Números Felizes
Números Felizes
Números Felizes
PROFMAT
Universidade Federal de S˜ao Jo˜ao del-Rei - UFSJ
Sociedade Brasileira de Matem´atica - SBM
Resumo: Este trabalho apresenta um breve estudo sobre os nu´meros felizes em qualquer
base posicional. Em especial, os pontos fixos da fun¸c˜ao felicidade. Al´em disso, mostra como
utilizar uma planilha eletroˆnica para trabalhar este conteu´do no ensino fundamental e
m´edio.
1 Introdu¸c˜ao
O interesse pelos nu´meros e suas propriedades remonta a` antiguidade. As suas
propriedades e rela¸co˜es tem sido exaustivamente estudadas. Algumas dessas propriedades
acabam por nomear alguns conjuntos como os nu´meros perfeitos, nu´meros primos,
nu´meros de Fibonacci, dentre outros.
Os nu´meros felizes foram introduzidos por Guy [4], no seu livro Unsolved Problems in
Number Theory (Problema E34), da seguinte forma:
“A filha de Reg Allenby chegou da escola na Gr˜a-Bretanha com o conceito nu´meros de felizes.
O problema pode ter origem na Ru´ssia. Se vocˆe fizer uma itera¸c˜ao do processo de
somar os quadrados dos d´ıgitos de um nu´mero decimal, ent˜ao ´e f´acil de ver que vocˆe
alcan¸car´a o ciclo
4 → 16 → 37 → 58 → 89 → 145 → 42 → 20 → 4
Em seu livro Guy faz algumas indagac¸˜oes a respeito dos nu´meros felizes: poss´ıveis
sequˆencias de nu´meros felizes, o nu´mero de iterac¸˜oes necessa´rias a` felicidade de um
nu´mero, a sua densidade nos inteiros positivos e da felicidade em diferentes bases. Diversos
autores tem trabalhado com estas questo˜es e outras que surgiram com o avan¸co dos estudos
sobre o tema. Por exemplo, A. F. Beardon [1] caracteriza os pontos fixos, E. El-Sedy e S. Siksek
[2] e H. Pan [8] trabalham com sequˆencias de nu´meros felizes em diferentes bases, e H. G.
Grudman e E. A. Teeple [3] generalizam n˜ao s´o as bases mas tamb´em o expoente da soma.
Este trabalho pretende mostrar que ´e poss´ıvel utilizar os nu´meros felizes como tema
para discutir, introduzir e motivar os estudos de outros conceitos em uma sala de aula. Em
particular, fun¸c˜oes, representa¸ca˜o posicional e algoritmos com o aux´ılio de uma planilha
eletroˆnica.
O texto lista algumas propriedades sobre os nu´meros felizes em uma base qualquer,
Sec¸˜oes 3 e 4. A terminologia e conceitos ba´sicos necess´arios ao entendimento do texto,
Se¸ca˜o 2. Na
Se¸ca˜o 5 define e exibe t´ecnicas para calcular os pontos fixos em qualquer base posicional.
A Se¸ca˜o 6 apresenta um algoritmo para determinar os nu´meros felizes em uma base menor
do que ou igual a 10. A Se¸c˜ao 7 cont´em uma proposta para introduzir o assunto em sala de
aula com o aux´ılio de uma planilha eletroˆnica.
2 Conceitos B´asicos
Aqui sa˜o fixados a terminologia e a nota¸c˜ao utilizadas ao longo do texto. Tamb´em sa˜o
relembrados alguns fatos sobre os sistemas de representac¸˜ao posicional. Os conjuntos
nu´mericos que ocorrem no texto:
fn = f ◦ fn−1.
Exemplo 2.1 Seja f : Z → Z, tal que f(x) = 2x + 1 ent˜ao f5(x) = 32x + 31. De fato,
f(x) = x.
Exemplo 2.2 O nu´mero 2 ´e ponto fixo da fun¸c˜ao f : Z → Z, definida por f(x) = x2−6x+10.
De fato, f(2) = 22 − 6(2) + 10 = 2. ♦ Ao representarmos os nu´meros naturais ´e comum
utilizarmos os d´ıgitos 0, 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8 e 9. Cada nu´mero ´e uma sequˆencia anan−1 ···a1a0
onde cada ai ´e um destes d´ıgitos. E de acordo com a posi¸ca˜o nesta sequˆencia o d´ıgito
assume determinado valor (valor relativo). Este sistema de numerac¸˜ao ´e conhecido como
decimal, ou sistema posicional na base 10.
7 · 103 + 6 · 102 + 2 · 10 + 4.
Observe que o valor relativo de cada nu´mero ´e obtido atrav´es da sua multiplica¸ca˜o por
uma potˆencia de 10. No caso geral anan−1an−2 ...a1a0 representa
Teorema 2.1 Seja b ≥ 2 um inteiro. Ent˜ao todo inteiro positivo p pode ser escrito de modo
u´nico na forma p = ambm + am−1bm−1 + ··· + a1b + a0,
[1011]2 = 1 · 23 + 0 · 22 + 1 · 2 + 1,
e na base 5 por
[21]5 = 2 · 5 + 1.
♦
4
Para diferenciar uma base de outra, ao longo do texto, ´e utilizada a seguinte nota¸ca˜o,
proposta por A. Hefez [5]
n
onde 0 ≤ ai ≤ b − 1 para todo 0 ≤ i ≤ n. E comum n˜ao indicar a base decimal. Assim´ quando a
base na˜o ´e mencionada subtende-se que o nu´mero esta´ representado na base 10.
Exemplo 2.5 O nu´mero 722 est´a representado na base decimal e na base 5 temos
[10342]5 = 1 · 54 + 0 · 53 + 3 · 52 + 4 · 5 + 2.
Como as opera¸c˜oes utilizadas no exemplo est˜ao definidas no sistema decimal, o nu´mero 491
est´a obviamente no sistema decimal. ♦
Exemplo 2.7 O nu´mero 491 escrito na base 8 ´e [753]8. De fato, aplicando sucessivas divis˜oes
euclidianas (como feito na demonstra¸c˜ao do Teorema 2.1), obtemos
491 = 61 · 8 + 3
61 = 7·8+5
7 = 0·8+7
Logo,
491 = 61 · 8 + 3 = (7 · 8 + 5) · 8 + 3 = 7 · 82 + 5 · 8 + 3 = [753]8.
♦
Note que os restos das diviso˜es sucessivas do Exemplo 2.7 sa˜o os d´ıgitos da
representac¸˜ao do nu´mero 491 na base 8. Esta observa¸ca˜o ´e na verdade um m´etodo
pr´atico (algoritmo) para efetuar tal conversa˜o.
Vamos refazer o Exemplo 2.7 utilizando o algoritmo da divisa˜o at´e obtermos um
quociente nulo.
5
Observe, na Figura 2, que ao ordenar os restos na ordem indicada pela seta obtemos a
mesma express˜ao, [753]8, do Exemplo 2.7.
Para elucidar melhor esse procedimento, vamos fazer mais um exemplo, por´em, desta
vez utilizaremos uma base maior que 10. Utilizaremos os s´ımbolos A,B,C,D e E para
representar os nu´meros 10,11,12,13 e 14 respectivamente.
Defini¸c˜ao 3.1 Seja n um nu´mero inteiro positivo e arar−1ar−2 ...a1a0 a sua representa¸c˜ao
na base decimal. A fun¸c˜ao
F : Z+ −→ Z+
n 7−→
´e chamada de fun¸c˜ao feliz. Utilizando a nota¸c˜ao de somat´orio
Exemplo 3.1 Aplicando a fun¸c˜ao F aos nu´meros 56, 384, 1234 e 6543, temos
F(56) = 52 + 62 = 61, F2(56) = F(61) = 37, F(384) = 32 + 82 + 42 = 89,
6
Defini¸c˜ao 3.2 Seja n um inteiro positivo. Se existe k ≥ 1 tal que Fk(n) = 1 dizemos que n
´e um nu´mero feliz. Caso contr´ario, n ´e dito um nu´mero triste.
Exemplo 3.3 Os nu´meros 7, 130, 5436 s˜ao felizes. De fato, F5(7) = 1, F2(130) = 1 e
F3(5436) = 1. ♦
{7,49,97,130,10,1,1,1,...}
Seja C o conjunto {4, 16, 37, 58, 89, 145, 42, 20}. Este conjunto ´e invariante por F. Ou seja,
para todo n ∈ C tem-se F(n) ∈ C. Note que F(4) = 16, F(16) = 37, F(37) = 58, F(58) = 89, F(89)
= 145, F(145) = 42, F(42) = 20 e, por u´ltimo, F(20) = 4. Assim Fk(n) ∈ C para todo n ∈ C.
Portanto, C ´e invariante por F e todos os seus elementos sa˜o tristes.
Lema 3.1 Seja n um nu´mero triste menor que 100, ent˜ao existe k tal que F m(n) ∈ C para todo
m ≥ k.
Demonstra¸c˜ao. C´alculos feitos com a ajuda de uma planilha (veja Figuras 3 e 4).
7
Demonstra¸c˜ao.
Segue do Lema 3.2 que ao obtermos uma sequˆencia pelas intera¸co˜es da fun¸ca˜o F, em
determinado nu´mero, que atinge o nu´mero 1 (ou algum nu´mero perten¸ca a C), todos os
nu´meros dessa sequˆencia sa˜o felizes (ou tristes).
Exemplo 3.6 Observe que 379 ´e um nu´mero feliz, obtido atrav´es das itera¸c˜oes abaixo:
F1(379) = 139, F2(379) = 91, F3(379) = 82, F4(379) = 68, F5(379) = 100 e F6(379) = 1.
Com isso, 139, 91, 82, 68 e 100 s˜ao igualmente felizes. ♦
Note que, sendo 68 um nu´mero feliz, enta˜o 680 e 68000 tamb´em ser˜ao nu´meros
felizes. Basta observar que os d´ıgitos zeros acrescidos ao nu´mero 68 n˜ao alteram o
resultado de F(68).
De modo geral, temos:
Teorema 3.1 Seja n um nu´mero feliz (triste). Ent˜ao n10r ´e feliz (triste) para todo r ≥ 0.
Em particular, este Teorema mostra que existem infinitos nu´meros felizes e tristes.
Demonstra¸c˜ao. Seja n = asas−1 ...a1a0 = as10s + as−110s−1 + ··· + a110 + a0. Enta˜o,
Assim, n10r possui todos os d´ıgitos de n acrescidos de r zeros. Logo, F(n10r) = F(n) e portanto
Fk(n10r) = Fk(n) para todo k ∈ Z+. Visto que n ´e feliz (triste), segue do Lema
3.2 que n10r tamb´em ´e feliz (triste).
Teorema 3.2 Seja n = arar−1 ...a1a0 a representa¸c˜ao de n na base decimal. Se n ´e feliz (triste),
ent˜ao qualquer nu´mero obtido pela permuta¸c˜ao dos d´ıgitos de n ´e feliz (triste).
Teorema 3.3 Dado n = arar−1 ...a1a0 um inteiro positivo, temos F(n) ≤ 81(r + 1).
Teorema 3.4 Seja n inteiro positivo. Se n ´e maior ou igual a 100, ent˜ao F(n) < n.
= (ar 10r − a2r )+( ar − 110r − 1 − a2r − 1)+ ··· +( a110 − a21)+( a0 − a20)
−
= ar (10r − ar )+ ar − 1(10r 1 − ar − 1)+ ··· + a1(10 − a1 ) + a0(1 − a0)
| {αz } | {βz }
Veja que α > 0, pois 0 ≤ ai < 10 para todo 1 ≤ i ≤ r − 1 e ar = 06. Observe ainda que seu menor
valor ´e 99 e ocorre para r = 2,a2 = 1 e a1 = 0. Temos tamb´em que β ≤ 0 ja´ que
0 ≤ a0 ≤ 9, assim o menor valor assumido por β ´e -72, quando a0 = 9. Logo,
n − F(n) = α + β
≥ 99 − 72 =
27 > 0.
Demonstra¸c˜ao. Suponha que Fk(n) > 100 para todo k. Segue do Teorema 3.4 que
n > F(n) > F2(n) > F3(n) > ··· > Fi(n) > ... > 100
Demonstra¸c˜ao. Pelo Corola´rio 3.1 dado um inteiro positivo n ≥ 100 existe k tal que Fk(n) ≤
100. Portanto, basta analisar todos os nu´meros de 1 a 100. O resultado segue do
Exemplo 3.4.
Uma consequˆencia direta do Teorema 3.5 e da planilha da Figura 3 ´e que um nu´mero
9
Defini¸c˜ao 4.1 Seja n um nu´mero inteiro positivo e [arar−1ar−2 ...a1a0]b ∈ N com b ≥ 2 a sua
representa¸c˜ao na base arbitr´aria b, definimos a fun¸c˜ao Fb como sendo
Quando se trabalha na base 10 ´e comum omitir o ´ındice 10. Ou seja, F10(n) = F(n).
Defini¸c˜ao 4.2 Seja b ≥ 2 e n um inteiro positivo. Dizemos que n ´e um nu´mero feliz na base b
se existe k ≥ 1 tal que Fbk(n) = 1. Caso contr´ario, n ´e um nu´mero triste na base b.
Observa¸c˜ao 4.1 Quando ´e evidente a base, no contexto, ´e usal dizer apenas nu´mero feliz ou
triste.
Exemplo 4.1 A felicidade em uma base n˜ao implica felicidade em outra. Considere o nu´mero
28. Ele ´e feliz na base 10 e triste na base 5. De fato,
,
F5 (28) = F5([31]5) = [20]5. Agora, observe que
4 para todo k
∈ N. ♦
Exemplo 4.3 O nu´mero 1 ´e feliz em qualquer base. A sua representa¸c˜ao em qualquer base
´e [1]b. Assim Fb(1) = Fb([1]b) = 12 = 1. ♦
Fb(b) = Fb([10]b) = 12 + 02 = 1.
Segue dos Exemplos 4.3 e 4.4 que, em qualquer base temos nu´meros felizes. Na verdade,
podemos generalizar os Teoremas 3.1 e 3.2 obtidos na base decimal e ver que, em qualquer
base, temos infinitos nu´meros felizes.
10
Exemplo 4.5 Na base 2 todo nu´mero ´e feliz! Observe que para 1, 2 e 3 temos
´e decrescente para todo n > 2. Assim dado m ∈ Z+ existe k tal que . Portanto, todo
inteiro positivo ´e feliz na base 2. ♦
Defini¸c˜ao 4.3 Uma base ´e dita feliz, quando todo inteiro positivo ´e feliz nesta base.
Podemos, enta˜o, dizer que a base 2 ´e uma base feliz, fato este que na˜o ´e exclusividade
da base 2, pode-se mostrar tamb´em que a base 4 ´e uma base feliz (ver Exemplo 4.7).
Exemplo 4.6 O nu´mero 2 ´e feliz em qualquer base da forma 22m, com m ∈ N. Note que
,
e da´ı, . ♦
E interessante notar que como no Teorema 3´ .3, Fb(n) possui uma cota superior,
para quaisquer valores de n.
| {z } r+1 parcelas
Teorema 4.2 Seja b um inteiro positivo maior ou igual a 2. Ent˜ao, Fb(n) < n, para todo n ≥ b2.
.
11
Seja α = ar(br − ar) + ar−1(br−1 − ar−1) + ··· + a1(b − a1). Como 0 ≤ ai ≤ b − 1, as parcelas da soma
ar−1(br−1 − ar−1) + ··· + a1(b − a1) sa˜o maiores ou iguais a zero, enquanto a parcela ar(br − ar) >
0, pois ar 6= 0 e r ≥ 2. Logo, α > 0. Veja tamb´em que b2 − 1 ´e o menor valor poss´ıvel para α e
ocorre quando temos r = 2, a2 = 1 e a1 = 0. Agora observe que a parcela β = a0(1 − a0) tem seu
menor valor quando a0 = b − 1, ou seja, β = (b − 1)(1 − (b − 1)) = (b − 1)(2 − b). Assim,
n − Fb(n) =α + β
≥ (b2 − 1) + (b − 1)(2 − b)
= 3(b − 1)
> 0.
Exemplo 4.7 A base 4 ´e uma base feliz! Segue do Corol´ario 4.1 que basta verificar os inteiros
positivos m tais que m < 42 = 16. Ou seja, deve-se verificar se existe k tal que para
todo m < 16. Mas isto pode ser feito diretamente ou com ajuda da segunda planilha descrita na
Se¸c˜ao 6. ♦
5 Pontos Fixos
Nesta Se¸ca˜o sa˜o definidos os pontos fixos da fun¸ca˜o felicidade. Tamb´em cont´em dois
m´etodos para encontra´-los: o primeiro requer a soluc¸˜ao de v´arias equa¸co˜es, o outro esta´
relacionado com a soma de dois quadrados.
Defini¸c˜ao 5.1 Seja b ≥ 2. Um nu´mero inteiro positivo n ´e chamado de ponto fixo na base b
quando Fb(n) = n.
Observa¸c˜ao 5.1 Por simplicidade, quando n˜ao houver confus˜ao em rela¸c˜ao `a base, em vez
de dizer que n ´e ponto fixo na base b, diremos apenas que n ´e ponto fixo.
Segue do Teorema 3.4 e da Planilha 1 (ver figura 3) que o u´nico ponto fixo na base decimal
´e 1. O Exemplo 4.3 garante que o nu´mero 1 ´e ponto fixo em qualquer base, mas nem sempre
´e o u´nico. Como podemos ver no exemplo abaixo.
O que mostra que a base 5 possui pelo menos dois pontos fixos 1 e 13. ♦
Existem outra bases com mais de um ponto fixo? Como encontrar os pontos fixos de uma
base? O restante desta se¸ca˜o procura responder a estas perguntas.
Teorema 5.1 Todos pontos fixos de uma base b ≥ 2 s˜ao da forma n = [xy]b = xb + y e satisfazem
a equa¸c˜ao x2 + y2 = xb + y.
x2 + y2 = xb + y (1)
Observa¸c˜ao 5.2 O u´nico ponto fixo com um u´nico d´ıgito ´e o nu´mero 1, visto que para
qualquer outro valor de n temos n2 > n. Portanto os pontos fixos, `a exce¸c˜ao do nu´mero 1,
possuem dois d´ıgitos. Vale ressaltar, que no Teorema 5.1, para facilitar os c´alculos, pode-se
supor x > 0 na express˜ao x2 + y2 = xb + y, visto que x = 0 implica y2 = y. Logo, y = 1 e temos n =
[01]b = 1.
Do Exemplo 5.1, temos que 13 = [23]5 ´e ponto fixo na base 5. Sera´ que existem outros
pontos fixos na base 5, al´em de [1]5 e [23]5? A resposta ´e dada no exemplo abaixo.
Exemplo 5.2 Determinando os pontos fixos na base 5. Observe que a Equa¸c˜ao (1) na base 5 ´e
escrita da seguinte maneira:
x2 + y2 = 5x + y,
onde x,y < 5 e x 6= 0. Vamos substituir nessa equa¸c˜ao, caso a caso, quando 0 ≤ y < 5.
Exemplo 5.3 Determinando os pontos fixos na base 11. A Equa¸c˜ao (1) na base 11 ´e escrita da
seguinte maneira:
x2 + y2 = 11x + y,
onde x,y < 11 e x 6= 0. Substiuiremos nessa equa¸c˜ao, caso a caso, os valores de y tal que 0 ≤ y <
11.
Para determinar os pontos fixos numa determinada base na˜o ´e necessa´rio testar todos
os nu´meros da forma [xy]b, mas somente os que satisfazem 1 .
Teorema 5.2 Seja b ≥ 2 e x 6= 0. Se [xy]b ´e um ponto fixo na base b, ent˜ao .
Demonstra¸c˜ao. Se y igual a 0 ou 1 na equa¸ca˜o x2 + y2 = xb + y temos que
x2 = xb.
x2 − xb + y2 − y = 0
Portanto, 1
Este resultado restringe o nu´mero de equa¸c˜oes que devemos resolver para determinar
os pontos fixos. Veja o exemplo abaixo.
Exemplo 5.4 Seja n = [xy]17 um ponto fixo na base 17, ent˜ao
14
x2 + y2 = 17x + y,
.
.
.
.
Portanto, os pontos fixos na base 17 s˜ao 1 = [1]17, 40 = [26]17, 261 = [F6]17, 58 = [37]17,
245 = [E7]17, 145 = [89]17 e 162 = [99]17, onde A = 10, B = 11, ... , F = 15. ♦
A seguir descrevemos um m´etodo bem elegante para encontrar os pontos fixos, proposto
por Alan F. Beardon [1]. Para encontrar todos os pontos fixos numa determinada base b
devemos encontrar todos os nu´meros de 2 d´ıgitos que satisfa¸cam Fb(n) = n, ou seja, que
resolvam a equa¸ca˜o (1). Agora, observe que
x2 + y2 = xb + y
implica que
x2 − xb + y2 − y = 0.
Completando os quadrados do lado esquerdo temos
H´a apenas uma maneira de escrever 122 como a soma de dois quadrados 12 + 112. Assim basta
resolver as equa¸c˜oes abaixo para encontrar os trˆes pontos fixos:
2x − 11 = ±1 e 2y − 1 = ±11 ⇒ x = 5 ou x = 6 e y = 6 ⇒ [56]11 e [66]11.
2x − 11 = ±11 e 2y − 1 = ±1 ⇒ x=0ey=1 ⇒ [1]11.
♦
15
Exemplo 5.6 J´a no Exemplo 5.4, onde queremos encontrar os pontos fixos na base 17, temos a
equa¸c˜ao
(2x − 17)2 + (2y − 1)2 = 172 + 1 = 290.
Existem 2 maneiras de escrever 290 como a soma de dois quadrados, 12 + 172 e 112 + 132. Assim,
devemos resolver as seguintes equa¸c˜oes:
6 Planilhas
Descreveremos nessa sec¸˜ao como foram criadas as duas planilhas que auxiliaram no
c´alculo da fun¸ca˜o Fb ao longo desse trabalho.
Para construirmos as planilhas descritas aqui foi utilizado o editor de planilhas Calc do
software livre LibreOffice. Primeiramente abordaremos como construir uma planilha para
obten¸ca˜o dos nu´meros felizes na base 10, observe pela figura 3 que essa primeira planilha
poder´a ser usada para obtenc¸˜ao do resultado da func¸˜ao F aplicada a qualquer sequˆencia
de 100 nu´meros, destacando-os quanto `a sua “felicidade”.
Para sua constru¸c˜ao precisaremos das fun¸c˜oes descritas abaixo:
• VALOR: Quando utilizamos a fun¸ca˜o EXT.TEXTO os d´ıgitos retirados s˜ao lidos como
texto pelo Calc, ou seja, para oper´a-los precisamos fazer com que eles sejam lidos como
nu´meros, para isso basta utilizar essa fun¸ca˜o que converte texto em nu´mero.
• SERRO: O problema ao utilizarmos a fun¸c˜ao valor, ´e que as c´elulas que por ventura
na˜o forem preenchidas com d´ıgitos sera˜o acusadas de erro, assim utilizamos a
fun¸ca˜o SERRO(valor;valor alternativo), que significa sem erro. Em valor colocaremos
a func¸˜ao VALOR descrita acima e valor alternativo deixaremos em branco ou
colocaremos aspas.
• SE: Essa fun¸ca˜o lo´gica sera´ usada para especificar se um nu´mero ´e feliz ou triste.
Ela ´e composta da seguinte maneira SE(teste;valor ent˜ao;valor sen˜ao), em teste
colocaremos, ao final de algumas itera¸co˜es, se determinada c´elula ´e igual a 1, se sim
em valor ent˜ao colocaremos FELIZ, caso contra´rio em valor sen˜ao colocaremos T, em
referˆencia a triste.
A figura 3 mostra parte da referida planilha, onde esta´ localizada a sequˆencia de 100
nu´meros (neste caso os nu´meros de 1 a 100), destacando os nu´meros felizes. Nesta parte
da planilha foi utilizada a fun¸ca˜o SE, descrita acima.
A figura 4 mostra a outra parte da referida planilha onde se encontram os ca´lculos da
fun¸ca˜o Fb. Nesta parte da planilha foram utilizadas, simultaneamente, as fun¸co˜es
SEERRO(VALOR(EXT.TEXTO(texto;in´ıcio;nu´mero));) e tamb´em a fun¸ca˜o SOMAQUAD nas
c´elulas da coluna AE.
Observe que limitamos a trabalhar com nu´meros de no m´aximo 15 d´ıgitos e 16
itera¸c˜oes da fun¸ca˜o F. Note que esse nu´mero de iterac¸˜oes foi excessivo, pois, para
nu´meros na base 10 de no m´aximo 15 d´ıgitos, gastar´ıamos no m´aximo 8 itera¸co˜es para
que ele atinja a “felicidade”, ou seja, qualquer nu´mero feliz n com no m´aximo 15 d´ıgitos
tera´ Fk(n) = 1 para k ≤ 8. Isto porque, como visto no Teorema 3.3, um nu´mero n de 15 d´ıgitos
ter´a F(n) ≤ 15 · 92 = 1225, ou seja, logo na 1a itera¸ca˜o j´a temos um nu´mero n1 de no m´aximo
4 d´ıgitos que, aplicado a` fun¸ca˜o, retornar´a F(n1) ≤ 324, ou seja, um nu´mero de 3 d´ıgitos.
Assim, com o apoio da referida planilha verificamos que os nu´meros felizes de 3 d´ıgitos
atingem a felicidade com no ma´ximo 6 itera¸co˜es. Logo, sa˜o necessa´rias apenas 8
itera¸co˜es para determinar os nu´meros felizes.
17
Para a segunda planilha de nu´meros felizes em outras bases (figura 5), procedemos da
mesma maneira, ou seja, utilizamos as mesmas fun¸c˜oes da planilha anterior, por´em
necessitamos de mais uma fun¸ca˜o: a fun¸ca˜o BASE. Essa fun¸ca˜o aparece da seguinte forma
BASE(nu´mero; radical; comprimento), onde nu´mero representa um nu´mero decimal que
queremos converter, radical representa a base que queremos trabalhar e comprimento ´e o
nu´mero de d´ıgitos que vocˆe quer obter na conversa˜o das bases, acrescentando assim zeros
a` direita para obter o nu´mero de d´ıgitos almejado.
Figura 5: Planilha 2
18
7 Proposta Did´atica
Muitas vezes o curr´ıculo program´atico extenso e a falta de tempo fazem com que os
professores do Ensino Fundamental e M´edio se limitem a trabalhar apenas o b´asico dos
conteu´dos mais comuns, ficando o aluno ref´em de um processo de repeti¸c˜ao de conteu´do,
de uma matem´atica pronta, sem qualquer pesquisa pr´evia ou aprofundamento interessante.
Assim sendo propomos essas atividades, n˜ao s´o para o aluno, mas tamb´em para
professores, como forma de levarmos o aluno a um processo de busca do conhecimento, ou
seja, `a pesquisa, utilizando para isso um conceito interessante e de certa forma novo, os
Nu´meros
Felizes.
Aproveitamos o momento para trabalharmos outro conceito, este na˜o novo, por´em
muitas vezes esquecido, o conceito de Sistema Posicional em diferentes Bases e tamb´em uma
intera¸ca˜o com um recurso computacional, um editor de planilhas.
Uma vez munidos de ferramentas e conceitos pr´evios, instigamos os alunos `a pesquisa,
despertando conjecturas e o prazer da descoberta de novos conceitos.
Minicurso
Objetivos:
• Conhecer e compreender as diferentes representa¸c˜oes dos nu´meros em diferentes
bases.
• Familiarizar-se com o editor de planilhas, bem como descobrir sua ampla capacidade
de uso.
Conteu´dos:
• Nu´meros Felizes.
• Editor de Planilhas.
Pu´blico alvo: Alunos do Ensino M´edio e/ou Professores dos Ensino Fundamental e
19
M´edio.
Aula 2
Em seguida pe¸ca aos alunos que trabalhem com uma base com mais s´ımbolos que a
decimal, como, por exemplo, a base 12, leve-os a utilizar os s´ımbolos A e B para representar
os s´ımbolos que faltam e pe¸ca para repetirem os procedimentos feitos para a base 4.
Por fim, explique o algoritmo de mudan¸cas de base exposto na Se¸ca˜o 1, e proponha
alguns exerc´ıcios para verificar o entendimento.
Aula 3
Objetivo espec´ıfico: Fazer com que os alunos utilizem o conhecimento adquirido com o
sistema de numera¸ca˜o em diferentes bases na descoberta e compreens˜ao dos nu´meros
felizes em bases diversas.
• Na base 2 todos os nu´meros sa˜o felizes, existe outra base em que isso ocorra?
Figura 7: Tabela
p = q0b + a0,
e
.
Assim devemos verificar que m = n e ai = a0i para todo 0 ≤ i ≤ n. Vamos supor, sem perda de
generalidade, que n ≤ m. Colocando b em evidˆencia em ambas as expresso˜es temos
.
Segue da unicidade do resto e do quociente na divisa˜o euclidiana que
e .
e .
23
Donde
e .
[2] Esam El-Sedy e Samir Siksek, On Happy Numbers, Rocky Mountain Journal of
Mathematics, v. 30, p. 565-570, 2000.
[4] Richard Guy, Unsolved Problems in Number Theory, New York: Springer-Verlag, 1994.
[6] C´esar Polcino Milies e Sˆonia Pitta Coelho, Nu´meros: Uma introdu¸c˜ao `a Matem´atica,
Edusp, S˜ao Paulo, 2006.
[8] Hao Pan, On consecutive happy numbers, Journal of Number Theory, v. 128, p. 16461654,
2008.