Dicionário Do Brasil Colonial - Engenho - Ronaldo Vainfas
Dicionário Do Brasil Colonial - Engenho - Ronaldo Vainfas
Dicionário Do Brasil Colonial - Engenho - Ronaldo Vainfas
partituras não mais cessou, embora ainda se providenciar um substituto em suas faltas.
mostre insuficiente. Na realidade, com Nessa posição, viria a falecer em I o de abril de
freqüência as composições aparecem em cópias r 8o5. (GPN)
de segunda ou terceira mão, reahzadas por
membros de alguns dos conjuntos locais do *; Referências BibliográJicas
século XIX e inícios do XX, que continuaram a BARBOSA, E. C. C. et alii. O ciclo do ouro: o tempo e
utilizá-las até o fim deste século, como é o caso Rio de Janeiro, PUC-RJ,
a música do barroco católico.
da orquestra Ribeiro Bastos, de São João del I979; LANGE, F. C. "Os compositores na
R"y. capitania geral das Minas Gerais". Estudos
no Arraial do Tejuco (atual Diamantina), onde aspiração maior dos contemporâneos: "O ser
atuou por 20 anos como mestre de música e, a senhor de engenho é título a que muitos
partir de 1784, como organista da irmandade aspiram, porque traz consigo o ser servido,
do Santíssimo Sacramento da matriz de Santo obedecido e respeitado de muitos." Eram
Antônio. Em 1798, transferiu-se para Vila equiparados, portento, em terras coloniais, aos
. i"
Acima: Frans Post, gravura extraída do livro de foice, pera e lavoura, os da moenda e, ainda, os
Gaspar Barléu, Rerum per octennium in Brasilia ü alibí domésticos. O senhor administrava também
nuptr gestarum, I647 .
sua família, mulher, filhos e agregados,
transpondo ao governo da casa o poder que
fidalgos do reino, espécie de "nobreza da adquirira na administração da produção e nâ
terra", como Evaldo Cabral de Mello esfera política. O cabedal (bens) que tinha de
caracterizou a "açucarocracie" pernambucana. ter um senhor do chamado engenho real
Mas havia hierarquias entre os engenhos. O deveria ser grande o suficiente para enfrenrar os
mais rico e complexo era o engenho real, movido elevados custos de implantação e
a água, que poderia chegar produzir quarro
a funcionamento do engenho. Isto sem falar nas
mil pães de açúcar, incluindo as canas moídas secas ou chuvas excessivas, de modo que,
de sua propriedade e as de lavradores sem mesmo com quebra de safra, rinham que saldar
engenho. Esses senhores tinham em torno de si suas dívidas, pois o crédito era o maior cabedal
uma grande variedade de oficiais de serviço a de um senhor honrado. Os demais engenhos,
soldo, necessários à produção, como mestre de movidos por escravos ou animais, e as
açúcar, purgador, calafares, carpinteiros, engenhocas, voltadas pera a produção de
pedreiros, carreiros, oleiros, vaqueiros, aguardente, exigiam investimento menor.
pastores, pescadores, caixeiros, feitores. E um Foi com base no citado Cultura e opulência do
grande número de escravos: os de enxada e Brasil, de Antonil, que diversos historiadores
8D .DrcroxÁR,Ío Do Bn,rsrl CoLo^-LeL engenho
escreveram sobre os engenhos coloniais. Ao IOO e I50. Segundo Schwartz, são esles os
lado de outros documentos, como cartes de que mais se assemelham à imagem idealizada
sesmaria e correspondência oficial entre os do engenho colonial, mas eles erem atípicos.
administradores ea metrópole, esse livro Em outras áreas açucareiras do Brasil, o padrão
acabou determinando o modelo de engenho era ainda mais reduzido, como os Campos dos
conhecimento suficientes. O autor tinha como diferem muito do observado noutras colônias
referência o bem-sucedido engenho de Sergipe açucareiras, como nas Antilhas, onde era
do Conde, grande unidade açucareira dos comum a existência de propriedades com mais
jesuítas no recôncavo baiano. Antonil escrevia de IOO escrâvos. Na Bahia, ao contrário, a
um pouco sobre o que observara e muito sobre escravaria mais comum mal atingia 2o cativos.
o que considerava teoricamente adequado. Schwartz conclui que nem o escravo nem o
Muito se escreveu sobre os privilégios dos senhor de engenho típicos viviam nos grandes
senhores de engenho com base no modelo de engenhos do Brasil colonial. Mas, em todas as
Antonil, mas sem o apoio de fontes seriadas áreas açucareiras estudadas, erâm os donos de
gerações mais empobrecidas. Daí o sentido do XVII ignoravam de tal maneira os loucos que
ditado popular colonial que indicava este os tratavem como possuídos pelo demônio, os
movimento: "pai taberneiro, filho barão e neto possessos (que mais tarde virariam mesmo
mendicante". (SCF) sinônimos de loucos). Mas não é exato,
tratando-se do século XVI. Diferenciava-se o
possesso do louco, embora o primeiro fosse
ANTONIL, A. J. Cultura e opulência do Brasil por dispensado ao cuidado de exorcistes, ao pesso
suas drogas e minas. (tZt t). 2u ed. São Paulo, que o segundo foi deixado à deriva por muiro
Melhoramenros, L976; FARIA, S. C. ,4 colônia em tempo. Até o século XMII, não havia saberes
movimento: fortuna e Jamília no cotidiano colonial. Rio médicos organizados sobre a loucura, nem
de )aneiro, Nova Fronteira, I998; MELLO, E. instituições asilares específicas.
C. Olinda restaurada: gl,terra e açúcar no nordeste A documentação inquisitorial relativa ao Brasil
(rglò.2u ed. Rio de Janeiro, Topbooks, I998; colônia fornece umas reras pistas sobre os
SCHWARTZ, S. B. Segredos internos: engenhos e loucos daquele tempo. Na visitação
escravos na sociedade colonial. (I985) Trad. São inquisitorial de I 59I-95, por exemplo,
Paulo, Companhia das Letras, I988. apareceram homens cuja conduta foi
considerada de aluados, porque gritavam coisas
sem nexo. Nesses casos, ovisitador sequer
mandou anoter as "sem-razões" que porventura
ô; E,nluados disseram os enluados. Noutros câsos,
indivíduos foram tidos como aluados porque
Enluado, aluado elunático eram expressões cometiem extravagâncias quando da "mudança
utilizadas no século XVI para designar os das luas", espancando pessoes, urrando,
loucos ou, pelo menos, os que tinham "ecessos quebrando objetos. Alguns até admitiam que
de loucura". Embora fosse muiro rematizada no sofriam de tais acessos "por causa das luas".
século XM, inspirando pinturas e livros Testamentos dos séculos XVII e XVIII ttazem,
importantes, a loucura não era então igualmente, expressões e fórmulas
medicalizade e quese não deixou vestígios nos interessantes pere nominar os loucos:
arquivos. Filosoficamente, erâ pensada como "demente", "embestado", " v azio de juí2o",
um e stado d'alma situado na fronteira enrre a "padece em tempos de lua suas loucuras". Era
sabedoria extrema ea sem-razão absoluta. Os senso comum que a lua exercia especial
loucos eram pintados como seres influência sobre certos indivíduos, havendo
extravagantes, por vezes bufões, porém mesmo uma tratadística sobre o assunto que
integrados na vida das comunidades. Os dataua de séculos. O direito eclesiásrico rocou
jesuítas deixaram escritos que, tratendo dos no assunto, a exemplo das Constituições do
estados d'alma, tangenciaram a loucura, Arcebispado da Bahia (tZoZ), que proibia aos
aproximando-a da melancolia, ume e outra doudos edesasisados de contrair matrimônio,