Literatura Namibe

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c) Frequentemente a verdade e a popularidade

não andam juntas.


d) Ser-se expulso significa sofrer-se o
ostracismo de uma comunidade.
4 As cinzas acertam de volta na cara daquele que
as atira.
a) Uns semeiam outros colhem.
INSTITUTO MÉDIO DE FORMAÇÃO DE b) A cinza sendo extremamente leve é
PROFESSORES DO NAMIBE facilmente transportada pelo vento.
LITERATURA c) Todos os nossos actos e palavras recaem
PROFESSOR MIGUEL GULLANDER sobre nós.
FASCÍCULOS DE APOIO d) Nunca se deve fazer o que não se quer, pois
2010 não se controlam as consequências.
5 O amanhã pertence aos que o preparam hoje.
a) O amanhã é dos que dominam a tecnologia.
b) Cava o poço antes de teres sede.
c) Amanhã, hoje e ontem são categorias da
mente.
d) O amanhã não existe.
6 Podes ser mais alto que o teu pai, mas ainda
assim não lhe és igual.
a) Um filho culto deve ser sempre venerado
pelo pai porque esse filho é superior.
b) Os homens não se medem aos palmos.
c) Um rapaz pode ser muito alto mas nem por
isso fica tão forte como o pai.
d) Idade e experiência valem mais do que a
adolescência.
7 É por causa do homem que o ferreiro faz as
armas.
a) O problema não está nas armas mas no
próprio ser humano que as deseja.
b) O ferreiro não pode ser culpado das
encomendas que recebe.
c) O ferreiro por vezes é obrigado a fabricar
objectos de morte contra vontade.
d) As armas são feitas de aço e materiais
(O Código de Hamurabi) típicos do ofício dos ferreiros.
8 Quem morde mais do que consegue engolir,
I PERCURSOS DA LITERATURA E TESTES acaba a asfixiar.
DIAGNÓSTICOS. A tradição oral e a passagem a) Quem abocanha sem medir o pedaço
para a escrita. arrisca-se a estragar a refeição.
b) A dificuldade em engolir os alimentos é
Teste de interpretação A algo perigoso.
c) A ganância é a causa da auto-destruição.
Provérbios africanos: d) Entre as formas de asfixia a causada pela
comida é a mais comum.
1 Sabes que tens um amigo quando com ele já 9 Se não és parte da solução, és parte do problema.
comeste um quilo de sal. a) A solução não está em nós, mas sim no
a) O sal tem a propriedade de reter líquidos, próprio problema.
devendo evitar-se usá-lo em excesso. b) Sê a diferença que queres ver no mundo.
b) Os bons amigos conseguem fazer proezas, c) Quem quer resolver os problemas do
incluindo comer grandes quantidades de mundo tem de conseguir poder económico.
sal. d) Os problemas nunca se hão-de resolver.
c) Uma verdadeira amizade demora muito 10 Quando os elefantes combatem, quem sofre é o
tempo a construir-se. capim.
d) Um verdadeiro amigo faz tudo por nós. a) Quando os poderosos guerreiam quem sofre
2 É numa bolsa de farrapos que se pode encontrar é o povo.
a jóia escondida. b) Há situações em que é necessário ser-se
a) O maior valor e potencial encontram-se no pisado.
banal. c) A grandeza é visível do maior ao mais
b) As bolsas de farrapos são óptimos lugares pequeno.
onde se ocultar objectos de valor. d) A presença dos grandes mamíferos torna-se
c) A jóia não pode ser polida sem fricção. rara em África.
d) A jóia sempre representa um esforço e 11 O que mais dói não são os gritos dos maus, mas
sacrifício relativamente a algo de valor. o silêncio dos bons.
3 Quem diz a verdade é expulso de nove aldeias. a) Se não o defendes ele ataca-te.
a) Falar a verdade é algo mal visto em certo b) É preciso evitar indignar-se seja com o que
número de aldeias. for e ficar calado.
b) O melhor é nunca falar a verdade em c) É obrigatório que se consinta tudo.
ocasião nenhuma.

1
d) Quem cala consente. a) A sorte é algo em que se deve confiar,
12 Não chames o cão com um chicote na mão. como uma estrela que guia o caminho.
a) A conquista da autoridade faz-se pela via da b) A sorte não depende da vontade, mas sim
violência. do que está determinado para cada um.
b) Para conseguir assustar um cão deve-se c) A sorte é algo que pode ser alcançado por
mostrar-lhe o chicote. meio duma grande determinação.
c) Esconde a tua arma até que o teu inimigo d) Um homem de sorte é um homem que
esteja perto de ti. sabe viver.
d) Ninguém consegue fazer-se obedecido pela 20 Segredo de dois, segredo de Deus, segredo de
violência. três, o diabo o fez. (Portugal)
13 Não é aquilo que te chamam, mas ao que tu a) Contar os segredos alheios é a forma de
respondes. uma população se manter informada.
a) Nunca se deve nem falar nem responder a b) As fofocas propagam-se como grande
estranhos. dificuldade em meios pequenos.
b) Saber responder pelo nome demonstra um c) Os boatos maldosos são fonte de muita
homem de carácter. injustiça.
c) Não importa nomes nem títulos, mas sim d) Um segredo de mais de dois, vira de dois
aquilo que se defende. mil.
d) Uma pessoa não deve responder por nada 21 Atrás do isco vem o anzol. (Portugal)
na vida. a) O isco serve para que o anzol seja posto em
14 Ver é diferente de ter ouvido. bom uso.
a) Nunca se devem confiar nos boatos, mas no b) O anzol representa tudo o que é de bom e
que se conhece directamente. está escondido por detrás das aparências.
b) Os ouvidos de uns são mais apurados do c) Na pesca existem mais forma de apanhar
que os olhos de muitos um peixe do que pelo anzol.
c) Deve-se acreditar no que nos contam. d) Deve-se sempre ser cauteloso em relação ao
d) Os olhos e os ouvidos funcionam como que é muito atractivo.
portas da percepção. 22 Cada um vê o argueiro no olho do vizinho e não
15 O idiota fala, o sábio ouve. a tranca no seu. (Bíblia)
a) Um sábio deve praticar a virtude da a) O ladrão acredita que todos roubam.
paciência ouvindo os idiotas. b) Bom julgador por si se julga.
b) Antes calar que mal falar. c) É bem mais fácil ver os defeitos nos outros
c) Os idiotas gostam de ter sábios como do que em si mesmo.
ouvintes. d) É bem mais fácil ver os defeitos em si que
d) Os idiotas gostam de se ouvir a si mesmos e nos outros.
obrigar os outros a isso. 23 Quem nunca se aventurou, não perdeu nem
16 Cegos que conduzem cegos, todos acabam no ganhou. (Portugal)
buraco. a) O melhor na vida é a tranquilidade.
a) A cegueira é uma das doenças mais comuns b) Não se deve arriscar, pois ninguém tem a
da actualidade. certeza de ganhar ou perder.
b) Uma das principais razões de queda é a c) Quem não arrisca não petisca.
escuridão e cegueira. d) As aventuras são para os inconscientes e
c) O buraco dos cegos é mais um lugar onde adolescentes.
todos se encontram divertidos. 24 Vê quem pisas na subida, porque irás encontrá-
d) Quando ignorantes orientam outros o los na descida. (Portugal)
resultado é o colapso colectivo. a) É sempre bom cumprimentar as pessoas no
nosso caminho.
Outros provérbios: b) Cada qual pagará a si mesmo pelas acções
que cometeu.
17 Quem dá, tudo tem. Quem se apega, nada lhe c) Para subir na vida é preciso pisar muita
resta. (Índia) gente.
a) Dar dói, chorar faz ranho. d) Somos anões às costas de gigantes.
b) Uma pessoa deve fazer por ter o seu 25 A duração de uma paixão é proporcional à
próprio sustento. resistência natural da mulher. (Balzac)
c) A maior das riquezas está na própria a) Quanto mais duradoura a relação mais
partilha. entediante se torna.
d) Muitos ficam sem nada, pois não sabem b) Quanto mais prolongada uma conquista
poupar os seus bens. mais longa a paixão.
18 Um idiota não vê a mesma árvore que um c) Quanto mais rápida a conquista mais longa
sábio. (William Blake) a paixão.
a) As árvores mudam de aspecto conforme os d) Quanto maior a paixão mais a mulher se
ângulos de observação. entrega.
b) Os sábios e os idiotas costumam discutir o
aspecto das diferentes árvores. Teste de interpretação B.
c) Os idiotas não conseguem distinguir as
árvores umas das outras. 1 Quando não há inimigo no interior, os inimigos
d) Não vemos o mundo como ele é, mas de fora não nos podem afectar.
como nós somos. a) A verdadeira força e defesa encontram-se
19 Um homem não encontra a sua sorte, a sorte é por dentro.
que encontra o seu homem. (Turquia)

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b) A força de um indivíduo encontra-se nas a) A menos que haja real confiança arriscamo-
relações externas que mantém. nos a ver os nossos segredos expostos.
c) Ameaças interiores ou exteriores são b) Os segredos são o melhor assunto de
sempre possíveis de contrariar. conversa enquanto se come um bom pão.
d) Deve-se cultivar relações com inimigos de c) Um saco de farinha é um saco de segredos
fora para garantir paz. que não confiamos a ninguém.
2 Quando conheces o seu amigo, sabes quem ele é. d) Quando existe fuga num saco de farinha é
a) Saber quem comigo está é conhecer um como ter encontrado a confiança dum
novo amigo. amigo.
b) O saber faz-se por meio das amizades. 10 Se sobes uma árvore, deverás descer por essa
c) Diz-me com quem anda e dir-te-ei quem é. mesma árvore.
d) O amigo de meu amigo, meu amigo é. a) Após uma subida ninguém gosta de descer.
3 A quem a serpente mordeu, alarma-se com o b) A descer todos os santos ajudam.
lagarto. c) As subidas e descidas da árvore
a) Os répteis causam um medo instintivo no representam impaciência.
ser humano. d) O que vai à volta, vem de volta.
b) A serpente e o lagarto pertencem à família 11 Se persegues duas lebres não apanhas
dos animais de sangue frio. nenhuma delas.
c) Segundo os relatos bíblicos a serpente a) As lebres são conhecidas pela sua
representa o mal. velocidade.
e) Gato a quem morde a cobra, tem medo à b) É impossível apanhar duas lebres em
corda. simultâneo.
4 Antes de atirar, deve-se apontar. c) Quem tudo quer tudo perde.
a) Para acertar num alvo convém ter boa mira d) A ambição é uma qualidade fundamental do
e pontaria. ser humano.
b) Apontar um dedo critico ao próximo 12 Se a tua língua se torna em faca, então cortará
implica boas razões para se o fazer. os teus lábios.
c) Deve-se sempre actuar após planear. a) O poder da palavra mal utilizada é muito
d) Nunca se deve planear nada em excesso. destruidor.
5 Nunca um cão chamou um homem para lhe b) Sempre que insultamos alguém ficamos
bater. com problemas na boca.
a) A crueldade premeditada do ser humano c) Uma língua afiada é sinónima de menina
torna-o pior que os próprios animais. atrevida.
b) Os cães não sabem chamar porque não d) Existem transformações do corpo que são
dominam a linguagem humana. incríveis.
c) Os cães não têm noção de como punir 13 Se te recusas a ser endireitado quando estás
situações desagradáveis. verde, não serás endireitado quando já estiveres
d) Nunca aconteceu uma mascote querer bater seco.
naquele que é o seu próprio dono. a) A cor verde representa esperança.
6 Sabedoria encerrada num coração é como luz b) Quanto mais jovem mais rebelde se é à
fechada num jarro. educação.
a) A tristeza de um coração abandonado c) De pequenino se torce o pepino.
compara-se a um lugar sem luz. d) Ser endireitado é algo que deve ser feito
b) Frequentemente os sábios são aprisionados antes de se ficar seco.
injustamente. 14 Manda um miúdo onde ele quer ir e verás o seu
c) A luz e a sabedoria são sinónimos de algo melhor passo.
que nunca se deve fechar num jarro. a) Os miúdos têm tendência para arrastar os
d) Como um valor inestimável escondido, a pés e fugirem aos deveres.
sabedoria sem ser partilhada de nada serve. b) Os miúdos devem ser vigiados nos seus
7 Nunca desenvolvas apetite por árvores às quais percursos e caminhos.
não podes subir. c) Quem corre por gosto não cansa.
a) O fruto proibido é o mais apetecido. d) O melhor passo de um miúdo é quando ele
b) Feliz é quem só quer o que pode e só faz o está assustado.
que deve. 15 O leão não olha para trás quando o pequeno
c) Quanto mais alta a subida maior a queda. cão ladra.
d) Em muitos lugares é desaconselhada a a) O leão é um animal que representa a
subida de árvores devido a perigos vários. arrogância e violência.
8 Não navegues de acordo com a estrela de b) Pessoas com grandeza não respondem a
outrem. provocações.
a) A estrela de outrem pode fazer com que nos c) Quando gente mesquinha insulta terceiros o
percamos no mar alto. som incomoda toda a gente.
b) O destino e opções de cada um devem ser d) Não olhar para trás significa que o
encontradas pelo próprio. indivíduo em questão atacará de surpresa.
c) As técnicas de navegação por meio da
observação de estrelas estão fora de moda. Outros provérbios:
d) As estrelas no céu indicam o futuro de cada
um. 16 Em terra de cegos quem tem olho é rei. (Índia)
9 Confiar um segredo a quem não se deve é como a) O ciclope é uma criatura mítica com apenas
carregar um saco de farinha com um furo. um olho.

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b) Na Índia existem muitos territórios 25 Uma sociedade torna-se grandiosa quando os
assolados pelo drama da cegueira. seus idosos plantam árvores sob cuja sombra eles
c) Em períodos e lugares desfavorecidos quem sabem nunca se poder vir a sentar. (Grécia)
tem o mínimo destaca-se. a) Os idosos, sabendo que vão morrer em
d) O sentido da visão é aquele mais apreciado primeiro lugar, devem divertir-se ao
pelas pessoas. máximo.
17 Em boca fechada não entra mosca. (Itália) b) Os idosos gostam de jardinagem e árvores
a) A boca silenciosa é a mais melodiosa. porque são geralmente pessoas sábias.
b) Todos devem manter a boca fechada para c) Os idosos já fizeram tudo o que deviam
não contarem segredos. fazer no seu tempo activo.
c) Os insectos são perigosos quando d) Os idosos que criam um futuro para seus
engolidos. descendentes representam o melhor duma
d) A mosca simboliza a incapacidade de saber sociedade.
sorrir.
18 Um pouco tarde, tarde demais. (Alemanha) Teste de interpretação e escrita A.
a) É bom chegar tarde demais, dá uma
imagem de estilo. 1. Leia atentamente o seguinte poema de Luís de
b) Por vezes num instante de atraso algo
Camões, datado do Século XVI.
irreversível acontece.
c) Devemos saber que a pontualidade tem um
valor relativo. Amor é fogo que arde sem se ver,
d) É impossível voltar a viver o passado. é ferida que dói, e não se sente;
19 Deus escreve direito por linhas tortas. é um contentamento descontente,
a) A vontade divina corresponde a uma escrita é dor que desatina sem doer.
torta.
b) Com a morte de Deus, só sobra a história e É um não querer mais que bem querer;
o poder. é um andar solitário entre a gente;
c) Tudo acontece por uma razão, mesmo que é nunca contentar-se de contente;
não se compreenda logo qual. é um cuidar que ganha em se perder.
d) Tudo acontece por acontecer, sem propósito
nenhum. É querer estar preso por vontade;
20 Pela boca morre o peixe. (Portugal) é servir a quem vence, o vencedor;
a) A conversar as pessoas entendem-se. é ter com quem nos mata, lealdade.
b) Quando se fala demais arrisca-se demais.
c) Deve-se sempre falar tudo o que nos passa Mas como causar pode seu favor
pela cabeça. nos corações humanos amizade,
d) O peixe é apanhado pela boca quando se se tão contrário a si é o mesmo Amor?
utiliza o anzol.
21 Quem quer a rosa, aguente o espinho. (Portugal)
a) Cada um tem o que merece. (Obtido em: "http://pt.wikisource.org/wiki/Amor_
b) Beleza sem virtude é rosa sem perfume. %C3%A9_fogo_que_arde_sem_se_ver")
c) Cada doçura custa uma amargura.
d) O melhor de tudo são as rosas que não têm 1.1. Dos temas universais que interessam e
espinhos. preocupam o espírito humano, qual é o tema
22 Olho por olho e mundo ficará cego. (Gandhi) neste poema presente?
a) Pela retribuição vingativa não se 1.2. Na sua opinião como é vívido este tema pelo
consegue nada de inteligente nem sábio. poeta? Como é que ele vive este sentimento?
b) A vingança é um prato que se deve comer 1.3. Sendo este tema universal ao coração humano,
frio. como é que você mesmo o vive e o que pensa
c) Olho por olho, dente por dente. dele?
d) A vingança é a forma mais rápida e
directa de se fazer justiça. 2. A obra “Instruções” de Ptahhotep (2414 – 2375
23 O que um homem diz quando bêbado pensou-o A.C.) é considerada a mais antiga obra literária
quando sóbrio. (Holanda) da História. Foi escrita no sentido de aconselhar
a) In vino veritas, no vinho a verdade. os jovens do império egípcio. Nesta obra
b) Não saber beber é um dos problemas da Ptahhotep escreve frases como as seguintes:
nossa sociedade.  “Grande é a Lei” (Maat)." (p. 24)
c) A bebedeira leva um homem a dizer coisa  “Toda a conduta deve ser recta de modo
que não acredita. que a possas medir com o fio de aprumo.”
d) Os homens sóbrios são incapazes de pensar (p. 27)
o mal.  “A injustiça existe em quantidade, mas no
24 Quem não sabe sofrer, não sabe amar. final o mal nunca será bem sucedido.”
(Portugal) (p.32)
a) É preciso sofrer mais na vida do que amar.  “A raça humana nunca alcança nada. É
b) Para amar muito é preciso muito sacrifício. Deus que comanda aquilo que é realizado.”
c) Ninguém gosta de sofrer uma perda (p. 41)
amorosa.
 “Segue o teu coração toda a tua vida, mas
d) Para amar muito é preciso muito prazer. não cometas excessos relativamente ao que
já foi ordenado.” (p. 66)

4
 “Se trabalhares arduamente e os teus 1. Leia atentamente o seguinte soneto de Florbela
campos de agricultura prosperarem, é Espanca, uma das primeiras mulheres a conquistar
porque Deus colocou abundância nas tuas um lugar cimeiro no mundo das letras, infelizmente
mãos.” (p. 74) tão vedado ao espírito feminino durante a maior parte
 “Não faças fofoca na tua vizinhança porque da História.
as pessoas respeitam o silêncio.” (p. 74)
 “Se aquele que escuta – escuta totalmente – Lágrimas Ocultas
então aquele que escuta torna-se aquele que
compreende.” (p. 76) Se me ponho a cismar em outras eras
 “Ouvir beneficia o ouvinte.” (p. 74) Em que ri e cantei, em que era q’rida,
 “Deus ama aqueles que ouvem.” (p. 76) Parece-me que foi noutras esferas,
 “Como o ignorante não sabe ouvir, não Parece-me que foi numa outra vida...
alcança nada. Ele iguala o conhecimento
com a ignorância, o inútil com o perigoso. E a minha triste boca dolorida,
Ele faz tudo o que é detestável, por isso as Que dantes tinha o rir das primaveras,
pessoas zangam-se com ele todos os dias”. Esbate as linhas graves e severas
(p. 77) E cai num abandono de esquecida!
 “A palavra perfeita está escondida mais
E fico, pensativa, olhando o vago...
fundo que a mais preciosa das jóias. Pode Toma a brandura plácida dum lago
ser encontrada com os humildes O meu rosto de monja de marfim...
trabalhadores junto da pedra de moer.” (p.
78) E as lágrimas que choro, branca e calma,
 “Fala apenas quando tiveres algo para de Ninguém as vê brotar dentro da alma!
valor para dizer.” (p. 79) Ninguém as vê cair dentro de mim!
 “Quanto a ti, ensina o teu aluno nas
palavras da tradição. Que ele possa actuar Obtido em "http://pt.wikisource.org/wiki/L
como modelo para os filhos dos poderosos, %C3%A1grimas_Ocultas"
e que estes possam encontrar no teu aluno a
sabedoria e a justiça de todos os corações 2.1. Dos temas universais da literatura quais os
que falem com ele.” (p. 85) principais temas presentes neste poema?
 “Uma mulher com um coração feliz traz o 2.2. Na sua opinião porque chora a poetisa? Qual a
equilíbrio”. (p. 107) causa das suas “lágrimas ocultas”? Argumente.
 “Ama a tua esposa com paixão” (p. 107) 2.3. Existe algo na sua vida e no seu passado de que
 “Para aqueles que estão sempre a desejar sinta saudade ou nostalgia? Elabore um pouco
mulheres diferentes, nenhum dos seus acerca dos seus próprios sentimentos.
planos vai ter sucesso.” (p. 108)
 “Como é maravilhoso um filho que 2. Enheduana viveu entre 2285-2250 antes de Cristo.
obedece a seu pai!” (p. 112) Enheduana foi uma princesa em Ur, antiga
cidade da Suméria, civilização a que se deve
 “Não critiques aqueles que não têm filhos e
também o código de Amurabi. Enheduana é
não te gabes de teres filhos tu próprio.” (p.
considerada a primeira autora de toda a História
113)
a escrever na primeira pessoa e a mais antiga de
 “Que nunca o teu coração se torne vaidoso toda a humanidade a deixar um registo escrito
por causa daquilo que sabes. Recebe expondo a consciência que tem dos seus
sempre conselhos tanto dos ignorantes próprios sentimentos íntimos. Da sua autoria é o
como dos sábios.” (p. 119) seguinte poema:
 “Não coloques qualquer confiança no teu
coração por causa das riquezas acumuladas, Eu sou Tua! E sempre serei Tua!
visto que tudo o que tu tens é dádiva de Possa o teu coração ser suave para comigo
Deus.” (p. 126) Possa eu receber a Tua compreensão… compaixão…
 “Vive em paz com o que já possuis, e seja o Eu que já experimentei o Teu grande castigo…
que for que Deus decidir dar-te virá de seu
próprio acordo.” (p. 139) Meu Deus, proclamo a Tua grandeza em todas as
 “Aquele que tem um coração grande tuas terras e a Tua glória!
recebeu uma dádiva de Deus. Mas aquele O Teu “caminho” e grandes obras sempre louvarei!
que obedece ao estômago obedece ao
inimigo.” (p. 140) 2.1. De que modo, na sua opinião, a escrita pode ser
 “Aqueles a quem Deus guia nunca se fundamental para a nossa vivência de
perdem.” (p. 143) sentimentos profundos? De que modo a escrita
contribui para a evolução da sua mente e
espírito?

2.1. Qual foi a maior invenção da humanidade


implícita no texto? De que modo, na sua
opinião, essa invenção mudou o curso de toda a II TEXTOS DE APOIO
História?
 ANTÍGONA, SÓFOCLES
Teste de interpretação e escrita B.

5
Creonte (Rei): - Mas tu (a Antígona) diz-me, sem Quando os meus ossos estavam a ser formados,
rodeios: sabias que te era vedado, por édito, fazer o E eu, em segredo, me desenvolvia,
que fizeste? Tecido nas profundezas da terra,
Antígona: - Sim, sabia-o bem. Como poderia ignorá- Nada disso te era oculto.
lo, se toda a gente o sabe?
Creonte: -E, apesar disso, atreveste-te a passar por Os teus olhos viram-me embrião.
cima da lei? Tudo isso estava escrito no teu livro.
Antígona: - Não foi Zeus que ditou esse decreto; nem Todos os meus dias estavam modelados,
Dice (a Justiça), companheira dos deuses Ainda antes que um só deles existisse.
subterrâneos, que estabeleceu tais leis para os
homens. E não creio que os teus decretos tenham Ó Deus, faz com que os ímpios desapareçam,
tanto poder que permitam a alguém saltar por cima Afasta de mim os homens sanguinários.
das leis, nãos escritas, mas imutáveis dos deuses; a
sua vigência não é, nem de hoje nem de ontem, mas  CARL SAGAN, A Biblioteca de Alexandria
de sempre, e ninguém sabe como e quando (Universidade de Cornell
apareceram. Não iria atrair o castigo dos deuses, com www.criticanarede.com)
receio das determinações dos mortais.
“A superstição é uma cobardia face ao divino”,
 A BIBLIA escreveu Teofrasto, que viveu no tempo da Biblioteca
de Alexandria. Habitamos num universo no qual os
átomos são produzidos no centro das estrelas; no qual
em cada segundo nascem um milhar de sóis, no qual
a luz do sol e os relâmpagos fazem surgir a faísca da
vida no ar e na água dos planetas mais novos; no qual
o material de base da evolução biológica resulta por
vezes da explosão de uma estrela no meio da Via
Láctea; no qual uma coisa tão bela como uma galáxia
se formou cem mil milhões de vezes — um cosmos
de quasares e quarks, de flocos de neve e pirilampos,
onde talvez existam buracos negros e outros
universos e civilizações extraterrestres cujas
mensagens de rádio chegam neste momento à Terra.
Em comparação com isto, quão pobre são as
pretensões da superstição e da pseudociência; quão
importante é para nós continuar esse esforço que
caracteriza o homem: a prossecução e a compreensão
da natureza.
Cada aspecto da natureza revela um profundo
mistério e acorda em nós um sentimento de respeito e
deslumbramento. Teofrasto tinha razão. Quem receia
o universo tal como é, quem se recusa a acreditar no
conhecimento e idealiza um cosmos centrado nos
seres humanos preferem o conforto efémero das
(Biblia impressa de Gutemberg)
superstições. Preferem evitar o mundo a enfrentá-lo.
Mas quem tem a coragem de explorar a estrutura e
 SALMO 139 (abreviado. Bíblia Sagrada textura do cosmos, mesmo quando este difere
Africana, ed. Paulinas) acentuadamente dos seus desejos e preconceitos, irão
penetrar profundamente nos seus mistérios.
Senhor, tu examinaste-me e conheces-me, Não há na Terra outras espécies que tenham
Sabes quando me sento e quando me levanto; alcançado a ciência, que continua a ser uma invenção
À distância conheces os meus pensamentos. humana, produzida por uma espécie de selecção
natural ao nível do córtice cerebral, e isto por uma
Vês-me quando caminho e quando descanso; razão muito simples: produz bons resultados. Sem
Estás atento a todos os meus passos. dúvida que a ciência não é perfeita e pode ser mal
Ainda não me chegou a palavra à boca, utilizada, mas é de longe o melhor instrumento que
Já tu, Senhor, temos, que se corrige a si próprio, que progride sem
A conheces perfeitamente. cessar, que se aplica a tudo. Obedece a duas regras
fundamentais: primeiro, não existem verdades
Se subir aos céus sagradas, todas as asserções devem ser
Tu lá estás; cuidadosamente examinadas com espírito crítico, os
Se descer ao mundo dos mortos, argumentos de autoridade não têm valor; segundo,
Ali te encontras. tudo o que estiver em contradição com os factos tem
Tu plasmastes as entranhas do meu ser de ser afastado ou revisto. Temos de entender o
E formaste-me no seio da minha mãe. cosmos como ele é e não confundir aquilo que é com
aquilo que gostaríamos que fosse. Por vezes, o óbvio
Se disser: “Talvez as trevas me possam esconder, está errado e o insólito é verdadeiro. Num contexto
Ou a luz se transforme em noite à minha volta”, alargado, todos os seres humanos partilham as
Nem as trevas me ocultariam de ti mesmas aspirações. E o estudo do cosmos fornece o
E a noite seria, para ti, como o dia. contexto mais alargado possível. A actual cultura
A luz e as trevas seriam a mesma coisa! mundial é uma espécie de arrogante novidade;

6
chegou à cena planetária depois de 4 mil e 500 redigiu um tratado de geometria com base no qual os
milhões de anos e, depois de ter passado os olhos em seres humanos aprenderam durante vinte e três
redor durante uns milhares de anos, declarou-se séculos, trabalho que iria contribuir para despertar o
detentora de verdades eternas. Mas num mundo em interesse científico de Kepler, Newton e Einstein; os
tão rápida mudança como o nosso, tal atitude é o escritos de Galeno acerca da medicina e da anatomia
caminho certo para o desastre. Nenhuma nação, dominaram as ciências médicas até ao renascimento.
nenhuma religião, nenhum sistema económico, E muitos outros exemplos, já apontados neste livro.
nenhum corpo de conhecimento pode oferecer todas Alexandria era a maior cidade que o mundo ocidental
as respostas quando está em jogo a nossa já conhecera. Pessoas de todas as nações iam até lá
sobrevivência. Devem certamente existir sistemas que para viver, fazer comércio, estudar; todos os dias
funcionem muito melhor do que qualquer um dos que chegavam aos seus portos mercadores, professores e
temos. Conforme a boa tradição científica, a nossa alunos, turistas. Era uma cidade em que os gregos,
tarefa é descobri-los. egípcios, árabes, sírios, hebreus, persas, núbios,
Uma vez já, na nossa história, houve a promessa de fenícios, italianos, gauleses e iberos trocavam
uma brilhante civilização científica. Resultante do mercadorias e ideias. Foi provavelmente aí que a
grande acordar jónico, a Biblioteca de Alexandria era, palavra "cosmopolita" atingiu o seu mais verdadeiro
há dois mil anos, uma cidadela onde os melhores sentido — cidadão, não apenas de uma nação, mas do
intelectos da antiguidade estabeleceram os cosmos. (A palavra "cosmopolita" foi inventada por
fundamentos para o estudo sistemático da Diógenes, o filósofo racionalista crítico de Platão.)
matemática, da física, da biologia, da astronomia, da Estavam certamente aqui as raízes do mundo
literatura, da geografia e da medicina. Ainda hoje moderno. Que foi que os impediu de crescer e
edificamos sobre essas bases. A biblioteca foi florescer? Por que razão o ocidente adormeceu para
construída e financiada pelos Ptolomeus, os reis só acordar um milhar de anos depois, quando
gregos que herdaram a parte egípcia do império de Colombo, Copérnico e os seus contemporâneos
Alexandre o Grande. Desde a época da sua fundação, redescobriram o mundo criado em Alexandria? Não
no terceiro século antes de Cristo, até à sua destruição me é possível dar uma resposta simples, mas sei pelo
sete séculos depois, foi o cérebro e o coração do menos o seguinte: não há registo, em toda a história
mundo antigo. da biblioteca, de que qualquer um dos seus ilustres
Alexandria era a capital editorial do planeta. É claro cientistas e estudiosos tivesse alguma vez desafiado a
que na altura não existia a imprensa. Os livros eram sério os princípios políticos, económicos e religiosos
caros; cada exemplar tinha de ser copiado à mão. A da sua sociedade… A permanência das estrelas era
biblioteca era o repositório das melhores cópias do posta em dúvida, mas não a da escravatura. A ciência
mundo. Foi ali inventada a arte da edição crítica. O e a sabedoria em geral eram domínio de alguns
Antigo Testamento chegou-nos directamente das privilegiados, a vasta população da cidade não tinha a
traduções gregas feitas na Biblioteca de Alexandria. mais leve noção do que se passava dentro da
Os Ptolomeus usaram muita da sua enorme riqueza biblioteca, ninguém lhe explicava nem divulgava as
na aquisição de todos os livros gregos, assim como novas descobertas, para ela a investigação tinha
dos trabalhos originários de África, da Pérsia, da utilidade quase nula. As descobertas nos campos da
Índia, de Israel e de outras regiões do mundo. mecânica e da tecnologia do vapor eram sobretudo
Ptolomeu III Evergeto tentou pedir em empréstimo a aplicadas no aperfeiçoamento de armas, no encorajar
Atenas os manuscritos originais ou as cópias oficiais das superstições e no entretenimento dos reis. Os
das grandes tragédias de Sófocles, Esquilo e cientistas nunca se deram conta do potencial de
Eurípedes. Para os atenienses, esses textos eram uma libertação dos homens que as máquinas continham.
espécie de património cultural — um pouco como, (À única excepção de Arquimedes, que enquanto
para a Inglaterra, os manuscritos ou as primeiras esteve na Biblioteca de Alexandria inventou o
edições das obras de Shakespeare; por isso, parafuso de água, ainda hoje utilizado no Egipto para
mostraram-se reticentes em deixar os manuscritos sair a irrigação dos campos. Mas mesmo assim
das suas mãos por um instante que fosse. Só considerava que esses mecanismos engenhosos
aceitaram ceder as peças depois de Ptolomeu ter tinham pouco a ver com a dignidade da ciência.)
assegurado a devolução através de um enorme As grandes realizações intelectuais da antiguidade
depósito em dinheiro. Mas Ptolomeu dava mais valor tiveram poucas aplicações imediatas: a ciência nunca
a esses manuscritos do que ao ouro ou à prata. cativou a imaginação das massas. Não havia
Preferiu por conseguinte perder a caução e conservar, contrapeso para a estagnação, o pessimismo, e a mais
o melhor possível, os originais na sua biblioteca. Os vil submissão ao misticismo. E quando por fim a
atenienses, ultrajados, tiveram de se contentar com as populaça veio incendiar a biblioteca, não houve
cópias que Ptolomeu, pouco envergonhado, lhes deu. ninguém que a impedisse de o fazer.
Raramente se viu um estado encorajar a busca da O último cientista a trabalhar na biblioteca foi… uma
ciência com tal avidez. mulher. Distinguiu-se na matemática, na astronomia,
Os Ptolomeus não se limitaram a acumular na física e foi ainda responsável pela escola de
conhecimentos adquiridos; encorajaram e financiaram filosofia neoplatónica — uma extraordinária
a investigação científica e deste modo geraram novos diversificação de actividades para qualquer pessoa da
conhecimentos. Os resultados foram espantosos: época. O seu nome, Hipácia. Nasceu em Alexandria
Eratóstenes calculou com precisão o tamanho da em 370. Numa época em que as mulheres tinham
Terra, traçou o seu mapa, e defendeu que se podia poucas oportunidades e eram tratadas como objectos,
atingir a Índia viajando para oeste a partir de Hipácia movia-se livremente e sem problemas nos
Espanha; Hiparco adivinhou que as estrelas nascem, domínios que pertenciam tradicionalmente aos
deslocam-se lentamente ao longo de séculos e homens. Segundo todos os testemunhos, era de
acabam por morrer; foi o primeiro a elaborar um grande beleza. Tinha muitos pretendentes mas
catálogo indicando a posição e magnitude das estrelas rejeitou todas as propostas de casamento. A
de modo a poder detectar essas mudanças. Euclides Alexandria do tempo de Hipácia — então desde há

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muito sob o domínio romano — era uma cidade em interior da caverna permanecem seres humanos, que
que se vivia sob grande pressão. A escravatura tinha nasceram e cresceram ali.
retirado à civilização clássica a sua vitalidade, a Ficam de costas para a entrada, acorrentados, sem
igreja cristã consolidava-se e tentava eliminar a poder mover-se, forçados a olhar somente a parede do
influencia e a cultura pagãs. fundo da caverna, onde são projectadas sombras de
Hipácia encontrava-se no meio dessas poderosas outros homens que, além do muro, mantêm acesa
forças sociais. Cirilo, o arcebispo de Alexandria, uma fogueira.
desprezava-a por causa da sua relação estreita com o Os prisioneiros julgam que essas sombras sejam a
governador romano, e porque ela era um símbolo da realidade.
sabedoria e da ciência, que a igreja nascente Um dos prisioneiros decide abandonar essa condição
identificava com o paganismo. Apesar do grande e fabrica um instrumento com o qual quebra os
perigo que corria, continuou a ensinar e a publicar até grilhões. Aos poucos vai se movendo e avança na
que no ano de 415, a caminho do seu trabalho, foi direcção do muro e o escala, com dificuldade enfrenta
atacada por um grupo de fanáticos partidários do os obstáculos que encontra e sai da caverna,
arcebispo Cirilo. Arrastaram-na para fora do carro, descobrindo não apenas que as sombras eram feitas
arrancaram-lhe as roupas e, com conchas de abalone, por homens como eles, e mais além todo o mundo e a
separaram-lhe a carne dos ossos. Os seus restos foram natureza.
queimados, os seus trabalhos destruídos, o seu nome Platão, com esta alegoria dá-nos um exemplo de
esquecido. Cirilo foi santificado. como Sócrates ajudava os seus alunos: pelo diálogo e
A glória da Biblioteca de Alexandria é agora apenas maiêutica Sócrates leva os seus alunos a descobrirem
uma vaga recordação. Tudo aquilo que dela restava a sabedoria que já se encontra, como um diamante,
foi destruído logo a seguir à morte de Hipácia. Foi escondida dentro deles próprios. Sócrates mostra-nos
como se a civilização inteira tivesse efectuado uma por esta alegoria como o nosso espírito, preso na
lobotomia a si mesma, e grande parte dos seus laços ignorância, está longe de se conhecer a si mesmo. E
com o passado, das suas descobertas, das suas ideias como essa ignorância nos leva a ver tudo de forma
e das suas paixões extinguiram-se para sempre. A distorcida – com menos beleza, com menos verdade,
perda foi incalculável. Em alguns casos, apenas e com menos bondade. Sair da caverna, descobrir a
conhecemos os aliciantes títulos das obras então iluminação espiritual é vermos as coisas como elas
destruídas, mas, na sua maioria, não conhecemos nem são, e sermos humanos completos.
os títulos nem os autores. Sabemos que das 123 peças
de teatro de Sófocles existentes na biblioteca, só sete O Mito da Caverna
sobreviveram. Uma delas é o Édipo Rei. Os mesmos Trata-se de um diálogo metafórico onde as falas na
números aplicam-se às obras de Ésquilo e Eurípedes. primeira pessoa são de Sócrates, e seus interlocutores,
É um pouco como se os únicos trabalhos Glauco e Adimanto, são os irmãos mais novos de
sobreviventes de um homem chamado William Platão. No diálogo, é dada ênfase ao processo de
Shakespeare fossem Coriolano e O Conto de conhecimento, mostrando a visão de mundo do
Inverno, mas sabendo nós que ele escrevera outras ignorante, que vive de senso comum, e do filósofo, na
peças, hoje desconhecidas embora aparentemente sua busca da Verdade Eterna.
apreciadas na época, obras chamadas Hamlet,
Macbeth, Júlio César, Rei Lear, Romeu e Julieta… Sócrates:
Do conteúdo científico desta gloriosa biblioteca não “Depois disto” prossegui eu. “Imagina a nossa
resta um único manuscrito. natureza, relativamente à educação ou à sua falta, de
acordo com a seguinte experiência. Suponhamos uns
(SAGAN, C: Cosmos, tradução de Maria Auta de homens numa habitação subterrânea em forma de
Barros et al., Gradiva, 2001, pp. 332-6.) caverna, com uma entrada aberta para a luz, que se
estende a todo o comprimento dessa gruta. Estão lá
 A ALEGORIA DA CAVERNA, PLATÃO dentro desde a infância, algemados de pernas e
pescoços, de tal maneira que só lhes é dado
permanecer no mesmo lugar e olhar em frente; são
incapazes de voltar a cabeça, por causa dos grilhões;
serve-lhes de iluminação um fogo que se queima ao
longe, numa eminência, por detrás deles; entre a
fogueira e os prisioneiros há um caminho ascendente,
ao longo do qual se construiu um pequeno muro, no
género dos tapumes que os homens dos "robertos"
colocam diante do público, para mostrarem as suas
habilidades por cima deles.
“Estou a ver” disse ele.
“Visiona também ao longo deste muro, homens que
transportam toda a espécie de objectos, que o
ultrapassam: estatuetas de homens e de animais, de
Fig. 1 - A caverna de Platão (Soccio, 1995) pedra e de madeira, de toda a espécie de lavor; como
é natural, dos que os transportam, uns falam, outros
A Alegoria da Caverna, foi escrita pelo filósofo seguem calados.”
Platão, e encontra-se na obra intitulada A República “Estranho quadro e estranhos prisioneiros são esses
(livro VII). Trata-se da exemplificação de como de que tu falas” observou ele.
podemos nos libertar da condição de ignorância que “Semelhantes a nós” continuei. “Em primeiro lugar,
nos aprisiona através da luz da verdade. pensas que, nestas condições, eles tenham visto, de si
Imaginemos um muro bem alto separando o mundo mesmo e dos outros, algo mais que as sombras
externo e uma caverna. Na caverna existe uma projectadas pelo fogo na parede oposta da caverna?”
abertura por onde passa um feixe de luz exterior. No

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“Como não” respondeu ele. “Se são forçados a mundo visível, e que é o responsável por tudo aquilo
manter a cabeça imóvel toda a de que eles viam um arremedo.”
vida?” “É evidente que depois chegaria a essas conclusões.”
“E os objectos transportados? Não se passa o mesmo “E então? Quando ele se lembrasse da sua primitiva
com eles?” habitação, e do saber que lá possuía, dos seus
“Sem dúvida.” companheiros de prisão desse tempo, não crês que ele
“Então, se eles fossem capazes de conversar uns com se regozijaria com a mudança e deploraria os outros?”
os outros, não te parece que eles julgariam estar a “Com certeza.”
nomear objectos reais, quando designavam o que “E as honras e elogios, se alguns tinham então entre
viam? si, ou prémios para o que distinguisse com mais
“É forçoso.” agudeza os objectos que passavam e se lembrasse
“E se a prisão tivesse também um eco na parede do melhor quais os que costumavam passar em primeiro
fundo? Quando algum dos transeuntes falasse, não te lugar e quais em último, ou os que seguiam juntos, e
parece que eles não julgariam outra coisa, senão que àquele que dentre eles fosse mais hábil em predizer o
era a voz da sombra que passava? que ia acontecer œ parece-te que ele teria saudades ou
“Por Zeus, que sim!” inveja das honrarias e poder que havia entre eles, ou
“De qualquer modo” afirmei. “Pessoas nessas que experimentaria os mesmos sentimentos que em
condições não pensavam que a realidade fosse senão Homero, e seria seu intenso desejo "servir junto de
a sombra dos objectos.” um homem pobre, como servo da gleba", e antes
“É absolutamente forçoso” disse ele. sofrer tudo do que regressar àquelas ilusões e viver
“Considera pois” continuei. “O que aconteceria se daquele modo?”
eles fossem soltos das cadeias e curados da sua “Suponho que seria assim œ respondeu œ que ele
ignorância, a ver se, regressados à sua natureza, as sofreria tudo, de preferência a viver daquela
coisas se passavam deste modo. Logo que alguém maneira.”
soltasse um deles, e o forçasse a endireitar-se de “Imagina ainda o seguinte” prossegui eu. “Se um
repente, a voltar o pescoço, a andar e a olhar para a homem nessas condições descesse de novo para o seu
luz, ao fazer tudo isso, sentiria dor, e o antigo posto, não teria os olhos cheios de trevas, ao
deslumbramento impedi-lo-ia de fixar os objectos regressar subitamente da luz do Sol?”
cujas sombras via outrora. Que julgas tu que ele diria, “Com certeza.”
se alguém lhe afirmasse que até então ele só vira “E se lhe fosse necessário julgar daquelas sombras
coisas vãs, ao passo que agora estava mais perto da em competição com os que tinham estado sempre
realidade e via de verdade, voltado para objectos mais prisioneiros, no período em que ainda estava
reais? E se ainda, mostrando-lhe cada um desses ofuscado, antes de adaptar a vista – e o tempo de se
objectos que passavam, o forçassem com perguntas a habituar não seria pouco – acaso não causaria o riso,
dizer o que era? Não te parece que ele se veria em e não diriam dele que, por ter subido ao mundo
dificuldades e suporia que os objectos vistos outrora superior, estragara a vista, e que não valia a pena
eram mais reais do que os que agora lhe mostravam?” tentar a ascensão? E a quem tentasse soltá-los e
“Muito mais” afirmou. conduzi-los até cima, se pudessem agarrá-lo e matá-
“Portanto, se alguém o forçasse a olhar para a própria lo, não o matariam?
luz, doer-lhe-iam os olhos e voltar-se-ia, para buscar “Matariam, sem dúvida” confirmou ele.
refúgio junto dos objectos para os quais podia olhar, e “Meu caro Gláucon, este quadro” prossegui eu.
julgaria ainda que estes eram na verdade mais nítidos “Deve agora aplicar-se a tudo quanto dissemos
do que os que lhe mostravam? anteriormente, comparando o mundo visível através
“Seria assim” disse ele. dos olhos à caverna da prisão, e a luz da fogueira que
“E se o arrancassem dali à força e o fizessem subir o lá existia à força do Sol. Quanto à subida ao mundo
caminho rude e íngreme, e não o deixassem fugir superior e à visão do que lá se encontra, se a tomares
antes de o arrastarem até à luz do Sol, não seria como a ascensão da alma ao mundo inteligível, não
natural que ele se doesse e agastasse, por ser assim iludirás a minha expectativa, já que é teu desejo
arrastado, e, depois de chegar à luz, com os olhos conhecê-la. O Deus sabe se ela é verdadeira. Pois,
deslumbrados, nem sequer pudesse ver nada daquilo segundo entendo, no limite do cognoscível é que se
que agora dizemos serem os verdadeiros objectos? avista, a custo, a ideia do Bem; e, uma vez avistada,
“Não poderia, de facto, pelo menos de repente.” compreende-se que ela é para todos a causa de quanto
“Precisava de se habituar, julgo eu, se quisesse ver o há de justo e belo; que, no mundo visível, foi ela que
mundo superior. Em primeiro lugar, olharia mais criou a luz, da qual é senhora; e que, no mundo
facilmente para as sombras, depois disso, para as inteligível, é ela a senhora da verdade e da
imagens dos homens e dos outros objectos, inteligência, e que é preciso vê-la para se ser sensato
reflectidas na água, e, por último, para os próprios na vida particular e pública.”
objectos. A partir de então, seria capaz de contemplar (Platão, A República, v. II p.105 a 109. Tradução do
o que há no céu, e o próprio céu, durante a noite, original grego pelo filósofo Pinharanda Gomes.)
olhando para a luz das estrelas e da Lua, mais
facilmente do que se fosse o Sol e o seu brilho de
dia.”
“Pois não!”
“Finalmente, julgo eu, seria capaz de olhar para o Sol  SHAKESPEARE, JÚLIO CÉSAR
e de o contemplar, não já a sua imagem na água ou
em qualquer sítio, mas a ele mesmo, no seu lugar.” CENA II
“Necessariamente.”
“Depois já compreenderia, acerca do Sol, que é ele Roma-Fórum
que causa as estações e os anos e que tudo dirige no
Entram Bruto e Cássio e uma chusma de cidadãos.

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tomado parte nenhuma na conjura, dela
CIDADÃO beneficiará, terá um lugar na República. Qual de
Queremos que nos dêem explicações. Queremos vós não lucrará assim com esta morte? Retiro-
explicações! me, afirmando o seguinte: «Matei o meu melhor
amigo por amor de Roma; conservo o punhal que
BRUTO o matou para mim próprio, no caso do meu país
Então, segui-me e concedei-me audiência, amigos. - querer dispor da minha vida.»
Cássio, ide por outra rua, repartiremos o povo entre
nós. - Aqueles que me quiserem ouvir falar, CIDADÃOS
fiquem aqui; os que quiserem ouvir falar Cássio, Viva Bruto! Viva Bruto!
sigam-no. Públicas satisfações da morte de
César hão-de ser-vos dadas. 1° CIDADÃO
Levemo-lo em triunfo até sua casa!
1º CIDADÃO
Eu quero ouvir falar Bruto. 2º CIDADÃO
Erijamos-lhe uma estátua no meio de todos os
2º CIDADÃO seus antepassados!
Eu ouvirei Cássio. Compararemos os seus argu-
mentos quando os tivermos ouvido aos dois. 3° CIDADÃO
(Cássio sai, seguido do alguns cidadãos. Bruto Que seja César!
sobe aos Rostros.)
4° CIDADÃO
3º CIDADÃO As melhores virtudes de César vão ser coroadas
O nobre Bruto vai falar. Silêncio! em Bruto.

BRUTO 1° CIDADÃO
Tende paciência até ao fim. Romanos, Conduzamo-lo a casa com aplausos e
compatriotas, amigos, atendei a minha causa e aclamações.
conservai-vos em silêncio a fim de melhor me
ouvirdes. Crede na minha honra e respeitai-a, se BRUTO
quiserdes crer-me. Julgai-me segundo a vossa Compatriotas...
sapiência, despertai os vossos sentidos a fim de,
que vos seja possível julgar-me 2º CIDADÃO
conscienciosamente. Se há alguém nesta Silêncio! Silêncio! Bruto vai falar.
assembleia amigo de César, dir-lhe-ei que por
mais amigo que dele fosse, não era capaz de ter 1º CIDADÃO
por César o amor que Bruto lhe dedicava. Se Silêncio!
esse amigo perguntar porque foi então que Bruto
se revoltou contra César, eis qual será a minha BRUTO
resposta: eu era amigo do César, mas era muito Meus bons compatriotas, deixai que eu parta
mais amigo de Roma. Preferiríeis que César só, e por consideração para comigo, ficai aqui
vivesse e morrêssemos nós todos escravos, ou com António. Prestai homenagem ao cadáver
que César morresse para nós vivermos como de César e honrai o discurso que António vai
homens livres? César era meu amigo: eu choro- pronunciar, celebrando a glória de César,
o. Ele foi feliz, folgo com isso. Foi valoroso, como por nós foi autorizado a fazer. Suplico-
presto-lhe as minhas honras. Mas, como era vos que ninguém daqui saia, excepto eu, até
ambicioso, eu matei-o. Eis lágrimas para o que António acabe de falar. (Sai)
chorar, porque o amava; alegria pela sua
fortuna, veneração pelo seu valor, e a morte pela 1º CIDADÃO
sua ambição! Qual é aqui o homem assaz vil que Silêncio! Ouçamos Marco António!
queira ser escravo? Se houver um, que fale, pois
eu ofendi-o! Qual é aqui o homem assaz bárbaro 3º CIDADÃO
para não querer ser romano? Se houver um, que Que suba à tribuna. Ouvi-lo-emos. — Nobre
fale, pois eu ofendi-o! Qual é aqui o homem António subi.
assaz desprezível para não amar a pátria? Se
houver um, que fale, pois eu ofendi-o! Espero ANTÓNIO
que me respondam. Fico-vos muito obrigado por me ouvirdes, em
consideração a Bruto. (Sobe)
CIDADÃOS (falando todos ao mesmo tempo)
Tal homem não existe, Bruto, não existe! 4º CIDADÃO
Que diz ele de Bruto?
BRUTO
Então, não ofendi ninguém. Não fiz a César 3º CIDADÃO
senão o que vós teríeis feito a Bruto. As razões Diz que nos está muito reconhecido por o
da sua morte estão inscritas no Capitólio. Elas ouvirmos, em consideração a Bruto.
não lhe atenuam a glória no que merecia
louvores, nem lhe exageram as culpas pelas 4º CIDADÃO
quais sofreu a morte (Entram António e outros Será bom que não diga uma única palavra má
com o cadáver de César.) Aqui vem o corpo de relativamente a Bruto...
César, pranteado por Marco António. Sem ter

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1º CIDADÃO
César era um tirano. 2º CIDADÃO
Pobre alma! Tem os olhos vermelhos como
3º CIDADÃO fogo por tanto chorar!
Não há dúvida, e foi uma felicidade para nós
que Roma se visse livre dele. 3º CIDADÃO
Em Roma não há outro homem mais nobre do que
2º CIDADÃO António.
Silêncio! Ouçamos o que António poderá
dizer. 4º CIDADÃO
Atenção! Ele vai começar outra vez a falar.
ANTÓNIO
Nobres romanos... ANTONIO
Ontem, ainda a palavra do César fazia tremer o
CIDADÃOS mundo e agora ei-lo por terra e ninguém, por mais
Silêncio! Escutem!... humilde que seja, lhe paga o seu tributo de respeito.
Ó meus amigos! Se cu estivesse disposto a excitar os
ANTÓNIO vossos corações e os vossos espíritos à rebelião e à
Amigos, romanos, compatriotas, prestai-me cólera, teria de ser injusto com Bruto e para com
atenção. Vim para, sepultar César, não para o Cássio, que, todos o sabeis, são homens honrados.
louvar. O mal que os homens fazem vive depois Não quero; prefiro antes ser injusto para com o
deles. O bem que puderam fazer permanece quase morto, injusto para comigo mesmo, injusto para com
sempre enterrado com os seus ossos. Que seja todos vós, do que sê-lo para com homens tão
assim para César. O nobre Bruto disse-vos que honrados. Mas eis aqui um pergaminho, com o selo
César era um ambicioso. A ser isso verdade, a do César, que encontrai no seu quarto. É o testamento
culpa era grave, e César dolorosamente, a expiou. dele. Se o povo conhecesse este testamento, que n ã o
Com a autorização de Bruto e dos outros (porque faço tenção de ler, iria beijar as feridas do corpo de
Bruto é um homem honrado, assim como todos os César, molhar o lenço no seu sangue sagrado,
outros são honrados) venho falar nos funerais de mendigaria um dos seus cabelos, para guardá-lo como
César. Ele era, para mim, um amigo fiel e justo. a essas relíquias que à hora da morte se mencionam
Mas Bruto diz que ele era ambicioso, e Bruto é um entre as últimas vontades, e que são transmitidas
homem honrado. Ele trouxe a Roma numerosos como um legado precioso à posteridade!
cativos, cujos resgates encheram os cofres
públicos. Era César ambicioso por isso? Quando o 1º CIDADÃO
pobre gemeu, César chorou. A ambição deveria ser Queremos ouvir o testamento! Lede-o, Marco
dum estofo mais rude. Mas Bruto diz que ele era António!
um ambicioso, e Bruto é um homem de bem. Todos
vós vistes, nas Lupercais, que três vezes uma coroa CIDADÃOS
real lhe foi apresentada, e que três vezes ele a O testamento! O testamento! Queremos ouvir o
recusou. Era isso ambição? Contudo, Bruto diz que testamento de César!
ele era um ambicioso, e não há dúvida que Bruto é
honesto. Eu não falo para reprovar o que Bruto ANTÓNIO
disse; mas estou aqui para dizer o que sei. Todos Tende paciência, nobres amigos, não devo lê-lo. Não
vós o amáveis antigamente e não era sem motivo. convém que fiqueis sabendo quanto ele vos amava.
Porque, pois, não o pranteais hoje? O que é que Vós não sois de pau, vós não sois de pedra, vós sois
vos impede disso? Ó razão, onde estás tu, razão? homens, e , sendo homens, se ouvísseis ler o
Refugiaste-te nas brutas feras, e os homens ficaram testamento de César, isso inflamar-vos-ia e tornar-
sem ti! Sede indulgentes para comigo. O meu vos-íeis furiosos. Não convém que fiqueis sabendo
coração está ali no esquife de César, vejo-me que sois seus herdeiros, porque, se o soubésseis, o
obrigado a calar-me até recuperar o ânimo. que viria a suceder?

1º CIDADÃO 4º CIDADÃO
Parece-me que tem muita razão no que diz. Lede o testamento! Queremos ouvi-lo, António!
Deveis ler-nos o testamento, o testamento de César!
2º CIDADÃO
Se bem considerares a coisa, verás que César ANTÓNIO
foi vítima de uma grande injustiça. Sossegai! Quereis esperar mais um momento? Fui
mais longe do que queria, ao falar-vos. Fui injusto —
3º CIDADÃO e disso tenho medo — para com homens honrados
Pensais como eu, senhores! Tenho medo de que, com seus punhais, assassinaram César. Sim,
que venha outro pior do que ele. tenho medo disso.

4º CIDADÃO 4º CIDADÃO
Tomaste bem sentido nas palavras de António? Homens honrados! Traidores é o que eles são...
César não quis aceitar a coroa, portanto é
certo que ele não era ambicioso. (Impresso pela primeira vez no in-folio de 1623,
representado provavelmente entre 1600, 1603 ou
1º CIDADÃO 1607,Tradução do DR. DOMINGOS RAMOS 1988,
Se isso se provasse, alguém o havia de pagar LELLO & IRMÃO-EDITORES PORTO)
caro!

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 SERMÃO DE SANTO ANTÓNIO AOS PEIXES, humana; mas o zelo da glória divina, que
PADRE ANTÓNIO VIEIRA ardia naquele peito, não se rendeu a
Vos estis sal terræ (S. Mateus, 5) semelhantes partidos. Pois que fez? Mudou
VÓS, diz Cristo Senhor nosso, falando com os somente o púlpito e o auditório, mas não
pregadores, sois o sal da terra: e chama-lhes sal desistiu da doutrina. Deixa as praças, vai-se
da terra, porque quer que façam na terra o que faz às praias; deixa a terra, vai-se ao mar, e
o sal. O efeito do sal é impedir a corrupção, mas começa a dizer a altas vozes: Já que me não
quando a terra se vê tão corrupta como está a querem ouvir os homens, ouçam-me os
nossa, havendo tantos nela que têm ofício de sal, peixes. Oh, maravilhas do Altíssimo! Oh,
qual será, ou qual pode ser a causa desta poderes do que criou o mar e a terra!
corrupção? Ou é porque o sal não salga, ou Começam a ferver as ondas, começam a
porque a terra se não deixa salgar. Ou é porque o concorrer os peixes, os grandes, os maiores,
sal não salga, e os pregadores não pregam a os pequenos, e postos todos por sua ordem
verdadeira doutrina; ou porque a terra se não com as cabeças de fora da água, António
deixa salgar, e os ouvintes, sendo verdadeira a pregava e eles ouviam.
doutrina que lhe dão, a não querem receber. Ou é Se a Igreja quer que preguemos de Santo
porque o sal não salga, e os pregadores dizem António sobre o Evangelho, dê-nos outro.
uma cousa e fazem outra; ou porque a terra se Vos estis sal terræ. É muito bom o texto
não deixa salgar, e os ouvintes querem antes para os outros santos doutores; mas para
imitar o que eles fazem, que fazer o que dizem. Santo António vem-lhe muito curto. Os
Ou é porque o sal não salga, e os pregadores se outros santos doutores da Igreja foram sal
pregam a si e não a Cristo; ou porque a terra se da terra, Santo António foi sal da terra e foi
não deixa salgar, e os ouvintes, em vez de servir a sal do mar. Este é o assunto que eu tinha
Cristo, servem a seus apetites. Não é tudo isto para tomar hoje. Mas há muitos dias que
verdade? Ainda mal. tenho metido no pensamento que nas festas
Suposto, pois, que, ou o sal não salgue ou a dos santos é melhor pregar como eles, que
terra se não deixe salgar; que se há-de fazer pregar deles. Quanto mais que o são da
a este sal, e que se há-de fazer a esta terra? minha doutrina, qualquer que ele seja, tem
O que se há-de fazer ao sal que não salga? tido nesta terra uma fortuna tão parecida à
Cristo o disse logo: Quod si sal evanuerit, de Santo António em Arimino, que é força
in quo salietur? Ad nihilum valet ultra, nisi segui-la em tudo. Muitas vezes vos tenho
ut mittatur foras et conculcetur ab pregado nesta igreja, e noutras, de manhã e
hominibus (Mateus V – 13). Se o sal perder de tarde, de dia e de noite, sempre com
a substância e a virtude, e o pregador faltar doutrina muito clara, muito sólida, muito
à doutrina e ao exemplo, o que se lhe há-de verdadeira, e a que mais necessária e
fazer, é lançá-lo fora como inútil, para que importante é a esta terra, para emenda e
seja pisado de todos. Quem se atreverá a reforma dos vícios que a corrompem. O
dizer tal cousa, se o mesmo Cristo a não fruto que tenho colhido desta doutrina, e se
pronunciara? Assim como não há quem seja a terra tem tomado o sal, ou se tem tomado
mais digno de reverência e de ser posto dele, vós o sabeis e eu por vós o sinto.
sobre a cabeça, que o pregador que ensina e Isto suposto, quero hoje, à imitação de Santo
faz o que deve; assim é merecedor de todo António, voltar-me da terra ao mar e, já que os
o desprezo e de ser metido debaixo dos pés homens se não aproveitam, pregar aos peixes. O
o que com a palavra ou com a vida prega o mar está tão perto que bem me ouvirão. Os
contrário. demais podem deixar o sermão, pois não é para
Isto é o que se deve fazer ao sal que não eles. Maria, quer dizer, Domina maris: «Senhora
salga. E à terra, que se não deixa salgar, do mar»; e posto que o assunto seja tão desusado,
que se lhe há-de fazer? Este ponto não espero que me não falte com a costumada graça.
resolveu Cristo Senhor nosso no Ave Maria.
Evangelho; mas temos sobre ele a resolução
do nosso grande português Santo António, (Sermão de Santo António aos Peixes. In Diciopédia
que hoje celebramos, e a mais galharda e X [DVD-ROM]. Porto : Porto Editora, 2006.)
gloriosa resolução que nenhum santo
tomou. Pregava Santo António em Itália na  REINER MARIA RILKE. Cartas a um
cidade de Arimino, contra os hereges, que jovem poeta.
nela eram muitos; e como erros de
entendimento são dificultosos de arrancar, Paris, 17 de Fevereiro de 1903
não só não fazia fruto o santo, mas chegou A sua carta só me chegou há alguns dias. Quero
o povo a se levantar contra ele, e faltou agradecer-lhe a grande e amável confiança dela.
pouco para que lhe não tirassem a vida. Pouco mais posso fazer. Não posso pronunciar-me
Que faria neste caso o ânimo generoso do sobre os seus versos porque estou muito longe de
grande António? Sacudiria o pó dos toda e qualquer intenção crítica. Nada pode tocar
sapatos, como Cristo aconselha em outro menos uma obra de arte do que as expressões críticas:
lugar? Mas António com os pés descalços isso só dá lugar a equívocos mais ou menos felizes.
não podia fazer esta protestação; e uns pés, As coisas não são todas tão apreensíveis e dizíveis
a que se não pegou nada da terra, não como muitas vezes se gostaria de nos fazer crer; a
tinham que sacudir. Que faria logo? maior parte dos eventos são indizíveis, perfazem-se
Retirar-se-ia? Calar-se-ia? Dissimularia? num espaço que nunca foi tocado por uma palavra, e
Daria tempo ao tempo? Isso ensinaria mais indizíveis do que tudo são as obras de arte,
porventura a prudência, ou a covardia

12
existências secretas cuja vida perdura enquanto a vida. Uma obra de arte é boa quando nasce da
nossa passa. necessidade Nesta sua maneira de irromper está o seu
Feita esta observação, só posso dizer-lhe que nos seus veredicto: não há mais nenhum. Por isso, caro senhor,
versos não há uma voz pessoal, embora haja indícios, não podia dar-lhe nenhum outro conselho além deste:
tímidos e encobertos, de uma personalidade própria. entrar em si mesmo e examinar as profundezas de que
Sinto isso com a maior clareza no último poema, “A brota a sua vida; nas nascentes dela encontrará a
minha alma”. Aí há qualquer coisa de próprio que resposta à pergunta sobre se deve criar. Aceite-a
quer chegar à palavra e à forma. E, na bela poesia “A como ela lhe soar, sem se pôr com elaborações.
Leopardi”, desenha-se talvez uma espécie de Talvez tenha a prova de que foi chamado a ser artista.
parentesco com esse grande solitário. Apesar disso, os Então aceite o destino e assuma-o, no seu peso e na
poemas ainda não são nada em si, nada de autónomo, sua grandeza, Com toda a dedicação e simpatia, sem
nem mesmo o último, nem o que respeita a Leopardi. querer saber da recompensa que poderia vir de fora.
A sua amável carta que os acompanhou não deixa de Na verdade o criador deve ser um mundo para si
me explicar muitas falhas que eu senti na leitura dos mesmo e tudo encontrar em si e na Natureza a que se
seus versos, sem todavia ser capaz de lhes dar nome. ligou. Mas talvez tenha ainda, depois dessa descida
Pergunta-me se os seus versos são bons. É a mim que em si e no que em si é solidão, de desistir de ser um
pergunta. Já antes perguntou a outros. Envia-os às poeta (basta sentir, como disse, que se pode viver sem
revistas. Compara-os com outros poemas e fica escrever, para que isso não nos seja lícito). Mas
inquieto se algumas redacções recusam as suas as mesmo então esse recolhimento que lhe peço não terá
tentativas. Ora bem (já que me autorizou a aconselha- sido em vão. A sua vida encontrará de toda a maneira
lo), peço-lhe que se deixe disso tudo. O senhor olha caminhos próprios a partir daí e que eles sejam bons,
para fora e é exactamente o que não deveria fazer fecundos e amplos, é o que lhe desejo mais do que
agora. Ninguém pode dar-lhe conselhos ou ajudá-lo, posso dizer.
ninguém. Há um único meio. Entre dentro de si. Que mais posso dizer-lhe? Parece-me que tudo foi
Procure o motivo que o faz escrever; examine se ele acentuado como devia; e enfim só desejaria ainda
tem raízes até ao lugar mais fundo do seu coração, aconselhá-lo a que cresça no silêncio e na seriedade
confesse a si mesmo se viria a morrer no caso de ao longo da sua evolução; não poderia prejudicá-la
escrever lhe ser vedado. Isto antes de mais nada: mais fortemente do que olhando para fora e
pergunte-se na hora mais calada da noite: tenho de esperando de fora a resposta a perguntas a que só o
escrever? Escave em si mesmo em busca de uma seu sentir mais íntimo, nas suas horas mais
resposta profunda. E se esta soar afirmativamente, se silenciosas, pode talvez responder.
o senhor tiver de enfrentar esta questão séria com um Foi uma alegria para mim encontrar na sua carta o
forte e simples “Sim, tenho”, então construa a sua nome do senhor professor Horaceck; tenho por esse
vida em função dessa necessidade; a sua vida terá de amável sábio uma grande veneração e uma gratidão
ser um sinal e um testemunho desse impulso até nas que perdura pelos anos. Peço-lhe o favor de lhe
horas mais indiferentes e insignificantes. Então transmitir estes meus sentimentos; desvanece-me que
aproxime-se da Natureza. Então tente dizer, como se ele se lembre ainda de mim e registo-o com apreço.
fosse o primeiro homem, o que vê e vive e ama e Devolvo-lhe com esta os versos que tão
perde. Não escreva poemas de amor; comece por amigavelmente me confiou. E mais uma vez lhe
evitar aquelas formas que são mais correntes e agradeço a generosa cordialidade da sua confiança de
comuns: são as mais difíceis, pois requer uma grande que eu tentei tornar-me um pouco mais digno do que,
força amadurecida exprimir o que nos é próprio como estranho, realmente sou, respondendo
quando já existem acumuladas tantas produções boas sinceramente e o melhor que sei.
e até esplendorosas. Por isso salve-se dos temas
gerais para os que lhe oferece a vida de todos os dias;  SIDDHARTA, HERMAN HESSE (Prémio
descreva as suas tristezas e desejos, os pensamentos Nobel da Literatura 1946. Tradução do Inglês,
passageiros, a fé em qualquer forma de beleza — Miguel Gullander)
descreva tudo isso com sinceridade íntima, tranquila,
humilde, e utilize para se exprimir as coisas que o Siddharta, a cada passo que agora dava, aprendia algo
rodeiam, as imagens dos seus sonhos e os objectos de novo, pois o mundo tinha-se transformado e
das suas recordações. Se o seu dia-a-dia lhe parece Siddharta estava maravilhado. Ele viu o sol erguer-se
pobre, não o lamente; lamente-se a si, diga para sobre a floresta e sobre as montanhas, e viu-o pôr-se
consigo que não é suficientemente poeta para lá longe na praia das palmeiras. À noite ele viu as
convocar as suas riquezas; pois para o criador não estrelas no infinito céu da noite e a lua, com a forma
existe escassez nem lugar pobre ou indiferente. E duma lâmina de foice, a flutuar como um barco no
mesmo que estivesse numa prisão cujas paredes não azul. Ele viu árvores, estrelas, animais, nuvens, o
deixassem chegar nenhum dos ruídos do mundo aos arco-íris, rochas, ervas, flores, riachos e rios, o brilho
seus sentidos — então não teria ainda e sempre a sua do orvalho nos arbustos durante a manhã, as altas
infância, essa riqueza preciosa e principesca, essa montanhas distantes, azuis e pálidas. Pássaros
câmara de tesouros da lembrança? Concentre nela a cantavam, abelhas zumbiam, e o vento soprava
sua atenção. Tente despertar as sensações afundadas suavemente sobre os campos de arroz. E tudo isto,
desse passado longínquo; a sua personalidade ganhará que ele agora via e sentia, colorido em milhares de
firmeza, a sua solidão há-de alargar-se e tornar-se sua diferentes formas, sempre ali estivera antes. O sol e a
morada crepuscular e o ruído dos outros passará ao luz sempre tinham brilhado e os rios sempre tinham
longe. E se desse voltar-se para dentro, desse corrido e fluído, e as abelhas sempre tinham zumbido
mergulho no seu mundo próprio, surgirem versos, — mas, em todas as vezes anteriores, tudo isto nada
então não lhe ocorrerá perguntar a alguém se eles são mais tinha sido como que um transitório véu de ilusão
bons. Também não fará a tentativa de interessar as perante os seus olhos, algo visto com desconfiança,
revistas nesses trabalhos, pois verá neles a sua dilecta algo condenado a ser desprezado e ostracizado para
e natural propriedade, um pedaço e uma voz da sua longe da sua mente, pois não era a realidade, porque a

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realidade encontra-se no outro lado do visível. Mas facilmente. Na minha meditação vi que centenas de
agora os seus olhos demoravam-se no que viam deste bebés nascem a cada dia ao longo do golfo do Sião, e
lado. Ele viu e reconheceu o visível e ele procurou o se nós educadores, servidores sociais, políticos e
seu lugar neste mundo (...) o seu objectivo já não outros não fizermos nada pela situação, dentro de 25
estava em qualquer outro lado. O mundo era lindo anos um bom número deles se tornará pirata. Isso é
quando se o olhava desta maneira — sem andar à certo. Se tu ou eu tivéssemos nascido hoje nessas
procura de nada, de modo simples, de modo tão aldeias de pescadores, poderíamos nos tornar piratas
inocente. A lua e as estrelas eram lindas, o rio, a daqui a 25 anos. Se tu agarras numa arma e dás um
praia, a floresta e a rocha, a cabra e o besouro tiro no pirata estarás disparando sobre todos nós,
dourado, a flor e a borboleta eram lindos. Era lindo, porque todos somos, em certo sentido, responsáveis
era um prazer ir por este mundo dessa maneira, tão por este estado de coisas.
inocente, tão desperta e acordada, tão atenta e Após uma longa meditação eu escrevi este poema.
interessada com o imediato, sem qualquer Nele há três pessoas: a menina de 12 anos, o pirata e
desconfiança. Algures o sol ardia ferozmente, algures eu. Podemos olhar e nos reconhecer a nós mesmos
havia abóboras e bananas. Os dias e as noites eram em cada uma dessas pessoas. O título do poema é Por
curtos, e cada hora passava rápida como a vela dum favor chama-me pelos meus verdadeiros nomes,
navio no mar, sob a vela dum navio de tesouros, porque eu tenho tantos nomes. Quando ouço um
cheio de alegria. Shiddarta viu um grupo de macacos desses nomes tenho de responder sim.
nas profundezas da floresta a moverem-se lá no alto,
entre os ramos, e ouviu os seus gritos selvagens e Não digas que amanhã partirei
urgentes. Siddharta viu um carneiro seguir uma porque ainda hoje estou sempre chegando.
ovelha, e viu-os acasalarem. Num lago de
movimentos brutais ele viu um esturjão fazer caça na Olha profundamente; eu chego a cada segundo
sua noite de fome. Cardumes de peixes mais novos, para ser o botão no ramo da primavera,
sacudindo-se e brilhando, fugiam ansiosamente para para ser o pequeno pássaro, de frágeis asas,
longe dele. Força e desejo estavam ali reflectidos no aprendendo a cantar no seu novo ninho,
turbilhão rápido, e nos remoinhos de água formados para ser a lagarta no coração da flor,
pelo furioso perseguidor. para ser a jóia escondendo-se numa pedra.
Tudo isto tinha sempre ali estado, e ele
nunca o tinha visto — ele nunca tinha estado Eu sempre chego para rir e chorar,
presente. Agora ele estava presente e pertencia a tudo para ter medo e esperança,
isto. Através dos seus olhos ele viu luz e sombras — o ritmo de meu coração é o nascimento e
através da sua mente ele estava consciente da lua e morte de tudo o que está vivo.
das estrelas.”
Eu sou a mosca d’água metamorfoseando-se
 THICH NHAT HANH, Por favor chama-me na superfície do rio,
pelos meus verdadeiros nomes. (Nomeado e sou o pássaro, que, chegada a primavera,
Prémio Nobel da Paz por Luther King. Tradução surge em tempo para engolir a mosca d’água.
do original Inglês por Miguel Gullander)
Eu sou o sapo nadando alegremente na
Na aldeia das Ameixeiras, na França, recebemos água clara do poço,
centenas de cartas por semana, vindas dos campos de e sou também a cobra cascavel que,
refugiados em Singapura, Malásia, Tailândia, aproximando-se em silêncio,
Indonésia e Filipinas. É doloroso ler essas cartas, mas engole o sapo.
temos que fazê-lo, para nos pormos em contacto.
Fazemos o que podemos para ajudar, mas o Eu sou a criança do Uganda, toda pele e osso,
sofrimento é tão grande que às, vezes, ficamos minhas pernas finas como palitos de bambu,
desencorajados. Sabe-se que metade dos boat-people e sou o negociante, vendendo armas mortíferas,
morre no oceano, e só metade chega às margens do instrumentos de morte e fogo para o Uganda.
sudoeste da Ásia.
No meio dos boat-people há muitas meninas que são Eu sou a menina de 12 anos, refugiada
violadas pelos piratas do mar. Mesmo com as Nações no pequeno barco,
Unidas e outros países tentando ajudar o governo da que se atira ao oceano depois
Tailândia para impedir esse tipo de pirataria, os de ser violada pelo pirata do mar,
piratas continuam causando muito sofrimento aos e eu sou o pirata, meu coração ainda incapaz de saber
refugiados. Um dia recebemos uma carta contando- ver e amar.
nos sobre uma menina que havia sido estuprada por
um pirata da Tailândia. Ela tinha apenas 12 anos e Eu sou o membro do politburo com
após ser violada atirou-se ao oceano, afogando-se. muitos poderes nas mãos,
Ao saberes uma coisa destas ficas logo com raiva do e sou o homem que tem de pagar a sua
pirata. Tu, naturalmente, ficas do lado da menina. “dívida de sangue” ao seu povo,
Mas à medida que começas a olhar mais morrendo lentamente num campo de trabalho
profundamente, passas a ver de modo diferente. forçado.
Tomar o partido da menina é fácil. Tu apenas agarras
numa arma e enfias um tiro no pirata. Mas não Minha alegria é como a primavera, que tão calorosa
podemos fazer isso! Na minha meditação vi que se faz
tivesse nascido na aldeia do pirata e fosse criado nas flores desabrocharem em todos os campos da vida.
mesmas condições que ele, eu agora seria um pirata. Minha dor é como um rio de lágrimas, tão cheio que
Haveria uma grande margem de probabilidade de ter- Inunda até à borda os quatro oceanos.
me tornado pirata. Não o posso condenar tão

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Por favor, chama-me pelos meus verdadeiros nomes, Conta-se que no século passado, um turista ocidental
de tal forma que eu possa ouvir todos os meus foi à cidade do Cairo, no Egipto, com o objectivo de
prantos visitar um famoso sábio. O turista ficou surpreso ao
e risos de uma só vez, ver que o sábio morava num quartinho muito simples
de tal forma que eu veja a minha alegria e a minha com alguns livros. Exceptuando os tais livros e uma
dor cama, tudo estava vazio.
como sendo uma só. “Onde estão os seus móveis? Onde estão as suas
coisas?” perguntou o turista.
Por favor, chama-me pelos meus verdadeiros nomes, E o sábio, bem depressa, perguntou também:
de tal forma que eu possa acordar, “E onde estão as suas...?”
e assim a porta do meu coração seja aberta, “As minhas?!” surpreendeu-se o turista. “Mas eu
a porta da compaixão. estou aqui só de passagem!!!!!”
“Eu também...” concluiu o sábio.
 CONTO JAPONÊS
A vida é somente uma passagem...
Perto de Tóquio vivia um grande samurai, já idoso, No entanto, alguns vivem como se fossem ficar aqui
que se dedicava a ensinar o Zen aos jovens. Apesar da eternamente, e esquecem-se de ser felizes.
sua idade, corria a lenda de que ainda era capaz de
derrotar qualquer adversário.  EXPRIME A TUA ALMA!!! (Tradução do
Certa tarde, um guerreiro conhecido pela sua total Inglês por Miguel Gullander)
falta de escrúpulos apareceu por ali. Queria derrotar o
samurai e aumentar sua fama. O velho aceitou o A coisa mais difícil de se fazer no mundo é revelares-
desafio e o jovem começou a insultá-lo. Chutou te, exprimires aquilo que tens para exprimir. Como
algumas pedras na direcção do samurai, cuspiu no artista, eu sinto que nós temos de tentar muitas coisas
seu rosto, insultou-o, ofendeu os seus ancestrais. — mas acima de tudo, nós temos que nos atrever a
Durante horas fez tudo para provocá-lo, mas o velho falhar. Tu tens que ter a coragem de ser mesmo mau,
permaneceu impassível. No final da tarde, sentindo-se de fazer coisas mesmo mal feitas — tens que estar
já exausto e humilhado, o impetuoso guerreiro pronto e desejoso de arriscar tudo para conseguires
retirou-se. Desapontados, os alunos perguntaram ao exprimir tudo.
mestre como ele pudera suportar tanta indignidade. John Cassavetes
“Se alguém chega até vocês com um presente, e
vocês não o aceitam, a quem pertence o presente?” Companheiros... o criador, o artista, procura alguém
“A quem tentou entregá-lo!” respondeu um dos — mas, não cadáveres, nem rebanhos de carneiros,
discípulos. seguidores, devotos, crentes. Companheiros artistas e
“O mesmo vale para a inveja, a raiva e os insultos. criadores, o criador procura aqueles que irão escrever
Quando não são aceites, continuam a pertencer a novos valores, sobre novas tábuas... Destruidores é o
quem os carregava consigo. A tua paz interior nome que lhes darão. Destruidores é o que lhes
depende exclusivamente de ti. As pessoas não te chamarão...
podem tirar a calma. Só se tu permitires...” Fredric Nietzsche

 CONTO INDIANO  RAMTZU

Houve um homem que encontrou um ovo de águia e A maior parte daquilo


colocou-o no ninho duma galinha, lá no galinheiro. A A que vocês chamam de amor
águia foi chocada juntamente com os pintainhos e É apenas negócio.
cresceu vivendo como eles. Toda a sua vida a águia
fez o que os pintos e as galinhas faziam, estando Vocês exigem
completamente convencida de que era uma galinha. A Suficiente retorno
águia arranhava a terra à procura de minhocas e Em relação ao vosso investimento
insectos. Cacarejava e dava gritos de galinha. Ou então irão para outro lado.
Abanava as asas com toda força e, às vezes, dava uns
saltos e voava alguns metros. Ninguém gosta de
Os anos passaram e a águia ficou velha. Um dia ela Sofrer uma perda.
viu um magnifico pássaro, lá bem no alto, a voar no
céu sem nuvens. Este pássaro deslizava com Porque, afinal,
graciosidade e poder entre as fortes correntes de ar e Se vocês não tomarem conta
ventos, quase sem bater as suas enormes asas Do vosso currículo amoroso
douradas. Cá em baixo a velha águia olhava para o Quem tomará?
céu completamente fascinada e maravilhada. Sentia
também um enorme respeito. “O que é aquilo?”, Não é uma daquelas coisas
perguntou ela. “Aquilo é uma águia, o rei de todos os Que vocês gostariam
pássaros.”, respondeu uma galinha que estava ali ao De deixar ao acaso.
lado. “As águias pertencem ao céu. Nós pertencemos
ao chão. Nós somos galinhas.” O problema é
E assim a águia viveu e morreu como uma galinha, Que vocês estão sempre com medo
pois isso era o que ela pensava e estava convencida Vocês estão sempre à defesa.
ser.”
Ram Tzu sabe isto...
 CONTO EGIPCIO
É uma proposição perdedora

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Tentares manter eu lhe chamei o Filtro Triplo.” E continuou: “O
Aquilo que não tens. primeiro filtro é VERDADE. Tens a certeza absoluta
de que aquilo que me vais dizer é perfeitamente
 DA WEASEL: No princípio era o verbo verdadeiro?”
“Não” disse o homem. “O que acontece é que eu ouvi
No princípio era o verbo — a palavra e depois a dizer que...”
rima “Então” diz Sócrates. “Não sabes se é verdade.
que provocou reacções como se fosse um enzima Passemos ao segundo filtro, que é BONDADE. O que
No princípio era a tesão, a fúria e a sofreguidão, me vais dizer sobre o meu amigo é bom?”
depois veio a calma, a procura do saber e a satisfação “Não, muito pelo contrário...”
— “Então” continuou Sócrates. “Queres dizer-me algo
inspiração para uma vida melhor, um caminho melhor mau sobre ele e ainda por cima nem sabes se é ou não
um mundo melhor para uma pessoa melhor verdadeiro. Mas, bem, pode ser que ainda passes o
Bem vindo ao manual de iniciação a Uma Vida Banal terceiro filtro. O último filtro é UTILIDADE. O que
ou o Diário de Bordo de uma nave especial me vais dizer sobre o meu amigo será útil para mim?”
Puto Pac ‘tá confiante, entra de rompante “Não, acho que não...”
Virgul sempre constante — brilha como um diamante “Bem.” concluiu Sócrates. “Se o que me dirás não é
Vai começar: Desaperta o cinto e acende um cigarro nem bom, nem útil e muito menos sabes se é
Relaxa a tua mente como se fosse barro verdadeiro, para quê dizeres-mo?”
Refrão:
Palavra de honra honrarei a Palavra todo o santo dia III TEORIA
No Princípio era a Verbo a palavra e depois
Anos em preparativos, tratamentos narrativos,  SISTEMATIZAÇÃO TEÓRICA POR
tantos curativos — dou graças a Deus por estarmos TÓPICOS.
vivos O PODER DA PALAVRA.
Em evolução permanente, seja ponto bem assente: CONCEITOS-FERRAMENTA:
quando o meu coração sente a minha boca não mente INTELIGÊNCIA, DESCONSTRUÇÃO.
Escrevo desde o meu inicio, nasci com esse vício
não importa tempo e espaço o ambiente é propicio 1 A linguagem como estrutura. A inteligência como
Faço a apologia da lírica terapia a capacidade de dominar e ir para lá dessa mesma
Palavra de Honra — honrarei a Palavra todo o santo estrutura.
dia
A minha semente eu formato em fita, plástico ou • O conceito de inteligência. Do Latim inter + legere
compacto, — “ler entre....” e/ou “eleger entre...”.
traço rota de colisão, vem aí mais um impacto • Ler entre: Ler nas entrelinhas. Exemplo: “A sorte
Vai começar : Desaperta o cinto e acende um cigarro nunca dá, só empresta”; “A palavra é como a pedra,
Relaxa a tua mente como se fosse barro uma vez atirada já ninguém a apanha”.
Refrão O provérbio é um bom exemplo duma forma de
Presunção e água benta cada um toma a que quiser expressão (oral e/ou escrita) em que o importante está
o Puto pode não saber tudo mas ao menos sabe aquilo nas entrelinhas, está para lá das próprias palavras.
que quer Está implícita uma mensagem, uma dimensão que
Nada de muito especial, tão simples que devia ser ultrapassa o significado literal das palavras.
banal • De igual modo, a linguagem, tal como se pode ver
paz de espírito, algum dinheiro, elevação espiritual num provérbio, poesia, ou letras de música, etc., tem
O manual não tem soluções — apenas algumas outras implicações que são descobertas, dadas por
sugestões, cada um dos leitores/ouvintes, “a obra propõe e o
Outras tantas questões, envoltas em várias canções leitor dispõe”, como aponta Barthes. Ou seja, cada
À procura do caminho certo, nunca estivemos tão um pode dar exemplos diferentes da sua própria vida
perto e experiência subjectiva, onde um provérbio, frase
o primeiro acto está no final — o livro fica aberto poética ou letra de música, etc., encaixe. Isso é entre-
A lição foi bem estudada, a rota foi traçada eleger significados. De entre as múltiplas
tripulação motivada — a Doninha ‘tá preparada possibilidades e experiências subjectivas elege-se,
Vai começar : Desaperta o cinto acende um cigarro escolhe-se, aquela que está implicada, que tem
Relaxa a tua mente como se fosse barro ligação com o que se leu ou ouviu. Assim o que se leu
ou ouviu é assimilado, torna-se parte integrante de
 SÓCRATES nós mesmos, pois, nós mesmos, contribuímos para a
sua construção e criação.
Na Grécia Antiga, Sócrates detinha uma alta • A riqueza da linguagem encontra-se a partir do
reputação e era muito estimado pelo seu elevado momento que se desenvolve a capacidade de ler nas
conhecimento. Um dia, um conhecido do grande entrelinhas. De ler para lá das próprias palavras. A)
filósofo aproximou-se dele e disse: Descobrir o implícito. B) Descobrir as implicações,
“Sócrates, sabes o que eu acabei de ouvir acerca de conexões e ligações com a experiência subjectiva, a
um amigo teu?” vida, de cada pessoa. Isso permite desenvolver-se a
“Espera um minuto” respondeu Sócrates. “Antes que capacidade de dar exemplos: “O sábio é aquele que
me digas alguma coisa, gostaria de te fazer um teste. sabe dar exemplos”.
Chama-se o “Teste do Filtro Triplo”. • Para se ir para lá do discurso (texto, oralidade, etc.),
“Filtro Triplo?” para se ler nas entrelinhas é preciso dominar
“Sim” continuou Sócrates. “Antes que me fales do totalmente os conteúdos dum discurso — é preciso
meu amigo talvez fosse uma boa ideia parar um compreender a estrutura fundamental, o "tutano"
momento e filtrar aquilo que vais dizer. Por isso é que desse mesmo discurso. Para isso é preciso "filtrar",

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fazer um raio-x ao discurso. É preciso encontrar a Mandamentos (Cultura judaico - cristã), Livro dos
informação e estrutura lógica que estão na base e Mortos (Egipto), Bardo Todol (Tibete) etc.
suportam todo o edifício discursivo — é necessário
entre-eleger o principal. Desconstruir significa, • Mas, por outro lado a linguagem infelizmente
portanto a) eleger de entre o múltiplo, filtrar, também serviu como forma de poder e hegemonia
seleccionar o essencial de entre toda a massa de — criação de castas. Tal como o antropólogo Claude
informação e encadeados lógicos (sejam eles Lévi-Strauss apontou, a invenção da escrita chegou a
verdadeiros ou falaciosos), de modo a formar uma ter como função “facilitar a escravatura de outros
imagem clara, um corpo consistente e coerente seres humanos”. Os cultos (cultivados) e os incultos.
daquilo que está a ser exposto; e b) ler nas entrelinhas Diferença entre os que sabem ler e dominar o código
- para descobrir a mensagem implícita, a dimensão e o resto da massa. Os que têm o poder da palavra
que está para lá das próprias palavras. têm o poder de criar Lei (poder político), têm o poder
de ler e interpretar os escritos sagrados (poder moral).
2
A linguagem como expressão do pensamento. •A linguagem é vista como um poder misterioso,
O pensamento é linguagem, a linguagem é mágico, sagrado. (Exemplo: os rituais mágicos, as
pensamento. palavras ditas em línguas estranhas, a missa em
A linguagem como criadora e destruidora de mundos. Latim, etc.) Dominar a linguagem é, claramente,
A linguagem como estrutura que aponta, aconselha dominar um enorme poder:
caminhos e direcções.
• “Nós somos aquilo que pensamos. Tudo aquilo que
3 pensamos surge por meio dos nossos pensamentos.
“No início era o Verbo, e o Verbo estava voltado para Com os nossos pensamentos nós fazemos o mundo.
Deus. Tudo foi feito por meio dele; e sem ele nada se Fala ou actua com uma mente impura e a desgraça
fez do que foi feito.” (João: 1: 1-3). O Verbo = o seguir-te-á tal como a roda segue o boi que puxa o
Logos = a Palavra. carro. Nós somos aquilo que pensamos. Tudo aquilo
• A importância da linguagem: segundo o relato que pensamos surge por meio dos nossos
bíblico o início deu-se por meio da Palavra, da pensamentos. Com os nossos pensamentos nós
linguagem, do Verbo... O início da história humana, fazemos o mundo. Fala ou actua com uma mente pura
do conhecimento (logos) humano está intimamente e a felicidade seguir-te-á como a tua sombra —
ligado à utilização da linguagem. inabalável.” Buda, Dhammapada. Isto leva a
compreender que: a pessoa é aquilo que pensa, a
“Deus modelou do solo todo animal dos campos e pessoa é os seus pensamentos.
todo pássaro do céu, que levou ao homem para ver
como ele os designaria. (...) O homem designou pelo • E o que é o pensamento? Linguagem associada a
seu nome todo gado, todo pássaro do céu e todo imagens e sensações. (Exercício: observar o
animal dos campos (...)” (Génesis: 2: 19-20) funcionamento da mente, por exemplo, durante
momentos de silêncio e solidão. Concentrar na
• No princípio era o Verbo — e simultaneamente expiração ajuda). O pensamento é linguagem, e a
surge a capacidade do ser humano de designar, linguagem é pensamento. A mente exprime-se e tem
nomear, dar forma, às coisas que via reflectidas por forma por meio da linguagem. Uma linguagem mal
meio dos seus sentidos na sua mente. Isso, utilizada é como uma mente mal estruturada — que
supostamente, distinguiu o ser humano dos outros não se consegue exprimir. Quando algo está mal
seres no jardim primordial. A linguagem era o expresso quer dizer que, também, foi mal pensado.
grande poder dado por Deus ao ser humano. Por Como Ben Johnson (poeta Inglês) defendia: “Mal
serem designadas, por serem nomeadas as coisas escrito/dito, mal pensado”.
ganham existência... (Exemplos: baptismo, rituais
iniciáticos, desenvolvimento da ciência em geral com • Por outro lado, uma linguagem bem utilizada é um
a nomeação em categorias todo o universo gigantesco poder — pode fazer milagres, criar
conhecido...) mundos... ou destruir mundos. Quando uma pessoa
consegue dominar a linguagem, domina o maior
• Em termos de realidade histórica com o poder que existe na sociedade — quem consegue
desenvolvimento da linguagem (especialmente a exprimir o que sente é como uma bomba que atinge
nível escrito) surgiu a civilização, a cultura. Cultura todos os que o rodeiam.... “I have a dream” são
associada também ao cultivar da terra, ao cultivar palavras de um discurso que mudou o mundo para
agrícola. Pois, foi por meio da linguagem escrita que sempre. Exemplos de pessoas que mudaram o mundo,
se puderam estabelecer as regras e técnicas de cultivo que criaram um novo mundo, por meio duma
das culturas sedentárias, urbanas (completamente poderosa utilização da linguagem: Gandhi, Mandela,
diferente do estilo de vida dos caçadores- Gautama, irmãs Brönte, Dalai-Lama, Luther King,
recolectores). O Código de Amurabi Sumério é o Bob Marley, Simone Weil, Lao-Tzu, Rumi, David
primeiro grande exemplo desta relação directa entre Bohm, etc.
regras de cultura agrícola + regras de vida urbana =
ao início da civilização e da História (registo escrito • O poder da linguagem pode levar mundos ao fim, ao
dos acontecimentos). apocalipse. O poder destrutivo da linguagem escreve
a fórmula da bomba atómica, escreve as palavras do
• A linguagem como forma de criação de Leis “Mein Kampf”, obra que participou do pesadelo
Orientadoras da existência em geral. Exemplo: I Nazi, ou as frases do “Livrinho Vermelho” durante a
Ching para ajudar a encontrar o TAO (China), Vedas Revolução Cultural. Mao, Hitler, Stalin, a propaganda
(Índia), Popol Vuh (índios da América do sul), 10 em geral, a publicidade, as seitas suicidas, são alguns

17
dos poucos exemplos de como a linguagem pode texto como prancha de salto, como estrutura de apoio
levar à grande destruição. para a aventura de interpretação e argumentação
próprias. Não existe, portanto, uma “resposta certa”
• Dominar a linguagem é também, portanto, a única para ser dada a um trecho do texto, e que sirva como
defesa para não se ser enganado. É ter a capacidade comentário. Um comentário não é “responder certo”,
de ler nas entrelinhas, de desconstruir as falácias e mas argumentar e problematizar um texto. Um bom
mentiras da propaganda. Dominar a linguagem é ser o comentário pode mesmo, até, ser constituído por uma
“Boss”, o patrão do seu próprio pensamento. Se nós série de questões, pertinentes, que tenham surgido e
nos expressamos exteriormente por meio daquilo que que sejam relevadas a partir do texto base.
pensamos, então, tendo controle sobre o nosso
pensamento temos controle sobre nós mesmos — No entanto, certas tendências devem ser evitadas:
somos nós o Boss de nós mesmos, e do nosso 1. Um comentário não deve ser um resumo dum
pensamento. E não os outros. Se nós actuamos como texto. O sumário e descrição não são um comentário.
consequência daquilo que pensamos, e o pensamento A paráfrase muito menos. É portanto necessário ter o
é linguagem, tendo um pensamento, uma linguagem cuidado de não avançar linha-a-linha no “ataque” ao
bem definida, bem estruturada — temos, portanto, texto. Em vez de avançar na escrita do comentário
uma personalidade e actuação forte e estruturada. acompanhando o próprio texto, do princípio para o
fim, deve-se, antes, identificar a mensagem implícita,
5 os temas chave e de importância e, então, argumentar
relativamente a cada um deles, à vez, recorrendo à
No entanto, deve ficar a seguinte ressalva própria memória, inspiração e exemplos que
relativamente a toda esta teoria da linguagem: a iluminem a argumentação pessoal. Fazer um
nossa Consciência é mais do que o pensamento. rascunho, com cerca de 3 a 7 tópicos, ajuda a não
Como um peixe fora de água, o nosso pensamento perder o norte (assim não se esquece dos pontos pelos
saltita de memórias (sensações, imagens e conversas) quais se tem de passar, e evita-se a dispersão com
passadas para uma projecção da sua própria ideias secundárias que poderão ocupar demasiado
telenovela futura, raramente atingindo instantes de espaço-tempo).
silêncio, ou aquilo que na filosofia ocidental se 2. Um comentário não se deve prender ao contexto do
chama de pax profunda (ou estado de samadhi, de texto, mas sim, visar as ligações implícitas a algo de
concentração e absorção, na filosofia oriental). maior dimensão. Aqui a inteligência intervém, na sua
Poucas vezes nos encontramos nessa Paz Profunda e capacidade de ler-nas-entrelinhas, e de entre-eleger
oceânica — a Presença Autentica que está sempre significados. Ou seja, deve-se tomar em consideração
como silenciosa testemunha por detrás do nosso a concepção de Biederman de compreensão e
corpo físico, das nossas emoções voláteis, e do nosso inteligência como “a capacidade de ver o diferente
pensamento tagarela. Pensamento tagarela, que é no semelhante, e o semelhante no diferente”.
como um filtro de ruído sobreposto a essa Portanto, quando se compara-e-contrasta ideias deve-
Consciência — tal como imagens que, passando se fazê-lo com relevância entre si, e não apenas por
sobre um espelho, nos fazem esquecer o que está terem um contexto comum. Logo, também se deve,
por detrás delas. em geral, evitar aventurar-se noutras partes do
trabalho de onde o excerto foi retirado — a menos
(Elaborado por Miguel Gullander segundo uma que sejam relevantes em termos de apontarem a
concepção teórica fundamentalmente à mesma dimensão maior. Também se deve evitar
responsabilidade do mesmo.) incursões num campo desconhecido da obra de um
autor. Portanto, isto quer dizer que é perfeitamente
 PARA A ESCRITA DUM COMENTÁRIO possível escrever comentários de sucesso acerca de
textos ou excertos com os quais não estás
A estrutura mais útil para alunos juvenis é a estrutura familiarizado, pois um comentário tem como por
típica da retórica clássica. Essa estrutura é criada por objectivo ser um mergulho e reflexão sobre O DADO
meio de três parágrafos correspondendo cada um aos TEXTO. Quaisquer comentários que se relacionem
seguintes momentos: com um contexto periférico do tema devem
a) Argumento. Neste primeiro parágrafo o autor do permanecer secundários — não se deve perder o
texto apresenta a proposição que sintetiza tudo o que norte. Estes comentários devem emergir duma leitura
irá escrever. É o ponto de partida de todo o seu nas entrelinhas do texto, ou então, iluminar esse
raciocínio e opinião. mesmo texto de algum modo.
b) Demonstração. Neste segundo parágrafo o autor do 3. Não é necessário citar a partir do texto, a menos
texto desenvolve de forma articulada, sequenciada e que seja fundamental.
lógica aquilo que avançou como proposição no seu Os seguintes pontos devem ser tomados em
primeiro parágrafo. Demonstra, portanto, o que em consideração:
síntese apontou no primeiro parágrafo. 1. Um comentário beneficia de uma observação
c) Defesa e confirmação. Neste último parágrafo o cuidada da linguagem (tanto a do texto, como a
autor do texto defende e remata a sua ideia própria durante a produção do comentário) — sendo,
confirmando, por meio da utilização da portanto, necessário domínio da metalinguagem.
exemplificação. Para isso utiliza como exemplo Dependendo do texto esta observação poderá incluir
referências de autoridade, ou a sua própria (não sendo exclusivamente limitada a estes
experiência pessoal. elementos): uso de rima e aliteração escolhas lexicais
Mas não há uma fórmula fixa de como se fazer um que demonstram que certas palavras têm
comentário. Os elementos que constituem um proeminência, ou são portadoras de uma carga
comentário de sucesso podem variar, dependendo da especial sintaxe, especialmente quando esta foi
natureza dos textos e da aproximação pessoal que se manipulada para relevar significado, criar
lhes fizer. O comentário é um voo pessoal, usando o ambiguidade, ou para interagir com a forma poética

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do verso estruturas gramaticais, tais como sequências pergunta que surge é a de saber como abordá-lo. A
de tempos verbais, que possam ser utilizados para técnica de angulação dá-nos a resposta.
criar uma estrutura temporal específica. No entanto, Esta técnica baseia-se no facto de que um Tema pode
deve ser relembrado que não vale a pena estar a ser visto sob vários ângulos, isto é, de diversos pontos
descrever tais características de um texto se não se de vista. Por exemplo, se o tema for “A Morte da
consegue explicar o COMO e o PORQUÊ delas Princesa Diana”, poderíamos distinguir o ponto de
serem importantes e terem significado. Não se irá vista médico (a reanimação utilizou ou não processos
acrescentar compreensão ao texto se meramente se adequados?), o ponto de vista criminal (quem é
identificam os tempos verbais, as aliterações, responsável pelo acidente?) ou o ponto de vista
metáforas, ironias, etc., ou se contam o número de mediático (como explicar a emoção espontânea da
sílabas em cada linha de um verso — e depois isso opinião pública à escala mundial?).
ficar por aí. Acaba por se revelar um conhecimento Entendemos por ANGULAÇÃO o ponto de vista
inútil da metalinguagem — pois a gramática deve ser ESPECÍFICO sobre o tema. Especificar um tema
trabalhada de modo implícito, ou seja, como espelho geral significa: FOCAR UM ASPECTO MAIS
daquilo que texto tem por intenção, ou não, RESTRITO DO TEMA.
transmitir. E deve ser sublinhado que a linguagem No exemplo de Diana citamos apenas o aspecto
não é menos importante num texto de prosa, ou em médico, jurídico e mediático. Na realidade cada
excertos discursivos. Como é óbvio, a atenção a dar- pessoa tem o seu próprio ponto de vista. Mas quando
se à linguagem não é campo exclusivo da escrevemos para uma audiência dada, é imperativo
interpretação poética. determinar a angulação que melhor corresponde às
2. É importante, também, prestar atenção aos modos características e aos interesses dessa mesma
de representação e atacar não só a questão DO QUÊ, audiência. O presente exercício visa a aprendizagem
mas também do COMO é dito. Questões tais como a da técnica de angulação para um determinado tema e
voz, perspectiva, e ponto de vista, podem ser tomadas audiência:
em consideração — tal como, por exemplo, as
relações entre a voz do texto e a do leitor-receptor. 1º IDENTIFICAR ÂNGULOS RELACIONADOS
Igualmente, um bom comentário deverá considerar COM UM TEMA DADO:
todas as implicações que estão implicitamente (ou
explicitamente) a ser feitas pelo texto — ou que são Marque com um “X” os ângulos directamente
atribuídas ao próprio leitor — e de que modo certas relacionados com os temas a), b) e c) seguintes:
configurações imagéticas e desenvolvimentos
temáticos são apontados e manipulados. a) Tema: POLUIÇÃO
3. Não é necessário atribuir ao texto um significado
definitivo ou fixo. Pelo contrário: frequentemente o Ângulo 1. A necessidade de zonas verdes nas
melhor é problematizar o texto, por meio de uma cidades 
sólida argumentação e inquirição. Na verdade, em Ângulo 2. A poluição sonora nas ruas
muitas circunstâncias, isso é essencial. 
Frequentemente, por meio da desconstrução, os bons Ângulo 3. A instalação de parquímetros na
comentários apontam ambiguidades ou cidade 
inconsistências e sugerem outras leituras possíveis.
Os comentários não devem ser exaustivos, mas b) Tema: NAZISMO
podem dar ênfase a temas-chave em particular, ou Ângulo 1. O silêncio como arma de
facetas específicas dum texto. Idealmente num comunicação 
comentário, os diferentes pontos relevados por um Ângulo 2. A ideologia da morte
texto ou excerto, devem ser sintetizados num só 
argumento — portanto evitando que se façam Ângulo 3. A queda do muro de Berlim
inventários de observações relativas a pontos 
secundários e pouco pertinentes.
(Concepção teórica fundamentalmente à c) Tema: MÚSICA
responsabilidade de Miguel Gullander, baseando-se Ângulo 1. Emancipação feminina 
em directrizes apontadas no site: Ângulo 2. Beatles – o mito musical do século
http://www.mml.cam.ac.uk/french/courses/ugrad/com 
mentary.html) Ângulo 3. Trânsito – o maior barulho da história

 TÉCNICAS REDACCIONAIS
A Angulação do Tema 2º DETERMINAR ÂNGULOS RELACIONADOS
Para interessar o Leitor COM OS TEMAS DADOS

Objectivos: Nas linhas em branco escreva, para cada tema,


um outro exemplo de ângulo relacionado:
Determinar a angulação do tema em função da
audiência a) Tema: LIBERDADE
Ângulo 1. Liberdade como responsabilidade
Adequar a angulação ao objectivo do texto social
Ângulo2.
Determinar a Angulação do Tema _______________________________________
______________
O Tema sobre o qual vamos escrever pode ser b) Tema: PROGRESSO
imposto de fora ou escolhido por nós próprios. Em Ângulo 1. Progresso: avanço ou recuo?
qualquer dos casos, uma vez fixado o Tema, a

19
Ângulo2.
_______________________________________ Audiência: Leitores de uma revista de fim-de-
_______________ semana.
Ângulo:________________________________
c) Tema: RELIGIÃO ____
Ângulo 1. Religião: ópio do povo?
Ângulo2. b) Tema: ORIENTAÇÃO PROFISSIONAL
_______________________________________
_______________ Audiência: Leitores da revista “Pais e Filhos”.
Ângulo:________________________________
3º IDENTIFICAR ÂNGULO MAIS ADEQUADO _____
À AUDIÊNCIA:
c) Tema: TOXICODEPENDÊNCIA
Marque no quadrado de cada “audiência” o
número que corresponde ao ângulo mais Audiência: Adolescentes
adequado a ela: Ângulo:________________________________
_____
a) Tema: LITERATURA
5º IDENTIFICAR ÂNGULOS ORIGINAIS
Audiência:
Adolescentes  Além de se adequarem à audiência, os
Editores e Livreiros  ângulos de um tema devem ser originais, isto é,
Alunos de letras  surpreendentes, quer no conteúdo, quer na
forma, para estimular o interesse do leitor.
Ângulo 1. Quem decide o que é bom na
literatura: a obra em si, os leitores ou o crítico Por exemplo:
literário?
Ângulo 2. Crise de papel – consequências para o Tema: CRIMINALIDADE
preço do livro. Audiência: Leitores do “Folha 8”
Ângulo 3. O efeito da poesia sobre a Ângulo 1. Os vários tipos de crime
sensibilidade dos jovens. Ângulo 2. Do pilha galinhas ao gangster de alta
Ângulo 4. Literatura: passatempo aos sessenta? roda: uma questão de grau

b) Tema: CRIATIVIDADE O ângulo 2 tem uma forma mais criativa. É


mais original.
Audiência:
Psicólogos  a) Assinale com um “X” o ângulo mais
Leitores de uma revista de moda  original no tema seguinte:
Assistentes Sociais 
Tema: COMPUTADOR
Ângulo 1. Moda: Criatividade ou
Extravagância? Audiência: jornal do tipo “Jornal de Angola”
Ângulo 2. A criatividade do “malandro de rua”.
Ângulo 3. Escrever com criatividade: dom inato Ângulo 1.
ou habilidade aprendida? Computador: QI = 0 
Ângulo 4. Os prejuízos na criação de material
pedagógico para ensino de arte. Ângulo 2. O computador e a inteligência
humana 
c) Tema: MEDICINA
b) Dê exemplo de um ângulo original para o
Audiência: tema seguinte:
Estudantes de Medicina 
Psicólogos  Tema: MULHER
Médicos Pediatras  Audiência: suplemento feminino de domingo
Ângulo original: Mulher? Apenas uma “dona de
Ângulo 1. A disputa entre psicólogos e casa”.
psiquiatras. Outro ângulo
Ângulo 2. A prevenção de doenças infantis original:____________________________________
através do aleitamento materno. ______
Ângulo 3. O actual mercado de trabalho para
médicos em Portugal. c) Escreva um ângulo original para o tema
Ângulo 4. Cirurgia plástica depois dos 70 anos seguinte:
de idade.
Tema: BRUXARIA
Audiência: “Folha 8”
4º DETERMINAR PARA OS TEMAS a), b) e c), Ângulo original:
SEGUINTES, A ANGULAÇÃO ADEQUADA AO _______________________________________
TIPO DE AUDIÊNCIA INDICADO: _______

a) Tema: AMIZADE

20
5º SEQUÊNCIA DOS PASSOS A DAR PARA
DETERMINAR A MELHOR ANGULAÇÃO DE d) Qual desses ângulos é o mais original
UM TEMA DADO PARA UMA DETERMINADA quanto ao conteúdo e/ou quanto à
AUDIÊNCIA forma?

Tema: JORNALISMO
Conclusão:
Audiência: Leitores do “Jornal da UAN”
Na minha opinião, a melhor angulação do tema
Para achar a melhor angulação deste tema “JORNALISMO”, para interessar os leitores do
levando em conta essa audiência responda às “Jornal da EFP” seria:
seguintes perguntas:
Ângulo:
a) Quais são as características da ___________________________________________
audiência? ____________________
Quem são?
Adequar a angulação ao objectivo do texto (ou o
_______________________________________ inverso)
_______________________
Nos exercícios anteriores aprendemos a determinar a
Quais as preocupações que têm quanto ao angulação de um tema em função de uma audiência
emprego? dada. O ângulo escolhido e o público visado são duas
balizas necessárias mas insuficientes: dão-nos a saber
_______________________________________ para quem escrevemos e sobre o que escrevemos,
_________________________ mas não dizem porquê, nem para quê.
Ora quando escrevemos para irmos de encontro ao
Como vêem a profissão de jornalista? leitor, temos que saber para que serve o nosso texto e
o que é que o leitor poderá fazer com ele. Daí a
_______________________________________ necessidade de definir: Onde queremos chegar? Qual
_________________________ o objectivo a alcançar? Qual o efeito que queremos
obter?
O que pensam sobre o curso de licenciatura As respostas a estas perguntas permitem precisar e
em Comunicação Social? formular numa frase, a ideia central (a mensagem
essencial, a tese) que queremos levar ao
_______________________________________ conhecimento do leitor.
_________________________ Basta para isso saber definir o OBJECTIVO do nosso
texto em função do ÂNGULO escolhido e da
b) De quantos pontos de vista o tema audiência visada, e depois, com a ajuda desse
“JORNALISMO” poderia ser olhado objectivo, formular a nossa ideia numa SENTENÇA
por essa audiência? – TESE apelativa, que interesse o leitor.
Este exercício vai ajudar-nos a definir o objectivo e a
Do ponto de vista formular a sentença-tese que explicita esse mesmo
_______________________________________ objectivo, isto é, o efeito que é susceptível de
produzir.
Outro ponto de
vista___________________________________ 1. Identificar os objectivos decorrentes do ângulo e
__ adequados à audiência

Mais um ponto de Marque com um “X” qual dos três objectivos


vista___________________________________ indicados está mais próximo do ângulo do tema
_ dado sendo ao mesmo tempo, o mais relevante
para a audiência visada:
(Não pense em si. Pense na audiência. Por
empatia, isto é, no lugar dos leitores do “Jornal da 1º Tema: ALIMENTAÇÃO
UAN”). Audiência: Mulheres operárias de uma fábrica
Ângulo: É possível comer melhor
c) Qual é o ângulo mais adequado à Objectivo 1. Comentar os últimos livros de
audiência? receitas 
Objectivo 2. Demonstrar que alguns produtos
_______________________________________ podem ser substituídos com economia e sem
__________________________ perda de qualidade nutritiva 
Qual é aquele que mais chamaria a atenção? Objectivo 3. Explicar a necessidade de proteínas
e calorias em dosagem adequadas para o
_______________________________________ organismo 
__________________________
Qual é aquele que mais corresponde aos seus 2º Tema: DEFICIÊNCIA MENTAL
anseios (seus, da audiência)?
Audiência: Pais de pessoas com deficiência
_______________________________________ mental
___________________________ Ângulo: O deficiente e a sua família

21
Objectivo 1. Formule uma Sentença-Tese tomando em
Comentar as relações dos atrasados mentais com consideração o objectivo, o interesse da audiência
outras pessoas  e situando-se no ângulo definido:
Objectivo 2. Comentar as formas de acção dos
pais para enfrentar os problemas diários Tema: UNIVERSIDADE
colocados pelos filhos com deficiência mental
 Audiência: Empresários
Objectivo 3. Analisar as etapas de Ângulo: Divórcio entre ensino superior e mundo
desenvolvimento de uma criança normal  laboral
Objectivo: promover cooperação entre patronato e
2.Determinar objectivos relevantes para a Universidade
audiência e decorrentes da angulação Sentença-Tese:
___________________________________________
O objectivo deve explicitar o que o emissor _____________
pretende com a mensagem: informar, mostrar,
demonstrar, comentar, analisar, convencer, 4. Estabelecer o objectivo e Sentença-Tese:
incitar, sugerir, explicar, ironizar, documentar,
comover, etc. Escreva para cada ângulo dado o objectivo que seria
relevante para a audiência em causa. Depois redija a
Estabeleça um objectivo para os temas Sentença-Tese capaz de explicitar o objectivo, isto é,
seguintes dentro do ângulo indicado e para a a mensagem essencial que quer dar a conhecer ao
audiência visada, utilizando um dos verbos leitor.
operativos no infinitivo.
1º Tema: FLORES
1º Tema: VELHICE
Audiência: Um clube de senhoras de idade
Audiência: Grupo em preparação para a reforma Ângulo: Aprendendo a cuidar de flores, elas ensinar-
Ângulo: O perigo da ociosidade na 3ª idade nos-ão a sorrir…
Objectivo: Objectivo:__________________________________
_______________________________________ ________________________
___________________ Sentença-
Tese:_______________________________________
2º Tema: TELEVISÃO _______________

Audiência: Mães e Educadores de Infância 2º Tema: EMIGRAÇÃO


Ângulo: A TV é uma concorrente às brincadeiras
infantis Audiência: Emigrantes Angolanos em Portugal
Objectivo: Ângulo: A construção da identidade no país de
_______________________________________ imigração
__________________ Objectivo:
___________________________________________
3º Tema: PUBLICIDADE __________________
Sentença-
Audiência: Alunos de comunicação social Tese:_______________________________________
Ângulo: Publicidade: manipulação ou __________________
aproveitamento das motivações
Objectivo: Verificação:
_______________________________________
___________ O objectivo que fixou é o melhor para a sua
audiência?
3.Formular Sentença-Tese a partir do objectivo O objectivo está relacionado com o ângulo?
O objectivo explicita o efeito que pretende obter com
A Sentença-Tese deve explicitar o que o Emissor a sua mensagem?
espera que o Receptor venha a fazer com a A sua Sentença-Tese explicita o objectivo de forma
mensagem. adequada para a audiência? A reacção do leitor irá ser
aquela que você pretende?
Exemplo:
5. Identificar Sentenças-Tese originais
Tema: VELHICE
Da mesma forma que o ângulo do tema deve ser
Audiência: Grupo em preparação para a reforma original, também a Sentença-Tese suscitará mais
Ângulo: O perigo da ociosidade na 3ª idade interesse ao leitor se for redigida de uma maneira
Objectivo: incitar a ocupar os tempos livres expressiva e surpreendente que incite o leitor a ler o
texto.
Sentença-Tese: Parar é morrer: a ociosidade diminui
as capacidades dos idosos mas pode ser evitada Exemplo:
mediante actividades lúdicas, físicas e intelectuais ao
mesmo tempo úteis e agradáveis que atrasam o Tema: DIPLOMACIA
envelhecimento. Audiência: Leitores do “Reader’s Digest”
Ângulo: O pragmatismo sorridente dos diplomatas

22
Objectivo: Ironizar sobre a arte de seduzir na lhe parece trazer mais proveito para a
diplomacia audiência)
Sentença-Tese: 1. A largura do sorriso de um
diplomata tem a medida certa para o que deseja O objectivo escolhido é
conseguir. _______________________________________
2. O diplomata tem que ser um homem _______________________________________
prático e sorrir sempre. _______________________________________
_______________
Neste exemplo a primeira Sentença-Tese tem uma
formulação expressiva (usa expressões fora do c) Que Sentença-Tese poderia traduzir o
contexto usual) que a torna original. A Sentença-Tese objectivo escolhido? (Escreva uma frase
2 é correcta mas de estilo normativo e banal. afirmativa ou interrogativa que exprima
onde você quer chegar)
Tente redigir Sentenças-Tese originais para cada _______________________________________
um dos objectivos dados nos temas seguintes: _______________________________________
_______________________________________
1º Tema: COMPUTADOR _________________

Audiência: Leitores de um suplemento informático d) A Sentença -Tese é original? (Tem algo de


Ângulo: Computador: QI = 0 diferente? Novo? Surpreendente? Insólito? Tem
Objectivo: salientar a incapacidade do computador algo que possa aumentar o interesse da sua
sem o homem audiência?). Caso considere agora necessário
Sentença-Tese: 1. O computador só funciona graças reformule a seguir a frase que redigiu em c)
ao cérebro do homem.
Sentença-Tese: 2. _______________________________________
___________________________________________ __________________________
_______
_______________________________________
2º Tema: COMUNICAÇÃO __________________________

Audiência: Leitores do “Cruzeiro do Sul”


Ângulo: Media a mais comunicação a menos IV EXECUÇÃO E PRÁTICA
Objectivo: demonstrar o paradoxo da falta de
comunicação entre as pessoas na era da  AS 8 REGRAS DE OURO!!!
superabundância dos media. 1. Apresentação. (Os trabalhos cuja
Sentença-Tese: 1. Desde que os media invadiram a apresentação, tipo e tamanho de letra não
nossa vida, perdemos o gosto pelas conversas em estiverem de acordo com a proposta
família e das visitas a casa de amigos. sofrerão desconto).
Sentença-Tese 2. Calendarização. (Não serão recebidos
2:_________________________________________ trabalhos além da data limite, ou
_______________ seja__________________).
3. Utilização de dicionário. (É fundamental
3º Tema: JORNALISMO que não sejam feitos erros ortográficos em
trabalhos elaborados a computador.
Audiência: Leitores do Jornal da EFP Utilizar tecla F7 e corrector automático de
Ângulo: Ingresso livre na profissão erros.)
4. Utilização de vocabulário seguro e
Responda às seguintes questões: adequado. (Evitar frases bombásticas e
vocabulário gongórico quando as
a) Que objectivos poderia ter um texto com o propostas pedem simplicidade e clareza.)
ângulo visando aquela audiência? 5. Articulação sequencial, lógica e passo-a-
passo das ideias. (Procurar ser claro e
O texto poderia servir bem estruturado, tanto nas ideias, como na
para___________________________________ sintaxe. Fazer frases curtas! Evitar divagar
_____ ou escrever muito sem dizer nada de
conclusivo. Ser assertivo, ir directamente
Ou ao assunto.)
para___________________________________ 6. Utilizar a pontuação, evitando frases
______________________ enormes. Lembrar: Sujeito – Verbo –
Complementos.
Ou para 7. Não às: frases demasiado longas,
_______________________________________ abreviaturas, má mancha gráfica,
__________________ rasura exagerada.
8. Ser criativo. Ter pensamento próprio. (O
(Pense no uso que os seus leitores poderiam plágio é crime. A paráfrase é inútil no dado
fazer da sua mensagem) contexto).

b) Qual o objectivo que seria mais relevante  AS TRÊS MANOBRAS DE EMERGÊNCIA


para a mesma audiência? (Examine os DA RETÓRICA!!!
objectivos anteriores e escolha aquele que

23
1. Apreender a mensagem implícita em nosso egoísmo, da nossa pequenez e nos tornarmos
dado texto. Criar o argumento próprio a algo muito maior e lindo. Todos nós seremos sábios,
partir dessa mesma mensagem todos nós seremos anjos – se assim o quisermos. Pois
compreendida no texto. é isso que está patente no poema, essa profunda fé e
2. Demonstrar passo-a-passo o argumento, convicção de que qualquer um de nós, por mais
dando a opinião pessoal. mesquinho e limitado que seja pode tornar-se puro e
3. Defender e confirmar fazendo recurso a vasto como a nuvem.
uma exemplificação pertinente e sintética. O grande cientista Einstein costumava dizer que “no
universo nada se perde, nem nada se ganha, tudo se
 PROPOSTA EXEMPLIFICATIVA DE transforma” referindo-se às leis básicas da física. Ou
COMENTÁRIOS (autoria de alunos) seja, não há morte, nem fim, mas um processo de
crescimento, de evolução ética, cultural e espiritual.
“A palavra é como a pedra. Uma vez atirada já Sem nos transformarmos em “nuvem” continuaremos
ninguém a apanha.” Provérbio russo. como poças de lama suja, encerrados na nossa
pequenez. Ser nuvem, ser algo celeste e imaculado é
Este provérbio russo aponta para um problema de possível, mas é preciso querê-lo com todo a alma, tal
máxima importância para todos nós, intelectuais e como o pequeno charco que tanto cismava acerca da
estudantes: o problema do valor da palavra e o perigo sua condição, pois queria ser mais. Muito mais.
da sua má utilização. E este problema não é exclusivo
daqueles que se preocupam com a linguagem, a “O melhor espelho é o olhar de um amigo.”
palavra, ou símbolo. Na verdade, todas as culturas, ao Provérbio gaélico.
longo de toda a história, sempre demonstraram um
cuidado muito particular relativamente ao mau uso da Este interessante provérbio utiliza a metáfora para
palavra. nos demonstrar que, muitas vezes, é nas reacções
A palavra tem o poder de nos apontar a verdade, mas daqueles que nos rodeiam, ou nos amam, que
também de mentir, de nos desviar da realidade, e de podemos descobrir quem somos. Aqui, portanto, é
nos magoar. Uma pequena palavra pode trazer muito utilizada uma metáfora em que o espelho simboliza o
sofrimento à nossa vida, como é o caso dos insultos, reflexo dos nossos actos e comportamentos.
boatos, “fofocas” e críticas. Palavras que, quando O ser humano é um ser social, de relações, e as
proferidas, já não são fáceis de apagar, e cujo eco relações com aqueles ao nosso redor são o que
pode indelevelmente permanecer nos nossos ouvidos constrói e define a nossa vida. Para muita gente,
e corações. Tal como se diz que a maior mentira é infelizmente, a vida pode ser definida como triste,
aquela que apenas se afasta ligeiramente da verdade, pois grande parte das pessoas vive vidas inteiras em
assim um insulto, uma palavra dura, é o quanto basta conflito com aqueles que estão em seu redor. E o
para destruir vidas. Uma pessoa pode matar ao dizer conflito e dor são, na maioria dos casos, resultado da
“amo-te”, caso isso seja mentira e a outra pessoa cegueira e falta de vontade de ver a verdade. Porque
acredite e crie naturais expectativas. Mas a ignorância se observássemos com atenção o olhar daqueles que
é isso mesmo: não antever as consequências das estão em nosso redor, frequentemente haveríamos de
palavras. Uma palavra, uma vez lançada, tem vida captar a tristeza, a reprovação e a dor no seu olhar.
própria e não sabemos como vai ser interpretada ou Nesse caso os olhos daqueles que nos rodeiam, e o
sentida por outros. modo como eles nos olham, são um bom espelho e
Em certas culturas, como a da Polinésia, existem reflexo daquilo que nós somos e fazemos.
palavras que são “tabu”, ou seja, não devem ser Por exemplo, todos nós já estivemos na situação de
proferidas levianamente, pois “tabu” significa, perguntar a outros: “porque me olhas desse modo?”
literalmente, “sagrado”. Há coisas sagradas na nossa justamente porque no olhar da outra pessoa captamos
vida, nomeadamente a Palavra e o uso que lhe damos. algum indício de algo de que nós mesmos não nos
Uma vez saída da nossa boca ela voa e as suas demos conta. Ou então, acontecer o maravilhoso
consequências devem ser acauteladas. Assim o diz o oposto, como quando num olhar cheio de ternura e
sábio ditado, também aqui em Angola utilizado: “a afecto podemos confirmar que estamos bem,
palavra é de prata, mas o silêncio é de ouro.” Por actuamos bem e o mundo, reflectido nas pupilas dos
vezes, quando não se tem a certeza de como irá outros, assim no-lo confirma.
“voar” a nossa palavra, o melhor é fazer silêncio.
“Se os teus projectos são para um ano, planta
“Hoje feio e fétido arroz. Se os teus projectos são para vinte anos,
- cismava o charco – planta árvores de fruto. Mas, se os teus projectos
amanhã serei nuvem.” são para mais de mil anos, então, educa as
(Hermógenes) pessoas.” Provérbio chinês.

Este belo e sintético poema tem implícita uma A mensagem que, claramente, nos é transmitida por
profunda mensagem de esperança. Este poema este provérbio é uma mensagem acerca das nossas
chama-nos a atenção para o facto de que a prioridades na vida. E, neste caso, aquilo que nos é
transformação, a redenção e a mudança são a apontado como fundamental prioridade é a cultura, a
natureza da nossa própria existência. Nada dura para educação das pessoas.
sempre, e tudo se transforma, sublima, de acordo com Para aqueles cujos objectivos de vida são modestos,
a sua própria natureza. Estamos todos a caminho de pequenos mesmo, o provérbio aconselha a que se
casa e de descobrir a nossa verdadeira identidade, ou plante arroz. Neste caso o arroz representará os
verdadeira natureza. objectivos mais simplistas e imediatos da vida. Do
Portanto, o que este poema nos quer mostrar é que mesmo modo as árvores de fruto representarão
todos nós teremos a oportunidade de nos tornarmos projectos de médio alcance, aqueles que a maioria das
melhores, de nos transcendermos, de irmos para lá do pessoas prioriza na sua vida, tais como casa, carro, e

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outros bens mais difíceis de obter. No entanto, fica “Ferramentas” poderá encontrar o comando que lhe
patente neste provérbio que tanto o “arroz”, como as permite obter esse número.
“árvores de fruto” representam prioridades e
objectivos exclusivamente materialistas,
consequentemente, perecíveis e mortais. Em
contrapartida a Educação representa um projecto que
vai para lá do material, é algo puro, pois leva à
sabedoria e imortalidade.
O prémio Nobel da paz, o tibetano Dalai-Lama, disse
que transmitirmos o nosso conhecimento é uma
maneira de nos tornamos imortais e eternos. Isto é
verdade, pois a transmissão e partilha do saber, da
cultura e da inteligência, são o mais alto objectivo e
prioridade que alguém pode ter na vida. É a
possibilidade real de contribuir para o mundo dos
nossos futuros netos – pois as nossas palavras,
descobertas e sabedorias farão parte integrante deles e
desse mundo melhor, onde a nossa vida durará muito
mais do que algumas décadas, mas atingirá os tais mil
anos que, no fundo, são uma metáfora acerca da
imortalidade. A mais ambiciosa de todas as
prioridades.

V COMENTÁRIO CRÍTICO INTERTEXTUAL


(guia de orientações).

1. Escolha, de acordo com a sua


sensibilidade, o excerto que considerou
mais relevante na obra literária.
2. Procure nos “fascículos” um excerto que
contenha uma mesma mensagem
implícita que o excerto escolhido da
obra literária.
3. Transcreva ambos os excertos no início
do seu trabalho.
4. Elabore um comentário intertextual de
350 a 500 palavras baseando-se em
ambos os excertos.
a) Torne clara a mensagem
implícita presente em ambos os
excertos e de que modo estes se
relacionam.
b) Apresente um argumento
criativo e relevante como base
para o seu trabalho.
c) Demonstre com assertividade e
articulação a sua opinião acerca
da obra e dos excertos.
d) Defenda e confirme o seu
argumento recorrendo a uma
exemplificação pertinente.
e) Faça uso dos apontamentos “Para
a escrita de um comentário” e
“Sistematização teórica por
tópicos”. Cumpra, também, as 8
regras de ouro.

Para a elaboração do comentário pede-se que o


trabalho seja apresentado no tipo de letra “Times
New Roman”, tamanho 12, com os parágrafos 1,5.
Ou seja, a estrutura e tipo de letra em que este
mesmo guia de orientações está a ser elaborado.
Poupe papel: faça o seu trabalho apenas em uma
folha de papel A4. Coloque no cabeçalho o logótipo
da Universidade Agostinho Neto, seguido da
Disciplina, Docente e nome do Autor do Comentário.
Apresente no fim do trabalho o número de palavras
que utilizou no seu comentário. Na barra

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