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História do Cristianismo

História do Cristianismo

SUMÁRIO

Introdução

Cap. 1 — Os Períodos Históricos da Igreja..................................................02


História da Igreja Antiga
História da Igreja Medieval
História da Igreja Moderna
História da Igreja Contemporânea

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Cap. 2 — História do Catolicismo Romano..................................................04
Definição do Termo
História da Igreja Cristã
Doutrina Católica
Organização e Estrutura

Cap. 3 — História do Catolicismo Grego......................................................14


Definição do Termo
História da Igreja Ortodoxa
Doutrina Ortodoxa
Ritos das Igrejas Orientais

Cap. 4 — Reforma e Contra-Reforma..........................................................16


Antecedentes da Reforma
A Reforma Protestante
A Contra-Reforma

Cap. 5 — A História do Protestantismo.......................................................20


Princípios Gerais
Origem e Evolução

Cap. 6 — Quatro Condições Espirituais do Cristianismo.............................23


Igreja Formada
Igreja Deformada

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História do Cristianismo
Igreja Reformada
Igreja Conformada

Cap. 7 — Ecumenismo — União das Igrejas................................................35


Definição de Ecumenismo
História do Ecumenismo
Novas Tendências

Conclusão....................................................................................................38

Bibliografia..................................................................................................38

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História do Cristianismo

INTRODUÇÃO

A Bíblia contém a história de Cristo. A Igreja existe para contar a história de Cristo. A história da igreja
é uma continuação da história bíblica. É com essas palavras que Halley abre sua Church History. Nada mais
próximo da verdade. “É impossível, continua ele, “compreender o estado atual do cristianismo senão à luz
de sua história.” 1
É isto que vamos tentar fazer neste módulo: compreender o estado atual do cristianismo à luz de sua
maravilhosa e acidentada história.

CAPÍTULO 1
OS PERÍODOS HISTÓRICOS DA IGREJA

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A História do mundo divide-se geralmente em quatro períodos. (1) Idade Antiga que compreende o
relato sobre Egito, Assíria, Babilônia, Pérsia, Grécia e Roma. (2) Idade Média, que vai desde a queda de
Roma até o descobrimento da América. (3) Idade Moderna, que vai desde o século quinze até a Revolução
Francesa. (4) Idade Contemporânea, que se inicia no século dezoito e continua até nossos dias.
A História da Igreja também pode ser dividida, para fins didáticos, em quatro grandes épocas ou
períodos, durante os quais ela mesma passa por diversas fases e condições: História da Igreja Antiga (31 a.C.
até 476 d.C.), da Igreja Medieval (476 até 1517) e da Igreja Moderna (1453 até 1789) e da Igreja
Contemporânea (1789 até a atualidade).

História da Igreja Antiga


Antiguidade ou Idade Antiga, sob o aspecto da existência da religião cristã, é o período de tempo
convencionalmente compreendido entre o início do cristianismo, datado em 31 d.C., e a queda do Império
Romano do Ocidente (476 d.C.). É a igreja vivendo no tempo do Império Romano.
Esse primeiro período da História da Igreja revela o nascimento da Igreja Cristã e sua posterior
evolução da fase de Igreja Apostólica para a fase de Primitiva Igreja Cristã. “Reconhece-se o começo da
igreja Cristã a partir do grande dia em que o Espírito Santo desceu, de acordo com a promessa de nosso
Senhor a Seus apóstolos.”2
O centro da atividade incluía as regiões da Ásia, África e Europa. A Igreja operou dentro do ambiente
cultural da civilização greco-romana e do ambiente político do Império Romano. Nesse período podemos
destacar três fases básicas: (1) avanço do cristianismo no Império, do ano 31 até o ano 100; (2) a luta da
primitiva Igreja Cristã, mártir, para sobreviver em meio às perseguições imperiais, de 100 a 313; (3) os pais
da igreja e as controvérsias; (4) a oficialização do cristianismo como religião oficial do Império, de 313 até
476.

1
Halley, La Historia de La Iglesia, pág. 10.
2
J. C. Robertson, Sketches of Church History, pág. 9.
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História do Cristianismo

História da Igreja Medieval


Chamamos Idade Média o período da história européia compreendido entre a queda do Império
Romano do Ocidente, no século V, e a afirmação do capitalismo sobre o modo de produção feudal, o
florescimento da cultura renascentista e os grandes descobrimentos. Esta é a época do surgimento e poderio
do papado; da inquisição, do monarquismo, do maometanismo e das cruzadas.
O palco da ação neste período muda-se do sul para o norte e oeste da Europa, isto é, para as margens do
Atlântico. No ano 538 surge a Igreja Católica Imperial
A Igreja Medieval, diante das levas migratórias das tribos teutônicas (tribos invasoras do Império),
lutou para trazê-las ao cristianismo e à integração na cultura greco-romana. Com este intento, a Igreja
Medieval acabou por centralizar sua organização debaixo da supremacia papal, desenvolvendo um sistema
sacramental-hierárquico que caracteriza a Igreja Católica Romana.

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História da Igreja Moderna
O período histórico conhecido como Idade Moderna iniciou-se com a queda de Constantinopla, em
1453. Caracterizado pelo fim do feudalismo, advento do renascimento e as grandes navegações e
descobrimentos, na religião também é um tempo de descobertas. É a época da Reforma Protestante do século
dezesseis, movimento religioso que, no séc. XVI, subtraiu à obediência do Papa uma parte da Europa e deu
nascimento às Igrejas protestantes.

Idade Contemporânea
O período da história iniciado com a Revolução Francesa, em 1789. É a época do denominacionalismo,
do reavivamento e das missões. Época de grande crescimento para as denominações protestantes. Ampla
circulação da Bíblia, liberdade crescente dos governos civis, eclesiástico. Época das missões mundiais, da
reforma social e da fraternidade crescente.

Os mais destacados fatos históricos da era cristã são:


1. A cristianização do Império Romano.
2. A invasão dos bárbaros e a fusão das civilizações romana e alemã.
3. A luta contra o islamismo.
4. O surgimento e predomínio do papado.
5. A reforma protestante.
6. O movimento missionário mundial moderno.

As três grandes divisões do cristianismo são:


1. Cristianismo católico romano, que predomina no sul da Europa e na América Latina.
2. Cristianismo católico grego, que predomina na Europa oriental e sul-oriental.
3. Cristianismo protestante, que predomina na Europa ocidental e América do Norte.
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História do Cristianismo

CAPÍTULO 2
HISTÓRIA DO CATOLICISMO ROMANO

Desde o Concílio de Trento, realizado entre 1545 e 1563, a igreja cristã subordinada à autoridade

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papal passou a denominar-se Católica Apostólica Romana, em oposição às igrejas protestantes constituídas a
partir da Reforma. Define-se como una, santa, católica e apostólica e considera seu chefe como legítimo
herdeiro da cátedra do apóstolo Pedro, sagrado papa, segundo o Evangelho, pelo próprio Cristo.

Definição do Termo
O termo catolicismo foi usado por alguns autores (Aristóteles, Zenão, Políbio), antes da era cristã, com
o sentido de universalidade. Aplicado à igreja, aparece pela primeira vez por volta do ano 105 da era cristã
na carta de Inácio, bispo de Antioquia. Nos textos mais antigos, aplica-se à igreja geral considerada em
relação às igrejas locais. Nos autores do século II da era cristã (Justino, Ireneu, Tertuliano, Cipriano), o
termo assume duplo significado: o de universalidade geográfica, pois na opinião desses autores a igreja já
havia atingido os confins do mundo; e o de igreja verdadeira, ortodoxa, autêntica, em contraposição às seitas
que começavam a surgir.

História da Igreja Cristã


Antes, porém, de cristalizar-se o catolicismo, o que existia era o cristianismo. Acompanhemos
passo a passo a formação deste colossal sistema religioso, que domina hoje grande parte do mundo.
Cristianismo na Palestina. Na época de Jesus Cristo, quando a Palestina era dominada pelos romanos, a
religião oficial do povo judeu pautava-se pela parte da Bíblia conhecida como Antigo Testamento. Embora
não pretendendo romper com a tradição religiosa judaica, a mensagem de Cristo dava realce principalmente
aos princípios éticos do amor e da fraternidade, contrapondo-se ao formalismo religioso apregoado pelos
fariseus e doutores da lei mosaica. Essa mensagem de cunho mais espiritual e menos legalista passou a ser
divulgada sobretudo entre as camadas pobres da população, na língua popular, o aramaico, mediante
parábolas.
Após a morte de Cristo, seus discípulos passaram a ser chamados cristãos (pela primeira vez na
Antioquia da Síria, Atos 11:26) e, reunidos em pequenas comunidades, procuraram manter viva a lembrança
de seus ensinamentos, embora participando ainda da tradição religiosa judaica. O evento mais importante
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História do Cristianismo
desse período foi a primeira assembléia cristã, conhecida como Concílio de Jerusalém, da qual emergiram
duas perspectivas pastorais bem definidas. De um lado, sob a liderança do apóstolo Tiago, estavam os que
pretendiam dar destaque à raiz judaica da nova fé; do outro, os seguidores de Paulo, que desejavam uma
abertura imediata da mensagem cristã para o mundo cultural greco-romano. A decisão conciliar optou por
uma abertura prudente, proposta por Pedro, um dos três do círculo mais íntimo de apóstolos (os outros dois
eram Tiago e João). Esse cristianismo judaico teve, porém, vida relativamente breve, em vista da destruição
de Jerusalém, ordenada pelo imperador Tito no ano 70. A partir de então, a fé cristã expandiu-se nas
províncias da Anatólia e na própria capital do Império Romano.
Cristianismo no mundo helênico. Foi sobretudo graças à atuação de São Paulo, divulgador da
mensagem cristã na Anatólia, que o movimento religioso iniciado por Cristo na Palestina estendeu-se para o
mundo helênico. A crença de pobres camponeses e pescadores passou a conquistar adeptos entre as famílias
pertencentes às classes médias urbanas. O culto cristão foi progressivamente adaptado às formas de

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expressão mística do Oriente e sua liturgia passou a empregar a língua grega. Fez-se também a tradução da
Bíblia para o grego, conhecida como versão dos Setenta, e a atitude ética proposta pelo cristianismo
complementou-se com um enfoque conceitual e doutrinário. A elaboração teórica começou com os
apologetas, entre os quais destacou-se Orígenes, empenhados em defender a validade da crença cristã diante
da cosmovisão grega.
Dois centros de cultura cristã assumiram uma importância excepcional nessa época: Alexandria, no
Egito, e Antioquia, na Síria. Em Alexandria predominava a influência platônica e uma interpretação das
Escrituras voltada para a alegoria; em Antioquia prevalecia a interpretação histórico-racional, de raiz
aristotélica. O período que abrange os séculos IV e V caracterizou-se pela atuação de eruditos cristãos tais
como Atanásio, Basílio, Gregório de Nissa, Gregório Nazianzeno, João Crisóstomo e Cirilo de Alexandria,
todos pertencentes ao clero católico. A consolidação dos dogmas cristãos nessa época gerou divergências
doutrinais conhecidas como heresias.
O primeiro concílio ecumênico realizou-se em Nicéia em 325, convocado pelo imperador Constantino.
Coube a Teodósio I reunir o segundo concílio ecumênico em 381, na cidade de Constantinopla, com a
participação apenas dos bispos orientais. O terceiro concílio realizou-se em Éfeso, no ano 431, e proclamou a
origem divina da maternidade de Maria. A maior assembléia cristã da antiguidade foi o Concílio de
Calcedônia, realizado em 451. Desde o século IV, a igreja grega passou a atuar em colaboração com o poder
político e essa aliança com o estado fortaleceu-se após a separação da igreja de Roma. No século IX, com
Fócio, patriarca de Constantinopla, as relações entre as duas igrejas se estremeceram, mas a separação
definitiva só se deu em 1054. Desde então a igreja romana se refere à igreja grega como cismática, embora
esta se definisse como ortodoxa, ou seja, detentora da reta doutrina. Além das divergências sobre
formulações teológicas, originadas de perspectivas culturais diversas, teve também grande peso na ruptura a
resistência dos cristãos gregos em aceitar a afirmação cada vez maior do poder político-eclesiástico da igreja
romana.
Cristianismo no Império Romano. Ao iniciar-se a expansão da fé católica pela Anatólia, toda a região
estava sob o domínio do Império Romano. Com a destruição de Jerusalém, inúmeros cristãos, entre os quais
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História do Cristianismo
o apóstolo Pedro, passaram a viver na periferia de Roma, juntamente com outros judeus. A partir de então,
Roma foi a sede de religião cristã; daí as expressões cristianismo romano e igreja romana. As celebrações do
culto passaram a realizar-se na língua latina. Também a Bíblia foi, mais tarde, traduzida para o latim, por são
Jerônimo, tradução conhecida como Vulgata. Ao contrário dos gregos, marcadamente especulativos, os
romanos eram um povo jurídico por excelência. Pouco a pouco, o espírito legalista afirmou-se na formação
cristã, com ênfase cada vez maior na organização das estruturas eclesiásticas. De acordo com a nomenclatura
romana, os territórios onde desabrochava a fé cristã dividiram-se em dioceses e paróquias, à frente dos quais
foram postos bispos e párocos, sob a chefia do papa, bispo de Roma.
A presença cristã no Império Romano foi marcada por duas etapas bem diversas. Na primeira, que se
estendeu até o final do século III, a religião cristã viu-se desprezada e perseguida. O imperador Nero foi o
primeiro perseguidor dos cristãos, acusados de terem provocado o incêndio de Roma no ano 64. Entre os
mártires dessa fase, que durou quatro anos, incluem-se são Pedro e são Paulo. Com Domiciano houve nova

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perseguição, iniciada por volta do ano 92. Os imperadores antoninos do século III não hostilizaram
abertamente os cristãos, mas a legislação permitia que fossem denunciados e levados aos tribunais. Houve
perseguições sob Décio, Valeriano e Diocleciano, mas a situação começou a modificar-se com a vitória de
Constantino sobre Maxêncio. A partir de Constantino, os imperadores passaram a proteger e estimular cada
vez mais a fé cristã, até que, na época de Teodósio I, em fins do século IV, o Império Romano tornou-se
oficialmente um estado cristão.
De início professado apenas pelos descendentes de judeus que viviam na periferia de Roma, o
cristianismo logo difundiu-se, porém, nas camadas pobres da população, especialmente entre os escravos, e
pouco a pouco foi atingindo também as famílias da nobreza romana. Com os decretos de liberdade e
oficialização, o cristianismo afirmou-se a ponto de tornar-se, para alguns, veículo de promoção social e
caminho para a obtenção de cargos públicos. Na medida em que a fé cristã se consolidou como religião
marcadamente urbana, a partir de fins do século IV, os demais cultos passaram a ser perseguidos. Por
conseguinte, seus seguidores tiveram que se refugiar na zona rural, donde o nome pagão, ou seja, habitante
do campo.
Cristianismo medieval. A partir do século V, o Império Romano entrou em decadência até sucumbir às
invasões dos povos bárbaros. Quando as populações germânicas ultrapassaram as fronteiras do Império e se
estabeleceram no Ocidente, foram os francos os primeiros a abraçar a fé cristã, razão pela qual a França foi
chamada, mais tarde, "filha primogênita da igreja". Por força da atividade missionária, outros povos foram,
em seguida, aderindo à fé cristã. A partir do século VI, o reino franco foi perdendo o antigo vigor, devido à
debilidade dos reis merovíngios, enquanto ocorria a ascensão da casa dos carolíngios. Carlos Magno foi
coroado imperador pelo papa Leão II em 800; consolidava-se assim um novo estado cristão, ou seja, a
cristandade medieval, fortemente apoiado no sistema feudal. A partir do século XI, essa cristandade foi
representada pelo Sacro Império Romano-Germânico e, no século XVI, pelos reinos da Espanha e Portugal.
Enquanto o cristianismo judaico, de caráter rural, assumira características urbanas com a transposição
para a cultura greco-romana, a divulgação da fé católica na sociedade medieval provocou o processo inverso,
pois os povos anglo-germânicos tinham uma forma de vida marcadamente rural. Não obstante, a hierarquia
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História do Cristianismo
católica procurou manter valores próprios da civilização romana. Dessa maneira, a língua oficial da igreja
continuou sendo o latim, pois os chamados povos bárbaros não tinham ainda expressão literária estruturada.
O clero continuou a usar a antiga túnica romana, chamada agora hábito talar dos eclesiásticos. A doutrina
religiosa também continuou a ser expressa por categorias filosóficas gregas e a organização eclesiástica se
manteve dentro dos padrões jurídicos romanos.
A partir de então, ocorreu de forma bem nítida uma separação entre a religião cristã oficial, sustentada
pela hierarquia com apoio do poder político, e o cristianismo popular, marcado por forte influência das
culturas anglo-germânicas. Não podendo mais participar do culto por falta de compreensão da língua oficial,
o povo passou a desenvolver formas próprias de expressão religiosa marcadamente devocionais. De modo
análogo ao que ocorria na vida leiga medieval, com vínculos sociais articulados pelo juramento de
fidelidade, mediante o qual os servos se comprometiam à prestação de serviços aos senhores feudais em
troca de proteção, também o auxílio celeste passou a ser invocado por promessas que deveriam ser pagas

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após o recebimento das graças e favores desejados.
A divisão entre religião popular e cristianismo oficial perduraria até os albores do século XVI, não
obstante a criação dos tribunais da Inquisição para a manutenção da ortodoxia da fé. Diante da fragilidade da
prática religiosa, o Concílio de Latrão IV, celebrado em 1215, decidiu prescrever aos fiéis cristãos a
assistência dominical à missa sob pena de pecado, bem como a confissão e a comunhão anual. Daí a origem
dos chamados mandamentos da igreja.
Desde o início da Idade Média, sob influência de santo Agostinho, um dos maiores pensadores
católicos, houve uma valorização da doutrina da graça divina, mas simultaneamente tomou incremento uma
concepção negativa a respeito do corpo e da sexualidade humana. Dentro dessa perspectiva, o Concílio de
Elvira, celebrado na Espanha em 305, prescreveu o celibato para os clérigos, medida oficializada
posteriormente para toda a igreja. Houve ainda uma grande promoção do monaquismo: a ordem de São
Bento, estabelecida em abadias rurais, teve ampla difusão nos primeiros séculos da formação da Europa. A
partir do século XIII, as ordens mendicantes, como a fundada por Francisco de Assis, difundiram-se
rapidamente.
No século IX, os monges de Cluny, de inspiração beneditina, passaram a dedicar-se à preservação do
patrimônio cultural clássico, copiando documentos antigos. No século XIII, a grande contribuição cultural da
igreja foi a fundação das primeiras universidades, nas quais se destacaram Tomás de Aquino e Alberto
Magno, da ordem dominicana. Não obstante, a visão religiosa de mundo começou a ser questionada a partir
do século XV, com as novas descobertas, produto do desenvolvimento científico, cuja origem estava
vinculada ao movimento das cruzadas, expedições religiosas que levaram os príncipes cristãos ao
estabelecimento de comércio com o Oriente.
Sociedade moderna e Reforma. As mudanças de caráter social, econômico e cultural que ocorreram a
partir do século XIV, marcando o fim da Idade Média e o nascimento do mundo moderno ocidental,
provocaram uma crise muito forte na instituição eclesiástica e na vivência da fé católica. Diversos grupos
passaram a solicitar reformas urgentes e a protestar contra a lentidão e a dificuldade da igreja em adaptar-se

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História do Cristianismo
aos novos tempos. Dessas divergências resultou a cisão no seio da Igreja Católica e o surgimento das
denominações protestantes.
A figura do monge católico Martinho Lutero é exemplar a esse respeito. Diante da emergência
progressiva dos idiomas modernos, Lutero apregoava a necessidade de que o culto fosse celebrado em língua
vernácula, a fim de diminuir a distância que se interpunha entre o clero e o povo. Desejoso de que os cristãos
de sua pátria tivessem acesso às fontes religiosas da fé, traduziu a Bíblia para o alemão. Nessa mesma
perspectiva, proclamou a necessidade de adotar para os clérigos os trajes da sociedade em que viviam e
contestou a necessidade do celibato eclesiástico. As diversas denominações protestantes surgidas nesse
período, como o luteranisno na Alemanha, o calvinismo na Suíça e o anglicanismo na Inglaterra difundiram-
se rapidamente em vista de sua maior capacidade de adaptação aos valores da emergente sociedade burguesa.
A profunda vinculação da igreja romana com o poder político, a partir de Constantino, e a progressiva
participação da hierarquia eclesiástica na nobreza ao longo da Idade Média fizeram com que os adeptos da fé

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católica tivessem dificuldades muito grandes para aderir à evolução da sociedade européia. A Igreja Católica
reagiu de forma conservadora não só às novas perspectivas culturais, como também às reformas propostas
por Lutero. A expressão mais forte dessa reação antiburguesa e antiprotestante foi o Concílio de Trento,
realizado em meados do século XVI. Em oposição ao movimento protestante que defendia a adoção da
língua vernácula no culto, os padres conciliares decidiram-se pela manutenção do latim. Acentuou-se o poder
clerical na estrutura da igreja e o celibato sacerdotal foi reafirmado. Diante da popularização da leitura
bíblica promovida por Lutero, a hierarquia católica recomendou a divulgação de catecismos com resumo das
verdades da fé.
A instituição católica reagiu fortemente contra o avanço da mentalidade humanista, insistindo sobre a
necessidade de uma prática ascética. A hierarquia eclesiástica persistiu na vinculação com a antiga nobreza
rural e encontrou dificuldade para aceitar os novos valores da burguesia urbana em ascensão. A reação
antiburguesa assumiu posições radicais na península ibérica, onde os reis católicos, Fernando e Isabel,
implantaram a Inquisição contra os judeus com a finalidade específica de quebrar o poder econômico que
eles detinham.
O Concílio de Trento trouxe uma significativa revitalização da instituição católica, com o surgimento de
novas congregações religiosas, muitas das quais dedicadas a atividades missionárias, educativas e
assistenciais. A Companhia de Jesus, fundada por Inácio de Loyola, tornou-se o modelo da nova forma de
vida religiosa. A arte barroca, por sua vez, tornou-se um instrumento importante de expressão da reforma
eclesiástica.
A mentalidade conservadora da Igreja Católica perdurou nos séculos seguintes, o que provocou a
hostilidade da nova burguesia liberal contra a Companhia de Jesus, expulsa de vários países na segunda
metade do século XVIII. A revolução francesa de 1789 assumiu também um caráter nitidamente anticlerical,
tendo em vista a aliança da igreja com o poder monárquico do Antigo Regime. Ao longo do século XX, a
igreja continuou combatendo as concepções liberais e encontrando dificuldade para assimilar os progressos
da ciência. O Concílio Vaticano I, interrompido com a tomada de Roma em 1870, reforçou as posições
autoritárias da igreja ao proclamar o dogma da infalibilidade papal. Desde princípios do século XX, o papa
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História do Cristianismo
Pio X prescreveu a todos os professores de seminários o juramento antimodernista, exigindo fidelidade às
concepções teológico-filosóficas elaboradas no século XIII por Tomás de Aquino, fundamentado na
cosmovisão grega aristotélica.
Catolicismo e mundo contemporâneo. Após cerca de 400 anos de reação e resistência contra os avanços
do mundo moderno, a Igreja Católica iniciou um processo de maior abertura com o Concílio Vaticano II,
realizado entre 1962 e 1968. Entre as conquistas mais expressivas dessa assembléia episcopal, deve-se
ressaltar a afirmação de que a fé católica não se vincula diretamente a nenhuma expressão cultural em
particular, mas deve adequar-se às diversas culturas dos povos aos quais a mensagem evangélica é
transmitida. Dessa forma, a marca da romanidade da igreja deixou de ter a relevância que tivera no passado.
Uma das conseqüências práticas dessa orientação foi a introdução das línguas vernáculas no culto, bem como
a adoção progressiva do traje civil pelo clero.
O concílio trouxe uma maior tolerância em relação aos progressos científicos; a posterior revogação da

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condenação de Galileu foi um gesto simbólico dessa nova atitude. As estruturas da igreja modificaram-se
parcialmente e abriu-se espaço para maior participação dos leigos, incluindo as mulheres, na vida da
instituição. Ao contrário dos concílios anteriores, preocupados em definir verdades de fé e de moral e
condenar erros e abusos, o Vaticano II teve como orientação fundamental a procura de um papel mais
participativo para a fé católica na sociedade, com atenção para os problemas sociais e econômicos.
Os padres conciliares mostraram sensibilidade para com os problemas da liberdade e dos direitos do
homem. A diretiva pastoral, menos devotada às questões dogmáticas da teologia clássica, permitiu maior
aproximação entre a igreja romana e as diversas igrejas ortodoxas de tradição grega, como a armênia e a
russa, e as denominações protestantes. Por último, os horrores do anti-semitismo nazista ofereceram
oportunidade para que a Igreja Católica repensasse sua tradicional posição de distanciamento em relação ao
judaísmo.

Doutrina Católica
Os quatro primeiros concílios ecumênicos definiram as concepções trinitárias e cristológicas,
sintetizadas no símbolo conhecido como Credo, adotado no ritual da missa. O dogma trinitário afirma a
crença num só Deus, que se manifesta por meio de uma trindade de pessoas: o Pai, o Filho e o Espírito
Santo. O dogma cristológico admite que Cristo é o Filho de Deus, encarnação do Verbo divino, verdadeiro
Deus e verdadeiro homem. O advento de Cristo deu-se por meio da Virgem Maria que, segundo o dogma
mariológico, concebeu do Espírito Santo. A finalidade da encarnação de Cristo foi salvar a humanidade do
pecado original, que enfraqueceu a natureza humana e acentuou sua tendência para o mal, de acordo com o
dogma soteriológico.
A doutrina do pecado original e da graça foi elaborada por santo Agostinho nas primeiras décadas do
século V. A partir do século XIII, Tomás de Aquino procurou estabelecer uma ponte entre o saber teológico
e a filosofia aristotélica, afirmando que as verdades da fé superam a racionalidade humana mas não estão em
contradição com ela. Assim sendo, a filosofia deve estar a serviço da teologia cristã. Tomás de Aquino
tornou-se o mestre por excelência da doutrina católica, com a síntese por ele realizada na Suma teológica. No
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História do Cristianismo
século XVI, o Concílio de Trento definiu dois pontos fundamentais. Em primeiro lugar, a afirmação da
doutrina da igreja, considerada como uma sociedade hierárquica, dentro da qual se atribui ao clero o poder de
magistério, de ministério do culto e de jurisdição sobre os fiéis. Em segundo lugar, o concílio definiu a
doutrina dos sete sacramentos da igreja (batismo, crisma ou confirmação, confissão, eucaristia, extrema-
unção, ordem e matrimônio), além de proclamar a presença real de Cristo na eucaristia, no mistério da
transubstanciação.
Ao longo dos séculos XVII e XVIII a teologia católica foi conturbada por polêmicas referentes ao papel
da graça e da participação do homem em sua própria salvação, onde se confrontam principalmente os jesuítas
e os jansenistas, estes últimos partidários de maior valorização da presença do mistério divino na história
humana. Durante o século XIX, foram proclamadas como verdades de fé a Imaculada Conceição de Maria e
a infalibilidade pontifícia. O primeiro dogma representou uma resposta da Igreja Católica às novas
concepções materialistas e hedonistas resultantes da revolução burguesa, paralelas ao processo acelerado de

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industrialização; o segundo constituiu uma reação ante o avanço das idéias liberais, com afirmação
progressiva dos direitos do homem. O último dogma da Igreja Católica foi proclamado por Pio XII em
meados do século XX: a Assunção da Virgem Maria ao céu, com corpo e alma. É necessário ainda ter
presente que, desde a Idade Média, com o surgimento do chamado catolicismo popular à margem da igreja
oficial, criaram-se também novas versões teológicas mais adequadas à compreensão do povo, cuja influência
muito se faz sentir na formação do catolicismo brasileiro.

Organização e Estrutura
O catolicismo apresenta duas características que devem ser levadas em conta na análise de suas
posições políticas e religiosas. A primeira é a profunda vinculação entre igreja e poder político, iniciada com
Constantino no século IV, mantida ao longo de toda a Idade Média e prolongada em diversos estados durante
a época moderna, em alguns países até os dias de hoje. Com muita freqüência, portanto, a organização
eclesiástica sofreu a influência das alianças com o poder secular. O segundo aspecto a ser considerado é que
a igreja transformou-se, desde o início da Idade Média, num verdadeiro estado político, sendo o papa,
portanto, não apenas um chefe religioso mas também um chefe de estado, atribuição que conserva até hoje,
não obstante o tamanho reduzido do estado pontifício.
Escolhidos por Jesus para pregar o Evangelho, os primeiros apóstolos eram simples pescadores da
Galiléia, homens de pouca instrução. A fim de prepará-los para sua missão, Jesus reuniu-os ao redor de si,
transmitindo-lhes pessoalmente seus ensinamentos. Também os apóstolos e seus primeiros sucessores
instruíram os discípulos por meio de contato pessoal, consagrando essa forma de educação sacerdotal nos
primeiros séculos da igreja. Muito contribuiu para a formação do clero a fundação de escolas catequéticas em
Alexandria, Antioquia e Cesaréia, desde fins do século II. A eleição dos clérigos estava a cargo dos apóstolos
e seus sucessores, os bispos, mas se costumava ouvir também o parecer da comunidade cristã, a quem
competia o sustento dos clérigos, dos quais se exigiam virtudes e qualidades morais.
De início, o celibato não era obrigatório para os clérigos que ingressavam casados no estado
eclesiástico. Tampouco se fazia distinção entre os termos bispo e presbítero; havia também as diaconisas,
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devotadas ao cuidado dos enfermos e instrução das mulheres, mas tal ordem eclesiástica desapareceu no
século VII. Nos primeiros séculos, a comunidade cristã dependia diretamente dos bispos, como atesta Inácio
de Antioquia; somente mais tarde foram criadas as paróquias.
A pujança da vida cristã, no início do século IV, é atestada ainda hoje pelas basílicas romanas: São
Pedro, São Paulo, Santa Maria Maggiore, São Lourenço, São João do Latrão, São Sebastião e Santa Cruz de
Jerusalém. Construídas sob o patrocínio de Constantino e de sua mãe, Helena, são prova do esplendor de que
se revestia então o culto litúrgico. Nos principais centros do Ocidente, como Cartago, Milão e Roma,
generalizou-se a praxe da missa cotidiana. Como regra geral, o clero se formava à sombra dos presbitérios e
das abadias. Na Itália, sacerdotes de diversas paróquias reuniam em seus presbitérios os aspirantes ao
sacerdócio, para instruí-los no serviço divino. Agostinho e Eusébio de Vercelas reuniam na própria casa
episcopal os jovens desejosos de seguir a vocação sacerdotal. Também os mosteiros preparavam um clero
seleto. O celibato, prescrito inicialmente para o clero da Espanha e depois estendido para toda a igreja do

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Ocidente pelo papa Sirício, no sínodo romano de 386, foi rejeitado pelos bispos do Oriente, onde vigorou
apenas a proibição de núpcias para os que recebiam solteiros as sagradas ordenações.
Com a queda do Império Romano, a igreja passou a ocupar-se da evangelização e conversão dos povos
germânicos, o que deu origem a novos modelos de organização eclesiástica. Nos reinos dos visigodos e dos
francos, ao lado da eleição feita pelo metropolita e avalizada pelo povo, exigia-se desde o século VI a
confirmação real para o episcopado. Tanto a igreja franca como a visigótica assumiram um caráter
fortemente nacionalista, acentuando-se sua independência com relação à Santa Sé. Em ambas as
cristandades, infiltrou-se o instituto das "igrejas próprias". As igrejas rurais passaram a ser consideradas
propriedades particulares dos senhores da terra, que se imiscuíam na eleição de párocos e capelães. Na igreja
franca, ao lado de um alto clero político e mundano, surge um clero inferior inculto e desregrado. No reino
visigótico, a vida religiosa do clero revitalizou-se no século VII com a convocação de numerosos sínodos.
Apesar disso, a prática do celibato foi quase abandonada, a tal ponto que o rei Vitiza julgou-se autorizado a
suprimi-la de todo no início do século VIII.
A partir de Pepino o Breve, é notória a ação dos carolíngios em favor da igreja; pode-se mesmo atribuir
a essa dinastia o surto reformador do século VIII e seguinte. Carlos Magno e seu filho Luís o Piedoso, em
modo particular, deram importância excepcional à reforma da igreja. Durante o reinado do primeiro,
instituíram-se muitas paróquias e bispados, a posição dos bispos nas dioceses foi valorizada pelas visitas
pastorais e pelos sínodos e o pagamento dos dízimos consolidou a base econômica das igrejas. O imperador
ordenou também a fundação de escolas ao lado das catedrais, mosteiros e abadias. Embora vinculado aos
interesses expansionistas do reino franco, o incremento da atividade religiosa converteu o reinado de Carlos
Magno na primeira experiência de construção da cristandade medieval.
Durante a época feudal dos séculos X e XI, houve acentuada decadência da vida cristã, ocasionada, em
primeiro lugar, pelas contínuas incursões dos normandos, húngaros e sarracenos, que traziam devastações,
desorganização, miséria e fome para o povo. A conversão em massa da população provocou uma assimilação
muito superficial do cristianismo. Além disso, na conversão dos saxões foi utilizada a força armada,
gerando-se com isso o ódio e não o amor pela fé cristã. Assim sendo, desagregado o império carolíngio, o
12
História do Cristianismo
povo retornou à vida primitiva e retomou costumes pagãos: práticas supersticiosas e uso de amuletos e
sortilégios. O paganismo se manifestava na instituição dos ordálios, ou juízos de Deus, resolvidos por meio
de duelos, provas de fogo e de água, nas quais se esperava uma intervenção miraculosa da divindade em
favor do inocente. Dominava o espírito de vingança, sensualidade e ebriedade, sendo comuns as violações do
vínculo matrimonial.
A decadência da vida cristã manifestava-se também na deficiente prática religiosa e sacramental.
Aumentava o culto dos santos, eivados muitas vezes de práticas supersticiosas e de ignorância. Cresceu a
veneração indiscriminada das relíquias, que eram da mesma forma comercializadas ou roubadas. Relíquias
falsas eram postas com facilidade em circulação: três localidades da Europa se vangloriavam de possuir entre
seus tesouros, a cabeça de são João Batista; chegavam a 33 os cravos da Santa Cruz venerados em diversas
igrejas; a abadessa Ermentrude de Jouarre falava em relíquias como o fruto da árvore da ciência do bem e do
mal e Angilberto enumera, entre as relíquias do mosteiro de São Ricário, a candeia que se acendeu no

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nascimento de Jesus, o leite de Nossa Senhora e a barba de são Pedro.
Desde meados do século IX até fins do século XI, a observância do celibato entrou em grande
decadência e num abandono quase completo. Padres e bispos casados preocupavam-se por vezes mais com
sua família do que com o ministério pastoral. Os bens eclesiásticos eram também utilizados para prover
parentes, ou transmitidos aos filhos, formando-se uma espécie de dinastia sacerdotal. Outro abuso de vastas
proporções era a compra e venda de benefícios e ministérios eclesiásticos. Houve casos de simonia, ou seja,
tráfico de coisas sagradas, na aquisição das dioceses da França, Itália e Alemanha. A fim de recuperar o
dinheiro gasto com a própria nomeação, os bispos eleitos dessa forma não admitiam clérigos às sagradas
ordenações senão mediante alguma compensação pecuniária. Os presbíteros não administravam os
sacramentos sem remuneração. No sínodo realizado em Roma em 1049, o papa Leão IX quis depor os
sacerdotes ordenados por bispos considerados simoníacos, mas os casos eram tão numerosos que ele não
pôde concretizar sua decisão, pois teria privado de cura de almas um número muito grande de igrejas.
Sob a orientação do papa reformador Gregório VII e de seus sucessores, afirmou-se a autoridade
legislativa e administrativa da igreja romana nos séculos XII e XIII. Diminuiu a influência dos costumes
germânicos, substituídos pelo direito romano, utilizado sob a forma de direito canônico pela instituição
eclesiástica. O apelativo "papa", já usado precedentemente pelo bispo de Roma, assumiu significado pleno e
exclusivo. Desde o século XI, introduziu-se também o uso da tiara, como símbolo do poder eclesiástico.
Fortaleceu-se a doutrina da autoridade normativa da Sé Apostólica para toda a igreja. A partir de então,
apenas o papa podia convocar e aprovar os concílios ecumênicos. Organizou-se a Cúria Romana para
despacho dos negócios referentes ao papa e ao estado pontifício. Nomearam-se os cardeais, espécie de
senadores da igreja, com quem o papa resolvia as questões mais importantes em reuniões denominadas
consistórios. Os cardeais passaram a ser enviados mais amiúde às diversas nações como legados pontifícios.
Tal instituição chegou ao máximo desenvolvimento sob Inocêncio III, papa que governou na passagem do
século XII para o século XIII e sob o qual o poder de Roma afirmou-se de forma enérgica e intransigente.
O fortalecimento do poder romano induziu os papas a se tornarem os incentivadores da libertação da
Terra Santa das mãos dos muçulmanos, dirigindo contra eles as cruzadas ou guerras santas. A defesa da
13
História do Cristianismo
ortodoxia católica teve também como resultado a criação do tribunal da Santa Inquisição. Esta apresentava
desde o início graves vícios, como a aceitação de denúncias e testemunhos de pessoas cuja identidade era
mantida em segredo, a não-admissão de defensores, o abuso do conceito de heresia, a aplicação da tortura e
a pena de morte. Embora as execuções fossem efetuadas pelas autoridades civis, esse particular não diminui
a responsabilidade da igreja; no entanto, o juízo sobre a Inquisição deve levar em conta a mentalidade da
época, que considerava a fé cristã como o máximo bem, e a apostasia e a heresia como os piores delitos.
A afirmação política da Santa Sé conduziu os papas a diversos conflitos com reis e príncipes. Em
conseqüência disso, os papas passaram a residir em Avignon no século XIV, pressionados pelos monarcas
franceses. Em contraposição aos pontífices de origem francesa, foram eleitos papas italianos, num cisma que
se prolongou até 1449. Em vista dessa situação, os teólogos passaram a questionar a autoridade papal e as
doutrinas conciliares ganharam força. A partir de Sisto IV, eleito em 1471, os pontífices passaram a atuar
mais como príncipes do que como sacerdotes e se comportavam como dinastas da Itália que, acidentalmente,

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eram também papas. A atuação mundana dos papas exigia novas práticas e expedientes: negócios
financeiros, vendas de ofícios e favores, artes pouco honestas e o nepotismo (favoritismo aos sobrinhos).
O nepotismo marcou fortemente o pontificado de Sisto IV e seu sucessor, Inocêncio III, que tinha como
objetivo dominante enriquecer o filho natural, Franceschetto. Sucedeu-lhe, por tráficos de simonia, o cardeal
Rodrigo Borgia, que assumiu no pontificado o nome de Alexandre VI, notório por adultérios, perfídias e
crueldades.
Nesse período de crise da igreja, Martinho Lutero iniciou o movimento reformador que culminou na
separação das chamadas igrejas protestantes. Só então a igreja romana decidiu-se pela convocação de um
concílio (o de Trento), já tão desejado pelos cristãos. Como resultado da assembléia conciliar, houve novo
fortalecimento da autoridade pontifícia. O papa tornou-se o verdadeiro orientador e promotor da reforma
católica, intervindo em todos os assuntos eclesiásticos. Para isso, muito contribuiu a nova organização da
Cúria Romana e do colégio dos cardeais, realizada por Sisto V. Em 1586, ele fixou em setenta o número de
cardeais, só ultrapassado no século XX, a partir do pontificado de Pio XII. Em 1587, o papa estabeleceu
também em 15 o número de congregações romanas na Cúria, como instrumento para implantar a reforma na
igreja. Mereceram especial referência a congregação dos bispos, dos religiosos, dos ritos e dos estudos
eclesiásticos.
Com as mesmas finalidades de governo, foram estabelecidas de modo definitivo as nunciaturas
apostólicas, ou seja, embaixadas papais nas diversas nações católicas. Anteriormente, os representantes do
papa junto aos reinos eram designados como legados, muito valorizados pela reforma implantada por
Gregório VII. O Concílio de Trento representou, sem dúvida, um evento de excepcional importância da
Igreja Católica e suas repercussões se prolongaram pelos séculos seguintes. Ao lado, porém, dos grandes
benefícios advindos em termos de fortalecimento da fé e da moral católica, implantou-se na igreja o espírito
apologético, do qual a congregação do Santo Ofício, com a censura de obras consideradas nocivas à religião,
foi a expressão mais significativa. Esse mecanismo autoritário existe até hoje com o nome de Congregação
da Doutrina da Fé. O centralismo romano aumentou o espírito conservador e autoritário da igreja,
preocupada na época em defender-se contra o avanço protestante e contra a mentalidade humanista. No
14
História do Cristianismo
século XIX, o poder centralizador da Cúria foi reforçado ainda mais, tornando-se os bispos simples agentes
das orientações da Santa Sé.
Não obstante a renovação de idéias que marcou o Concílio Vaticano II, a estrutura da Cúria Romana e a
organização do estado pontifício permaneceram quase intactos. Essas instituições serviram de base para o
movimento neoconservador posteriormente desencadeado pela Santa Sé, no intuito de frear a modernização
da igreja em diversos países, em busca de adaptação ao mundo contemporâneo e às realidades de cada
região.3

CAPÍTULO 3

HISTÓRIA DO CATOLICISMO GREGO

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(Igrejas Ortodoxas)

Definição do Termo
A denominação "ortodoxa" (isto é, de doutrina reta) tornou-se corrente, mesmo entre católicos e
protestantes, para designar as igrejas cristãs orientais que, em 1054, se separaram da igreja de Roma.
Chamam-se igrejas ortodoxas as que representam a fé historicamente preservada pela cristandade
oriental e se consideram depositárias da doutrina e dos ritos originais dos padres apostólicos. Dividem-se em
três grupos: a Igreja Ortodoxa do Oriente, de origem bizantino-eslava, e que reúne o maior número de fiéis;
as igrejas orientais dos nestorianos e monofisistas, sem qualquer comunhão com as demais; e as igrejas
orientais que "retornaram a Roma", mas se mantiveram distintas em rito e disciplina.

História da Igreja Ortodoxa


Nascido na Palestina, o cristianismo difundiu-se rapidamente em todo o Império Romano,
principalmente no Oriente, onde os apóstolos e seus primeiros discípulos criaram comunidades cristãs em
Antioquia, Alexandria, Corinto, Salonica e outras cidades. As igrejas ortodoxas e a Igreja Católica tiveram
história comum até a Paz de Constantino, no ano 313, e a divisão do império entre Oriente e Ocidente (395).
As primeiras divergências políticas entre latinos e gregos, que desfizeram a comunhão entre as igrejas,
manifestaram-se desde a transferência, em 330, da sede do império para Constantinopla.
A decadência da velha capital sob o domínio dos bárbaros, a divisão do império e as pretensões do
imperador de Bizâncio, que se considerava o herdeiro único do império -- de toda a cristandade --
acentuaram o antagonismo entre as igrejas, e iniciaram um processo de crescente afastamento, do século V
ao século XI, em meio a fracassadas tentativas de reunificação.
O conflito político e a diversidade de idioma, costumes e ritos litúrgicos sublinharam as divergências
teológicas, que passaram a ser resolvidas, nos concílios ecumênicos, com a participação dos bispos do

15
História do Cristianismo
Oriente e do Ocidente. No ano 867, Fócio, patriarca de Constantinopla, suscitou grave ruptura, ao condenar
o papa Nicolau I pelo acréscimo da expressão Filioque ("e do Filho") na versão ocidental do credo de Nicéia,
para indicar que o Espírito Santo procede do Pai e do Filho, e por sua determinação em tornar a sede
episcopal de Roma cabeça de todas as igrejas cristãs.
Deposto a pedido de Roma, o patriarca foi reintegrado depois no posto e, finalmente, confinado num
mosteiro armênio. A ruptura decisiva, o cisma entre Oriente e Ocidente, deu-se no século XI, quando o
patriarca Miguel Cerulário reproduziu as acusações de Fócio contra Roma, e desafiou o papa Leão IX, sendo
por ordem deste excomungado (1054).
As cruzadas, organizadas pela cristandade latina, e especialmente a tomada de Constantinopla pelos
cruzados, em 1204, além do estabelecimento do império latino de Constantinopla, consumaram a separação
entre as igrejas oriental e ocidental. Missionários da igreja oriental converteram os búlgaros no século IX, os
sérvios e os russos nos séculos X e XII, e criaram novos patriarcados. Numerosas tentativas de união foram

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feitas. Entre os atos de reunificação, todos com resultados efêmeros, foram importantes o Concílio de Lyon
(1274) e o de Ferrara-Florença (1438-1439).
Com a tomada de Constantinopla pelos turcos, em 1453, por falta de ajuda militar substancial do
Ocidente, a união também se tornou politicamente inviável. Nos últimos séculos, a Igreja Ortodoxa, cuja
ação se concentrava na Ásia e na Europa oriental, expandiu-se para o Ocidente e incluiu o continente
americano e a Austrália. No século XX, os ortodoxos participaram do movimento ecumênico para a
restauração da unidade cristã, e para a orientação da ação evangélica e social comum. A partir da fundação
do Conselho Mundial de Igrejas, em 1948, foram organizados estudos conjuntos e formas de cooperação
para descobrir caminhos que possam expressar a unidade entre ortodoxos e anglicanos e entre ortodoxos e
católicos.
O patriarca de Constantinopla (em Istambul), no fim do século XX guiava dois milhões de fiéis, dos
quais um milhão na Turquia, Grécia, outros países europeus e Austrália, e um milhão nos Estados Unidos.
Os patriarcas de Alexandria, Antioquia-Damasco, Moscou, Sérvia, Romênia e Bulgária são independentes.
As igrejas da Grécia, Chipre, Sinai, Geórgia, Polônia e Albânia são autocéfalas, ou seja, independentes e sem
patriarcas. Já as igrejas da Finlândia, República Tcheca, Hungria e Ucrânia são autônomas e seus arcebispos,
eleitos, são confirmados pelo patriarca de Constantinopla. A igreja do Japão está ligada à dos Estados
Unidos. No Brasil, o maior número de igrejas ortodoxas pertence ao patriarcado antioquino.

Doutrina Ortodoxa
As igrejas ortodoxas definem-se como "igreja una, santa, católica e apostólica". Suas doutrinas apóiam-
se nos livros do Novo Testamento, nos decretos dos sete primeiros concílios ecumênicos e nas obras
patrísticas. Como a Igreja Católica, aceitam a tradição e a Bíblia como fontes paralelas de doutrina, mas
diferem dos católicos principalmente do ponto de vista litúrgico.

3
Enciclopédia Barsa,
16
História do Cristianismo
A principal divergência entre a Igreja Católica e a Igreja Ortodoxa reside na própria concepção da
igreja. Para os ortodoxos, a totalidade da igreja realiza-se em cada comunidade cristã que celebra a eucaristia
presidida por um bispo. Em sua comunidade, o bispo é a máxima autoridade de origem divina, e nenhuma
outra existe acima dele. Sucessor dos apóstolos, deles procede sua autoridade.
Não há, religiosa ou dogmaticamente, diferença entre bispo, arcebispo, metropolita e patriarca: todos
são iguais na única e invariável sucessão apostólica. Apenas haverá primazia de bondade, sabedoria, idade e
ordem hierárquica. A autonomia das igrejas não significa isolacionismo, dada a exigência de comunhão com
o sínodo dos bispos, claramente expressa no fato de ser indispensável, na consagração dos novos bispos, a
presença dos bispos regionais.
Os ortodoxos, assim, não reconhecem o primado e a infalibilidade do papa, a que concedem uma
primazia de honra e a quem só consideram primus inter pares ("o primeiro entre iguais"). Diversamente da
doutrina católica, o Espírito Santo procede do Pai, mas não do Filho (pois rejeitam o filioque). Negam a

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doutrina do purgatório e o dogma da Imaculada Conceição de Maria, mas aceitam a assunção da Virgem
Maria, com base na afirmação formal dos livros litúrgicos. Outra distinção significativa é que, na Igreja
Ortodoxa, só os bispos devem manter-se celibatários.

Ritos das Igrejas Orientais


A liturgia das igrejas orientais caracteriza-se sobretudo por sua variedade, riqueza e esplendor. A missa
é sempre solene. Os ritos litúrgicos constituem o centro da vida ortodoxa, seja para a expressão da fé, seja
para a educação dos fiéis. Sua vitalidade está muito ligada à tradição do monasticismo, cujo centro é a
chamada "montanha santa", no monte Atos, na Calcídica. Na ornamentação, é proibido o uso de imagens
esculpidas, mas são permitidas as pinturas; veneram-se os santos e admitem-se os ícones que representam
santos, Jesus Cristo ou Maria. Não são usados instrumentos musicais, e cabe ao canto coral lugar de grande
relevo no culto.
Em função da autonomia das diferentes igrejas e patriarcados, desenvolveram-se diferentes liturgias,
que correspondem antes a diferenças lingüísticas e a tradições locais do que à diversidade de conteúdo
doutrinário. Os cinco ritos principais são o bizantino (adotado pela maioria dos ortodoxos), o alexandrino, o
antioquino, o armênio e o caldeu.4

Capítulo 4
REFORMA E CONTRA-REFORMA

O crescente desprestígio da igreja do Ocidente, mais interessada, nos séculos XIV e XV, no próprio
enriquecimento material do que na orientação espiritual dos fiéis; a progressiva secularização da vida social,
imposta pelo humanismo renascentista; e a ignorância e o relaxamento moral do baixo clero foram os fatores
que desencadearam a Reforma e a Contra-Reforma.

4
Enciclopédia Barsa, art. “Igrejas Gregas”.
17
História do Cristianismo
Reforma foi o movimento radical registrado na igreja do Ocidente ao longo do século XVI e que,
ultrapassando questões disciplinares, deixou à mostra problemas doutrinários de transcendência vital para o
cristianismo. As profundas divergências levaram à cisão de algumas igrejas que foram chamadas, de forma
global, protestantes. A Contra-Reforma foi tanto a reação da igreja que permaneceu fiel à tradição do papado
romano, em oposição ao protestantismo emergente, quanto o movimento reformista no interior da Igreja
Católica no decorrer dos séculos XVI e XVII.

Antecedentes da Reforma
Nas últimas décadas da Idade Média, a igreja ocidental viveu um período de decadência que favoreceu
o desenvolvimento do grande cisma do Ocidente, registrado entre 1378 e 1417, e que teve entre suas
principais causas a transferência da sede papal para a cidade francesa de Avignon e a eleição simultânea de
dois e até de três pontífices. O surgimento do "conciliarismo" -- doutrina decorrente do cisma, que

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subordinava a autoridade do papa à comunidade dos fiéis representada pelo concílio -- bem como o
nepotismo e a imoralidade de alguns pontífices demonstraram a necessidade de uma reforma radical no seio
da igreja. Nesse sentido, cabe assinalar o quanto tem de simbólico o fato de que o início da Reforma
protestante, com a proclamação das 95 teses de Martinho Lutero em 31 de outubro de 1517, em Wittenberg,
Alemanha, tenha sido precipitado pela chegada dos legados papais que anunciavam uma indulgência em
troca da doação em dinheiro para a construção da basílica de São Pedro, em Roma.
Por outro lado, já haviam surgido no interior da igreja movimentos reformistas que pregavam uma vida
cristã mais consentânea com o Evangelho. No século XIII surgiram as ordens mendicantes, com a figura
notável de são Francisco de Assis. Nos séculos XIV e XV destacaram-se como pregadores são Vicente
Ferrer, são Bernardino de Siena e são João Capistrano. Além disso, no século XV registrou-se uma
renovação da piedade popular, com um acentuado sentimentalismo em torno das dores da paixão de Cristo.
Outros movimentos reformistas surgiram em aberta oposição à hierarquia eclesiástica. No século XII os
valdenses, conhecidos como "os pobres de Lyon" ou "os pobres de Cristo", questionaram a autoridade
eclesiástica, o purgatório e as indulgências. Os cátaros ou albigenses defenderam nos séculos XII e XIII um
ascetismo exacerbado e caíram no maniqueísmo, considerando a si mesmos os únicos puros e perfeitos. No
século XIV, na Inglaterra, John Wycliffe defendeu idéias que seriam reconhecidas pelo movimento
protestante, como a posse do mundo por Deus, a secularização dos bens eclesiásticos, o fortalecimento do
poder temporal do rei como vigário de Cristo e a negação da presença corpórea de Cristo na eucaristia. As
idéias de Wycliffe exerceram influência sobre o reformador tcheco Jan Hus e seus seguidores no território da
Boêmia, os hussitas e os taboritas, nos séculos XIV e XV.
Em posição intermediária entre a fidelidade e a crítica à igreja romana situou-se Erasmo de Rotterdam.
Seu profundo humanismo, conciliatório e radicalmente oposto à violência, embora não isento de
ambigüidade, levou-o a dar passos importantes em direção à Reforma, como a tradução latina do Novo
Testamento, afastando-se da versão oficial da Vulgata; ou a sátira contra o papa Júlio II, de 1513. Ante a
insistência de Lutero para que se definisse em relação às teses dos reformadores, Erasmo fez a defesa da
liberdade humana em seu tratado sobre o livre arbítrio, de 1524, contestado por Lutero em seu tratado sobre
18
História do Cristianismo
o arbítrio escravizado. As ponderadas idéias reformistas de Erasmo não se ligaram a nenhum movimento
popular ou político nem foram acolhidas pelos intelectuais, que poderiam tê-las compreendido.

A Reforma Protestante
Iniciada por Lutero com seu desafio aos legados papais e à excomunhão, a Reforma protestante não se
desenvolveu em uma só direção: foram diversos os grupos que percorreram caminhos paralelos e
irreconciliáveis, embora unidos por sua oposição à doutrina e à disciplina da igreja romana e por sua luta
política e militar contra o papa ou o imperador.
Martinho Lutero, monge agostiniano, sentiu como uma experiência pessoal, baseada em um texto da
epístola de são Paulo aos romanos, que a salvação de Deus se comunicava pela fé e não por meio das obras,
que decorrem da natureza humana corrompida pelo pecado original. Dessa concepção fundamental - "só a
fé" - deduziu aos poucos, segundo as controvérsias ou as circunstâncias políticas, o conjunto de seu

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pensamento. A excomunhão por parte de Roma e a proteção que lhe dispensaram alguns príncipes alemães
impeliram Lutero à ruptura. A desqualificação da autoridade do papa foi avalizada por outro grande princípio
da Reforma -- "só a Escritura" -- que proclamava a Bíblia, interpretada individualmente à luz do Espírito
Santo, como única fonte de autoridade na comunidade cristã. Entretanto, bem depressa Lutero teve que
defender a necessidade de uma ortodoxia, de uma igreja e de uma disciplina, pois Thomas Münzer,
reformista de idéias revolucionárias e radicais que visava à criação de comunidades sem culto nem
sacerdotes, instigou a sublevação dos camponeses alemães, entre 1524 e 1525. Diante da ameaça de sua
expansão, a revolta foi dura e sangrentamente reprimida, com a aprovação de Lutero.
Em 1525 o reformador suíço Huldrych Zwingli fundou em Zurique uma teocracia que se estendeu a
Berna, Basiléia e Estrasburgo. Sua doutrina teológica radicalizou-se mais que a de Lutero, especialmente ao
negar a presença de Cristo na Eucaristia. Sua igreja, excluída da aliança evangélica de Gotha em 1526, só foi
readmitida após sua morte, na concórdia de Wittenberg, em 1536. Os anabatistas, assim chamados por
defenderem um novo batismo para os adultos, já que crianças não poderiam receber a graça que só se
transmite pela fé, eram vinculados às doutrinas de Zwingli, embora, mais revolucionários, exigissem uma
observância mais radical dos ensinamentos da Bíblia. No campo social, rechaçaram a violência,
proclamaram a separação entre a igreja e o estado e criaram comunidades livres. As repercussões políticas
dos novos grupos, que conquistaram adesões maciças em algumas cidades, provocaram a união dos católicos
e dos reformadores, que se aliaram para tomar de assalto seu centro na cidade de Münster, castigando
severamente seus dirigentes.
João Calvino, teólogo francês, refugiou-se em Basiléia e depois em Genebra devido a suas idéias
reformistas. Publicou em 1535 Christianae religionis institutio (Instituições da religião cristã), que se tornou
o primeiro catecismo da Reforma. Sua tentativa de unificar os diversos grupos protestantes atraiu
importantes seguidores de Zwingli, mas consumou a separação com os luteranos. Sua doutrina sobre a
predestinação à salvação e à condenação, a severa disciplina imposta em sua concepção teocrática da cidade-
igreja e o governo presbiteral das igrejas constituíram de fato o que se chamou de segunda Reforma.

19
História do Cristianismo
Na Inglaterra, a mudança da igreja teve uma origem fundamentalmente política, logo aproveitada para
uma Reforma religiosa. Henrique VIII, irritado pela negativa do papa Clemente VII em lhe conceder o
divórcio, conseguiu em 1531 que o Parlamento inglês aprovasse a subordinação da igreja à coroa. O monarca
acentuou sua exigência política em relação à igreja nos anos que se seguiram, até culminar no cisma
anglicano em 1534. À separação política seguiu-se uma reforma doutrinária e litúrgica, imposta mediante a
perseguição e a pena de morte. A obra mais destacada na fase inglesa da Reforma foi o Common Prayer
Book (Livro da prece pública). Na Escócia, predominou o presbiterianismo introduzido por John Knox, que
havia participado da Reforma em Genebra junto a Calvino.

A Contra-Reforma
A reação oficial da Igreja Católica foi lenta e, a princípio, desarticulada. Carlos V, imperador da
Alemanha e rei de Espanha e Nápoles, desempenhou um papel de especial relevo nas conseqüências políticas

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da Reforma protestante. Sua tradicional rivalidade com a monarquia francesa impediu a aliança entre os dois
reinos mais próximos à igreja romana. Não obstante, e apesar das pressões exercidas pelos príncipes da
igreja e das enormes dificuldades que cercaram a realização do Concílio de Trento, como reflete a cronologia
de suas três etapas (1545-1549, 1551-1552, 1562-1563), a firmeza dos teólogos e dos papas conseguiu, ainda
que tardiamente, o resultado esperado: deter a propagação da Reforma protestante, e instaurar, de forma
orgânica e oficial, uma Reforma católica.
A primeira fase do concílio, convocada pelo papa Paulo III, reuniu grupos de teólogos, nomeou cardeais
dignos, impulsionou as novas ordens religiosas dos teatinos (fundada em 1524 por Gian Pietro Carafa, futuro
Paulo IV, e são Caetano de Triana), das ursulinas e da Companhia de Jesus (criada em 1534 por santo Inácio
de Loiola), e restabeleceu em 1542 o tribunal da Inquisição, que se converteu em um dos instrumentos mais
valiosos da Reforma católica. Júlio III, que subiu ao trono de são Pedro em 1550, continuou com prudência o
trabalho de seu antecessor e conseguiu retomar, em 1551, o concílio interrompido.
Paulo IV, que sucedeu a Júlio III, foi um asceta que logrou banir da corte pontifícia o espírito mundano,
obrigou os bispos a renunciar a suas múltiplas prebendas e a regressar a suas dioceses; não obstante, sua
personalidade inflexível levou-o a uma total intransigência com os mesmos príncipes que poderiam ajudá-lo
na pacificação da cristandade e na implantação das reformas. Em compensação, seu sucessor, Pio IV, foi
moderado e conciliador e conseguiu implantar a paz entre as potências cristãs e concluir o Concílio de
Trento.
O concílio ocupou-se dos grandes problemas do momento, os doutrinários e os disciplinares. Em
relação à doutrina, cumpria dar resposta às assertivas dos protestantes e esclarecer o conceito católico de
igreja. O conclave afirmou o valor das Sagradas Escrituras, também a importância da tradição eclesiástica
como fonte da fé; a liberdade do homem, não destruída pelo pecado original; a justificação pela fé e pelas
boas obras; e a revalorização dos sacramentos, em especial os do sacerdócio ministerial, da eucaristia e da
confissão. Os direitos disciplinares ocuparam-se da colação de cargos eclesiásticos, da residência dos bispos
nas dioceses, dos concílios provinciais e da formação nos seminários.

20
História do Cristianismo
Entre 1566 e 1590 Pio V, Gregório XIII e Sisto V puseram em prática a Reforma elaborada pelo
concílio, não somente com medidas disciplinares, como também, e principalmente, mediante a renovação do
ensino, dos seminários e das práticas da vida religiosa. A Contra-Reforma tornou-se realidade e encontrou
instrumentos valiosos no trabalho dos teólogos e reformadores da vida monástica, religiosa e secular que
floresceram sob o impulso da renovação da Igreja Católica. Entre os teólogos, o jesuíta Roberto Belarmino
distinguiu-se por suas críticas às doutrinas reformistas. Entre os reformadores, destacaram-se Pio V e são
Carlos Borromeu, que reformaram a cúria romana. Igualmente importante foi a Companhia de Jesus, um dos
grandes pilares da Contra-Reforma, com seus teólogos, colégios e missionários.
Como reação à proibição do culto às imagens pela Reforma protestante, a Igreja Católica promoveu o
ensino através das imagens. Essa promoção, ao lado do desenvolvimento da piedade popular e da superação
das formas cortesãs do Renascimento e de seu estilo artístico mais racional, deu origem, principalmente na
Itália e na Espanha, ao chamado estilo barroco.

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Os temas da escultura e da pintura barroca são fundamentalmente religiosos, em contraste com os temas
mitológicos do Renascimento. Exaltam o triunfo da fé, do pontificado, dos mártires e dos santos.
Predominam os momentos patéticos, como os de Gian Lorenzo Bernini, e os místicos, como os de Tintoretto
ou os de El Greco.
Na arquitetura, o estilo da Contra-Reforma se denominou "jesuítico", por seguir o estilo que o arquiteto
italiano Giacomo da Vignola imprimiu à igreja de Gesu, de Roma, e por coincidir com a rápida expansão da
Companhia de Jesus. A conjunção de arte e teologia foi mais uma evidência de que a mudança da igreja
havia chegado ao povo.5

CAPÍTULO 5

A HISTÓRIA DO PROTESTANTISMO

O desejo de reconduzir o cristianismo à pureza primitiva e de livrar a igreja cristã da corrupção e


do excessivo poder temporal da hierarquia religiosa de Roma deu origem, ao longo do século XVI, a uma
importante cisão no seio da cristandade: o protestantismo, uma decorrência direta da Reforma.
Protestantismo é um termo empregado para designar um amplo espectro de igrejas cristãs que, embora
tão diferentes entre si como a Igreja Luterana e as Testemunhas de Jeová, compartilham princípios
fundamentais como o da salvação pela graça de Deus mediante a fé, o reconhecimento da Bíblia como
autoridade suprema e o sacerdócio comum de todos os fiéis.
O termo "protestante" tem origem no protesto de seis príncipes luteranos e 14 cidades alemãs em 19 de
abril de 1529, quando a segunda dieta de Speyer, convocada pelo imperador Carlos V, revogou uma
autorização concedida três anos antes para que cada príncipe determinasse a religião de seu próprio território.
O termo foi logo adotado, de início pelos católicos e logo a seguir pelos próprios partidários da Reforma,

5
Enciclopédia Barsa, art. “Reforma e Contra-Reforma”.
21
História do Cristianismo
pois seu protesto, entendido como uma rejeição à autoridade de Roma, constituiu um claro sinal às diversas
igrejas que se declaravam reformadas.
A disparidade e a progressiva subdivisão das igrejas protestantes (luteranos, calvinistas, anglicanos etc.)
decorreram de seu próprio princípio original: a interpretação pessoal das Sagradas Escrituras sob a luz do
Espírito Santo. A ênfase dada por algumas dessas igrejas aos Evangelhos como norma de vida e à
experiência pessoal da conversão acabou por provocar o aparecimento de duas tendências no seio do
protestantismo: a liberal e a fundamentalista, autodenominada evangélica.
Embora ambas as correntes tenham coexistido em algumas igrejas, a divergência acabou por provocar o
surgimento de outras igrejas, entre as quais se destacam a Evangélica Alemã, a Evangélica Luterana e a
Evangélica e Reformada. Apesar das diferenças existentes entre as diversas igrejas, as idéias fundamentais
dos primeiros reformadores permaneceram inalteradas na maioria das denominações e credos protestantes.

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Princípios Gerais
O fundamento da doutrina protestante gira em torno da idéia da salvação unicamente pela fé. Martinho
Lutero e os demais reformadores baseavam esta exclusividade na natureza corrupta do homem por causa do
pecado original e, por conseguinte, em sua incapacidade para realizar boas obras aceitáveis por Deus.
Dessa maneira, a salvação seria uma graça que envolve a natureza humana, sem penetrá-la, e que a
apresenta como justa ante Deus. Essa concepção difere da católica, segundo a qual a graça é conferida pelos
sacramentos, entendidos não como novos intermediários entre Deus e os homens, mas como prolongamento
da ação de Cristo que transforma internamente a natureza humana. Os protestantes sempre recusaram
qualquer pretexto de mediação da igreja, até mesmo por meio dos sacramentos.
Com base na natureza corrupta do homem, os protestantes negaram também a liberdade e deram maior
ênfase à predestinação, devida somente à vontade de Deus, sem participação humana. João Calvino levou tal
tese às últimas conseqüências lógicas ao afirmar a dupla predestinação -- para a salvação e para a
condenação. Por sua vez, a idéia da predestinação trouxe consigo a ânsia de manifestar sinais da escolha
divina, que tinham de ser pessoais e que foram postos no sentimento ou na prosperidade econômica.
De acordo com a mesma linha de evitar a intromissão de uma hierarquia eclesiástica, o sacerdócio
comum dos fiéis é o segundo ponto fundamental da doutrina protestante. Os reformadores insistiram no
princípio bíblico de que Cristo é o único sacerdote, mediador ante o Pai, e que todo o povo incorporado a
Cristo constitui o sacerdócio da nova lei. Os protestantes rejeitam, portanto, o sacerdócio ministerial, ou seja,
negam um sacramento que torne sacerdotes determinados membros da comunidade. A radicalização dessa
idéia levou diversas igrejas a substituir o regime episcopal pelo presbiteriano ou pelo congregacionista, que
transferem a direção eclesiástica à comunidade.
A única autoridade reconhecida pelos protestantes em matéria de fé e de costumes é a palavra de Deus,
constante das Sagradas Escrituras. A palavra atua por seu contato pessoal mediante a ação do Espírito Santo,
engendrando a fé, e com ela a salvação. Daí a importância da pregação da palavra de Deus, assim como da
tradução da Bíblia para as línguas vernáculas, iniciada por Lutero, e da interpretação pessoal ou livre exame
dos textos bíblicos.
22
História do Cristianismo
Com relação aos sacramentos, a uniformidade é menor. Em geral, os protestantes admitem como
sacramentos o batismo e a ceia do Senhor (eucaristia), mas os consideram como sinais que estimulam a fé.
Rejeitam, pois, a concepção católica de que os sacramentos conferem a graça por disposição divina e
independentemente da atitude de quem os recebe.

Origem e Evolução
A propagação do protestantismo pela Europa e América, assim como a multiplicidade de interpretações
doutrinárias surgidas ao longo de sua evolução histórica, deram origem, já no século XVI, à progressiva
divisão das primeiras igrejas protestantes.
Na França, o calvinismo propagou-se rapidamente, não sem certa violência, entre as camadas populares
e alguns setores da alta nobreza, apesar das cruentas perseguições de que foram objeto, como a da noite de
são Bartolomeu, em 1572, e das guerras de religião que assolaram o país. A partir de 1598, data da

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promulgação do Edito de Nantes, que reconheceu sua existência legal, os calvinistas ou huguenotes, como
também eram chamados, desfrutaram de um período de paz que durou até 1685.
De 1618 a 1648 ocorreu no império germânico a guerra dos trinta anos, concluída mediante a Paz de
Vestfália, que encerrou o período caracterizado pelos conflitos religiosos.
Na Inglaterra, depois do breve e sangrento período católico de Maria Tudor, que governou de 1553 a
1558, a rainha Elizabeth I restabeleceu a autonomia da Igreja Anglicana, ao promulgar, em 1559, o Estatuto
de Supremacia e o Estatuto de Uniformidade, e em 1563 os Trinta e nove artigos, uma compilação das
doutrinas cristãs consideradas fundamentais pelo protestantismo anglicano. A soberana pretendia dessa
forma chegar a um entendimento com os católicos e com os protestantes anglicanos de influência calvinista.
O descontentamento destes últimos foi o germe de futuras dissensões no seio da Igreja Anglicana e do
surgimento de novos movimentos religiosos. Tal foi o caso do puritanismo, no início apenas uma corrente
espiritual que tomava a Bíblia como única regra de vida e recusava taxativamente tudo quanto fosse
mundano. Como movimento organizado, o puritanismo surgiu quando alguns membros da Igreja Anglicana
se rebelaram contra os resquícios de catolicismo que subsistiam no novo Livro de orações, de 1564. As
perseguições movidas pela igreja oficial levaram então muitos puritanos a emigrar para o continente europeu
e para as colônias americanas.
Ao contrário do que ocorrera na Inglaterra, onde de início o calvinismo se chocou com a igreja oficial,
na Escócia ele não tardou em transformar-se na religião principal, graças aos esforços de John Knox, no
século XVI, que contribuiu ativamente para a instauração do presbiterianismo. Os congregacionistas, grupo
puritano saído da Igreja da Inglaterra e dirigido por Robert Browne, mostraram-se desde sua origem, em
1580, muito mais radicais que os puritanos, pois rejeitavam qualquer outra autoridade na igreja que não a
congregação, ou assembléia local. Baseavam sua maneira de pensar na doutrina dos primeiros reformadores,
especialmente nos ensinamentos de Lutero.
Por volta de 1647, George Fox fundou na Inglaterra a Sociedade dos Amigos, cujos adeptos logo foram
conhecidos como quacres (quakers, "trêmulos"), nome procedente de uma frase pronunciada certa ocasião
por seu fundador: "Honrai a Deus e tremei ante sua palavra." Os quacres concedem importância fundamental
23
História do Cristianismo
à palavra interior de Deus, de quem dizem receber inspiração direta; não admitem sacramento algum;
rejeitam as idéias calvinistas sobre a predestinação; e recusam-se a pegar em armas.
Paralelamente a essas igrejas independentes da Inglaterra, surgiram na Europa continental outros
movimentos religiosos, o mais importante dos quais foi o pietismo, surgido na Alemanha no final do século
XVII. Esse movimento nasceu como reação à teologia racionalista e ao dogmatismo que dominavam a igreja
oficial alemã, e teve seu maior impulsor no pastor luterano Philipp Jakob Spener, autor de Pia desideria
(1675; Piedosos desejos). Nessa obra, ele defendeu o sacerdócio universal dos fiéis, a leitura da Bíblia, um
ensino teológico mais piedoso, a necessidade da oração individual e a formação de grupos para o estudo das
Sagradas Escrituras.
O movimento pietista exerceu considerável influência sobre o metodismo, fundado no século XVIII
pelo teólogo inglês John Wesley, que, com seu irmão Charles e seu amigo George Whitefield difundiu entre
os estudantes da Universidade de Oxford uma série de métodos de vida cristã para reativar o sentimento

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religioso. Embora os fundadores do grupo divergissem doutrinariamente quanto à idéia da predestinação,
defendiam em comum a necessidade não apenas da fé, mas também da prática de boas ações.
A difusão das doutrinas metodistas pela Europa, e sobretudo pelos Estados Unidos, deu origem no
século XIX a um redespertar do protestantismo, caracterizado pela associação à teologia tradicional de uma
espiritualidade sentimental e por uma profunda preocupação com os problemas morais e sociais. Essa
renovação provocou também o surgimento de novos grupos minoritários com características próprias, os
quais com freqüência foram considerados seitas, como os adventistas, pentecostais e testemunhas de Jeová,
entre outros. Dada a conotação algo pejorativa do termo seita e do subjetivismo dessa classificação, essas
comunidades passaram a receber mais tarde o nome de igrejas informais; caracterizam-se por uma
interpretação da última vinda de Cristo e por se desenvolverem entre pequenos grupos de gente simples em
busca da solidariedade de uma piedosa comunidade local.
O reexame e a crítica dos textos bíblicos, e até mesmo da própria razão de ser do cristianismo -- que
teólogos e intelectuais protestantes iniciaram no século XIX sob influência do racionalismo então imperante
-- deram lugar ao desenvolvimento de uma nova teologia liberal, cujos representantes mais destacados foram
os alemães Friedrich Schleiermacher e Albrecht Ritschl. Suas teorias sobre a salvação pela fé, que para o
primeiro residia na experiência religiosa pessoal e para o segundo na necessidade social que o homem sente
de Deus, constituíram a base do pensamento protestante do século XIX.
A teologia liberal conduziu também a um enorme desenvolvimento da pesquisa bíblica, com uma
orientação historicista. Os estudos críticos dos livros do Antigo e do Novo Testamento feitos por Ferdinand
Christian Baur, Joseph Barber Lightfoot e Adolf von Harnack lançaram nova luz sobre as interpretações
tradicionais da Bíblia.
Com o início do século XX ocorreu um retorno à doutrina dos primeiros reformadores, representada por
Karl Barth e Emil Brunner na Europa, e por Reinhold Niebuhr nos Estados Unidos. O movimento por eles
impulsionado, denominado neo-ortodoxo, opunha-se às idéias liberais e ao sentimentalismo que rebaixam a
mensagem da revelação divina.

24
História do Cristianismo
Movimento ecumênico protestante. O trabalho missionário e assistencial decorrente da propagação do
protestantismo na Ásia e na África e a necessidade de atender às numerosas seitas que proliferam nos
Estados Unidos, levaram à busca da unidade e da ação conjunta das diversas igrejas protestantes. A
Conferência Missionária Mundial, realizada na cidade de Edimburgo em 1910, marcou o início desse
movimento ecumênico e foi o germe de novos congressos e conferências -- Estocolmo, em 1925 e Oxford
em 1939 -- que conduziram à constituição do Conselho Mundial de Igrejas, cuja primeira reunião ocorreu em
Amsterdam em 1948.
A partir de então, o desenvolvimento do movimento protestante foi muito grande, a ponto de atrair o
interesse da Igreja Católica e das igrejas ortodoxas.6

Capítulo 6

QUATRO CONDIÇÕES ESPIRITUAIS DO CRISTIANISMO

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I. IGREJA FORMADA

Do Pentecostes ao ano 590


Neste primeiro momento, formou-se a Igreja Cristã. Nosso Senhor profetizou o nascimento do
cristianismo no Evangelho de Mateus, cap. 16, quando disse a Pedro: “Tu és Pedro (petros, “pedregulho”) e
sobre Esta pedra (petra, “rocha”) edificarei a minha Igreja”.

O Alicerce da Igreja: Cristo


Este texto tem sido interpretado de várias maneiras. Os católicos têm procurado apoio nessas palavras
para supostamente afirmar que a doutrina do papado é correta e de que teria Pedro, o primado entre os
Apóstolos, sendo ele, a Pedra.
Outros estudiosos têm entendido ser a pedra, a confissão de fé, a declaração de fé proferida pelo
apóstolo Pedro, quando diz: “Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo”. Esta é uma possibilidade. Esta
interpretação não é errônea. Alguns estudiosos entendem ser a pedra a declaração de fé, o testemunho
doutrinário, solene, ali proferido por Pedro, vendo em Jesus o cumprimento da promessa Messiânica do
Velho Testamento.
Entretanto, o entendimento maior, e com maior fundamentação bíblica e lingüística, tem sido, de que a
Pedra é o Senhor Jesus Cristo. O próprio Pedro deixou isto bem claro (1 Ped. 2:4, 6, 7, 8). Esta pedra maior,
este alicerce que vem do Céu, essa é a base da Igreja: o Senhor Jesus Cristo. Os apóstolos foram os
fundamentos postos sobre a Pedra Angular. E nós, somos pedras pequenas, menores, tijolos colocados nesse
grande edifício, que é a Igreja e que tem o Senhor Jesus Cristo como pedra angular (Efés. 2:20).

6
Enciclopédia Barsa, art. “Protestantismo”.
25
História do Cristianismo
O Surgimento da Igreja
A Igreja é constituída no momento em que Pedro fez aquela declaração, embora tenha seu grande marco
de inauguração no momento solene da descida do Espírito Santo em grande medida sobre os discípulos no
dia de Pentecostes.
O Pentecostes é uma festa tem suas origens no Antigo Testamento, mas aquele de Atos é o primeiro
Pentecostes Cristão, que ocorre já neste novo momento da economia divina. Naquele primeiro Pentecostes
Cristão descrito em Atos 2, percebemos que a Igreja Cristã lá no seu nascedouro, já surge com um caráter de
universalidade, ou seja, de catolicidade, palavra histórica utilizada para definir o conceito. O termo
“católico”, portanto, não se limita apenas a uma agremiação religiosa em particular, mas sim, se refere à
Igreja do Senhor como um todo, e mesmo os protestantes não devem ter medo de usar a palavra católico
quando recitarem o Credo Apostólico, porque é uma palavra corretíssima, é patrimônio da cristandade.
Assim, a Igreja já nasceu com essa característica: a universalidade (ou catolicidade).

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No livro de Atos, percebemos que no dia de Pentecostes estavam presentes em Jerusalém pessoas,
prosélitos do judaísmo e tementes a Deus, procedentes dos três continentes conhecidos da época. O Mar
Mediterrâneo, conhecido como o Mar da Integração Transcontinental, banha três continentes: grande parte
da Europa, grande parte da África e parte da Ásia.
Já no Pentecostes, percebemos pessoas vindas de toda aquela região banhada pelo Mar Mediterrâneo,
pessoas que foram influenciadas pelo proselitismo judaico, e essa gente foi atingida pela pregação do
Evangelho, no dia de Pentecostes, quando quase 3000 pessoas se converteram. Agora, como cristãos,
retornaram para as suas terras de origem, marcando assim, o início da Igreja Cristã naquelas diferentes
regiões ao longo de todo o Mar mediterrâneo. Por exemplo: o apóstolo Paulo ainda não tinha ido à cidade de
Roma, mas escreve para a Igreja forte que estava estabelecida naquela cidade, porque o Cristianismo, graças
ao Pentecostes e a tudo o que ocorreu ali por volta do ano 35 da Era Cristã (data aproximada) surge com a
característica da universalidade. Daí, nós nos deparamos com o apóstolo João, se referindo a todos aqueles
que procedem (os remidos) de todos os povos, tribos, línguas e nações que estão em toda a Terra.
Esse é o primeiro grande momento da História da Igreja Formada, se estendendo desde o Pentecostes e
indo até em torno do Papado de Gregório. Quanto à data de 590 d.C., nem todos os historiadores comungam
a mesma opinião. Alguns entendem que este primeiro momento deva ter ido até meados do Séc. V, por volta
do ano 450, quando Leão I tornou-se bispo de Roma, o primeiro bispo de Roma a ser costumeiramente
chamado de primeiro papa. Outros entendem que este primeiro momento, vai um pouquinho mais além de
Gregório I, por volta de 590 d.C. dadas às grandes realizações de Gregório I, em conseqüência das suas
reformas já realizadas naquela época, surgindo, entre outras coisas, o chamado Canto Gregoriano. Ele
realizou a primeira grande reforma no culto.

A. Pais da Igreja
Mas, o que aconteceu durante este período tão longo da Igreja Formada? Este grande período é
conhecido como a época dos Pais ou Padres da Igreja. Esses homens eram assim denominados, dada a
fidelidade que dedicaram à Palavra de Deus. Eles levavam Deus e a Sua Palavra a sério. Tinham uma vida
26
História do Cristianismo
piedosa, consagrada. Tinham grande preocupação com a santidade da Igreja. Foram eles os responsáveis pela
elaboração inicial de toda nossa Teologia Sistemática. Por isso são conhecidos como os Pais da Igreja.
A Igreja Cristã não nasceu com um conjunto de doutrinas já definido. A Igreja não surgiu com todo o
Novo testamento escrito, traduzido ou elaborado. Ela herdou o Velho Testamento, mas as doutrinas foram
sendo elaboradas gradativamente e coube aos Pais da Igreja essa tarefa grandiosa.
Esses homens foram muitas vezes perseguidos. Alguns foram até martirizados. E, quanto mais os
inimigos da Igreja matavam servos do Senhor (não somente os Pais da Igreja, outros crentes também) mais a
Igreja crescia e se fortalecia. É tanto, que um dos Pais da Igreja, Tertuliano, um advogado cartaginês, se
expressou dizendo assim: “O SANGUE DOS MÁRTIRES É A SEMENTE DO CRISTIANISMO”. Ela é a
chave para o entendimento dessa fase. Muitos dos Pais da Igreja foram mortos em diversos lugares,
especialmente nas arenas romanas. Os Pais da Igreja, visto serem vários, deram grandes contribuições. Nós
geralmente podemos classificá-los tomando como referência Agostinho.

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A Patrística, os Pais da Igreja, são geralmente divididos em: Pais Pré-Agostinianos, ou seja, aqueles
Pais que viveram antes de Santo Agostinho (ele é assim denominado de Santo, como os outros também são,
mais por reconhecimento pela vida piedosa, devocional daqueles homens servos de Deus), os que estão ao
longo dos Séc. II e III d.C. e início do Séc. IV; Agostinianos, nessa classificação não se pluraliza, refere-se à
grande contribuição do próprio Agostinho. O que Agostinho escreveu. Não dá para imaginar, como aquele
homem gastou a vida toda debruçado, basicamente, escrevendo e também pastoreando a Igreja (porque ele
era pastor da cidade de Hipona, no norte da África, onde hoje é a Argélia. Naquela região, a religião
muçulmana, infelizmente, domina). Agostinho era um homem de Igreja. Ele era pastor de Igreja, era Bispo,
foi notável teólogo e grande doutrinador. Escreveu durante quase todo o tempo obras importantíssimas, de
grande profundidade bíblica e teológica. Ainda hoje dependemos de seus escritos. Daí ele ser um divisor de
épocas na história da Patrística.
Depois dele, seguem-se então os Pais Pós-Agostinianos, que estão depois de Agostinho, especialmente
ao longo da segunda metade do Séc. V até o Séc VI.
O período dos Pais da Igreja compreende um período muito longo mesmo. Talvez alguém perguntasse:
“Os pais da Igreja não estão desde o primeiro século da Era Cristã? A resposta é: Não. Porque o século I, é o
século da Era Apostólica. Os Pais da Igreja iniciam suas atividades no período que se segue à época dos
apóstolos. O último dos apóstolos foi João, já velhinho, que escreveu o livro de Apocalipse, no término do
Séc. I A.D.

B. Contribuição dos Pais da Igreja


Elaboração dos Credos
Os grandes credos da Igreja surgiram com o trabalho e a preocupação dos Pais da Igreja. Somente
quanto ao Credo Apostólico é que entendemos que teve elaboração anterior. O Credo teve sua origem
durante o Séc. I da Era Cristã e, segundo alguns, depois do Novo Testamento é o documento mais antigo da
Igreja. Mas, os demais credos, como o Credo Niceno, ou Credo Niceno-Constantinopolitano, elaborado
durante o Concílio de Nicéia, na cidade de Nicéia, no ano de 325, sendo mais tarde reafirmado em um outro
27
História do Cristianismo
Concílio na cidade de Constantinopla, noutra data; o Credo Atanasiano, supostamente escrito por outro Pai
da Igreja, Atanásio; e outros credos, sendo estes os mais conhecidos.

Realização de Concílios Eclesiásticos


Os Pais da Igreja tratavam dos problemas da Igreja através de Concílios. Esses Concílios eram
convocados, devidamente presididos e as matérias eram ali tratadas. Existiam problemas difíceis, às vezes os
assuntos eram tratados de maneira acalorada, como ocorre hoje nos nossos Concílios Eclesiásticos. A Igreja
entendeu ser este o meio mais eficiente de tratar suas dificuldades, através de Concílios Eclesiásticos,
constituídos por autoridades devidamente credenciadas para que suprissem as necessidades e resolvessem os
problemas da vida da Igreja.

Definição do Cânon do Novo Testamento

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A Igreja já surgiu recebendo do judaísmo o Velho Testamento prontinho. Inclusive traduzido para a
língua mais falada da época: a língua grega. A igreja não teve que elaborar o Velho Testamento, mas teve
que definir o Cânon Neo-testamentário. Era preciso muita sabedoria e pedir muita orientação de Deus para
saber quais eram os livros verdadeiramente inspirados, porque tinha muita gente escrevendo em nome dos
Apóstolos, coisas absurdas. Hoje, isso é chamado de Falsidade Ideológica. São os chamados textos pseudo-
epígrafos. Tinha gente que escrevia em nome de Paulo para as Igrejas. Já perceberam que há uma epístola
em que Paulo diz assim: “Vede com que letras grandes vos escrevo. É assim que eu assino”, chamando a
atenção para o seu autógrafo? Ele tinha, tudo faz crer, problemas nos olhos, e isto está bem provado por um
texto bíblico. Quando uma carta terminava, ele assinava. Tudo faz crer que era assim. Escrevendo aos
Gálatas ele diz assim: ”O zelo de vocês para comigo era tão grande que, quando vocês se converteram, se
pudessem, teriam arrancado seus olhos para mos dar”. Gál. 4:15. Provavelmente fazendo referência ao seu
problema, uma possível catarata. Sempre quando terminava uma carta ele assinava. Mas, por quê? Pra que
todo esse cuidado? Porque tinha gente usando o nome dele e incomodando a Igreja com falsas doutrinas. Por
isso, a Igreja teve que definir o Cânon, teve que analisar com muito cuidado, quais eram os livros do Novo
testamento que mereciam crédito, para serem assim utilizados pela Igreja. Os Pais da Igreja tiveram essa
preciosíssima responsabilidade.

Combate às Heresias
As mais diferentes heresias surgiram prejudicando a Igreja. À medida que um ensino falso ia
surgindo, os Pais da Igreja iam analisando e definindo a doutrina. A Igreja não surgiu já com sua doutrina
elaborada. Alguém que trabalhava em banco disse uma vez que, a melhor maneira de identificar uma cédula
falsa, é conhecendo a verdadeira. É preciso conhecer bem a verdadeira. Tudo o que for diferente da
verdadeira, é falsa. À medida que aqueles ensinos perigosos iam surgindo, os Pais da Igreja iam parando para
analisar e dizendo: “Isso não soa bem”. Era como se ferisse os ouvidos deles.
Assim, as doutrinas foram gradativamente sendo sistematizadas. É interessante quando a gente
pega a Confissão de Fé e vai analisar, estudar a História da Igreja antiga, e percebe o quanto dependemos
28
História do Cristianismo
desse primeiro momento da História da Igreja: a IGREJA FORMADA. A Igreja caminhava bem ao longo
desse período, mas, vem agora um segundo momento da História da Igreja que, nessa nossa visão
panorâmica, denominamos de IGREJA DEFORMADA.

II. IGREJA DEFORMADA


De 590 a 1517
Aqui, as palavras ditas por João, em Apocalipse 2:4, referindo-se à Igreja de Éfeso, se aplicam muito
bem a esse segundo momento da História da Igreja: “Tenho porém, contra ti, que abandonaste o teu
primeiro amor”. Essas palavras conceituam, classificam muito bem este novo momento. A Igreja começou,
a partir do fim do primeiro século, gradativamente a se distanciar de sua referência, daquela bússola
orientadora, a se degenerar pouco a pouco.
Esse período vai desde 590 até 1517. É um período muito grande em nível da História Universal.

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Compreende naturalmente, toda a medievalidade. Como essa fase é muito longa, basicamente 1000 anos,
costuma-se dividi-la em duas grandes fases chamadas de Alta Idade Média e Baixa Idade Média, apenas para
efeito didático.
A. Alta Idade Média
A Alta Idade Média é aquele período em que predominou o sistema político denominado de
Feudalismo. Quem dominava tudo era o Senhor Feudal. Existiam basicamente duas classes sociais: o Senhor
Feudal e o Servo da Gleba.
Não existia moeda corrente ainda e a Igreja era um desses senhores feudais. Ela tinha grandes
propriedades. Os bispos, os abades, com as suas propriedades em torno dos mosteiros, eram verdadeiros
senhores feudais.
A Igreja tinha uma autoridade muito grande ao longo daquele período. Além do mais, as pessoas
que não eram religiosas, que não eram bispos, nem abades, mas detinham riquezas e propriedades, também
eram senhores feudais.
Esta foi a época do chamado sacro-império romano-germânico, que começou precisamente a partir
de Carlos Magno, por volta do ano 800, e que vai predominar durante toda a Alta Idade Média.
A vida naquela época, era relativamente pacata. Com relação à Igreja, muita gente se convertia à
força. Assim o Cristianismo foi-se espalhando através do mundo bárbaro. Quando aquele que tinha voz de
mando se convertia, todos aqueles que estavam sob seu comando, eram obrigados a se converter. Era uma
espécie de conversão compulsória. E, o atestado de conversão, era o recebimento da água batismal. Foi
batizado: era cristão.
Ao longo desse período, muita gente entrou na Igreja e não havia classe de catecúmenos. Sabe-se
que Clóvis, rei dos francos, que viveu um pouco depois da queda de Roma em 496, se converteu e todos os
seus soldados, todos os seus súditos foram compulsoriamente batizados. Aconteceu a partir daí, que aquela
gente que veio do paganismo, trouxe sua herança pagã para dento da Igreja. Não deixaram nada de fora.
Começou a acontecer uma espécie de sincretismo religioso, e a Igreja começou a sofrer muito a partir daí.
Essa situação vai ao longo de toda a Alta Idade Média.
29
História do Cristianismo

B. Baixa Idade Média


Ao longo da Baixa Idade Média, o homem europeu começou a mudar do seu status de vida com o
surgimento de uma nova classe social: aqueles servos da Gleba, que eram pouco mais que escravos e deviam
obediência completa ao senhor feudal, gradativamente, por volta do Séc. XII, começaram a sair dos feudos, a
deixar o campo, e vir para a cidade, em torno dos palácios, dando origem às cidades medievais. Começaram
a descobrir o comércio, o poder existente na venda, na troca e vai surgir uma nova classe social denominada
de Burguesia, ao longo da baixa Idade Média.
É nessa nova fase que uma série de problemas, maiores até que aqueles outros, começam a entrar na
vida da Igreja. Uma situação deplorável, porque falsos dogmas começaram a ser elaborados a partir desse
momento. O clero não estava preparado, era um clero inculto. Gente que não estudava, que entrava na Igreja
e tornava-se Bispo comprando o seu cargo com dinheiro. Assim, surgiram muitos desvios teológicos. Os

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principais deles foram:

Veneração à Maria e aos Santos


O Culto a Maria começou a surgir gradativamente. Não foi de uma hora para outra. Atingiu o seu
ápice, não muito longe de nós, com o dogma da Imaculada Conceição de Maria, quase no término do século
passado. É uma história muito longa a veneração Mariana, com dificuldades as mais diversas. Agora, Maria
é cultuada e considerada como co-redentora ao lado de Cristo. Embora o catolicismo defenda esse ponto de
vista, a Bíblia ensina que nem anjos nem seres humanos devem ser adorados, mas somente o Criador (Apoc.
19:10; 22:9). Também ensina que só existe um Mediador entre Deus e os homens: Cristo (1 Tim. 2:5).

Celibato Obrigatório
Outro desvio foi a questão do celibato clerical obrigatório. É muito difícil dizer quando isto
realmente começou. É uma história muito longa, e, a partir de um determinado momento, a Igreja oficializou.
Por volta do IV Concílio de Latrão, a Igreja aprovou, no Papado de Inocêncio III , o dogma do Celibato
Clerical Obrigatório. É dito agora, com toda a seriedade, que aqueles que exercem cargos eclesiásticos NÃO
PODEM casar. O celibato não é mais uma questão de opção ou de circunstância da vida, mas uma
obrigatoriedade. Isto trará uma série de dificuldades, de problemas para a vida da Igreja.

Transubstanciação
A Igreja começou a dizer a partir de um certo momento (e isto tudo para aumentar o poder dos
sacerdotes) que, quando o sacerdote dizia as palavras da instituição da Santa Ceia, os elementos da Ceia,
transformavam-se no corpo de Cristo, tão vivo e real como estava no Céu. Mas, para que isto acontecesse,
era necessário o papel de quem? Quem tinha a prerrogativa de dizer as "palavras mágicas" para que os
elementos se transubstanciassem em corpo de Cristo? O sacerdote. Percebem como o sacerdote começa a ter
um papel importantíssimo?

30
História do Cristianismo
Purgatório
A Igreja afirma que as almas daqueles que morrem, vão para um lugar chamado Limbus. As crianças
não batizadas irão para o Limbus Infantus6.
Quem é que batiza? O sacerdote. Pra não ir pro purgatório tem que depender de quem, mais uma vez?
Do sacerdote.
Então, toda a vida do homem medieval dependia do Sacerdote, do nascimento, à morte, pois ao nascer
tinha que ser batizado pelo Sacerdote; ao casar tinha que receber a bênção do Sacerdote, ao morrer tinha que
receber a extrema unção do Sacerdote e depois da morte precisava do Sacerdote para sair do Purgatório.
Notem a importância que o Sacerdote passa a ter! Ele se torna um pouco menor que Deus, e bem maior que
todos os homens.
Para que as almas pudessem sair do purgatório, muita coisa teria que ser feita. Indulgências teriam que
ser pagas. Qualquer um poderia pagar inclusive a indulgência pelo pai já falecido, pelo amigo, pelo filho e

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até por si mesmo, pois alguém poderia esquecer dele e ele tinha que se garantir. Quem vendia as
indulgências? O Sacerdote. Quem dizia as "palavras mágicas" para que as almas fizessem a transição do
purgatório para o Céu? O Sacerdote.

Santa Inquisição
Como se não bastasse, a igreja medieval arranjou um sistema de calar a boca dos dissidentes. Os
instrumentos de tortura utilizados pela Igreja, com requintes de crueldade, durante a Inquisição é coisa que
desafia a criatividade mais original. Coisas aberrantes mesmo.
E, outra mais: qualquer pessoa podia denunciar outro de suposta heresia e, uma vez feita a denúncia,
não se fazia nenhum levantamento nem busca da verdade. Qualquer advogado sabe que num processo
natural, existe todo aquele julgamento garantindo pleno direito de defesa. Isso não acontecia durante a
Inquisição. Quase sempre as pessoas eram condenadas, executadas, de formas as mais diversas, seus bens
eram confiscados e, muitas vezes, a família era enviada ao desterro. Coisas absurdas. A fogueira inquisitorial
era uma das formas mais comuns de execução e talvez não fosse a pior delas.
Quem puder leia de Dostoievski, o grande escritor russo, autor de, entre outras obras, "Os Irmãos
Karamazov". Há um capítulo denominado de “Grande Inquisidor”, onde ele descreve o Senhor Jesus Cristo
entrando na cidade de Sevilha, na Espanha, sendo detido pelos representantes da Igreja e levado preso.
Chegam os grandes representantes da Igreja lá onde Ele está preso e dizem: “Nós não precisamos do Senhor.
O Senhor veio para nos atrapalhar. Aprendemos a ser Igreja sem a Sua presença”. Que coisa absurda!. A
Igreja foi, de fato, DEFORMADA. É nessa fase que vai haver muita crise em toda a Igreja.
Muitos disseram assim: “a Igreja está péssima, está totalmente degenerada, mas, eu estou na Igreja e
vou permanecer dentro dela. Vou fazer minha parte.”. Esses que reconheceram que a Igreja estava péssima
mas resolveram permanecer dentro dela são denominados de: os místicos medievais. São chamados místicos
porque eles buscaram uma vida piedosa, uma vida de comunhão com Deus, desejaram algo de melhor. E,
quase sempre, os místicos estavam naquela classe denominada de feudal. Eram pessoas mais esclarecidas,
mais instruídas, e, naturalmente tinham mais acesso e ficaram dentro da Igreja. Eles exerceram muita
31
História do Cristianismo
influência sobre os reformadores. Por exemplo, João Tauler é um desses místicos medievais. E há quem diga
que Tauler foi protestante antes do protestantismo. Com toda certeza, Lutero descobriu a doutrina da
justificação pela fé lendo as Escrituras, mas também examinando os escritos de Tauler, uma vez que ele
sistematizou esta doutrina de uma forma bem elaborada (porque antes de Lutero, Tauler já havia percebido
na Bíblia a doutrina da justificação pela fé).
Outros saíram da Igreja. São os chamados Pré-Reformadores. Quase sempre os Pré-Reformadores
saíram não só do feudalismo, mas daquela classe denominada de burguesia. Foi um movimento mais
popular, pelo menos na sua fase inicial. Mais tarde um movimento mais erudito, com Wycliff, com Huss,
com Savanarola. Wycliff, era professor da Universidade de Oxford, na Inglaterra e era sacerdote. Já Huss,
era professor da Universidade de Praga, na Boêmia; Savanarola era sacerdote na Itália, em Florença, naquela
fase de conflito entre as cidades-estados da Itália e França, porque a França tinha interesse naquela região
toda sob o domínio dos Médicis, especialmente. Savonarola foi o último dos Pré-reformadores, denominado

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de: “O João Batista da Reforma”. Ele foi condenado à morte, pela inquisição, em 1498. Essa fase toda, é
denominada de Igreja DEFORMADA.

III. IGREJA REFORMADA


Analisaremos o que foi a REFORMA. Leia Ap. 3:10, a primeira parte do versículo. Isto foi dito à
Igreja de Filadélfia. O apóstolo João estava se referindo à importância da Palavra guardada por aqueles
irmãos. Vem aí um novo momento na vida da Igreja: a IGREJA REFORMADA.
O que proporcionou a REFORMA foi, exatamente, a Palavra de Deus. A Bíblia foi descoberta.
Vejam só: durante muito tempo, a Palavra de Deus fora ignorada.
A REFORMA fez seu marco inicial no dia 31/10/1517. Lutero era sacerdote e também professor da
Universidade de Wittenberg. Homem muito instruído, começou a ler a Palavra de Deus, as Escrituras,
especialmente a epístola do apóstolo Paulo aos Romanos. Ele ficou muito impressionado com toda aquela
situação da Igreja.
Naquela data afixou na porta da Catedral de Wittenberg as famosas 95 teses, condenando a venda
de indulgências. No dia seguinte seria 1º de novembro, dia de todos os santos, e o dia 2, o dia de finados. A
catedral de Wittenberg teria naqueles próximos dias muitos fiéis. Muita gente viria à Igreja. Era uma grande
oportunidade para que todo mundo tomasse conhecimento. Nem todos podiam ler porque o numero de
analfabetos era muito grande.
Este grande momento da REFORMA se estende até 1648, quando terminam as guerras político-
religiosas. A data de 1648 é uma data muito importante, não só na história universal, mas na história da
Igreja, quando foi assinada a Paz de Westfália, que marca o término da guerra dos 30 anos na Alemanha
precisamente, e da guerra dos 80 anos entre os países baixos e a Espanha. Esse período todo é denominado
de REFORMA PROTESTANTE DO SÉC. XVI. Mas, vai um pouco além do séc. XVI. É um grande século
da REFORMA.
A REFORMA trabalhou algumas áreas específicas.

32
História do Cristianismo
A. A DOUTRINA
Era necessário restaurar a doutrina da Igreja. Alguns lemas foram elaborados.
SOLA SCRIPTURA
Tudo começou por aí, a título de REFORMA DOUTRINÁRIA.
Por SOLA SCRIPTURA os reformadores entenderam que a Bíblia é a nossa única regra de fé e
prática. O que é que isto significa? A gente diz isto tantas vezes, não é verdade?
Quando se diz que a Bíblia deve ser a única regra de fé, quer-se dizer que tudo quanto os cristãos
acreditam ser expressão de toda a verdade sagrada, está dentro da Bíblia. Nenhuma doutrina pode ou deve
ser ensinada ou crida, que não tenha fundamentação bíblica.
Mas ela também é dita ser a única regra de fé prática. Isto significa que a vida diária do cristão,
tudo o que ele faço, o que ele diz e o que ele penso, tem que estar de acordo com a Bíblia. Ao dizer sola
scriptura, os reformadores disseram o seguinte: “A Bíblia é mais importante que a tradição”. Eles não

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negaram, nem foram contra a tradição. Dizer que os reformadores jogaram na lata do lixo a tradição não é
verdade, porque todo grupo tem suas tradições. Tradição é aquela herança que a gente adquire daqueles que
viveram antes de nós.
Os reformadores examinaram isto com muito cuidado. Eles não eram necessariamente contra a
tradição, mas contra o tradicionalismo. Ou seja, na hora em que a tradição feria o que a Palavra de Deus
ensinava, eles rejeitavam a tradição e, naturalmente, faziam opção pela Palavra de Deus.
E mais ainda: a Bíblia foi traduzida para a língua vernácula. Sabem em que língua estava escrita a
Bíblia, naqueles dias? Em Latim. E quem conhecia o Latim? Uma faixa da sociedade muito privilegiada,
uma pequena fração. Apenas aqueles que eram sacerdotes, aqueles que lidavam com a ciência jurídica, os
advogados lá nos tribunais. Apenas estes conheciam o latim. Os Universitários conheciam o latim porque era
a língua universitária da época. Quem estudasse em Oxford, na Inglaterra; em Salamanca, na Espanha; em
Paris, ou em qualquer outra Universidade medieval, não tinha nenhuma dificuldade, porque a língua falada
em todas elas era o latim. O povão não sabia latim, então, os Reformadores providenciaram para que a Bíblia
fosse traduzida para a língua falada pelo povo. Surgiram muitas traduções da Bíblia. Na Alemanha, Lutero
traduz a Bíblia para o alemão; na França surgem traduções do Novo Testamento, ainda pelos humanistas
(eles forneceram uma contribuição à REFORMA). Mais tarde vai surgir uma nova versão das Escrituras, em
francês: a Bíblia Genebrina (porque Genebra é um dos cantões da Suíça que se fala francês) e outras versões.
Outras traduções também surgiram na Espanha, como a versão Reina-Valera, que é a versão oficial da Bíblia
em espanhol. Foi traduzida por Caciodoro de Reina e revisada por Cipriano Valera. Herança daquele
período. Uma série de outras traduções foi efetuada para que a Bíblia fosse colocada na mão do povo de um
modo geral.
O SACERDÓCIO UNIVERSAL DOS CRENTES
Toda a vida do homem medieval dependia do Sacerdote. Os reformadores disseram que, cada crente
no Senhor Jesus é também um sacerdote. Jesus Cristo é o Sumo-Sacerdote, o nosso Sacerdote maior. Não é
assim que nos ensina a epístola aos hebreus? Qual é o papel do sacerdote? Ministrar na casa de Deus. Então,
cada crente é um sacerdote em Cristo. Os Reformadores descobriram isto lendo a Bíblia. Assim, o cristão já
33
História do Cristianismo
não necessita da mediação de ninguém. Aquele que é mediador nosso diante de Deus é, única e
exclusivamente, o Senhor Jesus Cristo, como diz em 1 Pedro 2:9: “Porque vós sois sacerdócio real, nação
santa, povo de propriedade exclusiva de Deus”.
SOLA FIDE
Isso quer dizer que a fé é superior às obras. Obra é importante? É, mas não para a Salvação. O
cristão deve praticar boas obras? Claro que sim. Mas deve fazê-las como um atestado, um testemunho
público daquela mudança que já se operou dentro de nós. Obras são efeito, e não causa. Neste sentido, a fé é
quem salva e não as obras. A Salvação é operada pelo Senhor Jesus Cristo lá na cruz, e a fé é gerada em nós
pelo Espírito Santo que nos habilita a receber naturalmente esta graça extraordinária da Salvação.
É assim que os Reformadores passam a pregar a Doutrina da Justificação pela Fé. Não pelas obras,
mas sim, pela fé. O que foi que os Reformadores fizeram para que a doutrina fosse aprendida por todos? Não
era só para eles saberem. Todo mundo deveria ser instruído nessas santas verdades. Eles elaboraram

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Confissões de Fé e Catecismos. Isso são símbolos de Fé. Os símbolos de Fé da Igreja antiga são chamados de
Credos. Os credos são bem pequenos. São muito breves. Já os Catecismos e Confissões são mais
trabalhados, são bem mais longos.
Qual a diferença entre Catecismo e Confissão?
A Confissão é um pequeno tratado de Teologia Sistemática. Os assuntos são ali apresentados de
forma expositiva. Por exemplo: O capítulo que fala sobre Deus e a Santíssima Trindade. Está lá toda uma
exposição. É mais difícil. É preciso ter um certo conhecimento, analisar cuidadosamente para entender as
Confissões.
E quanto aos Catecismos? Eles são escritos de que maneira? Perguntas e respostas, para facilitar o
aprendizado. Existem catecismos em duas categorias: Maior e Menor. Naturalmente, os menores são mais
simples.
Tudo isto foi escrito para doutrinar o povo. A Igreja estava precisando aprender doutrina.

SOLE DEO GLORIA


Isto quer dizer: Glória, honra e louvor somente à Deus, ou seja, culto só se deve prestar a Deus.

B. O CULTO
O culto foi uma segunda área da Igreja a ser restaurada. Era preciso recuperar o verdadeiro culto
celebrado pela Igreja. Eles entenderam, lendo a Bíblia, que somente Deus deve ser louvado. Qual é a
pergunta número 1 da maioria dos catecismos protestantes e que está bem dentro desta reforma litúrgica?
Qual o fim principal do homem? Qual a resposta? O fim principal do homem é glorificar a Deus e gozá-lO
para sempre.
Isto quer dizer que Deus não existe em função de nós, mas nós existimos em função de Deus; que o
culto não é para nós, o culto é para Deus. Os Reformadores entenderam que tinha havido muito desvio com
relação ao culto. Concluíram qu o culto não é para o homem, não deve ter fundamento antropocêntrico,

34
História do Cristianismo
porque isto não tem base bíblica. O culto é do jeito que Deus gosta e é Deus quem determina como Ele deve
ser cultuado.
Sendo assim, é preciso estudar o que é que Deus tem a dizer a respeito do culto e foi isso que os
Reformadores fizeram através do lema SOLE DEO GLORIA. Com isso, eles resgataram uma expressão de
culto que vinha sendo ignorada, o culto ao Deus Triúno: o Pai, o Filho e o Espírito Santo. É tanto, que ainda
hoje, alguns clérigos iniciam o culto dizendo: “Iniciemos este culto em nome do Pai, do Filho e do Espírito
Santo”, mostrando assim, que o culto é para o Deus Triúno.
Os Reformadores, então, descobriram que só o Deus Triúno, só a Trindade é merecedora de culto. Com
isso, eles rejeitaram duas outras formas de culto que existiam, que surgiram na Idade Média: o Culto Dulia e
o Culto Hiperdulia.
CULTO DULIA
É o culto aos santos de um modo geral. A veneração aos santos havia crescido muito e de uma

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forma extraordinária durante a Idade Média. Antes de se converter, Lutero era devoto de Sant’Ana. Ele
participava desse culto Dulia. Mas, quando começou a ler a Bíblia descobriu que isto não tinha
fundamentação bíblica.

CULTO HIPERDULIA
Híper - estar acima. É o culto a Maria. A veneração a Maria tinha um lugar especialíssimo. Todas
essas expressões de culto foram rejeitadas pelos Reformadores. Daí o uso do lema: “SOLE DEO GLORIA.
Para isso, os Reformadores elaboraram os manuais de culto. E, mais ainda, verteram todo o culto para a
língua vernácula, na língua do povo, e não somente a Bíblia.
Isto foi muito importante para a REFORMA, porque antes ninguém entendia nada da missa. Os
manuais não tinham formas rígidas. Eles apresentavam uma estrutura normativa do culto cristão, diferente da
missa que gravita em cima daquelas partes denominadas de Próprio de Tempore e Ordinário6.
O Ordinário é o que acontece em toda missa. Não muda nada, nada daquilo ali. O Próprio de
Tempore está de acordo com as estações do ano eclesiástico.
Para os Reformadores, o culto deveria ter uma estrutura e esta estrutura ter certa mobilidade
facilitando assim o trabalho, a criatividade, a riqueza. Só que, agora, tudo isto policiado pelas Escrituras. E,
mais ainda, os Reformadores vão resgatar o canto congregacional. Dizer que a Igreja Católica não cantava de
jeito nenhum, é um exagero. Ela cantava, às vezes. Cantava os Améns, os Aleluias, o Agnus Dei e algumas
Doxologias. O Glória não. É muito difícil. Era mais o coro que cantava. Era a Doxologia Maior. E então,
ficava difícil. Somente algumas pequenas participações. A Congregação passou agora a cantar. Lutero
escreveu corais, ele era muito hábil nas questões musicais. Preparou os famosos corais luteranos, não
somente ele, mas outros o ajudaram, e Calvino auxiliado por pessoas competentes, não ele, mas se apropriou
de músicos famosos, de poetas importantes e elaborou o que nós chamamos de Saltério Genebrino. A
metrificação dos Salmos. Os Salmos passariam a ser cantados pela Igreja, de forma congregacional. Um
avanço extraordinário! Que beleza enorme! Agora, naquelas enorme catedrais góticas, poderiam ecoar de
forma tão melodiosa a voz de toda a congregação, louvando o nome do Senhor.
35
História do Cristianismo

C. A DISCIPLINA
Era preciso restaurar a disciplina da Igreja. O que fizeram os Reformadores? Organizaram tribunais
eclesiásticos em diferentes estâncias, como acontece ainda hoje. Quando acontece um problema de disciplina
na Igreja, o Conselho se transforma em tribunal. Quando acontece um problema com um pastor que precisa
de disciplina, não é o Conselho, é o Presbitério que se transforma em tribunal eclesiástico. Onde nasceu tudo
isto? Na REFORMA. Com que objetivo a REFORMA cuidou da disciplina? Para a Igreja crescer em
santidade; para que o povo de Deus fosse um povo zeloso, dando o seu testemunho na condição de sal da
terra e luz do mundo.

D. O GOVERNO DA IGREJA
A REFORMA recusou toda autoridade papal. Diferentes formas de governo eclesiástico surgiram.

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Formas de Governo Eclesiástico
Há geralmente quatro formas reconhecidas de governo eclesiástico, que podem ser resumidas do
seguinte modo:
1. Episcopal - a forma de governo eclesiástico por bispos, comumente com três ordens de
ministros: bispos, sacerdotes e diáconos.
2. Papal - a forma de governo eclesiástico em que o papa é investido de autoridade suprema. Ele
governa a igreja por intermédio dos cardeais, arcebispos, bispos e sacerdotes. A igreja local ou os membros
individuais não têm autoridade na administração da igreja.
3. Independente - a forma de governo eclesiástico que torna a congregação da igreja local suprema
e final dentro de seu próprio domínio. Esta forma é geralmente denominada congregacionalismo.
4. Representativa - a forma de governo eclesiástico que reconhece que a autoridade na igreja
repousa nos seus membros, com a responsabilidade executiva delegada a entidades e oficiais representativos
para dirigir a igreja. Esta forma de governo eclesiástico reconhece também a igualdade da ordenação de todo
o ministério. A forma representativa de governo eclesiástico parece ser a prevalecente na Bíblia.

Ramificações
“O protestantismo dividide-se em protestantismo histórico, criado a partir da Reforma, e protestantismo
pentecostal, surgido no começo do século XX, com ênfase no exorcismo e na veneração do Espírito Santo.”7

Protestantismo Histórico
a) Igreja Luterana
b) Igreja Presbiteriana

7
Almanaque Abril 1997, art. “Protestantismo”.
36
História do Cristianismo
c) Igreja Anglicana
d) Igreja Batista
e) Igreja Metodista

Protestantismo Pentecostal
a) Pentecostalismo tradicional (Assembléia de Deus, Congregação Cristã do Brasil, Evangelho
Quadrangular e Brasil Para Cristo).
b) Neopentecostalismo (principal é a Universal do Reino de Deus)

Pára-Protestantes
a) Igreja Adventista
b) Igreja Mórmon

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c) Testemunhas de Jeová

IV. IGREJA CONFORMADA


Qual a realidade da igreja contemporânea? Igreja CONFORMADA. Qual o retrato da Igreja no
momento? Igreja CONFORMADA. Durante a fase anterior muita coisa boa e louvável aconteceu ao longo
desse período. Aconteceram os avivamentos espirituais. Nós não podemos ignorá-los. Despertamentos na
Inglaterra com os Puritanos. Tudo isto está dentro deste período. Na Alemanha, com o pietismo, após o
período pós-guerra dos 30 anos. Vieram os avivamentos onde a Palavra de Deus foi pregada, divulgada, onde
muita gente se converteu. Nesse período surge o grande século de Missões.
Agora, depois disto, qual o retrato ao longo do nosso século? É uma Igreja estagnada, uma Igreja
decadente, CONFORMADA. Alguém se referiu à cristandade de dos nossos dias, denominando-a de
Cristianismo sem Cristo. É preciso empreender o retorno à condição da Igreja Primitiva. Aquele lema que
nós poderíamos denominar de Ad Fontis, o retorno às fontes originais do Cristianismo. Viver o Cristo na
Igreja não é uma experiência pontual, estagnada no tempo. É uma caminhada constante. Não é procurar criar
algo novo, novas experiências ou sensações. É retornar ao princípio, às raízes, para de lá extrair a seiva
renovadora.8

8
Adaptado do Rev. Maely Ferreira Vilela, Panorama Histórico da Reforma.

37
História do Cristianismo

CAPÍTULO 7

ECUMENISMO — UNIÃO DAS IGREJAS

A necessidade de união das igrejas cristãs na luta pelos princípios comuns de paz, caridade e
fraternidade constitui o fundamento do ecumenismo, essa tentativa ingente de unir um cristianismo dividido
e subdividido em quase infinitas ramificações.

Definição de Ecumenismo
Ecumenismo, segundo o decreto Unitatis redintegratio, aprovado pelo papa Paulo VI, é o conjunto de
atividades e iniciativas para favorecer a unidade dos cristãos. Seus princípios básicos são a eliminação de

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palavras, juízos e ações que apresentem uma visão distorcida dos cristãos não-católicos; e o diálogo
permanente com as diversas igrejas ou comunidades, para que cada um possa explicar mais profundamente a
doutrina de sua comunhão e assim se disponham todos a uma avaliação adequada e a uma colaboração mais
ampla em vista do bem comum.
Ao abordar as igrejas e comunidades eclesiais separadas da sé romana, o decreto analisou isoladamente
as igrejas orientais e as protestantes. Sobre as primeiras, exaltou a solicitude e o cuidado de conservar as
relações fraternas e reconheceu a herança delas recebida pela Igreja Católica na liturgia, tradição espiritual e
ordenação jurídica. Sobre as igrejas surgidas da Reforma, lembrou os laços de afinidade, principalmente no
que diz respeito ao reconhecimento de Cristo como Deus e senhor e único mediador entre Deus e os homens,
e ao fortalecimento dessa fé pela graça comum do batismo.
Em outro documento, a declaração Nostra aetate, também assinada por Paulo VI, a Igreja Católica
definiu sua posição frente às diversas religiões, cristãs ou não-cristãs. Assim, reconheceu que todas as
religiões buscam responder os profundos enigmas da condição humana por meio de doutrinas e regras de
vida, seja através das sutis explicações filosóficas do hinduísmo, seja pela busca de um estado de suprema
iluminação, como no budismo. Sobre o islamismo, mostrou as afinidades decorrentes do monoteísmo, da
veneração a Jesus, reconhecido como profeta, e da honra a Maria; e exortou a todos que, esquecidas as
dissensões do passado, pratiquem a mútua compreensão. Em relação ao judaísmo, relembrou que do povo
judeu nasceram Cristo, Maria e os apóstolos, recomendou o mútuo conhecimento e apreço e condenou os
ódios e perseguições contra os judeus.

História do Ecumenismo
O ecumenismo remonta aos primórdios da igreja, que sempre se preocupou com a unidade, ameaçada
pelos cismas e heresias que acompanham sua história. Na verdade, a tendência divisionista existiu desde os
primeiros séculos do cristianismo, com o fenômeno das heresias, o grande cisma que separou o Ocidente do
Oriente, a cisão do cristianismo saxão e latino, as crises do galicanismo na França e as ameaças de divisão no

38
História do Cristianismo
seio mesmo de Roma. Após a Reforma, o protestantismo começou também a dividir-se em numerosas
denominações ou confissões, de posições doutrinárias às vezes tão antagônicas quanto as da Reforma em
relação às de Roma. E os protestantes se preocuparam do mesmo modo com essas divisões e com a
necessidade de união. Assim é que, em 1846, surgiu na Inglaterra a Aliança Evangélica, movimento que se
estendeu aos Países Baixos, com o objetivo de impedir a tendência divisionista entre protestantes. Em 1910
surgiu a Reunião das Igrejas, na Inglaterra, e a Igreja Unida, nos Estados Unidos, que procuravam mais
intensamente a unificação dos credos.
O ponto inicial explícito do movimento ecumênico no meio protestante foi a Conferência Vida e
Trabalho, realizada em 1925, em Estocolmo, sob a influência doutrinária do teólogo protestante Nathan
Söderblom. Foi um congresso em que se procurou a unidade na fé interior em Jesus Cristo, com exclusão de
qualquer adesão a dogmas definitivos, inclusive o da própria divindade de Jesus. Em 1927 realizou-se na
Suíça a Conferência Fé e Ordem, onde se afirmou a mudança para uma base mais fixa de doutrina, com a

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participação de maior número de igrejas protestantes ortodoxas, que se opunham ao liberalismo religioso.
Tentou-se um denominador comum mínimo nos "artigos fundamentais", tidos como absolutamente
necessários à fé cristã, como o da divindade de Cristo.
A mesma linha de pensamento foi retomada no Congresso Ecumênico de Edimburgo, em 1937. Após a
segunda guerra mundial aumentou a consciência da necessidade de unificação para resistir às doutrinas
materialistas. Em 1948 reuniram-se em Amsterdam representantes de 150 igrejas protestantes, anglicanos,
ortodoxos e católicos antigos, fundando-se o Conselho Mundial das Igrejas ou Conselho Ecumênico que, por
meio de um comitê central, passou a dirigir e promover o movimento ecumênico no âmbito do
protestantismo.
As posições a respeito da unidade são diversas e decorrem da própria divisão doutrinária. Para os
anglicanos a unidade substancial do cristianismo não foi afetada pela formação dos grupos históricos,
romano, anglicano e ortodoxo; é a doutrina dos Três Ramos. Já os ortodoxos diminuem a divisão quando
declaram haver uma unidade de fé, sacramentos e, parcialmente, de governo. Negam simplesmente o
primado do sucessor de Pedro. A Igreja Católica defende a unicidade da igreja, organismo necessário e
exclusivo, em sua forma hierárquica visível, para a salvação através da fé e das obras, proclamada na Bíblia,
na tradição e definida pelos papas e concílios. A posição das demais igrejas protestantes foi reafirmada em
Nova Delhi, na conferência ecumênica de 1961, com a presença de observadores católicos, em que se
reafirmaram as teorias de Karl Barth, segundo as quais a igreja não é nem comunidade, nem grupo, nem
instituição, mas congregação viva dos que participam do "acontecimento" da redenção do homem.
Em 1962, o Vaticano convocou o XXI Concílio Ecumênico, cuja tônica foi o empenho dos católicos
pela unificação de todas as forças cristãs e a convivência fraterna com as demais religiões, em face do mundo
moderno. Em 1963, praticamente todas as igrejas ortodoxas orientais e diversas igrejas de países africanos e
asiáticos se tornaram membros do Conselho Mundial de Igrejas. Na América Latina, o predomínio das
igrejas conservadoras no âmbito protestante retardou a expansão do ecumenismo.

Novas Tendências
39
História do Cristianismo
O século XX assistiu a uma explosão dos conceitos religiosos tradicionais. As bases das grandes
religiões viram-se abaladas pela proliferação de um novo ecumenismo, surgido principalmente nas gerações
mais jovens e nos países recém-libertados da Ásia e África. Todas as religiões cristãs, das quais partiu com
mais vigor o movimento ecumênico, tiveram de dar-se conta da nova realidade cultural e religiosa do mundo
e tomar posição.
Grosso modo, pode-se falar de três posições em relação ao novo ecumenismo. A primeira é a do
exclusivismo, para a qual só há salvação no cristianismo. Combatida e criticada no Concílio Vaticano II e em
todos os encontros ecumênicos das diversas religiões cristãs, sobrevive hoje apenas nas alas mais
tradicionais. A segunda posição é antítese da antecedente, e defende o inclusivismo, na afirmação de que
embora a salvação seja, por definição, em Cristo, está à disposição de todos os seres humanos, sejam ou não
cristãos. A terceira posição é a do pluralismo, segundo a qual todas as grandes religiões da humanidade,
inclusive o cristianismo, são esferas válidas de salvação, em diferentes formas.9

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9
Enciclopédia Barsa, art. “Ecumenismo”.
40
História do Cristianismo

CONCLUSÃO

Vimos em rápidos lances a história condensada do cristianismo nos períodos antigo, medieval, moderno
e contemporâneo. Acompanhamos de perto os grandes lances de uma religião com dois milênios de
existência. Vimos seus erros e acertos, caminhos e descaminhos, marchas e contra-marchas. Fomos
testemunhas históricas de suas fraturas e desvios teológicos. Consideramos seu desenvolvimento,
cristalização e síncrese religiosa com os fatores pagãos. Divisamos sua tentativa de retorno às origens
singelas da fé do primeiro século.
Hoje o cristianismo não passa de uma massa informe e discordante de crenças, credos, confissões,
denominações e organizações religiosas. Um fator que tenta agregar tudo isso fundamentando-se no pouco
que existe em comum nas partes que compõem o todo é o ecumenismo, movimento surgido nas igrejas

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protestantes e, posteriormente, na Igreja Católica (Concílio Vaticano II), originado da crença de terem uma
identidade substancial a doutrina e a mensagem de Cristo. Existem, porém, algumas poucas igrejas para-
protestantes que não se alinham, pois julgam que certas doutrinas bíblicas são inegociáveis. Esse é o quadro
atual do cristianismo.

BIBLIOGRAFIA

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