Direito e Holismo
Florianópolis
1999
'
UNIVERSIDADE ,FEDERAL DE_SANTA CATARINA
CURSO DE POS-GRADUAÇAO EM DIREITO
ELABORADA POR
COMISSÃO EXAMINA
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de Oli~únior - Presidente
PTOÍ. Dr.
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Agradecimentos especiais
Ao professor José Alcebíades de Oliveira Júnior, homem portador de uma nova visão
de mundo, que compreendeu meu pensamento e que me proporcionou o apoio necessário
para
de Santa Catarina.
A todos que contribuíram para que fosse levada a termo a reflexão que resultou no
presente trabalho.
SUMÁRIO
1NTRODUÇÃ_O ......................................... ..
CAPÍTULO 1
DIREITO E HOLISMO ...........................
1. ..
CAPÍTULO 11
z.HOL1sMO,D1RE1TO E CIÊNCIA ......... ..
ANEXO ........................................................................... . .
7
RESUMEN
‹
XVII, continúa a ejercer una gran influencia en todas las secciones del conocimiento humano.
Con el progreso de las investigaciones se evidencia la necesidadq del acercaciento del
hombre cada vez más con la naturaleza, por medio del rescate de los valores defendidos por
los orientales, por los anteriores a Socrates y por los pueblos primitivos.
Nosotros cruzamos una crisis seria, que, antes de ser el extremo de un paseo, marca
un momento de reflexión y de busqueda de nuevos caminos para el hombre y para la
civilización.
_
Estado la tarea de determinar la programación responsable por el mando dela vida de las
personas. _
_
sociedad, no conseguirá el hombre priorizar los valores que son caros a los seres humanos y
que deben conservarse a todo costo, como la libertad y la justicia social.
8
Traer a la luz princípios olvidados, *o todavia un princípio basico estudiado por los
orientales, hace su requisito como medida indispensable para que se pueda conectar el Derecho
ala realidad, y puede sacarlo del mundo de fantasia que para él construyó.
De la visión holística debe nacer una nueva postura del operador jurídico, que ahora
debe preocuparse con la humanidad, con la naturaleza y debe comprometerse
fimdamentalmente con una propuesta de conocimiento de una ecologia profunda, consistente
en el descubrimiento de un nuevo hombre, com equilibrio intemo y externo, con una postura
eticamente irrepreensible y, fundalmentalmente, solidario.
RESUMO
Por que abordar o Direito do ponto de vista holístico? Porque o Direito, enquanto
ciência, preso à visão cartesiana do século XVII, continua ainda hoje a exercer uma grande
influência em todos os setores do conhecimento humano.
Com o avanço das pesquisas fica cada vez mais evidenciada a necessidade de
aproximação do homem com a natureza, mediante o resgate dos valores defendidos pelos
Atravessa-se uma grave crise que, ao invés de ser of fim de uma caminhada, assinala
ser humano.
Não é possível levar-se a termo uma leitura fiagmentada do homem enquanto ser
inserido na grande caminhada universal. Se as pessoas não forem consideradas como peças
cruciais' no jogo da sociedade, não se conseguirá priorizar os valores que são caros à
humanidade e que devem s/er preservados a todo custo, tais como a liberdade e a justiça social.
O
«
escravidão que foi imposta a todos pelos muros edificados pela ciência que não pennitem os
Trazer à luz princípios esquecidos ou, ainda, um princípio basilar estudado pelos
orientais, se faz necessário como medida imprescindível para que se possa conectar o Direito à
realidade, afastando-of do mundo de fantasia por ele edificado.
'
Da visão holística deverá nascer uma nova postura do operador juridico, agora
preocupado com a humanidade, com a natureza, e comprometido fimdamentalmente com uma
proposta de conhecimento de uma ecologia profunda, consistente na descoberta de um novo
homem, equilibrado, intema e externamente, com uma postura eticamente irrepreensível e,
fundamentalmente, solidária.
O operador deverá estar preparado para uma nova estrutura de poder, mais
INTRODUÇÃO
social. Num segundo momento, aborda-seíó holismo como desafio que se apresenta à ciênciag
com o objetivo de impregná-la da complexidade da vida. Para que isso se efetive, propõe-se
como necessária a ruptura epistemológica, o que também se aborda no primeiro capítulo. Para
a compreensão dos princípios, impõe-se a leitura integral. No segundo capítulo, fala-se da
ciência em geral e da ciência jurídica do dever-ser. Assim, parte-se do pressuposto de que a
crise única que efetivamente se vive é de percepção. Para a superação da crise, vislumbra-se a
~
educaçao.
voltado para a vida, num sistema ético de referência] Após, destaca-se o misticismo como
complementação necessária da leitura eminentemente racionalista efetuada pela ciência. Para
que haja uma saída, o que importa é o reconhecimento deluma ética holística e de uma estética
natural. Só assim se terá um novo operador jurídico. _
holística. O holismo perpassa todas as áreas do conhecimento, razão pela qual o presente
trabalho contém uma proposta de leitura integral.
Em verdade, as religiões e a ciência sempre buscaram respostas para as mesmas
perguntas que afligem, há milênios, a humanidade. Afinal, quem é o ser humano? De onde
veio? Para onde vai? O nó górdio consiste na busca do sentido de tudo.
Surgem, contudo, a cada dia, para surpresa dos religiosos e cientistas, novas
perguntas. Os problemas são complexos e estão todos eles interconectados. As questões
fundamentais se interpenetram, são produto de nossa consciência e dizem respeito à própria
12
natureza humana. O Direito não existe sem o Estado. O Estado, segundo eles, é imprescindível
para que se tenha a sociedade organizada. Não é bem assim. Desde o princípio, existiram
sociedades primitivas sem Estado, sem, contudo, haver o emprego da força. O estatismo
também traz em si uma concepção reducionista do homem. Não é somente com o emprego da
força por parte das classes dominantes que se terá uma verdadeira sociedade. Pelo contrário,
dever-se-á resgatar a solidariedade, que é o elemento que mantém unidos os seres e que
permite a convivência de todos sobre a face da terra. A aldeia global preconizada por Chardin
é apenas uma constatação. Sempre os seres estiveram ligados. Só que a cultura individualista,
estimuladora da competição, não permite que se veja sequer o vizinho como companheiro de
uma grande jomada, que não acaba agora, mas que requer de todos um enorme esforço fisico e
intelectual. Há violência porque os marginalizados não se consideram partícipes do jogo
coletivo. Eles não se consideram irmãos dos demais seres. Pelo contrário, sentem~se atingidos,
desequilíbrio. Não há problemas individuais que não estejam ligados aos demais homens. Há
doenças degenerativas que atacam o ser individualmente e também coletivamente. A violência
nasce dentro de cada um e se materializa a partir dos valores negativos ditados pela sociedade
capitalista. A mídia estimula os comportamentos atentatórios à ordem capitalista. As vitrinas,
indiscutivelmente, levam os marginalizados da sociedade a buscar os bens que a sociedade de
consumo oferece. (O homem holístico sabe que a violência resulta da competitividade
especialmente em face da construção científica atual. Não se trata de negar todo o avanço, mas
de reconhecer a unidade de tudo: que todos estão em busca das mesmas respostas e que as
perguntas centrais são aquelas que foram formuladas há milênios, por místicos e cientistas.
fara salvar o Direito, necessita-se dotá-lo de um conteúdo éticol Para se conhecer o homem,
precisa-se de uma ciência repleta de sensibilidade. Ademais, impõe-se uma profunda mudança
do próprio poder político, excessivamente personalista, centralizado. Há um incontestável
A proposta deste trabalho, em suma, é reflexo das novas descobertas científicas que
~
tiveram o condão de abalar o edificio científico, tao pretensamente forte e seguro de si. Mas o
que, em verdade, ocorreu foi simplesmente a superação do positivismo, da dogmática que foi a
todos imposta, a partir de uma visão newtoniana-cartesiana de mundo, oficialmente estruturada
para a leitura da realidade. A nova visão de mundo está mais voltada para a construção de um
novo Direito, que reconheça a experiência da tradição, o patrimônio genético e, ao mesmo
tempo, que se constitua em elemento para promover a paz de que se necessita.
O determinismo neurogenético constitui uma grande ameaça lançada pela ciência,
porque tem a pretensão de explicar toda a complexidade a partir dos genes, que seriam
responsáveis pelos mais diversos fenômenos.
1. DIREITO E HOLISMO
1.1 O significado do Direito*
I
Confomle LYRA FILHO, Roberto, Para um direito sem dogmas, p. 14: “Diria um positivista que a Ciência do
Direito é precisamenteisto: um saber dos dogmas estatais ou, mais amplamente, dos padrões impostos pelas
classes sociais que tomam as decisões cogentes (FERRAZ JR., 1977: 41).”
15
“Todo um rumor me diz que nada disso se dá por si mesmo! Por todos os lados
impõem-se espécies de invólucros neurolépticos para evitar precisamente qualquer
singularidade intrusiva. É preciso, mais uma vez, invocar a História! No mínimo
pelo fato de que corremos o risco de não mais haver história humana se a
humanidade não reassumir a si mesma radicalmente. Por todos os meios possíveis,
trata-se de conjurar o crescimento entrópico da subjetividade dominante. Ao invés
de ficar peipetuamente ao sabor da eficácia falaciosa de 'challenges' econômicos,
trata-se de reapropriar de Universos de valor no seio dos quais processos de
singularização poderão reencontrar consistência. Novas práticas sociais, novas
práticas estéticas, novas práticas de si na relação com o outro, com o estrangeiro,
com o estranho: todo um programa que parecerá bem distante das urgências do
momento! E, no entanto, é exatamente na articulação: da subjetividade em estado
nascente, do socius em estado mutante, do meio ambiente no ponto em que pode ser
reinventado, que estará em jogo a saída das crises maiores de nossa época. ”
Félix Guattari
A partir de que momento passou a existir o Universo? Ou ele sempre existiu? Quando
o primeiro homem pisou sobre a face da terra ?2 Quando nasceu a sociedade? Ou ela sempre
existiu? São questões que apresentam diferentes respostas, sempre na dependência das diversas
culturas e da ciência.
“No princípio Deus criou o céu e a terra. A terra, porém, estava informe e
vazia, e as trevas cobriam a face do abismo, e o Espírito de Deus movia-se sobre as
águas. E Deus disse : Exista a luz. E a luz existiu. E Deus viu que a luz era boa; e
separou a luz das trevas. E chamou à luz dia, e às trevas noite. E fez-se tarde e
manhã: o primeiro dia. '
Deus, o Absoluto, exerce Seu infinito poder criativo através de palavras que
dão ao Universo e ao seu conteúdo ('Existe a luz. E a luz existiu Q. O
existência
processo de criação se efetua por meio da separação entre opostos, em particular
entre a luz e as trevas, a mais primitiva polarização da realidade. Essa separação
permite então definição do Dia e da Noite, marcando o início da passagem do
tempo. Devido ao seu caráter verbal do processo de criação, alguns autores chamam
esse tipo de Ser Positivo de 'Deus Pensador Criação é, de certa forma, um ato
'.
2
Para MORIN, Edgar. Para sair do século XY, p. 13, as questões cruciais que instigam a humanidade
continuam sem resposta. “Quem somos? De onde viemos? Para onde vamos? Temos respostas fisicas,
biológicas, antropológicas, sociológicas, históricas cada vez mais certas para essas perguntas. Mas essas
respostas não provocam perguntas muito mais extensas do que as que encerram? Estamos num universo em que
miríades de estrelas morrem, explodem, nascem e renascem incessantamente. Somos seres fisicos situados no
terceiro satélite de um pequenino Sol da Via-Láctea. Somos os seres biológicos mais cerebralmente
ramo cerebralmente mais desenvolvido da evolução animal. Somos seres humanos da espécie
desenvolvidos do
denominada homo sapiens, para os quais o problema, o enigma e o mistério maiores residem na própn`a
capacidade de resolver os problemas, desvendar os enigmas, abordar os mistérios.”
3
GLEISER, Marcelo. A dança do universo - dos mitos de criação ao big-bang, p. 3 1.
16
sem que o homem tenha sofrido tal divisão. A divisão é recente, portanto.
O Direito teria existido desde o momento em que o primeiro homem e a primeira
mulher pisaram sobre a face da terra, mas sempre conectado aos demais saberes.
Assegura Francisco Fialho:
“No início era o ll/MR.
E
nesse Il/LAR misturavam-se as águas da Ciência, da Religião, da
F ilosofia, da Arte e da Magia. O
homem habitava o A/[AR e era feliz.
Mas tudo é ritmo no Universo. Respíram as estrelas ao som das reações
nucleares. Passeiam os astros em órbitas estabelecidas.
Ao bater do gongo do tempo as águas se separam. Holismo cede O
lugar ao Reducionismo, a Síntese se decompõe na Análise e, encetando viagens
fantásticas, rios se formam.
`
4
Idem, ibzâzm, p. 27.
5
FIALHO, Francisco. A eterna busca de deus - de quarks a psi, p. 113.
6
Conforme MORIN, Edgar, O problema epistemológico da complexidade, p.1023 é fundamental trazer à baila
a complexidade, mais como um desafio do que como uma resposta. Afirma ele: Estou em busca de uma
possibilidade de pensar através da complicação (ou seja, das inúmeras inter-retroacções), através das incertezas
e através das contradições. Não me reconheço quando dizem que eu coloco a antinomia entre a simplicidade
17
absoluta e a complexidade perfeita. Porque, para mim, antes de mais, a idéia de complexidade comporta a
imperfeição, uma vez que comporta a incerteza e o reconhecimento do irredutível.
Consoante MORIN, Edgar. Para sair do século XX, p. 13, “Somos partes constitutivas, integradas,
7
grandes descobertas cientificas de Galileu, Kepler, Descartes, Newton e muitos outros durante o século XVII
O
provocaram tuna profunda revisão na concepção ocidental de cosmo. Universo medieval, finito e limitado, foi
substituído pelo infinito de Newton, a morada de um Deus infinitamente poderoso. O poder (mas não a
intenção) do dogrnatismo religioso de influenciar a evolução da ciência já não existia. Especulações escolásticas
não podiam mais substituir resultados científicos obtidos a partir da interação entre teoria e experimento. A
fundação racional da nova ciência, desenvolvida durante o século XVII, atingiu um nível magnífico de
sofisticação durante o século XVIII. O
mundo fisico foi reduzido a partículas maciças interagindo sob a ação de
forças, conforme ditado pelas três leis do movimento e pela lei da gravitação universal de Newton. Implícito
nessa descrição mecanicista da Natureza, encontramos um rígido determinismo: se conhecêssemos as posições
e velocidades de todos os objetos num certo sistema (por exemplo, o Sol, a Terra e a Lua) em um dado instante,
então, usando as leis de Newton, seria, em princípio, possível prever as posições dos objetos em qualquer
momento do passado ou do futuro! No final do século XVIII, Pierre Simon (1729-1827) conseguiu explicar a
maioria dos movimentos do sistema solar, enquanto outros franceses, como Pierre Louis Moreau de Maupertuis
(1698-1759) e Louis de Lagrange (1736-1813) refonnularam a mecânica newtoniana em termos de um
poderoso formalismo matemático, tornando-a capaz de descrever o comportamento dos sistemas físicos muitos
mais complexos. O Universo foi reduzido a um grande sistema mecânico, uma máquina complicada, porém
compreensível.”
1°
FOUCAULT, Michel. A verdade e as formas jurídicas, p. 16. Na mesma página 16, prossegue Foucault: “O
conhecimento foi, portanto, inventado. Dizer que ele foi inventado é dizer que ele não tem origem. É dizer, de
maneira mais precisa, por mais paradoxal que seja, que o conhecimento não está em absoluto inscrito na
natureza. O
conhecimento não constitui o mais antigo instinto do homem, ou, inversamente, não Há no
comportamento humano, no apetite humano, no instinto humano, algo como um germe do conhecimento.
18
Porém, inicialmente, faz-se necessário saber o que é Direito, que é definido pela
doutrina como o conjunto' de princípios" e normas que disciplinam a conduta humana,
sistema jurídico da realidade social.” Advoga-se que o Direito somente pode ser
compreendido a partir da análise do seu verdadeiro papel.” Não pode, entrementes, se
“ MONTESQUIEU, O espírito das leis, p. 149, alerta para os efeitos da corrupção dos princípios. Afimia que
“Uma vez corrompidos os princípios do Governo, as melhores leis tornam-se más, e prejudicam o Estado.
Quando os princípios estão sadios, as mas leis têm o efeito de boas.”
12
Ver BOBBIO, Norberto. Teoria general del derecho, p. 03. Diz Bobbio, “Nuestra vida se desenvuelve dentro
de un mundo de nonnas. Creemos ser libies, pero en realidad estamos encerrados en una estrechíssima red de
reglas de conduta, que desde el nascimiento y hasta la muerte dirigen nuestras acciones en esta o aquella
dirección.”
13
Conforme DAVI, René, Os grandes sistemas do cüreito contemporâneo, p. 537: “Diferentemente dos
ocidentais, os povos do Extremo-Oriente não depositam a sua confiança no direito para assegurar a ordem
social e a justiça. Certamente que neles existe um
direito, mas este direito não tem senão uma função
subsidiária, não desempenha senão urna função menor; os tribunais apenas se prommciam, as próprias leis
apenas são aplicadas se, pelo recurso a outros meios, não se conseguir eliminar os conflitos e restabelecer a
ordem perturbada. As soluções precisas que o direito comporta, o recurso à coerção que ele implica são vistos
com um extremo desfavor; a preservação da ordem social repousa essencialmente sobre métodos de persuasão,
sobre técnicas de meditação, sobre um apelo constante à autocrítica por um lado e ao espírito de moderação e de
conciliação por outro.”
'4
Conforme RAO, Vicente, O direito e a vida dos direitos, p. 19: o direito um sistema de disciplina social
ñmdado na natureza humana, que estabelecendo, nas relações entre os homens, uma proporção de
reciprocidade nos poderes e nos deveres que lhes atribui, regula as condições existenciais e evolucionais dos
indivíduos e dos grupos sociais e, em conseqüência, da sociedade, mediante normas coercitivamente impostas
pelo poder público. Essa noção parte da sociedade, menos ainda do Estado, para atingir o homem. Ao contrário,
partindo da natureza humana, alcança a organização social e visa a disciplina das condições de coexistência e
de aperfeiçoamento dos indivíduos, dos grupos sociais e da própria sociedade.”
15
confonne' HEssE, Kama. A força zzzzmzzzâvzz da wnsfiruzçâo, p. 17, “As consúmições nâo podem ser
impostas aos homens tais como se enxertam rebentos em árvores. Se o tempo e a natureza não atuaram
previamente, é como se se pretendesse coser pétalas com linhas. O primeiro sol do meio-dia haveria de
chamuscá-las.”
Segundo SINGER, June, Androginia _ rumo a uma nova teoria da sexualidade, p. 60, não há preocupação
16
dos historiadores com o matriarcado. No entanto, no relato feito pelo arqueólogo James Mellaart, que realizou
três escavações em três sítios pré-históricos na Anatólia, nele não se vislumbra a fúria do patriarcado: “Não
havia guerra há milhares de anos. 0 modelo social era ordenado. Não se realizavam sacrifícios humanos ou
animais. O vegetarianismo prevalecia, pois os animais domésticos eram mantidos pelo seu leite e sua lã, não
19
diziam os antigos, é arte e ciência. Por decorrência disso deverá sofrer uma revolução nos seus
métodos. A visão parcial da ciência tradicional não mais se justifica. Deseja-se, mais do que
nunca, uma volta à percepção do todo, levando em conta a bipolaridade universal, que está
presente em tudo e em todos (iustiça-injustiça, igualdade-desigualdade, individualidade-
coletividade, vida-morte etc); caso contrário, não se conseguirá, com “segurança”, navegar na
seara jurídica. O Direito não é composto apenas por nonnas editadas pelo Estado, muito
embora prevaleça o monismo estatal.” Exsurge, contudo, o pluralismo jurídico”, portador, em
essência, de um enfoque sociológico do Direito, pedindo, com urgência, uma refonnulação
dos seus princípios.
Inicialmente, o Direito esteve de mãos dadas com as normas religiosas, provenientes
especialmente dos ensinamentos dos mestres, tais como Buda e Jesus, inseridas posteriormente
nos livros sagrados. O Direito, entrementes, como é conhecido hoje, fortaleceu-se com a
laicização da estrutura do poder político, com a ruptura que se deu no período medieval.
“O
trabalho de inscrição do poder e da lei em um território; a
delimitação de uma sociedade política no interior de fronteiras definidas; a
conquista, nesse espaço, de uma fidelidade em comum à autoridade do rei vão de
par com um trabalho de consagração do território, de espiritualização do reino.
Paralalelamente a um processo de secularização e laicismo que tende a privar a
Igreja de seu poderio temporal no quadro do Estado, que tende a incluir o clero
nacional na comunidade do reino, opera-se um processo de incorporação das
representações religiosas próprias a investirem um significado místico no espaço
'natural e nas instituições sociais. Um dos desdobramentos efetua-se entre o que
'
como sendo de uma pessoa e de uma comunidade, a cabeça continua sendo símbolo
de uma transcendência índelével.”19
violenta dos Estados Unidos, o Projeto Retorno registra a taxa de reincidência de 6%. “Desde 1983, quanto
decidiu largar a profissão de dentista bem-sucedido mas infeliz, até hoje, Bob Roberts é uma prova de que os
caminhos para a realização pessoal não estão, absolutamente, desvinculados do que se passa com a
comunidade. Ao contrário. “A lição que nossa cultuia precisa aprender é que nós, seres humanos, somos todos
interdependentes', ele diz. Roberts é Ph.D. em Psicologa e diretor-executivo do Centro para a Cura
Comunitária Projeto Retorno da Universidade de Tulane, em New Orleans, onde também é professor da Escola
de Saúde Pública e Medicina Tropical. (...) No Estado de Louisiana, 85% dos presos são negros; 75% são
homens e 92% abandonaram a escola no ensino fundamental. Ao contrário do que ocorre no Brasil, nos EUA
existem programas govemamentais de reintegração. Mas os resultados não têm sido animadores: 65% dos ex-
condenados voltam a ser presos. Em Louisiana, os reincidentes chegam a 75%.”
22
CREMA, Roberto. Introdução à visão holística: breve relato de viagem do velho ao novo paradigma, p. 40.
Diz Crema, textualmente, que “Precisamente em 1900, no ano em que Freud anunciou ter desvelado o mistério
dos sonhos, o fisico alemão, Prêmio Nobel em 1918, Max Planck (1858-1947) revolucionou a Física com a sua
teoria dos quanta, afirmando que a energia emitida por qualquer corpo só poderia realizar-se de forma
descontinua, através de múltiplos inteiros de uma quantidade mínima por ele denominada quantum de energia.
Era o início da Mecânica Quântica que substituiria a clássica, de Newton.”
21
Direito também deverá ser focalizado, porque ele coloca toda a sua carga ideológica na
decisão que leva a cabo dentro do sistema. Está jurista, como os demais cientistas, investido.de
poder pelo saber.” No entanto, não se pode falar em ecologia externa sem a ecologia intema.
O homem que se intoxica de alimentos quimificados e medicamentos alopáticos não tem o
equilíbrio sangüíneo necessário para ser um grande defensor da natureza e nem de ser
da água do mar; os sais minerais são parte do mundo mineral que existe lá fora; a hemoglobina
diferente, de uma ética de um novo tempo, comprometida com a natureza, que respeite as leis
da vida, que reaglutine corpo, mente e espírito”. A própria Física Quântica tem perfeita noção
da interação dos elementos no Universo, que estão em nossas vidas, em nossas células, em
constante movimento, transformação e complexidade. Poderia a ética até mesmo ocupar o
lugar do Direito cambaleante deste final de século, que traz apenas respostas precárias para as
graves questões que afetam a humanidade. Somente com o surgimento de um homem
comprometido com a vida é que se terá a paz. Precisa-se, com urgência, de um Direito vivo,
dotado de ética e que respeite a visão de integridade.
A crise de percepção que se está enfrentando no Direito não deverá se constituir em
empecilho. Pelo contrário, terá de se constituir na mola propulsora de um novo tempo. Ou o
Direito desperta e se aproxima da vida e de suas vicissitudes, ou sucumbirá inexoravelmentezó
23
ver FOUCAULT, Michel. A verdade e as femzaz- ¡zm'âf¢as, p. ll. Afirma ele “Ae fel-mas judielàúae -
z
maneira pela qual, entre os homens, se arbitram os danos e as responsabilidades, o modo pelo qual, na história
do Ocidente, se concebeu e se definiu a maneira como os homens podiam ser julgados em função dos erros que
haviarn cometido, a maneira como se impôs a deterrninados indivíduos a reparação de algumas de suas ações e
a punição de outras, todas essas regras ou, se quiserem, todas essas práticas regulares, é claro, mas também
modificadas sem cessar através da história - me parecem uma das formas pelas quais nossa sociedade definiu
tipos de subjetividade, forrnas de saber e, por conseguinte, relaçoes entre o homem e a verdade que merecem ser
estudadas.”
24
Ver Capítulo III, que trata do Direito e Jusnaturalismo, especialmente no item 3.4, Por um operador juridico
voltado para o holismo. A saúde é o bem-estar ñsico, mental e social do indivíduo. É flmdamental para que se
tenha uma visão maior e melhor da vida. A
qualidade de nosso sangue é ftmdamental para que se tenha um
mais claro discernimento a respeito do fenômeno hmnano. Os orientais já diziam que “somos o que comemos”.
25
Ver WEIL, Pierre. A nova ética - na política, na empresa, na religião, na ciência, na vida privada e em
todas as outras instâncias.
2°
ver REALE, Miguel. Tema mzzâmenszenez de âfreize, p. 147-155. Afimzl Reale que a ciência de Direito
deixa de possuir um simples lógico, como queria Kelsen, e passa a ter um conteúdo fático-valorativo. “Vale
~
22
Isso não significará, contudo, o caos, porque a ordem-desordem” que se tem, já é prenúncio
mantido no seio da coletividade. Como o Direito não consegue ter solução para todos os
problemas humanos, ele se reproduz a cada dia, criando novas leis, cada vez mais duras, cada
vez mais específicas, cada vez mais voltadas para a defesa do interesse de alguns (exemplo
disso é a lei que trata dos crimes hediondos, penalizando severamente os seqüestros e
impedindo a progressão de regime).
Somente com a compreensão da interconexão que há entre todas as áreas do
conhecimento humano é que se vai ter uma idéia da atuação do Direito no meio social,
estabelecendo limites, edificando muros e penalizando os sonhos. O homem não pode ser
notar que, quer se tenha aceito ou não expresamente a teoria tridimensional do direito quatale, o certo é que,
graças a ela, impôs a consciência da necessidade de um novo paradigma para se ter uma idéia global e
congruente da experiência jurídica, empregando eu o tenno “paradigma” no sentido que lhe dá T. Kuhn, como
ponto de partida da renovação da ciência, o que, no plano ontológico, corresponderia ao ensinamento de
Heidgger sobre o valor essencial e fundante do ato de “mostrar” algo que se oculta.”(p. 151-2).
27
Segundo MORIN, Edgar. Ciência com consciência, p. 71-2, é impossível “tanto no domínio do
conhecimento do mundo natural como no conhecimento do mundo histórico ou social, reduzir a nossa visão
quer à desordem quer à ordem.”
28
Conforme TI-IOMPSON, Augusto. A questão penitenciária, p. 21, o sistema impõe massacrantes privações
ao indivíduo: privação da liberdade, privação de bens, privação de autonomia, privação de segurança e privação
de relações heterossexuais. Há uma nítida separação, no exercício do poder punitivo, entre bons e maus. Para os
maus o infemo da penitenciária.
29
Ver KELSEN, Teoria pura do direito, p. 13 1-3.
23
positivas? Somente atacando as condutas que reputa negativas, ele nada mais faz do que
congelar a desigualdade que o capitalismo estimula. A visão newtoniana-cartesiana32,
materializada nos métodos jurídicos, nos dá uma percepção caolha, parcial, incompleta,
3°
MORIN, Edgar. Para sair do século XX, p. 1 17.
3'
Conforme MORIN, Edgar. Para sair do século XX, p. 116, “A idéia de um sistema social geralmente
representa uma espécie de arquitetura que obedece a leis mecânicas simples, na melhor das hipóteses uma
espécie de máquina detenninista trivial (cujos efeitos ou produtos podem ser preditos a partir de um
conhecimento de causas externas). Nessa visão mecanicista/determinista, todo agente e toda ação estão
inseridos num local e num momento determinado, e é impossível entender que haja, na sociedade, fontes de
inovação e de transformação. Em contrapartida, a sociologia, sensível aos dinamismos, às mudanças e às
transformações, escapa à idéia estática de sistema, mas também escapa à idéia organizadora de sistema e só vê
fluxo, movimentos, ações, transformações. Ora, trata-se de conceber, em conjunto, a estática e a dinâmica, a
repetição e a mudança, a invariância e a inovação, a reprodução e a evolução. Trata-se, pois, de conceber como
o sistema de reprodução invariante se transforma, isto é, conceber o que faz com que a invariância varie.”
32
Ver KUHN, Thomas S. Estrutura das revoluções científicas, p. 107.Desde o principio, o homem preocupou-
se em encontrar a verdade. Nas idas e vindas do conhecimento buscam-se novos paradigmas com freqüentes
rupturas, que não significam necessariamente a desconsideração do conhecimento anteriormente construído.
Diz Kuhn “Suponhamos que as crises são uma pré-condição necessária para a emergência de novas teorias e
:
perguntemos então como os cientistas respondem à sua existência. Parte da resposta, tão óbvia como
importante, pode ser descoberta observando-se primeiramente o que os cientistas jamais fazem, mesmo quando
se defrontam com anomalias prolongadas e graves.”(p. 107). As rupturas ocorrem, muitas vezes, com a
retomada de enfoques existentes anteriormente. Ressalta Kuhn “No século XX, Einsten foi bem sucedido na
:
explicação das atrações gravitacionais, e essa explicação fez com que a ciência voltasse a um conjunto de
cânones e problemas que, neste aspecto científico, são mais parecidos com os dos predecesssores de Newton do
que com os de seus sucessores. Por sua vez, o desenvolvimento da Mecânica Quântica inverteu a proibição
metodológica que teve sua origem na revolução química. (...) O espaço, na física contemporânea, não é o
24
realidade que é apresentada ao juiz, crua, verdadeira, humana. Pelo menos, tem-se de
considerar a eqüidade” como elemento sempre presente, na cabeça e no espírito do juiz, enfim,
como elemento fundamental para a promoção da justiça.
O positivismo vem impondo a força da lei34 ou a lei da força, em detrimento da
moralidade, que deveria reger o disciplinamento das condutas humanas. Com relação ao
princípio da moralidade, inscrito no art. 37, “caput”, da Constituição Federal, existem autores
substrato inerte e homogêneo empregado tanto na teoria de Newton como na de Maxwell; algumas de suas
novas propriedades não são muito diferentes das outras atribuídas ao éter.”(p. 143).
33
A eqüidade tem por objetivo a flexibilização norma, hmnanizando-a.
34
Conforme OHSAWA, George, O câncer e a filosofia do extremo~oriente, p. 10: “Ao contrário, a Lei, por
exemplo, que representa a maior violência, ataca seriamente os inimigos da sociedade, 'em lugar de amá-los,
sobretudo os pobres. Tolera até a pena de morte para certos crimes. Por que ninguém apresenta a outra face? O
inimigo rico escapa à lei por intermédio de sua poderosa arma: o dinheiro. Os “gangsters” são, algumas vezes,
mortos, mas, na realidade, os verdadeiros criminosos, que são os educadores, são raramente punidos pela
justiça. Não seria mais sensato punir aqueles que criadores de °gangsters' e delinqüentes do que os próprios
delinqüentes e `gangsters”? Acontece o mesmo com a medicina, que ataca os micróbios, os vírus e os outros
inimigos imaginários do homem. No entanto, todos esses organismos são criações de Deus, exatamente como o
homem. A medicina não os ama, nem pergunta por que Deus os creou, em primeiro lugar, e por que são
recreados dia a dia, nem por que alguns são atacados por eles, enquanto outros não são. Parece que só a
medicina Oriental achou sua presença e existência no corpo humano saudável como algo natural no esquema
das coisas. Acontece o mesmo com a indústria da guerra, conduzida em nome da Justiça, da Paz e da
Liberdade, como se a Justiça pudesse ser destruidora, a Paz sangrenta e a Liberdade conquistada pela
violência./”
35
O art. da Constituição Federal de 1988, diz que são princípios que regem a Administração
37, “caput”,
Pública os seguintes: o da legalidade, o da moralidade, o da publicidade e o da impessoalidade.
25
6--)
Moralidade administrativa é a adequação da conduta da Administração
ao bem comum e se manifesta nos princípios da razoabilidade, proporcionalidade,
publicidade, economicidade, motivação do ato e proibição de desvio de finalidade.
Vincula os agentes de todos os poderes públicos na prática dos atos
administrativos.”
ele morre.” Se não estiver dotado de ética, cada vez estará mais distante das aspirações
coletivas, de uma vida melhor para todos.”
“Oart. 37 é exemplo singular de implantação dos valores no direito,
atribuindo coercibilidade ao princípio da moralidade e cominando sanção de
nulidade em caso de sua violação, mesmo que atendido o principio da legalidade.
Consubstancia tal princípio o dever da boa administração da coisa
pública, levando em conta. a boa fé, a lealdade, a proporcionalidade, a
razoabilidade e a confiança dos administrados na atuação do Poder Público.
Aplica-se às fimções do Estado como um todo.
C--)
36
RELATÓRIO do xxr simpósio Naoioiisi as Direito Tributário. Rzvisrzz ao rnsfimzo dz Pesquisas z Estudos
- - n. 17, p. 296-7, abr e jul, 1997. A comissão III do XXI Simpósio Nacional
Divisão Jurídica de Direito
Tributário teve como autores Hugo de Brito Machado, José Eduardo Soares de Mello, Maria Teresa de Almeida
Rosa Cárcomo Lobo e Marilene Talarico Martins Rodrigues, estando presentes na mesa as seguintes
autoridades: Edvaldo Brito, Antônio José da Costa e José Carlos Francisco.
37
Conforme WEIL, Pierre. A nova ética, p.107, a ética holística inspira-se, acima de tudo, “nos valores de
preservação da vida, alegria, cooperação, amor e serviço, criatividade, sabedoria e transcendência, traduzidos
por ações efetivas (...) nas categorias de inteireza, inclusividade e plenitude...” Trata-se aqui não de uma ética
moralista, mas de uma ética espontânea, integral.
38
Para se manter o equilíbrio da vida, no corpo humano, há necessidade da morte de milhares de células, para
que outras milhares nasçam. Sem a morte, não há vida. Sem a superação dos dogmas, não nasce o novo. O
velho sucumbe, para o novo nascer.
op. cit., p. 107, a ética holística tem como primeira característica a inteireza. E esta
39
Conforme WEIL, Pierre,
desdobra-se em princípios: “ INTEIREZA - Princípio 1. Estar atento à utilização da terminologia holística (do
grego holos: inteiro), levando em conta o novo paradigma considera cada evento como sendo tuna parte e um
reflexo do todo, conforme a metáfora do hologmma. É uma visão na qual o todo e as partes estão
sinergicamente em inter-relações dinâmicas, constantes e paradoxais. Princípio 2. Cultivar discernimento,
tolerância, respeito, alegria, simplicidade e clareza nos encontros entre representantes das Ciências, Filosofias,
Artes e Tradições Culturais e Espirituais necessárias para a abordagem transdisciplinar em equipe. Principio 3.
Focalizar com abertura e exame crítico e complementaridade e a contradição na consideração do relativo e do
absoluto, da via quantitativa e qualitativa, a serviço da vida, do homem e da evolução. Il - INCLUSIVIDADE -
Princípio 4. Respeitar a fonte comum das Ciências, Filosofias, Artes e Tradições Espirituais, ao mesmo tempo
que a singularidade destas. Princípio 5. Reconhecer e respeitar cada ser e cada cultura como manifestações da
realidade plena. Princípio 6. Levar em consideração o fato de que o produto de toda a criatividade não tem, em
última instância, nenhum proprietário, respeitando contudo os autores individuais e coletivos. III -
PLENITUDE ~ Princípio 7. Ser solidário com o outro na satisfação de suas necessidades de sobrevivência e de
transcendência. Princípio 8. Colaborar com o outro na preservação do bem comum e na convivência harmônica
com a natureza. Princípio 9. Buscar um ideal de sabedoria indissociada da dimensão do amor e do serviço.”
26.
Kant. O
autor diz-nos que, para Kant, a idéia de pureza é 'aquele conhecimento que
não tem mescla empírica Tornando mais preciso: 'o ponto de vista puro é o da
'.
forma de nossa contemplação de algo; e o conceito puro não é outra coisa senão a
forma de nossa consideração sobre um projeto qualquer E, essa idéia de pureza é '.
assim, dizer que 'a pureza está na forma de mirar, não na coisa mirada. A forma de
olhar determina a coisa vista; mais, reconhece que ela é algo mais. A pureza limita-
se ao que se pode dizer que as categorias racionais são E, por isso, conclui que: '.
'La Teoria Pura del Derecho es una teoria pura del Derecho, no una teoria del
derecho pura. '41
4°
ao xxi simpósio Nooioool do Direito Tributário, p. 297.
Roioióiio
41
EGGER, Ildemar. Algunas Dificultades para la Determinación del Objeto en el Conecimiento Jurídico, p.
308.
42
Conforme RAO, Vicente, O direito e a vida dos direitos, p. 37,
“
(...) a simples exegese do texto ou dos
precedentes judiciais, jamais formará juristas e, sim, apenas práticos do direito. A
própria aplicação dos textos
27
Porém traz apenas um pouco de luz para que se possa compreender a vida na sua plenitude. O
Direito vivo é aquele que tem a capacidade de, paradoxalmente, absorver os anseios
historicamente, e às regras que disciplinam a vida dos grupos heterogêneos, que integram a
aos casos concretos (quando os textos das disposições obrigatórias esgotassem o conteúdo do direito) não
poderia efetuar-se por modo fiel e consciente, sem a subordinação dos elementos de fato aos princípios gerais.
Nem o direito conseguiria progredir, sem o processo critico da verificação da correspondência ou não dos
diversos institutos jurídicos com as situações e necessidades sociais que tais institutos visam disciplinar.”
43
CREMA, Roberto. Introdução à visão holística : breve relato de viagem do velho ao novo paradigma, p. 76.
Conforrne MORIN, Edgar. Ciência com consciência, p. 13, “Se a ciência é 0 sector da vida humana na qual
44
tudo está em revolução, é também o sector que pode revolucionar toda a vida humana. É isto que ingenuamente
o marxismo dizia socialismo científico. Hoje, somos levados a formular o problema da ciência da consciência.”
45
TELLES IUNIOR, Gofliedo. Direito Quântico, p. 280. É o professor que utiliza a expressão Direito
artificial, que se contrapõe ao Direito natural, que é o direito que não é artificial. “É o direito consentâneo com
o sistema ético de referência, vigente em dada comunidade.”
28
realidade e contribuir para que se tenha uma transformação menos traumática e com
dispositivos que prevejam resoluções para novos conflitos, que surgem em decorrência das
novas conquistas tecnológicas. O Direito que se aproxima da realidade incorpora as regras que
brotam da experiência. O 'Direito novo deverá necessariamente estar mais voltado para a
realidade, para a verdade, mais próximo da justiça ou, pelo menos, preocupado com ela. Não
se trata, por óbvio, de uma justiça fonnal, mas de uma justiça vital”, de- uma justiça total,
enfim, de uma justiça mais próxima da vida das pessoas. O verdadeiro Direito terá de estar
voltado mais para a justiça distributiva. A justiça comutativa deverá de se constituir apenas
numa faceta menor do trabalho do Poder Judiciário. Daí o destaque que se impõe de sua
~
fimçao política. Ensina Jonh Rawls, “verbis”:
“A justiça é a primeira virtude das instituições sociais, como a verdade o é
para o pensamento. Uma teoria que, embora elegante e econômica, não_ seja
verdadeira, deve ser revista ou rejeitada; da mesma forma, leis e instituições, por
mais eficientes e engenhosas que sejam, deverão ser reƒormuladas ou abolidas se
forem injustas. "47
45
CALDEIRA, João Cláudio. Justiça formal e justiça vital, p. 12. O juiz insiste que a justiça não tem hora e
não está na dependência dos órgãos estatais.
47
RAWLS, Jonh. Uma teoria da justiça, p. 27. Afirma Rawls que a “parece não haver dúvidas de que a justiça
como eqüidade é urna concepção moral razoavelmente estável.”(p. 553).
48
Vide LIMA, Alceu Amoroso. Introdução ao direito modemo, p. 191. Diz ele: O que se pode desde já
adiantar, porém, é que o materialismo jurídico prestou um grande serviço, não só àqueles que se dedicam ao
estudo da ciência do direito, mas em geral a todos que se interessam pelos problemas sociais do mimdo em que
vivemos.
E esse serviço eminente,
prestado pelo materialismo jurídico, foi e será mostrar a muitos espíritos iludidos a
o sofisma, a insuficiência ou o perigo de todos os sistemas jurídicos que secionaram, no direito, o
falácia,
elemento formal do elemento material.
29
Não se trata só de desconsiderar a lei como a mais importante fonte do Direito, mas
também de dirigir a preocupação às demais fontes que nascem nas diferentes comunidades. O
Direito nasceu para dar harmonia à convivência social. Como se a segurança” fosse possível
de ser estabelecida através de uma política autoritária do órgão estatal. Teria o condão de
cada dia.
Não pode o Direito ser apenas o espelho dos valores defendidos pelas classes
dominantes, com a função de instrumento político de dominação e opressão. Requer hoje, mais
do que nunca, que tenha um conteúdo axiológico voltado para a defesa dos marginalizados e
oprimidos da coletividade.
49
LYRA FILHO, Roberto. 0 quo é direito, p. 09-io.
5°
A segurança prometida está alicerçada na cultura patriarcal e patemalista, que tudo domina e que tudo
proporciona. Os governantes nos prometem segurança, como se ela não dependesse de nós. Também os
políticos dizem que a saúde é um bem de todos, retirando a responsabilidade de cada ser de promovê-la através
de uma alimentação adequada e de bons hábitos de higiene.
5*
conforme TELLES JÚNIOR, Gofffooo. Éfioo _ do mundo ao oézuzo oo mundo do oulruro, p. 233-4, a
Ética ou Moral é a ordenação ideal para a atividade livre do sêr humano. De fato, a Ética ou Moral tempor
objetivo levar o homem a ser a plena e perfeita realização da natureza, isto é, a ser cada vez mais homem, mais
completamente aquele sefiiue a natureza dotou de consciência e espiritualidade. (...) Significa que a Moral ou
Ética manda o homem agir de acordo com seus bens espirituais, que são seus bens soberanos; manda agir de
acordo com a ordenação que leva o homem a ser completamente homem. A
isto, em suma, se reduz a Ética
inteira. Quando o homem segue a sua natureza, ele se distingue dos demais seres, porque está agindo de acordo
com sua própria essência, que é, precisamente, o que o faz ser o que ele deve ser. Quando o homem segue a
sua natureza, ele tende para o seu perfazimento, dentro da ordem ou categoria a que o homem pertence. Ele
tende a ser cada vez mais homem.”
52
FREITAS, Juarez, op. on., p. 1ó.
30
seria tomar possível a vida harmônica em sociedade. Ademais, o fenômeno juridico está
intrinsecamente inserido no fenômeno social. Não haveria sociedade sem Direito nem Direito
sem sociedade, conforme os romanos, como se fiisou acima. Entrementes, não se pode apenas
encarar o Direito do ponto de vista objetivo”, olvidando o seu papel de agente promotor de
Justiça.
“O Direito não pode ser somente forma, sob pena de perecer com ela. O
jurista não pode fechar os olhos à absolutidade do justo, sem a qual a lógica
dialética não subsiste. Em
sentido lógico, o absoluto é, em instância decisiva, toda a
fonte do poder e de legitimidade, por mais abusos que o aproveitamento discursivo
de tal concepção tenha engendrado. Não é o Direito um mero instrumento formal,
mas deve sê-lo, primordialmente, a junção das “cidades” separadas, das quais fazia
menção SANTO AGOSÍYNHO. Tal missão deve ser coincidente com a do homem
justo. Neste sentido, não estamos de acordo com S TAMLLER, quando este frisa que
todas as fenomenologias jurídicas seriam limitadas e concretas, o mesmo não
acontecendo com as idéias de justiça. Não é conveniente divorciar a fenomenologia
jurídica da idéia de justiça, sobretudo quando se a concebe como uma noção de
absoluta harmonia entre todos os conteúdos de vontade jurídica, de vez que somente
há sentido lógico para o ordenamento jurídico e, por assim dizer, derivado da razão,
53
MIRABETE, Júlio Fabbrini. 0 processo penal, p. 23.
54
Conforme WEIL, Pierre. A
consciência cósmica -introdução à psicologia transpessoal, toda objetividade é
subjetiva. “A ciência procura, antes de tudo, a °objetividade”; esta objetividade consiste, em última análise, em
fazer passar toda “prova” por varios dos cinco sentidos. Quando o experimentador lança mão dos aparelhos, ele
o faz porque os cinco sentidos são insuficientes para alcançar o fenômeno procurado, ou porque a habilidade ou
força humana impedem de produzir o efeito desejado. É o que acontece por exemplo com a captação de raios
infravermelhos ou ultravioletas que escapam à nossa visão, ou onda de rádio ou TV que têm que ser
transformadas em estímulos sonoros ou visuais. Na realidade estas cores ou sons não existem; são apenas o
registro pelo nossos sentidos de várias energias de comprimento de onda variando de um centéssimo a um
trilhonésimo de metros. Frequências variando de 10 ciclos a 10,20 ciclos por segundo são percebidas como
sons, calor, ou cor, conforme o receptor que lhe é sensível. A própria matéria é vista como sendo
“objetivamente” sólida, quando na realidade ela é pura energia mais densa que outras formas energéticas.” (p.
31).
31
Não se pode esquecer que o objetivo maior do Direito é a promoção da justiça. Esta
deverá ser priorizada sempre. Enfatiza-se o papel do operador jurídico, mormente do julgador,
não só na escolha do dispositivo aplicável, mas no processo que adota objetivando a melhor
decisão, a partir do sistema que lhe é oferecido, com as suas múltiplas normas, e seus
em apontar para as nonnas como solução dos graves problemas humanos. Precisam os
natureza, para que tenham uma idéia da complexidade da vida. A relação do Direito com as
55
FREITAS, Juarez, vp. af., p. 17.
55
Idem, ibidem, p. 103.
32
demais áreas do conhecimento humano constitui-se na questão central que afeta a Filosofia do
Direito, não só ela, porque o que se busca é a essência do Direito.”
“La cuestión de la 'naturaleza 'del derecho constituye uno de los
permanentes problemas principales de cualquier filosofía del derecho. Es bastante
extraño que, al parecer, nadie há considerado digno de atención que tal cuestión se
haya planteado y nadie há meditado sobre la razón de la misma y de su importancia.
Sin embargo, cuando nos detenemos a pensar en esto, el problema es más bien
peculiar. ?Quién pensaria en destinar el problema de la 'naturaleza de los
fenómenos psíquicos' a un tratamiento separado por una ciencia distinta de la
psicologia? ?O el problema de la 'naturaleza' de la natureza a una ciencia distinta
de las ciencias naturales? ?Que más se podría decir de la 'naturaleza' de los
fenómenos psíquicos que lo que resulta de la descripción y explicación de ellos
hecha en la psicologia? ?O acerca de los fenómenos de la naturaleza, que no esté
dicho por las diversas ciencias naturales?
?Por qué es tan distinta la situación respecto del derecho? ?Por qué el
problema de la naturaleza del derecho se encuentra fuera del ambito de la ciencia
jurídica en sentido estricto? Qué más puede decirse acerca de la natureza de los
fenómenos jurídicos que lo que resulta de la ciencia del derecho, que tiene como
objeto a estos mismosfenómenos?58
Com efeito, não se pode ter um Direito fechado em si mesmo, com seus signos, com
seus princípios e métodos, sem abrir-se para as informações múltiplas e complexas que pululam
~
fora dele. Carente de informaçoes, a própria ciência do Direito está precisando, urgentemente,
estabelecer uma conexão da normatização jurídica com a vida. Nada é absolutamente positivo
ou negativo na seara jurídica. Com o Direito tem-se a opressão. Sem ele ter-se-á a desordem,
asseguram os dogmatistas. Sem o resgate das leis da natureza não se conseguirá ter a visão de
integridade, tão necessária para a edificação da ciência juridica do Terceiro Milênio, alicerçada
nos princípios universais tradicionalmente defendidosçhá milênios. O Direito que apresenta
autoritário de massacre e marginalização, que não se renova, que se reproduz nos aparelhos
estatais e que não permite o repensar da dogmática. Há ordem no caos?6° Poder-se-ia viver um
57
Ver RÁO, Vicente. 0 direito e a vida dos direitos, p. 35. Para o autor, o Direito pode ser considerado como
filosofia, como ciência, norma e como técnica. Aduz “As regras de direito, coercitivamente impostas, ou são
:
elaboradas, como as leis, pelo poder público, ou são de elaboração extra-estatal, mas reconhecidas pelo Estado,
tal qual sucede com os costumes, com os princípios gerais de direito e com os preceitos legais estrangeiros,
quando diretamente, ou subsidiariamente, incorporados a detenninado sistema positivo.”
58
ROSS, Alf, op. cit, p. 6.
59
O Direito estatal, legalista, tudo quer impor, tudo quer determinar. Ele expressa a vontade, na maioria das
vezes, dos detentores do poder político e econômico.
6°
Conforme MORIN, Edgar, Op. cit., p. 79, “a mitologia da ordem não está só na idéia reaccionária na qual
toda a inovação, toda a novidade significa degradação, perigo, morte; está também na utopia de uma sociedade
transparente, sem conflito e sem desordem.”
IDIIUIIUÍÊÊCÊ UÍIÍVGÍSIÍÊÍÍÊ
33
0,, šjgø,,IOq'9
`›
dia sem o Direito? Para Amoroso Lima, grande parte dos fenômenos existem sem o Direitoõl
Porém, existem outros fatos que foram previstos pelas leis, mas que seriam irrelevantes.
Mesmo o Direito posto não se reduz à linguagem, muito embora a linguagem seja a parte
61
Conforme LIMA, Alceu Amoroso. Introdução ao direito modemo, numa leitura marxista, “O direito,
portanto, éuma “ilusão': a única realidade é a economia. É uma simples superestrutura derivada, sem nenhuma
independência, sem nenhum valor próprio, sem nenhum caráter normativo, sem nenhum ftmdamento imutável
e superior às contingências da história e ao interêsse das classes dominantes.” (p. 32-3). Vale dizer, o direito
“deixa de ter independência ontológica, para ser apenas a expressão transitória dos interesses materiais da
classe dominante, em cada momento histórico, e de sua técnica industrial, também a administração da justiça
nos regimes políticos perde tôda autonomia e passa a ser um instrumento político e social.” (p. 34).
62
ROSS, Alf, op. cit., p. 14.
63
B1ÁG1oN1,J‹›â‹›, op. cn., p. 53/54.
54
Ver LYONS, John. As idéias de Chomsky, p. 18. Afirma Chomsky que “a linguística comumente é definida
como ciência da linguagem.” Há a necessidade do operador jurídico compreender a linguagem como
.
Qual é, afinal, a relação do Direito com o holismo? Será que ela existe? O holismo é
uma ciência?“ Pode of holismo contribuir para o aperfeiçoamento científico? O holismo não
tem a pretensão de ser ciência, e isso deve ser ressaltado sempre. E nem tampouco
supervalorizar o todo em detrimento da visão parcial. Não significa, contudo, que não se faça,
também, uma descrição sistemática das observações realizadas, demonstrando as relações entre
-«L
tempo e dizer quem está com a razão, ou quem tem maior sensibilidade para a compreensão
dos fenômenos. Ambas as leituras (racionais e intuitivas) são imprescindíveis para o avanço da
ciência, porquanto se complementam e se nutrem mutuamentefs Uma não subsiste sem a
outra.
humano”. O Direito › or Óbvio_:›,_a resenta uma íntima conexão com todas as disci linas> até
Consoante MORIN, Edgar. Ciência comi consciência, p. 13: “Que é a ciência? Por um lado, é um dos ramos
66
do pensamento, que não difere das outras formas de pensamento senão pelo seu modo de aplicação ao campo
empírico, e a sua atitude hipotética verificadora; por outro lado, é a fonte da técnica maquinista, organizadora,
racionalizadora moderna...”
67
Conforme BAUDRILLARD, Jean. A transparência do mal - ensaios sobre os fenômenos extremos, “O
sucesso da inteligência artificial não viria do fato de ela nos livrar da inteligência real? Do fato de, ao
hipertrofiar o processo operacional do pensamento, ela nos livrar da ambigüidade do pensamento e do enigna
insolúvel de sua relação como mundo? O sucesso de todas essas tecnologias não viria de sua função de
exorcismo e do fato de que o eterno problema da liberdade já nem pode ser enrmciado? Que alívio! Com as
máquinas virtuais, acabaram-se os problemas! Você já não é sujeito, nem objeto, nem livre, nem alienado, nem
isto nem aquilo: você é o mesmo, na magia de suas comutações. Passou-se do inferno dos outros para o êxtase
do mesmo; do purgatório da alteridade para os paraísos artificiais da identidade. Alguém pode achar que é urna
servidão ainda pior, mas o Homem Telemático, não tendo vontade própria, não pode ser servo. Ja não há
alienação do homem pelo homem, mas urna homoestase do homem através da 66). A.
artificialização do homem é um fenômeno que se evidencia, porque há a promessa de controle por parte da
tecnologia, que tudo sabe e que tudo oferece.
: ciência e poesia, “Bachelard e Heidgger convergem em
68
Para CESAR, Constança Marcondes. Bachelard
pontos essenciais: ambos indicam um caminho para a unificação do saber, que não é apenas científico, mas
também metafisico e poético. Ambos afirmam a prioridade da poesis em relação à ciência, bem como a
aproximação dinâmica como condição do crescimento do saber. Ambos nos falam de uma antropologia poética
que supere os estreitos linrites da razão discursiva e abra o homem a um surracionalismo, a uma surrealidade na
qual o meta-humano se faz presente através da beleza.”
69
PATRÍCIO, Zuleica Maria. Ser saudável na felicidade prazer: uma abordagem ética e estética pelo cuidado
holístico-ecológico, p. 33. Afirma a autora: “Trarrsdisciplinaridade implica necessariamente a abordagem
holística. A
vivência transpessoal faz parte e é resultado da holopráxis; transdiciplinaridade e vivência
transpessoal são partes integrantes da abordagem holística e incluem, por conseguinte, o encontro entre ciência
e tradição.
35
mesmo com aquelas que são consideradas estranhas ao estudo juridico. Todos os autores
editicadas nas ciências deverão ser desconsideradas, para que se possa entender a
complexidade da vida. Como se verá a seguir, a visão holística nasce da falência da ciência
tradicional e, ao mesmo tempo, da necessidade de reunificação das lutas empreendidas pelos
vítimas dos tratamentos violentos empregados pela ciência para curar doenças crônicas? Há
um genocídio em nome da paz, porém de uma paz falsa, irreal. Há uma busca insensata de
ordem, quando o caos tem um impulso importante das classes dominantes, e dos valores por
Qual a semelhança e a diferença entre transdisciplinaridade e holística? Do ponto de vista histórico, os dois
termos nasceram e se desenvolveram de modo independente. O termo “holístico` nasceu primeiro, em 1926,
trazido por Jan Christian Smuts, indicando uma força responsável por todos os conjuntos do universo. O termo
“transdisciplinaiidade°, por sua vez foi trazido por Jean Piaget,um dos nossos mestres ocidentais, num
encontro sobre interdisciplinaridade promovido pela Organização da Comunidade Européia, em 1970 (Weil,
1993).”.
Consoante BAUDRILLARD, Jean, op. cit. A transparência do mal- ensaio sobre os fiznômenos extremos:
7°
“Com a dimensão viral, são seus próprios anticorpos que destróem você. É a leucemia do ser que devora suas
próprias defesas, justamente porque já não há ameaças nem adversidade. A profilaxia absoluta é mortal. Foi o
que a medicina não compreendeu ao tratar o câncer e a Aids como doenças convencionais, ao passo que são
doenças nascidas do desaparecimento das doenças, da extinção das formas patogênicas. Patologia do terceiro
tipo, inacessível a toda farmacopéia da época precedente (a das causas visíveis e dos efeitos mecânicos).
Imediatamente todas as afecções parecem ter origem imunodefectiva (como todas as violências parecem ter
origem terrorista). O ataque e a estratégia viral substituiram de certo modo o trabalho do inconsciente.”(p. 71).
71
Confonne MORIN, Edgar. O método 11 - a vida da vida, p. 335, “o pensamento complexo não visa a
“totalidade” no sentido em que este termo substitui uma simplificação atomizante pela simplificação
36
~
nascimento até a morte, que disciplinam as ações numa ou em outra direçao,
72
que buscam,
enfim, uma certa harmonia nas relações sociais. O sistema jurídico sempre almejou a
liberdade.”74
1.20 holismo
“E sabio escutar não a mim, mas a meu discurso
,
,
Heráclito
concepção ética.
76
Quem define com precisão o termo é Pierre Weil:
globalizante, sucedendoa redução ao todo à redução em partes. Visa a relação entre os níveis moleculares,
molares/globais. O
pensamento complexo visa não o elementar - onde tudo se baseia na unidade simples e no
pensamento claro - mas o radical, onde aparecem incertezas e antinomias. O
pensamento complexo visa a
multimensionalidade. Reconhece no vivo não só um combinado de interacções moleculares, uma rede
informacional, um polianel recorrente, uma máquina térmica, um sistema aberto, um autómato dotado dum
ordenador, um aspecto e um momento dum processo auto-(geno-feno-ego)-eco-re-organizador, mas também um
ser, um indivíduo, um sujeito”,
72
conforme BoBB1o, Norberto, op. en., p. 3
73
CHOPRA, Deepak, op. az., p. os.
74
Idem, rbiâem.
ls
conforme WEIL, Pierre. 1» z BRANDÃo, Dênis M. s, CREMA
Roberto, org. 0
novo paradigma hozzsâeo _
ciência, filosofia, arte e mística, p. 19-20, “em 1926, foi editado em Londres um
livro escrito por general um
sul-africano, um
dos primeiros partidários do movimento anti-apartheid, o filósofo Ian Christian Smuts, sob o
título Holism and evolution. Trata-se, sem dúvida, de uma obra pioneira, demasiadamente à frente do seu
:
tempo para que seu alcance fosse plenamente compreendido na sua época.” Contudo, impõe-se a observação de
que o holismo era mna visão dos pré-socráticos. E sempre esteve presente entre os orientais, especialmente na
filosofia taoísta.
37
reurrificar o conhecimento78.' Trata-se de um meio imprescindível para que se tenha uma nova
concepção do Direito, vale dizer, de considerar o sistema jurídico como um sistema
Libertar o Direito dos compartimentos que lhe foram impostos significa libertar a sociedade
estiver. Nota-se, neste final do século XX, uma tendência, que se manifesta em todo o mundo,
de redescobrir as verdades buscadas há milhares de anos, produto de profiinda reflexão. Há
uma ocidentalização do Oriente. E, por outro lado, uma orientalização do Ocidente. Eles se
reencontram porque coexistem dentro de cada ser humano, simbolizados pela razão e pela
emoção. Em suma, a proposta de integridade nasce de legiões de conspiradores que estão em
toda a parte e que desejam uma mudança efetiva da vida, a partir de uma percepção mais
76
Segundo WILSON, Edward Osbome, A unidade do conhecimento - consilência, p. 258, o que se quer, é o
fim do reducionismo, que, segundo o autor, “não é popular fora das ciências naturais. Para muitos estudiosos
das ciências sociais e humanas, é um varnpiro na sacristia. Portanto, tentarei dissipar a imagem profana
causadora dessa reação À medida que se encena o século, o foco das ciências naturais começa a mudar da
busca de novas leis fundamentais para novos tipos de síntese - “holismo`, se você preferir - de modo a
compreender sistemas complexos. Essa é a meta, variadamente, dos estudos da origem do universo, da história
do clima, do funcionamento das células, da formação dos ecossistemas e da base fisica da mente.”
77
WEIL, Pierre, Organizações e tecnologias para 0 terceiro milênio - cultura organizacional holística, p. 88.
78
De acordo com DI BIASE, Francisco, 0 homem holístico - unidade mente-natureza, p. 121, “O Homem é
um cosmo em miniatura (microcosmo), interagindo com o universo e participando de todo e qualquer
acontecimento cósmico. Estamos portanto interligados ao cosmo de forma inextricável.” Vale dizer, o todo está
em cada um.
79
TABONE, Marcia. Psicologia transpessoal - introdução à nova visão da consciência em psicologia e
educação, p. 8. A autora cita Ferguson a respeito dos conspiradores que sempre surgem quando há uma crise :
legiões de conspiradores. Eles estão nas companhias, universidades e hospitais, nos corpos docentes das
38
fenômenos estudados.” Vale dizer, quanto maior a face, maior dorso. A Medicina, que tudo
quer compreender, não consegue superar moléstias antigas.
- “A medicina sintomática,
atual, está se metamoifoseando
desgovemadamente em seita modema,
seita subdividida. Ela está se transformando
descontroladamente em religião herética, fanática e idólatra; ao separar,
desrelacionar, iludidamente, a saúde da doença, e ao considerar a saúde como
Deus, e a doença como o Diabo, que deve ser excluído, rejeitado e eliminado.
A relação existente entre a doença e a saúde é inegável, como no
magnetismo, onde o positivo é inseparável do negativo. Então, como se poderia
eliminar a doença, parte negativa do nosso imã vital? A eliminação da doença é a
negação da relatividade, e a negação da relatividade é a negação da vida, mesmo.
A medicina oficial, sintomática, para fortalecer mais a crença fanático,
a religião terapêutica, e para fazer render mais ainda, financeiramente, está
acrescentando, incessantemente, bombas e rituais antibiológicos super-violentos e
também equipamentos eletrocomputadorizados, os quais manifestam,
momentaneamente, a sua força destrutiva de aniquilação dos sintomas, como se
"81
estes fossem expressão do demônio.
u
humanos. Se partir-se do pressuposto de que o Direito surgiu nos primeiros grupos sociais, ele
integrava os ritos impostos para fins religiosos ou ainda para imposição de uma sanção.” Os
escolas públicas, nas fábricas e gabinetes médicos, órgãos estaduais e federais, em conselhos municipais e no
gabinete da Casa Branca, nas assembléias estaduais, em organizações voluntárias e virtualmente em todas as
arenas de decisões políticas do país...”
8°
HEGEL, Georg Wilhelm Friedrich. Estética, p. 88, afirma que “é o belo considerado como resultante da
fusão do racional e do sensível, no que reside, segundo Schiller, a verdadeira realidade.”
8*
Ku<UcH1,T‹›mi‹›, op. cn., p. 246.
V. CLASTRES, Pierre. A sociedade contra o Estado,
82
p. 125. Os ritos sempre fizeram parte das sociedades
consideradas primitivas. Os rituais adotados pelos indígenas são utilizados para fins religiosos ou para
imposição de alguma tortura. Diz CLASTRES, na obra mencionada “É muito extenso o número de sociedades
:
primitivas que mostram a importância por elas atribuída ao ingresso dos jovens na idade adulta através da
39
seitas.
E
Ainda hoje se
a liberdade é vista
fala de
como o bem
uma Deusa da Justiça,
maior.
A solenidade
a Thêmis, dentro de
O rito adotado
um ~83
sempre faz parte das diferentes
ainda hoje os povos primitivos dão a ele. O corpo carrega as experiências da vida. Ele
simboliza o progresso do ser humano sobre a face da terra. Mas deve separar a fonna da
essência. Até parece que a forma atribui racionalidade ao ato. É como se a forma fosse tudo.
na verdade e que não são suficientes para encontrá-la. O dogmatista conservador acredita que
~
o seu sistema é real, que tem respostas para todas as perguntas e que as decisoes judiciais
instituição dos chamados ritos de passagem. Esses rituais de iniciação constituem muitas vezes um eixo
essencial, em relação ao qual se ordena, em sua totalidade, a vida social e religiosa da comunidade.”
83
vor FAGÚNDEZ, Paulo Roney Ávila. Direito o sexualidade. mz s1LvA, Reinaldo Poroim o, org. Direitos do
família uma abordagem interdisciplinar, LTr, prelo.
:
84
cLAsTREs,Pio1¬ro, op. on., p. 125-ó.
85
BAUDRILLARD, Joan *for oiii”, op. off., p. 43.
40
panoptismosó que rege as instituições, fechado em si mesmo, sem comunicação com o mundo
exterior. Acredita que as respostas são absolutas, que pode ser dada a última palavra, a
respeito das questões que lhe são submetidas.
“A medicina modema é mística, ela crê que a doença é um demónio que
deve ser eliminado; por isso, se utiliza de demoniúƒugos, de talismãs e de exorcismos
ƒetichistas. Os seus tratamentos são rituais de adoração da técnica material, do
remédio milagroso e de promessas incumpriveis. Realmente, a medicina se
transformou em autêntica religião, religando o tecnicismo ao curandeirismo e ao
"87
charlatanismo.
estabeleciam regras de conduta aos cristãos ocidentais. Contudo, entre os orientais, as normas
barreiras nem fionteiras e que reconhece a importância de cada partícula, repleta de energia, e
.r
doutrinas nem de pensadores. Busca unificar os pontos de vista de todos e direcioná-los para
um ponto comum, a uma teoria do conhecimento”, que reconheça a sua precariedade, a sua
temporariedade e a sua subserviência a determinados interesses.”
Q holismo sabe que a sociedade harmônica que tanto se almeja não passa de uma
utopia. A violência faz parte da humanidade, estando ligada umbilicalmente à paz. Valoriza-se
gerará mais violência. Se tentar extirpar a malignidade do crime, cometerá o grave erro de
O Direito não pode se calar. Mas deverá crescer na sua reflexão. Os operadores
jurídicos não são meros aplicadores de normas de conduta. O Direito posto é um produto
cultural. A sua historicidade é indiscutível. O Direito não pode se constituir em instrumento de
repressão nem de opressão. Ao invés de oprimir, ele pode estimular condutas positivas. Por
que não exerce o Direito, com a máxima urgência, a sua função educacional? O que se quer
reafirmar é que não é possível a existência do Direito sem a Filosofia. E que não pode ter o
Direito divorciado da Medicina, da Física, da Química, da Política, da Sociologia, da
valorização do amor.” Atente-se, ademais, para a percepção que as crianças têm do mundo,
92
Conforme NOVALIS, apud BACHELARD, Gaston. Filosofia do novo espírito científico - a filosofia do
não,p. 192, “Da mesma forma que todos os conhecimentos se encadeiam, os não-conhecimentos encadeiam-se
também. Quem pode criar tuna ciência deve também poder criar uma não-ciência. Quem puder tornar
compreensível tuna coisa deve também poder torná-la incompreensível. O mestre deve poder produzir ciência e
ignorância.”
93
Conforme RUSSEL, Peter.0 despertar da terra - o cérebro global, p. 158-71.
De acordo com MORIN, Edgar, 0 método II - a vida da vida, p. 412, precisa-se inserir o amor dentro da
94
problemática da hipercomplexidade. “Permanece, no âmago do amor, como de todas as coisas vivas e fisicas,
um princípio de degradação e de negatividade que nenhum pensamento pode doravante ocultar e que nenhum
pensamento complexo pode ocultar. Falo de nova emergência do amor e não de solução geral pelo amor. Idem
na fraternidade. Mas creio que, nesta e por esta emergência, o amor poderia desenvolver a sua própria
versatilidade selvagem: amor entre indivíduos, amor fratemo dedicado ao humano pelo humano, amor da vida,
amor da natureza, amor da verdade... De tal modo que o amor possa tomar-se o princípio gravitacional da
hipercomplexidade.”
41
movimento não vem da razão, mas das profundezas de nós mesmos, como se nossa
alma estivesse clamando dentro de nós. "89
religiões e pela ciência.” Mas, entretanto, não se pode afinnar que tenham, em detemrinado
momento, se separado. O misticismo permite uma reflexão mais profunda a respeito de
determinado fenômeno. A ciência busca descobrir uma causa e combatê-la, ou várias causas.
Velhas doenças, antes consideradas superadas, hoje retornam fortalecidas diante dos modernos
quimioterápicos, em virtude das mutações operadas pelas drogas, nas bactérias e vírus. O
homem apresenta, em face de sua condição de ser pensante, uma notável superioridade em
relação aos demais seres. Está em permanente evolução, em permanente questionamento,
sendo também, na mesma proporção, prisioneiro de suas criações.” É importante que os
Ela é sempre provisória. Consiste numa busca permanente. Não se trata de um processo
individual. Antes é uma busca coletiva, da humanidade, porquanto envolve tudo e todos. O
movimento holistico não é apenas um modismo. Ele se manifesta em todas as áreas do
conhecimento. Os pontos comuns são estudados, para que venha a ocorrer a reaproximação
urgente de todos os conhecimentos antes considerados estanques, para que passem a integrar a
combatendo a proliferação de diferentes seitas e religiões, que têm por objetivo único o
emiquecimento de falsos líderes. É cientííico, quando tem um compromisso com a verdade,
sem ser exclusivamente materialista, sem acreditar que o material existe por si mesmo,
independentemente dos demais. É natural, porque não inventa, apenas reconhece a
89
TELLES JUNIOR, op. cn., p. 258.
9°
Conforme JAPIASSU, Hilton. 0
mito da neutralidade científica, p. 75, “o cientificismo não é produto de
nosso século. Tem suas raízes no século XVIII, muito embora só tenha se afirmado, como atitude intelectual, no
decorrer do século XIX. O
“fundo de saber”, ou o “solo epistemológico' do qual emergiu, foi esse clima
espiritual criado pelo advento da “era da positividade”, em substituição, por oposição, à “era da representação.
91
Ver FOUCAULT, A verdade e as formas jurídicas, p. 15-6. Atesta ele que “A invenção - Erfindung - para
Nietzsche é, por um lado, uma ruptura, por outro, algo que possui um pequeno começo, baixo, mesquinho,
inconfessável. Este é o ponto crucial da Ezfindung. Foi por obscuras relações de poder que a poesia foi
inventada. Foi igualmente por puras obscuras relações de poder que a religião foi inventada. Vilania, portanto,
de todos estes começos quando são opostos à solenidade da origem tal como é vista pelos filósofos.”
43
que não vêem fronteiras entre asidiversas áreas do conhecimento. Somente na escola as
~ ~
crianças passam a receber a visao compartimentada do mundo. Até chegarem na educaçao
formal, não tinham sequer noção de que cada disciplina mostra parte do fenômeno maior da
vida. Assim, há necessidade de libertação da mente compartimentada deste final de século XX,
que insiste em ver fronteiras entre as diversas áreas do conhecimento. Reunir o que foi
afastado é a nossa grande tarefa, ou melhor, reconhecer a união do que nunca deveria estar
Tem-se de ter
por todo o operador do Direito. Não é apenas uma atribuição do juiz. Os advogados já
oferecem as teses quando da inauguração do processo. O magistrado não apenas opta por uma
tese, nem pode adotar parcialmente as argumentações apresentadas pelas partes. Deverá ele se
aprofundar no estudo das pretensões apresentadasgó O Direito, que nasce no início deste
terceiro milênio, deverá ter uma preocupação permanente com a promoção da justiça. Critica-
se o sistema jurídico, não com o objetivo de simplesmente eliminá-lo, mas de, a partir dele,
Fundamentalmente, a construção voltada à promoção do homem, que não sirva apenas para
puni-lo. O holismo proporciona uma visão ecológica” da vida, num sentido não apenas
preservacionista, mas mais profundo, de vida integral, rica na sua natural hipercomplexidadegs
O paradigma ecológico” traz uma preocupação não só com a preservação do meio ambiente.
Lança uma visão ao interior do homem e às partículas subatômicas que dançam e vibram em
95
Conforme MORIN, Edgar, Para sair do século XX, “a racionalização caracteriza-se, ao mesmo tempo, por
um excesso de lógica para com o empírico e pela rejeição da complexidade do real. Quer que o real obedeça às
estruturas simplificadoras do espírito.”(p. 137).
96
Ver MAXIMILIANO Carlos. A hermenêutica e a aplicação do direito. Indiscutivelmente, Maximiliano
contribuiu para a construção de uma hemienêutica livre dos brocardos latinos empregados tradicionalmente
pelos operadores jurídicos. Sustenta o autor: “Não raro os brocardos já se acham destituídos de valor científico
(exemplo -in claris cessar interpretatio), ou, pelo menos, são falsos e inexatos na sua generalidade forçada, em
desacordo com a origem.”(p. 240).
9”
Ver GUATARR1, Fe1i×.As três ecozogias, p. 09.
98
FAGÚNDEZ, Paulo Roney Ávila. O direito e a hipercomplexidade.
l\/l›ORIN, Edgar, 0 método II - a vida da vida, p. 21, ensina que: “0ikos: este termo grego, que significa
99
habitat, deu origem a ecologia e a ecúmena (a terra habitada, concebida como universo). A noção de ecologia
aparece com Haeckel (l866); institui um novo campo nas ciências biológicas: o das relações entre os seres vivos
e os meios onde vivem. (...) Efectivamente, no seu fundamento, a ecologia não é somente a ciência das
determinações e influências ñsicas provenientes do biótopo; não é somente a ciências das interacções
combinatórias/organizadoras entre cada um e todos os constituintes fisicos e vivos dos ecossistemas.”
44
cada ser, em cada coisa. Capra prefere não utilizar continuadamente a expressão holismo em
suas obras, muito embora faça alusão ao termo holístico em toda a extensão do seu discurso.
“O novo paradigma que emerge atualmente pode ser descrito de várias
maneiras. Pode-se chamá-lo de uma visão do mundo holística, que enfatiza o todo
em vez das partes. Pode-se também chamá-lo de visão de mundo ecológica, e este é
o termo que eu prefiro. Uso aqui a expressão ecológica num sentido muito mais
amplo e profundo do que aquele em que é usualmente empregado. A consciência
ecológica, nesse sentido profimdo, reconhece a interdependência fundamental de
todos os fenômenos e o perfeito entrosamento dos indivíduos e das sociedades nos
processos cíclicos da natureza. Essa profunda percepção ecológica está agora
emergindo em várias áreas de nossa sociedade, tanto dentro como fora da
””'0
ciência.
O paradigma ecológico traz uma visão maior da vida, respeitando-a nas mais diversas
manifestações. Respeita-se a vida através de suas variadas formas, de suas diferentes
nenhuma visão isolada é portadora de toda a verdade. Essa humildade se faz necessária,
especialmente por parte dos cientistas. A busca de uma pílula da eterna juventude não passa de
*°°
CAPRA, Fmjof. o :zw âzzfisâzzzz, p. 242.
4
45
uma falácia. Qualquer pessoa alcançaria os resultados, mesmo não tomando cuidados com a
sua saúde (sem cuidar de sua alimentação, de atividades fisicas, de seus pensamentos etc )? Há
muita infantilidade em se pensar dessa fonna. O ser humano não é uma máquina. Nele, todos
os órgãos estão interligados e são irrigados pelo mesmo sangue. Corpo e mente são elementos
perfeitamente integrados. Os neurônios se organizam em verdadeiras redes. Corpo e mente
compõem uma unidade. A célula é um elemento. Na vida complexa, um elemento não vive sem
”
o outro. Um é ° `
”, outro é “Yan ”. O “
in” não subsiste sem o
“
an ”, en uanto o “
an8
não sobrevive sem o Win”. O ser humano é naturalmente complexo. É corpo, mente, matéria e
energia, enfim, vários elementos em permanente interaçao com 0 meio. É ser individual e está
~
integrado coletivamente. Até no elemento fisico há uma natureza transcendente. É 0 que nos
exercida politicamente pelo Estado. Os marxistas afinnam que o Direito é apenas reflexo da
jurídica, que requer, sobretudo, a reflexão a respeito dos intrincados problemas humanos. Não
é possível a existência de um Direito que regule as condutas humanas, sem uma revolução
ética, que se opere internamente, que dependa de consciência. O Direito é também um
fenômeno interno que não consegue subsistir sem a consciência da necessidade de se
1°*
Idem, ibiâem, 242.
p.
102
BITTENCOURT, Jane. Conhecimento, complexidade e transdisciplinaridade, p. 57.
1°3
Conforme ALTHUSSER, Louis. Aparelhos ideológicos do estado, p. 68, o sistema jurídico é um aparelho
ideológico do Estado, estando, portanto, a serviço das classes dominantes.
¬
46
estabelecer limites e respeitar a natureza. O Direito, como se viu, apresenta uma íntima relação
com as demais áreas do conhecimento. Kelsen realizou um grande esforço no sentido de
afirrnar, com certeza, que a terra não é o centro do Universo, muito embora todos tenham a
nobre tarefa de presewá-la e respeitá-la.
Universo, complexo e, paradoxalmente, simples, que se contrai e que se expande, enfim, que se
modifica permanentemente. É uma dança que não tem fim e que reinicia a cada instante.
vários grupos dentro de um mesmo território, sem que o monismo jurídico estatal venha
violentar as culturas que sobrevivem há muito no meio de uma nação. O pluralismo,
'°4
Ver FERRAJOLI, Luigi. Palestras. Afirma que “o garantismo nasceu para superar o modelo positivista
ele
da dupla artificialidade do ser e do dever-ser. Busca, sobretudo, um programa que possui um conteúdo
substancial, que se assenta normativamente nos princípios e nos valores inscritos nas Constituições.”(p. 61).
105
Ver WEIL, Pierre. A arte de viver em paz.
1°6
TELLES Juzúor, Gomedo. 0 direito quântico, p. 27.
47
fragilidade dos sentidos e, ao mesmo tempo, apelando para a sensibilidade, amordaçada pela
representação do todo.1°9 A grande crise de percepção que atinge as ciências, também afeta
frontalmente, por óbvio, o Direito. Vive o operador do direito uma grave crise de percepção,
como resultado de uma profunda crise de identidade. Olha-se apenas uma parte do fenômeno
jurídico, que é extremamente complexo. Em que consiste, afinal de contas, o olhar da ciência?
É o olhar das classes dominantes, apenas, ou dos financiadores das pesquisas? Há muito mais
além dos muros traçados arbitrariamente pelos cientistas.Os métodos são caminhos, e não
obstáculos, para a descoberta da verdade. ~
A mistificaçao
~
da ciência não permite que a pesquisa possa ir além do horizonte por
ela previamente traçado. Ele é o limite. Além dele não há nada, ou faz-se de conta de que não
há nada. Como no Direito, assim também há um jogo na ciência, com regras preestabelecidas.
Tudo é muito previsível. Se o fenômeno não for previsível, deverá ser caracterizado
forçosamente pela previsibilidade. O sol muito forte cega, contudo. O que parece uma verdade
absoluta, pode ser a negação dela no momento seguinte. A ciência se contradiz a todo instante.
É importante que se mantenha permanentemente o diálogo entre sujeito cognoscente e objeto
conhecido, para que se possa extrair cada vez mais a realidade. Não se pode perder de vista a
multidimensionalidade. Cada cientista analisa uma parte do Universo. O importante hoje é que
sejam religados os pontos separados aleatoriamente. Caso contrário, o imenso quebra-cabeças
continuará indefinidamente sem solução.
hermenêutica, que pode ser denominada hermenêutica de integridade. Juarez de Freitas propõe
~
a criaçao de uma hennenêutica transdogmática, sem que ela crie um novo dogmatismo. Ela é,
A relação mansa, _sem conflitos, entre ,o sujeito que estuda e a coisa estudada, é
holística ou de integridade. Esta, contudo, não se opera apenas dentro dos limites da Ciência
Jurídica. Vai além, reconhecendo os pontos. de contato do Direito com as demais áreas do
conhecimento.m O intérprete não deve se anular como pessoa, conforme sugerea dogmática
reconhece a sua própria vida e sua própria criatividade. Ele se assume como ser integral,
para a vida.
“Não somos campeões, não somos perfeitos, não somos completos. Não
viemos cá somente pelas nossas virtudes, mas pelas nossas precaríedades. É uma
oportunidade de transformação temária. A ordem de existência mostra-nos que
passado é formação, presente é transformação, e futuro pré-formação. O foco,
"I 14
todavia, é o presente ternárío.
tempo._O cientista quer, cada vez mais, comprovar as suas teses, que apenas refletem uma
A
r
“2 Não se pode deixar de considerar a amplitude do principio da persuasão racional do juiz, ou livre
convencimento motivado do Magistrado. O juiz poderá recusar uma perícia. Precisa de um conhecimento
técnico ou artístico. E se ele não possuir? A hermenêutica de integridade dá um arsenal bem maior. Além do
mais, considera a sensibilidade como um atributo essencial para a promoção da Justiça. O caso submetido ao
julgador, por mais simples que pareça ser, traz a complexidade da vida.
"3 Conforme CESAR, Constança Marcondes. Bachelard: ciência e poesia, p. 17, “O real que a ciência
contemporânea aborda é construído pelo sujeito cognoscente. Essa construção não evoca um idealismo
subjetivo, que transforma o real em nossa representação, nem urna epistemologia de convenção, que considera o
mundo conhecido pela ciência como resultado das nossas convenções epistemológicos. A verificação contínua
dos resultados obtidos, pela ciência contemporânea, manifesta a dialética essencial entre sujeito cognoscente e
objeto, entre teorias antigas e novas.”
“4 KIKUCI-11, Tomio. Simultaneidade temária - proporção sensibilizadora da transjbrmação unipotente, p.
02. É o juiz João Cláudio Caldeira que faz apresentação da obra de Kikuchi, destacando as nossas limitações,
nossas defomiidades e a precariedade de nossas vidas. Somos aprendizes, ou melhor, seremos etemos
aprendizes.
“S Ver
IANNI, Octavio. Teorias da globalização. Afirma ele que “No pensamento de Marx e de alguns de seus
continuadores podem encontrar-se recursos metodológicos e teóricos fundamentais para a inteligência da
globalização. Nessa perspectiva, a sociedade global pode aparecer complexa e evidente, caótica e transparente;
uma totalidade problemática, contraditória, em movimento.”(p. 161). A globalização é apenas um fenômeno em
que se reconhece a natural integridade de homens povos.
e Será que todos os homens não fazem parte de uma
grande nação?
50
dos problemas sociais e políticos que se complexificam. E deverá, sobretudo, ter consciência
da rede que atravessa todos as áreas do conhecimentos e que são fundamentais para que o
Direito possa cumprir o seu papel de instrumento de harmonia social. Entrementes, a
tudo pode e controla, está visivelmente perdendo as suas forças. A previsibilidade, nitidamente,
cede à imprevisibilidade. E a segurança imposta pela força, gera, cada vez mais, insegurança. É
um jogo que parece não ter fim, que, entretanto, reflete com fidedignidade o choque dos
elementos que integram a vida na sua plenitude. A mecânica quântica, antes de negar o
está ligada umbilicamente à vida, exigindo compreensão, reflexão e uma solução que não se
confunde com a mera aplicação da lei no caso concreto. Como uma operação tão simples
projeto de ciência, para que se possa obter melhores respostas. Precisa-se repensar a ciência,
empreendida pelos pensadores. Inseri-la na caminhada levada pelo misticismo, pela arte, pelos
ecologistas, enfim, dentro de preceitos éticos. Não se pode admitir que a tecnologia venha
destruir os valores humanos e fazer terra arrasada da humanidade.” Nada pode substituir a
vida natural. Por maiores que sejam os avanços não conseguirá a tecnologia imitar a natureza
em toda a sua riqueza”. O holismo, como se vê, traz uma proposta de ruptura com o
conhecimento tradicional, mas, sobretudo, busca o respeito a todas as correntes de
pensamento.
Vejam-se as observações de Ferguson:
“Se temos que romper esse padrão, se temos que nos libertar de nossa
história pessoal e coletiva, devemos aprender a identiƒicá-lo
- ver os caminhos da
descoberta e da inovação, vencer nosso desconforto e resistência ao novo,
reconhecer as recompensas de cooperar com a mudança.
Thomas Kahn não foi o primeiro a ressaltar esse padrão. O problema foi
analisado objetivamente um século antes pelo jilósoƒo político inglês John Stuart
Mill. Cada época, disse ele, tem sustentado opiniões que as gerações subseqüentes
acham não só falsas como também absurdas. Kuhn alertou os seus contemporâneos
do século .XTX de que muitas idéias então dominantes seriam rejeitadas no futuro.
Assim, eles deveriam receber bem os 'questionamentos de todas as idéias, mesmo as
que pareciam as verdades mais óbvias, como a filosofia de Newton! A melhor
salvaguarda das idéias é 'um permanente convite ao mundo todo para provar que
'”' 19
são inƒundadas
sensatos, sejam eles cientistas ou não. Para que alguém possa comprometer-se com uma nova
visão, precisa-o apenas reconhecer que todos elementos estão ligados numa grande rede
universal, que não se preocupa com o tempo criado pelo homem e que não vê o lugar como
m Conforme OHSAWA, George. 0 câncer e a filosofia do extremo-oriente, p. 10: “É sabido que nossa
”
civilização cientifica e tecnicista, e mesmo toda a humanidade encontra-se à beira de uma catástrofe. Ainda
OHSAWA, George. Macrobiótica zen, p. 130, adverte que a lei é urna anna poderosa manobrada pelas classes
dominantes. “...a Lei, por exemplo, que representa a maior violência, ataca seriamente os inimigos da
sociedade, em lugar de amá-los, sobretudo os pobres. Tolera até a pena de morte para certos crimes. Por que
O
ninguém apresenta a outra face? inimigo rico escapa à lei por intermédio de sua poderosa anna: o dinheiro.
Os “gangsters° são, algumas vezes, mortos, mas, na realidade, os verdadeiros criminosos que são os educadores,
são raramente punidos pela justiça. Não seria mais sensato punir os criadores dos 'gangsters' e delinqüentes do
que os próprios delinqüentes e “gangsters°?”
“**
FOUCAULT, Miehe1.A verdade e as famzas jurídicas, p. is. sustenta ele que “o eenheeimeme nâe tem
relações de afinidade com o mundo a conhecer, diz Nietzsche frequentemente. Citarei apenas um texto da Gaia
Ciência (parágrafo 109): “O caráter do mundo é o de um caos eterno; não devido à ausência de necessidade,
mas devido à ausência de ordem, de encadeamento, de formas, de beleza e de sabedoria.” O mundo não procura
absolutamente imitar o homem, ele ignora toda lei. Abstenhamos de dizer que existem leis na natureza. É
contra um mundo sem ordem, sem encadeamento, sem formas, sem beleza, sem sabedoria, sem harmonia, sem
lei, que o conhecimento tem de lutar. É com ele que o conhecimento se relaciona.
Não há nada no
conhecimento que o habilite, por um direito qualquer, a conhecer esse mundo. Não é natural à natureza ser
conhecida.”
“Q FERGUSON, Marilyn. A conspiração aquariana, p. 186.
52
algo imprescindível. Ou como diz Hay, na verdade, todos os seres são umm, fazendo parte do
mesmo jogo, integrando a mesma cena. Os personagens fazem parte da mesma história. E
representam a mesma estória, que só formalmente tem um início e um fim. Quando morre, o
ser é apenas uma luz que se apaga para que outra se acenda e continue a fazer o equilíbrio do
todo. O equilibrio somente é possível a partir do desequilíbrio. Sem a morte, não há vida. Há
em toda pesquisa um papel importante do observador. O resultado que ele obtém é relativo,
porque está ligado às outras conclusões que demonstram que a vida é um processo em
movimento que não acaba nunca.
Segundo Marcelo Gleiser,
quântica desenvolvida principalmente por Bohr, como parte de seus esforços para
',
A indeterminaçao
~
que rege a Física é a mesma que atua no Direito. A partir dessa
no
HAY, Louise L. Você pode curar a sua vida, p. 233.
121
GLEISER, Marcelo. A dança do universo, p. 305-6.
S3
cada dia, fica mais dificil encontrá-las, porque elas simplesmente inexistem. Concorda-se com
Constança Marcondes Cesar, que cita Bachelard, quando ela diz: _
Assim, vive-se o alvorecer de uma nova era centrada no sujeito Çognoscente] que se
122
TELLES JÚNIOR, Goffredo. Direito quântico, p. 285-6.
1”
CESAR, Constança Marcondes. Bzz¢he1zzrzi~ ciência z poesia, p. 17-s.
124
FREI BETTO, A obra do artista - uma visão holística do Universo, p. 144-5.
54
objetos familiares são vistos sob uma luz diferente e a eles se apregam objetos
desconhecidos.”
Thomas S. Kuhn
envolveu a todos demasiadamente nas relações de_ causalidade traçadas entre os diferentes
fenômenos que vêm sendo estudados, impedindo o cientista de promover uma profunda
reflexão a respeito. das transformações que a realidade opera a cada dia; I-Iistoricamente,
125
Ver D`AMBROSIO, Ubiratan. In BRANDÃO, Dênis M. S. CREMA, Roberto, org. novo paradigma
:
0
holística -
ciência, filosofia, arte e mística, p. 48. Afirma o autor : “Pela primeira vez, desde que se
estabeleceram as bases do que se convencionou chamar de ciência moderna, nos séculos XVI e XVII, podemos
ter uma visão global do modelo social que dai resultou e das conseqüências para a qualidade de nossa vida
como indivíduos e como sociedade. O
interessante é que a própria sociedade moderna nos proporciona, através
da avançada tecnologia de comunicação e de mn
complexo modelo político de interdependência, os meios para
essa visão global. Ao analisarmos essa visão global, não podemos evitar uma grande preocupação. De fato, essa
visão nos amedronta e, após uma reflexão mais detalhada, nos deixa pasmados, sobretudo pelas contradições
internas resultantes do modelo de pensamento que serve de substrato ao chamado racionalismo científico.”
“À
'26
Conforme CAPRA, Fritjof. A teia da vida - uma nova compreensão científica dos sistemas vivos:
medida que o século se aproxima do fim, as preocupações com o meio ambiente adquirem supra importância.
Defrontamo-nos com toda uma série de problemas globais que estão danificando a biosfera e a vida humana de
uma maneira alarmante, e que pode logo se tornar irreversível.(...)
Quanto mais estudamos os principais problemas de nossa época, mais somos levados a perceber que eles não
podem ser entendidos isoladamente. São problemas sistêmicos, o que significa que estão interligados e são
interdependentes. Por exemplo, somente será possivel estabilizar a população quando a pobreza for reduzida
em
âmbito mundial. A
extinção de espécies animais e vegetais numa escala massiva continuará enquanto o
Hemisfério Meridional estiver sob o fardo de enormes dívidas. A escassez de recursos e a degradação do meio
ambiente combinam-se com populações em rápida expansão, o que leva ao colapso das comunidades locais à
violência étnica e tribal, que se tomou a característica mais importante da era pós-guerra fria.
Em última análise, esses problemas precisam ser vistos, exatamente, como diferentes facetas de uma única
crise, que é, em grande medida, urna crise de percepção. Ela deriva do fato de que a
maioria de nós, e em
especial nossas grandes instituições sociais, concordam com os conceitos de Luna visão de mundo obsoleta, uma
percepção da realidade inadequada para lidarmos com nosso mundo superpovoado e globalmente
interligado.”(p. 23).
55
integridade, que os orientais conhecem há mais de cinco mil anos. Trata-se apenas de um
repensar da trajetória histórica do homem. A partir de que momento _existe a ciência
fracionado necessita ser reunido num bonito mosaico para que se tenha uma grande visão da
vida, manifestada através das múltiplas facetas de sua verdade única e relativa. O que quere_r_n_
os pensadores holísticos hoje é retomar o que nasceu nos primórdios da humanidade. Desdç_ o
debruçar sobre os elementos apresentados pela natureza. Quis, desde um primeiro momento,
modificá-los, melhorá-los, enfim, domina-los. Ainda hoje almeja o controle da natureza e a
apreensão da vida.
'
desenvolvimento da mesma humanidade. Assim como não há “yin” sem Wang”, não há‹
racionalidade sem o rnisticismo. A paz somente se obterá a partir do entendimento da
127
SOUZA, José Cavalcante de. Os pré-socrâticos -fragmentos, doxografia e comentários, p. 5.
56
dois lados do mesmo sistema, ou as duas polaridades cerebrais que, antes de se excluírem,
jurídicos de quase todo 0 mundo. Toda a ciência recebeu uma importante influência dos
romanos. Não se trata de promover uma ruptura apenas, mas um reencontro de polaridades.
Os orientais sempre reconheceram a dança dos dois elementos que integram o universo. De um
lado, a racionalidade e, do outro, os elementos poéticos que fazem parte de uma única
verdade, transitória, mutável, permanente. São duas forças que se excluem e, paradoxalmente,
se encontram!
“A 'mudança de paradigma' ocorre quando despertamos nossa
consciência e reconhecemos as falhas e equívocos do pensamento então vigente,
sendo esta expressão introduzida pelo filósofo Thomas Kuhn, no seu livro 'A
Estrutura das Revoluções Cientificas', onde explica que esta nova visão exige uma
tal mudança, que muitos cientistas dificilmente são convertidos, porquanto aqueles
que trabalharam de modo frutifero com as velhas idéias estão emocionalmente e por
hábito ligados a elas, normalmente levando para o túmulo sua fé inabalável, até
mesmo após serem confrontados com provas numerosas, continuam ligados ao que
está errado, mas lhes é familiar; muitas vezes sendo responsáveis por graves atrasos
evolutivos, afastando, assim, os benefícios da nova visão, além de bloquear a
possibilidade do salto qualitativo da evolução.
6--)
128
Idem, ibidem..
”9Seg1mdo MARKERT, Christopher. Yin-yang -polaridade em nossa vida, p. 37, Oriente e Ocidente existem
dentro de nós como polaridades celebrais. Ver também RUSSEL, Peter. O despertar da terra.
13°
HENRIQUE, João. Direito romano, p. 12.
57
A
concepção cientijica ocidental, decorrente do paradigma newtoniano-
cartesiano, é um modelo mecanicista (concebe o universo como uma grande e
complexa máquina) e reducíonista (divide o conhecimento humano em
compartimentos), que separou de forma dualista o homem da natureza, gerando
"'31
toda a tragédia ecológica e violência do mundo hodiemo.
»
' Não vai a ciência curar as doenças que atingem a sociedade com a eliminação dos
seus sintomasm É como se se pudesse eliminar o câncer com a mera extirpação do tumor.133
A doença é uma crise individual e, ao mesmo tempo, coletiva. Nenhum ser vive isoladamente.
Não há um problema orgânico que possa ser resolvido .apenas com o tratamento do corpo.
Mente e corpo são partes indissociáveis. E cada observador tem uma percepção diferente da
resultados obtidos nas pesquisas científicas. Os caminhos verdadeiros são imprescindíveis para
que se,possa atingir melhores resultados. Os problemas do mundo são complexos. As doenças
não residem num único órgão. O sangue, com seus fluidos, por exemplo, em todo o
transita
organismo, levando a saúde ou a doença. A violência é gerada por múltiplas causas. O homem
é
~
um e tem várias dimensoes.
~
Nao é só corpo, nem só mente, nem só espírito. Não é um ser
m Ver LAO-TZU.
milênio, p. 23-4.
Tao de king - o livro do sentido e da vida, p. 39. Diz ele “Não valorizar os objetos
:
preciosos faz com que o povo não furte. Não exibir coisas que possam suscitar a cobiça evita que 0 coração do
povo se conturbe.” Assim, só se pode combater eficazmente a criminalidade no momento que as classes
dominantes deixarem de provocar os marginalizados da sociedade.
133
Não se resolve o problema da criminalidade com a pena privativa de liberdade e com a eliminação fisica do
condenado. O ataque pedagógico deverá se dar nas raízes da criminalidade, para que ela seja mantida sob
controle. O crime é o outro lado da paz. Uma polaridade não vive sem a outra.
134
BITTENCOURT, Jane. Conhecimento, complexidade e transdisciplinaridade, p. 30.
58
'As relações de causalidade são, em alguns casos, futilidades que não contribuem para
a compreensão da complexidade dos fenômenos e dos problemas que exigem solução. Convém
se ressaltar que o holismo é apenas um olhar diferente lançado sobre a realidade. Não tem a
pretensão de ter soluções para todos os problemas e respostas para todas as perguntas.
Considera, ademais, que existem perguntas que são mais importantes do que as respostas.
Ademais, as respostas são sempre provisórias. Não há cura total. Todos os resultados são
provisórios. As doenças não são curadas com a eliminação dos seus sintomas. Exigem do
natureza. O movimento holístico não traz nada de novo. Volta aos pré-socráticos e às
tradições do velho Extremo-Oriente. Através da visão dos antigos pensadores, traz o novo, o
que pode, “a priori”, parecer paradoxal. Não se trata de uma proposta intelectual, de uma
doutrina, de uma ciência, mas da busca do resgate da natureza das coisas. É a complementação
que se faz necessária na visão lançada pela ciência.
“As raízes do movimento holístico são subsequentes a várias concepções
filosóficas construídas ao longo de toda evolução do pensamento humano.
Como explica o Prof Clodoaldo Meneguello. Cardoso, o princípio
fundamental do paradigma holístico está presente nas grandes lições do Oriente:
'No hinduísmo, a suprema Lei do Dharma, expressa no livro sagrado
dos Vedas, aplica-se tanto ao cosmo como à vida diária das pessoas. É aquilo que
mantém unidas as pessoas e o universo. Também no budismo, tudo no universo está
inter-relacionado, fazendo parte de um grande todo. No taoísmo, encontra-se a
mesma visão integrativa. Do I Ching chinês, ou Livro das Mutações, aprende-se que
o Tao - essência primária de todas as coisas - é um processo de constante mutação
com duas polaridades indissociáveis: o yin e o yang. Todos os fenômenos
“'36
materias,
sociais e psíquicos são regidos por esse dinamismo cíclico etemo.
'35
Idem, ibidem., p. 85.
13°
REIS, Sérgio Neeeser Nogueira. Obra citada, p. 35-6. O autor retromenciado, ademais, destaca que a visão
de integridade foi difundida no Ocidente por grandes filósofos: Sri Aurobindo, Jiddu Krishnamurti,
Rabindranath Tagora, Paramahansa Yogananda e outros.
””segund‹› MORIN, Edgar. o méfada 11 _ a vida da vida, p. 301, “tada argazúzaçâa viva comporta
desorganização e desordens que combate, tolera, utiliza.” Pondera que toda organização traz no seu bojo
59
“No princípio era o Caos. Do caos veio a pura luz que construiu o Céu.
As partes mais concentradas juntaram-se para formar a Céu e Terra deram
Terra.
vida às 10 mil criações (Natureza), o começo, que contém em si o crescimento,
-
usando sempre o Céu e a Terra como seu modelo. As raízes do Yang e do Yin os
princqiios masculino e feminino - também começaram no Céu e na Terra. Yang e
Yin se misturaram, os cinco elementos surgiram dessa mistura e o homem foi
formado (..) Quando Yin e Yang diminuem ou aumentam seu poder, o calor ou fiio
são produzidos. O
Sol e a Lua trocam suas luzes. Isso também produz o passar do
ano e as cinco direções opostas do Céu: leste, oeste, sul, norte e o ponto central.
Portanto;38Céu e Terra reproduzem a forma do homem. Yang ƒomece
e Yin
”
recebe.
Pelo contrário, reconhece a intima relação que há entre todos os elementos do Universo. O
princípio único não busca simplificar 0 complexo, mas estabelecer regras que são aplicáveis a
todas as áreas do conhecimento. Em verdade, as disciplinas foram criadas para fixar limites
entre áreas de preocupação do homem. Só que passaram a se relacionar tão intimamente, que
uma disciplina não poderia ser compreendida sem a outra. Não é uma tarefa fácil edificar
fronteiras entre o conhecimento jurídico e os demais. E, no entanto, isso foi feito. Todos os
saberes estão intimamente relacionados. Os nossos antepassados realizaram uma tarefa mais
dificil do que a que nos é imposta neste final de século. A operação mais dificil é convencer os
cientistas de que se trata de apenas uma fantasia. Os homens imaginam que realizaram a
do tratamento cirúrgico levado a cabo pela ciência. Não se pode separar para compreender ou
múltiplos de existência e individualidade, bem como eventualidade, desordem, concorrência, e não é possível
eliminar a desordem sem a eliminação da vida.
138
GLEISER, Marcelo. A dança do universo - dos mitos da criação ao Big-Band, p. 35-6.
60
A visão de integridade não é nova. Mas, mesmo assim, revoluciona a ciência, dando
um enfoque metafisico à vida e afinnando que todos os compartimentos criados pela teoria
deverão ser reunidos, para que se tenha uma noção mais exata do quebra-cabeças criado pelos
pensadores. Sem dúvida, o ser humano fez o mais dificil: separar o que é, naturalmente,
fenômenos, por mais simples, ou aparentemente simples que sejam, requerem um estudo
determinado objeto, mas todas as suas implicações e suas relações com os demais objetos e
estudos já efetivados. Deve-se ter consciência de que sujeito e objeto estão umbilicalmente
integrados.
“O que diz o Logos, do qual Heráclito se faz anunciador e em nome do
qual condena o torpor da multidão ou a polimatia dos supostos sábios, é isto: a
unidade fundamental de todas as coisas. Essa é “natureza que gosta de se
ocultar ”(D 123). Mas a noção de unidade fundamental, subjacente à multiplicidade
aparente, já estava expressa pelo menos desde Anaximandro de Mileto. A novidade
trazida por Heráclito - e que lhe permite julgar tão duramente seus antecessores e
contemporâneos - está, na verdade, em considerar aquela unidade como uma
unidade de tensões opostas. Esta teria sido sua grande descoberta: existe uma
harmonia oculta das forças opostas, como a do arco e da lira ”(D 51). A Razão
(Logos) consistíra precisamente na unidade profunda que as oposições aparentes
ocultam e sugerem: os contrários, em todos os níveis de realidade, seriam aspectos
inerentes a essa unidade. Não se trata, pois, de opor o Um ao Múltiplo, como
quanta.
“Proclama Heráclito: 'É sábio escutar não a mim, mas a meu discurso
(logos), e confessar que todas as coisas são Um (D 50). O Logos seria a unidade
'
em pedir que cessasse a discórdia entre os deuses e os homens: 'O que varia está de
acordo consigo mesmo (D 51). A harmonia não é aquela que Pitágoras propunha,
'
O ser do terceiro milênio virá dotado de sensibilidade maior, mais insatisfeito do que
nunca, e sonha construir uma sociedade solidária e melhor para todos. Proliferam, em todas as
áreas os movimentos alternativos, questionadores, em essência, do conhecimento cartesiano
imposto. Todas as experiências são importantes para que surja um novo modelo, tão antigo
como o Universo, mas tão próximo da simplicidade e da complexidade inerente à própria vida.
O que não se deve esperar, contudo, são soluções definitivas, haja vista que os problemas
pensamento ocidentalm O interesse pela natureza passou a ocorrer a partir do século' XV,
quando começou .um desenvolvimento do espírito científico de cunho especulativo. A
transformação da natureza nos compartimentos estreitos da ciência foi o grande desafio
pela combinação do conhecimento empírico com a matemática e, por causa dessa atuação dele,
recebeu o título de pai da ciência moderna, cujos fundamentos vigem até os nossos dias.
Para Capra,
ciência moderna foi precedido e acompanhado por
“O nascimento da
um desenvolvimento do pensamento filosófico que deu origem a uma formulação
extrema do dualismo espírito-matéria. Essa formulação veio à tona no século XVII,
através da filosofia de René Descartes. Para este filósofo, a visão da natureza
derivava de uma divisão fundamental em dois reinos separados e independentes: da
mente (res cogitans) e o da matéria (res extensa). A divisão 'cartesiana' permitiu
aos cientistas tratar a matéria como algo morto e inteiramente apartado de si
mesmos, vendo o mundo material como uma vasta quantidade de objetos reunidos
numa máquina de grandes proporções. Essa visão mecanicista do mundo foi
sustentada por Isaac Newton, que elaborou sua Mecânica a partir de tais
fundamentos, tornando-a o alicerce da Física clássica. De segunda metade do
século XVII até o fim do século .XYX, o modelo mecanicista newtoniano do universo
dominou todo o pensamento cientifico. Esse modelo caminhava paralelamente com a
imagem de um Deus monárquico que, das alturas, governava o mundo, impondo-lhe
a lei divina. As leis fundamentais da natureza, objeto da pesquisa científica, eram
então encaradas como as leis de Deus, ou seja, invariáveis e etemas, às quais o
"[44
mundo se achava submetido. ¬
Até o nascimento da ciência moderna” houve uma grande caminhada. Eram imensas
as dificuldades enfrentadas pelo homem para compreender a realidade. Como não podia
realizar a leitura da totalidade dos fenômenos humanos, achou por bem separá-los, fragmentá-
“a priori”, considerava
los e, observando-os, chegar a determinadas conclusões que,
definitivasz 'O absolutismo da ciência, num primeiro momento, refletia o absolutismo do poder
compilados por Aristóteles. A evolução se fazia necessária em todas as áreas, nas artes e nas
ciências, na política e na visão do mundo da natureza. O que há, em verdade, no movimento
holístico, como se vê, é uma retomada da busca empreendida pelos pensadores nos primórdios
da civilização. O holismo renasce como proposta de visão científica, que não se limita a operar
dentro dos contomos preestabelecidos pelos investigadores da ciência. O holismo avança e
traça uma teoria do conhecimento, com um único compromisso, que é o de permitir uma
macrovisão dos acontecimentos emergentes da natureza:
“Já no início do nosso século, o filósofo fiancês Henri Bergson
apresentou o intuicionismo em oposição à abordagem mecanicista que vigorava até
então, resgatando a metafísica e elevando a intuição a um método filosófico;
'Cada
momento é não apenas algo novo, mas algo imprevisível (...) a mudança é muito
mais radical do que supomos e a previsibilidade geométrica de todas as coisas, que
a meta de uma ciência mecanicista, é apenas uma ilusão intelectualista.
representa
Pelo menos para um ser consciente, existir é mudar, mudar é amadurecer,
amadurecer é continuar criando a si mesmo eternamente(..) Essa percepção direta,
essa simples e firme consideração (intueor) de uma coisa, é intuição; não qualquer
processo rústico, mas o exame mais direto possível para a mente humana. Spinoza
estava certo: o pensamento reflexivo não é em absoluto a mais elevada forma de
conhecimento; é melhor, sem dúvida, do que o ouvir-dizer; mas como é fraco ao
lado da percepção direta da coisa em si '.
“S Ver BACON, Francis. Novum Organum, p. 5. Afirrna José Aluysio Reis de Andrade que “Francis Bacon foi
chamado de “primeiro dos modernos e último dos antigos”, “inventor do método experimental”, “frmdador da
ciência moderna e do empirismo°. Diderot (1713-1784) afirmou que, numa época na qual “era impossível
escrever a história daquilo que os homens sabiam, ele traçou um mapa do que eles deveriam aprender.” Deve-
se destacar a publicação do Discurso do Método, de Descartes, em 1637, como um marco na construção da
ciência moderna. Ver DESCARTES, O discurso do método. (Os Pensadores). Ver também GALILEU
O
GALILEI. ensaiador, p. 7. Atente-se para o comentário preliminar feito por José Américo Motta Pessanha,
“verbis”: Galileu tornou-se o criador da fisica moderna, quando enunciou as leis fundamentais do movimento;
pioneiras que fez com o
foi também um dos maiores astrônomos de todos os tempos, pelas observações
telescópio.” Todos eles foram responsáveis pelo surgimento do que se chama de ciência moderna e a sua visão
de mundo, sem se esquecer de Newton.
64
departamentos científicos que foram criados através dos anos. Por isso é que se insiste no
repensar da metodologiam. É a partir dela que são traçados previamente os limites das
pelo menos se tem uma idéia, dos resultados que serão obtidos. Não há nenhum campo do
conhecimento dotado de neutralidade, pelo simples fato de ela inexistir, divorciada da
ideologia, sempre presente na atividade científica. A ciência é produto das diferentes condutas
empreendidas pelos investigadores, na busca de soluções para os variados problemas que lhe
são apresentados.
“Se nos oƒrecen múltiples evidencias de la creciente importancia que fue
cobrando en las últimas decadas la relación entre ciencia e gobierno, desde las así
llamadas políticas de desarollo, hasta la configuración del denominado complejo
industrial-militar - modelado en el marco geopolitico de la carrera armamentista
entre los grandes imperios, o la vinculación del sistema científico-tecnológico com el
sector productivo que caracteriza la sociedad teconocrática y post modema.
Nuestra hipótesis principal es que la ciencia se há incorporado a las
tarcas de gobiemo porque se la define como una fiierza política y un instrumento a
los fines del estado. Cuando se acuña la expresión ya ampliamente aceptada de
'políticas cientificas' es precisamente, para designar los propósitos y valores
prioritarios buscados por el estado por intermediación de la ciencia.
El problema del papel da la ciencia dentro de las tareas de gobierno
adquiere gran relevancia en la década del sesenta y numerosos políticos, pensadores
y hombres de ciencia que han observado la cuestión, comienzan a plantearse
criticamente los alcances y limitaciones de la alianza entre la política y la ciencia.
En muchos casos las críticas se reƒieren a la forma de crecimiento de las
organizaciones cientificas, que habrían convertido a la ciencia en un estamento
autónomo y casi inalcanzable al control del poder político; en otros casos la
discusión está centrada en la potencial falta de libertad a que la estaria constreñido
el investigador que depende del poder político tando en el aspecto organizativo
””8
como en el de financiación de sus atividades científicas. ,
_
“Õ REIS, Sérgio Neeser Nogueira. op. cit., p. 37-8. A integralidade é uma maneira de ver o mundo, juntando os
elementos internos e externos, compondo, através dos seus diferentes elementos, uma sinfonia. Não se terá
harmonia em uma composição sem a junção das diferentes notas músicais, aparentemente inconciliáveis entre
si. A desarmonia surge como o outro lado do aparente equih'brio que reside na música composta de acordo com
as pautas aceitáveis. Às vezes prioriza-se a forma, quando a harmonia deveria residir no conteúdo da proposta
apresentada. Na ciência é assim. Se formalmente se tem um trabalho científico bem feito, o cientista deixa-se
embriagar e aceita os seus ensinamentos como verdadeiros.
W Ver WEIL, Pierre. A arte de viver em paz. Sugere Weil uma metodologia pedagógica, a fim de que cada
indivíduo possa se libertar da “fantasia da separatividade”(p. 47).
148
BIAGI, Marta C. Acerca de las relaciones entre la ciencia y la politica, p. 5-6.
65
fazem necessárias, neste final de terceiro milênio, entre todos os homens, enfim, entre todos os
seres existentes sobre a face do planeta. A discussão do aspecto político se impõe, porquanto
fisicamente todos estão inter-relacionados e em permanente troca de energia. -
energeticamente presente. Da mesma forma, os saberes integram uma grande rede. Buscar os
pesquisador detentor da visão de integridade. O olhar lançado pelo holismo não se dá apenas
dentro do sistema jurídico. É uma visão do sistema em relação aos demais sistemas e
subsistemas. Não nega a autopoiesis de Luhman. Contudo, ele teme o risco do sistema que se
abre para a Vidal” Em verdade, o holismo, preconiza que as pontes necessitam ser
restabelecidas e que os caminhos deverão ser desobstruídos, para que haja a convivência de
todos saberes com o conhecimento universal, que não comporta divisões. A totalidade deve ser
compreendida não como um conjunto de peças passíveis de estudo separadamente, mas um
sistema que traz de dentro de si o material e o espiritual, em pennanente atuação e em busca
de um sentido. Não basta estudar a anatomia de um sistema para sua compreensão. A sua
insistir na eliminação dos maus. É preciso inseri-los com urgência nos projetos da humanidade,
porque eles são importantes para que se tenha uma compreensão melhor de como a vida opera.
organizado que seja um sistema não está imune à entropiam É importante, sobremais, se
adotar a concepção sistêmica, que contribui para que possa reduzir bruscamente a cegueira
cientifica.
15]
ALTI-IUSSER, Louis. Aparelhos ideológicos do estado, p. 68.
152
Conforme PASOLINI, Piero. 0 futuro: melhor que qualquer passado - evolução, ciência e fé, a entropia
consiste num certo grau de desorganização do sistema.
“A Terra, por exemplo, é um sistema aberto em relação ao Sol e ao espaço que a envolve, do qual recebe
energia e também um pouco de matéria, e ao qual envia também energia e matéria. A entropia, porém, está
sempre presente, mesmo nos sistemas abertos, em que se desenvolvem operações químicas ou mecânicas
mantidas pelo fornecimento de energia e matéria. Mesmo quando o processo é bem organizado, a entropia será
apenas parcial, sempre inferior ao seu valor máximo.”(p. 188).
67
integridade, que será naturalmente complexo e plural, verdadeiro e mentiroso. A análise visa
reduzir a complexidade. Da análise parte-se para a síntese, que nada mais é do que a
recomposição do todo decomposto pela análise. Parte-se do complexo para o mais simples e
15"
'todo o sistema é constituído de eventos energéticos.
voltadas para o universo, os pesquisadores não conseguirão ter noção sequer da grande
correlação existente entre tudo e todos, numa teia, às vezes, imperceptível a olho nu, mas que
existe e que dá sustentação aos elementos da vida. É um fluir incansável de moléculas e
energia. As forças se transmutam. Moléculas morrem e nascem. Num jogo de vida e morte que
renasce a cada instante. Crema cita Lyall Watson, zoólogo-poeta, que consegue descrever com
precisao a interdependência que há entre os diferentes sistemas:
“Vejo (...) uma interdependência mútua quase incompreensível entre
toda matéria em nossos sistemas.
Começo a sentir a força dos laços que nos mantêm unidos.
a sensibilidade.
As luzes que brilham tão suaves no firmamento são os padrões
envolvidos no desdobramento.
Se tomarmos um padrão, teremos a chave para o sentido, os meios para
curar e toda a ajuda de que necessitamos para encontrar o caminho.
A terra vive. Como um grande animal, ela se mexe em seu sono,
roncando com seus gases intestinais, sonhando um pouco e sentindo coceiras. Ela
respira e cresce, e seus humores circulam. Os nervos do mundo estão sempre
estalando com mensagens vitais e agora, por meio de coletas sensíveis de células em
sua pele, ela começa a sentir-se consciente.
Nós e nosso planeta estamos chegando juntos à maturidade. Abrindo
nossos sentimentos coletivos ao universo, observando e esperando pelo acorde que
vai marcar o começo de uma nova dança mais enriquecedora.
"I 55
Estamos todos prontos para responder à música das esferas.
1”
CREMA, Roberto, dp. af., p. 70.
156
Conforme PATRÍCIO, Zuleica Maria, Ser saudável na felicidade-prazer - uma abordagem ética e estética
pelo cuidado holística-ecológico, p. 81.
157
WHITEHEAD, Alfred North. O conceito de natureza, p. 192.
15*
cdzzf‹›m1ewILsoN, Edward osbdme, Unidade do conhecimento, p. zs'/-s, “A busca da cdnsiiiência pode
parecer, à primeira vista, apriosionar a criatividade. O oposto é verdadeiro. Um sistema unificado de
conhecimentos é o meio mais seguro de identificar os domínios ainda inexplorados da realidade. Fornece um
mapa claro do que é conhecido e fonnula as pergimtas mais produtivas para futura investigação. Os
historiadores da ciência muitas vezes observam que fazer a pergunta certa é mais importante do que produzir a
resposta certa. A resposta certa a uma pergunta trivial também é trivial, mas a pergunta certa, mesmo quando
insolúvel com exatidão, é um guia para grandes descobertas. E assim sempre será nas excursões futuras da
ciência e nos vôos imaginativos das artes.”
69
imprescindível para o cientista. Sem ele, o pesquisador não consegue separar o essencial do
que a consciência da totalidade é obtida por outros processos que os dos meios
mnemotécnicos de enumeração completa. Para a ciência contemporânea, não é a
memória que se exerce na enumeração das idéias, é a razão. Não se trata de
recensear riquezas, mas de atualizar um método de enriquecimento. É preciso, sem
cessar, tomar consciência do caráter completo do conhecimento, espreitar as
*'15 9
oportunidades de extensão, prosseguir tôdas as dialéticas.
A ciência deverá, cada vez mais, aproximar-se da natureza e de suas leis, libertando-
se da visão fragmentada que lhe foi imposta. Por isso faz-se importante a leitura sistêmica.16°
~
Todos os seres sao atores da mesma peça, sendo que cada um representa um papel.
Efodo o conhecimento somente existe se interligado, conectado. Cada área do
conhecimento artificialmente criada necessita se nutrir da outra. Quer dizer, o holismo traz
159
BACHELARD, Gaston. O novo espírito cientifico, p. 127.
16°
Confonne BUNGE, Mario. Epistemologia, p. 89, “Um sistema é um objeto complexo cujas partes ou
componentes se relacionam de tal modo que o objeto se comporta em certos aspectos como uma unidade e não
como um mero conjunto de elementos.
161
GROF, Stanislav, BENNET, Hal Zina. A mente holotrópica: novos conhecimentos sobre psicologia e
pesquisa da consciência, p. 23.
70
Bacon.
163
E, sobretudo, almeja humanizar o conhecimento, ao reconhecer a
hipercomplexidade dos fenômenos da vida que, como poemas, estão repletos de significados.
162
D”AMBROSIO, Ubiratan. Transdisciplinaridade, p. 79-80.
163
BACON. Novum organum. Coleção Os pensadores, p. 5.
71
~
Nao há um precupação dos dogmatistas em discutir os pontos centrais que envolvem
proporcionar a sustentação do sistema jun'dico. Há, ainda hoje, uma grande influência de
alimenta o Direito, dá-lhe forma e vida. Contudo, os doutores consideram-no apenas como
matéria-prima da ciência responsável pelo equilíbrio social.
“O fato social é sempre o ponto de partida na formação da noção do
Direito. O Direito
surge das necessidades fundamentais das sociedades humanas,
que são reguladas por ele como condição essencial à sua própria sobrevivência. É
no Direito que encontramos a segurança das condições inerentes à vida humana,
'M5
determinada pelas normas que formam a ordem jurídica.
164
Ver KELSEN, Hans. Teoria pura do direito.
“S
JESUS, Damásio E. Direito pznzzz, p. 3.
16°
ROSSEAU, Jean-Jacques. O contrato social, p. 26-7.
72
a lei for justa e, no entanto, poderá ser um obstáculo à promoção da justiça, se a lei for injusta
e tiver sido elaborada para atender os interesses das classes dominantes. Há leis que defendem
os interesses coletivos e há normas que buscam preservar os interesses de alguns poucos
detentores do poder político ou econômico.
“O Princípio Único é a ciência unificadora da Metafísica (que estuda o
abstrato, o espiritual, o incondicionado, o ilimitado, o indeterminado, a teoria) e da
F ísica (que estuda o concreto, o material, o condicionado, o limitado, o determinado
e a prática). Éa combinação dos dois elementos universais yin e yang. Muitos
aspectos desses dois elementos são de conhecimento geral, como os fenômenos da
eletricidade, a existência das forças centrífuga e centrípeta etc.
Yin e yang são os braços da balança universal e correspondem aos dois
aspectos da manifestação: o negativo e o positivo, reação e ação, relaxamento e
tensão, dilatação e contração, umidade e secura, frio e calor, ácido e álcali,
clorofila e hemoglobina, efeito e causa, fêmea e macho, escuro e claro, veia e
artéria, vegetal e animal, repouso e atividade, consumo e produção, oferta
e
”' 67
procura, doce salgado, noite e dia, etc., respectivamente
injustiça são os dois lados da mesma moeda. Compreende-se uma somente a partir da outra.
construções teóricas. Quando surgiu o Princípio Único? Ele sempre existiu. Houve a
necessidade de ele ser sistematizado. Quem promoveu a sua sistematização foi o professor
George Ohsawalõs, que, a partir de sérias dificuldades pessoais, conseguiu superá-las a partir
concreto, palpável, que seria a dogmática, enquanto instrumento racional de controle social.
Quanto maior a face, maior o dorso. Ele é, ao mesmo tempo, o elemento que maior segurança
167
KIKUCHI, Tomio. Inyologia - guia do principioúnico, p. 25.
168
GEORGE OHSAWA foi o responsável pela sistematização do Princípio Único, baseado no pensamento do
I-
ching. Foi estudado o I-ching pelo filósofo Confúcio durante anos, sem que tenha extraído dele todo o
significado. OHSAWAatuou no Instituto Pasteur, tendo cursado Medicina na Universidade de Sorbonne.
73
Passa-se por um momento dificil, afirmam os próprios dogmatistas. Como fazer o Direito se
tomar a via adequada para se alcançar a hamionia tão sonhada? Sem dúvida, essa preocupação
toma o denominado discurso pós-moderno extremamente fútil. A ciência, que avançou e que
avança diariamente, toma-se cada vez mais mística. Há uma crença arraigada no seu potencial
de tomar a terra um local cada vez melhor para se viver. Entretanto, a violência destrói a vida
nos grandes centros urbanos. Há, em todo o mundo, uma grande fome de pão e de justiça. Os
problemas sociais e políticos se agravam a cada dia. O corpo social, em verdade, vive
sociedade se organize e se mobilize para encontrar a verdadeira justiça que parece, a cada dia,
mais distante. Se se está em busca de valores absolutos não se conseguirá valorizar os pontos
positivos presentes mesmo no momento mais dificil que se enfrenta. A paz que se mantém
pode não conter no seu estado a lição que uma rebelião traduz. Os povos que passaram pelas
mais violentas guerras conseguem valorizar a paz. Os homens que superaram a doença
abençoam a saúde. Os homens que sofreram sérias injustiças têm um discernimento maior,
conseguindo definir com maior precisão 0 que é justiça. A ciência não avançaria se não
desafios. O Direito não seria agora repensado se não vivesse as sérias crises que afetam a
sociedade. Contudo, insiste-se no estudo do Direito como um sistema que tem vida própria,
respostas para todas as perguntas, sem lacunas. O operador do Direito, se tiver consciência
das mazelas da sociedade, se desenvolverá e adotará novos caminhos para a edificação de uma
paz mais em consonância com as dificuldades que enfrentam as pessoas neste final de século e
início de terceiro milênio. Citando De Castro, Magda Barros Biavaschi faz alusão aos
159
Vide PASOLINI, Piero.0 futuro: melhor que qualquer passado - evolução, ciência e fiã. p. 9-19, que
anuncia: “A nova fisica, ou física nuclear, ou fisica das partículas, enfim, a ñsica que obrigou os cientistas a
mudarem sua maneira de conceber o mundo da matéria, foi posta no papel exatamente há cinqüenta anos,
simultaneamente por dois grandes fisicos, Heinsenberg e Schrödinger.” (p. 9).
17°
BIAVASCI-II, Magda Barros. Direito do trabalho: um direito comprometido com a justiça, p. 22.
74
Não são levados a sério. E quando atuam os operadores do Direito, simplesmente são
justiça. A relatividade dos princípios presentes no Direito, por outro lado, é uma porta aberta
para a busca de uma decisão melhor, mais próxima do problema que está sendo apresentado ao
composto de leis duras e sérias, não se conseguirá ver com clareza o problema em toda a sua
jurídico, que tem um tempo próprio e que se move linearmente, sem ter noção de sua
172
relatividade.
Em face da desunião gerada pela violência, mormente nas grandes cidades, são
criadas associações que têm por objetivo o fim da degeneração que se opera no corpo social.
paz. I-Iistoricamente percebe-se que o segundo momento surge para superar o primeiro,
trazendo uma resposta para as questões que resultaram sem respostas no primeiro. Só que as
questões como as respostas não são definitivas. Vive-se, como já disse anteriormente, numa
sociedade que agoniza. A doença não é incurável. Precisa a moléstia de um tratamento
da civilização. O homem voltado para a acumulação material, única e tão-somente, logo ali,
não consegue mais ver sentido na sua existência e transforma-se rapidamente num religioso ou
num neurótico, sendo enganado facilmente pelos charlatães de plantão, vale dizer, pelos falsos
1"
Conforme FAGÚNDEZ, Paulo Roney Ávila. O holismo e a garantia dos direitos fundamentais. In: SILVA,
Reinaldo Pereira e, org. Direitos humanos como educação para a justiça, p.92-3,
“O Direito não é tão-somente
um conjunto de normas. Traz princípios, que são portas que se abrem para a busca de novos conhecimentos, e
que se constituem ademais nas pontes que unem a ciência, a arte e a religião, enfim, todos os saberes. (...) O
Direito é apenas uma parte da grande teia que envolve a todos, que nos prende em seus labirintos.”
'72
O Universo vive em permanente dança de átomos. A cada momento os homens são seres diferentes, em face
da revolução biológica que se opera em cada mn. A cada período de 20 ou 25 dias, tem-se um novo sangue e,
num período de dez anos, sofre-se uma renovação celular completa. A todo instante concebe-se a justiça como
ideal que parece cada vez distante e que, todavia, permanece vivo em cada ser humano.
75
numa dança permanente. São seres visíveis ou invisíveis que bailam e se transmutam e que
homem. Por isso, impõe-se o resgate do “eu”, tomando-se, somente assim, possível a
sempre me deparo com uma ou outra percepção, de calor ou fiio, de luz ou sombra,
de amor ou ódio, de dor ou prazer. Nunca encontro meu 'eu' onde não há percepção
alguma.”"5
~
O câncerm causa a morte do paciente a partir da desorientaçao de uma única célula;
promove um desequilíbrio de todo o indivíduo. Não se pode apenas ver uma parte nem o todo
sem a compreensão dos mecanismos complexos que também estão presentes na parte e na
partícula mais “insignificante” do cosmos. Uma ponta do iceberg não é, na maioria das vezes,
suficiente para que se possa vê-lo e compreendê-lo na sua magnitude. Precisa-se viabilizar,
173
Conforme WEIL, Pierre. A nova linguagem holística - um guia alfabética ~ pontes sobre as fronteiras das
ciências fisicas, biológicas, humanas e as tradições espirituais, p. 84, “...O fisico David Bohm diz que o
Holograma é o ponto de partida de uma nova descrição da realidade: a ordem recolhida. Arealidade clássica
focalizou as manifestações secundárias - o aspecto desenvolvido das coisas, na sua origem. Estes
desdobramentos são retirados ou extraídos de um fluxo intangível e invisível que não é composto de partes; é
uma interconexão inseparável.”
174
OI-ISAWA, George. Macrobiótica zen - arte da longevidade e do rejuvescimento, p. 18.
O
"S Apud RUSSEL, Peter. despertar da terra - o cérebro global, p. 159.
176
OHSAWA, George. câncer e a filosofia do extremo-oriente, p. 8, afirma que “A filosofia do Extremo-
0
Oriente, unificadora da biologia, do bioquímica, da fisiologia, da agricultura, da botânica, da zoologia e da
medicina, ensina-nos como curar todas as doenças declaradas °incuráveis° pela medicina ocidental; e isto por
um método reputado paradoxal, desprovido de operações sangrentas, sem utilizar nenhum produto químico,
operando exclusivamente pela simples escolha dos alimentos cotidianos, segimdo a ordem do Universo: o
regime macrobiótico.”
177
Vide KIKUCI-Il, Tomio. Educação para a vida - apicação do princípio único na teoria e na prática.
76
toma possível o exercício da busca rotineira na sua plenitude. Qual a terapêutica adequada
para a violência? A paz, que não se confilnde com a debilidade alienada daqueles que querem
uma sociedade ideal, com uma tranqüilidade absoluta e com a preservação dos direitos dos
privilegiados pela estrutura de poder. Dessa maneira, radicalizando, não se está promovendo a
paz, mas estimulando a guerra. Somente se conseguirá a paz a partir da edificação de uma
estratégia de guerra, baseada na persuasão, sem disparar um úrrico tiram
A verdadeira justiça existe em estado naturalm. A justiça é bem maior e que deve ser
atribuição de todos os seres humanos. Por isso, se fala numa justiça vital, transcedental, que
não se confiinde com a justiça vital.18° Não cabe ao operador juridico avaliar a verdadeira
justiça; ou ela se manifesta na sua plenitude, ou ela não existe. A interpretação pode ser um ato
de criação de justiça no caso concreto ou a distorção de uma nonna justa. Justificável seria,
entendem as correntes mais avançadas, a transformação de uma lei injusta, objetivando tomá-la
melhor. É claro que a questão é dificil: depende da ideologia do operador do direito, da
conjuntura em que ele opera e dos valores defendidos pelos sistema jurídico em que atua.
Ohsawa diz que há necessidade de o juiz conhecer a ordem universal para que possa, com
sabedoria, construir a justiça no caso concreto.
"8 SUN TZU, A arte da guerra, diz, à pagina 15, que “Lutar e vencer em todas as batalhas não é a glória
suprema; a glória suprema consiste em quebrar a resistência do inimigo sem lutar. Na prática arte de guerra, a
melhor coisa é tomar o país inimigo totalmente e intato; danificar e destruir não é tão bom. Assim, também é
melhor capturar umexército inteiro que destruí-lo; capturar um
regimento, um
destacamento ou uma
companhia, sem os aniquilar.” E faz uma advertência: “Se conhecemos o inimigo e a nós mesmos, não
precisamos temer o resultado de uma centena de combates. Se nos conhecemos, mas não ao inimigo, para cada
vitória sofreremos uma derrota. Se não nos conhecemos nem ao inimigo, suctunbiremos em todas as
batallras.”(p. 28).
179
Vide CLASTRES, Pierre. Arqueologia da violência - ensaios de antropologia politica, p. 110. Assinala
Clastres que a chefia na sociedade primitiva reside no corpo social como unidade indivisa.
“Este poder não
separado da sociedade se exerce em um_único sentido e anima um único projeto : manter na indivisão o ser da
sociedade, impedir que a desigualdade entre os homens instale a divisão na sociedade. Segue-se que este poder
se exerce sobre tudo aquilo que é susceptível de alienar a sociedade e de nela introduzir a desigualdade. Entre
outras, ele se exerce sobre a instituição da qual não poderia surgir a captação do poder, a chefia. O chefe, em
sua tribo, está sob vigilância. A sociedade cuida para não deixar gosto do prestígio transformar-se em desejo do
poder. Se o desejo, o poder do chefe tomar-se por demais evidente, o procedimento é simples: ele é abandonado
e até mesmo morto. O espectro da divisão talvez atormente a sociedade primitiva, mas ela possui os meios de
exorcizá-la.”
18°
Conforme PERELMAN, Chaim, Ética e direito, p. 70, “No dominio do pensamento, como da ação, a regra
de justiça apresenta como normal a repetição de urna maneira de agir. Isso explica a racionalidade de fórmulas
muito variadas - porque partiram de pontos diferentes - mas que constituem todas as aplicações da regra de
justiça no campo da conduta:
Não faças a teu semelhante o que não desejarias que ele te fizesse.
Age para com teu semelhante como desejarias que ele agisse para contigo.
Não exijas de teu semelhante senão o que tu mesmo estás disposto a realizar.
Admite que te tratem como tratas teu semelhante.
Age de modo que desejarias que agissem todos os teus semelhantes
77
imediatamente desnudado. No sistema, por mais perfeito que ele seja, existem,
Não se pode esquecer da questão educacional, que deverá estar presente na Medicina,
a fim de que o indivíduo possa adotar um procedimento que lhe permita levar uma vida plena,
em liberdade, com reduzida possibilidade de contrair uma moléstia. Infelizmente, não tem a
sociedade o conhecimento necessário para discutir o melhor tratamento para seus sofiimentos.
Não há apenas a doença. Há um homem doente dentro de uma sociedade doente, que, apesar
de criar meios mais sofisticados de investigação, é, cada vez mais, invadida pela violência e
pelo desespero. Bendita seja a esperança que traz a reflexão! E o pleno conhecimento da
fragilidade da estrutura montada através dos anos pela ciência para a descoberta de toda a
verdade! Os princípios gerais de Direito estão, em verdade, umbilicahnente ligados ao Direito
estético que contribui decisivamente para o êxito do operador jurídico, que emana da vida,
centro de preocupação dos operadores jurídicos.
181
OSHAWA, George. Macrobiótica zen - a arte da longevidade e do rejuvenescimento, p. 22.
182
MARKERT, Christopher. Yíng-yang -polaridade e harmonia em nossa vida, p. 39.
78
absolutamente, que haja entre uma diferença de dignidade e que a técnica seja
menos nobre do que a arte. Ao contrário, é preciso observar que o belo só pode se
acrescentar ao eficaz, como a flor à juventude, sob a condição. do objeto técnico e
afirmar sem embaraço, segundo a lógica própria do seu desenvolvimento: ele não se
estetiza ao negar, mas ao se realizar. ”183
O Direito, que prima pela técnica, se aproxima da estética, sem que se priorize o» meio
unicamente, mas pelo reconhecimento da programação pertinente como caminho relativamente
seguro para se atingir a justiça. Oswaldo Ferreira de Mello afirma que a ética é pressuposto da
estética, especialmente no que diz respeito à conduta humana. E destaca que “A arte de viver é
uma constante colocação de estética na convivência.”m Para a recuperação da estética na vida
diária precisa-se recuperar a sensibilidade, estimular a criatividade e reconhecer-se a
atuação do jurista. Porém, aquilo que se necessita é o resgate de uma ética mais criativa, nova,
que respeite o ser humano, os valores promovedores da solidariedade, que serão os efetivos
constmtores da sociedade nova.
compreensão da vida, porquanto vão de encontro ao pensar racional que habita todas as áreas
do conhecimento humano.
“Nós no defiontamos sempre com o protótipo de pensar racionalmente na
cultura ocidental. Ser racional é atingir o pensar matemático, próprio do grande
construtor do universo! A crítica a esse pensamento foi magistralmente expressa
pelo líder sioux Russel Means, num documento do American Indian Movement:
'Newton revolucionou a Física e as chamadas ciências naturais ao reduzir o
universo físico a uma equação matemática linear. Descartes fez o mesmo com a
cultura. John Locke o fez com a política e Adam Smith com a economia. Cada um
desses 'pensadores' tomou um pedaço da espiritualidade da existência humana e a
converteu num código, numa abstração. "M5
Como se verá abaixo, o grande problema dos métodos cientificos empregados reside
na fragmentação dos saberes, que tomaram impossível a compreensão da vida na sua
multidimensionalidade.
~
1”
DUFRENNE, Mikel. Esréficzz zfi1‹›.‹‹›fizz,p. 255.
18'*
FERREIRA DE MELLO, Osvaldo. Fundamentos da paiírzwjufiâica, p. 62
185
D°AMBROSIO, Ubiratan. Consciência holística: passado e futuro se reencontrando. In: BRANDÃO, M.
S., CREMA, Roberto. Visão holística em psicologia e educação, p. 168.
79
2. o DIREITO E A CIÊNCIA
2. 1A ciência.
OS. POEMAS
“A ciência nao
~
se aprende.
A ciência apreende
A ciência em si.
para suspeitar que vivia rodeado de poeira e por ela sustido. Mas para contar
e
descrever os grãos desta poeira, era preciso nada menos que a paciente
sagacidade
”
da Ciência moderna.
Pierre Teilhard de Chardin
'80
As grandes questões continuam sem resposta, ou, pelo menos, sem uma resposta convincente.
Os homens não sabem quem são, de onde vieram e para onde vão. Os compartimentos
decisivamente para o debate que ainda hoje viceja a respeito do caráter científico do Direito.
imputação; e o Direito se caracterizava por ser uma ciência normativa. Ademais, toda a
antropologia kelseniana repousa num homem naturalmente egoístam, que, em seu estado de
construiruma teoria jurídica pura, “consciente da legalidade especzjica de seu objeto. A ”19°
186Segtmdo CESAR, Constança Marcondes. Bacherlard - ciência e poesia, p. 19, que cita Bachelard,
conseguem-se claramente distinguir três idades na evolução do pensamento científico, dos pontos
de vista
“I-Iistoricamente, as etapas seriam: a) o estado pre'-cientíjico «Antiguidade Clássica
histórico e epistemológico:
até o Renascimento e o século XVIII; b) o estado científico do fim do século
- XVIII ao fim do século XIX; c)
o novo estado científico - a partir do início do século XX, com o aparecimento da teoria da relatividade;
epistemologicamente, “Na formação individual, um espírito científico passará necessariamente pelos três
no qual o está voltado para as imagens dos fenômenos e
estados seguintes': a) o estado concreto, espírito
identificado com a natureza. É essencialmente poético; b) o estato concreto-abstrato, onde o espírito pela
primeira vez utiliza esquemas geométricos na abordagem do real. É o realismo ingênuo dos
primeiros cientistas
onde o rompe com a experiência imediata e a realidade inicial dos dois
e filósofos; c) o estado abstrato, espírito
estados anteriores e concebe o real como verificação do sujeito cognoscente.”
'87
AZZOLIN DE ÁVILA, Tânia Regina. Uma proposta de interdisciplinaridade para a ciência do direito, à p.
26, diz que a postura dogmática e hermética da ciência constitui empecilho para
o desenvolvimento da
consciência, e que contribui, ademais, para a instalação do despotismo que se vivencia ainda hoje. -
18*
coELHo, Fábio Unm. Para entender Kelsen, p. 44.
'89
BOBBIO, Norberto et alii. Sociedade e estado na filosofia politica modema, p. 120.
19°
KELSEN, Hans. A teoria pura do direito, p.07. Para KELSEN, a teoria pura estabelece o princípio da
imputação, enquanto que o princípio da causalidade se aplica às leis da natureza. (p. 57). Contudo, o que se vê é
para
a unidade de pensamento.da ciência. Há mna necessidade de apreensão dos fenômenos, de simplificá-los,
melhor explicá-los.
.
81
compreender foi o grande objetivo inicialmente colocado pelos cientistas a partir do século
XVIL191 Antes disso, os historiadores informam que os homens cultivavam múltiplos oficios.
O Direito, mais até do que as outras ciências, se viu absorvido pela fantasia do
controle promotor da segurança. A ciência political”, da mesma fonna que o Direito, traz no
seu bojo um conhecimento antigo, divorciado da realidadel”. A compreensão do elemento
político é fundamental para que se possa estudar o Direito. Dá-se ainda uma especial
relevância aos líderes fabricados, aos líderes políticos de ocasião. Não há nada sério, nem o
possa avançar e construir uma sociedade melhor para todos. Como já se assinalou, a visão de
homens no transcorrer da
integridade não respeita as fronteiras colocadas artificialmente pelos
história. É claro que o objetivo foi partir do mais complexo para o mais simples, ou seja, no
momento em que se estabeleceu uma relação entre fenômenos, a análise constitui-se num
elemento importante de separação de um objeto considerado complicado para sua melhor
compreensão.
Vide BUNGE, Mano. Epistemologia - curso de atualizacao, p. 20-1. Diz ele que o
191 . . . .
. ...
conceito geral de
ciência moderna.
método somente se consolidou no início do sec. XVII, quando se deu o nascimento da
acreditava na
Segundo Bacon, para a descoberta da verdade, bastava o método indutivo. Descartes, por sua vez,
“não se conforma com a observação pura
análise e na dedução. Galileu, considerado o pai da ciência natural,
hipóteses e as submete a prova
(teoricamente neutra) e tampouco com a conjectura arbitrária. Galileu propõe
experimental.”(p. 20). Em verdade, a partir de Galileu foram introduzidas várias modificações,
como o
controle estatístico de dados.”(p. 21).
“ciência política' entende-se hoje
govemo, sociedade, 55-6, “Por
192
Conforme BOBBIO, Norberto. Estado,
de
uma investigação no campo da vida política capz de satisfazer a essas três condições: a) o princípio
verificação ou de falsificação como critério da aceitabilidade dos seus resultados; b) o
uso de técnicas da razão
que pennitam dar uma explicação causal em sentido forte ou mesmo em sentido fraco do fenômeno investigado;
a abstenção ou abstinência de juízos de valor, a assim chamada “avaloratividade”
l8,“verbis”: “A crise não é um
c)
193
Consoante AGUIAR, Roberto A R, A crise da advocacia no Brasil, p.
pode ser
fenômeno isolado. Ela se insere na dinâmica das relações que constituem os fenômenos. Logo,
endógena ou exógena, isto é, fruto de problemas internos das relações numa dada ordem, ou reflexo dinâmico
existem crises isoladas.”“93
de crises exteriores à ordem estudada. Mas o que é importante relembrar é que não
194
TOFFLER, A1vm.A terceira onda, p.39s-9.
82
evidência, o pesquisador pode afirmar com certeza que isso se constitui numa
Havendo
absolutas. Todas elas são
verdade. Só que se tem de reconhecer que inexistem verdades
do indivíduo, recebendo toda a sua carga ideológica. Foucault diz que
a
relativas. Nascem
empecilho para se atingir a verdadews. Contudo, deve-se considerar
que o
ideologia é um
processo de descobrimento da verdade é uma tarefa permanente
do cientista e de toda a
sociedade.196 Busca-se repensar a classificação tradicional das ciências. Nem todas as ciências
são humanas. Será? Existem outras não humanas?
Direito é velho e a sociedade se renova a cada dia. Ou seja, o Direito se move lentamente,
matéria, ora são energia os elementos que fazem parte do corpo social. Quando os
Ora são
fenômenos parecem concluir um ciclo, eles têm reinicio, como ocorre em todo ser vivo.
As normas são compartimentos estanques criados pelo Direito para a apreensão dos
ele considera negativas. Para Kelsen, a ciência do dever-ser é indiferente aos valores e, no
entanto, está impregnada de valores negativos. E esses valores negativos se manifestam não só
no sistema legislativo posto, mas também na atuação dos organismos de execução a serviço
do sistema. Contudo, a proposta kelseniana está em sintonia com a ciência tradicional, que
A ciência, que alguns operadores sabem honestamente para que serve, não pode
excluir a sua racionalidade, é de sensibilidade e de bom senso. A ciência sem ética é como o
corpo sem vida, como um corpo sem alma. Veja-se a advertência de Jean-François Lyotard:
“Uma ciência que não encontrou sua legitimidade não é uma ciência
veróüzdeíra; ela cai no nível mais baixo, o de ideologia ou de instrumento de poder,
se o discurso que deveria legitimá-la aparece ele mesmo como dependente de um
saber pré-científico, da mesma categoria que um relato 'vulgar que não deixa de '.
O
19”
coEL1~1o, Fábio Uihoz. Para entender Kelsen, p. 21-2.
84
acontecer se se volta contra ele as regras do jogo da ciência que ele denuncia como
empírica.
Considere-se o enunciado especulativo: um enunciado científico é um
saber somente se for capaz de situar-se num processo universal de engendramento.
A questão que surge a seu respeito é a seguinte: seria este enunciado um saber no
sentido que ele determina? Ele não o será, a não ser que possa situar-se num
processo universal de engendramento. Ora, ele o pode. Basta-lhe pressupor que este
processo existe (a Vida do espírito) e que ele mesmo é uma de suas expressões. Esta
pressuposição é mesmo indispensável ao jogo de linguagem especulativo. Se ela não
é feita, a própria linguagem da legitimação não seria legítima, e estaria,
com a
"M8
ciência, imersa no non sense, pelo menos de acordo com o idealismo.
desmentem as anteriores. Há uma crise criada pela própria ciência, que não tem certeza de
nada (ou melhor, nunca teve, como atesta o princípio da incerteza, demonstrado pela mecânica
quântica). Precisa-se, contudo, aprender os jogos de linguagem.
“Surge assim a idéia de perspectiva que não é distante, pelo menos neste
ponto, da dos jogos de linguagem. Tem-se ai um processo de deslegítimação.
A
'crise do saber cientifico, cujos sinais se multiplicam desde
' o do fim
século XIXÇ
não provém de uma proliferação fortuita das ciências, que seria ela mesma o efeito
do progressos das técnicas e da expansão do capitalismo. Ela procede da erosão
interna do princípio de legitimação do saber. Esta erosão opera no
jogo
especulativo, e é ela que, ao afrouxar a trama enciclopédica na qual cada
ciência
devia encontrar seu lugar, deixa-as se emanciparem.
As delimitações clássicas dos diversos campos científicos passam ao
mesmo tempo por um requestionamento: disciplinas desaparecem, invasões se
produzem nas fronteiras das ciências, de onde nascem novos campos. A jerarquia
especulativa dos conhecimentos dá lugar a uma rede imanente e, por assim dizer,
'rasa', de investigações cujas respectivas fionteiras não cessam de se deslocar. As
antigas faculdades' desmembram-se em institutos e fundações de todo o tipo,
as
universidades perdem sua junção de legitimação especulativa. Privadas de
responsabilidade da pesquisa que o relato especulativo abafa, elas se limitam a
transmitir os saberes julgados estabelecidos e asseguram, pela didática,
mais a
reprodução dos professores que a dos cientistas. É neste estado que Nietzsche as
"[99
encontra e as condena.
A ciência, para avançar, não pode ter compromisso com quem quer que seja. Somente
a verdade2°° deve ser buscada pelo cientista. Contudo, sabe-se que a ideologia sempre está
19*
LYOTARD, Jean-François. 0 pós-modzmo, p. 70-1.
1”1z1zm, z'1›z'âem,p. 71-2.
2°°Para KELLER, Evelyn Fox. Reflexiones sobre género e ciencia, “Conocer la historia de la ciencia es
visión pasada de la verdad
reconocer la mortalidad de cualquier pretensión de verdad universal. Cualquier
resultado ser más limitado de lo que
científica, cualquier modelo de los fenómenos naturales, con el tiempo há
pretendían sus defensores. La supervivencia de la diferencia productiva em la ciencia
requiere que situemos
85
govemantes e dos grupos econômicos, ora pela utilização dos métodos tradicionais que
apreendem apenas parte da realidade e que não conseguem refletir os fenômenos da vida na
fragilidade dos métodos que emprega para a busca da verdade, também ao jurista compete,
humildemente, reconhecer que as normas que emprega para a solução dos conflitos, são
instrumentos insuficientes e frágeis para a melhor leitura da realidade e para a solução das
impossivel a imposição da ciência, mesmo com todo o incontestável avanço que se verificou na
tecnologia. A cada dia, tem-se de refletir a respeito dos resultados obtidos e dos caminhos que
se que se tem de empreender para encontra-los. Há uma busca permanente de sentido da
existência. O homem pensa permanentemente a sua vida, cheia de idas e vindas, avanços e
A vida é poesiam e racionalidade. O nosso cérebro. tem duas
retrocessos, buscas e esperas.2°1
fundamental para que se tenha paz. Os homens demasiadamente sensíveis vivem fora da
realidade. Os descobrimentos são desvendamentos levados a cabo pelo homem, daquilo que já
existe. A criatividade, por seu tumo, traz os elementos estéticos que iluminam nossas vidas e
que as tomam melhores qualitativamente.
-
todas las pretensiones de hegemonia intelectual en su lugar adecuado que entendamos que
tales pretensiones,
subsiste nele de forma numa duração uniforme. Tampouco vive nele como
ao tempo; não constante, inerte,
La libertad entendida como poesia. Nadie es libre cuando sueña com mundos completos e idealizados. Mtmdos
que nos dejan prisioneros de sueños perfectos mmca realizables. De ahi la libertad, como poesia que acoge
la
~
Vive-se, paradoxalmente, um momento de grandes definiçoes e conquistas e de
indefinições graves. Alguns pensadores chegam a afirmar que a humanidade está a bordo de
uma nau sem rumo. Não sabe para onde vão todos. Os seres humanos afastaram-se da
natureza. Não há um porto seguro. Encontra-se um ser cada vez mais artificializado e
criado. A operação dentro dos sistemas preestabelecidos, que proporciona uma visão parcial
da vida, não permite encontrar uma resposta satisfatória a respeito do sentido de tudo. Na vida
as respostas definitivas simplesmente inexistem. Os dogmatistas almejaram isso, sem êxito. O
homem não é apenas a imagem que ele projeta. Tem que ser despido das camadas que foram
colocadas sobre ele, a fim de que se possa vislumbrar os diferentes momentos políticos, sociais
e culturais pelos quais passou a humanidade. Todos os seres foram marcados, como o gado,
passado ou, como querem alguns, em vivências anteriores, em vidas passadas, como querem
outros. Em verdade, não se consegue negar as vidas passadas ou comprová-las. Não existem
provas absolutas de nada. São frágeis as relações de causalidade estabelecidas entre vírus e
fenômenos da vida.
Daí a grande preocupação, neste final de século, de achar a “cura” para doenças que
ainda desafiam a ciência. Não se trata de falência da ciência, mas de compreendê-la enquanto
meio para a solução de nossos problemas, sem o poder absoluto que a ela foi dado. Não
existem respostas absolutas. Não existem remédios para todos os males. Os remédios não
curam, apenas remed/iam2°3. Caso contrário, poderiam chamar-se “curédios” Curar significa ir
às raízes, às múltiplas causas que desencadeiam as doenças. Na maioria das vezes, as causas
não são bem estudadas, mas são consideradas as grandes responsáveis pelas doenças. No
entanto, pode-se deslembrar que elas estão ligadas umbilicamente com outros fenômenos. Não
há nenhum fenômeno divorciado de outros que, por seu turno, são causa e consequência de
outros. Não vai o ser humano se livrar desse emaranhado de fatos que nada mais fazem do que
1
87
Tendo em vista o que foi exposto, qual o melhor método para que possa fazer a
melhor leitura da vida? A resposta é a seguinte: nenhum método, por melhor que ele seja, tem
~
a força de nos proporcionar uma visão completa da realidade. As respostas sao' sempre
busca a construção de melhores decisões judiciais. Não se pode excluir nenhum sistema de
responder todas as perguntas. O método, embora tenha étimo em palavra grega que significa
caminho, não consiste apenas num meio. Ele incorpora a própria ciência, sua ideologia, suas
múltiplas conexões que estabelece com todas as áreas do conhecimento humano. O Direito não
é nada sem as demais ciências. Todo o resultado é interpretado. Em todo produto da ciência
incide a ação do agente, que a impregna de ideologia. A hermenêutica, no campo jurídico,
sempre ganhou relevância. Não se trata da filiação a uma determinada corrente, mas da
proceder así, el teórico del derecho obtiene para su saber un puesto no sólo entre las
ciencias sociales y políticas - lo cual ya era de pacífica posesión desde hace tiempo
-
,
sino también entre la actividad histórica, cultural y creativa en que se desenvuelve
su pensamiento. La teoria del derecho se inscribe en las teorias filosóficas y
culturales que dominan y mediatizan el pensamiento histórico de todos los hombres,
sin excluir los juristas, los cuales pugnan por una ciencia integrada en la cultura
humana. En concreto, la hermenêutica filosófica há trasvasado a la teoria jurídica
el bagajefilosójico-cultural en el que há nacido y del que se há alimentado y que
va
del idealismo alemán y el historicismo romántico a la fenomenologia existencial y la
filosofia del lenguaje. Son las grandes corrientes en las que se há elaborado esta
en consecuencia, entiende 'su problema como
Y el jurista,
'
linea de pensamiento.
referido a condiciones generales del conocer y del comprender, que aƒectan a todo el
bagaje cultural en que se mueve, y no como mera impostación de una teoria
”2°4
filosófica trasvasada al derecho.
204
FERNANDEZ-LARGO, Antonio Osuna. Hermeneutica juridica : en tomo a la hermeneutica de Hans-
Gadamer, p. 12.
88
aqueles obtidos pelo Direito? Não se sabe. Dificil responder. Há uma mitificação muito grande
humana. Respeita todas. Não veio para dividir, mas para somar. Não se encontra a verdade
sem uma macrovisão. Há descobertas de valor relativo, que devem ser permanentemente
sabem cada vez menos uma parcela cada vez menor do universo. Não querem aprender os
fantásticas experiências, objetivando projeção na mídia, porém cada vez mais distantes da
pensam como se a sociedade não estivesse impregnada de normas de conduta e o Direito não
contribui, com o arsenal legislativo para o exercício do regramento das condutas do indivíduo
na sociedade. É a ciência que almeja uma sociedade melhor para todos e uma arte de
à
89
não sabem o que que caminho seguir, em quem acreditar. Nem o próprio cientista
fazer,
2.2 A CÍÊIICÍ3 (10 d€V6l”-S€l`.O Direito apresenta o mesmo perfil das demais ciências?
Há nítida divisão entre ciência do ser e ciência Há uma ciência do ser? Para
do dever-ser?.
dever-ser.2°6 Na verdade, 0 Direito é um
Ferrajoli existe dupla artificialidade: a do ser e a do
dela. De acordo com a legislação, existem só homens e mulheres; os homossexuais são seres
face de sua violência velada. Ao operador do Direito não se exige a sensibilidade. A mulher
deverá se masculinizar; caso contrário, dificilmente alcançará um cargo público e, se o atingir,
61-2.
206
FERRAJOLI, Luigi. El derecho como sistema de garantias, p.
Ávila. Dfrzfro z sexualidade Reinaldo Porem, org. Direitos da
ln; s11.vA,
2°”
FAGÚNDEZ, Paulo Roney .
encontrar a felicidade preconizada pela tecnologia. É claro que a ciência traz muito do anseio
artificial) continua. Paradoxalmente, um não existe sem o outro. Visceralmente, ambos estão
quando se tiver aprendido a lição do avanço tecnológico que oferece conforto e sérios riscos
ao futuro da humanidade. A tecnologia é firin”, que traz nos seus braços uma grande força
da tecnologia para discutir o futuro do homem no planeta. E não se trata de um problema que
mas de penetrar no íntimo
reside nas grandes descobertas e ambiciosas viagens interespaciais,
essência do homem há muito perdida. Porque é importante que se tenha clareza a respeito dos
dos
caminhos que existem diante de nós e das enormes possibilidades que surgem de libertação
preconceitos. V
aqui obtido. Avança-se ou retrocede-se com toda a evolução científica? Avança-se, sem
manifestações do ser. A racionalidade, como visto, mostra apenas uma faceta dos fenômenos.
Busca traçar seguras relações de causalidade que geram cada vez mais insegurança. A
segurança que hoje se busca hoje opera-se mediante aumento do policiamento
e através uma
visão deformada do fenômeno da criminalidadem Precisa-se de um novo paradigma de
ciência, descomprometido com todas as instituições que foram edificadas no transcorrer dos
lançada pelo homem. Pelo contrário, quer questionar permanentemente as bases que foram
falhou por ter realizado uma leitura incompleta e parcial dos fenômenos naturais.
“No paradigma cientifico mecanicista clássico, acreditava-se que, em
qualquer sistema complexo, a dinâmica do todo podia ser entendida a partir das
propriedades das partes. Uma vez conhecidas as partes
~ suas propriedades
-
fundamentais e os mecanismos por meio dos quais interagiam podia-se inferir,
pelo menos em princípio, a dinâmica do todo. Portanto, a regra era: para
compreender qualquer sistema complexo, nos o dividimos nos pedaços que o
compõem. Estes não podem ser explicados além disso, exceto se forem ƒragmentados
em pedaços ainda menores. Mas, à medida que se avança neste procedimento,
sempre acabaremos encontrando, em alguma etapa, blocos de construção
fundamentais: elementos, substâncias, partículas, e assim por diante, com
compreender o corpo sem o espírito? Como afastar o misticismo da racionalidade? Afinal, tudo
entre todos os elementos e eventos?
não será pura energia? Não há uma indiscutível relação
teoria da
“Esse pensamento em termos de processo surge na física com a
relatividade de Einstein. O reconhecimento de que
a massa é uma forma de energia
são padrões de energia. A
eliminou da ciência o conceito de substância material;
associada com atividade, com processos, e isto implica
que
energia, no entanto, está
dinâmica. Ao observá-las,
a natureza das partículas subatômicas é intrinsecamente
nunca vemos qualquer substância, nem qualquer estrutura
ƒundamental. que O
continuadamente uns nos
observamos são padrões dinâmicos, transformando-se
"21 3
outros - uma contínua dança de energia.
212
CAPRA, Fritjof. 0 tao dafisica, p. 244.
2” Idem, zbfdem, p. 245.
214
ENGELS, Friedrich. A dialética da natureza, p. 162.
93
sentimento
Através do seu instinto sentia a existência do transcendental,
energética daqueles seres simples e
este que pulsava, de forma nítida, na essência
ignorantes, vazios de conhecimentos, porém plenos de
autenticidade.
À medida que a civilização humana começou a galgar novos degraus da
instintiva, passou a reprimir
escala de progresso, deixando cada vez mais de ser
para os porões do inconsciente as percepções inatas e verdadeiras.
Deixando para trás a infância histórica, passou a humanidade a
uma
adolescente que recusa “a priori' os
fase de constatação sistemática, tal qual o
conceitos estabelecidos. Na procura de respostas para
as inúmeras indagações que
acometem a mente humana, passa a duvidar até mesmo dos seus
instintos.
naturalidade dos
A crença no extrafísico, antes alicerçada na própria
sobretudo, a exigir a
sentimentos inatos, passa a ser substituída pela dúvida e,
participação do racional.
Contudo, o homem moderno, esteja ele ligado à ciência
ou à filosofia,
percebidos pelo
procura cruzar a fronteira do racional e a integrar-se aos valores
O mecanicista de Newton vem
seu próprio psiquismo, deforma subjetiva. paradigma
Não -há na vida nenhum elemento que tenha uma existência isolada. Todas as
partículas interagem. Em verdade, a matéria, em essência, é pura energia. Não há matéria em
repouso. Não há corpos sólidosm Há uma troca permanente, em todos os seres, de matéria e
2"*
POPPER, Karl Raymund. Conjecturas e refutações, p. 168, diz: “Na concepção de Heráclito, não há
estabilidade no mundo. “Tudo está em fluxo, nada permanece em repouso.” Tudo está em fluxo, até mesmo as
-
vigas, a madeira, o material de que é feito o mundo: a teria e as pedras, o bronze de uma caldeira tudo está
em fiuxo. As vigas apodrecem, a terra é levada e soprada pelas chuvas e pelos ventos, as próprias rochas
quebram e se desfazem, o caldeirão de bronze adquire uma pátina verde.” Como disse Aristóteles, “embora
nossos sentidos não o percebam, todas as coisas estäo em movimento o tempo todo.” Aqueles que não sabem
disso acreditam que só o combustível queima, enquanto o vaso do qual ele queima (...) permanece imutável,
pois não vemos o vaso queimar. No entanto ele também queima; é comido pelo fogo que abriga. Não vemos
nossos filhos crescerem, mudarem e envelhecerem, mas é o que acontece.””
l
95
Como as religiões, assim também a ciência busca uma explicação plausível a respeito
da origem e da estranha ordem que há no universo, mesmo no caos e nas transformações que
nele ocorrem a cada instante. É claro que há ordem no caos e uma profunda desordem na
ciência que se organiza para explicar os fenômenos da vida. Muitas doenças continuam
elementos, caos e ordem, estão em busca de explicações plausíveis a respeito de tudo. Não há
ordem sem caos e nem caos sem ordem. Um elemento não vive sem o outro. Todos as
individual, tem-se um corpo coletivo. Assim como se tem o exercício do poder de criação
decorrente da própria natureza das coisas, há, simultaneamente, a atuação de uma grande força
destrutiva que nega e, ao mesmo tempo, contribui, em linhas transversas, para a reconstrução
racionalidade extrema já está superado. O holismo não quer substituir a ciência no seu
relevante papel de buscar uma explicação para os fenômenos que habitam a natureza. O
holismo quer é mostrar a possibilidade concreta de se estruturar uma nova vida a partir das
contradições do próprio sistema que existe. As falhas são reconhecidas pela visão holística. Os
desvios fazem parte do trabalho de pesquisa que se desenvolve em busca da verdade. A ciência
que requer precisão nas suas investigações nem sempre consegue refletir a vida na sua natural
diversidade.
denominadas ciências sociais neste final de século. _O Direito dito alternativo surgiu para
contestar os dogmas criados pelas classes dominantes para imposição dos seus valores. Hoje, o
Direito Alternativo constitui-se numa verdadeira postura ideológica do operador jurídico que
de integridade, que tem o intuito de permitir que o operador jurídico possa promover a
conexão entre as diferentes áreas do conhecimento quando está prolatando uma decisão.
alma humana, sem esquecer o natural entrelaçamento que há entre arte e ciência. A
preocupação do holismo é também o resgate do antigo conhecimento dos sábios orientais. O
homem acredita - o que é grave - que, com os métodos artificiais, conseguirá curar as
moléstias, atacar os problemas sociais e políticos e criar uma sociedade divorciada dos valores
imanentes da natureza. Não se pode criar mn fosso entre a ciência e a realidade, porque isso é
reflexo do próprio autoritarismo que permeia as relações humanas, sejam políticas, sejam
22°
Conforme MORIN, Edgar. Para sair do século XX, p. 350, há a necessidade de se deter a megamorte.
“Para KRISHNAMURTI, Jidóu. nzzgzm por um mar desconhecido, p. iós, “A verdade nâo é cústâ,
hinduísta, vossa ou minha. Ela é o fato. E para observardes esse fato, não só tendes de escutá-lo atentamente,
mas também de evitar qualquer tradução desse fato. Porque, se o traduzirdes, o fareis de acordo com vosso
condicionamento, vossas lembranças, vossas inclinações ou tendências, e conforme a pressão das
circunstâncias. Nesse estado, por conseguinte, não estareis escutando.”
222
LYOTARD, Jean-François. O pós-moderno, p. 117-8.
97
globalização como um projeto das classes dominantes. Será isso verdade? Acredita-se que não,
haja vista que as fronteiras estabelecidas são elementos artificiais. Há uma indiscutível unidade
de quem quer que sejam Com certeza, o Estado que se quer está mais voltado para uma
visão pluralista, que acolhe todas as correntes de pensamento, do que para o olhar monista,
contido na obra de Kelsen. Até porque o respeito a todos os pontos de vista se faz necessário,
cantos do planeta. Por enquanto, a cidadania continua uma expressão sem sentido,
especialmente nos países do terceiro mundo, em que a grande maioria da população vive em
miséria absoluta.
para a imposição de suas verdades. A ciência vem perdendo a credibilidade. O povo quer saber
quem, afinal de contas, está falando sério, sem blefar. As violações éticas, na área médica, são
freqüentes. A educação perdeu espaços para a tecnocracia. A economia resulta num conjunto
de medidas que visa apenas manter o controle do ponto de vista formal. Nada de profundo se
realiza. Combate-se a inflação substituindo a moeda. Não há o ataque às causas do processo
inflacionário. O cidadão está perdido no meio dos escombros, sem saber para onde ir. A
cidadania permanece como uma expressão cada vez mais distante, ininteligível para o homem
comum do povo. A ciência deve buscar modestamente a verdade, sem o comprometimento
com quer que seja, a não ser com a felicidade das pessoas e o futuro da humanidade. Todavia,
não deve o holismo se constituir numa nova ciência. O que deseja o holismo - insista-se nisso -
223
Vide OLIVO, Luis Carlos Cancellier de. Direito e intemet: a regulamentação do ciberespaço. .
224
Vide ARENDT, Hannah. Origens do totalitarismo, p.53 l, que vê sempre o risco do advento do
totalitarismo. Já não se vive num sistema totalitário, que fragmenta o conhecimento? Há urna ruptura
evidente.
-
Cf. IANI, Otávio. Teorias da globalização, p. 43-4. E LAFER, Celso. A reconstrução dos direitos humanos
um diálogo permanente com Hannah Arendt, p. 80. Diz Lafer, “Para ela, a ruptura traduz-se num hiato entre o
passado e o futuro, gerado pelo esfacelamento dos padrões e das categorias que compõem o repertório da
tradição ocidental. Tal hiato gera contínuas perplexidades no presente na medida em que a tradição
do
pensamento não fornece regras para a ação futura e conceitos para o entendimento dos acontecimentos
passados. Daí um dos aspectos da crise contemporânea que se caracteriza pela dificuldade de discernir, no
contexto dos problemas do mundo, até mesmo as classes de pergrmtas que devem ser formuladas.”
98
cientistas. Se, por um lado, a racionalidade contribuiu para o avanço científico, por outro
avanços científicos que, às vezes, não passam de uma verdadeira falácia. O artificialismo, que
reside nas descobertas de laboratório, é, na maioria das vezes, o grande responsável pela
humanos têm uma necessidade muito grande de apreenderem as coisas. O homens caçam,
centrais que preocupam os homens. Mas afina-se sobremaneira com o misticismo oriental, com
o enraizamento filosófico, e sempre se preocupa em contribuir para o aumento do
discernimento humano.
“A diferença entre o misticismo oriental e ocidental reside no fato de
que as escolas místicas sempre desempenharam um papel marginal no Ocidente; no
Oriente, ao contrário, constituem o caráter essencial da filosofia e do pensamento
religioso orientais.
(---)
225
CASTRO, Reginaldo Oscar de. Cidadania & justiça : reflexões de um advogado, p. 89.
99
escola de Mileto, em Iônia, não se preocupavam com essas distinções. Seu objetivo
“Z”
girava em tomo da descoberta da natureza essencial de todas as coisas.
Assim, está-se em busca de algo que não deveria ter sido separado. Precisa-se, com
urgência, da libertação da cultura que foi imposta à civilização. Cada ser foi moldado. As
mentes pensam o que os detentores do poder político gostariam que os seres humanos
pensassem. Agem de acordo com a mídia, enfim, com a cultura das classes dominantes. Ao
buscar uma visão racional da vida, a ciência apresenta uma visão parcial do fenômeno humano,
que é naturalmente complexo. Ao querer a imparcialidade, já se mostra parcial e
comprometido com uma visão ideológica do mundo. Será que efetivamente a ciência busca a
verdade? Se quer a verdade, tem a convicção de que é uma verdade fragmentada, parcial? Ou
será que o cientista tem medo da verdade real como o diabo da cmz, e é por isso que faz
questão de criar 0 seu próprio mundo, afastado da realidade? O operador do Direito vive num
mundo de fantasia. Acredita na segurança que emana dos princípios e normas. É como um
peixe fora d'água quando atua distante dos signos e solenidades criadas pelo sistema. Cada
área do conhecimento criou 0 seu mundo particular, artificial, mais ou menos próximo dos
sobretudo, resgatar a individualidade enquanto a outra face da solidariedade que deve imperar
nas relações humanas. Todos os seres integram a mesma rede. São um só. Cada pessoa é um
universo. Dentro de cada ser habitam todos os elementos da vida. O holismo não afirma
categoricamente que detemiinada teoria é reflexo da realidade. Admite que é uma observação
e, por isso, dever-se-á levar em consideração quem observa o que e para que.
“Em resumo, a cosmovisão quântica enfatiza 0 relacionamento dinâmico
como a base de tudo o que existe. Diz que nosso mundo surge através de um diálogo
22°
CAPRA, 0 mo zzzzfis-zw, p. 23.
2” zoHAR, Dznah. 0 ser qzzânzzw, p. 187-zsx.
228
Vide WEIL, Pierre. A nova ética, p. 33-42, que aborda os valores presentes nos mandamentos da tradição
judaico-cristã, hinduísta e budista. Ver também PRABHUPADA, A
C. Bhaktivedanta Swami. Bhagavad-gita
como Ele é. São Paulo Bhaktivedanta, 1994, que traz
: principios como “Humildade; modéstia, não-violência;
tolerância; simplicidade...”(p. 223).
100
mutuamente criativo entre mente e corpo (interior e exterior, sujeito e objeto), entre
0 indivíduo e o seu contexto material e pessoal, e entre a cultura humana e o mundo
da natureza. Dá-nos uma visão do ser do homem como livre e responsável, reagindo
aos outros e ao ambiente, essencialmente relacionado e naturalmente comprometido,
e, a cada instante, criativo.
"M '
conciliação e, através dela, promover a paz. Não se trata da conciliação como uma etapa do
processo, mas como o fim mesmo do processo.
“A visão de mundo quântica transcende a dicotomia entre o indivíduo e
relacionamento revelando-nos que os indivíduos são o que são sempre dentro de um
contexto. Eu sou meus relacionamentos - meus relacionamentos com os subseres
dentro do meu próprio ser; meu passado e meu futuro, meus relacionamentos com os
outros e meus relacionamentos com o mundo em geral.
(---)
O ser quântico é portador de uma nova mensagem, que é paradoxalmente tão antiga
quanto a humanidade. E busca o respeito à ordem natural, em detrimento de uma cultura
produzida com o passar dos anos. Como se produz uma profunda reformulação na ciência? Em
primeiro lugar inserindo-a no grande projeto político-ecológico da humanidade e, sobretudo,
229
ZOHAR, Danah. O ser quântico, p. 293. A
visão quântica contribui decisivamente com o Direito no
exercício do controle social.Não existe individualmente sem o outro. Há um individual inserido num corpo
coletivo. _
O novo surge do velho. O velho morre para que possa nascer o novo. O novo nasce
para superar uma etapa de nossas vidas. Umas células nascem para substituir outras que
morrem. Nascer e morrer são verbos que deverão ser conjugados permanentemente para que
se tenha a vida na plenitude. Se umas células não morrerem, não haverá equilíbrio, e impossível
se tomará a vida. A reprodução celular forma o ser a partir de uma única célula e o elimina,
quando se dá de maneira desordenada.
“A negação dialética, manifestada no desenvolvimento de todas as
coisas, é negação do que caducou, mas não é negação de tudo, pois compreende,
também, um outro aspecto do desenvolvimento, que é o da conservação do que é
hígido, válido e viável.
O novo surge do próprio seio do velho e conserva o que há de bom, no
que lhe antecedeu. A coisa nova leva consigo tudo quanto a coisa acumulou de
”232
positivo, em seus graus anteriores de desenvolvimento.
Há uma permanente vinculação entre o velho e novo. O velho pode retomar como
novidade. O liberalismo que parecia superado retoma como regime novo. Nenhuma tese é tão
suficientemente nova, que não tenha sido manifestação da natureza, ou tão velha que não tenha
sido objeto de reflexão nas descobertas hoje levadas a cabo e que são consideradas
revolucionárias. O operador jurídico reproduz o mesmo discurso, que se toma enfadonho, que
traz respostas prontas para determinadas questões, à luz da dogmática, que não consegue
avançar e que sedimenta princípios que não consegue sequer explicar. As mesmas soluções são
reconhece o ser que julgam Como se fosse uma máquina, o julgador segue o legislador e
aplica e lei no caso concreto, para gerar segurançam Paradoxahnente, a cada dia, se vê mais
O Direito como ciência do “dever-ser” vive, neste final de século XX, a alucinação de
não conseguir manter a estabilidade que os operadores jurídicos consideram necessária para o
progresso social. Em verdade, a revolução na concepção de ciência partiu da Física, que seria
o último campo em que se poderia imaginar o surgimento de uma profunda transformação do
arcabouço científico.73° Segundo Guattari, talvez a grande mudança surja do lado das
235
GUATTARI, Félix. As três ecologias, p. 22. Guatarri fala-nos, inclusive, do personagem Titorelli, no
Processo de Kaflca, que realiza sempre e de maneira idêntica a pintura do mesmo juiz. E adverte: “Da mesma
maneira, cada instituição de atendimento médico, de assistência, de educação, cada tratamento individual
deveria ter como preocupação pennanente fazer evoluir a sua prática tanto quanto suas bases teóricas.”(p. 22-
3).
23°
Conforme BACHELARD, Gaston. 0 novo espírito cientijico, p.
109, “o conflito entre o determinismo e o
indeterminismo científicos de algum modo adormecera quando a revolução de Heisenberg veio repor tudo em
causa. Esta revolução não tende a nada menos do que a estabelecer uma indeterminação objetiva. Até
Heisenberg, os erros sôbre as variáveis independentes eram postulados como independentes. Cada variável
podia dar lugar separadamente a um estudo cada vez mais preciso; o experimentador se acreditava sempre
capaz de isolar as variáveis, de aperfeiçoar-lhes o estudo individual; êle tinha fé numa experiência abstrata
onde a medida não encontrava obstáculo a não ser na insuficiência dos meios de medida. Ora, com o princípio
de incerteza de Heinsenberg, trata-se de uma correlação objetiva de erros. Para encontrar o lugar de um elétron,
é preciso ilumina-lo com um fóton. O
encontro do fóton e do elétron modifica o lugar do elétron; modifica,
aliás, a freqüência do fóton. Em microfisica, não há, portanto, método de observação sem ação dos processos do
método sôbre o objeto observado. Há, portanto, uma interferência essencial entre método e objeto.”
237
GUATTARI, Félix. As três ecologias, p. 23. Não se pode, em nenhum momento, separar o sujeito do objeto.
Eles vivem interconectados. Um não vive sem o outro.
238
LYOTARD, Jean-François. Op. cit., p. 102.
103
Se o controle não é possível nas denominadas ciências exatas, nem se pode esperar
que o controle sobre os fenômenos seja possível nas ciências ditas sociais (é, em verdade, uma
distinção com a qual não se pode concordar, haja vista que todas as ciências são sociais ). O
conhecimento foge do investigador, qual água por entre os dedos, porque é insuscetível da
apreensão. Não pode haver tão-só a preocupação com a edificação de uma teoria do
conhecimento, que não conheça fronteiras entre as diversas áreas do saber. Mas deve haver a
Produz-se muito conhecimento inútil. Com efeito, a ciência está hoje numa encruzilhada: ou
avança, retirando a sua máscara, em busca de sua essência, ou permanece no seu mundo de
ilusão. É claro que não deverá fugir completamente da sistematização adotada, porque a
o método empregado para solucionar o problema. Se o caminho não é o melhor, leva-se mais
tempo para se atingir um determinado resultado, ou nunca se chegará a ele. Os desafios da
natureza, antes de serem obstáculos, são estímulos lançados para que se possa despertar. Se
um caminho não é correto, devem-se buscar outros. Se as respostas são primárias, não
conseguirá atingir um produto satisfatório. É inadmissível, em face dos grandes problemas
enfrentados pelos seres humanos, não se ter uma nova visão de ciência ao fim deste século. A
239
DI GIORGI, Rafiaele. O risco na sociedade contemporânea, p. 54.
104
da fragilidade dos métodos.” E que a verdade se constitui numa busca diutuma do significado
da própria vida. A ruptura paradigmática surge neste final de século XX como necessidade de
homem não construir uma nova subjetividade, a revolução se torna impossível. Daí a afirmação
de Souza Santos, ressaltando que “o novo paradigma epistemológico aspira igualmente a uma
nova psicologia, à construção de uma nova subjectividade.”243 O novo ser humano deverá ter
um compromisso com a vida, na sua plenitude.”
“Não basta criar um novo conhecimento, é preciso que alguém se
reconheça nele. De nada valerá inventar alternativas de realização pessoal e
não são apropriáveis por aqueles a quem se destinam. Se o novo
colectiva, se elas
paradigma epistemológico aspira a um conhecimento complexo, permeável a outros
conhecimentos, local e articulável em rede com- outros conhecimentos locais, a
subjectividade que lhe' faz jus deve ter caracteristicas similares ou
compatíve1`s.”2"5
competitividade são marcas registradas do capitalismo. Segundo ele, a escola serve para
24°
Idem, ¡1›¡z1e»z,p. 53.
“lsegzmao D*AMBRos1o, Ubiratan, Trzz»szz1z's¢z°p1mzz›«¡â«âz,. p. 11-s, “No
processa de aqzúsiçâo ao
sociedade. Os
conhecimento, criam-se códigos e símbolos, que são o que constitui cultura e identifica uma
membros de urna sociedade compartilham maneiras de explicação, artes e técnicas próprias e especificas a ela.
A sociedade desenvolve o seu próprio matemo. A
partir daí nascem suas normas de comportamento, seus modos
Essas categorias só
de propriedade, seus estilos de produção, sua estrutura de poder e sua divisão de trabalho.
entendidas em função de uma crítica que abrange todo o processo desde a sua geração,
organização
podem ser
sociointelectual e difusão. Desse ponto, poderemos evoluir para uma definição das mesmas.”
242
SANTOS, Boaventura de Sousa. Pela mão de Alice : o social e o político na pós-modemidade, p. 333.
243
Idem, ibidem.
244
Nada mais é do que o despertar da sensibilidade adormecida em cada ser, que se encontra embriagado pela
química, pela alimentação desnaturada e por outros venenos da cultura da Coca-Cola.
'
2” Idem, fbiâzm.
105
independentemente dos espaços preestabelecidos pelas soberanias em cada nação. Ele atuará
regulação da vida entre os grupos econômicos e para a solução dos problemas políticos de
interesse de todos. A ciência do novo milênio deverá ter a humildade de reconhecer o seu
problemas humanos. Há um grande movimento mundial que busca a reformulação das ciências,
das artes e, fiindamentalmente, da vida. Tem-se movimentos de minorias que buscam o
conhecimento.
“Esta multimensionalidade exige que as energias emancipatórias sejam
simultaneamente muito amplas e muito concretas. No paradigma da modemidade,
foi, ao contrário, a unidimensionalidade que tomou possível tomar amplitude por
abstracção: o indivíduo abstracto pode aspirar a uma amplitude universal, mas
obtida à custa do esvaziamento total de atributos contextuais. A amplitude do novo
paradigma significa, antes de mais, o alargamento das razões com que se podem
justificar as condutas, um alargamento da racionalidade cognitivo-instrumental
para uma racionalidade mais ampla onde caiba, além dela, a racioalidade moral-
prática e a racionalidade estético-expressiva, um alargamento da demonstração
racional para a argumentação racional, em suma, um alargamento da racionalidade
para a razoabilidade, do conhecimento epidítico para a jronese. Paradoxalmente,
quanto mais ampla é, melhor a racionalidade conhece os seus limites. Neste
domínio, as paixões de Chiller e dos românticos e a atracção apaixonada de
Fourirer são dois campos privilegiados de escavação arqueológica da
”248
modemidade.
O homem de ciência deve ter a alma livre, não podendo estar preso a dogmas ou
246
RODRIGUES, Neidson. Lições do principe e outras lições, 85-6.
247
SANTOS, Boaventura de Sousa. Pela mão de alice o social e o político na pós-modemidade, p.
: 333.
248
Idem, ibidem, p. 334.
106
aquela detenninada pela lei. É como se o legislador fosse infalível. Não se questiona a lei por
mais injusta que ela seja. É claro que se encontram autores que defendem a legitimidade,
mesmo num sistema fechado e autoritário, como é o sistema jurídicow. O que se alega
é que a paz deve ser mantida a todo custo. E a lei é o caminho. Será?
Segundo Freitas,
entre a legalidade e a legitimidade, o juiz há de
“No centro do Dilema
posicionar-se de modo transdogmátíco, na busca de um sistema jurídico aberto,
epistemologicamente, à sociedade que, em regra, desligitima os logicismos formais
de todas as correntes positivistas que desprezam os princípios fundamentais,
garantidos e assegurados na própria Constituição. Tais princípios, a propósito,
exigem que a legalidade se subordine à legitimidade, esta última consagrada por
estes mesmos princípios, aos quais se deve garantir a maior eficácia, sob pena de
reduzi-los a meros enunciados retóricos, sem a efetividade concreta que a sociedade
”250
solicita.
O Direito é uma ciência diferente, sem sombra de dúvidas, mais voltada para a ética e
para a vida coletiva, donde a importância do seu papel. A transdisciplinaridade terá a função de
produzir um saber total, sem fi'onteiras, com capacidade de transformar o Direito em meio
adequado para reger a vida do homem na comunidade. A transdisciplinaridade possibilita não
vê-lo em partes, mas no seu todo, sem dissociar corpo, mente e espírito do ser humano.
Wolkmer ensina que é preciso prestar atenção no diálogo e na interação que há entre o Direito
e as demais Ciências Humanas que produzem “problemas específicos ligados à articulação das
disciplinas”, envolvendo, segundo ele, questões essenciais que dizem respeito à natureza do
249
Conforme BOFF, Leonardo. A águia e a galinha - uma metáfora da condição humana, p. 100, “Sistema
significa um conjunto articulado de inter-retro-relacionamentos entre partes constituindo um todo organico.(...)
É fechado porque constitui uma realidade, consistente, em sua relativa autonomia, dotado de uma lógica interna
pela qual se auto-organiza e se auto-regula(...) É aberto porque se dimensiona para fora. Constituindo
uma teia
com outros seres e com o meio circundante. Dando e recebendo. Trocando informações no
de interdependência
seio de uma imensa solidariedade ecológica, terrenal e cósmica. Tudo está ligado a tudo.”
25°
FREITAS, Juarez. Da substancial inconstucionalidade da lei injusta, p. 107.
251
WOLKMER, Antonio Carlos. Introdução ao pensamento jurídico crítico, p. 57.
107
peças do jogo da vida continuam unidas. São tijolos, presos uns aos outros, que, porém, não
podem ser compreendidos apenas como tijolos. São elementos que, em permanente dança, se
transmutam.
O homem organicamente desequilibrado pelo consumo de produtos químicos,
criado A humanidade criou vários monstros, com os quais não sabe o que fazer. Há claro
conflito entre criador e criaturas. O Direito cresce cada vez mais. Novos tentáculos surgem de
seu corpo malformado. E há um risco real de as criaturas voltarem-se contra os seus criadores.
da burguesia, ela chega a falar da
Quando surge a ameaça do ataque aos interesse
demonstração disso. Deverá ser mantido o Direito necessário para a manutenção dos
privilégios e não para atingir os seus patrimônios. O Direito útil, voltado para os interesses das
classes dominantes, deverá ser preservado pela burguesia. Os direitos e garantias
direitos fimdamentais não deverá ficar restrita à área política tradicional. O forte conteúdo
exercício de poder.
Do ponto de vista holístico, precisa-se analisar o homem como um todo. Não se trata
das
Ademais, o conhecimento holístico não surge para lançar luz sobre as trevas das ciências e
~
religioes. Vem dizer que há sombra e luz, vida e morte, conhecimento e ignorância, ou seja,
tem por meta reconhecer a humanidade que sempre esteve presente, mesmo na ciência
Com efeito, a ciência obtém vitórias parciais sobre a complexidade da vida. Nenhuma
resposta é definitiva, porque as conclusões se referem a partes do todo, a
determinados
fenômenos que se consideram relacionados, tendo em vista que estão intrinsicamente ligados
transformação e interação. Os métodos atuais são limitados demais para que possam aprender
a sua incerteza. Assim, os métodos sao caminhos. Têm valor relativo. Em decorrência disso, os
resultados obtidos pelos cientistas deverão ser sempre objeto de profunda
reflexão. O jurista
deverá sempre se debruçar sobre a realidade, contemplá-la na sua magnitude e buscar extrair
dela a verdade, com a consciência das limitações dos sentidos. Um caso que lhe é apresentado
é apenas um fragmento, que, todavia, contém toda a riqueza da vida.
A hermenêutica de um novo tempo deverá lançar sobre o caso concreto uma visão de
integridade e restabelecer as pontes entre todas as áreas do conhecimento; enfim, reunir os
pontos, para que tenha uma imagem mais nítida do verdadeiro mosaico universal. Uma
hermenêutica transdisciplinar reconhece os métodos tradicionais, considera-os complementares
e, acima de tudo, permite que haja uma liberdade maior na atuação do intérprete. Construir
uma decisão judicial é uma tarefa dificil. Não se lirnita à aplicação da lei. Cometer-se-ia, assim,
Direito, como já se salientou desde o início deste trabalho, é a sociedade, seus conflitos, sua
harmonia etc. Por que não priorizar a solidariedade, ao invés da extrema racionalidade? Por
que não estimular a criatividade do operador jurídico? Por que não priorizar a ética?
Priorizando-a, não se chegará mais perto da justiça? Há uma grande carência de ética. É
flagrante o desrespeito aos seres humanos em particular e aos seres vivos de maneira geral.
imediatos. Mesmo que, para isso, haja a necessidade do sacrificio de animais. Pobres cobaias!
Quanto sofiimento! Quanta angústia! No campo jurídico experimentam-se fórmulas
milagrosas, mediante criação de novas leis repressivas. Porém, precisa-se de um novo homem
do Direito, que esteja comprometido com a ética, que esteja voltado para a integridade da
vida.
256
Ver FERNANDEZ-LARGO, Antomo osuna. La hennezzéuâcajuridica de Hens-Georg Gzzâzzmer, p. 100.
257
CARDOSO, Edna Dias. O advogado do novo milênio, p. 27.
110
O compromisso ético é fundamental para que se tenha uma vida mais sadia, mais
digna para todos. A ética é imprescindível para a edificação das pontes que se fazem
necessárias entre os diferentes saberes. Não se trata de uma ética capitalista nem de uma ética
ambiente, com o novo ser voltado para si e para os outros, integrado no Universo, tendo
consciência de que este é o seu lugar, sua vida. Não existem éticas específicas. Há uma única
ética, que deverá ser voltada para preservação da vida. A ética não deve se restringir a uma
cadeira escolar e nem pode ser ensinada. Deverá, sobretudo, ser vivenciada e transmitida pelo
necessidade de uma mudança; porém essa transformação não ocorre ( e não acontecerá )
através de uma postura autoritária da parte dos próprios intelectuais. Mas, isto sim, através de
uma ética holísticam Qual é o fiituro? Alguns afinnam que não haverá futuro, que se está
mediante uma mudança paradigmática. Verifica-se uma ruptura, gerada pela própria crise, em
virtude, principalmente, das contradiçoes dos modelos impostos.
“Ninguém sabe detalhadamente o que o futuro reserva ou o que
juncionará melhor numa sociedade da Terceira Onda. Por essa razão, devemos
pensar não numa reorganização maciça única ou numa mudança revolucionária,
cataclísmica única, imposta do topo, mas em milhares de experiências
descentralízadas, conscientes, que nos permitam ensaiar novos modelos de tomada
de decisão política em níveis local e regional antes de sua aplicação aos níveis
”259
nacional e transnacional.
para a esquerda como para a direita. Para a esquerda, porque, segundo ela, é um projeto da
burguesia. Os ditadores não estão satisfeitos com ela porque há uma fragmentação do poder. A
ciência jurídica altera a sua visão de mundo à medida que a sociedade se transforma. O
fenômeno jurídico é sócio-político. O aprendizado é de todos os que estão envolvidos nesse
processo, queiram ou não. A ciência, que vive nos laboratórios, se alimenta de tecidos
258Segundo WEIL, PierreA nova ética - na política, na empresa, na religião, na ciência, na vida privada e em
todas as outras instâncias, a ética holística inspira-se, sobretudo, “nos valores de preservação da vida, alegria,
cooperação, amor e serviço, criatividade, sabedoria e transcendência, traduzidos por ações efetivas agrupadas
(...) nas categorias de inteireza, inclusividade e plenitude.” Ver também Antonio Carlos Wolkmer, ética em A
redefinição: um novo fundamento para o direito, Revista Seqüência n. 26, jul/93, p. 50.
2” TOFFLER, A1vm.A terceira onda, p. 432-3.
111
científico resulta de uma ideologia, existem muitas outras - e todas elas são complementares --
eticamente postada na defesa dos verdadeiros valores humanosm Somente se fala em ruptura
a partir de uma crise. Questiona-se a ciência porque ainda existem muitas doenças
consideradas incuráveis. O Direito não consegue controlar a violência. A verdade parece fugir
a cada instante, mesmo com todo o desenvolvimento científico. O que tem de se aprender é
26°
iâem, zbzâzzm, p. 433.
261Seg1md0 LARA, Tiago Adão, A filosofia ocidental- do renascimento aos nossos dias, p. 33, “A afirmação
primeira do racionalismo é que o homem pode chegar, pela razão, a verdades de valor absoluto.”
262Conforme HESSEN, Johamies. Filosofia dos valores, p. 43,“Valor - pode dizer-se ~ é a qualidade de uma
coisa, que só pode pertencer-lhe em função de um sujeito dotado de uma certa consciência capaz de a registrar.”
Afirma o professor, p. 341, '“verbis”: “Procuramos - por outras palavras - assentar a existência dmna última
Realidade, dum Absoluto, como premissa latente e implicitamente contida em todas as nossas afimiações, quer
“Ser” - foi este o nosso
sobre o ser, quer sobre a verdade, quer sobre o valor. Isto é ainda: quando dizemos
pensamento - queremos dizer, em última constância, Deus. Quando dizemos °Verdade”, eis também sempre
nessa palavra subentendida a existência de Deus. E, finalmente, quando falamos dos valores e neles cremos e
na sua realização, é ainda e sempre em Deus que acreditamos e é a Ele que nos referimos. Em todas estas
ll2
de ser colocado numa biblioteca. Não se reconhece a complexidade, muito embora se tenha
uma noção do mistério (e, às vezes, o que é mistério é produto da ignorância). A regra é a
irresponsabilidade de cada um para a felicidade de todos. O Estado todo provê. É claro que
não se pode negar o avanço tecnológico. Mas a visão mecânica é apenas uma representação.
Sobreleva a essência de tudo o que precisa ser desnudado, o mistério que necessita ser
desvendado, a conexão de todos elementos que precisam, com urgência, ser resgatados. A
separação de tudo é artificial. A unidade é real. O homem não é uma máquina. A ciência traz
apenas uma leitura possível, racional, masculina e parcial dos fenômenos naturais. O campo
jurídico, no entanto, é aquele em que prolifera a fantasia. Há um jogo permanente de poder, no
qual o imaginário é tudo. Porém, na maioria das vezes, trata-se de regras preestabelecidas que
uma ciência diferente, que trata do “dever-sei” (pode-se afirmar que há uma ciência que trata
ordens ou esferas se inquirirmos acerca do seu último fimdamento, iremos pois sempre dar, em última análise,
à realidade de Deus - origem metafisica suprema de todo o ser, de toda a Verdade e de todos os Valores.”
263
WARAT O
Luís Alberto. direito e sua linguagem, p. 119.
,
113
O Direito deverá se voltar para a ética, para a estética, para a retórica, enfim, para a
vida.265 Somente assim se consolidará como meio importante para o controle social e para a
peças de uma grande máquina e entendê-las individualmente? Por isso, não se pode dissociar
dentro de sua esfera estritamente nonnativa. O Direito não deve ser apenas um instrumento de
positivas.
Não há futuro para a humanidade sem a solidariedade. Ela é inerente à vida. Não há
um elemento sem outro. Sem as partículas integradas, não existe o todo. A visão mecanicista
~
da ciência não contribui para a transformação que se faz necessária na sociedade, enfim, nos
homens. A educação é fundamental para revolucionar a ciência e para a difusão de uma nova
ciência, mais voltada para a humanidade (comprometida com os valores positivos humanos e
não com o dinheiro gerado pela doença). Educar é também promover uma permanente
reflexão a respeito do que se- ensina. A violência que se emprega na ciência para combater a
dor produz mais dor.
“Violência é o termo exato para o nosso propósito de eliminar a dor,
ignorando sua sábia mensagem de saúde. Por natureza, somos seres sociais e essa
violência atua nas relações humanas, tomando-as egocêntricas. As relações de seres
feios, vazios, ambiciosos, dúbios, medrosos e aproveitadores se reflete nessa
sociedade criada por nós e por nossos defeitos.
Na educação verdadeira vamos encontrar o elemento humano dotado de
recursos para resolver dinamicamente os problemas que a própria vida impõe. A
solução dos problemas, enfrentando alegre e confiantemente os desafios, é o clima
”266
próprio da educação verdadeira.
264Idem, ibidem.
265 p. 122, “a ética é a ordenação destinada a conduzir o
Conforme SILVA, Reinaldo Pereira e, Érica e bioética,
homem de acordo com uma hierarquia bens,
de uma tábua de valores, um sistema axiológico de referência,
tomando-o cada vez mais homem, cada vez mais aquele ser que a natureza dotou de consciência e
espiritualidade.”
266
KIKUCI-II, Tomio. Educação para a vida, p. 35.
114
O educador reproduz o conhecimento científico. O sistema que faz uso da violência cria mais
violência.
possam viver em paz, livres delas. Será isso possível. Elas não são também necessárias para o
equilíbrio da vida?268
'
compreender um fenômeno sem relaciona-lo. Por isso, faz-se necessária a visão holística, que
a mudança da percepção.
“A palavra que vem à mente, quando um cientista pensa nessas
mudanças súbitas, é quantum. Ele significa um salto descontínuo de um nível de
“zm
junção para outro, mais elevado: a transição quântica.
A ciência já não será a mesma. Passa-se do átomo para os elementos menores, que
estão presentes em toda a vida e que são, em alguns casos, pura energia.
2°”
Idem, ibzdem, p. 33.
ARevista Fonte de Luz, de janeiro/99, na matéria intitulada “Bactérias - seu trabalho surpreendente”
268
destaca o papel das bactérias para a manutenção do equilíbrio da natureza, comendo produtos poluidores e
produtos sintéticos, decompondo produtos químicos usados na agricultura, enfim, contribuindo decisivamente
para a manutenção do meio ambiente saudável. (p. 15).
269
CHOPRA, Deepak. A cura quântica - o poder da mente da consciência na busca da saúde integral, p. 23.
27°
Idem, ibiâzm, p. 28.
115
A ciência passou a ter uma fé inabalável nos seus métodos e nos resultados por eles
obtidos. Compreendendo os problemas a partir das conexões naturais que há entre eles e a
realidade, passa-se a entendê-los como forças que levam o homem ao progresso, e não como
obstáculos ou empecilhos ao desenvolvimento do ser humano. As estruturas científicas foram
edificadas para a obtenção de um máximo de segurança com um rnínimo de esforço, mediante
a ditadura científica, que quer, a todo custo, impor suas descobertas ao povo, mesmo que
produto de interesses dos grandes capitalistas.
Os meios não devem ser justificados por si mesmos, ao contrário do que pensa
Maquiavel. Os fins nobres que justificam os meios, não causam problemas às pessoas. O
Direito não deve ser apenas um meio de manutenção dos privilégios de alguns, em detrimento
da massa marginalizada e faminta. Ele deve constituir-se, numa sociedade civilizada, na virada
27]
ÃRDUÍNO, Ary Médici.et alii. A era de aquarius, p. 15-6.
2” KELSEN, Hans. Temzz pura do
direito, p. 41.
116
em verdade, vivendo uma mudança de paradigmam, em virtude da crise geral que afeta a
sociedade no final do século XX. SÓ que a crise, antes de ser obstáculo, é força que leva a uma
nova realidade. A partir da reflexão surge a ruptura. Da ruptura do sistema de dominação,
caracterizador da dogmática, nascerá um sistema de forças que, pelo menos num primeiro
momento, entrará em rota de choque com 0 modelo nonnativista assentado no fonnalismo, no
dominio da força e da racionalidade. Toda transição é traumática. Porém, dela deverá ser
extraída uma lição. O modelo jurídico tradicional está esgotado. A ciência, com os seus
métodos, embora tenha avançado, não consegue assegurar felicidade. Aumentam as doenças
crônicas como efeito iatrogênico da indústria farmacêutica. Surgem novos criminosos a cada
dia, mesmo com todo esforço da polícia, do Poder Judiciário, e com a criação, a cada dia, de
novas leis e decretos. Veja-se o que diz Capra, citando o I Ching, a respeito do momento que
está passando a humanidade:
A não compreensão dos problemas que afetam os Direito resulta de que o próprio
sistema jun'dico não contém todos os elementos necessários para o seu pleno entendimento.
Ademais, precisa-se avançar além da dialética marxista, porque, para ela, as forças que atuam
são antagônicas e excludentesm. É importante o reconhecimento da atuação de forças
273
O
Ver MAQUIAVEL, Nicolau. príncipe, p. 147. Diz ele que “os homens agem diversamente para atingir
seus objetivos, ou seja, glória e riqueza. Alguns agem com cautela, outros com ímpeto; alguns com violência,
outros com astúcia; alguns com paciência , outros com o contrário.”(p. (174).
274
Ver KUHN, Thomas. S. Estruturas das revoluções científicas, p. 218. Vê ele o paradigma como conjunto de
crenças, valores, técnicas, partilhados pelos membros de uma dada comunidade.. Também ver VOLKMER,
Antônio Carlos. Pluralismo Jurídico, p. 58-69.
275
CAPRA, Fritjof. O ponto de mutação, p. 5.
276
MARX, Carlos. El capital - la produccion capitalista y su desarrollo.
117
Que mistério
resideno bater
de asas da borboleta
que traz a chuva?
Que mistério
há na chuva
que traz os sonhos?
Que caminhos
há no mistério
que permanece
etemo
e que habita
o coração
de cada um?
1'
“Dá-me uma universidade que eu te darei uma visão compartimentada
do universo.”
Carlos Drummond de Andrade
2”
D'A1\{rBRos1o,Ubâmwn. op. cn., p. 161-2
278
FAGUNDEZ, Paulo Roney Avila, A ética integral do profissional do direito, p._ 18,-9".
118
Primeiramente, faz-se necessário atentar para a distinção entre três termos: educação,
ensino e instrução. A educação não consegue ser definida com precisão pela doutrina, que
somente salienta o seu papel fimdamental, que é o de promover o desenvolvimento integral das
potencialidades da pessoa humana. O ensino, por seu turno, almeja apenas estabelecer uma
relação entre educador e educando, que consiste na transmissão de conhecimentos. Já a
instrução somente quer levar a cabo a domesticação do indivíduo, programando-o para atuar
dentro das propostas previamente estabelecidas pelo sistemam
O ensino jurídico tem se preocupado única e tao-somente em reproduzir os dogmas
criados pelos romanos. Não há uma preocupação com o refletir a respeito dos conhecimentos
e uso altemativo do Direito ) é que se passou a pensar sobre os problemas que afligem os
indivíduos sérios que integram o sistema jurídico. A Ciência Jurídica emprega todo o esforço
intelectual dos seus operadores para atacar os males que afligem a humanidade. O Direito Civil
protege a propriedade, quer preservar a família e os valores que as classes dominantes
consideram importantes. O Direito Penal fica cada mais cruel. Quer-se, a todo custo, combater
a criminalidade. De acordo com a mídia, ela se constitui numa praga, que deve ser eliminada,
sonegação fiscal, como os demais empresários. Quem acusa é santo. O diabo está
marginalizado, precisa ser encarcerado, para que os homens de bem tenham paz.28°
Combate-se a violência com o fortalecimento do aparelho repressivo do Estado.
Gera-se mais violência ao combater a violência§ Em nenhuma parte do mundo a violência gera
não vai ser oferecida através de política governamental, única e tão-somente. Ela nasce dentro
de cada um e de exemplos que devem ser dados pelas próprias autoridades. O Direito é
estudado como uma ciência do “dever-ser” e que, entretanto, não se aprofunda no estudo da
criminalidade e de suas múltiplas causas. A tarefa é da Criminologia. Em nenhum momento se
afirma que o sistema repressivo pode ser o responsável pelo aumento da criminalidade, numa
visão tradicional. Não se minimiza a criminalidade quantificando a violência. Qualifica-se o
ataque para reduzir o produto multifacetário da criminalidade. Não reside o crime no homem
isoladamente. Ele está em tudo e em todos. Cada um pode sofrer as conseqüências de sua
atividade, dependendo única e tão-somente dos valores que o sistema quer proteger. Em cada
um há luz e sombra, vida e morte, em um jogo permanente. São elementos que se transmutam
a cada instante.
“A construção mutilada do objeto científico (o crime como produto de
causas determinantes) ignora as relações do comportamento criminoso com (a) a
reação social dos aparelhos de controle e repressão social: a influêncía da
rotulação como criminoso (e de estigmatização social) sobre a criminalidade futura,
(b) a fenomenologia da experiência pessoal do sujeito do comportamento: a
definição da situação pelo sujeito, seus motivos, orientação e significado do
acontecimento, e (c) os esquemas de poder político, nos conflitos de classe de
formação social, e o significado da definição e repressão seletiva do comportamento
”28I
criminoso.
indivíduo e nem se forma na sua personalidade. Nasce do meio, da atuação do Estado e dos
valores materialistas defendidos pelas classes dominantes. Quem tem mais, quer cada vez mais.
A fome não acaba. Há uma febre incontida de consumo. O desejem é o grande Deus. Saciá-lo,
281
SANTOS, Juarez Cirino dos. A
Criminologia da repressão, p. 115.
282
Consoante BOFF, Leonardo, Aáguia e a galinha - uma metáfora da condição humana, p. 168, há sempre
um desejo de romper as barreiras estabelecidas e criar o novo. “A águia representa a mesma vida humana em
sua criatividade, em sua capacidade de romper barreiras, em seus sonhos, em sua luz, resumindo, em sua
transcendência.”
283
OHSAWA, George. Macrobiótica zen, p. 130, pede a punição dos educadores, os verdadeiros responsáveis
pela criminalidade.
120
~
não questiona o ensino imposto, está prestando um desserviço à nação. Nao está contribuindo
para a libertação do indivíduo, mas amordaçando-oi a um código lingüístico vazio de
conteúdo
decisivamente para que ocorra a libertação dos marginalizados do sistema. A escola que impõe
um ensino bancário não só não liberta, mas também prende o educador a um modelo
e as
Já não se pode admitir as separações promovidas pelas ciências entre educação
convívio entre os seres sobre a face da terra. Ela, na verdade, nasce dentro
de cada um.
classes dominantes.
“A prática dos juristas unicamente será alterada na medida em que
mudem as crenças matrizes que organizam a ordem simbólica desta prática. A
284
ILICH, Ivan. Sociedade sem escolas.
285
MoRA1s,Reg¡s de. Entre zz educaçao z zz baràâfie, p. 46.
121
ter sido separado, é a grande tarefa neste final de século XX. O professor de Direito, que
somente sabe o Direito, não sabe nada. Se ele não consegue despertar o aluno para as pontes
que unem a ciência jurídica às demais, não promoverá a descoberta do verdadeiro
conhecimento, que não reconhece como reais os compartimentos criados através dos séculos
pelos homens. O Direito requer que o seu operador tenha ampla percepção da vida, nas suas
diversas fonnas. Não há ecologia externa sem a ecologia intema, bem como não há ecologia
intema sem ecologia extema. Tem que haver uma mudança de postura diante da vida. A
alimentação deveria ser mais naturalm (cereais integrais, raízes e verduras orgânicas,
de um sangue mais limpo, se criará o discernimento para a promoção da verdadeira justiça, que
requer mais sensibilidade do que bagagem de conhecimentos dogmáticos. Infelizmente, ainda
O homem deste final de século está se deteriorando, fisica e mentalmente. Não vê perspectivas
para a sua ciência e, em suma, para a sua vida. É um ser que não consegue compreender o
sentido de todo o esforço levado a cabo pela humanidade há séculos, em busca de novas
tecnologias, porque ele se vê, a cada dia, mais infeliz. É uma desilusão que parece não ter fim.
Há uma perda de identidade do ser humano, que se confunde nos labirintos por ele próprio
criados. Não vê luz no fim do túnel, porém não há escuridão sem luz e nem luz sem escuridão.
Quando um elemento prevalecer autoritariamente sobre o outro, diagnosticar-se-á, com
clareza, o desequilíbrio.
`
286
WARAT, Luís Alberto et alii. O poder do discurso docente nas escolas de Direito, p. 146.
2”
CLAUSNITZER, 11ze_ Guia prâfiw da alimentação mzzcmbiófica, p. 20, diz que “Um consmno excessivo
de produtos de origem animal (em geral mais de 10 %, em climas temperados) acarreta um enfraquecimento
das forças de defesa e das faculdades criadoras e etóricas. Pela absorção abundante de came e outros alimentos
refinados, permanecem as famílias, em regra, na quarta ou quinta geração sem herdeiros sadios, depois de
muito terem sofrido outrora sob o peso de doenças e outras desgraças.”
122
teologia, com dogmas impostos, viverá etemamente na sua fantasia, no seu mundo de “faz-de-
conta”, de fadas e duendes, pelos séculos e séculos. Qual, enfim, o verdadeiro papel da
não desenvolve, amordaça. A educação não tem compromisso com dogmas. Deverá questioná-
los permanentemente. A educação existe em todo o lugar, questiona tudo e abre sempre novos
caminhos. Não há nenhum projeto acabado para o verdadeiro educador. Uma etapa
necessariamente inaugura outra. O educador não impõe o seu conhecimento, experimenta-o e
informações, sem se questionar sequer a respeito da utilidade dos conhecimentos que foram
obtidos. Mais: a educação que não busca a independência do indivíduo não tem sentido,
porque marginaliza e oprime. Cada um deve aprender a se defender das tentativas de violação
da busca do sentido da vida, que partem dos professores, pelo uso da força da palavra.
“Nãopode comparar a Autocuraterpia com a ação da terapêutica
se
médica convencional. O objetivo da Autocuraterapia é o de independizar a cura de
doentes, que deve ser um ato fundamentalmente auto-educacional e não medicinal.
A “expropriação da saúde detendo, para os médicos, a exclusividade de direito de
tratamento de doentes e dificultando a liberdade de autocura, usando para isso a
legislação vigente, obedece, fundamentalmente à ignorância e aos interesses
financeiros. É esse um dos principais fatores que provocam doenças no conturbado
mundo modemo. "M
Infelizmente, a ciência quer encontrar 0 caminho mais curto e mais fácil para solução
para solucionar os problemas que afligem a humanidade. Em alguns casos, até se pode admitir
a sinceridade na luta empreendida pelos cientistas para combater os males que afligem a
humanidade. Em outras situações sabe-se que o único interesse que move a sua atuação é o
financeiro. Somente um milagre pennitirá que se encontre um remédio para cada doença. Por
que? Porque os medicamentos produzem efeitos iatrogênicos, vale dizer, outras doenças em
decorrência de sua atuação no organismo. Nas bulas dos medicamentos alopáticos encontram-
288
KIKUCI-II, Tomio. “Autocuraterapia - transformação homeostásica pelo tratamento independente, p. 05.
123
absurda, por sinal - de que se terá uma droga para cada doença, ou, o que é pior, uma vacina
para cada uma das mais de trinta mil moléstias catalogadas e que afetam o ser humano.
“A doença é como um incêndio e o médico é como o bombeiro. Apesar
da mobilização total de toda capacidade do médico (bombeiro) e do uso de todos os
seus equipamentos, ainda assim há inúmeras doenças graves (grandes incêndios)
que se desenvolvem paralelamente à evolução capenga da ciência e da tecnologia
mecânicas da atualidade. ”289
noção do significado da saúde. O educador, tal qual o médico, deverá sempre questionar os
conhecimentos com os quais trabalha, porque eles são provisórios, respondem a perguntas
historicamente, através dos seus métodos capengas. A visão cartesiana é parcial, matemática,
detém parte dos fenômenos e não permite que se possa progredir em conhecimento. Quer-se
saber o quê? Precisa-se do conhecimento para que se possa avançar em democracia e construir
uma sociedade melhor para todos. Somente se terá uma democracia real quando todos forem
livres, puderem traçar os seus caminhos, tiverem a oportunidade de optar por uma vida
diferente da cultura estabelecida. Por que se insiste tanto em modelos autoritários? Porque se
acredita que, somente com o fim da impunidade, se conseguirá edificar flamantes instituições,
mais em consonância com os nossos anseios. Precisa-se, contudo, que se opere uma cura
mansa, sem grandes efeitos colaterais. A adoção de um procedimento violento para superar os
sintomas das doenças pode trazer sérias conseqüências para os homens. Estando o corpo social
atingido por uma doença grave, degenerativa, se se atacar violentamente a doença, poder-se-á
levar o paciente à morte. As doses homeopáticas se fazem necessárias, porque, somente assim,
mldem, Ibidem.
,..i
K0 -lã
equilibrada29°, que deve evitar o uso indiscriminado dos quimioterápicos e que cada pessoa
presentes
terá de se voltar para os valores humanitários (solidariedade, liberdade, justiça
etc. ),
questões cruciais que atingem a humanidade. Se assim não se fizer não se conseguirá avançar,
não se conseguirá edificar uma sociedade nova, mais em sintonia com as aspirações de
liberdade e justiça do terceiro milênio. O homem novo, da sociedade nova, não respeita
conhecimento até aqui obtido. Não se satisfaz ele com as verdades absolutas impostas.
Questiona-as a cada dia. E rompe, sobretudo, com as barreiras criadas historicamente pela
ciência.
A educação não é um fenômeno que ocorre somente nas salas de aula. Ela se dá em
todo o lugar, em todo o tempo, envolvendo tudo e todos. Não se trata de um processo que
independentemente traçado por cada um e edificado por todos. Fidel Castro, quando da
consolidação da revolução cubana, disse que seu objetivo era transformar Cuba em uma
pepino”. Assim, a
grande universidade. Diz o ditado popular que é “de pequenino se torce o
fazem
educação básica é imprescindível para que sejam promovidas as revoluções que se
é uma
necessárias em todas as áreas do conhecimento humano. Educar para a dependência
atitude criminosa. Educar para a libertação é o melhor caminho e o mais curto para a
tem-se que
sociedade solidária dos sonhos da humanidade. Só que, na sociedade dos sonhos,
priorizar o ter.
num processo educacional amplo é que vai conseguir libertar efetivamente os seres humanos
dos laços que unem todos a uma tradição de ensino que escraviza e humilha e que, sobretudo,
solidifica a dependência.
tem, sobretudo, um compromisso com a vida, com o desejem e com a liberdade do educando.
E terá de respeitar as regras básicas que regem a vida, os valores humanos preconizadores da
solidariedade da vida, independentemente da vontade que emana dos governantes e dos grupos
que detêm temporariamente o poder politico. O processo educacional penneia tudo e todos.
Terá de se fazer presente em toda a atividade humana que apresente o anseio sincero de
promover a libertação do homem. Sem educação não se terá liberdade. Sem liberdade não se
291
STEINER, Rudolf. Andar, falar, pensar, p. 22.
292
HOBSBAWN, Eric, Era dos extremos - o breve século XX, 1914-1991, p. 325, declara: “Tomo meus
desejos por realidade, pois acredito na realidade dos meus desejos.”
126
terá vida em plenitude. O processo educacional somente é válido quando envolve, toda a
sociedade, não se restringindo às salas de aula, aos laboratórios, aos locais artificiais onde são
busca das primeiras ferramentas produzidas pelo homem, quando passou a habitar a terra, isto
trava a luta pelo conhecimento, pela transformação da natureza, pela busca do sentido da vida.
discuti-lo, enfim, abrir novos caminhos para os homens. A sociedade é uma grande
~
universidade: ou a escola se renova em sua estrutura patriarcal, ou nao sobreviverá. Os
papel293. Souza Santos, referindo-se à
elementos ético e estético deverão receber destacado
máquinas aplicadoras das leis nos casos concretos submetidos ao Judiciário. Entretanto, não
podem ser reduzidos a meros agentes do sistema. Sobre eles impende um compromisso com a
humanidade, à medida que o Direito é uma intervenção na vida de cada um, com o objetivo de
preservação da paz. Para Horácio Wanderlei Rodrigues, o que se deve fazer, neste momento, é
serviço da justiça social efetiva.295 O grande problema é a cegueira criada pelo sistema, que
293
Ver LASTÓRIA, Luiz Antônio Calmon Nabuco. Ética, estética e cotidiano: a cultura como possibilidade
de individuação, p. 149-150.
294
SANTOS, Boaventura de Sousa.Pela mão de Alice - o social e o político na pós-modemidade, p. 223. O
autor ressalta que se a universidade não se integrar à comunidade terá curto prazo (p. 230).
295
RODRIGUES, Horácio Wanderlei. Ensino jmâico zz direito zzzrzmzzfivo, p. zoó.
127
juízes tradicionais estudam a lei e dela são escravos, enquanto os professores levam a pensar
na santidade da lei, que não passa, como já dito acima, em instrumento social da classe
cada vez mais, que o operador do direito tenha uma visão interdisciplinar e, sobretudo, ampla,
do fenômeno juridico. Impõe-se a adoção de uma hermenêutica crítica que contemple, ao lado
do direito, a moral, a política, a arte, a sociologia, enfim, a própria vida manifestada na sua
plenitude.296
Hoje, o Direito educacional deverá exsurgir, antes orientando do que punindo, como
um guia seguro da caminhada empreendida por todos os homens. É importante que se tenha
um direito voltado para o futuro e que não se preocupe tão-só com os problemas do passado.
A questão ambiental surge na pós-modernidade como saber que requer reflexão sobre o
próprio devir da humanidade. É, em verdade, muito confuso o direito do dever-ser, que não
foi, que não é e que tampouco tem o desejo de ser alguma coisa. Até porque se perdeu na sua
alucinação mental, em que não consegue vislumbrar com exatidão a divisão entre a fantasia e a
classes.298
Mas é óbvio que o problema não reside somente no ensino jurídico. A educação sofre
de um mal aparentemente incurável, porque apenas reflete a cultura das classes dominantes,
impondo-a como verdades absolutas. Não se pode admitir a existência de um processo
constituir em meio de libertação, principalmente por parte daqueles que já são oprimidos pelo
29°
FAGÚNDEZ, Paulo Roney Ávila. A crise do ensino jurídico, p. 07. Após a reflexão levada a cabo nos
diversos pronunciamentos que realizamos sobre a visão holística, acreditamos que a melhor expressão
é
transdisciplinaridade, isto é, a construção de uma nova e abrangente teoria do conhecimento.
Cf. WEIL, Pierre. Nova linguagem holística
- um guia alfabético - pontes sobre as fronteiras das ciências
fisicas, biológicas, humanas e as tradições espirituais, p. 179, “A transdisciplinaridade corrigirá os efeitos
nefastos da especialização, através de um retorno à unidade do conhecimento humano colocado em
termos
científicos por Niels Bohr.”
297
FAGÚNDEZ, Paulo Roney Ávila. A crise do ensino jurídico, p. 07.
298
Tarso Fernando Genro afirma, em artigo publicado, na Revista do Instituto dos Advogados do Rio Grande
do Sul, intitulado “Profissão e História, uma Reflexão sobre a Advocacia”, que o ensino jurídico tem se
limitado a reproduzir a ideologia da classe dominante:
Diz ele: “Na nossa atividade profissional, como advogados, como professores, como pensadores, são diversos
os pontos tangenciais, os pontos de contato, entre essa crítica possível e os fatos do cotidiano. Dentre eles
`
podemos citar:
¿.. )
- A do ensino jurídico, denunciando-o e demonstrando-o como projetor de categorias que
crítica radical
tendem a reproduzir, como ideologia jurídica, os mecanismos opressivos da sociedade de classes (ver. Roberto
Lyra Filho, Problemas atuais do ensinojurídico, Ed. Obreira, 1981). ”(p. 251).
128
para o exercício do poder. Em verdade, não é o poder do saber que se manifesta, mas o saber
pelo poder. Há o reconhecimento de uma Medicina oficial, que mata, que considera
determinadas doenças incuráveis e que trata apenas os sintomas das doençasz”. Tem-se um
Direito que quer ingenuamente resolver os problemas de convivência humanos mediante a
aplicação de sanções cada vez mais duras, criando, cada vez mais, leis, produzindo um sistema
cada vez mais caótico. A infantilidade do sistema jurídico repressivo consiste no intuito de
combater a violência mediante o emprego da violência. Violência gera mais violência. Medo
gera mais medo. Por outro lado, paz gera mais paz, amor produz mais amor. Demais, o
operador juridico desconhece - ou não quer reconhecer - o importante papel que a educação
exerce no controle das condutas humanas. O educador já não poderá ser prisioneiro da cultura
individualista do sistema capitalista. De acordo com Souza Santos, o paradigma3°° emergente é
o eco-socialista:
nos foi imposto. Tem-se uma alimentação degenerativa, tanto fisica quanto mentalmente. O
corpo individual de alimentos refinados, que o degeneram. O corpo social se decompõe pela
299Para D”ÁVlLA, Roberto Luiz. CARLIN, Volnei Ivo, org. Ética & bioética, p. 155, a par de todo o avanço
científico, o profissional da saúde perdeu a sensibilidade.
3°°
Conforme MORIN, Edgar. Para sair do século XX, p. 76, “É um princípio de distinições/ligações/oposições
fundamentais entre algumas noções mestras que comandam e controlam o pensamento, isto é, a constituição
das teorias e a produção dos discursos. Assim, se abordannos a relação fundamental natureza-cultura ou
animal/homem, há um paradigma de conjimção que situa a cultura na natureza e insere a humanidade na
animalidade, e todos os diversos discursos produzidos a partir desse paradigma se esforçarão para reconhecer a
ligação entre o humano e o natural.”
301
SANTOS, Boaventura Souza. Pela mão de Alice o social e o político na pós-modemidade,
: p. 336.
129
confonne Sousa Santos (1996, p. 336), que vê a multiplicidade de correntes e tendências que
Por que será que foi deixada a questão do gênero em segundo plano sempre que se
analisa o progresso da ciência?3°4 Ou será que se quer uma ciência reprodutora da dominação
população vive (e isso decorrente da educação que é imposta) sob a égide dos discernimentos
mecânico e sensitivo.
conceitos de par e ímpar, mais e menos, forte e fraco, álcali e ácido etc; o juízo
positivo e negativo no plano físico. É
realmente muito grande o número de pessoas
que vive sob os moldes do discemimento mecânico.
da ciência. Tudo se quer ver, ouvir, sentir. Nada existe além do mundo concreto, analisado
pelos sentidos. O ser humano é preparado, na escola, para dar respostas às perguntas
apresentadas. Deverão estar as soluções nas cartilhas. A vida não é simples e nem pode ser
~A
É importante que se tenha consciencia do jogo, de suas regras e, fundamentalmente,
do paradoxo nele inserido. Não se alcançará uma hennenêutica de integridade se não se tiver a
excessivamente simplificada. Hoje se requer do jurista o conhecimento da lei. Não mais do que
isso. E à sua frente, cada vez mais, surgem questões dificeis. Como resolver os problemas?
médicos etc.3'°
porque a sua formação tecnicista não lhe proporcionou o arsenal necessário para a solução de
novos e intrincados problemas humanos. Em síntese, pode-se afinnar que educar é libertar. E
3°°
Jdzm, z1›¡z1‹z››z,p. 69.
3°?
Idem, ibidem, p. 70.
308
FAGÚNDEZ, Paulo Roney Ávila. O direito e a hipercomplexidade, 1999.
309
COSTA, Mário Allgayer. Mnhas experiências através da macrobiótica, p. 70.
131
apresentar caminhos, para que o educando possa livremente escolhê-los. O educador que se
reconhece limitado é mais honesto do que auele que se julga dono de todo o saber.
“Por outro lado, quero rebater a idéia de que a escola deve ensinar
diretamente o conhecimento especial e as habilidades que a pessoa terá de usar mais
tarde diretamente na vida. As exigências da vida são demasiado multiƒormes para
que esse aprendizado específico na escola pareça possível. Ademais, parece-me
censurável tratar o indivíduo como ferramenta inanimada. A escola deve ter sempre
como finalídade que o jovem a deixe com uma personalidade harmoniosa, não como
um especialista. "31 1
verdade, sem as fronteiras traçadas indevidamente pela ciência. O professor, como conselheiro,
terá a incumbência apenas de apontar caminhos. Jamais poderá determiná-los. Caso contrário,
deixará se ser educador. O ensino é, como se viu, apenas transmissão do saber imposto.O
conhecimento, tem que buscar a solução mais justa para o problema que lhe é apresentado. A
educação verdadeira - e que efetivamente liberta - não deve reconhecer as fronteiras do saber.
Terá de contribuir para o despertar do homem, para a construção do saber integral, íntegro,
ético. A educação não acaba nunca. É algo ligado à própria dinâmica da vida. Não existe para
ela regras absolutas. O processo educacional é, na verdade, um grande projeto que une a todos
os homens.
Para superar o autoritarismo científico precisa-se libertar primeiramente o educador
das amarras do sistema. A educação verdadeira não tem lugar nem momento adequado. Cada
célula necessita de vida. Cada elemento precisa de informação, para que a grande cadeia da
vida seja possível. Através da educação haver-se-á de construir a liberdade verdadeira, que
nascerá de um e que se materializará em todos. Todos fazem parte do mesmo corpo político.
decisivamente para a manutenção das coisas como estão. E assim a educação não produz
qualquer mudança.
“Por exemplo, os próprios pais e educadores estão ensinando e comendo
coisas injustas, dizendo que são justas. Cada um comendo
injustamente. Estão
completamente condicionados, sob o controle da sociedade de consumo. Esses
educadores são insensíveis à justiça social, à verdadeira moral cívica e humana,
já
perderam a condição para ensinar os jovens e as crianças. Porém, mesmo sem
capacidade para ensinar, porque a situação geral não está oferecendo condições
de
entendimento, o educador deve reconhecer a sua própria carência. Um
dia irá
encontrar a oportunidade que o obrigará, necessariamente, a transformar
o seu
próprio pensamento. Se ele não acordar e não enxergar essa realidade injusta, não
haverá a verdadeira educação de que nossa sociedade necessita, prejudicando
com
”3 13
isso os nossos jovens.
Se apenas se estiver preparando o ser egoísta, é claro que a violência continuará, eis
preocupação com
que assim são negras as perspectivas para o futuro. Se, entretanto, houver a
construção de um ser solidário dentro de um sistema educacional aberto
e livre, ter-se-á
a
violentamente.
“O homem alternância entre o crescimento e a
superior está atento à
redução, entre o pleno e o vazio; pois este é o curso do céu.
'
humanos.
Paulo Freire destaca que ensinar exige ética e estética.
313
Idem, ibidem.
3" WILHELM, Richard. I ching - o livro das mutações, p. 373.
315
Ver FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão, p. 11/12. A tortura continua como método
para obtenção de confissãos em delegacias de polícia.
133
sistema jurídico se aperfeiçoe, se abra para a vida e contemple os princípios que regem as leis
Félix Guattari
`
“A tua não é a lei dos deuses; apenas o capricho ocasional do homem. Não
lei
acredito que tua proclamação tenha tal força que possa substituir- as leis não
escritas dos costumes e dos estatutos infalíveis dos deuses. Porque essas não são
315
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia - saberes necessários à prática educativa, p.36.
3" WEIL, Pierre “et alii”. A/fistica e ciência - psicologia transpessoal, p. 12-3, añrma que “O estudo dos
estados ditos “anormais” em psicologia tem muito que dizer no que se refere à consciência cósmica.”
134
leisde hoje, nem de ontem, mas de todos os tempos: ninguém sabe quando
apareceram. Não, eu não iria arriscar o castigo dos deuses para satisfazer o
orgulho de um pobre rei.”
Antígona - Sófocles
Lao-Tzu
O que o holismo tem a ver com o jusnaturalismo?318 Trata-se de uma pergunta dificil,
mas cuja resposta, “a princípio”, se apresenta negativa. Convém sempre insistir que as
perguntas são mais importantes que as respostas. Os grandes equívocos nascem de questões
mal formuladas.
“Embora a idéia de direito natural remonteà época clássica, e não
tenha cessado de viver durante a Idade Média, a verdade que quando se ƒala de
(§¬
318
FASSÓ, Guido. Historia de la filosofia del derecho, p. 34-5, afirma que, no século V. a. C trata-se pela
primeira vez no direito natural, que assum três vertentes principais: “Uma é a teoria da lei justa, absolutamente
válida, superior às leis positivas, humanas, porque está ditada por uma vontade superior à humana, como
é o
caso das divinas, “leis não-escritas” de Antígona de Sófocles, e que podemos denominar jusnaturalismo
voluntarístico. Uma Segunda é a que contempla a lei da natureza como um instinto comum a todos os
animais, como sustentava Cálicles no Giórgias platônico (iusnaturalismo naturalístico). A terceira é a lei ditada
anos antes do Discours de la méthode de Descartes. Mas não tem uma data de
encerramento igualmente clara, ainda que não haja dúvidas sobre os eventos que
assinalaram o seu jim: a criação das grandes codificações, especialmente a
napoleônica, que puseram as bases para o renascimento de uma atitude de maior
reverência em face das leis estabelecidas e, por conseguinte, daquele modo de
conceber o trabalho do jurista e a junção da ciência jurídica que toma o nome de
"31 9
positivismo jurídico.
A visão de integridade não se confimde com o jusnaturalismo, seja ele teológico, seja
32°
racional. Trata-se da reconciliação entre todos as propostas apresentadas historicamente,
ordenação, de limpeza, de saúde e de autodisciplina. A ética, que foi afastada do Direito com o
passar dos anos, é retomada hoje. Seu papel é imprescindível para o êxito do Direito enquanto
319
BOBBIO, Norberto et alii. Sociedade e estado na filosofia politica modema, p. 13.
32°Escreve TELLES JUNIOR, Goffredo. O direito quântico - ensaio sobre 0 fundamento da ordem jurídica, p.
280-1: “Não que o Direito natural seja o conjunto dos primeiros e imutáveis princípios da moralidade.
se pense
Não queremos discutir sobre a existencia de tais princípios. Mas o que desejamos deixar assentado é que esses
princípios não são normas jurídicas e, em consequência não podem ser chamados de Direito. (...) Um Direito
natural é sempre o Direito positivo de uma sociedade. Mas nem todo direito positivo pode ser chamado de
Direito natural. Natural, só o é o Direito positivo que for consonante o sitema ético de referência, em que ele
vigora. É o Direito que se opõe ao Direito artificial. Todos os Direitos Objetivos que forem consonantes com
seus respectivos sistemas éticos de referencia são Direitos naturais.”
321
Para ROCHA, Leonel Severo. A problemática jurídica: uma introdução transdisciplinar, p. 46,
“O
jusnaturalismo foi quem elaborou em seu ideal de ciência a fundamentação categorial dualista. Os dualismos
são representações simbólicas jusnaturalistas. As representações jurídicas que procuram dar ao direito o seu
estatuto lógico de sistematicidade, em uma contradição com o seu método positivista, apropriaram
acriticamente estas categorias. Desta maneira, tanto a dogmática jurídica, como o jusnatmalismo, embora
ambos o neguem, possuem latentemente o mesmo marco teórico. Daí, se poder dizer que 0 jusnaturalismo e o
positivismo juridico, principais concepções jurídicas, são duas faces complementares de um
mesmo saber.”
136
último momento mas, assim que a decisão é tomada, executa o que foi combinado.
Espera-se que uma pessoa em avançado estágio de autodisciplina esteja sempre
tomando iniciativas para o autodesenvolvimento, o desenvolvimento do seu grupo e
da organização a que pertence, exercendo plenamente o seu potencial mental. É
óbvio que a autodisciplina representa o coroamento dos esforços persistentes de
educação e treinamento que levam em consideração a complexidade do ser
"92
humano.
momento, ser defensor dos interesses dos grupos detentores do poder econômico. Seria esse,
está mais em sintonia com os anseios da grande maioria da população, muito embora a
felicidade de todos. Quer-se ter controle sobre tudo e sobre todosm. Uma pergunta se impõe:
por que manipular geneticamente os elementos da vida? É porque, dotado de pensamento, o
homem acredita que tudo pode ser diferente da ordenação criada pela natureza. Em realidade,
as leis da natureza são implacáveis. Tem-se que conhecê-las.
“Apontando para os bens soberanos, a inteligência incorporou à
natureza do sêr humano o sentimento de dever, ou seja, o sentimento de que o
homem se deve comportar de acordo com determinados ideais, que são os bens de
sua perfeição, dentro da ordem ou categoria atingida pelo sêr humano, no longo
processo da evolução.
Fundada numa constelação de bens soberanos, que lhe serve de sistema
de referência, a inteligencia formula juízos de dever.
Os juízos de dever não são juízos sobre o valor das cousas, mas juízos
sobre como deve o homem agir para que seu comportamento se harmonize com
bens que foram objeto de juízos de valor (..)
Os juízos de dever são mandamentos para o comportamento humano,
de que constituem exemplos os seguintes: Se causar prejuízo ilícito, deves reparar o
dano”, 'Se encontrares cousa perdida, deves restituí-la ao dono 'Primeiro, fazer
',
322
s1LvA, Jaâa ivramns a ambiente da qaa1zaaâe,p. 16.
ae. se;
A e a galinha - uma metáfiira da condição humana, p. 72,
“A ciência
323Para BOFF, Leonardo. águia
moderna, nascida com Newton, Copérnico e Galileu Galilei, não soube o que fazer com a complexidade.
A
estratégia foi reduzir o complexo ao simples.”
137
'Conhece-
orgulhes com a douta ƒilosofia 'Não te aferres a teu proprio parecer “'94
',
te
',
os seres humanos fossem iguais. Cada ser é diferente. Cada homem tem os seus sonhos. Cada
indivíduo vê a vida de uma maneira diversa. Cada pessoa adota uma postura diante da vida, e
traça o seu próprio regramento. As normas éticas nascem dentro de cada um, embora
condicionadas a fatores políticos culturais. Existe uma ordem geral ética, que sobrevive
estatal vigente.”
“O termo etico, provindo do grego e o termo moral, provindo do
(êthê),
latim (mores), designam os usos e costumes, ou seja, os modos e maneiras
com que o
homem se comporta. Nas referidas expressões ordenação etica e ordenação moral,
tais termos são adjetivos, qualificando uma espécie certa de ordenação.
De fato, a ordenação etica ou moral é a ordenação composta de juízos
de dever. Isto significa que essa ordenação é feita de mandamentos para o
comportamento humano, em razão de um conjunto de anteriores juízos de valor.
Do que acabamos de explicar, infere-se que uma ordenação etica resulta
do encontro das faculdades da inteligencia com os fatos reais da vida.
Os fatos reais da vida, por mais que se repitam, jamais gerarão, por si
sós, imperativos para o comportamento humano. Jamais
redundarão em juízos de
dever, representações mentais do que deve ser feito.
O que é não constitui razão suficiente do que deve ser.
O que é póde ser o contrario do que deve ser. Por exemplo, o crime póde
ser praticado continuadamenie, como meio de vida, mas não é o que
deve ser
praticado como meio de vida. O ser não gera o dever-ser.
Por outro lado, a sem os fatos reais da vida é uma energia
inteligencia
desaplicada, uma faculdade ordenadora sem materia para ordenar, pura
potencia
sem ocasião de fazer ato.
A ordenação ética surge de uma complexa operação, pela qual a
inteligencia confronta os fatos reais da vida com uma
'tabua' ideal do que deve ser
núcleo familiar. Socialmente, recebe uma carga de um sistema axiológico de referência que,
”5BoRNHE1M, Gera. sujofro o oormo, p. 247, zfima que “o múvomal absnoio quo aofine toda fommlaçâo do
divina.” Para o
“dever-ser'da norma encontra o seu respaldo no universal concreto que é a própria realidade
universal”. (p. 247).
autor, “toda norma pretende instituir-se enquanto exigência
326
TELLES JUNIOR, Goffroao. Eâoo z do mundo do oézuzo oo mundo do ouuuro, p. 223-9.
138
embora não seja detenninante, exerce uma grande influência em sua vida. A partir desses
elementos, ele constrói o seu juízo de dever, passa a assumir um compromisso perante todos.
Quando há uma grande artificialidade na estrutura política montada, há uma tendência maior à
num valor de suma importância para a convivência harmônica dos povos. Todavia, trata-se de
um valor relativo, que não pode afrontar cada ser em sua individualidade, em seus sonhos, em
sua própria vida. A questão ontológica apresenta-se central hoje, mais do que nunca. Precisam
ser retiradas as camadas que foram colocadas sobre o ser e que o desvirtuaram. Qual e'
a
essência do ser? Ela reside na busca da identidade perdida e, sobretudo, na construção de uma
nova identidade, resultante das experiências que lhe foram impostas historicamente. Não se
trata de promover uma involução em 'todo o processo histórico. Mas,
acima de tudo, de
reconhecer o poder que reside em cada ser e na divindade que habita cada ente da natureza,
os animais, as plantas, enfim, todosos elementos da natureza, porque, sem eles, não há vida,
compreensão da rede que envolve tudo e todos. Todos os seres estão ligados por um fio
invisível que guia e, ao mesmo tempo, pemiite que se tenha a
possibilidade de traçar os rumos
da grande viagem dos homens em busca de seus sonhos. O direito natural, 'de conteúdo ético,
está mais em consonância com o que almejam hoje os operadores jurídicos, que vão ao
Conforme SANTO AGOSTINHO. Confissões, p. 89, “verbis”:. “Ignorava que a verdadeira justiça
327 interior,
formam-se os costumes das
que não julga pelo costume, mas pela lei retíssima de Deus Onipotente. Segundo ela
nações e dos tempos, consoante as nações e os tempos, permanecendo ela sempre a
mesma em toda a parte, sem
em pode-se afinnar, um
se distinguir em essência Há,
ou nas modalidades, qualquer lugar.” indiscutivelmente,
elo de ligação entre a justiça dos homens e a Justiça de Deus, considerada
imutável pelos teístas.
328
RODRIGUES, Horácio Wanderlei. Ensino jurídico e direito altemativo, p. 121.
139
subjetividade que estimule a criatividade e contribua para a promoção da Justiça, mesmo que o
sistema indique um caminho diametralmente oposto.
luz dos princípios maiores que regem o Direito e que deverão ser preservados para que se
~
Se nao são respeitados os princípios constitucionais, verdadeiros alicerces do sistema,
qual a credibilidade que goza 0 sistema jurídico diante da população? Há uma indiscutível
desconfiança de sua atuação. Os inimigos das classes dominantes são aqueles que efetivamente
sofrem, na seara penal, com os rigores da lei. Basta a leitura do censo penitenciário. Os fracos
são brutalmente atingidos pelo govemo da lei,333 enquanto os fortes fazem uso dos
alimentação fisica, mental e cultural. Isso tudo gera uma crise existencial sem precedentes, que
331
FREITAS, Juarez. Da substancial inconstucionalidade da lei injusta, p. 107.
332
Idem, ibidem.
333
CHOMSKY, Noam. Novas e velhas ordens mundiais.
141
mais está minado de religiosidade, muito embora possua naturalmente um conteúdo místico. É
no conteúdo ético que reside o papel importante do jusnaturalismo, mesmo no Direito estatal.
O Direito não pode ser apenas instrumento de pressão contra as reivindicações sociais. O
Direito, que prende e mata, presta um desserviço à nação. O que ele quer é manter o controle
da sociedade, a qualquer custo. Só que a educação é fundamental para que haja um equilíbrio
relativo nas relações humanas. A harmonia deve nascer de um processo educacional
permanente, que envolva toda a sociedade e que permita discutir todas as correntes de opinião.
natureza e às suas leis. Há um Direito artificial e, ao lado dele, um Direito natural, que nunca
deixou de existir, haja vista que é regido por princípios perenes, profundamente estudados
pelos orientais e, em alguns momentos, esquecidos pelos ocidentais. A grande revolução, sem
dúvida, ocorreu com o advento da teoria dos quanta de Max Planck e da teoria da relatividade
de Einstein. Também Kelsen, citando Planck, também faz alusão à visão lançada sobre os
O mesmo vale dizer das duas construções jurídicas das relações entre
Direito internacional e Direito estadual. A sua oposição baseia-se na diferença de
dois sistemas de referência diversos. Um está solidamente vinculado com a ordem
jurídica do nosso próprio Estado, o outro com a ordem jurídica internacional. Os
”334
dois sistemas são igualmente corretos e igualmente justiƒicados.
se-á, ao invés, mais violência. Com os valores. do capitalismo, não chegará à paz.
Diz Creonte, “verbis”:
“Os homens não inventaram nada mais nefasto do que os dinheiro.
Corrompe as cidades, destrói os lares, mina as almas mais honestas, levando-as a
.
atos cruéis ou vergonhosos, ensina perfídía ao mais ingênuo e conduz até 0 santo ao
sacrilégio.”336
O novo Direito deverá estar voltado para valores mais humanos, defensores da
resgatará os marginalizados.
“O custo, emtermos de depredação do mundo físico, desse estilo de vida
é de tal forma elevado que toda tentativa de generalízá-lo levaria ínexoravelmente
ao colapso de toda uma civilização, pondo em risco a sobrevivência da espécie
-
humana. Temos assim a prova cabal de que o desenvolvimento econômico a idéia
de que os povos pobres podem algum dia desfrutar das formas de vida dos atuais
povos ricos - é simplesmente irrealizável.”337
solidária que se quer erguer e violenta o direito- natural, essencialmente ético e de cunho
holístico.338
335
Para WEIL, Pierre, Sementes para um nova era - um livro de emergência para uma situação de
emergência, p. 74, deve ser empregada uma pedagogia voltada para o desarmamento. O profissional do Direito
também deverá ser preparado para a paz e não para a lide, para o conflito. Ver também WEIL, Pierre. A arte
de viver em paz -para uma nova consciência e educação.
336
sÓFocLEs. Anzígona, p. 17.
'
337
FURTADO, Celso. 0 mito do desenvolvimento econômico, p. 88-9.
338
Conforme TELLES JUNIOR, Goffredo. 0 direito quântico, p. 285, “o Direito é a ordenação quântica das
sociedades humanas.”
143
`
povo, num momento de sua história.339 Uma crise grave exige um esforço maior para a sua
superação. A crise menos grave não requer maior atuação por parte da pessoa para a sua
resolução.34° A doutrina afirma, quase que unanimemente, que se vive uma crise sem
precedentes na história da humanidade. Os problemas sociais. se agravam a cada dia. Os
empecilhos politicos que surgem parecem intransponíveis. Os modelos preexistentes são
sociedade. A própria Sociologia parece perplexa diante das profundas transfonnações que
ocorrem diutumamente. O grande avanço tecnológico não teria sido previsto num curto
espaço de tempo. A filosofia dá a impressão de estar distante da realidade. A arte, nem se fala,
sempre esteve divorciada da vida, segundo os tradicionalistas, quando a estética é crucial para
3”Para MORIN, Edgar, Para sair do século XX, p. 317, “Ao primeiro olhar, a crise manifesta-se não só como
fratura numa continuidade, perturbação mnn sistema até então aparentemente estável, mas também com o
amnento das possibilidades e, portanto, das incertezas. Manifesta-se pela transformação das
complementaridades em. antagonismos, pelo desenvolvimento rápido dos desvios em tendências, pela
aceleração dos processos desestruturantes/desintegrantes (feedback positivos), pela quebra das regras, pela
que tendem a se auto-amplificar por si mesmos ou a se chocar
explosão, portanto, de processos descontrolados
violentamente com outros processos antagônicos também descontrolados.”
34°
EPSTEIN, Isaac. Revoluções ciennficas, p. 103-4. Diz ele: “O que é, afinal, a crise? Krisis significava, na
evolução de um processo incerto, o momento da decisão. Essa decisão (assim entendida) equivale a
um grau
de indeterminação no processo referido. No caso das revoluções cientificas, a decisão ocorre na opção entre 0
velho e o novo paradigma: o velho saturado de anomalias já mal absorvidas e que introduzem contradições na
articulação de suas premissas; o novo, que já deve estar disponível, para que possa haver a decisão referida,
científico num imenso lamaçal. Contudo, a partir das experiências mal sucedidas, 0
A solidariedade deve ser buscada sempre. Ademais, a solidariedade é valor que deverá
estar presente em tudo e em todos. É natural, faz parte da vida, e não se constitui em meta
apenas dos socialistas, muito embora os marxistas tenham contribuído historicamente para
despertar os homens para a fraternidade, que se faz necessária para que se tenha uma vida
melhor, mais feliz. Devem os seres humanos tratar os outros como gostariam de ser tratados.
34'
GUATTAR1, Fé1i×.As zrês ecoiogfas, p. 7.
342
WEIL, Pierre. Organizações e tecnologias para o terceiro milênio: a nova cultura organizacional holística,
p. 17.
146
em breve se terá o fim
Se a individualidade defendida pelos neoliberaism permanecer,
da humanidade e dos seus sonhos. Não podem as pessoas viver como se fossem eternas. E nem
podem viver isoladas dos demais seres. Se assim procederem, promoverão a infelicidade delas
e a dos outros homens. A crise é promotora de ruptura, bem como de uma profunda reflexão a
respeito dos problemas que se fazem presentes em determinado momento histórico. Triste da
ciência que não vive em permanente crise. É a partir dela que se edifica o conhecimento.
Quanto mais provisório o resultado, mais consciência se tem da fragilidade dos métodos por
ela empregados. Quanto mais avança a ciência, mais problemas novos surgem, desafiando os
seus métodos e buscando soluções urgentes, sob pena de perda de sua credibilidade. Veja-se a
Há uma permanente busca da essência do ser. A crise, seja ela individual ou coletiva,
leva necessariamente à reflexão. Tem-se de buscar permanentemente as respostas, aí, sim,
como se os seres humanos fossem eternos. Precisa-se repensar com urgência os problemas que
estão aí, exigindo solução. Os modelos históricos não comportam toda a riqueza da vida, na
sua complexidade e transformação permanente. José Alcebiades de Oliveira Júnior acredita que
345
MENEGI-IE”I'l'I, Antonio. 0
nascimento do eu, p. 94.
346
OLIVEIRA JUNIOR, José Alcebiades de. Cidadania coletiva. - organizado por José Alcebiades de Oliveira
Júnior e José Rubens Morato Leite, p. 16-7.
148
Entretanto, ela coloca-se diante de todos como um grande desafio com capacidade de gerar o
aperfeiçoamento do ser, bem como o seu crescimento. Cada crise que surge na história
inaugura nova etapa, trazendo à baila novos questionamentos e rupturas. Não há nenhum
momento igual ao outro. A crise é grave? É. É superável? Depende da compreensão que se
tiver dela. Depende da capacidade que se tiver de transformá-la. A dificuldade pode ser
aniquilamento dos anseios humanos. Não há problema sem solução. Não há vida sem morte.
Não há início sem fim. E não há fim sem recomeço. A vida vai e vem permanentemente. As
ondas do mar vão e vêm. Nada consegue contê-las. Se se contiver o curso natural das águas,
estão todos sujeitos a uma grande catástrofe.
@or que se tem uma crise geral? Porque todos os problemas estão inter-relacionados.
Não existe uma problema isolado. Ele convive com os demais, exerce uma influência em
relação a todos> Os ocidentais, tradicionalmente, fragmentam os elementos da vida. Lança-se
um olhar parcial sobre as coisas. Busca-se o medicamento adequado para a doença. Considera-
porém não se vai ao encontro de suas raízes. Engana-se o investigador que desconhece o
3" Ver MORIN,Edgar. Para sair do século XX, p. 351. “O problema da violência “louca” é inseparável da
própria nanueza de homo sapiens/demens, mas age verdadeiramente na era histórica, que é a era dos Estados e
das guerras, com massacres enormes, sevícias cruéis, torturas insensatas que superam qualquer alcance
estratégico.”
348
KIKUCI-II, Tomio. Simultaneidade temária - proporção sensibilizadora da transformação unipotente , p.
27.
149
emaranhado em que estão todos inseridos. Há uma unidade do universo, que se manifesta nas
A visão oriental contém uma distinta percepção da vida. Os ocidentais querem traçar
com precisão a fronteira entre o bem e o mal, Deus e o Diabo, a verdade e a mentira, como se
isso fosse possível. Nada é absolutamente mau ou bom. Os valores são relativos. Só exsurge
tem dois braços (“yin” e “yang”),
como absoluto o Princípio Único Universal, que
científico deixou marcas. Mas há hoje, mais do que nunca, a necessidade de humanização do
34”
CAPRA, Fmjof. o um zzzzfisâczz, p. zó.
35°
Ver KIKUCI-11, Tomio. Inyologia - guia do princípio único, p. 25.
Para BOFF, Leonardo, 0 despertar da águia - o dia-bólico e o sim-bólico na construção da
351 realidade, p.
nascer dentro de cada pessoa. Por que surge a crise? Ela surge para ser superada. Nasce para
~
ensinar uma lição a todos.Quem não aprende, sucumbe. Quem nao desperta permanece no
sono eterno dos indiferentes. E mais tarde deverá despertar, senão mais uma vez será levado
pela onda.
“A visão do mundo orgânica, “ecológica das filosofias orientais é, sem
',
dúvida alguma, uma das principais razões para a imensa popularidade que
adquiriram em nossos dias, no Ocidente, especialmente entre os jovens. Em nossa
cultura ocidental, ainda dominada pela visão mecanicista e fragmentada do mundo,
um crescente número de indivíduos começa a se aperceber do fato de que essa visão
constitui a razão subjacente da ampla insatisfação reinante em nossa sociedade.
Assim, muitos têm se voltado para as formas orientais de libertação. É interessante -
- e talvez não muito surpreendente - que aqueles que se sentem atraídos pelo
ciência ocidental, tão carente de valores e tão divorciada da realidade. Se ela saísse do mundo
de fantasia por ela própria criada, teria condições de vislumbrar, na totalidade, o edificio falso
construído. Não se tem uma crise coletiva e uma crise individual, que não se confundem. Elas
estão integradas, interconectadas, fazendo parte de uma única realidade. A crise política
oportunidades de crescimento. Por que se adoece? A doença visa a nossa destruição fisica, ou
serve como lição para que tenha uma nova vida em plenitude? Como os religiosos conseguem
explicar isso? Será a doença uma punição pelo pecado cometido? Será que Deus é tão mau
assim, que não compreende os homens, advertindo-os severamente? Não será a doença o outro
lado da moeda? É possível a existência de saúde sem a doença? É possível a existência de
doença sem a saúde? Há saúde absoluta? A violência pode ser contida definitivamente? A
resposta é um sonoro não. A saúde sempre é relativa, como a paz. A maioria da população
vive num terceiro estado, entre a saúde e a doença, entre a alegria e a tristeza, a riqueza e a
porque a tristeza está do outro lado. A felicidade, se permanente, se tomaria enfadonha. Não
se valoriza a felicidade sem a tristeza. Sem dúvida, a crise não é o fim do caminho. Poderá
constituir-se no princípio de uma caminhada frutífera. Não há crescimento individual sem uma
grande dificuldade. Nenhum país conseguiu se fortalecer como nação sem um grande
obstáculo. Nenhum homem consegue crescer sem grandes dificuldades pessoais. São elas,
não se preocupa em ser ciência, em agir como ela, em traçar previamente os caminhos para as
descobertas. A violência, que gera crise no sistema jurídico, faz parte dele. Demais, o sistema
jurídico não seria edificado sem que ela existisse. Se o médico eliminar a doença, perderá o
Tao vê a história como uma jogo dialético e complementar de dois princípios: yin e yang. São forças que atuam
em todos os fenômenos.”
355
AGUIAR, Roberto A R A crise da advocacia no Brasil, p. 17.
355
Conforme ROCHA, Leonel Severo. Direito, complexidade e risco, p. 12.
152
Continuará a luta contra a violência, mas ela continuará ligada intrinsecamente à vida
mau.358 O
social, como elemento que faz parte dela. Cada individuo é paradoxahnente bom e
homem faminto agride em busca do alimento. O homem violentado pelo sistema reage, vale
dizer, se toma agressivo contra tudo e contra todos. A violência e a paz conviverão pelos
séculos,como os dois lados da mesma moeda, trazendo lições importantes. As dificuldades são
estimuladoras da criatividade. As nações, como as pessoas, somente crescem quando
enfrentam grandes dificuldades. A Alemanha se tomou uma potência após ter sido seriamente
atingida na segunda grande guerra mundial. Diante do problema só há dois caminhos: ou se
vence ou se sucumbe.
Precisam ser vistas as múltiplas causas que são responsáveis pelo desencadeamento
dos fenômenos. Somente assim se terá um retrato mais fiel da vida. Todo o sofiimento não
será em vão se o homem retirar dele a lição. O momento é de repensar a respeito de todo o
conhecimento. Está-se diante do fim dos dogmas? Certamente sim. Até mesmo do marxismo,
que é uma doutrina revolucionária, preconizadora do determinismo histórico, e que contribui
Felizmente, a crise atinge a todos. A grande crise estimula, levando os seres humanos
à reflexão. Não são eliminados os sonhos. Eles estão presentes nas vidas das pessoas. É deles
158.
358Para KRISHNAMURTI, Viagem por um mar desconhecido, p. 100, a desordem interna se reflete no
Jiddu,
exterior de cada ser humano, assim como o caos externo se interioriza na pessoa.
Há “um movimento único, um
movimento unitário - exterior e interior.”
359
KONDER, Leandro. O futuro da filosofia da práxis - o pensamento de Marx no século )O(I, p. 133.
153
distante da
utopias. A sociedade solidária, diagnosticada pela Mecânica Quântica, parece
arquitetar uma nova forma de dominação. Será isso possível numa sociedade globalizada,
como o ideal não existe sem o real. Bendita a crise que estimula, que leva à reflexão a respeito
Não há uma proposta suficientemente forte para resolver os graves problemas que
atingem o Direito, porém, com certeza, todas elas permitem uma visão do complexo fenômeno
da vida. A crise existe em todas as sociedades, sejam elas desenvolvidas, hiperdesenvolvidas
ou em desenvolvimento. ç
36°
MoR1N, Egzr. Para sair ao Século xx; p. 322-3.
154
soluções dos problemas que o afligem) Com a crise da humanidade ocorre exatamente a
mesma coisa, vale dizer, a partir dela surge a necessidade de desconstrução, de ruptura e de
edificação de uma nova “ordem”. Só que nessa ordem se insere a desordem e se integra o
351
Conforme PATRÍCIO, Zuleica Maria. Qualidade de vida do trabalhador - uma abordagem qualitativa do
ser humano através de novos paradigmas, p. 28.
155
O holismo não consiste numa visão mística do mundo. Porém, não descarta o olhar
sagrados, de seus discípulos, sofrendo distorções nas interpretações que foram levadas a cabo
Idem, ibidem, p. 20”-1. A autora fala sobre o novo paradigma, “verbis”: “Temos como referencial a visão e
362
a abordagem transdisciplinar das dinâmicas transpessoal e transcultural dos indivíduos em diferentes contextos.
Integra concepções da ciência, tradição, filosofia e arte, traduzindo-se num movimento de reconstrução pessoal-
profissional. É um método voltado às questões de bioética, mas a partir de uma visão sistêmica, porquanto
considera a individualidade humana na complexidade de suas múltiplas interações naturais e sociais, no caldo
de cultura e sentimentos. Busca analisar, refletir e fazer sínteses sobre os fenômenos humanos, num dado
contexto, para conhecer e compreender o sujeito, em seus valores, desejos e suas crenças, seus mitos e
conhecimentos, suas emoções de prazer e de dor e as práticas que expressam sua linguagem particular e
coletiva. E, especificamente, esse método busca identificar possibilidades e limites, individuais e coletivos, de
viver saudável, de ter a qualidade de vida de vontade e de direito.(Patrício, 1995).” Mais adiante, a autora, à p.
26, faz a advertência: “Mesmo que nem todos os cientistas estejam convencidos da necessidade de um diálogo
com as religiões ou as sabedorias ancestrais, nenhum deles dissimula a responsabilidade política e social que
lhes inciunbe. Entretanto, suponho que o fato de a ciência se aproximar da desordem, não a predisponha ao
cinismo, ou, pior, ao ativismo desordenado. (Pessis-Pasternak, 1993).”
363
Ver EPSTEIN, Isaac. Revoluções científicas, p. 36. Será possível a existência de uma unidade da ciência? O
autor responde esta questão, citando Camap (1983, p. 413):
“A questão da unidade da ciência significa aqui um
problema de lógica da ciência e não de ontologia. Não perguntamos: “É o mundo um só?” “São todos os eventos
fundamentalmente de um só tipo?° “São os processos mentais realmente processos fisicos ou não?° “São os
processos físicos realmente espirituais ou não'?° Parece duvidoso que possamos achar qualquer conteúdo teórico
em discussões filosóficas como as propostas pelo monismo, dualismo e pluralismo. Emtodo caso, quando
perguntamos se há unidade na ciência, queremos dizer que esta é uma questão de lógica que concerne às
relações lógicas entre os termos e as leis dos vários setores da ciência. Desde que concerne à lógica da ciência, a
questão diz respeito também aos cientistas quanto aos lógicos.”
364
CAPRA, O tao da física. p. 40.
156
comunica com os colegas. É por seu intermédio, também, que recebe instruções de
3 65
seus superiores. A linguagem é instrumento essencial das relações humanas.
A linguagem pode ser empregada para mentir ou iludir. Ou para expressar verdades.
Dificil estabelecer, contudo, as fronteiras que separam a verdade da mentira. O observador
expressa a sua visão de mundo. Sempre parcial. O Direito ainda hoje preserva a linguagem e
toda uma ritualística proveniente da religiosidade que estava sempre ao lado do poder, ora
tem-se notícia do poder divino sobrenatural. Somente num segundo momento é que se edificou
o princípio da soberania popular. Desde o princípio existem normas disciplinando a vida em
sociedade. É verdadeiro o brocardo segundo o qual onde está a sociedade está o Direito, onde
está 0 Direito está a sociedade. É um fenômeno naturalmente inserido no contexto social.
Nasceu, ademais, dentro do próprio ser, como manifestação ética e também de sua
religiosidade intrínseca. Existem pessoas, ainda hoje, que não atingem os direitos do outro, não
porque isso esteja previsto numa nonna jurídica, mas porque está nas sagradas escrituras.
O Direito é composto por normas que emanam do Estado, mas verifica-se, muitas
Tem-se que afastar do Direito a poção mágica. Porém, haver-se-á de reconhecer que
as diversas religiões contribuem (e contribuíram historicamente) com o Direito para o controle
das condutas humanas. A ciência busca explicações para os fenômenos humanos. As diferentes
religiões também querem respostas. Todas elas, contudo, mostram uma visão parcial, uma
explicação relativa. A fé irracional é absurda. O Direito esteve sempre ligado à vida, em todas
as suas manifestações. O misticismo é apenas um aspecto, porém é imprescindível para a
compreensão da vida. Traduz o mistério que habita cada ser. O olhar místico é profundo: não
355
WEIL, Pierre. Relações humanas na família e no trabalho, p. 57.
aõõ
REIS, Sérgio Neeser Nogueira. Uma visão holística do direito, p. 43.
157
interior da
busca estabelecer relações de causalidade e almeja, sobretudo, a navegação pelo
pessoa. O Direito, a par de ser instrumento artificial de controle da sociedade,
nasceu da
estabelecer limites à ação individual. Assim como a Física Quântica revolucionou a Fisica
Natural.
O Direito Natural, de que se trata, carrega no seu bojo as leis da vida. Que leis são
essas? São aquelas tradicionalmente ensinadas pelos sábios e que os orientais, há mais de cinco
adotam no estudo dos fenômenos humanos. Por que as leis ditadas pelo taoísmo?
rnil anos,
Porque elas estabelecem um princípio único universal, que permite, por óbvio, a aplicação a
humanas, que sabem da parcialidade das descobertas científicas humanas e que se constituem
no reconhecimento daquilo que existe, ou melhor, que sempre existiu. Cada homem tem uma
percepção do mundo, vale dizer, a sua percepção. Em cada avanço científico encontra-se um
pouco do pesquisador (ou muito do pesquisador e de sua ideologia, ou do grupo econômico
ou govemo que lhe financiou a pesquisa). Em verdade, o ser humano não se contentou com a
percepção advinda dos órgãos sensores. Trata-se de um conhecimento parcial, não definitivo a
respeito de determinado objeto de conhecimento. O objeto do conhecimento obtido através
dos métodos tradicionais proporciona uma visão parcial a respeito dos fenômenos da vida. O
observador se afasta, no mais das vezes, das cadeias da vida. Tenta dominar o conhecimento
3°”
Idem, ibfâzm, p. 51.
35*
TELLES JUNIOR, Goffredo. 0 direito quântico. Para o professor Goffredo, o Direito Quântico não se
que flui
conñmde com o Direito Natural doutrinário ou ideal, mas com o Direito Natural que brota da Natureza,
professor, que é um Direito que
das realidades bióticas e genéticas do agrupamentos huanos. Enfim, entende o
exprime o sentimento e a verdadeira índole das coletividades em que ele vigora.
Destaque-se aqui o papel
importante do prof. Goffredo no estudo de um novo Direito mais próximo da natureza
humana. Para o
professor, “O Direito é a ordenação quântica das sociedades humanas.”(p. 102).
158
O que se nota é que os cientistas buscam a certeza para fortalecer o sistema no qual
estão operando. Eles têm uma fé inabalável no encontro da verdade através do emprego dos
métodos tradicionais. Trata-se de uma fé absurda. É a mesma fé que têm os seguidores das
religiões e suas doutrinas. Houve a transformação da ciência numa religião, numa seita, que
que lhe
não reconhece os limites de suas descobertas, a relatividade do objeto de conhecimento
está sendo posto diante dos olhos. A Ciência Jurídica emprega
uma linguagem que busca
descrever a realidade e inseri-la dentro de determinado sistema. A linguagem se constitui em
mente. Será que ela
instrumento apenas de transmissão dos mitos, criações e representações da
Toda a cultura oriental apresenta fortes traços místicos, que ainda hoje influenciam a
cientistas neste final de
sua ciência e estão revolucionando o trabalho desenvolvido pelos
século XX.
-
misticismo indiano - e o Hinduísmo em particular reveste as suas
“O
e símbolos, de
afirmativas sob a forma de mitos, através do uso de metáforas
imagens poéticas, de comparações e alegorias. A linguagem mítica acha-se muito
menos acorrentada à lógica e ao senso comum; ao contrário, apresenta-se repleta
precisas, o
de situações mágicas e paradoxais, ricas em imagens sugestivas e jamais
que lhe permite expressar a maneira pela qual os místicos experimentam a realidade
de forma muito melhor que a linguagem factual. Segundo Ananda Coomaraswamy,
'o mito incorpora a abordagem mais próxima da verdade absoluta capaz de ser
359
REIS, Sérgio Neeser Nogueira. Uma visão holística do direito, p. 63.
37°
CAPRA, rútjof. o :zw âzzfisica, p. 40.
159
ser imparcial, neutro e comprometido com a justiça, mediante a aplicação da lei (muito embora
a lei não seja sinônimo de Direito O misticismo oriental, por seu turno,
nem de Justiça).
1....
me ('D~
mais realista. Ele admite a sensualidade e, ademais, dá um papel de destaque à mulher, à força
feminina, que é efetivamente a responsável pela criação. Nele não se encontra o Deus único,
371
Idem, ibidem.
3” idem, zbfdem,
,
p. 40-1.
160
As deusas hindus não são apresentadas como virgens sagradas, mas em braços
”373
sensuais de poderosa beleza.
Todos deuses e deusas compõem uma unidade, mesmo em diferentes culturas, que,
“a priori”, seriam inconciliáveis entre si. O ser quântico está comprometido com a
porque ele é, ainda hoje, elemento importante no exercicio do controle social, porque nele o
bem e o mal já estão devidamente preestabelecidos.374 Não se pode olvidar que a ciência
para fenômenos complexosm. Ainda hoje acredita-se que a lei pode solucionar os graves
problemas humanos, o que não deixa de ser uma postura infantil que adotam alguns
operadores do Direito.
“Nem a fisica mecânica de Newton nem a biologia de Darwin disseram
muito que possa contribuir para um quadro coerente de nós mesmos dentro do
Universo. A física de Newton não tem absolutamente nada a dizer sobre
a
consciência nem sobre o propósito e os objetivos dos seres conscientes. A visão do
mundo mecanicista fez muito pelo enfraquecimento das certezas do cristianismo,
químicos para o tratamento das doenças e técnicas que passaram a afastar ainda mais o homem
da natureza. As doenças sem sintomas são consideradas curadas. Basta o policiamento para
manter a violência sob controle.
378
O homem simplificou excessivamente os fenômenos
37°
ZOHAR, Danah. 0 ser quânfiw, p. 270-1.
377
NEM todo 0 remédio é santo. Istoé, p. 63-66
WBAUDRILLARD, Jean. transparência do mal - ensaio sobre os fenômenos extremos denuncia:
A
“estamos nós todos perdendo defesas, somos todos virtuais imunodeficíentes. Todos os sistemas integrados e
superintegrados, os sistemas técnicos, o sistema social, o próprio pensamento na inteligência artificial e seus
derivados, tendem a esse limite de imunodeficiência. Buscando eliminar toda a agressão externa, destilando a
própria virulência interna, sua reversibilidade maléfica. Em
certo ponto de saturação, eles assumem sem querer
essa ftmção de reversão, de alteração, tendendo a se destruir a si mesmos. Aprópria transparência os ameaça, e
o cristal se vinga. Num espaço superprotegido, o corpo perde todas as suas defesas. Nas salas de operação, a
proñlaxia é tal, que nenhum micróbio, nenhuma bactéria sobrevive. Ora, é aí mesmo que aparecem doenças
misteriosas, anômalas, virais. Porque os vírus proliferam quando têm espaço livre. Num mundo expurgado de
velhas infecções, mnn mundo clínico “ideal', desenvolve-se uma patologia impalpável, oriunda da própria
desinfecção.”(p.69)
379
ZOHAR, Danah. 0 ser quântico, p. 268.
162
religiões que contribuíram decisivamente para o avanço científico. O budismo, antes de ser
reside na própria matéria? Cada ser é o seu corpo e seus relacionamentos. É de cada indivíduo
que nasce o divino, o sobrenatural, a cultura.
“Existência e relacionamento são um só emaranhado na esfera quântica,
como na vida diária. São os dois lados da moeda quântica e são basicamente o que
queremos dizer com a dualidade onda-partícula. Assim como a mente e o corpo
são os dois lados da existência humana, aquele alerta, ou percepção de fundo não
focalizado, e o pensamento concentrado são os dois lados de nossa vida mental.
A dualidade onda-partícula é uma boa metáfora para um bom
relacionamento mente-corpo profundamente integrado, mas, diante da idéia de que
a própria consciência nasce de uma ordenação coerente de relacionamentos
virtuais de fótons no sistema quântico do cérebro (seu condensado de Bose-
Einstein), ele se torna muito mais que uma metáfora. A
dualidade onda-partícula
do 'material' quântico torna-se 0 relacionamento mente-corpo mais primário do
mundo, e no cerne de tudo isso, em níveis mais elevados, os reconhecemos como
” 381
os aspectos mental e fisico da vida.
38°
TELLES JÚNIOR, Gofifeao. 0 direito quânfico, p. 253.
381
ZOHAR, Danah. O ser quântico, p. 117.
382
Ver CAPRA, Fritjof. A teia da vida - uma nova compreensão dos sistemas vivos. A expressão é empregada
por Capra para designar a complexidade dos sistemas vivos.
383
WEIL, Pierre. A nova ética, p. 45-62, apresenta uma pesquisa científica sobre os valores humanos.
163
trabalhados pelos homens com o passar do tempo. O ser ético, voltado para a defesa dos
valores humanos, sempre foi o sonho da humanidade. Acima de tudo, o que se busca,
coletivamente. Para isso, foram construídos caminhos. Mas a ciência, com a sua promessa de
felicidade, na pós-modemidade, nada mais fez do que gerar frustração. O desejo é o que leva
o homem à busca de novos rumos. As conquistas são sempre insuficientes para a satisfação de
nossos anseios. E isso é natural. O mundo material não é suficiente para satisfazer os anseios.
A sociedade de consumo oferece tudo aos seres humanos, menos a felicidade. Está o homem
perseguindo um significado para sua existência. E busca incessantemente o elemento comum, o
elo que liga todos os seres. É nisso que reside a divindade, em suma, o reencontro com o todo.
Há, indiscutivelmente, uma unidade de toda a vida, uma rede que une todos os seres
que habitam o Universo. E é isso que dá sentido a tudo. O misticismo não é apenas uma visão
da vida. É o melhor olhar que se pode lançar sobre o mundo, sobre o Universo, sobre a vida,
porque repousa na introspecção, na busca de sentido de tudo. E não pode apenas residir na fé
É a advertência que Tikumagawa Hiroshi faz:
i
absurda.
“A ciência parte em primeiro lugar, de um ato de fé. O verdadeiro
cientista é um homem que está convencido da racionalidade do Universo, e isso é
um ato de Fé. ”386
consistente nos valores que se cultivam, nas coisas que se apreciam, na linguagem que se
adota, enfim, na própria concepção que se tem da vida. Não se trata de um olhar que se
vigilância critica do próprio sujeito. A moralidade contribui com o Direito para o controle
social. Ou é o próprio Direito, quando a nonna contempla a ética, que nasce do indivíduo ou
do grupo social.
~
A ciência e o misticismo transmitem as informaçoes através do instrumento lirnitado
religião que se adota (ou pelo ceticismo). E metaboliza-se um conceito individual de ordem
moral.
“O próprioconceito de 'desafio moral' (moralidade) já é uma inteireza
relacional ordenada criada em resposta à nossa necessidade de um quadro
integrado de comportamento social adequado. É uma tentativa de trazer ordem ao
caos potencial que pode surgir da gama muito ampla de comportamentos possíveis,
resultantes da ação de seres humanos complexos e essencialmente livres. No esforço
de produzir essa ordem, damos origem a nós mesmos e a nossa moralidade, a uma
nova dimensão de consciência que expressa e transcende decisões comportamentais
de membros individuais de uma sociedade ou de um grupo. Cada um de nós ajuda a
escrever o código moral sob o qual viveremos. Isso acontece especialmente em
”388
tempos de crise moral ou de desafio moral.
O código moral está em criação pennanente. Todos os homens contribuem para sua
construção. E as diferentes religiões têm um papel importante nessa tarefa. Todas as religiões
contribuíram decisivamente para a formação de um código ético, que está impregnado
em
nossa cultura e é transmitido de geração a geração. A religião hoje -- e principalmente em face
387
ZOHAR, Danah. O ser quântico, p. 231.
388
Idem, ibidzm, p. 241.
165
do aumento do avanço das seitas ~ não tem um papel até mais importante do que o do Estado
sociedades dominadas por detenninada religião.389 Há, sem dúvida, uma relação íntima entre
dos direitos humanos de cunho universalista. Para Perelman (1996, p. 316), a Declaração
morais não têm força coercitivam Em verdade, crescem em importância as relações entre
Direito, moral e religião, merecendo estudo mais aprofiindado por parte dos cientistas
estão acostumados a obedecer. As respostas são colocadas à mesa e são aceitas como
verdades absolutas. Não são questionadas, na maioria das vezes. Nas escolas, os professores
apenas reproduzem o saber estatal393. Acreditam naquilo que estão ensinando. Têm uma fé
absurda. Perdem a sensibilidade. Não se formam indivíduos. Eles são deformados. Pelo menos
dever-se-ia fomentar o espírito critico. Quanto ao espirito científico, que também é essencial,
neurogenético. Dessa maneira, podem ser selecionados os indivíduos em face de sua sanidade
fisica, beleza etc. Impõe-se uma verdadeira ditadura. Na religião, o Deus todo-poderoso,
criador do céu e da terra, vem sendo alvo de orações, mormente dos católicos no Ocidente.
Contudo, está perdendo espaço para o Deus síntese das forças antagônicas-complementares.
Kikuchi denuncia, com sabedoria, um verdadeiro monopólio do Deus Masculino, que também
dominação foi exercida durante a Inquisição na Europa e, empós, se espalhou por todo o
prometem que os fiéis serão bem-sucedidos em suas profissões. Para isso, faz-se
reformulação ética do sistema jurídico, com os valores positivos, com uma revolucionária
ética.395 A ética nova não é individualista, mas preconiza a solidariedade como caminho para
construção de uma sociedade nova, mais próxima das leis da vida. Afinal, não se quer nada
mais do que a união de todas as coisas, que é reflexo da vida na sua plenitude:
“SOCLÁLISMO /Para Rui Neves / O socialismo harmônico dos meus órgãos
trabalha em ritmo / Sangue anti-gravidade sobe desce/coração quente nos tecidos
394
KIKUCHI, Tomio. Simultaneidade temária - proporção sensibilizadora da transformação unipotente,p.
165.
395
Ver CAMPILONGO, Celso et alii. Discutindo a assessoria popular, p. 21-2.
167
respira velocidade / auto-mede seus passos no compasso dos dias /Meu estômago
se
nutre porque meus pés caminham / em comando o cérebro /Meus dedos pastores no
que a vida produz em comando o cérebro-- a cada órgão o que necessita sem mais
valia/um órgão trabalha para o outro / constrói a vida na anatomia de uma oficina.
Em conjunção meus olhos cintilam cores infinitamente / Hormônio e amor numa
harmonia / socialmente o corpo usufrui a seiva / se ediƒica de balões vermelhos e
”396
crianças.
espiritualidade, cansada do materialismo, que, a cada dia, gera novos desejos. O mundo da
racionalidade determinante chegou ao fim ou está com seus dias contados. Não oferece mais
equilíbrio nas relações humanas, mesmo quando fulge a aparência do domínio do caos.
“Uma era pós-econômica baseada na satisfação das necessidades teria
que ser assentada nas leis da solidariedade e da partilha. Teria que ser feita uma
matemática da distribuição equilibrada que pudesse regular a selvageria tanto da
alternativos de
oferta quanto da procura. Neste contexto, poder-se-ia criar modelos
desenvolvimento que não os liberais que hoje tanto ƒascinam o mundo mas que não
podem existir sem a exploração de vastos setores de populações, mecanismos estes
que hoje estão mais escamoteados do que nunca. É o modelo de desenvolvimento
”397
liberal que leva ao consumo desenƒreado e à destruição do meio ambiente.
Todos os fazem parte da mesma aventura. Estão todos conectados e compartilham das
seres
396
OSÓRIO, Laci. Jomal mural, p. 37.
uma história da mulher através dos tempos e suas
397
MURARO, Rose Marie. A mulher no terceiro milênio :
Com efeito, a ciência e a religião complementam-se. Uma não vive sem a outra399. No
Oriente encontram-se religiões que se constituem em verdadeiras ciências. Ninguém pode
negar o valor do princípio único universal (yin e yang), presente no taoísmo, na ciência.
A
acupuntura opera sobre a energia universal que atravessa os meridianos.
Esclarece Weil:
“A fragmentação do conhecimento levou a humanidade a uma crise sem
precedentes na história. A ciência se afastou da ética na medida em que deixou de se
posicionar, através de sua 'neutralidade' em relação a outros ramos do
conhecimento, tais como a filosoƒia, a arte e a mística. Essa aparente objetividade
”4°°
fez com que as regras de ética ficassem exclusivamente por conta da religião.
final de século XX? Com certeza. Elas são caminhos que se completam e que elevam o homem
na sua reflexão. Sem a sensibilidade, a racionalidade é vazia. Sem a racionalidade, a
gradativamente superada pela sensibilidade, sem ser por esta eliminada. Uma não vive sem a
racionalidade é extremamente cética. Não vê nada além do que foi objeto da investigação
grande teia da vida. Os sistemas vivos são dinâmicos, coexistindo na grande rede que a todos
envolve. Capra adverte que é assim que se compreendem os sistemas vivos. Segundo Capra,
“Sua propriedade mais importante é a de que é um padrão de rede.
Onde quer que encontremos sistemas vivos ~ organismos, partes de organismos ou
comunidades de organismos - podemos observar que seus componentes estão
arranjqqšqs à maneira de rede. Sempre que olhamos para a vida,
olhamos para
'
redes.
398
EINSTEIN, Albert. Escritos da maturidade - ciência, religião, racismo, educação, relações sociais, p. 29-
30.
que
399
Conforme BOFF, Leonardo. A águia e a galinha, p. 89, “função da religião é criar as condições para
paz.”
cada pessoa possa realizar seu mergulho no Ser e encontrar-se com Deus, Útero de infinito aconchego
e
40° para o terceiro milênio - a nova cultura organizacional
WEIL, Pierre. Organizações e tecnologias
holística, p. 17.
4°*
Ou a irracionalidade do “homo-demens”, que tudo destrói.
402
CAPRA, Fritjof. A teia da vida - uma nova compreensão cientifica dos sistemas vivos, p. 77-8.
169
convivência mais harmônica entre as pessoas. Sem reconhecer a grande teia universal, que a
melhores caminhos para que
todos envolve pennanentemente, não se conseguirá construir os
exercida por determinados indivíduos ou classes sociais, ora com a preponderância de um, ora
por ele
Na grande rede do sistema jurídico vislumbra-se paz e violência, quer
criado pelo
produzido ( por impor a força) e a segurança (como elemento artificialmente
aparelho repressivo ). Só falta a paz, como elemento que nasce do processo educacional,
pennitir a vida em sociedade. Só que a paz é relativa, pois a paz absoluta não existe. O
permanente conflito entre guerra e paz é que faz o equilíbrio. Mesmo nas sociedades bárbaras
igualdade real. Para que se possa construir a paz, vale muito ter em mente a lição da guerra.
Somente com o aprendizado da guerra é que se terá a compreensão da paz. A paz não nasce
sem um grande esforço de todos. E deverá ser buscada a cada dia.
O conhecimento científico não deixará de ser respeitado, mas será humanizado. E
ganhará uma compreensão maior. Buscar-se-á mais as relações entre todas as descobertas. A
sociedade nova será gerada pelo homem novo. É um ser para o qual a vida não é apenas uma
manifestação da matéria. É energia pura, que está em permanente mutação e que se adapta às
violações e anseios da comunidade. Não se curva a homoestase à agressividade do ser humano,
porque faz parte da natureza o reencontro diutumo com o equilíbrio. O que não se pode
discutir. Porém, a própria vida se renova a cada dia. O Direito transformou-se em verdadeira
seita, da mesma maneira que a Medicina denunciada por Tomio Kikuchi.
“Realmente, a medicina se transformou em uma autêntica religião,
religando a técnica ao curandeirismo e ao pecuniarismo.
O mais poderoso de todos os talismãs é o dinheiro. é justamente esse E
talismã que a nova religião adotou para a sua adoração. A própria medicina
modema caiu na armadilha que usa contra os seus crentes pacientes (realmente tem
que ser muito paciente), a armadilha monetária: 'Quem tem dinheiro tem salvação
'.
O mesmo dinheiro que se precisa para alcançar saúde, se necessita para atingir a
`usti a.
J ue `usti a é essa ue somente é obtida a eso de ouro? Que saúde é essa ue a
171
sociedade somente mantém mediante alto custo? A saúde individual é a mesma saúde coletiva.
Quando uma pessoa sofre injustiça, toda a sociedade está sendo injustiçada. Precisa-se de um
equilíbrio para que se tenha uma vida relativamente harmônica na sociedade. A saúde da
porém não se diagnosticam suas causas. Quer-se, a todo custo, a felicidade quando o próprio
busca-se outro elemento na prática. Falta sinceridade no projeto de sociedade que se tem.
Tudo depende do interesse de grupos, ou dos interesses econômicos de alguns. Não se está
habituado, enquanto homem de ciência, a pensar a sociedade, mas de buscar a melhor maneira
crônico. Quando se investiga, tem-se determinado problema concreto para resolver, mas que
não existe isoladamente. O juiz, quando prolata uma sentença, não está resolvendo apenas um
litígio. Quando se promove a justiça comutativa, também se quer atingir a justiça distributiva.
O Judiciário é um poder político, que busca dar a cada um o que é seu e,
fundamentalmente, deverá contribuir para a construção da sociedade nova, que deverá ser de
todos. Não há um problema isolado. O Judiciário deveria ser um templo de discussão dos
problemas humanos, com a incumbência, basicamente, de promover a justiça, mas uma justiça
verdadeira, não apenas a justiça formal. Contudo, ele é apenas um Poder do sistema capitalista,
comprometido com o patriarcado, com a dominação e com a visão caolha adotada pela política
desde a Antigüidade.
O misticismo contribui à medida que liberta, que desperta a consciência universal.. Os
dogmas simplesmente contribuem para o nosso aprisionamento de corpos e de espíritos. Há
luta real de libertação do homem dos valores impostos pelo patriarcado.
“Estamos certas de que isto não será conseguido sem muita
perplexidade e talvez muito sofrimento. Aqui vale a pena lembrar uma palavra do
Gênese inviabilizada pela cultura patriarcal e que poderá nos dar uma luz sobre o
que dissemos. Depois de Deus ter expulsado Adão e Eva do Paraíso e de ter-lhes
imposto as várias maldições, preocupou-se e disse: 'Eis que o homem se tornou
como um de nós, conhecendo o bem e o mal. Ora, não aconteça que estenda a sua
406
KIKUCI-II, Tomio. Simultaneidade temária - proporção sensibilizadora da transformação unipotente, p.
247.
172
21
mão e tome também da árvore da vida e coma e viva eternamente. (Cap. 3, vers.
'
a 24).
E continua o Gênese:'O Senhor Deus o lançou, pois, fora do jardim do
E
Éden para lavrar a terra de que fora tomado. havendo lançado fora o homem, pôs
no oriente do jardim do Éden um querubim e uma espada flamejante que se volvia
por todos os lados para guardar o caminho da árvore da vida.
'
pois o homem acabou se tornando “como um de Nós isto é, com um deus. E Deus
tem medo de que o homem siga em frente no seu projeto de obter a imortalidade e,
assim, tornar-se realmente igual ao Todo-Poderoso. Por isso
veda para sempre a
entrada do homem e da mulher no Jardim das Delícias, com uma espada que se
volve para todos os lados. _
Direito, em toda a religião há um ritual que busca formalmente expressar a “verdade” que está
detrás dela. Mas o rito não é tudo: é apenas a parte cosmética. Em
verdade, desde os
por
primórdios da humanidade, vê-se o fomento da atividade simbólica.
“Que és que se simboliza en el comportamiento religioso? Durkheim
lo
decía que en el totemismo (segúnd él, la forma elemental de la religión)
la
sociedad se rinde culto a sí misma, o, para decirlo más eruditamente, los hombres
afirman, y de este modo refuerzan, la importancia del sistema de interdependencia
que constituye la sociedad Radclifle-Brown sostenía que el ritual expresa
simbolicamente ciertos sentimientos o valores, de cuya aceptación depende el buen
funcionamiento de la misma sociedad Este punto de vista es esencialmente una
reformulación de la posición de Durkheim, y como ella oculta el importante
hecho
de que el conflicto y la oposición pueden ser elementos importantes de los sistemas
convertirse en
sociales del mismo modo que la armonía, y que pueden asi mismo
ocasiones
focos de ritual. Pero Radcliffe-Brown también afirmaba que en algunas
de viver en
el ritual expresa algo más que la necesidad que el hombre
tiene
apenas caminhos que são apontados como sendo os melhores. Porém, devem ser questionados
~
sendo negados os demais. Assim como a ciência, nao há
~
sempre. Ao escolher-se um, estao
nenhuma religião que seja portadora de toda a verdade. A oração não busca apenas o
reencontro do homem com Deus, mas, acima de tudo, do homem consigo mesmo. Perde-se o
pecados e delitos. Confundem-se. Pecados são transformados em delitos pelo Estado. Delitos
408
BEATTIE, John. Otras culturas. - objetivos, métodos y realizaciones de la antropologia social, p. 309-10.
174
concibe más bien como una especie de sustancia difusa, una suerte de contagio, que
puede extenderse e infectar otros si no se lo controla. En este sentido, se funde con
la dicotomia omnipresente de pureza-impureza.”4°9
nas religiões e na visão mecanicista da ciência. Não há absolutamente algo certo ou errado,
deste século serem os donos da verdade? Como se arvorar de detentor de toda a verdade,
quando ela está em toda a parte? Falta a humildade necessária aos cientistas. Sem ela não se
chegará a lugar algum. O cientista que priorizar a racionalidade, na busca de uma verdade,
corre o sério risco de ter, diante de si um, fragmento imprestável da vida. A prepotência gera
somente opressão. Diz o catolicismo que o pecado se mantém enquanto os homens não
reconhecerem as suas falhas.
Almeja, contudo, que haja objetivamente a comprovação dos fenômenos. Quer segurança,
puro é, paradoxalmente, impuro. Toda descoberta cientifica traz novos questionamentos. Não
se conseguirá idealizar a pílula da felicidade, porque não há felicidade plena como não há
infelicidade absoluta. Uma pílula não pode atacar todas as causas que são responsáveis por
nossa infelicidade, Ademais, a infelicidade é imprescindível para que se tenha uma noção da
própria felicidade. A ciência quer a felicidade. A religião quer a felicidade. Será? Para
O misticismo traz para nossa existência o ser que transcende, que não pode ser
Com efeito, não se consegue Ter o ser senão a partir do não-ser. O ser que transcende
é fundamental para que se possa compreender os mecanismos da vida, ou para que se possa
~
O eu está em permanente construçao. Precisa ser repensado permanentemente,
porque, para que possa ser estruturado, precisa se libertar da influência cultural e,
não existem apenas individualmente. Fazem parte de um todom. São partículas simples e,
sobretudo, sonha. São apenas partículas de uma grande vida. Morre-se para fazer o equilíbrio
da vida universal. A vida é integral ( ou não é vida ). Nela não existem elementos
isoladamente. Eles vivem harmonicamente, a partir de uma harmonia que é construída a cada
este infinito, esta imensidão se acham inteiros em todas as suas partes, de tal sorte que ele [o mundo] é o
próprio ubique. Daí que aquilo que está no universo, relativamente ao universo (e mesmo
que o seja com
está em
relação aos outros corpos particulares), acha-se por toda parte segimdo o modo
de sua capacidade;
porque na totalidade infinita
cima, embaixo, no meio, à direta, à esquerda, segimdo todas as diferenças locais,
há todas estas diferenças e não há nehuma delas. Todas as coisas que captamos no universo, por que encerra em
si mesmo o que está todo inteiro por toda parte, em seu
modo toda a alma do mundo (embora não a contenha
totalmente, conforme já dissemos); esta alma está inteira, independentemente de quais partes do universo.
Todavia, visto que o ato é Lmo e constitui um único ser, onde quer que esteja, não é preciso que
se creia que haja
para a vida. Em decorrência disso, surgem novas religiões, novos falsos líderes, construindo
suas igrejas, sedimentando grandes poderes. Devem os seres humanos se libertar dos falsos
lideres, bem como do Deus patriarcal, criador do céu da terra, que exerce o controle sobre
tudo e todos. A nossa busca de sentido da vida não deve acabar num templo qualquer, numa
proposta qualquer de religião.
“Por que Marx afirmou ser a religião um ópio?
Porque acha que, se alguém entrasse na religião, seria muito difícil sair
dela e, se essa pessoa continuasse firme em seu propósito de devoção à religião,
continuadamente, seria uma vítima da própria devoção religiosa.
Realmente, a religião hoje está perdendo cada vez mais sua verdadeira
atração, em troca de atração falsa e superficial da cura de doenças conseguida
"41 5
através de uma satisfação hipnótica, vendida por preços reduzidos.
Nos dias atuais, realmente, cada religião quer ter mais poder que a outra. Há um
disputa política, que visa o exercício, por parte dos seus líderes, do domínio de determinados
setores da sociedade. Todos querem dinheiro, mais dinheiro, a cada dia, numa corrida
insaciável. O destino é traçado por todos e por cada um e, para que isso ocorra, precisa-se
refletir a respeito do papel dos homens sobre a face da terra, enquanto seres que fazem parte
de um grande projeto global de vida, que não respeita fronteiras nem comporta limites. Mas
que requer de todos os mais diversos sonhos.
“O destino do homem não é oferecido por ninguém, nem mesmo por
Deus. Tampouco cairá do céu. O verdadeiro destino é criado pelo próprio ser
humano.
“W
pessoas. Há um Deus patriarcal que controla tudo e todos. O que deve ser levado em
consideração, em todas as religiões, é a solidariedade, que não deixa de ser o
reconhecimento
de que nós somos células do mesmo corpo, vale dizer, partes indissociáveis da mesma vida.
celulose. Eis o alimento das Por outra parte, a vaca faz o bolo alimentar que absorve trilhões e
bactérias.
trilhões destas bactérias. Alimenta-se delas mediante a ruminação do bolo
alimentar. A
vaca se faz, assim,
predadora das bactérias, como as bactérias se fazem predadoras da célulose. As bactérias comem o pasto-
celulose da vaca e são, por sua vez, comidas pela vaca. Sem o pasto-celulose as bactérias
não existiriam. E sem
sem mminação no bolo alimentar morreriam de
as bactérias, as vacas também não, porque a das bactérias
Vê-se aqui a mútua dependência, a simbiose entre as bactérias e a vaca.”
inanição e de fome.
415
KIKUCH1, Tomio. A religião atual e seu destino - estudo para o desenvolvimento global do ser humano, p.
1 1.
'“61âem, zbiâem, p. 52..
177
teatralidade de sua atuação. Qual será a ciência do futuro? O Direito contribuirá para o
operadores jurídicos?
aperfeiçoamento do ser humano? Existirão, afinal, no futuro, melhores
ibidem.
"19
Idem, ibidem, p. 97-8. “Provavelmente, grande parte da Matemática está ligada a esse cérebro
uma
primitivo. O grande matemático não é um tipo de calculadora,
de computador. É antes uma espécie de poeta.
muito interessantes
Quem descreveu isso muito bem foi o grande matemático Henri Poincaré. Ele fez estudos dando urna importante
sobre a criação matemática, mas que, provavelmente se
aplicam a outros campos,
é inconsciente, apresentando quatro etapas. É
contribuição à Psicologa.” Aduz Schenberg que a operação
interessante estudo que bem demonstra a relação que há entre os
saberes.
`
1'/s
Assegura Morin:
“A evolução não obedece nem a leis nem a um determinismo
preponderante. A evolução não é mecânica nem linear. Não há fator dominante
permanente que comande a evolução. O futuro seria, com efeito, muito fácil de
predizer se a sua evolução dependesse de um fator predominante e de uma
causalidade linear. Precisamos, ao contrário, partir da inépcia de toda predição
baseada num conceito evolutivo tão simplista. A realidade social é
multidimensional: comporta fatores demográficos, econômicos, técnicos, políticos,
ideológicos...Alguns deles podem predominar, em certo momento, mas há
rotatividade da dominante. A dialética não anda nem sobre os pés nem na cabeça;
ela gira porque, antes de tudo, é jogo de inter-reações, isto é, circuito em perpétuo
movimento.”42°
Cada ser nasce do amor pela vida. E caminha para o grande útero universal, haja vista
que “Há no ser humano um apelo para a unificação, para a comunhão com todas as coisas e
para um com elas. É a nossa inarredável saudade do momento» em que estávamos todos
”423
juntos, naquele ponto matemático inimaginavelmente pequeno, antes do big bang inicial.
cada fração sua. Inadmissível atingir a cura da vida se não se atingir a sua dimensão ecológica,
sua complexidade ética e sua dimensão etérea. A cura do corpo, seja ele individual, seja social,
somente se dará a nível quântico, consoante a própria Física modemafm
42°
MORIN, Edgar. Para sair do século XX, p. 3 1 1.
Para CI-IOPRA, Deepak As sete leis espirituais dos pais, p. 120, há uma verdadeira sabedoria da incerteza.
421
“O ego tem medo da incerteza, que sempre quer controlar a realidade, mas a partir do ponto de vista do
desapego,um universo em constante mudança e modificação precisa permanecer incerto. Se as coisas fossem
não haveria criatividade. Por conseguinte, o espírito atua através de surpresas e resultados inesperados.”
certas,
422
MATURANA, H. e VARELA, F. A árvore conhecimento - as bases biológicas do entendimento humano, p.
264.
423
BOFF, Leonardo. A águia e a galinha - uma metáfora da condição humana, p. 159.
Deepak. Saúde perfeita - um roteiro para integrar corpo e mente, com poder da cura quântica,
424
CHOPRA,
p. 20.
119
Chaim Perelman
errar, que ética e Direito não se constituem em dois círculos concêntiicos, em que aiprimeira
contém o segundo. O Direito positivo não tem, em essência, cânones éticos, como concebido
no regime capitalista. Nasce da vontade estatal para limitar a liberdade individual eiimpor a
encontra num terceiro estado. Não possui o bem-estar fisico, mental e social, ditado pela
425
Para WEIL, Pierre. A nova ética - na política, na empresa, na religião e
na ciência, na vida privada e em
todas as outras instâncias, p. 25-6, precisa-se fazer a distinção entre uma
ética moralista, preservacionista dos
180
faculdades mentais. O que fazer diante desse quadro complexo? Só nos resta estudá-lo. Não
há, em verdade, seriedade de propósitos. Os pesquisadores, infelizmente, em sua grande
maioria, ajustam os seus inventos aos interesses do capital, seja ele nacional seja estrangeiro.
Essa dependência se agrava ainda mais, com a falta de verbas para a educação e para a
realização da pesquisa. É por isso que os resultados são cada vez mais insatisfatórios, obtidos
econômicos que regem as pesquisas encomendadas e nem com as regras estatais impostas por
interesses dos grupos econômicos que detêm o poder. Deverão estar, fundamentalmente,
comprometidas com a vida. São estranhos os resultados obtidos por algumas pesquisas sobre a
que caem na rede do sistema repressivo, em sua maioria, são negros e pobres. E isso já é de
valores e da segurança, e mna ética essencial, precursora do amor, que tem o condão de dispensar os próprios
cânones éticos.
426
ESPELETA, Lydia Buisan. “Bioética y principios básicos de ética médica”, p. 120-1.
427
ROSE, Steven. A perturbadora ascensão do determinismo neurogenético, p. 21.
181
É certo que não existem verdades absolutas. Todavia, os casos de compromisso dos
cientistas com os interesses dos financiadores das pesquisas ou com as ideologias das classes
pré-socráticos, que não ficavam satisfeitos com o minimalismo emergente das relações de
inimigos poderosos. O vírus da AIDS428 está aí, numa demonstração inequívoca do fracasso da
terapêutica tradicional. O câncer se propaga e, quando é combatido, morre junto o paciente,
doenças, com sérios e graves efeitos colaterais, geradores, em muitos casos, de outras
moléstias (é um círculo vicioso que não tem fim), e quer ter saúde. Faz uso regular de cocaína,
maconha, cigarro e álcool. Para Tomio Kikuchim, a humanidade se acha em crescente
428
É a sigla que designa a moléstia conhecida como Síndrome da Imunodeficiência Adquirida(SlDA).
4” KIKUCHI, ronúø. ordem do corpo humano, p. 5. Nesta página KIKUCHI faz a seguinte advertência: “o
global do corpo
resultado claro e indiscutível do estudo cíentifico contemporâneo, que ignora a ordem
humano, é a sociedade humana atual, que acelera cada vez mais o ritmo de sua autodestruição com o
aumento
espantoso da desmoralização sexual, da doença venérea, do infanticídio (abortos), do parto
prejudicial
neuróticos, da intoxicação
(cesariana), da mãe sem leite, do desquite e do divórcio, dos nervosos e
medicamentosa e das doenças do homem civilizado, desde a anemia provocada pelo uso de antibióticos até o
câncer produzido pelos medicamentos paliativos fiatrogenia), do abuso da intervenção cirúrgica,
da
destruição do ambiente e da natureza, dainutilidade da educação decadente, da poluição
industrial e
e subomos
comercial, do abuso de inseticidas e adubos químicos, da violência e crimes, dos escândalos
da crise do petróleo, da subida excessiva do custo de vida, da tensão política mundial e da
burocráticos,
ameaça dos armamentos nucleares, aproximando velozrnente a humanidade do acontecimento inevitável da
terceira guerra mundial.”
182
considera a saúde como bem-estar fisico, mental e social. O homem é livre para alcançar a
população? A saúde, sem dúvida, é a grande bandeira dos governantes quando das campanhas
eleitorais. Saúde e educação são metas prioritárias, dizem eles. Contudo, somente se obtém
saúde com educação. A saúde somente é obtida a partir da compreensão da vida pelo próprio
indivíduo. A educação não se confunde com o ensino. Existe a educação em toda a parte,
do conhecimento
buscando proporcionar melhores condições de vida ao povo, libertando-o
imposto pelas classes dominantes. Somente se superará a violência
com um processo
mundial vive num
educacional voltado para a solidariedadefm A grande maioria da população
terceiro estado. A maioria das pessoas caminha entre a saúde e a doença, entre a vida e a
morte.
“Entre todos os cientistas modemos talvez tenha sido H. Selye o
primeiro a dar mais atenção aos estados transicionais entre a saúde e a doença,
a
saber os três estados de estresse: alarme, resistência e exaustão. Após Seb›e, muitas
classificações foram propostas para os estados
humanos. Vários autores
apresentaram um número maior ou menor dos estados entre saúde e doença.
Por
exemplo, o Professor R.M Bayevsky analisa:
I Um estado de tensão
.
2. Um estado de hipertensão
3. Um estado preliminar de doença
cl)estado de mudanças não especificas (geralmente astênicas)
b) estado de mudanças específicas.
43°
ESPELETA, Lydia Buisan. “Bioética y principios básicos de ética médica”, p. 120.
24. “Um aos principais
43*
conforme KR1srrNAMURT1, Jiddu. 1/“zzzgzm por um mar desconhecido, p.
Estados soberanos,
problemas do mundo é a guerra - não importa se ofensiva ou defensiva.
Enquanto existirem
nacionalismos, tem de haver
nacionalidades separadas, governos separados, com seus exércitos, fronteiras,
uma
Sempre serão inevitáveis as guerras, enquanto o homem estiver vivendo entre as
fronteiras de
guerra.
ideologia. Enquanto o homem existir dentro dos limites do nacionalismo,
dos limites religiosos ou dos limites
- haverá guerras. Porque esses dogmas, essas
dos dogmas - cristão, induista, budista ou maometano
nacionalidades, essas religiões separam os homens.”
183
possível através de uma ação pedagógica. Para superar-se a doença, o doente deverá ter uma
profunda reflexão.
“A Medicina e a Pedagogia têm em comum a meta de fomentar uma
saudável evolução do ser humano em crescimento. Uma observação
mais acurada
revela que, além disto, ambas se ocupam de dois processos
da vida humana bastante
relacionados entre si: curar e ensinar. Contrair uma doença, travar
uma batalha
contra ela e vencê-la são três passos que encontramos também
no aprendizado:
receber uma tarefa, lutar com o objeto do estudo e efetivamente alcançar a meta do
processo, ou seja, adquirir a nova habilidade. Em ambos os
planos são feitas novas
experiências que se correspondem. Por exemplo, a incapacidade
de solucionar um
problema matemático origina uma vivência semelhante à de um determinado
estado
Entender alguma
doentio que pode manifestar-se em mal-estar e dor de cabeça.
coisa, ao contrário, causa-uma sensação de alívio, de
cura. Todos nós conhecemos a
sensação de luminosidade quando, repentinamente,
'algo fica claro Assim como a
'.
muito embora
O corpo fisico, tanto individual como o coletivo, busca a estabilidade,
contrariam as da natureza de busca
haja sinais evidentes de tempestade que aparentemente
leis
cometidos diutumamente,
procedimento médico, para que se possa reduzir os crimes que são
corporativismo que impera
dos quais sem a punição exemplar, em face, principahnente, do
- o efeito dos
432
BREKI-IMAN, Izrail Itskovich. O homem
e as substâncias biologicamente ativas
medicamentos, dieta e poluição na saúde, p. 4-5. A
Constituição de 1988 assegura o direito à saúde, mas
nenhum momento faz menção ao Saúde plena, apenas uma minoria possui. As classes
terceiro estado.
de comida, que acarreta sérios problemas
dominantes são atingidas não pela subnutñção mas pela excesso
cardíacos e circulatórios.
GOEBEL, Wolfang et alii. Consultório pediátrico um conselheiro
433 : médico-pedagógico enfermidades,
:
condições para um desenvolvimento sadio, educação como terapia, p. 19. A Medicina Antroposófica vê uma
184
também na área da saúde. A imprensa vem veiculando notícias horripilantes. Pessoas têm as
simples; indivíduos perdem rins, quando se fazia desnecessário esse procedimento; transplantes
são realizados com o único objetivo de promoção de médicos, haja vista que pessoas operadas
sobrevivem alguns dias. A transformação que se impõe em nossa sociedade é profunda. Não
contra os laudos periciais que são elaborados com o único objetivo de impedir a
interessam pela defesa da vida, mas da busca de vantagens pessoais ou econômicas, que
resultam em sérios prejuízos para a saúde humana. É claro que esses profissionais não existem
só na área da saúde. Entretanto, verifica-se que há um poder efetivo exercido por esses
profissionais em relação aos' seus pacientes, sem que haja a possibilidade do tratamento mais
não almejam a saúde, mas o tratamento sintomático das doenças. Ao serem eliminados os
sintomas, estariam sendo curadas as doenças. A cura tem o significado mais profundo,
relação íntima entre a Medicina e a Pedagogia. Em verdade, todas as áreas de conhecimento humano estão
intimamente ligadas.
434
O professor Ricardo Lira participou do I Congresso Brasileiro de Direito e Bioética, que foi realizado em
Florianópolis, de 27 a 30 de agosto de 1997, na Universidade Federal de Santa Catarina, abordando o
tema A
bioética e a noção de responsabilidade. Parece que a expressão “máfia de branco” utilizada pelo notável
jurista é a que melhor representa a atuação dos maus profissionais da saúde.
4” ENGELS, Friedrich. A ariaiéfiaa da aazaraza, p. 237. .
185
relativas a
Não existem verdades absolutas. Todas elas são relativas, vale dizer, são
a não ser as produções tecnológicas. Precisa-se, com urgência, se operar uma aproximação
com a natureza. Deve-se ter consciência da trajetória que cumpre o homem neste
mundo. Qual
do corpo social. Diz a antiga filosofia oriental que tudo 0 que tem inicio
tem um fim. Em um
potência. Na natureza, nada se cria, nada permanece em estado estático, tudo se transforma
constantemente. A morte é uma mudança profunda no estado da matéria. Será. que a energia
não continua? A Medicina Energética constata essa realidade de que o ser humano é energia.
436
Idem, ibidem.. “A vida e a morte, estar desperto
437
Conforme POPPER, Karl R. Conjecturas e refutações, citando Heráclito,
de uma coisa é a outra; e a outra,
ou adormecido, a juventude e a velhice, tudo é o mesmo... pois o contrário
186
Foram diagnosticadas sete camadas de energia, de cores distintas, que se projetam do corpo.
natureza e da estranha relação que há entre todos eles. O que é aparentemente caótico
verdades na virada do milênio, sempre frágeis, provisórias, porém importantes para a busca
permanente que a humanidade empreende.
Cada uma das quais analisa cada forma
“Classificação das ciências -
de movimento, ou uma série de formas em correspondência (e que se transformam
entre), torna-se assim a classificação ou ordenamento dessas mesmas formas de
movimento, de acôrdo com sua sucessão inerente; e, nisso consiste sua importância.
Nos fins do século passado, segundo os materialistas franceses,
predominantemente mecanicistas, evidenciou-se a necessidade de um estudo
enciclopédico de tôda a ciência da Natureza, libertando-a dos pontos de vista da
velha escola de Newton-Linneu; e dois homens de extraordinário gênio
empreenderam essa tarefa: Saint-Simon (de uma forma incompleta) e Hegel. Hoje
em dia, quando a nova concepção da Natureza encontra-se completa, em seus
aspectos básicos, faz-se sentir a mesma necessidade, havendo algumas tentativas
nesse sentido. Mas agora que se deve pôr à mostra a geral interconexão evolutiva,
na Natureza, mostra-se tão insuficiente a disposição externa, lado a lado, como as
transições dialéticas artificialmente construídas de Hegel. As transições devem ser
feitas por si mesmas, devem ser naturais. De maneira semelhante àquela em que
invertida, é a primeira... O caminho que leva para cima e o que leva para baixo são o mesmo... O bem e o mal
são idênticos...”(p. 169).
438
ENGELS, Friedrich. A dialética da natureza, p. 143.
187
subjetividade que emerge do sujeito que conhece. Não se pode separar com clareza sujeito
que conhece e objeto conhecido. Sem a lucidez da poesia da arte, a dogmática submerge na
estabelecer-se uma programação divorciada da realidade que advém de um novo tempo que se
constrói. Sem dúvida, o Biodireito é uma construção importante para aproximação do sistema
jurídico à realidade. O Direito continua ainda, no nosso instrumento medieval de domínio dos
homem. Acredita-se que as salvaguardas poéticas
sonhos, que impede o desenvolvimento do
anomia:
de Paulo César Gutierres Guggiana estariam mais adequadas a essa alegada
“Art. I. - Obrigatório passear aos domingos de mãos dadas e, displicentemente,
pisar na grama, ter olhos para flores, semear esperanças e colher sonhos
silvestres.
Parágrafo único - Assegurados aos seres humanos a visão azul dos céus e o infinito
das revoadas.
Art. 2°. -- Fica proibido pensar em guerras, pena agravada
quando se afaga os
cabelos da amada.
Art. 30. -- Pena de banimento ao desejo sem amor.
Parágrafo único - Vedado cativar a esmo e quebrar encantos.
Art. 4°. -- É delito imperdoável sentir-se só e espalhar a solidão.
Art. 5°. - Obrigatório lavrar autos de soltura e declarar absurdas
as gaiolas.
Art. 6°. -- Pena de eterna sedução a quem seduz.
Art. 7°. - Fica desativado o império do medo e proclamada
a república do amor
maior. ”441
Parágrafo único - Revogam-se as inúteis disposições em contrário.
maneira de ver o mundo. O ser humano deverá ter postura adequada à sua natureza humana.
Os medicamentos químificos desnaturam o homem. A artificialização dos seres gera doenças
questões éticas com o Direito não representa algo novo. A ética não deveria ter-se divorciado
do Direito. O artificialismo do Direito não é um privilégio. As demais ciências foram tomadas
envolveram-se nele de tal forma, que não conseguiram a libertação. As ciências confimdiram
poderia ser responsabilizada pelo seu fim trágico? Acredita-se que sim. Não só pelo
A ética não se constitui num elemento volátil, artificial, que se possa tranquilamente
definir. Ela está presente em cada ser humano e tem uma teia historicamente construída com o
passar dos anos. A ética está ligada à ação, mesmo que isso ocorra da maneira imperceptível.
Vale
Desde os primórdios, o caos e a ordem estiveram presentes na vida humana.
dizer,
-
WEIL, Pierre. Organizações e tecnologias para o terceiro milênio a nova cultura
442 organizacional
holística, p. 22.
189
compreender as variadas facetas de cada dimensão que é apresentada, pelo cientista. como
verdadeira. Deve-se fomentar uma nova ética, a partir do reconhecimento da
complexidade de
todo o conhecimento e da nova maneira de ver o mundo. Não se quer ter uma nova ciência,
porque assim se continuaria a cometer o mesmo erro. É equívoco acreditar que a estrutura de
poder político possa permitir o surgimento imediato de uma sociedade melhor para todos. O
que se almeja é um novo homem, com uma nova percepção da vida.
“Os homens de ciência podem adotar a atitude que quiserem, mas
estarão sempre dominados pela filosofia. Trata-se apenas de saber se querem
ser
dominados por uma filosofia que, embora má, está na moda; ou por uma forma de
pensamento teórico fundado sôbre a familiaridade com a história do conhecimento e
de suas aquisições.
'Física, toma cuidado com a metafísica' ~ é uma advertência correta,
com Engels de que há uma verdadeira ciência da natureza. Os pensadores orientais buscaram a
sistematização dessas informações, baseadas em leis naturais, que se constituem
num arsenal
importante para que possamos compreender as leis que regem a vida. Da mesma forma que a
443
BITTENCOURT, Jane. Conhecimento, complexidade e transdisciplinaridade, p. 77.
"44
ENGELS, rúzar1¢h.A âizzzézfczz da natureza, p. isõ.
190
ética, assim também a estética acompanha as pessoas por toda a vida. Ela surge com a
percepção que se tem do mundo: ou ele é bonito ou feio. Vive-se em diálogo permanente com
o meio, com as pessoas e com as coisas que nos cercam. Atua no sentido de transfonnar os
elementos naturais que são apresentados. Quer-se criar algo novo. No Direito, a estética se
manifesta em todos os momentos, porque o Direito é, acima de tudo, arte do bom e do justo,
na melhor definição de Justiniano.
“A arte como um
conjunto de valores estéticos, englobando as artes
plásticas, literatura, música, cinema compõe um conjunto de valores harmônicos que
"M5
refletem no Direito, a cultura comum de uma civilização.
A arte não só traz beleza, mas também contribui para a reflexão a respeito das
construções humanas.446 Desde o princípio, os seres humanos rabiscaram, desenharam nas
A estéticam poderia ser considerada como a antítese do caos. Contudo, sabe-se hoje
que há ordem no caos e que a dificuldade traz consigo o germe de uma nova vida. Não há paz
sem a perspectiva da guerra, nem guerra sem paz.
A paz somente será obtida quando se tiver consciência da guerra como a outra e
causas e quando a paz for vista como uma conquista resultante da luta diutuma. Não se pode
auxiliares dessa conquista. Mas se conseguirá a paz relativa quando houver preocupação com
a essência das coisas, desmoralizando-se os meios fiíteis empregados pela técnica. Afinal, a
prioridade é o atendimento das necessidades dos homens, dos animais, das plantas, enfim, da
natureza. Por isso, precisa-se também resgatar a dimensão poética do sistema juridico,
lado a lado as ciências naturais e as ciências jurídicas. Contudo, sabe-se que os fenômenos da
vida são regidos pelas mesmas leis, estando presentes numa ou noutra polaridade universal. A
alienação do objeto de preocupação do Direito divorciou-o das normas éticas, afastou-o de
possíveis relações com a estética e transformou-o num corpo amorfo de regras e princípios
sem significado.
“Se bem que a ciência jurídica tenha por objeto normas jurídicas e,
portanto, os valores jurídicos através delas constituídos, as suas proposições são, no
entanto - tal como as leis naturais da ciência da natureza - uma descrição do seu
objeto alheia aos valores(wertfreia). Quer dizer : esta descrição realiza-se sem
qualquer referência a um valor metajurídico e sem qualquer aprovação ou
desaprovaçào emocional. Quem, do ponto de vista da ciência jurídica, afirma, na
sua descrição de uma ordem jurídica positiva, que, sob um pressuposto nessa ordem
jurídica determinado, deve ser posto um ato de coação pela mesma ordem jurídica
adequadas ao gênero humano, tais como: o desenvolvimento das faculdades e dos respectivos carecimentos de
atividade, de sentir e usufruir, do gosto, da compreensão teórica, e de relacionamento humano. Ambos os ideais
referem-se tanto à humanidade quanto à universalidade última, como a cada personalidade individual enquanto
singularidade última. Pode-se afirmar também que os dois ideais se constituem pr uma interpretação filosófica
acerca da posição hierárquica e do conteúdo valorativo da liberdade no atual estágio de desenvolvimento do
gênero humano, e que, esses ideais implicam-se mutuamente no processo de constituição da individualidade.”
449
KIKUCI-II, Tomio. Vida, sua resistência e transformação, p. 20.
45°
Consoante FAGÚNDEZ, Paulo Roney Ávila, Direitos humanos como educação para a justiça, citando Lao
Tzu, p. 93, “verbis”: “Quanto mais leis e decretos se publicarem, mais ladrões e assaltantes haverá.”
451
Ver KELSEN. Teoria pura, p. 85. Diz Kelsen, na referida página 85, “verbis”: “Se há uma ciência social
que é diferente da ciência natural, ela deve descrever o seu objeto segundo um princípio diferente do da
causalidade.
192
ƒixado, exprime isto mesmo, ainda que tenha por injustiça e desaprove a imputação
do ato coercitivo ao seu pressuposto. “452
autônomo, como um ramo da ciência, como um objeto próprio de preocupação, com uma
metodologia só dele. Perdeu-se, em decorrência dessa visão, a noção das conexões que
nas pesquisas realizadas. Não basta estabelecer uma relação de causalidade entre os
fenômenos, da mesma forma que não basta haver a imputação do jurista. Para que se possa
complexo, paradoxal, regido pelas leis da vida. Em decorrência disso, deverá nascer uma
hermenêutica nova, valorativa, voltada para a complexidade da vida, em consonância com a
nova ética.453
A visão transdisciplinarm permite que uma hermenêutica ampla surja, para que se
Precisa-se investigar esse mundo paradoxal que traz respostas e, ao mesmo, em igual, ou em
452
KELSEN, Hans. Teoria pura do direito, p. 89.
453
Ver WEIL, Pierre. A nova ética - na política, na empresa, na religião, na ciência, na vida privada e em
todas as outras instâncias.
454FERNANDEZ-LARGO, Antonio Osuna. Hermenéutica jurídica : En tomo de la hermenêutica de Hans-
~
até maior proporção, perguntas desafiadoras para o progresso da ciência. Não estao os
preconizada pela ciência jurídica, dentro de sua completude, quer dizer, o sistema traz,
ser. É o reconhecimento de que cada ser é também o outro, de que faz parte da grande teia
universal, de que é apenas uma partícula, mas que, paradoxalmente, é agente de transformação
da sociedade. Enfim, de que ela pode ser transformada por cada um e por todos num lugar
u
para o caosfm No entanto, se respeitar os valores humanos, poderá nascer, mesmo da aparente
da desintegração, a paz. Contudo, há necessidade de refletir a respeito da próprio modelo de
desenvolvimento.
“É preciso repensar,
reformular em termos adequados o desenvolvimento
humano, respeitando e integrando a contribuição de outras culturas que não a
ocidental.
estarão abertas as portas de um novo relacionamento com o diferente, com a natureza e com o cosmos na sua
totalidade.”
45°
FALCETA IR, Walter. Http://www.estado.com.br/edicao/especial/ciencia/caos/caoabre.html.
4” SHUMACHER, E. F. apud CAPRA, Fmjof. sabedoria incomum, p. 169-70, “A ezononúa americana é
totalmente voltada para o trabalho, os lucros e o consumo de bens materiais.O objetivo das pessoas é ganhar o
máximo de dinheiro possível para comprarem toda essa parafernália que associam a rmr padrão de vida
elevado. Ao mesmo tempo, sentem-se bons cidadãos, porque estão contribuindo para a expansão da economia
nacional. Não percebem, porém, que a maximização dos lucros leva à constante deterioração dos bens que
adquirirem. Por exemplo, a aparência visual dos produtos alimentares é importante para incrementar os lucros,
ao passo que a qualidade dos produtos continua se deteriorando devido a todos os tipos de manipulação.
Laranjas coloridas artiñcialmente e pães artificialmente fermentados são oferecidos nos supermercados; o
iogurte contém produtos químicos que lhe dão cor e sabor; os tomates são encetados para tomarem-se
brilhantes. Efeitos parecidos podem ser observados nas roupas, nas casas, nos carros e em várias outras
mercadorias. Embora os norte-americanos ganhem cada vez mais dinheiro, eles não estão enriquecendo; pelo
contrário, tomam-se cada vez mais pobres.”
194
A crise grave, segundo Morin, não é o fim. Dela pode nascer a esperança.
“A esperança funda-se em possibilidades humanas inexploradas e aposta
no improvável. Não é mais esperança apolíptica na luta final. É esperança corajosa
na luta inicial. Ela deve restaurar uma concepção, uma visão de mundo, um saber
articulado, uma ética. Ela deve inspirar não apenas um projeto, mas uma resistência
preliminar contra as forças gigantescas da barbárie que se desencadeia. Os que
aceitarem o desafio virão de diversos horizontes, e pouco importa sob que etiqueta
se reunirão. Mas serão os portadores contemporâneos das grandes aspirações
históricas que, durante algum tempo, nutriram o socialismo. Eles serão os paladinos
da esperança.”459
Constata-se, sem dúvida, uma grande evolução técnica e científica, mas, conforme
Frei Betto, há uma regressão quanto à. dimensão ética e socialfm No entanto, o holismo
458
MORIN, Edgar. A decadência do futuro e a construção do presente, p. 33.
459
Idem, ibidem, p. 34.
46°
MENEGI-IETTI, Antonio. Sistema e personalidade, p. 8.
46]
FREI BETTO. A obra do artista - uma visão holística do Universo, p. 226.
195
Enfim, há um dever do ser humano de ser ético, porque isso é ditado pelas leis da
vida. Enfim, o que se busca é o reencontro do poético na continuidade da vida de todos,
essencialmente dialética, vendo “a conciliação dos contrários e que, temporalmente, ela é feita
“Contra o positivismo, que pára perante os fenómenos e diz : 'Há apenas fatos eu ',
“Só os homens livres são muito gratos uns para com os outros.”
Baruch de Espinosa
Repousa sobretudo nos princípios e institutos do positivismo oficial. O jurista não tem o
conhecimento amplo que a atividade exige dele, que busca, sobretudo, a compreensão dos
problemas humanos e a resolução dos conflitos intersubjetivos.
Há apenas, nas escolas de Direito, a reprodução da ideologia da classe dominante. E
são transmitidos tão-só os valores negativos do capitalismo. Houve uma grande mudança,
independentemente do fim do sonho socialista preconizado pelos neoliberais. Exige-se hoje
uma postura ecológica do homens.464 Deverão os operadores jurídicos, pelo menos, ser
questões conjunturais e estruturais da. sociedade, sempre buscando uma solução com os
métodos disponíveis. Entrementes, o que se quer hoje é um ser comprometido com a natureza,
com a vida, enfim, com as múltiplas manifestações ecológicas que almejam um mundo melhor
462
Idem, ibidem..
"63
BACHELARD, Gaston. A âizztéâczz da âzzrzzçâo, p. 115.
196
para todos. Entende-se por ecologia não só a disciplina que busca a preservação do meio
ambiente, mas também a postura diante da vida, que quer manter todas as expressões da
natureza. Não basta querer-se a construção de uma sociedade mais justa, pois ter-se-á de
promover uma revolução interna, que nasce dos anseios humanos e de suas condutas.
Dependendo da alimentação, das atitudes, da ética perante a vida, é que se poderá
medir o respeito para com o ser que há em cada pessoa da coletividade. Há um Direito
verdadeiro, que nasce do coração de cada um, alicerçado numa ética humanista, e um Direito
falso, comercial, que tem compromisso com as classes dominantes e que somente se preocupa
em punir os já marginalizados pela sociedade. É importante a distinção que existe entre uma
ciência verdadeira e uma ciência falsa, uma ciência que quer compreender o homem e uma
ciência falsa, que não se interessa pelas questões humanas, zelando precipuamente pelo
interesse econômico.
“A diferença entre a medicina falsa e comercial e a medicina
verdadeira, conscienciosa, está entre o tratamento superficial, parcial, momentânea
e provisório da primeira e o tratamento profundo, global, perene e permanente da
segunda. A comparação entre os dois tipos de tratamento é muito interessante e
mostra diferenças tão grandes que dá-nos a impressão de ser relativa ao paraíso e
"46
ao infemo.
A ciência do Direito que busca a verdade não se encontra com as fronteiras criadas
verdade deverá levar em conta que os fenômenos são complexos, estão sempre interligados, e
estão em permanente busca do seu sentido. E, o que é pior, os fenômenos recebem sempre
uma visão própria de cada investigador que, na verdade, não vêem os fatos, mas a
compreensão que eles têm dos fatos. O operador jurídico deverá ter sensibilidade. A
racionalidade criou empecilhos para o desenvolvimento científico. E impôs uma conduta
completamente divorciada da realidade das coisas. Deverá o jurista, sobretudo, ter consciência
de que os instrumentos que emprega para a resolução dos conflitos que lhe são apresentados
têm limites. E que ideologicamente a sua vida está impregnada de elementos positivos e
negativos. O Direito atual busca conservar a estrutura de poder, porque ele é, sobretudo,
expressão de poder. Existem aqueles que detêm o conhecimento e os demais que deverão se
Para PATRÍCIO, Zuleica Maria “et alii”, Qualidade de vida do trabalhador - uma abordagem qualitativa
454
do ser humano através de novos paradigmas, p. 20, o paradigma holístico-ecológico traz em si uma abordagem
transpessoal e transcultural, exigindo do sujeito razão e sensibilidade.
455
KIKUCH1, Ton1io.Autocuraterapia - transformação homeostática pelo tratamento independente, p. 6.
197
submeter às deliberações das autoridades. Há sempre uma grande resistência quando se propõe
«Hay que saber transmitir, en lenguage sencillo, inteligible para el paciente, una
información que debe tener en cuenta las probabilidades de que se suceda lo
previsto. La medicina es una ciencia en la que todos os sucesos se expresan en
cálculo de probabilidades. No hay nada seguro. En definitiva se trata de un triple
problema de conocimiento, aptitud para transmitir información y actitud de
“'66
empatizar y compartir com el paciente.
Por que o cidadão que precisa de uma decisão judicial não pode optar por uma outra
forma de composição, diversa daquela imposta pelo Estado a todos? Por que há a imposição
de uma Medicina oficial, quando existem muitos tratamentos alternativos, que questionam
profundamente o sentido da cura? Será que a Medicina tradicional, atacando os sintomas das
doenças, consegue curá-las?
Ela é imprescindível para que haja o equilíbrio. Não há o equilíbrio da saúde sem o
desequilíbrio da doença. Como a violência faz parte da vida em sociedade, É claro que quando
assume grandes dimensões, deve ser objeto de preocupação. Devem ser buscadas as suas
causas, que são múltiplas. O que se diagnostica hoje é a existência duma sociedade gravemente
doente, que não consegue ver fiaturo porque tem um passado problemático e um presente que
não tem condições de respeitar os mais elementares anseios da comunidade. Como conseguir
superar a grave crise social em que vive? Em essência, há distinção entre os problemas
todas as coisas.
homem historicamente. O ser humano não está só. Está interligado aos demais elementos. E
tem sede de desbravar novos caminhos, de descobrir novas verdades, enfim, de reencontrar a
sua essência há muito tempo perdida. Ele não está só. Nunca esteve. A vida nasceu, cresceu e
466
ESPELETA, Lydia Buisan, “Bioética y principios básicos de ética médica”, p. 162.
198
mar, a terra, enfim, os demais elementos que lhe fornecem alimento e paz. Já não há
humano se todos os órgãos forem formados por próteses ou órgãos sintéticos. Estar-se-á
religiosos ou políticos. Há, sem dúvida, grande semelhança entre os princípios que regem as
diferentes religiões dos povos que habitam o planeta.
457
Para BOFF, Leonardo. O despertar da águia - o diabólica e o simbólico na construção da realidade, “Na
vida transparece o que seja um sistema aberto. Ela é simbiótica, quer dizer, vive da troca de matéria e energia
com o meio circundante. Somente subsiste e se desenvolve na medida em que está longe do equilíbrio. Se
chegar ao equilíbrio tennodinâmico significa que morreu. O cadáver em decomposição começa a virar pó. A
situação de não-equilíbrio faz com que o organismo vivo busque sempre um equilíbrio dinâmico e desenvolva a
luta contra a entropia. E o faz mediante as assim chamadas estruturas dissipativas, termo criado pelo grande
cientista russo-belga Ilya Prigogine, prêmio Nobel de química de 1977.”
46*
H1RosH1, Tnoomogowo, coro-fo o fi mesmo, p. 46, oito o dr. Ryoiolú Nakao, médico o diretor do
Associação Médica Japonesa, que diz que conhecido o fato de que é impossível criar vida pelo homem
através de meios químicos ou científicos. Por exemplo, é impossível criar até mesmo uma simples ameba. Nós
temos cerca de 10 trilhões de células vivas em nosso corpo. A regeneração de um tecido ferido depende
inteiramente da cura natural. Apesar de ser impossível gerar nova vida com química, damos muita importância
a medicina. Na verdade, doença
a é curada pelo poder curativo existente dentro de nós, enquanto os remédios
ajudam a retirar os sintomas do mal nos doentes.”
199
caminho seguro para a construção de uma nova vida. O operador do Direito terá de ter sangue
alcalino, corpo equilibrado, mente sã, sem qualquer tipo de dependência química (de drogas,
moléstias buscam o equilíbrio do seu organismo. É claro que está surgindo um novo ser
humano, mais compreensivo, mais voltado para a defesa dos mais caros valores humanos,
voltado para uma ética ecológica e integral.
justiça real. Não se trata de uma justiça formal, resultante da aplicação dos princípios e das
normas que existem no sistema, nem de uma justiça institucional, restrita aos limites do Poder
Judiciário. Não incumbe só a ele promover a justiça. O operador jurídico deve atuar em busca
de uma justiça universal: não discrimina povos; avança na direção do fortalecimento de uma
sociedade solidária, livre, em harmonia com os princípios que regem a natureza e que
permitem a libertação de todos. O espírito crítico deverá residir no operador do Direito que
469
D1 BERNARD1, Ricardo. op. cn., p. 13.
*”°1âem, ibiâzm., p. 13-4.
200
estabelecem requisitos da sentença. É claro que os aspectos técnicos não deverão ser
desprezados. Há uma preocupação tão-só com o exercício do poder individual, com a
enfim, com a defesa dos poderosos como se eles fossem os verdadeiros donos da sociedade. O
formando de Direito jura defender, com o mesmo denodo, pobres e poderosos. Com o mesmo
denodo não, haja vista que os desiguais deverão ser tratados desigualmente, para que se possa,
corrigindo, promover a verdadeira igualdade.
“A cosmovisão mecânica fracasso, em última análise, porque não labuta
em direção à maior consciência ordenada. Não reflete as instituições nem as
necessidades pessoais da maioria das pessoas, nem tampouco o fato simples e
bastante clássico de que vivemos num mundo 'encolhido', um mundo no qual a
tecnologia e a comunicação de massas, a poluição industrial e a ameaça de
extinção global fizeram-nos conscientes, como nunca anteriormente, de que algum
modo importante somos todos interdependentes, de que nossas vidas humanas estão
inseparavelmente entrelaçadas ao mundo natural. Uma visão do mundo que leva à
fragmentação e encoraja a exploração egoísta dos outros e de nosso mundo comum
”4 71
l
A fragmentação levada a termo pela ciência teve por objetivo estudar melhor os
fenômenos. Só que isso levou à perda da essência da vida, nas suas múltiplas manifestações.
armas mais importantes para a manutenção da paz social. É como se fosse possível a obtenção
direitos das pessoas, pelo Estado, pelos poderosos, enfim, por todos aqueles que têm o
controle do sistema jurídico, ou que por ele são beneficiados.
“A separação entre a cultura e a natureza tanto levou ao relativismo de
toda a sorte - factual, moral, estético e espiritual(¡'ulgamentos de valor) - quanto ao
dogma e ao fimdamentalismo extremado. Parecia não existir um meio-termo entre os
dois extremos: entre dizer que determinado modo de ver as coisas era somente um
dentre muitos modos contingentes e relativos de ver essas coisas e dizer que havia
somente um modo verdadeiro e absoluto de vê-las. Parecia não haver maneira de
dizer que não éramos inteiramente criaturas da cultura e, portanto, não enraizados
em nenhum fato estabelecido, nem inteiramente criaturas da natureza (do mundo
determinado), sem nenhuma flexibilidade ou espaço para desenvolvimento criativo.
No Ocidente, tais dicotomias roubaram nossa individualidade de seu
contexto e a plantaram no mais profundo isolamento, levando-nos ao narcisismo.
Fomos privados de uma confirmação exterior de nossa vida interior, o que levou ao
4"
zofiém, Damn. 0 ser qzzânfico, p. 291.
201
normas e de violência para controle dos impulsos humanos. Não se trata apenas de instrumento
de controle das classes dominantes. Mas um sistema dotado de grande riqueza, com
capacidade de contribuir para a emancipação do ser humano, estimulando, inclusive, a prática
não realizados, sempre pedindo uma evocação, uma interpretação.”473 Os operadores jurídicos
fazem parte do mundo real, muito embora atuem na fantasia do sistema jun'dico. A liberdade é,
com efeito, o fim dos limites do sistema.
“La libertad entendida como poesia. Nadie es quando sueña com libre
mundos completos e idealizados. Mundos que nos dejan prisioneros de sueños
perfectos nunca realízables. De ahí la libertad como poesia que acoge la
imaginación colectiva. La líbertad determinada por la producción del ƒuturo. Se
renuncia a la vida cuando no se apuesta, con el otro, poéticamente en el futuro. Es
la renuncia a la vida de Julie, que desestimó la dimensíón poética de su cuerpo
negando-se a tener futuro. Ella pretendia continuar viva idealizando (perfecta) la
pulsión de muerte (negando toda posibilidad al futuro de sus afectos). Algo
imposible de conseguir mientras se está com vida.
La poesia, el otro como poesia, es el único antídoto cuando se apuesta
en el desencanto como valor absoluto. El valor curativo del amor como apuesta de
'
libertad.
O intérprete do Direito é como o crítico literário, vale dizer, está sempre em busca de
um significado do texto. Qual o melhor significado? É aquele que contribui para a
normas e as decisões do sistema jurídico estão sempre pedindo uma interpretação, uma melhor
resposta para o sofiimento humano. Busca-se, à luz da dogmática, a solução dentro do
sistema. Ocorre que o sistema é aberto, alumiado fiindamentalmente pelos princípios jurídicos,
que são verdadeiras pontes que unem a ciência jurídica às demais áreas do conhecimento.
A revolução deverá ter início dentro de cada um. Deverá nascer do equilíbrio de
pela ciência ou pela política. E, ao invés de contribuir para a libertação das pessoas, atua para
474
WARAT, Luis Alberto. Por quien cantan las sirenas, p. 134.
4” conforma DYCHTWALD, Ken. WILBER, 1<aa“a¢ am”. o paradigma haiagrâfiaa z aaaas paraaaxaa _
uma investigação nas fronteiras da ciência, p. 109, há várias afirmações básicas sobre a vida e a consciência
que emergem simultaneamente dessa teoria. Destaca-se uma pela sua importância “Cada aspecto do universo
:
em si mesmo, um todo, um ser completo, um sistema abrangente por si mesmo, por 'direito nato contendo
e', ',
que o Estado é o grande responsável pela resolução dos nossos sofrimentos é bobagem. O
operador jurídico do terceiro milênio deverá ter a visão de integridade. Nela cabem os
melhores elementos das religiões, das ciências, dos pensamentos articulados pelos intelectuais
durante milênios. O operador do Direito deverá fugir da racionalidade excessiva, porque ela
sempre presente, transferindo o sujeito para o objeto observado, quando não se toma ele
sogra, o jomalista que emite a sua opinião - tratando-se de um caso de repercussão regional
Não se pode considerar a decisão judicial apenas como uma manifestação estatal. Ela
nasce de um conflito, de uma experiência de vida e precisa ser objeto de uma profunda
reflexão. Deverá a questão submetida ao juiz ser avaliada etica e politicamente. Há um
compromisso do operador jurídico do novo milênio com a vida, não lhe cabendo fazer
476
BANDLER, Richard Usando sua mente: as coisas que você não sabe que não sabe: programação
A
neurolingüisiica., p. 30.
4" ver CARLIN, v01nei1v‹›,p. 211-ó.
204
biodiversidade. Temos que reconhecer o ecocídio como uma das maiores violações
"08
dos direitos humanos e das outras espécies.
O jurista do novo milênio deverá se preocupar também com a ecologia interna. Terá
de buscar o autoconhecimento. E, com certeza, verá a vida com outros olhos. Não há a
poderá ser nosso inimigo. Cada ser tem a capacidade intrínseca de transmutação bioquímica,
bem como de modificação de sentimentos. Fecham-se para a comunidade, na esperança de se
salvar do tumulto que atinge a sociedade. De nada adiante o emprego da força para gerar a
paZ.
A
~
Os diferentes deverão ser respeitados. Todos sao desigualmente iguais perante a lei.
Não há uma pessoa igual a outra. Não há um caso igual a outro. Todos merecem análise
acurada. A jurisprudência atua para simplificar o complexo, para que um caso tenha solução a
partir de outro semelhante. Só que isso nem sempre é possível. Só que a jurisprudência não
tem conseguido responder a todas as questões. Gera conflitos entre correntes diametralmente
opostas. Porém, as soluções díspares são naturais, embora gerem muita confusão, na prática.
478
DIAS, Edna Cardozo.0 advogado do novo milênio-, p. 27.
479
Viver é uma Conviver em paz é uma tarefa que exige um aprendizado permanente.
arte.
48°
Ver EDELMAN, Joel, CRAIN, Mary Beth. 0 tao da negociação. Quase no final da obra, os autores
ressaltam “Nessa história existem, na verdade, dois guerreiros: um, o guerreiro voltado para a guerra; o outro,
A
:
o guerreiro voltado para a paz. expressão “guerreiro da paz” pode parecer incongruente, mas como tão
inteligentemente observou o XIV Dalai Lama, a paz não é simplesmente a ausência de guerra. A
paz é um
estado ativo, e não passivo; tanto as condições de guerra como as de paz requerem a mesma quantidade de
energia para sustentarem-se a si mesmas. Nós escrevemos o Tao da negociação para ajuda-lo a transformar-se
em um guerreiro pela paz, através de uma mudança em sua atitude - e, portanto, em suas reações - ao conflito.
Ao ficar mais familiarizado com suas próprias coisas - suas necessidades, vontades, motivações, intenções,
razões ocultas, formas como você reage a situações de conflito real ou potencial - voce desenvolve uma
consciência sobre como você contribui, consciente ou inconscientemente, para as suas situações de conflito em
sua vida.”(p. 329).
48*
Idem, ibidem.
205
O operador jurídico deverá ter consciência de sua ignorância. Terá de buscar sempre a
interconexão entre todos os elementos, para que possa estabelecer um diálogo com o problema
e encontrar a melhor solução. Uma decisão judicial é sempre reflexo do modo de pensar do
julgadorfm Quando ele aplica fiiamente a lei, está comprometido com o sistema jurídico
instituído e com os valores por ele defendidos. Sem o autoconhecimento, o reconhecimento do
seu papel na grande trama da vida, o operador o Direito não conseguirá contribuir para o
encontro da Justiça.
“O reconhecimento que os homens que se conduzem pelo desejo cego
experimentam uns para com os outros é, a maior parte das vezes, mais uma
mercadoria, ou seja, uma trapaça, que um reconhecimento. Além disso, a ingratidão
não é afecção. A ingratidão é, no entanto, torpe, porque, a maior parte das vezes,
indica que o homem é afetado por um ódio, ira ou soberba ou avareza etc.
excessivos. Com efeito, aquele que, por loucura, não sabe compensar os benefícios
recebidos, nào é ingrato; e muito menos aquele que não é movido pelas dádivas de
uma meretriz a sati.¶'azer-lhe os desejos libidinosos, nem pelos dons do ladrão a
calar os seus fiirtos, ou pelos de outra pessoa semelhante. Pelo contrário, mostra ter
um espírito constãnte aquele que não suporta deixar-se corromper por nenhuma
dádiva para sua própria ruína ou para a ruína comum.”483
elevado mister, que embora vitalício, não é etemo. Pelo simples fato de atuar no sistema
juridico, não deixa de ser uma pessoa humana, com as suas limitações, com as suas angústias e
com suas buscas. O novo operador jurídico deverá se assumir como pessoa que erra, que se vê
pequeno diante da complexidade» da vida e que reconhece o fracasso da metodologia
tradicional para a resolução dos conflitos. Precisa-se, com urgência, de uma nova ciência, que
fuja do maniqueísmo e que, sobretudo, reconheça a incerteza. Warat diz que é inadmissível
Para FOUCAULT, Michel, Nietzsche, Freud & Marx, a interpretação encontra-se diante de um dilema “de
482
:
interpretar-se a si mesma até o infinito; de voltar a encontrar consigo mesma. Daqui se depreendem duas
consequências importantes. A primeira refere-se a que a interpretação será sempre, sucessivamente a
interpretação 'de quem?'; não se interpreta realmente: quem propôs a interpretação. O princípio de
interpretação não é mais do que o intérprete, e este é talvez o sentido que Nietzsche deu à palavra “psicologiaí
A segunda conseqüência refere-se a que ao interpretar-se sempre a si mesma não pode deixar de voltar-se sobre
a si mesma. Em oposição ao tempo dos símbolos que é um tempo com vencimentos e por oposição ao tempo da
dialética, que é apesar de tudo linear, chega-se a um tempo de interpretação que é circular. Este tempo está
obrigado a voltar a passar por onde passou, o que ocasiona que, no final, o único perigo que realmente corre a
intepretação, embora seja um perigo supremo, é o que, paradoxalmente, fazem correr os simbolos. morte daA
intepretação é o crer que há símbolos que existem primariamente, originalmente, realmente, como marcas
coerentes, pertinentes e sistemáticas. A vida da intepretação, pelo contrário, é crer que não há mais do que
intepretações.”(p_. 26).
4” EsPINosA, Barueri ae, Éficzz, p. 394. .
206
“Una racionalización maniquea que no quiere ver jamás los efectos de la duda y de la
primitivas e passou a refinar as informações que resultaram na sua quase total alienação da
da espécie humana.
Uma coisa é a percepção, outra é a coisa mesma que permanece na sua natural
encontro de uma sociedade democráticam, socialista, solidária, melhor para todos. Se não
484
WARAT, Luis Alberto. Semiotica ecologia y direcho - los alrededores de una semiótica de la mediación,
p. 57.
485
Idem, ibidem.
486
ALVES, Rubem. Filosofia da ciência -introdução ao jogo e suas regras, p. 203.
487
Segundo WEFFORT, Francisco C. Por que democracia? p. 130, para que se tenha uma democracia
verdadeira precisa-se promover “alterações drásticas na política econômica, redirecionando o funcionamento da
economia para atender às demandas populares. Como pode funcionar a democracia em um país em que cerca
de trinta milhões de pessoas vegetam em uma condição de miséria absoluta? E não fica nisso. É evidente que a
democracia terá de contribuir para a supressão das desigualdades sociais extremas que impedem, para a maioria
do povo, o acesso à cidadania. Neste sentido, a realização de uma reforma agrária é uma tarefa democrática
urgente.”
207
~
O sistema jurídico precisa nao só de conhecimento, mas, também, fundamentalmente,
de sabedoria. Segundo Morin, “A sabedoria pode problematizar o amor e a poesia, mas amor e
a poesia podem reciprocamente problematizar a sabedoria.”49°
Para Frei Beto, verdadeiramente, “Somos um corpo. Assim como a árvore brota da
terra, o corpo humano emerge da evolução do universo. Somos todos feitos de matéria
estela.r.”491
Se se tiver consciência de que todos os seres fazem. parte da mesma vida, mais fácil
desempenhará o Direito o seu papel de articulador da paz numa sociedade de relações entre
~
seres distintos e irmaos.
488
MONICK, Eugene. Castração fúria masculina, p. 40.
489
MORIN, Edgar. Amorpoesiasabedoria, p. 8-9.
49°
Idem, ibidem, p. 9.
491
FREI BETO, 0 corpo cósmico, p. 2.
208
O que se quer é dizer não à doutrina tradicional de uma razão absoluta e imutável,
que. se constitui apenas. numa filsofia, porém numa filosofia. caduca. isso que diz Bachelard,
“verbis”:
pensamento cartesiano que ainda impera no mundo hodiemo.493 O operador do direito ter
consciência de que o sistema está alicerçado nos valores negativos do capitalismo e divorciado
da realidade.
'
japoneses etc., para que possam ter um sistema ético, “criado em harmonia com a ordem
natural das cousas.”494 Enfim, um direito calcado na ética natural da vida, mais próxima da
natureza essencial do ser humano, conforme Confiicio;
“Aquilo que 0 céu dispõe chama-se natureza essencial. A conformidade com
a natureza essencial chama-se lei natural. O aperfeiçoamento da lei natural chama-
”495
_
se cultura.
\
"92
BACHELARD, Gaston. Filosofia do novo espírito cientifico, p. 203.
493
Vide DESCARTES, Discurso do método.
494
RÁO, Vicente. 0 direito e a vida dos direitos, p. 113718.
4” Apuú MARITAIN, Jaques. A filosofia moral, p. 24.
209
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A unidade reside na diversidade. Na pluralidade há unidade.
repensar não só a ciência, mas também todas as áreas do conhecimento humano. Visa,
~
sobretudo, integrar os diversos elementos. Consiste numa maneira de ver as coisas. Nao é
passa-se a refletir a respeito do momento que vive o Direito, do grande divórcio que o Direito
vive com a realidade, e dos instrumentos medievais de controle da condutas humanas que ele
E
emprega.
O holismo visa, promover uma mais humana
H
se materialize num olhar que permita a ruptura da tradição científica. O holismo contribui,
assim, para que se possa empreender uma busca da verdade que, a cada momento, parece mais
distante. Não se pode ter a pretensão de construir verdades absolutas, a partir do domínio
total da ciência. Todas as verdades são relativas. Somente se poderá chegar a determinadas
conclusões importantes se se tiver consciência' da necessidade das pontes que deverão ser
aspectos. E não se pode afirmar hoje que as ciências exatas estão mais próximas da verdade. A
holística promete o resgate das ciências sociais, que estão, no nosso entender, mais próximas
da complexidade da realidade do universo. O misticismo das ciências dotadas de
conhecimentos tradicionais faz com que sejam encontrados dois pontos aparentemente
distantes, localizados em dois pontos inconciliáveis. O holismo surge como a nova visão da
vida, mais ampla, mais em consonância com a realidade que bate diariamente em nos Tribunais
e que exige resposta convincente, mais próxima do sofrimento do povo e da busca diutuma
da vida e do homem nas suas múltiplas dimensões. Não se pode cometer os mesmos erros das
ciências tradicionais. Nem biologizar o Direito e nem permitir que haja irracional
desencadeadoras. Deverá o homem ser visto como uma totalidade integrada no ambiente
natural. Os problemas humanos estão interligados. A grande revolução poderá nascer de
dentro de cada um, de uma busca e de um compromisso por todos assumidos para se
promover a transformação necessária da vida que se tem para a vida que se quer, mais
solidária e mais justa. O olhar eletrônico que se lança na ciência não permite só a visão
microscópica, mas também conduz o conhecimento à busca de um novo tempo, que consiste
ficaram presos aos mecanismos sólidos da dogmática, pensando que eles seriam os
responsáveis pela consolidação do domínio patriarcal sobre a face da terra. O holismo traz uma
proposta de libertação dos compartimentos edificados pelas ciências, sem se constituir numa
visão ingênua da totalidade e sem desprezar a divisão para a compreensão que foi empreendida
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235
ANEXO
APRESENTAÇÃO
Por uma visão holística
um especial enfoque à questão jurídica nesse contexto aparentemente novo. A partir daí
áreas do conhecimento.
O holismo busca, sobretudo, resgatar a interconexão entre todas as ciências e, acima
de tudo, entre a religião, a arte e a ciência. Ao invés de serem campos que se excluem, eles se
visão holística, não se tem um órgão doente, mas um indivíduo doente. O problema também
não está localizado em parte do corpo social, mas em todo ele. Não há nenhum elemento
desconectado do todo. A verdade está em todos elementos ligados que, em dança permanente,
constituem expressão da mais pura energia que move o universo.
Já os pré-socráticos tratavam da visão de integridade. Os orientais, há mais de cinco
mil anos, lançaram as bases do princípio único universal, que, considerado místico inicialmente,
hoje é reconhecido pelos setores mais avançados da ciência como verdade inquestionável. Os
métodos tradicionalmente empregados proporcionaram uma visão parcial dos fenômenos. Isso
hodiemo como resultado dos dogmas que foram impostos aos homens como verdades
'
absolutas.
236
ser permanentemente questionada e inter-relacionada, para que se tenha uma noção mais exata
de sua importância para o contexto de uma grande teoria do conhecimento. Não existem
excessivamente
doenças incuráveis, mas pessoas incuráveis. Os problemas complexos foram
simplificados. Não se vislumbram problemas insolúveis, mas alguns homens que estão
comprometidos com os interesses das classes dominantes e que não querem saber da verdade,
camadas culturais que foram sobrepostas ao ser e desnudá-lo, para que a sua essência possa se
porque, sem ela, não se conseguirá resgatar a verdade que está em algum lugar dos escombros
da ciência deste final de século.
Os homens, com certeza, caminham para algum lugar. Nenhum cientista consegue
precisar para onde. Todavia, tudo leva a crer que a crise terá um papel importante no
que foram impostos? Em primeiro lugar precisa-se de consciência. O doente que não souber
da gravidade de sua doença não consegue se libertar dela. Quanto maior a face, maior o dorso.
profunda
Quanto mais grave for a moléstia, maior a lição que se deve dela extrair. Quanto mais
a crise por que se passa, maior é a força que move o ser humano no sentido
de vencê-la.
tradicional apresenta, baseada na falsa crença de que a natureza deve ser fragmentada para ser
mais bem compreendida. Para a resolução dos problemas, a visão de integridade não se
satisfaz com as respostas prontas, e nem com os caminhos previamente traçados pela ciência
tradicional.
que a destruição do edificio da ciência só será possivel a partir das suas próprias contradições
intemas.
leitura parcial dos problemas. Simplificam o que é complexo. Dão-se respostas sempre
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medida imprescindível para a superação da grave crise que afeta a todos e que deixa a maioria
sem qualquer perspectiva de vida.
Não quer o holismo se transformar em uma nova ciênciam, mas, isto sim, questionar
os valores negativos que foram fomentados pela ciência tradicional durante anos. Para romper
revolucionar o objeto de preocupação dos investigadores. Há, sem dúvida, como campo de
interesse maior, uma grande teoria do conhecimento, que vem sendo estruturada há milênios e
que separa e busca sedimentar o conhecimento, e, de outro lado, a sensibilidade, que permite
que a intuição da alma vasculhe a verdade em todo o lugar, respeitando todas as tendências,
constitui medida imprescindível para que o ser humano possa se libertar. Ter-se-á de realizar
uma avaliação periódica das descobertas e, ao mesmo tempo, pensar sempre na renovação
diante de valores positivos. Mesmo eles, contudo, poderão ser prejudiciais, quando forem
fatores de inércia.
natureza do ser a busca pennanente de melhores dias. Na natureza não há nenhum elemento
que tenha existência solitária. Não há nada em estado estático. A própria Terra gira em tomo
do O Sol, por sua vez, integra o sistema da Via Lactea, também vive através de constantes
Sol.
Pode, no entanto, ser visto o holismo como um método que prioriza a complexidade na leitura dos
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fenômenos da vida, muito embora isso possa ser considerado, “a priori”, um reducionismo.
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STEIN, Suzana Albornoz, diz, à p. 93, “verbis”: “Eu não desejaria uma “feminilização do mundo... Mas
acredito que certos fatos próprios às sociedades atuais
- tais como a corrida do armamento, a agressividade
urbana, a destruição ecológica, a manipulação das massas - necessitam da contribuição “feminina” para ser
superados. Isto quer dizer: necessita-se de homens e mulheres que também percebem “valores femininos”, como
o cuidado da vida, o cultivo do amor, a busca da beleza, a alegria da
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contexto maior, de mais de cem milhões de sistemas iguais ao nosso. Definitivamente, a Terra
não é o centro do universo. Constitui-se apenas em uma partícula dele. Não é eterna. O
Universo está em expansão, conforme atestam os cientistas, o que poderá levar à destruição
dela. Em verdade, o ciclo da vida está presente em todos os seres, em todo o lugar, regulando
a atuação de todos os seres no universo.
A ciência percorre o mesmo caminho da religião. Quer respostas para as questões
excessiva tem sido, sem dúvida, o grande obstáculo para atingir o seu desiderato.
Paralelamente ao raciocínio lógico, o cientista deve empreender uma grande busca do sentido
complexo. É muita pretensão conseguir-se um remédio para cada doença ou uma vacina para
cada moléstia, quando existem mais de trinta mil patologias catalogadas pela Organização
criatura consegue viver sem os demais seres, há uma etema dança, consistente numa troca
permanente de energia entre tudo e todos. A matéria é energia. A energia é matéria. O sonho é
realidade. A realidade é sonho. g
fenômeno por poetas ou por místicos. Cada enfoque deve ser objeto de profunda reflexão da
parte do cientista, que, antes de ser cético em relação ao desconhecido, deve ter a mente aberta
insiste-se na adoção de
e o coração receptivo a todas as experiências e sentimentos. Por isso,
um método que permita uma leitura integral dos fenômenos, não rejeitando os aspectos que
Não há um modelo preestabelecido de ciência, assim como não se pode afirmar que
se-ia espancando o bom senso e fortalecendo o edificio da ciência tradicional, que somente
prioriza o poder, e que, por isso, se encontra hoje destituída de fundamentos, quer dizer,
alicerçada na lama.
em inércia. Toda a matéria é energia, que não permanece inerte. A dança é permanente. O
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homem é uma partícula insignificante diante do mundo. O mundo é uma poeira face ao
Universo. O nosso sistema solar é muito pouco diante do conjunto de sistemas que compõem
o Universo. Para um homem, uma célula é um minúsculo elemento. Um átomo contém todo
um universo do mundo subatômico.
Em sentido absoluto, nada é grande ou pequeno, verdade ou mentira, vida ou morte.
Algumas células morrem diariamente para o corpo viver. A sociedade nova nascerá
independentemente da previsão dos pensadores e estará mais voltada para a subjetividade, para
a liberdade individual, para o respeito à natureza, para a poesia e, o que pode parecer
paradoxal, para solidariedade que emana da natureza. Nada melhor do que acompanhar o
ritmo da natureza e as leis dela, para que se possa ter uma idéia, pelo menos superficial, da
Indiscutivelmente, ele revestiu-se de caráter científico, sem que os seus operadores, num
primeiro momento, vissem as pontes com as demais áreas que se formavam. O pluralismo
exsurge, neste final de século XX, como bandeira capaz de respeitar as várias correntes,
mesmas, discriminam. O mesmo ocorre em relação às mulheres. Por que elas recebem uma
tratamento diferenciado? Os desiguais são tratados desigualmente à medida em que se
O Direito não pode ser visto apenas como fator de contenção do desejo e manutenção
do status quo. Idealiza-se uma sociedade conservadora e nela inserem-se os ideais burgueses
num conjunto legislativo. Há uma sociedade real e uma sociedade do mundo das normas. Elas
vivem distantes, mas verifica-se uma influência muito grande da legislação na vida das
pessoas. A lei gera bloqueios reais nos indivíduos, levando-os ao analista. O novo ser quântico,
integral, não vê fronteiras entre as diversas áreas do conhecimento. Ele navega dentro si
mesmo, sabe de sua eternidade e admite a sua transformação pennanente. Reconhece a matéria
como energia e tem convicção de sua natureza divina.
Acredita-se que a visão de integridade aproxima of Direito ao jusnaturalismo, às leis
da vida, a um direito natural de um novo tipo, essencialmente ético. E isso não implica
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desconsiderar a dogmática. Haverá sempre a convivência de algo natural num sistema artificial
resgatar toda a reflexão levada a termo pelos cientistas e pelos místicos no transcorrer dos
anos. Tem-se a séria incumbência de questionar todo o conhecimento até aqui obtido, porque a
conhece? Por que se conhece? Tem-se, no entanto, que concordar com Foucault segundo o
Quer-se desnudar o ser humano das camadas culturais que lhe foram impostas, a fim
de que ele possa expressar a sua sexualidade, a sua vida e, sobretudo, empreender a busca da
paz. O ego é obstáculo para o encontro da essência do ser. Também o ego construído serve
como fantasia ao operador do direito, inserindo-o num determinado papel (juiz, professor etc).
Para que se possa humanizar a ciência, é preciso, antes de tudo, reconhecer-se as limitações
dos métodos tradicionalmente adotados.
Se a grande crise do conhecimento atinge as denominadas ciências exatas, ela não
deixará de fazer terra arrasada nas ciências humanas. Uma ciência verdadeira reconhece os
Em verdade, o holismo não pretende se tomar uma nova ciência. Mas, isto sim,
correntes e tendências e reconhece que existem muitos caminhos para a descoberta da verdade.
Tem-se que aprender, fundamentalmente, que, neste final de século, a saída não
reside numa única proposta, mas em todas elas. Deve-se ter a capacidade de visualizar o que
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há de verdade em cada uma delas. Renovar a ciência é tarefa dificil: significa atentar contra a
estrutura de poder montada, enfim, fazer com que haja um permanente questionamento de
todo conhecimento que é imposto pelos cientistas, pelos políticos e pelos místicos. Muitos
interesses serão contrariados; porém a permanente busca da verdade justifica o risco de uma
`
proposta inovadora.
O novo paradigma científico traz uma revolução. Contudo, ele requer que se atente
para a Física Quântica, para a Teoria da Relatividade, para a Transpsicologia, para a Teoria
dos Sistemas etc., enfim, para um novo mundo, que se descobre a par-“tir da reflexão, de uma
percepção humanista, que traz à tona os valores primitivos e, ao mesmo tempo, contribui para
o reconhecimento de que todos os. seres fazem parte da mesma vida, e de que todos são
interdependentes, enfim, peças do mesmo jogo.
Paulo Roney Ávila Fagúndez
Direito e Holismo
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