Anibal Costa
Anibal Costa
Anibal Costa
CONSTRUÇÕES TRADICIONAIS
ANÍBAL COSTA
Junho 2010
1. INTRODUÇÃO
A metodologia a usar na avaliação da segurança de estruturas, segue a que tem sido usada pelo
Núcleo de Conservação e Reabilitação de Edifícios e Património (NCREP) da FEUP para a
verificação da segurança e reforço do património edificado, que por sua vez se baseia nos
princípios estabelecidos nas “Recomendações para a Análise, Conservação e Restauro
Estrutural do Património Arquitectónico” [1], nomeadamente tendo em conta que “a
especificidade das estruturas do património, com a sua história complexa, requer a
organização de estruturas e propostas em fases semelhantes às que são utilizadas em
medicina. Anamnese, diagnóstico, terapia e controlo correspondem, respectivamente à análise
da informação histórica, identificação das causas dos danos e degradações, selecção das
acções de consolidação e controlo da eficácia das intervenções.
A compreensão completa do comportamento estrutural e das características dos materiais é
necessária a qualquer projecto de conservação e restauro. É essencial recolher informação
sobre a estrutura no seu estado original, sobre as técnicas e métodos utilizados na sua
construção, sobre as alterações posteriores e os fenómenos que ocorreram e, finalmente, sobre
o seu estado presente.
O diagnóstico é baseado em informações históricas e em abordagens qualitativas e
quantitativas. A abordagem qualitativa é baseada na observação directa dos danos estruturais e
degradações dos materiais, como também na investigação histórica e arqueológica, enquanto
que a abordagem quantitativa requer ensaios das estruturas e dos materiais, monitorização e
análise estrutural.
Antes de se tomar uma decisão sobre a intervenção estrutural, é indispensável determinar
anteriormente as causas dos danos e degradações, e em seguida, avaliar o nível de segurança
actual da estrutura.
A avaliação da segurança, constitui a etapa seguinte ao diagnóstico, é a fase em que a decisão
sobre a possível intervenção é definida, sendo necessário conciliar a análise qualitativa com a
análise quantitativa.
Toda a informação adquirida, o diagnóstico (incluindo a avaliação da segurança) em qualquer
decisão sobre a intervenção, deve ser discutida em detalhe no Relatório de Avaliação”.
Este relatório deve conter uma análise crítica e cuidada da segurança da estrutura, de forma a
justificar as medidas de intervenção e facilitará o juízo sobre as decisões a tomar.
Essas medidas deverão ser dirigidas à raiz das causas que provocaram os danos e nenhuma
acção deverá ser empreendida sem se demonstrar que é indispensável. Todo e qualquer
projecto de intervenção deverá “ser baseado numa compreensão clara dos tipos de acções que
foram a causa dos danos ou degradações e das acções que irão actuar no futuro” [1].
2
2. METODOLOGIA DE INTERVENÇÃO
A metodologia de intervenção que irá ser referida procura respeitar os princípios referidos
anteriormente, começando na generalidade dos casos por uma ou várias inspecções à
construção que, frequentemente, ultrapassam bastante o foro estritamente estrutural. De facto,
a fim de respeitar a história que confere um carácter por vezes único à edificação em apreço,
as inspecções devem ser acompanhadas de um levantamento histórico que permita datar a
estrutura, analisar a sua trajectória, as alterações e outras intervenções sofridas no tempo, de
modo a melhor compreender o seu estado actual [2]. Esse levantamento inclui visitas ao local,
conversas com os proprietários e/ou pessoas ligadas à edificação, recolha de elementos
históricos escritos ou fotográficos e consultas de especialistas [3].
Naturalmente, dependendo do maior ou menor grau de actuação, quer de análise para
avaliação de segurança, quer de efectiva intervenção de reabilitação e/ou reforço estrutural,
assim a inspecção e diagnóstico deverão cobrir uma maior ou menor gama de aspectos.
Independentemente de serem (ou não) todos considerados num dado caso específico
apresentam-se os procedimentos a que têm sido adoptados em diversos trabalhos:
1. Recolha e análise histórica
2. Danos observados
3. Caracterização geométrica da construção existente
4. Caracterização mecânica
5. Identificação e estabelecimento de modelos estruturais adequados
6. Calibração do modelo numérico
7. Análise e interpretação dos resultados
8. Avaliação da Segurança
9. Técnicas de reforço a aplicar
10. Monitorização
3
preocupação pelas Recomendações do ICOMOS.
4
a) Pormenor da construção da Ponte b) Pormenores de armaduras do sistema
Luíz I Hennebique
Figura 2 – Recolha de informação histórica
5
(a) Igreja da Ilha do Pico (b) Moradia na Ilha do Faial (c) Igreja de St. António
Figura 3 – Danos Observados
6
Tramo 1 Tramo 2 Tramo 3 Tramo 4 Tramo 5 Tramo 6 Tramo 7 Tramo 8 Tramo 9 Tramo 10 Tramo 11 Tramo 12 Tramo 13
GAIA PORTO
Pilar 1
Pilar 2 Pilar 3
7
ultra-sons, tomografias, etc. Na figura 6 apresenta-se os ensaios realizados na Igreja do
Mosteiro da Serra do Pilar, situada em Vila Nova de Gaia, num estudo desenvolvido no
âmbito de uma tese de mestrado [5].
A extracção das amostras a ensaiar, que foi realizada em duas paredes da fachada da igreja,
com recurso a uma máquina de corte rotativo com coroa diamantada, permitiu ter uma ideia
da disposição das pedras ao longo do interior das paredes, bem como dos vazios das mesmas.
(a) extracção de carotes (b) amostra de material (c) interior dos orifícios
A partir das carotes extraídas no local é possível realizar uma série de ensaios, de que se
apresentam alguns na figura 7, que permitem obter a resistência à compressão, à tracção, ao
corte e o módulo de elasticidade.
8
(a) provete de junta (b) fase inicial do ensaio (c) provete após ensaio de corte
Figura 8 - Ensaios de caracterização das junta
A partir dos ensaios de carga normal e de deslizamento [5] pode-se estimar a rigidez normal e
tangencial das juntas, o que permite definir a lei de comportamento das juntas.
Além de ensaios a provetes extraídos nas construções é possível avaliar as características de
elementos estruturais, recorrendo a outro tipo de ensaios.
No estudo já referido [5] determinou-se o módulo de elasticidade das paredes da Igreja
(referido à zona ensaiada) com recurso à utilização de um dilatómetro, que através da
aplicação de uma pressão do tipo hidrostática exercida pelo dilatómetro (nomeadamente na
zona da membrana do aparelho) sobre as paredes de furos realizados na estrutura, figura 9, e
com recurso à medição dos deslocamentos resultantes da pressão aplicada permite determinar
o módulo de elasticidade da zona em análise [5].
9
a) Ensaios no Faial em paredes de b) Ensaio em laboratório numa parede de
alvenaria de moradias alvenaria proveniente dos Açores
Figura 10 – Ensaios em elementos estruturais
Nos trabalhos desenvolvidos têm sido usados diversos programa. Um dos primeiros foi o
NLDYNA, desenvolvido na FEUP [17], que permite utilizar elementos sólidos
10
tridimensionais e elementos de barra, entre outros, tendo sido adoptado para realizar as
modelações e análises de construções em alvenaria. Com os elementos sólidos tridimensionais
modelam-se as paredes de alvenaria, escadas, pilares, vigas, etc. Os elementos de barra
serviram para modelar os barrotes de madeira que constituem o pavimento e o tecto. Outro
programa bastante usado é o CASTEM2000, [18] que é uma ferramenta mais geral de
modelação e análise estrutural e está disponível na FEUP desde 1997 e na UA desde 2000,
através de um protocolo de utilização e desenvolvimento estabelecido com a sua instituição de
origem, o CEA (Centro de Energia Atómica francês) em Paris. Em estreito contacto com o
Laboratório ELSA (European Laboratory for Safety Assessment) da Comissão Europeia em
Ispra, Itália, que é uma instituição com forte experiência na utilização de CASTEM2000, este
programa tem vindo a ser usado de forma intensiva na FEUP no âmbito do estudo de
estruturas antigas de alvenaria de grandes dimensões [5], [19]. Na figura 11 apresentam-se os
modelos numéricos da Igreja do Mosteiro da Serra do Pilar sita em Vila Nova de Gaia e o da
Igreja das Bandeiras da Ilha do Pico, Açores, modeladas com recurso ao CASTEM2000, na
figura 12 a) o modelo estrutural de uma moradia da Ilha do Faial, Açores modelada com
recurso ao NLDYNA e na Figura 12 b) o modelo da Ponte Luiz I que foi modelada com
recurso ao programa FEMIX [20] desenvolvido na FEUP e que foi usado em alguns casos.
11
2.6 CALIBRAÇÃO DO MODELO ESTRUTURAL
4.44 Hz
6.79 Hz
3,0
1.E+01
2,0
Acceleration (mg)
Explosion
1.E+00
S ((cm/s2)2/Hz)
1,0
0,0
1.E-01
9.96 Hz
-1,0
9.52 Hz
8.64 Hz
3.08 Hz
1.E-02
0.63 Hz
Ambient vibration
3.52 Hz
-2,0
-3,0 1.E-03
-4,0
4 4,5 5 5,5 6 1.E-04
0.0 1.0 2.0 3.0 4.0 5.0 6.0 7.0 8.0 9.0 10.0 11.0 12.0
T im e (seg.)
frequência (Hz)
12
2.7 ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS RESULTADOS
(a) Fachada Principal e Torres (b) Torre direita e alçado lateral direito
Figura 16 – Isóstáticas de tracção e compressão e fendas verificadas no
local
13
Um programa apropriado de investigação, com vários técnicos envolvidos, a experiência de
vários casos acompanhados, ao longo dos tempos e sempre que possível, monitorizados,
podem aumentar a fiabilidade da análise e da interpretação dos resultados, sendo este um dos
aspectos em que mais se tem apostado.
A tensão σrd, usada para tensão de referência, foi obtida por majoração da tensão que, de
acordo com a literatura especializada, é considerada como tensão admissível para aços de
obras com idade idêntica à Ponte Luiz I, ou seja, a tensão de 105 MPa. Os ensaios
experimentais efectuados com os provetes retirados da ponte confirmaram este valor.
14
A apresentação dos resultados revelou-se muito sugestiva e a sua interpretação resulta
bastante simplificada, tornando evidentes as barras cujas tensões estão próximas ou excedem
o máximo admissível. A figura 17 exibe para uma dada combinação das acções, conforme
notação utilizada, a coloração da ponte conforme a tensão instalada nas barras, de acordo com
os intervalos anteriormente apresentados e donde é possível concluir quais as barras a
reforçar.
A decisão e a escolha das técnicas de reforço devem ser o resultado da análise global e de
investigação. Em primeiro lugar, deve-se avaliar a segurança presente e depois os níveis
esperados ou que podem ser alcançados como resultado da acção; a análise matemática,
especialmente com respeito ao comportamento sísmico de construções antigas é
frequentemente só parcialmente fidedigna e a análise teórica deveria ser sempre interpretada
em função do comportamento da estrutura ao longo do tempo e com observação no local
precisa e com muita experiência prática [1].
15
intervenção: actuação ao nível global da construção ou intervenção ao nível dos elementos
estruturais.
Nas construções antigas a actuação ao nível global deverá consistir em: assegurar a
continuidade entre os diversos elementos estruturais (nestes casos paredes, pisos e
coberturas); assegurar as conexões (ligações) entre esses elementos e introduzir apoios
(ligações) entre os mesmos. Uma técnica de reforço bastante antiga (implementada na Ilha do
Faial, na sequência do sismo de 1927) e que se tem revelado bastante eficiente, consiste na
introdução de tirantes ao nível dos pisos, figura 18, que permitem ligar os panos de parede
opostos de alvenaria e que no caso das empenas soltas (paredes orientadas na direcção dos
barrotes que realizam o soalho) são fundamentais.
16
Figura 19 - Utilização de tirantes para ligar paredes
Muitas vezes a colocação desses tirantes poderá colocar problemas estéticos e arquitectónicos,
que terão de ser equacionados e resolvidos na altura da execução. Uma solução possível,
principalmente para monumentos (igrejas) será a utilização de uma estrutura de cobertura, que
poderá desempenhar diversas soluções estruturais: tirante a unir a cabeça dos contrafortes;
tirantes de sustentação das pedras do arco, de modo a evitar o seu desprendimento e o alívio
das cargas no arco (ver figura 21).
17
Figura 21 – Reforço dos arcos e atirantamento dos contrafortes (Igreja do Bonfim – Projecto
do Prof. Joaquim Sarmento)
Outras técnicas, com os mesmos objectivos, têm vindo a ser aplicadas em obras de reforço,
nas figuras 22 e 23, apresentam-se alguns exemplos de reforços de construções de alvenaria de
pedra, com vista a melhorar o seu comportamento global. Estas técnicas têm como finalidade
assegurar as ligações entre paredes opostas, obrigando-as a trabalhar em conjunto e
conferindo-lhes apoios ao longo da sua altura. Muitas destas intervenções poderiam ser
facilmente aplicadas na reabilitação das construções das cidades de Portugal, nomeadamente
em zonas onde a probabilidade de ocorrência de sismos de grande magnitude é maior,
principalmente na realização das denominadas obras de “Reabilitação Urbana” e outras do
mesmo tipo.
18
Figura 23 – Cantoneira usada em toda a envolvente da construção para assegurar a
ligação entre todas as paredes [21]
Em resumo, poderemos referir que, normalmente, as técnicas de reforço a usar, consistem em
assegurar o funcionamento correcto de todas as conexões estruturais e melhorar a tensão de
tracção nas zonas críticas, sendo as acções de reforço mais frequentes as seguintes:
• As paredes devem ser ligadas umas às outras, ligando os elementos individuais, tijolos ou
pedras, ou reforçando-os, usando elementos horizontais adicionais ou outros elementos de
aço ou fibras, figura 24. A solução final deste tipo de reforço estará sempre dependente de
se conhecer a constituição e o modo construtivo das paredes da construção.
• Deve-se assegurar que a força nos cantos aos níveis de topo onde as forças de compressão
são mais baixas devido ao peso reduzido é bem absorvida, podendo em alguns casos
obrigar a amarrar a parede a outros elementos construtivos, figura 25.
• Deve-se assegurar uma boa transmissão dos esforços dos arcos e das abóbadas para os
contrafortes e paredes e a estabilidade desses contrafortes, que são muito sensíveis à
ocorrência de assentamentos. É importante tentar anular as componentes horizontais dos
impulsos que são transmitidos na cabeça das paredes ou dos contrafortes, podendo usar-se
para o efeito tirantes ou outras soluções que procurem minimizarem estes esforços, figura
26.
• Abóbadas e arcos realizadas em alvenaria radial não necessitam, normalmente, de reforço
especial. É diferente com abóbadas construídas com “reboco e argamassa pobre”. Nestes
casos, pode-se usar capas de betão em cima do extradoso ou superfície de topo para
reforçar a abóbada ou arco, mas este tipo de solução só deverá ser usado como uma
medida de emergência e só depois de perceber bem a constituição da abóbada e quando
nenhuma outra solução seja possível para estabilizar a estrutura.
• A conexão entre as paredes com os pisos e o telhado deve ser satisfatória, para prevenir a
separação completa da fachada; soluções como a que se apresenta na figura 27, pode ser
muito efectiva, especialmente ao nível de telhado mas, como sempre, o uso deles deve ser
avaliado no contexto geral da história da construção. A eficiência das conexões entre a
19
cobertura e as paredes, que estão sujeitas a forças perpendiculares horizontais é importante
para a estabilidade das paredes, já que troca o desfavorável comportamento em consola
para o "comportamento de viga" apoiada, figura 28.
20
Figura 26 – Tirantes para absorver as componentes horizontais dos impulsos
a) Perspectiva b) Planta
Figura 27 – Amarração da parede na extremidade das paredes [10]
21
2.9.2 – Intervenção ao Nível dos Elementos Estruturais
A intervenção ao nível dos elementos estruturais, no caso das estruturas de alvenaria, está
relacionada com os materiais, que nestes casos são: a argamassa que pode ser consolidada ou
fortalecida através de diversas tecnologias, que são conhecidas; a alvenaria que pode ser
melhorada de modo a evitar-se a separação de pedras únicas e de paredes de revestimento em
alvenaria dupla, podendo para o efeito serem usadas injecções e em alguns casos usadas barras
adicionais de reforço para assegurar conexões adequadas entre as paredes e portanto nestes
casos as técnicas estão associadas ao melhoramento do comportamento da argamassa e das
paredes de alvenaria. Uma técnica que tem sido bastante usada nos Açores e testada em
laboratório, com ensaios experimentais realizados em paredes originárias do Faial, Açores,
tem sido a aplicação de redes de aço inox em ambas as faces da parede, sendo estas ligadas
por conectores metálicos, para realizar os chamados “travadouros” das paredes de alvenaria.
Nas figuras 29 e 30 apresentam-se imagens deste tipo de reforço, cuja eficácia foi comprovada
em laboratório, [16].
22
Figura 30 – Reforço de paredes de alvenaria com malha de aço inox [16]
23
2.10 MONITORIZAÇÃO
De modo a dar uma visão do tipo de trabalho que se pode realizar na monitorização de uma
construção, vamos apresentar o caso de uma ponte de alvenaria de pedra sobre o Rio Vizela,
em Vila Fria, que foi construída para substituir uma antiga passagem (figura 32) com graves
condições de segurança estrutural, [26].
Este trabalho insere-se numa iniciativa, aproveitada para fins científicos, realizada pelo
Instituto da Construção (IC) da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP)
em colaboração com a Câmara Municipal de Felgueiras e pode ser consultado nas páginas do
Núcleo da Conservação e Reabilitação de Edifícios e Património (NCREP) da FEUP.
Iremos procurar, de uma forma resumida, descrever a instrumentação usada para registar a
resposta estrutural da ponte, com referência ao sistema de aquisição de dados adoptado. Pelas
dificuldades e particularidades da obra, as fases essenciais da instalação dos sensores são
também abordadas sumariamente.
24
Figura 33 - Perspectiva do projecto da nova ponte
A estrutura foi fundada em grupos de micro-estacas encabeçadas por maciços de betão armado
em que assentam os pilares.
Tal como os arcos e os muros-tímpano, os pilares foram realizados em alvenaria de pedra
aparelhada de granito, assente com uma fina camada de argamassa de cal especificamente
estudada e produzida para o efeito [28].
Sobre o extradorso dos arcos e entre muros-tímpano, foi colocado enchimento de tout-venant
que, na zona mais superficial, incluiu também uma pequena percentagem de cimento Portland.
Após o enchimento foi realizada uma camada de regularização destinada a receber o
revestimento de telas asfálticas de impermeabilização, sobre o qual foi colocada uma camada
de traço-seco (areia e cimento em reduzida percentagem, sem adição de água) destinada ao
assentamento do pavimento final em lajeado de granito.
A construção da ponte começou no início de 2002 e terminou em Abril de 2005, com o
aspecto ilustrado na figura 34.
25
numéricos obtidos; nesse trabalho foram ainda identificados alguns aspectos carecendo de
melhor estudo, nomeadamente a influência da rigidez do enchimento e dos muros-tímpano
nos esforços dos arcos.
A possibilidade de acompanhar e monitorizar uma obra deste tipo desde a sua construção,
constituiu assim uma excelente oportunidade para estabelecer e calibrar técnicas de
modelação analítica adequadas para a simulação numérica de outras construções semelhantes
existentes. A monitorização em contínuo da ponte por um largo período de tempo materializa
um laboratório vivo que permite avaliar e sistematizar os principais aspectos do
comportamento estrutural deste tipo de pontes e sua relação com as patologias estruturais
frequentemente observadas.
Neste contexto procurou-se dotar a nova ponte de uma instrumentação capaz de fornecer
medições relativas a:
• deslocamentos globais da estrutura, em especial no coroamento dos arcos;
• deslocamentos relativos das juntas entre blocos de pedra, nomeadamente
abertura/fecho e escorregamento;
• deslocamentos relativos entre muros-tímpano opostos;
• deformações e tensões em alguns blocos dos arcos;
• pressões verticais no material de enchimento;
• temperatura.
Através de registos resultantes da referida instrumentação, pretende-se aferir a deformada da
estrutura (global e local, nas juntas) obtida de simulações numéricas por comparação com a
observada sob a acção de cargas reais controladas.
As medidas de deformações e tensões elásticas que lhe estão associadas nos blocos de pedra,
bem como as pressões no enchimento, deverão permitir esclarecer o encaminhamento e
distribuição de tensões entre arcos, enchimento e pilares, e aferir os correspondentes
resultados numéricos.
Por fim, a medição de temperatura em diversos locais da ponte, em particular próximo de
alguns sensores, destina-se essencialmente a permitir fazer correcções aos registos por forma a
entrar em linha de conta com os efeitos da temperatura.
2.10.3 MONITORIZAÇÃO
A instrumentação adoptada para a monitorização consiste num vasto número de sensores do
tipo a seguir descritos, conforme o género e medida em causa.
26
Figura 35a- Descimbre de um arco. Pórtico Figura 35b- Descimbre de um arco. Compa-
de referência para comparadores e LVDT’s. rador digital e LVDT no coroamento do arco.
No entanto, em permanência torna-se impossível dispor dessa estrutura de referência, pelo que
se optou por instalar uma rede de sensores de pressão piezoresistivos de grande sensibilidade
que medem a variação de pressão de um fluído existente num tubo com uma das extremidades
ligada à pressão atmosférica e outra ligada a uma porta do sensor (figura 36). A variação de
posição altimétrica da extremidade livre ou do sensor, ambas ligadas rigidamente aos pontos
cuja variação de nível se pretende medir, origina uma alteração de pressão que é captada pelo
sensor e transformada num sinal eléctrico proporcional à variação de nível ocorrida. Pelo facto
de serem usados para medir variações de nível, são designados por sensores de nível.
Não tendo sido possível dispôr de um ponto fixo na margem que servisse de referência para
deslocamentos verticais, e dado que, os esforços mais significativos na estrutura deverão
ocorrer por movimentos diferenciais entre o vão dos arcos e os seus pilares de apoio, optou-se
então por colocar uma série de sensores que permitissem obter aqueles deslocamentos
verticais relativos ao longo da ponte.
27
Para tal, foram adoptados quinze sensores que serão colocados no interior da ponte e sobre os
pilares (figuras 37a e 37b), mais propriamente sobre colunas rígidas circulares de betão
encastradas na face superior dos pilares junto à nascença dos arcos e no lado interior jusante
dos muros-tímpano.
Figura 37a- Posicionamento dos sensores Figura 37b- Posicionamento dos sensores
de pressão (corte longitudinal parcial de de pressão (planta parcial de meia-ponte).
meia-ponte).
Pretendeu-se assim criar plataformas para a colocação dos sensores a cotas compatíveis com o
seu intervalo de medição e as cotas do coroamento dos arcos. Essas colunas estão no entanto
isoladas do enchimento da ponte através de tubos de maior diâmetro (figuras 38a e 38b) a fim
de evitar movimentos daquelas devido às cargas actuantes na estrutura.
Figura 38a- Colunas de apoio aos sensores Figura 38b - Colunas de apoio aos sensores
de pressão (vista superior). de pressão (vista geral na fase de construção).
28
pedra.
29
Figura 40 - Instrumentação de juntas. Transdutor de deslocamento de fibra óptica.
No total foram instalados 44 transdutores de deslocamentos deste tipo, distribuídos por juntas
da face jusante e no intradorso de alguns arcos. Estes últimos destinam-se a medir eventuais
movimentos de expansão transversal dos arcos e de abertura de juntas na direcção longitudinal
nas proximidades do eixo da ponte onde a estrutura se apresenta mais flexível na direcção
vertical. A figura 41 ilustra esquematicamente a posição de alguns desses sensores colocados
no intradorso de um dos arcos.
30
de transdutores longos, foram feitos com base em sensores de Bragg em fibra óptica pela
FiberSensing [30]. Basicamente, o deslocamento é obtido através da medição da deformação
num fio de invar amarrado a cada um dos muros-tímpano com uma dada tensão inicial.
As extensões lineares em alguns blocos dos arcos são obtidas através de extensómetros
colados em faces dos blocos no intradorso e no extradorso de dois arcos.
Conhecendo previamente o módulo de deformabilidade e o coeficiente de Poisson da pedra
usada, e dado que neste tipo de construções as tensões são muito baixas e em regime linear
elástico do material, é possível obter as tensões instaladas a partir das extensões registadas. A
medição de deformações no extradorso e no intradorso dos arcos destina-se assim a avaliar a
distribuição de extensões e tensões na espessura do mesmo.
Foram então colocados pares de extensómetros nas direcções longitudinal e transversal da
ponte, em blocos de pedra de dois meios-arcos (A3 e A4) adjacentes ao pilar P4 (ver figura
43a), em dois alinhamentos longitudinais (um central segundo o eixo da ponte – figura 43b - e
outro junto à face jusante – figura 43c) e segundo três secções transversais dos arcos (uma
central passando pelo coroamento, outra num meridiano a cerca de 45º e outra ainda junto à
nascença dos arcos A3 e A4)
31
Na figura 44 apresenta-se uma vista geral de quatro zonas do extradorso já instrumentadas
com extensómetros e em fase de recobrimento com blocos de pedra.
32
mais próximo da superfície. Na figura 46 ilustra-se o posicionamento das referidas células,
designadas por C1 e C2. Na mesma figura é possível observar ainda a posição de outras cinco
células (C3 a C7) do mesmo tipo embora com geometria diferente e que foram instaladas em
rasgos abertos em pedras dos arcos a fim de avaliar as tensões neles introduzidas.
Na figura 47 pode ver-se duas células aplicadas, uma na base do pilar e outra no intradorso do
arco, numa das juntas da pedra.
C1 C3
2.10.3.5 Temperatura
33
instalados pela FiberSensing.
A opção por este tipo de sensores de temperatura de base óptica surgiu de forma natural pelo
facto de ser possível integrá-los sem dificuldade na rede de fibras ópticas instalada para os
transdutores de deslocamento. Estes sensores de temperatura foram colocados em conjunto
com alguns transdutores e também, como já referido, junto com tubos de fluído dos sensores
de nível. Na figura 48 pode-se observar um destes sensores com um daqueles tubos em fase de
colocação.
Tal como porventura já terá ficado patente através dos parágrafos e imagens anteriores, a
instalação dos sensores descritos exigiu a execução de um conjunto apreciável de tarefas e de
infra-estruturas específicas que vale a pena salientar e que importa prever desde o início do
planeamento da instrumentação.
Para além de intervenções locais para cada sensor, tais como execução de furos, rasgos,
cavidades, colocação de tubagens de protecção aos cabos, etc, foi necessário realizar:
• uma calha técnica para reunir e conduzir os cabos de todos os sensores a um armário
técnico;
• caixas de visita ao longo da calha técnica em locais devidamente escolhidos;
• um local fechado para albergar o armário técnico.
A calha técnica foi realizada no local em chapa de zinco, por forma a se conseguir as exíguas
dimensões exigidas. Estende-se ao longo da face jusante da ponte, junto à guarda lateral e
revestida totalmente por pedra de granito. Na figura 49 pode-se observar o aspecto da calha já
com alguns tubos ligados para condução de cabos eléctricos e ópticos, e uma das aberturas
para as caixas de visita ilustradas na figura 50.
34
Figura 49 - Aspecto da calha técnica
O armário técnico fica situado numa das extremidades da ponte, ao lado do encontro e
imediatamente abaixo da cota do pavimento conforme se pode observar na figura 51.
35
Figura 51 - Armário técnico
Nessa figura é visível o Prof. António Arêde o grande responsável de toda esta instalação e a
quem se deve grande parte deste trabalho. No armário fica o quadro das fichas de sinais de
todos os cabos eléctricos e ópticos para ligação ao sistema de aquisição, assim como o quadro
électrico de alimentação de todos os equipamentos. O sistema de aquisição fica também
alojado no mesmo armário fechado para monitorização em contínuo durante períodos longos.
A aquisição e registo de sinais dos sensores instalados é feita com recurso a dois sistemas
diferentes conforme os tipos de sensores, tanto durante a sua instalação como na fase de
serviço.
Para os sensores de base óptica (extensómetros, sensores de temperatura e transdutores de
deslocamento) a aquisição é feita usando uma unidade de medição produzida pela
FiberSensing com capacidade para condicionamento e aquisição de 16 ramos independentes
de fibra óptica, contendo cada um até 12 sensores multiplexados em série. A instalação de
todos os sensores ópticos foi devidamente acompanhada com recurso a uma destas unidades,
que pode ser observada na figura 52.
36
Figura 52 - Sistema de interrogação para sensores de fibras ópticas.
Para os sensores eléctricos, tais como extensómetros, sensores de nível, células de pressão e
termistores, as leituras e registos foram e são feitas com sistemas de aquisição da National
Instruments. Na fase de instalação foi usado o sistema de aquisição do Laboratório de
Engenharia Sísmica e Estrutural (LESE) da FEUP, que tem conduzido e executado todos os
trabalhos de instrumentação da ponte.
Para a fase definitiva de monitorização em serviço, a aquisição será feita com sistema de
aquisição FieldPoint da National Instruments (figura 53).
REFERÊNCIAS
[1] ICOMOS – Recomendações para a Análise, Conservação e Restauro Estrutural do
Património Arquitectónico, Lisboa, Junho, 2002.
[2] Guedes, J.; Costa, A.; Arêde, A.; Paupério, E. – Reabilitação e Reforço de Estruturas
Património Nacional. Experiência da FEUP. Seminário Euro-Mediterrânico, Forum
UNESCO, Universidade Lusíada, Lisboa, Junho, 2002.
[3] Costa, A.; Paupério, E.; Cid, P. - Relatório de Inspecção. Muralhas de Barcelos.
37
Departamento de Engenharia Civil. Secção de Estruturas. FEUP, Porto, Maio 2002.
[4] Arêde, A.; Costa, A. – Inspecção e Diagnóstico Estrutural de Construções Históricas.
Algumas contribuições da FEUP. Seminário sobre A Intervenção no Património. Práticas
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