A Multivocalidade Da Arqueologia Publica
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A MULTIVOCALIDADE DA ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL:
Comunidades, práticas e direitos
Reitora
Luciane Bisognin Ceretta
Vice-Reitor
Daniel Ribeiro Preve
Pró-Reitora de Ensino de Graduação
Indianara Reynaud Toreti Becker
Pró-Reitor de Pós-Graduação, Pesquisa e Extensão
Oscar Rubem Klegues Montedo
Pró-Reitor de Administração e Finanças
Thiago Rocha Fabris
2 Conselho Editorial
Dimas de Oliveira Estevam (Presidente)
Ângela Cristina Di Palma Back
Fabiane Ferraz
Marco Antônio da Silva
Melissa Watanabe
Merisandra Côrtes de Mattos Garcia
Miguelangelo Gianezini
Nilzo Ivo Ladwig
Reginaldo de Souza Vieira
Ricardo Luiz de Bittencourt
Richarles Souza de Carvalho
Samira da Silva Valvassori
Vilson Menegon Bristot
A MULTIVOCALIDADE DA ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL:
Comunidades, práticas e direitos
Editora da UNESC
Editor-Chefe: Dimas de Oliveira Estevam
Dados Internacionais
Dados Internacionaisde
deCatalogação naPublicação
Catalogação na Publicação
M961 A multivocalidade da arqueologia pública no Brasil [recurso
eletrônico] : comunidades, práticas e direito / Juliano
Bitencourt Campos, Marian Helen da Silva Gomes
3 Rodrigues, Pedro Paulo Abreu Funari, organizadores. –
Criciúma, SC : UNESC, 2017.
276 p. : il.
ISBN: 978-85-8410-082-8
DOI: http://dx.doi.org/10.18616/arq
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A MULTIVOCALIDADE DA ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL:
Comunidades, práticas e direitos
(ORGANIZADORES)
Criciúma
UNESC
2017
A MULTIVOCALIDADE DA ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL:
Comunidades, práticas e direitos
Piauí, onde realiza trabalhos relacionados à Costa Norte (Ceará, Piauí, Maranhão
e Pará) com concentração na área de ocupação dos índios Tremembés. Trabalha
com arqueologia colaborativa, desenvolvendo projetos junto aos Tremembés de
Almofala (CE), articulando arqueologia, história, memória, patrimônio cultural e
educação diferenciada indígena. Atuou como professora do Magistério Indígena
Tremembé Superior, primeira licenciatura intercultural do Nordeste a ser realiza-
da inteiramente nas comunidades indígenas. E-mail: [email protected]
NOTA DOS(AS)
ORGANIZADORES(AS)
ARQUEOLOGIA PÚBLICA: DIÁLOGOS SOBRE
EXPERIÊNCIAS E PRÁTICAS NO BRASIL
Boa Leitura!
Juliano Bitencourt Campos
Marian Helen da Silva Gomes Rodrigues
Pedro Paulo Abreu Funari
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A MULTIVOCALIDADE DA ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL:
Comunidades, práticas e direitos
PREFÁCIO I
Dr. Lúcio Menezes Ferreira
Laboratório de Estudos Interdisciplinares de Cultura Material/UFPEL
Pesquisador do CNPq
Desde que surgiu nos anos 1990, a arqueologia pública recebeu diver-
sas críticas. Algumas delas, inclusive, destilaram o sabor azedo das diatribes.
Foi o caso, por exemplo, do arqueólogo social Felipe Bate, ao ironizar a arqueo-
logia pública como simultaneamente democrática e comovedoramente pater-
nalista. A partir dos anos 2000, contudo, reformularam-se as metodologias da
arqueologia pública. Deram-lhe novos adjetivos para ressignificar suas práticas
de pesquisa: arqueologia comunitária, arqueologia colaborativa, arqueologia
participativa, arqueologia multivocal, dentre outras.
Mais recentemente ainda, uma nova onda crítica, cujas oscilações ad-
vieram de contextos periféricos, notadamente sul-americanos, atingiu em cheio
18 a arqueologia pública (e a arqueologia em geral). Criaram-se, uma vez mais,
novos adjetivos para conceituar a disciplina – ou para afastar-se radicalmente
dela. Intitularam-se como arqueologia relacional, arqueologia simétrica e, até
mesmo, arqueologia indisciplinada!
Essas novas disciplinas, ao criticarem a arqueologia pública, repousam
numa premissa teórica que se convencionou designar como “virada ontológi-
ca”. Procuram questionar os fundamentos modernos da disciplina e considerar
simetricamente as ontologias humanas e não humanas. Ainda percorrendo a es-
teira da “crise da representação” dos anos 1980, essa reinvenção contemporâ-
nea da arqueologia pública intenta abalar alguns dos fundamentos ontológicos
que constituíram historicamente a disciplina: a lógica da modernidade capita-
lista, o tempo linear e teleológico, as políticas logocêntricas e etnocêntricas de
preservação do patrimônio cultural e o primado do passado como seara única
da arqueologia.
Por mais plural que possam ser essas arqueologias, elas, assim como
os autores desta obra, recapitulam a pergunta que Rebeca Panameno e Enrique
Nalda lançaram no final dos anos 1970: “Arqueologia para quem?”. Valendo-se
de métodos e abordagens diversas, autores e autoras deste volume partilham
A MULTIVOCALIDADE DA ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL:
Comunidades, práticas e direitos
uma resposta similar: “para aqueles que veem a arqueologia como uma manei-
ra de criar benefícios coletivos”. Assim, na diversidade que os atravessa, os dife-
rentes capítulos deste livro mostram as comunidades no centro do palco. Como
no teatro de Augusto Boal, as comunidades são vistas, aqui, como protagonistas
e poetas. Afinal, como disse Haroldo de Campos, “O povo é o inventa línguas”.
Ele percebe e constrói paisagens e coisas, sem fetichização, sem apartá-las dos
fluxos e articulações que as formam. E à arqueologia, como nos ensinam os au-
tores e autoras desta obra, cabe misturar-se ao vernáculo do povo, tanto para
pensar-se como para reinventar-se. Seja lá que adjetivação usemos para carac-
terizá-la, a arqueologia, como a vemos estampada neste livro, pretende trans-
formar a disciplina como prática engajada e ativista junto às comunidades.
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A MULTIVOCALIDADE DA ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL:
Comunidades, práticas e direitos
PREFÁCIO II
Dr. Luiz Oosterbeek
Secretário-Geral da União Internacional das Ciências Pré-Históricas e
Proto-Históricas
Professor Coordenador do Instituto Politécnico de Tomar – Portugal
Investigador principal do Grupo de Quaternário e Pré-História do Centro de
Geociências da Universidade de Coimbra
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A MULTIVOCALIDADE DA ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL:
Comunidades, práticas e direitos
PREFÁCIO III
Dr. Alfredo González Ruibal
Consejo Superior de Investigaciones Científicas (CSIC), Espanha
isso não seja sempre reconhecido. A educação virou, algumas vezes, fenôme-
no negativo, associado ao autoritarismo e ao imperialismo epistêmico. O que a
arqueologia precisa hoje é outra forma de educação, na qual o Brasil está a se
converter em um referente: uma pedagogia crítica, na linha de Paulo Freire, ba-
seada no diálogo, na interação entre mestre e aluno, na preocupação pelo ou-
tro, na aprendizagem mútua. A arqueologia pública tem que ensinar com humil-
dade e estar pronta sempre para escutar, com a certeza de que o conhecimento
que pode oferecer é valioso cientificamente e, acima de tudo, socialmente. A
verdadeira educação, como a verdadeira multivocalidade, consiste em fazer re-
tornar às comunidades que ficaram marginadas na produção e no usufruto do
patrimônio o que é delas, legal e moralmente. Mas essa não é uma tarefa fácil,
porque esse retorno tem que ter instruções de uso. É nessa tarefa que estão
envolvidos vários dos autores deste volume, ou seja, na produção de instruções
que permitirão às coletividades recuperarem o que, por direito, é delas. Tais
instruções, no entanto, não devem ser escritas unicamente pelos arqueólogos:
eles têm que escutar as pessoas, as coisas e a paisagem para compreenderem
valores culturais, naturais e espirituais que, às vezes, ficam longe da especiali-
dade – da ontologia mesmo – do pesquisador. Essa atitude de escuta também
23 está evidente no livro.
O terceiro eixo da obra, junto com a multivocalidade e a educação, é a
comunicação. Ela também é o terceiro pilar da arqueologia pública. Enquanto
a multivocalidade convida coletivos marginados a participarem na construção
da memória comum, a educação forma cidadãos críticos, especialmente jovens
gerações. Já a comunicação é a forma pela qual a arqueologia participa na pro-
dução cultural em um nível mais amplo. Os novos meios de comunicação são
um aliado fundamental. Nesse sentido, os arqueólogos os empregam cada vez
mais para dar a conhecer as suas pesquisas e engajar públicos mais amplos,
porque as comunidades não são apenas aquelas que moram ao lado dos sítios
arqueológicos – embora as que moram sejam as mais importantes do ponto
de vista social –, elas pertencem também a uma comunidade ampla e virtual.
Sendo assim, todos aqueles interessados no passado e no patrimônio fazem
parte desse público, no sentido de “conjunto de pessoas que se interessa por
algo”. Ao mesmo tempo, muitas das plataformas on-line oferecem ferramen-
tas de análise, que permitem conhecer melhor os nossos públicos. Como as-
sinalam os colaboradores deste livro, a comunicação é muito mais que contar
A MULTIVOCALIDADE DA ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL:
Comunidades, práticas e direitos
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A MULTIVOCALIDADE DA ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL:
Comunidades, práticas e direitos
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO
ARQUEOLOGIA PÚBLICA: DIÁLOGOS SOBRE EXPERIÊNCIAS E 27
PRÁTICAS NO BRASIL
Renata Senna Garraffoni
CAPÍTULO 1
REVISITANDO UMA DISCUSSÃO SOBRE ARQUEOLOGIA, 32
IDENTIDADE ÉTNICA E DIREITOS TERRITORIAIS DOS POVOS
INDÍGENAS NO BRASIL
Jorge Eremites de Oliveira
CAPÍTULO 2
DAS TAPERAS DOS ÍNDIOS ANTIGOS AOS SÍTIOS: APROPRIAÇÕES 76
DO PATRIMÔNIO ARQUEOLÓGICO ENTRE OS TREMEMBÉS DE
25
ALMOFALA (CEARÁ)
Jóina Freitas Borges
Sebastião Ovildo dos Santos
José Getúlio dos Santos
CAPÍTULO 3
PARQUE NACIONAL SERRA DA CAPIVARA E COMUNIDADE LOCAL: 96
EDUCAÇÃO, VALORIZAÇÃO, FRUIÇÃO SOCIAL E PERSPECTIVAS
FUTURAS – O CASO DO MUNICÍPIO DE CORONEL JOSÉ DIAS (PI)
Marian Helen da Silva Gomes Rodrigues
CAPÍTULO 4
ARQUEOLOGIA PÚBLICA E PATRIMÔNIO NAS ESTEARIAS: 123
DIÁLOGO ENTRE A CIÊNCIA, A COMUNIDADE E A ESCOLA
Alexandre Guida Navarro
João Costa Gouveia Neto
A MULTIVOCALIDADE DA ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL:
Comunidades, práticas e direitos
CAPÍTULO 5
OS VALORES CULTURAIS E ESPIRITUAIS NA GESTÃO DE ÁREAS 146
PROTEGIDAS: ENFOQUES E OLHARES SOB A PERSPECTIVA
AMBIENTAL
Isabela Barbosa Frederico
CAPÍTULO 6
EM BUSCA DO PATRIMÔNIO CULTURAL (IN)VISÍVEL: O CABOCLO 167
DA REGIÃO DO CONTESTADO
Carlos dos Passos Paulo Matias
Delmir José Valentini
Juliano Bitencourt Campos
CAPÍTULO 7
A PRESERVAÇÃO CULTURAL COMO CAMPO DE PESQUISA 191
Tobias Vilhena de Moraes
CAPÍTULO 8
26
COMUNICANDO A ARQUEOLOGIA: DISCUTINDO O PAPEL DA 208
SOCIEDADE DE ARQUEOLOGIA BRASILEIRA
Glória Tega
Flávio Calippo
Marcia Bezerra
CAPÍTULO 9
A VARIÁVEL ARQUEOLÓGICA NO LICENCIAMENTO AMBIENTAL 226
Inês Virgínia Prado Soares
ÍNDICE ONOMÁSTICO
264
A MULTIVOCALIDADE DA ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL:
Comunidades, práticas e direitos
APRESENTAÇÃO
ARQUEOLOGIA PÚBLICA: DIÁLOGOS SOBRE
EXPERIÊNCIAS E PRÁTICAS NO BRASIL
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CAPÍTULO 1
REVISITANDO UMA DISCUSSÃO SOBRE
ARQUEOLOGIA, IDENTIDADE ÉTNICA E
DIREITOS TERRITORIAIS DOS POVOS
INDÍGENAS NO BRASIL
32
DOI: http://dx.doi.org/10.18616/arq01
SUMÁRIO
CAP. 1
A MULTIVOCALIDADE DA REVISITANDO UMA DISCUSSÃO SOBRE
ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: ARQUEOLOGIA, IDENTIDADE ÉTNICA E DIREITOS
Comunidades, práticas e direitos TERRITORIAIS DOS POVOS INDÍGENAS NO BRASIL
Até fins do século XX, discussões a respeito das relações entre arqueo-
logia, identidade étnica e direitos territoriais dos povos indígenas eram escassas
no Brasil. À época, prevalecia a ideia de que a maioria dos arqueólogos estuda-
ria os “índios mortos”, ao passo que etnólogos, linguistas e outros profissionais
trabalhariam com os “índios vivos”. Essa dicotomia simplifica questões episte-
mológicas demasiadamente complexas, minimiza a responsabilidade social e
a ética na prática arqueológica e, consequentemente, favorece um processo
de alienação em relação à situação histórica dos povos originários no tempo
presente. Chama ainda a atenção para a colonialidade que caracteriza o pro-
cesso de institucionalização do campo da arqueologia no Ocidente, verificado
especialmente a partir do século XIX, sob a égide de percepções eurocêntricas,
evolucionistas e nacionalistas acerca do mundo e da humanidade. Soma-se a
isso uma grande influência da presença dos Estados-nações e do colonialismo
interno característico de cada país. Nesse contexto mais amplo está situada a
legislação brasileira, voltada ao reconhecimento, à proteção, ao estudo e ao
uso do patrimônio arqueológico, concebida em desconsideração aos sistemas
jurídicos originários, o que dificulta a prevalência de um pluralismo jurídico para
tratar do assunto. Esse é o caso, apenas para exemplificar, da ideia de que o
33 patrimônio arqueológico relativo ao passado dos povos indígenas é um bem
estatal e, como tal, deve permanecer sob a tutela de órgãos governamentais,
bem como de pessoas e instituições por eles autorizadas.
Posteriormente, a partir de meados do século XXI, devido a um conjun-
to de fatores que favoreceu o crescimento quantitativo e qualitativo do campo
da arqueologia, o cenário apresentado começou a mudar. Essa transformação,
acompanhada de novos desafios, dilemas e perspectivas, impulsionou o surgi-
mento de brisas descolonizantes, que passaram a soprar em muitas direções.
Por conseguinte, assuntos relativos aos interesses e aos direitos dos povos in-
dígenas se tornaram recorrentes na prática de alguns arqueólogos, como veri-
ficado nos trabalhos de Pereira da Silva (2014 [2007]), Bespalez (2009, 2014),
Stuchi (2010) e Wanderley (2016 [2013]), dentre outros. Tais estudos foram ori-
ginalmente apresentados para a conclusão de cursos de pós-graduação stricto
sensu e remetem, portanto, ao papel da academia na promoção de mudanças
de nuance e a eventuais viradas ontológicas na arqueologia e em outras ciências
sociais.
Com o propósito de trazer essa discussão para um estudo de caso
localizado no Brasil profundo, apresento a análise revisitada sobre uma situa-
CAP. 1
A MULTIVOCALIDADE DA REVISITANDO UMA DISCUSSÃO SOBRE
ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: ARQUEOLOGIA, IDENTIDADE ÉTNICA E DIREITOS
Comunidades, práticas e direitos TERRITORIAIS DOS POVOS INDÍGENAS NO BRASIL
ção pontual observada em Mato Grosso do Sul, qual seja: a existência de uma
perícia arqueológica feita em 2000 para a Justiça Federal, na qual problemas
relativos à associação direta entre cultura material e identidade étnica reme-
tem a questões que superam os debates acadêmicos intramuros. Trata-se, es-
pecificamente, do laudo judicial elaborado por um conhecido arqueólogo sobre
a Terra Indígena Sucuri’y, uma das áreas de onde famílias indígenas foram ex-
pulsas na segunda metade do século XX, embora algumas tenham retornado
ao lugar no âmbito do movimento Guarani e Kaiowá de retomada de parte de
seus territórios tradicionais no Estado, chamados tekoha. Esta área fica locali-
zada no município de Maracaju, na bacia hidrográfica do rio Paraná, em uma
zona inserida no bioma Cerrado, que tem influências do bioma Mata Atlântica.
Configura-se como um espaço afetado pela expansão de frentes econômicas da
sociedade nacional, especialmente por meio do desmatamento para posterior
desenvolvimento de atividades agropecuárias. Foi identificada e delimitada em
1996 e possui uma extensão de 535 hectares. Quando este trabalho foi finaliza-
do e entregue para publicação, em fins de 2016, encontrava-se em processo de
regularização junto ao Estado brasileiro. Até então, a comunidade permanecia
dentro da área enquanto aguardava o desfecho de um processo judicial em que
34 ruralistas disputavam com os Kaiowá a posse da terra. À época, ao consultar um
servidor da FUNAI (Fundação Nacional do Índio), em Dourados, sobre a popu-
lação local, fui informado de que a comunidade era constituída por umas 320
pessoas, distribuídas em cerca de 90 famílias.
CAP. 1
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ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: ARQUEOLOGIA, IDENTIDADE ÉTNICA E DIREITOS
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Mapa 1 – Mapa com a localização da Terra Indígena Sucuri’y no contexto dos biomas pre-
dominantes no Brasil
Observação: Nesta representação cartográfica é possível observar que a área está situada
no Cerrado, próximo da Mata Atlântica, isto é, em uma espécie de zona de transição ou
ecótono entre os dois biomas.
35
Mapa 2 – Mapa com a localização da Terra Indígena Sucuri’y no contexto das terras indíge-
nas regulamentadas ou em processo de regulamentação no Brasil
Observação: Nota-se que as maiores áreas estão localizadas na região amazônica, realida-
de essa que corrobora a tese de que há poucas terras para muitos índios em Mato Grosso
CAP. 1
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Comunidades, práticas e direitos TERRITORIAIS DOS POVOS INDÍGENAS NO BRASIL
do Sul, estado onde está a segunda maior população indígena no país, estimada no censo
de 2010 em mais de 73.000 pessoas. Verifica-se, ainda, que fora da Amazônia as terras
indígenas são menores, muitas delas bastante diminutas e insuficientes para a reprodução
física e cultural das comunidades. Essa realidade atesta a existência, no âmbito da política
indigenista oficial, de diferentes critérios para a identificação e a delimitação de terras tradi-
cionalmente ocupadas por comunidades indígenas no país, a exemplo do que ocorre no Sul
e em parte do Centro-Oeste.
36
CAP. 1
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Faz-se necessário explicar que, nos anos de 1990 e 2000, laudos ar-
queológicos judiciais foram feitos pelo referido profissional para a Justiça
Federal no estado, mas a maior parte desses trabalhos permanece desconhe-
cida pelo grande público. Chamam a atenção para um tipo de estudo técnico-
-científico que exige expertise em antropologia social, embora, para a época,
talvez esse pré-requisito não fosse tão claro assim para alguns magistrados. Isso
resultou na determinação da produção de laudos periciais em que a chamada
arqueologia pré-histórica aparece distante e desconexa em relação à etnologia
indígena, com repercussões negativas no que se refere ao esclarecimento dos
fatos sobre terras tradicionalmente ocupadas, conforme estabelece o Art. 231
da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988).
Antes de apresentar o estudo realizado, cumpre ainda esclarecer que
no período de 2003 a 2012 participei, ora como arqueólogo, ora como antropó-
logo social, da produção de dois tipos de laudos que envolveram comunidades
indígenas no Centro-Oeste. O primeiro diz respeito à elaboração de dois laudos
periciais e um laudo administrativo sobre terras indígenas. O segundo tem a ver
CAP. 1
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Comunidades, práticas e direitos TERRITORIAIS DOS POVOS INDÍGENAS NO BRASIL
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Contralaudos podem ser produzidos ou não por assistentes técnicos, mas, via de regra, são feitos
por pessoas contratadas como experts pelas partes envolvidas em litígios judiciais, especialmente as
que são contrárias aos interesses das comunidades indígenas. São trabalhos feitos por técnicos que
são parciais, porque estão ligados à defesa das partes que representam, as quais contrataram o seu
serviço. Apenas os experts do Juízo são peritos, auxiliares do magistrado, aqueles que devem atuar
com imparcialidade, algo que deve ser atestado pelo rigor científico empregado na produção do laudo
judicial (EREMITES DE OLIVEIRA, 2012a; EREMITES DE OLIVEIRA e PEREIRA, 2009, 2010, 2011; BECKER,
SOUZA e EREMITES DE OLIVEIRA, 2013).
CAP. 1
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O termo Tupi-Guarani, grafado com hífen, refere-se a uma família linguística. Valendo-se da analogia
direta, uma tradição tecnológica ceramista foi definida com o mesmo nome durante o PRONAPA, po-
rém grafado sem hífen (Tupiguarani) para evitar o inevitável: a confusão entre tradição arqueológica,
família linguística e identidade étnica na longa duração. Essa ambiguidade contradiz convenções então
em voga na arqueologia histórico-cultural, as quais apontam para a nominação de padrões tecnoló-
gicos a partir do nome do lugar onde estão localizados os primeiros sítios arqueológicos estudados,
como verificado em Willey e Phillips (1958). Exemplo: tradição Taquara (ou Taquara-Itararé), tradição
Vieira, tradição Pantanal etc. Isso não significa, que se faça bem entendido, que as nomenclaturas es-
tabelecidas para tradições tecnológicas correspondem a apelativos ou etnônimos de povos indígenas.
Logo, seria equivocado falar em “os Taquara”, “os Vieira”, “os Pantanal” e assim por diante. A mesma
regra também e válida para indústrias líticas conhecidas na arqueologia europeia para o período pa-
leolítico: Acheulense, Magdalenense, Musteriense etc.
CAP. 1
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retas exerçam certo fascínio sobre nós, sabe-se, ainda, que povos agricultores
e linguisticamente aparentados podem ter distintos estilos ceramistas e alguns,
como os Aché, falantes do idioma guarani no Paraguai, sequer produzirem vasi-
lhas cerâmicas. Questões dessa natureza não devem ser ignoradas para o longo
período que antecede à invasão europeia, tampouco para temporalidades pos-
teriores, mas igualmente consideradas para pensarmos no estudo de uma histó-
ria indígena mais plural em termos de historicidade e diversidade sociocultural.
Exemplo disso reside na possibilidade de estudar a dispersão de elementos da
cultura material, como artefatos cerâmicos e líticos, no âmbito das dinâmicas
plurais e heterogêneas das redes interétnicas de relações sociais, constituídas
no tempo e no espaço.
Para finalizar este item e deslindar eventuais dúvidas que minhas
ideias possam suscitar sobre a associação entre agricultura e cerâmica, passo
a descrever rapidamente parte de uma observação feita em 2008, quando esti-
ve por alguns dias na comunidade Katitaurlu, linguisticamente nambikwara, da
Terra Indígena Sararé, localizada no vale do rio Guaporé, em Mato Grosso. Na
ocasião, após ter registrado a existência de fragmentos cerâmicos nas proximi-
dades de algumas aldeias, perguntei a um ancião se no passado eles produziam
45
vasilhas cerâmicas. Respondeu-me que não. Fiquei curioso, por isso, em segui-
da, eu o indaguei sobre como faziam para preparar alimentos cozidos. Ele olhou
para mim e disse que isso era algo simples. Bastava impermeabilizar um cesto
com cera e depois colocar carnes, vegetais e água dentro do recipiente para, em
seguida, acrescentar algumas pedras aquecidas em fogo e cozinhar a comida.
Apontou o dedo para alguns seixos rolados que havia nas proximidades de sua
casa e assim também o fez para indicar pedras que poderiam servir para esse
propósito. Eis alguns dados etnográficos que podem servir para interpretar as
chamadas pedras termóforas, encontradas em sítios arqueológicos associados
à presença de diversas populações indígenas pretéritas, incluindo as tidas como
“aceramistas” e, portanto, supostamente não agricultoras. Logo, situações aná-
logas podem ter existido entre comunidades linguisticamente tupi-guarani.
O que abordo aqui é sobre a necessidade de aprendermos a fazer et-
nografia, tal qual fazem os antropólogos sociais, porém com o necessário foco
na cultura material. No caso apresentado, ainda estou tratando do uso do mé-
todo comparativo, por meio de analogias indiretas ou relacionais e não, neces-
sariamente, de analogias diretas.
CAP. 1
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Comunidades, práticas e direitos TERRITORIAIS DOS POVOS INDÍGENAS NO BRASIL
Uma das questões que mais me intrigava até 2005 diz respeito à atri-
buição de uma identidade “guarani” à cerâmica da tradição Tupiguarani, que
ocorre na região platina, assim como uma identidade homônima, que arqueó-
logos, etnólogos e etno-historiadores sistematicamente atribuem aos Guarani,
Mbyá e Kaiowá. Em Mato Grosso do Sul, torno a registrar, apenas os chama-
dos Ñandeva se autoidentificam como Guarani, conforme discutido por Landa
(2005). Os Kaiowá que vivem no estado, por seu turno, autoidentificam-se por
esse etnônimo e não raramente marcam sua identidade aos mais desavisados
que se referem a eles como Guarani. No Paraguai, por outro lado, eles se au-
todenominariam como Paĩ-Taviterã, segundo consta no conhecido estudo de
Melià, Grünberg e Grünberg (1976, 2008). Não obstante, há muitas semelhan-
ças socioculturais entre esses povos, e as similitudes não sustentam a atribui-
ção, de nossa parte, dessa ou daquela identidade a eles, em desconsideração à
maneira como se percebem em situações relacionais. Talvez a maior dessas se-
46 melhanças esteja no plano cosmológico e religioso, segundo apontam Viveiros
de Castro (1987) e Pereira (2003), do que propriamente na organização social,
na territorialização ou até mesmo na cultura material. Significa dizer que um
povo linguisticamente guarani pode compartilhar de certa cosmologia e religião
sem, necessariamente, ter ou ser portador da tradição tecnológica ceramista
Tupiguarani. O contrário também seria possível, principalmente quando consi-
derada a trajetória dessas populações na longa duração.
Entendo que o termo “Guarani” tem sido usado, desde os tempos
coloniais, para se referir a um povo genérico, “de papel”, assim criticado por
Santos (1999)3. No entanto esse mesmo “Guarani” tem sido de grande utilidade
para a confecção de colchas de retalhos etnográficos, costuradas por meio do
método comparativo para a construção de um “monstro” do tipo Frankenstein,
conforme amiúde aponta Soares (2003). Isso geralmente é feito com o propó-
sito de formular modelos interpretativos globalizantes de longo alcance e am-
biciosos em termos de abrangência espaço-temporal. Para essa tarefa, alguns
3
No citado trabalho, a autora faz algumas apreciações inconsistentes e pouco elegantes em relação à
obra da antropóloga de origem eslovena, Branislava Susnik, ex-diretora do Museu Etnográfico “Andrés
Barbero”, de Assunção, Paraguai, falecida em 1996. Algumas de suas apreciações foram por mim re-
futadas em um ensaio elaborado em 2003 e publicado naquele país (EREMITES DE OLIVEIRA, 2003a).
CAP. 1
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ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: ARQUEOLOGIA, IDENTIDADE ÉTNICA E DIREITOS
Comunidades, práticas e direitos TERRITORIAIS DOS POVOS INDÍGENAS NO BRASIL
arqueólogo contradiz as provas que ele mesmo arrolou nos Autos, conforme
explicado adiante.5
O perito afirmou, ainda, segundo consta na página 1268 do Processo,
que deu início a escavações arqueológicas com o seguinte objetivo:
de. Mesmo assim, caso o perito tivesse encontrado fragmentos de cerâmica ti-
picamente Tupiguarani, datada, por exemplo, de 450±70 AP6, não haveria como
associá-los diretamente aos Kaiowá de Sucuri’y. Uma associação desse tipo so-
mente seria possível se a cerâmica fizesse parte da memória social ou possuísse
sentido de tradicional para a comunidade. Por esse e outros motivos, defendo a
tese de que procedimentos metodológicos e linhas argumentativas comuns na
arqueologia pré-histórica não são, pois, apropriados para esse tipo de trabalho.
Quem se percebe e é conhecido como especialista em pré-histórica, ou seja, em
“índios mortos”, não deveria aceitar trabalhar com “índios vivos”. O antropólo-
go social, por seu turno, quando especialista em etnologia indígena, é o profis-
sional mais habilitado para a produção de laudos judiciais desse tipo.
Uma das questões que o expert deveria ter esclarecido diz respeito,
por exemplo, ao início da ocupação da região pelas frentes de expansão eco-
nômica da sociedade nacional, algo que aconteceu entre fins do século XIX e
as primeiras décadas do século XX. Por esse motivo, o fundamental da perícia
seria esclarecer se quando a cadeia dominial das fazendas teve início a terra era
ou não ocupada pelos Kaiowá de Sucuri’y, em seu sentido mais amplo, pois os
indígenas alegaram ter sido vítimas de processo de esbulho7. Constatado o es-
55
pólio de suas terras, seria ainda necessário esclarecer como o processo se deu,
quais os indivíduos que o fizeram, como reagiu a comunidade e qual foi a ação
do órgão indigenista oficial no episódio. Se o esbulho foi feito pelos primeiros
ocupantes não índios, que conseguiram a titulação das terras, então, salvo me-
lhor entendimento, toda a cadeia dominial da área não possui validade à luz
da legislação brasileira, independentemente da opinião do perito sobre o que
entende ser ou não justo.
Além do que foi explicado até o momento, há outras questões que
precisam ser pontuadas. Em primeiro lugar, conforme consta na página 1267
dos Autos, o perito afirmou que suas diligências foram feitas após “[...] o estu-
do da bibliografia especializada, análise de fontes primárias e leitura dos autos
[...]”. Em seu relatório consta a relação de 105 títulos, da página 1285 à pági-
6
AP significa anos “Antes do Presente”, cujo presente é, por convenção, o ano de 1950. Em inglês essa
sigla é BP (Before Present). No caso da mencionada data hipotética, o sinal “±” indica a margem de
erro da datação, para mais ou para menos.
7
Para analisar a cadeia dominial da área em litígio, faz-se necessário recorrer ao livro Os Corrêa, os
Ponte, os Alves no planalto e serra de Maracajú: origem histórica, árvores genealógicas, do advogado
e ex-delegado de polícia Altinor Barbosa Ferreira (1993). Essa obra, de caráter memorialista e genea-
lógico, foi escrita com base em pesquisas cartoriais e informações orais registradas pelo próprio autor.
CAP. 1
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ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: ARQUEOLOGIA, IDENTIDADE ÉTNICA E DIREITOS
Comunidades, práticas e direitos TERRITORIAIS DOS POVOS INDÍGENAS NO BRASIL
8
A bibliografia arrolada no laudo pericial é praticamente a mesma que o autor relacionou em sua tese
de doutorado, defendida em 1996 na Universidade de São Paulo (USP), cujo tema central tem a ver
com a pré-história de antigas populações indígenas que se estabeleceram no planalto de Maracaju-
Campo Grande, incluindo o município de Maracaju. Nesse trabalho, há um subitem de número 3.2,
intitulado Panorama etno-histórico da região de Maracaju, em que consta um resumo do processo
de ocupação indígena no município homônimo, desde tempos imemoriais até temporalidades mais
recentes, inclusive o processo de esbulho a que os indígenas dizem ter sofrido na década de 1980.
CAP. 1
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ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: ARQUEOLOGIA, IDENTIDADE ÉTNICA E DIREITOS
Comunidades, práticas e direitos TERRITORIAIS DOS POVOS INDÍGENAS NO BRASIL
Fontes desse tipo deveriam ter sido analisadas e discutidas para res-
ponder, por exemplo, ao primeiro quesito apresentado pelo juízo: “1. Estabeleça
o Senhor Perito o local e o período em que os índios Guarani-Kaiowá habitavam
– ocuparam (no sentido amplo de caçar, pescar e coletar) a área mencionada na
petição inicial, se isso ocorreu”.
Em segundo lugar, o levantamento arqueológico foi concluído com
base em informações orais obtidas de membros da comunidade indígena. Isso
é o que geralmente se chama de levantamento oportunístico de sítios arqueoló-
gicos. Trata-se de um procedimento pertinente para trabalhos dessa natureza,
desde que direcionados para averiguar a ocupação tradicional, e caso o pes-
quisador tenha entendido o idioma cultural da comunidade. Anos depois, ao
conversar sobre o assunto com uma liderança indígena no estado, soube que
os Kaiowá de Sucuri’y teriam levado o perito para conhecer pontos que não
correspondiam, exatamente, a certos lugares sagrados. Temiam pelo pior: que o
arqueólogo profanasse locais onde seus antepassados foram sepultados.
Diversos pontos arrolados durante a perícia (antigas residências, lu-
gares de valor religioso, aterros sob forma de montículos, prováveis sepulturas
57 humanas, trilhas, áreas de caça etc.), associados à toponímia em língua guarani
conhecida para a região, à memória social da comunidade e a fontes textuais
mencionadas no Processo, chamam a atenção para a tese de que os Kaiowá
ocupam a área de acordo com os seus usos, costumes e tradições. Tais evidên-
cias são provas materiais e vão ao encontro da noção de oguata, palavra que em
guarani se refere a um modo de ser caracterizado por grande mobilidade espa-
cial, no sentido de andar, caminhar, circular, viajar e transitar. A noção de oguata
não deve ser vista como algum tipo de nomadismo ou perambulação errante,
sem direção certa, e ausente de estratégias de territorialidade. Pelo contrário,
tem a ver com mobilidade espacial em uma área reconhecida como território
tradicional para os próprios Kaiowá.
Registra-se, contudo, e mais uma vez, que não é a ocorrência de evi-
dências arqueológicas imemoriais, como artefatos líticos e cerâmicos, que po-
deriam ou não comprovar a ocupação tradicional da comunidade indígena na
área periciada. A comprovação deveria ter sido feita, também, por meio da aná-
lise minuciosa de outras evidências materiais, tais como: “latas velhas”, “sola de
sapato”, “entulho de lixo”, locais de importância simbólica para atividades de
caça (como o registrado como ogatawa), “alto topográfico” onde teria existido
CAP. 1
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ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: ARQUEOLOGIA, IDENTIDADE ÉTNICA E DIREITOS
Comunidades, práticas e direitos TERRITORIAIS DOS POVOS INDÍGENAS NO BRASIL
uma oga pysy etc.9 Todas essas evidências foram arroladas pelo expert da Justiça
Federal nas páginas 1262 e 1263 dos Autos, mas sobre elas não foi apresentada
qualquer análise etnográfica ou arqueológica à altura do que se faz em arqueo-
logia histórica e em etnoarqueologia. Sobre o material arqueológico recolhido
in loco, como os artefatos líticos, tampouco foi apresentada uma análise meti-
culosa, o que atesta ainda mais a fragilidade do trabalho. Por vezes, foram feitas
ainda referências a suposições do tipo “aparentemente” e “provavelmente”, as
quais, associadas ao descrédito dado à memória e à tradição oral dos Kaiowá,
bem como à literatura etnológica e etno-histórica, contribuíram para corroborar
a conclusão final do perito, reproduzida anteriormente.
Em terceiro lugar, as entrevistas com alguns indígenas, transcritas e
anexadas nos Autos, também sustentam a tese da ocupação tradicional da Terra
Indígena Sucuri’y. Apontam para o processo de esbulho que os índios afirmam
ter sofrido. Sem embargo a essa proposição, entendo que, à luz da história oral
e da etnografia, teria sido de bom alvitre se o perito tivesse tido alguns mo-
mentos a sós com a comunidade indígena10. Dessa forma, poderia ter realizado
entrevistas e observações com vistas a recolher maiores subsídios para a elabo-
ração do laudo. Em outros momentos, os assistentes técnicos das partes tam-
58
bém poderiam fazer as entrevistas e as observações com os mesmos indivíduos,
igualmente a sós, com o propósito de juntar elementos para a elaboração de
seus contralaudos.
9
Oga pysy é uma unidade residencial tipicamente Kaiowá, feita de madeira e coberta com capim sapé,
onde, geralmente, residia uma família extensa, denominada tey’i. Há também construções com essa
mesma denominação que eram e ainda são destinadas a rituais religiosos, às vezes até com outras
configurações arquitetônicas. O perito grafou essa palavra de maneira equivocada (oga pysi), pois, em
guarani, o “y” não tem o mesmo som que o “i”. Ogatawa, por sua vez, se é que o perito registrou cor-
retamente essa outra palavra, refere-se a um “povoado” ou, ainda, a um lugar de valor simbólico. Em
guarani, a palavra “oga” significa casa, local, moradia, e “táva” ou “tawa” diz respeito a povo, aldeia,
povoação, localidade (cf. KRIVOSHEIN DE CANESE; ACOSTA ALCARAZ, 1997).
10
Na opinião de Alberti (1990, p. 1-2): “Se podemos arriscar uma rápida definição, diríamos que a
história oral é um método de pesquisa (histórica, antropológica, sociológica etc.) que privilegia a rea-
lização de entrevistas com pessoas que participaram de, ou testemunharam acontecimentos, conjun-
turas, visões de mundo, como forma de se aproximar do objeto de estudo. Como consequência, o
método da história oral produz fontes de consulta (as entrevistas) para outros estudos, podendo ser
reunidas em um acervo aberto a pesquisadores. Trata-se de estudar acontecimentos históricos, insti-
tuições, grupos sociais, categorias profissionais, movimentos, etc., à luz de depoimentos de pessoas
que deles participaram ou os testemunharam”. Entretanto, quando no contexto de perícias judiciais
do tipo da que aqui é analisada, os depoimentos orais não devem ser confundidos com depoimentos
tomados em juízo, tampouco o método da história oral pode ser considerado um procedimento meto-
dológico mais preciso ou que se sobrepõe em relação ao método etnográfico.
CAP. 1
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Entre povos indígenas sul-americanos, os etnólogos, geralmente, não conseguem fazer diagramas
de parentesco com a indicação de mais de cinco gerações das quais descende o indivíduo de referên-
cia, denominado ego (“eu” em latim). Não é de se estranhar, então, que a memória dos Kaiowá possa
recuar até uns 150 anos, haja vista que uma geração tem em média de 20 a 25 anos. O que vai além
dessa cronologia está, portanto, no campo do imemorial e sua interpretação exige muita habilidade
etnográfica.
CAP. 1
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Comunidades, práticas e direitos TERRITORIAIS DOS POVOS INDÍGENAS NO BRASIL
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Há muitos estudos sobre a religião dos povos indígenas de língua guarani. A produção mais relevante
teve início com os padres da Companhia de Jesus, no século XVII, conforme verificado em Melià,
Grünberg e Grünberg (1976, 2008), Melià, Saul e Muraro (1987), Chamorro (1995, 1998), Pereira
(1999, 2004) e Eremites de Oliveira (2016).
CAP. 1
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Comunidades, práticas e direitos TERRITORIAIS DOS POVOS INDÍGENAS NO BRASIL
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Segunda: “O resultado é uma trama de títulos que vêm tentando obs-
taculizar o questionamento jurídico por parte dos indígenas no tocante a seus
direitos de acesso a terra.” (STEFANES PACHECO, 2004, p. 41).
A seguir, registro o que o próprio perito escreveu em um subitem de
sua tese de doutorado, elaborado sem a realização de pesquisa etnográfica, po-
rém centrado em uma análise histórica baseada em fontes textuais.17
Primeira:
17
As quatro citações apresentadas a seguir foram copiadas da tese de doutorado do perito: a primeira
da p. 93, a segunda da p. 94, a terceira da p. 106 e a quarta das p. 107-108.
CAP. 1
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Terceira:
Muito provavelmente, nas primeiras décadas deste século [sé-
culo XX], a região que estamos enfocando ainda abrigava, tal-
vez, algumas centenas de índios kaiowás [sic] dispersos entre
os bosques remanescentes da cobertura original ou vivendo
agregados nas recém-instaladas fazendas como mão-de-obra
[sic] desqualificada, conservando ainda parte de seus costumes
e uma obstinação em preservar o seu modo de ser, isto no ter-
ritório onde mantêm relações simbólicas com seu passado e
antepassados.
A partir da década de 1940, o panorama ambiental e sócio-e-
conômico [sic] passou por aceleradas mudanças. Nos primeiros
anos dessa década o tronco ferroviário da ‘Noroeste do Brasil’,
ligando Ponta Porá a Campo Grande, estava concluído. A facili-
dade de acesso e a de circulação de mercadorias daí advindas
viabilizou, pelos anos seguintes, o crescimento das atividades
agropastoris e o processo de urbanização do município. O espa-
CAP. 1
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Comunidades, práticas e direitos TERRITORIAIS DOS POVOS INDÍGENAS NO BRASIL
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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MURA, F.; BARBOSA DA SILVA, A. (Orgs.). Laudos antropológicos em perspecti-
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Brasil. Amazônica: Revista de Antropologia, Belém, v. 7, n. 354-374, 2015a.
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Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2002.
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Kaiowá no estado de Mato Grosso do Sul, Brasil. Revista de Arqueologia, São
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______. Sistema de assentamento e processo de territorialização entre os
Terena da Terra Indígena Buriti, Mato Grosso do Sul, Brasil. Habitus, Goiânia, n.
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______. Sobre os conceitos e as relações entre história indígena e etno-história.
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CAP. 1
A MULTIVOCALIDADE DA REVISITANDO UMA DISCUSSÃO SOBRE
ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: ARQUEOLOGIA, IDENTIDADE ÉTNICA E DIREITOS
Comunidades, práticas e direitos TERRITORIAIS DOS POVOS INDÍGENAS NO BRASIL
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CAP. 2
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ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: APROPRIAÇÕES DO PATRIMÔNIO ARQUEOLÓGICO
Comunidades, práticas e direitos ENTRE OS TREMEMBÉS DE ALMOFALA (CEARÁ)
CAPÍTULO 2
DAS TAPERAS DOS ÍNDIOS ANTIGOS AOS
SÍTIOS: APROPRIAÇÕES DO PATRIMÔNIO
ARQUEOLÓGICO ENTRE OS TREMEMBÉS DE
ALMOFALA (CEARÁ)
76
DOI: http://dx.doi.org/10.18616/arq02
Porque a gente hoje temos que viver os dois lados, nós temos
que viver o lado da nossa cultura e temos que viver o lado do
modelo capitalista, porque não dá para separar, você tem que...
você tem que viver. Agora tem que viver uma coisa que não dê
pra esquecer a outra [...]. (BORGES, 2006, p. 112).
“[...] a escrita conquistadora [...]”, a escrita da história europeia, que passa a ser
“inscrita” na América.
A colonização dos discursos sobre o passado, na Academia, produz a
disciplina histórica, a qual é duas vezes disciplina: por meio do verbo, que impõe
a norma do fazer historiográfico, e da doutrina, que se transforma em área de
conhecimento. Longe de realizar-se, assim, uma Arqueologia do Saber, como
propõe Foucault (2002), para a desconstrução dos esquemas lineares e para
a libertação dos “jogos das noções” (p. 24), os quais remetam àquela trama
da renda, que é a metáfora da complexidade da realidade, o discurso científi-
co tende ao esquema de uma história linear, da história como a verdade dos
acontecimentos.
Os acontecimentos, no entanto, nunca possuem uma única verdade,
pois que ganham cores variadas, de acordo com o olhar de quem os vê. O dis-
curso acadêmico produzido sobre o passado, quer a partir da história, quer a
partir da arqueologia (a ciência, não a proposta de Foucault), tende a homoge-
neizar o que é disperso, a generalizar o que é múltiplo e a simplificar o que é
complexo (FOUCAULT, 1998).
80 Nora (1993, p. 9) chama atenção para esse caráter “universal” da his-
tória, como uma “[...] operação intelectual e laicizante [...]”, enquanto que a
memória reflete atualidade e localidade, visto que “[...] se enraíza no concreto,
no espaço, no gesto, na imagem, no objeto [...]”. Os discursos das memórias são
mais múltiplos, são mais vivos, enquanto que na isonomia do enunciado cientí-
fico perde-se algo para o qual Sérgio Buarque de Holanda (1996, p. 8) chamava,
convenientemente, atenção: “Nada do que vive exprime-se impunemente em
vocábulos”.
“No coração da história trabalha um criticismo destrutor da memória
espontânea [...]” (NORA, 1993, p. 9). Nas nossas mãos estão as espadas, trans-
mutadas na escrita, que destroem essas memórias na monotonia de nossos dis-
cursos acadêmicos.
Cientes de todas essas insuficiências do discurso acadêmico e de nos-
sas insuficiências, porque também fomos colonizados e capturados por esse
discurso, tentamos construir uma narrativa mais plural, que desse conta das
nossas falas, mas também das falas dos outros que passam a compor o nosso
pensamento.
CAP. 2
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ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: APROPRIAÇÕES DO PATRIMÔNIO ARQUEOLÓGICO
Comunidades, práticas e direitos ENTRE OS TREMEMBÉS DE ALMOFALA (CEARÁ)
Há, dessa maneira, uma sinuosidade neste texto, que esperamos não
comprometer a leitura. Pedimos ao leitor paciência para enxergar, nas entreli-
nhas, os diversos autores que o compõem, pois diversas são as apropriações
das palavras, das histórias e das memórias que construíram este nosso texto, na
tentativa de construir-se um discurso, ainda científico, porém mais intercultural.
Assim, a professora também se fez aluna de seus alunos professores, e
nossos intercâmbios de conhecimentos geraram este texto, com tantas pessoas
do/no discurso!
1
A etapa anterior do magistério, em nível médio, foi chamada de Curso Pé no Chão. O MITS
assim também foi chamado pelo Cacique João Venança, pois ainda não possuía apoio oficial
de nenhuma instituição, mas teve início com muita esperança e empenho dos tremembés
para que pudesse acontecer.
CAP. 2
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Comunidades, práticas e direitos ENTRE OS TREMEMBÉS DE ALMOFALA (CEARÁ)
Nossos mais velhos, antigamente, não conheciam o que era sítio ar-
queológico, por causa do pouco conhecimento sobre o assunto. Muitos viam
esses restos como algo sem serventia para o fortalecimento da luta. Mal sabiam
eles que aqueles vestígios eram fontes históricas da memória de nosso povo.
É importante lembrar que, antes, nosso povo não tinha conhecimento
desse bem imaterial que estava em nosso aldeamento, pois conhecíamos esses
locais simplesmente por taperas velhas. Mesmo assim, tínhamos uma relação
harmoniosa com eles, pois tínhamos plena noção de sua importância, devido ao
fato de ali existirem vestígios de nossos troncos velhos.
82
Muitas pessoas de nosso aldeamento são consideradas “troncos ve-
lhos”, devido à vasta experiência de luta que adquiriram ao longo de suas jorna-
das, pois, diante dos desafios que enfrentaram, não se deixaram abater e conti-
nuaram de pé, firme na luta pela nossa terra. Vale ressaltar que troncos velhos
não são apenas as pessoas mais velhas e sim todos aqueles que levam a luta
com afinco, defendendo nossos direitos, nossos costumes e nossas tradições.
Eu – Getúlio Tremembé:
isso aí é uma tapera, era morada dos antigos”. Como a gente não tinha nenhum
conhecimento acadêmico sobre o assunto, não dava muita importância, e como
precisava cavar a terra, nos quintais, para plantar, na maioria das vezes, tudo
o que era encontrado nas taperas era vasculhado pela enxada. Muitas vezes,
eram encontradas cabeças de cachimbos, pedaços de pratos, bocas inteiras de
potes, pedras grandes, que diziam “Meu pai e minha mãe eram as trempes”.2
A cada ano que se passava, a gente achava mais materiais quando começava a
trabalhar, e, muitas vezes, movida pela curiosidade, a gente costumava cavar
um pouco mais fundo para ver se tinha mais coisas. E é claro que encontrava.
84
Fonte: Biblioteca Digital Luso-Brasileira. Autor: João Teixeira Albernaz I, fl. 1602-1649. 47,3
x 59,7 [ca.1629].
tiveram que se retirar de seu espaço ancestral, saindo de perto da igreja, que foi
tomada pelas areias.
No início dos anos de 1940, as dunas movimentaram-se novamen-
te, começando o trabalho inverso de descobrir a igreja e o povoado. Alguns
Tremembés mais velhos contam que desenterraram a igreja quando jovens e
crianças. Nas noites de lua cheia, lembram que faziam festa, que faziam nove-
nas, que as mulheres enchiam as saias de areia e as crianças se divertiam, tama-
nha era a alegria de ver seu símbolo voltando à tona. Seu Estevão Henrique dizia
com orgulho: “[...] eu descobri a igreja com essas mãozinhas aqui que a terra há
de comer [...]” (BORGES, 2006).
Com as dunas “caminhando” para outros locais, como gostam de dizer,
os Tremembés puderam retornar às suas origens, aos arredores da igreja, po-
rém não retornaram apenas eles, foram acompanhados de posseiros, “os bran-
cos”, que passaram a invadir Almofala. O local do antigo aldeamento, assim,
passou a representar um espaço de resistência e de afirmação étnica, pois, à
medida que o povoado ia sendo descoberto pelas areias, posseiros “brancos”
invadiam o lugar, disputando o espaço com os índios.
86 Conforme as invasões aconteciam, aumentava a violência, e, assim, os
índios não podiam sequer se dizer mais índios, como o senhor Estevão Henrique
afirmava: “[...] o sangue dava no meio da canela”. Se a polícia visse qualquer
conglomerado deles, “o pau comia”. Dessa maneira, conforme a igreja foi desco-
berta, a identidade indígena teve que ser encoberta, “[...] a nossa origem vivia
enterrada [...]”, como dizia o senhor Estevão Henrique do alto de sua sabedoria
(BORGES, 2006, p. 126).
Desde então, a história dos Tremembés está repleta de invasões, in-
clusive de grandes empresas, como a Ducôco S/A, que a partir de 1978 adquiriu
propriedades na região e estendeu seus coqueirais pelas lavouras e quintais dos
indígenas. Segundo os Tremembés, suas terras foram invadidas por tratores, e
cercas foram erguidas, espremendo-os em locais diminutos. O litígio se intensi-
ficou e eles lutam até hoje (BORGES, 2007).
O progresso chegou a Almofala: empresas agroindustriais, de pesca e
de beneficiamento de camarão, parques eólicos, dentre outros, os quais, além
de contribuírem para a expropriação das terras indígenas, também degradam
o ambiente, tornando impraticáveis a pequena atividade agrícola e a pesca
tradicional.
CAP. 2
A MULTIVOCALIDADE DA DAS TAPERAS DOS ÍNDIOS ANTIGOS AOS SÍTIOS:
ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: APROPRIAÇÕES DO PATRIMÔNIO ARQUEOLÓGICO
Comunidades, práticas e direitos ENTRE OS TREMEMBÉS DE ALMOFALA (CEARÁ)
travam “taperas”, mas meu interesse sobre isso só veio a se aprofundar quan-
do, em julho de 2006, tive a oportunidade de estudar no Curso de Magistério
Indígena Tremembé Superior – MITS a disciplina “antropologia, arqueologia e
história”. Nesse momento foi que passei a entender que o que nós Tremembés
chamamos de taperas são sítios arqueológicos.
Passei a entender que esses locais têm uma grande importância para
os Tremembés, pois dizem muito de como nossos antepassados viviam. Passei
a entender que são lugares que precisam ser preservados, estudados, para as-
sim se entender melhor como era a vida dos antigos Tremembés. Durante essa
etapa de estudos, a maioria dos cursistas teve a oportunidade de revelar que
conhece muitos locais assim, que já teve contato com taperas, ou seja, conhece
sítios arqueológicos, sendo alguns mais antigos e outros bem mais recentes.
Foi a partir do encontro com a professora que todos os cursistas do
MITS, entre eles eu, puderam e passaram a entender que os sítios arqueológi-
cos podem e devem ser fontes de pesquisa para o aprofundamento da História
Tremembé.
Outra coisa que vale a pena ressaltar é que esses conhecimentos ad-
88 quiridos sobre os sítios arqueológicos nos dão segurança para trabalhar esse
assunto com nossos alunos nas nossas Escolas Diferenciadas Tremembés. Hoje,
quando falamos do referido assunto nas Escolas, temos total segurança de falar
que as taperas, tão presentes entre nós, Tremembés, são sítios arqueológicos
que têm um significado muito grande nas nossas vidas, seja do ponto de vista
cultural, étnico, histórico, filosófico e até mesmo espiritual.
Em 2015, tive a oportunidade de falar do assunto, quando estava
ministrando a disciplina de História Geral, para os alunos do Ensino Médio
Intercultural Tremembé – EMIT da Escola Indígena Tremembé Maria Venância.
Nessa ocasião, visitamos as obras do Complexo Eólico de Itarema, e, nessa visi-
ta, fomos até a Lagoa Seca, localidade de Almofala, onde estavam sendo feitas
escavações arqueológicas.
Em conversas com os alunos e com os arqueólogos, pudemos per-
ceber o quanto as “taperas” têm um significado amplo para nosso povo, pois
alguns alunos chegaram a se emocionar quando se depararam com tantos ob-
jetos que pertenceram aos nossos ancestrais, e foi a partir daquele momento
que muitos deles despertaram para tal assunto. Em conversa com o responsável
pelas escavações, este nos revelou que já tinham encontrado em torno de doze
CAP. 2
A MULTIVOCALIDADE DA DAS TAPERAS DOS ÍNDIOS ANTIGOS AOS SÍTIOS:
ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: APROPRIAÇÕES DO PATRIMÔNIO ARQUEOLÓGICO
Comunidades, práticas e direitos ENTRE OS TREMEMBÉS DE ALMOFALA (CEARÁ)
mil peças arqueológicas e que todas estavam sendo catalogadas e seriam leva-
das para o Museu do Homem Cariri, em Nova Olinda, mas com a possibilidade
de serem trazidas de volta para Almofala, por fazerem parte da História Viva dos
Tremembés.
Lembro-me que dentre as peças encontradas havia bastantes restos
de búzios, conchas, cerâmicas, pedras e até mesmo restos de fogueiras, tudo
isso a uma profundidade de 1,5m. Ali mesmo, pude falar aos alunos dos meus
conhecimentos sobre as taperas, pois tudo o que estava sendo encontrado ali
eram resquícios de moradias antigas dos antigos Tremembés.
O conhecimento em relação aos sítios arqueológicos, hoje, está mais
presente em nosso cotidiano, devido ao fato de essa questão estar sendo bas-
tante discutida em sala de aula e em reuniões com a comunidade. Isso torna
mais fácil a preservação dos sítios, pois, com o conhecimento em mão, o povo
pode se organizar melhor e lutar pelo que é seu por direito, ou seja, os sítios
arqueológicos, que são vestígios deixados por nossos ancestrais mais velhos em
lugares que eles residiram por anos.
Com o decorrer do tempo, esse conhecimento, que havia adormeci-
89 do na memória, foi se expandindo e ganhando forma e, aos poucos, tomando
espaços perante a comunidade, principalmente dentro da sala de aula, na qual
os professores fazem um trabalho de resgate, de preservação desse bem tão
valioso para a continuação da construção de nossa própria identidade.
Esse resgate consiste na busca pela preservação dos nossos patrimô-
nios materiais e imateriais que estão nos sítios arqueológicos, uma vez que esse
conhecimento estava adormecido nas lembranças de nossos troncos velhos,
que não nos transmitiam essas vivências das quais tinham lembrança, de modo
que eram guardadas apenas em suas memórias e intelectos.
No processo de aprendizagem e continuação da autoafirmação de nos-
so povo, o tema “sítios arqueológicos” vem, cada vez mais, fortificando-se no
mundo jovem, pois os professores estão a cada instante fazendo ponte com a
história de nossos antepassados em relação aos vestígios dos sítios arqueológi-
cos e à continuação de sua preservação.
A relação das lideranças indígenas com os nossos vestígios também
vem se aprofundando. Esses vestígios, deixados ao longo do tempo nas mar-
gens da região litorânea, são as pegadas de identificação dos costumes pesquei-
CAP. 2
A MULTIVOCALIDADE DA DAS TAPERAS DOS ÍNDIOS ANTIGOS AOS SÍTIOS:
ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: APROPRIAÇÕES DO PATRIMÔNIO ARQUEOLÓGICO
Comunidades, práticas e direitos ENTRE OS TREMEMBÉS DE ALMOFALA (CEARÁ)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
[...] Ali foi um passado, ali foi aonde ele viveu, onde ele teve a
convivência dele, ali tem um significado, não é? Aonde [sic] se
dá com uma tapera de casa a gente sabe que ali tem um... toda
uma história, uma tradição, do passado daquela família que
morou ali, né? Então pra gente é a mesma coisa, a gente não
tem assim... aquilo como uma grande... né? Mas a gente tem o
respeito porque ali a gente sabe que morou um... uma pessoa
da família, morou um parente [...].
CAP. 2
A MULTIVOCALIDADE DA DAS TAPERAS DOS ÍNDIOS ANTIGOS AOS SÍTIOS:
ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: APROPRIAÇÕES DO PATRIMÔNIO ARQUEOLÓGICO
Comunidades, práticas e direitos ENTRE OS TREMEMBÉS DE ALMOFALA (CEARÁ)
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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PARQUE NACIONAL SERRA DA CAPIVARA E
CAP. 3
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CAPÍTULO 3
PARQUE NACIONAL SERRA DA CAPIVARA
E COMUNIDADE LOCAL: EDUCAÇÃO,
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PERSPECTIVAS FUTURAS – O CASO DO
MUNICÍPIO DE CORONEL JOSÉ DIAS, PI
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SUMÁRIO
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INTRODUÇÃO
CAP. 3
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1
Referência local aos abrigos sob rocha.
2
Trecho retirado dos inquéritos aplicados que serão analisados no capítulo IV. Na medida em que
os inquéritos iam sendo aplicados, muitas pessoas faziam questão de contar as histórias vividas no
Parque, mas nos inquéritos a identidade dos inqueridos foi preservada, portanto, não temos seus
nomes.
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Giovani Martins Dias, 73 anos, profissão: licenciado em matemática e contador. Antigo morador
do Parque, atualmente está escrevendo um livro sobre a história de Coronel José Dias. Vive há mais
de 20 anos no Pará. É uma pessoa isenta de qualquer influência ou discurso político local. A ideia de
entrevistá-lo partiu de uma conversa informal, quando ele visitava Coronel José Dias e questionou-me
sobre informações para o seu livro.
PARQUE NACIONAL SERRA DA CAPIVARA E
CAP. 3
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O autor completa que são essas pessoas, suas histórias vividas, que
acabam dando vida aos lugares, pois são elas que tornam os lugares excepcio-
nais, são suas memórias e referências culturais que dão sentido ao patrimônio
materializado nos parques nacionais (D’ANTONA, 2005).
Laraia (2004) explica que o modo de ver o mundo, as apreciações de
ordem moral e valorativa, os diferentes comportamentos sociais são produtos
de uma herança cultural determinada culturalmente. O homem é o resultado
do meio cultural em que foi socializado. É herdeiro de um longo processo acu-
mulativo, que reflete o conhecimento e a experiência adquiridos pelas numero-
sas gerações que o antecederam.
No contexto da Serra da Capivara, os modos de vida tradicionais e o
104
apego afetivo/simbólico daquelas comunidades pelo território, que não foram
considerados no processo de desapropriação, e a gestão do Parque, munida
pela lei federal, puniram esses moradores severamente (expulsões, prisões arbi-
trárias). O despreparo dos guardas/parque foi crucial no que concerne aos con-
flitos instaurados. Aqui apontamos a ausência ou a ineficiência de um programa
de educação ambiental/patrimonial voltado tanto para os guardas do parque
quanto para a comunidade diretamente afetada.
CAP. 3
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a) Valor Cultural
CAP. 3
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Pergunta 3 - Para você, qual a importância da Arte Rupestre do PNSC?
Opções de resposta: São riscos nas paredes, sem importância. Acho bo-
nito, mas não sei o significado. São desenhos pintados ou gravados nas rochas,
de grande importância para compreendermos a história dos nossos antepassa-
dos. Não sei, nunca vi. Não quero opinar.
CAP. 3
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b) Acessibilidade
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c) Preservação
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d) Fruição Social
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bairro São Pedro (centro histórico), 4,5% para os Serrotes Calcários, 4,7% para
danças regionais e 2,7% para não sei.
Percebe-se que existe a vontade de compartilhar como são os modos
de viver no território da Serra da Capivara, até porque se essas histórias não
forem compartilhadas, daqui a pouco essa geração não existirá e suas histórias
se perderão no tempo.
Faz-se necessário compreender que a demanda do museu aqui levan-
tada é a do município de Coronel José Dias, uma vez que o Museu do Homem
Americano está localizado no município de São Raimundo Nonato.
CAP. 3
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Perspectivas Futuras
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• Programa Educativo
CAP. 3
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Comunidades, práticas e direitos CASO DO MUNICÍPIO DE CORONEL JOSÉ DIAS (PI)
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Tais ações têm contribuído para o fortalecimento de políticas públicas
no que concerne à (re)valorização do patrimônio cultural no município. Desse
modo, toda a comunidade vem compreendendo a necessidade de preservar sua
identidade, suas raízes e sua memória. As iniciativas erigidas no seio da comu-
nidade têm contribuído para alavancar a autonomia local, dando voz e vez aos
herdeiros diretos desse patrimônio, que foram por tanto tempo silenciados e
invisibilizados.
Por fim, acredita-se que o IODA (apenas três anos de criação), por
meio de seus diversos subprogramas, possa aprimorar, em médio e longo prazo,
o relacionamento e a interação entre esse enorme patrimônio histórico e cul-
tural da humanidade com as comunidades que vivem no município de Coronel
José Dias e região. Acredita-se que a valorização desse patrimônio, em um tra-
balho que envolva o fomento de diversas iniciativas, permitindo o crescimento
intelectual e econômico destas em sinergia, resultará em benefícios tanto para a
divulgação e a preservação desse patrimônio quanto à sustentabilidade cultural
da comunidade pela comunidade.
4
Ver: http://documentoculturalolhodagua.ning.com/. Acessado em: 23 jan. 2011.
PARQUE NACIONAL SERRA DA CAPIVARA E
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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CAPÍTULO 4
ARQUEOLOGIA PÚBLICA E PATRIMÔNIO NAS
ESTEARIAS: DIÁLOGO ENTRE A CIÊNCIA, A
COMUNIDADE E A ESCOLA
123
DOI: http://dx.doi.org/10.18616/arq04
SUMÁRIO
CAP. 4
A MULTIVOCALIDADE DA ARQUEOLOGIA PÚBLICA E PATRIMÔNIO NAS
ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: ESTEARIAS: DIÁLOGO ENTRE A CIÊNCIA, A
Comunidades, práticas e direitos COMUNIDADE E A ESCOLA
tetura e dos gostos musicais. Dentro desse contexto, era difícil para a classe não
abastada identificar-se com aquilo que não pertencia ao seu universo cotidiano.
Por outro lado, a partir da Proclamação da República, em 1889, até
mesmo a elite distanciou-se do significado de patrimônio e a pompa de outrora
foi perdida, uma vez que a carga simbólica atribuída ao patrimônio edificado,
como a noção de antiquado, velho e ultrapassado, contrariava a ideia de mo-
dernidade e progresso (GOUVEIA NETO, 2010). Nesse sentido, como afirmam
Funari e Pelegrini (2006), até a capital do Brasil, Rio de Janeiro, foi substituída
por uma cidade mais “moderna”. Desse modo, a discussão sobre patrimônio é
de grande importância para entender a própria formação social de uma nação.
Como se afirmara, os debates acerca das diversas formas de patrimô-
nio tornaram-se um elemento de destaque na contemporaneidade. Além de
sua inserção nas discussões teóricas, fundamental para o desenvolvimento foi
sua aproximação com a comunidade, no seu sentido público, ou seja, um patri-
mônio que buscou a aproximação social dos excluídos, dando-lhes uma voz que
reverberou significados identitários e de preservação da memória, ora buscan-
do associações com o passado cultural, ora vivenciando experiências comunitá-
125 rias (MERRIMAN, 2004).
Logo, o papel dos museus e da musealização mostrou-se essencial
para ratificar a importância do conhecimento para as comunidades locais, cujos
museus comunitários são um importante instrumento de identidade cultural.
Museus, portanto, não devem ser locais estáticos. São lugares dinâmicos, cons-
truídos socialmente e com uma carga simbólica fundamental enquanto preser-
vação do patrimônio (FUNARI e PELEGRINI, 2006).
Antes de apresentarmos como a experiência vivenciada por alunos de
Ensino Médio da EFG/MA da cidade de São Luís afetou seu conhecimento acer-
ca da Arqueologia, apresentaremos nosso objeto de estudo, que possibilitou a
reflexão por parte desses alunos de como era a vida das comunidades pretéritas
e como os artefatos ajudam a entender sobre essas sociedades.
Amazônia Legal, sendo uma região que conta com mais de 500 mil habitantes
(IBGE, 2006). É um território muito pobre, com os menores índices (IDH) não só
do estado do Maranhão, como de todo o Brasil, cuja população vive da subsis-
tência da agricultura tradicional, da pesca, da criação de pequenos animais e do
extrativismo vegetal, especialmente do coco do babaçu. As principais cidades
dessa área são Penalva, Pinheiro, Viana, São Bento e Santa Helena (NAVARRO,
2013; NAVARRO, 2014).
As estearias foram moradias lacustres construídas com esteios (tocos
ou troncos de árvores) de madeira que serviam de sustentação para as constru-
ções superiores, dando origem, assim, às suas aldeias ou às palafitas pré-histó-
ricas (LOPES, 1924; CORREIA LIMA e AROSO, 1991; LEITE FILHO, 2010). Esse tipo
de sítio arqueológico aparece em casos isolados na América do Sul, como nos
relatos de Vespúcio, em 1499, sobre comunidades que viviam em palafitas na
costa venezuelana.
No Brasil, diversos autores consideram que as estearias são os sítios
arqueológicos menos conhecidos no território nacional (PROUS, 1992; MARTIN,
1996). No entanto, há relatos de palafiteiros no Alto Amazonas realizados pelas
126 expedições de Ursúa e Aguirre (1516) (apud PORRO, 1992). Além disso, fran-
ceses estabelecidos no Maranhão no início do século XVII, ao realizarem um
reconhecimento no rio Amazonas, fizeram referência às populações que viviam
em palafitas sobre lagos. No entanto, as estearias maranhenses são as únicas
conhecidas na atualidade.
As estearias estão localizadas ao longo dos diversos lagos, que se ca-
racterizam pela formação de um sistema hídrico composto de rios, campos
inundáveis e lagos de variados tamanhos, os quais se definem pela sazonalidade
do clima (as inundações ocorrem no primeiro semestre de cada ano) (FRANCO,
2012). Os lagos da Baixada Maranhense têm origem geológica recente, pleisto-
cênica, e se caracterizam por inundações periódicas na época das chuvas, pois
acabam recebendo as águas fluviais, além de auferirem, inclusive, as águas dos
rios da região quando de seu transbordamento, como o Pindaré, Pericumã e
Turiaçu (CORRÊA, MACHADO e LOPES, 1991; AB’ SÁBER, 2006). Pertencem, tam-
bém, a um bioma típico da região amazônica, que se caracteriza por campos de
várzea.
Podemos afirmar, em nível hipotético, que, em princípio, a existência
de farta alimentação nesses lagos pôde criar uma situação favorável à habitação
CAP. 4
A MULTIVOCALIDADE DA ARQUEOLOGIA PÚBLICA E PATRIMÔNIO NAS
ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: ESTEARIAS: DIÁLOGO ENTRE A CIÊNCIA, A
Comunidades, práticas e direitos COMUNIDADE E A ESCOLA
sedentária dos grupos humanos que ocuparam a região. Embora não queiramos
cair nas armadilhas de uma elaboração conceitual do determinismo ecológico e
cultural para a explicação da ocupação do território lacustre, negar a importân-
cia do rico ecossistema lacustre seria uma displicência por parte do pesquisador.
Pesquisas arqueológicas atuais realizadas na região amazônica vêm
demonstrando que as várzeas dos rios da região foram densamente povoadas
por sociedades de tipo cacicado na Pré-Histórica amazônica (ROOSEVELT, 1980;
HECKENBERGER, 2006; NEVES, 2006). Embora ainda seja muito incipiente inferir
o tipo de organização social das estearias, é importante ressaltar que o bioma
aquático e as condições ideais de obtenção de alimentos são parecidos com o
das várzeas amazônicas, o que nos faz inferir que esse rico ambiente foi fun-
damental para o desenvolvimento das sociedades palafíticas. Evidência dessa
adaptação é fornecida pelo relato de Simões (1981), que mediu uma das estea-
rias e conseguiu delimitar sua área em 2 km², portanto, um sítio de dimensões
consideráveis.
Por outro lado, fica sem responder quem eram essas comunidades la-
custres. Para Raimundo Lopes (1916), são populações tardias de filiação ama-
127 zônica que estão migrando para a região da Baixada. Para Correia Lima e Aroso
(1991), são grupos Nu-arawaque que foram expulsos, mais tarde, pela ocupação
Tupiguarani. Já para Leite Filho (2010, p. 255), as estearias foram construídas
por “[...] grupos intrusivos na região que se organizaram em aldeias autônomas
ou inversamente em um conjunto de habitações com algum vínculo político en-
tre si dado sua homogeneidade cultural e contemporaneidade”.
Aqui temos que mencionar a importância da estearia de Cacaria, no
lago Cajari, assim denominada pela população local por contar grande concen-
tração de cerâmica. A Cacaria foi estudada por Raimundo Lopes, em 1919, em
uma grande seca que afetou a região, cujo material arqueológico ficou evidente.
Lopes (1924) chega a afirmar a construção de calçadas na estearia, indicando
um sofisticado arranjo urbano pelas populações que ali habitaram.
Simões (1981) também a pesquisou, pontuando a importância dos es-
tudos de Lopes e dessa estearia em específico, que foi medida, alcançando os
2 km. Nos trabalhos de Corrêa, Machado e Lopes (1991), a Cacaria voltou a ser
estudada e, por meio dos troncos de pau d’arco (Tabebuia dasp), o referido pes-
quisador forneceu a datação radiocarbônica de 570 d.C.
Outro importante relato é a existência de “ilhas e tesos” (CORREIA
LIMA e AROSO, 1991) em algumas áreas dos lagos, cujas comparações geográfi-
CAP. 4
A MULTIVOCALIDADE DA ARQUEOLOGIA PÚBLICA E PATRIMÔNIO NAS
ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: ESTEARIAS: DIÁLOGO ENTRE A CIÊNCIA, A
Comunidades, práticas e direitos COMUNIDADE E A ESCOLA
cas e, por conseguinte, dos mounds foram feitas por Lopes (1924) com a região
marajoara, sem, no entanto, estabelecer discussões mais profundas.
Fomos pelo rio abaixo cinco ou seis dias [...] Chegamos a umas
casas fortes que os índios têm por ali, feitas em jirau, altas e cer-
cadas de tábuas de palmeira e [que] têm no alto troneiras para
flechar, e de lá nos feriram os índios quatro ou cinco espanhóis,
com vinte que se haviam adiantado com um chefe, e os fizeram
recuar; quando chegou a armada a essa casa os índios haviam
fugido... Quando queríamos sair daqui apareceram no rio mui-
tas pirogas e índios, as quais, segundo alguns, seriam mais de
100, com muitos índios de guerra. (PORRO, 1992, p. 95. Grifos
e acréscimo nosso).
3 4
136
CAP. 4
A MULTIVOCALIDADE DA ARQUEOLOGIA PÚBLICA E PATRIMÔNIO NAS
ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: ESTEARIAS: DIÁLOGO ENTRE A CIÊNCIA, A
Comunidades, práticas e direitos COMUNIDADE E A ESCOLA
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CAP. 4
A MULTIVOCALIDADE DA ARQUEOLOGIA PÚBLICA E PATRIMÔNIO NAS
ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: ESTEARIAS: DIÁLOGO ENTRE A CIÊNCIA, A
Comunidades, práticas e direitos COMUNIDADE E A ESCOLA
história nunca se apague, afinal tanta informação valiosa quanto à vida de so-
ciedades passadas não pode se perder no tempo, temos profissionais muito
engajados nesta causa em nosso estado e esperamos que eles tenham a opor-
tunidade certa de trabalhar em prol da construção do livro da humanidade”.
Resposta da aluna Marília: “O poder público pode criar projetos rela-
cionados às pesquisas arqueológicas e incentivar visitações a laboratórios ar-
queológicos para as escolas”.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como podemos analisar a partir das respostas dadas pelos alunos Luís
Felipe e Marília, da EFG-MA, a visita ao Laboratório de Arqueologia da UFMA foi
extremamente proveitosa. Os dois alunos disseram que tinham vontade de co-
nhecer mais sobre seus antepassados e sobre os utensílios produzidos por eles.
Os dois alunos também responderam que já sabiam superficialmente
do que tratava a Arqueologia e a visita serviu para aproximá-los da realidade
141 retratada nos livros por meio dos utensílios domésticos, das moedas e das peças
tidas como amuletos.
Na quarta questão, perguntamos se eles entendiam ser a Arqueologia
importante e em qual aspecto. Tanto Marília quanto Luís Felipe disseram que a
Arqueologia é importante. Marília respondeu que é através dela que descobri-
mos quem somos e qual é o ciclo da vida. Já Luís Felipe disse ser primordial para
escrevermos o livro da humanidade, afinal não se escreve um livro do meio para
o final, mas do início.
A quinta pergunta indagou sobre qual contribuição a Arqueologia pode
dar à sociedade. Ambos disseram que a Arqueologia ajuda o homem a entender
a evolução e o desenvolvimento da humanidade. O aluno Luís Felipe também
disse que contribui “[...] resgatando informações do cotidiano dos nossos ante-
passados, como, por exemplo, o que comiam, como viviam, como se adaptavam
e até mesmo seus hábitos preferidos, podendo, a partir daí, caracterizar e cata-
logar a evolução da espécie”.
Já na sexta questão, pedimos para que pontuassem algum aspecto so-
bre a Arqueologia e sobre os utensílios expostos durante a visita e se o tipo de
vida dos homens e mulheres da Pré-História era muito diferente da nossa. A alu-
CAP. 4
A MULTIVOCALIDADE DA ARQUEOLOGIA PÚBLICA E PATRIMÔNIO NAS
ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: ESTEARIAS: DIÁLOGO ENTRE A CIÊNCIA, A
Comunidades, práticas e direitos COMUNIDADE E A ESCOLA
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Bandeira Consultoria Cultural, 2014.
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PORRO, A. As crônicas do rio amazonas: Notas etno-históricas sobre as antigas
populações indígenas da Amazônia. Petrópolis: Vozes, 1992.
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HOFMAN, C.; RODRÍGUEZ RAMOS, R. (Orgs.). The Oxford Handbook of
Caribbean Archaeology. Oxford: Oxford University Press, 2013, p. 155-170.
ROOSEVELT, A. Parmana: prehistoric maize and manioc subsistence along the
Amazon and Orinoco. Nova Iorque: Academic Press, 1980.
ROSTAIN, S. Cacicazgos guyanenses: mito o realidad? In: PEREIRA, E.;
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SECULT, 2010, p. 169-192.
SIMÕES, M. F. As pesquisas arqueológicas no Museu Paraense Emílio Goeldi
(1870-1981). Acta Amazonica, Manaus, v. 11, n. 1, 1981. [Suplemento]
145
VIVEIROS DE CASTRO, E. A Inconstância da alma selvagem. São Paulo: Cosac &
Naify, 2002.
CAP. 5
A MULTIVOCALIDADE DA OS VALORES CULTURAIS E ESPIRITUAIS NA
ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: GESTÃO DE ÁREAS PROTEGIDAS: ENFOQUES E
Comunidades, práticas e direitos OLHARES SOB A PERSPECTIVA AMBIENTAL
CAPÍTULO 5
OS VALORES CULTURAIS E ESPIRITUAIS NA
GESTÃO DE ÁREAS PROTEGIDAS: ENFOQUES
E OLHARES SOB A PERSPECTIVA AMBIENTAL
146
DOI: http://dx.doi.org/10.18616/arq05
SUMÁRIO
CAP. 5
A MULTIVOCALIDADE DA OS VALORES CULTURAIS E ESPIRITUAIS NA
ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: GESTÃO DE ÁREAS PROTEGIDAS: ENFOQUES E
Comunidades, práticas e direitos OLHARES SOB A PERSPECTIVA AMBIENTAL
147
Antecedentes da questão ambiental
1
Estamos desenvolvendo a pesquisa de doutorado interdisciplinar em Ambiente e Sociedade, com
a temática “O papel da espiritualidade no turismo e na gestão de áreas protegidas: o caso da RPPN
Santuário do Caraça/MG”, no Núcleo de Estudos e Pesquisas Ambientais (Nepam) da Universidade
Estadual de Campinas, sob a orientação do Professor Pedro Paulo A. Funari. A pesquisa teve início em
2014 e está com a defesa pretendida para o ano de 2018.
CAP. 5
A MULTIVOCALIDADE DA OS VALORES CULTURAIS E ESPIRITUAIS NA
ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: GESTÃO DE ÁREAS PROTEGIDAS: ENFOQUES E
Comunidades, práticas e direitos OLHARES SOB A PERSPECTIVA AMBIENTAL
4
No Brasil, o autor menciona os exemplos do Movimento dos Seringueiros, dos Povos da Floresta
da Amazônia, dos Atingidos pelas Barragens. Também ressalta esse movimento indiano, com o
Movimento de Chipko e dos pescadores artesanais da Índia (DIEGUES, 1994). Em especial, o movimen-
to de Chipko constitui um exemplo interessante, pois evidencia a inferências dos elementos espirituais
na relação com a conservação. Antes mesmo de a espiritualidade vigorar na era da sustentabilidade,
as mulheres dessa região, inspiradas nas tradições do grupo espiritual Bishnois de Rajastán, abraça-
ram-se às árvores para evitar o desmatamento que ameaçava seus territórios (LEIS, 1998).
CAP. 5
A MULTIVOCALIDADE DA OS VALORES CULTURAIS E ESPIRITUAIS NA
ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: GESTÃO DE ÁREAS PROTEGIDAS: ENFOQUES E
Comunidades, práticas e direitos OLHARES SOB A PERSPECTIVA AMBIENTAL
7
Pensemos no vulcão Tongariro, na Nova Zelândia, centro de uma espiritualidade dos povos maoris.
Naquele espaço, não há nenhuma construção humana. Trata-se simplesmente de um vulcão, em toda
a sua materialidade, com uma série de valores imateriais espirituais associados. Este constitui um
exemplo claro de inclusão de novos elementos que não pertencem à concepção clássica de patrimô-
nio e de quebras às fronteiras entre o patrimônio cultural e o natural. Esta segmentação, de tradição
greco-judaica, não se dá em outras sociedades europeias, portanto, em sua superação, arriscam-se
muitas possibilidades de futuro [tradução nossa].
CAP. 5
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ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: GESTÃO DE ÁREAS PROTEGIDAS: ENFOQUES E
Comunidades, práticas e direitos OLHARES SOB A PERSPECTIVA AMBIENTAL
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CAP. 5
A MULTIVOCALIDADE DA OS VALORES CULTURAIS E ESPIRITUAIS NA
ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: GESTÃO DE ÁREAS PROTEGIDAS: ENFOQUES E
Comunidades, práticas e direitos OLHARES SOB A PERSPECTIVA AMBIENTAL
166
CAP. 6
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EM BUSCA DO PATRIMÔNIO CULTURAL (IN)
ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL:
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Comunidades, práticas e direitos
CAPÍTULO 6
EM BUSCA DO PATRIMÔNIO CULTURAL
(IN)VISÍVEL: O CABOCLO DA REGIÃO DO
CONTESTADO
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SUMÁRIO
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Comunidades, práticas e direitos
representação que ele fez de si próprio por aqueles de quem espera reconhe-
cimento; quando compreende as formas de dominação simbólica, por meio do
aparelho ou do aparato [...]” (CHARTIER, 1990, p. 23-24) tem um alcance de
proporções enormes na consciência ou no inconsciente das pessoas da mesma
nacionalidade.
Recentemente, percebeu-se a sensibilidade de instituir ações, e as re-
flexões sobre a importância dos bens culturais como referências fundamentais
para vários grupos formadores da sociedade brasileira contribuíram para que o
Congresso Nacional incluísse o tema, de maneira contundente e afirmativa na
Constituição Federal promulgada em 1988, que estabeleceu:
é todo bem palpável, como praça, museu. Os intangíveis são as memórias que
guardam a música, o canto, a reza.
de ser, organização social, sua relação com a história da guerra, o caboclo como
sujeito desse processo de construção de memórias, da necessidade do reco-
nhecimento do seu patrimônio cultural, das suas experiências de vida, de re-
lações de vida e de guerra, e atentando para esses aspectos e suas relações é
que podemos encontrar o caboclo, que é descrito como o inimigo da incipiente
república brasileira de então.
Em relação à experiência humana, Thompson (1987) lembra que ela
expressa o que há de mais vivo na história. É a presença de homens e mulheres
retornando como sujeitos construtores do devir e do presente. Não são as es-
truturas que constroem a história. São as pessoas carregadas de experiências.
Podem não representar sujeitos autônomos nem “sujeitos livres”, mas a situa-
ção e suas relações produtivas lhes são determinadoras como necessidades. As
contingências históricas exercem pesada presença na vida de cada pessoa. São
os antagonismos aos quais todos estão submetidos.
Segundo Thompson (1987), essa experiência é trabalhada na cultura
das pessoas e dos agrupamentos dos moradores, de acordo com suas afinida-
des. A cultura é engendrada no âmago da experiência social, toma corpo, cons-
trói uma coerência interna e passa a atuar, por sua vez, no embate de outras
175
experiências (a cultura aqui é compreendida como valores, modos de vida, vi-
sões de mundo, sentimentos, aspirações, projetos, crenças, formas simbólicas
de dominação e resistência, tradições, mitos, etc.).
O conjunto dessas experiências orienta, dá os vetores e os caminhos
das novas lutas. O grau de consciência social, conquistado na experiência e na
cultura, determina os caminhos da história, que no processo é indeterminada.
Os caboclos da região do Contestado (peões, turmeiros, posseiros, estanciei-
ros empobrecidos, índios etc.) experimentaram no seu cotidiano as mais diver-
sas experiências: organização e defesa dos seus bens; formas de sociabilidade,
de lazer, de construção de identidades, de conflitos étnicos, de migrações, de
construção e de destruição de cidades santas, de messianismo, da chegada do
capital internacional na região, bem como das transformações mais recentes
no mundo do trabalho e do sertão, modo de vida que chegou até a atualidade
como registro histórico e hoje se constitui em importante patrimônio cultural.
O cotidiano é mais que a simples descrição das condições materiais de
vida. É também a visualização das experiências vividas, percebidas pelas pessoas
que experimentaram “[...] as relações sociais (classe, gênero, étnicos, etc.) em
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EM BUSCA DO PATRIMÔNIO CULTURAL (IN)
ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL:
VISÍVEL: O CABOCLO DA REGIÃO DO CONTESTADO
Comunidades, práticas e direitos
última década do século XIX, no ano de 1908, foi assumida pelo grupo da Brazil
Railway Company, que inaugurou esse traçado ferroviário no ano de 1910.
Ainda no ano de 1910, ocorreu a terceira sentença no Supremo Tribunal
Federal dando ganho de causa para Santa Catarina na questão dos limites – uma
disputa política e jurídica que havia tumultuado a região, instigando conflitos
entre os moradores e indefinição relacionada à jurisdição sobre essas terras.
No ano de 1911, uma grande madeireira do grupo da Brazil Railway
Company iniciou as suas atividades industriais na região do Contestado, trans-
formando o meio ambiente. Também foi o ano em que ocorreram os primeiros
despejos dos moradores, os quais tinham suas casas próximo do traçado ferro-
viário, desprovidos de registros ou de algo que lhes garantisse a posse das terras
que ocupavam. Não bastasse isso, ainda veio a peste dos ratos por causa da seca
da taquara.
O fenômeno da seca da taquara ocorria a cada três décadas e, para
os moradores do sertão, representava uma verdadeira catástrofe. Ao findar o
alimento das ratazanas (sementes de taquaras), os roedores invadiam lavouras
e casas, devorando tudo e provocando miséria, doenças e desespero entre os
178 moradores. O flagelo do ano de 1911 só não foi completo porque boatos de que
o monge teria retornado se espalharam.
Quem surgiu foi um curandeiro de ervas, denominado José Maria, líder
religioso que protagonizou o episódio denominado Combate do Irani, ocorrido
entre as forças de segurança do estado do Paraná e o grupo de seguidores de
José Maria. Para os moradores da região, as transformações abruptas provoca-
ram uma aguda crise e a luta armada já havia iniciado. Embora o líder tenha sido
morto no primeiro combate, a guerra continuou por quatro anos.
A experiência dos homens e mulheres que estiveram nos redutos, acre-
ditando viver em uma irmandade cabocla, foi sufocada pelas forças armadas da
república, que bombardearam e destruíram as cidades santas. No final, doentes
e famintos procuraram se entregar e calar diante da condição de vencidos.
Ficou impressa nos caboclos a culpa pelo derramamento de sangue.
Silenciados e traumatizados, muitos guardaram o silêncio como resposta à con-
dição de vencidos que lhes foi imposta. Na fase final, a “demonização” dos líde-
res foi interiorizada pelos demais redutários (MACHADO, 2004).
Não fica difícil perceber que a negação da condição de sujeitos impôs
aos moradores que enfrentaram as forças oficiais da então incipiente repúbli-
CAP. 6
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Comunidades, práticas e direitos
O PATRIMÔNIO “MALDITO”
1
Disponível em: <http://camaracacador.sc.gov.br/noticias/index/ver/codNoticia/395390/cod MapaI-
tem/1536>. Acesso em: 03 jan. 2017.
CAP. 6
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ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL:
VISÍVEL: O CABOCLO DA REGIÃO DO CONTESTADO
Comunidades, práticas e direitos
Programação:
lonização) foram fatores decisivos para a deflagração da crise que levou à luta
armada.
Caboclos, denominação comum aos homens e mulheres que viviam na
região muito antes da chegada do progresso (consubstanciado na construção
da ferrovia), viviam de maneira simples até serem alcançados pela “civilização”.
Ao mesmo tempo que foram protagonistas de um grande movimento social,
foram vítimas da ganância do capital internacional nas terras onde plantaram
suas vidas.
Assim como Thompson (1987), que estudou a formação da classe ope-
rária inglesa e percebeu na tradição e na cultura o sujeito ativo nos movimen-
tos sociais, Maurício Vinhas de Queiroz (1966), Paulo Pinheiro Machado (2004),
Duglas Teixeira Monteiro (2011), e outros intelectuais que se debruçaram sobre
o tema, perceberam que o caboclo, muitas vezes, foi acusado de fanático, bár-
baro, bandido e outros adjetivos pejorativos; que ele lutou, na forma da sua
visão e entendimento, com bravura contra um mundo em transformação e, para
piorar, enfrentou um exército da mesma nação, onde o próprio governo brasi-
leiro utilizou a força contra seu povo, massacrando moradores simples, peões
e analfabetos de um sistema que, distante de qualquer tentativa de diálogo ou
186
entendimento, preferiu eliminar o elemento pernicioso que perturbava a or-
dem. Termos utilizados para denominar o morador simples que se revoltou e
que, por muitos anos, carregou nas costas a culpa pelo derramamento de san-
gue ocorrido na época.
Desse modo, não fica difícil entender porque o próprio morador da
região do Contestado não atenta para a importância de sua história e de seu
patrimônio, seja ele material ou imaterial. Na condição de vencidos, foram con-
denados ao silêncio, culpados e execrados pela própria história. Fácil de com-
preender os adjetivos atribuídos aos caboclos já nos primeiros escritos sobre a
Campanha do Exército na região do Contestado: facínoras, incautos, desordei-
ros e impatrióticos. Difícil recuperar a autoestima e sair da condição de vencidos
para assumir o protagonismo e se autoperceberem como sujeitos históricos.
Terminamos pensando sobre todos os acontecimentos, os fatos, as re-
lações. Isso faz parte do atual patrimônio cultural. Onde encontramos esses ves-
tígios? Nas tradições que ainda vivem entre os caboclos, nos monumentos, nos
Museus (quase sempre sobrevivendo aos trancos e barrancos, ou, quando não,
esquecidos pelo poder público), às vezes vistos pelos moradores como “alguma
coisa importante”.
CAP. 6
A MULTIVOCALIDADE DA
EM BUSCA DO PATRIMÔNIO CULTURAL (IN)
ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL:
VISÍVEL: O CABOCLO DA REGIÃO DO CONTESTADO
Comunidades, práticas e direitos
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CAPÍTULO 7
A PRESERVAÇÃO CULTURAL COMO CAMPO DE
PESQUISA
191
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SUMÁRIO
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A MULTIVOCALIDADE DA
ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: A PRESERVAÇÃO CULTURAL COMO CAMPO DE
Comunidades, práticas e direitos PESQUISA
A PRESERVAÇÃO EM PROCESSO
Fonte:IPHAN/RS
Fonte: IPHAN/RS(2004).
(2004).
195
Cabe destacar, ainda, que entre os anos de 2003 a 2006, em uma ação
que englobou a UNESCO, o World Monuments Fund (WMF) e outras instituições
Cabe destacar,
Cabe ainda, que
destacar, queentre os anos de 2003
2003aa2006,
2006,em emuma
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de Capacitação
(WMF)parae outras
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a Conservação, nacionais
Gestão
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nacionais responsáveis pelopelo
Sustentável das Missões Jesuíticas dos Guarani, que tinha como premissa opor-
mônio missioneiro,
atrimônio missioneiro,foifoipromovido
promovido o reconhecido ProgramadedeCapacitação
reconhecido Programa Capacitação
tunizar a cooperação internacional para integrar os esforços e as experiências
parapara
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onservação, de
ervação, Gestãodiversos
Gestão países sul-americanos.
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Desenvolvimento Sustentável das
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esforços
xperiências
riências dede diversospaíses
diversos paísessul-americanos.
sul-americanos.
197
Em suas linhas, o acordo era descrito como tendo como alguns dos
seus principais objetivos o “[...] estabelecimento de relações de cooperação
de caráter científico, tecnológico, formativo e cultural, em relações com a do-
cumentação, a conservação, a formação e a difusão do patrimônio histórico.”
(NOGUEIRA e BURKHARD, 2008, p. 29).
O projeto integra várias áreas da cultura, como patrimônio imaterial,
a estatuária missioneira, e objetiva estudar, recuperar e valorizar o patrimônio
arqueológico missioneiro. Profissionais de ambos os institutos participam de
oficinas e atividades de pesquisa que envolvem antropólogos, historiadores, ar-
quitetos e arqueólogos.
O projeto principal é denominado Guia da Paisagem Cultural para a
Gestão do Desenvolvimento do Território das Missões Jesuíticas no Brasil e um
dos seus enfoques mais profundos é a Arqueologia. Precisamente, desde o iní-
cio, o que se desejava era a aplicação de prospecções geofísicas e de sondagens
arqueológicas como forma de se compreender a ocupação territorial na redu-
ção (Figuras 11 e 12).
A partir do estudo, foi possível localizar com precisão antigas estrutu-
198 ras reducionais vinculadas às habitações indígenas que ficam próximo à área
central da praça. Dessas estruturas, duas habitações localizadas logo atrás dos
assentos atuais utilizados pelo público durante o espetáculo Som e Luz foram as
estruturas mais prospectadas.
Com os resultados do trabalho geofísico, no mês de abril de 2010, fo-
ram realizadas as primeiras escavações. Durante o trabalho, foram descobertas
extremidades de duas habitações indígenas.
Fato interessante foi que o alinhamento espacial das ruas das casas
com a porta da igreja não era ortogonal como se supunha até então pelas ilus-
trações históricas da malha urbana da Redução de São Miguel Arcanjo, havendo
uma leve inclinação. Esse dado contribuiu para uma reflexão sobre o processo
de adaptação do planejamento urbano a uma realidade diferente. A investiga-
ção científica assim iria interferir definitivamente nos futuros usos do campo
arqueológico.
CAP. 7
A MULTIVOCALIDADE DA
ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: A PRESERVAÇÃO CULTURAL COMO CAMPO DE
Comunidades, práticas e direitos PESQUISA
199
CAP. 7
A MULTIVOCALIDADE DA
moradias), carvão
ARQUEOLOGIA PÚBLICAe fogueira A PRESERVAÇÃO
na parte interna das
NO BRASIL: CULTURAL
habitações (ver quadro 1). COMO CAMPO DE
Comunidades, práticas e direitos PESQUISA
Cerâmica 468
Lítico 25
Louça 65
Vidro 16
Metais 92
Total 666
201
161
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ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: A PRESERVAÇÃO CULTURAL COMO CAMPO DE
Comunidades, práticas e direitos PESQUISA
Figura 18 - Cravo
202
204
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24 e 25). A MULTIVOCALIDADE DA
ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: A PRESERVAÇÃO CULTURAL COMO CAMPO DE
Comunidades, práticas e direitos Figura 24 - Sílex trabalhado PESQUISA
Figura
Figura 24 24 - Sílex
- Sílex trabalhado
trabalhado
Fonte:
Fonte: IPHAN-RS
IPHAN-RS (Catálogo
(Catálogo 425.85).
425.85).
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
207
CAP. 8
A MULTIVOCALIDADE DA COMUNICANDO A ARQUEOLOGIA: DISCUTINDO
ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: O PAPEL DA SOCIEDADE DE ARQUEOLOGIA
Comunidades, práticas e direitos BRASILEIRA
CAPÍTULO 8
COMUNICANDO A ARQUEOLOGIA:
DISCUTINDO O PAPEL DA SOCIEDADE DE
ARQUEOLOGIA BRASILEIRA
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DOI: http://dx.doi.org/10.18616/arq08
Glória Tega
Flávio Calippo
Marcia Bezerra
SUMÁRIO
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Comunidades, práticas e direitos BRASILEIRA
INTRODUÇÃO
Para Terra (2006, p. 27), a web é uma mídia, pois “[...] interpõe emisso-
res e receptores, servindo de canal para a transmissão de mensagens.”, sendo o
grande diferencial desse canal justamente essa capacidade interativa e também
instantânea. Na web, tempo e espaço deixam de existir, “[...] a distância física e
o tempo são elásticos e por isso a comunicação neste ambiente é policrônica e
multidirecional.” (TERRA, 2010, p. 128).
Desse modo, as entidades têm que se adaptar, deixando de, simples-
mente, emitir informações para gerar mensagens, dar chance de estabelecer
relacionamentos com públicos (TERRA, 2010), usando essas interações comuni-
cacionais como termômetro para ações institucionais. “As redes interativas de
computadores estão crescendo, criando novas formas e canais de comunicação,
moldando a vida e sendo moldadas por ela.” (CASTELLS, 1999, p. 25).
Dentro desse cenário é que as redes sociais estão inseridas. Nelas, as
entidades buscam se relacionar com seus públicos, transmitir informações, en-
tender a sua percepção em relação ao público, engajar, entre outros objetivos.
Como parte desse processo de integração entre emissores e receptores de in-
formação, a leitura da reação do público das mídias sociais é uma oportunidade
210 para que as “[...] organizações expandam suas audiências e engajamento em
seus sites.” (TERRA, 2010, p. 106).
Nesse sentido, quando as organizações aproveitam as oportunidades
vindas das interações com seus públicos, acabam ganhando legitimidade e visi-
bilidade (TERRA, 2010, p. 180), pois, na atual conjuntura, não podem ficar res-
tritas ao que se publica sobre elas nos meios de comunicação tradicionais ou
sobre o que elas dizem sobre si, pois “[...] a reputação é cada vez mais terceiri-
zada nas percepções que os públicos têm dela e expressam por meio de diversas
ferramentas tanto on quanto off-line” (TERRA, 2010, p. 123).
Assim, monitorar1 redes sociais foi uma das estratégias escolhidas pela
SAB. Monitorar significa verificar e analisar o que as pessoas estão falando sobre
um assunto ou uma entidade, sendo crucial para o atendimento pautar ações,
suprir demandas e gerar conteúdo. Desse modo, além de detectar desconten-
tamentos, o intuito é gerar conteúdo confiável sobre questões relacionadas ao
patrimônio arqueológico brasileiro de modo que esse conteúdo se dissemine
nas redes sociais. Isso porque, de acordo com Terra (2010), uma pesquisa que
questionou consumidores sobre a confiança em determinadas fontes de infor-
1
A SAB monitora redes sociais, como o Twitter e o Facebook, quase diariamente.
CAP. 8
A MULTIVOCALIDADE DA COMUNICANDO A ARQUEOLOGIA: DISCUTINDO
ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: O PAPEL DA SOCIEDADE DE ARQUEOLOGIA
Comunidades, práticas e direitos BRASILEIRA
mação concluiu que esses consumidores “[...] confiam muito mais em pessoas
próximas [...]” (TERRA, 2010, p. 92), demonstrando que conteúdos, quando
compartilhados entre “amigos” nas redes sociais, são mais persuasivos.
Muito embora a ciência cada vez mais necessite exercitar sua “face
pública”, não é raro constatar que muitos de nós, pesquisadores, ainda somos
arredios à divulgação científica, alicerçados na falta de confiança plena no tra-
balho desenvolvido pelos divulgadores científicos. O fato é que hoje todos nós
queremos, e precisamos, divulgar nossas pesquisas, porque, no mínimo, as “[...]
pesquisas científicas dependem cada vez mais de verbas públicas e de financia-
mento privado e, para obtê-las, o contato com a imprensa tornou-se imprescin-
dível.” (BOAS, 2005, p. 37).
Esse panorama atual também tem relação com o fato de vivermos na
“era da informação” e, dessa maneira, posturas de “clausura” em laboratórios
por parte dos cientistas, de acordo com Boas (2005), são cada vez mais raras já
211 a partir dos anos de 1990, quando equipes de comunicação a serviço de institui-
ções de pesquisas e cursos de divulgação científica começaram a se multiplicar
rapidamente, resultando em artigos mais claros, na aproximação da ciência com
a sociedade, gerando a demanda por informação científica.
Muito além de ser um processo de “[...] transposição de uma lingua-
gem especializada para uma linguagem não especializada.” (BUENO, 1984, p.
19), a Divulgação Científica é uma “formulação discursiva” (ZAMBONI, 1997,
p. 11), por meio da qual uma ação comunicativa parte do discurso científico,
moldando seu discurso de acordo com o público-alvo e com os meios de comu-
nicação usados – que podem ser matérias jornalísticas, filmes, livros, peças de
teatro, entre outros (DIAS et al., 2013).
Em estudo original (TEGA-CALIPPO, 2012) realizado a partir do jornal
“Folha de São Paulo” sobre a maneira como a Arqueologia era retratada nos
935 textos selecionados, entre os anos de 2000 e 2010, constatou-se, quanti-
tativamente, que o número de matérias publicadas no mundo ainda é muito
maior que as matérias que retratam as pesquisas realizadas por arqueólogas/
os brasileiras/os. Além disso, o número de textos publicados não acompanha,
CAP. 8
A MULTIVOCALIDADE DA COMUNICANDO A ARQUEOLOGIA: DISCUTINDO
ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: O PAPEL DA SOCIEDADE DE ARQUEOLOGIA
Comunidades, práticas e direitos BRASILEIRA
2
As informações contidas aqui foram retiradas da Dissertação intitulada “Arqueologia em notícia:
Pesquisas impressas, sentidos circulantes e memórias descobertas”, defendida por Tega-Calippo em
agosto de 2012, no Programa de Mestrado em Divulgação Científica e Cultural do Laboratório de
Estudos Avançados em Jornalismo da Universidade Estadual de Campinas (Brasil), sob a orientação
do Prof. Dr. Rodrigo Bastos Cunha, com financiamento da CAPES. O objetivo geral da pesquisa foi
analisar o processo de comunicação por meio do qual o conhecimento arqueológico é divulgado em
reportagens e notícias publicadas no jornal Folha de S. Paulo, usando a teoria da Análise do Discurso
de Linha Francesa.
CAP. 8
A MULTIVOCALIDADE DA COMUNICANDO A ARQUEOLOGIA: DISCUTINDO
ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: O PAPEL DA SOCIEDADE DE ARQUEOLOGIA
Comunidades, práticas e direitos BRASILEIRA
3
A SAB foi criada durante o Seminário Goiano de Arqueologia, ocorrido em Goiânia em 1980. Seu
primeiro congresso foi realizado em 1981, no Rio de Janeiro, nas Faculdades Integradas Estácio de Sá,
que abrigavam o único curso de Bacharelado em Arqueologia do país à época. Ela é uma associação
civil de caráter científico, de direito privado e sem fins lucrativos, que “[...] tem por objeto primordial
congregar arqueólogos/as e demais especialistas dedicados/as à pesquisa, ensino e disseminação da
arqueologia, patrimônio cultural e áreas afins, emanando o pensamento e o ideal coletivo de seus/uas
associados/as, viabilizando-os de modo mais justo e perfeito possível.” (SAB, 2013, p. 1). A SAB é com-
posta por profissionais e estudantes da Arqueologia e áreas correlatas, que residem ou exercem suas
funções nos mais diversos estados brasileiros, além de associadas/os de outros países. Atualmente,
são cerca de 900 associadas/os, com representantes de todos os estados do Brasil, além de colegas
estrangeiros. Ver: www.sabnet.com.br.
4
A Assessora de Imprensa da SAB, Gloria Tega, trabalha de forma voluntária desde outubro de 2013.
CAP. 8
A MULTIVOCALIDADE DA COMUNICANDO A ARQUEOLOGIA: DISCUTINDO
ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: O PAPEL DA SOCIEDADE DE ARQUEOLOGIA
Comunidades, práticas e direitos BRASILEIRA
uma percepção sobre como uma boa parte das/os associadas/os e membros da
comunidade arqueológica (que se manifestam nas mídias digitais) recebem as
decisões e ações desenvolvidas pela diretoria da SAB. Muitas vezes, os próprios
gestores da SAB respondem às colocações feitas pelos internautas ou utilizam
os questionamentos apresentados para a elaboração dos comunicados às/aos
associadas/os. Desse modo, essas ações de comunicação passam a atuar em
fluxos de informações de mão dupla, em que tanto a SAB como o seu público na
internet se tornam emissores e receptores.
Além disso, a publicação de notícias e de oportunidades no site da SAB
foi intensificada, o que pode ser demonstrado com dados. Desde a criação da
área de “notícias”5 no site, em 11 de agosto de 2011, até o dia 28 de fevereiro
de 2017, foram publicadas 431 notícias. Para efeito comparativo, considerare-
mos anos completos, ou seja, de 01 de janeiro a 31 de dezembro. Sendo assim,
de 01 de janeiro de 2012 a 31 de dezembro de 2013, registrou a publicação de
100 notícias, uma média anual de 50. A partir de 01 de janeiro de 2014 até 31
de dezembro de 2016, foram publicadas 305 notícias, com uma média de pouco
mais de 100 por ano, o dobro do período anterior aqui mencionado.
214 Há também no site da SAB a sessão “oportunidades”,6 que traz cursos,
chamadas para publicações, eventos, entre outros assuntos. Nessa sessão, tam-
bém houve um aumento considerável de publicações: de 01 de janeiro de 2012
a 31 de dezembro de 2013, foram publicadas 13 oportunidades enquanto que
de 01 de janeiro de 2014 até 31 de dezembro de 2016 foram 111.
Quando o assunto é a demanda de divulgação de eventos, cursos, en-
tre outros das/os associadas/os, já em 2015, a diretoria sentiu necessidade de
discutir na Assembleia Geral de Goiânia o que as/os associadas/os considera-
vam pertinente ser enviado pela entidade. Assim, desde setembro de 2015, o
que a SAB divulga pelos seus meios oficiais é norteado por essa discussão feita
em Assembleia7.
De outro lado, a Revista da SAB tem sido – desde os anos de 1980 – o
principal veículo de divulgação das pesquisas desenvolvidas pela comunidade
arqueológica no Brasil. Trata-se de um periódico científico, de acesso gratuito, o
5
Disponível em: <http://www.sabnet.com.br/informativo/public?TIPO=1>.
6
Disponível em: <http://www.sabnet.com.br/informativo/public?TIPO=2>.
7
Essas regras para divulgação estão disponíveis no site da SAB: <http://www.sabnet.com.br/
informativo/view?TIPO=1&ID_INFORMATIVO=392>.
CAP. 8
A MULTIVOCALIDADE DA COMUNICANDO A ARQUEOLOGIA: DISCUTINDO
ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: O PAPEL DA SOCIEDADE DE ARQUEOLOGIA
Comunidades, práticas e direitos BRASILEIRA
documentos e fotos que trazem um pouco da memória da SAB. O vídeo foi pen-
sado para ser crítico, mas, ao mesmo tempo, agregador. Logo no início apresen-
ta trechos de falas de diversas/os arqueólogas/os que, ao serem editados em
sequência, constroem uma definição plural de Arqueologia14.
No que diz respeito à imprensa, a distribuição de releases15, as notas
oficiais e os contatos constantes com jornalistas interessados na temática têm
sido estratégias que vêm dando resultados. As notas oficiais esclarecem a res-
peito de matérias com informações equivocadas sobre Arqueologia, divulgadas
na imprensa. Além disso, elas têm permitido o relacionamento da entidade com
jornalistas que, aos poucos, vêm considerando a SAB como fonte de informação
– assim como já ocorreu com os jornais Folha de São Paulo e Correio Braziliense
e com a revista Superinteressante. As fontes são entidades, locais ou pessoas
que são usualmente procurados por jornalistas que cobrem temas específicos.
Os jornalistas procuram determinadas instituições ou profissionais que servem
como referências para obterem informações e construírem seu texto. No caso
da SAB, por ser a entidade nacional que congrega o maior número de arqueó-
logas/os do país e por existir há mais de 30 anos, esse papel referencial deveria
ser natural, no entanto ele começou seu processo de construção somente nos
216
últimos anos.
Outro ponto crucial nos últimos anos foi o relacionamento da SAB com
outras entidades e órgãos oficiais. Desde junho de 2014 a SAB tem se feito pre-
sente, quase que mensalmente, no Congresso Nacional, em Brasília, com o in-
tuito de acompanhar projetos de lei que afetam de forma direta o exercício da
profissão16 e a proteção ao patrimônio arqueológico.
Além dela participar de diversos fóruns digitais de discussão nas áreas
de ciências humanas e sociais, também se faz representar, na medida do possí-
vel, nos eventos de outras sociedades. Esse diálogo tem sido fundamental para
a articulação das ações no Congresso Nacional. Uma relação similar àquela que
vem sendo estabelecida com o Centro Nacional de Arqueologia – CNA e com o
Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN, em que os ges-
14
Veja detalhes do vídeo em http://www.sabnet.com.br/conteudo/view?ID_CONTEUDO=784.
15
Texto de divulgação elaborado em linguagem jornalística.
16
Projeto no 1119/2015, que trata da regulamentação da profissão de arqueóloga/o, e PEC no 65/2012,
PLS no 654 e Decreto Legislativo no 540/2016 que, de maneira geral, alteram o processo de licencia-
mento ambiental.
CAP. 8
A MULTIVOCALIDADE DA COMUNICANDO A ARQUEOLOGIA: DISCUTINDO
ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: O PAPEL DA SOCIEDADE DE ARQUEOLOGIA
Comunidades, práticas e direitos BRASILEIRA
17
Disponível em: <http://www.comscore.com/por/Imprensa-e-eventos/Apresentacoes-e-
documentos/2014/The-State-of-Social-Media-in-Brazil-and-the-Metrics-that-Really-Matter>.
18
Veja em: <https://www.socialbakers.com/statistics/facebook>.
19
Fãs de uma página no Facebook são pessoas que “curtiram” essa página e acompanham suas
publicações.
CAP. 8
A MULTIVOCALIDADE DA COMUNICANDO A ARQUEOLOGIA: DISCUTINDO
ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: O PAPEL DA SOCIEDADE DE ARQUEOLOGIA
Comunidades, práticas e direitos BRASILEIRA
219
Partindo do ponto que “[...] a internet funciona nos dias de hoje como
uma vitrine virtual de exposição institucional.” (TERRA, 2010, p. 6), a experiên-
cia de comunicação desenvolvida pela SAB nos últimos anos vem mostrando
que existe um interesse crescente pela Arqueologia e que os meios digitais são
um mecanismo importante tanto para a comunicação com as/os associadas/os
222 como, principalmente, com a sociedade em geral. Mais do que uma alternativa
para difundir a importância da Arqueologia e, assim, justificar a necessidade
do emprego de verbas públicas e privadas, o estabelecimento de uma forma
de comunicação e de interação, a partir de um fluxo de informação em que os
emissores e os receptores trocam várias vezes de papel, efetivamente amplia o
diálogo e fortalece as relações entre os gestores e as/os associadas/os da SAB.
Na medida em que podemos perceber os anseios e os posicionamentos das/os
associadas/os e da comunidade arqueológica a respeito dos acontecimentos,
a SAB pode planejar melhor suas ações e ampliar as formas para equacionar
conflitos. De certo modo, permite aos gestores da SAB tomar decisões mais re-
presentativas em relação ao que pensam suas/seus associadas/os.
22
Veja os “memes” na Fanpage da SAB: <https://www.facebook.com/ArqueologiaSAB/>.
23
O dia 26 de julho foi escolhido como Dia do Arqueólogo, pois a Lei Federal 3.924 foi sancionada em
26 de julho de 1961. Essa lei garante a proteção aos monumentos arqueológicos ou pré-históricos
de quaisquer naturezas existentes no território nacional, colocando-os sob a guarda e proteção do
Poder Público, e considerando os danos ao patrimônio arqueológico um crime contra o Patrimônio
Nacional. Veja a lei em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1950-1969/L3924.htm>.
24
Veja em: <http://www.sabnet.com.br/informativo/view?TIPO=1&ID_INFORMATIVO=393>.
CAP. 8
A MULTIVOCALIDADE DA COMUNICANDO A ARQUEOLOGIA: DISCUTINDO
ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: O PAPEL DA SOCIEDADE DE ARQUEOLOGIA
Comunidades, práticas e direitos BRASILEIRA
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
223
225
CAP. 9
A MULTIVOCALIDADE DA
ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: A VARIÁVEL ARQUEOLÓGICA NO LICENCIAMENTO
Comunidades, práticas e direitos AMBIENTAL
CAPÍTULO 9
A VARIÁVEL ARQUEOLÓGICA NO
LICENCIAMENTO AMBIENTAL
226
DOI: http://dx.doi.org/10.18616/arq09
SUMÁRIO
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A MULTIVOCALIDADE DA
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Comunidades, práticas e direitos AMBIENTAL
INTRODUÇÃO
3
O acórdão foi proferido em 28 de junho de 2006 e julgou procedente a ADI (ADI 2544/RS. Relator
Ministro Sepúlveda Pertence).
CAP. 9
A MULTIVOCALIDADE DA
ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: A VARIÁVEL ARQUEOLÓGICA NO LICENCIAMENTO
Comunidades, práticas e direitos AMBIENTAL
4
ADI relatada pelo Ministro Gilmar Mendes, que questionava a constitucionalidade da Lei Estadual no
7.782/2002, do Mato Grosso (MATO GROSSO, 2002).
5
Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=71011>.
Acesso em: 19 mar. 2017.
CAP. 9
A MULTIVOCALIDADE DA
ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: A VARIÁVEL ARQUEOLÓGICA NO LICENCIAMENTO
Comunidades, práticas e direitos AMBIENTAL
Por isso, o melhor seria que a dúvida gerada pelo texto do art. 13,
§ 1°, fosse esclarecida o quanto antes10, nem que fosse para dizer o que nos
parece óbvio: que o órgão que detém o poder de polícia deve ter sua posição
acatada pelo órgão licenciador e pelo empreendedor. Aliás, esse foi o entendi-
mento da Procuradoria Geral da República (PGR), em parecer exarado na Ação
Direta de Inconstitucionalidade (ADI 5180), cujo relator é o Ministro Dias Tofolli
(BRASIL, 2015c), contra o artigo 36, parágrafo 3º, da Lei Federal 9.985/2000 (Lei
do SNUC – Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza). O artigo
questionado exige autorização do gestor das unidades de conservação no licen-
ciamento ambiental de qualquer empreendimento que afete a área relativa à
unidade de conservação (UC) ou a sua zona de amortecimento11. Nas palavras
de Rodrigo Janot, Procurador Geral da República, no parecer encartado à ADI:
10
Como destaca Talden Farias: “Existe uma lacuna, que é a falta de disciplinamento do momento e da
forma dessa participação [dos órgãos intervenientes]. Com efeito, até hoje não se sabe ao certo se
a manifestação dos órgãos públicos interessados será antes, durante ou após a finalização do estudo
ambiental, nem se deverá ocorrer um convite ou edital de convocação específico ou se a simples
publicação do requerimento da licença será o suficiente. Como as interpretações têm resultado em in-
segurança jurídica, em virtude das divergências entre os órgãos interessados, é preciso regulamentar
tais procedimentos por meio de decreto.” (FARIAS, 2016. Comentários nossos).
11
Ação pendente de julgamento. O acompanhamento pode ser feito em <http://www.stf.jus.br/por-
tal/processo/verProcessoAndamento.asp?numero=5180&classe=ADI&origem=AP&recurso=0&tipo-
Julgamento=M>.
CAP. 9
A MULTIVOCALIDADE DA
ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: A VARIÁVEL ARQUEOLÓGICA NO LICENCIAMENTO
Comunidades, práticas e direitos AMBIENTAL
Não se pode prever como será o julgamento dessa ADI 5180 (BRASIL,
2015c) e se a posição do Ministério Público Federal será acatada pelo Supremo
Tribunal Federal. Mas o argumento de que a autorização do responsável pela
Unidade de Conservação é um exercício de poder de polícia preventivo cabe
como uma luva para a posição do IPHAN nos licenciamentos ambientais.
Na audiência pública realizada em 2014 pelo Ministério Público Federal
acerca da proteção dos bens culturais no licenciamento, o representante do
IBAMA foi questionado sobre como o tema da vinculação ou não à manifestação
do IPHAN era tratado nos licenciamentos da União. Sua resposta foi:
lução sem conflito, o que nem sempre acontece. No caso do não atendimento,
prevalece o poder de polícia do IPHAN. Com a regulamentação da participação
do IPHAN no licenciamento, pela IN 001/2015 (posterior, portanto, à resposta
supratranscrita do IBAMA na audiência pública), nota-se que a comunicação do
IPHAN com o empreendedor não tem intermediação do órgão ambiental. Os
artigos 36, § 2° e § 5° e 37 da IN confirmam essa tratativa direta.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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______. Meio ambiente cultural: tombamento – ação civil pública e aspectos
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CAP. 9
A MULTIVOCALIDADE DA
ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL: A VARIÁVEL ARQUEOLÓGICA NO LICENCIAMENTO
Comunidades, práticas e direitos AMBIENTAL
263
A MULTIVOCALIDADE DA ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL:
Comunidades, práticas e direitos
ÍNDICE ONOMÁSTICO
A
Ab’Sáber, Aziz Nacib 142
Acosta Alcaraz, Feliciano 58, 71
Aguirre, Lope de 126, 128
Alberti, Verena 58, 68
Almeida, Guilherme de 168
Almeida, Marco Antonio Delfino 38, 68
Alves da Silva, Cleube 41, 68,
Amaral, Tarsila do 77, 168,
Andrade, Mário de 168
Andrade, Mariza Guerra de 159, 164
264 Andrade, Oswald de 77, 91, 93
Antunes, Paulo de Bessa 238
Arantes, António Augusto 124, 143
Arendt, Hannah 28, 31, 69,
Aroso, O. C. L. [sic] 126, 127, 143
B
Bahn, Paul 54, 74
Bandarin, Francesco 156, 164
Bandeira, Manuel [Manuel Carneiro de Sousa Bandeira Filho] 168
Barreto, Cristiana 215
Barth, Fredrik 44, 48, 68
Bastos, Rossano Lopes 170, 187
Becker, Ítala Irene Basile 48
Becker, Simone 38, 68
Bello, José Luiz de Paiva 108, 121
A MULTIVOCALIDADE DA ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL:
Comunidades, práticas e direitos
C
Caballos, Antonio 47, 72
Caldarelli, Solange Bezerra 241, 261
Calippo, Flávio 26, 30, 208
Campos, Juliano Bitencourt 5, 17, 20, 26, 29, 30, 167, 188
Capra, Fritjof 148, 164
A MULTIVOCALIDADE DA ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL:
Comunidades, práticas e direitos
D
D´Amato, José Luis 148, 165
D’Antona, Alvaro de Oliveira 101, 102, 104, 121
D’Evreux, Yves 84, 94, 128,
D’Abbeville, Claude 128,
Daniel, João 128, 129, 143
De La Torre, Marta 163, 164
Descola, Philippe 153, 164
Di Cavalcanti [Emiliano Augusto Cavalcanti de Paula Albuquerque e Melo] 168
A MULTIVOCALIDADE DA ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL:
Comunidades, práticas e direitos
E
Eliade, Mircéa 132, 143
Eremites de Oliveira, Jorge 10, 25, 29, 32, 38, 41, 44, 49, 50, 51, 61, 68, 69, 71
267 Ericson, Jonathan E. [sic] 131, 143
Esselin, Paulo Marcos 49, 71
Evans, Clifford 39
F
Farias, Talden 238, 242, 243, 251, 261
Fernandes, José Ricardo Oriá 124, 143
Ferreira, Altinor Barbosa 55
Ferreira, Francisco Bernardes 62, 65, 66, 71
Ferreira, Lúcio Menezes 7, 18
Filó, Maurício da Cunha Savino 171, 188
Folke, Carl 152, 164
Fonseca, Maria Cecília Londres 109, 121
Fontes, Marília de Sousa 135, 138
Foucault, Michel 28, 31, 69, 80, 94
A MULTIVOCALIDADE DA ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL:
Comunidades, práticas e direitos
G
Gnecco, Cristóbal 124, 143
Gonçalves, Yacy-Ara Froner 247, 262
Gouveia Neto, João Costa 12, 25, 29, 123, 124, 125, 144
Graça Aranha [José Pereira da Graça Aranha] 168
Grunberg, Evelina 97, 121, 171, 188
Grünberg, Friedl 46, 61, 72
268 Grünberg, Georg 46, 61, 72
Guidon, Niède 106
H
Hall, Stuart 77, 94, 95
Heckenberger, Michael 127, 144
Heinsfeld, Adelar 174, 188
Hilaire, Saint 160
Holanda, Sérgio Buarque de 80, 94
Holtorf, Cornelius 156, 165
Horta, Maria de Lourdes Parreiras 97, 111, 121, 171, 188
I
Ianni, Octávio 124, 144
Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional 5, 10, 60, 106, 122, 187,
A MULTIVOCALIDADE DA ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL:
Comunidades, práticas e direitos
J
Jacobi, Pedro Roberto 150, 151, 165
Janot, Rodrigo 251
Jenkins 220
Jones, Sian 44, 71
K
Karsburg, Alexandre 177, 189
Kern, Arno Alvarez 192, 197, 206
Kirchhoff, Paul 131, 144
Krivoshein de Canese, Natalia 58, 71
269
L
La Salvia, Fernando 43, 72, 206
Landa, Beatriz dos Santos 46, 72
Laraia, Roque de Barros 104, 122
Leal, Claudia Feierabend Baeta 262
Leff, Enrique 149, 150, 155, 165
Leis, Héctor R. [sic] 148, 149, 150, 165
Leite Filho, Deusdedit Carneiro 126, 127, 144
Lima da Costa, Marcondes [Prof. Dr.] 130
Lima Júnior, Antônio Augusto de 159, 165
Lima, Tania Andrade 254
Little, Barbara J. [sic] 27, 28, 31, 72
Lopes, Raimundo 126, 127, 128, 130, 144
Lopes, Daniel F. [sic] 126, 127, 143
A MULTIVOCALIDADE DA ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL:
Comunidades, práticas e direitos
M
Machado, Ana Lúcia 126, 127, 143
Machado, Gerson 31, 71, 74, 126, 127
Machado, Juliana 215
Machado, Paulo Pinheiro 173, 178, 186, 189, 190
Machado, Paulo Affonso Leme 258, 262
Machado, Renato de Freitas Souza 249
Malfatti, Anita 168
Marques, José Geraldo [sic] 153, 165
Martin, Gabriela 126, 144
Martins, Angela Maria 134, 144
Matias, Carlos dos Passos Paulo 13, 26, 30, 182, 167
Maurício, Vinhas de Queiroz 173, 174, 186, 190
Meggers, Betty Jane 39
Melià, Bartolomeu 46, 47, 48, 61, 72
270 Mello, Celso Antônio Bandeira de 237, 262
Mendes, Gilmar
Menotti Del Picchia
Merriman, Nick
Mignolo, Walter D.
Milheira, Rafael Guedes
Miranda, Marcos Paulo Souza
Montalvão, Ana Carolina Motta Rocha
Monteiro, Adriane Queiroz 97, 121, 171, 188
Monteiro, Duglas Teixeira 174, 186, 189
Montoya, Antonio Ruiz de
Moraes, Tobias Vilhena
Moran, Emilio Frederico
Morato Leite, José Rubens 239, 262
Moreira da Silva, Lázaro 49, 63, 64, 72
A MULTIVOCALIDADE DA ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL:
Comunidades, práticas e direitos
N
Nassar, Paulo 217, 224
Navarro, Alexandre Guida 12, 25, 29, 123, 126, 144
Neves, Eduardo 215
Neves, Eduardo Góes 42, 71, 127, 145
Neves, Walter Alves 43, 73
Nimuendaju, Curt 47, 73, 75
Noelli, Francisco Silva 43, 47, 48, 71, 73
Nogueira, Carmen Regina Dorneles 198, 207
Nora, Pierre 80, 94
Nowaztki, Carlos Henrique 192
271
P
Pacheco de Oliveira, João 44, 68, 70, 73, 74
Padgomy, Irina 42, 71
Palú, Lauro 162, 165
Peixoto, Leandro Rabelo 160
Pelegrini, Sandra de Cássia Araujo 124, 125, 143, 171, 189
Pena, Afonso 160
Pereira da Silva, Luciano 33, 73
Pereira, Levi Marques 38, 44, 46, 47, 49, 71, 73
Pessis, Anne-Marie 100, 106, 122
Phillips, Philip 40, 75
Pimbert, Michel 151, 152, 166
Pinchot, Gifford 151
Pinheiro Machado, Paulo 173, 186, 190
A MULTIVOCALIDADE DA ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL:
Comunidades, práticas e direitos
R
Read, Dwight W. [sic] 131, 143
Renfrew, Colin 54, 74
Ribeiro, Wagner Costa 150, 166
Rodrigues, José Eduardo Ramos 230, 262
Rodrigues, Marian Helen da Silva Gomes 4, 5, 17, 20, 25, 29, 96, 107, 118, 119,
122
272 Rodrigues, Nelson 49
Rodrigues, Rogério Rosa 189
Rodríguez Ramos, Reinaldo 131, 145
Roosevelt, Anna Curtenius 127, 145
Rosa, Albino Pereira da 62
Rosa, Ataliba Pereira da 62, 65, 66, 71
S
Salvadori, Maria Ângela Borges 171, 189
Santos, Ana Flávia Moreira 44, 74
Santos, Boaventura de Souza 79, 94
Santos, J. A. M. [sic] 66, 74
Santos, José Getúlio dos 11, 25, 29, 76
Santos, Maria Cristina dos 46, 74
Santos, Maria do Carmo Monteiro dos 66, 74, 241, 261
A MULTIVOCALIDADE DA ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL:
Comunidades, práticas e direitos
T
Tamanini, Elizabete 28, 31, 74
Tarsila do Amaral
Tea, Gloria 14, 26, 30, 208, 213
Tega-Calippo, Glória Maria Vagioni 211, 212, 225
Teixeira, Adriana 170, 187
Tenório, Maria Cristina 43, 74
Terra, Carolina Frazon 209, 210, 211, 220, 222, 225
Thaddeu, Vera 193, 194, 196
Thompson, Edward Palmer 174, 175, 186, 190
Thoreau, Henry David 151
A MULTIVOCALIDADE DA ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL:
Comunidades, práticas e direitos
U
Urban, Greg 43, 73
Ursúa, Pedro de 126, 128
V
Valentini, Delmir José 13, 26, 30, 167, 180,189, 190
274
Venância, Maria 11, 88
Venâncio, Cacique João 77
Vespúcio, Américo 126
Viçoso, Antônio Ferreira 160
Vilela, Ludiane das Chagas [sic] 90, 95
Viveiros de Castro, Eduardo Batalha 43, 46, 47, 49, 73, 75, 132, 145
Von Martius, Karl Friedrich Philipp 160
W
Wagner, Gustavo Peretti 43, 72
Wanderley, Elaine Cristina Guedes 33, 44, 75
Wehling, Arno 172, 190
Willey, Gordon Randolph 40, 75
Wolf, Cristina Scheibe 176, 190
Woodward, Kathryn 77, 95
A MULTIVOCALIDADE DA ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL:
Comunidades, práticas e direitos
Z
Zamboni, Lilian Márcia Simões 211, 225
Zanirato, Silvia Helena 150, 166
Zico, José Tobias 158, 160, 161, 162, 166
275
A MULTIVOCALIDADE DA ARQUEOLOGIA PÚBLICA NO BRASIL:
Comunidades, práticas e direitos
276