Ana Toyshima
Ana Toyshima
Ana Toyshima
Maringá, PR
2011
Ana Maria da Silva Toyshima
Maringá
2011
Dedico este trabalho a todos aqueles envolvidos
direta ou indiretamente em minha trajetória
acadêmica, aos que me proporcionaram
momentos felizes e inesquecíveis.
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente a DEUS, por ter me dado forças, por guiar meus passos,
pelas dificuldades superadas, enfim por ter possibilitado esta grande conquista.
Agradeço de maneira muito especial a minha mãe Neide, ao meu pai Dirceu e à
minha irmã Patrícia, por estarem sempre ao meu lado nos momentos serenos e
apreensivos, por serem pessoas amáveis e dedicadas. Amo vocês!
Ao Caio, pessoinha linda que eu tanto AMO. Filho você é minha jóia mais preciosa,
é você quem enche de alegria e carinho minha VIDA. .
Às minhas amigas e parceiras que compõe o meu grupinho do fundão Flavis, Lara,
Pati Guelles, Pati Alves, Paulinha e Pri, meninas vocês alegram minhas manhãs.
Tantas conversas, risadas e algumas briguinhas para apimentar a relação. Vou
sentir muitas saudades dos momentos maravilhosos que passei com vocês. Agora
me diz como será meu café da manhã sem vocês? E a nossa padaria? Aquele
cafezinho quentinho e o pão de queijo, que têm um sabor todo especial quando é
com vocês!
Enfim, agradeço a todos os meus companheiros de salas aqueles que não citei, pelo
convívio e troca de experiências ao longo desses quatro anos.
Muito Obrigada.
Nunca devemos nos esquecer de que o futuro não é nem
totalmente nosso, nem totalmente não-nosso, para não
sermos obrigados a esperá-lo como se estivesse por vir
com toda a certeza, nem nos desesperarmos como se não
estivesse por vir jamais.
(EPICURO)
TOYSHIMA, Ana Maria da Silva. O Ideário Educacional Jesuítico: Explorando o
Ratio Studiorum. 2011. Monografia (Trabalho de Conclusão de Curso) –
Universidade Estadual de Maringá.
RESUMO
1. INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 9
6. REFERÊNCIAS .................................................................................................... 49
9
1. INTRODUÇÃO
A Societas Iesu foi formada em 1534, nas cercanias de Paris, por seis padres
liderados por Inácio de Loyola, com o objetivo de fazer uma moderna cruzada para
converter os judeus e retomar Jerusalém ao domínio dos cristãos. Em 1540, o papa
Paulo III oficializou a nova ordem religiosa que passou a assumir tarefas
diferenciadas daquela principal objetivada por seus fundadores.
Esta pesquisa tem por objetivo analisar o Método Pedagógico dos Jesuítas (Ratio
Studiorum) adotado nos colégios da Companhia de Jesus para verificar o quanto
dele foi utilizado pelos missionários no ensino na América Portuguesa.
O trabalho está estruturado em três capítulos. O primeiro capítulo foi pensado para
apresentar a origem e materialização da Companhia de Jesus e o seu idealizador
Inácio de Loyola.
Além destes documentos são consultadas obras historiográficas, são elas: História
da Companhia de Jesus no Brasil, de Serafim Leite; A Companhia de Jesus em
Portugal e nas missões – esboço histórico, superiores, colégios, 1540-1934, de
Francisco Rodrigues; A formação intellectual do jesuíta – leis e factos, também de
Rodrigues e História das idéias pedagógicas no Brasil, de Dermeval Saviani.
Costa (2004, p.119) apresenta que “a reforma da igreja já era uma necessidade que
foi tomando corpo aos poucos nas décadas iniciais do século XVI e que concretizou
no Concílio de Trento (1545-1563), pelo menos enquanto deliberação oficial da
igreja”.
De acordo com Costa (2004, p. 119), “o Concílio de Trento foi, portanto, um dos
momentos oficiais mais significativos da Igreja Católica no século XVI, e é tido como
1
Martinho Lutero (1483-1546) nasceu em Eislenben, na Alemanha, em 1505 ingressou na Ordem
dos Agostinianos. No ano de 1517, ocorre o seu rompimento com a Igreja Católica. Lutero cola na
porta da igreja Wittenberg as famosas 95 teses, protestando contra a atitude do papa e expondo
alguns aspectos de sua doutrina.
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Todos os integrantes da Ordem militam por Deus sob obediência do Papa Paulo III e
de seus sucessores. Como observamos, a Companhia de Jesus possui certa
hierarquia a qual deveria ser correspondida: “façam todos voto de obedecer ao
2
Paulo III foi papa de 1534 a 1549; ele quem convocou pela primeira vez o Concílio de Trento,
fundou a Inquisição por meio da Sagrada Congregação do Santo Oficio em 1542 e criou também a
Sagrada Congregação do Index em 1543. Essas duas instâncias visavam, além da censura e
perseguição às heresias, rever os costumes da Igreja e recuperar os seus fundamentos teológicos.
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Para se constituir uma Província era necessário seguir certos critérios, como ter
poder aquisitivo para manter suas despesas e atender a circunstâncias geográficas
ou linguísticas. Quando as casas se tornavam numerosas dava-se origem a uma
nova Província, ou a uma Vice-Província.
A Companhia “espalhava-se, em ritmo forte, por todo o mundo, assim como os seus
Colégios, e de todas as partes se fazia pressão sobre Roma, a fim de que o modo
de proceder fosse uniforme, respeitando os diversos lugares” (MIRANDA, 2009, p.
38). Assim como ocorreu com as Constituições da Companhia de Jesus, o Ratio
Studiorum também foi alvo de experiências para que fosse verificada a sua
aplicabilidade, buscando a maior universalidade possível diante da vastidão de
lugares onde os jesuítas já se encontravam no século XVI.
Depois dele outros visitadores continuaram a missão, como por exemplo, Gonzales
Davila e João de Montoia, Everardo Mercuriano e Polanco, Maldonado e Olivério
Manareu. No entanto, Franca (1952, p. 07) menciona que o regime de inspeções
periódicas não era a solução definitiva do problema, era necessária a elaboração de um
código de leis que assegurasse a semelhança e a uniformidade da crescente
atividade pedagógica da Sociedade de Jesus.
16
Inácio decide fazer de sua Ordem uma sociedade composta por homens
absolutamente eruditos e, para isso, instituiu casas de formação científica e literária,
determinando que fossem admitidos em sua ordem jovens “que pelo talento e
virtude dêem fundadas esperanças de que hão de vir a ser doutos e profícuos á
sociedade” (RODRIGUES, 1917, p. 10). No entanto, sua intenção não se limitava
em formar apenas homens sábios e sim transformar o ensino e a ciência Teológica
em um meio de regeneração e elevação da humanidade.
3
A utilização dos termos instrução e educação são necessárias neste período histórico, visto que a
palavra instrução tem significado de educação formal, ensino sistematizado e o conceito de educação
é utilizado no sentido de educação moral, educar e formar o caráter do cristão de acordo com os
preceitos da religião católica. Segundo Miranda (2009, p. 41) deve-se equilibrar a educação
intelectual com a educação moral.
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chegar e para a qual fazem convergir todos os meios que estão ao seu alcance”.
Sendo assim, seus colégios formam homens de caráter predominantemente cristão,
uma vez que S. Inácio tinha convicção de que a instrução sem a educação religiosa
constituía um perigo para a sociedade.
E o professor, para Loyola, deveria ser o exemplo para seus alunos e suas ações
modelos, neste sentido, o mestre deveria aproveitar todas as oportunidades nas
tarefas escolares para semear o germe da virtude no coração dos discípulos com
uma palavra, com uma observação ou conselho (RODRIGUES, 1917, p. 20). O
Ratio na regra 1 comuns a todos os professores das faculdades superiores (1952, p.
87) apresenta que:
[...] que fizera até ai? Servir os princípios da terra. Daí em diante
seguiria o Rei dos Reis. Se até ai dera a juventude ao mundo e às
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Primeiramente Loyola dividiu o pouco que tinha entre os mais necessitados, dando
sua requintada roupa de cavaleiro. Depois deste episódio, ele seguiu sua árdua
peregrinação com muitos obstáculos e provações. Visitou as ermidas de nossa
Senhora, passou por Monserrat e se estabeleceu em Manresa, na Catalunha, por
um ano pedindo esmola e repousando onde lhe davam abrigo. De vez em quando
se dirigia até uma gruta para orar; segundo Leite (1938, p. 4) neste seu retiro teve a
primeira ideia dos Exercícios Espirituais (jejuns, oração, reflexão, assistência divina).
De acordo com Leite (1938, p. 10), estando assim a Companhia oficializada, faltava
apenas que se escrevessem as Constituições4. Santo Inácio começou a escrevê-las
em 1547 e, em 1550, depois de redigida a primeira fórmula, Inácio apresentou aos
Padres mais competentes, entre eles Francisco de Borja e Lainez, para analisar o
texto, sendo que todos aprovaram com poucas modificações.
Após correções feitas por ele próprio foi anunciada nas diversas províncias da
Companhia, a partir de 1552. De início, as Constituições foram instituídas somente
4
As Constituições da Companhia de Jesus é uma obra escrita por Inácio de Loyola que veio à luz em
1559, tal documento é composto por dez partes, cujo conteúdo traz os princípios que deveriam
nortear a vida de cada integrante da Companhia de Jesus, dentre eles podemos destacar a
obediência, a castidade e a pobreza.
19
para experiência como Loyola desejava e somente em 1558, após sua morte, que
elas foram aprovadas pela Congregação Geral.5
Optando pela religiosidade, escreve o livro Exercícios Espirituais, de que deriva toda
a espiritualidade da Companhia de Jesus. De acordo com Leite (1938, p. 15), o livro:
5
O supremo poder legislativo da Companhia de Jesus está na Congregação Geral. Inácio de Loyola
traça nas Constituições o perfil do Superior Geral: homem de coração e união com Deus; possua as
virtudes próprias do estado religioso, em particular caridade, humildade, mortificação, mansidão e
fortaleza; seja de grande entendimento e juízo, vigilante e eficaz para levar as coisas a bom têrmo;
goze de saúde e forças e tudo o mais que possa dar crédito e autoridade.
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Além das Constituições, Exercícios Espirituais, Inácio fundou o asilo para os cristãos
novos e também para aqueles que tinham o desejo de se converter ao cristianismo.
Instituiu a Casa Santa Marta para mulheres pobres, pecadoras, além de escolas e
universidades.
21
De acordo com Franca (1952), esta parte das Constituições registrava apenas a
orientação geral, sendo necessária a elaboração e a sistematização de um plano de
estudos específico para nortear as atividades de cunho pedagógico nos colégios da
Companhia.
Em 1551 foi dado o primeiro passo em direção ao documento que guiaria a ação
administrativa e educativa dentro dos colégios jesuíticos, quando Jerônimo Nadal6, a
pedido do Geral Loiola, recolheu informações a respeito dos colégios, principalmente
o de Messina7, e, a partir das observações, elaborou o primeiro regulamento que foi
enviado aos colégios.
Neste mesmo ano foi fundado também o Colégio Romano 8 que se tornou o principal
da Companhia. Conforme Franca (1952) o Colégio Romano teve entre os anos de
1564 a 1566, como Reitor, justamente o padre Nadal que, acumulando mais essa
experiência, elaborou um novo plano posto em execução durante o seu reitorado, o
Ordo Studiorum.
6
De 1552 a 1557 percorreu quase toda a Europa, como delegado de Inácio para explicar e promulgar
as Constituições da Ordem. De 1557 a 1559 foi nomeado Prefeito de Estudos no Colégio Romano e
governou ,como Reitor, o mesmo colégio de 1564 a 1566.
7
Primeiro Colégio de jesuítas criado em Messina, na Silícia, em 1548, a pedido do vice-rei, D. Juan
de Veiga, sob direção de Nadal. Foi nesse colégio que, pela primeira vez, os jesuítas aplicaram um
plano de estudos que, posteriormente, viria a ser adotado nos demais colégios da Ordem. O método
utilizado no colégio de Messina foi o modus parisiensis.
8
O Colégio Romano foi fundado em 1551 e tornou-se referência para toda Ordem. O método de
ensino utilizado foi o modus parisiensis, caracterizado pela distribuição de alunos em classes,
realização pelos alunos de exercícios escolares e mecanismo de incentivo ao trabalho escolar. A
organização da classe dava-se por um grupo de alunos mais ou menos da mesma idade e com o
mesmo grau de instrução. O conhecimento era proporcional ao nível do aluno e cada classe era
regida por um professor.
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Segundo Saviani (2008, p. 50) “está aí aquilo que se poderia considerar o primeiro
esboço do Ratio Studiorum que foi enviado de Roma para as instituições que iam
sendo fundadas nos diversos países visando uniformizar a organização e o
funcionamento dos colégios”.
Em 1591, uma nova comissão, composta por três dos seis integrantes da comissão
de 1585, Tucci, Azor e Gonzalez, recebeu e analisou o conteúdo dos relatórios.
“Para a elaboração de uma nova versão, o geral da Companhia associou a esses
três compiladores uma espécie de comissão de notáveis compostos pelos mais
renomados professores do Colégio Romano” (SAVIANI, 2008, P. 53). Após críticas
e sugestões de melhorias vem à luz a segunda versão, colocada em prática em
caráter experimental por três anos e, ao findar o prazo de experiência, os resultados
deveriam ser enviados a Roma para a promulgação final.
Franca (1952, p. 79) traz que o documento Ratio Studiorum previa certa flexibilidade
e adaptações das suas regras respeitando a diversidade dos lugares na qual a
Companhia possuía colégios. Um exemplo que confirma sua flexibilidade é a regra
39 do provincial que prevê modificações na organização do ensino para melhor
progresso das letras, desde que estas, se aproximem o mais possível das normas
estabelecidas no Ratio.
Franca (1952) apresenta que o código representado pelo Ratio atque Institutio
Studiorum Societatis Iesu caracteriza-se como um manual prático que preconiza
métodos de ensino e orienta o professor na organização de sua aula.
Segundo Saviani (2008) o manual contém 467 regras, cobrindo todas as atividades
dos agentes envolvidos ao ensino. A tabela a seguir foi retirada no autor e, tem
como finalidade proporcionar um esboço das regras e normas instituídas no
documento.
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A) Regras do provincial 40
B) Regras do reitor 24
O) Regras do bedel 07
A partir desta tabela verificamos que o Plano de Estudo dos jesuítas inicia-se com
as regras do provincial, depois as regras do reitor, do prefeito de estudos, dos
professores em geral e de cada matéria de ensino em particular; contempla também
as regras da prova escrita, distribuição de prêmios, do bedel, dos alunos e por fim
as regras das diversas academias.
- Teologia Escolástica. 4 anos; dois professores, cada qual com 4 horas por semana.
- Teologia Moral. 2 anos; dois professores com aulas diárias ou um professor com
duas horas por dia.
- 2º ano – Cosmologia, Psicologia, Física - 2 horas por dia, Matemática – 1 hora por
dia.
- 3º ano – Psicologia, Metafísica, Filosofia moral – dois professores. 2 horas por dia.
- Retórica
- Humanidades
- Gramática Superior
- Gramática Média
- Gramática Inferior
Quanto ao horário Franca (1952) descreve que o Ratio dispõe 5 horas por dia de
estudos, sendo duas e meia pela manhã e as demais no período da tarde. O tempo
era minuciosamente distribuído entre o grego e o latim, a prosa e a poesia, e os
diversos exercícios escolares, preleção, lição, composição, desafio etc. A ordem
dos estudos poderia ser alterada de acordo com os costumes locais.
27
O latim era o centro do curso literário e com ele se ensinava o grego, a língua pátria,
a história, mas “entender os autores clássicos, falar corretamente o latim escrevê-lo
com elegância e primor ciceroniano era o alvo principal a que se dirigia o empenho
do mestre e os esforços do discípulo” (RODRIGUES, 1917, p. 42- 43).
Franca (1952) expõe que o curso iniciava pela gramática latina e subia pelos três
degraus da gramática ínfima, média e suprema, passando, posteriormente, para a
classe de humanidades e, por fim, para a retórica.
Por fim, na classe suprema procurava-se obter notícias completas dos preceitos e
elegância da gramática latina. No grego estudavam-se as regras gramaticais e
avançava nos estudos de Cícero.
CURSO DE FILOSOFIA
O ensino de filosofia que se propõe era baseado em uma linguagem pura, de bons
pensamentos e raciocínio legítimo, “visava directamente a formação scientifica da
intelligencia; mas, segundo o Ratio Studiorum, encaminhava-se a um fim moral e
religioso [...]” (RODRIGUES, 1917, p. 56). Ensinavam-se as matérias de lógica,
física e ciências naturais, como método, e os mestres utilizavam os autores
propostos pelo Ratio.
O curso completo de filosofia tinha duração de três anos com duas horas diárias de
lição, o estudo contemplava a matemática, as ciências naturais e o estudo da
meteorologia. No entanto, em Coimbra e Évora se estendia até ao quarto ano, em
que se preparavam os discípulos para o exame público. Miranda (2009, p. 32)
apresenta que:
No que se refere ao estudo da filosofia Miranda (2009) divulga que Portugal trouxe
contribuições notáveis com a obra de Pedro da Fonseca, considerado o Aristóteles
português, e principalmente com o chamado curso conimbricense9, que abriu novos
horizontes à filosofia.
CURSO DE TEOLOGIA
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Conforme Miranda (2009, p. 33) o curso conimbricense constitui em importantes expressões do
ambiente de Humanismo que então se vivia na cidade de Coimbra e no Colégio das Artes. Numa
opção pelo tomismo, os mestres conimbricences criavam uma escola de filosofia, com tradução,
comentários e transmissão da obra aristotélica, de método breve e claro. O curso conimbricense
reflete o método estabelecido no Ratio.
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O curso de Teologia tinha a duração de quatro anos, porém, aqueles que possuem
aptidão para o estudo deveriam permanecer por mais dois anos para aprofundar os
conhecimentos adquiridos e assim alcançarem a mais vasta erudição.
Miranda (2009, p. 33-34), no livro Código pedagógico dos Jesuítas, traz que as aulas
ocupavam seis dias semanais nos quais o Ratio previa horários para as lições de
cada classe, disciplina, exercícios e também para o estudo pessoal, deixando
sempre acessível à adequação aos costumes locais.
Quanto ao sábado, domingo e dias festivos a autora destaca que também havia um
horário próprio para o estudo, preenchido por disputas ou por repetições, discursos,
declamações de poesias e até mesmo preleções.
Para esses ajudantes do professor, existiam regras as quais deveriam ser cumpridas
como, por exemplo, obediência ao professor, em que seu dever era executar
fielmente tudo o que lhe era prescrevido. Sobre as aulas, deveria providenciar para
que tudo corresse adequadamente (que não falte assentos, cuidados com a limpeza,
concerto dos quebrados, cuidados com o início do horário das aulas, entre outros).
Levar ao conhecimento do Superior se os estudantes não comparecem às lições,
repetições, disputa ou deixam de cumprir algum dos deveres relativos ao estudo ou
disciplina (RATIO, 1952, p. 144).
Passamos assim dos processos didáticos aos estímulos pedagógicos utilizados nos
colégios da Companhia para incentivar a atividade dos alunos. Faz-se necessário
destacar que “os jesuítas não eram amigos dos castigos corporais. Não os
suprimiram de todo, mas alistaram-se decididamente entre os que mais contribuíram
para suavizar a disciplina” (FRANCA, 1952, p. 37). Nesse sentido, as próprias
Constituições da Companhia já estabelecem que “na medida do possível a todos se
trate com o espírito de brandura, de paz e de caridade”, princípio que foi conservado
pelo Ratio. Um exemplo pode ser percebido na regra 40 do professor das escolas
inferiores quanto ao modo de castigar:
Os castigos físicos eram aplicados em casos mais graves, quando as boas palavras
e exortações não fossem suficientes. Como afirma Rodrigues (1917, p.31) “não é
33
Contudo, se fosse necessário fazer uso dos castigos físicos era chamado um
corretor10 para aplicar a palmatória, cujos golpes não poderiam passar de seis,
nunca no rosto ou na cabeça, assim como, nunca em lugar solitário, mas sempre na
presença de pelo menos duas testemunhas. Franca (1952) aponta que não se tinha
em vista ferir ou humilhar o aluno e sim lhe causar uma pequena dor física que na
primeira idade era um meio eficiente de disciplinar.
Como os castigos físicos ficavam sempre como último recurso, uma vez que a regra
era recorrer aos sentimentos mais nobres da honra e da dignidade, a emulação
constitui em seu sistema uma das forças psicológicas mais eficientes. Pois o espírito
de competição era um excelente estimulador para os jovens assim:
No século XVI a situação do professor não era das melhores como apresenta
Franca (1952), pois por motivos econômicos ou por motivos morais a profissão caiu
em grande desprestigio e a situação deste profissional estava muito abaixo de sua
nobre missão. No entanto, a Companhia sempre esteve atenta à formação do
professor e, para modificar esta realidade, dedicou-se a formação reabilitadora do
mestre, realizando um progresso na educação e adiantando-se ao seu século.
Neste sentido, eram dedicados dois anos para a formação moral (primeira
preocupação da Companhia de Jesus), ou seja, a formação da alma própria em que
o futuro formador adquire o conhecimento próprio, o governo das paixões, o domínio
sobre as tendências impulsivas.
Concluído o magistério o mestre iniciava o ensino superior cuja preparação era mais
longa, sendo quatro anos para formação teológica e mais dois de especialização na
disciplina que irá ministrar no ensino universitário. No entanto, o Ratio, na regra
nove destinada ao Reitor, prescreve que após o término do curso de Filosofia e
37
Para que o futuro professor desfrute de uma melhor formação “é muito necessário
que se preparem em academias privadas” (RATIO, 1952, p. 76), neste sentido, em
1563 a 2ª Congregação Geral, em seu Decreto 9, apresenta que na medida do
possível todas as Províncias instituam uma Academia ou Seminário pedagógico
para a formação de seus mestres.
A Companhia de Jesus não foi à primeira Ordem criada, havia outras que a
precederam e tiveram suas origens também no espírito reformador do período.
Como argumenta Costa (2007, p. 30) é necessário entender, mesmo que
minimamente, o contexto histórico no qual o objeto de estudo está inserido para
apreendê-lo na sua totalidade.
De acordo com Costa (2007), no século XVI, nas províncias de Portugal e naquelas
ligadas ao reino lusitano, instituíram-se vários colégios. Na província do Brasil foram
construídos três colégios: o da Bahia (1556), o do Rio de Janeiro (1567) e o de
Pernambuco (1576).
açúcar, fazendas, por ser a estadia dos Governadores e Bispos e também por ser o
local que os irmãos enviados de Portugal prosseguiam seus estudos. Anchieta, em
1584, (1988, p.334) apresenta que
11
Em 1553, Nóbrega foi escolhido por Loyola, com a aprovação do rei português, como o primeiro
provincial da recém província jesuítica do Brasil. Participou da fundação das cidades de Salvador e
do Rio de Janeiro e também na luta contra os franceses, como conselheiro de Mem de Sá. Além das
suas viagens por toda a costa de São Vicente e Pernambuco, estimulou a conquista do interior e
convenceu os portugueses a não permanecerem apenas no litoral. Nóbrega foi o primeiro a dar o
exemplo, ao subir ao planalto de Piratininga, para fundar a cidade de São Paulo que viria a ser o
caminho para o sertão e para a expansão do território brasileiro. Por desavenças com os portugueses
que viviam no Brasil e por divergências com o provincial português, Nóbrega foi afastado do
provincialato em 1556. Passou o resto da sua velhice no colégio do rio de Janeiro, até sua morte, em
1570.
40
Leite (1938) descreve que quando Nóbrega foi pela primeira vez a Pernambuco, em
1551, pensou em ensinar meninos e instituir um seminário semelhante ao que
existia na Bahia e em São Vicente, mas sua ideia não foi adiante.
O autor afirma que as aulas começaram com entusiasmo, junto com o curso de ler e
escrever deu início ao curso de caso de consciência, não com a mesma
regularidade. Ficaram célebres as festas de abertura do ano letivo de 1573 a 1574,
dias dois e três de fevereiro:
2.ª – porque havia ali muita juventude para estudar e muito clero, que
precisava do estudo, para ouvir e resolver casos de consciência;
Em 1574, dois anos antes de o colégio ser instituído pelo Rei, contava-se com 92
alunos, sendo 32 de Humanidades, 70 do curso elementar. Esse número de alunos,
diz Leite ser extraordinariamente alto para a época. Alguns anos depois baixou a
frequência de estudantes, tornando a aumentar posteriormente. Em 1597 o P.
Cristovão de Castro, passando por Pernambuco, se espantou com a quantidade de
alunos em um colégio tão pequeno.
Todos os colégios deliberados pelo rei possuíam rendas para subsidiar suas
despesas, já as demais casas (em todas nessas casas existiam escolas de ler,
42
No Brasil, por exemplo, nos Colégios propriamente ditos, era por direito possuir
algumas aulas de ensino secundário, ao menos Gramática ou Humanidades. Leite
(1938, p. 72) afirma que
Leite (1938) apresenta que o Irmão António Blasques ensinou a primeira classe de
latim no Colégio da Baía em 1553. Posteriormente, a Gramática adotada no Brasil e
em todo o mundo foi a do Padre Manuel Álvares. No período do Renascimento
juntou-se ao estudo do latim o estudo da língua grega, contudo o latim ainda possuía
maior predomínio. No latim se escrevia todos os documentos científicos e se
traduziam as obras da antiguidade.
O curso de Letras na Bahia, desde seu início em 1553, tirando o breve período de
1560 quando faltaram os estudantes da Sé, nunca deixou de funcionar. A partir de
1564 com a oficialização do colégio da Bahia não consta interrupções, sempre
existiram as duas formas: Humanidades ou Gramática, sendo que, segundo Leite,
na maioria das vezes tinham ambas as classes.
43
Quanto ao horário das aulas, a princípio, duravam duas horas de manhã e duas
horas à tarde. Em 1579 aumentou-se meia hora a mais em cada período, contudo,
verificou-se que não era adequado devido o calor que se fazia na terra,
permanecendo, assim, o horário antigo. No ano de 1586, com o advento do P.
visitador Cristóvão de Gouveia que trouxe ordens de reorganização dos estudos
ficou estabelecido que “nas aulas de latim, escrever e Artes, se gastarão duas horas
e meia de manhã e outro tanto à tarde, começando no inverno às oito e no verão às
sete” (LEITE, 1938, p. 75).
O curso de Dialética e Teologia teve início em 1572, quatro anos após o pedido
realizado pela Congregação Provincial da Baía por uma faculdade destinada para
esses ensinos. Foi o primeiro curso de Artes (Filosofia e Ciências) no Brasil,
considerado mais elevado que o de Letras. Geralmente havia um curso de Artes a
cada quatro anos com duração em média de três anos. Iniciou em 1593 com 20
estudantes e, cinco anos mais tarde, contavam com 40. Como salienta Leite (1938,
p. 96), os anos de 1572 a 1575 são marcos na história da instrução luso-brasileira, já
que datam os primeiros graus de bacharel em Artes.
Segundo Leite (1938), no ano de 1589 uma estatística confirma os progressos nos
estudos. Os estudantes na Faculdade de Teologia eram um interno e cinco externos;
de estudos de Casos de Consciência (Teologia Moral), três internos e seis externos;
e do Curso de Filosofia (Artes) eram oito internos e dezesseis externos.
Leite (1938, p. 88) menciona que no final do século XVI nos três colégios (Bahia, Rio
de Janeiro e Pernambuco) encontravam-se um corpo docente respeitado de 12
professores, alguns deles graduados, capacitados para docência de Teologia, Artes
e Humanidades em qualquer parte do mundo. Contudo, no que se refere ao ensino
era necessário, além de bons professores, a disciplina nos colégios, o que no século
XVI era rigorosa, no Brasil menos do que na Europa.
Até o início do século XVI, para manter a ordem e a disciplina nos colégios eram
aplicados além de castigos de repreensão, reclusão ou privação de recreio os
castigos corporais. De acordo com Leite (1938), sobre os castigos corporais não é
encontrado na legislação da Companhia nada determinando expressamente para os
colégios no Brasil neste século, “a não ser que não recebessem açoites os
estudantes de 16 anos para cima, e não se castigassem por ninguém da
Companhia, mas pelo corretor [...] (p. 89-90).
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A educação é uma prática social, uma atividade humana e histórica que se realiza
nos múltiplos espaços da sociedade. São muitos, os significados da educação no
decorrer dos tempos e estes variam de acordo com o momento histórico, político e
econômico em que a educação está engendrada.
Toda sociedade define um modelo de homem a ser formado, um indivíduo ideal para
nela viver, definindo seus comportamentos, visões de mundo, crenças e valores,
muitas vezes a sociedade deposita na educação os anseios de ter respostas as suas
necessidades mais urgentes.
6. REFERÊNCIAS
FRANCA, Leonel. O método pedagógico dos jesuítas. Rio de Janeiro: Agir, 1952.
PAIVA, José Maria de. Colonização e Catequese. São Paulo: Arké, 2006.
PAIVA, José Maria de; BITTAR, Marisa; ASSUNÇÃO, Paulo de (Org.). Educação,
História e Culura no Brasil Colônia. São Paulo: Arké, 2007.