Atividade - Crônica - 1 Série
Atividade - Crônica - 1 Série
Atividade - Crônica - 1 Série
Aluno (a):___________________________________________________________
Rachel de Queiroz nasceu em Fortaleza, Ceará, em novembro de 1910.Viveu parte de sua infância na
capital do estado e parte, no interior, na fazenda dos pais. Depois da seca de 1915, que atingiu a propriedade
familiar, mudou-se para o Rio de Janeiro, onde ficou por pouco tempo, transferindo-se para o Belém do Pará.
De volta ao Ceará, em 1921, retomou os estudos regulares, como interna do Colégio Imaculada
Conceição, formando-se professora em 1925. Ingressou no jornalismo como cronista, em 1927. Em 1930,
lançou seu primeiro romance O Quinze que recebeu o primeiro prêmio, concedido pela Fundação Graça
Aranha. Em 1931, veio ao Rio de Janeiro para recebê-lo, onde travou contato com o Partido Comunista
Brasileiro. Nos anos seguintes, participou da ação política de esquerda, pela qual foi presa em 1937. Sem
abandonar a ficção, continuou colaborando regularmente com jornais e revistas, dedicando-se à crônica
jornalística, ao teatro e à tradução. Foi, durante muito tempo, cronista exclusiva da revista O Cruzeiro. Em
1977, foi a primeira escritora a ingressar na Academia Brasileira
de Letras, um grupo que, até então, tinha sido exclusivamente
masculino. Embora more no Rio de Janeiro, tem retornado, com
frequência, às suas raízes - a fazenda no interior do Ceará.
Obras
Possuidora de uma vasta obra, Rachel de Queiroz
escreveu romances, contos e crônicas, com destaque para ficção
social nordestina. Além disso, escreveu literatura infanto-
juvenil, antologias e peças de teatro. Segue abaixo algumas
obras:
O Quinze (1930)
João Miguel (1932)
Caminhos de Pedras (1937)
As Três Marias (1939)
Três romances (1948)
O Galo de Ouro (1950)
Lampião (1953)
A Beata Maria do Egito (1958)
Quatro Romances (1960)
O Menino Mágico (1969)
Seleta (1973)
Dora Doralina (1975)
Memorial de Maria Moura (1992)
Andira (1992)
As Terras Ásperas (1993)
Teatro (1995)
Falso Mar, Falso Mundo (2002)
TRAGÉDIA DE CASAMENTO
Ora deu-se ultimamente um caso muito triste por estas bandas onde moro. O moço casara com a
moça quando eram ambos bastante jovens – ele forte, grosso, simpático, tinha acabado o serviço militar,
ninguém lhe conhecia vícios. Ela, magrinha e carinhosa, dava gosto vê-los de braço quando namorados,
passeando por essas beiras de praia, muito chegadinhos, cochichando. Chegando o tempo de noivar, o rapaz
pediu a menina ao pai e o pai deu, aprontaram o enxoval, correram os banhos, alugaram um bom cômodo
com direito a fogareiro na cozinha numa casa para os lados do Jequiá. Houve docinhos e vinho do Porto no
dia do casamento, a noiva foi ao civil na cidade trajando uma toalete cinza e chapéu com veuzinho de cor
idem que chamou a atenção do pessoal na barca; o religioso de vestido e véu, tudo branco, naturalmente,
muito chique, teve marcha nupcial e sermão, parecia quase casamento de fita de cinema como disse a
madrinha, que era tia do noivo e reluzia num vestido de cetim cor-de-violeta. Casados, foram vivendo e até
razoavelmente felizes, enquanto a transformação por que ambos iam passando não se tornava por demais
aparente; é que ele ia dando para beber e ela ia dando para engordar – um copo a mais hoje, meio quilo a
mais amanhã, - e entregues os dois cônjuges a esses vícios desgraçados, ele na bebida, ela na comida, que
se poderia esperar senão discórdia e infelicidade?
Ele chegava em casa puxando um fogo bem rijo. Olhava a mulher, recordava as formas que ela tinha
nos tempos dantes, a cinturinha que se abarcava com as mãos, as pernas esbeltas de maiô, mas o que via
agora? Aquele despotismo de carne e banha, a cintura rebentando nas costuras, esfogueada, o pescoço de
touro, um suor grosso porejando em redor da boca. E ficava furioso, achava que tinha sido logrado, que
houvera até troca de pessoa, se tivesse dinheiro mandava anular o casamento. Por fim o desgosto crescia
tanto que ele não podia se conter, levantava a mão e batia na companheira. Ela gritava, se maldizia, pedia a
proteção dos vizinhos e vez por outra ia dar queixa no distrito, que não ficava longe. E quando o delegado
indagava do homem como é que ele tinha coragem de espancar a sua senhora, o infeliz explicava: “Olhe
para ela, seu comissário. Veja como essa mulher engordou. Até dá nojo a vossa senhora?” O comissário não
olhava que não era bobo, dava era um conselho, perguntava à mulher se queria que o marido ficasse no
xadrez, coisa que ela só consentia quando era sábado para domingo. Outro dia qualquer precisava ele ir para
o trabalho, ganhar o feijão e a carne, duas coisas que eram o começo e o fim da desgraça da pobre, pois sem
feijão não vivia e com feijão engordava. Coitada, tomava vinagre, chupava limão, comia em pé, fazia
promessa, passava o dia inteiro sem beber água, praticava qualquer loucura que lhe aconselhassem para
emagrecer. Só não fazia mesmo cortar a comida, lhe tirassem tudo mas não lhe tirassem o prato cheio, havia
de enfraquecer e adoecer do peito, e além disso achava que nem comia esses excesso, era mais calibre seu
do que de outra coisa. Com o tempo, vendo que não emagrecia, foi se acostumando com o corpo e até
gostando dele, assim fornido. E com o amor de si mesma, ia crescendo nela o ódio pelo marido, crescendo
e inchando e empeçonhando, até que um dia não pôde mais e teve que dar um jeito. Pegou uma garrafa na
prateleira, bem à vista. Sabendo que ele não tendo em casa outra cousa que beber, não resistiria ao
conhaque. E contava com o gosto esquisito do alcatrão para disfarçar o sabor do formicida. Assim pensou e
assim foi. O marido chegou em casa – era uma sexta-feira – tão bêbado que nem bateu nela. Deitou-se,
dormiu. No meio da noite acordou, acendeu a luz, viu o conhaque, achou que podia levar a boca com ele
para tirar o amargo. Parece que não teve tempo sequer de estranhar o gosto, porque logo caiu no chão,
estrebuchando e com pouco estava morto. Veio a ambulância da assistência - e com essa é que a mulher
não contava – o médico não acreditou na história do conhaque que ela contou; não sei que sinal de veneno
ele viu, sei que apanhou a garrafa que ela pensava não precisar esconder – e aí veio a polícia, acabou-se
tudo.
Foi presa e está esperando o júri. Uma pessoa que a visitou disse que a achou muito tranquila, sem
queixas e sem vontade de sair. Verdade que desde que deu para engordar ficou preguiçosa e o mais longe
que ia era na vizinha ou no açougue. Assim não estanha mais a cadeia. Além do mais diz que a boia da
prisão não é tão má quanto se conta.
Links consultados:
http://www.nilc.icmc.usp.br/nilc/literatura/raqueldequeiroz.htm
https://cronicabrasileira.org.br/cronicas/9163/tragedia-de-casamento
https://www.todamateria.com.br/vida-e-obra-de-rachel-de-queiroz/