Rojo Letramentos
Rojo Letramentos
Rojo Letramentos
4.
GêneToscatalisadores
Inês Signorínijorg.l
ietramento e formação do professor
Roxane Rojo
14. L;brasa Que rírzgua é essa?
Audrei Gesser
Nestecapítulo,oleitorpoderá
detalhar mais e refletir sobre os
versãoforte efraca,na
+ perspectiva autónoma e ideológica,
e de letramentos (múltiplos,
multissemióticos, críticos). Poderá
R' E
quais as pessoas estão envolvidas.
l
FONTES das imagens:http://www.nysut.org/images/con- l Isso poderá despertarointeresse
tent/voice.080421.early.literacy14jpg, http://www.sfsh. Ç
org.pk/Women%20Literacy.htm, http://www.cloudbase. em viabilizar o diálogo entre
co.n z/2008/02/2 5/gra ffití-wa 11pa pe r-set-fo r'i phon e-i pod-to uc h/,
http://d ia riodono rdeste .globo. co m/ima ge m.asp?lma ge m =309060, os letramentos já apropriados
http://mandamarie.files. wordpress.com/2008/01/dscn0257jpg,
http://www.pembrokepublishers.com/ books/48a5a173044eejpg, pelos alunos com os letramentos
acesso em 20/01/2009.
privilegiados peia escola e os do
património cultural valorizado.
LETRAMENTO(S)
95
Letramento não é pura e simplesmente um conjunto de realizandono primeiro CDde rap com as letras em tupi de que setem no-
habilidades individuaisi é o conjunto de praticas sociais tícia. 'Fiquei interessadona sonoridadedaquelaspalavras', diz Renato.
!iradas à leitura e à escrita em que os indivíduos se
envolvem em seu contexto social (Sobres, lg98: 72). que se prepara para lançar, neste mês, as músicas de 'Kaumoda', que, em
Pode-se afirmctr que Q escola. a mais importante das
tupi. significa uma entidade espiritual maligna. O projeto só foi possível
agências de ]eframenfo, preocupa-se, não com o ]eframenfo, graças a uma inusitada mistura de um terreiro de umbanda com o rigor
pratica social, mas com apenas um tipo de prática de acadêmico da Universidade de São Paulo " ' -- práticas de letramento.
!etramento, a alfabetização, o processo de aquisição de
códigos (alfabético, numérico), processo geralmente Mas afinal que conceito é essetão complexo e diversificado que re-
percebido em termos de uma competência individual
necessária para o sucesso e promoção na escola. Já outras cobre desde a leitura escolar em voz alta de um texto escrito até um CD
agências de letramento, como a família, a igreja, Qrua como de rap em tupi, assessorado por um professor da USP.passando pelo uso
lugar de trabalho, mostram orientações de letramento muito
diferentes(Kieiman, 1995:20}.
de meios eletrânicos e digitais?
Nossapersonagem.professoraDou, entra na sala de aula, faz a Como diz Kleiman (1995: 15-16), "o conceito de letramento come-
çou a ser usado nos meios académicosnuma tentativa de separar os
chamada e em seguida pede a Tadeu que abra o livro na página 27 e leia
estudos sobre o 'impacto social da escrita' (Kleiman, 1989a)dos estudos
o texto em voz alta -- práticas de letramento.
sobre a alfabetização, cujas conotações escolares destacam as compe-
Josias, 22 anos, vestido com uma calça caqui esfarrapada e uma tências individuais no uso e na prática da escrita":
camiseta regata branca cheia de buracos, aproxima-se de meu carro pa-
Usamos até aqui o conceito de alfabefismo para designar o conjunto
rado no sinal e pendura no espelho um saquinho de balas de hortelã em
de competências e habilidades ou de capacidades envolvidas nos fitos
que há grampeado um bilhete com os seguintes dizeres: "Sou pai de de leitura ou de escrita dos indivíduos, conjunto esseque se diferencia
família e estou desempregado. Vendo balas para sustentar meus filhos.
e particulariza de um para outro indivíduo, de acordo com sua história
Compre um saquinho. Somente R$ 2,00" . Leio o bilhete e compro as ba-
de práticas sociais,e que pode, como vimos, ser medido e definido por
las -- práticas de letramento. níveis de desenvolvimentode leitura e de escl.ita.como fazem o INAF e
'os exames nacionais .
Suzana está sem dinheiro vivo na carteira e precisa comprar remédios.
De duas uma: ou vai ao caixa automático e segue as instruções na tela. ,4#abetbmo é um conceitobem mais antigo. Segundo Ribeiro(1997: 145)
digitando códigos alfanuméricos para retirar dinheiro vivo, ou vai direta-
o termo alíabetismo funcional foi cunhado nos EstadosUnidos na década
mente à farmácia e usa o cartão de crédito ou de débito. também seguindo
de 1930 e utilizado pelo exército norte-americano durante a Segunda Guer-
asinstruçõesda tela no temninal e digitando códigos alfanuméricos,para
ra. indicando a capacidade de entender instruções escutas necessáriaspara
realizar a compra sem precisar do dinheiro -- prát:ices de letramento. a realização de tarefas militares (Castell. Luke & MacLennan, 19861. A par-
"Tocadorde atabaque num terreiro de umbanda em Vila Medeiros. tir de então. o termo passou a ser utilizado para designar a capacidade de
na zona norte de São Pau]o, Renato ])ias ficou intrigado, certa noite. com
as frases balbuciadas, em aparente transe, por um guia espiritual. Dis- l Retirado de http://wwwl.folha.uol.com.br/folha/dimenstein/colunas/gd081106.
htm, acesso em 16/02/2008.
seram-lhe que talvez fosseuma língua indígena. Uma das entidades da
2 A autora ainda informa que o primeiro uso da palavra no Brasil. tradução literal do
umbanda é o caboclo, que representa o índio brasileiro. Independente- inglês de ]iferacy -- língua em que, aliás, recobre ao mesmo tempo os significados de
mente de quaisquer convicções religiosas. aquela cena acabou se mate- alfabetização e de letramento --, foi de Mary Kato, em seu livro de 1986.
LETRAMENTO(S) Ç1)9
Já a versão forte do letramento, para Sobres(1998),mais próxima
l lamienteinstituiçõeseducado-l l tos que circulam socialmente. de l
do enfoque ideológico e da visão paulo-freiriana de alfabetização, seria l naus.Leüamento, nessa perspec- l
revolucionária. crítica. na medida em que colaboraria não para a adap- l uva, é a competênciarequeridal :='=;==T*=.='=
:
tação do cidadão às exigências sociais. mas para o resgate da autoesti- l pma a parbcipaçãonessesdolní- l l nas mais variadas situações"l
ma, para a construçãode identidades fortes, para a potencialização de l nio privilegiados" l l (Brasi]/SEF/MEC,
(Olson.1994: 1998:19.ênfa-l
1274.ênfase adicionada). l jse adicionada). l
poderes (empoderamento,empowermenf) dos agentes sociais. em sua
cu[tura [oca[, na cu]tura valorizada. na contra-hegemoniaglobal (Souza- Um conhecimento mais profun- Letramentos são práticas so-
Santos,2005).Paratanto, leva em conta os múltiplos /eframenfos,sejam Versãoforte do da oralidade primitiva ou pri- ciais. plurais e situadas, que
mária pemüte-noscompreender combinam oralidade e escrita
valorizados ou não, globais ou locais. de formas diferentes em eventos
melhor o novo mundo da escrita.
o que ele verdadeiramente é e o de natureza diferente, e cujos
que os seres humanos funcional- efeitos ou consequências são
l
mente letrados realmente são condicionados pelotipo de prá-
Atividade tica e pelas finalidades específi-
seres cujos processos de pensa-
mento não nascem de capaci- cas a que se destinam. 'lhmbém
Enfoque autónomo e enfoque ideológico do letramento dades meramente naturais, mas podemosdizer que a definição
da estruturação dessas capaci- de duais letramentos são váli-
1. De acordo com a discussão feita sobre os enfoque do(s) letramento(s), preen- dades. direta ou indiretamente. dos como formas de 'inclusão
cha o quadro com as citações abaixo, avaliando em qual linha e coluna você pela tecnologiada escrita. Sem reflete os valores culturais e os
colocaria cada uma das citações:
a escrita. a mente letrada não hábitos linguísticos dos grupos
pensariae não poderia pensar mais poderosos no contexto so-
ENrOQUEAUTONOMO KNFOQUEiOEOLOOICO como pensa. não apenas quando cial em que são praticados.e
se ocupa da escrita. mas normal- que a aquisiçãodos letramen-
Embora um indivíduo possa ter Assim. um projeto educativo
Versãofraca mente. até mesmo quando está tos dominantes por grupos su-
a competência
requeridapara comprometido com a democra-
compondo seus pensamentos de balternos pode constituir-se um
participar de quaisquer comuni- tização social e cultural atribui à
forma oral. Mais do que qual- processo conflituoso e simboli-
dades de texto ou de letramento. escola afunção e a responsabili-
quer outra invençãoindividual. camente violento, cujas reper-
é preciso também admitir o fato dade de contribuir para garantir a escrita transformou a consci- cussões são muito pouco previ-
de que qualquer sociedade está a todos os alunos o acessoaos
ência humana" (Ong, 1982: 93, síveis"(Buzato, 2007: 153-154,
organizadae tomo de um corpo saberes linguísticos necessários
ênfase adicionada). ênfase adicionada).
de crenças. por vezes expressas para o exercício da cidadania.
numa forma textual, cujo acesso Essa responsabilidade é tanto
é uma fonte de poder e de pJ'es- maior quanto menor for o grau
tágio. Numa sociedade bulrocráti- de letramento das comunidades A citação 4, de Ong, foi qualificada como um enfoque autónomo em versão forte
ca. as questões legais, religiosas, em que vivem os alunos..Con- pois atribui à escrita, de maneira autónoma, isto é, por ela mesma, mudanças na
políticas. científicas e literárias siderando os diferentes níveis consciência.na cognição e na linguagem humana. Já a citação 1. de Olson, seria
constituem esse domínio privile- de conhecimento prévio, cabe à uma versão fraca do enfoque autónomo, pois já relativiza a autonomia da escrita e de
giado, e o acesso e participação escola promover sua ampliação, suas relações com a distribuição do poder e a hierarquia social e com as instituições.
nesses domínios define uma for- de forma que. progressivamente, Ainda assim. enfoca o letramento como uma competência adquirida para funcionar
ma particular de letramento. E o durante os oito anos do ensino em determinadas instituições. A citação 3. retiradas dos PCN de ensino fundamental
ljpo de leüamento que conceme fundamental, cada aluno se tome n (BRASIL/SEF/MEC, 1998),foi considerada uma versão fraca do enfoque ideológico,
às instituições públicas, parücu- capaz de inteipretm diferentes tex- pois, embora fale em democratização social e cultural, ainda vê a escola com o papel
sas lmprevtsiveis.
cial da mídia digital para outras esferas de comunicação,como um "ataque à
Street (2003: 77),
língua portuguesa". Veja, por exemplo, a posição da Prof' Elenice a respeito,
implica o reconhecimento dos múltiplos letramentos. que variam no tempo publicadanojornal santista 4 Irít)una, em 30/05/2005:
e no espaço, mas que são também contestados nas relações de poder. As-
sim. os Ni.snão pl'essupõem coisa alguma como garantida em relação aos Para a professora Elenice Rodrigues Lorenz, de língua portuguesa, li-
letramentos e às práticas sociais com que se associam. problematizando teratura e produçãotextual, o problema está na carência do domínio
aquilo que conta como letramento em qualquer tempo-espaçoe interro- da língua materna. "As pessoas não leem, não procuram ampliar seu
gando-se sobre "quais letramentos" são dominantes e quais são mal-finali-
vocabulário, erram na regência e na concordância das frases e das pa-
zados ou de resistência (ênfase adicionada).
lavras; têm dificuldade de conectar ideias e de interpretar textos". Para
Nesse movimento, o conceito de letramento passaa ser plural: letra- Elenice,portanto, a preocupaçãoé "adotar" o internetês como único
mentoS. Hamilton (2002: 4) chama os letramentos dominantes de "ins- recurso escrito alternativo, exatamente por ser simplificado e pobre
tituciona[izados" e os distingue dos ]etramentos locais "vernacu]ares " de regras gramaticais e ]inguísticas. [-.] "Não há condições de tolerar
(ou "autogerados"). Entretanto, não os vê como categorias independen-
o desrespeitoao idioma, principalmente dentro da sala de aula. Uma
tes ou radicalmente separadas, mas interligadas. Para a autora. os /efra-
coisa é usar gírias e internetês na informalidade e com amigos. Outra é
menfos dominantes estão associadosa organizaçõesformais tais como
levar esses vícios para toda a comunicação", argumenta Elenice.
a escola. as igrejas, o local de trabalho. o sistema legal, o comércio, as
burocracias. Os letramentos dominantes preveem agentes (professores, (Retirado de http://www.novomilenio.inf.br/idioma/20050530.ht
autores de livros didáticos, especialistas, pesquisadores, burocratas, pa- acesso em 21/02/2008, ênfase adicionada).
dres e pastores, advogados e juízes) que. em relação ao conhecimento,
são valorizados legal e culturalmente. são poderososna proporção do
poder da sua instituição de origem. Já os chamados ]eframentos "verna- Como vemos, o internetês é classificado como desrespeito ao íd/oma, vibío. um
cuJares" não são regulados, controlados ou sistematizados por institui- estilo de língua escrita simp/ificado e "pobre de regras gramaticais e linguísticas
ções ou organizações sociais, mas têm sua origem na vida cotidiana. nas jcomo se isso pudesse existir). Na verdade, o internetês é uma linguagem social
adaptada à rapidez de escrita dos gêneros digitais em que circula -- bate-papoem
chats, comunicação síncrona por escrito em ferramentas como MSN e l)/ogs.
4 Texto baseado em Rojo (2008a)
a) [VC VEIN AK] EM KAZA CM KEM E KDO? TRAZ XOCOLATE Justifique sua resposta
E + CERVEJA? AXO O NAUM TENHO + BLZ?
Os novosestudosdo letramento têm se voltado em especialpara os
b) Daniel: koeh blz mlk ??? lebamentos locais ou vemaculares, de maneira a dar conta da heretogenei
Pedro:blz e cntgu ??? dade das práticas não valorizadas e. portanto, pouco investigadas. No en
Daniel: manerow, mas i aew cmu vai a vida??? tanto, cabe também uma revisão dos letramentos dominantes na contem-
Pedro: tenhu idu a praia e saído com ms amigusl poraneidade. em especial dos letramentos escolares, por diversas razões.
Daniel: lgl kra, valewl
Em primeiro lugar. por causa de como se apresenta o mundo contem-
3 Você deve ter percebido que um dos prin-
Tente montar um glossário com as porâneo. Podemos dizer que. por efeito da globalização, o mundo mudou
cipais mecanismosé o da abreviação na
palavras do internetês e suas cor- escrita de palavras, mas também se evi- muito nas duas últimas décadas.Em ternos de exigências de novos le-
respondentes da escrita padrão. ta a acentuação, simula-se a língua oral tramentos, é especialmente importante destacar as mudanças relativas
Qual o principal mecanismo que em registro coüdiano e infomial, usam-se
aos meios de comunicação e à circulação da informação. O surgimento e
linguagem e sírias de grupo, simulando
opera no internetês, na sua opi- uma conversaface a face. Atende-se a a ampliação contínua de acessoàs tecnologias digitais da comunicação e
nião? Por quê? A que necessida- váüas necessidades da "conversa" pela da infomnação (computadores pessoais, mas também celulares, tocadores
des atende? intemet: escrever rapidamente em situa- de mp3, ws digitais. entre outras) implicaram pelo menos quatro mudan-
ção síncrona. isto é, quando duas pessoas
4 Considere palavras como vc, CM, Q, fazem a mesma coisa -- conversam -- ao ças que ganham importância na reflexão sobre os letramentos=
BLZ,MLK, CNTGU,MS, LGL,KRAs e os sím- mesmo tempo, não deixar o interlocutor e a vertiginosa ínfensiHcaçãoe a diversi#cação da cü'colação da infor-
bolosou "emotivos" como +, v6, D+, esperando, simplifica o uso do teclado,
estabelecercontatomais íntimo e fami- mação nos meios de comunicação analógicos e digitais, que, por isso
) (S)etc. Lembrando a breve histó- lim, informal com o interlocutor, circuns- mesmo. distanciam-se hoje dos meios impressos. muito mais moro-
ria da escrita que fizemos no capí- crever uma identidade de grupo. sose seletivos.implicando, segundo alguns autores (cf., por exemplo
tulo 4, você considera essa escrita Chartier. 1997i Beaudouín. 2002), mudanças significativas nas ma-
como mais próxima do alfabeto, do O intemetês mescla recursos dos três, neiras de ler, de produzir e de fazer circula textos nas sociedadesi
silabário ou do ideograma/picto- por vezes usando ideogramas ou mes- e a diminuição das distancias espaciais -- tanto em termos geográfi-
grama?Justifiquesua resposta. mo pictogramas, por vezes funcionan- cos. por efeito dos üansportes rápidos, como em termos culturais e
do como silabário, por vezes utilizando
5 Considerando as propriedades do a escrita alfabética e também recursos
infomiacionais, por efeito da mídia digital e analógica. desenraizan-
internetês que analisou, você diria de apreensãoda língua oral antes re- do as populações e desconstruindo identidadesi
que: servados à transcrição fonética, como e a diminuição das distâncias temporais ou a confraçãodo tempo
CNTGU,
CMg.ioy. Portanto. exige. da par- deten:ninadaspela velocidade sem precedentes, a quase instanta-
a) O internetês deve permane te de quem escreve.bastanteanálise neidade dos transportes, da infomxação, dos produtos culturais das
cerfora das salas de aula. linguística e consciência fonológica.
mídias. características que também colaboram para mudanças nas
práticas de letramento;
5 Parasabermais.ver o "glossário do MSN" em anexono fim do livro; ver http://www. e a mulfissemioseou a mulüphcidadede modosde significar que as
revistaenfoque.com.br/ index.php?edicao=56&materia=334. acesso em 21/02/2008 possibilidades mulümidiáticas e hipertnidiáticas do texto eletrânico
O ensino das disciplinas verbais conhece duas modalidades básicas esco- O movimento de localização é visível tanto no campo político-eco-
lar'es de transmissão que assimila o discurso de outrem (do texto, das regras, nómico, nas "novas" formas de organização da sociedade civil em orga-
dos exemplos): "de cor" e "com suas próprias palavras". ]...] O objetivo da nizações não-governamentais (ONGS),associações,cooperativas. dentre
assimilação da palavra de outrem adquire um sentido ainda mais profundo outros, como principalmente, no campo cultural e das identidades, por
e mais importante no processode fomtação ideológica do homem. no sen-
tido excitodo tempo.Aqui. a palavra de outrem se apresentanão mais na
9 Acessehttp://br.youtube.com/watch?v=hRjsOBle58Upara ver uma paródia que dá
qualidade de infom:rações,indicações. regras, modelos etc. ela procura o que pensar a respeito dos efeitos da globalização
«3
meio das identificações comunitárias agregadas a interesses comuns ou Neste sentido. o papel da escola na contemporaneidade seria o
a produção das culturas locais. Fenómenos desse tipo são encontrados de colocar em diálogo -- não isento de conflitos. polifónico em termos
tanto nas comunidades locais, como. principalmente. nas virtuais. Sendo bakhtinianos -- os textos/enunciados/discursos das diversas cu]turas lo-
os ambientes digitais interativos e pouco controlados. prestam-se a no- cais com as culturas valorizadas, cosmopolitas. patrimoniais, das quais é
vas formas de sociabilidade. Assim. as armas da globalização fortalecem guardiã. não para servir à cultura global, mas para criar coligaçõescon-
os laços e as contra-hegemonias da localização. A isso, Souza-Santos tra-hegemónicas, para translocalizar lutas locais. Como gosto de dizer.
(2005) vai chamar de globalização ou coligação contra-hegemónica. para transformar pafrimõnios em frafrimónios. Nesse sentido. a escola
pode formar um cidadão flexível, democrático e protagonista. que seja
[qa verdade. há duas formas de resistência: a localização assumida multicultural em sua cultura e poliglota em sua língua.
ou seja. o fomento a iniciativas locais de vários tipos ao redor do mun-
do, por meio de "espaçosde sociabilidade em pequena escala.comuni- Cabe. portanto. também à escola potencializar o diálogo multicultu-
ral. trazendo para dentro de seus muros não somente a cultura valoriza-
tários [...], regidos por lógicas cooperativas e participativos e a globali-
zação ou coligação contra-hegemónica" (Souza-Santos, 2005: 72), que da, dominante. canónica. mas também as culturas locais e populares e a
não se baseia no incremento e na proteção do local enraizado embora cultura de massa. para torna-las vozes de um diálogo, objetos de estudo
e de crítica. Para tal, é preciso que a escola se interesse por e admita as
não negue seu va]or estratégico, designando-o como localização contra-
culturas locais de alunos e professores.
hegemõnica --, mas no que ele chama de as "iniciativas. organizações
e movimentos integrantes do cosmopolitismo e do património comum Culturas locais
da humanidade. com vocação transnacional" , mas ancoradas em "lutas
locais concretas. [...] O global acontece localmente. E preciso fazer com
que o local contra-hegemónico também aconteça globalmente" (p. 74). Culturas valorizadas
Logo, duas armasa favor da construçãoda coligaçãocontra-he-
gemónica seriam justamente a escola e as tecnologias digitais. Por um
lado, novamenteaqui, são cruciais os letramentos críticos que tratam Culturas escolares
os textos/enunciados como materialidades de discursos, carregados de Figura 2: Multículturalismo e multa-ou transletramentos
apreciações e valores, que buscam efeitos de sentido e ecos e resso-
nâncias ideológicas. É preciso, portanto. um reenfocar do texto, fora da
escola. mas principalmente nela. por sua vocação cosmopolita, por sua
capacidade de agendamento de populações locais na direção do univer-
sal, dos patrimónios da humanidade. Letramentos múltiplos e multissemióticos na esfera da arte
popular -- o desfile de Escola de Samba
Mas também é muito importante um possível outro caminho
criar inteligibilidade recípl'oca entre as diferentes lutas locais, aprofundar 1. Em 2008, uma escola de samba da zona leste paulistana, Grêmio Recreativo
o que têm em comum de modo a promovem'o interesse em alianças translo- Cultural Escola de Samba Nenê de Vila Matilde, levou ao Sambódromo de São
cais e a criar capacidadespara que essaspossamefetivamenteter lugar e Paulo um enredo em homenagem a Luís da Câmara Cascudo, o professor que
prosperar(Souza-Santos, 2005: 74). não gostava de ser chamado de folclorista. Leia a letra do samba-enredo:
«5
O modo de agir, sentir e pensar(â potiguar)
Câmara Cascudo mostrou para o mundo
Ofolclore popular
Brasil da miscigenação, nosso povo estende as mãos
Vamos mestiçar
Costumes do nordeste... Oxente, cabra da peste
Vem pro forró dançar, poeira levantar
Maracatu, festa junina
Boi-Bumba no Norte, Parintins, o ponto nobre
Pro mau olhado tem reza forte
O pajé pode salvar
Ferraduras e carrancas... Patuás
Quem foi que deixou o espelho se quebrar?
No Centro-Oestenão pesque sem oração (porque)
Assombração vai te pegar
«9
e Os ]etramenfos mulficuJfurais ou mu/tiletramentos. ou seja, abordar possibilidades de aprendizagem. revozeando o conceito vygotskiano de
zona proximal de desenvolvimento (zpo). As possibi.cidades de apren-
os produtos culturais letrados tanto da cultura escola e da dominan-
te. como das diferentes culturas locais e populares com as quais alu- dizagem respondem à pergunta sobre quais objetos de ensino o aluno
poderá aprender. de quais poderá se apropriar nesse momento do seu
nos e professores estão envolvidos, assim como abordar criticamen-
desenvolvimento (zpo).Não posso querer ensinar a leitura de um edito-
te os produtosda cultura de massa.Essatriangulaçãoque a escola
pode fazer, enquanto agência de letramento patrimonial e cosmo- rial complexo se meu aluno ainda não lê uma notícia simples. É preciso
polita. enfie as culturas locais. global e valorizada é particularmente .averiguar seu trato com os objetos de ensino propostos. diagnosticar,
importante -- em especial no Brasil --(!uando reconhecemos a rele- para verificar aquilo que é ensinável.
vância de se foliar um aluno ético e democrático. crítico e isento de
No entanto, entre osmuitos "ensináveis" , tenho de escolheralguns.
preconceitos e disposto a ser "multicultural em sua cultura" e a lidar E essaescolhapoderá ser regida pelo princípio das necessidadesde en-
com as diferenças socioculturais.
sino, que respondem à pergunta: para essesalunos, dessa escola, dessa
e Os ]eframentos críticos, ou seja, abordar essestextos e produtos das
comunidade de práticas, visando formar um cidadão com tais caracterís-
diversas mídias e culturas. sempre de maneira crítica e capaz de des-
ticas, que gêneros e esferas escolher dentre os ensináveis? Na dependên-
velo suas finalidades, intenções e ideologias. Nesse sentido, é im- /