Suzane Weber - Metodologia de Inspiração Etnográfica em Pesquisas de Práticas Corporais Artísticas
Suzane Weber - Metodologia de Inspiração Etnográfica em Pesquisas de Práticas Corporais Artísticas
Suzane Weber - Metodologia de Inspiração Etnográfica em Pesquisas de Práticas Corporais Artísticas
Suzane Weber
PhD (UQAM)
Departamento de Teatro/ Instituto de Artes/ UFRGS
Resumo: Este artigo busca apresentar alguns aspectos de uma metodologia de inspiração
etnográfica capaz de auxiliar pesquisas na área de processos de criação e práticas
corporais artísticas nas artes cênicas, utilizando-se de alguns exemplos de dança. Esta
metodologia pode estabelecer relações que são importantes para a dança e o teatro,
fazendo a transição entre o que se vê para o que se escreve. Segundo Laplantine (1996), a
etnografia como atividade perceptiva, compreende um olhar que engloba uma visibilidade
não somente óptica, mas também tátil, olfativa, auditiva e gustativa.
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Em minha experiência do doutorado, a etnografia me auxiliou com ferramentas conceituais e metodológicas
para a observação da prática de bailarino-criadores. Ela também foi importante no auxílio a descrições
detalhadas e reflexivas das minhas observações. O nome da tese é “ Les pratiques du danseur-créateur vis-à-vis
des pratiques dominantes en danse contemporaines : trois études de cas”.
indivíduos e sociedade, em processo de transformação. A etnografia leva em consideração
aspectos socio-culturais do fenômeno estudado.
A inserção do observador no terreno
Segundo Laplantine (1996), a observação direta de comportamentos sociais
particulares e a familiaridade com certos grupos que procuramos conhecer - através do
convívio para fins de pesquisa - requer atenção sensível, inteligente e imaginativa por parte
do pesquisador. De acordo com este autor, a etnografia é basicamente uma atividade visual,
do olhar, e transformar este olhar em linguagem. A etnografia, como a atividade perceptiva,
inclui um olhar que não se restringe a visibilidade em termos ópticos, mas também inclui o
tato, o olfato, a audição e o paladar. Segundo Laplantine (1996), a visibilidade nos afeta, ao
mesmo tempo que nós afetamos o que está sendo percebido. Ele argumenta que a
etnografia é uma experiência de imersão física - do campo da prática - em uma sociedade
ou um grupo específico, no qual o pesquisador, além de entender, deve partilhar e
estabelecer trocas. A etnografia envolve a integração do observador no campo que ele
observa. "Nós nunca somos testemunhas objetivas observando objetos, mas sujeitos
observando outros sujeitos em um experimento no qual o observador é ele próprio
observado2 (LAPLANTINE, 1996, p. 23.).
Uma metodologia de inspiração etnográfica requer confiança e intercâmbio
através da passagem de olhares cruzados a olhares compartilhados, entre o observador e
aqueles que são observados (LAPLANTINE, 1996). Em minhas aulas como professora de
práticas corporais na área de artes cênicas trabalhando com atores e bailarinos, eu muitas
vezes destaquei aos alunos a importância de uma qualidade de presença, a força de estar
disponível, de ser e estar atento, de não deixar nada escapar em cena3. Eu utilizei este
background de professora, mas também de artista, para minhas observações. Em minhas
pesquisa, eu solicitava minha própria qualidade de presença, mesmo que ela fosse discreta.
A maioria das criações observadas no meu estudo tratavam-se de improvisação em dança,
propostas que demandam grande atenção do espectador em relação ao que esta sendo
desenvolvido em cena; o espectador torna-se parcialmente responsável por dar um certo
sentido a criação. Durante as minhas observações, sentado em um canto da sala,
presenciei os dançarinos frente as suas escolhas mais evidentes, mas eu também estive
vigilante frente aos pequenos detalhes, principalmente em relação aos olhares e gestos dos
bailarinos em minha direção, como um sinal de troca, de cumplicidade e de presença
atentiva de ambas as partes. Como sugerem alguns autores da dança (Fortin, 1994; Frosh,
2
« Nous ne sommes jamais des témoins objectifs observant des objets, mais des sujets observant d’autres
sujets au sein d’une expérience dans laquelle l’observateur est lui-même observé. ». Tradução da autora
3
Atores e bailarinos são especialistas nesta consciência do olhar que se expande pelo corpo.
1999) ao encontro das idéias de Laplantine (1996), a observação não é apenas visual, ela é
também uma troca de amplitude cinestésica.
Conclusão
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
FORTIN, Sylvie. (dir. publ.). Danse et santé : du corps intime au corps social. Montréal:
Presses de l’Université du Québec, 2008, 312 p.
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Também me utilizei o que se nas ciências sociais se chama de uma análise temática, utilizando como
“categorias” verbos e expressões tirados do próprio discurso verbal dos bailarinos, expressões verbais
recorrentes nas entrevistas. Eu tentei identificar no discurso dos bailarinos-criadores verbos que
correspondessem a aspectos significativos de suas práticas, tais como: “administrar o julgamento”, “captar tudo”,
“manter a proximidade”, “interpretar” e “colaborar”. Este tipo de análise foi utilizada buscando corresponder ao
aspectos dinâmico das práticas observadas que tratavam-se de improvisação em dança.
FORTIN, Sylvie. Contribuições possíveis da etnografia e da auto-etnografia para a pesquisa
na prática artística. Revista Cena, n. 7, 2009.
NOVACK, Cynthia. Sharing the dance : contact improvisation and American culture.
Madison : University of Madison Press, 1990, 258 p.