é muito caracteristico para o wollastonite. Conforme todos
estes caracteres, o mineral concorda melhor com o wollastonite, com o qual tambem
concorda a analyse dada adiante, admittindo um pequeno excesso de cal que, todavia, se
acha combinado com silica.
A occorrencia de wollastonite em calcareo parece indicar a acção de contacto de uma
rocha eruptiva e não é improvavel que haja n'esta localidade dikes de granito, bem que
nada de semelhante tenha sido observado.
A analyse quantitativa que devo ao collega Dr. F. W. Dafert é a seguinte:
H2 O (120º C.) = 0.11 %
CO2 = 36.27 %
CaO = 42.59 %
MgO = 3.42 %
Fe2O3 + A12 O 3 = 1.26 %
Si O2 etc. = 15.30 %
SO3 = traços
%
vertiges
Indeterminado:
C1, Alcabis = _
_____________________
Somma = = 98.95 0,1.
Quarta parte
Umas 24 léguas ao norte de Uberaba fica a cidade de Bagagem, celebre pela descoberta
do grande diamante conhecido pelo nome de «Estrella do Sul». Hoje em dia este deposito
(cascalho do rio do mesmo nome ) é completamente abandonado pelos trabalhadores ou
garimpeiros.
Quatro leguas ao sul d’esta cidade acha-se o pequeno arraial de «Agua Suja», onde um
grande deposito de cascalho sobre-jacente ao grés vermelho livre de fosseis, tem sido
lavrado com bom exito para diamantes desde 1867.
Não estando em trabalho as lavras de Bagagem e sabendo pelos recentes estudos do
meu collega Dr. Luiz Gonzaga, de Campos, que a lavra de Agua Suja, hoje propriedade
do Dr. A. Arena & C. e em plena exploração offerecia muitas particularidades
interessantes, dirigi-me para lá, onde, graças a amabilidade do Dr. Arena, pude, durante
onze dias, fazer um estudo bastante minucioso.
A estructura geologica da grande região campestre entre Uberaba e o Rio Paranahyba, é
relativamente simples, offerecendo os numerosos pequenos rios, que têm desnudado
esta planicie, excellentes córtes para o estudo d'esta estructura. Como base para o grez
ferruginoso, que forma estes campos, acha-se no fundo d’estes valles e sempre
altamente inclinado, um micaschisto, rico em mica branca, de côr cinzenta, quando não
alterado, ou de côr - avemelhada, quando decomposto.
Este schisto contém innumeros lenticulos de quartzo compacto e filões de quartzo rico em
turmalinas.
Immediatamente sobre o micaschisto, jaz o grez molle facilmente alteravel, em geral
reduzido a uma immensa camada de arêa um tanto argillosa. As camadas, pelo menos
nos poucos logares onde a rocha é bastante conservada para permittir observações, são
sempre em posição horizontal.
Não tendo-se encontrado fosseis n'este grez, a sua idade geologica é duvidosa,
parecendo porém ser mais recente do que a idade carbonifera.
Em alguns logares como em Cassú, perto de Uberaba, e em Ponte-Nova, sobre o rio das
Velhas, encontram-se sobre os micaschistos camadas effusivas de muitos metros de
espessura de uma rocha preta eruptiva, a augite-porphyrite, conhecida no paiz pelo nome
improprio de «pedra de ferro.» Esta rocha, pela decomposição, fornece a afamada «terra
roxa». Nos córtes da estrada de ferro entre Franca e Uberaba, vê-se esta rocha eruptiva
associada como grez de modo a mostrar que é contemporanea ou posterior em idade a
este.
O terreno acha-se, em quasi toda a parte, coberto de cascalho de seixos rolados, ora
livres, ora cimentados por limonite ou quartzo, formando a canga um verdadeiro
conglomerado de pouca idade geologica.
Naturalmente, cascalho e canga variam de caracter conforme á rocha sub-jacente da qual
se derivam. Sendo esta micaschisto, são ricos em seixos de quartzo, ao passo que
sobrepostos a rocha eruptiva basica acima mencionada, são ricos em seixos d'esta
mesma rocha e de magnetite.
Identica constituição geologica encontra-se em Agua Suja, onde o corrego d’este nome
corre sobre as margens levantadas das camadas de micaschisto, que se apresentam sob
possantes massas de grés molle, colorido em amarello ou vermelho por oxydo de ferro, e
este, por sua vez, é coberto por uma camada de cascalho diamantifero.
O cascalho, como se vê bem nas lavras ultimamente abertas, é disposto em camadas
horizontaes de mais de 12 metros de espessura. e, pela côr, granulação e composição,
pode ser dividido em quatro grupos.
A camada inferior, e mais possante, jaz immediatamente sobre o grez (chamado pizarra
pelos garimpeiros) e é conhecida pelo nome de Tauá. Sendo o cascalho deposito formado
sob a agua, é facil comprehender que esta camada seja a mais rica em grandes blocos de
pedra e em diamantes, isto é, das partes mais pesadas do material rochoso transportado
pela agua e por ella depositado em outro logar. Por este motivo, o tauá offerece um
aspecto particular: grandes blocos, mais ou menos rolados de cerca de 4 e 5 decimetros
de diametro, de varias qualidades de rocha, acham-se encerrados, como amendoas em
um bôlo, em areia fina, que contem em grande abundancia pedaços arredondados que,
quando muito, attingem o tamanho do punho, de augite-porphyrite, conhecida entre os
mineiros pelo nome de bolas.
Os grandes blocos de tauá são de varias côres e consistem de muscovite-granito, rica em
turmalinas, branco e decomposto, de blócos de augite-porphyrite, decomposta, de
micaschisto preto ou cinzento, de grez molle amarellado, etc.
É de grande interesse o facto de serem os diamantes encontrados somente na areia fina.
rica em «bolas» de augite-porphyrite do cimento do tauá.
Na occasião da minha visita, a lavra era trabalhada sómente no tauá, que apresentava a
espessura de 12mms.00. Como fundo da batéa ou residuo pesado da lavagem,
encontram-se junto com os diamantes, que são quasi exclusivamente de primeira agua,
porém infelizmente de dimensões relativamente pequenas, os seguintes mineraes:
staurolitha, rutilo, turmalina. ilmenita, granadas dodecaedricas incluindo grãosinhos de
quartzo, pseudomorphoses de (anatasio?), seixos de grez e de uma rocha semelhante ao
itacolumito e fragmentos de schisto micaceo; todos estes elementos, entretanto. muito
mais raros do que os minereos de ferro, aqui altamente predominantes, -magnetite e uma
rocha de magnetite, pyrite com o respectivo producto de alteração - limonite e granadas
cubicas. Além disso, são dignos de nota os seixos de augite-porphyrite, e os de
calcedonia com opala leitosa até o tamanho de um punho, que, frequentemente
concorrem com as rochas eruptivas citadas.
A pyrite encontra-se em cubos bastante rolados tendo até 2 centimetros de comprimento,
completamente transformada em limonite, que se apresenta nos seixos de côr negra
muito brilhante.
A magnetite, até na proporção de 30-40%, apresenta-se também em octaedros perfeitos,
cujas faces apresentam as impressões que mostram a sua lei de crescimento, segundo a
macla da spinella. São aqui muito mais raras as favas semelhantes ao jaspe.
DO PLANALTO CENTRAL DO BRAZIL......................................................................................313
Commissão Exploradora do Planalto Central do Brasil
Do mais alto interesse mineralogico são: 1º, os seixos da rocha ele magnetite que deve,
todavia, encontrar-se nas proximidades de Agua-Suja, e foi alterada pela acção das
correntes, productoras do cascalho; 2º, os abundantes e bellos crystaes cubicos de
granada, sem inclusão alguma.
Rocha de magnetite. -Occorre em grandes seixos muito rolados, ora de pura magnetite,
ora permeiados de um mineral crystallisado, decomposto, de côr verde-amarellada, ora,
emfim, totalmente compostos d'este mineral, apenas atravessado por tenues veias de
magnetita.
O mineral incluido na magnetite é sempre poroso; em laminas finas, é opaco; segundo
analyse chimica qualitativa é oxydo titanico, quasi puro com traços de ferro e cal. Em
superficies recem cortadas e polidas, vê-se a magnetite travada pelo mineral de titanio,
que mostra formas crystallinas, bem delimitadas-triangulos equilateros, quadrados,
rhombos, e hexagonos mais ou menos deformados: d'ahi a deducção para a forma
octaedrica.
Em laminas extremamente finas aliás difficil de obter, o mineral de titanio apparece ao
microscopio como já se mostrava apenas translucido, de côr amarellada. totalmente
alterado, com polarisação de aggregado, como se fôra composto de pequenos grãos ou
pyramides birefringentes, produzindo a alteração uma substancia disposta em veias e
filamentos.
Como mostra a investigação da rocha de magnetite e perowskite achada perto de
Catalão, o mineral octaedrico da magnetite de Agua-Suja concorda completamente com a
perowskite ou antes com o seu producto de alteração (T1 02). Uma noticia mais detalhada
a respeito será dada na parte III desta noticia na descripção da magnetite de Catalão.
Como demonstram a analyse chimica qualitativa e os ensaios feitos com o maçarico, a
granada cubica é um verdadeiro pyropo.
Com o borax, dá reacção facil e franca de chromo. Pela côr assemelha- se ás granadas
com inclusões de quartzo, que concorrem no mesmo cascalho, crystallisadas em
dodecaedros e ikositetraedros e são coradas de vermelho-sangue - escuro. Entretanto, ao
maçarico apenas derrete se nas quinas, e com o carbonato de soda só difficilmente funde.
Tratada ao maçarico, não perde a côr; apenas torna-se de um vermelho violaceo.
A densidade deste pyropo foi determinada com o apparelho de Klaproth para 3.693. -0
tamanho dos crystaes varia de um millimetro até 6, no maximo; aliás, os pequenos
crystaes de 1-2 millimetros são sempre os mais bem formados.
O que ha mais interessante, na occorrencia d'estes crystaes, sempre indecompostos e
sem inclusões, é a forma simples do cubo, que só raras vezes apparece combinada com
faces de octaedro.
As arestas são sempre bem vivas e as faces sempre arredondadas e cobertas de
numerosas saliencias mamillares; apenas os crystaes maiores estão um pouco rolados.
Ao microscopio, entre nicols cruzados, comportam-se como crystaes de pyropo, sempre
totalmente isotropos. É, certamente, do maior interesse encontrar agora em abundancia e,
sem a menor duvida, a forma cubica que já Mohs havia indicado nos pyropos da
Bohemia, que Dana considera muito rara e que Des Cloizeaux cita como possivel em seu
manual: em todo o caso, até hoje, é materia de duvidas.
Finalmente, devemos ainda mencionar no cascalho de Agua Suja, bem que elemento um
tanto raro e apenas observavel nas areias muito finas, crystaesinhos de zirconia, brancos
e um tanto rolados.
Um unico crystal de rubim corindon vermelho nobre foi achado pelo Dr. Luiz Gonzaga de
Campos.
No tocante aos diamantes da região de Bagagem (cidade da Bagagem, Agua Suja, Rio
Bagagem, Douradinho, etc.) posso dizer que, tendo examinado um grande numero de
Parece me, pois, que em Agua-Suja todas as condições são favoraveis para um notavel
desenvolvimento da mineração de diamantes, contrastando assim com a Bagagem, logar
da descoberta da famosa «Estrella do Sul» onde hoje o trabalho está parado, visto que o
cascalho, que se apresenta nos barrancos do rio do mesmo nome já se acha lavado.
Resta agora a questão de origem e da verdadeira rocha matriz do diamante n'estas
paragens.
Os estudos de Derby e Gorceix na região diamantifera da Serra do Espinhaço, em Minas
Oriental, têm mostrado que os casos conhecidos de diamantes encaixados em rocha,
quer seja a canga das lavras do rio, quer as celebres amostras da Serra do Grão-Mogol,
nas quaes a gemma se encontra em quartzito (itacolumite) representam formações
secundarias, em que o diamante, como os outros elementos da rocha, provém de outras
formações mais antigas. Ambos esses autores julgam ter encontrado a verdadeira matriz
do diamante nos filões decompostos que, em São João da Chapada, são intercalados em
schistos micaceos, pertencentes a uma formação geologica mais antiga do que o
quartzito diamantifero do Grão-Mogol.
Este modo de occorrencia se afasta notavelmento do verificado na região diamantifera do
Cabo da Boa Esperança, onde o corpo diamantifero é claramente de origem eruptiva
pertencendo a rocha matriz á classe dos peridotitos.
Ora, ha em Agua-Suja certas circumstancias que fazem presumir que o modo de
origem n'esta região tem mais analogia com o africano que com o da região de
Diamantina.
Estas circumstancias são: a falta ou raridade de muitas das «formações», ou
satellites do diamante, que são caracteristicas das lavras de Diamantina; a presença de
outras, que, como a granada pyrope, são caracteristicas das lavras do Cabo, porém raras
ou ausentes nas de Diamantina, e que, de certo modo, indicam rochas eruptivas. A
grande abundancia e caracter especial dos seixos de magnetite egualmente indicam
proveniencia de uma rocha eruptiva altamente basica e portanto aparentada com o
peridotito do Cabo .
Por outra parte, porém, a presença no tauá de abundantes fragmentos de micaschisto e
granito prova que duas formações, aliás já conhecidas na visinhança, têm fornecido
elementos ao cascalho de Agua-Suja, e, emquanto não apparecerem provas em
contrario, é admissivel que qualquer uma das duas tenha fornecido tambem os
diamantes.
Indicam-se tambem como diamantiferos o Rio das Velhas, perto de Ponte Nova e o
Paranahyba, no porto Mão de Pau.
Tive occasião de verificar que a «formação», isto é, os mineraes pesados, que, n'aquelle
logar, se accumulam no fundo da batéa, ao proceder-se à lavagem, são identicos aos que
em todas as lavras brazileiras acompanham o diamante.
Trabalhos de mineração em rios tão grandes seriam, porém, muito difficeis e,
provavelmente, pouco remunerativos.
Ordem dos Morcegos Chiroptera. -Não podemos citar n'esta ordem, senão por
informações, a existencia do vampiro (Phillostoma Spectrum?), e, nem tão pouco,
especificar individuos do grande grupo dos noctilionides , pois não tinhamos em vista
escrever esta noticia.
Ordem dos Carnivoros (Carnivora). - Entre os felida, a onça pintada e a preta ou tigre,
variedades conhecidas na mamilogia pelo nome de felis onça, são vistas em diversos
pontos como nos Arrependidos, Vão do Paranan, Vão dos Angicos, etc.
São rarissimas as pretas e pouco communs as pintadas. o que não se dá com a onça
vermelha ou suçuarana (Felis Concolor) e o gato jaguaritica. nome que dão no logar ao
felis macrura dos naturalistas, sendo mesmo este muito espalhado em todo o planalto. O
gato vermelho (Felis Eyra), se bem que pouco commum, existe tambem assim como o
mourisco (Felis Jaguarundi). Esta ultima especie é rara em todo o Brazil e a penultima
pouco vulgar. Ainda é conhecida outra variedade do felis concolor que tem entre os
habitantes o nome de-onça vermelha de lombo preto-e dizem ser de grande ferocidade. É
rara esta especie.
O lobo (Canis Jubatus), e a raposa ( Canis Vetulus) são da familia canida, os habitantes
dos campos, e a irára (Gallictis Barbara) o dos cerrados e florestas.
A lontra (Lutra Solitaria) e a ariranha (L. Brasiliensis) são encontradas nos rios. Estes
animaes são muito perseguidos pelos caçadores que têm em alto valor a pelle pela
impermeabilidade que offerece á Agua, o que a torna muito propria para capas de
espingarda, bolças, etc. É esta pelle tambem muito procurada pelos negociantes
exportadores, devido talvez ao frouxel expesso e de bella côr, que se acha sob os pellos
grossos.
A jaratataca, cangambá ou maritataca (Mephites Suffocans ) e o guaxinim (Procion
Crancrivorus) tivemos occasião de vêr nos campos.
O coati de bando (Nasua socialis) e tambem o quati mundeu (N. Solitaris) habitam as
mattas.
Ordem dos Roedores (Rodentia). -A caelogenis paca (paca), o lepus brasiliensis
(coelho do matto), a cavea aperea (preá), a dasypocrata aguti (cotia) , a histrix insidiosa
(ouriço caxeiro) são habitantes das florestas.
Todos estes roedores são caças muito apreciadas no logar, assim como a capivara
(hydrocherus capybara) gigante roedor que é muito commum na lagôa Feia, Rio Preto,
Samambaia e outros pontos.
Ordem dos Ongulados Ungulata – Entre os ruminantes, a especie conhecida pelo nome
de-cervo ou veado grande galheiro (Cervus Paludosus) vive nas proximidades das
florestas que margeam os rios e alagados. Não é commum, devido á perseguição que
soffre por causa de sua bella armação, cujos esgalhos vão, com o correr dos annos,
augmentando em numero e dimensões. Nos campos, apresentam-se em bandos de
dezenas o elegante cereus campestris (çuçuapara dos indios e-campeira-dos Brazileiros)
ostentando seus pequenos e bellos galhos. O veado vermelho ou catingueiro (Cervus
Nemorivagus) se encontra nos chapadões e cerrados, e, nas florestas, o veado branco,
pardo ou mateiro (Cervus Rufus).
Entre os pachydermes, o queixada dos Brazileiros Dicotyles labiatus de Lineu, vive aos
bandos nas florestas, assim como, de preferencia, nos cerrados e grutas, o caititú ( D.
Torquatus). A anta (Tapirus americanus), o maior representante hodierno da fauna sul-
americana, nas margens dos ribeirões e ribeiros.
Tendo este animal uma pelle de espessura talvez superior a todas as outras conhecidas
no Brazil, e de uma grande resistencia, soffre uma guerra de morte em todos os logares.
Os arreios de montaria, rebenques, etc., feitos de tal pelle são os mais procurados. D'ahi
o ser ella já muito pouco frequente.
Ordem dos Desdentados (Edentata). -Dos desdentados sul-americanos, o futuro Districto
Federal tem quasi todos os representantes; da preguiça da especie bradipus tridactilus,
tivemos occasião de ver uma pelle e me affirmaram a existencia da preguiça de colleira
(Bradipus torquatus ). O tatu canastra dos
Goyanos, tatú açú dos indios e dasypus gigas de Cuvier, o tatú verdadeiro ( D. Gilvipes) ,
o tatú péba ou papa defuntos ( D. Setosus ) e o tatú bola ( D. Conurus ) moram nos
chapadões e, em numero bastante crescido, o verdadeiro e o peba.
A caça aos tatús é feita na época do inverno de modo bastante singular. O frio que faz
durante a noite os obriga a permanecerem nos seus esconderijos. Porém ao nascer do
sol, elles os deixam e saem pelos chapadões á caça de vermes e insectos de que se
nutrem. Nesta occasião, os caçadores (alguns armados apenas de cacete), saem á sua
procura e com facilidade os apanham.
O tamanduá bandeira (Myrmecophaga Jubata) e o tamanduá pequeno ( M. Tetradactyla)
existem nos campos e cerrados. O tamanduá bandeira é muito perseguido, devido
simplesmente á frocada cauda que os habitantes do logar empregam em substituição aos
espanadores, pois não aproveitam a carne. A facilidade que ha em caçal-o (não trepa e
mais ainda não corre de modo a poder escapar ao inimigo) tem tornado já bastante raro
este curioso e utilissimo animal destruidor dos termites e das formigas.
Ordem dos Marsupiaes (Marsupialia) -Nesta ordem podemos citar o cassaco ou gambá
dos Goyanos (Didelphis Surita), e nos affirmaram a existencia da cuica ( D. Cuica ?).
Como objecto digno de nota, foi offerecida ao Dr. Cruls, chefe da Commissão, uma pelle
de Cuica d'agua, bello marsupial, hoje raro em todos os Estados do Brazil, o chironectes
palmatus dos zoologos.
Os estreitos limites deste trabalho que ainda resente-se da falta de pesquizas e
indagações, motivada por causas superiores, nos levam a apontar ( como já o fizemos na
parte relativa a mamalogia) somente as especies ornithologicas que, por assim dizer, não
passam desapercebidas aos viajantes de taes paragens, mais despreoccupados com o
conhecimento da fauna.
Ordem das Aves de rapina ( Rapacae).-Os abutres (Vulturidae ) são representados em
todas as regiões pelo urubú commum (Cathartes Foetens) especialmente, nos campos,
pelo urubú de cabeça lisa (C. Braziliensis), e nas florestas e cerrados, pelo urubú rei (C.
Papa ). Esta ultima especie é bastante rara.
Entre os gaviões (Falconidae), o caracará ( Falco Brasiliensis) o gavião ordinario (Falco
Sparverius?), o gavião pequeno (Nisus Striatus). É mais raro a chamada «aguia» (Falco
Destructor) pelos Goyanos e um pouco mais commum o acauan (Herpetotheres
Cachimans).
A familia Strigidae (corujas, caborés) é representada por algumas especies do genero
Athene e outros, sendo commum nos campos o Caboré ordinario (Syrnium Hylophilum?).
Ordem das Aves trepadoras (Scansorae). - Notámos entre as especies da fam.
Psittacidae (papagaios) a arara azul (Macrocercus Ararauna) que nidifica nos burityzaes
em Arrependidos e outros logares; o papagaio commum (Androglossa Aestiva), e, como
notaveis pela frequencia, em bandos bastante crescidos ás vezes, o periquito verde de
encontros amarellos (Conurus Xantopterus), o de testa amarella (C. Canicularis), e o
periquito tuin, tambem chamado miudo, caturrita e de vassoura (Pittacula passerina).
Da familia Ramphastidae (tucanos), vimos o tucano grande de papo branco (Ramphastus
Taco) nos, cerrados e mesmo nos laranjaes, proximo a habitação da fazenda Cipó de
Cima, no Vão do Paranan, e o chamado araçary (Pteraglossus Beauharnaisi).
Entre os Picapaus (Picidae) temos, nas florestas, o picapau de cabeça vermelha
(Campophilus robustus); nos cerrados, o picapau amarello (Colaptes Campestris), e nos
campos o picapau branco (Coeleus flavicans).
Da familia Cuculidae (anuns ou anús) o anum preto (Crotophaga Anú) vive nos campos e
em companhia dos animaes de que arranca, para nutrir-se, os carrapatos que lhes estão
agarrados á pelle, e o anum branco ou piló (Guira Piririgua) que prefere os lugares
pantanosos.
de admirar como naquelle Estado ainda se encontra tão crescido numero de taes seres.
Na qualidade de amador demos, ha tempos, começo a uma collecção de coleopteros, e
procurámos, desde que iniciámos a nossa viagem para o Planalto, apanhar os
exemplares que o acaso desse logar a encontrarmos; portanto, nenhuma caçada regular
fizemos absolutamente. A principio, a nossa colheita limitava-se a alguns gorgulhos e
estercoreiros ; mas, logo depois começaram as chuvas, appareceram os coleopteros em
grande numero assim como as borboletas e insectos de outras ordens até então
representadas muito escassamente.
Ordem dos Coleopteros. – D’entre os carnivoros, encontrámos além de alguns pequenos
exemplares dos generos Odontacheila, Agra e Scarite, uma especie do genero Tetracha,
bonita cicindelida azul de 18 millimetros de comprimento e 6 de largura, dando caça aos
termites nos chapadões.
Nos corregos e ribeiros nos foi facil apanhar, da familia gyrinidae, urna das especies do
genero enhydrus a que vulgarmente dão o nome de – tartaruguinha.
A especie mais notavel de staphilindae que encontramos, era de 20 millimetros de
comprimento e 5 de largura; de um avelludado côr de bronze com reflexos dourados.
Individuos solitarios de tal especie eram vistas correndo pelas estradas.
Entre os dermestidae, somente nos foi dado ver o dermeste museorum, insecto muito
conhecido pelo estrago que suas larvas fazem nas pelles.
Da familia malacodermidae, encontrámos diversas especies do genero lucernuta
(pyrilampos ou vagalumes), entre os quaes o lucernuta savignyi o pyrilampo da matta. e
mais representantes de outros generos.
Os pyrophorus noctilicus são, d'entre os elateridae, os que apparecem em grande
quantidade nas cidades e campos onde os chamam tambem de – vagalumes – devido, a
luz que emittem dos dous pontos que se acham nas extremidades de seu protothorax.
Na familia buprestidae não é muito raro encontrar-se o decantado euchroma gigante,
insecto de grandes dimensões chamado popularmente – olho, de sol ou olho de boi –
devido a dous grandes circulos reluzentes que tem na parte superior do protothorax.
Entre os scarabeus (scarabaeidae), era extraordinaria a quantidade que encontravamos
de diversas especies dos generos gymnetis, antichira, geniates, enema e megalosoma,
entre os quaes o enema infundibulus, chamado vulgarmente – torquez –, por ter na
cabeça um longo corno recurvado para traz que, á vontade do insecto, se move e se une
a outro fixo que se acha no protothorax ;e o hector, genero megalosoma, com o
comprimento de 7 centimetros sobre 4 de largura, conhecido vulgarmente pelo nome – de
forquilha – devido este nome ao appendice corneo que tem o macho na cabeça, e que
termina em duas pontas.
Na sub-familia dos coprophagos (estercoreiros), é extraordinario o numero dos phanaeus
que se encontra pela estrada nas dejecções dos animaes. – O virabosta de chifre
(Phanaeus ensifer), grande estercoreiro verde que tem na cabeça um longo apendice de
3 centimetros de comprimento, e o phanaeus minas, coprophago menor e da mesma côr
tendo douradas as bordas do protothorax. Os chamados - virabosta preto (genero Copris)
são tambem encontrados em quantidade numerosa, como o canthon prasinus, pequeno
estercoreiro de côr verde. – Os copris são atrahidos pela luz de modo que é frequente
muitos d'elles apparecerem no interior das casas onde estão lampadas acesas.
Entre as cantharidas (meloe), além de outras especies menos communs, encontra-se em
bandos de centenas a chamada – antinha, pelos Goyanos, que é cinzenta e salpicada de
pontos pretos.
Dos tenebrionidae, encontrámos especies dos generos Zophobas, Camaria, Strongilium e
Scotinus, entre os quaes o cascudo aranha (scotinus gramicus ?).
Entre os da familia curculionidae (gorgulhos), vimos, além do pequeno gorgulho destruidor
dos cereaes (Rhynchaphorus granaria), e do grande gorgulho das palmeiras (R.
Palmarum), grande numero de outras especies que se distinguem já pelo brilho de suas
côres, já pela forma.
O careta, lindo cyphus em cujos elytros sobre um fundo azul descobre-se, em dous
pontos e traços negros, a forma de uma carranca, lindos cêntrimos pretos reluzentes,
tendo uns o protothorax encarnado e outros preto, etc., são especies de gorgulhos muito
conhecidas em Goyaz.
Dos longicornios, são encontrados: o arlequim tambem chamado – serra. (Acrocinus
longimanus) cujas dimensões do par de patas do protothorax é o dobro do seu
comprimento no macho que, ás vezes, excede de 7 centimetros, e maior ainda são as
antennas; o dentista (Mallodon spinibarbi) , nome que é devido ás fortes mandibulas de
que é dotado e que lembra um dos instrumentos de extrair dentes; o testa de lã
(Drocacerus Barbatus), cuja cabeça é coberta por uma espessa camada de pello
amarello; o cinta amarella ou guarda de cinturão (Trachideres Succinctus) insecto côr de
café tendo no meio dos elytros uma facha amarella dividindo-os transversalmente, e
muitas outras especies cuja citação este trabalho não comporta.
Entre as chysomelinas, era numerosa a quantidade dos cascudos de enfeite, reluzentes
enmolpus cujo reflexo varia desde o verde até a côr de rubim, tendo uns o protothorax
azul e outros verde; a calligrapha polyspila conhecida pelo nome de – oncinha das folhas,
e que é de côr amarella com reflexos dourados e salpicada de preto, de modo a lembrar
uma pelle de onça pintada; o batonota cujos elytros formam uma longa ponta em meio do
dorso; e ainda na tribu cassidinae, além de muitas outras especies, torna-se notavel pelo
numero crescido em que ás vezes se encontra em grupos, o tatusinho, paecilaspis, cujos
elytros pretos têm no sentido transversal quatro ordens de pontos contendo a primeira e
quarta deus, a segunda quatro e a terceira seis pontos de um amarello alaranjado.
Da familia erotyliannae encontrámos representantes dos generos ischirus, aegitus,
omoplata, zonarius e brachysphaenus; assim como do genero adonia, familia das
coccinellidas.
Diversas outras ordens de insectos. – Teriamos acima feito ponto final nestas linhas em
vista de não permittir esta resumida noticia mais extensão, e ainda devido á nossa citada
falta de observações, se não fossemos como que obrigados a fazer ligeira referencia a
outros representantes entomologicos, visto como todo viajante de taes regiões, nota a
existencia delles, e, de alguns, conserva a mais duradoura lembrança.
Entre os orthopteros nota-se diversas especies de phasmas (phasmidae), insectos
conhecidos vulgarmente pelos nomes de-Põe-mesa, garrancho e Louva-Deus, diversas
de gafanhotos (acridiodae), e de grillos (grillidae).
Na ordem dos hemipteros, são communs os persevejos do matto, dos quaes algumas
especies sugam o sangue de diversos animaes e até do proprio homem.
Os cupins (termites) são nevropteros largamente espalhados no planalto e principalmente
os termes cummulans que são os constructores das casas que se encontram nos campos
affectando a forma de pequenos montes, e o cupim ordinario (Termes Devastans).
Dos Lepidopteros são encontrados, ás vezes formando grandes grupos nas margens dos
rios, diversas especies de papilionides e nymphalideus, entre as quaes a borboleta
amarella, tryte e cypris do genero Leachiana, a catagramma astarte, chamada
vulgarmente oitenta e oito, etc. Ainda são communs nas florestas e campos diversas
outras especies, irão só do grupo das diurnas como do das nocturnas.
Na ordem dos hymenopteros encontram-se diversas abelhas (apidae) do genero trigona e
mellipona, diversas especies de maribondos ou inchús (Vespa), e de formigas (Formica),
entre as quaes se acha a formiga de roça (Atta Cephalotes).
Os mosquitos tanto do genero culex como do simularia e as motucas (Tabanus) são, além
de multas outras especies, os representantes dos dipteros.
D’entre os Arachnideos encontra se, além do grande numero de especies dos generos
acrosoma e phalangidae, a migale Blondü, aranha caranguejeira, e entre os scorpionidae,
o lacrau (scorpio americanus).
Entre os crystapteros (carrapatos) além de outras especies, é crescido o numero dos
carrapatos grandes (Ixodes americanus), e verdadeiramente espantosa a quantidade do
Carrapato pequeno (I. Crenatus).
CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE.
DO PLANALTO CENTRAL DO BRASIL.......................................................................................329
ANNEXO VI
RELATORIO DO DR. ERNESTO ULE
BOTANICO DA COMMISSÃO
ANNEXO VI
Em seguida á “Noticia botanica” do meu Relatorio Parcial do anno proximo passado
esforçar-me-hei agora em offerecer dados mais completos, conquanto lamente que o
citado trabalho tenha sahido tão defeituoso, devido a muitos lapsos da revisão.
Tambem para a presente memoria conto com a indulgencia do leitor, lembrando-lhe que
trabalhos physiologicos e systematicos, para serem correctos, só se pódem executar
mediante prolongados estudos, e mesmo que, a varios respeitos, não são realisaveis sem
o concurso dos especialistas da Europa. E' ahi que nos principaes centros da sciencia se
acham accumulados abundantes herbarios e extenso material litterario, e são numerosas
as autoridades para questões ainda envolvidas em duvidas, emquanto no Brazil a
botanica ainda se acha na sua infancia. Entretanto, quando se trata do livre estudo da
natureza, achamo -nos aqui no Brazil em ponto de observavação mais favoravel, havendo
muitos casos susceptiveis de serem corrigidos e ampliados, e sem duvida se nos offerece
campo vasto de actividade, pois mesmo a respeito das mais importantes madeiras de lei e
plantas industriaes apenas ainda sahimos das trevas.
Para exemplificar, lembro que na «Flora Brasiliensis» se acham referidas quatro especies
de cedro (Cedrela) com indicação das localidades, ao passo que a respeito da localisação
e extensão dessa importante madeira, e das qualidades das diversas especies ha
completa falta de informações. Encarando eu neste sentido a minha presente tarefa,
applicar-me-hei especialmente á geographia botanica, especialidade que vos fornece
informações sobre a distribuição, e particulariedades da vegetação, e sobre a climatologia
das respectivas regiões.
Dispensado me julgo aqui dos detalhes meteorologicos e geologicos, que na verdade
pertencem á descripção de regiões de vegetação, mas serão dados com maior
especificação, aquelles pelo Dr. Pimentel, estes pelo Dr. Hussack, nos seus respectivos
Relatorios. Sobre plantas uteis nada mais accrescento, visto que na primeira viagem não
me sobrou o tempo necessario para colligir material sufficientemente extenso para
alcançar resultados especiaes. Tão pouco está ainda completa a lista das especies; além
disto, não me tendo sido possivel determinar as cryptogamas inferiores, recorri a
especialistas da Europa, os quaes ainda não me remetteram o resultado dos seus
exames.
Extende-se de fins de junho de 1892 ao começo de Fevereiro de 1893 o tempo das
explorações das regiões dos estados de Minas Geraes e de Goyaz especialmente, e foi
elle ao todo pouco favoravel, por haver secca nos primeiros mezes, á qual succedeu a
estação chuvosa, em que muitas plantas não desenvolvem senão suas partes
vegetativas: só no termo da viagem encontrei condições melhores. Percorri região
comparativamente bastante, vasta, que abrange acima de 2.000 kilometros, junto a
Commissão reunida fui primeiro a Meia-Ponte, d'ahi atravessando, com a turma do Dr.
Cruls, a continuação da Serra dos Pyreneus, alcancei Formosa. Alli fiz parte da pequena
expedição mandada ao norte para – não longe de Cavalcante – explorar as «Chapadas
dos Veadeiros», e voltei a Meia-Ponte passando por S. José do Tocantins e Trahiras. Em
Meia-Ponte fiquei ainda dous mezes, tanto por ser impraticavel a mudança para um dos
acampamentos, como por ser a mais promettedora possivel para explorações botanicas a
localidade com sua proximidade á Serra dos Pyreneus.
Por fim, fui com a turma do Dr. Morize para Goyaz, onde fiquei ainda mais de um mez,
visitando neste espaço de tempo São José de Mossammedes e a Serra Dourada.
Diversos botanicos têm me precedido em viagens por Goyaz e alguns, não somente
gosando de condições mais favoraveis, como tambem demorando-se mais tempo: cito
Saint-Hilaire, Burchell, Gardner, Weddell, Pohl, dos quaes o ultimo, sobretudo, reunio
extensas collecções e explorou detalhadamente as cercanias da cidade de Goyaz.
Entretanto, desta vasta região muitas locallidades deixaram de ser exploradas, ou o foram
em estação diversa, como parece ter se dado com a região entre Formosa e Cavalcante,
pois os botanicos que visitaram esta banda ahi penetraram passando por Trahiras e São
José, caminho que offerece menor interesse. Além d'isso, poucos foram os que deram
especial attenção ás Cryptogamas, das quaes eu trouxe Fetos, Musgos e Cogumelos; de
modo que o resultado da minha viagem não deixará de contribuir algum tanto para o
conhecimento do interior do Brazil. Sempre que me foi possivel, observei a vegetação das
regiões percorridas, e consegui trazer collecção de plantas seccas consistindo de 450
numeros de Phanerogamas e 310 numeros de Cryptogamas.
Para dar idéa geral e clara sobre o papel que cabe á Flora de Goyaz, e especialmente a
que occupa a região do Planalto, devo mencionar que os autores da geographia botanica
têm repartido a vegetação da terra em diversos «Reinos da Flora», e quer uns, com
Shouw, admittam 25 d'esses reinos, ou outros até 61, segundo G. Bentham. ou 51,
segundo Martius, todos elles concordam em attribuir ao Brazil um unico reino da flora, ou
varios, mas coherentes. Siga mos Martius, o insigne autor da «Flora Brasiliensis», o qual,
de facto, adopta um unico reino da flora brazileira que sómente ao noroeste e ao sul um
tanto ultrapassa os limites politicos do paiz: facto demonstrativo de que o Brazil fórma um
paiz de natureza
são para Goyaz, e algumas especies, como por exemplo, Mauritia armata Mart, Tococa,
mostram derivar-se d'ahi.
Procederei no que segue abaixo, á desdescripção das formações isto é, das
congregações de plantas como se apresentam em cada flora, e cujos multiplos esboços
nos fornecem o quadro da vegetação do nosso globo.
Chapadas ou Campos
A maior parte da região que percorri pertence a uma unica formação, isto é, á flora das
chapadas, da qual, posto que designada com a denominação geral de flora dos campos,
ha multiplas variações. O termo de “campos” (campo vero), no sentido restricto, significa
terrenos planos onde predomina a vegetação graminea, como os ha no sul do Brazil, e,
em posições mais elevadas, em Minas Geraes, e cá e lá, em Goyaz. Os planaltos
abaulados de que se trata aqui estão em geral cobertos de selvas, de arbustos
definhados, brenhas e hervas, alternando com trechos onde predominam as gramineas :
distincção que dá logar ás denominações de “taboleiros cobertos” e “taboleiros
descobertos”. Estes ultimos occorrem mais frequentemente na parte por mim percorrida
de Minas Geraes, aquelles mais em Goyaz. Os planos (planuras) com vegetação
arborescente e arbustea tambem são denominados “cerrados” : esses formam sobretudo
o typo caracteristico da região.
Arvores mediocres com galhos nodosos e casca rachada ou cortiçosa, acham-se em
grupos soltos, ou isolados, dispersas por sobre vastas superficies; ha ainda arbustos
isolados e brenhas de plantas arbustivas.
Cá e lá alguma palmeira anã, – cocos – de um a dous metros de altura, sobrepujam entre
soqueiras de Gramineas; palmeiras rasteiras e tambem grupos de Bromeliaceas
terrestres, tudo semelha um pomar abandonado que tornou ao estado selvagem. De
longe, dão a illusão de florestas, de perto apresentam sómente um arvoredo escasso.
Nem protege este ao viajor contra os ardentes raios solares, a não ser que, de vez em
quando, elle descubra alguma arvore mais robusta que lhe preste sombra para descanso.
A composição da vegetação differe totalmente das florestas ou da flora das formações
arbustivas da costa ou das serras do resto do Brazil; todavia, nas baixadas e suas
florestas se acham muitas plantas communs a todos os outros Estados.
Posto que entre as plantas lenhosas se encontrem aqui representadas grande numero de
familias, comtudo as diversas especies acham-se de preferencia em grupos isolados, e
menos misturados do que no matto virgem. Além, das Leguminosas e Bignoniaceas com
folhagem partida, predominam sobretudo arvores com folhas integras, coriaceas.
Multiplos representantes possue a familia das Leguminosas, como por exemplo: 99
Stryphnodendron Barbatimão, Mart.; 88 Pterodon abruptus, Benth.; Copaifera; e mais as
Apocyneas: 82 Aspidosperma tomentosum, Mart.; 464 Strychnos Pseodoquina, St. Hil.;
205, Hancornia speciosa, Mull. Arg:, a qual fornece borracha de qualidade inferior e dá
saborosos fructos; Plumeria drastica empregada como purgante; Anonaceas: 214 Xilopia
e outras; Erythroxylaceas, Vochysiaceas, Salvertia, com paniculas de quasi um metro de
comprido, 325 e 326 Qualea; Myrtaceas. Malpighiaceas: sobretudo Byrsonima. Outras,
arvores mais distinctas de familias aqui menos frequentes são: 160 Simaruba versicolor,
St. Hil.; 165 Couepia ovalifolia, Benth.; 330 Matayaba guyanisis, Aubl.; 155 Carioca
brasiliense, Miq.; 76 Luehea paniculata, Mart.; 110 Vernonia; 196 Styrax; 212 Lucuma;
460 Myristica sebifera Swartz; Roupala, Anacardium (cajú); 162 Terminalia argentea,
Mart. e Zucc.; Solanum grandiflorum, chamado – fruta do lobo – (por causadas frutas do
tamanho da cabeça d'este animal).
Da vegetação arbustiva, tenho de citar as Leguminosas como as especies : Mimosa e
Bauhimia, e algumas Myrtaceas, Malpighiaceas : 145 Heteropteris; 143 Tetrapteris; 328
Byrsonima verbascifolia, Benth.; Melastomaceas: 118 e 119 Miconia; 123 Leandra;
Hyppocrateaceas: 151 e 152 Salacia; 61 Kielmeyera; 222
RELATORIO DA COMMISSÃO EXPLORADORA.........................................................................334
Buttneria scapellata. Pohl: 176 Helicteres brevespina, St. Hil.; 433 Hilicteres Sacarolha. St.
Hil., 321. Sabicea cana. Hook fil. 66. Rourea induta Planch.; 94 Connarus suberosus,
Planch; 180. Brosimum Gaudichandü, Trec.
Entre as plantas herbaceas e outras menores citarei : 356, Eriosema glabrum, Mart.; 41
Camarea ericoides, St. Hil.; 443 Polygala longicaulis H. B. K., Macrosiphonia (velame);
361 Crotton chaetocalyx, Mull. Arg-.: Dalechampia humilis, MuIl. A.; Cyperaceas;
Gramineas; sobretudo especies de Andropogon; 524 Sorghum Minarum, Hack. 451
Gesneriaceas; 195 Lytsianthus, 131. Euphorbia, Dickia.
Extranhei a falta quasi total de epyphitas, pois mui raramente ahi se mostram, e, isoladas,
as Hepaticas e Lichenes as quaes são as mais frugaes das plantas; em vão procuram-se
epyphitas phanérogamicas; nem mesmo alguma Rhipsalis se descobre, Musgos tão
pouco parece haver ahi nesta formação secca.
Encontrei, porém, representantes de varias parasitas ,verdadeiras: acham-se ahi, por
exemplo : 490. Psittacanthus notavel por suas flores de côr amarella carregada: tambem
de vez em quando encontra-se: 159 Cassytha americana. Nees.
Raras são as plantas trepadeiras e cipós de alguma grossura, das quaes diversas
tambem rastejam pelo chão, taes como: Melancium campestre, e algumas especies de
Ipomea.
As Queimadas
De notavel influencia sobre o desenvolvimento da vegetação destes planaltos são as
queimadas ou incendios espontaneos, as quaes têm logar todos os annos, porém graças
ao maior afastamento das plantas entre si-são de menor violencia ou intensidade do que
os abrasamentos das – prairies – posto que obscureçam a atmosphera. Se, de um lado,
as plantas, em virtude da casca mais grossa e fendida, do revestimento escamoso, dos
bulbos e fortes rhizomas debaixo do solo resistem á inffluencia das chammas, do outro
lado não deixam estas de estorvar a exuberancia do desenvolvimento vegetal, tanto pela
destruição de muitas plantas e das suas diversas partes, como pelo endurecimento do
solo. Apoz taes queimadas, a vegetação brota com feição amesquinhada e com
difficuldade encontram-se algumas plantas em estado normal.
Primavera
Quando em Agosto ou Setembro, o sol começa a tornar-se mais ardente, esses campos
se cobrem de flores sem que chuva alguma lhes venha favorecer o desenvolvimento.
Nesta quadra do anno, achando-me em Meia-Ponte, e em seguida demorando-me em
Formosa, avistei arvores e arbustos da familia das Myrtaceas em plena florescencia
alvissima, como se estivessem cobertas de branca camada de neve a semelhança das
arvores fructiferas da Europa; outras arvores - das Papilionaceas e Tibouchinas (flor da
quaresma) encantavam a vista com sua linda côr de violeta, assim tambem: 156
Physocalymna scaberrimum, Pohl; com estas bellas flores tinham em Meia-Ponte
enfeitado uma ponte por occasião de uma festa de igreja. Em cor amarella reluziam
Ouratea, varias Malpighiaceas, e em outras cores ou tintas distinguiam-se Mimosas: 201
Callisthene mollissima. Warm., 153 Sapindacea; 40 Pterandra pyroidea, Juss: 73
Terminalia brasiliana; 76 Luehea paniculata. Mart.; 203 Jacarandá brasiliana, Pers: 53
Dalechampia humilis, Mull. Arg: Jonidium, etc. Em varias plantas precedera o
desenvolvimento das suas flores ao das folhas.
Griesbach, na sua “Vegetação do Globo” não sabe bem como explicar este notavel
phenomeno opinando dever ser assimilado ao da migração dos passaros para regiões
quentes; para explical-o recorremos á hypothese do “instincto”. - de certa sensação que
faz com que taes passaros, por previsão de falta de alimento se sintam arrastados a
emigrar para remotas terras; assim essas plantas entram em florescencia para na proxima
estação chuvosa completar seu desenvolvimento vegetativo. A mim parece estar mais a
mão à explicação dessa primavera sem concurrencia de chuvas: em primeiro logar, no
começo da estação relativamente
Chapadas inferiores
As chapadas com altura variando entre 600 a 800 metros, encontram-se mais ao sul,
entre Uberaba e Bomfim. Das plantas que alli parecem crescer mais ou menos
exclusivamente, cito as seguintes : uma Bauhinia; 123 Leandra; 418 Mimosa; 97 Cassia
Claussenü, Benth; 411 Cassia cordistipula, Mart.; 106 Eremanthus sphaerocephalus,
Baker; 164 Gouania; 111 Piptocarpha rotundifolia, Baker.
Cabeceiras
Sempre que nos baixios das chapadas e nas encostas das serras ha ajuntamento de
aguas e que consequentemente se formam pantanos, nascem regos, riachos, isto é,
«cabeceiras» de rios.
Aqui apparece então vistosa palmeira de leque ora em raros exemplares, ora disposta em
grupos ou junta a outras plantas arboreas, arbustivas e herbaceas formando bosques
chamados «capões»; dá a essas localidades um aspecto todo particular e é por este
motivo que se pode consideral-a como formação propria, especial. a dos buritysaes e
capões.
Chama-se Mauritia vinifera. Mart.; ou (de seu nome indigena) «burity» essa magestosa
palmeira e traz a lembrança do viajante que nada mais avistará senão campos e
cerrados-que elle se acha em latitudes tropicaes.
já no «Rio Grande», sob 20º de lat., apparece esta palmeira, e para o norte, apresenta
ella cada vez mais bellos exemplares e bosques extensos. Os capões quasi sempre estão
rodeados de pântanos ou campos e densamente cobertos de arvores bastante altas.
Sobresaem entre ellas algumas, esbeltas, rivalisando em porte com as Coniferas,
exhibindo symetria identica : é a 400 Xylopia, que entre Uberaba e Goyaz é muito
utilisada para postes de telegrapho.
Como arbustos, apparece uma Rubiacea 209 Rudgea viburnoides,. Benth.; 329
Cybianthus e, ordinariamente a beira dos capões, outra Rubiacea, a arbustiforme ; 207
Ucriana longifolia, Spreng.; que se assemelha um tanto á Fuchsia.
A' vegetação destes capões se aggregam igualmente, nas alturas, outros elementos, taes
como: 68 Linociera - 327 Cybianthus, Ilex, Richeria grandis, MuIl. Arg.; 57 Podocarpus
Selowü, Kzsch; 70 Belangera tomentosa, Camb., 124.. Tococa, 120 Miconia; 88.
Bauhimtia rubiginosa
Bong; 201 Callisthene, 175. Drimys Winteri, Forst; nas beiras acham-se Paepalanthus, e
frequentemente, uma especie aparentada da Lavoisiera cruciala.
Valles
O Planalto é cortado por diversos rios e riachos, em cujas margens acham-se encostas,
em parte differentes, quanto ao caracter, dos cerrados: as vezes, porém, estes ultimos-ou
suas partes componentes-descem até aos valles: tambem são estas encostas as unicas
regiões, entre as chapadas, susceptiveis de cultivo. A não ser que o solo esteja
modificado, por arroteamento, pela cultura, encontram-se ahi grupos de plantas sylvestres
chamadas «restingas), ou bosquetes que nas posições elevadas convergem e coincidem
com os capões. Muitas vezes esses bosques, na estação secca, estão despidos de
folhagem, tanto que então se poderia tomal-os por catingas, posto que esta ultima
formação aqui se apresente menos pronunciada. Em julho, na occasião da minha viagem
para Meia-Ponte, a geada do inverno. excepcionalmente rigoroso, tinha destruido nos
valles quasi toda a vegetacão: somente o Schinus molle ficara intacto, e, com sua
folhagem, verde escuro, destacava-se do resto do matto. Entre as plantas que apparecem
aqui. cito: 461 e 181 Arthante; 116 Macairea; 177 Prunnus sphaerocarpa, SW.; 179
Hirtella; 115 Tibouchina; 208 Alibertia concolor, K. Sch.; 168 Lauracea; 169 Labiata; 95
Inga affinis, Dl.; 12 Calliandra parviflora, Benth.
Perto de Meia-Ponte, acha-se uma região de transição intermediária do cerrado para a
restinga, onde se confundem ambas as vegetações; ahi ainda observei sobretudo os
seguintes arbustos, 156 Physocalymna; 16 Machaerium opacum, Vog.; 320 Coussarea
hydrangeifolia, Bth.; Hook.; 71 Tocayena formosa Schuman; 319 Thieleodorxa lanceolata,
Cham; 211 Styracea; 86 Symplocos; 183 e 184 Tapirira, 329 Allophylus leptostachys,
Rdhf; Peltogine (páo roxo) por causa da sua côr violeta.
Relativamente às plantas das margens dos rios e regatos coligi, no Paranahyba: 165.
Piriquita cistoides Meyer; 129 Phyllantlus, e mais tarde na volta, 427 Borreria
Schumanniana,
Florestas
Sómente se encontram nas baixadas e confins do Planalto: assim existe uma extensa
floresta entre Meia-Ponte e Goyaz, tendo uma largura de 100 kilometros sobre 500 de
comprimento, actualmente com muitas derrubadas para a cultura.
Tambem ao sul de Goyaz e no caminho de Uberaba, se encontram ricas florestas. Não
me foi possivel explorar este terreno, pela pouca demora neste trajecto, demorando-me
mais nas regiões elevadas. Menciono simplesmente que estas florestas têm, geralmente,
a mesma variedade de arvoredos que as mattas virgens da costa do Brazil, mas são
algum tanto menos exuberantes, e menos cobertas de epiphytas. Estas, na verdade, não
faltam, mas só apparecem parcialmente. Em certos trechos, a uberdade do solo era
denunciada pelo apparecimento de plantas variadas e pela matta espessa das
trepadeiras. Não aparece aqui a palmeira burity, mas a Euterpe e a Attalea.
Lagôa Feia
A pouca distancia da cidade de Formosa, n'uma baixada das chapadas, extende-se a
Lagôa Feia, (comprimento de cerca de 6 kilometros, com 1 1/2 kilometros de largura).
Deriva sua denominação de “Feia”, das suas aguas turvadas pela vegetação que lhe
assombra a superficie. Ha, em primeiro logar, uma Nymphacea, cobrindo-a com suas
folhas fluctuantes, e em seguida, já sob a superficie, mas visivel: Nitella, sobretudo
Cabomba Warmingü, Casp. A estas se ajuntam: 218 Hydrocleis Humboldt; 216 Sagittaria;
221 Polamogeiton.; Utricularia; na margem, Pontederia; 217 Allisma subulatum. Mart.;
Cyperaceas: Osmunda palustris, etc.
Serranias
A geral elevação da região reduz consideravelmente o effeito proprio á natureza
montanhosa, e bem raras são as paizagens de regiões montanhosas que sejam
comparaveis ás do Rio de Janeiro. Sob os gráos 17 e 16 ha a Serra dos Crystaes, a Serra
Dourada, e a Serra dos Pyreneus, (altitude 1.200 a 1.300 metros). No trecho da minha
viagem ao norte, encontrei as Serras da Bocaina, a dos Veadeiros, e o Morro do Salto,
com 1.500 a 1.700 metros de altitude.
Além dessas, ainda na orla do Planalto, apparecem varias serras que não explorei. São
desprovidas de florestas; nas encostas ha capões ou cerrados. Muitas vezes, os
espinhaços destas serras são formados de pedras e blocos de rochedos, entre os quaes
cresce uma vegetação mesquinha e propria. Caracterisa-se esta região pela abundancia
de varias especies de Vellosia, que occupam todo o terreno; tambem vêm-se arbustos
com o habito proprio ao alecrim, ao myrto e á mimosa, e muitas outras plantas que faltam
nos cerrados. Geralmente, essas regiões elevadas e montanhosas constituem os
principaes pontos centricos da distribuição vegetal local, e são as mais ricas em especies
proprias; é por isso que aqui tratarei de descrevel-as mais detalhadamente.
tricto Neutro da Capital Federal, mais adiante para léste até Formosa, quasi sempre
formando chapadões de 1.000 a 1.200 metros de altura.
De Meia-Ponte em diante, seguindo o caminho que conduz aos altos da serra,
percorrêmos primeiro varios cerrados, depois atravessámos n'um capão o Rio das Almas,
para alcançar região mais aberta e pedregosa.
Estão ahi fantasticamente amontoadas rochas de itacolumite, e ainda que não seja
luxuriante a vegetação, acham se comtudo plantas de interesse botanico. Em primeiro
logar sobresae, entre os arbustos e arvoresinhas, um vegetal lenhoso de grandes folhas
brancas pelludas: é uma Composta que antes que se desenvolvam as folhas novas
adorna se de grossas flores semelhantes ás dos cardos, é uma Wunderlichia, nova. Entre
os rochedos crescem a Aneimia elegans Presl.; em forma de estrella, e outros generos
dos Fétos: 360 Aneimia millefolium, Gardn.; 540 Aneimia; 389 Adiantum, miudinho, assim
uma Cactacea: Cereus semelhando uma columna. Arvores pequenas: 101 Mimosa, com
corôa do feitio de umbrella, de 1 a 3 metros de altura cobrem largos trechos até cederem
emfim logar a uma Vellosia cujo crescimento attinge a altura de meio metro, com longos
floraes tubulares brancos e folhas estreitas pelludas, enquanto as encostas oppostas da
montanha acham-se cobertas pelas rosetas das largas folhas de outra Vellosia com flores
de côr azul clara. Finalmente, nos sitios elevados, apparece uma Lychinophora que, com
seu singular habito, lembra o pinheiro bravo ainda novo. Além d'essas plantas que, por
assim dizer, formam o typo principal do aspecto geral encontram-se mais outras como:
374 Manihot pentaphylla, Pohl.; 333 e 351 Ipomea; 189 Crumenaria choretroides, Mart.;
190 Serjana velutina Camb.; Myrtaceas (subarbustos), 364. Sebastianea; 488 Eremanthus
(n. sp.) 382 Allamanda angustifolia, Poh1; 121 e 377 Microlicia viminalis, Tria; mais uma
Mimosa pequena, que, semelhante à maior já mencionada, acha se coberta de planta
parasitaria - a Bafflesiacea Pilostyles.
N’esta região pedregosa, vimos algumas casas em ruinas: pertenciam a uma Companhia
Ingleza, outr'ora exploradora da mina de ouro “Abbade” actualmente abandonada. Esta
localidade tem apenas a altitude de 1.100 metros acima do nivel do mar, demonstrando
isto que a sua flora especial pode-se attribuir mais á propriedade do solo, do que à sua
elevação absoluta.
Até aqui apenas percorrêmos a metade do caminho: chegamos agora aos terrenos ferteis,
passando por alguns declives da Serra, atravessando campos com capões, encontrando
já a palmeira burity. Nos campos vegeta frequentemente a Cambessedesia Hilariana, uma
pequena 324 Dipladenia Myriophyllum n. sp. com folhas piliformas; tambem recolhi uns:
373 Manihot rasteiro. Chegados emfim ao dorso da Serra dos Pyreneus seguimos até
alcançar o ponto culminante onde apenas se encontram rochedos de 50 metros de altura
sem vegetação especial. No terreno rochoso, a flora acha-se composta com as plantas
dos cerrados e dos rochedos, apparecendo tambem a Vellosia glauca. Entre os dorsos
das montanhas ha campos e alguns capões maiores. Os campos são em parte
pantanosos, achando-se frequentemente uma Xyridea azul: 227 Abolboda; 228 Oncidium
e Sphagnum.
No capão, encontrei no mez de Agosto: Drimys Winteri, Forst; em plena e soberba
florescencia, e, em exemplares destacados; Afteria lilacina. As Drimys, Leucotheo,
Podocarpus, Sphagnum, são typos das regiões mais altas, como tambem se encontram
em Goyaz.
A Serra dos Pyreneus, que visitei em varios logares e em diversas épocas do anno, é
muito extensa. Das plantas assim colhidas, cito por ora: em terreno rochoso: 486 Turnera
incana, Camb.; 368 Cuphea, 365 Miconia, 546 Vellozia, rasteira, 400 Ichthyothere Cunabi,
Mart.; 758 Manihot violacea. Nos campos : 358 Iridaceas (muito frequentes), 496
Orchidacea, 445 Thesium aphyllum, Mart.; Gramineas, Cyperaceas e Eriocaulaceas.
dos deixou Formosa, no dia 12 de Setembro; a principio a viagem foi boa e transpuzemos
chapadões extensos, ás vezes de altitude superior a 1.300 metros.
No quinto dia avistámos de longe alguns cumes: descendo um valle, atravessámos o Rio
Tocantins, 900 metros acima do nivel do mar, e de novo chegámos a um chapadão
extenso. Breve tivemos diante de nós uma planicie maior, á nossa esquerda algumas
cadeias elevadas, ao norte serras. Descemos outro valle, e chegámos a uma localidade
denominada – Paraiso – onde passámos o dia seguinte. D’ahi em diante, tivemos de
demorarmo-nos varios dias porque não obtivemos em Formosa provisões sufficientes, e
os nossos animaes necessitavam de repouso. Aproveitei esta parada para fazer varias
excursões. A primeira teve por destino os arredores de Paraiso, onde nos campos e nas
collinas, encontrei Mimosas : Mimosa paraizeinsis. Taub.; e, Mimosa Cyclophylla, Taub.;
arbustos de 1 a 2 metros de alto, uma bonita Papilionacea (Harpalyce speciosa, Taub.);
com flôres de côr vermelha, e um Eryngium pristis, Cham.; que, com suas folhas
finamente pinnatifidas, assemelha-se a um pennacho.
Entre arvoredo da beira dos regatos colhi Podocarpus Sellowii, Kltsch.; 22 Miconia e
Guettarda.
No dia seguinte mudámos nossa pousada para 9 kilometros adiante, no Pizarão, aonde
chegámos atravessando campos, verdadeiros, com certa regularidade occupados por
grandes casas de cupins de altura de um metro e galgámos montanhas descompostas
sem vegetação arborea.
Infelizmente nesses campos não se encontrou senão gramma e plantas seccas,
impossibilitando o estudo desta formação.
O fazendeiro em cujo sitio acampámos, prometteu matar gado no dia seguinte para nos
abastecer de carne, caso demorassemos ahi, com o que nós concordámos.
Ao norte d’este logar, assenta uma vasta extensão de rochedos que não pareciam ser
difficil de subir; resolvi dirigir os passos n'essa direcção, para aproveitar a demora.
Primeiro atravessei um campo, galguei em seguida o dorso de uma montanha pelo qual
prosegui por algum tempo esperando encontrar terreno proprio para effectuar a descida
ao valle da outra falda, e chegar ao declive do rochedo. Pelo caminho encontrei entre
plantas florescentes uma 3 Mimosa Tocantina, Sw. Taub.); 10 Calliandra macrocephal,
Benth.; 49 Euphorbia e, entre as rochas do morro, um cactus-ouriço, provavelmente,
Melocactus, mas sem flores. O valle é regado por um corrego, o “Vargem Grande”, e
alarga-se em varios logares. Notei muitas Melastomaceas similares a Laroisieira cruciata,
e Eriocaulaceas.
Nas beiras tornáram a apparecer arvoresinhas de Mimosas, um singular arbusto, uma 78
Labiata (Hyptis penacoides, Taub.); caracter de alecrim ou myrtiforme, de 1 a 2 metros de
altura, Wunderchia, uma Ericacea arbustiva sem flores. etc.
Na margem e na visinhança do corrego achei frequentemente uma 69 Qualea; 44
Byrsonima umbellata, uma 19 Microlicia cupressina, Don.; de flores amarellas, e um 52
Phyllanthus aphyllo semelhante a uma vareta. Nas pedras do leito do corrego avistei
quantidades de uma pequena Utricularia neottioides. St. Hil.; de flôr branca que tambem
occorre em similares logares de outras serranias e parece ser distribuida sobre todo o
Brazil central. O terreno explorado calculei estar mais ou menos 1.100 a 1.300 metros de
altura.
No dia seguinte, continuando a nossa viagem transpuzemos a mesma cadeia de montes
e tambem tocámos no Vargem Grande que todavia deixámos á esquerda.
Cada vez alargava-se mais diante de nós a soberba paizagem, imponente pelo seu
caracter grandioso.
Na parte anterior extendiam-se campos vastos e planos, a um lado dos quaes serpenteia
o Vargem Grande orlado de capões, com pittorescos grupos de palmeiras burity.
A' esquerda erguiam-se chapadões e, no fundo, tres montanhas isoladas com 300 a 400
metros de altura, dominavam o valle, o Morro do Salto e o Morro da Bocaina; partindo
d'estes, em direcção norte, se extende uma cadeia chamada – Chapada dos Veadeiros –
, até a vista ser interrompida por uma paragem montanhosa.
RELATORIO DA COMMISSAO EXPLORADORA........................................................................340
Argiloso), emprehendi uma excursão, na qual tinha primeiro de descer o valle do Passa
Tempo-ribeiro acompanhado de um trecho de floresta até a altura de 1060 metros.
Nos campos do valle appareceo frequentemente a 2 Mimosa cyclophilla, Taub.; arbusto
com flores côr de rosa, a miudo habitada por um Pilostyles bem desenvolvida, e outra
Mimosa longopedunculata, Taub.; que forma arvoresinhas com flores de côr branca-
avermelhada, e folhas glandulosas Subi pela encosta que era muito ingreme. No alto
encontrei, não raras vezes, uma Mimosa sem caule, com grandes flores côr de rosa, uma
Composta amarella, e 14 Papilionacea semelhante á Genista, da Europa, que cobria
trechos inteiros do solo. A alguma distancia de uma elevação rochosa, notei pequenas
arvores negras de um aspecto singular, ao approximar-me reconheci ser uma
Melastomacea. São arvoresinhas diminutas de 1 a 2 metros de altura, consistindo de
galhos nodosos, grossos, densamente ramificados, e terminando no apice por uma copa
de pequenas folhas lanceolares. Esse denso enlaçamento de galhos dá a planta um
aspecto peculiar e extranho. Senti não encontrar nem fruta nem flor, mas opino pelo seu
parentesco com a Lavoisiera. Em outra elevação appareceu uma Melastomacea com
altura de meio metro e caracter de cipreste; tambem tinha aspecto extranho, e supponho
ser uma Microlicia; e mais: poucos exemplares de uma 23 Trembleya. Realmente, na
maior parte a vegetação ainda estava por desenvolver o que me fez deixar de colligir
diversas Vellozias e outras plantas que notei entre os rochedos. Colhi tambem uma
Tillandsia, e vi minuscula Orchidea entre as Vellosias prova que na região dos montes
não faltaram as epiphytas.
Alguns dias depois punhamo-nos a caminho de volta para Meia-Ponte, deixando então de
colleccionar tanto porque muito apressámos a viagem como tivemos repetidas chuvas.
Apenas nos primeiros dias ainda colhi uma bellissima 17 Cambessedesia - provavelmente
nova - um 75 Displusodon e uma 6 Mimosa Ullei Taub., arbustiva.
Serra Dourada
Esta Serra constitue o termo sud-oeste da cadeia de montanhas que so o nome de -
Serra Geral - percorre o Estado de Goyaz, tendo partido dos limites do da Bahia.
Contrastando com a Serra dos Pyreneus, composta de varios planaltos elevados e de
cadeias correndo em direcção diversa, a Serra Dourada forma uma cadêa que se extende
por muitas lagoas em direcção este-oeste, com leve declinação para o sul. Nesta direcção
para o lado da Capital de Goyaz, vai descendo em declives abruptos e penhascos,
emquanto para o lado septentrional, as faldas são graduadas, porém frequentemente
compostas de blocos de rocha desaggregada. Ao sopé de quasi todos os lados ha uma
orla de capões. Esta serra, no ponto onde a estrada, que prosegue de Uberaba e Meia-
Ponte, vai descendo caminho de Goyaz, tem 900 metros de altitude; torna depois a subir
a 1.100 metros; no ponto onde passei, poderá porém, em trecho mais distante, alcançar
1.200 metros.
A flora assemelha-se notavelmente a da Serra dos Pyreneus, pois apparecem as mesmas
Vellozias, as mesmas Aneimias e outras Cryptogamas e mais Malpighiaceas, Anonaceas,
Ilicineas, sobretudo Ilex affinis, Gardn; que fornece um mate, e Vochysiaceas.
Algumas plantas que vegetam na Serra dos Pyreneus, parecem aqui faltar, são: 324
Dipladenia Myriophyllum Taub., diversas Mimosas. Cambessedesia Hilariana. Microlicia
riminalis; d'ahi em diante as Microlicias vão se tornando raras. Menos facil é citar as
plantas da Serra Dourada que faltam na Serra dos Pyreneus, quando se considera que
entre essas respecticas visitas a vegetação achava-se consideravelmente adiantada aqui
como tambem deve estar alli. Sómente mencionarei que esta serra já pertence mais á
vertente occidental, tanto que nella se encontram algumas plantas componentes
Os terrenos humidos estavam todos cobertos de flores amarellas de uma 513. Ir idea.
Muito frequente, como tambem nas montanhas de Goyaz, encontra-se a Langsdorffia
hypogaea Mart, que achava-se muitas vezes entre as pedras quasi isentas de vegetação.
Não parecia existir certa planta que sustenta esta parasita e sómente notei nos diversos
arredores arbustos pertencentes a varias familias.
Nas elevações na base da serra encontrei muitas plantas em florescencia, como: 412.
Cassia goyazensis Taub., 434. Pavonia, 487 Melochia hirsuta Cav., 438. Buettneria
campicola Taub. 422. Camnarea affinis St. Hil, 399. Riencourtia oblomgifolia Gardn 401
Ichthyothere Ulei Taub. 447. Ipomea 475 Manihot 472 Manihot gracilis Mûll Arg., 497
Pogonia speciosa Rechb. f. Tambem se acha aqui como já o encontrei n'um logar da
Serra dos Pyreneus, o raro e pequeno, 540 Ophioglossum macrorrhizum Kunze.
Dos cerrados e dos sitios rochosos devo citar: 403 Indigofera goyazenis. Taub ,
405 Galactia, 449 Gloxinia ichtyostoma Gard. 435 Pavonia 437 Ayenia Riedeliana K. Sch.
458 Asclepiadacea. 476. Pilostyles Calliandrae Gardn.; 537 e 542 Aneimias, 512
Adiantum lunulatum Bnr., 538 Aneimia glareosa Fied e Gard.
A' beira dos caminhos e em sitios outr'ora cultivados acham-se diversas plantas
especiaes como: Composta, 399 Pectis brevipedunculata Taub., 430 Sipanea pratensis
Aubl , 462 Sciledenia, 525 Microcklo setacea B. Br , Caphea, etc.
Conclusão
Se no presente trabalho tenho apresentado uma vista geral e um esboço da vegetação
mais importante de Goyaz, muito falta ainda para dar uma idéa da completa exploração
botanica desse estado, pois, além de limitadissimo o tempo, muitas vezes me foi pouco
favoravel e é o que não me permittir definir o caracter de muitos districtos.
Na enumeração das plantas typicas e importantes, citei os numeros que se acham
mencionados pela Commissão no herbario goyano e no nosso Museo Nacional.
Na continuação do Relatorio da Commissão, espero poder dar uma lista de todas as
especies: o que facilitará a organisação do quadro com as denominações
correspondentes.
Talvez me seja dada opportunidade para continuar as minhas explorações: então sentirei
intima satisfacção de poder collaborar mais extenso e com mais proveito para a Botanica
em investigações de tão importantes regiões.
Observação
Antes que as linhas precedentes fossem remettidas á imprensa, recebi ainda algumas
communicações sobre os resultados das collecções botanicas, nas quaes, ainda que as
Phanerogamas se achem apenas determinadas até a metade, já se encontrarão especies
novas e 2 generos novos. Os ultimos são a Composta N. 107, da Serra dos Pyreneus e a
Papilionacea N. r4 da Serra da Balisa; ainda N. 28, a nova Wunderlichia nomeada em
honra de nosso chefe - Wunderlichia Crulsiana.
ERNESTO ULE,
Botanico da Commissão.
DO PLANALTO CENTRAL DO BRASIL.......................................................................................345
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
_.._.-
C TBRASIL MINlsriRIO
DA IDUCA~AO
LUIZ CRULS
Diplomado em engenharia civil pela Universidade de Gand, que cursou de 1863 a 1868.
Admitido como aspirante de engenharia militar, permaneceu no exército belga até 1873.
Cria a Comissão Luiz Cruls, destinada a estudar e difundir a vida e a obra do astrônomo
belga, de mesmo nome, e sua importância na história de Brasília.
————
CRISTOVAM BUARQUE
Governador do Distrito Federal
MÁRIO TINOCO
Secretário da Fazenda e Planejamento
SANDRA LOUISE
Diretora Administrativa e Financeira
EQUIPE TÉCNICA
EQUIPE DE APOIO
RELATÓRIO DA COMISSÃO
EXPLORADORA
DO PLANALTO CENTRAL
DO BRASIL
Relatório Cruls
LUIZ CRULS
6ª EDIÇÃO
BRASÍLIA - 1995
RELATÓRIO CRULS
1ª edição 1894
2ª edição 1947
3ª edição 1957
4ª edição 1984
5ª edição 1987
* edição especial 1892/1992
6ª edição 1995
C955r Cruls, Luiz.
Relatório da Comissão Exploradora
do Planalto Central: Relatório
Cruls / Luiz Cruls. — 6ª ed. — —
Brasília: CODEPLAN, 1995.
380p: il.
APRESENTÇÃO ................................................................................................3
RESUMO ................................................................................................7
INTRODUÇÃO ................................................................................................1
RELATÓRIO DA COMISSÃO EXPLORADORA DO PLANALTO CENTRAL DO
BRASIL.....................................................................................................................................12
ÍNDICE DAS MATÉRIAS ................................................................................................5
INTRODUÇÃO ..............................................................................................17
ÍNDICEHELIOGRAVURAS ..............................................................................................23
RELATÓRIO DO Dr. LUIZ CRULS, CHEFE DA COMISSÃO.................................................25
MEDIÇÃO DOS RIOS ............................................................................................113
DISTÂNCIAS QUILOMÉTRICAS DOS ITINERÁRIOS..........................................................143
ANEXO I ...........................................................................................................................151
ANEXO II ...........................................................................................................................163
ANEXO III ...........................................................................................................................175
ANEXO IV ...........................................................................................................................237
ANEXO V ...........................................................................................................................293
ANEXO VI ...........................................................................................................................329
CAMINHAMENTOS .........................................................................................................345
RESUMO
O grupo dividiu-se em quatro turmas, tendo, cada uma delas, a missão de determinar no
terreno a posição de um dos vértices do quadrilátero.
A turma que assinalou o vértice noroeste foi chefiada por Augusto Tasso Fragoso; a turma
sudoeste foi chefiada por Luiz Cruls; a nordeste, por Julião de Oliveira e a sudeste, por
Henrique Morize.
O equipamento utilizado se compunha de teodolitos, sextantes, cronômetros e relógios,
barômetros, aneróides, podômetros, instrumentos meteorológicos e material fotográfico.
Além da demarcação da área da futura Capital, em sete meses de trabalho, de meados
de 1892 a princípios de 1893, foram percorridos mais de quatro mil quilômetros e feito um
levantamento minucioso sobre topografia, clima, hidrología, geologia, fauna, flora,
pedologia, recursos minerais e materiais de construção existentes na região.
O produto desse trabalho resultou no "Relatório da Comissão Exploradora do Planalto
Central do Brasil", composto por um volume de textos descritivos (português e francês, na
versão original), fotografias, tabelas, cálculos e croquis, além de um Atlas, contendo 83
caminhamentos (mapas) da região percorrida.
SOMMAIRE
RAPPORT DE LA COMMISSION DU PLATEAU
CENTRAL DU BRASIL - Rapporte CRULS
L' article 3ème de la Constitution Féderal de 1891 a déterminé que: "Une zone de 14.400
Km² située au plateau central de la République et à être opportunément demarquée,
appartiendra à l´Union, qui a 1'intention d' y établir la fúture capitale fédérale”.
Ayant pour but délimiter la région où devrait s'établir la nouvelle Capitale du Brésil, a été
nomée cette même arméc, 1891 une commission. constituée de 22 membres, dirigée par
l'astronome Luíz Cruls, directeur de l'Observatoire National.
On a choisi une partie du Plateau Central où se trouve la source des affluents de trois
grands fleuves brésiliéns: le Maranhão affluent du Tocantins, le Preto affluent du São
Francisco et le São Bartolomeu et Descoberto affluents du. Paraná.
Le nouveau District Fédéral a pris la forme d'un quadrilatère formé par deux lignes de
paralléle et deux lignes de méridien, ce qui rend facile la demarcation et ne pose pas de
problémes de limites.
Le points de fonction NW, NE, SE e SW, designés respectivement A, B, C et D devraient
avoir les coordonnés suivantes:
Le groupe s'est divisé en quatre sous-groupe ayant chacun la mission de marquer sur le
terrain la position dun des points de fonction du quadrilatère.
Ceux qui ont signalé le point de fonction nord-ouest ont été dirigé par Augusto Tasso
Fragoso; ceux du Sud-ouest par Luiz Cruls; ceux du nord-est par Julião de Oliveira et
ceux du sud-est par Henrique Morize.
L'équipement utilisé se composait de théodolites, sextants, chronomètres, baromètres,
anéroides, podomètres, des instruments météorologiques et du matériel photographique.
Pendant sept mois de travail, la moitié de 1892 et le début de 1893, on. a demarqué
1'espace de la future capitale et on a aussi parcouru plus de quatre mil quilomètres en
faisant une étude de la topographie, climat, hydrologie, géologie, faune, flore, pédologie,
ressouces mineraux et materiaux de construction existent dans la région.
Le résultat de ce travail a été le "Rapport de la Commission de I'Exploitation du Plateau
Centrall du Brésil", composé par un volume de textes decriptifs, (en portugais et en
françaís; dans le version originale) photos, tableaux, calculs, croquis et un Atlas contient
83 plans de la région parcourue.
SUMMARY
REPORT OF THE EXPLORER COMISSION OF THE
CENTRAL PLATEAU OF BRASIL - CRULS Report
The 3rd article of the Federal Constitution of 1891 determined that: "From this date on, it is
part of the Union's property, an area of 14.400 km² in the central plateau of the Republic,
that will be later delimited, where the future Capital of lhe Country will be stablished".
With this objective in mind, a comission formed by 22 members, and headed by the
astronomer Luis Cruls, director of the National Observatory was nominated in this same
year of 1981 to delimitate the area where the new capital of Brazil should be built.
The location chosen was a part of the central plateau, where we find the headwaters of the
confluents of the three major Brazillian rivers, the Maranhão, confluent of the Tocatins, the
Preto, confluent of the São Francisco, and the rivers São Bartolomeu and Descoberto,
confluents of the Paraná.
The way chosen to delimitate the lands of the new Federal District was a quadrilateral,
formed by two arcs of the parallel and two arcs of the meridian, justified not only by the
possibility of the appearance of fewer problems of delimitation, but also because of the
fácility of demarcation.
The vertex NW, NE, SE and SW, called respectively A, B, C and D should have the
following coordinates:
The major group was divided into four teams, each one having the incumbency of
determining the position of one of the vertices of the quadrangular area.
The group that marked the northwest vertex was headed by Augusto Tasso Fragoso; the
southwest group was; headed by Luis Cruls, the northeast group by Julião de Oliveira and
the southeast group by Henrique Morize.
The equipement used was composed of theodolites, sextants, chronometers and
timepieces, barometers, aneroid barometers, pedometers, meterological tools an
photographic materials.
Besides the demarcation of the of the future Capital, more than four thousand quilometers
were explored and a detailed study was made on the topography, climate, hidrology,
geology, fauna, flora, pedology, mineral resources and raw material for construection
existing in the location.
The proceeds of this work resulted in a "Report of the explorer comission of the Planalto
Central do Brasil" composed of one volume of descriptive texts (the original version in
Portuguese and French), photographs, charts, computations and croquis, besides one
Atlas containing 83 maps of the explored region.
RESUMEN
INFORME DE LA COMISIÓN EXPLORADORA DE LA
MESETA CENTRAL DEL BRASIL - Relatório Cruls
O Visconde de Porto Seguro fez vários manifestos a respeito. Inicialmente, ele sugeriu
São João Del Rei. Depois, preferiu o Planalto Central por considerá-lo mais importante.
Como resultado de toda a campanha pró-mudança (da Capital) Holanda Cavalcante
apresenta ao Senado, em 1852, um projeto de lei dispondo sobre a construção da nova
Capital, sendo mantido o topônimo Brasília, sugerido por José Bonifácio.
Com o advento da República, foi inserido na Constituição Federal, em 24 de fevereiro de
1891, o seguinte texto: "Art. 3º - Fica pertencente a União, no Planalto Central da
República, uma zona de 14.400 Km², que será oportunamente demarcada, para nela
estabelecer-se a futura Capital Federal".
Em maio de 1892, foi finalmente efetivada a escolha da área destinada a futura capital, e
para isso foi constituída uma comissão com a finalidade de demarcar os 14.400 Km2
estabelecidos na Constituição de 1891. Denominada "Comissão Exploradora do Planalto
Central do Brasil', foi confiada sua chefia ao astrônomo Luiz Cruls, diretor do Observatório
Astronômico do Rio de Janeiro.
Todos os fatos que estão ligados, de uma forma ou de outra ao "nascimento" de Brasília
compõem a memória da cidade e, portanto, não devem ser esquecidos. Este volume
apresenta a íntegra do Relatório da Comissão Exploradora do Planalto Central - Relatório
Cruls, excluída a versão francesa, que compõe também o volume original.
Todos os mapas correspondentes a área levantada (14.400 Km² ) estão reunidos em
outro volume - Atlas, de onde foram selecionados os 17 mapas - caminhamentos, que
fazem parte desta publicação e são referentes à área do atual Distrito Federal.
Além dos mapas, foi incluída uma síntese do Sistema Cartográfico do Distrito Federal -
SICAD - implantado em 1975 e, conforme o artigo 2º do Decreto nº 4.008 de 26 de
dezembro de 1977, passou a "constituir referência oficial obrigatória para todos os
trabalhos de topografia, cartografia, demarcação, estudos, anteprojetos, projetos,
implantação e acompanhamento de obras de engenharia em geral, bem como para o
controle de uso de solo do Distrito Federal".
O relatório dessa Comissão - que ora está sendo reeditado - é de grande importância
para a memória histórica e cartográfica do Distrito Federal, de vez que nele estão contidos
todos os passos da primeira demarcação da área, as técnicas empregadas na época e
seus resultados.
A justificativa desta publicação se faz pela grande importância desse documento: -foi o
primeiro levantamento e mapeamento do sítio da Capital e são poucos os exemplares à
disposição do público nas maiores bibliotecas do País.
Assim sendo, a CODEPLAN através do seu projeto "Memória Cartográfica", que tem por
objetivo divulgar fatos históricos e documentos cartográficos, e o Departamento de
Patrimônio Histórico e Artístico, com o projeto "Raízes', que pesquisa, preserva e divulga
os bens patrimoniais do Distrito Federal, empenharam-se na publicação do Relatório
Cruls.
COMMISSÃO EXPLORADORA DO PLANALTO CENTRAL DO
BRAZIL
RELATORIO
APRESENTADO A
POR
L. CRULS
Chefe da Commissão
______
RIO DE JANEIRO
1894
Quando, em Maio de 1892, o Governo mandou nos chamar, afim de nos confiar a missão
de explorar o Planalto Central do Brazil e n'elle demarcar a área que, segundo o que
prescreve a Constituição, deve ser reservada ao futuro Districto Federal, e ahi ser
opportunamente mudada a nova Capital da União, não nos illudimos a respeito da
magnitude do assumpto, e ao mesmo tempo da responsabilidade que ia pesar sobre nós
perante o paiz inteiro, aceitando tão honrosa quão espinhosa tarefa.
Agora que podemos dar por concluida a nossa missão, com a publicação do presente
Relatorio, em que se encontram os resultados dos nossos trabalhos, convenientemente
desenvolvidos, talvez não seja fóra de proposito mostrar que, procedendo á exploração e
demarcação da área pelo modo e na localidade onde foi feita, procurámos seguir o
espirito que animou o legislador quando inseriu na Constituição vigente o Art. 3º que
reproduzimos á pagina 69, d’este Relatorio.
Não ha negar que os membros da Constituinte, ou melhor a Commissão dos 21,
escolhida no seu seio, e a quem ficou incumbida a elaboração do projecto da
Constituição,
aguas obstruido em muitos pontos. Devemos, esperar que, com o correr dos tempos, ráie
o dia em que elles virão a tornar-se navegaveis em todo o seu percurso; quando chegar
este dia, e que um systema de vias ferreas ligar a nova Capital com os grandes rios, cujas
aguas descem para o Norte, a o Sul e para Léste, então achar-se-ha realisada a palavra
prophetica do visconde de Porto-Seguro, mencionada á pag 28 d’este Relatorio.
Por ahi vê se que, de todo o planalto brazileiro, a parte que, a priori, podia ser
considerada a unica que satisfizesse a dupla condição de ser a mais central e visinha das
cabeceiras dos grandes rios, é aquella a que a Commissão restringio sua exploração, e
onde demarcou a área reservada para o futuro Districto Federal.
Em summa, acreditamos que procedendo á demarcação na região onde a fizemos,
correspondemos ao que o legislador tivera em mente, quando inseriu na actual
Constituição o Art. 3º. E o nosso modo de pensar parece encontrar confirmação na
propria resolução do Congresso Nacional, mandando agora proceder á fixação do local
para a futura Capital da Republica na zona demarcada no planalto Central, Votando, esta
resolução, os Membros do Congresso, aliás os mesmos que, em 1891, mandaram
proceder à exploração e demarcação a área no planalto central, sanccionaram e
ratificaram com o seu voto, a demarcação feita pela Commissão. E tanto mais
fundamento parece ter esta nossa convicção, quanto o mesmo Congresso rejeitou um
projecto de Lei apresentado a 23 de Agosto de 1893 por diversos illustres deputados,
propondo que o Governo mandasse fazer os estudos de outra zona na região cortada
pelas linhas de limites dos Estados de Goyaz, Bahia e Piauhy no planalto central e com o
fim especial de para ella mudar a Capital da Republica.
Nutrimos pois a convicção de que a zona demarcada apresenta a maior somma de
condicções favoraveis possiveis de se realisar, e proprias para n'ella edificar-se uma
grande Capital, que gozará de um clima temperado e sadio, abastecida com aguas
potaveis abundantes, situada em região cujos terrenos, convenientemente tratados
prestar-se-hão ás mais importantes culturas, e que, por um systema de vias-ferreas e
mixtas convenientemente estudado, poderá facilmente ser ligado com o littoral e os
diversos pontos do territorio da Republica.1º de julho de 1894.
Oeste onde campêa a Serra dos Pyreneus, tão pittoresca. A léste, extende-se o bello e
grandioso valle que vai prolongando-se até aos pequenos montes do Rio Parnauá,
ramificando-se, em outros pontos, em todas as direcções. Esta planicie immensa, de
superficie tão suavemente sinuosa, é riquissima de cursos d'agua limpida e deliciosa que
manam da menor depressão do terreno. Essas fontes, como os grandes rios que regam a
região, são protegidas por admiraveis capões aos quaes nunca deveria golpear a
machada do homem, senão com a maior circumspecção. São magnificas de verdura os
pastos e certamente superiores a todos os que vi no Brazil Central. Todos esses
elementos cuja disposição se poderia attribuir á inspiração de um artista sublime dão á
paizagem o aspecto mais aprazivel e de que não ha nada comparavel, a não ser em
miniatura os antigos parques inglezes, desenhados por Le Notre ou Paxton. Tão
profundamente gravou-se-me na memoria a belleza do clima que de continuo o tenho na
mente.
Em consequencia da constituição geologica do solo, não é absolutamente fertil a
totalidade do territorio, porém as localidades desprovidas dessa qualidade são cobertas
de excellentes especies de gramineas principalmente dos generos Paspalum e Panicum.
A essas hervas espontaneas é que a região deve a superioridade do gado vaccum e de
seu producto lacticinio certamente igual aos melhores da Europa. Eis a razão porque a
criação do gado, que não acarreta senão desembolços minimos, será indubitavelmente a
industria agricola mais vantajosa do paiz. Á margem dos rios, dos bosques assim como
das innumeras cabeceiras existem ainda vastos terrenos aptos para o cultivo de muitas
especies de arvores fructiferas dos climas temperados, taes como as pereiras, as
macieiras, as figueiras, etc. e principalmente a vinha cujo futuro é garantido por todas as
condições que a sua prosperidade exige. A estação aqui chamada – fria - que
corresponde ao tempo secco, dá simultaneamente logar á queda das folhas exactamente
como na Europa succede com o inverno obstando o movimento ascendente da seiva, e
impõe ao vegetal uma inacção indispensavel á maturidade dos galhos novos para a
fructificação vindoura. A ser licita a esperança da prosperidade das arvores fructiferas,
não é menos fundada a de todos os legumes indisdispensavais ao consumo diario. Além
do cultivo em maior e menor escala dos differentes generos, o das florestas que,
certamente, não será de menor vantagem para a economia geral pela producção das
plantas industriaes, é igualmente digna da attenção do agronomo. Com bastante sorpreza
observei a existencia de numerosas Sapotaceas susceptiveis de fornecerem a -Guta-
Percha,- substancia mui procurada, hoje rara no estado de pureza. Por toda a parte nas
mattas marginaes dos rios encontram-se especies congeneres taes como Lucuma,
Chryzophyllum, Bassia, Mimusops, etc., das que produzem as melhores Gutta de
Sumatra inconsideradamente quasi destruidas pela cobiça dos indigenas que da
exportação auferiram grande lucro. Com essas Sapotaceas associam-se outros muitos
vegetaes cuja utilidade tão pouco não é para desprezar, como sejam as plantas de
gomma, fibrosas, etc., e mais a introducção de especies exoticas que tambem seriam de
muita vantagem para o paiz.
Agora que tenho a dita de viver sob o clima ameno do Planalto, cada dia o acho melhor
pela temperatura perfeitamente constante, a leveza e pureza do ar : ahi tudo é amavel e
calmo; quanto á configuração, os vegetaes não lembram nem os das regiões quentes
nem os dos paizes frios; ás vezes verifico a existencia de especies pertencentes á flora
alpestre do Itatiaia, do cume da Serra dos Orgãos ou a regiões distantes do equador, taes
como o Chili, a Plata, etc. Muitas d'essas plantas brazileiras provenientes de sementes
que remetti para Europa haverá 20 ou 30 annos, acham-se hoje perfeitamente acclimadas
em Nice e nos contornos, prova evidente da analogia que existe entre regiões não raro
afastadissimas umas das outras. Ora se os vegetaes das regiões altas do Brazil tem vida
normal, ao ar livre, no sul da França e da Italia, estou firmemente convencido que o
mesmo se ha de dar no Planalto quanto ás essencias mencionadas. Para se conseguir
este fim, convem, evidentemente, renunciar á rotina e recorrer á intel-
Acceite o Illm. Sr. Dr. Cruls a homenagem dos meus respeitosos sentimentos e sincera
dedicação. - A Glaziou.
L. Cruls.
Dezembro de 1894.
Página originalmente deixada em branco..........................................................................22
DO PLANALTO CENTRAL DO BRASIL............................................................................23
Preambulo
Quando, no começo do anno de 1893, o pessoal da Commissão Exploradora do Planalto
Central do Brazil, terminou os seus trabalhos de campo, apenas de volta á Capital, cuidou
immediamente dos trabalhos de gabinete, abrangendo todos os calculos de reducção das
posições geographicas determinadas durante a exploração, os da differença de longitude
entre Goyaz, Uberaba, São Paulo e Rio de janeiro, assim como dos desenhos dos
caminhamentos dos itinerarios percorridos, e cujo desenvolvimento total excedia a 4.000
kilometros. Exigindo esses trabalhos de gabinete, até, a completa conclusão, consideravel
lapso de tempo, e convindo, por outra parte, que o mais breve possivel fossem
informados o Governo e o Congresso dos resultados mais importantes colhidos pela
Commissão, resolvemos redigir um resumido Relatorio dos trabalhos effectuados e dos
principaes resultados obtidos.
Esse Relatorio, intitulado “ Relatorio parcial ” , foi publicado em junho de 1893.
Ao passo que nos occupavamos da publicação do “ Relatorio parcial ”, curavamos
activamente da redacção do Relatorio geral;
Historico
Não é nova a idéa da transferencia da Capital do Brazil: vemol-a mencionada em varias
publicações, das quaes as de data mais antiga é o jornal Correio Braziliense, do qual
reproduzimos adiante um artigo publicado em 1808, ha quasi um seculo. Mais tarde
vamos encontral-a de novo na obra em dous volumes do Visconde de Porto Seguro, de
que tambem damos alguns extractos. Convém notar que os autores que se têm occupado
com este projecto são unanimes em considerar a zona onde têm os mananciaes os rios
Araguaya, Tocantins. São Francisco, Paraná, isto é, sobre o Planalto Central, por cerca
de 15º de latitude austral como sendo a mais vantajosa, sob todos os pontos de vista.
Eis a reproducção integral das differentes publicações relativas a tão magno assumpto:
“Não nos demoraremos com as objecções que ha contra a cidade do Rio de Janeiro, aliás
mui propria para o commercio e outros fins, mas summamente inadequada para ser a
Capital do Brazil: basta lembrar que está a um canto do territorio do Brazil que a sua
communicação com o Pará e outros pontos d'aquelle estado é de immensa difficuldade, e
que sendo um porto de mar, está o governo alli sempre sujeito a uma invasão inimiga de
qualquer potencia maritima. Quanto ás difficuldades da creação de uma nova Capital,
estamos convencidos de que todas ellas não são mais do que méros subterfugios.”
Annos depois accrescentava. “A côrte não deve residir no porto ou logar que se destina a
ser emporio do commercio, porque os negociantes illudidos com o brilhante da côrte
desejam fazer-se cortezões, em vez de serem commerciantes; procuram habitos,
condecorações e titulos em vez de procurarem sobresahir em seu commercio, que é o
que lhes convém e interessa o Estado; e sahindo assim aquelles individuos da esphera
em que tão uteis eram, de negociantes da primeira ordem passam talvez a ser nobres na
infima graduação no que não utilisam a si nem fazem bem ao Estado.
“ Essa paragem, bastante central onde se deve collocar a Capital do Imperio parece,
quanto a nós, está indicada pela natureza na propria região elevada do seu territorio,
d’onde baixariam as ordens, como baixam as aguas que vão pelo Tocantins ao norte, pelo
Prata ao sul e pelo S. Francisco a léste. ”
Nesta obra do Dr. Joaquim Alexandre de Mello Moraes, acha-se pag. 85, § 9, cap. II, com
o titulo “ Negocios do Brazil ” que aos deputados de São Paulo foram ministradas
instrucções do Governo provisorio concernentes aos interesses do Brazil e entre outros :
“ Parece-nos tambem muito util que se levante uma cidade central, no interior do Brazil,
para assento da côrte ou da regencia o que poderá ser na latitude, pouco mais ou menos,
de 15 gráos, em sitio sadio, ameno, fertil, e regado por algum rio navegavel. Deste modo
fica a côrte ou assento da regencia livre de qualquer “ assalto ” e “ surpreza ” extrema. e
se chama para as provincias centraes o excesso da povoação vadia das cidades
maritimas e mercantis. Desta côrte central dever-se-hão logo abrir estradas para as
diversas provincias e portos de mar para que se communiquem e circulem com toda a
promptidão as ordens do Governo e se “ favoreça ” por ellas o commercio interno do vasto
Imperio do Brazil. ”
Foi apresentada esta proposta em sessão de 9 de Outubro de 1821, no Palacio do
Governo de São Paulo e approvada no dia immediato.
Alguns annos mais tarde, em 1834, o Visconde de Porto Seguro fez renascer esta
questão, e escreveu em sua obra em dous volumes - Historia Geral do Brazil, tomo II,
pag. 814:
“ E a primeira lição que devemos colher é a de, já em tempo de paz, attendermos mais
aos meios de resistencia que deve offerecer este importante porto, do qual permitta Deus,
que seja “ quanto antes ” retirada a Capital do Imperio tão “vulneravel”, ahi na fronteira e
tão “ exposta ” à ser ameaçada de um bombardeio e soffrêl-o com grande prejuizo de
seus proprietarios, por “ qualquer inimigo ” superior no mar que se proponha a arrancar do
Governo, pela ameaça, concessões em que não poderia pensar se o mesmo Governo “
ahi ” se não achasse.
E isto quando a propria Providencia concedeu ao Brazil uma paragem mais central, “mais
segura”, mais sã e propria a ligar entre si os tres grandes valles do Amazonas, do Prata e
S. Francisco, nos elevados chapadões, de ares puros de “ aguas boas ” é até de
abundantes marmores, visinho ao triangulo formado pelas tres lagôas Formosa, Feia e
Mestre d'Armas, das quaes manam aguas para o Amazonas, para o São Francisco e para
o Prata”.
Mais recentemente, querendo o mesmo autor, conhecer de visu as condições da
localidade, fez uma excursão a Goyaz, e da cidade Formosa dirigio ao Ministro das Obras
Publicas a communicação que transcrevemos:
“Na extensão que acabo de percorrer ha, porém, outra região não menos apropriada á
colonisação européa, e para a qual eu creio que poderiamos desde já dar algumas
providencias, afim de a ir preparando pouco a pouco para a missão que a Providencia
parece ter-lhe reservado, fazendo della partir aguas para os tres rios maiores do Brazil e
da America do Sul - o Amazonas, o Prata e o S Francisco, e constituindo, por assim dizer,
o nucleo que retine entre si as tres grandes conchas ou bacias fluviaes do paiz.
Refiro-me a bella região situada no triangulo formado pelas tres lagôas - Formosa, Feia e
Mestre d'Armas, com chapadões elevados a mais de 1.000 metros, como nesta paragem
requer, para a melhoria do clima a menor latitude, favorecidos com algumas serras mais
altas da banda do norte, que não só os protegem de alguns ventos menos frescos deste
lado, como lhes fornecerão, mediante a conveniente despeza, os necessarios
mananciaes.
Não entrarei aqui na questão da alta conveniencia para o Imperio, e até para o Rio de
janeiro, da mudança da Capital, questão
que me reservo para discutir em uma publicação não official. Mas não posso deixar de
aproveitar esta occasião para recommendar importancia, em todo o sentido, da
mencionada paragem, como sólo fecundo, em e tem de vingar e prosperar muito
quaesquer sementes que nella se lançarem.
................................................................................................................................................
.......................
Entre outras localidades proprias para o estabelecimento de povoações, que ainda
poderiam encontrar-se nesta paragem, única em relação ao Brazil todo, reconheço e me
atrevo desde já a recommendar duas, das quaes deveria merecer preferencia aquella
que, por exames feitos expressamente, promette vir a receber, com a maior facilidade,
necessaria abundancia de boas aguas.
São dous chapadões de facil accesso, qualquer dos quaes prestaria assento a uma
povoação, desde logo com a perspectiva de poder estender até mais de um milhão, de
almas.
Qualquer delles fica acima de 1.000 metros sobre o mar, em sólo firme, secco, de faceis
escoantes e offerece a vista, de um lado ao menos, horizontes mui dilatados.
É o primeiro denominado por alguns - o da Gordura, a perto de quatro leguas ao O. N. O.
da Formosa. na paragem onde, a um tiro de fuzil, se veem, uma das outras, as cabeceiras
dos ribeirões Santa Rita vertente do rio S. Francisco, pelo Rio Preto, Bandeirinha, vertente
do Amazonas pelo Paraná e Tocantins, e Sitio Novo, vertente do Prata pelo São
Bartholomeu e grande Paraná!
Mas, bem que sem estes predicados, que aliás não é essencial que sejam aceitos tanto
ao pé da lettra e digamos quasi mathematicamente, encontra-se logo adiante obra de
legua e meia ao N O, outra localidade ainda mais alta e muito superior a esta tanto pela
maior facilidade de conduzir a ella as primeiras aguas potaveis, como pela maior
ventilação e vastidão de seus horizontes e pontos de vista.
Fica sobre a chapada em declive, que fórma o paredão ao nascente da Lagôa Formosa, a
menos de uns cento e tantos metros antes de acabar a subida do caminho que d'ahi
segue para o norte pelo dorso da mesma chapada, em direcção á denominada - Serra do
Cocal.”
Pelo que precede, vêmos que, ha quasi um seculo, foram assignaladas as vantagens da
necessidade de se mudar a Capital brazileira. Não nos devemos pois admirar de que, em
1891, de novo a discutiram os membros da Constituinte e lhe consagraram um artigo
especial na nova Constituição do Brazil.
Conformando se com a determinação da Constituinte, o Congresso consignou em 1891,
uma verba para que se procedesse á demarcação de 14.400 kilom. quadrados no planalto
central do Brazil. Foi pois, em cumprimento desta determinação que o Governo nomeou a
“ Commissão Exploradora do Planalto Central do Brazil ”.
Instrucções
A 17 de Maio de 1892, dirigio-nos S. Ex. o Ministro das Obras Publicas o seguinte aviso,
contendo as instrucções destinadas á Commissão.
“Em observancia á disposição do art. 3º da Constituição Federal, e para dar cumprimento
à resolução do Congresso Nacional que consignou na lei do orçamento em vigor a verba
destinada à exploração do planalto central da Republica e demarcação da área, que tem
de ser occupada pela futura. Capital dos Estados Unidos do Brazil, é n'esta data nomeada
a commissão encarregada de taes trabalhos, cuja direcção é confiada ao vosso
conhecido zelo e provada competencia.
“ No desempenho de tão importante missão deveis proceder aos estudos indispensaveis
ao conhecimento exacto da posição astronomica da área a demarcar, da orographia,
hydrographia, condições climatologicas e hygienicas, natureza do terreno, quantidade e
qualidade das aguas, que devem ser utilisadas para o abastecimento, materiaes de
construcção, riqueza florestal, etc. da região explorada e tudo mais que directamente se
ligue ao assumpto que constitue o objecto da vossa missão.
No decurso de taes trabalhos e tanto quanto possivel, podereis realisar não só os estudos
que julgardes de vantagem e utilidade para mais completo desempenho do vosso
encargo, mas ainda os que possam concorrer para a determinação de dados de valor
scientifico com relação a essa parte ainda pouca explorada do Brazil.
“ Da inclusa copia da Portaria d'esta data consta o pessoal que faz parte da referida
commissão.
Saude e Fraternidade. (Assignado) Antão Gonçalves de Faria. - Sr. Dr. Luiz Cruls.
Pessoal da Commissão
Luiz Cruls Chefe
J.de Oliveira Lacaille Astronomo
Henrique Morize Astronomo
Antonio Martins de Azevedo Pimentel Medico Hygienista
Pedro Gouvêa Medico
Celestino Alves Bastos Ajudante
Augusto Tasso Fragoso Idem, servindo de secretario
Hastimphilo de Moura Ajudante
Alipio Gama Ajudante
Antonio Cavalcante de Albuquerque Ajudante
Alfredo José Abrantes Pharmaceutico
EugenioHussak Geologo
Ernesto Ule Botanico
Felicissimo do Espirito Santo Auxiliar
Antonio Jacintho de Araujo Costa Auxiliar
João de Azevedo Peres Cuyabà Auxiliar
JoséPaulodeMello Auxiliar
EduardoChartier' Mecanico
Francisco Souto Ajudante de mecanico
Pedro Carolino Pinto de Almeida Commandante do contingente
Joaquim Rodrigues de Siqueira Jardim Alferes do contingente
HenriqueSilva Idem, idem
Material
Compunha-se o material destinado aos trabalhos da Commissão do seguinte: circulo
meridiano, theodolítos, sextantes, micrómetro de lugeol, luneta astronomica, heliotrópios,
chronometros e relogios, barometros de fortin, aneróides, bussolas, podómetros,
instrumentos meteorologicos, material photographico. Havia mais uma collecção de
apparelhos mechanicos para o concerto dos instrumentos, dado o caso de algum
accidente.
Todo o material, inclusive barracas, armas, mantimentos, occupava 206 caixas e fardos
pesando ao todo 9.640 kilogrammas.
Primeiramente effectuou-se, pelo caminho de ferro o transporte d'esse material do Rio de
janeiro para Uberaba, e d'ahi por deante, em animaes cargueiros.
A 9 de junho partia a Commissão do Rio de janeiro para Uberaba, ponto terminal da linha
ferrea da Companhia Mogyana. Chegando a Uberaba cuidou-se immediatamente da
organisação dos meios de transporte quer para o pessoal quer para o material, o que,
como só e acontecer, apresentou sérias difficuldades, tanto maiores que, no caso
occorrente, tratava-se de uma commissão numerosa acompanhada de consideravel,
material.
Só a 29 de junho acharam-se terminados todos os aprestos e a Commissao poiz-se a
caminho.
Levantamento dos caminhamentos
Todos os itinerarios percorridos pela Commissão foram levantados pelo processo ame-
DO PLANALTO CENTRAL DO BRAZIL.....................................................................................31
Commissão Exploradora do planalto central do Brasil
d’onde
Tomemos como ultimo exemplo um caminhamento de 200 kilometros, com visadas de
0k.5, e seja e = 5º, teremos para a ultima estação do caminhamento
Erro linear:
Erro em azimuth:
Cliché H. Morize
ACAMPAMENTO NAS CABECEIRAS
do Pindahyba
DO PLANALTO CENTRAL DO BRAZIL..........................................................................................41
Commissão Exploradora do Planalto central do Brasil
BRAZIL...........................................................................................................................................43
No seu Clima, Geologia, etc., do Brazil, (pag. 48) o Sr. Liais se refere a este trecho do
modo seguinte: «Todavia não é certo ser o pico de Itatiaya o ponto mais alto do Brazil.
Incontéstavelmente é o ponto culminante das serras da Mantiqueira e do Mar, mas em
Goyaz o Sr. Thomaz Ward calcula em 9.500 pés inglezes a altura dos montes Pyreneus,
perto da cidade de Goyaz, o que corresponde a 2.896 metros e o Sr. Hartt cita uma carta
do Sr. H. R. des Genettes declarando que medío o pico mais alto dessas montanhas e
encontrou 2.932metros. »
Outros autores mais modernos, desprezando as reservas de Hartt e Liais, dão os
Pyreneus como sendo effectivamente os pontos mais elevados do Brazil.
Pelas citações acima vê-se que a unica autoridade para a altitude dos Pyreneus é o
Padre H. R. des Genettes, visto que não existe a determinação attribuida pelo Sr. Liais ao
Sr. Thomaz Ward. Convem, portanto, examinar cuidadosamente essa autoridade.
Não consta haver outra publicação sobre o assumpto, além da do jornal bahiano citado
por, Hartt, que hoje difficilmente se póde encontrar. Existia, porém, na Bibliotheca do
Imperador, um manuscripto do Padre des Genettes, com data de II de Outubro de 1873,
que foi apresentado na Exposição da Sociedade de Geographia, e pemitte ajuizar da
exactidão d'esta determinação. Descrevendo o planalto de Goyaz, d'onde, se erguem os
montes Pyrenêos, diz o autor da manuscripto: « A altura da Mão de Páo, perto do rio
Paranahyba, na estrada de Catalão, sendo de 1.283 metros, o planalto se acha elevado
1.493 metros acima do Oceano. O grupo dos Pyreneus apresenta contra-fortes
caracterisados Elle não se levanta inopinadamente sobre as altas chapadas. O pico que
domina parece ter pouca altura, por causa mesmo d’esta disposição. Comtudo eleva-se a
2.932 metros acima do nivel do Oceano». E mais adiante: « A serra das Vertentes ou dos
Pyreneus attinge a sua maior altura no pico por 15º48’ de latitude sul e 7º28' de longitude,
do Rio de Janeiro. O cume que pizei é de uma rocha granitoide e tem no ponto teminal.
15m.32 comprimento sobre 3m.43 de largo. A base é larga, a altitude de 500 metros
acima do dorso da serrania é de 2.932 metros acima do mar. ”
D'estas citações resulta, claramente que serviu de base para a determinação da altitude
dos Pyreneus a elevarão dada ao leito do Paranahyba, no porto Mão de Pau. Ora, esta
altitude não combina de modo algum com os outros dados que possuimos sobre este rio.
Na explorarão do prolongamento da estrada de ferro paulista em direcção a Matto-
Grosso, pelo engenheiro Francisco Pimenta Bueno, cujo recente fallecimento abre tão
sensivel lacuna n'esta sociedade, a elevação da confluencia dos rios Paranahyba e
Grande, perto de Sant'Anna do Paranahyba, é dada em 320 metros.
Mesmo sem outros dados seria impossivel admittir que do porto Mão de Pau até este
ponto, o rio Paranahyba tivesse o declive de 963 metros exigido pela determinação de
des Genettes.
Na passagem pelo mesmo rio, perto da villa de S. Francisco das Chagas, algumas leguas
apenas abaixo das cabeceiras determinei com o aneroide a elevação de 909 metros.
Conquanto este numero não possa ser considerado rigorosamente exacto, é provavel que
só se afaste umas dezenas de metros da verdade, visto que ao chegar a S. João d'El-
Rey, o meu instrumento combinava quasi exactamente com o nivelamento da via-ferrea.
Em toda a região ao oeste do rio S. Francisco, por mim atravessada, só encontrei
elevação egual a dada para o porto Mão de Pau (1.283 metros em meio curso do
Paranahyba) no alto da serra da Canastra, visivelmente mais elevada do que as proprias
cabeceiras do Paranahyba.
Dados mais positivos são fornecidos por um trabalho ainda inedito do engenheiro de
minas, Chrispiniano Tavares, que me foi obsequiosamente communicado.
Em três viagens para Goyaz partindo do Rio de janeiro, de Ouro Preto e do Ribeirão
Preto, o Dr. Tavares accumulou grande copia de determinações de alturas, feitas com
aneroide, que combinam entre si nos pontos
DO PLANALTO CENTRAL DO BRAZIL..........................................................................................45
Commissão Exploradora do Planalto Central do Brasil
Porto Velho
Therm barom
1892, Julho 0 mm
11 - 1h 45m da tarde 27.0 721.0
27.0 721.3
27.0 720.5
12 - 1h 15m da manhã 13.6 725.0
Média 23.7 721.8
Santa Rita
Therm barom
1893, Janeiro 0 mm
12 – 7h 20m da manhã 21.1 724.8
OS PYRENEOS
A numeração dos picos é indicada do Norte para Léste : o pico III cuja ascensão
effectuámos é o mais alto.
O nosso acampamento ficava alguns cem metros ao Sul e dous ou tres kilometros a
Oeste do pico III; segundo-as nossas observações, era de 257 metros inferior a sua
altitude a d'este pico.
Vamos agora tratar da determinação da altitude dos Picos dos Pyreneus relativá à de
Pyrenopolis:
Quatro barometros de mercurio serviram para a operação: os ns. 1584; 786; 789 e 790.
Os dous primeiros ficaram, em Pyrenopolis, onde fizeram-se leituras de hora em hora: os
dous últimos nos acompanharam: sendo deixado no acampamento o 790 e transportado
ao alto do Pico o 789.
A 8 de Agosto, sahimos do acampamento: chegando á base do pico, nos apeamos e
fizemos a ascensão ate o alto. Como se deprehende do relatorio do geologo, Dr. Hussák,
o grupo dos picos dos Pyrenêos é essencialmente constituido de Itacolumite, cujos blocos
escalavrados, e mais ou menos enredados, bastante difficultam a subida.
Cumpre notar ainda que o pico mais elevado não excede 70 metros de altura, a contar da
base, por outra, do ponto d’onde procedemos à ascensão.
Chegando ao cume, fizemos uma serie de leituras do barometro, e, ao meio dia, tomamos
a altura meridiana do sol para a determinação exacta da latitude do Pico. Eis as leituras
do sextante, verificadas por tres observadores:
117º 8' 10" Cruls
” ” 0 Morize
” ” 35 Fragoso
Dedúz-se d'ahi para a latitude do Pico
15º 47' 44''
o que concorda com o valor
15º 48'
obtida pelo Padre des Genettes. Se, quanto á latitude, ha concordancia quasi absoluta, já
não succede assim com a longitude do Pico, que segundo o mesmo observador. é de
7º28' W. do Rio de Janeiro. Ora, se tomarmos por base uma série de dez culminações
lunares observadas comum opti no circulo meridiano, collocando-nos visivelmente no
meridiàno de Pyrenopolis. e attendendo á differença de longitude entre essa cidade e os
Pyreneus, acharemos para longitude desses picos :
5'.41' Oeste do Rio de Janeiro.
Por ahi vêmos que a longitude achada pelo Padre des Genettes está exagerada de cerca
de 1º.47'.
Eis as leituras dos barometros feitas no acampamento e no cume dos Pyreneus:
PICO DOS
PYRENEUS barom 789.00
meio dia 24.0 barom 653.65
25.0 653.40
25.2 652.40
Na seguinte tabella acham-se as leituras dos dous barometros que tinham ficado em
Pyrenopolis.
BAROM 1584 BAROM 786
Agosto T B T B
º mm º mm
7.7h tarde 23.0 701.39 23.0 702.50
8 21.1 1.40 21.2 2.30
8.8h. manha 18.3 2.10 18.0 2.60
9 19.9 3.10 19.4 3.60
10 23.3 3.70 22.5 3.90
11 24.7 3.70 24.0 3.80
12 25.8 3.40 25.1 3.60
1 h tarde 26.8 2.50 26.8 2.80
2 28.0 1.70 27.3 2.20
3 28.4 1.19 27.9 1.70
4 28.8 1.29 28.2 1.50
5 28.4 0.90 27.9 1.30
6 26.7 0.80 26.0 1.40
7 24.2 0.90 23.8 1.50
DO PLANALTO CENTRAL DO BRAZIL..........................................................................................57
Commissão Exploradora do Planalto Central do Brasil
Dous d'esses barometros 1.854 e 789, (o ultimo servira no cume dos Pyreneus),
convenientemente comparados deram os resultados seguintes:
pois baixar a 15º. Pouco depois da meia noite, reproduzio-se o phenomeno, na occasião
em que observavamos o eclipse do 1º satellite de jupiter. A temperatura elevou-se a 18º
C. (seria 1 hora da manhã) ao passo que era de II o minimum nocturno observado
algumas horas depois. Não é facil de explicar esse phenomeno - o nosso guia, mui
conhecedor da região, dizia que nessa quadra do anno soía produzir-se regularmente.
porém não conhecia a causa provavel
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Demarcação da zona
O problema da demarcação da zona não deixava de ser complexo e podia receber várias
soluções entre as quaes convinha escolher aquella que satisfizesse o mais
completamente possivel o desideratum que o leggislador teve em vista quando inserio na
Constituição o seguinte:
« Artigo 3º.– Fica pertencente á União, no planalto central da Republica, uma zona de
14.400, kilom. quadrados, que será opportunamente demarcada para n'ella estabelecer-
se a futura Capital Federal.
Paragrapho unico. – Effectuada a mudança da Capital, o actual Districto Federal passará
a constituir um Estado. »
O planalto central indicado no art. 3º da Constituição é formado na realidade por uma
série de chapadões cujas altitudes vão crescendo de Sul a Norte, e embora occupe
realmente uma extensão bastante consideravel, tem a sua região central localisada na
zona onde se encontram as cabeceiras dos principaes rios do systema hydrographico
brazileiro: o Araguaya, o Tocantins, o São Francisco e o Paraná.
A altitude média, segundo as nossas observações, oscilla entre 900, e 1.300 metros e um
numero não pequeno de rios torna esta região rica em aguas potaveis.
Além d'estas considerações, não podiamos perder de vista as origens historicas da
questão, que, como vimos acima, data do começo d'este seculo, e sem duvida, o
legislador as tinha na mente quando designou o planalto central para o local onde mais
tarde se fundaria a nova Capital. E' pois indubitavel que era a região proxima dos
Pyreneus que cumpria explorar, e, com effeito, os resultados ulteriores confirmaram a
nossa opinião.
Uma segunda questão que convinha resolver era a fórma a adoptar para a zona do futuro
Districto Federal.
Devia-se adoptar uma forma irregular tomando como limites os que os systemas
orographico e hydrograplúco pareciam indicar como mais convenientes? Ou seguindo o
exemplo dos Estados-Unidos da America do Norte, onde os limites dos estados são
simplesmente arcos de meridiano e arcos de pa-
rallelo, não era preferivel adoptar para a área a demarcar a forma de um quadrilatero
tendo por lados esses mesmos arcos?
A primeira solução, isto é, a fórma irregular, além de outras desvantagens, necessitava
muito maior tempo para sua demarcação, pois tornava-se indispensavel o levantamento
de todo o perimetro da zona, assim como a medição de uma base, operações demoradas,
visto o gráo de precisão relativamente moderado que requeria uma primeira demarcação,
pois era evidente que depois, com tempo e cuidado, se procederia á demarcação
definitiva e absoluta por meio de um levantamento geodesico.
A segunda solução, iste é o quadrilatero espheroidal, preenchia melhor o fim que nos
propunhamos, e pelo seu perimetro constituido por uma figura geometrica regular, tinha a
vantagem de evitar para o futuro questões litigiosas, que não raras vezes suscitam-se
entre estados limitrophes, acerca dos proprios limites.
Com effeito, dadas as latitudes de dous arcos de parallelo bem como as longitudes de
dous arcos de meridiano que limitam a área demarcada, torna-se possivel verificar a todo
o tempo, a posição exacta no terreno dos limites da zona.
Além d'isso, a fórma e as dimensões do espheroide terrestre, permittem determinar com
sufficiente rigor, a área de um quadrilatero limitado por arcos de meridiano e de parallelo,
cujas respectivas longitudes e latitudes são conhecidas. Tambem é de facil solução o
problema inverso isto é, dada a área, determinar as coordenadas dos vertices do
respectivo quadrilatero espheroidal que a encerra. Excusado é observar que, d'esta
fórma, o problema seria indeterminado, pois a uma mesma área, corresponderiam
innumeros quadrilateros, porém, no caso presente se podia impor mais a condicção de
ser o quadrilatero limitado por arcos de meridiano com differença de longitude conhecida,
assim como a latitude de um dos parallelos. N'esta hypothese, determina-se pelo calculo
a latitude do segundo parallelo.
Foi pois a segunda solução a que preferimos: Restava adtoptar a fórma do quadrilatero.
Resolvêmos esta nova questão inspirando-nos em considerações concernentes a propria
zona, seu systema hydrographico, e orographico, suas riquezas naturaes, etc.
Pelas considerações acima vimos que a fórma mais conveniente para o quadrilatero seria
aqueIla cujos arcos de parallelo e de meridiano teriam cerca de 160 e 99 kilometros, pois
que pondo de parte a fórma espherica da terra, esse quadrilatero teria uma superficie de
14.400 kilometros quadrados e um perimetro de 500.
As observações feitas em Pyrenopolis e Formosa deram-nos as seguintes coordenadas
approximmadas :
Latitude Longitude
oeste de Greenwich
Pyrenopolis 15º51'35'' S 3h 15m 25s
Formosa 15º32'7'' S 3 9 25
Como vê-se, a differença de longitude approximada é de 6m ou de um gráo e meio, seja
cerca de 160 kilometros, na latitude média. Foi pois esse valor que adoptámos para
différença entre as longitudes dos arcos de meridiano. Para latitude do parallelo mais
septentrional, adoptámos 15º20'0''. Com esses dados, limitando-nos ao numero inteiro de
segundos, procurámos qual seria a latitude do segundo parallelo.
A formula conhecida:
que assim vêm a ser as latitudes dos arcos de parallelo do quadrilatero cujos meridianos
acham-se afastados 1º.5.
Como vimos acima, a differença da longitude entre Formosa e Pyrenopolis quasi que era
de 1º e meio; por outra parte, conhecendo tambem proximamente as longitudes d'esses
pontos, resolvêmos demarcar o quadrilatero de modo que os arcos de meridiano
passassem perto d'estas duas cidades e os arcos de parallelo ao norte de Formosa e ao
sul de Pyrenopolis.
Achando-se o pessoal todo reunido em Formosa, dividimol-o em quatro turmas, das
quaes a cada uma incumbia determinar no terreno a posição de um dos vertices
correspondentes ás coordenadas indicadas nas instrucções reproduzidas adiante.
Instrucções
RIO AREIAS
Ambas as coordenadas geographicas serão fornecidas cada uma pelo menos por dez
determinações distinctas, não podendo os valores extremos da latitude differirem de mais
de 20" e os da longitude de mais de 3ºs5. Neste caso o erro provavel do resultado final
não ,excedera para aquella de 2".5 e para esta de 3s 5
Uma vez conhecidos os valores da latitude e da longitude da estação de observação,
tomar-se-hão as differenças entre estas e os das coordenadas dos vertices indicados
n'estas instrucções e depois de transformal-as em comprimentos expressos em unidades
metricas, servindo-se para isto da tabella annexa, ter se-hão os lados AB e aB de um
triangulo rectangulo em que A é o vertice e a a estação de observação. Segundo as
grandezas d'estes lados e a conformação do terreno, uma simples operação topographica
permittirá determinar com sufficiente approximação a posição no terreno do vertice A em
relação a estação a. Conhecida esta posição tratar-se-ha de fixal-a do seguinte modo:
Abrir-se-ha no terreno uma excavação, tendo um metro de lado e 1m.30 de profundidade
e em coincidencia com o respectivo vertice. Esta excavação encher-se-ha de pedras até
um metro de altura e sobre estas será feito um revestimento de leivas, de, modo que a
vegetação em poucos dias, possa encobrir o logar.
No centro da excavação será depositado um documento assignado pelo chefe e membros
da turma, em que serão escriptas as coordenadas do vertice, determinadas pela
observação e que será mettido dentro de um envólucro convenientemente lacrado.
Em seguida a posição do vertice será ligada por meio de visadas feitas sobre serras,
morros ou edificios e por triangulação topographica com quaesquer accidentes naturaes
do terreno como sejam rios, cabeceiras, etc., etc., de modo que em toda e qualquer época
seja possivel descobrir o logar onde se acham os vertices da área demarcada.
Durante a permanencia da turma na estação da observação, far-se-hão caminhamentos
na região circumvisinha dentro de um raio de 5 kilometros.
Igualmente será feito o caminhamento ao voltar cada turma do respectivo vertice até
Pyrenopolis.
Todas as reducções e calculos concernentes à determinação das coordenadas
geographicas bem como os caminhamentos desenhados de Formosa até o vertice e
d'este até Pyrenopolis, serão entregues ao Chefe, quando as turmas estiverem de volta
em Pyrenopolis, afim de permittir as verificações indispensaveis antes de poder
considerar como concluidos os trabalhos de demarcação.
As turmas deverão estar de volta em Pyrenopolis o mais tardar até o dia 10 de Novembro,
ACAMPAMENTO EM MACACOS
TURMA NE
Julião de Oliveira Lacaille, Dr. Pedro Gouvêa, A. Cavalcante de Albuquerque, A. J. de
Araujo Costa, Alferes Joaquim Jardim.
TURMA SE
Henrique Morize. Alipio Gama. José Paulo de Mello.
Deduz-se d'ahi para a altitude d'este ponto que parecia o culminante da chapada dos
Veadeiros : 1.555 metros.
No cume de dous morros proximos do acampamento, os aneróides marcaram:
Morto A Morro B
Aneróide n. 6072 630.0 628.0
Feiglstok 628.0 628.0
Respectivamente são pois as altitudes destes dous morros 1.673 e 1.678 metros.
Por estas observações fica demonstrado que não é justificada a altitude supposta
segundo as indicações do Snr. Moreira. Todavia é bastante consideravel a altitude
determinada e apresenta todas as garantias de exactidão compativeis com o emprego do
aneróide; a chapada excede de 170 metros a do cume dos Pyreneus, e de 290 metros,
nos morros.
A 15 de Setembro seguiram de, Formosa as turmas de N. W. e S.W., indo porém, antes
de separarem-se em Mestre d'Armas, explorar a Lagôa Formosa e percorrendo o mesmo
itinerario que fôra outr'ora percorrido pelo Visconde de Porto Seguro. Pretendendo visitar
a cachoeira do Itiquira que nos fôra recommendada como digna de se vêr, desviamo-nos
um tanto do nosso itinerario e a 16 acampámos em Itiquira, proximo à cachoeira. O
Itiquira é um ribeirão, affluente do rio Paranan; suas aguas regam o valle do mesmo
nome, mas, na região proximo a For-
SALTO DO ITIQUIRA
(120° de alto)
DO PLANALTO CENTRAL DO BRAZIL..........................................................................................93
Por ahi vê-se que as aguas, são abundantissimas mormente na parte meridional da zona
demarcada, tornando-se facil abastecer uma cidade, por mais populosa que seja, a razão
de 1.000 litros d'agua por dia e por habitante.
A qualidade das aguas d'esses diversos rios varia de um a outro. Em geral pode-se
considerar as aguas do sul como sendo melhores do que as do norte, em relação á serra
das Divisões e as dos affluentes do Corumbá como superiores as do São Bartholomeu.
Madeiras. - Comquanto a região explorada do Planalto não seja por sua natureza
extremamente rica em florestas, encontram-se estas em varios pontos e mais abundantes
na parte occidental da zona demarcada, onde se prolonga o matto grosso.
Pedras.- As pedras que se podem aproveitar para as construcções são de diversas
especies e encontram-se em abundancia sufficiente para suas diversas applicações.
A melhor d'estas é o granito de Barreiros, cujas amostras colhidas na superficie, são um
tanto decompostas, mas é fora de duvida segundo o Dr. Hussak, geologo da Commissão,
que a pouca profundidade, se encontrará rocha completamente fresca.
Ainda se encontra ao norte da serra dos Pyrineus e das Divisões, calcareo em
abundancia, muito aproveitavel para construcções bem como, entre Santa Luzia e
Formosa, boa argila para a fabricação de tijolos.
Conclusão
Um dos resultados mais importantes que a Commissão colheu e sobre o qual ousamos
chamar a attenção, é concernente ao clima da região explorada.
Sem receio de errar, podemos asseverar que bem pequeno é o numero dos Brazileiros
que a conhecem sob este ponto de vista, e quanto aos exploradores estrangeiros, bem
poucos são aquelles, que a tenham convenientemente explorado.
Isto explica-se facilmente, pois, procurando geralmente, e de preferencia, os valles onde
correm os grandes rios, seus itinerarios deixaram, na maior parte, de cortar a região mais
caracteristica do Planalto Central do Brazil.
Entre os exploradores estrangeiros, que mais se approximara d'ella, ou em parte a
percorreram, devemos citar Augusto de Saint-Hilaire 6 e Francis de Castelnau 7.
D'estes dois naturalistas transcreveremos aqui o que a respeito do clima da região,
explorada por nós, escreve o segundo.
Diz elle:
« O julgado de Meia-Ponte8: é atravessado na parte sul pela grande serra commummente
chamada Espigão-Mestre; nas visinhanças da cabeça da comarca o clima é agradavel
não sendo nunca excessivos nem o calor nem o frio; o ar é puro e de noite reina uma
brisa constante. Os ventos geraes fazem-se sentir desde, Maio até Setembro, sua
direcção é de léste para oeste, e sopram das quatro horas da manhã ás onze.
Só no Morro-Grande que faz parte do Espigão-Mestre manifesta-se a nevoa, e affirmam
que as vezes gela; porém é raro esse phenomeno meteorologico.
E' , frio o clima e puro o ar do territorio que jaz a leste e ao sul de Meia-Ponte, os ventos
geraes ahi sopram todo o anno; de Maio a Agosto é espessa a nevoa, e gela em Junho e
Julho.
E' ameno o clima da parte que se estende a oeste e ao norte do arraial mesmo e são
desconhecidas ahi as nevoas e a geada; os ventos são variaveis e quentes.
Geralmente esta região é menos salubre que o resto do julgado, porém o noréste e mais
insalubre que o oeste. De ordinario as chuvas começam em Outubro prolongando-se até
Abril.»
Eis como se exprime Castelnau a respeito do clima do antigo julgado de Meia Ponte, que
se pode considerar como o da região demarcada e difficilmente poder-se-hia em tão
poucas palavras e tão fielmente descrevel-o, como elle o fez.
Pela nossa parte não podemos deixar de manifestar a admiração que se experimenta ao
encontrar, em latitude tão pequena, região tão salubre, onde o emigrante europeu póde
acclimar-se sem necessitar nenhuma hygiene
Provado, pois, como está, por esses algarismos, que se poderá percorrer a distancia
entre a nova Capital e o porto do Rio de Janeiro, em vinte horas, vê-se que a objecção da
distancia não é sustentavel.
De semelhante estrada de ferro, com um traçado o mais directo possivel, não poupando
as necessarias obras d'arte, dependerá o bom ou o mau exito do importante projecto da
mudança da Capital Federal, encarado pelo lado dos beneficios que sua realisação póde
trazer para o desenvolvimento da região central do Brazil.
E' certo, pois, que assim ligada ao porto do Rio de Janeiro, a futura Capital Federal não
tardará a tornar-se um centro industrial e commercial, cuja vitalidade será um factor
importante e poderoso para a futura prosperidade d'este rico paiz.
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De Uberara a Pyrenopolis
POUSOS Distancias parciaes Distancias totaes
Km. Km.
De Uberara a Pyrenopolis
Km. Km.
Km. Km.
10. Rio Alagada 26.6 227.6
11. Fazenda da Alagoinha 11.1 238.7
12. Fazenda dos Barreiros 30.5 269.2
13. Santa Roza 21.8 291.0
14. Carurú 30.0 328.0
15. Fazenda do Capivary 14.4 335.3
16. Vertice SW 17.9 305.2
17. Pyrenopolis 35.8 382.0
Km. Km.
3. João de Moraes 21.0 64.7
4. Monjolinho 25.8 90.5
5. Curralinho 21.3 111.8
6. Póvoa 23.5 135.7
7. Goyaz 16.9 152.2
De Goyaz a Uberaba
Km. Km.
12. S. Bernardo 25.7 291.1
13. Rio Tocantins 7.1 298.3
14. Limoeiro 36.7 334.9
15. Muquem 15.6 350.5
16. Rio do Peixe 21.1 371.6
17. Villa de S. José de Tocantins 26.6 398.2
18. Arraial das Trahiras 12.6 410.8
19. Capão das Antas 37.2 448.0
20. Rio Maranhão 20.0 468.0
21. Retiro 12.3 480.3
22. Fidalgo 32.2 512.5
23. Acampamento NW 12.6 525.1
De Pyrenopolis a Morrinhos
De Formosa a Uberaba
Km. Km.
20. Ponte Nova 29.9 489.8
21. Fanecos 32.4 522.2
22. Uberaba 50.0 572.2
De Formosa ao Vertice NE
ANNEXO I
CHEFE DA TURMA SE
RELATORIO DA COMMISSÃO EXPLORADORA.........................................................................152
ANNEXO I
SNR. CHEFE DA COMMISSÃO.
No dia 2 partimos tarde e fizemos cerca de quatro leguas sob tempo borrascoso,
chovendo copiosamente na direcção N do horisonte. Nosso ponto de pouso foi a fazenda
da Lagoinha, da propriedade de D. Fortunata Roiz do Nascimento.
Dia 3 de Outubro. -Na primeira parte da noite ventou fortemente e a poeira que cahia
pelos intersticios do telhado nos cobriu de espessa camada. Choveu desde as 2 horas da
noite até o amanhecer. A's 2h.20m, seguimos para o proximo pouso situado na margem
do Rio Jardim, quatro leguas adiante da Lagoinha, onde chegámos ás 5 h. da tarde.
Aproveitamos o tempo para medir rapidamente a despeza do Rio Jardim, importante
affluente da margem direita do rio Preto. O resultado encontra-se reunido aos
congeneres, na secção respectiva.
Dia 4 de Outubro. -Partimos com tempo encoberto por nevoeiro, e chegámos ás 2h.30 m
da tarde à Fazenda do Palmital após haver atravessado o Rio Preto n'uma ponte de
madeira. Mandando as instrucções descer cerca de 68 kilometros na direcção Norte-Sul,
approximadamente seguida por nosso caminhamento, e dando este, rapidamente
reduzido, as seguintes distancias:
km.
Formosa a Santa Rita 5.7
Santa Rita a Lagoinha 24.9
Lagoinha a Jardim 20.9
Jardim a Palmital 17.6
Total. 19.1
Julgámos dever parar para verificar por algumas observações astronomicas a exactidão
de nossa posição. Havendo antes da partida feito 3 determinações da latitude de Formosa
com sextante e horizonte artificial, as quaes deram 15º32'40'' e tendo o ponto procurado a
latitude de 16º8'35" apenas deveriamos, andar 64 kilometros em linha recta, que mais ou
menos seguimos. Portanto na mesma noite de nossa chegada aproveitámos alguns
claros entre as nuvens e observámos 2 distancias zenithaes duplas de Jupiter que
forneceram um estado absoluto inicial dos relogios.
No dia seguinte observei com theodolito o sol para hora e latitude ficando os calculos para
serem feitos com mais vagar. Na tarde do mesmo dia determinámos o valor do passo da
mula montada pelo Dr. Alipio Gama, que levava o podometro. Pela mesma occasião
determinámos tambem o valor de nosso passo. Encontrámos os seguinte resultados:
Besta do podometro, sobre 250 metros de comprimento, média de quatro determinações:
m
Em terreno plano 0.740
Em declive 2.5% subindo 0.732
'' '' descendo 0.758
m
Passo do Sr. Morize 0.757
Alipio Gama 0.811
Paulo de Mello 0.751
Choveu á tarde e continuou o mau tempo por toda a noite, e todo o dia seguinte. A noite
de 6 para 7 conservou-se encoberta, mas não chuvosa, impossibilitando fazer
observações. No dia 7 de manhã consegui observar algumas alturas do sol, mas não sua
passagem meridiana por estar o céo encoberto. Neste mesmo dia acabou o Dr. Alipio
Gama de desenhar o caminhamento que mostrou estarmos na visinhança do vertice
procurado.
O dia 8 passou com chuva forte, e noite encoberta.
No dia 9, tendo calculado algumas das observações de latitude, achámos que estavamos
por 16º 7' e portanto deviamos caminhar mais 2kms.8 correspondentes a 1'35''.
Fiz novas observações para hora e latitude no dia 10 e a 11, em companhia do Dr. Alipio
Gama, fui em reconhecimento para achar esse ponto, o qual vimos que cahia em um
chapadão a 1 km.500 da cabeceira do corrego Retiro onde assentámos nosso
acampamento no dia seguinte, ficando as barracas de bagagem e a cosinha perto do
corrego e os instrumentos no ponto de observação.
Começaram as observações no dia 13, com muita difficuldade e incommodo. Durante os
dias 14 e 15 não foi possivel ver nem o sol, devido ao mau tempo. Na noite de 16
conseguimos algumas observações de Canopus, que poderão ser utilisadas para a
latitude.
O mau tempo continua com fortes pancadas de chuva que tornam muito penosa a estadia
nas barracas de observação por não serem estanques, e ficarmos, o Dr. Alipio Gama e
eu, frequentemente impossibilitados de dormir pelas goteiras que caem de todos os lados
sobre nossas camas de campanha.
Passamos as tardes no acampamento da cabeceira onde tomamos nossas refeições e
cada noite voltamos ao observatorio improvisado, para observar e dormir. Durante o dia
calculamos as observações anteriores abrigados em tosco rancho coberto com couros
crus que exhalam cheiro fetido e attraem innumeras moscas. A presença de uma multidão
de borrachudos cuja mordedura é muito dolorosa contribue para tomar o trabalho lento e
penoso.
O ponto em que estamos fica a 2 ou 3 kilometros na margem esquerda do Rio Preto,
n'uma planicie inclinada francamente de Léste para Oeste, e apenas ondulada pelas
erosões das aguas atmosphericas. Os corregos que a sulcam têm agua de boa qualidade
e a região é extremamente sadia, porém pouco mais adiante, na direcção do Sul,
encontra-se uma depressão muito forte, por onde se atira encachoeirado, o Rio Preto, que
até ahi corria entre margens assaz elevadas e com bastante rapidez, porém sem quedas
notaveis; n'essa depressão, existem segundo as informações locaes, febres de mau
caracter. Toda via, é preciso concordar que, acima do Palmital, recebe o Rio Preto
diversos affluentes, entre outros o Jardim, que não gozam de boa reputação entre os
moradores. A região que percorrêmos n'esta viagem é bastante sympathica pelo aspecto.
E' uma successão de pequenas collinas com perfil arredondado, mas de pouca elevação,
que separam o leito do Rio Preto do São Marco . Esta pequena cadeia extende-se ainda
bastante a Sul de Arrependidos que indica o ponto em que o Rio Preto se curva
accentuadamente para Léste, para formar a celebre Serra dos Crystaes.
A zona que cerca a Fazenda do Palmital, que formava nosso centro de operações, pela
maior facilidade de alli obter os escassos recursos necessarios a nossa alimentação e a
de nossos camaradas, possue boas terras, em que crescem com abundancia todos os
cereaes, mas que são cultivadas pelos processos os mais rudimentares. As mattas vão
desapparecendo rapidamente em todo o Estado de Goyaz, devido ao systema das
queimadas e apenas resiste a vegetação em torno dos rios e ribeirões cuja humidade a
protege contra o incendio. Esta circumstancia que facilita o estudo da topographia, pois
cada curso d'agua assignala-se de longe pela orla de verdura que o cerca, faz com que os
terrenos cultivaveis pelos processos ahi usados tradicionalmente se tornem cada vez
mais raros, e mais abundantes, os terrenos descampados, cujos melhores vão se
transformando em verdes campinas. Resulta disto que a criação do gado bovino tem-se
tornado a principal das industrias agricolas locaes ; todavia, por occasião de nossa
estada, a alta que tivéra o gado no mercado fluminense havia determinado forte
exportação e o quasi total desapparecimento dos rebanhos, havendo sido o Governo local
obrigado a prohibir a sahida das vaccas afim de impedir o despovoamento das pastagens,
de forma que um observador desprevenido difficilmente poderia considerar o Estado de
Goyaz como um dos maiores productores de gado do Brazil.
Continuando o tempo invernoso, tornam-se de todo impossiveis as observações; nos dias
17, 18, 19 e 20 aproveitamos o tempo calculando os estados absolutos dos relogios e os
primeiros valores da latitude. No dia 21, nossa tropa de animaes de sella e carga estando
descançada e não havendo pastos fechados, espalha-se por toda a parte, sendo
necessario enviar camaradas até muito longe a procural-os.
De 21 a 25 choveu com poucas interrupções sendo totalmente impossivel observar. As
manhãs são habitualmente serenas, mas do meio dia em diante, e especialmente á noite,
temos chuva, vento e trovoada. Durante estes dias enviei o Sr. J. Paulo de Mello ao
Registro de Arrependidos afim de comprar alguns mantimentos que estão se tornando
muito escassos na visinhança, e tambem para verificar a collocação de uma lagôa que
DO PLANALTO CENTRAL DO BRAZIL 155
figura em muitos mappas como cabeceira do Ribeirão dos Arrependidos e cuja existencia
é posta em duvida pelos moradores da redondeza. Ao regressar, communicou-me não ter
achado tal lagôa, que o Sr. Dutra, agente da arrecadação fiscal, morador antigo nessa
localidade, não a conhece, e, mais, que nenhum dos habitantes a viu jamais. Creio pois
que a existencia d'esta Lagôa marcada em mappas de conspicuos autores como Moraes
Jardim, por exemplo, é uma ficção que deve desapparecer da geographia de Goyaz.
Em compensação fui informado pelos moradores, e isto com uniformidade de palavras,
que existem na margem esquerda do Rio Preto, duas lagoas notaveis e até hoje ineditas
nos melhores mappas. A primeira de nome Lagôa Grande é formada pelo corrego Fundo,
e desagoa na margem direita do Rio Bezerra que me dizem ser maior que o Jardim.
Acima da Fazenda do Palmital, existe outra que desemboca na margem esquerda do
Bezerra e é chamada Formosa. Ha assim duas lagoas Formosas: esta e a que fica a N da
cidade de Formosa, sendo que a nova é, segundo dizem, maior que a antiga. A
configuração destas lagoas e de seus sangradouros fica patente pelo croquis junto.
Havendo começado o tempo a restabelecer-se a 25, observou-se o sol para hora e
latitude e à tarde fez se com o transito algumas pontarias para a cabeceira dos
Arrependidos que se vê do observatorio e que nos é apontada pelo Sr. Mello. D’essas
observações resulta que a cabeceira tem o azimuth 14º.10' magnetico a SW.
A noite tendo sido clara e, favorecendo-nos o luar, começou-se a observar para a
longitude, mas rio dia seguinte, 26, recomeça o mau tempo que dura até o dia 28 em que
tendo subitamente clareado a noite, observo para hora e longitude, sendo, porem,
impossivel proceder como mandam as instrucções, por alturas iguaes da Lua e de uma
estrella por não haver na visinhança d'este astro nenhuma de sufficiente brilho que a isto
se prestasse.
A chuva recomeçou no dia seguinte, 29 de Outubro, com crescente intensidade,
acontecendo na noite de 30 a 31 que no acampamento da cabeceira houvesse durante
diversas horas uma verdadeira inundação que entrou pelas barracas a dentro e molhou
toda nossa roupa e papeis. Ao meio dia reproduziu-se outra enxurrada egual. Mandei
então fazer em torno do acampamento vallas que offerecem um mais facil escoamento as
aguas e que espero possam evitar a reproducção de igual facto.
O mau tempo continuando sem cessar, tendo já perdido esperança de poder observar
novamente a lua na presente lunação, e as mordeduras dos borrachudos tornando o
trabalho do calculo muito penoso, resolvi a 4 de Novembro levantar o acampamento e ir
aboletar-me com os companheiros na fazenda do Palmital onde poderiamos mais
tranquillamente acabal-o. Deixei todavia as barracas do observatorio com dous guardas e
os instrumentos para voltar na proxima lunação se os calculos mostrassem que fossem
insufficientes as observações de longitude.
No dia 8, chegou-me um portador enviado pelo Dr. Cruls recommendando maior presteza
e dizendo-me que á vista do mau tempo podia reduzir, a 5 as 10 determinações de
longitude ordenadas pelas instrucções. Como já houvesse 7 calculadas e com resultado
aceitavel, resolvi dar por concluidos os serviços de observação e calculo, restando o da
fixação do marco. O resultado das observações foi o seguinte:
Latitude austral 16º8'14" S.
Longitude 3h 9m 6s.7 W de Greenwich.
Como a posição do ponto procurado ficava, segundo as instrucções, 16º8'35'' o de latitude
e 3h 9m 25s de longitude, um calculo simples mostrou logo que tinha que ficar a 8.124m.6
do observatorio no azimuth S 85º28'29" W, ou, 640m 6 em latitude, na direcção do Sul e
8.099m.2 em longitude na direcção W.
Parti no dia 10 com o Dr. Alipio Gama em reconhecimento do ponto procurado, fazendo
para isto o levantamento do caminhamento seguido, e verificámos que o ponto ficava
proximo do Corrego Marianna na margem direita do Rio Preto. Nos dias 11, 12 e 13,
havendo voltado o mau tempo, tivemos que interromper o serviço até o dia 14. N'este dia
tomámos a deliberação de aproveitar uma elevação que permittia vêr, da zona provavel
do marco, as barracas brancas, para medir uma base e fixar por um triangulo, o seu logar
no solo. A chuva porém interrompeu o serviço e o dia 15 foi empregado no levantamento
topographico da visinhança.
No dia 16, recomeçou-se a medição da base que depois de balisada, foi duas vezes
corrida com fita de aço achando-se um comprimento de 1345".75. Das duas extremidades
da base apontou-se para as barracas, em seguida tomou-se o azimuth da base, e
calculou-se a distancia ac em que a recta OV cortava, assim como a distancia cV a que
ficava o vertice, e o angulo acV. Mediu-se então directamente no terreno a distancia ac e,
collocando alli o transito, descreveu-se o angulo acV, (por não se enxergar o ponto O do
ponto c), e tomou se na linha cV, balisada convenientemente, a distancia cV em cuja
extremidade fixou-se com uma estaca a posição procurada.
O mau tempo trazendo continuas interrupções nos trabalhos, só se conseguiu acabar este
serviço no dia 18 á tarde quando se implantou o marco respectivo.
Devido á falta de material apropriado vi-me obrigado a não cumprir á risca as instrucções
no que diz respeito á substancia do marco. Este consiste em um tronco de aroeira
cuidadosamente descascado, madeira esta de difficil destruição, de 2m.50 de
comprimento, tendo sido na extensão de um metro desbastado em forma de prisma
quadrado com 18 centimetros de lado. O marco está enterrado até 20 centimetros acima
do ponto em que começa a parte lavrada. Está elle orientado com as faces dirigidas para
os quatro pontos cardeaes. Na face Norte, abaixo do nivel do sólo, existe uma cavidade
fechada em que foi collocado, depois de convenientemente arrolhado e lacrado, um vidro
contendo um documento assignalando a posição geographica do vertice, assignado pelo
pessoal da turma e por diversas pessoas presentes.
De accordo com as ordens escriptas recebidas do Dr. Cruls, não havendo mais serviço a
fazer na localidade, partimos no dia 21 de Novembro, para voltar a Pyrenopolis passando
por Santa Luzia onde deveriamos determinar o valor da latitude, e em seguida seguirmos
rumo Norte até encontrar a estrada das Cabeceiras da fazendola do Sr. Chico Costa.
No primeiro dia de viagem, 21, fizemos pouco mais de 2 leguas e pousámos em uma
casa abandonada, na margem do corrego Vereda, onde soffrêmos grande chuva. No dia
seguinte, partimos muito tarde por terem faltado animaes e chegámos com forte temporal
á fazenda da Samambaia, em que fomos muito bem recebidos e tratados pelo seu
proprietario Sr. Manoel Gonçalves. A serem exactos os mappas existentes, deveriamos
atravessar aqui a celebre Serra dos Crystaes, que entretanto fica muito a Sul e nos é
apontada no horizonte pelo Sr. Gonçalves.
Continuando muito a chuva no dia seguinte, resolvêmos falhar e partimos a 24 para a
Fazenda de Suruby, guiados pelo Sr. Manoel Gonçalves.
No dia 25 chegámos sem mais novidade á cidade de Santa Luzia, onde deviamos nos
demorar por alguns dias para determinar a latitude e onde fomos cordial e
cavalheirosamente recebidos pelo Sr. Pedro Lully, delegado de Policia. Passaram-se os
dias 26 e 27 sem que o tempo melhorasse e fosse possivel tomar qualquer observação,
de sorte que havendo o Chefe recommendado evitar demoras, e não esperando mudança
de tempo, resolvi proseguir nossa viagem, que, por ordem superior, em vez de continuar
em rumo de Meia Ponte onde se achava a Commissão, teve de ir para Norte até
encontrar a fazenda do Sr. Chico Costa, na estrada que vae de Meia Ponte a Formosa,
passando pelas cabeceiras.
No dia 28 partimos, porém os camaradas e dous dos soldados sorrateiramente ficaram na
cidade onde embriagaram-se, deixando nossa tropa entregue ao cabo Calixto. A' chegada
ao pouso appareceram dous camaradas e um soldado que pretenderam terem estado
incommodados. O pouso é na fazenda do Sr. Camello situada proxima do corrego. No dia
seguinte continuámos a viagem com pessoal desfalcado, faltando especialmente o
arrieiro; o resultado foi que perdeu-se a tropa, e tivemos que pousar na margem do
ribeirão Brechó ou Guariroba, sem bagagens nem cosinha.
A 30 ao meio dia, appareceu a tropa muito cançada, e julguei acertado deixa -la repousar
de forma que a 1 de Dezembro chegámos ao ponto denominado Chico Costa onde
terminava nosso serviço, restando-nos apenas voltar a Meia Ponte.
A região que atravessámos de Palmital a Santa Luzia e d'esta a Chico Costa pareceu-nos
fertil e sadia, ainda que em alguns pontos, obstaculos ao curso natural das aguas tenham
determinado a formação de pantanos e o consecutivo apparecimento das febres
palustres.
Encontrámos grande numero de cursos d'agua em qualquer dos trajectos, sendo os
maiores o São Bartholomeu e o São Marcos, entre Palmital e Santa Luzia, e em seguida o
Rio Descoberto, formado pela confluencia, proximo do Chico Costa, dos rios Maria do O´,
das Pedras e Jatobá.
A zona entre Santa Luzia e Chico Costa pareceu-me fertil : é de aspecto agradavel e
abundantemente irrigada. A pesar de estarmos na estação chuvosa, não encontrámos
nos moradores nenhum caso de febre, se bem que alguns dissessem que nas cabeceiras
eram frequentes as sezões.
Creio que esta região merece ser estudada de novo e mais detalhadamente do que
podiamos fazel-o, tendo em vista especialmente um chapadão elevado que fica entre
Chico Costa e Guariroba, a Sul do Rio das Pedras e do Jatobá.
Partimos a 2 de Dezembro de Chico Costa em direcção a Meia Ponte, sem mais
tomarmos o levantamento do itinerario, por ter sido executado este trabalho nesta zona
pela turma do Dr. Cruls, e chegámos sem mais novidade, no dia 5, encontrando com
alegria os companheiros que alli estavam.
Tendo sido executados os trabalhos de que fôra encarregada nossa turma, deu o Dr.
Cruls novas ordens: tinhamos que seguir para a Capital de Goyaz, levantando sempre o
caminhamento e ahi esperarmos a chegada da turma em Uberaba para observar a
posição geographica da Capital, aproveitando para isto o telegrapho do Estado na
determinação da longitude.
Seguimos de Meia Ponte ou Pyrenopolis no dia 23, sempre com mau tempo. Pousámos
na margem do Ribeirão Santa Rita onde tivemos que ficar o dia seguinte por faltarem
animaes. Chegámos no dia 25 á pequena e decrepita cidade de Jaraguá que ainda
conserva traços de uma passada prosperidade.
Continuámos a viagem no dia 26 e atravessámos o Rio das Almas por uma ponte de 30
metros de largo. Em consequencia da continua chuva está reduzida a estrada a um
verdadeiro atoleiro. Dormimos na casa da viuva de J. de Moraes e seguimos no dia 27
para a Fazenda de Monjolinho.
Apesar das fortes pancadas de chuva que nos apanham, admiramos o aspecto gracioso
d'esta região coberta de mattas cortadas de verdes campinas onde pasta muito gado.
Desde que sahimos de Jaraguá penetrámos na zona chamada de «Matto-Grosso», por
conter verdadeiras florestas que contrastam com a raridade de arvores grandes dos
campos do resto de Goyaz meridional.
Pousámos a 28 na cidade de Currallinho em casa do Sr. Belisario, presidente da
Intendencia. No dia seguinte dormimos na fazendola do Póvoa e a 30 de Dezembro, ás 2
horas da tarde, entravamos na Capital Goyana, tendo-nos causado agradabilissima
impressão o apparecimento dos primeiros postes da linha telegraphica.
O primeiro aspecto da cidade, quando vista da estrada de Meia Ponte, não é muito
lisongeiro; esta impressão porém muda á medida que se penetra nas primeiras ruas, e
desapparece de todo quando se, chega ao largo principal onde se gosa de excellente
vista sobre toda a cidade.
RELATORIO DA COMMISSÃO EXPLORADORA.......................................................................158
O fundo do quadro é formado pelos contrafortes da Serra Dourada, cujos contornos muita
se assemelham aos da collina de Santa Thereza, no Rio de Janeiro. Entre os cumes
distinguem-se o de Cantagallo, notavel por sua forma ponteaguda, e o de Santa Barbara
onde se construiu uma capella sob a invocação da Santa do mesmo nome, e da qual tem-
se admiravel, ponto de vista sobre a cidade. Esta é cortada em duas partes desiguaes
pelo Rio Vermelho que tira o nome e a côr da argila que arrasta após as enxurradas. Suas
marpens são cobertas de casas pittorescamente dispostas, e entremeiadas de grupos de
coqueiros cujo verde brilhante atira uma nota alegre no meio das côres sombrias dos
velhos telhados.
A margem esquerda possue um caes estreito, mas bem calçado, que vae até o Mercado
e no qual apoiam-se duas pontes de madeira bem construidas.
Na margem direita existem diversos edificios publicos de importancia: os dois hospitaes,
civil e militar, a Relação, hoje Tribunal Supremo, o Thesouro do Estado, o Convento dos
Benedictinos, etc., etc., e muitas igrejas. Todas estas construcções são antigas e em
geral mal conservadas, mas algumas têm aspecto pittoresco e são dignas de attenção por
serem testemunhas do tempo colonial. Na margem esquerda encontra-se mais o Palacio
da Presidencia, velho casebre com pretenciosa fachada, que hoje está quasi
abandonado, e no qual esteve Saint-Hilaire por occasião de sua viagem em 1819 Existiam
egualmente no seu tempo o Quartel, a Cadeia e um chafariz de architectura
genuinamente portugueza, que ainda hoje orna o largo principal da cidade e dá-lhe o
nome popular.
A Sé ou Cathedral que existia do tempo de Saint-Hilaire foi demolida e em seu logar
ergueram os alicerces de enorme templo. Sobreveio a Republica e com a suppressão do
orçamento do culto catholico os esforços dos fieis não foram sufficientes para continuar a
construcção; hoje jazem n'este montão de pedras, mais de cem contos de reis que
poderiam ter sido melhor aproveitados.
As ruas da cidade, ainda que geralmente estreitas, são soffrivelmente limpas e
margeadas de cada lado por calçadas formadas de lages irregulares. Por entre muitas
d'ellas cresce verdejante gramma que, assim como nos largos publicos, não encontra
obstaculos a seu desenvolvimento no pisar descançado do raro e pacato viandante que
deambula, de uma para outra casa á cata da indispensavel palestra.
A superficie coberta pela cidade é grande e o aspecto de seu conjuncto agrada á vista.
Deixa atraz de si, e longe, Formosa e Meia Ponte, se bem que esta ultima esteja em
melhores condições sob o ponto de vista climatologico e da abundancia d'agua potavel.
Em quanto a do Rio das Almas é excellente, tanto no verão como no inverno, o Rio
Vermelho arrasta uma agua cujo gosto lodoso a torna impropria para a alimentação e que
desapparece quasi na estação secca. A Capital Goyana tem para prover-se o chafariz de
que fallei, cujo producto é ligeiramente salobro, e as bicas da Carioca e Biquinha que
estão um pouco arredadas da cidade, mas fornecem agua irreprehensivel. Na verdade
cada casa possue poços ou cacimbas, porém suas aguas são geralmente tão salobras
que são improprias a todo o uso culinario.
Os poucos membros da sociedade goyana, que tivemos o prazer de frequentar foram de
extrema amabilidade e graciosamente prestaram-nos todos os serviços que estavam a
seu alcance. Existe um certo nucleo de pessoas intelligentes e instruidas; que ahi se
acham reunidas por força de suas funcções publicas e constituem um pequeno centro de
vida intellectual. Devida á iniciativa de alguns desses cavalheiros fundou-se uma pequena
bibliotheca, muito bem provida de obras litterarias e scientificas de que muito me
aproveitei durante nossa estada.
O tempo conservou-se bom desde nossa chegada, havendo apenas algumas chuvas de
pouca duração até o dia 10. De 10 a 20 choveu continuadamente.
No dia 22 recebi telegramma do Dr. Cruls, communicando ter chegado a Uberaba, e
ordenando começar o trabalho da determinação da posição geographica.
Na mesma noite comecei, auxiliado pelo Dr. Alipio Gama, a observar no Largo do
Palacio. A primeira troca de signaes para longitude teve logar no dia 23. O tempo tendo-
se conservado firme e boa a linha telegraphica, observei no dia 24 e 25 em que fiz a
ultima comparação. A 26 troquei egualmente signaes com Cuyabá, para determinar a sua
longitude.
Do dia 27 a 31 tratei de levantar a planta topographica da cidade, o que fiz auxiliado , pelo
Dr. Alipio, empregando uma bussola prismatica para os angulos e medindo as distancias
a podometro.
No dia 5 de Fevereiro, recebi ordem telegraphica de regressar com toda a urgencia ao Rio
para d'ahi seguir em outra Commissão. Parti no dia 6 de Goyaz, no dia 21 estava em
Uberaba e a 28 no Rio de janeiro.
HENRIQUE MORIZE,
Chefe da turma SE.
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ANNEXO II
CHEFE DA TURMA NW
ANNEXO II
uma variedade de outros rios que regam quasi todo o sul do Estado.
Tendo suas origens no Planalto Central do Brazil, e por elle deslizando-se, pelo menos
em certa parte dos seus cursos, apresentam alguns rios d'essas bacias, nomeadamente
os que, desprendendo-se do N da divisora, correm pela direita do rio das Almas e do
Tocantins, verdadeiro contraste com os que se destacam da outra vertente.
Emquanto o plateau goyano, na phrase do distincto Dr. Hussak, geologo da Commissão e
meu digno companheiro de turma, parte integrante do Planalto Central, se vae
expandindo para o Sul, para o Oriente e para o Occidente, em ondulações suaves e
pequenas variações de altitude, permittindo assim que de algum modo a maior parte dos
rios, que o regam por esse lado mansamente deslisem, para ao Paranahyba, quasi
bruscamente se quebra ao Norte, apresentando uma nova topographia de terreno, por
cujas grandes depressões as aguas do plateau se precipitam em uma só ou em varias
quédas.
Não ha certamente um goyano d'essas zonas que não se tenha, apercebido d'esse
contraste.
E' commnum ouvil-os dizer, quando fallam de viajar para o Norte, que vão descer o Vão -
de tal ou tal rio, que tal é a palavra com que designam as depressões a que nos
referimos. O Vão do Paranan de um lado e a cachoeira do Itiquira do outro, são os
exemplos mais caracteristicos d'essas particularidades.
Taes circumstancias, porém, não impedem que, em dados logares, entre os valles de
certos rios, o plateau, com os caracteriscos que lhe são proprios, abra caminho para o
Norte, como o reconhecimento da chapada dos Veadeiros, devido ao meu intelligente
collega Celestino Alves Bastos revelou de um modo concludente.
Era para uma d'essas depressoes, appellidada - Vão dos Angicos - que nós desciamos no
dia 23 de Setembro. Por esse modo penetrámos na bacia do Maranhão e viemos pousar
no Desterro, fazenda do cidadão Victor de Abreu. Transpuzemos durante o trajecto o Rio
do Sal muito perto da sua nascente. A denominação dada a esse rio é a mais bem cabida,
ao contrario do que geralmente acontece.
A sua agua é quasi intragavel, tão salgada se apresenta ao paladar. O pouso está cerca
de 935 metros acima do nivel do mar e possue grande numero de moradores. A unica
cultura existente é a dos cereaes e são quasi todos destinados á manutenção dos
cultivadores. A industria da creação, conforme os habitos goyanos, é a principal
preoccupação dos habitantes d'essa zona. Quasi todo o commercio é feito com a cidade
de Santa Luzia onde elles vão á busca do sal e por onde vêm do Sul os boiadeiros fazer
acquisição de gado. Parte d'ahi para Santa Luzia uma boa estrada de rodagem com o
conveniente desenvolvimento, pela qual sobem a serra os carros de bois, que são o
principal meio de transporte do sal. No dia 24 abandonámos a fazenda do Desterro e
viemos acampar á margem esquerda do Corrego do Pé da Serra, affluente do rio
Monteiro, após um percurso de 19kms.2.
Este trecho da estrada é muito curioso. Orientado em geral para NE até transpôr o rio do
Sal, por cujo valle desenvolveu-se, dá o caminho, passado esse rio, quasi urna volta
sobre si e segue para o novo acampamento rio rumo de W.O terreno um tanto ondulado
nada offerece de notavel e é coberto de crescida vegetação.
Os rios do Sal e Monteiro têm n'essa parte dos respectivos cursos trajectos caprichosos.
Vão orlando as quebradas quasi verticaes pelas quaes o plateau se destaca
magestosamente aos olhos do viajante.
Gigantescos paramentos por onde a natureza geologica do logar se está denunciando,
vem pela esquerda morrer perto das margens dos rios, emquanto, pela direita, o horizonte
se abre n'uma alegre perspectiva de terrenos, que aplainando-se sempre em declive, vão
se descortinando para diarite. Transpuzemos em caminho o corrego Curralinho, affluente
do rio do Sal e o corrego Bonito affluente do rio Monteiro. Este ultimo, como o rio do Sal
tem as suas aguas extraordinariamente salobras.
No dia 25 viemos acampar na margem direita do Rêgo d'agua, após um trajecto de
16kms.6.
DO PLANALTO CENTRAL DO BRAZIL.......................................................................................167
Commissão Exploradora do Planalto Central do Brasil
A estrada vae com inflexões mais ou menos consideraveis sempre no rumo de W e pelo
vale do Monteiro. Transpuzemos até, ahi o corrego Fundo, o ribeirão da Porteira, os
corregos Canna Brava e Pontinha, todos affluentes da margem esquerda do Monteiro. O
Pontinha, antes de sua foz, une-se ao Rêgo d'Agua, cuja agua de pessima qualidade é
quasi imbebivel de salobra. Fomos obrigados durante o tempo em que pousámos perto da
margem direita do corrego a beber com assucar a sua agua, para assim vencer a
repugnancia que ella nos inspirava.
Munido de um sextante, consegui observar durante a noite algumas alturas meridianas de
estrellas, que me permittiram conhecer com alguma segurança o parallelo em que nos
achavamos.
Depois de uma viagem de 17 kms.3, fomos, no dia 26, acampar na fazenda do Padre
Simeão, á margem esquerda do rio Monteiro.
Cerca de metade do caminho a estrada corre na direcção NW e a outra metade no rumo
de N. O terreno semelha o do plateau: tem ondulações pouco pronunciadas e explendidas
pastagens.
São os melhores campos que vi em Goyaz, muito bem aproveitados para a creação do
gado, que é ahi numerosissima. Elegantes cabeceiras, com os seus aprumados e verdes
renques de buritys, poem uma nota alegre á monotonia do campo.
A casa da fazenda fica na extremidade de um suave e grande chapadão, perto da
margem esquerda do rio Monteiro, que ao percorrer esses terrenos já leva as suas aguas
consideravelmente avolumadas e sempre salobras.
As más condições atmosphericas durante a viagem não me tendo permittido observar
como desejava, resolvi que ficassemos alguns dias n'esse pouso, não só para esperar
uma mudança propicia de tempo, como para pôr em ordem as minhas cadernetas.
A fazenda do padre Simeão está cerca de 16 leguas distante de Pyrenopolis e, segundo
informações ministradas por um vaqueano dos arredores, a uma legua do nosso
acampamento tomam-se visiveis os Picos dos Pyreneus.
Obedecendo ás instrucções recebidas do Dr. Cruls, desenhei na escala de 1/100000 todo
o percurso que fizemos de Formosa á referida fazenda e tendo assignalado
simultaneamente no desenho o ponto, cuja demarcação nos fôra confiada, reconheci que
estava ainda distante do meridiano de 3hs.15m.25s W de Greenwiche e um pouco ao Sul
do parallelo de 15º20' S ambos prescriptos pelo nosso Chefe.
No dia 26 logrei observar algumas distancias da lua ao sol. Em quasi todas as noites
consecutivas o ceu manteve-se encoberto, acontecendo mesmo chover por vezes.
Do nosso acampamento poderiamos continuar o reconhecimento para W por dous
modos: proseguir pelo valle do Monteiro até a sua confluencia com o Rio Verde, e assim
penderiamos mais para o Sul ou transpondo o Monteiro n'esse ponto e trilhando rumo do
N, ir passar o Rio Verde muito abaixo da citada confluencia.
Resolvi aceitar o segundo alvitre, e com essas disposições, levantámos acampamento no
dia 30.
O Monteiro tem 2ms.58 de largura na superficie das aguas, no ponto em que o
atravessámos, na fazenda do padre Simeão. A sua maior profundidade attingia n'essa
época 0m.791. Segundo as nossas determinações elle tem uma velocidade de 33ms.2
por minuto.
A estrada até Quilombo, perto do corrego Agua Fria, onde fómos acampar no dia 20, vae
na direcção geral do N. Nada apresenta de particularmente notavel.
Logo após o Monteiro, transpuzemos o corrego Palmital, seu affluente, em uma altitude
de 627 metros e chegámos a Quilombo, depois de uma viagem de 15kms.6, por uma
successão de chapadões.
Durante a noite consegui felizmente observar a altura meridiana de Achenar e por ella
verifiquei que estavamos muito para o Norte, do parallelo de 15º20'S.
De Quilombo fomos até o Rio Verde, sempre no rumo W, e com um trajecto de 13kms.9
O terreno, de planuras a principio, tornava-se bastante accidentado a proporção que
avisinhava-se da margem do rio.
No dia 6 reconheci pelo meu caminhamento que não estava muito afastado, em longitude,
da posição que procurava.
Caminhámos no rumo de NW até São Bentinho, atravez de bonitos campos,
extraordinariamente adaptaveis á creação do gado.
Atravessámos n'esse percurso o Fidalgo, rio de pessima agua, bem como os corregos Pai
José e Salobro, seus affluentes. Como o nome do ultimo está indicando, são muito
salobras as suas aguas.
São Bentinho é um ajuntamento de moradores á beira da estrada que vae de Pyrenopolis
para o norte do estado de Goyaz. Fica collocado n'uma situação aprazivel, na fralda de
um chapadão delimitado a Léste pelo Salobro e a Norte pelo corrego São Bentinho.
Tem uma pequena capella, construida pelo Sr. Umbelino, principal fazendeiro das
redondezas, na qual, o vigario de Pyrenopolis celebra em certas épocas do anno
cerimonias do culto catholico.
A casa da fazenda está n'uma altitude de 648 metros; cerca de 100 metros abaixo de
Pyrenopolis.
O Sr. Umbelino é um grande creador, e, apezar das affirmações que elle faz em contrario,
é quem maior quantidade de gado vaccum possue n'um raio de 10 leguas.
A sua principal creação, porém, é feita n'uma outra fazenda, perto da margem do
Maranhão, onde são magnificos os campos de pastagens.
A unica cultura nas roças proximas é a dos cereaes. Grande parte D’ella é consumida
pelos moradores, emquanto o restante desapparece no commercio com os viajantes, que
percorrem a estrada.
A partir de São Bentinho seguimos rumo geral de NW, transpondo corregos insignificantes
e terreno de relevo pouco caprichoso. Todos esses corregos são tributarios do Rio
Fidalgo, no qual desaguam pela margem, esquerda.
No dia 8 de Outubro consegui finalmente acampar de um modo definitivo na encosta de
um chapadão suave, coberto de pequenas arvores, regularmente espacejadas, que os
Goyanos distinguem pela denominação de cerrado.
O logar destinado a servir-nos de ponto de observação, nada apresentava de
excepcionalmente attrahente.
Para o N e W ascendia em elevações pouco escarpadas, que fechavam-nos o horisonte
por esse lado e punham uma linha de separação evidente ás aguas tributarias do Rio
Fidalgo e do Rio dos Patos. Ambos esses rios passavam a uns 9 kilometros do nosso
acampamento, o primeiro pelo Oriente e o segundo pelo Occidente; fechando um
triangulo de magnificas pastagens corriam a juntar-se a NW da posição que
occupavamos. Levantámos as nossas barracas propriamente na bacia do Fidalgo perto
da garganta em que a estrada corta a divisoria a que acabamos de alludir.
Raros moradores existem pelas circumvisinhanças, o que equivale dizer que as grandes e
vastas superficies de terreno muito pouco têm sentido a acção benefica do homem A
cultura do sólo quasi que não existe pois mal se póde decorar com esse nome o esforço
inevitavel que faz o pobre sertanejo para arrancar do seio fecundo d’essa parte do
Planalto os indispensaveis alimentos. A creação do gado constitue, como sempre, a
principal occupação d'esses Goyanos: elles esperam pacientemente a chegada annual
dos boiadeiros, que ahi organisam as suas boiadas, pondo-se depois a caminho para
Minas Geraes.
N'essa época o gado vaccum attingiu uma cotação nunca vista nos annos anteriores.
Dir-se-ia, vendo a procura excepcional e o modo leviano por que em geral faziam
acquisição do gado, que estava-se ante um longinquo echo das especulações mercantis
da Bolsa do Rio.
Dei desde logo começo ás observações astronomicas, tendentes ao conhecimento das
coordenadas geographicas do ponto determinado pelo caminhamento.
Um sextante de Hurlimann, um thermometro commum, um thermometro de maxima e
minima, de Casella, um aneroide e um pequeno transito de Gurley — taes eram os
instrumentos que tinha a meu dispor.
Como não me devia demorar muito tempo, segundo as prescripções do Chefe, e eram
limitados os meus recursos materiaes, resolvi
A população é ahi muito menos condensada e quasi toda entregue aos labores da
creação.
ANNEXO III
RELATORIO DE A. CAVALCANTI
CHEFE DA TURMA NE
ANNEXO III
que, devido á mesma causa, ainda hoje se formam, deram logar ás primeiras
explorações. Assim é que, levados pela sede do ouro, os bandeirantes (exploradores que
serviram-se de bandeiras á procura do rumo que deviam seguir tomando o em que o
vento as dirigia), atravessaram o Paranahyba, e proximo aos ribeirões onde o ouro se
mostrava mais abundante, logo construiram habitações e um nucleo se formava. Multas
cidades de Goyaz assim tiveram o seu principio.
A fundação da cidade de Formosa, porém, parece não ter sido uma applicação litteral do
auri sacra fames, pelo menos não nos consta que em suas immediações exi stam
minereos auriferos. O commercio de cereaes e principalmente de pelles, como o indica o
seu primitivo nome «Villa dos Couros» é que julgo explicar sua origem.
Em antithese ao seu nome, esta cidade não se torna notavel, nem pelas construcções
que são em geral mal feitas e sem elegancia, nem por uma posição que permitta
descortinar bellos horisontes.
A agua de que se servem os habitantes é má e em quantidade insufficiente, entretanto o
Bandeirinha pode fornecel-a boa e em grande abundancia para o abastecimento da
cidade, sem sobrecarregar com pesado onus os cofres publicos, a crêr nas affirmações
de alguns interessados que com pessoas entendidas têm ido fazer tal reconhecimento.
A Lagôa Feia que fica 4 a 5 kilometros a Léste de Formosa, em desaccordo com o que
indica o seu nome, é bastante pittoresca; orlada de arvores mais ou menos frondosas e
cobertas as proximidades de suas margens por menuphares e outras plantas aquaticas
onde vivem as libellulas e outros insectos, povoada ainda pelas marrecas, mergulhões,
jacanans, etc., ella produz agradavel impressão ao visitante.
Deixemos porém, as descripções que se poderiam ter como divagações e procuremos
dar, embora de modo arido, apenas uma noticia do nosso trajecto até Uberaba,
E' a referida lagôa formada pelas cabeceiras de um dos affluentes do São Francisco, o
Rio Preto, nos approximando de cujo valle fizemos a nossa viagem quando sahimos de
Formosa,
No primeiro dia em que sahimos desta cidade, 4.700 metros adiante, passámos o Santa
Rita e fômos pousar no sitio Olhos d'Agua, tendo antes atravessado o ribeirão deste
nome. Estes ribeirões são os dous primeiros affluentes da margem direita do Rio Preto.
Em Tabatinga, fazenda do Sr. Francisco Venancio, pousamos no dia 3 a menos de um
kilometro distante deste rio nas cabeceiras de cujo ultimo affluente, o São Bernardo,
armámos nossas barracas na tarde do dia 4.
Já muito nos tinhamos afastado d’aquelle rio tributario, da bacia de Léste, e nos
dirigiamos para o valle do Samambaia, perto do qual pousámos no dia seguinte na
fazenda do mesmo nome.
O Sucury e mais galhos deste rio, que encontrámos em nosso trajecto nos impressionou
de modo agradavel, pois vimos então burityzaes10 que altos se erguiam desde as
nascentes e os seguiam de modo a indicar, até onde a vista alcançava, o curso das suas
aguas.
No dia 6, atravessámos o Samambaia e levantámos nossas barracas no Arrasta Burros.
Ahi, devido a terem desapparecido alguns animaes fômos obrigados a nos demorar 3
dias. Aproveitámos esta demora para fazermos um caminhamento do nosso pouso
situado na margem direita do ribeiro Arrasta Burros, no ponto em que elle desagua no
Samambaia
O terreno por onde fizemos o nosso trajecto até este ponto apresenta extensos
chapadões e campos vastos muito proprios para creação e agricultura.
O café, a mandioca11 , o milho, o feijão, a canna, etc., são cultivados com feliz exito
nestes logares
Em 10 de Fevereiro, depois de um itinerario de perto de 22 kilometros, deixámos a
estrada real e fónios pousar 1.700 metros ao lado na fazenda do Capim Pubo, onde o
nosso aneroide dava uma differença de altitude de 65 metros, para menos, comparada
com a que tinhamos ao deixar a estrada.
Já haviamos muito nos distanciado do valle do Samambaia e nos approximado do
Pamplona, affluente do São Bartholomeu,
tendo atravessado, proximo ás suas cabeceiras, o ribeiro Poção que é galho d'aquelle rio.
Em 11 de Fevereiro, deixámos a fazenda Capim Pubo. A altitude marcada por nosso
aneroide, ao chegarmos a estrada real, variou pouco até o logar denominado Barreiros
onde uma vegetação abundante de um e outro lado denunciava as cabeceiras de dous
ribeirões que seguiam direcções oppostas: o Capão e o Matto Grande. Seis kilometros
adiante tinham os ganho em altitude 80 metros e mais fômos subindo de modo a ter nos
elevado mais 295 metros, 9 kms.5, além deste ultimo ponto. Estavamos na Serra Nova
dos Crystaes, um kilometro distante do Almocafe, onde ao chegarmos accusava o nosso
aneroide uma perda da 70 metros em altitude.
No dia 12 deixámos este povoado, e fômos pousar na Estevinha, 35 kilometros além.
Ao galgarmos o dorso da serra, tinhamos subido 40 metros e adiante, cerca de 1km.5, de
0m.001, havia diminuido a pressão accusada naquelle ponto.
Relativamente plana a estrada se nos apresentou em seguida, e na Serra Velha dos
Crystaes a altitude encontrada era equivalente a do Almocafe. D' ahi vae o terreno pouco
sensivelmente descendo, e francamente poucos kilometros além de modo a estarmos no
ribeirão dos Ciganos 358 metros abaixo da altitude da Serra Velha.
A Serra dos Crystaes cuja lombada seguimos, estende-se na direcção NM. E' a divisora
das aguas dos rios São Marcos e São Bartholomeu os quaes recebem diversos ribeirões
que sulcam os flancos da serra e brotam, em sua quasi totalidade, das proximidades do
seu extenso cume.
Os crystaes de rocha existem ahi em veeiros mais ou menos profundos, pelo menos os
que são aproveitados para o commercio.
Foi na Serra Velha que foram feitas as primeiras explorações, e ultimamente estavam
sendo emprehendidas nas immediações do Almocafe. Crystaes limpidos e de tamanhos
notaveis se encontram nestes logares; mas são raros os em que sejam notadas todas as
faces, pelo menos não obtivemos uma só amostra. São estes crystaes vendidos a 6800 a
arroba, sendo regeitados todos os de pequenas dimensões e os que têm jaça ou são
coloridos, por não se prestarem ao fabrico de instrumentos opticos. Explica-se por este
modo encontrar-se montes deste quartzo em que abundam pequenos crystaes, nos
logares explorados.
Continuemos nossa noticia tornando-a ainda mais breve, procurando apenas satisfazer
seu principal fim.
Por entre o valle do São Marcos e o do São Bartholomeu, affluente do Corumbá, fizemos
a nossa viagem até a Larga do Estevão. Continuando o nosso trajecto avistámos á direita
as cabeceiras do Embiruçú de cujo valle nos approximámos e acompanhámos n'uma
pequena extensão, tendo-o depois deixado á esquerda. A nossa estrada até Catalão
seguiu então mais ou menos o rumo da linha divisora dos tributarios do São Marcos e do
Verissimo.
Muito accidentado mostra-se o terreno desde o ponto que fica uns 7 kilometros antes do
Rio Pirapetinga até proximo do sitio dos Picos.
A 18 de Fevereiro chegámos em Catalão e a 20 continuámos a viagem. Atravessámos o
Paranahyba no porto Mão de Pau a 21 e avançámos até o sitio dos Furados onde
pousámos.
Barreiros (sitio), Larga do Estevão (fazenda) cabeceiras do Pau Terra, Rio Pirapetinga,
Pires (fazenda), Catalão e Ranchos foram os nossos pousos depois do da Estevinha.
Retiro dos Macacos (fazenda), Bagagem (cidade), Agua Suja (villa) Ponte Nova (cidade),
Fanecos (sitio) e Uberaba (cidade), foram os nossos pousos nos dias seguintes ao em
que sahimos do sitio dos Furados, tendo portanto chegado em Uberaba a 28 de
Fevereiro.
Alem dos Furados 15 kms.5 avistámos o Rio Bagagem cuja agua era de um vermelho
escuro devido ao barro em suspensão que trazia das minerações de diamantes feitas em
Agua Suja.
Atravessa este rio, pouco além do Retiro dos Macacos, o caminho de Bagagem. Esta
cidade está dividida em 2 districtos, o da Estrella do Sul, onde foi encontrado o celebre
brilhante, e o da Cachoeira, nome devido a uma pequena cascata que o rio faz neste
logar. Ahi o atravessámos pela segunda vez; a 2 kms.5 além de Agua Suja elle corta
novamente a estrada. A sua agua é ahi limpida e bôa. A mineração do diamante
completamente abandonada em Bagagem é feita com resultado nesta villa. No relatorio
do Sr. E. Hussak, geologo, além de um estudo do terreno desta região, vem a descripção
do processo ahi empregado na mineração.
O Rio Brejão, das Velhas, Claro, Guariba e os ribeirões Atalho e Uberaba foram os mais
importantes cursos d'agua. que encontramos depois do Rio Bagagem.
O nosso caminhamento de Formosa a Catalão começa no Rio Jardim, visto como o
astronomo Sr. H. Morize já havia levantado a primeira parte quando foi determinar o
vertice SE.
A. CAVALCANTI,
Chefe da turma NE
CÁLCULOS
Concernentes a determinação das coordenadas do vertice NW
POR
AUGUSTO TASSO FRAGOSO
Chefe de turma
x = -15º20'7".4
L= 3hs.24m.16s.6 W Pariz
ou 3hs.14m.55s.6 W Greenwich
Observação preliminar
Nas paginas que seguem vêm todos os calculos effectuados para a determinação das
coordenadas do acampamento da turma designada para assignalar no terreno o vertice
NW da figura que define o futuro Districto Federal.
Para a realisação do trabalho astronomico servi-me do relogio E e de um sextante
Hurlimann.
A latitude foi calculada por meio de dez observações distinctas de alturas meridianas de
estrellas, escolhidas entre as que melhor se prestavam ao trabalho e conforme
permittiram as condições atmosphericas.
Para a longitude, utilisei-me de distancias da lua ao sol, medidas com o sextante, pouco
antes da conjuncção d'esses dous astros.
Parte das distancias foi observada no dia 12 e as restantes no dia 14 de Outubro.
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DETERMINAÇAO
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ANNEXO IV
RELATORIO DO DR. ANTONIO PIMENTEL
(SUB-TEMA)MEDICO HYGIENISTA DA COMMISSÃO
ANNEXO IV
O Planalto Central do Brazil ou da
America do Sul
Todo o mundo sabe que o povoamento do Brazi1 quasi que se limita exclusivamente á
facha do littoral, com o extenso desenvolvimento desde o Rio Grande do Sul á
embocadura do Rio Amazonas.
Justamente nesta região é a salubridade subordinada, em geral, ao gráo do paludismo
visto ser baixa, humida, quente e palustre toda essa zona.
Nas terras altas do interior tudo é differente.
E´ exuberante a fertilidade do solo; a salubridade proverbial; grande a abundancia de
excellente agua potavel; rios navegaveis; extensos plainos sem interrupções importantes;
soberbas madeiras de construcção de suas grandes florestas, abundancia de preciosos
mineraes e essencias diversas; elevação do terreno determinando um menor gráo de
seccura atmospherica e uma temperatura mais fresca do que á primeira vista se poderia
suppor, em face da sua latitude geographica; tudo, emfim, que tem as mais estreitas
rejações com os progressos materiaes de uma grande cidade, e com o bem estar dos
seus habitantes
Infelizmente, porém, tudo isto é desconhecido, e todo o interior longinquo do Brazil ainda
hoje passa por ser paiz doentio, muito quente e mesmo inhospito.
Entretanto, o contrario é que é exacto, e do que se segue claramente deduz-se que a
natureza fez desigual a repartição dos beneficios do solo do Brazil (como em toda a
parte), e os primeiros povoadores desconhecendo a sabedoria desta distribuição,
preferiram as regiões menos ferteis e menos salubres na comprida e estreita zona do
littoral, sem duvida pela maior facilidade do commercio maritimo e das relações politicas
com a antiga metropole e o resto do mundo civilisado.
Os chapadões do Brazil Central sobrelevam os da Europa Central e Meridional,
approximam-se dos da Africa Meridional, não attingem os da Asia nem os da America,
dentro dos limites andinos.
A Suissa, a Saboia e o Tyrol são considerados paizes mui elevados; mas, esta opinião é
fundada sobre o aspecto que offerece o grupamento de grande numero de cumes
perpetuamente cobertos de neve e dispostos em cadeias muitas vezes parallelas á cadeia
central. Os cimos dos Alpes elevam-se a 3900 e mesmo 4.700 metros de altura, ao passo
que as planicies visinhas do Cantão de Berne não tem mais de 400 a 600 metros. Esta
primeira elevação muito mediocre póde ser considerada como a da maior parte das
chapadas de extensão consideravel na Suabia, Baviera e Silesia, perto das nascentes do
Wartha e do Piliza.
Na Hespanha, o solo das duas Castellas tem um pouco mais de 580 metros de elevação;
e em França, a chapada a mais elevada, é a de Auvergne, sobre a qual repousam o Mont
Dore, o Cantal, o Puy de Dome, etc. e cuja elevação, segundo Leopoldo de Buch, é de
720 metros.
Estes exemplos provam que, em geral, na Europa, os terrenos elevados, que apresentam
o aspecto de planicies, não têm mais de 400 a 800 metros de altura acima do mar.
Do Cabo da Boa-Esperança até 21º de latitude austral, o solo da Africa, conforme as
observações de Gordon, se eleva insensivelmente até 2.000 metros.
Todo o chapadão africano, ao norte do parallelo de 31° habitado pelos Betchouanas, os
Korannas e os Bosjesmans, tem cerca de 800 a 900 metros acima do nivel do Oceano; e
esta altura, com pequena differença, póde ser considerada a mesma em Angola Central,
para baixar um pouco no Estado Livre do Congo, constituido, por assim dizer, só pela
vasta e pouco elevada bacia do Rio Congo.
Na Asia tem-se prestado mais attenção aos picos e ás gargantas ou passagens das
cadeias de montanhas do que, propriamente, às planuras elevadas Entretanto, como
refere Humboldt, entre os parallelos de 34º e 37º de latitude boreal encontram-se
chapadas analogas às do Mexico, e acredita este notavel naturalista que a altura média
das chapadas comprehendidas entre o Himalaya e o Kouen-Lun não vae além de 3.500
metros; mais ao norte, o grande deserto de Gobi' segundo o Padre Duhalde, não attinge a
1.400 metros. Mas, Schrader diz, que a região do NW da China fórma um enorme
chapadão interior, completamente cercado de montanhas, e que sob a fórma de grandes
terraços vem descendo por degráos da vertente septentrional do Himalaya, onde se
acham em uma altitude média de 4.000 metros, passa pelo Thibet com 3.000 a 3.500
metros até a grande superficie ligeiramente concava que forma o deserto de Gobi e as
esteppes da Mongolia, cujo nivel inferior não vae abaixo de 900 a 1.100 metros.
Nos Estados Unidos, na região comprehendida entre as Montanhas Rochosas e a cadeia
littoral da California, extende se uma intumescencia do solo, de 1.800 a 2.000 metros de
altura, formando o que o capitão Fremont e Walker chamaram a grande bacia.
E' um vasto terreno arido, pouco habitado, não interrompido por accidente algum, cheio
de lagos salgados, dos quaes o maior tem a altitude de 1.280 metros e communica com
um menor, o Yuta, que recebe um rio abundante, denominado Timpanogo.
E' palpavel o contraste entre estas terras elevadas do occidente norte-americano e as
planicies baixas, ligeiramente onduladas, bastante regadas, ferteis, cheias de habitantes,
proximas do Mississipi, entre as Montanhas Rochosas e os Alleghanys, cujos vertices, o
monte Washington e o monte Marcy, segundo Lyell, levantam-se a 2.027 e 1.642 metros;
sendo que a maior parte dessas terras baixas attinge apenas á elevação variavel de 138 a
195 metros.
Em geral, o chapadão mexicano, de direcção norte-sul, é tão pouco interrompida por
valles, tem o declive tão brando e uniforme, que em distancia superior a 800 kilometros o
solo conserva-se com a altura entre 1.700 e 2.700 metros sobre o nivel do Oceano
visinho.
Este chapadão inclina-se insensivelmente para o norte até os Estados Unidos, e para o
sul tambem; mas, para o oeste, para Acapulco, Tepic, etc ., e para léste até Vera-Cruz, a
descida é mais rapida e durante muito tempo servio de serio obstaculo ao
desenvolvimento do paiz.
Com o rapido progresso do Mexico, as difficuldades de transporte desappareceram com a
construcção de uma linha ferrea que partindo de Vera-Cruz e Alvarado, vae à cidade do
Mexico, e d'ahi, seguindo a geral direcção longitudinal do chapadão, procura os Estados
Unidos, onde penetra, com a altura de 1.148 metros, na chapada de La Sierra Madre, no
Novo Mexico.
Na America Meridional a Cordilheira dos Andes, a principio dividida em tres ramos, (o
oriental, o central e o occidental) reduz-se depois a dous no Equador e Perú, e assim
continúa com afastamentos differentes até ás proximidades do vulcão Copiapo, mais ou
menos, entre a provincia chilena de Atacama e a argentina de Catamarca, onde de novo
forma um só systema até ás terras de Magalhães.
Por toda a parte a Cordilheira é cortada e interrompida por fendas semelhantes a filões
abertos e não obstruidos por substancias heterogeneas.
Se ha plainos de 2.700 e 3.000 metros, como no Equador, Colombia, Bolivia, etc., são de
pequenas dimensões, podendo mesmo ser antes considerados como valles limitados
pelas cordilheiras secundarias, cujos picos mais elevados constituem as cristas dos
Andes tambem.
Os valles transversaes do Perú e da Colombia, mais do que os das outras republicas sul-
americanas, têm ás vezes profundidade vertical de 1.400 metros. Isto até hoje tem
impedido, talvez, a construcção de vias ferreas transandinas nesses paizes, obrigado os
viajantes a andar só a cavallo ou ás costas dos indios chamados carregadores, e reduzido
a nada a exportação agricola, mineral, ou outra, para as regiões orientaes pela
impossibilidade do transporte.
Pela succinta descripção que fiz de diversos plainos do mundo, em comparação com o
nosso Planalto, conforme o exposto neste livro, se inferirá a incontestavel superioridade
deste, visto que das tres zonas em que que Humboldt dividio a America Meridional, as
duas, do norte e do sul, são esteppes e planuras hervosas, de pouca altura; em quanto a
do meio, de um lado em contacto com a da serra de Parima e do outro com o systema
das elevadas montanhas do Brazil, póde ser considerada como uma planura selvatica,
que na porção mais elevada tem a altitude média de 1.000 metros sobre o nivel do mar, e
dimensões iguaes a quasi tres vezes o territorio de toda a Republica Franceza.
A conformação physica e climatologica do vasto planalto central do Brazil, facilita sobre-
maneira a acclimação do trabalhador europeu, sem os prejuizos das regiões torridas,
cujos predicados ahi desapparecem pela grande altitude média; pelos seus rios
navegaveis e brandos declives favorece o movimento commercial, interno e as demais
relações dos Estados brazileiros entre si e do Brazil com as republicas visinhas, a
America do Norte, a Europa e a Africa, bem como garante ao Governo Federal innumeros
pontos estrategicos para a defeza militar do Districto.
A fertilidade do solo combinada com a altitude, etc., concorre para o bom exito na cultura
do frumento, como em minima escala se observa perto de Cavalcanti ao norte do Estado
de Goyaz; e todas as plantas da zona temperada poderão bem se acclimar nesta região.
que, embora pequena em relação ás dos tres grandes citados rios da America do Sul, é
todavia uma das mais importantes do systema hydrographico brazileiro.
Este ramo concentra-se entre Piumhy, a léste, e o Araxá e Desemboque (conhecido pela
exuberante fertilidade do seu solo), a oeste, formando a Serra da Canastra, de direcção
septentrional, e da qual brota o magestoso Rio São Francisco, na cachoeira da Casca
d’Anta, de uma quéda de altura superior a 203 metros (S. Hilaire), e 24 kilometros apenas
distante do Rio Grande ou Paraná, já então bastante caudaloso e de mais de 400 metros
de largura média.
A Serra da Canastra, além da nascente do São Francisco, caminha para o norte quasi a
prumo, com o nome de Serra da Matta da Corda, até as cabeceiras principaes do rio
Paranahyba, perto de Patos; d'ahi em diante continúa mais ou menor o rumo de NE até
extinguir-se perto da confluencia do rio Paracatú com o São Francisco; e a das Vertentes
perlonga com a margem aquilonar do Paranahyba até o ponto de encontro deste com o
rio São Marcos, que do norte vem perpendicularmente.
Forma então a serra um angulo recto e passa a dividir os Estados de Minas Geraes e
Goyaz, nos limites septentrionaes, ao mesmo tempo que separa as aguas dos rios
Paranahyba ao sul, São Marcos ao norte e os tributarios do São Francisco, Paracatú,
Urucuia, etc., ao nascente.
As profundas inflexões da Serra das Vertentes mais importantes pelas suas articulações
na superficie accidentada do terreno do que pelas suas relações com a configuração
hypsometrica do mesmo terreno, nos levam a estudo mais detalhado; visto como o que é
meramente um appendice, um prolongamento do grande massiço divisor das aguas, por
muitos é tido como o proprio massiço, em virtude da engrenagem que formam as
cabeceiras dos rios do norte com os do sul, chegando mesmo em alguns logares a se
communicar, na estação das chuvas. ou guardar insignificante distancia entre si. Isto
acontece com as nascentes do Jaurú e Agoapehy de um lado, do rio Alegre e Guaporé do
outro; com o Paraguay e o Arinos, o Cuyabá e o Xingú, em Matto Grosso; com o Rio das
Almas e o Corumbá em Goyaz; com o Rio Preto e o São Marcos, nas divisas de Goyaz
com Minas Geraes.
Não muito acima, deste ultimo ponto, mais ou menos onde o Rio Preto corta a Serra das
Vertentes, cerca de 40 kilometros a léste de Formosa,a cadeia dobra para o occidente, ao
mesmo tempo emitte para o norte um braço que na latitude de 11º a 12º, se reparte para
NE e NW, separando os Estados da Bahia e Pernambuco do Piauhy e este do Maranhão
e Goyaz, e circunscrevendo as bacias dos rios Parnahyba, Itapicurú e outros que
desaguam no mar, nas costas septentrionaes.
Com o rumo geral de W, a Serra das Vertentes vai desapparecer perto da confluencia do
rio Beni com o Guaporé, no Estado de Matto Grosso, no principio da secção
encachoeirada deste ultimo rio.
Devo aqui tornar patente a impropriedade do nome de serra dado ao massiço central
divisor das aguas, ao divortium aquarum do finado geographo brazileiro Thomaz Pompeu
de Souza Brazil, por isso que verdadeiramente serras não ha ao occidente das da
Canastra e da Matta da Corda. Somente sobre as altas lombadas do grão massiço umas
vezes se elevam cristas isoladas ou seriaes, cumeadas mais ou menos uniformemente
dispostas, de diversos comprimentos, em geral pequenos; outras vezes o proprio massiço
mais não é do que um taboleiro largo, comprido e rectilineo, ou estreito, tortuoso e ligeira
ou profundamente accidentado quer no sentido transversal, quer no longitudinal, na sua
curta extensão.
Com os diversos ramos do massiço central o mesmo se dá, tanto para o norte como para
o sul, sobretudo para o norte, onde, é mais franca a differença de desnudação de um
chapadão a outro e mais fundos os valles produzidos pela lenta erosão das aguas no
correr de muitos seculos.
Entre Formosa e os Pyreneus ha uma porção de massiço, erradamente conhecida
nastra, segundo o Dr. Gorceix, até os arredores da cidade de Matto Grosso, segundo
Castelnau.
Como acontece com o grés e o itacolumito, tambem é constante a existencia simultanea
do itabirito, ferro oligisto e de schisto argiloso, sendo que neste schisto, de ordinario, se
encontram intercalações de calcareo diversamente corado.
Os calcareos das bacias do rio São Francisco e Rio das Velhas tomam importancia
consideravel e bem assim em varios logares dos Estados de Goyaz e Matto Grosso.
Após a formação do complexo fundamental dos schistos crystallinos, houve movimentos
orogenicos em virtude dos quaes os schistos foram levantados, fortemente dobrados e
metamorphoseados, ao mesmo tempo que provavelmente se produzio a zona granitica do
Rio Claro, Goyaz, Barreiros e os diques de pegmatito encontrados em varios pontos do
caminho (Dr. Hussack).
É possivel que fosse o mesmo o phenomeno que em Matto Grosso, na Serra dos Parecys
e na sua ramificação da Serra do Agoapehy, levantou os schistos talcosos pertencentes á
época dos schistos micaceos e outros do periodo de transição. De formação identica é o
calcareo que na antiga capital de Matto Grosso se usa para a construcção e caiação de
casas.
Ainda mais, o granito roseo de grãos finos commum nessa região, fórma, com toda a
probabilidade, a massa inferior, a base de todas as elevações de terreno desse canto do
longinquo Estado.
Mais perto da antiga capital, o terreno apresenta uma crosta superficial de 12 metros de
espessura, de ganga; uma camada inferior de quartzo fragmentado e de grés
itacolumitico, de cerca de 3 metros, em que se encontra ouro; e, emfim, mais abaixo vêm-
se pissarra, argilla roxa, amarella e branca, em ordem decrescente de sua riqueza
aurifera (Castelnau).
Em Goyaz, a referida constituição vai até o chapadão dos Veadeiros ao N, até Caldas
Novas e Velhas de Goyaz a SW, e chega tambem aos Estados visinhos do da Bahia,
Piauhy, Maranhão, Matto Grosso, Minas, e, como já vimos, São Paulo e Paraná.
As deslocações produzidas pela acção das forças internas do nosso planeta, elevando,
inclinando e modificando as camadas estratificadas, acarretam sérias difficuldades para a
determinação da idade absoluta destas rochas. Mesmo para a idade relativa dos diversos
grupos que se podem estabelecer, torna-se difficilima essa determinação em face da falta
absoluta de fosseis.
Em todo o caso, o deposito maritimo desses sedimentos, a horisontalidade da sua
disposição e o facto de não serem estas camadas cobertas por outras do mesmo periodo
geologico, formam os elementos essenciaes para uma interessantissima conclusão, que
mui agradavel até poderá ser para nós Brazileiros.
Vem a ser o que diz Gerber: “... Tendo Elias de Beaumont com evidencia demonstrado
que a idade das diversas partes do nosso globo, isto é, a época do levantamento das
mesmas acima do nivel do mar, deve ser anterior á mais antiga formação limitrophe, cujas
camadas se conservam horizontaes, assim como posterior á idade das formações que por
effeito do proprio levantamento se acham inclinadas, é claro que em vista do referido
facto, de se acharem as formações de transição (paleozoicas) horizontalmente
estratificadas sem serem cobertas por formações secundarias ou terciarias, phenomeno
de que não consta haver semelhante exemplo em outra parte do mundo, é claro, repito,
que esta parte do continente sul-americano já se achava elevada acima do nivel dos
mares em uma época anterior ao tempo em que começaram os depusitos sub-marinos;
ou, em outros temos, o Brazil central já existia como um continente extenso, quando o
resto do mundo ainda estava submergido no oceano universal, ou apenas surgiam partes
delle como ilhas insignificantes.
E' pois o Brazil, e em particular a provincia de Minas Geraes, a quem toca a honra de ser
o mais antigo continente no nosso planeta.”
Ao redor desta região, diz o Dr. Hussack, porém, ao N e W, na bacia do To
metros (Eschwege), e o Rio São Francisco com o mesmo comprimento tem na barra do
Rio Pará, 576 metros apenas.
Se compararmos, agora, essa altitude das nascentes do Rio Grande com as do Rio Preto
e do Parahybuna, affluentes do Parahyba do Sul, e com o leito deste ultimo rio, então a
differença excederá de 500 metros.
Com effeito, o Parahyba, em Campo Bello, nas contravertentes do Rio Grande e do Rio
Preto, está na altitude de 408 metros.
Na cachoeira do Pirapora, o rio São Francisco desce cerca de seis metros na extensão de
um kilometro e alguns metros, e nas barras dos rios Paracatú e Urucuia a altura é
respectivamente de 503 e 495 metros (Halfeld); notando se que o primeiro tem uma das
suas principaes nascentes, Rio Preto, dentro da cidade de Formosa e o segundo nasce
ao oriente da Serra das Vertentes, perto desta cidade, cuja altitude é de cerca de 850
metros. Ora, regulando o curso destes dous rios o comprimento pouco maior de 200
kilometros, vê se que os chapadões entre elles collocados, sobre serem de dimensões
pequenas, são sulcados em todos os sentidos pelos valles dos seus numerosos e
caudalosos affluentes.
Os dados relativos aos chapadões que dos rios Urucuia e Pardo vão até os limites do
norte do Estado de Minas Geraes, não me parecem sufficientes para uma boa noticia e a
elles me refiro com reserva.
O que se observa em Minas Geraes com referencia ás cabeceiras do Rio Grande, com as
do São Francisco, e com o Rio Parahyba, etc., se nota em Goyaz em relação ás
cabeceiras dos rios das vertentes do norte com as dos rios das vertentes do sul.
O ribeirão de Itiquira, que vai formar o Paranan, precipita-se da altura vertical de 120
metros, e corre ainda em borbotões em plano inclinado de 30 metros para alcançar o nivel
da corrente placida e tranquilla. Apezar desta grande queda, o Rio Paranan, após sinuoso
e longo curso, vai desaguar no Tocantins, cuja torrente mui pedregosa tem sido até hoje
talvez o maior obstaculo á navegação fluvial desta parte do Estado; isto não se dá com o
Araguava que, depois de tornar-se navegavel, apresenta-se completamente
desembaraçado em extensão talvez superior a 1.200 kilometros, como ficou dito.
Relativamente aos chapadões de Matto Grosso, me fallecem dados precisos para uma
exacta descripção minuciosa. Assignalo de passagem que, neste limite do planalto central
onde já é notavel a depressão do solo, provavelmente devido a isso e tambem á lentidão
das correntezas e ás grandes inundações dos rios, o paludismo assola cruelmente no
extremo occidental; tanto que a capital de Matto Grosso foi mudada da cidade deste nome
para a de Cuyabá por causa da sua insalubridade. Identica insalubridade se nota no
proprio Alto Tapajoz, onde o Dr. Langsdorf contrahiu (e alguns dos seus companheiros de
expedição tambem) tão grave intoxicação palustre com violentos symptomas de
perturbação cerebral, que na pequena estada de onze dias no Tucurisal, no Salto
Augusto, perdeu completamente o uso da razão, a acreditar-se no que diz Hercules
Florence, intelligente companheiro do inditoso explorador e escriptor da noticia da viagem.
Os irmãos Steinen, ha muito poucos annos, só a custa do acido arsenioso e rigorosos
cuidados puderam explorar o Alto Xingú.
A Commissão do Planalto, neste sentido, foi de excepcional felicidade, porquanto apezar
da sua grande quantidade de petrechos therapeuticos, só delles se aproveitou para
soccorrer a pobreza dos logares visitados, quasi nada servindo para o pessoal, não
obstante nos tres ultimos mezes supportar, além da fadiga, muita chuva.
Os dados relativos a São Paulo e Paraná infelizmente se resentem da mesma
insufficiencia que os de Matto Grosso, pelo que nada ouso affirmar de positivo.
Em summa, os chapadões afastados das proximidades do massiço central, collocados, ás
vezes, estreitamente entre valles de rios caudalosos, sem concorrer para separar as
cabeceiras dos grandes cursos d'agua, propria
mente fallando têm perdido grande parte dos attributos physionomicos do dito massiço
central, e em todos os sentidos têm as dimensões reduzidas, de modo a tornarem-se
individualisados ou, por assim dizer, independentes pela sua disposição topographica.
A W, o terreno baixa sem cessar e o paludismo domina a pathologia, local; ao NW, além
do paludismo, as depressões do terreno nas regiões inferiolres dos grandes rios fazem
perder ao todo o caracter dos altos chapadões; ao NW as terras elevadas, além de muito
afastadas do centro, e, como já disse, individualisadas, no S do Maranhão, Piauhy,
Pernambuco, a NW de Bahia estão sujeitas á acção devastadora das seccas, que de
tempos a tempos arruinam, essas paragens.
A Léste, encontra-se logo a bacia do São Francisco, que apezar dos chapadões do
Paracatú e Urucuia é baixa e está afastada do centro, como tambem se obseva com o Sul
e Sudoeste, abrangendo São Paulo e Paraná.
Pelo que tenho exposto até aqui, a meu ver, e so no proprio centro do Planalto, aliás
vasto, isto é, só por onde andou a Commissão, com pequenissima differença, é que se
acha o local que o legislador teve em vista quando incluiu na Constituição Federal o art.
3º.
traiçoeiramente os chefes uns aos outros, usando de argolas de ferro com correntes, no
intuito enganador de os fazer dansar, como falsamente havia feito com alguns dos seus.
Mal os chefes ficaram encorrentados pelo pescoço, o astuto Bueno os prendeu e grande
numero dos mais, durante a immensa confusão em que se viu a tribu, uma vez
descoberto o embuste.
Por estes e outros factos, teve dos indios o astucioso explorador o nome de Anhanguéra,
que quer dizer-Diabo velho.
Depois destes dous aventureiros, outros procuraram o ouro de Goyaz, destacando-se o
filho do velho Anhanguéra, dotado de juizo prudencial, de experiencia e inteireza, o qual
exerceu o cargo de capitão-mór regente das minas, em que prestou grandes serviços ao
Estado, vindo depois a morrer pobre em 19 de Setembro de 1740, com 70 annos de
idade, não obstante haver possuido mui ricas lavras.
Das grandes e riquissimas descobertas do capitão-mór regente a fama correu
promptamente, e por toda a parte echoou.
De Pernambuco, Bahia, Minas Geraes, São Paulo, Matto Grosso, etc., a immigração
irrompeu, e tal foi que,dentro de dous annos, o povo cresceu prodigiosamente. No dizer
de Cunha Mattos, numerosas caravanas de 25.000 e 30.000 pessoas levavam verdadeira
vida nomade em barracas, a cada nova descoberta transladando-se de um para outro
ponto.
Em 1752, fundou-se na capital a casa da fundição, que no anno seguinte, só de imposto
do quinto, rendeu 202:886$. Em 1767 a renda foi de 984:196, na época do fastigio, e em
1807, em plena decadencia, o quinto do ouro só rendeu 14:272.000.
Assim descahiu rapidamente a mineração goyana. Hoje, póde se dizer, todo o ouro
extrahido em Goyaz o é somente pelos faisqueiros.
Durante os annos de maior producção do ouro, a agricultura cahiu em tão completo
abandono, que os generos alimenticios alcançaram preços fabulosos: o sacco de milho
custava seis e sete oitavas de ouro, o de farinha de milho dez e onze; o primeiro porco
que lá appareceu foi vendido por oitenta e a primeira vacca de leite por duas libras de
ouro, ou 256 oitavas; o que importa dizer que só tiraram solidos e avultados lucros os
vivandeiros que de continuo estavam a chegar de São Paulo.
A illimitada avidez dos primeiros descobridores das minas auriferas parece ter extinguido
nelles toda a noção de economia, visto que havendo desprezado totalmente a agricultura,
todo o ouro extrahido despendiam em troca dos generos de que precisavam. Como a
maior parte delles eram dominados pela ignorancia, de baixa educação e anteriormente
viviam sem fortuna, tornaram-se altivos e orgulhosos vendo-se rapidamente na posse de
uma riqueza a que nunca tinham aspirado; e como o jogador afortunado, que desprende
com profusão o que venceu sem trabalho, entregaram-se ao luxo, creando assim milhares
de necessidades. Os costumes ficaram cada vez mais corrompidos, o ouro corria dos
cofres com a mesma presteza com que entrava, o que com elle se obtinha era de curta
duração; e emquanto assim se aluiam os alicerces da ephemera opulencia, era
completamente descurada a educação dos filhos, que, entregues ás escravas, em cujo
collo se criavam e levavam uma vida ociosa, mais tarde se atiravam ao luxo desregrado
em que predominavam puramente os instinctos dos prazeres animaes (Alincourt).
Facilmente se comprehende que, com este systema de vida, em pouco tempo sobreviria a
decadencia, o que de facto aconteceu. A agricultura em nada lhes pôde aproveitar e a
escravatura tambem, por isso que cada vez mais padecia, visto os proprietarios afastarem
a bem da manutenção do seu fasto, apparente, os já diminutos jornaes destinados á
alimentação dos escravos.
Assim acabaram todas as grandes casas que haviam firmado o forte dos seus cabedaes
exclusivamente na mineração.
Durante a expedição, encontrámos muitas lavras abandonadas, ou pela sensivel
diminuição do precioso metal ou, o que constitue a causa mais geral, pela deficiencia ou
falta completa de trabalhadores e de boa administração.
metros; que é innumeravel a quantidade de capões das nascentes; e, finalmente, que nas
vastissimas regiões das vertentes do N, NW e SW, onde a acção perenne de uma clima
mais humido favorece o seu desenvolvimento, a vegetação florestal é grandiosa e
abundantissima de arvores apropriadas ás construcções civis e navaes, a todos os ramos
da actividade industrial, á medicina, etc.
Como já disse, os capões representam uma das modalidades dos terrenos generativos
dos rios, ribeirões, etc.; além desta, ha tambem os brejos ou alagados, as lagoas e o
buritysaes.
Nada de interesse offerecem as nascentes brejosas ou lacustres, o que não acontece
com o buritysal.
O buritysal tem a superficie circular ou oblonga, ligeiramente concava com uma
depressão linear no centro em forma de rego; é coberto em toda a sua área de um tapete
de verdejante relva, homogenea na altura e na côr, emprestando-lhe por esse facto o
aspecto risonho de um prado artificial onde o trabalho do artista é objecto de cuidados
constantes e ternos.
O sólo pantanoso do buritysal, extremamente compressivel e movediço, se apresenta
como perigoso atoleiro lamacento, meio liquido, sob os enfeites da graciosa combinação
dos buritvs de differentes alturas e idades, ora em grupos magnificos de verdura fresca,
ora indistinctame nte isolados, ora arruados e indicando pela sua direcção a do curso
d'agua ahi originado sempre em grande abundancia.
O burity, a arvore da vida do padre José Gumila, a Mauritia Vinifera dos botanicos, é uma
bella palmeira dos sitios humidos, de cerca de 25 a 40 centimetros de grossura e 9 a 10
metros de altura, com folhas grandes em forma de leque aberto na extremidade livre de
longo e resistente peciolo.
O tronco presta para fazer casas e aqueductos de longa duração, as folhas para cobrir tão
bem como a telha de melhor fabrico, e as nervuras das folhas novas, não desabrochadas,
dão a seda do burity, que serve para tecidos diversos.
Antes de se entreabrir na palmeira masculina a cobertura delicada das flores, e só neste
periodo de metamorphose, o tronco provê-se de uma fecula, parecida com o sagú, e que
endurece formando pães delvados e redondos; da seiva fermentada faz-se o vinho de
palma, com que os indios costumam em briagar se; os fructos dos cachos colossaes,
cobertos de estreitas escamas imbricadas em castanhos estrobilos, semelhantes á pinha
européa, dão como quasi todos os fructos tropicaes alimentos diversos, conforme são
consumidos depois do desenvolvimento completo do principio assucarado, ou antes delle,
quando ainda se acha em estado farinaceo
Alem de todas estas qualidades de arvore providencial, o burity tem a propriedade (como
se diz em Goyaz) de chamar agua para o logar em que vegeta, o que motivou o costume
de só excepcionalmente se cortar uma dessas palmeiras.
Quem das folhas precisa, sóbe pelo tronco, tira as aproveitaveis, mas a arvore fica em pé
para não seccar a fonte.
Sendo fastidioso expôr aqui todas as plantas uteis deste bellissimo Estado, tomarei
apenas algumas d'aquellas que á qualidade excellente da madeira juntam a grande
abundancia, ou apresentam qualquer propriedade que as torne dignas de nota.
A aroeira, dita da matta, sem duvida occupa o primeiro logar não só pela extraordinaria
quantidade, em que se encontra em qualquer matta de Goyaz, como porque póde-se com
afoiteza dizer, é indestructível. O tronco aromatico e resinoso do colosso vegetal engrossa
muito, tem a rigidez de ferro e a duração admiravel, pois, que se tem achado em edificios
seculares a aroeira em perfeitissimo estado.
Em Pyrenopolis vi um grosso baldrame de aroeira perfeito, não obstante ter servido de
alicerce de uma casa por espaço de 50 annos.
O jatobá ou jatahy é um dos mais volumosos especimens das florestas goyanas, e entre
os enfezados vegetaes dos cerrados tambem avulta pelo porte, sem todavia. dar uma
idéa approximada, ao menos, da magnifica apparencia que tem a matta virgem. O tronco,
cuja grossura não poucas vezes excede de
um metro, dá bem como os galhos e ramos, a resina animada dos antigos, a resina de
jatahy de tanta applicação na therapeutica das affécções catarrhaes, broncho-
pulmonares, etc. Além desta propriedade, a resina animada, sob o nome de gomma copal
amarellada e aromatica, serve para fazer verniz.
A madeira é forte e muito procurada para moendas de engenhocas, eixos de carros etc.
O balsamo, que entre nós tem o nome de oleo vermelho, e cujo tronco muitas vezes
excede ao do jatobá em grossura, é uma das mais valiosas madeiras de leite que, pela
sua durabilidade, tem, ao lado da aroeira e do jatobá, preferencia sobre qualquer outra
nas construcções duradoras, no preparo das moendas, rodas de carro, etc.
Uma das mais interessantes arvores que vi em Goyaz: foi o tamboril.
E' semelhante ao cedro, um pouco mais escuro, de bonitos ondeados; engrossa muito e
tem o lenho tão leve, que em leveza ganha certamente o nosso louro de forro.
Um tecto de tamboril envernisado e artisticamente trabalhado levará de certo vantagens
ao proprio estuque.
Augmentam a riqueza florestal goyana o páo-brazil, jacarandá, guarabú, tambem
chamado Gonçalo-Alves e páo-roxo, a braúna, garapa, vinhatico, páo-marfim, cedro, páo-
rosa, tambem denominado Sebastião Arruda, ipé ou páo d'arco, peroba, angelim,
maçaranduba, etc., etc.
Das plantas medicinaes, em cujo numero se acham entre outras muitas, a copahiba,
cabureicica (balsamo do Perú), coca, cajú, icicariba (gomma elemi), caroba, sassafraz,
andaiassú, jurubeba, manacá, jaborandi, poaia, jalapa, rhuibarbo, nhandiroba, etc.,
destaco a plumeria, tambem chamada herva santa em alguns logares.
Esta planta herbacea, mucilaginosa, rasteira é uma polygonacea, e apresenta duas
variedades: uma roxa e outra branca, sendo aquella de mais energica acção therapeutica
do que esta.
Vegeta em logares humidos e em margens de correntes d'agua.
A acção curativa da plumeria nos casos de mordeduras de cobras, por mim verificada no
Estado do Rio de Janeiro, é admiravel, seja administrado o remedio sob a fórma de
extracto alcoolico fluido, seja socada a herva e ingerido o succo puro ou de mistura com
aguardente, seja, em recurso extremo, simplesmente mascada; e nos dous ultimos casos,
então o bagaço deve ser applicado sobre o logar da mordedura.
Tambem se encontra a plumeria em Matto Grosso, de onde vem em estado de tintura,
segundo ouvi dizer. Em Goyaz, onde era completamente desconhecida, vi-a, pela
primeira vez nas margens do Rio Padre Souza e depois em alguns dos seus pequenos
affluentes, quando viajava em companhia do Dr. Antonio Cavalcanti, e dos fazendeiros
Joaquim de Araujo e Francisco Rodrigues Chaveiro, a quem dei a conhecer a planta,
salientando o seu valor medicamentoso.
Entre os vegetaes celebres pela sua acção violentamente venenosa, occupa sem
contestação o primeiro plano a - tangaraca - dos indios, conhecida tambem pelo nome de
- herva de rato - ou, simplesmente pelo de - herva .
São conhecidas tres especies de tangaraca, e todas se acham nas capoeiras e nas
mattas virgens, tanto na sua espessura como na beira dos caminhos.
Tem o poder deleterio em tão alto gráo esta herva, que mesmo em pequena quantidade
ingerida, ou secca ou fresca, é logo seguida de phenomenos indicativos da mais grave
intoxicação.
Pouco depois da ingestão do veneno, o corpo da victima começa a inchar, principalmente
o abdomen, cujos musculos parecem fortemente contrahidos; a marcha é profundamente
alterada; a vista perturba-se; manifestam-se vertigens e aquebrantamento geral das
forças; o animal nada come; tem sêde excessiva, e em tempo relativamente curto, morre
no meio de angustiosa inquietação.
E' raro escapar um animal hervado.
Tão grande estrago produz a herva no Estado de Goyaz que o gado exportado do
Vão do Paranan em numero de 30 a 40.000 rezes por anno, perde cerca de 3.000, isto é
10%. mais ou menos, segundo as informações que na Formosa me foram ministradas por
um dos principaes criadores do Vão.
O fumo goyano, que, por assim dizer, até hoje, além do gado, e o unico genero da
diminuta exportação do Estado, chegou a ganhar fama mesmo aqui no Rio de Janeiro; e
não ha fumante algum que não conheça o cigarro e fumo goyano, ao menos pelos dizeres
do envoltorio do maço.
A canna de assucar, o café e o fumo dão perfeitamente em Goyaz, e os productos
industriaes resultantes são de excellente qualidade.
A soqueira da canna da seis e oito annos seguidos sem outro trabalho que não seja a
brutal queimação do cannavial, após a colheita; e quando este recebe trato, dura o dobro.
O cafezeiro tambem é de mui longa duração, embora as dimensões das arvores não me
parecessem differentes das de São Paulo.
A serem verdadeiras as informações que tive na cidade de Santa Luzia, vi um quintal todo
plantado de pés de café de 70 a 80 annos de idade, dando sempre mais ou menos
regularmente.
Os productos da canna e do café não são em quantidade sufficiente para a exportação, e,
talvez, nem mesmo para o consumo estadoal, porquanto em muitos logares em vez do
assucar ainda se usa da rapadura, e do Estado de S. Paulo é importado algum café.
Ha em Goyaz um capim muito procurado pelo gado, denominado jaragua, nimiamente
abundante, que passa por ter mais elevado valor nutritivo do que o capim gordura e o
chamado capim de Angola.
Finalmente, muitas gramineas, as cyperaceas e algumas outras plantas dos campos que
hoje são uma verdadeira praga, algum dia terão muito apreço, quando, por exemplo, o
fabrico do papel em Goyaz, na éra de progresso e de paz, dispensar o importado
europeu.
Fernando Delgado, ultimo governador de Goyaz, com o uso das suas aguas conseguiu
curar se de uma dôr rheumatica com paralysia incompleta do braço direito.
Apezar da fama que disto lhe adveio, o logar progrediu lentamente, e era pequena a
frequencia dos enfermos que ahi buscavam o restabelecimento da saude ou o allivio dos
seus males. Entre elles avultavam em numero os morpheticos, por isso que corria mundo
a fama de que aquellas aguas curavam tão triste doença.
Ao lado da povoação passa um aurifero corrego de aguas frias, em cujo leito e bordas
tambem se encontram alguns olhos d’agua quente, e cuja origem tem logar em um
burytisal distante cerca de quatro kilometros a SW.
Em 1838 constou ao director da Factildade de Medicina elo Rio de Janeiro a existencia
destas aguas, tidas então como sulphurosas, e com a fama de haver curado grande
numero de morpheticos e melhorado tambem alguns, que não obtiveram cura completa.
O Governo teve logo noticia das vitudes medicinaes das aguas de Santa Cruz, e officiou
ao presidente da provincia, José de Assis Mascarenhas, em fins de Julho de 1838,
ordenando as mais escrupulosas indagações, uma vez que não tinha havido dos factos
propalados averiguações exactas por pessoas profissionaes.
Em 16 de Outubro o presidente respondeu ao Governo affirmando a existencia das
afamadas aguas; encarregou ao Dr. Vicente Moretti Foggia, medico italiano de origem, do
exame das aguas e suas virtudes therapeuticas, e em Setembro do anno seguinte (1839,
o Dr. Foggia apresentou ao Governo provincial o resultado dos seus trabalhos.
Foggia ainda vivia nonagenario na cidade de Goyaz, em Dezembro de 1892, quando ahi
esteve a Commissão do Planalto. Goza de muita estima e justa reputação tanto na capital
como no Estado.
Em Agosto de 1838, tendo de partir para Goyaz o Dr. Manoel de Mello Franco, ao
governo pareceu conveniente aproveitar a opportunidade, e incumbiu-lhe de proceder a
analyse das referidas aguas no proprio logar das suas nascentes, de colher as
informações precisas para um juizo seguro e decisivo, sobre a sua virtude medicinal na
enfermidade em questão, e facilitou-lhe todos os meios.
O relatorio do Dr. Mello Franco pouco se fez esperar, pois em Agosto de 1840 o Governo
o submetteu ao juizo da Faculdade de Medicina, que nunca deu resposta!
Em 1842, o marquez de Barbacena convidou por parte do Governo, o Dr. Faivre, que se
achava em Goyaz, a fazer a analyse das aguas thermaes de Caldas Novas e, ao mesmo
tempo, a observar e julgar o seu pretendido effeito sobre os doentes de morphéa, em
grande numero attrahidos áquellas fontes pela voga de sua efficacia.
No anno seguinte, o medico francez apresentou o seu relatorio, composto de duas partes:
a primeira tratava das aguas e a segunda do seu effeito curativo sobre a morphéa. Deste
relatorio uma cópia foi remettida a Academia das Sciencias de Pariz, e, submettida ao
exame de uma commissão composta de Royer Collard, Rayer, Henry, Pariset e Delens,
teve um parecer muito interessante. Infelizmente as opiniões discordantes dos dous
medicos impediram qualquer resultado definitivo sobre o valor therapeutico das Caldas no
caso vertente em questão, e as duvidas permanecem até hoje.
Entretanto, devo consignar aqui, para melhor juizo dos mais competentes, que o Dr.
Faivre não negou de todo a acção dynamica das ditas aguas, apezar das infimas
quantidades dos seus residuos solidos, e especificou a sua acção topica; quanto á
morphéa, não acreditou no seu effeito curativo, embora fosse a sua opinião provisoria, e
attribuiu as melhoras de alguns doentes não á diminuição do seu estado morphetico, mas
à benefica modificação de affecções secundarias.
Eis, em synthese, o resultado das observações do Dr Foggia:
“Na parte do relatorio baseada sobre informações de pessoas de criterio, deduz-se que
com o uso das aguas thermaes sararam perfeitamente, desde 1835 até o fim de 1838,
além de 1 syphilitico e 1 darthroso, 9 morpheticos ; que obtiveram consideravel me
lhora 17 enfermos desta ultima molestia; que o uso das aguas foi infructifero a 7; que,
finalmente, falleceram 4. Na parte do mesmo relatorio, baseada sobre a propria
observado Dr. Foggia, se infere que em julho de 1839 existiam em Caldas Novas, em
tratamento, 60 pessoas, em Caldas Velhas 9 e em Caldas de Pirapetinga 7, perfazendo o
total de 76 pessoas.
Deste total 2 morpheticos estavam perfeitamente curados; 4 enfermos da mesma molestia
e 1 darthroso quasi sãos; 3 morpheticos com melhoras consideraveis; 22 morpheticos, 2
darthrosos e 1 syphilitico com melhoras sensiveis; 16 morpheticos com poucas melhoras;
finalmente 23 no mesmo estado em que tinham ido, dos quaes 19 morpheticos e 4
syphiliticos, sendo que 12 d'elles alli se achavam havia pouco tempo.
Os dous que faltam para completar os 76 falleceram na presença do medico, em
consequencia de inflammação aguda dos intestinos.”
Caldas Novas está situada a 17º 15" de latitude austral e a 50º 30" de longitude occidental
do meridiano de Pariz, segundo o Dr. João Mauricio Faivre.
Sua posição é agradavel e muito bonita, extensa a vista e bem distribuidos os terrenos
circumjacentes.
O clima é ameno, secco e mui saudavel; os ventos reinantes na estação chuvosa não são
regulares, predominando, entretanto, os dos rumos NW, W, e SW, e limpando o tempo
sopram geralmente os de NE e SE, como sóe acontecer em todo o sul de Goyaz.
Posto que a latitude não seja muito afastada do equador terrestre, todavia está a notavel
distancia do equador thermico, o que, unida a grande elevação do terreno, torna branda e
supportavel a temperatura média local.
“E' ahi moderado o calor pela posição elevada do terreno, diz o Dr. Faivre, e pela
ausencia de altas cadeias de montanhas, que poderiam impedir os ventos reinantes de
soprar livremente sobre toda a extensão do paiz, e de assim refrescar o ar e o sólo,
abrazados pelo sol. A temperatura observada á sombra, tres vezes ao dia, não deu senão
a média de 24º cent. nos mezes de Dezembro Março, e pelo meio indicado por
Boussingault a temperatura média annual seria de 22º cent.
O abaixamento da temperatura durante a noite, na superficie da terra. foi de 61º cent. nas
vezes em que a observação se fez.”
Todo o chapadão que circumda a região dos poços, desde o Rio Corumbá até a Serra de
Caldas é formado pelo grés argiloso, entremeiado cá e lá de uma grande serie de
manchas de argila pura. Nos morros, serras e serrotes encontram-se grés de varias
côres, ás vezes o proprio itacolumito, o quartzo e em muitos pontos o tauá e a canga.
Grandes jazidas de schisto micaceo tambem existem na direcção NW-SE, particularmente
no Rio Corumbá e seus affluentes, que atravessei.
O steaschisto, ou schisto hydromicaceo de Gorceix, tambem abundante, é empregado até
no rudimentar calçamento do povoado e nas sepulturas, onde talvez substitua com
vantagens o marmore e o granito.
No logar das fontes, sobre o itacolumito, se encontram recentes alluviões, depositadas em
fina camada, em que predominam fragmentos arredondados de quartzo rolado, etc.
O Dr. Faivre, que é um dos mais illustres representantes da geração medica passada, fez
uma analise chimica qualitativa das aguas de Caldas Novas; mas a fallar a verdade, essa
analyse pouco adianta, porquanto a existencia, nos insignificantes residuos solidos, do
chloro, dos acidos silicico e carbonico, e das bases potassa, soda, cal, magnesia e
alumina, nada exprime, visto serem estas substancias encontradas em todas as aguas
naturaes ou doces.
O oxygenio ou ar atmospherico, que o illustre medico a principio suppoz ter achado, por
causa da luminosidade e dos vapores brancos de acido phosphorico formados de tempos
a tempos, em um eudiometro de phosphoro cheio de gaz, não existia de facto, e a isso se
oppoem as experiencias de Barkmann, pelas quaes ficou provado que o
das tropas; e finalmente, a estrada de Therezopolis ahi está, como estas ultimas, bem
perto do Rio de Janeiro para attestar as grandes difficuldades de conducção nas regiões
do littoral em tempos felizmente remotos, em comparação com o que se observa na
actualidade do Goyaz.
A serra do Rio dos Bois não apresenta difficuldade alguma no transporte; a do Abbade, na
descida para a fazenda do Sr. Hermano, na base dos Picos dos Pyrenêos, a da
Contagem, perto do Sobradinho, e a de Caldas Novas, não ha duvida têm muitas pedras
destacadas que embaraçam sobremaneira a marcha; a falar a verdade, essas descidas
nem caminhos são, porquanto não havendo leito de estrada, desce-se a granel por sobre
essas pedras soltas; a serra dos Macacos, perto do riacho dos Paulistas, e a que passa
na fazenda do Parnauá, do coronel Valeriano de Castro, perto dos riachos da Taboca e
da Taboquinha, são de flancos muito inclinados e tornam incommoda a descida. O
mesmo acontece com a Serra do Corumbá e do Rio Ponte-Alta.
Porém em umas e outras não se encontram os declives abruptos tão communs nas
regiões montanhosas da zona do littoral.
A denominada Serra Dourada, fronteira a capital goyana, não é mais do que uma baixa
intumescencia do massiço central das terras brazileiras, assentada sobre uma larga base
que se estende das visinhanças da fazenda do Povoa até a povoação das Areias, na
base da face septentrional da mesma serra, 3 a 4 kilometros de Goyaz.
E' visivelmente impropria, geralmente fallando, a denominação de serra dada ás
lombadas, ás elevações do terreno no interior do Brazil, ao menos por onde andou a
Commissão. O que melhor parece definir essas elevações é sem duvida, o nome de
massiço. em que se encontram ora cristas e picos isolados ou não, ora espigões de
flancos mais ou menos escarpados, ora finalmente, verdadeiras chapadas e chapadões,
de largura variavel entre algumas dezenas de metros naquellas e muitos kilometros
nestes.
Os picos dos Pyreneus, cuja maior altura relativa não excede á do morro do Castello, me
pareceram cumes de altissima montanha, quando de viagem de Caldas Novas de Goyaz
com os meus companheiros Dr. Alipio Gama e José Paulo de Mello, os avistei nadistancia
de cerca de 50 a 60 kilometros, achando-me defronte da capellinha da aldeia da Posse a
meio caminho, mais ou menos, da fazenda das Antas ao sitio do Carurú, na estrada que
de Bomfim conduz a Pyrenopolis.
Esta perspectiva é completamente illusoria, pois que esses picos, com a altura ha pouco
mencionada, descansam sobre um chapadão de mais de 1.300 kilometros acima do nivel
do mar, e nem ao menos se constituem em cristas ininterrompidas por causa das
saliencias e depressões que dão á divisora das aguas o aspecto pittoresco que tem no
seu extenso desenvolvimento.
O atalho das Furnas, na estrada de Pyrenopolis a Antas, na fazenda do commendador
Barbo, representa uma verdadeira crista cortante no dorso do massiço central, sem ter 10
kilometros, talvez, de superficie plana, e, de um e outro lado, vêm-se respectivamente as
aguas que vão para o Pio Capivary, ao sul, e para o Rio das Almas e Padre Souza, ao
norte.
Esta estrada, tres leguas distante da povoação das Antas, percorre o chapadão unido das
Duas Oitavas e da Forquilha, com muitos kilometros de largura e ligeira inclinação, entre
os rios Capivary e Piancó, seu affluente, se desprezarmos a baixada formada pelo
corrego do Andréquicé, onde esteve a turma SW, do Chefe da Commissão.
A estrada se dirige para SW, e o chapadão toma o rumo WNW e mesmo NW, passando
pela antiga lavra do Gongo, pelas fazendas de Joaquim e Manoel de Araujo, Manoel
Mendes e outros, até que, reduzindo-se gradativamente, transforma-se de novo em
espigão cada vez mais estreito.
Soffreu este espigão uma funda ruptura no sentido da vertical, com o afastamento talvez
de 500 kilometros de face a face, e os depositos modernos, que lentamente vão
obstruindo a brecha , formam um perfeito arco de circulo no logar denominado Tira-
Chapeu,
onde as aguas das chuvas correm indifferentemente para os rios do sul ou do norte.
Alargando-se ainda, o espigão recebe a denominação de espigão do Jurema, e póde ser
considerado como o inicio do esplendido e alto espigão da Samambaia, que procura a
SW ou WSW os limites do Estado de Matto Grosso, e cuja vista alcança, para as bandas
do sul, uma extensão talvez maior de 70 kilometros, e abrange em ampla, immensa e
pouco profunda bacia as vertentes de todos os affluentes da margem esquerda do
caudaloso Rio Meia Ponte, até a confluencia do Rio João Leite.
Mais ou menos um kilometro distante das nascentes do primeiro affluente do Rio Meia
Ponte, o riacho dos Cedros, brota na face do norte a principal cabeceira do Rio Padre
Souza, o envenenador das aguas puras e crystallinas do Rio das Almas.
Quando exploravamos, os primeiros, estas paragens sertanejas, o Dr. Antonio Cavalcanti
e eu, alguns kilometros antes de passarmos pelas cabeceiras do ribeirão das Trahiras,
affluente do rio Padre Souza, subimos os morros dos Dous Irmãos e descortinámos uma
das mais bellas e attraentes paizagens que, é dado ao homem gozar.
Voltados para a direcção geral W ou WSW do curso do Rio João Leite, depois que,
abandonando as encostas do espigão, se deslisa pela planicie, vimos o terreno baixar
insensivelmente na extensão de mais de 6 a 8 kilometros até ao confluente do unico
tributario importante desse rio, o ribeirão Jurubatuda, e com a vista acompanhamos os
cordões de mattas marginaes ás duas correntes, que no meio do campo se fundem em
uma só, em busca do Rio Meia Ponte, após um curso de mais de 60 kilometros, pouco
além da extremidade da serra do mesmo nome.
Ao norte, acompanhando o espigão até perde-lo de vista, pudemos ver delineados, como
ramificações do grande massiço, os pequenos contrafortes que separam uns dos outros
os affluentes da margem esquerda do Rio Meia Ponte até a sua cabeceira principal; e ao
sul, a campina ondulada, verdejante e forrageal de excellente relva, ligeiramente se eleva
para encontrar-se com outras que a continuam seguindo a região adjacente do Rio Meia
Ponte.
apenas nas cabeceiras, o que sempre se nota, ha capões mais ou menos extensos, na
razão directa da quantidade d'agua que nasce.
Mais ou menos no meio da chapada que da Serra dos Macacos vae ao Sobradinho, se
acha o pouso das Tres Barras, (altitude 1.240 metros), e cujo nome provém de nascerem
a pequena distancia um do outro, os rios Torto, Gama e Riacho Fundo, os quaes, por sua
vez, têm as nascentes perto das dos rios Alagado e Descoberto ou Montes Claros.
Cerca de 1.200 metros de altitude tem o logar d'estas fontes, e a não ser já proximo da
serra fronteira ao Sobradinho, onde as oscillaçóes do terreno se vão tomando cada vez
mais fortes, a proporção que vae baixando um pouco, so se notaria o brando declive das
terras que acompanham o leito do Rio Parnauá, resultante da fusão dos rios Torto e
Gama, do Alagado, Descoberto e Areias, e seus affluentes.
Além d'estas depressões, ha ainda accidentes devidos aos corregos e ribeirões, que
nascem já um pouco mais afastados do espigão mestre, como sejam entre outros, os
corregos da Taboca e Taboquinha, com o leito em apertados e fundos valles, os rios da
Papuda, Sant'Anna, Mesquita, Lages, Saia Velha, antes de Santa Luzia, e os de Palmital,
Santa Maria, Jacobina, etc., depois.
Esse abaixamento do terrreno não excede talvez de 100 a 150 metros, na direcção de
NW a SE, qual é geralmente a dos citados rios com excepção, porém, da região
percorrida pelos dous componentes do Parnauá (o Torto e o Gama) porque o chapadão
do Gama com cerca de 1.130 metros tem a estrada de rodagem que conduz para a velha
cidade de Santa Luzia.
O chapadão do Gama, com a referida altitude e com a extensão SW de mais de 8
kilometros, termina-se tanto no lado do rio Gama, como no da Papuda, cujas nascentes
n'elle se acham encravadas, em suaves declives medindo approximadamente dous
kilometros.
No seu desenvolvimento para Santa Luzia, este chapadão se une com o da tapéra de
Sant'Anna, e formam assim uma das mais bellas regiões, que se póde imaginar, com
bastante vegetação, notavel abundancia d'agua potavel de excellente qualidade, planicies
de muitas dezenas de kilometros com insignificantes oscillações de superficie, rios
encachoeirados, altura variavel de 900 e 980 a 1.180 e 1.240 metros, e onde a natureza
prodigalisou admiravel fertilidade cobrindo uma grande extensão de terreno com a terra
roxa, como em quasi toda metade oriental do districto, e que tanta fama, riqueza e
desenvolvimento agricola tem dado ao adeantado estado de São Paulo.
Se não fôra a solução de continuidade causada pelos rios Mesquita, Lages e Saia Velha,
immenso plaino se estenderia uniforme desde as margens do Torto, Gama e Paranauá
até bem perto de Santa Luzia, onde começa a descer um pouco mais o algarismo das
alturas dos soberbos chapadões desta parte central do Brazil.
A partir d'esta cidade para W, conservam os chapadões a altura approximada de 900
metros, sem contar os morros que attingem até 1.030 metros perto de Barreiros, sendo
que n'esta extensão se acham as excavações de terreno produzidas pelos leitos dos rios
Santa Maria, Alagado, Descoberto e Areias ; não mencionamos outros menores, e cujas
margens são revestidas de espessa vegetação em grande extensão.
Perto dos Barreiros, as fortes ondulações do solo dão-lhe o aspecto de sopé de
montanhas visinhas, sem que, entretanto, isto se verifique ; ao contrario, a essas
ondulações suceede uma baixada mui rasa, onde se encontra o granito, que não é
commum em todo Goyaz.
Dos Barreiros ao Capivary todo o terreno é fortemente accidentado e nas partes mais
declives percorrem os rios Cachoeira, das Gallinhas, do Ouro, Congonhas, Corumbá,
Carurú e Capivary, que recebe na margem o Corrego das Duas Oitavas, originado no
chapadão do mesmo nome (1.000 metros de altura), nas contravertentes do corrego
Andréquicé.
O alto chapadão das Duas Oitavas continua com pequenas depressões até o arraial das
Estes baixos algarismos de temperatura coincidiram com a geada, que havia dez annos
não se fazia sentir no Estado de Goyaz de modo apreciavel, sendo que depois de 1872
em que houve uma tão forte como a de 1892, só em 1882 ou 1883 teve logar outra,
porém fraca e pouco extensa.
A de 1892 foi de extraordinarias dimensões em todos os sentidos, porquanto da capital do
Estado a Uberaba, desde Formosa até o espigão da Samambaia, em toda essa grande
área restam ainda vestigios de tão destruidora geada.
Com effeito, em todos os logares por onde passou a Commissão referiram os moradores
que a duração deste phenomeno foi de seis dias, com pequenas differenças em um ou
outro ponto.
Tabella n. 1
O exame d'esta tabella mostra que a proporção que adeantavamos para léste, no fim do
mez de Agosto que, por assim dizer, é o inicio da época de transição da estação secca
para a chuvosa, algumas perturbações se notavam nas indicações instrumentaes: é
assim que se vê que a regularidade observada dos dias 24 e 25 cessou no immediato,
descendo o thermometro de 24.º a 20º.8. subindo o barometro de 673mms.2 a 682mms.6,
a humidade relativa de 52º.0 a 61º.0, e a tensão do vapor d'agua passou de 12mms.2 a
12mm8.0.
A atmosphera enfumaçada em excesso, por causa das grandes queimadas dos campos
durante toda a estaçao secca, de manhã esttava ordinariamente despida de nuvens, do
meio dia para a tarde começavam a apparecer nos ritmos do sul, ora grandes cirrus ora
cumulus, ora nimbus, ou cumulus-nimbus, que umas vezes perduravam algum tempo
durante o qual se desprendiam algumas faiscas electricas, outras se transformavam em
stratus, que por sua vez vinham quasi sempre a desapparecer sob a influencia dos ventos
do norte, os quaes não variavam de espaço comprehendido entre NE e NW.
No Pichoá, a 25 de Agosto, estando o céo carregado para as bandas do S de pesados
nimbus, ouvimos os primeiros trovões durante essa longa viagem, chegando mesmo a
chover algumas gottas que não bastaram para molhar o solo, sendo que ao sul d'esta
localidade a chuva foi bastante fórte, segundo informações obtidas.
Com esta chuva pouco se modificou o estado ennevoado da atmosphera.
Do Pichoá em deante nada de notavel se encontra n'estas observações, a não ser que a
temperatura minima foi baixando cada vez mais, até que, na villa do Mestre d'Armas foi de
10º.5 e no Sobradinho 12º.2.
Tabella n. 2
Na cidade da Formosa, a regularidade e constancia dos elementos meteorologicos, nos
poucos dias em que, ahi a Commissão permaneceu. foram taes que a differença entre as
minimas extremas observadas foi de 4º.5, de 14º.2 a 18º.7, sendo a média 16º.0 assim
como foi de 3º.2 a que se manifestou entre a maior maxima e menor, entre 33º.0 e 28º.8,
sendo a média 38º.9.
A humidade relativa variou termo médio entre 44º.5 e 55º.1; o barometro entre 684 mms 1
e 686 mms.5.
O céo, de ordinario , apresentava-se do meio dia para a tarde em parte coberto de cirrus,
cumulus e algumas vezes nimbus, sem, no entretanto, chover, excepto no dia 8 de
Setembro em que a quántidade d'agua cahida foi inapreciavel.
O vento conservou-se sempre brando e na direcção de L, com excepção do dia 9, depois
da pequenia chuva em que soprou de S.
A julgar pela comparação d'estes dados com as informações prestadas pelos antigos
moradores da Formosa, essa regularidade e constancia são habituaes alli, o que torna o
clima local secco e bom.
Tabellas ns. 3 a 6
Inaugurados os trabalhos da demarcação do vertice SW do Districto Federal, algumas
interrupções se deram nas observações astronomicas, pois tendo-se firmado
definitivamente a estacão das chuvas muitos
dias houve sem que nos fosse dado ver o azul sereno do nosso céo tropical; apezar
d’isto, as observações meteorologicas, attenta a sua natureza, se fizeram
continuadamente, como vamos ver examinando a tabella n. 3.
As variações diurnas do thermometro tiveram logar entre 19º.0 e 26º.0 com a média geral
de 22º.4, no mez em que o sol passa pelo zenith do ponto de observação; a minima
absoluta foi de 9º.0, a maxima 34º.8, respectivamente nos dias 7 e 9 de Outubro; e a
excursão nychthemerica teve a amplitude de 23º.5. determinada pelos extremos 9º.0 e
32º.5.
A média das minimas alcançou 15º.7 e a das maximas 29º.5. A média do percurso da
pressão do ar foi de 671mms.4 a 676mms.3 o que dá insignificante oscillação média de
4mms.9, notando-se que a pressão minima foi de 670mms.4 e a maxima 677mms.9.
A temperatura do ar que variou entre a minima de 14.º.5 e a maxima de 32º.0, teve a
média de 21º.2; assim também a humidade relativa que oscillou entre a minima de 40º.2 e
a maxima de 90º.0 tem a média de 71º.7.
Durante os 40 dias de observação no vertice SW predominaram os cirrus-cumulus e os
cumulus-nimbus sobretudo de tarde, e de manhã os cirrus.
Em algumas tardes appareceram os stratus-cumulus, quasi sempre no poente.
O estado do céo manteve-se, na média, a 5º.9, sendo que no principio da estada da
Commissão ahi, o céo mostrou-se maior numero de vezes coberto no todo ou na maior
parte, do que nos ultimos dias.
Ordinariamente, a segunda metade do dia era mais farta de nuvens espessas do que a
primeira, e, não poucas vezes, a uma tarde tempestuosa succedia uma noite serena e
clara, em que o brilho intenso das estrellas e a transparencia e pureza da atmosphera
tocavam ao auge, particularmente nas noites de luar.
Nos dias 24, 25 e 27 de Outubro, ao amanhecer, havia cerração intensa bastante para
nada deixar ver a poucos metros de distancia, soprando fresco o vento N W.
Os ventos dominantes em toda a região explorada (e ao que parece em todo o sul de
Goyaz), com especialidade na de que me occupo agora, vêm do rumo N W, raramente de
W e mais raramente ainda de NE e E.
Pela primeira vez no dia 10 de Outubro soprou do S, depois a 12, 13 e 15; a 19 ventou de
SE e de 27 em deante a frequencia dos ventos d'este rumo foi gradativamente
augmentando até exceder em numero, no mez seguinte, aos que reinaram no principio do
mez de Outubro.
A velocidade de todos estes ventos foi sempre fraca, sendo a intensidade commnum de 4
a 6 metros por segundo, marcando o anemometro só uma vez a velocidade de 10 metros,
com o vento de S, de 12 de Outubro.
A quantidade d'agua cahida chegou a 245mms.3, occorrendo 22 dias de chuva e 22 de
trovoada; porém, nem sempre esta coincidia com aquella, de modo que houve dias em
que choveu e não trovejou e vice-versa.
Tabellas ns. 7 a 9
Em Pyrenopolis, a temperatura minima absoluta observada de 18 de Novembro a 10 de
Dezembro, foi de 18º.2 e a maxima de 32º.0; a menor temperatura média foi de 22º.3 e a
maior de 26º.1, e foi a média geral de 23º.5. O thermometro indicou para ora as
temperaturas extremas de 17º.5 e 31º.7, sendo a média de 24º.5.
O barometro differençou apenas na média de 9mms.0, pois sendo a menor pressão de
688mms.2, foi a maior de 697mms.2.
O céo esteve quasi sempre coberto, em cerca de dous terços, sob a acção constante dos
pluviosos ventos de NW e NE. Houve 16 dias de chuva com 278mms.1, e dous dias de
trovoada, a 21 de Novembro e 2 de Dezembro.
Tabellas ns. 10 e 11
Na capital do Estado de Goyaz, em sete dias de observações, de 19 a 25 de Dezembro, a
menor minima foi de 20º.6 e a maior de 21º.8, sendo a média das minimas 20º.8.
A menor e a maior maxima foram respectivamente 24º.0 e 31º.5, com a média de 29º.2,
sendo que a média geral foi de 24º.2. A menor temperatura do ar foi de 20º.5 e a maior
28º.0.
A pressão atmospherica tem a média de 717mms.9 e a humidade relativa 71º.4.
Do dia 20 a 25 choveu constantemente até o meio dia do ulitimo, ora de manhã só, ora de
tarde, ora todo o dia, conservando-se o céo sempre, na sua quasí totalidade, coberto de
nimbus, Cumulus-nimbus, cumulus e cirrus, sob a influencia invariavel dos ventos W, NW
e NE.
phera resvalando pelos planos inclinados ou encostas das terras altas do interior, e, pela
dupla razão de chegarem a regiões altas da atmosphera com temperaturas inferiores ás
suas e de se dilatarem em virtude de mais fraca pressão do ar, a humidade se, condensa
e formam-se as nuvens, ao mesmo tempo que grande producção de electricidade tem
logar; e é no meio de relampagos e trovões que estas nuvens. quasi sempre-se desfazem
em diluvianas chuvas tão communs no interior do Brazil, de Outubro a Março.
Propositalmente me extendi sobre a altitude, temperatura, humidade relativa, chuva e
ventos, e deixei em segundo plano a pressão barometrica, que no caso vertente pouco
exprime em face da altitude média da zona estudada, a tensão do vapor, etc., que
representam na constituição dos climas, papel menos importante a despeito da opinião de
Borius e Treille, que acreditam que não é sobre a temperatura que devem recahir as
accusações pelo facto das sensiveis variaçoes de calor e de frio, que experimenta o corpo
humano, e, sim, sobre as oscillações dos hydrometeoros, especificadamente da tensão
do vapor d'agua ou humidade absoluta.
Pathologia
Nenhuma affecção constante da pequena estatistica por mim organisada, é particular á
parte do Estado de Goyaz visitada pela Commissão, e nem tão pouco depende do clima.
As molestias alli indicadas, entre as quaes algumas graves, como a syphilis, a bouba, a
morphéa e diversas outras em que a anemia predomina, observam-se tambem em varios
pontos de toda a zona intertropical em medida desigual para as differentes raças, para os
differentes gráos de receptividade morbida individual, e, bem assim, para as influencias
mesologicas, etc.
A isto, de certo, não são estranhas a altitude média dos chapadões, que tambem o é do
da America do Sul; a excellencia das condições meteorologicas e atmospherologicas; a
constituição do solo até hoje absolutamente indemne do paludismo; a grande abundancia
e pureza da agua potavel, etc.
Ao contrario do que se dá com a georaphia botanica, a geographia medica é mui pobre e
mui imperfeitamente póde, mutatis mutandis, recordar a maior variedade relativa da flora
goyana.
Outrosim, o cunho pathologico da região do norte, especialmente das vertentes dos rios
caudalosos e de curso lento, ainda maior simplicidade acarreta á estatistica nosologica,
pois que o paludismo domina a pathogenia de toda a porção boreal do Estado, em que o
solo é baixo e formado por terrenos de alluvião recente, como se nota na grande facha
florestal que corre entre Pyrenopolis e Goyaz, conhecida geralmente pela denominação
de matto-grosso, e que constitue uma parte importante da vasta bacia do Alto Araguaya.
Como se vê, de 146 doentes, dos quaes 84 homens e 62 mulheres, sendo adultos 132 e
crianças 14, soffriam 18 ou 12, 3%,de dispepsia gastrica, ou gastro-intestinal com ou sem
dilatação do estomago; 13 ou 8, 9%, de boubas seccas ou humidas, em diversos gráos de
gravidade; 2 ou 7.5%, de neurasthenia de fórma cerebro-espinhal e gastro intestinal: 8 ou
5.4 % de bronchites e broncho-pneumonias; 7 ou 4.7%. de dismenorrhéa; 5 ou 3.4% de
manifestações agudas da intoxicação syphilitica; 4 ou 2,7% de hystero-epilepsia, sendo 3
mulheres e um homem; o mesmo numero de leucorrhéa e paludismo chronico e hypoemia
intertropical.
Entre as enfermidades mais communs em Goyaz, o grupo das venereas occupa um dos
primeiros logares, tendo na frente a syphilis, o gallico como lá se diz, debaixo de todas as
suas formas clinicas, desde a infecção hunteriana recente até as manifestações terciarias,
a heredo-syphilis, e outros effeitos remotos representados por lesões visceraes graves,
etc.
As manifestações agudas da infecção syphilitica dos cinco doentes apontados na
estatistica eram, em dous, exacerbações de molestia antiga, e em tres significavam
recente contaminação.
Assim tambem os doentes sob a rubrica de lesão cardio-aortica erão ambos syphiliticos; e
um, além disso, soffria de paludismo chronico de forma, intermittente, já quasi no declinio
cachetico. Apresentava este individuo uma endocardo-arterite proliferante syphili
DO PLANALTO CENTRAL DO BRAZIL.......................................................................................269
tica tão avançada que o sopro presystolico se ouvia a mais de vinte centimetros da
parede anterior do thorax, semelhando a um assobio e impedia o doente de conciliar o
somno. Applicando-lhe o tratamento especifico, em poucos dias melhorou sensivelmente.
O outro syphilitico tinha um vasto aneurisma da crossa da aorta causando tão profundas
perturbações na circulação e nutrição do braço direito, que este já tinha tomado
proporções gigantescas em relação ao outro.
Uma das mais interessantes manifestações da syphilis encontrei em um amaurotico que,
havia quatro annos tinha deante da vista uma nuvem branca que o impedia de distinguir
pessoas e cousas, o qual ficou relativamente curado dentro dos poucos dias em que nos
demorámos na Formosa.
Mais communs ainda do que as multiplas variedades das molestias venereas em Goyaz
são as que dependem das alterações da nutrição organica, sejam estas alterações
devidas ás substancias alimentares, a evolução anormal da digestão em suas diversas
phases, ou a vicios e defeitos dos phenomenos physicos ou chimicos, ou aos processos
intimos da nutrição intersticial.
Em qualquer das hypotheses, porém, a modificação da constituição chimica do organismo
implica fatalmente a diminuição da resistencia dos meios organicos contra a invasão dos
agentes da nossa destruição, para os quaes o homem são não é hospitaleiro, na bella e
exacta phrase de Bouchard.
E, pois, essa prévia modificação da nutrição organica representa o franco determinismo
de uma vasta serie de molestias differentes, das quaes se destacam: as diversas
dispepsias, a neurasthenia com todas as suas modalidades clinicas, o arthritismo, a
anemia, a chlorose, ete.
Muito mais frequentes são as affecções gastro-intestinaes idiopathicas, do que as
symptomaticas ou protopathicas. Um dos phenomenos mais constantemente observados
consistia no desenvolvimento de gazes no estomago e intestinos, com producção de forte
tympanismo que desapparecia pela expulsão ou absorção dos gazes, ou comprimia
mecanicamente o diaphragma para cima, e produzia subsequentemente oppressão
sempre penosa, sobretudo durante a digestão.
Nos casos de neurasthenia, os soffrimentos das faculdades intellectuaes eram patentes, e
em um doente que examinei manifestavam-se por uma inexplicavel indecisão em suas
resolucões.
Muitas vezes o abatimento era devido ao meteorismo, ás difficeis eructações, e a um
sentimento de tristeza acabrunhadora, que, quando era acompanhado de desarranjos
sensoriaes, levava o doente a falsa crença de congestão cerebral, e originava tambem
vertigens, cephalalgia, hypochondria, etc.
Facilmente se deduz que este estado de cousas, que acabo de descrever, existindo
permanentemente acarreta certo gráo de desnutrição seguido de anemia, chlorose, etc.
Conheci um neurasthenico, de forma gastro-cerebral, em que a scena morbida
apresentava manifestações psychicas apparentemente inquietadoras, e mui interessantes
para o neurologista. Semelhante ao maniaco, sempre que áquella cidade (Formosa) ia
uma pessoa da Commissão, aprazia-se o nesrasthenico em visitar o recem-chegado,
tendo-se previamente perfumado todo e vestido com todo o rigor, e durante a visita
achava se tão perturbado, em verdedeiro estado da excitação nervosa, que não podia
sustentar a conversaçao sem grande embaraço de palavra e difficuldade de ideiação.
Tendo de fazer uma viagem ao Rio de Janeiro, sentiu-se possuido de tal nervosismo, que
foram de todo infructiferas duas tentativas de iniciação da dita viagem. Para realizal-a foi
mister sahir incognito e, só a mais de meio caminho, é que se soube do destino tomado.
E', portanto, nas molestias deste grupo que avultam em numero as variedades, devido,
em geral, à alimentação impropria de grande parte dos habitantes particularmente além
dos limites ethnographicos marcados pela população mineira.
A natureza das substancias alimentares; o abuso dos condimentos fortemente excitantes,
alguns mesmo irritantes, pelo que se tornam verdadeiros causticos do estomago
e intestinos ; o pouco cuidado que se tem na escolha da agua para beber ; e a geral falta
das elementares noções de hygiene privada concorrem directamente para o
apparecimento de algumas das doenças que acabo de citar.
Apezar de ser a região abundantissima de excellente agua potavel, em geral a do uso
commum é má, ou porque é colhida em pontos ruins, ou porque antes de chegar ao logar
do consumo, tem atravessado chiqueiros de porcos, curraes de gado, etc.. ou em fim,
porque é tirada de uma pequena bacia cavada no chão, não obstante passar um corrego
ou um ribeirão distante algumas dezenas de metros apenas. A infecção palustre, que na
opinião de todos os medicos é a nota caracteristica da pathologia intertropical, é
excepcionalmente rara na região destinada a receber a futura Capital, e a que constitue a
raridade excepcional póde desapparecer em curto lapso de tempo, dependendo apenas
de insignificantes trabalhos de saneamento de alguns rios e deseccamento de alguns
brejos.
Os seis casos constantes da estatistica são todos exoticos, isto é, dous são de doentes
encontrados na minha viagem de Caldas Novas de Goyaz á cidade de Bomfim , tres são
do Vão do Paranan, e o ultimo contrahio a molestia em um pantanal do ribeirão Carirú,
com as nascentes na Serra do Mestre d'Armas, affluente do Rio Jardim que desemboca
no Rio Preto. Este vai ter no Paracatú e o Paracatú no São Francisco.
Segundo informações de pessoas que merecem fé, ha quarenta annos, houve uma
epidemia grave e mortifera de malaria nas margens do Rio Corumbá, após extraordinaria
enchente, epidemia que não passou para cima do porto do Pechincha.
N'aquelle porto, foram atacadas durante a referida epidemia, de preferencia, as pessoas
que, aproveitando os poços abundantes de peixes na retirada das aguas, iam nelles
pescar e se expunham sob os raios solares ardentes a contrahir facilmente a doença; as
que imprudentemente se banhavam nas aguas estagnadas e lodosas do rio transbordado,
etc.
Dos affectados, em numero de sete nesse porto, tres falleceram durante a evolução da
molestia, dous restabeleceram-se e os restantes vieram a fallecer cacheticos, após tres
annos de continuos soffrimentos.
Em toda a área demarcada, só ha um logar, esse mesmo muito pequeno, em que
observei pantano. Foi perto da villa de Mestre d'Armas, no rumo dos morros do
Catingueiro, na planicie humida que acompanha as sinuosidades do ribeirão do mesmo
nome, e onde se havia installado, por occasião da nossa passagem, o novo cemiterio,
contra tudo o que a sciencia e o senso commum indicam; sendo de notar que o minusculo
pantano promptamente desapparecerá desde que o curso do ribeirão fôr livre, e
desembaraçado o leito dos innumeros troncos e raizes de arvores que o atranvacam em
todos os sentidos.
Entretanto, em Mestre d'Armas não se conhece a febre palustre, e o aspecto da
população, na sua quasi totalidade mui pobre, é indicativo de boa saude.
Fóra do futuro Districto, a Lagôa Feia. que mais é uma expansão ovalar do Rio Preto, tres
kilometros abaixo da sua nascente dentro da cidade da Formosa, póde ser desseccada
pela colmatagem ou pela mudança do curso do rio, então pequenino corrego, e larga
abertura da extremidade meridional da Lagôa para o seu franco e completo esgoto.
O começo do mal afamado Vão do Paranan, em que se acha o vertice NE da área, é
perfeitamente salubre como a Commissão verificou, e como palustre só existe na
imaginação do ignorante ou em alguns dos muitos infundados preconceitos populares, tão
abundantes em quasi todos, senão em todos os legares atrazados.
E' corrente em todo o sul de Goyaz, que na época do começo dos ventos boreaes,
succedem-se casos de bronchites, bronchopneumonias, pneumonias, etc., originados,
regra geral, pelos descuidos pessoaes, etc.
Uma mulher adoeceu gravemente de pneumonia, comprehendendo a totalidade dos dous
pulmões, por haver lavado a cabeça
em uma bica d'agua corrente ao meio dia; tendo o corpo banhado de copioso suor, em
consequencia de serviço que fazia perto do fogo.
Este resultado é tanto mais natural, quanto tivemos na Commissão um exemplo claro do
que vale o cuidado, visto que a despeito da milita bondade de um clima, os abusos,
todavia têm mais força para produzir o mal do que o clima para o evitar.
Foi o caso de um dos nossos mais distinctos companheiros, que soffrehido ha longo
tempo de uma pharyngite granulosa, conseguio atravessar todos os mezes de frio e secca
e os de calor e chuva sem o menor incommodo; isto é mais uma prova de que aos effeitos
physiologicos do clima de regiões como a explorada, se junta o de grande força de
resistencia da maior parte das pessoas nelle residentes contra os resfriamentos (Weber).
-A dismenorrhéa, cujas fórmas predominantes foram a congestiva e nevralica originou-se
principalmeute na falta de cuidado na ultima phase de puerperio, ou has épocas do fluxo
catamenial; e não foram outras as razões pelas quaes pude encontrar esta doença em
uma menina de 14 annos.
-A leucorrhéa em grande parte é devida a má alimentação, á vida sedentaria de quasi
todas as mulheres, e, segundo penso, ao uso das aguas de brejo e de corregos
immundos para banhos.
- Dos casos observados, um dos mais curiosos foi o da hemato-chyluria do capitão V, que
antigamente teve febres intermittentes apanhadas no Vão do Paranan, e soffre
actualmente tambem de uma bronchite chronica. Tem tido melhoras duraveis sem
comtudo obter até agora cura permanente da hemato-chyluria. Accresce que esta
molestia no tempo quente cede mais facilmente a acção dos medicamentos e recrudesce
no tempo fresco, o que está em desaccordo com a theoria que admitte a acção do calor
solar dos tropicos dominando a etiologia e presta, pois, apoio a theoria parasitaria de
Bilharz e Wucherer.
-Não é, muito raro o papo em Goyaz, e as pessoas que o tem, salvo uma ou outra, não
ligam a menor importancia á doença.
O papo, em geral indolente, é pediculado ou não. No primeiro caso, a extensão do
pediculo varia de alguns centimetros a alguns decimetros e quasi sempre é fino; no
segundo, o papo é adherente e se apresenta com formas e dimensões variadas, seja elle
uniloculado ou multiloculado.
Algumas vezes, no periodo inicial, dóe a ponto de incommodar o paciente.
Dá em todas as idades e sexos, e de ordinario não tem cura.
Vi em Pyrenopolis um homem que possuia um incipiente doloroso. Acontecendo ir á
cidade de Goyaz, no fim de vinte dias notou que o papo havia desapparecido
completamente sem deixar o menor vestigio, para reapparecer com a sua volta para
aquella cidade.
A natureza do papo até hoje conserva-se ignorada, mas acredito que não lhe é extranha a
influencia da agua, da alimentação e das intemperies.
-A tuberculose é quasi desconhecida nos sertões, e os dous doentes que encontrei na
Formosa eram ambos de fora, e haviam procurado essa cidade por causa da excellencia
do seu clima. Uma moça mineira que anteriormente havia exercido o officio de cigarreira,
e um moço vindo de São Paulo por Araxá.
Estatistica pathologica
ORGANISADA PELO DR. ANTONIO PIMENTEL
Dyspesia 18
Bouba 13
Neurasthenia 11
Dismenorrhéa 7
Bronchite 8
Syphilis 5
Leucorrhéa 4
Paludismo 4
Hypohemia intertropical 4
Pneumonia 3
Idiotismo 3
Onanismo 3
Estreitamento da urethra 2
Escorbuto 2
Chloro-anemia 5
Prolapso do utero 1
Deslocamento parcial da retina 1
Hemato-chyluria 1
Amygdalite 1
Scrofulose 1
Verminose 1
Furunculose 1
Mania 1
Ozena 1
Amenorrhéa 1
Lymphatite suppurada 1
Amputação do 2º artelho direito 1
Ophtalmia blenorrhagica 1
Congestão cerebral 1
Hemorrhoides 3
Nevralgia facial 2
Hystero- epilepsia 4
Senectude 2
Dysenteria e diarrhéa 2
Gastrite chronica 3
Alimentação insufficiente 2
Lesão cardio-aortica 2
Congestão retiniana 1
Metrorrhagia 1
Keratite intersticial parenchymatosa 1
Mordedura de cobra 1
Conjunctivite purulenta 1
Sclerose lateral em placas 1
Polypo uterino 1
Phlebite traumatica 1
Congestão pulmonar 1
Psoriasis (lepra vulgar) 1
Hepatite traumatica 1
Retenção de placenta 1
Gonorrhéa 2
Tuberculose pulmonar 2
Herpes ulcerada 1
Facada 1
Tiro de garrucha 1
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Observações diversas
Dia 5 -Choveu inap. às 6 horas da manhã e ás 8. A 1 hora da tarde, soprava de N com a
força de 5ms..5, passando, ás 4, para WNW, com 5 metros por segundo. As 5 1/2
choviscou ligeiramente, embora houvesse ameaça de grande chuva.
6 -Durante a noite não choveu. A 1 hora da tarde soprava N com 3 metros. As 10 da noite
K-N a NE.
7 -Ar calmo. Céo limpido e vento fraco durante parte do dia. De noite, bello luar, calma.
Pequenos cirrus.
8 - Vento brando. N . De noite, luar.
9 - Ligeira viração de NW ; poucas nuvens C, K principalmente.
10 – Vento fraco do NW, de manhã. Pela primeira vez, appareceu vento de S, post
meridien. Chuva e trovoada..
11 - Pequena chuva ás 3 horas, Relampagos a W e S. Vento fresco de NW. Consigno
aqui o facto interessante de que, dentro da minha barraca, a variação thermometrica
oscillou entre a minima de 18º. 5 e a maxima de 41.ºo, no alto da tolda.
12 - As 1 1/2 da manhã cahiram algumas gottas grossas acompanhadas de trovoada de
N. A 1 hora da tarde, trovejava ao mesmo tempo de S e SW, soprando fresco de S com
28- Choveu e ventou fresco de NW até o meio-dia. 0 resto do dia, e de noite, algumas
nuvens, tempo melhor.
29 - Cumulus e cirrus durante o dia. De tarde, relampagos fracos a WSW, SE e S longe.
30 -Grandes cumulus a NE. Stratus a W e SE. Trovejou post meridien a NE. Cumulus-
nimbus em quasi todo o horizonte, com relampagos frequentes.
31 - Chuva forte com intermittencia desde 11 horas da noite, com trovoada: 31 millimetro.
Aguaceiro forte entre 2 3 horas com 17 millimetros.
NOVEMBRO DE 1892
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DEZEMBRO DE 1892
Dia 1. -0 dia veio, pela primeira vez, todo coberto de espessa cerração. Continúa
choviscando de vez em quando. Á tarde, cobrio-se o céo totalmente de nimbus e grandes
cumulus a NW, N, NE.
2.-Ás 10 horas, começou a trovejar e chover nas cabeceiras do Rio das Almas.
3.-Continúa o tempo coberto e choviscando por intervallos, não obstante a noite passada
parecer querer melhorar. O Rio das Almas amanheceu muito cheio e torrentoso.
4, 5 e 6.-Continúa o mesmo tempo chuvoso. Ao amanhecer de 6, chuva torrencial de 51
millimetros.
7, 8, 9 e 10. -Continua o mesmo tempo, porém, com alguns intervallos de limpidez. Ás 10
horas de 10 choveu 20 millimetros. Sahimos de Pyrenopolis com tempo chuvoso ainda.
RELATORIO DA COMMISSÃO EXPLORADORA........................................................................290
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ANNEXO V
____
RELATORIO DO DR. EUGENIO HUSSAK
GEOLOGO DA COMMISSÃO
ANNEXO V
—
Primeira parte
vegetação, tendo a fôrma de plateau e coberta com espesso manto vegetal, nas partes
onde se apresenta o micaschito.
Em virtude da maior resistencia que o itacolumito offerece à erosão pela agua e aos
effeitos da acção do tempo. ha na subida para “ os Picos” uma alternação tres vezes
repetidas de plateaux (micaschisto) e serrotes ingremes rochosos (itacolumito).
Os rios das Almas e Corumbá, que nascem ao pé dos Picos dos Pyreneus,
precipitam-se em bellas cascatas sobre as camadas de itacolumito.
As camadas de micaschisto avermelhado e decomposto, cheias de filões e massas
lenticulares de quartzo, são as que contém ouro e são trabalhadas nas grandes lavras do
Abbade e Vendinha: são ellas que fornecem este metal para as areias e cascalhos dos
rios das Almas e Corumbá.
Indo de Meia-Ponte para Santa Luzia, caminha-se sobre a formação de micaschisto, que.
na passagem do Rio Descoberto. apresenta intercalações de quartzito schistoso listrado.
A orientação des schistos muda-se gradualmente para NS sendo para 0 a inclinação perto
de Santa Luzia.
É para notar n'esta região o apparecimento de muscovito-granito, em Barreiros.
De Meia-Ponte para Santa Luzia predomina o caracter topographico dos chapadões,
interrompido, porém, perto de Barreiros, por um largo valle de contornos ligeiramente
concavos, com serrotes isolados cobertos de vegetação rica e é alli que se vê no meio
dos micaschistos um granito de grão grosso.
Este granito se apresenta sobre uma grande extensão e é, sem duvida, o prolongamento
do que se encontra perto da cidade de Goyaz e na zona granitica do Rio Claro explorada
pelo Dr. Pohl.
Na visinhança de Santa Luzia, o micaschisto é outra vez aurifero e acha-se coberto por
possante deposito de cascalho que, desde o seculo passado, tem sido extensamente
lavrado, dando hoje occupação apenas a uns poucos garimpeiros, visto ser o cascalho
relativamente pobre em ouro, e este de granulação excessivamente fina.
O schisto subjacente tambem mostra os signaes de antigos trabalhos de mineração.
De Santa Luzia até Formosa, passando os rios Mesquita e Parnauá, muda o caracter da
formação geologica, sendo o micaschisto substituido por schisto e grés argilosos,
alternados. com a orientação geral de NS e inclinação para 0. Não pude descobrir fosseis,
mas essas rochas indubitavelmente representam uma formação mais moderna do que o
micaschisto, provavelmente da idade paleozoica, sendo talvez equivalente à associada
com os calcareos da bacia de São Francisco, descriptos por Derby-. nos seus Relatorios
sobre este rio e o das Velhas.
O grés muitas vezes se assemelha a certas variedades de itacolumito e, em alguns
logares, é rico em crystaes de pyrito.
De Formosa para o norte predomina este grés argilloso formando o alto chapadão de
Porto Seguro, ( 1.ooo metros de altura), que, no Itiquira, apresenta uma descida abrupta
para o Vão do Paranan.
Na continuação da viagem de Mestre d'Armas, Rio Torto, Rio do Sal, no Vão dos Angicos,
até o Rio Verde, 15 léguas ao norte de Meia-Ponte, e no rumo de léste para oeste, a
formação de grez e schisto argilloso foi seguida até a fazenda do Padre Simeão.
No Vão dos Angicos (Rio do Sal e Pé da Serra) encontra-se no schisto, calcareo massico
de côr cinzenta escura e branca avermelhada, com intercalações finas de schisto
argilloso.
Da fazenda do Padre Simeão passando pelo Rio Verde e, d'ahi, para o sul até Meia-
Ponte, encontra-se de novo o micaschisto com orientação NS e inclinação para N.
N'esta paragem, é especialmente digna de nota a occorrencia extraordinariamente
possante de ferro oligisto massiço e schistoso no schisto totalmente decomposto do Vão
do Rio Verde, duas leguas distante de Quilombo e sobre o qual terei de dizer alguma
cousa adiante, bem como o cascalho aurifero do
DO PLANALTO CENTRAL DO BRAZIL........................................................................................297
Segunda parte
1º. Ouro. - Indubitavelmente pertence Goyaz, com Minas Geraes e Matto Grosso ao
grupo dos Estados mais auriferos do Brazil
Ha mais de 150 annos que em Goyaz, se lavra o metal precioso e com quanto hoje esteja
quasi extincta a mineração, limitada ao trabalho de poucas centenas de garimpeiros,
pelos methodos mais primitivos, é certo que a sua riqueza aurifera não está exgotada.
Todos estes phenomenos indicam que o ouro foi formado no mesmo tempo e do mesmo
modo que os filões de quartzo, no meio do micaschisto.
A theoria de Egleston da formação de ouro em filões ou dos cascalhos, pela deposição de
soluções, não encontra apoio n'esta lavra.
Onde os filões de quartzo, que se acham intercalados parallelamente á estratificação do
schisto são mais possantes, maior é o conteúdo do ouro.
Conforme as observações do Dr. Arena. um metro cubico da rocha dá um mil reis de
ouro, producto este apparentemente diminuto, porém bastante para dar resultado a um
bem dirigido serviço pelo systema hydraulico com amalgamação.
É evidente que alli o trabalho com batéa não compensará as despezas.
Outra lavra da Serra dos Pyreneus é o morro da Vendinha. Esta tambem é no
micaschisto, porém n'um horizonte inferior ao da lavra do Abbade.
São tambem auriferos os depositos de cascalho dos rios Corumbá e das Almas, sendo
em parte já lavrados como no Rio das Almas, perto de Meia-Ponte, ainda trabalhados por
uns poucos de garimpeiros.
O ouro destes rios é de côr mais escura e mais lamellar do que os das lavras
mencionadas e, por isso, parece ser proveniente de alguma outra parte da serra.
Tambem em Bomfim, o ouro se apresenta em formação primitiva em filões de quartzo no
meio do micaschisto decomposto, avermelhado, podendo-se distinguir dous filões
diversos.
O morro de Santo Antonio, cujos filões lenticulares de quartzo aurifero foram quasi
completamente exgotados, ha umas dezenas de annos, é interessante pelos restos dos
antigos trabalhos de mineração, como um grande poço, os pilões com que se triturava o
quartzo, o rego d'agua, etc.
Ainda resta intacto um grosso lenticulo de quartzo de cerca de um metro de grossura, que
os antigos mineiros deixaram por não poder abrir galeria, ou, talvez, por não achal-o
bastante rico em ouro.
Procurei em vão, com a batéa, encontrar ouro neste quartzo triturado.
É de interesse scientifico a occorrencia n'este quartzo de lamellas esverdeadas de
fuchisto, mineral, que em Minas. por exemplo, é companheiro frequente do ouro.
Em Santa Luzia, o ouro se apresenta num possante deposito de cascalho sobreposto ao
micaschisto e, em grande parte, já lavrado.
Cada prova de batéa dava-me ouro, bem que em quantidade muito pequena e
excessivamente fino.
Na occasião da minha visita alli havia alguns garimpeiros trabalhando com a batéa.
Sobre o modo de occorrencia do ouro, no estado de Goyaz e especialmente sobre a sua
origem, modo de formação e as suas complicadas formas crystallinas, terei mais a dizer,
depois de um estudo crystallographico e microscopico d’este metal e dos mineraes que o
acompanham.
2º. Diamante. -O deposito diamantifero de Agua Suja, no estado de Minas Geraes, ja foi
descripto na primeira parte d'este trabalho.
O estado de Goyaz é tambem rico de diamantes, porém, até o presente, estes não têm
sido regularmente trabalhados, sendo apenas lavrados por uns poucos de garimpeiros
nas arêas dos rios, principalmente nos affluentes do Rio Cayapó, no seu curso superior, e
no Rio Claro, cerca de 30 leguas distante da capital.
Tambem, em Trahiras, ao norte de Meia Ponte, encontram-se diamantes nas arêas do rio,
porém, conforme informam os garimpeiros, somente pequenos e pela maior parte
coloridos, portanto de pouco valor.
Na impossibilidade de visitar estas localidades, o que seria de grande interesse, só os
pude conhecer por diamantes comprados e por amostras de cascalho.
3º. Minereo de ferro -Tive occasião de examinar jazidas de duas especies: 1º. ferro
magnetico; 2º, ferro oligisto.
Interessante para o estudo da genesis do magnetite e pela analogia que apresenta com o
de Jacupiranga e São João de Ipanema, em São Paulo é a occorrencia de ferro
magnetico (Fe3 O4) de Catalão.
Na fazenda do Sr. Vicente Bernardo Pires, tres leguas distante de Catalão, encontram-se
grandes blocos de minereo de ferro, espalhados sobre a superficie, numa grande
extensão. Ahi consegui descobrir a rocha ferrifera.
A matriz original do magnetite, não foi, infelizmente, encontrada em condição de boa
conservação, sendo completamente transformada em massa terrosa de côr parda
avermelhada-escura, muito rica em grandes lamellas alteradas de hydrobiotite e
pequenos octaedros de magnetite. N'estes caracteristicos, esta massa terrosa concorda
inteiramente com a de lpanema e como magnetite-pyroxenite (jacupirangite) alterado de
jacupiranga12; sendo que neste ultimo logar é indubitavel a formação no hydrobiotite da
alteração de pyroxenio.
Lavando na batéa esta terra vermelha em que se encontram numerosos blocos, muitas
vezes angulares, de magnetite, que attingem até o volume de um metro cubico, obtem-se
um residuo de cerca de 40 % da massa lavada, consistindo de arêa fina de magnetite
com limonite e ferro titanifero; raramente encontram-se prismas de apatite e grãos de
quartzo. Estes ultimos são seguramente de origem secundaria, visto que nas massas de
magnetite puro se encontram pequenos filões de quartzo secundario e, exactamente
como em Ipanema, grandes massas de jaspe com geodes de crystaes de quartzo.
Finalmente encontram-se espalhadas pequenas massas de uma rocha esverdeada que, á
primeira vista parece ser serpentina, dentro da qual vêm-se crystaes de 1 a 2 millimetros
de diametro de magnetite e massas irregulares maiores, e veias da mesma substancia. A
principio julguei que esta rocha era a parte não alterada da matriz do magnetite, porém o
exame microscopico mostra que é uma rocha pura de perowskite consistindo de
innumeros crystaes de perowskite emittidos no magnetite e alterados em um mineral
verde e amarellado.
Como mostra o esboço junto, a matriz da rocha é de magnetite que, pela maior parte em
laminas muito finas, se extende em redor dos crystaes de perowskite de modo a
conservar os contornos crystallinos d'estes, mesmo quando estão completamente
alterados. Tres quartas partes dos crystaes de perowskite estão ainda bem conservados,
de côr vermelha-escura pardacenta, e de cerca de 2 millimetros em diametro. Têm dupla
refracção muito forte e, entre nicols cruzados, mostram côres de interferencia muito vivas,
fazendo lembrar as de brookite. Mostram tambem numerosas estrias de maclação, e não
raras vezes em luz polarizada convergente, a sahida obliqua de um eixo optico. A
clivagem conforme as faces do cubo é regularmente boa.
O producto de alteração que circumda os crystaes de perowskite é de côr verde
amarellada e em aspecto se assemelha ao leucoxenio, consiste em innumeros granulos
muito finos, de côr esverdeada e com forte dupla. refracção. As massas maiores de
magnetite mais puro, que se apresentam na rocha, tambem se acham cheias de crystaes
de perowskite alterados nas margens.
Pulverisando, peneirando e lavando, pode-se obter o perowskite, que facilmente se
separa da massa alterada, quasi puro e, pela fusão não muito prolongada em carbonato
de soda, pode-se purifical-o dos restos de magnetite e producto de alteração de modo a
verificar pela analyse qualitativa que o mineral é de facto puro titanato de cal, isto é,
perowskite.
N'uma solução de pó da rocha inteira, notou-se uma ligeira reacção de silica que,
seguramente, provem das pequenas veias de quartzo secundario que com a lente se vê
no magnetite.
Tambem a proporção de agua, determinada quantitativamente em 1.1 %, na rocha meia
decomposta, é demasiado pequena, tendo em vista a presença de limonite proveniente
da alteração do magnetite, para poder ser considerado como oxydo hydratado de
titaneo13 este producto de alteração do perowskite.
A questão da composição d'este producto de decomposição pôde ser resolvida pela
descoberta de fragmentos de magnetite de massas maiores, puras, em que a proporção
de perowskite ainda conservada era muito pequena, mas que apresentando a forma do
cubo e do octaedro, se mostraram claramente serem provenientes d'aquelle mineral.
Fundindo estas massas com bisulfato de potassa, obtive uma reacção fraca, porém
distincta, de acido silicico depois de dissolvido o producto da fusão em agua fria; fervendo
a solução, cahiu quasi todo o acido titanico sendo o resto precipitado com ammoniaco,
mostrando o precipitado traços de ferro. Este resultado estabelece claramente que o
producto da alteração do perowskite de Catalão é puro acido titanico, correspondendo
completamente ao producto de alteração, amarellado, pulverulento do ferro titanado,
como, por exemplo, em jacupiranga e Agua Suja, onde este producto tambem consiste de
pequenos grãos arredondados, amarellos, birefringentes, de acido titanico puro (anataz?).
Quanto á formação n'estas massas de rocha e perowskite na rocha matriz do magnetite
de Catalão, parece-me mais que provavel que estas, como as descriptas por Sauer de
Oberweisenthal, na Saxonia14, devem ser consideradas como segregações n'uma
magma eruptiva extremamente basica.
Em relação á genesis do magnetite, ha completa concordancia com os depositos de
Jacupiranga e Ipanema, sendo esta occorrencia de Goyaz o terceiro exemplo brazileiro do
grupo de depositos de minereo de ferro “Ekersund-Taberg” conforme a classificação de J.
H. L. Vogt15 do typo de «segregações de oxydos de ferro ricos em acido titanico.»
Uma analyse chimica feita pelo Dr. Dafert: sobre material relativamente puro, deu o
seguinte resultado:
H2O = 0. 29 %
O(directo) = 24.54 %
Fe = 62.14 %
Ti O2 = 11.27 %
Insoluvel = 2.29 %
__________
Somma = 99.70 %
Vê-se que o minereo é livre de acido phosphorico e, por este lado, muito apropriado ao
fabrico de ferro. O teor em titaneo, no qual se assemelha aos mineraes, parece não ser
demasiado elevado.
Combinando que fica uma parte de Fe O2 substituido pelo Ti O2 será a formula do
magnetito de Catalão (Fe3 O4) :
Determinado / Theoricamente
Fe = 71.30 % 72.41 %
O= 28.70 % 27.59 %
Terceira parte
Itacolumite e itabirite
Com o nome de itacolomite (da Serra de Itacolumi perto de Ouro Preto) é designada uma
rocha quartzosa, tendo como elemento accessorio lamellas de mica, intercallada entre
schistos crystallinos, sendo portanto da mesma idade que estes aos quaes passa por
graduações insensiveis. Achando-se o elemento micaceo substituido por ferro micaceo, o
itacolumite passa a itabirite (schisto de ferro micaceo) . Na Serra dos Pyreneus todas
estas transições podem ser observadas de modo
Calcareo
Como já foi dito, na parte da área demarcada para a nova Capital Federal predominam os
schistos paleozoicos entre os quaes se apresenta calcareo cinzento, compacto, que
corresponde em caracteres com o em
contrado no valle de São Francisco e referido pelo Prof. O. A. Derby á edade siluriana.
No Ribeirão do Sal, descobri um calcareo branco, compacto, semelhante ao marmore
com delgadas intercalações de schisto argilloso, que merece ser estudado relativamente
ao seu emprego para a fabricação de cal hydraulica.
O exame microscopico mostra entre as partes brancas calcareas numerosos crystaes de
um mineral monoclinico, incolor, que possue clivagem perfeita na direcção do eixo vertical
e mostra sobre as superficies da clivagem um ilustre de madre-perola, semelhante ao do
gesso. A dureza é entre 4 e 5.
Debaixo do microscopio, o mineral apresenta conforme a lei, secções hexagonaes e
rhombicas de grandes maclas, e plano de maclação; e orthopinacoide (100); o angulo de
extinção, com o eixo vertical é, no maximo, de 35º. É notavel a falta de clivagem distincta
pelas faces prismaticas, o que é muito caracteristico para o wollastonite. Conforme todos
estes caracteres, o mineral concorda melhor com o wollastonite, com o qual tambem
concorda a analyse dada adiante, admittindo um pequeno excesso de cal que, todavia, se
acha combinado com silica.
A occorrencia de wollastonite em calcareo parece indicar a acção de contacto de uma
rocha eruptiva e não é improvavel que haja n'esta localidade dikes de granito, bem que
nada de semelhante tenha sido observado.
A analyse quantitativa que devo ao collega Dr. F. W. Dafert é a seguinte:
H2 O (120º C.) = 0.11 %
CO2 = 36.27 %
CaO = 42.59 %
MgO = 3.42 %
Fe2O3 + A12 O 3 = 1.26 %
Si O2 etc. = 15.30 %
SO3 = traços
%
vertiges
Indeterminado:
C1, Alcabis = _
_____________________
Somma = = 98.95 0,1.
Quarta parte
Umas 24 léguas ao norte de Uberaba fica a cidade de Bagagem, celebre pela descoberta
do grande diamante conhecido pelo nome de «Estrella do Sul». Hoje em dia este deposito
(cascalho do rio do mesmo nome ) é completamente abandonado pelos trabalhadores ou
garimpeiros.
Quatro leguas ao sul d’esta cidade acha-se o pequeno arraial de «Agua Suja», onde um
grande deposito de cascalho sobre-jacente ao grés vermelho livre de fosseis, tem sido
lavrado com bom exito para diamantes desde 1867.
Não estando em trabalho as lavras de Bagagem e sabendo pelos recentes estudos do
meu collega Dr. Luiz Gonzaga, de Campos, que a lavra de Agua Suja, hoje propriedade
do Dr. A. Arena & C. e em plena exploração offerecia muitas particularidades
interessantes, dirigi-me para lá, onde, graças a amabilidade do Dr. Arena, pude, durante
onze dias, fazer um estudo bastante minucioso.
A estructura geologica da grande região campestre entre Uberaba e o Rio Paranahyba, é
relativamente simples, offerecendo os numerosos pequenos rios, que têm desnudado
esta planicie, excellentes córtes para o estudo d'esta estructura. Como base para o grez
ferruginoso, que forma estes campos, acha-se no fundo d’estes valles e sempre
altamente inclinado, um micaschisto, rico em mica branca, de côr cinzenta, quando não
alterado, ou de côr - avemelhada, quando decomposto.
Este schisto contém innumeros lenticulos de quartzo compacto e filões de quartzo rico em
turmalinas.
Immediatamente sobre o micaschisto, jaz o grez molle facilmente alteravel, em geral
reduzido a uma immensa camada de arêa um tanto argillosa. As camadas, pelo menos
nos poucos logares onde a rocha é bastante conservada para permittir observações, são
sempre em posição horizontal.
Não tendo-se encontrado fosseis n'este grez, a sua idade geologica é duvidosa,
parecendo porém ser mais recente do que a idade carbonifera.
Em alguns logares como em Cassú, perto de Uberaba, e em Ponte-Nova, sobre o rio das
Velhas, encontram-se sobre os micaschistos camadas effusivas de muitos metros de
espessura de uma rocha preta eruptiva, a augite-porphyrite, conhecida no paiz pelo nome
improprio de «pedra de ferro.» Esta rocha, pela decomposição, fornece a afamada «terra
roxa». Nos córtes da estrada de ferro entre Franca e Uberaba, vê-se esta rocha eruptiva
associada como grez de modo a mostrar que é contemporanea ou posterior em idade a
este.
O terreno acha-se, em quasi toda a parte, coberto de cascalho de seixos rolados, ora
livres, ora cimentados por limonite ou quartzo, formando a canga um verdadeiro
conglomerado de pouca idade geologica.
Naturalmente, cascalho e canga variam de caracter conforme á rocha sub-jacente da qual
se derivam. Sendo esta micaschisto, são ricos em seixos de quartzo, ao passo que
sobrepostos a rocha eruptiva basica acima mencionada, são ricos em seixos d'esta
mesma rocha e de magnetite.
Identica constituição geologica encontra-se em Agua Suja, onde o corrego d’este nome
corre sobre as margens levantadas das camadas de micaschisto, que se apresentam sob
possantes massas de grés molle, colorido em amarello ou vermelho por oxydo de ferro, e
este, por sua vez, é coberto por uma camada de cascalho diamantifero.
O cascalho, como se vê bem nas lavras ultimamente abertas, é disposto em camadas
horizontaes de mais de 12 metros de espessura. e, pela côr, granulação e composição,
pode ser dividido em quatro grupos.
A camada inferior, e mais possante, jaz immediatamente sobre o grez (chamado pizarra
pelos garimpeiros) e é conhecida pelo nome de Tauá. Sendo o cascalho deposito formado
sob a agua, é facil comprehender que esta camada seja a mais rica em grandes blocos de
pedra e em diamantes, isto é, das partes mais pesadas do material rochoso transportado
pela agua e por ella depositado em outro logar. Por este motivo, o tauá offerece um
aspecto particular: grandes blocos, mais ou menos rolados de cerca de 4 e 5 decimetros
de diametro, de varias qualidades de rocha, acham-se encerrados, como amendoas em
um bôlo, em areia fina, que contem em grande abundancia pedaços arredondados que,
quando muito, attingem o tamanho do punho, de augite-porphyrite, conhecida entre os
mineiros pelo nome de bolas.
Os grandes blocos de tauá são de varias côres e consistem de muscovite-granito, rica em
turmalinas, branco e decomposto, de blócos de augite-porphyrite, decomposta, de
micaschisto preto ou cinzento, de grez molle amarellado, etc.
É de grande interesse o facto de serem os diamantes encontrados somente na areia fina.
rica em «bolas» de augite-porphyrite do cimento do tauá.
Na occasião da minha visita, a lavra era trabalhada sómente no tauá, que apresentava a
espessura de 12mms.00. Como fundo da batéa ou residuo pesado da lavagem,
encontram-se junto com os diamantes, que são quasi exclusivamente de primeira agua,
porém infelizmente de dimensões relativamente pequenas, os seguintes mineraes:
staurolitha, rutilo, turmalina. ilmenita, granadas dodecaedricas incluindo grãosinhos de
quartzo, pseudomorphoses de (anatasio?), seixos de grez e de uma rocha semelhante ao
itacolumito e fragmentos de schisto micaceo; todos estes elementos, entretanto. muito
mais raros do que os minereos de ferro, aqui altamente predominantes, -magnetite e uma
rocha de magnetite, pyrite com o respectivo producto de alteração - limonite e granadas
cubicas. Além disso, são dignos de nota os seixos de augite-porphyrite, e os de
calcedonia com opala leitosa até o tamanho de um punho, que, frequentemente
concorrem com as rochas eruptivas citadas.
A pyrite encontra-se em cubos bastante rolados tendo até 2 centimetros de comprimento,
completamente transformada em limonite, que se apresenta nos seixos de côr negra
muito brilhante.
A magnetite, até na proporção de 30-40%, apresenta-se também em octaedros perfeitos,
cujas faces apresentam as impressões que mostram a sua lei de crescimento, segundo a
macla da spinella. São aqui muito mais raras as favas semelhantes ao jaspe.
DO PLANALTO CENTRAL DO BRAZIL......................................................................................313
Commissão Exploradora do Planalto Central do Brasil
Do mais alto interesse mineralogico são: 1º, os seixos da rocha ele magnetite que deve,
todavia, encontrar-se nas proximidades de Agua-Suja, e foi alterada pela acção das
correntes, productoras do cascalho; 2º, os abundantes e bellos crystaes cubicos de
granada, sem inclusão alguma.
Rocha de magnetite. -Occorre em grandes seixos muito rolados, ora de pura magnetite,
ora permeiados de um mineral crystallisado, decomposto, de côr verde-amarellada, ora,
emfim, totalmente compostos d'este mineral, apenas atravessado por tenues veias de
magnetita.
O mineral incluido na magnetite é sempre poroso; em laminas finas, é opaco; segundo
analyse chimica qualitativa é oxydo titanico, quasi puro com traços de ferro e cal. Em
superficies recem cortadas e polidas, vê-se a magnetite travada pelo mineral de titanio,
que mostra formas crystallinas, bem delimitadas-triangulos equilateros, quadrados,
rhombos, e hexagonos mais ou menos deformados: d'ahi a deducção para a forma
octaedrica.
Em laminas extremamente finas aliás difficil de obter, o mineral de titanio apparece ao
microscopio como já se mostrava apenas translucido, de côr amarellada. totalmente
alterado, com polarisação de aggregado, como se fôra composto de pequenos grãos ou
pyramides birefringentes, produzindo a alteração uma substancia disposta em veias e
filamentos.
Como mostra a investigação da rocha de magnetite e perowskite achada perto de
Catalão, o mineral octaedrico da magnetite de Agua-Suja concorda completamente com a
perowskite ou antes com o seu producto de alteração (T1 02). Uma noticia mais detalhada
a respeito será dada na parte III desta noticia na descripção da magnetite de Catalão.
Como demonstram a analyse chimica qualitativa e os ensaios feitos com o maçarico, a
granada cubica é um verdadeiro pyropo.
Com o borax, dá reacção facil e franca de chromo. Pela côr assemelha- se ás granadas
com inclusões de quartzo, que concorrem no mesmo cascalho, crystallisadas em
dodecaedros e ikositetraedros e são coradas de vermelho-sangue - escuro. Entretanto, ao
maçarico apenas derrete se nas quinas, e com o carbonato de soda só difficilmente funde.
Tratada ao maçarico, não perde a côr; apenas torna-se de um vermelho violaceo.
A densidade deste pyropo foi determinada com o apparelho de Klaproth para 3.693. -0
tamanho dos crystaes varia de um millimetro até 6, no maximo; aliás, os pequenos
crystaes de 1-2 millimetros são sempre os mais bem formados.
O que ha mais interessante, na occorrencia d'estes crystaes, sempre indecompostos e
sem inclusões, é a forma simples do cubo, que só raras vezes apparece combinada com
faces de octaedro.
As arestas são sempre bem vivas e as faces sempre arredondadas e cobertas de
numerosas saliencias mamillares; apenas os crystaes maiores estão um pouco rolados.
Ao microscopio, entre nicols cruzados, comportam-se como crystaes de pyropo, sempre
totalmente isotropos. É, certamente, do maior interesse encontrar agora em abundancia e,
sem a menor duvida, a forma cubica que já Mohs havia indicado nos pyropos da
Bohemia, que Dana considera muito rara e que Des Cloizeaux cita como possivel em seu
manual: em todo o caso, até hoje, é materia de duvidas.
Finalmente, devemos ainda mencionar no cascalho de Agua Suja, bem que elemento um
tanto raro e apenas observavel nas areias muito finas, crystaesinhos de zirconia, brancos
e um tanto rolados.
Um unico crystal de rubim corindon vermelho nobre foi achado pelo Dr. Luiz Gonzaga de
Campos.
No tocante aos diamantes da região de Bagagem (cidade da Bagagem, Agua Suja, Rio
Bagagem, Douradinho, etc.) posso dizer que, tendo examinado um grande numero de
Parece me, pois, que em Agua-Suja todas as condições são favoraveis para um notavel
desenvolvimento da mineração de diamantes, contrastando assim com a Bagagem, logar
da descoberta da famosa «Estrella do Sul» onde hoje o trabalho está parado, visto que o
cascalho, que se apresenta nos barrancos do rio do mesmo nome já se acha lavado.
Resta agora a questão de origem e da verdadeira rocha matriz do diamante n'estas
paragens.
Os estudos de Derby e Gorceix na região diamantifera da Serra do Espinhaço, em Minas
Oriental, têm mostrado que os casos conhecidos de diamantes encaixados em rocha,
quer seja a canga das lavras do rio, quer as celebres amostras da Serra do Grão-Mogol,
nas quaes a gemma se encontra em quartzito (itacolumite) representam formações
secundarias, em que o diamante, como os outros elementos da rocha, provém de outras
formações mais antigas. Ambos esses autores julgam ter encontrado a verdadeira matriz
do diamante nos filões decompostos que, em São João da Chapada, são intercalados em
schistos micaceos, pertencentes a uma formação geologica mais antiga do que o
quartzito diamantifero do Grão-Mogol.
Este modo de occorrencia se afasta notavelmento do verificado na região diamantifera do
Cabo da Boa Esperança, onde o corpo diamantifero é claramente de origem eruptiva
pertencendo a rocha matriz á classe dos peridotitos.
Ora, ha em Agua-Suja certas circumstancias que fazem presumir que o modo de
origem n'esta região tem mais analogia com o africano que com o da região de
Diamantina.
Estas circumstancias são: a falta ou raridade de muitas das «formações», ou
satellites do diamante, que são caracteristicas das lavras de Diamantina; a presença de
outras, que, como a granada pyrope, são caracteristicas das lavras do Cabo, porém raras
ou ausentes nas de Diamantina, e que, de certo modo, indicam rochas eruptivas. A
grande abundancia e caracter especial dos seixos de magnetite egualmente indicam
proveniencia de uma rocha eruptiva altamente basica e portanto aparentada com o
peridotito do Cabo .
Por outra parte, porém, a presença no tauá de abundantes fragmentos de micaschisto e
granito prova que duas formações, aliás já conhecidas na visinhança, têm fornecido
elementos ao cascalho de Agua-Suja, e, emquanto não apparecerem provas em
contrario, é admissivel que qualquer uma das duas tenha fornecido tambem os
diamantes.
Indicam-se tambem como diamantiferos o Rio das Velhas, perto de Ponte Nova e o
Paranahyba, no porto Mão de Pau.
Tive occasião de verificar que a «formação», isto é, os mineraes pesados, que, n'aquelle
logar, se accumulam no fundo da batéa, ao proceder-se à lavagem, são identicos aos que
em todas as lavras brazileiras acompanham o diamante.
Trabalhos de mineração em rios tão grandes seriam, porém, muito difficeis e,
provavelmente, pouco remunerativos.
Ordem dos Morcegos Chiroptera. -Não podemos citar n'esta ordem, senão por
informações, a existencia do vampiro (Phillostoma Spectrum?), e, nem tão pouco,
especificar individuos do grande grupo dos noctilionides , pois não tinhamos em vista
escrever esta noticia.
Ordem dos Carnivoros (Carnivora). - Entre os felida, a onça pintada e a preta ou tigre,
variedades conhecidas na mamilogia pelo nome de felis onça, são vistas em diversos
pontos como nos Arrependidos, Vão do Paranan, Vão dos Angicos, etc.
São rarissimas as pretas e pouco communs as pintadas. o que não se dá com a onça
vermelha ou suçuarana (Felis Concolor) e o gato jaguaritica. nome que dão no logar ao
felis macrura dos naturalistas, sendo mesmo este muito espalhado em todo o planalto. O
gato vermelho (Felis Eyra), se bem que pouco commum, existe tambem assim como o
mourisco (Felis Jaguarundi). Esta ultima especie é rara em todo o Brazil e a penultima
pouco vulgar. Ainda é conhecida outra variedade do felis concolor que tem entre os
habitantes o nome de-onça vermelha de lombo preto-e dizem ser de grande ferocidade. É
rara esta especie.
O lobo (Canis Jubatus), e a raposa ( Canis Vetulus) são da familia canida, os habitantes
dos campos, e a irára (Gallictis Barbara) o dos cerrados e florestas.
A lontra (Lutra Solitaria) e a ariranha (L. Brasiliensis) são encontradas nos rios. Estes
animaes são muito perseguidos pelos caçadores que têm em alto valor a pelle pela
impermeabilidade que offerece á Agua, o que a torna muito propria para capas de
espingarda, bolças, etc. É esta pelle tambem muito procurada pelos negociantes
exportadores, devido talvez ao frouxel expesso e de bella côr, que se acha sob os pellos
grossos.
A jaratataca, cangambá ou maritataca (Mephites Suffocans ) e o guaxinim (Procion
Crancrivorus) tivemos occasião de vêr nos campos.
O coati de bando (Nasua socialis) e tambem o quati mundeu (N. Solitaris) habitam as
mattas.
Ordem dos Roedores (Rodentia). -A caelogenis paca (paca), o lepus brasiliensis
(coelho do matto), a cavea aperea (preá), a dasypocrata aguti (cotia) , a histrix insidiosa
(ouriço caxeiro) são habitantes das florestas.
Todos estes roedores são caças muito apreciadas no logar, assim como a capivara
(hydrocherus capybara) gigante roedor que é muito commum na lagôa Feia, Rio Preto,
Samambaia e outros pontos.
Ordem dos Ongulados Ungulata – Entre os ruminantes, a especie conhecida pelo nome
de-cervo ou veado grande galheiro (Cervus Paludosus) vive nas proximidades das
florestas que margeam os rios e alagados. Não é commum, devido á perseguição que
soffre por causa de sua bella armação, cujos esgalhos vão, com o correr dos annos,
augmentando em numero e dimensões. Nos campos, apresentam-se em bandos de
dezenas o elegante cereus campestris (çuçuapara dos indios e-campeira-dos Brazileiros)
ostentando seus pequenos e bellos galhos. O veado vermelho ou catingueiro (Cervus
Nemorivagus) se encontra nos chapadões e cerrados, e, nas florestas, o veado branco,
pardo ou mateiro (Cervus Rufus).
Entre os pachydermes, o queixada dos Brazileiros Dicotyles labiatus de Lineu, vive aos
bandos nas florestas, assim como, de preferencia, nos cerrados e grutas, o caititú ( D.
Torquatus). A anta (Tapirus americanus), o maior representante hodierno da fauna sul-
americana, nas margens dos ribeirões e ribeiros.
Tendo este animal uma pelle de espessura talvez superior a todas as outras conhecidas
no Brazil, e de uma grande resistencia, soffre uma guerra de morte em todos os logares.
Os arreios de montaria, rebenques, etc., feitos de tal pelle são os mais procurados. D'ahi
o ser ella já muito pouco frequente.
Ordem dos Desdentados (Edentata). -Dos desdentados sul-americanos, o futuro Districto
Federal tem quasi todos os representantes; da preguiça da especie bradipus tridactilus,
tivemos occasião de ver uma pelle e me affirmaram a existencia da preguiça de colleira
(Bradipus torquatus ). O tatu canastra dos
Goyanos, tatú açú dos indios e dasypus gigas de Cuvier, o tatú verdadeiro ( D. Gilvipes) ,
o tatú péba ou papa defuntos ( D. Setosus ) e o tatú bola ( D. Conurus ) moram nos
chapadões e, em numero bastante crescido, o verdadeiro e o peba.
A caça aos tatús é feita na época do inverno de modo bastante singular. O frio que faz
durante a noite os obriga a permanecerem nos seus esconderijos. Porém ao nascer do
sol, elles os deixam e saem pelos chapadões á caça de vermes e insectos de que se
nutrem. Nesta occasião, os caçadores (alguns armados apenas de cacete), saem á sua
procura e com facilidade os apanham.
O tamanduá bandeira (Myrmecophaga Jubata) e o tamanduá pequeno ( M. Tetradactyla)
existem nos campos e cerrados. O tamanduá bandeira é muito perseguido, devido
simplesmente á frocada cauda que os habitantes do logar empregam em substituição aos
espanadores, pois não aproveitam a carne. A facilidade que ha em caçal-o (não trepa e
mais ainda não corre de modo a poder escapar ao inimigo) tem tornado já bastante raro
este curioso e utilissimo animal destruidor dos termites e das formigas.
Ordem dos Marsupiaes (Marsupialia) -Nesta ordem podemos citar o cassaco ou gambá
dos Goyanos (Didelphis Surita), e nos affirmaram a existencia da cuica ( D. Cuica ?).
Como objecto digno de nota, foi offerecida ao Dr. Cruls, chefe da Commissão, uma pelle
de Cuica d'agua, bello marsupial, hoje raro em todos os Estados do Brazil, o chironectes
palmatus dos zoologos.
Os estreitos limites deste trabalho que ainda resente-se da falta de pesquizas e
indagações, motivada por causas superiores, nos levam a apontar ( como já o fizemos na
parte relativa a mamalogia) somente as especies ornithologicas que, por assim dizer, não
passam desapercebidas aos viajantes de taes paragens, mais despreoccupados com o
conhecimento da fauna.
Ordem das Aves de rapina ( Rapacae).-Os abutres (Vulturidae ) são representados em
todas as regiões pelo urubú commum (Cathartes Foetens) especialmente, nos campos,
pelo urubú de cabeça lisa (C. Braziliensis), e nas florestas e cerrados, pelo urubú rei (C.
Papa ). Esta ultima especie é bastante rara.
Entre os gaviões (Falconidae), o caracará ( Falco Brasiliensis) o gavião ordinario (Falco
Sparverius?), o gavião pequeno (Nisus Striatus). É mais raro a chamada «aguia» (Falco
Destructor) pelos Goyanos e um pouco mais commum o acauan (Herpetotheres
Cachimans).
A familia Strigidae (corujas, caborés) é representada por algumas especies do genero
Athene e outros, sendo commum nos campos o Caboré ordinario (Syrnium Hylophilum?).
Ordem das Aves trepadoras (Scansorae). - Notámos entre as especies da fam.
Psittacidae (papagaios) a arara azul (Macrocercus Ararauna) que nidifica nos burityzaes
em Arrependidos e outros logares; o papagaio commum (Androglossa Aestiva), e, como
notaveis pela frequencia, em bandos bastante crescidos ás vezes, o periquito verde de
encontros amarellos (Conurus Xantopterus), o de testa amarella (C. Canicularis), e o
periquito tuin, tambem chamado miudo, caturrita e de vassoura (Pittacula passerina).
Da familia Ramphastidae (tucanos), vimos o tucano grande de papo branco (Ramphastus
Taco) nos, cerrados e mesmo nos laranjaes, proximo a habitação da fazenda Cipó de
Cima, no Vão do Paranan, e o chamado araçary (Pteraglossus Beauharnaisi).
Entre os Picapaus (Picidae) temos, nas florestas, o picapau de cabeça vermelha
(Campophilus robustus); nos cerrados, o picapau amarello (Colaptes Campestris), e nos
campos o picapau branco (Coeleus flavicans).
Da familia Cuculidae (anuns ou anús) o anum preto (Crotophaga Anú) vive nos campos e
em companhia dos animaes de que arranca, para nutrir-se, os carrapatos que lhes estão
agarrados á pelle, e o anum branco ou piló (Guira Piririgua) que prefere os lugares
pantanosos.
de admirar como naquelle Estado ainda se encontra tão crescido numero de taes seres.
Na qualidade de amador demos, ha tempos, começo a uma collecção de coleopteros, e
procurámos, desde que iniciámos a nossa viagem para o Planalto, apanhar os
exemplares que o acaso desse logar a encontrarmos; portanto, nenhuma caçada regular
fizemos absolutamente. A principio, a nossa colheita limitava-se a alguns gorgulhos e
estercoreiros ; mas, logo depois começaram as chuvas, appareceram os coleopteros em
grande numero assim como as borboletas e insectos de outras ordens até então
representadas muito escassamente.
Ordem dos Coleopteros. – D’entre os carnivoros, encontrámos além de alguns pequenos
exemplares dos generos Odontacheila, Agra e Scarite, uma especie do genero Tetracha,
bonita cicindelida azul de 18 millimetros de comprimento e 6 de largura, dando caça aos
termites nos chapadões.
Nos corregos e ribeiros nos foi facil apanhar, da familia gyrinidae, urna das especies do
genero enhydrus a que vulgarmente dão o nome de – tartaruguinha.
A especie mais notavel de staphilindae que encontramos, era de 20 millimetros de
comprimento e 5 de largura; de um avelludado côr de bronze com reflexos dourados.
Individuos solitarios de tal especie eram vistas correndo pelas estradas.
Entre os dermestidae, somente nos foi dado ver o dermeste museorum, insecto muito
conhecido pelo estrago que suas larvas fazem nas pelles.
Da familia malacodermidae, encontrámos diversas especies do genero lucernuta
(pyrilampos ou vagalumes), entre os quaes o lucernuta savignyi o pyrilampo da matta. e
mais representantes de outros generos.
Os pyrophorus noctilicus são, d'entre os elateridae, os que apparecem em grande
quantidade nas cidades e campos onde os chamam tambem de – vagalumes – devido, a
luz que emittem dos dous pontos que se acham nas extremidades de seu protothorax.
Na familia buprestidae não é muito raro encontrar-se o decantado euchroma gigante,
insecto de grandes dimensões chamado popularmente – olho, de sol ou olho de boi –
devido a dous grandes circulos reluzentes que tem na parte superior do protothorax.
Entre os scarabeus (scarabaeidae), era extraordinaria a quantidade que encontravamos
de diversas especies dos generos gymnetis, antichira, geniates, enema e megalosoma,
entre os quaes o enema infundibulus, chamado vulgarmente – torquez –, por ter na
cabeça um longo corno recurvado para traz que, á vontade do insecto, se move e se une
a outro fixo que se acha no protothorax ;e o hector, genero megalosoma, com o
comprimento de 7 centimetros sobre 4 de largura, conhecido vulgarmente pelo nome – de
forquilha – devido este nome ao appendice corneo que tem o macho na cabeça, e que
termina em duas pontas.
Na sub-familia dos coprophagos (estercoreiros), é extraordinario o numero dos phanaeus
que se encontra pela estrada nas dejecções dos animaes. – O virabosta de chifre
(Phanaeus ensifer), grande estercoreiro verde que tem na cabeça um longo apendice de
3 centimetros de comprimento, e o phanaeus minas, coprophago menor e da mesma côr
tendo douradas as bordas do protothorax. Os chamados - virabosta preto (genero Copris)
são tambem encontrados em quantidade numerosa, como o canthon prasinus, pequeno
estercoreiro de côr verde. – Os copris são atrahidos pela luz de modo que é frequente
muitos d'elles apparecerem no interior das casas onde estão lampadas acesas.
Entre as cantharidas (meloe), além de outras especies menos communs, encontra-se em
bandos de centenas a chamada – antinha, pelos Goyanos, que é cinzenta e salpicada de
pontos pretos.
Dos tenebrionidae, encontrámos especies dos generos Zophobas, Camaria, Strongilium e
Scotinus, entre os quaes o cascudo aranha (scotinus gramicus ?).
Entre os da familia curculionidae (gorgulhos), vimos, além do pequeno gorgulho destruidor
dos cereaes (Rhynchaphorus granaria), e do grande gorgulho das palmeiras (R.
Palmarum), grande numero de outras especies que se distinguem já pelo brilho de suas
côres, já pela forma.
O careta, lindo cyphus em cujos elytros sobre um fundo azul descobre-se, em dous
pontos e traços negros, a forma de uma carranca, lindos cêntrimos pretos reluzentes,
tendo uns o protothorax encarnado e outros preto, etc., são especies de gorgulhos muito
conhecidas em Goyaz.
Dos longicornios, são encontrados: o arlequim tambem chamado – serra. (Acrocinus
longimanus) cujas dimensões do par de patas do protothorax é o dobro do seu
comprimento no macho que, ás vezes, excede de 7 centimetros, e maior ainda são as
antennas; o dentista (Mallodon spinibarbi) , nome que é devido ás fortes mandibulas de
que é dotado e que lembra um dos instrumentos de extrair dentes; o testa de lã
(Drocacerus Barbatus), cuja cabeça é coberta por uma espessa camada de pello
amarello; o cinta amarella ou guarda de cinturão (Trachideres Succinctus) insecto côr de
café tendo no meio dos elytros uma facha amarella dividindo-os transversalmente, e
muitas outras especies cuja citação este trabalho não comporta.
Entre as chysomelinas, era numerosa a quantidade dos cascudos de enfeite, reluzentes
enmolpus cujo reflexo varia desde o verde até a côr de rubim, tendo uns o protothorax
azul e outros verde; a calligrapha polyspila conhecida pelo nome de – oncinha das folhas,
e que é de côr amarella com reflexos dourados e salpicada de preto, de modo a lembrar
uma pelle de onça pintada; o batonota cujos elytros formam uma longa ponta em meio do
dorso; e ainda na tribu cassidinae, além de muitas outras especies, torna-se notavel pelo
numero crescido em que ás vezes se encontra em grupos, o tatusinho, paecilaspis, cujos
elytros pretos têm no sentido transversal quatro ordens de pontos contendo a primeira e
quarta deus, a segunda quatro e a terceira seis pontos de um amarello alaranjado.
Da familia erotyliannae encontrámos representantes dos generos ischirus, aegitus,
omoplata, zonarius e brachysphaenus; assim como do genero adonia, familia das
coccinellidas.
Diversas outras ordens de insectos. – Teriamos acima feito ponto final nestas linhas em
vista de não permittir esta resumida noticia mais extensão, e ainda devido á nossa citada
falta de observações, se não fossemos como que obrigados a fazer ligeira referencia a
outros representantes entomologicos, visto como todo viajante de taes regiões, nota a
existencia delles, e, de alguns, conserva a mais duradoura lembrança.
Entre os orthopteros nota-se diversas especies de phasmas (phasmidae), insectos
conhecidos vulgarmente pelos nomes de-Põe-mesa, garrancho e Louva-Deus, diversas
de gafanhotos (acridiodae), e de grillos (grillidae).
Na ordem dos hemipteros, são communs os persevejos do matto, dos quaes algumas
especies sugam o sangue de diversos animaes e até do proprio homem.
Os cupins (termites) são nevropteros largamente espalhados no planalto e principalmente
os termes cummulans que são os constructores das casas que se encontram nos campos
affectando a forma de pequenos montes, e o cupim ordinario (Termes Devastans).
Dos Lepidopteros são encontrados, ás vezes formando grandes grupos nas margens dos
rios, diversas especies de papilionides e nymphalideus, entre as quaes a borboleta
amarella, tryte e cypris do genero Leachiana, a catagramma astarte, chamada
vulgarmente oitenta e oito, etc. Ainda são communs nas florestas e campos diversas
outras especies, irão só do grupo das diurnas como do das nocturnas.
Na ordem dos hymenopteros encontram-se diversas abelhas (apidae) do genero trigona e
mellipona, diversas especies de maribondos ou inchús (Vespa), e de formigas (Formica),
entre as quaes se acha a formiga de roça (Atta Cephalotes).
Os mosquitos tanto do genero culex como do simularia e as motucas (Tabanus) são, além
de multas outras especies, os representantes dos dipteros.
D’entre os Arachnideos encontra se, além do grande numero de especies dos generos
acrosoma e phalangidae, a migale Blondü, aranha caranguejeira, e entre os scorpionidae,
o lacrau (scorpio americanus).
Entre os crystapteros (carrapatos) além de outras especies, é crescido o numero dos
carrapatos grandes (Ixodes americanus), e verdadeiramente espantosa a quantidade do
Carrapato pequeno (I. Crenatus).
CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE.
DO PLANALTO CENTRAL DO BRASIL.......................................................................................329
ANNEXO VI
RELATORIO DO DR. ERNESTO ULE
BOTANICO DA COMMISSÃO
ANNEXO VI
Em seguida á “Noticia botanica” do meu Relatorio Parcial do anno proximo passado
esforçar-me-hei agora em offerecer dados mais completos, conquanto lamente que o
citado trabalho tenha sahido tão defeituoso, devido a muitos lapsos da revisão.
Tambem para a presente memoria conto com a indulgencia do leitor, lembrando-lhe que
trabalhos physiologicos e systematicos, para serem correctos, só se pódem executar
mediante prolongados estudos, e mesmo que, a varios respeitos, não são realisaveis sem
o concurso dos especialistas da Europa. E' ahi que nos principaes centros da sciencia se
acham accumulados abundantes herbarios e extenso material litterario, e são numerosas
as autoridades para questões ainda envolvidas em duvidas, emquanto no Brazil a
botanica ainda se acha na sua infancia. Entretanto, quando se trata do livre estudo da
natureza, achamo -nos aqui no Brazil em ponto de observavação mais favoravel, havendo
muitos casos susceptiveis de serem corrigidos e ampliados, e sem duvida se nos offerece
campo vasto de actividade, pois mesmo a respeito das mais importantes madeiras de lei e
plantas industriaes apenas ainda sahimos das trevas.
Para exemplificar, lembro que na «Flora Brasiliensis» se acham referidas quatro especies
de cedro (Cedrela) com indicação das localidades, ao passo que a respeito da localisação
e extensão dessa importante madeira, e das qualidades das diversas especies ha
completa falta de informações. Encarando eu neste sentido a minha presente tarefa,
applicar-me-hei especialmente á geographia botanica, especialidade que vos fornece
informações sobre a distribuição, e particulariedades da vegetação, e sobre a climatologia
das respectivas regiões.
Dispensado me julgo aqui dos detalhes meteorologicos e geologicos, que na verdade
pertencem á descripção de regiões de vegetação, mas serão dados com maior
especificação, aquelles pelo Dr. Pimentel, estes pelo Dr. Hussack, nos seus respectivos
Relatorios. Sobre plantas uteis nada mais accrescento, visto que na primeira viagem não
me sobrou o tempo necessario para colligir material sufficientemente extenso para
alcançar resultados especiaes. Tão pouco está ainda completa a lista das especies; além
disto, não me tendo sido possivel determinar as cryptogamas inferiores, recorri a
especialistas da Europa, os quaes ainda não me remetteram o resultado dos seus
exames.
Extende-se de fins de junho de 1892 ao começo de Fevereiro de 1893 o tempo das
explorações das regiões dos estados de Minas Geraes e de Goyaz especialmente, e foi
elle ao todo pouco favoravel, por haver secca nos primeiros mezes, á qual succedeu a
estação chuvosa, em que muitas plantas não desenvolvem senão suas partes
vegetativas: só no termo da viagem encontrei condições melhores. Percorri região
comparativamente bastante, vasta, que abrange acima de 2.000 kilometros, junto a
Commissão reunida fui primeiro a Meia-Ponte, d'ahi atravessando, com a turma do Dr.
Cruls, a continuação da Serra dos Pyreneus, alcancei Formosa. Alli fiz parte da pequena
expedição mandada ao norte para – não longe de Cavalcante – explorar as «Chapadas
dos Veadeiros», e voltei a Meia-Ponte passando por S. José do Tocantins e Trahiras. Em
Meia-Ponte fiquei ainda dous mezes, tanto por ser impraticavel a mudança para um dos
acampamentos, como por ser a mais promettedora possivel para explorações botanicas a
localidade com sua proximidade á Serra dos Pyreneus.
Por fim, fui com a turma do Dr. Morize para Goyaz, onde fiquei ainda mais de um mez,
visitando neste espaço de tempo São José de Mossammedes e a Serra Dourada.
Diversos botanicos têm me precedido em viagens por Goyaz e alguns, não somente
gosando de condições mais favoraveis, como tambem demorando-se mais tempo: cito
Saint-Hilaire, Burchell, Gardner, Weddell, Pohl, dos quaes o ultimo, sobretudo, reunio
extensas collecções e explorou detalhadamente as cercanias da cidade de Goyaz.
Entretanto, desta vasta região muitas locallidades deixaram de ser exploradas, ou o foram
em estação diversa, como parece ter se dado com a região entre Formosa e Cavalcante,
pois os botanicos que visitaram esta banda ahi penetraram passando por Trahiras e São
José, caminho que offerece menor interesse. Além d'isso, poucos foram os que deram
especial attenção ás Cryptogamas, das quaes eu trouxe Fetos, Musgos e Cogumelos; de
modo que o resultado da minha viagem não deixará de contribuir algum tanto para o
conhecimento do interior do Brazil. Sempre que me foi possivel, observei a vegetação das
regiões percorridas, e consegui trazer collecção de plantas seccas consistindo de 450
numeros de Phanerogamas e 310 numeros de Cryptogamas.
Para dar idéa geral e clara sobre o papel que cabe á Flora de Goyaz, e especialmente a
que occupa a região do Planalto, devo mencionar que os autores da geographia botanica
têm repartido a vegetação da terra em diversos «Reinos da Flora», e quer uns, com
Shouw, admittam 25 d'esses reinos, ou outros até 61, segundo G. Bentham. ou 51,
segundo Martius, todos elles concordam em attribuir ao Brazil um unico reino da flora, ou
varios, mas coherentes. Siga mos Martius, o insigne autor da «Flora Brasiliensis», o qual,
de facto, adopta um unico reino da flora brazileira que sómente ao noroeste e ao sul um
tanto ultrapassa os limites politicos do paiz: facto demonstrativo de que o Brazil fórma um
paiz de natureza
são para Goyaz, e algumas especies, como por exemplo, Mauritia armata Mart, Tococa,
mostram derivar-se d'ahi.
Procederei no que segue abaixo, á desdescripção das formações isto é, das
congregações de plantas como se apresentam em cada flora, e cujos multiplos esboços
nos fornecem o quadro da vegetação do nosso globo.
Chapadas ou Campos
A maior parte da região que percorri pertence a uma unica formação, isto é, á flora das
chapadas, da qual, posto que designada com a denominação geral de flora dos campos,
ha multiplas variações. O termo de “campos” (campo vero), no sentido restricto, significa
terrenos planos onde predomina a vegetação graminea, como os ha no sul do Brazil, e,
em posições mais elevadas, em Minas Geraes, e cá e lá, em Goyaz. Os planaltos
abaulados de que se trata aqui estão em geral cobertos de selvas, de arbustos
definhados, brenhas e hervas, alternando com trechos onde predominam as gramineas :
distincção que dá logar ás denominações de “taboleiros cobertos” e “taboleiros
descobertos”. Estes ultimos occorrem mais frequentemente na parte por mim percorrida
de Minas Geraes, aquelles mais em Goyaz. Os planos (planuras) com vegetação
arborescente e arbustea tambem são denominados “cerrados” : esses formam sobretudo
o typo caracteristico da região.
Arvores mediocres com galhos nodosos e casca rachada ou cortiçosa, acham-se em
grupos soltos, ou isolados, dispersas por sobre vastas superficies; ha ainda arbustos
isolados e brenhas de plantas arbustivas.
Cá e lá alguma palmeira anã, – cocos – de um a dous metros de altura, sobrepujam entre
soqueiras de Gramineas; palmeiras rasteiras e tambem grupos de Bromeliaceas
terrestres, tudo semelha um pomar abandonado que tornou ao estado selvagem. De
longe, dão a illusão de florestas, de perto apresentam sómente um arvoredo escasso.
Nem protege este ao viajor contra os ardentes raios solares, a não ser que, de vez em
quando, elle descubra alguma arvore mais robusta que lhe preste sombra para descanso.
A composição da vegetação differe totalmente das florestas ou da flora das formações
arbustivas da costa ou das serras do resto do Brazil; todavia, nas baixadas e suas
florestas se acham muitas plantas communs a todos os outros Estados.
Posto que entre as plantas lenhosas se encontrem aqui representadas grande numero de
familias, comtudo as diversas especies acham-se de preferencia em grupos isolados, e
menos misturados do que no matto virgem. Além, das Leguminosas e Bignoniaceas com
folhagem partida, predominam sobretudo arvores com folhas integras, coriaceas.
Multiplos representantes possue a familia das Leguminosas, como por exemplo: 99
Stryphnodendron Barbatimão, Mart.; 88 Pterodon abruptus, Benth.; Copaifera; e mais as
Apocyneas: 82 Aspidosperma tomentosum, Mart.; 464 Strychnos Pseodoquina, St. Hil.;
205, Hancornia speciosa, Mull. Arg:, a qual fornece borracha de qualidade inferior e dá
saborosos fructos; Plumeria drastica empregada como purgante; Anonaceas: 214 Xilopia
e outras; Erythroxylaceas, Vochysiaceas, Salvertia, com paniculas de quasi um metro de
comprido, 325 e 326 Qualea; Myrtaceas. Malpighiaceas: sobretudo Byrsonima. Outras,
arvores mais distinctas de familias aqui menos frequentes são: 160 Simaruba versicolor,
St. Hil.; 165 Couepia ovalifolia, Benth.; 330 Matayaba guyanisis, Aubl.; 155 Carioca
brasiliense, Miq.; 76 Luehea paniculata, Mart.; 110 Vernonia; 196 Styrax; 212 Lucuma;
460 Myristica sebifera Swartz; Roupala, Anacardium (cajú); 162 Terminalia argentea,
Mart. e Zucc.; Solanum grandiflorum, chamado – fruta do lobo – (por causadas frutas do
tamanho da cabeça d'este animal).
Da vegetação arbustiva, tenho de citar as Leguminosas como as especies : Mimosa e
Bauhimia, e algumas Myrtaceas, Malpighiaceas : 145 Heteropteris; 143 Tetrapteris; 328
Byrsonima verbascifolia, Benth.; Melastomaceas: 118 e 119 Miconia; 123 Leandra;
Hyppocrateaceas: 151 e 152 Salacia; 61 Kielmeyera; 222
RELATORIO DA COMMISSÃO EXPLORADORA.........................................................................334
Buttneria scapellata. Pohl: 176 Helicteres brevespina, St. Hil.; 433 Hilicteres Sacarolha. St.
Hil., 321. Sabicea cana. Hook fil. 66. Rourea induta Planch.; 94 Connarus suberosus,
Planch; 180. Brosimum Gaudichandü, Trec.
Entre as plantas herbaceas e outras menores citarei : 356, Eriosema glabrum, Mart.; 41
Camarea ericoides, St. Hil.; 443 Polygala longicaulis H. B. K., Macrosiphonia (velame);
361 Crotton chaetocalyx, Mull. Arg-.: Dalechampia humilis, MuIl. A.; Cyperaceas;
Gramineas; sobretudo especies de Andropogon; 524 Sorghum Minarum, Hack. 451
Gesneriaceas; 195 Lytsianthus, 131. Euphorbia, Dickia.
Extranhei a falta quasi total de epyphitas, pois mui raramente ahi se mostram, e, isoladas,
as Hepaticas e Lichenes as quaes são as mais frugaes das plantas; em vão procuram-se
epyphitas phanérogamicas; nem mesmo alguma Rhipsalis se descobre, Musgos tão
pouco parece haver ahi nesta formação secca.
Encontrei, porém, representantes de varias parasitas ,verdadeiras: acham-se ahi, por
exemplo : 490. Psittacanthus notavel por suas flores de côr amarella carregada: tambem
de vez em quando encontra-se: 159 Cassytha americana. Nees.
Raras são as plantas trepadeiras e cipós de alguma grossura, das quaes diversas
tambem rastejam pelo chão, taes como: Melancium campestre, e algumas especies de
Ipomea.
As Queimadas
De notavel influencia sobre o desenvolvimento da vegetação destes planaltos são as
queimadas ou incendios espontaneos, as quaes têm logar todos os annos, porém graças
ao maior afastamento das plantas entre si-são de menor violencia ou intensidade do que
os abrasamentos das – prairies – posto que obscureçam a atmosphera. Se, de um lado,
as plantas, em virtude da casca mais grossa e fendida, do revestimento escamoso, dos
bulbos e fortes rhizomas debaixo do solo resistem á inffluencia das chammas, do outro
lado não deixam estas de estorvar a exuberancia do desenvolvimento vegetal, tanto pela
destruição de muitas plantas e das suas diversas partes, como pelo endurecimento do
solo. Apoz taes queimadas, a vegetação brota com feição amesquinhada e com
difficuldade encontram-se algumas plantas em estado normal.
Primavera
Quando em Agosto ou Setembro, o sol começa a tornar-se mais ardente, esses campos
se cobrem de flores sem que chuva alguma lhes venha favorecer o desenvolvimento.
Nesta quadra do anno, achando-me em Meia-Ponte, e em seguida demorando-me em
Formosa, avistei arvores e arbustos da familia das Myrtaceas em plena florescencia
alvissima, como se estivessem cobertas de branca camada de neve a semelhança das
arvores fructiferas da Europa; outras arvores - das Papilionaceas e Tibouchinas (flor da
quaresma) encantavam a vista com sua linda côr de violeta, assim tambem: 156
Physocalymna scaberrimum, Pohl; com estas bellas flores tinham em Meia-Ponte
enfeitado uma ponte por occasião de uma festa de igreja. Em cor amarella reluziam
Ouratea, varias Malpighiaceas, e em outras cores ou tintas distinguiam-se Mimosas: 201
Callisthene mollissima. Warm., 153 Sapindacea; 40 Pterandra pyroidea, Juss: 73
Terminalia brasiliana; 76 Luehea paniculata. Mart.; 203 Jacarandá brasiliana, Pers: 53
Dalechampia humilis, Mull. Arg: Jonidium, etc. Em varias plantas precedera o
desenvolvimento das suas flores ao das folhas.
Griesbach, na sua “Vegetação do Globo” não sabe bem como explicar este notavel
phenomeno opinando dever ser assimilado ao da migração dos passaros para regiões
quentes; para explical-o recorremos á hypothese do “instincto”. - de certa sensação que
faz com que taes passaros, por previsão de falta de alimento se sintam arrastados a
emigrar para remotas terras; assim essas plantas entram em florescencia para na proxima
estação chuvosa completar seu desenvolvimento vegetativo. A mim parece estar mais a
mão à explicação dessa primavera sem concurrencia de chuvas: em primeiro logar, no
começo da estação relativamente
Chapadas inferiores
As chapadas com altura variando entre 600 a 800 metros, encontram-se mais ao sul,
entre Uberaba e Bomfim. Das plantas que alli parecem crescer mais ou menos
exclusivamente, cito as seguintes : uma Bauhinia; 123 Leandra; 418 Mimosa; 97 Cassia
Claussenü, Benth; 411 Cassia cordistipula, Mart.; 106 Eremanthus sphaerocephalus,
Baker; 164 Gouania; 111 Piptocarpha rotundifolia, Baker.
Cabeceiras
Sempre que nos baixios das chapadas e nas encostas das serras ha ajuntamento de
aguas e que consequentemente se formam pantanos, nascem regos, riachos, isto é,
«cabeceiras» de rios.
Aqui apparece então vistosa palmeira de leque ora em raros exemplares, ora disposta em
grupos ou junta a outras plantas arboreas, arbustivas e herbaceas formando bosques
chamados «capões»; dá a essas localidades um aspecto todo particular e é por este
motivo que se pode consideral-a como formação propria, especial. a dos buritysaes e
capões.
Chama-se Mauritia vinifera. Mart.; ou (de seu nome indigena) «burity» essa magestosa
palmeira e traz a lembrança do viajante que nada mais avistará senão campos e
cerrados-que elle se acha em latitudes tropicaes.
já no «Rio Grande», sob 20º de lat., apparece esta palmeira, e para o norte, apresenta
ella cada vez mais bellos exemplares e bosques extensos. Os capões quasi sempre estão
rodeados de pântanos ou campos e densamente cobertos de arvores bastante altas.
Sobresaem entre ellas algumas, esbeltas, rivalisando em porte com as Coniferas,
exhibindo symetria identica : é a 400 Xylopia, que entre Uberaba e Goyaz é muito
utilisada para postes de telegrapho.
Como arbustos, apparece uma Rubiacea 209 Rudgea viburnoides,. Benth.; 329
Cybianthus e, ordinariamente a beira dos capões, outra Rubiacea, a arbustiforme ; 207
Ucriana longifolia, Spreng.; que se assemelha um tanto á Fuchsia.
A' vegetação destes capões se aggregam igualmente, nas alturas, outros elementos, taes
como: 68 Linociera - 327 Cybianthus, Ilex, Richeria grandis, MuIl. Arg.; 57 Podocarpus
Selowü, Kzsch; 70 Belangera tomentosa, Camb., 124.. Tococa, 120 Miconia; 88.
Bauhimtia rubiginosa
Bong; 201 Callisthene, 175. Drimys Winteri, Forst; nas beiras acham-se Paepalanthus, e
frequentemente, uma especie aparentada da Lavoisiera cruciala.
Valles
O Planalto é cortado por diversos rios e riachos, em cujas margens acham-se encostas,
em parte differentes, quanto ao caracter, dos cerrados: as vezes, porém, estes ultimos-ou
suas partes componentes-descem até aos valles: tambem são estas encostas as unicas
regiões, entre as chapadas, susceptiveis de cultivo. A não ser que o solo esteja
modificado, por arroteamento, pela cultura, encontram-se ahi grupos de plantas sylvestres
chamadas «restingas), ou bosquetes que nas posições elevadas convergem e coincidem
com os capões. Muitas vezes esses bosques, na estação secca, estão despidos de
folhagem, tanto que então se poderia tomal-os por catingas, posto que esta ultima
formação aqui se apresente menos pronunciada. Em julho, na occasião da minha viagem
para Meia-Ponte, a geada do inverno. excepcionalmente rigoroso, tinha destruido nos
valles quasi toda a vegetacão: somente o Schinus molle ficara intacto, e, com sua
folhagem, verde escuro, destacava-se do resto do matto. Entre as plantas que apparecem
aqui. cito: 461 e 181 Arthante; 116 Macairea; 177 Prunnus sphaerocarpa, SW.; 179
Hirtella; 115 Tibouchina; 208 Alibertia concolor, K. Sch.; 168 Lauracea; 169 Labiata; 95
Inga affinis, Dl.; 12 Calliandra parviflora, Benth.
Perto de Meia-Ponte, acha-se uma região de transição intermediária do cerrado para a
restinga, onde se confundem ambas as vegetações; ahi ainda observei sobretudo os
seguintes arbustos, 156 Physocalymna; 16 Machaerium opacum, Vog.; 320 Coussarea
hydrangeifolia, Bth.; Hook.; 71 Tocayena formosa Schuman; 319 Thieleodorxa lanceolata,
Cham; 211 Styracea; 86 Symplocos; 183 e 184 Tapirira, 329 Allophylus leptostachys,
Rdhf; Peltogine (páo roxo) por causa da sua côr violeta.
Relativamente às plantas das margens dos rios e regatos coligi, no Paranahyba: 165.
Piriquita cistoides Meyer; 129 Phyllantlus, e mais tarde na volta, 427 Borreria
Schumanniana,
Florestas
Sómente se encontram nas baixadas e confins do Planalto: assim existe uma extensa
floresta entre Meia-Ponte e Goyaz, tendo uma largura de 100 kilometros sobre 500 de
comprimento, actualmente com muitas derrubadas para a cultura.
Tambem ao sul de Goyaz e no caminho de Uberaba, se encontram ricas florestas. Não
me foi possivel explorar este terreno, pela pouca demora neste trajecto, demorando-me
mais nas regiões elevadas. Menciono simplesmente que estas florestas têm, geralmente,
a mesma variedade de arvoredos que as mattas virgens da costa do Brazil, mas são
algum tanto menos exuberantes, e menos cobertas de epiphytas. Estas, na verdade, não
faltam, mas só apparecem parcialmente. Em certos trechos, a uberdade do solo era
denunciada pelo apparecimento de plantas variadas e pela matta espessa das
trepadeiras. Não aparece aqui a palmeira burity, mas a Euterpe e a Attalea.
Lagôa Feia
A pouca distancia da cidade de Formosa, n'uma baixada das chapadas, extende-se a
Lagôa Feia, (comprimento de cerca de 6 kilometros, com 1 1/2 kilometros de largura).
Deriva sua denominação de “Feia”, das suas aguas turvadas pela vegetação que lhe
assombra a superficie. Ha, em primeiro logar, uma Nymphacea, cobrindo-a com suas
folhas fluctuantes, e em seguida, já sob a superficie, mas visivel: Nitella, sobretudo
Cabomba Warmingü, Casp. A estas se ajuntam: 218 Hydrocleis Humboldt; 216 Sagittaria;
221 Polamogeiton.; Utricularia; na margem, Pontederia; 217 Allisma subulatum. Mart.;
Cyperaceas: Osmunda palustris, etc.
Serranias
A geral elevação da região reduz consideravelmente o effeito proprio á natureza
montanhosa, e bem raras são as paizagens de regiões montanhosas que sejam
comparaveis ás do Rio de Janeiro. Sob os gráos 17 e 16 ha a Serra dos Crystaes, a Serra
Dourada, e a Serra dos Pyreneus, (altitude 1.200 a 1.300 metros). No trecho da minha
viagem ao norte, encontrei as Serras da Bocaina, a dos Veadeiros, e o Morro do Salto,
com 1.500 a 1.700 metros de altitude.
Além dessas, ainda na orla do Planalto, apparecem varias serras que não explorei. São
desprovidas de florestas; nas encostas ha capões ou cerrados. Muitas vezes, os
espinhaços destas serras são formados de pedras e blocos de rochedos, entre os quaes
cresce uma vegetação mesquinha e propria. Caracterisa-se esta região pela abundancia
de varias especies de Vellosia, que occupam todo o terreno; tambem vêm-se arbustos
com o habito proprio ao alecrim, ao myrto e á mimosa, e muitas outras plantas que faltam
nos cerrados. Geralmente, essas regiões elevadas e montanhosas constituem os
principaes pontos centricos da distribuição vegetal local, e são as mais ricas em especies
proprias; é por isso que aqui tratarei de descrevel-as mais detalhadamente.
tricto Neutro da Capital Federal, mais adiante para léste até Formosa, quasi sempre
formando chapadões de 1.000 a 1.200 metros de altura.
De Meia-Ponte em diante, seguindo o caminho que conduz aos altos da serra,
percorrêmos primeiro varios cerrados, depois atravessámos n'um capão o Rio das Almas,
para alcançar região mais aberta e pedregosa.
Estão ahi fantasticamente amontoadas rochas de itacolumite, e ainda que não seja
luxuriante a vegetação, acham se comtudo plantas de interesse botanico. Em primeiro
logar sobresae, entre os arbustos e arvoresinhas, um vegetal lenhoso de grandes folhas
brancas pelludas: é uma Composta que antes que se desenvolvam as folhas novas
adorna se de grossas flores semelhantes ás dos cardos, é uma Wunderlichia, nova. Entre
os rochedos crescem a Aneimia elegans Presl.; em forma de estrella, e outros generos
dos Fétos: 360 Aneimia millefolium, Gardn.; 540 Aneimia; 389 Adiantum, miudinho, assim
uma Cactacea: Cereus semelhando uma columna. Arvores pequenas: 101 Mimosa, com
corôa do feitio de umbrella, de 1 a 3 metros de altura cobrem largos trechos até cederem
emfim logar a uma Vellosia cujo crescimento attinge a altura de meio metro, com longos
floraes tubulares brancos e folhas estreitas pelludas, enquanto as encostas oppostas da
montanha acham-se cobertas pelas rosetas das largas folhas de outra Vellosia com flores
de côr azul clara. Finalmente, nos sitios elevados, apparece uma Lychinophora que, com
seu singular habito, lembra o pinheiro bravo ainda novo. Além d'essas plantas que, por
assim dizer, formam o typo principal do aspecto geral encontram-se mais outras como:
374 Manihot pentaphylla, Pohl.; 333 e 351 Ipomea; 189 Crumenaria choretroides, Mart.;
190 Serjana velutina Camb.; Myrtaceas (subarbustos), 364. Sebastianea; 488 Eremanthus
(n. sp.) 382 Allamanda angustifolia, Poh1; 121 e 377 Microlicia viminalis, Tria; mais uma
Mimosa pequena, que, semelhante à maior já mencionada, acha se coberta de planta
parasitaria - a Bafflesiacea Pilostyles.
N’esta região pedregosa, vimos algumas casas em ruinas: pertenciam a uma Companhia
Ingleza, outr'ora exploradora da mina de ouro “Abbade” actualmente abandonada. Esta
localidade tem apenas a altitude de 1.100 metros acima do nivel do mar, demonstrando
isto que a sua flora especial pode-se attribuir mais á propriedade do solo, do que à sua
elevação absoluta.
Até aqui apenas percorrêmos a metade do caminho: chegamos agora aos terrenos ferteis,
passando por alguns declives da Serra, atravessando campos com capões, encontrando
já a palmeira burity. Nos campos vegeta frequentemente a Cambessedesia Hilariana, uma
pequena 324 Dipladenia Myriophyllum n. sp. com folhas piliformas; tambem recolhi uns:
373 Manihot rasteiro. Chegados emfim ao dorso da Serra dos Pyreneus seguimos até
alcançar o ponto culminante onde apenas se encontram rochedos de 50 metros de altura
sem vegetação especial. No terreno rochoso, a flora acha-se composta com as plantas
dos cerrados e dos rochedos, apparecendo tambem a Vellosia glauca. Entre os dorsos
das montanhas ha campos e alguns capões maiores. Os campos são em parte
pantanosos, achando-se frequentemente uma Xyridea azul: 227 Abolboda; 228 Oncidium
e Sphagnum.
No capão, encontrei no mez de Agosto: Drimys Winteri, Forst; em plena e soberba
florescencia, e, em exemplares destacados; Afteria lilacina. As Drimys, Leucotheo,
Podocarpus, Sphagnum, são typos das regiões mais altas, como tambem se encontram
em Goyaz.
A Serra dos Pyreneus, que visitei em varios logares e em diversas épocas do anno, é
muito extensa. Das plantas assim colhidas, cito por ora: em terreno rochoso: 486 Turnera
incana, Camb.; 368 Cuphea, 365 Miconia, 546 Vellozia, rasteira, 400 Ichthyothere Cunabi,
Mart.; 758 Manihot violacea. Nos campos : 358 Iridaceas (muito frequentes), 496
Orchidacea, 445 Thesium aphyllum, Mart.; Gramineas, Cyperaceas e Eriocaulaceas.
dos deixou Formosa, no dia 12 de Setembro; a principio a viagem foi boa e transpuzemos
chapadões extensos, ás vezes de altitude superior a 1.300 metros.
No quinto dia avistámos de longe alguns cumes: descendo um valle, atravessámos o Rio
Tocantins, 900 metros acima do nivel do mar, e de novo chegámos a um chapadão
extenso. Breve tivemos diante de nós uma planicie maior, á nossa esquerda algumas
cadeias elevadas, ao norte serras. Descemos outro valle, e chegámos a uma localidade
denominada – Paraiso – onde passámos o dia seguinte. D’ahi em diante, tivemos de
demorarmo-nos varios dias porque não obtivemos em Formosa provisões sufficientes, e
os nossos animaes necessitavam de repouso. Aproveitei esta parada para fazer varias
excursões. A primeira teve por destino os arredores de Paraiso, onde nos campos e nas
collinas, encontrei Mimosas : Mimosa paraizeinsis. Taub.; e, Mimosa Cyclophylla, Taub.;
arbustos de 1 a 2 metros de alto, uma bonita Papilionacea (Harpalyce speciosa, Taub.);
com flôres de côr vermelha, e um Eryngium pristis, Cham.; que, com suas folhas
finamente pinnatifidas, assemelha-se a um pennacho.
Entre arvoredo da beira dos regatos colhi Podocarpus Sellowii, Kltsch.; 22 Miconia e
Guettarda.
No dia seguinte mudámos nossa pousada para 9 kilometros adiante, no Pizarão, aonde
chegámos atravessando campos, verdadeiros, com certa regularidade occupados por
grandes casas de cupins de altura de um metro e galgámos montanhas descompostas
sem vegetação arborea.
Infelizmente nesses campos não se encontrou senão gramma e plantas seccas,
impossibilitando o estudo desta formação.
O fazendeiro em cujo sitio acampámos, prometteu matar gado no dia seguinte para nos
abastecer de carne, caso demorassemos ahi, com o que nós concordámos.
Ao norte d’este logar, assenta uma vasta extensão de rochedos que não pareciam ser
difficil de subir; resolvi dirigir os passos n'essa direcção, para aproveitar a demora.
Primeiro atravessei um campo, galguei em seguida o dorso de uma montanha pelo qual
prosegui por algum tempo esperando encontrar terreno proprio para effectuar a descida
ao valle da outra falda, e chegar ao declive do rochedo. Pelo caminho encontrei entre
plantas florescentes uma 3 Mimosa Tocantina, Sw. Taub.); 10 Calliandra macrocephal,
Benth.; 49 Euphorbia e, entre as rochas do morro, um cactus-ouriço, provavelmente,
Melocactus, mas sem flores. O valle é regado por um corrego, o “Vargem Grande”, e
alarga-se em varios logares. Notei muitas Melastomaceas similares a Laroisieira cruciata,
e Eriocaulaceas.
Nas beiras tornáram a apparecer arvoresinhas de Mimosas, um singular arbusto, uma 78
Labiata (Hyptis penacoides, Taub.); caracter de alecrim ou myrtiforme, de 1 a 2 metros de
altura, Wunderchia, uma Ericacea arbustiva sem flores. etc.
Na margem e na visinhança do corrego achei frequentemente uma 69 Qualea; 44
Byrsonima umbellata, uma 19 Microlicia cupressina, Don.; de flores amarellas, e um 52
Phyllanthus aphyllo semelhante a uma vareta. Nas pedras do leito do corrego avistei
quantidades de uma pequena Utricularia neottioides. St. Hil.; de flôr branca que tambem
occorre em similares logares de outras serranias e parece ser distribuida sobre todo o
Brazil central. O terreno explorado calculei estar mais ou menos 1.100 a 1.300 metros de
altura.
No dia seguinte, continuando a nossa viagem transpuzemos a mesma cadeia de montes
e tambem tocámos no Vargem Grande que todavia deixámos á esquerda.
Cada vez alargava-se mais diante de nós a soberba paizagem, imponente pelo seu
caracter grandioso.
Na parte anterior extendiam-se campos vastos e planos, a um lado dos quaes serpenteia
o Vargem Grande orlado de capões, com pittorescos grupos de palmeiras burity.
A' esquerda erguiam-se chapadões e, no fundo, tres montanhas isoladas com 300 a 400
metros de altura, dominavam o valle, o Morro do Salto e o Morro da Bocaina; partindo
d'estes, em direcção norte, se extende uma cadeia chamada – Chapada dos Veadeiros –
, até a vista ser interrompida por uma paragem montanhosa.
RELATORIO DA COMMISSAO EXPLORADORA........................................................................340
Argiloso), emprehendi uma excursão, na qual tinha primeiro de descer o valle do Passa
Tempo-ribeiro acompanhado de um trecho de floresta até a altura de 1060 metros.
Nos campos do valle appareceo frequentemente a 2 Mimosa cyclophilla, Taub.; arbusto
com flores côr de rosa, a miudo habitada por um Pilostyles bem desenvolvida, e outra
Mimosa longopedunculata, Taub.; que forma arvoresinhas com flores de côr branca-
avermelhada, e folhas glandulosas Subi pela encosta que era muito ingreme. No alto
encontrei, não raras vezes, uma Mimosa sem caule, com grandes flores côr de rosa, uma
Composta amarella, e 14 Papilionacea semelhante á Genista, da Europa, que cobria
trechos inteiros do solo. A alguma distancia de uma elevação rochosa, notei pequenas
arvores negras de um aspecto singular, ao approximar-me reconheci ser uma
Melastomacea. São arvoresinhas diminutas de 1 a 2 metros de altura, consistindo de
galhos nodosos, grossos, densamente ramificados, e terminando no apice por uma copa
de pequenas folhas lanceolares. Esse denso enlaçamento de galhos dá a planta um
aspecto peculiar e extranho. Senti não encontrar nem fruta nem flor, mas opino pelo seu
parentesco com a Lavoisiera. Em outra elevação appareceu uma Melastomacea com
altura de meio metro e caracter de cipreste; tambem tinha aspecto extranho, e supponho
ser uma Microlicia; e mais: poucos exemplares de uma 23 Trembleya. Realmente, na
maior parte a vegetação ainda estava por desenvolver o que me fez deixar de colligir
diversas Vellozias e outras plantas que notei entre os rochedos. Colhi tambem uma
Tillandsia, e vi minuscula Orchidea entre as Vellosias prova que na região dos montes
não faltaram as epiphytas.
Alguns dias depois punhamo-nos a caminho de volta para Meia-Ponte, deixando então de
colleccionar tanto porque muito apressámos a viagem como tivemos repetidas chuvas.
Apenas nos primeiros dias ainda colhi uma bellissima 17 Cambessedesia - provavelmente
nova - um 75 Displusodon e uma 6 Mimosa Ullei Taub., arbustiva.
Serra Dourada
Esta Serra constitue o termo sud-oeste da cadeia de montanhas que so o nome de -
Serra Geral - percorre o Estado de Goyaz, tendo partido dos limites do da Bahia.
Contrastando com a Serra dos Pyreneus, composta de varios planaltos elevados e de
cadeias correndo em direcção diversa, a Serra Dourada forma uma cadêa que se extende
por muitas lagoas em direcção este-oeste, com leve declinação para o sul. Nesta direcção
para o lado da Capital de Goyaz, vai descendo em declives abruptos e penhascos,
emquanto para o lado septentrional, as faldas são graduadas, porém frequentemente
compostas de blocos de rocha desaggregada. Ao sopé de quasi todos os lados ha uma
orla de capões. Esta serra, no ponto onde a estrada, que prosegue de Uberaba e Meia-
Ponte, vai descendo caminho de Goyaz, tem 900 metros de altitude; torna depois a subir
a 1.100 metros; no ponto onde passei, poderá porém, em trecho mais distante, alcançar
1.200 metros.
A flora assemelha-se notavelmente a da Serra dos Pyreneus, pois apparecem as mesmas
Vellozias, as mesmas Aneimias e outras Cryptogamas e mais Malpighiaceas, Anonaceas,
Ilicineas, sobretudo Ilex affinis, Gardn; que fornece um mate, e Vochysiaceas.
Algumas plantas que vegetam na Serra dos Pyreneus, parecem aqui faltar, são: 324
Dipladenia Myriophyllum Taub., diversas Mimosas. Cambessedesia Hilariana. Microlicia
riminalis; d'ahi em diante as Microlicias vão se tornando raras. Menos facil é citar as
plantas da Serra Dourada que faltam na Serra dos Pyreneus, quando se considera que
entre essas respecticas visitas a vegetação achava-se consideravelmente adiantada aqui
como tambem deve estar alli. Sómente mencionarei que esta serra já pertence mais á
vertente occidental, tanto que nella se encontram algumas plantas componentes
Os terrenos humidos estavam todos cobertos de flores amarellas de uma 513. Ir idea.
Muito frequente, como tambem nas montanhas de Goyaz, encontra-se a Langsdorffia
hypogaea Mart, que achava-se muitas vezes entre as pedras quasi isentas de vegetação.
Não parecia existir certa planta que sustenta esta parasita e sómente notei nos diversos
arredores arbustos pertencentes a varias familias.
Nas elevações na base da serra encontrei muitas plantas em florescencia, como: 412.
Cassia goyazensis Taub., 434. Pavonia, 487 Melochia hirsuta Cav., 438. Buettneria
campicola Taub. 422. Camnarea affinis St. Hil, 399. Riencourtia oblomgifolia Gardn 401
Ichthyothere Ulei Taub. 447. Ipomea 475 Manihot 472 Manihot gracilis Mûll Arg., 497
Pogonia speciosa Rechb. f. Tambem se acha aqui como já o encontrei n'um logar da
Serra dos Pyreneus, o raro e pequeno, 540 Ophioglossum macrorrhizum Kunze.
Dos cerrados e dos sitios rochosos devo citar: 403 Indigofera goyazenis. Taub ,
405 Galactia, 449 Gloxinia ichtyostoma Gard. 435 Pavonia 437 Ayenia Riedeliana K. Sch.
458 Asclepiadacea. 476. Pilostyles Calliandrae Gardn.; 537 e 542 Aneimias, 512
Adiantum lunulatum Bnr., 538 Aneimia glareosa Fied e Gard.
A' beira dos caminhos e em sitios outr'ora cultivados acham-se diversas plantas
especiaes como: Composta, 399 Pectis brevipedunculata Taub., 430 Sipanea pratensis
Aubl , 462 Sciledenia, 525 Microcklo setacea B. Br , Caphea, etc.
Conclusão
Se no presente trabalho tenho apresentado uma vista geral e um esboço da vegetação
mais importante de Goyaz, muito falta ainda para dar uma idéa da completa exploração
botanica desse estado, pois, além de limitadissimo o tempo, muitas vezes me foi pouco
favoravel e é o que não me permittir definir o caracter de muitos districtos.
Na enumeração das plantas typicas e importantes, citei os numeros que se acham
mencionados pela Commissão no herbario goyano e no nosso Museo Nacional.
Na continuação do Relatorio da Commissão, espero poder dar uma lista de todas as
especies: o que facilitará a organisação do quadro com as denominações
correspondentes.
Talvez me seja dada opportunidade para continuar as minhas explorações: então sentirei
intima satisfacção de poder collaborar mais extenso e com mais proveito para a Botanica
em investigações de tão importantes regiões.
Observação
Antes que as linhas precedentes fossem remettidas á imprensa, recebi ainda algumas
communicações sobre os resultados das collecções botanicas, nas quaes, ainda que as
Phanerogamas se achem apenas determinadas até a metade, já se encontrarão especies
novas e 2 generos novos. Os ultimos são a Composta N. 107, da Serra dos Pyreneus e a
Papilionacea N. r4 da Serra da Balisa; ainda N. 28, a nova Wunderlichia nomeada em
honra de nosso chefe - Wunderlichia Crulsiana.
ERNESTO ULE,
Botanico da Commissão.
DO PLANALTO CENTRAL DO BRASIL.......................................................................................345
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS