Musica e Intervencao Psicopedagogica
Musica e Intervencao Psicopedagogica
Musica e Intervencao Psicopedagogica
ANAIS
Resumo
Este artigo busca tratar a música como possibilidade de ajuda cognitiva através do
estudo de um instrumento musical, para auxiliar alunos com dificuldades de aprendizagem,
que é o objeto de estudo da Psicopedagogia. Inicialmente é feita uma abordagem sobre
a Psicopedagogia, com foco nas dificuldades de aprendizagem relacionadas à cognição,
que são concentração e memorização. Posteriormente, o enfoque é na música e sua
relevância, sua função terapêutica no corpo e nas emoções, as implicações do estudo de
um instrumento musical, sua relação com a cognição e a intervenção psicopedagógica
na qual ela é utilizada.
Palavras-chave
Música. Psicopedagogia. Intervenção psicopedagógica. Instrumento musical.
Abstract
< This article searchs to consider the music as possibility cognitive help through
studying of a musical instrument, helping students with learning disabilities, which is >
object of study of Pysichopedagogy. At first is done an approach about Psychopedagogy
with a focus on the learning difficulties related to cognition (concentration and memory).
Later the focus is on the music: its relevance, its therapeutic function in the body and
emotions, the implications of the study of a musical instrument, its relation with the
cognition and the use of the psycopedagogical intervention.
Key words
Music. Psychopedagogy. Psycopedagogical Intervention. Musical Instrument.
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Artigo escrito sob orientação do Professor Doutor Pedro Lyra, com co-orientação da Professora Doutora Maria Cristina
dos Santos Peixoto, no Mestrado em Cognição e Linguagem da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy
Ribeiro - UENF
* Mestranda em Cognição e Linguagem – UENF
ANAIS
Dificuldades de aprendizagem
Para que se possa entender o que são as dificuldades de aprendizagem, é
necessário, inicialmente, que haja uma compreensão do que seja aprendizagem.
Segundo Fonseca (2007), a aprendizagem compreende um processo funcional
dinâmico que integra quatro componentes cognitivos essenciais:
• input (auditivo, visual, tatil-cinestésico, etc.);
• cognição (atenção, memória, integração, processamento simultâneo e
seqüencial, compreensão, auto-regulação, etc.);
• output (falar, discutir, desenhar, observar, ler, escrever, contar, resolver
problemas, etc.);
< >
• retroalimentação (repetir, organizar, controlar, regular, realizar, etc.).
< >
Como os fatores que podem interferir no processo ensino-aprendizagem são
diversos, não se pode deixar de investigar o ambiente no qual a criança vive e a
metodologia utilizada nas escolas (fatores socioambientais), antes de se direcionar
a intervenção psicopedagógica, pois a criança pode não ter uma dificuldade de
aprendizagem, mas apenas uma dificuldade de adaptação à metodologia utilizada
pelo professor, ou ao ambiente escolar, como também a ausência de estímulos
dentro de casa ou acompanhamento escolar de seus familiares.
O processo de ensino-aprendizagem requer uma integração entre afetividade,
cognição e ação e, nas pessoas que não apresentam dificuldades, esta integração
acontece, favorecendo assim a aprendizagem. Mas, aqueles que, por algum
motivo, apresentam dificuldades, esta integração aparece cheia de obstáculos, em
desorganização, provocando tensão diante das situações que envolvem o aprender.
O não conseguir aprender por repetidas vezes faz com que o indivíduo forme
de si uma imagem de derrotado, desenvolvendo baixa auto-estima, levando-o
à inibição ou afastamento de novas situações de aprendizagem, podendo gerar
um círculo vicioso do fracasso, pois quanto mais ele se sente inferiorizado, mais
estará propenso ao insucesso, e menos poderá conseguir aprovação a partir de seu
desempenho.
Após esta visão geral do que significam as dificuldades de aprendizagem e
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suas implicações, será apontada a direção do enfoque que se pretende dar neste
ponto do trabalho, que são aquelas que têm relação com a cognição: concentração
e memorização.
Concentração
Concentração significa direcionar esforços mentais para a realização de
uma determinada atividade, situação ou problema.
Existem vários fatores que podem prejudicar a concentração:
• Estímulos externos, que são aqueles provenientes do ambiente, como
ruídos, objetos, imagens, pessoas, músicas, odores, etc.;
• Estímulos internos, que são os da própria pessoa, como imagens mentais,
pensamentos, lembranças, preocupações e emoções;
• Problemas psicológicos, que envolvem dificuldades de ordem financeira,
relacionamentos familiares e sociais, problemas de doença e também questões
religiosas, que muitas vezes impõe determinados tipos de comportamentos
castradores e inibidores da auto-expressão.
como mais atraente que a escola, tirando o foco dos estudos e ocasionando numa
dispersão que pode desembocar numa dificuldade na aprendizagem.
Apesar deste reconhecimento dos estímulos que se constituem em
instrumentos dispersivos, não se pode evitar o seu uso, pois o mundo tecnológico
está cada vez mais desenvolvido, apresentando todos os dias novidades que
deixam as pessoas estarrecidas. Já que seu uso não pode ser evitado, que seja ao
menos feito com bom senso e moderação para que o seu excesso não prejudique
a concentração necessária, levando à dificuldade de aprendizagem.
O estudo de um instrumento musical tem importantes aspectos que podem
ajudar na melhora da concentração, como, por exemplo, quando o músico toca
com outros instrumentistas, fazendo o que se chama de música de câmera: é preciso
ter atenção para tocar na hora certa (porque muitas vezes o instrumento executa
apenas algumas partes da música); estar bem conectado com os outros músicos
para que a velocidade da música seja constante, não variando o andamento; no
caso de se ter um maestro, estar muito atento para suas orientações e variações de
interpretações; executar o próprio instrumento com o máximo de perfeição possível
e, para tanto, faz-se necessária uma grande concentração devido à complexidade
< >
das implicações da execução, com necessidade de boa leitura da partitura com
todos os seus símbolos, bem como as técnicas referentes ao próprio instrumento.
É por isso que, após esta descrição do que constitui a prática da música
em conjunto, pode-se afirmar que o estudo de um instrumento musical pode ser
considerado como importante ferramenta no auxílio do exercício da concentração,
ajudando o indivíduo a manter sua atenção direcionada, objetivando uma boa
execução de seu próprio instrumento, via utilização de técnica instrumental
adequada e eficiente leitura da partitura, além de oportunizar o prazer de ouvir o
bom resultado com a harmonia conquistada pelos músicos do grupo.
Memorização
Uma definição muito adequada de memória foi dada por Cardoso (S/D)
que escreveu em seu artigo:
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< >
Com toda esta riqueza de detalhes, pode-se concluir que executar um
instrumento musical exige a utilização e integração de diversos tipos de funções e
memórias, sendo que cada uma dessas funções requer ativações de várias partes
do cérebro.
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< >
ao corpo e mente que apenas se encontram em quem tenha
sido educado de forma correta.” Aristóteles também promoveu
a educação musical integral, pois estava convencido de que
“alcançamos uma certa qualidade de personalidade graças a
ela”. Confúcio considerava que a música exercia influência
tanto pessoal como política: ‘O homem superior pretende
promover a música como meio de aperfeiçoamento da cultura
humana. Quando a música prevalecer e conduzir as pessoas
para seus ideais e aspirações, contemplaremos o panorama de
uma grande nação’.
Como bem expôs Lyra (2009), “a música é uma arte rítmica, que se define
por sua progressão no espírito e, portanto, ocupa um lugar imaterial no tempo”.2
Existem registros muito antigos de instrumentos musicais que foram feitos
com o objetivo de imitar os sons da natureza, dos pássaros, do trovão, do vento
nas árvores e dos animais da floresta. Na Bíblia, no Antigo Testamento, são citados
alguns instrumentos musicais, já no primeiro livro, o de Gênesis, no capítulo 4,
2
LYRA, Pedro. “As Três Formas Culturais de Conhecimento” - Texto utilizado no curso Cognição e Linguagem da UENF
– Universidade Estadual do Norte Fluminense, 2009.
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< >
explicação médica, gerada por conflitos psicológicos inconscientes.
Foi na Grécia antiga que se descobriu a influência da música no corpo
humano. Aristóteles falava do verdadeiro valor terapêutico da música e Platão
receitava música para a cura das angústias. Ele afirmava que “a música é o remédio
da alma”, reconhecendo assim que sons produzem efeitos terapêuticos.
Comprova-se que a música exerce influência no humor das pessoas e na
sua saúde física, tomando-se como exemplo a atuação de musicoterapeutas que
fazem uso dela para ajudar na cura de muitas doenças e conseguem obter bons
resultados. Um trabalho de musicoterapia feito pela psicóloga, Pólo (2009), com
crianças vítimas de violência doméstica, mostrou a relevância do trabalho com a
música e seus efeitos terapêuticos:
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É por isso que se pode afirmar que, entre os benefícios que a música traz
para as emoções, se tem nas funções cognitivas e no comportamento a melhora
do humor, do sono, da motivação, da autoconfiança, diminuição da ansiedade,
auxílio no combate à tensão, ajuda na eliminação do stress, porque ela é capaz de
ativar no cérebro os mesmos centros de recompensa que uma comida saborosa,
droga ou sexo, e reduz as concentrações dos hormônios do stress, segundo Sé
(2005).
Existem músicas apropriadas para cada situação da vida, guardando as
devidas diferenças culturais. A música marcial sempre foi usada para despertar o
espírito cívico e existem músicas próprias para cada solenidade ou ritual: marcha
nupcial (para casamentos), marcha fúnebre (para velórios), cantigas de ninar (para
fazer o bebê dormir), de aniversário (cantadas nas festas, como “Parabéns pra
você”), hinos oficiais das escolas, hino nacional (muito cantado em solenidades
importantes e em jogos internacionais), etc.
Segundo Silveira (2004), “o uso de uma música apropriada diminui o
ritmo cerebral, contribuindo para haver uma equilibração no uso dos hemisférios
cerebrais [...] e a música barroca, especialmente o movimento ‘largo’ (bem lento),
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o instrumento.
Cada tecla do piano emite um som diferente e cada uma das notas tem
sua “cor”, sua identidade. São sete as notas musicais (do, re, mi, fa, sol, la e
si), formando um total de doze sons e isto acontece porque cada nota pode ser
alterada, tendo sua entonação modificada, com a utilização de símbolos que
podem ser escritos ao lado esquerdo da nota na partitura, que são sustenido,
dobrado sustenido, bemol e dobrado bemol.
O piano possui 88 teclas e as sete notas musicais vão se repetindo,
mudando apenas sua altura, indo do mais grave ao mais agudo. As notas podem
ser identificadas tendo como referenciais as teclas pretas, que são arrumadas em
grupos de duas e três, conforme exemplo a seguir:
< >
3
Imagem disponível em: http://www.walmirsilva.com.br/iniciante/escala-musical. Acesso em 6 de setembro de 2011.
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Música e cognição
Segundo Gardner (1995, p. 21): “Uma inteligência implica na capacidade
de resolver problemas ou elaborar produtos que são importantes num determinado
ambiente ou comunidade cultural”. Em sua teoria das inteligências múltiplas,
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existem várias habilidades às quais ele chama de inteligências, que cada pessoa
tem em diferentes graus e combinações e fazem parte da herança genética humana.
Conforme o estímulo recebido e a cultura na qual está inserido, o indivíduo
desenvolve mais uma ou outra(s) determinada inteligência.
Tais inteligências estudadas pelo autor se apresentam em um número de
sete, e, entre elas está a musical, que se caracteriza pela habilidade de identificar
sons, timbres e ritmos, compor ou reproduzir uma peça musical, bem como por
tocar um instrumento musical ou cantar.
Alguns sons musicais são derivados da fala: a entonação, a pontuação,
a exclamação, a interrogação, o tom da voz, que constituem elementos da
linguagem verbal que encontram seus correspondentes na música. É por isso que
pode-se afirmar que a música e linguagem são organizações sonoras que servem
ao homem como veículos de expressão.
O'Donnell (1999) conta que Albert Einstein, apesar de ser considerado
como um dos homens mais inteligentes que já viveu, poucos sabem que quando
ele era criança, teve grandes dificuldades de aprendizagem, chegando ao ponto
de seus professores das séries iniciais dizerem a seus pais para tirá-lo da escola
< porque ele era "burro demais para aprender" e seria um desperdício o gasto de
recursos, investimento de tempo e energia em sua educação. >
Sua mãe não achava que Albert era "estúpido". Ao invés de seguir o conselho
da escola, os pais de Albert compraram-lhe um violino. Albert tornou-se um bom
violinista. A música foi a chave que ajudou Albert Einstein a tornar-se um dos
homens mais inteligentes que já viveu. O próprio Einstein disse que a razão pela
qual ele se tornara tão inteligente era porque tocava violino.
O poder que a música possui para interferir na memória é impressionante.
Conforme relata O'Donnell (1999), pesquisas foram realizadas comprovando que
a música de Mozart e a música barroca, com um padrão de sessenta batimentos
por minuto e que possui uma ordem que inclui repetição e alterações, com certos
padrões de ritmo e tom, são capazes de ativar o cérebro nos lados esquerdo e
direito e esta ação simultânea, quando estes dois lados do cérebro são ativados,
maximizam o aprendizado e a assimilação de informações.
Atividades em que os dois lados do cérebro estão sendo ativados ao mesmo
tempo, como tocar um instrumento ou cantar, fazem que o cérebro possa ser mais
eficaz ao processar informações, levando-o a responder de forma especial aos
estímulos recebidos.
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Pesquisas revelam que os alunos que têm algum tipo de formação musical
têm a tendência de trabalhar melhor em grupos e são capazes de executar várias
tarefas de forma mais eficiente do que os alunos que não tiveram nenhuma
formação musical.
Perret (2009) fez uma experiência com um quinteto de sopros numa escola
onde os alunos tinham notas muito abaixo da média em testes estaduais de
desempenho escolar. O quinteto tocava para os alunos e conversava com eles sobre
música e instrumentos musicais. Esta experiência com música foi determinante na
melhoria cognitiva destes alunos:
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se espera do aluno em termos musicais. Muitas vezes ele sofre com exigências
descabidas de perfeição na execução de seus instrumentos, tirando o próprio
prazer que a música deve proporcionar ao intérprete.
Sobre tal questão, Gainza (1988, p. 101) admite: “O objetivo específico da
educação musical é musicalizar, ou seja, tornar um indivíduo sensível e receptivo
ao fenômeno sonoro, promovendo nele, ao mesmo tempo, respostas de índole
musical”.
Observa-se muitas vezes que algumas pessoas executam seus instrumentos
mecanicamente, sem que haja um envolvimento emocional com o que está sendo
tocado, numa preocupação única de simplesmente acertar as notas escritas na
partitura. Professores de música devem estimular a sensibilidade e percepção
de seus alunos para que a música que está sendo executada toque primeiro a
sensibilidade deles, como um convite sonoro para que penetrem no mundo
dos sons, estimulando a imaginação, para que aqueles que a ouvirão sintam a
sensibilidade da interpretação musical e também sejam tocados por ela, pois,
ainda segundo Gainza (1988, p. 95):
< >
Educar-se na música é crescer plenamente e com alegria.
Desenvolver sem dar alegria não é suficiente. Dar alegria
sem desenvolver tampouco é educar. Embora o aspecto do
desenvolvimento propriamente dito encontre-se associado
principalmente ao conhecimento das técnicas pedagógicas,
o segundo aspecto, chame-se prazer, alegria, plenitude,
participação ou motivação, relaciona-se mais de perto com
aquilo a que chamamos intuição ou espírito pedagógico.
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Considerações finais
O aprendizado da música e de um instrumento musical, segundo Gainza
(1988), ajuda no desenvolvimento cognitivo, auxiliando na memorização, na
concentração, facilitando a percepção auditiva, a atenção, estimulando a memória
imediata, o raciocínio abstrato, a imaginação e a criatividade, e estes benefícios
não são restritos apenas ao momento do estudo de um instrumento musical,
mas refletem-se nos vários setores da vida, sendo também válidos para todas as
idades.
Todos têm condições de aprender um instrumento musical, pois são cercados
por sons e ritmos com a audição de músicas desde a barriga da mãe, mesmo que
não se tornem “virtuoses”. O ser humano é construído, desde a gestação, com o
ritmo da respiração da mãe, as conversas e canções que o embalam. No útero, a
partir do quarto mês de gestação, os bebês estão ligados ao mundo exterior e já
ouvem.
Na vida do homem, a música é muito importante por ser um elemento que
auxilia no seu bem estar. A criança que é estimulada a desenvolver a apreciação
sensorial aprende a gostar ou não de determinados sons e passa a reproduzi-los e
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